PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Brum.pdf · A gestão previdenciária e a...

134
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Gustavo Brum A gestão previdenciária e a sua potencialidade lesiva à esfera moral do beneficiário da Previdência Social MESTRADO EM DIREITO CIVIL SÃO PAULO 2016

Transcript of PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Brum.pdf · A gestão previdenciária e a...

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Gustavo Brum

A gestão previdenciária e a sua potencialidade lesiva à esfera moral do

beneficiário da Previdência Social

MESTRADO EM DIREITO CIVIL

SÃO PAULO

2016

Gustavo Brum

A gestão previdenciária e a sua potencialidade lesiva à esfera moral do

beneficiário da Previdência Social

MESTRADO EM DIREITO CIVIL

Dissertacao apresentada a Banca Examinadora da

Pontificia Universidade Catolica de Sao Paulo, como

exigencia parcial para obtencao do titulo de MESTRE

em Direito Civil, sob a orientacao da Profa. Dra Rosa

Maria Barreto Borriello de Andrade Nery.

SÃO PAULO

2016

Banca Examinadora

………………………………………………………………

………………………………………………………………

…………………………...................................................

Dedicatória

À Gabriele e à Olivia.

Agradecimentos

Ao apoio institucional da Justiça Federal das 3ª e 4ª Regiões, no fomento e estímulo

da produção acadêmica de seus integrantes, bem como à AJUFE e à PUC-SP, pela

sensibilidade em concretizar o convênio associativo que permitiu a realização deste

trabalho e o de outros colegas. À Família Nery, na pessoa da Profa. Rosa Nery,

pelas luzes que orientaram o desenvolvimento deste trabalho. Ao auxílio na

pesquisa, em especial à Biblioteca do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, na

pessoa da sua supervisora, Vera, do Tribunal Regional da 4ª Região, ao Centro de

Apoio dos Juízes Federais do Conselho de Justiça Federal e à Biblioteca do

Superior Tribunal de Justiça. A todos que me escutaram, especialmente ao Prof. Dr.

Min. Paulo Sanseverino, ao Prof. Dr. Georges Abbud, ao Doutorando Gustavo

Haical. Destacadamente, aos Professores da Faculdade de Direito da GV, Dr.

Thiago Reis e Dr. André Correia. Especialmente, ao Prof. Dr. Des. Federal Mairan

Maia, pela leitura crítica. Ao querido amigo Fábio Ricardo Medeiros Lima, pelos

livros. Aos colegas de seminário e de sala de aula, Samuel, Bruno, Paulo Ribeiro,

Adriana, Raquel, Ana Lya e Gustavo Cignachi. Por fim, à minha esposa, pelo apoio.

Resumo

No presente trabalho, a atenção está dirigida à compatibilização da estrutura

da responsabilidade civil em situações de potencialidade lesiva à esfera moral do

segurado da Previdência Social. Considerou-se a natureza dos riscos sociais

encobertos pela estrutura previdenciária estatal, quando da constatação dos

pressupostos de caracterização do dever de indenizar da autarquia previdenciária.

Delimitou-se o campo de análise aos atos de concessão de benefícios indeferidos

administrativamente que venham a ser revistos pelo Poder Judiciário, verificando a

ilegalidade desses atos, com o fito de determinar o reconhecimento do segurado à

prestação de benefício em sede judicial. Afastou-se a caracterização dos danos

morais tão somente pela simples negativa indevida dos benefícios, por não se

tratarem de danos morais in re ipsa. De outra parte, criticou-se a corrente

jurisprudencial que exime de responsabilidade o ente público, sob a excludente da

ilicitude caracterizada como exercício regular de direito, quando o ato administrativo

é emanado dentro de certa margem de razoabilidade interpretativa da norma

previdenciária. Perpassando pelos critérios e pressupostos de responsabilidade civil

extracontratual da Administração Pública, concluiu-se que o dever de indenizar os

danos morais no âmbito previdenciário exige a presença do liame normativo

verificado pelo nexo de imputação. Embasada na teoria de que o liame imputacional

está inserido no âmbito de causalidade normativa, a esfera de risco da atividade

previdenciária, por abrandar os riscos sociais a que expostos os segurados, torna

imputáveis os prejuízos extrapatrimoniais ao ente previdenciário somente quando a

sua atuação resultar em frustração das expectativas legitimamente depositadas

pelos segurados. Para caracterização dessa frustração, entendeu-se necessária a

constatação do abuso de poder-dever administrativo na interpretação/aplicação da

norma previdenciária. Os critérios de aferição dessas margens de razoabilidade de

atuação, por sua vez, podem ser objetivamente avaliados considerando a situação

do segurado em face da posição jurídica no âmbito do sistema previdenciário.

Palavras-chave: previdência social - responsabilidade civil extracontratual - dano

moral

Abstract

In this work, attention is directed to the compatibility of the civil liability

structure in situations of potential injury to the moral sphere of those insured under

social security. The nature of social risks covered up by the state welfare structure

was considered during the characterization of the social security authority’s duty to

compensate the insured. The field of analysis was restricted to benefits that were

rejected by public administration and afterwards reviewed by the judiciary, through

the verification of the illegality of such acts, with the aim of providing the benefit to the

insured in court. Compensatory damages are not characterized by the mere improper

rejection of benefits, because they are not in re ipsa compensatory damages. On the

other hand, it was criticized the understanding which exempts from responsibility the

public entity, under the argument of regular exercise of law, when the administrative

act is emanated from within a certain margin of interpretative reasonableness of the

social security rule. Permeating the criteria and assumptions of civil liability by public

administration, it was concluded that the duty to reimburse compensatory damages

regarding social security requires the attendance of a normative cause. Grounded on

that theory, considering that welfare activity decreases the risks to which the insured

is exposed, the losses are only attributable to social security when its operations

frustrate the legal expectations of the insured. To characterize this frustration, it is

required that public administration misuses the interpretation/application of social

security rules. In turn, the parameters of public administration’s operation can be

objectively evaluated considering the situation of the insured in view of their legal

position within the social security system.

Keywords: social security – civil liability – compensatory damage

8

Sumário

Introdução.............................................................................................................. 9

Capítulo 1. O âmbito de proteção previdenciária e a situação jurídica de seus beneficiários.....................................................................................................14

1.Da Seguridade Social e do Regime Geral de Previdência Social (RGPS) ......... 14 2.Da Previdência Social: finalidade e natureza de direito social ........................... 18 3.Da cobertura previdenciária limitada aos riscos sociais e da impropriedade da

funcionalização da responsabilidade civil como “ação social” .......................... 24 4.Do vínculo previdenciário: da relação e da situação jurídica previdenciária ...... 28 A. Da relação jurídica previdenciária e do direito subjetivo ........................... 28 B. Da situação jurídica previdenciária e da posição jurídica de

vantagem.......................................................................................................... 33 5. Do princípio da legalidade e da natureza vinculada do ato de concessão dos

benefícios previdenciários ................................................................................ 42 6. Da discricionariedade administrativa e do controle judicial de legalidade no

âmbito do ato de concessão de benefícios ....................................................... 48 7. Da natureza vinculada do ato de concessão de benefícios previdenciários......53

Capítulo 2. A responsabilidade civil .................................................................. 58

1. Da responsabilidade civil extracontratual: conceituação, fundamentos e pressupostos..................................................................................................... 58

2. Do subsistema de responsabilidade civil da Administração Pública ................. 66 A. Da irresponsabilidade da Administração Pública ao risco integral ............ 66 B. Da responsabilidade civil da Administração Pública de acordo com a

doutrina e a jurisprudência ................................................................................ 69 Capítulo 3. Os pressupostos de configuração de danos morais no âmbito da

Previdência Social .......................................................................................... 76

1. Do pressuposto: dano indenizável ................................................................... 76 A. Dos elementos gerais do dano ................................................................. 76 B. Conteúdo positivo do dano moral ............................................................. 78 C. O dano moral e nota de caracterização no âmbito previdenciário ............ 82 2. Do pressuposto: nexo de causalidade ............................................................. 89 A. Do nexo de causalidade ao nexo de imputação ....................................... 93 B. Da não abrangência da ilicitude do ato administrativo no âmbito dos riscos

sociais protegidos pela gestão previdenciária................................................... 96 C. Da imbricação da doutrina do risco e da solidariedade social ................... 100 D. Do abuso de direito como critério de imputação objetiva, a partir da situação

previdenciária.................................................................................................. 104

Capítulo 4. Considerações finais. .................................................................... 110

Bibliografia………………………………………………………………………….....114

Bibliografia de precedentes..............................................................................123

9

Introdução

A seleção do tema objeto da presente dissertação foi motivada a partir da

experiência jurisdicional na área da Previdência Social, na qual se percebeu o

crescente número de ações judiciais com pedido cumulado de indenização por

danos morais em decorrência do indeferimento administrativo de benefícios. Aliada a

essa constatação, verificou-se a carência de material teórico acerca do tema, bem

como a dificuldade em se identificar os efetivos critérios determinantes para

soluções casuísticas, especialmente se considerada a natureza do risco social

inerente à atividade de gestão previdenciária.

Com o intuito de contribuir para melhor compreensão acerca da

complexidade da relação entre a gestão de benefícios previdenciários e o instituto

da responsabilidade civil extracontratual da Administração Pública, busca-se expor,

mediante análise crítica, os critérios adotados para configuração do dano moral e da

responsabilidade civil do ente público, por intermédio de uma leitura estrutural

sistematizada consentânea ao ramo do Direito Previdenciário.

Destaca-se, por oportuno, que é gigantesco o contingente de indivíduos que

se socorrem de ações judiciais visando à obtenção de tutela na área previdenciária,

especialmente no Regime Geral de Previdência Social (RGPS). O problema central

a ser analisado está diretamente relacionado à maioria desse contingente, devido à

situação jurídica potencial de danos à esfera moral dos beneficiários da Previdência

Social, quando denegada indevidamente a concessão de benefícios previdenciários.

O ponto de inflexão do tema se refere aos efeitos indenizantes decorrentes

do ato indeferitório de benefícios, apesar de se abordar ao longo do trabalho outras

situações concretas. A questão basilar, todavia, prende-se à análise da configuração

do dever de indenizar em decorrência da negativa indevida de concessão de

benefícios previdenciários.

Trata-se de realidade que abarca um número amplíssimo de pretensões

judiciais, nas quais se pretende a condenação da autarquia previdenciária ao

pagamento de indenização por danos morais. Em termos quantitativos, essa seria a

situação mais abrangente; no entanto, existem outras situações de cunho

previdenciário com potencial igualmente lesivo, como aquelas em que se busca o

10

restabelecimento de benefício suspenso ou cancelado, ou a revisão da renda do

benefício. Há, ainda, situações excepcionais, tais como a retenção indevida de

valores de benefícios, o assédio administrativo caracterizador de maus-tratos ao

segurado no curso do processo administrativo, dentre inúmeras outras.1

De toda sorte, as referidas situações têm em comum o dever de a autarquia

previdenciária proceder de modo adequado, possibilitando sua comparação ao

problema central. Desse modo, adverte-se que as preocupações teóricas e as

repercussões práticas expostas em relação ao vínculo previdenciário estão dirigidas

ao eventual efeito indenizatório do indeferimento administrativo ilegal.

No âmbito jurisdicional, o cerne da questão, que se traduz como a causa de

pedir da pretensão indenizatória por danos morais, refere-se essencialmente à

natureza alimentícia do benefício previdenciário, com fundo de direito fundamental

social. Acrescenta-se a essa alegação o fato de o Poder Judiciário sindicar a

legalidade do ato administrativo, pois, ao julgar procedente o pedido de concessão

de benefício, automaticamente reconheceria a ilicitude do ato administrativo

indeferitório.

Nessa linha de raciocínio, advoga-se que a ilicitude da conduta

administrativa seria suficiente para ensejar a condenação do ente previdenciário ao

pagamento de indenização por danos morais, por se caracterizar como dano in re

ipsa. Portanto, bastaria apenas a comprovação da ilegalidade do ato administrativo

para gerar o direito à indenização pelo segurado preterido.

A despeito da ausência de uma aferição estatística rigorosa, desnecessária

à proposta deste trabalho, constata-se, nos Tribunais Superiores, nos Tribunais

Regionais Federais e na Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais

Federais, a tendência jurisprudencial em julgar improcedentes pretensões

indenizatórias com fundamento na ausência de ilicitude do ato administrativo, bem

como na falta de reconhecimento da presença de dano moral indenizável apenas em

razão do ato indeferitório indevido. Em alguns casos, todavia, tem-se reconhecido o

dever de indenizar com base em fundamentos que, no mais das vezes, baseiam-se

1 AGOSTINHO, Theodoro Vicente; SALVADOR, Sérgio Henrique. O Dano Moral Previdenciário: um estudo teórico e prático com modelo de peças processuais. São Paulo: LTr, 2015.

11

essencialmente nessa mesma linha de raciocínio, distinguindo-se apenas por

superlativos como a manifesta ilegalidade do ato administrativo ou a exponencial

gravidade das condições pessoais do segurado.

À guisa de contribuir com a cientificidade do Direito, como instrumento

capaz de permitir certo grau de previsibilidade dos efeitos jurídicos para

determinadas situações de fato, toma-se por necessário o aprofundamento do tema,

por intermédio de análise crítica da doutrina e da jurisprudência, de maneira a

resolver a questão da potencialidade lesiva à esfera moral do beneficiário da

Previdência Social.

O estado da arte em relação a esse ponto, no âmbito doutrinário, é bastante

incipiente, pois foram localizados apenas quatro livros abordando essa temática: o

primeiro, publicado no ano de 2005, intitulado “Dano Moral no Direito

Previdenciário”, de autoria do advogado Dr. Wladimir Novaes Martinez; no ano de

2010, a obra “Dano Moral no Direito Previdenciário: doutrina legislação

jurisprudência e prática,” publicada pela advogada Dra. Wânia Alice Ferreira Lima

Campos; em 2013, a obra “Dano Moral Previdenciário: teoria e prática”, de autoria

dos advogados Dr. Alexsandro Menezes Farineli e Dra. Fabia Maschietto; e, em

2015, o “Dano Moral Previdenciário: um estudo teórico e prática com modelo de

peças processuais”, da autoria dos advogados Dr. Theodoro Vicente Agostinho e Dr.

Sérgio Henrique Salvador.

De outra parte, em alguns periódicos foram localizados artigos específicos

acerca do tema, publicados entre os anos de 2010 a 2014, por BASSIL, Rafael

Laynes, “Dano moral decorrente da demora para análise do processo administrativo

previdenciário perante o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS”; RECK, Maria

Helena Pinheir, A dignidade da pessoa humana e o dano moral no âmbito do direito

a benefício previdenciário”; AGOSTINHO, Theodoro Vicente; SALVADOR, Sérgio

Henrique. “O Dano Moral no Direito Previdenciário: uma necessária abordagem”; e

CORREIA, Erica Paula Barcha. O Dano Moral no Direito Previdenciário.

O conteúdo dessas obras doutrinárias será analisado ao longo desta

dissertação. No presente momento, as referências apontadas se destinam apenas à

demonstração de que o assunto efetivamente merece aprofundamento na sua

abordagem acadêmica.

12

Nos capítulos que seguem, buscar-se-á identificar os principais pontos

manejados pela doutrina e pela jurisprudência para solucionar a questão referente

ao dano moral ocorrido em face da denegação de benefício no âmbito da

previdência social. Em geral, as decisões judiciais têm julgado pela improcedência

da pretensão indenizatória com fundamento na inexistência de ilicitude do ato

administrativo, haja vista o indeferimento administrativo estar pautado por critérios

de razoabilidade de interpretação, atuando o agente previdenciário dentro dos

limites do seu poder-dever de avaliação administrativa.

O problema inicial, portanto, é avaliar a questão da razoabilidade de

atuação do agente administrativo, aproximando a análise da “discricionariedade

administrativa” como atributo do agente previdenciário. Isto é, cumpre averiguar se

efetivamente é possível o reconhecimento dessa margem de atuação insindicável,

para o fito de se estabelecer o dever indenizatório da Previdência Social.

Desdobra-se a questão no cotejo entre o princípio da legalidade, como

parâmetro normativo da esfera jurisdicional, e o controle dos atos administrativos.

Nesse ponto, a análise da discricionariedade administrativa se prestaria a aclarar a

sindicabilidade judicial dos atos do poder público, no que concerne à margem

interpretativa ou técnica dos requisitos para concessão de benefícios

previdenciários.

De outra parte, avança-se na compreensão da estruturação da

responsabilidade civil, enfatizando-se o subsistema da responsabilidade civil

extracontratual da Administração Pública, assentada no art. 37, §6º, da Constituição

Federal. Em razão da aplicação da responsabilidade objetiva, com fundamento no

risco administrativo, no qual se prescinde da presença de culpa do agente

administrativo para configuração do dever de indenizar, chega-se a suficiência dos

seguintes pressupostos: dano e nexo de causalidade.

Na análise dos pressupostos, destaca-se a necessariedade da repercussão

negativa do indeferimento do benefício para que seja atingida a esfera

extrapatrimonial do segurado, decorrente de dificuldades econômicas que não

podem ser pressupostas somente em razão da ilicitude do ato administrativo. De tal

forma, somente as consequências efetivas de privação de verba de natureza

alimentar detêm potencial lesivo de ordem extrapatrimonial. Afasta-se, com isso, a

13

configuração do dano moral in re ipsa, baseado exclusivamente na demonstração da

ilicitude do ato administrativo. A questão é, então, realinhada para a necessidade de

efetiva exposição do beneficiário à situação de indignidade, esta sim capaz de

configurar lesão a direitos da personalidade.

Em relação ao pressuposto do nexo de causalidade, a reparabilidade do

dano moral repousa na imputabilidade do dever de indenizar em face do abuso de

direito. Com isso, a imputabilidade não se prende à ilicitude do ato denegatório do

benefício, nem à verificação de dificuldades financeiras sofridas pelo beneficiário, já

que os danos só serão imputáveis ao ente público quando este atuar fora dos

parâmetros de razoabilidade administrativa na aplicação da legislação

previdenciária.

Por intermédio da análise do risco social assumido pela Previdência Social,

a correlação entre a gestão de benefício e o eventual abalo moral sofrido pelo

segurado não se verifica no exame da licitude da ação praticada pelo agente, mas

no nexo de causalidade que conecta o risco de gestão previdenciária ao dever de a

autarquia previdenciária indenizar o lesado, haja vista que a atuação do Estado por

intermédio do sistema previdenciário implica a redução do risco social, não o seu

incremento.

Este trabalho não tem por objetivo propor novo modelo sistematizador da

responsabilidade civil extracontratual da Administração, senão apenas trazer a baila

os fundamentos ora identificados, enquanto indicativos de que o potencial lesivo à

esfera extrapatrimonial do segurado não está diretamente vinculado à constatação

da ilegalidade do ato administrativo.

Com isso, a ilicitude do indeferimento do ato administrativo passa a ser

apenas parte do problema, não se revelando como elemento isolado e determinante

da responsabilização da administração pública. A raiz da questão está relacionada à

situação do segurado frente ao sistema previdenciário, de tal modo que se torne

possível constatar efetivamente o nexo de causalidade entre a gestão de benefícios

previdenciários e a lesão extrapatrimonial experimentada pelo segurado.

14

Capítulo 1. O âmbito de proteção previdenciária e a situação jurídica de seus

beneficiários

1. Da Seguridade Social e do Regime Geral de Previdência Social (RGPS)

De acordo com a Constituição Federal, a Seguridade Social abrange a

Previdência Social, a Saúde Pública e a Assistência Social. Essa denominação foi

utilizada no Brasil somente a partir de 1988, sendo a origem da expressão atribuída

à Lei de Seguridade Social norte-americana de 1935,«Social Security Act», seguida

da lei neozelandesa de 1938, com idêntica denominação, bem como das legislações

que se seguiram, como a francesa, «sécurité socialize»; a italiana, «sicurezza

sociale»; e a espanhola, «seguridad social»"2. No Brasil, a expressão “Seguridade

Social” foi designada para o sistema de proteção social com abrangência nos três

âmbitos de proteção social: previdência social, saúde pública e assistência social.3

Segundo parcela da doutrina, o direito previdenciário enquadrar-se-ia como

ramo autônomo do Direito Público por ser dotado de um conjunto próprio de

princípios, institutos jurídicos e normas específicas 4 . Por conta disso, deteria

autonomia enquanto ramo jurídico específico, dissociando-se das áreas da saúde e

da assistência. Por outra banda, o ramo jurídico5 do “Direito da Seguridade Social",

de acordo com SÉRGIO PINTO MARTINS6, abrangeria os três ramos de proteção social.

Por fim, numa terceira corrente doutrinária, a denominação adequada seria “direito

previdenciário”, sem se dissociar, contudo, da temática dos demais ramos, mediante

a aplicação de tratamento sistematizador com base no texto constitucional,

compreendendo o conjunto principiológico formado pelas três espécies do gênero

2 LEITE, Celson Barroso. Conceito de Seguridade Social. In. BALERA, Wagner (Coord.). Curso de Direito Previdenciário. LTr, p. 16.

3 ROCHA, Daniel Machado da; BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Comentários à lei de benefícios da previdência social. 11ª ed., rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora: Estafe, 2012, p. 27.

4 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 13ª Ed., São Paulo: Conceito Editorial, 2011, p. 85 e segs.

5 O destaque atribuído à autonomia desta área jurídica é referida sobretudo em relação ao Direito do Trabalho. CORREIA, Marcus Orione Gonçalves; CORREIA, Érica Paula Barcha. Curso de Direito da Seguridade Social. 7ª ed. Saraiva: São Paulo, 2013.

6 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. 35ª ed., São Paulo: Atlas, 2015.

15

seguridade social, nos termos do art. 194 da Constituição Federal.

Em relação a essa última definição, destaca-se a seguinte observação de

WAGNER BALERA7, na qual aponta que

Sob a designação genérica de seguridade social, o Direito Previdenciário estuda o inventário de mecanismos de proteção social com que conta o aparato normativo a fim de, intervindo modeladoramente no mundo fenomênico, superar certas questões sociais.

Não havendo maiores consequências práticas na adoção de uma ou de

outra terminologia, empregou-se no presente trabalho a denominação “direito

previdenciário”, como ramo indissociável do “sistema de seguridade social

brasileiro”, decomposto em duas vertentes: a previdenciária (seguro social) e a

assistencial (saúde e assistência social), sendo que a “saúde, previdência social

e assistência social nada mais são que as linhas de execução da seguridade

social.” 8 A adoção de tal terminologia preserva o termo “direito previdenciário”,

difundido na cultura jurídica nacional, sem descurar da estruturação constitucional

em que estão previstas três esferas de proteção social.

Todavia, é preciso destacar que há certas peculiaridades no âmbito de

cobertura de benefícios previdenciários, devido a especificidades que lhe são

próprias. Dentre essas, por sua relevância em relação aos demais ramos da

seguridade social, ressalta-se o seu caráter compulsório, tanto para filiação do

segurado, quanto para exigência das contribuições sociais correspondentes, assim

entendida como uma das condições exigidas pela lei para concessão do benefício

previdenciário. Este último aspecto pode ser considerado o traço distintivo da

cobertura previdenciária em face da assistencial, que prescinde de qualquer vínculo

de filiação ao sistema contributivo previdenciário.9

WAGNER BALERA, ao tratar da questão, expõe com clareza a relação de

custeio/benefício nos sistemas previdenciários, segundo se colhe do trecho abaixo:

7 BALERA, Wagner. Noções Preliminares de Direito Previdenciário. 2ª Ed. rev. e ampl. São Paulo: Quartier Latin, 2010, p. 37.

8 Ibid., p. 141.

9 CASTRO; LAZZARI, 2011, p. 87-88.

16

No âmbito de um sistema de seguridade social puro ou assistencial, o custeio das prestações ocorre, muitas vezes, através de impostos, por dotações ao orçamento da seguridade. Assim, não há qualquer relação entre financiamento e benefício, isto é, entre contribuição e prestação. As contribuições devem advir de todo o sistema sem nenhuma origem específica.

Por outro lado, no sistema contributivo, somente são beneficiados os contribuintes previamente filiados ao sistema. Assim, há relação entre a contribuição e a prestação, ainda que mínima. Deve, portanto, também contribuir para o sistema aqueles indivíduos direta ou indiretamente envolvidos com a previdência, em relação exata entre contribuição e prestação; caso contrário, o regime de financiamento presente, no regime geral de previdência, passaria a ser de capitalização. Contudo, há, sem qualquer equívoco, liame, ainda que indireto e mínimo, entre contribuição e

prestação.10

Com efeito, no que se refere ao direito à Saúde Pública e à Assistência

Social, o vínculo jurídico é muito semelhante ao da Previdência Social, mas se

distingue deste na medida em que a cobertura sanitária e assistencial independe de

qualquer fonte de custeio vinculada ao beneficiário, consoante o disposto no art. 194

da Constituição Federal.

A cobertura dos direitos previdenciários do regime geral, por sua vez, está

atrelada ao caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados os critérios de

preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, nos termos do art. 201 da

Constituição Federal. Em relação à Previdência Social, são previstas ainda duas

ordens distintas: de previdência de regimes públicos obrigatórios e de regimes

complementares de caráter facultativo, constantes do art. 202 da Constituição

Federal.

Nos regimes públicos, situa-se o regime geral e os regimes próprios de

previdência constituídos pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios para os

servidores ocupantes de cargos efetivos (Dec. 3.048, art. 6º). O Regime Geral de

Previdência Social (RGPS) e os Regimes Próprios de Previdência Social (RPPS)

são de caráter obrigatório11, ao passo que a previdência complementar é de caráter

10 BALERA, Wagner; FERNANDES, Thiago D’Avila. Fundamentos da Seguridade Social. São Paulo:

LTr, 2015, p. 125.

11 Nos termos do art. 13 da Lei n. 8.213/91, é autorizado o ingresso de segurado facultativo, desde que não se enquadre em nenhuma das categorias de segurados obrigatórios.

17

facultativo.

O regime geral é regulado pela Lei n. 8.213/91, a qual é responsável pela

normatização e gestão dos benefícios previdenciários à autarquia federal

denominada Instituto Nacional do Seguro Social (INSS)12 . Aos Estados, Distrito

Federal e Municípios é autorizada a instituição dos referidos regimes próprios,

remanescendo vinculados ao regime geral no caso de não instituírem regimes

próprios. A previdência complementar está organizada de forma autônoma, em

relação ao regime geral de previdência social, segundo as disposições do art. 202

da Constituição Federal.

No que se refere ao direito de acesso à saúde, está ele previsto como

direito de todos e dever do Estado, sendo garantido mediante políticas sociais e

econômicas que visam ao acesso universal e igualitário às ações e aos serviços

para sua promoção, proteção e recuperação, nos termos do art. 196 da Constituição

Federal. O atendimento ao usuário abrange desde o simples atendimento

ambulatorial até o transplante de órgãos 13 , operando de forma regionalizada e

hierarquizada, de modo descentralizado, com direção única em cada esfera de

governo, constituindo no todo o Sistema Único de Saúde (SUS), regulamentado pela

Lei n. 8.080/90.

No âmbito da assistência social, além de benefícios eventuais e de serviços

prestados à população carente, merece destaque o benefício de prestação

continuada, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, regulamentado pelo art.

20 da Lei n. 8.742/93. Por intermédio desse benefício, é assegurado um salário

mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência ou ao idoso que comprovar não

possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.

Nos termos da art. 29, parágrafo único, da Lei de Assistência Social, sua execução e

manutenção foram atribuídas ao INSS

No presente trabalho, a análise está focada essencialmente no Regime

Geral de Previdência Social (RGPS), não obstante sejam abrangidas outras

12 Instituído pela Lei n. 8.029, de 12 de abril de 1990.

13 Informação colhida junto ao site Portal da Saúde. Disponível em: <http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/cidadao/entenda-o-sus>. Acesso em: 12 de agosto de 2015.

18

situações envolvendo os demais ramos da seguridade social. De todo modo, o

intuito é concentrar o estudo em torno dos benefícios do RGPS, destacadamente

para situação de indeferimento de benefícios previdenciários.

2. Da Previdência Social: finalidade e natureza de direito social

A intervenção estatal, mediante a institucionalização de mecanismos de

proteção de contingências sociais, está alinhada ao fundamento basilar do poder

estatal, consistente em assegurar a dignidade da pessoa humana (art. 1º da

Constituição Federal), bem como aos objetivos fundamentais da República

Federativa do Brasil, na construção de uma sociedade livre, justa e solidária, na

erradicação da pobreza e da marginalização, na redução das desigualdades sociais

e regionais, e na promoção do bem de todos (art. 3º da Constituição Federal).

A Seguridade Social é definida como o conjunto integrado de ações de

iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, nos termos do art. 194, parágrafo

único, da Constituição Federal. Por intermédio desse conjunto integrado de ações,

dirigidas pelos vetores principiológicos constitucionais, a sua finalidade, em

essência, é dar cobertura aos riscos sociais.14

Em relação à Previdência Social, os riscos sociais estão identificados no art.

201 da Constituição Federal, bem como no art. 1º da Lei n. 8.213/91, sendo

passíveis de serem sintetizados, no intuito de fornecer proteção à população, em

face dos seguintes eventos: incapacidade para o trabalho, desemprego involuntário,

idade avançada, tempo de serviço, encargos familiares e prisão ou morte daqueles

de quem dependiam economicamente. Constituem-se tais riscos em contingências

sociais eleitas pelo constituinte originário como merecedoras de proteção estatal.

Em sentido amplo, são aquelas que inviabilizariam o exercício laboral do sujeito. De

acordo com WAGNER BALERA, esse entendimento compreende a concepção moderna

14 “O termo risco social é empregado para designar os eventos, isto é, os fatos os acontecimentos que ocorrem na vida de todos os homem, com certeza ou probabilidade significativa, provocando um desajuste nas condições normais de vida, em especial a obtenção dos rendimentos decorrentes do trabalho, gerando necessidades a serem atendidas, pois nestes momentos críticos, normalmente não podem ser satisfeitas pelo individuo.” (ROCHA; BALTAZAR JUNIOR, 2012, p. 31.).

19

de risco social assumido pelo Estado para a proteção social dos trabalhadores.15

Os riscos sociais traduzem necessidades sociais 16 legitimadoras da

aplicação do princípio da solidariedade, de modo a permitir a cotização em prol

daqueles que serão afligidos por infortúnios que os impossibilitarão de angariar

recursos suficientes para se socorrerem no futuro. Considerando, ainda, que o futuro

é incerto, o sistema busca beneficiar a todos, inclusive ao previdente, na medida em

que a filiação já assegura de imediato a cobertura para determinados infortúnios,

como aqueles decorrentes de acidente de trabalho ou doenças. Aliás, somente por

intermédio da intervenção estatal é viabilizada a distribuição dos riscos para toda a

coletividade, sendo essa a nota caracterizadora da solidariedade social, decorrente

do art. 195 da Constituição Federal.

Com efeito, o custeio da Seguridade Social é imposto a toda sociedade, de

forma direta e indireta, mediante as contribuições sociais previstas no art. 195 da

CF17. Observa-se que a concessão de benefícios está orientada pelos princípios da

universalidade das hipóteses de cobertura e do atendimento, aliada ao da

seletividade e distributividade na prestação dos benefícios. No entanto, não são

todos os riscos sociais protegidos pelo sistema de seguridade. No sistema

contributivo do regime previdenciário, só estão protegidos os indivíduos previamente

filiados e seus dependentes, ao passo que, no sistema assistencial, a proteção

abrange todos os indivíduos.18

Em virtude do âmbito de abrangência e funcionalidade dos direitos

previdenciários, torna-se inequívoca a sua natureza de direitos fundamentais, cujo

tratamento constitucional encontra previsão nos artigos 6º e 7º, inciso IV e parágrafo

único, da Constituição Federal. São características típicas de direitos dessa

natureza: a universalidade, a historicidade, a inalienabilidade, a indisponibilidade, a

15 BALERA, 2010, p. 156.

16 SANTOS, Marisa Ferreira dos; LENZA, Pedro (Coord.). Direito Previdenciário esquematizado. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 34.

17 Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais.

18 BALERA; FERNANDES, 2015, p. 120-121.

20

aplicabilidade imediata e a vinculação aos poderes públicos19.

No que se refere à universalidade, importa dizer que todas as pessoas são

titulares de direitos fundamentais, pois a qualidade de ser humano lhes atribui a

legitimidade para invocar a garantia constitucional de proteção. Todavia, há direitos

fundamentais específicos que asseguram direitos apenas a determinadas pessoas20,

como é o caso dos direitos previdenciários típicos, em que se exige a filiação

contributiva ao regime para que lhes sejam conferidos direitos de cobertura

previdenciária. Diferem-se, nesse particular, dos direitos fundamentais à saúde e à

assistência social, cujas prestações materiais alcançam quem delas necessitar, não

sendo exigida a filiação vinculativa ao recolhimento de contribuições sociais.21

No que se refere à historicidade, os direitos previdenciários têm sua gênese

e desenvolvimento no curso da história e permanecem ligados ao contexto em que

estão inseridos, revelando caráter histórico-evolutivo. No caso dos direitos

previdenciários, o primeiro ordenamento legal previdenciário foi editado em 1883, na

Alemanha, por OTTO VON BISMARK, com a instituição do seguro-doença, que conferia

cobertura compulsória às vítimas de acidentes de trabalho. Posteriormente, a

legislação foi ampliada para abranger situações de invalidez e de velhice, sendo o

primeiro país a legislar acerca da atribuição do Estado de organizar e gerir

benefícios custeados por intermédio de contribuições recolhidas compulsoriamente

de empresas.22

No Brasil, o marco inicial da Previdência Social foi a Lei Eloy Chaves,

Decreto n. 4.682, de 24.01.1923, que criou as Caixas de Aposentadoria e Pensões

nas empresas das estradas de ferro existentes. Anteriormente, para funcionários

públicos, já havia sido criada a Caixa de Aposentadoria de Pensões dos Operários

da Casa da Moeda, por intermédio do Decreto n. 9.284, de 20.12.1911.

19 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Martires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007.

20 Ibid., p. 230.

21 “As prestações de previdência social, modalidade que são do antigo e conhecido esquema do seguro social, dependem de contribuições (art. 201, caput, da Constituição); enquanto que as prestações de saúde e de assistência social seguindo de perto a larga tradição caritativa com que nasceram, serão devidas a quem delas necessitar.” (BALERA, 2010, p. 156).

22 KERTZMAN, Ivan. Curso Prático de Direito Previdenciário. 7ª ed., rev., amp. e atual. São Paulo: Editora JusPodivm, 2010, p. 39.

21

Posteriormente à famosa Lei Eloy Chaves, que vinculava trabalhadores ligados a

empresas privadas, ampliaram-se as caixas de aposentadorias e pensões que eram

organizadas por empresas. Na década de 30, foram ordenadas caixas em Institutos

de Aposentadoria e Pensão (IAPS), tornando o novo sistema mais consistente. Em

1967, foram unificados os IAPS, com a criação do Instituto Nacional de Previdência

Social (INPS - Dec. 72/66), consolidando o sistema protetivo em função da Lei n.

5.859/72. Após a Constituição Federal de 1988, a Lei n. 8.029/90 autorizou a criação

do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), com a junção do INPS ao Instituto de

Administração Financeira da Previdência e Assistência Social (IAPAS).

Os direitos previdenciários, como se verificou no breve histórico, são

direitos incrustados no processo histórico de desenvolvimento do país, sendo

atualmente geridos pelo INSS, criado pelo Decreto n. 99.350/90, com sede em

Brasília (DF), vinculado ao Ministério da Previdência Social (MPS), e cuja finalidade

institucional, dentre outras, é a de conceder e manter os benefícios e serviços

previdenciários (art. 1º do referido decreto).

Quanto à inalienabilidade e à indisponibilidade, tem-se que tais direitos não

podem ser objeto de atos de disposição ou de renúncia em caráter irrevogável. Em

princípio, os direitos fundamentais são de aplicação imediata, na medida em que se

constituem “obra do poder constituinte originário, expressão da soberania de um

povo, achando-se acima dos poderes constituídos, não podendo, portanto, ficar sob

a dependência absoluta de uma intermediação legislativa para produzir efeitos.”23

Em se tratando de direitos previdenciários, todavia, a sua eficácia depende

de atos prestacionais a serem praticados pelo Estado, enquadrando-se na categoria

de direitos fundamentais de segunda geração. Diferem-se dos direitos fundamentais

de primeira geração, denominados direitos-liberdades, pois esses, em princípio,

demandam basicamente a abstenção de interferência do Estado, dentre os quais se

poderia enquadrar o direito ao livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou

profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer (CF, art. 5º,

23 MENDES; COELHO; BRANCO, 2007, p. 241.

22

XIII)24.

De acordo com JOSÉ AFONSO DA SILVA, na obra “Aplicabilidade das Normas

Constitucionais”, os direitos sociais seriam inseridos em normas de eficácia

limitada25 de princípio programático26, isto é

aquelas normas constitucionais através das quais o constituinte, em vez de regular, direta e imediatamente, determinados interesses, limitou-se a traçar-lhes os princípios para serem cumpridos pelos seus órgãos (legislativos, executivos, jurisdicionais e administrativos), como programas das respectivas atividades, visando à realização dos fins sociais do

estado.27

Desde a primeira edição em 1968, o referido autor já incitava o propósito de

fortalecimento da normatividade constitucional, opondo-se ao esvaziamento de

efeitos das normas constitucionais, sobretudo mediante a vinculação da atuação dos

poderes públicos, de tal sorte que tais direitos serviriam como parâmetro de

organização e de limitação dos poderes constituídos.28

Na quadra atual, o Supremo Tribunal Federal, com o julgamento do MI 712-

PA29, inaugurou uma nova fase de sua jurisprudência, ao não se limitar a reconhecer

a omissão constitucional, cujo efeito era apenas constituir em mora o Poder

Legislativo, pois passou a determinar a aplicação de regras legais, por analogia,

atuando, desse modo, como verdadeiro legislador positivo.

No comentário de NELSON NERY JR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY, por

24 “As normas constitucionais de eficácia contida, portanto, conferem situações jurídicas subjetivas de vantagem aos governados, de modo específico, e situações subjetivas de vínculo ou negativas aos indivíduos. Mas o contrário também pode ocorrer, dadas certas circunstâncias previstas nas regras de contenção de eficácia dessas normas, como já vimos.” (SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6ª ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2002, p. 172).

25 A classificação recebe crítica por Virgílio Afonso da Silva, apontado a incompatibilidade entre a classificação das normas constitucionais e a teoria contemporânea de direitos fundamentais. (SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 208-251).

26 SILVA, J., op. cit., p. 151.

27 Ibid., pág. 138.

28 SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel. Direito Constitucional: teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2013, p. 369.

29 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. MI 712, Relator(a): Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2007, DJe-206 DIVULG 30-10-2008 PUBLIC 31-10-2008 EMENT VOL-02339-03 PP-00384.

23

intermédio do mandado de injunção, houve uma inovação positiva no ordenamento

jurídico brasileiro, ao serem conferidos efeitos para além do caso concreto, com a

regularização do direito de greve no serviço público, a despeito da ausência de lei

específica. De acordo com a efetividade atribuída ao mandado de injunção,

"permitiu-se conceber os direitos sociais, não como direitos meramente retóricos,

mas sim como direitos possíveis, superando a concepção do Estado liberal, que

privilegia apenas os direitos negativos.”30

O resultado dessa vinculação direta de direitos fundamentais a prestações

materiais implica a negativa da concepção do “principio programático” como critério

de mera interpretação tendente à concretização de direitos no seu conjunto,

permitindo a toda pessoa a tutela jurisdicional efetiva de direitos sociais.31

No que concerne aos direitos previdenciários, as normas constitucionais de

direitos fundamentais sociais estão conformadas pela legislação previdenciária

infraconstitucional, sendo objeto de detalhada regulação. A sua classificação,

enquanto direito fundamental, outrossim, é essencial para destacar a relevância dos

direitos dessa natureza, especialmente no que se refere à vinculação entre o

princípio da proibição de retrocesso social e a segurança jurídica que delas se possa

esperar. Nesse sentido, INGO WOLFGANG SARLET alerta para a proteção contra o

aniquilamento de conquistas sociais, ao apontar que

[…] a otimização da eficácia e efetividade deste direito e princípio fundamental reclama (também) uma certa proteção contra medidas do poder público que venham a aniquilar ou reduzir de modo desproporcional e/ou ofensivo à dignidade da pessoa (já que as duas situações nem sempre

são coincidentes) os níveis já concretizados de proteção social.32

30 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição Federal comentada e legislação constitucional. 4ª ed. rev., atual. e amp. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais Ltda., 2013, p. 246.

31 NERY JUNIOR; NERY, 2013, comentário 126, p. 426.

32 SARLET, Ingo Wolfang. A Eficácia do Direito Fundamental à Segurança Jurídica: Dignidade da Pessoa Humana, Direitos Fundamentais e Proibição de Retrocesso Social no Direito Constitucional Brasileiro. In: Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE). Salvador: Instituto Brasileiro de Direito Público, nº. 21, março, abril, maio, 2010. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com/revista/RERE-21-MARCO-2010-INGO-SARLET.pdf >. Acesso em: 07 de julho de 2015.

24

No capítulo da ordem social da Constituição Federal, como já se apontou

anteriormente, o sistema de seguridade social brasileiro está compreendido no

conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade,

destinado a assegurar os direitos relativos à previdência, competindo ao poder

público a sua organização, de acordo com os objetivos específicos definidos no art.

194 da Carta constitucional.

Os direitos sociais estão previstos nos níveis constitucional,

infraconstitucional e infralegal, de modo a conferir concreção aos direitos sociais.

Logo, é lícito afirmar, desde já, a existência de um coeso bloco normativo

disciplinador do sistema jurídico de proteção de seguridade social, o qual confere

efetiva unidade integradora ao sistema nacional de seguridade social.

A natureza de direitos fundamentais sociais dos direitos previdenciários tem

por finalidade conferir proteção às contingências sociais da população. Esses

direitos já estão arraigados na “cultura juridica”33 do Estado constitucional brasileiro

e sua concretização é objeto de regulamentação legislativa constitucional,

infraconstitucional, legal e infralegal, formando verdadeiro bloco normativo, cuja

aplicação, em âmbito administrativo, compete ao INSS, autarquia federal

previdenciária de direito público.

3. Da cobertura previdenciária limitada aos riscos sociais e da impropriedade da

funcionalização da responsabilidade civil como “ação social”

No âmbito de proteção do sistema previdenciário, não há previsão, no título

“Da Ordem Social”, de hipótese de responsabilidade civil extracontratual, não se

caracterizando como instrumento direto de ação social destinado a dar cobertura a

riscos sociais. Todavia, WÂNIA ALICE FERREIRA LIMA CAMPOS, na obra “Dano Moral no

Direito Previdenciário: doutrina legislação jurisprudência e prática”, sustenta que

a efetiva reparação por dano de moral em caso de vícios na concessão de

33 A expressão se refere à própria definição do conceito de direito fundamental colhida na obra de NELSON NERY JR e ROSA MARIA DE ANDRADE NERY (NERY JUNIOR; NERY, 2013, p. 216).

25

benefícios previdenciários representa uma das medidas que compõem o conjunto integrado de ações a que se refere o art. 194 da Constituição de

1988, visando assegurar direitos relativos à previdência social.34

A afirmativa não está amparada em qualquer previsão normativa securitária,

pois não há cobertura pelo seguro para o dano moral havido em decorrência desse

vínculo, haja vista não se tratar de risco social protegido. Com efeito, a falha

administrativa decorrente da gestão de benefícios não está prevista como risco

social determinante de indenização por eventuais danos sofridos pelo segurado. O

eventual dever de indenizar encontra fundamento na regra geral de responsabilidade

extracontratual da Administração Pública, calcado no art. 37, § 6º, da Constituição

Federal.

A admissão do dano moral como instrumento de cobertura de riscos sociais

desvirtua o sistema de proteção social, especialmente em face da restrição

constitucional de que todo e qualquer benefício ou serviço social só poderia ser

criado, majorado ou estendido com a observância da correspondente fonte de

custeio total, nos termos do art. 195, § 5º, da Constituição Federal.

O risco social, segundo observa WAGNER BALERA,

encontra amparo na norma jurídica, que prevê a concessão de prestação

capaz de proteger uma possível necessidade social decorrente da

verificação de tal evento. Vale dizer: há uma norma jurídica, correspondente

a cada risco social, prevendo que, na hipótese de concretizar-se o fato,

conceder-se-á tal prestação capaz de proteger o indivíduo, trazendo,

portanto, bem-estar e justiça securitários.35

Sendo assim, só poderiam ser equalizados os gastos dessa nova ordem a

partir dos riscos sociais cobertos pela legislação infraconstitucional específica.

Ocorre que a previsão orçamentária de seguridade social não comporta a

funcionalização da responsabilidade civil como ação vinculada ao sistema social,

pois isso implicaria a subversão da sistemática securitária que correlaciona suas

34 CAMPOS, Wânia Alice Ferreira de Lima. Dano moral no direito previdenciário: doutrina, legislação, jurisprudência e prática. 1ª ed., reimp. Curitiba: Juruá, 2011, p. 45.

35 BALERA; FERNANDES, 2015, p. 119.

26

fontes de custeio à projeção de gastos dimensionados em razão dos riscos cobertos

por estimativa atuarial regulamentada na legislação específica.

De igual modo, a funcionalização da responsabilidade civil como ação social

não se justifica em face da finalidade de se corrigirem eventuais falhas

administrativas. A penalização dessas falhas através da imputação de indenizações

por danos morais não implica diretamente a correção de vicissitudes sistêmicas. A

despeito de a quantificação dos danos morais levar em conta o caráter profilático,

não se poderia considerar sua inclusão como “acao social integrativa” do sistema de

seguro social, ainda que com intuito de “tornar efetivo e realçar a sua importância na

ordem jurídica” 36.

Com a devida vênia, o fundamento de justificação da reparação por dano

moral como “acao” integrante do sistema de seguridade social, dentre aquelas

“destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência

social”, nos termos do art. 194 da Constituição Federal, acrescenta ao risco social o

risco administrativo de gestão de benefícios. Por isso, a indenização por dano moral

para toda falha de gestão previdenciária não é meio capaz de aprimorar o sistema

administrativo; ao contrário, é passível de torná-lo ainda mais deficitário,

burocratizado e moroso.

De outra parte, em determinadas situações, o Poder Judiciário tem

reconhecido a responsabilidade do Estado de implementar políticas públicas, tais

como a ampliação de hospitais37, o fornecimento de medicamentos não previstos em

listas padronizadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS)38, dentre outras. Nesses

casos, tem-se afastado a oposição do argumento orçamentário oposto pelo Estado,

no sentido do contingenciamento das despesas orçamentárias, sob o fundamento de

inoponibilidade da reserva do possível em face do mínimo existencial. As matérias

envolvendo essas questões, além do intenso debate em torno da adequação da

atuação do Poder Judiciário, encontram-se em ebulição, tanto em sede doutrinária

quanto jurisdicional, como no caso da responsabilidade solidária dos entes

36 CAMPOS, 2011, p. 166.

37 BRASIL. RE 581352 AgR. Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 29/10/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-230 DIVULG 21-11-2013 PUBLIC 22-11-2013).

38 BRASIL. RE 831385 AgR. Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 17/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-063 DIVULG 31-03-2015 PUBLIC 06-04-2015).

27

federados quanto ao dever de fornecer medicamentos, atualmente afetado a

julgamento em sede de repercussão geral no RE 855178 RG, Relator(a): Min. LUIZ

FUX, julgado em 05/03/2015.

O objeto do presente trabalho não engloba a questão da amplitude de

cobertura securitária abrangida pelo Estado, ou do impacto orçamentário da

intervenção do Poder Judiciário nas políticas públicas. Entretanto, no âmbito

previdenciário, é preciso deixar claro que o risco social abrangido pela cobertura

previdenciária lato sensu está delimitado em face da previsão de benefícios sociais

delineados nas normas previdenciárias e assistenciais. Por esse motivo, afirmou-se

que não poderia incluir a indenização por danos morais como ação integradora

abrangida pelo art. 194 da Constituição Federal.

No entanto, não há óbice para eventual condenação do Estado com

fundamento na responsabilidade civil, pois a necessidade de previsão de fonte de

custeio não inibe o juízo reparatório. As eventuais condenações do Estado seguem

a regra de pagamento por sistema de precatório ou por requisições de pequeno

valor, nos termos do art. 100 da Constituição Federal. Portanto, exigem a inclusão

orçamentária da verba necessária para rubrica destinada a débitos oriundos de

sentenças transitadas em julgado (art. 100, § 5º, da Constituição Federal).

Não obstante, a partir do momento em que se funcionaliza a

responsabilidade civil extracontratual, para abranger o risco social previdenciário,

não só a previsão normativa de natureza securitária nos parece necessária, assim

como a previsão orçamentária correlata.

Nessa perspectiva, o eventual dever de indenizar dano moral sofrido pelo

segurado na seara securitária deveria estar abrangido pela cobertura de proteção

social, caso a responsabilidade civil viesse a ser utilizada como instrumento de

reconhecimento do dever de indenizar toda e qualquer compensação financeira por

falhas de gestão de benefícios.

Não há, porém, no presente momento, qualquer previsão normativa

específica prevendo a responsabilidade civil da administração dessa natureza. A

responsabilidade civil extracontratual do Estado, dessarte, não se enquadra como

ação integrante do sistema de seguridade social, nem se confunde, ainda que

indiretamente, com os mecanismos de efetivação de políticas públicas concretizadas

28

por intermédio da atuação judicial.

4. Do vínculo previdenciário: da relação e da situação jurídica previdenciária

A. Da relação jurídica previdenciária e do direito subjetivo

A Constituição Federal brasileira assegura cobertura previdenciária aos

cidadãos, mediante a previsão de direitos fundamentais sociais. Significa dizer que,

aos sujeitos em geral, é garantida, em sede constitucional, proteção contra os riscos

sociais, os quais são passíveis de concretização por intermédio de ações

constitucionais tendentes a efetivá-los pela provocação dos poderes instituídos, em

especial do Poder Judiciário.

No âmbito constitucional, a questão do fornecimento de medicamentos é a

mais discutida, como se apontou anteriormente. De toda sorte, no que tange ao

sistema previdenciário, objeto preponderante de análise, as coberturas securitárias

se encontram devidamente concretizadas na legislação infraconstitucional, mediante

a previsão de diversas espécies de benefícios concernentes às contingências

sociais abstratamente referidas no texto constitucional. Para concessão de

benefícios previdenciários, além da filiação ao sistema, é necessária a verificação

dos requisitos legalmente previstos. Essa vinculação jurídica entre os destinatários

da cobertura social e o Estado é analisada pela doutrina através da relação jurídica

previdenciária.

De acordo com a DESA. MARISA SANTOS39 o sistema protetivo de seguridade

social está estruturado com base em relações jurídicas nas quais seriam sujeitos

ativos aqueles que dele necessitarem e sujeitos passivos os poderes públicos

(União, Estados e Municípios) e a sociedade, ao passo que o objeto da relação seria

a contingência social, geradora da consequência-necessidade objeto da proteção.

Em relação ao objeto, destaca que o risco, por ser conceito típico do Direito Civil,

está vinculado à potencialidade do dano e que a sua recomposição se dá por meio

39 SANTOS; LENZA, 2014, p. 36-37.

29

de indenização. Segundo a referida autora, esses conceitos são inadequados para

relação de seguridade social, pois nessa relação nem todos os que contribuem para

o seu custeio têm direito ao benefício, mas todos têm direito a algum tipo de

proteção social. Além disso, as prestações previdenciárias nem sempre são

conferidas em face da manifestação de um dano, como no caso da cobertura

dispensada à maternidade, que não poderia ser conceituada como dano. Assim, o

objeto identificado nas contingências sociais seria aquelas situações de risco

enumeradas na Constituição Federal, nas quais há previsão de prestações de

benefício a serem alcançadas pela Seguridade Social. Destaca, sobretudo, que a

relação jurídica de seguridade social nasce “apos” a ocorrência da contingência,

para, então, ensejar a reparação da consequência-necessidade dela decorrente.

Segundo WAGNER BALERA, a relação jurídica seria “o instrumento de ação

de que se vale o Direito Previdenciário para, intervindo na vida social, proporcionar

seguridade”40, consistindo na estrutura básica entre os sujeitos e o objeto, na qual o

sujeito ativo só pode exigir certo e determinado objetivo, o único apto a satisfazer, segundo os padrões normativos, a situação de necessidade surgida pelo irromper do evento (a concretização do risco) no mundo fenomênico. Por seu turno, do sujeito passivo só se exige uma conduta: que confira a prestação, nos termos e condições legalmente estabelecidos.41

Desse modo,

A partir do momento em que surgir a situação de necessidade, o sujeito ativo, denominado beneficiário (designação que compreende os segurados e dependentes) ficará investido do poder de exigir do Poder Público (e, mais concretamente, de um dos órgãos integrantes da estrutura estatal da seguridade social, ou de alguma pessoa privada a quem o Estado adjudicou a função) a expedição de concreto ato administrativo de outorga da

prestação. 42

Em síntese, “A relação jurídica terá por objeto a prestação, isto é, o

40 BALERA, 2010, p. 132.

41 Ibid., p. 132-133.

42 Ibid., p. 134.

30

comportamento devido pelo sujeito passivo, que tanto pode consistir na ‘realização

de um fato’ como na ‘dação de uma coisa’.”43

Analisando as estruturas de relação previdenciária apontadas, constata-se

que, no âmbito constitucional, seria possível afirmar que o indivíduo é destinatário da

garantia fundamental de proteção securitária, especialmente a partir da definição

traçada pela DESA. MARISA SANTOS. Desse modo, como se observou de início,

assegura-se ao indivíduo, enquanto detentor de direitos fundamentais, o exercício

de tutela constitucional destinado à concretude de direitos fundamentais sociais.

Cogita-se, pois, da possibilidade de o Poder Judiciário assegurar a efetividade de

determinada cobertura securitária em face de situações de ‘risco social’, sob o

fundamento de ainda não ter sido concretizado por intermédio de norma

infraconstitucional. Por essa linha de raciocínio, o direito subjetivo do segurado se

identificaria com o objeto prestacional, a partir da contingência social.

Todavia, na ausência de previsão legal de prestações materiais, segundo o

Min. GILMAR MENDES, ao referir a conformação de direitos sociais, não competiria ao

Poder Judiciário deduzir direitos subjetivos para alcançar aos sujeitos prestações

materiais concretas decorrentes tão somente da previsão constitucional originária de

direitos. Isso porque o "direito subjetivo pressupõe que as prestações materiais já

hajam sido precisadas e delimitadas — tarefa própria do órgão político, e não

judicial.”44 Por essa perspectiva, o objeto da relação “previdenciária” não estaria

abstratamente coligada a prestações deduzidas de contingências sociais, mas aos

direitos fundamentais sociais.

Desse modo, não se poderia qualificar propriamente a relação como

previdenciária, haja vista que o vínculo elementar é de natureza jurídico-

constitucional, invocando-se direitos fundamentais sociais; do contrário, seria

precoce reconhecer direitos subjetivos a prestações materiais ainda não

determinadas por lei previdenciária regulamentadora. No entanto, devido à

amplitude que se tem atribuído à eficácia direta dos direitos fundamentais,

especialmente por conta da atuação do Supremo Tribunal Federal, conforme

apontado anteriormente, havendo omissão qualificada pela inércia dos Poderes

43 BALERA, 2010, p. 134.

44 MENDES; COELHO; BRANCO, 2007, p. 251.

31

Legislativo e Executivo, não se poderia afastar de plano essa possibilidade.

Com essas considerações, admitindo-se a atuação judicial concretizadora

de direitos fundamentais como legislador positivo45, torna-se possível qualificar as

contingências sociais abstratamente previstas na carta política como sendo o objeto

da relação jurídica previdenciária, ao invés das prestações previdenciárias já

previstas concretamente em lei específica.

Em situação limítrofe, na tentativa de apontar situação exemplificativa, há

intenso debate acerca de decisões judiciais determinantes do fornecimento de

medicamentos não previstos em listas confeccionadas pelo Sistema Único de

Saúde. Discute-se, nesses casos, a preponderância de valores constitucionais a

endossar o afastamento das limitações de políticas públicas estabelecidas. Contudo,

assente na leitura da legislação de regência, por meio de interpretação conforme a

constituição, a questão envolve o enfrentamento da atuação do Poder Judiciário na

concretização de prestações materiais não contempladas na regulação

infraconstitucional, baseando-se essencialmente no direito fundamental deduzido da

necessidade vital do segurado de obter determinado medicamento.

Em suma, merece destaque a justificada dissonância na doutrina, ao

entabular a relação previdenciária com suporte na identificação do seu objeto

relacional, que ora está na contingência social, ora na prestação a ser alcançada ao

beneficiário.

Na relação previdenciária propriamente dita, os sujeitos da relação estão

vinculados ao sistema previdenciário por filiação contributiva, na posição subjetiva

ativa46, ao passo que o Estado, representado pelo INSS, enquadra-se na posição

subjetiva passiva. O objeto da relação previdenciária, segundo WAGNER BALERA,

45 Considerando a posição atual do Supremo Tribunal Federal, como se verificou no julgamento do MI 712-PA (STF, PLENO, rel. Min. Eros Grau, j. 25.10.2007, m.v.), que, ao conceder a injunção, determinou a aplicação da Lei de Greve, no que couber, à situação da omissão legislativa no regramento do direito de greve dos servidores públicos.

46 “A situação jurídica subjetiva é a posição que todo sujeito ocupa no contexto da relação jurídica: ela se estabelece normalmente entre dois sujeitos, dos quais um tem o dever de comportar-se de um certo modo e o outro tem um poder em relação ao primeiro para que ele se comporte daquele modo. Isso permite distinguir situações jurídicas em dois tipos fundamentais: as que impõem obrigações e as que atribuem poderes. As primeiras chamam-se situações jurídicas passivas; as segundas, situações ativas. Dado que ao poder de um corresponde o dever de outro, a relação jurídica surge como a correlação de duas situações jurídicas de sentidos opostos e de igual conteúdo." (LUMIA, Giuseppe. Elementos de teoria e ideologia do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 105).

32

refere-se às prestações previdenciárias, que se materializam em benefícios ou

serviços a serem prestados pela autarquia previdenciária.

Essa última classificação é tecnicamente mais acurada, porém não há como

se desprezar a natureza de direito fundamental inerente aos direitos previdenciários,

de tal maneira que a sua concretização pode ser aceita apenas a partir da

contingência social, no caso de inércia dos poderes públicos na concreção de lege

ferenda.

De toda sorte, antes da concretização desses direitos, não se poderia

afirmar tecnicamente a existência de uma relação jurídica “previdenciária”, pois

restaria destituída do objetivo prestacional, realizável somente mediante previsão

legal. Por essa razão, ao nosso sentir, a relação previdenciária não nasce

propriamente da verificação da contingência social, mas da previsão legal (direito

objetivo), que confere direitos prestacionais materiais a pessoas determinadas, ou

seja, aos segurados e seus dependentes, acrescida do preenchimento dos

requisitos legais à sua concessão (direito subjetivo). Por essa linha de raciocínio, o

direito subjetivo do segurado se identifica com o objeto prestacional, a partir da

implementação dos requisitos legais correspondentes.

Aprofundando o estudo da questão, em trabalho monográfico, FÁBIO BERBEL

aborda a questão da relação jurídica previdenciária por outro viés, analisando-a com

suporte na teoria que denomina de escionista, urdida a partir da teoria unitária ou da

relação bilateral 47 . Conforme a teoria escionista, não se verificaria o

“sinalagmatismo” defendido pela teoria unitária, uma vez que se busca a

“compreensão do fenômeno previdenciário a partir de várias relações jurídicas

distintas e autônomas.”48 A satisfação da obrigação não seria o elemento ensejador

de direitos subjetivos, pois a obrigação de contribuir decorreria da relação de

trabalho, ao passo que o direito à prestação decorreria da necessidade

(contingência social). Portanto, não se verificaria uma relação bilateral, por não

haver simultaneidade, haja vista que o dever de contribuir não nasce

47 Segundo o autor, a teoria unitária ou da relação bilateral tem sustentação com os pressupostos jurídicos do seguro privado.

48 BERBEL, Fábio Lopes Vilela. Teoria Geral da Previdência Social. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 141.

33

necessariamente no mesmo momento temporal em que nasce o direito à prestação.

A diferença essencial em relação à mencionada teoria unitária reside na

definição da relação jurídica previdenciária como sendo única e bilateral, pois

“ampara simultaneamente direitos e deveres em face das prestações e das

contribuições.”49 Dessarte, o direito subjetivo à proteção não estaria ligado somente

à ocorrência do fato imponível (contingência social), cumprindo à bilateralidade

impor a necessidade prévia de adimplir a obrigação de custeio, mas também ao

dever jurídico de contribuir.

A estrutura jurídica relacional, no âmbito do Direito Previdenciário, de

acordo com as abordagens doutrinárias apontadas, tem por finalidade a identificação

dos atores jurídicos envolvidos no vínculo previdenciário, entrelaçados pelo direito

subjetivo do segurado à cobertura previdenciária, a qual se concretiza mediante

normas jurídicas que prevêem direito a determinado benefício. No entanto, devido às

peculiaridades do direito previdenciário, a definição precisa da relação previdenciária

está ligada essencialmente à identificação do seu objeto, no sentido de justificar o

exercício do direito subjetivo público do segurado em face do poder público e lhe

autorizar a exigência de determinada prestação previdenciária.

Entretanto, conforme observamos anteriormente, como não há previsão

legal de uma prestação previdenciária indenizatória por dano moral, o conceito de

relação previdenciária se presta apenas a revelar que o liame jurídico entre o

segurado e a autarquia previdenciária está construído em torno dos benefícios

previdenciários. Ademais, na perspectiva relacional, somente é possível o juízo de

licitude/ilicitude em face do direito subjetivo do segurado no tocante ao objeto

(benefício) pretendido, não se podendo deduzir maiores efeitos com apoio nesse

campo de análise.

B. Da situação jurídica previdenciária e da posição jurídica de vantagem

Por outra linha de constatação, o liame jurídico entre o segurado e o ente

49 BERBEL, 2005, p. 143.

34

previdenciário se estabelece por uma série de situações fáticas qualificadas pela

norma previdenciária, as quais permitem avaliar a posição situacional do segurado

no âmbito do sistema securitário. Apreende-se, com maior acuidade, eventual

posição de vantagem ou desvantagem na qual venha a se encontrar um ou outro

sujeito do vínculo jurídico no âmbito do sistema previdenciário.

A perspectiva relacional aplicada ao âmbito previdenciário tem por

finalidade precípua assegurar o reconhecimento de direitos subjetivos públicos aos

indivíduos, legitimando-os a exercê-los em face do Estado, com a finalidade de que

obtenham a outorga da cobertura securitária concretizada pelas prestações de

benefício. A análise do vínculo previdenciário pela perspectiva situacional, por seu

turno, traz uma outra dimensão da proteção previdenciária, de tal modo a revelar a

efetiva complexidade dos elementos jurídicos que envolvem o vínculo entre o

indivíduo beneficiário e o Estado gestor de benefícios.

Segundo ROSA NERY 50 , as situações jurídicas, em sentido amplo,

configuram-se como situações absolutas, portanto não relacionais, e situações

relacionais, em que efetivamente se constatam as relações jurídicas propriamente

ditas. A situação jurídica, ainda segundo a referida autora, não seria mero fato

jurídico, mas sim uma síntese cultural de fato e de valor. Não seria, ademais,

fenômeno pré-normativo, como são as normas, nem algo que possa ser visto

apenas pelo aspecto empírico. Em outras palavras, a situação jurídica pressupõe o

direito realizado e a produção de efeitos, configurando-se uma maneira de

teorização do fenômeno básico de realização do direito.

No Direito Previdenciário, constata-se efetivamente que as situações de fato

implicam direitos reconhecidos pela norma previdenciária, mas que dependem ainda

do reconhecimento pela autarquia previdenciária para concretizar efeitos, haja vista

que o desiderato é assegurar a concessão de benefícios. Nessa linha de

estruturação do vínculo previdenciário, expõe-se o feixe de liames jurídicos

estabelecidos em favor do beneficiário, desde a sua posição enquanto sujeito

incluído no âmbito de proteção do sistema previdenciário, até a de sujeito

beneficiado por determinado benefício social, como no caso de benefício já

50 NERY JUNIOR; NERY, 2015.

35

concedido.

A questão que se coloca é se efetivamente tem sido adequado o tratamento

conferido aos sujeitos abrangidos pelo escopo de proteção das normas

previdenciárias através da perspectiva relacional, enfeixada basicamente em torno

da possibilidade de o sujeito buscar a concessão de cobertura securitária, com base

na reivindicação de determinado benefício previdenciário não alcançado na via

administrativa. Se há de fato um vínculo relacional, este se estabeleceria com a

entidade gestora de benefícios. No entanto, o referido vínculo não toma em conta a

posição situacional do segurado na sua completude, pois a proteção previdenciária é

pré-regulativa, abrangendo a situação do sujeito ainda despida de previsão

normativa infraconstitucional.

Como se apontou anteriormente, a partir do texto constitucional é possível

deduzir ações materiais protetivas do sujeito, mediante o exercício da tutela

constitucional pela via da atuação conformadora do Poder Judiciário. Nessa

perspectiva, a qualificação do vínculo previdenciário como de natureza situacional

posiciona o sujeito na rede de proteção previdenciária estatal, abrangendo na sua

integralidade a tutela de direitos previdenciários, desde a previsão constitucional de

direitos fundamentais sociais previdenciários, até a manutenção do benefício já

implantado em favor de determinado beneficiário. Assim, possibilitar-se-ia a aferição

da legitimidade das expectativas do segurado em receber a proteção securitária do

Estado, tendo em conta o grau de frustração do segurado ao não obter a proteção

que lhe deveria ter sido reconhecida como decorrência da posição de vantagem que

detinha.

Conforme se verificou no tópico anterior, não há propriamente uma relação

entre o custeio e a concessão de benefícios previdenciários, exceto quando a norma

trata da situação dos segurados facultativos, os quais são os únicos que

efetivamente podem optar por integrar o sistema. Em relação aos demais, é

obrigatória a filiação ao sistema, ainda que o sujeito não tenha a menor intenção de,

no futuro, exercer a posição de vantagem que essa situação jurídica lhe outorga.

Nessa perspectiva, veja-se exemplificativamente a situação do sujeito

empregado com carteira assinada, na qual a responsabilidade pelo recolhimento dos

encargos sociais é do empregador: na hipótese de este não recolher nenhuma das

36

contribuições sociais devidas ao longo dos trinta e cinco anos de atividade laboral

daquele, ainda assim será reconhecida ao empregado a qualidade de segurado e

será computado todo esse período como tempo de contribuição e de carência, de tal

modo que fará jus à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de

contribuição, nos termos do art. 143 da Lei n. 8.213/91.

No âmbito judicial, é comum que se exija do segurado a comprovação do

recolhimento das contribuições para que efetivamente lhe seja reconhecido o direito

à determinada prestação de benefício. Nesses casos, porém, a jurisprudência é

firme no sentido de que é suficiente a comprovação do vínculo empregatício, em

geral por intermédio da apresentação da carteira de trabalho, não sendo necessário

que o empregador tenha efetivamente efetuado o recolhimento das contribuições

previdenciárias, quiçá que o beneficiário demonstre tal recolhimento. Essa posição

de desvantagem da autarquia é equilibrada, com fundamento nas normas tributárias,

pela posição do Estado frente ao contribuinte empregador, em razão de ser exigível

a este último o cumprimento da exigência tributária, aduzindo-se, além disso, que a

questão é passível de fiscalização tributária pelo órgão competente.

Ao reverso, no âmbito previdenciário, o Estado ocupa posição de

desvantagem, sendo seu dever, na gestão de benefícios, implantá-los em favor do

segurado que preencher os requisitos legais para sua concessão, ainda que não

haja propriamente o custeio efetivo correspondente a essa situação específica. Em

outras situações, como no caso dos segurados rurícolas, sequer é exigida a

comprovação do recolhimento dos encargos sociais para que se reconheça o direito

ao benefício. O mesmo se poderia apontar dos benefícios por incapacidade, cujo

período de carência pode até mesmo ser dispensado, em razão da natureza da

doença.

Em suma, entre a proteção previdenciária prevista abstratamente em

âmbito constitucional e a estruturação jurídica do sistema previdenciário, pode-se

aferir o grau de expectativa do sujeito em face da garantia securitária esperada do

Estado, utilizando como critério de aferição eventuais prejuízos extrapatrimoniais

experimentados pelo segurado, conforme a perspectiva situacional previdenciária.

Com efeito, por intermédio da análise situacional dos sujeitos em face do regime

previdenciário, é possível avaliar desde a mera expectativa de obtenção da

cobertura previdenciária até a legítima garantia de manutenção do benefício já

37

concedido. Ademais, a partir da posição do sujeito, pode ser avaliada objetivamente

se a posição de vantagem do segurado é determinante ou não para imputação do

dever de indenizar prejuízos de ordem extrapatrimonial, decorrentes da frustração

na obtenção do benefício previdenciário.

A Previdência Social visa a dar cobertura a contingências, de acordo com

as quais estão previstos benefícios para assegurar aos indivíduos os meios

indispensáveis à sua manutenção. No caso de doença ou lesão incapacitantes,

estão previstos os benefícios de aposentadoria por invalidez, auxílio-doença e

auxílio-acidente, sem prejuízo dos serviços da reabilitação social, se for o caso. Para

a idade avançada, preveem-se as aposentadorias por idade, por tempo de serviço e

por tempo de contribuição e, na situação de morte do membro provedor da família, a

pensão para os seus dependentes.

Além desses benefícios, a proteção previdenciária abrange a maternidade,

por meio da concessão de salário-maternidade e de salário-família, e a reclusão,

através do auxílio-reclusão, destinado aos dependentes de segurados de baixa

renda. No âmbito assistencial, por sua vez, é previsto o benefício de prestação

continuada de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência ou ao

idoso que comprovar não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la

provida por sua família, de acordo com os requisitos previstos pela Lei n. 8.742/93.

Embora o objeto do presente trabalho não se refira propriamente aos

critérios legais para concessão de benefícios securitários, mas à responsabilidade

civil decorrente de danos morais, faz-se necessária essa abordagem, ao menos a

título ilustrativo de algumas hipóteses, justamente para demonstrar a influência da

posição jurídica do segurado em face da estrutura da Previdência Social.

A qualidade de segurado para concessão do benefício previdenciário é o

requisito essencial para qualquer benefício. No caso de aposentadoria rural por

idade (art. 48, "caput" e § 1º, ambos da Lei n. 8.213/91), em geral, discute-se o

reconhecimento da qualidade de segurado especial, dependendo de prova da

caracterização da atividade rural em regime de economia familiar, que deve, ainda,

abranger o período de quinze anos, ainda que forma descontínua, desde que

imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico

à carência do referido benefício. Só assim fará jus ao benefício no valor de um

38

salário mínimo, independentemente do recolhimento de contribuições sociais, pois é

exigida apenas a comprovação do tempo de exercício na atividade rural.

A posição jurídica desse segurado é precária em comparação à situação do

segurado urbano que pretende a obtenção de aposentadoria urbana por idade, no

sentido de que o seu ônus probatório é muito mais complexo. No benefício urbano, é

preciso que o segurado demonstre possuir mais de 65 (sessenta e cinco) anos de

idade completos, se homem, e 60 (sessenta), se mulher, com mais de 30 anos de

atividade remunerada, bem como carência superior aos 180 meses exigidos,

passível de ser provada por intermédio de carteira de trabalho (CTPS) assinada,

sem rasuras.

Pode-se afirmar que a expectativa deste último segurado em obter a

concessão do benefício no prazo de 45 dias, nos termos do art. 41-A, § 5º, da Lei n.

8.213/91, é muito superior ao caso do segurado trabalhador rural, que precisa provar

a atividade rural em regime de economia familiar. No segundo caso, a demonstração

da sua situação jurídica é complexa, sendo uma das demandas mais recorrentes na

Justiça Federal, tendo em vista, em regra, a escassez de provas em poder do

segurado e a grande dificuldade de se averiguar os fatos ocorridos há muitos anos.

A comprovação dos requisitos para concessão de aposentadoria rural por idade é,

logo, muito mais difícil do que a aposentadoria urbana. É inafastável, portanto, que a

expectativa do segurado trabalhador rural em obter tempestivamente a concessão

deve ser baixa, visto que a probabilidade de ser alçada somente em âmbito

jurisdicional é muito alta.

Esse raciocínio pode ser aplicado de igual modo ao segurado que, embora

empregado com vínculo laboral urbano, dependa da conversão de tempo especial

em comum para obter a sua conversão, de modo a atingir o tempo de

serviço/contribuição mínimo para concessão de aposentadoria por tempo de

contribuição/tempo de serviço.

Pode-se traçar aqui outra distinção entre o segurado que já apresenta no

processo administrativo a documentação exigida pelo agente previdenciário, como

Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT) e Perfil

Profissiográfico Previdenciário (PPP), entre outros laudos demonstrativos da sua

efetiva exposição à atividade nociva à saúde. Diferente cenário se dá com o

39

segurado que meramente refere estar exposto à atividade nociva, informando que a

empresa para a qual trabalhara já encerrou suas atividades muitos anos atrás e que

não há acesso a qualquer documento demonstrativo da natureza efetiva das

atividades desempenhadas em condições especiais (insalubres), pela apresentação

de laudo comparativo de empresa atual que desenvolve atividade similar e com

porte semelhante à empresa extinta, na qual efetivamente laborou.

Em suma, é possível avaliar a graduação de expectativas, no que se refere

ao sucesso da pretensão do segurado, a partir da configuração da posição de

vantagem que ostenta em face da autarquia previdenciária, analisando-se

basicamente os elementos apresentados para a comprovação da sua situação

previdenciária na esfera administrativa.

A questão se torna fulcral ao ser considerada, nessa projeção, a margem de

razoabilidade do parâmetro jurídico utilizado pela administração previdenciária na

avaliação da posição situacional previdenciária do segurado. Exemplificando-se:

para que se reconheça o direito à aposentadoria especial, o segurado deve ter

trabalhado com sujeição a condições especiais nocivas à saúde ou à integridade

física durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos.

Em torno desse tema, há divergências acerca do reconhecimento do tempo

especial, notadamente quando se trata do agente nocivo ruído. O ponto central da

polêmica deve-se ao fato de que, administrativamente, é aceita a neutralização do

agente ruído, mediante a utilização de equipamento de proteção auricular, para o

afastamento do reconhecimento do tempo especial. Já no âmbito judicial, não se

admite essa hipótese, pois estaria afastada a exposição do segurado ao agente

prejudicial à saúde ou à integridade física.

Essa dissonância foi recentemente enfrentada pelo Supremo Tribunal

Federal, chancelando o reconhecimento de que a utilização dos equipamentos de

proteção auricular não inviabiliza o reconhecimento do tempo especial. Desse modo,

pode-se afirmar que as expectativas dos segurados que se enquadram nessa

situação devem ser ampliadas, haja vista o aceno inequívoco da jurisprudência, em

sede de repercussão geral, em sentido favorável a essa pretensão.

No caso da aposentadoria por invalidez ou do auxílio-doença, exige-se

carência mínima de doze contribuições para a concessão de qualquer desses

40

benefícios, além de incapacidade para o trabalho, que deverá ser de modo total,

permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra

atividade, para fins de concessão da aposentadoria por invalidez, ou de modo

temporário e por mais de 15 dias para suas atividades habituais, no que concerne ao

auxílio-doença. Em geral, discute-se basicamente a conclusão da perícia

administrativa, pois esta é determinante para a constatação da incapacidade e

também da data do termo inicial da incapacitação, de modo que, sendo este anterior

ao ingresso no RGPS, o segurado não fará jus ao benefício. Com efeito, na última

situação, há a possibilidade de configuração de doença pré-existente ao ingresso,

que é causa de exclusão do direito à concessão desses benefícios, de acordo com

os arts. 42, § 2º e 59, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91. No entanto, em se

tratando de agravamento da doença, não se reconhece sua pré-existência, fazendo

o segurado jus ao benefício.

Enfim, nesses casos, a análise de concessão depende basicamente da

prova técnica dirigida à superação do laudo administrativo. O conteúdo desse laudo

é relevante para aferição da projeção de expectativas do segurado e também da

base probatória apresentada em sede administrativa, de modo que permita a

avaliação adequada do laudo administrativo naquele momento procedimental.

Em geral, o estado de saúde do segurado é reavaliado por perito judicial,

chegando-se muitas vezes a conclusões distintas das obtidas pelo perito do INSS.

De toda sorte, a projeção objetiva do resultado da perícia só é passível de ser

analisada ao considerarmos se o quadro clínico do sujeito, no momento da

realização da perícia administrativa, foi bem executado ou não. Esse juízo, ademais,

não é viável por meio da relação jurídica, no tocante ao objeto prestação de

benefício, em face do qual se avaliará apenas se o segurado obteve ou não a sua

concessão. Já na perspectiva da posição do segurado, é possível avaliar se as

expectativas para a concessão eram legítimas ainda em sede administrativa, a partir

do contexto probatório constante do processo administrativo.

Por fim, em relação ao benefício assistencial de prestação continuada,

dentre os requisitos para sua concessão, além do critério subjetivo de idade

avançada ou de caracterização da incapacidade, está previsto o critério objetivo

para constatação da miserabilidade do núcleo familiar, consistente de renda familiar

per capita de até 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. Este critério foi declarado

41

constitucional pelo Supremo Tribunal Federal (ADI 1.232-1/DF), mas persistiram

divergências no âmbito jurisdicional, especialmente em relação à possibilidade do

sopesamento de fatores subjetivos indicativos do estado de miserabilidade do

indivíduo. Desse modo, autoriza-se o desconto de certas despesas para a análise da

renda do núcleo familiar. Em sede administrativa, a análise de concessão está

pautada, em regra, apenas pela aferição objetiva da renda familiar, sem a avaliação

de outros fatores considerados em sede judicial.

A discussão se aprofundou em relação ao critério objetivo, conduzindo o

Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso Extraordinário n.

567.985/MT, a reconhecer a alteração do patamar fixado em normas que já

disciplinaram as políticas de amparo e assistência social promovidas pelo Governo

Federal, as quais fixam em 1/2 (meio) salário-mínimo por pessoa a base para

verificação do nível de pobreza no Brasil, conforme as Leis n. 10.836/01 (Bolsa

Família), n. 10.689/03 (Programa Nacional de Acesso à Alimentação) e n. 10.219/01

(Bolsa Escola), passando a ser adotado como novo critério objetivo para aferição da

situação de miserabilidade do núcleo familiar. Com isso, exemplifica-se o

descompasso entre o critério judicial e o administrativo, em relação aos requisitos

legais para o reconhecimento do direito à concessão de benefício assistencial.

Em face das considerações acima apontadas, é possível concluir pela

possibilidade de se graduar as posições de vantagem dos sujeitos/segurados em

face da proteção securitária estatal, levando em conta a situação previdenciária do

indivíduo a partir dos dados colhidos junto ao processo administrativo. Esse critério,

como analisaremos quando do enfrentamento do nexo causal, está ligado ao

eventual dever de o Estado reparar prejuízos de ordem moral sofridos em razão da

frustração de expectativas na obtenção de benefícios previdenciários. Difere-se do

exame da questão pela perspectiva relacional previdenciária, na qual o enfoque se

estabelece na legalidade do ato administrativo em razão do direito subjetivo do

segurado ao benefício. Nesse quadrante, só é possível a constatação da licitude ou

ilicitude do ato administrativo previdenciário. No entanto, essa questão não é tão

singela no campo da responsabilidade civil.

De toda sorte, estão lançadas as bases de análise da questão pela

perspectiva situacional, a qual se irá aprofundar no curso do presente estudo.

Passa-se, assim, ao exame das questões referentes à legalidade do ato

42

administrativo de concessão de benefícios previdenciários, para, no capítulo

seguinte, dar-se prosseguimento à abordagem dos seus efeitos indenizatórios em

face da Administração Pública.

5. Do princípio da legalidade e da natureza vinculada do ato de concessão dos

benefícios previdenciários

No ponto de concentração da presente dissertação, o ato de concessão de

benefício previdenciário depende do exercício da pretensão do segurado ou de seu

dependente, mediante a manifestação de vontade perante a autarquia

previdenciária, instrumentalizada pelo procedimento administrativo no qual se

poderá concluir pelo deferimento ou pelo indeferimento do requerimento

administrativo.

O ato de concessão de benefícios previdenciários se caracteriza como ato

jurídico51 de natureza administrativa, a partir do qual se reconhece ou se denega

direitos. Não se diverge acerca da sua qualificação como ato administrativo, pois se

trata de ato emanado de pessoa jurídica de direito público, concretizando prestações

de direitos sociais destinadas a dar cobertura a riscos sociais.

Apesar de não se localizar divergência quanto à natureza deste ato, é

pertinente apontar que a responsabilidade civil vem sendo analisada basicamente

em face do ato de concessão de benefícios, segundo já se reconheceu em conflito

de competência no qual restou fixada a competência da Justiça Federal para

processar e julgar ação de indenização por dano moral em razão de “ato

administrativo” praticado pelo INSS, segundo se infere da ementa abaixo, que assim

definiu:

51 “Os atos humanos, se alguma regra jurídica incide sobre eles, dizendo suficiente o suporte fático, fazem-se jurídicos; quer dizer: relevantes para o direito. Só assim têm eficácia jurídica. O ato humano, que só é de importância para as relações de cortesia ou de bom tom, não é ato jurídico. O ato humano, que só é objeto de apreciação moral. Não é ato jurídico. O ato humano, que só interessa à vida política, ou religiosa, ou econômica, não é ato jurídico. Sem a incidência de regra jurídica, não há ato jurídico." (PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. t. I. Rio de Janeiro: Borsoi, 1955-1972, p. 60).

43

PROCESSO CIVIL – CONFLITO DE COMPETÊNCIA – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - ATO ADMINISTRATIVO PRATICADO PELO INSTITUTO NACIONAL DE SEGURIDADE SOCIAL - INSS. 1. Tratando-se de ação de reparação por dano moral que tem como fundamento ato administrativo, supostamente indevido, praticado pelo INSS, é competente para o seu processamento e julgamento a Justiça Federal Comum, por não se tratar na hipótese de demanda relativa a benefício previdenciário ou dano material ou moral decorrente de acidente de trabalho. (…) BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, CC 54.773/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/02/2006, DJ 06/03/2006, p. 136;

O status jurídico do ato de concessão de benefício é de ato administrativo,

sendo este, segundo HELY LOPES MEIRELLES, em essência, "fundamentalmente o

mesmo do ato jurídico, do qual se diferencia como uma categoria informada pela

finalidade pública.52 Não se distingue, nesse sentido, da conceituação de CELSO

ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, para quem o ato é a declaração jurídica que produz

efeitos de certificação, criação, extinção, declaração ou de modificação de direitos

ou obrigações, provinda de pessoa investida das prerrogativas públicas, “consistente

em providências jurídicas complementares da lei ou excepcionalmente da própria

Constituição, sendo aí estreitamente vinculadas, a título de lhes dar cumprimento.”53

Nesse último aspecto, impende dar relevância ao princípio da legalidade,

que permeia a atuação da Administração Pública integralmente, compondo,

juntamente com os princípios da moralidade, impessoalidade, finalidade e

publicidade, a base principiológica da Administração Pública brasileira, segundo o

disposto no art. 37, caput, da Constituição Federal. É inegável a importância do

princípio da legalidade ao legitimar a atividade administrativa, na medida em que

confere atribuição de competência para a autoridade administrativa concretizar o ato

jurídico, ao mesmo passo em que condiciona a validade desse ato. Portanto, a

função concretizadora realizada pela Administração Pública só está autorizada a

partir e dentro dos limites da legalidade.

O surgimento dessa concepção, ainda hoje presente, deve-se à influência

52 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 21ª ed., atual. por Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burle Filho. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 132.

53 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17ª ed., rev. e atual. Malheiros: São Paulo, 2004, p. 353.

44

do gênio de OTTO MAYER54, devido à sua construção teórica que vincula a legalidade

administrativa ao ato jurídico praticado pela administração, como chave conceitual

de toda a atividade administrativa. Com isso, a atuação administrativa passa a ser

considerada aplicação concreta da previsão normativa geral, exercida sob reserva

de lei e com a primazia da lei. Essa concepção sofre influência de KELSEN, conforme

o qual o poder legítimo seria necessariamente um poder jurídico, no sentido de se

tratar de atribuição normativa precedente, resultando na vinculação positiva à lei.

Desse modo, não estaria permitida a atuação administrativa senão aquela emanada

com fundamento em lei em sentido formal.55

Na doutrina brasileira, de acordo com RUI CIRNE LIMA, o princípio da

legalidade surge “como decorrência da separação de poderes e do respeito aos

direitos fundamentais” 56 , desdobrando-se em critério de eficácia da atividade

administrativa e de fechamento do sistema. Assim, pode-se concluir, segundo HELY

LOPES MEIRELLES, que: “A eficácia de toda atividade administrativa está condicionada

ao atendimento da lei.”57

Devido à sua importância basilar no sistema administrativo, CELSO ANTÔNIO

BANDEIRA DE MELLO enfatiza que:

Assim, o princípio da legalidade é o data completa submissão da Administração às leis. Esta deve tão somente obedecê-las, cumpri-las, pô-las em prática. Daí que a atividade de todos os seus agentes, desde o que lhe ocupa a cúspide, isto é, o Presidente da República, até o mais modesto dos servidores, só pode ser a de dóceis, reverentes, obsequiosos cumpridores das disposições gerais fixadas pelo Poder Legislativo, pois esta é posição que lhes compete no Direito brasileiro.” 58

DI PIETRO, por sua vez, refere que:

54 Segundo Rui Cirne Lima, quem primeiro definiu o ato administrativo foi Otto Mayer, no seu livro Deutsches Verwaltungsrecht, também publicado pelo autor em versão francesa, sob o título Le Droit Administratif Allemand, em quatro volumes. (LIMA, Rui Cirne. Princípios de Direito Administrativo. 7ª ed., rev. e reel. por Paulo Alberto Pasqualini. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 217).

55 BINENBOJM, Gustavo. Uma teoria do direito administrativo: direitos fundamentais, democracia e constitucionalização. 2ª ed. rev. e amp. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 141.

56 LIMA, op. cit., p. 224.

57 MEIRELLES, 1996, p. 82.

58 MELLO, 2004, p 90.

45

Segundo o princípio da legalidade, a Administração Pública só pode fazer o que a lei permite. (…) Em decorrência disso, a Administração Pública não pode, por simples ato administrativo, conceder direitos de qualquer espécie, criar obrigações ou impor vedações aos administrados; para tanto, ela depende de lei.59

Desinência indissociável do princípio da legalidade é a atuação vinculada

da Administração Pública, segundo refere HELY LOPES MEIRELLES, ao apontar que:

o princípio da legalidade impõe que o agente público observe, fielmente, todos os requisitos expressos na lei como da essência do ato vinculado. O seu poder administrativo restringe-se, em tais casos, ao de praticar o ato, mas de o praticar com todas as minúcias especificadas na lei. Omitindo-as ou diversificando-as na sua substância, nos motivos, ou na finalidade, no tempo, na forma ou no modo indicados, o ato é inválido, e assim pode ser reconhecido pela própria Administração ou pelo Judiciário, se o requerer o interessado.60

No âmbito previdenciário, os atos de concessão de benefícios se

caracterizam como atos vinculados, distinguindo-se dos atos discricionários, nos

quais a administração possui “liberdade na escolha de sua conveniência,

oportunidade e conteúdo.” 61 Com efeito, a discricionariedade distingue-se da

vinculação pela liberdade de ação que é conferida ao administrador. Não obstante, a

tendência atual é de adelgaçamento do espaço da discricionariedade administrativa,

tanto no sentido de interpretação normativa e de contenção de arbitrariedades,

quanto no sentido político, em face da sistematização valorativa decorrente da carta

constitucional.62

Anteriormente, buscava-se, por intermédio da lei formal, vincular a atuação

59 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 26ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 64-65.

60 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29ª ed., atual. por Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burle Filho. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 115.

61 MEIRELLES, loc. cit.

62 “Essa tendência que se observa na doutrina, de ampliar o alcance de apreciação do Poder Judiciário, não implica invasão na discricionariedade administrativa; o que se procura é colocar essa discricionariedade em seus devidos limites, para distingui-la da interpretação (apreciação que leva a uma única solução, sem interferência da vontade do intérprete) e impedir as arbitrariedades que a Administração Pública pratica sob o pretexto de agir discricionariamente." (DI PIETRO, op. cit., p. 227).

46

administrativa ao processo democrático legitimador da expressão da maioria,

chancelado por intermédio da lei formal (ato do parlamento). Ainda hoje, o texto

legislativo expressa a projeção utópica desse ideal de obtenção do bem comum de

modo uniforme e justo, sem distinções de qualquer espécie, extensível igualmente

para todos. No entanto, entre o espaço da regra geral e abstrata condita na lei

formal e a sua aplicação individual e concreta, sempre se indagou acerca das

dificuldades interpretativas.

Atualmente, segundo refere BINENBOJM, vive-se a crise da lei formal, crise

esta que

é universal quanto a própria proclamação do princípio da legalidade como grande instrumento regularizador da vida social nas democracias constitucionais democráticas. Ao ângulo estrutural, confunde-se com a crise da representação, mais especificadamente da legitimidade dos parlamentos. Ao ângulo funcional, é a própria crise da ideia de legalidade como ‘parâmetro de conduta exigível do particular e do próprio Estado’.63

As razões para essa situação crítica, segundo o referido administrativista,

decorrem da proliferação ou inflação legislativa, pois "banalizou-se a lei, o que fez

com que se esvaziasse o sentido de respeito que lhe nutriu no período iluminista”, e

da constatação histórica de que a lei pode, além de veicular a injustiça, ser

fundamento para a barbárie, como ocorreu durante a 2ª Guerra, implicando na

“dessacralização da lei”, de modo a deixar de ser a principal e mais importante forma

de manifestação da vontade geral do povo. Conclui apontando que o

constitucionalismo sagrou-se o grande vitorioso diante do colapso do legalismo e

que, outrossim, a lei formal não seria mais o instrumento normativo que condiciona e

legitima toda a atuação administrativa, mas sim a interpretação constitucional.

Esse diagnóstico se aplica ao Direito Previdenciário, especialmente no que

concerne à proliferação legislativa, devido ao número exponencial de sucessões

legislativas e regulatórias, somado ao longevo vínculo previdenciário.

De toda sorte, o princípio da legalidade tem seu peso valorativo

paulatinamente reduzido ao ponto de a doutrina defender denominação diversa,

63 DI PIETRO, 2013, p. 125.

47

como JUAREZ FREITAS, que se refere ao princípio da legalidade temperada, em face

do qual assevera que:

(…) deve haver respeito à legalidade, sim, mas encartada no plexo de ponderações que a qualifiquem como sistematicamente justificável (interna e externamente). Não significa, no entanto, que se possa alternativamente obedecer à lei ou ao Direito. Não. A legalidade temperada requer a observância cumulativa de princípio em sintonia com a teologia constitucional, para além do textualismo estrito.64

Em suma, a função reguladora do princípio da legalidade está sendo

reestruturada, passando de pedra de toque angular da escola clássica do Direito

Administrativo à utilização do ordenamento jurídico como uma unidade

(Constituição, leis, regulamentos gerais, regulamentos setoriais), expressando-se

em diferentes graus e distintos tipos de normas, conforme a disciplina estabelecida

na matiz constitucional.

Por essa perspectiva, o controle da legalidade deixa de se restringir à

análise da subsunção do texto normativo ao caso concreto, devendo ser aplicado de

modo a açambarcar o bloco de constitucionalidade, como parâmetro de controle da

juridicidade do ato administrativo, resultando com isso “na vinculação da

Administração Pública ao ordenamento jurídico como um todo, a partir do sistema de

princípios e regras delineado na Constituição”. 65 Desse modo, a liberdade e a

vinculação da atividade administrativa amplificam-se, pois, conforme a atuação do

agente administrativo se desgarra da literalidade do texto normativo, passam a

abranger espaços normativos que demandam critérios hermenêuticos valorativos,

estando ainda mais vinculadas à juridicidade sistematizadora decorrente do

alinhamento das esferas constitucional, legal e infralegal.

Na temática enfrentada, relacionada ao ato de concessão de benefícios

previdenciários, desde já é preciso deixar claro que não há espaço para a

discricionariedade administrativa, uma vez que, estando presentes os requisitos

legais para concessão do benefício, não há margem para o agente administrativo

64 FREITAS, Juarez. Controle dos Atos Administrativos e os princípios fundamentais. 5ª ed., rev. e amp. São Paulo: Malheiros, 2013, p. 61.

65 FREITAS, op. cit., p. 143.

48

deixar de reconhecer o direito do segurado à concessão do benefício.

A natureza vinculada do ato de concessão de benefícios previdenciários

não se refere propriamente à aplicação da consequência jurídica da norma

previdenciária (concessão do benefício), mas à averiguação dos requisitos legais

para tanto, eis aqui o ponto em que se poderia indagar da discricionariedade

administrativa no âmbito previdenciário.

6. Da discricionariedade administrativa e do controle judicial de legalidade no âmbito

do ato de concessão de benefícios

O ato administrativo de concessão de benefícios previdenciários é ato

vinculado, pois

não está sujeito a juízo de oportunidade e conveniência do servidor do INSS, a quem compete somente averiguar o preenchimento dos requisitos legais, que são de caráter objetivo e não dependem de avaliação subjetiva do servidor público.66

Efetivamente, não há controvérsia acerca da natureza vinculativa do ato a

ser emanado pelo servidor público, por se tratar da análise de subsunção de critérios

legais aos fatos apresentados, os quais, uma vez comprovados, conduzem

inexoravelmente ao reconhecimento do direito à concessão do benefício. Em razão

da natureza vinculativa do ato de concessão, a doutrina afirma que o indeferimento

indevido da prestação previdenciária é causa determinante da responsabilidade do

ente previdenciário, como se colhe do seguinte trecho, constante do Manual de

Direito Previdenciário da autoria de CASTRO E LAZZARI:

O indeferimento pela Autarquia Previdenciária, de requerimento de benefício, quando o postulante preencher todos os requisitos legais para tanto, é ato ilícito, podendo ser questionado em Juízo, por se tratar de lesão a direito. Além disso, caracteriza lesão a um dos deveres ético-profissionais do servidor público responsável (art. 116, III, da Lei n. 8.112/90), por

66 CAMPOS, 2011, p. 105.

49

desatenção às normas legais pertinentes; no campo do Direito Penal, em tese, poderia caracterizar crime de prevaricação o retardamento ou a realização de ato administrativo contra disposição expressa de lei (CP, art. 319); uma vez configurado o crime e punido o servidor, este é passível de demissão do cargo público. Assim sendo, não comungamos da tese de que não há como punir servidores públicos ineficientes.67

De toda sorte, a pretensão indenizatória tem sido denegada por expressiva

corrente jurisprudencial, com fundamento na ausência de ilicitude da conduta do

servidor, sob a excludente de exercício regular de direito. O argumento essencial se

relaciona com a admissão da “discricionariedade” na interpretação aplicada pelo

agente administrativo, exercida no âmbito do seu poder-dever de apreciar os

critérios para concessão do benefício, ainda que o Poder Judiciário venha a

reconhecer o direito do segurado ao benefício denegado administrativamente.

Salienta-se, desde já, que os Tribunais Superiores, na maioria dos casos,

não têm apreciado o mérito de ações dessa natureza, com base na Súmula 279 do

STF e na Súmula 7 do STJ, as quais prevêem óbices recursais em face dos quais

não se admite o recurso para reexame de prova 68 . No entanto, em esparsos

67 CASTRO; LAZZARI, 2011, p. 492.

68 Os precedentes que seguem exemplificam a orientação jurisprudencial em relação ao referido óbice recursal: DECISÃO: Trata-se de agravo de instrumento cujo objeto é decisão que negou seguimento a recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim ementado (fl. 28): ADMINISTRATIVO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. APOSENTADORIA. AUTORA TRABALHOU POR MAIS TEMPO DO QUE O NECESSÁRIO EM FACE DA DEMORA POR PARTE DO INSS NA AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO RECONHECIDO POR SENTENÇA. AUSÊNCIA DE NEXO CAUSAL. (…) O recurso não deve ser provido, tendo em vista que, para dissentir do acórdão recorrido quanto a ocorrência, ou não, de nexo causal entre o ato do recorrido e o suposto dano alegado, é imprescindível a análise do material fático probatório dos autos, procedimento inviável em sede de recurso extraordinário. Nessa linha, vejam-se: RE 574.298-AgR, Rel.ª Min.ª Ellen Gracie; ARE 823.210, Rel. Min. Gilmar Mendes; e ARE 806.685, Rel.ª Min.ª Cármen Lúcia. Diante do exposto, com base no art. 557, caput, do CPC e no art. 21, § 1º, do RI/STF, nego seguimento ao recurso. Publique-se. Brasília, 19 de agosto de 2014. Ministro Luís Roberto Barroso Relator. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. DECISÃO MONOCRÁTICA. AI 860861. Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, julgado em 19/08/2014, publicado em DJe-166 DIVULG 27/08/2014 PUBLIC 28/08/2014).

CABIMENTO. INDENIZAÇÃO: DANO MORAL. I. - O acórdão-recorrido decidiu a causa a partir do exame da prova, certo que a versão fática da instância ordinária é imodificável em recurso extraordinário. II. - Agravo não provido. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 422001 AgR. Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 29/06/2004, DJ 13-08’2004 PP-00282 EMENT VOL-02159-03 PP-00478).

Na ementa: 2. A pretensão de ressarcimento por suposta ocorrência de dano moral, a aferir se houve desídia ou culpa da autarquia, enseja o necessário revolvimento de matéria fática, o que esbarra na Súmula n. 7/STJ. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AgRg no REsp 1075296/ES. Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 05/06/2012, DJe 18/06/2012).

50

precedentes relativos à matéria, constata-se a adoção da referida tese jurídica pelo

Superior Tribunal de Justiça, como no julgamento do REsp 1175308/RS, da

6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, com a lavra da Rel. Ministra MARIA

THEREZA DE ASSIS MOURA, DJe 27/06/2012, cuja ementa segue abaixo:

RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. PROFESSOR UNIVERSITÁRIO. BRASILEIRO NATURALIZADO. CONTAGEM DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO NO EXTERIOR, EM UNIVERSIDADES ARGENTINAS. APLICAÇÃO DO ACORDO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL ENTRE A REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL E A REPÚBLICA DA ARGENTINA, PROMULGADO PELO DECRETO Nº 87.918/82. APOSENTADORIA. LEI VIGENTE QUANDO DA IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA EXAME DO ACERVO PROBATÓRIO DOS AUTOS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. NÃO CABIMENTO. (…) 5. Ainda que tenha o recorrente direito à aposentadoria especial, o fato de ter ocorrido eventual interpretação errônea da lei pela Administração não é apto a gerar sua condenação ao pagamento de indenização por danos morais ao servidor, não cuidando a hipótese de ato ilícito. 6. Recurso especial provido em parte. (BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, REsp 1175308/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 18/06/2012, DJe 27/06/2012)

No referido precedente, embora tenha sido apreciada questão relativa ao

regime de previdência de servidor público federal (RPPS), em essência, este não se

distingue da seara do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), pois o dever de

indenizar é pautado na ausência de ilicitude da conduta do agente, que pode ocorrer

em ambos os regimes previdenciários.

Nesse mesmo sentido, julgados prolatados por Tribunais Regionais

Federais têm acolhido a tese da ausência de ilicitude para responsabilização do

Estado por danos morais decorrentes da negativa de concessão da prestação

previdenciária, com fundamento na excludente da ilicitude, conforme exemplificam

as ementas abaixo transcritas:

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. CONCESSÃO APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS: QUALIDADE DE SEGURADO, CARÊNCIA E INCAPACIDADE PERMANENTE PARA O TRABALHO. ATENDIDOS. PERÍODO DE GRAÇA. DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. (…) 5. Averiguada a incapacidade permanente, mostra-se devida a aposentadoria por invalidez a contar da data do requerimento administrativo. 6. É pressuposto da responsabilização por danos morais da pessoa jurídica de direito público interno, a

51

configuração de um ilícito, sob o ponto de vista da contrariedade ao ordenamento jurídico, que impõe à Administração estrita obediência à legalidade. O indeferimento do requerimento não configura ato ilícito. Descabimento. (…) 8. Apelação e remessa oficial parcialmente providas. (itens 6 e 7). (BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1ª Região. AC 0044222-95.2004.4.01.3800 / MG, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO DE ASSIS BETTI, Rel.Conv. JUIZ FEDERAL CLEBERSON JOSÉ ROCHA (CONV.), SEGUNDA TURMA, e-DJF1 p.102 de 28/05/2014) - grifo nosso -

APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. NÃO CABIMENTO. 1. Incabível a condenação do INSS ao pagamento de indenização por danos morais, uma vez que a Autarquia deu ao fato uma das interpretações possíveis, não se extraindo do contexto conduta irresponsável ou inconsequente diante do direito controvertido apresentado, não sendo devida, portanto, a pretendida indenização. 2. Apelação a que se dá provimento para decotar da sentença a condenação à indenização por danos morais, mantendo-se os seus demais termos. (BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1ª Região. AC 0026047-74.2012.4.01.9199 / MT, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL KASSIO NUNES MARQUES, PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 p.145 de 11/09/2013)

EMENTA: ADMINISTRATIVO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. EXPEDIÇÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO A MENOR POR PARTE DO INSS. LEGITIMIDADE PASSIVA. INEXISTÊNCIA DE ILÍCITO. ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL E DISCRICIONARIEDADE. INEXISTÊNCIA DE DEVER INDENIZATÓRIO. Quanto à ilegitimidade do INSS, não se trata de buscar revisão de benefício pago pela União, através do RPPS, mas de buscar a responsabilidade pelos prejuízos decorrentes do indeferimento do pedido de desaposentação e fornecimento de tempo de contribuição ao autor. Logo, é legítimo para figurar no pólo passivo da ação apenas o INSS, devendo ser excluída a União. Os atos administrativos estão adstritos ao princípio da legalidade, insculpido no artigo 37 da Constituição Federal, de modo que a interpretação de determinada situação pela Administração, ainda que gere resultado desfavorável ao interessado, não pode ser fonte de indenização, sob pena de não ser mais facultado à autoridade administrativa interpretar a lei e resolver as questões que lhe são submetidas. Tendo o INSS pautado sua conduta nos preceitos legais aplicáveis à espécie, agindo no estrito cumprimento do dever legal e nos limites da discricionariedade, inexiste dever indenizatório. (BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. AC 5003755-48.2013.404.7111, Quarta Turma, Relatora p/ Acórdão Vivian Josete Pantaleão Caminha, juntado aos autos em 30/01/2015)

De acordo com essa corrente jurisprudencial, a ilicitude da conduta do

agente administrativo estaria diretamente relacionada à razoabilidade interpretativa

atribuída ao ato administrativo. A admissibilidade dessa amplitude interpretativa

como fator de exclusão da ilicitude seria a causa determinante para o afastamento

da responsabilidade do Estado, na medida em que o ato restaria encoberto pela

excludente da ilicitude caracterizada pelo exercício regular de direito.

52

Dentre as implicações decorrentes dessa estruturação teórica, de início,

destaca-se que a qualificação do ato administrativo como ato de natureza vinculada

se torna duvidosa, revelando a pertinência do aprofundamento da questão da

discricionariedade administrativa.

A doutrina administrativista aponta divergência quanto a possibilidade de se

admitir “certa margem de liberdade” 69 para o agente administrativo decidir, nos

campos em que a lei comportar certo subjetivismo.

Admitida a tese da ausência de ilicitude, em razão da preservação do

campo subjetivo de interpretação do agente administrativo, abrem-se duas linhas de

investigação: a primeira, se a definição do ato de concessão de benefício deve ser

revisada, para comportar certa margem de discricionariedade, e quais seriam os

seus reflexos; a segunda, se o ato administrativo for reformado em sede

jurisdicional, para se reconhecer o direito do segurado à prestação previdenciária, a

possibilidade de esse fato implicar antinomia, por reconhecer determinado ato como

ilícito e lícito simultaneamente.

Outra implicação derivada dessa linha de orientação seria a vinculação do

referido critério à adoção do sistema de responsabilidade subjetiva, no âmbito do

sistema de responsabilidade civil da Administração Pública, questão a ser tratada

oportunamente no capítulo seguinte.

7. Da natureza vinculada do ato de concessão de benefícios previdenciários

A natureza vinculativa do ato de concessão de benefícios previdenciários,

em princípio, decorre da ausência de margem de apreciação do agente

administrativo no que concerne à conveniência e oportunidade para o deferimento

do benefício. O debate não se coloca em relação a esse aspecto, mas ao da

admissão de certa margem de liberdade na subsunção dos fatos em face dos

requisitos legais para autorizar o reconhecimento de direitos.

Na doutrina, AFONSO RODRIGUES QUEIRÓ admite a discricionariedade

69 MELLO, 2004, p. 389.

53

administrativa como “dimensao natural” ínsita à atuação administrativa, revelada em

razão da presença de conceitos práticos70 imanentes às disposições normativas.

Esses conceitos, segundo o referido jurista, diferenciar-se-iam dos conceitos

teoréticos71, nos quais não haveria discricionariedade, pois somente em relação

àqueles é que se admitiria a interpretação jurídica a ser realizada pelo agente

administrativo.

Em sentido contrário, GARCÍA DE ENTERRÍA e RAMÓN FERNÁNDEZ entendem

que não se poderia admitir a inserção de discricionariedade administrativa por

intermédio de conceitos indeterminados, pois a solução do problema se resolveria

com a interpretação. A discussão se coloca quanto à possibilidade de se encontrar

correspondência entre significado e significante, distinguindo-se a função prescritiva

dos enunciados linguísticos. Com isso, deveria ser afastada a possibilidade de a

discricionariedade se alojar nos conceitos plurissignificativos, elásticos ou

indeterminados, conforme a nomenclatura que se lhes dê, segundo se colhe do

seguinte trecho abaixo transcrito:

A discricionariedade é essencialmente uma liberdade de escolha entre

70 Em sentido contrário, Lúcia Valle Figueiredo, no trecho que se transcreve: “Os conceitos práticos são antes de mais nada conceitos. Um conceito tem limites, do contrário não seria um conceito. Um conceito prático, ou referido a realidades do mundo do dever-ser, tem como limites o dever-ser, isto é, o próprio ser, a realidade empírica. / “Se a lei fala de uma ‘falta grave’ de um funcionário, o conceito de gravidade (conceito prático) é limitado por estes dois conceitos teoréticos: o de ‘falta’ e o de ‘funcionário’. Quer dizer: se não se tratar de qualquer coisa, de qualquer materialidade que seja uma falta, e se não se tratar também de um funcionário, não será o caso de se falar de gravidade. Só nos de uma falta dum funcionário pode o agente competente apreciar e definir, segundo o seu sentimento do direito, guiado pelas exigências da concepção do Estado no caso concreto, a gravidade dessa falta. / É, portanto, plenamente aceitável a doutrina segundo a qual a materialidade dos fatos e a sua qualificação jurídica são elementos da legalidade, e não da oportunidade ou moralidade administrativa. Um erro sobre os fatos ou sobre o direito (qualificação) é uma questão de legalidade. Mas já não é um elemento de legalidade a saber determinar a gravidade da falta, ou seja, a sua qualificação prática; aqui trata-se de um elemento de discricionariedade.” (FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de Direito Administrativo. 7ª ed., rev., atual. e amp. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 204).

71 “Existem, pois, em conclusão, nas normas jurídicas a executar, conceitos não apenas vagos e imprecisos, mas que, por se referirem a valores não teoréticos, não encerram uma só significação, mas várias, sôbre uma das quais o agente se fixará, obedecendo na sua escolha aos princípios orientadores do Estado de que é servidor. O conceito de poder discricionário (que aliás não pode ser dado sem a discussão da matéria do número seguinte), resume-se nisto: trata-se de uma faculdade de escolher um entre várias significações contidas num conceito normativo prático, relativo às condições-de-facto do agir administrativo - escolha feita sempre dentro dos limites da lei (cfr. número seguinte). Esta escolha é livremente feita pela Administração, entendendo-se aqui por liberdade aquilo que vimos de expôr." (QUEIRÓ, Afonso Rodrigues. Reflexões sobre a Teoria do “Desvio de Poder” em Direito Administrativo. Coimbra: Coimbra Editora, 1940, p. 49-50).

54

alternativas igualmente justas, ou, se se preferir, entre indiferentes jurídicos, porque a decisão geralmente se fundamenta em critérios extrajurídicos (de oportunidade, econômicos etc.) não incluídos na Lei e remetidos ao crivo subjetivo da Administração. Ao contrário, a aplicação de conceitos jurídicos indeterminados é um caso de aplicação da Lei, já que se trata de subsumir a uma categoria legal (configurada, não obstante seus limites imprecisos, com a intenção de delimitar uma hipótese em concreto) algumas circunstâncias reais e determinadas; justamente por isso é um processo vinculado, que se esgota no processo intelecto de compreensão de uma realidade, no sentido de que o conceito legal indeterminado pretendeu, processo no qual não interfere nenhuma decisão de vontade do aplicador, como é próprio daquele que exerce uma potestade discricionária.72

Na doutrina nacional, LÚCIA VALLE FIGUEIREDO tem posição nesse sentido,

apontando que a

competência discricionária não emerge do fato de o conceito não ser, desde logo, preciso. Necessário, primeiramente, buscarmos, na norma, o sentido e alcance do conceito. Depois da interpretação, deveremos nos alçar aos princípios e valores do ordenamento jurídico, a fim de precisar o conceito.73

De toda sorte, compete ao Poder Judiciário o julgamento da legalidade dos

atos administrativos, sendo necessário observar que efetivamente deve ser

reconhecido certo núcleo de discricionariedade administrativa, para se assegurar o

desempenho da função administrativa com certa margem de autonomia e

segurança. Todavia, não há espaço para essa margem de discricionariedade no

âmbito previdenciário, no que concerne aos critérios de legalidade para avaliação de

pretensões à concessão de benefícios.

No que se refere à interpretação definitiva do sentido da norma, compete ao

Poder Judiciário, no exercício do controle de legalidade, dar a última palavra.

72 GARCIA DE ENTERRÍA, Eduardo. Curso de Direito Administrativo. 1 / Eduardo García de Enterría, Tomás-Ramón Fernández; revisor técnico Carlos Ari Sundfeld; tradutor José Alberto Fores Cal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014, p. 467-468.

73 “Precisado o conceito - ou determinado -, por conseguinte, localizado na zona de certeza positiva, mister a verificação se a norma outorgou possibilidade de decisão do administrador. / Verifica-se, portanto, que se encontra em crise, como brilhante afirma Satta, o próprio conceito de vinculação. Não há competência totalmente vinculada, ou, por outra, são raríssimas as hipóteses em que a norma predefine inteiramente a única conduta a ser tomada pelo administrador. Na área do Direito Administrativo, para se exemplificar ato vinculado, recorre-se sempre ao clássico exemplo a aposentadoria compulsória aos setenta anos de idade. / No mais das vezes, a norma possibilita condutas para atendimento de determinados fins, porém utilizando-se dos mais variados conceitos indeterminados.” (FIGUEIREDO, 2004, p. 221-222).

55

Segundo o pensamento de SEABRA FAGUNDES, no exercício da “funcao jurisdicional”

é que se restaura a legalidade, clima normal na vida do Estado74. Portanto, os

critérios legais definidores da concessão de benefício que exigem interpretação não

justificam a admissão de amplitude discricionária na atuação do administrador

previdenciário.

Conforme já se observou anteriormente, há aceno doutrinário no sentido de

considerar a amplitude interpretativa como componente poroso para infiltração da

discricionariedade administrativa. Apesar da não aceitação dessa corrente

doutrinária, segundo se observou em GARCÍA DE ENTERRÍA, RAMÓN FERNÁNDEZ e

LÚCIA VALLE FIGUEIREDO, admitir a abertura de discricionariedade implicaria desafiar

a possibilidade de conferir tratamento isonômico a todos os casos, por permitir certa

margem de dissonância interpretativa para casos similares. Isso tornaria

imperscrutável o desacerto entre a “legalidade administrativa” e a “legalidade

judicial”, especialmente para o fito de definir critérios à constatação dos efeitos

indenizatórios no campo da responsabilidade civil da Administração Pública.

As dissonâncias interpretativas, de início, são inerentes ao instrumental

linguístico de que se utiliza nas prescrições normativas. É o que ocorre, por

exemplo, com a união estável, em que há necessidade de interpretação de

conceitos indeterminados, visto que o requisito necessário ao reconhecimento do

benefício de pensão não pode ter, no escopo administrativo, interpretação distinta

daquela cujos parâmetros jurídicos já foram reconhecidos em âmbito judicial. De

igual modo se dá com os conceitos técnicos, como a incapacitação para o trabalho

e a atividade especial, isto é, a atividade exercida “sob condições especiais

prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador”. Por fim, o mesmo se

passa com a valoração probatória, normalmente realizada de início pela

justificação administrativa, como nos casos de enquadramento de segurado especial

em regime de economia rural familiar. Em suma, em todas essas situações, é

necessária a avaliação de fatos, porém não é por esse motivo que se poderia admitir

a discricionariedade interpretativa do agente previdenciário.

Em outras palavras, não se pode considerar que os conceitos

74 FAGUNDES, M. Seabra. O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário. 5ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1979, p. 11.

56

indeterminados ou técnicos, ou mesmo a valoração probatória, sejam

suscetíveis de margem interpretativa, ainda que se possa distinguir entre a

interpretação razoável e a conduta abusiva. De toda sorte, é imperativo que os

critérios normativos de concessão de benefício previdenciário sejam aplicados de

modo uniforme a todos segurados.

Nesse último ponto, destaca-se que a interpretação e a discricionariedade,

em que pese serem conceitos diversos, apresentam resultado equiparado. Ou seja,

seria admissível a ambos que a intervenção do administrador resultasse na

aplicação da norma em sentido diverso daquele atribuído pelo Poder Judiciário, a

quem compete dar a última palavra quanto ao sentido interpretativo dos atos

normativos e, portanto, à sua legalidade.

Dessarte, quando o Poder Judiciário reconhecer a irregularidade do ato

administrativo de concessão, considerando-o contrário às disposições normativas

previdenciárias, estará necessariamente qualificando esse ato como contrário ao

ordenamento jurídico, isto é, como ato ilícito. Desse modo, reconhecida a

inadequação da interpretação administrativa, a ponto de ensejar a anulação do ato e

a substituição por outro ato em sentido contrário, resta inafastável o reconhecimento

da antijuridicidade do ato administrativo denegatório de concessão de benefício. Isto

é, não seria possível se reconhecer esse ato como sendo lícito exclusivamente para

o fito de afastar eventual dever de reparar prejuízos extrapatrimoniais.

A aceitação da razoabilidade de interpretação "discricionária” somente para

afastar o efeito indenizatório não se compatibiliza com antijuridicidade objetiva, pois

configura verdadeira antinomia sistemática, uma vez que o mesmo ato seria

reputado ilícito e lícito ao mesmo tempo. A utilização da figura da excludente de

ilicitude com a finalidade do afastamento do dever de indenizar se justificaria apenas

se dirigida à isenção da responsabilidade do agente administrativo no plano

subjetivo de responsabilidade civil. Somente distinguindo-se os planos objetivo e

subjetivo é que se poderia sustentar que a interpretação atribuída pelo servidor,

contrária àquela firmada em sede jurisdicional, está isenta de ilicitude, no sentido de

afastar a culpabilidade do emitente do ato, pois não poderia ser considerado

irregular sob a perspectiva da sua intencionalidade (dolo/culpa). No entanto, o ato

em si írrito ao ordenamento jurídico, e eventual consequência indenizante, poderia

ser imputável ao Estado.

57

Desse modo, no caso da negativa indevida de concessão de benefícios,

não é possível se reconhecer a antijuridicidade do ato apenas no plano

administrativo e afastar peremptoriamente eventual efeito indenizatório. Não se está

afirmando que a antijuridicidade é causa determinante, irreprochável e inafastável do

dever de indenizar. A questão se limita, isso sim, à sua utilização como causa de

exclusão da ilicitude nesse caso específico. Ademais, não se tratam de campos

jurídicos distintos, não obstante as esferas administrativa e civil. A ilicitude se refere

ao mesmo ato e diz respeito aos efeitos passíveis de lhe serem atribuídos, quais

sejam: o efeito de invalidação do ato, para autorizar a prolação de outro no seu

lugar, quando da concessão do benefício, e o efeito reparatório, este último com

base nos critérios da responsabilidade civil extracontratual do Estado.

Passa-se, com isso, à análise da responsabilidade civil extracontratual da

Administração Pública.

58

Capítulo 2. A responsabilidade civil

1. Da responsabilidade civil extracontratual: conceituação, fundamentos e

pressupostos

Segundo JOSÉ AGUIAR DIAS, o termo responsabilidade possui ampla

significação, comportando três sentidos determinados: moral, penal e civil. Apesar

da aproximação entre a responsabilidade moral e jurídica, nesta última a violação da

regra jurídica sempre implica na ocorrência de prejuízo, sendo que, na violação da

regra moral, o prejuízo pode não ocorrer. Nas responsabilidades penal e civil, ambas

de natureza jurídica, o dano penal ofende a coletividade, de modo a autorizar a

aplicação de reprimenda estatal pela aplicação de pena punitiva, ao passo que, na

civil, ao invés de se aplicar uma punição, busca-se a reparação do dano causado ao

particular ofendido. Na responsabilidade moral, a noção de dano é mais ampla,

como se pode constatar da idéia de pecado, para a qual independe a presença de

dano. No sentido jurídico, de toda sorte, a responsabilidade está vinculada ao dano,

embora guarde certa correlação com a responsabilidade moral, pois não se poderia

falar em direito despido de conteúdo moral.75

Nessa linha, é inequívoca a influência da moral no instituto da

responsabilidade civil, embora o instituto tenha evoluído no sentido de se afastar da

busca pela reprimenda do ofensor, para enfatizar a necessidade de se atender à

vítima, buscando ampliar as hipóteses de restabelecimento do equilíbrio desfeito por

ocasião do dano, ao invés de aplicar medida repressora àquele que o causou. No

âmbito jurídico, o instituto da responsabilidade civil autoriza, por intermédio da

atuação do Estado-juiz, o ingresso no patrimônio de determinada pessoa (ofensor)

para que se obtenha certa quantia em pecúnia, ou in natura, com a finalidade de

reparar ou compensar os prejuízos sofridos pelo ofendido. Despido de qualquer

predicativo normativo, trata-se de uma reação à ação prejudicial, visando à sua

reparação.

Os registros legislativos mais antigos datam do ordenamento 75 DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. Vol. I. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987, p. 4.

59

mesopotâmico, em que se pode perceber a presença da ideia de punição em reação

ao dano infligido76. A civilização helênica, mais avançada, legou a ideia de reparação

do dano. Porém, nos primórdios do direito romano, ainda prevalecia a ideia de

retaliação da pessoa do ofensor, ou da sua comunidade, como forma de vingança

privada.77 O marco fundamental civilizatório de comutação do impulso de vingança

privada para a reparação está demarcado na Lex Aquilia, que prevê, em sua

essência, a conversão proporcional da lesão em indenização pecuniária. Supera-se,

com isso, a equivalência (talio) da punição do mal com o mal (Lei de Talião).78

Embora não se possa afirmar que a noção de culpa tenha surgido na Lei Aquiliana,

a partir de Gaius a sua presença já é considerada como sinonímia entre as palavras

«iniuria» e «culpa».79 A relevância da culpa não decorre apenas do fato de ser

tratada como elemento primordial da construção do instituto da responsabilidade

civil, mas carrega consigo, ainda nos tempos atuais, os efeitos decorrentes da sua

projeção no âmbito da moralidade, especialmente por influência da igreja cristã,

instituição determinante na formação da cultura ocidental80.

No que se refere ao âmago da responsabilidade civil, busca-se do ofensor a

reparação pelos prejuízos sofridos, como nota de preservação da integridade do

indivíduo e de seus bens. Dessa maneira, procura-se assegurar a convivência

pacífica entre os membros de uma coletividade. Em certa medida, o equilíbrio das

relações entre os indivíduos é sustentado pelo instituto da responsabilidade civil,

uma vez que garante aos lesados o direito à reparação ou à compensação dos

76 PEREIRA, Caio Mario da Silva. Responsabilidade civil. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992, p. 2.

77 SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2013, p. 13.

78 A Lei Aquiliana detinha apenas três artigos, prevendo situações específicas: i) a morte injusta (dolo ou negligência) de escravos e de cabeças de gado; ii) a apropriação fraudulenta do pagamento da dívida pelo co-estipulador no lugar do estipulador; e iii) o «damnum injuria datum», que refere a todos os outros danos causados sem justa causa, chegando a se estender a todos os ferimentos produzidos em homens livres e a quaisquer danos irrogados às coisa em geral «damnum non corroer non corpore datum».(DIAS, 1987, passim. e GAIO. Instituições - Direito Privado Romano. Tradução do texto latino, introdução e notas J.A. Segurado e Campos. Fundação Calouste Gulbenkian: Lisboa, 2010, passim.).

79 PEREIRA, op. cit., p. 5.

80 Caio Mário refere que, quando incumbido de elaborar um Anteprojeto de Código de Obrigações, introduziu um princípio objetivista, sem repelir a teoria da culpa, destacando que “a idéia cristã de culpa moral domina, no curso de vinte séculos, todo o direito da responsabilidade, e não se trata de abandoná-la.” (Ibid., p. 24).

60

prejuízos experimentados em decorrência da conduta lesiva do ofensor ou, ainda,

em razão de danos imputáveis às atividades de risco.

ROSA NERY destaca que:

O direito de o prejudicado (vítima do dano) buscar o ressarcimento de seu ‘prejuízo’, a contenção dos atos e fatos que lhe são prejudiciais e a correção dos efeitos nefastos daquilo que lhe provoca perda, é garantia que o sistema jurídico de segurança presta à vida das relações.

Esse direito, ressalta a insigne jurista, garante o

aspecto mais jurídico de toda a dogmática jurídica, pois na obrigatoriedade de o imputado reparar danos — sob pena de perda de seu patrimônio penhorável — e no direito da vítima à reparação integral do dano sofrido residem a importância do direito como ciência e como técnicas capazes de imprimir na vida das relações humanas resultados efetivos que pertinem à coercibilidade jurídica, que afastando os riscos da vingança privada, garantem a paz.81

O fundamento basilar da responsabilidade civil, imutável em todas as suas

modalidades, e que se revela como corolário do instituto, resume-se na máxima do

neminem laedere 82 . Por intermédio dessa parêmia, o conteúdo fundamental da

responsabilidade, assim como a sua finalidade última, é sintetizado no dever de

todos de não causar danos a outrem e, ao mesmo passo, na necessidade de

restabelecer o equilíbrio desfeito.

Os problemas, todavia, não aparecem propriamente na aceitação do

mecanismo de reparação de danos, ou seja, na imputação da obrigação do ofensor

de reparar o dano sofrido pelo ofendido. As polêmicas surgem em torno dos critérios

81 NERY, JUNIOR; NERY, 2015, p. 329-330.

82“Deste modo é possível perceber que tanto a responsabilidade civil contratual quanto a aquilina repousam sobre uma base comum preenchida pelo conteúdo das regras neminem laedere ou alteram non laedere, à qual conduzirá no concernente à primeira ao dever de colaboração em sua forma positiva, e, quanto à segunda, ao mesmo dever em sua forma negativa regulando-se assim aquelas situações nascidas do desequilíbrio.” (MARTINS-COSTA, Judith. Os Fundamentos da Responsabilidade Civil. In: Revista Trimestral de Jurisprudência dos Estados. v. 93. São Paulo: Editora Velenich, 1991, p. 29-52).

61

pelos quais se deve reconhecer esse dever de indenizar83. Em atenção a essa

perspectiva é que se busca situar a responsabilidade civil no âmbito da teoria geral

do direito, para permitir uma compreensão mais clara da gênese do dever de

reparação.

No direito romano, as fontes das obrigações eram definidas em contratos,

quase contratos, delitos e quase delitos. Segundo CAIO MÁRIO, essa classificação foi

abandonada depois do desenvolvimento do conceito de fato jurídico pela ciência

alemã, em torno do vocábulo Tatbestand. A partir desse esquema dogmático,

inicialmente criado para o Direito Penal, passou-se a reconhecer a inserção do

pressuposto material do direito nas relações jurídicas, nos seus três momentos

fundamentais: nascimento, modificação e extinção. Ulteriormente deslocado para as

relações de direito privado, veio-se a admitir que as condições materiais

determinantes das situações jurídicas estivessem previstas na ordem legal para

determinarem efeitos jurídicos84. Desse modo, o elemento gerador do direito se

revelaria a partir da situação de “fato”, que seria a partícula reveladora do fenômeno

jurídico.

Em outras palavras, somente a partir do pressuposto material é que se

pode conceber o fato jurígeno. Portanto, na estrutura geradora de obrigações está

inserida a descrição dos fatos, denominada “suporte fático”. Sem a verificação de

fatos nos quais se inserem atos ou omissões atribuíveis a determinada pessoa, não

há a propagação de efeitos jurídicos no âmbito da responsabilidade civil.

Na doutrina primeva da responsabilidade civil, contudo, o dever de indenizar

estruturava-se a partir da figura do “delito" e do “quase delito”, levando em

consideração a intencionalidade dolosa ou culposa do agente como elemento

determinante do nascimento da obrigação. Essa classificação desaparece na

modernidade justamente por se direcionar apenas à averiguação da conduta do

agente. A partir do modelo jurídico alemão, no qual o fato humano voluntário passa a

integrar o suporte fático do ato ilícito, é que a culpabilidade do agente, intencional ou

83 "A mais profunda controvérsia e a mais viva polêmica vige em torno da determinação do fundamento da responsabilidade civil. Se não padece dúvida a indagação se o ofensor é responsável, travam-se de razão os autores quando enfrentam esta outra questão: por que é responsável o causador do dano?” (PEREIRA, 1992, p. 13) .

84 Ibid., p. 27.

62

culposa, começa a ser descrita na previsão normativa. Desse modo, em atenção à

intencionalidade da conduta é que se principia a averiguar a culpabilidade do

agente, atribuindo-lhe o predicativo de ilicitude, ou seja, de contrariedade às

prescrições do ordenamento jurídico, nascendo daí o dever de reparar o dano.85

Desse modo, a estrutura da responsabilidade civil principia atrelada ao

conceito de responsabilidade por ato ilícito, servindo a culpa como conceito

indeterminado para o reconhecimento do dever de indenizar. A culpa presta-se,

ainda, como filtro de moralidade, pois apenas à conduta culposa é que se imputa o

dever de indenizar. Assim, o ato ilícito como cláusula geral é determinante para a

responsabilidade civil, sendo a violação de dever jurídico preexistente a sua nota de

distinção.86

Na atualidade, todavia, a culpa, elemento subjetivo da responsabilidade

civil, concorre com o risco, elemento de objetivação da responsabilidade. Desse

modo, o conceito indeterminado de culpa, em certos casos, cede lugar ao conceito

indeterminado de risco, no qual o dever de indenizar é imputado objetivamente a

partir da “atividade”, do “proveito” ou do “perigo”, chegando-se a afirmar que essa

objetivação abrange inclusive a responsabilização por atos lícitos.

Desde já, tornam-se perceptíveis as dificuldades em sistematizar a

responsabilidade civil, na medida em que o risco trouxe profundas alterações nos

seus pressupostos de constatação. ROSA NERY destaca que o sistema de

responsabilidade civil

é o mecanismo lógico-jurídico por cujas linhas estruturantes fundamentais busca-se as causas de eventos danosos e, consequentemente, apontar o responsável (imputação civil) por sua ocorrência e/ou reparação, para fazê-lo responder pela indenização, ou pela reparação correspondente, nos termos da lei, ou do contrato, em favor de quem sofreu prejuízo por decorrência de contrariedade ao ordenamento jurídico.87

São dois os grandes sistemas de responsabilidade civil, o de

85 PEREIRA, 1992, p. 27.

86 CAVALIERI FILHO, 2014, p. 17.

87 NERY JUNIOR; NERY, 2015, p. 401.

63

responsabilidade civil subjetiva e o de responsabilidade civil objetiva; além desses,

há, ainda, outros subsistemas, como o da Administração Pública (Constituição

Federal, art. 37, §6º), o das relações de consumo (CDC, art. 6º, VI) e o dos danos

ambientais (Lei n. 6.938/81, art. 14, § 1º).88 Em princípio, porém, a estrutura da

responsabilidade civil está assentada em pressupostos comuns, especializando-se

de acordo com cada sistema e subsistema.

No ordenamento brasileiro, as responsabilidades civis objetiva e subjetiva

convivem, inclusive no âmbito do subsistema da responsabilidade civil do Estado,

pois, segundo parcela da doutrina e da jurisprudência, admite-se ainda a doutrina da

culpa na responsabilidade civil da Administração Pública, no caso do ato

administrativo por omissão.

No presente momento, entretanto, importa destacar a distinção entre a

responsabilidade subjetiva e a objetiva, residente no afastamento da culpa do

agente como pressuposto de caracterização do dever de indenizar. O risco da

atividade passa a integrar o sistema de responsabilidade, a partir da imputação

objetiva do dano ao responsável, bastando que fique demonstrado o nexo de

causalidade entre o exercício da atividade geradora de risco e o dano verificado.89

Como consequência, segundo CAIO MÁRIO,

ao invés de exigir que a responsabilidade civil seja a resultando dos elementos tradicionais (culpa, dano, vínculo de causalidade entre uma e outro) assenta na equação binária cujos pólos são o dano e a autoria do evento danoso. Sem cogitar da imputabilidade ou investigar a antijuridicidade do fato danoso, o que importa para assegurar o ressarcimento é a verificação se ocorreu o evento e se dele emanou o prejuízo.90

Desse modo, o juiz não teria de examinar o caráter lícito ou ilícito do ato

imputado ao pretenso responsável, transformando-se as questões de

responsabilidade em simples problemas objetivos que se reduzem à pesquisa de

uma relação de causalidade. Distancia-se, com isso, do sistema da responsabilidade

88 NERY JUNIOR; NERY, 2015, p. 401.

89 Ibid., p. 420.

90 PEREIRA, 1992, p. 269.

64

civil subjetiva, fundada no ato ilícito absoluto composto pela imputabilidade do

agente à constatação de culpa.91

No que se refere à temática em análise, importante recapitular a orientação

jurisprudencial no sentido de afastar a responsabilidade civil do Estado com

fundamento na ausência de ilicitude do ato administrativo, com base na excludente

de ilicitude caracterizada pelo exercício regular de direito. Conforme se apontou

anteriormente, essa orientação caracterizaria antinomia sistemática, uma vez

considerada como elemento de afastamento da ilegalidade do ato administrativo

(antijuridicidade objetiva). Essa orientação compatibiliza-se com o não

reconhecimento da ilicitude (antijuridicidade subjetiva), cujo resultado se limita ao

afastamento da responsabilidade pessoal do servidor público que praticou o ato

reputado ilícito, apenas em sentido objetivo. Com o aprofundamento da estrutura da

responsabilidade civil, é possível identificar a distinção entre as responsabilidades

objetiva e subjetiva, tornando mais compreensível a distinção apontada

anteriormente.

Com efeito, ao reconhecer a irregularidade do ato de indeferimento de

benefício previdenciário, o Poder Judiciário qualifica-o como contrário ao direito, por

não terem sido observadas as normas previdenciárias pertinentes ao caso concreto.

Quando o segurado prejudicado buscar a reparação civil dos danos, a

antijuridicidade do ato administrativo não poderá ser removida com fundamento na

“razoabilidade da interpretação” aplicada pelo agente administrativo. Seria possível,

como se afirmou, apenas reconhecer a ausência de ilicitude em relação à conduta

do agente, no âmbito da responsabilidade civil subjetiva. No entanto, a

antijuridicidade em sentido objetivo já está rotulada pelo Poder Judiciário, ao reverter

a negativa de concessão do benefício, ainda que a interpretação administrativa

tenha se mantido dentro de padrões de razoabilidade.

ORLANDO GOMES esclarece com precisão a distinção entre os atos

antijurídicos subjetivos e objetivos, ao referir que a antijuridicidade se caracteriza

como a desconformidade pura e simples das exigências estabelecidas em lei para

validade do ato, cuja reação da ordem jurídica é a declaração de nulidade desse ato.

91 NERY JUNIOR; NERY, 2015, p. 414.

65

Nas palavras do ilustre jurista:

Sempre, portanto, que a desconformidade jurídica se manifesta como infração de uma regra que disciplina a atuação estritamente jurídica de alguém, o ato é antijurídico, sem lesar diretamente, porém, direito subjetivo de quem quer que seja.92

Dessa maneira, quando do ato resultar dano à pessoa determinada, no

caso do dano moral em decorrência do indeferimento do benefício previdenciário, a

situação é diferente, pois, se houver violação a direito subjetivo, em princípio haverá

dano, sendo este passível de ensejar a imputação do dever de indenizar do Estado.

Não há que se indagar acerca da “ilicitude” do ato lesivo, no sentido de se perquirir

acerca da culpa do agente administrativo responsável pelo ato írrito ao regramento

previdenciário.

A antijuridicidade subjetiva, para que seja determinante do dever de

indenizar, exige a caracterização do ato ilícito, dependendo, portanto, da ação

humana. Com isso, revela-se a distinção entre a antijuridicidade objetiva, na qual

ocorre a lesão sem culpa do agente, e a antijuridicidade subjetiva, para a qual

importa a culpabilidade do ofensor. Retomando-se as lições de ORLANDO GOMES, na

antijuridicidade objetiva, a reação da ordem jurídica não leva em conta o comportamento do agente. Ademais, pode ser provocada por um fato stricto sensu, enquanto a antijuridicidade subjetiva sempre é consequência de ato voluntário.93

Sendo aceito que a responsabilidade civil extracontratual da administração

é objetiva, não se perquire acerca da culpabilidade do agente. O Estado, em

princípio, responderia apenas com base no risco administrativo. Desse modo, a

relação estabelecida pela jurisprudência entre a ilicitude e a antijuridicidade objetiva

do ato administrativo, em princípio, não exclui eventual efeito indenizante decorrente

do ato administrativo, mas apenas a “ilicitude” correspondente à antijuridicidade

92 GOMES, Orlando. Obrigações. 8ª ed. Forense: Rio de Janeiro, 1988, p. 306.

93 Ibid., p. 307.

66

subjetiva no tocante à culpabilidade do agente previdenciário.

Com isso, não se está afirmando que a responsabilidade civil da

Administração Pública deve sempre ser reconhecida com base na antijuridicidade

objetiva do ato administrativo, apenas que a excludente da ilicitude não é adequada

para afastar a eventual responsabilidade do Estado.

No entanto, a questão da legalidade do ato administrativo, enquanto

elemento determinante da constituição do dever de indenizar, está essencialmente

relacionada à base de imputação objetiva de responsabilidade, sendo este elemento

vinculado à natureza da atividade de gestão de benefícios previdenciários. Assim,

mister a identificação dos pressupostos da responsabilidade civil objetiva do Estado,

para se avançar no exame dessa questão.

2. Do subsistema de responsabilidade civil da Administração Pública

A. Da irresponsabilidade da Administração Pública ao risco integral

A evolução da responsabilidade civil da Administração Pública permite a

identificação de fases distintas94: de início, denegava-se a possibilidade de o Estado

responder pelos danos porventura decorrentes da sua atuação; atualmente, todavia,

há ampla aceitação da imputabilidade da responsabilidade civil, inclusive por países

como os Estados Unidos e a Inglaterra, historicamente refratários a essa noção.95

Essas fases apresentam soluções teóricas acerca da responsabilidade civil do

Estado, não representando propriamente os critérios pragmáticos utilizados pelas

Cortes Judiciais. Apesar disso, são essenciais ao intuito de permitir a abordagem

científico-analítica da questão objeto do presente trabalho.

94 CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade Civil do Estado. 5ª ed. rev., atual e amp. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, capítulo II, p. 17-27.

95 Segundo Celso Antônio Bandeira de Mello: “Esta noção é, hoje, curial no Direito Público. Todos os povos, todas as legislações, doutrina e jurisprudência universais, reconhecem, em consenso pacífico, o dever estatal de ressarcir as vítimas de seus comportamentos danosos. Estados Unidos e Inglaterra, últimos refratários à tese, acabariam por assumi-la em 1946 e 1947, respectivamente, embora sem a extensão que seria de desejar, posto que ainda apresenta caracteres algo irrestrito.” MELLO, 2004, p. 876).

67

Na primeira fase, com fundamento na teoria da irresponsabilidade,

defendia-se a irresponsabilidade do Estado com justificativa na soberania estatal,

transportada posteriormente para o princípio da separação dos poderes. Conforme

essa teoria, não se poderia imputar ao Estado, assim como um poder não poderia

imputar ao outro, o dever de indenizar, sob pena de incidir em contradição, na

medida em que se cogitaria arranhar a soberania estatal. Na base dessa teoria

reside a ideia de imunidade advinda do despotismo, no qual o déspota era

inquestionável (the King can do no wrong).

Na segunda fase, com apoio na teoria civilista, passou-se a atribuir ao

funcionário do Estado a responsabilidade pelo dever de indenizar, sob a justificativa

de que atuaria mediante mandato estatal, razão pela qual seria ele o sujeito

responsável pela reparação do dano, e não o ente abstrato em nome do qual

atuasse. Desse modo, a atividade que repercutisse em prejuízo seria imputada

subjetivamente ao servidor, não ao ente abstrato. Com isso, a responsabilidade do

Estado se caracterizaria por culpa in eligendo, revelada pela escolha errônea do

funcionário público faltoso. Essa é a matriz civilista da teoria, na medida em que

justifica o dever de indenizar com base em ato ilícito culposo.

Com a aceitação da teoria de OTTO VON GIERKE, a concepção de

responsabilidade do Estado passa a ser insustentável, pois, consoante o servidor

representa o Estado, o ato por ele realizado é ato da administração pública, não

havendo dissociação entre a sua atuação e a do Estado96. Por isso, a imputação da

responsabilidade exclusivamente em face do serventuário público retomaria a

dissociação entre a atuação do Estado e a de seus servidores, por meio da teoria do

vínculo de representação ou do mandato entre representante e representado, cuja

falha se encontra na dificuldade em se identificar quem outorga por primeira vez

poderes ao servidor para representar o Estado.

Essa última questão conduziu a distinção entre os atos de império, em face

dos quais a atuação estatal estaria imbuída de prerrogativas de soberania, e o atos

de gestão, nos quais o Estado se equipararia ao particular, passando, com isso, a

responder civilmente pelos prejuízos que viesse a causar. Essa teoria igualmente se

96 CAVALCANTI, Amaro. Responsabilidade civil do Estado. Tomos I e II. 9ª ed., atualizada por José de Aguiar Dias. Rio de Janeiro: Editora Borsoi, 1956, p. 343.

68

revelou insustentável, pois toda a atividade do Estado tem seu fundamento no

exercício da soberania, destinada à realização dos fins de interesse público, não

sendo viável discernir com precisão quando se estaria perante atos de império ou

atos de gestão.

Na terceira e atual fase, de concepção publicística, passa-se a admitir a

responsabilidade objetiva do Estado com fundamento em princípios como o da

equidade, o da política jurídica e, notadamente, o dos ônus e o dos encargos

sociais.

Segundo CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, na sistemática brasileira,

doutrina e jurisprudência, preponderante, afirmam a responsabilidade objetiva do Estado como regra de nosso sistema, desde a Constituição de 1946 (art. 194), passando pela Carta de 1967 (art. 105), pela Carta de 1969, dita Emenda 1 à “Constituição” de 1967 (art. 105), cujos dispositivos, no que a isto concerne, equivalem ao atual art. 37, §6º.97

A questão recai na abrangência com que se compreende a

responsabilidade objetiva do Estado, sendo as principais teorias, de acordo com

YUSSEF CAHALI, as seguintes: a teoria do risco integral, ou por causa do serviço

público; a teoria da culpa administrativa; e a teoria do acidente administrativo ou da

irregularidade do funcionamento do serviço público.

Segundo a teoria do risco integral, é suficiente o prejuízo decorrente do

serviço público, regular ou irregular, para gerar o dever de indenizar. Para a teoria

da culpa administrativa, com resquícios da teoria civilista, revelados em razão da

transposição da ideia de culpa para a de falta anônima do serviço, é necessário

comprovar a culpa do órgão ou preposto da administração, não se indenizando todo

e qualquer prejuízo, mas somente quando há demonstração de alguma

“irregularidade" administrativa. Por fim, para a teoria do acidente administrativo ou

da irregularidade do funcionamento do serviço público, de concepção publicística,

adota-se a teoria do risco criado pelas atividades normais e anormais do Estado.

Nessa última, constata-se a sua incompatibilidade com a concepção do

97 MELLO, 2004, p. 881.

69

«faute du service» ou da culpa anônima da administração, como causa da

responsabilidade civil do Estado, pois aqui é necessária a demonstração da falha do

serviço, ao passo que, naquela, basta a comprovação do dano havido e o nexo de

causalidade em relação ao serviço administrativo.

A adoção da teoria do risco integral sempre foi objeto de grande

resistência, por temor de que o Estado se tornasse uma espécie de segurador

universal de danos. No entanto, sua distinção com a teoria do risco administrativo

prendia-se no fato de não admitir a incidência das hipóteses de quebra do nexo de

causalidade, consistente da culpa exclusiva da vítima, do caso fortuito e da força

maior. Sem embargo, essas restrições foram sendo mitigadas, conforme observa

CAIO MÁRIO, ao apontar que a

aceitação da teoria do risco administrativo não significa, entretanto, que o Estado é o responsável em qualquer circunstância. Não obstante a proclamação da responsabilidade, aplicam-se, no que couber, as causas “excludentes da responsabilidade" definidas e estudados em o Capítulo XX, infra.98

Desse modo, salienta YUSSEF CAHALI, tornou-se

desnecessário recorrer-se ao artificialismo da distinção risco integral/risco administrativo para se pretender, como ainda se tem feito alguma jurisprudência, que na segunda hipótese seria permissível a discussão das excludentes da responsabilidade.99

Em síntese, tem-se admitido que a responsabilidade civil do Estado está

baseada no risco administrativo, deslocando a atenção para a causalidade em

relação ao dano e à atividade administrativa.

B. Da responsabilidade civil da Administração Pública de acordo com a doutrina

e a jurisprudência

98 PEREIRA, 1992, p. 133.

99 CAHALI, 2014, p. 38.

70

No Brasil, a cláusula geral de responsabilidade civil da Administração

Pública está delineada essencialmente no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, que

prevê o dever de reparar os danos causados por seus agentes, com o seguinte texto

normativo:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) […] § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Esse dispositivo constitucional consagra a responsabilidade civil objetiva da

Administração Pública, sendo necessário demonstrar, em princípio, apenas dois

pressupostos: a existência do dano patrimonial ou moral e o nexo de causalidade

entre a conduta da administração e o dano. No entanto, há divergências doutrinárias

e jurisprudenciais a esse respeito, conforme se passa à análise.

De um lado, sustenta-se que seria subjetiva a responsabilidade do Estado

por atos omissivos, segundo CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, em trecho abaixo

transcrito:

Quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de aplicar-se a teoria da responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode, logicamente, ser ele o autor do dano. E, se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar ao evento lesivo.

Deveres, caso o Poder Judiciário não estivesse obrigado a impedir o acontecimento danoso, faltaria razão para impor-lhe o encargo de suportar patrimonialmente as consequencias da lesão. Logo, a responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito. E, sendo responsabilidade por comportamento ilícito, é necessariamente responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado (embora do particular possa haver) que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação (dolo). Culpa e dolo são justamente as modalidade de responsabilidade objetiva.

71

Não bastará, então, para configurar-se responsabilidade estatal, a simples relação entre ausência do serviço (omissão estatal) e o dano sofrido. Com efeito: inexistindo obrigação legal de impedir um certo evento danoso (obrigação, de resto, só cogitável quando haja possibilidade de impedi-lo mediante atuação diligente), seria um verdadeiro absurdo imputar ao Estado responsabilidade por um dano que não causou, pois isto equivaleria a extraí-la do nada; significaria pretender instaurá-la prescindindo de qualquer fundamento racional ou jurídico.100

Para o eminente administrativista, nos atos omissivos, a responsabilidade

da Administração seria subjetiva, aproximando-se a verificação da ilicitude, mediante

a demonstração da falha do serviço, para ensejar o dever do Estado de reparar os

danos experimentados pelo administrado. MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO adota

essa mesma opinião, distinguindo os atos comissivos dos omissivos, ao apontar que

“enquanto no caso dos atos comissivos a responsabilidade incide nas hipóteses de

atos lícitos ou ilícitos, a omissão tem que ser ilícita 101 para acarretar a

responsabilidade do Estado.”102

Ainda mais restritiva, por exigir a presença da culpa também na

responsabilidade objetiva, é a posição de MARÇAL JUSTEN, pois entende que a “teoria

objetiva causalista” é insuficiente para fundamentar a responsabilidade civil do

Estado, especialmente nas hipóteses de omissão, gerando defensores da

necessidade de duas concepções distintas para sistematização da responsabilidade

civil do Estado, uma por ação e outra por omissão. 103 Salienta, ademais, sua

discordância com o reconhecimento da responsabilidade do Estado por atos “licitos”,

derivada de conduta própria, — vale dizer, de agentes encarregados de formular e

manifestar a vontade estatal —, defendendo tratamento jurídico único e equivalente

para atos omissos e comissivos. Segundo o administrativista paranaense, a

responsabilidade civil dependeria da infração a um “dever jurídico de diligência”,

visto que não seria possível suprimir por completo o elemento subjetivo da

100 MELLO, 2004, p. 886.

101 Aponta que a chave para determinar a falha do serviço público seria a configuração de uma “omissão antijurídica”, caracterizada quando o “Estado ou suas entidades descumpram uma obrigação legal expressa ou implícita (art. 1.074 do Cód. Civil) tal como são as vinculadas com o exercício da polícia administrativa, descumprimento que possa achar-se imposto também por outras fontes jurídicas. (DI PIETRO, 2013, p. 716).

102 DI PIETRO, loc. cit.

103 JUSTEN FILHO, Marçal. Responsabilidade civil do Estado. (organizador Juarez Freitas). Editora Malheiros: São Paulo, 2006, p. 231.

72

responsabilidade do Estado, uma vez que

na ausência de dispositivo legal da responsabilidade civil objetiva do Estado, faz-se necessária a existência de um elemento subjetivo de cunho reprovável para a responsabilização estatal. Esse elemento subjetivo pode ser presumido, tal como acima exposto, em virtude da consumação do evento danoso numa situação em que a adoção de cautelas e providências teria impedido que tal se passasse.104

Com a aplicação desse critério de objetivação da culpa, incluir-se-ia no

âmbito da responsabilidade civil estatal a necessariedade de constatação da ilicitude

na conduta administrativa comissiva, apenas presumindo-se a culpa do agente, ao

passo que, na conduta omissiva, dependeria da demonstração de “dever jurídico

específico de diligencia” 105 . O resultado dessa sistematização implicaria a

qualificação dos atos administrativos no campo da licitude, e não apenas no campo

da causalidade, para se reconhecer a configuração da responsabilidade civil do

Estado.

De outra parte, no sentido da aplicabilidade da responsabilidade objetiva do

Estado, HELY LOPES MEIRELLES refere que a doutrina subjetiva permaneceu entre

nós até a Constituição Federal de 1946, no art. 194; porém, ao ser revogado em

parte pelo art. 15 do Código Civil de 1916, passou-se a acolher a teoria objetiva do

risco administrativo, mantida pela Constituição Federal de 1988. Ainda de acordo

com o referido eminente administrativista, não se distingue entre atos comissivos e

omissivos, mas há necessidade de se identificar a falha anônima do serviço, como

se constata do seguinte trecho:

Desde que a Administração defere ou possibilita ao seu servidor a realização de certa atividade administrativa, a guarda de um bem ou a condução de uma viatura, assume o risco de usa execução e responde civilmente pelos danos que esse agente venha a causar injustamente a terceiros. Nessa substituição da responsabilidade individual do servidor pela responsabilidade genérica do Poder Público, cobrindo o risco de sua ação ou omissão, é se assenta a teoria da responsabilidade objetiva da

104 JUSTEN FILHO, 2006, p. 236.

105 “Se o agente estatal infringir esse dever de diligência, atuando de modo displicente, descuidado, inábil, estará configurada a conduta ilícita e surgirá, se houver dano a terceiro, a responsabilidade civil." (Ibid., p. 233).

73

Administração, vale dizer, da responsabilidade sem culpa, pela só ocorrência da falta anônima do serviço, porque essa falta está, precisamente, na área dos riscos assumidos pela Administração para a consecução de seus fins.106

Destaca, ademais, que não estariam abrangidos atos de terceiros e

fenômenos da natureza, em face dos quais as administração não responderia, pois o

dispositivo constitucional só abrangeria a atuação funcional dos agentes públicos.

Nessa linha de orientação, apesar de não se reconhecer a necessidade da

demonstração da culpa, exige-se a presença de “falha anônima”, que torna

imperiosa a ilicitude da atuação administrativa, revelando a inequívoca aproximação

com a doutrina subjetiva de responsabilidade.

JOSÉ DE AGUIAR DIAS perfilha os adeptos da doutrina objetivista, citando

orientação defendida por AMARO CAVALCANTI, sob a justificativa de ser imperativa a

igualdade dos direitos e dos encargos, como condição ou necessidade do bem

comum, para que sejam igualmente repartidos os efeitos da lesão, por toda

coletividade, restabelecendo-se o equilíbrio por intermédio de justiça comutativa.107

NELSON NERY identifica com precisão a divergência doutrinária acima

destacada, bem como o seu reflexo na jurisprudência, analisando dois julgados do

Supremo Tribunal Federal, nos quais, invocando-se teorias distintas, chega-se ao

mesmo resultado, porém com fundamentos diversos. Salienta-se que ambos os

casos envolvem condutas omissivas. No primeiro, afirma-se a falha do serviço em

vigiar estudante que sofreu dano causado por colega dentro do recinto da escola

pública. Nesse caso, foi reconhecido o dever do Estado em indenizar a vítima, com

fundamento na responsabilidade objetiva (RT 733/130). No segundo, a hipótese era

de homicídio de preso, sob a custódia do Estado, perpetrado por outro presidiário

dentro da cadeia. Nessa situação, afirmou-se a culpa da administração para se

reconhecer o dever de indenizar com base na responsabilidade subjetiva (RT

753/156).

Em ambas as hipóteses, em tudo e por tudo assemelhadas, conforme

106 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 16ª ed. São Paulo: RT, 1991, p. 552.

107 DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. Vol. II. 10ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 579.

74

destacou o articulista, foi reconhecida a falha no dever de vigilância e de

preservação da incolumidade, imputando-se o dever de indenizar ao Estado, ainda

que com fundamentações distintas: a primeira, com base na doutrina do risco; e a

segunda, na doutrina da culpa. A conclusão do ilustre jurista é de que correto seria

falar-se, portanto, na existência de apenas responsabilidade objetiva da administração pública, pelo risco (art. 37, § 6.º, da CF/1988 (LGL\1988\3), sendo impertinente argumentar-se com responsabilidade subjetiva com culpa administrativa pela falta do serviço, bem como é correto falar-se que são requisitos para haver o dever de a administração indenizar: a) dano; b) nexo de causalidade entre conduta (omissiva ou comissiva) da administração e o dano, sendo também impertinente falar-se em "culpa exclusiva da vítima" ou em "força maior" como causas excludentes da responsabilidade civil do poder público.

De toda sorte, persistem divergências, inclusive no Supremo Tribunal

Federal, encontrando-se, na atualidade, afetado para julgamento o RE 608880/RG,

no qual se discute a responsabilidade civil do Estado em razão de dano decorrente

de crime praticado por preso foragido, a partir do qual se poderá cogitar da

possibilidade de unificação do tratamento dessa renitente divergência doutrinária e

jurisprudencial.108

Por oportuno, destaca-se que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal

já vem sinalizando no sentido da adoção da responsabilidade civil objetiva para os

atos omissivos da Administração, segundo alguns precedentes recentes.109

No que se refere às pretensões indenizatórias no âmbito previdenciário, na

maioria dos casos, considerando que a causa de pedir se conecta a ato comissivo,

108 RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – DANO DECORRENTE DE CRIME PRATICADO POR PRESO FORAGIDO. Possui repercussão geral a controvérsia acerca da responsabilidade civil do Estado em face de dano decorrente de crime praticado por preso foragido, haja vista a omissão no dever de vigilância por parte do ente federativo. (RE 608880 RG, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 03/02/2011, DJe-183 DIVULG 17-09-2013 PUBLIC 18-09-2013 EMENT VOL-02702-01 PP-00014).

109 Exemplificativamente, seguem as seguintes referências: STF, ARE 733886 AgR, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 18/06/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-125 DIVULG 28-06-2013 PUBLIC 01-07-2013;STF, RE 677283 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 17/04/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-089 DIVULG 07-05-2012 PUBLIC 08-05-2012. STF, ARE 697326 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 05/03/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-078 DIVULG 25-04-2013 PUBLIC 26-04-2013 e STF, RE 677283 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 17/04/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-089 DIVULG 07-05-2012 PUBLIC 08-05-2012.

75

consistente no indeferimento de pedido administrativo, não se avança na abordagem

da doutrina subjetiva. Contudo, como passaremos a verificar, é indispensável a

presença de ambos os conceitos para o aprofundamento da temática, especialmente

no que concerne à alocação da ilicitude dentre os critérios necessários ao

reconhecimento do dever de indenizar.

De qualquer forma, entendemos que a responsabilidade civil objetiva

calcada no risco administrativo é o critério adequado para sistematização dos

pressupostos identificadores do dever de indenizar, repisando posição firmada por

NELSON NERY, para quem é suficiente a demonstração dos pressupostos do dano e

do nexo de causalidade.

76

Capítulo 3. Os pressupostos de configuração de danos morais no âmbito da

Previdência Social

No âmbito da Previdência Social, considerando que o vínculo previdenciário

se estabelece entre o sujeito, isto é, entre o segurado ou o seu beneficiário, e o

Estado, na pessoa jurídica da autarquia previdenciária (INSS), eventuais danos à

esfera moral do segurado ensejam o dever de indenização por parte do ente público,

nos termos do art. 37, §6º, da Constituição Federal.

Em regra, a responsabilidade civil extracontratual da Administração Pública

tem por fundamento a doutrina objetiva; excepcionalmente, poderia-se aventar da

possibilidade de aplicação da teoria subjetiva, porém não é a tese que entendemos

adequada para a solução de controvérsias dessa natureza, conforme apontado no

capítulo anterior.

1. Do pressuposto: dano indenizável

A. Dos elementos gerais do dano

A partir da doutrina objetiva, deslocou-se o eixo da responsabilidade civil da

“culpa” para a “vitima”, passando o “dano” a configurar-se verdadeiro pressuposto

capital de caracterização do dever de indenizar110. A relevância da análise do dano

na teoria objetiva ganhou ainda mais destaque do que na responsabilidade

aquiliana. O termo “dano” tem origem na expressão romana “damnum”, sendo

compreendido, em linguagem vulgar, segundo HANS FISCHER, como “todo o prejuízo

que o sujeito de direito sofra na sua alma, corpo ou bens, quaisquer que sejam o

autor e a causa da lesão” e, em linguagem científica, como “todo prejuízo que o

sujeito de direito sofra pela violação dos seus bens jurídicos, com exceção única

daquele que a si mesmo tenha inferido o próprio lesado: êsse é jurìdicamente

110 Mário Moacyr Pôrto

77

irrelevante.”111

De outra banda, ADRIANO DE CUPIS aborda o conceito de dano mediante a

noção de fenômeno e de fato jurídico, aproximando a noção de dano a de interesse

jurídico tutelado.112 No Brasil, CAVALIERI FILHO, ao tratar do conceito de dano, faz

menção a ambos os elementos, bem jurídico e interesse juridicamente protegido,

referindo o dano:

como sendo lesão a um bem ou interesse juridicamente tutelado, qualquer que seja a sua natureza, quer se tratar de um bem patrimonial, quer se tratar de um bem integrante da personalidade da vítima, como a sua honra, a imagem, a liberdade, etc. Em suma, dano é lesão de um bem jurídico, tanto patrimonial como moral, vindo daí a conhecida divisão do dano em patrimonial e moral.113

Na avaliação da situação concreta, por intermédio da teoria da diferença,

“o prejuízo a ser reparado corresponde à diferença entre o valor atual do patrimônio

do lesado e aquele que teria caso não tivesse sido afetado pela ocorrência do ato

ilícito.”114 Desse modo, a constatação do dano se daria por intermédio do critério

econômico ou patrimonial, avaliando-se quantitativamente a perda sofrida pelo

lesado. Essa teoria se volta aos danos patrimoniais, na medida em que a

constatação do prejuízo se deve em razão da avaliação da perda, expressa em

termos econômicos em face do patrimônio material do sujeito.

Nos danos extrapatrimoniais, a teoria da diferença se revela insubsistente,

pois a ofensa aos bens imateriais é destituída de conteúdo econômico. Com isso,

não seria possível estimar a diferença decorrente da lesão a bens imateriais

atingidos no patrimônio ideal do sujeito lesado, haja vista a impossibilidade de se

estabelecer um parâmetro meramente quantitativo de avaliação decorrente desse

tipo de lesão.

111 FISCHER, 1938, p. 7.

112 DE CUPIS, Adriano. Il Danno. Teoria Generale Della Responsabilità Civile. Vols. I. Milano: Dott. A. Giuffrè Editore, 1979.

113 CAVALIERI FILHO, 2014, p. 93.

114 SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Princípio da Reparação Integral - indenização no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 142.

78

Com efeito, a constatação da ocorrência de danos morais depende da

identificação de lesão ao interesse juridicamente tutelado do lesado. Nessa linha,

segundo a teoria dos interesses ou do dano concreto, é possível avaliar

qualitativamente a ofensa à bem jurídico imaterial, de modo a se constatar a

presença de efetiva lesão de ordem moral.

De toda sorte, seja qual for a sua natureza, o elemento central do

pressuposto dano é a sua certeza. É inafastável que haja a efetiva identificação do

prejuízo sofrido pelo lesado, caracterizado pela lesão a interesse juridicamente

tutelado. Portanto, o dano deve ser real e efetivo, sem deixar dúvida acerca da sua

existência ou realidade. Desse modo, ficam excluídos de eventual dever de reparar

os chamados danos hipotéticos.115

Especificamente quanto ao tema central do presente trabalho, o dano

moral, sabe-se que o desafio da atualidade é encontrar o equilíbrio necessário na

revalorização da pessoa humana, sem banalizar o conceito de dignidade e,

consequentemente, de dano, através de demandas frívolas, como as que deram

origem à denominada indústria do dano moral.

B. Conteúdo positivo do dano moral

No âmbito previdenciário, a gênese do dano moral se verificaria na negativa

de concessão do benefício previdenciário, pois o não recebimento de parcelas

mensais de benefício representaria prejuízos patrimoniais passíveis de

indenização, considerando que o segurado, ao deixar de receber certa vantagem

econômica a que teria direito, sofreria prejuízos denominados lucros cessantes. No

entanto, por certo que os prejuízos de ordem moral não estão presentes

exclusivamente em razão da negativa de concessão do benefício previdenciário.

Mas, em assim sendo, indaga-se: no que se constituiriam então os danos morais?

Parcela da doutrina adota o critério negativo de caracterização de danos

morais, apontando serem tudo aquilo que não se enquadre como danos

115 SANSEVERINO, 2010, p. 164.

79

patrimoniais. Essa abordagem feita por exclusão, porém, não traz propriamente

qualquer elemento definidor do conceito de dano moral.116

WILSON DE MELLO DA SILVA refere que a pessoa pode ser lesada tanto no

que tem como no que é, não se recusando a ninguém o direito à vida, à honra e à

dignidade, direitos esses sem valor de troca na economia política, mas que, nem por

isso, deixariam de constituir bens valiosos para a humanidade. A caracterização dos

danos morais se daria pela constatação das lesões sofridas pelo sujeito, pessoa

física ou pessoa natural de direito, em seu patrimônio ideal, sendo este, em

contraposição ao patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não é suscetível

de valor econômico.117

ROBERTO BREBBIA, por outro lado, observa que os reflexos dos danos nos

âmbitos patrimonial e extrapatrimonial conduzem à imprecisão do critério de

definição do dano, pois existem prejuízos patrimoniais que podem resultar em danos

extrapatrimoniais e vice versa. Por conta disso, sugere a adoção da tese de que o

dano moral se constitui na “violação de um ou vários direitos inerentes à

personalidade de um sujeito de direito.”118

Nessa linha, MARIA CELINA BODIN DE MORAES desenvolve o tema,

defendendo ser preciso correlacionar a caracterização dos danos morais ao princípio

da dignidade da pessoa humana, segundo se colhe do seguinte trecho:

O dano moral tem como causa a injusta violação de uma situação jurídica subjetiva extrapatrimonial, protegida pelo ordenamento jurídico através da cláusula geral de tutela da personalidade, que foi instruída e tem sua fonte na Constituição Federal, em particular e diretamente decorrente do princípio (fundante) da dignidade da pessoa humana (também identificado como princípio geral de respeito à dignidade humana).119 - grifo nosso -

116 SANTOS, 2003, p. 92.

117 SILVA, W., 1999, p. 320 et. seq.

118 “Si recordamos que, de acuerdo a la tesis por nosotros expuesta, daño moral es aquella especie de agravio atribuída por la violación de alguno de los derechos inherentes a la personalidad, fácil será, en cierta manera, determinar las cualidades jurídicas que revistem los daños morales, pues es evidente que éstas no podrán menos que hallarse determinadas por las características especiales de aquellos derechos inherentes a la personalidad y, por ende, de aquellos bienes personales que constituyen el objeto o finalidad de la protección jurídica que acuerda esa clase de derechos.” (BREBBIA, 1950, p. 91-92).

119 MORAES, M., 2009, p. 132-133.

80

Dessarte, na configuração dos danos morais, não se prescinde da

investigação acerca dos direitos da personalidade, cuja matriz constitucional

encontra guarida no art. 1º, inciso III, da Constituição Federal, enquanto fundamento

principiológico basilar do Estado Democrático de Direito brasileiro.

Os direitos da personalidade, por sua vez, estão previstos expressamente

nos arts. 11 a 21 do Código Civil de 2002, destacando-se a disposição constante do

art. 12, que prevê a ressarcibilidade em decorrência de lesões contra direitos dessa

orbe. Todavia, a consistência jurídica dos direitos da personalidade não é tarefa

simples de ser alcançada. Em erudito trabalho120, WALTER MORAES observou que o

acervo desses direitos vem sendo ampliado de modo a transmitir a sensação de que

ora se trata de algo muito sofisticado no campo jurídico, ora de algo sobre o qual a

doutrina está desorientada ou perdida, em dimensões cujas bases ainda não logrou

encontrar. O alerta é tão relevante quanto as conclusões do articulista, pois não se

pode deixar escapar, na identificação de “novos danos”, a essência dos direitos da

personalidade, para a caracterização dos danos morais com maior acuidade.

Segundo o referido autor, a base do conceito de direito da personalidade

não se revela a partir da legislação, não obstante a precisão da definição jurídica de

personalidade, que consiste na aptidão para a pessoa ser sujeito de direito (de

direitos e obrigações). Esse conceito, contudo, induz a uma aparente equivalência

entre o conceito de pessoa e o de personalidade, pois ser pessoa é justamente ser

sujeito de direitos e obrigações.

A relação entre a personalidade e a pessoa se dá como subsistência e

substância, sendo esta última definida como aquilo que é em si, enquanto aquela

outra é subsistente quando, por sua natureza, ordena-se a ser com outra substância.

Assim, o indivíduo da espécie humana é um composto psicossomático, é corpo e

psique (ou alma). Vale dizer, é um corpo animado segundo o princípio operativo da

natureza. Distingue-se, com isso, a personalidade, enquanto dimensão, da pessoa,

apesar da indissociabilidade entre ambos. Torna-se plausível, pois, a dedução de

direitos vinculados à personalidade, sem confundir tais direitos com a singularidade

120 MORAES, W., p. 187.

81

decorrente do status de “ser” pessoa, pois todos os direitos são relacionados à

pessoa, na medida em que “ser” pessoa é ser, de “per si”, receptáculo de direitos.

Desse modo, lesão a direitos da personalidade não se assimila à lesão a

todo e qualquer direito de que seja titular determinado indivíduo, assim como não é

qualquer dor, desconforto ou tristeza, mas sim à lesão da qual efetivamente resulte

dano a interesse juridicamente protegido, vinculado à essência da pessoa humana

(personalidade).

Por meio da percepção da essência dos direitos da personalidade como

bens éticos de substâncias, essências, potências, atos e propriedades que integram

o composto natural humano, pela suficiente razão de carecer delas o homem, é que

se qualificam como bens da personalidade, como integrantes do homem in natura.

Nas palavras de WALTER MORAES:

Com efeito, excluem-se das extensas relações de bens de personalidade (supra n.1) os que extravasam dos limites da individualidade humana, também os simples desdobramentos de componentes fundamentais e algumas extravagâncias do entusiasmo teórico avaliáveis de pronto, e teremos alguns poucos direitos básicos, estes admitidos pela communis opinio doutrinária: o corpo (saúde etc.) e a psique (integridade psíquica), que são substâncias, a vida, que é essência do corpo (visibilidade), a condição de família, que é propriedade da potência generativa (congeneratividade), a liberdade e a dignidade, que são propriedades da anima intelectiva, a identidade (verdade pessoal, nome) e a intimidade (incomunicabilidade ontológica), que são propriedades do todo humano - além de outros cuja qualificação como bens e direitos de personalidade é discutida.

Nesse mesmo sentido, ROSA NERY sintetiza a identificação dos danos

morais a partir da

esfera do patrimônio do sujeito que não é mensurável de maneira argentária, porque os bens lesados ou postos em risco pertencem à esfera da natureza humana, em sua essencialidade, em sua potencialidade, ou na expressão de atos humanos realizados.121

Em atenção aos danos morais no âmbito previdenciário, é preciso destacar

121 NERY JUNIOR; NERY, 2015, p. 434.

82

que os bens jurídicos imateriais ofendidos, dentre os quais se poderia pretender a

inclusão da proteção securitária, não se caracterizam por si só como interesse

integrante dos direitos da personalidade, pois não exprimem nenhum dos

predicativos ligados a essa esfera de direitos na acepção abordada. Dessa forma,

nem todos os bens jurídicos imateriais são passíveis de caracterizarem o dano

moral, pois nem todos os interesses não patrimoniais integram a categoria de

direitos da personalidade. Os direitos previdenciários, por seu turno, enquadram-se

na referida categoria, na medida em que protegem interesses imateriais, porém não

estão dotados de predicativos ligados à esfera da personalidade dos indivíduos.

C. O dano moral e nota de caracterização no âmbito previdenciário

Parcela da doutrina especializada utiliza-se da expressão “dano moral

previdenciário” para descrever o problema da lesão extrapatrimonial ocorrida no

âmbito do vínculo previdenciário. Essa expressão, que serve inclusive de título para

algumas obras 122 , tem por mérito situar topicamente o dano moral no ramo

previdenciário. No entanto, sugere o reconhecimento do dano extrapatrimonial como

nova categoria de danos morais, inerente à ofensa de direito subjetivo previdenciário

titularizado pelo segurado. Essa linha de pensamento é defendida por ALEXSANDRO

MENEZES FARINELI, que trata da questão nos seguintes termos, sic:

É a violação do sentimento que rege os princípios morais tutelados pelo direito”, conclui-se que, de regra, a injusta negativa de concessão de benefício previdenciário, assim como o indevido cancelamento, acarretam em afronta à dignidade da pessoa humana, gerando à vítima o direito de ver reparados os danos morais suportados.123

No mesmo sentido, DIOGO DE MEDEIROS BARBOSA,

122“Dano Moral Previdenciário: teoria e prática”, de autoria dos advogados Dr. Alexsandro Menezes Farineli e Dra. Fabia Maschietto e “Dano Moral Previdenciário: um estudo teórico e prática com modelo de peças processuais”, de autoria dos advogados Dr. Theodoro Vicente Agostinho e Dr. Sérgio Henrique Salvador.

123 FARINELI; MASCHIETO, 2013, p. 129.

83

afiguram-se presumíveis os sentimentos de humilhação, indignação, privação e impotência que experimentam os lesados pela conduta do INSS. É importante atentar-se para o fato de que, nos dias atuais, não é exagero afirmar que as pessoas são mensuradas muito mais pelo que têm do que pelo que são de fato.” Deste modo, “a injusta negativa de concessão de benefício previdenciário, assim como o indevido cancelamento, acarretam em afronta à dignidade da pessoa humana, gerando à vítima o direto de ver reparados os danos morais suportados.124

De igual modo, ERICA PAULA BARCHA CORREIA, ao referir que o dano moral

se caracteriza como a “lesão nos direitos da pessoa humana em suas diversas

‘integralidades’”, quais sejam, “a psicofísica, a intelectual, a moral propriamente dita

e a social”, levando-se em consideração, por sua vez, o seguinte:

há casos de lesão material que atingem direitos de personalidade do ofendido como são aqueles nos quais o INSS suspende o benefício indevidamente, bem como a demora excessiva e infundada na concessão de benefícios previdenciários.

Segundo a articulista, os danos morais se verificariam a partir das

“consequências decorrentes da inadequada atuação” administrativa, enfatizando que

[…] é pacífico em nossa jurisprudência o entendimento no sentido de que não há necessidade de efetiva comprovação do dano, mas tão somente do fato deflagrador do sofrimento ou angustia vivida pela vítima de tal ato ilícito, pois que existem fatos que, por si só, permitem a conclusão de que a pessoa envolvida sofreu constrangimento capazes de serem reconhecidos como danos morais.125

WÂNIA DE LIMA CAMPOS, por sua vez, refere que:

Qualquer abalo causado à pessoa que já se encontra debilitada é impactante sobre a sua órbita moral, sobre a sua higidez psicológica e equilíbrio intelectual. É evidente, pois, que os vícios nas concessões de

124 BARBOSA, Diogo Medeiros. A Responsabilidade civil do INSS por ato que cancela ou nega a concessão de benefício previdenciário devido. Disponível em: <<http://medeirosadv.adv.br/2010/09/02/159/>>. Acesso em 10/10/2015.

125 CORREIA, E., p. 13.

84

benefícios se constituem um problema a mais a atormentar as pessoas que já se encontram em estado frágil, exigindo sejam prevenidos e, acaso ocorram, reprimidos exemplarmente para se evitar a prática rotineira de realização desses vícios.126

A partir dessa linha doutrinária, a expressão “dano moral previdenciário”

estaria adequadamente utilizada se a negativa de quaisquer direitos previdenciários

efetivamente se prestasse como causa do abalo moral do segurado. Nesse

contexto, seria a ilicitude o elemento objetivo caracterizador do dever da autarquia

previdenciária de indenizar o lesado.

De início, há de se observar a inexistência de uma “moral securitária”127, em

face da qual se reconheceria a ofensa moral como consequência automática da

negativa de direitos previdenciários. Conforme já se apontou, não é toda ofensa a

direitos titularizados pelo sujeito que se constitui em lesão a direitos da

personalidade e que gera dano moral, mas somente aquela que danifica interesse

vinculado à essência da pessoa humana.

De outro lado, os direitos previdenciários não se confundem com os direitos

da personalidade somente pelo fato de encontrarem fundamento na dignidade da

pessoa humana. Esta é o amalgama basilar do sistema jurídico e está

inexoravelmente correlacionada aos direitos previdenciários, na base de justificação

da carta política. Ocorre que somente por ofensa aos direitos da personalidade é

que se poderia atribuir conteúdo positivo aos danos morais, descabendo aplicar

tratamento similar aos direitos previdenciários.

De fato, a mera ofensa a direitos previdenciários, mesmo diante de sua

natureza de direitos sociais fundamentais, não é capaz de afetar bens jurídicos

relativos à personalidade. Com efeito, a violação de um direito subjetivo, ou seja, de

um determinado interesse jurídico protegido pelo ordenamento jurídico, deve estar

ligada ao âmbito da norma que o protege.128 Nessa linha, o direito à cobertura

126 CAMPOS, 2011, p. 79.

127 Expressão utilizada por Wladimir Novaes Martinez na obra Dano Moral no Direito Previdenciário. 2ª ed. São Paulo: LTr, 2009.

128 “Un derecho es lesionado cuando el acto realizado por el ofensor ocasiona un perjuicio, detrimento o menoscabo en el bien tutelado por referido derecho. / Todo derecho tiene por objeto la protección de un bien, que al recibir la garantía de la norma adquire la categoría de bien jurídico.” BREBBIA, 1950, p. 53.

85

previdenciária não está ligado à integridade do indivíduo, pois não se trata, como é

cediço, de valor essencial ínsito à pessoa humana. Assim sendo, o ato

administrativo que nega a prestação previdenciária não é capaz, por si só, de afetar

diretamente o conteúdo positivo dos danos morais, pois, rigorosamente, não implica

necessária ofensa a direito subjetivo ligado à esfera personalíssima do indivíduo.

A jurisprudência, ao tratar dessa questão, não reconhece o direito à

indenização por danos morais em razão da mera denegação de concessão de

benefício, segundo se colhe das ementas abaixo transcritas:

ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. CONCESSÃO CONDICIONADA À REGULARIZAÇÃO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO EXTEMPORÂNEO. CNIS. ESTRITO CUMPRIMENTO DE DEVER LEGAL. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAIS DESCABIDA. APELAÇÃO IMPROVIDA. (…) 3. Ainda que configurado ato ilícito praticado pela autarquia ré, o indeferimento de benefício previdenciário, por si só, não faz nascer direito à reparação moral, sendo necessário que a frustração e o sofrimento causados pela negativa interfiram intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústias e desequilíbrio em seu bem estar. Não sendo o que se observa na hipótese dos autos, não há que se reconhecer o dever de indenizar. (…) (BRASIL, Tribunal Regional Federal da 5ª Região, PROCESSO: 00086551220124058100, AC565526/CE, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO FIALHO MOREIRA, Quarta Turma, JULGAMENTO: 10/12/2013, PUBLICAÇÃO: DJE 12/12/2013 - Página 511)

EMENTA: ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL INSS. INDEFERIMENTO OU CANCELAMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DIREITO À INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. INEXISTÊNCIA. O indeferimento ou cancelamento de benefício por parte do INSS, de acordo com os dispositivos legais de regência, não gera direito à indenização por dano moral. Precedentes. (TRF4, AC 5025865-31.2014.404.7200, Terceira Turma, Relatora p/ Acórdão Salise Monteiro Sanchotene, juntado aos autos em 14/05/2015) - grifo nosso -

Estabelecidas tais premissas, importante esclarecer que, em determinadas

situações, além de existir violação a determinado direito previdenciário, em

decorrência do ato do INSS que indefere a concessão do benefício, o segurado

poderá sofrer dano moral, desde que configurados outros elementos ligados à lesão

a direito da personalidade, causadores de dano extrapatrimonial à esfera moral do

indivíduo segurado. Daí decorre que o simples indeferimento do benefício não

configura hipótese de dano moral in re ipsa, capaz de ensejar a presunção do abalo

extrapatrimonial tão somente a partir da ilicitude do ato administrativo denegatório. O

86

dano in re ipsa, apesar de aceito pela jurisprudência como mecanismo de

configuração do abalo moral, demanda mais do que a ilicitude do ato, no escopo do

Direito Previdenciário, para que se configure o dano moral.129

Com efeito, a caracterização do dano moral in re ipsa é aceita em casos

nos quais se reconhece a presença do dano em decorrência do ato em si, pois este

é causa efetiva e direta da lesão. Como, por exemplo, no caso da morte de um ente

querido, em que o ato causador da morte é o fato deflagrador da dor e do abalo

psicológico experimentado pelo lesado. Como, em outro exemplo, no caso do

protesto ou do cadastro indevido de devedor mau pagador, em que está em causa a

exposição indevida do sujeito à situação vexatória, verificada desde o ato de

cadastramento indevido do nome do sujeito. Nessas hipóteses, a ilegalidade

efetivamente se presta como critério de imputabilidade do dever de indenização dos

prejuízos experimentados injustamente pelo ofendido, pois o ato em si já revela

objetivamente a configuração de dano moral in re ipsa, de tal modo que não se

precisaria perquirir do efetivo abalo emocional ou psicológico sofrido pela vítima.

As situações acima, todavia, diferem dos casos derivados de ato

administrativo previdenciário denegatório da concessão de benefício previdenciário.

Aqui se cogitaria das implicações decorrentes da natureza alimentar das prestações

previdenciárias, que podem ensejar a ocorrência de danos morais. Ou seja, os

desdobramentos decorrentes da negativa ou da supressão de prestações

previdenciárias se constituiriam em elementos fáticos potencialmente causadores de

danos morais. Não seria propriamente a ilegalidade do ato administrativo em si o

elemento caracterizador dos danos morais, mas sua causa potencial, reflexa.

Nesse sentido, merece destaque a observação de ANTÔNIO JEOVÁ SANTOS,

nos seguintes termos:

O que pode determinar o dano moral indenizável é a consequência, o resultado que o ato dimana. Não é o dano em si que dirá se ele é ressarcível, mas os efeitos que o dano provoca. Reduzindo o dano ressarcível à lesão mesma, o fato em si é que seria indenizado. No sistema

129 Oportunamente, não procede o apontamento de ERICA PAULA BARCHA CORREIA ao referir que se trata de questão pacífica na jurisprudência. Os exemplos citados não se referem ao dano moral ocorrido no âmbito da esfera previdenciária, mas apenas à aceitação da figura do dano moral in re ipsa.(Vide nota 131).

87

processual brasileiro, em que o autor tem de narrar os fatos e fundamentos jurídicos do pedido, mas avulta a necessidade de compreender o dano moral como a consequência que tem a origem do mal inferido a alguém.130

A observação amolda-se às situações potenciais de danos morais passíveis

de ocorrer no âmbito previdenciário, revelando que o dano pode se configurar como

reflexo do ato ilegal, mas não como decorrência lógica e necessária da ilegalidade

do ato. Com isso, a tese do dano moral in re ipsa não procede, nem se presta como

presunção dos prejuízos eventualmente experimentados pelos segurados. Esse

raciocínio suprime etapas cognitivas em face das quais se desenvolveria uma

espécie de benefício indireto em favor do segurado.

Essa sistematização em larga escala seria desinteressante em todos os

sentidos, porquanto apenas estimularia o interesse egoístico do segurado, bem

como alimentaria a advocacia predatória, na medida em que seria mais interessante

buscar o insucesso na esfera administrativa, para alavancar a inclusão de

compensação financeira a título de danos morais, a ser obtida na via judicial. Isso

tudo se daria ao custo da postergação do alcance econômico da parte interessada,

do incremento da litigiosidade e, sobretudo, à margem de qualquer verificação

acerca da efetiva ocorrência de danos morais.

Com efeito, o reconhecimento do direito à indenização por dano moral

apenas em razão do indeferimento administrativo abarcaria situações como a

revisão e a concessão de benefícios para segurados que se mantêm em plena

atividade laboral. Para esses casos, seguramente, o não deferimento ou o

deferimento tardio do benefício não implicam peremptoriamente abalo de ordem

moral, pois, em princípio, causam apenas prejuízos de ordem material, ressarcíveis

mediante concessão retroativa do benefício, acrescida dos consectários legais.

Somente em caráter excepcional é que se poderia cogitar que essas situações

importassem abalo psíquico característico de dano moral. No entanto, novamente,

seria necessária a análise das circunstâncias do caso concreto, não sendo possível

a sua mera dedução a partir da ilegalidade do ato administrativo.

A simples demonstração da ilegalidade tem por finalidade a simplificação do

130 SANTOS, A., 2003, p. 93.

88

ônus probatório da parte autora, por intermédio da presunção das consequências

funestas decorrentes da privação de verba alimentar. No entanto, não se pode

apenas admitir que essas consequências estejam ligadas à ilegalidade do ato

administrativo. Nesse campo de análise, a questão se encaminha para a

identificação das circunstâncias fáticas determinantes da presença do dano moral,

em virtude das quais se concretizariam os prejuízos decorrentes da indisponibilidade

econômica de natureza alimentar.

Essa questão, segundo a jurisprudência, desafia instrução probatória,

competindo à parte autora o ônus de comprovar a efetiva ocorrência de danos

morais, senão vejamos das ementas abaixo transcritas:

DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS PREENCHIDOS. LAUDO PERICIAL CONSTATANDO A INCAPACIDADE. CONCESSÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO DE DANO MORAL. I - Nos termos do art. 42 da Lei 8213-91, a concessão de aposentadoria por invalidez dependerá da verificação dos requisitos da manutenção da qualidade de segurado, carência, incapacidade para exercer atividade laboral e insuscetibilidade de recuperação . II - O exame médico-pericial realizado pelo experto do juízo confirma o estado de incapacidade plena do autor para a atividade que exercia, requisito esse que foi objeto de devido contraditório entre as partes. III - O ato que indefere benefício previdenciário, por não conter, em si, ilicitude, caracteriza um mero dissabor do cotidiano com relação ao segurado, não ensejando, pois, reparação de dano moral. IV- Apelação da autora e Remessa Necessária desprovidas. (BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, APELREEX - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO - 571000, Processo: 200951040033133, 2ª TURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 05/11/2014, Data Publicação: 04/12/2014, Relator Desembargador Federal ANDRÉ FONTES) - grifo nosso -

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PENSÃO POR MORTE. MAIOR INVÁLIDA. BENEFÍCIO DEVIDO DESDE O ÓBITO ATÉ A DATA DO REQUERIMENTO. HABILITAÇÃO TARDIA. COEXISTÊNCIA DE OUTROS DEPENDENTES. PAGAMENTO RETROATIVO AO INCAPAZ CONDICIONADO A INEXISTÊNCIA DE OUTROS BENEFICIÁRIOS NO REFERIDO LAPSO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. (…) 7. Não se sustenta o pedido de indenização por dano moral uma vez que, não comprovado abalo no quadro psicológico da autora ou em sua honra, o atraso no pagamento pelo INSS dos valores devidos representa um mero dissabor. (…) Apelação parcialmente provida. (BRASIL, Tribunal Regional Federal da 5ª Região, PROCESSO: 200782000002130, AC460008/PB, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ MARIA LUCENA, Primeira Turma, JULGAMENTO: 05/03/2015, PUBLICAÇÃO: DJE 12/03/2015) - grifo nosso -

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. SUSPENSÃO DE BENEFÍCIO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. RESTABELECIMENTO. DANO MORAL. NÃO-CABIMENTO. 1. A Administração, em atenção ao princípio da legalidade,

89

tem o poder-dever de anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornem ilegais (Súmulas 346 e 473 do STF). 2. Ausente comprovação de irregularidade na concessão do benefício, deve ser anulado o ato administrativo que determinou a sua suspensão. 3. Inexistindo comprovação de ofensa ao patrimônio subjetivo do autor, não há direito à indenização por dano moral. O desconforto gerado pelo cancelamento do benefício resolve-se exclusivamente na esfera patrimonial, através do pagamento de todos os atrasados, com juros e correção monetária. (TRF4, AC 0021200-02.2014.404.9999, Quinta Turma, Relator Rogerio Favreto, D.E. 03/06/2015) - grifo nosso -

Feitas tais considerações, em conclusão, a caracterização dos danos

morais está ligada, num primeiro momento, à supressão da renda, pois, a partir

disso, podem surgir inúmeras situações de ofensa a direitos da personalidade, de

modo a implicar danos de natureza extrapatrimonial ao indivíduo e efetivamente

comprometer “suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia,

alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte etc”, nos termos

do art. 6º, IV, da Constituição Federal. Para mais, não somente as necessidades

básicas podem ser afetadas, como também outras situações decorrentes da

supressão da fonte de renda podem gerar danos de natureza extrapatrimonial,

desde que as circunstâncias ultrapassem o inconveniente, o mero dissabor,

repercutindo efetivamente em dor, humilhação ou angústia ao lesado.

De todo modo, é preciso que a situação em que o segurado está inserido

seja comprovadamente determinante da presença efetiva de dano moral, ainda que

minimamente, visto que, no caso do segurado que permanecer ativo

economicamente, o atraso no deferimento do benefício, em princípio, não implicará

danos morais. Em suma, a configuração dos danos morais não é decorrência direta

da ilicitude do ato administrativo, fazendo-se necessária a comprovação da situação

fática reveladora do dano moral experimentado pelo segurado, sendo este um dos

pressupostos para o reconhecimento do dever de indenizar.

2. Do pressuposto: nexo de causalidade

O nexo de causalidade é o outro pressuposto necessário para configuração

da responsabilidade civil extracontratual da Administração Pública. Caracteriza-se

como o liame causal entre a ação e o seu resultado, o qual não é passível de ser

90

eliminado em nenhum dos sistemas de responsabilidade civil sem que seja excluída

a responsabilidade do Estado. Segundo expõe ROSA NERY, o nexo de causalidade

“[…] é uma relação de dependência intrínseca entre o acontecimento e o resultado,

mas que não se deve considerar como uma causalidade naturalística, como uma

sequencia lógico-temporal de evento antecedente e evento sucessivo.” 131 As

principais teorias acerca do nexo de causalidade são: a teoria da equivalência das

condições ou conditio sine qua non; a teoria da causalidade adequada; e a teoria da

causalidade direta e imediata.

Na teoria da equivalência dos antecedentes, os antecedentes causais

são todos aqueles aptos a produzirem o resultado danoso verificado. Portanto, são

examinados retrospectivamente às circunstâncias fáticas como condições sem as

quais o resultado não ocorreria. A crítica refere que a premissa fundamental dessa

teria conduz à exasperação da causalidade à regressão infinita do nexo causal, já

que, em princípio,

[…] não se indaga se uma delas foi mais ou menos eficaz, mais ou menos adequada. Causa é a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido, sem distinção da maior ou menor relevância que cada uma teve. Por isso, essa teoria é também chamada da conditio sine qua non, ou da equivalência das condições.132

Em razão das perplexidades que pode gerar, pela ausência de filtro

limitativo, especialmente quando não trata de responsabilidade fundada na culpa,

como na hipótese de responsabilidade objetiva, essa teoria acaba sendo mais

utilizada para se constatar a ausência do nexo de causalidade do que para

corroborar a sua presença.

Na teoria da causalidade adequada, diferentemente da anterior, distingue-

se a causa da condição determinante do dano. Dentre as condições, estão

abrangidos todos os atos sem os quais não se verificaria a consequência dano. Por

meio dessa teoria, avaliam-se os antecedentes que tenham relevância determinante

para a ocorrência do fato lesivo. Em vista disso,

131 NERY JUNIOR; NERY, 2015, p. 425.

132 CAVALIERI FILHO, 2014, p. 64.

91

[…] várias condições concorrem para o resultado, e isso é feito através do mesmo processo mental hipotético (até aqui as teorias seguem os mesmos caminhos), é necessário agora verificar qual foi a mais adequada. Causa será apenas aquela que for mais determinante, desconsiderando-se as demais.133

Segundo CAVALIERI FILHO 134 , deve ser aplicada a fórmula atributiva de

ilicitude ao fato antecedente, para elevá-lo de mera condição à “causa adequada”,

impingindo critério de juridicidade a respeito da idoneidade de cada condição. Essa

consideração, entretanto, conduz a situações paradoxais no âmbito da

responsabilidade objetiva, especialmente se considerada a possibilidade de

reconhecimento do dever de indenizar, independentemente da análise da ilicitude da

atividade de risco. Retornaremos à questão oportunamente, destacando desde já

que a definição da causa adequada exige a análise normativa do nexo de

causalidade, não se reduzindo a mero juízo naturalístico, que se verificaria numa

primeira etapa de constatação do liame causal entre o dano e a ação ou a atividade

de risco.

A terceira teoria influente na doutrina nacional é denominada teoria da

causalidade direta e imediata. Nela, a questão se refere à necessariedade de

íntima conexão entre a causa e o dano, pois os prejuízos indenizáveis são

decorrentes direta e imediatamente do seu fato gerador. 135 Portanto, os danos

sofridos pela vítima devem ser provocados pelo fato imputado ao agente

responsável, devendo se estabelecer a íntima relação de causalidade naturalística

direta entre a ação e o dano. Essa teoria é chancelada pela abalizada doutrina de

AGOSTINHO ALVIM136.

De acordo com a opinião de CAVALIERI FILHO137, teria sido essa a teoria

133 CAVALIERI FILHO, 2014, p. 65.

134 Ibid., loc. cit.

135 CC, Art. 403. “Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual.”

136 ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas consequências. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 1980.

137 CAVALIERI FILHO, op. cit., p. 67.

92

positivada no art. 403 do Código Civil. No entanto, segundo esse autor, o “efeito

direito e imediato” indica apenas o liame de necessariedade, e não de proximidade

naturalística, de modo que a causa próxima natural não é determinante da ruptura

do nexo de causalidade, sendo causa aquela “mais determinante segundo o curso

natural e ordinário das coisas”138.

De toda sorte, na esteira das considerações pragmáticas do MIN. PAULO

SANSEVERINO, o reconhecimento do nexo de causalidade se deve à conjugação das

teorias da equivalência dos antecedentes e da causalidade adequada. Assim, se

permite distribuir com razoabilidade o ônus probatório do nexo causal, inclusive na responsabilidade objetiva. O lesado, enquanto autor da ação indenizatória, deve demonstrar apenas que o fato imputado ao demandado situa-se dentro do espectro de condições aptas à produção do dano sofrido. Feita essa prova, transfere-se para o demandado o ônus de provar a inadequação da causa que lhe é imputada para a produção do resultado alegado ou, pelo menos, na extensão pretendida. A conjugação das duas teorias mostra-se, assim, bastante razoável, já que o conceito de causa inadequada permite estabelecer um limite jurídico-normativo para a teoria da equivalência dos antecedentes.139

Na análise do nexo de causalidade, é de se observar que há certa margem

interpretativa, na qual se imiscui a valoração normativa. Nesse sentido, não se pode

descurar da opinião crítica de ANDERSON SCHREIBE, ao alertar sobre as denominadas

“presunções clandestinas de causalidade”, nas quais a atuação criativa dos juízes, à

margem de qualquer previsão do legislador, conduz à injustificada ampliação do

nexo de causalidade, deixando-se permear por questões políticas, morais e

ideológicas. Exemplifica essa situação, citando julgado do Tribunal de Justiça do Rio

138 CAVALIERI FILHO, 2014, p. 69.

139 SANSEVERINO, 2002, p. 243.

93

Grande do Sul (TJRS APC 70007090798, 19.11.2003)140, no qual foram adotadas as

máximas da experiência para se reconhecer o dever indenizar danos à saúde

sofridos por vítima em decorrência do uso contínuo de cigarro. Conclui seu alerta

apontando a erosão do nexo causal como filtro da responsabilidade civil:

a liberdade com que o Poder Judiciário trata a questão do nexo causal estimula pedidos de reparação, fundados mais das desgraças da vítima, que em uma possibilidade jurídica de imputação dos infortúnios ao sujeito que se considera responsável. Fala-se, neste sentido, em vitimização social ou blame culture.141

Nesse contexto, mostra-se pertinente a observação no que tange ao

tratamento das pretensões indenizatórias no âmbito da Previdência Social.

Conforme se referiu no ponto anterior, a caracterização do dano se deve em razão

de repercussões negativas na esfera do titular do benefício injustificadamente

denegado, impingindo ao segurado condições de vida precárias. Contudo, não se

pode presumir a ocorrência de danos unicamente a partir da ilegalidade do ato

administrativo. Ademais, não se pode limitar a análise do nexo de causalidade ao

vínculo naturalístico entre a concessão tempestiva do benefício ou a sua não

supressão pelo ente previdenciário, pois, quando da aferição da imputabilidade do

dever de indenizar, os limites dos riscos sociais assumidos pela Previdência Social

não podem ser desprezados.

A. Do nexo de causalidade ao nexo de imputação

140 DANO MORAL. CIGARROS. CAUSAS MORTAIS QUE PODEM ORIGINAR: 'ENFISEMA PULMONAR', 'ARRITMIA CARDÍACA' E 'CÂNCER PULMONAR', ENTRE OUTRAS. NEXO CAUSAL COMPROVADO, FACE AO CONSUMO DO CIGARRO E O EVENTO MORTE. PRINCÍPIO DA BOA FÉ OBJETIVA QUE SE APLICA AO CCv/16, INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR (arts. 6º, incisos I, III, IV, VI e VIII, e 12, par. 1º) E ART. 159 DO CCv/16, NA MODALIDADE OMISSÃO NA AÇÃO. APLICAÇÃO DO ART. 335 DO CPC: "REGRAS DE EXPERIÊNCIA COMUM". INDENIZAÇÃO DEVIDA. (PRECEDENTE: Apelação Cível n. 70000144626, Redator para o acórdão Des. Adão Sérgio do Nascimento Cassiano, j. em 29.10.03, 9ª. Câmara Cível). APELO PARCIALMENTE PROVIDO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70007090798, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luís Augusto Coelho Braga, Julgado em 19/11/2003)

141 SCHREIBER, 2013, p. 79.

94

O sistema previdenciário, ao contrário de gerar ou agravar, produz a

redução dos riscos sociais nas situações de desamparo social dos cidadãos. Dessa

feita, embora se possa delinear a presença do nexo causal naturalístico entre a

negativa na concessão de benefícios e os prejuízos de ordem extrapatrimonial, não

é possível desconsiderar a imputabilidade desses prejuízos no âmbito de cobertura

previdenciária.

ANA MAFALDA CASTANHEIRA NEVES DE MIRANDA BARBOZA refere, a esse

respeito, o seguinte:

Pois se o que releva é o incremento do risco, então a possibilidade do dano deve ser entendida de acordo com uma pertinência funcional da lesão concretamente experimentada à esfera de risco assumida, gerada, potenciada.142

Retoma-se, por esse enfoque, o exame da atuação do ente previdenciário,

a partir de certos limites de razoabilidade da gestão previdenciária, tocante à

interpretação dos critérios legais e avaliação de documentos para análise de

benefícios. Inicialmente, quanto à situação previdenciária na qual está inserido o

segurado, importante esclarecer que a degradação das suas condições sócio-

econômicas, em face da dependência da prestação mensal de benefício, não é

atribuível exclusivamente à eventual falha do sistema previdenciário, já que, a toda

evidência, decorre de questões sociais mais abrangentes, envolvendo fatores

econômicos, sociais e, eventualmente, a conduta da própria vítima.

Em outros termos, no caso da atuação administrativa dentro de certa

margem de plausibilidade, não se poderia imputar ao ente público a

responsabilidade decorrente do atraso na prestação do benefício que foi obtido

mediante ação judicial. Do mesmo modo, não seria imputável ao ente o dever de

indenizar quando, por desídia ou mesmo por impossibilidade da parte autora, não

foram apresentados todos os documentos necessários à verificação do cumprimento

dos critérios legais para o reconhecimento do seu direito à concessão do benefício.

Não se pretende aqui, de forma alguma, isentar o ente previdenciário de

142 BARBOSA, A., 2014, p. 73.

95

toda e qualquer responsabilidade extracontratual, mas avaliar a situação específica

do segurado dentro do contexto global para, a partir de então, identificar se a

degradação das suas condições sócio-econômicas é, de fato, atribuível ao ente

social. Com isso, examinando a origem dos prejuízos suportados pelo segurado,

eventual falha administrativa só gera o dever de reparação quando a atuação

administrativa não se mostre consentânea à margem de razoabilidade com a qual o

ente público exerce seu poder-dever de gestão de benefícios. Sendo esperada a

eventual negativa do benefício, como nas situações descritas quando da análise da

situação previdenciária, não se poderia imputar ao ente público o dever de

reparação.

No plano geral de responsabilidade civil, a ilicitude do ato administrativo já

representa a quebra da confiança na atuação administrativa, repercutindo no dever

de indenizar. No sistema previdenciário, não se pode utilizar essa mesma estrutura

de responsabilidade civil, porque assim o risco administrativo acaba sendo absorvido

pelo risco social à que se visa dar cobertura. As eventuais ilegalidades

administrativas corrigidas pelo Poder Judiciário, quando não caracterizam abuso de

direito, não estão encobertas pelo sistema previdenciário, de modo a gerar

indenizações por danos morais. Com efeito, a assimetria na concretização

normativa, desde que não se caracterize como abuso de direito, não implica quebra

da confiança no sistema de proteção previdenciário, sendo esperada a atitude

administrativa, especialmente em determinadas situações, cuja correção só seria

possível mediante a análise aprofundada da questão, pela intervenção do Poder

Judiciário.

Desse modo, ainda que aventada a possibilidade de configuração do nexo

de causalidade pela perspectiva naturalística, em que a situação de miserabilidade

pudesse ter sido evitada ou solvida em razão da concessão do benefício, mesmo

que de forma parcial, não haverá necessariamente o dever de indenizar. Isso porque

referido dever só estará abrangido na esfera de responsabilidade do ente

previdenciário quando a atuação administrativa desbordar da margem de

razoabilidade na interpretação de conceitos indeterminados ou técnicos, ou quando

da valoração dos elementos de comprovação dos requisitos de constatação do

direito do segurado à prestação previdenciária.

Retomamos, então, a análise da ilicitude, agora sob a perspectiva do nexo

96

de imputação objetivo, contextualizado no âmbito do liame causal entre atividade e o

dano moral, considerando a natureza do risco abrangido na gestão de benefícios

previdenciários.

B. Da não abrangência da ilicitude do ato administrativo no âmbito dos riscos

sociais protegidos pela gestão previdenciária

Segundo WÂNIA DE LIMA CAMPOS, no processo administrativo de concessão

de benefício previdenciário, podem ocorrer alguns vícios, seja no curso do processo

administrativo, seja na análise dos requisitos do benefício. A configuração de danos

morais aos beneficiários da Previdência Social, segundo a referida autora, é

decorrência de eventual irregularidade na conduta do agente administrativo,

conduzindo à ilicitude do ato administrativo e consequente caracterização de dano

moral in re ipsa.143

A atenção aqui se dirige à preocupação em demonstrar que, embora não se

deduza do ato-fato ilícito, cristalizado no ato de concessão de benefício, importa a

análise da regularidade e coerência da conduta administrativa em face do ato

praticado. Desse modo, a conduta que desborde dos limites de razoabilidade

interpretativa, implica configuração do dever de reparação. Em outros termos, o

elemento da ilicitude, na responsabilidade civil objetiva da Administração Pública,

não se refere à conduta do agente administrativo, sob o viés da culpa anônima ou da

falha do serviço.

Com efeito, ainda que o dever de indenizar dependa do alinhamento dos

pressupostos em torno da força gravitacional da cláusula geral de risco,

substituindo-se a cláusula geral de culpa, o deslocamento do critério de calibração

do sistema para o pressuposto do nexo de causalidade não elide a análise da

ilicitude.

Segundo destaca ROSA NERY 144 , referindo-se à doutrina objetiva, não

143 CAMPOS, 2011, p. 108.

144 NERY, JUNIOR; NERY, 2015, p. 411.

97

haveria resposta para a pergunta “quem deu causa a?”, pois a consideração dessa

premissa se desenvolve

como uma relação de dependência intrínseca entre o acontecimento e o resultado, mas que não se deve considerar como causalidade naturalística, como um sequencia lógico-temporal de evento antecedente e evento sucessivo. Trata-se do porquê, em sentido jurídico, determinado acontecimento vem a ocorrer.

Portanto, na responsabilidade objetiva fundada na doutrina do risco, não se

indaga da culpabilidade do agente da ação, sendo suficiente a adoção do critério de

probabilidade de que usualmente se vale a lei para imputar objetivamente a “certas

ações sociais” maior grau de responsabilização do que a outras, como no caso da

adoção do risco proveito.145

Na responsabilidade extracontratual da Administração Pública, de acordo

com a teoria do risco integral, não se analisaria a ilicitude da conduta administrativa,

sendo suficiente que o prejuízo tenha ocorrido em razão do desenvolvimento da

atividade administrativa. No entanto, essa teoria abarcaria o apontado vício, no

processo administrativo, de concessão de benefício, caracterizador da ilicitude do

ato, porquanto o dever de indenizar exsurgiria apenas em face da relação de

causalidade com os prejuízos extrapatrimoniais sofridos pelo segurado.

Ao se analisar a responsabilidade subjetiva, partindo-se da conduta do

agente, a este é imputável o dever de indenizar somente se a ação é praticada com

consciência e voluntariedade, ainda que o resultado não seja desejado. De todo

modo, a violação do dever imposto pela norma jurídica146 não se resume apenas à

contrariedade ao direito, mas ao que se denomina ilícito absoluto. Com efeito, a

ilicitude e a contrariedade ao direito não guardam correspondência perfeita entre si,

pois não é a inobservância do regramento normativo pura e simplesmente que

conduz à configuração do dever de indenizar.

No âmbito da responsabilidade subjetiva, é bastante claro que a

responsabilização decorre da inobservância do dever de cuidado, imputável ao

145 NERY, JUNIOR; NERY, 2015, p. 425.

146 CAVALIERI FILHO, 2014, p. 19.

98

agente dotado de consciência e liberdade de escolha para agir de modo diverso. No

entanto, na responsabilidade objetiva, como não se perquire acerca da culpa,

tampouco se analisa o elemento subjetivo de imputação do agente causador do

dano, de forma que a análise se resume aos elementos do dano e do nexo de

causalidade, a partir do risco da atividade. Não obstante a irrelevância da análise de

culpa do agente, não se afasta, na responsabilidade objetiva, o exame do nexo de

imputação, o qual está diretamente correlacionado ao risco inerente da atividade.

Em tese defendida por ANA MAFALDA CASTANHEIRA NEVES DE MIRANDA

BARBOZA, procede-se a releitura da responsabilidade civil extracontratual por

intermédio da revalorização do risco, segundo se colhe do seguinte trecho:

Falar da dimensão axiológica do risco implica reconduzi-lo ao centro nevrálgico do modelo ressarcitório segundo um pensamento de cariz normativo. Onde ele, consoante as perspectivas e os autores, é chamado a cumprir uma de duas funções.

Tradicionalmente, e de acordo com um modelo metódico que esgotava o plano da fundamentação num ideia de justificação do direito positivo, o risco assumia-se exclusivamente como arrimo uniformizado de algumas hipóteses de responsabilidade objectiva: aquelas que, ficando conhecidas pelo mesmo nome, constituiam, afinal, uma excepção ao princípio da culpa, ainda que pudessem colher sustentáculo em outras ideias para além da simples alocação dele.

Vamos, porém, agigantar-se a ideia num outro contexto. Apartando-nos do domínio da excepção e comprometendo-se exclusivamente com a regra, joga-se também aí, a aceitarem-se por boas as lucubrações expendidas ao longo da nossa dissertação, a mobilização activa do caráter arriscado de um dado comportamento, o qual vem permitir, em últimas infância, concretizar o sentido de exigibilidade que viabiliza o juízo de censura daquele que não conforma o comportamento com os parâmetros exigíveis, em face da situação, a um homem médio. E é a análise dele que, para lá da culpabilidade do agente, cumprindo, desta feita, o papel imputacional objectivo que, de outro modo, ficaria reservado para os casos em que se prescindisse da culpa.

Duas ideias avultam, portanto. De um lado, e conforme ficou dito, não pode ser só o risco a justificar o quadro de excepcionalidade com que nos confrontamos. De outro lado, não se discutindo a exclusividade da categoria nas hipóteses em apreço, torna-se possível aventar heuristicamente a ideia de um continum em toda a responsabilidade civil, que seria edificado exactamente a partir dela.147 (grifos não constam do original)

147 BARBOSA, A., 2014, p. 1035-1036.

99

Por essa linha de análise, constata-se a contaminação do requisito causal

pelo risco, no sentido de inserir o nexo de imputação no contexto da causalidade,

por intermédio do cotejo das esferas de risco.148 Em outras palavras, o nexo de

causalidade ganha contorno que ultrapassa o vínculo naturalístico, exigindo a

avaliação da “pertinência do resultado à esfera de risco encabeçada pelo lesante,

reconduzindo o resultado ao aumento do risco por ele protagonizado.”149

Examinando juridicamente a atividade administrativa, para fins de apuração

da responsabilidade por eventuais prejuízos causados ao beneficiário, não nos

parece adequada a atribuição do risco administrativo de gestão à autarquia pública,

porquanto ampliaria o risco social e estaria destituída de qualquer previsão

orçamentária para lhe dar guarida. Ainda que a responsabilidade civil extracontratual

permita o reconhecimento do dever de reparação, entendemos aqui que, em se

tratando de um risco sistêmico, a cobertura dependeria de previsão legislativa

expressa, salvo nas hipóteses de abuso de direito.

A distinção do risco administrativo em face da Previdência Social, em

comparação com outras áreas jurídicas, inclusive do direito público, deve-se ao fato

de o Direito Previdenciário assumir a cobertura de riscos sociais, implicando redução

da exposição dos sujeitos encobertos pela estrutura previdenciária estatal a esses

riscos. Quanto ao ponto, no que se refere à natureza da gestão de benefícios

previdenciários, a atividade administrativa se difere de outras atividades estatais

desenvolvidas no setor da economia.

Segundo ALEXANDRE ARAGÃO, nos serviços sociais:

em razão de sua natureza, esses serviços, quando estão sendo prestados pelo Estado, não perseguem fins lucrativos, sendo geralmente até mesmo deficitários, o que determina um regime especial de financiamento, já que apenas podem ser mantidos através de impostos ou contribuições; enquanto que os serviços públicos cuja natureza é industrial ou comercial admitem apenas o financiamento na base de preços e taxas (…). Também é característica daquele tipo de prestação a possibilidade de atuação dos particulares exercendo um direito próprio, dentro dos limites que forem

148 BARBOSA, A., 2014.

149 Ibid., p. 160.

100

fixados pelas leis.150

Portanto, a atividade de gestão de benefícios previdenciários, ainda que

financiada compulsoriamente, destina-se à salvaguarda de exigências sociais, as

quais, de acordo com WAGNER BALERA, na concepção moderna de risco social,

nascem em razão do papel de proteção dos trabalhadores assumido pelo Estado.

Assim, a cobertura dos riscos sociais resulta no abrandamento dos infortúnios aos

quais estão expostos os beneficiários da Seguridade Social.

Por tal razão, o risco da gestão previdenciária difere-se do risco

administrativo típico e, sobretudo, do risco proveito de atividades empresariais

lucrativas. Logo, não se pode conferir à Previdência Social o mesmo tratamento

dispensado a outras atividades estatais potencialmente geradoras de danos.

No âmbito previdenciário, de todo modo, a atuação estatal é destinada

justamente a dar cobertura ao risco social, por meio de complexa estrutura de

custeio de benefícios, destinada a conferir proteção ao trabalhador e aos cidadãos

em geral, os quais não passam a depender da renda do benefício na ausência de

provisão financeira ou de apoio do núcleo familiar, como no caso dos benefícios

assistenciais. Desse modo, o risco previdenciário inerente à Previdência Social não

pode ser equiparado ao risco da atividade administrativa estatal típica, pois, ainda

que custeada por sistema contributivo, não instaura uma relação sinalagmática com

a concessão de benefício, razão pela qual a assunção do risco social está limitada

aos benefícios previstos no âmbito de cobertura previdenciária.

Isso posto, o nexo de imputação do ato administrativo denegatório da

concessão de benefício só estará presente quando houver atuação administrativa

fora dos limites de razoabilidade, realocando-se a questão a partir da influência da

ilicitude enquanto elemento integrativo de imputação objetiva entre o dever de

indenizar e o dano extrapatrimonial do segurado.

C. Da imbricação da doutrina do risco e da solidariedade social

150 ARAGÃO, 2007, p. 184.

101

Ao tratar da questão da discricionariedade do ato administrativo de

concessão de benefícios previdenciários, sustentou-se a opinião de que não seria

possível admitir certa liberdade de interpretação ao agente previdenciário, quando

da avaliação dos requisitos, ainda que recaíssem sobre análise probatória. A

exclusão da ilicitude do ato com fundamento no exercício regular de direito,

consistente na razoabilidade da interpretação aplicada pelo agente previdenciário,

conduziria a uma antinomia sistemática.

Com efeito, o mesmo ato estaria sendo considerando ilícito e lícito ao

mesmo tempo e em face do mesmo ramo jurídico, ou seja, em razão das mesmas

regras de Direito Previdenciário. Dessa forma, uma vez considerado ilegal pelo

Poder Judiciário, o benefício passa a ser reconhecido como regular por intermédio

de ato jurisdicional, não sendo mais possível simplesmente afastar o dever de

reparar com fundamento na ilicitude da conduta do agente administrativo.

A releitura desse ponto é fulcral para preservar a salutar margem de

autonomia da gestão administrativa de benefícios previdenciários, sem que se

comprometa a estrutura sistêmica da responsabilidade civil. Afastando a figura da

exclusão da ilicitude da conduta com base no exercício regular de direito, não se

conduz ao reconhecimento obrigatório do dever de indenizar, pois é mister que se

verifique o nexo de causalidade.

De acordo com a doutrina acolhida na presente dissertação, o nexo de

causalidade incorpora o nexo de imputação, na medida em que não se poderia

desprezar a natureza do risco previdenciário inerente à atividade de gestão

previdenciária, cuja finalidade é justamente minimizar os riscos sociais que

conduzem os segurados a situações de miserabilidade.

Por conseguinte, a base justificadora da caracterização do dever de

indenizar não se resume apenas à configuração do nexo de causalidade

naturalístico, sendo necessário levar em consideração que a gestão de benefícios

previdenciários é causa de redução de riscos sociais, e não de incremento ou

criação.

Outrossim, os riscos sociais inerentes à convivência coletiva, ainda que por

ato de vontade política tenham sido incluídos dentre os direitos sociais fundamentais

102

da Constituição Federal, merecendo tratamento privilegiado na estruturação do

sistema previdenciário, não autorizam reparação em caso de atraso ou

indeferimento irregular de benefícios, com base em normas de Direito

Previdenciário. O reconhecimento do dever de indenizar só estaria autorizado por

intermédio do instituto da responsabilidade civil, quando constatada a ruptura do

sistema previdenciário, ultrapassando a referida margem de autonomia da gestão

administrativa de benefícios previdenciários.

Para que essa afirmativa seja melhor compreendida, é preciso retomar a

questão tendo as incertezas e dificuldades decorrentes do afastamento da culpa

como critério de configuração da responsabilidade civil objetiva, pois, na medida em

que a culpa é composta da violação do dever (elemento objetivo) e da

imputabilidade (elemento subjetivo), a adoção da doutrina do risco tornou nebulosa a

fronteira entre a reprovabilidade da conduta (“ilicitude”) e a imputação do dever de

indenizar. Nesse sentido, AGOSTINHO ALVIM, em acurada observação, sintetiza a

questão nos seguintes termos:

A teoria do risco tem sido combatida, já quanto ao seu valor intrínseco, porque nem todos aceitam o risco como o verdadeiro fundamento da responsabilidade, já quanto ao seu valor prático, ou seja, quanto à alegada facilidade de apreciação e solução dos casos.

Se à primeira vista parece que cada um deve responder pelo risco que criou, uma análise mais profunda do assunto, como a que fazem Ripert e outros autores, abala essa convicção, porque, como raciocinam êles, não se compreende que uma atividade lícita, como a que origina o dano, possa ser fonte de responsabilidade.

Realmente, não é a ilicitude da atividade (indústria, transporte) que se acha o fundamento do responsabilidade e, sim, no risco da atividade mesma. E a muitos repugna ver nisso o fundamento da responsabilidade.”

(…)

"Quase sempre o fato, “donde se pretende fazer derivar a responsabilidade não se apresenta simples, é antes o resultado do concurso de duas atividades convergentes, a assinalarem um risco criado pelo autor do dano e, outro, pela vítima.

Finalmente, reconhecendo que a teoria do risco deve ser atenuada, alguns autores têm procurado modificar a sua fórmula, de modo a fazer depender a responsabilidade das circunstâncias de se revestir de certo caráter anormal a atividade exercida (cf. Gaudemet, ob. cit., págs. 312-213).

Mas isto é deslizar para o terreno do ilícito, do abuso do direito : atividade irregular, que causa dano a terceiro.

Estaremos, então no campo da culpa, porque anormalidade do procedimento é uma forma de culpa, como já acentuamos em outro lugar, com apoio em Rabat (Da la Notion de Faute en Droit Privé, nº 79).

103

A teoria do risco teria perdido o que lhe é essencial: a dispensa da culpa sob qualquer de suas manifestações.151

Na responsabilidade civil objetiva, o fundamento essencial do dever de

indenizar está presente no risco, o qual dispensa a análise da culpa do lesante,

conforme a lição de Agostinho Alvim. No entanto, nessa visão que reflete o

pensamento acerca desse subsistema de responsabilidade civil, o responsável pela

atividade de risco, que cria, assume ou obtém lucro com o risco, é autor dos danos

advindos da atividade. Antecipa-se, de certo modo, o risco assumido pelo

desenvolvimento da atividade em si. Dessa feita, independentemente da quebra de

qualquer dever de cautela no curso da atividade desenvolvida, torna-se irrelevante o

juízo de licitude (culpa) no que concerne aos resultados lesivos que dela possam

advir.152 Portanto, não é a ilicitude da atividade o fundamento de justificação do

dever de indenizar, como não é culpa, mas o risco inerente à atividade.

Nesse ponto, a responsabilidade civil objetiva se aproxima da

responsabilidade por ato lícito153, na medida em que a conduta culposa do agente

deixa de ser o critério determinante do dever de indenizar, ampliando o seu espectro

com o deslocamento do eixo para a perspectiva do dano sofrido pela vítima. No

dever de indenizar por atos “licitos”, como aqueles praticados ao abrigo de uma

causa excludente da antijuridicidade (art. 188 do CC/02), caracterizados pela

legítima defesa, pelo exercício regular de direito ou pelo estado de necessidade, não

se perquire de qualquer juízo de reprovabilidade da conduta. Em ambas as

situações, o fundamento basilar está ligado ao princípio de solidariedade social, em

razão do qual se busca evitar que a vítima suporte sozinha os prejuízos decorrentes

dos danos sofridos, imputando-se ao responsável o dever de reparação. Esse

mesmo fundamento é utilizado na justificação do critério do risco administrativo, no

qual é imputado ao Estado o dever de indenizar, inclusive em certos casos de ato

administrativo lícito, já que determinada vítima não há de responder sozinha,

151 ALVIM, 1972, p. 307-308.

152 NERY JUNIOR; NERY, 2015, p. 406.

153 Há divergências doutrinárias a respeito da sua aceitação ou não, como em CANOTILHO, 1974 e em ALESSI, 1972.

104

devendo o ônus ser dissipado para toda a coletividade.154

No caso do Direito Previdenciário, todavia, o dever de indenizar fundado no

risco previdenciário tem sua gênese justamente no abrandamento de riscos sociais.

Desenvolve-se, por conta disso, toda sua estrutura de financiamento coletivo

universalizado, tendente à atenuação dos impactos sociais funestos para os

indivíduos socialmente mais vulneráveis. Assim, a reprovabilidade da gestão

administrativa, na análise de eventuais prejuízos sofridos pelos segurados, não se

afigura afastável de plano com base na alegação da assunção dos riscos

administrativos, porquanto tais riscos não estão encobertos pelo sistema

previdenciário.

De outra parte, esse incremento dos riscos sociais, com base no princípio

da solidariedade social, implicaria a funcionalização da responsabilidade civil

extracontratual para a cobertura securitária, a qual, em princípio, já está delimitada

na estrutura previdenciária, de acordo com suas normas. Portanto, a

responsabilidade civil extracontratual no âmbito da Previdência Social está limitada

aos atos administrativos que incorrem em abuso de direito, no que concerne ao

poder-dever de interpretação e aplicação das normas previdenciárias.

D. Do abuso de direito como critério de imputação objetiva, a partir da situação

previdenciária

Aprofundada a análise das questões lançadas no tópico anterior, o

elemento chave se insere na imputabilidade da responsabilidade ao ente

previdenciário. A imputabilidade está ligada à culpa, sendo considerada o elemento

capaz de permitir a imputação do dever de indenizar a determinado sujeito.

Na responsabilidade civil subjetiva, o nexo de imputação se relaciona à

culpa. CAIO MÁRIO, ao tratar da questão, aponta que o elemento característico da

ilicitude da conduta é a presença do elemento subjetivo (culpa) caracterizador da

ilicitude do ato gerador do dever de indenizar, no qual a imputação se relaciona com

154 CANOTILHO, 1974.

105

a consciência do agente.155

A ilicitude é vinculada essencialmente à conduta culposa, a despeito de o

art. 927 do CC, ter incluído o risco como cláusula geral para apuração do dever de

indenizar. Na doutrina atual, como, por exemplo, em CARLOS ROBERTO GONÇALVES, o

ato ilícito ainda é considerado o fator determinante do dever de indenizar, na medida

em que constitui “fonte de obrigação: a de indenizar ou ressarcir o prejuízo causado

(CC, art. 927).”156

CAVALIERI FILHO, por outro lado, previne que a vinculação entre o ato ilícito

culposo e o dever de indenizar “cria enorme dificuldade em sede de

responsabilidade objetiva, na qual não se cogita de culpa.” 157 Com isso, a

abordagem do conceito de ilicitude vem sendo ampliada de tal modo a se

desvincular da noção de culpa, conforme se colhe da obra de MARIA HELENA DINIZ,

ao assim definir o conceito de ato ilícito: “O ato ilícito (CC, arts. 186 e 187) é o

praticado em desacordo com a ordem jurídica, violando direito subjetivo individual.

Causa dano a outrem, criando o dever de reparar tal prejuízo (CC, art. 927).”158

Por outra perspectiva, ROSA NERY destaca que o dever de indenizar é um

dos aspectos do ato ilícito:

podem ter como causa fatos e atividades e não necessariamente atos e, nesse sentido, o conteúdo do termo ilícito passa a dispensar a verificação da qualidade de uma conduta ilícita (culposa? dolosa?) para radicar-se, a ilicitude, simplesmente, na potencialidade daquilo que gera dano: assim, o ilícito é aquilo que prejudica. A antijuridicidade da causa não está necessariamente nela, mas está no reflexo, no efeito, que por ser injusto, é antijurídico.159

Complementa a insigne jurista:

155 PEREIRA, 1992, p. 33.

156 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro. Vol. IV. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 15.

157 CAVALIERI FILHO, 2014, p. 21.

158 DINIZ, 2007, p. 826.

159 NERY JUNIOR; NERY, 2015, p. 327.

106

Nesse sentido, o fato do produto, o fato do animal, o fato da coisa, o risco, a atividade e, mais especificadamente, a atividade de risco, para nos referirmos aos fenômenos mais comuns, da experiência jurídica de nossos dias, são fatos jurídicos que podem desencadear efeitos prejudiciais à esfera jurídica do titular de um direito e por em movimento o direito de indenização do prejudicado em face de quem, objetivamente se imputa responsabilidade por essas situações jurídicas decorrentes desses fatos, dessas atividades e desse risco. Nesse sentido pode-se, então, falar de fato ilícito.160

Na atividade de gestão de benefício previdenciário, por ser causa plausível

de dano moral, o critério deflagrador do dever de indenizar se caracteriza pela

abusividade da conduta administrativa. Logo, inafastável que se verifiquem

divergências na aplicação da legislação previdenciária, especificamente na

interpretação administrativa dissonante da interpretação judicial. Do mesmo modo,

podem ocorrer divergências quanto à análise probatória do reconhecimento dos

critérios fáticos concernentes aos requisitos legais de concessão de benefícios. De

toda sorte, a categorização do ato administrativo como ilícito, decorrente da

contrariedade à norma previdenciária, não é causa do dever de indenizar por si só.

Em se tratando de atividade essencialmente ligada à gestão de benefícios,

é preciso que se reconheça, na sua negativa ou supressão, além da ilicitude do ato,

a ruptura da legítima expectativa do segurado na obtenção ou na manutenção de

benefício previdenciário, caracterizada pela atuação abusiva das prerrogativas

administrativas do ente público.

A Seguridade Social tem por base a solidariedade das fontes de custeio e

se dirige à redução dos riscos sociais. À vista disso, só será atribuível o dever de

indenizar, para além da correção dos prejuízos materiais, quando a situação jurídica

previdenciária do indivíduo permita concluir que o ente administrativo atuou de modo

a fraturar a legítima expectativa do sujeito no reconhecimento de seus direitos

previdenciários, de modo a submetê-lo a condição indigna. Aliás, tal condição

deverá ser demonstrada pelo segurado ou, ao menos, dedutível por elementos que

possam ser extraídos da situação previdenciária no caso concreto.

No âmbito da proteção previdenciária, não se pode perder de vista que a

finalidade precípua do sistema previdenciário é assegurar amparo aos sujeitos

160 NERY JUNIOR; NERY, 2015, p. 327-328.

107

diante de determinadas situações. Tratando-se de atividade de cunho

eminentemente social, com o fito de dar guarida à observância de políticas públicas

previstas por estatuto normativo específico, a abrangência dos riscos não engloba a

falibilidade do sistema administrativo.

Dessarte, o dever de indenizar, decorrente da falha administrativa

determinante de dificuldades financeiras caracterizadoras de danos morais, só é

imputável ao ente previdenciário quando se constatar a efetiva ruptura da confiança

depositada na situação previdenciária do segurado, mediante a atuação abusiva do

ente público.

Segundo ROSA NERY, a respeito do risco administrativo,

a atividade do Estado não deve causar problemas ao particular, e, se assim o fizer, o particular merece ser indenizado pelo prejuízo. O dever de indenizar do Estado é fundado no princípio da boa-fé objetiva, tendo em vista a função de que é investido o Estado. No atual sistema, não se admite mais a teoria da culpa administrativa (faute do service).161

Desse modo, conforme conclusão da referida jurista,

não é a licitude, ou não, do ato que irá determinar a incidência do dever de indenizar, mas a existência do prejuízo ao particular. Portanto, a Administração não pode se furtar ao dever de indenizar apenas calcada no fato de que não cometeu ato ilícito, talvez partindo de uma premissa errada, como era possível na vigência do CC/1916 15 - naquela época, a indenização só seria devida se o órgão administrativo, ou seu preposto, agisse de “modo contrário ao direito” ou “faltando em dever prescrito pela lei”. A CF 37 § 6º não faz esse tipo de especificação.162

Como já se apontou, a supressão de verba de natureza alimentar é a

condição determinante da configuração do dano moral, na medida em que retira a

capacidade de “autodeterminacao” 163 do segurado. No entanto, o problema se

apresenta em razão da complexidade da relação previdenciária, na qual a estrutura

161 NERY JUNIOR; NERY, 2015, p. 441.

162 Ibid., p. 442-443.

163 RECK, 2013.

108

administrativa não só implica redução de riscos sociais. Dessarte, eventual situação

de dificuldade financeira não é sempre imputável ao ente previdenciário

exclusivamente em razão do indeferimento da pretensão.

Assim como a concessão de benefícios previdenciários depende da

análise de processo administrativo, suscetível de indeferimento, bem como de

necessário tempo de tramitação, as expectativas do segurado devem estar

ajustadas a esses aspectos. Somente a partir da constatação desse feixe de

implicações envolvendo o segurado e o ente previdenciário é que se torna possível

apurar as expectativas legitimamente projetadas pelo segurado.

O liame jurídico situacional previdenciário torna aferível a projeção

realística do segurado em face da resposta esperada do ente previdenciário. Dessa

feita, pode-se constatar objetivamente se foram observados critérios de

razoabilidade e coerência na gestão de benefício. Caso não tenham sido

observados, o nexo de imputação se configura, ensejando o dever do ente

previdenciário de indenizar o segurado pelos danos extrapatrimoniais que tenha

experimentado.

Com isso, o critério determinante de imputação do dano moral só é

passível de ser obtido na apreciação casuística do segurado no contexto situacional

da posição previdenciária, sendo as circunstâncias pessoais determinantes apenas

para a configuração do dano e a quantificação da indenização, não servindo como

elemento conformador do dever de indenizar.

A diferença é significativa no sentido de que a situação fática do

segurado não se presta como causa do dever de indenizar, mas de configuração do

dano moral, ao passo que a posição situacional do beneficiário em relação ao

sistema previdenciário é o elemento determinante do nexo de imputação ao risco

previdenciário inserido na gestão de benefícios.

A situação previdenciária se refere não apenas aos requisitos fáticos

em virtude dos quais a autarquia previdenciária deve se pautar, mas funciona

também como parâmetro de controle do comportamento da administração quando

da interpretação da norma previdenciária aplicada ao caso concreto. Desse modo, a

abusividade do comportamento da administração passa a ser relacionada à situação

previdenciária do segurado, tornando aferível objetivamente a razoabilidade dos

109

critérios administrativos na análise da pretensão administrativa do segurado.

Comparativamente à avaliação dos critérios de responsabilidade civil

pela perspectiva da legalidade do ato administrativo, constata-se que a

responsabilidade civil da Administração Pública pode ser isolada e avaliada com

maior acuidade, permitindo a análise mais justa das situações em que os prejuízos

experimentados pelo segurado justificam a imputação de responsabilidade ao ente

previdenciário.

110

Capítulo 4. Considerações finais.

A Seguridade Social está estruturada em complexa estrutura administrativa,

visando essencialmente a dar concretude aos direitos previdenciários destinados à

cobertura de contingências sociais para o aparo dos indivíduos.

Constituem-se riscos sociais aquelas situações eleitas pelo constituinte

originário e garantidas como direitos de natureza fundamental.

A concretização dos direitos previdenciários depende da atuação

administrativa destinada à concessão de benefícios, através de ato administrativo. O

agente previdenciário não detém poder discricionário na avaliação do direito do

segurado ao benefício, pois se trata de ato administrativo vinculado. No entanto, no

exercício da função administrativa, é necessária a preservação de certo grau de

autonomia funcional, no que se refere à interpretação jurídica e valoração probatória

quando da análise de situações concretas.

A despeito dessa autonomia, o ato administrativo denegatório de benefícios,

ao ser revisado em sede judicial, ainda que salvaguardada certa margem de

razoabilidade na aplicação dos casos singulares, quando da interpretação jurídica ou

valoração probatória consentânea ao sistema jurídico vigente, será caracterizado

como ato ilícito, uma vez que a contrariedade ao ordenamento jurídico é realidade

inafastável. Com efeito, sendo de legalidade a natureza do controle exercido pelo

Poder Judiciário, o ato administrativo dissonante da interpretação judicial é

considerado ato ilícito.

Dessa maneira, ainda que dentro da margem de razoabilidade na qual se

insere o poder-dever exercido pelo servidor público, na avaliação

normativo/casuística do pedido de concessão de benefícios, a exclusão da ilicitude

do ato com fundamento no exercício regular de direito redundaria em antinomia

sistêmica, uma vez que o mesmo ato jurídico passaria a ser considerado ilícito e

lícito simultaneamente.

A admissibilidade da exclusão da ilicitude só é válida se considerado

apenas o aspecto de valoração subjetiva da conduta pelo servidor público, no plano

da responsabilidade aquiliana, por não revelar ofensa a dever funcional. A

implicação se limita, no entanto, apenas ao afastamento da responsabilidade

111

subjetiva do servidor, em eventual ação de regresso. Não resta afastada a

responsabilidade civil extracontratual do ente público.

Em face desse ato jurídico reputado ilícito no plano objetivo, o eventual

efeito indenizatório não resta obstado pela exclusão da ilicitude do ato

administrativo, pois está alocado no âmbito da responsabilidade objetiva do Estado.

No subsistema de responsabilidade civil extracontratual da Administração

Pública, considerando a doutrina objetivista pautada no risco, exige-se

essencialmente a demonstração de dois pressupostos: o dano e o nexo de

causalidade.

Em relação ao dano, constata-se a inexistência de uma nova categoria de

danos morais de natureza previdenciária. O abalo na esfera extrapatrimonial dos

segurados, em decorrência de eventual denegação de direito previdenciário, deve

estar relacionado à ofensa a direitos da personalidade para que reste caracterizado.

A ofensa isolada a interesse previdenciário não está juridicamente vinculada à

essência da pessoa humana, razão pela qual não estão abrangidas eventuais

repercussões de cunho moral no âmbito de proteção da norma previdenciária. De

igual forma, a negativa administrativa de direitos previdenciários por si só não

implica prejuízos ou ofensas de ordem extrapatrimonial.

Todavia, os prejuízos extrapatrimoniais podem ocorrer indiretamente, em

razão da privação das prestações previdenciárias, a qual pode submeter o sujeito

necessitado à condição financeira precária e possivelmente lhe infligir dor,

sofrimento ou angústia para além do mero dissabor ou aborrecimento, haja vista a

natureza alimentar dos benefícios previdenciários.

Como reflexo dessas premissas, constata-se a impossibilidade de

presunção dos danos morais por intermédio da ilicitude do ato administrativo

denegatório de benefício previdenciário. Não se categorizam os eventuais danos

morais ocorridos no âmbito previdenciário, em especial decorrentes do indeferimento

administrativo ou do seu atraso, como sendo danos morais in re ipsa.

De outra parte, deve estar comprovada pelo segurado a demonstração

efetiva de que esteve exposto a circunstâncias reveladoras de dor, sofrimento ou

angústia, pelas dificuldades financeiras que lhe foram infligidas, para que se

comprove a presença inequívoca do dano moral.

112

No que se refere ao nexo de causalidade, o liame causal entre a atividade

geradora do risco e o dano verificado, além da consequência naturalística

estabelecida entre os danos morais que teriam sido evitados se houvesse a

concessão tempestiva do benefício, é necessário o liame normativo, verificado a

partir do nexo imputacional deduzido da esfera de risco da atividade previdenciária.

No sistema securitário, cuja finalidade constitucional é dirigida à redução de

riscos sociais, mediante cobertura previdenciária custeada por financiamento

público, a imputação do dever de indenizar em decorrência da gestão de benefícios

previdenciários só se verifica quando a atuação administrativa desbordar dos limites

de razoabilidade, no tocante à interpretação jurídica ou valoração probatória na

análise casuística de concessão de benefícios.

Portanto, a responsabilidade civil objetiva da Previdência Social só se

caracteriza em face de abuso de direito, por implicar ruptura da confiança projetada

nos mecanismos de proteção social, à margem dos riscos sociais encobertos pela

atuação securitária estatal.

A indenizabilidade de eventuais falhas administrativas decorrentes das

inafastáveis dissonâncias interpretativas e de valoração casuística depende de

expressa previsão legal, abrangendo o risco administrativo no âmbito de cobertura

dos riscos sociais, sob pena de não se configurar o nexo de imputação entre os

prejuízos extrapatrimoniais e a atividade de gestão de benefícios previdenciários.

A abusividade da conduta administrativa tem por base a quebra da

confiança determinante do nexo de causalidade que se constata na situação

previdenciária do segurado, em razão da qual é possível a projeção da probabilidade

de êxito na obtenção do benefício previdenciário, sem desprezar as referidas

dissonâncias interpretativas aferíveis por critérios objetivamente extraídos do

procedimento administrativo.

Em síntese conclusiva, as dificuldades na estruturação sistematizante da

responsabilidade civil extracontratual da Previdência Social decorrem

essencialmente da natureza dos riscos sociais abrangidos na esfera de gestão

previdenciária. Isso porque, na medida em que se destina cobertura a contingências

sociais, não se pode desprezar o afastamento da esfera de responsabilização civil,

por não ser imputável o dever de indenizar, haja vista que as circunstâncias fáticas

113

não são sistemicamente agravadas pela gestão de benefícios. O nexo de imputação

na gestão previdenciária só se caracteriza pelo abuso de direito, uma vez que

implica quebra das expectativas legítimas projetadas pelo segurado, passíveis de

serem aferidas na avaliação de sua posição situacional previdenciária, sem se

desprezar a margem de razoabilidade da atuação administrativa.

114

Bibliografia ABBOUD, Georges e outros. Introdução à Teoria e à Filosofia do Direito. 2ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. ABBOUD, Georges. Jurisdição Constitucional e Direitos Fundamentais. São Paulo: RT, 2011.

AGOSTINHO, Theodoro Vicente; SALVADOR, Sérgio Henrique. O Dano Moral Previdenciário: um estudo teórico e prático com modelo de peças processuais. São Paulo: LTr, 2015.

AGOSTINHO, Theodoro Vicente; SALVADOR, Sérgio Henrique. O Dano Moral no Direito Previdenciário: uma necessária abordagem. In: Revista Síntese, Direito Previdenciário, Ano XII, n. 56, Set-Out, 2013. ALESSI, Renato. L’Illecito e La Responsabilità Civile Degli Enti Pubblici. 2ª ed. Milano: Dott. A. Giuffrè Editore, 1972. ALVES-MAZZOTTI, Alda Judith; GEWANDSZNAJDER, Fernando. O método nas ciências naturais e sociais: pesquisa quantitativa e qualitativa. 2ª ed. São Paulo: Pioneira, 1999.

ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas consequências. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 1980.

ALVIM, Agostinho. Da inexecução das obrigações e suas consequências. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 1972.

ATIENZA, Manuel. Ilícitos atípicos: sobre o abuso de direito, fraude à lei e desvio de poder. / Manuel Atienza, Juan Ruiz Manero; tradução Janaína Roland Matilda. 1ª ed. São Paulo: Marcial Pons, 2014. ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos Serviços Públicos. Rio de Janeiro: Forense, 2007. BALERA, Wagner; FERNANDES, Thiago D’Avila. Fundamentos da Seguridade Social. São Paulo: LTr, 2015. BALERA, Wagner. Sistema de Seguridade Social. 7ª ed. São Paulo: LTr, 2014. BALERA, Wagner. Noções Preliminares de Direito Previdenciário. 2ª Ed. rev. e ampl. São Paulo: Quartier Latin, 2010. BARBOSA, Ana Mafalda Castanheira Neves de Miranda. Do Nexo de Causalidade ao Nexo de Imputação - Contributo para a compreensão da natureza binária e

115

personalística dor requisito causal ao nível da responsabilidade civil extracontratual. Vol I. Cascais: Princípia Editora, 2014. (ISBN 978-989-716-107-0) BARBOSA, Ana Mafalda Castanheira Neves de Miranda. Do Nexo de Causalidade ao Nexo de Imputação - Contributo para a compreensão da natureza binária e personalística dor requisito causal ao nível da responsabilidade civil extracontratual. Vol II. Cascais: Princípia Editora, 2014. (ISBN 978-989-716-108-7) BARBOSA, Ana Mafalda Castanheira Neves de Miranda. Responsabilidade Civil Extracontratual - Novas Perspectivas em Matéria de Nexo de Causalidade. Cascais: Princípia Editora, 2014. (ISBN 978-989-716-109-4)

BARBOSA, Diogo Medeiros. A Responsabilidade civil do INSS por ato que cancela ou nega a concessão de benefício previdenciário devido. Disponível em: <<http://medeirosadv.adv.br/2010/09/02/159/>>. Acesso em 10/10/2015.

BASSIL, Rafael Laynes. Dano moral decorrente da demora para análise do processo administrativo previdenciário perante o Insituto Nacional do Seguro Social - INSS. Revista Magister de Direito Previdenciário. Ed. 14. Abr/Mai 2013. / Revista Justiça do Trabalho, Ano 27, n. 322, Out, 2010. BEDONE, Igor Volpato. Imputação de danos na omissão estatal. Dissertação de Mestrado em Direito pela PUC/SP, defendida no ano de 2013.

BERBEL, Fábio Lopes Vilela. Teoria Geral da Previdência Social. São Paulo: Quartier Latin, 2005.

BINENBOJM, Gustavo. Uma teoria do direito administrativo: direitos fundamentais, democracia e constitucionalização. 2ª ed. rev. e amp. Rio de Janeiro: Renovar, 2008.

BRAGA NETO, Felipe Peixoto. Teoria dos Ilícitos Civis. 2ª ed., rev., amp. e atual. Salvador: JusPodivm, 2014. BREBBIA, Roberto H. El Daño Moral. Buenos Aires: Editora Bibliográfica Argentina, 1950.

CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade Civil do Estado. 5ª ed. rev., atual e amp. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.

CAHALI, Yussef Said. Dano Moral. 3ª ed. rev., atual conforme o Código Civil de 2002, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

116

CAMPOS, Wânia Alice Ferreira de Lima. Dano moral no direito previdenciário: doutrina, legislação, jurisprudência e prática. 1ª ed., reimp. Curitiba: Juruá, 2011.

CANARIS, Claus Wilhelm. Pensamento Sistemático e Conceito de Sistema na Ciência do Direito. [trad.] A. Menezes Cordeiro. 5ª ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2012. (ISBN978-972-31-0295-6) CANE, Peter. Atiyah’s Accidents, Compensation and the La., United Kingdom: Cambridge University Press, 2006. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 7ª ed., 14ª reimp. Editora Almedina: Coimbra, 2003. (ISBN 978-972-40-2106-5) CANOTILHO, José Joaquim Gomes. O problema da responsabilidade do Estado por actos lícitos. Coimbra: Almeida, 1974. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 17ª ed. rev., amp. e atual até 05.01.2007. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2007.

CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 13ª Ed., São Paulo: Conceito Editorial, 2011.

CAVALCANTI, Amaro. Responsabilidade civil do Estado. Tomos I e II. 9ª ed., atualizada por José de Aguiar Dias. Rio de Janeiro: Editora Borsoi, 1956.

CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 11ª ed. São Paulo: Atlas, 2014. CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2007.

CORREIA, Erica Paula Barcha. O Dano Moral no Direito Previdenciário. In: Revista Síntese Direito Previdenciário. Ano XIII, N. 61, jul/ago/2014, p. 10-20.

CORREIA, Marcus Orione Gonçalves; CORREIA, Érica Paula Barcha. Curso de Direito da Seguridade Social. 7ª ed. Saraiva: São Paulo, 2013.

CORREIA, Marcus Orione Gonçalves. Os Direitos Sociais enquanto Direitos Fundamentais. Revista de Direito do Trabalho, vol. 117/2005, p. 149 - 166, Jan - Mar / 2005; Doutrinas Essenciais de Direitos Humanos, vol. 3, p. 921 - 941, Ago / 2011; Doutrinas Essenciais de Direito do Trabalho e da Seguridade Social, vol. 5, p. 59 - 80, Set / 2012, DTR\2005\92.

117

COUTO E SILVA, Clóvis V. do. O Conceito de Dano no Direito Brasileiro e comparado. Revista dos Tribunais, vol. 667/7, 1991. DE CUPIS, Adriano. Il Danno. Teoria Generale Della Responsabilità Civile. Vols. I. Milano: Dott. A. Giuffrè Editore, 1979.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 26ª ed. São Paulo: Atlas, 2013.

DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. Vol. II. 10ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997.

DIAS, José de Aguiar. Da Responsabilidade Civil. Vol. I. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1987.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil 3. Teoria das Obrigações Contratuais e Extracontratuais. 23ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007.

DWORKIN, Ronal. O Império do Direito. São Paulo : Martins Fontes, 2003. ESSER, Josef. Principio y norma en la elaboración jurisprudencial del derecho privado. Barcelona: Bosch Casa Editoria, 1961.

FAGUNDES, M. Seabra. O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário. 5ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1979.

FARINELI, Alexsandro Menezes; MASCHIETO, Fabia. Dano moral previdenciário. 2ª ed. São Paulo: Mundo Jurídico, 2013.

FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de Direito Administrativo. 7ª ed., rev., atual. e amp. São Paulo: Malheiros, 2004.

FISCHER, Hans Albrecht. A Reparação dos Danos no Direito Civil. (tradução Antônio de Arruda Ferrer Correia). São Paulo: Livraria Acadêmica Saraiva & Cia., 1938. FREITAS, Juarez. Controle dos Atos Administrativos e os princípios fundamentais. 5ª ed., rev. e amp. São Paulo: Malheiros, 2013. GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil. Vol. II, Obrigações. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 2003. GAIO. Instituições - Direito Privado Romano. Tradução do texto latino, introdução e notas J.A. Segurado e Campos. Fundação Calouste Gulbenkian: Lisboa, 2010. (ISBN 978-972-31-1321-1)

118

GARCIA DE ENTERRÍA, Eduardo. Curso de Direito Administrativo. 1 / Eduardo García de Enterría, Tomás-Ramón Fernández; revisor técnico Carlos Ari Sundfeld; tradutor José Alberto Fores Cal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. (ISBN 978-85-203-5691-3) GLEISER, Marcelo. A dança do Universo: dos mitos de criação ao Big-Bang. São Paulo: Cia das Letras, 1997.

GOMES, Orlando. Obrigações. 8ª ed. Forense: Rio de Janeiro, 1988.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro. Vol. IV. Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva, 2007.

HABERMAS, Jürgen; RATZINGER, Joseph. Dialética da Secularização: sobre razão e religião. Org. e prefácio de Florian Schüller [tradução Alfred J. Keller]. 3ª ed. São Paulo: Ideias e Letras, 2007. JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 7ª ed. rev. e atual. 1. reimp. Belo Horizonte: Fórum, 2011. (ISBN 978-85-7700-423-2) JUSTEN FILHO, Marçal. Responsabilidade civil do Estado. (organizador Juarez Freitas). Editora Malheiros: São Paulo, 2006. KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 6ª ed. [trad.] João Baptista Machado. 6ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. KERTZMAN, Ivan. Curso Prático de Direito Previdenciário. 7ª ed., rev., amp. e atual. São Paulo: Editora JusPodivm, 2010. LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. 6ª ed. [trad. José Lamego]. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2012, p. 286. LIMA, Alvino. Culpa e Risco. 2ª ed. rev. e atual pelo Prof. Ovídio Rocha Barros Sandoval. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. LIMA, Rui Cirne. Princípios de Direito Administrativo. 7ª ed., rev. e reel. por Paulo Alberto Pasqualini. São Paulo: Malheiros, 2007.

LEITE, Celson Barroso. Conceito de Seguridade Social. In. BALERA, Wagner (Coord.). Curso de Direito Previdenciário. LTr.

LUMIA, Giuseppe. Elementos de teoria e ideologia do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

119

MARTINEZ, Wladimir Novaes. Dano Moral no Direito Previdenciário. 2ª ed. São Paulo: LTr, 2009.

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da seguridade social. 35ª ed., São Paulo: Atlas, 2015.

MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado: sistema e tópica no processo obrigacional. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999.

MARTINS-COSTA, Judith. Os Fundamentos da Responsabilidade Civil. In: Revista Trimestral de Jurisprudência dos Estados. v. 93. São Paulo: Editora Velenich, 1991, p. 29-52.

MAURER, Harmut. Direito Administrativo Geral. tradução Luiz Afonso Heck, São Paulo : Manole, 2006. MAYER, Otto. Deutsches Verwaltungsrecht. Leipzig: Verlang von Dicker & Humblot, 1895.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29ª ed., atual. por Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burle Filho. São Paulo: Malheiros, 2004.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 21ª ed., atual. por Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burle Filho. São Paulo: Malheiros, 1996.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 16ª ed. São Paulo: RT, 1991.

MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Martires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e Controle Judicial. 2ª ed., 11ª tiragem. São Paulo: Malheiros, 2012.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17ª ed., rev. e atual. Malheiros: São Paulo, 2004.

MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Princípios Gerais de Direito Administrativo. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2007.

120

MORAES, Maria Celina Bodin de; KONDER, Carlos Nelson. Dilemas de direito civil-constituicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2012. MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos à pessoa humana: uma leitura civil-constitucional dos danos morais. Rio de Janeiro: Renovar, 2009. MORAES, Walter. Concepção atomista de pessoa. Um contributo para a teoria do direito da personalidade. Revista de Direito Privado, n. 2. p. 187. MÜLLER, Friedrich. Métodos de trabalho no direito constitucional. 3ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. MÜLLER, Friedrich. Strukturiende Rechtslehre. Berlin: Ducker & Humblot, 1994.

NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Instituições de Direito Civil: Direito das Obrigações. Vol. II. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.

NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição Federal comentada e legislação constitucional. 4ª ed. rev., atual. e amp. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais Ltda., 2013.

NERY JUNIOR, Nelson; ABBOUD, Georges. Noções fundamentais sobre pós-positivismo. In Revista de Direito Privado, n. 53, 2013. NERY JUNIOR, Nelson. Responsabilidade Civil da Administração Pública aspectos do direito brasileiro positivo vigente: art. 37, § 6.º, da CF/1988 e art. 15, do CC/1916. Revista de Direito Privado | vol. 1/2000 | p. 29 - 42 | Jan - Mar / 2000; Doutrinas Essenciais de Responsabilidade Civil | vol. 6 | p. 25 - 41 | Out / 2011. PEREIRA, Caio Mario da Silva. Responsabilidade civil. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992.

PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. t. I. Rio de Janeiro: Borsoi, 1955-1972.

PÔRTO, Mário Moacyr. REALE, Miguel. Filosofia do Direito. São Paulo: Saraiva, 1998. RECK, Maria Helena Pinheiro. A dignidade da pessoa humana e o dano moral no âmbito do direito a benefício previdenciário. In: Revista Brasileira de Direito Previdenciário n. 13, Fev/Mar, 2013. REIS, Claiton. Dano Moral. 4ª ed. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2001.

121

ROCHA, Daniel Machado da; BALTAZAR JUNIOR, José Paulo. Comentários à lei de benefícios da previdência social. 11ª ed., rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora: Estafe, 2012.

SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Princípio da Reparação Integral - indenização no Código Civil. São Paulo: Saraiva, 2010.

SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Responsabilidade civil no Código do Consumidor e a defesa do fornecedor. São Paulo: Saraiva, 2002.

SANTOS, Marisa Ferreira dos; LENZA, Pedro (Coord.). Direito Previdenciário esquematizado. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2014. SANTOS, Antonio Jeová. Dano Moral Indenizável. 4ª ed. rev. amp. e atual. de acordo com o novo Código Civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003. SARLET, Ingo Wolfang. A Eficácia do Direito Fundamental à Segurança Jurídica: Dignidade da Pessoa Humana, Direitos Fundamentais e Proibição de Retrocesso Social no Direito Constitucional Brasileiro. In: Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE). Salvador: Instituto Brasileiro de Direito Público, nº. 21, março, abril, maio, 2010. SCAVINO, Dardo. La filosofia: pensar sin certezas. Santiago del Esterro: Paidós Postales, 1999. SCHREIBER, Anderson. Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos filtros da reparação à diluição dos danos. 5ª ed. São Paulo: Atlas, 2013. SILVA, Américo Luís Martins da. O Dano Moral e a sua Reparação Civil. 3ª ed., rev., atual. e amp. conforme o novo Código Civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005. SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6ª ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2002. SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia. São Paulo: Malheiros, 2009. SILVA, Wilson Melo da. O dano moral e a sua reparação. 3ª ed., revista e ampliada. Rio de Janeiro: Forense, 1999. SOKAL, Alan e BRICMONT, Jean. Imposturas Intelectuais: o abuso da Ciência pelos filósofos pós-modernos. [trad.] Max Altmann. Rio de Janeiro: Record, 2012. SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel. Direito Constitucional: teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2013.

122

STRECK, Lenio Luis; ABBOUD, Georges. O que é isto – o precedente judicial e as súmulas vinculantes. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013. STRECK, Lenio Luis. Verdade e Consenso. Constituição, Hermenêutica e Teorias Discursivas da Possibilidade à necessidade de respostas corretas em Direito. 4ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2011. TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil. volume único. 3ª ed. rev., atual. e ampl.. São Paulo: Método, 2013. (ISBN 978-85-309-4475-9) USTÁRROZ, Daniel. Responsabilidade civil por ato lícito. São Paulo: Atlas, 2014.

123

Bibliografia de precedentes BRASIL, Supremo Tribunal Federal, RE 792414, DECISÃO MONOCRÁTICA, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 18/11/2014, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-229 DIVULG 20/11/2014 PUBLIC 21/11/2014; BRASIL, RE 581352 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 29/10/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-230 DIVULG 21-11-2013 PUBLIC 22-11-2013; BRASIL, SL 47 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2010, DJe-076 DIVULG 29-04-2010 PUBLIC 30-04-2010 EMENT VOL-02399-01 PP-00001; BRASIL, Supremo Tribunal Federal, RE 382054, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 03/08/2004, DJ 01-10-2004 PP-00037 EMENT VOL-02166-02 PP-00330 RT v. 94, n. 832, 2005, p. 157-164 RJADCOAS v. 62, 2005, p. 38-44 RTJ VOL 00192-01 PP-00356; BRASIL, Supremo Tribunal Federal,RE 607771 AgR, Relator(a): Min. EROS GRAU, Segunda Turma, julgado em 20/04/2010, DJe-086 DIVULG 13-05-2010 PUBLIC 14-05-2010 EMENT VOL-02401-06 PP-01216 RT v. 99, n. 898, 2010, p. 152-154 LEXSTF v. 32, n. 377, 2010, p. 250-254; BRASIL, Supremo Tribunal Federal, RE 456.302-AgR, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 6-2-2007, Primeira Turma, DJ de 16-3-2007; BRASIL, Supremo Tribunal Federal, ARE 733886 AgR, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 18/06/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-125 DIVULG 28-06-2013 PUBLIC 01-07-2013; BRASIL, Supremo Tribunal Federal,RE 677283 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 17/04/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-089 DIVULG 07-05-2012 PUBLIC 08-05-2012; BRASIL, Supremo Tribunal Federal, BRASIL, RE 831385 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 17/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-063 DIVULG 31-03-2015 PUBLIC 06-04-2015; BRASIL, Supremo Tribunal Federal, RE 855178 RG, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 05/03/2015, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-050 DIVULG 13-03-2015 PUBLIC 16-03-2015; BRASIL, Supremo Tribunal Federal, ARE 664335, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-029 DIVULG 11-02-2015 PUBLIC 12-02-2015; BRASIL, Supremo Tribunal Federal, MI 712, Relator(a): Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2007, DJe-206 DIVULG 30-10-2008 PUBLIC 31-10-2008 EMENT VOL-02339-03 PP-00384;

124

BRASIL, Supremo Tribunal Federal, DECISÃO MONOCRÁTICA, AI 860861, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, julgado em 19/08/2014, publicado em DJe-166 DIVULG 27/08/2014 PUBLIC 28/08/2014; BRASIL, Supremo Tribunal Federal, DECISÃO MONOCRÁTICA, ARE 659174, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, julgado em 22/05/2014, publicado em DJe-102 DIVULG 28/05/2014 PUBLIC 29/05/2014; BRASIL, Supremo Tribunal Federal, AI 817531 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 22/02/2011, DJe-048 DIVULG 14-03-2011 PUBLIC 15-03-2011 EMENT VOL-02481-02 PP-00537; BRASIL, Supremo Tribunal Federal, RE 422001 AgR, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 29/06/2004, DJ 13-08’2004 PP-00282 EMENT VOL-02159-03 PP-00478; BRASIL, Supremo Tribunal Federal, RE 661256 RG, Relator(a): Min. AYRES BRITTO, julgado em 17/11/2011, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-081 DIVULG 25-04-2012 PUBLIC 26-04-201. BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, REsp 1175308/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 18/06/2012, DJe 27/06/2012; BRASIL, Superior Tribunal de Justiça,AgRg no REsp 1075296/ES, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 05/06/2012, DJe 18/06/2012; BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, AgRg no AREsp 519.033/RS, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/10/2014, DJe 23/10/2014; BRASIL, Superior Tribunal de Justiça,AgRg no AREsp 486.376/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/06/2014, DJe 14/08/2014; BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, AgRg no AREsp 193.163/SE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/04/2014, DJe 08/05/2014;* BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, AgRg no AREsp 345.911/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/09/2013, DJe 25/09/2013;* BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, REsp 1175308/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 18/06/2012, DJe 27/06/2012 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, AgRg no REsp 1171358/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 07/06/2011, DJe 13/06/2011;

125

BRASIL, Superior Tribunal de Justiça,REsp 1228224/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/05/2011, DJe 10/05/2011; BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, REsp 1026088/SC, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/04/2008, DJe 23/04/2008; BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, CC 54.773/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 08/02/2006, DJ 06/03/2006, p. 136; BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, REsp 1079185/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/11/2008, DJe 04/08/2009; BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, REsp 1310042/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/05/2012, DJe 28/05/2012; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0043718-76.2013.4.01.9199 / GO, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL ÂNGELA CATÃO, PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 p.1465 de 12/02/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0011524-76.2007.4.01.3300 / BA, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO DE ASSIS BETTI, Rel.Conv. JUIZ FEDERAL CLEBERSON JOSÉ ROCHA (CONV.), SEGUNDA TURMA, e-DJF1 p.475 de 10/12/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0011026-63.2009.4.01.9199 / MG, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL ÂNGELA CATÃO, PRI’EIRA TURMA, e-DJF1 p.38 de 18/11/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0000960-43.2005.4.01.3806 / MG, Re’. DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO DE ASSIS BETTI, Rel.Conv. JUIZ’FEDERAL CLEBERSON JOSÉ ROCHA (CONV.), SEGUNDA TURMA, e-DJF1 p.362 de 26/08/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0044222-95.2004.4.01.3800 / MG, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO DE ASSIS BETTI, Rel.Conv. JUIZ FEDERAL CLEBERSON JOSÉ ROCHA (CONV.), SEGUNDA TURMA, e-DJF1 p.102 de 28/05/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0072121-55.2013.4.01.9199 / MT, Rel. JUIZ FEDERAL HENRIQUE GOUVEIA DA CUNHA (CONV.), SEGUNDA TURMA, e-DJF1 p.801 de 08/08/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0075636-98.2013.4.01.9199 / MG, Rel. JUIZ FEDERAL CARLOS AUGUSTO PIRES BRANDÃO (CONV.), PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 p.426 de 05/06/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0065196-43.2013.4.01.9199 / GO, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NEY BELLO, PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 p.275 de 30/05/2014;

126

BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0020112-68.2003.4.01.9199 / MG, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MOREIRA ALVES, Rel.Conv. JUIZ FEDERAL MÁRCIO BARBOSA MAIA (CONV.), SEXTA TURMA, e-DJF1 p.345 de 19/11/2013; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0029839-39.2009.4.01.3800 / MG, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NEY BELLO, PRIMEIRA SEÇÃO, e-DJF1 p.592 de 11/10/2013; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0001252-73.2006.4.01.3812 / MG, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL NEUZA MARIA ALVES DA SILVA, SEGUNDA TURMA, e-DJF1 p.356 de 02/10/2013; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0026047-74.2012.4.01.9199 / MT, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL KASSIO NUNES MARQUES, PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 p.145 de 11/09/2013; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0049266-51.2011.4.01.3800 / MG, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO DE ASSIS BETTI, Rel.Conv. JUIZ FEDERAL CLEBERSON JOSÉ ROCHA (CONV.), SEGUNDA TURMA, e-DJF1 p.1343 de 17/07/2013; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0003484-18.2002.4.01.4000 / PI, Rel. JUIZ FEDERAL RODRIGO NAVARRO DE OLIVEIRA, 4ª TURMA SUPLEMENTAR, e-DJF1 p.1517 de 21/06/2013; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0013193-68.2001.4.01.3400 / DF, Rel. JUIZ FEDERAL RODRIGO NAVARRO DE OLIVEIRA, 4ª TURMA SUPLEMENTAR, e-DJF1 p.719 de 14/06/2012; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0000389-05.2001.4.01.4100 / RO, Rel. JUIZ FEDERAL FRANCISCO HÉLIO CAMELO FERREIRA, 1ª TURMA SUPLEMENTAR, e-DJF1 p.640 de 16/09/2011; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0030528-46.2000.4.01.3300 / BA, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS OLAVO, Rel.Conv. JUIZ FEDERAL GUILHERME MENDONÇA DOEHLER (CONV.), PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 p.67 de 21/01/2010; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0007243-37.2004.4.01.3800 / MG, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTÔNIO SÁVIO DE OLIVEIRA CHAVES, PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 p.1178 de 16/12/2008; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0021574-92.2002.4.01.3800 / MG, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTÔNIO SÁVIO DE OLIVEIRA CHAVES, PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 p.63 de 07/10/2008;

127

BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0007612-24.2006.4.01.3812 / MG, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTÔNIO SÁVIO DE OLIVEIRA CHAVES, PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 p.196 de 19/08/2008; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região,AC 0000287-60.1999.4.01.4000 / PI, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ GONZAGA BARBOSA MOREIRA, Rel.Conv. JUIZ FEDERAL ITELMAR RAYDAN EVANGELISTA (CONV.), PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 p.25 de 01/07/2008; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0001157-30.2002.4.01.3700 / MA, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAGUNDES DE DEUS, Rel.Conv. JUIZ FEDERAL CESAR AUGUSTO BEARSI (CONV.), QUINTA TURMA, DJ p.105 de 06/09/2007; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, AC 0004776-19.2006.4.01.9199 / MG, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTÔNIO SÁVIO DE OLIVEIRA CHAVES, Rel.Conv. JUIZ FEDERAL MANOEL JOSÉ FERREIRA NUNES (CONV.), PRIMEIRA TURMA, DJ p.57 de 28/08/2006; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, PROCESSO: 200782000002130, AC460008/PB, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ MARIA LUCENA, Primeira Turma, JULGAMENTO: 05/03/2015, PUBLICAÇÃO: DJE 12/03/2015 - Página 71; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, PJE: 08027304720134058300, APELREEX/PE, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL GERALDO APOLIANO, Terceira Turma, JULGAMENTO: 15/01/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 1ª Região, PROCESSO: 00076355620124058400, APELREEX30055/RN, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL VLADIMIR CARVALHO, Segunda Turma, JULGAMENTO: 21/10/2014, PUBLICAÇÃO: DJE 10/11/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, APELAÇÃO CÍVEL/REEXAME NECESSÁRIO 201051018106824 DJ de 9/7/2013, pp 80 e 81, publicado em 10/7/2013Relator: Desembargador Federal IVAN ATHIÉ - 1ª Turma Especializada; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, APELREEX - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO - 580949, Processo: 201251510027088 UF: RJ Orgão Julgador: 1ª TURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 11/12/2014, Data Publicação: 07/01/2015, Relator Desembargador Federal ABEL GOMES; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, APELREEX - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO, Processo: 201251140005195, 5ª TURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 02/12/2014, Data Publicação: 12/12/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, APELREEX - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO - 624816, Processo: 200851018114395, 2ª TURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 26/11/2014, Data Publicação: 05/12/2014;

128

BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, APELREEX - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO - 571000, Processo: 200951040033133, 2ª TURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 05/11/2014, Data Publicação: 04/12/2014, Relator Desembargador Federal ANDRÉ FONTES; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 580337, Processo: 201151200006431, 2ª TURMA ESPECIALIZADA, Data Decisa’: 05/11/2014, Data Publicação: 19/11/2014, Relator Desembargador Federal ANDRÉ FONTES; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, APELREEX - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO - 567238, Processo: 201051018053212 UF: RJ Orgão Julgador: 2ª TURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 23/09/2014, Data Publicação: 06/10/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, APELREEX - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO - 547103, Processo: 201151200012250 UF: RJ Orgão Julgador: 2ª TURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 23/09/2014, Data Publicação: 30/09/2014, Desembargadora Federal SIMONE SCHREIBER; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, AC - APELAÇÃO CÍVEL, Processo: 201050010047944, 2ª, TURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 23/09/2014, Data Publicação: 08/10/2014, Desembargadora Federal SIMONE SCHREIBER; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 620682, Processo: 201402010042277, 1ª TURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 18/09/2014, Data Publicação: 03/10/2014, Relator Desembargador Federal ABEL GOMES; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, REO - REMESSA EX OFFICIO EM AÇÃO CÍVEL - 512180, Processo: 200751080008682, 5ª TURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 09/09/2014, Data Publicação: 03/10/2014, Relator Desembargador Federal RICARDO PERLINGEIRO; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 559428, Processo: 201151010019610, 5ª TURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 26/08/2014, Data Publicação: 10/09/2014, Relator Desembargador Federal MARCUS ABRAHAM; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, APELREEX - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO - 622253, Processo: 201402010051011, 1ª TURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 21/08/2014, Data Publicação: 05/09/2014, Relator Desembargador Federal PAULO ESPIRITO SANTO; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 574488, Processo: 200851070000794, 2ªTURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 21/08/2014, Data Publicação: 01/09/2014, Relator Desembargadora Federal SIMONE SCHREIBER;

129

BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 449591, Processo: 200751010205462, 5ªTURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 15/07/2014, Data Publicação: 28/07/2014, Relator Juiz Federal Convocado FLAVIO OLIVEIRA LUCAS; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, AC - APELAÇÃO CÍVEL, Processo: 201351170003405, 6ªTURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 30/06/2014, Data Publicação: 29/07/2014, Relator Juíza Federal Convocada CARMEN SILVIA LIMA DE ARRUDA; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 587747, Processo: 201151018044343, 1ªTURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 13/06/2014, Data Publicação: 14/08/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, APELREEX - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO - 592092, Processo: 201151020027560, 1ªTURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 15/05/2014, Data Publicação: 30/05/2014, Relator Desembargador Federal ABEL GOMES; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 523317, Processo: 200750030001409, 2ªTURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 20/03/2014, Data Publicação: 02/04/2014, Relator Desembargador Federal ANDRÉ FONTES; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, APELREEX - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO - 598980, Processo: 201251010140761, 1ªTURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 25/02/2014, Data Publicação: 18/03/2014, Relator Desembargador Federal ANTONIO IVAN ATHIÉ; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, REO - REMESSA EX OFFICIO EM AÇÃO CÍVEL - 610184, Processo: 201251010116564, 2ªTURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 25/02/2014, Data Publicação: 17/03/2014, Relator Desembargador Federal MESSOD AZULAY NETO; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 615006, Processo: 201251010378832, 6ªTURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 17/02/2014, Data Publicação: 26/02/2014, Relator Desembargadora Federal NIZETE LOBATO CARMO; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 493536, Processo: 200950010012289, 8ªTURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 18/12/2013, Data Publicaca’: 09/01/2014, Relator Desembargadora Federal VERA LÚCIA LIMA; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, APELREEX - APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO - 555707, Processo: 200951018121719, 1ªTURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 17/12/2013, Data Publicação: 17/01/2014, Relator Desembargador Federal ANTONIO IVAN ATHIÉ;

130

BRASIL, Tribunal Regional Federal da 2ª Região, Classe: AC - APELAÇÃO CÍVEL - 593774, Processo: 200951018124368, 2ªTURMA ESPECIALIZADA, Data Decisão: 12/12/2013, Data Publicação: 17/01/2014, Relator Desembargador Federal MESSOD AZULAY NETO ,Relator para Acórdão Desembargador Federal MARCELO PEREIRA DA SILVA; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 3ª Região, QUARTA TURMA, AC 0000619-55.2007.4.03.6113, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRE NABARRETE, julgado em 14/05/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/06/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 3ª Região, DÉCIMA TURMA, APELREEX 0013254-47.2010.4.03.6183, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL BAPTISTA PEREIRA, julgado em 19/05/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/05/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 3ª Região, SEXTA TURMA, AC 0008141-25.2001.4.03.6120, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL REGINA COSTA, julgado em 20/06/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/06/2013; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 3ª Região, OITAVA TURMA, AC 0000629-65.2008.4.03.6113, Rel. JUIZA CONVOCADA RAQUEL PERRINI, julgado em 06/05/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/05/2013; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 3ª Região, SEXTA TURMA, AC 0008868-37.2008.4.03.6120, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA, julgado em 02/05/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/05/2013; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 3ª Região, TERCEIRA TURMA, AC 0012303-15.2009.4.03.6110, Rel. JUIZ CONVOCADO ROBERTO JEUKEN, julgado em 18/04/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:26/04/2013; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 3ª Região, DÉCIMA TURMA, AC 0002424-14.2001.4.03.6126, Rel. JUIZ CONVOCADO NILSON LOPES, julgado em 12/03/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/03/2013; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 3ª Região, AC 0006987-91.2009.4.03.6119, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MARCONDES, julgado em 07/02/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:22/02/2013; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 3ª Região, SEXTA TURMA, AC 0005675-04.2009.4.03.6112, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA, julgado em 18/10/2012, e-DJF3 Judicial 1 DATA:25/10/2012; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 3ª Região, SEXTA TURMA, AC 0007604-29.2001.4.03.6120, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL MAIRAN MAIA, julgado em 17/03/2011, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/03/2011 PÁGINA: 513; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, TRF4, AC 5007524-32.2011.404.7112, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Fernando Quadros da Silva, juntado aos autos em 03/06/2015;

131

BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, TRF4, APELREEX 5023379-25.2013.404.7001, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Ricardo Teixeira do Valle Pereira, juntado aos autos em 29/05/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5002879-87.2013.404.7210, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Luís Alberto D'azevedo Aurvalle, juntado aos autos em 26/05/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5007218-10.2013.404.7107, Sexta Turma, Relatora p/ Acórdão Vânia Hack de Almeida, juntado aos autos em 22/05/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, APELREEX 5071162-07.2013.404.7100, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 21/05/2015, BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região., AC 0021200-02.2014.404.9999, Quinta Turma, Relator Rogerio Favreto, D.E. 03/06/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, TRF4, AC 5025865-31.2014.404.7200, Terceira Turma, Relatora p/ Acórdão Salise Monteiro Sanchotene, juntado aos autos em 14/05/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5016936-95.2012.404.7000, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Luiz Carlos de Castro Lugon, juntado aos autos em 08/05/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5013583-77.2013.404.7205, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Ricardo Teixeira do Valle Pereira, juntado aos autos em 04/05/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, APELREEX 5030877-15.2012.404.7000, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão (auxílio Ricardo) Taís Schilling Ferraz, juntado aos autos em 30/04/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, APELREEX 0015827-87.2014.404.9999, Sexta Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 28/04/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, APELREEX 5015968-22.2013.404.7100, Sexta Turma, Relatora p/ Acórdão Vânia Hack de Almeida, juntado aos autos em 24/04/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5011965-34.2012.404.7205, Terceira Turma, Relatora p/ Acórdão Salise Monteiro Sanchotene, juntado aos autos em 23/04/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5005991-88.2013.404.7202, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Fernando Quadros da Silva, juntado aos autos em 16/04/2015;

132

BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, APELREEX 5030324-21.2014.404.9999, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão (auxílio Vânia) Paulo Paim da Silva, juntado aos autos em 13/04/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, APELREEX 5000971-34.2013.404.7003, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, juntado aos autos em 26/03/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5000’34-43.2013.404.7200, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Nicolau Konk’l Júnior, juntado aos autos em 20/03/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5003755-48.2013.404.7111, Quarta Turma, Relatora p/ Acórdão Vivian Josete Pantaleão Caminha, juntado aos autos em 30/01/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, APELREEX 5007881-02.2012.404.7104, Quinta Turma, Relatora p/ Acórdão Maria Isabel Pezzi Klein, juntado aos autos em 29/01/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, APELREEX 0022670-68.2014.404.9999, Quinta Turma, Relatora Maria Isabel Pezzi Klein, D.E. 28/01/2015; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, EINF 5017118-52.2010.404.7000, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Luiz Carlos de Castro Lugon, juntado aos autos em 16/12/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5011247-18.2013.404.7200, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Luís Alberto D'azevedo Aurvalle, juntado aos autos em 11/12/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5006607-69.2013.404.7200, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Fernando Quadros da Silva, juntado aos autos em 13/11/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5000012-04.2011.404.7013, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão (auxílio Lugon) Taís Schilling Ferraz, juntado aos autos em 19/11/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5000070-58.2012.404.7017, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Roger Raupp Rios, juntado aos autos em 17/11/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5033961-44.2014.404.7100, Quarta Turma, Relatora p/ Acórdão Vivian Josete Pantaleão Caminha, juntado aos autos em 31/10/2014;

133

BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5010044-62.2011.404.7112, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Luís Alberto D'azevedo Aurvalle, juntado aos autos em 29/10/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5027215-05.2010.404.7100, Segunda Turma, Relator p/ Acórdão Otávio Roberto Pamplona, juntado aos autos em 09/10/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, APELREEX 5007549-13.2013.404.7003, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Rogerio Favreto, juntado aos autos em 03/10/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5002446-68.2013.404.7215, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Rogerio Favreto, juntado aos autos em 03/10/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 0009085-80.2013.404.9999, Sexta Turma, Relator Luiz Antonio Bonat, D.E. 25/08/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5064168-94.2012.404.7100, Quarta Turma, Relatora p/ Acórdão Loraci Flores de Lima, juntado aos autos em 06/08/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5000290-50.2012.404.7116, Quarta Turma, Relatora p/ Acórdão Vivian Josete Pantaleão Caminha, juntado aos autos em 06/08/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5002623-81.2012.404.7113, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Fernando Quadros da Silva, juntado aos autos em 31/07/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, APELREEX 5057508-59.2013.404.7000, Terceira Turma, Relatora p/ Acórdão Marga Inge Barth Tessler, juntado aos autos em 11/07/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 4ª Região, AC 5001696-91.2012.404.7121, Terceira Turma, Relator p/ Acórdão Roger Raupp Rios, juntado aos autos em 11/07/2014; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 5ª Região, PROCESSO: 00062645720124058400, AC576182/RN, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO WILDO, Primeira Turma, JULGAMENTO: 07/05/2015, PUBLICAÇÃO: DJE 14/05/201’ - Página 40; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 5ª Região, PROCESSO: 00043271220124058400, APELREEX25699/RN, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO BRAGA, Segunda Turma, JULGAMENTO: 07/04/2015, PUBLICAÇÃO: DJE 16/04/2015 - Página 186;

134

BRASIL, Tribunal Regional Federal da 5ª Região, PROCESSO: 00072046520114058300, AC537195/PE, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO BRAGA, Segunda Turma, JULGAMENTO: 10/03/2015, PUBLICAÇÃO: DJE 13/03/2015 - Página 68; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 5ª Região, PROCESSO: 00086551220124058100, AC565526/CE, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO FIALHO MOREIRA, Quarta Turma, JULGAMENTO: 10/12/2013, PUBLICAÇÃO: DJE 12/12/2013 - Página 511; BRASIL, Tribunal Regional Federal da 5ª Região, PROCESSO: 00068164920124058100, APELREEX29098/CE, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ MARIA LUCENA, Primeira Turma, JULGAMENTO: 28/11/2013, PUBLICAÇÃO: DJE 05/12/2013 - Página 188;