PERRENOUD, PHILIPPE. A pedagogia na escola das diferenças

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Philippe Perrenoud A Pedagogia na Escola das Diferenças. Fragmentos de uma sociologia do fracasso Porto Alegre (Brasil), Artmed Editora, 2001. Há várias décadas a escola vem transformando as desigualdades sociais e culturais em desigualdades de resultados escolares, devido à sua " indiferença pelas diferenças ". Atualmente, novas ferramentas estão sendo utilizadas para demonstrar que o fracasso escolar não é uma fatalidade: a pedagogia de suporte, a pedagogia diferenciada, a individualização dos percursos de formação, o ensino por ciclos, os estudos dirigidos e módulos no ensino médio, entre outras. No entanto, essas iniciativas nem sempre produzem os resultados esperados e, às vezes, os professores se desestimulam e retornam ao ensino coletivo que tinham denunciado antes. Neste livro, Philippe Perrenoud auxilia o leitor a compreender esse fenômeno, a analisar as resistências ligadas a uma organização social pensada em outra época, e a entender as inquietudes es que consideram arriscado que as diferenças sejam levadas em conta. Sua visão sociológica e realista ajuda os educadores a encontrarem novas formas de atuação. Sumário Introdução O fracasso escolar incomoda vocês? Talvez seja possível fazer algo Em primeiro lugar, é preciso que o fracasso escolar incomode! A seguir, é preciso negar a fatalidade do fracasso. Uma abordagem sistêmica A tríplice fabricação do fracasso Indiferença às diferenças, realmente? Entre a psicanálise e a antropologia Pedagogias diferenciadas Plano da obra 1. Five Easy Pieces Da individualização à diferenciação: tudo se complica! A diferenciação sonhada Diferenciar tudo logo 1

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Philippe PerrenoudA Pedagogia na Escola das Diferenças.

Fragmentos de uma sociologia do fracassoPorto Alegre (Brasil), Artmed Editora, 2001.

Há várias décadas a escola vem transformando as desigualdades sociais e culturais em desigualdades de resultados escolares, devido à sua " indiferença pelas diferenças ". Atualmente, novas ferramentas estão sendo utilizadas para demonstrar que o fracasso escolar não é uma fatalidade: a pedagogia de suporte, a pedagogia diferenciada, a individualização dos percursos de formação, o ensino por ciclos, os estudos dirigidos e módulos no ensino médio, entre outras. No entanto, essas iniciativas nem sempre produzem os resultados esperados e, às vezes, os professores se desestimulam e retornam ao ensino coletivo que tinham denunciado antes.

Neste livro, Philippe Perrenoud auxilia o leitor a compreender esse fenômeno, a analisar as resistências ligadas a uma organização social pensada em outra época, e a entender as inquietudes es que consideram arriscado que as diferenças sejam levadas em conta. Sua visão sociológica e realista ajuda os educadores a encontrarem novas formas de atuação.

Sumário

Introdução

O fracasso escolar incomoda vocês? Talvez seja possível fazer algo

Em primeiro lugar, é preciso que o fracasso escolar incomode!

A seguir, é preciso negar a fatalidade do fracasso.

Uma abordagem sistêmica

A tríplice fabricação do fracasso

Indiferença às diferenças, realmente?

Entre a psicanálise e a antropologia

Pedagogias diferenciadas

Plano da obra

1. Five Easy Pieces

Da individualização à diferenciação: tudo se complica!

A diferenciação sonhada

Diferenciar tudo logo

" A manteiga e o creme da manteiga ": ambiguidades da diferenciação

Cultura escolar, cultura elitista?

2. A desigualdade cotidiana diante do sistema de ensino: a ação pedagógica e a diferença

O tratamento das diferenças

Os professores do ensino fundamental e a desigualdade

Diversidade dos alunos e animação do grupo-classe

Relação pedagógica e distância cultural

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A ação pedagógica não é indiferenciada

Imagens das diferenças, diferenciação das imagens.

O ensino é um ofício impossível?

3. As novas pedagogias são elitistas?

Reflexões sobre as contradições da escola ativa

Uma questão com duas facetas

Uma ideologia próxima das novas classes médias

A organização invisível

A recusa da avaliação e da seleção

Relação com o saber e motores da aprendizagem

A criança no centro do mundo

Trabalho e jogo

Privilegiar as aprendizagens fundamentais

À guisa de conclusão

4. Diferenciação do ensino: resistências, lutos e paradoxos.

Assumir o luto

Paradoxos

5. Organizar a individualização dos percursos de formação: medos a superar e habilidades a construir

O currículo real já é individualizado!

Contra uma individualização deixada ao acaso

Agir em diversos níveis

Os obstáculos no nível do sistema de ensino

Os obstáculos no nível do estabelecimento

Os obstáculos no nível das interações didáticas

Devemos nos desesperar?

6. Ciclos pedagógicos e projetos escolares: é fácil dizer!

Viver uma época formidável!

Enriquecer sua caixa de ferramentas

Aprender a trabalhar em conjunto

Trabalhar consigo mesmo

Concluir?

7. Perspectivas: contra o pensamento mágico!

Mudar de identidade e de satisfações profissionais

Mudar a relação com a cooperação profissional

Mudar a relação com os saberes, a aprendizagem, o sentido.

Mudar a relação com as pessoas e as famílias

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Mudar a relação com a mudança

De novo, a profissionalização do ofício.

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PERRENOUD, PHILIPPE. A pedagogia na escola das diferenças: fragmentos de uma sociologia do fracasso. Porto Alegre; Artmed, 2001; 2ª edição.

A obra de Perrenoud trata dos diferentes aspectos a serem considerados na problemática do fracasso escolar, abordando a dificuldade do sistema escolar em respeitar a heterogeneidade dos alunos como principal causa e analisando de modo crítico o papel de todos os atores envolvidos e sobretudo de quem o autor afirma ter fundamental importância nessa discussão: o professor.

O autor discute a diferenciação entre os alunos citando Bourdieu quando trata da bagagem cultural que cada indivíduo traz e como essa diferença poderá familiarizar ou exilar o aluno em função do que cada um apreendeu ao longo de sua vida, analisando os vários aspectos que permeiam a questão. Tratar os alunos como iguais em direitos e deveres, quando na realidade é evidente que são muitas as diferenças entre eles, acaba por favorecer uma parte deles em detrimento dos demais. O que traz à tona a discussão de que a diferenciação poderá beneficiar as elites, dependendo do modo como o profissional desenvolva a sua prática. Perrenoud defende que os percursos são necessariamente diferenciados, ainda que não pareçam a primeira vista, uma vez que a história de vida, as aspirações e até mesmo a atenção que o aluno tem a determinadas aulas interferem no que cada um aprende, sendo portanto impossível avaliar o percurso de cada aluno. Desse modo ele afirma que toda proposta didática será inadequada para uma parcela dos alunos. Portanto, faz um alerta para que jamais, se espere por resultados espetaculares, mas que se tenha consciência de que se trata de um longo percurso, em que nenhum esforço é perdido.

O papel do professor também é criticamente avaliado, considerado como principal variável a ser mudada. O autor faz uma discussão onde analisa os medos e as vaidades que se impõem a muitos profissionais, impedindo que assumam o compromisso de adotar uma pedagogia diferenciada com vistas a vencer o fracasso escolar. Nesse aspecto, trata dos lutos que necessariamente precisam ser enfrentados e reconhecidos, para que pesem as perdas e ganhos dessa decisão e percebam que vale a pena enfrentar o desafio. Habituados a ser o centro dos acontecimentos, o professor sente a perda de poder e agarra-se ao modelo tradicional de ensino. Sua autoridade também é discutida, na medida em que se questiona como mediar o seu papel dentro da sala de aula, sem uma postura autoritária, mas mantendo a liderança da turma. Outro aspecto que causa temor e luto é o trabalho em equipe, que gera insegurança e conflito de interesses entre alguns profissionais, que se apegam as dificuldades apresentadas e negam-se a abrir seu espaço de relativa autonomia para interferência externa. O autor defende que sem um trabalho conjunto, onde toda a comunidade escolar se envolva no processo de mudança, não será possível vencer os desafios da diferenciação.

A relação professor x aluno é avaliada, considerando a dificuldade do professor em aceitar determinadas posturas, bem como, até que ponto os alunos estão dispostos a confiar em alguém que faz julgamentos a seu respeito, através de avaliações nem sempre justas. Lembrando que na verdade o professor informalmente acaba conhecendo muito da vida dos seus alunos, no entanto, ele não apreende a importância dessas informações e acaba por descartá-las ao longo de sua prática cotidiana. Nesse aspecto, ele defende que o professor precisaria dispor de um esquema de classificação e registro de tais informações para poder fazer uso adequado delas. Perrenoud lembra que diferentes profissionais desenvolvem seu trabalho de modo personalizado, como médicos, psicólogos e assistentes sociais, dispondo assim de condições adequadas para compreender a individualidade das pessoas para as quais

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trabalham; o autor defende que se a profissão de professor tivesse sido pensada da mesma forma, não haveria uma incidência tão grande fracasso escolar, uma vez que não haveria dificuldade alguma para compreender a diferenciação de percurso de cada aluno e ajudá-lo a encontrar o caminho adequado para alcançar o sucesso escolar.

A escola também é avaliada por Perrenoud quando questiona seu papel apontando-a como responsável por fabricar o fracasso escolar. Para ele existe uma tríplice fabricação do fracasso por parte da escola; em primeiro lugar através do currículo, que desconsidera as diferenças tanto do ponto em que partem, como nas condições de avançar, o que certamente favorece àqueles que estão familiarizados com as normas. Em seguida ele discute o problema da indiferença às diferenças como sendo o segundo modo de fabricar tanto o sucesso como o fracasso escolar. E finalmente, o momento e o modo de avaliação, afirmando que a importância que a escola dá a hierarquia é decisiva na construção do que se reconhece como sucesso ou fracasso e que interfere diretamente no desempenho escolar.

Outra questão trabalhada no livro é a sistematização da diferenciação, lembrando que é essencial que existam regras de funcionamento negociadas com os alunos e um mínimo de disciplina para que todos compreendam a finalidade do sistema e passem a acreditar nele. A avaliação tradicional é discutida, quando o autor questiona se os alunos que não passam pela avaliação tradicional na fase escolar, ao deparar-se com uma avaliação seletiva para disputar com àqueles que estão habituados ao sistema sentiriam dificuldades ou se seriam autônomos e preparados o suficiente para enfrentar diversas situações que se apresentem sem dificuldade.

Por fim, Perrenoud lembra que a diferenciação não precisa ser pensada como uma coisa acabada, mas como uma construção que deverá ser continuamente construída em razão da complexidade e diversidade de situações.

Fazendo uma breve apreciação da obra, pode-se dizer que se trata de uma abordagem bastante completa da problemática da pedagogia diferenciada como enfrentamento do fracasso escolar. A complexidade do tema traz consigo diferentes perspectivas, que são discutidas de modo claro e coeso. Considero a obra essencial como referencial teórico para quem trabalha com questões voltadas à educação. Os temas discutidos trouxeram-me uma nova roupagem ao entendimento que tinha acerca do assunto, possibilitando um aprofundamento das ideias prévias ao fomentar um novo olhar à antiga questão.

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