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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP Tânia Ishikawa Mazon Fomento público à inovação tecnológica MESTRADO EM DIREITO São Paulo 2015

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC/SP

Tânia Ishikawa Mazon

Fomento público à inovação tecnológica

MESTRADO EM DIREITO

São Paulo

2015

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC/SP

Tânia Ishikawa Mazon

Fomento público à inovação tecnológica

MESTRADO EM DIREITO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora do

Programa de Estudos Pós-Graduados em Direito,

da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,

como parte dos requisitos para a obtenção do

título de Mestre em Direito, na área de

Efetividade do Direito – Núcleo de Direito

Administrativo, sob orientação da Professora

Doutora Dinorá Adelaide Musetti Grotti.

São Paulo

2015

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Banca Examinadora:

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DEDICATÓRIA

Aos meus pais, Haruo e Guaraciaba, exemplos de caráter, bondade, união, dedicação e

amor à família, por todos os esforços e sacrifícios que fizeram em nome dos meus estudos.

Ao meu marido Cassiano, aos meus irmãos Danilo e Vanessa, aos meus cunhados

Stelamares e Rodrigo e aos meus afilhados Lucas e André.

Amada família, sem o amor, o apoio incondicional, a força e a compreensão de vocês,

este trabalho não teria sido realizado.

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AGRADECIMENTOS

À Professora Orientadora Doutora Dinorá Adelaide Musetti Grotti, que ensina com

dedicação, seriedade, sabedoria e respeito incomparáveis, com admiração e gratidão eternas.

Estimada Orientadora, não há palavras para lhe agradecer por todo o tempo que me

dedicou, por todas as preciosas sugestões, críticas e revisões. Obrigada por sua generosidade,

humanidade, paciência e por não me deixar esmorecer.

Ao Professor Doutor José Roberto Pimenta Oliveira, membro da banca do exame de

qualificação, pelo incentivo constante, desde as primeiras aulas, valiosas críticas e sugestões

ao presente trabalho.

Ao Professor Doutor Pietro de Jesús Lora Alarcón, membro da banca do exame de

qualificação, pelas enriquecedoras contribuições ao presente trabalho.

Ao Professor Doutor João Fernando Gomes de Oliveira, pelo estímulo à realização do

curso de Mestrado e à escolha do tema, críticas e contribuições sempre pertinentes, apoio,

confiança e amizade.

Aos Professores Doutores Clovis Beznos, Ricardo Marcondes Martins, Sílvio Luís

Ferreira da Rocha, Cláudio De Cicco, Alvaro de Azevedo Gonzaga e Luiz Alberto David

Araújo, pelos preciosos ensinamentos ministrados no Programa de Pós-Graduação da

PUC/SP.

À Professora Doutora Maria Paula Dallari Bucci, pelo incentivo à escolha do tema e

disponibilização de material pertinente ao assunto investigado.

À querida amiga Carla Carolina Pires Mentone, pela amizade de todas as horas,

incentivo, carinho e lealdade.

Aos estimados amigos e colegas do Curso de Mestrado da PUC/SP, em especial a

Alessandra Cristina Girotto Rodrigues, Ana Claudia de Paula Albuquerque, Bruna Chimenti,

Diogo Albaneze Gomes Ribeiro, Evelise Pedroso Teixeira Prado Vieira, Fabiano Zavanella,

Fagner Vilas Boas, Flávio Feturessi, Francisco Sérgio Oto Souza Bonelli, Guilherme Corona

Rodrigues Lima, Luís Maurício Chierighini, Maria Hermínia Penteado Pacheco e Silva

Moccia, Mário Marcio Saadi Lima, Mirena Ferragut Gallo e Wilson José Vinci Junior, pelo

aprendizado em equipe, solidariedade e momentos de alegria divididos ao longo de nossas

jornadas.

À Maria Aparecida Pires Lopes, pela paciente e sempre cordial orientação quanto aos

aspectos técnicos na elaboração de trabalhos acadêmicos.

Ao IPT, em especial ao Professor Doutor Fernando José Gomes Landgraf, pelo

estímulo e compreensão quanto aos meus afastamentos; à Professora Doutora Conceição

Vedovello, pela leitura crítica e inestimáveis contribuições à elaboração do presente trabalho;

à Edna Baptista dos Santos Gubitoso, pelo auxílio com a plataforma lattes do CNPq e

orientação para adequação às normas; à Professora Doutora Zehbour Panossian, pela

confiança e consideração e aos queridos amigos Ana Paula Moza Quatro, Fábio de Carvalho

Groff, Janay Carvalho de Almeida, Ieda Yoshimi Kanzaki Oliveira, Julio Seguchi, Marconi

Amorim Gonçalves, Mariana Cipollini Pereira Lopes, Renata Cristina Calil, Stella Correa da

Cunha Martins, Tales Paranahiba, Tiago Cassemiro Falchi Nebesny, Vanessa Barbieri

Marques de Oliveira e Vera Lucia Crabbe Teixeira, pelo carinho, apoio e compreensão.

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O mundo das ajudas públicas não é o terreno do

conservadorismo, mas o da ousadia responsável.

(José Vicente Santos de Mendonça. Direito constitucional

econômico: a intervenção do Estado na economia à luz da

razão pública e do pragmatismo)

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RESUMO

Na década de 90 do século XX o termo inovação passou a ser utilizado com frequência e a

atrair a crescente atenção de formuladores de políticas públicas e do setor produtivo no Brasil.

Tendo como pano de fundo o estímulo do Estado ao desenvolvimento científico, à pesquisa e

à capacitação tecnológicas preconizado pelas Constituições Federal de 1988 e Paulista de

1989 e a necessidade premente de o País inovar cada vez mais, o presente estudo foi

desenvolvido com o objetivo de analisar a função administrativa de fomento e, especialmente,

a construção de ambientes especializados e cooperativos de inovação, à luz da Lei Federal nº

10.973/2004 e da Lei Complementar Paulista nº 1.049/2008. Foi também examinado o papel

do Direito na constituição de alianças estratégicas e de projetos cooperativos de inovação,

assim como na formação de redes de pesquisa, incubadoras, parques tecnológicos, acordos de

parceria e na participação minoritária do Poder Público no capital de empresa privada,

apontando polêmicas surgidas na aplicação das leis citadas, assim como parâmetros para

orientar a atuação promocional pública. Ao final, foram arroladas as conclusões obtidas ao

longo do trabalho.

Palavras-chave: Fomento público. Inovação tecnológica. Alianças estratégicas. Projetos de

Cooperação. Incubadoras. Parques tecnológicos.

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ABSTRACT

In the 1990s of the twentieth century the term innovation became to be used frequently

and attract increasing attention of policymakers and the productive sector in Brazil.

Having as background the State's promotion of scientific development, research and

technological expertise recommended by the Federal Constitution of 1988 and the São Paulo

State Constitution of 1989 and the urgent need for the country to innovate more and more,

this study was developed with the purpose of analyzing the administrative function of support

and, in particular, the construction of specialized and cooperative environments of innovation

in the light of Federal Law N° 10973/2004 and the Complementary State Law N° 1049/2008.

It was also reviewed the role of Law in developing strategic alliances and cooperative

projects of innovation, as well as in the building of research networks, business incubators,

technology parks, partnership agreements and minority stake of the Government in the capital

of the privately held company, by highlighting controversies arising from the implementation

of those laws, as well as parameters to guide public promotional activities. At the end, the

findings obtained during the work were listed.

Key words: Public support. Technological Innovation. Strategic Alliances. Cooperative

Projects. Business Incubator. Technological Parks.

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

ABC Academia Brasileira de Ciência

ABDI Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial

ACS Alcântara Cyclone Space

ADIn Ação Direta de Inconstitucionalidade

AEB Agência Espacial Brasileira

ANDIFES Associação Nacional dos Dirigentes de Instituições Federais de

Ensino

ANPEI Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das

Empresas Inovadoras

ANPROTEC Associação Nacional de Entidades Promotoras de

Empreendimentos Inovadores

BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

BRICS Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul

CADE Conselho Administrativo de Defesa Econômica

Capes Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CCT Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia

CGEE Centro de Gestão e Estudos Estratégicos

Ceitec Centro de Excelência em Tecnologia Eletrônica Avançada

CIS0 Community Innovation Sursey

CNCT Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia

CNCTI Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação

CNEN Comissão Nacional de Energia Nuclear

CNPEM/ABTluS Centro Nacional de Pesquisas em Energia e Materiais / Associação

Brasileira de Tecnologia de Luz Síncroton

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

CONCITE Conselho Estadual de Ciência e Tecnologia

CONFAP Conselho Nacional das Fundações de Amparo à Pesquisa

CONSECTI Conselho Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de

Ciência e Tecnologia

C&T Ciência e tecnologia

C,T&I Ciência, tecnologia e inovação

EMBRAPII Associação Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial

ENCTI Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação

EUROSTAT Statistical Office of the European Commnunities

FAPESP Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo

FAPEMIG Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais

FAPs Fundações de Amparo à Pesquisa

FINEP Financiadora de Estudos e Projetos

FNDCT Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

FORTEC Fórum Nacional de Gestores de Inovação e Transferência de

Tecnologia

FUNCET Fundo Estadual de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

ICT Instituição Científica e Tecnológica

ICTESP Instituição Científica e Tecnológica do Estado de São Paulo

IDSM Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá

IFE Instituição Federal de Ensino Superior

IMPA Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada

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INB Indústrias Nucleares Brasileiras

INVESTE SÃO

PAULO

Agência Paulista de Promoção de Investimentos e Competitividade

IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

IPEN Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares

IPT Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo S.A

MCT Ministério da Ciência e Tecnologia

MCTI Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação

MDIC Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior

MEC Ministério da Educação

MPEG Museu Paraense Emílio Goeldi

NIT Núcleo de Inovação Tecnológica

Nuclep Nuclebrás Equipamentos Pesados

OEA Organização dos Estados Americanos

OCDE Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico

ONU Organização das Nações Unidas

OS Organização Social

OSCIP Organização da Sociedade Civil de Interesse Público

PACTI Plano de Ação de Ciência, Tecnologia e Inovação para o

Desenvolvimento Nacional

PADCT Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico

PEC Proposta de Emenda Constitucional

PDP Política de Desenvolvimento Produtivo

PDP Parceria para o Desenvolvimento Produtivo

P,D&I Pesquisa, desenvolvimento e inovação

PETROBRAS Petróleo Brasileiro S.A.

PIB Produto Interno Bruto

PITCE Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior

Pintec Pesquisa de Inovação Tecnológica

PL Projeto de lei

PLS Projeto de Lei do Senado

PND Programa Nacional de Desestatização

P&D Pesquisa e desenvolvimento

RHAE Programa de Formação de Recursos Humanos para Áreas

Estratégicas

RNP Rede Nacional de Ensino e Pesquisa

RPCITec Rede Paulista de Centros de Inovação Tecnológica

RPITec Rede Paulista de Incubadoras de Empresas de Base Tecnológica

RPNIT Rede Paulista de Núcleos de Inovação de Inovação Tecnológica

SBDC Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência

SBPC Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência

SIBRATEC Sistema Brasileiro de Tecnologia

SPAI Sistema Paulista de Ambientes de Inovação

SPE Sociedade de propósito específico

SPTec Sistema Paulista de Parques Tecnológicos

TRIPS Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual Property

Rights

TCU Tribunal de Contas da União

UNESP Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho

UNICAMP Universidade Estadual de Campinas

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USP Universidade de São Paulo

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 14

1.Delimitação do objeto ............................................................................................................ 14

2.Relevância e atualidade do debate ......................................................................................... 14

3.Metodologia a ser usada ........................................................................................................ 16

PARTE I – CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES .............................................................. 18

1 ORIGEM, USO DO TERMO FOMENTO, RAZÕES E CONSEQUÊNCIAS DA

ESCASSA EXPLORAÇÃO DO TEMA ............................................................................. 18

2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA ................................................................................................... 25

3 NOÇÃO DO FOMENTO PÚBLICO .................................................................................... 31

4 DISTINÇÕES ENTRE FOMENTO PÚBLICO, SERVIÇO PÚBLICO E PODER DE

POLÍCIA................................................................................................................................ 39

5 CLASSIFICAÇÃO DOS MEIOS DE FOMENTO ............................................................... 45

5.1 Meios de fomento segundo a forma de atuação sobre a vontade dos sujeitos fomentados:

classificação tradicional e sua crítica .................................................................................... 45

5.2 Meios de fomento segundo o tipo de vantagens outorgadas: classificação tradicional e sua

crítica..................................................................................................................................... 46

5.3 Meios de fomento segundo os fins a alcançar ................................................................... 51

5.4 Classificação do fomento segundo os tipos de ponderação e seus destinatários ............... 51

PARTE II – O FOMENTO PÚBLICO À INOVAÇÃO TECNOLÓGICA NO DIREITO

BRASILEIRO ........................................................................................................................ 53

6. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988, A CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO

PAULO DE 1989 E O FOMENTO PÚBLICO À INOVAÇÃO TECNOLÓGICA ............. 53

6.1 O dever constitucional do Estado de promover e incentivar o desenvolvimento científico,

a pesquisa e a capacitação tecnológicas ................................................................................ 61

6.2 Competências dos entes federativos para a promoção de medidas de fomento à inovação

tecnológica ............................................................................................................................ 67

6.3 Ciência, tecnologia, pesquisa, capacitação e autonomia tecnológicas .............................. 69

6.4 Inovação tecnológica ......................................................................................................... 75

7 A IMPORTÂNCIA DA ATUAÇÃO PÚBLICA FOMENTADORA À INOVAÇÃO

TECNOLÓGICA ................................................................................................................... 88

7.1 Os indicadores nacionais de inovação ............................................................................... 93

7.2 Os indicadores paulistas de inovação ................................................................................ 94

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8 SISTEMAS DE INOVAÇÃO ............................................................................................... 99

9 A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA CONCERTADA E A INOVAÇÃO TECNOLÓGICA

............................................................................................................................................. 111

10 O ESTÍMULO À CONSTRUÇÃO DE AMBIENTES ESPECIALIZADOS E

COOPERATIVOS DE INOVAÇÃO À LUZ DA LEI FEDERAL Nº 10.973/2004 E DA

LEI COMPLEMENTAR PAULISTA Nº 1.049/2008 ........................................................ 125

10.1 Alianças estratégicas e projetos de cooperação ............................................................. 130

10.2 Redes e projetos internacionais de pesquisa, incubadoras e parques tecnológicos ....... 138

10.2.1 Redes e projetos internacionais de pesquisa tecnológica ............................................ 138

10.2.2 Incubadoras .................................................................................................................. 141

10.2.3 Parques tecnológicos ................................................................................................... 150

10.2.4 Fundações de apoio ..................................................................................................... 164

10.3 Compartilhamento e permissão de utilização de laboratórios, equipamentos,

instrumentos, materiais e instalações de Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs) ... 171

10.4 Participação minoritária do Poder Público no capital de empresa privada.................... 180

10.5 Acordos de parceria com Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs) ..................... 189

11 PARÂMETROS PARA FORMULAÇÃO E CONCESSÃO DO FOMENTO PÚBLICO À

INOVAÇÃO TECNOLÓGICA........................................................................................... 192

11.1 O fomento público e o princípio da legalidade .............................................................. 193

11.2 A necessária vinculação do fomento público à inovação tecnológica ao planejamento

científico e tecnológico ....................................................................................................... 194

11.3 O fomento público e os princípios da igualdade e da livre concorrência ...................... 198

11.4 O fomento público, a subsidiariedade e o compartilhamento de riscos ........................ 203

11.5 O fomento público à inovação tecnológica motivado, transparente e controlado ......... 206

PARTE III - CONCLUSÃO ................................................................................................... 215

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 219

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INTRODUÇÃO

Há um consenso nos dias de hoje sobre o papel central que a inovação deve ter na

economia.

Reconhece-se que países que inovam são mais produtivos, têm economias mais

eficientes e competitivas, obtendo maiores ganhos no comércio internacional. Empresas

inovadoras, de igual modo, costumam ter melhor desempenho, exportar mais e pagar

melhores salários.1

A inovação, todavia, não costuma surgir espontaneamente – ela exige a assunção de

riscos, a realização de investimentos vultosos, impondo àqueles que a perseguem, não raras

vezes, enormes fracassos.

Em razão da necessidade premente de fazer o País inovar, o fomento público à inovação

tecnológica vem despertando o crescente interesse de formuladores de políticas públicas e do

setor empresarial, exigindo, também cada vez mais, maior atenção por parte dos estudiosos do

Direito Administrativo.

1. Delimitação do objeto

O presente trabalho objetiva analisar o fomento público à inovação tecnológica no

Direito Brasileiro e, em especial, o estímulo à construção de ambientes especializados e

cooperativos de inovação à luz da Lei Federal nº 10.973/2004 e da Lei Complementar Paulista

nº 1.049/2008, assim como os principais parâmetros para o exercício da função pública

promocional.

2. Relevância e atualidade do debate

Somente em 2011 os dispêndios em atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D)

no Estado de São Paulo, realizados pelos governos federal e estadual e por empresas do setor

privado foram de R$ 21,8 bilhões, correspondendo a 1,61% do Produto Interno Bruto (PIB)

do Estado. No Brasil, o valor atingiu R$ 47,2 bilhões ou 1,14% do PIB do País.2

Nos dias atuais, defende-se a ampliação de investimentos públicos e de estímulos aos

investimentos do setor privado em atividades de P&D, a fim de que o investimento total

1 Imperativo da inovação. Folha de São Paulo, São Paulo, 05 dez. 2013. Opinião, p. A2.

2 PEDROSA, Renato H. L.; CRUZ, Carlos Henrique de Brito. Dispêndios em P&D em São Paulo atingiram R$

21,8 bilhões em 2011 e parcela do PIB chegou a 1,61%. No Brasil, somaram R$ 47,2 bilhões, ou 1,14% do

PIB. Boletim Indicadores FAPESP de Ciência, Tecnologia e Inovação, São Paulo, n. 4, p. 1-4, maio, 2014,

p.1.

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brasileiro na área possa alcançar, o mais rapidamente possível, patamares mais próximos dos

padrões dos países desenvolvidos.3

A grandiosidade dos indicadores econômicos citados demonstra, por si só, a

necessidade de expansão da matéria para além dos estudos de economistas, administradores,

engenheiros e sociólogos.

É fato que a inovação costuma exigir investimentos de alta monta. Todavia, ela exige

mais do que isto, estando diretamente relacionada à robustez do sistema de inovação4

existente, à sua capacidade de articulação com o processo produtivo e o setor empresarial.

Vale dizer, ela depende do quadro jurídico-institucional vigente, na medida em que este pode

favorecer, ou não, as condições para o investimento produtivo e inovador.5

Objetivando incentivar o desenvolvimento da inovação no País têm sido criadas

iniciativas como o Movimento Brasil Competitivo6 e a Mobilização Empresarial pela

Inovação,7 assim como estimulados debates em torno da necessidade de mudanças no vigente

arcabouço legal atinente à matéria.

Nesse sentido, a atualidade do tema pode ser corroborada pelas discussões relacionadas

à proposta de instituição de um código nacional de ciência, tecnologia e inovação (C,T&I).

Encontra-se, de igual sorte, em tramitação, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº

290/2013, que busca atualizar o tratamento das atividades de C,T&I.8

3 Conforme a Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (ENCTI) 2012-2015, no ano de 2011, o

dispêndio brasileiro em atividades de P&D era inferior aos de todos os países avançados, aos de outros

membros dos BRICs e aos de outras economias de menor dimensão, como a Itália, Espanha, Coreia, Portugal e

Cingapura. (MINISTÉRIO DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Estratégia Nacional de Ciência,

Tecnologia e Inovação 2012-2015 – Balanço das atividades estruturantes 2011. Brasília: MCTI, 2012, p. 45). 4 Conforme explica Gilberto Bercovici, fala-se em “sistemas de inovação” ao se referir às condições

institucionais e jurídicas complexas necessárias à inovação. (BERCOVICI, Gilberto. Ciência e inovação sob a

Constituição de 1988. Revista dos Tribunais, São Paulo, n. 916, p 267-295, fev. 2012, p.289). 5 PORTO, Claudio; GIAMBIAGI, Fabio; BELFORT-SANTOS, Andréa. O Brasil em transição: panorama atual

e tendências futuras 2011-2022. In: GIAMBIAGI, Fábio; PORTO, Claudio (Org.). 2022: Propostas para um

Brasil melhor no ano do bicentenário. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011, p. 3-33, p. 13. 6 Criado em novembro de 2001, o Movimento Brasil Competitivo é reconhecido como uma Organização da

Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), que busca contribuir para a melhoria da qualidade de vida da

população brasileira, por meio do aumento da competitividade do país. Disponível em:

<http://www.mbc.org.br/mbc/novo/index.php?option=conteudo&Itemid=20&Itemid=20. Acesso em: 07 ago.

2014. 7 A Mobilização Empresarial pela Inovação surgiu em 2008 com o propósito de reforçar o desenvolvimento

científico, tecnológico e de inovação no País e de mudar o foco do mundo empresarial. Tem por objetivo

incorporar e aprimorar a gestão da inovação nas empresas brasileiras, além de ampliar os instrumentos

públicos que buscam a inovação no país. Disponível em: <http://www.inovacaonaindustria.com.br/portal/mei.

Acesso: em 07 ago. 2014. 8 A proposta do aludido código originou-se na própria comunidade científica, por meio do Fórum de Secretários

de Ciência e Tecnologia, de fóruns de fundações de apoio à pesquisa, com o apoio da Sociedade Brasileira para

o Progresso da Ciência (SBPC) e da Academia Brasileira de Ciências (ABC). Foram criados dois projetos de

lei: no Senado, o Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 619/11, de autoria do senador Eduardo Braga (PMDB-

AM); e, na Câmara, o Projeto de Lei (PL) nº 2.177/11, de autoria do Deputado Bruno Araújo (PSDB-PE). O

PLS nº 619/11 aguarda parecer da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática,

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Apesar de o fomento à inovação tecnológica estar intrinsecamente relacionado à atuação

do Estado, compreendendo matérias, dentre outras, pertinentes à concessão de subvenções e

benefícios fiscais, à celebração de licitações, contratações públicas e parcerias e colaborações

entre os setores público e privado, são bastante escassos os trabalhos do Direito

Administrativo sobre o assunto.

Em verdade, abordar inovação tecnológica no meio acadêmico jurídico não é algo usual.

A inovação e, em especial, a inovação tecnológica, envolve complexos e numerosos

aspectos multidisciplinares,9 aos quais a área jurídica não está habituada, o que, talvez, ajude

a explicar o porquê do distanciamento entre os estudiosos e operadores do Direito e os

estudiosos e operadores da inovação.

Espera-se demonstrar que os desafios impostos cotidianamente pela inovação

tecnológica estão a exigir, mais do que uma mera aproximação, um efetivo e urgente

estreitamento de laços com o Direito Administrativo, tarefa certamente instigante, por todos

os motivos expostos e que, certamente, muito poderá contribuir para o avanço do

desenvolvimento nacional.

3. Metodologia a ser usada

Não obstante a multidisciplinaridade do tema proposto, o enfoque da presente

dissertação será jurídico, dogmático, construído a partir do vigente direito positivado

brasileiro.10-11

tendo sido analisado pelas Comissões de Constituição, Justiça e Cidadania e de Assuntos Econômicos. Por sua

vez, o PL nº 2.177/11 foi aprovado pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados, aguardando apreciação

pelo Plenário. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/noticias/Jornal/emdiscussao/inovacao/projeto-de-lei-

codigo-ciencia-tecnologia-e-inovacao.aspx. Acesso em: 02 ago. 2014. A PEC 290/2013 foi aprovada na

Câmara dos Deputados, em segundo turno, por unanimidade, tendo seguido para a apreciação pelo Senado.

Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=586251. Acesso

em: 01 ago. 2014. 9 Nesse sentido, pondera Glauco Arbix que a compreensão dos mecanismos mais sutis da inovação exige intenso

tratamento multidisciplinar: “Como processo, é alimentada – e se alimenta – de insumos originados em

diversas áreas; como produto, provoca impactos em campos distintos. Seus determinantes profundos fincam

raízes em distintas esferas da vida social; e o seu desenvolvimento se desdobra em múltiplas dimensões.

Estudos recentes em países avançados mostram que se trata de um processo essencialmente colaborativo e

comunicativo, fruto de um fluxo contínuo de informação entre empresários, engenheiros, cientistas e usuários,

mas também entre instituições que facilitam – ou dificultam – a interação com o seu entorno produtivo e o

ambiente social.” (ARBIX, Glauco. Inovar ou inovar: a indústria brasileira entre o passado e o futuro. São

Paulo: Papagaio, 2007. p. 30). 10

Sobre o enfoque dogmático, ensina Ricardo Marcondes Martins que há duas formas de se proceder à

investigação de um problema: ou ressaltando o aspecto pergunta, ou ressaltando o aspecto resposta. Se o

aspecto pergunta é acentuado, os conceitos básicos, as premissas, os princípios ficam abertos à dúvida. Se o

aspecto resposta é acentuado, por sua vez, determinados elementos são, de antemão, subtraídos à dúvida.

Zetética vem de zetein e significa perquirir, saber o que é uma coisa. Dogmática vem de dokein e significa

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17

As abordagens não jurídicas, apesar de relevantes, terão natureza complementar, com o

propósito de melhor elucidar as variadas interfaces do assunto.

O estudo será realizado com base em análise normativa e doutrinária.

Sempre que possível, será efetuado exame de jurisprudência, sendo de todo oportuno

esclarecer, desde logo, que, em razão, provavelmente, da Lei Federal nº 10.973/2004 e da Lei

Complementar Paulista nº 1.049/2008 estarem em vigor há pouco tempo, ter havido a

identificação de poucos julgados relacionados à pesquisa.

O trabalho versará, na Parte I, sobre a origem, o uso da palavra fomento, as possíveis

razões e consequências da escassa exploração do tema; a evolução histórica e a noção do

fomento público; suas distinções em relação ao serviço público e ao poder de polícia, assim

como a classificação de seus meios.

Na Parte II, o trabalho analisará a relação entre as vigentes Constituições Federal e

Paulista e o fomento público à inovação tecnológica. Para uma melhor contextualização do

assunto, serão tecidas considerações sobre as noções de ciência, tecnologia, pesquisa,

capacitação, autonomia e inovação tecnológicas. Serão abordados a importância da atuação

pública fomentadora à C,T&I, assim como os sistemas de inovação, incluindo alguns

indicadores nacionais e paulistas. Serão, ainda, investigados os instrumentos previstos na Lei

Federal nº 10.973/2004 e na Lei Complementar Paulista nº 1.049/2008 para o estímulo à

construção de ambientes especializados e cooperativos de inovação, quais sejam as alianças

estratégicas e os projetos de cooperação; as redes de pesquisa; as incubadoras; os parques

tecnológicos; o compartilhamento e a permissão de utilização de laboratórios, equipamentos,

instrumentos, materiais e instalações de Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs), a

participação minoritária do Poder Público no capital de empresa privada e os acordos de

parceria. Por fim, serão estudados os principais parâmetros para a legítima utilização dos

instrumentos da ação promocional pública.

A conclusão será, finalmente, apresentada na Parte III.

ensinar, doutrinar, possibilitar uma decisão e orientar uma ação. O enfoque da Ciência do Direito é sempre

dogmático, pois alguns conceitos são tomados como indiscutíveis, dentre eles, por exemplo, a supremacia da

Constituição num sistema que adota o modelo constitucionalista, tal como o sistema jurídico brasileiro.

(PIRES, Luis Manuel Fonseca; MARTINS, Ricardo Marcondes. Um diálogo sobre a justiça: a justiça

arquetípica e a justiça deôntica. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 48-49). 11

Segundo José Rodrigo Rodriguez, a dogmática jurídica vem sendo tratada como o inimigo a ser combatido

pelos agentes modernizadores das instituições, sejam eles pesquisadores ou agentes públicos. O pensamento

dogmático, equivocadamente, tem sido estigmatizado como o principal responsável pelo atraso das instituições

latino-americanas em relação ao centro do capitalismo, sendo necessário revalorizá-lo, incorporando-o ao

debate sobre o desenvolvimento (RODRIGUEZ, José Rodrigo. Dogmática jurídica e desenvolvimento. In:

RODRIGUEZ, José Rodrigo (Org.) Fragmentos para um dicionário crítico de direito e desenvolvimento. São

Paulo: Saraiva, 2011, p. 128-148, p. 128).

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18

PARTE I – CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

1 ORIGEM, USO DO TERMO FOMENTO, RAZÕES E CONSEQUÊNCIAS DA

ESCASSA EXPLORAÇÃO DO TEMA

Foi o espanhol Luis Jordana de Pozas quem, em meados do século XX, reivindicou para

o termo fomento um significado técnico concreto, caracterizando-o, ao lado do poder de

polícia e do serviço público, como uma das atividades administrativas destinadas à satisfação

de necessidades públicas.12

Até então, na Europa continental, distinguia-se exclusivamente entre atividade de

ordenação ou limitação, por um lado, e prestação de serviço público, por outro, tendo essa

formulação tripartite constituído uma novidade.13

De fato, o estudo formulado por Jordana de Pozas sistematizou, com originalidade, a

ação promocional, não mais como um fim em si mesmo do Estado, contribuindo

sobremaneira para a atual concepção da atividade administrativa de fomento.14

Segundo a tradição administrativa, o fomento é a ação consistente em proteger,

estimular, auxiliar ou fomentar atividades particulares mediante as quais se satisfazem

necessidades ou conveniências de caráter geral.15

A palavra fomento origina-se do latim fomentum, contração de fovimentum, que

significa aquecer, acalentar ou abrigar. No idioma espanhol, em sentido denotativo, significa

dar calor para vivificar, vigorar e, em sentido figurado, estimular, promover ou proteger algo.

Trata-se de uma só palavra que consegue reunir uma rica variedade de formas, tais como

promover, ajudar, auxiliar, proteger, melhorar, desenvolver, estimular, premiar etc.16

Na língua portuguesa fomentar significa, dentre outras acepções, cercar de cuidados

para criar ou fazer crescer, estimular; promover os meios para o desenvolvimento de (algo),

estimular, promover, desenvolver.17-18

12

MALJAR, Daniel Edgardo. Intervencion del Estado en la prestacion de servicios publicos. Buenos Aires:

Hammurabi, 1998, p. 276. 13

DE LA RIVA, Ignacio M. La figura del fomento: necesidad de encarar una revisión conceptual. In: Servicio

público, polícia y fomento: jornadas organizadas por la Universidad Austral Facultad de Derecho. Buenos

Aires: Rap, 2003. p. 413-422, p. 413. 14

HIGA, Alberto Kenji. A construção do conceito da atividade de fomento. Revista Direito Mackenzie. São

Paulo, v.5, n. 1, p.10-36, 2011, p.12. 15

JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo. Revista de

Estudios Politicos, n. 48, p. 41-54, 1949, p. 49. 16

JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo. Revista de

Estudios Politicos, n. 48, p. 41-54, 1949, p. 49. 17

FOMENTAR. In: DICIONÁRIO Houaiss da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004, p. 1.367. 18

Quanto ao uso das palavras na língua portuguesa, Ricardo Marcondes Martins observa: “Pertencem ao

vernáculo, nos termos da Lei nº 5.765/1971, todos os registros constantes do Vocabulário Ortográfico da

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19

A ideia geral do fomento público, ou seja, aquele realizado pela Administração

Pública,19

pelo menos a princípio, não é difícil de indicar: “trata-se de auxiliar o

desenvolvimento e o exercício de uma atividade privada, que se supõe de interesse público,

com meios públicos”.20

Apesar de haver elementos comuns entre as diversas noções sobre o fomento público,

existem divergências doutrinárias a respeito da utilização do termo “fomento”.

Enquanto alguns autores dão preferência para o uso de expressões como “ajudas

públicas” ou “recompensas públicas”, outros preferem, ainda, falar em “estímulos

positivos”.21

Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras” (Regulação administrativa à luz da

constituição federal. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 268). A palavra “fomentar” consta do Vocabulário em

questão, não sendo um neologismo. 19

Salienta José Vicente Santos de Mendonça que mesmo as entidades integrantes da Administração Pública

dotadas de personalidade jurídica de direito privado realizam fomento público. Ressalta que, no Brasil, o

Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a Petróleo Brasileiro S.A (Petrobras) e a

Caixa Econômica Federal S.A. são, em volume de recursos, as maiores entidades fomentadoras da

Administração Federal (Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento público democrático,

eficiente e não-paternalista. Revista de Direito Processual Geral, Rio de Janeiro, n. 65, p. 115-176, 2010, p.

118) 20

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento

público democrático, eficiente e não-paternalista. Revista de Direito Processual Geral, Rio de Janeiro, n. 65,

p. 115-176, 2010, p. 118. 21

Destacando a polêmica acerca da denominação “fomento”, José Vicente Santos de Mendonça esclarece:

“Afirma-se que a palavra “fomento” já carrearia uma escolha, ainda que implícita, por uma das possíveis

definições para o instituto: a que destaca a importância da persuasividade como elemento definitório central da

atuação. Em substituição, alguns autores propõem ‘atividade administrativa dispensadora de ajudas e

recompensas” ou, apenas ‘ajudas públicas’. Reconhecemos que tais autores possuem razão em suas críticas, e,

até, que as denominações alternativas são melhores do que o tradicional ‘fomento’. Só que vamos ficar com

‘fomento’ mesmo, pela consagração do termo e facilidade na comunicação da ideia. Se a questão fosse maior

do que a da evitação de sutilezas, talvez os novos termos vencessem a inércia em favor da denominação

clássica – mas não é o caso” (Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento público

democrático, eficiente e não-paternalista. Revista de Direito Processual Geral, Rio de Janeiro, n. 65, p. 115-

176, 2010, p. 118). Segundo Ricardo Rivero Ortega: “Ante la vaguedad del término fomento, parte de nuestra

doctrina propone, como sucede con la policía, una reconsideración conceptual, sustituyendo la vieja idea por

otra más expressiva y circunscrita a la concreta actividad de ayuda y recompensa de la iniciativa privada. Esta

propuesta es plausible, pues permite hacer énfasis en aquellas herramientas jurídicas más características del

fomento (destacadamente, las subvenciones y otras ayudas económicas) cuya incidencia sobre el

funcionamiento de los mercados, que pueden perturbar, es más que notable.” (Derecho Administrativo

Económico. 6. ed. Buenos Aires: Marcial Pons, 2013, p. 166). Também para Ignacio M. De La Riva, “[...] para

dotar a la figura de un perfil jurídico consistente es preciso abandonar la finalidad (de promoción o protección)

y la técnica (persuasiva) como elementos definitorios y pasar a prestar atención a la constitución estructural del

concepto. Esta intuición de poner el acento en la estructura interna de la figura como camino metodológico

para alcanzar su consolidación definitiva ha sido enunciada por um sector de la doctrina española, encabezado

por Martinez López-Muñiz y por Fernández Farreres, cada uno con matices próprios. El primero de dichos

autores es quien postula, además, el abandono de la voz fomento – dada su irremediable connotación

teleológica – y su sustitución por la de ayudas públicas, expresión esta última que, por cierto, ya resultaba de

uso frequente en las normas y em la doctrina europeas.” (DE LA RIVA, Ignacio M. La figura del fomento:

necesidad de encarar una revisión conceptual. In: Servicio público, polícia y fomento: jornadas organizadas por

la Universidad Austral Facultad de Derecho. Buenos Aires: Rap, 2003, p. 413-422, p. 417). De acordo com

Marcos Juruena Villela Souto, a expressão “estímulos positivos” é bem mais ampla que a de fomento, nela

abrangida. O fomento, a seu entender, seria um incentivo ao desempenho de determinada função de interesse

do agente fomentador e o estímulo positivo, a criação de um cenário favorável aos investimentos. (SOUTO,

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20

Neste trabalho, opta-se pela utilização da expressão “fomento público” porque, além

dele constar, de forma literal, no texto constitucional (é bem verdade que o texto

constitucional menciona outras expressões, tais como “incentivo” e “estímulo”), possui um

sentido bastante amplo, que comporta variadas formas de apoio. Além disso, “fomento

público” é a expressão consagrada nas áreas da C,T&I, ao contrário das expressões “ajudas

públicas”, “recompensas públicas” e “estímulos positivos.”

Não obstante as divergências de nomenclatura, o fomento é um instituto, sem dúvida

alguma, consagrado pelo direito positivo pátrio.

Nessa senda, a Constituição Brasileira, em seu artigo 3º, elege, dentre outros, como

objetivos fundamentais da República, garantir o desenvolvimento nacional, além de reduzir as

desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos.

Dispõe, ainda, em seu artigo 174, que o Estado, enquanto agente normativo e regulador

da atividade econômica, exercerá, na forma da lei, além das funções de fiscalização e

planejamento, a função de incentivo.22

A figura do Estado fomentador, portanto, encontra guarida na Lei Maior.

Ademais, tanto a Constituição Federal como a Constituição do Estado de São Paulo,

apesar de não aludirem de modo textual à palavra “inovação”, prescrevem, respectivamente,

em seus artigos 218 e seguintes e 268 e seguintes, o dever específico de o Estado promover e

incentivar o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas; de apoiar a

formação de recursos humanos nas áreas de ciência, pesquisa e tecnologia, assim como de

estimular as empresas que invistam em pesquisa, criação de tecnologia adequada ao País,

formação e aperfeiçoamento de seus recursos humanos. Não há como negar o alto potencial

de vinculação dessas atividades à inovação.

No plano infraconstitucional, o fomento público à inovação tecnológica vem recebendo,

cada vez mais, merecido destaque, conforme se demonstrará adiante, na Parte II, deste

trabalho.

Não obstante isso, a ação administrativa de fomento tem sido examinada

superficialmente, sem se dedicar maior atenção à sua singularidade e à caracterização dos atos

Marcos Juruena Villela Souto. Estímulos positivos. In: CARDOZO, José Eduardo Martins; QUEIROZ, João

Eduardo Lopes; SANTOS, Márcia Walquiria Batista dos. (Coord.). Direito administrativo econômico. São

Paulo: Atlas, 2011, p. 741-769, p. 741). 22

Confira-se: “Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na

forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor

público e indicativo para o setor privado”.

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21

pelos quais se efetiva, ao contrário, do poder de polícia e do serviço público, que têm sido

objeto de múltiplos estudos.23

José Vicente Santos de Mendonça, a esse propósito, constata que o fomento não é um

dos campeões de audiência nas monografias e nas teses de Direito. Explica que características

próprias da atividade, como a voluntariedade e a discricionariedade, fizeram e fazem com que

a sua plena juridicização seja longa e difícil, enfatizando: “O Direito tradicional, acostumado

a lidar com obrigações, deveres e sanções negativas, mostra-se pouco à vontade com situações

em que tais elementos não aparecem de modo evidente”.24

Nessa mesma vereda, Rafael Munhoz de Mello anota que, entre os modos de

intervenção estatal na ordem econômica, o fomento é o que recebe menos atenção da

doutrina, apesar de sua importância econômica e de sua ampla utilização nas mais variadas

esferas da Administração Pública. Esclarece que esse desinteresse tem reflexo na

jurisprudência, que registra pouquíssimos casos em que o tema foi enfrentado com

profundidade.25

Célia Cunha Mello, após alertar para o fato de a experiência jurídica em matéria de

fomento público ser bastante reduzida, também sublinha que a jurisprudência é quase

inexistente, destacando, ademais, que tanto no Brasil como no exterior a legislação existente

vem sendo constituída de forma aleatória, sem tratamento normativo sistematizado, podendo

o injustificado desinteresse para com o tema comprometer o próprio desenvolvimento

socioeconômico do País.26

Em estudo acerca da contratação de fomento, Marçal Justen Filho e Eduardo Ferreira

Jordão refletem que a escassa exploração do tema, no Brasil, tende a produzir uma de duas

consequências negativas: “ou leva à subutilização da valiosa técnica consensual para o

fomento de atividades de relevante interesse coletivo ou faz com que estas contratações sejam

utilizadas em situações que não as autorizam”.27

23

JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo. Revista de

Estudios Politicos, n. 48, p. 41-54, 1949, p. 43. 24

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento

público democrático, eficiente e não-paternalista. Revista de Direito Processual Geral, Rio de Janeiro, n. 65,

p. 115-176, 2010, p. 121. 25

MELLO, Rafael Munhoz de. Atividades de fomento e o princípio da isonomia. In: SPARAPANI, Priscilia;

ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social: homenagem

ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 263-285, p.263. 26

MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. xii. 27

JUSTEN FILHO, Marçal; JORDÃO, Eduardo Ferreira. A contratação administrativa destinada ao fomento de

atividades privadas de interesse coletivo. Revista Brasileira de Direito Público – RBDP, Belo Horizonte, ano

9, n. 34, p. 47-72, jul./set. 2011, p. 49.

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22

Também para Floriano Peixoto de Azevedo Marques Neto, o fomento, apesar de ser

uma forma de intervenção estatal no domínio econômico muito polêmica, é a forma menos

estudada pelos especialistas. Ressalta que a atividade estatal de fomento envolve a busca de

uma infinidade de objetivos e prevê sua veiculação por outro sem número de instrumentos,

pressupondo um campo inesgotável de alternativas e soluções, tão variadas quanto múltiplos

são os seus móveis.28

Merece, porém, destaque o estudo de Norberto Bobbio sobre o tema do fomento, e mais

especificamente, da função promocional do Direito e das sanções positivas.

Segundo Bobbio o fomento está relacionado à função social do Direito, tema que nunca

recebeu muita atenção. O escasso interesse pela função social do Direito na teoria geral do

direito dominante estaria associado ao relevo que os grandes teóricos, de Jhering a Kelsen,

deram ao Direito como instrumento específico, cuja especificidade não deriva dos fins a que

serve, mas do modo pelo qual os fins, quaisquer que sejam, são perseguidos e alcançados.29

O diagnóstico, enfim, tanto de autores brasileiros, como de autores estrangeiros, é de

que o tratamento doutrinário (e, também, o jurisprudencial) atribuído ao tema, por várias

razões, não tem sido proporcional à sua relevância política, econômica e social.

O fomento público, outrossim, vem sendo apontado como a atividade administrativa

mais resistente ao influxo do Direito, arrolando, Ignacio M. De La Riva, cinco causas para tal

situação: a) a problemática jurídica vai além do binômio autoridade-liberdade que tipifica,

normalmente, o conflito que se enfrenta no Direito Público. Sendo a atividade de

favorecimento, a dificuldade está em assegurar que o benefício concedido a uns não ocorra

em detrimento àquilo que, justamente, corresponda aos demais; b) no fomento, a linha

demarcatória entre o jurídico e o meta-jurídico não é tão clara, sobressaindo-se os aspectos

não jurídicos, como os políticos e econômicos; c) isto cria, no fomento, um amplo espaço para

a discricionariedade, terreno este que, por muito tempo, ficou livre de ataduras jurídicas; d)

há, também, dificuldades metodológicas: no fomento confluem diversos ramos do Direito

(constitucional, concorrencial, penal, internacional etc.); 5) há na ação promocional uma

28

MARQUES NETO, Floriano Peixoto de Azevedo. O fomento como instrumento de intervenção estatal na

ordem econômica. Revista de Direito Público da Economia- RDPE, Belo Horizonte, ano 8, n. 32, out./dez.

2010. Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/PDI0006.aspx?pdiCntd=70679. Acesso em: 14 jul. 2013.

(documento não paginado). 29

BOBBIO, Norberto. Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. Tradução de Daniela Beccaccia

Versiani. Revisão técnica de Orlando Seixas Bechara, Renata Nagamine. Barueri, SP: Manole, 2007, p. 85. O

autor sustenta que o reconhecimento da importância do direito promocional não é incompatível com a

consideração instrumental do direito, própria da teoria kelseniana. Mesmo depois de se perceber que o direito

não limita a reprimir, mas promove e estimula, continua a afirmar, como faz Kelsen, que o direito é um meio e

não um fim. (p.77).

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23

enorme diversidade de técnicas específicas, marcada por uma dispersão conceitual, fruto, em

boa medida, da ausência de sistematização no ordenamento positivo.30

Nos dias atuais, não há mais espaço para que motivos, tais como os apontados por De

La Riva, justifiquem a resistência do fomento público ao Direito. Ao contrário disso, é sabido

que a maior parte das agendas das sociedades contemporâneas envolve, não raras vezes,

debates que excedem a dicotomia liberdade-autoridade; e que compreendem, ao mesmo

tempo, a tomada de decisões guiadas sobretudo por diretrizes econômicas e políticas. Hoje,

discricionariedade não mais se confunde com arbitrariedade; as pautas político-sociais são

todas multidisciplinares. Não mais se sustenta, portanto, qualquer tentativa de fazer crer que o

fomento público possa estar, por alguma razão, fora do campo de incidência do Direito e,

mais especificamente, dos princípios do regime jurídico administrativo. De igual forma, a

resistência do Direito em analisar o tema de forma mais sistemática também não pode mais

ser admitida.

Felizmente, a situação de escassa juridicização da atividade de fomento tem sido

revertida, podendo ser citado como um caso paradigmático deste fenômeno o da Comunidade

Europeia, em que a regulação da matéria passou a ser peça relevante do sistema,

imprescindível à concretização da aspiração de formação de um mercado comum.31

No Brasil, a Lei Federal nº 10.973, de 2 de dezembro de 2004 prescreve diversos meios

e instrumentos de fomento à inovação.

A recente Lei nº 13.019, de 31 de julho de 2014, que estabelece o regime jurídico das

parcerias voluntárias entre a Administração Pública e as organizações da sociedade civil, em

regime de mútua cooperação, define diretrizes para a política de fomento e de colaboração

com organizações da sociedade civil e, ainda, institui o termo de colaboração e o termo de

30

DE LA RIVA, Ignacio M. La figura del fomento: necesidad de encarar una revisión conceptual. In: Servicio

público, polícia y fomento: jornadas organizadas por la Universidad Austral Facultad de Derecho. Buenos

Aires: Rap, 2003, p. 413-422, p. 415. 31

Segundo De La Riva: “La piedra angular del régimen de las ayudas de Estado del Derecho comunitario

europeo reposa sobre el Artículo 87.1 del Tratado de la Comunidad Europea, según el cual ‘salvo que el

presente Tratado disponga otra cosa, serán compatibles (sic) com el mercado común, en la medida en que

afecten a los intercambios comerciales entre Estados miembro, las ayudas otorgadas por los Estados o

mediante fondos estatales, bajo cualquier forma, que falseen o amenacen falsear la competencia, favoreciendo

a determinadas empresas o producciones.’ Los apartados 2 y 3 del mismo precepto introducen excepciones a la

regla antedicha, mientras que los Artículos 88 y 89 del Tratado proporcionan ciertos elementos de naturaleza

adjetiva que completan el régimen. A partir de las disposiciones citadas, lós órganos comunitarios han

elaborado una profusa normativa de desarrollo a través del dictado de numerosas comunicaciones, directrices y

reglamentos que abordan los aspectos más variados de las ayudas de Estado. Los tribunales de la propia CEE,

por su parte, han contribuido a consolidar el sistema mediante una prolífica jurisprudencia en la materia.” (DE

LA RIVA, Ignacio M. La figura del fomento: necesidad de encarar una revisión conceptual. In: Servicio

público, polícia y fomento: jornadas organizadas por la Universidad Austral Facultad de Derecho. Buenos

Aires: Rap, 2003, p. 413-422, p). Em tempo, onde o autor consignou “serán compatibles”, leia-se “serán

incompatibles”, conforme assinalado no dispositivo citado.

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fomento, assim como a Lei Federal nº 9.790/1999 e a Lei Federal nº 9.637/1998, que, dentre

outras normas, também objetivam fixar balizamentos para a atuação da Administração

Pública fomentadora.

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25

2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Segundo Dinorá Adelaide Musetti Grotti, as instituições jurídicas estão intimamente

vinculadas às relações dinâmicas entre o Estado e a sociedade, existentes no momento

histórico em que se desenvolvem. As circunstâncias ideológicas, políticas, sociais e

econômicas que vão se apresentando nas distintas épocas e nos distintos países resultam na

transformação das instituições. Nesse sentido, as transformações das instituições jurídicas

devem ser consideradas exigências da realidade, necessárias à sua própria sobrevivência.32

Assim como o serviço público e o poder de polícia, o fomento administrativo é um

instituto multifacetado e dinâmico. A inovação, por sua vez, também envolve uma acepção

móvel, “que acompanha a evolução das sociedades e se desenvolve num invólucro de

incerteza”.33

A evolução do tema fomento público, como não poderia deixar de ser, ocorre conforme

os limites ideológicos da atividade do Estado, bem como de sua intervenção na vida privada e

no domínio econômico, em cada período da história.34-35

Com efeito, consoante Luis Jordana de Pozas, a persuasão exercida pelo governante

sobre o ânimo dos governados, sem o uso da força, existiu em todas as épocas, constituindo

um dos principais capítulos da política.36

Também para Célia Cunha Mello, interferências policiais, aduaneiras, fiscais, entre

outras, sempre existiram, com maior ou menor intensidade, conhecendo a interferência estatal

vários graus.37

Ainda que se possa falar em precedentes da atividade promocional em épocas bastante

remotas, as raízes do fomento, enquanto instrumento de política econômica, remontam aos

séculos XVII e XVIII.38

32

GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. O serviço público e a constituição brasileira de 1988. São Paulo:

Malheiros, 2003, p. 14. 33

ARBIX, Glauco. Inovar ou inovar: a indústria brasileira entre o passado e o futuro. São Paulo: Papagaio,

2007, p. 29. 34

MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 17. 35

A respeito da vinculação entre Estado de Direito e concepção política, Celso Antônio Bandeira de Mello,

invocando as lições de Afonso Rodrigues Queiró, registra: “[...] as bases ideológicas do Direito Administrativo

são as que resultam das fontes inspiradoras do Estado de Direito, e neste se estampa a confluência de duas

vertentes de pensamento: a de Rousseau e a de Montesquieu”. E mais adiante: “[...] o Estado de Direito é

exatamente um modelo de organização social que absorve para o mundo das normas, para o mundo jurídico,

uma concepção política e a traduz em preceitos concebidos expressamente para a montagem de um esquema

de controle do Poder.” (Curso de direito administrativo, 29. ed. rev. ampl. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 48-

49). 36

JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo. Revista de

Estudios Politicos, n. 48, p. 41-54, 1949, p. 47. 37

MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 17.

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26

Segundo Villar Palasí, o emprego das técnicas promocionais, no que se refere, pelo

menos, à construção de obras públicas, já ocorria na Idade Média. Na Espanha, no memorial

da construção da ponte de Zaragoza, de 1336, havia uma súplica de subvenção dirigida ao

Rei. Antes disso, a construção do cais da cidade também havia sido subsidiada. Em Castilla,

costumava-se conceder esporadicamente subvenções para as obras realizadas pelos

Municípios, com recursos de fundos procedentes de multas. Em 1579 e em 1585 receberam

subvenção, respectivamente, a construção do Canal Imperial de Aragão e o projeto de

canalização da Cidade de Toledo.39-40

No século XVI, Pedro de Valencia (1555 a 1620) escrevia sobre “prêmios y apremios”

para aludir aos mecanismos que o Rei possuía a fim de que seus súditos agissem como

convinha, supostamente, ao bem público. Mas são nos escritos da época do despotismo

ilustrado em que surge, positivamente, a função do fomento do Estado em relação a obras de

interesse público. Esta finalidade foi prevista na legislação, com caráter geral,41

desde o início

do século XVIII, tendo o espírito do fomento animado a criação, em 1705, da Real Junta de

Comércio; da Instrução dos Intendentes, ditada por Felipe V, em 1718, e da Nova Ordem dos

Intendentes Corregedores, ditada por Fernando VI, em 1749. Toda a ideologia política do

século XVIII foi favorável a uma intervenção de fomento destinada a combater as causas da

decadência econômica e comercial espanhola.42-43-44

38

SANTAMARIA PASTOR, Juan Alfonso. Princípios de derecho administrativo general. 2. ed. Madrid: Iustel,

2009, v. II, p. 351. 39

PALASÍ, Villar apud GARRIDO FALLA, Fernando. Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid:

Tecnos. 1992, v. II, p. 301. 40

Em relação ao destaque dado à matéria pelo Direito Espanhol, segundo Juan Carlos Cassagne, “En Francia, la

doctrina no se ha ocupado mayormente de lós diferentes tipos de clasificación de la actividad administrativa,

incluyendo la actividad de fomento dentro del concepto amplio de intervencionismo económico.” (Derecho

administrativo. 7. ed. atual. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2002, t. II, p. 345). No mesmo diapasão, Daniel

Edgardo Maljar observa que a doutrina espanhola tem se ocupado quase exclusivamente da matéria.

(Intervencion del Estado en la prestacion de servicios publicos. Buenos Aires: Hammurabi, 1998, p. 270). A

noção de fomento nasceu na Espanha, país que até hoje possui um Ministério do Fomento. (MENDONÇA,

José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento público democrático,

eficiente e não-paternalista. Revista de Direito Processual Geral, Rio de Janeiro, n. 65, p. 115-176, 2010, p.

120). 41

Conforme ressalva Santamaría Pastor, uma coisa, todavia, era o fomento como um objetivo geral e outra, as

medidas concretas e específicas que possuíam esta particular natureza. O objetivo geral de fomento, para o

autor, foi perseguido com a adoção de medidas de reforma estrutural (que em si mesmas não eram de

fomento), como o aumento de terras postas para cultivo, a eliminação de alfândegas interiores, a liberdade de

circulação de mercadorias nacionais no interior do reino e uma incipiente política de construção de obras

públicas, principalmente canais e estradas. (Princípios de derecho administrativo general. 2. ed. Madrid:

Iustel, 2009, v. II, p. 351). 42

GARRIDO FALLA, Fernando. Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, v. II, 1992, p.

301-302. 43

Importante ponderar que, no regime absolutista, a própria existência de uma atividade de fomento pode ser

questionada. O Rei incentivava comportamentos, atividades e serviços concedendo vantagens a seus súditos.

Mas o interesse público aparecia como pretexto, pois o interesse era o do monarca. Tratava-se de uma forma

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27

Todavia, no século XVIII, a concepção da atividade de fomento identificava-se com a

ideia de poder de polícia. A polícia era toda atividade desenvolvida pelo Estado, toda a

atividade que competia ao príncipe. Dividia-se em polícia de bem-estar e polícia de ordem – o

fomento estava vinculado à polícia de bem-estar.45-46

Segundo Fernando Garrido Falla a conexão entre as técnicas de fomento com o Estado

de Direito47

ocorreu efetivamente no século XIX. Na Espanha, no Decreto Real de 30 de maio

absolutista de fomento. (MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del

Rey, 2003, p. 18). 44

De acordo com Santamaría Pastor, na vigência do absolutismo, França e Inglaterra, em primeiro lugar, e

depois, os outros Estados europeus, empreenderam ações tendentes a introduzir mudanças estruturais em seus

sistemas econômicos. Essas mudanças foram impulsionadas pelo mercantilismo, teoria baseada na hipótese de

que a riqueza de um país devia ser medida pela quantidade de metais preciosos em circulação em seu

território. Fazia-se necessário conservar e aumentar ao máximo possível a quantidade de metais e,

consequentemente, fomentar a produção interior, para reduzir as importações, e limitar as compras no exterior

de produtos manufaturados. Visando ao incremento da riqueza que o mercantilismo perseguia, foram

introduzidas mudanças em aspectos básicos da estrutura social, tal como o regime de exploração de terras, a

existência de fronteiras e alfândegas e a rigidez de determinadas atividades econômicas. Tais alterações

constituíram as principais propostas das primeiras teorias econômicas liberais, que começaram a ser postas em

prática pelos monarcas ilustrados já no século XVIII, antes mesmo da Revolução Francesa. (Princípios de

derecho administrativo general. 2. ed. Madrid: Iustel, 2009, v. II, p. 351). 45

MALJAR, Daniel Edgardo. Intervencion del Estado en la prestacion de servicios publicos. Buenos Aires:

Hammurabi, 1998, p. 272. 46

Na esteira de Baena de Alcázar, segundo Célia Cunha Mello, a ideia primitiva de fomento, “aparece

compreendida dentro do Poder de Polícia, utilizado para designar toda atividade que competia ao príncipe. O

Poder de Polícia (ius politiae) era dividido em: Polícia de Ordem (atividade restritiva e proibitiva) e Polícia do

Bem-estar ou da Prosperidade (atividade incentivadora), sendo esta última a idéia que se identifica com a

atividade de fomento. No século XIX, processou-se uma inversão dessa situação, à medida que os critérios

liberais foram amplamente instalados. Isso porque a mentalidade liberal rejeitava o emprego do termo

“polícia”, em face da idéia limitadora e restritiva que nele se encontrava arraigada. Assim, a palavra “fomento”

passou a ser empregada, principalmente, na Espanha, para designar todas as atividades antes incluídas na

polícia. Acrescente-se que o desejo de impulsionar o progresso econômico por meios indiretos aproximava os

ideais liberais das técnicas de fomento, apesar da antipatia pela intervenção estatal. Por isso, Villar Palasí

afirma que o fomento é resultado de amplo critério liberal.” (O fomento da administração pública. Belo

Horizonte: Del Rey, 2003, p. 23-24). 47

Também de acordo com Célia Cunha Mello, a atividade administrativa de fomento só pode ser concebida a

partir do momento em que haja a submissão de toda organização estatal ao ‘império’ da lei. A aparição da

administração personificada (diferenciação entre o Estado e o príncipe) e a primazia da lei surgem, apenas,

com o advento do Estado de Direito (O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p.

18). No mesmo sentido, Alberto Shinji Higa (A construção do conceito da atividade de fomento. Revista

Direito Mackenzie. São Paulo, v.5, n. 1, p.10-36, 2011, p.12). Tais entendimentos corroboram a conhecida

lição de Celso Antônio Bandeira de Mello de que: “O Direito Administrativo nasce com o Estado de Direito .

Nada semelhante àquilo que chamamos de Direito Administrativo existia no período histórico que precede a

submissão do Estado à ordem jurídica. Antes disso, nas relações entre o Poder, encarnado na pessoa do

soberano, e os membros da sociedade, então súditos – e não cidadãos -, vigoravam ideias que bem se

sintetizam em certas máximas clássicas, de todos conhecidas, quais as de que quod principi placuit leges habet

vogorem: ‘o que agrada ao príncipe tem força de lei’. Ou, ainda: ‘o próprio da soberania é impor-se a todos

sem compensação’; ou, mesmo: ‘o rei não pode errar’. O advento do Estado de Direito promoveu profunda

subversão nestas ideias políticas, que eram juridicamente aceitas. Ao afirmar a submissão do Estado, isto é, do

Poder, ao Direito e ao regular a ação dos governantes nas relações com os administrados, fundando, assim, o

Direito Administrativo, este último veio a trazer, em antítese ao período histórico precedente – o do Estado de

Polícia – justamente a disciplina do Poder, sua contenção e a inauguração dos direitos dos, já agora,

administrados – não mais súditos. Em suma: o Direito Administrativo nasce com o Estado de Direito, porque é

o Direito que regula o comportamento da Administração.” (Curso de direito administrativo, 29. ed. rev. ampl.

São Paulo: Malheiros, 2012, p. 47).

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28

de 1817 previa-se a realização de vultosos gastos em benefício da agricultura, artes e

comércio. Em 1832 ocorreu a criação do Ministério do Fomento e, em 1833, seu primeiro

titular, Don Francisco Javier De Burgos, editou a Instrucción a los Subdelegados de Fomento.

Na ideologia de De Burgos a atividade de fomento era uma consequência lógica da nova

postura da Administração Pública frente ao problema da prosperidade nacional. As doutrinas

de laissez faire tinham dado lugar a uma fé na onipresença da Administração, da qual somente

resultariam benefícios.48

Como se nota, a atividade promocional pública está relacionada com a aparição do

moderno Estado Social de Direito que, indo além da simples garantia da ordem pública,

procurava satisfazer a uma série de necessidades e exigências da comunidade de interesse

público. Entendia-se que estas podiam ser adequadamente realizadas por meio da atividade

privada protegida e estimulada pela Administração.49

Com o advento do Estado Social, o uso de técnicas promocionais passou a ser uma

constante na legislação, passando a ser criadas, inclusive, medidas dirigidas a estimular as

atividades econômicas de setores industriais específicos.

Nesses termos, conforme apontado por Santamaría Pastor, transcorrido o primeiro terço

do século XX, o fomento começou a ser empregado de modo sistemático nos países europeus

como elemento básico da política global de desenvolvimento e com tripla finalidade: a) de um

lado, o incremento da produção industrial e agrária, objetivando a criação de riqueza e de

emprego e a reconstrução dos danos ocasionados pelas guerras civis e pela Segunda Guerra

Mundial; b) de outro, o sustento de empresas e setores econômicos de importância estratégica

ou de forte impacto social, porém em fase de declínio ou de baixa produtividade; c) por

último, o estímulo de atividades culturais e sociais e de prestação de serviços sociais,

caracterizados por escassa rentabilidade empresarial.50

Segundo Pastor, na segunda metade do século XX, houve um desenvolvimento sem

precedentes na atividade de fomento: a) a atividade pública de promoção se estendeu à imensa

maioria dos setores econômicos e aos setores cultural e social; causando uma generalização

das medidas de fomento, baseada na hipótese de que tudo que não é negativo tem utilidade

pública e pode ser fomentado; b) as políticas de promoção não cresceram apenas em extensão

material, mas também em intensidade. Por essa razão, em muitos países europeus, diversos

48

GARRIDO FALLA, Fernando. Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, 1992, v. II, p.

302. 49

COMADIRA, Julio Rodolfo; ESCOLA, Héctor Jorge; COMADIRA, Julio Pablo. Curso de derecho

administrativo. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2013, T. I, p. 706. 50

SANTAMARIA PASTOR, Juan Alfonso. Princípios de derecho administrativo general. 2. ed. Madrid: Iustel,

2009, v. II, p. 352-353.

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29

setores econômicos passaram a ser sustentados quase exclusivamente por meio de subvenções

públicas (agricultura, mineração, construção naval, cinema e teatro); c) o incremento das

políticas de fomento teve grande repercussão financeira. Em razão do desordenado

crescimento da atividade de promoção da vida econômica, somado à crise financeira do

Estado Social e ao auge das políticas macroeconômicas neoliberais, houve reação às políticas

promocionais, o que gerou uma crise de legitimidade do instituto.51

Norberto Bobbio evidenciou a importância do fomento para o direito positivo da

segunda metade do século XX, na medida em que este deixou de se circunscrever ao proibir e

ao permitir, passando também a prestigiar o promover e o estimular.52

Em verdade, a adequação da teoria geral do Direito às transformações da sociedade

contemporânea e ao crescimento do Estado Social exige a compreensão da ação promocional

do Estado.

Nesse sentido, segundo Mario Losano, uma teoria do Direito que considere o

ordenamento jurídico apenas do ponto de vista de sua função tradicional puramente protetora

e repressiva é incompleta.53

Conforme Bobbio, o uso frequente de técnicas de encorajamento no Estado

contemporâneo fez surgir o ordenamento jurídico com função promocional, devendo ser

abandonada a imagem tradicional do Direito como ordenamento apenas protetor-repressivo.

No ordenamento jurídico protetivo-repressivo interessam, sobretudo, os comportamentos

socialmente não desejados, sendo o seu fim precípuo impedi-los o máximo possível. No

ordenamento promocional importam, principalmente, os comportamentos socialmente

desejáveis, sendo seu fim levar sua concretização até mesmo aos mais recalcitrantes.54

51

SANTAMARIA PASTOR, Juan Alfonso. Princípios de derecho administrativo general. 2. ed. Madrid: Iustel,

2009, v. II, p. 354. 52

LAFER, Celso. Apresentação à edição brasileira. In: BOBBIO, Norberto. Da estrutura à função: novos estudos

de teoria do direito. Tradução de Daniela Beccaccia Versiani; revisão técnica de Orlando Seixas Bechara, Renata

Nagamine. Barueri, SP: Manole, 2007. p. LII. 53

Para Mário G. Losano, o predomínio da teoria pura do direito teve por efeito que os estudos de teoria geral do

direito foram orientados, por um longo período, mais em direção à análise da estrutura dos ordenamentos

jurídicos do que a análise de sua função: “o positivista Kelsen distanciara-se explicitamente do problema da

função do direito. Os pontos de partida de Hans Kelsen – relativismo ético, irracionalidade dos valores,

neutralidade da ciência – levavam-no a evitar ocupar-se dos fins que o direito pode perseguir: para ele, o direito

é uma técnica para o controle social que persegue o fim que vez por vez a ele é assinalado por quem detém o

poder coercitivo, ou seja, pelo Estado. Conseqüentemente, na progressiva construção de sua teoria pura do

direito, Kelsen concentrara-se cada vez mais na estrutura do ordenamento, ao mesmo tempo em que reduzia ao

mínimo qualquer referência à sua finalidade.” (LOSANO, Mário G. Prefácio. In: BOBBIO, Norberto. Da

estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. Tradução de Daniela Beccaccia Versiani; revisão técnica

de Orlando Seixas Bechara, Renata Nagamine. Barueri, SP: Manole, 2007. p. XLIII). 54

BOBBIO, Norberto. Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. Tradução de Daniela Beccaccia

Versiani; revisão técnica de Orlando Seixas Bechara, Renata Nagamine. Barueri, SP: Manole, 2007, p. 13-15.

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30

Enquanto a técnica das sanções negativas é a mais adequada para exercer a função

protetiva-repressiva (protetiva em relação aos atos conformes e repressiva em relação aos atos

desviantes), a função promocional implica o uso de sanções positivas, que dão vida a uma

técnica de estímulo aos atos considerados socialmente úteis, em lugar da repressão de atos

considerados socialmente nocivos.55

No Brasil, especialmente a partir da década de 1990, os instrumentos e técnicas de

fomento multiplicaram-se, assim como os relatos de abusos cometidos na atividade

promocional pública. Os veículos de comunicação noticiam, frequentemente, a malversação

de recursos e bens públicos por entidades do terceiro setor, fundações de apoio, empresas

privadas etc.

Urge tentar estabelecer, pois, parâmetros para a legítima utilização do fomento público,

afastando-se as práticas que possam resultar na perda de credibilidade por parte da sociedade

em relação à capacidade de promoção de mudanças detida pelo instituto.

A atividade promocional pública é um instrumento com grande potencial transformador

da sociedade e do desenvolvimento do País. Deve ser tratada com máxima seriedade e

transparência, a fim de que os objetivos por ela buscados efetivamente se realizem.

Com efeito, sob a ótica da análise funcional da sociedade, enquanto as medidas de

desencorajamento são usadas predominantemente com o objetivo de conservação social, as

medidas de encorajamento são usadas com o objetivo da mudança.56

O fomento público à inovação tecnológica presta-se a essa mudança, propondo novas

formas de analisar a dicotomia público-privado, assim como novos paradigmas para o debate

sobre empreendedorismo privado inovador e intervenção estatal.

O fomento público à inovação tecnológica, sem dúvida alguma, pode e deve ser

instrumento transformador da capacidade e da autonomia tecnológicas do País, tornando-o

mais competitivo e mais desenvolvido em todas as dimensões.

55

BOBBIO, Norberto. Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. Tradução de Daniela Beccaccia

Versiani; revisão técnica de Orlando Seixas Bechara, Renata Nagamine. Barueri, SP: Manole, 2007. p. 24. 56

BOBBIO, Norberto. Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. Tradução de Daniela Beccaccia

Versiani; revisão técnica de Orlando Seixas Bechara, Renata Nagamine. Barueri, SP: Manole, 2007. p. 19.

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31

3 NOÇÃO57

DO FOMENTO PÚBLICO

Para Jordana de Pozas, a ação de fomento é uma via intermediária entre a inibição e o

intervencionismo do Estado, que pretende conciliar a liberdade com o bem comum, mediante

a influência indireta sobre a vontade do indivíduo, para que queira aquilo que convém à

satisfação da necessidade pública. É a ação da Administração encaminhada a proteger as

atividades, estabelecimentos ou riquezas dos particulares e que satisfazem necessidades

públicas ou se estimam de utilidade geral, sem usar da coação nem criar serviços públicos.58

Fernando Garrido Falla, por sua vez, assinala que o fomento é a atividade administrativa

que se dirige a satisfazer indiretamente certas necessidades consideradas de caráter público,

protegendo ou promovendo, sem empregar coação, as atividades dos particulares ou de outros

entes públicos que diretamente as satisfaçam. Apresenta pequena discrepância comparada à

de Jordana de Pozas: a atividade fomentada não necessita ser privada, podendo ser de outros

entes públicos.59

Também de acordo com Roberto Dromi, o fomento administrativo é uma ação dirigida a

proteger ou promover as atividades ou estabelecimentos dos particulares, que satisfaçam

necessidades públicas e se estimem de utilidade geral. A ideia predominante é que se trata de

uma atividade persuasiva ou de estímulo. A finalidade perseguida é convencer para que se

faça ou não se faça algo. Mediante o fomento, a Administração persegue fins públicos, sem

empregar coação e sem realizar prestações públicas per se.60

A seu ver, assim como para

Garrido Falla, o objeto do fomento são as atividades dos particulares e também as de outros

entes públicos. O fim do fomento é a satisfação indireta de necessidades públicas.61-62

57

A conceituação de um fenômeno pressupõe sua delimitação factual atemporal e permanente, o que não ocorre

quando se trata de estabelecer a sua noção, vez que esta evolui de acordo com as contradições a ela inerentes.

(ARAGÃO, Alexandre Santos de. Direito dos serviços públicos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 73).

Eros Roberto Grau, com fulcro nas lições de Sartre, ensina que “a noção jurídica deve ser definida como idéia

que se desenvolve a si mesma por contradições e superações sucessivas e que é, pois, homogênea ao

desenvolvimento das coisas.” Ministra o autor: “[...] O conceito é atemporal. Pode estudar-se como os

conceitos se engendram uns aos outros no interior de categorias determinadas. Mas nem o tempo, nem, por

consequência, a história podem ser objecto de um conceito (A ordem econômica na Constituição de 1988. 16.

ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 130). 58

JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo. Revista de

Estudios Politicos, n. 48, p. 41-54, 1949, p. 46. 59

GARRIDO FALLA, Fernando. Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, 1992, v. II, p.

300-301. 60

DROMI, Roberto. Derecho administrativo, 6. ed. Buenos Aires: Ediciones Ciudad Argentina, 1997, p. 724. 61

DROMI, Roberto. Derecho administrativo, 6. ed. Buenos Aires: Ediciones Ciudad Argentina, 1997, p. 724. 62

Quanto à possibilidade das atividades de entes públicos também serem objeto de medidas promocionais,

também para Juan Carlos Cassagne, o fomento, por ser uma atividade estatal que amplia os direitos das

pessoas físicas ou jurídicas, é uma técnica que pode ser estendida às entidades estatais (Derecho

administrativo. 7. ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2002, T. II, p. 345).

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32

Gaspar Ariño Ortiz destaca as seguintes características do fomento: a) trata-se de uma

atividade administrativa, uma forma de ação da Administração e um meio de intervenção na

economia; b) com um aspecto negativo: não há uso de coação, nem criação de serviços

públicos. O Estado não manda nem assume diretamente a titularidade da atividade; c) com um

aspecto positivo: o Estado oferece favorecimento, com caráter ampliador da esfera do direito

do particular; d) e caráter teleológico: o fomento se caracteriza pela busca de uma finalidade –

convencer os particulares a promover atividades que se revestem de interesse geral. Portanto,

para Gaspar Ariño Ortiz o fomento é uma atividade de estímulo, realizada de modo não

coativo, sobre os cidadãos e grupos sociais, para imprimir um determinado sentido à sua

atuação. Trata-se de orientar, incentivar ou dissuadir a ação econômica privada.63

Para Héctor Jorge Escola, a atividade administrativa de fomento é a atividade da

Administração Pública que pretende a satisfação de necessidades coletivas64

e a obtenção dos

fins do Estado de maneira indireta e mediata, mediante a participação voluntária dos

particulares, que desenvolvem por eles próprios ações tendentes a esse objeto, protegidas e

estimuladas pela Administração por diversos meios, exceto coação. São, portanto, notas que

caracterizam o fomento: a) é uma atividade administrativa, que deve ser levada a cabo pela

Administração Pública, com o propósito de alcançar finalidades que lhes são próprias; b) tais

finalidades são de interesse público e se referem à satisfação de necessidades coletivas e à

obtenção dos fins do Estado; c) o fomento se encaminha a alcançar esses fins de maneira

indireta e mediata; d) para esse objetivo, a atividade administrativa protege ou promove

atividades particulares, utilizando diversos meios, com exceção da coação; e) os particulares

atuam voluntariamente, aparecendo como colaboradores da Administração. Para Escola, ao

contrário do defendido por Garrido Falla e Roberto Dromi, não se inclui na noção a

possibilidade de ação de fomento destinada a órgãos e entidades administrativos. Isso porque

a ação destes seria delimitada pela sua competência normativamente assinalada. Seu exercício

e cumprimento não seriam apenas uma atribuição, mas um dever legal – o fomento, portanto,

63

ARIÑO ORTIZ, Gaspar. Principios de derecho público económico: modelo de Estado, gestión pública,

regulación económica. Granada: Lael, 2004, p. 345. 64

Eros Roberto Grau ministra que “Interesse coletivo não é interesse social. Este está ligado à coesão social,

aferido no plano do Estado, plano da universalidade. Os interesses coletivos são aferidos no plano da

sociedade civil, expressando particularismos, interesses corporativos” (GRAU, Eros Roberto. A ordem

econômica na Constituição de 1988. 16 ed. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 125). Neste trabalho, as alusões

feitas ao termo ‘necessidades coletivas’ não se afastam do sentido de necessidades e interesses sociais, usando-

se as expressões necessidades coletivas, necessidades sociais e necessidades públicas de forma indistinta.

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33

nessa hipótese, seria doutrinariamente inadmissível, revestindo-se do caráter de uma

colaboração interadministrativa, para obtenção de finalidades comuns.65

Após propor uma reformulação da noção clássica do fomento, incluindo a substituição

do termo “fomento” por “ajudas públicas”,66

Ignacio M. De La Riva registra que são a

concessão de uma série de bens a determinados sujeitos em razão de certas atividades (de

interesse público) a que estão afetados. Este caráter afetado da atuação, que vincula a entrega

de bens pelo Estado a atividades a cargo do beneficiário, constitui, a seu ver, o aspecto

juridicamente configurador da noção.67

No Direito brasileiro, segundo Diogo de Figueiredo Moreira Neto o fomento público é:

a função administrativa através da qual o Estado ou seus delegados

estimulam ou incentivam, direta, imediata e concretamente, a iniciativa dos

administrados ou de outras entidades, públicas ou privadas, para que estas

desempenhem ou estimulem, por seu turno, as atividades que a lei haja

considerado de interesse público para o desenvolvimento integral e

harmonioso da sociedade.68

Sílvio Luís Ferreira da Rocha, por sua vez, registra que a atividade de fomento é a

atividade administrativa que se destina a satisfazer indiretamente certas necessidades

consideradas de caráter público, protegendo ou promovendo as atividades dos particulares,

sem empregar a coação.69

Nos dizeres de José Vicente Santos de Mendonça, o fomento é o resultado de uma

ponderação entre os impulsos interventivos e planejadores do Estado e a proteção ao espaço

65

COMADIRA, Julio Rodolfo; ESCOLA, Héctor Jorge; COMADIRA, Julio Pablo. Curso de derecho

administrativo. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2013, T. I, p. 707. 66

Conforme anteriormente ressaltado, Ignacio M. De La Riva propõe a substituição do termo “fomento” por

“ajudas públicas”. Segundo o posicionamento do autor: “[...] para dotar a la figura de un perfil jurídico

consistente es preciso abandonar la finalidad (de promoción o protección) y la técnica (persuasiva) como

elementos definitorios y pasar a prestar atención a la constitución estructural del concepto. Esta intuición de

poner el acento en la estructura interna de la figura como camino metodológico para alcanzar su consolidación

definitiva ha sido enunciada por un sector de la doctrina española, encabezado por Martinez López-Muñiz y

por Fernández Farreres, cada uno com matices próprios. El primero de dichos autores es quien postula,

además, el abandono de la voz fomento – dada su irremediable connotación teleológica – y su sustitución por

la de ayudas públicas, expresión esta última que, por cierto, ya resultaba de uso frecuente en las normas y en la

doctrina europeas. El elemento distintivo de las ayudas públicas – y también del clásico fomento – es la

coincidencia de los intereses público y privado que se observa. De allí que sea posible que el particular actúe

voluntariamente en la dirección esperada, ya que persiguiendo su proprio provecho contribuirá al interes

general. [...] Pero esa coincidencia en la intención no pasa de ser un elemento fáctico, que precisa de una

estructura jurídica que garantice su realización. En tal sentido, el núcleo jurídico de la relación entablada entre

la Administración que concede la ayuda y el beneficiario que la recibe está dado por la afectacción de los biens

otorgados a la actividad en la vistas de la cual se confieren” (La figura del fomento: necesidad de encarar una

revisión conceptual. In: Servicio público, polícia y fomento. Buenos Aires: Rap, s.d., p. 413-422, p. 417). 67

DE LA RIVA, Ignacio M. La figura del fomento: necesidad de encarar uma revisión conceptual. In: Servicio

público, polícia y fomento: jornadas organizadas por la Universidad Austral Facultad de Derecho. Buenos

Aires: Rap, 2003, p. 413-422, p. 417. 68

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e

parte especial. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 524. 69

ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Terceiro Setor. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 23.

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34

privado de atuação empreendedora. É uma técnica de atuação em que o Poder Público indica,

sugere ou recomenda, oferecendo, para isso, algum estímulo palpável, sem o caráter de

obrigação.70

Para Marçal Justen Filho:

Fomento é uma atividade administrativa de intervenção no domínio

econômico para incentivar condutas dos sujeitos privados mediante a

outorga de benefícios diferenciados, inclusive mediante a aplicação de

recursos financeiros, visando a promover o desenvolvimento econômico e

social.71

Enfatiza Justen Filho, em primeiro lugar, que sendo uma atividade pública, o fomento

envolve a existência permanente de bens e pessoas, vale dizer, de uma atividade contínua e

coordenada. Em segundo lugar, a ação de fomento destina-se a orientar o uso de recursos

econômicos, alterando a conduta da iniciativa privada. Preserva-se a autonomia do setor

privado, que é, todavia, estimulado a escolher um comportamento reputado como desejável

pelo Estado. O incentivo é produzido pela previsão normativa de benefícios vinculados à

adoção de condutas ativas ou omissas pelo particular. Finalmente, a finalidade imediata

buscada pelo fomento é o desenvolvimento econômico e social.72

Nesses termos, o fomento constitui um instrumento indireto de defesa e promoção dos

direitos fundamentais, que visa à eliminação da pobreza e das desigualdades regionais e

sociais, ao aumento da oferta de emprego e outras melhorias relacionadas ao desenvolvimento

social-econômico.73

Para Célia Cunha Mello, a acepção atual do fomento caracteriza-se por se tratar de

função administrativa74

“voltada à proteção e /ou promoção de seu objeto, atuando com

ausência de compulsoriedade, para satisfazer indiretamente necessidades públicas”.75

70

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento

público democrático, eficiente e não-paternalista. Revista de Direito Processual Geral, Rio de Janeiro, n. 65,

p. 115-176, 2010, p.119. 71

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 10 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2014, p. 715. 72

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 10 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2014, p. 715. 73

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 10 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2014, p. 715-716. 74

Conforme lição de Celso Antônio Bandeira de Mello: “O Direito Administrativo é o ramo do Direito Público

que disciplina o exercício da função administrativa, bem como pessoas e órgãos que a desempenham. Cumpre,

portanto, ainda que sucintamente, buscar identificá-la, cotejando-a com as demais funções estatais. Comece-se

por dizer que função pública, no Estado Democrático de Direito, é a atividade exercida no cumprimento do

dever de alcançar o interesse público, mediante o uso dos poderes instrumentalmente necessários conferidos

pela ordem jurídica” (Curso de direito administrativo, 29. ed. rev. ampl. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 29). E

ainda: “Função administrativa é a função que o Estado, ou quem lhe faça as vezes, exerce na intimidade de

uma estrutura e regime hierárquicos e que no sistema constitucional brasileiro se caracteriza pelo fato de ser

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35

Deste modo, a exata compreensão da atividade fomentadora exige que fiquem

evidenciados os seguintes caracteres: a) trata-se de exercício de função administrativa; b) a

função está voltada à proteção e/ou promoção de seu objeto; c) há ausência de

compulsoriedade; d) a função visa à satisfação indireta das necessidades públicas. A proteção

e a promoção do objeto fomentado correspondem à função de induzir os agentes fomentados a

adotar certos comportamentos, prescindindo, todavia, de coação. Cuida-se de um modo

indireto de realizar o interesse público, porque a administração fomentadora não realiza

diretamente a finalidade pretendida – quem o faz é o agente fomentado, depois de aderir,

livremente, aos propósitos desta, seduzido pelas vantagens prometidas.76

Importa notar que, a exemplo de Garrido Falla, Roberto Dromi, Juan Carlos Cassagne e

Diogo de Figueiredo Moreira Neto, também para Célia Cunha Mello, uma entidade pública

pode, além de perseguir seus próprios interesses, estar em condições de conceder vantagens

capazes de convencer ou de estimular uma outra entidade pública a adotar um determinado

comportamento que satisfaça as suas necessidades.77

A nosso ver, o fomento é a função administrativa de promoção, incentivo e estímulo a

atividades de interesse público, realizadas por particulares que, voluntariamente, aderem aos

propósitos do Estado, ficando sujeitos a medidas coativas tão somente após sobredita adesão.

André Luiz Freire reconhece o fomento de atividades desempenhadas por pessoas

jurídicas de direito privado da Administração Indireta. Exemplo disto seria a criação de uma

empresa estatal destinada a explorar atividade econômica e a concessão de isenção tributária

às pessoas que atuam no setor.78

No Brasil, de fato, não há dúvidas de que empresas estatais também podem se beneficiar

de medidas de fomento público.

Nesse sentido, segundo os resultados da primeira edição da Pesquisa de Inovação nas

Empresas Estatais Federais, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no

período de 2006 a 2008, 24,5% das empresas estatais federais receberam algum tipo de

incentivo governamental para inovar.79

desempenhada mediante comportamentos infralegais ou, excepcionalmente, infraconstitucionais, submissos

todos a controle de legalidade pelo Poder Judiciário. (p. 36). 75

MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 33. 76

MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 30-31. 77

MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 21. 78

FREIRE, André Luiz. Responsabilidade patrimonial na atividade administrativa de fomento. In: SPARAPANI,

Priscilia; ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social:

homenagem ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 160-186, p.165. 79

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação nas empresas

estatais federais 2008. Rio de Janeiro: IBGE, 2011. Segundo a Pesquisa em tela, o Manual de Oslo, referência

conceitual e metodológica da pesquisa, desaconselha que sejam realizadas pesquisas sobre inovação no setor

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36

A legislação de inovação brasileira, apesar de ter o claro propósito de estimular uma

maior contribuição do setor produtivo privado ao desenvolvimento científico, tecnológico e

industrial do País, não impede que integrantes da Administração Pública Direta e Indireta

sejam beneficiados por suas medidas de incentivo à inovação.

Vale dizer, do ponto de vista prático, é inegável que entidades públicas incentivam

outras entidades públicas, o que frequentemente ocorre por meio de convênios de repasses

financeiros. Nesses ajustes há traços típicos do regime jurídico do fomento, como a união de

esforços, a cooperação em prol de um objeto comum e a fiscalização do uso dos recursos. Por

outro lado, é certo que a aceitação desses auxílios como fomento enseja uma inadequada

expansão da noção, pois deixa de haver um acordo entre uma vontade pública e uma vontade

privada para a realização de uma atividade privada.80

Parece-nos ser a posição mais razoável a apresentada por Cortés. A seu entender, nas

hipóteses referentes ao relacionamento entre entidades públicas, o fomento propriamente dito

seria possível desde que o fomentado pudesse ser reconhecido como um terceiro. Não haveria

fomento público no qual, entre fomentador e fomentado, ambos integrantes da Administração

Pública, existissem vínculos hierárquicos ou de dependência. Todavia, se o fomentado,

entidade pública, pudesse ser tido como um terceiro em relação ao fomentador – como uma

entidade pública de outro nível federativo ou, ainda que no mesmo nível, distanciada da

fomentadora, aí haveria fomento e não mera transferência orçamentária.81

Outra relevante questão é a possibilidade de participação de pessoas jurídicas de direito

privado, não integrantes da Administração Pública, na gestão do fomento público.

Segundo José Vicente Santos de Mendonça, nada impede que uma entidade privada

exerça atividade material de dispensamento de ajudas públicas. Sustenta que, nessa hipótese,

os critérios concessivos do fomento devem utilizar dados vinculados.82

público e em atividades de serviços preponderantemente governamentais: “A inovação pode ocorrer em

qualquer setor da economia, incluindo serviços governamentais como saúde e educação. As diretrizes do

Manual, entretanto, são essencialmente voltadas para as inovações das empresas comerciais. Isso abarca a

indústria de transformação, indústrias primárias e o setor de serviços. A inovação é também importante para o

setor público. Porém, pouco se sabe sobre o processo de inovação em setores não orientados pelo mercado.”

(nota de rodapé 4, documento não paginado). 80

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Direito constitucional econômico: a intervenção do Estado na

economia à luz da razão prática e do pragmatismo. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 361. 81

CORTÉS. Aproximación al concepto de subvención y su adecuación em la Ley 3/1987, de 2 de Julio, de

financiación de partidos políticos. Cuadernos constitucionales de la Cátedra Furió Ceriol, p. 223-224, apud

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Direito constitucional econômico: a intervenção do Estado na

economia à luz da razão prática e do pragmatismo. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 360-361. 82

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Direito constitucional econômico: a intervenção do Estado na

economia à luz da razão prática e do pragmatismo. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 362. Interessante notar,

contudo, que segundo sustentado pelo próprio autor, na construção do fomento republicano, o mais importante

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37

Para Marcos Juruena Villela Souto, tal como as demais funções da Administração que

não exigem o uso de poder de império estatal, o fomento comporta condução por estruturas

privadas:

A reforma constitucional trouxe novos institutos jurídicos incorporados à

praxe da Administração, tais como a previsão do contrato de gestão e o

advento das agências reguladoras e das agências executivas, das

organizações sociais e das organizações da sociedade civil de interesse

público, que merecem ser examinadas como opções para estruturação de

fundos de fomento, sendo certo que a economia concertada deve buscar,

sempre que possível, o envolvimento dos destinatários do fomento.83

De fato, uma vez que a formulação e a concessão do fomento público não compreendem

o uso imediato de coação, a nosso ver, não existe óbice ao seu exercício por intermédio de

pessoas privadas. Além disso, na área da C,T&I, a própria Constituição permite a atuação

direta do Estado; a atuação da iniciativa privada e a atuação dos particulares em colaboração

com o Poder Público.84

André Ramos Tavares, nessa toada, em resposta à consulta jurídica realizada pelo

Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE) sobre a constitucionalidade da Lei Federal

nº 9.637/1998 e da Lei Federal nº 9.648/1998, que operou a inserção na Lei Federal nº

8.666/1993 de mais uma hipótese de dispensa de licitação - consulta esta motivada pelo

ajuizamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.973/DF85

- registra que não há no

artigo 218 da Constituição qualquer menção a uma forma pré-determinada de como o Estado

promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação

tecnológicas, não afastando desta seara o setor privado.86

Nessa senda, Gustavo Justino de Oliveira salienta que atualmente as ações públicas

devem estar voltadas a produzir maiores e melhores resultados, calcadas no critério da

é o estabelecimento e a difusão de critérios dogmáticos consistentes e operacionais, podendo ficar, a partir daí,

a discussão se o fomento é vinculado ou discricionário em segundo plano. (p. 396). 83

SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo da economia. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p.

762. 84

Nesse sentido, vale notar que o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) mantém contrato de

gestão com diversas Organizações Sociais. 85

A Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.973/DF foi ajuizada no Supremo Tribunal Federal, em 1998, pelo

Partido dos Trabalhadores (PT) e pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) impugnando dispositivos da Lei

nº 9.637/1998 e a possibilidade de dispensa de licitação incluída no artigo 24, inciso XXIV, da Lei nº

8.666/1993 pela Lei nº 9.648/1998 (possibilidade de contratação direta para a celebração de contratos de

prestação de serviços com as Organizações Sociais, qualificadas no âmbito das respectivas esferas de governo,

para atividades contempladas no contrato de gestão). O pedido de concessão de medida cautelar foi indeferido,

por maioria, em Sessão Plenária realizada em 2007, tendo sido destacada a inexistência de periculum in mora,

conforme a ementa da decisão, “seja mercê do transcurso do tempo – os atos normativos impugnados foram

publicados em 1998 – seja porque no exame do mérito poder-se-á modular efeitos do que vier a ser decidido,

inclusive com a definição de sentença aditiva.” Aguarda-se o julgamento de mérito da Ação. 86

TAVARES, André Ramos. Parecer jurídico, 2007, p. 20. Disponível em:

<http://www.cgee.org.br/noticias/parecerandre.pdf. Acesso em: 06 jan. 2014.

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38

eficiência. Dependendo da área em que devam ser desenvolvidas e das necessidades a serem

satisfeitas, pode ser melhor opção uma aproximação mais intensa entre as esferas pública e

privada, “desde que ocorram a partir de bases jurídico-normativas transparentes, com o

respeito e a observância dos princípios e das regras de direito público, aplicáveis a tais

hipóteses.”87

87

OLIVEIRA, Gustavo Justino de. Direito administrativo democrático. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 196.

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39

4 DISTINÇÕES ENTRE FOMENTO PÚBLICO, SERVIÇO PÚBLICO E PODER DE

POLÍCIA

Conforme visto, a partir da sistematização de Luis Jordana de Pozas tornou-se possível

distinguir o fomento do poder de polícia e do serviço público.

O presente trabalho, pretendendo evidenciar tal distinção, adota tal sistematização como

ponto de partida, deixando, contudo, de tecer considerações específicas acerca desses outros

dois institutos, já bastante estudados no âmbito do Direito Público.

Para Jordana de Pozas, o fomento distingue-se da polícia porque, enquanto esta previne

e reprime, o fomento protege e promove, sem fazer uso de coação. E distingue-se do serviço

público porque, mediante este, a Administração realiza diretamente e com seus próprios

meios o fim perseguido, enquanto o fomento se limita a estimular os particulares a, por sua

própria vontade e desenvolvendo uma atividade determinada, cumprir indiretamente o fim

eleito pela Administração.88

Em consonância com Juan Carlos Cassagne, tanto o fomento, como a polícia e o serviço

público caracterizam a intervenção subsidiária do Estado. Contudo, a polícia limita direitos

individuais com o fim de fazê-los compatíveis com o bem comum e o interesse geral,

enquanto o fomento amplia direitos. O serviço público envolve o dever de continuidade da

prestação, caracterizando-se o fomento, ao contrário disso, como uma ajuda, um estímulo,

para que os particulares realizem suas próprias finalidades comerciais ou industriais.89

Segundo Daniel Edgardo Maljar a noção ampla de polícia abarca tanto a técnica de

fomento como a técnica de coação, razão pela qual não caberia realizar uma diferenciação

entre estes dois institutos. Entende, por outro lado, ser procedente a distinção entre fomento e

serviço público. Para Maljar, a diferenciação proposta por Jordana de Pozas não é suficiente,

vez que considera que a prestação do serviço público é sempre realizada pelo Estado de forma

direta. Ressalta que a atividade de fomento é em todo caso indireta, mas que o serviço público

pode ser prestado diretamente ou indiretamente pelo Estado (neste caso, por meio de

particulares, mediante contratos de concessão de serviço público). Registra, ademais, que

Diez, na sua opinião, foi quem realizou a distinção com maior clareza e precisão. Para este

autor, o serviço público importa uma prestação obrigatória a cargo do Estado, que se realiza

88

JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo. Revista de

Estudios Politicos, Madrid, n. 48, p. 41-54, 1949, p. 46. 89

CASSAGNE, Juan Carlos. Derecho administrativo. 7. ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2002, T. II, p. 345.

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direta ou indiretamente, trazendo uma obrigação de fazer. De outro turno, o fomento não tem

caráter obrigatório para o Estado, trazendo a sua realização uma obrigação de dar.90

A dificuldade, conforme ensina Célia Cunha Mello, está em saber em que sentido pode

ser empregada a expressão “atuação direta e indireta do Estado” decorrente da noção de

Jordana de Pozas e tão citada por outros autores. Entende que distinção entre serviço público

e atividade de fomento deve ser feita segundo o critério da titularidade da atividade. Quando o

Estado é competente para prestar um serviço, trata-se de uma atuação direta e, portanto, de

serviço público, ao passo que, quando compete ao Estado apenas promover e/ou incentivar

determinada atividade, trata-se de uma atuação estatal indireta e, portanto, de fomento

público. No primeiro caso, a lei confere ao ente público competência para prestá-lo,

diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, na forma do artigo 175, da

Constituição. Na segunda hipótese, a competência atribuída legalmente ao ente estatal se

restringe a conferir a ele poderes para adotar, discricionariamente, medidas promocionais para

convencer alguém a fazer ou deixar de fazer algo.91

No que tange à diferenciação entre ação promocional e serviço público, outras

distinções podem, ainda, ser ressaltadas. O serviço público é regido pelo princípio da

continuidade, dada a sua presumida essencialidade. Já a ação fomentadora deve revestir-se de

transitoriedade, não sendo aconselhável que haja protecionismo indefinido.92

A propósito da questão, consigna José Vicente Santos de Mendonça que o fomento

público não é auxílio indefinido. As atividades fomentadas devem sê-lo na exata medida e

apenas durante o período em que precisem do aporte público, como meio de manter a sua

viabilidade econômica. O objetivo da autosustentabilidade, ainda que não possa ser nunca

atingido, deve existir sempre e ser periodicamente averiguado.93

Segundo Mendonça:

Atividade privada que só existe graças ao fomento público não é, em

princípio, atividade privada em sentido próprio, seara do livre

empreendedorismo (ainda que publicamente regulado) e da busca pelo lucro.

Estado não existe para garantir nem lucratividade nem sustentabilidade

empresarial.

90

MALJAR, Daniel Edgardo. Intervencion del Estado en la prestacion de servicios publicos. Buenos Aires:

Hammurabi, 1998, p. 283. 91

MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 55-56. 92

MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 57. 93

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento

público democrático, eficiente e não paternalista. Revista de Direito Processual Geral. Rio de Janeiro, n. 65, p.

115-176, 2010, p. 117.

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41

[...] a transitoriedade se refere à situação-padrão do fomento público, vale

dizer, a uma atividade empresarial simples (ainda que, naturalmente, de

interesse público) cujo exercício é auxiliado pelo Poder Público.94

Todavia, esclarece que há exceções a essa regra:

Dada a abrangência do conteúdo abrigado dentro do termo fomento público,

é importante destacar que a transitoriedade não se aplica a situações que

evidentemente não são passíveis de mudanças a curto ou médio prazo, ou

mesmo, a circunstâncias estruturais que jamais mudarão. A transitoriedade

não se aplica, por exemplo, quando a Constituição da República assegura

tratamento privilegiado às micro e pequenas empresas (art. 179) – enquanto

ostentarem tal condição, as empresas sempre farão jus a essas medidas de

auxílio -, ou na hipótese de um Fundo de Desenvolvimento Regional (o

critério, aqui, é geográfico, e não temporal).95

Para Héctor Jorge Escola96

e Sílvio Luís Ferreira da Rocha,97

a atividade de fomento é

meramente facultativa, de acordo com critérios de oportunidade e conveniência, ao contrário

do serviço público. Entendem que os serviços públicos podem ser exigidos, e o fomento só

pode ser pretendido ou solicitado.

A este propósito, Carolina Zancaner Zockun frisa que não há um dever constitucional

atribuído ao Estado de fomentar atividades privadas, tratando-se, pois, de política legislativa,

que permite ao Estado optar pelas atividades de relevância social que receberão, ou não,

incentivo estatal.98

Esta também é a opinião de André Luiz Freire, uma vez que o Estado, a seu ver, escolhe

que setores das atividades privadas fomentará, por meio de escolhas políticas do Legislativo,

editadas mediante planos incitativos. Vale dizer, o autor entende que há no fomento

discricionariedade legislativa, podendo haver, ou não, discricionariedade administrativa.99

A seu turno, Célia Cunha Mello esclarece que o Poder Público tem o dever de proteger

ou promover as atividades que as legislações constitucional e infraconstitucional

94

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Direito constitucional econômico: a intervenção do Estado na

economia à luz da razão prática e do pragmatismo. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 378. 95

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Direito constitucional econômico: a intervenção do Estado na

economia à luz da razão prática e do pragmatismo. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 379. 96

COMADIRA, Julio Rodolfo; ESCOLA, Héctor Jorge; COMADIRA, Julio Pablo. Curso de derecho

administrativo. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2013, T. I, p. 715. 97

ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Terceiro Setor. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 23 98

ZOCKUN, Carolina Zancaner. Da intervenção do Estado no domínio social. São Paulo: Malheiros, 2009, p.

189. 99

FREIRE, André Luiz. Responsabilidade patrimonial na atividade administrativa de fomento. In: SPARAPANI,

Priscilia; ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social:

homenagem ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 160-186, p. 166.

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42

determinaram que fossem fomentadas, não podendo, discricionariamente, escolher se deve, ou

não, proteger ou promover a atividade eleita pela lei.100

O fato é que há disposições constitucionais expressas acerca do dever do Estado de

promover e incentivar determinadas atividades. Isto, a nosso sentir, vincula o legislador à

concretização da previsão constitucional, condicionando também a atuação do administrador

público.

Oscar Vilhena Vieira e Dimitri Dimoulis, nessa toada, aduzem que as opções

desenvolvimentistas incluídas no texto de Constituições rígidas,101

caso do Diploma brasileiro

de 1988, possuem supremacia e aplicabilidade imediata enquanto mandamentos endereçados

aos legisladores.102

Segundo Alexandre Santos de Aragão, a nota essencial da distinção do fomento para o

serviço público é o fato de que no fomento a atividade permanece sendo privada, meramente

apoiada pelo Estado. Se o fomento estatal é de tal monta que a Administração se substitue ao

particular, então há prestação de atividade pela própria Administração.103

Quanto, especificamente, às distinções entre fomento público e poder de polícia, destaca

Célia Cunha Mello que o poder de polícia caracteriza-se pela coerção restritiva da liberdade e

da propriedade individuais, enquanto o fomento, ao contrário, deixa os indivíduos livres para

aderir, ou não, aos propósitos do Estado. Vale dizer – o poder de polícia utiliza a

imperatividade estatal para assegurar o exercício de direitos individuais, condicionando-os ao

bem-estar social. O fomento público, apesar de buscar esta mesma finalidade,104

não se coloca

100

MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 29. 101

Quanto à mutabilidade das constituições, ensina Paulo Gustavo Gonet Branco, “Distinção relevante é a que se

faz entre constituições rígidas e flexíveis (agregando-se ao binômio as constituições semirrígidas, para

designar constituições, como a do Brasil-Império, em que parte da Carta era rígida, e parte, flexível). A rigidez

ou flexibilidade da Constituição é apurada segundo o critério do grau de formalidade do procedimento

requerido para a mudança da Lei Maior. A estabilidade das normas constitucionais, em uma Constituição

rígida, é garantida pela exigência de procedimento especial, solene, dificultoso, exigente de maiorias

parlamentares elevadas, para que se vejam alteradas pelo poder constituinte de reforma. Em oposição, as

constituições flexíveis permitem a sua reconfiguração por meio de um procedimento indiferenciado do

processo legislativo comum. Não se cobra, na Constituição flexível, uma supermaioria para que o Texto seja

modificado. A rigidez é atributo que se liga muito proximamente ao princípio da supremacia da Constituição.

[...] Se a Constituição pode sofrer transformações pela mesma maneira como se elaboram as demais leis, não

se assegura a supremacia da Carta sobre o legislador ordinário. A rigidez distingue o poder constituinte dos

poderes constituídos e positiva uma hierarquia entre as normas jurídicas, em que a Constituição aparece como

o conjunto de normas matrizes do ordenamento jurídico, em posição de prevalência sobre todos os atos

normativos que hão de nela encontrar fundamento último.” (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo

Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 70). 102

VIEIRA, Oscar Vilhena; DIMOULIS, Dimitri. Constituição e desenvolvimento. In: LIMA, Maria Lúcia L.

M. Padua (Coord.). Agenda contemporânea: Direito e economia. 30 anos de Brasil. São Paulo: Saraiva, 2012,

t. 1, p. 382-400, p. 396. 103

ARAGÃO. Alexandre Santos de. Direito dos serviços públicos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 168.

104 A respeito da correlação entre fins perseguidos pela Administração e técnicas operativas empregadas, ensina

Garrido Falla que o progressivo aparecimento das técnicas de fomento e de serviço público, correspondente ao

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43

em nível de superioridade,105

ao menos formalmente, em relação ao particular. Além disso, as

medidas de polícia são, diante de expresso permissivo legal, ou em casos de urgência, dotadas

de autoexecutoriedade, o que não ocorre com as atividades de fomento.106

Com fulcro na lição de Ricardo Marcondes Martins, duas notas caracterizam o fomento

– a voluntariedade, que o diferencia da ordenação e do poder de polícia e o objetivo de

satisfação indireta das necessidades públicas, que o diferencia do serviço público. Os

particulares são livres para aderir, ou não, aos propósitos estatais; a Administração não realiza

diretamente o interesse público, ela convence o administrado a fazê-lo.107

Segundo André Luiz Freire, o fomento distingue-se das demais atividades

administrativas em razão do seu modus operandi, ou técnicas operativas da Administração.

No fomento, o Estado adota a técnica do encorajamento de condutas, a fim de satisfazer

necessidades de interesse público.108

Também para José Roberto Pimenta Oliveira:

[...] diferentemente das relações jurídicas nascidas sob a égide do Direito

Administrativo Ordenador e do Direito Administrativo Sancionador, as

relações jurídico-administrativas surgidas sob a égide da técnica

promocional são estruturadas a partir da adesão dos administrados à

constituição dos referidos vínculos, teleologicamente orientados à satisfação

indireta de interesses públicos específicos. Esta dimensão dota o fomento de

singularidade, em face da atividade ordenadora e prestacional. Assim, a

distinção não está no elemento finalístico comum a toda função

administrativa, mas no modus operandi, ou seja, na técnica jurídica operativa

de estruturação ou criação do vínculo jurídico-administrativo entre particular

surgimento de novos fins assumidos pelo Estado, não autoriza pensar no monopólio de determinados fins

administrativos a favor de uma ou outra técnica de atuação. Tanto é possível, nas palavras do autor, alcançar

uma finalidade de ordem pública (para muitos, privativa de poder de polícia) empregando técnicas de fomento,

como é possível perseguir uma finalidade do tipo protecionista (típica do fomento) empregando medidas

coativas. A falta de correlação entre o fim perseguido e a técnica empregada determina a prevalência do

critério da técnica, ou seja, se a atuação administrativa reveste-se ou não do caráter de coação (Tratado de

derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos. 1992. v.II, p. 300). 105

Quanto à inexistência de uma supremacia geral da Administração Pública numa relação de fomento, entende

José Vicente Santos de Mendonça que “é algo que depende muito mais das condições econômicas do

fomentado do que de uma natureza essencial do fomento”. O autor exemplifica seu argumento, citando o caso

de entidades fomentadoras de eventos culturais que se encontram em relação de superioridade prática em

relação aos empreendedores artísticos (não a ponto de modificar as condições do fomento durante o seu curso,

mas a ponto de impor sua interpretação de eventual cláusula duvidosa de edital). (Uma teoria do fomento

público: critérios em prol de um fomento público democrático, eficiente e não paternalista. Revista de Direito

Processual Geral. Rio de Janeiro, n. 65, p. 115-176, 2010, p. 124). 106

MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 43. 107

MARTINS, Ricardo Marcondes. Regulação administrativa à luz da Constituição federal. São Paulo:

Malheiros, 2011, p. 128. 108

FREIRE, André Luiz. Responsabilidade patrimonial na atividade administrativa de fomento. In:

SPARAPANI, Priscilia; ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no

domínio social: homenagem ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p.

160-186, p.163.

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44

fomentado e Administração fomentadora, em vista do interesse público

colimado pela lei.109

A ausência de compulsoriedade é um dos elementos que caracterizam a ação

fomentadora pública. A partir do consentimento do agente fomentado, que adere aos

propósitos do Estado, adotando o comportamento por ele almejado, forma-se a relação entre a

vontade pública e a vontade particular.110

A função de fomento revela a transformação do papel do Direito na sociedade, que

sempre mais passivo que ativo, no sentido de proteger interesses mediante sanções negativas,

passou a ser também o de promoção, estimulando os atos inovadores, mediante sanções

positivas.111

Tamanha a relevância da adesão do particular, no fomento, que, na opinião de Diogo de

Figueiredo Moreira Neto, sem ela, inexiste a formação da relação jurídico-administrativa

promocional. Sendo a formação do vínculo entre o particular e o Estado meramente

facultativa, somente após essa adesão é que Estado pode coagir ao cumprimento daquilo que

foi avençado e punir, em caso de não cumprimento.112

De certo, enquanto o particular não adere ao convite formulado pelo Poder Público está

a salvo de medidas coativas. Depois de aceito o convite, porém, a Administração deve

fiscalizar o desempenho do fomentado, impondo-lhe, se e quando preciso, penalidades, tais

como a devolução de recursos e multas administrativas.113

109

OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no direito

administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 516. 110

Para Eros Roberto Grau, o particular tem a alternativa de não se deixar seduzir pelo convite do Estado.

Todavia, a sedução à adesão ao comportamento sugerido é muito vigorosa, pois os que não aderem passam a

ocupar posição desprivilegiada nos mercados (A ordem econômica na Constituição de 1988. 16. ed. São Paulo:

Malheiros, 2014, p. 146). 111

BOBBIO, Norberto. Da estrutura à função: novos estudos de teoria do direito. São Paulo: Manole, 2007, p.

24. 112

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e

parte especial. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 524. 113

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento

público democrático, eficiente e não paternalista. Revista de Direito Processual Geral. Rio de Janeiro, n. 65, p.

115-176, 2010, p. 123.

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45

5 CLASSIFICAÇÃO DOS MEIOS DE FOMENTO

Apesar de julgar ser impossível estabelecer um catálogo de formas pelas quais pode se

revestir a função promocional, dadas as suas características de flexibilidade e de adaptação às

circunstâncias, Luis Jordana de Pozas classificou114

seus principais meios, destacando seus

pontos comuns. Outrossim, ressaltou que a eleição desses meios não é uma questão de técnica

jurídica, mas de experiência, ligada à psicologia coletiva, que varia com o tempo, com as

circunstâncias, com as pessoas etc., tratando-se, a rigor, de uma escolha política.115

A partir da clássica sistematização de Jordana de Pozas, adotada, diga-se, por quase toda

a doutrina, os meios de fomento podem ser classificados: a) segundo a forma de atuação sobre

a vontade dos sujeitos fomentados; b) segundo o tipo de vantagens que outorgam.116

5.1 Meios de fomento segundo a forma de atuação sobre a vontade dos sujeitos

fomentados: classificação tradicional e sua crítica

Para Jordana de Pozas, são positivos os meios que outorgam prestações, bens ou

vantagens e, negativos, os que significam obstáculos ou ônus para dificultar, por meios

indiretos, as atividades ou estabelecimentos contrários aos que o Estado quer fomentar. Todos

os meios positivos de fomento significam privilégios, vez que supõem uma exceção vantajosa

a uma norma geral a favor de pessoas ou classes determinadas.117

114

Agustin Gordillo, a propósito do assunto classificação, explica: “ ‘As características comuns que adotamos

como critério para uso de uma palavra de classe são uma questão de conveniência. Nossas classificações

dependem de nossos interesses e nossa necessidade de reconhecer tanto as semelhanças como as diferenças

entre as coisas. Muitas classificações distintas podem ser igualmente válidas’. ‘Há tantas classes possíveis no

mundo como características comuns ou combinações destas que podem ser tomadas como base de uma

classificação.’ ‘O procedimento que adotamos em cada caso particular depende em grande medida do que é o

que consideramos mais importante, as semelhanças ou as diferenças.” Não há uma maneira correta ou

incorreta de classificar as coisas, do mesmo modo que não há u’a maneira correta ou incorreta de aplicar

nomes às coisas. [...] ‘as classificações não são verdadeiras nem falsas, são úteis ou inúteis: suas vantagens e

desvantagens estão submetidas ao interesse que guia quem as formula e a sua fecundidade para apresentar um

campo de conhecimento de u’a maneira mais facilmente compreensível ou mais rica em consequências

práticas desejáveis’. ‘Sempre há múltiplas maneiras de agrupar ou classificar um campo de relações ou de

fenômenos; o critério para se decidir por uma delas não está circunscrito senão por considerações de

conveniência científica, didática ou prática. [...]’”. (Princípios gerais de direito público. Tradução de Marco

Aurélio Greco; revisão de Reilda Meira. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977, p. 10) (os grifos são

originais). 115

JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo. Revista de

Estudios Politicos, Madrid, n. 48, p. 41-54, 1949, p. 50-51. 116

GARRIDO FALLA, Fernando. Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, 1992, v. II, p.

304. 117

JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo. Revista de

Estudios Politicos, Madrid, n. 48, p. 41-54, 1949, p. 51.

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46

Fernando Garrido Falla menciona que um exemplo de meio negativo seria o imposto

sobre bebidas alcoólicas, para combater o alcoolismo. Adverte, todavia, adotando, neste

particular, o posicionamento de Entrena Cuesta, que, também a seu ver, não é possível admitir

esta classificação. Isso porque o que importa para determinar a qualificação jurídica de uma

medida não é tanto a finalidade pretendida e sim seu caráter formal (coativo ou persuasivo).

Os meios negativos não são, em sentido estrito, medidas de fomento – a justificativa da

medida não se confunde com a sua natureza jurídica.118

Em razão disso, para Célia Cunha Mello, o critério proposto por Jordana somente pode

ser considerado válido se entender como medida de fomento os meios negativos que usem

técnicas persuasivas.119

Também para José Vicente Santos de Mendonça, desde que sejam admitidos os meios

de fomento negativo persuasivos e não os propriamente coativos, a classificação é defensável,

embora pouco útil: “positivo ou negativo, o fomento vai ser tratado da mesma forma”.120

5.2 Meios de fomento segundo o tipo de vantagens outorgadas: classificação tradicional e

sua crítica

A partir da classificação de Jordana de Pozas, os meios de fomento, em relação ao tipo

de vantagens que outorgam, podem ser divididos em honoríficos, econômicos e jurídicos.121

Segundo o autor, são honoríficos os meios que compreendem distinções e recompensas

concedidas como reconhecimento público de um ato ou conduta exemplar, tais como

condecorações, tratamentos, títulos, uso de emblemas ou símbolos, troféus, diplomas etc.

Ainda que envolvam, às vezes, vantagens de caráter jurídico ou econômico, estas são

acessórias, sendo mais relevante o enaltecimento social do beneficiado. Por sua vez, são

meios econômicos todos aqueles que, de modo direto, autorizam o recebimento de valores ou

118

GARRIDO FALLA, Fernando. Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, 1992, v. II, p.

304. 119

A esse respeito, a autora exemplifica: “[...] a hipótese prevista no inciso II, do artigo 182 da Constituição da

República, não constitui hipótese de meio negativo de fomento, visto que se identifica nessa norma

constitucional o caráter coativo e não meramente persuasivo. Ela poderia ser considerada medida de fomento

se o texto constitucional recorresse apenas aos meios negativos que utilizam técnicas persuasivas, o que

ocorreria, por exemplo, caso a Carta Magna facultasse ao Poder Público municipal conceder ao proprietário do

solo urbano edificado uma redução, ainda que progressiva, do imposto predial urbano, vantagem que não seria

aproveitada pelo proprietário do imóvel não edificado, promovendo, assim, o adequado aproveitamento do

solo urbano” (MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p.

90). 120

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento

público democrático, eficiente e não-paternalista. Revista de Direito Processual Geral, Rio de Janeiro, n. 65,

p. 115-176, 2010, p. 146. 121

JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo. Revista de

Estudios Politicos, Madrid, n. 48, p. 41-54, 1949, p. 52.

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47

dispensam um pagamento que seria obrigatório, tal como ocorre nas subvenções,122

prêmios

em dinheiro, antecipações e empréstimos, isenções e demais privilégios de caráter fiscal.

Finalmente, são meios de fomento jurídico os que outorgam condições privilegiadas, que, de

modo indireto, representam vantagens econômicas ou de seguridade.123

A propósito da classificação proposta por Jordana de Pozas, Fernando Garrido Falla

consigna, quanto aos meios honoríficos, que não há impedimento ao uso de medidas que

signifiquem um estímulo ao sentimento de honra dos administrados, não podendo ser

adotadas, evidentemente, medidas que sejam incompatíveis com o regime político

estabelecido.124

Antes da Revolução Francesa de 1789, o uso de distinções honoríficas era frequente,

situação que foi alterada substancialmente após esta, quando chegaram a ser suprimidas. É

fato, porém, que tais distinções subsistiram, aceitando-se que, sem o sentido de privilégio

supralegal e de conotação social, são compatíveis com os regimes mais liberais e

democráticos.125

No entanto, seria duvidoso considerar como fomento público a outorga de honras,

títulos ou troféus a pessoas que já prestaram um serviço ou atividade, ainda que o Estado

reconheça, posteriormente, ter havido por meio destes o atendimento do interesse público. A

crítica é que se não houve persuasão, não houve atuação estatal indireta e, portanto, não houve

fomento.126

Na mesma senda, para José Vicente Santos de Mendonça, a construção em comento é

artificial, e somente num sentido muitíssimo lato é que o potencial de honrarias poderia

conduzir ao conceito de fomento público.127

José Roberto Pimenta Oliveira considera que os meios honoríficos são admissíveis

apenas quando o seu uso for compatível com a forma de governo republicana e a sua

122

Anota Ricardo Rivero Ortega, “hay que reconecer que la técnica administrativa del fomento por excelência, o

de la actividad administrativa dispensadora de ayudas públicas, es la subvención. (Derecho Administrativo

Económico. 6. ed. Buenos Aires: Marcial Pons, 2013, p. 167). No mesmo sentido, para Roberto Dromi:

“Dentro de los médios económicos se formulan diversas clasificaciones, pero todas ellas giran en torno a la

columna del fomento: la subvención.” (Derecho administrativo, 6. ed. Buenos Aires: Marcial Pons, 2013, p.

725). 123

JORDANA DE POZAS, Luis. Ensayo de una teoria del fomento en el derecho administrativo. Revista de

Estudios Politicos, Madrid, n. 48, p. 41-54, 1949, p.53. 124

GARRIDO FALLA, Fernando. Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, 1992, v. II, p.

306. 125

COMADIRA, Julio Rodolfo; ESCOLA, Héctor Jorge; COMADIRA, Julio Pablo. Curso de derecho

administrativo. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2013, T. I, p. 709. 126

MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 94. 127

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento

público democrático, eficiente e não-paternalista. Revista de Direito Processual Geral, Rio de Janeiro, n. 65,

p. 115-176, 2010, p. 147.

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48

disciplina normativa prévia for a causa efetiva do desempenho da atividade fomentada, com o

alcance dos objetivos administrativos.128

Especificamente quanto aos meios econômicos, Garrido Falla menciona que podem ser

de caráter real, quando envolvem o uso de bens públicos, ou, ainda, quando incluem o uso

gratuito de serviços técnicos129

prestados pela Administração, e de caráter financeiro, quando

pertinentes a desembolsos econômicos em favor de particulares ou à liberação de obrigações

fiscais.130

As vantagens financeiras se classificam em auxílios diretos e indiretos. São diretos

quando constituídos por desembolsos efetivos de dinheiro do erário público a favor de

particulares ou de outros entes administrativos, como antecipações, prêmios, subsídios e

subvenções. E indiretos, quando não significam um desembolso imediato, uma transferência

imediata de recursos aos particulares, como isenções e desonerações fiscais e admissões

temporárias.131

O benefício pecuniário direto mais utilizado é a subvenção, figura típica do fomento,

por meio da qual o Estado transfere dinheiro aos particulares a fundo perdido, sem expectativa

de reavê-lo, para que estes o empreguem nas atividades que o Estado quer incentivar.132

Conforme lembra Rafael Munhoz de Mello, no ordenamento jurídico pátrio, a

subvenção está disciplinada, superficialmente, na Lei nº 4.320/1964 e no Decreto nº

93.872/1986, ao lado do auxílio e da contribuição. A subvenção trata de uma transferência

corrente, realizada para cobrir despesas de custeio das entidades beneficiadas, enquanto o

auxílio e a contribuição são repasses classificados como transferência de capital para

investimentos ou inversões financeiras. O auxílio deve estar previsto na lei de orçamento, a

contribuição, em lei especial.133

128

OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no direito

administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 524. 129

Quanto à utilização gratuita de serviços técnicos fornecidos pela Administração, Daniel Edgardo Maljar

ressalta que esse exemplo não foi feliz. Se a atividade é da Administração, que atua diretamente, ela não

poderia estar incluída no fomento (MALJAR, Daniel Edgardo. Intervencion del Estado en la prestacion de

servicios publicos. Buenos Aires: Hammurabi, 1998, p. 289). 130

GARRIDO FALLA, Fernando. Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, 1992, v. II, p.

307. 131

GARRIDO FALLA, Fernando. Tratado de derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, 1992, v. II p.

308. 132

MELLO, Rafael Munhoz de. Atividades de fomento e o princípio da isonomia. In: SPARAPANI, Priscilia;

ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social: homenagem

ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 263-285, p. 270. 133

MELLO, Rafael Munhoz de. Atividades de fomento e o princípio da isonomia. In: SPARAPANI, Priscilia;

ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social: homenagem

ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 263-285, p. 271.

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49

A Administração Pública fomentadora não transfere apenas dinheiro a fundo perdido

aos particulares, concedendo, também, empréstimos por entes ligados ao Estado, como os do

Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), com juros inferiores aos

praticados por outras instituições financeiras públicas e privadas do mercado.134

Finalmente, quanto aos meios jurídicos (como por exemplo, a imposição obrigatória no

mercado de um produto para favorecer a indústria nacional e a proibição de importar certos

produtos), Garrido Falla os rejeita, a princípio, por constituírem uma atividade administrativa

por via de coação.135

Nesse particular, André Luiz Freire, alegando ser possível sustentar a existência de

meios jurídicos de fomento, lembra que há casos, todavia, em que a Administração apenas

confere uma situação privilegiada a determinadas pessoas, sem usar a coação (casos, por

exemplo, das microempresas e empresas de pequeno porte, que possuem direito de

preferência em licitações públicas e das dispensas de licitação para a contratação de

associação de pessoas portadoras de deficiência para a prestação de serviços).136

Na mesma toada, Rafael Munhoz de Mello anota que os meios jurídicos de fomento têm

por característica a concessão de um status jurídico excepcional e privilegiado a certos

indivíduos ou categorias de particulares que o Estado deseja proteger ou incentivar. Cita como

exemplos as organizações sociais (Lei nº 9.637/1998) e as organizações da sociedade civil de

interesse público (Lei nº 9.790/1999), títulos que asseguram certos privilégios, inserindo as

entidades qualificadas num regime jurídico específico.137

A propósito desta específica classificação, Juan Alfonso Santamaría Pastor sustenta que

a qualificação de medidas como meios jurídicos é errônea, haja vista que sua finalidade e

conteúdo material são econômicos. Sustenta, outrossim, que quase nenhuma dessas medidas

134

MELLO, Rafael Munhoz de. Atividades de fomento e o princípio da isonomia. In: SPARAPANI, Priscilia;

ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social: homenagem

ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 263-285, p. 271. 135

Vale mencionar que Fernando Garrido Falla, apesar de rejeitar, a princípio, os meios de fomento jurídico,

esclarece que as dispensas podem assim ser consideradas. Dá como exemplo o caso em que, para favorecer o

desenvolvimento de uma cidade em uma determinada direção, aumenta-se, nessa zona, o limite sobre a altura

máxima dos edifícios, contido nas leis municipais de construção. (GARRIDO FALLA, Fernando. Tratado de

derecho administrativo. 10. ed. Madrid: Tecnos, 1992, v. II, p. 315). 136

FREIRE, André Luiz. Responsabilidade patrimonial na atividade administrativa de fomento. In:

SPARAPANI, Priscilia; ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no

domínio social: homenagem ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p.

160-186, p.175. 137

MELLO, Rafael Munhoz de. Atividades de fomento e o princípio da isonomia. In: SPARAPANI, Priscilia;

ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social: homenagem

ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 263-285, p. 269.

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50

persegue, em verdade, fins de autêntico estímulo da iniciativa privada, constituindo técnicas

obsoletas usadas para reduzir o custo de obras públicas.138

José Vicente Santos de Mendonça concorda com a primeira crítica apresentada por

Santamaría Pastor, vez que tudo na matéria, a seu entender, é, no fundo, econômico.139-140

Quanto às demais críticas daquele autor, pondera o seguinte:

Quanto a estarem ultrapassados, isso não se aplica ao Brasil, país em que,

mais e mais, imagina-se que a criação de externalidades econômicas

juridicamente bem-intencionadas seja a solução para diversos males. Quanto

a não perseguirem realmente fins de auxílio a atividades privadas de

interesse público, não é comentário com o qual se concorde por inteiro: em

alguns casos – como na cessão de servidores às Organizações da Sociedade

Civil de Interesse Público, o caráter de ‘fomento a atividades privadas de

interesse público’ é, até, bastante destacado. A análise é caso a caso 141

.

Há que se dizer que uma parte da doutrina menciona, ainda, a existência de meios

psicológicos de fomento, consistentes, basicamente, em propaganda pela Administração aos

administrados, sendo estes, todavia, bastante criticados, uma vez que na propaganda não

existe estímulo no sentido de vantagem ou ajuda.142

Ao contrário desse entendimento, Célia Cunha Mello constata que os meios de

comunicação em massa, não raras vezes, traduzem vantagens muito superiores aos estímulos

de natureza econômica, podendo ser admitidos, entretanto, somente quando o Estado,

138

SANTAMARIA PASTOR, Juan Alfonso. Princípios de derecho administrativo general. 2. ed. Madrid:

Iustel, 2009, v. II, p. 360. 139

José Vicente Santos de Mendonça defende que os meios de fomento público são, usualmente, os creditícios e

os econômicos propriamente ditos (subvenção) e que os meios reais podem ser tidos como tais por exceção.

Entende que os meios fiscais não são meios de fomento e sim medidas gerais de política econômica. Ressalva

que a doutrina brasileira, em sua maioria, ao falar de fomento, inclui, tradicionalmente, os benefícios fiscais

dentro da categoria. (MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol

de um fomento público democrático, eficiente e não paternalista. Revista de Direito Processual Geral. Rio de

Janeiro, n. 65, p. 115-176, 2010, p. 148). 140

Em sentido contrário, Sílvio Luís Ferreira da Rocha anota que a classificação dos meios de fomento em

honoríficos, econômicos e jurídicos não é correta, “pois se a atribuição das vantagens honoríficas e

econômicas está prevista em normas, essa espécie de fomento não deixa de ser jurídica.” (ROCHA, Sílvio Luís

Ferreira da. Terceiro Setor. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 35). 141

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento

público democrático, eficiente e não paternalista. Revista de Direito Processual Geral. Rio de Janeiro, n. 65, p.

115-176, 2010, p. 148. 142

A crítica é feita, por exemplo, por Pellisé Prats, Daniel Edgardo Maljar (MALJAR, Daniel Edgardo.

Intervencion del Estado en la prestacion de servicios publicos. Buenos Aires: Hammurabi, 1998, p. 286) e

Héctor Jorge Escola (COMADIRA, Julio Rodolfo; ESCOLA, Héctor Jorge; COMADIRA, Julio Pablo. Curso

de derecho administrativo. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2013, T. I, p. 710). Também para José Vicente

Santos de Mendonça, uma simples sugestão de consumo, contida numa campanha publicitária, é vaga demais

para ser qualificada como um estímulo juridicamente relevante. Ainda segundo o autor: “É curioso notar,

ainda, que, a se considerar os meios psicológicos como meios legítimos de fomento público, eles incidem, a

partir do Poder Público, sobre o mercado consumidor, com vistas a incentivar as empresas privadas. O

esquema tradicional de fomento – pensemos na subvenção – importa ajudar diretamente as empresas, mas não

seu público-alvo.” (MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol

de um fomento público democrático, eficiente e não paternalista. Revista de Direito Processual Geral. Rio de

Janeiro, n. 65, p. 115-176, 2010, p. 147).

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acenando com medidas psicológicas, estimula os sujeitos fomentados a fazerem aquilo que

convém ao Poder Público.143

5.3 Meios de fomento segundo os fins a alcançar

Expostas as classificações tradicionais dos meios de fomento, assim como suas

principais críticas, insta notar, finalmente, que no Direito pátrio é possível aludir a uma outra

classificação, formulada por Diogo de Figueiredo Moreira Neto e feita “sob critério dos fins a

alcançar e não dos meios empregados, pois esses poderão ser diversificadíssimos, como os

creditícios, financeiros, técnicos, burocráticos, tributários etc., conforme prefiram e

disponham os legisladores [...].”144

Para Moreira Neto o fomento público subdivide-se em quatro grandes blocos: a) o do

planejamento estatal – no sistema vigente, adota-se o modelo do planejamento democrático,

direcionado para servir de fundamento racionalizador para o exercício da função

administrativa de fomento público. Conciliam-se as vantagens técnicas do planejamento com

as liberdades democráticas (nessa classificação, incluem-se o desenvolvimento regional e a

atividade econômica suplementar do Estado à iniciativa privada); b) o do fomento social –

tem como o destinatário direto o homem e envolve a multiplicação de instrumentos de amplo

alcance coletivo destinados a auxiliá-lo para o desfrute de uma vida digna e produtiva

(incluem-se no fomento social o fomento à educação, à pesquisa, à informação, ao trabalho,

cultura, lazer e desportes, ao turismo, ao ambiente, ao rural e reforma agrária); c) o do

fomento econômico - é voltado à realização de tarefas que ultrapassam as possibilidades do

indivíduo isolado (envolve o fomento empresarial, o cooperativo, o de atividades econômicas

primárias, o científico e tecnológico e o financeiro e creditício e, por fim; d) o do fomento

institucional - está relacionado com os novos canais de participação da sociedade, cada vez

mais consciente e demandante, e com a participação colaborativa.145

De acordo, portanto, com a perspectiva apresentada por Moreira Neto, o fomento

público à inovação está compreendido no fomento público econômico.

5.4 Classificação do fomento segundo os tipos de ponderação e seus destinatários

143

MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 90. 144

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e

parte especial. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 525. 145

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e

parte especial. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 525-555.

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52

Ricardo Marcondes Martins alude ao fomento abstrato e ao fomento concreto. O

abstrato depende de ponderação abstrata; o concreto, de ponderação concreta. Pode se

destinar a um gênero, categoria ou tipo – fomento geral, ou a pessoas determinadas – fomento

individual. A seu entender, o fomento tributário negativo, o tributário positivo e o honorífico

são sempre abstratos e gerais. O fomento real é, em regra, individual e concreto. O fomento

por subvenção e o creditício podem ser abstratos ou concretos.146

Embora todas as classificações apresentadas mostrem-se úteis, na medida em que

permitem, mediante diferentes enfoques, a melhor compreensão do assunto, no presente

trabalho, adota-se a classificação de Diogo de Figueiredo Moreira Neto, considerando-se o

fomento público à inovação tecnológica espécie do fomento público econômico.

A escolha é devida em razão dos seguintes motivos: a classificação de Diogo de

Figueiredo Moreira Neto é a mais pragmática de todas.

A tecnologia está vinculada ao conhecimento aplicado, relacionando-se notadamente ao

desempenho das atividades empresariais.

Além disso, os instrumentos de fomento público à inovação tecnológica, muito variados

e pouco sistematizados, não podem ser resumidos, por exemplo, nas subvenções, ainda que

possuam todos fundo econômico. A inovação, por si só, também tem objetivos econômicos.

De fato, o fomento público à inovação tecnológica, independentemente dos

instrumentos por meio dos quais se manifesta, visa a orientar a aplicação de recursos

econômicos pela iniciativa privada, intervindo na sua conduta. Esta é a essência do instituto.

A classificação em tela, apresentada por Moreira Neto, é a mais adequada, portanto,

para os fins deste trabalho.

146

MARTINS, Ricardo Marcondes. Regulação administrativa à luz da constituição federal. São Paulo:

Malheiros, 2011, p. 267.

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PARTE II – O FOMENTO PÚBLICO À INOVAÇÃO TECNOLÓGICA NO DIREITO

BRASILEIRO

6. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988, A CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE

SÃO PAULO DE 1989 E O FOMENTO PÚBLICO À INOVAÇÃO TECNOLÓGICA

Embora a preocupação com o ensino da ciência tenha sido uma constante, desde a Carta

de 1824,147

é somente a partir do Texto de 1988 que se inscreve na história constitucional

pátria um Capítulo inteiro dedicado à ciência, à tecnologia e ao seu fomento – o Capítulo IV –

Da Ciência e Tecnologia, do Título da Ordem Social – passando, portanto, a matéria, a

adquirir maior relevo, em consonância com a sua expansão no mundo atual.148

Fazendo uso, intensamente, das palavras fomento, amparo, incentivo, promoção,

estímulo e apoio, a Constituição de 1988 dispõe não somente sobre os desenvolvimentos

científico e tecnológico, econômico, regional, nacional, abordando, de igual sorte, os

desenvolvimentos social, cultural, educacional, e humano, sendo, deste modo, bastante

extenso o rol de medidas fomentadoras das ordens econômico-financeira e social.

O Diploma não faz menção alguma à palavra inovação, encontrando-se o tema, todavia,

há alguns anos, no centro de debates relacionados ao aumento da competição empresarial, à

expansão da industrialização e à busca da autonomia tecnológica nacional, podendo-se aludir,

nos dias de hoje, inclusive, à existência de um ordenamento jurídico da inovação.149-150

147

Na Constituição de 1824 não havia qualquer tipo de citação à palavra desenvolvimento (social, econômico,

cultural, científico, tecnológico, nacional, regional ou de qualquer outra natureza). De igual forma, inexistia no

texto constitucional referência às palavras tecnologia, pesquisa, inovação, amparo, fomento, promoção e

incentivo. Em Título que tratava das Disposições Gerais, Garantias dos Direitos Civis, e Políticos dos

Cidadãos Brasileiros, a Constituição de 1824, porém, previa, expressamente, o direito de propriedade dos

autores em relação às suas descobertas, assim como a garantia de colégios e universidades onde seriam

ensinados os elementos das ciências, belas letras e artes: “Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e

Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é

garantida pela Constituição do Imperio, pela maneira seguinte. [...] XXII. E' garantido o Direito de

Propriedade em toda a sua plenitude. Se o bem publico legalmente verificado exigir o uso, e emprego da

Propriedade do Cidadão, será elle préviamente indemnisado do valor della. A Lei marcará os casos, em que

terá logar esta unica excepção, e dará as regras para se determinar a indemnisação. [...] XXVI. Os inventores

terão a propriedade das suas descobertas, ou das suas producções. A Lei lhes assegurará um privilegio

exclusivo temporario, ou lhes remunerará em resarcimento da perda, que hajam de soffrer pela vulgarisação.

XXXII. A Instrucção primaria, e gratuita a todos os Cidadãos. XXIII. Collegios, e Universidades, aonde serão

ensinados os elementos das Sciencias, Bellas Letras, e Artes.” (Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao24.htm>. Acesso em: 01 jun. 2013). 148

BITTAR, Carlos Alberto. O direito civil na Constituição de 1988. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 1991, p. 147. 149

Não obstante a ausência de citação expressa, na Constituição de 1988, à palavra inovação, é certo que o

assunto permeava, naquela época, os debates da sociedade brasileira. Cândido Mendes, em trabalho que

buscou refletir as propostas da Comissão Arinos acerca do tema, já destacava que: “No registro de obtenção de

objetivos, o regime da Cultura, Ciência e Tecnologia aparece como particularmente suscetível ao avanço da

perspectiva pluralística dentro de uma diversificação crescente, na perseguição de políticas públicas

concernentes: [...] b) no âmbito da Ciência, à oportunidade de considerar-se ao lado da política de amparo à

ciência pura, o apoio público à ciência aplicada, superando-se as demandas do desenvolvimento referidas ao

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Tamanha a relevância da ciência e da tecnologia para o constituinte, imprescindíveis à

inovação tecnológica, que este não pôde deixar de inseri-las em diversos outros dispositivos

da Lei Maior, além daqueles consagrados no já citado Capítulo IV.151

De fato, diante da elaboração de uma Constituição eminentemente democrática, o papel

da ciência e da tecnologia não poderia ficar à margem dos trabalhos realizados, tendo sido

debatido pela Comissão da Família, Cultura e Esportes, da Ciência e da Tecnologia, por meio

seu estrito enfoque tecnocrático; c) no domínio da tecnologia, à valorização social dos processos inovadores e,

ao longo prazo, ao reconhecimento imperativo de uma política pública que favoreça a vigência social dos

procedimentos inovatórios e do impacto que podem vir a ter sobre a aceleração do esforço nacional de

mudança”. (MENDES, Cândido. A inconfidência brasileira: a nova cidadania interpela o constituinte. Rio de

Janeiro: Forense-Universitária, 1986, p. 62). Os grifos são nossos. 150

Segundo Gilberto Bercovici “A atual política de consolidação e fortalecimento do sistema brasileiro de

fomento à ciência e tecnologia está inserida em um contexto econômico internacional de intensa competição,

buscando reverter o ciclo de esvaziamento e sucateamento instaurado no país com as políticas de corte

neoliberal da década de 1990. O Brasil vem tentando estruturar seu próprio Sistema Nacional de Inovação,

com a adoção de uma série de políticas e atuação de instituições públicas e privadas (a articulação essencial

entre os atores da “tripla hélice”: academia, governo e setor privado) voltadas para o desenvolvimento e a

difusão de novas tecnologias. O fundamento jurídico desta política de inovação está no que se chama hoje de

ordenamento jurídico da inovação, estruturado a partir dos arts. 3º, 170, 218 e 219 da CF/1988.”

(BERCOVICI, Gilberto. Ciência e inovação sob a constituição de 1988. Revista dos Tribunais, São Paulo, n.

916, p. 268-295, fev. 2012, p.290). Os grifos são nossos. 151

Confira-se: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos

brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à

segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos

industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade

das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o

desenvolvimento tecnológico e econômico do País;”; “Art. 23. É competência comum da União, dos Estados,

do Distrito Federal e dos Municípios: [...] V - proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à

ciência;”; “Art. 187. A política agrícola será planejada e executada na forma da lei, com a participação efetiva

do setor de produção, envolvendo produtores e trabalhadores rurais, bem como dos setores de comercialização,

de armazenamento e de transportes, levando em conta, especialmente: [...] III - o incentivo à pesquisa e à

tecnologia;”; “Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei: [...]

V - incrementar em sua área de atuação o desenvolvimento científico e tecnológico;”; “Art. 207. As

universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e

obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. § 1º É facultado às

universidades admitir professores, técnicos e cientistas estrangeiros, na forma da lei. (Incluído pela Emenda

Constitucional nº 11, de 1996). § 2º O disposto neste artigo aplica-se às instituições de pesquisa científica e

tecnológica. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 11, de 1996).”; “Art. 213. Os recursos públicos serão

destinados às escolas públicas, podendo ser dirigidos a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas,

definidas em lei, que: [...] § 2º - As atividades universitárias de pesquisa e extensão poderão receber apoio

financeiro do Poder Público.”; “Art. 214. A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração decenal,

com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes,

objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em

seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes

esferas federativas que conduzam a: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009) I - erradicação

do analfabetismo; II - universalização do atendimento escolar; III - melhoria da qualidade do ensino; IV -

formação para o trabalho; V - promoção humanística, científica e tecnológica do País. VI - estabelecimento

de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto. (Incluído

pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009)’; “Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de

natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade,

à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: [...] III - as

criações científicas, artísticas e tecnológicas; [...] V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico,

paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.” Os grifos são nossos. (Disponível

em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em: 18 nov.

2013).

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de sua Subcomissão da Ciência e da Comunicação, com a participação de vários segmentos da

sociedade, dentre os quais o então Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) (atualmente,

Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação), a Sociedade Brasileira para o Progresso da

Ciência (SBPC), as universidades e centros de pesquisa (federais e estaduais), além de

representantes de empresas nacionais.152

Percorrendo o caminho do chamado Estado de bem-estar social, a Constituição de 1988,

segundo lição de Luiz Alberto David Araujo e Vidal Serrano Nunes Júnior,

identificou como objetivos fundamentais da República, dentre outros, a

construção de uma sociedade justa, a erradicação da pobreza e a redução das

desigualdades sociais. Tais objetivos foram incorporados, ainda uma vez,

pelas regras constitucionais da economia (arts. 170 e s.), que, por disposição

textual, ficou jungida à valorização do trabalho e à realização da justiça

social. Além disso, a educação e a saúde deixaram de ser tratadas como

programas de caráter indicativo, para integrar o rol de Direitos Fundamentais

do cidadão.153

Uma vez que a Lei Maior de 1988 previu um amplo catálogo de direitos sociais, a busca

do bem-estar social não pode deixar de ser considerada na tarefa de delimitar o perfil

constitucional do Estado brasileiro.154

Por essa razão, importa sublinhar, sempre tendo em vista a potencial conexão entre

inovação tecnológica e desenvolvimento, que a garantia do desenvolvimento nacional

constitui objetivo fundamental da República, nos termos do artigo 3º, da Carta Magna,155

devendo esse objetivo coexistir com os objetivos de construção de uma sociedade livre, justa

e solidária; de erradicação da pobreza, da marginalização e da redução das desigualdades

sociais e regionais; assim como da promoção do bem de todos, sem preconceitos e

discriminações de quaisquer naturezas.

Nessa senda, ensinam Oscar Vilhena Vieira e Dimitri Dimoulis que a Carta de 1988 é

típica do reencontro entre constitucionalismo e desenvolvimento no sentido coletivo-social do

152

AMORA, Ana Paula Soares. Licitações e contratos na ciência, tecnologia e inovação. Boletim de Licitações e

Contratos. São Paulo: Nova Dimensão Jurídica, p. 457-466, maio 2011, p. 457. 153

ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 16 ed. São

Paulo: Verbatim, 2012, p. 131. 154

ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 16 ed. São

Paulo: Verbatim, 2012, p. 132. 155

Confira-se: “Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma

sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a

marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos

de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 18 nov. 2013.

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termo, não significando a Constituição mera limitação do poder estatal e não se esgotando o

desenvolvimento no mero crescimento econômico.156

Também para Gilberto Bercovici a definição de um conceito de desenvolvimento

constitucionalmente adequado exige que se diferencie a ideia de desenvolvimento da de

crescimento, pois o desenvolvimento é uma mudança qualitativa, e não apenas quantitativa,

englobando, assim, a ideia de crescimento e superando-a. Partindo do conceito de Fábio

Konder Comparato, Bercovici esclarece que:

o desenvolvimento é um processo de longo prazo, induzido por políticas

públicas ou programas de ação governamental em três campos interligados:

econômico, social e político. O elemento econômico consiste no crescimento

endógeno sustentado da produção de bens e serviços. Endógeno, porque

fundado nos fatores internos de produção e não, portanto, de modo

predominante, em recursos advindos do exterior. Crescimento sustentado,

porque não obtido com a destruição dos bens insubstituíveis, constituintes do

ecossistema. O elemento social do processo desenvolvimentista é a aquisição

da progressiva igualdade de condições básicas de vida, isto é, a realização,

para todo o povo, dos direitos humanos de caráter econômico, social e

cultural, como o direito ao trabalho, o direito à educação em todos os níveis,

o direito à seguridade social (saúde, previdência e assistência social), o

direito à habitação e o direito de fruição dos bens culturais. Enfim, o

desenvolvimento integral comporta, necessariamente, um elemento político,

que é a chave da abóbada de todo o processo: a realização da vida

democrática, isto é, a afetiva assunção, pelo povo, do seu papel de sujeito

político, fonte legitimadora de todo o poder e destinatário de seu exercício.157

Sob a perspectiva de que o crescimento econômico não é um fim em si mesmo,

Lafayete Josué Petter pontua ser clara a dicção constitucional, ao discorrer sobre os princípios

gerais da atividade econômica, pois, ao conferir-lhes um significado jurídico, procurou dar-

lhes uma ordem, e, fundando-a no modo de ser capitalista – apropriação privada dos meios de

produção e livre iniciativa – orientou-os com o fim de assegurar a todos existência digna, num

ambiente de justiça social.158

Conforme Calixto Salomão Filho, o conceito de desenvolvimento se identifica com um

processo de conhecimento social que leve à maior inclusão social possível, algo que poderia

se caracterizar como democracia econômica.159

156

VIEIRA, Oscar Vilhena; DIMOULIS, Dimitri. Constituição e desenvolvimento. In: LIMA, Maria Lúcia L.

M. Padua (Coord.). Agenda contemporânea: Direito e economia. 30 anos de Brasil. São Paulo: Saraiva, 2012,

t. 1, p. 382-400, p. 392. 157

BERCOVICI, Gilberto. Constituição econômica e desenvolvimento: uma leitura a partir da Constituição de

1988. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 108. 158

PETTER, Lafayete Josué. Princípios constitucionais da ordem econômica: o significado e o alcance do art.

170 da Constituição Federal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 82. 159

SALOMÃO FILHO, Calixto. Regulação, desenvolvimento e meio ambiente. In: SALOMÃO FILHO, Calixto

(Org.). Regulação e desenvolvimento: novos temas. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 19.

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O direito ao desenvolvimento é considerado, na atualidade, um dos direitos

fundamentais de terceira geração.160

Guilherme Amorim Campos da Silva destaca que foi o jurista senegalês Keba M’Baye

quem, em 1972, em aula inaugural da Terceira Turma do Instituto Internacional de Direitos

Humanos de Estraburgo, se dedicou ao tema do direito de todo o homem a viver e viver

melhor. Foi também em 1972 que o professor espanhol Juan Antonio Carillo Salcedo

sustentou a mesma concepção, precisando que o direito ao desenvolvimento é um direito

humano e um direito dos povos, que traz o corolário de que todos os homens e todos os

povos, sem distinção, contribuirão para um desiderato comum da humanidade.161

Silva ressalta que o artigo XXII, da Declaração Universal dos Direitos Humanos,

consagra que toda pessoa, como membro da sociedade, tem direito à segurança social e à

realização, pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a

organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais

indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento de sua personalidade. Anota,

ademais, que o direito ao desenvolvimento está contido, essencialmente, nos capítulos VII,

VIII e IX da Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA) e nos Pactos

Internacionais de Direitos Humanos, assim como na encíclica de Paulo VI, de 1967, “Sobre o

Desenvolvimento dos Povos”.162

Apreciando o desenvolvimento sob a ótica do humanismo, também Wagner Balera

anota que este deve incorporar as categorias do humanismo integral, servindo de

“instrumental capaz de habilitar a pessoa e os povos para que alcancem os melhores de seus

atributos: a dignidade individual (primeiro dos valores universais) e a dignidade nacional”.163

Balera destaca o Capítulo VII, da Carta da Organização dos Estados Americanos (OEA)

que, dentre outras disposições, propugna que:

Art 30 Os Estados membros, inspirados nos princípios de solidariedade e

cooperação interamericanas, comprometem-se a unir seus esforços no

sentido de que impere a justiça social internacional em suas relações e de

que seus povos alcancem um desenvolvimento integral, condições

indispensáveis para a paz e a segurança. O desenvolvimento integral abrange

os campos econômico, social, educacional, cultural, científico e tecnológico,

160

Também são considerados direitos fundamentais de terceira geração: o direito à paz, o direito ao meio

ambiente e os direitos de propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade e de comunicação.

(BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 27. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 587). 161

SILVA, Guilherme Amorim Campos da. Direito ao desenvolvimento. São Paulo: Método, 2004, p. 41. 162

SILVA, Guilherme Amorim Campos da. Direito ao desenvolvimento. São Paulo: Método, 2004, p. 161. 163

BALERA, Wagner. Humanismo e desenvolvimento. In: SOUZA, Carlos Aurélio Mota de; CAVALCANTI,

Thais Novaes (Coord.). Princípios humanistas constitucionais: reflexões sobre o humanismo do século XXI.

São Paulo: Letras Jurídicas, 2010, p. 399-417, p. 401.

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nos quais devem ser atingidas as metas que cada país definir para alcançá-

lo.164

Ainda conforme lição de Guilherme Amorim Campos da Silva, do grupo dos direitos

denominados da ‘terceira geração’ dos direitos humanos ou direitos de solidariedade, foi o

direito ao desenvolvimento o primeiro a ser reconhecido como direito humano. De fato, em

1977, a Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas o reconheceu como tal e quatro

anos depois, em 1981, a Assembleia Geral da Organização Mundial, em sua Resolução

36/133, aprovou que o direito ao desenvolvimento é um direito humano inalienável.165

Diversos Tratados assinados e ratificados pelo Brasil, como a Carta das Nações Unidas,

de 1945; o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, de 1966; o Pacto Internacional

dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e a Convenção Americana de Direitos

Humanos, de 1969, estabeleceram, de algum modo, a busca do desenvolvimento baseada no

respeito à autodeterminação dos povos e aos princípios de solidariedade econômica

internacional.166

Coube, finalmente, ao Relatório Bruntland, de 1987 – Nosso Futuro Comum

sistematizar os princípios daquilo que veio a se denominar desenvolvimento sustentável,

entendido como um contínuo processo de transformação e de mudança, envolvendo múltiplas

dimensões – econômica, social, ambiental e política.167

Nesse contexto, emerge a inovação “como uma das contribuições mais determinantes na

busca de um desenvolvimento sustentável efetivo em suas múltiplas dimensões.”168

Em estudo acerca do Direito, da desigualdade e do desenvolvimento, Diogo R.

Coutinho destaca que, na grande maioria das economias capitalistas, o desenvolvimento,

entendido como o resultado do processo pelo qual a assimilação de novas técnicas e o

aumento da produtividade levam a melhorias no bem-estar da população e à homogeneização

social, é mais exceção do que regra. Registra que pobreza e desigualdade impactam

164

BALERA, Wagner. Humanismo e desenvolvimento. In: SOUZA, Carlos Aurélio Mota de; CAVALCANTI,

Thais Novaes (Coord.). Princípios humanistas constitucionais: reflexões sobre o humanismo do século XXI.

São Paulo: Letras Jurídicas, 2010, p. 399-417, p. 402. 165

SILVA, Guilherme Amorim Campos da. Direito ao desenvolvimento. São Paulo: Método, 2004, p. 43. 166

SILVA, Guilherme Amorim Campos da. Direito ao desenvolvimento. São Paulo: Método, 2004, p. 45-47. 167

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Livro azul da 4ª Conferência Nacional de Ciência,

Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Sustentável. Brasília: MCT, 2010, p. 27 168

Segundo o Livro Azul, hoje, o desenvolvimento sustentável está bastante focado na questão energética e na

questão da mudança climática. Considera-se que o sistema de inovação brasileiro está em grande parte

alicerçado em seus recursos naturais. “Do petróleo e das hidrelétricas aos biocombustíveis e ao papel da

Floresta Amazônica no clima, a maior parte das inovações no Brasil está associada à natureza diversificada de

seu território. É das inovações baseadas numa economia do conhecimento da natureza que o País poderá gerar

a riqueza a ser utilizada na superação das carências sociais que nele ainda perduram.” (MINISTÉRIO DA

CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Livro azul da 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação para

o Desenvolvimento Sustentável. Brasília: MCT, 2010, p. 27).

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diretamente as economias do planeta, produzindo os efeitos sociais mais perversos – reduzida

expectativa de vida, menor mobilidade social, maior taxa de população encarcerada e,

inclusive, menor quantidade de inovações, entre outros.169

Investigando a desigualdade no Brasil, o autor esclarece que, diferentemente de outros

países, a pobreza brasileira não resulta da escassez de recursos, estando diretamente

relacionada aos níveis de desigualdade que o País ostenta.170

Na mesma linha, Maria Paula Dallari Bucci sublinha que:

O Estado brasileiro não se encontra no núcleo do sistema mundial não em

consequência de limitações materiais naturais, mas em virtude do insucesso

de estratégias emancipatórias. O atraso econômico, a desigualdade social e

cultural, além do profundo desnível na distribuição de renda, perpetuados

pelos sistemas político e social, devem ser levados em conta na reflexão

sobre as estruturas jurídicas e institucionais do Estado brasileiro, em

particular a Administração Pública.171

Mostra-se evidente, deste modo, o dever de vinculação do fomento público à inovação

tecnológica à concretização do bem-estar da população brasileira, da soberania, da cidadania,

da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, estes

últimos, frise-se, fundamentos do Estado Brasileiro Democrático de Direito.172

Tal vinculação, sem dúvida alguma, constitui um dos mais importantes balizamentos da

ação pública promocional, devendo o fomento público à inovação legítimo estar

comprometido com a consecução dos objetivos fundamentais da República.

Ainda que a constatação possa parecer óbvia e simplista, ela merece ser registrada.

De fato, a ciência e a tecnologia não podem ser pensadas como um setor da sociedade

no qual um grupo de pessoas trabalha desinteressadamente no desenvolvimento do

conhecimento humano.

Nesse sentido, adverte Gilberto Cotrim:

A ciência está atrelada a interesses econômicos e políticos que norteiam a

sua própria ação, seja pela definição do que vai ser pesquisado, seja pela

escolha das áreas que serão beneficiadas com recursos para possibilitar as

pesquisas.

169

COUTINHO, Diogo R. Direito, desigualdade e desenvolvimento. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 13. 170

COUTINHO, Diogo R. Direito, desigualdade e desenvolvimento. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 65. 171

BUCCI, Maria Paula Dallari. Direito administrativo e políticas públicas. São Paulo: Saraiva, 2002, p.3. 172

“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do

Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a

cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o

pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes

eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

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60

Não cabe, enfim, nenhuma ilusão a esse respeito: uma redefinição dos rumos

do desenvolvimento tecnológico implicará, necessariamente, uma

reorientação global da estrutura social.173

Em trabalho realizado no final dos anos 70, Francisco R. Sagasti alertava, criticamente,

sobre as possibilidades e limitações da ciência e da tecnologia. Lembrava que, embora as

aplicações da ciência e da tecnologia em benefício da humanidade pudessem parecer ser

ilimitadas,174

como qualquer outra atividade social, desenvolviam-se dentro de um

determinado contexto; respondendo às demandas específicas da sociedade, expressas por

meio de alguma ordem institucional. Dessa forma, chamava a atenção para o fato de que a

possível contribuição da ciência e da tecnologia aos objetivos do desenvolvimento devia ser

examinada à luz dos fatores políticos e culturais que as condicionavam.175

Advertia, ainda, Sagasti, que estudos da época apontavam que mais de 97% da despesa

mundial em ciência e tecnologia e mais de 90% dos cientistas e engenheiros do mundo

estavam concentrados em países desenvolvidos. Como consequência, a orientação e a forma

de desenvolvimento da ciência e da tecnologia estavam determinadas pelas elites do poder dos

países industrializados. Em resposta a estes interesses é que mais de um terço dos recursos

mundiais para a ciência e tecnologia estavam destinados à produção de armamentos e a trocas

marginais de produtos e processos para estimular um maior consumo de bens não essenciais.

Vale dizer: no final do século XX, a maior parte do conhecimento científico e tecnológico de

que se dispunha correspondia às necessidades e se adaptava às condições dos países

desenvolvidos, ignorando os problemas científicos e tecnológicos próprios dos países

subdesenvolvidos.176-177

Outra limitação merece ser citada - o esforço de reorientação das pesquisas científicas e

tecnológicas para que se ajustem às necessidades do País é muitas vezes interpretado como 173

COTRIM, Gilberto. Fundamentos da filosofia: história e grandes temas. 16 ed. reform. e ampl. São Paulo:

Saraiva, 2006, p. 236. 174

Francisco R. Sagasti recorda, neste particular, que as promessas de uma nova época de prosperidade para

todos, mediante o uso da ciência, tem sido preconizadas desde que Francis Bacon tratou de uma “Nova

Instauração” em princípios do século XVII. (Tecnologia, planejamento e desenvolvimento autônomo. São

Paulo: Perspectiva, 1986, p.1). 175

SAGASTI, Francisco R. Tecnologia, planejamento e desenvolvimento autônomo. São Paulo: Perspectiva,

1986, p. 144. 176

Em relação aos percentuais citados, o autor esclarece, que “Quase toda a tecnologia que se dispõe no mundo

atual foi criada nos países desenvolvidos. O Grupo Sussex estimou que 98% do gasto mundial em pesquisa e

desenvolvimento são feitos pelos países desenvolvidos. Por outro lado, os 2% que os países subdesenvolvidos

gastam são muitas vezes mal usados e dedicados a trabalhos de pesquisa com menor produtividade que a

média de seus equivalentes nos países desenvolvidos.” Os dados da pesquisa constam em SUSSEX GROUP,

Science, Technology and Underdevelopment: The case for Reform. Declaração Introdutória ao Plano Mundial

de Ação de Ciência e Tecnologia das Nações Unidas, Universidade de Sussex, Brighton, 1970) (Tecnologia,

planejamento e desenvolvimento autônomo. São Paulo: Perspectiva, 1986, p. 16). 177

SAGASTI, Francisco R. Tecnologia, planejamento e desenvolvimento autônomo. São Paulo: Perspectiva,

1986. p. 144.

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61

uma violação à liberdade de pesquisa, sendo necessário, portanto, promover a preservação da

liberdade científica sem que esta seja instrumentalizada por interesses ilegítimos do poder

político ou do poder econômico privado.178

O desafio, pois, consiste em criar os meios, os arranjos institucionais e os controles

adequados para que a inovação tecnológica, realizada, de alguma forma, com o fomento

público, possa vir a servir, efetivamente, ao desenvolvimento nacional. O Direito, enquanto

instrumento de implementação de políticas públicas, não pode se manter distante deste

desafio.

Mais do que isso, sendo a pessoa humana o sujeito central de todo o processo de

desenvolvimento, é preciso criar mecanismos jurídicos para que o fomento público à inovação

tecnológica tenha sempre em vista a busca de melhores condições materiais para o bem-estar

a que toda a sociedade e a que todo indivíduo aspiram.

É justamente sob esse aspecto que, para Guilherme Amorim Campos da Silva, o direito

ao desenvolvimento deve ser planejado e compreendido como uma norma jurídica

constitucional, de caráter fundamental, provida de eficácia imediata e impositiva sobre todos

os Poderes da União, com a consequente descrição de um dever do Estado – o de promover o

desenvolvimento econômico nacional, com qualidade de vida de cada cidadão.179

Assim sendo, o incentivo oficial à pesquisa tecnológica justifica-se na medida em que

esta seja voltada às soluções dos problemas brasileiros e ao desenvolvimento dos sistemas

produtivos nacional e regional.180

Pela mesma razão, a importância da pesquisa e da inovação tecnológica no combate à

miséria e à exclusão social não pode ser menosprezada. As políticas de desenvolvimento

científico-tecnológico e de inovação não podem ignorar os problemas essenciais da sociedade

brasileira, sob pena de serem inócuas e de não contribuírem verdadeiramente para a

transformação das estruturas econômicas e sociais do País.181

6.1 O dever constitucional do Estado de promover e incentivar o desenvolvimento

científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas

178

BERCOVICI, Gilberto. Ciência e inovação sob a Constituição de 1988. Revista dos Tribunais, São Paulo, n.

916, p. 268-295, fev. 2012, p. 270. 179

SILVA, Guilherme Amorim Campos da. Direito ao desenvolvimento. São Paulo: Método, 2004, p. 66. 180

SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 838. 181

BERCOVICI, Gilberto. Ciência e inovação sob a Constituição de 1988. Revista dos Tribunais, São Paulo, n.

916, p. 268-295, fev. 2012, p. 294.

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62

Leciona Clóvis Sá Britto Pingret que nem o sistema econômico nem o Estado são

realidades ontológicas, mas puras construções culturais. Por essa razão, as definições dos

institutos não devem ser buscadas em campos metafísicos, mas sim no estabelecido pelo

próprio ordenamento jurídico. “Daí decorre que as funções do Estado não estão determinadas

a priori, mas sim pelo que se acha estabelecido na Lei Fundamental.”182

Nesses termos, passa-se, doravante, a analisar o relacionamento entre o fomento público

à inovação tecnológica e as prescrições das normas constitucionais atinentes aos assuntos da

ciência e tecnologia.

De forma inédita, consoante já referido, a Carta de 1988 prescreveu o dever do Estado

de promover e incentivar o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação

tecnológicas:

Capítulo IV

Da Ciência e Tecnologia

Art. 218. O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a

pesquisa e a capacitação tecnológicas.

§ 1º - A pesquisa científica básica receberá tratamento prioritário do Estado,

tendo em vista o bem público e o progresso das ciências.

§ 2º - A pesquisa tecnológica voltar-se-á preponderantemente para a solução

dos problemas brasileiros e para o desenvolvimento do sistema produtivo

nacional e regional.

§ 3º - O Estado apoiará a formação de recursos humanos nas áreas de

ciência, pesquisa e tecnologia, e concederá aos que delas se ocupem meios e

condições especiais de trabalho.

§ 4º - A lei apoiará e estimulará as empresas que invistam em pesquisa,

criação de tecnologia adequada ao País, formação e aperfeiçoamento de seus

recursos humanos e que pratiquem sistemas de remuneração que assegurem

ao empregado, desvinculada do salário, participação nos ganhos econômicos

resultantes da produtividade de seu trabalho.

§ 5º - É facultado aos Estados e ao Distrito Federal vincular parcela de sua

receita orçamentária a entidades públicas de fomento ao ensino e à pesquisa

científica e tecnológica.

Art. 219. O mercado interno integra o patrimônio nacional e será incentivado

de modo a viabilizar o desenvolvimento cultural e sócio-econômico, o bem-

estar da população e a autonomia tecnológica do País, nos termos de lei

federal.

Observando que a Constituição de 1988 inovou em relação às Constituições anteriores,

por reconhecer de maneira enfática a importância da ciência e tecnologia, Gilberto Bercovici

destaca que:

Esta previsão constitucional está inserida no contexto das relações dialéticas

entre Estado e ciência no século XX, que, segundo Peter Michael Huber, se

182

BARACHO, José Alfredo de Oliveira. O princípio da subsidiariedade: conceito e evolução. In: CAMARGO,

Ricardo Antônio Lucas (Org.). Desenvolvimento econômico e intervenção do Estado na ordem constitucional:

estudos em homenagem ao professor Washington Peluso Albino de Souza. Porto Alegre: Sérgio Antonio

Fabris, 1995, p. 99-138, p. 51.

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63

tornaram simbióticas. A necessidade, expressa constitucionalmente, de uma

política científica visa também garantir a expansão das forças produtivas e o

acesso ao conhecimento para as futuras gerações.

[...]

De acordo com o disposto no art. 218 da CF/88, o papel do Estado na ciência

e na tecnologia é prioritário, enfatizando a necessidade de um planejamento

científico e tecnológico. A política científica e tecnológica está vinculada à

política de desenvolvimento. O que a Constituição de 1988 efetivou foi a

plena incorporação da ciência e da tecnologia ao processo de superação do

subdesenvolvimento e de dependência tecnológica.183

Bercovici ressalta, ainda, que no Brasil, a relevância do Estado é tamanha que o

financiamento de pesquisas cabe quase exclusivamente aos órgãos estatais.184

Nos países

desenvolvidos os recursos investidos pelas empresas em atividades de P&D são em grande

medida financiados por recursos públicos, colocados à disposição do setor privado na forma

de subvenção ou com juros subsidiados.185

A diferença entre o Brasil e esses países mais avançados está no fato de que os

investimentos efetuados pelas empresas brasileiras em atividades de P&D, de modo geral, são

baixos e feitos em sua grande maioria com recursos próprios, havendo, assim sendo, poucos

investimentos privados em atividades de P,D&I.

O setor empresarial privado geralmente importa tecnologia, por entendê-la

economicamente mais vantajosa, devido aos custos e riscos envolvidos na realização de

pesquisas próprias. As filiais de empresas estrangeiras, por seu turno, importam tecnologia de

suas matrizes, enviando recursos para o exterior, sob a justificativa de aquisição de know-

how.186

Daí a importância de estimular o esforço de inovação no setor produtivo nacional.

Analisando o papel do Estado delineado pela Lei Maior, José Afonso da Silva frisa que

é incumbência deste promover e incentivar o desenvolvimento científico, a pesquisa e a

capacitação tecnológicas. Promover, no contexto do artigo 218, para o autor, significa

realizar, por si próprio, especialmente por meio de universidades e institutos especializados187

183

BERCOVICI, Gilberto. Ciência e inovação sob a Constituição de 1988. Revista dos Tribunais, São Paulo, n.

916, p. 268-295, fev. 2012, p. 268. 184

BERCOVICI, Gilberto. Ciência e inovação sob a Constituição de 1988. Revista dos Tribunais, São Paulo, n.

916, p. 268-295, fev. 2012, p. 270. 185

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e

Inovação 2012-2015 – Balanço das atividades estruturantes 2011. Brasília: MCTI, 2012. p 42. 186

BERCOVICI, Gilberto. Ciência e inovação sob a Constituição de 1988. Revista dos Tribunais, São Paulo, n.

916, p. 268-295, fev. 2012, p. 270. 187

Os institutos públicos de pesquisa têm sido pouco estudados, até mesmo nas pesquisas voltadas à área de

engenharia e economia, que tratam da cooperação entre instituições públicas de ensino e de pesquisa e as

empresas. Eles costumam ser abordados de forma genérica, como pertencentes ao mesmo grupo das

universidades. Em regra, oferecem serviços e pesquisas tecnológicos complementares aos da indústria, dando

suporte ao desenvolvimento industrial de seus países (TELLES, Luciana. O papel dos institutos públicos de

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64

e, incentivar, conceder apoios e meios, inclusive a instituições privadas, para a realização

desses objetivos.188

A Constituição Federal prevê, de forma literal, o dever de concessão de apoio e estímulo

às empresas que invistam em pesquisa, criação de tecnologia adequada ao País, formação e

aperfeiçoamento de seus recursos humanos e que pratiquem sistemas de remuneração que

assegurem ao empregado, desvinculada do salário, participação nos ganhos econômicos

resultantes da produtividade de seu trabalho.

Finalmente, complementando a estrutura de normas referentes à inovação, segundo

observado por Denis Borges Barbosa, o artigo 5º, XXIX, da Constituição, prescreve:

Art. 5º [...]

XXIX- a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio

temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à

propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos,

tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e

econômico do País.

Este preceito constitucional dirige-se ao legislador, determinando o conteúdo da

propriedade industrial e a finalidade do mecanismo jurídico a ser criado. Evidencia-se que a

lei ordinária estabelecedora de direitos relativos à propriedade intelectual somente será

constitucional na medida em que atender aos seguintes objetivos: a) visar ao interesse social

pesquisa no desenvolvimento tecnológico e na cooperação universidade-empresa. 2011. 279 f. Tese

(Doutorado) - Escola Politécnica, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011, p. 61, 65 e 254). Segundo Ruy

Quadros, Sandra Brisolla, André Furtado e Roberto Bernardes, os institutos de pesquisa têm uma função muito

importante no sistema científico e tecnológico: “São instituições orientadas para a pesquisa aplicada e o

desenvolvimento tecnológico, que atendem demandas mais orientadas da sociedade e do sistema produtivo.

Boa parte desses institutos tem uma nítida vocação setorial e possui objetivos claramente direcionados para o

desenvolvimento de tecnologias [...] Eles podem ser considerados, na maioria dos casos, um elo entre a

pesquisa acadêmica, que está localizada principalmente nas universidades, e o sistema socioprodutivo.”

(QUADROS, Ruy. et. al. Força e fragilidade do sistema de inovação paulista. In: São Paulo em Perspectiva,

São Paulo, v. 14, n. 3, p. 124-141, p. 127). Para Roberto Mazzoleni e Richard R. Nelson: “Public research

institutions, often but not always conneted with universities, have been in the past important elements of the

structures supporting economic catch-up. Recent changes in the international economic environment, and the

growing scientific basis for contemporany technologies, will make those institutions even more important in

the future. Universities and public labs have contributed to the development of technological capabilities in

different forms across countries and economics sectors. In contrast with current emphasis on university-based

embryonic inventions and fundamental research, effective research programs have predominantly occurred in

the application-oriented sciences and engineering, and have been oriented towards problem-solving, and the

advancement of technologies of interest to a well-defined user-community.” (MAZZOLENI, Roberto;

NELSON, Richard R. Public research institutions and economic catch-up. Research Policy, New York, n. 36,

p. 1512-1528, 2007, p. 1512). 188

SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 837. De

modo geral, diferentemente daquilo que entende José Afonso da Silva, na legislação de inovação, o verbo

“promover” é usado como sinônimo de incentivar, apoiar, estimular, ou seja, fomentar.

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do País; b) favorecer o desenvolvimento tecnológico do País e, c) favorecer o

desenvolvimento econômico do País.189

No Direito Internacional, o Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade

Intelectual relacionados ao Comércio, mais conhecido como Acordo TRIPS (do inglês

Agreement on Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights), assinado e ratificado

pelo Brasil, apresenta cláusulas com objetivos semelhantes:190

ARTIGO 7

Objetivos

A proteção e a aplicação de normas de proteção dos direitos de propriedade

intelectual devem contribuir para a promoção da inovação tecnológica e para

a transferência e difusão de tecnologia, em benefício mútuo de produtores e

usuários de conhecimento tecnológico e de uma forma conducente ao bem-

estar social econômico e a um equilíbrio entre direitos e obrigações.

ARTIGO 8

Princípios

1. Os Membros, ao formular ou emendar suas leis e regulamentos, podem

adotar medidas necessárias para proteger a saúde e nutrição públicas e para

promover o interesse público em setores de importância vital para seu

desenvolvimento sócio-econômico e tecnológico, desde que estas medidas

sejam compatíveis com o disposto neste Acordo.

2. Desde que compatíveis com o disposto neste Acordo, poderão ser

necessárias medidas apropriadas para evitar o abuso dos direitos de

propriedade intelectual por seus titulares ou para evitar o recurso a práticas

que limitem de maneira injustificável o comércio ou que afetem

adversamente a transferência internacional de tecnologia.191

Na mesma trilha da Constituição Federal, dispõe o ordenamento constitucional paulista.

Na Constituição do Estado de São Paulo de 1947 previu-se que o amparo à pesquisa

científica seria propiciado pelo Estado, por intermédio de uma fundação, organizada em

moldes estabelecidos por lei. Estabeleceu-se que, anualmente, o Estado atribuiria a essa

fundação, como renda especial de sua privativa administração, quantia não inferior a meio por

cento do total da sua receita ordinária.192

A Constituição Bandeirante de 1967, por sua vez, prescreveu o dever de manutenção,

pelo Estado, da Fundação de Amparo à Pesquisa, atribuindo-lhe dotação mínima

189

BARBOSA, Denis Borges. O direito constitucional ao desenvolvimento, inovação e a apropriabilidade das

tecnologias. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro:

Lumen Juris, 2011, p. 9-28, p. 13. 190

BARBOSA, Denis Borges. O direito constitucional ao desenvolvimento, inovação e a apropriabilidade das

tecnologias. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro:

Lumen Juris, 2011, p. 9-28, p. 13-15. 191

BARBOSA, Denis Borges. O direito constitucional ao desenvolvimento, inovação e a apropriabilidade das

tecnologias. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro:

Lumen Juris, 2011, p. 9-28, p. 15. 192

A Lei Estadual nº 5.918, de 18/10/1960, autorizou o Poder Executivo a instituir a Fundação de Amparo à

Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). O Decreto Estadual nº 40.132, de 23/5/1962, aprovou os estatutos

da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.

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correspondente a meio por cento da receita de seus impostos, como renda de sua privativa

administração.

Na vigente Constituição Paulista de 1989, tal como na Constituição Federal de 1988,

não há menção textual à palavra inovação, tendo recebido, de toda forma, a ciência e a

tecnologia, tratamento destacado:

CAPÍTULO IV

Da Ciência e Tecnologia

ARTIGO 268 - O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento

científico, a pesquisa e a capacitação tecnológica.

§1º - A pesquisa científica receberá tratamento prioritário do Estado,

diretamente ou por meio de seus agentes financiadores de fomento, tendo em

vista o bem público e o progresso da ciência.

§2º - A pesquisa tecnológica voltar-se-á preponderantemente para a solução

dos problemas sociais e ambientais e para o desenvolvimento do sistema

produtivo, procurando harmonizá-lo com os direitos fundamentais e sociais

dos cidadãos.

ARTIGO 269 - O Estado manterá Conselho Estadual de Ciência e

Tecnologia com o objetivo de formular, acompanhar, avaliar e reformular a

política estadual científica e tecnológica e coordenar os diferentes programas

de pesquisa.

§1º - A política a ser definida pelo Conselho Estadual de Ciência e

Tecnologia deverá orientar-se pelas seguintes diretrizes:

1 - desenvolvimento do sistema produtivo estadual;

2 - aproveitamento racional dos recursos naturais, preservação e recuperação

do meio ambiente;

3 - aperfeiçoamento das atividades dos órgãos e entidades responsáveis pela

pesquisa científica e tecnológica;

4 - garantia de acesso da população aos benefícios do desenvolvimento

científico e tecnológico;

5 - atenção especial às empresas nacionais, notadamente às médias,

pequenas e microempresas.

§2º - A estrutura, organização, composição e competência desse Conselho

serão definidas em lei.

ARTIGO 270 - O Poder Público apoiará e estimulará, mediante mecanismos

definidos em lei, instituições e empresas que invistam em pesquisa e criação

de tecnologia, observado o disposto no artigo 218, §4º, da Constituição

Federal.

ARTIGO 271 - O Estado destinará o mínimo de um por cento de sua receita

tributária à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, como

renda de sua privativa administração, para aplicação em desenvolvimento

científico e tecnológico.

Parágrafo único - A dotação fixada” no “caput”, excluída a parcela de

transferência aos Municípios, de acordo com o artigo 158, IV da

Constituição Federal, será transferida mensalmente, devendo o percentual

ser calculado sobre a arrecadação do mês de referência e ser pago no mês

subsequente.

ARTIGO 272 - O patrimônio físico, cultural e científico dos museus,

institutos e centros de pesquisa da administração direta, indireta e

fundacional são inalienáveis e intransferíveis, sem audiência da comunidade

científica e aprovação prévia do Poder Legislativo.

Parágrafo único - O disposto neste artigo não se aplica à doação de

equipamentos e insumos para a pesquisa, quando feita por entidade pública

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de fomento ao ensino e à pesquisa científica e tecnológica, para outra

entidade pública da área de ensino e pesquisa em ciência e tecnologia.

Como se pode depreender, a Constituição Paulista é ainda mais explícita de que a

Constituição Federal de 1988 em relação à necessidade de vinculação da pesquisa tecnológica

aos problemas sociais e ambientais, assim como em relação à necessidade de sua

harmonização com os direitos fundamentais do cidadão.

Tal como a Constituição Federal, na Constituição do Estado também se verifica a

previsão de que o Poder Público deverá apoiar e estimular, mediante mecanismos definidos

em lei, instituições e empresas que invistam em pesquisa e criação de tecnologia.

Sem correspondência na Lei Maior de 1988, a Constituição Bandeirante estabelece que

o patrimônio físico, cultural e científico dos museus, institutos e centros de pesquisa da

administração direta e indireta são inalienáveis e intransferíveis, sem audiência da

comunidade científica e aprovação prévia do Poder Legislativo.

Disposições tais como a consignada no artigo 272, da Constituição Bandeirante, podem

impactar o sistema paulista de inovação.

Nos termos da Lei nº 9.279/1996, que trata sobre direitos e obrigações relativos à

propriedade intelectual, os direitos de propriedade intelectual, que podem constituir

importantes mecanismos de proteção da inovação, consideram-se bens móveis, para os efeitos

legais – vale dizer – a princípio e em tese, pode haver restrições na alienação de direitos de

propriedade intelectual pertencentes ao patrimônio das entidades públicas paulistas, o que

pode ser algo não necessariamente benéfico, podendo resultar insegurança tanto para as

pessoas que pretenderem a alienação de referidos direitos, como às pessoas que pretenderem a

sua aquisição.

De fato, não raras vezes, projetos cooperativos de P,D&I geram criações passíveis de

proteção, facultando a legislação infraconstitucional às entidades públicas a faculdade de

celebrar contratos de transferência de tecnologia e de licenciamentos. Nessas hipóteses,

continuariam sendo exigidas a audiência da comunidade científica e a prévia aprovação do

Poder Legislativo? Segundo o texto constitucional, a resposta é positiva, não se coadunando

com as práticas das entidades públicas nesse particular.

6.2 Competências dos entes federativos para a promoção de medidas de fomento à

inovação tecnológica

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Embora a inovação tecnológica e, de modo geral, a inovação, tenham passado a ocupar,

nos últimos anos, lugar de destaque na agenda do desenvolvimento nacional, não há na

Constituição Federal, consoante antes mencionado, previsão textual dos termos “inovação” e

“inovação tecnológica”.

No que tange, especificamente, às competências estabelecidas na Lei Maior, nem

mesmo o termo “ciência e tecnologia” encontra-se relacionado no rol das matérias de

competência legislativa concorrente dos entes federados, constante de seu artigo 24.

Matérias correlatas, como educação, saúde e meio ambiente são objeto de competência

concorrente. Quando determinada disciplina relativa à ciência e tecnologia guardar relação

com tais matérias, poder-se-á cogitar da edição, pela União, de normas gerais, vinculantes de

todos os entes federados, a teor do art. 24, §1º, da Carta Magna. Quando isso não ocorrer,

contudo, entende-se que competirá a cada ente federado dispor livremente sobre a matéria,

não sendo dado ao legislador federal criar normas vinculantes para Estados e Municípios.193

Há que se observar, outrossim, que no artigo 218, o termo “Estado” é utilizado de forma

genérica, para incluir todos os entes políticos. Referido termo é repetido nos parágrafos do

artigo, sempre com a mesma conotação. O § 4º, do mesmo artigo 218, também não especifica

a que tipo de lei se refere, permitindo concluir se tratar de lei de qualquer dos entes federados.

Com efeito, o estímulo a empresas que invistam em pesquisa e tecnologia pode se dar das

mais variadas formas, inclusive por benefícios tributários, cabendo a cada ente, no uso de sua

competência tributária, disciplinar tais incentivos.194

Apenas no artigo 219, da Constituição, encontra-se um mandamento dirigido

diretamente ao legislador federal, mas não no sentido de edição de normas gerais.

Analisando a questão da competência dos entes federativos para promover medidas de

fomento, Floriano Peixoto de Azevedo Marques Neto destaca que o fomento é uma das

formas de intervenção na ordem econômica prevista na Constituição e por ela atribuída a

todos os entes da federação. O Estado referido nos artigos 173 e 174 e o Poder Público

aludido no artigo 175, da Lei Maior, correspondem à universalidade dos entes da federação,

193

SENADO FEDERAL. Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Parecer aprovado sobre o Projeto de

Lei do Senado nº 619/2011, relator Senador Luiz Henrique da Silveira, 2013, p. 9. Disponível em:

<http://www.sendado.gov.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=143553&tp=1. Acesso em: 05 nov. 2014. 194

SENADO FEDERAL. Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Parecer aprovado sobre o Projeto de

Lei do Senado nº 619/2011, relator Senador Luiz Henrique da Silveira, 2013, p. 9. Disponível em:

<http://www.sendado.gov.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=143553&tp=1. Acesso em: 05 nov. 2014.

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cumprindo a todos eles, de forma comum e indistinta, a consecução dos objetivos e princípios

constantes do artigo 170.195

Para Diogo de Figueiredo Moreira Neto, para o desempenho das funções

administrativas de execução do fomento público inexistem privatividade, exclusividade,

reserva legislativa ou administrativa, que inibam os entes políticos de empregá-las ampla e

intensamente, com exceção, apenas, de duas, que são constitucionalmente disciplinadas: o

planejamento estatal (art. 174) e a exploração econômica pelo Estado (art. 173).196

Pode-se concluir daí que também o estabelecimento de medidas para o fomento público

à inovação tecnológica compete a todos os entes federativos.

6.3 Ciência, tecnologia, pesquisa, capacitação e autonomia tecnológicas

Para tentar melhor apreender o importante papel do Estado no fomento à inovação

tecnológica, é mister tecer algumas considerações, ainda que perfunctórias, sobre ciência,

tecnologia, pesquisa, capacitação, autonomia e inovação tecnológicas.

Ensina José Afonso da Silva que o termo ciência, utilizado no artigo 218, da

Constituição, tem o sentido geral de conhecimento sistematizado, dizendo respeito a qualquer

das ciências:

[...] o saber científico resulta da formulação conceptual das leis que regem o

fenômeno dos diversos objetos que constituem a realidade – e é essa

especificação de objetos e das respectivas leis que dá nascimento às ciências

particulares. Todas elas estão envolvidas no termo genérico ‘ciência’, assim

como nas expressões ‘desenvolvimento científico’, ‘pesquisa científica

básica’ (art. 218 da CF) e ‘atividade científica’ (art. 5º, IX). É nesse sentido

que se fala que ciência é o conjunto de conhecimento e de pesquisa com

suficiente unidade, generalidade, suscetível de conduzir o homem que a ela

se consagra a conclusões concordantes (leis harmônicas) que resultam de

relações objetivas que se descobrem gradualmente e que se confirmam por

métodos de verificação definida.197

Se a técnica, enquanto capacidade de organizar elementos materiais para a fabricação de

instrumentos de que se serve o homem na produção e construção de obras, é muito antiga, a

tecnologia, lado prático do saber, é a etapa revolucionária da técnica, que incorpora pesquisa

científica e também tecnológica, para a obtenção de resultados produtivos.198

195

MARQUES NETO, Floriano Peixoto de Azevedo. O fomento como instrumento de intervenção estatal na

ordem econômica. Revista de Direito Público da Economia- RDPE, Belo Horizonte, ano 8, n. 32, out./dez.

2010. Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/PDI0006.aspx?pdiCntd=70679. Acesso em: 14 jul. 2013.

(documento não paginado). 196

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e

parte especial. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 525. 197

SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 836. 198

SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 837.

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70

Como sistematização racional do conhecimento, a ciência encontra seu estímulo no

campo educacional e cultural, estando a tecnologia, na qualidade de conhecimento aplicado,

relacionada à atividade empresarial.199-200

Considerando que a Constituição diferencia pesquisa científica básica de pesquisa

tecnológica, urge verificar como estas, na prática, se distinguem.

A pesquisa científica básica refere-se à produção de conhecimentos básicos e

potencialmente utilizáveis que não podem ser incorporados diretamente às atividades

produtivas. Há poucas chances de apropriar os seus resultados com fins econômicos, sendo

prioridade a sua publicação e divulgação. Já a pesquisa tecnológica, também chamada de

pesquisa aplicada, está voltada ao desenvolvimento experimental, à adaptação de tecnologias,

à transferência de tecnologias, à pesquisa de produção e outras atividades que produzem e

aumentam o conhecimento disponível para ser incorporado diretamente a atividades

produtivas. As atividades envolvidas no conceito de política tecnológica têm como

199

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e

parte especial. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 543. 200

De acordo com da Financiadora de Estudos e Projetos - FINEP, ciência e tecnologia podem assim ser

definidas, respectivamente: “CIÊNCIA - Conjunto organizado dos conhecimentos relativos ao universo,

envolvendo seus fenômenos naturais, ambientais e comportamentais. A geração do conhecimento científico se

faz através da pesquisa ou investigação científica, seguindo as etapas do método ou metodologia

científica. LONGO, W.P. Conceitos Básicos sobre Ciência e Tecnologia. Rio de Janeiro, Finep, 1996. v.1.

OECD. Frascati Manual. Paris, OCDE, 1993, cap.2, pag.2”; “TECNOLOGIA - "Tecnologia é o conjunto

ordenado de conhecimentos empregados na produção e comercialização de bens e serviços, e que está integrada

não só por conhecimentos científicos - provenientes das ciências naturais, sociais, humanas, etc. -, mas

igualmente por conhecimentos empíricos que resultam de observações, experiência, atitudes específicas, tradição

(oral ou escrita), etc. Sábato 1972:1 citado em Barbosa, 1981, pág. 19” ou ou “TECNOLOGIA - Tecnologia é

o conjunto organizado de todos os conhecimentos científicos, empíricos ou intuitivos, empregados na produção e

comercialização de bens e serviços. A tecnologia gerada ou aperfeiçoada pela pesquisa e desenvolvimento

experimental pode exigir diferentes graus de elaboração até o seu emprego numa unidade produtiva. Essa

elaboração exige os serviços especializados de engenharia. Em outras palavras, a tecnologia produzida pela

pesquisa e desenvolvimento experimental tem que ser "engenheirada" para poder ser utilizada pelo setor

produtivo. Assim, para que os conhecimentos gerados pelas universidades, institutos e outras organizações

envolvidas em pesquisa e desenvolvimento tenham resultado concreto no setor produtivo, há que se cuidar do

estabelecimento de alta competência em se "engenheirar". A estreita ligação entre Ciência e Tecnologia fez

surgir o binômio Ciência e Tecnologia - C&T e a forma de se comunicar estes conhecimentos é através da

informação. LONGO, W.P. Conceitos Básicos sobre Ciência e Tecnologia. Rio de Janeiro, Finep, 1996. v.1. Ou

ainda “TECNOLOGIA - O termo tecnologia tem uma ampla conotação e refere-se às técnicas, métodos,

procedimentos, ferramentas, equipamentos e instalações que concorrem para a realização e obtenção de um ou

vários produtos. O termo implica o que fazer, por quem, por quê, para quem e como fazer. Em geral, divide-se a

tecnologia em duas grandes categorias: tecnologia de produto e tecnologia de processo. As de produto são

aquelas cujos resultados são componentes tangíveis e facilmente identificáveis, tais como: equipamentos,

instalações físicas, ferramentas, artefatos, etc. As de processo são aquelas em que se incluem as técnicas,

métodos e procedimentos utilizados para se obter um determinado produto.

IBICT. Rede Nacional de Transferência e Difusão de Tecnologias Apropriadas. Capturado em 17 Ago. 2000. On

line. Disponível na Internet http:// www.ibict.br.” Os grifos são originais. (Glossário. Disponível em:

<http://www.finep.goc.br/o_que_e_a_finep/conceitos_ct.asp. Acesso em: 05 nov. 2014).

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71

característica a apropriação de resultados para fins econômicos, existindo vários mecanismos

para assegurar essa apropriação (como o sistema de patentes e de segredos).201

A pesquisa científica básica deve receber tratamento prioritário do Estado, tendo em

vista o bem público e o progresso das ciências, estando vocacionada ao domínio público.

Nessa esteira, a Lei Federal nº 9.279/1996 prescreve, em seus artigos 8º e 9º, que pode

ser patenteável a invenção que atenda aos requisitos de novidade, atividade inventiva e

aplicação industrial, assim como, na qualidade de modelo de utilidade, o objeto de uso

prático, ou parte deste, suscetível de aplicação industrial, que apresente nova forma ou

disposição, envolvendo ato inventivo, que resulte em melhoria funcional no seu uso ou em

sua fabricação.

Todavia, segundo a Lei nº 9.279/1996, não se consideram invenção nem modelo de

utilidade as descobertas, teorias científicas e métodos matemáticos, dentre outros; as

concepções puramente abstratas e as obras literárias, arquitetônicas, artísticas e científicas ou

qualquer criação estética.

A pesquisa tecnológica, por seu turno, deve voltar-se preponderantemente para a

solução dos problemas brasileiros e para o desenvolvimento do sistema produtivo nacional e

regional.

Verifica-se, consoante Denis Borges Barbosa, uma seleção necessária resultante do

critério constitucional, de modo que, dentre os problemas técnicos advindos da economia

global ou de problemas típicos dos países em desenvolvimento, o apoio estatal deverá

privilegiar o financiamento e o apoio das soluções de problemas nacionais. Destes, terão

ênfase os de apoio ao setor produtivo. Ainda de acordo com o autor, no caso da pesquisa

tecnológica, diferentemente da pesquisa científica básica, a regra é de apropriabilidade da

tecnologia, pois “sem apropriação não há eficiência do investimento; consequentemente não

haverá destinação constitucional adequada.”202

Em sentido contrário, Patrícia Pereira Tedeschi sustenta que apesar de a possibilidade

de apropriação de pesquisas financiadas pelo Estado poder configurar fonte de recursos

financeiros, este não é o objetivo da norma constitucional. A seu ver, para os fins do artigo

201

SAGASTI, Francisco R. Tecnologia, planejamento e desenvolvimento autônomo. São Paulo: Perspectiva,

1986, p. 62. 202

BARBOSA, Denis Borges. O direito constitucional ao desenvolvimento, inovação e a apropriabilidade das

tecnologias. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro:

Lumen Juris, 2011, p. 9-28, p. 17.

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72

218 da Constituição, seria mais coerente garantir a inapropriabilidade de tais resultados e

consequentemente o usufruto por toda sociedade de seus benefícios.203

Discorda-se deste entendimento no qual a inapropriabilidade, na hipótese do artigo 218,

do Diploma Constitucional, seria algo mais coerente. A possibilidade de apropriação dos

resultados da pesquisa tecnológica é uma das formas de incentivo e apoio ao seu

desenvolvimento pelo setor privado. Não houvesse a possibilidade de proteção desses

resultados, possivelmente, muitas empresas deixariam de despender recursos em atividades

tão incertas e custosas como as de inovação, ainda que realizadas em parceria com o Estado.

Quando uma empresa faz uma inovação tecnológica, pode, por exemplo, patentear a

ideia e gozar dos benefícios econômicos dela decorrentes.

[...] a patente internaliza a externalidade dando à empresa um direito de

propriedade sobre sua invenção.204

Se outras empresas quiserem usar a nova

tecnologia, terão que obter permissão das empresas detentoras da patente e

pagar royalties. Assim, o sistema de patentes oferece às empresas um

incentivo adicional para que se dediquem à pesquisa e outras atividades que

façam avançar a tecnologia.205

Além disso, a legislação infraconstitucional prevê mecanismos que objetivam impedir

que inovações de relevante interesse público, realizadas com estímulos públicos, sejam

apropriadas exclusivamente pelo setor privado.206

Feitas as necessárias distinções entre pesquisa científica básica e pesquisa

tecnológica,207

importante ponderar que, segundo alguns autores, na medida em que um país

203

TEDESCHI, Patrícia Pereira. Inovação tecnológica e direito administrativo. 2011. 106 f. Dissertação

(Mestrado) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011, p. 24. 204

Vale esclarecer que inovação e propriedade intelectual não são sinônimos. Segundo Fabrício Polido, Mônica

Steffen Gusie Rosina e Priscilla Maria Dias Guimarães César “Inovação relaciona-se diretamente com o

mercado e o ambiente produtivo e pode surgir e persistir mesmo que não haja direitos de propriedade

intelectual, ao passo que direitos de propriedade intelectual podem ser colocados em vigor ao longo de uma

cadeia que não necessariamente gerará produtos ou processos inovadores hábeis a atingir o mercado em

diversas áreas.” (POLIDO, Fabricio; ROSINA, Mônica Steffen Guise; CÉSAR, Priscilla Maria Dias

Guimarães. Propriedade intelectual: potencialidades e fragilidades do ambiente jurídico-institucional brasileiro

para a inovação. In: SHAPIRO, Mario G.; TRUBEK, David M. (Coord.). Direito e desenvolvimento: um

diálogo entre os BRICS. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 135-180, p. 143). 205

MANKIW, N. Gregory. Introdução à economia. Tradução Allan Vidigal Hastings. São Paulo: Thomson

Learning, 2006, p. 208 (tradução da 3ª edição norte-americana). 206

Tanto a Lei Federal nº 10.973/2004 como a Lei Complementar Paulista nº 1.049/2008 prescrevem que a

transferência de tecnologia e o licenciamento para outorga de direito de uso ou de exploração de criação,

reconhecidos em ato do Poder Executivo como de relevante interesse público, somente poderão ser efetuados a

título não exclusivo. Ainda segundo a Lei nº 10.973/2004, a contratação com cláusula de exclusividade, para

essas finalidades, deve ser precedida de edital. 207

Por oportuno, objetivando esclarecer ainda mais o assunto, podem ser citadas, novamente, as acepções

seguintes, assinaladas pelo Glossário da Financiadora de Estudos e Projetos – FINEP: “PESQUISA

APLICADA- É uma investigação original concebida pelo interesse em adquirir novos conhecimentos. É,

entretanto, primordialmente dirigida em função de um objetivo prático específico. A pesquisa aplicada é

realizada ou para determinar os possíveis usos para as descobertas da pesquisa básica ou para definir novos

métodos ou maneiras de alcançar um certo objetivo específico e pré-determinado. Ela envolve consideração de

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se desenvolve e que a sua ciência e tecnologia se integram ao sistema produtivo, estas

distinções tendem a desaparecer.208

Os objetivos de uma política de desenvolvimento científico e tecnológico devem

considerar a necessidade de reorientar o sistema produtivo, afastando-o dos padrões imitativos

dos países centrais; reduzir a necessidade de tecnologia importada e fortalecer as atividades

científico-tecnológicas nacionais.209

Também os Estados-membros devem perseguir o desenvolvimento do sistema

produtivo em seus respectivos territórios, em harmonia com a política nacional de

desenvolvimento econômico e tecnológico.210

Quanto à capacitação tecnológica, segundo o Glossário da FINEP, pode ser definida

como: CAPACITAÇÃO TECNOLÓGICA- Significa a aquisição de capacidade de

inovar, através principalmente do domínio das tecnologias em uso. É o

estágio prévio e necessário para a ocorrência da inovação. Deve ser o

objetivo principal da política tecnológica no que se refere às empresas. Não

significa substituição de importação de tecnologia, envolvendo em geral,

pelo contrário, compra de tecnologia de origem externa em condições de

efetiva absorção. A capacitação tecnológica é também condição importante

para a interação frutífera entre empresas e centros de P&D. (Os grifos são

originais).211

conhecimento disponível e sua ampliação com vistas à solução de problemas específicos. No Setor

Empresarial, a distinção entre pesquisa básica e aplicada será frequentemente marcada pela criação de um

novo projeto para explorar os resultados promissores de um programa de pesquisa básica. Os resultados da

pesquisa aplicada são hipotética e fundamentalmente válidos para apenas um ou para um número limitado de

produtos, operações, métodos e sistemas. A pesquisa aplicada operacionaliza as ideias. Os conhecimentos ou

informações dela advindos são quase sempre patenteados, podendo contudo se manterem sob sigilo.

(OECD. Frascati Manual. Paris, OCDE, 1993, cap.2, pag.29 )”; “PESQUISA BÁSICA - Estudo teórico ou

experimental que visa contribuir de forma original ou incremental para a compreensão sobre os fatos e

fenômenos observáveis, teorias, sem ter em vista uso ou aplicação específica imediata. A pesquisa básica

analisa propriedades, estruturas e conexões com vistas a formular e comprovar hipóteses, teorias etc. Os

resultados da pesquisa básica, geralmente não negociáveis, são, no mais das vezes, publicados em periódicos

científicos ou postos em circulação entre os pares. Portanto, o cientista gera e consome conhecimento. O

produto da ciência é basicamente um novo conhecimento, que é repassado através da informação, tendo como

suporte o documento. O domínio público da literatura científica faz parte do processo de comunicação

científica. Sua atividade mais importante é a avaliação da produção científica feita pelos pares, pelos

"referees", cujo resultado é determinante para que a publicação ocorra e consequentemente para o seu

reconhecimento. Eventualmente, a pesquisa básica pode ser declarada secreta ou confidencial por razões de

segurança. A pesquisa básica é comumente executada por cientistas que estabelecem suas próprias metas e, em

grande parte, organizam o seu próprio trabalho. Contudo, em alguns casos, a pesquisa básica pode ser

fundamentalmente orientada ou dirigida em função de áreas mais amplas de interesse geral. Tal tipo de

pesquisa é, às vezes, chamado de "pesquisa básica orientada". (OECD. Frascati Manual. Paris, OCDE, 1993,

cap.2, pag.29). Os grifos são originais. (Glossário. Disponível em:

<http://www.finep.goc.br/o_que_e_a_finep/conceitos_ct.asp. Acesso em: 05 nov. 2014). 208

SAGASTI, Francisco R. Tecnologia, planejamento e desenvolvimento autônomo. São Paulo: Perspectiva,

1986, p. 63. 209

BERCOVICI, Gilberto. Ciência e inovação sob a Constituição de 1988. Revista dos Tribunais, São Paulo, n.

916, p 267-295, fev. 2012, p. 271. 210

SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 838. 211

A noção apresentada pela FINEP é de Fábio Celso de Macedo Soares Guimarães em A Política de Incentivo à

Inovação. Rio de Janeiro. Finep, 2000. (Glossário. Disponível em:

<http://www.finep.goc.br/o_que_e_a_finep/conceitos_ct.asp. Acesso em: 05 nov. 2014).

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74

Consoante o Texto para Discussão nº 348, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

(IPEA), a capacitação tecnológica constitui o conjunto de habilidades que sustentam as rotinas

de produção e de melhoramentos da empresa. Essas habilidades localizam-se nas linhas de

produção e em departamentos especializados. A capacitação tecnológica, regra geral, adquire

as seguintes formas: a) capacitação em produção, que constitui o conjunto de habilidades

associadas à operação de plantas e de processos produtivos, à manutenção, ao planejamento

da produção, à otimização de processos, ao controle de qualidade de matérias primas, ao grau

de atualização de equipamentos, etc.; b) capacitação em projeto, que envolve um conjunto de

habilidades orientadas para o empreendimento de novas unidades produtivas. Compreende

uma vasta gama de conhecimentos, desde a identificação e a negociação da tecnologia,

passando pelo desenho básico e de detalhe, até a implantação do projeto; c) capacitação em

pesquisa e desenvolvimento, que consiste no conjunto de habilidades desenvolvidas pela

empresa com vistas à geração de um novo conhecimento científico e tecnológico. Essas

habilidades se situariam nas atividades de pesquisa básica, aplicada ou de desenvolvimento,

que encontrariam lugar em departamentos com pessoal especializado; d) capacitação em

recursos humanos, consistente no conjunto de habilidades acumuladas pelos recursos

humanos da empresa. Para consolidar esse estoque de conhecimentos contidos nos seus

empregados, seja sob a forma de educação formal ou informal, a empresa desenvolve ou

contrata atividades de treinamento em diversos níveis, adota sistemas de carreiras e de

incentivo, políticas de contratação e de manutenção da força de trabalho, qualificada ou

não.212

Para José Afonso da Silva, a capacitação tecnológica é um setor que merece especial

atenção do Poder Público na sua política de estímulo e incentivo ao desenvolvimento

científico e tecnológico, sendo dever do Estado apoiar a formação de recursos humanos nas

áreas de ciência, pesquisa e tecnologia, concedendo, inclusive, aos que delas se ocupem,

meios e condições especiais de trabalho. O autor ressalta a importância do papel da rede

pública de ensino superior na formação de recursos humanos de elevada competência, sem

olvidar, ao mesmo tempo, que “sem a extensão e a qualidade do ensino básico (fundamental e

médio) o país não poderá responder pelos desafios propostos pelas novas tecnologias, cujo

212

FURTADO, André. Capacitação tecnológica, competitividade e política industrial: uma abordagem setorial

e por empresas líderes. Brasília: IPEA, n. 348, 1994, p. 11-14.

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75

grau crescente de complexidade demanda que haja, desde o chão de fábrica, uma mão de obra

preparada e polivalente.”213

Em estudo sobre inovação, via internacionalização, Glauco Arbix, Mario Sergio Salerno

e João Alberto De Negri, registram, no mesmo sentido, que a qualificação da mão-de-obra,

em especial, o seu treinamento e escolaridade, consiste em uma das mais importantes

variáveis na probabilidade de uma empresa inovar. Esclarecem que se a escolarização da

força de trabalho, por si só, não induz as empresas automaticamente à inovação e à

internacionalização, pesquisas indicam que empresas que se internacionalizam com foco na

inovação empregam mão de obra mais escolarizada. Deste modo, uma política de incentivo à

inovação na indústria passa por políticas de aumento da escolaridade da população.214

Finalmente, quanto à autonomia tecnológica, importa mencionar que está relacionada

com a capacidade potencial autônoma de um país produzir internamente os bens e serviços

essenciais para a sua estratégia de desenvolvimento. Por seu turno, a autodeterminação

tecnológica consiste na capacidade de se tomar decisões autônomas em questões de

tecnologia, gerando, de forma independente, os elementos críticos do conhecimento técnico

necessários à obtenção de um processo ou produto.215

Por força de mandamento constitucional, a conquista da autonomia tecnológica é um

objetivo a ser perseguido, devendo o mercado interno, inclusive, ser incentivado de modo a

viabilizá-la.

Com efeito, a dependência tecnológica tem sido considerada um dos principais

instrumentos de geração e preservação de assimetrias no sistema internacional, podendo

comprometer até mesmo a soberania nacional. A manutenção da soberania e da autonomia

dos países depende, hoje, nitidamente, do conhecimento, da educação e do desenvolvimento

científico e tecnológico.216

6.4 Inovação tecnológica

O verbo inovar, oriundo do latim innovatus, remete a tornar novo, renovar, introduzir

mudança. Significa possibilitar a ampla difusão e utilização de uma invenção técnica.

213

SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 7. ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 838. 214

ARBIX, Glauco; SALERNO, Mario Sergio; DE NEGRI, João Alberto. O impacto da internacionalização com

foco na inovação tecnológica sobre as exportações das firmas brasileiras. Revista de Ciências Sociais, Rio de

Janeiro, v. 48, n. 1, p. 395-442, 2005, p. 434. 215

BERCOVICI, Gilberto. Ciência e inovação sob a Constituição de 1988. Revista dos Tribunais, São Paulo, n.

916, p 267-295, p.272, fev. 2012. 216

FRIEDE, Reis. SILVA, André Carlos da. A importância da lei de inovação tecnológica. Revista CEJ,

Brasília, ano XIV, n. 50, p. 34-39, jul./set. 2010, p. 37.

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Melhoras introduzidas em produtos, técnicas de produção ou até mesmo no gerenciamento

empresarial podem ser consideradas inovação.217

Para Fabrício Polido, Mônica Steffen Guise Rosina e Priscilla Maria Dias Guimarães

César, a inovação, frequentemente vista como a principal fonte de lucros da indústria, “é tudo

o que ainda não foi feito e que oferece à empresa algum grau de vantagem sobre seus

concorrentes.”218

Foi Joseph Alois Schumpeter (1883-1950), um dos mais importantes economistas do

século XX, quem, de forma original e pioneira, sustentou a tese de ser a inovação o principal

fator responsável pelo desenvolvimento econômico.219-220

É por essa razão que Schumpeter costuma ser citado, inevitavelmente, em estudos,

manuais e pesquisas relacionados ao tema inovação, nos mais variados campos do saber.

217

POLIDO, Fabricio; ROSINA, Mônica Steffen Guise; CÉSAR, Priscilla Maria Dias Guimarães. Propriedade

intelectual: potencialidades e fragilidades do ambiente jurídico-institucional brasileiro para a inovação. In:

SHAPIRO, Mario G.; TRUBEK, David M. (Coord.). Direito e desenvolvimento: um diálogo entre os BRICS.

São Paulo: Saraiva, 2012. p. 135-180, p. 137. 218

POLIDO, Fabricio; ROSINA, Mônica Steffen Guise; CÉSAR, Priscilla Maria Dias Guimarães. Propriedade

intelectual: potencialidades e fragilidades do ambiente jurídico-institucional brasileiro para a inovação. In:

SHAPIRO, Mario G.; TRUBEK, David M. (Coord.). Direito e desenvolvimento: um diálogo entre os BRICS.

São Paulo: Saraiva, 2012. p. 135-180, p. 137. 219

Ensina Rubens Vaz da Costa: “Precursor da teoria do desenvolvimento capitalista, Schumpeter ofereceu uma

importante contribuição à economia contemporânea, particularmente no estudo dos ciclos econômicos. Enfant

terrible de sua geração, foi sucessivamente advogado de um tribunal internacional no Cairo, conselheiro

econômico de uma princesa egípcia, criador de cavalos, ministro da fazenda na Áustria, filósofo social e

profeta do progresso. Com menos de trinta anos de idade, já tinha escrito dois livros extraordinários: A

Natureza e a Essência da Teoria da Economia Política (1908) e a Teoria do Desenvolvimento Econômico

(1912). Costumava chocar os meios universitários, então extremamente conservadores, ao assistir às reuniões

da Congregação com botas de montaria. Schumpeter nasceu em Triesch, na Morávia, então província

austríaca, a 8 de fevereiro de 1883. Filho único de um rico fabricante de tecidos, pouco se sabe sobre seus pais.

Frequentou a Faculdade de Direito da Universidade de Viena, onde, em 1906, graduou-se igualmente em

Direito e Economia. Depois de formado, viajou por diversos países, entre eles a Inglaterra e o Egito. Ao voltar

à Áustria, já firmara prestígio como brilhante financista e economista, tendo sido convidado, sob a proteção de

Böhm-Bawerk, a lecionar na Universidade de Graz, em 1911. Após o final da Primeira Guerra Mundial, entre

1919 e 1924, Schumpeter afasta-se das atividades docentes e passa a dedicar os próximos anos à política e aos

negócios. Data dessa época sua presença no governo socialista austríaco. Em 1932, prevendo a maré fascista e

a guerra, emigra para os Estados Unidos, passando a lecionar na Universidade de Harvard até a sua morte,

ocorrida em 1950. Durante sua permanência nos Estados Unidos, Schumpeter escreveria ainda alguns de seus

trabalhos mais expressivos: Capitalismo, Socialismo e Democracia (1942), onde considera inevitável o

desaparecimento do capitalismo e a vitória do socialismo; e História da Análise Econômica, obra não

completada e publicada postumamente em 1954.” SCHUMPETER, Joseph Alois. Teoria do desenvolvimento

econômico: uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juro e ciclo econômico. Introdução de Rubens Vaz

da Costa; Tradução de Maria Sílvia Possas. 2 ed. São Paulo: Nova Cultural, 1985 (Os economistas).

(contracapa). 220

“Mis teorias pueden ser equivocadas; mis esquemas, con seguridad, non son más que una de tantas

posibilidades; pero hay dos cosas de las que estoy seguro: primero, que se debe tratar al capitalismo como un

proceso de evolución, y que todos sus problemas fundamentales arrancan del hecho de que es un proceso de

evolución; y, segundo, que esta evolución no consiste en los efectos de los factores externos (incluso factores

políticos) sobre el proceso capitalista, ni en los efectos de un lento crecimiento del capital, de población, etc..,

sino en esa especie de mutación económica, me trevo a usar un término biológico, a la que he dado el nombre

de innovación.” (Teoria del desenvolvimiento económico: Una investigación sobre ganâncias, capital, crédito,

interes y ciclo económico. Tradução Jesús Prados Arrarte. 2 ed., D.F., México: Fondo de Cultura Econômica.

1957, p. 12)

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Em sua obra “A Teoria do Desenvolvimento Econômico”, publicada em 1911,

Schumpeter trata, no capítulo inicial, de um modelo de economia fundamentado num fluxo

circular da vida econômica, no qual as atividades econômicas repetem-se continuamente.

Todavia, no capítulo intitulado “O Fenômeno Fundamental do Desenvolvimento Econômico”,

apresenta um modelo diverso, em que surge a figura do empresário inovador – agente

econômico que traz novos produtos para o mercado por meio de combinações mais eficientes

dos fatores de produção, ou pela aplicação prática de alguma invenção.221

No capítulo final da “Teoria do Desenvolvimento Econômico”, Schumpeter versa sobre

os ciclos econômicos, períodos de prosperidade e de recessão econômica comuns no processo

de desenvolvimento capitalista. Sustenta que há períodos de prosperidade porque o

empreendedor inovador, ao criar novos produtos, é imitado por empreendedores não

inovadores, que investem recursos para produzir e imitar os bens por ele criados. A economia

é estimulada, gerando prosperidade e o aumento do nível de emprego. À medida, porém, em

que as inovações tecnológicas são absorvidas pelo mercado e seu consumo se generaliza, a

taxa de crescimento da economia diminui, dando início a um processo recessivo, com a

redução dos investimentos e a baixa da oferta de emprego. A alternância entre prosperidade e

recessão é um obstáculo periódico e transitório no curso normal de expansão da renda

nacional, da renda per capita e do consumo.222

A relevância da teoria de Schumpeter para a configuração da inovação como principal

fator para o desenvolvimento econômico é enorme.

Trasladando a lógica da evolução natural para a explicação dos ciclos econômicos,

Schumpeter demonstrou que a inovação requer novas combinações dos meios de produção no

setor privado e no setor público com o fim de adaptação à variação das circunstâncias.223

Com efeito, a partir de Schumpeter, foi construída uma tipologia do empreendedor

associada à inovação, vinculada a atividades ditas combinatórias:

(i) introdução no mercado de um novo produto; (ii) desenvolvimento de

um novo método de produção; (iii) exploração de um novo mercado; (iv)

novas fontes de oferta; (v) criação de uma nova organização em uma

indústria. A partir dessas características, o conceito de empreendedorismo

221

SCHUMPETER, Joseph Alois. Teoria do desenvolvimento econômico: uma investigação sobre lucros,

capital, crédito, juro e ciclo econômico. Introdução de Rubens Vaz da Costa; Tradução de Maria Sílvia Possas.

2 ed. São Paulo: Nova Cultural, 1985 (Os economistas)., p. XII. 222

SCHUMPETER, Joseph Alois. Teoria do desenvolvimento econômico: uma investigação sobre lucros,

capital, crédito, juro e ciclo econômico. Introdução de Rubens Vaz da Costa; Tradução de Maria Sílvia Possas.

2 ed. São Paulo: Nova Cultural, 1985 (Os economistas)., p.XII. 223

ORTEGA, Ricardo Rivero. Derecho Administrativo Económico. 6. ed. Buenos Aires: Marcial Pons, 2013,

p.47.

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78

foi construído como uma atividade combinatória, vocacionada para arranjar

e rearranjar elementos e recursos já existentes de modo a gerar inovação. 224

Schumpeter conceituou a inovação como um fenômeno amplo, envolvendo a introdução

de novos produtos, novos processos, novos mercados, novas fontes de matérias-primas e uma

nova organização dentro de uma indústria. Posteriormente, surgiu um conceito mais restrito, o

de inovação tecnológica, consistente na introdução de produtos ou processos

tecnologicamente novos ou significativamente aprimorados.225

Schumpeter também foi responsável pela definição precursora da inovação como um

fenômeno de natureza empresarial, separando invenção (criação de uma nova tecnologia) de

inovação (introdução da novidade no mercado). A partir dessa concepção, sustentou que a

inovação não consiste apenas em uma nova tecnologia, mas na habilidade que o empresário

tem de criar um novo mercado para ela.226

As teorias de Schumpeter deram ensejo à produção de indicadores específicos para a

inovação.

Ao mesmo tempo, o reconhecimento do avanço da técnica e da inovação como uma

variável relevante para o desenvolvimento econômico deu origem a importantes estudos sobre

as características da evolução tecnológica e dos fatores que a influenciam, tais como os

realizados por P.A. David; Metcalfe, J.S.; Nelson, R. e N. Rosenberg.227

Quanto à produção de indicadores específicos para a inovação, em 1963, a Organização

para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) organizou uma reunião de peritos

na Villa Falconieri de Frascati, na Itália, dando origem ao Manual de Frascati, destinado a

estabelecer a metodologia de levantamento de dados sobre pesquisa e desenvolvimento.228

De acordo com o Manual de Frascati:

21. As atividades de inovação tecnológica são o conjunto de diligências

científicas, tecnológicas, organizacionais, financeiras e comerciais, incluindo

o investimento em novos conhecimentos, que realizam ou destinam-se a

levar à realização de produtos e processos tecnologicamente novos e

melhores. P&D é apenas uma dessas atividades e pode ser realizada em

224

ARBIX, Glauco. Inovar ou inovar: a indústria brasileira entre o passado e o futuro. São Paulo: Papagaio,

2007. p. 157. 225

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-6. 226

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-6. 227

TELLES, Luciana. O papel dos institutos públicos de pesquisa no desenvolvimento tecnológico e na

cooperação universidade-empresa. 2011. 279 f. Tese (Doutorado) - Escola Politécnica, Universidade de São

Paulo, São Paulo, 2011, p. 26. 228

ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT. Manual de Frascati 2002:

metodologia proposta para definição da pesquisa e desenvolvimento experimental. Rio de Janeiro: F-

Iniciativas, 2012, p.187.

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79

diferentes estágios do processo de inovação, sendo usada não apenas como

uma fonte de ideias inventivas, mas também para resolver os problemas que

possam surgir em qualquer etapa do processo, até a sua conclusão.229

Após a criação do Manual de Frascati a OCDE decidiu consolidar uma metodologia

destinada especificamente para captar o fenômeno da inovação nas empresas, criando o

Manual de Oslo.230-231

O Manual de Oslo constitui a principal fonte internacional de diretrizes para a coleta e o

uso de dados sobre as atividades inovadoras da indústria. Uma vez que a capacidade de

determinar a escala das atividades inovadoras, as características das empresas inovadoras e os

fatores sistêmicos que podem influenciar a inovação é considerada um pré-requisito para o

desenvolvimento e a análise de políticas públicas relacionadas ao fomento da inovação

tecnológica, a importância do referido Manual é inquestionável,232

inclusive para a área

jurídica.

A respeito da metodologia da OCDE, consolidada no Manual de Oslo, esclarece a

FAPESP:

A metodologia da OCDE reflete o progresso do conhecimento

multidisciplinar sobre os determinantes e as características das empresas

inovadoras. Esse progresso corresponde à superação da abordagem linear e

sequencial da inovação, que via a pesquisa acadêmica pública e a pesquisa

tecnológica interna à empresa com as únicas etapas efetivamente produtoras

ou originadoras de inovações tecnológicas. Nessa visão, as demais funções

críticas, como produção e o planejamento e a execução da interação com o

mercado (marketing), eram entendidos como canais para viabilizar soluções

entregues pela P&D. Daí a ênfase quase exclusiva, nas primeiras abordagens

de indicadores de ciência e tecnologia, na medida de P&D como esforço

tecnológico voltado para a inovação, e das patentes como o seu principal

resultado.

229

ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT. Manual de Frascati 2002:

metodologia proposta para definição da pesquisa e desenvolvimento experimental. Rio de Janeiro: F-

Iniciativas, 2012, p. 23. 230

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-6. 231

“Em que pese o fato de se ter como fonte padrões de países desenvolvidos, o Manual de Oslo é bastante

abrangente e flexível quanto a suas definições e metodologias de inovação tecnológica e, por isso mesmo, tem

sido uma das principais referências para as atividades de inovação na indústria brasileira.” (ORGANISATION

FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT. Manual Oslo: proposta de diretrizes para

coleta e interpretação de dados sobre inovação tecnológica. Rio de Janeiro: Finep, 2012, p.9). A Organização

para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) foi criada em 1960 e conta hoje com

aproximadamente 30 membros da Europa, Américas, Ásia e Oceania. Tem sede em Paris e atua

principalmente na área social e econômica, abordando temas como macroeconomia, comércio,

desenvolvimento, educação, ciência e inovação. Entre os objetivos da OCDE estão fomentar a boa governança

estatal e empresarial, o desenvolvimento social e o crescimento econômico por meio de cooperação

institucional e política, assim como a utilização de mecanismos de monitoramento (Disponível em:

http://www.cade.gov.br/Default.aspx?b879bb44c847c960f356. Acesso em: 07 jul.14). 232

ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT. Manual Oslo: proposta de

diretrizes para coleta e interpretação de dados sobre inovação tecnológica. Rio de Janeiro: Finep, 2012, p. 5.

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Em contraste com a abordagem linear, que ainda influencia fortemente o

senso comum do que seja inovação, a abordagem sistêmica, expressa no

Manual de Oslo, apresenta a inovação como processo de aprendizagem,

centrado na empresa inovadora, mas em que atuam e interagem diversos

atores internos e externos a ela. Essa visão mais complexa se beneficiou do

progresso do conhecimento no campo dos estudos da inovação [...].233-234

Como se nota, inicialmente, havia uma visão linear sobre o processo de inovação, em

que se assumia uma sequência hierárquica ou cronológica, em que a ciência era sempre

anterior e determinava os avanços tecnológicos, que, por sua vez, eram responsáveis por

colocar as inovações no mercado. Atualmente, existe uma visão sistêmica da inovação, sobre

a qual se discorrerá mais adiante, segundo a qual o movimento ciência-tecnologia pode

ocorrer em ambas as direções, ou seja, ora as descobertas científicas resultam no avanço da

técnica, ora os avanços tecnológicos apresentam novas questões à ciência; ora as pesquisas

feitas nos laboratórios públicos impulsionam o desenvolvimento de novas tecnologias

estimulando o surgimento de projetos propostos pela indústria, ora as pesquisas fornecem o

conhecimento para solucionar problemas de projetos propostos pela indústria.235

A primeira edição do Manual de Oslo, em 1992, definiu o conceito de inovação

tecnológica, aplicando-o às empresas do setor industrial, tendo recebido duas revisões, dando

origem às suas segunda e terceira edições. A segunda edição foi publicada em 1997. Na

terceira edição, em 2005, com inspiração na abordagem inicial de Schumpeter, ampliou-se o

conceito de inovação, incluindo-se, além da inovação tecnológica, a inovação organizacional

e a mercadológica. Nessa última edição a palavra ‘tecnológica’ foi retirada da definição de

inovação, fazendo concluir ser possível fazer inovação não somente em produtos e processos,

mas também em serviços, em marketing e em sistemas organizacionais.236

233

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-7. 234

Conforme explica Glauco Arbix, com a intensificação dos processos de inovação, a análise de novos dados

consolida a rejeição da visão linear, que apontava para uma suposta trajetória hierarquizada da inovação ao

longo do tempo. A visão de que a inovação seguiria sempre os caminhos da atividade mais nobre até a mais

vulgar, ou seja, da pesquisa científica básica, passando pela aplicada para finalmente desembocar na inovação

orientada para os mercados, mostrou-se frágil e insustentável. Pesquisas indicaram que a inovação tanto pode

seguir dos laboratórios para o mercado como pode nascer nas empresas, se desenvolver no mercado e gerar

desdobramentos nas universidades (Inovar ou inovar: a indústria brasileira entre o passado e o futuro. São

Paulo: Papagaio, 2007, p. 30). 235

TELLES, Luciana. O papel dos institutos públicos de pesquisa no desenvolvimento tecnológico e na

cooperação universidade-empresa. 2011. 279 f. Tese (Doutorado) - Escola Politécnica, Universidade de São

Paulo, São Paulo, 2011, p. 41. 236

ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT. Manual Oslo: proposta de

diretrizes para coleta e interpretação de dados sobre inovação tecnológica. Rio de Janeiro: Finep, 2012, p. 15.

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81

Vale frisar – atualmente, é possível falar, de modo abrangente, em inovação e não

apenas em inovação tecnológica.237

De igual sorte, nos dias de hoje, considera-se superada a abordagem linear e sequencial

da inovação, a qual, consoante já mencionado, via a pesquisa acadêmica pública e a pesquisa

tecnológica interna à empresa como as únicas etapas efetivamente produtoras ou originadoras

de inovações tecnológicas.

Sob a ótica do vigente Manual de Oslo,

Uma inovação é a implementação de um produto (bem ou serviço) novo ou

significativamente melhorado, ou um processo, ou um novo método de

marketing, ou um novo método organizacional nas práticas de negócios, na

organização do local de trabalho ou nas relações externas.238

Ainda segundo o Manual de Oslo, o requisito mínimo para se definir uma inovação, é

que o produto, processo, o método de marketing ou organizacional sejam novos, ou

significativamente melhorados para a empresa. Isso inclui produtos, processos e métodos que

as empresas são as pioneiras a desenvolver e bem assim aqueles que foram adotados de outras

empresas ou organizações.239

Como se nota, o conceito de empresa inovadora é amplo, compreendendo tanto a

empresa que desenvolveu ela mesma a inovação quanto a que adotou uma inovação gerada

por outra empresa, “de maneira que a inovação é vista desde a perspectiva da própria

empresa, podendo já existir em outras empresas do país ou do exterior.”240

Um aspecto geral que merece ser frisado, na esteira das citadas lições de Schumpeter, é

que uma inovação depende de implementação.

A implementação é a introdução no mercado de um produto novo ou melhorado. Novos

processos, métodos de marketing e métodos organizacionais são implementados quando

efetivamente utilizados nas operações das empresas. Uma inovação pode consistir na

implementação de uma única mudança significativa, ou em uma série de pequenas mudanças

incrementais que, juntas, podem constituir uma mudança significativa.241

237

São consideradas inovações não tecnológicas, por exemplo, as relativas a modelo de negócio, marketing,

canal de distribuição, cadeia de fornecimento, gestão, planejamento urbano e logística de transporte

(MINISTÉRIO DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e

Inovação 2012-2015 – Balanço das atividades estruturantes 2011. Brasília: MCTI, 2012. p. 30). 238

ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT. Manual Oslo: proposta de

diretrizes para coleta e interpretação de dados sobre inovação tecnológica. Rio de Janeiro: Finep, 2012, p. 55. 239

ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT. Manual Oslo: proposta de

diretrizes para coleta e interpretação de dados sobre inovação tecnológica. Rio de Janeiro: Finep, 2012, p.55. 240

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-6. 241

ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT. Manual Oslo: proposta de

diretrizes para coleta e interpretação de dados sobre inovação tecnológica. Rio de Janeiro: Finep, 2012, p. 56.

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82

Diz-se, por essa razão, que as inovações podem ser tecnologias radicalmente novas

(mais raras, portanto) ou a combinação de tecnologias existentes em novos usos, ou seja, as

inovações incrementais (mais comuns). Um produto tecnologicamente aprimorado é um

produto existente cujo desempenho tenha sido significativamente elevado.242

A propósito do assunto, para Fabrício Polido, Mônica Steffen Guise Rosina e Priscilla

Maria Dias Guimarães César:

A inovação radical, assim, busca a criação de novas tecnologias, trabalha

com um alto grau de incerteza quanto à viabilidade do produto final e tem

como foco produtos, processos ou serviços com características nunca antes

vistas, introduzindo uma grande mudança no mercado ou até criando novos

mercados. Já a inovação incremental busca o aprimoramento de tecnologias

existentes, trabalha com um menor grau de incerteza quanto à viabilidade do

produto final e tem como foco produtos, processos ou serviços já

desenvolvidos, mas melhorados, gerando grande competitividade entre as

empresas.

Ainda segundo os autores, os especialistas no assunto identificam como quatro os

principais estágios da inovação: a) invenção ou descoberta per se; b) desenvolvimento do

produto, ou seja, o conjunto de atividades por meio do qual determinado conceito é

modificado e aperfeiçoado até que passe a ser um produto apto a entrar no mercado; c)

empreendedorismo e investimento. Este estágio pode preceder o segundo; é a fase em que o

inovador decide comercializar o produto fruto da inovação, buscando apoio financeiro e

explorando as oportunidades de mercado; e, finalmente, d) difusão do produto, com sua

efetiva entrada no mercado.243

É importante ressaltar que, para inovar, as empresas empreendem determinadas

atividades – as chamadas atividades inovativas - que são, basicamente, as de pesquisa e

desenvolvimento (P&D) e outras atividades não exatamente relacionadas com P&D,

envolvendo, por exemplo, a aquisição de bens (máquinas e equipamentos), serviços e

conhecimentos externos.244

242

POLIDO, Fabricio; ROSINA, Mônica Steffen Guise; CÉSAR, Priscilla Maria Dias Guimarães. Propriedade

intelectual: potencialidades e fragilidades do ambiente jurídico-institucional brasileiro para a inovação. In:

SHAPIRO, Mario G.; TRUBEK, David M. (Coord.). Direito e desenvolvimento: um diálogo entre os BRICS.

São Paulo: Saraiva, 2012. p. 135-180, p. 138. 243

POLIDO, Fabricio; ROSINA, Mônica Steffen Guise; CÉSAR, Priscilla Maria Dias Guimarães. Propriedade

intelectual: potencialidades e fragilidades do ambiente jurídico-institucional brasileiro para a inovação. In:

SHAPIRO, Mario G.; TRUBEK, David M. (Coord.). Direito e desenvolvimento: um diálogo entre os BRICS.

São Paulo: Saraiva, 2012. p. 135-180, p. 138. 244

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação 2011. Rio de

Janeiro: IBGE, 2013, documento não paginado.

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83

No Brasil, desde meados dos anos 90, segundo ressalta Glauco Arbix, o termo inovação

passou a ser usado com bastante frequência nos pronunciamentos de autoridades públicas e de

empresários, contando, atualmente, com grande audiência.245

Com efeito, antes da década de 90, a ciência e a tecnologia costumavam ser debatidas

somente interna corporis, no âmbito de universidades e entidades especializadas. Apesar de

ter havido, na segunda metade do século XX, um crescente envolvimento entre o Estado e o

apoio ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia, a sociedade brasileira tinha pouco

conhecimento das atividades de pesquisa científica e tecnológica e do papel destas para

melhorar seu padrão de vida e o seu bem-estar. O assunto também não costumava ser

debatido no Congresso Nacional.246

Tanto assim que foi somente em 1985 que ocorreu a 1ª Conferência Nacional de Ciência

e Tecnologia (CNCT), que teve como objetivo ampliar a participação da sociedade brasileira

na definição de uma política científico-tecnológica para o País.247

Antes dessa 1ª Conferência, nunca havido sido realizado no Brasil um debate nacional,

com a participação ampla de diferentes segmentos da sociedade, em torno do tema ciência e

tecnologia.248

A 2ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (CNCTI), realizada em

2001, enfatizou a importância da inovação tecnológica como instrumento para a

competitividade. Previamente ao evento, foi elaborado o Livro Verde, discutido em

Conferências Regionais e em uma Conferência Nacional. As recomendações e definições de

estratégias para a C,T&I nacionais definidas na 2ª CNCTI foram, então, sintetizadas no

chamado Livro Branco.249

O prefácio deste, desde então, anunciava:

A C&T brasileira passa agora a ser iluminada pelo foco atualizado e

dinamizador da inovação. Os avanços alcançados pela C&T justificam

plenamente que o Brasil ingresse, em definitivo, na nova etapa da Inovação,

245

ARBIX, Glauco. Inovar ou inovar: a indústria brasileira entre o passado e o futuro. São Paulo: Papagaio,

2007, p. 29. 246

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Ciência e tecnologia: numa sociedade democrática. Brasília:

MCT, 1985. (apresentação do Ministro Renato Archer, documento não paginado). 247

Informação constante do site do MCTI. Disponível em:

<http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/309656/Conferencia_Nacional_de_CI_I_CNCTI.html.

Acesso em: 05 nov. 2014. 248

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Ciência e tecnologia: numa sociedade democrática. Brasília:

MCT, 1985. (apresentação do Ministro Renato Archer, documento não paginado). 249

Informação constante do site do MCTI. Disponível em:

<http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/309656/Conferencia_Nacional_de_CI_I_CNCTI.html.

Acesso em: 05 nov. 2014.

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84

ao passo que as transformações mundiais da C&T impelem o País na mesma

direção.250

Em 2005, a 3ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação buscou

apresentar a C,T&I produzida no Brasil como base de uma estratégia para promover o

desenvolvimento político, econômico, social e cultural do País.251

A 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, convocada sob o título

de Política de Estado para Ciência, Tecnologia e Inovação com vistas ao Desenvolvimento

Sustentável, foi realizada em maio de 2010, objetivando consolidar o Sistema Nacional de

Ciência, Tecnologia e Inovação como política de Estado e, também, apresentar subsídios para

o desenvolvimento do Plano de Ação de Ciência, Tecnologia e Inovação para o

Desenvolvimento Nacional (PACTI), 2011-2014, que resultou em importantes subsídios para

a Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (ENCTI) 2012-2015.252

Os temas centrais desta quarta edição foram focados nos eixos do PACTI 2007-2010: a

consolidação do Sistema Nacional de C,T&I; a inovação tecnológica nas empresas; as áreas

estratégicas e C,T&I; e a inovação para o desenvolvimento social.

Propôs como objetivo estratégico para o País um desenvolvimento científico e

tecnológico inovador, baseado em uma política de redução de desigualdades regionais e

sociais, de exploração sustentável das riquezas do território nacional e de fortalecimento da

indústria, agregando valor à produção e à exportação por meio da inovação e reforçando o

protagonismo internacional em ciência e tecnologia. As principais contribuições da 4ª

Conferência foram sintetizadas no chamado Livro Azul.253

A ENCTI 2012-2015, por seu turno, foi aprovada pelo Conselho Nacional de Ciência e

Tecnologia.

Buscando a articulação e coordenação das políticas públicas setoriais e das iniciativas

do setor privado relacionadas com o desenvolvimento científico e tecnológico do País, a

ENCTI 2012-2015 prioriza, especialmente:

[...] traduzir o desenvolvimento científico e tecnológico em progresso

material e bem estar social para o conjunto da população brasileira, o que

passa pela convergência de dois macro-movimentos estruturais: a revolução

do sistema educacional e a incorporação sistemática ao processo produtivo,

250

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Livro branco: ciência, tecnologia e inovação. Brasília:

MCT, 2002, p. IX. 251

Disponível em: <http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/309656/Conferencia_Nacional_de_

CI_I_CNCTI.html. Acesso em: 05 nov. 2014. 252

Disponível em: <http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/309656/Conferencia_Nacional_de_

CI_I_CNCTI.html. Acesso em: 05 nov. 2014. 253

Disponível em: <http://www.mct.gov.br/index.php/content/view/309656/Conferencia_Nacional_de_

CI_I_CNCTI.html. Acesso em: 05 nov. 2014.

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85

em seu sentido mais amplo, da inovação como mecanismo de reprodução e

ampliação do potencial social e econômico do País. Esse é o caminho para

transformar a ciência, a tecnologia e a inovação em eixo estruturante do

desenvolvimento brasileiro.254

Elenca, ademais, a ENCTI 2012-2015 alguns programas prioritários, que envolvem

cadeias importantes para impulsionar a economia, tais como: tecnologias da informação e

comunicação, fármacos e complexo industrial da saúde, petróleo e gás, complexo industrial da

defesa, aeroespacial, nuclear e áreas relacionadas com a economia verde e o desenvolvimento

social.255

O ordenamento jurídico pátrio não ignorou os avanços da inovação nos debates técnicos

promovidos ao longo dos últimos anos. A rigor, mesmo antes da Lei nº 10.973/2004, já havia

normas que abordavam o assunto, ainda que por vezes de relance.

O Decreto Federal nº 792/1993, revogado pelo Decreto nº 5.906/2006, por exemplo, que

regulamentava a concessão de incentivos fiscais previstos na Lei Federal nº 8.248/1991,

visando à capacitação e à competitividade do setor de informática e automação, não fazia

alusão ao termo inovação, mas previa, como atividade de desenvolvimento, o trabalho

sistemático utilizando o conhecimento na pesquisa ou experiência prática para desenvolver

novos materiais, produtos ou dispositivos, implementar novos processos, sistemas ou serviços

ou, então, aperfeiçoar os já produzidos ou implantados, incorporando características

inovadoras.

A Lei Federal nº 10.168/2000, regulamentada inicialmente pelo Decreto nº 3.949/2001,

revogado pelo Decreto nº 4.195/2002, apesar de também não dispor, especificamente, sobre

inovação, instituiu contribuição de intervenção de domínio econômico destinada a financiar o

Programa de Estímulo à Interação Universidade-Empresa para o Apoio à Inovação.

Também a Lei Federal nº 10.332/2001, regulamentada pelos Decretos nºs 4.143/2002;

4.154/2002; 4.157/2002; 4.179/2002 e 4.195/2002 instituiu mecanismo de financiamento para

o Programa de Ciência e Tecnologia para o Agronegócio, para o Programa de Fomento à

Pesquisa em Saúde, para o Programa Biotecnologia e Recursos Genéticos – Genoma, para o

Programa de Ciência e Tecnologia para o Setor Aeronáutico e para o Programa de Inovação

para Competitividade.

A Lei Complementar nº 123/2000, por sua vez, em seu artigo 64, definiu, de forma

literal, a inovação, como sendo a concepção de um novo produto ou processo de fabricação,

254

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e

Inovação 2012-2015 – Balanço das atividades estruturantes 2011. Brasília: MCTI, 2012, p. 12. 255

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e

Inovação 2012-2015 – Balanço das atividades estruturantes 2011. Brasília: MCTI, 2012, p. 25.

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bem como a agregação de novas funcionalidades ou características ao produto ou processo

que implica melhorias incrementais e efetivo ganho de qualidade ou produtividade, resultando

em maior competitividade no mercado. Previu, ainda, em seu artigo 65, o dever da União, dos

Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das respectivas agências de fomento, das

ICT, dos núcleos de inovação tecnológica e das instituições de apoio manter programas

específicos para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive quando

revestidas da forma de incubadoras.

A Lei Federal nº 10.973/2004, a Lei de Inovação, regulamentada pelo Decreto nº

5.563/2005, em seu artigo 2º, dispôs, de forma ampla, que a inovação é a introdução de

novidade ou aperfeiçoamento no ambiente produtivo ou social que resulte em novos produtos,

processos ou serviço.

Já a Lei 11.196, de 21 de novembro de 2005, regulamentada pelo Decreto nº

5.798/2006, conhecida como Lei do Bem, considerou inovação tecnológica a concepção de

novo produto ou processo de fabricação, bem como a agregação de novas funcionalidades ou

características ao produto ou processo que implique melhorias incrementais e efetivo ganho

de qualidade ou produtividade, resultando maior competitividade no mercado.

É importante destacar que as definições da Lei do Bem e de seu Decreto regulamentador

nº 5.798/2006 estão baseadas nas recomendações do Manual de Frascati e não no Manual de

Oslo, este, consoante já visto, mais abrangente e flexível quanto às definições e metodologias

de inovação. Isto porque, vale lembrar, desde a sua terceira edição, publicada em 2005, o

Manual de Oslo expandiu o conceito de inovação, retirando a palavra ‘tecnológica’ de sua

definição e fazendo concluir ser possível fazer inovação em produtos, processos, em serviços,

em marketing e em sistemas organizacionais.256

Na Lei do Bem, vale observar, não há

menção à palavra “serviços”.

Por fim, a Lei Complementar Paulista nº 1.049, de 19 de junho de 2008, utiliza a

palavra “tecnológica” em sua definição, estipulando que inovação tecnológica é a introdução

de novidade ou aperfeiçoamento no ambiente produtivo e/ou social que resulte em novos

processos, produtos ou serviços, bem como em ganho de qualidade ou produtividade em

processos, produtos ou serviços já existentes, visando ampliar a competitividade no mercado,

bem como a melhoria das condições de vida da maioria da população, e a sustentabilidade

socioambiental.

256

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Guia prático de apoio à inovação. Brasilia: MCT, 2013.

Disponível em: <http://www.uergs.edu.br/uploads/1378305548_Downloads_Guia_Inovacao _Empresas.pdf>.

Acesso em: 20 jun. 2013, p. 15.

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87

Como se nota, há uma pluralidade de definições para o termo inovação. É preciso ficar

atento a este fato, pois, eventualmente, pode não haver coincidência entre o que uma norma

ou um manual técnico considera inovação e o que a lei considera inovação.

Muitas vezes, pode não ser fácil a identificação e a distinção, sob o ponto de vista

técnico e prático, de atividades de inovação e de atividades de P&D. Se existe, além desse

problema, falta de sistematização no tratamento legal da matéria, ocorre maior insegurança,

tanto para o setor público como para o setor privado, na aplicação da legislação.

De toda forma – como os pressupostos das normas técnicas e legais são diversos, como

alternativa para a superação desse tipo de dificuldade, deve se considerar que cada uma de

suas definições deverá ser empregada em seu contexto próprio, tendo em vista os objetivos

que perseguirem.257

Há que se esclarecer, por fim, que não obstante, nos dias atuais, a inovação possa ser e

seja efetivamente considerada de forma mais abrangente, expandindo-se para além da acepção

de inovação tecnológica e para além das atividades do setor industrial, o presente trabalho

opta pela utilização do termo “inovação tecnológica”.

Primeiro, porque a Lei Federal nº 10.973/2004 e a Lei Complementar Paulista nº

1.049/2008 estão voltadas, diretamente, para o estímulo das pesquisas científica básica e

tecnológica, tal como preconizado na Constituição Federal.

Em segundo lugar, porque os instrumentos de fomento à inovação mostram-se

especialmente relevantes nos casos de execução de atividades mais complexas, com maior

conteúdo tecnológico, voltadas à P&D e ao desenvolvimento do setor industrial. Consoante já

verificado, a pesquisa tecnológica deve estar voltada para a solução dos problemas brasileiros

e para o desenvolvimento do setor produtivo nacional.

Finalmente, porque a inovação tecnológica está relacionada intimamente ao

conhecimento, aos processos criativos que geram benefícios para toda a sociedade. O uso do

vocábulo “tecnológica” não consiste numa questão meramente semântica.

257

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 50.

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88

7 A IMPORTÂNCIA DA ATUAÇÃO PÚBLICA FOMENTADORA À INOVAÇÃO

TECNOLÓGICA

A inovação possui objetivos econômicos, que são, basicamente, segundo a literatura

especializada: a) substituir produtos que estejam sendo descontinuados; b) aumentar a linha

de produtos dentro e fora do campo do produto principal; c) desenvolver produtos amistosos

em termos de meio ambiente; d) manter participação de mercado; e) aumentar participação de

mercado; f) abrir novos mercados no exterior e novos grupos-alvos domésticos; g) aumentar a

flexibilidade da produção; h) reduzir os custos de produção por meio da redução dos custos

unitários de mão de obra, do corte de materiais de consumo, do corte do consumo de energia,

da redução dos custos de desenho do produto; da redução dos prazos de início de produção; i)

melhorar as qualidades do produto; j) melhorar as condições de trabalho; l) reduzir os danos

ao meio ambiente.258

A Pesquisa de Inovação Tecnológica - Pintec 2011, do IBGE, 259-260

que tem avaliado,

no Brasil, desde 2001, dados relacionados à inovação nas empresas, em escala nacional,

resume a questão de forma objetiva - a inovação é um fenômeno complexo, cujas atividades

258

ORGANISATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT. Manual Oslo: proposta de

diretrizes para coleta e interpretação de dados sobre inovação tecnológica. Rio de Janeiro: Finep, 2012, p. 79. 259

Consoante esclarece o IBGE: “A Pesquisa de Inovação Pintec tem por objetivo a construção de indicadores

setoriais, nacionais e regionais, das atividades de inovação nas empresas do setor de Indústria, e de indicadores

nacionais das atividades de inovação nas empresas dos setores de Eletricidade e Gás e de Serviços

selecionados (edição e gravação e edição de música; telecomunicações; atividades dos serviços de tecnologia

da informação; tratamento de dados, hospedagem na internet e outras atividades relacionadas; serviços de

arquitetura e engenharia, testes e análises técnicas; e pesquisa e desenvolvimento), compatíveis com as

recomendações internacionais em termos conceituais e metodológicos. Ao permitir conhecer e acompanhar a

evolução destes indicadores no tempo, seus resultados poderão ser usados pelas empresas de análise de

mercado, pelas associações de classe para estudos sobre desempenho e outras características dos setores

investigados, e pelo governo para desenvolver e avaliar políticas nacionais e regionais. [...] No atual modelo de

produção de estatísticas do IBGE, esta é uma pesquisa de corte transversal e, como tal, busca aprofundar o

tema da inovação produzindo informações sobre aspectos como gastos com as atividades inovativas; fontes de

financiamento destes dispêndios; impacto das inovações no desempenho das empresas; fontes de informações

utilizadas; arranjos cooperativos estabelecidos; papel dos incentivos governamentais; obstáculos encontrados

às atividades de inovação; inovações organizacionais e de marketing, e uso de biotecnologia e

nanotecnologia.” (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação

2011. Rio de Janeiro: IBGE, 2013). (introdução, documento não paginado). 260

As metodologias estatísticas sobre atividades tecnológicas das empresas são relativamente novas e menos

disseminadas e consolidadas. No Brasil, o IBGE realizou, em 2001, a primeira experiência de pesquisa de

inovação em escala nacional para a indústria nacional, denominada Pesquisa de Inovação Tecnológica –

Pintec, tendo como referência o período de 1998-2000. Em 2003, houve a segunda edição da pesquisa,

referente ao período 2001-2003 e, em 2005, a terceira edição, relativa ao período 2003-2005. A terceira edição

incluiu alguns segmentos do setor de serviços em seu levantamento de dados. O IBGE fez algumas adaptações

de conceitos, para melhor adequá-los ao contexto brasileiro. Em 2008, houve a Pintec 2008, pertinente ao

triênio 2006-2008 e em 2011, a quinta edição da pesquisa, referente ao período de 2009 até 2011. A referência

conceitual da Pintec 2011 baseou-se na terceira edição do Manual de Oslo e, mais especificamente, no modelo

proposto pela Oficina de Estatística da Comunidade Europeia (Statistical Office of the European

Commnunities – Eurostat), consubstanciados nas versões 2008 e 2010 da Community Innovation Sursey –

CIS0. (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação 2011. Rio de

Janeiro: IBGE, 2013) (documento não paginado). A Pintec 2011 foi a última pesquisa divulgada pelo IBGE.

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89

são geralmente motivadas pela busca do lucro diferenciado, envolvendo percepções a respeito

de oportunidades técnicas e econômicas ainda não exploradas. A inovação é algo arriscado,

incerto e custoso. Ainda que os ganhos auferidos em suas atividades possam ser

consideráveis, em geral, o que se busca não pode ser conhecido com exatidão a priori e,

consequentemente, os efeitos técnicos dos esforços inovativos raramente podem ser

conhecidos de antemão.261

Para inovar, é importante poder errar e tentar de novo.262

Leciona Mário Gomes Schapiro que não há atividades experimentais certas para buscar

produtos ou processos novos. O grau dessa imprevisibilidade é diretamente proporcional à

amplitude do processo inovativo: as inovações incrementais, pertinentes a produtos e

processos já existentes, apresentam um menor grau de incerteza do que as inovações radicais.

Por outro lado, as inovações radicais garantem exclusividade temporária de mercado e a

possibilidade de se auferir maiores rendas.263

A inovação impõe ao empreendedor problemas de êxito técnico e de êxito comercial,

encerrando, a um só tempo, “possibilidades de ganho supracompetitivos e a iminência de

fracassos retumbantes – em uma atividade cuja decisão corporativa é mediada pela

incerteza.”264

Essa situação enseja uma falha de mercado do setor industrial, que pode comprometer

sua viabilidade econômica. Nem sempre os agentes econômicos têm interesse em realizar

determinados empreendimentos (seja em razão do prazo de maturação do investimento, seja

em razão da incerteza quanto aos seus resultados etc.), o que pode causar alocações de

recursos inadequadas. É certo que as atividades industriais geram efeitos que excedem suas

próprias transações. Dessa forma, enquanto a insuficiência de investimentos em alguns setores

pode prejudicar toda a economia, por outro lado, investimentos industriais bem sucedidos

podem beneficiar os demais ramos da atividade.265

261

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação 2011. Rio de

Janeiro: IBGE, 2013. (documento não paginado). 262

CRUZ, Renato. Inovação nos negócios surge em rede. O Estado de São Paulo, São Paulo, 27 out. 2013.

Economia, p. B14. 263

SCHAPIRO, Mario Gomes. Novos parâmetros para a intervenção do Estado na economia. São Paulo:

Saraiva, 2010, p. 154. 264

SCHAPIRO, Mario Gomes. Novos parâmetros para a intervenção do Estado na economia. São Paulo:

Saraiva, 2010, p. 155. 265

SCHAPIRO, Mario Gomes. Política industrial. In: RODRIGUEZ, José Rodrigo (Org.). Fragmentos para um

dicionário crítico de direito e desenvolvimento. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 72-85, p. 75.

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90

O poder de mercado de monopólios e oligopólios, ou as assimetrias de informação são

outros exemplos de falhas de mercados que alteram os resultados do modelo de concorrência

perfeita, o que é relevante para um número não desprezível de situações.266

Trata-se de um problema de externalidade:

as transações e as decisões privadas provocam efeitos que ultrapassam o

espaço de atuação dos agentes envolvidos. No segmento industrial, em

particular, a presença de externalidades é quem pode provocar esta

dissociação entre as expectativas privadas de rentabilidade e os benefícios

sociais resultantes dos empreendimentos. Em virtude da existência de falhas

individuais de mercado (notadamente, a incerteza e os problemas de

coordenação), os empreendedores podem considerar desinteressante

empreender determinado investimento industrial, o que, entretanto, pode

gerar resultados externos, impactando, por exemplo, o incremento de riqueza

de uma dada economia nacional.267

Vale dizer, “As externalidades ou economias externas surgem quando a decisão tomada

por um agente influencia o bem-estar de outro agente, não diretamente envolvido com as

decisões do primeiro.”268

A racionalidade do fomento, portanto, consiste na regulação de falhas de mercado, que

podem ser externalidades negativas ou positivas, conforme correspondam a custos ou a

benefícios gerados para terceiros, respectivamente. Têm sido estimuladas as atividades que

geram externalidades positivas, promovendo benefícios, tais como a movimentação da

economia, a criação de empregos e o desenvolvimento industrial.269

As externalidades positivas decorrentes da implementação de novos conhecimentos

tecnológicos são conhecidas na literatura econômica como “transbordamentos tecnológicos”.

De acordo com N. Gregory Mankiw, embora alguns economistas acreditem que os

transbordamentos tecnológicos são universais e que os governos devem incentivar as

indústrias que criam os maiores transbordamentos, por meio de políticas industriais, outros,

mais céticos, entendem que o sucesso de uma política industrial requer que os governos sejam

capazes de medir a magnitude dos transbordamentos em diferentes mercados, o que seria

difícil de realizar. O problema é que na ausência de medidas precisas, o sistema político

266

GREMAUD, Amaury Patrick. et al. Manual de economia. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 281. 267

SCHAPIRO, Mario Gomes. Política industrial. In: RODRIGUEZ, José Rodrigo (Org.). Fragmentos para um

dicionário crítico de direito e desenvolvimento. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 72-85, p. 75. 268

GREMAUD, Amaury Patrick. et al. Manual de economia. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 281. 269

JUSTEN FILHO, Marçal; JORDÃO, Eduardo Ferreira. A contratação administrativa destinada ao fomento de

atividades privadas de interesse coletivo. Revista Brasileira de Direito Público – RBDP, Belo Horizonte, ano

9, n. 34, p. 47-72, jul./set. 2011, p. 54.

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91

acabaria subsidiando as indústrias que têm maior poder político, em vez das indústrias que

criam as maiores externalidades positivas.270

Este último pensamento precisa ser considerado com cautela.

É cediço que há, em toda sociedade, grupos que exercem pressão política a fim de

melhor defender e exercer os seus próprios interesses, o que se verifica, vale frisar, não

somente em matéria de política industrial. Daí a relevância de, não sendo possível estabelecer

metas e indicadores para mensurar, com máxima precisão, as externalidades positivas

decorrentes de uma determinada atividade, estabelecer-se as metas e indicadores que

consigam apurar, de forma transparente, a maior eficiência e qualidade possível do fomento

público, acompanhados dos meios de controles necessários.

A criação de mecanismos eficientes de acompanhamento e avaliação de investimentos

públicos numa área tão complexa como a C,T&I é certamente um dos maiores desafios atuais

impostos aos agentes públicos. A tarefa é difícil, exige recursos financeiros e mobilização de

recursos humanos altamente especializados e capacitados para a sua realização. Não pode o

Estado deixá-la em segundo plano.

Entendemos que o fomento público tem sido e é essencial para que as atividades

referentes à inovação façam parte do planejamento corporativo e da ação das empresas,

mormente porque poderá haver situações em que, sem o apoio do Estado, não haverá

incentivos suficientes para o empreendedorismo privado de interesse social.

Não é possível dissociar o fomento público à inovação tecnológica da política industrial.

Isso, exatamente porque, de acordo com Mario Gomes Schapiro, a formulação de uma

política industrial assume que determinados objetivos sociais e econômicos podem não ser

alcançados se submetidos apenas à lógica concorrencial de mercado.271

Ainda que haja entendimentos divergentes, é possível afirmar que, tanto nos países em

desenvolvimento, como nos países considerados já desenvolvidos, o tratamento dos

problemas do setor industrial tem contado com medidas de socialização de riscos, destinadas

270

MANKIW, N. Gregory. Introdução à economia. Tradução Allan Vidigal Hastings. São Paulo: Thomson

Learning, 2006, (tradução da 3ª edição norte-americana), p. 208. 271

SCHAPIRO, Mario Gomes. Política industrial. In: RODRIGUEZ, José Rodrigo (Org.). Fragmentos para um

dicionário crítico de direito e desenvolvimento. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 72-85, p. 73. “a política industrial

pode ser entendida, de forma estipulativa, como uma política pública empreendida pelos governos nacionais

com o propósito de favorecer o setor produtivo. Em regra, costuma combinar medidas de fomento e

disposições regulatórias dirigidas a alterar a alocação dos recursos industriais, influenciando com isso a

estrutura e o desempenho desse setor. Trata-se, assim, de uma política dirigida imediatamente ao setor

produtivo e mediatamente ao fortalecimento da competitividade nacional, motivada pela percepção de que os

agentes privados podem ser carentes de um impulso governamental, para empreender determinadas atividades

industriais, que se mostram, no entanto, estratégicas para uma dada economia.” (p. 73).

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a amparar publicamente aqueles empreendedores cujos investimentos são portadores de

significativas externalidades positivas.272

No Brasil, cada vez mais, as políticas industriais têm dedicado atenção ao fomento

público da inovação tecnológica.273

De fato, a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE), de 2004 a

2008, teve por objetivo fortalecer e expandir a base industrial brasileira por meio da melhoria

da capacidade inovadora das empresas. Em 2008, dando continuidade à PITCE, a Política de

Desenvolvimento Produtivo (PDP), de 2008 a 2010, intentou fortalecer a economia do País,

ampliando o diálogo entre os setores público e privado, assim como incentivar a exportação e

estimular a inovação. Em 2011, o Plano Brasil Maior (PBM), de 2011 a 2014, teve por foco o

estímulo à inovação para alavancar a competitividade da indústria nos mercados interno e

externo, integrando instrumentos de geração de emprego e de renda.274

Nesse contexto de crescente preocupação com o esforço inovador do País, a análise dos

dados resultantes da pesquisa Pintec 2011 demonstrou que, no período de referência de 2009 a

2011, os principais instrumentos utilizados pelas empresas inovadoras foram o financiamento

para compra de máquinas e equipamentos (25,6%) e outros programas de apoio, que

agregavam as bolsas oferecidas pelas Fundações de Amparo à Pesquisa (FAPs) e pelo

Programa Recursos Humanos para Áreas Estratégicas (RHAE-Inovação), do Conselho

Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), os programas de aporte de

capital de risco do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e da

Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), e outros, como compra governamental,

incentivos fiscais concedidos pelos Estados especificamente para o desenvolvimento de P&D

etc. (7,9%). Os instrumentos menos utilizados foram a subvenção econômica (1,0%) e o

272

SCHAPIRO, Mario Gomes. Política industrial. In: RODRIGUEZ, José Rodrigo (Org.). Fragmentos para um

dicionário crítico de direito e desenvolvimento. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 72-85, p. 80. 273

Para o Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, “Fomento: em sentido amplo, corresponde a políticas e

programas voltados para a promoção de atividades de C&T&I de instituições científicas e tecnológicas (ICT’s)

e empresas com base nos seguintes instrumentos: de regulação (definição de percentuais mínimos de aplicação

de recursos orçamentários; definição de contrapartidas; formas de acesso aos recursos – editais públicos, carta

convite e encomendas etc.); aporte de recursos não reembolsáveis às empresas privadas); créditos (recursos

reembolsáveis); aporte de capital (participação em investimentos); e fiscais (incentivos fiscais ou renúncia de

receitas). Segundo esses diferentes tipos de instrumentos, pode-se estabelecer uma tipologia das políticas e

programas de C&T&I. Conceitos mais restritos de fomento podem ser definidos tendo por referência cada um

ou um subconjunto desses tipos de instrumentos”. (GALVÃO, Antonio Carlos Filgueira. Descentralização do

fomento à ciência, tecnologia e inovação no Brasil. Brasília, DF: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos,

2010, p. 12). 274

Informação constante do site da ABDI. Disponível em:

http://www.abdi.com.br/Paginas/politica_industrial.aspx. Acesso em: 17 set. 2014.

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93

financiamento a projetos de P&D e inovação tecnológica em parcerias com universidades ou

institutos de pesquisa (1,3%).275

A pesquisa, tal como as anteriores já haviam demonstrado, evidenciou a manutenção do

padrão brasileiro de realização de atividades de inovação de baixo conteúdo tecnológico, tais

como o acesso ao conhecimento tecnológico por meio da compra de máquinas e

equipamentos, treinamento e aquisição de softwares.276

Os dados revelaram, ainda, que há muito a avançar em relação ao financiamento de

projetos de P,D&I em parcerias com universidades ou institutos de pesquisa, os quais, diga-

se, costumam envolver alto conteúdo tecnológico.

Por fim, importa notar que, comparando o percentual de empresas industriais

inovadoras que utilizaram ao menos um instrumento de apoio governamental no período de

2006 a 2008 com o resultado observado no período de 2009 a 2011, houve aumento nessa

participação de 22,8% para 34,6%. Atingiu-se o número de cerca de 14, 3 mil empresas

industriais que utilizaram algum incentivo público federal para desenvolver suas inovações de

produto e/ou processo nesse último período, número este aproximadamente 64,4% maior do

que o verificado no período anterior. A proporção cresceu com o tamanho da empresa: 33,4%

das que ocupavam entre 10 e 99 pessoas, 40,4% daquelas que possuíam entre 100 e 499

pessoas ocupadas e 54,8% nas empresas com 500 ou mais pessoas ocupadas. Conforme

revelado na edição anterior da pesquisa, foram as grandes empresas277

as relativamente mais

beneficiadas pelos programas governamentais.278

7.1 Os indicadores nacionais de inovação

Segundo a Pintec 2011, na economia brasileira, o ano de 2009 foi marcado por uma

retração, que ocorreu em decorrência da crise econômica internacional de 2008. Em 2009, o

Produto Interno Bruto (PIB) registrou uma queda em volume de 0,3% em relação ao ano

275

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação 2011. Rio de

Janeiro: IBGE, 2013. (documento não paginado). 276

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação 2011. Rio de

Janeiro: IBGE, 2013. (documento não paginado). 277

Quanto maior a empresa, maior o volume de recursos que ela consegue alocar ao processo inovativo e

maiores os meios que garantem que ela consiga se apropriar dos ganhos provenientes da inovação. 278

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação 2011. Rio de

Janeiro: IBGE, 2013. (documento não paginado).

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anterior. Na indústria da transformação, segmento predominante das empresas do universo

coberto pela Pintec, a queda foi de 8,7% em comparação a 2008.279

Além da crise internacional, no intervalo de 2009 a 2011, outro fenômeno relevante foi

o movimento de apreciação cambial, tendo havido em 2011 uma taxa média de câmbio

comercial para a venda real/dólar bastante acima que a taxa de 2006 e, consequentemente, o

incremento das importações.280

No período de 2009 a 2011 as empresas brasileiras foram expostas a um cenário mais

adverso do que o período de 2006 a 2008, especialmente em razão da crise de 2008, que

possivelmente determinou mudanças de comportamento em relação ao risco por parte dos

investidores. “Sendo a inovação um fenômeno intrinsecamente sujeito a elevados níveis de

incerteza, as decisões de investir em estratégias desta natureza tendem a ser condicionadas por

expectativas.”281

Entre 2009 a 2011, considerado o total das empresas pesquisadas pela Pintec 2011,

35,7% das empresas foram inovadoras. Houve queda da taxa geral de inovação282

em relação

à Pintec 2008, quando 38,1% das empresas haviam sido inovadoras,283

o que enfatiza o dever

de o Estado continuar analisando e aprimorando seus meios e instrumentos de fomento,

especialmente no que tange aos seus resultados e à sua eficácia.

7.2 Os indicadores paulistas de inovação284

279

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação 2011. Rio de

Janeiro: IBGE, 2013. (documento não paginado). 280

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação 2011. Rio de

Janeiro: IBGE, 2013. (documento não paginado). 281

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação 2011. Rio de

Janeiro: IBGE, 2013. (documento não paginado). 282

Segundo a FAPESP, a taxa de inovação, que mede o percentual de empresas que introduziram algum tipo de

inovação tecnológica de produto ou processo frente ao conjunto de empresas pesquisadas, é o indicador mais

usado e citado nos meios acadêmicos e políticos. Como a definição de inovação é a seguida pelo Manual de

Oslo, compreende a empresa que adotou uma inovação tanto gerada por ela própria como por outras (processo

de difusão). (BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência,

tecnologia e inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-9). 283

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação 2011. Rio de

Janeiro: IBGE, 2013. (documento não paginado). 284

As informações e dados relacionados aos indicadores de São Paulo, constantes ao longo de todo o presente

item 7.2, foram extraídos dos Indicadores de ciência, tecnologia e inovação em São Paulo 2010, Capítulo 7,

páginas 1 a 49. (BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de

ciência, tecnologia e inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-8). O estudo da FAPESP, de

2010, utilizou indicadores baseados nos dados da Pintec, com predominância da Pintec de 2005, pesquisa

disponível à época de sua elaboração.

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Com base na Pesquisa Pintec 2005, as taxas de inovação da indústria paulista e da

indústria brasileira foram, respectivamente, de 33,6 e 33,4%. Houve pouca distância entre as

médias apuradas.285

Em 2004, cerca de 41% das empresas industriais da Comunidade Europeia foram

inovadoras, tendo ficado o Brasil abaixo dessa média. Nesse período, o país líder da Europa, a

Alemanha, apresentou uma taxa de 72,8% e a França, uma taxa um pouco acima da brasileira,

em 36,1%.286

Praticamente não houve evolução da taxa de inovação entre a Pintec 2003 e a Pintec

2005 - no Estado de São Paulo, a taxa subiu de 31,1%, em 2003, para 33,6%, em 2005.287

Importante notar que embora o total das empresas inovadoras, no Brasil, somasse

apenas um terço das empresas do setor industrial, elas responderam por 81,3% da receita

líquida e por 86,3% das exportações da indústria de transformação do País.288

No Estado de São Paulo houve diferenças importantes em relação aos setores industriais

de maior destaque no restante do Brasil. Os setores que, segundo a classificação da OCDE,

pertencem ao grupo de alta tecnologia, como o aeronáutico e o farmacêutico, apresentaram,

no Estado, uma taxa de inovação muito acima da média nacional.289

Segundo os dados da Pintec 2005, principal base do estudo da FAPESP, as grandes

empresas (consideradas assim as que empregavam 500 ou mais empregados), foram as mais

inovadoras do setor industrial brasileiro.290

As filiais de empresas multinacionais, assim entendidas as empresas brasileiras que

possuem capital majoritária ou parcialmente estrangeiro, por possuírem mais fácil acesso ao

chamado fluxo de conhecimento intrafirma, também apresentaram taxa de inovação em

patamar muito superior à média das empresas nacionais.291

Entre 2003 e 2005, as empresas de capital de origem estrangeira consideradas

inovadoras foram responsáveis por 39,4% da receita líquida da indústria e por 46,3% das

285

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-11. 286

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-9. 287

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-11. 288

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-11. 289

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-11. 290

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-12. 291 BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-12.

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exportações industriais do Brasil. Por estarem fortemente concentradas em São Paulo, essas

empresas responderam por mais da metade da receita líquida da indústria, com 57,3%, e por

66,3% das exportações industriais no Estado.292

A presença de empresas de capital estrangeiro na P&D industrial brasileira foi de

44,4%. Em São Paulo, essas empresas responderam por 56,6% da P&D industrial do

Estado.293

Considerado, todavia, o sentido schumpeteriano de inovação (sem englobar a difusão,

que é a adoção de uma tecnologia já estabelecida), no cenário nacional, apenas 4,2% das

empresas, sublinhe-se, e não mais as 33,4%, anteriormente citadas, inovaram, revelando-se,

conforme frisado pela FAPESP, o caráter passivo e dependente das empresas do setor

industrial brasileiro.294

Essa taxa de inovação, de 4,2%, situa-se em patamar muito inferior a dos países

europeus, em 2004: Alemanha: 17,5%; Espanha: 7,3%; França: 12,6%; Itália: 11,3%;

Finlândia: 21,5%; e Reino Unido: 20,5%. Ou seja, não é difícil concluir que o País ainda tem

muito a avançar, sendo necessário promover uma verdadeira mobilização em toda a sociedade

em prol da consecução do objetivo de tornar o Brasil mais inovador e mais competitivo.295

Conforme conclusões da FAPESP:

a postura relativamente passiva das empresas industriais se reflete na

pequena importância que a P&D tem para a adoção de inovações na maioria

das empresas industriais. Poucas empresas estabelecem vínculos de

cooperação com outras empresas ou com universidades e institutos de

pesquisa. Essa proporção fica aquém daquela presente nos países europeus.

A aquisição de máquinas é ainda o principal esforço inovativo das empresas

brasileiras e paulistas, contrariamente às empresas dos países europeus, em

que esses recursos se concentram em P&D interna.

O indicador que melhor ilustra as diferenças estruturais da indústria

brasileira com a dos países desenvolvidos é a intensidade de P&D interna,

que é a medida a partir da razão do dispêndio de P&D sobre o valor

adicionado. Essa taxa fica em 1,5% para o conjunto da indústria brasileira e

em 2,1% para o Estado de São Paulo, muito abaixo dos 7,7% da média dos

países da OCDE. Quando se faz uma comparação das intensidades por

setores da indústria, percebe-se que é nos setores de alta tecnologia que as

discrepâncias são mais acentuadas em relação à média dos países

292 BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-14. 293

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-15. 294

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-17. 295

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-17.

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97

desenvolvidos, exceto no setor aeronáutico, em que a intensidade brasileira

emparelha-se com a dos países desse bloco.296

No plano nacional, São Paulo, líder no País, concentrou 58,4% de todos os dispêndios

em P&D.

Os dados levantados pela Pintec demonstraram que, no Brasil, apesar dos esforços

realizados, o papel do Estado nas atividades de inovação ainda é limitado:

[...] aproximadamente 96% dos recursos que financiaram a P&D interna e

externa da indústria de transformação no Estado de São Paulo provinham das

próprias empresas, 2,8% tinham origem em organismos governamentais e

apenas 1,1% em organismos privados.297

Demonstraram, ainda, que, apenas 6% das empresas inovadoras brasileiras

consideravam as universidades e institutos de pesquisa importantes como fonte de informação

para a inovação e que um conjunto ainda menor de empresas, equivalente a 2,9%, estabelecia

vínculos de cooperação298

com estes. Essa taxa mostrou-se inferior à taxa de países como a

França e o Reino Unido (taxas de cerca de 10%); a Alemanha (8%), a Itália e a Espanha

(5%).299

Consoante já afirmado, as empresas, as universidades e institutos de pesquisa e o Poder

Público têm sido considerados atores centrais nos processos de inovação. Não podia ser

diferente, afinal, nas universidades e institutos de pesquisa públicos encontram-se

infraestrutura e recursos humanos altamente especializados e capacitados para as atividades

de P,D&I. Por essa razão, mostram-se essenciais para as políticas públicas o aperfeiçoamento

da legislação e dos instrumentos jurídicos pertinentes à promoção da interação entre esses

atores, interação esta que, como se depreende, não tem sido eficaz. Com efeito, a maior

disposição das empresas para cooperar com parceiros e contratar mão de obra qualificada tem

sido considerada uma importante condicionante dos efeitos positivos sobre a inovação, ao

296

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-48. 297

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-43. 298

Na Pintec, a cooperação para inovação é definida como “a participação ativa da empresa em projetos

conjuntos de P&D e outros projetos de inovação com outra organização (empresa ou instituição), o que não

implica, necessariamente, que as partes envolvidas obtenham benefícios comerciais imediatos. A simples

contratação de serviços de outra organização, sem a sua colaboração ativa, não é considerada cooperação.”

(INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação 2011. Rio de

Janeiro: IBGE, 2013. (documento não paginado). 299

(BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia

e inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-31-32.

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lado de outros fatores tais como a maior disseminação da cultura da inovação na sociedade e a

ampliação dos incentivos aos agentes inovadores, inclusive para atividades de P&D.300

Conforme procurou-se demonstrar até este momento, o Estado brasileiro promove

diretamente e regula a inovação tecnológica. Parece-nos evidente a necessidade de um

envolvimento mais consistente por parte dos estudiosos do Direito Administrativo nos debates

relacionados à melhora do desempenho inovador do País, o que muito poderá contribuir para

a concretização do objetivo constitucional do desenvolvimento nacional.

A respeito das parcerias entre os setores público e privado, com vistas à consecução de

atividades de inovação, é que se tratará mais adiante.

300

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação 2011. Rio de

Janeiro: IBGE, 2013. (documento não paginado).

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8 SISTEMAS DE INOVAÇÃO

O conhecimento é considerado um recurso econômico com características únicas, tendo

em vista que não é escasso nem consumido quando utilizado. Ao contrário de outros recursos,

com a utilização, o seu estoque é aumentado pela difusão na economia.301

Ruy Quadros, Sandra Brisolla, André Furtado e Roberto Bernardes ensinam que os

conhecimentos científico e tecnológico vêm lapidando um novo significado à noção

contemporânea de produtividade, consolidando-se como elementos essenciais e determinantes

do ciclo de desenvolvimento econômico e na formação de poder e riqueza das empresas,

regiões e países. Essa nova perspectiva tenta traduzir o significado da produção, distribuição e

uso do conhecimento e da informação como elementos nucleares para a mudança social e para

o progresso tecnológico e econômico das nações avançadas.302

A formulação de expressões como “economias baseadas em conhecimento”; “sociedade

da informação”; “economia do aprendizado”; “capitalismo de alianças relacional e coletivo”

tenta retratar a transição do modelo linear de C,T&I para o modelo de ligações em cadeia,

alterando-se posteriormente para um modelo padrão sistêmico.303

No Brasil, o revogado Decreto Federal nº 75.225, de 15 de janeiro de 1975, que

dispunha sobre o Sistema Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, já

estabelecia, em seu artigo 2º, a organização das atividades de ciência e tecnologia sob a forma

de sistema.

Em consonância com a lição de Glauco Arbix, um sistema de inovação consiste num

conjunto de instituições cujas interações determinam o desempenho inovador das firmas.304

Para Gilberto Bercovici, a pesquisa na área da inovação fala em ‘sistemas de inovação’

ao se referir às condições institucionais e jurídicas complexas necessárias à inovação. A seu

ver, os mecanismos fundamentais que organizam um ambiente propício à inovação consistem

em regras que possibilitam a criação, difusão e troca de direitos que assegurem a seus

301

SILVA, Carla Maria de Souza e. Inovação e cooperação: o estado das artes no Brasil. Revista do BNDES, v.

7, n. 13, p. 65-88, jun., 2000, p. 67. 302

QUADROS, Ruy. et al. Força e fragilidade do sistema de inovação paulista. In: São Paulo em Perspectiva,

São Paulo, v. 14, n. 3, p. 124-141, p. 124. 303

QUADROS, Ruy. et al. Força e fragilidade do sistema de inovação paulista. In: São Paulo em Perspectiva,

São Paulo, v. 14, n. 3, p. 124-141, p. 124-125. 304

ARBIX, Glauco. Inovar ou inovar: a indústria brasileira entre o passado e o futuro. São Paulo: Papagaio,

2007, p. 142.

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proprietários a possibilidade de atuar no mercado e, a terceiros, a possibilidade de acessar este

mercado.305

Conforme explica Luciana Oliveira Telles, o termo é utilizado para denominar o

conjunto de instituições que contribuem para o desenvolvimento e difusão de conhecimentos

e tecnologias e que proveem a estrutura sobre a qual ocorre a inovação. O alinhamento efetivo

entre essas instituições não se dá naturalmente, mas se desenvolve em resposta a incentivos e

oportunidades, precisando ser construído.306

Um sistema de inovação é baseado na divisão de trabalho das instituições, no que se

refere às suas funções e domínios. As instituições acumulam diferentes tipos de

conhecimento, possuem culturas e objetivos também distintos e respondem a mecanismos

diversos de incentivo. Por outro lado, a inovação demanda a combinação desses diferentes

tipos de conhecimento, o que requer um sistema eficiente de interação, de comunicação e de

coordenação entre esses vários agentes.307

De fato, a inovação é um processo em que a interação com os mais diversos atores, tais

como clientes, fornecedores, universidades, institutos de pesquisa, empresas de serviços de

engenharia, serviços de formação profissional e serviços tecnológicos, e até mesmo

concorrentes tem significação importante. Por isso, as oportunidades oferecidas pelos

aspectos virtuosos, ou não, dos sistemas nacionais (e também dos sistemas regionais) de

inovação, incluindo a sua dimensão regulatória, devem ser considerados em qualquer

abordagem sobre a matéria.308

Nessa trilha, verifica Alessandro Octaviani que a construção dos sistemas nacionais de

inovação foi uma tarefa realizada por todos os países centrais e os retardatários que realizaram

esforços de mobilidade na hierarquia do sistema-mundial no século XX, tarefa esta na qual,

segundo a literatura especializada, o Estado teve papel central 309-310

.

305

BERCOVICI, Gilberto. Ciência e inovação sob a Constituição de 1988. Revista dos Tribunais, São Paulo, n.

916, p 267-295, fev. 2012, p. 289. 306

TELLES, Luciana. O papel dos institutos públicos de pesquisa no desenvolvimento tecnológico e na

cooperação universidade-empresa. 2011. 279 f. Tese (Doutorado) - Escola Politécnica, Universidade de São

Paulo, São Paulo, 2011, p. 37. 307

TELLES, Luciana. O papel dos institutos públicos de pesquisa no desenvolvimento tecnológico e na

cooperação universidade-empresa. 2011. 279 f. Tese (Doutorado) - Escola Politécnica, Universidade de São

Paulo, São Paulo, 2011, p. 37 -38. 308

BRENTANI; Ricardo Renzo; CRUZ, Carlos Henrique de Brito (Coord.). Indicadores de ciência, tecnologia e

inovação em São Paulo 2010. São Paulo: Fapesp, 2011, p. 7-8. 309

OCTAVIANI, Alessandro. Recursos genéticos e desenvolvimento. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 187. 310

Segundo Luciana Oliveira Telles, a literatura especializada adota o termo catch-up para denominar os

esforços que os países realizam para diminuir o hiato tecnológico e econômico que os distancia dos países

mais avançados em uma determinada época. Economias que realizaram o catch-up são as que conseguiram

gerar inovações tecnológicas em um ritmo mais acelerado que os países avançados. A autora destaca, ainda,

que estudos especializados envolvendo quase uma centena de países com diferentes níveis de

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Constatando, em particular, a forte presença estatal na confecção dos sistemas nacionais

de inovação dos países centrais, observa, ainda, Octaviani, que desde 2000, os orçamentos de

governo para P&D na área da OCDE têm crescido.311

No Brasil, o sistema nacional de inovação é marcado pela debilidade do setor privado

em realizar inovações, apesar da considerável rede pública de produção científica.

A cultura da inovação brasileira é bastante recente, a indústria não tem tradição em

inovar nem tampouco em contratar pessoal mais qualificado (como mestres e doutores).

O grau de inovação no país é baixo, em comparação com os países centrais. Em termos

de produção científica, o País está longe dos primeiros colocados, muito embora tenha havido,

ao longo das últimas décadas, considerável aumento de sua capacidade científica.312

De fato, entre 2000 e 2010, houve uma ampliação dos esforços brasileiros em C,T&I , o

que, todavia, não foi suficiente para reduzir o descompasso em relação aos países centrais.

Segundo a ENCTI 2012-2015, atualmente, o Brasil encontra-se em um estágio intermediário

de desenvolvimento científico e tecnológico – se o País mantiver a taxa de crescimento em

P&D dos últimos anos, serão necessários cerca de 20 (vinte) anos para se chegar ao nível, de

hoje, dos países europeus.313

Existe, inegavelmente, uma defasagem tecnológica no País, cuja superação requer uma

mudança de patamar nos investimentos públicos e privados em P,D&I.

Tendo em vista que o Direito tem papel essencial dentro dos sistemas de inovação e que

o Estado tem atuação de destaque nos processos inovativos, seja ao promovê-los, seja ao

regulá-los, faz-se necessário, cada vez mais, estudar as prescrições e efeitos decorrentes do

chamado ordenamento jurídico da inovação.

No plano federal, esse arcabouço é composto, especialmente, das seguintes leis e

decretos:

desenvolvimento, para o período de 1960-2000, apontam uma mudança nas condições de catch-up, mostrando

que, até os anos 80, a imitação tecnológica de países avançados era um importante fator de geração do

crescimento econômico mas, a partir dos anos 90, o sucesso ou fracasso de países de baixa renda em realizar

processos de catch-up dependeu, principalmente, de suas capacidades de desenvolver ou organizar seus

sistemas de inovação. (TELLES, Luciana. O papel dos institutos públicos de pesquisa no desenvolvimento

tecnológico e na cooperação universidade-empresa. 2011. 279 f. Tese (Doutorado) - Escola Politécnica,

Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011, p. 30). 311

OCTAVIANI, Alessandro. Recursos genéticos e desenvolvimento. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 190. O autor

destaca que, em termos de produção científica, o Brasil respondeu, em 2005, por 1,8% da produção científica

mundial (critério: artigos publicados em periódicos científicos indexados), ocupando a 17ª posição mundial

(primeiros colocados: EUA: 32,7%; Japão: 8,5%; Alemanha: 8,4%; Reino Unido: 7,4%; China: 6,7% e

França: 5,9%. Em 1981, o País formou 547 doutores e, em 2005, 10.616). 312

OCTAVIANI, Alessandro. Recursos genéticos e desenvolvimento. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 191-193. 313

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e

Inovação 2012-2015 – Balanço das atividades estruturantes 2011. Brasília: MCTI, p. 34.

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Decreto-Lei nº 719, de 31 de julho de 1969, que cria o Fundo Nacional de

Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT);

Lei nº 8.010, de 29 de março de 1990, que dispõe sobre as importações de bens

destinados à pesquisa científica e tecnológica, alterada pela Lei nº 10.964, de 28 de outubro de

2004;

Lei nº 8.172, de 18 de janeiro de 1991, que restabelece o FNDCT; alterada pela Lei

11.540/2007;

Lei nº 8.248, de 23 de outubro de 1991, alterada pelas Leis nºs 10.176/2001 e

11.077/2004;

Lei nº 8.958, de 20 de dezembro de 1994, alterada pelas Leis nº 10.973, de 02 de

dezembro de 2004 e 12.863/2013, e regulamentada pelos Decretos nº 7.423/2010, 8.240/2014

e 8.241/2014, que dispõe sobre as relações entre as instituições federais de ensino superior e

de pesquisa científica e tecnológica e as fundações de apoio;

Lei nº 9.279, de 14 de março de 1996 (Lei da Propriedade Industrial);

Lei nº 9.456, de 25 de abril de 1997 (Lei de Cultivares);

Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998 (Lei de Direitos Autorais);

Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998 (Lei de Software);

Lei nº 9.994, de 24 de julho de 2000, que institui o Programa de Desenvolvimento

Científico e Tecnológico do Setor Espacial;

Lei nº 10.168, de 29 de dezembro de 2000, que institui contribuição de intervenção de

domínio econômico para financiamento do programa de estímulo à interação Universidade-

Empresa para apoio à inovação;

MP nº 2.186-16, de 23 de agosto de 2001 que dispõe sobre o acesso ao patrimônio

genético, à proteção e o acesso ao conhecimento tradicional associado, a repartição de

benefícios e o acesso à tecnologia e transferência de tecnologia para sua conservação e

utilização;

Lei nº 10.973, de 2 de dezembro de 2004 (Lei de Inovação) e Decreto nº 5.663, de 11

de outubro de 2005 (Regulamento da Lei de Inovação);

Lei nº 11.105, de 24 de março de 2005 (Biossegurança);

Lei nº 11.079, de 30 de dezembro de 2004 (Lei de Parcerias Público-Privadas);

Lei nº 11.196, de 21 de novembro de 2005 (Lei do Bem, que estabelece incentivos

fiscais para a inovação tecnológica);

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Lei nº 11.080, de 30 de dezembro de 2004, que autoriza o Poder Executivo a instituir o

Serviço Social Autônomo denominado Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial

(ABDI);

Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, que institui o Estatuto

Nacional da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte;

Lei nº 11.487, de 15 de junho de 2007, que institui novo incentivo à inovação

tecnológica;

Lei nº 11.484, de 31 de maio de 2007 (Lei de Topografias de Circuitos Integrados e

Programa de Apoio às Indústrias de Semicondutores/TV Digital);

Decreto nº 6.170, de 25 de julho de 2007, que regulamenta os convênios, contratos de

repasse e termos de cooperação celebrados pelos órgãos e entidades da administração pública

federal com órgãos ou entidades públicas ou privadas sem fins lucrativos, para a execução de

programas, projetos e atividades de interesse recíproco que envolvam a transferência de

recursos oriundos do Orçamento Fiscal e da Seguridade Social da União, alterada pelas Leis

nºs 6.170/07, 6.428/08, 6.619/08, 7.568/11 e 8.244/14;

Lei nº 11.794, de 8 de outubro de 2008, que regulamenta o inciso VII do §1º do art.

225 da Constituição Federal, estabelecendo procedimentos para uso científico de animais;

Lei nº 12.349, de 15 de dezembro de 2010 (Lei do Poder de Compra Nacional, que

promoveu alterações nas Leis de Licitação, de Inovação e a pertinente às fundações de apoio).

Lei nº 13.019, de 31 de julho de 2014, que dentre outros assuntos, define as diretrizes

para a política de fomento e de colaboração com as organizações da sociedade civil,

instituindo o termo de colaboração e o termo de fomento.

Como se vê, trata-se de um emaranhado de normas, pertinentes aos mais diversos

assuntos, estabelecidas de forma não sistematizada, nas mais diversas épocas, relacionadas ao

exercício de competências das mais variadas entidades, tais como o Ministério da Ciência,

Tecnologia e Inovação (MCTI),314

o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio

Exterior (MDIC) e o Ministério da Educação (MEC).

314

Apenas a título de ilustração, cumpre destacar que o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI)

possui, atualmente, nos termos da Lei nº 10.683, de 28 de maio de 2003, com alterações dadas pela Lei nº 12.

545, de 14 de dezembro de 2011, as seguintes áreas de atribuições: a) políticas nacionais de pesquisa científica

e tecnológica e de incentivo à inovação; b) planejamento, coordenação, supervisão e controle das atividades de

ciência, tecnologia e inovação; c) política de desenvolvimento de informática e automação; d) política nacional

de biossegurança; e) política espacial; f) política nuclear; g) controle da exportação de bens e serviços

sensíveis; h) articulação com os governos estaduais, do Distrito Federal e municipais, com a sociedade civil e

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Estão vinculados ao MCTI a Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP)315

e o

Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)316

. Além das

agências de fomento, compõem o sistema MCTI: a Comissão Nacional de Energia Nuclear

(CNEN); a Agência Espacial Brasileira (AEB); 19 unidades de pesquisa científica,

tecnológica e de inovação; e quatro empresas estatais: Indústrias Nucleares Brasileiras (INB);

Nuclebrás Equipamentos Pesados (Nuclep); Alcântara Cyclone Space (ACS) e Centro de

Excelência em Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec). Ademais, mantêm contratos de

gestão com o MCTI as seguintes Organizações Sociais: Centro de Gestão e Estudos

Estratégicos (CGEE); Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (IMPA); Centro

Nacional de Pesquisas em Energia e Materiais / Associação Brasileira de Tecnologia de Luz

Síncroton (CNPEM/ABTluS); Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP); Instituto de

Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM) e Associação Brasileira de Pesquisa e

Inovação Industrial (EMBRAPII).317

Convém notar que sempre houve um Ministério para a área de ciência e tecnologia.

com outros órgãos do Governo Federal no estabelecimento de diretrizes para as políticas nacionais de ciência,

tecnologia e inovação. 315

Em 1967 a FINEP, empresa pública vinculada ao MCTI, foi criada para institucionalizar o Fundo de

Financiamento de Estudos de Projetos e Programas, de 1965. Substituiu o papel até então exercido pelo Banco

BNDES e seu Fundo de Desenvolvimento Técnico-Científico (FUNTEC), constituído em 1964 para financiar

a implantação de programas de pós-graduação nas universidades brasileiras. Em 1969, foi instituído o Fundo

Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), destinado a financiar a expansão do sistema

de C&T. A partir de 1971, a FINEP foi declarada a sua Secretaria Executiva. Nas últimas décadas, a FINEP

financiou a implantação de novos grupos de pesquisa, a criação de programas temáticos, a expansão da

infraestrutura de C&T e a consolidação institucional da pesquisa e da pós-graduação no País, assim como

estimulou a articulação entre universidades, centros de pesquisa, empresas de consultoria e contratantes de

serviços, produtos e processos. Atualmente, financia o sistema de C,T&I, por meio da concessão de recursos

reembolsáveis e não-reembolsáveis, assim como por meio de outros instrumentos. Disponível em:

http://www.finep.gov.br/pagina.asp?pag=institucional_empresa. Acesso em: 05 nov. 2014. 316

Desde os anos 20, após a Primeira Guerra Mundial, a criação de uma entidade governamental para fomentar o

desenvolvimento científico no país era cogitada pela Academia Brasileira de Ciências (ABC). Na década de

1930, houve uma tentativa de criação de um Conselho de Pesquisas Experimentais, voltado ao setor agrícola,

mas a ideia não teve êxito. A partir da Segunda Guerra Mundial, os avanços da tecnologia bélica, aérea,

farmacêutica e principalmente a energia nuclear, despertaram os países para a importância da pesquisa

científica e de seu fomento. Em maio de 1946, o Almirante Álvaro Alberto da Motta e Silva propôs ao

governo, por intermédio da ABC, a criação de um conselho nacional de pesquisa. Em 1948, foi fundada por

cientistas a Sociedade para o Progresso da Ciência, voltada para a defesa do avanço científico e tecnológico e

do desenvolvimento educacional e cultural do Brasil. Ainda em 1948, o projeto da criação do conselho foi

apresentado na Câmara dos Deputados. Em janeiro de 1951, o Presidente Dutra sancionou a Lei de criação do

Conselho Nacional de Pesquisas como autarquia vinculada à Presidência da República - Lei nº 1.310 de 15 de

janeiro de 1951. Disponível em: http://www.cnpq.br/web/guest/a-criacao. Acesso em: 05 nov. 2014.

Interessante notar que também no ano de 1951 foi criada a CAPES. A criação do CNPq e da Capes é

considerada o marco do esforço sistemático de investimento na formação de recursos humanos e de pesquisa

no Brasil (ARBIX, Glauco. Inovar ou inovar: a indústria brasileira entre o passado e o futuro. São Paulo:

Papagaio, 2007. p.5). 317

Informação constante do site do MCTI. Disponível em:

www.mct.gov.br/index.php/content/view/79120/Organizacoes_Sociais.html. Acesso em: 05 nov. 2014.

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105

A rigor, o MCTI foi criado pelo Decreto nº 91.146, em 15 de março de 1985.318

Antes de sua criação, o órgão responsável pela coordenação do sistema de C,T&I era o

então Conselho Nacional de Pesquisa, hoje Conselho Nacional de Desenvolvimento

Científico e Tecnológico (CNPq).

A articulação para a criação do Ministério teve início na década de 1970, tendo ganhado

forças com a criação do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico

(PADCT), que contava com a participação das quatro principais agências de fomento, o

CNPq, a FINEP, a CAPES e Secretaria de Tecnologia Industrial. A proposta da criação de um

ministério foi aprovada pelo então presidente eleito Tancredo Neves. Apesar da morte de

Tancredo Neves, o presidente, à época, José Sarney honrou o compromisso de criar o

Ministério, nomeando Renato Archer como ministro. Em 1989 ocorreu a fusão do Ministério

da Ciência e Tecnologia com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. Em

março do mesmo ano uma medida provisória dividiu as duas pastas, passando o Ministério a

ser a Secretaria Especial da Ciência e Tecnologia. Em 1989, o Ministério da Ciência e

Tecnologia foi recriado por outra medida provisória e, em 1990, o então presidente Fernando

Collor o extinguiu novamente, criando a Secretaria da Ciência e Tecnologia, ligada à

Presidência da República. Em 1992, o presidente Itamar Franco editou nova medida

provisória que voltou a criar o Ministério, que assim permanece até os dias atuais.319

Ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, por seu turno,

conforme disposto na Lei nº 10.683, de 28 de maio de 2003, competem áreas também

inquestionavelmente relevantes à inovação, a saber: a) política de desenvolvimento da

indústria, do comércio e dos serviços; b) propriedade intelectual e transferência de tecnologia;

c) metrologia, normalização e qualidade industrial; d) políticas de comércio exterior; e)

318

As razões que levaram à criação do então intitulado Ministério da Ciência e Tecnologia podem ser conferidas

nos “considerandos” do próprio Decreto nº 91.146, de 15 de março de 1985: “CONSIDERANDO que o

impacto dos avanços científicos e tecnológicos sobre as condições da vida do homem comum e da sociedade -

cada vez mais extenso e mais profundo - não pode passar desapercebido ao Estado e aos Governos, em virtude

da elevada missão que têm de zelar pelo bem comum; CONSIDERANDO que, no estágio de desenvolvimento

do Brasil, impõe-se o estímulo à atividade empresarial no setor, bem como o desenvolvimento de um

patrimônio de conhecimentos científicos e de uma tecnologia nacional que atenda às necessidades do País;

CONSIDERANDO que, embora já exista na estrutura da Administração Pública Brasileira uma série de

órgãos e de instituições de pesquisa e fomento voltados ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia, trata-se

de um conjunto disperso e desarticulado, sem supervisão e orientação unificadas, circunstância que inviabiliza

a formulação e a execução de uma estratégia de ação política firme e consistente no setor; CONSIDERANDO,

ainda, a contribuição que o progresso científico e tecnológico pode trazer tanto ao levantamento dos padrões

de vida da população, quanto ao desenvolvimento mais eficaz dos setores industrial, agrícola e de serviços;

CONSIDERANDO, enfim, que um Ministério da Ciência e Tecnologia estabeleceria os instrumentos e os

canais indispensáveis a uma política nacional no setor, capaz de servir aos mais altos interesses econômicos,

sociais e políticos da comunidade brasileira [...]” 319

Informação constante do site do MCTI. Disponível em:

www.mct.gov.br/index.php/content/view/78977/Historico.html. Acesso em: 05 nov. 2014.

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106

regulamentação e execução dos programas e atividades relativas ao comércio exterior; f)

aplicação dos mecanismos de defesa comercial; g) participação em negociações internacionais

relativas ao comércio exterior.

As áreas de competência do Ministério da Educação, conforme a Lei nº 10.683, de 28

de maio de 2003, compreendem, dentre outras: a) política nacional de educação; b) educação

infantil; c) educação em geral, compreendendo ensino fundamental, ensino médio, ensino

superior, educação de jovens e adultos, educação profissional, educação especial e educação à

distância, exceto ensino militar; d) pesquisa e extensão universitária; e) magistério. A atuação

de tal Ministério é de patente relevância, haja vista que educação e qualificação profissional

são, conforme anteriormente citado, importantes variáveis na probabilidade de uma empresa

inovar.

A Presidência da República, nos termos da Lei nº 9.257, de 09 de janeiro de 1996, conta

com um órgão de assessoramento para a formulação e implementação da política nacional de

desenvolvimento científico e tecnológico, o Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia

(CCT), ao qual compete propor a política de Ciência e Tecnologia do País, como fonte e parte

integrante da política nacional de desenvolvimento; propor planos, metas e prioridades de

governo referentes à Ciência e Tecnologia, com as especificações de instrumentos e de

recursos; efetuar avaliações relativas à execução da política nacional de Ciência e Tecnologia;

opinar sobre propostas ou programas que possam causar impactos à política nacional de

desenvolvimento científico e tecnológico, bem como sobre atos normativos de qualquer

natureza que objetivem regulamentá-la.320

Especificamente em relação ao Estado São Paulo, vale ressaltar que ele conta com uma

relevante infraestrutura pública dedicada à C&T, composta, dentre outras instituições, pela

320

A composição do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia – CCT, nos termos do Decreto nº 6.090, de 24,

de abril de 2007 é a seguinte: I - Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia, que será o seu Secretário; II -

Ministro de Estado Chefe da Casa Civil da Presidência da República; III - Ministro de Estado da Defesa; IV -

Ministro de Estado da Educação; V - Ministro de Estado da Fazenda; VI - Ministro de Estado das

Comunicações; VII - Ministro de Estado da Saúde; VIII - Ministro de Estado das Relações Exteriores; IX -

Ministro de Estado do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior; X - Ministro de Estado do

Planejamento, Orçamento e Gestão; XI - Ministro de Estado da Integração Nacional; XII - Ministro de Estado

Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República; XIII - Ministro de Estado da

Agricultura, Pecuária e Abastecimento; XIV - oito membros entre produtores e usuários de ciência e

tecnologia, e respectivos suplentes, com mandato de três anos, admitida uma única recondução; e

XV - seis membros representantes de entidades de caráter nacional representativas dos setores de ensino,

pesquisa, ciência e tecnologia, e respectivos suplentes, com mandato de três anos, admitida uma única

recondução. Os membros referidos no inciso XV são indicados pela Associação Nacional dos Dirigentes de

Instituições Federais de Ensino - ANDIFES, pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC,

pela Academia Brasileira de Ciências - ABC, pelo Conselho Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos

de Ciência e Tecnologia - CONSECTI, pelo Fórum Nacional de Secretários Municipais da Área de Ciência e

Tecnologia e pelo Conselho Nacional das Fundações de Amparo à Pesquisa - CONFAP. Os membros referidos

nos incisos XIV e XV são designados pelo Presidente da República.

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Universidade de São Paulo (USP); pelo Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São

Paulo S.A (IPT); pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP);

pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN); pela Universidade Estadual de

Campinas (Unicamp); e pela Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita Filho"

(UNESP), além de diversos institutos de pesquisas integrados às suas próprias Secretarias de

Estado, tais como o Instituto Adolfo Lutz e o Instituto Butantan.321

A rigor, o sistema público de C&T de São Paulo é o mais diversificado e desenvolvido

dentre todos os sistemas estaduais brasileiros, respondendo por metade da produção científica

nacional e pela formação de cerca de dois terços dos doutores brasileiros.322

Na esfera estadual, à Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, Ciência,

Tecnologia e Inovação, consoante o Decreto nº 59.773, de 19 de novembro de 2013, incumbe,

dentre outras atribuições: I - a formulação, a implantação e a coordenação da execução de

políticas públicas voltadas à promoção da inovação tecnológica e à garantia do crescimento

econômico sustentável do Estado, com os objetivos de: a) gerar trabalho e renda; b) reduzir as

desigualdades regionais; c) assegurar apoio tecnológico aos municípios paulistas,; d) fomentar

e apoiar a realização de planos, programas e projetos de âmbito local ou regional que possam

contribuir para o desenvolvimento sustentável do Estado de São Paulo; e) atrair

investimentos; f) incrementar o comércio exterior; g) fortalecer e estimular: os arranjos

produtivos locais; o empreendedorismo; e as microempresas e empresas de pequeno e

médio portes; h) melhorar e facilitar a prospecção, a legalização e o exercício de atividade

econômica; i) aumentar a participação relativa da micro e pequena empresa no produto

321

A título exemplificativo, os diplomas seguintes, com suas respectivas alterações posteriores, tratam, entre

outros assuntos, de algumas das instituições criadas em São Paulo, no período compreendido entre 1934 até o

final da década de 70, integrantes de sua relevante estrutura de P&D: Decreto nº 6.283, de 25 de janeiro de

1934, que cria a Universidade de São Paulo; Decreto nº 6.375, de 03 de abril de 1934, que cria o Instituto de

Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo, anexo à Escola Politécnica; Decreto-Lei nº 13.979, de 16 de

maio de 1944, que dispõe sobre a reorganização do Instituto de Pesquisa Tecnológica, instituindo-o em

entidade autárquica; Lei Estadual nº 5.918, de 18 de outubro de 1960, que autoriza o Poder Executivo a

instituir a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo-FAPESP; Lei Estadual nº 7.655, de 28 de

dezembro de 1962, alterada pelas Leis 9.715, de 30 de janeiro de 1967, e 10.214, de 10 de setembro de 1968,

que dispõe sobre a criação da Universidade de Campinas como entidade autárquica; Decreto-Lei de 6 de

outubro de 1969, que cria, como entidade autárquica, o Centro Estadual de Educação Tecnológica de São

Paulo; Decreto-Lei nº 250, de 29 de maio de 1970, que cria o Instituto de Energia Atômica, atual Instituto de

Pesquisas Energéticas e Nucleares – IPEN; Lei nº 93, de 27 de dezembro de 1972, alterada pela Lei nº 13.784,

de 23 de outubro de 2009, que cria o Fundo Estadual de Desenvolvimento Científico e Tecnológico –

FUNCET; Lei nº 896, de 17 de dezembro de 1975, que autoriza o Poder Executivo a constituir empresa sob a

denominação de Instituto de Pesquisa Tecnológica do Estado de São Paulo – IPT; Lei nº 952, de 30 de janeiro

de 1976, que cria a Universidade Estadual Paulista "Julio de Mesquita Filho", transformando o Centro

Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza, criado por Decreto-lei de 6 de outubro de 1969, em autarquia

de regime especial, associada à Universidade; Decreto nº 30.519, de 02 de outubro de 1989, que cria e

organiza o Conselho das Instituições de Pesquisa do Estado de São Paulo. 322

QUADROS, Ruy. et al. Força e fragilidade do sistema de inovação paulista. In: São Paulo em Perspectiva,

São Paulo, v. 14, n. 3, p. 124-141, p. 129.

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interno bruto da economia paulista, j) promover: a articulação dos fatores de produção; a

eficiência da infraestrutura e da logística no âmbito do Estado; k) desenvolver, qualificar e

expandir o ensino técnico, tecnológico e profissionalizante, de modo a atender as

necessidades da população e as demandas do mercado; I) estimular: a produção de

conhecimento; a pesquisa científica e tecnológica; a inovação tecnológica; m) aumentar a

competitividade da economia paulista; II - a proposição de políticas e diretrizes para o

ensino superior, em todos os seus níveis; III - a coordenação e a implementação de ações de

competência do Estado com vista à formação de recursos humanos no âmbito do ensino

superior; IV - a promoção da realização de estudos para: desenvolvimento e aprimoramento

do ensino superior; aumento da acessibilidade ao ensino superior; ampliação das atividades de

ensino, pesquisa e extensão; busca de formas alternativas para oferecer formação nos níveis

de ensino superior, com vista a aumentar o acesso à Universidade, respeitadas a autonomia

universitária e as características de cada Universidade; V - o intercâmbio de informações e a

colaboração técnica com instituições públicas e privadas, nacionais, estrangeiras

ou internacionais; VI - o desenvolvimento e a implementação de sistemas de informações

destinadas a orientar as instituições de ensino médio diante das dificuldades encontradas

pelos alunos nos cursos de formação universitária; VII - fomentar o artesanato no Estado.

Em São Paulo, a Lei Complementar nº 1.049, de 19 de junho de 2008, regulamentada

pelo Decreto nº 54.690, de 18 de agosto de 2009, dispõe sobre medidas de incentivo à

inovação tecnológica, à pesquisa científica e tecnológica, ao desenvolvimento tecnológico, à

engenharia não-rotineira e à extensão tecnológica em ambiente produtivo, e dá outras

providências correlatas.323

323

Estão, ainda, relacionadas ao tema, a título exemplificativo, as seguintes normas estaduais: Decreto nº 50.243,

de 16 de novembro de 2005, que institui o Comitê Estadual para a elaboração do Programa Paulista de

Nanotecnologia e Nanociência; Decreto nº 50.504, de 06 de fevereiro de 2006, que institui o Sistema Paulista

de Parques Tecnológicos (revogado pelo Decreto nº 54.196/2009); Decreto nº 52.360, de 13 de novembro de

2007, que institui o Comitê Executivo encarregado da elaboração do Plano de Ciência, Tecnologia e Inovação

para São Paulo; Decreto nº 53.141, de 19 de junho de 2008, que institui Grupo de Trabalho para apresentar

proposta de regulamentação da Lei Complementar nº 1.049, de 19 de junho de 2008; Lei nº 13.179, de 19 de

agosto de 2008, que autoriza o Poder Executivo a instituir Serviço Social Autônomo denominado Agência

Paulista de Promoção de Investimentos e Competitividade – INVESTE SÃO PAULO; Decreto nº 53.766, de

05 de dezembro de 2008, que institui o Serviço Social Autônomo denominado Agência Paulista de Promoção

de Investimentos e Competitividade - INVESTE SÃO PAULO; regulamenta os parágrafos únicos dos artigos

2º e 3º da Lei nº 13.179, de 19 de agosto de 2008, e dá providências correlatas; Decreto nº 53.826, de 16 de

dezembro de 2008, que institui incentivos no âmbito dos parques tecnológicos integrantes do Sistema Paulista

de Parques Tecnológicos, de que tratam a Lei Complementar nº 1.049, de 19 de junho de 2008, e o Decreto n.º

50.504, de 06 de fevereiro de 2006; com alterações dadas pelos Decretos nºs 60.570/2014; 58.768/2012;

57.241/2011; 56.848/2011; 56.340/2010 e 54.906/2009; Decreto nº 54.196, de 02 de abril de 2009, que

regulamenta o Sistema Paulista de Parques Tecnológicos, de que trata o artigo 24 da Lei Complementar nº

1.049, de 19 de junho de 2008 (revogado pelo Decreto 60.286/14); Decreto nº 54.339, de 15 de maio de 2009,

que altera o dispositivo que especifica do Decreto nº 53.766, de 5 de dezembro de 2008, que instituiu o

Serviço Social Autônomo denominado Agência Paulista de Promoção de Investimentos e Competitividade -

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109

Também os demais Estados brasileiros, inspirados pela Lei nº 10.973/2004, vêm

promulgando suas respectivas leis de inovação,324

fortalecendo os sistemas regionais de

inovação.

INVESTE SÃO PAULO; Decreto nº 54.690, de 18 de agosto de 2009, que regulamenta dispositivos que

especifica da Lei Complementar nº 1.049, de 19 de junho de 2008; Decreto nº 54.906, de 13 de outubro de

2009, que altera o Decreto 53.826, de 16 de dezembro de 2008, que instituiu incentivos no âmbito dos parques

tecnológicos integrantes do Sistema Paulista de Parques Tecnológicos, de que tratam a Lei Complementar

1.049, de 19 de junho de 2008 e o Decreto 50.504, de 6 de fevereiro de 2006; Decreto nº 56.848, de 18 de

março de 2011, que altera o Decreto 53.826, de 16 de dezembro de 2008, que institui incentivos no âmbito dos

parques tecnológicos integrantes do Sistema Paulista de Parques Tecnológicos, de que tratam a Lei

Complementar nº 1.049, de 19 de junho de 2008, e o Decreto 50.504, de 06 de fevereiro de 2006; Decreto nº

57.241, de 17 de agosto de 2011; que altera o Decreto 53.826, de 16 de dezembro de 2008, que institui

incentivos no âmbito dos parques tecnológicos integrantes do Sistema Paulista de Parques Tecnológicos, de

que tratam a Lei Complementar nº 1.049, de 19 de junho de 2008, e o Decreto 50.504, de 6 de fevereiro de

2006; Decreto nº 56.413, de 19 de novembro de 2010, que institui o Programa Estadual de Fomento ao

Desenvolvimento Regional, visando a apoiar a elaboração de estudos e projetos voltados ao fomento do

desenvolvimento regional do Estado; Decreto nº 54.424, de 23 de novembro de 2010, que institui e

regulamenta a Rede Paulista de Incubadoras de Empresas de Base Tecnológica de que trata o artigo 24 da Lei

Complementar nº 1.049/2008 (revogado pelo Decreto 60.286/2014); Decreto nº 56.569, de 22 de dezembro de

2010, que cria os Núcleos de Inovação Tecnológica - NITs, no âmbito das Instituições Científicas e

Tecnológicas do Estado de São Paulo - ICTESPs, das Secretarias de Estado que especifica; Lei nº 14.676, de

28 de dezembro de 2011, que institui o Plano Plurianual para o quadriênio 2012-2015; Decreto nº 58.107, de

05 de junho de 2012, que institui a Estratégia para o Desenvolvimento Sustentável do Estado de São Paulo

2020; Decreto nº 58.326, de 24 de agosto de 2012, que regulamenta o § 4º do artigo 1º da Lei nº 93, de 27 de

dezembro de 1972, alterada pela Lei nº 13.784, de 23 de outubro de 2009, que criou o Fundo Estadual de

Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FUNCET; Lei nº 15.099, de 25 de julho de 2013, que dispõe

sobre programas específicos de inovação tecnológica para as microempresas e para as empresas de pequeno

porte no Estado de São Paulo; Decreto nº 59.977, de 30 de outubro de 2013, que reorganiza o Conselho

Estadual de Ciência e Tecnologia – CONCITE; Decreto nº 59.773, de 19 de novembro de 2013, que altera a

denominação da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia, para Secretaria de

Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação e dispõe sobre sua organização; Decreto nº

60.286, de 25 de março de 2014, que regulamenta o Sistema Paulista de Ambientes de Inovação – SPAI e dá

providências correlatas; Lei Complementar nº 1.243, de 30 de maio de 2014, que altera a Lei Complementar nº

846, de 1998, que dispõe sobre a qualificação de entidades como organizações sociais, e dá providências

correlatas; Decreto nº 60.561, de 20 de junho de 2014, que dá nova redação a dispositivos que especifica do

Decreto nº 53.961, de 2009, que aprova o Estatuto da Agência Paulista de Promoção de Investimentos e

Competitividade - INVESTE SÃO PAULO; Decreto nº 60.570, de 24 de junho de 2014, que altera os Decretos

53.051/2008, 53.826/2008 e 54.904/2009, que tratam, respectivamente, do Programa de Incentivo ao

Investimento pelo Fabricante de Veículo Automotor, dos Incentivos no âmbito dos Parques Tecnológicos e do

Programa de Incentivo ao Investimento pelo Fabricante de Produtos da Indústria de Processamento Eletrônico

de Dados. 324

No plano dos Estados, como parte essencial de seus respectivos sistemas de inovação, podem ser citados: a)

no Amazonas: Lei Estadual nº 3.095, de 17 de novembro de 2006, que dispõe sobre incentivos à inovação e à

pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo no âmbito do Estado do Amazonas; b) no Mato

Grosso: Lei Complementar nº 297, de 07 de janeiro de 2008, que dispõe sobre incentivos à inovação e à

pesquisa científica e tecnológica visando alcançar autonomia tecnológica, capacitação e o desenvolvimento do

Estado; c) em Santa Catarina: Lei nº 14.348, de 15 de janeiro de 2008, que dispõe sobre incentivos à

pesquisa científica e tecnológica e à inovação no ambiente produtivo no Estado de Santa Catarina,

regulamentada pelo Decreto nº 2.372, de 9 de junho de 2009; d) em Minas Gerais: Lei nº 17.348, de 17 de

janeiro de 2008, que dispõe sobre o incentivo à inovação tecnológica no Estado; e) no Ceará: Lei nº 14.220,

de 16 de outubro de 2008, que dispõe sobre incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no

estado do Ceará; f) em Pernambuco: Lei nº 13.690, de 16 de dezembro de 2008, que dispõe sobre incentivos

à pesquisa científica e tecnológica e à inovação no ambiente produtivo e social no Estado de Pernambuco, e dá

outras providências, regulamentada pelo Decreto 33.433, de 29 de maio de 2009; g) no Rio de Janeiro: Lei nº

5.361, de 29 de dezembro de 2008, que dispõe sobre incentivos à inovação e à pesquisa científica e

tecnológica no ambiente produtivo no âmbito do estado do rio de janeiro, e dá outras providências,

regulamentada pelo Decreto nº 42.302, de 12 de fevereiro de 2010; h) na Bahia: Lei nº 11.174 de 9 de

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110

Os municípios, de igual modo, vêm reconhecendo a relevância do assunto.

Em 2010, a Lei Paulistana nº 15.247, de 26 de julho de 2010, dispôs sobre a criação do

Conselho Municipal de Ciência, Tecnologia e Inovação, vinculado à Secretaria Municipal de

Desenvolvimento Econômico e do Trabalho, de caráter consultivo, tendo por finalidade o

incentivo ao desenvolvimento científico, tecnológico e à inovação, com vistas ao

desenvolvimento sustentável da cidade, em apoio ao planejamento e à gestão da

Administração Pública Municipal.

Bem se vê que os sistemas de inovação são complexos, não somente sob a ótica técnica

e operacional, mas também sob o ponto de vista de seu disciplinamento legal. A grande

quantidade de normas esparsas em todos os entes federativos demonstra por si só a

necessidade crescente de promover sua melhor articulação e coordenação, identificando e

eliminando, sempre que necessário e possível, as lacunas e sobreposições existentes.

dezembro de 2008, que dispõe sobre incentivos à inovação e à pesquisa científica e tecnológica em ambiente

produtivo no Estado da Bahia e dá outras providências; i) em Alagoas: Lei nº 7.117, de 12 de novembro de

2009, que dispõe sobre incentivos à pesquisa científica e tecnológica, à inovação e à proteção da propriedade

intelectual em ambiente produtivo e social no estado de Alagoas, e dá outras providências; i) no Rio Grande

do Sul: Lei nº 13.196, de 13 de julho de 2009, que estabelece medidas de incentivo à inovação e à pesquisa

científica e tecnológica, define mecanismos de gestão aplicáveis às instituições científicas do Estado do Rio

Grande do Sul e dá outras providências; j) em Sergipe: Lei nº 6.794, de 02 de dezembro de 2009, que dispõe

sobre medidas de incentivo à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo no Estado

de Sergipe, e dá providências correlatas; l) no Espírito Santo: Lei Municipal nº 7.871, de 21 de dezembro de

2009, que dispõe sobre medidas de incentivo à inovação e a pesquisa tecnológica, ao desenvolvimento da

engenharia e a consolidação dos ambientes de inovação nos setores produtivos e sociais na cidade de Vitória,

no âmbito da organização do Sistema Municipal de Ciência, Tecnologia e Inovação, da ampliação da Política

Municipal de Ciência e Tecnologia, e dá outras providências; m) em Goiás: Lei n° 16.922, de 08 de fevereiro

de 2010, que dispõe sobre o incentivo à inovação tecnológica no âmbito do Estado de Goiás e dá outras

providências; n) no Mato Grosso do Sul: Decreto Legislativo n° 489 de 16 de novembro de 2010, que

autoriza o Poder Executivo Estadual adotar medidas de incentivo à inovação tecnológica do Estado de Mato

Grosso do Sul e dá outras providências; o) em Tocantins: Lei nº 2.458, de 5 de julho de 2011, que dispõe

sobre o incentivo à inovação e à pesquisa científico-tecnológica nas atividades produtivas do Estado do

Tocantins.

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111

9 A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA CONCERTADA E A INOVAÇÃO

TECNOLÓGICA

Conforme visto na Parte I, do presente trabalho, no período de transição do Estado

Liberal para o Estado Social de Direito, ganhou notoriedade o desenvolvimento pela

Administração Pública da atividade prestacional e promocional, ou seja, o exercício da função

administrativa tendo por objeto o serviço público e o fomento público.325

Percebeu-se que, para o cumprimento dos objetivos desse Estado Social, a atividade

administrativa teria de ser expandida além de suas funções ordenadora e sancionatória,326

ampliando-se, dessa forma, a intervenção estatal nos domínio econômico e social.

Concomitantemente à expansão das atividades estatais, houve, conforme ensinamentos

de Maria João Estorninho, a proliferação de contratos como instrumentos de parceria entre os

setores público e privado:

O alargamento dos fins a cargo deste Estado Providência, prestador de bens

e serviços aos administrados justifica, não apenas o crescimento da máquina

administrativa mas também a proliferação dos contratos, como instrumento

privilegiado de colaboração de particulares com a Administração.327

Mais recentemente, como registra Dinorá Adelaide Musetti Grotti, o papel

desempenhado pelo Estado sofreu novas alterações. Desta feita, as modificações acabaram

ensejando, por um lado, o desmonte do Estado prestador e, por outro, o fortalecimento, uma

vez mais, do Estado fomentador:

Na quadra final do século passado, operou-se uma transformação nas

concepções dominantes quanto ao papel do Estado. Esta nova visão adota a

descentralização como estratégia; impõe redução das suas dimensões,

envolvendo as questões de privatização, terceirização e publicização; a

recuperação da sua capacidade financeira e administrativa; a necessidade de

fortalecimento de sua função reguladora, fiscalizadora e fomentadora; e o

desmonte do Estado prestador, produtor, interventor e protecionista; o

aumento da governabilidade.328

325

OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no direito

administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 516. 326

OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no direito

administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 516. 327

ESTORNINHO, Maria João. Direito europeu dos contratos públicos: um olhar português. Coimbra:

Almedina, 2006, p.134. 328

GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. As agências reguladoras. Revista Eletrônica de Direito Administrativo

Econômico. Salvador, Instituto de Direito Público na Bahia, n. 6, maio/jun./jul., 2006, p. 1. Disponível em:

<http://www.direitodoestado.com.br. Acesso em: 05 nov. 2014.

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112

Com efeito, ganhou vulto, no País, no bojo da globalização e da Reforma do Estado, a

ideia de Estado baseado no princípio da subsidiariedade.329

Em razão do citado princípio,

De um lado, o Estado deve abster-se de exercer atividades que o particular

tem condições de desempenhar por sua própria iniciativa e com seus

próprios recursos; de outro, o Estado deve fomentar, coordenar, fiscalizar a

iniciativa privada, de sorte a permitir aos particulares, sempre que possível, o

sucesso na condução de seus empreendimentos.330

A Reforma do Estado encontrou seus primórdios na adoção do Programa Nacional de

Desburocratização,331

de 1979, posteriormente aperfeiçoado por meio da criação do Conselho

Interministerial de Privatização, nos termos do Decreto nº 91.991/1985. Com o Governo

Collor, na década de 1990, época em que as privatizações ganharam impulso, foi

regulamentado o Programa Nacional de Privatização. 332-333

O Programa Nacional de Privatização possuía dentre suas metas reordenar a posição

estratégica do Estado na economia, transferindo à iniciativa privada todas as atividades que

por ela poderiam ser bem executadas.334-335

329

GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. Parcerias na administração pública. In: CARDOZO, José Eduardo

Martins; QUEIROZ, João Eduardo Lopes; SANTOS, Márcia Walquiria Batista dos. (Coord.). Direito

administrativo econômico. São Paulo: Atlas, 2011, p. 413-476, p. 413. 330

GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. Parcerias na administração pública. In: CARDOZO, José Eduardo

Martins; QUEIROZ, João Eduardo Lopes; SANTOS, Márcia Walquiria Batista dos. (Coord.). Direito

administrativo econômico. São Paulo: Atlas, 2011, p. 413-476, p. 413. 331

Programa disciplinado pelo Decreto nº 83.740/1979. 332

GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. Parcerias na administração pública. In: CARDOZO, José Eduardo

Martins; QUEIROZ, João Eduardo Lopes; SANTOS, Márcia Walquiria Batista dos. (Coord.). Direito

administrativo econômico. São Paulo: Atlas, 2011, p. 413-476, p. 414. 333

O Programa Nacional de Privatização foi regulamentado mediante a Medida Provisória nº 155/1990,

convertida posteriormente na Lei nº 8.031/1990, substituída pela Lei nº 9.491/1997. Conforme previsto na Lei

nº 9.491/1997, alterada pelas Leis nºs 9.700/1998, 11.483/2007 e 11.483/200 e, MP 2.161/2001: “Art. 1º O

Programa Nacional de Desestatização – PND tem como objetivos fundamentais: I- reordenar a posição

estratégica do Estado na economia, transferindo à iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo

setor público; II - contribuir para a reestruturação econômica do setor público, especialmente através da

melhoria do perfil e da redução da dívida pública líquida; III - permitir a retomada de investimentos nas

empresas e atividades que vierem a ser transferidas à iniciativa privada; IV - contribuir para a reestruturação

econômica do setor privado, especialmente para a modernização da infra-estrutura e do parque industrial do

País, ampliando sua competitividade e reforçando a capacidade empresarial nos diversos setores da economia,

inclusive através da concessão de crédito; V - permitir que a Administração Pública concentre seus esforços

nas atividades em que a presença do Estado seja fundamental para a consecução das prioridades nacionais;

VI - contribuir para o fortalecimento do mercado de capitais, através do acréscimo da oferta de valores

mobiliários e da democratização da propriedade do capital das empresas que integrarem o Programa [...] Art.

2º [...] § 1º Considera-se desestatização: a) a alienação, pela União, de direitos que lhe assegurem, diretamente

ou através de outras controladas, preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos

administradores da sociedade; b) a transferência, para a iniciativa privada, da execução de serviços públicos

explorados pela União, diretamente ou através de entidades controladas, bem como daqueles de sua

responsabilidade. c) a transferência ou outorga de direitos sobre bens móveis e imóveis da União, nos termos

desta Lei”. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9491.htm>. Acesso em 20 nov. 2013. 334

GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. Parcerias na administração pública. In: CARDOZO, José Eduardo

Martins; QUEIROZ, João Eduardo Lopes; SANTOS, Márcia Walquiria Batista dos. (Coord.). Direito

administrativo econômico. São Paulo: Atlas, 2011, p. 413-476, p.

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113

Buscava contribuir para a reestruturação econômica do setor privado, especialmente

para a modernização da infraestrutura e do parque industrial do País, ampliando sua

competitividade e reforçando a capacidade empresarial nos diversos setores da economia,

inclusive através da concessão de crédito.

Consoante Mario Gomes Schapiro os formuladores da Reforma do Estado partiram do

diagnóstico de crise fiscal do Estado brasileiro, que teria ensejado a consequente perda de

suas possibilidades de intervenção. A crise fiscal consistia na incapacidade do Estado para

responder às demandas sociais e econômicas do País. Na esteira da lição de Bresser Pereira,

Shapiro explica que dois fatores foram decisivos para a precipitação da crise: o aumento

abrupto dos juros norte-americanos no início da década de 1980, fator incidental à crise do

fordismo e a extemporânea manutenção de políticas nacionais de subvenção a diversos setores

econômicos, ao longo dos anos 80, quando o Estado já não possuía mais condições

financeiras.336

Enquanto a crise de 1929 foi uma crise de mercado, para cuja solução foi construído o

aparato keynesiano, a crise contemporânea foi uma crise de Estado, cujo remédio seriam as

reformas voltadas para o mercado. Daí porque o Estado deveria passar, sempre que possível,

da condição de provedor direto para a de regulador e de indutor indireto de processos de

mercado.337

A redefinição do papel do Estado ensejou a substituição do modelo de Administração

burocrático para o modelo de Administração Pública gerencial, ou seja, de uma

Administração autoritária, verticalizada e hierarquizada, para uma Administração mais

democrática, com prevalência da eficiência e de indicadores objetivos de gestão, com maior

ênfase no resultado do que no processo.338

335

Leciona Maria Sylvia Zanella Di Pietro que a ideia de privatização, em sentido amplo, abrange todas as

medidas tomadas com o fim de reduzir a presença do Estado: “a. a desregulação (diminuição da intervenção

do Estado no domínio econômico ou, pelo menos, a mudança na forma de regulação); b. a desmonopolização

de atividades econômicas; c. a venda de ações de empresas estatais ao setor privado [...]; d. a procura pelas

formas privadas de gestão, como a concessão de serviços públicos e, mais recentemente, as parcerias público-

privadas [...]; e. os contracting out (como forma pela qual a Administração Pública celebra acordos de

variados tipos para buscar a colaboração do setor privado, podendo-se mencionar, como exemplos, os

convênios e os contratos de obras e prestação de serviços) [...]; f. a liberação de serviços públicos, em

movimento inverso ao da publicatio [...]. (os grifos são originais) (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella.

Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria público-privada e

outras formas. 9. ed. São Paulo: Atlas, p. 5). 336

SCHAPIRO, Mario Gomes. Novos parâmetros para a intervenção do Estado na economia. São Paulo:

Saraiva, 2010, p. 165. 337

SCHAPIRO, Mario Gomes. Novos parâmetros para a intervenção do Estado na economia. São Paulo:

Saraiva, 2010, p. 165. 338

GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. Parcerias na administração pública. In: CARDOZO, José Eduardo

Martins; QUEIROZ, João Eduardo Lopes; SANTOS, Márcia Walquiria Batista dos. (Coord.). Direito

administrativo econômico. São Paulo: Atlas, 2011, p. 413-476, p. 415.

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114

Conforme ensina Maria Sylvia Zanella Di Pietro, a administração pública burocrática

teria sido concebida no Estado Liberal, na segunda metade do século XIX, para combater a

corrupção e o nepotismo patrimonialista, baseando-se nos princípios da profissionalização,

organização em carreira, hierarquia funcional, impessoalidade e formalismo, com controles

formais e a priori. Já a administração pública gerencial teria surgido na segunda metade do

século XX, em resposta à expansão das funções econômicas e sociais do Estado, do

desenvolvimento tecnológico e da globalização da economia mundial. A eficiência e a

qualidade tornam-se essenciais, alterando-se a forma de controle, que deixa de ser formal e

passa a ser de resultados. Passa-se a buscar a definição de metas, a outorga de maior

autonomia ao administrador na gestão dos recursos humanos, materiais e financeiros e a

instituição do controle a posteriori ou de resultados.339

Nesse contexto surgiram termos como parceria, “vinculado à contratualização, para

abranger os diversos ajustes que expressam a colaboração entre entidades públicas ou entre

entidades públicas e setor privado, ou, ainda, entre todas as partes, envolvendo assim, uma

pluralidade de atores” 340

e concertação administrativa, para designar um fenômeno em que a

Administração renuncia ao emprego de seus poderes com base na imperatividade e

unilateralidade, aceitando realizar acordos com os particulares, ganhando uma colaboração

ativa dos administrados. Na atuação concertada, não há uma relação de subordinação entre a

Administração e as entidades parceiras, daí porque também se emprega, comumente, a

locução Administração paritária, para caracterizar esta forma de administrar.341

Gustavo Justino de Oliveira destaca que o debate acerca da cultura do diálogo ganhou

espaço, fazendo surgir, também, a Administração Pública dialógica, contrastante com a

Administração monológica, refratária à instituição e ao desenvolvimento de processos

comunicacionais com a sociedade. Ainda, a partir da intensificação do emprego de métodos e

técnicas negociais ou contratualizadas no campo de atividades realizadas pelas entidades

públicas, passou a expressão “governar por contrato” a evocar a necessidade de o Estado

estabelecer vínculos com a sociedade, como meio para a melhor consecução de suas ações.342

Esses vínculos com a sociedade são formados mediante um prévio e necessário processo

de negociação, em que são discutidas as bases sobre as quais eventualmente são firmados

339

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,

terceirização, parceria público-privada e outras formas. 9. ed. São Paulo: Atlas, p. 33. 340

MEDAUAR, Odete. O direito administrativo em evolução. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p.

140. 341

OLIVEIRA, Gustavo Justino de. Direito administrativo democrático. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 222. 342

OLIVEIRA, Gustavo Justino de. Direito administrativo democrático. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 217.

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115

acordos e contratos. O conteúdo desses ajustes é o objeto do possível consenso entre as partes,

resultado das concessões e dos intercâmbios realizados na negociação.343

A atuação pública em parceria com o setor privado mobiliza a sociedade para a

realização de fins de interesse da coletividade, devendo valorizar o espaço público.

Entende-se que a atividade pública promocional insere-se no campo da chamada

Administração consensual, concertada, dialógica, paritária, gerencial, relacionando-se com o

Estado, em tais condições, quem o desejar, o que de certa forma pode superar a

Administração imperativa em eficiência, dependendo do objetivo que se proponha a

alcançar.344

Com efeito, é possível verificar a regulação administrativa concertada na formação de

alianças entre entidades públicas, organizações civis, empresariais e pessoas físicas, por meio

de variadas modalidades de acordo de parceria. Admite-se que o Estado não pode concretizar

a promoção de ciência, tecnologia e inovação sem a iniciativa privada que, por sua vez,

depende da renovação para o aprimoramento de seus processos e produtos, aumentando, com

isso, sua capacidade competitiva.345

Se, no campo político e econômico, as décadas de 1980 e 1990 foram marcadas pela

Reforma do Estado, no campo da C&T a década de 1980 foi marcada por um progressivo

esvaziamento financeiro e técnico da FINEP e do FNDCT, ao mesmo tempo em que se

expandia o Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PADCT), que

procurou apoiar o segmento da ciência básica. O ano de 1985, como visto, foi o ano de

criação do MCT, incorporando-se na sociedade a ideia de que setores estratégicos deveriam

ser estimulados pelo Estado.346

Também no ano de 1985, ocorreu a 1ª Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia

(CNCT), tendo sido realizada somente no ano de 2001 a segunda edição desse evento.

343

OLIVEIRA, Gustavo Justino de. Direito administrativo democrático. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 218. 344

MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e

parte especial. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 524. 345

CALDAS, Roberto Correia da Silva Gomes; NEVES, Rubia Carneiro. Administração Pública consensual:

uma nova tendência nos acordos de parceria para promover tecnologia e inovação. Fórum de Contratação e

Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano 11, n. 130, p. 63-76, out. 2012. Disponível em:

http://www.bidforum.com.br/bid/PDI0006.aspx?pdiCntd=81781. Acesso em: 30 jul. 2013. (documento não

paginado). 346

ARBIX, Glauco. Inovar ou inovar: a indústria brasileira entre o passado e o futuro. São Paulo: Papagaio,

2007. p. 56.

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116

Na década de 1990 houve a desarticulação da política de C&T e da política industrial,

assim como a estagnação dos investimentos em C&T no Brasil, que, entre 1986 e 1996,

mantiveram-se praticamente no mesmo volume anual.347

Nesse período, também de estagnação econômica, tanto a política industrial como a

política científico-tecnológica foram negligenciadas no Brasil em favor do uso de recursos

públicos para pagamento de juros sobre dívida crescente.348

Houve também abertura comercial na década de 1990, o que provocou importantes

mudanças nos marcos de regulação do comércio de tecnologia. Com a promulgação da Lei nº

8.383/1991, que instituiu a unidade fiscal de referência, e alterou a legislação do imposto de

renda, foram revogados dispositivos que impediam a remessa de divisas a título de

transferência de tecnologia entre matrizes no exterior e subsidiárias instaladas no País.

Em 1997, entrou em vigor uma nova lei de propriedade intelectual, a Lei nº 9.279, de 14

de março de 1996. Em 1997 e 1998 foram promulgadas, respectivamente, a Lei nº 9.456, de

25 de abril de 1997 (Lei de Cultivares) e a Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998 (Lei de

Software).

A partir de 1999, teve início a retomada do processo de adoção de políticas de inovação,

especialmente com a criação dos fundos setoriais, considerados relevantíssimos na área de

C,T&I, que, dentre os seus objetivos, buscavam a aproximação dos setores público e

privado.349

Com a criação desses fundos, a política científica e tecnológica passou a contar com

recursos para apoio a setores estratégicos, tais como energia, recursos hídricos, recursos

minerais, transportes, petróleo, aeroespacial, informática, telecomunicações, infraestrutura e

biotecnologia.350

A Lei de Inovação nº 10.973, de 2 de dezembro de 2004, assim como a Lei do Bem nº

11.196, de 21 de novembro de 2005 foram marcos significativos nos anos 2000, que

estimularam o avanço das políticas de Estado para o fomento à inovação.

347

ARBIX, Glauco. Inovar ou inovar: a indústria brasileira entre o passado e o futuro. São Paulo: Papagaio,

2007. p. 56. 348

PINTO, Marco Aurélio Cabral. Ciência, tecnologia e engenharia: opções para a indução de padrão brasileiro

de industrialização com inovação até 2020. Revista do BNDES, Rio de Janeiro, v. 15, n. 30, p. 63-92, dez.

2008, p. 76. 349

ARBIX, Glauco. Inovar ou inovar: a indústria brasileira entre o passado e o futuro. São Paulo: Papagaio,

2007. p 56. 350

PINTO, Marco Aurélio Cabral. Ciência, tecnologia e engenharia: opções para a indução de padrão brasileiro

de industrialização com inovação até 2020. Revista do BNDES, Rio de Janeiro, v. 15, n. 30, p. 63-92, dez.

2008, p. 78.

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117

Em 2013 o Programa Inova Empresa recebeu uma dotação de R$ 32,9 bilhões,

resultando numa demanda de R$ 93,4 bilhões para os programas lançados por complexo

produtivo, como saúde, energia e agropecuária.351

Nota-se que o Estado passou a intensificar seus investimentos em inovação, tendo

procurado, cada vez mais, fomentar a iniciativa privada de interesse público e fortalecer a

cooperação entre os setores público e privado também no setor de C,T&I.

Hoje reconhece-se que o setor privado empreendedor, sozinho, não consegue criar as

bases para o desenvolvimento científico e tecnológico, dependendo da atuação pública

promocional.352

É por essa razão que, segundo Glauco Arbix, nos últimos anos, as agendas dos países

que mais alcançaram resultados positivos quanto à elevação de seu desempenho inovador

prestigiaram termos como cooperação, envolvimento, persuasão e mobilização das

comunidades empresarial e acadêmica em torno de um novo compromisso – vale dizer, um

compromisso entre aqueles que trabalham com os fundamentos da ciência e os que visualizam

e buscam suas aplicações práticas.353

A cooperação tem sido apontada como um fator de fundamental importância para a

inovação, uma vez que as empresas, isoladamente, podem ter dificuldades para reunir todas as

competências necessárias para implementar novos produtos ou processos.

Exatamente por esse motivo, não causa estranheza o fato de a cooperação estar mais

presente em segmentos de maior conteúdo tecnológico, nos quais os produtos e processos

apresentam maior complexidade.

Os baixos níveis de cooperação no sistema brasileiro ajudam a evidenciar o

desenvolvimento de atividades inovativas mais simples, como aquisições de máquinas e

equipamentos.

No âmbito da indústria, conforme demonstrou a Pesquisa Pintec 2008, apenas 10,1%

das empresas cobertas pela pesquisa haviam cooperado com algum tipo de parceiro; na Pintec

2011, este percentual subiu para 15,9%. Houve uma correspondência entre patamares mais

acentuados de cooperação e porte maior da empresa. Na indústria, 13,1% das empresas

351

DE NEGRI, João; ARBIX, Glauco. Chega de saudades. Folha de São Paulo, São Paulo, 02 jun. 2014.

Tendências/Debates, p. A3. 352

PFEIFFER, Roberto Augusto Castellanos. Desenvolvimento. In: RODRIGUEZ, José Rodrigo (Org.).

Fragmentos para um dicionário crítico de direito e desenvolvimento. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 17-29, p. 20. 353

ARBIX, Glauco. Inovar ou inovar: a indústria brasileira entre o passado e o futuro. São Paulo: Papagaio,

2007, p. 31.

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118

inovadoras na faixa de 10 a 49 pessoas ocupadas cooperaram, ao passo que, no conjunto

daquelas com 500 ou mais pessoas ocupadas, o percentual foi de 48,6%.354

Em relação à importância dos parceiros na cooperação, apontou a Pintec 2011 que, no

segmento da indústria, 76,5% das empresas inovadoras indicaram os seus fornecedores como

de relevância alta ou média; no segmento de serviços, as empresas de consultoria figuraram

como os principais parceiros (62,5%). Tão somente no setor de eletricidade e gás

prevaleceram as universidades ou institutos de pesquisas (70,4%).355

Os resultados demonstram que, embora desejáveis, as cooperações não têm ocorrido

com a intensidade e eficácia necessárias à inserção do Brasil entre os países mais inovadores e

competitivos, sendo necessário entender as razões disto e fazer avançar a sua prática.

A relevância dessa constatação reside no fato de que, em matéria de cooperação, uma

das mais importantes tarefas está na criação do ambiente a ela propício. Ao que tudo indica,

esse ambiente precisa de aperfeiçoamento. Sempre haverá a existência de condicionantes

sociais que a dificultam, tal como o receio do comportamento estratégico da contraparte, e a

existência de condicionantes que a estimulam. Por essa razão, o aparecimento ou não da

cooperação ocorrerá em função direta de condições e instituições que permitam o seu

desenvolvimento.356

De fato, conforme observa Marçal Justen Filho, a formação da conduta humana é um

processo complexo, que envolve circunstâncias internas individuais e fatores externos, sendo

a importância destes últimos reconhecida de modo intenso pelo pensamento econômico.357

Essa situação de dificuldades e de estímulos pode ser bem ilustrada nas parcerias entre

universidades e empresas, conforme constatado por André Luis de Sá Nunes.

O autor destaca dentre as vantagens para a cooperação do ponto de vista das

universidades: a) o aumento de prestígio institucional; b) a difusão do conhecimento; c) a

possibilidade de manutenção de múltiplas direções de pesquisa; d) a participação no

desenvolvimento de novos produtos e novas tecnologias; e) o gozo dos benefícios dos

resultados das pesquisas; f) o acesso à indústria para pesquisas básicas e aplicadas; g) o

aumento do prestígio do pesquisador e a expansão de suas perspectivas profissionais; h) a

oportunidade de intercâmbio de estudantes na indústria; i) a associação entre o aprendizado na

354

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação 2011. Rio de

Janeiro: IBGE, 2013. (documento não paginado). 355

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de inovação 2011. Rio de

Janeiro: IBGE, 2013. (documento não paginado). 356

SALOMÃO FILHO, Calixto. Regulação e desenvolvimento: novos temas. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 38-

39. 357

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 10. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2014, p. 717.

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119

sala com a prática; j) a geração de renda adicional para o pesquisador e a universidade; k) a

criação de um bom ambiente de convivência e relacionamento. Cita, como vantagens para a

cooperação, sob a ótica das empresas: a) o acesso às fronteiras científicas e tecnológicas do

conhecimento; b) a transferência internacional de tecnologias; c) a obtenção do estado-da-arte

da informação; d) o acesso ao conhecimento valioso mais difícil para os competidores; e) a

diminuição de prazos, custos e riscos no desenvolvimento da tecnologia; f) a possibilidade de

recrutamento de recursos humanos altamente qualificados, já especializados em atividades de

pesquisas no estado da arte; g) o desenvolvimento de pesquisas a menores custos; h) o acesso

aos recursos universitários como laboratórios, bibliotecas, instrumentos etc., evitando grandes

investimentos em instalações internas; i) a melhoria da imagem da empresa. 358

Por sua vez, André Luis de Sá Nunes arrola como barreiras à cooperação para as

universidades: a) a busca ao conhecimento fundamental e à ciência básica e não ao

desenvolvimento e à comercialização; b) a visão de que o Estado deve ser o único financiador

de atividades universitárias de pesquisa, para garantir a plena autonomia dos pesquisadores

acadêmicos e a liberdade de publicação; d) a visão de que as pesquisas encomendadas

poderiam provocar distorções nos objetivos da universidade; e) o excesso de burocracia das

instituições públicas; f) as indefinições na elaboração de uma política institucional clara de

relacionamento com o ambiente externo; g) a falta de experiência em trabalho interdisciplinar;

h) a falha nos serviços para comercialização dos resultados de P&D. São listados como

empecilhos à cooperação para as empresas: a) a extensão do tempo da pesquisa se realizada

em cooperação; b) o grau de incerteza dos projetos; c) a visão de que a universidade ou o

instituto de pesquisa são instituições em que o sigilo não é uma preocupação básica; d) a

existência de barreiras legais, inerentes à contratação e à transferência de tecnologia.359

Como barreiras gerais à cooperação são mencionados dentre outros fatores: a) a

carência de comunicação entre as partes; b) a ausência de instrumentos legais que

regulamentem as atividades de pesquisa envolvendo universidades e empresas,

concomitantemente; c) a falta de flexibilidade dos atores (empresas, universidades e governo)

358

NUNES, André Luis de Sá. Mudanças promovidas pela lei de inovação nas funções e práticas de gestão dos

intermediadores da cooperação universidade-empresa das universidades federais. 2010. 242 f. Dissertação

(Mestrado) – Programa de Pós-graduação em Administração, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2010,

p. 38. 359

NUNES, André Luis de Sá. Mudanças promovidas pela lei de inovação nas funções e práticas de gestão dos

intermediadores da cooperação universidade-empresa das universidades federais. 2010. 242 f. Dissertação

(Mestrado) – Programa de Pós-graduação em Administração, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2010,

p. 39.

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120

em ajustar a sua forma de trabalhar; d) a complexidade dos contratos a serem negociados; e,

e) o suporte insuficiente por parte dos intermediadores na agilização da cooperação.360

Como se depreende, segundo ensina Conceição Vedovello, empresas e universidades

são entidades bastante diferentes, com diversos objetivos, resultados e formas de

reconhecimento. As empresas objetivam o aumento dos lucros, a manutenção e a expansão de

suas posições de mercado e desempenho econômico. As universidades visam à formação e

treinamento de pessoal qualificado e à geração de conhecimento por meio de pesquisas

independentes.361

Apesar de tantas diferenças, a interação empresa-universidade no contexto brasileiro

apresenta iniciativas bem-sucedidas, tais como os casos da Embraer e da Embrapa, em que a

combinação da excelência na formação de pessoal altamente qualificado com a determinação

estratégica das empresas tem produzido resultados que deveriam servir de modelo para outros

empreendimentos dessa natureza”.362

De fato, o estímulo à construção de ambientes de colaboração entre os setores público e

privado tem sido considerado imprescindível ao aumento da competitividade e da inovação no

País.

Pontuam Glauco Arbix e João de Negri a esse respeito:

Para viabilizar um salto de qualidade na competitividade, é preciso unir

empresas, universidades, centros de pesquisa e órgãos de governo para

calibrar o foco das políticas industriais e priorizar as áreas intensivas em

tecnologia. Falhas de mercado e distorções estruturais são corrigidas com

políticas públicas.363

Renato Cruz, questionando a origem de novos produtos e serviços, também esclarece

que a ideia de que novos produtos e serviços surgem de grupos de pesquisadores trancados em

seus laboratórios está ultrapassada. A inovação aparece da interação com universidades,

centros de pesquisa, clientes, fornecedores e com a própria comunidade.364

360

NUNES, André Luis de Sá. Mudanças promovidas pela lei de inovação nas funções e práticas de gestão dos

intermediadores da cooperação universidade-empresa das universidades federais. 2010. 242 f. Dissertação

(Mestrado) – Programa de Pós-graduação em Administração, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2010,

p. 39. 361

VEDOVELLO, Conceição. Perspectivas e limites da interação entre universidades e MPMEs de base

tecnológica localizadas em incubadoras de empresas. Revista do BNDES, Rio de Janeiro, v. 8, n. 16, dez. 2001,

p. 281-316, p. 285. 362

VEDOVELLO, Conceição. Perspectivas e limites da interação entre universidades e MPMEs de base

tecnológica localizadas em incubadoras de empresas. Revista do BNDES, Rio de Janeiro, v. 8, n. 16, dez. 2001,

p. 281-316, p. 289. 363

DE NEGRI, João; ARBIX, Glauco. Chega de saudades. Folha de São Paulo, São Paulo, 02 jun. 2014.

Tendências/Debates, p. A3. 364

CRUZ, Renato. Inovação nos negócios surge em rede. O Estado de São Paulo, São Paulo, 27 out. 2013.

Economia, p. B14.

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121

Analisando as dificuldades para promover a inovação a partir de conhecimentos

acadêmicos, João Fernando Gomes de Oliveira e Luciana Oliveira Telles destacam que o

processo de inovação pode envolver atividades muito dispendiosas, como a demonstração da

aplicabilidade da ideia e a realização de testes referentes à sua viabilidade comercial. Caso

não sejam encontrados atores capacitados para realizá-las, nem tampouco obtidos recursos

para o seu financiamento, a sociedade pode ser levada a concluir que “muito do que se cria e

se pesquisa não se transforma em inovação para o mercado e para os cidadãos em razão das

deficiências de ligação entre academia e setor empresarial”.365

Segundo Luciana Oliveira Telles, nas últimas décadas tem se observado um aumento

dos projetos cooperativos de pesquisa envolvendo empresas e instituições públicas de

pesquisa. São citadas como causas desse movimento fatores como o aumento da competição

empresarial, o aumento dos investimentos necessários para o avanço das pesquisas, uma

maior complexidade e multidisciplinaridade dos conhecimentos demandados, uma maior

abertura das universidades à cooperação com empresas, a necessidade de divisão de riscos e

de diminuição dos custos elevados associados às pesquisas, o aumento dos custos referentes à

aquisição de novos equipamentos e instrumentos, entre outros. A aceitação de que a inovação

ocorre por meio de um processo interativo e complexo entre ciência e tecnologia – e não por

meio de um modelo linear, segundo anteriormente analisado, indica que os projetos

cooperativos são adequados e úteis.366

De fato, previa o Livro Branco Ciência Tecnologia e Inovação, do então Ministério da

Ciência e Tecnologia, em 2002, que a experiência de outros países já demonstrava ser a

cooperação universidade-empresa um crescente e forte instrumento de promoção da inovação

tecnológica e do desenvolvimento em geral.367

Atribuía o Livro Branco, contudo, o distanciamento entre esses atores, no Brasil, dentre

outros fatores, a um marco legal inadequado e à insuficiência de mecanismos apropriados à

promoção de tal interação. Enunciava, ainda:

[...] A geração de conhecimento demanda volumes cada vez maiores de

investimentos e depende da presença, funcionamento e articulação de uma

rede complexa de instituições e atores de natureza diversa e com papéis

específicos, capaz de fazer face aos crescentes riscos inerentes a esse

365

OLIVEIRA, João Fernando Gomes de; TELLES, Luciana Oliveira. O papel dos institutos públicos de

pesquisa na aceleração do processo de inovação empresarial no Brasil. Revista USP, São Paulo, n. 89, p. 204-

217, mar./maio 2011, p. 210. 366

TELLES, Luciana. O papel dos institutos públicos de pesquisa no desenvolvimento tecnológico e na

cooperação universidade-empresa. 2011. 279 f. Tese (Doutorado) - Escola Politécnica, Universidade de São

Paulo, São Paulo, 2011, p. 50-51. 367

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Livro branco: ciência, tecnologia e inovação. Brasília:

MCT, 2002, p. 27.

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122

processo. Evidencia-se, portanto, a necessidade de fortalecer o arcabouço

institucional de Ciência, Tecnologia e Inovação no País, de maneira a incluir

a criação de novos arranjos entre os diferentes setores da vida nacional e

alterar a natureza da relação entre público e privado. Torna-se claramente

necessário complementar esses esforços com uma estrutura que integre os

diferentes níveis e setores governamentais.368

Mais recentemente, também o Livro Azul da 4ª Conferência Nacional de Ciência,

Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Sustentável, de 2010, ao tratar da inovação

como um componente sistêmico da estrutura produtiva nacional, teceu recomendações

similares às do Livro Branco, inclusive sobre a necessidade de reexame das disposições da

Lei nº 10.973/2004:

1.Tratar a inovação como estratégica, tanto nas empresas como na academia

e no governo, incentivando e financiando o desenvolvimento de competência

na gestão da inovação. Essa competência está diretamente relacionada com a

ampliação da formação de mão de obra qualificada e com o estabelecimento

de um melhor ambiente de negócios.

2. Fomentar um maior protagonismo privado no processo de inovação e nas

discussões relativas às políticas públicas para a área, em especial por meio

de entidades empresariais representativas dos diversos segmentos de

negócios.

3. Ampliar os investimentos públicos e estimular os investimentos de

empresas em P&D (que, juntos, correspondem a 1,24% do PIB em 2009) de

modo que o investimento total alcance, em 2020, uma faixa entre 2,0% e

2,5% do PIB, próxima do padrão dos países líderes mundiais.

[...]

6. Criar ambientes de inovação, atuando em rede, com destaque para os

Parques Científicos e Tecnológicos de classe mundial, distribuindo no País

ambientes de inovação que atraiam investimentos privados nacionais e

internacionais e gerem novas empresas e produtos inovadores, tanto para os

mercados internos como para exportação, atuando de forma articulada com

os Arranjos Produtivos Locais (APLs)369

e outras iniciativas regionais,

interagindo dinamicamente com os atores públicos e privados envolvidos.

7. Fomentar o desenvolvimento de empresas inovadoras nascentes por meio

de pré-incubadoras, incubadoras e parques tecnológicos, como instrumento

de promoção do desenvolvimento tecnológico e socioeconômico local e

regional, estimulando a ampliação da interação entre as ICTs, as empresas e

o governo.

[...]

11. Reexaminar a Lei de Inovação quanto à segurança jurídica e as

contradições legais existentes, gerando subsídios para uma reestruturação

368

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Livro branco: ciência, tecnologia e inovação. Brasília:

MCT, 2002, p. 28. 369

De acordo com a ANPEI, “Arranjos Produtivos Locais são aglomerações de empresas, localizadas em um

mesmo território, que apresentam especialização produtiva e mantêm vínculos de articulação, interação,

cooperação e aprendizagem entre si e com outros atores locais, tais como: governo, associações empresariais,

instituições de crédito, ensino e pesquisa. Existe uma vasta literatura nacional e internacional sobre o

fenômeno da aglomeração de empreendimentos de uma mesma atividade produtiva em uma determinada

região geográfica. Há muitas denominações e ênfases diferentes. O mesmo fenômeno é às vezes denominado

arranjo produtivo local, sistema produtivo local ou mesmo "cluster". No Brasil a expressão mais difundida é

arranjo produtivo local. Fonte: MDIC”. (Disponível em: <http://www.anpei.org.br/glossario. Acesso em 05

nov. 2014).

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123

dos marcos legais na área de C,T&I, tanto para os segmentos públicos como

para os privados, de modo que os órgãos de fiscalização governamentais e

agências de fomento atuem de forma alinhada com a política nacional na

área de C,T&I.

12. Revisar e expandir a Lei da Inovação, de modo a:

– incluir as IES comunitárias e privadas no conceito de ICT;

– contemplar as tecnologias sociais;

– facilitar o ingresso no mercado dos produtos e serviços derivados dos

benefícios concedidos no contexto da lei.370

Já estabelecia o referido Livro Azul que o aprimoramento do marco legal regulatório

impunha-se a fim de que as relações entre os atores do sistema fossem intensificadas em

regime de risco sistêmico reduzido.

O documento sustentava, ademais, ser necessário superar as fontes de insegurança

jurídica, de forma a favorecer a intensificação da utilização dos instrumentos de apoio à

inovação previstos pela legislação vigente, assim como a assegurar iniciativas e investimentos

de longo prazo pelas empresas e agentes de governo nos mais diversos níveis. Para que tais

objetivos fossem realizados, entendia-se ser necessário o:

aprimoramento e complementação do marco legal regulatório que preside a

construção da relação público-privada, a redução do risco tecnológico, a

gestão da propriedade intelectual e a interpretação das normas pelos órgãos

controladores.371

A Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação (ENCTI) 2012-2015, nos dias

atuais, propõe-se a conduzir as ações e articulações necessárias ao aperfeiçoamento do marco

legal, de forma a propiciar ambiente atraente e motivador para a realização das atividades de

desenvolvimento científico, tecnológico e de inovação em prol do desenvolvimento do

País.372

Na inovação, como se depreende, a interação entre os agentes é algo necessário, o que

torna o desenvolvimento da confiança e de normas mutuamente respeitadas essencial para a

superação da incerteza associada à atividade. Quanto maior o grau de incerteza e

complexidade do produto, maior a necessidade de interação e incentivo aos parceiros.373

Os exemplos mencionados corroboram a lição de Calixto Salomão Filho, para quem os

valores conhecimento e informação são essenciais na cooperação. O autor ressalta que o

370

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Livro azul da 4ª Conferência Nacional de Ciência,

Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Sustentável. Brasília: MCT, 2010, p. 38. 371

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Livro azul da 4ª Conferência Nacional de Ciência,

Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Sustentável. Brasília: MCT, 2010, p. 66-68. 372

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e

Inovação 2012-2015 – Balanço das atividades estruturantes 2011. Brasília: MCTI, p. 52. 373

SILVA, Carla Maria de Souza e. Inovação e cooperação: o estado das artes no Brasil. Revista do BNDES, v.

7, n. 13, p. 65-88, jun., 2000, p. 67.

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124

cumprimento das decisões econômicas decorrentes de cooperações normalmente acontece de

forma natural e não coercitiva. Historicamente, decisões adotadas mediante o método

cooperativo, por meio de regras bem elaboradas, trazem um nível muito maior de

cumprimento voluntário, sendo essas considerações importantes para a fixação do papel do

Direito no incentivo à cooperação.374

Importante observar que:

[...] para o Direito a cooperação não deve ser e não é um valor absoluto.

Naquelas situações em que a cooperação não serve como instrumento de

conhecimento social, mas sim como forma de estratificação de decisões e

concentração de conhecimento econômico, como ocorre nos cartéis, ela deve

ser e é severamente reprimida. De outro lado, permitir que ela surja como

alternativa ao comportamento individual é tarefa indiscutível do Direito.

Trata-se de oferecer mais uma alternativa no campo econômico, ampliando

as escolhas econômicas.375

É certo que a tendência de estimular a cooperação na C,T&I também teve e continua

tendo consequências no Direito Administrativo. É o que se verificará a seguir.

374

SALOMÃO FILHO, Calixto. Regulação, desenvolvimento e meio ambiente. In: SALOMÃO FILHO, Calixto

(Org.). Regulação e desenvolvimento: novos temas. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 39. 375

SALOMÃO FILHO, Calixto. Regulação, desenvolvimento e meio ambiente. In: SALOMÃO FILHO, Calixto

(Org.). Regulação e desenvolvimento: novos temas. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 40.

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125

10 O ESTÍMULO À CONSTRUÇÃO DE AMBIENTES ESPECIALIZADOS E

COOPERATIVOS DE INOVAÇÃO À LUZ DA LEI FEDERAL Nº 10.973/2004 E

DA LEI COMPLEMENTAR PAULISTA Nº 1.049/2008

A Lei nº 10.973/2004 consiste em uma nova e original temática que lança, diariamente,

diversos desafios àqueles que necessitam por em marcha, na prática, as suas disposições,

conjugando os interesses público e privado e trazendo novos instrumentos para a atuação

concertada da Administração Pública.

Referido diploma, alterado pela Lei nº 12.349/2010, regulamentado pelo Decreto nº

5.563/2005 e correlacionado à Lei nº 11.196/2005 (a Lei do Bem, que dispõe sobre incentivos

fiscais para a inovação) tem por fim estabelecer medidas de incentivo à inovação e à pesquisa

científica e tecnológica no ambiente produtivo, com vistas à capacitação e ao alcance da

autonomia tecnológica e ao desenvolvimento industrial do País, nos termos dos artigos 218 e

219 da Constituição.

Para Denis Borges Barbosa aludida norma teve como fonte de inspiração outras leis

previamente instituídas no cenário internacional, a saber: a) National Research Development

Corporation (atual British Technology Group) 1948 – Reino Unido; b) Stevenson-Wydler

Technology Innovation Act 1980 – Estados Unidos; c) Bayh-Dole University and Small

Business Patent Act 1980 – Estados Unidos; d) Bundesministerium für Bildung und

Forschung – Patentinitiative 1966 – Alemanha; e) The Law to Promote Technology Transfer

from Universities to Industry 1988 – Japão; f) Loi sur I’innovation et la recherché 1999 –

França.376

Explica, ademais, que, no ano de 2000, o Senador Roberto Freire apresentou projeto

que, após tramitar pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, foi arquivado pela

Presidência em 2003. Em substituição a tal projeto, o Poder Executivo apresentou, em 2004, o

projeto original da lei atual.377

Após mais de vinte emendas e uma proposta adicional de substituição, o projeto chegou

à sua versão final e foi aprovado em 02/12/2004 pela Mesa Diretora da Câmara.

Para André Luis de Sá Nunes a Lei nº 10.973/2004 foi inspirada nas leis francesa e

norte-americana. Quanto, especificamente, à lei francesa, o autor, após destacar que ela

também aponta para um modelo de cooperação entre o Estado e o setor produtivo, identifica

três principais diferenças em relação à lei brasileira:

376

BARBOSA, Denis Borges. Uma breve introdução: por que a lei? In: BARBOSA, Denis Borges (Org.).

Direito da inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 1-8, p. 1. 377

BARBOSA, Denis Borges. Uma breve introdução: por que a lei? In: BARBOSA, Denis Borges (Org.).

Direito da inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 1-8, p. 1.

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126

A primeira diferença é em relação à mobilidade dos pesquisadores. Na

França os pesquisadores têm três formas de interação com a iniciativa

privada – criação de empresa, consultoria e participação em conselho

– e nas três formas a mobilidade implica no deslocamento do

pesquisador para o mercado ou no deslocamento de sua atuação para o

mercado. No Brasil, a mobilidade é bem mais limitada, se restringindo

apenas à licença não remunerada. A segunda diferença é em relação à

orientação da interação da pesquisa pública com a iniciativa privada.

Na França essa interação se dá em um nível individual (pesquisadores)

e estes se deslocam ou deslocam suas atenções da pesquisa pública

para a iniciativa privada. No Brasil essa iniciativa tem um caráter mais

institucional (entre empresas e ICTs), com a iniciativa privada se

deslocando para o ambiente da pesquisa pública (mediante acordos de

cooperação e de prestações de serviços). A terceira diferença é em

relação ao órgão de julgamento e aprovação das convenções e

autorizações. Na França isso é feito por um Comitê de Ética nacional

enquanto que no Brasil é feito pela instância máxima de cada ICT.378

O modelo francês presume a estrutura do Estado extremamente profissional, não menos

controladora, mas mais eficiente no seu controle, condição que não se verifica no Brasil.379

Em relação à legislação norte-americana, Patrícia Pereira Tedeschi ressalta que, em

1980, houve a promulgação de um marco regulatório mais relevante ao estímulo à inovação,

por meio de atividades de cooperação entre empresas, laboratórios, universidades e órgãos

federais dos Estados Unidos. O Bayh-Dole Act objetivou uniformizar o modo como as

agências norte-americanas fomentavam a pesquisa e tratavam as invenções obtidas a partir de

pesquisas por ela financiadas, permitindo às universidades obter sua titularidade, de forma a

acelerar o processo de patenteamento e de licenciamento, com exclusividade, às empresas. O

Stevenson-Wydler Technology Innovation Act teve por escopo facilitar o acesso da indústria

aos laboratórios federais, disponibilizando infraestrutura especializada e oportunidades de

parceria no financiamento e uso por instituições privadas de tecnologias desenvolvidas por

instituições públicas.380

Nessa senda, Tedeschi anota que a importação do modelo estrangeiro não trouxe os

mesmos benefícios que nos países em que foi criado, tendo sido, a seu ver, poucas as

378

NUNES, André Luis de Sá. Mudanças promovidas pela lei de inovação nas funções e práticas de gestão dos

intermediadores da cooperação universidade-empresa das universidades federais. 2010. 242 f. Dissertação

(Mestrado) – Programa de Pós-graduação em Administração, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2010,

p. 64. 379

NUNES, André Luis de Sá. Mudanças promovidas pela lei de inovação nas funções e práticas de gestão dos

intermediadores da cooperação universidade-empresa das universidades federais. 2010. 242 f. Dissertação

(Mestrado) – Programa de Pós-graduação em Administração, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2010,

p. 64. 380

TEDESCHI, Patrícia Pereira. Inovação tecnológica e direito administrativo. 2011. 106 f. Dissertação

(Mestrado) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011, p. 27.

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127

inovações trazidas pela lei quanto ao tema relações contratuais. Explica que na legislação de

inovação brasileira a questão da titularidade não foi expressamente prevista, talvez porque a

legislação sobre propriedade intelectual já estabeleça de forma clara como será determinada a

titularidade sobre tais direitos”. 381

A adoção de um modelo influenciado intensamente por padrões estrangeiros, sem levar

em consideração a inquestionável diversidade dos regimes jurídicos de cada país e suas

peculiaridades merece críticas – críticas sempre pertinentes, diga-se.

De fato, não há um único modelo capaz de suprir a demanda de países com realidades

jurídicas, econômicas, sociais e culturais altamente diferenciadas – a rigor, entendimento

contrário é falácia que pode ser um entrave ao desenvolvimento dos países.382

Isso não significa negar a relevância da experiência internacional, que pode e deve ser

estudada e aproveitada naquilo que for pertinente e cabível.

Segundo estudos especializados, países que consideram a C&T como atividades

estratégicas (tais como a Coréia do Sul, a França, os Estados Unidos e o Japão) constroem

sistemas legais que estimulam, de forma coordenada, o desenvolvimento científico,

tecnológico e a inovação no setor industrial:383

Sem desconsiderar a dimensão física, a diversidade regional e a

complexidade econômica, política e cultural e populacional dos países

citados, pode-se argumentar que a consecução das metas na área de

ciência e tecnologia passa pela consolidação de um arcabouço legal,

cujo conteúdo permita dinamizar a relação entre universidades,

institutos de pesquisa e o setor produtivo nacional.384

A Lei nº 10.973/2014 representou um importante passo para a consecução dos objetivos

das áreas de CT&I ao buscar fortalecer a relação entre universidades, institutos de pesquisa, o

governo e o setor produtivo nacional. Mais do que isso, o diploma lançou luzes sobre assuntos

relevantes, como as parcerias entre tais atores que, na prática, já aconteciam, muitas vezes de

modo pouco transparente.

381

TEDESCHI, Patrícia Pereira. Inovação tecnológica e direito administrativo. 2011. 106 f. Dissertação

(Mestrado) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011, p. 30 e 99. 382

POLIDO, Fabricio; ROSINA, Mônica Steffen Guise; CÉSAR, Priscilla Maria Dias Guimarães. Propriedade

intelectual: potencialidades e fragilidades do ambiente jurídico-institucional brasileiro para a inovação. In:

SHAPIRO, Mario G.; TRUBEK, David M. (Coord.). Direito e desenvolvimento: um diálogo entre os BRICS.

São Paulo: Saraiva, 2012. p. 135-180, p. 135. 383

MATIAS-PEREIRA, José; KRUGLIANSKAS, Isak. Gestão de inovação: a lei de inovação tecnológica como

ferramenta de apoio às políticas industrial e tecnológica do Brasil. RAE-Eletrônica, v. 4, n. 2. jul./dez. 2005.

(documento não paginado). 384

MATIAS-PEREIRA, José; KRUGLIANSKAS, Isak. Gestão de inovação: a lei de inovação tecnológica como

ferramenta de apoio às políticas industrial e tecnológica do Brasil. RAE-Eletrônica, v. 4, n. 2. jul./dez. 2005.

(documento não paginado).

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128

Além disso, até o advento da Lei, o quadro normativo referente à inovação era bastante

difuso, tendo sido esta, acertadamente, considerada um marco relevante para o setor.

Enfatizando a necessidade da criação e do aperfeiçoamento de instrumentos tendentes à

promoção e ao estímulo da inovação, a norma convidou ao debate, até então travado

especialmente entre engenheiros, economistas, administradores, sociólogos e juristas da área

do Direito Econômico e do Direito Comercial, os estudiosos de todas as áreas do Direito. Este

é um convite que, em verdade, necessita de urgente aceitação, sob pena de o País perder

oportunidades de se tornar mais competitivo, mais inovador, mais independente

tecnologicamente e mais desenvolvido em todas as dimensões.

Somente a partir do diálogo entre os estudiosos dos mais variados ramos do Direito e os

principais atores dos sistemas de inovação é que as deficiências da Lei poderão ser

adequadamente superadas, afinal, não se pode criticar fragilidades, corrigir desacertos e

mesmo propor melhorias e adequações àquilo que, muitas vezes, nem mesmo se conhece. O

caminho, de certo, é longo, fato que não impede o reconhecimento da importância dos

primeiros passos já trilhados.

Para Denis Borges Barbosa a Lei nº 10.973/2004 compreende cinco grandes grupos de

normas:385

a) Constituição de ambiente propício às parcerias estratégicas entre as

universidades, institutos tecnológicos e empresas – objetivo: propiciar a cooperação entre os

atores do processo inovador, reduzindo as barreiras institucionais entre eles e possibilitando a

formação de articulações horizontais (artigos 3º, 4º, 5º e 9º).

b) Estímulo à participação de instituições de ciência e tecnologia no processo de

inovação – objetivo: facultar às ICT celebrar contratos de transferência de tecnologia e de

licenciamento de patentes de sua propriedade, prestar serviços de consultoria especializada

em atividades desenvolvidas no âmbito do setor produtivo (artigos 6º, 7º e 8º); induzir à

mobilidade dos pesquisadores entre ICT e sua transferência temporária ao setor privado, para

o fim de estímulo à inovação (artigos 14 e 15); a criação nas ICT federais de um órgão gestor

das atividades de inovação e de articulação (artigo 16).

c) Normas de incentivo ao pesquisador-criador – objetivo: estimular a natureza

especial do trabalho criativo, prevendo compartilhamento de resultados de serviços,

participação nos ganhos comerciais de exploração comercial de criação e pagamento de

bolsas (artigos 8º, 11, 13 e 15).

385

BARBOSA, Denis Borges. Uma breve introdução: por que a lei? In: BARBOSA, Denis Borges (Org.).

Direito da inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 1-8, p. 6.

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129

d) Incentivo à inovação na empresa – objetivo: a concessão, por parte da União,

das ICT e das agências de fomento, de recursos financeiros, humanos, materiais ou de

infraestrutura, para atender às empresas nacionais envolvidas em atividades de pesquisa e

desenvolvimento, segundo as prioridades da política industrial e tecnológica nacional. Há

previsão de subvenção econômica, financiamento ou participação societária; no caso de

subvenção deve haver contrapartida da empresa beneficiária (artigo 19); exercício do poder de

compra do Estado como meio de incentivo à inovação e realização de programas com ações

dirigidas especialmente à promoção de inovação nas micro e pequenas empresas (artigo 20);

incentivos fiscais a tais empresas (artigo 28).

e) Apropriação de tecnologias – objetivo: estabelecer o princípio de que todas as

tecnologias devem ser primordialmente apropriadas em favor do setor produtivo nacional. A

produção de conhecimento pelas ICT fica sujeita a uma regra primordial de apropriação e não

de lançamento em domínio público (artigo 12).

Doravante, será abordado o primeiro grupo de normas mencionado por Denis Borges

Barbosa.

Consoante se verificará, a leitura da Lei nº 10.973/2004 permite concluir, desde logo,

ser ela impregnada do crescente espírito de parceria entre os setores público e privado, o que é

revelado por meio da menção expressa a contratos, convênios, acordos de parcerias, acordos

de colaboração, “contratos específicos”, termos de “compartilhamento” e de permissão de uso

de infraestrutura, ajustes a serem firmados entre os vários atores dos processos de inovação.

A fim de analisar essas formas de parceria de forma mais detida, é importante notar que,

para os efeitos da Lei nº 10.973/29914, nos termos de seu artigo 2º, considera-se:

I - agência de fomento: órgão ou instituição de natureza pública ou privada

que tenha entre os seus objetivos o financiamento de ações que visem a

estimular e promover o desenvolvimento da ciência, da tecnologia e da

inovação;

II - criação: invenção, modelo de utilidade, desenho industrial, programa de

computador, topografia de circuito integrado, nova cultivar ou cultivar

essencialmente derivada e qualquer outro desenvolvimento tecnológico que

acarrete ou possa acarretar o surgimento de novo produto, processo ou

aperfeiçoamento incremental, obtida por um ou mais criadores;

III - criador: pesquisador que seja inventor, obtentor ou autor de criação;

IV - inovação: introdução de novidade ou aperfeiçoamento no ambiente

produtivo ou social que resulte em novos produtos, processos ou serviços;

V - Instituição Científica e Tecnológica - ICT: órgão ou entidade da

administração pública que tenha por missão institucional, dentre outras,

executar atividades de pesquisa básica ou aplicada de caráter científico ou

tecnológico;

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130

VI - núcleo de inovação tecnológica: núcleo ou órgão constituído por uma

ou mais ICT com a finalidade de gerir sua política de inovação;

VII - instituição de apoio - fundação criada com a finalidade de dar apoio a

projetos de pesquisa, ensino e extensão e de desenvolvimento institucional,

científico e tecnológico de interesse das IFES e demais ICTs, registrada e

credenciada nos Ministérios da Educação e da Ciência e Tecnologia, nos

termos da Lei no 8.958, de 20 de dezembro de 1994; (Redação dada pela Lei

nº 12.349, de 2010)

VIII - pesquisador público: ocupante de cargo efetivo, cargo militar ou

emprego público que realize pesquisa básica ou aplicada de caráter científico

ou tecnológico; e

IX - inventor independente: pessoa física, não ocupante de cargo efetivo,

cargo militar ou emprego público, que seja inventor, obtentor ou autor de

criação.

Assim sendo, tendo sido verificados os objetivos, principais eixos e definições

essenciais da Lei nº 10.973/2004, assim como os argumentos de caráter econômico e técnico

que têm sido apresentados para justificar uma maior interação entre os diversos atores

públicos e privados dos sistemas de inovação, passa-se a analisar o estímulo à construção de

ambientes especializados e cooperativos, com base no diploma legal citado.

Serão tecidas considerações sobre a Lei Complementar Paulista nº 1.049/2008 sempre

que oportuno.

10.1 Alianças estratégicas e projetos de cooperação

Inserido no Capítulo II, intitulado “Do estímulo à construção de ambientes

especializados e cooperativos de inovação”, o artigo 3º, da Lei nº 10.973/2004 dispõe que:

Art. 3o A União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as

respectivas agências de fomento poderão estimular e apoiar a constituição de

alianças estratégicas e o desenvolvimento de projetos de cooperação

envolvendo empresas nacionais, ICT e organizações de direito privado sem

fins lucrativos voltadas para atividades de pesquisa e desenvolvimento, que

objetivem a geração de produtos e processos inovadores.

Como observa Denis Borges Barbosa, o artigo, genericamente, propõe os termos do

relacionamento entre os setores público e privado, tendentes à inovação, sendo as

modalidades dessa atuação conjunta apresentadas em outros dispositivos da norma. A seu ver,

as alianças são as articulações estruturadas e com vistas à atuação de longo prazo entre os

vários atores da lei (consideram-se de longo prazo em razão do uso da expressão

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131

“estratégicas”); os projetos de cooperação, formulados ou não dentro dessas alianças,

instâncias específicas de cooperação.386

Por sua vez, Carlos Ari Sundfeld e Rodrigo Pagani de Souza, sem fazer distinções entre

“alianças estratégicas” e “projetos de cooperação”, optam por denominar, genericamente,

como “parcerias estratégicas” os vínculos negociais previstos na Lei de Inovação, de trato

continuado, estabelecidos entre a Administração Pública e os particulares para viabilizar o

desenvolvimento, sob a responsabilidade destes, de atividades com algum coeficiente de

interesse geral. Destacam os autores que, por visarem à autonomia e ao desenvolvimento

industrial do País, tais parcerias podem servir à capacitação de qualquer das partes

envolvidas.387

Entendemos, assim como Sundfeld e Souza, que as alianças estratégicas e os projetos de

cooperação podem ser considerados de modo amplo como modalidades de parcerias.

Isso porque, independentemente de haver eventuais diferenças nas suas noções,

especialmente sob o ponto de vista técnico-científico-prático, não existe uma figura contratual

peculiar que se aplique, especificamente, às redes de pesquisas ou às incubadoras ou, ainda,

aos parques tecnológicos. Todas essas figuras tratam, sob a ótica jurídica, de modalidades de

parcerias entre os setores público e privado.

O vocábulo parceria, de acordo com essa ótica, é usado para designar

todas as formas de sociedade que, sem formar uma nova pessoa jurídica, são

organizadas entre os setores público e privado, para a consecução de fins de

interesse público. Nela existe a colaboração entre o poder público e a

iniciativa privada nos âmbitos social e econômico, para a satisfação de

interesses públicos, ainda que, do lado do particular, se objetive o lucro.

Todavia, a natureza econômica da atividade não é essencial para caracterizar

a parceria, como também não o é a ideia de lucro, já que a parceria pode dar-

se com entidades privadas sem fins lucrativos que atuam essencialmente na

área social e não econômica.388

São múltiplas as possibilidades de alianças estratégicas e projetos cooperativos voltados

à inovação.

As parcerias para o desenvolvimento produtivo, intituladas, no setor da saúde, de PDPs

(parceria para o desenvolvimento produtivo), são um dos exemplos da atuação conjunta entre

os setores público e privado que objetiva a obtenção de produtos ou processos inovadores.

386

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 51. 387

SUNDFELD, Carlos Ari; SOUZA, Rodrigo Pagani de. Parcerias para o desenvolvimento produtivo em

medicamentos e a lei de licitações. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 264, p. 91-133,

set./dez. 2013, p. 107. 388

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,

terceirização, parceria público-privada e outras formas. 9 ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 24.

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132

Segundo a Portaria nº 837/2012, do Ministério da Saúde, que define as diretrizes e os

critérios para o estabelecimento das PDPs:

Art. 2º As PDP são parcerias realizadas entre instituições públicas e

entidades privadas com vistas ao acesso a tecnologias prioritárias, à redução

da vulnerabilidade do Sistema Único de Saúde (SUS) a longo prazo e à

racionalização e redução de preços de produtos estratégicos para saúde, com

o comprometimento de internalizar e desenvolver novas tecnologias

estratégicas e de valor agregado elevado.

Em síntese, as PDPs consistem em modalidade de contratação por meio da qual um

laboratório privado, detentor de propriedade industrial (como uma patente, por exemplo)

sobre determinado processo de fabricação de um medicamento, compromete-se a ceder a um

laboratório público a expertise e o know-how para a produção de um medicamento

(transferência de tecnologia), ao passo que, em contrapartida, este mesmo laboratório compra

o medicamento do parceiro privado durante o processo de internalização da tecnologia, sem

necessidade de licitação.389

Os instrumentos a que se referem as alianças estratégicas e as cooperações citadas na

Lei nº 10.973/2004 apresentam, em regra, natureza aparentemente mais consentânea à dos

convênios, acordo de vontades com peculiaridades próprias.

Em verdade, não se pode negar que, mesmo antes do advento da Lei de Inovação,

diversas formas de parceria eram praticadas no setor da C,T&I entre os setores público e

privado, sob o amparo do artigo 116, da Lei nº 8.666/1993, segundo o qual: “Aplicam-se as

disposições desta Lei, no que couber, aos convênios, acordos, ajustes e outros instrumentos

congêneres celebrados por órgãos e entidades da Administração.”

Tendo isto em vista pode surgir o seguinte questionamento: as parcerias voltadas a

atividades de P,D&I, eventualmente não enquadradas, de forma exata, nas modalidades de

parcerias descritas na Lei nº 10.973/2004, poderão continuar sendo celebradas com

fundamento no artigo 116 da Lei de Licitações? Esse tipo de incerteza em relação às

389

São exemplos de experiências brasileiras bem sucedidas com PDPs as firmadas entre o Laboratório alemão

Boehringer Ingelheim e o Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmaguinhos) para a produção do

medicamento Pramimpexol, utilizado para o tratamento do mal de Parkinson e a PDP celebrada entre o

laboratório multinacional Merck e o brasileiro Bionovis, para a produção de seis medicamentos contra o câncer

(Rituximabe, Bevacizumabe, Cetuximabe, Trastuzumabe) e contra a artrite (Etanercepte e Infliximabe)

(ANTUNES, Vitor Amuri. Parcerias para o desenvolvimento Produtivo (PDPs). Boletim do Albino Advogados

Associados, 2014. Disponível em: <http://www.albino.adv.br/artgvaa028.pdf>. Acesso em: 20 out. 2014).

Segundo Fabrício Polido, Mônica Steffen Guise Rosina e Priscila Maria Dias Guimarães César, no Brasil,

destacam-se as parcerias na destinadas à P,D&I na indústria farmacêutica, para medicamentos de doenças

neglicenciadas, como dengue, febre amarela, doença da Chagas, tuberculose e malária, e que são direcionadas

para mercados específicos, como a América Latina e África. (POLIDO, Fabricio; ROSINA, Mônica Steffen

Guise; CÉSAR, Priscilla Maria Dias Guimarães. Propriedade intelectual: potencialidades e fragilidades do

ambiente jurídico-institucional brasileiro para a inovação. In: SHAPIRO, Mario G.; TRUBEK, David M.

(Coord.). Direito e desenvolvimento: um diálogo entre os BRICS. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 135-180, p. 174).

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133

aplicações práticas das Leis de Inovação e de Licitações e Contratos Administrativos gera

insegurança para o gestor público. A nosso ver, não há impedimentos à celebração de acordos

de vontade com base no artigo 116 da Lei de Licitações.

Os instrumentos de parceria também podem apresentar natureza mais complexa, como

nos casos de participação acionária minoritária, pelo Estado, no capital votante de empresa

privada.

Marçal Justen Filho e Eduardo Ferreira Jordão denominam de contrato de fomento o

instrumento de implantação de políticas públicas. Nesse tipo de ajuste o interesse público

reside em externalidades positivas e não na atividade em si, possuindo a Administração menor

ingerência sobre como a atividade será desempenhada e, o particular, maior liberdade para

executá-la, de acordo com os seus critérios empresariais. Nesses termos, o regime jurídico

aplicável aos contratos de fomento não é exatamente o mesmo aplicado aos contratos

administrativos em sentido estrito,390

não se reconhecendo à Administração as chamadas

cláusulas exorbitantes e nem tampouco garantia da intangibilidade da equação econômico-

financeira do contrato ao particular.391

Vale dizer, no contrato de fomento, o poder público estimula a execução de um

empreendimento privado, que remanesce privado e cuja configuração continua nas mãos do

particular.392

Fernando Dias Menezes de Almeida explica que, em termos finalísticos, há diferença

entre a busca, pela Administração, de cooperação para o desempenho de suas próprias

atividades e o incentivo para que a outra parte contratante desenvolva atividade dela mesmo,

que é de interesse geral. Neste último caso, a vinculação recíproca das partes, em termos de

390

Esta afirmação, todavia, não significa o afastamento dos princípios regentes da função administrativa de

fomento. Nos dizeres de Rafael Munhoz de Mello: “O maior risco à isonomia é que os benefícios e privilégios

sejam distribuídos sem qualquer critério racional que justifique o tratamento diferenciado. Em tal situação, os

particulares beneficiados são escolhidos não porque se distingam dos demais pela sua atuação numa atividade

cuja promoção é do interesse coletivo, tal qual definido em lei, mas sim porque têm meios de exercer maior

pressão política ou mesmo simples compadrio [...] Pode acontecer também de o tratamento discriminatório em

que consiste a medida de fomento ser outorgado com base em critérios lógicos [...] mas ainda assim com

ofensa ao princípio da isonomia, em função da promoção de valores incompatíveis com o texto constitucional

[...] tanto num caso como noutro a atividade de fomento será ilícita, eis que contrária ao princípio

constitucional da igualdade”. Como medida destinada à redução do risco de ilicitude, o autor defende a

transparência e a definição de critérios objetivos para a concessão do fomento. (MELLO, Rafael Munhoz de.

Atividades de fomento e o princípio da isonomia. In: SPARAPANI, Priscilia; ADRI, Renata Porto (Coord.).

Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social: homenagem ao Professor Celso Antônio

Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 263-285). 391

JUSTEN FILHO, Marçal; JORDÃO, Eduardo Ferreira. A contratação administrativa destinada ao fomento de

atividades privadas de interesse coletivo. Revista Brasileira de Direito Público – RBDP, Belo Horizonte, ano

9, n. 34, p. 47-72, jul./set. 2011, p. 60. 392

JUSTEN FILHO, Marçal; JORDÃO, Eduardo Ferreira. A contratação administrativa destinada ao fomento de

atividades privadas de interesse coletivo. Revista Brasileira de Direito Público – RBDP, Belo Horizonte, ano

9, n. 34, p. 47-72, jul./set. 2011, p. 59.

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134

volume ou de complexidade das obrigações assumidas, é mais tênue, podendo a atuação da

Administração ser mais flexível.393

Essa característica da contratação de fomento mostra-se particularmente relevante à

inovação tecnológica, processo marcado por incertezas de toda ordem.

Roberto Correia da Silva Gomes Caldas e Rubia Carneiro Neves destacam que os

acordos de parceria entre instituições de ciência e tecnologia, Estado e organizações privadas

do setor produtivo contribuem para uma maior repartição e melhor distribuição dos riscos

envolvidos com a pesquisa e o empreendimento de transformação da ciência em inovação

tecnológica.394

A melhor distribuição dos riscos envolvidos e a não incidência de prerrogativas

extraordinárias, nas contratações de fomento, não devem significar, contudo, ausência de

controle e impossibilidade de aplicação de sanção em caso de inadimplemento do avençado.

Outro aspecto a ser observado é o relativo aos destinatários da norma contida no artigo

3º, da Lei nº 10.973/2004.

Embora esse artigo afirme que os poderes nele previstos são atribuídos aos Estados,

Distrito Federal, e Municípios, as constrições constitucionais não permitem que algumas

disposições da Lei nº 10.973/2004 surtam efeito em todos os entes federativos. Isso porque a

lei é essencialmente federal, e não nacional. Todavia, haja vista que o art. 3º apenas declara o

conteúdo do art. 218, da Constituição Federal, sem qualificações, tem eficácia geral,

aplicando-se em todos os níveis da Federação.395

No Estado de São Paulo, a exemplo da Lei nº 10.973/2004, a Lei Complementar nº

1.049/2008 dispõe que:

Artigo 3º - O Estado, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São

Paulo - FAPESP e suas demais agências de fomento poderão estimular e

apoiar a constituição de alianças estratégicas e o desenvolvimento de

projetos de cooperação envolvendo empresas e ICTESPs voltadas para

atividades de pesquisa e desenvolvimento que objetivem a geração de

produtos e processos inovadores.

393

ALMEIDA, Fernando Dias Menezes de. Contrato administrativo. São Paulo: Quartier Latin, 2012, p. 259. 394

CALDAS, Roberto Correia da Silva Gomes; NEVES, Rubia Carneiro. Administração Pública consensual:

uma nova tendência nos acordos de parceria para promover tecnologia e inovação. Fórum de Contratação e

Gestão Pública – FCGP, Belo Horizonte, ano 11, n. 130, p. 63-76, out. 2012. Disponível em:

http://www.bidforum.com.br/bid/PDI0006.aspx?pdiCntd=81781. Acesso em: 30 jul. 2013. (documento não

paginado). 395

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 51.

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135

Não há dúvidas, portanto, que também em São Paulo, a constituição de alianças

estratégicas e o desenvolvimento de projetos de cooperação recebem o estímulo e o apoio do

Estado.

Oportuno, ainda, se faz registrar que, por força do artigo 24, XXXI, da Lei Federal nº

8.666/93, com a redação dada pela Lei Federal nº 12.349/2010, é dispensável a licitação:

XXXI – nas contratações visando ao cumprimento do disposto nos arts. 3º,

4º, 5º e 20 da Lei nº 10.973, de 2 de dezembro.

Observa Marçal Justen Filho que o inciso XXXI apresenta um clássico defeito de

técnica legislativa, que é a ausência de definição precisa e exata da hipótese, com remissão ao

texto de outros dispositivos legais.396

Explica, ademais, que: (i) nas hipóteses referidas, assinaladas na Lei nº 10.973/2004,

embora seja válido que o Estado promova a contratação sem uma perspectiva de resultados

econômicos imediatos ou previamente estimados, é obrigatória uma avaliação técnico-

científica sobre a consistência das propostas e de sua relevância para os interesses nacionais;

(ii) os possíveis interessados deverão ser tratados com critérios similares; (iii) os critérios das

diversas escolhas deverão estar relacionados com o tema do desenvolvimento nacional

sustentável; (iv) sempre que viável, deverá ser efetuado procedimento seletivo, com critérios

objetivos de julgamento e observância aos princípios da publicidade e da isonomia, não se

aplicando essa solução nos casos de inviabilidade de competição.397

De fato, ainda que a hipótese de contratação direta assinalada no inciso XXI não tivesse

sido incluída no rol do artigo 24 de Lei de Licitações, poderia existir caso de inexigibilidade

de licitação.

Nesse sentido, explicam Carlos Ari Sundfeld e Rodrigo Pagani de Souza que “parcerias

estratégicas com múltiplos objetos, articulados entre si, com certa complexidade, exigindo

parceiros escolhidos por longa negociação, não são passíveis de constituição por licitação”.398

A rigor, alude-se a uma tendência de revelação de incompatibilidades da Lei de

Licitações com a era das parcerias, uma vez que a Lei de Licitações é alterada pelo acréscimo

de hipóteses de dispensa de licitação para a contratação de cooperações, sem que a lei preveja

procedimentos alternativos para contratá-las (a previsão tem ocorrido por meio de

396

JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 15 ed. São Paulo:

Dialética, 2012, p. 403. 397

JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 15 ed. São Paulo:

Dialética, 2012, p. 404-405. 398

SUNDFELD, Carlos Ari; SOUZA, Rodrigo Pagani de. Parcerias para o desenvolvimento produtivo em

medicamentos e a lei de licitações. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 264, p. 91-133,

set./dez. 2013, p. 125.

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136

regulamentos), ao passo que a condução dessas parcerias ocorre em meio à insegurança, pois

intérpretes e controladores tentam sujeitá-la ao processo licitatório da Lei de Licitações.399

Essa tendência de incompatibilidade destaca a necessidade de enfrentamento de dois

desafios, a saber: a) a necessidade de melhor distinção entre as diversas espécies do

multifacetado fenômeno contratual do qual faz parte a Administração Pública; b) a

necessidade de tratamento legislativo mais adequado às novas espécies contratuais, que não as

tradicionais.400

Do que foi dito deflui que, apesar de seu intuito moralizador, a aplicação do regime

mais rígido da Lei nº 8.666/1993 não é adequada ante a complexidade e variedade das

situações concretas a serem tratadas de modo contratual pela Administração. Enquanto

gênero, a expressão contrato não pode remeter a um único regime, uniforme e completo,

aplicado a todos os acordos de vontade celebrados pela Administração.401

Para Marçal Justen Filho, o contrato de fomento não se subordina à prévia licitação nos

termos da Lei nº 8.666/93:

Em alguns casos, porque os benefícios previstos são assegurados a todos

quantos se dispuserem a cumprir os requisitos exigidos em lei – portanto, a

ausência de excludência torna inexigível a licitação. Em outros casos,

configura-se inviabilidade de competição, eis que não é viável comparar as

diversas alternativas segundo critérios objetivos de vantajosidade. Quando,

no entanto, existir a possibilidade de comparação entre as diversas

alternativas, a solução será instaurar um procedimento seletivo simplificado,

não subordinado ao regime da Lei nº 8.666/1993.402

Cumpre anotar que a adoção de instrumentos contratuais para organizar a atividade de

fomento relaciona-se com o oferecimento de garantias aos particulares.

Consigna, ainda, Marçal Justen Filho a esse respeito que:

A previsão de benefícios a particulares contemplada em ato unilateral do

Estado pode ser suprimida sem que, usualmente, o particular possa a tanto se

399

SUNDFELD, Carlos Ari; SOUZA, Rodrigo Pagani de. Parcerias para o desenvolvimento produtivo em

medicamentos e a lei de licitações. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 264, p. 91-133,

set./dez. 2013, p. 126. 400

SUNDFELD, Carlos Ari; SOUZA, Rodrigo Pagani de. Parcerias para o desenvolvimento produtivo em

medicamentos e a lei de licitações. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 264, p. 91-133,

set./dez. 2013, p. 97. 401

ALMEIDA, Fernando Dias Menezes de. Contrato administrativo. São Paulo: Quartier Latin, 2012, p. 203. O

autor sustenta a tese de insuficiência da teoria do contrato administrativo para explicar completa e

adequadamente o fenômeno contratual da Administração, em face do atual aumento de complexidade do

fenômeno. Propõe a sistematização desse fenômeno em módulos convencionais, assim agrupados,

respectivamente: (i) módulos convencionais de cooperação, que ressaltam a ideia de atuação conjunta para um

mesmo fim; (ii) módulos convencionais de concessão, que conotam transferência e (iii) módulos

convencionais instrumentais, que destacam o seu aspecto instrumental em relação à finalidade da função

pública; (iv) módulos convencionais substitutos de decisão unilateral da Administração (p. 240 e 356). 402

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 10. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2014, p.

475.

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137

opor. Não existe direito adquirido a regime jurídico. No entanto, a

formalização contratual de um benefício, condicionada à observância de

certos requisitos, configura ato jurídico perfeito e gera direito adquirido em

favor do beneficiário.403

Por fim, cabe registrar que a Lei nº 12.349/2010 modificou o artigo 57, da Lei nº

8.666/93, ao prever que:

Art. 57. A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à

vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos:

[...]

V- às hipóteses previstas nos incisos IX, XIX, XXVIII e XXXI do art. 24,

cujos contratos poderão ter vigência por até 120 (cento e vinte) meses, caso

haja interesse da administração.

Uma das hipóteses previstas no inciso XXXI do artigo 24 da Lei nº 8.666/1993 é

justamente o artigo 3º da Lei nº 10.973/2004.

Se o intuito desse dispositivo era o de incentivar relações contratuais mais duradouras,

na prática ele poderá ter efeito contrário.404

Isso porque, a princípio, não se aplicariam as

restrições de prazo da Lei nº 8.666/1993 a esse tipo de parceria. Com o advento do preceptivo

legal em comento, há uma expressa limitação de prazo até 120 (cento e vinte) meses.

Considerando que projetos de P,D&I podem ter prazos muito longos, a alteração legislativa

poderá, na prática, trazer dificuldades à sua negociação.

Carlos Ari Sundfeld e Jacintho Arruda Câmara, nesse particular, sustentam que a

racionalidade do artigo 57, da Lei nº 8.666/93 parece estar na vinculação dos prazos dos

contratos à duração de créditos ou planos orçamentários, de modo que, aparentemente, a regra

somente faria sentido nos contratos fontes de despesas orçamentárias. Nos contratos sem esse

tipo de despesa, a sua duração não deveria estar limitada aos prazos desse artigo.405

Os autores defendem, também, a inexistência de uma única regra de aplicação uniforme,

vale dizer, um regime jurídico único em relação ao prazo de contratos públicos:

A identificação segura do regime jurídico contratual aplicável a determinado

setor deve ser obtida a partir da análise da eventual lei específica, da sua

lógica econômica e negocial e de outras características do objeto da

contratação.406

403

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 10. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista

dos,Tribunais, 2014, p. 722. 404

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 54. 405

SUNDFELD, Carlos Ari; CÂMARA, Jacintho Arruda. Uma crítica à tendência de uniformizar com princípios

o regime jurídico dos contratos públicos. Revista de Direito Público da Economia – RDPE, Belo Horizonte,

ano 11, n. 41, p. 57-72, jan./mar. 2013. 406

SUNDFELD, Carlos Ari; CÂMARA, Jacintho Arruda. Uma crítica à tendência de uniformizar com princípios

o regime jurídico dos contratos públicos. Revista de Direito Público da Economia – RDPE, Belo Horizonte,

ano 11, n. 41, p. 57-72, jan./mar. 2013.

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138

No caso ora em comento, melhor teria sido se a lei, considerando as peculiaridades

próprias dos projetos de P,D&I, tivesse exigido prazo contratual determinado, porém, sem um

limite geral a ser observado.

10.2 Redes e projetos internacionais de pesquisa, incubadoras e parques tecnológicos

Prescreve o parágrafo único, do artigo 3º da Lei nº 10.520/2004 que:

Parágrafo único. O apoio previsto neste artigo poderá contemplar as redes e

os projetos internacionais de pesquisa tecnológica, bem como ações de

empreendedorismo tecnológico e de criação de ambientes de inovação,

inclusive incubadoras e parques tecnológicos.

De modo bastante similar, o parágrafo único, do art. 3º da Lei Complementar Paulista nº

1.049/2008 estabelece:

Parágrafo único - O apoio previsto neste artigo poderá contemplar as redes e

os projetos internacionais de pesquisa tecnológica, bem como ações de

empreendedorismo tecnológico e/ou social e de criação de ambientes de

inovação, incluídas as incubadoras e parques tecnológicos.

Em razão da expressa previsão legal de possibilidade de fomento público às redes e aos

projetos de pesquisa internacionais de pesquisa tecnológica e à criação de ambientes de

inovação, urge verificar essas figuras mais atentamente.

10.2.1 Redes e projetos internacionais de pesquisa tecnológica

Redes de pesquisa tecnológica dizem respeito à articulação de arranjos de diversas

instituições especializadas, para o desempenho conjunto de atividades científicas e

tecnológicas, que possam ser beneficiadas pela complementaridade de conhecimentos e

competências.

O surgimento da chamada inovação em redes está relacionado com as profundas

modificações que o sistema de produção capitalista passou a sofrer a partir do final da década

de 1970. Este era marcado pela produção em massa e por economias de escalas obtidas pelo

uso de maquinários específicos. Os produtos e os processos essenciais à inovação eram

controlados diretamente, por meio de direitos de propriedade, para proteger os altos

investimentos empreendidos em sua criação. Havia o que se chama de firmas verticais.

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139

Atualmente, os agentes econômicos vêm se organizando em colaborações

interorganizacionais, desverticalizadas, controladas majoritariamente por contratos.407

De fato, com o surgimento de uma nova economia baseada no aproveitamento

econômico do conhecimento, despontou uma nova forma de organização desverticalizada: as

redes. Conforme Marcus Lessa, “através delas, firmas, pesquisadores, o Estado e agentes do

capital se unem, sem uma cadeia clara de subordinação ou controle, para, em conjunto e

através de suas complementaridades, inovar num ambiente incerto e instável”.408

O Sistema Brasileiro de Tecnologia – SIBRATEC, por exemplo, instituído pelo Decreto

Federal nº 6.259/2007, e disciplinado conforme as diretrizes estipuladas na Resolução do

Comitê Gestor SIBRATEC nº 001, de 17 de março de 2008, estabelece que as entidades dele

integrantes são organizadas na forma de redes.

No SIBRATEC essas redes podem ser temáticas, conforme as prioridades das políticas

industrial, tecnológica e de comércio exterior e regionais, quando for o caso, para melhor

atender as demandas empresariais, objetivando o desempenho de pelo menos uma das

seguintes atividades: (i) pesquisa, desenvolvimento e inovação de processo e produto; (ii)

prestação de serviços tecnológicos; e (iii) extensão ou assistência tecnológica.409

Cada uma dessas redes é gerenciada por um comitê técnico composto por representantes

de órgãos ou entidades públicas e privadas e por especialistas convidados nas áreas de atuação

da rede.410

Busca-se articular os laboratórios de empresas com suas redes, a fim de que contribuam

para melhorar a tecnologia de empresas que atuem em sua cadeia. Por meio dessa articulação,

intenta-se conhecer melhor os reais problemas dos setores, além de permitir que competências

empresariais e acadêmicas estabelecidas no País se complementem.

A organização de atividades na forma de redes visa, enfim, à otimização e ao

compartilhamento de recursos e de experiências.

Segundo o artigo 9º, da Portaria nº 251, de 12 de março de 2014, do MCTI, que

estabelece as diretrizes para a gestão da política de inovação das suas Unidades de Pesquisa,

as ICTs a ele subordinadas deverão se associar em arranjos de núcleos de inovação

tecnológica, de acordo com a sua localização, devendo esses arranjos operar em forma de rede

407

LESSA, Marcus. Contratos para inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da inovação. 2. ed.

rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 409-468, p. 413. 408

LESSA, Marcus. Contratos para inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da inovação. 2. ed.

rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 409-468, p. 414. 409

Conforme disposto no art. 3º do Decreto nº 6.259/2007. 410

Conforme disposto no art. 3º do Decreto nº 6.259/2007.

Page 140: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP … Ishikawa Mazon.pdf · PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC/SP Tânia Ishikawa Mazon Fomento público à

140

colaborativa, com a finalidade de otimizar e compartilhar recursos, disseminar boas práticas

de gestão da inovação e de proteção à propriedade intelectual e à transferência de tecnologia.

No Estado de São Paulo todo o chamado Sistema Paulista de Ambientes de Inovação

(SPAI) está estruturado a partir de sistemas e redes – o Sistema Paulista de Parques

Tecnológicos (SPTec); a Rede Paulista de Incubadoras de Empresas de Base Tecnológica

(RPITec); a Rede Paulista de Centros de Inovação Tecnológica (RPCITec) e a Rede Paulista

de Núcleos de Inovação de Inovação Tecnológica (PPNIT).

Sob o aspecto jurídico, convém destacar que as articulações formadas por meio das

redes de pesquisa são parcerias com natureza aparentemente mais consentânea à dos

convênios, não resultando da atuação conjunta de seus diversos atores a constituição de nova

pessoa jurídica.

O parágrafo único, do artigo 3º da Lei nº 10.973/2004 faz menção, de forma literal, aos

chamados “projetos internacionais”, sendo, portanto, relevante, tecer algumas considerações a

propósito deles.

Em primeiro lugar, há que se notar que no apoio público destinado a ações

internacionais, será sempre preciso ponderar os interesses quanto aos seus objetivos, eis que

sua tônica deverá ser a solução dos problemas brasileiros. Haverá exceções a esse

entendimento, como as redes relacionadas a interesses regionais, tais como os do Mercosul,

mas isso deverá ocorrer em atendimento a outros valores constitucionais relevantes.411

É sabido que a cooperação internacional tem sido e é absolutamente fundamental para o

avanço da C,T&I no País, máxime nos presentes tempos de globalização, devendo ser,

evidentemente, adaptada às prioridades e necessidades definidas pela agenda de

desenvolvimento e pelo regime jurídico brasileiros.

Nesse sentido, já dispunha o Livro Branco Ciência, Tecnologia e Inovação, do então

Ministério da Ciência e Tecnologia:

[...] será necessário mobilizar a cooperação internacional para reforçar a

atuação do Brasil tanto nas fronteiras do conhecimento, na promoção de

pesquisas avançadas, e na solução do nosso déficit tecnológico, quanto no

plano da realização das vocações nacionais e regionais, em matéria de

Ciência e Tecnologia. A cooperação é o veículo preferencial de acesso ao

conhecimento internacionalmente disponível e, ao mesmo tempo, fonte

potencial de recursos para ações cooperativas de interesse nacional ou

local.412

411

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 53. 412

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Livro branco: ciência, tecnologia e inovação. Brasília:

MCT, 2002, p. 46.

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141

Corroborando a importância das cooperações internacionais na área da C,T&I, segundo

estimativas do Livro Azul da 4ª Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia e Inovação, de

2010, mais de 40% (quarenta por cento) dos trabalhos científicos brasileiros publicados no

período entre 2003 e 2007 foram feitos em colaboração com pesquisadores estrangeiros, em

especial os dos Estados Unidos, França, Inglaterra, Alemanha, Argentina, México e Chile.

No Estado de São Paulo, conforme informa o Decreto Estadual nº 57.932/2012, que

institui o Plano de Relações Internacionais 2011-2014 do Governo do Estado, o

multilateralismo é a face mais visível das relações internacionais:

É a lógica natural de condução das relações no sistema internacional atual,

fruto de um processo histórico que gradualmente acentuou a falta de

capacidade dos estados nacionais e subnacionais para dar respostas

individuais e isoladas a desafios modernos, impelindo-os a cooperar

globalmente. 413-414

A partir dos anos 1990, segundo o aludido Anexo, a abertura e a estabilização

econômica permitiram o fortalecimento do País no cenário internacional, sendo, o Brasil,

hoje, reconhecido como um ator com vocação global, o que exige maior internacionalização

de todas as entidades públicas e privadas brasileiras.415

O Anexo do Decreto 57.932/2012 propõe como objetivos gerais do Plano de Relações

Internacionais 2011-2014, dentre muitos outros, qualificar a mão de obra e preparar os

cidadãos paulistas para a inserção nos mercados globais, especialmente fomentando a

inovação, o empreendedorismo, o ensino de idiomas, a formação técnico-científica e a

inclusão social e, como metas específicas, criar condições para que o investimento em P&D

em São Paulo atinja 2% do PIB estadual e incentivar, por meio da FAPESP e das

universidades e centros de pesquisa, a internacionalização da pesquisa científica e

tecnológica, da inovação e do conhecimento paulista, assim como estimular o investimento de

empresas estrangeiras em centros de pesquisa, desenvolvimento e inovação, de caráter público

ou privado, localizados no Estado de São Paulo.416

10.2.2 Incubadoras

413

A afirmação consta do item “Metas específicas” do Anexo do Decreto. 414

Um excelente exemplo da importância da cooperação internacional é a Embrapa. A Embrapa possui

Laboratórios de Antenagem nos Estados Unidos, na França e na Coréia do Sul, encarregados de realizar

projetos em cooperação com instituições locais e de captar o que há de mais avançado em matéria de

tecnologia agrícola. Mantém escritórios de transferência de tecnologia em Gana, na Venezuela e no Paraná.

(MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Livro azul da 4ª Conferência Nacional de Ciência,

Tecnologia e Inovação para o Desenvolvimento Sustentável. Brasília: MCT, 2010, p. 56). 415

A afirmação consta do item “1. Contexto internacional e nacional” do Decreto. 416

A afirmação consta do item “Metas específicas” do Anexo do Decreto.

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142

Ensina Conceição Vedovello que no campo especializado dos estudos econômicos, as

incubadoras de empresas têm despertado crescente interesse em vários seguimentos sociais,

devido à possibilidade de serem utilizadas como instrumentos de políticas públicas de apoio

ao crescimento e fortalecimento de micro, pequenas e médias empresas de base tecnológica, à

geração de empregos; à promoção do desenvolvimento econômico e social, tanto em termos

regionais como nacionais; e ao fortalecimento das relações entre empresas e academia,

dinamizando o setor produtivo e tornando-o mais competitivo e participativo do mercado

global.417

As incubadoras pressupõem um conjunto de empresas – geralmente, vinculadas aos

setores de alta tecnologia – concentrado em um ambiente físico provido de instalações

adequadas e infraestrutura administrativa e operacional competente, gerador de um ambiente

propício não somente ao nascimento, desenvolvimento e consolidação de novos negócios,

mas também ao estabelecimento de ligações com outros provedores de conhecimento,

informação e tecnologia, como universidades e centros de pesquisa.418

O surgimento das incubadoras, tal como o surgimento das redes de pesquisa

tecnológica, está vinculado aos novos padrões impostos pela economia do conhecimento.

Mario Gomes Schapiro destaca que entre as décadas de 1950 e 1970 a economia

baseava-se no paradigma fordista-desenvolvimentista. Acreditava-se que a riqueza das nações

mais pobres dependeria da viabilização dos mesmos setores industriais que garantiam êxito às

nações mais desenvolvidas, voltados à produção de bens de consumo em série. O esquema de

produção fordista contava com alguns atributos, tais como as grandes indústrias, a produção

seriada e a produção e o emprego em massa.419

Desde a década de 1980, todavia, uma parte significativa das vantagens competitivas

entre as empresas deixou de ser baseada em bens econômico padronizados, produzidos em

série, passando gradativamente a girar em torno de bens diferenciados, customizados e

fabricados por meio de processos produtivos amparados em P&D. Nesse contexto, no lugar

417

VEDOVELLO, Conceição. Perspectivas e limites da interação entre universidades e MPMEs de base

tecnológica localizadas em incubadoras de empresas. Revista do BNDES, Rio de Janeiro, v. 8, n. 16, dez. 2001,

p. 281-316, p. 282. 418

VEDOVELLO, Conceição. Perspectivas e limites da interação entre universidades e MPMEs de base

tecnológica localizadas em incubadoras de empresas. Revista do BNDES, Rio de Janeiro, v. 8, n. 16, dez. 2001,

p. 281-316, p. 291. 419

SCHAPIRO, Mario Gomes. Novos parâmetros para a intervenção do Estado na economia. São Paulo:

Saraiva, 2010, p. 21.

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143

exclusivo das grandes empresas, as pequenas e médias empresas, especializadas em produtos

para o atendimento de segmentos específicos de mercado, passaram a ter papel de destaque.420

Com efeito, a formação de ambientes sistêmicos de promoção da competitividade, na

qual os competidores lastreiam a sua rivalidade não apenas em custos, mas também em

conhecimento e nos atributos qualitativos e seus produtos, pressupõe o aparecimento

constante de novas empresas emergentes, organizadas em torno de propostas produtivas.

Essas novas empresas são as chamadas start-ups, inseridas, em regra, em incubadoras

universitárias.421-422

A história das incubadoras, no País, é recente. Assim como os parques tecnológicos,

elas começaram a ser criadas na década de 1980, a partir da implantação, pelo CNPq, do

primeiro Programa Brasileiro de Parques Tecnológicos no País. Essa iniciativa semeou a

noção de empreendedorismo inovador no Brasil.423

Segundo o Relatório Técnico Estudo, Análise e Proposições sobre as Incubadoras de

Empresas no Brasil, elaborado em conjunto pelo MCTI e pela Associação Nacional de

Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (ANPROTEC), com o objetivo de

levantar e atualizar as informações e os indicadores das incubadoras brasileiras, havia, no

País, em 2011, 384 incubadoras em operação, que abrigavam 2.640 empresas, gerando 16.394

postos de trabalho. Essas incubadoras já haviam graduado 2.509 empreendimentos, que

faturavam, à época, R$ 4,1 bilhões e empregavam 29.205 pessoas.424

Nem a Lei Federal nº 10.973/2004 e tampouco o Decreto nº 5.563/2005 apresentam

uma definição própria para o termo “incubadora”, a ela referindo-se somente como um

420

SCHAPIRO, Mario Gomes. Novos parâmetros para a intervenção do Estado na economia. São Paulo:

Saraiva, 2010, p. 21. 421

SCHAPIRO, Mario Gomes. Novos parâmetros para a intervenção do Estado na economia. São Paulo:

Saraiva, 2010, p. 156. 422

A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) adota a seguinte definição para

start-up: “Startup ou empresa emergente - Organização em fase de estruturação (quase firma) que busca

nichos específicos de mercado. Nessa categoria de empresa, a base técnica da produção advém de esforços de

pesquisa e desenvolvimento tecnológico. Pode estar ou não inserida em incubadora.” A acepção, por seu turno,

de spin-off, termo também usualmente empregado nos debates relacionados a incubadoras e parques

tecnológicos, é a seguinte: “Spin-off -Empresa oriunda de laboratório e resultante de pesquisa acadêmica ou

industrial; empresa impulsionada por outra já estabelecida no mercado, para atuar na mesma área de negócio,

mas com produto ou serviço diferente daquele que a empresa original comercializa. Fonte: Dicionário

Tecnologia e Inovação Sebrae” (os grifos são originais). Disponível em:

http://www.fapemig.br/apoio/programas-de-rede-de-pesquisa. Acesso em 05 nov. 2014. 423

ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE ENTIDADES PROMOTORAS DE EMPREENDIMENTOS

INOVADORES. Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Estudo, análise e proposições sobre as

incubadoras de empresas no Brasil -– relatório técnico. Brasília: ANPROTEC, 2012. 24 p., p.5. 424

ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE ENTIDADES PROMOTORAS DE EMPREENDIMENTOS

INOVADORES. Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação. Estudo, análise e proposições sobre as

incubadoras de empresas no Brasil -– relatório técnico. Brasília: ANPROTEC, 2012. 24 p., p. 6.

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144

ambiente de inovação, passível do recebimento de apoio e estímulo pela União, pelos Estados,

pelo Distrito Federal, pelos Municípios e pelas respectivas agências de fomento.

Demais leis e decretos federais relacionados à inovação também não trouxeram

diretrizes acerca do funcionamento e modo de interação das incubadoras com o setor público.

A Portaria nº 251, de 12 de março de 2014, do MCTI, estabelece as diretrizes para a

gestão da política de inovação das Unidades de Pesquisa da Pasta, sem, contudo, abordar,

especificamente, o tema das incubadoras.

Apesar de o assunto estar vinculado à atuação do Estado, seja diretamente, seja por

intermédio de regulação, ainda são raros os estudos destinados à matéria no âmbito do Direito

Administrativo Brasileiro.

No âmbito do Estado de São Paulo, depreende-se do art. 2º, da Lei Complementar nº

1.049/2008 que as incubadoras devem abrigar predominantemente empresas nascentes

intensivas em conhecimento tecnológico.425

Depreende-se, também, da Lei Complementar Paulista, o compromisso assumido pelo

Estado de São Paulo de manter, ao lado de um Sistema Paulista de Parques Tecnológicos,

uma Rede Paulista de Incubadoras de Empresas de Base Tecnológica, como parte de sua

estratégia para incentivar os investimentos em inovação tecnológica, pesquisa científica e

tecnológica, desenvolvimento tecnológico, engenharia não-rotineira, informação tecnológica e

extensão tecnológica em ambiente produtivo que gerem novos negócios, trabalho e renda e

ampliem a competitividade da economia paulista.

Recentemente, o Decreto Estadual nº 60.286/2014, que instituiu e regulamentou o

Sistema Paulista de Ambientes de Inovação, definiu:

II – Incubadora de Empresas de Base Tecnológica: empreendimento que, por

tempo limitado, oferece espaço físico para instalação de empresas e

empreendimentos nascentes voltados ao desenvolvimento de produtos e

processos intensivos em conhecimento, disponibiliza suporte gerencial e

tecnológico, assim como outros serviços correlatos de valor agregado, com

vista ao seu crescimento e consolidação;

Interessante questão que se apresenta é a de saber se incubadoras são dotadas, ou não,

de personalidade jurídica.

Segundo já mencionado, a legislação federal não aborda este assunto tampouco tece

detalhamento sobre qualquer outro ponto da matéria.

425

Artigo 2o - Para os efeitos desta lei complementar, considera-se: [...] VI - Rede Paulista de Incubadoras de

Empresas de Base Tecnológica: instrumento articulador do conjunto das incubadoras que abrigam

predominantemente empresas nascentes intensivas em conhecimento tecnológico, estabelecidas no Estado e

credenciadas pela Secretaria de Desenvolvimento.

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145

O artigo 25 da Lei Complementar Paulista nº 1.049/2008 faz presumir que as

incubadoras poderão possuir personalidade jurídica própria, nos termos abaixo:

Artigo 25 - O Estado, suas autarquias, fundações e empresas por ele

controladas, direta ou indiretamente, poderão participar do capital social de

sociedade ou associar-se a pessoa jurídica caracterizada como parque

tecnológico, como incubadora de empresas de base tecnológica, e arranjos

produtivos pertencentes ao Sistema Paulista de Parques Tecnológicos, e a

Rede Paulista de Incubadoras de Empresas de Base Tecnológica de que trata

o artigo 24.

Diversamente, o Decreto Estadual nº 60.286/2014, ao fazer menção, simplesmente, à

expressão “empreendimento”, leva a crer que as incubadoras poderão ser entes

despersonalizados.

A nosso ver, apesar do quanto disposto no artigo 25, da Lei Complementar 1.049/2008,

a maior parte das disposições do Decreto nº 60.286/2014 permite concluir que as incubadoras

não têm personalidade jurídica.

A questão, no entanto, pode suscitar dúvidas, cumprindo lembrar que, no Brasil, os

decretos se prestam a regulamentar a lei.

Prescreve, ainda, o mencionado Decreto nº 60.286/2014, como objetivos da Rede

Paulista de Incubadoras de Base Tecnológica – RPITec:

I – fomentar a implantação e o fortalecimento das incubadoras de empresas

de base tecnológica no Estado de São Paulo;

II – promover a cultura do empreendedorismo inovador, fomentando a

utilização de novas tecnologias de produção e de gestão;

III – integrar as incubadoras promovendo a troca de informação e a difusão

de conhecimento e de processos de gestão tecnológica, mercadológica,

empresarial e de internacionalização de operações;

IV – incentivar a integração com as cadeias produtivas, arranjos e outros

mecanismos de desenvolvimento existentes no Estado de São Paulo,

buscando proporcionar sustentabilidade e competitividade aos seus negócios;

V – desenvolver estudos, mapeamentos, metodologias de monitoramento e

avaliação de resultados, através de indicadores que demonstrem o grau de

inovação e empreendedorismo, a capacidade de geração de empregos e sua

participação no mercado;

VI – apoiar:

a) a aplicação de capital empreendedor e o direcionamento de linhas de

investimentos às demandas das empresas incubadas;

b) a captação de recursos de órgãos de fomento para aplicação em ações que

beneficiem horizontalmente as empresas incubadas e as incubadoras;

VII – buscar o intercâmbio com:

a) entidades nacionais e internacionais de fomento à inovação, à tecnologia e

ao empreendedorismo;

b) entidades congêneres no país e no exterior;

VIII – promover e apoiar a realização de eventos, reuniões técnicas, missões

técnicas e outras ações, em nível nacional e internacional, em apoio às

incubadoras de empresas de base tecnológica no Estado de São Paulo.

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146

Como se nota, a recente regulamentação paulista da matéria, ao menos no que tange à

sua importância e objetivos perseguidos, procura traduzir aquilo que diversos estudos da área

econômica identificaram nos últimos anos.

Nos termos do art. 14 do Decreto, são requisitos para inclusão de incubadoras à Rede

Paulista de Incubadoras de Empresas de Base Tecnológica - RPITec:

I – a existência de pessoa jurídica sem fins lucrativos encarregada da gestão

da incubadora, cujo ato constitutivo demonstre:

a) tratar-se de entidade privada ou de entidade do setor público da

Administração Indireta e Fundacional;

b) ter objetivos compatíveis com os arrolados no artigo 13 deste decreto;

c) ter modelo de gestão adequado à realização de seus objetivos;

d) possuir capacidade técnica e idoneidade financeira para gerir a

incubadora;

II – a apresentação de:

a) requerimento pela entidade gestora, contendo justificativa do pleito e

caracterização detalhada do empreendimento;

b) planejamento estratégico e operacional para sua instalação e

desenvolvimento;

c) relatório identificando o perfil das empresas incubadas, de acordo com as

vocações econômicas e produtivas e as áreas de atuação das instituições de

ciência, tecnologia e ensino na região;

III – o oferecimento de infraestrutura, espaço físico e instalações de uso

compartilhado, como biblioteca, serviços administrativos e de escritório,

salas de reunião, auditório, utilidades, facilitando, ainda, o acesso a

laboratórios, grupos de pesquisas em universidades, institutos, centros de

pesquisa e instituições de formação profissional;

IV – a promoção de apoio nas áreas de gestão tecnológica, empresarial e

mercadológica, dentre outras, visando o desenvolvimento e a consolidação

das empresas incubadas;

V – a existência de modelo de gestão adequado à realização de seus

objetivos;

VI – a previsão na sua estrutura organizacional interna, de órgão colegiado

com as seguintes características:

a) é responsável pelo planejamento e pela direção estratégica;

b) tem a atribuição de zelar pelo cumprimento do objeto social da entidade; e

c) pode contar com representantes do Município onde se encontra instalada a

incubadora, de instituições de ensino e pesquisa e de entidades privadas

representativas do setor produtivo;

VII – a demonstração de sua viabilidade econômico-financeira, indicando a

existência de recursos próprios ou oriundos de instituições de fomento,

instituições financeiras ou outras entidades de apoio às atividades

empresariais, em especial as direcionadas para micro e pequenas empresas;

VIII – a demonstração de capacidade para criar as condições para que as

empresas incubadas se consolidem.

Não há detalhamento sobre as formas pelas quais a capacidade técnica e a idoneidade

financeira das interessadas no credenciamento na RPITec serão avaliadas.

A comprovação de alguns dos requisitos comporta o exercício de discricionariedade,

sendo dotados de relativo subjetivismo. A título de exemplificação, não há definição exata do

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147

que deverá ser considerado “modelo de gestão adequado”; não há parâmetros que permitam

inferir quando haverá viabilidade econômico-financeira do empreendimento.

Nesse passo, cumpre dizer que há divergências sobre a natureza do fomento público –

cuida-se de atos exercidos mediante competência vinculada ou discricionária?

De acordo com José Vicente Santos de Mendonça, alguns autores, como Marcos

Juruena e Gaspar Ariño Ortiz defendem que se trata de atos vinculados. A maior parte da

doutrina, porém, entende que a atividade promocional é discricionária, apesar de reconhecer

que na outorga de muitas das subvenções, existem elementos vinculados.426

Segundo o posicionamento do autor, que é perfilhado pela Autora:

[...] o fomento público, se não pode ser considerado discricionário ou

vinculado de modo estanque, está mais próximo da discricionariedade do

que da vinculação. Podem existir hipóteses nas quais a ajuda pública restará

vinculada, ou por uma norma legal específica, ou pelos termos do edital ou

do contrato. Além disso, as medidas de fomento público que importem

dispêndio de verbas ou desonerações fiscais devem se submeter às

constrições normativas trazidas pela Constituição e, em específico, pela Lei

de Responsabilidade Fiscal (autorização orçamentária, indicação de fonte de

custeio etc.). [...] O papel da doutrina, no que toca a construção de um

fomento republicano, é essencialmente o de estabelecer e difundir critérios

dogmáticos e operacionais. A partir daí, discutir se o fomento é vinculado ou

discricionário pode passar a segundo plano. Além disso, não é porque todas

as atividades públicas, hoje em dia, submetem-se a controles finalísticos e

principiológicos, que o fomento vai deixar de ser, a princípio, atividade

discricionária.427

Para o art. 15 da norma, cabe à Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência,

Tecnologia e Inovação, como coordenadora da RPITec, por meio da Subsecretaria de Ciência,

Tecnologia e Inovação, dentre outros objetivos, decidir sobre a inclusão, ou seja, sobre o

credenciamento de incubadora na RPITec, e respectiva exclusão, assim como elaborar o

relatório anual de avaliação de desempenho das incubadoras integrantes da Rede.

Nos termos do art. 16, a exclusão será devida quando a incubadora descumprir qualquer

dos requisitos exigidos quando de sua inclusão ou quando tiver desempenho desfavorável,

segundo o relatório de identificação do perfil das empresas incubadas, apresentado quando do

pedido de inclusão na RPITec. Poderá ocorrer também a pedido da própria entidade gestora.

Vale notar que o termo “credenciamento” utilizado diversas vezes pelo Decreto, a rigor,

constitui um instituto reconhecido há longa data pela Administração Pública, utilizado, em

regra, para delegar

426

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Direito constitucional econômico: a intervenção do Estado na

economia à luz da razão prática e do pragmatismo. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 395. 427

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Direito constitucional econômico: a intervenção do Estado na

economia à luz da razão prática e do pragmatismo. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 396.

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148

unilateral e precariamente, por atos administrativos, a credenciados,

atividades, reconhecendo-lhes a produção de eficácia administrativa pública

e dando-lhes assentimento para que sejam remunerados por seus serviços,

diretamente pelos administrados beneficiários ou por ela própria.428

Para Dinorá Adelaide Musetti Grotti “o credenciamento é apenas a transferência, a

particulares, de uma atividade técnica, meramente instrumental, de mera verificação, não

configurando delegação de poder de polícia, nem, muito menos, de serviço público”.429

Nas situações de ausência de competição, em que o credenciamento é adequado, é

inexigível a licitação, com base no artigo 25, caput, da Lei nº 8.666/93, pois todos os

interessados aptos serão aproveitados. Se houver, no entanto, possibilidade de competição

objetiva entre os particulares, será necessária a licitação.430

Como se nota, no caso de não ser possível ou desejável contratar todas as incubadoras

que cumpram as exigências impostas, as formas e os critérios de seleção para inclusão na

RPITec adquirem ainda maior importância, devendo ser estabelecidos de forma mais objetiva

possível.

Não se pode perder de vista que, por força do art. 17 do Decreto nº 60.286/2014, as

incubadoras credenciadas poderão receber fomento público, inclusive mediante a celebração

de convênios e outros instrumentos jurídicos com o Estado, visando à realização de estudos,

obras civis e aquisição de equipamentos.

Assim como o ato de credenciamento, a exclusão também parece um ato exercido no

uso de competência discricionária. Vale notar, por exemplo, que o Decreto não prescreve, a

priori, como a expressão “desempenho desfavorável” deverá ser interpretada. Parece-nos, no

entanto, que melhor teria sido condicionar a avaliação de desempenho à avaliação dos

resultados de planos contendo não somente objetos, metas e indicadores, mas também prazos

de execução prévia e conjuntamente ajustados. A norma propõe, ao contrário disso, avaliação

de desempenho desfavorável segundo o relatório do perfil das empresas incubadas, o que,

aparentemente, não se mostra razoável.

Cumpre observar que embora o Decreto nº 60.286/2014 exija das incubadoras a

apresentação de relatórios anuais para o acompanhamento e avaliação de seu desempenho,

428

MOREIRA NETO, Diogo Figueiredo. Curso de direito administrativo. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009,

p. 313. 429

GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. Parcerias na administração pública. In: CARDOZO, José Eduardo

Martins; QUEIROZ, João Eduardo Lopes; SANTOS, Márcia Walquiria Batista dos. (Coord.). Direito

administrativo econômico. São Paulo: Atlas, 2011, p. 413-476, p. 472. 430

GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. Parcerias na administração pública. In: CARDOZO, José Eduardo

Martins; QUEIROZ, João Eduardo Lopes; SANTOS, Márcia Walquiria Batista dos. (Coord.). Direito

administrativo econômico. São Paulo: Atlas, 2011, p. 413-476, p. 474.

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149

estes, a rigor, não foram apontados como elementos determinantes da manutenção ou

exclusão das incubadoras na RPITec.

O estabelecimento de requisitos materiais que permitam avaliar a efetiva eficiência das

incubadoras é, efetivamente, muito importante e devia ter sido considerado, de forma

expressa, como o fator determinante da manutenção ou exclusão de uma incubadora na

RPITec.

Os relatórios de desempenho, nos termos do art. 18, deverão ser apresentados,

anualmente, no mês de abril, pelas incubadoras com credenciamento à Secretaria de

Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação, com os seguintes indicadores:

I - Aspectos Financeiros e Sociais:

a) postos de trabalho, gerados discriminados por tipo de atividade;

b) número de empresas:

1. instaladas, por segmento de atuação;

2. geradas/graduadas, por segmento de atuação;

c) dados econômicos, financeiros e contábeis referentes ao exercício

anterior;

d) recursos públicos e privados aplicados.

II - Aspectos Científicos, Tecnológicos e de Gestão:

a) qualificação da equipe gestora;

b) número de:

1. projetos de P&D/ano com as universidades e institutos de pesquisas;

2. pesquisadores por área de conhecimento/competência;

c) áreas de competência da incubadora;

d) plano de metas e plano estratégico;

III - Aspectos Competitivos e de Infraestrutura e Sustentabilidade:

a) quantidade de:

1. mão de obra qualificada formada na região;

2. pessoas empregadas na incubadora;

b) custo de instalação, assim como despesas com locação e condomínio;

c) número de:

1. interações com universidades e institutos de pesquisa, como convênios,

contratos e laboratórios compartilhados;

2. patentes solicitadas e de patentes concedidas por organismos nacionais e

internacionais;

3. empresas de atuação internacional;

4. tecnologias licenciadas/geradas pela interação universidade-empresa;

5. relacionamentos internacionais estabelecidos;

6. participação em eventos nacionais e internacionais, como feiras,

seminários, encontros e “workshops”;

d) impacto regional

Não há referências nas normas pesquisadas em relação a um possível prazo de validade

do credenciamento das incubadoras, o que pode ensejar a seguinte dúvida: a qualquer

momento, poderá o Poder Público realizar a exclusão de uma incubadora, ainda que não se

verifique qualquer um dos motivos arrolados para dita exclusão?

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150

Além disso, há aspectos pertinentes à avaliação de desempenho que demandam

apreciação conjunta entre as partes, que não deveriam ser apresentados de forma unilateral,

como faz presumir a norma.

10.2.3 Parques tecnológicos

Em consonância com o Estudo de Projetos de Alta Complexidade – Indicadores de

Parques Tecnológicos, de 2013, realizado pela Secretaria de Desenvolvimento Tecnológico e

Inovação do MCTI em parceria com o Centro de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico da

Universidade de Brasília, o conceito de parque tecnológico surgiu nos Estados Unidos, na

década de 1950, em Stanford, Califórnia.431

Para o referido Estudo, parques tecnológicos têm sido considerados importantes

instrumentos para o desenvolvimento de ambientes inovadores. Baseados na interação entre

instituições públicas e privadas, com foco em empresas inovadoras, start-ups de base

tecnológica, centros tecnológicos, institutos de pesquisas e universidades, têm por objetivo

promover uma infraestrutura técnica, logística e administrativa para ajudar empresas a

desenvolver seus produtos, aumentar a competitividade e favorecer a transferência

tecnológica.432

De fato, conforme entendimentos da literatura especializada, parques tecnológicos são

empreendimentos promotores da cultura da inovação e da competitividade, complexos

produtivos industriais e de serviços de base científico-tecnológica, planejados, de caráter

formal, concentrados e cooperativos, que agregam empresas cuja produção se baseia em

pesquisa tecnológica desenvolvida nos centros de P&D vinculados ao parque.433

A importância dos parques tecnológicos é devida ao fato de que, segundo têm

demonstrado diversas pesquisas, tanto nacionais como estrangeiras,434

eles beneficiam não

somente os empreendimentos neles localizados, mas também toda a região e a economia, por

gerarem um ambiente de cooperação entre empresas inovadoras e demais atores do processo

431

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Estudo de projetos de alta complexidade:

indicadores de parques tecnológicos. Brasília: CDT/UnB, 2013. p. 7. 432

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Estudo de projetos de alta complexidade:

indicadores de parques tecnológicos. Brasília: CDT/UnB, 2013. p. 7. 433

Informação constante do site da ANPROTEC. Disponível em: www.anprotec.org.br/site/incubadoras-e-

parques/perguntas-frequentes. Acesso em: 05 nov. 2014. 434

A publicação intitulada Parques Tecnológicos no Brasil: estudo, análise e proposições, elaborada ao longo

dos anos 2007 e 2008, por meio de trabalho conjunto da ANPROTEC e da ABDI demonstrou que a

experiência tem sido bem sucedida em países como Espanha, Finlândia, França, Estados Unidos, Coréia,

Taiwan, entre outros. (AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Parques

tecnológicos no Brasil – estudo, análise e proposições. Brasília: ABDI, 2010. p. 8).

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151

de inovação, oferecerem serviços de alto valor agregado às empresas, facilitarem o fluxo de

conhecimento e tecnologia e possibilitarem a geração de empregos qualificados.435

É sabido que os primeiros incentivos ao desenvolvimento de tais parques no País datam

da década de 1980, com a criação do Programa Brasileiro de Parques Tecnológicos, pelo

Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq. Todavia, é a partir

da Lei Federal nº 10.973/2004 que seu desenvolvimento, no plano nacional, ganha maior

impulso.

Marcos Augusto Perez, lembrando que os parques tecnológicos também constituem

instrumentos de requalificação de ambientes urbanos que deixaram de ter vocação industrial e

precisam buscar alternativas para sua população, esclarece:

Na prática grande parte dos chamados parques tecnológicos constituem-se a

partir de um ou mais edifícios públicos, agregados ou não a áreas públicas

adjacentes, ou ainda a áreas privadas adjacentes, cuja destinação urbana

passa a ter relação com o desenvolvimento de atividades do setor de

tecnologia, os quais são gradativamente ocupados por ICTs, instituições de

apoio, entidades públicas e organizações privadas (com ou sem finalidade

lucrativa), sempre com o intuito de promover o desenvolvimento de pesquisa

e demais atividades ligadas à inovação tecnológica.436

Conforme levantamentos recentemente efetuados, são conhecidas, atualmente, no

Brasil, cerca de 94 iniciativas de parques tecnológicos, em diferentes estágios (fases de

projeto, implantação e operação) e mais de 1.500 iniciativas no mundo.437

Apesar de o assunto estar vinculado à atuação do Estado, seja diretamente, seja por

intermédio de regulação, são escassos os estudos destinados à matéria no âmbito do Direito

Administrativo Brasileiro.

De início, convém observar que, a Lei Federal nº 10.973/2004 e demais leis e decretos

federais não dispõem acerca de uma definição precisa sobre parque tecnológico.

A Portaria nº 251, de 12 de março de 2014 do MCTI estabelece as diretrizes para a

gestão da política de inovação das Unidades de Pesquisa da Pasta, sem, contudo, abordar,

especificamente, o tema dos parques.

No Estado de São Paulo a questão vem sendo tratada em leis e decretos de modo mais

detalhado.

435

Informação constante do site da ANPROTEC. Disponível em: www.anprotec.org.br/site/incubadoras-e-

parques/perguntas-frequentes. Acesso em: 05 nov. 2014. 436

PEREZ, Marcos Augusto. Organizações sociais para a gestão de parques tecnológicos. In: DI PIETRO, Maria

Sylvia Zanella. et al. (Org.). Direito e Administração Pública: estudos em homenagem a Maria Sylvia Zanella

Di Pietro. São Paulo: Atlas, 2013, p. 511-525, p. 511. 437

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Estudo de projetos de alta complexidade:

indicadores de parques tecnológicos. Brasília: CDT/UnB, 2013. p. 9.

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152

A exemplo da Lei nº 10.973/2004, a Lei Complementar Paulista nº 1.049/2008, em seus

artigos 3º, parágrafo único438

e 19,439

dispõe tão somente que os parques tecnológicos são

ambientes de inovação.

Para o artigo 2º do Decreto Estadual nº 60.286/2014 consideram-se parques

tecnológicos os complexos de desenvolvimento econômico e tecnológico, dotados com as

seguintes características:

a) visam fomentar economias baseadas no conhecimento por meio da

integração da pesquisa científica e tecnológica, negócios/empresas e

organizações governamentais em um local físico e do suporte às inter-

relações entre estes grupos;

b) além de prover espaço para negócios baseados em conhecimento, podem:

1. abrigar centros para pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico,

inovação e incubação, treinamento e prospecção;

2. servir de infraestrutura para feiras, exposições e desenvolvimento

mercadológico; e

c) são formalmente ligados a centros de excelência tecnológica,

universidades e/ou centros de pesquisa;

Tal como no caso das incubadoras, interessante questão que se coloca é a de saber se os

parques tecnológicos são dotados, ou não, de personalidade jurídica.

A legislação federal não aborda este assunto tampouco tece detalhamento sobre

qualquer outro ponto da matéria.

O artigo 25 da Lei Complementar Paulista nº 1.049/2008, a exemplo do caso das

incubadoras, faz presumir que os parques poderão possuir personalidade jurídica própria, nos

termos abaixo:

Artigo 25 - O Estado, suas autarquias, fundações e empresas por ele

controladas, direta ou indiretamente, poderão participar do capital social de

sociedade ou associar-se a pessoa jurídica caracterizada como parque

tecnológico, como incubadora de empresas de base tecnológica, e arranjos

produtivos pertencentes ao Sistema Paulista de Parques Tecnológicos, e a

Rede Paulista de Incubadoras de Empresas de Base Tecnológica de que trata

o artigo 24.

Diversamente, o Decreto Estadual nº 60.286/2014, ao fazer menção, simplesmente, à

expressão “complexos”, leva a crer que os parques poderão ser entes despersonalizados.440

438

Artigo 3o - O Estado, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo - FAPESP e suas demais

agências de fomento poderão estimular e apoiar a constituição de alianças estratégicas e o desenvolvimento de

projetos de cooperação envolvendo empresas e ICTESPs voltadas para atividades de pesquisa e

desenvolvimento que objetivem a geração de produtos e processos inovadores.

Parágrafo único - O apoio previsto neste artigo poderá contemplar as redes e os projetos internacionais de

pesquisa tecnológica, bem como ações de empreendedorismo tecnológico e/ou social e de criação de

ambientes de inovação, incluídas as incubadoras e parques tecnológicos. 439

Artigo 19 - O Estado, por meio de seus órgãos da administração pública direta ou indireta, incentivará a

participação de empresas no processo de inovação tecnológica, bem como ações de empreendedorismo

tecnológico e de criação de ambientes de inovação tecnológica e/ou social, inclusive incubadoras e parques

tecnológicos.

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A nosso ver, apesar do quanto disposto no artigo 25 da Lei Complementar Paulista nº

1.049/2008, a maior parte das disposições do Decreto nº 60.286/2014 permite concluir que a

ideia é que os parques não tenham personalidade jurídica.

A questão, no entanto, pode suscitar dúvidas, sendo de todo oportuno lembrar que, no

Brasil, os decretos não podem inovar o ordenamento jurídico.

Ainda acerca da legislação paulista, importa notar, a teor do art. 4º, do Decreto nº

60.286/2014, que o Sistema Paulista de Parques Tecnológicos - SPTec tem os seguintes

objetivos:

I – estimular, no âmbito estadual, o surgimento, o desenvolvimento, a

competitividade e o aumento da produtividade de empresas cujas atividades

estejam fundadas no conhecimento, na tecnologia e na inovação;

II – incentivar a interação entre instituições de pesquisa, universidades e

empresas, capital de oportunidade (“venture capital”) e investidores, com

vista ao desenvolvimento de atividades intensivas em conhecimento e

inovação tecnológica;

III – apoiar as atividades de pesquisa, desenvolvimento e engenharia não

rotineira no âmbito estadual;

IV – propiciar o desenvolvimento do Estado de São Paulo, por meio da

atração de investimentos em atividades intensivas em conhecimento e

inovação tecnológica.

Cabe à Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação,

conforme o art. 6º do Decreto em comento, na qualidade de coordenadora do Sistema Paulista

de Parques Tecnológicos - SPTec, por meio da Subsecretaria de Ciência, Tecnologia e

Inovação: (i) decidir sobre a inclusão de parques tecnológicos no SPTec e respectiva

exclusão; (ii) harmonizar as atividades dos parques tecnológicos integrantes do SPTec com a

política científica, tecnológica e de inovação do Estado de São Paulo; (iii) promover a

cooperação entre os parques tecnológicos paulistas e destes com: a) empresas cujas atividades

estejam baseadas em conhecimento e inovação tecnológica; b) órgãos e entidades da

administração pública direta ou indireta, federal, estadual ou municipal; c) organismos

internacionais, instituições de pesquisa, universidades e instituições de fomento, investimento

e financiamento, nacionais e/ou internacionais; (iv) apoiar o desenvolvimento de projetos de

440

Marcos Augusto Perez, analisando a legislação de inovação dos Estados de São Paulo (Decreto nº

54.196/2009, atualmente revogado) e dos Estados de Minas Gerais e Paraná concluiu: “(1) o primeiro deles é

que muito embora essa legislação tente definir mais precisamente a figura dos parques tecnológicos, essa

definição, ainda que não contraditória com a legislação federal, não apresenta uniformidade, variando de

Estado para Estado da federação; (2) em segundo lugar, apesar da variação referida, a legislação dos diferentes

estados tende em assemelhar os parques tecnológicos tanto com “empreendimentos” ou “complexos” sem

personalidade jurídica, como com entidades personificadas, tais como fundações, autarquias, associações ou

empresas.” (PEREZ, Marcos Augusto. Organizações sociais para a gestão de parques tecnológicos. In: DI

PIETRO, Maria Sylvia Zanella. et al. (Org.). Direito e Administração Pública: estudos em homenagem a

Maria Sylvia Zanella Di Pietro. São Paulo: Atlas, 2013, p. 511-525, p. 515).

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cooperação entre o SPTec e universidades e instituições de pesquisa instaladas no Estado; (v)

zelar pela eficiência dos integrantes do SPTec, mediante articulação e avaliação de suas

atividades e do seu funcionamento, promovendo, inclusive, eventos, missões técnicas

nacionais e internacionais, de seus interesses; (vi) acompanhar o cumprimento de acordos

celebrados pelo Estado com entidades participantes de parques tecnológicos integrantes do

SPTec, zelando para que sejam respeitados os objetivos dos empreendimentos; (vii) criar rede

de disseminação e compartilhamento de informações e gestão do conhecimento entre os

parques tecnológicos, por meio de técnicas e instrumentos de tecnologia da informação; (viii)

participar de redes e associações nacionais e internacionais que congregam parques

tecnológicos; (ix) promover e apoiar eventos e projetos de mídia para promoção e divulgação

do SPTec, das ações e dos seus integrantes; (x) realizar, anualmente, duas reuniões técnicas

do SPTec para se discutir temas pertinentes ao Sistema e troca de experiências entre os

diversos gestores de parques tecnológicos; (xi) elaborar relatório anual de avaliação de

desempenho dos parques tecnológicos integrantes do SPTec.

Vale ressaltar que o Decreto nº 60.286/2014 está voltado, essencialmente, aos requisitos

para os credenciamentos provisório e definitivo dos empreendimentos postulantes a parque

tecnológico, estipulando, ainda, alguns deveres a serem cumpridos por aqueles credenciados

em definitivo.

Segundo o art. 7º, do referido Decreto, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico,

Ciência, Tecnologia e Inovação poderá autorizar o credenciamento provisório, com validade

limitada de até 04 (quatro) anos, no Sistema Paulista de Parques Tecnológicos – SPTec de

empreendimentos que satisfaçam às seguintes exigências:

I - já disponham de um Centro de Inovação Tecnológica integrante da Rede

Paulista de Centros de Inovação Tecnológica - RPCITec, em funcionamento,

e uma incubadora de empresas de base tecnológica credenciada na Rede

Paulista de Incubadoras de Empresas de Base Tecnológica - RPITec, em

funcionamento; e

II - cumpram os seguintes requisitos, de apresentação de:

a) documento comprobatório de bem imóvel a que alude o inciso III, alínea

“a”, do artigo 8º deste decreto, com área medindo no mínimo 200.000m²

(duzentos mil metros quadrados), em terreno singular ou segmentos

contíguos ou suficientemente próximos, destinado à instalação do parque

tecnológico, situado em local cujo uso, segundo a respectiva legislação

municipal, seja compatível com as finalidades do empreendimento;

b) requerimento, pela entidade gestora, do qual conste justificativa do pleito

e caracterização detalhada do empreendimento;

c) documento manifestando apoio à implantação do parque tecnológico

subscrito por empresas locais, bem como por centros de pesquisa e

instituições de ensino e pesquisa com as características a que alude a alínea

“e” do inciso IV do artigo 8º deste decreto;

d) projeto básico do empreendimento, contendo:

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155

1. esboço do projeto urbanístico e arquitetônico;

2. estudos preliminares de viabilidade econômico-financeira, técnico-

científica e de sustentabilidade ambiental.

Em relação ao credenciamento provisório, apesar da objetividade da maior parte de seus

requisitos, parece haver discricionariedade em relação à análise e aceitação de alguns

documentos, tais como os estudos preliminares de viabilidade e a própria justificativa do

pleito.

Outra questão a ser verificada é a pertinente à escolha e atuação da entidade gestora do

empreendimento.441

Segundo o Decreto, para fins do credenciamento provisório, a gestora do

empreendimento poderá ser a Prefeitura do Município em que o parque tecnológico esteja

localizado, podendo, esta, todavia, permanecer nessa função apenas durante o tempo da

vigência do credenciamento provisório.

Caso, entretanto, o Município não tenha interesse em atuar nessa função, e supondo-se

que não exista uma pessoa jurídica constituída especialmente para representar o parque, quem

poderá ou deverá assumir essa responsabilidade? Que requisitos mínimos deverá comprovar?

Como a gestora será selecionada? Por quem será remunerada? A rigor, a legislação estadual

de São Paulo trata dos requisitos a serem exigidos da gestora somente no momento do pedido

de credenciamento definitivo.

Nesses termos, são exigências, conforme o art. 8º, do Decreto nº 60.286/2014, para o

credenciamento definitivo de um parque tecnológico no Sistema Paulista de Parques

Tecnológicos – SPTec,

I – a existência de:

a) pessoa jurídica sem fins lucrativos encarregada da gestão do parque

tecnológico, que será a gestora;

b) um Centro de Inovação Tecnológica, integrante da RPCITec e em

funcionamento, que deverá integrar o parque tecnológico;

441

Convém lembrar, nesse passo, conforme ensinamentos de Marcos Augusto Perez que: “[...] a estruturação

institucional da gestão do parque tecnológico é um dos pontos cruciais para o seu sucesso, uma vez que todo o

seu funcionamento e a harmonia de suas ações dependem diretamente da capacidade de atuação inovadora e

empreendedora desse gestor, por meio de ações que, por exemplo, vão da articulação dos entes

governamentais com as universidades, incubadoras, empresas de base tecnológica e empreendedores à geração

ou exploração de receitas para a sustentabilidade do próprio parque e das pesquisas eventualmente por ele

fomentadas”. O autor entende que uma direção pública, nas lindes exclusivas do regime jurídico

administrativo, seguramente asfixiaria esses parques, impedindo-os de realizar o interesse público. Entende,

por essa razão, que todos os motivos apontam para a delegação da gestão a uma organização social,

possibilitando que a Administração Pública assuma o papel de incentivadora e, ao mesmo tempo, fiscalizadora

da iniciativa privada. A organização social, sem objetivar diretamente ao lucro, teria flexibilidade e

congregaria as diferentes capacidades, especialidades e vocações imprescindíveis para o sucesso do parque.

(PEREZ, Marcos Augusto. Organizações sociais para a gestão de parques tecnológicos. In: DI PIETRO, Maria

Sylvia Zanella. et al. (Org.). Direito e Administração Pública: estudos em homenagem a Maria Sylvia Zanella

Di Pietro. São Paulo: Atlas, 2013, p. 511-525, p. 518-520).

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c) uma incubadora de empresas de base tecnológica, integrante da RPITec e

em funcionamento, que deverá integrar o parque tecnológico;

II - a apresentação:

a) de requerimento, pela entidade gestora, do qual conste justificativa do

pleito e caracterização detalhada do empreendimento;

b) do ato constitutivo da entidade gestora, que demonstre:

1. tratar-se de entidade privada sem fins lucrativos ou de entidade do setor

público da Administração Indireta e Fundacional;

2. ter objetivos compatíveis com os arrolados no artigo 4o deste decreto;

3. existir órgão colegiado superior responsável pela direção técnico-

científica, podendo este contar, sem a eles se limitar, com representantes do

Governo do Estado de São Paulo, do Município onde está instalado o

empreendimento, de instituição de ensino e pesquisa presente no parque

tecnológico e de entidade representativa do setor produtivo;

4. existir órgão técnico com a atribuição de zelar pelo cumprimento do

objeto social da entidade;

5. ter modelo de gestão adequado à realização de seus objetivos;

III – a comprovação de que:

a) a entidade referida no inciso I, alínea “a”, deste artigo, por força de

contrato celebrado com o proprietário do bem imóvel onde será instalado o

parque tecnológico e com as entidades que apoiam sua instalação, é

responsável pela gestão do empreendimento;

b) a gestora possui capacidade técnica e idoneidade financeira para gerir o

parque tecnológico;

IV – a comprovação da viabilidade técnica do empreendimento, mediante a

juntada de:

a) documento comprobatório do bem imóvel a que alude o inciso III, alínea

“a”, deste artigo, com área medindo no mínimo 200.000m² (duzentos mil

metros quadrados), em terreno singular ou segmentos contíguos ou

suficientemente próximos, destinado à instalação do parque tecnológico,

situado em local cujo uso, segundo a respectiva legislação municipal, seja

compatível com as finalidades do empreendimento;

b) projeto urbanístico-imobiliário básico de ocupação da área, devidamente

aprovado pelo órgão colegiado superior da gestora;

c) projeto de ciência, tecnologia e inovação do qual constem:

1. as áreas de atuação inicial;

2. os serviços disponíveis, como laboratórios, consultoria de pesquisadores e

projeto-piloto de pesquisa; e

3. a indicação do instrumento jurídico que garanta a integridade do parque

tecnológico;

d) estudos de viabilidade econômica, financeira e ambiental do

empreendimento, incluindo, se necessário:

1. projetos associados, plano de marketing e atração de empresas;

2. demonstração de recursos próprios ou oriundos de instituições financeiras,

de fomento e/ou de apoio às atividades empresariais;

e) instrumento jurídico que assegure a cooperação técnica entre a gestora,

centros de pesquisa, reconhecidos pela comunidade científica e por órgãos

de fomento, e instituições de ensino e pesquisa credenciadas para ministrar

cursos de pós-graduação em programas conexos às áreas de atuação do

parque tecnológico, com boa avaliação pela Coordenação de

Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES e instaladas no

Município ou na Região de Governo respectiva, nos termos do Decreto no

22.592, de 22 de agosto de 1984, com as alterações subsequentes;

f) legislação municipal de incentivo às entidades que venham a se instalar

nos parques tecnológicos;

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V – a compatibilidade com as políticas definidas pelo Conselho Estadual de

Ciência e Tecnologia – CONCITE.

Ainda em relação à constituição da entidade gestora, a norma deixa dúvidas, por

exemplo: a presença de representantes do Governo do Estado de São Paulo e do Município

onde encontrar-se instalado o empreendimento, no órgão colegiado superior responsável pela

sua direção técnico-científica, será meramente facultativa, podendo ser dispensada, apesar de

o Poder Público, em regra, ser o responsável pelo aporte de grande parte dos recursos

necessários à sua viabilização? Que critérios deverão ser utilizados para aferir as capacidades

técnica e financeira da gestora? Não serão feitas exigências pertinentes às suas regularidades

fiscal e trabalhista, por exemplo? Durante o período de credenciamento provisório, que

poderá se estender por até 04 (quatro) anos, esta responderá por quais obrigações ou

contrapartidas?

Insta sublinhar que, segundo o art. 10, do Decreto, os parques tecnológicos integrantes

do SPTec, tal como as incubadoras credenciadas na RPITec, poderão receber fomento público

mediante a celebração, com a gestora, de convênios e outros instrumentos jurídicos, para o

fim de elaboração do projeto urbanístico-imobiliário básico de ocupação da área; do projeto

de ciência, tecnologia e inovação e dos estudos de viabilidade econômica, financeira e

ambiental do empreendimento; assim como quanto à instalação de núcleos administrativos,

incubadoras e laboratórios.

Após o credenciamento definitivo, poderão ser celebrados convênios visando ao repasse

de recursos públicos para a realização de obras e a aquisição de equipamentos. Supondo-se,

nesta situação, que o parque é um ente despersonalizado e que existe uma pessoa jurídica

encarregada especialmente pela sua gestão, deverão ser os bens adquiridos em nome da

gestora? Aliás, a gestora será remunerada ou de alguma forma ressarcida em função do

desempenho de suas atividades? Por quem? Segundo o Decreto nº 60.286/2004, os convênios

de repasse de recursos deverão conter cláusulas que prevejam que, na hipótese de substituição

da gestora ou do representante do parque, o substituído transferirá a seu substituto, sem

qualquer ônus, os bens móveis adquiridos em decorrência do ajuste e os excedentes

financeiros existentes. Por meio de que instrumento ocorrerá a transferência? A que título?

Haverá incidência de tributação nessas operações?

Quanto à gestão, em si, dos parques após o credenciamento definitivo, o artigo 11 do

Decreto Estadual Paulista, com base no artigo 24,442

da Lei Complementar nº 1.049/2008,

442

“Artigo 24 - O Estado manterá o Sistema Paulista de Parques Tecnológicos, e a Rede Paulista de Incubadoras

de Empresas de Base Tecnológica, como parte de sua estratégia para incentivar os investimentos em inovação

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prevê que estes deverão, anualmente, no mês de abril, apresentar à Secretaria de

Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação relatório para

acompanhamento e avaliação de desempenho do empreendimento, com os seguintes

indicadores:

I - Aspectos Financeiros e Sociais:

a) postos de trabalho gerados, discriminados por tipo de atividade;

b) número de empresas:

1. instaladas, por segmento de atuação;

2. geradas/graduadas, por segmento de atuação;

c) dados econômicos, financeiros e contábeis referentes ao exercício

anterior;

d) recursos públicos e privados aplicados;

II - Aspectos Científicos, Tecnológicos e de Gestão:

a) qualificação da equipe gestora;

b) número de:

1. projetos de P&D/ano com as universidades e os institutos de pesquisas;

2. pesquisadores, por área de conhecimento/competência;

3. artigos científicos publicados;

c) áreas de competência do parque;

d) plano de metas e plano estratégico;

III - Aspectos Competitivos e de Infraestrutura e Sustentabilidade:

a) quantidade de:

1. mão de obra qualificada formada na região;

2. pessoas empregadas no parque;

b) custo de instalação, assim como despesas com locação e condomínio;

c) número de:

1. interações com universidades e institutos de pesquisa, como convênios,

contratos e laboratórios compartilhados;

2. patentes solicitadas e de patentes concedidas por organismos nacionais e

internacionais;

3. empresas de atuação internacional;

4. tecnologias licenciadas/geradas pela interação universidade-empresa;

5. relacionamentos internacionais estabelecidos;

6. participação em eventos nacionais e internacionais, como feiras,

seminários, encontros e “workshops”;

d) impacto regional do empreendimento.

Para o acompanhamento da execução do plano de metas, os parques tecnológicos

integrantes do SPTec deverão apresentar relatórios trimestrais de acompanhamento.

É imprescindível, portanto, que sejam prévia e objetivamente acordadas, pelos

envolvidos, as informações necessárias a tal acompanhamento. Sem a definição de objetivos

tecnológica, pesquisa científica e tecnológica, desenvolvimento tecnológico, engenharia não-rotineira,

informação tecnológica e extensão tecnológica em ambiente produtivo que gerem novos negócios, trabalho e

renda e ampliem a competitividade da economia paulista. Parágrafo único - Para os efeitos deste artigo, a

Secretaria de Desenvolvimento analisará e decidirá sobre a inclusão e a exclusão de empreendimentos no

Sistema Paulista de Parques Tecnológicos do Estado, levando em consideração, além de requisitos

a serem estabelecidos em sua regulamentação, a sua importância para o desenvolvimento tecnológico do

Estado, o seu modelo de gestão e a sua sustentabilidade econômico-financeira”.

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159

estratégicos, metas a serem atingidas, prazos de execução, respectivos indicadores de

desempenho e critérios de avaliação, a gestão será falha.

Não se pode olvidar que as atividades de fomento envolvem contrapartidas dos

particulares, beneficiários que são de uma atuação favorável do Estado. Cabe a estes realizar

investimentos em um montante mínimo e razoável e em locais específicos, tais como a

implantação de uma planta industrial, desenvolver certos tipos de benefícios para a

comunidade, produzir riqueza etc. Nesse sentido, as obrigações assumidas pelos particulares

não constituem uma prestação a ser executada diretamente em favor do Estado.443

Não obstante isso, haja vista que a atuação favorável do Estado apenas acontece com a

finalidade de que objetivos maiores, de interesse público, sejam realizados, o Estado tem o

dever de controlar os resultados efetivos das atividades fomentadas, assim como a realização

da esperada contrapartida por parte do setor privado. Fomento sem contrapartida não é

fomento. Fomento sem verificação da efetiva concretização dos resultados desejados pelo

Estado é ajuda ilegítima.

Cumpre sublinhar, todavia, que para realização do acompanhamento e do controle de

resultados, o Estado tem o dever de manter estrutura operacional e recursos humanos

altamente capacitados. Avaliar projetos de P,D&I e seus impactos não é atividade simples e

corriqueira. Sem a estrutura de apoio adequada, aumentam os riscos de desvio de finalidade e

de não consecução dos objetivos públicos almejados.

Apesar da importância destacada dos mecanismos de gestão dos parques tecnológicos,

conforme dados obtidos pela publicação Parques Tecnológicos no Brasil: estudo, análise e

proposições, da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e da ANPROTEC,

mais de metade dos parques brasileiros não possuía, no período compreendido entre os anos

2007 e 2008, um modelo de gestão claramente definido e consolidado, tanto para a fase de

operação como para a fase de implantação.444

É provável que a situação esteja diretamente relacionada, dentre outros motivos, com o

fator novidade/complexidade que envolve todas essas relações e empreendimentos. Nesse

sentido, a estipulação de critérios gerais de avaliação da sua gestão, ainda que ficassem

sujeitos, posteriormente, a naturais críticas e aperfeiçoamentos, constituiria um avanço.

Compreendemos que as fases de projeto, implantação e operação dos parques

tecnológicos necessitam respeitar as peculiaridades de cada caso concreto. Entendemos as

443

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 10. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2014, p. 722. 444

AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Parques tecnológicos no Brasil –

estudo, análise e proposições. Brasília: ABDI, 2010. p. 9.

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160

preocupações que, face à complexidade do assunto, podem levar a uma deliberada não criação

de normas que possam burocratizar demasiadamente ou mesmo engessar a atuação dos atores

envolvidos, em especial a do administrador público. Apesar disso, acreditamos ser necessária

a fixação, em todos os entes da Federação, pelo legislador, de balizamentos gerais sobre os

pontos principais de cada uma dessas fases.

Embora seja preciso assegurar que o administrador público exerça a discricionariedade,

até mesmo porque a lei não pode prever tudo, é sabido que este, em casos de ausência de

parâmetros claros e suficientes para a sua atuação, prefere, muitas vezes, simplesmente não

agir e, dessa forma, não correr riscos e não se expor perante os órgãos de controle, interno,

externo e jurisdicional. O problema é que o ato de deixar de agir pode ser bastante prejudicial

ao próprio interesse público.

No mesmo sentido, mostra-se essencial o estabelecimento e a divulgação não somente

dos critérios de inclusão, permanência e exclusão dos parques tecnológicos em seus

respectivos sistemas regionais, mas principalmente, a fixação e divulgação das diretrizes e

critérios de seleção e exclusão dos órgãos e entidades, públicos e privados, que neles poderão

encontrar abrigo.

A título exemplificativo, cumpre mencionar que o Decreto Estadual nº 60.286/2014,

como já dito, trata do credenciamento de parques tecnológicos no SPTec, nada dispondo sobre

uma outra questão do mesmo modo relevante, não prevista em lei alguma, que são os critérios

de seleção, pela gestora do empreendimento, dos entes que poderão vir a integrá-lo.

É certo que determinados critérios de seleção deverão ser adotados, até mesmo porque

não se mostra fisicamente possível instalar nos espaços físicos destinados aos parques um

número ilimitado de pessoas.

Atualmente, a questão não está disciplinada nem em lei, nem em decretos – essa

situação tanto pode resultar na não atuação do agente público como pode gerar uma atuação

sem a observância dos princípios de direito público que o exercício da função promocional

pública requer.

Se os parques devem abrigar os mais diversos tipos de atores relacionados ao processo

de inovação, sejam eles públicos ou privados, é natural pensar que estes necessitarão tomar

conhecimento de todas as condições e oportunidades referentes à sua instalação no

empreendimento, tais como: que exigências deverão atender para serem aceitos? Por quanto

tempo poderão ficar instalados? Que despesas assumirão a título da ocupação e uso do espaço

físico? Quais serão os direitos e obrigações da gestora e de todos os integrantes do

empreendimento? Não se pode desprezar o fato de que a instalação de laboratórios e centros

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161

de pesquisa, não raras vezes, envolve a instalação de infraestrutura sofisticada e cara,

destinada, muitas vezes, à execução de projetos de longa duração. Sem transparência e

segurança em relação a direitos e obrigações a serem assumidos, poderá haver dificuldade em

atrair os investimentos (em especial os privados) tão desejados.

Por outro lado, não seria demais destacar que a participação, per se, de uma entidade

num parque tecnológico pode lhe conferir diversos benefícios além daqueles já elencados,

inclusive, a possibilidade de utilização de incentivos fiscais.

No Estado de São Paulo, por exemplo, o art. 1º, do Decreto nº 53.826/2008, que

instituiu incentivos às empresas instaladas no âmbito dos parques tecnológicos integrantes do

Sistema Paulista de Parques Tecnológicos, atualizado pelo Decreto nº 60.570, de 24 de junho

de 2014, dispõe sobre a utilização de crédito acumulado de ICMS, ampliando suas hipóteses:

Artigo 1º - As empresas integrantes de parques tecnológicos que compõem o

Sistema Paulista de Parques Tecnológicos, a serem relacionadas por

resolução conjunta dos Secretários de Estado da Fazenda, de Planejamento e

Desenvolvimento Regional e de Desenvolvimento Econômico, Ciência e

Tecnologia poderão utilizar o crédito acumulado do ICMS apropriado até 31

de dezembro de 2015, ou passível de apropriação, para:

I - pagamento de bens e mercadorias adquiridos, inclusive energia elétrica, a

serem utilizados na realização do projeto de investimento neste Estado em

um dos parques tecnológicos integrante do Sistema Paulista de Parques

Tecnológicos, exceto material destinado a uso ou consumo;

II - pagamento do ICMS relativo à importação de bens destinados ao seu

ativo imobilizado, desde que o desembarque e o desembaraço aduaneiro

sejam efetuados neste Estado em um dos parques tecnológicos integrante do

Sistema Paulista de Parques Tecnológicos;

Por seu turno, o art. 32, do Decreto Estadual nº 60.286/2014 informa:

As empresas integrantes de parques tecnológicos que compõem o Sistema

Paulista de Parques Tecnológicos - SPTec, a serem relacionadas por

resolução conjunta dos Secretários da Fazenda, de Planejamento e

Desenvolvimento Regional e de Desenvolvimento Econômico, Ciência,

Tecnologia e Inovação, poderão utilizar o crédito acumulado do ICMS de

que trata o Decreto nº 53.826, de 16 de dezembro de 2008, e alterações

posteriores, somente após o credenciamento definitivo do parque tecnológico

junto ao SPTec 445

445

As empresas enquadradas em outros programas de incentivos, tais como o Pró Informa (Decreto nº

54.904/2009) e o Pró Veículo (Decreto nº 53.051/2008) também gozam dos mesmos incentivos. Importa

observar que a Lei Complementar Paulista nº 1.049/2008, diferentemente da Lei Federal nº 10.973/2004, não

dispõe sobre a concessão de incentivos fiscais com vistas à consecução dos objetivos nela estabelecidos

(segundo o art. 28, da Lei federal citada: “A união fomentará a inovação na empresa mediante a concessão de

incentivos fiscais com vistas a consecução dos objetivos estabelecidos nesta lei”) Vale notar, ademais, que, no

plano federal, a Lei nº 11.196/2005, conhecida como Lei do Bem, dentre outros assuntos, estabelece incentivos

fiscais para a inovação tecnológica. Não há, em São Paulo, lei similar. Em estudo sobre a concessão de

incentivos públicos a empresas privadas e guerra fiscal, Odair Tramontin sustenta que os incentivos a

empresas privadas somente podem ser concedidos para atingir três objetivos: a) desenvolvimento nacional; b)

desenvolvimento regional; c) desenvolvimento setorial. Aduz, ainda, que a concessão de incentivos a empresas

privadas necessita estar autorizada por meio de lei, que estabeleça os requisitos mínimos para a prática do ato

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A Resolução Conjunta SD/SEP/SF-3, de 16/01/2009, em São Paulo, estabelece os

critérios de enquadramento de empresas para fruição dos incentivos instituídos pelo Decreto

Estadual nº 53.826/2008.

De acordo com a referida norma:

Artigo 1º- Os incentivos instituídos pelo Decreto nº 53.826, de 16 de

dezembro de 2008, poderão ser fruídos pelas empresas integrantes dos

parques tecnológicos que compõem o Sistema Paulista de Parques

Tecnológicos que se enquadrem nas seguintes classificações:

I – instituições de apoio:

a) unidades de ensino e pesquisa das Instituições Científicas e

Tecnológicas do Estado de São Paulo – ICTESPs ou de outras instituições

similares privadas ou públicas, nacionais ou estrangeiras, bem como

escritórios ou sedes de seus Núcleos de InovaçãoTecnológica – NITs ou de

suas Agências de Inovação, ou ainda, qualquer outro órgão de intercâmbio

com o setor produtivo dessas instituições;

b) laboratórios de ensaios, públicos ou privados, que atendam

principalmente às necessidades das empresas instaladas no parque;

c) organizações certificadores credenciadas e laboratórios credenciados

para certificação de produtos e processos.

II- empresas de base tecnológica

a) empresas instaladas nas incubadoras e pós-incubadoras dos parques;

b) centros de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação, laboratórios de

desenvolvimento ou escritórios de intercâmbio com instituições de ensino e

pesquisa de empresas;

c) empresas graduadas nas incubadoras e pós-incubadora sediadas nos

parques ou integrantes da Rede Paulista de Incubadoras de Empresas de

Base Tecnológica, que ainda mantenham atividades de desenvolvimento ou

engenharia não-rotineira;

d) micro e pequenas empresa (sic) que mantêm convênios de Pesquisa,

Desenvolvimento e Inovação – PD&I com instituições de pesquisa instaladas

ou conveniadas com os parques do Sistema.

administrativo. Nesse particular, explica que não é condição indispensável a confecção de uma lei para cada

caso específico, bastando que o ato administrativo da concessão seja feito com base em requisitos específicos

estabelecidos numa lei de caráter geral emanada do poder competente. Destaca, outrossim, que a Lei

Complementar nº 101/2000 também estabeleceu regras que repercutem nas ações administrativas voltadas à

concessão de incentivos públicos a empresas privadas como estratégia de desenvolvimento econômico

(TRAMONTIN, Odair. Incentivos públicos a empresas privadas & guerra fiscal. Curitiba, Juruá, 2002, p. 116,

121 e 145). De fato, nos termos do artigo 14, da Lei Complementar nº 101/2000, “Art. 14. A concessão ou

ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar

acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência

e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes

condições: I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei

orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo

próprio da lei de diretrizes orçamentárias; II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período

mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da

base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição”. Ainda, consoante o §1º, do mesmo artigo,

“A renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não

geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos

ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.” Uma vez que as

disposições do Decreto nº 53.826/2008 ampliam as hipóteses de utilização de crédito de ICMS acumulado,

parece-nos que constituem benefícios correspondentes a tratamento diferenciado.

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163

A terminologia da Resolução não é precisa. Embora haja menção expressa ao termo

“empresas”, a rigor, as prescrições da norma comportam entidades constituídas sob outras

formas e não somente as empresas. Não há qualquer tipo de definição acerca de exigências ou

requisitos a serem cumpridos por essas entidades.

A verdade é que, em São Paulo, ainda existem muitas dúvidas relacionadas ao trato da

matéria. Por exemplo, o credenciamento definitivo dos parques tecnológicos também exige a

comprovação de compatibilidade do empreendimento com as políticas definidas pelo

Conselho Estadual de Ciência e Tecnologia (CONCITE).

Apesar de reorganizado recentemente, nos termos do Decreto Estadual nº 59.977/2013,

a atuação do CONCITE está prevista na Constituição Paulista de 1989. Quais políticas têm

sido definidas por esse órgão?

A corroborar a necessidade de regras mais transparentes, de modo geral, sobre o tema,

cumpre notar que, no item “Desafios para os parques tecnológicos no Brasil”, o próprio

Relatório Parques Tecnológicos no Brasil: estudo, análise e proposições, registra:

Há necessidade de aporte de recursos financeiros significativos

governamentais para “fazer a diferença” no mercado global e, ao mesmo

tempo, de regras claras, com segurança jurídica, para a atração intensiva de

capital privado446

Vale dizer – o estabelecimento claro e objetivo das regras do jogo, além de

imprescindível para os fins de atuação isonômica e de controle da atuação pública, mostra-se

igualmente relevante para que a iniciativa privada avalie as reais possibilidades (incluindo as

técnicas, evidentemente) e limitações, vantagens e desvantagens, riscos e oportunidades de

virem a fazer parte de iniciativas como os chamados parques tecnológicos.

Dados do Estudo de Projetos de Alta Complexidade – Indicadores de Parques

Tecnológicos sugerem que o fortalecimento dos parques envolve, primordialmente, um apoio

financeiro e institucional dos setores públicos, especialmente em suas fases iniciais. Somente

após a efetiva operação é que as empresas privadas costumam aportar recursos mais

substanciais nesses ambientes de inovação.447

446

AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Parques tecnológicos no Brasil –

estudo, análise e proposições. Brasília: ABDI, 2010. 447

Segundo esse Estudo, os parques em projeto recebem proporcionalmente menos recursos, em todas as fontes

de financiamento. No entanto, o governo federal possui a maior parcela de investimento (R$ 18,2 milhões -

54%) em parques no estágio de projeto, superando os governos estaduais e municipais (R$ 11,5 milhões -

34%) e a iniciativa privada (R$ 3,8 milhões - 12%). Dessa forma, dadas as maiores incertezas de parques nessa

etapa de desenvolvimento, o apoio do governo federal tem se mostrado imprescindível para que as iniciativas

possam avançar. Parques em implantação obtêm um volume maior de recursos dos governos estaduais e

municipais (R$ 1,8 bilhões – 92%), seguido por investimentos federais (R$ 133,0 milhões – 7%) e por

investimentos privados (R$ 15,7 milhões – 1%). Parques em operação têm como fonte principal de recursos

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Se o aporte de recursos públicos tem sido considerado fundamental à viabilização

desses empreendimentos, é evidente que, nesse contexto, os princípios do regime jurídico

administrativo devem conduzir inclusive as ações dos responsáveis pela sua gestão, desde a

sua fase de projeto até a sua fase de operação.

Não se pode olvidar que, conforme o art. 70 da Constituição Federal, com a redação

dada pela Emenda Constitucional nº 19/1998, a fiscalização contábil, financeira,

orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e

indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e

renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e

pelo sistema de controle interno de cada Poder, devendo prestar contas qualquer pessoa física

ou jurídica, pública ou privada, que utilize, arrecade, guarde, gerencie ou administre

dinheiros, bens e valores públicos ou pelos quais a União responda, ou que, em nome desta,

assuma obrigações de natureza pecuniária.

10.2.4 Fundações de apoio

Segundo o artigo 3º-A, da Lei Federal nº 10.973/2004:

Art. 3

o-A. A Financiadora de Estudos e Projetos - FINEP, como secretaria

executiva do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

- FNDCT, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico - CNPq e as Agências Financeiras Oficiais de Fomento poderão

celebrar convênios e contratos, nos termos do inciso XIII do art. 24 da Lei

no 8.666, de 21 de junho de 1993, por prazo determinado, com as fundações

de apoio, com a finalidade de dar apoio às IFES e demais ICTs, inclusive na

gestão administrativa e financeira dos projetos mencionados no caput do art.

1o da Lei no 8.958, de 20 de dezembro de 1994, com a anuência expressa

das instituições apoiadas. (Redação dada pela Lei nº 12.349, de 2010)

Ensina Dinorá Adelaide Musettti Grotti que as fundações de apoio são:

entes dotados de personalidade jurídica de direito privado, sem fins

lucrativos, instituídas nos moldes do Código Civil, exercendo atividades de

interesse público, tendo entre os seus objetivos o de colaborar e dar apoio a

determinadas instituições. Não integram a Administração indireta nem a

investimentos advindos da iniciativa privada (cerca R$ 2,1 bilhões – 55%). Os recursos do governo federal (R$

1,1 bilhões – 29%) e dos governos estaduais e municipais (R$ 612,6 milhões – 16%) ainda são relevantes para

os parques em operação, porém a iniciativa privada passa a ter grande participação no desenvolvimento dos

mesmos. Os investimentos privados estão concentrados em alguns parques de maior escala, mais consolidados

e com poder de atração de empresas multinacionais. No entanto, os dados sugerem que o fortalecimento dos

parques envolve, primordialmente, um apoio financeiro e institucional dos setores públicos para que,

posteriormente, as empresas privadas possam ter maior segurança e aportar recursos mais substanciais nesses

ambientes de inovação e de desenvolvimento tecnológico (MINISTÉRIO DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E

INOVAÇÃO. Estudo de projetos de alta complexidade: indicadores de parques tecnológicos. Brasília:

CDT/UnB, 2013. p. 20).

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estrutura das universidades ou faculdades a que prestam apoio; de regra,

mantém convênios, ajustes e contratos com as universidades ou faculdades,

sem prejuízo de atividades ou serviços que possam prestar a particulares.448

Alertando sobre a utilização indevida de parcerias com o setor privado como forma de

fugir ao regime jurídico publicístico, Maria Sylvia Zanella Di Pietro pondera:

A grande dificuldade no exame das entidades de apoio está no propagado

(mas ainda não comprovado) fato de que elas produzem bons resultados para

as entidades públicas junto às quais atuam; por outras palavras, a alegação é

a da EFICIÊNCIA. Talvez por isso se fechem muitas vezes os olhos para a

irregularidade de sua situação, que se pode chamar, no mínimo, de

esdrúxula. Do ponto de vista jurídico, é difícil enquadrar o tipo de

relacionamento entre a fundação de apoio e a entidade pública beneficiária,

provavelmente porque não se encaixa nas fórmulas conhecidas e

disciplinadas pelo Direito.449

Di Pietro ressalta, ainda, que embora haja diferenças entre as fundações de apoio, elas

costumam seguir o seguinte padrão: (i) a cooperação com a Administração ocorre mediante

convênios, sendo que as atividades das convenentes praticamente se confundem; (ii) o ente de

apoio exerce atividades próprias da entidade apoiada, as quais são incluídas entre os seus

objetivos institucionais em seu estatuto social; (iii) a sede das convenentes muitas vezes se

confundem; o ente de apoio nem sempre tem sede própria; (iv) o ente de apoio assume a

gestão de recursos públicos próprios da entidade apoiada; (v) parte dos empregados da

entidade de apoio são servidores dos quadros da entidade apoiada; (vi) o local da prestação de

serviços é, em regra, o mesmo; (vii) os entes de apoio mantêm-se em função do convênio com

a Administração, não dispondo de outras fontes de recurso, sendo seu patrimônio insuficiente

para alcançar os fins a que se propõe.450

Outra característica que, em regra, se verifica nas fundações de apoio é a presença, nos

seus órgãos de direção superior, de membros dos órgãos superiores das entidades apoiadas.

Há alguns anos, os jornais brasileiros veiculam notícias atinentes ao assunto, referentes

a burlas e malversação de recursos públicos por essas entidades.451

448

GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. Parcerias na administração pública. In: CARDOZO, José Eduardo

Martins; QUEIROZ, João Eduardo Lopes; SANTOS, Márcia Walquiria Batista dos. (Coord.). Direito

administrativo econômico. São Paulo: Atlas, 2011, p. 413-476, p. 462. 449

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,

terceirização, parceria público-privada e outras formas. 9 ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 291. 450

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,

terceirização, parceria público-privada e outras formas. 9 ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 292. 451

“SUCESSIVOS impasses em tentativas de reformar o regime das universidades públicas no Brasil

estimularam soluções improvisadas para os problemas, especialmente de gestão, que surgiam. O acúmulo

desses reparos parciais resultou num sistema ainda mais heterogêneo, além de ter produzido várias distorções

novas. Para contornar dificuldades advindas do orçamento engessado pela crescente despesa com pessoal, da

instabilidade no fluxo de verbas e dos entraves burocrático para a realização de despesas, muitas universidades

constituíram fundações de apoio. Esses órgãos, em geral, possuem mais agilidade e flexibilidade para coletar

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166

De fato, em razão do mau uso das fundações de apoio, o Tribunal de Contas da União

realizou determinações ao MEC a fim de corrigir as irregularidades identificadas na sua

relação com as Instituições Federais de Ensino Superior (IFEs).

No Acórdão do TCU de nº 2.731/2008 exigiu-se a instituição de ato normativo

regulamentando o relacionamento entre tais entidades, referentes a procedimentos de

contratação de projetos, registros de propostas, elaboração de planos de trabalho, prestação de

contas, restrições quanto à subcontratação e quanto à terceirização etc.

Mais recentemente, o Acórdão nº 2.035/2010, que modificou a redação do Acórdão nº

1.255/2010, pertinente à tomada de contas do exercício de 2007 do Museu Paraense Emílio

Goeldi (MPEG), órgão integrante da Administração Direta, vinculado ao então MCT

(atualmente, MCTI), traçou a seguinte diretriz sobre a matéria:

Acórdão

[...]

9.1. conhecer dos presentes embargos, com fundamento no art. 34 da Lei

8.443/1992, para, no mérito, dar-lhe provimento parcial, conferindo ao item

9.7 do Acórdão 1.255/2010 - 2ª Câmara a seguinte redação:

"9.7. determinar ao Ministério da Ciência e Tecnologia que:

9.7.1. oriente as agências de fomento a não efetuarem repasses de recursos

financeiros, com objetivos de desenvolvimento de projetos de cooperação

que visem à geração de produtos e processos inovadores, diretamente às

fundações de apoio das Instituições Científicas e Tecnológicas (ICT), se

destinados a projetos abrangidos pela Lei 10.973/2004, hipótese em que tais

recursos devem ser repassados diretamente às ICT, fixando-lhe, para tanto, o

prazo excepcional de 360 (trezentos e sessenta dias) para o cumprimento

desta determinação;

O Relatório do processo em questão apontou a seguinte irregularidade, dentre outras:

A.3. Ocorrência: Recursos financeiros decorrentes de convênios pactuados

com outros órgãos/entidades repassados diretamente pelos concedentes à

recursos e realizar desembolsos. As fundações, na maioria dos casos, também serviram como uma fonte de

complementação salarial de professores e pesquisadores. Acumularam, entretanto, uma série de problemas,

quase todos oriundos da falta de controle sobre sua operação. Escândalos relacionados ao abuso das fundações

ocorridos no ano passado -que acabaram na renúncia de pelo menos dois reitores de universidades federais-

estimularam o Tribunal de Contas da União a realizar uma ampla auditoria em fundações de apoio. Uma série

de irregularidades foi apontada, da falta de prestação de contas a dispensas de licitação. O tribunal determinou

ao Ministério da Educação que, até o final de maio, estabeleça normas que disciplinem o funcionamento das

fundações e corrijam as distorções detectadas. A admoestação é positiva e tem o mérito de tirar da inércia um

tema que há anos requer solução. O que se espera é que o MEC aproveite a oportunidade para modernizar esse

importante flanco de gestão das universidades. [...] É o caso do apoio à pesquisa, setor em que repasses a

fundações também foram questionados pelo TCU. Há critérios consagrados de distribuição de verbas para essa

finalidade que prescindem dos controles burocráticos tradicionais. Trata-se do financiamento com base no

mérito de projetos e programas apresentados - não importa se por um instituto, um pesquisador isolado, uma

fundação -, que pode ser controlado por comissões acadêmicas independentes. Esse é apenas um exemplo de

controle que não compromete a agilidade e a flexibilidade da gestão de recursos na área acadêmica. Mas é

preciso dar passos adicionais e normatizar de vez as regras para o recebimento de fundos não-estatais pelas

universidades públicas. O Brasil ainda engatinha e improvisa nessa área, fundamental para o avanço do ensino

superior e da ciência no país”. FUNDOS universitários. Folha de São Paulo, São Paulo, p. A2, 12 jan. 2009.

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Fundação de Amparo e Desenvolvimento da Pesquisa - Fadesp e à Fundação

Instituto para o Desenvolvimento da Amazônia - Fidesa, apesar de o órgão

(Museu Paraense Emílio Goeldi - MPEG) ser o executor dos objetos

conveniados, participar com contrapartidas e ser o beneficiário final (Equipe

Técnica Científica), inclusive com incorporação dos bens decorrentes,

contrariando os dispositivos previstos na Lei 8.958/94, no art. 1º do Decreto

5.205/04 e no art. 18, incs. I, II e III da IN/STN 01/97.

Dentre os argumentos apresentados em sua defesa, os responsáveis do MPEG

sustentaram que a Lei Federal nº 10.973/04 veio a estimular e apoiar a constituição de

alianças estratégicas e o desenvolvimento de projetos de cooperação envolvendo empresas

nacionais, ICTs e organizações de direito privado sem fins lucrativos. Argumentaram ser

facultado às ICTs celebrar acordos de parcerias com instituições de apoio, criadas sob o

amparo da Lei 8.958/94, para realização de atividades conjuntas de pesquisa científica e

tecnológica e desenvolvimento de tecnologia, produto ou processo, tal como estabelece o art.

9º da Lei 10.973/04.

O Tribunal reconheceu que a relação entre as partes envolvidas (ICT/MPGE - agência

de fomento - fundação de apoio) estava devidamente caracterizada, não havendo, em

princípio, irregularidade na formulação das parcerias realizadas. Entendeu, todavia, que estas

deixaram de observar a legislação referente à execução de convênios, em especial, a Instrução

Normativa 01/97, da Secretaria do Tesouro Nacional (IN STN 01/97), que definia, àquele

tempo, com clareza, as partes da relação convenial.

Segundo o Tribunal, o que se observou nas avenças em questão foi o MPEG assumindo

as funções de convenente e executor dos convênios firmados com as agências de fomento, ao

passo que as fundações de apoio (Fadesp e Fidesa), às quais caberia o papel de executor dos

objetos avençados, receberam diretamente os recursos repassados pelas agências de fomento,

limitando-se, tão-somente, a executar a gestão financeira desses recursos.

Tal procedimento contrariou deliberações da Corte de Contas, tais como as dos

Acórdãos 733/2000 - 2ª Câmara, 456/2006 - 2ª Câmara e 1.973/2008 - 1ª Câmara,

relacionadas à necessidade de definição precisa e clara dos objetos a serem

conveniados/contratados com as fundações de apoio e de conexão com atividades de ensino,

pesquisa, extensão ou desenvolvimento institucional, em projetos com prazo determinado e

com produtos resultantes bem definidos.

Apesar de as decisões supra mencionadas terem sido proferidas em processos em que se

analisavam as relações entre as IFES e suas respectivas fundações de apoio, com base na Lei

8.958/94, tais entendimentos, segundo o Tribunal, seriam inteiramente aplicáveis aos projetos

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168

celebrados com fulcro na Lei nº 10.973/04, haja vista a aplicabilidade das disposições da Lei

8.958/94 também às ICTs, nos termos do caput de seu art. 1º:

Art. 1º As instituições federais de ensino superior e de pesquisa científica e

tecnológica poderão contratar, nos termos do inciso XIII do art. 24 da Lei

8.666, de 21 de junho de 1993, e por prazo determinado, instituições criadas

com a finalidade de dar apoio a projetos de pesquisa, ensino e extensão e de

desenvolvimento institucional, científico e tecnológico de interesse das

instituições federais contratantes.

Entendeu-se que, apesar de não haver uma jurisprudência formada no âmbito do

Tribunal acerca das relações entre as agências de fomento, as ICTs e as fundações de apoio,

efetuadas com base na Lei nº 10.973/04, as decisões podiam ser aplicadas por analogia ao

caso concreto, caracterizando-se, pois, como ato de gestão irregular a celebração de parcerias

com fundações de apoio para que estas apenas efetuassem a execução financeira das

atividades desenvolvidas pelo MPEG.

Propôs-se, no Relatório, a rejeição da defesa apresentada e a expedição de determinação

corretiva com o intuito de prevenir ocorrências semelhantes, nos moldes da determinação

exarada mediante o item 9.4.1 do Acórdão 2.731/2008 - Plenário, destinada ao MCT.

No caso a que se refere o Acórdão nº 1.255/2010 também foi apontada a seguinte

ocorrência:

A.4. Ocorrência: Incompatibilidade na contratação da Fundação de Amparo

e Desenvolvimento da Pesquisa - Fadesp e da Fundação Instituto para o

Desenvolvimento da Amazônia - Fidesa, por meio de processos de dispensa

de licitação, para apenas prestação de serviços de execução financeira de

gestão de projetos de responsabilidade do próprio Museu Paraense Emílio

Goeldi - MPEG, contrariando os dispositivos do art. 1º da Lei 8.958/94, art.

1º, § 1º, do Decreto 5.205/04 e item 8.1.1 da Decisão 1.646/2002 - Plenário,

uma vez que os recursos, no exercício de 2007 (R$ 1.032.649,00) foram

utilizados para o pagamento de pessoal, diárias e passagens para servidores e

colaboradores do MPEG e aquisições de materiais de consumo.

Nesse particular, o Tribunal entendeu que, em princípio, não haveria qualquer

irregularidade nas contratações questionadas, uma vez que amparadas pela Lei nº 8.958/1994.

Todavia, sustentou que a participação das referidas fundações nessas avenças devia estar

relacionada ao desenvolvimento de atividades de ensino, pesquisa, extensão ou de

desenvolvimento institucional, científico e tecnológico e não à mera execução da gestão

financeira dos recursos envolvidos nos projetos, tal como ocorrido.

As contratações foram consideradas irregulares por idênticos motivos aos consignados

na Decisão 1.646/2002 - Plenário, assim como em outros Acórdãos, fato que, segundo foi

proposto no Relatório, devia resultar na reprovação das contas em análise.

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169

[...] os mencionados contratos violam a exigência licitatória (art. 2º da Lei

8.666/93, sem ocorrência da hipótese do art. 1º da Lei 8.958/94), quebram o

princípio de unidade de tesouraria (arts. 56 e 65 da Lei 4.320/64 e do art. 1º

do Decreto 93.872/86) e transferem à Fundação de Apoio atos de

competência exclusiva da Universidade (Decisão 293/95, Ata 28/95 -

Plenário)

Em seu voto, todavia, o Relator, deixou de acolher a proposta de irregularidade das

contas.

Considerando que a gestão analisada remontava ao período inicial de implementação

das determinações do TCU quanto aos problemas de relacionamento entre as IFEs e ICTs

com as fundações de apoio, e tendo em vista que não existia notícia de que os contratos

analisados tivessem causado dano ao erário, posicionou-se, referido Relator, pela prolação de

determinação específica à entidade visando à coibição da continuidade da prática considerada

irregular.

Fica explicada, assim sendo, a determinação contida no item 9.7 do Acórdão nº

2.035/2010.

Daí porque, segundo Denis Borges Barbosa, o art. 3º-A da Lei Federal nº 10.973/2004,

com redação dada pela Lei nº 12.349/2010, teve como propósito facultar o repasse de recursos

para “dar apoio” às ICTs e IFES, superando a objeção expressa pelo Acórdão 2.035/2010 do

TCU.452

Verificada a exposição de motivos da Medida Provisória nº 495/2010, a E.M.I. n° 04/

MP/MF/MEC/MCT, posteriormente convertida na Lei Federal nº 12.349/2010, não se

constata justificativa alguma ou menção em particular pertinente aos problemas apontados

pelo TCU no Acórdão nº 2.035/2010.453

O fato é que as alterações legislativas posteriores a

452

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 55. 453

Nesse particular, segundo a Exposição de Motivos: “24. No tocante às modificações nas Leis nos

8.958, de

1994, 10.973, de 2004, e 11.273, de 2006, as propostas têm por contexto o movimento de aperfeiçoamento das

capacidades de gestão e planejamento das Instituições Federais de Ensino Superior – IFES, chamado Agenda

da Autonomia e estruturado pelos Ministérios da Educação e da Ciência e Tecnologia e por outros

colaboradores, dentre ministérios e agências de fomento. O encadeamento das medidas apresentadas, e a

ameaça concreta de interrupção das atividades de pesquisa e inovação levadas a cabo pela rede de Instituições

Federais de Educação Superior e de inovação e pesquisa científica e tecnológica, que, diretamente ou através

de parcerias com empresas inovadoras, responde por parte significativa da produção científica e tecnológica do

país, caracterizam a urgência e relevância do tema. 25. Com efeito, a proposta encaminhada promove

adequações no marco normativo sob o qual as Instituições Federais de Educação Superior e as Instituições

Científicas e Tecnológicas operam contratos e convênios com a colaboração das fundações de apoio

credenciadas sob o regime ditado pela Lei nº 8.958, de 1994, em projetos de suporte às atividades finalísticas

de ensino, pesquisa e extensão, através do conceito de desenvolvimento institucional. Tal conceito passa a ter

sua definição e limites esclarecidos normativamente, relacionando critérios de melhorias mensuráveis das

condições dessas instituições, inclusão da Financiadora de Estudos e Projetos e das agências oficiais de

fomento no rol das colaboradoras. Concede-se, assim, segurança jurídica a essas parcerias ora consolidadas,

para o que também converge a delimitação das iniciativas com melhorias infra-estruturais, condicionadas a

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170

esse Acórdão vieram a permitir, de forma literal, a gestão administrativa e financeira, pelas

fundações de apoio, de projetos contratados com IFEs e ICTs.

Por fim, cabe referir ainda uma outra importante questão.

Mencionando a aplicabilidade da Lei nº 8.958/1994 apenas à esfera federal, Maria

Sylvia Zanella Di Pietro adverte que:

Seria de todo conveniente que Estados, Distrito Federal e Municípios

regulamentassem os vínculos com as fundações de apoio, na esteira do que

foi feito na esfera federal. Essa disciplina legal da matéria é necessária para

melhor proteger o patrimônio público que elas administram.

Seria necessário que o legislador estabelecesse um mínimo de normas sobre

tais entidades, não para igualá-las às entidades da Administração Pública,

mas para submetê-las a regime jurídico semelhante aos dos serviços sociais

autônomos. Poderiam sujeitar-se ao direito privado, porém parcialmente

derrogado por normas de direito público, com o objetivo de melhor proteger

o patrimônio público que elas administram. Bastaria que a referida Lei nº

8.958/94 tivesse alcance mais amplo, de modo a abranger todas as entidades

de apoio.454

Com efeito, no plano federal, o relacionamento entre IFEs, ICTs e fundações de apoio

encontra-se disciplinado pela Lei nº 8.958/1994, com redação alterada pelas Leis nºs

12.349/2010 e 12.863/2013, regulamentada pelos Decretos nºs 7.423/2010; 8.240/2014 e

8.241/2014.

No Estado de São Paulo, a Lei Complementar nº 1.049/2008, diferentemente da Lei

Federal nº 10.973/2004, não faz referência às fundações de apoio.

Apesar da existência de diversas fundações de apoio paulistas (tais como a Fundação

Universitária para o Vestibular – FUVEST; a Fundação Instituto de Administração – FIA e a

Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas – FIPE, a Fundação de Apoio à Tecnologia –

FAT; a Fundação de Apoio à Universidade de São Paulo – FUSP e a Fundação de Apoio ao

Instituto de Pesquisas Tecnológicas – FIPT) ainda não existe uma lei paulista sobre o assunto.

Cremos que o estabelecimento de lei prevendo ao menos as diretrizes e princípios

aplicáveis à atuação das fundações de apoio também nos planos estaduais contribuiria

projetos especificamente relacionados às atividades de inovação e pesquisa científica e tecnológica, que

também integra a proposta. 26. As alterações na Lei nº 10.973, de 2004, a Lei de Inovação, harmonizam

dispositivos com os demais diplomas voltados ao tratamento do tema. Insere o conceito "inovação" nas

categorias de atuação das instituições científicas e tecnológicas e nas instituições de apoio, no que se alinha ao

processo de modernização corrente das relações das IFES e ICTs com colaboradores externos. (Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Exm/EMI-104-MP-MF-MEC-MCT-MPV-495-

10.htm. Acesso em: 05 nov. 2014). 454

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,

terceirização, parceria público-privada e outras formas. 9 ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 298.

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171

sobremaneira à segurança dos atores envolvidos nos processos de contratação por elas

operados e à preservação do interesse público.455

As disposições previstas na legislação federal procuram moralizar456

os relacionamentos

e interações que, durante anos, foram conduzidos sem maiores formalidades e rigores, muitas

vezes de maneira improvisada, sem observância dos princípios do regime jurídico

administrativo.

Em São Paulo, seria importante estabelecer balizamentos legais mínimos para a atuação

dessas entidades, o que certamente poderia contribuir, também, com o aperfeiçoamento do seu

controle. A atuação destas entidades tem sido considerada importante pelos operadores de

políticas de C,T&I – espera-se, portanto, que o assunto seja melhor disciplinado.

10.3 Compartilhamento e permissão de utilização de laboratórios, equipamentos,

instrumentos, materiais e instalações de Instituições Científicas e Tecnológicas

(ICTs)

A teor do art. 4o da Lei nº 10.973/2004, as ICTs poderão, mediante remuneração e por

prazo determinado, nos termos de contrato ou convênio,

I - compartilhar seus laboratórios, equipamentos, instrumentos, materiais e

demais instalações com microempresas e empresas de pequeno porte em

atividades voltadas à inovação tecnológica, para a consecução de atividades

de incubação, sem prejuízo de sua atividade finalística;

II - permitir a utilização de seus laboratórios, equipamentos, instrumentos,

materiais e demais instalações existentes em suas próprias dependências por

empresas nacionais e organizações de direito privado sem fins lucrativos

voltadas para atividades de pesquisa, desde que tal permissão não interfira

diretamente na sua atividade-fim, nem com ela conflite.

Segundo o parágrafo único, do mesmo artigo, o compartilhamento e a permissão de que

tratam, respectivamente, os incisos I e II do caput do artigo, deverão obedecer às prioridades,

critérios e requisitos aprovados e divulgados pelo órgão máximo da ICT, observadas as

respectivas disponibilidades e assegurada a igualdade de oportunidades às empresas e

organizações interessadas.

Vale notar que, no primeiro caso, a lei vincula, expressamente, a possibilidade de

compartilhamento às microempresas e empresas de pequeno porte, para a consecução de

atividades de incubação. No segundo caso, a permissão de utilização está voltada para a

realização de atividades de pesquisa por empresas nacionais, independentemente de seu porte,

455

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,

terceirização, parceria público-privada e outras formas. 9 ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 298. 456

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia,

terceirização, parceria público-privada e outras formas. 9 ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 298.

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172

e organizações de direito privado sem fins lucrativos. Em ambas as situações, a norma

pressupõe a realização de publicação das prioridades, critérios e requisitos aprovados pelo

órgão máximo da ICT, haja vista a necessidade de se assegurar a igualdade de oportunidades

aos interessados.

Uma questão que surge, desde logo, diz respeito à utilização do termo “permissão de

utilização”.

A hipótese em comento remete à figura da permissão de uso, ato, de acordo com a

doutrina clássica, unilateral, discricionário e precário, pelo qual a “Administração consente

que certa pessoa utilize privativamente bem público, atendendo ao mesmo tempo aos

interesses público e privado”.457

Tal concepção tradicional não se amolda com precisão à hipótese do art. 4º. Isso porque

a própria norma conferiu natureza contratual às figuras de compartilhamento e permissão de

utilização, não cabendo falar em ato unilateral.

De igual sorte, parece-nos que também não existirá precariedade.

Isso porque, consoante a lição de Alexandre Santos de Aragão,

A precariedade e consequente revogabilidade de alguns atos administrativos

se distinguem da possibilidade de rescisão unilateral dos contratos

administrativos em razão de naqueles casos não haver direito à indenização.

O caráter não precário dos contratos administrativos não decorre de uma

suposta impossibilidade de extinção unilateral de vínculo, possibilidade

presente nos contratos.

Ocorre que, no caso dos contratos administrativos, a extinção (rescisão) gera

a obrigação de o Estado pagar pelos danos sofridos.458

A utilização da infraestrutura pública para fins de realização de atividades de pesquisa e

de inovação costuma estar vinculada a projetos de duração mais longa, cuja solução de

continuidade pode acarretar grandes prejuízos. Não parece razoável supor a possibilidade de

extinção unilateral do ajuste sem se cogitar, minimamente, da provável necessidade de

indenização da entidade prejudicada, especialmente tendo em vista o fato de ela ter sido

obrigada a cumprir requisitos mínimos, estabelecidos por meio de chamamento público.

Importante frisar que, consoante o Manual Básico de Acordos de Parceria de PD&I, do

Fórum Nacional de Gestores de Inovação e Transferência de Tecnologia (FORTEC), nos

contratos de permissão e compartilhamento não se incluem o uso, gozo e disposição do capital

intelectual, conhecimentos e recursos humanos, nem recursos financeiros da ICT. A entidade

457

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 25 ed. rev. atual. ampl. São Paulo:

Atlas, 2012, p. 1158-1159. 458

ARAGÃO. Alexandre Santos de. Direito dos serviços públicos. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 686.

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173

interessada apenas passa a ter acesso à infraestrutura da ICT para a realização de pesquisas de

seu interesse.459

A nosso pensar, considerando que tanto nos contratos de permissão, como nos de

compartilhamento, o que se busca é o acesso à infraestrutura das ICTs, as distinções efetuadas

entre compartilhamento e permissão para utilização, conforme os incisos I e II, do art. 4º,

apesar de terem como destinatárias entidades diferentes, não se excluem e, ao final, não têm

préstimo.

Isso não significa negar a relevância do art. 4º, especialmente tendo em vista que,

segundo a literatura especializada, a infraestrutura pública de pesquisa constitui um

instrumento-chave de suporte aos processos de desenvolvimento industrial recentes.460

Nesse

sentido, o dispositivo poderá, inclusive, contribuir para dar maior transparência e segurança a

ajustes que provavelmente já aconteciam com essa finalidade.

De fato, a inovação, hoje, requer, além de recursos humanos qualificados, capacidade de

geração de conhecimento e um ambiente econômico indutor, complexa e diversificada

infraestrutura, concentrando as ICTs brasileiras infraestrutura de alta qualidade.

Para Denis Borges Barbosa, o art. 4º é uma norma de apoderamento, tendo como

destinatárias as ICTs da Administração Federal, que passam a poder abrir suas instalações e

materiais para determinados agentes econômicos. Matéria típica de Direito Administrativo,

esta autorização não se estende às ICTs estaduais, distritais ou municipais, que terão de obter

autorização de sua lei própria.461

Acrescenta que a modalidade de acesso às instalações e materiais das ICTs prevista no

art. 4º distingue-se de uma outra modalidade de acesso, consignada, por seu turno, no art. 19,

da Lei nº 10.973/2004, voltada às atividades de P&D, para atender às prioridades da política

industrial e tecnológica.

A seu ver, nas hipóteses previstas no art. 19 não se aplicam as restrições relativas à

remuneração e prazo determinado:462

Art. 19. A União, as ICT e as agências de fomento promoverão e

incentivarão o desenvolvimento de produtos e processos inovadores em

empresas nacionais e nas entidades nacionais de direito privado sem fins

459

PIMENTEL, Luiz Otávio (Org.). Manual básico de acordos de parceria de PD&I: aspectos jurídicos. Porto

Alegre: Edipucrs, 2010. (Fórum Nacional de Gestores de Inovação e Transferência de Tecnologia), p. 31. 460

TELLES, Luciana. O papel dos institutos públicos de pesquisa no desenvolvimento tecnológico e na

cooperação universidade-empresa. 2011. 279 f. Tese (Doutorado) - Escola Politécnica, Universidade de São

Paulo, São Paulo, 2011, p. 43. 461

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 57. 462

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 57.

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174

lucrativos voltadas para atividades de pesquisa, mediante a concessão de

recursos financeiros, humanos, materiais ou de infraestrutura, a serem

ajustados em convênios ou contratos específicos, destinados a apoiar

atividades de pesquisa e desenvolvimento, para atender às prioridades da

política industrial e tecnológica nacional.

§ 1o As prioridades da política industrial e tecnológica nacional de que trata

o caput deste artigo serão estabelecidas em regulamento.

§ 2o A concessão de recursos financeiros, sob a forma de subvenção

econômica, financiamento ou participação societária, visando ao

desenvolvimento de produtos ou processos inovadores, será precedida de

aprovação de projeto pelo órgão ou entidade concedente.

§ 3o A concessão da subvenção econômica prevista no § 1

o deste artigo

implica, obrigatoriamente, a assunção de contrapartida pela empresa

beneficiária, na forma estabelecida nos instrumentos de ajuste específicos.

§ 4o O Poder Executivo regulamentará a subvenção econômica de que trata

este artigo, assegurada a destinação de percentual mínimo dos recursos do

Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - FNDCT.

§5o Os recursos de que trata o § 4

o deste artigo serão objeto de programação

orçamentária em categoria específica do FNDCT, não sendo obrigatória sua

aplicação na destinação setorial originária, sem prejuízo da alocação de

outros recursos do FNDCT destinados à subvenção econômica.

Ocorre que pode haver dúvidas quanto à diferenciação prática das disposições previstas

nos artigos 4º e 19 da Lei nº 10.973/2004.

Denis Borges Barbosa sustenta que o diferencial do art. 19 está justamente na

vinculação às prioridades da política industrial e tecnológica nacional, fixadas, no plano

federal, segundo o Decreto nº 5.563/2005.463-464

Todavia, conforme exposto anteriormente, nos termos do art. 218, §2º, da Constituição,

todo o fomento público à pesquisa tecnológica deve estar voltado preponderantemente para a

solução dos problemas brasileiros e para o desenvolvimento do sistema produtivo nacional e

regional, havendo, portanto, uma proximidade muito grande em relação aos propósitos de

ambos os dispositivos.

Além disso, Barbosa alega que o art. 19 refere-se apenas à assistência prestada sem

objetivo de resultados comuns.465

463

O § 1o do art. 20, do Decreto Federal 5.563/2005 prescreve que “As prioridades da política industrial e

tecnológica nacional, para os efeitos do caput, serão definidas em ato conjunto dos Ministros de Estado da

Ciência e Tecnologia e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior.” A Portaria Ministerial nº 652, de

14 de setembro de 2012, nesse sentido, estabelece que as prioridades da politica industrial e tecnológica

nacional compreendem as ações sistêmicas, os destaques estratégicos, os programas estruturantes definidos na

Política Industrial e Tecnológica vigente e as prioridades de ciência, tecnologia e inovação definidas pelos

governos estaduais para estimular o desenvolvimento econômico, social e tecnológico. 464

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 151 e 152. 465

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 151 e 152.

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O problema, a nosso sentir, é que nas hipóteses do art. 4º também pode acontecer de não

existir a pretensão de se obter resultados comuns, até mesmo porque o que se compartilha,

mediante a correspondente remuneração, são apenas os usos de laboratórios, equipamentos,

materiais e instalações.

Ao mesmo tempo, parece-nos que não há no art. 19 qualquer elemento que impeça a

consecução do objetivo de se atingir esses resultados comuns.

No âmbito do Estado de São Paulo, diferentemente da legislação federal, que

estabelece, a princípio, no art. 4º, duas medidas de acesso à infraestrutura das ICTs, a Lei

Complementar nº 1.049/2008 prevê, de início, apenas uma hipótese de compartilhamento,

hipótese esta que deve estar voltada à consecução de atividades de incubação:

Artigo 4º - As ICTESPs poderão, mediante remuneração e por prazo

determinado, nos termos de contrato ou convênio, compartilhar seus

laboratórios, equipamentos, instrumentos, materiais e demais instalações

com empresas ou grupos de produção associada, em atividades voltadas à

inovação tecnológica, para a consecução de atividades de incubação, sem

prejuízo de sua atividade finalística.

§1º - O compartilhamento de que trata o "caput" deste artigo obedecerá às

prioridades, critérios e requisitos aprovados e divulgados pelo órgão máximo

da ICTESP, observadas as respectivas disponibilidades e assegurada a

igualdade de oportunidades às empresas e organizações interessadas.

§2o - Os investimentos feitos em aquisição de novos equipamentos e

melhoria dos equipamentos existentes, bem como em melhoria e ampliação

das instalações, reverterão ao patrimônio das ICTESPs.

A vinculação às atividades de incubação pode restringir as possibilidades de

compartilhamento, na medida em que as empresas incubadas são apenas as nascentes, as

microempresas.

Outra diferença diz respeito à expressa previsão, na lei paulista, sobre a possibilidade de

realização de investimentos privados para a melhoria e ampliação das instalações das ICTs, o

que parece enfatizar a inexistência de precariedade nos instrumentos contratuais de

compartilhamento.

Nesse particular, ainda que a Lei Federal nº 10.973/2004 não possua dispositivo similar,

entendemos que outros dispositivos dela constantes autorizam esse tipo de investimento

privado, pois a Lei visa à autonomia tecnológica e ao desenvolvimento do País e não apenas

de seu setor privado ou público.

Tal como a Lei Federal nº 10.973/2004, a Lei Complementar nº 1.049/2008,

supostamente, também prevê uma forma adicional de acesso à infraestrutura pública, prevista

em seu art. 18:

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Artigo 18 - O Estado, por meio de seus órgãos da administração pública

direta ou indireta, incentivará a participação de empresas, grupos de

empresa, cooperativas, arranjos produtivos e outras formas de produção no

processo de inovação tecnológica, mediante o compartilhamento de recursos

humanos, materiais e de infraestrutura ou a concessão de apoio financeiro, a

serem ajustados em acordos específicos.

§1º - A concessão do apoio financeiro previsto no "caput" deste artigo

implica, obrigatoriamente, a assunção de contrapartida pelo beneficiário, na

forma estabelecida nos respectivos instrumentos jurídicos.

§2º - As condições e a duração da participação de que trata este artigo, bem

como os critérios para compartilhar resultados futuros, deverão estar

definidos nos respectivos instrumentos jurídicos.

Também nesta situação pode haver dificuldade prática em distinguir o acesso à

infraestrutura previsto neste art. 18 da hipótese de compartilhamento estabelecida no art. 4º,

havendo menção expressa, no parágrafo segundo, do dispositivo, à necessidade de

estabelecimento de prazos e à possibilidade de compartilhamento de resultados, inclusive.

Interessante notar que, no artigo 18 em comento, embora haja menção à necessidade de

contrapartida, pelo beneficiário, no caso da concessão de apoio financeiro, não se define em

que proporção ela deverá ocorrer.

Em suma, não existe clareza quanto aos elementos que distinguem a forma de

compartilhamento prevista no artigo 4º da forma de compartilhamento prevista no artigo 18

da lei paulista, se é que existe realmente alguma diferença entre elas. De igual sorte, não há

clareza sobre a existência de efetiva distinção prática entre os artigos 4º e 19 da Lei Federal de

Inovação.

No plano federal, a Portaria nº 251, de 21 de março de 2014, estabelece diretrizes para a

gestão da política de inovação das Unidades de Pesquisa do MCTI. Ao dispor, em sua Seção

II, sobre a permissão de utilização e do compartilhamento de laboratórios, equipamentos,

instrumentos e demais instalações, somente faz menções ao artigo 4º da Lei nº 10.973/2004,

nada mencionando sobre o seu artigo 19.

Ponto essencial a ser destacado, seja qual for a modalidade de acesso de terceiros aos

laboratórios, equipamentos, materiais e instrumentos das ICTs, é o dever de confidencialidade

acerca de informações sigilosas, especialmente quando voltadas ao desenvolvimento de

inovações para o setor produtivo.

A propósito, Denis Borges Barbosa ressalta que o art. 195, da Lei Federal nº

9.279/1996, tutela como crime de concorrência desleal o ato de quem divulga, explora ou

utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos, informações ou dados confidenciais, utilizáveis

na indústria, comércio ou prestação de serviços, excluídos aqueles que sejam de

conhecimento público ou que sejam evidentes para um técnico no assunto, a que teve acesso

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177

mediante relação contratual ou empregatícia, mesmo após o término do contrato; ou divulga,

explora ou utiliza-se, sem autorização, desses conhecimentos e informações, obtidos por meio

ilícitos ou a que teve acesso mediante fraude. Excluídos os casos de emprego de meios

ilícitos, a tutela das informações sigilosas se resume às hipóteses em que haja relação

contratual de confidencialidade. Daí ser absolutamente essencial que as partes disponham

expressamente sobre o assunto.466

O adequado estabelecimento de condições de sigilo e confidencialidade de informações

relacionadas a projetos de inovação, sem dúvida alguma, é matéria que pode favorecer ou

desestimular, conforme as condições avençadas, as parcerias na área de inovação tecnológica

entre os setores público e privado.

É inegável que em projetos de P,D&I existe justificada preocupação quanto à proteção

das informações reputadas sigilosas e confidenciais. Em se tratando de projetos recebedores

de fomento público, essa preocupação e os princípios da publicidade e transparência precisam

ser ponderados.

A Lei Federal nº 12.527/2011 – Lei de Acesso à Informação - em seu artigo 3º,

estabelece procedimentos destinados a assegurar o direito fundamental de acesso à

informação, em conformidade com os princípios básicos da administração pública e com as

seguintes diretrizes: (i) observância da publicidade como preceito geral e do sigilo como

exceção; (ii) divulgação de informações de interesse público, independentemente de

solicitações; (iii) utilização de meios de comunicação viabilizados pela tecnologia da

informação; (iv) fomento ao desenvolvimento da cultura de transparência na administração

pública; e (v) desenvolvimento do controle social da administração pública.

Segundo o artigo 7o da Lei nº 12.527/2011, o acesso à informação não compreende as

informações referentes a projetos de pesquisa e desenvolvimento científicos ou tecnológicos

cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. Conforme o artigo 23,

inciso VI, da norma, são consideradas imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado

as informações cuja divulgação ou acesso irrestrito possam, dentre outras hipóteses,

prejudicar ou causar risco a projetos de pesquisa e desenvolvimento científico ou tecnológico,

assim como a sistemas, bens, instalações ou áreas de interesse estratégico nacional. Nesses

casos, as informações poderão ser classificadas como ultrassecretas, secretas ou reservadas e

os prazos máximos de restrição de acesso à informação serão de 25, 15 e 5 anos,

respectivamente, conforme o enquadramento adotado.

466

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 60.

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178

O disposto na Lei de Acesso à Informação, nos termos de seu artigo 22, não exclui as

hipóteses legais de sigilo e de segredo de justiça nem as hipóteses de segredo industrial

decorrentes da exploração direta de atividade econômica pelo Estado ou por pessoa física ou

entidade privada que tenha qualquer vínculo com o poder público.

A lei prevê, ainda, em seu artigo 25, o dever de o Estado controlar o acesso e a

divulgação de informações sigilosas produzidas por seus órgãos e entidades.

Nessa senda, o Decreto Federal nº 7.724/2012, prescreve, em seu artigo 5º, que a

divulgação de informações de empresas públicas, sociedade de economia mista e demais

entidades controladas pela União que atuem em regime de concorrência, sujeitas ao disposto

no art. 173 da Constituição, estará submetida às normas pertinentes da Comissão de Valores

Mobiliários, a fim de assegurar sua competitividade, governança corporativa e, quando houver,

os interesses de acionistas minoritários. Estabelece, ademais, que não se sujeitam ao disposto

no Decreto as informações relativas à atividade empresarial de pessoas físicas ou jurídicas de

direito privado obtidas pelo Banco Central do Brasil, pelas agências reguladoras ou por outros

órgãos ou entidades no exercício de atividade de controle, regulação e supervisão da atividade

econômica cuja divulgação possa representar vantagem competitiva a outros agentes

econômicos.

Segundo o artigo 6º, do Decreto citado, o acesso à informação não se aplica:

I - às hipóteses de sigilo previstas na legislação, como fiscal, bancário, de

operações e serviços no mercado de capitais, comercial, profissional, industrial

e segredo de justiça; e

II - às informações referentes a projetos de pesquisa e desenvolvimento

científicos ou tecnológicos cujo sigilo seja imprescindível à segurança da

sociedade e do Estado, na forma do §1o do art. 7

o da Lei n

o 12.527, de 2011.

No Estado de São Paulo, o Decreto Estadual nº 58.052/2012, prevê, em seu artigo 10,

que o acesso aos documentos, dados e informações compreende, entre outros, os direitos de

obter: (i) orientação sobre os procedimentos para a consecução de acesso, bem como sobre o

local onde poderá ser encontrado ou obtido o documento, dado ou informação almejada;

(ii) dado ou informação contida em registros ou documentos, produzidos ou acumulados por

seus órgãos ou entidades, recolhidos ou não a arquivos públicos; (iii) documento, dado ou

informação produzida ou custodiada por pessoa física ou entidade privada decorrente de

qualquer vínculo com seus órgãos ou entidades, mesmo que esse vínculo já tenha cessado;

(iv) dado ou informação primária, íntegra, autêntica e atualizada; (v) documento, dado ou

informação sobre atividades exercidas pelos órgãos e entidades, inclusive as relativas à sua

política, organização e serviços; (vi) documento, dado ou informação pertinente à

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179

administração o patrimônio público, utilização de recursos públicos, licitação, contratos

administrativos; (vii) documento, dado ou informação relativa: a) à implementação,

acompanhamento e resultados dos programas, projetos e ações dos órgãos e entidades

públicas, bem como metas e indicadores propostos; b) ao resultado de inspeções, auditorias,

prestações e tomadas de contas realizadas pelos órgãos de controle interno e externo,

incluindo prestações de contas relativas a exercícios anteriores.

O acesso a esses documentos, dados e informações não compreende, contudo, a teor do

artigo 10, do Decreto, as informações referentes a projetos de pesquisa e desenvolvimento

científicos ou tecnológicos cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do

Estado.

Também para o Decreto Paulista, a exemplo da legislação federal, consoante o artigo

30, são considerados imprescindíveis à segurança da sociedade ou do Estado e, portanto,

passíveis de classificação de sigilo, os documentos, dados e informações cuja divulgação ou

acesso irrestrito possam, dentre outras situações, prejudicar ou causar risco a projetos de

pesquisa e desenvolvimento científico ou tecnológico, assim como a sistemas, bens,

instalações ou áreas de interesse estratégico nacional.

As disposições do Decreto, conforme o seu artigo 29, não excluem as demais hipóteses

legais de sigilo e de segredo de justiça nem as hipóteses de segredo industrial decorrentes da

exploração direta de atividade econômica pelo Estado ou por pessoa física ou entidade

privada que tenha qualquer vínculo com o poder público.

Ainda segundo o Decreto Estadual nº 58.052/2012, em seu artigo 69, o contrato cuja

execução implique o acesso por parte da contratada a documentos, dados ou informações

sigilosos, obedecerá aos seguintes requisitos: (i) assinatura de termo de compromisso de

manutenção de sigilo; (ii) o contrato conterá cláusulas prevendo: a) obrigação de o contratado

manter o sigilo relativo ao objeto contratado, bem como à sua execução; b) obrigação de o

contratado adotar as medidas de segurança adequadas, no âmbito de suas atividades, para a

manutenção do sigilo de documentos, dados e informações aos quais teve acesso;

c) identificação, para fins de concessão de credencial de segurança, das pessoas que, em nome

da contratada, terão acesso a documentos, dados e informações sigilosos.

Finalmente, vale registrar que, por força do artigo 24, XXXI, da Lei Federal nº

8.666/93, com redação dada pela Lei Federal nº 13.349/2010, é dispensável a licitação nas

contratações visando ao cumprimento do disposto no art. 4º, da Lei nº 10.973/2004.

Embora a licitação seja dispensável quanto às situações descritas no art. 4º referido, não

seria demais lembrar uma vez mais que, segundo o seu parágrafo único, o compartilhamento e

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180

a permissão deverão obedecer às prioridades, critérios e requisitos aprovados e divulgados

pelo órgão máximo da ICT, assegurada a igualdade de oportunidades às empresas e

organizações interessadas. Vale dizer, a possibilidade de dispensa de licitação não afasta a

necessidade de observância aos princípios da isonomia e transparência.

10.4 Participação minoritária do Poder Público no capital de empresa privada

Ensina Mario Gomes Schapiro que da consolidação da economia do conhecimento

decorre o desafio do financiamento de empresas emergentes, portadoras de ativos intangíveis

e de estratégias voltadas às inovações de produtos e processos:

Este tipo de investimento, como visto, é detentor de um grau elevado de

incerteza, marcado pelo longo prazo de maturação dos resultados e, via de

regra, desprovido de mecanismos de garantia habitualmente utilizados nas

operações financeiras. Tais características problemáticas são ainda

acentuadas quando se trata de apoiar empreendimentos inovadores

realizados por pequenas e médias empresas, que no mais das vezes não

detêm sequer um acervo de bens e patrimônios, nem tampouco um fluxo de

caixa considerável capaz de assegurar as suas necessidades de

financiamento. O risco deste financiamento, portanto, é alto, o que tende a

agravar os problemas de assimetria entre financiadores e empreendedores

[...]467

Segundo Schapiro são adversidades do financiamento das empresas inovadoras: a) a

inovação apresenta um componente de incerteza, havendo imprevisibilidade em relação ao

desfecho dos projetos objeto de financiamento; b) os ativos intangíveis, diferentemente dos

ativos tangíveis, como uma obra de infraestrutura ou uma máquina, apresentam dificuldades

para serem medidos e avaliados, não podendo servir de garantia dos financiamentos

contraídos; c) diferentemente das empresas maduras, estabelecidas em setores econômicos

tradicionais, as empresas inovadoras, quando emergentes, não têm um histórico que permita

ao financiador avaliar se se trata de uma empresa com bons resultados passados; d) as

empresas emergentes não têm atributos econômicos capazes de mitigar as reais chances de

insucesso; e) as empresas emergentes podem ter déficit de gestão (seus fundadores costumam

ser pesquisadores e não administradores de empresas).468

É por essa razão que, a seu ver, o financiamento das empresas inovadoras por meio da

constituição de dívidas não é o mais adequado. Sustenta que transações ocasionais

467

SCHAPIRO, Mario Gomes. Novos parâmetros para a intervenção do Estado na economia. São Paulo: Saraiva,

2010, p. 169. 468

SCHAPIRO, Mario Gomes. Novos parâmetros para a intervenção do Estado na economia. São Paulo:

Saraiva, 2010, p. 172- 174.

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181

relacionadas a bens padronizados tendem a ser realizadas de forma simples, mediante os

contratos clássicos ou liberais; que transações com alguma especialidade, nas quais o bem é

específico para uma determinada relação econômica (como nos contratos entre fabricantes e

produtores de insumo), requerem contratos mais complexos, com estipulação minuciosa de

sanções e meios de resolução de conflitos; finalmente, que transações frequentes que

envolvem bens superespecializados, em razão das múltiplas dificuldades de negociação para

as partes, sugerem que a melhor estrutura de governança possível é suprimir a rivalidade de

mercado entre elas, constituindo uma sociedade.469

Tem se reconhecido que a participação minoritária do Estado no capital da economia

cumpre o objetivo de apoiar o empreendimento privado em setores chaves da economia

nacional, sendo possível, também, o Estado exercer a condição de acionista não controlador

somente para assegurar a preservação de interesses estratégicos nas empresas privatizadas,

sem específica motivação de fomento.470

Conforme Mario Engler Pinto Junior:

Em qualquer das situações, subsiste o caráter privatista da companhia

investida, que não pode ser equiparada à sociedade de economia mista

prevista na Lei nº 6.404/1976. O exercício das prerrogativas associadas à

propriedade acionária pelo Estado possui escopo mais limitado, não

consistindo instrumento hábil para impor à companhia a persecução do

interesse público referido no artigo 238 daquele diploma legal.

O art. 5º da Lei Federal nº 10.973/2004, reconhecendo o papel do Estado de fomento ao

empreendedorismo privado por meio de participações acionárias minoritárias, dispõe que:

Art. 5o Ficam a União e suas entidades autorizadas a participar

minoritariamente do capital de empresa privada de propósito específico que

vise ao desenvolvimento de projetos científicos ou tecnológicos para

obtenção de produto ou processo inovadores.

Parágrafo único. A propriedade intelectual sobre os resultados obtidos

pertencerá às instituições detentoras do capital social, na proporção da

respectiva participação.471

Como se nota, diferentemente das hipóteses de parceria anteriormente citadas, neste

caso, cuida-se de uma parceria personificada.

Segundo Marçal Justen Filho, a participação minoritária em sociedades privadas

consiste em uma manifestação diferenciada de fomento. A característica diferencial é que,

469

SCHAPIRO, Mario Gomes. Novos parâmetros para a intervenção do Estado na economia. São Paulo:

Saraiva, 2010, p. 179. 470

PINTO JUNIOR, Mario Engler. Empresa estatal: função econômica e dilemas societários. 2. ed. rev. e atual.

São Paulo: Atlas, 2013, p. 194. 471

PINTO JUNIOR, Mario Engler. Empresa estatal: função econômica e dilemas societários. 2. ed. rev. e atual.

São Paulo: Atlas, 2013, p. 194.

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182

neste caso, o Estado não desempenha apenas uma tarefa passiva, consistente em editar regras

ou prever benefícios. A vantagem essencial é o aporte de parcela de recursos necessários ao

empreendimento. E esclarece: 472

[...] o particular não assumirá a integralidade dos investimentos, nem

necessitará recorrer às fontes tradicionais de financiamento. O Estado será o

sócio do particular, o que produz inclusive efeitos positivos indiretos, tal

como o reconhecimento formal da relevância e da seriedade do

empreendimento.

Por essa via, torna-se viável a realização de atividades socialmente

desejáveis. Existe o compartilhamento dos riscos de insucesso entre a

iniciativa privada e o Estado, O empreendimento objeto do fomento será

desenvolvido por meio de uma sociedade privada. Tal sociedade será

constituída a partir da conjugação de recursos públicos e privados, que

adotará usualmente a forma de companhia (sociedade por ações), com

objetivo específico e delimitado.473

A SPE não constitui uma modalidade societária autônoma.

Para Justen Filho, com a constituição da SPE, em regra, como dito, sob a forma de uma

sociedade por ações, os riscos das partes são restritos à extensão de sua participação

societária. O poder de controle é atribuído, em princípio, ao sócio privado, que possui o poder

de eleger a maioria dos administradores e a maioria dos votos na tomada de decisões. A SPE

não integra a estrutura da Administração, seu patrimônio é privado. Sua gestão e sua atuação

não estão sujeitas aos mecanismos de controle interno e externo próprios da função pública.

Também não está sujeita aos mecanismos de controle jurisdicional da atividade

administrativa, como a ação popular, a ação civil pública, a ação de improbidade e o mandado

de segurança. Por outro lado, não se admite que a SPE seja beneficiária de qualquer vantagem

decorrente da qualidade do sócio estatal, não podendo lhe ser atribuídos encargos nem

tampouco benefícios em razão da participação estatal.474

Nessa senda, parece não haver impedimentos à concessão à SPE de outras medidas de

fomento público tendentes ao estímulo de P,D&I, tais como benefícios fiscais e subvenções.

Em relação à questão do controle, conforme o artigo 7º, da Lei Federal nº 6.223, de 14

de julho de 1975, que dispõe sobre a fiscalização financeira e orçamentária da União, pelo

Congresso Nacional, com a redação dada pela Lei Federal nº 6.525/1978, somente as

entidades com personalidade jurídica de direito privado, de cujo capital a União, o Estado, o

472

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 10. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2014, p. 723. 473

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 10. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2014, p. 723. 474

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 10. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2014, p. 723-726.

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183

Distrito Federal, o Município ou qualquer entidade da respectiva administração indireta seja

detentora da totalidade ou da maioria das ações ordinárias, ficam submetidas à fiscalização do

Tribunal de Contas competente, sem prejuízo do controle do Poder Público.475

Todavia, segundo Marcelo Gustavo Silva Siqueira, o controle do Tribunal de Contas

não pode ser excluído por completo. O aporte de capital na empresa privada deve ser objeto

de controle. Lembra, ademais, que o próprio Tribunal de Contas da União já identificou sua

competência não em decorrência da participação minoritária, mas em caso de dano ao erário

ainda que resultante da atuação de sociedade privada, nos termos da Decisão nº 220/2000, do

Plenário, do TCU (Número Interno do Documento DC-0220-12/00-P), conforme artigo 71,

II,476

da Constituição Federal.477

Sobre a possibilidade de a SPE gozar de benefícios em razão da participação estatal, em

verdade, parece haver divergência doutrinária.

Carlos Ari Sundfeld e Rodrigo Pagani de Souza, ao contrário de Marçal Justen Filho,

admitem a possibilidade de contratação direta de uma semiestatal pela empresa estatal que

participa do seu controle, com fundamento no artigo 24, XXIII, da Lei nº 8.666/1993478

:

Art. 24. É dispensável a licitação:

[...]

XXIII – na contratação realizada por empresa pública ou sociedade de

economia mista com suas subsidiárias e controladas, para a aquisição ou

alienação de bens, prestação ou obtenção de serviços, desde que o preço

contratado seja compatível com o praticado no mercado.

Não existe definição legislativa para o vocábulo subsidiária. O artigo 251 da Lei

6.404/1976 faz menção à expressão “subsidiária integral”, consistente numa sociedade

anônima cuja integralidade de ações pertence a uma sociedade brasileira. Entende-se que

sociedade subsidiária, em regra, indica empresa controlada.479

475

SIQUEIRA, Marcelo Gustavo Silva. Empresa de propósitos específicos: participação minoritária e controle

de contas. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen

Juris, 2011, p. 367-376, p. 374. 476

Dispõe o art. 71, da Constituição Federal: “O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido

com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: [...] II- julgar as contas dos administradores e

demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as

fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal e as contas daqueles que derem causa

a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público.” 477

SIQUEIRA, Marcelo Gustavo Silva. Empresa de propósitos específicos: participação minoritária e controle

de contas. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen

Juris, 2011, p. 367-376, p. 374. 478

SUNDFELD, Carlos Ari; SOUZA, Rodrigo Pagani de. Parcerias para o desenvolvimento produtivo em

medicamentos e a lei de licitações. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 264, p. 91-133,

set./dez. 2013, p. 94. 479

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 10. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2014, p. 312.

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184

Para Carlos Ari Sundfeld e Rodrigo Pagani de Souza a empresa semiestatal a que se

refere o inciso XXIII do artigo 24, da Lei de Licitações, que pode ser contratada diretamente,

é a empresa privada na qual o Estado tem participação acionária minoritária, mas relevante,

no capital votante.480

Esse cuidado parece tentar reduzir os riscos de uso indevido do dispositivo e a violação

do princípio da razoabilidade.

De toda forma, o dispositivo apresenta grande potencial de violação do princípio da

igualdade.

Ainda que seja possível admitir a validade da contratação direta da subsidiária por

empresa pública e sociedade de economia mista, com fulcro no artigo 24, XXIII, da Lei nº

8.666/1993, é fato que esta dependerá da economicidade da operação, assim como da

pertinência entre o serviço a ser prestado ou o bem a ser adquirido e o objeto social das

entidades controlada e controladora. Além disso, não se pode esquecer que ressalvadas as

hipóteses em os valores jurídicos vigentes autorizem atuação com prejuízos, a Administração

não poderá eternizar situações deficitárias, de prejuízos constantes.481

No caso das sociedades anônimas, o artigo 245 da Lei nº 6.404/1976 proíbe

contratações deficitárias entre sociedades coligadas, controladoras ou controladas. O artigo

117, § 1º, a seu turno, também dispõe que o favorecimento de uma sociedade, em prejuízo da

participação dos minoritários nos lucros, caracteriza abuso do poder de controle, podendo

ensejar a responsabilização do ente controlador e dos administradores pelos prejuízos

derivados de contratações deficitárias com sociedades controladas.482

Insta ressaltar que as disposições do artigo 24, XXIII, da Lei nº 8.666/1993 remetem ao

artigo 37, XIX e XX, da Constituição Federal:

XIX- somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a

instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de

fundação, cabendo à lei complementar, neste último caso, definir as áreas de

sua atuação;

XX- depende de autorização legislativa, em cada caso, a criação de

subsidiárias das entidades mencionadas no inciso anterior, assim como a

participação de qualquer delas em empresa privada

480

SUNDFELD, Carlos Ari; SOUZA, Rodrigo Pagani de. Parcerias para o desenvolvimento produtivo em

medicamentos e a lei de licitações. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 264, p. 91-133,

set./dez. 2013, p. 94. 481

JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 15 ed. São Paulo:

Dialética, 2012, p. 389. 482

JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 15 ed. São Paulo:

Dialética, 2012, p. 389.

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185

Consoante Dinorá Adelaide Musetti Grotti, a norma do inciso XX, do artigo 37 além de

acolher as subsidiárias como parte do sistema, inovou também ao exigir autorização

legislativa para a sua criação em cada caso. Explica que tal exigência, em cada caso, poderia

resultar na interpretação de necessidade de indicação da titularidade de determinada empresa,

nominalmente indicada, mas que, segundo Caio Tácito, a expressão “em cada caso” pode ser

compreendida como indicativa somente da área ou atividade específica a ser contemplada.483

A parte final do inciso XX tem gerado dúvida sobre o alcance da expressão

“participação de qualquer uma delas”, destacando, ainda, Dinorá Adelaide Musetti Grotti, na

esteira do pensamento de Caio Tácito, que tal expressão não se refere às subsidiárias e sim às

próprias entidades de que elas provém.484

Com efeito, a autorização legislativa exigida pela Constituição não precisa ser dada para

a criação específica de cada entidade, sendo legítimo que a lei disciplinadora da entidade

primária autorize a posterior instituição de subsidiárias, antecipando o seu objeto.485

Nesse sentido, decidiu o STF na ADn nº 1.649-DF, Relator Ministro Maurício Corrêa,

julgada em 24.03.2004, em relação à Lei nº 9.478/1997, que regula atividades petrolíferas. O

artigo 65 da norma autorizou a PETROBRAS a instituir subsidiária para operar e construir

seus dutos, terminais e embarcações para transporte de petróleo e derivados, dispensando a

edição de Lei específica para tal objetivo.486

A esse respeito, Bernardo Strobel Guimarães anota que a lei exigida pela Constituição

para participação em outra sociedade não necessita ser específica para cada caso, admitindo-

se uma autorização genérica, concretizada a partir de juízos feitos pela Administração na

qualidade de controladora da empresa em questão. Exige apenas, portanto, que exista no rol

de atribuições de uma empresa previsto em lei a possibilidade de ela vir a participar de outras

sociedades. Essa é a técnica mais adequada do ponto de vista prático, que permite aos gestores

da estatal definir – a partir de pautas empresariais – qual o momento oportuno de exercer a

opção em concreto.487

483

GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. O regime jurídico das empresas estatais. In: WAGNER JUNIOR, Luiz

Guilherme da Costa Wagner. Direito Público: estudos em homenagem ao professor Adilson Abreu Dallari.

Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 125-179. 484

GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. O regime jurídico das empresas estatais. In: WAGNER JUNIOR, Luiz

Guilherme da Costa Wagner. Direito Público: estudos em homenagem ao professor Adilson Abreu Dallari.

Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 125-179. 485

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 25. ed. rev., ampl. e atual. São

Paulo: Atlas, 2012, p. 493. 486

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 25. ed. rev., ampl. e atual. São

Paulo: Atlas, 2012, p. 493. 487

GUIMARÃES, Bernardo Strobel. A participação de empresas estatais no capital de empresas controladas pela

iniciativa privada: algumas reflexões. In: In: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. et al. (Org.). Direito e

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186

Como visto, a autorização legislativa exigida no artigo 37, XX, da Constituição, no caso

da União e das entidades por ela controladas, consta da Lei nº 10.973/2004.

O Decreto Federal nº 4.195, de 21 de abril de 2002, que regulamenta a Lei nº 10.168, de

29 de dezembro de 2000, que trata, por seu turno, da instituição da contribuição de

intervenção no domínio econômico destinada a financiar o Programa de Estímulo à Interação

Universidade-Empresa para Apoio à Inovação, e a Lei no 10.332, de 19 de dezembro de 2001,

que institui mecanismos de financiamento para programas de ciência e tecnologia

estabelecem, em seus art. 1º e 2º, respectivamente, que 40% dos recursos provenientes da

contribuição de que trata o art. 2o da Lei n

o 10.168, de 29 de dezembro de 2000 serão alocados

ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - FNDCT, em categoria de

programação específica denominada CT-Verde Amarelo e utilizados para atender ao

Programa de Estímulo à Interação Universidade-Empresa para o Apoio à Inovação; e que os

recursos previstos nos arts. 1o, inciso V, e 5

o, da Lei n

o 10.332, de 2001, serão alocados

ao FNDCT, destinados ao Programa de Inovação para Competitividade, na categoria de

programação específica referida no art. 1o, e utilizados, dentre outras finalidades,

na participação minoritária no capital de microempresas e pequenas empresas de base

tecnológica e fundos de investimento, por intermédio da FINEP.

A Portaria MCT nº 622 de 01, de setembro de 2008, que dispõe sobre a aplicação dos

recursos ao FNDCT, na ação Estímulo a Empresas de Base Tecnológica mediante

Participação no Capital - CT - Verde Amarelo prevê, em seu art. 5º, que a FINEP poderá

adquirir participação minoritária no capital das microempresas e das empresas de pequeno

porte de base tecnológica, em consonância com as ações de criação, capitalização e

desenvolvimento de empresas de base tecnológica previstas em sua política operacional. A

participação no capital das microempresas e das empresas de pequeno porte poderá ocorrer de

forma direta ou através de fundos de investimento criados para esse fim, devendo os

procedimentos e critérios para seleção e aquisição das participações ser estabelecidos pela

FINEP em sua Política Operacional.

A Lei Federal nº 10.973/2004, em seu artigo 19, § 2º, prevê que a concessão de recursos

financeiros, sob a forma de subvenção econômica, financiamento ou participação acionária,

para empresas nacionais e entidades nacionais de direito privado sem fins lucrativos voltadas

para atividades de pesquisa, visando ao desenvolvimento de produtos ou processos

inovadores, será precedida de aprovação de projeto pelo órgão ou entidade concedente.

Administração Pública: estudos em homenagem a Maria Sylvia Zanella Di Pietro. São Paulo: Atlas, 2013, p.

374-389, p. 387.

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187

No Estado de São Paulo, a Lei Complementar nº 1.049/2008 estabelece:

Artigo 21 - O Estado, suas autarquias, fundações e empresas por ele

controladas, direta ou indiretamente, poderão participar do capital social de

sociedade de propósito específico, visando ao desenvolvimento de projetos

científicos ou tecnológicos para a obtenção de produto ou processo inovador

de interesse econômico ou social.

Parágrafo único - A propriedade intelectual sobre os resultados obtidos

pertencerá às instituições detentoras do capital social, na proporção da

respectiva participação, na forma da Lei n.º 10.973, de 2 dezembro de 2004.

Artigo 22 - O Estado, suas autarquias, fundações e empresas por ele

controladas, direta ou indiretamente, poderão participar de sociedades cuja

finalidade seja aportar capital ("seed capital") em empresas que explorem

criação desenvolvida no âmbito de ICTESP ou cuja finalidade seja aportar

capital na própria ICTESP.

[...]

Artigo 25 - O Estado, suas autarquias, fundações e empresas por ele

controladas, direta ou indiretamente, poderão participar do capital social de

sociedade ou associar-se a pessoa jurídica caracterizada como parque

tecnológico, como incubadora de empresas de base tecnológica, e arranjos

produtivos pertencentes ao Sistema Paulista de Parques Tecnológicos, e a

Rede Paulista de Incubadoras de Empresas de Base Tecnológica de que trata

o artigo 24.

Artigo 26 - O Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo

S.A. - IPT e o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares - IPEN, na

consecução de seus objetivos institucionais e nos termos dos artigos 21 e 25,

ficam autorizados a constituir subsidiárias, as quais poderão associar-se,

majoritária ou minoritariamente, a outras empresas.

Como se nota, as entidades paulistas também têm autorização legal para participar do

capital social de sociedade de propósito específico, visando ao desenvolvimento de projetos

científicos ou tecnológicos para a obtenção de produto ou processo inovador de interesse

econômico ou social.

Ao IPT e ao IPEN confere-se desde logo autorização para constituir subsidiárias, às

quais poderão se associar majoritária ou minoritariamente. A admissão da participação

majoritária no capital de empresa controlada atrairá, porém, os mecanismos de atuação e

controle interno, externo e jurisdicional próprios do exercício da atividade pública.

Chama a atenção o fato de o IPEN, ao contrário do IPT, que é uma empresa, estar

constituído sob a forma de autarquia.

Isso porque as subsidiárias são um fenômeno inerente ao aumento da complexidade da

atuação do Estado, consistente num instrumento para racionalizar e melhor disciplinar, em

regra, a atividade empresarial488

e não a atividade das autarquias. Embora o legislador não

488

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 10 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos

Tribunais, 2014, p. 312.

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188

esteja vinculado aos entendimentos esposados pela doutrina, do ponto de vista prático, o

descompasso entre estes pode, certamente, causar dúvidas quando de sua aplicação.

Outro ponto a ser ressaltado é que, segundo o artigo 24, XXXI, da Lei Federal nº

8.666/93, com redação dada pela Lei Federal nº 13.349/2010, é dispensável a licitação nas

contratações visando ao cumprimento do disposto no art. 5º, da Lei nº 10.973/2004.

Ainda que assim não fosse, muito provavelmente, haveria hipótese de inviabilidade de

competição.

A rigor, Bernardo Strobel Guimarães pondera que, usualmente, a escolha de uma

empresa a ser objeto de participação pelo Poder Público, para fins estratégicos, a princípio, é

uma ideia que repele a ideia de disputa, pois considera as condições particulares daquela para

receber o investimento estatal.489

O artigo 5º ainda suscita duas importantes questões, ambas comentadas por Denis

Borges Barbosa. A primeira delas diz respeito à titularidade da propriedade intelectual da

empresa que recebeu o investimento público e a outra diz respeito ao prazo de vigência da

contratação resultante da parceria. Observa o autor:

Este é um ponto muito curioso, porque a propriedade intelectual

desenvolvida por uma pessoa jurídica pertence a ela. Não sobe, a jusante,

para os seus controladores. Este estranho dispositivo afeta, dentre outras

questões, o próprio estatuto societário, o código civil, o art. 117 da Lei das

Sociedades Anônimas, Lei nº 6.404 de 1976. ... Na verdade, a única forma

de realizar o que a lei prevê é instituir uma cadeia obrigacional entre os

investidores e a empresa investida, pela qual esta se obrigue a ceder àqueles

a titularidade de todas as suas criações, provavelmente conservando o seu

uso.490

A dúvida relacionada ao prazo da contratação está relacionada à disposição do art. 57,

da Lei nº 8.666/19936, com redação dada pela Lei nº 12.349/2010:

Art. 57. A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à

vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos:

[...]

V- às hipóteses previstas nos incisos IX, XIX, XXVIII e XXXI do art. 24,

cujos contratos poderão ter vigência por até 120 (cento e vinte) meses, caso

haja interesse da administração.

A crítica que se faz, a nosso ver, acertadamente, é que a instituição de uma empresa não

poderia estar sujeita ao regime geral de prazos da Lei nº 8.666/1993.

489

GUIMARÃES, Bernardo Strobel. A participação de empresas estatais no capital de empresas controladas pela

iniciativa privada: algumas reflexões. In: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. et al. (Org.). Direito e

Administração Pública: estudos em homenagem a Maria Sylvia Zanella Di Pietro. São Paulo: Atlas, 2013, p.

374-389, p. 388. 490

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 44.

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189

Ocorre que da forma posta pela Lei de Licitações, as empresas constituídas sob o artigo

5º passariam a ter duração determinada, com prazo máximo de até 120 meses, o que, a

depender das circunstâncias do caso concreto, pode vir a ser um empecilho, uma situação não

razoável.

10.5 Acordos de parceria com Instituições Científicas e Tecnológicas (ICTs)

Segundo o art. 9º da Lei Federal nº 10.973/2004:

Art. 9o É facultado à ICT celebrar acordos de parceria para realização de

atividades conjuntas de pesquisa científica e tecnológica e desenvolvimento

de tecnologia, produto ou processo, com instituições públicas e privadas.

§ 1o O servidor, o militar ou o empregado público da ICT envolvido na

execução das atividades previstas no caput deste artigo poderá receber bolsa

de estímulo à inovação diretamente de instituição de apoio ou agência de

fomento.

§ 2o As partes deverão prever, em contrato, a titularidade da propriedade

intelectual e a participação nos resultados da exploração das criações

resultantes da parceria, assegurando aos signatários o direito ao

licenciamento, observado o disposto nos §§ 4o e 5

o do art. 6

o desta Lei.

§ 3o A propriedade intelectual e a participação nos resultados referidas no §

2o deste artigo serão asseguradas, desde que previsto no contrato, na

proporção equivalente ao montante do valor agregado do conhecimento já

existente no início da parceria e dos recursos humanos, financeiros e

materiais alocados pelas partes contratantes.

O dispositivo cuida da típica união de esforços existente nas parcerias entre ICTs e

terceiros, com o fim de desenvolvimento inovativo, mas sem a criação de uma nova pessoa

jurídica.

Importante notar que há referência genérica, neste artigo, à expressão “instituições

públicas e privadas”, o que o torna mais abrangente do que o artigo 3º, que dispõe, frise-se,

sobre alianças estratégicas e projetos de cooperação envolvendo empresas nacionais, ICTs e

organizações de direito privado sem fins lucrativos, voltadas para atividades de pesquisa e

desenvolvimento, que objetivem a geração de produtos e processos inovadores.

Nas parcerias a que alude o artigo 9º, consoante Denis Borges Barbosa, há uma união de

capital inicial constituído de conhecimentos e de recursos humanos, financeiros ou materiais.

A dinâmica do relacionamento volta-se à geração do capital final, que é o resultado, a ser

apropriado pelos atores envolvidos segundo uma regra de proporcionalidade em face dos

recursos trazidos ao empreendimento.491

491

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 90.

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190

Segundo o Manual Básico de Acordos de Parceria de PD&I, do Fórum Nacional de

Gestores de Inovação e Transferência de Tecnologia (FORTEC), diferentemente das hipóteses

do art. 4º, mais restritas, nos acordos de parceria a que se refere o art. 9º pode ser incluída,

além do compartilhamento de laboratórios, equipamentos, instrumentos, materiais e

instalações das partes, a participação de capital intelectual.492

Há diversas importantes questões relacionadas à titularidade da propriedade intelectual e

a participação nos resultados da exploração das criações resultantes da parceria, que não

fazem parte, especificamente, do escopo deste trabalho, mas que também merecem, como

diversos temas presentes na Lei de Inovação, maior atenção por parte dos estudiosos do

Direito Administrativo.

A Lei Federal nº 8.666/1993, em seu artigo 24, inciso XXV, estabelece que:

Art. 24. É dispensável a licitação:

[...]

XXV- na contratação realizada por Instituição Científica e Tecnológica –

ICT ou por agência de fomento para a transferência de tecnologia e para o

licenciamento de direito de uso ou de exploração de criação protegida.

O dispositivo corrobora a constatação de que seria inútil que a Administração investisse

recursos em atividades de P,D&I e não pudesse transferir os direitos de exploração para a

iniciativa privada. Não haveria sentido que isso ocorresse sempre de forma gratuita,

admitindo-se a cessão remunerada, sem necessidade de licitação.493

De toda forma, a possibilidade de dispensa de licitação não significa autorização para a

contratação por valores ínfimos ou incompatíveis com os investimentos públicos realizados e

o valor econômico do invento.494

Ademais, não se mostra compatível com o sistema legal brasileiro que, sendo a pesquisa

ou o desenvolvimento comum exitoso, o parceiro se transforme em fornecedor exclusivo para

a Administração, por via de sucessivas inexigibilidades de licitação.495

Entende Denis Borges Barbosa que sempre que do desenvolvimento conjunto resultar

um material ou um serviço de interesse do Estado, não caberá renúncia dos direitos de

propriedade intelectual, possibilitando que terceiros participem de licitação. Embora de

grande interesse negocial para o parceiro privado, não se mostra inteiramente justificável o

492

PIMENTEL, Luiz Otávio (Org.). Manual básico de acordos de parceria de PD&I: aspectos jurídicos. Porto

Alegre: Edipucrs, 2010. (Fórum Nacional de Gestores de Inovação e Transferência de Tecnologia), p. 31. 493

JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 15 ed. São Paulo:

Dialética, 2012, p. 397. 494

JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 15 ed. São Paulo:

Dialética, 2012, p. 397. 495

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 101.

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191

argumento de que, sem essa vantagem, o parceiro não participaria do empreendimento

comum. Este teria como estímulo à sua participação no negócio os seguintes fatores: (i)

proteção pela margem de preço representado pelos royalties que terceiro terá de pagar; (ii)

experiência e ganhos e produtividade resultantes do desenvolvimento comum, quando

resultarem em melhor preço; (iii) pela melhor técnica, no caso de uma licitação deste tipo; (iv)

pelo interesse em outros adquirentes e mercados.496

Nos acordos de parceria com ICTs presume-se a existência de interesses comuns entre

os partícipes.

Na apuração do que pode ser considerado interesse comum o critério relevante é o da

fonte do retorno esperado. Se a contratada tem interesse na remuneração, há um contrato

regido sob os parâmetros da Lei nº 8.666/1993. Mas se o aporte da empresa privada for igual

ou maior do que o da entidade pública e se o retorno dela for proporcional ao aporte, a

modalidade contratual não recai sob o regime comum da Lei de Licitações.497

Quanto à seleção dos partícipes para a celebração dos acordos de parceria, a licitação

pode ser dispensável ou mesmo inexigível, conforme disposto no art. 3º da Lei de Inovação,

afinal, parcerias estratégicas tendem a exigir do partícipe contratante características subjetivas

peculiares.

Embora a Lei nº 12.349/2010 não tenha feito alterações no artigo 57 da Lei nº

8.666/1993, relacionadas, especificamente, ao artigo 9º da Lei de Inovação, nos termos do

artigo 3º, da Lei e Inovação, deverá ser considerado como prazo de vigência máximo 120

meses, o que, conforme antes mencionado, poderá ser algo não necessariamente adequado aos

interesses e necessidades dos partícipes.

496

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 101. 497

BARBOSA, Denis Borges. Comentários à lei de inovação. In: BARBOSA, Denis Borges (Org.). Direito da

inovação. 2. ed. rev. e aum. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 29-193, p. 111

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192

11 PARÂMETROS PARA FORMULAÇÃO E CONCESSÃO DO FOMENTO

PÚBLICO À INOVAÇÃO TECNOLÓGICA

Forma típica de função administrativa, o fomento público possui um regime jurídico

conformado pelos princípios regentes desta.498

Para Ignacio M. De La Riva, as ajudas públicas são atos de favorecimento, que

ampliam499

o âmbito de ação de seus destinatários. Em consequência, a necessidade de

proteger o interesse público e os interesses de terceiros exige a sua sujeição ao Direito.500

Propondo a construção de um estatuto jurídico que governe a ação promocional, o autor

elenca os princípios que, a seu ver, devem reger o fomento. São eles os princípios materiais da

subsidiariedade, igualdade e proporcionalidade e os princípios formais da reserva de lei,

transparência e controle.501

Gaspar Ariño Ortiz, de igual modo, identifica como princípios especialmente aplicáveis

à ação promocional os da legalidade, igualdade, eficiência e economia do gasto público.502

Juan Alfonso Santamaría Pastor assinala a incidência, no fomento, dos princípios da

legalidade (reserva de lei), igualdade, transparência, publicidade e respeito à concorrência.

498

Ensinam José Roberto Pimenta Oliveira e Sílvio Luís Ferreira da Rocha, respectivamente: “Em face do

comando do artigo 37 da Magna Carta, não há como separar a atividade administrativa de fomento da

observância integral dos princípios da legalidade, impessoalidade, publicidade, moralidade, eficiência e

demais princípios constitucionais (v.g. motivação, devido processo legal, segurança jurídica, boa-fé, finalidade

etc.), sob pena de nulidade” (OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os princípios da razoabilidade e da

proporcionalidade no direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 519). Para Sílvio Luís

Ferreira da Rocha: “A atividade de fomento, enquanto atividade administrativa, deve estar submetida ao

regime jurídico administrativo, que no Brasil deriva diretamente da Constituição Federal. A atividade de

fomento submete-se aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (art.

37, caput, redação da EC 19), além da motivação (art. 93, X), da igualdade e da finalidade, entre outros.”

(ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Terceiro Setor. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 27). Também para Rita

Tourinho: “Caracterizada como atividade administrativa, o fomento está subordinado à observância dos

princípios administrativos. Além dos princípios da legalidade, publicidade, moralidade, impessoalidade e

eficiência, constantes do caput, do art. 37, da Constituição Federal, o fomento deve também atentar aos

princípios implicitamente constantes da Carta Constitucional como, por exemplo, o da motivação,

razoabilidade e proporcionalidade. Dessa forma, não se pode pensar na realização da atividade de fomento sem

suporte legal ou constitucional, nem, tampouco, sem critérios na escolha dos beneficiários, ou mesmo sem a

devida motivação. Por outro lado, também viola a ordem jurídica os incentivos conferidos sem qualquer

razoabilidade ou com resultados desproporcionais aos investimentos efetivados.” (TOURINHO, Rita. Terceiro

setor no ordenamento jurídico brasileiro: constatações e expectativas. Revista Eletrônica sobre a Reforma do

Estado (RERE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, n. 24, dez/jan./fev. 2011. Disponível em:

http://www.direitodoestado.com/revista/RERE-24-dezembro-janeiro-fevereiro-2011-RITA-TOURINHO.pdf.

Acesso em: 10 jun. 2014, p. 5-6). 499

Também para Juan Carlos Cassagne, mediante a técnica dos atos favoráveis, a ação interventora da

Administração produz uma espécie de ampliação do status jurídico do particular (Derecho administrativo, 7.

ed. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2002, T. II, p. 343). 500

DE LA RIVA, Ignacio M. La figura del fomento: necesidad de encarar uma revisión conceptual. In: Servicio

público, polícia y fomento. Buenos Aires: Rap, 2003, p. 413-422, p. 419. 501

DE LA RIVA, Ignacio M. La figura del fomento: necesidad de encarar uma revisión conceptual. In: Servicio

público, polícia y fomento. Buenos Aires: Rap, 2003, p. 413-422, p. 419-421. 502

ARIÑO ORTIZ, Gaspar. Principios de derecho público económico: modelo de Estado, gestión pública,

regulación económica. Granada: Lael, 2004, p. 349-355.

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193

Refere-se, ainda, à necessidade de atendimento de procedimentos administrativos e de

critérios de eficiência e economia.503

A afirmação da submissão da atividade administrativa de fomento ao regime jurídico

administrativo merece ser ressaltada, especialmente porque, na prática, os princípios deste,

muitas vezes, deixam de ser observados nesse tipo de atividade.

Na doutrina nacional, Sílvio Luís Ferreira da Rocha lembra que o fomento, até certo

ponto, foi relegado a um segundo plano, abaixo dos serviços públicos e que embora tenha

havido a redescoberta da atividade, isso ocorreu sem se perceber que esta também deve

obedecer aos princípios que regem toda a atividade administrativa.504

José Vicente Santos de Mendonça formula original e interessante proposta acerca dos

critérios tanto de concessão como de formulação da concessão do fomento público.

De acordo com o autor, os critérios de concessão são formais: a) transparência e

procedimentalização; (b) competitividade e (c) objetividade; e materiais: (a) a não

lucratividade; (b) a eficiência do gasto público; e (c) a razão pública. Os critérios de

formulação do fomento são: (a) a submissão ao debate público e (b) a compatibilidade entre

os requisitos de acesso ao fomento e o direito fundamental que se pretende fomentar. O maior

de todos os requisitos, pano de fundo para todas as ações, é o princípio da legalidade.505

Na formulação e na concessão dos instrumentos de fomento público à inovação

tecnológica devem ser aplicados os parâmetros norteadores da ação fomentadora do Estado

em geral.

11.1 O fomento público e o princípio da legalidade

Como toda e qualquer atividade administrativa, a ação promocional submete-se ao

princípio da legalidade, o que, historicamente, não acontecia no passado.506

Entendia-se que a atividade promocional, por não possuir o caráter de limitar as

condutas e a liberdade dos particulares, estaria livre de amarras jurídicas.507

Nos dias de hoje, exige-se autorização legislativa para a prática do fomento. É possível

defender o entendimento de que essa autorização é genérica.

503

SANTAMARIA PASTOR, Juan Alfonso. Princípios de derecho administrativo general. 2. ed. Madrid:

Iustel, 2009, v. II, p. 355-357. 504

ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Terceiro Setor. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 34. 505

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Direito constitucional econômico: a intervenção do Estado na

economia à luz da razão prática e do pragmatismo. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 401. 506

ARIÑO ORTIZ, Gaspar. Principios de derecho público económico: modelo de Estado, gestión pública,

regulación económica. Granada: Lael, 2004, p. 349. 507

PASTOR, Santamaría. Princípios de derecho administrativo general. 2. ed. Madrid: Iustel, 2009, v. II, p. 356.

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194

Conforme José Vicente Santos de Mendonça seus termos não podem ser tão gerais que

não permitam o controle; ou tão específicos que impossibilitem a atuação do administrador. O

fomento deve possuir base legal que indique, na medida do possível, beneficiários, benefícios

e critérios de seleção.

É preciso ressaltar, todavia, que em alguns casos a própria Constituição Federal exige

lei específica para a concessão de fomento. Isso ocorre, por exemplo, na hipótese de

concessão de qualquer subsídio ou isenção (art. 150, §6º).508-509

A exigência de lei é também reforçada, como destaca José Roberto Pimenta Oliveira,

pelas normas constitucionais disciplinadoras das finanças públicas (art. 163 e ss.), quando o

fomento ensejar acréscimo de despesa ou redução de receita.510

11.2 A necessária vinculação do fomento público à inovação tecnológica ao planejamento

científico e tecnológico

O debate do fomento público relaciona-se necessariamente ao campo da intervenção

estatal.511

É sabido que o Estado intervém nas ordens econômica e social, direta e indiretamente,

dentro de um regime que privilegia, dentre outros, os valores sociais do trabalho e da livre

iniciativa, fundamentos da República.512

508

Segundo o artigo 150, §6º, da Constituição Federal: “Art.150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas

ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: [...]§ 6.º Qualquer

subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos

a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou

municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou

contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº

3, de 1993).” 509

FREIRE, André Luiz. Responsabilidade patrimonial na atividade administrativa de fomento. In:

SPARAPANI, Priscilia; ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no

domínio social: homenagem ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p.

160-186, p.168. 510

OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no direito

administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 519. 511

Para Eros Roberto Grau, alude-se ao vocábulo atuação ou ação administrativa em sentido mais amplo,

conotando atuação na esfera do público; intervenção expressa mais precisamente atuação em área de outrem,

em área de titularidade do setor privado (ordem econômica na constituição de 1988: interpretação e crítica. 15

ed. São Paulo: Malheiros, 2012, p. 90). José Vicente Santos de Mendonça sustenta que no caso do fomento

público ter-se-ia precisamente uma intervenção, já que o Poder Público está tentando influir, pelo convite, no

mercado. Mas a intervenção seria pelo modo indireto, pelas mãos do particular. Ressalta, todavia, que para

Diogo de Figueiredo Moreira Neto, o fomento, diferentemente das intervenções regulatória, concorrencial,

monopolista e sancionatória, não pode ser considerado como modalidade de intervenção porque não tem

natureza impositiva (Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento público democrático,

eficiente e não paternalista. Revista de Direito Processual Geral. Rio de Janeiro, n. 65, p. 115-176, 2010, p.

115). Consoante o escólio de Ricardo Marcondes Martins, o texto constitucional afasta o entendimento de que

a regulação restringe-se à imposição de condicionamentos: “a regulação dá-se, nos termos do art. 174, não

apenas pela função de fiscalização, mas também pela função de incentivo” (Regulação administrativa à luz da

constituição federal. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 128).

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195

Nesse sentido, o rol de instrumentos de que o Estado dispõe para realizar intervenções é

amplo, estendendo-se da disciplina normativa, da regulação, da atuação direta mediante entes

empresariais estatais, da sujeição de determinadas atividades ao regime de serviço público, até

chegar às modalidades de fomento.513

O fomento público à inovação, espécie do gênero fomento público econômico, constitui,

como se nota, instrumento de intervenção do Estado na ordem econômica. Todavia, uma vez

que as medidas de fomento público não têm natureza impositiva e que a Administração atua

por meio do particular, trata-se de uma modalidade de intervenção indireta.

O artigo 174,514

da Lei Maior, atribui ao Estado, agente normativo e regulador da

atividade econômica, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento,

sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

Lúcia Valle Figueiredo explica a existência de três tipos de planejamentos: os

indicativos; os imperativos e os incitativos ou estimulativos.515

Segundo a autora, os planos indicativos são aqueles em que o governo apenas assinala

em alguma direção, sem pretender o engajamento da iniciativa privada; os planos imperativos,

os que devem ser observados pelos particulares; e os planos incitativos ou estimulativos,

aqueles em que o Governo objetiva implementar determinadas atividades com a participação

do setor privado. Aduz que “quando o Estado necessita desenvolver a economia, sobretudo

direcionadamente, recorre, ou deve recorrer, à atividade de fomento, planejamento incitativo,

com a finalidade de engajamento da iniciativa privada”.516

O fomento público à inovação tecnológica, assim como qualquer outro tipo de fomento

público, é indissociável do planejamento.

Para Marcos Juruena Villela Souto, o fomento é consequência natural do planejamento

dentro de um regime que privilegia a livre iniciativa, devendo ser considerado o principal

instrumento de intervenção, pois os investidores que aportarão os recursos indispensáveis ao

512

Dispõe, nesse diapasão, a Constituição Federal: Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união

indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e

tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores

sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Os grifos são nossos. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em:18 nov. 2013. 513

MARQUES NETO, Floriano Peixoto. O fomento como instrumento de intervenção estatal na ordem

econômica. Revista de Direito Público da Economia – RDPE, Belo Horizonte, ano 8, n. 32, out./dez. 2010.

Disponível em: <http://bidforum.com.br/bid/PDI006.aspx?pdiCntd=70679>. Acesso em:14 jun. 2013.

(documento não paginado). 514

Confira-se: “Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na

forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público

e indicativo para o setor privado”. Disponível em

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>. Acesso em 18 nov. 2013. 515

FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Direito Público: estudos. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 43. 516

FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Direito Público: estudos. Belo Horizonte: Fórum, 2007, p. 48.

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196

desenvolvimento econômico só adquirem segurança com o pleno conhecimento das regras do

jogo.517

José Roberto Pimenta Oliveira salienta que sem planejamento estatal cuidadoso revela-

se difícil, senão impossível, cumprir as injunções normativas das pautas constitucionais

voltadas para a disciplina da função promocional pública.518

Na mesma senda, José Vicente Santos de Mendonça pontua que há íntima relação entre

o planejamento estatal e o fomento. Uma determinada atividade ou setor somente serão

fomentados se isso fizer sentido dentro de uma programação prévia. O conteúdo dessa

programação vem com o planejamento. A proximidade é tamanha que, por vezes, os planos

de desenvolvimento econômico e social são chamados de “Planos de Fomento”. A execução

do plano de desenvolvimento, elaborado pelo Poder Público, pressupõe ampla participação da

sociedade, incluindo atividades públicas e privadas. 519-520

Em seu aspecto jurídico, o planejamento é institucional, vez que o Estado se organiza

para a obtenção de objetivos econômicos e, normativo, porque há a inserção sistemática de

regras jurídicas para implementar o plano estabelecido. Apresenta-se como a constante busca

de eficiência na Administração Pública.521

Há que se ressaltar que o texto constitucional prescreve, em alguns casos, que o

planejamento deve ser aprovado por lei.522

A título de exemplificação, segundo o artigo 48,

incisos I e VI, da Carta Magna, cabe, respectivamente, ao Congresso Nacional, com a sanção

do Presidente da República, dispor sobre as matérias de competência da União, em especial

sobre o plano plurianual, diretrizes orçamentárias, orçamento anual, operações de crédito,

dívida pública e emissões de curso forçado; bem como sobre planos e programas nacionais,

regionais e setoriais de desenvolvimento.

517

SOUTO, Marcos Juruena Villela Souto. Intervenção do Estado no domínio econômico. In: ARAÚJO, Valter

Shuenquener de Araújo (Coord.). Direito administrativo. Niterói, RJ: Impetus, 2005, p. 181-206, p. 206. 518

OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no direito

administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 529. 519

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Uma teoria do fomento público: critérios em prol de um fomento

público democrático, eficiente e não paternalista. Revista de Direito Processual Geral. Rio de Janeiro, n. 65, p.

115-176, 2010. 520

Ensina Denilson Marcondes Venâncio que os planos, programas ou projetos são produtos da atividade de

planejamento (VENÂNCIO, Denilson Marcondes. O planejamento como fator determinante da boa

administração pública. 2010. 200 f. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,

2010, p. 14). 521

MARQUES NETO, Floriano Peixoto de Azevedo; QUEIROZ, João Eduardo Lopes. Planejamento. In:

CARDOZO, José Eduardo Martins; QUEIROZ, João Eduardo Lopes; SANTOS, Márcia Walquiria Batista

dos. (Coord.). Direito administrativo econômico. São Paulo: Atlas, 2011, p. 681-740, p. 686. 522

VENÂNCIO, Denilson Marcondes. O planejamento como fator determinante da boa administração pública.

2010. 200 f. Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2010, p.24.

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197

De acordo com a Lei nº 9.257, de 09 de janeiro de 1996, o Conselho Nacional de

Ciência e Tecnologia – CCT, órgão de assessoramento da Presidência da República para a

formulação e implementação da política nacional de desenvolvimento científico e tecnológico

é competente, dentre outras ações, para propor a política de Ciência e Tecnologia do País,

como fonte e parte integrante da política nacional de desenvolvimento e para propor planos,

metas e prioridades de governo referentes à Ciência e Tecnologia, com as especificações de

instrumentos e de recursos.

A atual Estratégia Nacional para Ciência, Tecnologia e Inovação (ENCTI) 2012 -2015

foi aprovada pelo Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT) em 15/12/2011, dando

continuidade ao Plano de Ação em Ciência, Tecnologia e Inovação 2007-2010 (PACTI). Na

sua elaboração, foram consideradas as recomendações do Livro Azul, que reuniu as sugestões

colhidas por ocasião da 4ª Conferência Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação.

A implementação dos planos exige que sejam incorporados às leis orçamentárias,

primeiro ao plano plurianual de investimentos, executado anualmente, conforme prioridades

definidas na lei de diretrizes orçamentárias.523

A incorporação dos planos às leis orçamentárias evita que metas e objetivos deixem de

ser atingidos.

É cediço que as metas estabelecidas no PACTI 2007–2010, por exemplo, não foram

integralmente cumpridas, em razão, dentre outros fatores, de cortes no orçamento público

destinado ao setor. Na ocasião, objetivava-se que os investimentos atingissem 1,5% do PIB

em CT&I até o fim da década passada. Nesse período, apesar de o volume de recursos gastos

ter crescido, a participação relativa no gasto global do governo não se alterou. Ainda, em

2011, o governo federal diminuiu em 22,3% do orçamento do Ministério da Ciência,

Tecnologia e Inovação, que ficou em R$ 6,5 bilhões, abaixo dos R$ 7,9 bilhões de 2010. Em

2012, os valores foram novamente diminuídos em R$ 1,5 bilhão, dos R$ 6,7 bilhões previstos

no Orçamento aprovado no Congresso.524

Por outro lado, o planejamento não pode ser reduzido ao orçamento, porque assim

perderia sua principal característica, que é a de fixar diretrizes para a atuação do Estado, que

também servem para a orientação dos investimentos do setor privado.525

523

SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo da economia. 3. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: 2003,

p. 472. 524

Notícia constante do site do Senado Federal. Disponível em:

www.senado.gov.br/noticias/jornal/emdiscussao/inovacao/orcamento-publico-ciencia-tecnologiaeinovacao-

investimentos-bilhoes-governo-do-brasil-aspx. Acesso em: 05 nov. 2014. 525

BERCOVICI, Gilberto. Constituição econômica e desenvolvimento: uma leitura a partir da Constituição de

1988. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 81.

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198

11.3 O fomento público e os princípios da igualdade e da livre concorrência

Quanto ao princípio da igualdade, ensina Celso Antônio Bandeira de Mello que “a Lei

não deve ser fonte de privilégios ou perseguições, mas instrumento regulador da vida social

que necessita tratar equitativamente todos os cidadãos”.526

A seu ver, para que a discriminação legal seja compatível com a isonomia é necessário

que concorram quatro fatores: a) que a desequiparação não atinja de modo atual (ou seja, no

presente) e absoluto (ou seja, definitivamente) um só indivíduo; b) que as situações ou

pessoas desequiparadas pela regra de direito sejam efetivamente distintas entre si (os traços

nelas residentes devem ser diferenciados); c) que exista, em abstrato, uma correlação lógica

entre os fatores diferenciais e a distinção de regime jurídico estabelecida pela norma jurídica;

d) que, in concreto, esse vínculo de correlação seja pertinente aos interesses

constitucionalmente protegidos.527

Esclarece Rafael Munhoz de Mello que a atividade de fomento, sendo essencialmente

discriminatória, oferece um vasto campo para que a Administração atue ao arrepio do

princípio da igualdade. Para que o fomento não afronte a igualdade deve ser exercido de

modo que os benefícios e privilégios sejam distribuídos apenas a quem efetivamente se

destacar e, sendo possível, a todos os que se destacarem, necessitando, ainda, estar voltado

para a promoção de valores compatíveis com o texto constitucional.528

Consigna que o maior risco à igualdade é que os benefícios sejam distribuídos sem

qualquer critério racional que justifique o tratamento diferenciado. Daí a relevância de os

critérios do fomento serem definidos de forma objetiva, e, se necessário, em situações que

envolvam escassez de recursos, por meio de procedimentos competitivos.529

Na mesma senda, para Floriano Peixoto de Azevedo Marques Neto, a entidade

fomentadora deve atuar observando dois pressupostos: a presença de interesse público

relevante, compatível com as suas atribuições, a ser alcançado pela atividade fomentada e a

526

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3. ed. São Paulo:

Malheiros, 2012, p. 10. 527

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3. ed. São Paulo:

Malheiros, 2012, p. 41. 528

MELLO, Rafael Munhoz de. Atividades de fomento e o princípio da isonomia. In: SPARAPANI, Priscilia;

ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social: homenagem

ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 263-285, p. 279. 529

MELLO, Rafael Munhoz de. Atividades de fomento e o princípio da isonomia. In: SPARAPANI, Priscilia;

ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social: homenagem

ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 263-285, p. 281-282.

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199

eleição objetiva dos beneficiários, a partir de fatores de discrímen objetivamente aferíveis e

legítimos.530

Outra questão que se apresenta em relação ao princípio da igualdade diz respeito às

eleições dos objetos das ações interventivas do Estado (por que fomentar uma determinada

atividade ou um setor e não outro?), afinal, pressupõe-se um tratamento igualitário dos

administrados em geral por parte do ente estatal.

Nesse particular, Célia Cunha Mello explica que atenuar o princípio da igualdade não

significa, todavia, mitigá-lo para admitir um tratamento desigual entre as pessoas, mas sim

para reconhecer a existência de exceções cabíveis, sempre tendo em vista que o princípio da

igualdade não é absoluto.531

Também para Gaspar Ariño Ortiz, as exigências do princípio da igualdade se traduzem

da seguinte forma: a) do ponto de vista econômico: as ajudas públicas não podem prejudicar

as regras da concorrência; b) do ponto de vista jurídico, as ajudas públicas devem ser

outorgadas segundo um procedimento administrativo, que garanta as regras de transparência,

publicidade, objetividade e livre concorrência, utilizando, sempre que possível, mecanismos

competitivos.532

Santamaría Pastor, tal como Gaspar Ariño Ortiz, enfatiza a relevância de tais

procedimentos competitivos, esclarecendo que estes possibilitam que as ajudas públicas sejam

outorgadas a quem seja capacitado para gerar um maior benefício coletivo.533

Para Ignácio M. De La Riva, a dificuldade está justamente em estabelecer critérios

objetivos de avaliação, para comparação. Para que não haja arbitrariedade torna-se relevante a

regulamentação da execução de cada programa de ajudas que se instaure.534

Em relação ao princípio da concorrência, segundo Gaspar Ariño Ortiz, o

reconhecimento da liberdade de empresa como marco da economia de mercado, ou seja, a

livre e leal concorrência, é um dos eixos básicos do Tratado Constitutivo da Comunidade

Europeia e do direito comunitário derivado. No artigo 92, do Tratado de Roma, estabelece-se,

como regra geral, que serão incompatíveis com o mercado comum, e na medida em que

530

MARQUES NETO, Floriano Peixoto de Azevedo. O fomento como instrumento de intervenção estatal na

ordem econômica. Revista de Direito Público da Economia- RDPE, Belo Horizonte, ano 8, n. 32, out./dez.

2010. Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/PDI0006.aspx?pdiCntd=70679. Acesso em 14 jul. 2013.

(documento não paginado). 531

MELLO, Célia Cunha. O fomento da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 159. 532

ARIÑO ORTIZ, Gaspar. Principios de derecho público económico: modelo de Estado, gestión pública,

regulación económica. Granada: Lael, 2004, p. 350. 533

SANTAMARIA PASTOR, Juan Alfonso. Princípios de derecho administrativo general. 2. ed. Madrid:

Iustel, 2009, v. II, p. 356. 534

DE LA RIVA, Ignacio M. La figura del fomento: necesidad de encarar uma revisión conceptual. In: Servicio

público, polícia y fomento. Buenos Aires: Rap, s.d., p. 413-422, p. 419.

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200

afetem os intercâmbios comerciais entre Estados membros, as ajudas outorgadas pelos

Estados mediante fundos estatais, sob qualquer forma, que prejudiquem ou ameacem

prejudicar a concorrência, favorecendo a determinadas empresas ou produções. Junto à regra

geral de proibição o Tratado de Roma reconhece diversas exceções (como para os serviços de

interesse econômico geral, produtos agrícolas, defesa e transportes).535

Observa Calixto Salomão Filho que a compreensão do sistema concorrencial brasileiro

impõe a análise do livre comércio e a cooperação Estados-empresas. Destaca que o sucesso

econômico das empresas japonesas, que tem enorme poderio tecnológico e concorrencial,

pode ser atribuído em grande medida à visão menos ortodoxa do direito concorrencial ali

vigente. No Japão, 60% da economia são controlados por seis grandes grupos. Em

contrapartida, o Ministério do Comércio Internacional e da Indústria exerce direção

econômica, seguida e aceita por esses grupos privados. Os objetivos de política industrial se

sobrepõem aos interesses concorrenciais. A mesma tendência, embora mais atenuada, existe

na Alemanha.536

O fato é que direito concorrencial tem sido influenciado e até mesmo submetido a

objetivos de política industrial, nos moldes nipônicos. As legislações inglesa e francesa

incorporam esses objetivos. Até mesmo o direito antitruste americano modificou seu sistema

concorrencial para permitir a promoção da competitividade interna e internacional das

empresas americanas. O poder econômico, de quase um mal em si, passa a ser encarado como

uma necessidade, desde que seja capaz de promover a eficiência econômica.537

A legislação brasileira também incorporou essa tendência, inserindo a palavra eficiência

no artigo 13, da Lei Federal nº 8.158, de 8 de janeiro de 1991, como uma justificativa para as

concentrações. Na revogada Lei nº 8.884/94 a eficiência aparecia com grande destaque e

permitia a justificação tanto de situações de domínio de mercado já existentes (art. 20, §1º)538

quanto de posições dominantes em formação (art. 54, §1º, I, “c”).539-540

535

ARIÑO ORTIZ, Gaspar. Principios de derecho público económico: modelo de Estado, gestión pública,

regulación económica. Granada: Lael, 2004, p. 351. 536

SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito concorrencial: as estruturas. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 39. 537

SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito concorrencial: as estruturas. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 41-

42. 538

Dispunha a Lei Federal nº 8.884/1994: “Art. 20. Constituem infração da ordem econômica,

independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objetivo ou passam

produzir os seguintes efeitos, ainda que não alcançados: [...] II- dominar mercado relevante e bens ou serviços;

[...]§1º A conquista de mercado resultante de processo natural fundado na maior eficiência de agente

econômico em relação a seus competidores não caracteriza o ilícito no previsto no inciso II.” 539

Dispunha a Lei Federal nº 8.884/1994: “Art. 54. Os atos, sob qualquer forma manifestados, que possam

limitar ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência, ou resultar na dominação de mercados relevantes

de bens ou serviços, deverão ser submetidos à apreciação do CADE. §1º O CADE poderá autorizar os atos a

que se refere o caput, desde que atendam as seguintes condições: I – tenham por objetivo, cumulada ou

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201

Em conformidade com o vigente artigo 88, da Lei Federal nº 12.529/2011, que estrutura

o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC) e dispõe sobre a prevenção e a

repressão às infrações contra a ordem econômica, devem ser submetidos ao Conselho

Administrativo de Defesa Econômica (CADE) pelas partes envolvidas na operação os atos de

concentração econômica em que, cumulativamente: I - pelo menos um dos grupos envolvidos

na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de

negócios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$

400.000.000,00 (quatrocentos milhões de reais); e II - pelo menos um outro grupo envolvido

na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de

negócios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$

30.000.000,00 (trinta milhões de reais).

Os atos que se subsumirem ao disposto no caput do artigo 88 não podem ser

consumados antes de apreciados, sob pena de nulidade, sendo ainda imposta multa pecuniária,

de valor não inferior a R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) nem superior a R$ 60.000.000,00

(sessenta milhões de reais), a ser aplicada nos termos da regulamentação.

Conforme o § 5o, do artigo 88, são proibidos os atos de concentração que impliquem

eliminação da concorrência em parte substancial de mercado relevante, que possam criar ou

reforçar uma posição dominante ou que possam resultar na dominação de mercado relevante

de bens ou serviços, ressalvados aqueles praticados nos limites estritamente necessários para

atingir os seguintes objetivos: I - cumulada ou alternativamente: a) aumentar a produtividade

ou a competitividade; b) melhorar a qualidade de bens ou serviços; ou c) propiciar a eficiência

e o desenvolvimento tecnológico ou econômico; e II - sejam repassados aos consumidores

parte relevante dos benefícios decorrentes.

De acordo com o artigo 90, para efeitos do art. 88, realiza-se um ato de concentração

quando: (i) 2 (duas) ou mais empresas anteriormente independentes se fundem; (ii) 1 (uma)

ou mais empresas adquirem, direta ou indiretamente, por compra ou permuta de ações, quotas,

títulos ou valores mobiliários conversíveis em ações, ou ativos, tangíveis ou intangíveis, por

via contratual ou por qualquer outro meio ou forma, o controle ou partes de uma ou outras

empresas; (iii) 1 (uma) ou mais empresas incorporam outra ou outras empresas; ou (iv) 2

(duas) ou mais empresas celebram contrato associativo, consórcio ou joint venture.

alternativamente: a) aumentar a produtividade; b) melhorar a qualidade de bens ou serviços; c) propiciar a

eficiência e o desenvolvimento tecnológico e econômico” 540

SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito concorrencial: as estruturas. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 43.

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202

A expressão “contrato associativo” é abrangente e pode suscitar dúvidas. Assim, o

CADE decidiu disciplinar as hipóteses de notificação de celebração de contrato associativo,

nos termos da Resolução nº 10, de 29 de outubro de 2014, vigente a partir de dezembro de

2014.541

Não se pode esquecer que empresas integrantes da Administração Indireta podem ser

entidades fomentadoras (a PETROBRAS, por exemplo, é uma das maiores financiadoras de

projetos de P,D&I no País). A questão, portanto, pode repercutir no âmbito da ação

promocional pública.

As políticas industriais referentes ao desenvolvimento tecnológico influenciam o

sistema concorrencial, podendo o desenvolvimento tecnológico ajudar a justificar tanto as

cooperações como as concentrações empresariais.

Mas isso não significa que o desenvolvimento tecnológico possa ser perseguido

irrestritamente, a qualquer preço. Ele serve como causa justificadora de uma posição de poder

“desde que a concentração não erija barreiras insuplantáveis à entrada de concorrentes e desde

que existam ganhos líquidos de eficiência.”542

Ainda de acordo com Calixto Salomão Filho, na Comunidade Europeia, os acordos

entre empresas para realização de pesquisa e desenvolvimento tecnológico estão isentos de

aplicação do direito concorrencial. Esse benefício, no entanto, é restrito pela legislação aos

casos em que não há a exploração comercial conjunta dos resultados da pesquisa tecnológica.

Acordos que limitem ou restrinjam o licenciamento de patentes pelas partes que cooperam na

pesquisa e no desenvolvimento são ilegais do ponto de vista antitruste. A patente é um

monopólio temporário que constitui exceção relevante à aplicação do direito antitruste, não

admitindo acordo entre particulares para aumentar a sua abrangência. Outrossim, os acordos

para pesquisa e desenvolvimento não devem impedir a parte de continuar a sua própria

541

Conforme a Resolução CADE nº 10/2014: “Art. 2º Respeitados os critérios objetivos estabelecidos no artigo

88 da Lei nº 12.529, de 2011, e para fins do disposto nesta lei, consideram-se associativos quaisquer contratos

com duração superior a 2 (dois) anos em que houver cooperação horizontal ou vertical ou compartilhamento

de risco que acarretem, entre as partes contratantes, relação de interdependência. § 1o Para fins do disposto no

caput deste artigo, considera-se que há cooperação horizontal ou vertical ou compartilhamento de risco que

acarretam relação de interdependência: I - nos contratos em que as partes estiverem horizontalmente

relacionadas no objeto do contrato sempre que a soma de suas participações no mercado relevante afetado pelo

contrato for igual ou superior a vinte por cento (20%); ou II – nos contratos em que as partes contratantes

estiverem verticalmente relacionadas no objeto do contrato, sempre que pelo menos uma delas detiver trinta

por cento (30%) ou mais dos mercados relevantes afetados pelo contrato, desde que preenchida pelo menos

uma das seguintes condições: a) o contrato estabeleça o compartilhamento de receitas ou prejuízos entre as

partes; b) do contrato decorra relação de exclusividade. § 2º Para fins dos incisos I e II deste artigo,

consideram-se partes contratantes as entidades diretamente envolvidas no negócio jurídico sendo notificado e

os respectivos grupos econômicos, conforme definição do artigo 4º da Resolução nº 2, de 29 de maio de 2012.

§ 3º Os contratos com duração inferior a dois anos devem ser notificados nos termos desta Resolução quando,

mediante sua renovação, o período de 2 (dois) anos for atingido ou ultrapassado. 542

SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito concorrencial: as estruturas. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 213.

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203

pesquisa. Por isso, é importante demonstrar que a união de esforços das partes é indispensável

para a realização da pesquisa, que de outro modo não se poderia realizar.543

11.4 O fomento público, a subsidiariedade e o compartilhamento de riscos

O princípio da subsidiariedade teve origem no Direito da Igreja Católica, ou seja, no

Direito Canônico.544

Na esteira dos ensinamentos de Silvia Faber Torres, Sílvio Luís Ferreira da Rocha

observa que o princípio da subsidiariedade foi concebido para proteger a autonomia dos

indivíduos contra toda intervenção pública injustificada. Registra que já estava implícito na

Encíclica Rerum Novarum do Papa Leão XIII (1891), quando elevava a dignidade da pessoa

humana à peça fundamental da doutrina social da Igreja e defendia a propriedade privada da

ira socialista, assim como o operário da exploração do liberalismo econômico. Entretanto, o

princípio da subsidiariedade tem o seu melhor enunciado na Encíclica Quadragesimo Anno.545

Também segundo José Alfredo de Oliveira Baracho, os antecedentes do princípio da

subsidiariedade encontram-se especialmente na Encíclica Quadragesimo Anno, de 1931.546

De acordo com o artigo 79 desta:

Assim como é injusto subtrair aos indivíduos o que eles podem efetuar com

a própria iniciativa e trabalho, para o confiar à comunidade, do mesmo modo

passar para uma comunidade maior e mais elevada o que comunidades

menores e inferiores podem realizar é uma injustiça, um grave dano e

perturbação da ordem social. O fim natural da sociedade e da sua ação é

coadjuvar os seus membros, e não destruí-los nem absorvê-los. 547

As Encíclicas Mater et Magistra (1961), do Papa João XXIII e Centesimo Anno, de

João Paulo II, reafirmaram o princípio da subsidiariedade.548

Apesar de sugerir uma função de suplência, o princípio também compreende a limitação

da intervenção de um órgão ou coletividade superior, podendo ser usado para restringir a

543

SALOMÃO FILHO, Calixto. Direito concorrencial: as estruturas. 3. ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 363. 544

BARACHO, José Alfredo de Oliveira. O princípio da subsidiariedade: conceito e evolução. In: CAMARGO,

Ricardo Antônio Lucas. Desenvolvimento econômico e intervenção do Estado na ordem constitucional:

estudos em homenagem ao professor Washington Peluso Albino de Souza. Porto Alegre: Sérgio Antonio

Fabris, 1995, p. 99-138, p. 119. 545

ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Terceiro Setor. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 17. 546

BARACHO, José Alfredo de Oliveira. O princípio da subsidiariedade: conceito e evolução. In: CAMARGO,

Ricardo Antônio Lucas. Desenvolvimento econômico e intervenção do Estado na ordem constitucional:

estudos em homenagem ao professor Washington Peluso Albino de Souza. Porto Alegre: Sérgio Antonio

Fabris, 1995, p. 99-138, p.120. 547

ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Terceiro Setor. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 17. 548

ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Terceiro Setor. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 17.

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204

intervenção do Estado. De outro turno, a subsidiariedade está ligada a um outro princípio, que

lhe é complementar, o princípio da unidade.549

Daí porque a doutrina indica um paradoxo inerente ao princípio da subsidiariedade –

impor limites à ação estatal, mas, ao mesmo tempo, tornar indispensável o estímulo do Poder

Público quando se afigurar impossível à comunidade menor realizar as suas próprias

necessidades, ou quando tal realização não for eficaz ou satisfatória.550

Segundo Ignacio De La Riva, das três formas clássicas de atuação administrativa, as

ajudas públicas configuram a modalidade de intervenção mais tênue, apresentando-se, por

essa mesma razão, como um meio particularmente idôneo para resguardar ou promover a

iniciativa privada. O risco está na sua vocação expansiva, que sublinha a necessidade de

prévia e estrita ponderação, em cada caso, da conveniência ou necessidade da intervenção

pública.551

O princípio da subsidiariedade, apesar de guiar o fomento público, não se aplica a todas

as atividades administrativas, não podendo o Estado, a pretexto de fomentar, deixar de

executar atividades públicas que devam ser levadas a cabo de modo direto, como saúde e

educação, embora também caiba o fomento dessas atividades quando desempenhadas por

particulares.552

Esta constatação é bastante relevante no caso das atividades de C,T&I que, conforme

cediço, devem ser realizadas tanto diretamente pelo Estado como por meio dos particulares,

não devendo a ampliação da participação empresarial nos esforços tecnológicos do País

significar a redução do papel do Estado:

Ao contrário, nos Países desenvolvidos os recursos investidos pelas

empresas em P&D são financiados em grande medida por recursos públicos,

normalmente colocados à disposição das empresas na forma de subvenção

ou com juros subsidiados. No Brasil, apesar de ter crescido a participação

pública no financiamento à P&D, 76% dos investimentos em P&D das

empresas foram realizados com recursos próprios (PINTEC 2008).553

549

BARACHO, José Alfredo de Oliveira. O princípio da subsidiariedade: conceito e evolução. In: CAMARGO,

Ricardo Antônio Lucas. Desenvolvimento econômico e intervenção do Estado na ordem constitucional:

estudos em homenagem ao professor Washington Peluso Albino de Souza. Porto Alegre: Sérgio Antonio

Fabris, 1995, p. 99-138, p.120. 550

ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Terceiro Setor. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 18. 551

DE LA RIVA, Ignacio M. La figura del fomento: necesidad de encarar uma revisión conceptual. In: Servicio

público, polícia y fomento. Buenos Aires: Rap, 2003, p. 413-422, p. 419. 552

FREIRE, André Luiz. Responsabilidade patrimonial na atividade administrativa de fomento. In:

SPARAPANI, Priscilia; ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no

domínio social: homenagem ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p.

160-186, p.169. 553

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e

Inovação 2012-2015 – Balanço das atividades estruturantes 2011. Brasília: MCTI, 2012, p. 42. Pondera

Ricardo Marcondes Martins ser equivocado supor a aplicação do princípio da subsidiariedade na seara dos

serviços públicos – esta é própria do Estado, vez que o constituinte atribui-lhe a missão de prestá-los. Somente

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205

Diretamente relacionado ao princípio da subsidiariedade, encontra-se o princípio do

risco compartilhado, que impede seja o beneficiário exonerado de todo o risco ou da

obrigatoriedade de aportar recursos próprios para a atividade fomentada.554

Conforme explica Sílvio Luiz Ferreira da Rocha, a observância do princípio da

repartição de riscos está prevista, inclusive, na Lei nº 4.320/1964, em seu artigo 16,555

quando,

ao tratar das subvenções sociais, usa o termo suplementação de recursos de origem privada, o

que indica que o fomento pressupõe o investimento de recursos privados.556

A Lei Federal nº 10.973/2004, em seu artigo 19, §3º, ao prever a concessão de recursos

financeiros a empresas nacionais e entidades nacionais de direito privado sem fins lucrativos,

sob a forma de subvenção econômica, exige a assunção de contrapartida pela empresa

beneficiária, na forma estabelecida nos instrumentos de ajuste específicos.

A Lei Complementar Paulista nº 1.049/2008, em seu artigo 18, de igual modo, prevê a

concessão de apoio financeiro inclusive a empresas e grupos de empresas, vinculada,

obrigatoriamente, à assunção de contrapartida pelo beneficiário, na forma estabelecida nos

respectivos instrumentos jurídicos.

Parece-nos que o disciplinamento de contrapartida é relevante também nas situações de

financiamento e de participações acionárias, razão pela qual não pode ser desconsiderado.

Não pode ocorrer de Administração substituir o particular, passando, simplesmente, a

sustentar as suas atividades. Considerando que as normas não indicam o que seriam

contrapartidas mínimas razoáveis, (a questão também não é tratada em decretos), estas devem

ser fixadas de forma razoável pelo administrador público.

O compartilhamento de riscos, imposição do empreendedorismo inovador, além de

ocorrer por meio da fixação de contrapartidas mínimas obrigatórias em convênios e

instrumentos congêneres também ocorre, por exemplo, mediante a diversificação das opções

de financiamento público nas micro e pequenas empresas nascentes, através de instrumentos

como capital semente557

e de risco.

com a outorga estatal, os particulares podem desempenhá-los. (MARTINS, Ricardo Marcondes. Regulação

administrativa à luz da constituição federal. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 271). 554

ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Terceiro Setor. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 33. 555

Dispõe o artigo citado: “Art. 16. Fundamentalmente e nos limites das possibilidades financeiras a concessão

de subvenções sociais visará a prestação de serviços essenciais de assistência social, médica e educacional,

sempre que a suplementação de recursos de origem privada aplicados a esses objetivos, revelar-se mais

econômica.” 556

ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Terceiro Setor. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 33. 557

É o financiamento de projetos empresarias antes da instalação do negócio, ainda na fase de projeto e de

desenvolvimento. (COMO fazer, Folha de São Paulo, São Paulo. Especial. p. 6, 17 nov. 2014).

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206

11.5 O fomento público à inovação tecnológica motivado, transparente e controlado

O fomento público republicano é o fomento motivado, transparente e controlado.

Mediante a motivação, os cidadãos podem conhecer as razões que levaram o Poder

Público a fomentar determinada atividade, controlando a validade dos benefícios concedidos.

Somente por meio da indicação das razões de fato e de direito torna-se possível verificar se os

pressupostos de validade do ato administrativo, especialmente o finalístico e o lógico, foram

observados.558

A motivação ajuda, ainda, a impedir que a atividade administrativa de fomento seja

exercida sem observância do princípio da igualdade, dificultando a concessão de privilégios

arbitrários ou fortuitos.559

A motivação é sempre obrigatória. Quando não realizada, em caso de fomento concreto,

os argumentos em prol da invalidação do ato são muito mais intensos do que em relação ao

fomento abstrato; a probabilidade de invalidação também é mais intensa no fomento

individual, em relação ao fomento geral.560

A motivação vincula-se intrinsecamente à transparência.

A transparência implica o dever de divulgar à sociedade, de forma clara, objetiva e

sistematizada, os diversos instrumentos de fomento colocados à disposição dos cidadãos,

inclusive seu modo de funcionamento.

Os estudos relacionados à área da C,T&I há tempos indicam a necessidade urgente de

estabelecer as regras claras do jogo, a fim de atrair os investimentos privados. Essas regras

não dizem respeito somente à concessão de recursos financeiros na forma de subvenções,

financiamentos, participações acionárias, mas também à constituição de ambientes de

inovação e, eventualmente, de alianças estratégicas.

O dever de obediência ao princípio da transparência, assim como o dever de

atendimento ao princípio da igualdade, remete à procedimentalização.

558

FREIRE, André Luiz. Responsabilidade patrimonial na atividade administrativa de fomento. In:

SPARAPANI, Priscilia; ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no

domínio social: homenagem ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p.

160-186, p.169. 559

MELLO, Rafael Munhoz de. Atividades de fomento e o princípio da isonomia. In: SPARAPANI, Priscilia;

ADRI, Renata Porto (Coord.). Intervenção do Estado no domínio econômico e no domínio social: homenagem

ao Professor Celso Antônio Bandeira de Mello. Belo Horizonte: Fórum, 2010, p. 263-285, p. 282. 560

MARTINS, Ricardo Marcondes. Regulação administrativa à luz da constituição federal. São Paulo:

Malheiros, 2011, p. 268.

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207

Conforme José Vicente Santos de Mendonça, “a existência de procedimento concessivo

prévio, e o acesso e o conhecimento, por todos os interessados, de todas as suas fases é, numa

síntese, o conteúdo mínimo do primeiro critério formal do fomento público.”561

Caso não seja possível promover o fomento mediante o amplo acesso de todos os

interessados, o procedimento público deve promover a competitividade, a fim de que sejam

selecionados os agentes que tenham condições de melhor desempenhar a atividade a partir do

fomento público. A seleção deve ser baseada preferencialmente em critérios objetivos.

Quando isso não for possível, é importante delegar o ônus da decisão a um colegiado de

julgadores.562

Devem ser privilegiadas soluções voltadas a otimizar decisões vinculadas, atribuindo-se

a discrição apenas na medida indispensável à implementação administrativa do interesse

público.563

A procedimentalização mostra-se relevante ao assegurar maior segurança jurídica não

somente ao ente fomentado mas também ao ente fomentador. Os processos de inovação

tecnológica são caros, complexos, multidisciplinares, não lineares, indissociáveis do elemento

risco. A existência de parâmetros para a atuação de agentes públicos e privados contribui para

a diminuição das incertezas que envolvem naturalmente a matéria, tão carente de referências

jurisprudenciais e doutrinárias, em prol da segurança jurídica.

A segurança jurídica designa a existência de instituições estatais sujeitas ao princípio da

legalidade; confiança na atuação do Poder Público, regida pela boa-fé e pela razoabilidade;

estabilidade das relações jurídicas, permanência e anterioridade das normas em relação aos

fatos que ela regula, previsibilidade de comportamentos e igualdade.564

O fomento público do Estado Democrático de Direito é o fomento controlado.

A lógica da atividade promocional pública está na concretização de atividades privadas

de interesse público. O fomento público opera políticas públicas – a falta ou a deficiência de

controle aumenta os riscos existentes nesse tipo de atuação, podendo, inclusive, comprometer

o resultado pretendido pela ação governamental e, consequentemente, a legitimidade do

instituto.

561

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Direito constitucional econômico: a intervenção do Estado na

economia à luz da razão prática e do pragmatismo. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 403. 562

MENDONÇA, José Vicente Santos de. Direito constitucional econômico: a intervenção do Estado na

economia à luz da razão prática e do pragmatismo. Belo Horizonte: Fórum, 2014, p. 404. 563

OLIVEIRA, José Roberto Pimenta. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade no direito

administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 527. 564

PIRES, Maria Coeli Simões. Direito, segurança jurídica e inovação: contexto, novos paradigmas e

modelagem democrática. In: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. et al. (Org.). Direito e Administração Pública:

estudos em homenagem a Maria Sylvia Zanella Di Pietro. São Paulo: Atlas, 2013, p. 155-172, p. 164.

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208

Sem o acompanhamento e a avaliação dos impactos das medidas promocionais

adotadas, não é possível saber se e em que medida os tão desejados resultados almejados pelo

Estado foram concretizados.

A tarefa é deveras complexa e difícil, afinal, a inovação tecnológica relaciona-se, antes

de tudo, à aplicação do conhecimento, bem intangível.

Deve haver, portanto, transparência em relação ao acompanhamento e ao controle de

resultados da ação promocional empreendida pelo Estado, assim como a manutenção de

infraestrutura estatal especializada, necessária à plena e efetiva execução dessas atividades.

O Tribunal de Contas da União vem despertando para a relevância dos assuntos da

inovação tecnológica para o desenvolvimento nacional.

O Relatório de Levantamento objeto dos autos do processo TC nº 011.261/2009-9 teve

por finalidade analisar a organização e a operacionalização da ação subvenção econômica a

projetos de desenvolvimento tecnológico (Lei nº 10.973/2004), do Programa Ciência,

Tecnologia e Inovação para a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior

(PITCE), e da ação Fomento a Projetos de Implementação e Recuperação da Infraestrutura de

Pesquisa das Instituições Públicas (CT-Infra), do Programa Promoção da Pesquisa e do

Desenvolvimento Científico e Tecnológico, com o propósito de gerar a agenda de

fiscalizações a serem realizadas pelo TCU.

As citadas ações são operacionalizadas, respectivamente, por meio da concessão de

recursos financeiros, sob a forma de subvenção econômica, a empresas e entidades nacionais,

e sob a forma de financiamento de projetos para implantação, recuperação e modernização da

infraestrutura de pesquisa nas instituições públicas de ensino superior.

Segundo o Relatório de Auditoria:

Essa forma de apoio governamental, pela sua complexidade, pode envolver

riscos variados, na medida em que pressupõe a existência de uma estrutura

de controle adequada para assegurar a transparência na aplicação dos

recursos, a avaliação técnica dos projetos, bem como o acompanhamento dos

resultados. Há que se considerar ainda os instrumentos de que dispõe o

gestor para avaliar os riscos inerentes à própria atividade econômica da

inovação, pesquisa e desenvolvimento das entidades subvencionadas e

financiadas. Até o momento, não foram identificadas auditorias de natureza

operacional realizadas pelo TCU que tenham contemplado essas ações.565

565

Relatório de levantamento – nas ações: Subvenção Econômica a Projetos de Desenvolvimento Tecnológico e

Fomento a Projetos de Implementação e Recuperação de Infra-Estrutura de Pesquisa das Instituições Públicas

(CT-infra). Relator: Auditor André Luís de Carvalho. Fiscalis: nº 441/2009. Disponível em: www.tcu.gov.br.

Acesso em: 05 nov. 2014.

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209

Por ocasião desse levantamento, foram constatados diversos eventos de riscos, por

exemplo: (I) na ação fomento a projetos de implantação e recuperação da infraestrutura de

pesquisa das instituições públicas: a) escolha de projetos dissociados dos objetivos do

programa e da política de C&T, bem como direcionamento para projetos circunstanciais;566

b) afastamento dos projetos elaborados pelas universidades das orientações estratégicas da

política governamental de ciência e tecnologia;567

c) sobreposição de apoios financeiros; 568

d)

desvio de finalidade na execução de convênios;569

e) celebração de convênios com

instituições inadimplentes;570

(II) na ação subvenção econômica a projetos de

566

Segundo o Relatório, foi constatado o não atendimento das disposições do art. 6º, do Decreto Federal nº

3.807/2001. Os documentos previstos neste dispositivo (regimento interno, diretrizes estratégicas, plano

plurianual de investimento, documento básico, critérios de seleção e parâmetros de julgamento), seriam

norteadores das chamadas públicas e deveriam direcionar os editais das chamadas realizadas pela Finep.

Relatório de levantamento – nas ações: Subvenção Econômica a Projetos de Desenvolvimento Tecnológico e

Fomento a Projetos de Implementação e Recuperação de Infra-Estrutura de Pesquisa das Instituições Públicas

(CT-infra). Relator: Auditor André Luís de Carvalho. Fiscalis: nº 441/2009, p. 17. Disponível em:

www.tcu.gov.br. Acesso em: 05 nov. 2014). 567

Segundo o Relatório, as chamadas pública realizadas no âmbito do CT-Infra exigem a apresentação de

proposta, pelas universidades, nas quais devem ser identificadas as áreas de pesquisa priorizadas para receber

investimentos em infraestrutura e os resultados e impactos que tais investimentos deverão acarretar para o

desenvolvimento da pesquisa e da pós-graduação nessas áreas. A ideia é valorizar a realização de

planejamento estratégico das universidades. Todavia, “O problema não está em fomentar o planejamento

estratégico das universidades ou preconizar a aderência ao planejamento institucional. A questão é a ausência

de identificação de lacunas em áreas estratégicas prioritárias e a ausência de criação de novas estruturas de

C&T em apoio a segmentos econômicos estratégicos do país [...]” (Relatório de levantamento – nas ações:

Subvenção Econômica a Projetos de Desenvolvimento Tecnológico e Fomento a Projetos de Implementação e

Recuperação de Infra-Estrutura de Pesquisa das Instituições Públicas (CT-infra). Relator: Auditor André Luís

de Carvalho. Fiscalis: nº 441/2009, p. 22. Disponível em: www.tcu.gov.br. Acesso em: 05 nov. 2014). 568

Segundo o Relatório, esse risco existia em razão da ausência de um banco de dados completo e suficiente que

contivesse informações detalhadas sobre os projetos financiados para subsidiar o processo de escolha. Havia

possibilidade de sobreposição de apoio financeiro da Finep para os mesmos projetos por ela já financiados ou

por outras agências de fomento governamentais: “No caso de ocorrerem sobreposições, haverá desperdício de

recursos públicos e diminuição do número de projetos que poderiam ser financiados em função da alocação

inadequada dos recursos disponíveis.” Relatório de levantamento – nas ações: Subvenção Econômica a

Projetos de Desenvolvimento Tecnológico e Fomento a Projetos de Implementação e Recuperação de Infra-

Estrutura de Pesquisa das Instituições Públicas (CT-infra). Relator: Auditor André Luís de Carvalho. Fiscalis:

nº 441/2009, p. 27. Disponível em: www.tcu.gov.br. Acesso em: 05 nov. 2014). 569

Segundo o Relatório, “A falta de descrição detalhada, objetiva e clara de modo a permitir a identificação

exata do que se pretende realizar ou obter facilita a ocorrência de desvio de finalidade e (ou) eu objeto.”

(Relatório de levantamento – nas ações: Subvenção Econômica a Projetos de Desenvolvimento Tecnológico e

Fomento a Projetos de Implementação e Recuperação de Infra-Estrutura de Pesquisa das Instituições Públicas

(CT-infra). Relator: Auditor André Luís de Carvalho. Fiscalis: nº 441/2009, p. 27. Disponível em:

www.tcu.gov.br. Acesso em: 05 nov. 2014). 570

Segundo o Relatório, “Este risco consiste na celebração de convênios com instituições que pactuaram outros

acordos com a Finep e não cumpriram suas obrigações conveniais [...] A possível causa da celebração de

convênios com instituições inadimplentes está relacionada à falta de acompanhamento e ausência da utilização

de instrumentos adequados, a exemplo da Tomada de Contas Especial, para obter o devido ressarcimento das

entidades.” (Relatório de levantamento – nas ações: Subvenção Econômica a Projetos de Desenvolvimento

Tecnológico e Fomento a Projetos de Implementação e Recuperação de Infra-Estrutura de Pesquisa das

Instituições Públicas (CT-infra). Relator: Auditor André Luís de Carvalho. Fiscalis: nº 441/2009, p. 28.

Disponível em: www.tcu.gov.br. Acesso em: 05 nov. 2014).

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210

desenvolvimento tecnológico:571

(a) descumprimento de normas previstas em editais de

seleção pública; b) superposição de apoios financeiros da FINEP e entre a FINEP, o CNPq e o

BNDES às mesmas empresas e para os mesmos projetos de inovação;572

c) priorização de

projetos menos prioritários em detrimento de outros de maior mérito;573

d) perda da

oportunidade de analisar projetos inovadores, por falta de conhecimento, pelas empresas, dos

instrumentos de estímulo ao desenvolvimento tecnológico.574

O Acórdão nº 393/2010 – Plenário, que aprovou o Relatório pertinente aos autos do

processo TC nº 011.261/2009-9, dispôs:

571

Segundo o Relatório, “[...] caso uma microempresa, no desenvolvimento do contrato celebrado, venha a ser

adquirida pela empresa de grande porte e não exista um reequilíbrio contratual, a grande empresa poderá ter

acesso a recursos sem ofertar a contrapartida correspondente a seu porte, descumprindo, ainda que por via

reflexa, as normas prévias do edital. (Relatório de levantamento – nas ações: Subvenção Econômica a Projetos

de Desenvolvimento Tecnológico e Fomento a Projetos de Implementação e Recuperação de Infra-Estrutura

de Pesquisa das Instituições Públicas (CT-infra). Relator: Auditor André Luís de Carvalho. Fiscalis: nº

441/2009, p. 35. Disponível em: www.tcu.gov.br. Acesso em: 05 nov. 2014). 572

Segundo o Relatório, “Entende-se que a possibilidade de uma mesma empresa obter recursos de várias fontes

distintas, por si só, não representa um problema, mas, em se tratando de objetivos a serem alcançados por

determinada política pública, essa concentração de recursos em certas entidades pode acarretar a ineficiência

na alocação desses recursos, limitando o alcance potencial dos instrumentos no estímulo às atividades de

inovação.” (Relatório de levantamento – nas ações: Subvenção Econômica a Projetos de Desenvolvimento

Tecnológico e Fomento a Projetos de Implementação e Recuperação de Infra-Estrutura de Pesquisa das

Instituições Públicas (CT-infra). Relator: Auditor André Luís de Carvalho. Fiscalis: nº 441/2009, p. 42.

Disponível em: www.tcu.gov.br. Acesso em: 05 nov. 2014). 573

Segundo o Relatório “A Subvenção econômica foi instituída pela Lei nº 10.973, de 2 de dezembro de 2004, e

regulamentada pelo Decreto nº 5.563, de 11 de outubro de 2005. O § 6º do art. 20 do referido Decreto

determina que Ato conjunto dos Ministros da Ciência e Tecnologia, do Desenvolvimento, Indústria e

Comércio Exterior e da Fazenda definirá anualmente o percentual a ser destinado exclusivamente à subvenção

para as microempresas e empresas de pequeno porte. Já a lei nº 11.540, de 12 de novembro de 2007, que

dispõe sobre o FNDCT, determina no parágrafo único do art. 16 que no mínimo, 30% (trinta por cento) dos

recursos serão aplicados em instituições sediadas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, incluindo s

respectivas áreas de abrangência das Agências de Desenvolvimento Regional. Em 2006 e 2007, Portarias

Interministeriais destinaram a aplicação de 40% dos recursos para micro e pequenas empresas. Já para as

chamadas públicas de 2008 e 2009, as Portarias passaram a exigir que 30% dos recursos fossem aplicados em

projetos oriundos de empresas localizadas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.” Pode ocorrer de

projetos que não possuem risco tecnológico estejam sendo aprovados para simplesmente cumprirem as

determinações legais, comprometendo os resultados das subvenções econômicas. Especialistas divergem em

relação ao uso do mecanismo da subvenção para estimular inovação tecnológica em empresas de pequeno

porte, sendo o assunto bastante polêmico. “Enquanto não for feita uma avaliação dos resultados da subvenção

econômica, não será possível verificar se os percentuais de recursos definidos estão realmente incentivando a

pesquisa e o desenvolvimento tecnológico.” (Relatório de levantamento – nas ações: Subvenção Econômica a

Projetos de Desenvolvimento Tecnológico e Fomento a Projetos de Implementação e Recuperação de Infra-

Estrutura de Pesquisa das Instituições Públicas (CT-infra). Relator: Auditor André Luís de Carvalho. Fiscalis:

nº 441/2009, p. 42. Disponível em: www.tcu.gov.br. Acesso em: 05 nov. 2014). 574

Segundo o Relatório “as empresas não estão estruturadas para retirar o maior proveio dos novos instrumentos

de estímulo ao desenvolvimento tecnológico, ora por não estarem suficientemente informadas acerca da

existência e do funcionamento de tais instrumentos, ora por não possuírem know how na elaboração de bons

projetos para solicitação de apoio financeiro. Desse modo, torna-se oportuno atentar para o risco de perda de

projetos inovadores que por ventura possam existir no ambiente interno das empresas, mas que estejam

impossibilitadas de chegar à sociedade em razão das causas já apontadas.” (Relatório de levantamento – nas

ações: Subvenção Econômica a Projetos de Desenvolvimento Tecnológico e Fomento a Projetos de

Implementação e Recuperação de Infra-Estrutura de Pesquisa das Instituições Públicas (CT-infra). Relator:

Auditor André Luís de Carvalho. Fiscalis: nº 441/2009, p. 45. Disponível em: www.tcu.gov.br. Acesso em: 05

nov. 2014).

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211

[...]

1.5. Determinar à Finep que preveja, na minuta do contrato anexa ao Edital

de Subvenção Econômica, dispositivos contratuais que exijam repactuações

para restabelecer o equilíbrio contratual quando ocorrerem aquisições das

micro e pequenas empresas beneficiadas pela subvenção por empresas de

porte superior, de maneira que a contrapartida seja compatível com o porte

da empresa adquirente, em cumprimento às normas do edital.

1.6. Recomendar à Finep que estruture a sistemática de monitoramento e

avaliação dos projetos contemplados por meio de subvenção econômica.

[...]

O Acórdão nº 394/2010, pertinente aos autos do processo TC nº 028.369/2009-8

enfatizou a necessidade de maior transparência nos processos do CT-Infra:

1.5. Determinações:

1.5.1. ao Comitê Gestor do CT-Infra que:

1.5.1.1. elabore ou atualize os documentos previstos no art. 6º do Decreto nº

3.807/2001;

1.5.1.2 delibere expressamente sobre a alocação de recursos para projetos

contratados sob a modalidade encomenda, justificando a escolha e o valor

dos projetos, de maneira a dar mais transparência e legitimidade à escolha,

com supedâneo no art. 6º, inciso IV do Decreto nº 3.807/2001.575

O Relatório de Levantamento objeto dos autos do processo TC n° 002.105/2012-8 teve

por escopo caracterizar a construção e o acompanhamento das metas definidas pelas atuais

políticas de C,T&I, com o foco na sua contribuição à sustentabilidade do crescimento

econômico brasileiro, assim como identificar os principais pontos críticos na gestão e

operacionalização dos instrumentos de fomento administrados pela FINEP, que são os

principais mecanismos públicos de estímulo direto ao investimento em P,D&I existentes no

País.

O documento admitiu como premissa “o fato de que um país não consegue sustentar o

seu crescimento econômico de longo prazo sem fortes investimentos públicos e privados em

ciência, em tecnologia e em inovação”.576

Alguns dos pontos críticos identificados pela equipe de auditoria do Tribunal

apontavam para a necessidade de maior transparência no processo de definição de áreas

temáticas e de classificação dos critérios de aprovação dos projetos. Relacionavam-se,

também, à ausência de avaliação pela FINEP dos resultados das ações fomentadas, tanto em

relação ao setor empresarial (crédito, subvenção e investimentos), como em relação às ICTs

(recursos não reembolsáveis).

575

Houve cumprimento parcial das deliberações, conforme o Acórdão nº 103/2012- Plenário, TC nº

015.581/2012-8, que tratou do monitoramento das deliberações constantes do Acórdão nº 394/2010 – Plenário. 576

Relatório de Levantamento sobre as Políticas de Cência, Tecnologia e Inovação no Brasil e sobre o papel

exercido pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) nesse contexto, p. 44. Disponível em:

www.tcu.gov.br. Acesso em: 05 nov. 2014).

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212

No Acórdão nº 2000/2012, referente ao TC nº 025.819/2006-5 deliberou-se pelo

encaminhamento do Relatório de Levantamento para as Secretarias competentes, de modo a

orientar futuras ações de controle.

O Relatório de Levantamento objeto dos autos do processo TC nº 025.819/2006-5, que

teve por escopo avaliar a transparência das informações sobre aplicação de recursos das

agências de fomento, em atendimento ao disposto no art. 49 da Lei de Responsabilidade

Fiscal, em 2007, apontou que:

o grande número de informações publicadas a respeito da aplicação dos

recursos das agências financeiras oficiais de fomento pouco contribuiu para

a transparência dessas informações, uma vez que dados relevantes,

principalmente aqueles relacionados aos fluxos de empréstimos e

recebimentos, não são disponibilizados de forma harmoniosa.

O Acórdão nº 287/2007 – Plenário, pertinente ao processo nº TC nº 025.819/2006-5,

também ressaltou a importância da transparência das informações relacionadas à aplicação de

recursos financeiros pelas agências financeiras oficiais de fomento:

9.1. determinar à Secretaria do Tesouro Nacional – STN que, na qualidade

de órgão central de Contabilidade da União, conforme Lei nº 10.180/2001 e,

por força do disposto no § 2º do art. 50 da Lei Complementar nº 101/2000,

observe os dispositivos reiteradamente constantes das Leis de Diretrizes

Orçamentárias – LDO, inclusive da Lei nº 11.439/2006 (LDO 2007), que

dispõem sobre a obrigatoriedade de publicação de informações referentes à

aplicação dos recursos das agências financeiras oficiais de fomento nos

Relatórios Resumidos da Execução Orçamentária – RREO;

9.2 determinar à Secretaria do Tesouro Nacional – STN, por força do

disposto no art. 18, inciso VI, da Lei nº 10.180/2001, e à Secretaria Federal

de Controle Interno – SFC, por conta do disposto no art. 24, inciso X, da

mesma lei, que incluam na Prestação de Contas Anual do Presidente da

República:

9.2.1. as informações a que se refere o art. 49, parágrafo único, da Lei

Complementar nº 101/2000, de forma a evidenciar, detalhadamente, para

cada uma das respetivas agências de fomento, dentre outras informações, os

valores concedidos e os valores aplicados por região, por setor de atividade e

por tipo de fonte de financiamento do orçamento fiscal e seguridade social,

acompanhados dos saldos anteriores e atuais, encargos apropriados, valores

devidos e recebidos e inadimplência;

[...]

A relevância da atuação do Tribunal de Contas da União em relação às políticas e ações

para fomento da C,T&I foi expressamente reconhecida no Voto do Relatório de

Levantamento objeto dos autos do processo TC nº 004.795/2011-3, que teve por objeto

aprofundar o conhecimento das políticas e ações afetas à atuação do Ministério do

Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), subsidiando a escolha de futuras auditorias

do Tribunal:

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213

Para que o desenvolvimento seja economicamente sustentável, ele tem que

estar alicerçado em ciência, tecnologia e inovação. Caso contrário, mais cedo

ou mais tarde, a economia do país sofrerá inflexões irreversíveis ou, no

mínimo, ficará à mercê da conhecida volatividade dos mercados

internacionais, principalmente o de commodities.

Em razão disso, o Tribunal presta um relevante serviço à sociedade brasileira

ao decidir atuar em áreas que, em geral, não são o foco das fiscalizações,

seja em razão de que não envolvem (embora deveriam) grandes montantes

de recursos financeiros (materialidade) se comparadas com outras como

infraestrutura e regulação, seja por, aparentemente, apresentarem menos

problemas (riscos).

Todavia, a percepção relacionada à materialidade pode estar equivocada,

quando se observa o potencial de geração de externalidades positivas das

citadas áreas.

Igualmente, pode estar se cometendo um erro quando, a priori, se atribui um

nível baixo de risco às mencionadas áreas.

Nesse sentido, o trabalho da Seprog foi profícuo e efetivo, porquanto,

mediante um inconteste estudo técnico, logrou identificar sete oportunidades

de fiscalização, que se mostram pertinentes do ponto de vista dos critérios

objetivos de relevância, oportunidade, materialidade e risco, os quais devem

nortear a realização de ações de controle pelo Tribunal.

No âmbito do Estado de São Paulo não há informações (de fácil acesso ao público, pelo

menos) a respeito de eventuais avaliações específicas empreendidas pelo Tribunal de Contas

do Estado acerca de programas governamentais, inclusive na área da C,T&I.

Mostra-se necessário incrementar a segurança jurídica e a efetividade normativa no

âmbito da inovação, apontando Maria Coeli Simões Pires, como alternativa para isto a criação

de formas de mensuração do impacto do marco regulatório existente, a ampliação da a

transparência no trato institucional do tema, o fortalecimento do accountability e a realização

de escolhas claras em relação aos métodos interpretativos utilizados para o tratamento da

legislação pertinente.577

O fomento público republicano é também o fomento que incorpora a ampliação da

participação da sociedade.

Conforme constatado, já em 1985, pela 1ª Conferência Nacional de Ciência e

Tecnologia (CNCT), no Brasil, a política de C&T, apesar de ter recebido um impulso

considerável a partir da década de 70, quando veio a estruturar um arcabouço institucional

próprio, com recursos explicitamente alocados pelo Estado para as atividades de pesquisa, não

ensejou um maior envolvimento da sociedade no seu traçado.578

577

PIRES, Maria Coeli Simões. Direito, segurança jurídica e inovação: contexto, novos paradigmas e

modelagem democrática. In: DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. et al. (Org.). Direito e Administração Pública:

estudos em homenagem a Maria Sylvia Zanella Di Pietro. São Paulo: Atlas, 2013, p. 155-172, p. 169. 578

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Ciência e tecnologia: numa sociedade democrática. Brasília:

MCT, 1985, p. 57.

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214

Segundo referida Conferência, podem ser citados como fatores dessa situação: a) os

condicionamentos resultantes da realidade política brasileira que, durante muitos anos, não

privilegiou a participação social nas políticas de Estado, de forma geral; b) a especialização

inerente ao tema que, em geral, tende a transformá-lo num assunto hermético ao cidadão

comum. Muitas vezes, o cidadão comum encontra dificuldades para identificar os efeitos da

política de C&T (e atualmente, de C,T&I) no dia-a-dia de sua comunidade, visto serem os

seus objetivos, em geral, definidos a longo prazo, e estarem embutidos em outras políticas de

Estado; c) a complexidade do arcabouço institucional em meio ao qual é definida a política de

C,T&I apresenta dificuldades adicionais à participação dos vários segmentos sociais com

interesse em seu direcionamento. Essa política possui uma interface com praticamente todas

as demais políticas de Estado – é uma política-meio para atingir-se objetivos setoriais

específicos – por esse motivo, ela não se configura com contornos e esferas de ação e decisão

precisas. Pode haver avanços notáveis em determinadas áreas e fragilidade em outras.579

As políticas e C,T&I dependem eminentemente de recursos públicos e da definição de

prioridades governamentais nos campos econômico e social. Os seus resultados impactam o

meio ambiente e a qualidade de vida de todos os cidadãos.580

Nesse sentido, espera-se que “a

disseminação de novos conhecimentos e novas tecnologias sejam capazes de ampliar o acesso

da população a novos bens e serviços, e que gerem melhorias concretas para a coletividade,

diminuindo as desigualdades sociais existentes”.581

É necessário, portanto, assegurar à sociedade instrumentos efetivos à sua participação

no processo de decisões sobre os rumos do desenvolvimento tecnológico do País, inclusive

naquilo que se refere ao seu fomento pelo Estado.

A atividade promocional pública relaciona-se com a Administração concertada – não

pode ser concebida sem o estabelecimento de diálogo com a sociedade.

579

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA. Ciência e tecnologia: numa sociedade democrática. Brasília:

MCT, 1985, p. 58. 580

A C,T&I pode contribuir com o desenvolvimento de métodos e técnicas que atendam a demandas nas áreas

da educação, saúde, segurança, transporte e energia. Pode contribuir com a superação da pobreza e a redução

das desigualdades sociais, por meio, por exemplo, de tecnologias assistivas para a inclusão de pessoas

portadoras de necessidades especiais; inclusão digital; desenvolvimento de novas tecnologias urbanas e

habitacionais, para ajudar a equacionar problemas como enchentes e deslizamentos. (MINISTÉRIO DA

CIÊNCIA TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação 2012-

2015 – Balanço das atividades estruturantes 2011. Brasília: MCTI, 2012, p. 39). 581

MINISTÉRIO DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E INOVAÇÃO. Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e

Inovação 2012-2015 – Balanço das atividades estruturantes 2011. Brasília: MCTI, 2012, p. 28

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215

PARTE III - CONCLUSÃO

1. A Constituição Federal de 1988 dá guarida à figura do fomento público,

prevendo o dever de o Estado promover e incentivar o desenvolvimento científico, a pesquisa,

a capacitação e a autonomia tecnológicas.

2. Segundo a Lei Maior, a pesquisa científica básica deve receber tratamento

prioritário do Estado, tendo em vista o bem público e o progresso das ciências; a pesquisa

tecnológica deve voltar-se preponderantemente para a solução dos problemas brasileiros e

para o desenvolvimento do sistema produtivo nacional e regional.

3. A Constituição do Estado de São Paulo de 1989, tal como a Constituição

Federal de 1988, estabelece o dever de fomento do Estado ao desenvolvimento científico, à

pesquisa, à capacitação e à autonomia tecnológicas.

4. O desenvolvimento do sistema produtivo nacional, a conquista da autonomia

tecnológica e a melhora da capacidade de inserção do Brasil em mercados intensivos em

conhecimento dependem, cada vez mais, da ampliação de seus esforços tecnológicos e da sua

capacidade de inovar, ou seja, de inserir nos mercados produtos (bens ou serviços) ou

processos novos ou significativamente melhorados.

5. Não basta, nos dias de hoje, apenas fazer pesquisa, ciência e tecnologia.

6. No Brasil, a cultura da inovação é recente. A indústria não possui tradição em

inovar nem tampouco em contratar pessoal mais qualificado (como mestres e doutores).

Embora tenha havido, nos últimos anos, considerável aumento da capacidade científica

brasileira, existe uma inegável defasagem tecnológica em relação aos países mais

desenvolvidos, sendo premente estimular a maior participação dos investimentos privados nos

esforços tecnológicos do País, sem que isto signifique a redução ou a substituição dos

investimentos públicos destinados à C,T&I.

7. A inovação tecnológica depende da robustez do quadro jurídico-institucional

vigente e da sua capacidade de promover a articulação com o setor empresarial, favorecendo,

assim, as condições para o investimento produtivo inovador.

8. O fomento público é fundamental para que as empresas realizem inovações

tecnológicas, haja vista que há situações em que, sem o apoio do Estado, não há incentivos

suficientes para o empreendedorismo privado que, indiretamente, satisfaz o interesse público.

9. A inovação tecnológica demanda a combinação de diferentes tipos de

conhecimento, o que requer um sistema eficiente de articulação, de coordenação e de

comunicação entre os vários atores dos sistemas de inovação.

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216

10. Os sistemas de inovação são baseados na divisão de trabalho de diversos

atores, que possuem diferentes tipos de conhecimento, culturas, objetivos, regimes jurídicos.

11. Na inovação tecnológica a interação é algo fundamental, o que torna o

desenvolvimento da confiança e da segurança jurídica essencial para a superação da incerteza

associada à atividade. Quanto maiores o risco e a incerteza das atividades, maior a

necessidade de interação e incentivo aos parceiros.

12. Considera-se de fundamental importância que a legislação referente à

promoção da C,T&I permita dinamizar a relação entre os diversos atores dos sistemas de

inovação, especialmente o Poder Público, as universidades, os institutos de pesquisa e o setor

produtivo nacional.

13. No País, o arcabouço legal de fomento público à inovação tecnológica ainda

não é suficientemente claro e consistente para servir de instrumento efetivo de estímulo ao

setor privado à pesquisa, ao desenvolvimento e à inovação tecnológica, especialmente no que

se refere à construção de ambientes especializados e cooperativos de inovação. Atualmente, o

tratamento legal da matéria é feito de forma pouco sistematizada.

14. A principal lei de regência da matéria, a Lei Federal nº 10.973/2004, não

obstante o fato de constituir um importante ponto de partida para fomentar um modelo de país

mais inovador, apresenta deficiências. A Lei Complementar Paulista nº 1.049/2008 também

possui vários pontos geradores de incertezas.

15. A relação entre a Lei nº 10.973/2004 e a Lei nº 8.666/93, de igual modo, tem

ensejado uma série de dúvidas àqueles que precisam construir soluções práticas e teóricas

para os desafios lançados cotidianamente pela necessidade de inovar.

16. Convivem, diariamente, de um lado, o risco da ocorrência de problemas

relacionados a uma indevida e generalizada aplicação do regime peculiar próprio da Lei nº

8.666/93 aos instrumentos de parcerias para o fomento à inovação e, de outro, o risco da não

observância dos princípios do regime jurídico administrativo na execução da função

promocional pública.

17. Em geral, faltam diretrizes e parâmetros aptos a assegurar aos investidores

privados maior segurança quanto aos negócios jurídicos a serem celebrados com os atores

públicos dos sistemas de inovação. Essa mesma falta de clareza quanto às regras do jogo,

frequentemente, impede o administrador público de agir. Isso porque, não raras vezes, este,

entre não atuar ou exercer competências discricionárias em relação a assuntos novos, para os

quais não existe posicionamento dos órgãos de controle, prefere, simplesmente, por receio,

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217

não se expor, ou seja, deixar de agir. O problema é que o deixar de agir também pode ser

prejudicial ao desenvolvimento nacional.

18. Somam-se a esse cenário de insegurança jurídica os seguintes fatores: o

desconhecimento, de modo geral, pela sociedade, da legislação de incentivo à inovação,

inclusive pelos órgãos de controle; a falta de debate sobre as dúvidas e divergências de

interpretação geradas por tal legislação; a inexistência de uma cultura de inovação sólida no

País; a falta de transparência em relação a muitos assuntos da área; a falta de mecanismos de

acompanhamento e de avaliação dos resultados obtidos a partir das ações fomentadoras

empreendidas pelo Estado.

19. A revisão e o aperfeiçoamento do arcabouço jurídico-institucional de

regulamentação da inovação tecnológica no Brasil é medida que se impõe, exigindo o

enfrentamento de diversos obstáculos. Por se tratar de um tema bastante amplo, novo e

complexo, o debate precisa ser ampliado e aprofundado por todos os atores dos sistemas de

inovação, sem se perder de vista os seus diferentes interesses e objetivos.

20. Conforme verificado no decorrer deste trabalho, segundo os ensinamentos de

Denis Borges Barbosa, a Lei nº 10.973/2004 compreende cinco grandes grupos de normas,

quais sejam: a) a constituição de ambientes propícios às parcerias estratégicas entre

universidades, institutos tecnológicos e empresas; b) o estímulo à participação de instituições

de ciência e tecnologia no processo de inovação; c) as normas de incentivo ao pesquisador-

criador; d) o incentivo à inovação na empresa; e e) a apropriação de tecnologias. No presente

estudo, buscou-se aprofundar a análise, em especial, das normas relacionadas à construção de

ambientes especializados e cooperativos de inovação. Cumpre enfatizar, todavia, que em cada

um dos demais grupos de normas há diversas questões que merecem análise sob a ótica do

Direito Administrativo.

21. A título meramente exemplificativo, o estímulo à participação das ICTs no

processo de inovação passa, necessariamente, pelo debate acerca da celebração de contratos

de transferência de tecnologia e de licenciamento para a outorga do direito de uso ou de

exploração de criação por elas desenvolvida. Nesses ajustes, desde logo, surge a pergunta -

como ponderar o necessário dever de observância dos princípios da publicidade e da

igualdade com as restrições naturalmente relacionadas à escolha do parceiro ideal, à proteção

de criações pelas normas do Direito de Propriedade Industrial e às questões de sigilo, tão

caras ao setor produtivo ?

22. O afastamento de pesquisadores públicos para participação em atividades de

outras instituições científicas e tecnológicas, assim como para a participação na constituição

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218

de empresas com a finalidade de desenvolver atividades empresariais relacionadas à inovação

é um dos muitos outros temas que merecem a reflexão dos estudiosos do Direito

Administrativo.

23. De igual sorte, a concessão de recursos financeiros às empresas, sob a forma de

subvenção, figura típica do fomento público, assim como as questões pertinentes ao uso do

poder de compra do Estado, mediante compras de tecnologia, oferecem múltiplas

possibilidades para o debate jurídico da matéria.

24. Uma das questões mais importantes da atualidade diz respeito à análise de

impacto do marco regulatório do setor, assim como dos mecanismos de acompanhamento e de

avaliação dos resultados obtidos por meio da atuação fomentadora pública. O estudo dos

aparatos e instrumentos capazes de melhor aferir a eficiência e a destinação

constitucionalmente adequada dos investimentos públicos às atividades privadas voltadas à

inovação tecnológica é uma pauta que deveria ser tratada também pelo Direito, vez que

diretamente relacionada à legitimidade do instituto fomento público.

25. São muitas, enfim, as questões que a aplicação da Lei nº 10.973/2004 pode

suscitar. O objetivo deste trabalho foi, antes de tudo, destacar a relevância de apenas um dos

possíveis temas da legislação de inovação, sem a menor pretensão de esgotá-lo.

26. Os desafios impostos pelo exercício da ação promocional pública da inovação

tecnológica exigem esforços multidisciplinares. A mobilização dos estudiosos do Direito

Administrativo em torno do assunto mostra-se absolutamente necessária e será, sem dúvida

alguma, uma valiosa contribuição à agenda do desenvolvimento nacional.

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