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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Departamento de História ENTRE A ESPADA E A POLÍTICA: A candidatura Lott em 1960 Marco Túlio Antunes Gomes

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

Departamento de História

ENTRE A ESPADA E A POLÍTICA:

A candidatura Lott em 1960

Marco Túlio Antunes Gomes

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Belo Horizonte 2014

Marco Túlio Antunes Gomes

ENTRE A ESPADA E POLÍTICA:

A candidatura Lott em 1960

Projeto de pesquisa apresentado ao Departamento de História da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, para obtenção de financiamento junto ao Programa de Bolsas de Iniciação Científica PROBIC Edital nº 75/2012

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Belo Horizonte 2014

AGRADECIMENTOS

Iniciar-se na pesquisa científica configura-se como uma verdadeira odisseia,

repleta de desafios e surpresas das mais diversas magnitudes. A conclusão de cada

etapa desta jornada não se deu unicamente por esforço pessoal, mas por auxílio de

diversas pessoas, cabendo assim os devidos agradecimentos. Primeiramente ao

meu orientador, Mário Cléber Martins Lanna Júnior, pela imensurável contribuição

dada para a confecção desta pesquisa, manifestada através de conselhos,

incentivos, críticas e sugestões. Graças ao seu apoio esta produção pode deixar de

se assemelhar-se a teia de Penélope, alcançando seu fim. Fica aqui a expectativa

em retribuir a oportunidade dada com um resultado satisfatório. E em um país cuja

educação ainda percorre mares tempestuosos, agradeço também a FAPEMIG e a

equipe da Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-graduação da PUC Minas, pelo auxílio

prestado.

Agradeço ainda a todos os funcionários do Centro de Pesquisa e

Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC), do Arquivo Público

do Estado do Rio de Janeiro (APERJ), da Hemeroteca da Biblioteca Pública

Estadual Prof. Luiz de Bessa, e da Biblioteca Padre Alberto Antoniazzi, pela

solicitude quanto à documentação utilizada nesta pesquisa. Cabem agradecimentos

à equipe do Centro de Memória e Pesquisa Histórica da PUC-Minas, principalmente

os amigos Leandro Pereira de Abreu e Rafael Pacheco Mourão, que contribuíram

com valiosos conselhos no desenvolvimento deste trabalho. Também são alvos de

minha gratidão às professoras Carla Ferretti Santiago e Heloísa Guaracy Machado,

que me orientaram nos primeiros passos rumo à homérica tarefa da pesquisa

acadêmica.

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Por fim, agradeço aos meus colegas de turma, pelo companheirismo e pelas

frutíferas conversas. Tratam-se de amizades que certamente continuarei nutrindo

para além dos muros da universidade. Obrigado a todos os meus familiares, mas

principalmente a Lucilene Antunes e a Priscila Batista, pela confiança, afeto e

compreensão.

LISTA DE SIGLAS

CPDOC – Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do

Brasil

CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito

FEB – Força Expedicionária Brasileira

FPN – Frente Parlamentar Nacionalista

ISEB – Instituto Superior de Estudos Brasileiros

JK – Juscelino Kubitschek

MMC - Movimento Militar Constitucionalista

MPJQ - Movimento Popular Jânio Quadros

MTR – Movimento Trabalhista Renovador

PCB – Partido Comunista Brasileiro

PDC - Partido Democrata Cristão

PL - Partido Libertador

PR – Partido Republicano

PRM – Partido Republicano Mineiro

PRP - Partido de Representação Popular

PSB – Partido Socialista Cristão

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PSD – Partido Social Democrático

PSP – Partido Social Progressista

PTB – Partido Trabalhista Brasileiro

PTN - Partido Trabalhista Nacional

UDN – União Democrática Nacional

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO .............................................................................................. 5

2. CAPÍTULO 1: UMA VIDA PELA LEGALIDADE ........................................ 11

2.1 TEMPOS NEBULOSOS ................................................................... 12

2.2 O 11 DE NOVEMBRO ...................................................................... 16

2.3 A ESPADA DE OURO ...................................................................... 18

3. CAPÍTULO 2: A CANDIDATURA ............................................................... 22

3.1 PROPOSTAS .................................................................................... 24

3.2 A PERFORMANCE POLÍTICA .......................................................... 27

4. CAPÍTULO 3: O QUADRO PARTIDÁRIO NO PERÍODO DEMOCRÁTICO 29

4.1 O DESGASTE DA ALIANÇA PSD-PTB ............................................. 30

4.2 AS ELEIÇÕES DE 1958: ENSAIO PARA 1960 .................................. 32

4.3 JK: UM OLHO EM 1960, OUTRO EM 1965 ....................................... 34

4.4 A CANDIDATURA SEM APOIO ......................................................... 37

4.5 JÂNIO E A JAN-JAN .......................................................................... 40

4.6 O APOIO INDESEJADO .................................................................... 42

5. CAPÍTULO 4: O NACIONALISMO COMO BANDEIRA ............................. 46

5.1 NACIONALISMO DA CASERNA ........................................................ 46

5.2 O NACIONALISMO DESENVOLVIMENTISTA .................................. 47

5.3 A VOZ QUE NÃO ERA DO POVO ..................................................... 50

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6. CONCLUSÃO ............................................................................................. 57

7. FONTES ...................................................................................................... 59

8. REFERÊNCIAS ........................................................................................... 62

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1. INTRODUÇÃO

Esta pesquisa se dedica a uma temática pouco abordada atualmente pela historiografia: a candidatura do Marechal Henrique Teixeira Lott a presidência da República, no ano 1960. Com seu símbolo de campanha, a espada de ouro, o militar trazia consigo a reputação de guardião da democracia e da legalidade, conseguida após liderar o contragolpe de 1955. A candidatura Lott também representava o continuísmo do governo Juscelino Kubitschek e foi lançada pela chapa PSD-PTB, a mesma que apoiara o presidente do qual foi Ministro da Guerra. Dentre seus oponentes ao pleito, encontrava-se o ex-governador de São Paulo, Jânio da Silva Quadros, apoiado pela UDN. Figura emblemática da política brasileira, Jânio portava como símbolo uma vassoura, e tinha como promessa de campanha a moralização da política brasileira. O panteão de candidatos à presidência se encerrava com Ademar de Barros, do PSP, eterno rival de Quadros em São Paulo. Do pleito sairia vitorioso o candidato Jânio Quadros, que renuncia após oito meses de mandato e dá início a um período de grande instabilidade política que culmina com o golpe civil-militar de 1964. Jânio foi o primeiro candidato de oposição do período republicano a vencer uma eleição presidencial, além de ser até então o presidente a vencer um pleito com mais número de votos. Mas afinal, o que teria levado marechal Lott, candidato da situação, a perder a eleição?

A escolha de estudar a figura de Lott não decorre da inexistência de estudos na área, tendo sido o militar tema de diversas obras, em vários períodos distintos. Um ano antes do ano de eleições, em 1959, Lott foi alvo de críticas do jornalista Viriato de Castro no livro Espada X Vassoura: Marechal Lott. Castro divide sua obra em duas partes: na primeira, analisa a vida do militar, considerando-o um golpista no episódio de 1955, além de criticar sua postura diante dos processos que moveu contra os indivíduos que o difamaram, dentre outros assuntos. Na segunda parte, o autor se dedica a realizar uma “autópsia do governo JK” (CASTRO, 1959, p. 107), destacando episódios como o aumento da inflação e o grande número de analfabetos no país. Ao apresentar aspectos negativos do governo Juscelino, Castro busca alertar o leitor sobre a possibilidade da manutenção da ineficácia do Executivo em solucionar os problemas do povo ao eleger o candidato do continuísmo. Ressalta o autor:

Se o governo tem um marechal candidato, deve lembrar que o povo também possui marechais: o marechal da fome; o marechal da miséria; o marechal da alta do custo de vida; o marechal da inflação; o marechal o marechal do atual estado das coisas. Na frente vem a Vassoura, que já derrubou governos e situações, nas condições mais adversas deste mundo (CASTRO, 1959, p. 109).

Se ao leitor restasse alguma dúvida quanto à adesão do autor ao janismo, ela seria sanada na parte final da obra, em que no embate entre espada e vassoura, o autor confessa ser favorável à última, já que “Jânio Quadros é o único político, no Brasil, em condições de fazer alguma coisa pelo país” (CASTRO, 1959, p. 213).

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O marechal Lott também contou com publicações favoráveis a sua candidatura. Em 1960 uma biografia foi escrita pelo major Joffre Gomes da Costa, intitulada Marechal Teixeira Lott. A obra, que exaltava a postura nacionalista do militar por toda a sua vida, chegou a ser comercializada pelo Comitê Interpartidário Lott e Jango (O SEMANÁRIO, 1960, p. 8). Ainda em 1960, o deputado Salomão Jorge dedicou-se a fazer uma obra pró-lottista de título A vida do Marechal Lott: a espada a serviço da lei, em que descreve a trajetória do militar em que desde cedo “tudo o impulsionava a servir a Pátria, porque ele a amava fervorosamente, com um afeto desmedido, avassalador, sem limites” (JORGE, 1960, p. 28). Desta forma, toda a vida do biografado é associada a um elevado padrão de patriotismo e devoção ao país. Em um dos capítulos, exclusivamente voltado para discorrer sobre o programa de governo de Lott, o militar ganha voz, e descreve todas as suas propostas para a presidência. O livro também se dedica a fazer “uma visão panorâmica da obra monumental do presidente Juscelino Kubitschek” (JORGE, 1960, p. 193), cujo governo é tratado em dois capítulos, o último deles exclusivamente voltado a tratar sobre Brasília. Ao fazer isso, Jorge legitima ao mesmo tempo não só o governo JK, mas também incentiva seus leitores a apoiar seu sucessor.

A militância lottista rendeu uma terceira obra no ano eleitoral de título Marechal Henrique Lott, escrita pelo major Joffre Gomes da Costa. Além de fazer um resgate da vida do marechal, o livro também levantou informações acerca dos antepassados do militar, como dados sobre os pais e avós de Lott, além de dedicar o anexo a traçar a genealogia da família Teixeira Lott. Após elencar os episódios mais distintos da vida do ‘estadista’ Lott, Costa encerra sua obra com a seguinte mensagem:

É o Marechal Henrique Lott – soldado da Lei e da Ordem – que apontam para levantar o nível da nossa cultura política e erguer bem acima das paixões e sentimentos cívicos, abastardados no mercado de interesses. Confiemos e esperemos que desta vez, como de tantas outras, permaneça luzindo no alto a estrela da sua predestinação, a iluminar, por entre as nuvens da batalha das urnas, o caminho que há de conduzir nos braços do povo o menino pobre do Sítio à Presidência da República (COSTA, 1960, p. 474).

Derrotado nas urnas, o marechal recolhe-se a vida modesta de seu lar, mas isso não faz com que o símbolo que havia se tornado para muitos fosse esquecido. Em 1968 foi publicado o livro Como não se faz um presidente, de autoria do jornalista Milton Senna. Trata-se da cobertura dos seis meses de campanha política do marechal por todo país, minuciosamente descrita por Senna, que o acompanha em suas viagens. De acordo com o autor, a obra tinha como um de seus objetivos, além de expor os pronunciamentos nacionalistas de Lott, “refazer conceitos errôneos sobre a sua pessoa, que a propaganda adversária tentou levar ao ridículo e mostrar, a quem tiver boa vontade de entender, o grande exemplo de sacrifício e amor à pátria” (SENNA, 1968, p. 32). O resgate da figura simbólica de Lott em um período em que o regime de exceção já dava indícios de que não teria uma duração efêmera, não foi por mero caso. Senna relaciona a derrota do candidato e a vitória

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da UDN e Jânio Quadros como a interrupção do processo democrático que se encontrava em marcha:

A revolução brasileira (democrática e cristã – é evidente) sofreu, assim, uma solução de continuidade, dando lugar à revolução de março de 1964, sem identificação com aquela, por mais bem intencionada que tenha sido. E mais esta estagnação, ninguém poderá negar, foi uma contribuição valiosa da União Democrática Nacional (SENNA, 1968, p. 41).

A vida do Marechal Lott também rendeu uma biografia em 2005 de nome O soldado absoluto – uma biografia do marechal Henrique Lott. Escrita com um maior rigor do que seus antecessores, o jornalista Wagner William, além de empregar todas as biografias produzidas sobre o marechal, também recorre a documentos de arquivos do Exército, CPDOC, e do arquivo da família Lott. São utilizados diferentes jornais e revistas, tendo como resultado final uma rica pesquisa sobre a vida do marechal Lott. O biografado é apresentado, como sugere o título do livro, um “soldado absoluto”, que dedica toda a sua vida a cumprir os desígnios da nação.

Encerrando o hall de produções do marechal Lott destacam-se dois trabalhos desenvolvidos pela historiadora Karla Guilherme Carloni em sua dissertação e tese de doutorado. Na primeira, intitulada Forças armadas e democracia no Brasil: o 11 de Novembro de 1955, Carloni destaca o episódio em que Lott garantiu a posse de Juscelino Kubitschek na presidência da República. Nesta obra a autora evidencia a multiplicidade de segmentos políticos existentes na Caserna, destacando o segmento defensor da democracia, no qual Lott se insere. Além de evidenciar a relevância do episódio para a manutenção da democracia, Carloni considera o 11 de Novembro como

um importante marco na aproximação entre militares e partidos políticos comprometidos com os ideais reformistas do nacionalismo. Trabalhadores, sindicalistas, pessedistas, petebistas, militares e comunistas, dentre outras parcelas da população, manifestaram apoio ao ministro da Guerra e à facção legalista das Forças Armadas (CARLONI, 2012, p. 19).

Como tese de doutoramento Carloni dá continuidade a sua produção dedicada a vida do marechal Lott com o trabalho Marechal Henrique Teixeira Lott: a opção das esquerdas, em que é feita uma análise mais extensa da ação política do militar. Inicialmente a autora se propõe a trabalhar com as memórias acerca de Lott, destacando o conflito existente entre os relatos da esquerda e da direita. Nos capítulos que seguem, Carloni acompanha a trajetória de Lott desde seu ingresso na carreira militar, ainda na Primeira República, a sua ação durante a ditadura instaurada a partir de 1964. Trata-se do mais importante trabalho historiográfico que se dedica a analisar a campanha de Lott a presidência da República em 1960, utilizando fontes inéditas como materiais de campanha apreendidos pela Divisão de Polícia Política, localizados no Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro (APERJ). Carloni esclarece que o uso da biografia de Lott como uma possibilidade

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de se analisar a relação entre as esquerdas civis e militares, cujo rompimento justificaria a perda de memórias sobre o marechal (CARLONI; 2010).

Este breve resgate bibliográfico sobre o marechal Lott indica as variações nos usos de sua biografia. Os primeiros trabalhos possuem caráter literário, e se assemelham por serem escritos e publicados em pleno período de eleições, em que há um esforço de legitimar ou desvalidar o candidato perante o eleitorado. Para seus partidários, Lott era um símbolo da legalidade e da defesa da democracia, e assim é mantido pelos trabalhos posteriores, de Milton Senna, que busca resgatá-lo como contraponto ao momento político que escreve, a Karla Carloni, em que Lott é apresentado como símbolo das esquerdas democráticas na Caserna e na sociedade civil. Longe de buscar refutar sua importância simbólica, a figura de Lott aqui é reavivada para a análise da classe político-partidária nos últimos anos do período democrático, e de que maneira ela lida com a candidatura do marechal e de que maneira é construído seu discurso nacionalista neste cenário.

Embora as maiores partes das obras citadas anteriormente tendessem a exaltar seu biografado, a figura do marechal foi concebida de maneira distinta durante o pleito de 1960. Pela oposição, proprietária dos mais relevantes veículos da grande imprensa, Lott era retratado ora como comunista, ora como candidato atrapalhado e sem experiência. Se a história nos mostra que tal discurso foi comprado pelo eleitorado, levando Lott a perder as eleições, a historiografia, pelo menos em parte, legitima aspectos acerca da construção da imagem sobre o candidato.1 Diante disso, é objetivo desta pesquisa analisar a ação do marechal Lott no cenário político em 1960, observando suas relações com os partidos e ideologias políticas vigentes, relacionando-as com o imaginário formado sobre o candidato.

O interesse do político pela história ganhou fôlego recentemente, e a partir do diálogo constante com outras ciências, como a antropologia e a ciência política, possibilitando o surgimento de novas abordagens. De acordo com René Rémond, se outrora a história política podia ser caracterizada como factual, elitista e subjetivista, a nova história política “pretende integrar todos os atores – mesmo os mais modestos – do jogo político, e que se atribui como objeto a sociedade global” (RÉMOND, 2003, p. 33). Assim sendo, o processo eleitoral, foco de nossa pesquisa, ganha grande importância, já que traz a tona os diversos comportamentos políticos (RÉMOND; 2003). Pierre Rosanvallon também observa um retorno do interesse da história pela política a partir da década de 1970, propondo a existência de uma “história do político”, em que mais do que refazer uma reconstrução dos acontecimentos, seria concebida como um laboratório que dialogaria passado e presente, buscando compreender de que forma os grupos sociais assimilavam as situações que enfrentavam, trazendo a tona suas experiências e tentativas, seus

1 Francisco Iglésias (1993), e Thomas Skidmore (2003) são os exemplos de autores mais conhecidos, e serão tratados adiante.

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conflitos e controvérsias. A partir do contato com a história das mentalidades, a história do político buscaria aglutinar os elementos que compõem a chamada cultura política, como ritos, panfletos, a imprensa, entre outros (ROSANVALLON; 2010). Neste diálogo, o imaginário tem se destacado como um destes elementos que se tornam objetos de estudo da história política.

Originalmente o imaginário social torna-se preocupação de estudo da História Cultural dos Annales, comumente tratada como história das mentalidades. Roger Chartier, um de seus principais nomes, considera as representações do mundo social como forjadas por interesses de grupos específicos que competem entre si para a imposição de determinados valores (CHARTIER; 1985). O autor constrói este conceito de representação a partir da teoria sociológica de Pierre Bourdieu, que considera o campo político como local onde ocorre o embate de forças “que tem em vista transformar a relação de forças que confere este campo a sua estrutura em um dado momento” (BOURDIEU, 2010, p. 164). Nesta disputa pelo poder, a força das ideias existentes não se dá pela veracidade delas, mas pela sua capacidade de mobilização e reconhecimento. De acordo com o autor, no campo político, em que vigora a lei da oferta e da procura, produtos, conceitos e ideias concorrem entre si, cabendo aos cidadãos comuns escolhê-las (BOURDIEU; 2010).

Na seara da história política, a partir deste contato com as Ciências Sociais e a história das mentalidades, diversos trabalhos dedicaram-se a temática do imaginário. Em Reinventando o otimismo Carlos Fico analisou o imaginário social construído através da propaganda oficial do regime militar brasileiro entre 1969-77, em que se vivenciava um sentimento de otimismo com o “milagre econômico”. Fico compreende o otimismo do período pelos setores médios e elites do meio urbano como não sendo apenas “a atitude positiva de que os problemas brasileiros podem vir a ter uma solução satisfatória, mas a pela convicção de que isso ocorrerá” (FICO, 1997, p. 19). Ainda em 1997, Eliana Dutra se utiliza do conceito de imaginário ao analisar a cultura política dos anos 30 do país em O ardil totalitário: imaginário político no Brasil dos anos 30, que passava por um processo de fascistização no período. Deste contexto de construção do totalitarismo e de polarização, Dutra analisa tanto o imaginário anticomunista, próprio do integralismo, quanto o imaginário da revolução feito pelos comunistas (DUTRA; 1997).

O imaginário também é contemplado nas pesquisas de Jorge Ferreira, que em Trabalhadores do Brasil: o imaginário popular busca analisá-lo na relação entre os Vargas e trabalhadores, sindicalistas desempregados e indivíduos pobres. Sua abordagem, no entanto, é a cultura popular, identificando dela aspectos “ideias, crenças, práticas políticas e estratégicas de vida de grupos sociais” (FERREIRA, 1997, p. 17). Cabe ainda citar o trabalho de Rodrigo Patto Sá Motta, que na obra Em guarda contra o perigo vermelho investiga o anticomunismo no Brasil entre a Primeira República até o golpe de 64, dividindo o período em três momentos: no primeiro, em que considera os primórdios do anticomunismo do país vai de 1917 a 1935, e é seguido pela “Primeira Grande ‘Onda’ Anticomunista”, que vai de 1935 até

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1937. Por fim, Patto identifica o “Segundo Grande Surto Anticomunista”, que vai de 1961 até 1964 (MOTTA; 2002). Não por acaso, algumas datas limites determinadas pelo autor coincidem com instauração de períodos de exceção no país, já que a ameaça comunista foi utilizada muitas vezes para a legitimação de golpes de estado, além de “reprimir movimentos populares, garantir interesses imperialistas ameaçados pelas campanhas nacionalistas, ou seja, manter inalterado o status quo” (MOTTA, 2002, p.24). No que diz respeito às representações anticomunistas, Motta observa uma contínua utilização de certas imagens, ideias e mitos que são reproduzidas durante décadas (MOTTA; 2002).

Situando-se na renovação da história política, o objetivo desta pesquisa é analisar os principais elementos que compunham o quadro político-partidário em 1960, destacando suas relações com o marechal Lott e como isso interferiu em sua campanha e na construção do imaginário sobre o candidato. O primeiro capítulo desta pesquisa é dedicado a fazer uma breve trajetória da vida de Lott até o 11 de Novembro, quando sua figura ganha repercussão nacional. Esta fugaz retrospectiva é aqui realizada para demonstrar de que maneira a figura de Lott é associada ao ideal nacionalista e ao legalismo, elementos que aparecem constantemente atrelados ao militar durante sua candidatura. Em um segundo momento, já tendo como mote a campanha do marechal, analiso as forças políticas por trás do lançamento de Lott na vida política, suas propostas, e de que maneira sua performance é descrita por seus contemporâneos e historiadores, buscando compreender se estes últimos não legitimam certos relatos proferidos pelos primeiros ao tratarem da derrota do marechal nas urnas. No capítulo 3 faço uma análise do quadro político partidário diante da candidatura Lott, mostrando o peso que o desgaste da aliança PSD-PTB, chapa que lança o marechal, além da inércia de JK e dos caciques do PSD em promovê-lo contribuem para sua derrota. Além disso, destaco o apoio do Partido Comunista a sua candidatura como um fator importante para o distanciamento de setores da sociedade e da Caserna. Por fim discorro sobre o discurso nacionalista no período, e de que forma o uso de tal ideologia feito pelo candidato o afetou negativamente.

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2. CAPÍTULO 1: UMA VIDA PELA LEGALIDADE

A candidatura do Marechal Lott passa a ser considerada a partir da própria

carreira militar do personagem. Seu apreço pela legalidade e a democracia foram os

principais atributos que fizeram sua imagem repercutir nacionalmente. Após eventos

de 1955, em que garantiu a posse do presidente Juscelino Kubitscheck e o vice

João Goulart, tornou-se para muitos um símbolo, sendo visto como o candidato

natural à sucessão.

Henrique Batista Duffles Teixeira Lott nasceu em Sítio, atual Antônio Carlos,

no dia 16 de novembro de 1894, um dia após a posse do presidente Prudente de

Moraes. Filho de Henrique Matthew Lott e Maria Batista Duffles Teixeira Lott,

Henrique foi o primeiro de dez filhos do casal. Desde cedo optou pela carreira militar,

cursando o Colégio Militar do Rio de Janeiro por seis anos. Ingressou na Escola de

Guerra de Realengo logo depois, de onde saiu como aspirante a oficial. Chegou a

integrar uma das expedições enviadas a Guerra do Contestado por três meses,

retornando do conflito após contrair tifo. Enquanto se recuperava em sua cidade

natal, casou-se com Laura Ferreira do Amaral, logo depois partiu para Belo

Horizonte.

Após retornar ao Rio, Lott instruiu sargentos na Vila Maria. Dedicou-se por

muitos anos ao aprimoramento de sua carreira, pertencendo ao longo deste período

a diversas instituições militares, como a de Aperfeiçoamento de Instrução de

Infantaria, a Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais e a Escola de Estado-Maior do

Exército, da qual saiu formado em 1927 com o posto de capitão.

Desde muito cedo o militar sempre demonstrou grande apreço a legalidade. O

cenário de conflagração de 1930 não contou com a participação de Lott, então

professor da Escola Militar do Realengo, que manteve sua neutralidade diante das

agitações da Caserna. E com a chegada de Vargas ao poder, o militar teve poucas

promoções até o final de sua carreira, preço pago por se manter alheio ao

movimento. Pouco tempo depois, partiu para uma missão na Europa, onde

participou de uma comissão para compra de armas para o Exército brasileiro. Lott

retornou ao país em 1939, após concluir seu curso na École Supérieure de Guerre,

em Paris (WILLIAM; 2005).

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A conflagração da Segunda Guerra Mundial em 1939 mudou os ares no

Brasil. Getúlio Vargas não tomou parte do conflito até 1942, quando declarou guerra

à Alemanha e aos demais países do Eixo. Apesar de flertar politicamente com a

Itália e a Alemanha, a agenda econômica do país fez com que os brasileiros

lutassem ao lado dos Estados Unidos no litígio. Henrique Lott, que então ocupava o

posto de coronel, organizou embarques da Força Expedicionária Brasileira (FEB)

para a Itália. Porém, insatisfeito com a atribuição que lhe fora concedida, recorreu a

Eurico Gaspar Dutra, então Ministro da Guerra, para que também pudesse ir para a

Europa. Tendo sua permissão concedida, o militar passou a ser o elo da FEB com o

Comando do 5º Exército Americano. Por desentendimentos com o general

Mascarenhas de Moraes, Lott optou por retornar ao Brasil, no qual permaneceu por

pouco tempo: em dezembro de 1946 foi nomeado adido militar na embaixada

brasileira em Washington.

De volta ao Brasil Lott foi comandante do 2º Região Militar e da 2ª Divisão de

Infantaria em São Paulo. Também foi diretor de Engenharia e Comunicações até

agosto de 1954, quando foi convidado a ocupar a pasta do Ministério da Guerra. A

partir deste momento, a figura do Marechal estava prestes a ser conhecida por todo

o país (WILLIAM; 2005).

2.1. Tempos Nebulosos

A crise política iniciada com o suicídio do presidente Vargas em agosto

de 1954, não teve seus ânimos acalmados com a posse de seu vice Café Filho. Ao

nomear seus ministros, o novo presidente mostrou-se comprometido com a agenda

política udenista, indicando vários nomes ligados ao partido. Em Forças armadas e

democracia no Brasil: o 11 de novembro de 1955, a historiadora Karla Guilherme

Carloni lista os civis convocados por Café Filho:

Os udenistas civis que ocuparam cargos ministeriais e de primeiro escalão durante o

governo Café Filho foram: Raul Fernandes, na pasta de Relações Exteriores; José

Monteiro, na Casa Civil; Prado Kelly (substituto de Miguel Seabra Fagundes), na Justiça;

Clemente Mariani, no Brasil (posteriormente substituído por Alcides Vidigal). Eugênio

Gudin, na pasta da Fazenda (posteriormente substituído por José Maria Whitaker) e

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Gouvêa Bulhões, na Superintendência da Moeda e do Crédito (Sumoc), não pertenciam

oficialmente ao partido, mas nutriam simpatia. (CARLONI, 2012, p. 55).

Os cargos militares também foram ocupados por conhecidos antigetulistas: a pasta

da Aeronáutica foi entregue ao brigadeiro Eduardo Gomes, candidato a presidência

pela UDN por duas vezes, no Ministério da Marinha assumiu Edmundo Jordão

Amorim do Vale, e como chefe do Estado-maior das Forças Armadas o militar

Canrobert Pereira da Costa. Juarez Távora, que seria candidato à presidência pela

UDN nas eleições seguintes, ocupou o cargo de secretário-geral do Conselho de

Segurança Nacional. Somente um militar indicado pelo novo presidente era

desvinculado a movimentações partidárias: Henrique Lott. Em Radiografia de

Novembro Bento Munhoz da Rocha Neto, Ministro da Agricultura no governo Café

Filho, justifica a indicação do militar para o cargo de ministro da Guerra:

Era um militar alheio às lutas políticas. Sua atitude em 24 de Agosto foi de solidariedade

com a classe, evitando sua cisão. E como não se filiava a nenhum grupo, seria o homem

talhado para o momento em que o Exército necessitava de concórdia (ROCHA, 1961, p.

21).

O trecho refere-se ao fato de Lott ter sido um dos signatários do Manifesto dos

Generais, documento que exigia a renúncia do presidente Vargas. Apesar do apreço

a legalidade, o marechal temia que Vargas “resolvesse eternizar-se no poder.

Assinara o manifesto dos militares, depois sentira remorso. O suicídio tinha sido

experiência dolorosa” (BOJUNGA, 2010, p. 356). Assim sendo, o respeito à

legalidade e a desvinculação de Lott a setores políticos na Caserna ou mesmo

partidários, contribuíram para que Café Filho julgasse que Lott era a melhor escolha

para a manutenção da ordem durante seu governo.

Conforme o ano eleitoral de 1955 se aproximava, a tese da necessidade de

haver um candidato único para a presidência da república ganhava adeptos, sendo

inclusive considerada por Café Filho. A ideia de um “candidato nacional” partiu dos

caciques udenistas, que redigiram um documento e tentaram recolher assinatura de

apoiadores da causa. Diversos militares pressionavam Café Filho para que

negociasse com as lideranças partidárias em prol de um candidato único,

ameaçando intervirem no processo eleitoral caso isso não ocorresse. O nome mais

indicado por muitas lideranças políticas era Juarez Távora, conhecido pela sua

participação no movimento tenentista e filiado a UDN. Mas já era tarde: o nome de

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Juscelino Kubitschek, então governador de Minas Gerais, já era amplamente

apoiado pela “ala moça” do Partido Social Democrático (PSD). Reunindo nomes

como Ulysses Guimarães, Renato Archer, Cid Carvalho e José Joffily, a ala moça era

formada por jovens deputados federais ligados ao ideal nacionalista e defensores de

uma renovação política (HIPPÓLITO; 2013), objetivando maior participação nas

decisões políticas frente aos caciques do partido. A candidatura de Juscelino foi

aceita pelos caciques pessedistas, e no dia 10 de junho reconheceram o petebista

João Goulart como candidato a vice-presidência de JK na Convenção Nacional do

PSD.

Com a impossibilidade da candidatura nacional, a oposição começou a se

movimentar. A UDN permaneceu por algum tempo sem consolidar um nome para as

eleições de 1955, tendo como principais possibilidades Juarez Távora, Etelvino Lins

e Jânio Quadros. Por fim, decidiram apoiar Távora, tendo como vice o mineiro Milton

Campos e o apoio do Partido Democrata Cristão (PDC) e de membros do Partido

Socialista Brasileiro (PSB). Ao mesmo tempo em que se articulava em relação às

candidaturas, buscava boicotar a de Juscelino, realizando uma CPI para a

investigação dos bens dos candidatos. JK era um político estável politicamente,

dono de diversos imóveis e um cassino na Pampulha. Porém nada foi averiguado, e

o próprio udenista Sobral Pinto, que acompanhou as investigações do candidato,

reconheceu que “Juscelino era homem simples, honesto e muito preocupado em

realizar obras governamentais que correspondessem às necessidades do povo de

Minas Gerais” (BOJUNGA apud PINTO, 2010, p. 377). O ex-integralista Plínio

Salgado também se lançou a corrida presidencial, sendo candidato pelo Partido de

Representação Popular (PRP), de forte teor nacionalista e conservador. O paulista

Ademar de Barros fecha a lista de candidatos à presidência, concorrendo pelo

Partido Social Progressista (PSP), que contava com forte expressão em São Paulo e

em alguns outros pontos do país. O Partido Comunista Brasileiro (PCB) de Luiz

Carlos Prestes, diante as opções de candidaturas, apoia JK (BASBAUM; 1976).

A força da estratégia de campanha de JK certamente se encontrava na

manutenção da aliança PSD-PTB. Conforme destaca Leôncio Basbaum, Juscelino

contava principalmente com o apoio das classes conservadoras do país, principalmente

a burguesia agrária e a máquina-eleitoral do campo. E com os mineiros. Tinha, além

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disso, a seu favor, as massas “queremistas”, em mãos de João Goulart, seu

companheiro de chapa, herdeiro de Getúlio (BASBAUM, 1976, p. 213).

A oposição udenista não aceitaria o resultado do pleito com tanta facilidade.

Além da já mencionada tentativa de investigar os bens de JK, passou a defender a

cédula única, que deveria ser impressa pela Justiça Federal, com os nomes dos

candidatos. Apesar da legitimidade da proposta, contando com apoio de figuras do

governo Café Filho, a proposta foi encaminhada apenas três meses antes do pleito

para a aprovação na Câmara, sendo rejeitada. Por trás da investida da UDN havia

um desejo de neutralizar a ação dos “coronéis” pessedistas, afinal os partidos

políticos eram autorizados a produzir suas próprias cédulas, que eram distribuídas

apenas como o nome de seus candidatos em seus currais eleitorais. Segundo José

Murilo de Carvalho,

As práticas eleitorais ainda estavam muito longe da perfeição, apesar da justiça

especializada. A fraude era facilitada por não haver cédula oficial para votar. Os próprios

candidatos distribuíam suas células. Isso permitia muita irregularidade. O eleitor com

menos preparo podia ser facilmente enganado com a troca ou anulação de cédulas por

cabos eleitorais. Coronéis mantinham várias práticas antigas de compra de voto e

coerção de eleitores. A seu mando, cabos eleitorais ainda levavam os eleitores em

bandos para a sede do município e os mantinham em “currais”, sob vigilância constante,

até o momento do voto. Os cabos eleitorais entregavam aos eleitores os envelopes

fechados com as cédulas de seus candidatos, para evitar trocas. O pagamento podia ser

em dinheiro, bens ou favores (CARVALHO, 2013, p. 147).

Chegou-se a um meio-termo entre governo e oposição, e em 1955 o ministro

Edgard Costa aprovou a Lei 2.250, que criava a folha individual de votação. Apesar

de não se tratar de uma cédula oficial, o decreto conferia a obrigatoriedade de conter

nelas os nomes de todos os candidatos ao pleito, na mesma ordem, além de

também estabelecer a fixação do eleitor em uma única seção eleitoral. Dessa forma,

a lei diminuiu a incidência de fraudes com a preservação do sigilo de voto (afinal,

ainda que emitidas pelos partidos políticos, o eleitor poderia escolher qualquer uma

das opções contidas na cédula), além de facilitar a apuração das eleições (PIAUÍ;

2013). O Marechal Lott, incansável defensor da legalidade e da democracia, foi

amplo defensor da medida.

Outra tentativa de macular JK e João Goulart foi a carta Brandi, documento

veiculado por jornais brasileiros que ligava Jango a forças políticas socialistas da

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Argentina. O documento, supostamente assinado pelo deputado argentino Antonio

Jesus Brandi, denunciava contatos entre João Goulart e o governo Perón, além de

propalar a existência de contrabando de armas argentinas para o Brasil. Um

inquérito foi instaurado pelo governo Café Filho, e Lott participou do diálogo com o

governo da Argentina. Somente após o pleito de 1955 ficou comprovado que o

documento se tratava de um embuste. Contudo, as ofensivas da UDN não

conseguiram impedir a concretização de seu temor: com 3.077.411 de votos,

Juscelino Kubitschek foi eleito presidente do país. Seu vice, João Goulart também

obteve vitória nas urnas, eleito com 3.591.409 votos (WILLIAM; 2005).

O embate entre a situação e a oposição não cessou após a apuração dos

votos, se estendendo até dentro dos quartéis. O brigadeiro Eduardo Gomes, ministro

da Aeronáutica, e o almirante Amorim do Vale, ministro da Marinha, eram ferrenhos

opositores da posse de JK, representantes de uma ala golpista da Caserna. Muitos

destes militares eram membros da chamada Cruzada Democrática, movimento de

teor conservador destinado a concorrer à presidência do Clube Militar no início dos

anos 50, mas que também se engajou em momentos como a renúncia de Vargas e

para impedir a posse de JK em 1955. (LAMARÃO; 2010). Por outro lado, alguns

militares defensores do regime democrático e da realização das eleições em 1955,

se organizaram no Movimento Militar Constitucionalista (MMC), que contou com

nomes como o do coronel José Alberto Bittencourt, general Zenóbio da Costa, e

Nelson Werneck Sodré (CARLONI; 2012). A penalização prevista pela emissão de

opiniões políticas vindas da Caserna não impediu que muitos militares se

envolvessem nos debates acerca do pleito de 1955. O Marechal Lott era avesso a

“organizações paralelas à organização estatal” (SODRÉ, 1988, p.187), punindo

muitos militares que se pronunciavam politicamente. Sua firmeza para promover a

manutenção da lei foi justamente o aspecto explorado pela ala golpista do Exército

para obter sua demissão da pasta da Guerra, já que o militar era o único empecilho

para “alcançar a unidade de cúpula indispensável à conspiração em andamento”

(SODRÉ, 2010, p. 435).

2.2. O 11 de Novembro

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No dia 31 de outubro de 1955 o general Canrobert, militar respeitado por todo

o Exército e admirado por Lott, faleceu de câncer após muitos anos de tratamento. O

enterro do general contou a participação de muitos membros das Forças Armadas,

sendo acordada a participação de alguns militares com discursos, inclusive Lott. Um

destes militares era o coronel Bizarria Mamede, de forte inclinação golpista. Mamede

realizou um discurso de teor político, criticando pontos como o voto do analfabeto,

então proibido na época, que tinha como principal defensor o próprio marechal Lott.

O ministro da Guerra não permitiria que tal irregularidade passasse sem a devida

punição, e passou a buscar mecanismos para penalizar Mamede. Como não era seu

subordinado, Lott recorreu ao presidente Café Filho para que este o autorizasse a

punir o general. Contudo Café Filho se afastou da presidência, após ser acometido

de um enfarte apontado por muitos jornalistas na época como suspeito e oportuno,

já que o livraria de tomar qualquer atitude em relação à contenda entre os militares.

Com a saída de Café Filho, Carlos Luz, presidente da Câmara, assume a

presidência (WILLIAM; 2005).

Apesar de membro do PSD, Luz tinha ligações com a rival UDN, tendo

interesses econômicos comuns com o partido pelo fato de ser banqueiro. Após ser

procurado por Lott sobre o caso Mamede, Luz se opõe a qualquer punição ao militar,

atitude tida como intolerável pelo ministro, que se demite da pasta da Guerra. A

demissão de Lott era esperada, e seu substituto, o general Fiúza de Castro, já se

encontrava no Palácio do Catete para assumir a pasta do Ministério da Guerra

(CARLONI; 2012). Com Lott fora do Ministério, a oposição poderia seguir firme para

impedir a posse de JK e João Goulart.

Após se demitir do cargo de ministro Lott foi procurado pelo general Odílio

Denys para que ele liderasse a oposição ao golpe que Carlos Luz, juntamente com

militares e udenistas, articulavam. Apesar de relutante inicialmente, Lott concordou

em participar. Em entrevista ao CPDOC, o militar revelou os motivos que o levaram a

participar do movimento que ficou conhecido como 11 de novembro:

Naquele momento, entretanto, tratava-se do seguinte: um presidente, um segundo em

exercício, estava pactuando com uma atuação contrária à escolha do povo e à decisão

dos tribunais. Era uma situação contrária aos interesses do povo brasileiro,

absolutamente insustentável para quem prezasse o bem comum. Eu estava ocupando

uma função que era militar e política. Para mim, seria muito simples me afastar do

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Ministério da Guerra e deixar o Brasil pegar fogo, porque naturalmente haveria reação do

outro lado. Entretanto, com minha autoridade, com o conhecimento que eu tinha da

situação poderia, se agisse prontamente, impedir que se chegasse à guerra civil. Refleti

e lá pela madrugada tomei a decisão de agir (LOTT, 2002, p. 80).

A ação foi rápida e não enfrentou resistência: quartéis de todo o país se colocaram a

postos para conter qualquer ato de insurreição, ocupando gabinetes ministeriais,

correios e telégrafos. (BASBAUM; 1976). Obstinados a organizar uma resistência à

ação de Lott, Carlos Luz, Carlos Lacerda, o almirante Penna Botto e outros militares

e civis zarparam do Rio de Janeiro a bordo do cruzador Tamandaré com destino a

São Paulo, objetivando contar com o apoio do governador Jânio Quadros. A

embarcação já se encontrava preparada para um eventual combate, retornando com

os tiros de intimidação disparados pela costa. Diante do inevitável fracasso do golpe,

a embarcação retornou a Baía de Guanabara, e Luz renunciou a presidência,

enquanto Carlos Lacerda se exilou em Cuba (CARLONI; 2012).

Dias após a renúncia de Luz, subitamente o quadro de saúde de Café Filho

melhorou, e após receber alta, estava disposto a reassumir a presidência. O

pessedista foi procurado por diversos membros da UDN, esperançosos de que Café

seria solidário a impedir a posse de JK e João Goulart. Café era visto com

desconfiança por Lott e muitos políticos do Congresso, que votaram a favor da

decretação do estado de sítio, uma manobra jurídica para impedir sua posse. Nereu

Ramos, presidente do Senado Federal, assumir a presidência, mantendo a

estabilidade democrática até a posse de Juscelino Kubitschek, que ocorreu em 31

de janeiro de 1956 (WILLIAM; 2005).

2.3. A Espada de Ouro

O governo JK foi de considerável estabilidade, contando mais uma vez com o

marechal Lott no Ministério da Guerra, além do general Odílio Denys no comando do

I Exército. Ambos “eram os homens do 11 de novembro e tinham liderança sobre a

tropa” (BOJUNGA, 2010, p. 436). A política desenvolvimentista de Juscelino, voltada

a cumprir seu Plano de Metas, permitiu a entrada de capital estrangeiro, o que

acalmou os ânimos dos udenistas que temiam vínculos do político com o

comunismo.

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Após o 11 de novembro Lott passou a ser alvo de ataques da oposição, que o

acusava de golpista, mas também passou a ser homenageado por diversos setores

da sociedade civil e também das Forças Armadas. Em março de 1956 foi fundada

pelo coronel Nemo Canabarro Lucas a Frente de Novembro, antiga Frente

Nacionalista que foi suspensa após o 11 de novembro. Militares, líderes sindicais e

políticos integravam o movimento, que embora se declarasse nacionalista e

legalista, era apontado como comunista pela oposição. Segundo Sérgio Lamarão,

dentre os objetivos da Frente estava a promoção da

reforma agrária, o combate à especulação, a democratização do crédito, a

nacionalização das riquezas básicas do país e a reforma da Constituição. Essas

medidas viabilizariam a “autêntica democratização social, econômica e política” da

nação. No plano político, a frente tinha como objetivo imediato promover a candidatura

do general Henrique Lott, ministro da Guerra de Juscelino, às eleições presidenciais de

1960 (LAMARÃO; 2013).

No aniversário de um ano do 11 de Novembro a Frente reuniu em praça pública uma

multidão de 15 mil pessoas para premiar o marechal Lott com uma espada de ouro.

Um dos biógrafos de Lott, o jornalista Wagner William, descreveu a arma:

A polêmica peça havia sido feita na cidade Gaúcha de Caxias do Sul. Tinha o punho e a

bainha em ouro de 18 quilates; e a lâmina era de aço de Toledo, Espanha. No punho, a

inscrição: “Civis e militares oferecem ao general Lott”. Na lâmina, outra inscrição: “A

espada de novembro”. Custou 405 mil cruzeiros, dinheiro arrecadado através de

manifestações populares.” (WILLIAM, 2005, p. 196).

A espada ficou exposta em frente ao Ministério da Guerra, ao lado de um cartaz com

a seguinte inscrição: “A dívida de gratidão”. Segundo Jorge Ferreira, transportes

gratuitos foram disponibilizados para os trabalhadores em diversos pontos da

cidade, comparecendo cerca de 20 mil pessoas no evento. Sindicalistas, militares, e

políticos se sucederam nos discursos de homenagem ao marechal. (FERREIRA;

2005). O penúltimo pronunciamento ficou a cargo de João Goulart, que proferiu

palavras nacionalistas e de exaltação da soberania do povo. O evento se encerrou

com o discurso de Lott, que agradeceu a homenagem, relembrando também os

acontecimentos que antecederam o 11 de novembro.

A entrega da espada de ouro causou rebuliço tanto na sociedade civil quanto

nas Forças Armadas. Muitos militares conservadores, dentre eles o general Castelo

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Branco – rival histórico de Lott – não compareceram no evento. De acordo com

Karla Guilherme Carloni, na mesma data das comemorações do aniversário do 11 de

Novembro, o almirante Amorim do Vale, que esteve envolvido no golpe, foi

homenageado na Marinha, juntamente com outros militares conspiradores

(CARLONI; 2012). A homenagem a Lott também foi alvo de crítica do poeta udenista

Manuel Bandeira, que se dedica a criticar o episódio através de um poema intitulado

A Espada de Ouro:

A Espada de Ouro

Excelentíssimo General

Henrique Duffles Teixeira Lott,

A espada de ouro que, por escote,

Os seus cupinchas lhe vão brindar,

Não vale nada (não leve a mal

Que assim lhe fale) se comparada

Com a velha espada

De aço forjada,

Como as demais.

Espadas estas

Que a Pátria pobre, de mãos honestas,

Dá a seus soldados e generais.

Seu aço limpo vem das raízes

Batalhadoras da nossa história:

Aço que fala dos que, felizes,

Tombaram puros no chão da glória!

O ouro da outra é ouro tirado,

Ouro raspado

Pelas mãos sujas da pelegada

Do bolso gordo dos salafrários

Do bolso raso dos operários.

É ouro sinistro,

Ouro mareado:

Mancha o Ministro,

Mancha o Soldado. (MAGALHÃES JÚNIOR; 2013).

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A oposição só diminuiu o tom quando Lott fechou a Frente de Novembro,

ainda no mês da homenagem que recebeu. Segundo o militar, a permanência do

movimento “criava possibilidade de agitação nas Forças Armadas” (LOTT, 2002, p.

99), o que o desprestigiaria na luta contra os oposicionistas do regime.

Posteriormente, o Clube da Lanterna, organização oposicionista criada por Lacerda,

também encerrou suas atividades. Para José Murilo de Carvalho, o 11 de novembro

foi traumático: “dividiu o Exército internamente e o incompatibilizou com a Marinha e

a Aeronáutica” (CARVALHO, 2005, p. 115). A ação dos oposicionistas se manteve

em episódios isolados do governo JK, e durante boa parte do governo João Goulart,

quando finalmente conseguem assumir o poder, em março de 1964.

Apesar das repercussões negativas, para muitos setores da sociedade civil e

também das Forças Armadas, o episódio do 11 de Novembro tornou a figura do

marechal Lott como representante do nacionalismo e de respeito as instituições

democráticas. Criava-se assim, um imaginário político acerca do candidato,

associando-o a defesa da legalidade. De acordo com Jorge Ferreira, no 11 de

Novembro

As representações que descreviam Lott procuravam dar uma explicação racional para

um evento pouco compreensível e, por isso, temerário; restabelecer a ordem à uma

situação conturbada que, tudo indicava, poderia levar ao caos e à anarquia política;

impor disciplina a tendências desagregadoras da sociedade; explicar, por fim, como as

legiões do Bem derrotaram, no momento decisivo, as hostes do Mal (FERREIRA, 2005,

p. 260).

Esta representação acerca de Lott ganharia força entre os nacionalistas durante todo o mandato de Juscelino, fazendo com que ele fosse visto o candidato natural a sucedê-lo, sendo a aposta de diversos grupos em 1960. Neste processo, a construção da imagem do candidato se dá pelo cruzamento da representação que Lott – e estes grupos que o apoiam – se atribuem, e a credibilidade dada pelos demais agentes políticos conferem, aderindo ou recusando esta representação2.

2 Roger Chartier realiza a mesma análise ao conceber a sociedade de corte apresentada por Norbert Elias. Para mais, ler: CHARTIER, Roger. Formação social e “habitus”: uma leitura de Norbert Elias. In: _____. A história cultural: entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1990. p. 91-119. (Memória e sociedade)

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3. CAPÍTULO 2: A CANDIDATURA

A iniciativa de lançar o marechal Henrique Lott como candidato partiu da ala

moça do PSD, facção mais ligada à doutrina nacionalista. Na Novembrada de 1955,

o militar garantiu a posse de JK, candidato amplamente apoiado pela ala moça,

fazendo com que os políticos desta passassem a nutrir admiração por Lott. De

acordo com Jose Joffily, a ideia da candidatura foi acertada em sua casa, juntamente

com outros políticos da ala moça do PSD, dentre eles Renato Archer, Filadelfo

Garcia, Cid Carvalho e Hermógenes Príncipe. Para Joffily, a candidatura do

marechal Lott se justificava por dois motivos:

primeiro, os serviços prestados a democracia, garantindo a posse dos eleitos, garantindo

a liberdade do pleito; segundo, a continuidade do governo de Juscelino, uma vez que

Lott tinha também compromissos com o desenvolvimento (JOFFILY, 1982, p. 179).

Os pronunciamentos do marechal também se mostravam bem coerentes à ideologia

nacionalista da Ala Moça. O militar se posicionava a favor do monopólio de petróleo,

tido para ele como questão de interesse nacional, e grande defensor do ensino

público e gratuito.

Os pessedistas que compunham a Ala Moça se integravam a chamada Frente

Parlamentar Nacionalista (FPN), organização composta por membros de diversos

partidos políticos, principalmente pelo PTB. Afinada com a doutrina nacionalista, a

frente suprapartidária tinha como principal objetivo a emancipação nacional e a

promoção das reformas de base. Devido à participação de políticos petebistas

vinculados a movimentos sindicalistas e ligas camponesas, a FPN também defendeu

outras bandeiras, como o direito de greve e o de previdência social (DELGADO;

1989). Seu campo de ação se dava essencialmente no poder legislativo.

Lançada pela ala moça do PSD e com o apoio da FPN, a candidatura Lott

era espécie de contra-ataque dos nacionalistas. A política econômica de JK foi

marcada pela crescente penetração de capital estrangeiro que “criou déficits

permanentes nas trocas cambiais pela evasão contínua de dólares” (BASBAUM,

1976, p. 225). Para os membros da FPN, a presença dos chamados “trustes” na

economia brasileira ia contra os interesses da nação, sendo necessário controle da

remessa de lucros. No âmbito interno do PSD, a candidatura de Lott daria mais força

a ala moça no partido, marginalizada por JK a partir de 1958.

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Por muito tempo o marechal Lott se negou a aceitar sua candidatura,

principalmente pelo fato de não haver uma homologação dos grandes caciques dos

partidos que compunham a chapa de apoio. O militar somente se convenceu quando

a Ala Moça impôs sua candidatura como uma missão que cujo cumprimento era um

dever ao marechal. Em entrevista ao CPDOC, Cid Carvalho relembra o momento:

“Nós estamos aqui, jovens parlamentares de diversas facções. Estamos assustados com

os rumos do país, e achamos que, por um lado, o senhor tem direito à vida privada, mas

também tem deveres para com a vida pública; o senhor, no nosso modo de entender, é a

pessoa que pode unir diversas correntes e diversos partidos dentro de uma mesma

concepção. Nesse momento viemos aqui para saber em que medida o senhor é capaz

de aceitar o sacrifício de ser o símbolo de tudo isso”. Nessa reunião, o Lott aceitou a

candidatura (CARVALHO, 1977, p. 38).

Colocada nestes termos, a candidatura era um desafio imposto a Lott, não restando

outra opção senão aceitá-la. Havia, no entanto, outro motivador: a candidatura de

Jânio Quadros. O marechal o conhecia desde os tempos em que foi comandante da

Região de São Paulo. Segundo Lott, Jânio possuía ligações com comunistas,

contribuindo financeiramente para organizações fiéis a esta ideologia. Para o

marechal,

Quando se apresentou aquele cidadão como candidato por um partido que esposava

ideias diametralmente opostas às que ele até então pregara, isto queria dizer que ele iria

ser ferramenta desse partido. Eles iriam explorá-lo devido à sua demagogia, à sua

penetração na massa popular, à sua capacidade de arrastar o povo, mesmo tendo dados

do seu despreparo, dada a maneira pela qual ele tinha agido nas funções anteriores

(LOTT, 2002, p. 105).

Mais do que um desafio militar, Lott era responsável por tentar impedir que Jânio

vencesse, sendo também seu dever enquanto cidadão. O militar, já com seus 65

anos, aceita sua candidatura, colocando-se como o anti-Jânio ao traçar estratégias

eleitorais diametralmente opostos ao outro candidato. Apesar da avançada idade,

Lott não foge de sua missão, percorrendo todo o território nacional de avião, abrindo

mão de sua rígida rotina diária. Nas palavras de Milton Senna:

Trocou a farda militar pela roupa civil, a continência sisuda pelo sorriso franco do paisano

e, do convívio disciplinado com a tropa, passou ao contato ululante das massas,

arrastando multidões à praça pública para ouvir sua pregação de candidato. Nesta nova

condição, conversou e auscultou as aflições e necessidades do povo, representado,

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principalmente, pelas classes mais humildes, que o aplaudiam e o carregavam nos

braços, e lançou, em seus comícios, as bases de um programa governamental

verdadeiramente nacionalista. (SENNA, 1968, p. 18).

A candidatura era um novo momento para o militar, e acima de tudo, para os

nacionalistas. E embora não tenha logrado êxito, foi realizada em um dos momentos

mais democráticos do período republicano, sem a ocorrência de episódios que

questionassem a legitimidade do processo.

3.1. Propostas

Intitulado II Plano de Desenvolvimento Nacional, o plano de governo do

marechal Lott pretendia ser um continuador da política desenvolvimentista do

presidente Juscelino Kubitschek, pautado no crescimento da economia juntamente

com o aumento do consumo per capita. Desta forma, objetivava-se “alcançar uma

repartição da renda nacional, através da qual suprimem-se, de um lado, os extremos

anti-sociais de pobreza e, do outro lado, os abusos do poder econômico concentrado

em mão de minorias privilegiadas” (O CRUZEIRO, 1960a, p. 30).

Para a concretização dos objetivos do Plano de Lott, foram traçadas cinco

metas:

1) ampla Reforma Administrativa, visando reaparelhar e dotar de maior eficiência a

máquina governamental, no desempenho de suas tarefas específicas, especialmente

daquelas atinentes ao desenvolvimento econômico;

2) aprofundamento, em tempo útil, dos conhecimentos acerca da estrutura dos recursos

do País, especialmente dos seus recursos naturais, dentre os quais destacam-se o solo

cultivável, os minerais-chave e as fontes de energia;

3) aplicação sistemática dos métodos de programação econômica mais eficientes,

oferecidos pela ciência e pela técnica contemporâneas, especialmente pelas modernas

técnicas de gestão industrial;

4) tratamento preferencial dos problemas regionais e sua incorporação ao Plano

Nacional, mediante um mecanismo de colaboração da União com as esferas político-

administrativas inferiores, visando pôr fim à disparidade de desenvolvimento entre as

várias unidades da Federação;

5) elaboração das reformas institucionais, na Constituição, na legislação fiscal, na

legislação relacionadas com o uso dos recursos naturais do País, de sorte a assegurar o

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melhor uso desses recursos e a maior eficiência, equilíbrio e justiça social, no esforço do

desenvolvimento nacional (O CRUZEIRO, 1960a, p. 30).

Embora em sintonia com o desenvolvimentismo do governo de JK, expresso

pela preocupação com o progresso tecnológico, observa-se que o programa de Lott

busca ir mais além, objetivando a promoção da diminuição das desigualdades

sociais e regionais. Há também uma preocupação em se realizar uma reforma

administrativa, a fim de se evitar a excessiva burocratização dos serviços públicos.

Um dos pilares do II Plano de Desenvolvimento é a educação, de grande

relevância para Lott não somente pela necessidade de qualificação do trabalhador

para atender uma demanda do mercado, mas também para seu próprio

desenvolvimento enquanto indivíduo. Destarte, seria ofertado um ensino tanto

tecnológico quanto humanístico.

A escola pública era o principal alvo das metas para a educação, visando à

eliminação do analfabetismo do país. A preocupação do candidato era plausível,

visto que o analfabetismo era um dos grandes entraves para que considerável parte

da população fosse impedida de exercer sua cidadania. Visando resultados mais

imediatos para conter esta privação do exercício do político, Lott defendia a criação

de uma Campanha Nacional de Alfabetização, “com o objetivo de mobilizar todos os

brasileiros, que tiveram o privilégio de estudar, para a tarefa de recuperação cultural

e cívica dos jovens e adolescentes que não puderam frequentar escolas primárias

na idade apropriada” (O CRUZEIRO, 1960a, p. 30). Paralelamente, defendia a

concessão do voto aos analfabetos, o que lhe rendeu diversas críticas da oposição.

Em Espada X Vassoura: Marechal Lott, o escritor Viriato de Castro não poupa

críticas ao candidato, acusando Lott de tentar solucionar o problema do

analfabetismo com uma estratégia eleitoral:

E o marechal-candidato, o sr. Teixeira Lott? Que diz ele sobre o problema? Ah!

Não sabiam?! O sr. Lott é favorável a que o analfabeto também tenha direito de votar...

Pronto. Está resolvido o problema. Na certa o ministro-candidato vai proclamar

nos comícios de sua campanha eleitora:

- Eu resolvi o problema do analfabetismo no Brasil! Por mim, todo analfabeto

deve ter o direito de votar, em igualdade de condições!

E daí para frente, que mais se poderá acrescentar sobre essa tragédia simplista?

(CASTRO, 1959, p. 111).

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Lott, contudo, apresentava sólidas propostas para a educação, defendendo uma

reforma na legislação federal de ensino e uma reorganização do Ministério da

Educação e da Cultura para que fosse realizada uma descentralização

administrativa capaz de substituir a “interferência burocrática pela cooperação de

caráter técnico” (O CRUZEIRO, 1960a, p. 31). A proposta de Lott para a educação

apresentava um aspecto polêmico: a implantação do ensino básico gratuito e

obrigatório, com duração de seis anos. Com isso, almejava o corte de auxílio

governamental as escolas públicas, o que gerou grandes críticas a sua candidatura.

Este ponto, juntamente ao apoio comunista a candidatura, fez com que lideranças

da Igreja Católica se indispusessem com o marechal, já que muitas ordens religiosas

se dedicavam ao ensino básico (CARLONI; 2010).

Integrando o II Plano de Desenvolvimento Nacional do Marechal Lott estava o

Programa de Metas Sociais, visando complementar com infraestrutura as metas

educacionais e econômicas. De acordo com o marechal Lott, o programa de metas

econômico-sociais:

Conquanto por um lado visem a levar a um maior número e no menor tempo os frutos do

desenvolvimento nacional, reduzindo os desequilíbrios, até certo ponto inevitáveis, no

processo desenvolvimentista, por outro lado devem ser encaminhados de sorte a

complementarem as metas econômicas e lhes darem maior produtividade (ÚLTIMA

HORA, 1960a, p. 7).

O Plano previa atuação nos seguintes pontos: habitação, objetivando a construção

de 60 mil moradias; saneamento, aumentando em 40% a distribuição de água 30% o

sistema de esgoto; abastecimento, em que planeja a construção de centros de

abastecimento em cidades com mais de 10 mil habitantes; transporte urbano, em

que aumentariam em 40% as áreas de pavimentação e em 50% o número de

transporte coletivo; telefones, em que prevê a instalação de mais de 300 mil linhas

telefônicas; eletricidade, no qual preza pela renovação das redes elétricas; cidades

industriais, planejando a elaboração de novos planos diretores; povoamento, com a

delimitação de novos 3 mil lotes; desenvolvimento regional, obtido pela ação da

SUDENE; Previdência, Trabalho e Seguro Social; e Proteção à Família, na

maternidade, infância e adolescência.

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Inegavelmente, Lott apresentava propostas concretas, indicando preocupação

nos mais diversos campos de atuação, incluindo educação, cultura e economia.

Nesta visão nacionalista do candidato, alinhada aos intelectuais do ISEB, o Estado é

o condutor de todo o processo de transformação social, daí sua atuação em tantas

áreas distintas. Desta forma, buscava aliar a concepção getulista de nacionalismo,

em que o processo de desenvolvimento nacional era guiado pelo Estado, com

grande enfoque no caráter social, com o nacional-desenvolvimentismo de JK, dando

prosseguimento ao seu Plano de Metas.

3.2. A Performance Política

A postura do Marechal Teixeira Lott nos palanques é relatada de maneira diversa. Constantemente o candidato é retratado de maneira negativa, em que é ressaltada sua inabilidade perante o eleitorado. O historiador Francisco Iglesias caracteriza o militar como “um mau orador e com a mensagem antiga” (IGLESIAS, 1993, p. 277), enquanto Thomas Skidmore relata Lott como “um candidato fraco, sem experiência política e sem nenhum charme pessoal” (SKIDMORE, 2003, p. 234). Já o jornalista Carlos Lacerda, contemporâneo e adversário político de Lott, também questiona sua oratória, afirmando que cada “vez que o Lott falava, era um desastre” (LACERDA, 1978, p. 213).

A argumentação de que Lott seria um mau orador estava embasada em declarações infelizes dadas pelo candidato em determinados momentos de sua campanha. Um destes momentos se deu em Fortaleza onde o marechal sugeriu que a açudagem dos rios no nordeste poderia ser resolvida “com um plástico que cobrisse o açude para que a água não evaporasse” (TRIBUNA DA IMPRENSA, 1960ª, p. 3). De acordo com Wagner William, o militar

se referia na verdade à utilização de filmes monomoleculares de hexadacanol, um método que estava sendo testado na Austrália (e que cinquenta anos depois seria considerada tecnologia ambientalmente saudável para conservação de água doce pela ONU) (WILLIAM, 2005, p. 314).

Pronunciamentos como este, mesmo tendo certo embasamento, eram distorcidos e utilizados pela mídia da oposição, numa bem sucedida tentativa de diminuir Lott.

Contrariando os relatos pessimistas em relação à candidatura Lott, o jornalista Milton Senna, que acompanha o marechal em suas viagens pelo Brasil, apresenta diversos episódios das cidades em que o candidato passou, que demonstram uma relação do militar com o eleitorado. De acordo com Senna, Lott “disputou e conquistou popularidade e nunca encerrou um comício sem receber a prova de haver sido ouvido e compreendido pelo povo que o carregava nos braços, como que

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a desagravá-lo” (SENNA, 1968, p. 24). O major Joffre Gomes da Costa, ao tratar do momento em que Lott se desvincula do ministério da Guerra para se lançar a vida política, destaca a grande manifestação popular que o prestigia, sendo coberto de flores por senhoras e carregado pela multidão (COSTA; 1960).

Fica claro ao analisar os testemunhos dos partidários e opositores da candidatura Lott qual discurso foi comprado pela historiografia ao descrever o militar. A imagem negativa, que caracteriza Lott como o “anticandidato”, ingênuo e despreparado seria fruto de uma sólida campanha organizada pela oposição durante o período eleitoral, que surtiu efeito, e que foi mantida por historiadores como Skidmore e Iglésias. Nota-se que a derrota do militar não se deu por um despreparo político, embora, mas muito mais por uma carência de apoio político. Milton Senna relata que:

o Comitê Eleitoral de Lott abria suas portas, num dia, para receber o candidato e fechá-las, no dia seguinte, à falta de recursos e de assistência, enquanto luzes em profusão, alto-falantes em funcionamento, viaturas em permanente atividade, marcavam a aura iluminada do futuro eleito das urnas (SENNA, 1968, p. 26).

A maciça máquina de campanha de Jânio, que contava com diversos jornais de circulação nacional, tornava hercúlea a tarefa de combater as calúnias dirigidas ao marechal Lott.

A derrota de Lott não deve ser interpretada como despreparo do candidato, mas a prevalência de uma representação sobre outra. De acordo com Chartier, “as representações supõe-nas como estando sempre colocadas num campo de concorrências e de competições cujos desafios se enunciam em termos de poder e de dominação” (CHARTIER, 1990, p. 17). Assim sendo, a imposição de uma representação acerca do candidato, promovida principalmente pela grande imprensa atrelada aos interesses de Jânio Quadros, possibilitou não só a vitória deste, mas a perpetuação deste discurso pela historiografia, apontando Jânio como um “fenômeno”, enquanto Lott é apresentado como o candidato fraco e despreparado.

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4. CAPÍTULO 3: O QUADRO PARTIDÁRIO NO PERÍODO DEMOCRÁTICO

O retorno à ordem democrática iniciado no final do Estado Novo em 1945 permitiu a restauração do pluripartidarismo, tendo em vista que as organizações partidárias eram imprescindíveis à sua manutenção. Conforme observou Michels, “quer se trate, na realidade, de reivindicações econômicas ou políticas, a organização se revela como o único meio de criar uma vontade coletiva.” (MICHELS, 1982, p. 15).

Os partidos políticos de maior expressão que surgem no período se organizam a partir da figura de Getúlio Vargas, seja buscando representar o continuísmo, como é o caso do PSD e do PTB, seja se firmando como partido de oposição, como é o caso da UDN. Segundo Rodrigo Patto Sá Motta (1999), a permanência do getulismo pode ser explicada através da aproximação de Getúlio com as questões trabalhistas, garantindo como herança política de seu governo leis voltadas à normatização das atividades laborais com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Através disso,

De ditador semifascista, caçador de comunistas, Getúlio Vargas se transformou em líder popular, amigo dos trabalhadores e aliado da esquerda. Com a nova postura e imagem preparou-se para a fase democrática que então se iniciava, credenciando-se para tentar voltar ao poder com os votos dos trabalhadores (MOTTA, 1999, p. 87).

Comprometidos com o continuísmo do varguismo, o Partido Social Democrático (PSD) e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) mantiveram uma aliança durante todo o período democrático. Apesar disso, eram nitidamente opostos quanto sua composição: enquanto o PSD possuía bases rurais, reunindo “burocracias administrativas estaduais e locais sobre o controle de Vargas” (MOTTA,1971, p. 28), o PTB possuía vínculos com os movimentos trabalhistas, principalmente urbanos. A União Democrática Nacional (UDN), por sua vez, nasce da oposição a Vargas existente já no período do Estado Novo, mantendo-se contrária aos candidatos posteriores que representavam o getulismo. Apesar de ser tão conservadora quanto o PSD, a UDN possuía mais expressão no meio urbano, sendo composta principalmente por empresários e setores da classe média (MOTTA; 1999).

Havia ainda no quadro partidário outros partidos de menor expressão, como o Partido Social Progressista (PSP), de Ademar de Barros, que concentrava a maior parte de seu eleitorado em São Paulo. No mesmo estado também era consideravelmente expressivo o Partido Trabalhista Nacional (PTN), no qual era filiado Jânio Quadros. O Partido de Representação Popular (PRP), por sua vez, foi criado por Plínio Salgado e contava com indivíduos remanescentes do movimento integralista.

Alguns partidos do período democrático tinham uma expressão nacional pouco significativa. Em Belo Horizonte foi criado o Partido Republicano (PR), organizado sob a liderança de Arthur Bernardes, que atuava basicamente no estado de Minas Gerais, sendo uma espécie de ressurreição do antigo Partido Republicano

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Mineiro (PRM). Outro partido de pouca representatividade nacional era o Partido Libertador (PL), que concentrava suas ações no estado do Rio Grande do Sul (BASBAUM; 1976).

Na gama dos partidos políticos também existiam alguns de orientação socialista, mas que não viam constrangimento em formar alianças com a UDN, partido de origem liberal. Dentre estes, estão o Partido Socialista Brasileiro (PSB), e o Partido Democrata Cristão (PDC). Por fim, o movimento político mais comprometido com a agenda política de esquerda era o Partido Comunista Brasileiro (PCB). Após anos na ilegalidade, o PCB retornou em 1945, a partir de uma estratégia de Vargas de aproximação com as esquerdas. O partido obteve vitórias no senado e na Câmara, mas sua situação legal permaneceu somente até 1947, quando foi colocado na ilegalidade pelo governo Dutra (BASBAUM; 1976). Embora ilegal, o partido continuou a existir, produzindo manifestos ou declarações de apoio a candidatos, sempre sobre a orientação da figura de Luís Carlos Prestes, principal nome do partido.

4.1. O Desgaste da aliança PSD-PTB

A aliança partidária que lançou a candidatura do Marechal Lott não era inédita, tendo os partidos acordos políticos desde o início do período democrático. E mesmo sustentando bandeiras distintas, PSD e PTB não tinham seus interesses em conflito: enquanto o PSD mantinha maior expressão na zona rural, a atuação petebista era mais expressiva na área urbana. (MOTTA; 1971).

O apoio mútuo no âmbito federal era, em tese, favorável a ambos. De acordo com Paulo Roberto Motta, “O PSD aliou-se ao PTB na esperança de controlar o movimento trabalhista. No caso do PTB, a aliança oferecia uma proteção capaz de facilitar-lhe a ascensão, já que o PSD era o mais forte partido nacional.” (MOTTA, 1971, p. 47). Vale ressaltar que a coalizão nem sempre ocorria a níveis estadual e municipal, em que PSD e PTB em muitos casos se aliavam até mesmo com a UDN, rival de ambos os partidos a nível federal.

O PSD E PTB tinham como ponto em comum os vínculos com o getulismo, sendo muitos dos membros fundadores do PSD antigos interventores durante o Estado Novo, enquanto o PTB foi o partido escolhido pelo próprio Vargas para concorrer à eleição presidencial em 1950. Neste ano, observando a força da candidatura de Getúlio, o PSD deixou de apoiar o próprio candidato, Cristiano Machado, para aderir ao ex-presidente3 . A aliança PSD-PTB foi vitoriosa nesta ocasião, obtendo êxito em duas outras eleições presidenciais: a de Eurico Dutra em 1945 e a de Juscelino Kubitschek em 1955.

3O episódio deu origem ao termo “cristianização”, que passou a ser utilizado para todos os políticos cujas candidaturas são abandonadas pelos partidos que as lançaram, empregado, inclusive, na candidatura Lott.

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O suicídio de Vargas em agosto de 1954 fez surgir as primeiras fissuras na aliança entre PSD e PTB. O getulismo, ou seja, a influência política de Getúlio, também chamada de varguismo, era o elemento que unia os dois partidos, e com a morte do ex-presidente, os partidos iniciam um processo de dissociação. Conforme observou Lucília de Almeida Neves Delgado,

o Partido Trabalhista Brasileiro, que tinha sua imagem fortemente vinculada à do presidente, começou a ganhar maior autonomia em relação ao varguista. Além disso, passou a incorporar em seus quadros alguns políticos que mesmo sendo getulistas, tinham personalidades muito fortes e projetos de transformar o PTB em uma agremiação trabalhista ainda mais comprometida com a causa nacionalista e com a defesa de reformas sociais e econômicas profundas no país. (DELGADO, 2011, p. 143).

Porém o fim da chapa PSD-PTB custaria caro a ambos: enquanto os pessedistas perderiam o apoio da classe trabalhadora, os petebistas, apesar das novas bandeiras reformistas, não se sentiam seguros a arriscar um candidato próprio para a presidência em 1955. Assim sendo, os partidos mantiveram-se aliados em prol da candidatura de Juscelino Kubitschek para presidente, juntamente com João Goulart, como vice. A chapa foi vitoriosa, porém o resultado evidenciava o afastamento entre os partidos: Juscelino foi eleito com uma porcentagem de 35,68% dos votos válidos, vencendo com uma diferença de apenas 5,41% do segundo colocado, o udenista Juarez Távora.

Certamente o cenário onde se realizaram as eleições contribuiu para que JK fosse eleito com uma margem estreita de votos, porém, quando comparamos os números de JK e João Goulart, observa-se que o petebista, ainda que tenha sofrido tanto ou mais represálias durante sua candidatura, obteve maior respaldo diante do eleitorado brasileiro. Eleito com 44,25% dos votos válidos, Jango obteve mais votos do que seu companheiro de chapa, uma diferença de 513.998 de votos. Maria Victoria Benevides ressalta que a campanha foi realizada logo após um momento de crise política de 1954, além de enfrentar outras dificuldades, como a dissidência interna do próprio PSD, a oposição udenista e a tentativa de veto por parte de setores das Forças Armadas a candidatura de JK e João Goulart. (BENEVIDES; 1976).

Embora a manutenção da dobradinha PSD-PTB tenha sido vitoriosa, sua repetição, de acordo com a análise de Maria do Carmo Campello de Souza, foi a “deslegitimação do sistema partidário e do poder legislativo” (SOUZA, 1976, p. 147). Isso porque a união entre os partidos ia contra a tendência do eleitorado brasileiro, reforçando a ideia de que inevitavelmente o sistema partidário não representava o “país real” (SOUZA; 1976). O realinhamento entre partidos com agendas políticas tão distintas era feito somente para fins eleitorais, e as consequências de tal anomalia gerava atritos entre os dois grupos partidários, ou mesmo no âmbito interno de cada um deles. Desavenças essas que seriam constatadas nas eleições gerais de 1958 e na eleição presidencial de 1960.

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4.2. As Eleições de 1958: ensaio para 1960

As eleições gerais de 1958, voltadas para a escolha de governadores em alguns estados, além de senadores e deputados, evidenciaram as mudanças que ocorriam no quadro político-partidário brasileiro ao longo do período democrático.

O PTB se destacava como o partido com maior representatividade na Câmara, obtendo 66 cadeiras (20,2%), tendo um aumento de 3% em relação à eleição anterior (MOTTA; 1999). No mesmo ano, o partido ainda obteve vitórias em diversos governos estaduais: no Rio Grande do Sul venceu Leonel Brizola, no Amazonas Gilberto Mestrinho, no Piauí Francisco de Chagas Rodrigues, no estado do Ceará Francisco Chagas Rodrigues, e no Rio de Janeiro Roberto Silveira.

As conquistas eleitorais do PTB refletiam uma mudança do próprio partido. Após a morte de Vargas, o petebismo inicia um processo de reestruturação partidária, buscando se libertar de práticas fisiologistas para defender bandeiras trabalhistas mais autênticas. Segundo Angela de Castro Gomes,

a ideologia trabalhista continuou marcada pela defesa dos direitos do trabalhador, pelo sindicalismo, pelo nacionalismo e pela proposta de um Estado intervencionista e protetor, mas vinculou-se abertamente a outras questões, entre as quais a luta pelas reformas de base. (GOMES, 2007, p. 75).

Destarte, as ligações do PTB com o trabalhismo permitiram que o partido se expandisse graças as estruturas sindicais, fazendo destas seus verdadeiros currais eleitorais. Porém o crescimento do partido não se deve somente a organizações urbanas. A partir dos anos 50, o PTB passa a se expandir para o interior, região até então dominada pelos aliados pessedistas, que faziam política através de chefes locais, estes últimos com objetivo de obterem melhoramentos para suas localidades. Maria Victoria Benevides traçou a diferença estratégica entre os dois partidos:

O PSD tinha seus chefes políticos formais – os coronéis -, enquanto que o PTB aproveitava as lideranças mais pragmáticas, de acordo com as condições locais – o vendeiro, a parteira, o ferroviário, o mineiro, o padre, etc..., ou seja, uma liderança popular cristalizada. Ao PTB interessava a formação de “cabos eleitorais” possíveis; o PSD continuava a manter seus chefes políticos conservadores, os coronéis e muitas vezes o PTB engajava o próprio empregado do coronel... (BENEVIDES, 1976, p. 115).

Até o governo Kubitschek, a aliança PSD e PTB havia sido mantida, além dos laços de ambos os partidos com o getulismo, pelo fato de que atuavam em áreas distintas: enquanto o PSD dominava as eleições no interior, o PTB se firmava como um partido urbano. O avanço do PTB para a zona rural, e a defesa de temas como a reforma agrária e a regulamentação do direito de greve, fez com que os interesses do partido se choquem diretamente com os do conservador PSD, o que tornava a aliança quase insustentável. Vale ressaltar a modernização econômica promovida no período JK em muito aumentou a população urbana, local em que o PTB exercia maior influência sobre o eleitorado. Segundo Wanderley Guilherme dos Santos, o “processo de urbanização avançou velozmente, a taxa de industrialização acelerou-

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se no final da década de 50, e a força eleitoral do PTB aumentou significativamente.” (SANTOS, 1986, p. 84).

Nas eleições de 1958, embora o PSD tenha se mantido como a maior bancada na Câmara, registrou uma queda se comparada a eleição de 1954 (quando obteve 287 deputados), considerando o aumento de cadeiras entre os dois pleitos:

Comparando-se os deputados estaduais eleitos em 1954 e em 1958, constata-se que enquanto o total de cadeiras a ser preenchido aumenta em 3,0% (27 deputados), o PSD diminuiu sua participação percentual em 2,1%! (HIPPOLITO, 1985, p. 198).

Nos governos estaduais, o PSD também saiu prejudicado das eleições de 1958, perdendo o Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Piauí e Bahia. Segundo o pessedista Amaral Peixoto, “não há dúvida de que, a longo prazo, as eleições de 58 foram desastrosas para o PSD” (PEIXOTO, abud CAMARGO, 1986, p. 424). Após o fracasso das eleições gerais, o PSD conservava para si sete governos estaduais: Minas Gerais, Paraná, Pará, Paraíba, Mato Grosso, Goiás e Espírito Santo. No entanto, de todos estes, somente Minas Gerais, que a esta altura apresentava tendências udenistas, poderia garantir a eleição de um presidente do PSD em 1960.

A liberal UDN, exausta das sucessivas tentativas fracassadas de se alcançar o poder, faz uma reformulação interna, tanto estratégica quanto programática. A partir do final do governo Kubitschek, o partido abandona sua roupagem golpista, passando a fazer oposição ao governo somente por vias legais. Embora no Congresso mantivesse sua tradicional postura de denunciar escândalos de golpes e corrupção do governo através da “Banda de Música”, a UDN passa a defender em seu programa novos elementos, buscando conciliar o caráter liberal do partido com itens da pauta nacionalista. Segundo Otávio Soares Dulci, dentre seus alvitres, a UDN

Propunha a adoção de uma escala móvel de salários, o aperfeiçoamento da Petrobrás, a participação dos trabalhadores nos lucros, a introdução do Parlamentarismo, reiterava a ideia de autonomia sindical e sustentava como desejável a desproletarização, dentro de um contexto de democratização da propriedade (DULCI, 1986, p. 151).

Conduzido por Juracy Magalhães, as novas técnicas eleitorais da UDN incluíam se utilizar de estratégias “populistas”, buscando adquirir maior popularidade junto às massas. O próprio Magalhães cunha o principal slogan do partido neste novo momento: “A UDN não é populista, mas faz questão de ser popular” (BENEVIDES, 1981, p. 105).

Uma das estratégias iniciadas pelo partido foi a Caravana da Liberdade, iniciada para burlar a censura dos pronunciamentos de Carlos Lacerda nos meios de impressa. Criada pelo próprio Lacerda e por Juracy Magalhães, membros da UDN percorreram diversos estados do Brasil entre junho e setembro de 1957, onde realizavam comícios objetivando estender seus domínios sobre o eleitorado (D’ASSUMPÇÃO; 2007).

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A Caravana surtiu efeito nas eleições de 1958, juntamente com outra estratégia: uma “nova política de acordos e coligações estaduais” (BENEVIDES, 1981, p. 105), mais flexíveis a realidade de cada localidade. Desta forma, em 1958, A UDN elege três governadores: Cid Sampaio em Pernambuco, Juracy Magalhães na Bahia e Luiz Garcia em Sergipe. Além disso, apoiou a eleição de outros três governadores. No Senado, obteve sua vitória mais expressiva: 7 cadeiras. No, senado, entretanto, registra queda na representatividade: das 74 cadeiras que ocupava, conquista 70 em 1958 (DULCI; 1986).

Conforme se observa a partir do resultado do pleito de 1958, o PTB se consolida enquanto partido mais influente no cenário político, em detrimento do PSD, que cada vez mais se aproxima da UDN. Vale ressaltar, contudo, que no mesmo ano se observa uma adesão por parte do eleitorado ao oposicionismo da UDN, iniciando uma tradição de vitórias em eleições majoritárias que serviram de subsídio para a vitória de Jânio Quadros em 1960 (BENEVIDES: 1981).

4.3. JK: um olho em 1960, outro em 1965

A preocupação de Juscelino em retornar a presidência da República em 1965 se iniciou muito antes do fim de seu mandato. Conforme destaca seu biógrafo, Claudio Bojunga, a partir de 1958 o pessedista começa a se afastar da ala moça de seu partido, se aproximando dos caciques para “consolidar seu prestígio junto à máquina tradicional do partido” (BOJUNGA, 2010, p. 706). Para agradar os líderes do PSD, inicia uma reforma ministerial, nomeando novos membros para as pastas da Justiça e Relações Exteriores. JK também providenciou a troca de José Maria Alkmin por Lucas Lopes na pasta do Ministério da Fazenda, ação que continha a árdua campanha contra o político liderada pelo Correio da Manhã, ao passo que também minava o nome de Alkmin para o pleito em 1960 (HIPPOLITO; 1985), já que este gozava de grande influência na ala moça do partido. Para reter com sucesso o crescimento de Alkmin no partido, JK negou o candidato indicado por ele para a sucessão de Bias Fortes no governo de Minas Gerais, apoiando a candidatura de Tancredo Neves. E a derrota de Tancredo para Magalhães Pinto no estado não frustraria seus planos: “ela dividiria a UDN, em 1965, entre Lacerda e Magalhães” (BOJUNGA, 2010, p. 715), o que o beneficiaria imensamente. Ainda em Minas Gerais, o Partido Republicano, um dos mais expressivos no estado, viveu um impasse: embora certos políticos simpatizassem com a candidatura do Marechal Lott, no âmbito estadual o PR se compromete em apoiar a candidatura do udenista Magalhães Pinto, o que geraria uma contradição. Por fim, os republicanos, sob a liderança de Arthur Bernardes Filho, concedem apoio a candidatura de Jânio Quadros.

As ações de Juscelino não se restringiram a Alkmin: Ernani do Amaral Peixoto, então presidente do PSD, era tido por muitos como candidato natural para a sucessão de JK. Segundo Amaral Peixoto, em uma convenção nacional do partido,

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“Dos 26 que estavam presentes, 23 se pronunciaram a meu favor.” (PEIXOTO, 1986, p. 428). Porém sua permanência como embaixador em Washington a mando de Juscelino enfraqueceu sua possível candidatura, além de desestruturar o partido para que se organizasse em torno de qualquer outro nome, por carecer de seu presidente.

Para Juscelino Kubitschek, se o vencedor da eleição presidencial de 1960 fosse um candidato do PSD, sua chance de retornar como chefe do Executivo em 1965 seria menor. Segundo Ronaldo Costa Couto,

No final do governo, a inflação prejudica muito a imagem de Kubitschek. É e que ela penaliza muito e mais rapidamente os assalariados, principalmente os de menor nível de renda. Entra no cotidiano de milhões de pessoas, que perdem renda real, poder de compra. (COUTO, 2001, p. 243).

Assim sendo, aquele que assumisse a presidência após JK enfrentaria um período de recessão econômica, motivada pelo endividamento do governo anterior na efetivação do Plano de Metas. Juscelino possuía plena consciência disso, tanto que não pensou duas vezes antes de romper com o FMI para dar continuidade à construção de Brasília, afinal as consequências disso não recairiam sobre ele. Dessa forma, era mais favorável para o presidente que um candidato de oposição vencesse, para que o nome do PSD não se prejudicasse e ele pudesse retornar em 1965, quando poderia dar continuidade ao seu programa. Juscelino então passa a defender um “candidato da conciliação”, ou seja, que agradasse tanto situacionistas quanto a oposição, com o pretexto de estabilizar o quadro partidário e salvaguardar a ordem democrática. E para o pessedista, o nome ideal era o de Juracy Magalhães.

Para colocar em prática seu plano, Juscelino criou, como relembra o político Renato Archer em entrevista ao CPDOC, o Grupo de Ação Política, composto por políticos membros do governo e da cúpula direta de JK.4 O pretexto utilizado para a criação da equipe foi averiguar os problemas das seções estaduais do partido que poderiam ter contribuído para o fraco resultado das eleições gerais, buscando fortalecer estas instâncias. Juscelino, contudo, tinha outras pretensões, confidenciando a Archer e a Eurico Sales que seu sucessor enfrentaria um período de instabilidade econômica, e nesse caso seria melhor que o novo presidente não fosse do PSD. Segundo Archer, “Nunca na história do pobre PSD alguém tinha mencionado a hipótese de apresentar um candidato para não ganhar.” (ARCHER, 1979, p. 252).

Em sua autobiografia, Armando Falcão, ministro da Justiça do governo JK, relembra que o presidente delega a ele a tarefa de convencer Lott a abandonar sua

4Segundo Archer, além dele próprio, compunham o GAP “os líderes do Senado e da Câmara – Filinto Muller e Armando Falcão -; o chefe da Casa Civil – Vítor Nunes Leal -; os assessores diretos – Oswaldo Penido, Sette Câmara, Geraldo Carneiro _; Eurico Sales” (ARCHER, 2002, p. 251).

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candidatura em favor de Juracy Magalhães. Falcão descreve seu diálogo com o marechal:

“O senhor admitiria abrir mão da sua candidatura em favor de um político militante?”

“Quem, por exemplo? Você sabe que eu nunca pleiteei a candidatura, nem jamais aspirei à presidência. Admitindo que eu não quisesse mais continuar nessa desagradável maratona, quem poderia fica em meu lugar?” – falou Lott.

“Marechal, sei que o senhor foi candidato quase à força. Sua desambição é patente. Se o senhor saísse do páreo, que tal o nome do Juracy Magalhães?”

“Bem, essa seria uma solução aceitável. Se o meu nome puder ser substituído pelo do Juracy, eu até ficaria feliz em sair do barco, dentro do qual não me sinto à vontade. Eu não nasci para ser político, nasci para ser soldado.” (FALCÃO, 1989, p. 190).

Figura de destaque do movimento tenentista e na Revolução de 1930, Juracy Magalhães gozava de grande prestígio no meio político. Não era a primeira vez em que se envolveria em acordos entre a UDN e o PSD: em 1950, o udenista tentou um acordo com seu partido rival, prevendo o fracasso da candidatura de Eduardo Gomes. Tendo o aval de Lott, Juscelino estava livre para negociar com o udenista. Em suas memórias, Magalhães relembra da ocasião em que foi sondado por JK:

Juscelino dissera que desejava ver-me como seu sucessor. Gostaria de deixar o governo escrevendo uma bela página democrática, dando um tom elevado à política nacional. O PTB já fizera de Getúlio seu presidente, o PSD estava no poder, e era justo que a UDN tivesse sua vez. O candidato natural seria eu mesmo, e ele, Juscelino, estava disposto a apoiar-me numa eleição sem problemas. Era uma jogada política perfeita. Tinha muito de cavalheirismo, mas certamente uma grande dose de interesse pessoal. Juscelino achava que, se fosse sucedido por um líder da UDN, certamente voltaria ao poder na eleição seguinte, em 1965, para continuar seu ambicioso plano de metas. (MAGALHÃES, 1996, p. 296).

Apesar de JK se prontificar a negociar com Magalhães Pinto para que assumisse o lugar de Juracy na presidência da UDN para que este pudesse concorrer ao pleito presidencial, Juracy Magalhães declina do convite. A esta altura o nome de Jânio Quadros já havia sido lançado como candidato pelo Movimento Popular Jânio Quadros (MPJQ), o que inviabilizaria qualquer tentativa de se lançar um candidato da conciliação. A iniciativa seria jogada por terra por Carlos Lacerda, líder da UDN e amplo defensor da candidatura Jânio Quadros. Para O Cruzeiro, Lacerda interpretava o fato como uma tentativa de sobrevivência da situação: “A candidatura udenista do Sr. Juraci, somente viável em função de um acordo com o PSD e o PTB, seria, contraditoriamente, instrumento de sobrevivência dos velhos dominadores da vida pública nacional” (O CRUZEIRO, 1960b, p. 74).

A esta altura do governo JK, como se pode observar, o perfil do PSD passava por mudanças. Sobre a batuta de Juscelino, o partido firmava cada vez mais seu caráter conservador, flertando, inclusive, com a UDN. Marginalizada, a ala moça aposta na candidatura de Lott como um meio para concretizar o projeto nacionalista para o país. E após JK minar todos os possíveis nomes para o PSD, Lott segue

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como candidato do partido, sem qualquer empolgação dos caciques pesedistas. Lucia Hippolito expõe porque não houve muitos protestos contra a candidatura: “Quem se atreve a hostilizar abertamente a candidatura do ministro da Guerra, a quem o PSD deve, em última instância, a própria posse de Juscelino?” (HIPPOLITO, 1985, p. 205).

4.4. A candidatura sem apoio

Homologada em dezembro de 1959 pelo PSD, a candidatura Lott foi marcada por diversos contratempos, além da ausência de apoio político efetivo. Os caciques do partido pouco ou nada fizeram para alavancar a campanha presidencial, que já se iniciava atrasada em relação à oposição pela relutância de Lott em aceitar sua candidatura. O próprio JK, que após boicotar todos os possíveis candidatos do partido, se mantém inerte nesta questão. Durante toda a campanha de Lott, Juscelino demonstrou um claro afastamento de seu candidato da sucessão. Em uma matéria intitulada “JK: ‘Meu Voto é de Lott e Jango’”, o então presidente afirmou:

Em face da eleição que aí está, quero mais uma vez dizer que, homem de partido e fiel aos meus amigos, tenho os meus candidatos, Marechal Henrique Lott e o Sr João Goulart. Acima de tudo, porém, está o meu dever de Chefe da Nação, e este dever me obrigaria, se a hipótese se apresentasse – o que felizmente não ocorre de maneira alguma – a bater-me, até o extremo sacrifício, pela posse daquele cuja eleição fosse reconhecida e proclamada pela justiça competente (ÚLTIMA HORA, 1960b, p. 6).

Nesta declaração fica clara a ausência do presidente na candidatura Lott: ao mesmo tempo em que apoiava ao marechal, mostra-se disposto a defender o que fosse decidido nas urnas para a preservação da democracia. A neutralidade de JK em relação ao pleito de 1960, aparentemente louvável, mascarava interesses pessoais. Diante da inevitabilidade de minar a candidatura Lott da mesma forma que fez com as demais, Juscelino acaba por aceitá-la. Afinal, uma campanha enfraquecida tanto financeiramente quanto politicamente tornava a vitória da oposição eminente, o que aumentaria as chances de retorno de JK em 1965.

O PTB mostrou-se disposto a lançar um candidato próprio a presidência, sustentando por muito tempo a ideia da candidatura de João Goulart. Contudo, ostentava insegurança em romper a aliança com o PSD. De acordo com Hippolito,

De um lado, os petebistas têm consciência de que ainda não são suficientemente fortes para dispensar o concurso do PSD numa eleição presidencial. De outro, não se contentam mais em ser os “primos pobres” da aliança. (HIPPOLITO, 1985, p. 206).

Isto posto, endossam a chapa Lott-Jango na convenção nacional do partido em 17 de fevereiro de 1960. Porém, não o faz sem barganhar seu apoio, obtendo igualdade na divisão dos ministérios e demais centros administrativos, além de exigirem a elaboração de um programa comum que também atendesse seus interesses (HIPPOLITO; 1985).

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Se inicialmente os trabalhistas são relutantes em apoiar Lott, revelaram-se posteriormente seus mais fervorosos defensores. A “petebização” da campanha Lott, se explica pelo posicionamento ideológico do candidato, alinhado as bandeiras nacionalistas e reformistas do partido. Ao mesmo tempo, era uma forma de “evitar o fortalecimento de uma candidatura pessedista” (PEIXOTO; apud CAMARGO, 1986, p. 432) que pudesse debilitar a atuação do PTB. O governador Leonel Brizola, uma das principais figuras do partido, se destacava como ávido partidário de Lott, mas acima de tudo, da candidatura de Goulart. Brizola não deixou de criticar a excessiva neutralidade de Juscelino, chegando a responsabilizá-lo pelo desfecho da disputa eleitoral de 1960 (KUBITSCHEK; 1978), como conta o próprio Juscelino em suas memórias.

O apoio do PTB não era em vão: durante toda a sua vida, Lott foi apartidário, mantendo-se neutro a disputas políticas. Embora filiado ao PSD, Lott evitou ao máximo se envolver nos conchavos políticos em torno de seu nome. Apoiando Lott, o PTB poderia moldar o candidato de acordo com seus interesses, ao mesmo tempo em que obstruía o lançamento de um candidato verdadeiramente pessedista.

A “petebização” da candidatura Lott gerou um efeito negativo junto aos caciques do PSD, que, conforme relata Amaral Peixoto, “queriam um candidato pessedista a vice-presidência” (PEIXOTO; CAMARGO, 1986, p. 433). Diante deste impasse, muitos deles dedicaram pouco apoio à candidatura do militar em seus diretórios. Na prática, isso significou uma campanha de escassos recursos, diminuindo ainda mais as chances de Lott. Em suas memórias, Nelson Werneck Sodré, um dos militares que se dedicou a campanha do marechal, relembra que

Enquanto, de nosso lado, as dificuldades materiais eram insuperáveis, do outro a campanha se marcava por cópia extraordinária de recursos, em opulência mais do que suspeita: a reação jogava em Jânio e jogava forte. (SODRÉ, 1988, p. 221).

Em muitos casos, os caciques não só prestavam pouco apoio, como também aderiam ao janismo. No estado do Amazonas, por exemplo, pessedistas se comprometeram a sufragar Jânio (O CRUZEIRO, 1960c, p.103). Segundo Wanderley Guilherme dos Santos, Jânio Quadros “conseguiu atrelar ao seu reboque considerável parcela do pessedismo rural, culminando ainda com a bem-sucedida incursão pelo eleitorado popular petebista” (SANTOS, 1978, p. 21).

O caso de Minas Gerais, em que a vitória era dada como garantida para os apoiadores da candidatura Lott, merece destaque. O ano de 1960 não era somente de eleição presidencial, mas sim de governadores de alguns estados, inclusive Minas Gerais. Neste, a candidatura de Tancredo Neves era defendida pela maioria dos pessedistas do estado. Contudo, o nome de Tancredo foi ofuscado pelo lançamento da candidatura de Ribeiro Pena, político de pouco destaque no estado, mas que contava com o apoio de José Maria Alkmin e Paulo Pinheiro Chagas, renomados políticos de Minas Gerais. Diante do impasse, Juscelino Kubitschek, que era presidente do diretório municipal do PSD de Belo Horizonte, sugeriu que as duas

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candidaturas fossem lançadas. Conforme observou Plínio de Abreu Ramos, “Juscelino quis mostrar-se isento, mas revelou-se intensamente omisso, favorecendo ativamente o campo adversário” (RAMOS, 1993, p. 189). Da mesma forma que enfraqueceu a candidatura Lott, JK desestimulou organização de um candidato do PSD a nível estadual, agindo da forma que melhor lhe convinha para que pudesse retornar em 1965. Para completar, as duas candidaturas situacionistas tiveram como vices políticos outros partidos: Clóvis Salgado, do PR, partido que havia demonstrado clara orientação janista, e San Tiago Dantas, do PTB, que se mostrou favorável a apoiar Jânio e Jango. Desta forma, os candidatos trabalharam somente em suas próprias candidaturas, não oferecendo nenhum apoio a Lott.

Assim sendo, nem Tancredo Neves nem o Marechal foram vitoriosos no estado: o candidato a governador teve uma diferença de 79868 votos em relação ao vitorioso, o udenista Magalhães Pinto, enquanto Jânio obteve uma vantagem de 12087 votos em relação ao Marechal Lott.5

No Rio Grande do Sul, onde se esperava que o marechal Lott fosse exitoso, também foi cenário de sua derrota. Porém, diferentemente do estado de Minas Gerais, em que seu vice João Goulart também foi derrotado, o trabalhista obteve êxito em seu estado natal. Esta aparente ambiguidade é explicada se analisado o modo com que fora conduzida a chapa Lott-Jango, em que os candidatos seguiram em candidaturas autônomas pelo país, havendo poucas ocasiões em que os correligionários apareciam juntos. Além disso, se inicialmente o PTB buscou apoiar a candidatura Lott, durante a campanha eleitoral deu pouco apoio e credibilidade ao seu nome, o que em muito contribuiu para o fracasso de Lott não só no Rio Grande do Sul, que se encontrava sobre o domínio do PTB, mas em diversos pontos do país. O próprio Leonel Brizola, um dos primeiros petebistas a apoiar Lott, tramou junto a diversas organizações sindicais greves para reivindicar a desistência da candidatura Lott (DELGADO; 1989), dedicando-se somente a candidatura de Jango. O PTB, contudo, não se encontrava totalmente centrado na figura de João Goulart. Segundo Wagner William,

Uma nova corrente, nascida em seu estado, batizada de “Cruzada Cívica das Mãos Limpas”, atacava os fisiologistas e conseguia lançar o deputado Fernando Ferrari como candidato à vice-presidência pela chapa de Jânio. Existia também o “grupo compacto”, que defendia as reformas, era contra o apoio a Lott e não acatava o comando de Jango. E havia até quem simplesmente defendesse a candidatura do marechal, movido por ideais, como os deputados petebistas da FPN. (WILLIAM, 2005, p. 283).

Outro grupo que ficou dividido na candidatura do Marechal Lott foi a Frente Parlamentar Nacionalista, em que seus membros optaram por seguir a orientação de 5Os números de votos obtidos pelos candidatos a presidência e a vice-presidência da República, bem como os dos candidatos a governador e vice-governador em Minas Gerais utilizados nesta pesquisa estão disponíveis na obra de Plínio de Abreu Ramos. Para mais, ler: RAMOS, Plínio de Abreu. O PSD mineiro. Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1993.

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seus partidos. Mesmo a candidatura a vice-presidência promoveu divergências: muitos parlamentares optaram por apoiar João Goulart, mas alguns apoiaram Ferrari. Segundo, Lucília de Almeida Neves Delgado, “o próprio caráter suprapartidário da Frente provocava dissidências internas à organização, devido às influências discordantes de origem dos frentistas” (DELGADO, 1994, p. 66).

4.5. Jânio e a Jan-Jan

Diferentemente dos dias atuais em que são votadas chapas compostas por candidatos a presidência e a vice-presidência da República, uma brecha legal permitia que um candidato de uma coligação e o vice de outra fossem eleitos simultaneamente. Jânio Quadros soube se utilizar disso muito bem: embora oficialmente tivesse como candidato a vice-presidência o udenista Milton Campos, na prática também integrou chapas informais com os petebistas Fernando Ferrari e João Goulart.

A dobradinha “Jan-Jan”, como ficou conhecida a chapa alternativa que apoiava Jânio Quadros e João Goulart, foi idealizada por Dante Pelacani, presidente da Federação Nacional dos Gráficos e importante figura do PCB. A alternativa contou com amplo apoio dos comitês do Movimento Popular Jânio Quadros (MPJQ), prevalecendo os nomes de Jânio e Jango em São Paulo, em que o PTB possuía grande força junto aos sindicatos, e o Paraná, em que Jânio já havia obtido vitórias anteriores.

Embora não tenha apoiado publicamente a dobradinha, o PTB foi extremamente beneficiado pela Jan-Jan. Segundo D’Araújo,

Esta chapa alternativa reflete a estratégia eleitoral adotada. O importante era fazer de Goulart o vice-presidente, e diante do mau desempenho de Lott os petebistas focaram liberados para outras composições: Jânio-Goulart ou Ademar-Goulart. O que interessava era o apoio ao presidente do partido, e nesse caso a “traição” a Lott era bem-vinda. (D’ARAÚJO, 1996, p. 133).

O marechal Lott tentou recorrer ao ministro da Justiça Armando Falcão para que se diante do problema da Jan-Jan, porém, visto que não era algo reconhecido pelo PTB, nada foi apurado. Emílio Carlos, presidente do PTN, partido de Jânio Quadros, apressou-se em se responsabilizar pela existência da Jan-Jan, em uma clara de tentativa de livrar Jânio e Jango de qualquer ligação ao movimento.

Diante da possibilidade de se obter um grande coeficiente eleitoral, Jango não se pronunciou sobre o assunto. Segundo Jorge Ferreira “Todos sabiam que Goulart teria muito mais votos que o marechal e que só os sufrágios ‘Jan-Jan’ somariam, no mínimo, 500 mil (...). O vice-presidente não poderia recusar o potencial eleitoral dos Comitês ‘Jan-Jan’”. (FERREIRA, 2011. p. 212).

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Lott não foi o único prejudicado: a existência da Jan-Jan fazia com que a candidatura de Milton Campos, o verdadeiro vice de Jânio Quadros, permanecesse “mais como uma contribuição ao movimento janista do que como uma reivindicação de êxito partidário” (O CRUZEIRO, 1960d, p. 118). A vitória de Quadros não significou necessariamente uma vitória da UDN, já que o candidato buscou desde a sua campanha realizar uma política independente. Conforme observou Paula Beiguelman, “Jânio Quadros manipula símbolos de natureza diversa, através dos quais: sensibiliza a opinião comum com o tema da austeridade; atinge os setores econômicos mais identificados com o campo oposicionista; desperta a potencialidade revolucionária difusa na massa popular.” (BEIGUELMAN, 1988, p. 326). Além dos votos arrecadados pela chapa com Milton Campos e os estimulados pela Jan-Jan, Quadros ainda obtém apoio da dissidência petebista, o Movimento Trabalhista Renovador (MTR), composto pelos trabalhistas insatisfeitos com os rumos do partido. Fernando Ferrari, líder do movimento e figura histórica do PTB gaúcho, rompe com o partido e lança sua candidatura à vice-presidência de Jânio, sendo mais uma possibilidade do paulista de arrecadação de votos.

O não constrangimento de Jânio em realizar as mais incoerentes alianças políticas garantiu sua vitória. Dizia-se adepto a toda e qualquer ideologia ou projeto político que lhe fosse apresentado, chegando a se colocar como defensor das teses nacionalistas que Lott apoiava. O marechal Lott, por outro lado, mostrava-se irredutível a alianças, não prometendo benesses em troca de apoio político. Em correspondência destinada a Etelvino Lins, o deputado José Abílio Ávila alerta sobre a força da UDN em conseguir a vitória nos estados, destacando a necessidade de se fazer acordos assim como Jânio: “O General Lott, deixe para organisar [sic] uma Democracia limpa, quando assumir a Presidência da República. A presente é de lama e muito mais enlameada ficará se o General Lott for derrotado” (CPDOC�FGV, 1959, p. 1). A rigidez do militar, desconsiderada pelos seus partidários quando o lançaram candidato, foi o pretexto utilizado por eles no abandono de sua candidatura. Ainda no mesmo documento, Ávila encerra seu post-scriptum com a seguinte frase: O Marechal e o Presidente, abram as portas para os correligionários se desejam vencer. O Jânio é peso pesado e veremos” (CPDOC�FGV, 1959, p. 2). Posteriormente, tanto Ávila quanto Etelvino, embora pessedistas, apoiariam a candidatura de Jânio Quadros.

Na verdade, fica claro que a derrota de Lott era reflexo de algo maior, consequência da crise da histórica aliança entre PSD e PTB, sendo esta gerada por um processo de reformulação partidária dos trabalhistas, que entra em choque com os interesses das raposas pessedistas, cada vez mais próximas da UDN. Considerando a concepção de campo político delimitada por Bourdieu como um campo de forças e lutas, em que “a lógica da oferta e da procura é a desigual distribuição dos instrumentos de produção de uma representação do mundo social” (BOURDIEU, 2010, p. 164), a derrota de Lott pode ser mais bem compreendida: ao ter apoio negado por JK, um dos principais nomes do partido, e pelos caciques do

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partido, que voltam-se para as disputas estaduais, a representação do mundo social construída pelo candidato, que inclui programas, discursos e conceitos não encontram tanto espaço no campo político, dada a sua incapacidade de difusão. Desta forma, os cidadãos comuns, ou “consumidores” deste mercado político (BOURDIEU; 2010), aderem em sua grande maioria ao janismo, que amparado por mais recursos financeiros e pela grande mídia nacional, possui maior poder de imposição.

4.6. O apoio indesejado

Um dos principais problemas enfrentados pelo marechal Lott ao longo de sua candidatura foi o apoio dos comunistas. Embora extinto desde 1947, o PCB continuava a se reunir na ilegalidade, realizando pronunciamentos em prol de certos candidatos em momentos de eleição. Neste período o PCB se aproximou cada vez mais do PTB, apoiando sempre sua aliança com o PSD. Segundo Dulce Pandolfi, após a ilegalidade do partido alguns comunistas se filiaram ao PTB, conseguindo se cadeiras no Legislativo (PANDOLFI; 1995). Durante a década de 50 o PTB aumenta sua influência no cenário político nacional, contando com a estrutura sindical que se reforçava. Os comunistas participavam deste processo, estando na liderança de muitos movimentos trabalhistas. Desta forma, nas eleições de 1960, o partido se posicionou oficialmente como apoiador da chapa PSD-PTB.

Os comunistas, que há alguns anos vinham se dedicando à causa nacionalista, viram em Lott um candidato dedicado a diversas bandeiras por eles defendidas. O militar já era benquisto pela esquerda desde 1955, episódio em que ficou marcado pela sua “luta contra os golpistas a serviço dos monopólios ianques, preferindo ficar ao lado do povo e respeitar suas conquistas democráticas

asseguradas na Constituição” (CPDOC�FGV; 1960a). Edgard Carone destaca os aspectos da plataforma do candidato que atraíam os comunistas:

Como expressão do sentimento nacionalista do Exército, o Marechal Teixeira Lott é um partidário intransigente do monopólio estatal do petróleo. Propugna o voto para os analfabetos, declara-se favorável a medidas de reforma agrária e não permitiu que o Exército fosse lançado contra os posseiros que, de armas na mão, lutaram pela terra no oeste do Paraná. Pronuncia-se pela limitação das remessas de capital estrangeiro e tem-se oposto aos aspectos mais negativos da reforma cambial. (CARONE, 1982, p. 206).

Diante das similaridades dos pontos defendidos na campanha Lott com a pauta dos comunistas, a cúpula PCB passa a emitir constantes pronunciamentos em prol de sua candidatura. De acordo com Wagner William, enquanto os comunistas do “baixo clero” optaram por Lott, a “esquerda chique” se solidariza ao janismo, porém o “bloco esquerdista não iria para a rua com a intensidade tradicional” (WILLIAM, 2005, p. 297).

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Embora tomado como candidato pelas esquerdas, o marechal Lott era um militar conservador. Ao longo de sua candidatura nunca se mostrou favorável ao apoio recebido pelo PCB. Para o militar, que se definia como católico apostólico romano, o comunismo era anticristão:

Ora, uma das ideias básicas do cristianismo é que nós todos somos irmãos e devemos, primeiro, amar a Deus acima de todas as coisas e depois amar ao próximo como a nós mesmos. Então, somos todos iguais e se somos todos iguais não pode haver ditadura nem do proletariado nem dos militares nem de quem quer que seja. Por isso, o comunismo é coisa errada (LOTT, 2002, p. 101).

Além do argumento religioso, Lott justificava seu anticomunismo por ser nacionalista. Na concepção do militar, ao defender a autonomia do país, não poderia compactuar com a legalização de um partido que atendesse a interesses estrangeiros. Nas palavras do marechal:

Sendo nacionalista, não posso ser internacionalista. E o comunismo, afinal de contas, é uma orientação internacionalista. Se não quero sujeitar meu país a outro, economicamente, como vou sujeitá-lo politicamente? Seria falta de coerência (O CRUZEIRO; 2014a).

Seguindo este raciocínio, Lott se indispunha com alguns adeptos do comunismo, que de alguma forma ansiavam obter maior participação política com a vitória do marechal. Tamanho fervor anticomunista chegava a fazer com que o candidato vivenciasse certas situações delicadas politicamente. Renato Archer, um dos membros da Ala Moça do PSD que apoia Lott, conta que no começo da campanha foi marcada uma coletiva de imprensa no apartamento de Cid Carvalho para oficializar a candidatura do militar. Ao chegarem ao elevador do prédio de Cid, Archer e Lott se deparam com Maria da Graça, militante do Partido Comunista, que interpela o candidato sobre como seria a relação do Brasil com todos os países soberanos do mundo caso ele ganhasse. Lott nada respondeu, mas o assunto voltaria à tona:

Chegando ao apartamento, terminados os contatos pessoais com o grupo, a imprensa se reuniu no escritório de Cid. A primeira pergunta foi feita pela Maria da Graça, que tinha ouvido este diálogo no elevador, e que era a única mulher presente. Fez a pergunta: “Como o senhor encara o problema do reatamento de relações com os países do Leste?” Lott respondeu secamente: “Sou contra.” (JOFFILY, 1982, p. 255).

Enquanto o marechal se mantinha irredutível quanto aos comunistas, Jânio Quadros visita Cuba e a União Soviética, fazendo diversas declarações esquerdistas de fins eleitorais. De acordo com Nelson Werneck Sodré, “parte da esquerda acreditou nelas, homens de boa qualidade acompanharam-no” (SODRÉ, 1988, p. 222), fazendo com que Lott perdesse apoio.

Mas não era somente na esquerda que Lott se comprometia. É preciso ressaltar que a candidatura do marechal era feita em um cenário de Guerra Fria, onde forças capitalistas e comunistas, lideradas pelos Estados Unidos e União Soviética, respectivamente, preocupavam-se com a hegemonia mundial (HOBSBAWM; 2010). A vitória das forças revolucionárias em Cuba no ano de 1959, que buscavam dar fim ao imperialismo americano na ilha acendeu o alerta dos Estados Unidos sob a necessidade de garantir seu domínio na América Latina. No

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Brasil, os setores conservadores de orientação norte-americana também se preocupavam com o momento internacional, que acompanhava o processo de surgimento de novas organizações de esquerda no país. Segundo Rodrigo Patto Sá Motta:

No limiar da década de 1960, as bandeiras esquerdistas começaram a empolgar novos contingentes sociais, para além de intelectuais e ativistas sindicais, tradicionais fornecedores de quadros para os grupos radicais. Militantes católicos leigos e grandes quantidades de líderes estudantis fortaleceram o campo esquerdista, engrossando os movimentos favoráveis a transformações sociais (MOTTA, 2002, p. 233).

Assim sendo, o apoio comunista a candidatura Lott acaba por despertar o pavor anticomunista em setores conservadores da sociedade, sobretudo a Igreja Católica. Inicia-se em periódicos que apoiavam Quadros um intenso programa de ataques ao militar, em que eram publicadas constantes declarações ou movimentações de religiosos que eram contra o candidato dos comunistas. De acordo com o jornal Tribuna da Imprensa, um dos principais veículos de oposição a Lott, em Curitiba o arcebispo recomenda suas paróquias para que “alertassem a população católica, cujo voto não pode ser canalizado para eles.” (TRIBUNA DA IMPRENSA, 1960b, p. 2). No Rio de Janeiro, o arcebispo-auxiliar D. Helder Câmara e o padre Álvaro Negromante teriam recomendado o eleitorado católico a não votar em Lott por ser manobrado pelas forças comunistas (TRIBUNA DA IMPRENSA, 1960c, p. 3). A intensa campanha da oposição católica para associar Lott ao comunismo chocava os mais próximos do militar, que sabiam que o candidato “era católico de convicção, católico autêntico, praticante de formação” (SODRÉ, 1988, p. 223).

Por onde passava, Jânio Quadros reforçava a acusação de que Lott cooperava com os comunistas. Em Viçosa, Minas Gerais, o presidente do PR Arthur Bernardes Filho, apoiador da candidatura de Jânio, exclama em um comício do político: “tantas tem sido as provas, não mais indiciárias, mas completas, de que o marechal Teixeira Lott aderiu completamente ao órgão marxista, que não há dúvida da influência de Moscou em seu governo, se ele pudesse ser eleito a 3 de outubro” (TRIBUNA DA IMPRENSA, 1960c, p. 3). Embora Lott passasse boa parte da candidatura se colocando como anticomunista, a ação do PCB o faz perder apoio de partidos conservadores, como o PR, o PRP de Plínio Salgado (TRIBUNA DA IMPRENSA, 1960d, p. 3), tradicionais rivais do comunismo, e o próprio PSD.

A participação dos comunistas na candidatura Lott também agitou a Caserna, onde a direita fazia circular documentos contra o marechal. Em um deles encontrava-se trechos da publicação em que Prestes declara seu apoio ao militar, indagando o documento o porque de tal atitude, além da veemente crítica ao candidato Jânio Quadros. De acordo com documento, Lott seria um inocente útil diante dos interesses do partido, enquanto Jânio era severamente criticado pelos comunistas por ser o único político que “em vez de se frustrar deante [sic] da sua propaganda, conseguiu, eficazmente, tornar inoperante a ação dos comunistas” (CPDOC�FGV , 1960b, p.2). O documento encerra com a seguinte pergunta: “E o Sr.,

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com quem fica? Com quem interessa ao Partido de Moscou, ou com o outro a quem tanto temem os comunistas?” (CPDOC�FGV , 1960b, p.2).

Outro documento que circulava na Caserna levava o título de “Lott e os Comunistas Militares”, em que eram relatados fatos que ligavam o militar aos militares de esquerda. De acordo com o relatório, Lott favoreceu diversos militares simpáticos ao comunismo de ingressarem na Escola de Comando e Estado Maior, além de garantir a circulação de jornais comunistas durante o 11 de Novembro e prestigiar o Instituto Superior de Estudos Brasileiros, que oferecia cursos para militares. O documento encerra argumentando que Edna Lott, filha do marechal que participa amplamente de sua candidatura, fazia pregações marxistas, e que Carlos Prestes teria afirmado que “a eleição de Lott representa um avanço para nós, comunistas, e propiciará a que amanhã o possamos dar um passo bem maior” (CPDOC�FGV , 1960c, p.4).

Nota-se que assim como no discurso dos jornais aliados a Jânio, Lott é apresentado pelas forças conservadoras do Exército não como um comunista, mas um instrumento para que o PCB alcançasse o poder. De acordo com Sá Motta, o anticomunismo estava presente em diversos setores da sociedade, incluindo homens de negócios, membros das Forças Armadas e religiosos, desempenhando estes últimos “o principal papel, notadamente no que respeita à elaboração de representações sobre o inimigo e sua divulgação” (MOTTA, 2002, p. 43). Temerosos com a possibilidade dos comunistas alcançarem o poder, as forças conservadoras se uniram a favor de Jânio. Este, porém, esteve em Cuba após a revolução, deixando ser fotografado ao lado dos líderes do movimento que depôs o governo Fulgêncio Batista. Wagner William, autor de uma das biografias do marechal, não deixa de comentar a contradição entre os candidatos: “Na fantástica eleição de 1960, a direita flertara com o amigo de Fidel; a esquerda carregara um candidato papa-hóstia contrário ao comunismo.” (WILLIAM, 2005, p. 354). Lott foi pivô de um conluio em que dialogavam os principais porta-vozes do conservadorismo, Igreja, Forças Armadas e a imprensa, sendo retratado constantemente como o “candidato pessedo-petebo-comunista” (TRIBUNA DA IMPRENSA, 1960e, p. 4). E em um período em que se temia enormemente a infiltração do comunismo no país, tamanha propaganda contra o candidato surtiu efeito.

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5. CAPÍTULO 4: O NACIONALISMO COMO BANDEIRA

O período democrático foi quadro de diversos matizes ideológicos, que se apresentam difusos no cenário político brasileiro. Contudo, é inegável a predominância do nacionalismo enquanto ideologia de maior influência, ganhando força como “ideologia oficial na Era Vargas” (WEFFORT, 2003, p. 41) durante as campanhas de nacionalização do petróleo. Neste capítulo, propomos a discussão do conceito de nacionalismo presente no discurso lottista, destacando de que maneira a ideologia não encontrou adesão junto ao eleitorado brasileiro.

Ao tratarmos nacionalismo como ideologia, tomamos como referência o “significado fraco” do conceito dado por Norberto Bobbio (2010), que atribui a “um conjunto de ideias e de valores respeitantes à ordem pública e tendo como função orientar os comportamentos políticos coletivos” (BOBBIO; MATTEUCI; PASQUINO, 2010, p. 585). Tal acepção do termo foi empregada por diversos sociólogos nas décadas de 50 e 60 que concebiam o período de crise deste conceito. Porém aqui não nos cabe realizar uma discussão teórica do nacionalismo, mas sim o que tal ideologia representava para o candidato. Buscamos identificar o que era ser nacionalista para Lott, e de que maneira tal percepção contribui negativamente para o marechal em sua candidatura.

No contexto em que se encenou o teatro eleitoral de 1960, a pauta nacionalista aparece em peso nos dois principais candidatos a presidência. O Marechal Lott se apresentava como herdeiro do nacionalismo getulista, alegando ir até o fim de sua campanha sustentando a “gloriosa bandeira de Vargas” (ÚLTIMA HORA, 1960B, p. 7). Nota-se que a afirmação se dá por duas vias: pelas propostas apresentadas pelo candidato, voltadas para a área social e ao mesmo tempo de desenvolvimento nacional, e pela aliança feita com João Goulart, herdeiro natural do getulismo. Quanto a Jânio Quadros, sua campanha é direcionada a desmascarar os falsos nacionalistas, que na busca por cargos e facilidades políticas, abusam da boa-fé do eleitorado, sendo desprovidos de “qualquer sentido patriótico ou nacional” (TRIBUNA DA IMPRENSA, 1960f, p. 3).

5.1. Nacionalismo da Caserna

O nacionalismo lottista se deve em parte a formação militar do candidato. Segundo Celso Castro, dentre as ideias “inventadas” pelo Exército está o “vínculo indissolúvel entre o Exército e a nacionalidade brasileira” (CASTRO, 2002, p. 72), que remonta aos tempos da Batalha dos Guararapes. De acordo com o autor, embora os combatentes do conflito não constituíssem de fato um Exército nacional, que só é criado a partir da emancipação política do país, em termos simbólicos, Guararapes é um marco da associação entre Exército e Nação. O ideal foi reforçado durante o governo Hermes da Fonseca, quando oficiais da Caserna estagiaram no Exército da Alemanha, que ao retornarem, eram chamados pejorativamente de

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“Jovens Turcos”. O grupo defendia a profissionalização do Exército, que incluía desde a modernização do aparato bélico ao recrutamento obrigatório. De acordo com Edmundo Campos Coelho, almejava-se um Exército apolítico, “uma organização desvinculada de seu contexto societal, idealizada na identificação de seus interesses com os interesses nacionais, impermeável aos conflitos no seu meio ambiente” (COELHO, 2000, p. 95). Historicamente, contudo, sabe-se que o ideal apolítico foi deixado de lado pelos tenentes, que se envolvem na Revolução de 1930. A Missão Militar Francesa, que dá continuação à modernização iniciada pelos “Jovens Turcos”, faz com que o Brasil tomasse contato como novas armas e táticas de guerra. Lott tomou contato com os novos ares da Caserna, participando da “Missão Indígena” em 1919, comandada pelos “jovens turcos”, em que era responsável pela orientação de seus alunos com o ideal de modernização do Exército.

As mudanças nas Forças Armadas nutriram na mentalidade militar a responsabilidade do Exército como “guardião da ordem política” (WILLIAM, 2005, p. 32). Porém a Caserna divergia quanto à forma de resguardá-la. José Murilo de Carvalho identifica três visões da Caserna acerca do seu papel em relação à política: a primeira, vinculada ao PCB, buscava introduzir a luta de classes nas Forças Armadas, promovendo uma união entre militares e trabalhadores para criar um exército revolucionário. Outro grupo, formado principalmente por membros do tenentismo, buscava o intervencionismo reformista. O último grupo defendia a não intervenção das Forças Armadas no cenário político, devendo ocupar-se estritamente com assuntos relativos a Defesa nacional. Segundo o autor, para estes indivíduos:

A participação do Exército nas disputas partidárias acarretava muitas inconveniências para a carreira e para o exercício da profissão. Era benéfica apenas para a minoria de oficiais mais agressivos, movidos por ambição pessoal ou ideais políticos. O grosso tendia a preferir a regularidade das normas burocráticas (CARVALHO, 2005, p. 74).

Lott se ingressava nesta corrente, evitando debates políticos ao longo de sua carreira militar. Sua própria nomeação como Ministro da Guerra, de acordo com Campos Coelho, foi por ser “considerado elemento apolítico, exemplar perfeito de uma formação militar rígida, o protótipo do soldado profissional” (COELHO, 2000, p. 125). Seu envolvimento na política enquanto trajava a farda foi somente em 1955, para que “os interesses do Brasil fossem devidamente respeitados” (LOTT, 2002, p. 32). Desta forma, ainda que soe contraditório, Lott lidera o contragolpe para garantir a manutenção da democracia ameaçada por militares ligados a elementos políticos da UDN.

5.2. O Nacionalismo desenvolvimentista

Outra fonte em que bebia o nacionalismo lottista é o próprio contexto político em que se desenvolveu a campanha. Candidato do PSD, tendo como vice o PTB,

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ambos partidos criados por Vargas, Lott se proclamava herdeiro do getulismo. Tinha como vice João Goulart, ex-ministro do Trabalho de Vargas e proprietário da carta-testamento deste. Ao considerarmos os aspectos políticos do segundo governo Vargas, é intrínseca a relação entre populismo, trabalhismo e nacionalismo. De acordo com Maria Celina D’Araujo,

Pela primeira e última vez, um projeto nacionalista conseguiu obter efetivamente um lugar junto ao Governo. Embora não se transformasse em projeto dominante, coexistiu na esfera governamental com outras tendências, o que lhe imprimiu caráter oficial, condição que permanece inédita. (D’ARAÚJO, 1992, p. 192).

O discurso nacionalista getulista, que aparentemente havia sido eficiente para a eleição do presidente Juscelino Kubitschek, é também evocado por Lott. João Goulart, que havia sido vice de JK, foi também escolhido para ser vice de Lott. A campanha Lott-Jango se inicia simbolicamente em São Borja, Rio Grande do Sul, cidade onde nasceu Vargas e Goulart. Milton Senna, que fez a cobertura jornalística da campanha do marechal, descreve o significado da ida do candidato à cidade gaúcha no dia 20 de abril de 1960:

Lott, naquele instante, ficara irremediavelmente comprometido com a causa nacionalista, ao repassar em sua mente, durante os minutos que duraram as homenagens, todo o passado de lutas e sacrifícios de Vargas e o povo brasileiro. E deve ser feito, perante a sua própria consciência, um solene e silencioso juramento de fidelidade aos ideais que levaram à morte do grande presidente (SENNA, 1968, p. 48).

O nacionalismo de Lott também flertava com as ideias da Frente Parlamentar Nacionalista (FPM), que era composta por políticos dos mais diversos partidos “com o objetivo comum de lutar pela implementação de políticas públicas

nacional�reformistas” (NEVES, 1994, p. 63). O militar se mantinha em contato com a Ala Moça do PSD que integrava a FPN, e que também lança a candidatura do marechal. De acordo com Lucilia de Almeida Neves, embora se mantivessem unidos para a aprovação de certas medidas,

Na campanha presidencial de 1960 a FPN sofreu algumas dissensões internas, pois nem todos os seus integrantes apoiaram a candidatura de Lott, preferindo acompanhar a orientação de seus partidos de origem. Muitos parlamentares, por exemplo, votaram em Jânio Quadros. Essa foi a posição da maior parte dos parlamentares frentistas vinculados à UDN (DELGADO, 1994, p. 66).

Assim sendo, embora nacionalista, Lott não recebeu apoio integral dos membros da FPN. A campanha de Lott e o ápice da ação da Frente se deram durante o governo Juscelino Kubitschek, período em que também foi marcado pela produção política e cultural do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), criado durante o governo Café Filho. O ISEB se propunha ser uma intelligentsia nacional, aglomerando intelectuais das mais diversas orientações político-ideológicas, unidos pelo projeto nacional-desenvolvimentista. De acordo com Caio Navarro de Toledo,

O nacional-desenvolvimentismo foi então concebido como essa ideologia síntese capaz de levar o país – através da estação estatal (planejamento e intervenção econômica) e

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de uma política de classes – à superação do atraso econômico-social e da alienação cultural. (TOLEDO, 2005, p. 7).

A defesa do desenvolvimentismo pelos isebianos fez com que o órgão se aproximasse do governo JK, buscando garantir “apoio e sustentação à política econômica desenvolvimentista definida no Programa de Metas” (BENEVIDES, 1975, p. 241). Lott, que se colocava como continuador do Programa de Metas, reafirmava seu compromisso com a emancipação do país em cada discurso que proferia. Em passagem ao estado de Pernambuco, o candidato chama a atenção do eleitorado sobre a importância em se defender a Petrobrás:

Sabeis que não sou nacionalista de véspera de pleitos. Não estou sujeito a marchas e contramarchas dos que apenas refletem interesses e preocupações eleitorais. Conheceis minhas atitudes neste domínio. Estou empenhado, como todos vós, Pernambucanos, na causa de nossa emancipação econômica. Não encontro nenhum sentido agressivo nessa declaração, mas tão somente uma atitude de defesa de nossos interesses essenciais. Quando afirmo que a Petrobrás é intocável, não expresso apenas um compromisso de todos nós. É também um símbolo, no traduzir a atitude de defesa intransigente, que precisamos adotar em face de todas as nossas riquezas básicas. Não é apenas a Petrobrás que é intocável, repito. São e devem ser intocáveis todas as riquezas, de que possa depender a independência ou a segurança da Pátria. E se assim falamos, não é que nos mova qualquer preocupação de hostilidade a quem quer que seja. Pensamos apenas no Brasil, nos seus interesses, no seu futuro, na sua grandeza, na sua independência (ÚLTIMA HORA, 1960c, p. 6).

Em trechos como este, o candidato se coloca alinhado aos interesses do povo, já que defende a emancipação da Nação. A Petrobrás, que já se tornara símbolo da ideologia nacionalista desde o segundo Governo Vargas, era retomada por Lott como símbolo de sua campanha. Fazendo isto, buscava legitimar sua plataforma, ganhando assim os votos do eleitorado. Para Irlys Barreira, que considera as campanhas eleitorais como ritos,

A representação política pode ser percebida como uma construção simbólica que tem como objetivo instituir a legitimação de processos eletivos de candidatos e ideias, e, ao mesmo tempo, a deslegitimação de forças adversárias. [...] Os símbolos eleitorais podem ser pensados como construção ou reativação de vínculos, o que se faz a partir da valorização dos discursos realçando a importância do voto e dos critérios de escolha. São discursos que convocam à participação e recapitulam a presença do “povo” como juiz de causa eleitoral (BARREIRA, 1998, p. 43).

Assim sendo, a constante reafirmação dos vínculos de Lott com o getulismo nacionalista não se dava simplesmente por convicções próprias, mas pela necessidade em que demandava o momento político. A ação da FPN, a produção dos acadêmicos do ISEB, e sobretudo a intensa participação dos jornais, fazia com que o debate ideológico entorno do nacionalismo se intensificasse durante o governo JK. De acordo com Francisco Weffort, o nacionalismo se impunha como ideologia dominante, fazendo com o que todo o debate político no entorno dele também tomasse um posicionamento ideológico (WEFFORT; 2003). E tudo aquilo que não se adequasse a ele, era tachado como “entreguismo”, termo utilizado para

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caracterizar indivíduos que se alinhavam aos interesses externos, e não aos nacionais.

Ao se fazer pauta central do discurso político, o nacionalismo era apropriado de formas distintas por ambos os lados, janismo e lottismo, que atribuíam ao outro o status de entreguistas. Para Lott, Jânio seria um oportunista, que negociava apoio com os comunistas ao mesmo tempo que se comprometia com os “trustes”. Para os janistas, o falso nacionalismo estaria nos lottistas, que tentam colocar a ideologia apenas para si próprios:

Todo o povo brasileiro sente que essa manobra, intentada por esses “nacionalistas”, facilmente identificáveis nos pleitos eleitorais como traficante de um apoio em troca de cargos, posições e facilidades, é destituída de qualquer sentido patriótico ou nacional. Buscam, apenas, mais uma vez, agora sob outra forma, embair a boa fé do eleitorado, na vã tentativa de obter o seu sufrágio (TRIBUNA DA IMPRENSA, 1960f, p. 3).

Diante do cenário político em que se traçaram as campanhas eleitorais, em que o nacionalismo se fazia pauta essencial pela pressão de grupos como o ISEB e a FPN, a ideologia assumia diferentes formas. Enquanto Lott apostou no continuísmo do nacionalismo getulista, associado ao desenvolvimentismo do governo JK, Jânio assumia uma plataforma moralista, representada pela vassoura.

5.3. A voz que não era do povo

Afinal, o que teria contribuído para o discurso nacionalista de Lott não ser reconhecido nas urnas? Embora Lott tivesse tentado se associar ao nacionalismo getulista, depois do mandato do segundo governo Vargas a ideologia não se mantém associada ao poder, não sendo assimilada nem “pelo Governo nem pelas forças políticas dominantes” (D’ARAÚJO, 1992, p. 192). De acordo com Maria Victoria Benevides, governo Juscelino Kubitschek, que sucede o governo Vargas e se elege como continuador deste, dá novo significado a ideologia nacionalista, utilizando-a não como política de Estado, mas sim como uma forma de legitimação de sua política desenvolvimentista (BENEVIDES; 1979).

A aproximação de JK do nacionalismo, que chegou a empolgar os intelectuais do ISEB, se deu, sobretudo pela meta de desenvolvimento da autonomia do país através da industrialização, que apresenta um crescimento em cerca de 100% entre 1956 e 1961 no número de indústrias de base (SILVA; 2013). A construção de Brasília, no Centro-Oeste brasileiro, assim como de rodovias, promovia a integração regional, reforçando o conceito de Nação. Porém, muitos aspectos do governo JK acabaram por promover um resultado contrário ao ambicionado pelo nacionalismo aos moldes do getulismo. Segundo Benevides,

a grande penetração do capital estrangeiro,se por um lado aumentou as possibilidades de suspensão do subdesenvolvimento, por outro lado aumentou as disparidades

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regionais e contribuiu para o enfraquecimento da já débil “burguesia nacional”. (BENEVIDES, 1979, p. 239).

A política juscelinista também foi responsável pelo aumento da inflação, resultado do investimento voltado para a construção da nova capital. Principal vilão do seu governo, a inflação fez aumentar o custo de vida, alimentando os discursos da oposição. Em 1959, um dos grandes sucessos do palhaço Carequinha era a música Dá um jeito nele, Nonô, de autoria de Miguel Gustavo, que fala sobre a situação econômica no momento para o trabalhador:

Dá um jeito nele, Nonô.

Meu dinheiro não tem mais valô.

Meu cruzeiro não vale nada.

Já não dá nem pra cocada.

Já não compra nem banana.

Já não bebe mais café.

Já não pode andar de bonde

nem chupar um picolé.

Afinal esse cruzeiro

é dinheiro ou não é? (COSTA, 2001, p. 243).

Assim sendo, o nacionalismo realizado pelo governo JK é voltado exclusivamente para o âmbito econômico, o chamado nacionalismo-desenvolvimentista. De acordo com Miriam Limoeiro Cardoso, o desenvolvimentismo

“Propõe um nacionalismo que se apresenta como racional (técnico): que atende àqueles interesses da nação que são dados a priori como sendo antes de tudo os interesses do desenvolvimento econômico. Opõe-no a um nacionalismo que qualifica de emocional (político) que, segundo o desenvolvimentismo, a pretexto de defender acaba por contrariar os anseios nacionais identificados sempre como voltados para o desenvolvimento” (CARDOSO, 1977, p. 343).

Desta forma, o nacionalismo-desenvolvimentista busca atender os reais anseios da população, interpretando o desenvolvimento como vontade geral da população. Gabriel Cohn observa que o nacionalismo, ao se associar com o desenvolvimentismo, dava grande ênfase para a industrialização, sendo a princípio atraente tanto para a burguesia quanto para o proletariado:

Do ponto de vista da burguesia industrial em expansão, o desenvolvimentismo tinha sobre o nacionalismo “puro” a vantagem de evitar a ênfase que este punha na intervenção estatal na economia. Para as massas, também tinha atrativos, dado que oferecia algo concreto (oportunidades de trabalho), ao passo que o nacionalismo é uma abstração para o operário comum (COHN, 1965, p. 149).

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Contudo, considerando os efeitos da política econômica sob o trabalhador, a ideologia se mostrou falha, atendendo na verdade não a sociedade como um todo, mas a grupos sociais específicos que se beneficiam com a concentração “produtiva, distribuitiva e política” (CARDOSO, 1997, p. 334). A alternativa desenvolvimentista não tardou para evidenciar seu peso sobre o operariado, sentido pelos índices de desemprego gerados pela inflação. O marechal Teixeira Lott, ao se colocar como continuador do programa político juscelinista, compromete sua candidatura, já que evidencia a possibilidade de se manter os problemas gerados pela gestão JK que em tanto afetaram negativamente a vida da população de maneira geral, resultado da inflação galopante. Este cenário contribuiu para que a campanha janista ganhasse adeptos, tanto do operariado, quanto de uma pequena burguesia nacional temerosa com sua proletarização gerada pela entrada de capital estrangeiro no país (COHN; 1965). Segundo Basbaum, “o povo, votando contra o governo, só podia votar contra Lott. E nesse caso, o apoio de Juscelino de nada lhe serviria, se não fosse acompanhado de atos a favor do povo” (BASBAUM, 1976, p. 241).

Ao mesmo tempo, ao se caracterizar como nacionalista, Lott faz apelo a uma ideologia abstrata, em um cenário onde se coexistiam as mais diversas concepções do termo. No período em que se realizou a eleição presidencial, o isebiano Guerreiro Ramos chegou a destrinchar diversas tipologias do nacionalismo, que incluía o nacionalismo ingênuo, o utópico, o de cúpula, o de cátedra e o de circunstância. Esta era uma dentre várias interpretações que se fizeram sob a ideologia, que varia até mesmo dentre os integrantes do ISEB. Lott caracterizava seu nacionalismo da seguinte forma:

O nacionalismo, para mim, é uma atitude de defesa, de vigorosa continuada, intransigente defesa de todos os valores nacionais em perigo, ou porque grupos econômicos estrangeiros intentem a exploração de riquezas brasileiras em detrimento dos nossos legítimos interesses, ou porque correntes de pensamento estrangeiro pretendam atingir as nossas prerrogativas políticas ou culturais. Em face de ameaças desse gênero, levantar-se-á, sem trégua, a nossa resistência e a nossa repulsa. Este o sentido do nacionalismo brasileiro, este o verdadeiro alcance e finalidade da ideia nacionalista que estará presente e influente na minha atuação governamental (ÚLTIMA HORA, 1960b, p. 7).

Nestes moldes, o conceito do nacionalismo lottista torna-se ambíguo, se considerarmos a vontade do candidato em ser um continuador das metas do nacionalismo de Vargas e JK. Na verdade, o termo assume significados distintos (e que até se anulam) nos dois governos: enquanto Getúlio Vargas mostrava-se favorável a regulação do capital estrangeiro e da remessa de lucros, Juscelino Kubitschek abre as portas para a entrada em massa do capital estrangeiro no país. Ao assumir os dois nacionalismos (o getulista e o desenvolvimentista), Lott assume também a contradição, ignorando os efeitos negativos da política econômica juscelinista. Ignora que o nacionalismo, ideologia que prega a valorização do interesse da Nação, acaba por atender interesses de somente alguns setores da sociedade. Vale ressaltar que a adesão de Lott ao getulismo é constantemente

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questionada durante o período eleitoral pela oposição, já que o militar foi signatário do Manifesto dos Generais de 1954, que exigia a deposição do presidente.

Jânio Quadros, por sua vez, não desconsidera o nacionalismo, mas não o emprega como plataforma de governo, mas sim como outra possibilidade de se angariar votos. Traça sua candidatura pautada na crítica ao governo JK, no aumento do custo de vida e nas denúncias de corrupção envolvendo Brasília. Faz assim um discurso moralização política, que já existia na conservadora UDN, mas com a diferença de contar com maior apelo popular. De acordo com Francisco Weffort, o moralismo janista atende as classes sociais desiludidas com o favoritismo político, sendo seu novo mito “a ideia de justiça, igualdade incondicional perante a lei” (WEFFORT, 2003, p. 36). Aglutina, desta forma, não só a pequena-burguesia, como fazia a UDN, mas os operários. Jânio não se atém a nenhuma posição ideológica, criando a sua própria: o janismo. Segundo Limoeiro Cardoso:

Ao questionar não apenas o subdesenvolvimento, como também o processo de desenvolvimento em curso, negando o tipo de reforço da ordem em que ele enseja, é capaz de concentrar em si toda a força da oposição, todas as forças que se ressentem do presente. Opera como um catalisador do descontentamento que se cria contra a implantação de uma nova hegemonia. Deste modo, pode recolher e agrupar a insatisfação de diferentes setores: 1) dos antigos detentores da hegemonia, que vem dividida com outros, de tal modo que a sua capacidade de direção vai-se esvaindo a medida em que outro domínio se implanta; 2) dos que aspiram compor uma nova hegemonia e se sentem impossibilitados de uma participação mais efetiva; 3) dos que são alijados do exercício hegemônico, sendo apenas incorporados pelo processo (CARDOSO, 1975, p. 349).

Não é só no discurso atrativo a oposição que faz Jânio Quadros mais bem sucedido em relação a Lott. Embora ambos contemplem a Nação na sua integridade, Lott representa o continuísmo governo JK, que contribuiu para o crescimento das desigualdades regionais. Jânio declara:

O progresso não é, nem pode ser privilégio de uns poucos, em detrimento da maioria. Não pode favorecer umas quantas regiões e esquecer outras tantas. Não deve discriminar uma classe, contra todas as classes. Não há de beneficiar uma casta, com o sacrifício de todos. Por isso já o disse e o reafirmo que meu Governo, visando embora o futuro, não irá sufocar as gerações presentes, mas buscar os meios de proporcionar-lhes o bem-estar e a tranquilidade a que tem direito, e já, nestes dias que vivemos (O CRUZEIRO, 1960e, p. 29).

Fica claro que mesmo pregando a integridade do país, Jânio reconhece em seu discurso a existência de diversas regiões, castas e classes. Compreende a realidade nacional difusa, adotando as mais diversas estratégias para atingi-la, utilizando tanto o Movimento Popular Jânio Quadros quanto acordos partidários, chegando a ter dois vices oficiais na sua candidatura (além de Jango pela Jan-Jan). Lott, por sua vez, se atém a concepção nacionalista de povo, assumindo os equívocos da ideologia. Segundo Weffort:

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os nacionalistas, mesmo os mais radicais, falaram sempre em nome do povo, em nome

da comunidade nacional. Por certo nunca se propuseram, nem o poderiam, representar

o povo atual, concreto, contraditório, pois isto seria levar a uma prática absurda a ideia

inconsistente do povo-comunidade. Na prática que, bem ou mal, conseguiram

desenvolver, a ideologia quase sempre embotou-lhes a percepção de nação dividida e

em conflito. (WEFFORT, 2003, p. 39).

Tal incompreensão da multiplicidade do Povo, como o próprio autor ressalta, não é o único ponto em que se difere o janismo da ideologia nacionalista. Ao desenvolver sua campanha baseada no mérito pessoal, Jânio mostra-se alheio em relação ao jogo partidário, reforçando a sua imagem de que sua candidatura nasce da espontaneidade das ruas. De fato, Quadros começa a ganhar expressão nas ruas durante sua candidatura à prefeitura de São Paulo, em 1953, na sua Campanha do Tostão Contra o Milhão. Além de declarar-se apartidário, Quadros não define postura ideológica, alegando ser nem liberal nem marxista, dualidade para ele já superada pelo desenrolar da história:

Não sou liberal, nem sou marxista. A terminologia política a que muitos continuam ape-

gados, na velha Europa, não tem mais o sentido lógico que assumiu em certa fase da

história das idéias. Os conceitos que alicerçaram esquerda e direita, na fase que culmi-

nou com o embate entre fascismo e bolchevismo, mudaram de natureza, em conse-

qüência da Segunda Guerra Mundial e da explosiva evolução que se opera em nossos

dias, e que também a nós nos abarca. (O CRUZEIRO, 1960b).

O nacionalismo, por sua vez, não é originário (e nem consegue passar esta imagem) do povo, embora a ele se direcione. Segundo Weffort, a “ideologia nasce, pois, dentro do Estado ou em associação com ele, embora pretendendo traduzir os interesses gerais de todo o povo” (WEFFORT, 2003, p. 42). O nacionalismo existente no período democrático ganhou tais configurações a partir do estado varguista, constituiu-se como instituto no governo Café Filho e tornou-se um órgão a serviço do Estado no governo Juscelino Kubitschek. Curiosamente, a própria figura de Lott, porta-voz do nacionalismo em 1960, também surge de dentro do Estado, sendo um ex-ministro da Guerra.

Através da intensa atividade dos teóricos do ISEB, a ideologia nacionalista buscava se revestir enquanto ciência. Desta forma, de acordo com Guerreiro Ramos, o nacionalismo se consolidaria como um

conjunto de princípios gerais de uma atitude metódica destinada a habilitar a transpor conhecimentos e fatos de uma perspectiva para a outra, a relativizar o adquirido, a bombardear com perguntas e arguições todo produto da ação humana. (RAMOS, 1960, p. 255)

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Isto posto, o nacionalismo procurava se afastar de qualquer aspecto emotivo, buscando a racionalização de seus princípios6. Lott adere a esta postura, realizando verdadeiras palestras em seus comícios onde expunha seus projetos para o Brasil, deixando claro o seu compromisso com a doutrina nacionalista. Foi acusado inclusive pelo periódico Tribuna da Imprensa de ter seu programa criado pelos “economistas isebianos” (TRIBUNA DA IMPRENSA, 1960g, p. 3). Mas ao negar o caráter emotivo para alcançar o formalismo ideológico (WEFFORT; 2003), o nacionalismo acabou por se afastar do Povo, daí sua incapacidade de compreendê-lo em toda sua complexidade – e mais ainda de representá-lo. Vale ressaltar que com o passar do tempo o ISEB se torna cada vez mais vinculado à ideologia marxista, o que se torna algo contraditório para o candidato que bebe de seus teóricos, já que era anticomunista.

Em todo o cenário em que se encenou o teatro eleitoral, todos os elementos envolvidos, envolvendo os problemas da época, afetam no resultado do pleito. Jânio Quadros soube se aproveitar disto, focando sua candidatura principalmente nos problemas gerados pelo situacionismo, colocando-se como a panaceia para os males do país. Lott, por sua vez, aposta em reforçar sua imagem como sucessor de JK, ignorando os efeitos negativos de seu governo. Além disso, coloca-se como porta-voz de uma ideologia difusa, de difícil compreensão mesmo para seus teóricos. O nacionalismo lottista nem sequer chega a ser lottista de fato, já que o militar não inclui apelo “emocional” em seu discurso, não pretendendo ser um demagogo mobilizador de massas, mas o porta-voz de uma doutrina racional e necessária. Nos moldes pregados pelo marechal, o nacionalismo nunca chegou a ser empregado, sendo bem sucedido quando associado ao personalismo de figuras políticas, como o getulismo e o janguismo. Segundo Weffort:

O nacionalismo nunca possuiu uma única liderança que expressaria de forma dita “não ideológica” a ideia da comunidade do povo, nem o partido (ou partidos) que a expressariam de maneira dita “ideológica”. Como movimento ideológico, o nacionalismo nunca passou do estágio de atmosfera que se expandia à custa da ambiguidade e da indefinição social (WEFFORT, 2003, p. 43).

Assim sendo, o nacionalismo pregado por Lott, ideológico e racional, nunca chegou a ser utilizado anteriormente, tendo respaldo basicamente entre a elite intelectual. Nem sequer consegue o apoio do nacionalismo personalista: afirma seu nacionalismo ser aliado ao getulismo e ao juscelinismo, mas não conta com presença nem de João Goulart, principal figura associada a Vargas, nem de JK em suas viagens pelo país.

A desconfiança em relação ao nacionalismo partia do próprio partido de Lott, em que se vivenciava uma situação de desrespeito a hierarquia. A ideologia que foi

6 Para Weffort, este caráter emotivo é típico do populismo, sendo o nacionalismo incapaz de reconhecê-lo enquanto ideologia. E ao fazer isso, o autor problematiza: “não estaria o nacionalismo revelando sua própria inconsistência como ideologia? Ao atirar o populismo para o passado, não estaria o nacionalismo tentando esconder suas afinidades de parentesco?” (WEFFORT, 2003, p. 25).

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fortemente abraçada pela Ala Moça do PSD apostava no nome de Lott como uma estratégia de maior autonomia política, atropelando os caciques pessedistas com o lançamento de sua candidatura. O apelo a uma doutrina de libertação do povo no cenário político ia ao oposto do velho estilo do PSD, que manejavam os eleitores do interior alheios a ideologias (O CRUZEIRO, 1960c, p. 127). Tal descompasso custou ao marechal, já que a Ala Moça não possuía apelo o suficiente para levar sua candidatura adiante sozinha, não contando com o apoio dos caciques do partido que viam as movimentações com desconfiança. Jânio se aproveita deste distanciamento entre as forças do partido, negociando apoio político com raposas do PSD.

Desamparado de grandes nomes associados a sua campanha, proferia um discurso que embora dissesse representar o povo, a ele era desconhecido. Assim, Lott perde as eleições, e embora tenha errado na estratégia discursiva de sua campanha, acerta na profecia que faz sob o candidato vencedor: “Ele, na presidência, não dura uma gestação” (WILLIAM, 2005, p. 354).

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6. CONCLUSÃO

O estudo da campanha do Marechal Lott é termômetro das mudanças em curso na política do período, evidenciando o embate de diversas forças entorno de sua candidatura. Lott é lançado por uma aliança partidária vitoriosa durante todo o período democrático, mas que já se encontrava em crise no final do governo JK. A crescente influência do PTB no cenário político, ávido pela implantação de reformas sociais, chocava-se com o conservadorismo dos caciques do PSD. Este ainda contava com uma pequena facção, a Ala Moça, que se identificava com o projeto político do PTB, e que lança a candidatura do marechal em uma tentativa de se livrar das amarras dos líderes do partido e se ascenderem politicamente. No meio deste complicado jogo de xadrez ainda há o presidente Juscelino, que almejando seu retorno em 1965, manipula as demais peças – incluindo Lott – para realizar seu objetivo.

Além da caduca política de alianças entre os partidos que lançam Lott, sua candidatura também revela certos projetos políticos da época. A causa nacionalista abraçada por Lott e pelo ISEB buscava se consolidar como uma ideologia autêntica, sem se atrelar a líderes populistas que a utilizam a bel prazer. Com a sua derrota, é evidente que o espírito público não concebia a disjunção de ambos: a essência do nacionalismo enquanto ciência não era claro ao eleitorado. E na tentativa de ser o anti-Jânio, Lott ignora tal problema, partindo do princípio de que a união entre a ideologia e o culto a sua imagem resultariam em demagogia. Desta forma, como apresentamos, prevaleu a representação do Lott como um candidato fraco e inexperiente, construída pela oposição, em detrimento da imagem do candidato legalista e defensor da ordem democrática, defendida pelos arquitetos de sua candidatura.

Outro elemento manifestado pela candidatura Lott é o crescente sentimento anticomunista. Embora se declarasse contrário à legalização do PCB, Lott é apoiado pelos comunistas, que se identificam com diversos aspectos de sua plataforma política. O temor da sovietização do país em plena Guerra Fria contribui negativamente para Lott nas urnas, usado habilmente por uma grande campanha difamatória arquitetada pela mídia ligada a UDN e Jânio Quadros. Ao ser colocado como ‘o candidato dos comunistas’, em um período de forte propaganda anticomunista movimentada pela imprensa, Lott é derrotado pela oposição.

Ignorando todos estes obstáculos, Lott foi até o fim com sua candidatura. Encarando sua campanha como uma missão, viaja por todo o país disposto a apresentar seu projeto político para o Brasil. Lida com os mais diversos contratempos: na Paraíba, seu avião estraga em circunstâncias suspeitas. Em Minas Gerais, o desabamento de um palanque causa uma fratura na perna de Lott, forçando-o a cancelar diversos comícios. No dia anterior a eleição, o jornal do presidenciável Ademar de Barros publica uma falsa notícia de que Lott teria desistido de sua candidatura. Apesar de todos os obstáculos, o militar cumpriu sua agenda

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política, encerrando sua campanha com inquestionável dignidade. Aos 65 anos de idade, Lott trocou a farda pelos trajes civis, mas manteve o mesmo desejo de servir a nação. Embora derrotado, o militar reforçaria seu compromisso com a democracia posteriormente ao apoiar a posse de João Goulart em 1961. Seu enterro em 1984, sem honras militares, foi resultado de não ter apoiado o golpe em 1964.

O marechal Lott nomeia uma avenida no Rio de Janeiro, uma rua no Ceará e outra no Piauí, além de uma travessa no Maranhão. Seus serviços prestados a democracia e a legalidade, no entanto, pouco são mencionados pelos livros de História. O estudo de sua campanha política possibilita não só a recuperação da figura deste grande brasileiro, mas o imaginário construído entorno dele, pelo eleitorado e pela elite política, por partidários e opositores, naquele complexo cenário político em que se desenrolava as eleições. O militar que outrora buscava não se envolver em nenhum tipo de atividade político passava a ser o candidato de chefe da nação. Seria injusto desconsiderarmos qualquer destes momentos, como militar ou como político, já que Lott exerceu um papel de destaque em ambos. Melhor que seja lembrado desta forma: entre a espada e a política.

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