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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO ELISABETE CALABUIG CHAPINA OHARA O PAPEL DO IDOSO NA FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA Doutorado em Estudos Pós Graduados em Ciências Sociais São Paulo 2012

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

ELISABETE CALABUIG CHAPINA OHARA

O PAPEL DO IDOSO NA FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA

Doutorado em Estudos Pós Graduados em Ciências Sociais

São Paulo 2012

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ELISABETE CALABUIG CHAPINA OHARA

O PAPEL DO IDOSO NA FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA Tese apresentada ao Programa de Estudos Pós graduados em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, para a obtenção do título de Doutor

Orientadora: Profª. Drª. Maria Helena Villas Boas Concone

São Paulo 2012

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FICHA CATALOGRÁFICA Ohara, Elisabete Calabuig Chapina

O papel do idoso na família contemporânea / Elisabete Calabuig Chapina Ohara. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUCSP, 2012.

ix, 121 f. Orientador: Maria Helena Villas Boas Concone

Tese de Doutorado – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUCSP, Programa de Estudos Pós graduados em Ciências Sociais, 2012.

1. Envelhecimento 2. Família contemporânea 3. Idoso I. Concone, Maria Helena Villas Boas II.Pontifícia Universidade Católica de São Paulo III. O papel do idoso na família contemporânea

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Elisabete Calabuig Chapina Ohara

O PAPEL DO IDOSO NA FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA

Tese apresentada ao Programa de Estudos

Pós-graduados em Ciências Sociais da

Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,

para a obtenção do título de Doutor

Aprovado em : _______________________________________________________

Banca Examinadora

Profª Drª Maria Helena Villas Boas Concone Instituição: PUC-SP

Julgamento: _______________________ Assinatura: ______________________

Profª Drª ___________________________________ Instituição: _____________

Julgamento: _______________________ Assinatura: ______________________

Profª Drª ___________________________________ Instituição: _____________

Julgamento: _______________________ Assinatura: ______________________

Profª Drª ___________________________________ Instituição: _____________

Julgamento: _______________________ Assinatura: ______________________

Profª Drª ___________________________________ Instituição: _____________

Julgamento: _______________________ Assinatura: ______________________

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus filhos Lucas,

Vitória e João Vítor, que vieram ao mundo como

um presente de Deus para iluminar minha vida,

pensava que tinha a responsabilidade de ensinar-

lhes o caminho correto e eles me surpreenderam

com seu amor incondicional, demonstrando que

recebo muito mais do que posso oferecer.

AMO VOCÊS!!!

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por tudo. Por toda a coragem, luz, determinação e força na

escolha da direção correta a tomar e por dar-me a oportunidade de conhecer tantas

pessoas boas em minha jornada. Agradeço a Ele todas as vitórias e conquistas

alcançadas durante a minha vida.

À Professora Doutora Maria Helena Villas Boas Concone, orientadora e amiga, o

reconhecimento pela disponibilidade e interesse constantes.

Aos idosos e às suas famílias, sujeitos da pesquisa, pela disponibilidade e

generosidade.

Agradeço à minha família, meus pais, minha sogra, minhas irmãs, cunhados e

sobrinhos pelo apoio e pela compreensão do tempo de convívio muitas vezes

sacrificado para realização deste trabalho.

Agradeço especialmente ao Renato e meus filhos Lucas Eduardo, Vitória e João

Vitor que são o maior presente que Deus poderia ter me dado nesta vida. Por toda

felicidade, carinho, compreensão, apoio, incentivo, dedicação encontrada na minha

querida família que sempre farão parte de cada vitória.

Ao Programa de pós Graduação em Ciências sociais da PUC-SP, que proporcionou

momentos de conscientização e reflexão da sociedade em que vivemos e dos fatos

e processos sociais que nos rodeiam.

A todos os professores que colaboraram no processo ensino-aprendizagem, por

todo apoio e a estrutura oferecida para o desenvolvimento de meu estudo.

À amiga e companheira Bernadete, pela disponibilidade, contribuição, apoio e

incentivo.

Às amigas, Roseli, Silvia e Raquel que de alguma forma me motivaram e estiveram

a meu lado durante o estudo.

Aos alunos, por me incentivarem e acreditarem no estudo, à medida que lhes

relatava os passos dados na pesquisa.

Muito obrigado a todos!!!

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EPÍGRAFE

“O valor das coisas não está no tempo que elas

duram, mas na intensidade com que acontecem.

Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas

inexplicáveis e pessoas incomparáveis.”

Fernando Sabino

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RESUMO

A família e o idoso são parte essencial do cuidado de enfermagem, sendo necessário que o profissional se abra para a família para compreender experiências e visões de mundo. Neste estudo de caráter interdisciplinar buscou-se refletir sobre as principais mudanças que envolvem o processo de envelhecimento e a diversidade que o caracteriza, indo ao encontro dos seus significados e das mudanças sociais que rebatem na família como instituição. O estudo teve como objetivos: refletir sobre as modificações pelas quais a família brasileira tem passado e as repercussões dessas mudanças no papel do idoso na família contemporânea; identificar os aspectos culturais, sociais e subjetivos do idoso e seus familiares; conhecer a dinâmica familiar e suas significações para o idoso; compreender como a família do idoso se estrutura, seu desenvolvimento e funcionamento. Com esse foco optou-se por realizar pesquisa qualitativa com pequenos grupos (idosos e seus familiares);o trabalho de campo - observação participativa daqueles pequenos grupos e longas entrevistas – ancorou, em diálogo com a literatura especializada, as interpretações propostas. As famílias escolhidas deviam preencher algum dos seguintes requisitos para o estudo: a família do idoso estar vivenciando modificações no aspecto social (aposentadoria; desemprego, voluntariado, viuvez, dificuldade financeira); a família tendo o idoso como o principal provedor (a renda familiar está centrada na aposentadoria do idoso); o idoso como cuidador dos netos; a família como cuidadora do idoso; idoso vivenciando experiências motivadoras. Todos os envolvidos nesta pesquisa (idosos e familiares) aceitaram a participação. O roteiro de entrevista foi constituído por perguntas abertas (este roteiro foi entendido como um conjunto de provocações para o diálogo e no limite, lembretes, para que fosse possível ter um material passível de comparação). A técnica utilizada para análise possibilitou construir uma multiplicidade de estruturas complexas, sobrepostas ou amarradas umas às outras, que podem ser diferentes, irregulares e que, inicialmente, procurou-se apreender e depois interpretar e apresentar. (GEERTZ, 1989) Na análise de conteúdo recorreu-se também, ao auxílio de um software (QSR internacional Nvivo 9 projeto-Environmental Change Down East), desenvolvido por pesquisadores que trabalham com pesquisa qualitativa na área das ciências sociais. Os papéis familiares no mundo atual modificaram-se dada a complexidade de situações criadas por fatores socioculturais e econômicos que afetaram diretamente a dinâmica familiar. As funções básicas dos idosos na família são variadas, destaca-se a de agente educador, com funções específicas como zelar pelos aspectos religiosos, culturais, econômicos e sociais, sendo papel da família (grupo familiar) cuidar das crianças, idosos e doentes. O conhecimento sobre o papel do idoso na família contemporânea possibilitou mostrar caminhos para a prática profissional. Acreditamos também que os aspectos estudados podem contribuir para uma nova perspectiva teórica e interdisciplinar do objeto e, especialmente, contribuir para a formação de profissionais da área da saúde, ciências sociais e educação. Acreditamos que ao darmos voz aos idosos, provocamos sua própria mudança e conseqüentemente ajudamos na quebra de preconceitos e mitos a seu respeito, viabilizando a abertura de caminhos para o resgate da sua cidadania ativa e a conquista ou manutenção de seu espaço na família e na sociedade Conclui-se que o estudo é uma ferramenta de trabalho para os profissionais que buscam uma melhor compreensão das variáveis que interferem no envelhecimento, família e a comunidade. Palavras chaves: envelhecimento; idoso; família contemporânea.

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ABSTRACT

The family and the elderly are an essential part of nursing care, being necessary for the professional to open themselves to the family to understand experiences and worldviews. This interdisciplinary study was intended to reflect on the major changes that involve the aging process and the diversity that characterizes it, going to their meanings and social changes that reflect in the family as an institution. The study objectives were: reflect on the changes the Brazilian family has gone through and the impact of these changes on the role of the elderly in the contemporary family; identify the cultural, social and subjective aspects of the elderly and their families; meet the family dynamics and their meanings for the elderly; understand how the elderly’s family structures itself, its development and functioning. Focusing on this, we opted for conducting qualitative research with small groups (elderly and their relatives); the fieldwork - participatory observation of those small groups and long interviews – anchored, in dialogue with the specialized literature, the proposed interpretations. The chosen families should meet any of the following requirements for the study: the elderly’s family should be experiencing changes in social aspect (retirement; unemployment, volunteering, widowhood, financial hardship); the elderly in the family as the primary provider (household income is centered on the elderly’s pension); the elderly as caregiver for grandchildren; the family as caregiver for the elderly; the elderly experiencing motivating experiences. Everyone involved in this research (elderly and family) accepted to participate. The questionnaire for the interview was composed of open-ended questions (this was seen as a provocation to the dialogue and within the limits, reminders, so that it was possible to have material for comparison). The technique used for analysis made it possible to build a multiplicity of complex structures, overlapping or tied to each other, which may be different, irregular and that initially should be learnt and then interpreted and presented. (GEERTZ, 1989) Content analysis was also performed with the aid of a software (International QSR Nvivo 9 project-Environmental Change Down East), developed by researchers working with qualitative research in the area of social sciences. The family roles in today's world have changed due to the complexity of situations created by economic and sociocultural factors directly affecting the family dynamics. The basic functions of the elderly in the family are varied, above all others as the educator, with specific functions such as ensuring religious, cultural, economic and social aspects, while the role of the family (family group) is to take care of the children, the elderly and the sick. Knowledge about the role of elderly people in the contemporary family allowed for paths to professional practice. We also believe that the studied aspects can contribute to a new theoretical and interdisciplinary perspective of the object and, especially, contribute to the training of health, social sciences and education professionals. We believe that by giving voice to seniors, we provoke their own change and consequently help in breaking down the prejudices and myths about them, enabling the opening of roads to the rescue of their active citizenship and the achievement or maintenance of their place in the family and in society. It is concluded that the study is a tool for professionals who seek a better understanding of the variables that interfere with aging, family and the community.

Key Words: aging; elderly; contemporary family.

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Dados referentes à extensão territorial, população e densidade demográfica dos distritos da Subprefeitura de Itaquera..................... 41

Tabela 2. Unidades de contexto, de registro, categorias e Subcategorias....... 68

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1. Caracterização dos sujeitos da pesquisa quanto à idade, naturalidade, estado civil, número de filhos, religião, profissão, escolaridade, habitação e renda............................................................ 45

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1. Modelo de Dahlgren e Whitehead........................................................... 36 Figura 2. Mapa da Cidade de São Paulo e da área de abrangência da

Subprefeitura de Itaquera......................................................................... 40 Figura 3. Genograma do sujeito 1 – Girassol ........................................................ 61 Figura 4. Genograma do sujeito 2 – Jasmim......................................................... 61 Figura 5. Genograma do sujeito 3 – Gérbera ....................................................... 62 Figura 6. Genograma do sujeito 4 – Margarida .................................................... 62 Figura 7. Genograma do sujeito 5 – Magnólia....................................................... 63 Figura 8. Genograma do sujeito 6 – Angélica........................................................ 63 Figura 9. Genograma do sujeito 7 – Lótus............................................................. 64 Figura 10. Genograma do sujeito 8 – Prímula.......................................................... 64 Figura 11. Genograma do sujeito 9 – Violeta........................................................... 65 Figura 12. Genograma do sujeito 10 – Cravo.......................................................... 65 Figura 13. Genograma do sujeito 11 – Palma.......................................................... 66 Figura 14. Genograma do sujeito 12 – Frésia.......................................................... 66 Figura 15. Genograma do sujeito 13 – Alfazema..................................................... 67 Figura 16. Representação gráfica das categorias e subcategorias utilizadas

para análise................................................................................................ 70

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................................

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CAPÍTULO I 17 1. ENVELHECIMENTO E FAMÍLIA ........................................................................ 18

1.1. Refletindo sobre Envelhecimento e Família ........................................... 18 1.2. Políticas públicas e envelhecimento ........................................................ 21 1.3. Antropologia e família .................................................................................. 23 1.4. Tipos de famílias ........................................................................................... 25 1.5. Funções da família ........................................................................................ 26 1.6. Sistema de parentesco ................................................................................ 28 1.7. Família como sistema .................................................................................. 31 1.8. Família brasileira ........................................................................................... 32 1.9. Famílias, redes sociais e comunidade ..................................................... 34

CAPÍTULO II 37 2. O PAPEL DO IDOSO NA FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA: Caminho do

Pensamento: Objetivos, Sujeitos, Procedimentos de Coleta ........................... 38 2.1. Aspectos da metodologia ............................................................................ 38 2.1.1. Local da pesquisa ....................................................................................... 39

2.1.2. Os sujeitos da pesquisa ............................................................................. 42

CAPÍTULO III 53 3. O PAPEL DO IDOSO NA FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA .............................. 54

3.1. Análise e interpretação dos dados ........................................................... 54 3.2. Envelhecimento: Significado de ser idoso ............................................. 71 3.3. Significado de Família: cuidado, laços, afetividade e religião............ 80 3.4. Função na família: papel que exerce na família .................................... 93 3.5. Experiências motivadoras e qualidade de vida ..................................... 100 3.6. À Guisa da Conclusão .................................................................................. 103

CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................... 109

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REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 113

APÊNDICES................................................................................................................. 118

Apêndice A. Roteiro de entrevista ............................................................................ 119

Apêndice B.Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.................................... 121

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INTRODUÇÃO

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O interesse por este estudo emergiu de uma pesquisa realizada durante o

mestrado que tomou a minha prática como enfermeira de família e responsável

técnica pelo grupo de idosos vinculados a uma instituição de ensino superior. No

mestrado, o objetivo da pesquisa foi conhecer os aspectos subjetivos do homem

(gênero) idoso hipertenso e a não adesão à terapêutica anti-hipertensiva. Durante o

desenvolvimento do estudo, pude perceber a importância e a relevância da família

na vida dos sujeitos entrevistados e como os idosos lutam para manter-la, mesmo

com uma sobrecarga de responsabilidades e diante das exigências da sociedade

contemporânea sobre ele. A valorização afetiva e sociocultural da família permanece

de maneira nítida no consciente ou no subconsciente da grande maioria dos idosos.

A família e o idoso fazem parte essencial do cuidado de enfermagem, sendo

necessário que eu me abra para a família para compreender experiências e visões

de mundo. A partir dessas indagações, o estudo atual tem como finalidade saber o

que as famílias fazem pelos seus membros e pelo grupo total. Almeja-se obter uma

imagem clara a respeito dessas funções, na tentativa de compreender por que a

qualidade de membro de tais unidades pode apresentar tantas variações.

Neste estudo buscou-se refletir sobre dois pontos: principais mudanças

sociais que ocorrem no processo de envelhecimento, dimensionando seus impactos

na diversidade que o caracteriza indo ao encontro dos seus significados e das

mudanças sociais que rebatem na família como instituição.

O tema do envelhecimento e da velhice tem sido discutido desde a

antiguidade clássica (pelo menos) em obras filosóficas, obras literárias, mas

recentemente, o tema se tornou objeto de reflexão sistemática e.científica.

Consolida-se uma nova temática de estudo que escapa do nicho médico e da saúde

em geral para invadir o campo das ciências humanas e sociais.

Com essa perspectiva este estudo se faz importante em função da urgência

de inserir o tema na área das ciências sociais afim de ampliar nosso quadro de

referência e de discussão. Nosso recorte específico é das relações entre o idoso e

sua família.

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Apresento a seguir os capítulos que norteiam as reflexões sobre

envelhecimento, família e os caminhos percorridos para que os objetivos do trabalho

fossem atingidos.

Inicialmente desenvolvi um capítulo de natureza conceitual. Nele realizei uma

revisão da literatura e das pesquisas realizadas sobre o tema. Caracterizei o papel

dos idosos na família por meio de um resgate histórico.

Os estudos do envelhecimento e família começaram nas áreas da Psicologia,

Sociologia, Serviço Social e Ciências Sociais. Posteriormente; surgiram trabalhos

nas áreas de Educação, Comunicações e Direito. Nota-se o interesse pelo assunto

envelhecimento e família, em diversos domínios disciplinares, revelando diferentes

faces do envelhecimento. Percebe-se ao mesmo tempo uma expansão nos temas

abordados e talvez uma pequena mudança de direção. Os estudos sobre família

como instituição social evidenciam que essa instituição está vivenciando

transformações. Dentre as novas formas de organização familiar, multiplicam-se

aquela que se caracteriza pela presença da mulher e sua prole, isto é, famílias

chefiadas por mulheres.

Logo a seguir, traço o “Caminho do Pensamento” para alcançar na prática a

abordagem da realidade. A pesquisa foi um estudo qualitativo por responder a

questões particulares que não podem ser quantificadas. Qualitativa por trabalhar

com significados, crenças, valores, num espaço mais profundo das relações

humanas. A técnica empregada proporcionou a possibilidade de se obter melhor

compreensão do grupo denominado “família”. O estudo foi uma pesquisa

interpretativa, à procura do significado.

Nesse sentido, exponho o caminho metodológico utilizado nesta investigação,

principalmente no que diz respeito aos procedimentos adotados desde a entrada no

campo até a análise dos dados. O processo analítico começou durante a fase da

coleta de dados, permitindo conferir-los e interpretar-los continuamente apoiando o

desenvolvimento e norteando as coletas adicionais.. Esse processo de análise nos

possibilitou voltar e refinar questões e buscar vias emergentes de indagação em

maior profundidade. Neste capítulo faço ainda uma descrição dos sujeitos, além de

caracteriza a estrutura das suas famílias.

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No capítulo seguinte, apresento os grandes temas derivados da análise de

dados, quais sejam:

- Significado de família na perspectiva do idoso;

- Envelhecimento

- Papel do idoso na família;

- Experiências motivadoras e qualidade de vida.

Cada um desses temas, por si só, comportaria um capítulo a parte, devido à

multiplicidade de aspectos que os envolve, mas, considerando a íntima relação que

existe entre os mesmos, optei por reuni-los.

Procurei refletir sobre as análises produzidas no curso do estudo e sobre o

contato direto que tive com os idosos e suas famílias, durante a pesquisa de campo.

Resgatei não só o que foi relatado em suas falas, como também tudo o que pude

captar ao longo das observações e da comunicação não verbal.

Assim, nas considerações finais, sistematizo os resultados, procurando

contribuir para as Ciências Sociais. Isso significa trazer proposições capazes de

proporcionar nova perspectiva teórica ao objeto estudado. O estudo levantou novas

questões a serem consideradas no futuro e para a discussão de novas políticas

públicas para o envelhecimento e família, e capacitação de profissionais da saúde

com um olhar diferenciado para o idoso e para família.

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CAPÍTULO I

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1. ENVELHECIMENTO E FAMÍLIA

1.1. Refletindo sobre Envelhecimento e Família

Neste momento do estudo procuro realizar considerações epidemiológicas e

demográficas sobre o envelhecimento da população; assim como as alternativas que

se propõem as políticas públicas frente ao envelhecimento e a família.

O envelhecimento populacional é um fato mundial. Mesmo em países em

desenvolvimento como o Brasil, o ritmo desse processo nas próximas décadas será

acelerado. São vários os fatores que contribuíram para o envelhecimento da

população. Entre eles, podemos destacar o controle das doenças

infectocontagiosas, o controle da natalidade, diminuindo a base da pirâmide

populacional, o saneamento básico e os avanços tecnológicos.

O Brasil teve avanços, tanto na área médica como na social, mas mostra às

deficiências graves em setores relacionados à proteção social do idoso como a

Saúde Pública e a Seguridade Social. O crescimento da população idosa traz

consequências para a família, a comunidade e o Estado. A falta de apoio formal, na

verdade, faz com que uma parcela significativa dos idosos, nas regiões menos

desenvolvidas, dependa do apoio dispensado quase que exclusivamente pela

própria família.

Juntamente com o crescimento da população idosa, ocorreram modificações

sociais importantes que afetam a capacidade da família em prestar apoio a seus

membros idosos. Dentro das funções da família, o papel da mulher sempre esteve

ligado aos cuidados da casa, dos filhos, dos doentes e dos idosos. Com a inserção

da mulher no mercado do trabalho, a família perdeu a capacidade de prestar apoio

aos seus membros idosos. Outro fator importante é a queda da fecundidade que

representa uma redução sensível da rede potencial de apoio para as futuras

gerações. (ROUQUAYROL, 2003)

No Brasil, a falta de uma política de cuidado institucional faz com que esse

cuidado venha recaindo sobre as famílias, o que resulta em corresidência. Quanto

maior for a idade dos idosos, maior probabilidade de acontecer a corresidência.

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Os estudos têm mostrado que a corresidência não se dá apenas por

necessidades dos idosos. Muitas vezes, ela acontece devido à baixa renda da

população mais jovem. Os jovens estão permanecendo dependentes

economicamente de seus pais, devido à instabilidade do mercado de trabalho, ao

maior número de anos passados na escola e à instabilidade das suas relações

afetivas.

O estudo realizado pelo projeto SABE (Saúde, Bem Estar e Envelhecimento)

mostra que os idosos que residem na Cidade de São Paulo contam com uma rede

de apoio importante e significativa, constatada pela quantidade expressiva de filhos

vivos e pessoas corresidentes, formando uma rede de apoio à população idosa.

A pesquisa ainda põe em relevo que mais da metade dos idosos reside em

domicílios com três ou mais moradores, sendo que aproximadamente um quinto dos

casos refere-se a domicílios com cinco ou mais moradores. Em relação aos filhos,

mais da metade da população idosa possui três ou mais filhos vivos e um quarto

possui cinco ou mais filhos. A proporção dos que moram só é quase duas vezes e

meia maior entre as mulheres comparativamente aos homens. Em relação ao estado

conjugal, a proporção é maior de idosos que moram sós entre os solteiros,

comparativamente aos viúvos, separados e divorciados, e a proporção é

significativamente menor dos que moram com os filhos entre os idosos separados e

divorciados, comparativamente aos viúvos. (LEBRÃO e DUARTE, 2003)

A partir dos anos 50, os Estados Unidos e vários países na Europa, como a

Inglaterra, França e a Alemanha, começaram a vivenciar o processo de transição

demográfica, com o aumento da população idosa e um declínio da taxa de

natalidade, despertando assim o interesse dos pesquisadores.

A sociedade começou a se preocupar em encontrar soluções para os

problemas individuais e coletivos que sugiram com o aumento da população idosa.

Tal aumento, como dissemos, gerou uma crescente pressão nas instituições sociais,

fazendo com que os estudiosos pesquisassem soluções para os problemas sociais e

individuais dos idosos.

As pesquisas em geral abordam duas visões opostas: a velhice como período

de perdas e a velhice bem sucedida como conquista e responsabilidade individual.

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(NERI, 2007). A produção científica mais recente passou a se mover em direção à

busca do potencial de desenvolvimento na velhice, na perspectiva de otimização das

capacidades latentes nessa fase da vida, com menos ênfase nas perdas.

Por outro lado, não há como negar que os idosos que necessitam de ajuda

nas suas tarefas de vida diária, contam com apoio da família, quase sempre

fornecido pelas filhas. No caso de casais idosos, normalmente é a esposa que

realiza os cuidados, embora com frequência, ela também esteja vivenciando o

processo de envelhecimento. (YAZAKI e RAMOS, 1991)

Tendo em vista que as políticas públicas praticamente eximem o Estado de

obrigações sociais com seus idosos uma vez que há programas pontuais e locais

que não correspondem a uma demanda geral, as famílias assumem cada vez mais o

cuidado com esses familiares, desempenhando novos papéis ou re-encenando

antigos e surgindo novos arranjos familiares.

Em todas as sociedades humanas, o primeiro grupo de socialização é a

família, entretanto, ela diferencia-se em sua composição, tamanho e estrutura, de

acordo com a cultura, assim com o papel que ela exerce sobre a vida de seus

membros. (HELMAN, 2003)

Vivenciar a velhice pode ter significados diferenciados, da plenitude à

decadência, da gratidão ao abandono, com a presença de disparidades sociais e

regionais como as que caracterizam o Brasil contemporâneo.

No âmbito das relações familiares, observa-se a mudança de papéis, com a

aposentadoria, viuvez, casamento dos filhos. São mudanças representadas como

esperadas “normais” na vida de um grupo. No imaginário cultural, os idosos mudam

as funções e atividades de vida progressivamente. Nesse processo, os idosos

deveriam criar novos significados para o próprio envelhecimento e encontrar seu

“novo nicho’ no grupo. O papel idealizado por excelência é de avós. Esse nicho seria

o nicho feliz e “normal”.

A mudança na estrutura familiar à qual nos referimos antes se associa a vida

urbana que cria novos modos de morar. Tudo isso tem como influência novos

arranjos familiares, trocas de parceiro, celibato e casamentos tardios, menor número

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de filhos ou nenhum filho, busca de carreira profissional pelas mulheres e não

apenas pelos homens, vida em apartamento dificultando acolhimento de mais

moradores que os ajudantes. Claro que nas novas condições o papel de avós

dedicado fica bastante reduzido a locais segmentos específicos. Não obstante as

mudanças o imaginário nacional continua a priorizar a família como lugar de afeto,

amor incondicional, proteção e segurança.

Quanto o envelhecimento em si podemos dizer é um processo natural e

fisiológico, universal, heterogêneo, influenciado por aspectos biológicos,

socioculturais, políticos, econômicos e subjetivos do indivíduo.

A própria definição de envelhecimento é complexa e não está ligada apenas

às questões cronológicas, alterações fisiológicas, declínio normal, progressivo e

dificuldades funcionais; é um processo natural, as pessoas podem manter-se

saudáveis e atuantes. É fundamental que o idoso mantenha sua capacidade

funcional e o interesse em conservar os mesmos níveis de atividade dos estágios

anteriores da vida adulta.

1.2. Políticas públicas e envelhecimento

O aumento significativo da população idosa traz para a saúde pública

questões importantes e um espaço na agenda política de assistência que englobe

todos os setores da sociedade brasileira. Em 2000, a população com 60 anos ou

mais passou de 14 milhões e atingirá 30 milhões em 2035, colocando o Brasil entre

as dez maiores populações de idosos do mundo. O aumento da população idosa

resulta em uma crescente atenção à saúde, pois temos um precário sistema de

atenção, dificuldades econômicas estruturais, peculiaridade da situação

demográfico-epidemiológica brasileira, as doenças infectocontagiosas ainda não

erradicadas e as doenças crônicas degenerativas. Diante desse quadro, fazem-se

necessárias políticas de saúde e ações intersetoriais e integradas de políticas

públicas que abordem os vários determinantes do processo de envelhecimento,

desfazendo o preconceito de que investimentos com a população idosa causam

prejuízos para os mais jovens. (ROUQUAYROL, 2003)

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A Conferência Internacional de Promoção da Saúde da Organização Mundial

da Saúde (OMS) realizada em 1986 em Ottawa, no Canadá, foi um importante

marco de referência da Promoção da Saúde. Firmaram-se as bases doutrinárias da

Promoção à Saúde que deram origem às ações fundamentais do documento. Essa

conferência constituiu-se na ferramenta que tornou possível concretizar as ações de

Promoção da Saúde. As áreas estratégicas contemplam: Políticas públicas, criação

de ambientes físicos, sociais, econômicos, políticos e culturais, ação comunitária,

desenvolvimento de novos estilos de vida e reorientação dos serviços de saúde.

(BRASIL, 1999)

A OMS e a Organização Pan-Americana da Saúde – OPAS (1990)

estabelecem que a Promoção à Saúde seja concebida, cada vez mais, como “a

soma das ações da população, dos serviços de saúde, das autoridades sanitárias e

outros setores sociais e produtivos, voltados para o desenvolvimento de melhores

condições de saúde individual e coletiva”. O eixo do processo gira em torno de: ação

intersetorial, para alcance de políticas públicas saudáveis, além das políticas de

saúde pública; incentivo da melhoria da qualidade de vida (por meio de

conhecimento sobre saúde pelo próprio indivíduo), controle da sua própria saúde e

seu ambiente; fortalecimento da participação popular. (BRASIL, 1999)

O enfoque de Promoção da Saúde dos idosos traz como princípios e

objetivos: promover uma velhice saudável, na visão de que velhice não é doença;

manter a capacidade funcional, prevenir agravos à saúde, manter e recuperar a

saúde, manter um bom funcionamento físico, mental e social, realizar a prevenção

de enfermidades e incapacidades.

Os objetivos da Política Nacional dos Idosos (PNI) são: “promover o

envelhecimento saudável, manter e melhorar a capacidade funcional dos idosos,

prevenir as doenças, recuperar a saúde e reabilitar a capacidade funcional”. Para

atingir esses objetivos, foram definidas como diretrizes essenciais, segundo o PNI:

promoção do envelhecimento saudável; manutenção da capacidade funcional,

assistência às necessidades de saúde do idoso; reabilitação da capacidade

funcional comprometida; capacitação de recursos especializados, apoio ao

desenvolvimento de cuidados informais e apoio aos estudos e pesquisas. (BRASIL,

1999)

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A finalidade do PNI é manter o idoso na comunidade, junto à família, de

forma digna e o mais confortável possível. A promoção da saúde não deve estar

pautada somente na prevenção das doenças, mas em uma qualidade satisfatória de

vida e bem-estar.

1.3. Antropologia, família e envelhecimento

O diálogo entre antropologia, família e envelhecimento se faz necessário,

pois são temas estudados por diversas áreas e prerrogativa indispensável para o

nosso estudo. Neste e nos próximos itens vou apresentar um resumo de vários

modos de abordagem da família. A partir de perspectivas disciplinares ou

pluridisciplinares diversas iniciamos com a Antropologia, lançamos mão de várias

referências para esta apresentação. A abordagem pioneira foi de Levi Morgan,

antropólogo norte americano em meados do século XIX mostra que a família, as

normas de descendência e de mudanças entre os Iroqueses era diferente daquela

da sociedade ocidental. A descoberta causou verdadeiro escândalo dado à nação

etnocêntrica de família.

O termo família é comum, ligado à experiência cotidiana, contudo, definir o

que é família não foi considerado fácil para os estudiosos, como Levi Strauss. Os

estudos sobre família entre os diversos povos suscitaram polêmica em toda história

do pensamento científico.

Os estudos sobre a família nasceram no século XIX, quando os antropólogos

e sociólogos observaram a importância do parentesco nas sociedades. A

historiografia passou a ver a família como objeto de reflexão, com ênfase nos

estudos genealógicos das famílias ricas, pesquisando a tradição, patrimônio,

herança, poderes econômicos e políticos decorrentes de alianças matrimoniais dos

poderosos.

Já no século XX, a partir da década de sessenta, ocorreu uma mudança

epistemológica que marcou a historiografia da família, as pesquisas com famílias

desprovidas de recursos financeiros tiveram um maior enfoque, revelando a vida do

homem comum.

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Apesar de todas as diversidades, todos os sistemas sociais incluem o que

denominamos de família. Todas as sociedades reconhecem a existência de certas

unidades cooperativas que, organizadas, ocupam um lugar entre o indivíduo e a

sociedade total da qual ele faz parte. Sendo assim, uma pessoa é atribuída membro

de uma dessas unidades, numa base de parentesco biológico. Na realidade, a

qualidade de membro pode também ser atribuída por meio de relações reconhecidas

como paternidade presuntiva ou adoção. Essas unidades possuem funções

específicas, tanto em relação a seus membros quanto à sociedade total. Dentro da

unidade, cada membro tem direito e obrigações específicas em relação aos outros

membros. Na família ideal, existe uma interação íntima e contínua entre os

membros: ligado por laços de afetividade, interesses comuns, mas também de

disputas. (MARCONI e PRESOTTO, 2008)

As funções dessas unidades são muito mais importantes do que as pessoas

que as compõem. A normatização da relação sexual é uma das funções da família,

mas essa função segue padrões culturalmente definidos. Toda sociedade atribui

certas funções a suas unidades familiares.

A família no mundo ocidental europeu, a partir do mercantilismo, perdeu

suas funções públicas e passou a ter funções privadas. Anteriormente, o espaço

público era vivido como extensão da casa e, posteriormente, uma segmentação e

compartimentalização das relações em uma “privatização” da família e em um

contexto de uma “sociedade individualizada”. (MARCONI e PRESOTTO, 2008)

Na segunda metade do século XIX e início do século XX, o modelo

prevalente de explicação na antropologia por evolucionismo. A principal idéia era de

ordenar a diversidade de modo que coincidem as instituições de povos não

europeus com as primeiras etapas da evolução da humanidade, enquanto as outras

instituições que corresponderiam às etapas mais avançadas da evolução. O

matrimônio monogâmico era considerado na perspectiva evolucionista que

prevaleceu na antropologia do século XIX uma forma de organização avançada

quando comparada às sociedades primitivas. A ruptura com essa perspectiva foi se

construindo do final do século XIX e no decorrer do século XX.

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Em todas as sociedades humanas, encontra-se uma forma de organização. A

família é na maioria das vezes o fundamento das sociedades. Esses agrupamentos

humanos podem variar conforme sua estrutura, desenvolvimento e funcionamento.

A família é instituição cultural e como tal apresenta numerosos modelos.

Como todos os fenômenos do gênero passam por mudanças. Tomando o exemplo

latino tal como visto o processo de mudança desenrolou até a regulamentação de

suas bases conjugais conforme leis contratuais, normas religiosas e morais. Nas

línguas latinas ou de influência latina o uso do termo família remete a “fâmulus”

(escravo doméstico), uma expressão romana que definia um novo organismo social

surgido entre as tribos latinas depois da adoção da agricultura e da escravidão legal.

Esse modelo de família contava com o chefe que mantinha sua autoridade a mulher,

os filhos e certo número de escravos, com poder de vida e morte sobre eles. Esse

poder é conhecido como “paterpotestas”. (HELMAN, 2003)

A variabilidade cultural e histórica da instituição família desafia qualquer

conceito geral a esse respeito. A generalização do termo “família”, para designar

instituições e grupos historicamente tão variáveis, termina por ocultar as suas

diferenças que se expressam nas relações entre reprodução e as demais esferas

sociais. (CARVALHO, 2003)

Colocando o foco mais próximo vemos que existem vários conceitos de

família, mas na maioria das definições existe certa coesão entre os autores. A

definição, conforme a Constituição Brasileira é “família como união estável entre o

homem e a mulher e a união formada por qualquer um dos pais e seus

descendentes”.

1.4. Tipos de famílias

As famílias podem ser classificadas de acordo com sua organização e

estrutura e são como déssemos variáveis no tempo e espaço. De modo geral, numa

definição sociológica pode ser apontadas em quatro formações:

Família elementar ou nuclear: é uma unidade formada por homem, sua

esposa e seus filhos, que vivem juntos em uma união reconhecida pelos membros

de uma sociedade. Quando a relação não é formal, recebe o nome de concubinato.

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A família nuclear é a base social, onde se originam as relações primárias de

parentesco. A família elementar vai diminuindo, quando seus filhos casam e formam

uma nova família nuclear, ou pode desaparecer com a morte dos pais.

Família extensa: é uma unidade formada de duas ou mais famílias nucleares,

ligadas por laços consanguíneos, por um dos lados (esposa ou cônjuge) ou ambos,

e ainda, duas ou mais gerações. Nesse tipo de família, além do grau de parentesco,

dos laços consanguíneos, existem deveres e direitos mútuos reconhecidos que

fortalecem a união. A família extensa pode ser formada por avós, tios, sobrinhos.

Família composta: também conhecida com família complexa ou conjunta,

formada por três ou mais cônjuges e seus filhos. A família complexa é formada por

um núcleo de família separada, mas ligadas pela relação com um pai comum.

Família conjugada fraterna: uma família formada de dois ou mais irmãos,

suas respectivas esposas e filhos.

Família fantasma: é formada por uma mulher casada e seus filhos e o

fantasma. Nesse tipo de família, o pai não desempenha a função de pai, mas

apenas de genitor, sendo a função do pai desenvolvida pelo irmão mais velho da

mulher.

1.5. Funções da família

A família é um sistema ativo em constante mudança, ou seja, complexo, que

se altera com o passar do tempo para assegurar a continuidade como sistema. Esse

processo assegura a continuidade e crescimento que permitem o desenvolvimento

da família como uma unidade, ao mesmo tempo em que assegura sua diferenciação

de seus membros. Apesar de as funções da família passarem por várias alterações

durante os séculos, os estudiosos apontam quatro funções básicas e quatro

subsidiárias. (CERVENY e BERTHOUD, 2002)

As funções básicas, também denominadas de fundamentais, são

encontradas em todos os agrupamentos. Entre elas encontramos a sexual, que

atende às necessidades permitidas por meio da união ou casamento. A segunda

função é a reprodução, que visa à perpetuação por meio dos filhos. Mesmo em

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algumas sociedades onde há liberdade sexual, as procriações dos filhos legitimam a

reprodução. A terceira função da família é a econômica, assegura o sustento e a

proteção dos membros, esses cuidados podem ser desempenhados na própria

família nuclear, mas também pelos familiares com laços consanguíneos. A função

educação, do cuidado com os filhos, é reconhecida como função universal da

família. As funções subsidiárias são incluídas nas funções relacionadas aos

aspectos religiosos, jurídico, político e recreativo, necessários à formação do

indivíduo. (MARCONI e PRESOTTO, 2008)

Antropologicamente proteção da prole, criação dos imaturos é a função

fundamental.

Existem duas formas de relações entre os sexos: o casamento e a união.

União é o ajuntamento de pessoas de sexo oposto sob a influência do impulso

sexual. O matrimônio ou o casamento é o modo pelo qual a sociedade estabelece as

normas para relação entre os sexos. No matrimônio, os filhos nascidos desse tipo de

contrato são legítimos de ambos os pais. A partir do matrimônio, o casal forma uma

nova família elementar diferente daquela em que ele nasceu. De modo que em cada

sociedade, um adulto geralmente pertence a duas famílias nucleares: aquela onde

nasceu e da que constituiu. Os antropólogos chamam a primeira de “família de

origem”. O casamento proporciona novas relações sociais e direitos entre os

cônjuges e entre cada um deles e os parentes do outro. Estabelece os direitos dos

filhos. (CERVENY e BERTHOUD, 2002) Esta abordagem apesar de recente já

mostra necessidade de revisão. União e mesmo casamento já assumem formas

diversas entre nós.

Na antropologia não diríamos “parentesco real” porque o parentesco é uma

construção sócio-cultural. Depende da definição cultural de cada grupo, Levi Strauss

diz que o tabu do incesto é universal como as coisas de natureza e variável como as

coisas da cultura. Isto é a proibição forte, o tabu varia. As relações não são

consideradas simplesmente de parentesco. Nem toda proibição é em virtude do

parentesco.

Culturalmente as formas de união consideradas legítimas variam. Entre nós,

a forma legal é a monogâmica (alguns autores apontam uma “poligamia disfarçada”

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quando homens constituem várias famílias ou sustentam mais de uma mulher; o

inverso é entre nós, menos referido), mas estas são uniões não legais. As uniões

consensuais no Brasil incluem hoje, de modo mais visível uniões homossexuais e, o

reconhecimento legal de tais uniões, tem gerado polêmica, embora já haja casos

legitimados, bem como o reconhecimento de adoções por casais chamados homo

afetivos.

O divórcio ou dissolução aparecem como uma forma legal de desfazer o

casamento ou união. Durante muitos anos no Brasil, só se reconhecia o “desquite”

(separação legal) que não dava direito a contrair um novo casamento.

1.6. Sistema de parentesco

As mudanças rápidas nos arranjos familiares e nas formas de casamento e

de moradia mostram que a atribuição, de responsabilidade à família (genericamente

entendida) deve ser pensada com a devida percepção da variedade e da

impermanência.

No século XIX, antropólogos, estudando várias populações, mostraram

maneiras diferentes de classificação do parentesco, surgindo o conceito de sistema

de parentesco. Vários estudiosos dedicaram seus estudos ao sistema de

parentesco. Segundo alguns estudiosos, o sistema de parentesco consiste em um

sistema estrutural de relações uma rede, no qual as pessoas consideram-se unidas

por um complexo de relações, reconhecidas socialmente como de laços biológicos,

ou de “sangue” e de afinidade. Tal rede segundo a cultura de um povo define

lugares, funções e tratamento (nomenclatura) de cada membro em relação aos

demais. (MARCONI e PRESOTTO, 2008)

Os modos de classificação de parentes não obedeceu a um código universal,

podendo variar. Em muitos sistemas, a posição genealógica é marcada pelo genitor,

pelo “pai”. É equacionada classificatoriamente a outras posições genealógicas, de

modo que, por meio de um mesmo termo, cobrem-se as posições genealógicas ‘pai”

e “irmão do pai”. Para realizar uma análise de parentesco, inicialmente deve-se

considerar a família e observar os tipos de relações. As relações nesse contexto

podem ser classificadas de acordo com a afinidade (marital ou legal),

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consanguinidade (biológico), “fictícios” ou “pseudoparentes” (adotivos).

(DAMATTA,2000)

O homem pode ter papel de marido, esposa, pai, mãe, filho, filha, irmão, irmã

em uma família, estabelecendo desse modo as relações definidas culturalmente e

socialmente esperadas. O princípio do sistema de parentesco consiste no fato de

uma pessoa pertencer, ao mesmo tempo, a duas famílias nucleares. Pertencendo a

duas famílias nucleares, estabelece um vínculo entre os membros de ambas. A

ramificação desses vínculos vai unindo um grupo de indivíduos a outros, por meio

dos laços de parentesco, fazendo com que cada família tenha seu próprio de

conjunto parentes. Entre os tipos de parentes, encontramos o primário, secundário e

o terciário. O primário é formado por indivíduos que pertencem à mesma família

nuclear (pai, mãe e irmãos do Ego1

Os antropólogos utilizam o diagrama de laços de parentesco para facilitar a

compreensão e possibilitar uma visão clara e objetiva do modo como os diferentes

status estão relacionados em referência à consanguinidade ou afinidade. Por meio

dos laços de parentesco, é possível classificar os tipos de parentes. Para realizar o

diagrama, devemos ter como ponto de partida o Ego. As relações, em várias

sociedades, podem ter denotações ou significados diferentes. O irmão do pai pode

ser considerado um parente diferente do irmão da mãe ou o irmão do pai pode

entrar na mesma categoria do irmão mais velho. A sociedade ocidental classifica os

irmãos do pai como sendo tios de Ego. Em algumas culturas, o irmão do pai

assumirá o papel do pai e padrasto, casando-se com a viúva. Para realizar o

diagrama, é necessário verificar alguns fatores como: sexo e geração, afinidade e

consanguinidade. Na confecção do diagrama de laços de parentesco, são utilizados

símbolos. O triângulo é usado para o sexo masculino e o círculo para o sexo

feminino; um traço horizontal indica a consanguinidade e dois traços paralelos,

afinidade. A posição pais acima e filhos abaixo determina geração. Para realizar a

análise do sistema de parentesco, deve-se ter como ponto de referência o símbolo

) família de orientação e família de procriação

(marido, esposa e filhos). Secundário, partindo do Ego, consiste nos avós e tios.

Terciário, tendo o Ego como referência, seria o bisavô, esposa dos tios e outros

parentes. (MARCONI e PRESOTTO, 2008)

1 Ego é um indivíduo adulto do sexo masculino ou feminino solteiro, que será considerado o ponto de partida para a classificação no diagrama de laços de parentesco.

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Ego, ou seja, um triângulo escurecido. (O ego feminino é representado com um

triângulo escurecido acompanhado pela letra f e ego masculino representado com

um triângulo escurecido acompanhado pela letra m). O diagrama de parentesco não

deve ser grande e podem ser utilizadas abreviaturas em português. Nesse caso,

utilizam-se letras maiúsculas para o sexo masculino e letras minúsculas para o sexo

feminino. Por meio da utilização na terminologia, os antropólogos podem verificar o

comportamento dos indivíduos e descobrir a estrutura social de determinado grupo.

(MARCONI e PRESOTTO, 2008) A terminologia é importante também para a análise

semântica.

Os termos de parentesco podem ser divididos em:

• Critérios de uso vocativo e referência;

• Critérios linguísticos: elementar, derivativo e descritivo;

• Critérios de identificação: geração; sexo; afinidade2; colateralidade3,

bifurcação4

• Derivados: idade relativa; sexo de quem fala e descendência.

e polaridade.

Os termos de parentesco no critério de uso dependem de o Ego estar falando

com ou sobre seus parentes. Ser vocativo fala diretamente com a pessoa e ser for

referência, refere-se a uma terceira. No critério linguístico elementar, usa-se um

termo irredutível, que não pode ser analisado em seus componentes léxicos. Já no

critério linguístico, na categoria derivado, aparecem os termos: um elementar e um

léxico, embora, primariamente, não possam ter significado de parentesco. Na

categoria descritiva, há combinação de dois ou mais termos elementares, indicando

uma relação específica.

Em relação ao sistema de parentesco, teoricamente, existe um grande

número de sistemas. As sociedades, em geral, classificam seus parentes de forma

2 Afinidade é diferença entre parentes consanguíneos e os ligados pelo matrimônio, que ampliam a rede de parentesco. 3Colateralidade é a diferença entre o relacionamento linear e o colateral. Na geração de Ego, alguns parentes são mais relacionados que outros e todos os colaterais são os primos. 4Bifurcação é a diferença do sexo da pessoa por meio da qual se estabelece o relacionamento. O termo é utilizado somente para se referir a parentes secundários remotos.

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semelhante. Em todos os tipos de sistema de parentesco, devem-se seguir dois

critérios: primeiramente a geração dos pais; segundo, geração do Ego, de acordo

com a fusão ou bifurcação do parentesco linear ou colateral. (MARCONI e

PRESOTTO, 2008)

A análise e a interpretação de parentesco permitem ao antropólogo o

estabelecimento de correlações entre os sistemas de parentesco e outras formas de

comportamento (religiosa, política, educacional, econômica, cultural). A análise

sociológica do parentesco torna visível um plano básico do domínio humano,

permitindo saber que as formas de organização da família variavam e nenhuma

podia ser tomada como referencial e absoluta, e ficava claro que os sistemas de

termos de designação de parentes, embora fossem variados, formavam sistemas

coerentes.

O estudo do parentesco permite uma avaliação das diferenciações entre

infraestrutura biológica universal e uma superestrutura verbal, que a partir da base,

recriam o conjunto no plano social e ideológico. Embora toda família seja constituída

de marido, mulher, filhos, nem toda organização familiar classifica seus membros do

mesmo modo, atribuindo um mesmo conteúdo às suas relações sociais mais

básicas.

Estas são as possibilidades abertas, que quis delinear, possibilidades que

exploradas por especialistas podem revelar aspectos difíceis de perceber por outros

meios.

1.7. Família como sistema

No século XX, no campo das ciências em geral, e no das ciências humanas

em particular, foi o advento do denominado “pensamento circular ou sistêmico”, que

veio se contrapor ao chamado “pensamento linear”, até então hegemônico como

balizador da aquisição do conhecimento humano. Na década de 20, Von Bertalanffy

elaborou a teoria geral dos sistemas. Após a teoria psicanalítica e a teoria

behaviorista, a teoria geral dos sistemas é considerada uma grande contribuição à

busca de uma teoria unificada do comportamento humano. (OSÓRIO, 2004)

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A teoria geral dos sistemas amplia seu espaço nas ciências humanas, os

acontecimentos são explicados, não de forma causal ou ações individuais, mas sim

em virtude da ação de sistemas socioculturais em interação, o grupo em detrimento

do indivíduo.

A cibernética passa a compor a teoria dos sistemas, colocando cada coisa

dentro de um contexto e estabelecendo a natureza de suas relações. A família vista

agora como, um sistema psicossocial, é uma união de seres humanos com atributos

que interagem e cujas relações mantêm a condição do sistema. No caso da

abordagem de famílias, a teoria sistêmica possibilita implementar uma prática por

meio de ferramentas conceituais que dêem oportunidade para que à família possa

criar suas próprias possibilidades. (WRIGHT e LEAHEY , 2008)

O Modelo Calgary de Avaliação da Família (MCAF) é uma estrutura

multidimensional que enseja uma avaliação estrutural, de desenvolvimento e

funcional da família. Esse modelo baseia-se em um fundamento teórico que envolve

sistemas, cibernética, comunicação e mudança. Um sistema familiar compõe uma

parte de um suprassistema mais amplo e, por sua vez, é composto de muitos

subsistemas. Uma família é formada de muitos subsistemas, como pais, filhos,

cônjuge, irmãos. Esses também são compostos por outros subsistemas. Os

indivíduos estão envolvidos por sistemas biológicos, físicos, culturais, sociais e

psicológicos. Wright e Leahey (2008) referem que “é apropriado visualizar um

sistema, desenhado em um grande circulo está o contexto maior, onde todos os

fatores impingidos sobre o sistema podem ser colocados”. O modelo permite

desenhar um círculo para visualizar uma família e em seguida situar dentro dele

seus membros familiares individuais.

Ao trabalhar com familiares, é indicado considerar as pessoas que fazem

parte desse sistema familiar; os subsistemas importantes e a quais suprassistemas

significativos a família pertence.

1.8. Família brasileira

No Brasil, desde o início colonial, com o estabelecimento de uma estrutura

econômica de base agrária, latifundiária, escravocrata, com descentralização

administrativa, excessiva concentração fundiária e acentuada dispersão

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populacional, deu-se a instalação de uma sociedade do tipo paternalista. Na família

patriarcal, as relações de caráter pessoal assumiram grande importância, sendo

consideradas vitais. A base do relacionamento estimula a dependência da

autoridade paterna e a solidariedade entre os parentes. (SAMARA, 1983)

De acordo com Samara (1983), “a família brasileira, no período colonial,

apresentava uma feição complexa, incorporando ao seu núcleo central componentes

de várias origens, que mantinham diversos tipos de relações com o dono da casa,

sua mulher e a prole legítima.”

Na família patriarcal, viviam juntos indivíduos ligados por laços

consanguíneos, trabalho ou amizade, definindo a complexidade do modelo, pois a

composição do núcleo central estava, até certo ponto, bem delimitada. Todos viviam

no mesmo domicílio.

De acordo com estudos, a família brasileira é o resultado de transplante e

adaptação da família portuguesa ao nosso ambiente colonial, tendo como

consequência um modelo com características patriarcais e tendências

conservadoras em sua essência.

O modelo patriarcal serviu para estruturar e caracterizar a família brasileira.

Esse tipo de concepção foi aceito pela historiografia, sendo de tal forma

representativa, estática e praticamente única para exemplificar toda a sociedade

brasileira. As variações na estrutura familiar ocorreram em função do tempo, do

espaço e de outros grupos sociais.

A família patriarcal instalou-se nas regiões onde foram implantadas as

grandes unidades agrárias de produção, engenhos de açúcar, fazendas de criação

ou plantação de café. Nesse tipo de família, a incorporação de novos membros

ocorria de preferência por parentes legítimos ou ilegítimos, a extensos “clãns” que

asseguravam a individualidade de seu poder. (SAMARA, 1983)

A família extensa ou família patriarcal tinha funções econômicos e sociais.

Esse tipo de família desempenhava um papel fundamental na sociedade colonial,

apresentava-se também como solução para os problemas de acomodação

sociocultural da população livre e pobre.

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A função do chefe da família patriarcal era cuidar dos negócios, preservar a

linhagem familiar e a honra; exercia a autoridade sobre a mulher, filhos e os demais

membros do grupo.

O volume e a amplitude dos movimentos migratórios internos no Brasil e o

ritmo acelerado do processo de urbanização, durante o século XX, apontam para

transformações econônico-sociais profundas que se relacionam com o processo de

desenvolvimento do país. Um fenômeno que manifesta transformações na própria

estrutura da sociedade brasileira que deve ser compreendida de forma mais ampla.

(DURHAN, 1973)

As transformações econômico-sociais revertem em transformações no nível

do comportamento dos sujeitos que vivem o processo. A industrialização e a

urbanização trouxeram a ruptura de isolamento das comunidades tradicionais e a

negação dos velhos valores, a adoção de novos comportamentos. (DURHAN, 1973)

A migração não ocorreu de forma dramática; foi paulatinamente transferindo

indivíduos e grupos das comunidades mais tradicionais e mais pobres para os

grandes centros urbanos, onde se concentram os centros de transformação.

(DURHAN, 1973)

A transformação e a decadência da estrutura patriarcal extensas ocorreram

com o advento da industrialização e a ruína das grandes propriedades rurais.

Estudos mais recentes mostram que as estruturas familiares extensas tipo patriarcal

não são tão evidentes, sendo mais comuns famílias estruturadas com menor número

de integrantes. A família patriarcal assumiu configurações regionalmente diferentes e

mudou com o tempo.

1.9. Famílias, redes sociais e comunidade

Outra forma de abordagem a ser considerada é aquela que relaciona família,

redes sociais e comunidade.

As redes sociais e comunitárias estão incluídas no Modelo de Dahlgren e

Whitehead entre os determinantes de saúde. Este modelo descreve as relações

entre os fatores sociais e a saúde coletiva e individual e organiza os determinantes

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sociais de saúde (DSS) em diferentes camadas que se relacionam permitindo

identificar pontos de intervenção. (BRASIL, 2008)

Os determinantes sociais de saúde (DSS) considerados nesse modelo

compõem diferentes camadas, desde camada mais próxima dos determinantes

individuais até uma camada distal, onde se situam os macrodeterminantes. Entre os

determinantes sociais da saúde, conta-se o chamado capital social entendido este

como o conjunto das relações de solidariedade e confiança entre pessoas e grupos.

Além dos contatos com amigos e parentes, diferentes formas de participação social

com pertencer a grupos comunitários, religiosos, associações de moradores,

instituições de recreação entre outros, também representam formas pelas quais os

grupos de pessoas mantêm-se em contato e estabelecem vínculos sociais. (BRASIL,

2008)

O Modelo de Dahlgren e Whitehead, descreve as relações entre os fatores

sociais e a saúde coletiva e individual, com suas características individuais de idade,

sexo incluiu fatores genéticos que, evidentemente, exercem influência sobre seu

potencial e suas condições de saúde. (Figura 1) Na camada imediatamente externa

aparece o comportamento e os estilos de vida individuais. Esta camada está situada

no limiar entre os fatores individuais e os determinantes sociais de saúde, já que os

comportamentos, muitas vezes entendidos apenas como de responsabilidade

individual, dependentes de opções feitas pelo livre arbítrio das pessoas, na realidade

podem também ser considerados parte dos determinantes, já que essas opções

estão fortemente condicionadas por determinantes sociais: como informações,

propaganda, pressão dos pares, possibilidades de acesso a alimentos saudáveis e

espaços de lazer etc. (BUSS e PELLEGRINI FILHO, 2007)

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Figura 1. Determinantes sociais: Modelo de Dahlgren e Whitehead

Fonte: PHYSIS: Rev. Saúde Coletiva, 2007.

A rede social pessoal pode ser definida como a soma de todas as relações

que um indivíduo percebe como significativas ou define como diferenciadas da

massa anônima da sociedade. Essa rede corresponde ao eixo interpessoal e

contribui substancialmente para seu próprio reconhecimento como indivíduo e para

sua auto-imagem.

O conceito de rede social começa com o de família, pois é nela que se inicia

a base da qualidade dos vínculos, tornando-se um conceito caro ao de rede social.

Com o Modelo de Dahlgren e Whitehead nota-se uma ampliação do conceito

tornando-o mais coeso quando mostra as camadas que envolvem os determinantes

sociais de saúde: indivíduo, família, comunidade, políticas e condições sócias

econômicas e ambientais.

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CAPÍTULO II

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2. O PAPEL DO IDOSO NA FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA Caminhos da Reflexão do Pensamento: Objetivos, Sujeitos, Procedimentos de Coleta

2.1. Aspectos da metodologia

Neste capítulo, serão apresentados os fundamentos teóricos que sustentam

as nossas interpretações e norteiam os caminhos da investigação. O estudo teve

como objetivos:

• Refletir sobre as modificações pelas quais a família brasileira tem

passado e a repercussão dessas mudanças no papel do idoso na família

contemporânea;

• Identificar os aspectos culturais, sociais e subjetivos do idoso e sua

família;

• Conhecer a dinâmica familiar e suas significações para o idoso e;

• Compreender como a família do idoso se estrutura, seu desenvolvimento

e funcionamento.

Com enfoque no objeto de estudo optou-se por pesquisar pequenos grupos

(idosos e seus familiares) dado que nossos objetivos dizem respeito a procurar

entender como eles vêem o mundo e organizam seu cotidiano.

Tratou-se de um trabalho interpretativo ancorado em pesquisa de campo,

observação participativa daqueles pequenos grupos; optamos por uma abordagem

qualitativa, opção coerente com a nossa proposta. No caso deste trabalho, tal

opção justifica-se por trabalhamos com os significados que as pessoas atribuem às

suas experiências no mundo social - incluído aí o mundo familiar - e como elas

compreendem esse mundo; por outras palavras, nesta pesquisa buscamos

compreender os fenômenos sociais em termos dos sentidos a eles atribuídos pelo

nosso segmento de interesse. (MINAYO, 2009)

Retomando os objetivos expostos, pode-se ver que nosso trabalho cabe na

definição de Gil (2010) de trabalho descritivo, uma vez que nossa proposta teve

como finalidade também a “descrição das características de uma determinada

população”, no que concerne às atitudes e crenças de um grupo. Preferimos,

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entretanto, reforçar que nosso trabalho, que se desenvolve numa perspectiva da

Antropologia, pretende buscar uma “descrição densa”, tal como é definida por Geertz

(1989).

Para realizar esse tipo de estudo, foi utilizada a técnica de observação

participativa (às vezes entendida como de “participação observante”, denominação

que traduz bem a nossa posição profissional para entrada nas famílias). Essa

técnica nos permitiu tentar ver o mundo com os olhos dos nossos atores e observar

algumas de suas ações e experiências nesse mundo.

2.1.1. Local da pesquisa

O estudo foi realizado com idosos que participaram de atividades de uma

Clínica Escola vinculado a uma Instituição de Ensino Superior, localizada no bairro

de Itaquera, Zona Leste do Município de São Paulo.

Levantando alguns dados da história do bairro, encontramos que o nome

Itaquera é de origem tupi e quer dizer "pedra dura". A data de fundação do Bairro

ainda é uma incógnita. A primeira referência de que se tem notícia é de 1686,

quando o nome aparece em uma Carta de Sesmaria. No entanto, data de 1820, a

primeira referência sobre a povoação de Itaquera, onde existia um simples e

precário rancho conhecido como a "Casa Pintada". Ali os viajantes paravam para

descansar e reabastecer-se de provisões. A povoação de Itaquera começa a se

desenvolver mesmo a partir da inauguração da estação de trem local, no dia 6 de

novembro de 1875, data escolhida pela comunidade como a do aniversário, apesar

de toda a polêmica em torno da verdadeira idade. (SÃO PAULO, 2011)

Atualmente, a subprefeitura de Itaquera é composta pelos distritos José

Bonifácio, Parque do Carmo, Itaquera e Cidade Líder. A população em 2008 era

respectivamente de: 124.122; 68.258; 204.871 e 126.597 habitantes. A população

total da subprefeitura de Itaquera era em 2010 de 523.848 habitantes (SÃO PAULO,

2011)

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A figura 2 apresenta o mapa da Cidade de São Paulo dividido em 31

subprefeituras com destaque para a área de abrangência da subprefeitura de

Itaquera, localizada na região leste da cidade. (SÃO PAULO, 2010)

Figura 2. Mapa da Cidade de São Paulo e da área de abrangência da Subprefeitura de

Itaquera. São Paulo, 2010.

Fonte: Prefeitura do Município de São Paulo – Secretaria Municipal de Planejamento. (http://sempla.prefeitura.sp.gov.br/infocidade/mapas/3_regioes_subprefeituras_e_distritos_2009_8.pdf)

A tabela 1 apresenta os dados referentes à extensão territorial (área em Km2)

e população por distritos que compõem a área da Subprefeitura de Itaquera. (SÃO

PAULO, 2011)

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Tabela 1. Dados referentes à extensão territorial e população dos distritos da Subprefeitura de Itaquera. São Paulo, 2011.

Subprefeitura Distritos Área (km²) População (2010)

Itaquera

Cidade Líder 10,55 126.597

Itaquera 14,64 204.871

José Bonifácio 14,47 124.122

Parque do Carmo 15,66 68.258

TOTAL 55,32 523.848

Fonte: Prefeitura do Município de São Paulo – Secretaria Municipal de Coordenação de Subprefeituras. (http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/subprefeituras/subprefeituras/dados_demograficos/index.php?p=12758)

A clínica escola, a qual nos referimos anteriormente estava localizada no

distrito de Itaquera, foi escolhida por realizar atenção primária contínua nas

especialidades básicas, com uma equipe interdisciplinar habilitada nas atividades de

promoção, proteção e recuperação da saúde, favorecendo o desenvolvimento do

trabalho. A prestação de serviços junto à comunidade buscava estabelecer relação

entre a formação e capacitação profissional, e as necessidades e demandas

locorregionais, visando à transformação de cenários e dos espaços de atuação. As

atividades desenvolvidas pela equipe de saúde compreendiam a territorialização,

atendimento domiciliário, consulta, educação em saúde, atividade física, cultural e de

lazer.

O trabalho com idosos na clínica escola foi introduzido em agosto de 2006; a

partir desse período, fomos desenvolvendo ações diferenciadas e que tinham como

principal objetivo melhorar a qualidade de vida do idoso. Participei da implantação

de todas as atividades desenvolvidas na clínica escola, o que contribui para uma

aproximação do objeto do estudo. Em 2010 as atividades desenvolvidas pela clínica

escola foram suspensas, continuei participando como voluntária das atividades com

os usuários em espaços oferecidos pela própria comunidade o que favoreceu minha

entrada em campo.

Optei por continuar a pesquisa com os idosos que eram cadastrados da

clínica escola pelo vínculo estabelecido com os sujeitos da pesquisa.

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O método observacional documentou tudo o que foi vivido ao longo da

convivência com os sujeitos da pesquisa. A convivência com os sujeitos da pesquisa

foram de quatro anos; o tempo disponibilizado com os sujeitos permitiu conhecer

diferentes períodos de tempo, isto garantiu que os dados foram coletados em

momentos diversos e com uma riqueza maior de informações. O método forneceu

descrições detalhadas da coleta e da análise dos dados. A análise de dados

começou na fase da coleta de dados da pesquisa, os dados iniciais informaram o

desenvolvimento da codificação das categorias. As categorias emergentes foram

testadas durante todo o trabalho de campo. Terminada a fase das entrevistas e a

partir das interpretações dos depoentes, formulei a segunda interpretação. Os

depoimentos foram registrados em áudio com o consentimento dos entrevistados, e

as fitas transcritas na íntegra; o diário de campo permitiu o registro das observações

realizadas durante as entrevistas.

2.1.2. Os sujeitos da pesquisa

Tratou-se de uma pesquisa qualitativa, na qual os números não se fizeram o

mais importante, importante identificar algumas diretrizes para incluir as famílias

para o estudo. As famílias escolhidas preencheram as seguintes indicações para o

estudo:

• A família do idoso estava vivenciando modificações no aspecto social

(aposentadoria; emprego, voluntariado, viuvez, dificuldade financeira);

• A família tendo o idoso como o principal provedor (a renda familiar está

centrada na aposentadoria do idoso);

• O idoso como cuidador dos netos e a família como cuidadora do idoso e;

• O idoso estava vivenciando experiências motivadoras.

Os sujeitos da pesquisa foram selecionados inicialmente conforme a ficha de

cadastro social e prontuário interdisciplinar. A ficha de cadastro permitiu uma

avaliação social, econômica e cultural das famílias e o prontuário oportunizou uma

avaliação estrutural, funcional e de desenvolvimento da família.

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Os dados foram coletados por meio de entrevista (Apêndice A), buscando

apreender a estrutura, o desenvolvimento e a função da família e do idoso. A

pesquisa de campo foi realizada no domicílio dos idosos e seus familiares, após o

consentimento prévio; a observação participante se fez graças à relação de

confiança já existente e também comunicada e permitida. A aproximação anterior

com os sujeitos da pesquisa facilitou a entrada em campo e o desenvolvimento da

pesquisa.

A entrevista semi-estruturada constou de perguntas abertas. Esse modelo de

entrevista dá ensejo a um diálogo entre o pesquisador e o sujeito. A entrevista, como

disse acima, foi realizada no próprio domicílio dos sujeitos da pesquisa, agendadas

previamente pelo pesquisador, após terem acesso ao Termo de Consentimento Livre

e Esclarecido (Apêndice B).

A observação participante possibilitou estabelecer novas relações entre o

observado, o que foi relatado e vivido pelos idosos e seus familiares, a partir dos

significados atribuídos a esses sujeitos e as suas experiências no papel que

desempenham. A observação permitiu uma aproximação maior entre os sujeitos e o

pesquisador, por meio do contato direto no seu espaço de residência, no contexto

natural. Foi necessário compartilhar com os sujeitos suas realidades, identificando-

me com eles e podendo avaliar melhor o significado de suas ações, sentimentos e

percepções acerca de experiências vivenciadas. Por meio da observação, foi

possível verificar o ambiente, as relações familiares, as práticas e ações dos idosos

e seus familiares. Foi possível conhecer as formas de comunicação entre os idosos,

familiares e rede social.

O roteiro de entrevista foi constituído por perguntas abertas (este roteiro foi

entendido como um conjunto de provocações para o diálogo e no limite, lembretes,

para que fosse possível ter um material passível de comparação). Com a finalidade

de favorecer uma compreensão ampliada das interpretações sobre o idoso e a sua

família, as entrevistas foram individuais em momentos distintos, garantindo sempre a

privacidade, no que diz respeito aos itens:

a) Papel do idoso (segundo ele mesmo) na família;

b) Significado do idoso para a família;

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c) O significado da (sua) família para o idoso;

d) As principais mudanças observadas pelo idoso na família contemporânea e;

e) Avaliação da família dos idosos (desenvolvimento, estrutura e

funcionamento).

Tendo a população já delimitada, reuni informações sobre cada sujeito.

Mesmo com poucos sujeitos, a pesquisa qualitativa pode gerar uma grande

quantidade de dados. Por essa razão, o estudo baseou-se num número modesto de

sujeitos. (POPE e MAYS, 2005)

Foi realizado um pré-teste com a população escolhida, que serviu para

orientação das entrevistas subseqüentes, ao aprofundamento do referencial teórico

e condução da análise comparativa do conteúdo.

Os participantes que se dispuseram a dar entrevistas tiveram os nomes

originais substituídos por fictícios. Os nomes foram substituídos por nomes de flores.

O motivo da substituição além da preservação dos sujeitos da pesquisa foi pela

simbologia das flores. Uma simbologia antiga e profunda. A flor é considerada um

elemento feminino, ligado a criação, fertilidade e o ao nascimento. As flores que

nomearam as entrevistadas neste estudo significam a “beleza”, “perfeição”,

“doação”, “amor”, a “glória”, a “alegria” e a “vida”.

Para facilitar a exposição dos dados referentes aos sujeitos, optei pela

construção de um quadro.

O quadro 1 apresenta os dados de caracterização dos sujeitos da pesquisa

quanto à idade, naturalidade, estado civil, número de filhos, religião, profissão,

escolaridade, habitação e renda.

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Quadro 1. Caracterização dos sujeitos da pesquisa quanto à idade, naturalidade, estado civil, número de filhos, religião, profissão, escolaridade, habitação e renda. São Paulo, 2011.

NOME IDADE NATURALIDADE ESTADO CIVIL

Nº DE FILHOS RELIGIÃO PROFISSÃO ESCOLARIDADE COABITAÇÃO RENDA

Girassol 63 Cearense Casada 4 Evangélica Dona de Casa Analfabeta Mora com o esposo e a irmã

Dois salários mínimos

Jasmim 73 Cearense Separada 0 Evangélica Costureira Aposentada Analfabeta Mora com a irmã e

o cunhado Um salário

mínimo

Gérbera 63 Pernambucana Casada 5 Evangélica Dona de Casa Fundamental Incompleto

Mora com esposo e filho

Três salários mínimos

Margarida 73 Baiana Viúva 9 Evangélica Dona de Casa Aposentada Analfabeta Mora com a filha e

o neto Dois salários

mínimos

Magnólia 63 Baiana Casada 4 Evangélica Costureira Fundamental Incompleto

Mora com esposo e dois netos

Dois salários mínimos

Angélica 66 Paulista Divorciada 3 Espírita Auxiliar de Enfermagem Aposentada

Ensino Médio Completo Mora sozinha Quatros salários

mínimos

Lótus 61 Pernambucana Casada 3 Católica Dona de Casa Fundamental Incompleto Mora com esposo Três salarios

mínimos

Prímula 80 Sergipana Viúva 3 Evangélica Dona de Casa Fundamental Incompleto

Mora com o filho e duas netas.

Três salários mínimos

Violeta 83 Baiana Viúva 4 Evangélica Costureira Analfabeta Mora com a filha e o neto

Dois salários mínimos

Cravo 65 Baiano Divorciado 4 Evangélico Aposentado Fundamental Incompleto

Mora com a filha, genro e neta

Três salários mínimos

Palma 75 Paulista Divorciada 3 Espírita Costureira Fundamental Incompleto

Mora com o ex-marido

Três salários mínimos

Frésia 72 Cearense Viúva 4 Católica Doméstica Analfabeta Mora com a filha Três salários mínimos

Alfazema 66 Mineira Viúva 4 Evangélica Dona de Casa Fundamental Incompleto

Mora com a irmã e dois netos

Três salários mínimos

Fonte: São Paulo, 2011

45

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Lendo o quadro são, portanto, 13 (treze) idosos entrevistados sendo 12

(doze) mulheres e um homem. Deste conjunto quatro mulheres são casadas e vivem

com os maridos (uma separada vive com o ex- marido); quatro são viúvas e as

demais divorciadas e uma separada. O único homem do grupo é divorciado. Quanto

ao grupo de residência, apenas uma mulher vive sozinha, os demais entrevistados

moram com um número variável de familiares de 1(hum) a 4(quatro), 5 (cinco) vivem

com mais de 2(duas) pessoas, 3 (três) com mais de três pessoas, 2 (dois) com mais

uma pessoa, 1(hum) com mais uma pessoa e 1 (hum) com mais de 4 (quatro)

pessoas. A religião declarada predominante foi a Evangélica, 9 (nove) entrevistados,

2 (dois) se declaram católicas e 2 (dois) espíritas. Quanto à renda: 7 (sete)

declararam viver com 3 (três) salários mínimos, 4(quatro) com 2(dois) salários

mínimos; um declara viver com 4 (quatro) salários mínimos (vive sozinha e tem

maior escolaridade dentre os entrevistados); 1(hum) declara receber apenas 1(hum)

salário mínimo.

Quanto à escolaridade: 5 (cinco) mulheres são analfabetas, 7 (sete) possuem

o ensino fundamental incompleto e uma tem ensino médio completo.

Dentre os entrevistados 4 (quatro) se declararam aposentados; 6 (seis)

mulheres são “donas de casa” sendo 1(um) aposentado; 4 (quatro) são costureiras

sendo 1(uma) aposentada; 1(um) auxiliar de enfermagem.

Apenas 2(dois) entrevistados são paulistas, os demais são majoritariamente

vindos do nordeste (seis); quatro vindos da Bahia e uma de Minas Gerais.

As idades variaram de 61 a 83 anos, 7 (sete) tem entre 61 e 66 anos; 4

(quatro) entre os 72 e 73 anos e 2 (dois) possuem entre 80 e 83 anos.

Acredito que, além de apresentar a tabela 1 e comentá-la, seja importante

também tecer alguns comentários sobre o perfil de cada sujeito. É o que

apresentamos a seguir usando suas identificações florais.

Girassol (sujeito 1) (representa dignidade, glória e paixão), 73 anos, casada,

evangélica, mora em casa própria com o esposo e sua irmã, analfabeta, nasceu e

cresceu no Ceará; mudou-se para São Paulo em busca de uma vida melhor, tiveram

quatro filhos, dois faleceram ainda crianças por falta de atendimento médico, sempre

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foi dona de casa, dedicando-se aos filhos e marido. Após a perda dos filhos

apresentou um quadro depressivo que só veio a melhorar com sua participação na

igreja. Seu marido é aposentado, recebe em torno de dois salários mínimos e é o

pastor da igreja, que fica sobre a casa onde moram. Relata que após o fechamento

da clínica escola, onde realizava atividade física e de artesanato, sente um vazio

que ainda não foi preenchido.

Jasmim (sujeito 2) (significa sorte, doçura e alegria), 83 anos, separada,

evangélica, Cearense, mora com a irmã mais nova, não teve filhos e foi abandonada

pelo esposo. Trabalhou a vida toda como costureira é aposentada e recebe um

salário mínimo por mês. Não têm possibilidade de morar só devido suas condições

financeiras e saúde comprometida pela doença de Parkison e seqüelas de Acidente

Vascular Encefálico. Acamada é dependente totalmente de cuidados. Paga suas

contas e uma pessoa para dar banho, cuidar da higiene e cuidar de suas roupas.

Vive muito triste, pois acredita dar muito trabalho para irmã, que não tem paciência e

saúde para cuidar dela. Não se entendem e brigam o tempo todo, pois a irmã

acredita que ela mesmo doente poderia colaborar mais. Sua maior vontade é poder

andar novamente e fazer um café. Como acredita que isso não vai acontecer, disse

estar se preparando para morte. Sua maior distração é assistir programas

evangélicos na televisão e receber os irmãos da Igreja na sua casa para receber a

palavra.

Gérbera (sujeito 3) (significa alegria, pureza e simplicidade), 63 anos,

casada, evangélica, mora em casa própria há 40 anos com esposo e o filho mais

novo. Tiveram cinco filhos, uma das filhas morreu antes de completar um ano, com

problemas de saúde. Os três filhos mais velhos são casados e independentes. O

esposo é aposentado; recebem dois salários mínimos e meio. Sempre foi

responsável pelo cuidado do esposo e a criação dos filhos. O marido é o

responsável pelo pagamento das contas (água, luz; imposto) enquanto é ela que vai

ao mercado, feira e decide o que é preciso comprar para a casa. Sua função é a

limpeza e organização da casa. Recebe seus filhos e netos aos domingos para

almoçarem e tem o compromisso de ir à igreja todas as terças, sábados e domingos

para evangelizar. Seu esposo é Ancião na igreja há 28 anos. Gosta de costurar,

fazer tricô e crochê. Atualmente, o que dá maior prazer é ficar no sítio que

compraram há pouco tempo, gosta de plantar e colher. Apesar de ser portadora de

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doenças crônicas, quando vai para o sítio não sente nada. Quando precisa ir ao

médico o seu esposo sempre a acompanha. Casada há 44 anos considera-o como

um companheiro ideal.

Margarida (sujeito 4) (simplicidade, pureza, confiança e criatividade) 72 anos,

viúva, analfabeta, evangélica, mora com a filha portadora de doença mental e o neto

também portador de deficiência mental. Tem a guarda do neto (Robinho) desde seu

nascimento, ele é totalmente dependente para as suas necessidades básicas. Aos

72 anos ela cuida da filha (51 anos) e do neto (23 anos) é responsável pela limpeza

e organização da casa. Algumas vezes ainda toma conta da neta de cinco anos para

sua nora trabalhar como diarista. Freqüenta diariamente a igreja evangélica, onde

prática a evangelização. É aposentada e recebe um salário mínimo. Solicita ajuda

para sua irmã mais nova que mora próxima a sua casa.

Magnólia (sujeito 5) (amor e simpatia), 63 anos, casada, evangélica, reside

em casa própria, moram atualmente ela, o esposo, filho e um neto. Teve quatro

filhos. Seu esposo recebe um salário mínimo de aposentadoria. Apesar de ter

contribuído para INSS por 15 anos não tem direito a aposentadoria. Costura e faz

tear para ganhar um dinheiro para contribuir nas despesas domésticas. Gosta de ir á

igreja, faz parte do coral e gosta de sair para passear no centro de São Paulo,

costuma fazer compras no comércio no centro da cidade de São Paulo (Rua 25 de

março). Ajuda sua irmã Maria quando precisa ir ao médico ou levar a Lúcia (filha da

Maria com doença mental). Relata que teve um acidente vascular encefálico, mas

que isso não a impossibilitou de fazer as coisas que gosta. Os filhos têm medo que a

mãe sai sozinha e acompanham sempre que possível.

Angélica (sujeito 6) (harmonia, paz e união), 66 anos, divorciada, espírita,

ensino médio, mora sozinha, trabalha, pretende se aposentar no próximo ano (2012)

teve três filhas, ficou casada por 25 anos. Enquanto foi casada não trabalhava fora

de casa, após a separação voltou estudar e trabalhar. Angélica acha que a idade

além de proporcionar mais sabedoria trouxe liberdade, pois hoje ela realiza coisas

que quando mais jovem não teve oportunidade. Gosta muito de ler, praticar

atividades de artesanato e atividade física. Já participou de atividades sociais na

comunidade, inclusive como voluntária em atividades de artesanatos. Freqüentou

aula de noções de informática e outras atividades fornecidas pela clínica escola.

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Relata sentir falta das atividades e gostaria de freqüentar lugares onde pudesse

dançar cantar e realizar outras atividades com pessoas da mesma idade. É

responsável pela organização de sua casa e colabora no cuidado dos netos.

Lótus (sujeito 7), 61 anos, casada, pernambucana, católica, teve quatro filhos,

um faleceu ainda criança, os outros são casados. Mora a 43 anos em São Paulo. A

família (filhos, noras e netos) se reúne todos os domingos para almoçar. Mora em

uma chácara, atualmente cuidam de 15 cachorros, 10 gatos, galinhas e outros

animais. Lótus foi adotada ainda criança, a mãe adotiva mora ainda em

Pernambuco. Não sai de casa para passear ou ir à igreja, pois tem que cuidar da

criação de animais. Lótus refere-se aos bichinhos de estimação como seus “filhos”.

Tem uma ótima relação com os filhos, noras, netos e esposo. É responsável pela

organização da casa, cuidam juntos da criação de animais, vão sempre que possível

juntos fazer as compras de mercado e feira livre. As contas são pagas pelo esposo,

pois ele detém o recebimento da aposentadoria. Gosta muito do lugar onde mora e

principalmente de seus vizinhos, com quem pode sempre contar. Coloca-se a

disposição dos vizinhos em caso de necessidade.

Prímula (sujeito 8) (juventude, equilíbrio e objetividade), 80 anos, viúva, teve

três filhos, o mais velho faleceu em 2010. O filho mais novo mora com ela

juntamente com sua esposa e suas duas filhas (falta de condições financeiras para

manter uma casa), analfabeta, evangélica, freqüenta o culto aos sábados e

domingos. Gostaria que o filho tivesse condições de morar com sua família em outra

casa. Manifesta cansaço e o desejo de morar só, não gostaria de ter a

responsabilidade do cuidado das netas (12 anos e sete anos). Limpa e organiza a

casa, lava roupa, faz comida e leva as crianças na escola. Acorda às 6 horas da

manhã, capina o mato, planta, cuida da casa e costura no período da tarde. Mora

nessa chácara há 15 anos onde é caseira, recebe um salário mínimo para cuidar do

local. Cede o quintal da casa para Unidade Básica de Saúde realizar os grupos

educativos e atividade física duas vezes por semana. Refere melhora das dores na

coluna após ter iniciado a atividade física. Gosta muito de receber as pessoas em

sua casa para realizar as atividades.

Violeta (sujeito 9) (Lealdade, simplicidade e modéstia), 83 anos, mora com a

filha e o neto (portador de doença mental). A casa é própria e a renda fixa da casa é

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dela. Ainda para colaborar com as despesas costura juntamente com sua filha.

Quando sua filha sai para realizar trabalhos informais, fica responsável pelo cuidado

do neto, que têm 23 anos, mas tem dificuldade para falar e andar. Ainda costuma

cozinhar e fazer pequenos serviços domésticos como passar roupas, lavar louças e

varrer a casa. É evangélica, mas ultimamente devido ao acesso ser difícil e sua

dificuldade de locomoção o pastor vem em sua casa aos domingos para fazer o

culto.

Cravo (sujeito 10) (amor puro e latente) 71 anos, nasceu na Bahia, separado,

envangélico e aposentado (dois salários mínimos). Mora atualmente, com a filha

caçula, o genro e a neta. A casa fica em um local de invasão, sem água e esgoto

tratado. Lugar de difícil acesso para veículos e não possui transporte público

próximo a residência. Veio morar em São Paulo devido seus problemas de saúde. É

aposentado por acidente de trabalho, ficou cego do olho esquerdo. Hoje depende da

filha para os cuidados de higiene, alimentação e para tratamento médico. Em

contrapartida a renda da casa é somente do Cravo, pois os outros membros

encontram-se desempregados.

Palma (sujeito 11) (dedicação, devoção e grande amizade), 69 anos,

divorciada, mora atualmente com o ex-esposo. Teve três filhos, sendo o último

adotivo. Foi casada durante 30 anos, e sempre foi feliz com seu casamento.

Considerava seu marido como seu grande companheiro, logo após o nascimento de

suas duas filhas apresentou um distúrbio mental grave sendo necessários internação

e cuidados. Nesse período o esposo foi um companheiro, cuidando da casa, das

filhas e dela. A religião fez parte da estratégia de superação desses momentos

difíceis. Superaram diversas dificuldades e adotaram o terceiro filho como forma de

gratidão pelo retorno da paz e da harmonia no lar. Os filhos cresceram e se

casaram, seu esposo se aposentou e comprou um sítio no interior de São Paulo.

Gostava de plantar e cuidar dos animais passava a semana inteira no sítio, sem

muitas condições. Ao longo do tempo apresentou descolamento de retina devido aos

esforços que realiza no sítio, mesmo após o tratamento e cirurgias foi perdendo a

visão e ficando cego. Com a perda da visão e as dificuldades financeiras foi

necessário vender o sítio. Após esse fato o seu esposo apresentou um quadro

depressivo e começou outro período de turbulências na família. Seu esposo saiu de

casa e foi morar no apartamento que havia dado para seu filho. Solicitou o divórcio e

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arrumou outra companheira, mas o relacionamento não durou muito. Hoje em dia,

devido as suas dificuldades foi morar com sua ex-esposa novamente. A Palma acha

que tem obrigação em cuidar, pois os filhos não têm condições, têm suas próprias

vidas.

Frésia (sujeito 12) ( calma e essência de amizade) 72 anos, cearense, semi

alfabetizada. Católica, viúva mora com a filha mais velha. A casa é própria.

Aposentada, renda de três salários mínimos, mãe de 4 (quatro) filhos, sendo que o

filho caçula morreu de forma violenta próximo sua residência. Participa de atividades

semanalmente na igreja e promove grupo de orações em seu domicílio. Apresentou

um quadro depressivo logo a após a morte de seu filho, hoje ainda lamenta a morte,

mas relata que por meio da religião conseguiu superar a perda. Tem um papel ativo

na comunidade, vive no mesmo local a mais de 30 anos, desenvolve trabalhos

voluntários na comunidade. Cuidou voluntariamente de uma criança que após uma

apendicectomia apresentou um quadro de hipóxia irreversível; dormia todas as

noites com a criança para prestar os cuidados necessários até sua morte.

Atualmente, cuida de sua irmã que têm diagnóstico de câncer, vai todos os dias para

ajudar nas tarefas domiciliares e apoiar sua irmã que esta em tratamento. Ainda

realiza alguns trabalhos informais na vizinhança (lava e passa roupa). Participa de

atividades sociais na comunidade, tanto na unidade básica de saúde e

principalmente as ligadas à comunidade católica. Aprendeu a escrever e assinar o

nome na clínica escola.

Alfazema (sujeito 13) (calma), 66 anos, mineira, viúva, teve quatro filhas.

Ficou viúva com quarenta e quatro anos, seu esposo faleceu de crise hipertensiva

causada pelo alcoolismo. Após o casamento sempre morou no mesmo quintal da

casa de sua mãe (Dona Rosa). Após a morte de seu esposo foi morar na casa de

sua mãe. Dona Rosa (mãe) teve duas filhas; Alfazema filha legítima e Dália filha

adotiva (portadora de deficiência mental). Sempre foi dependente da mãe

financeiramente e psicologicamente. A sua mãe (Dona Rosa) foi responsável pela

criação de suas quatro filhas. Atualmente, moram na casa de dona Alfazema, sua

irmã (deficiência mental) e sua neta mais velha (dezesseis anos) e seu neto (nove

anos). Dona Rosa, 93 anos faleceu neste ano (2011), causando vários transtornos

na estrutura e funcionamento da família. Alfazema não aceita ser responsável pela

sua irmã e não conta com ajuda de suas filhas. O relacionamento com a irmã e suas

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filhas é conflituoso. É responsável pelos netos desde o nascimento. Sua filha mais

nova teve seis filhos, dos quais deixou três na casa da avó (Alfazema), dos demais

uma faleceu, uma foi entregue para adoção com quatro meses e o mais novo mora

com sua mãe (filha da dona Alfazema) no Rio de Janeiro. Em 2010, Dona Alfazema

entregou a sua neta (cinco anos) para adoção, mesmo contrariando sua mãe (Dona

Rosa, bisavó) que dizia que mesmo diante das dificuldades a família deve

permanecer unida; mas como já estava debilitada e acamada sua filha (Alfazema)

tomou a decisão de entregar a neta para adoção. A casa é própria (herança da

mãe), recebe a pensão de um salário mínimo do esposo falecido, sua irmã é

aposentada por invalidez (um salário mínimo) e sua neta também recebe uma

pensão (um salário mínimo). Com a morte da mãe e a responsabilidade da casa

relata a dificuldade em participar de atividades sociais, mas pretende se inserir em

grupos, relatando que sente falta de apoio e atividades que promovam prazer.

Em uma análise preliminar, participaram do estudo 13 (treze) idosos cuja faixa

etária variou entre 61 a 83 anos, há prevalência de união estável, baixo poder

aquisitivo, baixa escolaridade, presença de três ou mais filhos (exceto uma idosa

que não teve filhos), presença de coabitação entre os idosos e familiares (somente

uma reside sozinha).

As entrevistas foram gravadas em áudio após o consentimento dos sujeitos, e

tiveram duração média de 90 minutos. Foi necessário o retorno em algumas famílias,

com a finalidade de esclarecer e obter novas informações.

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CAPÍTULO III

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3. O PAPEL DO IDOSO NA FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA

3.1. Análise e interpretação dos dados

Nesta fase da pesquisa, descrevemos o caminho da análise de dados e

apresentamos a nossa interpretação.

A técnica utilizada para análise possibilitou construir uma multiplicidade de

estruturas complexas, sobrepostas ou amarradas umas às outras, que podem ser

diferentes, irregulares e que, inicialmente, procurou-se apreender e depois

interpretar e apresentar. (GEERTZ, 1989)

Procurei colocar-me em situação que permitisse observar as pessoas

participantes da pesquisa em suas vidas diárias, enfatizando a importância de

compreender o mundo simbólico dos idosos e suas famílias vivem, vendo coisas

como elas vêem e captando os sentidos que elas atribuem às suas experiências. A

pesquisa de campo exigiu que a pesquisadora permanecesse o maior tempo

possível na comunidade; essa imersão na realidade permitiu entender as regras, os

costumes e as convenções que regem o grupo estudado. Evidentemente, e dentro

dos cânomes clássicos da observação, realizei o trabalho pessoalmente, pois além

da exigência do tipo de trabalho, tenho experiência com as situações estudadas.

Não perdi de vista que essa abordagem é essencialmente dinâmica, procurando

compreender os problemas à medida que se apresentam (não se limitando às

ocorrências que se repetem), ou que surgem no campo social, a fim de trazer

hipóteses que possam contribuir para soluções.

Não se pode esquecer, por outro lado, conforme aponta Laville e

Siman(1999), “que é preciso cuidado para não reformar ou reduzir a natureza do

objeto do estudo, sua complexidade e o fato de ser livre e atuante”. Os fenômenos

humanos repousam sobre a multicausalidade, ou seja, sobre um encadeamento de

fatores, de natureza e de peso variáveis, que se conjugam e interagem. Assim, com

a proposta de conhecer a dinâmica familiar e suas significações para o idoso, optei

pela coleta de dados por meio de entrevistas e observação. A partir da observação e

da fala dos depoentes, percebemos detalhes mais íntimos da vida familiar

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significativos para este estudo, que busca captar o papel do idoso na família

contemporânea, valorizando a riqueza dos dados dos depoentes.

Na tentativa de captar os códigos culturais, foi utilizado o referencial teórico

desenvolvido pelo antropólogo Clifford Geertz (1989) e o Modelo Calgary de

Avaliação da Família (MCAF). As Teorias Sociológicas e Antropológicas sobre o

envelhecimento, entre outras, deram suporte à análise e interpretação dos dados.

A partir desse conjunto, fiz uma aproximação do objeto deste estudo. Os

pressupostos teóricos deram suporte à análise e à interpretação dos dados e eu

mesma me coloquei como tradutora dos símbolos contidos nas falas dos depoentes.

Na análise de conteúdo, usei também, como auxílio, um software (QSR

internacional Nvivo 9 projeto-Environmental Change Down East), desenvolvido por

pesquisadores que trabalham com pesquisa qualitativa na área das ciências sociais.

Este software é capaz de oferecer suporte computacional ao trabalho com dados

qualitativos não estruturados, isto é, artigos, registro de entrevistas e observações

do diário de campo. O programa permite ilustrar as principais características do

projeto. Ao usar o NVivo 9, foi possível:

• Gerenciar tudo em um só lugar — reunindo meus materiais de origem e

registrando meus insights analíticos em um arquivo de projeto seguro;

• Gerenciar os dados bibliográficos importando dados de aplicativos como

EndNote, Zotero ou RefWorks. Criando uma bibliografia no NVivo e

exportando para uma ferramenta de gerenciamento de referência quando

quis registrar minhas descobertas;

• Codificar minhas fontes para reunir materiais em temas ou nós - usar a

barra de codificação rápida tirando proveito da autocodificação — o NVivo

forneceu ferramentas práticas para tornar a codificação fácil e rápida;

• Organizar meus nós em pastas e criar hierarquias de nós que se

adaptaram ao projeto;

• Criar e classificar nós de ‘casos’ para reunir informações descritivas sobre

os meus sujeitos, lugares e organizações;

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• Usar ferramentas sofisticadas de análise de texto para ajudar a encontrar

um significado nos dados não-estruturados (unstructured);

• Executar consultas para revelar tendências ou ver como as ideias se

relacionam.

• Usar visualizações para obter novas perspectivas sobre o material. A

partir das árvores de categorias, as novas técnicas de visualização do

NVivo 9 ajudaram a ver os padrões e as conexões com os dados.

• Compartilhar as descobertas executando relatórios personalizados ou

salvando seus nós e fontes como páginas HTML.

O software nos permitiu analisar os dados brutos, analisando os dados

secundários a partir das falas dos depoentes, a incorporação das notas do diário de

campo, reuniu de forma organizada as anotações, observações, ideias, fazendo

diversas combinações e leituras sobre elas, ampliando-se, dessa maneira, de forma

significativa, as possibilidades de análise e reflexão. O programa também ofereceu a

visualização quantitativa das categorias, onde, por meio das matrizes, permitindo

verificar a precisão do estudo quanto aos aspectos que se mostram mais relevantes

segundo a fala dos idosos e seus familiares. O software requer que, previamente, os

dados textuais brutos sejam transformados nos moldes que o programa pode ler (txt)

e, depois disso, iniciamos a análise e desenvolvemos os seguintes procedimentos:

1. Transcrição literal dos conteúdos das fitas por meio de texto do Word

2003;

2. Formatação do texto em “txt”;

3. Leitura do material e registro desses segmentos devidamente codificados

segundo quem eram os sujeitos (pesquisadora, idosos e familiares);

4. Leitura e análise desse material, visando derivar e definir as categorias

nativas.

5. Codificação e registro das categorias nativas segundo o tipo de sujeito

num protocolo único;

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6. Reunião das categorias nativas identificadas nas entrevistas dos

informantes por conjunto de entrevistas de cada idoso e sua família.

7. Emissão de relatórios, derivação de categorias com base na análise do

conteúdo das categorias nativas;

8. Construção de árvores de categorias na tentativa de procurar visualizar

melhor suas inter-relações;

9. Definição de cada categoria para ter maior clareza sobre o que

representam;

10. Construção de intersecções entre as diversas categorias para melhor

avaliar a interligação entre elas. Nesse momento, foram utilizados os

dados quantitativos fornecidos pelas matrizes produzidas pelo cruzamento

das categorias no software o que possibilitou a visão rápida de todo

trabalho.

O uso da tecnologia não substituiu a atividade reflexiva e analítica que o

pesquisador desenvolveu quando se debruça sobre os dados coletados na busca de

uma melhor compreensão da fala dos sujeitos da pesquisa. A preparação do

material exige um verdadeiro mergulho: antes de realizar a análise propriamente

dita, o material reunido é preparado.

Ainda quanto a outros procedimentos aponto que o projeto foi aprovado pelo

Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo para

a devida liberação quanto aos aspectos metodológicos da pesquisa.5

A participação dos meus interlocutores deu-se de forma voluntária, após a

leitura e a solicitação da sua anuência por escrito do Termo de Consentimento Livre

e Esclarecido, incluindo a permissão para a gravação da entrevista.

A pesquisa produziu dois tipos de dados brutos: as transcrições literais das

fitas de áudio gravadas durante as entrevistas e o texto decorrente da seleção de

elementos do diário de campo que podem servir para contextualizar esses registros.

5 Parecer consubstanciado apensado ao protocolo de pesquisa nº 317/2010 (anexo 1), aceito e aprovado em Reunião Ordinária de 08/12/2010.

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A análise de conteúdo seguiu três fases cronológicas: pré-análise; a exploração do

material; o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação. (BARDIN, 2006)

A pré-análise correspondeu a um período de intuições, onde o principal

objetivo foi sintetizar as idéias iniciais, possibilitando produzir um esquema preciso

do desenvolvimento das operações sucessivas, num plano de análise. Foi

estabelecido o contato com os documentos, tornando-se uma leitura mais precisa.

Os documentos foram demarcados pelo gênero e efetuada a análise. Todas as

informações coletadas durante a pesquisa foram analisadas, seguindo a regra da

exaustividade.

A interpretação requer um trabalho de múltiplas facetas: primeiro, não

perdendo de vista as lições de Geertz (1989), a nossa interpretação procurou

contemplar outras interpretações dos próprios interlocutores e dos múltiplos atores;

além disso, a interpretação tornou possíveis descrições minuciosas, não

generalização dos casos, mas generalização dentro deles. Fizemos uma inferência a

partir do conjunto de significados e os ordenamos de forma inteligível.

A organização do material e a exploração sistemática dos documentos

possibilitaram a construção de um sistema estrutural, sistema de parentescos

(sistema estrutural de relações), no qual as pessoas encontram-se interligadas por

um complexo de relações e do reconhecimento social dos laços. A análise e a

interpretação permitiram-nos o estabelecimento de correlações entre os diferentes

sistemas (religião, política, educação, economia e cultura).

Não é ocioso pontuar novamente que a família está formada por uma rede de

relações que é preexistente ao sujeito. Existem relações conjugais, materno-filiais e

paterno-filiais, cada uma com significados diferentes, e satisfazendo necessidades

individuais ou do grupo. As famílias desenvolvem uma estrutura característica,

comportando papéis e regras, dentro das quais os seus membros funcionam.

Visando identificar os componentes estruturais das famílias em questão construí o

genograma e o ecomapa de cada sujeito. Avaliação estrutural consiste na avaliação

de três dimensões a estrutura familiar interna, estrutura externa e contexto. O

instrumento utilizado para avaliação estrutural foi o genograma e o ecomapa que

permitiu delinear as estruturas internas e externas da família. O genograma é um

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diagrama do grupo familiar. O ecomapa por outro lado, é um diagrama de contato da

família com outros além da família imediata. O objetivo do ecomapa é representar os

relacionamentos dos membros da família com os sistemas mais amplos.

O genograma foi construído com figura/símbolos, que representam as

pessoas, e de linhas (cheias ou pontilhadas), que descrevem os seus

relacionamentos. A participação dos sujeitos na construção do instrumento foi ativa,

o que possibilitou identificar com maior clareza os elementos que compunham as

redes familiares e a rede social do idoso.

Seguem-se os símbolos usados na construção do genograma.

(McGOLDRICK e GERSON, 1987)6

Homem

Mulher

Caso índice

Casamento Separação Divórcio

Filhos (por ordem de nascimento)

6 Os símbolos utilizados não são exatamente iguais aos utilizados nas análises antropológicas; realizamos uma aproximação a partir dos modelos usados na área da saúde.

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Símbolos para os padrões de interação familiar

Relação forte/íntima Relação conflituosa

Relação Distante

--------------------------

O Modelo Calgary de Avaliação da Família foi o instrumento técnico e

também fundamento teórico para análise dos sistemas; foi utilizado para avaliação

multidimensional das famílias e permitiu uma análise da estrutura, desenvolvimento

e funcionamento da família. O genograma tem como base a teoria geral dos

sistemas a qual considera as relações familiares como determinantes da saúde

emocional de seus membros. Ao construirmos o genograma e o ecomapa

identificamos: a estrutura familiar; as adaptações ao ciclo vital, o funcionamento

familiar, os padrões vinculares e as redes de apoio.

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Figura 3. Genograma do sujeito 1 – Girassol, 63 anos. São Paulo, 2011.

Figura 4. Genograma do sujeito 2. Jasmim, 73 anos. São Paulo, 2011.

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Figura 5. Genograma do sujeito 3. Gérbera, 63 anos. São Paulo, 2011. Figura 6. Genograma do sujeito 4. Margarida, 73 anos. São Paulo, 2011.

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Figura 7. Genograma do sujeito 5. Magnólia, 63 anos. São Paulo, 2011.

Figura 8. Genograma do sujeito 6. Angélica, 66 anos. São Paulo, 2011.

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Figura 9. Genograma do sujeito 7. Lótus, 61 anos. São Paulo, 2011.

Figura 10. Genograma do sujeito 8. Prímula, 80 anos. São Paulo, 2011.

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Figura 11. Genograma do sujeito 9. Violeta, 83 anos. São Paulo, 2011.

Figura 12. Genograma do sujeito 10. Cravo, 65 anos. São Paulo, 2011.

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Figura 13. Genograma do sujeito 11. Palma, 75 anos. São Paulo, 2011.

Figura 14. Genograma do sujeito 12. Frésia, 72 anos. São Paulo, 2011.

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Figura 15. Genograma do sujeito 13. Alfazema, 66 anos. São Paulo, 2011.

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Nesse momento da pesquisa, retornei as hipóteses do estudo com a

finalidade de enquadrar a técnica dentro de um quadro teórico. A codificação dos

dados brutos foram transformados e agregados em unidades, o que permitiu uma

descrição das características pertinentes do conteúdo. A técnica de observação

participativa proporcionou análise de conteúdo, a elaboração de unidades de

registros, elementos obtidos por meio da decomposição do conjunto da mensagem.

As unidades elaboradas emergiram do tema abordado. Além das unidades de

registro, definimos as unidades de contexto, possibilitando uma referência mais

ampla dando origem as categorias e subcategorias.

A fim de se tornar mais didático construímos a tabela 2 que apresenta as

unidades de contexto, de registro, categorias e subcategorias que utilizamos para

análise de conteúdo das entrevistas dos sujeitos.

Tabela 2. Unidades de contexto, de registro, categorias e subcategorias. São Paulo, 2011.

UNIDADES DE CONTEXTO

UNIDADES DE REGISTRO CATEGORIAS SUBCATEGORIAS

Envelhecimento Significado de ser Idoso

Não ficar velho Finitude/perdas

Viver Conflitualidades

Manter-se jovem Morte e doença

Novas experiências Sentimento confuso

Família Significado de Família

Filhos, netos Cuidado

Afetividade Religião

Enfim todos da família Estresse, conflitualidades,

sentimento confuso Amor/tudo, laços

Início da vida em família

Função da Família

Papel que exerce na família

Educação/saúde/segurança Deveres/obrigações

Religião

Amor Afetividade

Cuidado Conflitualidade,

Sentimento confuso

Expectativas em relação a

vida

Experiências motivadoras e

qualidade de vida

Cuidando dos netos Religião

Novas experiências Saúde

Amor Fé

Lazer (dançar, passear) Atividade física Ler e Escrever

Fonte: Grifo meu

A partir das unidades foi possível identificar as opiniões, atitudes, valores,

crenças e significados. Já as categorias surgiram da divisão dos componentes das

mensagens e a classificação de elementos constituídos de um conjunto.

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Essa fase correspondeu à preparação formal. O texto foi preparado e

codificado segundo as possibilidades de leitura do computador e segundo as

instruções do programa. O principal valor do programa de computador foi sua

capacidade de analisar grandes quantidades de texto, selecionando temas,

concentrando os temas e revelando as relações entre ele. O programa de

computador foi útil na conversão de dados qualitativos em apresentação gráfica.

Apresento na sequência a figura 16 com a representação gráfica da árvore

de categorias, visando explicitar a maneira como foi organizada a discussão dos

resultados. Procurei visualizar as categorias e como relacioná-las e busquei refletir

sobre o que elas estavam apontando.

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Figura 16. Representação gráfica das categorias e sub categorias utilizadas para análise. São Paulo, 2011.

Fonte: São Paulo, 2011.

Finitude/ perdas

Queixas Morte Crochê; tricô; Costurar; plantar

Doença Manter-se jovem/vivo

Novas experiências

Não ficar velho

Conflitualidades

Lazer

Significado de ser Idoso

Estresse Viver Conflitualidades

Experiências motivadoras

Cuidado Filhos, netos

Amor/tudo

Significado de família

ÁRVORE DAS

CATEGORIAS

Cuidado Saúde

Religião

Religião

Segurança Educação

Deveres e Obrigações

Religioso

Evangelização (prego a palavra)

Amor

Papel que exerce na família

Ler e escrever

Passear e dançar

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71

A seguir realizamos a inferência, tendo o indivíduo e a família como

produtores da mensagem. A análise visou obter um procedimento sistemático e

objetivo de descrição do conteúdo das mensagens que permitiram a inferência de

conhecimentos relativos ás condições de produção e recepção das mensagens. As

categorias criadas permitiram um aprofundamento no tema da pesquisa, mas não

impediram o surgimento de outras, significando mais do que um procedimento

técnico.

A decodificação da fala à luz das unidades de análise enriqueceu o estudo

delineando novos contextos simbólicos. Busco teoria e a prática no campo das

investigações sociais, passo refletir e analisar não os depoimentos (mensagens),

mas o que foi captado ao longo do convívio com os idosos e da comunicação não

verbal.

Apresento os grandes temas derivados da análise de dados, quais sejam:

- Envelhecimento

- Significado de família na perspectiva do idoso;

- Papel do idoso na família;

- Experiências motivadoras e qualidade de vida.

3.2. Envelhecimento: significado de ser idoso

O envelhecimento é um processo natural e fisiológico que sofre influências

sociais e culturais ou, é condicionado por elas. Até hoje muitos buscam as “fórmulas

de rejuvenescimento” ou o “elixir de longa vida” que impediriam o progresso do

envelhecimento, que muitas vezes é caracterizado como um período patológico, fato

que estimula muito mais o combate do que o conhecimento. Biologicamente, o

envelhecimento se inicia precocemente, logo após o término de desenvolvimento e

estabilização fisiológica, perdurando um longo período, mas só é perceptível quando

as alterações estruturais e/ou funcionais tornam-se claramente evidentes.

A literatura aponta o processo de envelhecimento sob os aspectos intrínsecos

e os extrínsecos. Os fatores intrínsecos são aqueles que estão relacionados

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intimamente com a genética de cada individuo e podem ser amenizados ou

prejudicados por hábitos pessoais e pela exposição ao meio ambiente em que vive.

A Organização Pan-Americana da Saúde descreve que os efeitos do ambiente

fisico-biológico sobre a saúde são decorrentes das mudanças ambientais que

ocorrem em todo o planeta. Os efeitos que não são percebidos tão diretamente

influem sobre a saúde humana com graves conseqüências para a qualidade de vida.

(BRASIL, 1999) Fatores que podem determinar os efeitos do envelhecimento sobre

aspectos incluem além da genética, o nível sócio econômico e educacional; as

relações sociais; a prática regular de atividade física, o consumo de álcool e tabaco

e; o tipo de trabalho. As abordagens teóricas em relação ao processo de

envelhecimento estão relacionadas com a qualidade de vida. Nesse contexto, alguns

autores destacam a importância do trabalho com estímulo e associação da

complexidade ambiental.

No campo da reflexão antropológica pode-se questionar se o envelhecimento

é um fato natural (fase universal de todas as coisas vivas) embora composta de

ritmos diversos segundo a espécie e as condições extrínsecas. No caso da espécie

homem pode-se dizer que há conceitos que são importantes para o entendimento da

questão: Envelhecimento é um fato que incide sobre todos os homens

independentemente de época, lugar e cultura. Para os antropólogos, o homem foi

moldado pela cultura e não pelo instinto. É universal, mas varia segundo a época,

lugar e condições de vida e herança genética. Varia tembém da individualidade. A

velhice se refere a uma construção sócio cultural (tanto quanto a infância ou

juventude). A diferenciação de velhice, ou de ser velho, depende de questões sócio

culturais. A idade cronológica é um demarcador social, define quando se adquire ou

perde direitos. (CONCONE e MURTA, 2009)

O comportamento humano varia culturalmente, tendo em vista os diversos

momentos históricos e as diferentes sociedades. Para Levi-Strauss, a existência de

regras e comportamentos, linguagem e pensamento apontam o universo da cultura,

o que pode significar o inverso do mundo da natureza. (MERCADANTE in NETTO,

2005)

No estudo sobre cultura, estão em causa atos simbólicos ou um conjunto de

atos simbólicos, estudá-la, segundo Geertz (1989), é realizar uma análise do

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discurso social. Para esse antropólogo, “a cultura consiste em estruturas de

significado socialmente estabelecidas” e, portanto, compartilhadas, é por isso e nos

termos dessas estruturas partilhadas, no seu exemplo, as “simples” piscadelas

podem ser amplamente interpretadas. De fato, é porque existem estruturas

partilhadas de significados é que “as pessoas fazem certas coisas (como as

‘piscadelas’) como sinais de conspiração e se aliam ou percebem os insultos e

respondem a eles.”

Podemos afirmar que velhice é um fenômeno biológico e também um

fenômeno social e cultural. Na questão cultural, devemos considerar os diversos

significados simbólicos criados pelos diferentes sujeitos em diferentes contextos

sobre o tema.

As diferenças ou desigualdades na situação de saúde entre um grupo de

idosos e um grupo de jovens são esperadas; por outras palavras é de se esperar

que a situação de saúde dos dois grupos seja diferente. Teremos desigualdades

ocasionadas por diferenças de idade, gênero e classes econômicas e sociais.

Temos conhecimento sobre as diferenças, o que não muda a situação de saúde e as

desigualdades decorrentes das condições sociais em que as pessoas vivem e

trabalham.

Os determinantes sociais da saúde podem influenciar no processo de

envelhecimento, pois incluem as condições gerais como socioeconômicas, culturais

e ambientais de uma sociedade e relacionam-se com as condições de vida e

trabalho de seus membros: habitação, saneamento, ambiente de trabalho, serviços

de saúde e educação, incluindo também a trama de redes sociais amplas e

comunitárias. Por outro ângulo Neri (2007) aponta o concurso de fatores diversos

que influenciam o envelhecimento, entre elas a exposição a marcadores biológicos

do desenvolvimento e do envelhecimento, a presença de maior ou menor

plasticidade comportamental, a existência de maior ou menor resiliência às formas

de socialização, os papéis sociais e o maior ou menor risco de viver eventos não

controláveis do curso da vida.

Camarano (2001) em seu estudo considera que a relação entre o

envelhecimento e a dependência não é tão clara; pois o envelhecimento é um

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fenômeno complexo e sujeito à interação de vários fatores. Um idoso pode cuidar

como também pode ser cuidado. O estudo de Moraes et al (2005), entretanto,

permitiu concluir que os fatores associados ao envelhecimento relacionados a

manutenção da independência para as atividades da vida diária, a autonomia e a

satisfação com o relacionamento familiar e as amizades foram fatores preditivos

para o envelhecimento bem sucedido.

A importância do suporte familiar para os idosos é ressaltada como uma rede

de apoio que pode ser verificada com outro olhar, pois à medida que uma pessoa se

aposente em boas condições de saúde, a preocupação pode ser minimizada.

(CAMARANO, 2001)

Nota-se que as afirmações acima se confirmaram em nosso estudo, pois cada

idoso vivencia seu envelhecimento de forma subjetiva, considerando os valores que

lhe foram atribuídos ao longo de sua vida. Sendo assim, pode-se ver que a velhice

não pode ser considerada uma fase isolada do desenvolvimento humano, mas sim

uma fase de um processo histórico e cultural.

[...] faz parte da vida, é bom ver tudo que fizemos e ainda podemos fazer... (ANGÉLICA) [...] acho que a gente constrói durante a vida toda a nossa forma de viver é que vai dizer quem é velho... (GÉRBERA) [... ] aprende a vida toda, agora com a experiência que ganhamos durante a vida, pode até ser que faria diferente, não me arrependo de nada, acho que fiz e faço até hoje o que Deus esperou de mim. (MARGARIDA) [...] não me sinto velha, quando a gente é velha é por que não consegue fazer mais nada, ta doente, ainda sou capaz de fazer quase tudo, minha mãe mesmo com 93 anos tinha uma cabeça boa, melhor que a minha, o corpo pode até estar cansado, o que mais importa e como a gente se sente e poder fazer os outros ficarem bem. (ALFAZEMA) [...] ficar velho é diferente de se sentir velho, quando adoeço me sinto velha,a gente não é velha o tempo todo, gosto muito da vida que tenho e a que tive, acho que vive cada momento da minha vida, muitos momentos difíceis, mas a gente com fé e amor a gente vai vencendo, a doença aparece em qualquer fase da vida, hoje tenho o marido da minha neta com câncer ainda jovem necessitando de ajuda até para ir ao banheiro, a gente fica velha e tem que procurar fazer de tudo para manter a saúde e boas relações com a família e todas as pessoas com quem convivemos e viver bem sempre em busca da felicidade nossa e da nossa família. (PALMA)

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O cuidado com a saúde, a prevenção e a própria tecnologia permitiram uma

expectativa de vida maior que pode ser aproveitada na fase da velhice.

Culturalmente e socialmente “mantém o sonho de torna-se ‘velho’ mantendo a

juventude”, os novos idosos se sentem mais saudáveis e mais produtivos do que no

passado onde velho era só sinônimo de incapacidade funcional e de dependência

(perdas).

[...] eu não me sinto velha... (MARGARIDA) [...] eu velha? Os outros não dizem nem a idade, eu tenho tantos anos, é assim que vivo, aceito, porque se não aceitar....(GIRASSOL) [...] sou velha, mas a mente é jovem (PRÍMULA) [...] a idade chega, mais o que importa é manter a mente jovem (ALFAZEMA) [...] acho que hoje as pessoas vivem mais, meus pais e avós morreram cedo, mas hoje nos cuidamos mais, fazemos exames, tratamos as doenças, não tenho nada grave, às vezes fico com alguma coisa, já melhoro, temos mais acompanhamento da saúde, as pessoas morriam e a gente nem sabia do quê, mudou muito, procuro fazer atividades para manter minha saúde, todos os dias escutamos falar das coisas se são boas para manter a saúde, procuro comer melhor e quero manter minha saúde. (PALMA) [...] eu me sinto velho quando não consigo fazer alguma coisa, mas a gente podendo fazer as coisas a gente se mantém jovem. Quando era mais jovem eu não dava valor para a vida, não me cuidava, hoje sofro as conseqüências do que fiz quando era mais novo, mas hoje com minha idade eu me cuido e procuro manter minha saúde, quero ficar bom e fazer tudo, porque velho tem direito de fazer tudo. (CRAVO)

Observa-se algumas contradições aparentes nas falas, que parecem oscilar

entre a “obrigação” de se reconhecer velho (referência no tempo Cronos7

As mudanças sociais influenciaram a forma de vivenciar a velhice. Idosos

mais jovens com idade entre 60 a 70 anos, mesmo com dificuldades

socioeconômicas, demonstram continuidade de atividades e da produtividade. Os

idosos brasileiros estão mais saudáveis, vivendo mais e mantendo-se ativos.

) e a auto-

percepção de vitalidade “não me sinto velho”, “sou velha, mas a mente é jovem”, “se

todos os jovens fossem velhos como eu”. Percebe-se que as duas percepções,

existe a racionalização: “velho” é aquele que depende do outro.

7 Cronos é um termo grego para designar o tempo, é medido pelo relógio, calendário, rotina. (CONCONE e MURTA, 2009)

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[...] só porque é velho, não tem deixar de fazer as coisas. (PRÍMULA) [...] eu acho, que sou velha, o tempo passou a gente fica velha (...) velho é aquele que depende do outro, eu não dependo de ninguém, são os outros que dependem de mim. (MARGARIDA) [...] sou velha, com pensamento de jovem (...) se todos os jovens fossem velhos como eu..não paro, eu que faço tudo...(PRIMULA) [...] vejo bastante oportunidade para os velhos hoje, atividades que não tivemos chance de fazer antes, agora temos chance de fazer tantas coisas boas, até aprender a mexer no computador, aprender escrever, dançar e passear. (ALFAZEMA) [...] a gente tem sempre o que fazer, às vezes nem dou conta de fazer todas as coisas que aparece para fazer, se não consigo cuidar da casa, mas sempre que posso gosto de participar dos grupos de idosos, da instituição. Quando meu ex-marido veio morar de novo em casa fiquei presa de novo, mas não estou mais agüentando, pois quero fazer minhas coisas e ele não deixa, tenho que resolver isso, ele terá que arrumar outro lugar para morar, quero minha vida de novo. (PALMA) [...] não vejo a hora de melhorar da minha perna para voltar a fazer as coisas, não quero parar, quando estou bom ando o dia todo, falo com um com outro, e disso que gosto de ficar com gente, de conversar com os vizinhos e participar...(CRAVO)

A perspectiva de um envelhecimento bem sucedido enfatiza o estilo de vida

escolhido por eles mesmos. A fala dos depoentes retrata que mesmo apesar de

todas as precariedades de recursos, o fato de serem idosos, não altera sua condição

e a qualidade de vida. A mudança de papel é referida quando existe perda da saúde

e de capacidade funcional.

[..] enquanto a gente tem saúde, a gente não é velho, quando perde (a saúde) aí sim. (MARGARIDA) [...] faço tudo, agora faço coisas que antes não tive chance de fazer... (GÉRBERA) [...] agora tenho até vaidade, cuido de mim, e faço até mais coisas. (ANGÉLICA) [...] saúde é bom sempre, olha aí a Lúcia tão nova e doente, desde criança. (MARGARIDA) [...] minha mãe morreu cuidando de mim com 66 anos e da mina irmã com problema na cabeça, a idade não quer dizer nada, minha filha tão nova nunca quis responsabilidade, enquanto minha mãe tão velha e tão sábia, sempre cuidou da casa e da família, mesmo doente, sempre foi ela que decidia tudo em casa. (...) quando a doença é no corpo do velho e a cabeça continua funcionando tudo continua igual, a minha mãe continuou

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mandando em tudo até o dia que morreu, mesmo na cama, ela que fala o que devia comprar, limpar, a comida ela que escolhia, a gente só fazia as coisas conforme o que ela mandava. (ALFAZEMA) [...] a saúde é tudo, enquanto a gente tem saúde, a gente faz tudo. Me ex-marido sempre foi tão trabalhador e não parava e agora que ficou cego nada tá bom, não se entende com os filhos e noras, acho até que ele está acabando com minha saúde, tudo que faço nada está bom, parece que desaprendi fazer tudo, até comida. (PALMA)

O processo de construção cultural do idoso destaca as qualidades que lhe

são atribuídas; embora amplas, possuem de um modo geral aspectos negativos do

envelhecimento, definindo-o como sujeito somente a perdas físicas e sociais.

(MERCADANTE in NETTO, 2005)

O idoso reconhece que existem perdas que fazem parte do envelhecimento

natural do ser humano, procura se adaptar a essa perdas de forma tranqüila e mudar

seu comportamento em busca de melhoria da sua condição física.

[...} tenho alguns problemas de saúde, mas quem não tem? Percebo que quando vou ao médico, sempre aparece alguma coisa nova, mas isso não muda nada, pois contínuo fazendo tudo e me cuido, se for bom faço, mudei a comida, tirei o sal. (LÓTUS) [...] tenho osteoporose, bico de papagaio, faço atividade física e procuro me alimentar bem (ANGÉLICA) [...] mesmo depois do derrame, fui melhorando e agora já consigo fazer minhas coisas, gosto de sair para fazer compras, costuro, meus filhos não gostam que (eu) saia sozinha, sempre alguém me acompanha (...) ajudo minha irmã, quando ela tem que levar o Robinho (neto) ou a Lúcia (filha) no médico eu acompanho, mesmo depois do derrame eu que ajudo, coitada já tem tanto problema. (MAGNÓLIA) [...] velho é assim dói aqui e ali, mas se não for eu agora quem é que vai cuidar dos meus netos e da minha irmã, a gente tem que enfrentar os problemas, ainda tô superando a morte da minha mãe, mesmo com a doença a gente tem que viver bem, procuro coisas que me dão alegria, vou no posto de saúde para me cuidar (...) outro dia achei que ia morrer fiquei com tanta dor no peito, aí pedi para Deus deixar eu continuar vivendo, pois como será a vida dos meus netos, só têm eu para cuidar... (ALFAZEMA) [...] o corpo fica velho, mas o pensamento tem que se manter e a vontade de viver também, apesar do corpo ficar velho agente tem que se cuidar, procuro fazer tudo para manter minha saúde, não é só de remédio que o idoso vive, precisa de alegria, amizades, de família, vizinho... (PALMA)

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O fato de envelhecer é considerado normal e inevitável, o que trás conflito

entre os idosos é a perda da capacidade funcional. Entre os idosos mais velhos há a

percepção da descontinuidade em relação ao funcionamento da velhice inicial, os

idosos ficam mais sujeitos à multimorbidade, perdas cognitivas e na capacidade de

aprender aumentando o risco de dependência. O surgimento de doenças

degenerativas e o fato de se tornar um fardo pesado para as gerações mais novas

preocupa os idosos que não querem trazer transtornos na dinâmica familiar.

[...] ficar velha não é nada, duro é ficar doente (...) já pedi para me levar pro asilo, ela (irmã) acha que dou muito trabalho, que não faço as coisas, que não quero fazer (...) ficar velha é isso, não poder decidir nada, pago minhas coisas, mas tenho que ficar aqui na casa dela, não quero ficar, não gosto de ficar aqui (...) agora tenho que me preparar para morte (...) meu marido foi embora quando fiquei velha e doente (JASMIM) [...] acho difícil quando a cabeça não funciona mas se a cabeça tiver funcionando (...) minha mãe morreu com 93 anos mas com a cabeça boa, mesmo na cama, ela sabia tudo e participava de tudo, todos a consideravam como uma sábia. (ALFAZEMA) [...] a doença é que não é bem vinda, o resto tudo é bom, a família cresce e a gente tem prazer de ver os filhos e os netos bem. (CRAVO)

Um dado considerado universal é que as mulheres vivem mais do que os

homens, essa vantagem pode ser atribuída pelas questões de morbidades e

culturais. A prevalência de doenças crônicas são maiores em mulheres, quanto mais

idosa, maior a chance de ser portadora de uma doença não transmissível. Já os

homens são acometidos de doenças isquêmicas do coração e violência, o que

acaba fazendo com que eles vivam menos. Em relação aos aspectos culturais,

percebe-se que a mulher se preocupa mais com a saúde dos que os homens,

participam de atividades educativas, consultas médicas e se propõem a mudar de

comportamento em pró a sua saúde.

[...] há quando o médico falou do meu colesterol, mudei tudo, não como nada que faz mal. (LÓTUS)

[...] prefiro frutas, legumes, verduras, o que faz bem pra saúde, tenho o colesterol alto, tive que mudar (hábitos), hoje não faço mais comida ‘gorda’... (MAGNÓLIA) [...] eu sabia, tenho diabetes, nunca me cuidei, agora tô sofrendo..tenho muita dor(...) acho que tem que cortar a perna toda(...)quem sabe depois não tenho mais dor, e posso sair por aí novamente. (CRAVO)

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[...] sou gorda, não sei por que, não como nada com gordura, cada vez como menos, faço comida sem gordura e sem sal, sem gosto, mas preciso né... (GÉRBERA) [...] agora o médico falou que tenho que fazer regime, comer de três em três horas, pouca quantidade, falou que meu colesterol e o açúcar estão altos, tenho que me cuidar. (ALFAZEMA) [...] me preocupo com a saúde, me alimento bem, faço caminhada e atividade física, gosto de fazer tudo que é bom para manter minha saúde. (PALMA) [...] como bem, escolho a comida com pouca gordura, como só o que é bom para saúde, tomo os medicamentos, faço atividade física, acho até que sou mais disposta que muitos jovens. (ANGÉLICA)

A pobreza, a baixa escolaridade, o baixo nível ocupacional, expõe os idosos a

maior risco de maus tratos, negligência, abandono, violência urbana e isolamento.

Mesmo diante da vulnerabilidade apresentada pelos sujeitos desta pesquisa, não

presenciamos maus tratos e isolamento (salvo nas falas de Jasmim). Ao mesmo

tempo, os idosos que fizeram parte do universo da investigação residem em um

bairro da periferia da cidade de São Paulo que tem como segunda causa de

mortalidade a violência, ficando somente atrás das doenças cardiovasculares. Se

eles mesmos não são vítimas de violência doméstica, a violência é vivida pelos

idosos e invade suas casas e famílias, gerando um estresse emocional e crônico.

Três idosos perderam seus filhos por morte violenta próximo de sua residência e

procuram estratégias para suportar o sofrimento e se recuperar emocionalmente.

[...] era o melhor filho, mataram ele, saindo do trabalho, era segurança aqui do hospital (...) acabou tudo, a gente tem continuar vivendo... (FRÉSIA) [...] meu filho foi morto aqui próximo de casa, era um bom filho, nunca mais fui a mesma, choro todos os dias (...) mas procuro fazer outras coisas... (FRÉSIA) [...] é difícil perder um filho assim... (PRÍMULA)

As estratégias de enfretamento vividas por esses idosos agrupam-se em

fatores como religiosidade, apoio familiar e rede social. Fatores que serão discutidos

mais adiante. A solidão e tristeza desses idosos são amenizados pelos grupos que

se formam nas igrejas e outras entidades.

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3.3. Significado de Família: cuidado, laços, afetividade e religião

Os contextos teóricos servem para nos lembrar a importância e o significado

da família para cada um de seus membros e em especial para os idosos,

responsáveis pela configuração do estudo. A história da família contada pelos seus

precursores nos dá uma dimensão especial para família contemporânea.

A cultura é um produto social que organiza toda a vida dos indivíduos e da

comunidade, tanto determinando o modo de viver, os costumes e sua transmissão

de geração a geração como por promover as ações que criam as instituições sociais

como família, religião, formas de trabalho distribuição de tarefas entre outras. Chaui

(2003) inspirada numa visão antropológica afirma que os seres humanos são

capazes de criar uma ordem de existência que não é simplesmente natural e sim

uma ordem simbólica. Mais fiel entretanto, a uma perspectiva antropológica, diria

que tal “existência natural” é de fato culturalmente construída.

Nessa perspectiva retomamos a obra de Bastos (1986), que em seu estudo,

procurou desvendar na obra de Gilberto Freire, nas inúmeras leituras, o pensamento

brasileiro, aceitando ou rejeitando diferentes explicações sobre a formação nacional

e a simbologia. Nesse sentido, o autor considera que as obras ajudam a

compreensão no que se refere ao espaço subalterno, como a escravidão, mulher,

menino, sexo, religiosidade, magia, alimentação, envelhecimento, habitação, família,

entre outros personagens e situações que ajudam a redescobrir dimensões às vezes

essenciais de uma realidade social e cultural que não estava sendo questionada,

codificada, conceituada em muitas das análises anteriores e contemporâneas.

Apresenta ainda a questão cultural como ordem simbólica e interpreta a cultura

como fruto de capacidade do ser humano de atribuir para si mesmo regras e normas

que asseguram a existência e conservação da comunidade.

Os símbolos surgem para interpretar a realidade, dando-lhe sentido. A

cultura como um conjunto de práticas e comportamentos, ações e instituições pelas

quais os seres humanos se relacionam entre si e com a natureza e dela se

distinguem, modificam os rituais de trabalho, rituais religiosos e rituais familiares. A

criação simbólica ainda determina valores nas relações humanas como: fertilidade,

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forma de tratamento de acordo com a faixa etária (crianças e velhos) e formas de

relação de poder. (CHAUI, 2003). A cultura não pode ser vista como estática, de fato

está sempre em mudança. Os comportamentos variam de formação social para

formação social e podem variar numa mesma sociedade entre segmentos e no

decorrer do tempo. Segundo Prost e Vincent (1992) falar sobre o comportamento e

evolução da família parece ser simples, pois os estudos revelam que a família

perdeu suas funções públicas e passou a ter funções privadas. A mudança de

funções favorece a privatização da família e uma desinstitucionalização. Contudo, as

famílias que agora desempenham suas funções privadas, já não são as mesmas

que desempenhavam funções públicas. Observa-se em nossa sociedade que as

famílias passaram a ser “informais”. Conquistaram o direito de ter uma vida privada

autônoma.

Por meio desse parâmetro fiz uma revisão das principais mudanças ocorridas

e procuro identificar as obrigações fundamentais na família ocidental.

Dentre os diversos fatores que contribuíram (e ao mesmo tempo são sinais

da mudança) para a mudança na família, alguns autores destacam o divórcio, a

participação da mulher no mercado de trabalho, o exercício da sexualidade e o

crescimento do individualismo.

A partir da industrialização e das mudanças demográficas do século

dezenove, observa-se uma diferenciação gradual entre os grupos de idade e

mudanças relacionadas às funções e à idade. Na família, as configurações de idade

ainda eram consideravelmente diferentes da atual; o declínio da natalidade afetou

tanto o tamanho da família como as configurações de idade.

Para Hareven (1999), “uma das principais mudanças históricas a esse

respeito foi a transição da grande família para uma menor, e do amplo espectro de

idade dos filhos na família mais extensa para família comprimida, com 2-3 filhos de

idades próximas”. O número maior de filhos significava, além de uma grande família,

também a diversidade de suas idades.

Com o aumento da população idosa, aliada à diminuição do tamanho

ocorreram modificações sociais importantes que afetam a capacidade da família em

prestar apoio a seus membros idosos. Dentro das funções da família, o papel da

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mulher sempre esteve ligado aos cuidados da casa, dos filhos, dos doentes e dos

idosos. Com a inserção da mulher no mercado de trabalho, a família perdeu a

capacidade de prestar apoio aos seus membros idosos. Outro fator importante é a

queda fecundidade que pode representar uma redução sensível da rede potencial de

apoio para as futuras gerações. (ROUQUAYROL, 2003)

Apesar das baixas taxas atuais de fecundidade, a população brasileira idosa

possui um número grande de filhos, como resultado da fecundidade passada. A

partir de dados de um trabalho de Berquó e Cavenaghi (2006), pode-se observar a

da taxa de fecundidade entre as diversas faixas de rendimento médio domiciliar per

capita.

As pesquisas demonstram que famílias com um maior número de filhos

contam com os mais jovens para cuidar dos pais idosos. Essas famílias não

vivenciavam o “ninho vazio”. Em nosso estudo, o número de filhos entre os

entrevistados ainda é grande como a coabitação; nas regiões periféricas da cidade

de São Paulo, tem-se o advento do desemprego e a ausência de moradia, de modo

que os filhos, mesmo após o casamento, permanecem na mesma casa dos idosos

além de muitos também serem responsáveis financeiramente por filhos e netos.

Verificamos que os idosos que fizeram parte do nosso estudo ainda são

responsáveis pelo sustento da família, não necessitando do apoio financeiro e

poucos necessitam de cuidados oferecidos pelos filhos. O casamento de algumas

das idosas entrevistadas terminou com a morte do esposo antes mesmo da criação

dos filhos, dificultando ainda mais a situação precária em que viviam, mas isso não

influenciou na educação dos filhos e netos. As mulheres idosas mesmo diante de

circunstâncias desfavoráveis aceitam as adversidades da vida para suprir as

necessidades da família. Para a idosa o seu desempenho como boa dona de casa

implica em controlar o dinheiro recebido, priorizando os gastos com a alimentação

dos filhos e netos.

Ter a família como símbolo de “amor, acolhimento e proteção” significa

privilegiar a ordem moral sobre a ordem legal, assim as exigências dos direitos

universais de cidadania, com freqüência conflitantes com os critérios pessoais

dificultam estabelecer critérios morais universais. Nota-se que a família ainda é o

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núcleo responsável pela promoção, desenvolvimento e bem estar dos seus

membros.

Sarti (2007) escreve que o universo moral é constituído por uma cadeia de

relações sociais ordenada pela reciprocidade entre três obrigações fundamentais:

dar, receber e retribuir.

A manutenção da família, assim como a maternidade, faz parte do curso da

vida e envolve as mulheres em papéis familiares ativos até a velhice. Observarmos

vínculos fortes entre idosos e familiares, especialmente entre os avós e netos.

[...] minhas filhas, meu netos, meus genros, minha bisnetinha, as mães dos meus genros, marido da minha neta(...) é a minha vida.... (ANGÉLICA) [...] .família é tudo, como eu amo a família, os filhos, netos, meus irmãos, a igreja... (GÉRBERA) [...] cuido do Robinho (neto) desde as fraldas (...) A mãe nunca cuidou, sempre foi eu, ele fala que me ama (...) eu que sou a mãe, acha a mãe de Lúcia.... (MARGARIDA) [...] cuido dos meus netos, moram na minha casa desde pequenos, eles me ajudam arrumar a casa, cuido como se fosse meus filhos. (MAGNÓLIA) [...] esperei sete anos para nascer minha tão esperada neta (...) ela é tudo, sabida, fala com todos, é inteligente. (GÉRBERA) [...] Meus netos são minha vida, se não fosse eles o que ia fazer da minha vida, moram comigo desde o nascimento, são como meus filhos. (...) minha filha mais nova, nunca teve juízo, bebe muito, mas eu como mãe, não posso abandonar, quando ela precisa, estou sempre aqui de portas abertas para ela. (ALFAZEMA) [...] minha família é tudo, hoje a minha alegria é poder cuidar do meu netinho mais novo, ele me faz sentir capaz e útil. (PALMA)

Estes depoimentos mostram a resistência do modelo da mãe cuidadora entre

nossas depoentes idosas, malgrado as mudanças na instituição família como

indicamos antes e na sequência. Segundo Hareven (1999), a principal mudança

observada no século passado e atualmente é que as necessidades coletivas

vivenciadas pela família passaram a ser individualizadas. As mudanças que levaram

ao isolamento dos indivíduos mais velhos hoje se enraízam não tanto em mudanças

na estrutura familiar ou nos arranjos residenciais, mas nas mudanças de papéis e

valores da família. Para Airês (1978), “a família moderna se separa do mundo e

impõe a sociedade grupos isolados de pais e filhos. À medida que a maior

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diferenciação entre os estágios da vida começou a se desenvolver, as funções

sociais e econômicas tornaram-se mais relacionados à idade, aumentando a

segregação entre os grupos etários.

No processo de evolução das famílias, percebe-se de certa forma, que os

lares podem ser compostos por uma única pessoa, onde vivem a vida privada

doméstica tornando-se uma vida privada individual.

As transformações culturais e socioeconômicas do século passado levaram

gradualmente a uma separação do trabalho de outros aspectos da vida e a um

abandono dos valores familiares em favor do individualismo e da privacidade. Os

idosos criam possibilidades para o desenvolvimento material dos filhos e netos,

favorecendo o individualismo e o distanciamento destes de suas obrigações

coletivas na família. “Toda energia do grupo é gasta em ajudar os filhos a subir na

vida, individualmente e sem qualquer ambição coletiva.”

[...] eles trabalham, tem a vida deles, todos trabalham, são bons filhos. (GÉRBERA) [...] eu não estudei não, só trabalhei na roça, mas tenho uma neta até na faculdade... (LÓTUS) [...] criei sozinha os quatro, sabe né, o Jair sai cedo, eu que fazia tudo, todos estudaram, tem a vida deles(...)se precisar eu ajudo. (GÉRBERA) [...] quando era moça não tive chance de estudar, mas minhas filhas todas estudaram, hoje trabalham e tem a vida delas. (ALFAZEMA) [...] sempre vivi para a minha família, vim de uma família sofrida, mas que permaneceu unida, e procuro manter minha família unida, e gosto de fazer as coisas para ajudar todos, não tenho dinheiro para ajudar, mas sempre tem um lugar para todos na minha casa. Meus filhos estão bem casados e são bons filhos, é isso que a gente fica feliz. (PALMA)

De novo, os depoimentos colhidos mostram continuidades e mudanças: estas

mulheres reconhecem o individualismo dos filhos (têm a própria vida) e

desempenham papéis tradicionais (cuidadoras), mas também incorporam novos

(provedoras).

A família pode ser vista como um sistema dinâmico no qual seus membros

estão envolvidos emocionalmente uns com os outros. O termo envolvimento

emocional implica em obrigações e responsabilidades dentro do contexto familiar ao

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longo do ciclo vital. Em todos os estágios da vida, a família tem sua importância,

mas nos extremos, muitas vezes se torna essencial. É o sistema considerado ideal

para o equilíbrio afetivo e físico das pessoas, permitindo um desenvolvimento

“natural” e valorizando as suas potencialidades de maneira global. É o que dizem as

mulheres ouvidas:

[...] a família não perdeu a importância, acho que a relação de família tem que ter sempre(...)pode ser que algumas casas não tenham. (ANGÉLICA) [...] é bom né, às vezes até cansa, fazer o que, família é assim, é bom e ruim ao mesmo tempo, mas a gente não sabe viver sem. (PRÍMULA) [...] a gente quando é moça pensa que os filhos vão crescer e não vão dar mais trabalho, que nada, aí vem os netos também para a gente cuidar, fica tudo com a gente. (PRÍMULA) [...] não sei quem vai cuidar de mim se eu precisar com certeza vai ser alguém da família, pois família é assim, sempre um cuida do outro, hoje cuido dos meus netos, quando preciso de alguma coisa telefono pra um, pra outro e, sempre aparece alguém para ajudar. (ALFAZEMA) [...] a família é o lugar que sempre tem apoio, por pior que é a família, sempre existe um apoio, na minha família a gente apóia um ao outro, procurando ajudar todos, o que esta melhor ajuda o outro, continuo cuidando de todos, precisou é só chamar a mãe, a avó. Cuido até do ex- marido, Ele também é da família, dele às vezes canso, ele me explora, mas faço tudo para ele ficar bem. (PALMA)

As etapas evolutivas da família vão desde a formação do casal, passado pelo

nascimento dos filhos, até a etapa dos filhos adultos. Percebe-se que diferentemente

do que se espera “ninho vazio” entre os idosos, nos deparamos com os avôs ainda

responsáveis pela criação de seus netos. Constatamos que as famílias ampliadas

estão presentes em nosso cotidiano, compostas por avós e netos, principalmente na

periferia da cidade, que de alguma forma provêm as necessidades de apoio

financeiro, educação e de saúde de seus membros.

A deficiência de direitos e de políticas sociais efetivas na velhice faz com que

a família seja o principal recurso para os idosos. Diante das circunstâncias adversas,

a solidariedade surge como recursos para enfretamento das condições de

envelhecimento e pobreza. Nos contatos que mantive com os idosos, percebi que

são os familiares, vizinhos, amigos e irmãos da igreja que compõem a rede de apoio

necessário para manutenção da vida.

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[...] minhas filhas se precisar solicito ajuda. (ANGÉLICA) [...] o Ismael (filho) que me ajuda, vai ao mercado, me deu esta casa(...) ajuda só de Deus mesmo, mas se precisar os irmãos oram por nós. (MARGARIDA) [...] a gente sofre quando tem outro irmão sofrendo, um ajuda o outro, para isso que serve a irmandade né. (GÉRBERA) [...] hoje em dia é difícil contar com alguém, só com aqueles mais próximos, muitas vezes os filhos não podem ajudar, mas sempre tem irmão (igreja) que pode. (MAGNÓLIA) [...] preciso de ajuda, chamo os meus vizinhos e também os irmãos da igreja. (PRÍMULA) [...] posso contar com a esposa do meu neto, meus netos e meus vizinhos também se precisar, posso contar. (ALFAZEMA) [...] minha filha mais velha é quem mais me ajuda, converso mais e posso contar tudo. Ela paga meu convênio, eu não peço nada eles que acharam melhor pagar um convênio. A gente fica feliz de saber que alguém se preocupa com a gente, mesmo sem a gente pedir. O meu filho mais novo ainda conta com minha ajuda, ganha pouco e eu que cuido do filho dele com muito prazer, acho que é o que me dá mais prazer, faço a comida para eles almoçarem em casa. Quando ele ficou desempregado eu ajudava ele com a comida, eles comiam só na minha casa.(PALMA)

As redes sociais e comunitárias, incluídas no modelo de Dahlgren e

Whitehead entre os determinantes sociais da saúde, entendido este modelo como o

conjunto das relações de solidariedade e confiança entre pessoas e grupos. Existem

diferentes formas de participação social como pertencer a grupos religiosos,

associações sindicais, associações de moradores e clubes de recreação também

representam formas pelas quais grupos de pessoas mantêm-se em contato e

estabelecem vínculos sociais.

[...] ir para igreja e como estar no céu, todos te tratam bem, é um ambiente bom tranqüilo onde todos são iguais (...) quando a gente faz exercício junto com o pessoal do posto, é bom, a gente fica junto, não tem diferença. (PRÍMULA) [...] é o melhor lugar, vou todos os dias, eu encontro a paz. (MARGARIDA) [...] gosto muito de receber gente em casa, de conversar, sair de casa, sempre chamo uma vizinha (amiga) pra gente sair, ir até o posto, para andar. (ALFAZEMA) [...] participo de atividades espíritas, sempre participei, gosto das reuniões e palestras, participo de encontros da terceira idade, faço viagens com o pessoal do centro espírita. (PALMA)

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Ao indagarmos sobre o significado de família; apesar das diferenças em sua

estrutura e composição, vê-se que ela continua desempenhando um papel

importante para os idosos, mesmo havendo mudança nos papéis familiares, com a

mulher no mercado de trabalho e o conflito entre a afirmação da individualidade e as

possibilidades do mundo contemporâneo; nosso estudo mostra, como destacamos

anteriormente, a tradição sendo mantida a todo custo, no que diz a respeito às

obrigações e as responsabilidades próprias dos vínculos familiares.

[...] família? Família é tudo. (MARGARIDA) [...] filhos são riquezas, eu levei quinze anos para aceitar, que a minha menina morreu, guardei as coisas dela, isso é idolatria (...) família é convivência, lá em casa... (GÉRBERA) [...] é muito importante, minha razão de viver... (ANGÉLICA) [...] família, mãe, filhos, os irmãos da igreja... (PRÍMULA) [...] minha mãe, filhos, a igreja, os vizinhos (...) valorizo a família que tenho, pois não tive uma família, construí depois do casamento (...) meus filhos, minha mãe, ele mesmo (marido) família é tudo. (MARGARIDA) [...] família é tudo, a vida da gente começa na família e acaba também na família, a gente vive pra família. (ALFAZEMA) [...] família são os filhos, netos, os parentes, os amigos e todos que amamos (PALMA) [...] minha família é grande e é tudo, tudo começa com a família, os filhos são bons né. (CRAVO)

No desenrolar da história, observamos que as relações familiares envolvem

significados emocionais. Estudiosos da sociedade apontam que a estrutura social

pode ser descrita por meio de esboço das relações familiares nela vigentes. Para

alguns estudiosos, uma sociedade perderia seu vigor quando as pessoas deixam de

cumprir suas obrigações na família. A abordagem sociológica focaliza a família como

instituição social e como sua única e peculiar característica o aspecto social da

interação familiar. Os sistemas familiares apresentam características de legitimidade

e autoridade. Os valores relativos à família ou direitos e deveres inerentes aos status

família, as categorias de pai, filho, avô, são peculiares no nível sociológico.

(GOODE, 1970)

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A família carrega ainda grandes significados como afetividade e o cuidado. Elsen (1984) se refere à família como um sistema de saúde para seus membros.

Ainda em seu estudo identificou a família como portadora de um conjunto de valores,

conhecimentos, práticas e crenças, sendo o principal pilar de promoção da saúde de

seus membros. E é nesse sistema que ocorre todo o processo de cuidado, no qual

a família toma para si toda responsabilidade e iniciativas frente às dificuldades. O

cuidado, no nosso estudo, também se refere ao amor fraternal, proteção,

prevenção, afetividade, alimentação, educação, moradia, trabalho, formação ética e

religiosa; nesta medida, vai muito além de um “sistema de saúde” num sentido

estrito; abarca as próprias condições de produção de saúde em sentido amplo.

[...] sei lá, como a gente fala, a gente quer agradar e acarinhar quer tratar tudo por igual, não desfazer de ninguém, é cuidado que a gente tem bastante, é aí que cansa a mente, será que cuidei bem, será que tratei bem, será que não machuquei ninguém... (GÉRBERA) [...] cuidei da mãe, só vim para São Paulo quando ela morreu, essa doença é de família (...) agora cuido dela (...) não tem ninguém para cuidar né (...) fazer caridade né, eu cuido, meu marido cuida, meus filhos ajudam... (LÒTUS) [...] tenho que cuidar dela, a Lúcia (filha) sempre foi doente, desde pequena, aprendeu ler e escrever, mas é diferente dos outros, se pudesse não queria mais cuidar, se eu não cuidar, quem é que vai cuidar...cada vez pior..(MARGARIDA) [...] os filhos não podem ficar largados, a família é importante para educação das crianças, para as pessoas também (...) sou companhia, amizade e amor (...) desejo a minha família com muita saúde e que se mantenham sempre unidos, todos unidos. (ANGÉLICA) [...] eu não cuidei das minhas filhas, minha mãe não deixava, ela colocava o berço no quarto dela, mas com os netos tive que aprender; minha filha os deixava pra eu cuidar e ia embora, cuido até hoje... (ALFAZEMA) [...] cuido do ex-marido, os filhos não podem cuidar, eles trabalham e tem a vida deles, então sou eu que tenho que cuidar, ele foi um homem bom e um bom marido, mas não sei o que aconteceu, agora tá ficando difícil de cuidar. (PALMA)

Esse cuidado com a família não termina com o crescimento e

desenvolvimento dos filhos/netos, os idosos continuam se achando responsáveis por

aqueles que consideram como parte de sua família. Assim, mesmo enfrentando

situações desconfortáveis, ou até mesmo adversas, os indivíduos procuram apoiar

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seus próximos, mesmo que em detrimento de sua qualidade de vida. Os sujeitos

acreditam ser capazes de contribuír para formação dos membros familiares. É

interessante notar que há uma certa hierarquia no cuidar: “ eu cuido”, “meu marido

cuida”, “meus filhos ajudam”. Em alguns casos os filhos não são protagonistas, mas

coadjuvantes.

[...] na casa das minhas filhas, recolho roupa, lavo uma louça, dobro uma roupa, penduro as roupas, ajudo no que posso. (ANGÉLICA) [...] tenho que cuidar (irmã) né, ela ficou doente, não tem ninguém, não teve filhos... (GIRASSOL) [...] peço ajuda pro filhos, daqui posso ajudar ou ser ajudada, não quero ir pro norte nada, não deixo a família (...) sinto necessidade de cuidar, cuido dos bichinhos como se fossem meus filhos (...) deixo de comer as frutas para deixar pro meus bichinhos (...) Acordo e vou cozinhar para eles... (MARGARIDA) [...] precisou cuido, é nossa vida é cuidar, às vezes até canso. (PRÍMULA) [...] quando minha filha precisa de ajuda, mesmo sabendo que ela não tem juízo eu ajudo, a mãe tem ajudar se eu não ajudar quem é que vai ajudar. (ALFAZEMA) [...] minha função agora é ensinar meu netinho o que é certo e errado, a gente cuida dos filhos e dos netos, sempre com amor, para serem bons, a gente tem que educar para o bem, o mundo tá difícil. (PALMA)

Percebemos que apesar das mudanças na estrutura familiar, principalmente

na área urbana, entre as populações de baixa renda, a definição de família é aquela

que encontramos na literatura, onde a “família surge de união estável entre o homem

e a mulher e a união formada por qualquer um dos pais e seus descendentes”, mas

também ultrapassa os limites dos laços consangüíneos, envolvendo a rede de

parentesco mais ampla. As dificuldades de manter o padrão conjugal de família,

dificuldades enfrentadas para a realização dos papéis familiares no núcleo conjugal,

uniões instáveis e empregos incertos, levam a arranjos que envolvem a rede de

parentesco como um todo, para viabilizar a existência da família, tal como é

concebida. Assim, notamos que os idosos entrevistados ampliam o conceito clássico

quando incluem na família outros membros sem laços afinidade ou consangüíneos,

como os “irmãos da igreja” ou até mesmo outras pessoas (vizinhos, amigos) com as

quais possam contar, solicitar ajuda se necessário

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[...] meu ex-marido também é da família, ele é família, é pai das minhas filhas. (ANGÉLICA) [...] a é também o pessoal da igreja são família também, amigos né, precisa de ajuda. (MAGNÓLIA) [...] minha mãe ficou casada com meu pai até a morte, eu também, acredito que família começa assim com o casamento, considero também da família as pessoas que a gente gosta, a família que adotou minha neta, é também minha família, as pessoas que a gente pode contar considera da família, algumas pessoas que nem são da família a gente conta mais que minha filha mais velha, que nem liga para mim... (ALFAZEMA) [...] meus filhos, netos, meu filho adotivo e minha neta adotiva, não importa o sangue e sim o amor. (PALMA)

Família é pois, uma categoria mais ampla nestas representações; de fato

família entra como “sinônimo” de afeição, confiança, apoio. Diversos trabalhos têm

sido realizados em torno do apoio social. Os termos mais utilizados freqüentemente

na literatura são apoio social e redes sociais, entretanto, é comum encontrarmos

termos como relações sociais, integração social, vínculos sociais e ancoragem

social, sendo empregados indistintamente. Por não haver consenso a respeito do

sentido de apoio social, ao qual na maioria das vezes associam-se as dimensões de

saúde do indivíduo, boa parte dos investigadores concorda que tal categoria seria

composta por uma estrutura e uma função. Os nossos entrevistados reconhecem a

importância desse apoio social e definem a seu modo tais relações sociais como

“família”.

Lebrão (2007) em sua pesquisa cita que a função do apoio abrange aspectos

qualitativos e comportamentais das relações sociais como apoio emocional (envolve

expressões de amor e afeição); apoio instrumental ou material; apoio de informação

que compreende informações (aconselhamentos, sugestões, orientações) que

podem ser usadas para lidar com problemas e resolvê-los; e interação social positiva

que diz respeito à disponibilidade de pessoas com quem se divertir e relaxar.

O apoio emocional é valorizado e citado como um apoio fundamental para a

manutenção das relações. Os vizinhos são considerados uma rede de apoio

significativa para os idosos pobres.

[...] vizinho aqui, é a coisa melhor que tem, sempre pode contar. (GIRASSOL)

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[...] um ajuda o outro, os problemas sempre aparecem, cada vez é a hora de um ajudar, e assim vai a vida. (MAGNÓLIA) [...] se fica doente, ou necessita de alguma coisa, a gente ajuda. (FRÉSIA) [...] se não ajudar como é que faz, um dia são os outros, no outro somos nós (PRÍMULA) [...] moro aqui no bairro há muito tempo, quando vim morar aqui não tinha nada, as coisas agora são melhores, a gente conhece todo mundo, é bom ter vizinho, a gente conta um com outro, quando não posso pegar meu neto na escola peço para minha vizinha e assim vai, quando um precisa o outro ajuda. (ALFAZEMA) [...] a gente mora aqui e é bom a gente conhecer todo mundo, um ajuda o outro. (CRAVO)

Alguns estudos confirmam diferenças na estrutura das relações sociais

conforme a idade. Em termos gerais as pessoas jovens tendem a ter mais contatos e

mais apoio instrumental. Esses achados não consistentes com os desta pesquisa, o

apoio social (instrumental) é presente e fortalecido entre os entrevistados. Apoio

realizado por vizinhos, “irmãos da igreja”, agentes de saúde e familiares. A

solidariedade e as relações sociais entre os idosos pobres é claramente perceptível.

O apoio instrumental como os auxílios concretos e trabalhos práticos

(limpeza de casa, provimento de transporte) foram identificados nos depoimentos.

[...] precisou é só chamar, sempre tem alguém para ajudar (JASMIM) [...] minha filha vem e limpa toda casa (...) meu filho me trouxe da Bahia e me deu essa casa, me leva para todo lugar que preciso. (MARGARIDA) [...] quando preciso ir ao hospital, minha filha arruma um carro do vizinho emprestado (...) essa aí (filha) que me leva para todo canto, cozinha e cuida de mim, até a minha ex-mulher cuida de mim, os vizinhos, nora, todo mundo. (CRAVO) [...] na hora da urgência, a gente conta só com os vizinhos, é mais que família né? (...) aqui é bom de morar, sempre podemos contar com ajuda de um ou de outro, todo mundo se ajuda, São Paulo é muito bom, e aqui é melhor ainda... (GIRASSOL) [...] a minha neta limpa casa, faz comida, é minha amiga, converso muito com ela, é minha companheira. (ALFAZEMA)

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A interação social é retratada pela necessidade do convívio com outras

pessoas e gerações. A possibilidade compartilhar e ajudar faz parte do apoio

demonstrado por estes idosos.

[...] você tem alguém que tá desempregado é como se fosse seu filho, se tem alguém doente a gente sofre com os irmãos, é bom demais, é tudo irmão (da igreja). (GÉRBERA) [...] o quintal não é meu, mas moro aqui, então enquanto eu estiver aqui, deixo o pessoal usar para fazer as atividades de exercícios e outras coisas, é muito gostoso a gente se reunir, é como brincar... (PRÍMULA) [...] eu ajudo o posto (cede o espaço para atividades da UBS) e ele me ajuda. (LÓTUS)

Os idosos entrevistados falam também dos agentes comunitários de saúde

(ACS) como parte importante das suas redes de apoio; os ACS estão presentes no

cotidiano dessas pessoas e contribuem para as orientações visando uma vida mais

saudável. [..] e não fosse ela (ACS) para me ajudar nesses problemas que tenho, tanta coisa na minha cabeça, não sei ler, ela que ajuda saber as coisas que tem fazer, os remédios. (MARGARIDA) [...] ah! se não fossem essas meninas (ACS) aqui, não sei, só elas mesmo pra se importar com a gente. (GIRASSOL) [...] as meninas (ACS) se importam com a gente, fala as coisas boas para nós. (JASMIM) [...] valem ouro, elas (ACS) são igual da família, elas dão conselhos, ajudam a gente a viver melhor, mesmo com os problemas que agente tem. (LÓTUS)

Podemos afirmar que essas relações sociais surgiram no decorrer da vida,

são pessoas que residem no mesmo bairro desde a idade adulta com dificuldades

semelhantes e que buscam o enfretamento contando com o apoio mútuo da

comunidade. Lutaram por bens comuns como saneamento básico, educação,

transporte, saúde e também por condições favoráveis ao bem estar da família e da

comunidade, fornecendo apoio àqueles que dele precisam.

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3.4. Função na família: papel que exerce na família As considerações a seguir dão prosseguimento às reflexões sobre as funções

na família e os papéis que exercem nela. A cultura mantém-se viva por meio da

transmissão necessária à sociedade; modos de fazer, valores, maneiras de ser e de

relacionar são ensinados e aprendidos de geração a geração. A família possibilita a

socialização primária, estabelecida por vínculos entre seus membros, criando

condições para que cultura de uma dada sociedade, grupo ou segmento seja

transmitida à criança. A cultura é acervo de conhecimentos e teia de significados e é

antes de tudo, a estratégia de sobrevivência da espécie.

A ligação entre o biológico e cultural pode ser verificada por meio da

necessidade de se incluir no conteúdo da socialização, não apenas a motivação

para que uma geração socialize a seguinte, mas que haja repetição do processo,

sendo as obrigações vinculadas aos papéis fixos para uma ou várias pessoas

determinadas. Espera-se que cada membro da família desempenhe suas obrigações

em cada fase da vida, como a mãe que deve cuidar e educar os filhos, que os

idosos sejam cuidados pelos familiares mais novos, sendo esses papéis

determinados e esperados pela sociedade. É evidente que as obrigações, os modos

e os conteúdos de cada cultura mudam, mas mudança e continuidade são faces da

mesma moeda.

Para Goode (1970), “o resultado mais importante do processo de socialização

é o fato de os indivíduos passarem a desejar realizar as tarefas que devem ser

realizadas para que a sociedade e seus membros sobrevivam”. Nessa perspectiva,

os membros são motivados a se satisfazerem individualmente, desempenhando os

deveres vinculados aos papéis que exercem ao realizar tarefas que contribuem para

a permanência do próprio grupo e da sociedade. Dentro dos papéis que

desempenham, podem ser punidos ou gratificados por cumprirem com as

obrigações, as quais, em sua maior parte, não são obrigações para com a

sociedade, mas para com indivíduos ou grupos particulares.

Cerveny e Berthould (2002) fala que a família possui uma expectativa que é

de “colher o que plantou” ao longo do ciclo vital. A expectativa de continuidade que

traduz a perpetuação da família que se retrata na figura dos netos, que são tão

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esperados por aqueles que não se tornaram avós; para aqueles que já se tornaram,

o desejo de poder acompanhar o desenvolvimento dos netos, e, quem sabe, vê-los

encaminhados na vida. Herança no sentido de contribuir para formação dos filhos e

netos, como estudo, trabalho e principalmente valores.

Para nossos entrevistados, entre os papéis que exercem na família foram

destacados a educação de seus membros, preparação para sociedade e

sobrevivência.

[...] a família começou com meu casamento, aí a gente vive para criar os filhos, fazer deles bons, mostrar a vida para eles, ensinar o certo e o errado, esse é o papel nosso. (LÓTUS) [...] nossa responsabilidade é fazer os filhos serem bons, até para que eles não sofram. (FRÉSIA) [...] eu não estudei, só trabalhei na roça, mas pros filhos a gente quer o melhor é mostrar o caminho certo. (PRÍMULA) [...] a gente quer o melhor pros filhos e netos, coloca na escola, dá educação e ensina o certo e errado. (ALFAZEMA)

O ser humano depende de outro socializado para sobreviver ao nascer,

sendo esse o principal vínculo entre a sobrevivência biológica da espécie humana e

o sistema social da família. Entre o biológico e social, a cultura é a mediação por

meio da transmissão entre as gerações. Para Goode (1970), “a cultura só terá

continuidade se resolver os problemas de sobrevivência biológica do homem”.

Dessa forma, ele afirma que a continuidade biológica é assegurada por meio de

padrões culturais transmitidos pelo processo de socialização e a família é a invenção

social que auxilia parcialmente a transformação de um organismo biológico em ser

humano. Vínculos significativos com a família são construídos ao longo da vida.

[...] sou casada há 44 anos, ah! é bom, agora (velhice) é melhor ainda, somos companheiros, se não fosse nossa união, para criar os filhos... (GÉRBERA) [...] a gente casa, e constrói a família, não tinha família, fui abandonada, fiz família quando casei. (LÓTUS) [...] minha mãe sempre falou que temos que fazer tudo pela família, e assim tento fazer, quero dar continuidade o que ela falava e fazia, quero minha família perto de mim. (ALFAZEMA)

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A sociedade espera que a família deva assegurar as condições necessárias

para a substituição das gerações. Os adultos devem garantir os alimentos aos

jovens, crianças, velhos, enfermos, aos incapazes e promover a proteção aos seus

membros. As obrigações devem ter equilíbrio necessário entre o biológico e o social.

A mulher idosa continua desempenhando o papel de organizar a casa e seu

funcionamento prioriza os cuidados com o esposo, filhos e netos. Percebemos que

em nome da “família” persistem no casamento mesmo diante das crises e percalços,

continuam unidos pelo dever de cuidar e educar os filhos e netos. Ao priorizar a

família, algumas vezes cada qual abre mão do eu lhe é singular, para manter-se ao

lado do outro, mantendo a família.

[...] era difícil, ele (marido) bebia muito, mas fiquei com ele até a morte, com filhos, agente que ficar junto né...(MARGARIDA) [...] enquanto minhas filhas eram pequenas, tinha que manter o casamento. (ANGÉLICA) [...] meu marido bebia e saia com outras mulheres, mas continuei casada até ele morrer, a gente casa uma vez só, e depois que tem filhos, aí a coisa fica mais difícil ainda, tem que ficar casada, tem criar os filhos. (ALFAZEMA)

Ribeiro (2002) em seu estudo realizado com mulheres chefes de famílias

considera o lugar da mulher importante no núcleo familiar, seja como portadora de

estabilidade seja pelo seu papel na reprodução das representações sociais. Na

impossibilidade dos papéis femininos serem realizados pela mãe, são transferidos

para a avó ou irmã mais velha, dentro da unidade doméstica.

Nos casos de instabilidade familiar, aliadas as outras dificuldades como

econômica, social e estrutural, as crianças (netos) passam a não ser de

responsabilidade somente da mãe ou do pai, mas também dos avôs.

Observa-se uma coletivização das responsabilidades pelas crianças dentro

da lógica de obrigações morais que caracterizam a rede de parentesco, no caso do

presente trabalho, entre famílias pobres.

Como já apontamos em páginas anteriores a família como instituição tem

passado por inúmeras mudanças paralelamente às mudanças socioeconômicas e

culturais; entretanto, algumas das nossas interpretações e das interpretações de

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autores citados no que concerne à figura feminina e seu papel central na estrutura

doméstica e nas relações mãe/filhos, avó/netos parecem tomar o modelo daquela

instituição como fixo ou como único modelo existente. Evidentemente não é este o

caso, mas não se pode negar que tal modelo prevalece real e simbolicamente e

prevalece sobretudo para a geração dos entrevistados, mesmo não sendo o único.

As figuras das avós fazem parte do nosso imaginário. O papel de avó está

inserido no cotidiano social, cultural e por sua relação de gênero. As mudanças dos

laços familiares e a vulnerabilidade que atinge as famílias demandam novos papéis,

novas exigências para essas figuras, personagens que ganham destaque não só na

relação afetiva, mas também no sustento e na socialização dos netos. Alguns

estudos retratam a importância de envelhecer em nossa sociedade e não discutem o

papel de avós como um privilégio.

Cuidar, educar ou ser responsável? Os entrevistados consideram o papel de

“avó” como prioridade na família, responsabilidade, amor incondicional, proteção e

segurança.

[...] sinto bem no meu papel, de avó, mãe, sempre que posso ajudo (...) desempenho o papel de ‘vó’, cuido do meu jeito, se precisar eu cuido. (ANGÉLICA) [...] cuido deles desde pequenos, a mãe não quis cuidar, eles são minha vida. (MAGNÓLIA) [...] eu sou a mãe, ela nunca quis o Robinho (neto), ele é tudo para mim, vivo para ele. (MARGARIDA) [...] queria um cantinho só para mim, é muita responsabilidade. (PRÍMULA) [...] acho que não fui boa mãe, a minha mãe não deixava eu cuidar das minhas filhas, ela interferia e falava que eu não tinha capacidade para criar minhas filhas, e agora crio meus netos como filhos, acho que tive que aprender a cuidar, faço tudo para eles, cuido como ou melhor que filho, faço todos os gostos. (ALFAZEMA)

Ao analisarmos o papel da família e seu significado na vida dos idosos

entrevistados, percebe-se a importância da religião na vida dessas mesmas

pessoas. Já apontamos que o modelo de família na sua expressão simbólica permite

referenciar relações afetivas construídas fora do sistema fora do sistema familiar em

sentido estrito e legalmente reconhecido; são comuns expressões do tipo: “é um

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irmão para mim”, “é como se fosse minha irmã”, tais reconhecimentos fazem parte

da valorização positiva atribuída aos laços de família (mesmo que esta de fato possa

ser um espaço de conflitos). Ora, a religião abre para nossos entrevistados um outro

espaço de leitura pelo modelo família; as referências aos “irmãos da Igreja” são

insofismáveis.

A religião em si pode ser vista como um sistema cultural (Geertz, 1989) que

atribui sentido aos eventos e à vida. Responde e coloca questões. Aponta caminhos

e cria problemas. Para Chaui (2003) a religião “é a atividade cultural mais antiga”; a

palavra religião vem do latim religio, formada pelo prefixo re (outra vez, de novo) e o

verbo ligare (ligar, unir, vincular), assim pode-se dizer que a religião é um vínculo. A

religião transmuta o espaço e qualifica o tempo dando-lhes a marca do sagrado. Da

perspectiva do antropólogo Geertz (1989) a dependência do homem em relação aos

símbolos e aos sistemas simbólicos é muito grande porque estes “são decisivos para

a viabilidade como criatura”; a função por excelência desses símbolos e sistemas de

símbolos é a de evitar o caos. É ainda Geertz (1989, p. 114) que pontua:

Há pelo menos três pontos nos quais o caos – um tumulto de acontecimentos ao qual faltam não apenas interpretações, mas interpretabilidade – ameaça o homem: nos limites de sua capacidade analítica, nos limites de seu poder de suportar e nos limites da sua introspecção moral. A perplexidade, o sofrimento e um sentido de paradoxo ético obstinado (...) são todos desafios radicais de que a vida é compreensível e de que podemos orientar-nos efetivamente dentro dela, através do pensamento – desafios que qualquer religião que pretenda subsistir tem que enfrentar, por mais “primitiva” que seja.

Nossos entrevistados se referem com freqüência à necessidade de “orientar”

filhos e netos e nesse sentido a religião de cada um poderá ser uma poderosa aliada

nessa tarefa. Se formos repassar as entrevistas e levar em consideração as

condições de vida que estas pessoas apresentam, não seria exagero dizer que elas

se encontram “nos limites da sua capacidade analítica, do seu poder de suportar e

do paradoxo ético”. As mortes, as doenças, as dificuldades financeiras, as rupturas

de laços familiares, o convívio com a deficiência e a dependência, são constantes na

vida destas pessoas. Não é de estranhar, portanto, que elas se digam adeptas de

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alguma religião: é o recurso de explicabilidade possível, a garantia da

interpretabilidade, mesmo que a interpretação não se apresente no momento. Os

fragmentos de depoimentos abaixo mostram numa linguagem simples a verdade

contida na análise antropológica da religião:

[...] carece chorar Ana Lúcia (filha) (...) não sei da família dele, ai não adianta dizer nada, nois não resolve nada (...) só tem um que resolve é Deus (...) fora ele (...) vou todo dia na igreja, ajuda com a oração... (MARGARIDA) [...] quando vou a igreja parece que vou para céu... (PRÍMULA) [...] canto com as irmãs também, para louvar ao Senhor né (...) tenho que louvar ao senhor com a voz que ele deu... (MAGNÓLIA)

Os ritos vivenciados no convívio com outros adeptos une-os enquanto

sedimentam a união com o sagrado. Os cânticos na Igreja correspondem e repõe o

bem estar.

A religião garante o respeito às normas, às regras e aos valores da

moralidade estabelecida pela sociedade. Deus garante a obediência a elas sob pena

de sanções sobrenaturais. Na maioria das culturas, a religião se apresenta como um

sistema explicativo geral. Tudo isso pode ser visto nas falas abaixo, entretanto, mais

que obediências gerais a regras sociais estes depoimentos falam de uma relação

mais pessoal com Deus; entra de novo o ideal de família na figura do Pai. As falas

abaixo dizem de confiança, de carinho, de conforto moral: “Ele ouve”, “Ele é

bonzinho”, “Ele vai libertar”, “Ele dá forças”:

[...] o Ana Lúcia (filha) só Deus mesmo para ter misericórdia (...) ela têm duas cruzes, o Robinho (neto) e a Ana Lúcia,o Robinho não é tanto(...) Deus me perdoe (...) é tanta coisa, tenho problema na cervical, lombar, pressão alta, só Deus... (MAGNÓLIA) [...] Deus vai libertar Ana Lúcia... (MARGARIDA) [...] Deus me deu quatro filhos, que são uma benção (...) muitas vezes vai casa de um, pede oração, peço. Pode pedir, uma oração por uma enfermidade, por uma causa, vou pedindo, Deus escuta Ele é bonzinho (...) graças a Deus vou parar de orar, você já conseguiu o emprego, não preciso mais aclamar no pé do senhor, pedi a Deus para abrir a porta... (GÉRBERA) [...] se não fosse Deus, para me dá força para criar essas crianças. (ALFAZEMA)

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. [...] a morte do meu filho o ano passado a gente nunca pensa (...) só Deus mesmo (...) penso no meu marido até o vejo capinando o terreno às vezes se não fosse Deus nessa hora... (PRÍMULA)

A solução é simbólica porque opera com a lógica do invisível é subjacente à

organização social. O problema do sofrimento é, paradoxalmente, não como evitar o

sofrimento, mas como sofrer, como fazer da dor física, da perda pessoal, da derrota

frente ao mundo ou da impotente contemplação da agonia alheia algo tolerável,

suportável, sofrível.

[...] é tanta coisa, tenho problema na cervical, lombar, pressão alta, só Deus... (MAGNÓLIA) [...] Deus vai libertar Ana Lúcia (filha) (...) Deus revelou que vai curar o Robinho(neto), ele vai andar e enxergar, para depois levar ele. (MARGARIDA) [...] ela pede a Deus para curar ele... (MAGNÓLIA) [...] ah! meu Deus dá luz, como vou pagar essa conta... (GÉRBERA) [...] Deus sempre prepara, a gente consegue forças e vai vivendo. (ALFAZEMA)

A presença da religião confirma os princípios para ação moral e fortalece a

esperança num destino superior da alma humana. Nesta, perspectiva sem a crença

em Deus não haveria humanidade, nem a imortalidade da alma, o cumprimento do

dever não seria o sinal de nossa destinação futura numa vida superior.

Para os estudiosos da fenomenologia, as essências são constituídas pela

intencionalidade da consciência, que é doadora de sentido à realidade. A

consciência retrata o sentido da realidade; constituí as significações, assumem

atitudes diferentes, cada qual com seu campo específico, sua estrutura e finalidade

próprias. A consciência relaciona-se com o mundo de maneiras variadas; senso

comum, ciência, filosofia, artes religião, de sorte que não há oposição nem exclusão

entre elas, mas diferença. (MARCONI e PRESOTTO, 2008)

A cultura de forma geral consiste em idéias, abstrações e comportamento.

Os comportamentos são modos de agir comuns de um grupo ou conjunto de atitudes

e reações dos indivíduos em face do meio social. O comportamento da sociedade

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em relação aos idosos relaciona-se aos acontecimentos e aos objetos (coisas), uma

concretização do comportamento humano, portanto, em uma série de coisas reais

que podem ser observáveis, ser estudas num contexto simbólico. Os idosos ainda

são vistos pela sociedade como solitários, dependentes e sofridos. “Enquanto o

jovem está projetando o seu futuro a pessoa idosa está a contemplar seu fim,

‘impossibilitada’ de traçar novos planos, ou mesmo, olhar para trás e ver o caminho

que já foi percorrido”. Ora faz-se necessário desmistificar essa idéia da velhice não

poder ser vivida de maneira positiva saudável e feliz. Dentro desse contexto de

conhecimento, novas perspectivas são projetadas, envolvendo os idosos na sua

realidade, com dificuldades, conflitos, superações como vimos nos depoimentos, aí

estão as bases para a inversão da perspectiva anterior.

É fundamental que o idoso mantenha sua capacidade funcional e o interesse

em conservar os mesmos níveis de atividade dos estágios anteriores da vida adulta.

Nessa perspectiva procurei analisar as experiências motivadoras e a qualidade de

vida entre os sujeitos que compõem este estudo.

3.5. Teorias da Atividade: experiências motivadoras e qualidade de vida

As teorias construídas para dar conta do envelhecimento tomado como objeto

de reflexão das ciências sociais podemos colocar algumas questões. As teorias

sociológicas podem ser classificadas de acordo com o momento em que foram

propostas as gerações. A primeira geração compreende as teorias elaboradas entre

1949 e 1969, em que a unidade de análise concentra-se no indivíduo, nos papéis

sociais e normas explicativas relativas ao ajustamento do declínio decorrente do

envelhecimento; a segunda geração de teorias abrange as elaboradas entre 1970 e

1985, que se concentram na transformação das condições sociais, as quais

influenciam o processo de envelhecimento e a situação social dos idosos; a terceira

geração de teorias critica e sintetiza as proposições das anteriores e junta níveis

micro e macrossocial de análise.

Alguns autores consideram que essa evolução de gerações de pensamento

contribuiu para o reconhecimento de que os idosos são atores ativos do processo,

criam significados para o próprio envelhecimento e a estrutura social guarda uma

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variação de significados. A contribuição da terceira geração de teorias é a busca

entre as restrições sociais, os significados individuais e as forças sociais que

propõem um envelhecimento não isolado, mas influenciado pelas condições

circunstanciais.

A Teoria da Atividade formulada por Havighutst (1968) enfatiza que todo idoso

requer e deseja altos níveis de atividade social. Existe um declínio físico e mental

com o envelhecimento, mas o interesse de manter os mesmos níveis de atividade

dos estágios anteriores da vida adulta concorre de forma importante para o

envelhecimento bem-sucedido. Para a manutenção de um autoconceito positivo, o

idoso deve substituir os papéis sociais perdidos com o processo de envelhecimento

por novos papéis, de modo que o bem-estar na velhice seria o resultado das

atividades relacionadas a esses novos papéis sociais. A teoria influencia até hoje os

movimentos sociais de idosos e orienta projetos na área cultural, lazer, educação

não-formal, promovendo o bem-estar na velhice. (SIQUEIRA in FREITAS et al, 2002)

O fundo de sociabilidade criado por Weiss (1969) possibilita que um grande

número de interações sociais substitua as perdas de papéis sociais decorrentes da

aposentadoria, da viuvez e da saída dos filhos de casa. A teoria da atividade

contribuiu para formulação de políticas públicas nos anos 70, permitiu maior

flexibilibadade nos movimentos sociais, centros de lazer e da educação não formal

para adultos e idosos (SIQUEIRA in FREITAS et al, 2002)

O conceito da teoria de atividade procura explicar como os indivíduos

(idosos) se ajustam as mudanças relacionadas à idade. Percebe-se que as pessoas

mais velhas e ativas são mais satisfeitas e mais bem ajustadas. A nossa pesquisa

permitiu perceber também, que os idosos podem substituir as perdas de papéis por

novos.

[...] faço hidroginática que não fazia, faço alongamento, faço umas pinturas, trabalhos manuais, trabalho... (ANGÉLICA) [...] só em casa mesmo, vou na “vinte e cinco” gosto de sair, com a neta, às vezes dou uma escapulidinha, esqueço um pouco as coisas, até que melhorei um pouco, faço tear, aprendi com a médica, lá na Tiradentes, ela falou que é bom, costuro também, sempre invento uma coisa... (MAGNÓLIA) [...] Fazer crochê, tricô é um santo remédio, me distrai (...) não paro o dia todo, só para orar... (PRÍMULA)

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[...] meus planos para minha vida, eu pretendo, mais tempo para fazer objetos de arte, pintura, caixinhas, e outras coisas que posso aprender. (ANGÉLICA) [...] dá prazer em fazer exercício, dançar, procuro ser feliz... (FRÉSIA) [...] não tenho parada com diz o outro, não tenho mesmo, levanto às cinco e meia, faço tricô até as dez da manhã, vou cuidar da casa, depois vou fazer almoço, a tarde faço tricô, faço o jantar e fico no tricô até as dez da noite. (GÉRBERA)

As teorias sociológicas relatam que as “grandes teorias” buscam explicar, de

forma geral, a relação entre pessoas idosas, envelhecimento e sociedade. A

sociedade produz a atividade que forma seus indivíduos.

Verifica-se a necessidade dos estudiosos conhecerem as teorias, para que

não busquem explicações pouco precisas e sobretudo desvinculadas da realidade,

potencialidades e desejos dos adultos idosos. A teoria da atividade está presente no

trabalho prático desenvolvido com idosos.

A atividade humana está inserida no sistema de relações da sociedade. O

sujeito necessita de atividades como um processo contínuo de interação com o meio

social. A atividade está estreitamente ligada aos papéis vividos em sociedade, pois

tal atividade é o que consolidará o sujeito no meio social em que está inserido.

Como vimos no conjunto das entrevistas com idosos, houve praticamente em

todos os casos o desenvolvimento de novas atividades e também continuidade de

atividades já realizadas. Por outras palavras, se houve por qualquer razão liberação

do tempo, aumento de tempo livre, este foi ocupado com atividades diversas, novos

(como o tear) ou pré-existentes (como crochê por exemplo). Uma das idosas em seu

depoimento falava das possibilidades de aprender coisas novas (como o uso da

internet) e do desejo de realizar aprendizados novos. Boa parte das mulheres por

outro lado, continua desempenhando o papel de cuidadoras (netos, filhos) e donas

de casa, arrumando e cozinhando. São exemplos que estão longe daquela

perspectiva de uma velhice ociosa e dependente como única opção.

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3.6 À Guisa da Conclusão

Estas considerações dão prosseguimento às reflexões já desenvolvidas a

respeito do papel do idoso na família contemporânea, tanto o papel desempenhado

como o seu lugar simbólico.

Enfatizando as diferenças e similaridades com a literatura, entretanto

percebem-se semelhanças com outros estudos brasileiros em relação às

características sócio-demográficas dos idosos entrevistados.

A maioria dos entrevistados declarou-se branco, evangélicos participantes de

cultos semanais, com baixa escolaridade e baixa renda. Convivem com duas ou três

gerações, participam de atividades religiosas, algumas atividades sociais e de lazer.

Houve acentuado predomínio do sexo feminino, com grande proporção de viúvas,

caracterizando a feminização do envelhecimento, conseqüência da

sobremortalidade masculina.

As famílias que fizeram parte do nosso estudo foram classificadas em sua

maioria como “famílias extensas ou ampliadas”, de acordo com sua organização e

estrutura. Encontramos famílias extensas, ligadas por laços consanguíneos, com

duas ou mais gerações e formada por avós. Nesse tipo de família, além do grau de

parentesco, dos laços consangüíneos, existem deveres e direitos mútuos

reconhecidos que fortalecem a união.

Conforme indicam os censos demográficos existe uma inversão na economia

que antes estava relacionada diretamente com a agricultura, atualmente a

população economicamente ativa dedica-se à produção industrial ou de serviços.

Evidentemente, essa redistribuição do setor agrícola para os setores industriais e de

serviços implicou num processo de urbanização também extraordinariamente

acelerado. As dificuldades econômicas fizeram com a população menos favorecidas

se instalassem nas regiões da periferia da cidade de São Paulo.

As famílias oriundas do nosso estudo em sua maioria se deslocaram do seu

local de origem para a área urbana, mudaram de estado e se alojaram na periferia

da cidade.

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A maior parte dos idosos que vivem em bairros da periferia de São Paulo é

migrante, sobretudo nordestina. Constatamos que quanto mais idoso maior a

probabilidade de que o morador seja migrante.

Os sujeitos da pesquisa migraram ainda jovens em busca de melhores

condições de vida e trabalho. Estes indivíduos com poucas condições e recursos

financeiros acabaram por se alojar em locais com pouca infraestrutura, formando as

“vilas” ou “comunidades”. Sendo que essas moradias urbanas não apresentam uma

distribuição interna favorável, formada em média por dois ou três cômodos ligados

entre si.

As moradias favorecem uma aglomeração de indivíduos no mesmo ambiente,

favorecendo situações adversas. Verifica-se que poucas modificações ocorreram em

relação às moradias nos últimos 50 anos nas áreas da periferia de São Paulo; sendo

que a única evolução é a presença de água encanada e luz elétrica nas casas.

Mesmo morando em casas com pouco conforto, a maioria das famílias passou ter

acesso a equipamentos e outros benéficos que são oferecidos na área urbana.

A construção da família se iniciou com o casamento e a formação de um lar,

com base em uma realidade social definida claramente dentro da coletividade. Os

idosos se casaram para dar sustento e auxílio mútuo, para ter filhos e pela

perpetuação da família. Os valores familiares atribuídos pelos sujeitos ainda são

centrados na sociedade, onde os indivíduos são julgados em função do êxito de sua

família e do papel que desempenham nesse êxito.

Entre os idosos participantes da pesquisa percebe-se a dificuldade de definir

o papel dos sentimentos em relação ao casamento, podemos supor que ocorreu em

função da norma social e não pelo amor ao futuro companheiro. Apesar de a união

ocorrer em virtude de uma atração entre o casal, o amor não parecia ser a condição

fundamental para o casamento nem critério de seu sucesso. A valorização dos

aspectos institucionais do casamento mascarava as realidades afetivas. Mesmo

diante do fracasso da união, mantiveram o casamento.

[...] sou viúva, só tive sossego quando ele (marido) morreu (...) quando a gente casa, pensa que é tudo bom, depois a gente vê, como é difícil, a gente tem que criar os filhos, não tem jeito, tem que agüentar... (MARGARIDA)

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[...] Minha família começou quando me casei e quando nasceram meus filhos e netos. (LÓTUS)

Em relação ao divórcio, a Lei que o introduziu por acordo mútuo, apresentou

um aumento do número de separações legais; entre os sujeitos estudados apenas

duas idosas estão divorciadas, fato ocorrido após a criação dos filhos. Mesmo diante

das dificuldades impostas pela união, permaneceram juntos com a finalidade de

cumprir o papel de criação e educação dos filhos.

[...] só me separei depois que minhas filhas eram grandes, já tinham casado, a gente quando vai separar só pensa nos filhos, precisa ficar junto, mesmo que seja difícil. (ANGÉLICA) [..] é difícil acreditar que separei do meu marido, pois todo mundo achava que meu casamento era perfeito, mas não era, fazíamos de conta que era, porque tínhamos os filhos para criar, quando eles casaram e foram embora de casa, a gente não achou mais motivo para ficar junto, ele acabou arrumando uma mulher fora do casamento, eu não quis mais ele como marido, hoje ele mora na minha casa, pois tá doente e ninguém quer cuidar dele, eu cuido. (PALMA)

A migração das famílias aconteceu na expectativa de melhorar de vida, os

moradores desse bairro falam da percepção de uma modalidade social em relação à

geração que se procedeu, no sentido de que tiveram acesso a recursos inexistentes

em seus locais de origem, sobretudo no que se refere às oportunidades de trabalho,

de consumo e de educação para seus filhos encontrados na cidade de São Paulo.

[...] São Paulo é um lugar muito bom para morar, trabalhar, aqui é bem melhor, pude criar pelos filhos, lá (no Ceará) a gente passa muita necessidade não tem trabalho, não tem nada, não dá para criar os filhos não, aqui todos foram para escola...(GIRASSOL) [...] me casei em Pernambuco, mudei pra cá, pois lá a vida é difícil, aqui pelo menos meu marido conseguiu emprego, compramos essa casinha, e conseguimos ter alguma coisa, os filhos estudaram, e tenho uma neta até na faculdade. (LÓTUS)

Constatamos, como em outras pesquisas realizadas no Município de São

Paulo (Lebrão e Berthould, 2007), que a função de apoio social é ainda garantida

primeiramente pela rede de apoio familiar, em seguida por membros dos grupos

religiosos, seguido de vizinhos e, por último, os profissionais de saúde. A

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participação da rede formal é incipiente. Os serviços de saúde foram representados

pelos Agentes Comunitários de Saúde.

Neste bairro, como em muitos outros, os serviços públicos como Unidade

Básica de Saúde e creche, foram instalados a partir dos movimentos populares e

femininos. As mudanças ocorridas no bairro retratam a transformação da periferia

como um processo constante, tanto no espaço físico que se expande, como na

perspectiva de seus habitantes de melhorar sua vida.

Os papéis familiares no mundo atual modificaram-se dada a complexidade de

situações criadas por fatores socioculturais e econômicos que afetaram diretamente

a dinâmica familiar. Várias as circunstâncias que contribuíram de maneira relevante

para as alterações na composição e recomposição da família moderna. Estes

rearranjos familiares denominados de família ampliada são provocados pelo retorno

de filhos à casa materna. Dentre as causas que levam a esses rearranjos familiares

podemos citar a entrada da mulher para o mercado de trabalho, divórcios, viuvez,

gravidez fora do casamento, desemprego, pauperização dos pais e dos avós e

questões de doenças na família.

Em estudo realizado no município de São Paulo em 2007 a explicação para

os novos arranjos familiares aponta que estão relacionados à incapacidade física

dos idosos ou incapacidade financeira, dependência econômica dos filhos para

constituição de um novo domicílio, necessidade de um responsável pelos netos e

pela própria casa em virtude do trabalho externo dos filhos. (LEBRÃO e

BERTHOULD, 2007)

Ressaltamos que a presença de um grande número de filhos ainda faz parte

da realidade e de acordo com alguns estudiosos na área, o número maior de filhos

pode expressar uma rede potencial de apoio social informal.

Observamos que apesar da baixa renda entre os entrevistados somente dois

sujeitos estão vivendo na mesma residência devido à limitação física causada pela

doença. Os níveis de ajuda recebida são esperados conforme o aumento da idade,

espera-se que o idoso passe a ser menos independente funcionalmente. Por outro

lado, confirmamos a necessidade da coabitação para o cuidado com os netos.

Constamos que os idosos se sentem bem por realizar o papel de avô e que muitas

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vezes as idosas assumem o papel de mãe, sendo responsáveis pela criação e

educação dos netos.

Em seu estudo Sarti (2003) retrata a trama de direitos e obrigações

familiares, em que os indivíduos desenvolvem seus papéis conforme o momento em

que estão vivendo: de filho, mãe, pai, avô e tio. Os entrevistados não consideram

tais papéis como obrigação, mas como o papel esperado. Ficam felizes por

conseguir contribuir para a manutenção da estrutura familiar e consideram um

privilégio poder assumir os netos como filhos.

As funções básicas dos idosos na família são desempenhadas de várias

maneiras, destaca-se a de agente educador, com funções específicas com zelar

pelos aspectos religiosos, culturais, econômicos e sociais. Sendo papel da família

cuidar das crianças, idosos e doentes. Culturalmente, não se aceita a interrupção da

conexão indivíduo e família quando cessa sua utilidade. Outra função é a de

proteção dos interesses familiares.

Alguns estudos mostram a coabitação e o apoio funcional como um fator de

proteção aos idosos, embora concorde com essa afirmação, o que este estudo

sugere é que a coabitação é um fator de proteção aos netos, pois os idosos são

responsáveis pela estrutura e funcionamento da família. Os filhos/filhas transferem a

responsabilidade dos netos aos avós e constroem outros laços familiares, não

fornecendo nenhum apoio à própria mãe (avó) e ao filho. Os idosos entrevistados

são os proprietários da casa, pagam as contas, cuidam da limpeza e organização da

casa e cuidam dos filhos/netos.

No imaginário social o ser velho está associado a um conjunto negativo e à

estagnação e apego a valores “ultrapassados e cristalizados” que também levam ao

isolamento social; imagem negativa do aposentado, significando um final de vida,

falta de capacidade pessoal e a exclusão da rede produtiva; pessoa que necessita

de cuidados, sem força, sem vontade, sem vida, doente, incapacitado. Estes seriam

os motivos que teriam levado o idoso a optar pela passividade. A possibilidade de

desconstruir a imagem negativa ligada a uma visão tradicional da velhice abre-se

para os idosos contemporâneos. A transformação se apresenta na voz dos

depoentes, pois apesar de existirem perdas relacionadas ao processo de

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envelhecimento, essas não estão associadas à estagnação que leva à ruptura e ao

isolamento. Cabe salientar um movimento que vem se delineando nos dias atuais,

sinalizando uma valorização do idoso, no sentido da desconstrução daquela imagem

negativa e as possibilidades abertas de um envelhecimento saudável, feliz e com

novas perspectivas. Cada idoso terá sua própria forma de envelhecer, com

características próprias decorrentes da sua história de vida, das opções feitas, dos

acidentes do presente, das possíveis doenças e do contexto social em que está

inserido.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

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Nossa pesquisa permitiu voltar-nos para o idoso e a família com um olhar de

busca de compreensão. Procuramos apresentar os resultados como um conjunto de

conhecimentos buscando dar-lhes profundidade e harmonia possível procurando

assegurar a contribuição para prática, para a formação e pesquisa na área de

envelhecimento e família.

No aspecto da antropologia social o estudo proporcionou verificar os

processos culturais e sociais centrados na família do idoso. Pudemos observar as

diferenças e semelhanças no grupo estudado; foi possível conhecer as relações

sociais que as regem. Estamos conscientes de que cada aspecto da vida social,

como a família, religião, economia, política só pode ser compreendido quando

estudado em relação aos demais, como parte de um conjunto integrado.

Acreditamos que este estudo levantou novas questões a serem consideradas

no futuro, seja para a pesquisa, seja para a discussão de novas políticas públicas

para o envelhecimento e família, seja ainda para a capacitação de profissionais da

saúde com um olhar diferenciado para o idoso e sua família.

Ao entendermos a família como um sistema introduz-se a noção de

conexões, ligações e combinações, tornando possível organizar o pensamento de

forma interdisciplinar. A família deve ser pensada como um sistema de interação.

Segundo Andolfi (1980), “para analisar a relação entre o comportamento individual e

grupo familiar, numa única observação, é necessário considerar a família como um

todo orgânico”. Ainda o mesmo autor diz que a família é um sistema de interação

que supera e articula dentro dela e de outros componentes individuais.

Nota-se que ao falar com um idoso membro deste sistema, fala-se com todos.

Ao intervir sobre um deles, podemos concluir que estaremos intervindos sobre todos.

A família deve ser vista como um fenômeno complexo. As famílias podem ser

diferentes, a configuração de cada núcleo familiar vai depender de sua cultura,

classe social, religião, história, composição do sistema político, social e de relação

de trabalho, considerando todo sistema de vizinhança, mas qualquer que seja a

configuração, será sempre um fenômeno complexo a ser abordado.

Sabe-se que os profissionais da saúde, especialmente aqueles que atuam na

Atenção Básica, necessitam de uma visão de complexidade, é preciso considerar

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111

diversas áreas do saber, como antropologia, sociologia, política social, comunicação

entre outras áreas, com a finalidade de direcionar seu olhar para além dos idosos,

buscando compreender a funcionalidade familiar como um componente com

necessidades diversas que exigem abordagem interdisciplinar.

A doença, a fragilidade, a inatividade, a dependência e a solidão são imagens

que devem ser relativizadas. Há necessidade, portanto, de formar uma nova idéia,

considerar novos significados para o envelhecimento.

Hoje envelhecer é uma virtude própria da nossa época. A desvalorização e o

descaso pelos idosos fez com que sejam considerados inúteis e um “peso morto” em

nossa sociedade, ao contrário de outras em que os idosos são portadores de todo o

saber da coletividade, respeitados e admirados. O envelhecimento deve ser

considerado uma fase da existência, um momento de transmissão de experiência e

sabedoria do qual a família e a sociedade devem participar ativamente.

Malgrado a desvalorização, percebe-se que o idoso procura manter um

comportamento ativo, atuando individualmente ou em grupos, tornando claras suas

reivindicações e fazendo pressão sobre a sociedade no sentido da valorização de

sua situação. O papel do idoso na família permite o crescimento de todos e garante

a subsistência das gerações seguintes. Outros aspectos relacionados ao papel do

idoso constituem na estimulação do pensar, do fazer, do dar, do trocar, do reformular

e do aprender no âmbito familiar e comunitário.

O idoso deseja estar engajado em atividades que o faça o sentir vivo e com

perspectivas que proporcionem prazer e motivação. A atividade em grupo é uma

forma de manter o indivíduo no convívio social, permitindo a relação com outras

pessoas contribuindo de forma significativa em sua qualidade de vida.

Torna-se necessário a implementação de estratégias de promoção da saúde

da população idosa; diminuição da fragmentação dos direitos sociais da pessoa

idosa, há a necessidade imediata da incorporação de uma perspectiva integral de

cuidado ao idoso e sua família (proteção, promoção, tratamento e reabilitação da

saúde), conforme preconizado no Sistema Único de Saúde. Dessa forma, é

fundamental manter uma postura crítica e reflexiva tanto na formação e educação

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permanente dos profissionais quanto na reivindicação dos direitos estabelecidos

legalmente no programa nacional da saúde.

Nossa pesquisa verificou a necessidade de mudança nos padrões estéticos,

de produtividade, de socialização, com a finalidade de evitar uma concepção que

chamaria de pragmática do idoso. O conhecimento sobre o papel do idoso na família

contemporânea possibilitou mostrar caminhos para a prática profissional.

Foi possível conhecer melhor as condições de vida dos idosos e suas

famílias, por um lado, como determinantes mais gerais da sociedade e, por outro,

com determinantes mais específicos próprios dos indivíduos que compõem esses

grupos. Como profissional da saúde mas estudiosa das Ciências Sociais devemos

fazer com que a sociedade se conscientize do problema que as iniqüidades na

saúde representam, não somente para os mais desfavorecidos como também para a

sociedade em seu conjunto, buscando com isso conseguir o apoio político

necessário à implementação de intervenções.

O Brasil revela a necessidade de discussões mais aprofundadas sobre o

papel do idoso na família contemporânea, acreditamos que nosso estudo abordou

questões pertinentes sobre o envelhecimento, o significado da família, funções na

família e experiências motivadoras tais questões podem fertilizar o debate

necessário. Acreditamos também que os aspectos estudados podem trazer

proposições capazes de dar uma nova perspectiva teórica ao objeto estudado,

sobretudo na formação de profissionais da área da saúde, ciências sociais e

educação. Envolvidos com o tema

Ao darmos voz aos idosos enquanto grupo social, provocamos sua própria

mudança e conseqüentemente ajudamos na quebra de preconceitos e mitos a seu

respeito, viabilizando a abertura de caminhos para o resgate da sua cidadania e a

conquista de seu espaço na família e na sociedade

Conclui-se que o estudo é uma ferramenta de trabalho para os profissionais

que buscam uma melhor compreensão das variáveis que interferem no

envelhecimento, família e a comunidade.

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REFERENCIAS

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APÊNDICES

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APÊNDICES Apêndice A

ROTEIRO DE ENTREVISTA CARACTERIZAÇÃO DOS SUJEITOS

NOME:

IDADE: SEXO: ESTADO CIVIL: PROFISSÃO:

ESCOLARIDADE:

RENDA:

ATIVIDADES QUE DESENVOLVE: O que é ser idoso?

Qual o significado de família para você?

Quais as pessoas (instituições, grupos) que você solicita ajuda?

AVALIAÇÃO ESTRUTURAL

1. Quem faz parte da família?

2. Alguém mudou recentemente?

3. Alguém mais é considerado da família?

4. Todos têm parentesco biológico?

5. Como você se sente diante do papel que exerce na família:

6. Como você lida com as mudanças ocorridas na sua família e na sua vida:

7. Qual a sua relação com os membros da família?

8. Quem você procura na família para conversar ou obter apoio?

9. Quais as principais mudanças observadas na sua família nos últimos anos? ( casamentos,

viuvez, nascimentos, aposentadoria, mortes, mudanças, acréscimo de outras pessoas, emprego

outros)?

10. Você participa de alguma igreja? Tem alguém na igreja que você tem consideração (família)?

Qual o significado da religião atualmente para você e sua família?

11. Construção do genograma familiar ou familiograma.O genograma deve ser construído com os

membros da família Instrumento utilizado para apresentar a árvore familiar que representa a

estrutura familiar.

12. Construção do Ecomapa. O objetivo principal do Ecomapa é representar o relacionamento dos

membros da família com os sistemas mais amplos (rede social e comunitária).

AVALIAÇÃO DE DESENVOLVIMENTO

1. Quando você rememora sua vida, quais os aspectos mais importantes?

2. Quais os aspectos que você se lamenta?

3. Quais os planos que você tem para sua vida e para os demais de sua família?

4. O que você acha que mudou na sua vida com o envelhecimento e na vida de sua família?

5. Em que fase do ciclo vital você se encontra?

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6. Quais as diferenças que você observa na família dos seus avós e pais e na família hoje? O que

mudou na família? Qual a importância dada a família antigamente e hoje?

7. Como você se vê diante de sua família e como sua família o vê?

AVALIAÇÃO FUNCIONAL

1. Quem paga as contas na sua casa?

2. Quem faz compras (mercado, feira, farmácia)?

3. Quem resolve os problemas de sua “família”?

4. Quem cuida das crianças e ou dos doentes?

5. Quem acompanha outro membro da família ao médico?

6. Qual sua função na sua família?

7. Quem organiza e cuida da casa?

8. Você procura realizar outras atividades (antes não fazia)?

9. Quais atividades que você realiza para você e para sua família?

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Apêndice B

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO PARA O ENTREVISTADO

Título do Estudo: O papel do Idoso na Família Contemporânea

Venho por meio desse termo convidá-lo a participar desta pesquisa que tem como objetivos:

Refletir sobre as modificações pelas quais a família brasileira tem passado e a repercussão

dessas mudanças no papel do idoso na família contemporânea;

Verificar os aspectos culturais, sociais e subjetivos do idoso e sua família;

Conhecer a dinâmica familiar e suas significações para o idoso; Compreender como a família do idoso se estrutura seu desenvolvimento e como funciona.

A coleta de dados será realizada individualmente, por meio de entrevista, no domicílio do participante ou em local que considerar mais apropriado, seu nome não será citado no trabalho e o seu depoimento não deverá lhe trazer desconforto. O entrevistado ficará como uma cópia do termo de consentimento, o entrevistador ficará com outra cópia. A pesquisa não sugere nenhum desconforto ou desvantagem para os sujeito (entrevistado). Quaisquer dúvidas que surgirem a respeito da pesquisa poderão ser esclarecidas pela enfermeira Elisabete Calabuig Chapina Ohara, que pode ser encontrada pelos telefones 2511-8930 e 8311-8546

Tendo alguma dúvida sobre os aspectos éticos da pesquisa, o(a) senhor(a) poderá entrar em contato com o Comitê de Ética em Pesquisa da PUCSP. A qualquer momento poderá deixar de participar deste estudo sem que isso o prejudique. Serão fornecidas informações atualizadas sobre os resultados parciais da pesquisa. Não terá o participante despesas em qualquer fase da pesquisa. Qualquer opinião que porventura seja verbalizada pelo participante relacionada com sua privacidade será mantida em caráter confidencial, sendo assegurado ou seu anonimato. Caso necessite de outros esclarecimentos estarei a sua disposição.

Eu ________________________________________________ li ou foram lidas para mim as informações descrevendo o estudo “O Papel do Idoso na Família Contemporânea”. O Estudo contará de idosos e suas famílias que residem na Região Leste da Cidade de São Paulo”. Discuti com a enfermeira Elisabete Calabuig Chapina Ohara sobre minha decisão em participar deste estudo. Ficaram claros para mim quais são os propósitos do estudo. Sei que poderei retirar o meu consentimento se achar necessário, antes ou durante o mesmo, sem prejuízo. Concordo voluntariamente em participar deste estudo.

Ciente de tudo isso, concordo em participar do estudo.

ASSINATURA DO ENTREVISTADO

ELISABETE CALABUIG CHAPINA OHARA PESQUISADORA