Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

31
POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL: descentralização em um Estado federativo * Marta T. S. Arretche RBCS Vol. 14 n o 40 junho/99 A estrutura organizacional do Sistema de Proteção Social Brasileiro vem sendo profunda- mente redesenhada. À exceção da área de previ- dência, nas demais áreas da política social — educação fundamental, assistência social, saúde, saneamento e habitação popular — estão sendo implantados programas de descentralização que vêm transferindo, paulatinamente, um conjunto significativo de atribuições de gestão para os níveis estadual e municipal de governo. Em 1997, instân- cias colegiadas estaduais, com representação pari- tária de estados e municípios, eram responsáveis pela alocação da totalidade dos recursos da princi- pal fonte financeira da política federal de sanea- mento e habitação popular — o FGTS; 1 a oferta de merenda escolar era inteiramente gerida por esta- dos e municípios; pelo menos 33% dos municípios brasileiros estavam habilitados a gerir os recursos federais destinados à oferta de serviços assistenci- ais; 58% dos municípios brasileiros estavam enqua- drados em alguma das condições de gestão previs- tas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), 2 e 69% das consultas médicas eram realizadas através de pres- tadores estaduais ou municipais, sendo que, destas, 54% eram prestadas pelos municípios. Se conside- rarmos que todas as atividades relativas à gestão destas políticas eram, no início dos anos 90, centra- lizadas no governo federal, temos a dimensão da transformação institucional que se vem operando no Sistema Brasileiro de Proteção Social. Há expressiva variação no alcance da des- centralização entre cada uma destas políticas. 3 Se a alocação dos recursos do FGTS e a merenda escolar estão totalmente descentralizadas, os re- sultados alcançados no território nacional nas áre- * Este trabalho foi extraído da Parte I de minha tese de doutorado, O processo de descentralização das políticas sociais no Brasil e seus determinantes, defendida junto ao IFCH/Unicamp em 1998, sob a orientação da Dra. Argelina Cheibub Figueiredo. Uma versão preliminar foi apresentada no XXI Encontro da LASA, 24-26 de setem- bro de 1998, Chicago, EUA. Agradeço à FAPESP o apoio financeiro para a participação no XXI Encontro da LASA; à Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pes- soal de Nível Superior (CAPES) e à Escola Nacional de Administração Pública (ENAP), pela concessão de bolsa do Programa de Apoio à Pesquisa em Administração Pública, aporte financeiro que foi fundamental para a realização deste trabalho; ao Instituto de Pesquisa Eco- nômica Aplicada (IPEA) e à Fundação do Desenvolvi- mento Administrativo (Fundap), pela possibilidade de realizar a pesquisa de campo. Finalmente, registro que a última versão deste artigo beneficiou-se das contribui- ções dos pareceristas anônimos desta Revista.

Transcript of Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

Page 1: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NOBRASIL: descentralização emum Estado federativo*

Marta T. S. Arretche

RBCS Vol. 14 no 40 junho/99

A estrutura organizacional do Sistema deProteção Social Brasileiro vem sendo profunda-mente redesenhada. À exceção da área de previ-dência, nas demais áreas da política social —educação fundamental, assistência social, saúde,saneamento e habitação popular — estão sendoimplantados programas de descentralização quevêm transferindo, paulatinamente, um conjuntosignificativo de atribuições de gestão para os níveisestadual e municipal de governo. Em 1997, instân-cias colegiadas estaduais, com representação pari-tária de estados e municípios, eram responsáveispela alocação da totalidade dos recursos da princi-pal fonte financeira da política federal de sanea-mento e habitação popular — o FGTS;1 a oferta demerenda escolar era inteiramente gerida por esta-dos e municípios; pelo menos 33% dos municípiosbrasileiros estavam habilitados a gerir os recursosfederais destinados à oferta de serviços assistenci-ais; 58% dos municípios brasileiros estavam enqua-drados em alguma das condições de gestão previs-tas pelo Sistema Único de Saúde (SUS),2 e 69% dasconsultas médicas eram realizadas através de pres-tadores estaduais ou municipais, sendo que, destas,54% eram prestadas pelos municípios. Se conside-rarmos que todas as atividades relativas à gestão

destas políticas eram, no início dos anos 90, centra-lizadas no governo federal, temos a dimensão datransformação institucional que se vem operandono Sistema Brasileiro de Proteção Social.

Há expressiva variação no alcance da des-centralização entre cada uma destas políticas.3 Sea alocação dos recursos do FGTS e a merendaescolar estão totalmente descentralizadas, os re-sultados alcançados no território nacional nas áre-

* Este trabalho foi extraído da Parte I de minha tese dedoutorado, O processo de descentralização das políticassociais no Brasil e seus determinantes, defendida juntoao IFCH/Unicamp em 1998, sob a orientação da Dra.Argelina Cheibub Figueiredo. Uma versão preliminar foiapresentada no XXI Encontro da LASA, 24-26 de setem-bro de 1998, Chicago, EUA. Agradeço à FAPESP o apoiofinanceiro para a participação no XXI Encontro da LASA;à Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pes-soal de Nível Superior (CAPES) e à Escola Nacional deAdministração Pública (ENAP), pela concessão de bolsado Programa de Apoio à Pesquisa em AdministraçãoPública, aporte financeiro que foi fundamental para arealização deste trabalho; ao Instituto de Pesquisa Eco-nômica Aplicada (IPEA) e à Fundação do Desenvolvi-mento Administrativo (Fundap), pela possibilidade derealizar a pesquisa de campo. Finalmente, registro quea última versão deste artigo beneficiou-se das contribui-ções dos pareceristas anônimos desta Revista.

Page 2: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

112 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

as de assistência social e saúde são mais modes-tos. Também é expressiva a variação do grau dedescentralização alcançado por cada uma destaspolíticas entre os estados brasileiros. No Estadodo Ceará, em 1996, a participação dos municípiosno total das consultas médicas realizadas era su-perior à média nacional, ao passo que na Bahiaesta participação era de apenas 24% do total dasconsultas prestadas no estado. No Estado do Para-ná, alterou-se substancialmente o padrão de ofer-ta de vagas no ensino fundamental, de tal modoque estas passaram a ser dominantemente oferta-das pelos municípios, ao passo que nos demaisestados não ocorreram, entre 1987 e 1994, altera-ções significativas na distribuição prévia das ma-trículas neste nível de ensino. Portanto, o alcancedesta reforma é bastante variável, seja entre asdiversas políticas, seja entre as unidades da Fede-ração no tocante a cada política particular.

Embora avançando a diferentes velocidades,é inegável, contudo, que há um processo de rede-finição de atribuições e competências na área socialque, se mantido, modificará radicalmente o padrãocentralizado característico do formato prévio denosso Sistema de Proteção Social, tal como consti-tuído ao longo dos anos 60 e 70.

Este artigo examinará os fatores que têmdeterminado a descentralização das políticas soci-ais no Brasil. Parte do pressuposto de que esteprocesso se vem realizando sob condições institu-cionais inteiramente distintas daquelas que viabili-zaram a consolidação do Sistema Brasileiro deProteção Social. Alterações profundas na naturezadas relações intergovernamentais, relacionadas àrecuperação das bases federativas do Estado bra-sileiro ao longo dos anos 80, têm impacto nascondições sob as quais se vem realizando o pro-cesso de transferência de atribuições na área soci-al. No Estado federativo brasileiro pós-1988, esta-dos e municípios passaram a ser, de fato, politica-mente autônomos. Isto implica que os governosinteressados em transferir atribuições de gestão depolíticas públicas devem implementar estratégiasbem-sucedidas de indução para obter a adesãodos governos locais.

O trabalho busca demonstrar que, no casobrasileiro — um Estado federativo, em um país

caracterizado por expressivas desigualdades estru-turais de natureza econômica, social, política e decapacidade administrativa de seus governos —,atributos estruturais das unidades locais de gover-no, tais como a capacidade fiscal e administrativae a cultura cívica local, têm um peso determinantepara a descentralização. Mas, tais fatores não sãodeterminantes em si. Seu peso e importância vari-am de acordo com requisitos institucionais postospelas políticas a serem assumidas pelos governoslocais, tais como o legado das políticas prévias, asregras constitucionais e a própria engenharia ope-racional de cada política social. No entanto, aação política deliberada, vale dizer, estratégias deindução eficientemente desenhadas para delegara outro nível de governo a responsabilidade pelagestão destas políticas, pode compensar obstácu-los à descentralização derivados daqueles fatoresde natureza estrutural ou institucional. Tais estra-tégias de indução, por sua vez, podem ser analiti-camente apreendidas por meio do exame da re-gulamentação dos programas e seu modo efetivode implementação.

Portanto, nas condições brasileiras, não ésuficiente que a União se retire da cena para que,por efeito das novas prerrogativas fiscais e políticasde estados e municípios, estes passem a assumir demodo mais ou menos espontâneo competências degestão. Na mesma direção, a descentralização daspolíticas sociais não é simplesmente um subprodu-to da descentralização fiscal, nem das novas dispo-sições constitucionais derivadas da Carta de 1988.Ao contrário, ela ocorreu nas políticas e nos estadosem que a ação política deliberada operou de modoeficiente.

A base empírica deste trabalho compreendeas cinco políticas sociais nas quais a descentraliza-ção estava na agenda de reformas desde os anos80 e seis estados brasileiros suficientemente diver-sos entre si para permitir observar o comporta-mento das variáveis consideradas relevantes: oEstado de São Paulo, o mais rico da Federação;dois estados da Região Sul, o Rio Grande do Sul eo Paraná, bastante assemelhados do ponto devista da riqueza econômica, capacidade fiscal eadministrativa e tradição de participação cívica; etrês estados da Região Nordeste — Bahia, Per-

Page 3: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL 113

nambuco e Ceará — que apresentam distinçõesentre si no que diz respeito à capacidade fiscal etradição cívica, mas que, para efeito de compara-ção com estados do Sul e Sudeste, podem serconsiderados um bloco com características asse-melhadas (ver Quadro 1).

Estado federativo e descentralizaçãodo Sistema Brasileiro de ProteçãoSocial

Durante o regime militar, as relações inter-governamentais do Estado brasileiro eram, na prá-tica, muito mais próximas às formas que caracteri-zam um Estado unitário do que àquelas que ca-racterizam as federações. Com efeito, governado-

res e prefeitos das capitais e de cerca de 150cidades de médio e grande portes foram destituí-dos de base própria de autonomia política: seleci-onados formalmente por eleições indiretas e, defato, por indicação da cúpula militar, sua autori-dade política não era derivada do voto popular.Além disto, todos os governadores e prefeitosdetinham escassa autonomia fiscal: a centraliza-ção financeira instituída pela reforma fiscal demeados dos anos 60 concentrou os principaistributos nas mãos do governo federal e, ainda quetenha ampliado o volume da receita disponíveldos municípios, uma vez realizadas as transferên-cias, estas estavam sujeitas a estritos controles dogoverno federal. Finalmente, os governadores nãotinham autoridade sobre suas bases militares, uma

Quadro 1Características Populacionais, Econômicas,

Fiscais e de Participação Associativa de Estados SelecionadosBrasil - 1987-95

1 2 3 4 5 6População PIB Receita Receita % de Filiação a Associações Civis

(em per capita Disponível Média Municípios Entidades Partidos Associaçõesmil hab.) (em per capita dos com mais de classe(b) políticos voluntárias(c)

(em 1994) R$ 1,00)(a) do Gov. Municípios d e (% da população declarante - 1988)(média Estadual (em 50.000 hab.

1987-94) (em R$ 1,00)(a) ( emR$ 1,00)(a) (média jan/1997)

(média 1989-95)1987-94)

Rio G. do Sul 9.502 4.495 513 4.667 8% 18,8 5,4 52,2Paraná 8.740 3.386 377 4.335 8% 18,9 4,5 21,7São Paulo 33.162 6.134 610 11.914 16% 12,1 2,4 13,5Bahia 12.610 2.739 275 3.094 8% 10,8 4,8 7,6Pernambuco 7.389 2.185 245 3.607 14% 13,8 2,6 7,5Ceará 6.756 1.711 252 2.771 11% 11,8 3,6 5,5BRASIL ... . . . . . . . . . 8% ... . . . . . .

Fontes: (1), (2) e (3): FEE, IPARDES, SEADE, SEI, FUNDAJ e IPLANCE.(4): STN/MINFAZ, Finanças do Brasil, 1989, 1993, 1991, 1995.(5): IBGE, Contagem Populacional, 1996.(6): IBGE, Suplemento político-social da PNAD, 1988.

(a) Valores deflacionados a preços de dez/95 pelo IGP-DI/FGV.(b) Obtido pela soma do número de filiados a sindicatos e a associações de empregados.(c) Obtido pela soma do número de filiados a associações de bairros ou de moradores,associações religiosas ou filantrópicas e associações esportivas ou culturais.

Page 4: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

114 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

vez que as polícias militares estaduais foram colo-cadas sob o controle do Exército nacional. Ora,relações intergovernamentais desta natureza ca-racterizam os estados unitários, nos quais o poderpolítico no plano local é uma delegação do go-verno central, fonte exclusiva da autoridade polí-tica (Riker, 1987).

Foi um Estado dotado destas característicasque consolidou o Sistema Brasileiro de ProteçãoSocial, até então um conjunto disperso, fragmen-tado, com reduzidos índices de cobertura e fragil-mente financiado de iniciativas governamentaisna área social. Esta forma de Estado moldou umadas principais características institucionais do Sis-tema brasileiro: sua centralização financeira e ad-ministrativa. As políticas federais de habitação esaneamento básico eram formuladas, financiadase avaliadas por uma agência federal e executadaspor uma série de agências locais dela dependen-tes. Os diversos programas de assistência socialeram formulados e financiados por organismosfederais e implementados por meio de diversasagências públicas e organizações semi-autônomasprivadas. As fatias federais da oferta de ensinofundamental — particularmente, os programas dereforço alimentar e de apoio à educação básica —eram diretamente formuladas, financiadas e im-plementadas por agências do governo federal.4 Apolítica de saúde, ainda que dispersa entre dife-rentes instituições, também era executada supon-do a centralização financeira e administrativa doInstituto Nacional de Assistência Médica e Previ-dência Social (INAMPS) e os programas verticaisdo Ministério da Saúde. Tal formato institucionalera compatível com o tipo de Estado vigentedurante a ditadura militar, para o qual estados emunicípios eram agentes da expansão do Estadoe da execução local de políticas centralmenteformuladas. Nestes termos, grande parte da ativi-dade de planejamento no plano local consistia emformular projetos de solicitação de recursos parao governo federal, nos termos previstos pelaagência federal encarregada da gestão de umadada política (Medeiros, 1986).

Ao longo dos anos 80, recuperaram-se asbases do Estado federativo no Brasil. A democrati-zação — particularmente, a retomada de eleições

diretas para todos os níveis de governo — e adescentralização fiscal da Constituição de 1988alteraram profundamente a natureza das relaçõesintergovernamentais. A autoridade política de go-vernadores e prefeitos não deriva do governocentral, mas do voto popular direto. Paralelamente,estes últimos também expandiram expressivamen-te sua autoridade sobre recursos fiscais — uma vezque se ampliou a parcela dos tributos federais queé automaticamente transferida aos governos subna-cionais —, assim como passaram a ter autoridadetributária sobre impostos de significativa importân-cia. Em suma, no Brasil pós-1988, a autoridadepolítica de cada nível de governo é soberana eindependente das demais. Diferentemente de ou-tros países, os municípios brasileiros foram declara-dos entes federativos autônomos, o que implicaque um prefeito é autoridade soberana em suacircunscrição.

Nestas condições, a redefinição de compe-tências e atribuições da gestão das políticas sociaistem-se realizado sob as bases institucionais de umEstado federativo, o que significa dizer que o modopelo qual os governos locais assumem funções degestão de políticas públicas é inteiramente distintodaquele sob o qual elas foram assumidas noregime militar.

Em Estados federativos, estados e municípi-os — porque dotados de autonomia política efiscal — assumem funções de gestão de políticaspúblicas ou por própria iniciativa, ou por adesãoa algum programa proposto por outro nível maisabrangente de governo, ou ainda por expressaimposição constitucional. Assim, a transferênciade atribuições entre níveis de governo supõe aadesão do nível de governo que passará a de-sempenhar as funções que se pretende que sejamtransferidas. A recuperação das bases federativasdo Estado brasileiro tem impacto sobre o proces-so de descentralização das políticas sociais nopaís pelo fato de que, resguardados pelo princí-pio da soberania, estados e/ou municípios assu-mem a gestão de políticas públicas sob a prerro-gativa da adesão, precisando, portanto, ser incen-tivados para tal. Isto significa que as agênciasfederais já não dispõem dos mecanismos de ali-nhamento dos governos locais — autoridade polí-

Page 5: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL 115

tica delegada pelo centro e centralização fiscal —de que dispunham sob o regime militar. Assim,no Estado federativo, tornam-se essenciais estraté-gias de indução capazes de obter a adesão dosgovernos locais. Ou, dito de outro modo, as difi-culdades para que a União — ou um governoestadual — delegue funções a um nível de go-verno menos abrangente são maiores hoje do quesob o regime militar.

Mas, além disto, em Estados federativos comsistema partidário competitivo, o controle de pos-tos no Executivo e nas agências de governo cons-titui um importante recurso institucional das partesem disputa, o que implica dizer que tais sistemastendem a estimular conflitos intergovernamentais(Schaps e Riker, 1987, pp. 73-77). Estados federati-vos e competição eleitoral engendram barganhasfederativas, pelas quais cada nível de governopretende transferir a uma outra administração amaior parte dos custos políticos e financeiros dagestão das políticas e reservar para si a maior partedos benefícios dela derivados.

No caso brasileiro, a responsabilidade públi-ca pela gestão de políticas sociais passou a serum dos elementos da barganha federativa. Dadasas dimensões da pobreza brasileira e, portanto, dapopulação-alvo dos programas sociais, a gestãode políticas sociais em nosso país tende a sersimultaneamente cara e inefetiva, na medida emque tende a consumir um elevado volume derecursos e apresentar baixos níveis de proteçãoefetiva. Neste caso, nas situações em que os cus-tos políticos e/ou financeiros da gestão de umadada política forem avaliados como muito eleva-dos, a barganha federativa consiste em buscaratribuí-los ou imputá-los a um outro nível degoverno. Tais custos serão tanto maiores quantomais elevados forem os recursos exigidos pelaengenharia operacional de uma dada política5 ena medida direta da extensão legal do escopo debeneficiários.6

É devido à dimensão de barganha federati-va que o processo de descentralização das polí-ticas sociais no Brasil só pode ser efetivo namedida em que as administrações locais avaliempositivamente os ganhos a serem obtidos a partirda assunção de atribuições de gestão; ou, pelo

menos, que considerem que os custos com osquais deveriam arcar poderiam ser minimizadospela ação dos demais níveis de governo. Assim,nas condições brasileiras atuais, a adesão dosgovernos locais à transferência de atribuições de-pende diretamente de um cálculo no qual sãoconsiderados, de um lado, os custos e benefíciosfiscais e políticos derivados da decisão de assu-mir a gestão de uma dada política e, de outro, ospróprios recursos fiscais e administrativos com osquais cada administração conta para desempe-nhar tal tarefa.

Determinantes da descentralizaçãodas políticas sociais nos anos 90

Nestes anos 90, o governo federal vemdelegando a estados e municípios grande partedas funções de gestão das políticas de saúde,habitação, saneamento básico e assistência soci-al. Em 1997, instâncias colegiadas estaduais, comrepresentação paritária de estados e municípios,eram responsáveis pela alocação da totalidadedos recursos da principal fonte financeira dapolítica nacional de saneamento e habitação po-pular, o FGTS, o que significa que o executivofederal perdeu grande parte de seu poder aloca-tivo sobre os recursos do Fundo; a oferta demerenda escolar era inteiramente gerida por es-tados e municípios; 58% dos municípios brasilei-ros estavam enquadrados em alguma das condi-ções de gestão previstas pelo SUS, o que signifi-ca que estes assumiram funções de gestão daoferta local de serviços de saúde até então de-sempenhadas pela União; 69% das consultas mé-dicas eram realizadas através de prestadores es-taduais ou municipais, sendo que, destas, 54%eram prestadas pelos municípios, o que significaque mais da metade das consultas médicas pas-saram a ser oferecidas por prestadores munici-pais, os quais eram, até o final dos anos 80 —respeitadas as exceções —, o nível de governomenos envolvido na oferta de serviços de saúde(ver coluna “extensão da descentralização noplano nacional”, no Quadro 2).

Por outro lado, nos estados examinados, amunicipalização dos serviços de saneamento bási-

Page 6: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

116 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

Quadro 2Atributos Institucionais das Áreas e Programas Selecionados

Áreas de Programas Política Níveis de Extensão dapolítica ativa de governo descentralização

descentralização envolvidos no plano nacionalSaneamento Municipalização não Governo estadual para Em nenhum estado ocorreu

dos serviços de governos municipais um processo significativosaneamento básico de municipalização

(dez/1997)Habitação Emergência de não Governo federal para Criou-se um sistema estadual

Sistemas Estaduais governos estaduais de habitação apenasde Habitação nos estados de São Paulo e

Ceará (final de 1994)Habitação e Programa (federal) sim Governo federal para Houve 100% de adesão dosSaneamento de criação de governos estaduais governos estaduais

instâncias colegiadas ao programa (dez/1995)estaduais para adistribuição dosrecursos do FGTS

Educação Municipalização sim (Paraná) Governo estadual para A municipalização da rededas redes não (Rio G. do Sul, governos municipais estadual de ensino(estaduais) São Paulo, Bahia, fundamental ocorreude ensino Pernambuco apenas no Estado do Paranáfundamental e Ceará) (final de 1994)

Educação Programa (federal) sim Governo estadual para A municipalizaçãode municipalização governos estaduais da merenda escolar estáda merenda escolar e municipais integralmente descentralizada

(outubro/1997)Assistência Programa (federal) sim Governo federal para 33% de adesão

de municipalização governos municipais dos governos municipaisda política ao programade assistência (agosto/1997)

Saúde Municipalização sim Governos federal e 54% das consultas médicasdas consultas estaduais para foram prestadas pelosmédicas governos municipais municípios (ano de 1996)

Saúde Processo sim Governo federal para 58% dos municípios haviamda habilitação governos municipais aderido ao programamunicipal ao SUS (janeiro/1997)

co não passou de uma expectativa frustrada; até1995, a emergência de sistemas estaduais de habi-tação ocorreu apenas nos estados de São Paulo e doCeará; a municipalização da rede de ensino funda-mental ocorreu somente no Estado do Paraná; e,finalmente, em 1997, apenas 33% dos municípiosbrasileiros estavam habilitados a gerir os recursosfederais destinados à oferta de serviços assistenci-ais (ver coluna “extensão da descentralização noplano nacional”, no Quadro 2).

Que fatores determinaram esta variação, deum gradiente de total adesão, nos casos das ins-tâncias colegiadas do FGTS e da merenda escolar,à ausência de municipalização, no caso do sanea-mento? Que fatores determinaram que, nos de-mais casos estudados — redes de educação fun-damental, consultas médicas, habilitação ao SUS,municipalização da assistência social e criação desistemas estaduais de habitação —, tenha ocorri-do expressiva variação no grau de descentraliza-

Page 7: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL 117

ção observado nos estados? Tomemos, inicial-mente, os determinantes da variação entre as áre-as de política social para, em seguida, examinar-mos a variação entre os estados.

Determinantes da variação entre as políticass o c i a i s

Tomemos os resultados alcançados no planonacional para avaliar o alcance da descentraliza-ção em cada uma das áreas de política social.

Para operacionalizar a análise da descentra-lização em cada política, tomei como objeto em-pírico de análise um conjunto selecionado de“programas”, os quais estão apresentados noQuadro 2. Assim, para compreender a descen-tralização na área de educação fundamental, fo-ram observadas as trajetórias do programa demerenda escolar e a municipalização das matrí-culas no ensino fundamental. Portanto, a trajetó-ria destes “programas” será tomada como repre-sentativa da descentralização na área de educa-ção fundamental.

Observe-se que foi adotada aqui uma no-ção alargada do conceito de programa, uma vezque esta seleção abrangeu inclusive situaçõesem que não ocorreu uma ação deliberada dogoverno na direção da descentralização. Aqui, oconceito de “programa” está relacionado a umapossível área de atuação do Estado, no interiorde uma dada área de política social, mesmo queesta atuação não tenha ocorrido,7 ou mesmoque este “programa” cuja trajetória foi objeto deobservação seja um componente de um progra-ma governamental de dimensões mais abrangen-tes.8 Neste caso, cada “programa” refere-se auma dimensão observável da área de políticasocial em questão, dimensão esta que deveriaser simultaneamente o mais representativa possí-vel do processo de descentralização em curso emensurável por indicadores de cobertura ou ca-pacitação institucional.9 Portanto, esta seleçãocompreendeu: (a) processos quantificáveis porindicadores de cobertura ou de capacitação insti-tucional em todas as áreas de política social emque a questão da descentralização está na agen-da de reformas desde os anos 80, para testar aimportância de variáveis de tipo institucional; (b)

processos de descentralização que envolvem re-lações do governo federal com governos estadu-ais, do governo federal com estados e municípi-os e dos governos estaduais com seus respecti-vos municípios, para testar se tais relações pode-riam ter impactos sobre o processo de transfe-rência de atribuições; e (c) processos nos quaisocorreram políticas ativas de descentralização,bem como situações nas quais estas não ocorre-ram, para testar se estratégias de indução desti-nadas a transferir atribuições poderiam afetar osresultados da descentralização (ver Quadro 2).

Observemos nos resultados apresentados noQuadro 2 que temos aí três casos situados nospontos extremos da escala de variação: de umlado, a municipalização dos serviços de sanea-mento básico, cujo grau de descentralização foipraticamente nulo em todos os estados e, deoutro lado, a descentralização da merenda escolar— já totalmente transferida a estados e municípi-os — e o programa (federal) de criação de instân-cias colegiadas para a alocação do FGTS, os quaisobtiveram elevados graus de descentralização emtodos os estados.10 Entre estas situações polares,temos os casos da municipalização dos recursosfederais para assistência social; da emergência desistemas estaduais de habitação; das dimensõesavaliadas de municipalização de funções na áreada saúde, e da municipalização das redes deensino fundamental.

O que revelam as situações polares, valedizer, aquelas nas quais encontramos “zero” ou“100%” de descentralização?

Comecemos pela municipalização dos servi-ços de saneamento no período 1987-1994. Osmunicípios cujos serviços de saneamento básiconão são municipalizados são servidos por empresaspúblicas estaduais, detentoras de contratos de con-cessão. Além disto, esta política, por ser operadacomo monopólio natural, deve ser gerida sob aforma de competências exclusivas, independente-mente de qualquer definição constitucional. Nosanos 80, quando a proposta de municipalizaçãodos serviços ganhou espaço na agenda de refor-mas, operavam no setor companhias estaduais jáinstaladas, com contratos de concessão municipalem vigência, e com alguma capacidade para reali-

Page 8: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

118 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

zar investimentos. Para municipalizar, os municípi-os deveriam romper unilateralmente seus contratosde concessão com estas empresas, o que implicariauma longa batalha jurídica com alto risco de insu-cesso do ponto de vista legal. Mas, caso viessem aser bem-sucedidos nesta estratégia, deveriam arcarcom a parcela do endividamento destas empresasrelacionada aos investimentos realizados no muni-cípio, bem como negociar os termos de transferên-cia do patrimônio instalado e do quadro de pessoal.Além disto, deveriam fazer novos investimentospara melhorar a qualidade dos serviços, uma vezque o rompimento com a empresa estadual justifi-cava-se por descontentamentos na prestação deserviços. Ademais, a engenharia operacional daárea de saneamento básico supõe que sejam reali-zados vultosos investimentos concentrados no tem-po. Estes dois fatores — natureza da política elegado das políticas prévias — implicariam, para osmunicípios dispostos a assumir a gestão dos servi-ços, que estes deveriam arcar com elevados custosfinanceiros e (incertos) custos jurídicos para obter atransferência de funções.

Naquela conjuntura (1987-1994), as decisõestomadas no âmbito federal e pelos governos esta-duais detentores das concessões não visaram mi-nimizar tais custos para as administrações munici-pais. Não havia qualquer regra constitucional queincentivasse a alteração da distribuição prévia deatribuições, o que na prática favoreceu a manu-tenção do status quo. Mas, além disto, não houvequalquer programa federal — ou de iniciativa dealgum governo estadual — que, a exemplo doPlanasa, criasse incentivos para que os municípiosse dispusessem a reverter a modalidade de ofertade serviços preexistente. Ao contrário, as compa-nhias estaduais de saneamento atuaram de modoa preservar seus mercados, pelas vias da disputajurídica, da melhoria de seus serviços e de umapolítica mais agressiva de renovação dos contra-tos de concessão. Dados os custos derivados danatureza da política e do legado das políticasprévias, e dada a ausência de incentivos à muni-cipalização derivada das decisões tomadas nosplanos federal e estadual, o cálculo das adminis-trações municipais foi francamente desfavorável àmunicipalização.

Os casos da instalação de instâncias colegia-das para a alocação dos recursos do FGTS e dadescentralização da merenda escolar situam-se nopólo oposto. O programa federal que transferiuintegralmente a colegiados estaduais a autoridadepara alocar os recursos do FGTS em seu territóriofoi lançado em junho de 1995 e, em outubroseguinte, todos os estados brasileiros já haviamcumprido as exigências legais para deter autorida-de alocativa sobre estes recursos. Isto ocorreu, deum lado, porque as políticas de habitação e sanea-mento envolvem vultosos investimentos, isto é, aengenharia operacional destas políticas envolveelevados custos financeiros para os agentes quequiserem assumir sua gestão. De outro lado, desdea extinção do Banco Nacional da Habitação (BNH),a alocação dos recursos do FGTS vinha sendocrescentemente submetida a critérios de lealdadepolítica e, de 1992 a 1995, por decorrência de umrombo financeiro produzido para “comprar” oapoio ao presidente Fernando Collor de Mello noepisódio do impeachment, nenhum novo contratohavia sido firmado entre governo federal e osestados e municípios. Em suma, às dificuldadesderivadas da natureza da política acrescentava-se aescassez de recursos que caracterizou a gestãofederal do FGTS previamente à proposta de instala-ção das instâncias colegiadas.

A partir de 1995, o governo federal instituiuum programa cujo desenho operacional tornavaextremamente atrativo aos governos estaduais as-sumirem determinadas funções de gestão. O pro-grama (1) transferia vultosos recursos para seremalocados com relativo grau de liberdade pelasinstâncias colegiadas estaduais; além disto, (2)exigia baixos custos de instalação — bastava criarum colegiado nos termos previstos pelo governofederal — e (3) conferia forte poder decisório aosexecutivos estaduais, uma vez que estes detêm opoder de convocar os membros da comissão epodem com facilidade “fazer a maioria” em suacomposição.11 Nestes termos, a estratégia de des-centralização adotada pela União, cujo desenhoinstitucional levou em consideração os elevadoscustos financeiros a serem assumidos para o exer-cício destas políticas e o legado das políticasimplementadas previamente, implicava elevados

Page 9: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL 119

benefícios e custos reduzidos aos governos estadu-ais. Adesão rápida e massiva foi a resposta dosgovernos locais.

No caso da descentralização da merendaescolar, a natureza do serviço a ser oferecido nãoenvolve elevados custos de investimento ou cus-teio. Até uma certa escala de operações, trata-sede oferecer alimentos gratuitamente à populaçãoescolar — o que permite angariar benefícios polí-ticos com baixo custo financeiro —, refeição estasobre a qual não existe um rigoroso controle dequalidade e cuja preparação permite a contrata-ção de funcionários de baixa qualificação e bai-xos salários.

Por sua vez, o desenho do programa federalapresenta poucas exigências para a adesão. Naverdade, as exigências do MEC apenas referen-dam o que estados e municípios já deveriamfazer: estar em dia com os impostos federais,cumprir a vinculação constitucional de gasto ecriar conselhos de alimentação escolar. Mas, oque é mais importante, o programa federal acres-centa recursos automáticos aos cofres locais —vale dizer, recursos que não estão sujeitos à nego-ciação política —, cujos montantes serão tantomaiores quanto maiores forem as populações es-colares sob sua responsabilidade. Ou seja, o nívelde governo que tiver bancos escolares e cumpriras exigências para inscrever-se junto ao FNDE12

estará apto a receber os recursos federais. Nestecaso, portanto, à natureza do serviço a ser ofere-cido, que implica baixos custos financeiros deinstalação e custeio, agregou-se a decisão federalde instituir um programa cujo desenho operacio-nal oferece uma estrutura de incentivos muitofavorável à adesão. Nestes termos, o resultado docálculo das administrações locais (estaduais oumunicipais) revela-se no amplo alcance da des-centralização.

Em suma, embora os possíveis custos políti-cos e financeiros derivados da engenharia operaci-onal das políticas e do legado das políticas préviassejam elementos importantes do cálculo que reali-zam as administrações locais para vir a assumirdeterminadas funções de gestão na área social, avariável “existência de programas deliberados” éfundamental para explicar o alcance ou a extensão

da descentralização. Em um Estado federativo, ca-racterizado pela efetiva autonomia política dosníveis subnacionais de governo, a assunção deatribuições em qualquer área de políticas públicas— na ausência de imposições constitucionais —está diretamente associada à estrutura de incenti-vos oferecida pelo nível de governo interessado natransferência de atribuições.

Mas, não é a simples “presença ou ausênciade programas” que define a extensão da descentra-lização. Se assim fosse, em todos os casos em quehouvesse sido instituído um programa, teríamos osmesmos resultados. A existência de programas —ou a disposição do nível de governo interessado —é uma condição necessária, mas não suficiente paraque ocorra descentralização.

Na verdade, o grau de sucesso de um progra-ma de descentralização está diretamente associadoà decisão pela implantação de regras de operaçãoque efetivamente incentivem a adesão do nível degoverno ao qual se dirigem: reduzindo os custosfinanceiros envolvidos na execução das funções degestão; minimizando os custos de instalação dainfra-estrutura necessária ao exercício das funçõesa serem descentralizadas; elevando o volume dareceita disponível; transferindo recursos em umaescala em que a adesão se torne atraente; e,finalmente, revertendo as condições adversas deri-vadas da natureza das políticas, do legado daspolíticas prévias e — como veremos no próximoitem — dos atributos estruturais de estados emunicípios. Inversamente, na ausência de progra-mas que gerem tais incentivos, os recursos doscofres locais serão disputados pelas demais áreaspossíveis de aplicação.

É por esta razão que a descentralização fis-cal não é condição suficiente para que uma dadaadministração decida aplicar o acréscimo de re-ceitas dela derivado na implementação de progra-mas em uma dada área das políticas públicas. Istoapenas significa que este executivo local terá maisrecursos a serem aplicados, mas não é suficientepara definir em qual política os aplicará. Consi-derando um leque possível de áreas de aplicaçãode recursos, esta decisão será o resultado de umcálculo no qual a natureza da política, o legadodas políticas prévias, as regras constitucionais e a

Page 10: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

120 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

existência de uma estratégia eficientemente dese-nhada e implementada por parte de um nível degoverno mais abrangente são componentes de-c i s i v o s .

A importância da variável “existência deprogramas que gerem incentivos à ação dos go-vernos locais” pode ser claramente identificadacom relação ao caso das redes de ensino funda-mental. Assumir a gestão de tais redes implicagastos de investimento relativos à construção einstalação de escolas e gastos de custeio relativosà sua manutenção e ao pagamento de professo-res. Tais custos financeiros serão tão maioresquanto maior for sua provável população-alvo,isto é, quanto maior for a população em idadeescolar de uma dada cidade. Aos custos financei-ros, contudo, contrapõem-se os custos políticosde não oferecer vagas escolares; tais custos políti-cos tornam-se ainda mais elevados por tratar-sede uma política com relação à qual existe umaregra constitucional que obriga o poder público àoferta universal de serviços. Embora esta não seja,constitucionalmente, uma obrigação exclusiva dosgovernos municipais, a responsabilidade políticapela oferta de vagas escolares recai também so-bre as administrações municipais.

Nestas circunstâncias, a existência de progra-mas que minimizem os custos de instalação emanutenção das redes escolares funciona como umincentivo para que as administrações municipaisdecidam canalizar seus esforços para a oferta devagas no ensino fundamental. Para municípiospobres, a existência de tais recursos funciona inclu-sive como uma estratégia de captação — perma-nente ou provisória — de recursos externos, sejameles estaduais, federais ou internacionais.

Os programas federais das décadas de 70 e80, que ofereciam recursos para a instalação deredes municipais no ensino de 1a a 4a séries eapoio técnico e financeiro à sua manutenção,foram decisivos para a expansão da oferta devagas escolares municipais nos estados do Nor-deste, particularmente naqueles municípios po-bres, pouco populosos e distantes dos centrosadministrativos. Da mesma forma, no período1987-1994, a existência de um programa delibera-do de transferência da rede de ensino de 1a a 4a

séries no Estado do Paraná explica a expressivaalteração da distribuição das matrículas no nívelfundamental naquele estado. Contrariamente, oinsucesso das medidas tomadas no Estado de SãoPaulo e a ausência de programas desta naturezanos estados do Rio Grande do Sul, Bahia e Per-nambuco explicam por que não ocorreu a munici-palização das matrículas nestes estados (ver Qua-dro 2). Assim, embora a Constituição de 1988estabeleça que o ensino fundamental deva seroferecido preferencialmente pelos municípios eos obrigue a aplicar ao menos 25% de suas recei-tas de impostos e transferências em ensino, ape-nas no Estado do Paraná, devido à existência deuma estratégia de indução eficientemente dese-nhada e implementada, ocorreu uma alteraçãosignificativa da distribuição prévia das matrículasentre os níveis de governo.

Até o momento, vimos como, para cada umdos casos acima examinados, a existência de umaestratégia de indução eficientemente desenhada eimplementada foi decisiva para os resultados dadescentralização. Uma estratégia de indução efici-ente, por sua vez, supõe que o nível de governointeressado na descentralização tenha disposição emeios para formular e implementar um programacujo desenho torne a decisão pela assunção deatribuições de gestão suficientemente atrativa paraas administrações locais. Ora, se os requisitos daengenharia operacional de cada política, o legadodas políticas prévias e as regras constitucionaispodem gerar — de modo diferente para cadapolítica particular — (des)incentivos à decisãolocal pela descentralização, um programa destina-do a transferir atribuições deve, no mínimo, incor-porar e permitir superar tais obstáculos.

Este mesmo argumento pode ser utilizadopara explicar a variação de resultados dos demaiscasos. O programa (federal) de municipalização daassistência social alcançou, até setembro de 1997,33% de adesão municipal. Por que uma taxa assimtão baixa?

O programa propõe que as administraçõesmunicipais venham a assumir em seu território agestão integral das ações de assistência social. Aassunção de tais atribuições implicaria um certorisco financeiro, visto que, uma vez habilitado, o

Page 11: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL 121

município passaria a responder pelo pagamentodos convênios com as instituições não-governa-mentais prestadoras de serviços, cujo credencia-mento é — segundo a regulamentação do progra-ma — realizado pelo governo federal. E o municí-pio deveria assumir tal compromisso em condiçõesde incerteza quanto ao efetivo cumprimento dastransferências financeiras por parte da União. Alémdisto, dado que passaria a responder por todas asações diretas de assistência em seu território, aassunção de tais funções implicaria que União egoverno estadual estariam desobrigados de desem-penhar tais tarefas, exceto em casos de calamidadepública. Em suma, não são irrelevantes os custosfinanceiros e políticos derivados da proposta demunicipalização do governo federal, vale dizer, dasregras de operação do programa e de seu modoefetivo de implementação.

Acrescente-se a isto que o modo efetivo deimplantação do programa não foi capaz de minimi-zar as incertezas das administrações municipaisquanto aos prováveis custos derivados da munici-palização da assistência social. A regulamentaçãodo programa completou-se apenas em 1997, suasregras efetivas de operação favoreceram executi-vos estaduais contrários à municipalização dasações e o repasse automático de recursos efetiva-mente não ocorreu. Nestes termos, na prática, omodo efetivo de implementação do programa oaproxima da situação de “ausência de política dedescentralização”, uma vez que seu processo deimplantação é recente e seu desenho operacional émarcado por contradições internas, as quais permi-tem amplo espaço de manobra aos interessescontrários à municipalização. Nestas condições,não é de surpreender que o cálculo realizado pelasadministrações municipais tenha-se traduzido embaixas taxas de adesão.

Os programas de descentralização na área dasaúde aqui analisados apresentam, por sua vez,taxas mais elevadas de adesão. Em janeiro de 1997,58% dos municípios brasileiros estavam habilitadosem alguma condição de gestão do SUS e, ao longodo ano de 1996, 54% das consultas médicas foramprestadas por unidades municipais de saúde (Qua-dro 2). Estes resultados são condicionados peloconjunto de regras que envolvem a implantação do

SUS: a regra constitucional de universalidade doatendimento em saúde, as regras de operação doSUS e o modo pelo qual o Ministério da Saúde vemimplantando a descentralização, marcado pela pre-cariedade no desempenho de suas funções definanciamento do sistema. No entanto, para cadaum destes dois casos, a adesão à municipalizaçãoimplica custos diferentes, dado que são diferente-mente afetados pelas regras de operação do SUS epela natureza mesma das funções a serem desem-penhadas.

No caso do programa federal de habilitaçãomunicipal ao SUS, a adesão envolve o custo políti-co e financeiro de arcar com a responsabilidadepública pela oferta universal de serviços de saúdeem condições de elevada incerteza quanto ao fatode que o governo federal venha efetivamente acumprir com sua função de financiamento dosistema. Paralelamente, supõe que o municípiodisponha de uma dada capacidade técnica instala-da que o habilite a desempenhar as funções previs-tas em cada uma das condições de gestão. No casodas consultas médicas, embora as regras do SUS —o pagamento por número de procedimentos —incentivem a maximização dos atos médicos, ovolume de atendimentos depende diretamente dacapacidade de os municípios instalarem os recursostécnicos — equipamentos, recursos humanos econhecimento especializado — necessários à suaoferta. Neste caso, é o custo financeiro para ainstalação de tal capacidade técnica que interferemais fortemente nas taxas municipais de atendi-mento em saúde. É preciso não esquecer que,como um legado das políticas previamente imple-mentadas — as quais não privilegiaram a ofertamunicipal de serviços —, é muito provável quegrande parte dos municípios esteja ampliando seusequipamentos em saúde por ocasião da implanta-ção do modelo do SUS, o que significa que grandeparte do esforço de ampliação da capacidadetécnica de prestação de serviços está sendo realiza-do a partir do final dos anos 80.

Por outro lado, o fato de que a municipali-zação da saúde tenha obtido elevado grau deconsenso na agenda de reformas da área social eo fato de que a coalizão pró-reformas nesta áreaseja fortemente articulada e estável geram intensa

Page 12: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

122 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

pressão local pela adesão municipal ao SUS.Além disto, a flexibilidade do desenho do progra-ma de municipalização, que contempla distintasmodalidades de adesão — incorporando, portan-to, as possíveis resistências das administraçõeslocais, derivadas dos custos financeiros e políticosa serem assumidos —, facilita a adesão ao progra-ma, na medida em que permite uma maior ade-quação entre custos prováveis da adesão e capa-cidade local de assunção de atribuições. Final-mente, a regra constitucional da universalidadedo acesso — que implica o fato de que custospolíticos de não oferecer serviços em uma dadaquantidade e qualidade também recaem sobre asadministrações municipais — representa tambémum poderoso incentivo à municipalização. Sime-tricamente, os benefícios políticos de oferecer oserviço representam um poderoso incentivo àmunicipalização.

Em suma, o SUS alcançou taxas de adesãoem cerca de 60% dos municípios brasileiros eestes, por sua vez, eram responsáveis por mais dametade das consultas médicas no Brasil em 1997porque, nestes casos, o comportamento das variá-veis determinantes — disposição de descentrali-zar, desenho do programa e meios para a imple-mentação do programa de descentralização —,associado aos custos derivados da natureza dapolítica e das regras constitucionais, compõem,nesta política particular, uma estrutura de incenti-vos que é mais favorável à adesão do que aquelada municipalização da assistência social, e menosfavorável do que a do programa de merendaescolar.

Portanto, quando comparados entre si, o su-cesso de cada programa é determinado por umadada estrutura de incentivos à adesão. Vale dizer,dado que, em Estados federativos, a assunção deatribuições de gestão em políticas públicas dependeda decisão soberana dos governos locais — salvoexpressas imposições constitucionais —, e dado queesta decisão é resultado de um cálculo destas admi-nistrações quanto aos custos e benefícios nela im-plicados, a extensão da descentralização depende,em grande parte, da estrutura de incentivos associ-ada a cada política particular. A existência de umaestratégia de indução eficientemente desenhada e

implementada — o que supõe que o nível de gover-no interessado tenha disposição e meios econômi-cos e administrativos para tal — é um elementocentral desta estrutura de incentivos, na medidaem que, associada a requisitos ou exigências postospela engenharia operacional de cada política, pe-las regras constitucionais que normatizam suaoferta e pelo legado das políticas prévias — fatoresestes cujo comportamento varia para cada política—, constituem elementos importantes da decisãolocal pela assunção de competências de gestão depolíticas públicas.

Determinantes da variação entre os estadosComo já apontado mais acima, a variação na

extensão da descentralização das políticas sociaisno Brasil não diz respeito apenas aos programasanalisados. Há também uma substancial variaçãoquanto aos graus de descentralização alcançadospelos estados. No Quadro 3 são apresentadosindicadores de cobertura ou de capacitação insti-tucional que evidenciam o alcance da descentrali-zação em cada um dos programas analisados nosseis estados da amostra observada. Observe-se,por exemplo, a taxa de adesão municipal aoprograma federal de descentralização da assistên-cia social em agosto de 1977: no Estado da Bahia,apenas 2% dos municípios haviam cumprido asexigências do art. 30 da LOAS13 para habilitar-sea gerir os recursos federais, ao passo que noEstado do Ceará esta taxa era de 55% e, para oconjunto dos municípios brasileiros, de 33%. Ob-serve-se ainda as variações no índice municipalde habilitação ao SUS em cada estado: se noBrasil este índice era de 0,74 em janeiro de 1997,na Bahia era de 0,42 e no Ceará, de 0,93.

Para tornar estes diferentes indicadorescomparáveis entre si, utilizei os critérios apresen-tados no Quadro 4 para atribuir diferentes “graus”de descentralização a cada estado. Assim, osgraus “baixo”, “médio” ou “alto” revelam diferen-ças na extensão da transferência de atribuições decada programa observado em cada um dos esta-dos da amostra. O Quadro 5, portanto, é o resul-tado da aplicação dos critérios expostos no Qua-dro 4 sobre os diferentes indicadores apresenta-dos no Quadro 3.

Page 13: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL 123

Quadro 3Indicadores de Descentralização em Estados Selecionados

Brasil — 1987-97Rio Grande Paraná São Paulo Bahia Pernambuco Ceará BRASIL

do Sul(1) Taxa de 0 0 0,60 0,30 0 0 0municipalização deserviços desaneamento básico (a)

(2) Política Extinção Programas Programas Programas Programas Programas ...habitacional da COHAB; próprios; próprios; próprios; próprios; próprios;estadual redução manutenção expansão redução redução manutenção ...(1987-94) da oferta; da oferta; da oferta da oferta; da oferta; da oferta;

redução recursos recursos recursos recursos recursosdo gasto federais estaduais federais federais próprios ...

(3) Criação e sim sim sim sim sim sim simfuncionamento deinstância colegiadaestadual paraalocação do FGTS(4) Crescimento Matrícula Matrícula Matrícula Matrícula Matrícula Matrícula .. .das matrículas municipal municipal municipal municipal municipal municipalno ensino total das total das total das total das total das total dasfundamental matrículas matrículas matrículas matrículas matrículas matrículas(1988-94)(b)

(5) Taxa de 100% 100% 100% 100% 100% 100% 100%descentralização damerenda escolar(outubro/1997)(6) Taxa de 75% 68% 77% 66% 76% 71% 66%municipalização damerenda escolar(outubro/1997)(7) Taxa de adesão 32% 42% 7% 2% 13% 55% 33%municipal aoprograma federal dedescentralizaçãoda assistência social(agosto/1997)(c)

(8) Índice municipal 0,53 0,95 0,76 0,42 0,77 0,93 0,74de habilitação ao SUS(janeiro/1997)(d)

(9) Taxa de habilitação 48% 83% 54% 42% 69% 80% 58%municipal ao SUS(janeiro/1997) (e)

(10) Taxa de 42% 72% 58% 24% 44% 55% 54%municipalização dasconsultas médicas

Fontes: (1): Anjos Jr. (1996); Araújo e Loureiro (1996); Freitas (1996); Mendonça (1996); Morais e Vidal (1996); Raggio (1996);(2): Anjos Jr (1996); Arretche (1996); Barbosa (1996); Ferreira, Silva e Rocha (1996); Luz (1996); Raggio (1996); (3): SEPURB/MPO;(4): FEE, IPARDES, SE/SP, SEI, FUNDAJ, IPLANCE; (5) e (6): FNDE/MEC; (7): SAS/MPAS; (8), (9) e (10): DATASUS.Número de municípios por estado: Contagem Populacional do IBGE.

(a) Número de municipalizações efetivas (até dezembro de 1997)/número de municípios não-municipalizados (em 1987).(b) O indicador considera o índice de crescimento das matrículas municipais em relação ao índice de crescimento do total dasmatrículas no estado.(c) Percentual de municípios em cada estado que cumpriram as exigências regulamentares para habilitar-se à descentralização.(d) (No de municípios na gestão incipiente x 1)+(no de municípios na gestão parcial x 2)+(no de municípios na gestão semi-plena x 3)/total de municípios do estado.(e) Proporção de municípios habilitados ao SUS em cada estado.

Page 14: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

124 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

Observemos o Quadro 5, onde estão apre-sentados os scores globais de cada estado emtodos os casos analisados. Em uma escala devariação que poderia ir de 8 a 24, os estados daBahia (12), Pernambuco (13) e Rio Grande do Sul(13) obtiveram os mais baixos scores globais da

amostra: estes são inferiores a 16, score quecorresponderia à situação na qual o estado teriaalcançado no mínimo índices médios em todos oscasos. Em outras palavras, estes estados alcança-ram um score médio inferior a 2. O Estado deSão Paulo (16), por sua vez, obteve um score

Quadro 4Critérios para Identificação de Graus de Descentralização em Políticas Selecionadas

PROGRAMA GRAU BAIXO GRAU MÉDIO GRAU ALTOMunicipalização Taxa estadual de Taxa estadual de Taxa estadual dedos serviços de municipalização é inferior municipalização está próxima municipalização é superiorsaneamento básico à taxa nacional à taxa nacional à taxa nacionalEmergência de - existência de órgãos - existência de órgãos - existência de órgãosSistemas Estaduais especializados especializados (COHABs) + especializados (COHABs) +de Habitação (COHABs) + continuidade existência de programas existência de programas

dos programas federais com desenho próprio com desenho próprio +- média de unidades - média de unidades existência de fontes(87-90) > média (87-90) ≅ média de de financiamento própriasde unidades (91-94) unidades (91-94) - média de unidades- média de gasto per capita - média de gasto per (87-90) ≤ ou ≅ média de(87-90) > média de gasto capita (87-90) ≥ média de unidades (91-94)per capita (91-94) gasto per capita (91-94) - média de gasto per capita

(87-90) ≤ ou ≅ médiade gasto per capita (91-94)

Programa (federal) O governo estadual não O governo estadual criou O governo estadual crioude criação de criou uma instância uma instância colegiada, uma instância colegiada einstâncias colegiadas colegiada mas esta não funciona esta funcionaestaduais para aalocação do FGTSMunicipalização das - sem alteração no perfil de - sem alteração significativa - alteração significativaredes (estaduais) de distribuição das matrículas no perfil de distribuição no perfil de distribuiçãoensino fundamental - taxa de crescimento das matrículas das matrículas

das matrículas municipais - taxa de crescimento das - taxa de crescimento dasé < ou ≅ à taxa de matrículas municipais é pouco matrículas municipais écrescimento do total superior à taxa de crescimento muito superior à taxa dedas matrículas do total das matrículas crescimento do total

das matrículasPrograma (federal) Taxa estadual de Taxa estadual de Taxa estadual dede municipalização municipalização é inferior municipalização está próxima municipalização é superiorda merenda escolar à taxa nacional à taxa nacional à taxa nacionalPrograma (federal) Percentual de municípios Percentual de municípios Percentual de municípiosde municipalização com conselhos, planos com conselhos, planos com conselhos, planosda política e fundos de assistência é e fundos de assistência está e fundos de assistência éde assistência inferior à taxa nacional próximo à taxa nacional superior à taxa nacionalProcesso de Índice estadual de Índice estadual de Taxa estadual dehabilitação municipalização é inferior municipalização está próximo municipalização é superiormunicipal ao SUS à taxa nacional à taxa nacional à taxa nacionalMunicipalização do Taxa estadual de Taxa estadual de Taxa estadual deatendimento municipalização é inferior municipalização está próxima municipalização é superiorbásico em saúde à taxa nacional à taxa nacional à taxa nacional

Page 15: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL 125

médio de 2. Finalmente, os estados do Paraná edo Ceará, com scores globais de 21 e 20, respec-tivamente, apresentaram um score médio de 2,6e 2,5, muito próximo de 3, isto é, muito próximodo score máximo possível.

Observe-se ainda, no Quadro 5, que o Paranáe o Ceará não apresentaram um alto grau dedescentralização em situações muito particulares:em situações nas quais não houve um programafederal para tal fim, ambos apresentaram baixosgraus de municipalização dos serviços de sanea-mento básico, caso este no qual nenhum estado doBrasil obteve qualquer alteração da distribuiçãoprévia de atribuições; o Estado do Paraná apresen-tou grau médio no que diz respeito à instituciona-lização de seu sistema estadual de habitação e oEstado do Ceará apresentou grau médio nos casosda municipalização de sua rede estadual de ensinofundamental e do atendimento básico em saúde.

Já foi demonstrado que o desenho e o modoefetivo de implementação de estratégias de indu-

ção para transferir atribuições de gestão de políti-cas públicas são decisivos para a extensão doprocesso de descentralização. Que outros fatoresinterferem na decisão local de aderir a tais progra-mas, de modo que uma mesma estratégia deindução no plano nacional venha a obter resulta-dos diferentes entre as unidades da Federação?Há atributos das unidades locais de governo queaí interferem? Que variáveis são capazes de pro-duzir mais baixas ou mais elevadas taxas de ade-são local aos programas desenhados para transfe-rir competências?

Para responder a estas questões, é necessário,inicialmente, testar a relação de cada uma dasvariáveis, consideradas como atributos das unida-des de governo, com os resultados da descentrali-zação obtidos em cada um dos estados examina-dos. Assim, a princípio, cada uma das variáveis serátomada isoladamente, para, posteriormente, serintegrada em uma análise que contempla o conjun-to das variáveis consideradas.

Quadro 5Graus de Descentralização em Programas Sociais e Estados Selecionados

OBJETO DE ESTUDO RS PR SP BA PE CEMunicipalização da rede de BAIXO ALTO BAIXO BAIXO BAIXO MÉDIOensino fundamental (1) (3) (1) (1) (1) (2)Programa (federal) de ALTO ALTO ALTO ALTO ALTO ALTOmunicipalização da (3) (3) (3) (3) (3) (3)merenda escolarProcesso de habilitação BAIXO ALTO MÉDIO BAIXO MÉDIO ALTOmunicipal ao SUS (1) (3) (2) (1) (2) (3)Municipalização BAIXO ALTO MÉDIO BAIXO BAIXO MÉDIOdo atendimento básico (1) (3) (2) (1) (1) (2)em saúde do SUSEmergência de Sistemas BAIXO MÉDIO ALTO BAIXO BAIXO ALTOEstaduais de Habitação (1) (2) (3) (1) (1) (3)Programa (federal) de criação ALTO ALTO ALTO ALTO ALTO ALTOde instâncias colegiadas (3) (3) (3) (3) (3) (3)estaduais para a distribuiçãodos recursos do FGTSMunicipalização dos serviços BAIXO BAIXO BAIXO BAIXO BAIXO BAIXOde saneamento básico (1) (1) (1) (1) (1) (1)Programa (federal) de MÉDIO ALTO BAIXO BAIXO BAIXO ALTOmunicipalização da política (2) (3) (1) (1) (1) (3)de assistência socialScore de Estadualização 4 5 6 4 4 6Score de Municipalização 9 16 10 8 9 14Score Global 13 21 16 12 13 20

Page 16: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

126 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

Graus de descentralização e nível de riquezae c o n ô m i c a

Examinemos a hipótese de que seja a varia-ção nos níveis de riqueza econômica dos estados emunicípios que tenha a faculdade de alterar oescopo da descentralização. Por este argumento, asdesigualdades econômicas regionais — próprias aum país estruturalmente dividido em duas grandesregiões: Norte, Nordeste e Centro-Oeste, de umlado, e Sul e Sudeste, de outro — expressar-se-iamnos rumos da municipalização e/ou estadualizaçãode atribuições.

Examinemos esta hipótese tomando comoindicadores, de um lado, o PIB de cada um dosestados da amostra e, de outro lado, seus respec-tivos scores globais de descentralização14 (res-pectivamente, Quadros 1 e 5). O Gráfico 1 nãoconfirma a hipótese de que o nível de riquezaeconômica seja uma variável independente capaz

de, isoladamente, representar um fator de diferen-ciação no processo de transferência de atribuiçõesde gestão na área social. Não há correlação entreos scores globais de descentralização alcançadospelos estados da amostra e seus respectivos PIBs.É suficiente observar que há dois casos nos pon-tos 20 e 21 do eixo y (Estados do Paraná e doCeará) situados em pontos distantes no eixo x.Há um caso (São Paulo), situado no ponto maiselevado do eixo x, cujo score de descentralizaçãoé inferior aos dos estados do Paraná e Ceará.Além disto, Rio Grande do Sul, Bahia e Pernam-buco alcançaram scores globais de descentraliza-ção muito próximos, sendo que seus respectivosPIBs são muito distintos.

Examinemos agora a hipótese da existência deuma relação entre a variação nos graus de descen-tralização alcançados pelo conjunto dos municípiosde cada um dos estados e o grau de riqueza

Gráfico 1Graus de descentralização de programas sociais por PIB estadual

0

5

10

15

20

25

0 2000 4000 6000 8000

pib estadual

scor

e gl

obal

Seqüência1

Média do PIB estadual/score global de descentralização: RS: 4495/13; PR: 3386/21; SP: 6134/16; BA: 2739/12; PE: 2185/13;CE: 1171/20.

PIB estadual

Page 17: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL 127

econômica destes municípios. Admitamos que vari-ações no porte socioeconômico dos municípiospossam ser avaliadas pelo tamanho de sua popula-ção, aceitando a proposição de que um municípiocom população superior a 50 mil habitantes tenhauma relativa densidade social e econômica que ohabilitaria a dispor de um conjunto de recursostécnicos e administrativos para gerir programassociais. Portanto, estou supondo que, se esta é umavariável decisiva em si mesma, então, caso um dadoestado tenha um expressivo número de municípioscom porte populacional superior a 50 mil habitan-tes, este estado tenderá a apresentar taxas maiselevadas de municipalização.

Neste caso, a unidade utilizada para compara-ção entre os estados será a proporção de municípi-os com população acima de 50 mil habitantes(Quadro 1). De outro lado, para avaliar a relação

desta variável com a extensão da descentralização,é necessário tomar como score de comparação asoma dos scores alcançados em cada estado naque-les casos que envolvem a municipalização defunções sociais (coluna “score de municipalização”do Quadro 5).

Novamente, não é possível afirmar, combase nestes indicadores, que o porte dos municí-pios de um dado estado, aqui medido pelo tama-nho de sua população, possa ser uma variávelindependente capaz de, isoladamente, explicar avariação dos resultados nos casos de municipali-zação. Observe-se no Gráfico 2 que não há umarelação direta ou inversa entre estas duas variá-veis. Basta observar que três casos situados nomesmo ponto do eixo x (8% de municípios compopulação superior a 50 mil habitantes) situam-seem pontos distintos no eixo y (Bahia, Rio Grande

Gráfico 2Graus de municipalização de programas sociais por proporção de municípios

com população acima de 50.000 habitantes

0

2

4

6

8

10

12

14

16

0 5 10 15 20

proporção de municípios com mais de 50.000 hab

scor

e de

mun

icip

aliz

ação

Seqüência1

Proporção de municípios com população acima de 50.000 hab/grau de municipalização: RS: 8/9; PR: 8/16; SP: 16/10;BA: 8/8; PE: 14/9; CE: 11/14.

Page 18: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

128 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

do Sul e Paraná). Embora não tenha sido feitonenhum teste que avalie a correlação estatísticaentre estas variáveis, é possível observar que, porexemplo, o Estado de São Paulo, com 16% deseus municípios com população superior a 50 milhabitantes, alcançou um grau de descentralizaçãomuito inferior aos dos estados do Paraná e Ceará,respectivamente com 8% e 11% de seus municípi-os nessa condição.

Isto não significa, contudo, que o nível deriqueza econômica — ou a densidade econômica esocial — de um dado município não seja umavariável capaz de interferir nas decisões de umadada administração municipal. Significa apenasque isoladamente esta variável não explica avariação na disposição dos municípios para assu-mir funções de gestão nos casos examinados. Naverdade, esta variável pode condicionar o grau deautonomia municipal para a oferta de serviçospúblicos, bem como sua capacidade de resistir aeventuais pressões advindas dos programas formu-lados pelos demais níveis de governo. Porém, nestecaso, sua interferência nos resultados não é direta,mas é um dos componentes do cálculo realizadopor cada administração local com vistas à decisãode descentralizar atribuições.

Graus de descentralização e participação políticaExaminemos agora a hipótese de que a vari-

ação na descentralização possa ser atribuída auma característica política dos estados: sua culturacívica. Este argumento considera que a participa-ção em associações civis — seja qual for suanatureza — geraria sociedades fortes, cuja capaci-dade de pressão geraria governos fortes, os quais,por sua vez, seriam caracterizados por sua capaci-dade de instituir e manter políticas públicas dequalidade (Putnam, 1993). Assim, seria de se es-perar que, no caso brasileiro, a mais elevadastaxas de participação em associações civis corres-pondessem mais elevados graus de iniciativa localpara a gestão de políticas sociais. Observemos apossibilidade desta relação causal com base, deum lado, nos scores globais de descentralizaçãoem cada estado (Quadro 5) e, de outro, nas taxasde filiação a associações civis apresentadas noQuadro 1.

Os dados não confirmam, para a amostra deestados brasileiros examinada, que variações nastaxas de filiação a associações civis sejam fatoresdeterminantes para que os governos locais sesintam decisivamente pressionados a assumir agestão de programas sociais. Ou, dito de outromodo, se a cultura cívica de um dado estadopode ser medida pelas taxas de pertencimento aassociações civis, não há evidências de que estatenha uma relação direta com a variação nosgraus de descentralização alcançados pelos esta-dos.

O Estado do Rio Grande do Sul apresenta astaxas mais elevadas de filiação a associações civisda amostra — 19% de filiados a entidades de classe,5% a partidos políticos e 52% a associações volun-tárias15 — e um score global de descentralização(13) equivalente ao Estado de Pernambuco e poucosuperior ao da Bahia (12), cujas taxas de filiaçãosão bastante inferiores — 14% e 12%, respectiva-mente, para a filiação a entidades de classe; 2,6% e3,6%, respectivamente, para filiação a partidos e7,5% e 5,5%, respectivamente, para a filiação aassociações civis. Os scores de descentralização noParaná (21) e Ceará (20) são muito próximos, comtaxas de filiação a entidades civis bastante distintas(ver Quadro 1). Os estados do Ceará e do RioGrande do Sul encontram-se em pólos opostos noque diz respeito à extensão do processo de descen-tralização, sendo que este último apresenta taxasmuito mais elevadas de participação cívica. Combase nos dados disponíveis, não é possível afirmarque a participação política seja uma variável queisoladamente possa explicar a variação na dispo-sição de governos locais para assumir funções degestão em programas sociais.

Graus de descentralização e capacidade fiscaldos governos

Examinemos agora a hipótese de que a des-centralização seria menos viável nos estados ouregiões mais pobres do país, dado que esta pobrezaeconômica expressar-se-ia também sob a forma dereduzida capacidade de gasto público.16 Esta pro-posição, portanto, associa diretamente possibilida-des de gestão descentralizada a capacidade de gastodos governos. Neste caso, seria de se esperar que

Page 19: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL 129

graus mais elevados de descentralização fossemencontrados nos estados cuja capacidade de gastoseja elevada e que, inversamente, graus mais baixosfossem encontrados nos estados mais pobres.

Para testar esta hipótese, tomei como indica-dor de “capacidade de gasto” a receita disponíveldas unidades de governo em questão. Embora asreceitas disponíveis dos estados e municípios bra-sileiros tenham sofrido expressiva variação porefeito da descentralização fiscal de 1988, este é umfenômeno que afetou igualmente todas as unidadessob análise. Assim, para efeitos de comparaçãoentre os estados, o indicador a ser utilizado aquiserá a média da receita disponível per capita(Quadro 1).

Examinemos inicialmente a hipótese de que areceita disponível dos governos estaduais analisa-dos tenha afetado decisivamente sua disposiçãopara assumir a gestão de programas sociais. Para

fazê-lo, temos de tomar como objeto de compara-ção os casos de descentralização nos quais estives-se colocada a perspectiva de o governo estadualassumir atribuições de gestão: a instalação deinstâncias colegiadas para alocação dos recursos doFGTS e a emergência de sistemas estaduais dehabitação. Assim, o eixo y do Gráfico 3 correspon-de aos “scores de estadualização” de cada estado(Quadro 5) e o eixo x corresponde à média dareceita estadual disponível no período 1987-1994(Quadro 1).

O Gráfico 3 indica que não há uma relaçãodireta entre a variação nas iniciativas dos governosestaduais para instituir seus próprios sistemas deoferta de unidades residenciais públicas, ou parainstalar suas instâncias colegiadas, e sua capacida-de de gasto. O score 4, correspondente a um baixograu de descentralização, é encontrado em trêsestados cuja média da receita estadual disponível é

Gráfico 3Graus de estadualização de programas sociais por receita estadual disponível

0

1

2

3

4

5

6

0 200 400 600 800

média da receita estadual disponível per capita

scor

e de

est

adua

lizaç

ão

Seqüência1

Média da receita estadual disponível per capita/score de estadualização: RS: 513/4; PR: 377/5; SP: 610/6; BA: 275/4;PE: 275/4; CE: 252/6.

Page 20: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

130 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

inteiramente distinta; o mesmo pode ser dito comrelação ao score 6, casos dos estados de São Pauloe Ceará, situados em pontos extremos da escala devariação do indicador “média da receita estadualdisponível per capita”.

Mas, examinemos ainda a possibilidade deque capacidade de gasto e descentralização sejamnegativamente relacionados, isto é, quanto menor acapacidade de gasto do nível estadual de governo,mais elevados seriam os scores de municipaliza-ção, dado que, nesta situação, os governos estadu-ais teriam poderosos incentivos financeiros parabuscar transferir atribuições — e responsabilidadepública — de gestão na área social. Nesta linha deargumentação, quanto menor a capacidade degasto de um estado, mais municipalizados seriamos resultados.

Para testar esta proposição, temos de tomar,de um lado, a média da receita disponível per

capita de cada estado e, de outro, seus respectivosscores de municipalização, os quais estão apresen-tados no Gráfico 4.

Como podemos claramente observar, nãohá uma relação direta entre a capacidade de gastodos governos estaduais analisados e os resultadosalcançados na municipalização de programas so-ciais. Estados com médias de receitas estaduaisper capita bastante próximas, como Bahia, Per-nambuco e Ceará — respectivamente, R$ 275, R$245 e R$ 252 —, encontram-se em pontos bastan-te distantes no eixo y. O Estado de São Paulo,cuja média da receita estadual disponível per ca-pita é quase três vezes a cearense, apresentouum score de municipalização muito inferior aodeste estado.

Assim, a capacidade fiscal dos estados não éuma variável independente capaz de isoladamen-te explicar os resultados da municipalização no

Gráfico 4Graus de municipalização de programas sociais

por receita estadual disponível

0

2

4

6

8

10

12

14

16

0 200 400 600 800

média da receita estadual disponível per capita

Seqüência1

Média da receita estadual disponível per capita/score de estadualização: RS: 513/9; PR: 377/16; SP: 610/10; BA: 275/8;PE: 245/9; CE: 252/14.

scor

e de

mun

icip

aliz

ação

Page 21: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL 131

período analisado: nem os governos estaduaisanalisados assumiram a gestão de políticas sociaisapenas porque dispunham de mais recursos,nem os municípios foram levados a assumir estasatribuições exclusivamente por referência à situa-ção orçamentária de seus respectivos governosestaduais.

Isto não significa, contudo, que a situação dasfinanças estaduais não possa ser um fator importan-te para que os governos adotem programas dedescentralização. De fato, restrições orçamentáriaspodem representar um incentivo para que os go-vernos busquem transferir a uma outra administra-ção pelo menos parte dos custos financeiros impli-cados na gestão de uma dada política social.

Mas, existe uma diferença entre condiçõesestruturais para que governos tomem determinadoscursos de ação e o fato de que estes venhamefetivamente a tomá-los. Em uma situação de

restrição orçamentária, seria racional, do ponto devista da contenção de custos, que os governosestaduais buscassem a municipalização. Mas, paraque esta se torne uma realidade, é necessário queos governos tomem decisões em favor da descen-tralização e — como vimos — que, além disto, asdecisões tomadas sejam de tal natureza que ve-nham a obter a adesão das administrações munici-pais. Portanto, a relação entre a situação fiscal deum nível de governo mais abrangente e a descen-tralização efetiva é mediada pela decisão de des-centralizar e pela implementação de uma eficienteestratégia nesta direção, vale dizer, é mediada pelaexistência de disposição e meios para descentrali-zar por parte deste nível de governo. A situaçãofiscal é, tal como os requisitos institucionais de umadada política, um dos elementos do cálculo realiza-do por um dado nível de governo para adotar umaestratégia de descentralização.

Gráfico 5Graus de municipalização de programas sociais por receita dos governos municipais

0

2

4

6

8

10

12

14

16

0 2000 4000 6000 8000 10000 12000

média da receita orçamentária "per município"

scor

e de

mun

icip

aliz

ação

Seqüência1

Relação: Média da receita municipal/score de municipalização: RS: 4667/9; PR: 4335/16; SP: 11914/10; BA: 3094/8;PE: 3607/9; CE: 2771/14.

Page 22: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

132 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

Ainda examinando o argumento de que acapacidade fiscal possa ser uma variável indepen-dente capaz de influir decisivamente no ritmo dadescentralização, analisemos agora o impacto dacapacidade de gasto dos municípios dos estadospesquisados sobre o alcance da municipalização,com base na receita média dos municípios de cadaestado, excluídas as capitais.17

Mais uma vez, o Gráfico 5 não autoriza que,nos casos examinados, a variação nas taxas demunicipalização possa ser atribuída a variações nareceita orçamentária das administrações munici-pais. Os municípios paulistas dispõem, em média,de uma capacidade de gasto três ou quatro vezessuperior à do conjunto dos municípios dos demaisestados e seu score de municipalização é poucosuperior ao dos estados do Rio Grande do Sul ePernambuco. Os estados do Rio Grande do Sul e doParaná apresentam uma média de receita orçamen-tária municipal bastante próxima — R$ 4.667 e R$4.335, respectivamente (Quadro 1) — e a mesmaproporção de municípios com população superiora 50 mil habitantes — 8% (Quadro 1) — e, noentanto, obtiveram scores de municipalização bas-tante desiguais: 9 e 16, respectivamente.

Tomemos ainda os estados da Bahia e doCeará. A média da receita orçamentária municipaldos municípios cearenses é ligeiramente inferior àbaiana — R$ 2.771 e R$ 3.094, respectivamente(Quadro 1) — e, por outro lado, a proporção demunicípios com população superior a 50 mil ha-bitantes no Ceará é um pouco superior à doEstado da Bahia: 11% e 8%, respectivamente(Quadro 1). No entanto, o score de municipaliza-ção no Ceará é muito superior ao baiano: 14contra 8 (Quadro 5). Com base nestas compara-ções, não é possível sustentar que a capacidadede gasto dos municípios possa ser uma variávelindependente capaz de, decisiva e isoladamente,interferir no ritmo da municipalização dos progra-mas sociais. Não é possível afirmar que quantomais elevada a receita orçamentária dos municípi-os de uma dada unidade da Federação, maiselevada seria a quantidade de municípios queteriam disposição para aderir a programas estadu-ais ou federais de municipalização. Também nãoé possível afirmar o inverso, isto é, que quanto

mais baixa a receita orçamentária dos municípios,mais elevados seriam os graus de municipalizaçãoem cada estado, porque, nesta situação, as admi-nistrações municipais teriam mais incentivos paraaderir aos programas propostos pelos níveis maisabrangentes de governo, para, por esta via, elevarsua receita disponível.

Descentralização e ação políticaComo vimos acima, variações no nível de

riqueza econômica dos estados, no porte dos mu-nicípios, no grau de participação política dos ci-dadãos na vida política de cada estado e na capa-cidade fiscal de estados e municípios não sãovariáveis que isoladamente possam determinaros rumos da descentralização. A capacidade fiscaldos governos e sua capacitação político-adminis-trativa influem no processo de transferência deatribuições, na medida em que configuram osrecursos com que conta uma dada administraçãolocal para desempenhar funções de gestão depolíticas públicas. Mas tais variáveis não são de-terminantes em si; seu peso e importância variamde acordo com os atributos institucionais da polí-tica que se pretende descentralizar. Os recursosfiscais e administrativos exigidos para a municipa-lização da política de saneamento básico — cujaoperação exige vultosos recursos fiscais e admi-nistrativos, em um mercado controlado por com-panhias estaduais já instaladas e na ausência deregras constitucionais que imponham a descentra-lização — são muito superiores àqueles exigidospara a municipalização da merenda escolar —cuja operação exige reduzido montante de recur-sos. Do mesmo modo, variações no porte popula-cional das cidades pode ser uma variável maisimportante para a decisão pela municipalizaçãodas redes de ensino fundamental do que para amunicipalização da merenda escolar, uma vezque, dadas as dimensões da mesma populaçãoescolar, são os custos de operação de cada umadestas políticas que variam.18

Assim, como já vimos, atributos estruturaisdas unidades de governo — como riqueza econô-mica, capacidade de gasto e capacitação adminis-trativa — fazem parte do conjunto de elementosque entram no cálculo de uma administração local

Page 23: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL 133

quando da tomada de decisão pela assunção deatribuições de gestão em uma dada política social.Mas, o peso de cada uma destas variáveis para adecisão pode ser maior ou menor, a depender desua importância para a gestão da política emquestão.

No entanto, a força determinante destes cons-trangimentos pode ser compensada por estratégiasde indução eficientemente desenhadas e imple-mentadas por parte do nível de governo interessa-do na descentralização. Para constituir as instânciascolegiadas estaduais, variáveis tais como o PIB, ograu de participação de sua população em associ-ações civis, ou mesmo a capacidade fiscal de cadaestado seguramente tiveram menor importância.Isto porque se tratava de um programa dotado deuma estrutura de incentivos muito favorável àadesão: os custos de adesão são baixíssimos e osbenefícios são elevados. Por outro lado, para queuma dada administração municipal tome a decisãode buscar enquadrar-se na condição de gestãosemiplena do SUS, variáveis tais como a pressãodos membros politicamente ativos da cidade e acapacidade fiscal do município podem ter umaimportância maior. Isto porque se trata de umprograma que impõe razoáveis custos financeiros eadministrativos aos municípios, assim como asdificuldades do Ministério da Saúde para sua imple-mentação efetiva contribuem para elevar o grau deincerteza das administrações municipais quanto à“retaguarda” oferecida pelo governo federal.

Em suma, variáveis de natureza estrutural einstitucional são determinantes da descentraliza-ção, na medida em que são elementos da tomadade decisão pela qual uma dada administração viráa assumir (ou não) a gestão de uma política qual-quer. São fatores do cálculo realizado por umadada administração, mas não constituem, em simesmas, variáveis definitivas para a transferênciade atribuições. Em primeiro lugar, a importânciados atributos estruturais varia de acordo com osatributos institucionais das políticas. E, além disto,para o desempenho de funções de gestão na áreasocial, obstáculos de natureza econômica ou fiscalpodem ser compensados pela ação política delibe-rada de níveis mais abrangentes de governo, assimcomo governos eleitos em estados ou regiões com

elevada capacidade de mobilização podem revelar-se insensíveis à natureza das pressões política delaadvindas.

Descentralização e ação dos governos estaduaisÉ certo que, para a estadualização de políti-

cas, a orientação do executivo estadual é decisiva.Mas, também as probabilidades da municipalizaçãoaumentam quando os governos estaduais instituemmecanismos — políticas, programas e medidas degoverno — que minimizem tais custos. Seja quandoos programas federais instituem regras de operaçãoque conferem autoridade aos governos estaduaisna implementação de um dado programa,19 seja naausência de tais prerrogativas, a ação dos governosestaduais pode influir decisivamente nos rumos damunicipalização dos programas sociais no Brasil.Por quê?

O Brasil é estruturalmente um país caracteri-zado pela existência de uma esmagadora maioriade municípios fracos, com pequeno porte popula-cional, densidade econômica pouca expressiva esignificativa dependência de transferências fiscais.Neste caso, a ação dos governos estaduais contribuidecisivamente para compensar adversidades à pos-sibilidade técnica de gestão destas políticas, obstá-culos estes de ordem econômica ou fiscal ou,ainda, derivados das políticas prévias.

É certo que há administrações municipaisque, por sua densidade econômica, populacional epolítica, são mais independentes dos reforços oupressões dos governos estaduais. Há municípiosbrasileiros cujas características estruturais lhes per-mitem assumir a gestão de programas sociais comalgum grau de autonomia em relação aos incenti-vos advindos dos demais níveis de governo. Apartir de um dado patamar de riqueza econômicae capacitação político-administrativa, o impactodas estratégias de indução sobre os governos locaispode vir a tornar-se cada vez menos decisivo.

Mas, esta não é a realidade da maioria dosmunicípios brasileiros. Ao contrário, dotado deuma esmagadora maioria de municípios de peque-no porte e historicamente dependentes da capacita-ção institucional dos governos estaduais e federalpara a prestação de serviços sociais, o Brasil, parareformar — ou descentralizar — seu Sistema de

Page 24: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

134 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

Proteção Social, depende da ação política delibera-da dos níveis mais abrangentes de governo.

Assim, para que os estados do Ceará e Paranáalcançassem os mais elevados graus de descentra-lização da amostra, foi decisivo que seus sucessivosgovernos estaduais tenham instituído políticas ati-vas e continuadas de capacitação municipal e detransferência formal de atribuições de gestão a seusmunicípios. Esta ação do executivo estadual foimais decisiva para as taxas de municipalização doque o fato de que, no Estado do Ceará, apenas 11%de seus municípios tenham mais de 50 mil habitan-tes e que apenas esta classe de municípios nosestados do Nordeste disponha de uma receitaprópria média superior a R$ 10 per capita, ou aindaque, no caso do Estado do Paraná, apenas 8% deseus municípios tenham população superior a 50mil habitantes e uma receita própria média superiora R$ 53.20

O Estado do Rio Grande do Sul, com caracte-rísticas econômicas e populacionais equivalentesàs paranaenses e dotado de taxas de participaçãoem associações civis mais elevadas, foi gerido, noperíodo 1983-1994, por sucessivas administraçõesque pouco ou nenhum incentivo deram à munici-palização das políticas sociais. A natureza da açãodos executivos estaduais gaúchos foi decisiva paraque o estado tenha alcançado tão baixas taxas dedescentralização.

O Estado da Bahia, com apenas 8% de seusmunicípios com população superior a 50 mil habi-tantes, em uma região cuja receita própria médiaper capita dos municípios com tamanho populaci-onal inferior a esta cifra é inferior a R$ 10, foi geridopor sucessivos governos desfavoráveis à municipa-lização. Com escassos recursos próprios e semincentivos por parte do governo estadual, não é deestranhar que estejam aí as mais baixas taxas demunicipalização da amostra. Dito de outro modo,dados os atributos estruturais da esmagadora maio-ria dos municípios no Estado da Bahia, a possibili-dade de descentralização efetiva das políticas soci-ais supõe necessariamente políticas ativas e conti-nuadas de capacitação municipal.

No Estado de Pernambuco, 14% de seusmunicípios teriam, hipoteticamente, maior proba-bilidade de assumir a gestão de programas com

relativa independência dos incentivos derivados daação do governo estadual. No entanto, neste esta-do, não ocorreu uma política continuada dedescentralização. Na gestão Miguel Arraes (1987-1990), quando as perspectivas da descentralizaçãoainda estavam sendo esboçadas no cenário nacio-nal, o governo estadual empreendeu algumas me-didas de municipalização, descentralização e des-concentração administrativa associadas fortementeà participação. No governo seguinte, quando co-meçavam a ser implementados alguns dos progra-mas federais de municipalização, a ação do gover-no estadual foi desfavorável à municipalização.Finalmente, na atual gestão, observa-se novamenteuma orientação favorável. Neste caso, portanto,dada a intermitência da ação do governo estadual,fatores de natureza estrutural — econômicos, fis-cais e o legado de políticas prévias — pesaram maisfortemente.

Finalmente, o Estado de São Paulo é aquelecujos municípios contam com as mais elevadastaxas de receita orçamentária do país; quer tome-mos a receita disponível, quer tomemos a receitaprópria, estas são no mínimo quatro vezes superi-ores às taxas dos estados nordestinos. Este estadoconta ainda com cerca de 16% de seus municípioscom população superior a 50 mil habitantes (Qua-dro 1), o que permite inferir que tais municípiospodem tomar suas decisões com maior grau deindependência em relação às estratégias de indu-ção advindas do executivo estadual. Em outraspalavras, o fato de que as taxas de municipalizaçãoneste estado sejam superiores às taxas pernambu-canas — a despeito da ausência de qualquerpolítica de municipalização por parte do governoestadual — pode ser explicado pelo fato de que, noEstado de São Paulo, há um maior número demunicípios cujas características estruturais permi-tem que a variável “ação do executivo estadual”seja menos decisiva como elemento do cálculorealizado pelas administrações municipais para atomada de decisão pela assunção de funções degestão em uma dada política social.

As “estratégias de indução dos executivosestaduais” são, na verdade, o resultado de umconjunto de variáveis — tais como a orientaçãodo governador e do secretário estadual, a ação

Page 25: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL 135

das burocracias do setor, a pressão dos interessesorganizados em conjunturas específicas e a pró-pria pressão dos municípios — que não estãosendo analisadas neste trabalho.21 Em outras pa-lavras, a variável “ação do executivo estadual” éuma variável dependente de um conjunto de ou-tras variáveis, mas está sendo considerada aquicomo uma variável independente para explicardiferentes graus de descentralização de políticassociais.

ConclusõesO Sistema Brasileiro de Proteção Social vem

modificando radicalmente seu formato institucionalnestes anos 90. Mas, esta reforma está longe de serhomogênea para as diversas políticas e para oterritório nacional. Há grande variação no que dizrespeito à extensão do processo de descentraliza-ção entre as diversas políticas sociais e entre osdistintos estados brasileiros.

Em primeiro lugar, o contexto institucionalem que se vem realizando esta dimensão da re-forma do Estado brasileiro é inteiramente distintodaquele sob o qual se consolidou o Sistema Bra-sileiro de Proteção Social, durante o regime mili-tar. A retomada das eleições diretas para todos osníveis de governo, bem como a descentralizaçãofiscal e a definição dos municípios como entesfederativos autônomos na Constituição de 1988modificaram a natureza das relações intergoverna-mentais e, por extensão, tiveram impacto sobre oprocesso de redefinição de competências na áreasocial. Sob o Estado federativo pós-1988, os go-vernos locais são de fato politicamente soberanose aderem à descentralização com base em umcálculo em que são avaliados os custos e benefí-cios prováveis desta decisão. Isto implica que,para obter a adesão dos governos locais a umprograma de transferência de atribuições, gover-nos centrais devem implementar estratégias bem-sucedidas de indução.

Nestas condições, em um processo de refor-ma do Estado no qual se reconfigura o desenhoinstitucional de um modelo nacional de prestaçãode serviços sociais, sob um Estado federativo commarcadas diferenças regionais e dotado de uma

esmagadora maioria de municípios fracos, a capa-cidade fiscal e administrativa das administraçõeslocais influi no processo de reforma. Isto porque aspróprias capacidades para assumir a responsabili-dade pública pela gestão de um dado programasocial entram como um dos elementos do cálculoque realizam as administrações locais com vistas àtomada de decisão.

Mas, estes fatores não são determinantes emsi. Seu peso varia de acordo com os requisitospostos pelos atributos institucionais das políticasque se pretende descentralizar, vale dizer, deacordo com os custos operacionais implicados emsua gestão, com as dificuldades à transferência deatribuições derivadas do legado das políticas prévi-as e com as prerrogativas legais estabelecidasconstitucionalmente.

Estas variáveis — atributos estruturais dosgovernos locais e requisitos institucionais das po-líticas — são elementos decisivos do cálculo rea-lizado por cada administração local com vistas àdecisão de assumir funções de gestão em cadapolítica particular. Quanto mais elevados forem oscustos implicados na gestão de uma dada políticae mais reduzidos os benefícios dela derivados,menor será a propensão dos governos locais aassumirem competências na área social. Simetri-camente, quanto mais reduzidos os custos e maiselevados os benefícios implicados na descentrali-zação da gestão, maior será a propensão dosgovernos locais a aderirem a um processo de(re)definição de atribuições. Evidentemente, opeso e importância destes fatores variam paracada administração local e com relação a cadapolítica particular.

No entanto, estratégias de indução eficiente-mente desenhadas e implementadas por parte dosníveis de governo interessados nas reformas po-dem compensar obstáculos à descentralização de-rivados dos atributos estruturais de estados e mu-nicípios ou dos atributos institucionais das políti-cas. Dito de outro modo, estratégias de induçãoque minimizem custos ou tragam benefícios aonível de governo que assumirá a gestão de umadada política alteram os termos do cálculo apre-sentado acima, em que os componentes da deci-são eram apenas fatores relacionados aos atribu-

Page 26: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

136 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

tos dos governos locais e das políticas a seremadotadas. Assim, ao contrário das análises queconsideram que uma reforma desta extensão pu-desse ocorrer a partir de iniciativas espontâneasdos governos locais, ou ainda, ao contrário dasexpectativas que julgavam ser suficiente descen-tralizar recursos e liberar as unidades subnacio-nais de governo das “amarras” do governo cen-tral, este trabalho concluiu que estratégias de in-dução eficientemente desenhadas e implementa-das são decisivas para o sucesso de processos detransferência de atribuições.

Isto implica que, para que uma estratégia deindução seja bem-sucedida, é necessário que osníveis de governo interessados nas reformas te-nham disposição — isto é, tomem decisões favorá-veis a programas de descentralização — e meios —isto é, contem com recursos financeiros, políticos eadministrativos — para implementar políticas cujodesenho institucional obtenha a adesão dos demaisníveis de governo.

A extensão da descentralização em cada esta-do depende ainda, diretamente, da ação dos execu-tivos estaduais, isto é, quanto maior for o grau decoincidência das ações dos níveis mais abrangentesde governo — no nosso caso, governo federal egovernos estaduais —, maior será o alcance damunicipalização em cada unidade da Federação.Quando se trata de municipalizar atribuições degestão, estratégias eficientemente implementadaspor parte do governo federal são decisivas. Mas, aação dos executivos estaduais também o é, namedida em que políticas favoráveis à municipaliza-ção minimizam os custos prováveis que a assunçãode tais atribuições tende a acarretar. Simetricamen-te, a ausência de tais políticas implica que cadaadministração municipal deverá arcar sozinha comtais custos. Nestes casos, portanto, variáveis como“a capacidade fiscal dos governos locais”, “o portesocioeconômico das localidades”, “a natureza dapolítica” e a “capacidade técnica instalada em cadaunidade de governo” tendem a operar sem ocontrapeso da variável “ação política deliberada”.Sem políticas deliberadas de transferência de atri-buições, a importância e o peso das variáveis acimatendem a reproduzir as condições previamenteexistentes.

No Brasil, há municípios cujos atributos estru-turais lhes permitiriam assumir a gestão de políticassociais sem incentivos derivados de estratégias deindução advindas dos níveis mais abrangentes degoverno. Nestes casos, estratégias de indução po-dem até mesmo ser desnecessárias. Mas, a grandemaioria dos municípios brasileiros caracteriza-sepor baixa capacidade econômica, expressiva de-pendência das transferências fiscais e fraca tradiçãoadministrativa. Nestas condições, programas dedescentralização desenhados de forma a minimizaros custos financeiros e administrativos de gestãopassam a ter um peso decisivo na decisão dasadministrações locais. Dado que a esmagadoramaioria dos municípios brasileiros tem baixa capa-cidade financeira e administrativa, o sucesso de umprograma abrangente de reforma do Estado queimplique o (re)desenho do modelo nacional deprestação de serviços sociais depende, necessaria-mente, da implementação de estratégias delibera-das e adequadas de incentivo à adesão dos gover-nos locais. Ou seja, não basta aumentar as fontesautônomas de recursos das unidades locais daFederação ou transferir recursos de uma maneirageral para que essas unidades passem a assumirfunções de gestão das políticas sociais. Da mesmaforma, não basta a existência de recursos adminis-trativos, freqüentemente herdados de políticas im-plementadas de forma centralizada, para que estessejam postos na operação de programas e serviçossociais.

Na mesma direção, o escopo da descentrali-zação depende diretamente da continuidade notempo da implementação de estratégias de indu-ção destinadas a compensar obstáculos derivadosda (in)capacidade fiscal e/ou administrativa dosgovernos locais. Políticas continuadas de capacita-ção municipal revelaram-se decisivas para expli-car variações no escopo da transferência de atri-buições sociais às administrações municipais emcada estado.

Page 27: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL 137

NOTAS

1 Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS): fundofederal obtido da arrecadação compulsória de 8% sobrea folha salarial e vinculado ao financiamento dos pro-gramas federais de desenvolvimento urbano: habitação,saneamento e infra-estrutura urbana.

2 Sistema Único de Saúde (SUS): programa federal quepretende implantar um modelo descentralizado e hie-rarquizado de prestação de serviços de saúde. Paraimplementar a descentralização, o programa estabeleceque cada estado ou município poderá optar por enqua-drar-se em diferentes condições de gestão, às quaiscorrespondem diferentes funções a serem desempenha-das, em graus crescentes de complexidade.

3 “Descentralização”, aqui, significa, genericamente, a“institucionalização no plano local de condições técni-cas para a implementação de tarefas de gestão depolíticas sociais”. Assim, é indiferente se esta toma aforma da estadualização e/ou da municipalização. Anoção de “local” estará, na verdade, referida à unidadede governo para a qual se pretende transferir atribui-ções. Por exemplo, nas políticas educacional e desaúde, os programas de descentralização têm comometa municipalizar a gestão de determinadas tarefas.Nestes casos, a descentralização é entendida comomunicipalização. Diferentemente, na política habitacio-nal, a perspectiva era de que se constituíssem sistemasestaduais de prestação de serviços; neste caso, a descen-tralização é encarada como estadualização da políticahabitacional.

4 Nos programas de merenda escolar e do livro didático,a compra do material era realizada pelas agências dogoverno federal e, posteriormente, distribuída peloterritório nacional, o que dá uma idéia de seu grau decentralização, uma vez que o transporte de alimentosadquiridos de forma centralizada em um país comdimensões continentais é indiscutivelmente irracional.

5 Por exemplo, a oferta de unidades residenciais é indis-cutivelmente mais cara do que a oferta de merendasescolares.

6 Políticas constitucionalmente garantidas como univer-sais tendem a exigir um maior aporte de recursos, dadaa obrigatoriedade de ofertá-las em grande escala edados os custos políticos de não produzí-las na escalacompatível com o princípio da universalidade.

7 Observe-se no Quadro 1 que, a rigor, a “municipaliza-ção dos serviços de saneamento básico” e a “emergên-cia de sistemas estaduais de habitação” envolvem “não-programas”.

8 O SUS é o grande projeto de reforma na área da saúde;mas, para analisar os resultados deste programa, que en-volve a descentralização de uma variedade de ações emsaúde, foram considerados dois “programas”: o processode habilitação municipal ao SUS e a municipalização dasconsultas médicas. Estes são os “programas” de descen-tralização examinados no interior da área da saúde.

9 Penso que indicadores de cobertura e de capacitaçãoinstitucional são superiores a indicadores de gasto paraexaminar se um nível de governo está efetivamenteassumindo a gestão de uma dada política social. Apre-sento argumentos em favor desta proposição em Arret-che (1998).

10 Observe-se aqui, novamente, a distinção entre política eprograma adotada pelo modelo de análise empregadoneste trabalho. A trajetória das políticas de saneamentobásico e habitação popular está sendo analisada em doismomentos distintos: o período 1987-1994, no qual nãohavia um programa federal de descentralização (linhas1 e 2 do Quadro 2), e o período posterior a 1995,quando o governo federal implementa um programa dedescentralização da alocação dos recursos do FGTS(linha 3 do Quadro 2) que afeta igualmente a trajetóriadestas duas políticas setoriais.

11 Na verdade, as condições para ter acesso efetivo aosrecursos do FGTS permanecem bastante rigorosas. Asinstâncias estaduais passaram a ter poder para decidirquais são os projetos prioritários no estado, mas acapacidade de endividamento dos solicitantes, analisa-da pelas agências federais, pode barrar o acesso aosempréstimos.

12 Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação,órgão que substituiu a antiga Fundação de Apoio aoEstudante (FAE) na gestão do programa federal dealimentação escolar.

13 Lei Orgânica da Assistência Social, legislação aprovadaem 1993 que regulamenta o processo de descentraliza-ção na área de assistência social.

14 Como unidade de comparação para o PIB estadual foicalculada a média dos valores absolutos per capita parao período 1987-1994, dado que este período é quaseequivalente àquele sobre o qual foi realizada a análisedos casos (ver Quadro 1).

15 Seguramente, na taxa de 52% de filiação a associaçõesvoluntárias há um problema de superestimação, dadoque este indicador foi obtido pela soma dos quedeclararam “sim” à filiação a associações de bairros oude moradores, a associações religiosas ou filantrópicas ea associações esportivas ou culturais. A operação desoma, neste caso, pode contabilizar três vezes ummesmo declarante com triplo pertencimento. Mas, poroutro lado, esta distorção está igualmente dada paratodos os estados da amostra.

16 No caso brasileiro, dada a expressiva redistribuiçãointer-regional de recursos viabilizada pelo sistema fiscal,o comportamento das variáveis “riqueza econômica” e“capacidade fiscal dos governos” pode ser distinto, oque implica que, para efeitos de comparação, é neces-sário tomar indicadores diferentes para cada uma destasduas variáveis.

17 Este indicador permite observar a capacidade média degasto do conjunto dos municípios de cada estado,contornando a possível distorção das informações deri-vada da expressiva superioridade de gasto das capitais

Page 28: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

138 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

em cada estado vis-à-vis os municípios do interior.Além disto, excluída a capital, a unidade de comparaçãoentre os estados não é a média da receita disponível percapita, mas a receita disponível por município. Nestecaso, à receita orçamentária do conjunto dos municípiosde cada estado foi subtraída a receita das capitais e, emseguida, a capacidade de gasto média dos municípiosdo estado foi calculada sobre o total de municípios quedeclararam suas receitas à Secretaria do Tesouro Nacio-nal, com informações disponíveis para o período 1989-1995 (Quadro 1).

18 Observe-se, novamente, a utilidade de distinguir “pro-gramas” e “áreas de política social” no modelo deanálise empregado neste trabalho, pois municipalizaçãodas matrículas e merenda escolar são “programas”diferentes no interior de uma mesma “área de políticasocial”. Suas trajetórias variam porque seus requisitosinstitucionais são distintos.

19 Por exemplo, a habilitação dos municípios ao SUS éoperacionalizada por uma comissão bipartite estadual, apartir de uma normatização federal. As regras de funci-onamento desta comissão dão ampla margem de mano-bra aos secretários estaduais de Saúde. Na mesmadireção, os recursos do programa federal de municipa-lização da assistência social, até o final de 1997, eramrepassados às secretarias estaduais de Assistência Socialque, por esta via, podiam sinalizar às administraçõesmunicipais se valia a pena aderir ao programa federal.

20 Para a proporção de municípios com população superi-or a 50 mil habitantes em cada estado da amostra, verQuadro 1. Para os dados de receita corrente própria emcada região brasileira, ver Gomes e Mac Dowell (1997).

21 Esta variável independe inclusive da filiação partidáriado governador. As políticas continuadas de municipali-zação nos estados do Paraná e do Ceará foram realiza-das por governos, respectivamente, do PMDB e doPSDB. Contudo, no Estado de São Paulo, sucessivasgestões do PMDB e o atual governo do PSDB nãoadotaram políticas ativas nesta direção. Da mesmaforma, os governos do PMDB no Rio Grande do Sul e naBahia no período 1987-1990 também não implementa-ram políticas ativas de municipalização. Em outraspalavras, a municipalização de políticas sociais nãopode ser encarada como uma variável determinada pelafiliação partidária dos governadores.

BIBLIOGRAFIA

ABRUCIO, Fernando Luiz. (1994), “Os barões daFederação”. Lua Nova, 33: 165-83.

AFFONSO, Rui de Britto Álvares. (1990), “A ruptura dopadrão de financiamento do setor público e acrise do planejamento no Brasil nos anos 80”.Planejamento e Políticas Públicas, 4: 37-66.

AFFONSO, Rui de Britto Álvares e SILVA, Pedro LuizBarros (orgs.). (1995), Desigualdades regio-nais e desenvolvimento. São Paulo, Fundap/Unesp.

AFONSO, José Roberto Rodrigues. (1992), “Sistematributário, federalismo e a revisão constitucio-nal de 1993”. Tributação em Revista, 1(2): 37-46.

__________. (1995), Notas para o debate: a questãotributária e o financiamento dos diferentesníveis de governo. Trabalho apresentado aoseminário Impasses e Perspectivas da Federa-ção no Brasil, realizado pela Fundap em SãoPaulo.

AFONSO, José Roberto Rodrigues e SENRA, Nelsonde Castro. (1994), “Despesa pública. Compe-tências, serviços locais, descentralização: opapel dos municípios”. Texto para DiscussãoCEPP, Rio de Janeiro, CEPP, 23, datilo.

ALMEIDA, Maria Hermínia Tavares de. (1995), “Fede-ralismo e políticas sociais”. Revista Brasileirade Ciências Sociais, 28(10): 88-108.

ANDRADE, Ilza Araújo Leão de. (1996), Descentraliza-ção e poder municipal no Nordeste: os doislados da nova moeda. Trabalho apresentadoao GT de Políticas Públicas no XX EncontroNacional da Anpocs, datilo.

ANJOS JR., Moacir dos (coord.). (1996), Balanço eperspectivas da descentralização no Estado dePernambuco 1986-1994. Relatório de pesqui-sa, projeto Balanço e perspectivas da descen-tralização das políticas sociais no Brasil, SãoPaulo, Fundap.

ARAÚJO, Ricardo e LOUREIRO, Rubem Severian.(1996), Limites e possibilidades de descentrali-zação administrativa: o setor de saneamentobásico no Estado de São Paulo. Relatório depesquisa, projeto Balanço e perspectivas dadescentralização das políticas sociais no Brasil,São Paulo, Fundap, datilo.

Page 29: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL 139

ARRETCHE, Marta T.S. (1995), “Políticas de desenvol-vimento urbano na crise: descentralização oucrise do modelo BNH?”, in Elisa Reis, MariaHermínia Tavares de Almeida e Peter Fry,Pluralismo, espaço social e pesquisa, São Pau-lo, Anpocs/Hucitec.

__________. (1996a), “Mitos da descentralização: maisdemocracia e eficiência nas políticas públicas”.Revista Brasileira de Ciências Sociais, 31 (11):44-66.

__________. (1996b), “Desarticulação do BNH e auto-nomização da política habitacional”, in Rui deBritto Álvares Affonso e Pedro Luiz BarrosSilva, Descentralização e políticas sociais, SãoPaulo, Fundap.

__________. (1996c), “Aspectos regionais dos gastoscom habitação e saneamento básico”, in Rui deBritto Álvares Affonso e Pedro Luiz BarrosSilva, Descentralização e políticas sociais, SãoPaulo, Fundap.

__________. (1998), O processo de descentralizaçãodas políticas sociais no Brasil e seus determi-nantes. Campinas, tese de doutorado, IFCH/Unicamp.

ARRETCHE, Marta e RODRIGUEZ, Vicente. (1997), Adescentralização da educação no Brasil: o ba-lanço de uma política em processo. Relatóriode pesquisa, projeto Balanço e perspectivas dadescentralização das políticas sociais no Brasil,São Paulo, Fundap, datilo.

__________. (1998), A descentralização das políticassociais no Estado de São Paulo: 1986-94. SãoPaulo, FAPESP/Fundap/IPEA.

BARBOSA, Eva Machado. (1996), Gastos e modalida-des de atuação do Estado do Rio Grande do Sulno setor da habitação social (1986-1994).Relatório de pesquisa, projeto Balanço e pers-pectivas da descentralização das políticas soci-ais no Brasil, São Paulo, Fundap, datilo.

COHEN, Joshua e ROGERS, Joel. (1995), Associationsand democracy. Londres/Nova York, Verso.

DRAIBE, Sônia Miriam. (1994), “As políticas sociais noregime militar brasileiro: 1964-84”, in GláucioAry Dillon Soares e Maria Celina d’Araújo, 21anos de regime militar. Balanços e perspecti-vas, Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas.

__________. (1997), Avaliação da descentralizaçãodas políticas sociais no Brasil: saúde e educa-ção fundamental. Relatório final do projetoEstudios de descentralización de servicios so-ciales, CEPAL, datilo.

EVANS, Peter B., RUESCHEMEYER, Dietrich e SKO-CPOL, Theda. (1985), Bringing the state backin. Cambridge, Cambridge University Press.

FERREIRA, Assuéro, SILVA, José Borzacchiello da eROCHA, Maria Eloisa Bezerra da. (1996), Rela-tório de habitação. Relatório de pesquisa, pro-jeto Balanço e perspectivas da descentraliza-ção no Brasil, São Paulo, Fundap, datilo.

FIGUEIREDO, Argelina Cheibub e LIMONGI, Fernan-do. (1995), “Mudança constitucional, desem-penho do Legislativo e consolidação instituci-onal”. Revista Brasileira de Ciências Sociais,10(29): 175-200.

FREITAS, Marcio Rosa Rodrigues de. (1996), Descen-tralização em saneamento no Rio Grande doSul. Relatório de pesquisa, projeto Balanço eperspectivas da descentralização no Brasil, SãoPaulo, Fundap, datilo.

GOMES, Gustavo Maia e MAC DOWELL, Maria Cristi-na. (1997), Os elos frágeis da descentralização:observações sobre as finanças dos municípiosbrasileiros. Trabalho apresentado ao Seminá-rio Internacional sobre Federalismo e Gover-nos Locais, La Plata, Argentina.

GONZALEZ, Hélios Puig. (1996), Descentralização emsaneamento no Rio Grande do Sul. Relatóriode pesquisa, projeto Balanço e perspectivas dadescentralização no Brasil, São Paulo, Fundap,datilo.

HAGGARD, Stephan. (1995), The reform of the statein Latin America. Paper apresentado na Annu-al Bank Conference on Development in LatinAmerica and the Caribbean, Rio de Janeiro,datilo.

HAGGARD, Stephan e KAUFMAN, Robert. (1993), “OEstado no início e na consolidação da reformaorientada para o mercado”, in Lourdes Sola(org.), Estado, mercado e democracia, SãoPaulo, Paz e Terra.

HOMMES, Rudolf. (1995), Conflicts and dilemmas ofdecentralization. Paper apresentado na Annu-al Bank Conference on Development Econo-mics, Washington, DC, datilo.

IMMERGUT, Ellen M. (1960), “As regras do jogo: alógica da política de saúde na França, na Suíçae na Suécia”. Revista Brasileira de CiênciasSociais, 30(11): 139-65.

JOBERT, Bruno e MULLER, Pierre. (1987), L’Etat enaction. Paris, PUF.

Page 30: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

140 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 14 No 40

LIMA, Maria Helena de Castro. (1996), Descentraliza-ção da política de assistência social no Estadode São Paulo. Relatório de pesquisa, projetoBalanço e perspectivas da descentralização noBrasil, São Paulo, Fundap, datilo.

LIMONGI, Fernando e FIGUEIREDO, Argelina Chei-bub. (1996), “As reformas (des)necessárias”.São Paulo em Perspectiva, 10(4): 37-43.

LIRA, Emilia Maria Noronha G. e FIGUEIREDO, Mariado Socorro Paim de. (1996), Setor de assistên-cia social. Relatório de pesquisa, projeto Balan-ço e perspectivas da descentralização no Bra-sil, São Paulo, Fundap, datilo.

LUZ, Regina Lúcia Pereira de Assis. (1996), Setor dehabitação. Relatório de pesquisa, projeto Ba-lanço e perspectivas da descentralização noBrasil, São Paulo, Fundap, datilo.

MARCH, James G. e OLSEN, Johan P. (1989), Redisco-vering institutions: the organizational basis ofpolitics. Nova York, Free Press.

MARQUES, Rosa Maria. (1996), A descentralização dapolítica de saúde no Estado de São Paulo.Relatório de pesquisa, projeto Balanço e pers-pectivas da descentralização no Brasil, SãoPaulo, Fundap, datilo.

MEDEIROS, Antonio Carlos. (1986), Politics and inter-governmental relations in Brazil: 1964-1982.Nova York/Londres, Garland Publishing Inc.

MÉDICI, André Cezar. (1994), A dinâmica do gastosocial no Brasil nas três esferas de governo:uma análise do período 1980-1992. Relatóriode pesquisa, projeto Balanço e perspectivas dofederalismo fiscal no Brasil, São Paulo, Fun-dap, datilo.

MÉDICI, André Cézar e AGUNE, Antonio Celso.(1993), Desigualdades sociais e desenvolvi-mento no Brasil: uma análise dos anos oitentaao nível regional. Trabalho apresentado noXVII Encontro Anual da Anpocs.

MENDONÇA, Emanoel. (1996), Setor de saneamento.Relatório de pesquisa, projeto Balanço e pers-pectivas da descentralização no Brasil, SãoPaulo, Fundap, datilo.

MENEZES, Jaci Maria Ferraz de e SANTANA, ElisabethC. (1996), Setor de educação. Relatório depesquisa, projeto Balanço e perspectivas dadescentralização no Brasil, São Paulo, Fundap,datilo.

MIGDAL, Joel S. (1988), Strong societies and weakstates. State-society relations and state capabi-lities in the third world. Princeton, PrincetonUniversity Press.

MORAIS, José Andrade de e VIDAL, Ana Maria Porte-la. (1996), Saneamento. Relatório de pesquisa,projeto Balanço e perspectivas da descentrali-zação no Brasil, São Paulo, Fundap, datilo.

NEPP. (1987), Brasil. Relatório sobre a situação socialdo país. Campinas, NEPP/Unicamp.

ORLOFF, Ann Shola. (1993), The politics of pensions.Wisconsin, University of Wisconsin Press.

PAULA, Danielle B. Accioly de e COELHO, Vera MariaCâmara. (1996), Saúde. Relatório de pesquisa,projeto Balanço e perspectivas da descentrali-zação no Brasil, São Paulo, Fundap, datilo.

PETERSON, Paul. (1995), The price of federalism.Nova York, The Twentieth Century Fund.

PETERSON, Paul e ROM, Mark C. (1990), Welfaremagnets. A new case for a national standard.Washington, Brookings Institution.

PIOLA, Sérgio Francisco e CAMARGO, Sebastião Fran-cisco. (1993), Brasil: gasto social federal poráreas (1980 a 1992). Brasília, IPEA, datilo.

PUTNAM, Robert D. (1993), Making democracy work.Princeton, Princeton University Press.

RABELO, Mercedes e RÜCKERT, Isabel. (1996), Oprocesso de descentralização do setor saúdeno RS: histórico, estrutura institucional e pa-drão de financiamento. Relatório de pesquisa,projeto Balanço e perspectivas da descentrali-zação no Brasil, São Paulo, Fundap, datilo.

RAGGIO, Nadia Zaiczuck (coord.). (1996), Balanço eperspectivas da descentralização no Estado doParaná. Relatório de pesquisa, projeto Balançoe perspectivas da descentralização no Brasil,São Paulo, Fundap, datilo.

REZENDE, Flavio da Cunha. (1997), “Descentraliza-ção, gastos públicos e preferências alocativasdos governos locais no Brasil (1980-1994)”.Dados, 40(3): 441-64.

RIKER, William H. (org.). (1987), The development ofAmerican federalism. Norwell, Kluwer Acade-mic Publishers.

RODRIGUEZ, Vicente. (1996), A descentralização daeducação no Estado de São Paulo: a municipa-lização do ensino básico. Relatório de pesqui-sa, projeto Balanço e perspectivas da descen-tralização no Brasil, São Paulo, Fundap, datilo.

RUESCHEMEYER, Dietrich, STEPHENS, Evelyne Hu-ber e STEPHENS, John D. (1992), Capitalistdevelopment & democracy. Chicago, Universi-ty of Chicago Press.

Page 31: Políticas Sociais no Brasil: Descentralização em um Estado Federativo

POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL 141

SANÁBRIA, Lorys e BORSATTO, Maria Luiza B.(1996), Descentralização da assistência socialno Rio Grande do Sul. Relatório de pesquisa,projeto Balanço e perspectivas da descentrali-zação no Brasil, São Paulo, Fundap, datilo.

SCHAPS, Ronald e RIKER, William. (1987), “Dishar-mony in federal government”, in WilliamRiker (org.), The development of Americanfederalism, Norwell, Kluwer Academic Publi-shers.

SERRA, José e AFONSO, José Roberto R. (1991a),“Finanças públicas municipais. Trajetória e mi-tos I”. Conjuntura Econômica, 45(10): 44-50.

__________. (1991b), “Finanças públicas municipais.Trajetória e mitos II”. Conjuntura Econômica,45(11): 35-43.

TEIXEIRA, Carmem Freitas e MOLESINI, Joana.(1996), Setor de saúde. Relatório de pesquisa,projeto Balanço e perspectivas da descentrali-zação no Brasil, São Paulo, Fundap, datilo.

TENDLER, J. e FREEDHEIM, S. (1994), “Trust in a rent-seeking world: health and government trans-formed in Northeast Brazil”. World Develop-ment, 22(12): 1.771-91.

VIDAL, Ana Maria Portela e ALBUQUERQUE NETO,Pedro de. (1996), Assistência social. Relatóriode pesquisa, projeto Balanço e perspectivas dadescentralização no Brasil, São Paulo, Fundap,datilo.

VIDAL, Ana Maria Portela e VERAS, Neide FernandesMonteiro. (1996), Relatório de educação. Rela-tório de pesquisa, projeto Balanço e perspecti-vas da descentralização no Brasil, São Paulo,Fundap, datilo.

WEAVER, R. Kent e ROCKMAN, Bert A. (eds.). (1993),Do institutions matter? Washington, BrookingsInstitution.

WEIR, Margaret, ORLOFF, Ann Shola e SKOCPOL,Theda. (1988), The politics of social policy inthe United States. Princeton, Princeton Univer-sity Press.

WEYLAND, Kurt. (1996), Democracy without equity.Failures of reform in Brazil. Pittsburgh, Pitts-burgh Press.

WINCKLER, Carlos Roberto e SANTAGADA, Salvato-re. (1996), Descentralização em educação noRio Grande do Sul. Relatório de pesquisa,projeto Balanço e perspectivas da descentrali-zação no Brasil, São Paulo, Fundap, datilo.