PESQUISAS REALIZADAS NO BRASILSOBRE A OBRA DE JEAN PIAGET:

UMA VISÃO GERAL (*)

SOLANGE APARECIDA GARAKISLicenciada em Pedagogia - Magistério *':'

1 - INTRODUÇÃO

Este trabalho surgiu do nosso interesse pela obra de JeanPiaget, por considerá-Ia uma contribuição valiosa às questões.ligadas ao desenvolvimento e aprendizagem, questões estasfundamentais para a Pedagogia.

De conhecimento e reconhecimento internacional, suaobra, no Brasil, se constitui em objeto de estudos e pesqui-sas, principalmente nas áreas de Educação e PsicologiaEducacional, com o intuito de buscar uma melhor fundamen-tação teórica para a ação pedagógica.

O objetivo do presente estudo é o de oferecer um visãogeral a respeito destas pesquisas. Inicialmente, foi feito umlevantamento das dissertações realizadas no Brasil sobre suaobra, tendo como fonte os volumes I, li e 111 do Banco deTeses, editado pelo M. E. C.; selecionadas cinco, como amos-tra das pesquisas realizadas, estas dissertações foram objetode estudo e análise e transformadas em resumos.

(:~) Trabalho resultante do projeto I. do Mestrado em Educação, sob ori-entação da Ora. Maria Lucia Lopes Oallago.

(':'*) Supervisão Escolar pela F.F.L.S.A. (São Paulo) e aluna do Mes-trado em Educação da U. F. C. (Ceará).

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2 - MODELO E ESTRUTURA NA OBRA DE JEAN PIAGET

Chiarottino, Zélia Ramozzi (U. S. P .)O objetivo desta tese é demonstrar como Piaget chega a

um modelo de estruturas mentais e de sua formação, a partirda observação e experimentação.

Justificando a proposição básica do trabalho, a autorada tese afirma que, se analisarmos a obra de Piaget para delaextrair não o que queremos mas o que ele teve intenção defazer, verificaremos que seu objetivo foi o de resolver o pro-blema do conhecimento, criando para isto um modelo abs-trato daquilo que outros filósofos chamaram razão e ele chamainteligência.

A argumentação teórica do trabalho parte do estabeleci-mento dos modelos que justificariam a existência de umaconstrução das estruturas mentais desde o período sensóriomotor até o período das operações proporcionais.

A seguir, é apresentado o problema da formação e· fun-cionamento das estruturas onde a noção de equilíbrio é cen-tral, na medida em que deve explicar a formação e o funcio-namento das estruturas mentais, de maneira a justificar apassagem de um processo temporal a um sistema de cone-xões atemporais, e assim, estabelecer um acordo entre oaspecto genético e o aspecto lógico-matemático dessas es-truturas.

Chiarottino demontra que houve uma evolução do con-ceito de equilíbrio, inicialmente proposto por Piaget comoum equilíbrio biológico-mecânico e que, não satisfazendo asexigências de conciliação entre o caráter necessário das es-truturas lógico-matemáticas e sua natureza biológica, foi subs-tituído por um novo conceito de equilíbrio cibernético que su-peraesta dificuldade.

O novo conceito de equilíbrio poderia, no entanto, suporum "a priori" responsável pel necessidade lógico-matemáticaalcançada pela inteligência; para esclarecer esta colocação éanalisado o "apriorismo e aprendizagem" na obra de Piagetdemonstrando que, na teoria piagetiana, encontramos um"a priori" funcional, que é condição necessária de todo co-

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nhecimento, mas que não implica a pretorrnação de formassuperiores, mas, sim, propicia uma série de reconstruções nãopredeterminadas.

Concluindo, a autora afirma que para Piaget as estrutu-ras de agrupamento e do grupo I. N. R. C. são os modelos dasestruturas mentais; o estabelecimento destes modelos é a ten-tativa de Piaget de estruturar um fenômeno do qual se co-nhece apenas a aparência.

A criação de um modelo abstrato poderia parecer umaatitude não objetiva, mas objetividade científica, como afirmaPiaget, não é um estado, é um processo; a criação de um mo-delo não é ficção do cientista, pois surge para explicar umfenômeno, e tem que ser aplicado à experiência.

3 - MODELO NORMATIVO DE ESTRUTURAS DE CURRf-CULO PARA AS H S'~RIES DO I GRAU: UMA APLICA-çÃO DA TEORIA DE JEAN PIAGET.

Guelman, Tanha (U. F. R. J.)

Visando apresentar uma nova perspectiva de currículocomo alternativa até então vigente, o trabalho propõe a ela-boração de um modelo normativo de estruturas de- currículopara as H séries do I Grau conforme a linha piagetiana dedesenvolvimento mental. "

O embasamento teórico do modelo é elaborado partindode uma análise do Estruturalismo e, particularmente, do Es-truturalismo Piagetiano e suas manifestações na Epistemo-logia Genética, buscando subsídios para uma proposta edu-cacional.

Confirmada a possibilidade destes subsídios, a autora dotrabalho apresenta a análise do período operacional concretodemonstrando que a criança, nesta fase, pensa por agrupa-mentos, sendo que a organização desses agrupamentos cons-titui o aspecto estrutural de seu desenvolvimento, enquantoque o aspecto dinâmico dessas estruturas é constituído pelasinvariantes tuncionais de assimilação, acomodação e adap-tação.

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A partir destas constatações, a proposição do trabalho éa de construir uma estrutura de currículo similar à estruturamental da criança no seu aspecto estrutural e dinâmico.

Finalmente, é elaborado um modelo de estruturas meto-dológicas de currículo na linha piagetiana para as H sériesdo I Grau e apresentada a aplicação do modelo à área deIntegração Social; um modelo que possibilite na criança odesenvolvimento do pensamento social, da consciência críticado social, de análise e avaliação das estruturas sociais paraa compreensão do contexto sócio-cultural e dela mesma, nestecontexto.

4 - A TEORIA DO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO DEPIAGET NA ELABORAÇÃO DE UM ESQUEMA DE OR-

-' GANIZAÇÃO CURRICULAR CONFORME OS CRITÉRIOSDE INTEGRAÇÃO, CONTINUIDADE E SEQü~NCIA

Moro, Maria Lúcia Faria (P. U. C. - São Paulo)O objetivo desta dissertação é o de identificar os ele-

mentos que a teoria do desenvolvimento cognitivo de Piagetpossa oferecer para a elaboração de um esquema de orga-nização curricular, para a escola elementar, conforme os cri-térios de integração, continuidade e seqüência.

Inicialmente, são apresentados alguns conceitos básicosda teoria do desenvolvimento cognitivo de Piaget e outrossobre organização de currículos, estabelecendo um quadrode referências para investigar a possibilidade daquela teoriaoferecer elementos para o esquema de organização pretendido.

A seguir, é apresentada um revisão da literatura sobre ateoria piagetiana na educação escolar e, particularmente, asreferentes à organização curricular procurando identificar pro-cessos mentais ou psicológicos que permitam a elabração deum esquema curricular conforme os critérios de integração,continuidade e seqüência.

Utilizando-se do referencial teórico apresentado, a autorado estudo conclui que a teoria piagetiana oferece as quatrooperações concretas - a direta, a inversa, a idêntica e a as-

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associativa incompleta - como elementos, que podem consti-uir um esquema de organização de currículos para a escola

elementar; coordenadas entre si e interagindo com os objetosou conteúdos de cada disciplina elas podem, como elemen-tos daquele esquema de organização, atender aos critériosde integração, continuidade e seqüência.

Aquelas quatro operações, cujo modelo é o agrupamento,constituem a estrutura típica da inteligência humana na fase'operatória concreta, quando o aluno é cliente da escola ele-mentar, e consistem nos processos mentais ou psicológicoscom que o sujeito transforma os objetos em noções operató-rias.

Considerando estes processos mentais como o modo deinteração do aluno com o ambiente físico e social, nesta faseé que a autora propõe estas quatro operações como conteú-dos curriculares, isto é, aquilo cuja ocorrência deve ser fa-vorecida durante aquele nível de escolaridade.

5 - COMPETt:NCIAS BÁSICAS A SEREM DEMONSTRADASPELO PROFESSOR DAS QUATHO PRIMEIRAS S~RIESDO I GRAU

Ramalho, Tania Cristina Araujo (U.F.R.J.)

Constatando a necessidade de melhoria da qualidade dosCursos de Formação de Professores, esta dissertação tempor objetivo. estabelecer algumas competências básicas,consideradas fundamentais à atuação do professor das sé-ries iniciais, na teoria do desenvolvimento cognitivo de Piaget.

A fundamentação teórica do estudo inicia-se com a apre-sentação de alguns conceitos básicos da teoria do desenvol-vimento cognitivo de Piaget, sendo destacado o período dasoperações concretas considerado de maior interesse para oprofessor das quatro primeiras séries do I Grau.

As características principais de programas de ensino ba-seados em competência são definidos, bem como apontadassuas dificuldades e vantagens de aplicação.

Concluindo, a autora apresenta um quadro construídocom os conceitos básicos, destacados da teoria piagetiana, e

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as respectivas competências, propostas como indicadores dedomínio dos mesmos, e sugere algumas atividades que pode-riam servir como meio de avaliação de tais competências.

6 - A SOLICITAÇÃO DO MEIO E A CONSTRUÇÃO DAS ES-TRUTURAS LóGICAS ELEMENTARES NA CRIANÇA

Assis, Orly Zucatto Montovani de (UNICAMP - SP).

O objetivo fundamental desta pesquisa é o de verificar ainfluência da solicitação do meio no desenvolvimento intelec-tual das crianças de Campinas.

Visando alcançar este objetivo, foram formuladas umahipótese geral e quatro sub-hipóteses.

1 - As crianças submetidas a um processo de estimula-"ção deverão chegar ao estágio operatório-concreto na idademédia em que chegam as crianças de países culturalmenteadiantados, isto é, 6, 7 anos.

Dentre as crianças que atingirão o estágio operatórioconcreto:

2.1 - A proporção das crianças aumenta em relação di-reta com a idade.

2.2 - A proporção de crianças de nível sócio-econômicoalto (Nível 4) é maior que as demais.

2.3 - A proporção das crianças de nível sócio-econômicomédio (nível 3) será maior que a dos níveis sócio-econômico1 e 2.

2.4 - A proporção das crianças de nível sócio-econô-mico baixo será maior que a do nível sócio-econômico baixo(Nível 1).

Para testar empiricamente as hipóteses, foram controla-das as seguintes variáveis:

1 - Solicitação do meio-processo de solicitação, desen-volvido no grupo experimental, que consiste em colocar acriança em situações problemas com o objetivo de desenvol-ver a expressão verbal, o conhecimento físico e a sociali-zação.

2 - Estágio de desenvolvimento intelectual - determi-nado a partir dos resultados nas provas para diagnóstico docomportamento operatório, instrumento utilizado como me-dida desta variável.

3 - Nível sócio-econômico - cujo instrumento de me-dida foi elaborado a partir de indicadores usados por Poppovic(1973).

4 - Idade.

A amostra foi constituída por 388 sujeitos matriculadosnas classes de educação pré ....escolar de Campinas; suas ida-des variavam entre 4 anos e 7 meses e 6 anos e 8 meses ese distribuíam quanto ao nível econômico em 22,9 = % donível 1; 39,62% do nível 2; 14, 32% do nível 3 e 23,18% donível 4.

O modelo do experimento pode ser assim esquernatizado.

GEO X O1 2

GC O2

O pré-teste1

X = tratamento (solicitação do meio)

O = pós-teste2

A análise estatística do efeito da variável independentesolicitação do meio sobre o desenvolvimento íntelectual, foifeita pela simples comparação dos resultados obtidos pelossujeitos do Grupo Experimental e do Grupo de Controle.

A análise estatística dos efeitos das variáveis idade enível sócio-econômico na variável dependente estágio do de-senvolvimento intelectual foi feita através do Teste X2 (quiqua-drado corrigido) e Teste de Duas Proporções para PopulaçõesIndependentes.

Finalmente, a autora apresenta as conclusões que se re-ferem à confirmação de dados teóricos sobre o desenvolvi-

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mento cognitivo proposta por Piaget e aos, resultados experi-mentais da pesquisa.

Os resultados experimentais comprovam: a) a existênciade um atraso no desenvolvimento mental de nossas crianças;b) que a falta de solicitação ambiental adequada é o fatorfundamentalmente responsável por esse atraso; c) que esseatraso pode ser superado e uma das formas pelas quais. issopode ser feito é através do processo de solicitação do meio.

A hipótese geral foi, portanto, confirmada e as sub-hipó-teses referentes às variáveis idade e nível sócio-econômico(a, b, c, d) foram rejeitadas.

Comentários e sugestões

O"interesse central das pesquisas realizadas no Brasilsobre a obra de Piaget tem sido preponderantemente o deaperfeiçoar a qualidade do ensino em nossas escolas, bus-cando, para tanto, uma fundamentação teórica capaz de orien-tar a ação pedagógica de modo mais científico.

A preocupação maior tem se revelado com as primeirasséries do I Grau, justificada pelos autores, como as de maiorabrangência quantitativa no Brasil e as que concentram omaior número de problemas educacionais, por atenderem aalunos de ambientes mais e menos favorecidos culturalmen-te, aspecto considerado por Piaget como um dos fatores dedesenvolvimento e aprendizagem.

Os trabalhos de Guelman e Moro que, a partir da funda-mentação teórica da concepção piagetiana de desenvolvi-mento, apresentaram propostas curriculares, assumem o ca-ráter de hipóteses válidas a serem verificadas na prática edu-cativa.

A constatação dos resultados da pesquisa experimentalde Assis evidenciou a viabilidade de um novo método peda-gógico para as classes pré-prirnárlase a possibilidade de suaexecução.

Esclarecimentos teóricos oferecidos por trabalhos comoo de Chiarottino, que apresentou uma análise detalhada sobre

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a noção de equilíbrio na teoria piagetiana, servem de funda-mentação para estudos experimentais, como ficou demonstra-do na dissertação de Assis, que se utilizou desses conhe-cimentos para fundamentar o processo de solicitação domeio.

As competências básicas a serem demonstradas peloprofessor das séries iniciais, apresentadas no trabalho deRamalho, são, a meu ver, uma tentativa de transmitir conhe-cimentos cognitivos na linha comportamental, amplamentecriticada por Piaget.

Todas estas pesquisas realizadas. no Brasil, apesar depouco numerosas, (apenas doze constavam no Banco de Te-ses) são importantes na medida em que confirmam dadosteóricos da concepção piagetiana de desenvolvimento e pro-curam utllizá-Ios na solução de problemas educacionais.

Devido a amplitude da obra de Piaget e de seus colabo-radores, muitas outras pesquisas podem ser desenvolvidascomo continuação de estudos por eles já iniciados, como arelação entre o pensamento e a linguagem, julgamento e ra-ciocínio e o julgamento moral das crianças, cujos resultadosindicam um paralelismo entre os estágios de desenvolvimentointelectual e o desenvolvimento da criança nestas. áreas.

A teoria piagetiana propõe, ainda, um estreito paralelis-mo entre afetividade, socialização e desenvolvimento intelec-tual e pesquisas nestas áreas poderiam confirmar esta pro-posição teórica.

Além disso, as relações entre a imaginação, percepçãoe inteligência certamente abrem perspectivas para novas in-vestigações.

Inhelder, um dos colaboradores de Piaget, iniciou estu-dos sobre o desenvolvimento de crianças com deficiênciasintelectuais, outro novo campo de pesquisas dentro da teoriapiagetiana de desenvolvimento cognitivo.

Estes estudos interessam sobremaneira a Pedagogia, poisa escolaridade é um importante fator de desenvolvimento dacriança e do adolescente, e· se constitui no meio que a socie-dade utiliza para preparar as novas gerações.

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REFER~NCIAS BIBLIOGRAFIAS

FLAVELL, John H. - A PsicolDgia do desenvolvimento de Jean Piaget.São Paulo, Pioneira, 1975.

PIAGET, Jean - A Teoria de Piaget, in Carmichaell Manua, de Psicologiado Desenvolvimento da Criança 4, Desenvolvimento cognitivo I. SãoPaulo, E.P.U. e E.D.U.S.P., 1977.1977.

- Psicologia e Pedagogia. Rio de Janeiro - São Paulo. Ed.Forense, 1970.

--- - Seis estudos de Psicologia. Rio de Janeiro - São Paulo,Ed. Forense, 1969.

Dissertações de:Assis, Orly Zucatto Montovani de U. Estadual de Campinas - São Paulo.Doutorado em Educação - Tese defendida em 1976.Orientador: Zélia Ramozzi ChiarottinoChiarottino, Zélia Ramozzi - U. S. P. - São PauloDoutorado em Psicologia - Tese defendida em 1970.Orientador: Dante Moreira LeiteGuelman, Tanha - Rio de JaneiroMestrado em Educação - Tese defendida em 1976.Orientador: Franco Presti SeminérioMoro, Maria Lúcia Faria - P. U. C. - São PauloMestrado em Educação - Tese defendida em 1977.Orientador: Maria Regina MalufRamalho, Tania Cristina Araújo - U.F.R.J. - Rio de JaneiroMestrado em Educação - Tese defendida em 1977.Orientador: Lilia da Rocha Bastos.

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