POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO Uma análise da experiência recente dos EUA e do Brasil por Gilberto De Martino Jannuzzi Professor Livre-docente do Departamento de Energia, Faculdade de Engenharia Mecânica, Universidade Estadual de Campinas C.P. 6122 13088-970 Campinas, São Paulo Telefone/fax: 19-788-3282 email: [email protected] URL http://www.fem.unicamp.br/~jannuzzi 1999

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Este livro foi escrito com a pretensão de organizar idéias sobre o tema de políticas para incentivar o desenvolvimento do setor energético na direção de maior participação de fontes renováveis e maiores esforços para se economizar energia, justamente em um momento quando novos agentes passam a fazer parte do processo de decisão e investimentos no setor energético. A busca de maior competição e eficiência econômica em um setor importante como este não é uma tarefa fácil e as expectativas de que os mecanismos de mercado poderão cumprir esses objetivos ainda merecem mais discussões. O tema é extremamente novo e não existem fórmulas mágicas. Em todo o mundo ainda se aprende a acomodar os interesses do mercado de energia com objetivos de desenvolvimento sustentável e as experiências não são facilmente transferíveis de um contexto para outro. Procura-se aqui mostrar algo da recente experiência dos EUA em tentar garantir a preservação e estimular a utilização de formas mais sustentáveis de energia e ao mesmo tempo criar reformas para permitir livre concorrência entre os produtores de energia. Desde o início da década de 90 aquele país experimenta uma transição de uma indústria composta de monopólios regionais com preços e lucros fortemente regulados pelo poder público para uma situação de mercado competitivo com preços de energia elétrica determinados de acordo com a oferta e demanda. Chama-se a atenção para os riscos de uma privatização e introdução de competição sem se definir quais são as características de interesse público que o setor energético deve manter. A expectativa é que esse material possa servir como referência para as experiências que se iniciam no Brasil.

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POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIAENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO

NOVO CONTEXTO DE MERCADO

Uma análise da experiência recente dos EUA e doBrasil

por

Gilberto De Martino Jannuzzi

Professor Livre-docente do Departamento de Energia, Faculdade de Engenharia Mecânica, UniversidadeEstadual de Campinas

C.P. 6122 13088-970 Campinas, São PauloTelefone/fax: 19-788-3282 email: [email protected] http://www.fem.unicamp.br/~jannuzzi

1999

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AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer o apoio recebido do Conselho Nacional de Desenvolvimento

Científico e Tecnológico - CNPq durante minha estadia no Lawrence Berkeley National

Laboratory, Universidade da Califórnia-Berkeley, onde foi desenvolvido o presente trabalho. Ao

meu colega e amigo Dr. Ashok Gadgil que me facilitou diversos contatos e com quem mantive

interessantes discussões nesse e em outros temas sobre energia, tecnologia, meio ambiente e

ambiciosamente especulamos sobre o futuro da humanidade.

Dedico este trabalho à minha querida família, companheira

solidária e fiel em todas minhas empreitadas:

Ana Maria

Felipe, Helena e Daniel

Berkeley, Maio 1999

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SUMÁRIO

AGRADECIMENTOS................................................................................................. ILISTA DE TABELAS............................................................................................... IVLISTA DE FIGURAS ................................................................................................ VLISTA DE QUADROS ............................................................................................. VIGLOSSÁRIO .........................................................................................................VIIPREFÁCIO ............................................................................................................ XRESUMO........................................................................................................... XICAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO ....................................................................................1

Motivação, objetivos e estrutura do estudo .....................................................1Energia e “bem público”...................................................................................3Externalidades do setor energético .................................................................4Benefícios públicos de sistemas energéticos e o mercado .............................6

CAPÍTULO 2: A REFORMA DO SETOR ELÉTRICO NOS EUA .....................................11Introdução......................................................................................................11Conceituando as Reformas do Setor Elétrico................................................12

As reformas segundo mecanismos de coordenação ..................................12As reformas segundo sua natureza e objetivos ..........................................14

As motivações para as reformas nos EUA ....................................................17Causas das mudanças na estrutura do setor elétrico dos EUA..................19Quais foram as mudanças e principais impactos........................................21

Impactos das mudanças................................................................................24Eqüidade.....................................................................................................25O papel do governo federal ........................................................................28Acesso e divulgação de informações..........................................................28A questão da competição entre gás e eletricidade .....................................28

CAPÍTULO 3: A EFICIÊNCIA ENERGÉTICA ..............................................................31Introdução......................................................................................................31

Os programas de eficiência energética antes das reformas .......................32Tipos de programas de eficiência energética .............................................34

As implicações das reformas para a eficiência energética ............................34Efeitos da des-verticalização ......................................................................35Efeitos da competição ................................................................................37

A eficiência energética e o mercado.............................................................40O “energy efficiency gap”............................................................................41Barreiras, falhas e intervenção no mercado de energia .............................45

As mudanças das atividades em eficiência energética nos EUA...................47Atividades comerciais .................................................................................47Atividades para o setor público...................................................................49

CAPÍTULO 4: FONTES RENOVÁVEIS E MEIO AMBIENTE.............................................52Introdução......................................................................................................52As fontes renováveis .....................................................................................52

Introdução...................................................................................................52O mercado de energia renovável (green marketing) ..................................58O mercado e políticas públicas...................................................................59

O meio ambiente ...........................................................................................60

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Mecanismos de mercado: a experiência com SO2 .....................................63A geração distribuída.....................................................................................65

CAPÍTULO 5: A PESQUISA E DESENVOLVIMENTO ....................................................67Introdução......................................................................................................67

Pesquisa de interesse público ....................................................................69Efeitos da reestruturação...............................................................................71O papel futuro da P&D no setor energético ...................................................73

CAPÍTULO 6: A PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL...............................................75Introdução......................................................................................................75Califórnia .......................................................................................................76Nova Inglaterra: .............................................................................................78A Região do Noroeste-Pacífico......................................................................79Minnesota ......................................................................................................80Texas.............................................................................................................82

CAPÍTULO 7: MECANISMOS PARA PROMOVER PROGRAMAS DE BENS PÚBLICOS......83Introdução......................................................................................................83Mecanismos fiscais........................................................................................83Mecanismos regulatórios...............................................................................88Ações diretas do governo ..............................................................................89

CAPÍTULO 8: EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E OUTROS BENS PÚBLICOS NO BRASIL..........91Introdução......................................................................................................91Bens públicos e as reformas setoriais no Brasil ............................................92

Características da regulação para Eficiência Energética e P&D ................93As reformas do setor energético e o novo arranjo institucional .....................94Mudanças do papel do setor público .............................................................95Investimentos em Programas Regulados durante 1998-99...........................98

Eficiência Energética ..................................................................................98Pesquisa e desenvolvimento ....................................................................101

O problema de consumidores de Baixa Renda ...........................................105Conclusões..................................................................................................106

CAPÍTULO 9: CONCLUSÕES ................................................................................109Bens públicos nos EUA ...............................................................................110Bens Públicos no Brasil ...............................................................................112

ANEXO..............................................................................................................115O Protocolo de Quioto .................................................................................115

Características dos mecanismos de implementação................................115A Implementação Conjunta (Joint Implementation – JI) ...........................116O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo................................................116Os Certificados de Emissões (Global Tradable Permits) .........................119

BIBLIOGRAFIA ...................................................................................................120

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LISTA DE TABELAS

TABELA 1: AS RESPONSABILIDADES DE POLÍTICAS PÚBLICAS .....................................9TABELA 2: O EFEITO DO MERCADO NAS RESPONSABILIDADES PÚBLICAS DAS EMPRESAS

DE ENERGIA ..................................................................................................10TABELA 3: TIPOLOGIA DE MODELOS DE COORDENAÇÃO ..........................................12TABELA 4: TIPOLOGIA DE MODELOS DE COORDENAÇÃO MISTOS...............................13TABELA 5: IMPLICAÇÕES DA DES-VERTICALIZAÇÃO PARA A EFICIÊNCIA ENERGÉTICA ..36TABELA 6: IMPLICAÇÕES DA COMPETIÇÃO PARA A EFICIÊNCIA ENERGÉTICA ..............40TABELA 7: PRIORIDADES PARA PROGRAMAS DE EFICIÊNCIA ENERGÉTICA FINANCIADAS

PELOS CONSUMIDORES DE ENERGIA................................................................50TABELA 8: A ESTRUTURA DE PRODUÇÃO DE ELETRICIDADE NA CALIFÓRNIA (1989-95)

....................................................................................................................57TABELA 9: CAPACIDADE INSTALADA DOS NGU (GW).............................................58TABELA 10: SUMÁRIO DAS IMPLICAÇÕES DE REFORMAS DO SETOR ELÉTRICO NO SEU

DESEMPENHO AMBIENTAL...............................................................................62TABELA 11: PREÇOS DE ENERGIA RENOVÁVEL NA INGLATERRA DURANTE A

PRIVATIZAÇÃO (1991-94) (EM C/KWH) ............................................................63TABELA 12: INVESTIMENTOS EM PESQUISA E DESENVOLVIMENTO EM ALGUNS PAÍSES

....................................................................................................................69TABELA 13: MECANISMOS PROPOSTOS PARA FINANCIAMENTO DE P&D...................75TABELA 14: MECANISMOS PARA INCENTIVAR A PROMOÇÃO DE BENS PÚBLICOS: TAXAS

E INCENTIVOS ...............................................................................................84TABELA 15: EXEMPLOS DE APLICAÇÃO DO SBC EM ALGUNS ESTADOS.....................86TABELA 16: RENÚNCIA FISCAL FEDERAL PARA PRODUTOS EFICIENTES E FONTES

RENOVÁVEIS 1999 ........................................................................................87TABELA 17: MECANISMOS PARA INCENTIVAR BENEFÍCIOS PÚBLICOS NO CONTEXTO

COMPETITIVO: MEDIDAS REGULATÓRIAS ........................................................89TABELA 18: POSSÍVEIS AÇÕES DO GOVERNO PARA IMPLEMENTAÇÃO DE BENEFÍCIOS

PÚBLICOS NO CONTEXTO COMPETITIVO: MECANISMOS PARA IMPLEMENTAÇÃO DEPROGRAMAS .................................................................................................90

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1: REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DA ESTRUTURA DO SETOR ELÉTRICO DOSEUA, ANTES E APÓS AS REFORMAS ................................................................24

FIGURA 2: EXEMPLO DO “ENERGY EFFICIENCY GAP”..............................................42FIGURA 3: EXEMPLO DE CURVA DE SUPRIMENTO DE ENERGIA CONSERVADA ...........43FIGURA 4: O PAPEL DE POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EXPLORAR O POTENCIAL DE

EFICIÊNCIA ENERGÉTICA.................................................................................47FIGURA 5: INVESTIMENTOS EM P&D NA ÁREA DE ENERGIA NOS E.U.A. (1974-80-90-

96) ..............................................................................................................67FIGURA 6: SEGMENTAÇÃO DO POTENCIAL DE EFICIÊNCIA ENERGÉTICA ENTRE OS

DIVERSOS AGENTES.......................................................................................97FIGURA 7: INVESTIMENTOS REGULADOS PARA PROGRAMAS DE EFICIÊNCIA ENERGÉTICA

E P&D DE INTERESSE PÚBLICO.....................................................................114

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LISTA DE QUADROS

QUADRO 1: AS AGÊNCIAS DE REGULAÇÃO DA CALIFÓRNIA E SUAS ATRIBUIÇÕES .....25QUADRO 2: PROGRAMAS PARA POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA..................................27QUADRO 3: OS PRINCIPAIS ATORES PÚBLICOS DO SETOR ENERGÉTICO APÓS A

REFORMA SETORIAL.......................................................................................95QUADRO 4: DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS ENTRE CE E IC..................................118

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GLOSSÁRIO

AIC Atividades Implementadas Conjuntamente, o mesmo que AIJ.

AIJ Activities Implemented Jointly. Atividades Implementadas Conjuntamente.

ANEEL Agência Nacional de Energia Elétrica.

ANP Agência Nacional do Petróleo.

CDM Clean Development Mechanism. Mecanismo de Desenvolvimento Limpo.

CE Comércio de Emissões.

CEPEL Centro de Pesquisas em Eletricidade

CER Certified Emissions Reductions Certificados de Redução de Emissões (gases estufa)

CLF Conservation Law Foundation. Organização Não Governamental.

CNPE Conselho Nacional de Política Energética

COP Conference of the Parties . Conferência das Partes.

CPUC California Public Utility Commission

CPUC California Public Utilities Commission. Agência de regulação para as empresas que operam serviços públicosna Califórnia.

DISCO Distribution Utility. É a companhia regulada de distribuição que constrói e mantém a rede de distribuiçãoao consumidor final.

DOE Department of Energy. Ministério de Energia do governo norte americano.

DSM Demand-side management. Gerenciamento do lado da Demanda ou GLD.

EB Executive Board. Conselho Executivo.

EC Emission Certificates.. Unidades de Certificados de Emissões.

EDF Environmental DefenFund. Organização Não Governamental dos EUA

EP Emission Permits. Quota autorizada de emissão de poluentes.

EPA Environmental Protecxtion Agency. O´rgão de Proteção Ambiental do governo federal americano.

EPACT Energy Policy Act. Lei do governo americano que facilitou o acesso à rede de transmissão paraprodutores independentes.

EPRI Electric Power Research Institute.

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ERAM Electric Revenue Adjustment Mechanism. Mecanismo concebido para compensar as concessionárias poreventuais perdas de receitas com o resultados de programas de eficiência energética.

ESCO Energy Service Company. Uma companhia que se propõe a oferecer serviços para reduzir os gastos deenergia de seu cliente, tendo como pagamento parte dessas economias, ou algum outro arranjo baseado nessaredução.

EST Energy Savings Trust. Agência responsável por programas de eficiência energética na Inglaterra.

ET Emissions Trading. Comércio de Emissões (CE).

FERC Federal Energy Regulatory Commission. Agência Federal que regula preços, contratos e condições defornecimento e transmissão de energia transacionados entre estados americanos. É o equivalente federal dasagências estaduais de regulação.

G77 Grupo de países em desenvolvimento.

GEE Gases de Efeito Estufa.

GLD Gerenciamento do Lado da Demanda.

IC Implementação Conjunta.

IOU Investor-owned utilities. Companhia de propriedade privada (de acionistas).

IOU—Investor owned utility. Uma companhia de propriedade de acionistas que tem o objetivo de produzir lucroatravés de serviços de energia. É uma terminologia utilizada para diferenciar das companhias de propriedademunicipal, ou cooperativas rurais.

IPP Independent Power Producer. Produtores Independentes de Energia.

IPP—Independent Power Producer. Uma entidade privada que opera uma unidade de geração de energia e vendepara a rede ou clientes.

ISO Independet System Operatior. Operador Independente do Sistema (no Brasil é chamado Operador Nacional doSistema - ONS).

ISO Independent System Operator. Operador Independente do Sistema. Uma organização independente e neutrasem interesse financeiro na geração de energia que administra a operação e uso do sistema de transmissão. AOIS tem a palavra final sobre o despacho da geração para preservar a confiabilidade e eficiência do sistema,garantir o acesso público, administrar as tarifas de transmissão e fornecer informações sobre o estado do sistemae capacidade de transmissão.

JI Joint Implementation. Implementação Conjunta (IC).

MME Ministério de Minas e Energia.

MOP

MRPR Mandate Renewables Purchase Requirements. Reduções mandatórias para compra de energia renovável.

NARUC National Association of Regulatory Utility Commissioners. É um conselho consultivo composto pelasagências de cinqüenta estados, Distrito de Columbia, Porto Rico e Virgin Islands com o objetivo de defender ointeresse do consumidor para aprimorar a qualidade e eficácia da regulação pública no país.

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NASUCA National Association of Utility Consumer Advocates. Organização que congrega membros de 38 estados edo Distrito de Columbia com o objetivo de trocar informações e defender posições de interesse do consumidorem questões relacionadas a tarifas de energia em audiências das agências federais, Congresso Nacional e tribunaisde justiça.

NDRC Natural Resources Defence Council. Organização Não Governamental (ONG).

NFFO Non Fossil Fuel Obligation. Medida que obrigava as companhias regionais de eletricidade do Reino Unido acomprar uma parcela de sua demanda de fontes nuclear ou renovável.

NGO Non governmental organization. Organização não governamental (ONG).

NGU Non Generating Utility. CHECK

NPPC Pacific Northeast Electric Power Planning. Órgão regional de planejamento do setor elétrico.

OCDE Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico.

P&D Pesquisa e Desenvolvimento

PD&D Pesquisa, Desenvolvimento e Demonstração.

PIR Planejamento Integrado de Recursos.

PROCEL Programa de Combate ao Desperdício de Eletricidade, inicialmente concebido como Programa deConservação de Eletricidade

PU Public Utility.

PUC Public Utility Commission. Agência de Regulação.

RD&D Research, Development and Demonstration. Pesquisa, Desenvolvimento e Demonstração (PD&D).

REC Renewable Energy Credits. Certificados transacionáveis no mercado referentes a quotas de produção deeletricidade a partir de fontes renováveis.

SBC Systema Benefit Charge. Taxa cobrada dos consumidores para financiar programas públicos de energia.

SE Secretaria de Energia do Ministério de Minas e Energia.

SMUD Sacramento Municipal Utility District

T&D Transmissão e Distribuição de energia.

UEC Units of Emmision Certificates. Unidades de Certificados de Emissão ( o mesmo que UCE). CHECK

URE Unidades de Redução de Emissão (o mesmo que CER)

USAID United States Agency for International Development. Agência de Cooperação do governo dos EUA.

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x

PREFÁCIO

Este livro foi escrito com a pretensão de organizar idéias sobre o tema de políticas para

incentivar o desenvolvimento do setor energético na direção de maior participação de fontes

renováveis e maiores esforços para se economizar energia, justamente em um momento

quando novos agentes passam a fazer parte do processo de decisão e investimentos no setor

energético.

A busca de maior competição e eficiência econômica em um setor importante como

este não é uma tarefa fácil e as expectativas de que os mecanismos de mercado poderão

cumprir esses objetivos ainda merecem mais discussões. O tema é extremamente novo e não

existem fórmulas mágicas. Em todo o mundo ainda se aprende a acomodar os interesses do

mercado de energia com objetivos de desenvolvimento sustentável e as experiências não são

facilmente transferíveis de um contexto para outro.

Procura-se aqui mostrar algo da recente experiência dos EUA em tentar garantir a

preservação e estimular a utilização de formas mais sustentáveis de energia e ao mesmo

tempo criar reformas para permitir livre concorrência entre os produtores de energia. Desde o

início da década de 90 aquele país experimenta uma transição de uma indústria composta de

monopólios regionais com preços e lucros fortemente regulados pelo poder público para uma

situação de mercado competitivo com preços de energia elétrica determinados de acordo com

a oferta e demanda. Chama-se a atenção para os riscos de uma privatização e introdução de

competição sem se definir quais são as características de interesse público que o setor

energético deve manter. A expectativa é que esse material possa servir como referência para

as experiências que se iniciam no Brasil.

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xi

RESUMO

POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIAENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO

NOVO CONTEXTO DE MERCADO

Uma análise da experiência recente dos EUA e doBrasil

No Brasil e em vários outros países, o setor energético passa por grandes

transformações na sua estrutura de gerenciamento, nas decisões de novos investimentos e nas

formas da sociedade implementar mecanismos de controle e regulação. Este é um fenômeno

relacionado com novas condições financeiras, tecnológicas e econômicas principalmente para

a geração de eletricidade. De uma forma geral, a grande preocupação dessas reformas é

garantir competitividade, eficiência econômica para o setor e maiores investimentos da

iniciativa privada. Dependendo da situação em cada país tem se observado maior ou menor

ênfase em um desses aspectos.

É possível notar, no entanto, que o denominador comum dessas mudanças é um

enfraquecimento do poder público, seja ele como o principal gestor da indústria de eletricidade,

ou como regulador de uma concessão privada para a oferta de serviços de energia (conforme

era o caso dos EUA até recentemente). Algumas das reformas inclusive, especialmente

aquelas que se preocupam em introduzir maior competição no segmento da geração, têm

provocado um completo desinteresse em promover serviços de utilidade pública, como é o

caso da eficiência energética, seja pelas companhias de geração, ou distribuição de

eletricidade.

O grande desafio dessas mudanças é, a nosso ver, garantir que a indústria de

eletricidade além de ser competitiva, seja capaz também de atender objetivos sociais, de

proteção ambiental, e assegurar investimentos que promovam maior sustentabilidade do

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xii

sistema energético para o futuro. É com esse objetivo que se desenvolve o presente trabalho

para analisar a experiência recente dos EUA com relação a reestruturação do seu setor elétrico

e iniciativas desenvolvidas naquele país para preservar os “bens públicos”. Este país teve um

desempenho diferenciado nessa questão quando comparado com os demais e, embora as

reformas estejam sendo feitas para promover uma agressiva competição nos serviços de

energia, tem havido preocupação em manter o caráter de “indústria de interesse público”.

A tendência das reformas no Brasil é fazer com o setor público participe cada vez

menos de iniciativas diretamente relacionadas com eficiência energética, pesquisa e

desenvolvimento e fontes renováveis, e se dedique mais à criação de um ambiente favorável

para que outros agentes se envolvam nessas atividades.

A análise aqui desenvolvida para o caso norte-americano procura aproveitar sua larga

experiência em criar incentivos através de regulação para estimular a ação de companhias de

energia em investimentos em programas de eficiência energética, embora tenham sido

concebidos durante um período onde ainda não havia competição.

Nossa intenção aqui é a de procurar entender quais são e quais foram as motivações

para preservar “bens públicos” nesse período de reformas e, na medida do possível, procurar

descrever os mecanismos que estão sendo discutidos ou colocados em prática para a

promoção desses bens no ambiente de maior competição.

Verificamos, como conclusão do trabalho, que três fatores tem sido especialmente

importantes para a preservação dos aspectos de utilidade pública da indústria de eletricidade

nos EUA. Em primeiro lugar destacamos a forte tradição do país na implementação de

programas federais, estaduais e regionais de conservação de energia e proteção ambiental.

Essas iniciativas são uma importante herança das várias décadas de rigorosa regulação

pública a que esteve submetida a indústria de eletricidade nos EUA, que inclusive, foi

responsável pela criação de mercados para várias tecnologias eficientes e de energia

renovável. Outro fator foi a participação da sociedade civil, seja através de grupos de proteção

ao consumidor, ambientalistas, acadêmicos, grupos comerciais e industriais ligados a fontes

renováveis. Finalmente observamos o interesse e sintonia de órgãos legislativos, tanto no

âmbito federal como estadual, para atender às reivindicações e preocupações da sociedade.

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xiii

Trata-se de um processo ainda em elaboração e com diferentes enfoques de acordo com as

especificidades de cada estado, mas que oferece uma contribuição e inspiração para que

iniciativas semelhantes sejam experimentadas em países como o Brasil.

O presente trabalho consiste de 9 capítulos. Inicialmente são apresentados os

conceitos de bens e benefícios públicos do sistema energético. No segundo capítulo analisam-

se as principais causas e objetivos das reformas nos EUA, buscando evidenciar as principais

mudanças que poderiam comprometer o papel de interesse público dessa indústria. Os

capítulos seguintes discutem com maiores detalhes os efeitos das reformas do setor para a

eficiência energética, fontes renováveis e pesquisa e desenvolvimento, procurando mostrar as

iniciativas que foram realizadas naquele país para garantir esses aspectos. O capítulo 6 discute

o importante papel desempenhado pela opinião pública organizada através de grupos civis na

manutenção dos aspectos de interesse público da indústria. O capítulo 7 resume alguns dos

principais mecanismos utilizados pelos governos estaduais e federal para promover programas

de bens públicos nos EUA. O capítulo 8 apresenta uma análise do mecanismo regulatório

colocado em prática no Brasil para fomentar investimentos em eficiência e pesquisa e

desenvolvimento pelas empresas privatizadas, com o objetivo de verificar se está sendo

realmente eficaz para prover bens públicos para o país. As conclusões estão discutidas no

capítulo oitavo.

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CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

As reformas do setor energético e a situação dos “bens públicos”. Objetivos e contexto

do estudo.

Motivação, objetivos e estrutura do estudo

No Brasil e em diversos outros países, o setor energético experimenta grandes

transformações com relação a sua estrutura de gerenciamento e decisões de novos

investimentos. Este é um fenômeno relacionado com novas condições financeiras, tecnológicas

e de custos para a geração de eletricidade. Existe, é certo, uma diversidade com relação aos

objetivos das mudanças e consequentemente, o mesmo ocorre com a forma como elas estão

sendo implantadas em cada país. No entanto, pode-se afirmar que de uma maneira geral, a

grande preocupação é garantir que estas introduzam maior competitividade, eficiência

econômica e maior investimentos da iniciativa privada no setor energético. Dependendo da

situação particular de cada país, tendo sido dado maior ou menor ênfase a cada um desses

três fatores. Nos EUA, que é o objeto de maior atenção neste trabalho, grande parte das

expectativas com relação a reestruturação se refere a um efetivo decréscimo nos preços de

energia aos consumidores (especialmente para os grandes consumidores) e ao aparecimento

de inovações tecnológicas decorrente da competição entre os chamados Energy Services

Providers – ESP.

É possível notar que o denominador comum das mudanças nos vários países onde se

tem analisado os efeitos das reformas (Hagler Baily 1998a,b,c; Diesendorf, 1996) é um

enfraquecimento do poder público, seja ele como o principal gestor da indústria de eletricidade,

ou como o regulador de uma concessão privada para a oferta de serviços de energia (conforme

era o caso dos EUA até recentemente). Alguns tipos de reformas inclusive, especialmente

aquelas que se preocupam em introduzir maior competição no segmento da geração, têm

provocado um completo desinteresse - pelo menos inicialmente - em promover serviços de

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2

utilidade ou benefícios públicos, como é o caso da eficiência energética seja pelas companhias

de geração, ou distribuição (como foi o caso da Noruega, Chile e Argentina).

O grande desafio dessas mudanças é, a nosso ver, garantir que a indústria de

eletricidade além de ser competitiva, seja também capaz de atender objetivos sociais, de

proteção ambiental, e assegurar investimentos que promovam maior sustentabilidade do

sistema energético para o futuro. É com esse objetivo que se desenvolve o presente trabalho

para analisar a experiência recente dos EUA com relação com a reestruturação do seu setor

elétrico e as iniciativas desenvolvidas naquele país para preservar os “bens públicos” (V.

definição na próxima seção). Embora seja um processo ainda em consolidação em vários

estados daquele país, é possível verificar desde o início o interesse e preocupação em

preservar o caráter interesse público dessa indústria. Nosso objetivo aqui é o de procurar

entender quais são e quais foram as motivações para preservar “bens públicos” e, na medida

do possível, procurar descrever os mecanismos que estão sendo discutidos ou colocados em

prática para a promoção desses bens no ambiente maior de competição. Também analisamos

o caso brasileiro que desde 1998 colocou em prática um mecanismo regulatório para financiar

eficiência energética e P&D, o que inicialmente se configura como um avanço considerável e

até mesmo mais agressivo quando comparado ao que se verifica nos EUA. Interessa-nos

verificar, no entanto se essa regulação realmente garante a provisão de bens públicos e quais

são os limites de uma regulação sem uma definição de uma política pública para eficiência

energética e P&D para o setor energético, como tem sido o caso brasileiro.

O presente trabalho consiste de 9 capítulos. No primeiro são apresentados os

conceitos de bens e benefícios públicos do sistema energético. Os capítulos 2 a 7 referem-se

ao caso norte-americano. No segundo capítulo analisam-se as principais causas e objetivos

das reformas nos EUA, buscando evidenciar as principais mudanças que poderiam

comprometer o papel de interesse público dessa indústria. Os capítulos seguintes discutem

com maior detalhes os efeitos das reformas do setor para a eficiência energética, fontes

renováveis e pesquisa e desenvolvimento, procurando mostrar as iniciativas que foram

realizadas naquele país para garantir esses aspectos. O capítulo 6 discute o importante papel

da opinião pública organizada através de grupos civis na manutenção dos aspectos de

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interesse público da indústria. O capítulo 7 resume alguns dos principais mecanismos utilizados

pelos governos estaduais e federal para promover programas de bens públicos nos EUA. O

capítulo oitavo discute a obrigatoriedade de implantação de programas de eficiência e P&D nas

empresas privatizadas no Brasil, seus primeiros resultados e limitações. As conclusões estão

discutidas no capítulo nono com algumas reflexões sobre aprimoramento da regulação para

fomentar iniciativas de interesse público da indústria de eletricidade.

Energia e “bem público”

É importante definir o que se entende como "bem público". Vários economistas no

início dos anos 50 e 60 se preocuparam com esse tema. São chamados de “bens públicos”

aqueles bens e serviços que não são produzidos em função da existência de um mercado

competitivo, ao contrário, são na verdade um clássico exemplo das chamadas imperfeições de

mercado. São bens (e serviços) consumidos por todos indivíduos e não podem ser restritos

para beneficiar somente um ou poucos grupos de compradores. Dessa maneira tampouco

existe interesse de indivíduos ou firmas agindo isoladamente na produção desses bens, uma

vez que não existirá um consumidor que individualmente esteja disposto a pagar por um bem

que é usufruído por todos1.

Bens públicos são caracterizados por três fatores. Um deles é o atributo da não

exclusão (ou não exclusividade), mencionado acima, ou seja, uma vez que esse bem foi

colocado a disposição de um consumidor, não é possível restringir o seu consumo por outros.

Por exemplo, investimentos em melhoria da qualidade do ar de uma cidade beneficiam todos

os cidadãos daquela região. Outro atributo de um bem público é a chamada não rivalidade: o

consumo desses bens por um indivíduo não diminui as possibilidades dos outros consumirem.

1 A teoria dos "bens públicos" teve início entre economistas europeus e começou a ser discutida

nos EUA em meados da década de cinqüenta, especialmente por Paul Samuelson. Mais tarde,discussões sobre a teoria de ação coletiva (Mancur 1965) foram também baseadas na teoriade bens públicos e deram novos enfoques sobre o acesso aos "bens públicos". Foi tambémconsiderado que enquanto bens privados são perfeitamente fornecidos pelo mercado, osuprimento de "bens públicos" deve se dar através de instituições políticas (Buchanan 1968)(citação extraída de Mielnik 1998). Existe também o clássico artigo Hardin (1968) intitulado“Tragedy of the Commons” que analisa o caso de uma vila onde cada habitante podia levar seucarneiro para pastorear em campos que pertenciam a todos. Como o campo era coletivo, cadaum procurava levar o maior número de animais para pastar até exaurir a pastagem. Esse é umexemplo que ilustra o tipo de dificuldades para gerenciar benefícios de recursos públicos. Apresente seção baseia-se em Pindyck&Rubinfeld (1994), Nordhaus (1999) e Rosset (1997).

Page 18: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

4

Isso significa que a produção de quantidades adicionais desses bens não implica em que

novas quantidades de recursos seja utilizadas, em outras palavras, o custo marginal para a

produção de novos bens é zero. É claro que existem limitações quando a demanda por esses

bens é excessiva, por exemplo vias públicas utilizadas para trânsito de veículos é um bem

público que não exclui nenhum usuário, mas pode tornar-se congestionada em função de um

excesso de veículos trafegando ao mesmo tempo e impedir que outros veículos tenha acesso.

Finalmente, e como conseqüência dos aspectos anteriores, bens públicos são caracterizados

pela falta de interesse de firmas ou indivíduos em produzi-los. É necessário que sejam fundos

coletados da sociedade através de taxas, impostos, ou outras formas, para o financiamento da

produção desses bens.

No caso do setor de energia elétrica o que se observou na literatura recente dos EUA,

foi a preocupação de se definir quais seriam os aspectos de "bens públicos" cuja manutenção

seria necessária no contexto de menor regulação pública no que se refere a preços e

organização da indústria e maior competição entre as empresas.

Como exemplo dessa preocupação, tem-se que em 1994 a CPUC (CPUC, 1997)

apresentou um documento onde fica explicitada a relação de "bens públicos" que deveriam ser

mantidos pela nova configuração do setor elétrico da Califórnia e estabelecia níveis de recursos

que deveriam ser investidos em programas para que os mesmos fossem disponibilizados para

os cidadãos daqueles estado. Foi definido que os bens públicos eram: eficiência energética,

fontes renováveis, proteção ambiental, pesquisa, desenvolvimento e demonstração em áreas

de interesse público, e a manutenção de programas para atender a população de baixa renda.

Externalidades do setor energético

Este é outro conceito relevante quando se discute a reforma do setor energético.

Externalidades são os efeitos sobre terceiros, ou sobre a sociedade como um todo, causadas

por atividades na produção, transmissão, distribuição e consumo de energia que não são

capturados adequadamente através de mecanismos de preços. Essas externalidades podem

ser positivas quando beneficiam outros, ou negativas quando trazem prejuízos. Por exemplo,

embora os custos de produção de eletricidade através de painéis fotovoltaicos sejam maiores

que a eletricidade produzida por óleo diesel, o sistema de preços não reconhece nenhuma

Page 19: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

5

vantagem da fonte renovável (solar) sobre o diesel. Como será visto mais adiante (Capítulo 4:

fontes renováveis e meio ambiente) os diferentes impactos sociais e ambientais das fontes de

energia podem também justificar a intervenção do setor público para sinalizar as preferências

da sociedade, quando os mecanismos usuais de mercado são limitados para esse fim.

A indústria de energia é particularmente responsável por uma série de impactos

negativos no meio ambiente local e global. Existem basicamente três maneiras de se procurar

refletir as preferências da sociedade de minimizar os efeitos negativos da produção ou

consumo de energia: estabelecimento de normas, ou padrões; impostos ou taxas; e mais

recentemente temos a criação de quotas de poluição que podem ser transacionadas entre os

agentes através de mecanismos de mercado.

O setor público pode estabelecer limites para emissões de poluentes, ou especificar

padrões de desempenho energético de equipamentos. Essa tem sido uma ferramenta muito

usada para controlar qualidade de combustíveis, poluição atmosférica, eficiência energética de

equipamentos e edificações, entre outros. A contínua revisão dessas normas tem possibilitado

incorporar os avanços tecnológicos e exigências da sociedade e em alguns casos inclusive,

induzir o desenvolvimento de novas técnicas e padrões de uso de energia.

Taxas ou impostos podem ser adicionados de acordo com critérios que possam

encarecer aquelas fontes de energia que são mais poluentes e favorecer as demais que

apresentem maiores benefícios sociais e ambientais.

A criação de quotas ou permissões transferíveis é um sistema onde se estabelece um

teto global para emissões (ou outro aspecto de interesse) que é repartido entre os agentes

responsáveis. Dependendo das possibilidades de cada um em promover reduções ele pode

transferir (vender) a parcela não utilizada de sua quota para um outro, ou seja, essas

permissões são negociadas entre os agentes. Esse mecanismo possibilita o aproveitamento de

diferentes oportunidades existentes entre as empresas de promover as reduções utilizando o

mecanismo de mercado (“preço” das permissões e o custo das reduções) para priorizar as

soluções de menor custo. Esse mecanismo foi introduzido com sucesso para controlar as

emissões de enxofre na indústria de eletricidade dos EUA (v. Capítulo 4) e mais recentemente

Page 20: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

6

é parte dos esforços para controle de emissões de CO2 através do Mecanismo de

desenvolvimento Limpo do Protocolo de Quioto (v. Anexo).

Benefícios públicos de sistemas energéticos e o mercado

É possível verificar a preocupação que existiu em se definir quais devem ser os

interesses públicos a serem atendidos pela indústria de eletricidade nos EUA desde o início

das discussões sobre a restruturação. As discussões que se desenrolaram criaram a

possibilidade de um contexto favorável para proposição de políticas para o atendimento de

interesses públicos em mercados competitivos.

Golove & Eto (1996) sumariam os interesses públicos associados a essa indústria a

partir de vários documentos elaborados por órgãos encarregados de conduzir o processo de

reestruturação nos EUA: 1) promoção da eqüidade inter e intra-classe (eqüidade vertical) de

consumidores e entre gerações; 2) the equal treatment of equals (eqüidade horizontal), mesmo

tipo de consumidores recebem mesmo tratamento (tarifas, condições de

pagamento/fornecimento, etc.); 3) equilíbrio entre metas de longo e curto prazo que possuem o

potencial de comprometer o futuro das novas gerações; 4) proteção contra o abuso de poder

monopolístico; e 5) proteção geral para a saúde e bem estar dos cidadãos do estado, nação e

mundo.

Outro documento bastante esclarecedor sobre a visão do papel das políticas públicas

para a manutenção de benefícios coletivos da indústria de eletricidade nos EUA é o “Public-

Policy Responsabilities in a Restructured Electricity Industry” de Bruce, Hirst & Bauer (1995).

Esse trabalho foi escrito a partir dos resultados de um seminário onde participaram

representantes de diversos setores: companhias de eletricidade, PUCs, agências estaduais de

energia, NGOs, comunidade acadêmica e produtores de energia. A Tabela 1 mostra o elenco

de benefícios coletivos segundo esse estudo que estão associados à indústria de eletricidade e

sua relação com a promoção de crescimento econômico, eqüidade social e proteção ambiental.

É interessante verificar que houve a preocupação de se explicitar as áreas de atuação para

políticas públicas no novo ambiente de maior competição e menor regulação da indústria:

confiabilidade do sistema, investimentos em pesquisa e desenvolvimento, gerência de recursos

naturais e riscos, acesso não discriminatório de produtores à rede de transmissão, programas

Page 21: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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de fornecimento de energia para população de baixa renda, estabelecimento de padrões

mínimos de qualidade de serviço, proteção aos consumidores, incentivo ao uso de fontes

renováveis e redução de níveis de poluição. Essas áreas de atuação atendiam a metas e

objetivos dessa comunidade e que devem ser a base das políticas públicas. Essa Tabela

mostra também a estreita relação da indústria de eletricidade com diversas áreas de interesse

público.

A Tabela 2 apresenta os possíveis impactos do mercado competitivo para o acesso

desses benefícios públicos. Enquanto alguns objetivos que satisfazem interesses coletivos

como, por exemplo a confiabilidade do sistema elétrico, poderão ser garantidos por um

mercado competitivo outros não o serão, e devem ser supridos por iniciativa do poder público.

Esse é o caso de medidas de proteção ambiental e proteção ao consumidor, entre outras.

Essas informações ilustram o importante exercício de análise feito nos EUA para se

entender os limites e os benefícios que o mercado competitivo pode trazer para a manutenção

dos aspectos de interesse público considerados relevantes naquele país.

Page 22: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO
Page 23: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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Tabela 1: As responsabilidades de políticas públicas

Ações

Valores e objetivos

P&D

Confia-bilidade do

sistema

Gerênciados

recursos/riscos

GLD Acesso nãodisc. Trans-

missão

Progra-masde Baixa-

renda

Padrõesmínimos de

serviços

Proteção aoconsumi-

dor

Energiarenovável

Redução deníveis depoluição

Progresso Econômico

Eficiência econômica 33 33 33 33

Competitividade industrial 33 33 33 33 33 33 33

DesenvolvimentoEconômico

33 33 33 33 33 33 33

Escolhas paraconsumidores

33 33 33 33 33

Equidade Social

Repartição eqüitativa decustos e benefícios

33 33 33 33 33 33 33

Participação pública 33 33 33

Proteção ao bem estarpúblico

33 33 33 33 33 33

Proteção ambiental

Geração e distribuição deeletricidade limpa

33 33 33 3333 33

Qualidade ambientalregional

33 3333 33

Fonte: Bruce, T. & E. Hirst, Bauer, D. 1995.

Page 24: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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Tabela 2: O efeito do mercado nas responsabilidades públicas das empresas de energia

Ações favorecidas pelo mercado

Confiabilidade dossistema

Consumidores em um mercado competitivo poderão considerar a confiabilidade doserviço e o preço pago para escolher seus fornecedores.

Acesso não-discriminatório

Como a transmissão continuará a ser um monopólio, ela permanecerá sob aregulação do FERC. Discriminação poderia ser um problema se os proprietários datransmissão também controlassem a geração ou a distribuição.

Ações parcialmente favorecidas pelo mercado

Pesquisa eDesenvolvimento

Haverá investimentos em determinados tipos de P&D. Algumas inovações poderãoter repercussões sociais importantes, outras ficarão restritas a determinados nichose sempre terão o objetivo maior de aumentar a competitividade e lucros da empresade energia.

GLD Deverá haver o fornecimento de serviços de energia para os consumidores quandoessas atividades fornecerem receitas para as companhias. As decisões sobre quetipo de programas se farão sob uma perspectiva da empresa (rate-impact measuretest) e não sob uma perspectiva social (total resource cost test)

Energia renovável A falta do PIR e a habilidade de engajar diversos atores nas decisões sobre autilização de recursos naturais deverá reduzir o uso de fontes renováveis quepossuem preços mais caros que as alternativas convencionais. Reduções em P&Dnessa área também adiarão a entrada de novas fontes. Por outro lado com o acessonão discriminatório os produtores existentes poderão ter acesso a um mercado.

Gerenciamento derecursos naturais eriscos

Existe uma incerteza sobre os critérios que nortearão as decisões sobreinvestimentos na exploração de recursos naturais, especialmente quando se pensano longo prazo.

Ações que não serão favorecidas pelo mercado

Controle da poluiçãoe proteção ambiental

Custos de controle de poluição ainda não são internalizados pela indústria. Se osreguladores puderem estabelecer incentivos para a redução de níveis de emissões,por exemplo, a indústria deverá procurar maneiras de atingir essa meta com o menorcusto. O despacho ambiental é uma maneira de se atingir esse objetivo.Reguladores poderão taxar as plantas mais poluentes ou estabelecer um limite deemissões.

Programas paraconsumidores debaixa renda

O fornecimento de serviços para consumidores de baixa renda não é uma atividaderentável.

Padrões mínimos deserviços

Referem-se aqui a serviços que devem ser mantidos obrigatoriamente (mesmo sempagamento) para os consumidores (como fornecimento durante os meses deinverno). Esses serviços somente serão mantidos se forem mandatórios. Pequenosconsumidores ou consumidores cativos terão dificuldades para controlarem aqualidade de serviços de energia.

Proteção aoconsumidor

O mercado por si mesmo não oferece garantias ao consumidor. Isso é importante sehouver um grande número de companhias e intermediários para vendas de energia.

Fonte: baseado em Tonn, Hirst & Bauer, 1995.

Page 25: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

CAPÍTULO 2: A REFORMA DO SETOR ELÉTRICO NOS EUA

Antecedentes e motivações

Introdução

O setor elétrico dos EUA possui uma capacidade instalada de cerca de 725 GW (1996),

ou seja mais de dez vezes que o Brasil, o que dá idéia da complexidade e dimensão dos

impactos que as reformas devem causar no contínuo desenvolvimento de iniciativas de

economia de energia e de fontes renováveis naquele país. O crescimento do consumo total de

eletricidade tem sido modesto, entre 2-3% nos últimos anos, sendo que o setor comercial e

residencial apresentam as maiores taxas de crescimento. As reformas não foram motivadas

pela busca de maior eficiência no gerenciamento do setor, uma vez que já é um setor bem

administrado, com perdas técnicas em torno de 3% e perdas comerciais menores que 1%, mas

sim com o objetivo de reduzir os custos finais de energia, possibilitando a introdução de novas

tecnologias de produção de energia e aumentar a competitividade da economia americana no

mercado global.

O processo e velocidade da implantação das reformas variam muito de estado para

estado. Algumas regiões se encontram em estágios mais avançados, como a Califórnia e

estados da Nova Inglaterra, mas cerca de um total de 48 estados (1998) já estão introduzindo

reformas no setor para estimular a competição principalmente do lado da geração.

O objetivo deste capítulo é descrever de uma maneira geral as principais mudanças

ocorridas no setor elétrico e quais foram as motivações que determinaram iniciativas de

proteção aos bens públicos. Neste capítulo serão apresentadas as principais causas das

reformas no país e em alguns estados em particular. Inicialmente procura-se conceituar o

significado das reformas promovidas no âmbito da indústria de eletricidade de maneira geral,

para melhor colocar o contexto das mudanças nos EUA.

Page 26: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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Conceituando as Reformas do Setor Elétrico

A análise de novas estruturas de organização do setor elétrico em vários países mostra

que existe uma grande diversidade de enfoques adotados. As mudanças que estão sendo

chamadas de “reformas” do setor energético são basicamente novas formas de organização

industrial e gerenciamento desse setor.

Para melhor apresentar as reformas implantadas nos EUA dentro do contexto de

possibilidades de novas organizações da indústria de eletricidade lança-se mão aqui de dois

referenciais: um que mostra as possibilidades de reformas segundo mecanismos de

coordenação entre os governo e empresas de energia, e outro que procura categorizar as

mudanças de acordo com sua natureza e objetivos.

As reformas segundo mecanismos de coordenação

Arentsen e Künneke (1996) propõem um modelo conceitual para representar os

diversos mecanismos de coordenação que caracterizam a organização de uma indústria

nacional de eletricidade. São considerados três tipos de mecanismos: preços de mercado,

acordos voluntários e autoridade governamental (Tabela 3). Cada unidade de decisão possui

um mecanismo de alocação prioritário com objetivos próprios.

Tabela 3: Tipologia de modelos de coordenação

Modelos decoordenação

Tomadores de decisão Mecanismo dealocação

Objetivo econômico

Mercado Indivíduo Sistema de preços Vantagens individuais

Rede de atores Grupo Acordos voluntários Vantagens mútuas

Hierarquia Autoridade pública Normas, leis, regras Interesse público

Fonte: a partir de Arentsen e Künneke (1996)

Uma combinação desses três mecanismos em pares, considerando “mecanismo de

coordenação dominante/ mecanismo de coordenação acessório”, gera a tipologia de modelos

de coordenação setorial que esses autores utilizam para estudar a organização do setor

Page 27: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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energético em vários países. Essa tipologia oferece um referencial teórico para analisar a

diversidade de reformas setoriais (Tabela 4). Esses autores propõem chamar de liberalização a

qualquer movimento na direção ao topo da tabela e/ou à sua esquerda, ou seja fora da

localização da estrutura hierárquica e mais próxima do Mercado Puro.

Tabela 4: Tipologia de modelos de coordenação mistos

Mecanismo de coordenação dominante

Preço

(A)

Acordos Voluntários

(B)

Autoridade Pública

(C)

Preço Mercado Puro Auto-CoordenaçãoCompetitiva

HierarquiaCompetitiva

(A)

Acordovoluntários

MercadoCoordenado

Auto-CoordenaçãoPura

CoordenaçãoHierárquica

(B)

Mec

anis

mo

de

Co

ord

enaç

ão S

ecu

nd

ária

Autoridadepública

Mercado Reguladopelo Poder Público

Auto-CoordenaçãoControlada

Hierarquia Pura (C)

Fonte: a partir de Arentsen & Künneke 1996

Uma representação matricial desses modelos segundo o grau de centralização de seus

decisores permite elencar um espectro de configurações possíveis desde aquelas onde

predominam ações de Mercado baseada em preços de energia (Tabela 4, coluna A) até

Organização Hierárquica onde as iniciativas são do tipo “comando e controle” (Tabela 4, coluna

C). Como exemplo, podemos utilizar esse referencial representando a situação do Brasil até

meados da década de 90, como a de “Coordenação Hierárquica” uma vez que havia a

característica de interação entre diversos atores do setor elétrico, representando diferentes

companhias de eletricidade estaduais e regionais, sob a coordenação da ELETROBRÁS.

Decisões sobre o planejamento da operação e expansão, juntamente com financiamento e

execução dos planos eram coordenados através da ELETROBRÁS. A França através da

Eléctricité de France - EDF tem ainda a característica de ser tipicamente um caso de

“Hierarquia Pura”.

Page 28: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

14

As reformas nos EUA e no Brasil

De acordo com essa tipologia, a presente reestruturação dos EUA pode ser descrita

como sendo um movimento a partir de um Mercado Regulado pelo Poder Público (através de

controle de tarifas e lucros das empresas) na direção de um Mercado Puro (competição livre

para produção e distribuição e preços determinados pelas regras de oferta e demanda). Nos

EUA, portanto, as reformas significam um movimento de baixo para cima, mas restrito à

segunda coluna à esquerda da Tabela 4, um movimento de (A,C) para (A,A).

Já no caso brasileiro as reformas implicam em mudanças profundas na propriedade (de

pública, ou estatal para privada) e gestão do setor que deixou de ter um planejamento

centralizado, em um movimento de (C, B) para (A,A) ainda não completado.

As reformas segundo sua natureza e objetivos

Um estudo realizado para o Departamento de Energia, Meio Ambiente e Tecnologia da

Agência norte-americana USAID (Hagler Bailly, 1996) categoriza em 5 os tipos principais de

reformas realizadas no setor elétrico a partir de uma análise comparativa entre vários países.

São elas comercialização, privatização, des-verticalização, competição para o mercado

atacadista mercado varejista, e regulação. No entanto, é bom ressaltar, se processam dentro

de um período de tempo que pode ser longo e incluir muitas das etapas descritas a seguir.

Comercialização

A comercialização significa a introdução de princípios de gerência e administração

comercial em companhias de propriedade do estado. Essas companhias passam a obedecer

as mesmas regras de preços, empréstimos, contabilidade e impostos que as empresas

privadas. São eliminados subsídios governamentais e outras vantagens como interferência e

garantias governamentais para obtenção de novos empréstimos. Freqüentemente o passivo de

dívidas da empresa é assumido pelo poder público.

Além disso, as empresas passam a apresentar sua contabilidade em separado para as

atividades de geração, transmissão e distribuição de energia. Suas decisões de investimentos

possuem um caráter comercial e deixam de ter uma conotação de política de desenvolvimento

Page 29: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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econômico-social, e sofrem ajustes visando redução de custos, aprimoramento do sistema de

tarifas e faturamento, melhorando a medição e redução de perdas comerciais.

A comercialização tem sido encarada como uma etapa intermediária na direção da

privatização e outras reformas. Alguns países tem introduzido a comercialização do setor

elétrico através da gestão privada, mas mantendo ainda o setor sob domínio público, como por

exemplo a Costa do Marfim, Gana, Senegal, Tailândia, Singapura e Malásia.

Privatização

Privatização significa a transferência de empresas originalmente pertencentes ao setor

público para a iniciativa privada. Em algumas situações inicia-se o processo dando à iniciativa

privada a oportunidade de investir em capacidade adicional e depois passa-se a vender as

companhias existentes. Uma maneira de transferir à iniciativa privada novos investimentos é

designar, a partir de um determinado plano de expansão, aqueles empreendimentos que

devem ser explorados pela iniciativa privada. Outra maneira tem sido identificar as

necessidades de nova capacidade e deixar para a iniciativa privada determinar as fontes de

menor custo. A privatização tem sido a maneira de se introduzir reformas em países como

Argentina, Brasil, Chile, China, Colômbia, Costa Rica, Costa do Marfim, entre outros.

Quando se decide pela transferência do setor energético para a iniciativa privada é

necessário manter um conjunto de regras para controlar o setor e proteger o interesse público,

principalmente o controle de tarifas e garantias de qualidade de serviço. Isso pode ser feito

através de contratos na ocasião da venda das empresas ou através de comissões/agências de

regulação. Idealmente as comissões de regulação e as novas regras devem ser criadas antes

da privatização por agências com certa independência política, mas isso tem sido raro.

Des-verticalização ou Reestruturação

Esse tipo de reforma refere-se a um desmembramento das companhias de eletricidade,

separando as unidades de geração, da transmissão e distribuição de energia em diferentes

companhias. A Inglaterra e o Chile foram os pioneiros a realizar esse tipo de reforma. Outros

países que estão adotando a des-verticalização incluem a Argentina, Austrália, Bolívia, Brasil,

El Salvador, Hungria, Nova Zelândia, Nicarágua, Paquistão, Filipinas, Polônia, Suécia, Ucrânia.

Page 30: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

16

Em alguns países tem havido também um desmembramento horizontal com divisões

de companhias responsáveis por um segmento de atividade da indústria (geração ou

distribuição) segundo regiões geográficas.

Competição

Embora a porção da transmissão e distribuição seja considerada um monopólio natural,

pode-se introduzir a competição tanto para companhias de geração de energia (que venderão

no mercado atacadista) como também diretamente no varejo. A competição no lado da oferta

pode contar com produtores independentes de energia que podem negociar contratos com as

companhias de eletricidade.

A competição no varejo significa que consumidores finais podem negociar contratos de

compra diretamente com diferentes fornecedores. A competição no varejo inicia-se com

grandes consumidores industriais e comerciais, que são tipicamente mais atraentes para

disputarem contratos diretos com produtores de eletricidade.

Regulação

Esse é o tipo de reforma que vem associado principalmente quando também se

introduz a privatização. É seu objetivo principal proteger o interesse público, principalmente a

evolução de tarifas, qualidade do serviço e atendimento da região de concessão.

Quando existe uma privatização de companhias verticalmente integradas é

extremamente importante controlar a transferência de recursos dos consumidores para as

companhias através de regulação. Essa era a situação prevalecente nos EUA até

recentemente. Quando existe uma competição estabelecida no lado da geração deixa-se de se

regular esse segmento pois acredita-se que o próprio mercado se encarregará de controlar a

evolução das tarifas de suprimento.

As reformas nos EUA

O sistema elétrico americano já possuía uma estrutura descentralizada na qual vários

proprietários privados poderiam participar em um mercado competitivo para fornecimento de

energia, uma vez estabelecidas as novas regras. Não eram necessárias, portanto, iniciativas de

comercialização ou privatização de empresas.

Page 31: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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Nos EUA duas das reformas mencionadas anteriormente foram praticadas: a des-

verticalização (ou reestruturação) da indústria e a introdução da competição a nível da geração

e distribuição, chamada de des-regulamentação. Foi necessário realizar uma reforma nas

regras de operação da indústria (des-regulamentação), eliminando total ou parcialmente as

restrições do governo de modo a permitir a mais completa competição entre as diferentes

unidades seja no mercado atacadista como no varejista.

Em quase todos os estados as reformas buscam inicialmente a competitividade do lado

da geração de eletricidade com a participação de novos agentes como os Independent Power

Producers – IPP (Produtores Independentes de Energia), ou mesmo intermediários comerciais

que poderão realizar contratos e entrar em processos de leilão promovidos por grandes

compradores de energia ou com operadores de sistemas de Transmissão/Despacho de

energia.

As motivações para as reformas nos EUA

Desde o início do século 20 até recentemente o setor elétrico era considerado um

monopólio natural nos EUA, e franquias eram concedidas para que companhias privadas (IOU)

operassem em regiões definidas. Em contrapartida estas companhias tinham a obrigação de

atender a área servida e eram submetidas a uma forte regulação pública abrangendo todos os

aspectos de sua operação. O controle público se dava através de comissões estaduais de

regulação. Ao longo do tempo, muitos estados introduziram a obrigação de se realizar o

planejamento integrado de recursos - PIR, um processo de planejamento onde oportunidades

de gerenciamento da demanda, proteção ambiental e utilização de recursos naturais para

produção de eletricidade eram contempladas simultaneamente. A partir desses estudos a

agência de regulação autorizava os investimentos das companhias de energia. A regulação da

indústria se realizava principalmente a nível estadual, sendo as transações inter-estaduais de

energia controladas por um órgão federal (FERC- Federal Energy Regulatory Commission).

As reformas que começaram a ser implantadas na década de 90 em diversos estados

dos EUA tiveram o objetivo principal de criar competição nessa indústria e reduzir custos finais

de energia dos consumidores, principalmente para o setor industrial, que necessitava manter-

se competitivo globalmente, e grandes consumidores comerciais. As mudanças incluíram a

Page 32: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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introdução de novos tipos de compradores e produtores de energia2; novos mecanismos para

compra e venda de energia como leilões de blocos de energia de produtores; a des-

verticalização das companhias de eletricidade, separando as unidades de geração,

transmissão e distribuição. O resultado foi o surgimento de produtores independentes - IPPs,

uma entidade central para comandar a transmissão e o despacho de energia, companhias de

distribuição – DISCOs , companhias de comercialização ou brokers e companhias de serviços

de energia - ESCOs. Hoje o mercado de energia elétrica nos EUA é extremamente sofisticado

e dinâmico.

Nos primórdios da implantação da indústria de eletricidade nos EUA, no final do século

19, a situação era bem diferente. Não havia interesse em promover competição entre diferentes

produtores de eletricidade pois isso ocasionava um aumento nos custos de eletricidade aos

consumidores (Smeloff & Asmus, 1997, pg. 10.). Era um período onde a indústria recém

implantada estava lutando com dificuldades para criar um mercado para seu produto. Admitia-

se na época que a produção de energia era um monopólio natural3 e debatia-se então se as

vendas (distribuição) de energia deveriam ser um monopólio privado ou público. A partir de

1907 um grupo, o National Civic Federation, composto por influentes homens de negócios e

banqueiros estabeleceu um modelo que foi adotado durante os 90 anos seguintes. Nesse

modelo as companhias elétricas eram consideradas monopólios naturais mas eram reguladas

por comissões públicas. As empresas poderiam produzir e vender energia em uma

determinada região de sua exclusividade, ou seja, elas possuíam uma franquia territorial para

explorar os serviços de energia. Esse tipo de regulação criou bases estáveis que propiciaram o

desenvolvimento dessa indústria que a partir de então assumiu uma estrutura verticalizada

responsável por todas as atividades desse negócio.

2 Além das classes de consumidores (residencial, comercial, industrial, etc.) com necessidades e

nível de informação distintos, existe uma diversidade de atores como os IOU (Investor-OwnedUtility), POU (Public-Owned Utility), NGU (Non Generating Utility), e ESCO (Energy ServicesCompany).

3 Um monopólio natural se caracteriza quando uma firma pode produzir um dado nível deprodução de um produto a custos inferiores que quando várias firmas o fazem. Monopóliosnaturais ocorrem em indústrias que exibem custos médios de longo prazo decrescentes devidoa economias de escala.

Page 33: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

19

Segundo Smeloff & Asmus (1997) foi somente nos anos 30 que houve um esforço e

interesse no desenvolvimento de uma indústria pública de eletricidade. Isso ocorreu durante o

governo de Franklin D. Roosevelt com o início da exploração do potencial hidroelétrico através

de agências públicas. Dessa época datam as primeiras companhias (públicas) municipais, e

diferentemente das outras não eram submetidas às comissões públicas de regulação, uma vez

que já eram de propriedade de governos municipais e submetidas à fiscalização pública.

Causas das mudanças na estrutura do setor elétrico dos EUA

Historicamente as IOUs dominaram a indústria de eletricidade nos EUA, representando

na década de 90 mais de 70% da capacidade de geração e a maior parte da T&D e durante

quase 90 anos esse setor foi operado como uma coleção de monopólios regulados,

geograficamente independentes entre si. As companhias possuíam franquias para serviços de

eletricidade que permitiram sua integração vertical, condição importante para atingir as

economias de escala.

A indústria de eletricidade se desenvolveu muito bem de acordo com esse modelo até

a década de 70. Significativas economias de escala eram até então obtidas com o sistema de

grandes monopólios, que por sua vez construíam grandes usinas e sistemas de transmissão

cada vez maiores. O desenvolvimento tecnológico durante o período possibilitou que as

turbinas a vapor melhorassem continuamente sua eficiência permitindo a construção de usinas

maiores e mais eficientes. Durante esse período houve a diminuição dos custos de produção

de eletricidade, aumento extraordinário do consumo e lucros para a indústria. No entanto, na

medida em que se estabilizaram os ganhos de eficiência técnica através de economias de

escala também se estabilizaram os custos de produção e rentabilidade da indústria. Nesse

momento a energia nuclear passou a ser então uma alternativa tecnológica procurada pela

indústria para diminuir os custos de uma geração baseada até então no carvão.

No final da década de 60 a energia nuclear começava a ser implantada em várias

regiões do país. Ao mesmo tempo dois fatores começaram a impor mudanças no setor:

problemas internos da economia dos EUA (alta inflação e pressões para manter a

competitividade de seus produtos no mercado internacional), e o surgimento de um forte

movimento de consumidores de energia e de ambientalistas.

Page 34: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

20

Para um setor intensivo em capital como este, os custos crescentes de financiamento

pressionavam aumento das tarifas dos consumidores. Os novos preços do petróleo da década

de 70 tiveram que ser repassados, uma vez que grande parte da eletricidade era baseada em

petróleo e gás natural.

Concomitantemente uma nova legislação ambiental estava sendo posta em prática a

nível federal e em alguns estados americanos como a Califórnia. É criada a agência ambiental

americana EPA, e leis ambientais bastante restritivas como o Clean Air Act e o California

Environmental Quality Act, entre outros.

Um dos resultados desse conjunto de medidas foi que os custos e o tempo necessário

para a implantação de projetos energéticos começaram a crescer. Na medida em que esses

custos começaram a ser repassados aos consumidores uma forte reação começou a ser

orquestrada por todo o país através de entidades civis. Os grupos de pressão começaram a se

organizar de maneira bastante efetiva e passaram a influir nas audiências das Comissões de

regulação onde se debatiam as novas tarifas (v. também Cap. 6). Resultados importantes

começaram a surgir com a criação de tarifas especiais de cunho de assistência social para

consumidores e foram incrementados os esforços para conservação de energia.

Durante o governo Carter houve interesse em aumentar a independência energética

dos EUA, começou-se a tomar medidas para promover a substituição do petróleo importado e

incentivar a conservação de energia. Três importantes decretos federais foram assinados

durante sua gestão com implicações para os investimentos do setor elétrico que viriam a

seguir:

• O Power Plant and Industrial Fuel Act, que proibia o uso de derivados de petróleo e gás

natural em novas usinas termelétricas. Nessa época metade do petróleo usado em

termelétricas do país era importado e havia também a preocupação com o nível das

reservas de gás natural. Além disso, a população já tinha experimentado problemas com o

abastecimento desse combustível durante os meses de inverno de 1977 e 78. A idéia

prevalecente na época era preservar o gás para aquecimento doméstico.

Page 35: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

21

• O Natural Gas Policy Act foi criado para des-regulamentar os preços das novas jazidas e,

com isso estimular a exploração de gás natural no país. Com essa medida os preços de gás

passaram a ser determinados pelo mercado.

• A competição no setor elétrico começou de certo modo com o decreto do PURPA (Public

Utilities Regulatory Policy Act). Esse decreto estipulava que as companhias deveriam

comprar eletricidade de produtores independentes quando o preço era menor que o custo de

se construir novas usinas. Em 1982 a CPUC autorizou contratos de longo prazo que foram

fundamentais para o desenvolvimento de produtores independentes. Outras companhias em

várias partes do país começaram a ver as vantagens das tecnologias que começavam a ser

instaladas na Califórnia. Eram tecnologias de geração em pequena escala.

A partir da década de 80 principalmente, as economias de escala na geração foram

drasticamente reduzidas com o surgimento em escala comercial de novas tecnologias como

turbinas a gás com ciclo combinado que podiam ser instaladas modularmente com custos de

capital e prazos de construção muito menores que as principais tecnologias disponíveis

comercialmente.

Em 1992 o Energy Policy Act (EPACT) facilitou ainda mais a des-regulamentação

obrigando o acesso à rede de transmissão para produtores que quisessem vender energia a

grandes consumidores (third party wheeling of power to wholesale customers).

Quais foram as mudanças e principais impactos

Na seção anterior definimos reestruturação como sendo o processo de mudanças na

forma de organização de um determinado tipo de indústria e des-regulamentação como sendo

uma reforma nas regras de operação dessa indústria, eliminando total ou parcialmente as

restrições do governo de modo a permitir a mais ampla competição entre as diferentes

unidades dessa indústria. Na verdade, o setor energético é um dos últimos a experimentar o

processo de des-regulamentação e reestruturação nos EUA. Esse tipo de experiência em

várias indústrias similares a de energia elétrica já se iniciou há uma década, como foi o caso da

indústria de gás natural, telecomunicações, companhias aéreas, transporte rodoviário de carga.

Todas essas indústrias possuem um conjunto de produtores independentes que se utilizam de

Page 36: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

22

uma rede de dutos, vias, estradas, linhas de transmissão, etc. para fornecer seus produtos e

serviços a seus consumidores - portanto similares à indústria de eletricidade - já passaram por

um processo de des-regulamentação há mais de uma década.

O resultado da experiência com des-regulamentação nessas indústrias tem

demonstrado, segundo afirma Crandall & Ellig (1998), que maior competição trouxe benefícios

aos consumidores quando comparada com a situação anterior de forte regulação econômica.

Esses autores, baseados em outros estudos, mostram que houve uma queda real de preços ao

consumidor final para os produtos dessas indústrias e quantificam esses benefícios aos

consumidores4.

Esses fatos foram importantes não só para tornar o debate em torno das reformas do

setor elétrico mais concreto, como também já apontavam um referencial para as iniciativas de

proteção ao consumidor e para disciplinar as transações entre fornecedores, redes de

distribuição e consumidores finais. Outro elemento importante foi o fato que consumidores,

especialmente aqueles do setor comercial e industrial, já possuíam a experiência de se

relacionar com diferentes fornecedores, especialmente na área de telecomunicações, e atuar

dentro de um mercado mais competitivo.

A Figura 1 representa esquematicamente a estrutura da indústria de eletricidade e a

abrangência do órgão regulador antes e depois das reformas. O poder público continua sendo

o responsável pela elaboração de políticas gerais para o setor através de seus órgãos, como o

DOE (Department of Energy) a nível federal e os organismos correspondentes a nível estadual,

mas com menor interferência que antes das reformas.

As companhias de eletricidade foram desmembradas (des-verticalizadas), sendo que

no segmento da geração inicialmente houve a criação de um sistema de um power pool onde

os geradores competem entre si para vender energia a compradores, ou então um sistema

onde os geradores fornecem ao Operador Independente do Sistema (ISO- Independent System

Operator) suas planilhas de regime de operação, que descrevem as quantias e custos de

4 Após a des-regulamentação da indústria de telecomunicação estima-se que US$ 5 bilhões

(1995 $) foram economizados pelos consumidores, no setor de aviação civil a cifra é de US$19,4 bilhões, no transporte de carga rodoviária US$ 19,6 bilhões e no transporte ferroviário US$9,1 bilhões (Crandall&Ellig 1998).

Page 37: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

23

energia a serem fornecidas ao longo de um período de tempo. Ao ISO compete a consolidação

dessas planilhas e planos de operação diversos assegurando os melhores preços e

confiabilidade do sistema. O ISO é responsável pelas estimativas horárias de demanda,

controle de leilões de compra de energia (caso seja essa a opção escolhida) e despacho de

energia. O ISO não pode ser proprietário de sistemas de transmissão ou geração e não pode

determinar os preços de energia ou de transmissão.

Com as reformas nos EUA as comissões de regulação não são mais responsáveis pela

fiscalização do segmento de geração, apenas naqueles estados que ainda mantém

companhias verticalmente integradas, ou quando ainda não existe competição. O papel

tradicional de se controlar a evolução das tarifas de geração também está sendo abolido com

as reformas, uma vez que se espera que o próprio mercado se encarregará de minimizar os

preços de energia. Essas agências controlarão as tarifas para a transmissão e distribuição,

mas não mais pelo sistema de custo do serviço e uma taxa de retorno, e sim através de

sistema que incentive preços finais mais baixos possíveis.

Page 38: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

24

ANTES DA REESTRUTURAÇÃO APÓS A REESTRUTURAÇÃO

Figura 1: Representação esquemática da estrutura do Setor Elétrico dos EUA, antes e após asreformas

Fonte: a partir de USAID/Office of Energy.

Impactos das mudanças

Nesta seção serão analisados alguns dos impactos que a reestruturação ocasionou

com relação a eqüidade, papel do governo federal, acesso e divulgação de informações, e

promoção de substituição entre eletricidade e gás. Nos capítulos seguintes serão analisados os

impactos das reformas para o fornecimento dos chamados bens públicos, conforme foi definido

no capítulo 1: eficiência energética, fontes renováveis, proteção ambiental e pesquisa e

desenvolvimento. Serão discutidos mecanismos que estão sendo considerados para a

proteção ou promoção desses bens dentro de um contexto de competição e quais foram os

motivos que levaram à sua implementação.

POLÍTICASPOLÍTICAS

GERAÇÃOGERAÇÃO

TRANSMISSÃOTRANSMISSÃO

DESPACHODESPACHO

IMPORT/IMPORT/EXPORT.EXPORT.

DISTRIBUIÇÃODISTRIBUIÇÃO

AGÊNCIAS EXECUTIVASFEDERAIS E ESTADUAIS

COMPANHIAS

VERTICALMENTE

INTEGRADAS

CONSUMIDORES

REGULAÇÃOREGULAÇÃO

AGÊNCIAS

REGULADORAS

FEDERAIS E

ESTADUAIS

POLÍTICASPOLÍTICAS

GERAÇÃOGERAÇÃO

OIS/ OIS/ POWER POWER EXCHANGE EXCHANGE

DISTRIBUIDORES DISTRIBUIDORES

REGULAÇÃOREGULAÇÃO

AGÊNCIAS

REGULADORAS

FEDERAIS E

ESTADUAIS

NOVO DIS-TRIBUIDOR

CIA. DEELE-TRICIDADE

CIA DE TRANS-MISSÃO

CIA DE DES-PACHO

CIA GE-RADORA

PROD. IND.

INTERME-DIÁRIOS

AGÊNCIAS EXECUTIVASFEDERAIS E ESTADUAIS

CONSUMIDORES

Page 39: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

25

Quadro 1: As Agências de Regulação da Califórnia e suas Atribuições

The California Public Utilities Commission (CPUC) é a principal agência governamental que

fiscaliza as empresas de serviços públicos (eletricidade, gás, telefone, água e esgotos e transportes). Ela

é constituída por 5 commissioners designados pelo governador para um período de 6 anos e aprovados

pela Assembléia Legislativa do estado. Ela é responsável pela aprovação de preços para eletricidade e

atende os interesses dos consumidores, fiscaliza e aprova os planos de investimentos e a operação das

empresas de eletricidade. Foi a entidade principal e responsável pelo plano de re-estruturação do estado.

Com a re-estruturação a CPUC não é mais responsável por determinar as tarifas a serem cobradas, mas

continua sendo o principal fiscalizador para garantir a qualidade e fornecimento de energia para o estado,

bem como a manutenção dos programas de “bens públicos”.

The California Energy Commission (CEC) também é constituída por 5 elementos designados

pelo governador para um período de 4 anos e aprovados por um comitê específico da Assembléia

Legislativa estadual. A lei exige que quatro membros da CEC tenham especializações nas áreas de

engenharia e ciências exatas, proteção ambiental, economia e direito. O quinto membro deve ser um

representante do público geral. A CEC é responsável por cinco áreas de atividades: projeção da demanda

futura de eletricidade do estado, desenvolvimento de fontes renováveis, promover o uso eficiente de

energia, licenciamento de usinas termelétrica com capacidade maior que 50 MW e o planejamento de

planos de emergência para o estado5.

The Federal Energy Regulatory Commission (FERC) é constituída por cinco elementos

apontados pelo presidente e aprovados pelo Senado Federal. È o órgão encarregado de regular as

vendas de energia entre os estados americanos. FERC verifica se as taxas cobradas para a transmissão

são justas e não abusivas e não discriminatórias entre os vários compradores e fornecedores. Ela revisa

os acordos e as transações comerciais entre as companhias.

Além dessas agências, as empresas de energia (na verdade todo o setor indústrial) está sujeito a

uma série de leis ambientais, de saúde pública e de segurança estaduais e federais.

Eqüidade

Eqüidade se refere a assegurar procedimentos e garantias de serviço para todos os

consumidores. Isso, mais especificamente nos EUA, significa proteção de serviço para

1. A Califórnia é sujeita a terremotos.

Page 40: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

26

pequenos consumidores no que se refere, por exemplo, ao adiamento de pagamento de contas

durante meses de pico no verão e inverno, quando são maiores os gastos com energia para o

condicionamento ambiental. A manutenção de serviços de energia nessas condições não está

baseada em princípios de racionalidade econômica de um mercado competitivo, mas sim de

princípios de bem estar social, tendo portanto a característica de um bem público.

Parece óbvio inferir que somente os grandes consumidores com possibilidades de

negociação com fornecedores poderão se beneficiar da maior competição proporcionada com a

restruturação. Pequenos consumidores não são interessantes e freqüentemente não estão em

condições de negociar contratos vantajosos para si. Grandes consumidores podem exercitar

seu poder de barganha ameaçando trocar de fornecedor e dessa maneira negociar reduções

de preço de tarifas. Uma vez que a companhia elétrica necessita recuperar seus investimentos,

isso pode inclusive implicar em aumentos de preços para outros consumidores, ou seja para os

pequenos consumidores.

Colton (1996) destaca os problemas a serem enfrentados por pequenos consumidores

em um mercado liberal. Além das mencionadas acima, tem-se ainda que firmas competitivas

não terão interesse próprio em assegurar um serviço universal, quando isso significar maiores

custos ou retornos pouco atrativos para os seus investimentos. É muito provável também que

ocorra uma segmentação geográfica, onde firmas procurarão oferecer serviços diferenciados

(inclusive qualidade de fornecimento de energia) de acordo com o tipo de mercado atendido.

É possível afirmar em um primeiro momento que maior parte dos benefícios da maior

competição no setor elétrico deve ir para alguns poucos grandes consumidores, conforme

analisa (Colton, 1996). Entretanto, Crandall & Ellig (1998) argumentam que é muito provável

que os benefícios auferidos por grandes consumidores de energia serão eventualmente

repassados para os demais, uma vez que eles devem enfrentar competição também. Segundo

esses autores, a experiência com des-regulamentação mostra que não se redistribui

simplesmente os custos de um grupo de consumidores a outro, mas existem desdobramentos

com relação ao desempenho das indústrias e em última instância existem ganhos para o

consumidor final. Afirmam ainda que quando se introduz maior risco e mais competição para as

Page 41: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

27

empresas existe o mérito de se estimular inovação e eficiência econômica. É provável que a

análise de Crandall& Ellig (1998) faça sentido considerando a situação dos EUA.

No entanto, a experiência com o gás natural e telecomunicações mostra que 60-75%

dos pequenos consumidores não se interessam em participar do mercado competitivo e trocar

seus fornecedores, tendo em base somente as economias com suas contas. As companhias de

distribuição de eletricidade dos EUA sabem que deverão incluir novos serviços para atrair

esses consumidores.

Quadro 2: Programas para população de baixa renda

Durante a re-estruturação estão sendo implantados basicamente dois tipos de programas para a

população de baixa renda: um que oferece uma tarifa diferenciada e outro que consiste em programas

com componentes de eficiência energética ou melhoria de isolamento térmico das residências. Além

desses programas existem ainda os programas de informação que em muitos lugares são concebidos

especificamente para atender à população de baixa renda, com orientações de como comprar, utilizar e

manter equipamentos elétricos.

Um programa de tarifa especial oferece descontos que apenas consumidores credenciados

podem usufruir. Inicialmente a tarifa é fixada nos valores de 1996 ou antes da re-estruturação. Na

Califórnia o programa é chamado California Alternative Rates for Energy, e o desconto é de 15%. Em

Massachusetts e Rhode Island a tarifa foi estabelecida por atos do poder legislativo. No Arizona a

comissão de regulação estabeleceu valores para a tarifa e em Wisconsin o próprio estado possui um

programa para auxiliar o pagamento das contas de energia de consumidores credenciados, sendo o

programa financiado através de taxas cobradas das companhias de energia.

Os programas de eficiência energética realizam investimentos em tecnologias e reformas em

prédios residenciais ocupados por famílias de baixa renda, como uma medida para auxiliar a redução das

contas de energia.

Em geral, os programas para baixa renda procuram agregar várias outras iniciativas das áreas

de assistência social nos âmbitos de governos municipais, estaduais e federal.

Page 42: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

28

O papel do governo federal

Outro impacto importante dessas reformas nos EUA refere-se ao papel do estado no

processo de des-regulação. Tem havido um enfraquecimento do governo federal no que se

refere à tomada de decisão sobre novos recursos energéticos, e só recentemente o FERC

comecou a ficar mais ativo no processo de regulação.

A presença do órgão federal de regulação é bastante antiga, tendo sido estabelecida

pelo Federal Power Act de 1935.

Acesso e divulgação de informações

Outro problema que começa a ocorrer com a reestruturação é o acesso as informações

sobre o mercado de energia. Vine 1997 discute a questão da divulgação de informação entre

empresas num contexto competitivo e diz:

Companhias de energia ficarão relutantes em compartilhar suas informações se

existir a percepção que poderão tirar alguma vantagem competitiva desse fato. Por esta

razão os reguladores deverão ter uma atitude mais pro-ativa ao instituírem processos de

revisão e coleta de informações das companhias. Muitas das políticas com relação a

confidencialidade de informações das companhias devem ser revistas. Sem uma atualização

do marco regulatório incluindo regras específicas para acesso a informações os problemas

atuais apenas se agravarão.

Informações são especialmente importantes para que o próprio setor público possa

realizar um planejamento de longo prazo, avaliar e acompanhar o progresso de programas

específicos de eficiência energética e outros.

A questão da competição entre gás e eletricidade

Outro problema decorrente de maior competição entre empresas de energia - em

particular entre as de eletricidade e gás - é a dificuldade de implementar a substituição de

combustíveis nas situações que podem trazer vantagens para o consumidor ou para a

Page 43: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

29

sociedade em geral (menor impacto ambiental, por exemplo). A questão é saber como os

reguladores deverão criar dispositivos para que as companhias invistam em programas para

promover a substituição de eletricidade por gás natural quando isso for conveniente para o

consumidor. Caso não existam determinações nesse sentido, as companhias de eletricidade

somente se preocuparão em realizar investimentos para encorajar o uso de eletricidade, o

mesmo acontecendo com a indústria de gás natural. (Wiel & Goldman.1994).

Quando o planejamento integrado de recursos era mandatório em várias regiões dos

EUA (por exemplo, Washington, Oregon, Califórnia, e outros) era possível identificar

oportunidades de substituição entre energéticos que fossem vantajosas para consumidores,

meio ambiente ou para a sociedade. Isso fez com que várias comissões de regulação (foi o

caso, por exemplo dos estados de Vermont, Georgia, Wisconsin, Califórnia, Oregon e Nova

Iorque) estabelecessem obrigações ou incentivos para programas de substituição de

energéticos conduzidos pelas companhias de eletricidade ou gás. O caso mais interessante de

programas de substituição parece ter sido o da Califórnia, que coincidentemente possuia

também a maior companhia que comercializa gás e eletricidade (PG&E).

Nessa época, a CPUC determinou a consideração de medidas de substituição entre

energéticos dentro dos planos de GLD. Os programas de substituição que deveriam ser

implementados pelas companhias de energia eram identificados através de três testes

1) o programa não deve aumentar a quantidade de energia (medida em BTU) consumida para

o uso final considerado,

2) o programa deve ter um Total Resource Cost ou um benefício-custo total 6 maior ou igual a

1,

3) o programa não deve ter impactos negativos no meio ambiente.

6 Total Resource Cost inclui os custos do programa para a companhia e também os custos

adicionais para o consumidor com as medidas. Também são contabilizados os benefíciosdecorrentes tanto para a companhia (custos evitados) como para os consumidores (economiasde energia, por exemplo).

Page 44: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

30

Os critérios da Califórnia são mais rigorosos daqueles que estão sendo utilizados pelos

outros estados e tem a intenção de limitar também programas substituição que sejam

exclusivamente financiadas pelos próprios consumidores.

É bom lembrar que tem existido nos EUA bastante resistência e debates para aumentar

a regulação e a interferência das comissões. A idéia prevalecente das reformas é deixar que o

mercado decida sobre as melhores soluções quanto à substituição. No entanto, existe a

experiência de que em algumas situações, como foi o caso da Califórnia, tenha se garantido

maneiras de promover a substituição através de regulação.

Page 45: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

31

CAPÍTULO 3: A EFICIÊNCIA ENERGÉTICA

O passado e os novos impactos

Introdução

Durante as décadas de 70 e 80 a construção de novas usinas elétricas nos EUA

implicavam em custos de energia superiores àqueles obtidos com as usinas existentes. O

sistema de preços de eletricidade era baseado em custos médios, de acordo com o sistema

regulatório vigente e, dessa maneira, as vendas da energia produzida pelas novas unidades

não eram suficientes para cobrir os custos dos novos investimentos destinados a suprir a

demanda adicional de energia.

Nessa época, portanto, suprir nova demanda significava aumentar os custos de

produção e distribuí-los através de tarifas mais altas entre todos os consumidores. Nesse tipo

de contexto era razoável esperar que as companhias elétricas tivessem um papel importante e

interesse na implantação de programas de conservação de energia. Mesmo repassando os

custos dos programas de conservação aos consumidores isso significava muitas vezes em um

menor aumento de tarifa que se tivesse que atender a demanda adicional através de novas

unidades de produção.

Outro fator relevante, foi que durante esse período era pouco prático e caro para que

consumidores, ou outros agentes, gerassem sua própria eletricidade dada a situação de

monopólio conferida às companhias de eletricidade. Não era possível a introdução de outros

sistemas de geração de energia que pudessem competir com as companhias verticalmente

integradas e com concessões territoriais..

Já em meados da década de 90 o contexto era bem diferente com preços baixos de

gás natural, melhores tecnologias e o acesso dos consumidores a outros sistemas de

transmissão e distribuição decorrente das reformas no setor elétrico. Com isso, os

investimentos das companhias de eletricidade em medidas de eficiência energética junto aos

seus consumidores começaram a ficar comprometidos e diversos estados procuraram

Page 46: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

32

assegurar recursos para que as reformas não eliminassem os benefícios públicos advindos de

medidas de conservação de energia.

Nesse capítulo apresenta-se brevemente a evolução dos programas de conservação

nos EUA antes das reformas e sua continuidade durante o período de reformas. A seguir,

procura-se mostrar as dificuldades de se introduzir melhorias em eficiência energética somente

por ações do mercado. A nosso ver o caso americano é uma ilustração de que são necessárias

ações públicas para manter a continuidade de programas de eficiência.

Os programas de eficiência energética antes das reformas

Os EUA possuem uma sólida e respeitável tradição em iniciativas de programas de

eficiência energética e GLD (Gerenciamento do Lado da Demanda). Muitas delas foram

conduzidas pelas próprias companhias verticalmente integradas e outras surgiram a partir de

determinações a nível federal e estadual. A nível federal foram concebidos programas, tanto no

âmbito do DOE como EPA, responsáveis por significativos avanços em economias de energia.

Dentre os exemplos importantes que tiveram impactos a nível mundial estão programas como o

Energy Star Program, que influenciou o desempenho energético de microcomputadores e

periféricos no mundo todo. Outro exemplo é o Green Lights Program, um programa de

participação voluntária responsável por significativas economias de energia no setor de

iluminação, que agora passa a ser replicado em outros países, como a China. O

estabelecimento de normas técnicas mais rigorosas tanto a nível federal como estadual tem

acelerado a introdução em escala comercial de avanços técnicos e tecnologias que de outra

maneira não teriam entrado no mercado. O mesmo acontece com normas de edificações para

prédios públicos a nível federal e em muitos estados. O DOE tem dedicado recursos

substanciais para a pesquisa e desenvolvimento de tecnologias eficientes até recentemente.

Muitas dessas iniciativas datam desde a década de setenta durante o choque do petróleo e

também como resposta à crescente pressão de ambientalistas preocupados com a proliferação

da energia nuclear e poluição de termelétricas a carvão e petróleo.

Antes das reformas do setor elétrico, programas de eficiência energética ao nível dos

estados foram estimulados fortemente através de regulação, financiamento para pesquisas e

desenvolvimento, e campanhas de informação financiadas pelo poder público. Desde a década

Page 47: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

33

de 80 diversos estados passaram a exigir que as companhias de eletricidade adotassem o

Planejamento Integrado de Recursos - PIR e investissem em programas de GLD como

alternativas para controlar a expansão da geração. Os programas conduzidos pelas

companhias eram, portanto, determinados pelas comissões de regulação que requeriam a

adoção de medidas de GLD consideradas de custos menores que as alternativas de geração,

ou então, quando analisados os planos de expansão sob a ótica do PIR, as oportunidades de

conservação de energia mais atraentes que novas usinas ou sistemas de transmissão. Muitas

companhias realizaram investimentos em uso eficiente de energia porque percebiam sua

atratividade, mas muitas outras o fizeram para cumprir determinações das agências estaduais

de regulação.

Reid (1992) descreve a evolução dos diversos mecanismos de incentivo ao GLD nos

EUA desde o início da década de 80 até os primeiros anos da década de 90. Já a partir de

1991, 30 estados possuíam algum tipo de incentivo para atividades de GLD em seu sistema de

regulação para o setor. Experiências importantes como as ocorridas na Califórnia, Washington

e Wisconsin estabeleceram mecanismos regulatórios que puderam influenciar sua adoção em

vários outros estados.

Em 1980 um estatuto regulatório do Estado de Washington estipulava que as

companhias de eletricidade poderiam obter um bônus de 2% na taxa de retorno de seus

investimentos em conservação. Nesta época, também, o Estado da Califórnia implementou o

Electric Revenue Adjustment Mechanism - ERAM, que permitiu um desacoplamento entre

vendas de energia e receitas para a companhia. A idéia básica do ERAM era razoavelmente

simples: a companhia deveria manter somente a receita previamente acordada advinda da

tarifa básica autorizada pelo órgão regulador. Qualquer rendimento em excesso ou a menos,

em um dado ano, era colocado em uma conta separada. Esse balanço contábil, que inclui

juros, é “zerado” a cada ano usando uma taxa adicional (que pode ser positiva ou negativa) a

ser incluída nas tarifas do ano seguinte. Outro tipo de enfoque, ainda, foi dado pela comissão

de regulação de Wisconsin em meados da década de 80, através de uma determinação que

uma companhia local iniciasse um programa de financiamento a juros baixos para que seus

Page 48: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

34

consumidores investissem em medidas de eficiência energética, em lugar de autorizar novos

investimentos na ampliação de uma de suas usinas.

Como resultado, aproximadamente um terço das companhias de eletricidade dos EUA

realizaram programas de GLD nos últimos quinze anos. Essa tradição de incentivos

regulatórios possibilitou a prática do GLD permitindo que as companhias pudessem recuperar

seus custos e lucrar com investimentos em eficiência energética. Entretanto, já a partir de

meados da década de 90, com a introdução das reformas, esse quadro passa a mudar

drasticamente.

Tipos de programas de eficiência energética

No contexto deste trabalho chama-se programa de conservação de energia, ou

programa de eficiência energética a três diferentes tipos de atividades:

Programas de GLD para promover substituição de combustíveis

São programas destinados a reduzir a demanda de energia em períodos de pico, ou

tornar certos usos cativos. Exemplos: sistemas de ventilação e ar condicionado, aquecimento

de água e bombas de calor, transporte elétrico

Programas de administração de carga

Modulação da carga sem necessariamente reduzir o consumo de energia. Exemplos:

tarifas horosazonal, aquecedores de água com reservatórios de armazenagem, sistemas de

aquecimento abastecidos por dois tipos de combustíveis (ou eletricidade-gás), sistemas de ar-

condicionado com armazenamento de gelo.

Programas de eficiência energética

São programas destinados a reduzir a quantidade de eletricidade consumida.

Exemplos: auditorias energéticas, condicionamento climático de edifícios, informação ao

consumidor, melhoria de processos, mudanças de tecnologias.

As implicações das reformas para a eficiência energética

Nesta seção analisam-se os efeitos potenciais do tipo de reforma experimentada pelos

EUA, para a eficiência energética tendo como base o estudo realizado para a USAID/Office of

Page 49: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

35

Energy (Hagler Baily 1998b) que discute os impactos das reformas no setor elétrico em seis

países, entre eles os EUA.

Como foi visto no capítulo anterior, as mudanças verificadas nos EUA são classificadas

de des-verticalização e competição. Em um primeiro momento estas mudanças são

desfavoráveis para a eficiência energética, como se apresenta abaixo.

Efeitos da des-verticalização

Com a des-verticalização cada segmento da indústria (geração, transmissão,

distribuição) é responsável pela contabilidade e formação de preços relativos à sua atividade.

Desse modo, o efeito de preços como instrumento para introdução de maior eficiência

energética no mercado de consumo dependerá de como os custos de fornecimento de energia

serão repassados nessa cadeia da indústria de energia. Nessa estrutura os investimentos em

geração e transmissão não são mais controlados pela distribuição. O consumidor final somente

receberá os sinais de preços corretos se sua tarifa refletir adequadamente os investimentos

que, na verdade, são feitos ao longo de toda a cadeia da indústria. Por exemplo, o distribuidor

de energia poderá repassar certos custos que dependem da demanda horária, como custos

fixos (ampliação de sua capacidade de distribuição). Porém, na medida em que custos que

poderiam auxiliar na modulação da carga do consumidor são absorvidas como custos fixos,

diminui seu interesse em conservação e as oportunidades para muitas das atividades

desenvolvidas pelas ESCOs.

Quando as companhias eram verticalmente integradas elas podiam tirar proveito dos

programas de GLD uma vez que não só eram inteiramente responsáveis pelo suprimento como

também possuíam detalhado conhecimento do padrão de demanda de seus consumidores

finais, um aspecto fundamental para se realizar programas de GLD. As economias de energia

conseguidas junto aos seus consumidores podiam ser integralmente capturadas pela

companhia.

Com as reformas, os distribuidores finais de energia, que são os únicos a terem

informações detalhadas do mercado consumidor, podem estar fortemente desmotivados para

realizar programas de GLD. Isso porque além de perderem receitas reduzindo as vendas de

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kWh, é possível também que eles não usufruam integralmente dos benefícios que poderão

estar ocorrendo à jusante (na geração ou transmissão). Uma vez que os demais distribuidores

competidores que também estão comprando energia de um mesmo fornecedor (ou de um

power pool) compartilharão dos benefícios sem ter realizado nenhum investimento em GLD.

Essa situação pode caracterizar uma desvantagem competitiva da companhia que fez

investimentos em programas de GLD, e mesmo que isso tenha reflexos positivos diminuindo

custos da companhia geradora, esses benefícios são passados também para seus

competidores.

A Tabela 5 mostra as implicações da des-verticalização para a eficiência energética

para cada segmento da cadeia de produção e consumo de eletricidade.

Tabela 5: Implicações da des-verticalização para a eficiência energética

Agente Efeito provável da reforma Valor

Companhias de geração etransmissão

Companhia de distribuição- atacado

Companhias de distribuição- varejo

Todos (geração,transmissão e distribuição)

Nenhum contato com os consumidores para poder implementarprogramas de GLD

Poderá não receber os incentivos por reduzir os requerimentosde geração e transmissão através de seus investimentos emeficiência energética

Tem interesse em não diminuir as vendas de energia

Os incentivos para implementar GLD dependem de como oscustos variáveis são repassados entre os agentes

_

_

_

-/+

Consumidor Depende de como os custos à jusante serão repassados à suaconta de energia. Depende de sua percepção sobre a evoluçãodos custos futuros de energia com a competição.

-/+

ESCOs Depende de como os custos à jusante serão repassados aosconsumidores. Idem acima.

-/+

Governo/ Órgão regulador Tem o papel de estabelecer regras para preços e fornecimentode energia e pode (ou não) oferecer incentivos para iniciativas deeficiência energética para as companhias de energia econsumidores.

-/+

Efeito líquido da reforma -/+

Fonte: Hagler&Baily 1998b (modificado pelo autor).

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37

Efeitos da competição

A maior competição entre as companhias de energia introduzida pelas reformas tanto

para a geração como para o segmento de vendas de energia (distribuição/comercialização)

junto aos usuários finais tampouco incentiva necessariamente o surgimento de esforços para o

uso eficiente de energia.

A competição entre os produtores de energia especialmente em um mercado spot faz

com que se priorize a formação de preços baseados em custos de curto prazo de energia, ou

seja, são considerados basicamente os custos operacionais, e não os seus custos marginais

de longo prazo. Custos de longo prazo levam em conta futuros investimentos em produção e

distribuição de energia de se produzir energia.

Os consumidores, que também são responsáveis por investimentos em eficiência

energética, farão suas considerações de acordo com um horizonte de tempo (em geral

bastante curto) e ponderarão se os custos anuais com a conservação de energia serão mais

atrativos que os custos com energia elétrica. Se apenas os custos de energia de curto prazo

são repassados para eles, não existe incentivo para se realizar novos investimentos em

conservação, pois não se tem nenhuma sinalização quanto aos futuros preços de energia.

Ainda, se o usuário final pode optar entre diferentes companhias, é provável que exista maior

relutância de uma companhia realizar investimentos junto ao seu usuário final, uma vez que

existe o risco dele migrar para outro fornecedor. No entanto, programas de eficiência

financiados pelas companhias distribuidoras poderão progredir, por exemplo, se houver um

interesse e a percepção de que este tipo de serviço poderá auxiliar em melhoria de sua

imagem e consequentemente fazer parte de sua estratégia de manter o consumidor.

A competição entre as firmas encarregadas da comercialização de energia junto ao

usuário final é também negativa para o uso eficiente de energia. Isso acontece porque seu

interesse será o de vender cada vez mais energia até o ponto onde o custo marginal pago aos

fornecedores se iguala ao incremento marginal de sua receita.

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Quando o gerador vende sua energia diretamente a consumidores (situação chamada

de Direct Access ou Retail Wheeling) pode haver interesse em se promover maior eficiência no

uso de energia nos seguintes casos:

• O produtor está interessado em maximizar o fator de capacidade de sua usina e poderá,

portanto promover incentivos para GLD junto aos seus consumidores.

• A utilização da rede de distribuição poderá implicar em taxas adicionais para o produtor que

podem variar segundo horários do dia/épocas do ano. Se essas taxas são repassadas para o

consumidor haverá incentivos para que ele se engaje em programas de GLD juntamente com

o gerador e distribuidor para atingir benefícios, ou seja, diminuindo os custos de energia para

o consumidor, e também evitando novos investimentos na infra-estrutura de distribuição.

• O gerador poderá promover a conservação de energia em alguns de seus consumidores e

vendê-la para outros. Isso seria uma estratégia interessante sempre quando o custo da

energia conservada for menor que seus custos de geração e os preços dos demais

competidores.

• Quando o gerador/distribuidor de energia possui a obrigação de atender consumidores que

não lhe rendem lucros, é interessante diminuir as vendas de kWh através de melhorias em

eficiência energética, sempre que esses investimentos sejam menores que os custos de

fornecimento de energia.

A competição no varejo pode afetar os incentivos dos consumidores em investimentos

em eficiência energética em diferentes maneiras:

• A competição poderá de fato diminuir os preços finais de energia, o que não encoraja

investimentos em novas medidas cujo custo/kWh conservado seja maior.

• O consumidor terá uma alternativa adicional para controlar seus custos com energia, além

daquelas que tradicionalmente considerava antes das reformas. Agora ele poderá também

escolher entre diferentes companhias aquelas com menores preços de energia.

Page 53: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

39

• A maneira como se estabelece a competição poderá afetar o financiamento dos programas

de GLD. Por exemplo, uma companhia pode repassar os custos desses programas para

seus consumidores cativos e beneficiar aqueles outros pelos quais ela necessita competir.

Essa é uma situação de competição parcial onde grandes consumidores podem escolher seu

fornecedor, mas os demais ficam sob uma área de serviço designada para uma companhia.

• Poderão surgir nova atividades para ESCOs que passariam a vender serviços de compra de

energia, além daqueles relacionados com a otimização da demanda para os grandes

consumidores (não-cativos).

• A competição dificulta a atuação de uma série de agentes relacionados com o setor de

consumo de energia, como fabricantes de equipamentos, comerciantes, construtores,

arquitetos, e outros técnicos, que tradicionalmente participavam de iniciativas de eficiência

energética e de transformação de mercado. Além disso, tradicionalmente essas medidas só

fazem sentido quando dirigidas a uma determinada região geográfica ou segmento de

consumidores. A indústria de eletricidade competitiva não terá interesse em realizar

investimentos e promover transformação de mercado em uma região ou classe de

consumidores que não são cativos.

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Tabela 6: Implicações da competição para a eficiência energética

Agente Efeito provável da reforma Valor

Companhias degeração etransmissão

Companhias dedistribuição

Todos (geração,transmissão edistribuição)

A competição baseada em preços spot incentiva amaximizar a produção de usinas com menores custosoperacionais

Poderá fazer parte de sua estratégia para manterconsumidores oferecendo serviços de conservação deenergia

Programas que aumentem custos para a companhia outarifas para os consumidores, ou comprometam a receitacom vendas de energia serão evitados

_

+

_

Consumidor A competição poderá aumentar a incerteza com relação apreços futuros de energia, que poderão inclusive baixar,não incentivando investimentos em maior eficiênciaenergética

_

ESCOs Perspectivas de preços mais baixos dificultarão a criaçãode um mercado para atuar

_

Governo/O.regulador

Poderá desempenhar maiores atividades para suprir ainexistência de interesse privado para realizar programasde transformação de mercado.

+

Efeito líquido da reforma _

Fonte: Hagler&Baily 1998b.

A eficiência energética e o mercado

Quando se passa a retirar os incentivos e regulamentos que estimulavam e, muitas

vezes obrigavam, as companhias a realizarem esforços para implementar medidas de

eficiência energética, assume-se que o mercado será responsável por isso. Mas será o

mercado capaz de conduzir os investimentos dos vários agentes da sociedade na direção de

padrões de consumo e uso de tecnologias mais eficientes?

A discussão em um primeiro momento das reformas se resume na decisão de se

promover ou não intervenção do poder público para possibilitar o progresso das medidas de

conservação no mercado de energia. Eto & Golove (1996) fazem uma revisão sobre as

posições prevalecentes nos EUA e resumem a questão do seguinte modo:

Page 55: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

41

Os proponentes de maior intervenção do governo acreditam que barreiras significantes

impedem que níveis socialmente desejáveis de investimentos em eficiência energética sejam atingidos.

Eles sustentam que é pouco provável que qualquer que seja a estrutura de mercado para a indústria

de eletricidade melhore substancialmente essas “barreiras” para eficiência energética. Essa posição é

usada para justificar uma contínua intervenção do governo em mercados de energia para corrigir as

distorções inerentes à alocação de recursos nesse setor.

Os proponentes de menor (ou nenhuma intervenção para promover eficiência energética

argumentam que, dada a libertada para operar em uma maneira menos regulada, o mercado

alcançará eficiências ainda não conseguidas pela indústria de eletricidade. Eles opinam que as várias

imperfeições ou falhas que possam persistir nó funcionamento do mercado ou são ilusórias ou de

pequena importância, ou mesmo que devem ser melhor resolvidas por agentes privados atuando de

maneira a preservar seus interesses, e não através da intervenção governamental.

Como foi visto anteriormente a tradição de incentivos regulatórios nos EUA foi rompida

com a introdução das reformas e houve uma discussão para se determinar se o mercado

viabilizaria a introdução contínua de medidas e tecnologias de uso mais eficiente. A polêmica

entre os dois pontos de vista mencionados acima ainda persiste.

Nas seções seguintes apresentamos três conceitos relacionados entre si e que

aparecem freqüentemente na discussões acerca da necessidade de regulação para manter

investimentos em eficiência energética: o “energy-efficiency gap”, barreiras e falhas de

mercado.

O “energy efficiency gap”

Existe uma abundante literatura (v. por ex. Reddy, 1991; Howarth & Andersson, 1993)

que discute as barreiras para a introdução de medidas e tecnologias eficientes no mercado. Em

geral, percebe-se que existem muitas ações e tecnologias que poderiam ser utilizadas mas não

o são. Define-se (v. por exemplo. Gunn, 1997) “energy efficiency gap” como sendo a diferença

entre o nível atual de demanda de energia, e aquele que seria obtido com a introdução de

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tecnologias mais eficientes, ou seja, refere-se a diferença entre os níveis de investimento em

eficiência energética que são economicamente justificáveis do ponto de vista técnico e

econômico mas que não prática não ocorrem. Graficamente esse gap é representado por uma

curva chamada de supply curve of conserved energy ou curva de suprimento de energia

conservada. Esse conceito tem sido muito usado por aqueles que advogam maior intervenção

no mercado de energia.

Figura 2: Exemplo do “Energy Efficiency Gap”

A Figura 2 apresenta esquematicamente a evolução da demanda de energia com e

sem uma deliberada intervenção para acelerar a adoção de tecnologias e medidas de

eficiência, sendo a diferença entre as curvas o chamado energy efficiency gap. A Figura 3 é um

exemplo da chamada curva de suprimento de energia conservada que apresenta os potenciais

de energia conservada de acordo com determinadas tecnologias ou medidas e seus

respectivos custos7

7 Para maiores informações de como construir curvas de suprimento de energia conservada,

consultar Jannuzzi & Swisher, 1997, cap. 3 e 4. V. também Koomey et al. 1991, Rosenfeld, et.Al., 1993.

GWh

Ano 0 Ano N

Sem conservação

Com conservação

EnergyEfficiencyGap

EVOLUÇÃO DA DEMANDA DE ENERGIA

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Expansão do Setor

Conservação 1

Conservação 3

Conservação 2

CM

cce2

cce1

cce4

D1 D3D2

Demanda de Energia GWh

$ / kWh

Figura 3: Exemplo de Curva de suprimento de Energia Conservada

Notas: CCEi= custo de conservar energia através da medida i; CM= custo marginal da expansão

Esse tipo de análise foi desenvolvido por técnicos interessados em verificar o potencial

e os custos envolvidos com adoção de medidas e tecnologias mais eficientes (Rosenfeld et al,

1993, por ex.). Estas são informações básicas para estudos no âmbito do PIR.

Existem questões técnicas importantes por detrás dessas curvas que influenciam os

resultados e sua interpretação. A taxa de desconto, por exemplo, utilizada para se calcular os

custos de energia conservada é freqüentemente comparável com aquela taxa utilizada pelos

consumidores para outros investimentos. Na perspectiva social, taxas de desconto poderiam

ser menores, favorecendo o potencial econômico das tecnologias e medidas consideradas.

Portanto, curvas desse tipo elaboradas por diferentes agentes (consumidores, agências

públicas, companhias de energia, etc.) irão indicar diferentes potenciais economicamente

atrativos para investimentos em eficiência energética. No capítulo 8 voltaremos a essa questão

procurando destacar o papel do agente público.

Page 58: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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A literatura mostra também que existe uma diferença fundamental entre os analistas de

origem técnica e os economistas nesse tipo de estudo. Os técnicos tendem a assumir taxas de

desconto relativamente menores e desconsideram grandes incertezas futuras com relação a

preços de energia e vida útil de equipamentos8. A natureza do investimento em eficiência

energética é diferente daquela em outros tipos onde pode existir maior liquidez. Assim vejamos,

o investidor em eficiência energética precisa considerar a vida útil real do equipamento e não

pode mudar seus hábitos de utilização durante esse período, com o risco de afetar a

rentabilidade de seu investimento. Os economistas analisam os investimentos em função de

taxas de mercado.

Outros analistas ainda consideram variáveis “não econômicas” como determinantes

para a decisão de investimentos do consumidor final. Os trabalhos de Stern (1986) e Stern &

Aronson (1984) abordam a questão de valores comportamentais e suas implicações na

determinação de decisões com relação ao uso de energia. Existe evidência empírica que tanto

os economistas como os tecnologistas tem simplificado demais as descrições de serviços de

energia: caso do ar condicionado- existem outros parâmetros, como ruído, que podem afetar a

decisão e operação do consumidor. Consumidores podem deixar luzes acesas por questão de

segurança e não para satisfazer as necessidades de iluminação. Essas considerações são

importantes porque elas podem ser mais determinantes que os aspectos econômicos ou

estritamente técnicos relacionados ao uso eficiente de energia.

Embora o potencial existente para representar esse energy efficiency gap seja passível

de discussão, pode-se reconhecer que muitas vezes oportunidades de eficiência energética

não são aproveitadas pelo consumidor, seja por falta de informação, seja por considerações

econômicas ou outras.

A seção a seguir discute algumas das barreiras que podem explicar a existência desse

gap e justificar uma intervenção no mercado de energia.

8 A vida útil de um equipamento é fortemente afetada por condições incorretas de seu uso ou

qualidade de energia, conferindo grandes incertezas nos cálculos de custo e benefícios.

Page 59: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

45

Barreiras, falhas e intervenção no mercado de energia

As barreiras e falhas de mercado se referem a diversas características que impedem

que investimentos em eficiência energética se realizem de maneira ótima, seja do ponto de

vista privado ou social. Vários autores têm analisado essas dificuldades para a disseminação

de medidas de eficiência energética (v. por ex. Reddy, 1991; Lutzenhiser, 1993, Jannuzzi &

Swisher 1997, Levine et al. 1994).

Preços são necessários mas não parecem ser suficientes para estabelecer um

equilíbrio entre oferta e demanda. A existência de um efficiency gap, conforme visto na seção

anterior, em relação a investimentos em tecnologias eficientes que são “econômicas” é um

exemplo nessa direção. A literatura identifica um número grande de barreiras de mercado para

a introdução de eficiência energética. No entanto, alguns tem feito a distinção que apenas

algumas barreiras são realmente falhas (ou defeitos) de mercado (imperfeições de mercado).

Fazemos aqui a seguinte distinção entre barreira e falhas de mercado: a) barreiras: podem ser

removidas através de políticas energéticas adequadas que orientam a tomada de decisão dos

agentes privados na direção considerada ótima do ponto de vista social (por exemplo, para

remover o desincentivo que as empresas de energia encontravam em financiar programas de

conservação de energia, a comissão de energia do estado da Califórnia elaborou o ERAM9); b)

falhas de mercado: exigem uma intervenção direta do setor público (um exemplo típico é o

financiamento de pesquisas de alto risco e longo prazo de maturação, cujos resultados não

podem ser apropriados por um único agente).

Imperfeições ou falhas de mercado tem sido usados como justificativa para intervenção

governamental em mercados específicos. Um mercado competitivo assume que os custos de

transação entre firmas e indivíduos é zero, o que não é verdade no caso da energia. Custos

transacionais incluem: custos de busca de informação, os custos de se realizar barganhas e

decisão sobre investimentos, monitoramento e verificação de contratos ou regras. Existem

custos de transação apreciáveis para se adquirir ou ter acesso a informação sobre tecnologias

de energia, escolha de regime de tarifas mais apropriados para um padrão de demanda do

consumidor, por exemplo.

Page 60: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

46

A Figura 4 mostra de uma maneira esquemática o papel das políticas públicas para

melhor explorar o potencial de eficiência energética. Conforme dito antes, diferentes agentes

terão diferentes percepções sobre as vantagens de investimentos em eficiência. Nessa figura

estão representados dois agentes: as concessionárias de energia e a sociedade. Uma das

explicações do potencial de eficiência energética avaliado pela sociedade ser maior que aquele

das concessionárias está relacionado com o fato das taxas de desconto sociais serem menores

que aquelas utilizadas por investidores privados (as concessionárias). Na verdade, o objetivo

de uma boa política pública para eficiência energética é maximizar as o potencial realizado de

economias de energia fazendo melhor uso dos recursos existentes, tanto públicos como

privados. É possível remover barreiras para que investidores privados (as concessionárias, no

caso) se interessem em investir em eficiência energética e deixar que o próprio mercado os

guiem para tomar suas decisões. No entanto, é provável que muitas opções de investimentos

desejáveis do ponto de vista da sociedade podem não ser contempladas pelo mercado. Desse

modo serão necessários que recursos públicos sejam utilizados e uma ação direta do setor

público na promoção de algumas dessas iniciativas. No Capítulo 8 discutimos esse tipo de

questão para o caso brasileiro através da regulação que estabelece a aplicação de recursos

das concessionárias em programas de eficiência energética e pesquisa e desenvolvimento.

9 Vide Os programas de eficiência energética antes das reformas, pág. 32

Page 61: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

47

A Exploração do Potencial

sociedade concessionárias

Políticas públicas podemestimular maioresinvestimentos privados emEE (Remoção de barreirasde mercado)

Ações determinadaspelo mercadocompetitivo efinanciados pelaspróprias companhias

Investimentos com recursosregulados (públicos)

Ações que requeremfinanciamento público“Falhas de Mercado”

Limite consideradosatisfatório/econo-micamente viável paraa sociedade

Objetivo de políticas públicas:maximizar ações com usomínimo de recursos $

Figura 4: O papel de políticas públicas para explorar o potencial de eficiência energética

Nota: EE = eficiência energética.

As diferenças de opinião com relação à necessidade de intervenção pública não estão

baseadas na disputa sobre a existência de barreiras de mercado, mas de diferentes

percepções com relação à magnitude dessas barreiras, e principalmente com relação à eficácia

e conseqüências de políticas elaboradas para superar as barreiras (Golove & Eto, 1996).

As mudanças das atividades em eficiência energética nos EUA

Atividades comerciais

Em várias partes dos EUA muitos serviços antes gratuitos para o consumidor agora

começam a ser cobrados dentro do novo contexto do setor. Mesmo assim existe a necessidade

de ações mais abrangentes que só podem ser levadas a cabo com a participação do poder

público. No Capítulo 7 serão discutidas as ações mais importantes que estão sendo conduzidas

pelo setor público.

Page 62: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

48

Smith,(1997) apresenta uma relação de mecanismos que estão sendo utilizados

comercialmente pelas companhias de eletricidade:

Informação (usando Internet)

Várias companhias estão investindo em serviços via internet para orientar os

consumidores a controlarem seus gastos com energia.

Venda de serviços para melhoria de uso final de energia.

Companhias de energia oferecem serviços para treinar consumidores para operarem

equipamentos elétricos, principalmente para o setor comercial e industrial, mas também para o

residencial. São serviços pagos e algumas companhias estão oferecendo pacotes que incluem

outros serviços como telecomunicações e segurança eletrônica..

Sistemas de tarifação e medição

Consumidores podem requisitar medições individualizadas em equipamentos por

tempo determinado, para estudar as tarifas mais convenientes. Antes esse tipo de assistência

era gratuito, mas agora está sendo cobrado pela maioria das companhias.

Fornecimento de equipamentos e serviços de manutenção

Algumas companhias fornecem equipamentos e incluem serviço de manutenção

através de contratos de leasing.

Contratos de economias compartilhadas

A companhia realiza contratos com grandes companhias comerciais e industriais para

fazer leasing de equipamentos. A companhia instala os equipamentos e compartilha as

economias com o consumidor, no estilo das ESCOS.

Chauffage programs

A companhia instala o equipamento e vende para o consumidor o produto, por exemplo

água fria ou quente/gelo.

Além desses exemplos de serviços comercializados pelas companhias de eletricidade

nos EUA, Nilsson (1998) reporta o caso do também sofisticado mercado de eletricidade da

Suécia, também experimentando os efeitos da reestruturação. As reformas no mercado de

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49

eletricidade naquele país tem forçado que as companhias se preocupem em atender

demandas específicas dos consumidores. Embora existe maior competição com preços,

eficiência energética e outros serviços são importantes componentes paro o mix de produtos

em todas as empresas de eletricidade da Suécia.. Na área de eficiência energética, o foco tem

sido até agora em medidas de baixo custo e rápido retorno. Se as medidas de eficiência de

maior tempo de maturação serão realizadas isto ainda é incerto.

Atividades para o setor público

Eto, Golove & Kito (1996) listam uma série de argumentos a favor da participação do

setor público na implementação de programas de eficiência energética. A Tabela 7 apresenta

as diferentes características que os programas públicos (ou financiados pelos próprios

consumidores) podem ter e seus efeitos no mercado.

A necessidade da participação do setor público em atividades para promover o uso

eficiente de energia já é aceita em muitas regiões dos EUA e aparece, por exemplo em

resoluções do órgão regulador da Califórnia.

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Tabela 7: Efeitos de alguns tipos de programas de eficiência energética promovidospelo setor público

Tipo de atividade ou programa Impactoseconômicos

Proteçãoambiental

Superação defalhas demercado

Preservar eestimularESCOs

Informação/educação/auditorias

Baixo Baixo Médio Baixo

Incentivos financeiros (rebates) Alto Alto Baixo Médio

Normas, padrões de eficiênciaenergética

Curto prazo:baixo

Longo prazo:alto

Médio Alto Baixo

Programas de transformaçãode mercado

Curto prazo:baixo

Longo prazo:alto

Depende doprograma

Alto Altoinicialmente

DSM bidding/standard offer(a) Médio Médio Médio Alto

Avaliação dos programas(medidas)

TRC teste Economias deenergia,

redução deemissões

Verificação daredução de

imperfeições demercado

Verificação dacompetitividade

de mercado

Fonte: modificado de Eto, Golove & Kito, 1996. Nota: (a) v. texto.

DSM bidding (licitação de projetos de DSM)e Standard Offer programs se mostraram

importantes para estimular o surgimento de companhias de serviços de energia, em particular

as ESCOs. Em um DSM bidding program uma companhia de eletricidade lança um Request for

Proposals oferecendo um contrato de longo prazo com uma ESCO ou possivelmente com

grandes consumidores para que ocorra uma redução de consumo e demanda a um

determinado valor de custo. Em um programa Standard Offer a companhia estabelece um

padrão e condições (incluindo preço) que são disponíveis para interessados até que se

complete a meta desejada. As comissões de regulação no passado tiveram um papel

importante colocando requerimentos que induziram as companhias a realizar licitação de

“negawatts” através de programas de eficiência ou quantias de energia renovável através de

Standard Offers.

Page 65: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

51

No passado os objetivos dos programas de eficiência energética foram articulados

pelas companhias e reguladores no contexto do PIR ou do planejamento de atividades de

DSM. Tipicamente o mix de investimentos em novos empreendimentos energéticos e

programas de GLD representava um equilíbrio nem sempre muito explícito entre diversos

objetivos (least-cost resource plans10, metas ambientais, impactos nas tarifas e serviços aos

consumidores). Daqui para frente esses objetivos deverão ser mais claros para evidenciar a

repartição dos custos e benefícios entre consumidores, empresas de energia e o setor público.

Será necessário distinguir quais ações na área de eficiência energética necessitarão de fundos

coletados publicamente e interferência do setor público, e quais o próprio mercado será capaz

de promover.

10 Planos de expansão da geração, transmissão ou distribuição a custos mínimos para o setor

elétrico.

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CAPÍTULO 4: FONTES RENOVÁVEIS E MEIO AMBIENTE

A demanda de bens públicos em um mercado

competitivo

Introdução

O desenvolvimento de fontes renováveis e sua maior participação na estrutura de

produção de energia, juntamente com medidas de proteção ambiental são outros dois dos

chamados “bens públicos” assim entendidos pelos reguladores e analistas americanos

conforme foi visto no capítulo 1. Neste capítulo serão analisados alguns dos procedimentos

que estão sendo adotados para a manutenção desses bens em um ambiente de maior

competição e menor interferência governamental no mercado.

Fontes renováveis estão em desvantagem em um ambiente de maior competição para

produção de eletricidade onde o tempo de retorno de investimentos privados é menor e essas

tecnologias são mais capital intensivas. Além disso, possuem características particulares, como

a intermitência de algumas fontes que dificulta o planejamento de seu despacho.

A literatura sobre o assunto nos EUA mostra também um intenso debate sobre a

necessidade ou não de se utilizar recursos públicos e até que ponto é necessária uma

intervenção no mercado para viabilizar as alternativas de geração baseadas em fontes

renováveis. No caso da proteção ambiental veremos que a situação é um pouco diferente.

As fontes renováveis

Introdução

O principal mecanismo de apoio a projetos de energia renovável nos EUA foi

implantado em 1978, chamado de PURPA (Public Utilities Regulatory Policy Act) que

estabeleceu que as companhias de eletricidade deveriam comprar energia de origem renovável

ou de co-geradores quando seus preços fossem menores que os custos evitados das

companhias elétricas. A aplicação desse mecanismo adicionou vários megawatts de

capacidade instalada de energia produzida a partir de fontes renováveis, especialmente em

Page 67: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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estados como a Califórnia e Maine. No entanto, com a queda dos preços de energia fóssil nos

anos seguintes ficou comprometido o progresso das fontes renováveis através desse

mecanismo.

Com as reformas iniciou-se a discussão sobre o papel que subsídios públicos deveriam

ter para apoiar os produtores de eletricidade a partir de fontes renováveis e como isso poderia

também introduzir um viés favorecendo alguns em um mercado competitivo de energia.

As fontes renováveis são representadas por uma diversificada coleção de tecnologias,

cada uma tendo características e custos diferentes para a produção de eletricidade. Algumas

estão em processo de desenvolvimento técnico e são menos competitivas que outras: a solar,

por exemplo, é mais cara que a eólica e a geotérmica. Além disso, nem todas possuem os

mesmos benefícios econômicos, sociais e ambientais. A utilização de biomassa envolve uma

classe de produtores bem diferente daquela que explora recursos hidroelétricos ou

geotérmicos, por exemplo. Os impactos ambientais desses empreendimentos, embora bem

menores quando comparados com as fontes convencionais (geração fóssil, ou grandes

hidroelétrica) são também bem diversos e muitas vezes podem ser significativos.

A experiência com programas de energia renovável nas companhias americanas

iniciou em 1993 no Colorado, Califórnia e Flórida e em 1997 cerca de 20 companhias já

possuíam programas baseados em green marketing11 (Wiser, R. & S. Pickle. 1997). Os

programas tem sido estruturados em basicamente três maneiras:

1) Compra de energia renovável ou Green Marketing: programas que oferecem a opção de

compra de energia renovável com uma taxa adicional ou com preços mais elevados. Esses

programas de energia renovável tem sido também implementados aproveitando a nova

estrutura de maior competição do lado da demanda, onde algumas companhias tentam agora

se diferenciar oferecendo um novo produto para seu consumidor: green energy;

11 Green marketing é um mecanismo de mercado que possibilita aos produtores e distribuidores

que comercializam eletricidade divulgar através de propaganda uma diferenciação de seuproduto. Ele basicamente se utiliza dos resultados de pesquisa de opinião junto asoconsumidores que têm demonstrado nos EUA um interesse em pagar mais por energia deorigem renovável.

Page 68: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

54

2) Doação: oferece a possibilidade dos consumidores fazerem doações cujo fundo é revertido

para o apoio a projetos de energia renovável;

3) instalação de equipamentos de energia renovável junto a consumidores: a companhia

oferece contratos de leasing ou compra de equipamentos para serem instalados junto aos

consumidores. Esses programas tem principalmente envolvido a instalação de painéis

fotovoltaicos.

A seguir é analisada a experiência da Califórnia em incorporar maior proteção às fontes

renováveis.

Energia Renovável na Califórnia

A Califórnia é uma líder no movimento de reestruturação dos EUA e historicamente tem

sido a pioneira no tratamento do uso de fontes renováveis em sua matriz energética. Sua

política energética para renováveis tem seguido três enfoques principais dentro do contexto

das reformas para o setor:

(1) resoluções mandatórias para compra de energia renovável (Mandate Renewables Purchase

Requirements – MRPR),

(2) programas financiados através de fundos coletados de consumidores de energia (programas

públicos); e

(3) compras voluntárias de energia renovável através de “green marketing”.

Esses mecanismos começaram a ser discutidos desde o início da reestruturação em

1994, quando a CPUC orientou o green marketing como sendo o principal meio de suporte

para as fontes renováveis. Esse tipo de resolução era apoiada por uma constatação que se

tinha na época de haveria consumidores dispostos a comprar energia de fontes renováveis,

mesmo se elas custassem mais que as alternativas convencionais. Era portanto um

mecanismo de mercado coerente com as reformas em curso e o tamanho desse mercado seria

determinado pela própria sociedade. Houve, no entanto, uma forte reação das entidades

ambientalistas e organizações ligadas a tecnologias renováveis, que criticaram essa política,

argumentando que green marketing não seria capaz de corrigir imperfeições de mercado,

especialmente com referência aos maiores benefícios ambientais que as fontes renováveis

Page 69: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

55

podem trazer. Além disso, não se sabia ao certo qual seria a dimensão desse mercado “verde”

voluntário e se ele seria adequado para sustentar uma indústria de produção de eletricidade

baseada em fontes renováveis. Havia pressão dos ativistas ambientais e de setores comerciais

ligados às fontes renováveis para se criar fundos ou mecanismos mandatórios para serem

destinados ao fomento de atividades na área.

Em 1995 a CPUC decidiu colocar em pauta um mecanismo para apoiar energias

renováveis, o Mandate Renewables Purchase Requirements - MRPR, sendo contrária na

época, à idéia de criação de um fundo para financiar fontes renováveis. O MRPR permite que

reguladores/legisladores possam determinar que uma certa percentagem do uso de

eletricidade (ou de sua capacidade instalada) do estado seja produzida a partir de fontes

renováveis. Esse sistema permitiria também a introdução de mecanismos que adicionariam

grande flexibilidade para os produtores e vendedores de eletricidade através de certificados

transacionáveis no mercado, conhecidos como Renewable Energy Credits (REC), permitindo

que esses agentes aderissem aos padrões de produção/venda estipulados. Existiriam 3

possibilidades para que um produtor/vendedor de eletricidade atendessem aos requisitos do

MRPR:

• ele pode ser o proprietário de uma instalação e produzir a quantia determinada pelo MRPR

de energia renovável,

• ele pode comprar RECs de outros produtores/vendedores juntamente com quantias

associadas de energia renovável,

• ele pode comprar somente RECs de outros produtores/vendedores que tenham excedido a

determinação das quotas estipuladas pelo MRPR, sem ter que produzir ou comprar energia

renovável.

Dessa maneira criou-se um mercado de RECs e de energia renovável entre os

produtores e vendedores de energia elétrica. No entanto, mesmo assim seria necessária a

participação do governo através da (a) estipulação da porcentagem de produção (ou de

capacidade) que deveria vir de fontes renováveis, (b) certificação dos RECs e (c)

monitoramento e fiscalização dos requisitos MRPR para validação dos RECs.

Page 70: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

56

Essa solução não agradou a todos. Embora o custo do MRPR seja, em princípio,

determinado pelo mercado, baseado no nível de requisitos de energia renovável e nos custos

dos RECs, havia a percepção de que esse sistema requereria muita burocracia para os

produtores e distribuidores de energia. Havia também dúvidas com relação aos resultados

dessa política, ainda mais se a burocracia envolvida fosse financiada com recursos públicos.

Após vários meses de discussões e negociações o Legislativo da Califórnia resolveu

adotar um outro enfoque de política que favorece a criação de um fundo: o surcharge-funded

production credit. Essa proposta incluiu a implementação de um fundo cujos recursos seriam

distribuídos através de concorrência entre projetos para o desenvolvimento de novos

empreendimentos com fontes renováveis.

Cerca de US$ 540 milhões deverão ser alocados para esse fundo entre 1998 e 2002, e

serão coletados pelas 3 maiores IOU do Estado, através de taxas junto aos seus

consumidores. As outras companhias de eletricidade que operam no estado mas de

propriedade publica também coletarão taxas para programas públicos, mas possuem

flexibilidade para alocar os recursos entre programas de eficiência energética, pesquisa,

desenvolvimento e demonstração, renováveis e programas para consumidores de baixa renda.

Esse fundo foi criado através do decreto AB 1890 e também contém dispositivos para

apoiar “green marketing”. A California Energy Comission (CEC) é responsável pela

administração do fundo que deve ser utilizado com os seguintes objetivos e princípios:

• incentivar ou priorizar as fontes economicamente mais atraentes,

• implementar um processo de certificação de possíveis produtores de energia renovável,

• permitir que consumidores obtenham um rebate com recursos desse fundo se eles

comprarem energia renovável, e

• maximizar o uso dos recursos do fundo através de financiamentos ou outros mecanismos.

Houve muita discussão entre os mecanismos MRPR e surcharge-funded renewable

energy policy. O MRPR era apoiado pelas associações de fabricantes de equipamentos para

energia renovável e produtores de energia renovável, algumas entidades ambientalistas e as

companhias de eletricidade. Já a criação do fundo era apoiado pela maioria das entidades

Page 71: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

57

ambientalistas, power marketers, consumidores industriais, e também algumas companhias de

eletricidade.

O MRPR foi efetivamente abandonado, não só pela sua pouca praticidade segundo os

produtores/vendedores privados, mas também, e talvez principalmente, por ele conferir uma

vantagem adicional para aquelas companhias que possuem uma porcentagem maior de

produção a partir de fontes renováveis. Esse tipo de política feriria um dos princípios da

competição concebido pelas reformas chamado de competitive neutrality.

Tabela 8: A estrutura de produção de Eletricidade na Califórnia (1989-95)

Porcentagem da produção total anual (%)

1989 1991 1993 1995

13.72 9.59 17.19 20.15

14.17 15.34 15.11 14.11

8.26 9.67 9.47 6.99

3.89 0.22 0.86 0.19

33.08 31.29 29.22 30.57

6.39 6.42 6.52 5.57

2.18 3.02 2.38 2.33

0.89 1.10 1.18 1.24

0.19 0.30 0.35 0.31

83.31 76.95 82.27 81.46

7.43 11.89 6.39 7.76

9.78 11.16 11.33 10.78

17.21 23.05 17.72 18.54

100.52 100.00 100.00 100.00

Produção interna

Hidroeletricidade

E. Nuclear

Carvão

Petróleo

Gás Natural

Geotermal

Biomassa (mat. orgânica) (a)

Eólica

Solar

Total

Importação

Pacific Northwest

Southwest

Total

Total(b)

Total geração (TWh) 238.57 242.34 242.03 256.37

Fonte: Comissão de Energia da Califórnia, 1996. Notas: (a) inclui biomassa e resíduos; (b) existem errosde arredondamento.

Page 72: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

58

Tabela 9: Capacidade Instalada dos NGU (GW)

Ano Cogeração Resíduos E. Geotérmica Peq. Hidro. Solar Eólica Total

1980 227 14 0 0 0 173 414

1981 261 14 0 0 0 176 451

1982 412 32 0 48 1 176 669

1983 658 46 9 59 8 227 1.007

1984 893 79 96 67 27 496 1.658

1985 1.444 140 178 107 57 1.015 2.941

1986 1.788 275 188 144 122 1.235 3.752

1987 3.063 396 319 176 155 1.366 5.475

1988 3.662 513 587 229 221 1.378 6.590

1989 4.942 783 806 298 301 1.382 8.512

1990 5.315 878 870 321 381 1.647 9.412

1991 5.838 883 813 330 374 1.698 9.936

1992 5.991 951 845 341 374 1.745 10.247

1993 5.947 1.180 836 253 374 1.756 10.346

Nota: Inclui as vendas de energia e auto-geração. Fonte: Califórnia Energy Commission, EnergyCommission, Electricity Report, Draft Final, June 1995

O mercado de energia renovável (green marketing)

Havia uma expectativa desde o início das reformas de que consumidores,

principalmente de algumas regiões do país, estariam dispostos a pagar a mais por energia

elétrica produzida a partir de fontes renováveis. Haveria, portanto um mercado, chamado de

“mercado verde de energia” (green power market), apontado como uma nova oportunidade

para a disseminação de tecnologias de fontes e principalmente com abertura do mercado para

pequenos consumidores que podem escolher o supridor dos serviços de energia.

Dados mais recentes (Wiser&Pricle, 1998, Oakland Tribune, 1998) dizem que no

momento apenas se registra um modesto interesse por parte de consumidores residenciais

Page 73: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

59

para mudar de companhias de eletricidade, portanto esse potencial será desenvolvido muito

lentamente, ao contrário das indicações iniciais. Estima-se que apenas 1-2 % dos

consumidores residenciais (100-200 mil) que poderão escolher o seu supridor, optarão por

energia renovável. A idéia é que essa porcentagem suba para 4-10% em 2003. As indicações

de pesquisas realizadas (Wiser & Pricle, 1998) entre os diversos consumidores revelam que

75% das vendas de energia renovável advirão de consumidores residenciais, 14% de

consumidores comerciais, 9% da indústria e 3% do governo. A demanda residencial será

dominante.

Até o momento as vendas de energia renovável pouco fizeram para expandir esse tipo

de produção. Na Califórnia, quatro dos cinco distribuidores existentes de energia renovável

apenas revendem a energia das instalações já existentes e pertencentes a empresas públicas,

ou compram energia de outros produtores fora do estado.

O mercado e políticas públicas

É crucial determinar o nível de apoio com fundos públicos que devem ter os programas

de energia renovável. Para se conhecer o ótimo social para gastos com renováveis é

necessário se conhecer os custos de desenvolvimento de renováveis e os benefícios para a

sociedade (meio ambiente, redução de riscos, mais empregos, etc.), mas o fator mais

determinante depende de preferências públicas. Diversas pesquisas de opinião, algumas

conduzidas por associações com interesses na área de energia renovável, como a Sustainable

Energy Coalision, que reúne um grupo de 35 empresas, entidades ambientalistas e

representantes de classes de consumidores, mostram um forte apoio para o desenvolvimento

de energias renováveis e eficiência energética (ENN Daily News, 1999). Algumas regiões dos

EUA parecem ter maior interesse em dedicar fundos públicos para subsidiar a geração de

energia renovável, o mesmo acontece em vários países da Europa também. Existem benefícios

para toda a sociedade que advém da utilização de energia renovável, especialmente com

relação á poluição atmosférica e a produção de gases estufa. É muito pouco provável que a

maximização desses benefícios seja atingida somente com a parcela dos consumidores que

voluntariamente estão dispostos a pagar os preços ainda superiores da energia renovável.

Page 74: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

60

Uma constatação deste fato é que mesmo havendo um nicho de mercado para ser

explorado através de mecanismos convencionais não impediu que fossem realizadas ações ao

nível de políticas públicas, como no caso da Califórnia, para conferir recursos adicionais para o

desenvolvimento das fontes renováveis. Conforme indicam Wiser&Prickle (1998), o próprio

surgimento desse “green power market” é resultado de anos de prévias políticas públicas

através de órgãos não governamentais e agência de regulação. O mercado verde não surgiu

espontaneamente, mas foi fomentado ao longo do tempo em conseqüência de políticas

públicas que tinham o objetivo de estimular o desenvolvimento tecnológico e a utilização de

fontes renováveis.

É relevante mencionar também que como o produto final - a eletricidade - é o mesmo,

seja ele de origem fóssil ou renovável, uma tarefa do green marketing é justamente explicar ao

consumidor as vantagens das fontes renováveis e providenciar uma contabilidade que

demonstre o que ele está efetivamente consumindo.

Existe um programa de certificação liderado por um órgão sem fins lucrativos, com o

objetivo de educar o consumidor e fazer uma definição mais técnica sobre o conteúdo

renovável da eletricidade vendida por cada companhia. Isso é necessário também para conferir

credibilidade e até que ponto os produtos verdes conferem benefícios ambientais de acordo

com a fonte originalmente utilizada para produção de eletricidade.

O meio ambiente

As chamadas externalidades ambientais possuem dificuldades para serem capturadas

através de preços em um mercado de energia que procura ser altamente competitivo, conforme

foi discutido no Capítulo 1 (pág. 4). Dentre os vários impactos ambientais produzidos pelo setor

de eletricidade o problema de poluição atmosférica se destaca, e mais recentemente tem-se

ainda a questão de emissões de gases estufa - principalmente o dióxido de carbono (CO2).

Como muitas vezes os maiores e mais evidentes impactos ambientais ocorrem em locais muito

distantes do consumidor final, existe um dificuldade de transmitir-lhes informação para explicar

as diversas formas de se produzir energia e seus diferentes impactos. O consumidor

freqüentemente só tem a percepção e interesse em ter os serviços de energia (iluminação,

lazer, etc.) que são fornecidos com a mesma qualidade independentemente da origem da

Page 75: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

61

energia elétrica. Para a maioria dos consumidores, exceto a pequena parcela que está disposta

a investir em fontes renováveis e eficiência energética o que realmente vai influenciar sua

escolha de companhias de serviços de eletricidade serão os preços finais. Isso é

particularmente válido para os grandes consumidores industriais e comerciais.

Duas das maneiras onde os efeitos ambientais do setor elétrico podem ser minorados

são através de eficiência energética e maior uso de renováveis. Maior eficiência energética

tanto do lado da demanda como na oferta (melhorando o desempenho das usinas elétricas

existentes, investindo em novas tecnologias de produção e diminuindo as perdas em T&D) são

maneiras de reduzir os problemas ambientais como poluição atmosférica das usinas

termelétricas, por exemplo. A maior utilização de fontes renováveis como solar em substituição

a carvão ou óleo combustível reduz drasticamente as emissões de poluentes. As decisões que

o setor energético pode realizar, seja na escolha de tecnologias para produção, tipo de

combustível, gerenciamento de carga, investimento em eficiência energética e mesmo sua

formação de preços para o consumidor, tem influência causando maiores ou menores impactos

ao meio ambiente.

O estudo feito para o Office of Technology da USAID (Hagler & Baily 1998b) apresenta

uma lista de possíveis efeitos das reformas no desempenho ambiental da indústria de energia

elétrica. Embora alguns impactos sejam positivos, como a possibilidade de entrada de

tecnologias para geração de energia mais eficientes, e principalmente do gás natural em

substituição ao carvão e petróleo, é certamente difícil esperar que a maioria das oportunidades

de introdução de novas tecnologias e medidas de eficiência sejam implementadas sem esforço

adicional (Tabela 10).

A experiência com as reformas implementadas no Reino Unido mostram que são

necessários mecanismos próprios para proteger as iniciativas de conservação de energia e

proteção ambiental em um ambiente de maior competitividade econômica.

Naquele país três iniciativas na área ambiental tiveram lugar: a introdução de uma

regulação ambiental baseado no Environmental Protection Act, que foi aprovado no Parlamento

junto com o processo de privatização. O segundo foi o Non Fossil Fuel Obligation, criado

inicialmente para proteger a indústria nuclear que incluiu o Fossil Fuel Levy, uma taxa sobre

Page 76: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

62

combustíveis fósseis que se destinou a financiar projetos de energia renovável. A terceira

iniciativa foi o Energy Saving Trust (EST), criado para apoiar as iniciativas de conservação de

energia (Brower & Mitchell 1996).

Tabela 10: Sumário das implicações de reformas do setor elétrico no seu desempenho ambiental

Tipo dereforma

Efeitos em tecnologias de geração e eficiênciado lado da oferta

Efeitos para melhoria de eficiência do lado dademanda

Des-verticalização

O acesso a rede de transmissão dosprodutores de energia renovável depende decontratos ⇔⇔

Possibilidade de geração descentralizada ⇔⇔

A busca de lucros no sistema de T&D reduzperdas ⇑⇑

Projetos de geração com energia fóssil sãofavorecidos em contratos de compra ⇓⇓

Incentivos para os consumidores investiremem eficiência depende como os custos sãorefletidos nas tarifas ⇔⇔

Investimentos do distribuidor em eficiênciadepende de como é o tratamento de custos decapacidade, T&D ⇔⇔

Competiçãono atacado

No curto prazo somente fontes de menor custosão despachadas ⇓⇓

Fontes de energia fósseis usando tecnologiaseficientes são favorecidas no curto prazo ⇑⇑

Incentivos para que o consumidor invista emeficiência podem desaparecer se preços deenergia caem ou tornam-se imprevisíveis nofuturo ⇓⇓

Competiçãono varejo

Tecnologias de geração que demandamcapital de baixo custo são favorecidas ⇓⇓

Não existem incentivos para se investir emP&D em tecnologias ambientais ⇓⇓

Incentivos para maximizar vendas deeletricidade ⇓⇓

Consumidor tem menos incentivos parainvestir em eficiência se ele pode mudar paraoutro fornecedor mais barato. ⇓⇓

Serviços de gerenciamento da demandapodem ser oferecidos para diferenciar doscompetidores ⇑⇑

Fonte: Baseado em Hagler Bailly Services 1998. Notas: ⇑⇑ impacto favorável, ⇓⇓ impacto desfavorável, ⇔⇔ depende de suaimplementação.

O Non Fossil Fuel Obligation estabelece que as companhias elétricas devem comprar

uma certa quantia de energia renovável e elas são reembolsadas caso exista algum diferencial

de custos de produção. Esse diferencial é calculado com referência aos preços mensais de

energia oferecidos pelo pool. É importante notar que esse diferencial é passado para os

Page 77: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

63

consumidores através de uma taxa adicional, chamada de Fossil Fuel Levy12. Esse mecanismo

foi responsável por uma significativa e rápida aumento da oferta de energias renováveis

naquele país.

O sistema introduzido no Reino Unido para proteção ambiental num ambiente

competitivo contemplou portanto dois dispositivos: o Non Fossil Fuel Obligation (NFFO) que

obrigava as companhias regionais de eletricidade a comprar uma parcela de sua demanda de

fontes nuclear e renovável e a criação de uma taxa cobrada dos consumidores para criação de

um fundo (Energy Savings Trust).

Tabela 11: Preços de Energia Renovável na Inglaterra durante a privatização (1991-94) (em c/kWh)

Tecnologias Preços Preços

1991 NFFO 1994 NFFO

E. Eólica (>1.6 MW) 17.3 6.8

E. Eólica (<1.6 MW) 8.3

Hidroeletricidade 9.4 7.0

Gás de aterros sanitários 8.9 5.9

Combustão de resíduos 10.3 6.0

Outros sistemas de comb. 9.3 8.0

Biogás (Sewage gas) 9.3 N/A

Média 11.3 6.8

Fonte: C. Mitchell1995 Renewable Energy in the UK available from the Council for theProtection of Rural England citado em Brower & Mitchell 1996

Mecanismos de mercado: a experiência com SO2

Em geral a maioria das medidas relacionadas a proteção ambiental têm as

características de serem do tipo comando e controle e estão relacionadas principalmente com

aspectos de poluição atmosférica. Uma novidade, no entanto, tem sido o caso de emissões de

12 O FFL foi criado em 1989 com o Electricity Act, sendo reformulado em 1998

(http://www.hmso.gov.uk/acts/acts1998/ 1998005.htm), passando a ser chamado do Fossil FuelLevy Act 1998.

Page 78: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

64

SO2. Existe em prática um sistema de permissões de poluição chamado de tradable permits,

que se baseia em um mecanismo de mercado cujo objetivo foi de limitar e controlar as

emissões do setor. Desde 1990 a legislação ambiental americana no âmbito do Clean Air Act

Amendments estabelecia metas anuais para redução de emissões de SO2 e NOx para as

companhias de eletricidade 13. Esse mecanismo introduziu uma maneira onde as companhias

podiam buscar independentemente formas mais baratas de redução e aquelas que

conseguiam superar as metas de redução podiam comercializar o excedente com outras

companhias cujo custo de redução era mais alto. Iniciativas semelhantes, mas bem mais

complexas estão em curso com relação às emissões de CO2 (v. anexo) e iniciaram

formalmente com o Tratado de Quioto.

As avaliações do controle de emissões de SO2 e NOx mostram que as reduções

através do mecanismo proposto avançaram bem depressa (Bohi & Burtraw, 1997) e os preços

associados com a redução foram menores daqueles previstos inicialmente. Esses resultados

positivos são encorajadores e mostram que o mecanismo de tradable permits pode ser uma

alternativa mais flexível que procedimentos de comando e controle, deixando para os agentes

do mercado a busca de soluções de mínimo custo segundos as possibilidades de cada um. No

caso de redução de SO2 em lugar das firmas adotarem uma especificada tecnologia, ou

medida padronizada de redução para atingir as metas estabelecidas elas puderam tirar proveito

das diferentes eficiências e características das unidades existentes com potencial e custos de

redução que variam enormemente entre si.

O papel de agências públicas como o EPA e as comissões de regulação do setor

elétrico estaduais são realizar a avaliação das reduções de emissões e controle da alocação,

uso e transferências dos permits entre os agentes. Foi necessário também a intervenção

pública para se criar um mercado para uma nova commodity : os certificados de redução de

13 As determinações da Lei dispunham de metas de redução de 10 milhões de toneladas de SO2

e de 2 milhões de toneladas de NOx dos níveis de 1980. A partir do ano 2000 o total dasemissões das companhias de eletricidade estriam limitadas a 8,9 milhões por ano e o total dasemissões para as outras indústrias em 5,6 milhões/ano. Esses valores seriam implementadosem duas etapas. Numa primeira fase os proprietários/operadores de 110 unidades listadas nalei são obrigados a reduzir emissões em 3,5 milhões/ano a partir de 1995. Na segunda fase,todas as unidades acima de 25 MW devem obedecer os limites da lei. Para manter asreduções obrigatórias para as instalações existentes são estabelecidos caps (limites) em

Page 79: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

65

SO2 avalizados pelos setor público. O lado positivo é que, embora com alguns problemas, está

havendo de fato uma redução de níveis de poluição através desse mecanismo.

A geração distribuída

A geração distribuída se refere a unidades de produção de eletricidade de tamanho

reduzido localizados ao longo do sistema de distribuição com o objetivo de atender demandas

localizadas (ao nível de sub-estações, por exemplo) durante períodos de pico ou então

postergando a necessidade de novas instalações ou expansão daqueles existentes. As

principais tecnologias de geração distribuída são aquelas relacionadas a sistemas de

cogeração e energia renovável como fotovoltaicos, geração eólica, pequenas centrais

hidrelétricas e uso de biomassa para produção de eletricidade. A localização dessas fontes

próxima a centros de consumo diminuem (ou evitam) os custos necessários para transmissão e

mesmo distribuição para o atendimento de mercados locais.

O uso de tecnologias para geração distribuída oferece problemas técnicos e

operacionais que muitas vezes criam barreiras adicionais à sua disseminação e competição

com as alternativas convencionais de geração. Alguns problemas técnicos relacionados com o

uso de fontes renováveis estão relacionadas com a interface de conexão com o sistema

elétrico14 e problemas de ordem operacional devido a característica de intermitência de muitas

das fontes utilizadas para geração distribuída.

As companhias de eletricidade, por sua vez, devem manter determinados padrões de

desempenho e se proteger contra eventuais perdas de geração, flutuações ou inesperadas

quedas de energia na rede. Por isso, a integração de geração distribuída ao seu sistema

convencional pode significar também uma necessidade de compensar a imprevisibilidade de

curto prazo de alguns tipos de geração distribuída com reservas operacionais adicionais para

manter a integridade do sistema.

toneladas para cada fonte e para as novas instalações que irão emitir quantias adicionais, sãoexigidas medidas mitigadores que neutralizem as emissões (off-set measures).

14 Harmônicos, potência reativa, controle de freqüência e sincronização com a rede principal.

Page 80: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

66

De uma maneira geral, com relação à operação desses sistemas, os principais

problemas para a rede elétrica estão relacionados com:

• Margem de reserva

• Despacho econômico

• Intermitência da produção

Essas características podem impor desvantagens adicionais a sistemas de geração

distribuída em uma situação de competição. No entanto, assegurar maneiras de se incluir

oportunidades de geração distribuída no planejamento dos investimentos das companhias de

eletricidade podem resultar em economias para os consumidores e maior uso de fontes

renováveis.

Page 81: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

67

CAPÍTULO 5: A PESQUISA E DESENVOLVIMENTO

Introdução

O processo de reestruturação nos EUA foi acompanhado por um decréscimo

acentuado de investimentos em pesquisa e desenvolvimento - P&D, em especial pelas

companhias de eletricidade do tipo Investor-owned utilities – IOU. Investimentos totais

realizados no país em P&D tiveram seu pico no final da década de 70 e no início dos anos 80

quando chegaram a representar quase 0,25% do PIB anual, declinando posteriormente

chegando a atingir um valor de apenas 0,05% em 1996 (Dooley 1997). A Figura 4 mostra a

evolução dos gastos em P&D e é possível observar que tanto investimentos públicos como

privados foram reduzidos na década de 90.

Os seis principais programas de P&D existentes nos EUA experimentaram

decréscimos de financiamento público e privado, principalmente a partir de 1995: Esses

programas abrangiam as seguintes áreas: (a) células de combustível (Fuel cells), (b)

gaseificação do carvão, (c) turbinas a gás (advanced gas turbines), (d) energia solar

fotovoltaica, (e) tecnologias de armazenamento de energia elétrica; (f) energia eólica (US.

General Accounting Office, 1996).

Figura 5: Investimentos em P&D na área de Energia nos E.U.A. (1974-80-90-96)

Fonte: (Dooley, 1997). Notas: incluem investimentos em energia fóssil, renováveis e conservação deenergia e energia nuclear.

0

2

4

6

8

10

12

14

74 80 90 96

bilh

ões

de

US

$ (1

995)

setor privado

setor público

Page 82: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

68

Citando dados colhidos pela Comissão Federal de Regulação (Federal Energy

Regulatory Commission), Blumstein et al (1998) mostram que os investimentos anuais em P&D

tiveram uma acentuada queda a partir de 1993, sendo que em 1996 o total investido (US$ 386

milhões) representou apenas 45% daquele correspondente ao ano de 1993. Esse fato não

apenas ocorreu no país como um todo, mas foi especialmente marcante na Califórnia,

tradicional centro inovador de tecnologias e práticas de eficiência energética. Neste estado os

investimentos em P&D diminuíram em mais de 50% após o início do processo de

reestruturação do setor.

A redução em P&D tem diminuído não só nos EUA, mas também em diversos países

da OCDE que passaram a introduzir reformas liberais no setor energético orientadas para a

promoção da competição. Na Holanda, por exemplo investimentos em fontes renováveis

caíram pela metade desde 1992, enquanto que na área nuclear diminuíram em 40% e aqueles

relacionados com energia fóssil mantiveram-se constantes em termos nominais (Friedman,

1998).

Uma maneira de se medir a importância que é dada para a P&D é verificar a

porcentagem investida nessa atividade em relação ao faturamento da indústria. Embora a

NARUC tenha feito uma recomendação no sentido de que as companhias dos EUA

dedicassem pelo menos 1% de suas vendas de eletricidade em P&D, na prática isso não tem

ocorrido. Cerca de apenas 0,3% em média do faturamento com as vendas de eletricidade no

EUA15 foram investidos em P&D em 1994, e esse valor tem diminuído desde então. A Tabela

12 apresenta os níveis de investimento em P&D como percentuais do faturamento do setor de

eletricidade em alguns países industrializados. Deve-se observar que a maior percentagem tem

sido verificada na Holanda onde se situa na faixa de 0,7-0,6%, ou seja, em nenhum desses

países tem sido atingida a marca de 1%.

15 Como referência tem-se que o setor industrial no EUA gasta cerca de 3,1% de seu faturamento

em P&D.

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Tabela 12: Investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento em alguns Países

% das vendas

E.U.A. Média: 0,3%. Existe a recomendação daNARUC para se destinar 1% da receita paraP&D, mas isso raramente tem sido verificado.

Inglaterra 0,3-0,1%

Holanda 0,7-0,6%

Espanha Antes da re-estruturação as companhiaseram obrigadas a investir 0,85% da receitaem P&D. Após a re-estruturação aexpectativa é que esses valores se reduzampara 0,35%

Noruega 0,3%

Fonte: Dooley, 1998.

Pesquisa de interesse público

Blumstein et al (1998) definem pesquisas de interesse público sendo aquelas que não

são adequadamente concebidas e financiadas pelo mercado competitivo, uma vez que alguns

ou todos os benefícios resultantes são amplamente difundidos e não podem ser capturados

exclusivamente por firmas individuais. Como exemplo podem ser citadas pesquisas básicas na

área de combustão e controle de emissões e conservação de energia, que podem ter impactos

positivos não só para o meio ambiente como também propiciar benefícios para a operação de

todo o sistema elétrico.

Existem dificuldades em se definir com precisão quais pesquisas são de interesse

público e o debate nos EUA fez com que alguns estados abordassem essa questão durante o

processo de reformas. Na Califórnia, a CPUC elaborou um documento onde procura, entre

outros objetivos, colocar os limites das atividades em PD&D que competem ao setor público e

privado (California Public Utilities Commission, 1996). Esse documento define três tipos de

P&D:

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P&D competitiva: atividades dirigidas ao desenvolvimento científico e

tecnológico cujos benefícios são apropriados integralmente pela entidade privada responsável

pelos investimentos realizados.

P&D regulada: atividades dirigidas ao desenvolvimento científico e tecnológico

cujos benefícios estão relacionados às funções reguladas da entidade responsável pelo

investimento.

P&D de interesse público: atividades dirigidas ao desenvolvimento

científico e tecnológico com as seguintes características: 1) seus benefícios se estendem a todos

os cidadãos da Califórnia e 2) não são adequadamente atendidas através do mercado

competitivo ou entidades reguladas.

Conforme observam Blumstein et al (1998) a característica principal de pesquisas de

interesse público é a sua coerência com metas estabelecidas por outras políticas públicas,

como melhoria do meio ambiente, políticas sociais de melhoria de qualidade de vida, etc.,

áreas que fogem ao escopo principal de atividades de empresas privadas. Desse modo cabe

ao poder público determinar quais são os investimentos que devem ser realizados nessas

áreas e quais as prioridades.

O relatório do grupo de trabalho mencionado da CPUC apresenta também

recomendações sobre os níveis adequados para financiamento em PD&D, e maneiras como

recursos devem ser coletados e administrados. É importante observar que nos EUA, como

ilustra o exemplo da Califórnia, houve a preocupação de se definir melhor a atuação do setor

público para que as oportunidades de pesquisa, desenvolvimento e demonstração - PD&D que

atendem ao interesses coletivos não fossem perdidas durante o processo de reestruturação.

Foi reconhecido que a nova estrutura concebida para o setor colocava esses aspectos em

risco. A própria lei (AB 1890) que estabelece os princípios das reformas no estado da

Califórnia, também introduz mecanismos para coleta de recursos através de uma taxa, a Public

Goods Tax - PGT, um imposto adicional cobrado sobre as vendas de eletricidade e que são

recolhidas para financiar os programas de bens públicos do estado. Um total estimado de US$

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62,5 milhões deverão ser coletados com o objetivo específico de financiar programas de PD&D

na Califórnia durante o período 1998-2001.

No passado a pesquisa de interesse público nos EUA era financiada por uma

combinação de instituições públicas e privadas, reguladas ou não, federais e estaduais. Esses

recursos eram administrados em forma de consórcios, como o EPRI, ou através do DOE e das

comissões estaduais de energia. Durante a reestruturação muitos desses arranjos foram

interrompidos.

Efeitos da reestruturação

As reformas do setor elétrico tem levado a uma alteração da estrutura da indústria com

conseqüências para o financiamento da P&D na área de energia. Na Inglaterra, por exemplo

tem surgido super utilities que combinam diversos tipos de serviços: lixo, gás natural, água e

esgotos, e telefone. Nos EUA isso também tem acontecido, com algumas companhias

oferecendo serviços de TV a cabo, telefone, serviços de Internet, e água esgotos. Essa

diversidade de serviços e formas de realizar negócios também re-orienta os interesses desses

companhias em investimentos em P&D. Havendo novas oportunidades de realizar negócios

com retornos mais atraentes e mais rápidos que aqueles relacionados com energia é provável

que não exista interesse imediato em investimentos de maior risco e tempo de maturação na

área de energia propriamente dita.

De uma forma geral, a introdução de maior competição trouxe três tipos de

conseqüências para a condução de P&D dentro do setor elétrico (Friedman, 1998):

a) uma redução imediata no financiamento de P&D;

b) mudança na direção de investimentos em projetos de curto-prazo;

c) interrupção de programas de cooperação e colaboração em P&D.

Um dos primeiros efeitos das reformas é a redução dos níveis de investimentos em

P&D. Esses cortes fazem parte da estratégia das empresas de diminuir seus custos

operacionais e melhor se posicionar em um mercado competitivo.

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Além disso, as incertezas de como poderão ser apropriados os benefícios de

investimentos em P&D faz com que se interrompam projetos e atividades realizadas

cooperativamente. A abertura do mercado à competição induz as empresas a considerar

somente investimentos de curta maturação, baixos riscos e que objetivem manter suas

vantagens competitivas (menores preços de energia ao consumidores e menores custos de

produção).

A percepção de que existem outras oportunidades de serviços e negócios que podem

ser desempenhados pela companhia de energia com melhor retorno e menor risco, também

diminui seu interesse em investimentos em P&D.

A pesquisa colaborativa entre empresas de energia e órgãos públicos que era prática

comum nos EUA, começou a declinar uma vez que companhias percebiam isso como uma

desvantagem comparativa com relação a outras companhias (incluindo produtores

independentes) que não participavam desses esforços. Várias companhias retiraram-se de

pesquisas realizadas em conjunto e com longos prazos de maturação, dando clara preferências

para projetos de curto prazo, com riscos menores e passíveis de serem patenteados, ou seja

onde podiam adquirir direitos para comercializar os resultados das pesquisas. Órgãos como o

EPRI que desenvolviam pesquisas consorciadas entre empresas sofreram bastante. Entre

1994-96 as contribuições e anualidades das companhias consorciadas caíram em cerca de

30%, mesmo após o EPRI realizar mudanças e re-orientações nos projetos de pesquisa para

atender aos novos interesses das companhias. Por exemplo, em 1995 cerca de 50% de seus

fundos eram alocados em pesquisas com prazos de maturação de 5 ou menos anos, 30% em

projetos com período de 5-10 anos e os restantes 20% com prazos de 10 -20 anos. Na

Califórnia as companhias do tipo IOU reduziram ou eliminaram o financiamento de pesquisas

como o Photovoltaic USA - PVUSA e o Collaborative Advanced Gas Turbine Project.

Como se não bastasse o financiamento governamental também foi diminuído durante

esses primeiros anos das reformas, conforme mostra a Figura 4. Havia a argumentação de que

a des-regulamentação também assumia a transferência de responsabilidades em P&D para a

iniciativa privada e que a maior competição estimularia maior inovação tecnológica e

necessariamente maiores inversões em P&D. No entanto, o fato foi que houve uma forte

Page 87: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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retração de investimentos, conforme já mencionado, ficando claro que atividades de P&D de

maior risco, maior tempo de maturação com maiores benefícios públicos não será

desempenhada por firmas privadas.

Além da iniciativa da Califórnia, outro exemplo de coleta de fundos para financiamento

de P&D de interesse público é a proposta do governo federal de criar um fundo de 3 bilhões

para oferecer como contrapartida de financiamento de projetos. Esse fundo foi criado a partir

de uma cobrança de 1 mill16 por kWh de todos consumidores.

É provável que uma vez esgotadas as oportunidades de redução de custos com as

tecnologias e métodos atuais, haverá renovado interesse das empresas privadas em aumentar

os recursos para P&D. No entanto, é razoável admitir que haverá uma concentração de

esforços em áreas que não impliquem em benefícios e forneçam vantagens comparativas para

outras companhias, ou seja, haverá uma clara delimitação de áreas e interesses para

investimentos em P&D. Desse modo é bastante provável que muitas atividades de pesquisa

que poderiam trazer benefícios públicos e coletivos, especialmente na área ambiental, não

sejam financiadas dessa maneira.

O papel futuro da P&D no setor energético

A perspectiva de menor prazo para obtenção de resultados de P&D são motivadas pela

necessidade de maiores lucros e competitividade do atual modelo para a indústria de

eletricidade. Como resultado o papel da P&D está mudando, começa a haver menor interesse

em investimentos em modernas e avançadas tecnologias de geração em favor de tecnologias

de informática que ajudam a diferenciar os produtos entre as empresas. Hoje os projetos

possuem as características de serem de curto prazo, baixo risco e procuram atender os

interesses dos acionistas e investidores. A pesquisa básica e ambiental perdeu terreno para

projetos cujo mérito é aumentar a curto prazo a competitividade da indústria de energia. Isso

acontece na Inglaterra onde o setor tinha um horizonte típico de investimentos em P&D de 5-7

anos e agora considera projetos apenas na faixa de 1-3 anos. O mesmo está acontecendo na

Suécia e Bélgica e Itália. Nos EUA muitas companhias estão retirando recursos de projetos

16 1 mill é igual a um milésimo de dólar americano.

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relacionados com tecnologias avançadas como turbinas a gás (advanced gas turbines) e novos

tipos de células de combustível (fuel cells), conforme mencionado (Friedman,1998) .

Existem áreas, entretanto, onde se espera um incremento em investimentos em P&D,

como por exemplo pesquisas para melhorar a eficiência da operação do sistema elétrico.

Nessa área incluem também necessidades de investimentos em tecnologias para melhor

gerenciar a distribuição de carga, medição em consumidores possibilitando tarifação em tempo

real. No entanto, a maior área onde tem se verificado investimento em pesquisa é a área

destinada a criar novos serviços e produtos, uma classe ainda em definição, mas fortemente

centrada no mercado consumidor.

Os problemas de energia e meio ambiente do futuro certamente serão mais difíceis e

complexos de serem resolvidos e necessitarão de novas tecnologias, é importante garantir

investimentos em P&D com horizontes relativamente largos para produzir resultados

esperados. A expectativa de redução de preços finais de energia resultante de maior

competitividade entre as empresas de energia impõe também novos desafios para as fontes

alternativas e tecnologias mais eficientes de uso de energia. Isso deve implicar em

necessidade de maiores esforços e investimentos nessas áreas para que essas opções

possam competir com as fontes convencionais no futuro.

Em alguns estados começam ser discutidos mecanismos para gerar recursos e

administração de P&D considerando a diversidade de grupos de interesse que agora

participam do setor energético: investidores, consumidores, pesquisadores. A Tabela 13

apresenta dois dos mecanismos propostos para financiar P&D nos EUA. No Capítulo 8

analisaremos o caso brasileiro e os mecanismos recentemente criados para fomentar o

financiamento de P&D do setor elétrico.

Em resumo, existe o entendimento que o papel do governo é crítico para atingir os

objetivos da pesquisa de interesse público mas existe um consenso de que é ainda cedo definir

precisamente seu papel. Um mecanismo de colaboração é necessário entre os estados,

agencias federais, e companhias de gás e eletricidade, grupos de interesses, e outros para o

desenvolvimento de opções de políticas, não havendo necessidade de novas instituições e sim

melhor colaboração entre as existentes.

Page 89: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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Tabela 13: Mecanismos propostos para Financiamento de P&D

Taxa estadual (State Surcharge) Vários estados estão considerando a criaçãode uma taxa para financiar P&D de interessepúblico: California, Nova Iorque,Massachussets e Rhode Island.

Existe a preocupação de que se algunsestados não implementam esse tipo definanciamento colocariam aqueles que ofazem em um posição de desvantagemcomparativa, além de uma preocupação coma administração desses fundos.

Taxa nacional ( non-bypassable NationwideWires Charge)

Existe a proposta de uma taxa nacional deacesso a rede de transmissão que financiariapesquisas realizadas pelo EPRI de longoprazo e pesquisas colaborativas. Segundoesta proposta toda a eletricidade seja intra-estado ou inter-estado seria taxadaigualmente.

Fonte: U.S. General Accounting Office, 1996.

CAPÍTULO 6: A PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL

Introdução

A sociedade civil americana organizada através de entidades ambientalistas,

representantes de associações de classes e interesses corporativos possui uma tradição em

participar de decisões na área de energia, principalmente devido ao debate nuclear da década

de 60, como comentaremos neste capítulo. É importante destacar a influência que a sociedade

tem exercido nesse processo de reformas do setor, com qualificadas intervenções no sentido

de garantir a manutenção e promoção de benefícios públicos.

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O objetivo deste capítulo é o de apresentar uma análise das principais atividades da

sociedade civil e seu papel em garantir e fiscalizar a manutenção das características públicas

da indústria de energia. As informações apresentadas a seguir cobrem alguns dos estados

americanos e grande parte dessas informações estão baseadas em Smeloff & Asmus, 1997.

Califórnia

O processo de reestruturação na Califórnia, iniciado em 1992, foi caracterizado por um

longo processo de consultas públicas, análises técnicas e econômicas, definição de metas,

elaboração e discussão de relatórios específicos cobrindo os pontos mais polêmicos do

processo de reestruturação. Desde seu início houve o envolvimento de entidades de

consumidores, grupos ambientais, representantes das empresas de energia (IOU e PU), NGU,

legisladores, e outros17.

Em 1994 a CPUC lançou o documento “A vision for the future of California’s Electric

Services Industry” (conhecido como Blue Book) onde apresenta os princípios básicos da

reestruturação para o estado: fim do monopólio que até então dispunham as IOUs no estado,

eliminando a supervisão do governo sobre o planejamento das novas unidades de produção e

dando aos consumidores a escolha de seus fornecedores. Novamente iniciam-se consultas

públicas em todo o estado para discussão do documento. Esse processo continuou até 1996,

com várias novas adições prevendo os aspectos de proteção ambiental e os impactos para os

consumidores durante a transição do sistema regulado para o outro. Além disso, havia o

processo formal da reforma do setor energético que corria em paralelo na Assembléia

Estadual. Somente em setembro 1996 é que foi aprovada a lei que dispunha sobre a nova

estrutura para o setor elétrico da Califórnia.

Como se observa esse processo foi extremamente aberto à participação pública e pode

contar com contribuições importantes de entidades como o EDF - Environmental Defense

Council e NRDC - Natural Resources Defense Council, entre outros. Muitas das entidades

possuem um quadro de pessoas bem qualificadas tecnicamente e que puderam enriquecer o

17 É interessante consultar alguns dos relatórios elaborados pelos diversos grupos de trabalhos

criados nessa época para melhor apreciar a diversidade dos elementos que efetivamenteelaboraram e opinaram sobre o processo de reestruturação. A maior parte desses documentosestão disponíveis no endereço: http://www.cpuc.ca.gov.

Page 91: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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debate e garantir concretamente medidas para manter programas de eficiência energética,

proteção ambiental, maior investimento em P&D, programas para população de baixa renda.

Toda essa militância de entidades bem informadas e com especialistas em várias áreas

não é recente na Califórnia. É interessante observar a experiência da companhia SMUD18 com

o fracasso de um grande empreendimento nuclear - a usina de Rancho Seco (913 MW) que era

responsável por grande parte de sua geração. Com o acidente verificado nessa usina em 1985,

a companhia teve que buscar rapidamente alternativas para suprir seus consumidores. A

imprensa local desempenhou um papel fundamental, na opinião de Smeloff & Asmus (1997)

no debate sobre o desempenho da usina nuclear de Rancho Seco. A preocupação da

população com relação a energia nuclear estava no auge, pois nessa época outros acidentes

como o de Chernobyl e o de Three Mile Island também repercutiam na mídia. Esses fatos

estimularam maior participação popular nas discussões sobre os serviços de energia naquela

região.

Os altos custos decorrentes dos reparos da usina rancho Seco e de toda a controvérsia

em torno da energia nuclear fizeram com a SMUD iniciasse três tipos de atividades para

garantir o fornecimento de energia: a realização de licitações para compra de grandes blocos

de energia de outros fornecedores (era a primeira vez que isso era feito nos EUA), maior uso

de fontes renováveis e programas de eficiência energética. Finalmente foi decidido que a usina

de Rancho Seco seria fechada e colocada em prática uma série de idéias para estimular o uso

eficiente de energia e uso de renováveis na área de serviço da empresa. Como era uma

companhia municipal, havia interesse em reduzir a remessa de recursos para fora do município

com compras de eletricidade. Essas medidas estimulariam a economia local. A eletricidade

conservada significaria menos recursos exportados para fora do município. SMUD começou a

investir em energia eólica, sistemas fotovoltaicos e cogeração. SMUD buscou eleger

alternativas economicamente competitivas para substituir a usina nuclear que foi desativada, e

com essa estratégia foi possível também manter as tarifas constantes durante a década de 90.

18 SMUD é uma companhia municipal que serve a cidade de Sacramento, capital do estado da

Califórnia. É a maior companhia municipal de eletricidade dos EUA.

Page 92: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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Uma outra conquista que se atribui a ação da sociedade civil na Califórnia, diz respeito

a garantias para acesso a serviços básicos de energia para população de baixa renda. Foi o

caso da criação do lifeline rate19, feito sob pressão da organização não governamental TURN

(Toward Utility Rate Normalization). Já na década de 70 esse tipo de preocupação surgiu a

partir de grupos como Citizens Action, Fair Share e Public Interest Research Group que se

estabeleceram em vários estados do país e exerciam pressão contra os aumentos de tarifas

que estavam sendo praticados na época.

Nova Inglaterra:

O sistema elétrico dessa região é bem diferente daquele encontrado na Califórnia.

Biomassa é a mais importante fonte de energia renovável dessa região e tem também sido

tradicional centro de iniciativas na área de eficiência energética.

Em 1989 houve um sério problema no reator da usina nuclear de Seabrook, New

Hampshire, agravando um debate regional que já durava cerca de dez anos sobre os

problemas da energia nuclear. O fracassado complexo nuclear de Seabrook levou à falência

seu principal acionista, a Companhia elétrica do Estado de New Hampshire e dificuldades para

as demais empresas da região consorciadas no empreendimento.

O problema nuclear fez com que entidades ambientalistas tomassem interesse em

participar do planejamento de recursos da região, uma vez que havia falta de energia, ao

contrário da Califórnia, onde havia um excesso da capacidade instalada durante a década de

80. O Conservation Law Foundation - CLF um grupo baseado em Boston começou a discutir o

plano do estado de expansão dos serviços de geração. Eles argumentaram que o PIR deveria

ser empregado na região para reduzir o consumo através de medidas de conservação de

energia. Inicialmente houve atuação específica em cima de alguns empreendimentos mas logo

essa entidade ganhou credibilidade e passou a interferir no planejamento da região. Em 1987

esse grupo confeccionou um estudo: Power to Spare: a plan to increase New’s England

competitveness Through Energy Efficiency criticando os planos do governo de construir mais

usinas. Um componente importante do estudo foi a preocupação com as tarifas da região, já

19 Lifeline rate é um sistema de tarifação por blocos onde se estabelece um mínimo de consumo

mensal necessário para uma família sendo cobrada uma tarifa com descontos.

Page 93: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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25% mais altas que a média do país, e deveriam aumentar ainda mais em função de

investimentos para a expansão da capacidade instalada dos planos oficiais.

Problemas ambientais já eram grandes na região e o grupo CLF foi bastante ativo para

garantir a manutenção de investimentos das companhias da região em programas de eficiência

energética demonstrando que eram alternativas mais atraentes que investimentos em

tecnologias para atender aos requisitos do Clean Air Act para as novas usinas.

O CLF continuou atuando durante a reestruturação do setor nessa região procurando

garantir a continuidade de investimentos para proteção ambiental, especialmente para acelerar

a substituição de usinas antigas e poluentes da região por versões mais modernas movidas por

fontes mais limpas.

A Região do Noroeste-Pacífico

Assim como a Califórnia e a Nova Inglaterra essa região dos EUA também teve

experiências de intensa participação de grupos ambientais com a instalação mal sucedida de

usinas nucleares. É uma região também que teve um grande avanço da energia hidráulica até

os anos 60, quando esse potencial já se encontrava praticamente esgotado nos EUA e se

expandiu ainda através de acordos com o Canadá através da British Columbia Hydro - BC

Hydro.

Em meados da década de 70 iniciou-se no estado de Washington a construção de

usinas nucleares cujos custos começaram a escalar rapidamente nos anos seguintes e 4 dos 5

reatores planejados não puderam ser concluídos.

Em 1980 foi criado o Pacific Northeast Electric Power Planning , primeiro órgão regional

de planejamento do setor elétrico dos EUA.. Seu primeiro trabalho foi realizar um levantamento

e planejamento da oferta de energia para os quatro estados da região: Washington, Oregon,

Montana e Idaho. Além dessa tarefa esse órgão deveria elaborar um plano para os próximos

20 anos para proteger as espécies de peixes que haviam sido prejudicadas por anos de

exploração de energia hidroelétrica. O ato legislativo do congresso federal20 que criou esse

órgão também determinava que deveria haver participação e consulta pública para a realização

20 Pacific Northwest Electric Power Planing and Conservation Act.

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desses planos. Diversos grupos da sociedade civil e também algumas companhias de

eletricidade se reuniram e fundaram a Northwest Conservation Act Coalition e conjuntamente

produziram um estudo de Planejamento Integrado de Recursos em 1982 chamado de Model

Electric Power and Conservation Plan. Esse estudo serviu de base para o estudo oficial

produzido pela NPPC.

Em outro estado da região, o Oregon, também houve uma forte reação contra uma

usina nuclear chamada Trojan de 1,1 GW de capacidade, construída em 1975. Ao longo dos

anos 80 e 90 houve tentativas públicas de fechamento desta usina mas somente em 1993 a

usina foi fechada, em parte devido a sérios problemas com vazamento de água radioativa e os

altos custos de manutenção e reparação exigidos.

A criação do NPPC foi importante para criar possibilidades de maior participação

pública nos trabalhos de planejamento energético e opções para o futuro da região. Em 1993

foi realizado o Renewables Northwest Project que procurou conquistar o suporte da população

para outras tecnologias de geração de eletricidade renováveis diferentes da hidroeletricidade e

também desenvolver projetos de energia eólica e geotérmica na região.

É claro que o processo de reestruturação teve que levar em consideração o alto grau

de envolvimento da sociedade com a questão do planejamento energético. Diferentemente da

Califórnia que iniciou a discussão pública após a elaboração de um documento (o Blue Book)

esse região já engajou a sociedade antes de qualquer proposta formal. Um grupo de

representantes dos vários segmentos dos estados da região foram convidados para o debate

(eles se chamaram a si mesmos de learning groups) e se reuniam duas vezes por semana para

discutir e elaborar propostas para aumentar a competitividade do setor elétrico sem

comprometer os interesses da sociedade ali representada.

Minnesota

Minnesota é um estado que possui uma longa tradição de regulação ambiental e onde

predomina maior presença do poder público regulando as atividades econômicas das

empresas privadas, ao contrário do que ocorre na Califórnia e Texas, por exemplo. Embora

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81

grande parte de sua geração seja de origem nuclear e carvão, foi uma região onde ocorreram

várias iniciativas pioneiras de geração eólica.

Novamente a energia nuclear teve uma importante participação para catalisar a opinião

pública e gerar controvérsias que possibilitaram a discussão de fontes alternativas de energia

para o estado. No caso específico o problema não foi exatamente a geração de energia de

origem nuclear ou os altos custos, e sim o destino dos resíduos das usinas nucleares. Houve

controvérsias com relação a decisão sobre o local de depósito que era próximo a terras de

tribos indígenas. Após algum tempo em disputas judiciais foi permitido a localização de um

depósito em terras do estado para acumular os resíduos equivalentes a sete anos de operação

da usina nuclear e em contra-partida a companhia de eletricidade responsável deveria investir

$500 milhões de dólares na construção de várias unidades de porte usando energia eólica e

biomassa.

Minnesota possui também a mais agressiva legislação em favor do PIR. Sua PUC tem

uma curiosa política default que requer que toda a concessionária deve provar inicialmente que

fontes renováveis não são de interesse público antes de investir em fontes não renováveis. A

PUC também estabelece padrões de eficiência energética e impõe também que as companhias

invistam 1,5% das vendas de eletricidade em GLD21.

As reformas tem a participação de grupos que apoiam fontes renováveis e que têm se

associado a cooperativas de eletricidade, concessionárias municipais, e grupos de interesse

público representando classes de baixa renda para desenvolver pontos de consenso sobre as

novas regras. Ficou acordado que a qualidade ambiental e proteção dos recursos do estado

seria mantida através do PIR ou processo publico similar que assegure uma consideração de

um portfolio de diferentes opções economicamente eficientes do lado da demanda e fontes

renováveis.

21 A companhia Regional Northern States Power - NSP se propôs a investir 3,7% de suas

vendas.

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Texas

O estado do Texas recentemente (junho 1999) aprovou as leis que introduzem

reformas no seu setor elétrico. A novidade nesse estado de tradição liberal e de alto consumo

energético, foi a inserção de dispositivos mandatórios que garantam um progressivo aumento

de fontes renováveis e investimentos em eficiência energética. Com isso o Texas possui agora

uma das melhores leis de des-regulamentação dos EUA, que contempla objetivos de controlar

a poluição atmosférica ocasionada pela indústria da eletricidade (EDF Newsletter, 1999).

Isso só foi possível devido ao trabalho de duas organizações, uma de âmbito nacional

(EDF) e outra local (Public Citizen and Sustainable Energy and Economic Development)

preocupadas com os altos índices de contaminação atmosférica do estado onde o petróleo é

barato e extensamente utilizado. A nova legislação coloca metas para redução de emissões de

óxidos de enxofre e nitrogênio e gases estufa. Além disso, estabelece de forma mandatória o

desenvolvimento de 2GW de capacidade instalada de fontes renováveis durante os próximos

10 anos e que as companhias de energia deverão ter programas de eficiência energética para

reduzir o crescimento anual de demanda em pelo menos 10%.

Page 97: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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CAPÍTULO 7: MECANISMOS PARA PROMOVER PROGRAMAS DE BENS

PÚBLICOS

Introdução

A atuação do setor público para "proteger" o acesso a bens públicos nesse contexto de

menor regulação do setor não é isenta de controvérsias nos EUA. Existem aqueles que

rejeitam qualquer intervenção do governo e acreditam que o mercado deverá ser capaz de

prover aqueles bens que a sociedade deseja (v. por exemplo Taylor, 1999). Entre aqueles que

defendem a intervenção nota-se também a preocupação que a utilização de fundos públicos

não deva introduzir diferenciais no mercado que levem algumas firmas serem privilegiadas ou

terem vantagens competitivas subsidiadas com recursos públicos.

Os mecanismos existentes se classificam em duas categorias: os de natureza fiscal

(taxas e incentivos) e os regulatórios. Eles tem sido praticados segundo diversas versões nas

várias regiões dos EUA e ainda se encontram em evolução e experimentação. Além desses

dois mecanismos, o governo pode interferir diretamente no mercado de energia, seja como

uma grande consumidor, ou como o responsável pela formulação de políticas de

desenvolvimento, normas técnicas para garantir eficiência energética de equipamentos e

edifícios, educação e pesquisa que podem ter impactos na provisão dos bens público (Figura

4).

A experiência dos EUA parece indicar de maneira clara que a disponibilidade de "bens

públicos" requer mecanismos para arrecadação de recursos, agências para coleta e

administração e implementação de programas para disseminá-los. Em que pese a controvérsia,

na prática tem sido necessária intervenção do poder público para esses propósitos.

Mecanismos fiscais

A Tabela 14 apresenta alguns dos mecanismos fiscais que o poder público pode lançar

mão com o objetivo de arrecadar fundos para financiar programas de "bens públicos" como

aqueles que foram discutidos neste trabalho: eficiência energética, fontes renováveis,

Page 98: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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programas de acesso a serviços de energia para população de baixa renda, medidas de

proteção ambiental e financiamento a pesquisa de interesse público.

Tabela 14: Mecanismos para incentivar a promoção de bens públicos: Taxas e Incentivos

Taxa ao nível dadistribuição

Taxas cobradas diretamente dos consumidores de energia e recolhidas para umfundo independente da companhia de energia. Pode ser fixa ou dependente doconsumo ($/kWh) ou da demanda ($/kW)

Taxa ao nível datransmissão

Aplicada ao nível da transmissão para uma determinada região.

Taxa nacional(national wirescharge)

Taxa cobrada ao nível da transmissão em todo o país.

Imposto sobre oconsumo deenergia

Imposto cobrado sobre as vendas de energia da companhia para financiarprogramas diversos.

Imposto sobreemissões

Taxa cobrada sobre combustíveis dependendo de suas características de poluição.

Permissão paraoperar

Companhias que vendem eletricidade a consumidores poderiam ser requeridas apagar uma taxa para operarem esse privilégio.

Incentivos/créditos

O governo pode conceder incentivos fiscais para determinadas ações ou forma deenergia

Impostos gerais Imposto de renda, imposto sobre propriedades (IPTU)

Fonte: baseado em Tonn, Hirst & Bauer, 1995.

Tem-se observado uma preferência para a adoção de mecanismo do tipo de "taxa ao

nível da distribuição", chamada nos EUA de System Benefit Charge - SBC, que é cobrada dos

consumidores. Diversos estados estão usando esse mecanismo para manter programas que

trazem benefícios públicos durante a transição de monopólio para a competição.

O SBC é um mecanismo de coleta de fundos mandatório ao nível da distribuição ou

uso final de energia, tendo em base o consumo (kWh) para taxação. Algumas vezes é referido

como wires charge ou um access charge, se cobram valores pelo uso ou acesso à rede de

distribuição (em geral valores fixos). Pode também vir sob forma de uma taxa anual que é

cobrada das companhias de gás ou eletricidade. Nesse caso essa taxa anual não é imposta

Page 99: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

85

diretamente aos consumidores finais (não é estritamente uma SBC), mas certamente elas

serão repassadas através das tarifas cobradas pelas companhias.

A decisão de se adotar um mecanismo do tipo SBC para financiar programas públicos

é feita pelo legislativo estadual ou pela comissão de regulação, que mesmo assim em alguns

casos deve submeter a decisão ao legislativo para sua implementação (Fang 1997).

O SBC tem sido empregado como um mecanismo para financiar benefícios públicos na

área de telecomunicações, como por exemplo programas para colocar linhas telefônicas,

acesso a internet e tarifas subsidiadas para escolas, bibliotecas e postos de saúde. Mudanças

introduzidas a partir do Telecommunications Act de 1996 aumentaram ainda mais a

arrecadação de recursos para financiar programas de benefícios públicos. Somente o apoio a

bibliotecas e escolas tem uma verba anual de cerca de US$ 2.25 bilhões. Esse tipo de taxa tem

sido aplicado a outras indústrias que começaram a experimentar competição com o objetivo de

manter benefícios públicos associados a elas e que a competição poderia comprometer. A

aviação é outro exemplo. Existe o Airway Trust Fund, um órgão financiado por taxas cobradas

sobre as vendas de bilhetes e responsável por fiscalizar a segurança em aeroportos e controle

de ruído (Cowart 1997).

Alguns estados colocaram metas específicas para arrecadar fundos para os

programas, outros especificaram uma sobretaxa em termos de US$/MWh cobrado dos

consumidores, conforme mostra a Tabela 15.

Page 100: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

86

Tabela 15: Exemplos de aplicação do SBC em alguns estados

Califórnia Na CA os níveis de fundos para os diferentes programas são determinadospelo legislativo. Para eficiência energética foi estabelecido o valor de US$106milhões por ano durante 98-2001 para a PG&E; US$32 milhões por ano para aSan Diego Gas and Electricity Co (1998-2001) e US$90 milhões por anodurante 98-2000 com um mínimo de US$50 milhões em 2001 para a SouthernCalifornia Edison Co. Para energia renovável o valor é de US$ 540 milhõesdurante 1998-2001 para todas as companhias juntas. Para os programas debaixa renda devem-se manter os valores de 1996, de acordo com asnecessidades dos consumidores

Rhode Island Foi estabelecido a taxa de 2,3 mills/kWh para eficiência energética eprogramas de energia renovável, começando em 1997. Isso totaliza mais deUS$18 milhões ao ano. Em 1997 US$210.000 foram alocados para energiarenovável e espera-se aumentar esse valor.

Nova Iorque Foi determinado o valor de 1 mill/kwh ou aquela necessária para manter o nívelde 1995 de gastos com eficiência energética, P&D, programas de baixa renda(um total de US$ 98 milhões). O financiamento de proteção ambiental deveráser adicional.

Massachusetts A taxa para programas de renováveis é 1 mill/kwh. O financiamento paraeficiência energética e programas para baixa renda será determinado paracada companhia.

Wisconsin A comissão de regulação estipulou níveis determinados na sua proposta:US$100 milhões para conservação de energia, US$5 milhões para energiarenovável, US$105 milhões para baixa renda. Esses valores têm aumentadonos anos recentes.

Fonte: Fang 1997

Tem sido considerados quatro tipos de modelos para administrar os fundos recolhidos

através do SBC:

1) Conselhos independentes (Independent Boards). Nesse modelo as comissões de regulação

apontam um outro grupo que ficará encarregado de tomar decisões sobre a alocação dos

fundos e programas a serem financiados e lança os concursos públicos para contratar

administradores dos programas. Esse grupo pode também designar um conselho técnico

para assessorá-lo.

2) Comissão de regulação. Nesse modelo a decisão final fica a cargo da comissão de regulação

ou da agência estadual responsável. Um Conselho Assessor pode ser designado para

auxiliar. Indivíduos podem ser contratados especificamente para administrar programas

Page 101: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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específicos, como tem ocorrido na Califórnia, Massachusetts, Nova Iorque, Rhode Island e

Wisconsin.

3) Companhias de distribuição. Nesse sistema as companhias de distribuição continuam a

operar os programas de benefícios públicos aprovados pelas comissões e podem cobrar

taxas diretamente de seus consumidores para cobrir os custos dos programas, devendo, no

entanto, se submeter à aprovação das comissões. Esse é o modelo adotado em Arizona.

Esse tipo de administração, no entanto, é visto como transitório e deverá ser abandonado

devido a conflitos de interesses potenciais das companhias.

4) Um sistema híbrido. Permite que companhias reguladas possam administrar fundos em suas

áreas de interesse e ao mesmo tempo selecionar administradores para cuidar de fundos e

programas para todo o estado. Esse é o caso do Estado de Nova Iorque.

Incentivos fiscais têm sido um importante instrumento do governo federal para

estimular a disseminação de tecnologia eficientes nos EUA. A Tabela 16 mostra os valores

referentes à renúncia fiscal federal para o ano de 1999 relativos aos impostos incidentes sobre

equipamentos e atividades consideradas importantes para reduzir o consumo de energia e as

emissões de gases estufa.

Tabela 16: Renúncia Fiscal Federal para produtos eficientes e fontes renováveis 1999

Incentivos fiscais Perda de receita (em milhões dedólares)

Equipamentos eficientes para uso em edificações 230

Residências eficientes 60

Sistemas de coletores solares em telhados de edifícios 9

Eletricidade produzida por energia eólica ou biomassa 20

Co-geração industrial 64

Total 383

Fonte: Taylor, 1999.

Page 102: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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Mecanismos regulatórios

O poder público através dos órgãos reguladores ou do poder legislativo pode introduzir

regras destinadas a garantir e promover os benefícios públicos do setor energético. A Tabela

17 apresenta uma listagem das principais medidas discutidas e algumas já aplicadas. Algumas

dessas medidas possuem a característica de serem capazes de criar condições para o

surgimento de um mercado para que certos benefícios público passem a ser disponibilizados. É

o caso, por exemplo, do controle de emissões de enxofre que fez surgir um mercado de

transações de certificados de emissões e uma efetiva redução de poluentes de maneira

economicamente eficiente.

Page 103: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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Tabela 17: Mecanismos para incentivar benefícios públicos no contexto competitivo: Medidasregulatórias

Green electronwheeling

As comissões de regulação poderiam permitir que somente fontes renováveis façamparte do mercado de vendas diretas aos consumidores (retail wheeling).

Licitação defranquias

Regiões geográficas seriam organizadas em áreas de franquias e processos deleilão ou licitação seriam abertos para fornecedores de serviços de energia segundodeterminadas especificações.

Regulaçãobaseada nodesempenho

Especificações relacionadas a benefícios públicos decorrentes de programas deGLD ou fontes renováveis seriam requeridas das companhias.

Permissões ecertificações

Agências de proteção ambiental especificam padrões de emissões e autorizam ounão a instalação e operação de novas usinas elétricas.

Padrões deeficiênciaenergética

São estabelecidos padrões de eficiência energética mínimos para equipamentoselétricos e edificações.

Regulaçãoambiental

Agências governamentais regulam os níveis emissão de substâncias tóxicasconsiderando efeitos para a saúde pública e ecossistema.

Especificação deum portfolio depadrões deprodução

O governo pode estabelecer determinados níveis para que uma companhia forneçauma percentagem especificada de sua produção a partir de energia renovável ouque invista uma percentagem de suas vendas em medidas de GLD, por exemplo.

Criação demercados

Governos podem criar mercados: por exemplo a criação de um mercado paratransacionar emissões de SO2.

Limites deemissões

Governos podem limitar emissões de poluentes. Essas emissões poderiam sertransacionadas dentro de certas regras.

Fonte: baseado em Tonn, Hirst & Bauer, 1995.

Ações diretas do governo

Existem algumas medidas que podem ser tomadas diretamente pelo poder público

tirando partido de sua importância como setor expressivo de demanda de serviços de energia.

Por exemplo, ele pode se utilizar de mecanismos licitatórios e encomendar a compra de

serviços e equipamentos com determinadas especificações de eficiência energética. Ele pode

atuar na divulgação de informações referente a usos de energia e tecnologias renováveis. A

Tabela 18 apresenta as várias maneiras do poder público ser também um agente direto no

fornecimento de benefícios públicos no contexto competitivo.

Page 104: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

90

A criação de legislação para garantir o contínuo desenvolvimento de equipamentos que

devem apresentar índices mínimos de eficiência energética e outra importante área de atuação

do setor público.

Tabela 18: Possíveis ações do governo para implementação de benefícios públicos no contextocompetitivo: Mecanismos para implementação de programas

Trust funds(Fundos)

Representam uma combinação de fundos do governo e fundos coletados através detaxas diretas para fomentar programas de "bens públicos"

Programas decompras

Governo podem realizar encomendas específicas de serviços e equipamentos deenergia garantindo a criação de escala de produção e mercado.

Programas deinformação

Governo faz divulgação de tecnologias eficientes e apropriadas para melhorproteção ambiental.

OrganizaçõesNãoGovernamentais

Podem ser financiadas pelo governo e podem promover eficiência energética,programas para população de baixa renda e fontes renováveis.

P&Dadministradapelo governo

Pesquisa de longo prazo administrada pelo governo dos EUA através doDepartamento de Energia - DOE

Estabelecimentode normastécnicas

Laboratórios governamentais propões normas técnicas para equipamentos eedificações com especificações que levam a redução de consumo de energia.Periodicamente essas normas são revistas e induzem o desenvolvimento ecomercialização de tecnologias mais eficientes.

PlanejamentoIntegrado deRecursos a nívelEstadual

Comissões de energia ou órgãos de planejamento desenvolvem PIR

Programas paraBaixa Renda

O governo pode assumir a administração desses programas através de seus 'órgãosde assistência social.

Fonte: baseado em Tonn, Hirst & Bauer, 1995.

Page 105: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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CAPÍTULO 8: EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E OUTROS BENS PÚBLICOS NO

BRASIL

Limitações da regulação sem uma política de bens públicos

Introdução

Diferentemente dos EUA, o processo de reformas no Brasil se iniciou sem um claro

referencial regulatório e se baseou em um primeiro momento na privatização das companhias

de distribuição. Seus reflexos foram enormes para o planejamento do setor elétrico e para o

estabelecimento de uma política de bens públicos. Ao mesmo tempo que a tradição de

planejamento centralizado foi sendo abandonada foi introduzida a idéia de que o setor público

deve realizar apenas um planejamento indicativo e deixar que os agentes privados a decisão

de determinar os investimentos em expansão dos serviços de energia. Até meados da década

de 90 a ELETROBRÁS era a encarregada de planejar, financiar, construir e operar todo o

sistema elétrico em cooperação com as demais empresas de eletricidade do país. Diversos

programas de utilidade pública como eletrificação rural, eletrificação de favelas, tarifas

subsidiadas para consumidores de baixa renda, entre outros era assumidos pela

ELETROBRÁS e demais companhias estaduais. No campo da eficiência energética, em

particular, o país mantinha desde 1985 um programa de âmbito nacional, PROCEL, que vinha

acumulando experiência na coordenação, implantação e avaliação de uma série de ações

nessa área. A partir de 1998 os trabalhos do PROCEL sofreram discontinuidade sem que

fosse definido seu novo papel. O mesmo acontece com as atividades de P&D tradicionalmente

realizadas no CEPEL, principal centro de pesquisas financiado e gerenciado pelo setor elétrico,

e exigem novas definições frente ao novo contexto de P&D no ambiente competitivo.

Embora o processo de reformas não tenha explicitado uma política para provisão de

bens públicos durante a transição para um ambiente de gerenciamento privado do setor e de

maior competição, no âmbito da regulação algumas medidas importantes foram introduzidas

para garantir investimentos em eficiência energética e P&D, como será visto neste capítulo.

Desde 1998 as empresas privatizadas têm a obrigação de investir 1% de sua receita anual em

programas de eficiência energética e pesquisa e desenvolvimento.

Page 106: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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A obrigatoriedade desse tipo de investimento em um mercado crescentemente

competitivo é uma novidade. A considerável experiência dos EUA com a regulação de

iniciativas de interesse público nos últimos 20 anos não foi feita em um contexto onde

empresas competem entre si. Mas até que ponto o mecanismo concebido é capaz de corrigir e

complementar a atuação do mercado? Esse é o objetivo deste capítulo.

Bens públicos e as reformas setoriais no Brasil

A preocupação com aspectos de interesse público da indústria de eletricidade estão

presentes na Lei 8987/95, que dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação

de serviços públicos previsto no artigo 175 da Constituição Federal. O artigo 29, inciso X da

referida lei estabelece ao Poder Concedente a obrigatoriedade de “estimular o aumento da

qualidade, produtividade, preservação do meio-ambiente e conservação”. Existe, portanto, o

reconhecimento de que essa indústria deve manter características de interesse público mesmo

sob gerenciamento privado

Esse dispositivo possibilitou que a Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL,

criasse a Resolução 242/98 estabelecendo a obrigatoriedade da aplicação de 1% da receita

operacional líquida das empresas privatizadas em programas de conservação de energia e

pesquisa e desenvolvimento. Anualmente, a ANEEL publica uma Resolução e um Manual que

regulamenta a aplicação dos recursos regulados (1% da receita operacional líquida das

empresas) conforme previsto nos contratos de concessão. Assim, para o ciclo 1998/1999 foi

publicada a Resolução 242/98 e para o ciclo 1999/2000, foi publicada a Resolução 261/99, que

introduziu alguns ajustes relacionados a prioridades e limites de investimentos segundo tipos

de programas.

Durante 1995-98, antes portanto da resolução da ANEEL, algumas iniciativas para

garantir investimentos em preservação ambiental, eficiência energética e P&D foram colocadas

como cláusulas em contratos de concessão. Em muitos casos, essas cláusulas eram muito

genéricas e de difícil verificação, e na verdade não havia interesse do próprio setor público em

torná-las mais específicas uma vez que se temia com isso a desvalorização das empresas a

serem privatizadas.

Page 107: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

93

Características da regulação para Eficiência Energética e P&D

A Tabela 19 apresenta os principais requisitos da regulação da ANEEL que rege a

aplicação dos fundos regulados para eficiência energética e P&D: um mínimo de 0,25% da

receita operacional líquida deve ser investida em programas de melhoria de eficiência do uso

final e 0,1% em programas de pesquisa e desenvolvimento, sendo o restante em programas de

melhoria de eficiência do lado da oferta.

Tabela 19: Alocação dos recursos regulados em programas de eficiência energética (lado da oferta edemanda) e pesquisa e desenvolvimento (Resolução ANEEL 261/99)

% da receita anuallíquida

Tipos de programas Limites sugeridos e prioridades estabelecidas

(a) >1.00% Eficiência de usofinal, pesquisa edesenvolvimento eeficiência do ladoda oferta

>0.25% Eficiência do uso final (lado da demanda)

>0.1% Pesquisa e desenvolvimento

Eficiência do lado da oferta (sem limites)

(b) >0.25% Eficiência do usofinal (lado dademanda)

Até o máximo de 0.125% a ser investido em iluminação pública emarketing

Mínimo de 0.025% a ser investido no setor industrial

Mínimo de 0.025% a ser investido no setor residencial

Mínimo de 0.025% a ser investido no setor público

(c) >0.1% Pesquisa edesenvolvimento

Áreas sugeridas: planejamento energético, fontes alternativas,melhoria da qualidade do serviço, co-geração

(d) (a)-(b)-(c) Eficiência do ladoda oferta

Melhoria do fator de carga (mínimo de 30% a ser investido nasregiões S, SE e CO, mínimo de 10% nas regiões N e NE).

Perdas de energia (técnicas e comerciais)

Nota: Níveis mínimos em relação à receita operacional líquida segundo a Resolução ANEEL 261/1999; (*) companhias degeração que não possuem distribuição devem aplicar um mínimo de 0.25% em P&D. Fonte: ANEEL 1999.

A presente sistemática de aplicação desse regulamento confere às empresas de

energia a tarefa de elaborar, submeter seus projetos para aprovação da ANEEL e finalmente

implementá-los sob a fiscalização da ANEEL. Em lugar de coletar os recursos e gerenciar um

fundo a ANEEL entendeu que as concessionárias seriam quem melhor realizariam a alocação

de recursos uma vez que são os maiores conhecedores do mercado e do comportamento dos

consumidores. Havia também a preocupação de que o gerenciamento pudesse ser

monopolizado politicamente por alguma entidade existente com o prejuízo para a implantação

Page 108: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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de programas de maior abrangência e eficácia. As Agências Estaduais de Regulação e o

PROCEL em convênio com a ANEEL tem o papel, no momento, de oferecer suporte técnico

para realizar uma avaliação dos projetos submetidos. ANEEL é responsável pela definição de

regras e aprovação de programas anuais das concessionárias e também por sua fiscalização.

Esse modelo, aliado com a ausência de uma política pública para eficiência energética

e P&D, vai se revelar limitado e redundante, conforme apontaremos mais adiante.

As reformas do setor energético e o novo arranjo institucional

As reformas introduziram importantes modificações no aparelho público de formulação

de políticas para o setor energético brasileiro. A organização do setor energético atual

estabeleceu a criação do Conselho Nacional de Política Energética - CNPE, como sendo o

mais importante órgão do setor, responsável pela determinação de políticas capazes de

formatar o futuro desenvolvimento do setor e seu relacionamento com o mercado. O Conselho

é um órgão vinculado à Presidência da República e presidido pelo Ministro de Minas e Energia

– MME, sendo constituído majoritariamemte por Ministros de Estado e conta também com a

participação de membros da sociedade civil (v. Quadro 3). Sua secretaria executiva é a própria

Secretaria de Energia (SEN) do MME. Dentre as principais funções do CNPE está a de propor

políticas públicas de energia que servirão de guia indicativo ao investidor privado e fornece

orientação aos órgão reguladores (ANP e ANEEL). O CNPE tem um caráter deliberativo com

responsabilidade executiva sobre a definição de diretrizes para importação e exportação de

petróleo, gás natural e derivados e assegurar o adequado suprimento de combustíveis no país.

O CNPE tem o suporte dos Comitês técnicos onde a indústria encaminha propostas para a

decisão do governo.

Embora a lei de criação do CNPE tenha sido sancionada pelo presidente da república

em 1997, ainda não houve nenhuma reunião e nem nomeação de seus integrantes22, ou seja,

ainda não se tornou operacional. Em junho de 2000 novo decreto presidencial define a

estrutura e o funcionamento do CNPE.

22 Até junho/2000.

Page 109: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

95

O Quadro 3 apresenta os principais atores públicos e seu respectivo papel definidos

com a reformas do setor.

Presidente da República: decide em última instância sobre matéria de política energética, nomeia osmembros do CNPE e defina sua operação.

Conselho Nacional de Política Energética (CNPE): tem a responsabilidade geral de assegurarsuprimento adequado de energia ao país, promover o uso racional de energia, revisar periodicamentea matriz energética nacional. Promover políticas para proteger os interesses do consumidor, atrairinvestimentos para a produção de energia, promover a livre concorrência, ampliar a competitividadedo país no mercado internacional. Promover programas específicos para gás natural, álcool, energianuclear, e outros. Garantir sistema adequado de financiamento das reservas estratégicas decombustíveis do país.

Ministro de Minas e Energia (MME): preside o CNPE, é o interlocutor das políticas energética com opresidente da República e nomeia os membros dos comitês técnicos.

Secretaria Executiva do CNPE (é a Secretaria de Energia – SEN do MME): Organiza as pautas,monitora a implantação das diretrizes definidas pelo CNPE e coordena os trabalhos dos ComitêsTécnicos.

Demais membros do CNPE: deliberam sobre política energética e sobre a criação de comitês técnicosno plenário do CNPE. Fazem parte do CNPE: Ministro de Ciência e Tecnologia, Ministro do MeioAmbiente, Ministro do Orçamento, Planejamento e Gestão, Ministro da Fazenda, Ministro doDesenvolvimento Indústria e Comércio Exterior, um representante dos Estados e Distrito Federal,Ministro Chefe da Casa Civil, um representante da Universidade e um cidadão brasileiro ambosespecialistas em matéria de energia.

Apoio técnico ao CNPE: ANP e ANEEL são responsáveis para oferecer apoio técnico ao CNPE.

Comitês Técnicos: constituem o plenário de análise técnica das principais questões do setor. Sãocriados conforme a necessidade e possuem caráter temporário. São através deles que os demaisagentes sociais (concessionárias, indústrias) interessados nas questões interagem com o CNPE.

Quadro 3: Os principais atores públicos do setor energético após a reforma setorial

Fontes: Lei no 9.478 (06/08/1997) e Decreto no 3.520 (21/06/2000).

Mudanças do papel do setor público

Na medida em que as reformas avançam percebe-se que o governo está deixando de

ser o principal protagonista para implementar medidas de eficiência energética (anteriormente

capitaneadas pelo PROCEL, ELETROBRÁS e concessionárias estaduais), assumindo um

papel de atuação indireta, responsável pela criação de um contexto de políticas favorável para

que agentes privados tomem decisões e invistam nessa área. Esse movimento deverá ser

acompanhado simultaneamente por mudanças na forma de financiamento das ações de

eficiência energética em particular e para os demais bens públicos em geral. Em outras

palavras, a tendência deverá ser cada vez depender menos de recursos públicos (recolhidos

Page 110: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

96

através de impostos) e financiar essas ações com recursos recolhidos diretamente dos próprios

consumidores de energia. A criação das resoluções 241/98 e 261/99 e as indefinições sobre o

futuro do PROCEL ilustram claramente essa tendência.

É importante observar, no entanto, que no caso de investimentos em eficiência

energética e P&D de interesse público, entendemos que o setor público deverá manter uma

papel importante de atuação direta, conforme explicaremos a seguir. A Figura 6 representa o

potencial econômico para investimentos em medidas de eficiência energética, que pode ser

determinado através de técnicas do PIR e servem para identificar segmentos desse “mercado

potencial” segundo as perspectivas de atratividade econômica dos diversos agentes:

concessionárias, consumidores, fabricantes de equipamentos, etc.

A competitividade do mercado de energia deve estimular que concessionárias

identifiquem oportunidades para reduzir seus custos através de investimentos em eficiência,

realizar gestão de carga (GLD), realizar programas e outros serviços junto a determinados

consumidores para mantê-los como clientes, etc. Dependendo dos preços de energia, o próprio

consumidor pode perceber vantagens em realizar investimentos em eficiência energética.

Fabricantes de equipamentos podem perceber oportunidades para lançar novas tecnologias

mais eficientes. Ou seja, é possível constatar que a exploração de uma razoável parcela do

potencial de eficiência energética pode ser realizado através de mecanismos do próprio

mercado.

No entanto, sabemos que diversas oportunidades, especialmente aquelas que

envolvem maiores riscos, maior tempo de maturação, maiores custos de transação e maior

coordenação entre diferentes agentes, não serão adequadamente resolvidas por mecanismos

usuais de mercado. É sabido por exemplo, que o mercado de eficiência energética necessita

de informação adequada sobre preços de energia, desempenho de tecnologias, etc. para que

seus agentes possam tomar decisões e funcione adequadamente. São estas áreas que devem

ser objeto de atenção e atuação direta do setor público.

O novo contexto que o próprio setor público almeja com maior participação de decisões

do mercado competitivo, impõe novos e maiores esforços para a identificação e definição de

bens públicos, ou seja aqueles bens que o mercado não será capaz de prover. O setor público

Page 111: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

97

deve dedicar particular atenção para a determinação do potencial de eficiência energética que

a sociedade considera e sua segmentação conforme apresentado na Figura 6. É possível

conceber um conjunto de políticas que podem incentivar que agentes privados se sintam

estimulados a capturar parte desse potencial através de mecanismos do próprio mercado. Essa

Figura ilustra o destino ideal dos fundos recolhidos dos consumidores de energia através de

regulação para financiar as atividades diretas do setor público, e cada vez menos deverá haver

a utilização de outros fundos como tem sido até recentemente.

Ao contrário do que se observou nos EUA, a pouca discussão ocorrida no Brasil sobre

os objetivos dos programas implementados pelas concessionárias, e o vácuo existente com a

falta de definições do CNPE, não criaram diretrizes para aplicações de investimentos em

eficiência energética e P&D que possam ser caracterizados como bens públicos. Isso ficará

mais claro com a análise dos resultados obtidos durante o ciclo 1998-99 com a Resolução da

ANEEL apresentada a seguir.

Figura 6: Segmentação do potencial de eficiência energética entre os diversos agentes

Concessionárias de EnergiaAções de interesse próprio da empresa:- redução de custo- aumento de competitividade- DSM, tarifas

Investimentos do consumidor

Mercado Privado, ESE, ONGs,empresas de equipamentos.

Principal agente: setor público.Ações: Transformação demercado, Normas técnicas, P&Dde interesse público

Recursoscoletados dos

consumidores deenergia

Potencial de Eficiência Energética

+

+

RGR, PROCEL,Eletrobrás, etc

Financiamento deBens Públicos

Page 112: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

98

Investimentos em Programas Regulados durante 1998-99

Eficiência Energética

Durante o ciclo 1998-99 um total de US$ 113 milhões (R$ 196 milhões) foram

investidos em programas de eficiência energética, cerca de 16% a mais que o mínimo

requerido pela regulação. Desse total, 68% foram investidos em programas de eficiência do

lado da oferta e 32% em programas de eficiência energética do lado da demanda23. É

importante observar que a definição de programas considerados como de melhoria de

eficiência do lado da oferta é bastante amplo e inclui: a) melhorias no sistema de distribuição

de energia (reforços e novas instalações) visando redução de perdas técnicas; b) regularização

de consumidores (instalação de medidores)24 reduzindo perdas comerciais; c) projetos de

redução perdas reativas no sistema de distribuição e d) melhoria na operação de circuitos

secundários. O total investido exclusivamente em projetos destinados a reduzir perdas técnicas

e comerciais representaram 0.54% do total da receita operacional líquida das concessionárias

reguladas nesse período.

Do lado da demanda é possível verificar que as concessionárias cumpriram os

requisitos mínimos exigidos pela regulação e, de fato, investiram além do exigido em alguns

setores. Esse foi o caso de programas de iluminação pública, programas para o setor industrial

e residencial. No entanto uma análise mais detalhada dos programas de uso final revela

algumas distorções. Algumas concessionárias concentraram seus investimentos em iluminação

pública, por exemplo, porque houve oportunidades de compartilhar esses investimentos com as

prefeituras locais e ganhos financeiros para as concessionárias. Algumas concessionárias

investiram em projetos de melhorias em suas próprias instalações creditando essas iniciativas

como projetos de melhorias em prédios do setor comercial, quando que na verdade, esses

projetos deveriam ser considerados pelo menos como projetos de melhoria de eficiência do

23 O relatório da ANEEL classifica programas de melhoria do fator de carga como programas de

eficiência do lado da demanda, preferimos considerar aqui os programas do lado da demandaapenas aqueles investimentos realizados junto ao consumidor final, ou seja programas deeficiência de uso final de energia. No ciclo 1998-99 os programas de melhoria do fator de cargadas concessionárias reguladas representou 17% do total de investimentos regulados emeficiência energética. O Manual elaborado para o ciclo 1999-2000 já é consistente com nossoenfoque.

24 Desde 1999 ANEEL exige que um esforço adicional seja realizado pelas concessionárias queimplementam esse tipo de projetos. São requisitados programas especiais de informação eoutros com o objetivo de reduzir o consumo desses consumidores.

Page 113: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

99

lado da oferta, pois desse modo teriam maior disponibilidade de energia para vender a seus

consumidores25. Em algumas concessionárias os investimentos em projetos de melhoria do

consumo de energia em seus prédios foi equivalente ao total gasto em programas de eficiência

para o setor residencial.

Esses exemplos ilustram a clara tendência das concessionárias priorizarem seus

investimentos com os fundos regulados em projetos que lhes tragam benefícios, o que é

natural e esperado. No entanto, o presente mecanismo e não garante que esses benefícios

sejam transferidos para o consumidor e se mostra redundante, uma vez que grande parte dos

projetos estariam sendo feitos mesmo sem a existência da regulação. Na verdade, a grande

maioria dos projetos são difíceis de serem justificados como “bens públicos” e que exigiriam um

esforço ou necessidade de regulação, pois são projetos que concessionárias competitivas,

interessadas em reduzir seus custos e aumentar sua disponibilidade de energia para vender

deveriam estar fazendo de qualquer maneira.

25 Isso já foi corrigido para os programas apresentado no ciclo 1999-2000.

Page 114: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

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Tabela 20: Alocação de investimentos em Projetos de Eficiência Energética – Projetos regulados ciclo1998-99

Tipos de projetos

Iluminação Pública 50%

Industrial 12%

Marketing 10%

Residencial 10%

Prédios Públicos 8%

Outros 10%

Projetos de melhoriade eficiência do ladoda demanda (usofinal)

(32%)

Total 100%

Melhorias no sistema de distribuição (reformas, ampliação e novossistemas)

27%

Instalação de medidores, regularização de consumidores, redução deperdas comerciais e técnicas

26,6%

Compensação reativa 9%

Melhoria em transformadores e circuitos secundários 7,9%

Outros 4,5%

Projetos de melhoriade eficiência do ladoda oferta

(68%)

Melhoria do fator de carga 25%

Total 100%

TOTAL US$ 112.7 milhões

Fonte: ANEEL (1999d).

Outro grande desafio para a ANEEL é realizar uma avaliação dos programas

implementados pelas concessionárias. O procedimento presentemente estabelecido baseia-se

em um mecanismo de controle de despesas das concessionárias. Não existe uma avaliação

com relação ao desempenho dos projetos, ou seja metas de energia conservada, custos por

unidade de energia conservada e capacidade evitada. Para isso seriam necessários dados

referentes ao mercado das próprias concessionárias, estabelecimento de referências ou “bench

marks” para se proceder a essa avaliação. Trata-se de um tipo de avaliação de caráter

bastante técnico e especializado que exigirá a confecção de protocolos de avaliação e

monitoramento juntamente com as proposições dos programas.

Page 115: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

101

Quanto aos benefícios econômicos que as próprias concessionárias poderão estar

auferindo com a aplicação dos recursos regulados, também existem dificuldades para sua

avaliação no momento. Idealmente espera-se que recursos regulados por uma agencia pública

tenham claro o seu objetivo final de beneficiar a sociedade e, portanto, em última análise esses

benefícios deveriam ser revertidos em tarifas menores para os consumidores.

Pesquisa e desenvolvimento

Nesta seção procura-se apresentar os principais elementos que são encontrados no

Manual de orientação para elaboração de projetos da ANEEL, com o propósito de caracterizar

a presente estratégia e tendência de investimentos em P&D. É feita também uma breve análise

dos projetos aprovados em 1998/99 com o objetivo de verificar a participação das áreas de

Eficiência energética do lado do Uso final e do lado da oferta.

O Manual da ANEEL distingue três categorias para as atividades de P&D:

1. Pesquisa Básica Dirigida: trabalho teórico ou experimental executado com o

objetivo de adquirir conhecimentos quanto à compreensão de novos fenômenos,

com vistas ao desenvolvimento de produtos, processos ou sistemas inovadores.

Envolve a análise de propriedades, estruturas e conexões para formular e

comprovar hipóteses, teorias e leis. Em geral são projetos desenvolvidos no âmbito

acadêmico e em institutos de pesquisas. São exemplos típicos os

desenvolvimentos nas áreas de materiais, tais como supercondutores, novos

materiais isolantes, ferromagnéticos, etc.

2. Pesquisa Aplicada: trabalho executado com objetivo de adquirir novos

conhecimentos , com vistas ao desenvolvimento ou aprimoramento de produtos,

processos e sistemas. Determina possíveis usos para as descobertas de Pesquisa

Básica Dirigida ou novos métodos e maneiras de alcançar um objetivo específico.

O resultado da Pesquisa Aplicada geralmente propicia à empresa de energia

elétrica a possibilidade de registro de patente junto ao INPI.

3. Desenvolvimento Experimental: trabalho sistemático delineado a partir do

conhecimento existente, visando a comprovação ou demonstração da viabilidade

Page 116: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

102

técnica ou funcional de novos produtos, processos, sistemas e serviços ou ainda,

um evidente aperfeiçoamento dos já produzidos ou estabelecidos.

Além disso, o Manual destaca cinco áreas de P&D para classificação dos projetos das

empresas:

1. Eficiência Energética: desenvolvimento de tecnologias e métodos para reduzir o

consumo de energéticos para a geração de eletricidade (melhoria de eficiência do

lado da oferta) e equipamentos de uso final (lado da demanda, ou uso final).

Incluem também o desenvolvimento de tecnologias para avaliar a melhoria de

eficiência das tecnologias de uso final.

2. Energia Renovável: captação e conversão das fontes renováveis (solar, eólica,

biomassa, PCHs) para gerar eletricidade e melhoria do desempenho técnico e

econômico dos sistemas de energia renovável.

3. Geração de Energia Elétrica: são projetos direcionados a obter melhorias de

eficiência energética e/ou desempenho ambiental de tecnologias de geração,

reduzindo os custos de produção.

4. Meio Ambiente: projetos destinados a melhorar o entendimento dos impactos

ambientais provocados pela exploração de energia elétrica e as medidas

mitigadoras dos mesmos.

5. Pesquisa Estratégica: melhorar a capacidade competitiva das empresas. Novos

negócios para as empresas adequação de produtos e serviços a diferentes

padrões de mercado e regulações para melhorar a posição competitiva das

empresas.

O Manual deixa claro as preocupações em se definir quais são os resultados

desejáveis de projetos de pesquisa e necessidade de equipes com formação acadêmica

adequada. Existe a preocupação por parte da ANEEL de analisar os projetos de acordo

também com diretrizes de P&D do setor elétrico, avaliar seus riscos e benefícios, mas não se

Page 117: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

103

distingue aquelas áreas que são de interesse público daquelas que possuem caráter comercial

e que não necessitam de regulação.

Uma avaliação dos projetos apresentados no ano de 1998 mostra que o total de

recursos que foram aplicados pelas empresas no ciclo 1998-99 foi de US $ 6,9 milhões (R$

12.026.567,00)26. Cerca de aproximadamente 92% desse montante foi destinado a pesquisas

consideradas do tipo estratégicas, 3% na área de Meio Ambiente e 5% em projetos de P&D na

área de Eficiência Energética. Cerca de 16% desses recursos estão sendo gastos nas próprias

empresas, com gastos de pessoal envolvido nos projetos. É notória a concentração de

investimentos em projetos de interesse próprio das concessionárias (“projetos estratégicos”). A

maioria dos projetos são de curto prazo e destinados a melhorar a eficiência do lado da oferta

(ANEEL, 1999c). Não se observou nenhum projeto para fontes renováveis de energia (Tabela

21).

Tabela 21: Investimentos em P&D durante 1998/99: indicadores

Total de investimentos: 6,9 milhões de dolares

Estrutura dos investimentos:

♦ 24% do total foram gastos em salários de funcionários das próprias concessionárias envolvidos emprojetos de P&D

♦ 76% foi usado para contratar serviços de universidades e centros de pesquisa (17% foram gastos comcontratos com CEPEL)

♦ Despesas com projetos de uso eficiente do lado da demanda: 0.6% do total

♦ Despesas com projetos de P&D com objetivos ambientais: 3%

♦ Despesas com pesquisas de caráter comercial: 92%

Fonte: a partir de dados da ANEEL

Os projetos na área de eficiência energética que puderam ser identificados estão

apresentados na Tabela 22. Não é de se surpreender que a maioria dos projetos propostos

pelas empresas tenham a classificação de pesquisas estratégicas, e que todos os projetos de

26 Em 1999, somente a Comissão de Energia da Califórnia aprovou projetos num montante de

US$ 34 milhões em seu Programa de Pesquisa de Interesse Público (Public Interest Energy

Page 118: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

104

eficiência energética (com exceção dos dois de menor porte, v. Tabela 22) visassem a melhoria

de eficiência do lado da oferta, diminuindo as perdas técnicas das empresas.

Tabela 22: Investimentos em projetos de P&D na área de Eficiência Energética aprovados pelaANEEL ciclo 1998/99

Empresa Recursos investidos Título do projeto

EBE R$ 335.040,00 Metodologia para avaliação de perdas técnicas e comerciais

R$ 147.067,00 Metodologia para cálculos de perdas em alimentadores.

R$ 45.900,00 Avaliação de equipamentos Eletrorurais.

CEMIG

R$ 50.000,00 Implementação de novas funções de controle em bancos decapacitores, reduzindo perdas no sistema com correção deperdas de reativo de forma padronizada.

COELBA R$ 33.175,00 Medição online do rendimento de um motor de induçãotrifásico – bancada de ensaio.

Total de investimentos em projeto de P&D na área de EficiênciaEnergética

R$ 611.182,00 (5% do total)

Total de recursos destinados a P&D (ciclo 1998/99) R$ 12.026.567,00

A pergunta que cabe é: é papel do regulador orientar, avaliar e fiscalizar essas

atividades? Não existem outras áreas que requerem uma intervenção mais explícita do

regulador para serem promovidas, e que não serão contempladas através dos mecanismos

usuais do mercado competitivo?

Na verdade existe a necessidade de uma definição de objetivos de política energética e

o papel da eficiência energética e P&D nesse contexto. A partir daí é possível estabelecer

mecanismos de regulação e acompanhar sua avaliação. No próximo capítulo voltaremos a

essa questão procurando aplicar a maior experiência dos EUA na regulação das atividades das

companhias privadas de energia.

Research - PIER), ou seja cerca de 5 vezes mais que todo o Brasil (a capacidade instalada daCalifórnia é ligeiramente superior que a do Brasil) (CEC 1999).

Page 119: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

105

O problema de consumidores de Baixa Renda

Muito embora a presente regulação não prevê nenhuma obrigação de investimentos

para atingir metas de universalização ou atendimento de consumidores de baixa renda esta é

outra área fortemente afetada pela introdução de maior competitividade e privatização dos

serviços de eletricidade.

Na medida em que as concessionárias foram privatizadas elas começaram a revisar a

classificação de seus consumidores considerados como baixa renda e sujeitos a tarifas

especiais. Como resultado de maior rigor na aplicação das regras herdadas desde 1995 do

antigo DNAEE que determinava os critérios para consumidores de baixa renda para cada

concessionária houve um acentuado declínio no número desse tipo de consumidor conforme é

apresentado na Tabela 23.

Se por um lado existe o interesse das concessionárias em diminuir o número de

consumidores que recebem uma tarifa mais baixa e subsidiada existe a realidade que esses

consumidores se vêem com contas maiores de energia, possuem pouca informação,

equipamentos obsoletos, baixa qualidade de suas instalações. Algumas dessas questões estão

sendo tratadas mais recentemente juntamente com os programas regulados de eficiência

energética quando concessionárias apresentam programas de instalação de medidores em

consumidores de baixa renda.

No entanto, dada as condições de renda do brasileiro e o fato de que ainda não existe

cobertura completa de serviços de eletricidade existe a necessidade de se pensar em uma política

para financiamento do acesso e manutenção desses consumidores à rede elétrica. A introdução de

competição impõe o problema de novo tipo de financiamento para substituir a atual prática de

subsídios cruzados.

Page 120: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

106

Tabela 23: A participação de consumidores de baixa renda nas várias regiões do país (março 1999)

Região % em relação ao total de consumidoresresidenciais

Variação do número de consumidores deBaixa Renda

(Dez. 97/ Mar. 99)

Centro-oeste 11,80% -19,52%

Norte 31,93% -17,90%

Nordeste 19,58% -26,44%

Sul 6,61% -40,75%

Sudeste 42,34% -9,47%

Brasil 29,10% -14,47%

Fonte: ANEEL, 1999

Conclusões

Atualmente, conforme apresentado acima, são as próprias concessionárias que

administram seus recursos aplicados em projetos de P&D aprovados pela ANEEL. Dentro

desse modelo, cabe à ANEEL apenas fiscalizar os itens de desembolsos dos projetos.

Assim como se observou no caso da grande parte dos projetos de melhoria de

eficiência, os projetos de P&D aprovados possuem a característica de trazer benefícios

financeiros às próprias companhias, e não fica claro como estes poderão ser repassados aos

consumidores e sociedade em geral. Não se trata de impedir que concessionárias tenham

benefícios, mas devem haver objetivos outros que justifiquem a necessidade dos recursos

regulados pela ANEEL.

É importante perceber que existem conflitos naturais de interesses para promover um

programa de eficiência de energia que poderá significar perda de receitas para a

concessionária e é necessário entender os limites de eficácia de uma regulação que deixa para

a própria concessionária a implantação desses programas.

A avaliação dos programas financiados com os recursos regulados é complexa e vai

além de uma contabilidade de despesas efetuadas. Os programas devem ser eficazes para

promoverem economias de energias para os consumidores, reduzir suas contas de energia,

Page 121: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

107

aumentar a confiabilidade do setor elétrico, auxiliar fontes menos poluentes a serem mais

competitivas, etc. É necessário que se estabeleçam objetivos e prioridades para programas de

eficiência e P&D juntamente com procedimentos de avaliação e monitoramento para melhor

utilização dos recursos regulados.

Caso modificações não sejam introduzidas no atual sistema de alocação e

gerenciamento de recursos, é possível apontar as seguintes conseqüências:

• Somente serão financiados projetos de P&D de curto prazo, de caráter comercial, não

havendo oportunidades para pesquisas de interesse público que permanecem sem definição

e sem financiamento.

• Projetos de P&D e eficiência energética do lado da demanda envolvem outros parceiros:

indústrias, consumidores. Existe uma dificuldade de realização de pesquisa e projetos

colaborativos, pois pode haver conflito de interesse entre as concessionárias e outros

parceiros. A competição entre concessionárias pode impedir sua colaboração para o

desenvolvimento de programas de maiores impactos e menores custos para a sociedade.

Projetos realizados em colaboração ajudam a diluir riscos entre os participantes, possibilitam

maior escala e recursos.

• Haverá um agravamento de disparidades regionais. As maiores e mais rentáveis companhias

estão localizadas nas regiões mais desenvolvidas, com maior renda per capita. Programas

de uso final deverão ser mais caros, mais difíceis de serem implementados em outras

regiões, onde inclusive poderão ter maiores benefícios sociais. Algumas regiões

(especialmente Norte e Nordeste) apresentam características menos investigadas e

problemas de fornecimento de energia que poder requerer maiores recursos que aqueles que

serão disponibilizados pelas concessionárias locais.

• Algumas das prioridades discriminadas nos manuais da ANEEL e a tendência observada

atestam que muitas ações seriam implementadas pelo próprio mercado e por companhias

que desejam manter vantagens competitivas, não havendo necessidade de uma intervenção

do órgão regulador para sua realização.

Page 122: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

108

• A atual sistemática não fornece meios para que o órgão público avalie o desempenho dos

investimentos em programas de eficiência energética e dos programas de P&D. Apenas

pode-se fazer uma contabilidade de gastos nesses programas, sem se saber quantificar as

economias de energia obtidas. Não é possível quantificar a apropriação de benefícios

advindos com a aplicação dos recursos regulados pelas concessionárias e como repassá-las

aos consumidores através de tarifas mais baratas.

A experiência brasileira serve para ilustrar a necessidade de se explicitar uma política

para aplicação de recursos e que a criação de um mecanismo de coleta de recursos para

financiar bens públicos como eficiência energética e P&D não é suficiente para garantir a

satisfação de interesses públicos que o regime de mercado pode não prover.

Page 123: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

109

CAPÍTULO 9: CONCLUSÕES

No plano internacional, a experiência tem mostrado que iniciativas de interesse público

nas áreas de eficiência energética, proteção ambiental e investimentos em pesquisas, por

exemplo, são minimizadas ou simplesmente ignoradas durante os estágios iniciais das

reformas. O desenvolvimento de um mercado competitivo captura toda a atenção da indústria

de eletricidade e freqüentemente dos órgãos encarregados das reformas. Como o ponto central

da competição baseia-se em preços de energia, mesmo atividades tradicionais ou em

andamento em áreas de eficiência energética, pesquisa e desenvolvimento, perdem sua

importância ou são desativadas se elas não apresentam vantagens para as companhias

privadas. Salvo, alguns casos onde existem oportunidades economicamente atraentes de

introdução de medidas de conservação e eficiência energética em grandes consumidores

comerciais e industriais, é que pode-se verificar uma continuidade de ação das ESCOs. Até

mesmo em países, como os EUA, onde já existia uma atividade considerável na área de

eficiência energética, fontes renováveis e pesquisa e desenvolvimento, o que ocorreu foi um re-

orientação de decisões e investimentos para fora do setor elétrico, antes regulado pelo setor

público, na direção do mercado consumidor, justamente onde o horizonte de tempo de

investimentos é menor quando comparado com o setor elétrico (ou governo), e apresenta altas

taxas de descontos.

Somente após 3 - 5 anos de reformas, alguns países com mercados mais sofisticados,

estão mostrando sinais de mais ativa participação do setor elétrico em matéria de eficiência

energética. É o caso da Nova Zelândia, onde as companhias de eletricidade estão formando

joint-ventures com fabricantes de equipamentos para introdução de modelos eficientes, na

busca de novas oportunidades de negócios (Hagler & Bailly, 1997). Na Inglaterra e Suécia

(Nilsson 1998) também existe a tendência das companhias de eletricidade iniciarem

investimentos em eficiência energética com o objetivo de diferenciar seus produtos no

mercado.

Page 124: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

110

A queda em investimentos em P&D na área energética é extremamente preocupante

por dois motivos principais: é crescente a evidência de que os impactos ambientais das fontes

e tecnologias de combustão de energéticos são grandes e crescentes, e que novas alternativas

necessitam ser investigadas para poder atingir metas mesmo modestas estabelecidas pelo

Protocolo de Quioto. Outro fato é que são necessários mais esforços de P&D para que

tecnologias de uso eficiente de energia e fontes renováveis venham a se tornar mais atraentes

frente às alternativas convencionais que deverão ter preços menores, como resultado de maior

competição.

Bens públicos nos EUA

Os EUA tem sido uma exceção dentre vários países que introduziram reformas no

setor energético no que se refere ao acesso a bens públicos durante o período de transição

para um ambiente de menor regulação e maior competição econômica. O debate e as

iniciativas para adaptação das reformas variam muito de estado para estado, no entanto, é

possível notar essa preocupação quando se constatou, por exemplo, a incapacidade do

mercado em manter os programas de eficiência energética e de pesquisa e desenvolvimento.

Em vários estados houve atenção e cuidado desde o início do processo para que informações

fossem levadas ao público e fossem promovidos amplos debates sobre os fundamentos e

implicações da reestruturação. A boa qualidade da intervenção pública foi grande responsável

pela introdução de mecanismos para criar e financiar os programas de bens públicos.

O caracter público da indústria de eletricidade era mais facilmente garantido nos EUA,

quando ela era um monopólio regulado, mas é possível constatar que as reformas consideram

que o governo deve determinar os limites de ações que favorecem uma agressiva competição,

sem comprometer o interesse da comunidade. A polêmica parece residir na extensão e forma

de sua intervenção no mercado de energia.

É importante reconhecer que se hoje existe um mercado para determinadas

tecnologias eficientes, fontes renováveis e maior nível de informação dos consumidores nos

EUA, isso se deve também aos vários anos de forte regulação pública.

Page 125: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

111

Além da tradição em implementar grandes programas de eficiência energética e uso de

fontes renováveis, o fato dos EUA já terem tido a experiência de realizar reformas nos setores

de telecomunicações e transportes auxiliou a formulação de políticas públicas para preservar

os aspectos de interesse para a sociedade.

Houve a preocupação em se definir quais são os bens públicos que devem ser

mantidos e até que ponto o próprio mercado competitivo poderia estimular ou comprometer o

acesso a esses bens. Percebe-se que ainda existem dificuldades para se estabelecer os limites

da intervenção do setor público, principalmente quando se trata da coleta e gerenciamento de

recursos financeiros27.

O caso da Califórnia é bastante ilustrativo no que se refere aos seguintes pontos:

a) intensa participação da sociedade através de suas organizações civis;

b) preocupação na definição dos "bens públicos" cuja manutenção era importante para os

cidadãos do estado e que estariam comprometidos com a maior competição entre as

empresas de energia;

c) definição de mecanismos transitórios para arrecadação de recursos para financiar a

continuidade de programas de "bens públicos";

d) definição de responsabilidades para o gerenciamento e definição de prioridades para os

programas.

O exemplo dos EUA mostra que é necessário garantir que investimentos continuem

fluindo para que iniciativas de eficiência energética, fontes renováveis, programas de pesquisa

e desenvolvimento, medidas de proteção ambiental e programas para população de baixa

renda. E que para isso ocorra é relevante a participação do governo através de suas agências

de regulação e a constante vigilância dos diversos grupos de interesses de consumidores,

27 É ilustrativo reproduzir aqui a posição do Cato Institute durante debate no 1996 ACEEE

Summer Study on Energy Efficiency in Buildings, Asilomar, Califórnia: ‘As decisões sobreinvestimentos em P&D devem ser feitas pela iniciativa privada, pois se existem oportunidadesde investir em idéias que gerem lucro, as empresas privadas o farão. O papel do governo é tãosomente o de facilitar o crescimento econômico. Eficiência energética não é tão importantequanto eficiência econômica’. Cato Institute é uma organização não-governamental quepromove estudos e análises sobre políticas públicas defendendo menor intervençãogovernamental e maior liberalismo econômico (http://www.cato.org).

Page 126: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

112

fabricantes de equipamentos eficientes, companhias relacionadas com fontes renováveis,

organizações ambientalistas, acadêmicos e pesquisadores, etc.

Bens Públicos no Brasil

As motivações e o processo de reformas introduzidas no Brasil são bem diferentes

daquelas observadas para os EUA. Ao mesmo tempo em que se privatizam as companhias de

energia estamos definindo os novos papeis para o setor público e nos capacitando para criar

regras para promover a competição e controlar um setor importante da infra-estrutura do país.

Nos primeiros momentos das reformas o que se observou foi uma orientação dos

órgãos ligados ao setor público de se afastarem das ações de eficiência energética e P&D e

deixar para que o próprio setor realizasse esses investimentos.

Um dos elementos chaves dessa estratégia foi a criação de uma resolução da ANEEL

obrigando que as companhias privatizadas alocassem 1% de suas receitas para investimentos

em medidas e programas de eficiência energética e P&D. Trata-se de um mecanismo bastante

explícito de fomento que foi colocado em prática em curto tempo e exigiu grande mobilização

do órgão regulador e das companhias para colocá-lo em operação. Ã luz da experiência dos

EUA, notamos duas diferenças relevantes: em primeiro lugar não houve aqui uma definição de

como esses investimentos deveriam ser conduzidos para atingir benefícios públicos que o

mercado não seria capaz de prover. Outro fator é a relativa pouca experiência no país

(comparada com os 20 anos de regulação em eficiência energética nos EUA e a experiência

com as reformas nos setores de transportes e telecomunicações) em criar regras e incentivos

para as companhias de eletricidade investirem em eficiência energética.

A falta de uma política nacional para o setor energético definida pelo CNPE é

largamente responsável pela omissão ou incompleta formulação de orientação para que a

ANEEL possa criar regulações eficazes. A criação da Resolução do 1% é uma iniciativa

progressista, mas por si só não garante nada. A formulação de programas de eficiência e P&D

pelas próprias concessionárias limita a abrangência das oportunidades que trazem maiores

benefícios sociais.

Page 127: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

113

É verdade que a atual regulação da ANEEL e as recentes iniciativas do governo para

criar recursos para eficiência e P&D são importantes, mas se não houver uma clara definição

de como aplicar esses recursos os resultados poderão ser modestos ou distorcidos como se

tem verificado até agora.

Esses recursos criados através de regulações devem ter como objetivo principal

financiar bens públicos. Deve haver maior preocupação em se verificar se os programas

implementados pelas concessionárias possuem desejado impactos sociais e econômicos nas

várias regiões do país. Ao mesmo tempo deve-se minimizar a utilização desses recursos em

atividades que são particularmente do interesse de companhias competitivas e que deveriam

estar sendo realizadas mesmo na ausência de regulação.

Faltam estudos de referência que avaliem as necessidades e potenciais para

investimentos em eficiência energética e P&D necessários para o desenvolvimento do país.

Falta maior definição sobre quais são as pesquisas de interesse público que um setor

privatizado não terá interesse em desenvolver.

É necessário entender também limitação do interesse das concessionárias brasileiras

em promover programas de eficiência energética, uma vez que para elas esses programas

podem representar perda de receitas. Aqui é relevante aproveitar a experiência dos EUA em

promover uma regulação por incentivos, conforme foi apresentado no capítulo 3.

No caso dos recursos do 1% a Figura 7 ilustra a presente alocação dos recursos e

como deverá ser o seu futuro emprego.

Page 128: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

114

Figura 7: Investimentos regulados para programas de eficiência energética e P&D de interessepúblico

A criação de um mercado competitivo implica em uma redefinição de papéis para o

poder público que agora deve se preocupar na definição de áreas de interesse publico onde é

necessária sua atuação direta e áreas onde deve adequar instrumentos para estimular que os

agentes do mercado convergiam para ações consideradas ótimas. As agência públicas devem

criar um contexto de políticas favoráveis para investimentos de agentes privados em medidas

de eficiência energética, fontes renováveis, e outras removendo as “barreiras” de mercado e

atuar diretamente utilizando fundos recolhidos de consumidores para financiar ações diretas

em áreas identificadas como “falhas” desse mercado.

A experiência brasileira serve para ilustrar a necessidade de se explicitar uma política

para aplicação de recursos regulados e que a criação de um mecanismo para financiar bens

públicos como eficiência energética e P&D não é suficiente para garantir a satisfação de

interesses públicos que o regime de mercado pode não prover.

Regulação Hoje

Futura regulação

SOCIEDADECONCESSIONÁRIA

Programas deEficiência e P&D deinteresse para asconcessionárias

Programas deEficiência e P&Dde interesse

Áreas determinadas pelomercado e levam abenefícios financeiros

Áreas querequeremfinanciamento.“Falhas demercado”

Page 129: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

115

ANEXO

O Protocolo de Quioto

O propósito desta seção é de fazer uma caracterização dos aspectos principais

relacionados ao Protocolo assinado em Quioto em dezembro de 1997. Ainda existem diversas

pendências e aspectos não definidos que serão necessários para viabilizar a operacionalização

das metas estabelecidas no protocolo.

Estamos interessados em apresentar aqui este protocolo porque ele incorpora uma

grande flexibilidade nos mecanismos que estão sendo propostos e eles são mecanismos de

mercado.

O Protocolo adotado pelo Third Conference of the Parties - COP-3 em Quioto

estabelece que as nações industrializadas (OCDE, mais Rússia, algumas nações da antiga

República Soviética e outros países do Leste Europeu – Países do Anexo I) deverão limitar as

emissões de gases estufa, em média a 5% a menos que os níveis registrados em 1990, para o

período de 2008 até 2012. Essa redução média representa de fato diferentes níveis de

emissões para esses países, indo desde –8% até +10%, com referência ao ano de 1990.

O protocolo incorpora a característica de deixar para que agentes privados

individualmente procurem por oportunidades de reduções economicamente atraentes para

serem transacionadas entre nações. Pela primeira vez mecanismos de mercado foram

introduzidos para implementar mudanças tecnológicas que resultem na redução de emissões.

O Protocolo regula seis GEEs: dióxido de carbono (CO2), metano (CH4), óxido nitroso

(N2O), hidro-fluorcarbonetos (HFCs), perfluorcarbonetos (PFCs) e hexafluor sulfúrico (SF6).

Características dos mecanismos de implementação

Com vistas a regular as emissões de GEE foram concebidos três mecanismos: i)

Certificados de Emissões Transacionáveis - Emissions Trading Among Nations with Caps (ET);

ii) Implementação Conjunta - Joint Implementation Between Nations With Caps (JI), que são

iniciativas baseadas em projetos visando a redução de emissões; e iii) Mecanismo de

Desenvolvimento Limpo Clean Development Mechanism Between Industrialized and

Page 130: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

116

Developing Nations (CDM) acordo entre países industrializados e em desenvolvimento visando

a negociação de transferência de certificados de emissão (Certified Emissions Reductions -

CER).

Existem ainda sérias indefinições com relação aos aspectos operacionais dos

mecanismos propostos, mas algumas características podem ser elencadas: a adicionalidade

ambiental e a adicionalidade financeira.

Existe uma clara determinação de se estimular a participação de entidades privadas

em soluções tecnológicas para o problema climático.

A Implementação Conjunta (Joint Implementation – JI)

Esta é uma modalidade onde os países do Anexo I, ou empresas dos mesmos,

realizam projetos em outros países com vistas a redução de GEE. Cada projeto gera um

número de Unidades de Certificados de Emissões – (Emission Certificates Units - EC) que

poderão ser utilizadas pelo país investidor. As UEC adquiridas pelo país investidor são

acrescentadas às quotas de emissões e deduzidas do país que recebeu os investimentos.

O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo

O artigo 12 cria condições para que países do Anexo I colaborem com países em

desenvolvimento através de projetos regulados por um conjunto de regras acordadas

multilateralmente, sendo essa cooperação supervisionadas pela Conferência das Partes e um

Executive Board.

Existe uma preocupação em se conceber mecanismos de mercado que são flexíveis e

estimulam uma competição de maneira transparente para introduzir no mercado as maneiras

mais eficientes e efetivas. Existe uma clara preocupação em se afastar de um modelo de

intervenção tradicional do setor público.

As decisões sobre a operação do CDM serão determinadas pelos seus órgãos de

governo. O artigo 12 da Convenção delega ao COP/MOP e a um Executive Boad (EB) as

funções gerais de orientação e supervisão do CDM.

As unidades transacionáveis pelo MDL são os certificados de reduções de emissões

(CREs) resultantes de projetos também certificados. Esta certificação tem um cariz multilateral

Page 131: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

117

e independente. Assim, a COPmop (designação dada à reunião das Partes da Convenção

destinadas à discussão do Protocolo de Quioto) designa (acredita) as entidades certificadoras,

as quais serão supervisionadas pela “comissão executiva” do MDL. Os CERs são então

adicionados às quotas de emissão dos países do Anexo 1 e apenas podem representar “Parte”

dessas quotas (requisito idêntico ao de suplementariedade).

O MDL é o resultado de várias pressões nem sempre coincidentes, que debateram até

à exaustão a inclusão no Protocolo de uma figura muito controversa: as atividades

implementadas conjuntamente. Acontece porém que esta figura se encontra numa fase piloto

que, na prática “não ata nem desata”. Foi então que, sob proposta do Brasil, surgiu a idéia de

criação de um “fundo de desenvolvimento limpo” que seria financiado através de sanções

pecuniárias aplicadas aos países que não cumprirem com as obrigações do Protocolo.

Todavia esta proposta acabaria por se transformar no MDL. Assim, por cada transação no

âmbito do MDL é cobrada uma taxa, que será aplicada no financiamento dos custos de

adaptação dos impactes das AICs em países em desenvolvimento, “particularmente

vulneráveis” à mudança climática. Esta componente de assistência financeira—aliada à

transferência de tecnologia resultante dos projetos do MDL propriamente dito--, foi uma das

condições essenciais de viabilização do Protocolo por Parte do chamado “Grupo dos

77+China” i.e. o grupo dos países em desenvolvimento (G77).

Em aberto porém ficam todas as questões que se colocavam em relação às atividades

implementadas conjuntamente, e que deram razão precisamente à criação de uma fase piloto

para essa figura. Por isso é essencial a articulação entre o funcionamento do MDL e a referida

fase piloto.

Page 132: POLÍTICAS PÚBLICAS PARA EFICIÊNCIA ENERGÉTICA E ENERGIA RENOVÁVEL NO NOVO CONTEXTO DE MERCADO

118

Quadro 4: Diferenças e semelhanças entre CE e IC

Comércio de emissões Implementação Conjunta

Diferenças

Por programa (licenças deemissão)

Antes das reduções ocorrerem (exante)

Governo-a-governo

por projecto (unidades de reduçãode emissões-UREs)

reduções antes da troca de UREs(ex post)

companhias podem participar

Semelhanças

Comércio de emissões entre países do Anexo I

um país adiciona as emissões à sua quota e o outro país deduz essasemissões na sua quota

suplementariedade: as emissões devem ser sobretudo reduzidas no paísde origem

identificação das emissões por país de origem

Somente parte das reduções podem ser transacionadas

CDM Entre país do Anexo I e País em Desenvolvimento (companhias podemparticipar)

Identificação por país e por projeto

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119

Os Certificados de Emissões (Global Tradable Permits)

As Partes do Anexo 1 podem comercializar uma porção da suas quotas de emissões.

Em princípio, através do comércio de emissões em sentido estrito (CE), cada Parte converterá

a sua quota de emissões em licenças de emissão transaccionáveis (V. Quadro 2: diferenças

entre CE e IC). Do ponto de vista contábil, o país adquirente adiciona as licenças compradas à

sua quota de emissões, e o país vendedor deduz essas mesmas licenças da sua quota de

emissões. Do ponto de vista das emissões, portanto, o país vendedor tem de emitir menos e o

país comprador pode emitir mais GEE, sendo que o limite global de emissões mantém-se

inalterado.

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