Poesia, Vento e Fogo

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POESIA, VENTO E FOGO Por: Luiz Aurélio

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Livro reunindo poesias anarquistas de autoria própria.

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POESIA,

VENTO E

FOGO

Por: Luiz Aurélio

Page 2: Poesia, Vento e Fogo

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PARA A VIDA CONQUISTAR É PRECISO NAVEGAR!

Sentado nessa pedra olho o mar...

Por toda parte a me cercar

E a maré cada vez a subir

Estarei condenado a sucumbir?

Essa velha terra só está a afundar

O que haverá além-mar?

Um novo mundo podemos construir

Um vida plena conquistar

Quero para isso contribuir

Quero para isso poder lutar

Dizem que a Anarquia é um delírio

Porque o oceano é infinito

Ou ainda, que no fim dele há um abismo

Mas eu não acredito nisso

Tendo a história por piso

Vejo que navegar é preciso

Me junto àqueles malditos

Amaldiçoados por pensarem além

Perseguidos ou tratados com desdém

Difícil é ser um deles também

Olho para o mar,

não posso sozinho nadar

Pois assim só irei me afogar

Sem muito longe conseguir chegar

É necessário um grande mutirão

Saio então a chamar a população

Vamos organizar uma grande expedição

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É preciso construir e tomar navios

Para atravessar os mares bravios

Carpinteiros, marinheiros,

cada um no nosso meio

Vamos nos organizar

Para o mais rápido poder zarpar

Com velas alçadas o vento nos impelirá

O céu estrelado nos guiará

Não se assustem companheiros

Pois que esse céu inteiro

Só reflete o que há em nosso peito

O vento na verdade é da liberdade o desejo

As estrelas e os ventos encontramos em nós mesmos

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REVOLTA ADOLESCENTE

Dizem que sou

um ser inferior

um menor...

de idade

me infantilizam

me subestimam

desprezam minha vontade

Eu sempre sou obrigado a escutar

Mas ninguém dá atenção

No que eu tenho a falar

Só querem submissão

Aceitar com um sorriso

tudo que vocês instituíram.

Falam de um mundo bonito

Enumeram qualidades

mas vou crescendo e descobrindo

a podridão da realidade

de tudo que me falaram

muito pouco é verdade

Porque vocês falam uma coisa

e fazem outra ?

Porque vocês exigem que eu faça

o que vocês mesmos não fazem ?

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Estou cansado de toda essa hipocrisia

Querem que eu me adapte

ao mundo que vocês criaram

Mas o mundo que vocês criaram

é uma grande porcaria

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ESCOLHAS

O político sempre indecente

Do patrão devo ser servente

A televisão alienação influente

A polícia repressão potente

Não há como ficar indiferente

Do que por toda parte se faz presente

Me sinto diante disso descontente

Dessa moral e valores descrente

Devo seguir como penitente,

Acorrentar coração e mente

Ao imundo esteio do existente

Como posso a isso ser obediente?

Aceitar vai parecendo conveniente

Aos de consciência decadente

Contestar parece imprudente

Mas é uma atitude valente

Prefiro ser um combatente

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DIFICULDADES

Se os obstáculos parecem muito grandes

e o fracasso parece certo

É preciso esquecer as aparências

e olhar mais adiante

Pois se sozinhos somos como insetos

Unidos seremos um gigante

Que não há o que o possa deter

Mesmo todo o aparato do poder

Fica ridículo, pequenino

O povo só continua a sofrer

Por que não tem consciência disso

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CONTRAPONTO

Os dias passam tão rápido

Nem dá para acreditar

No pouco tempo que me resta

Quero fazer algo para transformar

Diante desse mundo destrutivo

Que ao menos deixe escrito

Meu grito estridente

Contra essa sociedade

Me levanto resistente

Um sentimento latente

De contra tudo isso protestar

Numa atualidade envolta em problemas

Mesmo com meu eu envolto em dilemas

Algo construtivo insisto em expressar

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PERSPECTIVA DO PROLETARIADO

Cresça no seu peito autêntica certeza

Que nos que hoje são humilhados

Explorados e inferiorizados

É que reside a verdadeira grandeza

A grandeza que esses carregam

não é a capacidade de suportar

Essa odiável situação

Mas sua capacidade de lutar

Se unir para a ação

Sua humanidade afirmar

Promover a transformação.

Essa velha ordem aniquilar

E construir a autogestão

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O FOGO CONTRA A MORTE

Governo

Expressão dos poderosos

Condição de um povo enfermo

Rebelião dos corajosos!

Ah...

Revolta.

Um grito de ira

Um grito de vida

O fogo que transforma

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UM CHAMADO AO COMBATE

Das aparências eles aparecem como sujeitos dignos de respeito

querem ver a sociedade mirando nas paredes da sua casa de espelhos

- Tudo está bem, está bem até demais,

do que você está reclamando aí meu rapaz ?

Acho que o que pergunta também reclamaria

se ao menos visse direito

alguma coisa além do próprio umbigo gigantesco

Pra ele é tudo bem

pros outros é que é o bicho

mas até esse estar bem

também é relativo

agora de sua vida fútil outra hora falo disso

Sigo em frente e os deixo

na lama da mediocridade fazendo seus rastejos

e procuro desenvolver a minha mente

sempre em passos gigantescos.

Porém ao solo do estabelecido também não quero ficar preso

É preciso muito além pensar

pois somente pensando grande

é que se pode coisas grandes alcançar

Tento num grande salto me lançar ao ar

além das barreiras rasteiras navegar

mas a gravidade das imposições

da decadente sociedade

tentam me puxar

me derrubar

para que nesse caminho eu não possa continuar

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- O mal exemplo deve perder o sustento

se não outros podem começar a imitar!

Ou pior, podem imitar

e na mesma linha começarem a inovar

desenvolvendo o mal exemplo

que tormento!

podem do trono nos vir a arrancar.

Contorno a adversidade

evitando ir para baixo

as velas eu alço

procurando orientar o pensamento

encontrando as correntes de vento

que fortaleçam o movimento

que conduzem ao libertar.

E junto com muitos outros lhes responderemos:

- Tremam mesmo seus vampiros nojentos!

Deixaremos sua velha ordem ao relento

seu domínio podre iremos destroçar

com um golpe só, a dois se derrubará

ao seu domínio e ao nosso sofrimento

Esse circo de horrores

hipocritamente chamado de desenvolvimento

será para a humanidade

somente triste lembrança no tempo.

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Vejo a sociedade atual

Que deprimente espetáculo

seres humanos escravizados

animais

presos nos currais

adestrados, domesticados, castrados , confinados

no rebanho sempre iguais

seguindo esses falsos guias como bobos

não conseguindo perceber que esses guias são os lobos

Iludidos com a promessa de encontrar algum tesouro

não percebem que o caminho esta levando ao abatedouro.

Que sufoco

O seu vencer na vida pra mim é só ouro de tolo

Na verdade é bem pior

o ouro de tolo ainda é inofensivo

mas seu sistema é pra vida humana extremamente destrutivo

Antes matasse de uma vez !

Mas não, ainda consegue ser pior

é uma tortura cruel por toda a existência

contra a qual não adianta pedir clemência

pois tem na desgraça da humanidade a própria essência

e o que alimenta sua permanência.

Não perca tempo pedindo piedade

nem ache dos céus ou do espaço

virá alguém que te resgate.

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Aparecem também humanos supostos salvadores

mas que não salvam nada na verdade

querem é derrubar os dominantes

para se tornarem os novos senhores

Outro jogo podre

onde poucos ganham muito

e muitos saem perdedores.

Tem também os pacificadores pregando a não violência

como solução das dores da humanidade.

Ser bonzinho contra quem te estraçalha que bondade!

Dê a outra face até que arranquem sua cara de tanto tapa,

não reaja

reagir é ser igual a eles?

Que falácia !

Isso mais parece um masoquismo destrutivo

Te ferem gravemente e você acha bonito.

Te impõem a desgraça e você não fala nada

falar até fala

mas a não violência

também é uma não ameaça

contra quem oprime as massas

Tudo que eles temem é a revolta popular

a população armada ao sistema derrubar

isso para alguns ditos revolucionários

é violência...

é uma demência de lascar!

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Não vê que a violência é a que emana do sistema?

Lutar contra isso se chama resistência

é o combate pela vida a favor da existência

Se eles não largam o osso nós devemos sim tomar.

Se preciso for através da força.

Ou então faça sua forca

tente conseguir indo abraçar os da matilha loba

e peça que nenhum te morda

A intenção até que é boa...

mas no final não largarão osso algum

e ainda outros ossos terão na boca os lobos

serão os ossos pacifistas arrancados do seu corpo.

Seja racional,

"até o verme se retorce

contra o pé que o esmaga"

O conflito aberto é a via

a vitória é o resultado.

É a turbulência do parto

antes do nascer da nova vida.

Veja que falo de lutar

mas não começar a guerra.

Pois ela já está rolando solta

mas você que não enxerga

se atualmente está camuflada

pode ser traga às abertas.

Se a luta torna a vitória possibilidade

devemos arriscar a cura

para a doente sociedade.

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A doença é bem grave

é quase estado terminal

a evidências apontam claro

que a morte é o seu final

ou fazemos alguma coisa

ou a história acaba mal.

Sozinho ou de grupinhos ninguém faz revolução

mas aqui no meu cantinho dou minha contribuição

como todos também sinto sofrimento

de várias formas

efeito consequente da doente sociedade

que faz com que viver seja um tormento

e raros os momentos de felicidade

Descarrego a queima roupa

meu cartucho de descontentamento

agora compare com a realidade e veja

se esse pensamento tem mesmo fundamento

Se você também sente em suas veias

pulsar o sangue da revolta

contra tudo que te oprime

e as pessoas mundo afora.

Essa é a hora

e sem mais demora

usemos dos meios disponíveis

e propaguemos a revolta!

A utopia é um sonho,

dos mais belos é verdade

mas caminha pra realidade

quando procurada

pelas classes dominadas

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Se a vitória é o que temos em mente

porque temermos a derrota?

A derrota permanente

já a temos atualmente.

Se o combate abre uma chance

então é um grande lance

entrar nessa empreitada.

Porque se no agora o azar é certo

na luta a sorte estará lançada

Se você concorda

estamos do mesmo lado da corda

e a vitória tem o início

no momento que o povo acorda

Impeli-los para isso é que é a grande sacada,

Expor e desenvolver nossos argumentos

falando, escutando, cantando, debatendo, lendo e escrevendo

até o momento

em que nos encontraremos

no calor das barricadas...

companheiros na batalha

até a vitória camarada !

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CÁRCERES

Cárcere, cadeia, prisão.

É das sociedades

fundadas em desigualdades

Mas uma horrenda criação

Se fundamenta na hipocrisia...

De quem diz combater

De quem nos diz proteger

De males que são sua cria!

Legisladores, juízes, policiais

Aparato a serviço dos barões

E os pobres cada vez mais

A lotar as celas das prisões

Sobre os verdadeiros ladrões

É preciso fazer a crítica

Para vê-los nos ricos patrões

Para vê-los na política

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TRABALHO CALVÁRIO

Antes mesmo do sol raiar

Já te vejo acordado a ralar

Quem a duras penas consegue viver

Que trabalha tanto e continua a sofrer

Para que outros possam então enriquecer

E desfrutem do luxo e do prazer

Aqueles mesmos que você

Proporciona mas não pode ter

Diante disso você pode escolher

Ou simplesmente aceitar

e emudecer

Ou ousar pensar

E lutar

Para que as coisas diferentes possam ser

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A VERDADEIRA REVOLUÇÃO

Vejo essa sociedade e a podridão que simboliza

Vejo o grupo de sonhadores que com ela rivaliza

Vejo e sinto o peso da ordem que escraviza

Me uno ao sonhadores, me faço um anarquista

na batalha me lanço, como lutador propagandista

pois sei que a vitória só com o povo se conquista

Ao povo trabalhador deixo este refrão:

Se desejam a verdadeira revolução

rechacem ao líder fanfarrão.

A chave da emancipação

não a procurem em chefes ou governos

Basta a vocês olhar direito

não para cima mas para o próprio peito

e aí a encontrarão

Logo se vê a diferença que têm

entre os libertários e os rebeldes bolchevistas

que querem a revolução como um trem

que promete chegar a terra prometida

seguindo os trilhos da estatal burocracia

conduzido por seu líder, -o maquinista-

onde o povo não é protagonista,

mas simples refém

a olhar pela janela do vagão

com desdém

desilusão

se sentindo usado como bucha-de-canhão

ao ver sua bela revolução

se degenerar em uma nova tirania.

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Não meus irmãos !

Não se percam na cruel ilusão

de um governo novo que fará transformação

Estado significa opressão, ditadura, hierarquia,

essa é sua trilha nunca irá por outra via

E aí reside o valor da anarquia

que a todo poder proclama antipatia

em nome da autogestão

O segredo para nosso sucesso

que leva ao mundo novo de harmonia e união

reside que o povo tome todo o processo

em suas próprias mãos

Que no campo ou na fábrica

não haja proprietário nem patrão

para que o povo que trabalha

seja senhor da produção

junto com mais camaradas

faça o transporte e distribuição

e outros que prestando serviços diversos

deem sua contribuição

seja na área da saúde ou da beleza

limpeza urbana ou construção

Que tudo seja para todos e não de alguns um luxo

onde a produção não sirva ao comércio e lucro

mas sim para atender as necessidades da população.

Por isso o trabalho não será mais excessivo,

estressante, degradante e cansativo.

Será um meio de alegria e satisfação.

e em todo tempo livre que terão

o povo livre poderá se dedicar

às ciências, artes e diversão.

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Assim, no lugar do estado e governo acabados

deve figurar o povo livre associado

organizando sua auto administração.

No lugar da polícia e exército derrotados

deve figurar o povo armado

fazendo sua auto proteção.

Um vez efetivada essa verdadeira revolução

logo virá sua alastração

pelos povos mundo afora

daí em diante a divisão do planeta

em países e territórios, não mais vigora

se abolirá toda fronteira

é o fim da divisão

a raça humana comporá uma só nação

que caminhará livre por sobre a terra

Nessa altura de evolução

já não haverá mais razão

para o estoque de armas de guerra

Com todos os opressores derrotados

e o povo todo libertado

elas servirão somente aos museus

como velhos artefatos

para serem observados

E se algum desentendimento surgir

Logo irá se descobrir

uma boa solução

com tranqüilidade, diálogo e conversação

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No Mundo Livre as novas gerações

levantarão muitas questões

quando a curiosidade os levar

a estudar o passado.

Olhando o presente em que vivemos

e outras épocas de opressão

Se perguntarão a respeito daqueles coitados

que aceitaram viver por tanto tempo

de modo tão desgraçado

sem depressa terem se rebelado.

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O CONSTRUTOR NÃO DEVE TEMER RUÍNAS

Caos! Terror!

Dizem o patrão e o senhor

Quando a revolução de aproxima

Dizem que dali só sobrará ruinas...

A visão de mundo propagada pelo burguês

Não consegue ver além do capital e do lucro

Mas olho as construções e produtos...

O trabalhador fez isso tudo!

Poderá também fazê-los outra vez...

E pode fazer bem melhor!

Em uma sociedade liberta da ganância

Que se mova para a satisfação humana

De realizações e feitos, será muito maior

Vejo um povo moribundo,

em um mundo de privações

Se eles se movimentarem as coisas mudam...

Aos revolucionários ruínas não assustam

Porque sementes de um Novo Mundo

Já carregam em seus corações

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O GRITO LIBERTÁRIO

O grito que os bravos companheiros,

Lançaram com vontade no passado

Continuam a ecoar em nosso meio

Desafiando a propriedade e o Estado

Enquanto perdurarem opressões

A criar seres humanos humilhados

Perdurarão rebeliões

Quando da humilhação ficam cansados

Pois se tolas décadas separam...

Une o elevado ideal de liberdade,

Os que em outras épocas lutaram.

Ao futuro deixo uma verdade

Serei também dos que gritaram

Contra o poder e a autoridade

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SAUDAÇÕES PROLETÁRIOS

“Saudações Proletários,

chegou o grande dia;

deixemos os antros da exploração,

não ser mais escravos da burguesia,”

tomemos os meios de produção!

De cada um segundo as suas capacidades,

a cada um segundo as suas necessidades.

A sociedade organizada em Autogestão,

isso é que é Revolução!

A Liberdade como maior anseio

Coerência entre os fins e os meios

O Povo livre associado,

a destruição do Estado,

a extinção dos tiranos!

Conhecerão vida os seres humanos,

que só vegetaram ao longo dos anos...

Oh, Proletário!

Está tudo em suas mãos...

Não te chamamos à revolta por caridade.

É porque a sua auto emancipação,

é também condição de libertação,

para toda a humanidade!

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ANACIONALISTA

Pensando mais a fundo...

Nem fronteiras, nem nações!

Fronteiras são prisões,

Somos cidadãos do mundo.

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CIDADÃOS “RESPEITÁVEIS”

O burguês e o político são venerados

até mesmo por alguns

que são por esses explorados.

Privilégios e poder ao paspalho!

E todo esforço nessa vida será falho

Os que com seu trabalho

geram toda riqueza

colherão penúria, pobreza

e de brinde mais opressão de sobremesa.

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QUE VENHAM NOVOS VENTOS

Esse é um poema em dedicatória

Aos ventos que sopraram outrora

Que fizeram passagem notória

Para soprarmos também já é hora

Ventos são de intentos luminosos

A escuridão? A querem em destroços!

Mesmo em trevas eles fazem trajetória

Afirmando que pela luta existe escapatória

Que os trabalhadores podem fazer aurora

Nesse mundo que ao ser humano deteriora

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PÁTRIA?

Nasci dentro do que chamam de Brasil

e por aqui sempre vivi

Ainda não fui ao estrangeiro

Orgulho de ser brasileiro?

Acho um termo suspeito

Não tenho compromisso

com um Estado, país

ou governo

Minha visão na verdade

exponho sem receio

meu povo é a humanidade

e minha pátria o mundo inteiro.

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O VÔMITO

Esse mundo sempre a sufocar

E eu ali sem concordar

Mas para conseguir a sobrevivência

A mim mesmo era preciso negar

Tinha que aguentar a existência

Que corrói a minha essência

Por liberdade sempre a gritar

O estudo e o trabalho a oprimir

Um banquete pra me alimentar

Goela a baixo devo empurrar

Muitas coisas fui obrigado a engolir

Mas me recuso porém em as digerir

Na cara dessa sociedade elas hão de voltar

Não da forma bonita

Como na mesa estavam a apresentar

Mas cortada, mastigada, engolida

Para seu conteúdo verdadeiro mostrar

Que a outros venha a enojar esse vômito

Para que também de seus estômagos

para fora venham tudo colocar

Ainda a tempo de não se contaminar

com toda essa porcaria que nos fizeram alimentar

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Não é pois esse alimento

que ao corpo dá o sustento

é comida ideológica

Que naturaliza o poder

Que escraviza ao que comer

A reproduzir do sistema a lógica

a mesma que o irá esmagar

Como podem aceitar?

É tortura física e psicológica

Ou continuam a tolerar

Ou se colocam contra ela a lutar

Só na segunda opção

É a que alguma solução

Poderão os povos conquistar

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HOMENAGEM À REVOLTA DE VISEU

No ano de 2008,

mês de agosto

em Viseu no Pará,

Se levantou dali o povo,

uma revolta a cintilar!

O que ali aconteceu?

Espere aí amigo meu,

essa história vou contar.

Foi abordado por policiais um rapaz

Depois disso ele não foi visto mais

Seu boné ensanguentado ali perto denuncia

Que esse jovem foi morto pela polícia

Sua família chora com a notícia

Fervilham ódio e dor contra essa injustiça

O povo pelas ruas se atiça

Vão cobrar do municipal judiciário

Mas o fórum não se importa com o vil assassinato

Diz que nada pode fazer nesse caso

É o estopim que bota o povo rebelado

Que decide fazer justiça, que regaço!

Já que o fórum ao pobre não tem serventia

Botá-lo abaixo sentiu que deveria

Logo começou o estardalhaço

Ali dentro quebraram tudo que encontraram

E o prédio depois incendiaram

Para o juiz e promotor haviam guardado um fósforo

Mas os dois amedrontados já fugiram de helicóptero

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O povo sublevado seguiu pra delegacia

Eles eram muitos, fugiu de lá toda a polícia

Viram dentro das celas que só pobre ali havia

Abriram aquelas portas, aos prisioneiros alforria!

Pouco depois em chamas toda a delegacia arderia

Revoltados em Viseu, bagaçeira, quem diria!

Mas isso ainda é pouco,

sempre digo a todo povo:

- Sua força é infinita!

Reacionários qualificaram a ação de criminosa

Mais aos revolucionários foi ela grandiosa

Homenageio a cada um daqueles bravos

Que naquele dia arregaçaram os braços

À família e amigos do jovem assassinado

deixo meu sincero lamento

Seguirei combatendo esse mundo de tormento

Pois quero ver ainda o dia,

que acabará essa injustiça

Será do povo uma conquista,

a velha ordem derrubar

E construir com sua revolução,

um mundo livre da iniquidade,

sem patrão nem propriedade

sem Estado se organizar a sociedade

É a vitória Autogestão!

É a verdadeira libertação!

Para isso também lutar,

falo a toda população.

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JIRAU: HUMILHAÇÃO, FÚRIA E FOGO

(Feito em homenagem aos operários que se revoltaram na usina de Jirau em Rondônia)

Me chamaram do sertão

prometendo emprego bom

trabalho com alojamento, alimentação

transporte, férias, boa remuneração.

Vim de longe e descobri logo a enganação

queriam que eu trabalhasse

que nem no tempo da escravidão!

Da comida prometida só nos servem a bagaça

o transporte é uma merda e o motorista destrata

do trabalho que eu faço o patrão não dá paga

recebi o salário e vi que faltava.

Ainda tem o idiota, da farda amarelada

gentinha folgada, me xinga, maltrata.

Fico nessa droga de obra no meio do nada

e o sindicato pelego não ajuda, atrapalha

Descubro que mundo só se ferra quem trabalha!

Sou gente mas me tratam como burro de carga

o emprego ainda sustenta,

mas minha dignidade estraçalha

fico revoltado com toda essa desgraça

quero esquecer, vou ao boteco, tomo cachaça

volto pro alojamento, descançar minha carcaça

mas vem o segurança me bate, me escurraça.

Tanta humilhação já não tinha como aguentar

Que confusão é essa que vejo iniciar?

Vejo colegas irados querendo tudo quebrar

os encarregados desesperados vejo vazar.

-Corre farda amarela, se não pra você vai sobrar!

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Quando a fúria dos explorados começa a estourar

O burguês desprezível se põe a chorar

os operários felizes se põe a cantar

são os "foguinhos" que saem pondo tudo a queimar!

Que bela visão!

Olhai bem, ó burguês fanfarrão,

o fogo que consome toda sua instalação!

Nessa chama arde não só a sua empresa

arde a ira de um povo revoltado com a pobreza

cansado de sofrer pra alimentar sua riqueza

Se o burguês só quer nos peões ganhar em cima

se coloca segurança e polícia pra botar disciplina

mas nem oferece comida que presta na cantina

Os trabalhadores pra esse mal já tem a vacina

venham todos irmãos com fogo e gasolina

daremos uma lição no patrão que azucrina

Trabalhadores se revoltando na Amazônia

parece aos poderosos uma imagem medonha

temem que outros pelo país queiram fazer igual

então o governo manda a Força Nacional

reprimir quem se revolta em um mundo desigual

Os operários rebelados sofrem repressão

o policial espanca dá voz de prisão

o patrão esbraveja entrega demissão

Mas essa gente é valente, não tem medo não.

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Esses bravos operários

pro povo desolado

deixaram um recado

-Que esse mundo pertence aos proletários

e o burguês é um parasita desgraçado!

Com a opressão não se deve ter calma

A revolta do povo é a arma

de quem já cansou de ser pisoteado.

Em Jirau o operário se pôs em ação

é o povo lutando contra a exploração

mas de todo problema a real solução

só virá com o dia da revolução

de todo governo a total destruição

e o povo organizado em autogestão.

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AOS MANIFESTANTES

Marcha contra a corrupção

O povo mostra sua indignação

Em meio à manifestação

Sentimos a forte emoção

De lutar junto à população

É momento também de reflexão

Para pensar nossa situação

E fortalecer uma ideia de transformação

Precisamos ampliar nossa visão

Para conseguir ver a corrupção

Não de um ponto de vista superficial

Mas em seu caráter social

Aí entendemos e percebemos

Que o corrupto não é um camelô

Mas sim os da corja do “senhor” governador

Políticos são para o povo um fardo

Não se trata do indivíduo mas do cargo

Tenhamos nós todos a consciência

Que todo poder é corrupto por excelência

Enquanto houver capitalismo

A humanidade estará à beira do abismo

Page 39: Poesia, Vento e Fogo

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Que mais protestos esse povo anime

Pois esse sistema é a corrupção e o crime

Organizados

Sistematizados

Institucionalizados

E tornados em estado normal de sociedade

Deprimente realidade

Revelamos que nossa intenção

Depois de analisar esse tema

É não esperar do governo a solução

Pois o mesmo faz parte do problema

Que essa luta proporção maior tome

Para além do Fora Marconi

E sejamos então mais críticos

Para gritar Fora Todos os Políticos!

Pelo fim a sociedade corrupta

Só uma transformação radical

Essa deve ser a nossa luta

Pela Autogestão Social!

(Distribuído na Marcha Contra a Corrupção/ protesto Fora Marconi dia 21 de Abril de

2012 em Goiânia)

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FORA TODOS OS OPRESSORES

Fora Marconi com certeza

Porém não com delicadeza

Protestemos com rudeza

Por que rude é a riqueza

Que acumularam com frieza

Os que roubaram com destreza

Ser governado é dureza

O poder é corrupto por natureza

Sua existência é pro povo a tristeza

Da opressão, exploração e pobreza

Da competição, desunião e fraqueza

Do medo, incapacidade e incerteza

Façamos então limpeza

Lutemos com firmeza

Fora Marconi com rudeza

Fora detentores da riqueza

Fora bandidos da grandeza

A solução não é surpresa...

O povo possui a chama acesa

Pra destruir a vil torpeza

Pra construir com profundeza

A revolução, maior proeza

Autogestão sua fortaleza

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O PM E A PIMENTA

A covardia sempre foi um ato grotesco

A opressão quer gerar no povo o medo

Uma farda para agir de modo animalesco

Na mão do gambé safado

Spray de pimenta é brinquedo

Se divertem como no ditado:

“Pimenta no olho dos outros é refresco!”

Como é no centro não podia ter tragédia

Os manifestantes eram de “classe média"

As câmeras fizeram a polícia maneirar

Pois o que queriam mesmo era bater

Dar coronhada e prender

Quem sabe até atirar

Como fazem todo dia

Nas quebradas e na periferia

Mas como ali não podia...

Sobrou o spray para fazerem covardia

Só o povo unido e decidido

Pode decretar esse sistema abolido

E a autogestão estabelecer

O governo só opressão tem pra oferecer

Gás de pimenta, face light da brutalidade

O spray pode fazer seu olho arder

Mas não te impedir de ver a realidade...

Page 42: Poesia, Vento e Fogo

41

CONTRA O AUMENTO DA PASSAGEM

No transporte mais um aumento...

Eu me revolto, eu não aguento

O Povo tirar do seu sustento

Ter que tirar da sua família

Só pra enriquecer essa quadrilha

Quadrilha de engravatados

De homens do Estado

De megaempresários

E outros parasitas milionários

O transporte coletivo

É pro povo necessidade

Mais pra outros é oportunidade

De um enriquecimento extorsivo

Só mais um negócio lucrativo

E a má qualidade do serviço...

É problema do usuário

Que justiça há nisso?

A revolta é um ato necessário!

Chega de ser feito de otário

Hora do rebuliço

Consciência e ação

Pois só a nossa união

Pode esse mal enfrentar

O pau vai quebrar!

Para o aumento diga não

Incite a população

E saiam em multidão

Vamos às ruas protestar

Page 43: Poesia, Vento e Fogo

42

O GIGANTE ACORDOU

Era uma vez um gigante

Acomodado e confortável...

Em sua vida alienante

Um jovem "responsável"

Das causas sociais sempre distante

"Pensando no futuro"

Que não inclui seu semelhante

Viu pela TV um movimento

Como vários nos últimos anos

"Condenável obra de estranhos"

Coisa demais pro seu entendimento

O jornal aquilo condenou

O gigante concordou

Era contra o aumento da passagem

Coisa que pro gigante era bobagem

A pauta do movimento se ampliou

Por várias cidades o protesto se alastrou

E o gigante indiferente continuou

Mas a mídia sua estratégia modificou

O protesto supostamente ela apoiou

Seu verdadeiro significado deturpou

E o gigante então acordou!

Page 44: Poesia, Vento e Fogo

43

E acordou bem atrapalhado

Ele parecia querer lutar

Mais não sabia bem de que lado

Viu a polícia lhe atacar

E não pôde acreditar:

- O policial não é o mocinho,

que vem pra nos salvar?

Perdido, foi a TV ligar

Então achou o caminho

Não era pra fazer escândalos

Pois tudo era culpa dos Vândalos!

O gigante descobriu sua missão

Ser polícia interna na manifestação

Gritava: - Sem Violência

- Sem Vandalismo

E sabotava a resistência

Em nome do moralismo

De grande cegueira acometido

Se metia a traidor

Confundindo a resistência do oprimido

Com a violência do opressor

O gigante pedia paz

A polícia mandava gás

O gigante então fugia

Deixando seus companheiros pra trás

Page 45: Poesia, Vento e Fogo

44

E se alguém resistia

O gigante em histeria

Sua velha cantiga pacifista repetia

A autodefesa não é legítima

Uma “boa imagem” pro movimento

Vale mais que sua integridade física

Que todos se contenham nesse momento

Suportem as agressões agradecendo

Para que só nós sejamos “a vítima”

Protesto é luta, não penitência

Ó gigante defensor “das coisas boas”

Pra quem é mais importante uma aparência

Do que a integridade das pessoas

Perdoe esses revoltados

“Que estragam O SEU belo protesto”

Que sejamos sempre uns coitados

Implorando políticos honestos

Perdoe os vândalos terríveis

Seres tão insensíveis

Que saem quebrando as coisas

Cada coisa que simboliza

Tudo o que você admira:

Governo, repressão, grande mídia

Estado, propriedade, hierarquia

O gigante nunca fez muitas reflexões

Ele dizia querer transformar

Mas era defensor das instituições

Que fazem todo povo penar

Page 46: Poesia, Vento e Fogo

45

Parecia apontar uma nova via

Mas só mantinha

Tudo na velha ordem estabelecida

Ia ao protesto pra ficar sentado

Na hora que deveria ser ousado

Isso não quer e nem percebe

Pois a ousadia é coisa da plebe

Já o gigante "refinado donzelo"

Adornado de verde-amarelo

Não afeito a “deselegâncias”

Desconsiderava as circunstâncias

Mas depois que tanto brincou

O gigante cansou

E sua revolta passou...

Já se encontra novamente

"Deitado eternamente"

Em confortável "berço esplêndido"

Page 47: Poesia, Vento e Fogo

46

BANDEIRA NEGRA

Bandeira Negra,

sua maior beleza

é ser uma anti bandeira

no sentido nacional

Representa nenhuma nação

Pois é símbolo de união

Com objetivo de luta

Com objetivo de ação

Nacionalismo é um mal

Poderosos o colocaram

As fronteiras não nos separam

Nos separa a classe social

De união repercuta uma voz

Entre todos os produtores

Gritando paz entre nós

Gritando guerra aos senhores!

Trabalhadora e Trabalhador

Seja lá de onde for

Também é um dos nossos

Não travemos fratricidas combates

Que não haja guerra entre os povos

Que não haja paz entre as classes!

Sob as coloridas bandeiras nacionais

a humanidade agoniza

Entre multidão de divisas,

sofrimentos tão iguais!

Page 48: Poesia, Vento e Fogo

47

Nos dividindo é a maneira

Que o inimigo se fortalece

Contra isso é preciso lutar

Levantemos bandeira negra

bandeira que se escurece

para que o ser humano possa brilhar

Chega de tiranias!

Escancaradas

ou travestidas de democracia

Governo é só sofrimento e opressão

Para cima da população

Nesse mundo degradativo

Só os trabalhadores podem dar solução

Botando fora o político

Botando fora o patrão

Se lançando ao combate

Abolindo a propriedade

dos meios de produção

Começar a organização da sociedade

Através do povo em união

Com compromisso e responsabilidade

Sua infinita capacidade mostrarão

Para uma verdadeira revolução

Que leve para a libertação

Não há outra maneira

Page 49: Poesia, Vento e Fogo

48

Que o nosso ser seja fogueira

A queimar toda opressão

Levantemos bandeira negra

e gritemos autogestão

Page 50: Poesia, Vento e Fogo

49

ALERTA CONTRA OS TRAIDORES

Quanta enganação...

Malditos bolcheviques!

Quando correm águas de revolução...

O que eles fazem nessa situação?

Barram seu caminho pondo diques!

Quando falamos revolução

Falamos de toda a sociedade

organizada em autogestão

Quando eles falam revolução

É um engodo na verdade

Para outra forma de opressão

Nós queremos transformação imediata

Com eles não temos nada em comum

Eles propagam um conto de fadas

Buscando enganar mais algum

O conto da etapa de transição necessária

Que é uma transição de fachada

Que transita do nada para lugar nenhum

Quando a luta popular abre alas

Quando os trabalhadores ardem como brasas

Quando o povo se revolta e cria asas

Os porcos logo querem por as patas

Para fazer a contra revolução

E estabelecer uma nova dominação

A dominação dos burocratas

Page 51: Poesia, Vento e Fogo

50

Só o povo a revolução garante

Autogestão é caminhar adiante

Seguir um Lênin é estar perdido

“A revolução não é tarefa do partido”

A traição e a decepção aguarda

A todo que acredita na “vanguarda”

Ela fala em ganho mas só traz perda

O bolchevismo é o ópio da esquerda

Transformação?

É acabar com os exploradores

E com a possibilidade de novos senhores

Combater a corja dos notórios traidores

Pois a revolução dos trabalhadores

Só há de ser obra dos próprios trabalhadores!

Page 52: Poesia, Vento e Fogo

51

A VIRTUDE ORIGINAL DO SER HUMANO

Maravilhosa desobediência

A benção e a maldição

Das pessoas de consciência

Page 53: Poesia, Vento e Fogo

52

A MORTE NÃO PODEM ME DAR

Contra a injustiça sempre a lutar

Procurando ao povo ajudar

Não por caridade ofertar

Mas por reconhecer

Sua força, seu valor e seu padecer

Por ver

Que unidos podem tudo transformar

Com o sofrimento da humanidade acabar

Essa forma de sociedade podem superar

Mas essa luta para a liberdade alcançar

Aos poderosos parece incomodar

De morte estão a me ameaçar

Mas a morte não podem me dar

A morte seria me acomodar

Diante de tanta atrocidade me calar

Como mais uma ovelha por essa vida passar

Não...

A morte não podem me dar

Nesse mundo,

imundo

Que a vida humana segue a triturar

A morte está em o aceitar

A vida está em contra ele lutar

É a venda dos olhos tirar

É para baixo parar de fitar

É ao infinito lançar o olhar

A morte não podem me dar

Page 54: Poesia, Vento e Fogo

53

Por que aquele que luta,

mesmo que executado

por pistoleiro e força bruta

Não tem final selado

Seus inimigos o verão voltar

Cada vez mais forte

Pois ao que julgaram ter dado morte

Aos tiranos ainda irá assombrar

A cada vez que um oprimido se revoltar

Ali ele também vai estar

Se minha vida foi lutar

Mesmo se por balas eu tombar

A luta continuará

Enquanto a injustiça perdurar

Colocada a causa da revolta está

Mais revoltados gerará

E o rebelde, mesmo “morto”, viverá.

(Em homenagem a todos @s lutador@s que foram mortos ou ameaçados de morte devido a sua

militância)

Page 55: Poesia, Vento e Fogo

54

CONTRA CORRENTE

Não tenha medo de ser diferente...

Onde ser normal é mediocridade

Tente ir sempre em frente...

Mesmo que te amarre a odiosa sociedade

Tenha a liberdade sempre em mente...

Não tema o calor dos conflitos

Seja aquele que entre mortos-vivos...

Tenta lutar e viver intensamente

Page 56: Poesia, Vento e Fogo

55

AO ESCRITOR

Curto é o período de um dia

Curto é o espaço de uma vida

Rápida como páginas lidas...

Que podem ser longas

Quando é algo que significa

Pois possui prolongamento

Para além daquele tempo

Em que você as ficou lendo

É algo que contagia

Ficam em processamento

Lhe estimulam o pensamento

Despertam sentimentos

Que geram movimentos

Apenas papel e tinta

Podem ser algo mais

Dependendo do conteúdo

Apenas a breve vida

Pode ser algo mais

Dependendo do conteúdo

Page 57: Poesia, Vento e Fogo

56

O LAMPEJAR

Feliz em produzir

Em minha mente a eclodir

A revolta exprimir

Em versos, existir

As normas transgredir

E poder então sentir

O peito se abrir

A alma se despir

Nas veias ver fluir

A vida a florir

Page 58: Poesia, Vento e Fogo

57

CHAMADO PARA A FARRA

Poesia, por que me despertas?

Sei que a noite é longa

Mas as portas a ti estarão abertas

Por que esperas que eu me deite

para então fazer deleite?

É só prazer em me levantar,

para no papel te colocar?

Por que não escolhes momento mais adequado,

para então mandar recado?

Não queres que eu durma

Pois sou da tua turma

Mas alegre me levanto

E contigo canto e danço

Volte sempre que puderes

Enxuta ou encorpada

Aparição desenfreada

Assombração da madrugada!

Teu doce incomodar

Também me faz voar

Ah poesia, porque me despertas?

Sei que a noite é longa

Mas as portas a ti estarão abertas

Page 59: Poesia, Vento e Fogo

58

MAIS UMA NOITE EXPLOSIVA

Uma sociedade que te esmaga

E quer destruir o que você têm de melhor

Porque o que há de bom ela estraga

Somente a negação da vida ao seu redor

O inaceitável sendo tolerado

E considerado comum

Quem não concorda é que é o errado

Se recusando a ser só mais um

Dias inquietos, noites de insônia

Mil demônios lhe atacando sem cerimônia

Faltam realizações, sobram algemas

E a vontade de destruir tudo apenas

De aniquilar o que te aniquila

De pela luta afirmar a vida

De se unir aos conspiradores

E explodir nossos opressores

Page 60: Poesia, Vento e Fogo

59

PÓS TRIP

Entorpece a passageira euforia

Permanece a sujeira do dia-a-dia

Sujo por toda essa porcaria

Que nos foi imposta de cima

E que quero ver destruída.

Page 61: Poesia, Vento e Fogo

60

DILEMAS DE UM MORTO-VIVO

Perdido... deprimido...

o sonho se desmanchou!

Por mim mesmo traído

meu espírito se esvaziou.

Naquela noite sombria

A lua de nuvens apagada

Pelo cemitério eu seguia

O álcool me embriagava

Lápides, vultos, vozes

Tudo me assustava

O galopar dos meus algozes

O sacudir de minha garrafa

Companheiros, nessa noite trágica,

O esperar será a tática

(É a passividade ilógica)

Quem sabe uma entidade mitológica,

saia da minha lâmpada mágica?

E realize o desejo,

de me dar o que quero mas não vejo

e nem busco pela prática

Ah... vida desgraçada!

Lâmpada não tenho

Apenas essa garrafa

Que não clareia nada,

desde lá de onde venho.

Seu conteúdo a vista embaça...

Page 62: Poesia, Vento e Fogo

61

Oh! Seu vidro se estilhaça,

aumentando meu lamento.

Olho ali triste,

aquele líquido desperdiçado

que os cacos sejam alpiste

de algum pássaro amaldiçoado

Sobrou o frio congelante

O ar parado, sossegado

Um eu subjugado

Covardia e medo abundante

Ali bem chateado

Ouço gemidos agonizados

Vindos de túmulos despedaçados

De repente...

grotesca visão!

Mortos que saem do caixão

Um deles à minha frente

Os vi em toda direção

Mas o perigo só senti realmente

Quando com uma mordida de raspão

Me surpreendeu violentamente

Um deles a sair do chão

Me dei conta da grave situação

Quando se revelou claramente

Qual era deles a intenção

Dilacerar a minha mente

Comer meu coração

Page 63: Poesia, Vento e Fogo

62

Fugi desesperadamente

Mas o novo era repetir o antigo

Pois era o cemitério um labirinto

E outro maior ainda trazia comigo

Aqui o tormento é o que mais sinto

Sem conseguir escapar do recinto

Saio pelos corredores a me debater

As paredes a esmurrar

De tristeza e raiva a chorar

Autocondenado a perecer

Após fuga alucinada

Os zumbis acreditei despistar

De cansaço a ofegar

Encostei numa lápide abandonada

Estava toda empoeirada

Não se lia a inscrição

Sobre ela passei a mão

Vi meu nome nela gravada!

Se levantou dela um morto...

E pelo seu rosto e pelo corpo...

Era eu que ali estava!

Contra mim estava a vir

Não tinha como fugir

Travou-se uma luta feroz

E não sabia mais distinguir

Em qual dos dois estava minha voz

Na briga, a mim mesmo traí

Senti a vida se esvair

Derrotado me deixei cair...

Como pude desistir?

Page 64: Poesia, Vento e Fogo

63

Comemoraram os quase mortos:

-Agora você é um dos nossos!

Nada de inovadora trilha,

bem vindo a nossa velha família:

Moribundus Decompostus!

Agora subvivo por aqui

Não preciso construir

Porque vivo dos destroços

Ser vivo é difícil

Tudo é enfadonho

Sempre ali em conflito

lutando por um sonho

É fora da larga estrada caminhar

Se desgarrar do rebanho

Se tornando um estranho

Vagando em caminho tortuoso

Querendo abrir novas passagens

Para explorar novas paisagens

Dizendo que andar na estrada é perigoso

Fala ainda pra convencer os outros

Que é possibilidade, de grandes vantagens

Se saíssem dela todos!

É querer as coisas complicar

Quando o que resta é aceitar

É remoer só ilusão

São devaneios que quem é moço

É teimar com a razão

e provocar vão alvoroço

Page 65: Poesia, Vento e Fogo

64

O cemitério me vislumbra

Agora minha casa é uma tumba

No trabalho tenho hora

Aqui sou só mais um

Ganho pra cavar minha própria cova

e também de mais algum

Mal consigo me mexer

Não consigo mais correr

Nem consigo mais sonhar

Desajeitado e lento é meu andar

Sigo pela noite a cambalear

Com gemidos a soltar

Pois mal consigo mais falar

Do morto vivo o descanso

é a morte definitiva

De quem foi sempre manso

a morrer por toda a vida

Já do vivos criei raiva

Só atrapalham daqui a calma

Dos que se deixam apodrecer

Querem que zumbis deixemos de ser

Dizendo que realmente podemos viver

Atormentam minha podre paz!

De persegui-los fui capaz

Veja só como é que é

Se pisa em minha tumba um rapaz

E eu já lhe mordo o pé

Page 66: Poesia, Vento e Fogo

65

Os vivos ataco todo dia

Pois defendo a porcaria

Sou zumbi até os ossos

Honro a tradição de minha família

Moribundus Decompostus

Mas as vezes sinto nos vivos razão...

De onde isso vêm?

Acho que disso tudo tenho rejeição...

Será que quero ser um vivo também?

Devorando ali migalhas

E olhando aquelas chagas

de meu corpo moribundo

Pude ver no fundo...

de uma profunda ferida apodrecida

uma brasa ainda acendida

Pensei um pouco...

Se eu quisesse, chama dela eu faria

Talvez esse fogo

consumisse meu corpo morto...

Mas seu calor em dois me dividiria!

Um Eu Vivo contra mim se colocaria

Uma luta inevitavelmente se daria

E o desfecho, que dilema!

Eu ainda que decidiria

Em meio à confusão suprema

Indeciso fico

Mas só esse pensar

Já fez fumaça levantar

Atormentando o cadáver frio

Page 67: Poesia, Vento e Fogo

66

Sua carne fez esquentar

Da coruja o horripilante pio

Anuncia o início da batalha

Naquela noite embalada

Pela orquestra dos fantasmas

E pelos uivos do vento nebuloso

Possibilidades estão lançadas

O futuro? Eu o escolho!

A derrota do meu eu zumbi

A rejeição dos mortos vivos vai provocar

Perseguido e errante terei de seguir

Ousada é essa decisão tomar.

Poderei eu deixar

de a cada instante continuar a morrer?

Livremente me movimentar,

quem sabe até pelos campos conseguir correr?

Poderei surpreender,

os que me viram semifalecido?

Como um leão me erguer,

lançando forte e vivo rugido?

Só terei força pra lutar...

Se novamente voltar a sonhar

Se irei pois triunfar

e meu morto-vivo derrotar...

Encarnada contradição!

Possibilidade de solução

Em minha mão aí está!

Page 68: Poesia, Vento e Fogo

67

RESISTIR É MINHA RAZÃO DE EXISTIR

Lutando com dedicação

Entre o estudo e a ação

Horas, entre leituras e escrita

Nos protestos, uma cara conhecida

Um espírito que não se conforma

Um alienado para isso olha,

e não entende o porque faço isso.

Diante de um mundo dessa forma,

realmente não faltam motivos,

em quem tenha de consciência o mínimo.

Um dia passou diante de mim a morte

E eu pude escapar dela por sorte

Refleti depois sobre minha existência

Neste mundo cheio de problemas...

Será que fiz alguma diferença?

Mais bem pior que não ter nada mudado

É não ter nem ao menos tentado

Não ter nem pra isso se esforçado

E se ali tivesse tudo acabado?

Meu fim naquela hora chegado...

Que estúpida morte seria!

Mas não mais estúpida do que toda minha vida

Page 69: Poesia, Vento e Fogo

68

Já que nesse mundo imundo eu vou continuar

Não mais em branco por ele irei passar

Minha marca nele eu irei deixar

Meu compromisso é agora para sempre lutar

Num sistema que a todos mortifica

Na luta contra ele se expressa a vida

Agora tudo é intensidade

A emoção que se sente no calor do combate

Em cada obra lida,

Em cada texto ou poesia escrita...

Uma batalha vencida!

Aqueles que leem por ler

Escrevem por escrever

Obrigados pelo trabalho ou pela escola

Em troca de um salário ou de uma nota

Ou mesmo para se promover

Querendo alguma vantagem obter...

Nunca poderão me compreender!

Se o mundo irá mesmo melhorar ou não

Não é essa a questão

O importante é que dei minha contribuição

Que lutei com compromisso e determinação

Que não fui cúmplice nem omisso...

Em meio a atrocidade e injustiça,

vendo a população explorada e oprimida.

Fui alguém que se colocou contra tudo isso

Page 70: Poesia, Vento e Fogo

69

E agora não mais importa

Se a morte me bater à porta

Para o fim da existência eu sigo

Com sensação de dever cumprido

O único lamento sentido

Será o de mais tempo não ter tido

para mais um pouco ter aqui combatido.

Page 71: Poesia, Vento e Fogo

70

AUTOEDUCAÇÃO

Você pode aprender...

Por conta própria.

Em casa e nas ruas

Fora dos muros da escola

Você pode aprender...

Por conta própria.

Sem professores,

aulas, provas, notas.

Você pode aprender...

Por conta própria.

Acorda !

Não desperdice seu tempo

na frente da TV

Não desperdice seu tempo

com besteiras no PC

Não seja um alienado

Seja mais você.

O que você quiser

Você pode aprender

escolha uns bons livros

crie o hábito de ler

e leia criticamente

desenvolva sua mente

para o sistema combater.

Page 72: Poesia, Vento e Fogo

71

LEMBRANÇAS DA ILHA DA BABEL ERUDITA

Fui pela primeira vez ao estrangeiro

No avião tive uma estranha sensação

Pessoas de diferentes lugares

Nas conversas idiomas em diversidade

Ou não entendia nada, ou não entendia direito

Mas aí não havia novidade

Lembrei de sentir isso na universidade

Ouvindo falatórios sem recheio

Versos vieram à cabeça

não encontrava um papel que seja

Mas na minha frente, encontrei um ali...

pendurado, era um saco de vômito

rasgando-o com a mão o abri

alguns versos escrevi

parei, pensei na cena, achei cômico

Esse papel inusitado...

pareceu até calculado...

Expressava uma verdade!

Haveria outro mais apropriado,

pra falar da universidade?

Lembrei de "seres superiores"

Professores, Doutores!

Que idioma eles falam?

Francês, mandarim, inglês?

Dialetos, líguas mortas

ou idiomas ainda nem inventados?

Page 73: Poesia, Vento e Fogo

72

Pode parecer esquisito

eles falam meu idioma mas em um tom erudito

A fala é elaborada, complicada

mas destituída de relevante sentido

O discurso tem forma rebuscada

mas o conteúdo se mostra vazio

A confusão na verdade

Vem de uma necessidade...

De não falar da realidade

Da agonia da humanidade

Sob o véu do capitalismo

Vamos pois entoar cantigas.

Explorar curiosidades bem particulares

sobre filósofos ou Grécia Antiga.

Já que o mundo é mesmo tragédia

minha pesquisa é uma comédia.

Quero estudar sobre o umbigo,

suas representações... no imaginário coletivo

durante algum período da idade média!

Mesmo que na atualidade estejam todos fodidos

Me interessa pesquisar

como os povos de tal época fodiam.

Professor Doutor: - Ha! Ha!

Vou falar coisas que você não entende

Pois quanto mais incompreensível mais inteligente

Eu serei o Incrível e você meu subserviente

Não invente de querer inventar

Para repetir o que foi dito aqui é o lugar

Nunca contrarie o que eu digo

Repita sempre comigo: Repetir

Page 74: Poesia, Vento e Fogo

73

Acadêmico contestador: - Concordar e imitar esse é o jogo

Para agradar aos senhores

Irei repetir seus autores

Pois aqui não interessa nada novo

Professor Doutor: - Também não fale de luta nem de povo

Pois se no mundo reina a miséria e a ganância

Quero é alimentar minha erudita ignorância

Sabendo cada vez mais sobre coisas sem importância.

Não pense também que pode ler os autores de qualquer forma

Se guiar pela minha interpretação deles é a norma

Os alunos por ser ignorantes sempre erram

Me venerem pois sou inteligente

Para leituras mais coerentes tenham sempre em mente

O importante é o que eu disse que eles disseram

Coro: - Academia! És para o pensamento a morte não a vida

Em ti se formam papagaios não pensadores

Ovelhas adestradas não sonhadores

És para a humanidade a continuação das dores

Para o revolucionário és porcaria

Acadêmico contestador: - Se a revolta vive em mim é porque não morri

A universidade quer fazer de mim um zumbi

Mas transgressor do ideal conservador eu sou

Inimigo do tirano, opressor e explorador

Irei eu dentro dela também transgredir

Professor doutor: - Então é melhor você sair

Se você me contrariar eu irei te perseguir

Posso também diante de todos utilizar

Minha autoridade pra te ridicularizar

Você quer ser sério em meio a palhaços

Page 75: Poesia, Vento e Fogo

74

Eu que sou gênio gritarei que és um asno

Falar de transformação é ser panfletário

Tudo que eu quero é ser venerado

É olhar de cima os outros embaixo

Na academia me encontro realizado

Acadêmico contestador: - Para seu desagrado vou comunicar

Que a minha presença terá de aturar

Aí estarei só pra atazanar

Aqueles do trono e também os do altar

Me movo por forte convicção libertária

E não hei de temer represálias

Elas para os outros mostrará o nível

A que pode se rebaixar

Um professor desprezível

Mas essa postura não é de assustar

Cada vez fica mais claro

Que estamos de diferentes lados

Sua vida será na academia definhar

Tanta necessidade de por cima se colocar

É para sua profunda decadência camuflar

A cada jovem desses que você reprime

também o seu jovem interior você comprime

Entorpecido por acima dos outros se imaginar

Não percebe o quanto se encontra limitado

Esse mundo só a degradação segue a provocar

Disso não escapa nem professor universitário

Que contribui para ordem que a todos corrói

Está autocondenado a seguir o itinerário

De reproduzir o mesmo sistema que também o destrói

Page 76: Poesia, Vento e Fogo

75

Coro: - Academia! És para o pensamento a morte não a vida

Em ti se formam papagaios não pensadores

Ovelhas adestradas não sonhadores

És para a humanidade a continuação das dores

Para o revolucionário és porcaria!

Narrador: - Náufrago, preso, sem saída

Deprimentes lembranças de minha estadia,

na perdida ilha da Babel Erudita.

Page 77: Poesia, Vento e Fogo

76

VIAGEM AO ESTRANHO MUNDO ACADEMICISTA

(um poema longo e tosco para o ambiente mais tosco de todos)

O jovem no ambiente escolar

sonha no vestibular passar

na universidade poder estudar

Mas os que conseguem até lá chegar

dentro dela estranho cenário irão encontrar

no centro um imponente altar

em cima dele a estátua dourada de um doutor

diante da qual devem se ajoelhar,

se humilhar

e recitar cânticos de louvor

Os professores sendo ou não doutores

vão guiando o ritual

Fazendo coreografias e danças esquisitas

exigindo que o aluno faça igual

Das bocas dos guias sempre palavras incompreensíveis

Então eles se elevam em plataformas de diferentes níveis

Os graduandos ficam no espaço inferior

para entrar naquele lugar mais perto do altar

só quem tem o nome na lista

Tem que ser no mínimo especialista

um andar mais elevado e privilegiado é para o mestre

o topo do olimpo é pro doutor

O ritual prossegue com ardor

mais lá embaixo um graduando parece insubmisso

então um professor fica irritado

se sacode e solta um grito

balançando seu chocalho lhe aponta seu cajado

e lhe ameaça com feitiços

Page 78: Poesia, Vento e Fogo

77

Se a magia não adianta

um escravo traz a capanga

dentro dela várias armas

não vi chicote, pistola a laser, nem espadas

também não tinha lanças, flechas ou cordas

suas armas de ataque e tortura

eram chamadas, trabalhos, provas, notas

Tinha ainda por escudo e armadura

a sua titularidade

(que lhe dava respeitabilidade)

além de enquanto professor a autoridade

que o transforma em legislador, juiz e carrasco

dentro da sala de aula

ele assim bem equipado

suas armas ostentamente segura

o aluno é obrigado a suportar

o professor que nele as usa

ou então largar o curso como fuga

A situação parece até ilusão de tão maluca

mas infelizmente é realística

Alguns estudantes procuram resistir

tentam contrapor o arsenal do professor

utilizando a arma da crítica

mas a esses quase ninguém quer ouvir

pois contraria o que é tomado por senhor

o que a titulação diz que tem razão

independente do que dele vir

muitos veneram o professor

visto sobremodo inteligente

como um ser superior

que não é gente como a gente

Page 79: Poesia, Vento e Fogo

78

Alguns acreditam mesmo nisso

Outros só o defendem por um puro oportunismo

Fora da sala o ritual prossegue seu estrago

fico ali olhando aquela droga de espetáculo

os docentes de corpos pintados

e de adereços enfeitados

agitam a cerimônia

exibindo suas máscaras

Tem do tipo medonha

tem das tão ridículas, engraçadas

tem de toda qualidade

e para todos os gostos

Eles as usam para mascarar a realidade

e também cobrir seus rostos

Normalmente quanto mais graduado

maior a elaboração possui seu artefato

Olhando vi que ali nada falta

Por mim passou uma doutoranda

com ornado capacete de astronauta

Um especialista falou que era quilombola

e batia em um tambor

Do outro lado um doutor lhe atirava molas

dizendo que era um robô

Tinha um que reprovava

os alunos que eram mais críticos

nas universidades se falava

que entidades invocava

e baixavam nele espíritos

Page 80: Poesia, Vento e Fogo

79

Saí de uma palestra de doutores dinossauros

Entrei em outra sala para olhar uma conferência

Tinha ali um doutor que queria ampliar os dicionários

Inventava palavras onde não era necessário

Cunhava conceitos de um modo arbitrário

Era em sua obra a tentativa de virar uma referência

Era sua forma, de criar uma nova moda

para reproduzir a decadência

No outro dia me esforcei para chegar no horário

assisti a fala de um doutor que queria convencer

que uma coisa ao mesmo tempo poderia ser

totalmente outra, ela mesma e o seu contrário

Com esse congresso fiquei decepcionado

na época era do primeiro ano

de lá pra cá a coisa foi piorando

e eu ficando mais inconformado

As vezes saía da sala

pois depois de cada fala

eu só ficava mais zureta

No auditório havia gente aglomerando

Lá na frente um certo mestrando

dizendo que era o capeta

Naquela hora contrastando

Uma luz no céu da academia apareceu

e por entre as nuvens um pós-doutor desceu

Diante de todos defendeu ser ele o próprio Deus

O mestrando foi por ele questionado

e o coitado estremeceu

Diante daquele iluminado

até sua própria luz se escureceu

Page 81: Poesia, Vento e Fogo

80

Mas ocorreu o inesperado

E o mestrando a ele respondeu

no começo com cuidado

mas cada vez contrariado

no debate o respeito à divindade ele perdeu

Seus colegas essa postura reprovaram

Ao lado do Senhor eles ficaram

e no final o Pós-Doutor foi aplaudido pois venceu

Declarou superadas as ideias do Demônio

Então eu que sou ateu

Pensei estar em um manicômio

Podre academia!

Que assim já foi nascida

Pelos abutres foi mantida

De mais podridões foi expandida

Porque a mais fétida carniça

É a que atiça ao urubu

Naquele embate complicado

Entre o pós doudor Jeová e o mestrando Belzebu

Os professores puxa-sacos

Apoiaram o que era em titulação mais elevado

Esse debate foi comentado durante muitos anos

Os dois se desentenderam sobre o sexo dos anjos

Mas um tempo depois o Belzebu fez uma autocrítica

E hoje ele e Jeová são do mesmo grupo de pesquisa

Sempre temi ficar doente

em meio a esse ambiente epidêmico

um dia fui falar com um certo acadêmico

algum conforto ou apoio procurando

comentei:

Page 82: Poesia, Vento e Fogo

81

- Isso aqui tá tudo errado né!

Então constatei com espanto

que pelo seu corpo haviam pelos brancos

Ele me olhou e falou:

-Bééééééé !

Com aquilo fiquei bastante transtornado

No corredor ao lado passou um professor

Meu colega se abaixou

e começou a andar de quatro

Aquele professor ia andando

no trajeto seu rastro ia deixando

sempre cagando e caminhando

e agora aquele colega atrás acompanhando

em seus dejetos ia pastando

Descobri que ele era um orientando

e o da frente era um mestre

O mestre merda ia falando

nas quais o orientando rolava

e das quais se alimentava

ao mestre fazia preces

o agradecendo por suas sagradas fezes

dizia que de seus sonhos o que mais gosta

era um dia conseguir produzir uma bosta

tão sofisticada como os mestres

Fiquei a perguntar:

-O que é este lugar,

se não degradação ?

Page 83: Poesia, Vento e Fogo

82

É a perpetuação da não solução

dos problemas da humanidade

A preocupação da academia

não é com a realidade

mas com a fantasia

Perigosa é a verdade

Para aquele que domina

Por isso a universidade

Na verdade passa em cima

oculta, fragmenta, camufla, falsifica

essa é a sua sina

é braço do mesmo Estado

que a dignidade do povo assassina

Nessa sociedade cada ocupação é mais odiável

E eu trabalho nesse espaço que detesto

Mesmo sendo tão ruim

ainda é pra mim mais suportável

Vou continuar só para deixar o meu protesto

Page 84: Poesia, Vento e Fogo

83

ARTE E CIÊNCIA

Artistas e pensadores?

Mercenários e traidores!

Se pondo a serviço do poder

Serviçais dos dominadores

Cúmplices e colaboradores

De tudo que traz o aniquilamento

da livre arte e pensamento

arte, ciência?

Engano, elitismo...

assim colocados

que pena.

Talvez o dia venha

Dias de um mundo novo

E recebam vida junto ao povo

Então a arte e a ciência

deixarão de ser um problema

Page 85: Poesia, Vento e Fogo

84

GÊNESIS DOIS

Pó de um chão ardente

que penava sob o sol quente

Daquela longa noite

O vento sorrateiro

fazia poeira no teu meio

no caminhante dava açoite

-O vento está danado!

Diziam senhores preocupados

Que ora andando, ora parados

por sobre aquele areado

que esquentava sob seus calçados

a vida assim ganhavam.

Vendo os ares agitados

Mandaram um dos seus para um lugar alto

e poder ver dali se tudo estava calmo

Logo ele voltou desesperado:

-Está vindo para este lado!

Então a viram despontar no horizonte...

um dos chefes pra correr havia gritado...

mas não havia como e nem pra onde.

Um dos dirigentes exclamou frustrado:

-Vamos nos dar mal!

Page 86: Poesia, Vento e Fogo

85

Então vinha o vendaval

a sacudir a dunas do deserto

Imensa tempestade de areia ia formando

Os líderes a vendo violenta chegando

já sabiam que o próprio final era certo

A cidade fantasma acabou soterrada

As aves cantaram naquela alvorada

A vida, ainda sonolenta, despertava

Onde antes só havia alma penada

E o que dizer de cada trabalhador?

Enquanto somente grãos de areia

se achavam tão pequeninos

Mas se unidos, que bagaceira!

Quem se porá em seu caminho?

Cada revolucionário é um Criador

É a partícula encrenqueira

Que no morto universo primordial

Busca irradiar as companheiras...

Para a grande explosão inicial!

Agora onde tudo era ressecado

e só havia areia escaldante

Se veem nascer riachos

e se multiplicar vida abundante

Aquela água de nova vida

ao pó da terra deu consistente liga

na beira dos veios d'água

vê-se o barro a movimentar inquieto

pois que tendo agora alma

esse barro tomou forma de bonecos

Que os ventos da liberdade sopraram os narizes

Page 87: Poesia, Vento e Fogo

86

Recebendo fôlego, se levantaram

Aqueles ares novos respiraram

Surgiram então seres humanos felizes

Que entoaram de amor sincero uma canção

De novos sentimentos havia embriaguez

Em cada obra prima de uma criação...

que a si mesmo se fez!

Benditos os que se revoltaram

Pois a revolta a vida fez nascer

Esse mundo livre imaginaram...

que para a realização humana conduz

Ao se insurgirem contra o poder

Na verdade eles gritaram:

-Haja luz!

A raça humana agora caminha livre

por um paraíso que ela própria construiu

Aí verdadeiramente se vive

E a liberdade se instituiu

No jardim não há frutos proibidos

e tem um que é o preferido:

o da árvore da ciência e do conhecimento

que é ali considerado um excelente alimento.

Isso por ter um humano e real fundamento,

coisa que era impossível, na antiga era do tormento.

Com tantas novidades acabo disperso

Por entre as maravilhas daquele mundo liberto

Para meu azar do sonho então eu desperto

na podridão da realidade me vejo submerso

E ali só...

Page 88: Poesia, Vento e Fogo

87

me vejo impotente...

Mas tenho um pró,

Sou persistente.

Um ponto agindo controverso

no antigo apático universo

Um grão de areia embalado pelo vento

Que no deserto morto, atreve movimento

Em me associar,

aos que querem transformar,

estou propenso.

Se esse aglutinar

perigo representar...

Estupendo!

Estarei por aí a exclamar:

- Povo, te reduzem a pó!

Te achas digno de dó?

Basta unir-te aos teus,

E terás a força infinita de um deus!

Page 89: Poesia, Vento e Fogo

88

PANGEIA LIBERTÁRIA

Vamos derrubar as fronteiras nacionais

Dizei aos senhores e governos: - ide!

Não há mais superiores pois somos iguais

A caminhar unidos pelo Mundo Livre

Sem mover de volta qualquer placa tectônica

Vamos todos formar uma nova Pangeia

Compor uma humanidade harmônica

Livre dos horrores da discriminação e da guerra

Page 90: Poesia, Vento e Fogo

89

REALIZAÇÃO DA ESPÉCIE HUMANA

Se alastra pelo campo e pela cidade

A algazarra da revoltada multidão

Exalando ódio contra a opressão

Dando brados de amor à liberdade

É o desabrochar da revolução

Fim da particular propriedade

Tudo para a coletividade

Organizada em autogestão

Um daqueles raros momentos

Que dividem a história

Explosão de sentimentos

Gritos de vitória

Page 91: Poesia, Vento e Fogo

90

VENTO DA SUBVERSÃO

Queria ser como o vento

o vento aparece assim

de repente

ninguém sabe ao certo

para onde ele vai

e nem de onde vem

Pode ser uma brisa suave

ou um vendaval impetuoso

um tipo de vento curioso

para uns agradável

para outros perigoso

O vento voa livre

tentar aprisioná-lo

é perda de tempo

não há como detê-lo.

E em busca da liberdade

ele continuará a vagar

mesmo que possa aparentar

que pelo mundo voa a esmo.

Mesmo que de vez em quando

sozinho

se feche em algum redemoindo

ele segue seu caminho

Persegue seus intentos.

Mais juntando com outros ventos

pode formar vendavais maiores

na ação e no efeito

sem dúvida melhores

Page 92: Poesia, Vento e Fogo

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De ventos em multidão

surge um poderoso furacão

para a antiga paisagem podre

terror e destruição

Violento e brutal

ritual de purificação

Descartar o inútil e prejudicial

Não constitui desperdício

Mais pode ser o início

De um processo sem final

De construção de benefícios.

Oh, ventos da revolta !

Sinto em mim tua energia eólica

Tenho por amiga a teimosia

E a liberdade ideal em primazia

Nosso tempo carrega uma lógica

Que o vento tenta romper

Para que emerja outra ótica

Olho para um mundo de dores

É possível solução?

Quem dera os trabalhadores

Soubessem que em suas mãos

Habita um poder infinito

Capaz de aniquilar senhores

Transpassar montanhas e abismos

Saquear e realizar, ideias e gritos

Que outrora foram dos sonhadores.

Mas... aqui, que posso eu ?

O vento sacode meus cabelos

Quero voar também !

Page 93: Poesia, Vento e Fogo

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Que esses ventos sejam meus

Que esses ventos sejam teus

Que os ventos não fiquem sós

Que um vento seja eu

Que os ventos sejam nós.

Page 94: Poesia, Vento e Fogo

93

POESIA, VENTO E FOGO

O que é essa poesia?

Porque eu a escrevo?

É expressão de teimosia,

da revolta a que me atrevo

É de liberdade uma canção

a conclamar um mundo novo

É uma singela contribuição

que ofereço a este Povo

É ante o mundo da degradação um lamento

e uma apologia à subversão desse jogo

É uma tentativa de fazer da poesia vento

e um desejo de trazer nos versos fogo

Page 95: Poesia, Vento e Fogo

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ÍNDICE

Para a vida conquistar é preciso navegar! – 1

Revolta adolescente - 3

Escolhas - 5

Dificuldades – 6

Contraponto – 7

Perspectiva do proletariado – 8

O fogo contra a morte – 9

Um chamado ao combate – 10

Cárceres – 17

Trabalho calvário – 18

A verdadeira revolução – 19

O construtor não deve temer ruínas – 23

O grito libertário – 24

Saudações proletários – 25

Anacionalista – 26

Cidadãos “respeitáveis” – 27

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Que venham novos ventos – 28

Pátria? – 29

O vômito – 30

Homenagem à revolta de Viseu – 32

Jirau: humilhação, fúria e fogo – 34

Aos manifestantes – 37

Fora todos os opressores – 39

O PM e a pimenta – 40

Contra o aumento da passagem – 41

O gigante acordou – 42

Bandeira negra – 46

Alerta contra os traidores – 49

A virtude original do ser humano – 51

A morte não podem me dar – 52

Contra corrente – 54

Ao escritor – 55

O lampejar– 56

Page 97: Poesia, Vento e Fogo

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Chamado para a farra – 57

Mais uma noite explosiva – 58

Pós trip – 59

Dilemas de um morto vivo – 60

Resistir é minha razão de existir – 67

Autoeducação – 70

Lembranças da ilha da babel erudita – 71

Viagem ao estranho mundo academicista – 76

Arte e ciência – 83

Gênesis Dois – 84

Pangeia libertária – 85

Realização da espécie humana – 89

Vento da subversão – 92

Poesia, vento e fogo – 93