Pierre Bourdieu, Edmond Goblot E a EDUCAÇÃO BURGUESA

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  • 7/26/2019 Pierre Bourdieu, Edmond Goblot E a EDUCAO BURGUESA

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    DOI: http://dx.doi.org/10.5007/2175-7984.2015v14n31p180

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    Pierre Bourdieu, Edmond Goblot

    e a educao burguesaJuarez L. de Carvalho Filho1

    Resumo

    Este artigo prope uma discusso sobre duas obras clssicas da sociologia contempornea:

    A Barreira e o Nvel: estudo sociolgico sobre a burguesia francesa moderna (1925), de EdmondGoblot (1858-1935) eA Distino: crtica social do julgamento (1979), de Pierre Bourdieu (1930-2002), que contriburam na Frana na elaborao de um quadro analtico para uma sociologia

    disposicional da burguesia e de uma sociologia da educao e da cultura, nos estudos da classe

    dirigente e o poder. Goblot coloca, antes de Bourdieu, os fundamentos de uma sociolgica da

    distino social. Se distanciando da concepo materialista de classes sociais, inaugura uma

    perspectiva cultural descrevendo etnograficamente os costumes da burguesia francesa. Bourdieu

    nessa perspectiva, mas de maneira mais sofisticada do ponto de vista do mtodo, da anlise

    sociolgica e mobilizando campos prximos das cincias sociais (psicanlise, lingustica, analise

    de correspondncia...) rompe com os substancialismos de classe e a naturalizao do habituseos estilos de vida socialmente distintos. A lgica social da distino no est nos critrios quanti-

    tativos (patrimnio), mas nas propriedades qualitativas (capital cultural, simblico...) partilhadas

    por aqueles que so membros de um mesmo grupo social. Este artigo objetiva, alm de identificaras afinidades destes dois trabalhos, demonstrar suas contribuies para a sociologia da educao

    e da cultura, notadamente para as pesquisas sobre as escolas da classe dirigente no Brasil.

    Palavras-chave:Classe social. Distino. Habitus. Sociologia da burguesia. Sociologia da educao.

    1 Introduo

    O presente artigo prope um paralelo entre duas obras doravante clssicasda sociologia contempornea que contriburam para lanar as bases episte-

    molgicas de uma sociologia disposicional da burguesia, da educao e dacultura, a saber: A Barreira e o Nvel: estudo sociolgico sobre a burguesia francesamoderna (1925), de Edmond Goblot (1858-1935) eA Distino: crtica socialdo julgamento (1979), de Pierre Bourdieu (1930-2002).

    Em A Barreira e o Nvel, Goblot coloca, antes de Bourdieu, os funda-mentos de uma teoria sociolgica da distino social. Se distanciando de uma

    1 Doutor em Sciences Sociales et conomiques pelo Institut Catholique de Paris. Professor adjunto III da Univer-

    sidade Federal do Maranho e do Programa de Ps-Graduao em Cincias Sociais da UFMA.

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    anlise materialista das classes sociais, uma tnica da poca, ele lana luzesnuma perspectiva cultural descrevendo de modo etnogrfico os costumes da

    burguesia francesa moderna, mundo que ele conhece do interior, onde elemesmo se inscreve socialmente. Contemporneo de Henri Bergson e de mileDurkheim na cole normale suprieure, Edmond Goblot, filsofo da Lgi-ca, no desfruta do mesmo prestgio intelectual dos seus contemporneos,porm, tornou-se um autor de referncia no campo da Lgica e de Filosofiadas Cincias. A Barreira e o Nvel influenciou fortemente os contempor-neos do seu autor. Hoje, Goblot considerado um precursor dos trabalhos de

    Bourdieu sobre a distino(LALLEMENT, 2015, p. 282).A Distinofiguracomo uma obra carrefourda sociologia de Bourdieu, segundo Frderic Le-baron, considerado O Capital de Pierre Bourdieu. Para Lebaron, o sucessodADistino(resultado de um conjunto de pesquisas dele e de seu grupo detrabalho, obra mais lida, mais citada) se deve ao fato de ter suscitado efeitode revelao prximo da psicanlise, uma espcie de retorno ao recalque so-cial. Para LebaronA Distino aparece como uma obra carrefour, no sentidode que ela articula ao mesmo tempo de maneira original a objetividade de

    regularidades estatsticas, representaes com o auxlio do mtodo de analisede dados, observao qualitativa e, mais precisamente discursiva e icono-grfica da onipresena dos determinantes sociais, a scio-anlise dos sistemasde classificao e, enfim, a crtica sociolgica daquilo que Bourdieu chamoude postura escolstica (LEBARON, 2012, p. 155-156). Muito evidentementereside nestes elementos a originalidade dA Distino em relao Barreirae o Nvel de Goblot. Enquanto a obra de Goblot se caracteriza mais como

    um estudo descritivo de estilo etnogrfico, a de Bourdieu se apresenta comum estudo analtico dos mais sofisticados, mobilizando ferramentas tericas eepistemolgicas e propondo uma unidade das cincias sociais (antropologia,psicanlise, lingustica, estatstica). comum se afirmar que Bourdieu teriase negado a citar Goblot. Esta afirmao no procede, uma vez que Bourdieuno somente tinha conhecimento da obra de Goblot, como o cita em um dosprimeiros textos sobre a noo de classe social: Condition de classe et positionde classe (2005, p. 9).

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    Num primeiro momento busca-se neste texto situar Goblot (mais des-conhecido que Bourdieu2) no campo intelectual francs e a novidade do seu

    ensaio sociolgico sobre a burguesia francesa, notadamente no que concer-ne a noo de classe social rompendo com a noo materialista de Marx.O mesmo se far para Bourdieu, uma vez que se entende que este ltimo,buscou, nA Distinoromper com os substancialismos de classe. Numa ter-ceira seo a partir da noo de distino, busca-se um paralelo entre os doistrabalhos, mostrando, o quanto possvel, as diferenas existentes. Por ltimo,enfatizar-se- a educao burguesa e o seu papel na luta de distino.

    Conclui-se propondo, alm de identificar as afinidades destes dois tra-

    balhos (este um dos objetivos deste texto) frequentemente ignoradas pelosleitores e estudiosos de Bourdieu (sobretudo no Brasil), demonstrar suas con-tribuies para uma sociologia disposicional, uma sociologia da educao eda cultura, notadamente sobre as pesquisas sociolgicas relativas s escolas daclasse dirigente no Brasil.

    2 Da lgica de classes

    No se discute aqui a longa histria social do conceito de classes sociais.

    Existem trabalhos de grande envergadura que tratam com pertinncia da his-tria e a arqueologia de um dos termos essenciais das cincias sociais e polti-cas3. O interesse dessa seo demonstrar os critrios definidos por Goblot eBourdieu sobre o que constitui uma classe social na lgica de distino.

    Edmond Goblot nasceu em Mamers (Frana) em 1858 e morreu em1935. Foi aluno da cole normale superieure, contemporneo de mile Dur-kheim (1856-1917) e Henri Bergson (1859-1941). Filsofo de formao,Goblot obtm a Agrgation4de philosophieem 1893. Consagrou sua tese de

    2 Digno de nota o fato de que o livro de Goblot foi publicado no Brasil em 1989, enquanto que o livro ADistino foi publicado somente em 2007, embora a obra deste ltimo comece a ser difundida no Brasil desdeos anos 1970 (CARVALHO FILHO, 2015). O livro de Goblot sofreu, no entanto, uma modificao no ttulo: ABarreira e o Nvel: retrato da burguesia francesa na passagem do sculo. Trad. De Estela dos Santos Abreu eMaria da Silva Cravo. So Paulo: Papirus, 1989.

    3 Cf. por exemplo, de PIGUET, Marie-France. Classe: histoire du mot et gense du concept des physiocrates auxhistoriens de la restauration (1996).

    4 Concurso pblico para atuar como professor do Liceu ou de faculdade e que confere aos aprovados o ttulo de

    professor agrg.

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    doutorado sobre a filosofia das cincias (Le systme des sciences),ficou primei-ramente mais conhecido como filsofo da Lgica (Trait de logique,1902; La

    logique des jugements de valeurs, 1913), sendo seu Trait de logique, por muitosanos, adotado nos estudos de filosofia como referncia. Goblot foi professor

    no liceu de Bastia (Crsega) e na facult de lettres de Caen e de Lyon. Noentanto, Goblot ficou celebrizado na Frana aps a publicao, em 1925, do

    livro La barrire et le niveau: tude sociologique de la bourgeoisie franaisemoderne, que se tornou um clssico da sociologia contempornea na Frana.Mas desde 1899, Goblot se interessa ao problema que se tornar o centro da

    nova sociologia, e publica, neste ano, na Revue dconomie politique, um artigo

    Les classes de la socit, demonstrando queA barreira e o nvel, no foi um acaso(LALLEMENT, 2015).

    Antes de discutir elementos constitutivos do clssico de Goblot e dADistinode Bourdieu, cabe aqui enfatizar a ruptura estabelecida frente aoconceito de classe social operada pelos dois autores. Para o filsofo da lgica,

    a tese que d ttulo sua obra est anunciada desde o primeiro captulo, inti-

    tulado Ideia de classe social oposta ideia de casta:

    uma casta algo fechado: nela se nasce, nela se morre; salvo raras excees, nela ningumentra, dela ningum sai. Uma classe algo aberto: temos os parvenuse os rebaixados(dclasss) [...] (p. 11) As caractersticas que separam devem ser qualitativas. Alm disso,so comuns a todos os que elas distinguem. Toda demarcao social ao mesmo tempobarreiraenvel. preciso que a fronteira seja escarpa, mas que acima da escarpa haja umplanalto. Dentro de si toda classe igualitria; no admite declives nem cumes: a igualdadena classe condio da superioridade de classe (p. 19-20).

    V-se a partir desses elementos de definio que para Goblot, a noo

    de classe social no repousa sobre os critrios quantitativos como o patrim-nio, terra, mquinas, mas sobre as propriedades qualitativas compartilhadas

    por aqueles que so membros (nvel), mas que os distingue das outras classes

    sociais (barreira): as vestimentas, a moda, a educao, a linguagem, o lazer, o

    diploma. No captulo Classe e riqueza, Goblot observou tambm, contra

    a ideia marxista de classe proprietria, que o critrio de riqueza insufi-

    ciente e artificial para demarcar as classes sociais. Argumentando que o crit-

    rio pertinente antes de tudo como usar a riqueza (p. 33), Goblot mostra

    que distino de classe uma questo de julgamento de valor (p. 26), de

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    representaes e imagens que passam atravs de prticas sociais especcas edistintamente codicadas5.

    Para Pierre Bourdieu, a noo de classe social um instrumento de an-lise terica constituda pelo socilogo que deve funcionar como princpio declassicao tendo um papel explicativo6e no somente descritivo como astaxinomias das cincias da natureza. Ele distingue a classe teoricamente cons-truda da classe real (grupo mobilizado construdo dentro da realidade). O queBourdieu prope com essa perspectiva a no reicao das classes sociais. Eleadota uma oposio entre substncia e relao, a partir da losoa neokan-tiana de Ernst Cassirer propondo uma concepo relacional e no substancial

    das classes sociais que no so classes no sentido de Marx: classe como grupomobilizado em vista de objetivos comuns e em particular, contra uma outraclasse (BOURDIEU, 1994, p. 26). Para Bourdieu as classes reais so produ-to de classicaes e, sobretudo, o desfecho de luta de classicao, com lutapropriamente simblica (e poltica) para impor uma viso do mundo social,ou melhor, uma maneira de constru-la (BOURDIEU, 1994, p. 27).

    5 Michel Lallement (2015, p. 16) relembra que no momento em que Goblot reflete, trabalha e escreve sobre aburguesia, outros autores fazem o mesmo. Em 1914, P. Coudert publicou La Bourgeoisie et la question sociale.Essai pour la formation dune conscience de classe. Aps a Primeira Guerra mundial, em 1924, Abel HermantLe Bourgeois et Ren Johannet, Lloge du bourgeois franais. Acentuamos aqui por ser mais conhecido otrabalho de Werner Sombart, uma das figuras mais influentes da escola de economia histrica da Alemanha,que publicou em 1913 Le Bourgeois: contribution lhistoire morale et intellectuelle de lhomme conomiquemoderne, publicado em francs pela primeira vez em 1926 (aps a publicao de A Barreira e o Nvel, 1925).Neste clssico, Sombart analisa a burguesia como um resultado da unio entre um fenmeno da psicologiahistrica e dos fatos econmicos propriamente ditos. Esta anlise se separa do pensamento liberal como dasideias marxistas. Como Bernard Groethuysen, francs de origem alem, o burgus representa aps a anlise deSombart, o homem do nosso tempo. O burgus a forma mais tpica do esprito de nosso tempo. O burgus

    no apenas um tipo econmico, mas um tipo social e psicolgico.6 Para um aprofundamento maior sobre a teoria da classe social na arquitetura da obra de Bourdieu, o leitorpode se remeter ao artigo de Loc Wacquant, Poder simblico e fabricao de grupos: como Bourdieu reformulaa questo das classes(2013). Esse discpulo de Bourdieu enfatiza que A abordagem que Bourdieu faz de classeincorpora sua concepo marcadamente relacionalda vida social. Para o autor de A distino, da mesma

    forma que para Marx e Durkheim, o estofo da realidade social e, portanto, a base para a heterogeneidade ea desigualdade consiste de relaes. No de indivduos ou grupos, que povoam nosso horizonte mundano,mas sim de redes de laos materiais e simblicos, que constituem o objeto adequado da anlise social. Essasrelaes existem sob duas formas principais: primeiramente, reificadas como conjuntos de posies objetivasque as pessoas ocupam (instituies ou campos) e que, externamente, determinam a percepo e a ao;e, em segundo lugar, depositadas dentro de corpos individuais, na forma de esquemas mentais de percepoe apreciao (cuja articulao, em camadas, compe o habitus), atravs dos quais ns experimentamos

    internamente e construmos ativamente o mundo vivido (WACQUANT, 2013, p. 88).

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    J no artigo publicado em 1966, Condition de classe et position de classe,(BOURDIEU, 2005) as noes de condio e de posio de classe permitem

    descrever uma situao ecolgica e numrica: campons, citadina, uma situa-o de renda e de status. Bourdieu neste artigo se refere a diferentes autores:a noo de status tomada emprestada de Max Weber; a noo de estilo devida vem de Groethuysen e das teorias da cultura e da relao entre lingua-gem e cultura; por fim, a noo de funo social, de Durkheim. Esses emprs-timos permitem de uma parte, descrever o que um determinado grupo emdeterminadas condies faz destas condies; permitem objetivar as razes desuas escolhas, essas escolhas implicando uma opo que se traduz estatistica-mente por uma posio sobre uma curva linear; de outra parte essas noesenfatizam as homologias de posio que constituem uma estrutura geral. Porexemplo, as classes mdias, por suas condies na Frana escolhem uma escalade status, uma curva de posies ascendente que se define fundamentalmentepor aquilo que no mais e pelo que ainda no , extrai inmeras atitudes(estilo de vida: economia, trabalho), tal como sua inclinao para o objetivis-mo, de uma posio de dupla oposio, em relao s classes superiores e emrelao s classes populares (BOURDIEU, 2005, p. 9). Dupla posio aosvalores lingusticos que ope o distinto ao vulgar. O conjunto constitui uma

    estrutura ao mesmo tempo econmica, cultural e lingustica, historicamentedeterminada e geral. , nesse sentido, que se definem aquilo que Bourdieuchamou de herdeiros, aqueles que, desde o nascimento, acedem aos sinaisde distino (cultura livre, por exemplo). Os herdeiros so ao mesmo tempoaqueles que economicamente so, seno os mais favorecidos, ao menos osmais livres para escolher as profisses liberais. Socialmente so os que domi-nam o sistema escolar (pelo nmero e a posio que ocupam no espao social);e, linguisticamente so os que se beneficiam da familiaridade com a cultura

    erudita (BOURDIEU, 2004, p. 30-34).3 A lgica de distino: o corpo como marcador social7

    Edmond Goblot abre o captulo IV dA Barreira e o Nvel dedica-do moda com seguinte frase: O que diferencia o burgus a distino

    7 Alguns elementos desta seo foram apresentados no seminrio sobre os 30 anos de publicao dA Distino(1979), organizado pelo Laboratrio de Leitura e Pesquisa em Sociologia da Educao de Pierre Bourdieu, coordena-

    do pelo Prof. Dr. Antonio Paulino de Sousa (UFMA; PPGE; PPGCSoc.), em dezembro de 2010. Na ocasio apresentei

    uma comunicao intitulada Pierre Bourdieu e ADistino: o habitus e o corpo nas diferenciaes sociais.

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    (GOBLOT, 1989, p. 51)8. Utilizando o Grand Littr, Dictionnaire de la LangueFranaise, dmile Littr, Goblot destaca que numa das acepes, distino

    aquilo que, no traje, tem um carter de elegncia, de nobreza, de bom tom.Ter distino, um ar de distino. A distino de maneiras. Em seguidaGoblot completa:

    no por beleza, para no ser confundida que a burguesia moderna se esfora para dis-tinguir no vesturio, nos modos, na linguagem, nos objetos que a cercam. O contrrio dedistinto comum: comum o que no distingue, vulgar o que distingue negativamentee revela inferioridade. Esse sentido parece recente, pois no se encontra nos autores antigos(GOBLOT, 1989, p. 52).

    Como se v, a distino apresentada como uma separao, uma distn-cia social, tanto material e espacial, como simblica:

    O esprito burgus tenta evitar ao mximo a promiscuidade ou qualquer aproximao; quer

    conservar as classes populares distncia, no se deixa invadir nem confundir; dispe de

    restaurantes, hotis (...) aos quais essas classes no tm acesso; frequentam festas em que

    a sociedade no misturada (GOBLOT, 1989, p. 51)

    NA DistinoBourdieu descreve uma nova cartografia dos grupos sociaisno seu espao social. Estes so notadamente ordenados segundo seu estilo devida, para os quais Bourdieu estabelece uma classificao a partir da mobliados apartamentos, dos costumes em termos de msica e de vestimentas. Nessadmarche, os agentes so diferenciados segundo a similitude do desenvolvi-mento do seu apartamento, das foras de suas atividades de lazer ou dos suaspreferncias culturais (CARVALHO FILHO, 2013).

    Como percebemos nessa sequncia, o estilo de vida descrito por Goblotencontra eco nas anlises de Bourdieu na relao estreita entre o estilo de vidae o corpo legtimo. O estilo de vida um conjunto de gostos, de prticas siste-mticas caractersticas de uma classe ou de uma determinada frao de classe.Ele compreende e engloba a totalidade de prticas e de obras de um agente,incluindo as prticas sexuais, as opinies polticas, as crenas filosficas, as

    8 importante lembrar que bem antes de Goblot, Georg Simmel se interessa ao fenmeno da moda (Philosophie de lamode, publicado em alemo em 1905), dotando-o de um carter social distintivo, permitindo as classes superiores

    se misturar sem se confundir. Nessa perspectiva a moda para ele um fenmeno social indissociavelmente vincula-

    do a um sistema de pensamento classificatrio fundado na diviso social de classe.

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    convices morais, as preferncias estticas (ACCARDO, 2006, p. 167-168).Essas aquisies, determinaes sociais, esto inscritas no nosso corpo, nas

    posturas, nos nossos movimentos, na nossa relao ao corpo ou ao hexiscor-poral. O corpo, socialmente construdo, um revelador das lgicas e lutas dedistino9.

    O hexiscorporal constitudo de um conjunto de condutas, mais incor-poradas do que interiorizadas; essas condutas tornam-se disposies durveis.A outra dimenso do habitus, nomeada por Bourdieu como ethos concerne asdisposies ticas. Uma e outra se reforam. Os estudos sobre a alta burguesia(sociologia da burguesia) atestam como a elegncia menos ligada a certas

    vestes do que s boas maneiras corporais. Essas boas maneiras remetem stcnicas corporais e de um savoir-faireprprios sociedade mundana (saberandar de forma leve, mas segura, andar de cabea erguida, mas descontrada)fundado num perfeito domnio corporal. Ter classe, como se diz, mostrarpelo corpo que fazemos parte de uma certa elite. A dmarche, em particularconstitui um verdadeiro carto de visita: mesmo num terno, se reconhecero homem da periferia, de classe popular, o campons. As condies para serelegante, distinto, devem ser perfeitamente incorporadas para parecer quase

    natural (DURET; RUSSEL, 2003, p. 14-15).Para Bourdieu, a percepo das hierarquias sociais remete imediata per-

    cepo da postura corporal. A dignidade da pessoa se expressa por seu portee sua retido. A classificao do alto e do baixo do mundo social, se conjugapor sua oposio entre o reto e o curvo. No Le sens pratique publicadoem 1980(2005, p. 119)e retomado em La domination masculineem 1998(p. 15-16), Bourdieu evoca a diviso do trabalho entre os sexos e a diviso dotrabalho sexual a partir do exemplo da colheita de oliva feita pelas mulheres.

    O trabalho corporal do homem, reto, se ope mulher curvada apanhando(com submisso) as olivas que o homem derrubou. Essa etnografia econmica

    9 Nota-se aqui que Marcel Mauss inaugura essa perspectiva em techniques du corps (1936) concebendo essasltimas como sendo essencialmente sociais e culturais: maneira de andar, de correr, de dormir, de comer, de falar,

    os gestos, dependem de aprendizagens sociais. As tcnicas corporais funcionam como marcadores sociais. Para

    Norbert Elias, por sua vez, um processo histrico de uma longa durao, como dizia Braudel, modificou profun-

    damente a relao dos indivduos com o corpo. Essa civilisation de moeurs se caracteriza pelo crescimento do

    autocontrole das pulses. Isso posto podemos afirmar no entanto, que devemos a Pierre Bourdieu e a Luc Bolstanski,

    o desenvolvimento, a teorizao e a ilustrao da importncia dos usos sociais do corpo e de os ter articulado ao

    sistema geral do habitus (DETREZ, p. 143-144). Para Luc Boltanski (1971), Cf. Les usages sociaux du corps.

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    dos camponeses nas montanhas de Kabyle confirma a estruturao da divisodo trabalho social entre os gneros masculino e feminino, pela oposio bin-

    ria entre: o alto/o baixo, reto/curvo, frente/trs.Para Bourdieu, os agentes incorporam os habitus(no plural) que por sua

    vez incidem sobre a maneira pela qual eles percebem, mantm e utilizam so-cialmente o corpo, situando-o no espao social das prticas sociais e culturais.Convm, no entanto, falar de corpo como uma categoria de percepo domundo e de diferenciao social, ou seja, analisar o corpo como um marca-dor social por excelncia, como um capital corporal. nesses termos quedevemos falar como Bourdieu o faz nA Distino. Para ele, se o corpo o

    lugar da denegao do social, essa denegao em si, no pode ser tomada aop da letra; preciso, ao contrrio, desvelar o que ela esconde, quer dizer, asfunes sociais do corpo como instrumento de classe e de classificao e dereproduo distinguindo o gosto (alimentar, esttico, musical, literrio, espor-tivo, vesturio), e o pertencimento a um habitusde classe social. Opondo-se naturalizao e neutralidade do corpo, Bourdieu desvela nA Distino, opapel social do habitus enquanto forma incorporada da condio e posiode classe nos julgamentos sociais e morais remetidos sobre o corpo tanto do

    ponto de vista da esttica, dos cuidados (de sade) com o corpo, como daalimentao (1996, p. 210-212). Assim, o corpo um elemento central do sis-tema de disposies durveis. O corpo certamente um fator de permannciada identidade (que diz eu sou) assegurando a continuidade do ser para si epara os outros, mas podemos colocar em xeque sua incapacidade a estabeleceras relaes sociais fora do esquema pr-construdo pelos habitus.

    No artigo publicado em 1977emActes de la Recherches en Sciences So-ciales, intitulado Remarques provisoires sur la perception sociale du corps,

    contm uma matriz que ser desenvolvida nA Distino. Neste artigoBourdieu postula que

    para compreender os investimentos (em duplo sentido) do qual o corpo objeto (custoem tempo, energia e em dinheiro como estratgia destinada a transformar o corpo, paraaproxim-lo da conformao tida como legtima, maquiagem ou roupas, diettica ou ci-rurgia esttica, para lhe tornar apresentvel ou representvel) preciso relembrar algumas

    proposies que geralmente esquecemos por fora da evidncia. O corpo, como categoria

    de percepo e perceptvel que causa impresso (o que a linguagem comum chama de fsi-

    co), de todas as manifestaes do indivduo, a que menos se deixa modificar apesar do

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    investimento de ordem variada. O corpo deve ser levado em considerao por significar de

    forma mais adequada a natureza de uma pessoa, funcionando, portanto como uma forma

    de linguagem de identidade social em que se falado, mais do que se fala. No corpo se

    leria a linguagem da natureza cultivada em que se trai o mais escondido e o mais verdadeiro,

    j que o menos conscientemente controlado e controlvel e que contamina e determina

    as mensagens percebidas e despercebidas de todas as expresses, comeando pela fala

    (BOURDIEU, 1977, p.51).

    O corpo como construto social , portanto, um princpio central na per-manncia da identidade. Ele articula a dimenso tanto do indivduo comoda coletividade. nesse sentido que o habitusprecisa do corpo para se tornarser; mas, sem se tornar pr-estabelecido do habitus, o corpo no .

    Para Bourdieu (1977, p. 51-520), necessrio compreender os investi-mentos no qual o corpo objeto: maquiagem, cirurgia esttica. O corpo no algo que portamos, locusde categorias, frutos da disposio do habitus. Nocorpo, h uma linguagem que transmite tudo aquilo que se . a linguagemsocial. O corpo um produto social: as deformaes, as doenas, o gosto, acultura so informaes que podem ser transmitidas pela maneira de se por-tar. So sinais distintivos que constituem o corpo e que so produtos de uma

    fabricao. Expressam uma naturalidade, mas so socialmente cultivados.Mas, segundo Bourdieu, essa linguagem da identidade natural, social-

    mente cultivada, em efeito, uma linguagem da identidade social, assim na-turalizada (sob forma de exemplo vulgar ou de distino natural, logo legi-timada). Bourdieu lembra que o corpo naquilo que ele tem de mais naturalem aparncia, quer dizer nas dimenses de sua conformao visvel (volume,tamanho, peso, etc.) um produto do social. E desse feito ele com suas pro-priedades socialmente construdas e socialmente naturalizada, funciona como

    um princpio de classificao social um vez que a distribuio desigual entreas classes das propriedades corporais, assim como as diferentes espcies decapital (econmico, cultural, social, simblico) so mal e desigualmente re-partidas, se cumprem atravs de diferentes mediaes tais como as condiesobjetivas de condies de trabalho (com as deformaes, doenas, mutilao)e os costumes em matria de consumo, que enquanto dimenso de gosto, ouseja, de habitus, podem se perpetuar para alm das condies sociais de produ-o. por isso, que o corpo, segundo Bourdieu, no designa somente a posi-

    o atual no mundo social, mas tambm sua trajetria social e histrica. Desse

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    fato, as diferenas de pura conformao fsica, so redobradas pelas diferenasde hexis, de postura, diferenas na postura corporal, na maneira de portar e de

    se comportar, onde se expressa na relao do corpo ao mundo social.A representao social do corpo, com o qual cada agente deve contar,

    desde a origem, para elaborar sua representao subjetiva de seu corpo (seuhexiscorporal), obtida pela aplicao de um sistema de classificao socialcujo princpio o mesmo dos produtos sociais ao qual ele se aplica. Assim ocorpo teria todas as chances de receber um preo estritamente proporcional posio de possuidores na estrutura de distribuio das outras propriedadesfundamentais.

    4 Educao burguesa

    Sem dvida a educao exerce um papel fundamenta na lgica de dis-tino, contribuindo na estruturao de prticas sociais e culturais distintivase codificadas. Podemos nos remeter ao clssico de orstein Veblen Teoriada classe ociosa (1899) quando Goblot faz referncia necessidade de notrabalhar. Veblen enfatizou os processos sociais de disputas entre os homens,conduzindo-os a comprometer-se nas lutas de distino no que importa ma-

    nifestar sua superioridade. Ele se interessa aos modos distintos de consumoda burguesia no final do sculo XIX. Neste sentido, o meio mais seguro dedistinguir-se era mostrar que no se trabalhava ou mais precisamente que nohavia necessidade de trabalhar para viver. Em contraste com a grande maioriaque tinha a necessidade de viver do trabalho na indstria, alguns podiam con-tentar-se em extrair o fruto do labor dessa maioria. A riqueza extorquida per-mite constituir, assim, a classe ociosa que manifesta, de modo ostentatrio,que ela no tem necessidade de trabalhar para viver. Assim, descrevendo os

    ditos pertencentes mentalidade coletiva da burguesia, Goblot afirmava que

    uma das coisas que mais denunciam a falta de recursos a necessidade de trabalhar para

    viver. mais fino a pessoa ser servida do que servir-se, ser servida do que servir os outros; muito honroso ser proprietrio, no fazer nada (...) e viver do trabalho do outro: a honra o dinheiro (GOBLOT, 1989, p. 32).

    Esse tempo livre, tempo do cio, ser o exigido nos processos de escolari-zao, ou seja, na aquisio de disposies e de cdigos da vida burguesa que

    passa eminentemente pela educao. Bourdieu constantemente lembrava que

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    a aquisio dos instrumentos para desvelar as coisas escondidas, inconscientesou implcitas do mundo social, exige muito tempo livre; e que o privilgio dos

    intelectuais (e dos artistas) o fato de que eles tm tempo. Como dizia Plato,skhol, significa ao mesmo numa palavra o lazer e a escola (BOURDIEU,1997, p. 265).

    Goblot afirmava que

    a ordem social tem estreitas relaes com as profisses e os ofcios assim como com os

    partidos polticos; mas nunca a profisso ou o partido que determina a classe e sim, quase

    sempre, a classe que fixa as profisses e os partidos. Antes de tudo, a educao cria e man-

    tm a distino de classe; mas a palavra educao toma aqui um sentido novo e restrito:

    trata-se da educao que classifica, no da que desenvolve o mrito pessoal (GOBLOT,1989, p. 19).

    No final deste captulo (Classe e riqueza), o autor avana que viver bur-guesmente , antes de tudo, proporcionar aos filhos uma educao burguesa(GOBLOT, 1989, p. 36). Goblot descreve a educao, ponto crucial da lgicade classe e de distino, numa sequncia de trs captulos: Educao moral;Educao intelectual; Educao esttica. Vrios temas so abordados: a polidez(simples e convencional) que se aprende de maneira tcita no seio familiar, asprticas da vida cotidiana e as influncias do meio social, as prticas religiosa(aprendizagem do catecismo e a frequentao missa dominical), o uso damentira, a emergncia da prostituio, aprendizagem da msica e outras prti-cas artstica. Buscaremos enfatizar aqui mais a educao intelectual, que, con-soante educao esttica, ou como diz Bourdieu, a economia dos bens sim-blicos, influenciou as pesquisas no campo da educao e da cultura. Comorelembra Delphine Moraldo (2010), as anlises consagradas educao in-telectual, acentuado no baccalaurat10e a aprendizagem do latim, so pontos

    centrais que constituem a lgica da barreira e o nvel. Tudo isso prefigura asanlises posteriores da sociologia da educao. Goblot observava, ainda, queo conhecimento do latim, era a garantia de uma cultura de luxo que pormuito tempo funcionou como um princpio de distino entre a burguesia eo resto da sociedade (quando o ensino se tornou obrigatrio e gratuito), antesde ser substitudo por uma barreira oficial e garantia do Estado. A funo dobaccalauratera de distinguir e de nivelar a elite (MORALDO, 2010).

    10 Exame nacional que sanciona o curso secundrio francs e serve de ingresso universidade.

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    No que concerne a estas pesquisas em sociologia da educao, pareceum consenso armar que os trabalhos de Bourdieu (os primeiros em parceria

    com Jean-Claude Passeron) consolidaram uma anlise sociolgica da hierar-quizao intelectual, notadamente seus livros: Les Hritiers: les tudiants et laculture; La Rproduction: lments pour une thorie du systme denseignement;Homo Academicus et La noblesse dtat: Grandes coles et esprit de corps. Estestrabalhos so consagrados ao sistema escolar e s condies em que as grandesescolas11e universidades refletem os privilgios de alguns, vis--visda escolari-dade. Em outras palavras, como se estrutura e funciona o sistema de ensino ecomo certos privilgios so perpetuados e fecundados pela prpria instituio.

    Para Bourdieu, o sistema de ensino uma das mais importantes instituiesda sociedade moderna. Nesta sociedade moderna, que a nossa, existem doisgrandes princpios de dominao: o capital econmico e o capital cultural.Sobre este ltimo, Bourdieu (1979, p. 3-4) acentua sobre as propriedadessegundo ele, bizarras, no sentido de que, ele tem por propriedade de ser par-cialmente incorporado; se inscreve na estrutura cognitiva, ou seja, exige umtrabalho de inculcao e de assimilao, custa tempo, deve ser investidopessoalmente, e tende a desaparecer, pois morre com seu portador. Por outrolado, ele no transmitido por hereditariedade, nem diretamente sob a formade um ttulo de terra ou um cheque. Sua transmisso se d de maneira a maisdifusa, por um mecanismo, que passa pelo discurso, um princpio poderosoda eficcia ideolgica, da prpria lgica de transmisso do capital cultural.O capital cultural, segundo Bourdieu, que possui todas as espcies de pro-priedades se tornou, nas sociedades modernas, como os Estados Unidos e oJapo, para citar dois exemplos, um princpio da dominao ao lado do capitaleconmico. importante verificar, por exemplo, como demonstram MichelPinon e Monique Pinon-Charlot (2007, p. 20) em suas pesquisas exploran-

    do o mundo desconhecido das aristocracias e dos grandes burgueses, que nocarter multiforme da riqueza da alta burguesia francesa, num processo cadavez mais acentuado da competio escolar, a cultura da alta sociedade no serestringe a uma erudio de amadores da arte. A escola tambm um dom-nio onde essas famlias se distinguem. E, dado ao crescimento dos mercados

    11 As Grandes Escolas, na Frana, formam a classe dirigente, principalmente nas reas tecnolgicas e administrativas.A formao tem durao geralmente de cinco anos, aps o liceu. O diploma reconhecido pelo Estado e assegura

    aos portadores as melhores oportunidades de acesso aos cargos administrativos e empresariais mais prestigiosos.

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    nanceiros e dos riscos inerentes s novas competies no mundo dos neg-

    cios, as escolas da alta burguesia, pblicas e privadas, elevam o nvel de exign-

    cias ao acesso s grandes escolas.Segundo Pinon e Pinon-Charlot (2007, p. 84), a escola como segunda

    instncia de socializao, confronta as experincias ligadas ao meio familiar.

    Com efeito, os estabelecimentos de ensino que acolhem as crianas da alta

    sociedade apresentam a particularidade, quer sejam pblicos ou privados, de

    assegurar, para alm da instruo, propriamente dita, atividades de educa-

    o. Esses estabelecimentos transmitem os saberes indispensveis ao sucesso

    nos exames nacionais, mas eles formam, ao mesmo tempo, os espritos e os

    corpos legtimos dando continuidade ao trabalho educativo realizado no seio

    da famlia. Essa educao burguesa assume a totalidade da personalidade das

    crianas, dmarcheem homologia com a fortuna e a multiplicidade das formasde capitais. As escolas da burguesia, como acentuam os autores, devem ainda

    estar altura de assumir os elementos de socializao transmitidos pela fam-

    lia, todos esses cdigos, maneiras de fazer e maneiras de ser que permitem de

    se fazer admitir como membro parte da sociedade. No entanto eles ressaltam

    que, a importncia da boa escola como lugar da transmisso da educao

    intelectual no se traduz apenas pelo uso exclusivo dos estabelecimentos pri-

    vados, haja vista que, sendo a segregao espacial e social na regio parisiense

    bastante acentuada, as famlias burguesas se concentram nos beaux quar-tiers para controlar os estabelecimentos pblicos de ensino (laicos e republi-canos) para poder enviar seus lhos com conana (PINON; PINON-

    CHARLOT, 2007, p. 84).

    Isso colocado, podemos armar que pertencer mesma categoria social

    no tem o mesmo signicado nos espaos escolares diferenciados para a aces-sibilidade, a hierarquia dos estabelecimentos escolares (socialmente marca-

    dos) e dos recursos disponveis e mobilizveis pelas famlias. Assim, os estabe-

    lecimentos, que no se situam em qualquer lugar no espao geogrco e social

    urbano da cidade, tambm no recebem qualquer um, e, por isso, no tm o

    mesmo projeto, as mesmas opes diferenciadas. Em consequncia disso, os

    grupos de elite constroem socialmente a maneira de ver o mundo, de se repre-

    sentar e de representar socialmente os outros no mundo social (CARVALHO

    FILHO, 2014).

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    5 Concluso: a reverberao da sociologia da burguesia

    para pensar a educao de elite no Brasil

    Na Frana tanto A Barreira e o Nvel (Goblot), quanto A Distino(Bourdieu), contriburam para pensar a relao das classes sociais dirigentescom a cultura e a escola. Esta ltima mais que a primeira. Isto justificvelpelo cursusde formao dos autores e o investimento que eles fizeram nascincias sociais. Num recente coletivo celebrando os 30 anos de publicaodA Distino12, toda uma parte do livro se intitula La distinction commethorie de classes sociales, na qual Agns van Zanter, examina as relaesculturais e econmicas no interior da classe mdia alta a partir do estudo

    das disposies e estratgias, associadas com a escolha dos estabelecimentosde ensino para seus filhos. Para definir essas categorias sociais ela adotou aperspectiva multidimensional do espao social desenvolvida nADistinoar-ticulando a considerao de uma hierarquizao de classes e de estilo de vida.No entanto, os dois livros so bastante requisitados nos estudos sociolgicosda nova burguesia francesa.

    No Brasil, no somenteADistino, assim como o conjunto da obra deBourdieu mobilizado para analisar a escola e o sistema escolar, indepen-dentemente dos alcances e limites dos seus conceitos para se pensar o casono Brasil, em razo das particularidades das realidades sociais, econmicas eculturais deste ltimo13. Uma das frentes de difuso e circulao da obra deBourdieu no Brasil vinculada sociologia da educao. O artigo As apro-priaes da obra de Pierre Bourdieu no campo educacional brasileiro, atravsde peridicos da rea, de autoria de Afrnio M. Catani, Denice Brbara Ca-tani e Gilson R. de M. Pereira (2001), um levantamento que indica e buscacompreender os modos de apropriao que marcaram a entrada do socilogo

    francs nos estudos sobre a educao e a cultura no Brasil, objetos dominantesda sociologia bourdieusiana na Frana, aps seu retorno da Arglia como jaludido (CARVALHO FILHO, 2015, p. 9).

    12 Trata-se do livro intitulado Trente ans aprs La Distintion, de Pierre Bourdieu, coordenado por Philippe Coulegeon eJulien Duval (2013).

    13 Sobre essa discusso podemos consultar A sociologia da educao de Pierre Bourdieu: limites e contribuies de

    Claudio Marques Martins Nogueira e Maria Alice Nogueira (2002); A sociologia de Pierre Bourdieu (ou como um

    autor se torna indispensvel ao nosso regime de leituras) (2002) e de Ana Maria Fonseca, A noo de capital

    cultural til para se pensar o Brasil? (2011).

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    Sobre essa questo, o importante artigo de Amurabi Oliveira intitula-do La sociologie de lducation au Brsil: tendances historiques et contem-

    poraines (2013), analisa a trajetria histrica da sociologia da educao noBrasil, marcada por tenses e rupturas, no interior das instituies de ensinosuperior e entre os intelectuais disputando o direito legtimo para tratar deobjetos concernentes s questes educacionais. O autor acentua dois aspectosimportantes: a centralidade da questo das desigualdades sociais na produode sociologia da educao no Brasil e a recepo da obra do socilogo fran-cs neste campo de pesquisa. O intuito do autor no realizar uma revisoabrangente do trabalho feito anteriormente por outros autores, mas analisaras tendncias que definem esta rea de pesquisa no Brasil, dado o seu processo

    de formao histrica.

    Nas ltimas dcadas o acento colocado na escolha dos estabelecimentosde ensino. Como afirmamos noutro texto, a sociologia da escolha dos esta-belecimentos de ensino desenvolvida na Europa, nos Estados Unidos e, nosltimos anos, no Brasil, encontrou eco nos trabalhos realizados sob a gide deMaria Alice Nogueira e Ana Maria F. Almeida, socilogas expoentes da socio-logia da educao, e difusoras da sociologia da educao e da cultura elabo-rada por Pierre Bourdieu. Elas conjugam, em suas anlises, a escolha do esta-

    belecimento de ensino com o processo de socializao e de hierarquizao dasfamlias e a escolarizao das elites. Ou seja, buscam compreender e explicara relao complexa entre famlia e instituio escolar (CARVALHO FILHO,2014). No artigo A escolha do estabelecimento de ensino pelas famlias: aao discreta da riqueza cultural (1998), Nogueira levanta a hiptese de queas famlias ou diferentes meios sociais so desigualmente equipados no quese refere s condies necessrias boa escolha do estabelecimento escolarpara seus filhos (NOGUEIRA, 1998, p. 43). A referida autora busca verificar

    em que medida as estratgias de escolha do estabelecimento de ensino varia denatureza quando se passa de um meio social a outro ou de uma famlia a outrano interior de um mesmo universo social. Ela afirma ainda, que o que est emjogo e no centro dos discursos no campo das relaes entre famlia/escola, aquesto do grau de autonomia que pode atribuir a varivel famlia em relao varivel social. A escolha da boa escola para os filhos exige um conheci-mento do sistema de ensino, da situao social do estabelecimento, disposiode tempo, capital econmico e capital cultural. Ou seja, um conjunto de dis-posies e condies objetivas, que so repartidas de maneiras desiguais entre

    as famlias (CARVALHO FILHO, 2014).

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    A reflexo proposta aqui indica que a escola, como instituio determi-nante da sociedade moderna e contempornea e a relao que a classe dirigen-

    te estabelece com ela permite compreender e explicara contribuio concreta que o sistema de ensino oferece para a produo das diferenas deestilo de vida no mais das vezes vinculadas, na frmula weberiana, a diferenas de status

    concretizadoras das fraturas sociais na medida em que presidem a constituio de redes

    de influncias e ncleos de formao de poder estruturados por relaes de amizade ou

    alianas matrimoniais (NOGUEIRA, 2009, p. 22).

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    Recebido em: 10.07.2015

    Aceito em: 20.10.2015

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    Pierre Bourdieu, Edmond Goblot, bourgeois and education

    AbstractThis article proposes a discussion on two classic works of contemporary sociology: The Barrierand the Level: sociological study of modern French bourgeoisie (1925), Edmond Goblot (1858-1935) and The Distinction: Social Critique of Judgment (1979) Pierre Bourdieu (1930-2002),who contributed in France in developing an analytical framework for a dispositional sociologyof the bourgeoisie and the sociology of education and culture, in studies of the ruling classand power. Goblot puts before Bourdieu, the foundations of a sociological social distinction.Moving away from materialistic conception of social classes, opens a cultural perspectiveethnographic describing the customs of the French bourgeoisie. Bourdieu this perspective, but

    in a more sophisticated manner from the point of view of the method of sociological analysisand mobilizing nearby fields of the social sciences (psychoanalysis, linguistics, correspondenceanalysis ...) breaks with the class substancialismos and the naturalization of habitus and sociallydistinct lifestyles. The social logic of distinction is not the quantitative criteria (equity), but thequalitative properties (cultural capital, symbolic ...) shared by those who are members of a socialgroup. This article aims, in addition to identifying the affinities of these two works, demonstratetheir contribution to the sociology of education and culture, notably for research on the schoolsof the ruling class in Brazil.

    Keywords:Social class. Distinction. Habitus. Sociology of the bourgeoisie. Sociology of education.