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ESCOLA DE COMUNICAÇÃO E ARTES CURSO DE JORNALISMO TALITA DOS SANTOS DE SOUZA STARTUPS DE JORNALISMO NO BRASIL: UMA ALTERNATIVA SUSTENTÁVEL AOS MODELOS DE NEGÓCIO CURITIBA 2019 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ

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ESCOLA DE COMUNICAÇÃO E ARTES

CURSO DE JORNALISMO

TALITA DOS SANTOS DE SOUZA

STARTUPS DE JORNALISMO NO BRASIL: UMA ALTERNATIVA SUSTENTÁVEL

AOS MODELOS DE NEGÓCIO

CURITIBA

2019

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ

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TALITA DOS SANTOS DE SOUZA

STARTUPS DE JORNALISMO NO BRASIL: UMA ALTERNATIVA SUSTENTÁVEL

AOS MODELOS DE NEGÓCIO

Trabalho de Conclusão de Cursoapresentado ao Curso de Graduação emJornalismo da Pontifícia UniversidadeCatólica do Paraná, como requisito parcialà obtenção do título de bacharel emJornalismo.

Orientador: Profa. Me. Celina do RocioPaz Alvetti

CURITIBA

2019

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TALITA DOS SANTOS DE SOUZA

STARTUPS DE JORNALISMO NO BRASIL: UMA ALTERNATIVA SUSTENTÁVEL

AOS MODELOS DE NEGÓCIO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação emJornalismo da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial à

obtenção do título de bacharel em Jornalismo.

COMISSÃO EXAMINADORA

_____________________________________

Profa. Me. Celina do Rocio Paz Alvetti

PUCPR

_____________________________________

Profa. Me. Criselli Maria Montipó

PUCPR

_____________________________________

Profa. Me. Evary Elys Anghinoni

PUCPR

Curitiba, 10 de junho de 2019.

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À todas aquelas que empreendem como

garotas.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço meu pai, Elizeu de Souza, e minha Mãe, Glauciane dos Santos Souza,

que nunca mediram esforços para que eu tivesse a melhor educação possível e,

assim, me ensinaram o real valor do conhecimento. A meus familiares que souberam

compreender minha ausência por conta dos momentos destinados ao estudo e hoje

podem compartilhar minhas conquistas comigo.

Aos amigos que permaneceram nos momentos de alegria e dificuldade, e que me

deram apoio, incentivo e suporte em todos eles sem pensar duas vezes.

Agradeço a todos aqueles contribuíram, de alguma forma, para minha trajetória

como estudante e profissional, em especial às mulheres inspiradoras que são meus

exemplos diários: minhas colegas de trabalho e minhas professoras, especialmente

minha orientadora neste trabalho, Profa. Me. Celina Alvetti, cuja dedicação foi

essencial para sua conclusão.

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Portanto, é em torno de um conteúdo de

qualidade que o jornalista e o

empreendedor se encontram: o jornalista

precisa produzir ‘‘bom conteúdo”, com

credibilidade e submetido a um processo

de verificação rigorosa para estabelecer

uma relação de confiança que visa a

conquista e retenção de muitos leitores.

Esses leitores são mobilizados na

sequência, no processo de valorização

escolhido pelo empreendedor.

(CARBASSE, 2015, p. 275-276)

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RESUMO

A produção de conteúdo jornalístico inovador deixa de ser um diferencial para setornar uma necessidade em uma sociedade marcada pela circulação constante deinformação e o fácil acesso a ela. Nesse mesmo contexto, empresas e profissionaisde jornalismo se perecebem em uma verdadeira crise moral e financeira: instituiçõesque mantém o sistema produtivo arcaico da era pré-internet estão fadadas aofracasso. Na busca pela reconfiguração dos modelos de negócio em jornalismo, asstartups surgem como uma alternativa por conta de sua capacidade. No presenteestudo, busca-se entender como se dá a produção de conteúdo inovador de formasustentável em empreendimentos jornalísticos enquadrados como startups. Paratanto, a investigação aqui desenvolvida se propõe a compreender as novasnecessidades da produção jornalística, discutir a incorporação do empreendedorirmopelos jornalistas e entender o panorâma das sartups brasileiras. Também édesenvolvido um estudo de caso sobre a startup jornalística braseileira Jota.Fundada com a proposta de cobrir assuntos ligados ao Poder Judiciário do país, aempresa é um case de sucesso no setor, apresentando um faturamento superior a 6milhões de reais menos de dois anos após sua criação. A conclusão do trabalhoevidencia a relação entre as características do modelo de startup e fatores desucesso tanto na produção e sustentabilidade dos negócios de jornalismonascentes.

Palavras-chave: Jornalismo. Startup. Conteúdo inovador.

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ABSTRACT

The production of innovative journalistic content stopped to be a differential tobecome a necessity in a society marked by the constant circulation of informationand easy access to it. In this same context, journalism companies and professionalsare perceived themselves in a true moral and financial crisis: institutions thatmaintain the archaic production system of the pre-internet era are doomed to failure.In the search for the reconfiguration of business models in journalism, startupsappear as an alternative because of their adaptation capacity. The present study,looking for understand how the sustainnable production of innovative content isachieved in journalistic enterprises classified as startups. Therefore, the researchdeveloped here aims to understand the new needs of journalistic production, todiscuss the incorporation of entrepreneurship by journalists and to understand thepanorama of Brazilian publications. A case study on Jota journalistic startup is alsodeveloped. Founded by the proposal to cover matters related to the country'sJudiciary, the company is a successful case in the industry, with a turnover of morethan 6 million reais less than two years after its creation. The conclusion of the workshows the relationship between the characteristics of the startup model and factors ofsuccess in both the production and sustainability of nascent journalism business.

Key-words: Journalism. Startup. Innovative content.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO...............................................................................................11

2 CRISE NO JORNALISMO.............................................................................14

2.1 UMA NOVA CONFIGURAÇÃO SOCIAL BASEADA NA INFORMAÇÃO.......14

2.2 JORNALISMO LÍQUIDO................................................................................15

2.3 CRISE DA MÍDIA TRADICIONAL...................................................................18

2.3.1 Impacto da internet para crise do jornalismo...........................................19

2.3.2 Crise nos modelos de negócio do jornalismo..........................................23

3 JORNALISMO E EMPREENDEDORISMO...................................................27

3.1 TRANSFORMAÇÃO NAS ORGANIZAÇÕES................................................27

3.1.1 Novas necessidades na produção jornalística.........................................28

3.1.2 Novos negócios no jornalismo...................................................................30

3.2 EMPREENDEDORISMO COMO ALTERNATIVA..........................................32

3.3 NECESSIDADE DE UM JORNALISMO INOVADOR....................................33

3.3.1 Modelos de negócio inovadores no jornalismo........................................35

4 STARTUPS.....................................................................................................37

4.1 DEFINIÇÃO DE STARTUP............................................................................37

4.1.1 Startups ao longo da história......................................................................39

4.2 STARTUPS NO BRASIL................................................................................40

4.2.1 Mercado brasileiro de jornalismo...............................................................43

4.3 PLANO E MODELO DE NEGÓCIOS.............................................................44

4.3.1 Modelo de negócios.....................................................................................46

5 JOTA: UM CASE DE SUCESSO DE STARTUP JORNALÍSTICA

BRASILEIRA...............................................................................................................48

5.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS......................................................48

5.1.1 Revisão bibliográfica...................................................................................49

5.1.2 Estudo de caso.............................................................................................49

5.1.2.1 Entrevista 50

5.2 JOTA...............................................................................................................51

5.2.1 Crescimento e desenvolvimento................................................................53

5.2.2 Critérios de escolha.....................................................................................55

5.3 RELAÇÃO ENTRE MODELO DE NEGÓCIO E CONTEÚDO INOVADOR

PELO JOTA.................................................................................................................57

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................60

REFERÊNCIAS...........................................................................................................63

APÊNDICE A – TRANSCRIÇÃO DE ENTREVISTA FEITA COM MARC SANGARNÉ

(CEO DO JOTA) VIA SKYPE.....................................................................................69

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1 INTRODUÇÃO

A atividade jornalística ocupa posição central na era das redes, em que a

informação sofre interferências, é replicada, comentada, apoiada ou rebatida por

uma multiplicidade de atores. Além disso, percorre caminhos diferentes e é recebida

de maneira completamente distinta daquela inserida em um sistema de

comunicação vertical. Comparar como o processo comunicativo ocorre hoje e há 20

ou 30 anos, especialmente antes da chegada da internet domiciliar é analisar dois

processos totalmente diferentes. Historicamente centralizador e detentor de

conteúdos informativos, o jornalismo agora compete com seus próprios

consumidores na produção e distribuição de informações.

No entanto, a insistência em uma lógica produtiva antiga, que conserva a

visão do jornalista como único ator social capaz de produzir conteúdo informativo de

qualidade, coloca em risco as instituições na quais esses profissionais trabalham.

São mantidas, entre outras particularidades, a hierarquia familiar, a manutenção de

produtos padronizados, a apuração tradicional e a concepção do consumidor como

mero receptor. A falta de inovação em relação aos conteúdos produzidos nesse

âmbito faz com que não sejam atrativos e, portanto, não gerem receita, configurando

o que se pode definir como uma crise no jornalismo.

Por outro lado, um novo sistema produtivo se destaca, trazendo na adaptação

às transformações sociais seu principal atributo. As startups partem da busca pela

resolução de um problema social latente. Toda a estrutura, equipe e processos

dessas empresas se movimentam e direcionam com o único objetivo de resolvê-lo

da melhor forma possível em um mínimo espaço de tempo. Em um contexto de

incerteza e adaptações constantes, procura-se entender e sanar as necessidades e

desejos reais dos clientes.

É diante da crise verificada no modo tradicional de se fazer jornalismo que a

atividade deve ter seu processo de produção e modelo de negócio repensados para

que possa sobreviver. Jornalistas deixam de lado sua subordinação em cargos

dentro de grandes redações e passam a abrir seus próprios negócios, mesmo que

não disponham da formação e conhecimento necessários para tal. Tanto a falta de

preparo quanto a confusão sobre o conceito de inovação, porém, fazem com que

esses novos empreendimentos conservem a lógica produtiva arcaica que se

buscava superar.

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A relação entre jornalismo e empreendedorismo ainda é pouco explorada no

meio acadêmico. Apesar da verificação de um crescimento de pesquisas

relacionando os temas, poucas se voltam para a realidade dos modelos de negócio.

Em outros momentos, é possível verificar um certo entusiasmo sobre o

empreendedorismo no jornalismo, colocando a prática como solução para todos os

problemas vindos da crise na profissão e ignorando as necessidades e dificuldades

que vêm junto com ela.

Diante da situação na qual o jornalismo se encontra, especialmente a falência

dos modelos de negócios ultrapassados, e tendo em vista o potencial trazido pelo

modelo de startup, a presente pesquisa se propõe a entender como enquadramento

da produção jornalística em um formato de startup possibilita a produção de

conteúdo inovador de forma sustentável.

Como maneira de oferecer resposta a esse objetivo central, estão elencados

os seguintes objetivos específicos: compreender como ocorre a produção jornalística

em veículos cujo modelo de negócio é definido como startup (diferenciando-a

daquela posta em prática em empresas tradicionais), identificar fatores de sucesso

em um caso de startup de jornalismo brasileira e relacionar características do

modelo de negócio de startup com a manutenção de práticas jornalísticas

inovadoras.

Para que essa compreensão seja possível, adota-se, em conjunto com a

revisão bibliográfica, necessária para a compreensão do contexto estudado, o

método de estudo de caso, defendido por Duarte, M. (2006) como forma de

compreender uma multiplicidade a partir de um caso específico e representativo. É

analisado, neste estudo, o Jota, uma startup de jornalismo brasileira criada em 2014

com o intuito de selecionar, apurar e distribuir informações relacionadas ao Poder

Judiciário do país.

O estudo enquadra-se na linha de pesquisa “Gestão e Tecnologias da

Comunicação: estudos das intervenções tecnológicas, em seus âmbitos cultural,

social e econômico, nas práticas de comunicação”. Nela, são objetos de

investigação a comunicação, organizacional ou mercadológica, em instituições

privadas, governamentais, não governamentais ou redes colaborativas.

Definidos como autores base da pesquisa estão: Rublescki (2011), que

institucionaliza o termo jornalismo líquido como a prática caracterizada pela

descentralização dos tempos líquidos; Salaverría (2018), que faz questionamentos e

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críticas sobre o jornalismo arcaico frente às inovações presentes na sociedade;

Flores (2016), autora base para entender como o jornalismo absorve as mudanças

tecnológicas e quais são as principais tendências nesse sentido; Bertocchi (2017),

por sua vez, introduz a definição de jornalismo de startup, atribuindo as vantagens

da inovação à ela. Entrando no campo dos negócios, elenca-se Blank e Dorf (2014)

e Ries (2012), três autores tidos como referência quando se trata do tema startup.

O trabalho é composto por seis seções. Após a introdução, a seção “Crise no

Jornalismo” explora causas que levaram à nova configuração midiática,

especialmente em relação aos negócios, e aponta a necessidade de adaptação ao

novo paradigma comunicacional. A seção intitulada “Jornalismo e

Empreendedorismo” aborda a relação crescente entre essas duas esferas de

atuação e demonstra como a abertura de um negócio por parte dos jornalistas, ao

mesmo tempo em que pode ser uma solução à crise, gera demandas e riscos. Na

seção “Startups”, encontra-se um histórico e um levantamento de dados sobre a

presença e crescimento desse modelo de negócio no Brasil, além de discussões

sobre o enquadramento da prática jornalística nesse formato. Por fim, a seção “Jota:

um case de sucesso de startup jornalística brasileira”, anterior às Considerações

Finais, traz o estudo de caso feito sobre a empresa, discutindo informações

coletadas em entrevista com um de seus representantes, relacionando-as aos

objetivos iniciais da pesquisa.

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2 CRISE NO JORNALISMO

A sociedade atualmente é configurada em torno da informação e das relações

que se estabelecem ao seu redor. Castells (2002) define esse fenômeno como

“sociedade em rede”, enquanto Bauman (2001) fala de uma “modernidade líquida”.

Ambas as definições tratam da quebra sobre o sistema comunicativo que tínhamos

como estabelecido, especialmente antes da popularização da internet ocorrida nos

anos 1990. A comunicação deixa de ser hierarquizada para se estabelecer em um

sistema de fluxos globalmente difundido.

Nesse cenário, as instituições jornalísticas, antes colocadas no patamar de

detentoras da informação de qualidade passam a ser mais um dos atores da rede.

No entanto, algumas organizações deixam de se adaptar e buscar alternativas a

esse contexto e mantém sua configuração antiga. É nesse momento em que se

estabelece uma crise do jornalismo que afeta os produtos oferecidos por ele (não se

tornam mais necessários frente à grande disponibilidade de informação gratuita),

seus profissionais (são obrigados a acumular trabalho para sustentar redações cada

vez menores) e os negócios em si (já não são mais rentáveis).

2.1 UMA NOVA CONFIGURAÇÃO SOCIAL BASEADA NA INFORMAÇÃO

Uma nova Revolução Industrial teve início em meados dos anos 1970.

Diferentemente daquelas geradas a partir do descobrimento de novas fontes

energéticas -seja o vapor, eletricidade ou petróleo- esta tem como propulsoras as

tecnologias da informação que se expandem exponencialmente. “Pela primeira vez

na história, a mente humana é uma força direta de produção, não apenas um

elemento histórico no sistema produtivo”. Tal análise é proposta por Castells (2002)

ao explorar a sociedade em rede.

Difundida globalmente, a revolução tecnológica passou a ser apropriada em

diferentes contextos culturais e organizações. Esse fenômeno faz com que seu

desenvolvimento possibilite o desenvolvimento da própria tecnologia. Além disso,

atribuiu a ela novos usos e aplicações. O desenvolvimento da internet se deu

durante os trinta anos finais do século XX, no que Castells define como “uma fusão

singular de estratégia militar, grande cooperação científica, iniciativa tecnológica e

inovação contracultural”. Concomitantemente, surge o novo modelo capitalista de

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produção, que tem no informacionalismo seu modo de desenvolvimento, o que

configura uma nova estrutura social.

Nesta nova sociedade, a informação, seja ela em formato de palavras, sons

ou imagens, passa por uma série de processos desde a sua geração, podendo ser

armazenada, processada, transmitida e recuperada. Isso acontece por conta de

sistema de comunicação digital universal e horizontal com uma linguagem própria a

partir, justamente, da comunicação digital.

Para Bauman (2001), o que configura a nova modernidade, classificada pelos

termos líquida, fluida entre outros adjetivos que remetem ao dinamismo, é a relação

entre o tempo e o espaço, que deixa de ser estagnada para tornar-se mutável. O

primeiro, subordinado à inventividade e à capacidade técnica humanas, se

emancipou em relação ao segundo, podendo apropriar-se dele. Pode-se dizer que

todo o espaço foi conquistado com a substituição do tempo pela instantaneidade:

no universo de software da viagem à velocidade da luz, o espaço pode seratravessado, literalmente, em “tempo nenhum”; cancela-se a diferença entre “longe e“aqui”. O espaço não impõe mais limites à ação e seus efeitos, e conta pouco, ounem conta (BAUMAN, 2001, p. 136, grifo do autor).

Com a chegada da modernidade líquida, finda-se a modernidade pesada,

aquela que valoriza valor, tamanho, peso e volume como forma de poder. Na

“modernidade leve”, todo excesso deve ser eliminado para facilitar o movimento, a

transição. Até mesmo o capital passa a ser volátil e extraterritorial.

O longo prazo, a duração, ou tudo o que impede o movimento, antes vendidos

como um valor, se tornam um risco. A durabilidade deu lugar à transitoriedade, o

valor da modernidade líquida. Sendo assim, são detentores do poder aqueles que

contam com a capacidade de se deslocar, transitar e mudar.

2.2 JORNALISMO LÍQUIDO

É em um cenário de transformações constantes, mudanças sociais estruturais

e queda de instituições de poder que o jornalismo se configura, também, em um

novo formato, com uma nova organização, em que a cultura de informação é

diagnosticada por Deuze (2008) como globalmente interligada e independente.

Segundo o autor, o jornalismo como instituição social não consegue absorver as

mudanças constantes e aceleradas da modernidade líquida.

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Para Rubleski (2011), no entanto, essa configuração faz emergir o jornalismo

líquido. Nessa nova abordagem da prática jornalística, busca-se entender os

processos que acontecem em seu entorno, mais do que o próprio exercício da

profissão. Deuze (2008) qualifica como líquido o jornalismo que tem a capacidade de

se adaptar às alterações dessa nova ecologia.

Assim como qualquer definição de jornalismo, essa é construída a partir do

atual momento histórico e de desenvolvimento econômico, social e político. Assim

como nesses âmbitos, a mídia também passa por um momento de transformações.

Para Canavilhas (2010), trata-se de uma nova ecologia midiática, termo proveniente

da biologia e transportado pelo autor para o âmbito dos media para diagnosticar o

ambiente em que se dá a transformação dos velhos para os novos meios. Rubescki

(2011, p. 28) complementa essa visão ao afirmar que a nova ecologia midiática,

caracterizada pelo fluxo de notícias e relações, traça “o declínio do Jornalismo

enquanto instituição mediadora socialmente legitimada”.

Desde sua instituição, a prática jornalística, que serve para produzir

construções da realidade e formar as opiniões dos consumidores, sofreu alterações

causadas pelo avanço tecnológico, especialmente relacionadas ao surgimento da

internet. A mais recente delas se deu com a interatividade proporcionada pela

navegação na web, que promoveu uma apropriação das competências jornalísticas

por seus diferentes atores, cada um com seus próprios interesses, trazendo à tona

uma pluralidade de jornalismos (RUBLESCKI, 2011).

A informação é agora descentralizada e sua construção a partir de

interferências entre mídias e interações sociais se amplia com a quebra das

definições de produtor e consumidor de conteúdos e com a formação de uma

audiência líquida que mantém uma conexão permanente universal e dinâmica com a

rede (CANAVILHAS, 2012). Outra mudança importante acontece com a passagem

do sistema pull, quando o usuário buscava pela informção, para o sistema push, no

qual o usuário é buscado pelo conteúdo. O consumidor, portanto, dita cada vez mais

qual e como se dará o seu consumo.

O jornalismo deixa de exercer o papel de gatekeeper e a quebra da noção de

pólo de emissão e de recepção faz com que qualquer conteúdo esteja sujeito à

interatividade e mesmo à modificação causada pelos atores que nele interferem,

trazendo instabilidade para o jornalista em seu papel de mediador entre os fatos e a

sociedade:

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a partir deste momento passamos a falar de um sistema em que meios eambientes geram novas e variadas relações resultantes da sua naturezainstável, móvel e global, gerando um constante estado de desequilíbrio querapidamente se reequilibra para logo a seguir se desequilibrar novamentepela introdução de novos meios ou ambientes num ecossistema empermanente mudança (CANAVILHAS, 2008, p. 2).

Esse cenário remete ao processo de convergência que acontece, na visão de

Canavilhas (2012), em quatro instâncias complementares: tecnológica (resultando

em produções multiplataformas), empresarial (com a renovação do modelo de

negócios, organização e estratégias empresariais), profissional (derivada da anterior,

faz com que profissionais acumulem funções) e de conteúdos (transformando a

produção jornalística em multimidiática).

Atualmente, a própria divisão entre mídias, sejam elas on ou off line, já não

faz mais sentido. Dá-se mais importância aos fluxos que acontecem entre os

diversos canais e às funções desempenhadas por eles (RUBLESCKI, 2013). A

narrativa jornalística é vista como processo e deixa de se reduzir a um produto

localizado em um ambiente específico com conteúdo e formato delimitados.

A autora entende que, mais do que uma reestruturação quanto a aparatos

tecnológicos, técnicas de produção ou distribuição, como a que se deu entre o final

do século XX e o início do século XXI, com a emergência da internet, os jornais

passam agora por uma crise de identidade, configurada pelo deslocamento da

produção para a circulação.

Outro conceito que se liquefaz no contexto do jornalismo líquido são as

notícias. Elas deixam de ser monopólio dos meios jornalísticos e passam a se

materializar em outras instâncias, inclusive nos fluxos do tecido social constituído na

web.

com este direcionamento, é possível considerar notícia no jornalismo líquido amultiplicidade de fluxos, quer de viés noticioso inédito, quer de crítica,falseabilidade, republicação ou complementação das notícias disponibilizadasno tecido social que circulam e interagem entre si, desde que articuladas coma atualidade e com o interesse comum (RUBLESCKI, 2013, p. 189-190).

Até perderem sua atualidade e relevância, as notícias são reenquadradas de

acordo com os olhares de quem a produz e pelas mediações que sofrem. Mas,

apesar da remodelação do que se considera notícia, a credibilidade creditada a ela

permanece como um fator importante para favorecer seu consumo. Aqui, a interação

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volta a ser determinante, já que parte do público é responsável pela legitimação da

qualidade dos conteúdos. Esta pode acontecer pela recomendação, republicação ou

comentários.

Por fim, seguindo a lógica do jornalismo líquido condicionado por interações

desenvolvidas na rede, Rubleski (2011, p. 216) lembra que “No jornalismo líquido,

disponibilizar uma notícia é apenas a fase inicial de um processo de múltiplas

apropriações e sucessivas mediações”. É preciso pensar na distribuição de

conteúdos conforme a mediação proporcionada pelos diferentes atores sociais em

cada um dos espaços de discussão.

2.3 CRISE DA MÍDIA TRADICIONAL

O jornalismo constitui-se como uma atividade circunscrita em determinado

momento social, político e econômico e cujas mudanças dependem também das

alterações que ocorrem nessas instâncias. É por conta disso que pode se dizer que

a prática jornalística realizada e comercializada em seus moldes analógicos está em

crise, especialmente em um mundo cada vez mais informatizado, hipermidiático e

dinâmico.

Dados que comprovam esse cenário são apresentados no levantamento “A

Conta dos Passaralhos”, produzido pela agência interdependente Volt Data Lab. De

2012 até junho de 2015 foram detectadas 3.568 demissões em cerca de 50

diferentes redações brasileiras, 1.084 delas apenas de jornalistas. Com um prejuízo

de 140 milhões em 2014, o grupo Abril é a organização com mais demissões,

totalizando 446, seguida por Record (369), MTV (300), Terra (250), Rede TV! (223) e

o jornal O Globo (170).

Lopes (2001) é categórica ao reduzir a chamada crise do jornalismo causada

pela tecnologia à mais uma das mudanças enfrentadas pela profissão, caracterizada

pela constante instabilidade desde sua concepção. Assim como em outros

momentos, algumas funções serão extintas, outras serão criadas, rotinas serão

alteradas e preocupações terão um novo foco. Mas as transformações no campo

jornalístico provocadas pelo impacto e instabilidades das tecnologias podem,

inclusive, ser encaradas como uma evolução digna de celebração já que

proporcionam novas oportunidades de atuação.

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Salaverría (2015) discorre sobre duas causas principais relacionadas à crise

do jornalismo: fatores econômicos e tecnológicos. Enquanto os primeiros dependem

de um contexto externo e, apesar de afetarem tanto consumo quanto anúncios em

jornais, mudam com mais frequência. Os segundos representam uma transformação

profunda e são, portanto, mais prejudiciais, uma vez que exigem mudanças

estruturais na forma de se exercer a profissão.

O autor faz uma analogia entre as mudanças pelas quais passou a indústria

da informação na década de 1990, com a popularização dos computadores, às

revoluções industriais das empresas da siderurgia, da mineração ou dos grandes

estaleiros:

à semelhança daquelas indústrias ineficientes, as empresas jornalísticasestão sendo obrigadas a evoluir a partir de um modelo analógico, fortementecondicionado pelo suporte de distribuição, para o digital, onde as regras dojogo e a escala de valores mudaram por completo. (SALAVERRÍA, 2015,p.81).

Percebe-se, na avaliação de Salaverría, a ação determinante de uma

organização comunicacional digital na ruptura de fronteiras geográficas, barreiras de

acesso ao mercado, do ciclo editorial e do monopólio da palavra, fazendo com que a

informação se tornasse descentralizada e mais fácil de ser produzida.

2.3.1 Impacto da internet para crise do jornalismo

A internet surge nos Estados Unidos, nos anos 1960, como uma estratégia

militar utilizada para comunicação. Depois de apropriada pela comunidade

acadêmica, as primeiras conexões internacionais acontecem em 1975. Mas é só no

começo da década de 1990 que são disponibilizados serviços de transmissão de

arquivos através da rede (RIBEIRO, 2003). No Brasil, a popularização da internet

tem início em 1995, quando a Embratel deixa de ser o único provedor, fazendo surgir

diversas empresas que oferecem o serviço.

Brasileiros representam, atualmente, um expoente no consumo de

informações online. 90% das notícias consumidas são via web. De 2013 a 2018,

verificou-se um crescimento de quase 20% no consumo de informações via redes

sociais, que passou de 47% para 66%. Enquanto isso, a TV se manteve como fonte

de notícias para 75% das pessoas e o jornal impresso sofreu uma queda de 16%,

indo de 50% para 34% das preferências (NEWMAN et al., 2019).

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Nesse mesmo intervalo de tempo, em nível global, foi verificado um

crescimento na utilização da internet e mídias sociais mais evidenciado em países

emergentes, enquanto nações desenvolvidas mantém números relativamente

estáveis em relação a isso. Em economias avançadas, o uso de redes sociais

passou de 61% para 60% da população. Nas emergentes, essa proporção subiu de

34% para 53%. O Brasil fica em 21° lugar entre os países cuja população adulta

acessa redes sociais, com um total de 53% do total (BISHOP; CHWE; POUSHTER,

2018).

O impacto da internet no jornalismo acontece, principalmente, por duas

características desse meio frente às mídias anteriores a ele (televisão, rádio e jornal

impresso). A primeira é a concentração de todos os recursos comunicacionais –texto

escrito, imagens, som e vídeo– em conteúdos que podem ser encontrados em um

só lugar e, ainda, acumulados em repositórios pessoais ou compartilhados.

Isso sugere, conforme Ribeiro (2003), uma tendência ao uso do hipertexto,

aquele construído a partir de interferências textuais que ampliam o conhecimento

contido no conteúdo, e da narrativa multimídia, a combinação de diferentes recursos

audiovisuais que proporcionam uma experiência rica na apreensão do fato narrado.

Rublescki (2010), ao tratar, mais especificamente, da crise relacionada aos

jornais impressos e sua transposição para o online, explica que, com o surgimento

de uma nova mídia, ocorre um mimetismo entre essa e as já existentes. Esse

processo de repaginação é intrínseco à história da imprensa e do jornalismo.

A segunda característica que confere um caráter revolucionário à internet é a

interação. Um fato que antes era interpretado por um repórter e distribuído por um

canal de comunicação massivo agora pode sofrer interferências desde sua

captação, inclusive por pessoas que o presenciaram, até sua distribuição,

especialmente nas redes sociais, e interpretação, por meio de comentários, relatos

paralelos, entre outros recursos.

Soma-se a isso a descentralização da produção de notícias. Meios de

comunicação instituídos deixam de ser seus detentores e passam a travar uma

disputa pelo tempo e atenção do leitor com blogs, redes sociais e sites diversos

(RUBLESKI, 2010). Mesmo que o conteúdo seja produzido no âmbito do jornalismo,

e mesmo contra a vontade de instituições jornalísticas, o acesso a ele é dado de

maneira dispersa por inúmeras vias, configurando-se um processo de

superdistribuição, explorado por Costa (2014). Ao contrário da descoberta direta, na

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qual meios de produção jornalística controlavam canais e meios que davam acesso

às suas informações, na descoberta distribuída esse processo acontece por meio

dos diversos relacionamentos estabelecidos na rede, entre usuários e meios.

No relatório “More Important, But Less Robust?”, de 2019, produzido pela

agência Reuters, são identificados canais de distribuição de mídia, como motores de

busca, redes sociais e agregadores de notícia, que são os propulsores do fenômeno

de descoberta distribuída. Em 2018, a descoberta distribuída foi o modo principal

pelo qual 65% dos consumidores de notícias online em 37 países diferentes

encontraram conteúdos de seu interesse. Os principais canais utilizados por eles

foram a busca (24%), mídias sociais (23%), e-mail (6%), notificações no celular (6%)

e agregadores (6%) (NIELSEN; SELVA, 2019).

Esboça-se, então, outra tendência a ser seguida pelos meios jornalísticos

nesta nova era: a atenção ao público consumidor. A elaboração dos conteúdos

passa a ser pautada, inicialmente, na comunidade a que será oferecido (RIBEIRO,

2003). Não é mais possível supor que uma informação atingirá a todos de maneira

uniforme. Por isso, busca-se estabelecer nichos formados por pessoas com

interesses em comum que busquem por determinado tipo de informação (SILVEIRA,

2016).

À primeira vista, a função de uma organização que produz e distribui

informações pode parecer descartável nesse cenário. No entanto, como lembra

Lopes (2001), podemos encontrar, justamente no caos de informação que se

constitui a internet, uma posição tão ou mais relevante para as empresas

jornalísticas quanto durante sua era analógica. Segundo Ribeiro (2003), com a

infinidade de informações criadas e em circulação todos os dias, a atuação

jornalística mais básica e fundamental nesse contexto é de organizá-las de forma

compreensível e lógica.

Além disso, empresas jornalísticas consolidadas antes mesmo da revolução

digital carregam em seu nome a credibilidade das informações prestadas, o que

induz à uma preferência pela informação que provém delas, ainda que o próprio

reconhecimento de qualidade passe, também, pelo público (RUBLESKI, 2011).

Uma crise no jornalismo fica evidente quando se insere o modelo de produção

tradicional e em voga até início dos anos 1990 em um contexto informacional com

tantas mudanças em curso que vivemos atualmente. Agora, é preciso pensar nas

demandas da geração que já nasceu imersa na internet, para a qual os meios de

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massa já não fazem mais sentido (SILVEIRA, 2016). Nessa tentativa, alguns

veículos acertam em estratégias para conquistar audiência enquanto outros

sucumbem.

Essa adaptação envolve mudanças em todas as instâncias da profissão.

Salaverría (2003) defende mudanças nas dimensões profissional, comunicativa,

tecnológica e empresarial do jornalismo para que este esteja adaptado à

convergência multimídia própria da comunicação mediada na internet. Nesse

processo, ocorrem fluxos de informação entre as diversas plataformas, meios,

formatos, linguagens e atores da comunicação digital (JENKINS, 2009).

A dimensão profissional refere-se às habilidades dos profissionais na era da

convergência. Além de ágeis para acompanhar o rápido surgimento de fatos e suas

mudanças, eles precisam dominar técnicas em todas as etapas da produção e

distribuição. É certo que profissionais da área precisam inovar nas suas práticas e

buscar oportunidades não convencionais. Isso é possível, de acordo com Lopes

(2011):

diante do desenvolvimento de novas tecnologias de informação e comunicação; dacrescente valorização dos processos comunicacionais pelas empresas, governos eterceiro setor; das possibilidades culturais e formas alternativas de lidar com ainformação (LOPES, 2011, p.68).

Já a dimensão comunicativa localiza-se no uso de diferentes códigos

comunicacionais na transmissão de mensagens. A combinação de textos, áudios,

vídeos, infográficos e outros recursos em uma única página é exclusividade da web

e, em breve, será possível a transmissão de estímulos ainda mais imersivos.

As dimensões tecnológica e empresarial estão, frente essas duas primeiras,

em um estágio mais avançado de desenvolvimento. Isso porque nelas a adaptação

começou pelo menos 20 anos antes, assim como os investimentos destinados a elas

foram maiores (SALAVERRÍA, 2013). A tecnologia se dá com a revolução dos

instrumentos utilizados nos processos da imprensa.

Por fim, a dimensão empresarial se mostra a mais complexa entre todas as

elencadas pelo autor. Com a necessidade de diversificação midiática, empresas de

jornalismo tiveram de promover mudanças em seus setores de produção, agora

diversificadas para os diferentes meios. Além disso, foi preciso estabelecer uma

coordenação entre eles, tanto no que se refere à distribuição de recursos

econômicos quanto no controle da linha editorial.

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2.3.2Crise nos modelos de negócio do jornalismo

Está claro que as inovações tecnológicas que aconteceram, mais

propriamente, nos últimos 20 anos, transformaram estruturalmente o panorama

comunicacional em suas todas as suas instâncias: produção distribuição e consumo.

Na visão de Silveira (2017), pensar essas mudanças aplicadas ao jornalismo resulta

em uma ruptura dos modelos de negócio tradicionalmente conhecidos pela

comercialização de notícias e sustentado pela venda de espaço publicitário.

Em comparação a 2017, no ano de 2018 a quota de publicidade nos jornais

se manteve relativamente estável. Apesar disso, uma queda de circulação foi

verificada nos onze principais periódicos pagos, bem como no ano anterior. O

número de cópias impressas caiu 41,4% e a circulação digital subiu 5,8% (NEWMAN

et al., 2019).

Anunciantes encontraram na web um local eficiente para se fazer

propaganda. Empresas como Google e Facebook (ambas com verba de publicidade

superior a 100 bilhões em 2017) desenvolveram tecnologias que possibilitam

direcioná-la a um público muito segmentado e, além disso, obter retorno sobre sua

apreensão –quem viu, em qual momento, utilizando qual(is) meio(s) (SILVEIRA,

2017). Nos meios analógicos, mesmo aqueles com linha editorial segmentada, não é

possível obter um controle sobre quem, de fato, era impactado por um anúncio.

Como os meios jornalísticos não dispõem de tais recursos, sua ascensão ao

online aconteceu sem uma geração de receita que sustentasse esse novo formato

de produção. Ou seja, as empresas de jornalismo, carregando a credibilidade

adquirida ainda antes da internet, simplesmente cediam seu conteúdo, gentil e

gratuitamente (RUBLESKI, 2010).

A discussão sobre a emergência das TIC’s (tecnologias da informação e

comunicação) como fator determinante para a crise de organizações jornalísticas já

existe há mais de uma década. Corrêa (2006, p. 51) afirma que “a crise vivenciada

pela mídia brasileira possui muitos componentes autóctones” ao fazer uma avaliação

da adaptação de empresas de informação ao contexto multimídia surgido com a

chegada da internet e verificando que demissão de jornalistas, aquisição de veículos

por especuladores e entrada de capital estrangeiro são ocorrências específicas do

mercado brasileiro.

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A manutenção de uma lógica que privilegia o lucro a qualquer custo e a falta

de uma racionalidade operacional na produção integrada de conteúdos resulta no

gasto com infraestrutura e tecnologias e na disputa pela atenção do mercado com os

mesmos atrativos do formato analógico:

a maioria de nossas empresas informativas, monomídia em suas origens,empreendeu iniciativas visando uma reconfiguração de identidade multimídia. Nesteprocesso verificamos que a maioria delas buscou simplesmente transpor suasestratégias bem-sucedidas nos mercados monomídia para a nova realidade. Muitasinvestiram em tecnologia e novos negócios para adquirirem um perfil contemporâneo,mas quase todas não deixaram de agir no velho modo (CORRÊA, 2006, p. 52).

A incerteza diante de uma nova modalidade de consumo de informação em

uma nova mídia ainda não totalmente explorada fez com que empresas jornalísticas

apostassem em caminhos óbvios no seu processo de adaptação ao digital. Ao

estabelecerem seus primeiros portais de notícias na web, no final da década de

1990, jornais passaram a transpor o conteúdo veiculado no meio impresso para o

site com quase nenhuma alteração (CARVALHO, 2014). Já no início dos anos 2000,

o conteúdo direcionado à internet começa a ser pensado exclusivamente para ela.

Passa-se a fazer uso do slideshow noticioso, um recurso até então não utilizado pelo

jornalismo (LONGHI, 2014).

Nas duas décadas seguintes que se passaram até o momento atual, o

aprimoramento de códigos de programação possibilitou a criação de reportagens

com combinações complexas de recursos. Os especiais multimídia, por exemplo,

passaram a ser desenvolvidos de 2002 a 2011, com a utilização da tecnologia flash.

Já a grande reportagem multimídia, a partir de 2012, sustentada pelo HTML5

(LONGHI, 2014).

Em uma análise feita por Alvez (2016) sobre o desempenho do jornalismo

online em seus primeiros dez anos de existência, o autor afirma que, por mais que

um crescimento em termos de audiência fosse constatado, não houve a

consolidação de um modelo de negócio sustentado pela publicidade e/ou venda de

assinaturas.

O paywall, modelo de financiamento que consiste em uma assinatura digital

que dá acesso a conteúdos até então restritos ao usuário não pagante, parte da

mesma lógica de pagamento utilizada em jornais ou revistas impressas. Porém, é

preciso levar em consideração esse modelo coloca empresas jornalísticas em um

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status de detentoras de informação. Como já visto, esse papel não é mais ocupado

por elas, principalmente quando se trata de hard news, notícias de última hora. Com

a expectativa de gerar fluxo de leitores em seus portais e, consequentemente, atrair

verba publicitária, os próprios jornais subverteram o paywall ainda nos primeiros

anos do online (RUBLESKI, 2010).

Uma busca em agregadores de conteúdo, como o Google, permite encontrar

diferentes portais que disponibilizam a mesma notícia, muitas vezes de forma

gratuita (LONGHI, 2015). Em outros casos, os próprios participantes do fato relatam

sua versão com postagens em redes sociais ou em seus blogs pessoais. Assim,

pagar por algo que pode ser consumido de graça não parece atrativo (NEWMAN et

al., 2019).

Com o crescimento de empreendimentos jornalísticos digitais, as fontes de

receita foram sendo diversificadas. O relatório “Ponto de Inflexão”, realizado pela

SembraMedia em 2017, mapeou mais de 15 fontes diferentes em um estudo sobre

100 startups digitais de jornalismo na América Latina. As mais utilizadas são

anúncios de banner (por 31% das organizações), que se assemelha à tradicional

venda de espaço publicitário em jornais impressos, publicidade nativa ou conteúdo

de marca (28%), quando se desenvolve um conteúdo semelhante ao jornalístico,

porém encomendado por uma marca e serviços de consultoria (28%), um produto

agregado à expertise dos jornalistas dessas empresas, que podem contribuir com o

desenvolvimento da comunicação interna em empresas, design de sites,

gerenciamento de redes sociais ou criação de conteúdo

É justamente a diversificação dessas fontes de receitas que determina a

sustentabilidade e até mesmo gera lucratividade nesses empreendimentos. Pelo

menos 65% deles segue esse caminho (SembraMedia, 2017). Para tanto, dois

caminhos podem escolhidos: atrair tráfego para o site, gerando interesse dos

anunciantes ou desenvolver uma audiência fiel a ponto de conseguir doações e

financiamentos para a execução dos projetos.

A falta de financiamento impacta diretamente os recursos para a produção do

conteúdo jornalístico. Um negócio menos robusto coloca em risco a cobertura de

questões importantes e torna as organizações vulneráveis aos interesses do Estado

e atores políticos com influência sobre anunciantes. Os mais afetados são aqueles

com cobertura local (NIELSEN; SELVA, 2019).

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Como consequências dessa crise nas empresas, equipamentos de captação,

produção e edição deixam de ser atualizados. A impossibilidade de manter um

número considerável de profissionais faz com que jornalistas acabem em redações

sucateadas e tenham de absorver diferentes funções para suprir as necessidades.

Na pesquisa “Quem é o jornalista brasileiro?” (FENAJ; UFSC, 2013), um em cada

quatro dos 2.731 profissionais entrevistados tinha mais de um emprego na área e

metade deles trabalhava mais de oito horas por dia, sendo que para 40,3% a

jornada era de até 12 horas. É evidente, portanto, que a crise nos negócios

jornalísticos tem consequências diretas na qualidade da atuação profissional.

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3 JORNALISMO E EMPREENDEDORISMO

É clara e evidente a necessidade de uma produção jornalística inovadora, que

apresente um conteúdo realmente atrativo e diferenciado de todos aqueles

produzidos e distribuídos na web (SILVEIRA, 2017). Para que ele seja produzido, se

mostra necessária uma redefinição das organizações jornalísticas.

Frente à crise no setor, parte dos jornalistas enquadrados como funcionários

de grandes e ultrapassadas empresas se empolgam com a possibilidade de criar

seu próprio empreendimento jornalístico (BERTOCCHI, 2017). Mas, para tanto, é

preciso ter em mente como, de fato, será possível produzir um conteúdo inovador

mantendo a sustentabilidade das práticas.

3.1 TRANSFORMAÇÃO NAS ORGANIZAÇÕES

Na sociedade em rede, a economia global passa a ser baseada na

informação, uma consequência da interação entre a tecnologia avançada e a nova

lógica organizacional que surgiram com a revolução em meados dos anos 1970,

identificada por Castells (2002). A economia informacional exige a capacidade de

gerar conhecimentos e processar informações, adaptar-se à economia global,

transformar meios e objetivos conforme a transformação cultural, tecnológica e

institucional e, principalmente, inovar.

Diante de uma organização social em constante transformação, um modelo

econômico baseado na produção em massa passa a destoar como um sistema

rígido, incapaz de se adaptar às mudanças com agilidade. Flores (2016a) defende a

personalização e a customização como os caminhos possíveis para se manter

empresas se serviços como um todo, inclusive aquelas comunicacionais, tendo em

vista um público crescente em tamanho e dispersão. Essa também é a perspectiva

de Deuze (2008) ao diagnosticar a fragmentação da audiência.

Assim, empresas passam a executar um sistema de trabalho mais flexível e

um modo de produção enxuto, quebrando divisões hierárquicas dentro das

organizações, eliminando e automatizando tarefas, o que gera economia na mão de

obra. Essa transição é protagonizada por pequenas e médias empresas.

Para Bittencourt (2018), no jornalismo, essa mudança se dá com a criação de

produtos e serviços únicos e personalizados, deixando de lado a comunicação em

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massa que segue o sistema de um para muitos e levando em consideração as

possíveis interações promovidas pelo novo paradigma tecnológico.

Apesar de enaltecer o modelo flexível como uma solução em um ambiente de

crescimento rápido, Castells (2002) atenta para a dificuldade em controlar e corrigir

erros gerados por ele. Além disso, afirma que a produção enxuta reduziu custos,

mas deu continuidade ao oligopólio já presente na produção em massa.

O novo paradigma organizacional, então, se dá em uma estrutura de rede em

que “a própria empresa teve de tornar-se uma rede e dinamizar cada elemento de

sua estrutura interna” (CASTELLS, 2002, p. 221-222). Esses empreendimentos

estabelecem relações com outros em nichos de mercado ou de forma cooperativa.

O jornalismo, como “catalisador de uma estrutura hierárquica informativa

mutável e contínua” (RIBEIRO, 2003, p. 3), exerce como atividade primordial a

transformação de dados em informações e estas em conhecimento, tendo sua

importância ressaltada no contexto da economia informacional explorada por

Castells (2002).

Assim como demais setores econômicos, no entanto, é preciso encontrar

métodos inovadores para desempenhar essa função. A informação deve ser

compreensível e se adaptar aos hábitos de consumo dos leitores, ouvintes,

espectadores e internautas que precisam reconhecer no conteúdo jornalístico um

valor maior do que os demais encontrados na rede.

3.1.1Novas necessidades na produção jornalística

O novo produto jornalístico deve ser pensado para um ambiente em que

informações de todo tipo estão sendo criadas infinitamente e em velocidade

constante. Diferentemente da disposição um para todos, que caracterizou o

jornalismo durante o século XX, a comunicação agora passa a ser direcionada

(DEUZE, 2018).

Para que o público atribua valor a um conteúdo, e se disponha a gastar uma

parte do seu tempo –cada vez mais escasso– com ele, é preciso entender as

demandas e expectativas da audiência. “Diferenciação, exclusividade,

aprofundamento e originalidade são alguns dos valores que podem tornar um

conteúdo jornalístico mais útil ao consumidor criando, consequentemente, valor

individual, econômico, de troca e uso” (SILVEIRA, 2017, p. 91).

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Interatividade é um dos conceitos chave para essa produção. Deve-se

estabelecer um diálogo com os consumidores do conteúdo. Eles serão responsáveis

por comentar, recomendar e compartilhar as informações, se tornando

indispensáveis no processo de distribuição. Também é preciso desenvolver técnicas

de mensuração que permitam traçar um perfil dos usuários e dar aos anunciantes

um feedback bem definido. Quanto aos profissionais, estes devem tornar-se

multipotenciais. Empresas precisam prepará-los para pensar a produção multimídia,

desenvolvendo capacidades de atuação em todo o processo de produção. Todas

essas adaptações garantem a sobrevivência das empresas de mídia gerando a

diversificação de fontes de renda o que, segundo Silveira (2017). 92) é a saída após

a queda da publicidade como fonte de renda.

Mesmo em seu status de negócio que depende da geração de renda, a

atividade jornalística deve voltar-se à sua função primordial de informar, ensinar e

formar opinião. “Sua natureza empresarial convive com a condição de supridora de

informações necessárias e muitas vezes decisivas nos processos de participação da

cidadania nos controles públicos”. (CORRÊA 2006, v. 9, p. 58).

A evolução tecnológica, no entanto, não pode ser apontada como condição

única para ocorrências como a perda de audiência e, consequentemente, de

anunciantes, o que leva à falência de grupos de comunicação e demissão de

jornalistas. A manutenção de modelos de negócio familiares tradicionais é apontada

por Corrêa (2006) como a principal causa da crise, uma vez que as decisões quanto

à produção jornalística são tomadas em um contexto fechado e deixa-se de

compreender as necessidades informativas do público.

Dessa forma, veículos que optam por manter estruturas de negócio arcaicas

são os primeiros a encontrarem seu fim. Para sobreviver nesse cenário é preciso

modernizar profissionais e organizações jornalísticas quanto ao seu modo de fazer,

sem deixar, no entanto, de cumprir a função primordial da profissão que é

necessária à sociedade, ou seja, trazer à luz assuntos desconhecidos:

É preciso não perder as tecnologias do amanhã para seguir praticando o jornalismode ontem. Urge encontrar modelos de negócio que permitam sustentar asorganizações jornalísticas. Mas essa busca de modelos não deve centrar-se, comoaté agora, em perpetuar moldes caducos, mas em proporcionar viabilidade à mídiapara incorporar o novo jornalismo. (SALAVERRÍA 2015, p.83).

Portanto, é preciso estabelecer uma estrutura capaz de produzir, distribuir e

favorecer o consumo de conteúdos com demandas específicas da nova

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configuração informacional. Quando pensamos na reconfiguração do jornalismo

nesses três âmbitos, nos referimos à necessidade de uma revolução em seu modelo

de negócios.

3.1.2 Novos negócios no jornalismo

Empreendimentos dos mais diversos segmentos e com oferta dos mais

diferentes produtos estão sendo transformados e criados. E não é diferente com o

jornalismo. Grandes grupos midiáticos têm visto suas estruturas caírem ao manter

um modelo de negócio arcaico em um contexto de tantas transformações e novas

necessidades informacionais.

Na tentativa de encontrar financiamento para a manutenção de estruturas de

trabalho ultrapassadas, empresas jornalísticas fazem testes. Flores (2016a) elenca

modelos de geração de receita testados por novos empreendimentos digitais que

ainda não encontraram eco na audiência: as assinaturas pagas, geradoras de

polêmica em alguns casos, a opção pela administração de empresas sem fins

lucrativos, a colaboração e o auto-financiamento. Tentativas como essas

demonstram a preocupação em entender como ocorre a geração de valor da

informação para o público.

A produção sustentável de notícias em modelos de negócio desenvolvida até

agora funciona, em sua maioria, a partir de uma combinação de receitas que variam

entre publicidade, apoio de leitores e atividades sem fins lucrativos. Essa dinâmica

consegue sustentar redações enxutas, comparadas àquelas das mídias tradicionais

(NIELSEN; SELVA, 2019).

Entre os 37 países contemplados no estudo Digital News Report, produzido

pela Agência Reuters, o Brasil apresenta a quarta maior porcentagem em termos da

quantidade de pessoas que paga por notícia: 22%. Isso demonstra a crescente

ascensão às assinaturas pagas de jornais digitais. Os locais que apresentam maior

população pagante por notícias online são Noruega (30%), Suécia (26%) e Austrália

(20%) (NEWMAN et al., 2019).

Em uma sociedade que gira em torno da produção e consumo de informação,

os meios precisam pensar em uma pauta estratégica que gere uma cobertura

complementar (SALAVERRÍA, 2003). O foco das pautas deve se voltar, sobretudo,

para assuntos menos factuais e mais passíveis de análise, que provoquem o debate

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popular e gerem repercussões futuras. Assim, é possível realizar uma cobertura

completa, aprofundada, e multiplataforma que se adapta aos hábitos de consumo do

público.

A preocupação com o consumidor passa pela antecipação de preferências,

que pode ser medida com auxílio de tecnologias, por exemplo. Uma prática bem

distante do que se costumava fazer nos jornais diários focados em hard news

(FLORES, 2016b). Becker et al. (2018) ressaltam a importância da reflexão sobre a

audiência do jornalismo para compreender as necessidades de mudança na

profissão. Estratégias inovadoras nesse campo por meio de novas linguagens e

formatos, são uma forma de atrair e fidelizar um público jovem emergente:

A inovação reflete mudanças de valores, comportamentos e visões de mundo emdiversos segmentos produtivos da sociedade, é uma resposta a transformaçõesestruturais decorrentes tanto do cenário econômico quanto das práticas socioculturaisna contemporaneidade e ganha repercussão no jornalismo em um momento em queeste campo enfrenta desafios econômicos e políticos (BECKER et al., 2018, p. 93).

Para Salaverría (2003), dois aspectos da profissão precisam de atenção: o

empresarial –é necessário integrar todos os meios que compõem o grupo,

integrando também a cobertura– e o profissional. Jornalistas devem lançar mão de

todos os recursos tecnológicos que dispõem para promover produtos que favoreçam

o consumo. Nesse sentido, empresas de comunicação podem fornecer planos de

formação aos seus funcionários para desenvolver tais potencialidades.

Bittencourt (2018, p. 78), afirma que “há um descompasso dentro das

empresas no que concerne ao avanço do aparato tecnológico e o preparo dos

profissionais que irão atuar em suas práticas diárias com este aparato”. A demanda

de uma prática jornalística inovadora, para a autora, surge com a disrupção

tecnológica e mudanças no comportamento das audiências.

Com o aprimoramento do produto jornalístico de acordo com o progresso

tecnológico, os processos e modelos em que o jornalismo se insere precisam ser

remodelados. Um modelo tradicional cuja geração de receita é baseada

exclusivamente na venda de publicidade já não se sustenta (BITTENCOURT, 2018).

Em meio à crise que afeta a profissão e à nova configuração do trabalho,

profissionais encontram no empreendedorismo uma alternativa.

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3.2 EMPREENDEDORISMO COMO ALTERNATIVA

Bertocchi (2017) percebe um “entusiasmo” nos discursos a respeito do

jornalismo empreendedor que enaltecem a inovação pois este parece ser uma

resposta à redução do número de profissionais nas redações, que precisam cada

vez mais diminuir gastos. Reflexos desse movimento podem ser notados na

atualização de cursos acadêmicos e publicações de obras em torno do tema

(CARBASSE, 2015).

No Brasil, a situação econômica instável do país é mais um fator motivador

para que jornalistas deixem as empresas e abram seu próprio negócio. Bittencourt

(2018) soma a esses aspectos a precariedade do trabalho e a dificuldade de

adequação às demandas de um público com novos comportamentos. A inovação,

conforme a autora, se torna uma rota de fuga necessária em um quadro de perda de

autoridade pelos jornais.

Abreu e Bottentuit Junior (2018) apontam a crise dos meios impressos e a

insatisfação com as mudanças na rotina produtiva como principais fatores

motivadores para que jornalistas deixem veículos tradicionais e partam para o

empreendedorismo, seja com a criação de novos nichos de mercado ou atuação

autônoma.

Aqui, cabe a diferenciação entre os termos jornalista freelancer e jornalismo

empreendedor, estabelecida por Carbasse (2015) ao estudar as novas práticas

jornalísticas promovidas pela web. O primeiro refere-se ao jornalista que produz

conteúdos para vendê-los, atuando como terceirizado. Já o segundo descreve o

profissional que, além de jornalista, atua como empresário, executando a produção e

distribuição de conteúdos em seu próprio meio.

Essa transição entre empregado e empreendedor cria a necessidade da

incorporação de uma nova mentalidade pelos profissionais da mídia. Eles deixam de

estar subordinados à uma lógica de produção tradicional e uma linha editorial

estabelecida e tornam-se seus próprios chefes, passam a representar sua própria

marca, o que demanda um conhecimento em gestão empresarial, mesmo que atuem

como freelancers. Sobre este ponto, Carbasse (2015) questiona a qualidade da

formação dos jornalistas para atuarem como gestores e constata a necessidade de

atualizá-la.

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O estudo “Ponto de Partida”, lançado em 2018 pela SembraMedia, detectou a

presença do ensino de jornalismo empreendedor em 2,8% das faculdades latino

americanas, sendo que na Espanha esse número chega a 20%, o que demonstra

uma necessidade de adequação do ensino.

Na pesquisa, foram entrevistados 59 professores de jornalismo empreendedor

na Ibero-América. 76% deles começou a dar aulas de jornalismo empreendedor a

partir de 2012, seis anos antes do estudo. Desses, 64% têm experiência prática com

a participação na fundação de algum meio de comunicação.

Com as possibilidades trazidas com a criação de empreendimentos

jornalísticos, capaz de solucionar a falta de emprego, instituições de ensino já

passam a incorporar princípios do conhecimento empresarial na formação em

jornalismo (BERTOCCHI, 2017). Também se popularizou o oferecimento de cursos,

materiais didáticos e espaços de discussão relacionados ao tema, que surgem com

o objetivo de possibilitar a criação de negócios inovadores e rentáveis.

Flores (2016b), justifica o crescente interesse acadêmico pelos modelos de

negócio jornalísticos por conta do cenário de crise na profissão gerada pela queda

de consumidores, o que causou impacto no número de profissionais empregados e

financeiramente estáveis. Ainda assim, o empreendedorismo ainda é um caminho

cheio de incertezas, especialmente para profissionais que não receberam uma

formação específica para essa atuação e que estiveram subordinados às empresas

durante toda sua carreira (ABREU; BOTTENTUIT JUNIOR, 2018).

3.3 NECESSIDADE DE UM JORNALISMO INOVADOR

A discussão acentuada em torno do empreendedorismo no jornalismo nos

leva a pensar em como a inovação de fato acontece nesse processo. Para Bertocchi

(2017, p. 106), a inovação está em “adotar uma visão sistêmica da comunicação que

ultrapasse a monotonia das empresas informativas tradicionais”. Mais do que

simplesmente abrir um negócio digital, ou lançar mão de tecnologias, deve-se

pensar nas mudanças da práxis.

Para Carbasse (2015), criou-se um espírito de startup, com a formação de

equipes enxutas, formadas por profissionais que assumem diferentes funções de

acordo com a necessidade. O foco na adaptação contínua de seus produtos

demanda uma atitude multipotencial e adaptável.

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Bertocchi (2017) explica que, ao remediar a falta de emprego nas redações

com o empreendedorismo jornalístico e o freelance, não necessariamente se rompe

com processos tradicionais da comunicação. Novas empresas que surgem no

ambiente de otimismo e inspirador quanto essa possibilidade seguem padrões já

concretizados na prática da profissão. Para inovar de fato, o modelo de negócio

posto em prática deve ser singular, inédito e visionário, o que ela classifica como um

posicionamento de startup.

A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE,

2005) apresenta, como definição geral de inovação, um conceito que se refere a

produtos, processos, métodos organizacionais e processos produtivos que, apesar

de já existentes, sofrem melhorias ou ganham um novo uso. Segundo Alves (2013),

inovações se diferenciam entre radicais e incrementais. As primeiras acontecem com

uma ruptura estrutural do padrão tecnológico, surgimento de novas indústrias,

mercados e produtos. As segundas, com incrementos em produtos e processos.

Mesmo na instância jornalística, a inovação pode ser percebida em múltiplos

sentidos e, para além de uma invenção, pode ser estabelecida como uma

recombinação de recursos e ideias (FLORES, 2016b). Tal processo sempre fez parte

da atividade jornalística, mas sempre voltada às questões de ordem qualitativa,

enquanto que, naquelas ligadas à administração e empreendedorismo, a inovação

se volta para geração de lucro.

Apesar da inovação no jornalismo ser associada ao mero uso de dispositivos,

Flores (2016a) define três categorias para o que considera jornalismo de inovação,

compreendido pelo objetivo de se manter relevante para sua audiência aumentá-la.

Ele passa, necessariamente, por alterações quanto os processos referentes à

atividade, ou seja, técnicas, tecnologias, processos, linguagens, formatos e

dispositivos:

compartimentamos didaticamente três tipologias derivadas do que consideramosjornalismo de inovação, quais sejam: 1) conteúdo e narrativa, 2) tecnologia e formatoe 3) modelo de negócio. As categorias 1) e 2) têm maior identificação ligadasdiretamente aos produtos do jornalismo, enquanto a categoria 3) se relaciona maisproximamente ao processo de produção do jornalismo (FLORES, 2016b, p.6).

Saad (2016) afirma que a inovação no jornalismo deve considerar as novas

necessidades informativas da sociedade no que se refere ao acesso e consumo. Os

empreendimentos jornalísticos refletem o contexto social no qual se inserem e

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devem adaptar-se a eles. Para Flores (2016a), tal adaptação se dá com o

aperfeiçoamento entre jornalista e público e convergência, em um pensamento

sobre o tempo futuro do jornalismo, o que reflete em mudanças nos produtos, meios

e linguagens, transformando a comunicação em uma experiência, na perspectiva da

convergência midiática, estabelecida por Jenkins (2009).

Não se pode deixar de esquecer dos possíveis riscos que o entusiasmo

empreendedor pode causar à função social principal do jornalismo, por conta da

confusão na separação entre atividades editoriais e comerciais. Carbasse (2015)

levanta questões como a busca incessante pela venda de conteúdos, que pode

afetar diretamente a qualidade das pautas selecionadas. Também discute a

transparência ao assumir determinados produtos como frutos de publicidade nativa.

Para o autor, é o conteúdo de qualidade que une o bom jornalismo ao

empreendedorismo de sucesso. Seguindo uma linha editorial bem definida, o

jornalista que preza pela qualidade fica satisfeito e o empreendedor agrega valor ao

seu produto. Da mesma forma, Flores (2016a) acredita que a busca por valores

reais do jornalismo é a saída para tornar a prática sustentável.

3.3.1Modelos de negócio inovadores no jornalismo

A cconsolidação dos modelos de negócio jornalísticos no ambiente digital.

Segundo Becker et al. (2018), isso acontece porque o conceito de inovação

empreendido por eles não incorpora conflitos da profissão e as práticas

socioculturais contemporâneas relacionadas à informação. Apesar de a inovação ter

sido sempre necessária no campo jornalístico, agora é preciso direcioná-la para os

processos de produção e distribuição de notícias que devem acompanhar o

interesse do público.

Como modelo de negócio no jornalismo, Duarte (2011) entende a

esquematização das vantagens e recursos de uma empresa frente aos seus

objetivos. Na busca de alcançá-los, traçam-se estratégias, transformando processos,

sistemas e estruturas.

O empreendedorismo surge como alternativa para a manutenção econômica

dos profissionais da área. Além disso, torna-se um espaço de voz para setores

sociais diversos. No entanto, várias dessas iniciativas mantém uma lógica de

produção baseada na mídia tradicional ou dependem dela para manter sua atuação

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viva. Portanto, surge a necessidade de reinventar o jornalismo também em seu

modelo de negócio, de forma que este possibilite a promoção de práticas inovadoras

e independentes da estrutura midiática já ultrapassada.

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Page 37: PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ · em veículos cujo modelo de negócio é definido como startup (diferenciando-a daquela posta em prática em empresas tradicionais),

4 STARTUPS

Na busca pelo modelo de negócio ideal que proporcione a sustentabilidade da

produção de conteúdo jornalístico inovador de fato, as starups se mostram como

uma possibilidade. Elas configuram-se como empreendimentos que atuam em

cenários de incerteza extrema e apresentam a capacidade se se adaptar aos

consumidores que atendem, estando em conformidade com as dinâmicas sociais

atuais em torno da informação.

No Brasil, verifica-se um crescimento e boas perspectivas para esse

enquadramento de negócio e, atualmente, 307 delas oferecem produtos e/ou

serviços classificados como “Comunicação e Mídia” (STARTUPBASE, 2017). Apesar

de não contar com muitos programas de incentivo ou possibilidades de investimento,

o país ainda se mostra um lugar repleto de possibilidades (BERNARDI, 2014).

4.1 DEFINIÇÃO DE STARTUP

Ao contrário do que se tem como consenso na discussão popular sobre

empreendedorismo, as startups não são pequenas empresas ou versões menores

de grandes empreendimentos, apesar de começarem dessa forma na maior parte

das vezes (BLANK; DORF, 2014). Ries (2012, p. 24) acredita que “qualquer pessoa

que está criando um novo produto ou negócio sob condições de extrema incerteza é

um empreendedor”, mesmo que esteja inserido em uma grande e consolidada

organização. A diferença entre uma startup e as demais organizações, portanto, está

em seu modelo de produção.

Sob condições de extrema incerteza, as startups se organizam

temporariamente na busca de um modelo de negócio escalável, recorrente e

lucrativo, o que gera modificações constantes no produto ou serviço, nas formas de

financiamento e geração de receita, nas estratégias de divulgação e comunicação,

entre outros. Essas mudanças acontecem na busca pelo conhecimento do cliente e

aperfeiçoamento com objetivo de conquistá-lo.

Sendo assim, especialmente em seus primeiros estágios de desenvolvimento,

o modelo de negócio de uma startup é flexível o suficiente para ser intensamente

modificado. É intrínseca a ligação do empreendimento enquadrado no modelo de

startup com a inovação constante. O próprio termo, em tradução literal, pode ser

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dividido em “start”, que significa “iniciar”, e “up”, ou seja, “para cima” (ALVEZ;

DUARTE, 2016).

Como defende Bernardi (2014), dadas as complexidades empresariais, as

empresas que contam com a capacidade de se renovar em cada um dos estágios de

seu desenvolvimento são aquelas, consequentemente, com maior ciclo de vida

tempo de sobrevivência. O ambiente empresarial é cada vez mais complexo e

competitivo, com variáveis incontroláveis e imprevisibilidades, o que demanda uma

postura empresarial holística e sistêmica.

Ries (2012) defende o modelo da startup enxuta, cujo nome vem da produção

enxuta, estabelecida pelos empreendedores Taiichi Ohno e Shigeo Shingo no

sistema produtivo da Toyota, o chamado Toyotismo. Neste formato, a percepção do

consumidor, grande visão e ambição são pontos-chave para realizar a interação

rápida, desenvolvendo o serviço e/ou produto em tempo record, se comparado ao de

empresas tradicionais.

As startups representam o modelo de empresa que está adequado aos novos

paradigmas da organização social que, conforme Bauman (2001), se caracteriza

pela quebra na noção de tempo. Ao se apresentarem um alto grau de

adaptabilidade, elas podem se organizar em semanas e se reorganizar a cada dia.

De forma a evitar suposições e testar ideias na prática, essa teoria tem como

justificativa encontrar o que, de fato, gera percepção de valor pelos clientes, já que

“todo o restante é desperdício”, nas palavras de Ries (2012, p. 43). Para o autor,

apenas com o entendimento das necessidades dos clientes é possível criar negócios

sustentáveis.

A base para o desenvolvimento da startup enxuta é o ciclo de feedback

construir-medir-aprender, no qual, ao invés de se desenvolver uma ideia e

apresentá-la aos consumidores –modelo de produção em escala defendido no

fordismo e taylorismo– são feitos pequenos processos de desenvolvimento de um

produto com o intuito de testá-lo diversas vezes até consolidá-lo no mercado.

Sendo assim, o plano de negócios traçado antes que as atividades da

empresa fossem iniciadas, formado por suposições que, na visão de seus criadores,

são verdadeiras, sofre diversas alterações até se adequar à realidade. Essas

suposições são postas em prática e testadas. Conforme o resultado de adesão,

serão mantidas, adaptadas ou descartadas (RIES, 2012).

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Traçar uma estratégia com prioridades e limites é uma necessidade defendida

por Silveira e Souza (2017) para ser incorporada pelas organizações de mídia

digital. As empresas jornalísticas de modo geral, assim como startups, estão

inseridas em um contexto de constantes mudanças que torna necessária a

racionalização das práticas. Nesse sentido, estratégias mais simples possibilitam

que as decisões tenham seu curso mais controlado, pois são mais facilmente

adaptáveis.

Bem como nas consequências geradas à atividade jornalística, a internet

impacta fortemente o desempenho das startups como um todo. Segundo Blank e

Dorf (2014), aquelas presentes no ambiente online conseguem realizar o ciclo

básico de desenvolvimento de produtos a partir de um feedback real de clientes que

acontece em tempo zero ou praticamente zero, tornando todo o ciclo ainda mais

rápido.

4.1.1Startups ao longo da história

O formato de negócio seguido por empresas que se caracterizam como

startups, especialmente no que se refere à sua característica de unir capital de risco

à atividades empreendedoras rodeadas de incertezas foi se consolidando ao longo

do século XX, período em que a execução de atividades empreendedoras passou a

ser menos restrita aos donos de grandes monopólios, consolidados juntamente com

o sistema capitalista, para difundir (BLANK; DORF, 2014). Essa transição é marcada

pelo primeiro curso de MBA (administração de empresas) que passou a ser ofertado

pela universidade de Harvard em 1908.

Tal processo se intensificou com a nova Revolução Industrial nos anos 1970,

identificada por Castells (2002), marcada pela informação como principal motor e

pela organização social em rede. Alves (2013), destaca o caráter global das

transformações econômicas, políticas, sociais, culturais e tecnológicas ocorridas nas

décadas de 1970 e 1980 como fator para o declínio de economias capitalistas

organizadas em grandes instituições. Essas, frente ao novo sistema econômico

global, tiveram de estabelecer estratégias para se diferenciarem e valorizarem.

Nesse mesmo momento, o Brasil, afundado em dívidas provindas dos anos

de regime militar, afastado da economia global, deixa de realizar esforços no

desenvolvimento de seu mercado empreendedor interno para focar na obtenção de

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superávits e saldar suas dívidas (ALVES, 2013). Já nos anos 1990, a inflação foi

outro impasse para que o país entrasse no cenário produtivo internacional, mesmo

que já fosse conhecido o impacto positivo do apoio à criação de empresas para o

desenvolvimento nacional, distribuição de renda e diminuição do desemprego.

O equilíbrio econômico a partir dos anos 2000 foi o que permitiu uma maior

atenção à criação e fomento de novos negócios. Juntamente a ele, a expansão da

internet, mais evidenciada a partir de 2010, contribuiu com a mudança de cenário

(ALVES, 2013). Atualmente, o apoio ao empreendedorismo se dá por iniciativas do

governo federal, regional e local, entidades como o SEBRAE (Serviço Brasileiro de

Apoio às Micro e Pequenas Empresas) e, no caso das startups, aceleradoras.

Entidades com a função de desenvolver empresas com alto potencial, as

aceleradoras dispõem de recursos comuns para “incubar” startups, ou seja,

desenvolvê-las em seus estágios mais primários, além de fornecerem investimentos

que tornem possível sua concretização. Em contrapartida, quando startups atingirem

seu equilíbrio econômico e posterior geração de lucro, devolvem parte de seu

rendimento durante determinado período, conforme condições combinadas antes do

investimento.

4.2 STARTUPS NO BRASIL

Atualmente, existem 12.686 startups no Brasil, de acordo com os dados mais

recentes da StartupBase, base de dados oficial do ecossistema brasileiro de

startups, organização criada e administrada pela Associação Brasileira de Startups

(AbStartups). Aproximadamente 46% das startups brasileiras já têm mais de dois

anos de duração e 63% delas têm até cinco pessoas. Esses dados demonstram

uma certa, ainda que recente, consolidação desse ecossistema (ABRSTARTUPS,

2018). Mais da metade delas (59,19%, cerca de 7.500 empresas) está concentrada

na região sudeste. Em seguida, vem a região Sul com 23,27%, região Nordeste com

9,61%, Centro-Oeste com 5,66% e Norte com 2,27%.

Para Alves (2013), a presença recente de empreendimentos desse formato no

Brasil faz com que programas, associações e projetos desenvolvidos com o objetivo

de fomentá-los apresentem propostas de aproximação dos atores envolvidos nesse

processo: os próprios empresários, investidores, além de centros de pesquisa. “Isso

se mostra necessário para se criar uma cultura de inovação característica da

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realidade startup, ou seja, um ambiente propício aos testes que elas precisam

realizar” (ALVES, 2013, p. 62).

Além disso, devem ser feitos esforços para proporcionar a redução de

impostos e taxas direcionados a esses empresários, de forma a se adequarem à

realidade de empresas ainda não consolidadas no mercado. Ao mesmo tempo, o

desenvolvimento de incentivos fiscais pode ser determinante para sua abertura,

progresso e sucesso (ALVES, 2013).

O mais recente relatório do Global Entrepreneurship Monitor (GEM), sobre o

cenário brasileiro de empreendedorismo, produzido em 2016 e publicado em 2017,

demonstra, em linhas gerais, visão pouco especializada, amadora e otimista por

parte dos empreendedores brasileiros. Prova disso é a pequena parcela deles

(13,4%) que busca órgãos especializados para a gestão de seus negócios, o que

causa dificuldades em processos básicos como planejamento, gestão financeira e

mercadológica, entre outras demandas. O principal fator que leva à essa inércia é a

falta de conhecimento e informação sobre esses serviços. Essa característica, no

entanto, demonstra um crescimento conforme o nível de desenvolvimento do

negócio avança.

O estudo do GEM sustenta que, no olhar dos empresários, os principais

fatores limitantes tanto para a abertura quanto para a manutenção de novos

negócios são, em ordem decrescente: acesso a recursos financeiros (empréstimos

ou financiamentos), legislação e impostos (leis e carga tributária), programas de

orientação para criar ou manter um negócio e formação e capacitação de mão de

obra.

Esse dado é contrastante quando se refere às startups: entre todas aquelas

existentes no Brasil, 45% já participaram de algum programa de incubação ou

aceleração (ABRSTARTUPS; ACCENTURE, 2018). De acordo com Kubota, Mayer e

Oliveira (2013, p. 71) são motivos para a busca de aceleradoras: apoio na gestão e

infraestrutura física e possibilidade de acesso a recursos financeiros. Entre os

empresários respondentes da pesquisa da AbrStartups, 39% demonstra satisfação

quanto ao acesso a capital. Já a taxa de satisfação em relação ao apoio é de 54%.

Partindo da análise do comportamento dos próprios empreendedores e da

compreensão do empreendedorismo como processo, o relatório “Empreendedorismo

no Brasil–2016” segmenta as empresas pesquisadas entre nascentes e novas

(aquelas que se encontram nas fases de criação e estabelecimento) e consolidadas

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(quando já ultrapassaram o estágio de persistência no mercado). É dessa

perspectiva que são levantados dados gerais sobre geração de receita, processos

de gerenciamento, inovação, entre outras características desses negócios.

Entre os empreendimentos iniciais, a porcentagem daqueles que ainda não

demonstra nenhum faturamento é de 30,6%. Um percentual um pouco maior, de

45,7% já faturou até 12 mil, enquanto 14,4% faturou entre 12 e 24 mil. Aqueles que

já somam um faturamento entre 24 e 36 mil representam 5,3%. Acima desse valor, a

quantidade de empreendimentos é menor do que 5% do total. É possível aplicar

esses dados no universo das startups, uma vez que, assim como na noção de

empreendimentos iniciais adotada no levantamento, elas são empresas marcadas

pela intensa criação e adaptação. No caso das startups, 69% têm faturamento anual

abaixo dos 50 mil reais, dado presente no estudo da AbrStartups (2018).

Uma das características exploradas no relatório do GEM é o potencial de

inovação relativo aos empreendimentos brasileiros, dado que reflete os

investimentos realizados em pesquisa e desenvolvimento. Com 20,4% de potencial

de inovação, o Brasil apresenta o segundo menor potencial entre os países

analisados na pesquisa (África do Sul, Alemanha, China, Estados Unidos, Índia,

México e Rússia) ficando apenas acima apenas da Rússia, que conta com 17,5%.

Em primeiro lugar estão China (76,9%), Índia (62,6%) e África do Sul (47,9%).

Apesar dessa posição, empreendedores brasileiros conseguem apresentar produtos

com certo grau de diferenciação, dada a existência de concorrentes em uma taxa de

48,5%, menor apenas do que a existente nos Estados Unidos, de 61,6%.

Como já afirmado no desenvolvimento da presente pesquisa, inovação é um

atributo intrínseco ao estabelecimento das startups. O posicionamento do Brasil

nesse sentido, quando comparado aos demais países aos que foi comparado no

estudo do GEM, reflete a existência de um ambiente desfavorável para a criação de

empresas nesse modelo. Esse cenário pode ser causado por diversos fatores, entre

eles: escassez de atenção governamental, desinteresse de instituições privadas, de

recursos sociais, tecnológicos, financeiros, etc. Somada à baixa inovação, a

porcentagem ínfima de 4% coloca o país como último da lista em relação ao uso de

tecnologia. Índia e África do Sul têm esse mesmo percentual superior a 50%.

Mesmo imerso em todos esses aspectos desfavoráveis, o empreendedor

brasileiro tem um censo de otimismo sobre a criação de negócios a curto prazo que

se sobrepõe a quase todos os países, exceto Estados Unidos e Índia (GEM, 2017).

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Trata-se de uma característica que pode ser entendida sob o aspecto cultural. O

Brasil, juntamente com Estados Unidos, também é um dos países cuja população

mais se sente preparada para empreender, cerca de 50%.

Bem como afirma Bernardi (2014 p. 15), apesar das dificuldades típicas de

empreender no Brasil, “o país ainda é um celeiro de oportunidades, com um

potencial respeitável”. A interpretação feita com base dos dados trazidos pelas

pesquisas aqui apresentadas sugere que o Brasil, apesar de apresentar condições

desfavoráveis ao empreendedorismo, demonstra altos níveis de atividade

empreendedora que, neste sentido, vão contra as expectativas.

4.2.1Mercado brasileiro de jornalismo

O mercado brasileiro de mídia é caracterizado, de acordo com o Relatório

anual de 2018 do Instituto Reuters, por emissoras comerciais de massa, grandes e

populares portais online e jornais que buscam uma nova alternativa de negócio.

Também se destaca o expressivo uso de redes sociais pelos brasileiros – 61%

compartilha notícias via redes sociais ou e-mail e 38% comenta em notícias

publicadas em redes sociais ou websites. O Facebook é a rede de maior uso (75%

da população tem uma conta no site), seguido pelo Whatsapp (48%).

Tanto nas mídias off-line (rádio, televisão e impresso) quanto nas plataformas

online de notícias, o cenário é dominado por grandes e tradicionais grupos

midiáticos. No primeiro caso, Globo news, Band news e Record news são, em

ordem decrescente, as marcas dominantes. Na internet, os portais mais acessados

pelos brasileiros são G1, UOL Online e O Globo online (NEWMAN et al., 2018).

No estudo “Digital News Report”, de 2018, a única marca inserida em um

modelo caracterizado como startup e aparece entre as estatísticas do consumo de

notícias online é o site BuzzFeed News, que faz parte do Buzzfeed, uma empresa de

mídia americana criada em 2006 com o intuito de produzir conteúdo “compartilhável”

e facilmente consumível. O Buzzfeed chegou ao Brasil em 2013. Atualmente, já

existe uma redação física em São Paulo (VELOSO, 2014).

Quanto à segmentação das startups brasileiras, de acordo com dados da

StartupBase, aquelas que se enquadram na categoria “Comunicação e Mídia”

somam 307 em todo o país (STARTUPBASE, 2019). Por consenso, inclui-se nessa

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categorização as startups de jornalismo, já que não existe uma categoria mais

específica para mapear as startups desse segmento.

Ao analisar o cenário brasileiro das startups de jornalismo, Bertocchi (2017) o

enquadra em uma fase experimental inicial. Apesar do termo ter se popularizado,

ainda é confundido com o jornalismo autônomo ou com empresas jornalísticas que

não podem se enquadram em um modelo de startup.

Uma evolução dessa realidade seria a incorporação dos processos essenciais

das startups pelos negócios já criados: a criação de um negócio inovador, busca de

investimentos, adaptações rápidas e escalabilidade. Isso levaria a um objetivo que

vem sendo buscado pela maior parte das iniciativas empreendedoras: a geração de

lucros (BERTOCCHI, 2017).

4.3 PLANO E MODELO DE NEGÓCIOS

Na literatura sobre empreendedorismo e negócios, os termos “plano de

negócios” e “modelo de negócios” são aplicados de maneira confusa. Por servirem a

um propósito semelhante –planejar uma empresa no que diz respeito a seu corpo de

funcionários, processos, rotina, produção, entre outros aspectos, visando a geração

de lucro– são, muitas vezes, usados como sinônimos, apesar de apresentarem

definições distintas. Como forma de esclarecer tal uso, Alvez e Duarte (2016)

estabelecem uma divisão.

Para os autores, plano de negócio é uma ferramenta formada por seções sem

número definido que abrangem a organização total da empresa, em todas as suas

características essenciais, como: produto a ser vendido, forma de compra,

plataforma de distribuição, estratégia de marketing, entre outros, com perspectivas

para cada uma delas. Se trata de um documento extenso, com informações

detalhadas e previsões de até cinco anos. Sua compreensão pode levar horas.

“Para negócios em estágios iniciais, como as startups, é necessário ter um

documento que se obtenha informações rápidas, pois trabalham com inovação e

incerteza” (ALVEZ; DUARTE, 2016, p. 121).

Ainda segundo definição de Alvez e Duarte (2016), o modelo de negócios, por

outro lado, fornece informações de apreensão rápida que abrangem as quatro

principais áreas de um negócio: clientes, oferta, infraestrutura e viabilidade

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financeira, vistas da perspectiva de geração de valor para o cliente e da forma

encontrada para gerar receita.

Desse modo, permite compreender a complexidade de um negócio de

maneira simples e rápida e se torna adaptável ao ambiente de complexidade e

incerteza na qual startups estão inseridas. Por conta dessa diferença, o

planejamento de startups normalmente se dá pelo uso do modelo de negócios, mais

dinâmico e ágil quando comparado ao plano.

Bernardi (2014) diferencia plano e modelo de negócios pela abrangência de

cada um deles. O plano é tido como um projeto específico, elaborado em cinco

diferentes etapas, para alcançar um objetivo determinado: ideia e concepção, coleta

de informações, preparação de dados, análise, montagem e avaliação. Já o modelo

abrange aspectos como a funcionalidade do sistema de funcionamento adotado pela

empresa e a lógica das relações que o compõem. Juntamente com o modelo, a

estratégia define a forma encontrada pelo negócio para se diferenciar no sistema ou

ambiente em que se insere.

A elaboração tanto do plano quanto do modelo de negócio não é uma ciência

exata. Ambos devem ser testados e avaliados. Se os números resultantes do

planejamento se mostrarem insatisfatórios, devem ser reformulados conforme as

necessidades da empresa. “O que se deve buscar constantemente é uma

aproximação relativa dos modelos ideais e caminhar em direção a um modelo

moderno e realista, face às necessidades ambientais observadas na atualidade”

(BERNARDI, 2014, p. 55).

Blank e Dorf (2014), vão além: diferenciam plano de negócio e modelo de

negócio caracterizando o primeiro como sendo um planejamento estático e o

segundo como uma série de definições mutáveis e adaptáveis e, portanto, mais

adaptado ao conceito de desenvolvimento de clientes defendido por eles.

a diferença entre um plano de negócio estático e um modelo dinâmico poderiamuito bem ser a diferença entre extinção e sucesso. As startups deveriamjogar fora o plano de negócio e adotar o modelo de negócio. Um modelo denegócio descreve a interação entre os fatores principais que constituem umacompanhia (BLANK; DORF, 2014).

Estabelecida a divisão entre plano e modelo de negócio, fica evidente a

motivação das startups em optar pela utilização do segundo, dada a adaptabilidade

do modelo de negócios frente a certa inflexibilidade do plano. Como toda a

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estratégia de uma empresa enquadrada nesse modelo pode mudar conforme o

comportamento adotado pelo seu público, é preciso que seu planejamento mude na

mesma velocidade.

4.3.1Modelo de negócios

O modelo de negócio, na visão de Ries (2012) é o caminho pelo qual a

startup transforma a ideia inicial em um empreendimento rentável e sustentável,

permitindo a visualização de todo o processo da empresa. Também de acordo com o

autor, possibilita a determinação do valor da empresa. No caso dos

empreendimentos em comunicação, tal valor se dá de forma subjetiva, por meio do

reconhecimento de valores como verdade, honestidade, aprendizado, entre outros

pelos seus clientes, como afirma Alves (2014).

Bernardi (2014) estabelece uma subdivisão para modelo de negócio, de forma

a abranger todas as suas esferas, elencando: modelo de mercado; modelo de

concorrência; modelo de vendas e distribuição; modelo de fornecimento; modelo de

produção e modelo de administração. Para garantir sua flexibilidade, o modelo de

negócios deve contemplar todos esses aspectos de maneira simples e objetiva.

São nove os componentes definidos por Ostewalder e Pigneur (2011) que

devem ser descritos no modelo de negócio para que que as quatro áreas principais

de uma empresa (clientes, oferta, infraestrutura e viabilidade financeira) sejam

contempladas. São eles: segmentos de clientes, proposta de valor, canais,

relacionamento com clientes, fontes de receita, recursos principais, atividades-

chave, parcerias principais e estrutura de custo.

Para Meira (2013), o modelo de negócios é uma complexa e ampla matriz de

variáveis. Em consonância com as constantes dinâmicas da economia atual, o

pensamento empreendedor deve ir além da garantia da performance (que envolve

componentes como qualidade, preço e prazo). Todos os processos, desde o

planejamento até a prática de qualquer ação deve ser pensado em rede. Isso implica

se adiantar às tendências do mercado como, por exemplo, a automatização, que

surge para substituir e ampliar o capital humano qualificado.

Meira (2013) defende um determinado conjunto de condições para ir ao

mercado, isto é, se posicionar como uma empresa de valor e geradora de lucro. O

primeiro deles é a identificação de uma necessidade que gera demanda por parte do

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mercado consumidor. Se já existir atendendo esse grupo, é preciso descobrir um

encaixe no mesmo segmento. Se não houver, por outro lado, se faz necessário

investigar as causas que levaram a essa falta de oferta.

Diagnosticada a necessidade, a quem atenderá e a qual preço sua solução

será negociada, o próximo passo é solucioná-la. Para tanto, empreendedores

precisam estudar os caminhos para atendê-la por meio do produto a ser

desenvolvido. Por fim, deve-se desenvolver a geração e a percepção de valor sobre

o produto oferecido. Dessa forma, os custos envolvidos em sua produção serão

menores que seu valor de venda.

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5 JOTA: UM CASE DE SUCESSO DE STARTUP JORNALÍSTICA BRASILEIRA

Criado por dois jornalistas em 2014, o Jota é um case de sucesso entre as

startups de jornalismo brasileiras. A ideia de criar conteúdo e produtos que tratassem

de assuntos relacionados ao Poder Judiciário brasileiro fez com que a empresa

fosse criada e se organizasse em um modelo de startup para atender um nicho de

mercado segmentado. Assim, surgiu uma estrutura inovadora que exigiu novas

habilidades dos jornalistas que compõe a equipe com o objetivo de desenvolver

produtos inéditos no mercado jornalístico.

O estudo de caso aqui desenvolvido sobre o Jota estabelece relações entre o

modelo de negócio estabelecido no formato de startup à produção inovadora

possibilitada por conta desse enquadramento. A partir da entrevista com Marc

Sangarné, um dos sócios e atual CEO (diretor executivo) da empresa, foram

verificados elementos para o suesso do negócio e as possibilidades demonstradas

por ele.

5.1 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Foram trazidos, neste estudo, como procedimentos metodológicos: a revisão

bibliográfica e o estudo de caso. O primeiro sustentou as três primeiras seções do

trabalho sendo que a leitura de material e tomada de apontamentos –apontados por

Gil (2002) como as fases do processo, serviram como base para se compreender o

universo tratado na pesquisa, seja por meio de leitura teórica sobre temas como

crise na mídia e jornalismo, empreendedorismo e comunicação e mercado de

startups, seja por meio da coleta de dados provindos de pesquisas, que trouxeram

concretude aos assuntos tratados teoricamente, inserindo-os na realidade.

O estudo de caso, por outro lado, ao ser entendido como um meio para

compreensão de uma realidade e ou contexto social (DUARTE, M., 2006) serviu

para testar e relacionar as informações coletadas durante a elaboração teórica na

prática. A coleta de dados para o estudo foi feita por meio de entrevista de um

representante do Jota, objeto de estudo aqui definido.

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5.1.1Revisão bibliográfica

Gil (2002) divide as fases do delineamento da pesquisa bibliográfica em

definição e localização de fontes, leitura de material e tomada de apontamentos.

Para o autor, esse procedimento deve ter como premissa o problema definido na

pesquisa e o conjunto de temas abordados no trabalho para que se realize uma

seleção variada de obras que contemplem e suportem a posterior redação.

No caso do presente estudo, a atualidade do tema escolhido dificultou o

levantamento, já que a pesquisa em jornalismo na perspectiva do

empreendedorismo é incipiente (ABREU; BOTTENTUIT JUNIOR, 2018). Assim, a

maior parte das obras encontradas nesse sentido é recente e tem um viés

experimental e há certa dificuldade para encontrar produções mais consolidadas.

5.1.2Estudo de caso

Como uma das metodologias a ser aplicada nesta pesquisa, optou-se pelo

estudo de caso, uma vez que essa técnica tem como finalidade demonstrar, a partir

de um caso específico, a multiplicidade dentro de uma realidade, no contexto deste

estudo, o universo das startups de jornalismo no Brasil. Segundo Duarte:

num mundo imperfeito como o nosso, a realidade pode ser vista sobdiferentes perspectivas, não existindo uma única versão que seja a maisverdadeira. Nesse sentido, o método do estudo de caso permite aoinvestigador identificar os vários elementos que constituem uma situação ouproblema de modo a possibilitar que outros leitores tirem suas própriasconclusões (DUARTE, M., 2006, p. 234).

Feito a partir de um levantamento de evidências, o estudo de caso pode ser

realizado com observação participante, entrevistas e coletas de materiais como

documentos, registros, cartas, entre outros (GIL, 2002). Os dados coletados devem

ser tratados com rigor para que se evite qualquer alteração na sua análise. Ao

considerar uma unidade social como um todo, no estudo de caso é possível

compreender o que ele representa a respeito do contexto em que está inserido. Por

conta disso, é preciso que essa unidade deve ser representativa da realidade a ser

estudada.

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5.1.2.1 Entrevista

Nesta pesquisa, a entrevista qualitativa, um método versátil e amplamente

empregado nas ciências sociais, foi escolhida como forma de coleta de dados.

Gaskell (2002) defende a entrevista como uma porta de entrada para o cientista

social estabelecer sistemas interpretativos com objetivo de compreender a ação de

atores sociais, suas relações e contextos nos quais se inserem.

Para o autor, a entrevista deve ser abrangente. Diferentemente de um

questionário, formatado em questões específicas e pontuais, o roteiro de uma

entrevista configura-se em uma seleção de tópicos abrangentes relacionados ao

assunto tratado. Na perspectiva Gil (2002), entre as técnicas interrogativas, e

entrevista é a mais flexível delas. Quando apresenta um roeiro pré-definido,

configura-se como parcialmente estruturada. Nesse caso, as questões aplicadas na

entrevista devem traduzir os objetivos específicos do estudo a ser desenvolvido.

Durante a aplicação do método, é ideal que se estabeleça uma converssção

natural, sem que o entrevistador se coloque em uma postura passiva, na qual se

explore o “espectro de opiniões, as diferentes representações sobre o assunto em

questão” (GASKELL, 2002, p. 68).

A escolha do entrevistado é feita de forma não probalística, ou seja, de acordo

com quem o entrevistador considerar mais adequado, conforme Duarte, J. (2006).

Nas entrevistas qualitativas, essa seleção é feita por conveniência (baseada na

viabilidade) ou intencionalmente (a partir do juízo particular do pesquisador). De

maneira intencional, o entrevistado para representar o Jota na entrevista

desenvolvido foi Marc Sangarné, sócio e diretor geral da empresa. A escolha se deu

pela representatividade de Sangarné sobre o modelo de negócio e estratégias

mercadológicas adotadas pela empresa, uma vez que ele foi o principal responsável

pelo desenvolvimento desses dois elementos.

Formado como engenheiro de telecomunicações, Marc Sangarné tem

experiência de 20 no mercado de trabalho, durante os quais desenvolveu projetos

ligados à inovação, informação e tecnologia em 20 países. Sua entrada no Jota

aconteceu praticamente um ano após a abertura da empresa, em 2015, com o

objetivo principal de gerar valor nos produtos desenvolvidos por ela frente a

sociedade e, principalmente, seu público-alvo. Antes do Jota, sua experiência com

jornalismo aconteceu em outra startup, a BRIO Stories, cuja proposta era produzir

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narrativas em formato longo. Em termos de negócio a BRIO fracassou e se

transformou na BRIO Hunter, um centro de serviços direcionados a jornalistas, do

qual Sangarné não faz mais parte.

Depois dos dados coletados, parte-se para análise da entrevista. Segundo

Duarte, J. (2006) essa etapa consiste na divisão do conteúdo coletado em partes

que possam ter sua natureza, funções e relações analisadas individualmente. Assim,

as informações recolhidas são enquadradas em categorias de temas comuns sobre

os quais se possa discorrer a respeito, estabelecendo um sistema de análise

(DUARTE, J., 2006).

A entrevista aqui desenvolvida teve como principal objetivo a apreensão e

compreensão de informações sobre o modelo de negócio e estrutura organizacional

do Jota. Deste modo, os tópicos previamente estabelecidos pautaram tópicos que,

de acordo com Ostewalder e Pigneur (2011) são essenciais ao se estabelecer um

modelo de negócio, como: clientes, valor agregado aos produtos, comunicação,

relacionamento com o consumidor, custos, geração de receita, principais recursos,

profissionais, atividades e processos e parceiros. Direta ou indiretamente, todos

esses tópicos foram contemplados.

A condução da conversação se deu de forma fluída, possibilitando a

ampliação das falas do entrevistado para assuntos que, mesmo não estando

previstos no roteiro, pudessem ser considerados importantes por ele. A duração total

foi de uma hora e três minutos com um total de 10 perguntas feitas.

5.2 JOTA

Criado em 2014 pelos jornalistas Felipe Seligman e Felipe Recondo o Jota é

uma startup que nasceu da necessidade percebida por eles de fornecer uma

cobertura jornalística extensiva do cenário judicial brasileiro. Ambos trabalhavam

para dois jornais concorrentes (Folha de São Paulo e Estado de São Paulo) cobrindo

assuntos ligados ao Supremo Tribunal Federal (STF). Por conta do contato com

profissionais desse meio (entre advogados, juízes, políticos, etc) perceberam a

quantidade de conteúdos, em geral mais técnicos) que geravam interesse por esse

público, mas não encontravam respaldo nos periódicos populares.

Desde o início, a proposta do Jota é oferecer informação para audiências

reduzidas, configurando-se como um veículo de nicho. Os clientes variam entre

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assinantes individuais e empresas. Como principais produtos do Jota estão o portal

(www.jota.info), o mais popular deles e porta de entrada para outros produtos mais

especializados, e o Jota Pró Tributário, especializado para escritórios de advocacia,

definido por Sangarné (2019) como o “carro-chefe”.

No portal, a escolha das pautas se dá pelos fatos relacionados aos três

poderes: legislativo, executivo e, principalmente, judiciário e a página inicial é

abastecida diariamente. Existem nove editorias principais: Justiça, STF, Tributos e

Empresas, Carreira, Dados, Legislativo, Opinião e Análise, Coberturas Especiais e

Eventos.

Quando cadastrado, qualquer usuário tem acesso a até 10 matérias. Se o

login não for feito, esse acesso é restrito a apenas três. A de receita proveniente

dessa produção é gerada pelo paywall, no valor de R$19,90 ao mês para

assinaturas individuais e R$9,90 para estudantes de graduação, mestrado ou

doutorado. Além do acesso ilimitado às publicações do site, essa assinatura permite

o cadastro nas três newsletters do Jota: Direto na Mídia, Últimas Notícias e Mais

Lidas.

A proposta do Jota Pró Tributário, produto mais especializado entre todos os

oferecidos pelo Jota, é oferecer uma curadoria de conteúdo analítica, exclusiva e

adaptada às demandas dos assinantes, compostos por grandes empresas, agentes

do mercado financeiro ou de fundos de investimento, por meio de diversos canais de

comunicação, do e-mail ao WhatsApp. Além de receberam análises de cenários e

modelações preditivas sobre movimentações financeiras, os clientes podem tirar

dúvidas a qualquer momento. O Jota Pró Poder varia entre as modalidades básica,

essencial e completa, cada uma com funcionalidades adicionais. O preço não é fixo,

mas varia conforme a dificuldade em conseguir as informações solicitadas.

Entre os demais serviços que compõem a receita do jota estão outros

produtos temáticos: Tributário (direcionado a empresas, fornece informações sobre

impostos e movimentações tributárias), Saúde (acompanha movimentações no

Supremo Tribunal de Justiça e no Supremo Tribunal Federal a respeito do tema).

Aqueles com conteúdo mais específico estão enquadrados na categoria Sob

Medida: o Tracking (fornece relatórios específicos sobre assuntos demandados

pelos clientes), Dados (disponibiliza análises e estatísticas baseadas em dados) e

Jota Discute (composto por discussões opinativas sobre assuntos debatidos por

profissionais do Jota).

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Por fim, o site do Jota ainda conta com uma área no site de editoria

patrocinada, apesar de totalmente independente, chamada de “Coberturas

Especiais”. Quando alguma organização considera a discussão de algum tema

benéfica, compra a produção de um artigo a respeito do assunto. No entanto, não é

permitido que as empresas interfiram e qualquer momento ou escolha na elaboração

da matéria, como enfoque, fontes, abordagem, etc.

Todas as informações tratadas devem ser públicas, ou seja, não devem ser

recolhidas com o oferecimento de vantagem indevida a qualquer pessoa, não devem

sofrer interferência de qualquer possível interessado e não devem ser publicadas

sem que estejam disponíveis ao mercado. Mesmo que assuma um tom mais

analítico, nenhuma publicação deve funcionar no formato de consultoria

Tanto os princípios editoriais quanto o código de ética estão expostos no site.

Quanto à questão editorial, são seis os critérios adotados como princípios que

regem a produção: utilidade, transparência, precisão, leitor no centro, empatia e

colaboração. O código de ética que rege a atividade na empresa é dividido entre

quatro tópicos. O primeiro se dedica a prescrever as regras para a produção de

conteúdo. Em seguida, trata-se da informação privilegiada e os limites éticos para

consegui-la. O critério da confidencialidade se refere à divulgação de informações

sobre a empresa pelos jornalistas. Por fim, o último tópico, Conflito de Interesses,

esclarece a relação entre colaboradores do Jota e seus clientes.

5.2.1Crescimento e desenvolvimento

Na própria descrição disponível da aba “Quem Somos” do site do Jota, ele é

definido como uma startup. Na fala de Sangarné (2019), essa denominação é dada

por conta de três características principais da empresa: seu crescimento escalável

partido apenas de uma ideia, seus componentes inovativos que vão desde os

conteúdos abordados até a estrutura de negócio adotada, e a busca pela resolução

de um problema latente e concreto, nesse caso a falta de previsibilidade das

instituições brasileiras, que é resolvido com a busca de informação sobre instituições

direcionada de maneira aprofundada (a partir de dados, apuração e análise) para

setores e nichos.

Sendo assim, bem como nas definições de startup tratadas anteriormente, no

Jota o ponto central de geração de valor é dado pela audiência. A adequação às

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demandas dos consumidores é feita por meio da manutenção de um diálogo

constante e monitoramento de opiniões e sugestões. Seu lançamento aconteceu

inicialmente no Twitter, para que pudesse ser avaliado o interesse real sobre o

projeto. Ao longo dos primeiros três meses, o portal era totalmente gratuito.

Atualmente, o Jota conta com um número de leitores únicos em seu site que varia

entre 700 mil e 1,7 milhão.

Para chegar a esse montante foram necessárias muitas adaptações ao longo

dos cinco anos desde a criação do Jota. Quando fundada, a empresa contava com

cinco funcionários (hoje são 38), em sua maior parte jornalistas sócios. Segundo

Sangarné (2019), essa formação em comum dos fundadores influenciava

diretamente sobre a criação de conteúdo e na distribuição de funções. Apesar de

contar com áreas de marketing, vendas, administração e tecnologia, a redação

contava com o maior número de funcionários.

Juntamente com o desenvolvimento da empresa, seus criadores buscaram

formação em áreas mais ligadas ao empreendedorismo e administração com cursos

de especialização e MBA’s. Isso refletiu em uma proporção mais equilibrada entre as

diferentes atuações da equipe. A produção de conteúdo também passou a

apresentar um equilíbrio maior entre seus aspectos qualitativos e quantitativos.

Percebeu-se a contribuição dos dados para a própria apuração jornalística e o

valor percebido pelos consumidores na elaboração de modelos estatísticos e na

apresentação de cenários preditivos, fatores que fizeram com que os investimentos

da empresa se direcionassem ao crescimento desse setor. Atualmente, a área de

conteúdo do Jota conta com um setor exclusivamente destinado ao aprimoramento

do tratamento de dados.

Essa adequação e concentração às demandas feitas pelos clientes fez com

que a geração de receitas crescesse exponencialmente, sendo que o Jota entrou em

equilíbrio financeiro, ou seja, passasse a ter o valor das receitas equivalente ao das

despesas, menos de dois anos após sua fundação, em dezembro de 2015. Assim,

passou a gerar lucro. Este, por sua vez, foi sempre direcionado a investimentos na

empresa.

O faturamento total do ano passado foi de 6,5 milhões de reais. Todo o

crescimento em termos de lucro ocorreu de forma orgânica, custeado com

montantes gerados da rentabilidade gerada com as vendas. O único aporte inicial foi

feito de maneira informal pela família dos fundadores. Mais recentemente, em maio

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de 2019, o Jota recebeu uma capitação de 6,8 milhões do fundo de investimentos

Astella, justificado com um investimento destinado à ampliação do Jota Labs, seu

laboratório de ciência de dados.

Para Sangarné (2019), a empresa agora já está se direcionando para uma

definição além da startup, chamada de scale-up, quando o empreendimento tem seu

modelo produtivo totalmente estabelecido e passa a se concentrar no crescimento

escalável. Com esse foco, o lucro do Jota continua a ser reinvestido em seu

desenvolvimento.

5.2.2Critérios de escolha

Os critérios para escolha do Jota como unidade de análise partiram do estudo

“Ponto de Inflexão”, feito pela SembraMedia, uma organização sem fins lucrativos

que promove o desenvolvimento de produtores de conteúdo digital em espanhol,

com apoio da empresa de investimento filantrópico Omidyar Network.

Nele, foram entrevistadas 100 startups de mídia digital entre dezembro de

2016 e abril de 2017, 25 em cada um dos países estudados: Argentina, Brasil,

Colômbia e México. Cada entrevista durou cerca de duas horas e conteve 130

perguntas com temas que variam entre impacto, desafios, modelos de negócios,

equipes e gestão, audiência e inovação. 90% das organizações responderam a

todos os questionamentos enquanto 10 delas não quiseram compartilhar

informações financeiras.

Antes de selecionar essa amostra, um levantamento com mais de 600

empreendimentos em mídias digitais de 14 países diferentes foi transformado em

diretório durante 19 meses pelo SembraMedia. Como critério de seleção baseou-se

em oito princípios elaborados em conjunto por uma equipe internacional de

jornalistas.

Os negócios analisados devem: ser nativos digitais, com toda ou a maior

parte de sua publicação feita online; ter a maior parte de seu conteúdo produzido em

espanhol - neste caso estende-se aos idiomas hispanos; servir ao público com

conteúdos que geram interesse; ser não-partidários, econômicos e editorialmente

independentes - projetos totalmente financiados pelo governo não são incluídos; ser

não-corporativos - aqui a restrição se estende para projetos financiados por uma

única organização; transparentes, identificando seus fundadores, donos e diretores;

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ter conteúdo de valor jornalístico e de interesse público, no caso de blogs e

newsletters; distribuir conteúdo original, para aqueles projetos que publicam

exclusivamente por redes sociais.

A amostra selecionada representou, na visão dos sete pesquisadores

envolvidos no estudo, representatividade aos critérios de tamanho, influência,

sofisticação tecnológica, inovação e/ou dedicação ao jornalismo de qualidade

durante o ano de 2016 na América Latina. Também buscou-se uma variedade no

que se refere às áreas de cobertura, que variam entre hiperlocais, nacionais ou

internacionais.

Dentre as 25 startups de mídia brasileiras levantadas no relatório, o Jota se

destaca por, além de definir a si próprio como uma startup, se enquadrar em critérios

que caracterizam esse modelo de negócio, já apresentados neste estudo, que

podem ser resumidos em aplicação de inovação no produto e/ou serviço oferecido

ou, ainda, no modelo de negócio posto em prática, rapidez na adaptação dos

componentes da empresa e potencial de escalabilidade e domínio de mercado. Tais

critérios partem da própria definição de startup, proposta por Blank e Dorf (2014).

Ao diferenciar o termo “startups de jornalismo” de “jornalismo empreendedor”

e “jornalismo freelancer”, Bertocchi (2017) aponta sua ligação intrínseca com a

inovação. Para tanto, a própria inovação é entendida de forma ampla: não se trata

apenas da criação de negócios digitais, mas em “inaugurar um modelo singular,

inédito e visionário de negócio, promovendo rupturas em suas diversas camadas:

equipes, estratégias, processos, formatos narrativos, audiências e tecnologias”

(BERTOCCHI, 2017, p. 106). Por fim, essas empresas também devem ter o

compromisso em oferecer soluções aos problemas sociais reais.

Todas essas características foram encontradas no Jota. Além de ser um

negócio digital, é evidente a discrepância da organização do negócio em

comparação a empresas de mídia tradicionais: a equipe é diversa e dinâmica. Sem

funções preestabelecidas, ela se organiza e recombina conforme necessidades,

ditadas pelas demandas dos consumidores.

As estratégias são muito pontuais, focadas em um nicho de mercado,

alterando também a noção de audiência, muito mais segmentada nesse caso.

Quanto aos processos, deixam de se reduzir ao exercício do jornalismo para serem

complementados com técnicas não necessariamente ligadas à profissão e muito

ligadas ao aprimoramento tecnológico. Os formatos narrativos são outro aspecto que

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passa a ser condicionado pelo que os consumidores precisam e exigem. Toda essa

estrutura parte de um problema social identificado –falta da cobertura de

instituições– que pode ser resolvido com o trabalho feito pelos profissionais do Jota.

5.3 RELAÇÃO ENTRE MODELO DE NEGÓCIO E CONTEÚDO INOVADOR PELO

JOTA

O estudo de caso, como propõe Duarte, M. (2006), deve ser pautado nas

questões do estudo, ou seja, aquilo que se pretende entender. No caso desta

pesquisa, como é viável a produção de conteúdo inovador e rentável em uma

estrutura enquadrada no modelo de startup, partindo das informações recolhidas a

respeito do Jota, unidade de análise escolhida para esta pesquisa. Deve-se ligar os

dados recolhidos às proposições iniciais, interpretando e fazendo inferências sobre

as descobertas do estudo.

Como principal proposição, o presente estudo sustenta que o enquadramento

de empresas jornalísticas em um modelo de negócio de startup é uma alternativa

sustentável para a produção de conteúdo inovador. Neste sentido, o Jota se torna

um caso emblemático ao demonstrar que a estrutura de startup não apenas sustenta

o conteúdo jornalístico inovador, como é uma forma lucrativa de se fazer isso. Como

sustentado pelo CEO da empresa, se ela “seguisse o modelo tradicional, isso nem

sequer seria possível” (SANGARNÉ, 2019).

A empresa quebra paradigmas de instituições tradicionais de jornalismo em

vários aspectos. O primeiro deles é a proposta inicial da qual surgiu, de fornecer

informação segmentada a um nicho de consumidores restrito. Grandes jornais como

a Folha e o Estado de São Paulo, dos quais seus fundadores faziam parte, atendem

a um público muito mais amplo e, por conta disso, sua curadoria de conteúdo

também é mais abrangente e genérica, não permitindo tal aprofundamento.

Em toda a fala de Sangarné (2019), esteve evidente a atenção dada pelo Jota

aos seus clientes e busca de adequação constante às suas exigências em termos

de informação. Para que esse objetivo proposto incialmente fosse alcançado, toda a

estrutura do Jota foi adaptada e readaptada, no processo denominado por Ries

(2012) como ciclo de feedback construir-medir-aprender que, por sua vez, faz parte

da startup enxuta. A atuação da equipe foi diversificada para atuações além da

redação jornalística, a apuração se voltou para a busca de informações cada vez

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mais específicas, os produtos, especialmente análises e previsões, foram

aprimorados e aprofundados.

Todas essas mudanças aconteceram com vistas à rentabilidade do negócio. A

orientação voltada ao cliente seus desejos e necessidades é um dos fatores

principais nessa busca e, no Jota, esse direcionamento é bem evidente. Também se

mostrou comprovadamente lucrativo adotar essa postura, dados os números de

faturamento do empreendimento. Apesar de todo o lucro ser reinvestido nele próprio,

deve-se considerar o montante conseguido no ano de 2018 (6,5 milhões) como

expressivo em um momento em que grandes grupos midiáticos apresentam valores

negativos. O Grupo Abril, por exemplo, registrou um prejuízo de 331,6 milhões de

reais em 2017 (PRICEWATERHOUSECOOPERS, 2018).

Sobre este ponto, é importante retomar a discussão iniciada por Carbasse

(2015) acerca da possível perda de qualidade do jornalismo em função da obsessão

pelo conteúdo vendável. Como forma de manter a integridade da profissão, o Jota

conta com um código de ética próprio, adaptado à realidade da empresa, que

direciona os profissionais à uma atuação saudável, dentro dos limites cabíveis.

Também não existe a venda de conteúdo puramente comercial, como publieditoriais.

Mesmo nas editorias patrocinadas da seção “Coberturas Especiais”, o jornalista tem

a liberdade de conduzir seu trabalho do modo que considerar mais adequado. Essa

foi a saída encontrada para manter a essência jornalística e as metas comerciais em

equilíbrio.

A geração de receita no Jota acontece por três vias principais: o paywall no

site, a venda de artigos patrocinados e os produtos especializados com informações

e previsões específicas. Não se faz a venda de espaço publicitário em nenhum

deles, mais uma quebra com os modelos tradicionais de negócios jornalísticos que

fazem da publicidade sua principal e, por vezes, única fonte de renda. No Jota, os

produtos oferecidos representaram todo o lucro do negócio durante seus cinco

primeiros anos. O aporte conquistado em 2018 de uma investidora em startups

representa a diversidade de conquista de receitas possibilitada por um negócio que

se enquadra no modelo de startup.

Não há dúvidas de que o conteúdo produzido no Jota é inovador. Pode-se

enquadrá-lo dessa forma pois, além de atingir um novo e restrito segmento de

consumidores de informação, o desenvolvimento do trabalho no Jota coloca em

prática técnicas que atrelam o uso de dados à apuração e produção jornalística, que

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resultam na entrega de produtos altamente inovadores ofertados no mercado de

mídia brasileiro e mesmo internacional.

Além de fazer uso de aparatos tecnológicos, especialmente softwares, a

produção desse conteúdo demanda o desenvolvimento de novas habilidades por

parte dos jornalistas. Eles não estão mais restritos a fazer a apuração básica que

resultará em matérias destinadas a uma massa. Agora, devem se especializar na

busca e interpretação de dados que será entregue a um cliente já conhecido.

O jornalismo de base de dados, ou data journalism, já é uma prática

consolidada e em cada vez mais acordo com o cenário do jornalismo produzido na

web (BARBOSA, 2007). Também devem ser adaptáveis o suficiente para suprir

qualquer deficiência na dinâmica da organização. O dinamismo na atuação do

profissional de jornalismo é uma das principais adequações necessárias ao novo

mercado de mídia (SALAVERRÍA, 2011).

Assim, o Jota se mostra uma possibilidade ao demonstrar como startups de

jornalismo podem sustentar a produção de jornalismo inovador, partindo do objetivo

principal em resolver um problema social real. Para tanto, é preciso que se

estabeleçam diversas quebras no paradigma da atuação jornalística que vão desde

a busca por um novo segmento do mercado até o dinamismo nas práticas

profissionais e a incorporação de tecnologias, requisitos necessários por atender

esse nicho. Mesmo com tantas quebras, ainda é possível manter seu padrão de

qualidade quanto aos princípios éticos e sua função social de informar e contribuir

com a formação de opinião.

Com base no desenvolvimento do Jota, seguindo um processo semelhante,

negócios de jornalismo nascentes contam com diversas possibilidades de encontrar

a lucratividade com a identificação de um nicho de mercado, seguida pela

adequação dos produtos oferecidos à audiência atendida até chegarem à

estabilidade e, posteriormente, ao crescimento escalável. Profissionais jornalistas

que deixam suas ocupações na indústria tradicional em busca de empreender

encontram, nas startups, um, enquadramento de negócio ideal para colocarem suas

ideias em prática.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A inovação, tanto em relação aos produtos quanto aos modelos de negócio

jornalísticos, deixou de ser um atributo para significar uma necessidade diante das

rupturas que fazem parte da era da informação. Em um contexto de fluxos

informacionais de todos os lados, construção de redes, superdistribuição e liquidez

de tempo e espaço, instituições jornalísticas que não buscam se adaptar passam por

uma crise. Redações são sucateadas, instrumentos deixam de ser atualizados,

profissionais acumulam funções ou são demitidos.

Privilegiados durante a maior parte de sua história pelo poder gerado com a

posse e o controle da informação, jornalistas se encontram agora equiparados a

qualquer pessoa quando se trata da possibilidade de produção e distribuição de

notícias. Pode-se indicar como principal causa desse fenômeno a popularização do

acesso internet, um meio que provocou uma ruptura nunca vista no processo de

consumo de jornalismo. Reunindo mídias de todos os outros meios anteriores

(impresso, rádio e televisão), ela possibilitou a interatividade direta, desencadeou a

descentralização da produção de notícias e modificou sua forma de distribuição.

A saída para muitos desses profissionais é dada com a possibilidade de

empreender. Porém, é preciso pensar, novamente, na inovação como fator

primordial desses novos negócios. Ao se fundar uma empresa de jornalismo, deve-

se romper com as definições do passado, buscando atender as reais demandas

informativas da audiência que se quer atender.

Nesse sentido, as startups surgem como uma possibilidade sustentável para

produzir conteúdo inovador. Com um modelo de negócio altamente adaptável e foco

no cliente, essa nova configuração de empresa se torna uma alternativa aos

empreendimentos de jornalismo nascentes. Mesmo com as dificuldades impostas ao

exercício empreendedor, no Brasil, esse é um modelo que já adquiriu certa

estabilidade e tem perspectivas otimistas ao seu respeito.

A investigação feita nessa pesquisa se deu com o objetivo de entender como

a configuração da prática jornalística no modelo de startup possibilita a produção de

conteúdo inovador. Além de sua relevância e contribuição para a manutenção do

jornalismo e, consequentemente, de suas contribuições de alto valor social (na

oferta de informação precisa e formação de opinião), este trabalho fomenta a

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literatura acadêmica que relaciona o empreendedorismo ao jornalismo, verificada

como escassa até o momento da conclusão do trabalho.

Partindo do estudo de caso sobre o Jota, uma startup de jornalismo brasileira,

cumpriram-se três finalidades fundamentais estabelecidas para a pesquisa:

compreendeu-se como ocorre a produção jornalística em veículos cujo modelo de

negócio é definido como startup (diferenciando-a daquela posta em prática em

empresas tradicionais), identificaram-se fatores de sucesso em um caso de startup

de jornalismo brasileira e foram relacionadas características do modelo de negócio

de startup com a manutenção de práticas jornalísticas inovadoras.

No primeiro aspecto, verificou-se que, em uma startup, diferentemente de

uma empresa tradicional de jornalismo, a produção é direcionada, bem como sua

audiência. Na busca por solucionar um problema específico, a produção do

conteúdo rompe com a apuração clássica, estruturada em etapas, e passa a incluir

atividades diversas e até mesmo não enquadradas no que pode se considerar

jornalismo. Ao final, tem-se um produto aprofundado e inédito, destinado a uma

pessoa, grupo ou organização específica, e não necessariamente uma matéria que

pode ser consumida pela população em geral.

Entre os fatores de sucesso identificados no Jota, está o atendimento de uma

parcela do mercado até então não atendida, que busca por produtos até então não

existentes. Ou seja, a procura pela resolução de um problema real e de uma

demanda latente gera, naturalmente, público consumidor disposto a pagar pelos

produtos que solucionem suas necessidades e desejos. O próprio projeto do Jota

surgiu por conta da falta da cobertura da grande mídia sobre assuntos relacionados

ao Poder Judiciário. Outro componente para o resultado positivo da empresa está a

diversificação de dinamicidade da equipe, que foi readequada, quanto às funções

exercidas, e desenvolvida, quanto às habilidades profissionais, para a criação de

produtos que atendessem os clientes da melhor maneira possível.

Ficou evidente como as características que enquadram o Jota em um modelo

de startup são as mesmas que possibilitam suas práticas jornalísticas inovadoras.

Para que os produtos feitos no Jota atinjam seu máximo desempenho no

atendimento às necessidades dos clientes, tanto a atuação dos profissionais, quanto

as ferramentas utilizadas por eles e processos de uma maneira geral passaram por

inovações. Jornalistas tiveram de ampliar seu conhecimento, especialmente na

busca e tratamento de dados, além de modernizar a forma com que trabalham,

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utilizando softwares e recursos tecnológicos para apurá-los e inseridos em uma nova

estrutura de trabalho, criada de acordo com o trabalho desenvolvido no Jota.

Dessa maneira, os objetivos propostos no início do trabalho foram atingidos.

O estudo do Jota comprovou o modelo de startup como possibilidade de produção

inovadora ao demonstrar equilíbrio financeiro menos de dois anos após sua

fundação. Além disso, se mostrou como um exemplo a ser seguido por jornalistas

que se propõem a empreender inovando de fato, isto é, quebrando paradigmas

organizacionais das grandes e tradicionais instituições jornalísticas.

Como continuidade à investigação aqui desenvolvida, sugerem-se temas nos

quais esta pesquisa toca, mas não se aprofunda, sobre os quais futuros estudos

podem se debruçar, como: perfis dos profissionais jornalistas no contexto de

startups, possibilidades e melhores táticas de geração de receita em startups de

jornalismo e inclusão do ensino de empreendedorismo nas formações em

jornalismo.

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APÊNDICE A – TRANSCRIÇÃO DE ENTREVISTA FEITA COM MARC SANGARNÉ

(CEO DO JOTA) VIA SKYPE

1. Gostaria que me contasse um pouco sobre você e sua sua carreira,

especialmente como ela se relacionou com informação e jornalismo.

Sou engenheiro de telecomunicações, faz um pouco mais de 20 anos que trabalho.

Fiz um mestrado em administração, um MBA, em uma escola internacional que se

chama ENSEAD. Nesse MBA, eu precisava de um projeto no Brasil. A gente tocou

um projeto jornalístico lindo que foi um fracasso em modelo de negócio que é o Brio

Stories, que depois virou o Brio Hunter, em um outro modelo em uma outra lógica.

Mas o Brio Stories inicialmente ia na contramão do mercado.

2. Você entrou no Jota uma nos depois de sua criação, em 2015, certo? O que

te levou a compor essa equipe?

O Jota não é a minha história, o Jota é a história de várias pessoas e,

principalmente, de dois jornalistas brasileiros, o Felipe Seligman e o Felipe Recondo.

Eles estavam cobrindo o Supremo, eram concorrentes na Folha e no Estado e, em

algum momento, se deram conta de que tinham espaço para uma cobertura mais

técnica. Havia muito conteúdo no Supremo e não havia espaço nos jornais. Daí

nasceu a ideia de fazer uma cobertura no site.

Eu entrei no Jota um ano depois do seu lançamento. Já no final do meu primeiro ano

a gente atingiu o equilíbrio financeiro. O Jota já estava demonstrando muito

potencial de geração de receita.

O valor de produto no Jota percebido no começo foi rápido, cobrindo o STF,

jornalistas conversando com advogados, com ministros se deram conta de que

tinham muita informação pública de muito valor lá que não tinha nenhum espaço

para ser publicada e isso era nítido. Disso nasceu a ideia de montar produtos de

informação para audiências reduzidas, que pode ser uma indústria, pode ser um tipo

de empresa, pode ser um assinante só ou uma empresa só. os limites e definições

iniciais daqueles produtos foram combinados com as próprias fontes, inclusive.

A informação sempre é pública, não há nada sigiloso. Sempre vai ser uma

informação de análise, mas que nunca chega a pisar na consultoria, começar a falar

o como fazer. E sem intermediação. Eles redefiniram como trabalhar com

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informação de alto valor para um público reduzido e de uma maneira ética, recriando

nosso próprio guia ético.

Então eles perceberam isso. Quando eu cheguei já tinha receita disso. Eu sou

administrador, sou uma pessoa de números, então era muito fácil para mim

participar da organização disso: saber que a receita do site é uma coisa, a receita de

produtos para grandes empresas é outra, ver o que dá receita, insistir no que dá

certo, equilibrar as despesas e começar a administrar a empresa.

Em dezembro de 2015 a empresa já alcançou um ponto de equilíbrio financeiro, já

deu lucro e operamos nesse patamar desde então. Qualquer dinheiro adicional a

gente gasta para o crescimento, que está engolindo todo o lucro operacional, mas é

um crescimento que até o começo deste ano foi orgânico.

3. O Jota, em sua própria descrição no site, se denomina como uma startup.

Quais são as características do negócio levadas em consideração para que ele

se denomine dessa forma?

Eu acho que startup tem essa noção de começar do zero e tem um componente de

inovação que também é importante. Você pode abrir uma padaria do zero, mas é um

modelo de negócio conhecido, com parâmetros conhecidos, dificilmente uma

padaria se autodenominaria startup.

No nosso caso, tem uma oferta inovadora e a gente tem uma oferta que está

funcionando, que resolve algum problema concreto. Por isso a gente chamaria de

startup. Agora a gente está entrando em uma fase de crescimento e estamos

começando a entrar nessa fase de scale-up.

4. Como o Jota começou (com quantas pessoas, com quais recursos e ideias)?

Comente um pouco sobre a evolução até agora.

Quando eu cheguei, tinham oito pessoas no Jota. A maioria sócios e poucas

contratadas. O crescimento era totalmente empírico: se tinha alguém gritando,

resolvia-se com custo mínimo.

Historicamente, a empresa se desenvolveu em uma redação abrangendo a maior

parte da empresa. Sempre se deixou algumas pessoas desenvolvendo marketing

vendas, administração e tecnologia. No começo, não nos desenvolvemos de

maneira muito equilibrada. Se a gente compara com o modelo ideal para otimizar e

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ter o crescimento máximo, o ideal era ter uma proporção entre marketing e vendas,

produção de conteúdo, tecnologia e operação.

A gente teve um peso no jornalismo sempre maior por ter founders jornalistas. Só

que esses founders evoluíram: teve um que fez um MBA no MIT e hoje tem uma

cabeça muito mais de administração e tecnologia, tem outro que fez um doutorado

em ciências estatísticas e virou cientista do Jota. Então a gente começou a ter uma

empresa mais equilibrada. A produção de conteúdo começou a ser mais equilibrada

entre o qualitativo e quantitativo. Hoje, a produção de conteúdo para nós é dada

para um lado e análise e texto para outro. Hoje, a gente vê o analista como uma

figura importante.

Os dados estão recebendo a maior parte dos nossos investimentos hoje para

equilibrar as duas coisas. E os dados ajudam muito na apuração e a apuração ajuda

muito na elaboração de modelos estatísticos também. As duas coisas trabalham

muito bem juntas.

Nossa estrutura é uma área de conteúdo, uma área de dados, uma área de lab, que

tem mais liberdade para fazer pesquisa, uma área de crescimento: uma área de

marketing e uma de customer success, que é uma palavra típica da startup: sucesso

do cliente. No meio, temos produtos, opração, tecnologia, tudo o que é

desenvolvimento do produto, formatação. E como funciona o suporte, relações

humanas e governança.

As famílias dos founders botaram um dinheiro porque vários dos fundadores não

tinha condição de ficar sem renda, vamos dizer assim. Por causa disso, teve um

aporte inicial. Quando eu cheguei não tinha quase nada e no momento que começou

a dar lucro, já tinha se esgotado essa reserva.

Recentemente, fizemos uma captação com o investidor Astella de startup de

tecnologia. Captamos 6,8 milhões para investir na tecnologia, dados, crescimento,

esse tipo de coisa.

A gente diversificou um pouco nossos produtos. Temos um site que trata do

judiciário e tem paywall. Essa é a parte mais óbvia. Temos um produto tributário para

escritórios de advocacia que têm essa especialização, o Jota Pró Tributário. E

depois temos várias ofertas para o mercado financeiro. Esse é o nosso carro-chefe:

tem bastante análise, tem alerta pelo WhatsApp, tem uma cobertura exclusiva para

esses assinantes, eles têm o direito de tirar dúvidas, então tem que imaginar as

dores das nossas personas, nossos clientes, tem que apresentar cenário para as

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pessoas. A gente entrega também modelação preditiva. A gente faz aquela coisa a

mais que pode fazer diferença na hora. Todo mundo faz previsão, o importante é ser

um pouco melhor que os outros. Isso faz toda a diferença. Aí temos outros produtos

como uma editoria patrocinada totalmente independente: alguma empresa tem

interesse que a imprensa fale de algum tema, mas não vai poder dizer quem vai

poder entrevistar, quem pode falar. Isso funciona quando o debate técnico é a favor

daquela empresa. A gente não faz publieditorial.

O importante sobre todo produto é ter uma noção da audiência e a clareza sobre o

problema que está sendo resolvido. Há um ano a gente tinha 12 produtos, matamos

metade deles há seis meses.

Uma assinatura tem que levar em consideração que pode ir, no site, desde 20 reais

por mês, a um Jota Pró Tributário, que a gente pode falar de centenas de reais por

mês e os projetos para grandes contas, que podemos falar de milhares por mês, ou

dezenas de milhares, nos produtos mais sofisticados.

6. Qual é a relação entre a geração de valor gerada sobre os produtos do Jota

e a qualidade do conteúdo jornalístico oferecido por eles?

O problema que o Jota está tentando resolver, de uma maneira geral, é o da

imprevisibilidade das instituições brasileiras. Como? Trazendo informação para que

os atores da economia, advogados, cidadãos, entendam mais sobre o que vem por

aí e influenciando positivamente as instituições. E como trabalhar isso? A gente tenta

identificar setores, nichos, aí pegamos um problema específico e mergulhamos

nisso, com dados, com apuração, com análise e tentamos resolver isso.

O Jota tenta entender o valor criado para a audiência. Mas é claro que a maior parte

das pessoas que trabalha no Jota é jornalista, e claro que existe essa predisposição

natural em acreditar que a informação tem que ser publicada para todos, tem que

ser apurada de uma certa forma, que os textos têm que ser longos. Mas às vezes

um alerta de oito linhas tem mais repercussão do que uma apuração completa. E a

gente tenta avaliar isso usando estudos, perguntando “o que foi mais útil para

você?”. As respostas variam da audiência, e o que a gente tenta fazer é tentar

adequar isso e tentar reservar recursos para poder fazer aquela matéria

aprofundada. É uma visão pragmática e não óbvia.

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7. Uma das autoras-base da minha pesquisa, Bertocchi, define startups de

jornalismo como empresas que não apenas criam negócios digitais, mas

inauguram modelos singulares, inéditos e visionários de negócio. Também tem

compromisso com problemas sociais reais. Como você acredita que o Jota

cumpre essas funções?

Todo mundo vem da grande mídia no Jota. A questão é: temos um problema para

resolver e como vamos resolver? E a gente não teve opção, teve que fazer diferente.

Por exemplo, todas as áreas se falam por necessidade, para entender as dores do

cliente, como podemos acompanhar isso, explicar os cenários. Como a gente lida

com o risco do conflito de interesses? Primeiro, a gente tem centenas de clientes,

então não tem um grande problema de perdemos algum. Nenhum cliente representa

mais do que 5% da receita. Outra estratégia é colocar ferramentas para evitar

qualquer conflito de interesses ou qualquer coisa que não seja ética.

O nosso modelo não funcionaria tentando aplicar as regras de uma grande redação,

com certeza. É um pensamento de startup pensar qual problema você quer resolver

e nós estamos totalmente nessa filosofia.

8. É possível compartilhar dados sobre lucratividade, rentabilidade? Se sim,

qual é a margem de lucro do Jota?

Ano passado a gente faturou seis milhões e meio e reais. A questão do lucro é um

pouco relativa porque, se você não estiver crescendo, você pode operar com lucro

de 10, 20%. Mas se você estiver crescendo vai estar sempre ampliando. Então, em

termos práticos, a gente não lucra, mas conseguimos crescer até onde estamos hoje

organicamente. Ou seja, geramos lucro e reinvestimos. Mas para fazer isso tem que

ter um modelo rentável. A partir do momento que a gente começou a lucrar, no final

de 2015 até agora, esse crescimento foi orgânico e geração de caixa operacional do

Jota.

9. De forma mais ampla, como vê o mercado de startups jornalísticas no

Brasil? É positivo em relação à manutenção e sucesso dessas empresas?

Acredita que surgirão novas?

Eu estou vendo uma integração forte entre a produção de conteúdo e a venda de

produtos que não é via publicidade tradicional. É o que o Jota está fazendo: o Jota

tem um site e produtos de informação para profissionais. E a gente não tem

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publicidade, não precisa. Acho que quem está sustentando esse jornalismo é a

própria empresa que está vendendo alguma coisa. Tem empresas também que vão

continuar porque elas têm um produto lucrativo do lado, mesmo se não está tão

integrado. A maioria das mídias que estão funcionando têm uma área que está

gerando alguma receita, algum lucro. Acho que esses casamentos vão continuar e

vão funcionar.

O mundo da startup está recebendo cada vez mais dinheiro e todo esse dinheiro vai

para fazer a boa prática de vendas de conteúdo de qualidade. Um conteúdo que não

é publicitário, um conteúdo que genuinamente está tentando começar a resolver o

problema do cliente para, aos poucos, mudar ele para um plano pago.

10. O que é preciso para um jornalista empreender? Quais capacidades devem

ser desenvolvidas? Qualquer jornalista pode empreender? Esse é um caminho

viável para todos?

De fato, vemos uma diferença entre o mindset de um jornalista quando entra no Jota

e o que tem que fazer depois. Ele entra para uma coisa e acaba fazendo o que ele

não sabia que ia fazer. Muitas coisas que estava acostumado a fazer seguindo uma

regra tem que fazer sozinho tomando decisões com mais autonomia. Então não é

para todo mundo. Tem gente que prefere autonomia, que gosta de fazer coisas

variadas com autonomia e tem gente que prefere fazer tudo com regras claras. O

grande desafio para nós como empresa é identificar isso na entrevista. Na nossa

atividade a gente precisa fazer o que é necessário com dinamismo.

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