PIBIC_Relatório Final_2007_2008_Janailson Macêdo Luiz_Maria Lindaci Gomes de Souza
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBAPRÓ-REITORIA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA
PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA
PIBIC/CNPq/UEPB Cota 2007-2008
JANAILSON MACÊDO LUIZ
REPRESENTAÇÕES ICONOGRÁFICAS SOBRE OS NEGROS
NOS LIVROS DIDÁTICOS DE HISTÓRIA DA 7ª SÉRIE
Grande Área:
Ciências Humanas (CH)
Sub-Área:
7. 05.00.00-2 – História
CAMPINA GRANDE – PB
AGOSTO/2008
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JANAILSON MACÊDO LUIZ
REPRESENTAÇÕES ICONOGRÁFICAS SOBRE OS NEGROS NOS LIVROS DIDÁTICOS DE
HISTÓRIA DA 7ª SÉRIE
Relatório Final apresentado ao Programa
Institucional de Bolsas de Iniciação
Científica - PIBIC/CNPq/UEPB.
Nome do Orientador(a): Maria Lindaci Gomes de Souza
CAMPINA GRANDE – PB
AGOSTO/2008
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F ICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL – UEPB
L953r Luiz, Janailson Macêdo.
Representações iconográficas sobre os negros nos livros
didáticos de história da 7ª série [manuscrito] / Janailson Macêdo
Luiz. – 2008.
45 f. : il. color.
Digitado.
Relatório (PIBIC) – Universidade Estadual da Paraíba, Pró-
Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa, 2008.
“Orientação: Profª. Drª. Maria Lindaci Gomes de Souza,Departamento de História e Geografia”.
1. Iconografia. 2. Representação - História. 3. Negros – Livro
Didático. I. Título.
21. ed. CDD 704.9
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RESUMO
INTRODUÇÃO: Estudos realizados entre 1950 e 2003 constataram que os negrosforam representados na maior parte das vezes nos livros didáticos brasileiros deHistória através de um viés eurocêntrico, tendo seus papéis minimizados naconstrução do estado-nação. Tornam-se, portanto, necessários estudos sobre asrepresentações destes sujeitos reproduzidas nos livros didáticos de Históriautilizados no início do século XXI, sobretudo no que se refere às imagens, que acada dia adquirem um maior valor histórico e social no processo educativo e nasociedade. OBJETIVOS: Analisar as modalidades de uso e as formas deapropriação das representações iconográficas sobre os negros nos livros didáticosde História da 7ª série adotados entre 2002 e 2007, pelo corpo docente de uma
escola pública. METODOLOGIA: Foram analisados os livros didáticos de autoria deSilva (2005), e Piletti e Piletti (2002). Deste modo, realizaram-se análises completasdas estruturas das obras, observações gerais das iconografias nelas apropriadas eleituras contextualizadas (internas e externas) das representações iconográficasrelativas às populações negras. RESULTADOS: Ao todo foram observadas 358iconografias presentes nestas obras. O estudo constatou que apenas 55 destasiconografias representam ao menos um personagem negro. Além disso, muitasdestas representações iconográficas apresentaram estes sujeitos em segundo planoe com reduzidas condições de visualidade. Contudo, em Silva (2005) foramidentificadas também micro-rupturas com relação ao paradigma tradicional dasrepresentações sobre os negros, sendo apropriadas algumas iconografias que
apresentavam concepções positivas deste grupo social. CONCLUSÃO: É recorrentenas obras a invisibilidade e a minimização dos negros nas iconográficasrepresentadas. Estas obras, apesar de apresentarem algumas mudanças comrelação a forma tradicional de representar os negros nas iconografias, reproduziramconcepções reducionistas e estereotipadas sobre a história e cultura daspopulações negras presentes na sociedade brasileira no início do século XXI. Nessesentido, as referidas obras apresentam-se como campos férteis para propagação deconcepções reducionistas sobre os negros.
PALAVRAS-CHAVES: Representação, Iconografia, Negros.
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SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ______________________________________ ______________________________________ 5
2. REVISÃO DA LITERATURA ____________________________________________________________ 8
3. DAS TEORIAS UTILIZADAS _________________________________ _ ________________________ 14
4. METODOLOGIA _________________________________________________________________________ 18
4.1. Análise Iconográfica ___________________________________________________________________ 21
5. RESULTADOS ___________________________________________________________________________ 23
5.1. A História entre pequenas rupturas e grandes permanências ___________________ 26
5.2. Sobre a catalogação no Nudoph e a formação de acervo iconográfico ________ 296. DISCUSSÃO ________________________________ _ _____________________________________________ 30
6.1. Das inferências, e comparações _____________________________________________________ 31
7. CONCLUSÃO ____________________________________________________________________________ 32
8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS __________________________________________________ 36
APENDICE A – Conhecendo o Premen 40
APENDICE B – Cronograma de execução proposto no projeto 41
APENDICE C – Novo cronograma de execução 42ANEXO A – Jogar Capoeira 43
ANEXO B – Gravura de Debret 44
ANEXO C – Retrato de Luis Gama 45
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1. INTRODUÇÃO
O presente relatório tem como finalidade apresentar os resultados de uma
pesquisa que objetivou analisar as modalidades de uso e as formas de apropriação
das representações iconográficas sobre os negros expostas em livros didáticos de
História utilizados como recurso pedagógico para o ensino desta disciplina na 7ª
série do ensino fundamental em uma escola pública, entre os anos de 2002 e 2007.
O estudo objetivou também identificar a recorrência de representações
iconográficas sobre as populações negras nos livros didáticos1 de História
pesquisados, bem como verificar as modalidades de usos das representações sobreos negros nessas obras e analisar que concepções sobre este segmento são
construídas e/ou reproduzidas nas iconografias selecionadas.
Foram escolhidos para a análise os LDs de História da 7ª série adotadas
entre 2002 e 2007 pelo corpo docente da Escola Estadual de Ensino Fundamental e
Médio Dr. Hortêncio de Souza Ribeiro (Premen), localizada no município de
Campina Grande – PB. Este é um dos espaços que merecem maior atenção deste
tipo de abordagem, não só por se encontrarem entre a clientela deste lugar umagrande quantidade de alunos negros e oriundos dos grupos mais carentes da
população, mas também por este espaço estar inserido no contexto da educação
como direito de todos os cidadãos.
A predileção pelo Premen motivou-se em virtude desta escola ser a instituição
na qual o pesquisador/bolsista concluiu os ensinos fundamental e médio. Fato que
possibilitou a este sujeito uma visão da escola tida agora de outro ângulo, e em
outra perspectiva, o retorno de um ex-aluno ao colégio, podendo agora este ex-aluno também contribuir com o saberes emanados naquele espaço.
Por outro lado, foi escolhido como objeto o LD de História, material que
cumpre um papel específico no processo de ensino/aprendizagem e se constitui em
um recurso amplamente utilizado pelo professor de História. Este tipo de material
didático, cuja utilização pelos professores da referida disciplina remonta ao século
XIX, se tornou comum nas escolas públicas, principalmente a partir da
obrigatoriedade da sua distribuição gratuita pelo governo federal através do
1 A partir de agora será utilizado o termo LD para designar Livro Didático, e LDs o seu plural.
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Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) que começou a vigorar em 1994. No
cotidiano escolar, o LD desempenha um papel significativo na formação cultural dos
alunos-leitores. Nesse sentido, seus textos e imagens passam a ser um forte
referencial para os estes sujeitos, haja vista que as concepções expostas em suas
páginas influenciam na formação da auto-estima dos que se debruçam sobre elas. O
LD em muitos casos vem se mostrando como um dos meios de propagação de
valores depreciativos que interferem nas formulações culturais dos indivíduos,
sobretudo no que tange às culturas oriundas de grupos estigmatizados na
sociedade, como é o caso dos negros.
Repensar, via análise do LD, a maneira como os negros foram representados ,
bem como sua história, constitui uma das reflexões fundamentais para aqueles quelidam direta ou indiretamente com o ensino de História, haja vista que este ainda é o
material pedagógico mais utilizado pelos professores, principalmente nas escolas
públicas, e que o “retrato” do passado estampado nas obras didáticas não escapa
ao olhar atencioso dos alunos. Muitas vezes é conferido um caráter de verdade aos
LDs, especialmente em se tratando do livro de História, que está intrinsecamente
ligado à formação de identidades individuais e coletivas, que são construídas pelos
indivíduos como algo ligado ao valor que os outros seres humanos lhe conferem, edependentes da influência que os sujeitos recebem dos processos sociais.
Optou-se para delimitar a problemática da pesquisa, em primeiro lugar, pela
análise dos LDs de História utilizados na 7ª série2. Esta escolha foi motivada pela
característica dos conteúdos de História ministrados nesta etapa do ensino, que
cobrem um amplo período da construção sócio-histórica do Brasil, tratando também
de temas cruciais para o entendimento da História das populações negras no país3.
Em segundo lugar, foi escolhido o recorte temporal 2002-2007 pelo fato desteperíodo ser marcado por medidas importantes para o ensino das questões
referentes aos negros, e para o contexto da educação no país de modo geral:
percepção dos primeiros resultados de mudanças provocadas pela LDB aprovada
em 1996 e pela inclusão em 1997 da pluralidade cultural entre os temas transversais
2 Atual 8°ano, segundo a nova designação adotada re centemente pelo Ministério da Educação.Contudo, para evitar anacronismos continuou-se com a designação 7ª série, utilizada durante ocontexto histórico abordado na pesquisa.3 Tráfico negreiro e sua proibição; insurreições de escravos e formações quilombos como o dePalmares; participação negra na guerra do Paraguai; inúmeras revoltas populares com participaçãonegra; lei de terras; lei sexagenária; lei do ventre livre; neocolonialismo na África; abolição daescravatura; primeiros anos da pós-liberdade dos ex-escravos; entre outros.
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dos Parâmetros Curriculares Nacionais para a educação; debates em torno da
aprovação da Lei 10.6394 e a sua aplicabilidade; crescente incentivo por parte do
governo para a massificação da educação publica; aumento de problematizações
relativas a História do negro no Brasil, provocadas pelos debates relacionados aos
500 anos do país. Esse período é considerado um momento de transformação, onde
os estudos referentes à população negra no Brasil tiveram mais uma de suas
metamorfoses. Também foi escolhido os primeiros anos do século XXI por se tratar
de um período ainda pouco abordado por outros pesquisadores, momento que gera
inquietações, relativas ao entendimento da existência ou não, nas produções das
obras didáticas analisadas, de influencias dos debates gerados por pesquisas
anteriores e das discussões do movimentado contexto histórico do início de século.A pesquisa centrou-se nas iconografias 5 e nas apropriações das mesmas nos
LDs de História. A análise iconográfica se faz cada vez mais necessária em um
período em que o mercado editorial privilegia o uso de imagens como ilustração dos
textos, visando uma melhor apreensão da realidade. A grande quantidade de
imagens reproduzidas hoje nos LDs se justifica pela elevada demanda visual tida no
atual mundo globalizado, em um contexto saturado de imagens, como é o caso da
(pós)moderna sociedade da informação. Nesse sentido, a execução de umapesquisa centrada nas análises iconográficas originou-se da compreensão de que
as iconografias se constituem em fontes que possibilitam leitura, interpretação e
construção do saber histórico e, além disso, influenciam de forma marcante as
atividades relacionadas ao ensino.
Com relação às populações negras , inúmeros estudos realizados no Brasil
mostram que por muito tempo o papel deste segmento na construção da sociedade
brasileira não foi reconhecido. Este quadro faz com que seja necessária a buscapela reversão desta invisibilidade dos negros, substituindo pré-conceitos por
conceitos, estereótipo s superficiais por entendimentos mais aprofundados. Deste
modo, analisar as representações sobre os negros presentes nos LDs,
principalmente através de imagens, constitui uma ação voltada para uma nova
leitura e possível etapa ulterior de desconstrução das imagens de negro que são
apresentadas nestes materiais.
4 Sancionada pelo presidente Luis Inácio Lula da Silva em 09 de Janeiro de 2003. Esta Lei altera aLDB e torna obrigatório o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira nas escolas de ensinofundamental e médio da rede pública e particular de ensino em todo o país.5 Desenhos, pinturas, charges, fotos, gravuras, etc.
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2. REVISÃO DA LITERATURA
Os temas representações de negros em LDs brasileiros e racismo em LDs e
seu combate estão na confluência de diversos campos de estudo das ciências
humanas, e envolvem múltiplos agentes que atuam no universo acadêmico, meio
político e movimentos sociais, sobretudo no movimento negro (ROSEMBERG;
BAZILLI; SILVA, 2003). Estes temas passaram a fazer parte das políticas
governamentais brasileiras em 1933, através de ações de expurgo da xenofobia em
LDs. Contudo, o número de pesquisas feitas sobre estes assuntos entre 1950 e
2003 é considerado como incipiente e reduzido em comparação a abordagensrealizadas sobre outras temáticas.
De 1950 a 2003, as pesquisas sobre as visões tidas dos negros nos LDs
brasileiros privilegiaram em sua maioria materiais didáticos e paradidáticos utilizados
no ensino fundamental, relacionados principalmente as disciplinas História e Língua
Portuguesa6. Estas pesquisas tiveram principalmente como objetos de estudo os
textos e a ilustrações presentes nas obras didáticas. De modo geral, foram
realizadas poucas abordagens sobre a circulação e recepção deste material. Nomesmo sentido, a maioria destes estudos se voltaram para os materiais didáticos e
paradidáticos, ou seja, muito pouco se pesquisou acerca de outros materiais
pedagógicos utilizados nas práticas cotidianas dos professores. Além disso, os
referidos estudos apresentaram poucas discussões relacionadas à diversidade
cultural e ao multiculturalismo. Este quadro deixa claro que, com estas dificuldades,
a “retaguarda disponível para propor e implementar ações práticas é frágil, para
além do diagnóstico genérico ‘os LDs brasileiros são racistas’, e da palavra deordem genérica ‘é necessário mudá-los’” (Id. Ibid ., p. 131).
Com relação aos principais aportes teóricos utilizados nas pesquisas entre
1950 e 2003, privilegiaram-se as abordagens inspiradas na análise de conteúdos,
análise de discurso, e enfoques predominantes em determinado momento nas
pesquisas da sociologia da educação e/ou dos estudos raciais no Brasil. No
6 Como o objeto de estudo desta pesquisa foi o LD de História, serão abordadas questões, por umlado, relativas apenas a este livro, e por outro, relacionadas a temática representações dos negrosnos LDs de um modo geral. Deste modo, não serão discutidas neste espaço questões específicasdos LDs de Língua Portuguesa.
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específico ao campo histórico, a maior parcela dos trabalhos sobre o tema
realizados nos últimos anos utilizaram teorias ligadas a História Cultural francesa.
As primeiras análises no Brasil sobre concepções tidas dos negros nos LDs, e
preconceitos e estereótipo s raciais contidos nestes materiais ocorreram na década
de 1950. Em geral, essas pesquisas buscavam apreender preconceitos explícitos
apresentadas nas obras abordadas. No entanto, foram encontradas incidências
mínimas de preconceitos apresentados abertamente, mas os resultados
constataram algumas características das representações dos negros nos LDs
estudados: caracterização de personagens negros em situação social inferior;
superioridade da população branca em beleza e inteligência nas representações ;
postura de desprezo e/ou piedade com relação aos negros; figura do negroassociada a funções subalternas; justificação da escravidão como atividade
econômica; figura positiva dos donos de escravos e omissão dos maus tratos aos
escravos (Id. Ibid .).
Na década seguinte estes estudos foram deixados de lado7. No entanto, as
abordagens foram retomadas no fim dos anos 70 e princípio dos 80, período do
início da redemocratização do Brasil. Neste contexto foram realizados estudos que
objetivavam encontrar nos LDs, além dos preconceitos apresentados explicitamente,estereótipo s e discriminações implícitas. As pesquisas deste período tiveram grande
influência das ações dos ativistas do movimento negro.
Nos anos 90 os estudos se ampliaram e diversificaram. Um ponto comum
entre várias pesquisas realizadas sobre os negros nos LDs nesse contexto foi a
busca de discriminações ocorridas na própria constituição do gênero. Desta forma,
estes estudos constataram que os LDs eram produzidos visando principalmente o
aluno branco, na busca da formação do adulto branco, que seria o esperadorepresentante das elites brasileiras.
Em suma, os resultados de pesquisas feitas entre o fim dos anos 70 e o fim
do século identificaram que: os brancos foram muito mais representados nas
ilustrações, tendo seu lugar garantido em praticamente todas as posições de
destaque; prevaleceram nas representações os contextos e valores da cultura
européia; ocorreram poucas representações de negros nas iconografias ; os negros
foram em muitos casos, identificados nos textos apenas pela etnia e não pelo nome
7 Sobretudo devido às fatídicas conseqüências do golpe militar de 1964 para as pesquisas e osestudos desenvolvido nos campos das ciências humanas no país.
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próprio, e representados em diversas ilustrações com traços estereotipados; a
aparição de negros em contexto familiar ou em família não constituída de pessoas
pobres foi bastante reduzida; os negros foram associados a um número limitado de
atividades profissionais e representados principalmente em posições de menor
prestígio; foi recorrente nas obras a associação de crianças negras a animais pretos
e/ou a figura dos meninos de rua; foi realizada uma descrição dos negros como
meros coadjuvantes das ações e dos processos históricos, sendo invisibilizados os
contextos socioculturais típicos dos negros; as culturas africanas não foram tratadas
de modo complexo; as populações negras estiveram confinadas a determinadas
temáticas; em vários casos enfatizou-se simplificadamente a vinculação da
transformação do escravo no marginal contemporâneo; em alguns casos foi dadodestaque a manifestações individuais de resistência negra, mas não a
manifestações coletivas.
Contudo, foi também na década de 90 que começaram as mudanças mais
significativas nas representações dos negros encontradas nos LDs. Pesquisas deste
período identificaram a possibilidade de ruptura com o paradigma dominante após
analisarem livros e coleções que romperam significativamente com visões
estereotipadas tidas sobre os negros (SILVA, 1999). Assim, foram encontradasneste contexto obras que mostram os negros em funções sociais diversificadas:
representações de negros com poder aquisitivo; humanização do tratamento das
crianças negras; crianças negras apresentadas com feições positivas, em ambientes
esportivos, de lazer ou escolares; utilização de nomes próprios para caracterização
de personagens negros; representações de famílias negras; tratamento de temas
históricos antes relegados e que contaram com intensa participação negra; maior
inclusão dos negros como participantes dos processos históricos; representação positiva de ícones da resistência negra8; representação positiva de caracteres
fenótipos dos negros ; etc (ROSEMBERG; BAZILLI; SILVA, 2003).
Um dos elementos que possibilitou essas rupturas com os paradigmas
tradicionais foi a influencia de perspectivas historiográficas mais recentes durante a
formulação dos LDs. Estes resultados são importantes por mostrarem que outras
representações são possíveis, o que não deixa brechas para criação de visões
fatalistas e/ou deterministas sobre o tema, e incentiva os que se esforçam para
8 Como Zumbi dos Palmares.
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inverter o quadro negativo apresentado nas pesquisas nos últimos cinqüenta anos
do século XX. Entretanto, as mudanças diagnosticadas ainda são bastante
reduzidas e a maior parte das pesquisas mostram que os LDs foram e ainda são
elementos privilegiados para a propagação do chamado “racismo à brasileira”, ligado
ao mito da democracia racial existente no país e ao novo racismo contemporâneo,
que tem um aspecto mais simbólico, indireto e mascarado, construído com base nas
diferenças culturais e identitárias, e se diferenciando do racismo direto e explícito
(MUNANGA, 2007). Desta forma, Silva (1999, p. 21), destaca que:
No livro didático a humanidade e a cidadania, na maioria das vezes, sãorepresentadas pelo homem branco e de classe média. A mulher, o negro, os
povos indígenas, entre outros, são descritos pela cor da pele ou pelogênero, para registrar sua existência.
Não só os negros, mais todos aqueles que fogem da norma ou padrão ideal
do mundo ocidental (homem, branco, heterossexual, cristão, jovem, magro) acabam
sendo desfavorecidos nas lutas de representações existentes na sociedade
brasileira. Desta forma, a “historiografia centrada na visão européia, onde os
elementos negro e índio aparecem como ‘os diferentes’, naturaliza a idéia de que o
normal é ser branco” (COSTA, W., 2008, p. 5). O que faz com que muitos saberes,não apenas específicos de outras culturas, mas igualmente importantes para a
humanidade e formação dos seres humanos, sejam sumariamente deixados de lado.
De modo geral, a maior parte das analises que buscaram entender as formas como
os negros foram representados nos LDs de História constataram que:
Quanto aos antigos livros de Estudos Sociais e atuais livros de História, aspesquisas evidenciam como tendência predominante a perspectiva
eurocêntrica, a ênfase na representação do negro associado à escravidão,a omissão a práticas de resistência negra, o tratamento de negros comoobjeto (Id. Ibid., p. 136).
O LD está assim contribuindo “para que no processo cognitivo de apreensão
do conhecimento, determinados valores sejam reforçados de forma estereotipada,
influenciando negativamente na formação identitária de alunos e professores“
(COSTA, W., 2008, p. 6).
Com relação às iconografias, as pesquisas mostraram que são apresentadas
predominantemente imagens dos negros associadas ao trabalho escravo. Em geral,
são privilegiadas as ilustrações canônicas de pinturas produzidas no Século XIX por
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artistas como Jean-Baptiste Debret e Johann Moritz Rugendas. Desta forma, as
representações iconográficas estariam contribuindo para o reforço da ligação da
imagem dos negros apenas a escravidão.
Não se pode deixar de lado a realidade difícil vivenciada pelos escravizados
durante os quatro séculos de escravidão, entretanto, ignorar aspectos da cultura, e
das relações sócio-culturais efetivas dos sujeitos que se estabeleciam na sua
vivência cotidiana, é reduzir a um plano simplista a dinâmica da História. As
representações textuais e iconográficas predominantes nos LDs estariam assim
omitindo inúmeras características da resistência negra a dominação e a escravidão9.
Não se trata de propor a omissão das representações dos negros onde estes
estejam em situações desfavoráveis socialmente, muito menos de defender oesquecimento da histórica marginalização dos negros na sociedade brasileira, mas a
educação e o ensino da trajetória dos homens no tempo não podem se ater apenas
a estes pontos.
Nesse sentido, ignorar a complexidade dos processos históricos significa
jogar fora saberes bastante aprofundados, em troca de visões reducionistas, o que
contribui para internalização por parte dos alunos de uma forma de pensar
“compartimentalizada, mecanicista, disjuntiva, parcelada, [que] destrói acomplexidade do mundo em fragmentos distintos, fraciona os problemas, separa o
que está unido, unidimensionaliza o multidimensional” (MORIN, 2003, p. 71).
O histórico “esquecimento”, por exemplo, da inclusão da História da África no
ensino de História, fez com que muitos conhecimentos importantes para a
humanidade fossem deixados de lado (OLIVA, 2003). Saberes fundamentais para o
entendimento da humanidade foram assim relegados, o que se caracterizou como
uma perda imensa para a ampliação de conhecimentos no país. Estasrepresentações reducionistas acabam se propagando pela sociedade, o que faz com
que elas incitem práticas tão limitadas quanto elas. Nesta perspectiva:
Os alunos, embora nem sempre reconheçam esses conteúdos comodiscriminatórios, identificam-nos e utilizam-nos com fins de depreciar oscolegas (...) Por outro lado, os sujeitos docentes ignoram-nos e negam suaexistência, demonstrando uma significativa insensibilidade para a percepção
9 Como, por exemplo, fuga para quilombos, reunião de escravos e negros libertos em IrmandadesNegras, assassinato de senhores, além de outras resistências presentes no dia-a-dia, como quebrade ferramenta no trabalho, labor em ritmo mais lento do que o exigido, manutenção de elementosreligiosos das culturas africanas, etc.
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desses conteúdos no principal recurso utilizado no processo educativoescolar (COSTA, C., 2007, p. 90-91).
Contudo, apesar de todos estes entendimentos, deve-se atentar para uma
questão muito importante: as imagens estereotipadas e os “componentes racistas
[apresentados nos materiais didáticos e paradidáticos] podem conviver com a
exortação de valores igualitaristas e lições de combate ao racismo” (ROSEMBERG;
BAZILLI, SILVA, 2003, p. 135). Este ponto demonstra a complexidade do tema, e a
atenção e sensibilidade exigidas do pesquisador que pretende se debruçar sobre
ele. O estudo sobre as representações dos negros nos LDs deve levar em conta que
determinada obra, seja ela didática ou não, surge em um contexto específico, e
estando seus autores imersos neste contexto, que é representado em suas obras.Além disso, a noção de autoria do LD pode ser questionada, haja vista que,
afora aqueles que assinam a obra, existem vários outros sujeitos envolvidos na
produção destes materiais: editores, ilustradores, revisores, diagramadores, etc. Ou
seja, pode-se observar que vários agentes estão envolvidos na produção de um LD,
o que o coloca no interior de uma rede complexa de visões e interesses. Desta
forma, pode-se observar que os “autores não escrevem livros: não, escrevem textos
que outros transformam em objetos impressos.” (CHARTIER, 1991, p. 182).Com esta compreensão evita-se uma tentativa de “caça as bruxas”, na
expressão de Silva (1999), ou de demonização dos produtores dos LDs. A própria
historicização deste tipo de abordagem possibilita a compreensão de que as visões
negativas acerca dos negros estão inseridas em uma rede sistemática e não casual,
e que a culpa na estaria em apenas um ou outro autor, ou nos sujeitos envolvidos
com estas produções. O que também não significa de se deve isentá-los da
reprodução de visões depreciativas acerca de negros ou outros sujeitos sociais.
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3. DAS TEORIAS UTILIZADAS
Para a construção teórica da pesquisa, alguns conceitos tornaram-se
fundantes, entre eles estão: negros e populações negras ; estereótipos ;
representação ; apropriação , poder simbólico ; iconografia .
É comum nos estudos que envolvem questões raciais a problematizarão de
conceitos utilizados com relação à designação do(s) grupo(s) abordado(s). Desta
forma, termos como afro-descententes , negros , brancos , índios , indígenas , passam
a não serem mais vistos como naturais , mas entendidos como construções
históricas que carregam consigo toda uma gama de valores. Munanga (2007) sugerea utilização nas pesquisas dos termos negros e brancos ou populações negras e
populações brancas 10 ao invés do tradicional conceito de raça , já que no século XX
as descobertas da ciência genéticas derrubaram o mito da existência de raças
humanas diferenciadas, o que inviabilizou a utilização do temo raça no seu sentido
biológico.
Entretanto, hoje em dia este termo ainda é utilizado no senso comum como
fator diferencial, fazendo ainda parte do imaginário e cotidiano de diversas culturas,especialmente em países formados por povos oriundos de múltiplos locais do
planeta. Além disso, atualmente a categoria raça é utilizada no seu sentido cultural e
estrutural em várias pesquisas. No entanto, o uso deste termo muitas vezes causa
mal entendido no momento de se transportar os resultados do campo acadêmico
para a sociedade em geral. Os termos sugeridos por Munanga auxiliam neste
sentido, e ajudam igualmente por estarem mais próximos do cotidiano,
especialmente do cotidiano escolar.Optou-se também pela não utilização do conceito etnia . Este conceito se
encaixaria melhor em uma análise que tratasse especificamente das identidades e
não de representações acerca de grupos sociais11. Além disso, outro fator foi
determinante na escolha. Nesse sentido, Munanga (Ibid., p. 9-10) salienta que
“enquanto o racismo clássico se alimenta na noção de raça, o racismo novo se
alimenta na noção de etnia definida como um grupo cultural, categoria que constituí
10 Os dois últimos emprestados do geneticista Jean Hiernaux.11 Mesmo que a temática identidade seja crucial para a realização da análise, esta contudo não secentrou neste aspecto em específico.
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um lexical mais aceitável que a raça (falar politicamente correto)”. Deste modo,
foram utilizados no estudo os termos negros e populações negras .
Estereótipo foi outro conceito utilizado durante o desenvolvimento da
pesquisa. Esta categoria pode ser definida como “uma tendência à padronização,
com a eliminação das qualidades individuais e das diferenças, com a ausência total
do espírito crítico nas opiniões sustentadas” (SHESTAKOV apud SANTANA, 1999,
p. 65). O estereótipo representa uma imagem fixa, engessada e simplista, tida sobre
determinado grupo ou pessoa, e intrinsecamente ligada aos preconceitos e a prática
da discriminação. Como destaca Silva (1999, p. 24):
A presença dos estereótipos nos materiais pedagógicos e especificamentenos livros didáticos, pode promover a exclusão, a cristalização do outro emfunções e papéis estigmatizados pela sociedade, a auto-rejeição e a baixaauto-estima, que dificultam a organização política do grupo estigmatizado.
No ato discriminatório baseado em preconceitos, o individuo que internalizou
imagens estereotipadas acerca de determinada pessoa ou grupo, trata a pessoa ou
grupo alvo da discriminação como sendo a própria encarnação/materialização do
estereótipo que lhe foi atribuído. Por exemplo, recentemente uma das inúmeras
pesquisas que constataram que o preconceito para com o negro no Brasil12 ainda égrande, demonstrou nitidamente o quanto os estereótipos negativos relacionados a
determinados grupos fazem parte do imaginário dos brasileiros (ALMEIDA, 2007).
No estudo, pediram-se as pessoas entrevistadas que opinassem, através de
observação de fotos de sujeitos negros, brancos e pardos, quais seriam as
características e prováveis profissões de cada uma das pessoas das fotos. Os
resultados foram evidentes, aos brancos foi atribuída uma imagem, no geral, mais
positiva, ao passo que aos outros sujeitos foram delegados os lugares menosconfortáveis13. Estas respostas pautaram-se em estereótipos tidos sobre a aparência
daqueles sujeitos, e identificação de uma suposta pertença destes a um
determinado grupo definível socialmente.
Os preconceitos, estereótipos , e as visões gerais tidas de um determinado
segmento social são por vezes expostas através de representações . As
representações coletivas são as “matrizes de práticas construtoras do próprio mundo
12 No caso em questão na referida pesquisa, negros e pardos.13 Como ser, por exemplo, considerados menos inteligentes e associados aos empregos de menorprestígio.
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social” (CHARTIER, 1991, p. 183). Deste modo, o fundamento da criação cultural
não seria apenas o social14, mas social e cultural se complementam, produzindo um
ao outro a cada instante.
De um lado, as representações influenciam e comandam atos, do outro, as
práticas criam e reproduzem representações . Neste sentido, representações
negativas sobre determinado grupo, ocasionam práticas negativas dos indivíduos
para com aquele grupo. No caso das relações entre negros e brancos, são estas
representações negativas sobre o outro grupo que geram a discriminação, que é um
ato induzido pela internalizarão de algo representado através de estereótipos .
As representações são assim apropriadas em diversas ocasiões por
determinados grupos ou indivíduos, que as utilizam e inserem ao lado de outrasrepresentações, tornando possíveis outros significados para o que é representado.
As representações estão assim sempre imersas em um “campo de concorrências e
de competições cujos desafios se enunciam em termos de poder e de dominação”
(Id., 1990, p. 17).
Além disso, as formas como um ser humano representa algo ou alguém estão
relacionadas ao seu lugar social, a sua visão de mundo e a identificação a uma
identidade. Representações de imagens estereotipadas sobre os negros se inseremdeste modo em um contexto mais amplo, no cerne das chamadas lutas de
representações , que tem “tanta importância como as lutas econômicas para [se]
compreender os mecanismos pelos quais um grupo impõe, ou tenta impor, a sua
concepção do mundo social, os valores que são os seus, e o seu domínio” (Id. Ibid.,
p. 17-18). Estas lutas, em outro sentido, podem ser vistas como manifestações do
poder simbólico . Este último é entendido como:
Poder de constituir o dado pela enunciação, de fazer ver e fazer crer, deconfirmar ou de transformar a visão de mundo e, deste modo, a acção sobreo mundo, portanto o mundo; poder quase mágico que permite obter oequivalente daquilo que é obtido pela força (física ou econômica), graças aoefeito específico de mobilização, só se exerce se for reconhecido, querdizer, ignorado como arbitrário (BOURDIEU, 2007, p. 14).
No século XX explodiu em todo o mundo o poder atribuído às questões
simbólicas, sobretudo após o fim da segunda guerra mundial, as sucessivas
revoluções tecnológicas e os avanços da globalização. Em um contexto em que um
14 Como no clássico modelo marxista: base x superestrutura.
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grupo, povo ou nação necessita cada vez menos de violência física para exercer
poder, dominar e impor suas vontades a outros, o poder simbólico vem,
inversamente, sendo cada vez mais utilizado.
No que tange as relações raciais no Brasil, este poder substitui em muitos
casos a necessidade de conflitos físicos diretos, como ocorria durante a
escravidão15. Hoje as dominações de um grupo sobre outro ocorrem mais a nível
indireto, simbólico. Estão inseridos nestes campos, das lutas de representação e do
poder simbólico , por exemplo, os esforços dos militantes do movimento negro para
reverter imagens antes inferiorizadas, através da valorização de elementos da
negritude (BERND, 1998), bem como o ”resgate” de personagens históricos
negros16.Todavia, este tipo de poder é tão antigo quanto a humanidade. Ele está
associado, por exemplo, a própria criação do termo negro como índice de
diferenciação. Categoria apropriada inicialmente para designar uma suposta raça
inferior, e justificar assim a praticada da escravidão (SANTOS, 2002).
As iconografias são bastante utilizadas pelo que buscam exercer determinado
poder simbólico . Todavia, ainda é incipiente a problematizarão acerca do uso destes
recursos como fonte nas pesquisas educacionais, assim como nas pesquisashistóricas. As iconografias são representações simbólicas feitas através de imagens
variadas, como pinturas, charges, desenhos, caricaturas, fotografias. Elas estão
relacionadas aos valores histórico-culturais de uma dada sociedade, e a ícones
ligados a simbologia e ao imaginário de uma ou várias populações. Desta maneira:
As imagens não têm sentido em si, imanentes. Elas contam apenas — jáque não passam de artefatos, coisas materiais ou empíricas — com
atributos físico-químicos intrínsecos. É a interação social que produzsentidos, mobilizando diferencialmente (no tempo, no espaço, nos lugares ecircunstâncias sociais, nos agentes que intervêm) determinados atributospara dar existência social (sensorial) a sentidos e valores e fazê-los atuar(MENESES, 2003, P.28).
As iconografias se tornaram presentes nos LDs, por serem fortes elementos
simbólicos, “especialmente em uma época marcada pela estetização do cotidiano e
pela proliferação de imagens” (MENDONÇA; VAZ, 2008, p.7). Além disso, a
15 Quando os escravos desobedientes eram castigados fisicamente ou, em contrapartida, em várioscasos acabavam matando seus senhores.16 Como o ícone da resistência negra Zumbi dos Palmares, ou o líder da Revolta da Chibata (1910),João Cândido Felisberto.
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observação das cenas históricas é fundamental para a apreensão do saber histórico
pelos alunos-leitores. Deste modo, as iconografias são vistas pelos alunos como um
testemunho fiel da época e da caracterização dos sujeitos e espaços retratados.
No entanto, sem pretender superestimar a representação, ou reduzir a elas
todas as possibilidades de apreciação de uma imagem, é necessário o entendimento
de que o sujeito que observa uma iconografia exposta em um LD de História, não
aprecia apenas os seus valores estéticos e/ou artísticos, identificando-a
imediatamente com uma rede complexa de representações , e atribuindo-a valores
representativos de um dado contexto histórico e de uma dada população nela
representada . Valores estes que estão ligados ao tempo presente, não se limitando
apenas aos significados das imagens nos seus contextos de produção.Como sugerem Santaella e Nöth (1998) existem dois domínios inseparáveis
no mundo das imagens: as imagens como representações visuais e como
representações mentais. Neste sentido, as observações de imagens não constituem
apenas em processos mecânicos e superficiais, mas ligados a elementos subjetivos,
inconscientes e cognitivos dos sujeitos.
Deste modo, se torna impossível olhar para uma imagem exposta no LD e
não estabelecer uma ligação com algo incrustado no imaginário social, noinconsciente coletivo ou na memória pessoal. A partir desta compreensão, percebe-
se que:
A importância da imagem no ato de aprender é inquestionável. Para aprodução de cada imagem, uma intenção de seu autor, para sua utilização,outro sentido. A leitura da imagem proporciona ao receptor um sentido, umsignificado próprio de acordo com suas vivências (COSTA, W., 2008, P. 1).
Tanto as pinturas de autores considerados17
como os que melhorrepresentaram determinados elementos do seu contexto histórico, quanto as
imagens fotográficas, charges retiradas de jornais e gravuras produzidas em dado
contexto ou diretamente para a produção dos livros analisados, tem cada uma a sua
própria história, e por se tratarem de produções vistas como representativas de dado
período, incitam determinados significados acerca dos processos históricos. Estas
histórias, ao serem apropriadas e reunidas, cruzando-se umas com a outras,
17 Pelos autores e produtores dos LDs.
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formando uma teia que será apreendida pelos alunos-leitores, e que contribui ainda
mais para transformar os LDs de História em sistema simbólico bastante complexos.
Estes sistemas, como destaca Bourdieu (Ibid, p. 12), diferenciam-se entre si:
“fundamentalmente conforme sejam produzidos e, ao mesmo tempo, apropriados
pelo conjunto do grupo ou, pelo contrário, produzidos por um corpo de especialistas
e (...) por um campo de produção e de circulação relativamente autônomo”.
O LD de História pode ser caracterizado como um espaço especial para a
atuação do poder simbólico . Somando-se a grande circulação desse material, com
os valores tradicionalmente transmitidos em suas páginas, com o caráter de verdade
que lhe é atribuído pelos alunos, que o enxergam como um elo para a verdade
científica, e com a falta de preparo dos professores em geral para problematizar oque está inserido nos seus textos e imagens, se chega a constatação de que o LD
de História é um campo fértil para a difusão de representações que são utilizadas
em busca de uma vitória em uma batalha simbólica.
Entretanto, do mesmo modo que representações existentes na sociedade são
apropriadas e ressignificadas por quem produz o livro didático, de modo análogo, os
professores podem, durante o seu fazer pedagógico, se apropriarem de diferentes
maneiras do que é apresentado no LD. Neste sentido, “os mesmos textos – sobformas impressas possivelmente diferentes – podem ser diversamente aprendidos,
manipulados, compreendidos” (Id., Ibid. p. 181). O que pode ser atribuído também
as iconografias , e deixa claro que as abordagens sobre representações dos negros
em LDs tem que levar em conta que, sejam quais forem as concepções
apresentadas nos livros, elas não são determinantes absolutas das formas como
estes livros foram (serão) utilizados nas salas de aulas e outros espaços por alunos
e professores.
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4. METODOLOGIA
Inicialmente foi realizada uma catalogação dos Trabalhos Acadêmicos
Orientados (TAO’s) que fazem parte do acervo do Núcleo de Pesquisa Histórica
(Nudoph)18, buscando identificar trabalhos desenvolvidos sobre a temática
representações sobre os negros nos LDs. Após o término desta catalogação foi
realizada a leitura das pesquisas catalogadas que tratam do tema da pesquisa.
Em outra perspectiva, após os primeiros contatos com as diversas fontes
bibliográficas, foram realizadas as leituras exploratórias , leituras seletivas , leituras
analíticas e leituras interpretativas (GIL, 2002). Nas leituras exploratórias identificaram-se fontes que ajudaram na resolução dos problemas levantados pela
pesquisa, Durante as leituras seletivas se iniciou a seleção, entre o material
identificado, das referências bibliográficas mais pertinentes ao desenvolvimento da
pesquisa. Finalmente, realizaram-se as leituras analíticas , de caráter ainda mais
crítico que as anteriores, onde se buscou entender os pormenores apresentados nas
obras dos autores selecionados. Por último, foram realizadas as leituras
interpretativas , onde foi efetuado o cruzamento entre as contribuições dos autores edos teóricos selecionadas com o que foi observado durante a parte empírica da
pesquisa.
Outra etapa do estudo foi a coleta dos LDs, efetuada na Escola Estadual de
Ensino Fundamental e Médio Dr. Hortêncio de Souza Ribeiro (Premen), situada em
Campina Grande - PB. Primeiramente, realizou-se a apresentação do projeto a
direção do colégio. Mais adiante foram colhidas informações gerais que permitissem
o traçar de um perfil sobre o estabelecimento (ver APÊNDICE A). Durante aspesquisas na escola foram repassados pela direção os LDs utilizados
posteriormente como objeto de análise do estudo. Nesse sentido, a direção da
cedeu, através de empréstimo, um exemplar de cada livros para que o pesquisador
pudesse analisar mais detalhadamente os LDs em outros espaços.
18 Este local foi escolhido, porque lá se encontram cópias das monografias defendidas nos últimosanos no curso de História, o que permite um panorama geral sobre a recorrência destas produçõesno curso de História da UEPB.
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4.1. Análise Iconográfica
Dois LDs de História de 7ª série serviram de objeto para as análises
iconográficas : Piletti e Piletti (2002) e Silva (2005). O primeiro foi adotado no Premen
de 2002 a 2004, enquanto que o segundo foi utilizado de 2005 a 2007.
As análises das iconografias expostas nestes livros foram efetuadas em
quatro etapas.
Na primeira etapa realizou-se a leitura completa das obras, observando os
seguintes pontos relativos as suas estruturas: detalhes técnicos; propostas de
trabalho inclusas nos elementos pré-textuais; concepções tidas acerca da disposição
dos conteúdos; papeis atribuídos as imagens; concepções de história apresentadas;forma de organização dos capítulos; quantidade de imagens por capítulos; tipo de
iconografias apresentadas; quantidade de iconografias que retratam seres humanos
ou figuras representativas de humanos19; dimensões das imagens se comparada a
estrutura do livro e ao conteúdo dos capítulos; visualidade e inteligibilidade das
iconografias ; quantidade de imagens de cunho ilustrativo; reprodução ou não das
chamadas imagens canônicas ; quantidade de imagens de cunho complementativo;
apresentação ou não de referências para as iconografias , indicando seu título, autore período de produção20; existência ou não de textos complementares
acompanhando as iconografias; representações textuais relativas aos negros .
A segunda etapa constituiu em observação mais detalhada das iconografias ,
identificando nestas os seguintes aspectos: assuntos tratados; continentes e países,
nações, estados e/ou povos representados ; quantidade de representações de
negros , brancos , indígenas e outros21; proporcionalidade de representações de cada
um dos referidos grupos segundo os sexos; proporcionalidade das representações sobre as crianças dos grupos abordados; quantidade de representações envolvendo
personagens negros de destaque na história do Brasil.
A terceira etapa constituiu na leitura interna (BITTENCOURT, 2004) de cada
iconografia onde foram representados negros e/ou elementos relativos às
populações negras .
19 Como, por exemplo, fotos de estátuas ou outras esculturas que retratam humanos, muito comunsnos LDs de história.20 Ou identificando a ausência de título, o anonimato dos autores e indefinições relativas ao períodode produção das iconografias .21 Como os orientais (ditos segundo nomenclatura oficial como amarelos) foram encontradas nos LDsanalisados representações de asiáticos com estas característica fenotípica.
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Neste ponto foram observados os seguintes aspectos específicos de cada
iconografia selecionada : tema; título; autor; cena retratada, contextos físico,
institucional, político, histórico e social retratados; contexto de sua produção;
posturas dos personagens em geral e dos personagens negros ; vestimentas dos
personagens em geral e dos personagens negros ; espaço retratado; relações
interpessoais representadas ; relações familiares representadas ; proporcionalidade
das imagens de personagens negros, se comparado às representações de outros
grupos e ao tamanho da página; formas de representações das características
fenotípicas dos negros em detrimento das de outros grupos; posicionamento dos
personagens negros nas cenas retratadas, observando se estes foram
representados de modo central ou periférico; diversificação de papéis atribuídos aosnegros nas cenas retratadas; recorrência de representações dos negros enquanto
agentes ativos ou passivos; recorrência de representações de manifestações negras
coletivas; representações da negritude ; existência de pré-conceitos explícitos ou
implícitos para com os negros nas iconografias .
Na quarta etapa foram somados os resultados das análises específicas de
cada iconografia , o que possibilitou uma visão mais complexa da rede formada pela
sistematicidade das representações iconográficas apropriadas pelosautores/produtores dos LDs analisados.
Deste modo, os seguintes pontos foram observados com relação a análise
geral das representações dos negros contidas nas iconografias : reafirmação ou não
de um lugar social estereotipado; diversidade ou não de papéis e funções sociais;
visões gerais apresentada em cada livro e no conjunto das obras; concepções
sobre os negros apresentadas; aspectos inclusos e omitidos em comparação com
obras analisadas em outras pesquisas; continuidades e descontinuidades com aforma como tradicionalmente as populações negras foram representadas.
Por último, efetuou-se o cruzamento dos resultados obtidos nas quatro
referidas etapas, o que possibilitou um panorama geral do que foi identificado nas
análises iconográficas.
Estes resultados foram então associados às discussões teóricas,
historiográficas e temáticas levantadas por outros pesquisadores, o que possibilitou
a obtenção das respostas aos problemas levantados no projeto inicial, e das
conclusões finais acerca das formas como os negros foram representados nos LDs
de História da 7ª série analisados.
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5. RESULTADOS
No LD de autoria de Piletti e Piletti (2002), são apresentadas ao todo cento e
setenta (170) representações iconográficas , contando com cinco (5) presentes na
capa, sete (7) localizadas no glossário e cento e cinqüenta e oito (158) dispostas
pelos vinte e dois (22) capítulos. Destas, cento e setenta iconografias , vinte e três
(23) não representam humanos ou figuras representativas de humanos.
Os brancos foram representados nas iconografias neste LD em cento e trinta
e nove (139) ocasiões. A eles seguiram-se os negros , representados em vinte e sete
(27) iconografias, indígenas , representados em treze (13) iconografias , e orientais22 representados em duas (2) iconografias23. Nesse sentido, os negros tiveram
aproximadamente um quinto (1/5) do total das representações dos brancos, e
ficaram muito próximos da quantidade de representações de figuras não humanas.
Considerando apenas os doze (12) capítulos referentes a história do Brasil, e
subtraindo as vinte imagens presentes nestes capítulos que não retratam humanos
ou figuras representativas de humanos, chega-se ao total de cinqüenta e cinco
representações de brancos (55), vinte e cinco de negros (25), dez de indígenas (10),duas (2) não identificadas, e zero (0) representações de orientais.
Por outro lado, se forem considerados os dez (10) capítulos que não se
referem a história do Brasil, mas a História Geral, tem-se os seguintes números:
setenta e três iconografias representando brancos (77), duas representando negros
(2), duas indígenas (2), e uma (1) orientais. Deste modo, pode-se observar que os
brancos tiveram mais representações nestes dez capítulos do que nos doze
restantes que tratam da História do Brasil. Nestes capítulos também diminuem aquantidade de imagens não identificadas e não-humanas.
Na capa e no glossário, encontram-se onze representações iconográficas de
brancos (12), uma (1) de negros, uma (1) de indígenas e uma (1) de orientais. No
entanto, das cinco imagens da capa, nenhuma representa negros.
Com relação a proporcionalidade das representações das diversas
populações por gênero, observou-se que cento e vinte e uma (121) iconografias
22 Descritos como amarelos pela nomenclatura do IBGE.23 Devido as condições de visualidade não foram identificados a que populações pertencempersonagens representados em três iconografias.
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representam homens brancos, quarenta e quatro (44) representam mulheres
brancas, vinte e seis (26) homens negros, dezessete (17) mulheres negras, onze
(11) homens indígenas, oito (8) mulheres indígenas, dois (2) homens orientais e zero
(0) mulheres orientais. Com este quadro fica nítida a formação de uma hierarquia
nas representações , o que contribui para deixar implícita uma suposta lógica natural
na mente dos leitores. Nesse sentido, os homens brancos foram mais representados
que as mulheres brancas, que por sua vez tiveram mais espaço nas imagens que os
homens negros, que apareceram mais nas representações do que as mulheres
negras, que foram mais representadas que os homens indígenas, e assim
sucessivamente. Neste quadro visual, a inexistência de representações acerca da
mulher oriental fica bem clara, uma que esta nem mesmo apare nas iconografias .Em nenhum dos capítulos os negros tiveram representações iconográficas em
maior número do que as dos brancos. Nos entanto, nos capítulos III e XX há um
equilíbrio numérico entre esses dos grupos, apresentando-se respectivamente duas
e cinco representações para cada população por capítulo. Todavia, esta igualdade
ficou apenas no campo quantitativo, pois a análise mais detalhada dos aspectos
qualitativos das iconografias mostraram diferenças significativas existentes nos
referidos capítulos entre as representações sobre estas duas populações, o que érecorrente em toda a obra.
Nesse sentido, ao se analisar, por exemplo, a proporção dos personagens
negros no referido livro, observou-se que estes não ocupam uma parcela
significativa do espaço físico das iconografias, sendo minimizados visualmente.
Assim apresentaram-se no total dezessete (17) representações destes sujeitos em
pequena proporção, dez (10) em média proporção e zero (0) em grande proporção.
Outro ponto bem ilustrativo é o que diz respeito à visualidade dospersonagens negros nas representações apropriadas neste LD. No geral, estas
representações apresentam má visualidade, sendo que em muitas delas não é
possível ao menos identificar os traços dos rostos dos negros representados. Deste
modo, das vinte e sete iconografias que representam personagens negros, apenas
sete (7) foram caracterizadas pela análise como apresentando uma boa visualidade
destes sujeitos, enquanto que as outras vinte (20) apresentaram condições ruins ou
péssimas de visualização dos negros.
Das imagens que representam negros, apenas sete foram caracterizadas pela
análise iconográfica como renovadas. As outras vinte e uma foram caracterizadas
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como canônicas. Estas últimas, em sua maioria, são produções de artistas bastante
conhecidos dos leitores dos LDs. Assim, por exemplo, Jean-Baptiste Debret, teve
cinco (5) de suas obras expostas nos livros, Johann Moritz Rugendas, teve quatro
(4) de suas obras representadas e Antonio Parreiras teve duas (2) obras
representadas.
Das cento e quarenta e seis (146) imagens que retratam humanos, quarenta
(40) são retratos ou imagens focalizando nitidamente uma pessoa, destes trinta e
oito (38) retratam pessoas brancas, enquanto que apenas um (1) negro é retratado,
e mesmo assim como elemento ilustrativo da pobreza dos sertanejos no fim do
século XIX, fator que é apontado como a causa da revolta de Canudos.
Inversamente, os retratos dos personagens brancos expostos nesta obra, em suamaioria, ilustram poder e riqueza, através de representações de reis, rainhas,
imperadores, políticos, filósofos, cientistas, mártires e heróis nacionais24. Algo
semelhante ocorre com as representações familiares. Se por um lado o livro contém
várias ilustrações de famílias brancas, sobretudo famílias de prestígio e poder como
as famílias reais, por outro, apenas uma família negra é retratada, em uma foto que
ilustra o início da ocupação das favelas no Rio de Janeiro.
Estas visões apresentadas na obra com relação às representações
iconográficas relativas aos negros, quando interagem com os textos, mesmo em
pequeno número, denunciam aspectos negativos da escravidão e do mito da
democracia racial, fazendo com que na prática o livro isole as populações negras da
chamada História Integrada . Esta integração é fragmentada por integrar poucos de
modo pleno e deixar muitos às margens das representações acerca dos processos
históricos.
Desta forma, o aluno que se debruçou sobre esta obra, a não ser que tenhasido bem preparado pelos professores para olhar criticamente as concepções sobre
os negros e outros grupos apresentadas nas iconografias , possivelmente
internalizou a concepção de História sistematicamente exposta nela, que está
imersa em uma tradição hierárquica em relação aos grupos sociais, que naturaliza e
reproduz determinados valores estereotipados presentes na sociedade.
24 Alguns destes personagens, como Giuseppe Maria Garibaldi e Dom Pedro II, foram retratados emduas ocasiões.
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5.1. A História entre pequenas rupturas e grandes permanências
Silva (2005) apresenta o total de cento e oitenta e oito (188) representações
icnográficas no decorrer dos seus dezoito (18) capítulos e das quatro (4) divisões
entre as unidades. Destas iconografias , quarenta e duas (42) não representam
humanos ou figuras representativas de humanos. Nesta obras são apresentadas
praticamente a mesma quantidade de representações iconográficas encontradas em
Piletti e Piletti (2002). Contudo, existem algumas diferenças entre as duas obras nos
aspectos qualitativos das iconografias .
Ao contrário do que ocorre com o LD analisado no item anterior, em Silva
(2005) foi atribuído um papel central as imagens, sobretudo aos seus aspectosartísticos e subjetivos. Nesse sentido, as iconografias expostas nesta obra, ao
contrário da outra, são na maior parte das vezes acompanhadas de referências a
autor, título, tipo e período de produção. Em diversos momentos foram também
apresentadas algumas informações relativas aos autores das iconografias e aos
contextos de produções das mesmas, o que é importante para o entendimento, por
parte dos alunos, de que as iconografias são representações dos processos sociais
e não devem ser vistas como retratos fiéis dos contextos históricos nelas retratados.A análise constatou que neste LD encontram-se cento e quarenta e seis (146)
representações iconográficas de humanos ou figuras representativas de humanos,
entre as quais estão cento e sete (107) representações de brancos, vinte e oito (28)
de negros, cinco (5) de indígenas e zero (0) de orientais. Em seis (6) das
iconografias não foi possível identificar a população representada. Deste modo,
nesta obra os negros ocuparam apenas um quarto (1/4) das representações
iconográficas atribuídas aos brancos. Obviamente, isto ocorre devido ao viéseurocêntrico adotado.
Por outro lado, se forem considerados apenas os nove (9) capítulos da obra
relativos à História Geral, chega-se as seguintes conclusões numéricas: setenta e
três iconografias (73) representam brancos, cinco (5) representam negros e três (3)
representam indígenas. Este quadro reproduz a imagem da dominação a partir da
criação simbólica da existência de um grupo que supostamente faz a História, ou
seja, os brancos, e de outros que, inversamente, apenas serviriam para auxiliar e
ilustrar os processos Históricos, no caso os negros e os indígenas.
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Além disso, são transmitidas em Silva (2005) e em Piletti e Piletti (2002)
concepções que reproduzem a visão de que a História é passada quase que
exclusivamente na Europa, e que os agentes históricos que merecem ser lembrados
são os europeus e seus descendentes diretos que residem em outros continentes.
Em contrapartida, nos nove (9) capítulos de Silva (2005) que tratam da
História do Brasil, os brancos tiveram cinqüenta e duas (52) iconografias, ao passo
que ocorreram vinte e três (23) representações iconográficas contendo personagens
negros e duas (2) representando membros dos povos indígenas . Este quadro é
agravado pelo fato de que nenhum personagem negro de destaque foi apresentado
aos leitores por meio de textos visuais, mas apenas por meio de textos verbais, nos
episódios da História do Brasil abordados.Na referida obra foram encontradas poucas apropriações de retratos de
pessoas negras. Nesse sentido apenas quatro (4) negros foram representados no
LD por meio de retratos, enquanto que foram apropriados vinte e nove (29) retratos
de personagens brancos e dois (2) de indígenas.
A hierarquia das representações relativas aos gêneros, identificada em Piletti
e Piletti (2002), se fez também presente nesta obra. Nesse sentido, foram
representados cento e dezessete (117) homens brancos, sessenta e seis (66)mulheres brancas, vinte e dois (22) homens negros, quatorze (14) mulheres negras,
quatro (4) homens indígenas e uma (1) mulher indígena25. Este quadro, somado ao
que foi analisado na outra obra, mostra que o modelo padrão ideal apresentado
nestes livros é o ser humano branco e masculino.
Esta concepção acerca do agente histórico modelo, visto quase como um
semi-deus ou herói, faz parte de estratégias criadas em outros períodos por uma
elite que visava manter e justificar o poder exercido sobre outros grupos e povos. Osmembros destes povos deveriam apenas contemplar os fatos históricos. A referida
concepção, que tem as mesmas raízes que o racismo e a xenofobia, está sendo
transmitida nas duas obras analisadas, e talvez tenha sido infiltrada por meio delas
no processo ensino-aprendizagem e também, conseqüentemente, na mente dos
alunos, que possivelmente passariam a reproduzi-las no decorrer de suas vidas.
De um modo geral, mais da metade das iconografias que representam negros
apropriadas por Silva (2005) apresentam boa visualidade dos negros. Deste modo,
25 Em vários casos é representado mais de um gênero e grupo em cada uma das representaçõesiconográficas. Estes números representam o todo das representações, a sua média final.
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das vinte e oito imagens que representam pelo menos um personagem negro, nove
(9) representam negros em pequena proporção, treze (13) em média proporção e
seis (6) em grande proporção.
No entanto, a outra metade das iconografias apropriadas apresenta pouca
qualidade em relação a visualidade dos negros, o que deixa a impressão de que
eles são apenas figurantes dos processos históricos. O problema não está assim
nas representações em si, que são em sua maioria obras de grande valor artístico,
mas na rede formada pela sistematicidade das iconografias apropriadas.
Um diferencial desta obra frente a outras produções é que nela foram
apropriadas iconografias que retratam duas manifestações cultuais coletivas típicas
dos negros no século XIX: o jogo da capoeira (ver ANEXO A) e a dança do Lundu.Nestas iconografias, são representados aspectos positivos da história e da cultura
afro-brasileira, ao serem retratados negros em momentos de lazer, festividade e
execução de práticas de resistência cultural.
Também se percebe o cuidado por parte do autor, a cada capítulo que trata
de temáticas relacionadas aos negros, em denunciar o racismo e a criação de
concepções negativas sobre estes sujeitos no decorrer da História. O livro contém,
inclusive, um capítulo específico para a discussão da situação das populaçõesnegras na pós-abolição, denunciando a continuidade da exclusão social deste
segmento na sociedade brasileira contemporânea.
Todavia, a obra não se limita a este ponto, haja vista que são apresentadas
iconografias onde constam representações de negros em papéis bem sucedidos e
de prestígio. No referido capítulo (XVIII) são apresentadas três fotos retratando
negros, e nenhuma delas apresenta visualidade ruim, pequena proporção ou
caracterizações estereotipadas dos negros. Neste ponto a análise identificou umaquebra com o paradigma dominante, pois se o autor tivesse apenas dado
continuidade a um modo tradicional de tratar o tema, teria apenas vinculado a
imagem do negro na pós-abolição a marginalidade.
Contudo, as análises iconográficas mostraram que se, por um lado, ocorreram
rupturas com o padrão tradicional, por outro também existiram várias permanências
na forma de se representar os negros. Nesse sentido, as populações negras
continuaram sendo vistas como algo distante, como o outro , o estrangeiro, aquele
está por perto, na periferia, mas tem pouca atuação nos fatos Históricos que
merecem ser exumados .
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5.2. Sobre a catalogação no Nudoph e a formação de acervo iconográfico
A pesquisa no Nudoph chegou a um resultado que mesmo já sendo
esperado, não deixou de causar inquietações. Dos mais de duzentos trabalhos
observados, somente dois tratavam da temática representações dos negros nos
livros didáticos brasileiros e, mesmo assim, de maneira pontual no cerne de
abordagens mais amplas. São eles, Matias (2005), que trata dos usos de
iconografias nas salas de aula, e Pereira (2006), que aborda os olhares construídos
sobre o negro na escola moderna. Deste modo, constatou-se a pouca quantidade de
pesquisas sobre a referida temática no curso de História da UEPB.
No que se refere à formação do acervo iconográfico, foram reunidas centenasde imagens presentes nos LDs analisados através de pesquisas na internet, bem
como iconografias que não foram representadas nestes livros, mas que são
igualmente representativas dos contextos históricos retratados26.
Um exemplo de iconografia que faz parte do acervo é uma gravura de Debret
onde é representado um escravo negro sendo castigado com uma vara por um
capitão do mato, e ao fundo um escravo castigando uma escrava através do mesmo
procedimento (ver ANEXO B). Esta imagem está presente em Piletti e Piletti (2002),e sem uma maior problematização, como ocorre na obra, acaba gerando uma
imagem de submissão e passividade dos escravos.
Por outro lado, a reunião de imagens não apresentadas nos LDs analisados
possibilitou um maior entendimento acerca do não dito sobre a diversidade cultural
brasileira, sobretudo no que se refere as populações negras. Nesse sentido,
observaram-se nestas iconografias os inúmeros papeis e funções dos negros nos
vários séculos da História brasileira.Imagens como a do abolicionista, advogado e ex-escravo Luis Gama (ANEXO
C), não representada nos LDs analisados, reforçam a constatação de que também
existiram negros intelectuais no século XIX, quebrando assim com a associação dos
negros no século XIX apenas ao modelo: escravidão, pobreza e violência. Foram
assim, em suma, identificadas imagens que mostram a diversidade de papéis e
funções dos escravos e homens negros livres.
26 Este acervo, após devidamente organizado, estará disponível para consulta em local a serdeterminado, podendo fazer parte de uma exposição que relacione o que foi exposto nos LDs e o quefoi omitido deles. As iconografias do acervo digital em pouco tempo serão também disponibilizadaspara cópias.
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6. DISCUSSÃO
A pesquisa enfrentou dificuldades no seu início, sobretudo decorrentes da
aprovação tardia do projeto27, o que gerou alguns atrasos. Por exemplo, no plano
inicial, os primeiros dois meses do desenvolvimento do estudo estavam ligados a
reunião de fontes bibliográficas, discussão de tarefas e metodologias e produção de
fichamentos temáticos. Logo em seguida, seria feito o contato com o Premen.
Na prática, entretanto, este contato foi adiado, devido ao ano letivo do colégio
já estar se encerrando no mês de dezembro. Por isso, a escola foi contatada apenas
no inicio do ano letivo escolar de 2008. Da mesma forma, o início da catalogaçãotambém foi comprometido, já que o espaço onde ela seria realizada (Nudoph) não
estava em funcionamento no mês de dezembro, vindo a reabrir apenas em fevereiro.
Em suma, com a exceção das leituras e da reunião de material, muitas das
tarefas propostas inicialmente para 2007 se tornaram executáveis apenas a partir de
fevereiro de 2008, por isso o cronograma de execução proposto no projeto (ver
APÊNDICE B) se tornou inviável. Nesse sentido, nas vésperas da elaboração do
relatório parcial foi montado um outro cronograma (ver APÊNDICE C), baseado noprimeiro e adaptado à realidade apresentada no decorrer da pesquisa.
Outra dificuldade encontrada foi a demora da escola em localizar os livros de
História da 7ª série adotados entre o recorte temporal proposto inicialmente para a
pesquisa (1998-2003)28. Apenas um livro deste período foi encontrado, o que tornou
necessária uma mudança no recorte temporal para 2002-2007, tendo em vista cobrir
pelo menos o universo de duas obras efetivamente utilizadas na instituição. O
segundo livro, mesmo estando identificado, também demorou a ser entregue, o quecausou certo atraso nos últimos passos do desenvolvimento da pesquisa29.
27 Que só ocorreu no início de novembro de 2007, bem depois do inicio das pesquisas da cota PIBIC/ UEPB/CNPq 2007/2008.28 A demora por parte da escola deve-se a falta de registro dos LDs adotados na época. Estesregistros se perderam durante a reforma do colégio há alguns anos. Para identificação dos livros, aescola teve que entrar em contato com os professores que lecionavam naquela época.29 Este atraso foi provocado principalmente pela falta de uma organização mais cuidadosa dos livrospor parte da escola. O que dificultou o acesso a estes materiais. No depósito de livros da escolaforam encontrados pelo pesquisador, por exemplo, exemplares de livros de literatura em bom uso, nomeio de caixas com LDs velhos que foram deixados no local. Além disso, falta a escola uma melhororganização no acervo dos livros utilizados no local, o que constitui um importante elemento para amanutenção da memória educacional do colégio.
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6.1. Das Inferências e comparações
No mesmo sentido do que foi identificado por outras abordagens, este estudo
contatou que o número de pesquisas realizados no curso de História da UEPB sobre
o tema representações dos negros nos LDs de história foi bastante reduzido. O que
em um recorte micro mostra as dificuldades deste tipo de análise para se constituir
enquanto campo de estudos autônomo.
Com relação às análises das iconografias apropriadas nos dois LDs objetos
do estudo, a pesquisa constatou que não foram identificados pré-conceitos explícitos
nas iconografias presentes nestas obras, resultado similar ao da maior parte dos
estudos realizados entre 1950 e 2003. Contudo, foram identificadas a reprodução dealguns estereótipos sobre os negros nestas duas obras, e ocorreu uma sistemática
invisibilidade e minimização dos papéis dos negros na trajetória dos homens nos
períodos históricos nelas retratados, o que representa uma permanências com
relação as características presentes nas obras da última década do século XX.
Prevaleceram nas representações apropriadas os valores da cultura européia,
e as visões de mundo inspiradas em um paradigma eurocêntrico. Ou seja, o poder
simbólico dos LDs está sendo utilizado, consciente ou inconscientemente, parapropagar visões que minimizam a importância dos negros nos processo históricos,
bem como na construção da sociedade brasileira. O que foi exaustivamente
apresentado por outras análises nas últimas cinco décadas do século XX, mas que
ainda se faz presente em obras didáticas produzidas no início do século XXI. Nesse
sentido, as populações negras estão ainda em grande desvantagem nesta luta de
representações .
Entretanto, assim como destaca Silva (1999), não se pode iniciar uma “caçaas bruxas” com relação aos autores que reproduziam uma visão excludente a
respeitos das populações negras. Obviamente, os autores têm que ser
responsabilizados pelas concepções que transmitem em sua obras, mas é
necessário o entendimento de que essa concepções fazem parte da realidade social
na qual as obras foram produzidas. Além disso, as poucas rupturas com o
paradigma tradicional apresentadas nos dois Lds, visando uma maior visibilidade
dos negros, também tem que ser ressaltadas.
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7. CONCLUSÃO
Os resultados da análise dos modos de uso e das formas de apropriação das
representações iconográficas sobre os negros em Silva (2005), e Piletti e Piletti
(2002) mostram que estas obras se apropriaram de formas diversas das
representações acerca das populações negras.
Através das análises iconográficas dos dois LDs de História da 7ª série se
chegou a uma visão densa das estruturas que sustentaram a elaboração destas
obras, bem como de algumas rupturas ocorridas em tais estruturas, que
possibilitaram a emergência de visões para além dos aspectos tradicionais. Nessesentido, a análise atingiu um campo bem mais profundo do que a superfície do papel
onde as imagens foram impressas.
O que foi identificado nas análises comprova a não casualidade ou
naturalidade das formas como se direcionaram as apropriações das representações
sobre, de um modo geral, a construção da sociedade brasileira, e de um modo
específico, os papéis das diversas populações em tal construção.
Desta maneira, o peso de uma tradição excludente foi sentido durante aprodução dos referidos livros de 7ª série, que tinham como objetivo contar a história
da humanidade e da formação do povo brasileiro. Contudo, os mesmos autores que
realizaram esta tarefa de modo ainda excludente e reducionista, paradoxalmente,
contribuíram também de alguma forma para a reversão e superação destas mesmas
limitações na sociedade.
As formas como as populações negras foram apropriadas e representadas
nas iconografias expostas em Silva (2005), e Piletti e Piletti (2002) não são naturais,uma vez que estão relacionadas com visões acerca dos negros existentes na
sociedade na qual foram produzidas. O entendimento das apropriações das
iconografias sobre os negros revelam assim muito mais questões relativas ao seu
contexto de ocorrência do que aos períodos históricos representados .
Por um lado, ambas as obras contribuíram para a reprodução do
silenciamento de diversos aspectos da história e da cultura das populações negras ,
e reproduziram a naturalização da representação dos negros como figurantes ou
coadjuvantes dos processos históricos. Por outro lado, foram identificadas micro-
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rupturas com uma tradição que privilegia a apropriação de representações
excludentes e reducionistas relativas aos negros.
Deste modo, constatou-se que várias características hierárquicas pautaram a
apropriação das iconografias pelos autores, produtores e ilustradores dos LDs. Das
trezentas e cinqüenta e oito (358) iconografias apropriadas nos dois livros, apenas
cinqüenta e cinco (55) retratam ao menos um personagem negro. Da mesma forma,
quase dois terços (2/3) destas iconografias apresentaram ora más condições de
visualidade dos personagens negros, ora imagens estereotipadas destes. O que
contribui para a reprodução da permanência destes sujeitos nos lugares sociais a
que são tradicionalmente atribuídos.
As hierarquias se mostraram presentes principalmente no que tange a relaçãoentre as questões de cor e de gênero. A análise das duas obras deixou muito claro
que as apropriações das iconografias privilegiaram o homem branco com traços
europeus representante das elites, seguidos da mulher branca européia também
representante das elites, em terceiro lugar é que aparecem os homens negros, que
ficam ainda bem a frente das suas companheiras, as mulheres negras.
Raras foram as mulheres negra representadas destacadamente, sendo que
só uma delas foi retratada isoladamente nos dois LDs analisados. Estahierarquização deixa explícita a presença, durante a produção destes LDs da junção
de pressupostos patriarcais tidos sobre as mulheres e visões estereotipadas tidas
sobre os negros. Deste modo, nestas obras as mulheres negras acabam sendo duas
vezes minimizadas e estigmatizadas, por um lado por serem mulheres, por outro por
serem negras. Ou seja, as visões tidas na sociedade para com estes sujeitos estão
sendo tranportadas para os LDs, que terão agora o papel de retransmiti-las para a
sociedade por meio dos alunos.Além disso, um outro ponto a ser considerado é que nenhum personagem
negro de destaque na História do Brasil foi representado nas iconografias contidas
nas duas obras. De modo análogo, com a exceção de Toussant Louventure30,
nenhum outro personagem negro de destaque na História foi apropriado nas
representações iconográficas presentes nas duas obras. O que não ocorreu com as
figuras ilustres das populações brancas, como reis, rainhas, políticos, inventores,
cientistas, etc.
30 Líder negro da Revolução que derrubou o sistema escravista em São Domingos, atual capital doHaiti.
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Nas setenta e cinco (75) apropriações de retratos de seres humanos, apenas
cinco (5) negros são representados, ao passo que os brancos aparecem em
sessenta e sete (67) destas representações . O que mostra nitidamente quais foram
os eleitos pelos autores como protagonistas da História da construção da sociedade
brasileira.
No entanto, não se deve demonizar os autores dos LDs analisados, pois em
cada uma das obras foram encontradas visões polifônicas acerca das populações
negras. Nesse sentido, os Lds de História de 7ª série, enquanto sistemas simbólicos
complexos, não escaparam de um jogo presente no cerne dos próprios processos
históricos. Jogo este que estabelece a todo o momento, rupturas e permanências,
continuidades e descontinuidades.Assim, em cada um dos LDs objetos do estudo coabitaram representações
excludentes sobre os negros e tentativas compromissadas de acabar com estas
exclusões. Deste modo, a própria representação do já citado Toussant Louventure
pode ser considerada uma pequena ruptura no modo tradicional de caracterizar os
negros. Também se destacaram nesse sentido duas representações de
manifestações culturais marcadamente negras: o lundu e a capoeira. Uma outra
ruptura das formas tradicionais das apropriações das iconografias relativas aosnegros nos LDs de História foi a inserção em uma das obras, mesmo que reduzida,
de iconografias representando negros bem sucedidos, e colocada em contraponto
ao estereótipos tidos na sociedade brasileira do início do século XXI.
O fato dos LDs estarem submetidos as regras de mercado, a padrões sociais
bem enraizados, e a pouca vontade de mudança dos governantes, inibe mudanças
mais significativas na estrutura destes materiais, já que o ensino de História no
Brasil, desde sua criação, esteve voltado para a formação do cidadão nos moldesdesejados pelas elites que controlam o Estado brasileiro.
Em resumo, os sujeitos que sonham com tais mudanças terão que se adaptar
a um processo bem mais lento do que desejavam. Contudo, a análise identificou que
já estão ocorrendo mudanças nas formas de apropriação das representações
relativas aos negros, mesmo que ainda reduzidas, que devem ser tomadas como
diretrizes na busca de uma metamorfose nas relações entre os diversos grupos
sociais que habitam o território brasileiro, buscando principalmente uma maior
inclusão daqueles sujeitos que vem sendo sistematicamente afastados para as
margens da sociedade nos últimos quatro séculos.
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Por isso, tornam-se fundamentais mobilizações da sociedade civil, no sentido
de desabilitar as estratégias criadas para a manutenção do status quo estrutural da
sociedade brasileira. Para tal desmonte destas estratégias milenares de exclusão
social, é necessária uma verdadeira competição no campo do poder simbólico ,
visando a criação de uma rede que fundamente reações as tentativas de
perpetuação de uma tradição limitada. Urge para tal empreitada a chamada
paciência histórica, que não deve ser confundida com comodismo ou indiferença.
Nesse sentido, os produtores, autores, ilustradores, donos de editoras,
professores, diretores, alunos, governantes, políticos, membros de movimentos
sociais, pesquisadores acadêmicos e quaisquer outros agentes envolvidos com a
produção, comercialização e consumo dos LDs, tem que se perguntar se estãovoluntária ou involuntariamente perpetuando estratégias de exclusão social, que
como pedras atiradas para o alto, tem grande chances de acertar a cabeça de algum
inocente em algum outro lugar.
A diferença entre a pedra e a minimização e reprodução de estereótipos é
que o ferimento causado pela pedra logo cicatrizará, enquanto que as visões
estereotipadas acerca de uma determinada parcela da população, inversamente,
continuam vivas na cabeça dos sujeitos que as internalizaram. Segundo o resultadoda análise, se constatou a possibilidade da formação de leitores acríticos no que diz
respeito ao processo de fabricação de imagens.
Ficam assim novas questões para outras pesquisas, sobretudo no que se
refere às apropriações e recepções destes materiais por parte de professores e
alunos. Torna-se importante entender como os agentes, nas situações práticas de
uso destes materiais didáticos, consomem estas representações acerca de negros ,
brancos, indígenas e asiáticos . Como estes sujeitos lidam com estas representações iconográficas ? Até que ponto eles vem absolvendo acriticamente ou reinventando o
que é transmitido na literatura didática? E os alunos e professores negros, como
lidam com as representações dos negros durante a relação ensino/aprendizagem?
Também fica no ar outro questionamento: Como se constituem as relações
raciais por traz dos bastidores de produção, venda e comercialização dos LDs?
Estas são questões que não serão respondidas neste momento, mas que não
podem ficar no vazio, pois seu entendimento é fundamental para que se tenha uma
visão geral das Histórias que estão sendo ensinadas nas escolas e dos usos de tais
Histórias pelos seus consumidores.
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APÊNDICE A - CONHECENDO O PREMEM
A Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio Dr. Hortêncio de Souza
Ribeiro (Premen), se localiza na Rua Otacílio Nepomuceno, sem número, no Bairro
do Catolé, Cidade de Campina Grande – PB. Atualmente esta escola possui cerca
de setenta e cinco professores no seu quadro, sendo sete de História. A escola
comporta turmas do ensino fundamental, do sexto ao nono ano, e do ensino médio,
do primeiro ao terceiro ano. A estimativa da quantidade de alunos está em torno de
mil seiscentos e vinte quatro, sendo setecentos e sessenta e sete matriculados no
turno da manhã, seiscentos e cinqüenta e um no turno da tarde e duzentos e seis ànoite. A média de alunos por sala é de quarenta.
Segundo a direção da escola, no ano de 2007 o colégio possuía seis turmas
de sétima série: três no turno da manhã e três no turno da tarde. Existe neste
estabelecimento de ensino uma grande quantidade de alunos que procedem do
bairro onde a escola se localiza, e também de vários bairros circunvizinhos, sendo
que um considerável número destes sujeitos mora em bairros distantes e alguns,
inclusive, residem em cidades próximas a Campina Grande.Com relação à estrutura física, o colégio, que já está em funcionamento há 28
anos, possui um total de quarenta salas de aula, além de um pátio amplo, sala de
informática, biblioteca e um ginásio poli esportivo recém construído. Há cerca de
dois anos o Premem passou por uma reforma geral, que envolveu toda a sua
estrutura.
Sobre o perfil étnico-racial dos alunos que estudam no colégio, a maioria dos
alunos pode ser identificada como pertencente à categoria pardo , segundo a direçãoda escola. Esta categoria é utilizada pela direção do Premen no formulário de
matrícula dos alunos, onde são apresentadas as mesmas nomenclaturas para
identificação étnico-racial utilizadas pelo IBGE: preto, pardo, amarelo e branco.
Desta forma, segundo a direção, a maioria dos alunos se identifica como parda ou
mestiça, tendo o estabelecimento poucos negros e brancos matriculados e uma
grande quantidade de pardos.
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APÊNDICE B - CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO PROPOSTO NO PROJETO
2007 2008 ATIVIDADES A
G
O
S
E
T
O
U
T
N
O
V
D
E
Z
J
A
N
F
E
V
M
A
R
A
B
R
M
A
I
J
U
N
J
U
L
Discussão detarefas emetodologia
X X
Leituras dabibliografia efichamentos
temáticos
X X
Pesquisa deCampo: Contatocom as escolas eseleção dos livros
X X
Identificação eseleção dasimagens nos livrosdidáticos
X X
Discussão sobreos referenciaisteóricos: livrodidático, questão
étnico-racial, LDB,PCNs, Lei 10.639,teoria da história
X X X X X
Apresentação dorelatório parcial
X
Análise dasiconografias quetratam da etnianegra
X X X
Análise esistematizaçãodos dados
X X
Catalogação dasimagens reunidas X X X X X X
Preparação dorelatório final X
Redação eapresentação dorelatório final
X
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APÊNDICE C - NOVO CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO
2007 2008
ATIVIDADES
AGO
SET
OUT
NOV
DEZ
JAN
FEV
MAR
ABR
MAI
JUN
JUL
AGO
Início do período devigência da bolsa
X
Discussão de tarefas e metodologia X X X X X X X
Leituras da bibliografia efichamentos temáticos X X X X X XParticipação nas atividades do XIVEncontro de Iniciação Científica daUEPB
X
Pesquisa de Campo: Contato comas escolas e seleção dos livros X XIdentificação e seleção dasimagens nos livros didáticos X X X X XDiscussão sobre os referenciaisteóricos: livro didático, questãoétnico-racial, Lei 11.645, teoria dahistória
X X X X
Apresentação dorelatório parcial XAnálise das iconografias que tratamda etnia negra X X X XCatalogação das imagens reunidas
X X X XPreparação do relatório final
X XTérmino do período de vigência daBolsa
X
Entrega do relatório final e doresumo para o XV Encontro daIniciação Científica
X
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ANEXO A – JOGAR CAPOEIRA
Jogar Capoeira ,
Litografia de Johann Moritz Rugendas,
de aproximadamente 1815.
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ANEXO B - GRAVURA DE DEBRET
Gravura do Século XIX, de autoria
De Jean-Baptiste Debret.