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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Programa de Pós-Graduação em Direito COGNOSCIBILIDADE DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE NO PROCESSO DO TRABALHO CONSTITUCIONALIZADO Vitor Salino de Moura Eça Belo Horizonte 2008

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

Programa de Pós-Graduação em Direito

COGNOSCIBILIDADE DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE NO

PROCESSO DO TRABALHO CONSTITUCIONALIZADO

Vitor Salino de Mou ra Eça

Belo Horizonte

2008

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Vitor Salino de Moura Eça

COGNOSCIBILIDADE DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE NO

PROCESSO DO TRABALHO CONSTITUCIONALIZADO

Tese apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Direito da Faculdade Mineira

de Direito da Pontifícia Universidade

Católica de Minas Gerais, na área de

concentração em Direito Processual, como

requisito parcial para a obtenção do título

de Doutor em Direito Processual.

Orientador: Prof. Dr. José Marcos Rodrigues

Vieira

Belo Horizonte

2008

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Vitor Salino de Moura Eça

Cognoscibilidade da Prescrição Intercorrente no Pro cesso do Trabalho

Constitucionalizado

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito da Faculdade

Mineira de Direito, da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, na área

de concentração em Direito Processual.

___________________________________________________________

Professor Doutor José Marcos Rodrigues Vieira (Orientador) – PUC Minas

___________________________________________________________

Professor Doutor Vicente de Paula Maciel Júnior - PUC Minas

___________________________________________________________

Professor Doutor Fernando Horta Tavares - PUC Minas

___________________________________________________________

Professor Doutor Aroldo Plínio Gonçalves - UFMG

___________________________________________________________

Professor Doutor João Alberto de Almeida - UFMG

___________________________________________________________

Professora Doutora Tais Maria Macena de Lima – PUC Minas - Suplente

___________________________________________________________

Professor Doutor Luiz Otávio Linhares Renault – PUC Minas - Suplente

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AGRADECIMENTOS

Os trabalhos acadêmicos, em geral, têm folhas destinadas a agradecer a

parentes, amigos, professores, enfim pessoas que, de alguma forma,

contribuíram para o êxito do trabalho.

Confesso que não via tanto valor nisso. Parecia-me algo piegas, pois o

principal esforço ali empregado era, afinal, de quem se propôs a executar o

trabalho. E olha que até aqui já fiz dois cursos de especialização e um de

mestrado, ou seja, antes já tinha experimentado o apuro de produzir textos

técnicos mais consistentes. Ah, na época de meu bacharelado ainda não havia

a exigência de se escrever monografia de final de curso, embora tenha “me

formado” também.

A tese me fez perceber que estava errado. E como.

É muito duro escrever uma tese! Acho que só mesmo quem já passou

por isso pode compreender. Muito trabalho, muita dedicação e muitíssimas

horas subtraídas do lazer, do descanso e do conforto. E, naturalmente, do

convívio com os parentes mais próximos, dos amigos e de todos que nos

cercam.

A obra é, verdadeiramente, conjunta.

Assim, antes de agradecer, preciso me desculpar com todos eles. Só

depois posso agradecer.

Agradeço em primeiro lugar a Deus, que me deu forças, inteligência e

condições para desenvolver este trabalho. Também à Monica, minha mulher e

aos meus filhos, Fernanda, Renan e Breno. Se a Banca entender que o

trabalho está à altura de atender o requisito para que a Escola me conceda o

título de Doutor, quero lhes devolver esse tempo em viagens de puro descanso

e repletas de alegria.

Agradeço ainda a Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais -

PUC - Minas, primeiro por ter criado com seu fabuloso corpo docente o curso

de doutorado, segundo por ter me concedido bolsa institucional, e em terceiro

lugar pelo Auxílio à Capacitação Docente.

Trata-se de instituição que realmente investe em seus professores,

elevando-nos individual e coletivamente. E se realimenta com isso, num

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autêntico espaço criado para a educação contínua. Quero lhe devolver tudo

isso com minha dedicação ao ensino e à pesquisa.

Como esquecer da Biblioteca Central, com seus solícitos funcionários

sempre dispostos a ajudar? Quantas horas lá dentro? E o peso dos livros?...

Ao Professor Doutor José Marcos Rodrigues Vieira, meu orientador

amigo, que com paciência e boa vontade sempre compreendeu minhas

limitações. Foi meu Professor em várias disciplinas, desde os tempos do

mestrado, prosseguindo assim no doutorado. – Acho que fiz todas as

disciplinas por ele ofertadas na pós-graduação. Gostava de ser seu aluno.

Aprendi muito, não só com o profissional, mas com o homem. Vi que é possível

ser genial sem desmedida vaidade. Que conhecimento científico e humildade

podem se equilibrar harmonicamente. Enfim, um grande Professor!

Ao Tribunal Regional do Trabalho da 3ª. Região, que em pioneira

iniciativa concedeu-me três meses de licença para viabilizar a elaboração da

tese, além do deferimento de férias regulamentares sempre em épocas

oportunas para o cumprimento dos créditos do curso, como Juiz do Trabalho

Titular de Vara no interior, precisando estudar na capital do estado, onde

empreendi minhas pesquisas.

Homenageio os servidores, Senhores Guilherme Augusto Araújo e Zélia

Beatriz Freire e Silva, da Secretaria Geral da Presidência, que com imensa boa

vontade sempre acomodaram os interesses da administração pública com as

necessidades de um Juiz estudante.

Por fim, aos amigos e servidores que sempre me estimularam e

ajudaram como puderam, reservando uma decisão sobre o tema central desta

pesquisa ou através de uma boa conversa.

Vale dizer: para escrever uma tese de doutorado nos colocamos em

débito com tantas pessoas e instituições, que uma folha de agradecimento é

pouco. E para que esta não fique maior do que a própria tese, expresso minha

eterna gratidão e deixo-lhe bons fluídos a reconfortar o espírito para sempre.

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RESUMO

A partir de conflito estabelecido entre as súmulas dos tribunais

superiores em torno da prescrição intercorrente no processo do trabalho, o

trabalho acadêmico de pesquisa se desenvolveu para procurar responder a

principal indagação persistente na sociedade, ou seja, qual das cortes atuou

mais ajustadamente o direito.

A restrição estava com a corte trabalhista, pois atuava dentro de uma

perspectiva protecionista, onde o empregado não poderia ser penalizado pelo

transcurso do tempo, após não ver seus direitos existenciais respeitados

oportunamente, e tampouco depois de judicialmente reconhecidos.

Tal posicionamento se mostrou bem mais fruto de uma opção

jurisprudencial do que decorrente de técnica jurídica, sobretudo porque o

impulso oficial caracteriza o direito processual como um todo e não

exclusivamente o processo do trabalho, situação que põe a diretiva em conflito

com o Estado Democrático de Direito, modelo de organização constitucional

adotado pelo Brasil.

A construção doutrinária processual do trabalho, curiosamente, não

suporta a jurisprudência nacional, porquanto admite abertamente a prescrição

intercorrente, de modo acentuado e majoritário.

As recentes alterações legislativas, dispondo sobre o tempo de exercício

da pretensão processual com eficácia, também servem de objeto de

investigação científica, sobretudo no tocante ao reconhecimento de ofício do

instituto, bem como da previsão expressa de declaração da prescrição

intercorrente, pela Lei dos Executivos Fiscais, aplicável na Justiça do Trabalho.

O mais interessante é que, no âmbito da referida lei, a parte com menor

sustentabilidade no processo é justamente o empregador e o reconhecimento

do decurso do tempo em seu proveito acomoda-se com os princípios que

informam o Direito Processual do Trabalho. Isso certamente fará o instituto

chegar às demais causas, justificando a pesquisa que estabeleceu critérios

para que ocorra de modo juridicamente sustentável.

Palavras-chave: Processo do Trabalho Constitucionalizado;

Prescrição Intercorrente;

Declaração.

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ABSTRACT

Having the been established among the stare decisions of the superior

courts around the statute of limitation (intercurrent) in the labor procedural law,

the academic research intends to find answer to the main question persistent

through society: which court more adjusted to the law.

The restriction lies in the labor court, that acted into a protectionist

perspective, where the employee could not be penalized for the passing time,

after not seen his existential rights respected opportunely, and even after

judicially recognized.

Such positioning showed to be, however, much more ideological than

juridical, mainly because the official impulse characterize the procedural law as

a whole, and not exclusively the labor procedural law, situation that brings the

directive issue into conflict with the Democrated State of Law, the brazilian

model of constitutional organization.

The doctrinal labor procedural construction, curiously, do not supports

the national jurisprudence, so admits openly the statute of limitation

(intercurrent), in an accentuate and majority way.

The recent legislation modifications, dealing with the exercise period of

the procedural issue with efficacy, also works as a scientific investigation object,

mainly what is related to the recognizing of the institute by the Judge’s, as well

as the expressing prevision of the statute of limitation declaration (intercurrent),

by the Fiscal Executive’s Law, applicable in the Labor Justice.

The most interesting is that, in the scope of the referring law, the weakest

part of the process is exactly the employer and the limitation period recognition

on his own benefit accommodate with the principles that inform the Labor

Procedural Law. This certainly will bring the institute to get to other cases,

justifying the research that has established criterions on order to make it occur

in a juridical sustainable way.

Key words: Constitucionalized Labor Procedural Law;

Statute of Limitation (intercurrent);

Declaration.

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SUMÁRIO............................................................................................................8

INTRODUÇÃO...................................................................................................13

Capítulo 1 - Aspectos históricos da prescrição e a compreensão da

pretensão ..........................................................................................................17

1.1. Definição de prescrição............................................................................. 20

1.2. A prescrição como exceção e a técnica de ‘encobrimento’........................23

1.3. Compreendendo a pretensão.................................................................... 30

Capítulo 2 - A posição científica da prescrição int ercorrente .................... 41

2.1. Na Teoria Geral do Direito......................................................................... 42

2.2. Na Teoria Geral do Processo.................................................................... 43

2.3. Conceito de prescrição intercorrente........................................................ 47

2.3.1. Prescrição intercorrente em fase de conhecimento: uma proposta de

lege ferenda ......................................................................................................49

2.4. Distinção com a pretensão executória........................................................55

2.5. Prova da prescrição intercorrente...............................................................57

2.6. Interrupção da prescrição intercorrente......................................................57

Capítulo 3 – O regime jurídico da prescrição ...............................................63

3.1. Direito do Trabalho e Processual do Trabalho ..........................................63

3.2. Direito Civil e Processual Civil ...................................................................70

3.3. Direito Penal e Processual Penal ..............................................................78

3.4. Direito Tributário: material e processual ....................................................79

Capítulo 4 – Análise da prescrição intercorrente à luz da doutrina

processual do trabalho ..................................................................................84

Capítulo 5 – As recentes alterações legislativas .........................................93

5.1. EC 28/2.000 – trabalhadores rurais ...........................................................94

5.2. Lei 10.406/02 – Código Civil – prazos das demandas ...............................95

5.3. Lei 11.051/04 – prescrição intercorrente na LEF/CLT ...............................95

5.4. Lei 11.280/06 – CPC – conhecimento de ofício da prescrição ..................96

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Capítulo 6 – Os efeitos da Emenda Constitucional 45 /2.004 ......................99

Capítulo 7 – O tratamento doutrinário da prescrição intercorrente após a

revisão constitucional ..................................................................................102

Capítulo 8 – A compreensão sumular e os valores pos tos para

harmonização dos verbetes prescricionais com o proc esso

constitucionalizado ......................................................................................109

8.1. Modelos estatais: liberal, social e democrático de direito e a função do

Poder Judiciário em cada um deles ................................................................117

8.2. A controvertida legitimidade sumular e aspectos do contraditório ...........121

8.3. Atuação sumular ......................................................................................126

Capítulo 9 – Análise da prescrição intercorrente à luz da jurisprudência

processual trabalhista ..................................................................................139

9.1. Supremo Tribunal Federal .......................................................................141

9.2. Tribunal Superior do Trabalho .................................................................146

9.2.1. Acolhimento expresso da prescrição intercorrente pelo TST .....155

9.2.2. Acolhimento tácito da prescrição intercorrente pelo TST ...........156

9.3. Admissão integral da prescrição intercorrente em TRT ...........................161

9.4. Admissão parcial da prescrição intercorrente em TRT ............................166

9.5. Admissão da prescrição intercorrente em outros tribunais ......................169

Capítulo 10 - Prescrição intercorrente trabalhista no direito comparado 173

10.1. Argentina ................................................................................................173

10.2. Estados Unidos ......................................................................................181

10.3. França ....................................................................................................183

10.4. Itália .......................................................................................................184

10.5. Portugal ..................................................................................................185

10.6. Venezuela ..............................................................................................186

Capítulo 11 – Prazos para reconhecimento da prescri ção intercorrente 188

11.1. Demandas trabalhistas stricto sensu .....................................................194

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11.2. Demandas civis de competência da Justiça do Trabalho ......................195

CONCLUSÃO .................................................................................................196

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..............................................................200

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ABREVIATURAS UTILIZADAS

AC – Acórdão

ADIN – Ação Direta de Inconstitucionalidade

AGREsp – Agravo em Recurso Especial

AI – Agravo de instrumento

AP – Agravo de petição

Art. – Artigo

BGB – Código Civil Alemão

c/c – Combinado com

CC – Código Civil

Cf. – conferir

CLT – Consolidação das Leis do Trabalho

CNJ – Conselho Nacional de Justiça

CP – Código Penal

CPC – Código de Processo Civil

CPP – Código de Processo Penal

CPCCN – Código de Procesal Civil y Comercial de la Nación Argentina

CTN – Código Tributário Nacional

Des. - Desembargador (a)

DJU – Diário de Justiça da União

EC – Emenda Constitucional

ed. - edição

Exmo. - Excelentíssimo (a)

JT – Justiça do Trabalho

LCT – Lei de Contrato de Trabalho Argentina

LEF – Lei dos Executivos Fiscais

LRF – Lei de Recuperação Judicial e Falências

Min. – Ministro (a)

MP – Medida Provisória

n. – número

NCC – Novo Código Civil

OAB – Ordem dos Advogados do Brasil

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OJ – Orientação Jurisprudencial

p. – página

Proc. – Processo

PUC – Pontifícia Universidade Católica

T. – Turma

TRT – Tribunal Regional do Trabalho

RE – Recurso Extraordinário

REPRO – Revista de Processo

Res. – Resolução

R. Esp. - Recurso Especial

RR – Recurso de Revista

SDI – Seção de Dissídios Individuais

ss. – seguintes

STF – Supremo Tribunal Federal

TST – Tribunal Superior do Trabalho

UBA – Universidad de Buenos Aires

V. – Volume

VT – Vara do Trabalho

ZPO – Código de Processo Civil Alemão

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INTRODUÇÃO

O objeto do direito se altera no tempo e no espaço, convindo a

diferentes ideologias, sempre com suporte teórico, sendo este mais ou menos

denso, mas, inegavelmente, tendo o homem no centro de sua atuação. E ainda

de acordo com o tempo e o lugar onde vivem as pessoas que vão atuá-lo.

Convém por em destaque, entretanto, que toda interpretação para ser

sustentável precisa estar ajustada aos direitos e garantias estabelecidos na

Constituição Federal, e conforme o modelo de Estado pela sociedade adotado.

O Direito do Trabalho surge em decorrência de um fenômeno sócio-

econômico, qual seja a Revolução Industrial, que modifica substancialmente o

modelo de produção, deixando o trabalhador de ser um artífice para se inserir

em uma engrenagem fabril, administrativamente organizada, na qual a antiga

liberdade de organizar os métodos de trabalho sucumbe diante poder diretivo

consagrado ao detentor dos novos instrumentos de trabalho, subordinando a

prestação de serviços daqueles que a ele se unem para a consecução de único

fim.

Esse ideal comum é naturalmente conflituoso, porquanto um dos pólos

detém o capital, enquanto o outro dispõe de sua força de trabalho, o que

conduz a interesses nem sempre coincidentes, gerando permanente tensão.

Há ainda um agravante, pois as relações são de trato continuado, sublimando

pequenas lesões de parte a parte, as quais deságuam tardiamente e, portanto,

potencializam os efeitos dos conflitos.

Assim sendo, embora o grupo em análise disponha de toda uma

estrutura de justiça especializada para a solução dos conflitos emergentes, os

quais, como em todas as relações humanas surgem cotidianamente, pelas

peculiaridades da situação de trabalho, raramente se sentem à vontade para

atiçar a prestação jurisdicional durante a relação de trabalho.

Buscar interferir neste dado de realidade não é tarefa fácil, posto que a

pessoalidade permeia tais relações, criando dependência recíproca e de

incômoda substituição. Por mais que um disponha de amplos recursos

materiais, encontrar outro trabalhador que conheça sua estrutura produtiva e

nela funcione com razoável adequação consiste em estafante missão. Idem em

relação ao trabalhador, que resolve postergar a consagração de seus direitos,

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simplesmente porque não quer correr os riscos inerentes à integração em outra

estrutura, quadro agravado pela crescente escassez de postos de trabalho

decorrentes da automação dos sistemas e da concepção de novos modelos

produtivos.

A conclusão de tudo isso é à busca de prestação jurisdicional já distante

dos fatos, e considerando-se ainda a natureza continuada de tais relações,

quando esta se efetiva, múltiplas micro lesões já se operaram redundando em

demandas de inúmeros pedidos, sendo que a maioria deles tem caráter

existencial, levando a proteção qualificada dos mesmos, sobretudo diante da

disparidade de forças entre os litigantes.

Temos, portanto, que quando o direito não é satisfeito a tempo e modo,

sua reparação também não é tentada imediatamente pela peculiaridade da

relação. E considerando-se o efeito inexorável do tempo nas relações jurídicas,

há de se constatar uma resistência na admissão de que o passar do tempo

fulmina a pretensão.

Tanto é assim, que a prescrição dos créditos trabalhistas chega,

felizmente, ao extremo de ser tratada na própria Constituição Federal, o que

nos aproxima do desejado parâmetro de interpretação de todo o direito, ou

seja, conforme o padrão pré-fixado na norma maior, fazendo-o no inciso XXIX,

de seu art. 7º, além da legislação infraconstitucional1, art. 11 e vários outros da

CLT, e em inúmeras súmulas.

A prescrição que agora nos interessa por em evidência é a

intercorrente2, ou seja, a que se opera no curso da demanda, razão pela qual

também pode ser tida como prescrição superveniente.

Seguindo a lógica do sistema, a jurisprudência trabalhista resiste

bravamente em admitir tal realidade, cristalizando entendimento no verbete

114, da Súmula do Tribunal Superior do Trabalho – TST, que categoricamente 1 Parte minoritária da doutrina entende que o inciso XXIX, do art. 7º/CF, revogou o art. 11/CLT, acabando com a chamada prescrição parcial. Assim, consoante a norma constitucional, teria o demandante sempre o direito de rever os últimos cinco anos do contrato de trabalho, não importando o interregno entre o distrato e a data do ajuizamento da reclamação, desde que, naturalmente, seja respeitado o prazo de dois anos após a extinção do pacto (MACIEL JÚNIOR, 1.996, p. 520). 2 Apesar de em todo o cenário jurídico o instituto em análise ser conhecido como prescrição intercorrente, quer parecer

que a melhor designação seria prescrição intracorrente, porquanto a mesma designa fato ocorrido durante a tramitação de único processo, sobretudo após a execução deixar de ser um processo distinto, constituindo-se de mera fase processual, como, aliás, sempre foi no Direito Processual do Trabalho. Nesse sentido a advertência de Arnor Serafim Junior, que observa: “Anote-se que alguns autores apresentam objeção em relação à própria utilização da expressão ‘prescrição intercorrente’, preferindo em seu lugar ‘prescrição intracorrente’: ... admite-se o uso da expressão ‘prescrição intercorrente’ apenas em homenagem à praxe forense, pois o rigor gramatical reclama o uso de uma expressão mais condizente com o sentido almejado de fluência dentro de um processo e não no meio de dois processos” (SERAFIM JUNIOR, 2.006, p. 87).

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afirma ser inaplicável na Justiça do Trabalho a prescrição intercorrente,

contrariando a Súmula do Supremo Tribunal Federal – STF, cujo verbete 327

com redação não menos contundente preceitua que o direito trabalhista admite

a prescrição intercorrente.

No âmbito do direito processual isso ocorre porque a maioria dos

sistemas modernos recepciona com entusiasmo o impulso oficial, e este não se

acomoda bem com a prescrição intercorrente. Entretanto, o tempo é fenômeno

absolutamente relevante para o direito e, ademais, apesar do impulso oficial

ser preconizado, em várias situações concretas o feito não pode ser

impulsionado sem a decisiva colaboração da parte interessada. E como as

legislações não enfrentam o tema, para não desajustar o sistema que os seus

códigos consagram, a doutrina de modo acanhado passa ao largo das

implicações que o tempo acarreta no mundo do processo.

O problema está colocado, exigindo da academia a construção de teoria

capaz de tentar explicar tais fenômenos, a partir da matriz constitucional, sendo

que, no caso brasileiro, alguns fatos jurídicos relevantes decorrentes de

alterações da própria Carta Magna, ainda impuseram profunda alteração de

sistematização do Direito Processual do Trabalho, campo mais sensível para

atuação da prescrição intercorrente, em face de seus princípios.

O primeiro diz respeito ao advento da ampliação da competência da

Justiça do Trabalho, que passou a julgar questões de Direito Civil,

administrativo, para-fiscal, dentre outros ramos que admitem sem rebuços a

prescrição intercorrente, instituto que ganhou nova dimensão no Novo Código

Civil, sobretudo porque somente se interrompe, agora, uma única vez. Isso

inclusive, a nosso sentir, trouxe, definitivamente, a prescrição intercorrente

também para a fase de conhecimento do processo.

Outro elemento também poderoso foi trazido pela Lei 11.051, de 29 de

dezembro de 2.004, que acrescentou o § 4º, ao art. 40, da Lei 6.830/80, que

dispõe sobre a cobrança da dívida ativa da fazenda pública, conhecida como

Lei dos Executivos Fiscais, aplicável duplamente perante a Justiça do

Trabalho, primeiro pelas execuções nela fundadas e segundo pela regra

constante do art. 889/CLT, pelo qual: aos trâmites e incidentes do processo de

execução são aplicáveis, naquilo em que não contravierem ao presente título,

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os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a cobrança

judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal.

Pela regra recém incorporada, se da decisão que ordenar o

arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a

Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e

decretá-la de imediato.

Mais ainda, a Lei 11.280/06, altera o § 5º, do art. 219/CPC, que passa a

dispor que o juiz pronunciará de ofício a prescrição, não fazendo qualquer

restrição ao tipo de prescrição que será reconhecida de ofício, o que pode

ensejar o reconhecimento de ofício da prescrição intercorrente, medida,

inclusive, que caminha em sintonia com os declarados anseios da sociedade, e

que se reverberam no Poder Judiciário, no sentido de dispor de um processo3

com duração razoável, nos moldes do inciso LXXVIII, do art. 5º/CF, o que

contribui para a criação de outra categoria para o instituto, na medida em que

não sendo argüida pela parte, talvez não possa ser conceituada como exceção.

Por fim, a promulgação da Lei 11.417/06, que regulamenta o art. 103-

A/CF, dispondo sobre a súmula vinculante, que inibe os órgãos do Poder

Judiciário de dar compreensão diversa às matérias decididas pelo STF, embora

a prescrição intercorrente no processo do trabalho não esteja nesta hipótese4.

Diante de tudo disso, o objetivo deste trabalho é teorizar o instituto da

prescrição intercorrente, balanceando-o com interpretação conforme o modelo

constitucional, concebendo um regime jurídico equilibrado para sua aplicação

no âmbito do Direito Processual do Trabalho, de modo a harmonizar a

legislação recém agregada aos princípios que informam o aludido ramo da

ciência jurídica, questionando ainda a razão pela qual a Súmula 114/TST

persiste, se os elementos legais e doutrinários atuam em sentido oposto.

3 Melhor seria procedimento, mas seguimos com a terminologia utilizada na Constituição Federal. 4 Apesar das súmulas mencionadas não serem tecnicamente vinculantes, inegável que servem de sólido substrato para a construção do provimento jurisdicional, sobretudo em matéria trabalhista, onde a jurisprudência é fonte formal de direito, com base no artigo 8º/CLT.

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CAPÍTULO 1

ASPECTOS HISTÓRICOS DA PRESCRIÇÃO

E A COMPREENSÃO DA PRETENSÃO

As demandas na Roma Antiga eram solucionadas por meio de um

sistema legal conhecido como legis actiones, pelo qual o Juiz soluciona a

questão trazida oralmente pelas partes. Entretanto, para êxito do sistema,

havia rígido regime preclusivo, que muito desagradava cidadãos romanos.

Na tentativa de solucionar o problema, veio à luz a Lei Aebutia (Séc. II a.

C.), criando novo sistema, conhecido como período formulário, no qual o

processo dava-se num documento escrito onde se fixava o ponto litigioso e

outorgava-se ao Juiz poder para condenar ou absolver o réu, conforme ficasse

ou não provada a pretensão do autor. As fórmulas consistiam num esquema

estabelecido entre o julgador e as partes que servia de modelo para que, num

caso concreto, com as adaptações e modificações que se fizessem

necessárias, se redigisse o documento em que se fixava o objeto da demanda

a ser julgada, dividindo-se em: demonstratio, intentio, adiudicatio e

condemnatio. Entretanto, a pedido das partes, poderiam ser inseridas partes

acessórias, ou adiectiones, donde poderiam estar a praescriptio, que é o que

mais nos interessa mais, a exceptio, e a replicatio, a duplicatio e a triplicatio

(ALVES, 1.983, p. 250).

A este fenômeno é atribuída a origem da prescrição, porquanto, ainda de

acordo com o magistério de Moreira Alves, dem, p. 261, a prescriptio era a

parte acessória da fórmula que assim se denominava porque, quando inserida

nela, era colocada em seu início (prae = antes; scriptio = escrever), antes da

demonstratio e a intentio, tendo como objetivo impedir o sucesso a pretensão,

ou o direito, com se entendia à época5.

5 Pondera José Marcos Rodrigues Vieira que: “o que se tem de levar em conta é que, pelo menos até uma constituição

de Teodósio II, de 424 (a qual introduziu a prescrição extintiva, de origem grega) não havia distinção, entre actiones perpétuas e actiones temporárias e a actio não se extinguia, em regra, pelo decurso do tempo. A generalização da prescrição levaria, naturalmente, à idéia de actio nascida no momento da violação do direito – não se encarando a distinção das ações em reais e pessoais, tanto quanto, generalizada a actio no direito pós-clássico, a prescrição passaria a referir-se a qualquer direito estatuído objetivamente. A prescrição – vê-se, pois – contribuiu decisivamente para a formação da extraordinariedade jusromanista, vale dizer que para a ordinariedade moderna: com a introdução da exceptio, em lugar da prescriptio do proêmio da formula” (VIEIRA, 2.007, p. 104).

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A aludida Lei Aebutia permitiu, então, a criação de ações não previstas

no direito honorário, através do que o pretor introduziu o uso de fixar um prazo

para sua duração, dando origem às chamadas ações temporárias, em

contraposição às do direito quiritário, que eram perpétuas.

Ao estatuir a fórmula, se a ação era temporária, ele a fazia preceder de

uma parte introdutória, em que determinava ao Juiz a absolvição do réu, se

estivesse extinto a prazo de duração da ação. E por uma evolução conceitual,

passou o termo praescriptio a significar, extensivamente, a matéria contida na

parte preliminar da fórmula, e daí sua nova forma de extinção da “ação6”, pelo

fim de sua duração, sendo necessário para sua configuração a presença de

seus quatro elementos: a existência de uma ação exercitável (actio nata); a

inércia do titular da ação pelo seu não exercício; continuidade dessa inércia

durante certo lapso de tempo, e a ausência de algum fato ou ato que a lei

atribua eficácia impeditiva, suspensiva ou interruptiva do curso prescricional

(LEAL, 1.978, p. 4 e 11).

E com que objetivo isso ocorre? Seguindo o magistério do festejado

magistrado paulista Câmara Leal, ibidem p. 14 e 18, seus fundamentos são:

necessidade de fixar as relações jurídicas incertas; o castigo à negligência e o

interesse público. Daí porque o Estado procura remover essa situação e

restabelecer o equilíbrio, por uma providência que corrija a inércia do titular,

assumindo a prescrição um caráter de pena, reproduzido na doutrina

subseqüente, como será demonstrado adiante, na medida em que poena est

malum passionis, propter malum actionis.

No mesmo sentido as vantagens listadas, de se evitar as demandas de

difícil solução pela antigüidade dos fatos, cujas provas se tornariam

embaraçosas, e, por vezes, impossíveis, pela dispersão ou perecimento;

impedir que o autor retarde, maliciosamente, a demanda, no intuito de dificultar

a defesa do réu pelo desbaratamento das provas, em virtude da remota

ocorrência dos fatos; proteger o devedor contra a má-fé do credor, que,

prevalecendo-se do desaparecimento das provas do pagamento, por extravio

6 Ao fazermos referência ao vocábulo ação, buscamos apenas fidelidade à idéia do texto de origem, na medida em que

a alusão feita é ao período clássico, no qual o entendimento era de que a prescrição extinguia a ação e a não a pretensão ou, mais modernamente, o exercício desta, o que não importa em concordância com a assertiva nesta quadra do conhecimento.

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19

da quitação, ou pela ausência ou morte das testemunhas, que o presenciaram,

poderia novamente exigi-lo, ou seja, questão eternamente verificada.

O caráter de pena não constitui uma unanimidade, sendo a antítese

levantada por Pontes de Miranda, para quem: serve à segurança e à paz

públicas, para limite temporal à eficácia das pretensões e das ações. A perda

ou destruição das provas exporia os que desde muito se sentem seguros, em

paz, e confiantes no mundo jurídico, a verem levantarem-se – contra o seu

direito, ou contra o que têm por seu direito – pretensões ou ações ignoradas ou

tidas por ilevantáveis. O fundamento da prescrição é proteger o que não é

devedor e não pode mais ter prova da inexistência da dívida; e não proteger o

que era devedor e confiou na inexistência da dívida, tal como juridicamente ela

aparecia (MIRANDA, 1.955, p. 101/102).

A doutrina trabalhista também que repudia a idéia de pena, ao

argumento de que não há de se falar em negligência do credor quando o direito

de ação não é exercido em razão do estado de subordinação ínsito à relação

de emprego, como lembra (LORA, 2.001, p. 23) ao abordar o tema da

prescrição. Prossegue, dizendo que dita sujeição interdita a vontade, pois

ninguém ignora que a demanda, ainda que com o único fim de interromper a

prescrição, implica, em regra, resilição contratual mediante denúncia vazia, por

iniciativa do empregador.

Talvez não seja mesmo um exagero a idéia de resistir à prescrição,

conforme gosto justrabalhista, eis que a primeira disciplina do instituto, no

direito brasileiro, é encontrada no Código de Comércio de 1.850. Como regra

geral, era estabelecido o prazo de vinte anos. A prescrição trabalhista, todavia,

somente fluía seu prazo de um ano a contar do término do contrato, consoante

preceituava o art. 448 do aludido Código: “Art. 448 – As ações de salários,

soldadas, jornais ou pagamento de empreitadas contra comerciantes,

prescrevem no fim de um ano, a contar do dia em que os agentes, caixeiros ou

operários tiverem saído do serviço do comerciante, ou a obra da empreitada for

entregue. Se, porém, as dívidas se provarem por títulos escritos, a prescrição

seguirá a natureza dos títulos”, idem p. 29.

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1.1. Definição de prescrição

A prescrição, como é cediço, é um instituto secular, que difunde seus

efeitos nos mais variados seguimentos da ciência jurídica. E, assim, comporta

diversas acepções.

Antes de tudo, convém mais uma vez deixar claro que prescrição

procede do vocábulo latino praescriptio, derivado do verbo praescribere,

formado de prae e scribere, com significação de escrever antes ou no começo,

em derivação exposta no item anterior.

Ademais, estabelecer seus suportes fáticos também é relevante. Sobre

esses temos, conforme rol estabelecido por Vilson Alves: a) a possibilidade da

pretensão; b) a prescritibilidade dessa pretensão; c) o transcurso do prazo

prescricional, desde que não submetido às imunidades dos artigos 197 a

204/NCC, e d) o não exercício da pretensão (ALVES, 2.006, p. 80).

Trazer algumas definições atende a uma questão metodológica, todavia,

por pura questão de afinidade, vou começar pelos autores juslaboralistas,

passando, é claro, pela raiz civilista, para chegar aos absolutamente clássicos:

Câmara Leal e Pontes de Miranda, onde pode ser encontrada doutrina mais

densa.

Interessantíssimo constatar, todavia, o quanto a prescrição é encarada

como um tabu, um desafio mesmo. Os manuais de direito passam

praticamente ao largo do instituto. No direito material o compromisso ainda é

um pouco maior, com a preocupação em conceituar o instituto. Na esfera

processual, quando muito se fala nos efeitos da prescrição para o processo7.

No saber de Antônio Álvares da Silva, prescrição é o fato jurídico pelo

qual, em virtude do transcurso do tempo, o credor perde o direito de exigir do

devedor o cumprimento da obrigação e, nos direitos reais, pelas mesmas

razões, o proprietário perde, em favor do possuidor, o domínio da coisa (SILVA,

1.990, p. 23).

7 Certamente que podemos contar com algumas monografias acerca do tema, entretanto refiro-me aos manuais de

direito. Outro dado que também chama a atenção, e que, por isso merece nota, é que a despeito da alteração posta no direito positivo e do amplo consenso no sentido a prescrição atinge a pretensão, a maioria dos livros utilizados nos bacharelados ainda a vinculam ao direito de ação.

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Segundo o magistério de Isis de Almeida, prescrição é a perda, pelo

decurso de certo tempo, da faculdade de pleitear um direito, através da ação

judicial competente.

Sustenta ainda que já se tornou indiscutível que a prescrição é um

direito do devedor oponível à pretensão do credor, que se conservou inerte por

determinado tempo, em relação à cobrança da dívida (ALMEIDA, 1.994, p. 15 e

59).

Mais recentemente, Sérgio Pinto Martins, afirma, em síntese apertada,

que prescrição é a perda da exigibilidade do direito, em razão da falta do seu

exercício dentro de um determinado período (MARTINS, 2.007, p. 676).

No Direito Processual do Trabalho, Carlos Henrique Bezerra Leite, trata

a prescrição como exemplo de fato extintivo, pois, quando acolhida, extingue o

processo com resolução de mérito (LEITE, 2.007, p. 499).

No Direito Civil, diz César Fiuza que a prescrição extingue a

responsabilidade do devedor. Assim, transcorrido o prazo prescricional, o

devedor terá a faculdade de pagar se quiser. Do ponto de vista da

responsabilidade, a obrigação está extinta. No entanto, se enforcarmos o

débito, a obrigação nunca se extinguirá, tanto que se houver pagamento

espontâneo, não poderá ser repetido, exatamente por ser devido e válido

(FIUZA, 2.006, p. 376).

Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho, também sob a esfera

civil, sustentam que prescrição é a perda da pretensão de reparação do direito

violado, em virtude da inércia do seu titular, no prazo previsto pela lei, pelo que

a obrigação civil converte-se em obrigação natural (GAGLIANO & PAMPLONA

FILHO, 2.002, p. 476).

No processo civil, Luiz Guilherme Marinoni, percebe a prescrição como

defesa material indireta, tratando-a como exceção, com arrimo em

CHIOVENDA, entendendo que ela:

“...confere ao réu o poder jurídico de anular a específica

ação proposta, mantendo no mais intacta a relação

jurídica material com outras eventuais ações possíveis...,”

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concluindo que a mesma consiste em um fato extintivo (MARINONI, 2.006, p.

140/141).

Ainda no âmbito processual, o magistério de Rosemiro Pereira Leal,

para quem a prescrição e a decadência, como institutos jurídicos, configuram-

se pela perda do prazo para o exercício de direitos. Assim:

“A prescrição é a perda do prazo de obter ato ou sentença

reconhecedora de direitos em procedimento instaurado...”

(LEAL, 2.001, p. 168).

Agora sim seguindo em busca dos mais eruditos, sem qualquer

desdouro para os demais autores aqui mencionados.

Absolutamente clássica e, assim, inesquecível a doutrina de Câmara

Leal, para quem a prescrição é a extinção de uma ação ajuizável, em virtude

da inércia de seu titular durante certo lapso de tempo, na ausência de causas

preclusivas de seu curso, explicando que, aí estão, a dar-lhe corpo e

individualidade, seus diversos elementos integrantes: objeto, causa eficiente,

fator operante, fator neutralizante e efeito8.

Sobre o objeto diz ser a ação ajuizável; sua causa eficiente: a inércia do

titular; seu fator operante: o tempo; seu fator neutralizante: as causas legais

preclusivas de seu curso; seu efeito: extinguir as ações (LEAL, 1.978, p. 12).

Na doutrina de Pontes de Miranda, o conceito apresenta-se de forma

bem mais rebuscada, importando em um ato-fato jurídico, incidindo no suporte

fático a regra jurídica sobre a prescrição, o fato jurídico da prescrição se produz

(o suporte fático entra no mundo jurídico). Entretanto no mundo jurídico o

suporte fático, temos, nesse mundo, mais um fato jurídico, que havemos de

considerar ato-fato jurídico, devido ao ato humano negativo, talvez involuntário,

que é mister ao suporte fático. O ato-fato jurídico da prescrição somente

produz, no mundo jurídico, o efeito de criar o ius excepcionis, isto é, o direito de

exceção de prescrição (MIRANDA, 1.955, p. 112).

Sua existência, portanto, decorre do suporte fático. E para a formação

deste é indispensável reunir-se seus supostos, donde é possível concluir que 8 O mesmo Câmara Leal, sempre lúcido e insuperável, diz ainda: se remontarmos às fontes romanas, ali

encontraremos três fundamentos da prescrição, indicados nos textos: a) o da necessidade de fixar as relações jurídicas incertas, evitando as controvérsias; b) o do castigo à negligência; e c) o do interesse público (LEAL, 1.959, p. 28).

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inexiste prescrição sem a pretensão pré-existente. Nesta lógica, temos como

supostos: a pretensão propriamente dita; a prescritibilidade desta e o efeito do

tempo, sem interrupções. Não é demais lembrar que, todas essas situações

jurídicas, por segurança, são legalmente estabelecidas.

O seu significado também é de capital importância. Temos, nesse

sentido, que a prescrição sintetiza a convivência possível entre dois valores

fundamentais do direito: o ideal de justiça e a segurança jurídica. Enquanto flui

o prazo prescricional, a supremacia é do valor justiça, pois se assegura ao

prejudicado e exercício da pretensão para a busca de sua satisfação. Se o

demandado, por inércia, conformação ou descaso deixar vencer o prazo para

corrigir a injustiça, a prioridade desloca-se inexoravelmente para o valor

segurança jurídica, ficando sepultadas, sem a avaliação de conteúdo, todas as

incertezas que poderiam gerar conflitos, de modo a preservar a paz social e a

estabilidade das relações (OLIVEIRA, 2.006, p. 529).

1.2. A prescrição como exceção e a técnica do ‘enco brimento’

A exceptio, no direito romano, com fundamento no ius honorarium foi um

meio de oposição, de defesa, na qual poderia estar contida a exceção de

prescrição, embora não houvesse a distinção entre as exceções de direito

material e de direito processual, apesar de serem sempre declarativas. Jamais

constitutivas, condenatórias, mandamentais ou executivas, porquanto somente

pode ser excepcionado algo que é objeto de pretensão.

A exceção é palavra polissêmica na dogmática jurídica: possui sentido

pré-processual, processual e substancial. Esses sentidos seguem, mutatis

mutandis, a mesma linha das acepções conferidas à palavra ação, o que

possibilita desempenhar um paralelo entre elas. Qualquer que seja a acepção

dada, o emprego do termo exceção pressupõe a condição de demandado

(DIDIER JR, 2.004, p 54).

A exceção há de ser entendida como oposição à pretensão, ou seja, o

direito de se opor não só à exigência de uma eventual prestação, bem como a

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qualquer meio que o interessado tenha para exercer sua pretensão. Daí a

razão por que se dizia intentione per exceptionem elisa.

Vemos que a exceção do demandado se opõe à pretensão do

demandante. Porém, nesse diapasão, consiste ela, a exceção do demandado,

também em uma pretensão, só que em direção inversa à do demandante.

O demandante tem a intenção, e o demandado tem a exceção. Ambas

são vontades, propósitos, intentos, objetivos, mas caminhando em direções

opostas, tendendo à anulação recíproca (ZANGRANDO, 2.007, p. 46).

Segundo a doutrina de Eduardo Couture, há, em verdade, um

paralelismo entre ação e exceção. Salienta que embora a doutrina tenha dado

muito mais atenção ao primeiro assunto, cada uma das teorias relativas à ação,

corresponde uma opinião semelhante com referência à exceção. E assim

prossegue, tratando a ação como “... o meio legal de pedir o que nos pertence

ou nos é devido...”, enquanto que a exceção é “... um meio legal de destruir ou

adiar a ação intentada...” (COUTURE, 1.948, p. 58).

Justificando sua posição, estabelece comparações, demonstrando que a

teoria que considera o direito e a ação simplesmente dois aspectos distintos de

uma unidade jurídica, admite paralelo com uma noção também substantiva da

exceção9. À teoria da ação como um direito concreto corresponde de certo

modo à teoria, também concreta, da exceção entendida como um “contra-

direito”. E, por último, a teoria do chamado direito abstrato de agir, quando

projeta seus princípios sobre o tema da exceção, definindo-a como uma

possibilidade jurídica de defesa, atribuída até mesmo aos que carecem de

direito legítimo à pretensão.

Remata apud Picard, in Le droit pur, com imagens de uma época em

que o direito era muito mais romântico, asseverando que o paralelismo é por tal

forma evidente, que os autores que definem a ação como sendo “o direito

armado em pé de guerra dizem que na exceção, o direito perdeu o capacete,

mas conserva ainda o escudo” (COUTURE, 1.948, p. 58).

9 Importante não esquecer que a exceção é poder de todo indivíduo de recusar-se à prestação a que esteve obrigado, enquanto a objeção abrange duas formas particulares de oposição: as denegatórias de direito, que tendem a demonstrar que o direito do autor não existe, e aquelas que tendem a anular o direito do demandante (pretensão) e que se apresentam como verdadeira contra-pretensão, nos moldes do direito abstrato de ação.

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Von Tuhr, apud Pontes de Miranda10, salienta, contudo, que somente há

exceção contra a pretensão, e que esta diz respeito à eficácia do ius

excepcionis, porquanto tudo que ela faz é admitir o direito do excipiente, sem

excluir, nem modificar o do excetuado. E conclui asseverando que a exceção

não é o direito de exceção, como a pretensão e a ação não são o direito a que

se ligam. A exceção é a possibilidade jurídica de prevalecimento da eficácia de

algum direito sobre a de outro, “encobrindo-a” (MIRANDA, 1.955, p. 3-7).

A exceção, pois que não elimina no todo, nem em parte, o direito, a

pretensão, ou a ação, ou outra exceção, e só lhes atinge a eficácia11, para

encobrir, até onde vá a do direito, pretensão, ou ação, de que emana. Não

torna teoricamente ineficaz o direito, a pretensão, ou a ação, ou exceção,

contra que se dirige, apenas os torna praticamente ineficazes, porque,

encoberta, a sua eficácia não pode contra-ocorrer, temporal ou definitivamente.

Essa noção técnica de encobrimento evita a negação do direito, da pretensão,

da ação, ou da exceção, e da própria eficácia deles. A exceção não nega,

sequer, a eficácia do direito, da pretensão, da ação, ou da exceção do

excetuado, - só a encobre12. (MIRANDA, 1.955, p. 8).

A resistência do réu à pretensão possui contornos semelhantes ao

exercício do direito de ação, como restou evidente. Destarte, do mesmo modo

que o autor tem a faculdade de dirigir-se aos tribunais para deduzir sua

pretensão, cabe ao réu exercer sua contrariedade por meio de exceção de

prescrição. Não é, contudo, um contra-direito, como originariamente se pensou,

pois o réu limita-se a afirmar a ausência de exigibilidade, e não a ansiar algo

para seu patrimônio jurídico.

Tanto é assim que, na atualidade, Elio Fazzalari não aceita também a

contraposição entre ação e exceção, o fazendo com argumentos pujantes.

Sustenta que:

10

Durante todo o trabalho houve a intenção de se fazer apenas citação diretas, em respeito ao leitor e à fidelidade das fontes. As duas indiretas, constantes, por coincidência, de parágrafos seguidos, devem-se ao fato de serem obras muito antigas e indisponíveis, uma encontrada na obra de Couture e outra na de Pontes de Miranda, juristas de expressão internacional, mas que escreveram na primeira metade do Século passado, mas que suas ilustrações permanecem atuais e úteis à compreensão do instituto. 11 Daí sua contundente distinção com a preclusão, pois a pretensão prescrita está encoberta e, portanto, inválido o seu exercício, enquanto a pretensão preclusa, simplesmente deixa de existir. 12 Com esmerado acerto, pontua José Marcos Rodrigues Vieira, que o que prescreve não é a pretensão, mas o seu exercício (VIEIRA, 2.007, p. 100).

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“Não é correta a contraposição entre 'ação' e 'exceção',

como se a primeira coubesse ao autor, e a segunda ao

réu. A ambos cabe a respectiva 'ação'; e, de sua parte, a

'exceção' é uma figura bem mais limitada: propriamente

ela consiste na faculdade – que cabe ao réu no processo

de cognição – de alegar fatos 'impeditivos' ou 'extintivos',

isto é, fatos que descalcem ou paralisem os fatos

'constitutivos', alegados pelo autor como suporte da

situação substancial inscrita e deduzida na lide”

(FAZZALARI, 2.006, p. 508).

Assim, pela visão clássica, o defendente apenas poderia pretender fosse

a pretensão repelida. Nada poderia requerer em face do autor, situação jurídica

incompatível, data venia, com o status de que dispomos hoje para a busca de

satisfação plena, com o maior espectro possível de possibilidades, na medida

em que estas se colocam como integrantes do princípio basilar do devido

processo legal, com ampla liberdade probatória.

Poderá então o réu opor a exceção de prescrição, não apenas para

impedir o advento de uma decisão com solução de mérito que lhe seja

desfavorável, mas sim opor-se a pretensão do autor, pleiteando que a decisão

judicial declare que esta não mais produz efeito jurídico, bem como o que mais

lhe aprouver.

Naturalmente que a exceção também deita seus efeitos sobre o direito

abstrato, consistindo, neste caso, um direito negativo. Entretanto, há de se

reconhecer que ao estabelecer a negação, a parte não nega a existência

(pode, inclusive, nem existir), nem a validade, nem desfaz, nem co-elimina atos

de realização da pretensão – só encobre a eficácia desta. Nenhuma

contestação do direito, da pretensão, ou da exceção do autor há no exercício

do direito do réu, exercício do ius excepcionis, importando num “direito de

encobrir a eficácia do direito alheio, estabelecendo um desnível entre existir e

ser exigível” 13 (MIRANDA, 1.955, p. 11).

13 A doutrina considera ainda os sentidos da exceção, onde numa acepção muito geral, considera-se exceção qualquer meio de que se sirva o réu para justificar o seu pedido de absolvição, onde simples negação do pedido importa em exceção; em sentido mais estrito, só é exceção o ato de defesa do réu que não consista em pura negação, sendo necessário um fato impeditivo o, modificativo ou extintivo; finalmente, de modo mais restrito ainda, só é exceção

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Assim, a exceção de prescrição consiste num fenômeno independente,

porquanto ela é o seu próprio conteúdo (imediato) do direito de excepcionar. E

o seu efeito é o de permitir a recusa da pretensão, somente podendo extinguir-

se pela renúncia14 (MIRANDA, 1.955, p. 12).

Daí a necessidade do Juiz instar a parte a pronunciamento antes de

declarar a prescrição de ofício, pois o direito de renúncia à prescrição co-existe

com o dever do Juiz em declarar o fato jurídico por conta própria15.

As exceções ou dilatam ou perimem, de acordo com o autor em

referência, p. 14, isto é, apenas encobrem, temporariamente, a eficácia

(exceções dilatórias), ou a encobrem para sempre (exceções permanentes).

Há, contudo, as exceções mistas, que embora fundamentalmente

meritórias, circunscrevem-se em questões que devem ser analisadas

anteriormente, como nas extintas “preliminares de mérito”, tendo, pois, forma

de exceção dilatória, mas conteúdo de peremptória.

A exceção de prescrição é peremptória, sendo que a peremptoriedade

da exceção diz respeito à permanência do encobrimento, atribuindo-lhe uma

contra-eficácia incessante.

A exceção de prescrição, naturalmente, pode ser exercida tanto em

juízo, quanto fora dele. Entretanto, a prescrição intercorrente, que é a que nos

interessa, por óbvio, que somente pode ser levada a efeito em juízo.

Absolutamente imprescindível notar que, historicamente, a prescrição,

por si só, não extinguia a pretensão ou encobria sua eficácia. Somente através

de sua oposição é que emergia o efeito desejado. Havia necessidade da

manifestação de vontade de excepcionar. Assim, o efeito mais palpável da

prescrição era apenas fazer emergir tal possibilidade. Hoje não mais. A

possibilidade do conhecimento de ofício da prescrição faz com que ela encerre

a contraposição ao fato constitutivo afirmado pelo autor. Todavia, somente sob este derradeiro aspecto há de se valer em real exceção, ou exceção propriamente dita, passim Couture in “Fundamentos” e Chiovenda in “Instituzioni”. E nesta linha de raciocínio, a prescrição se enquadra na última modalidade. 14 Situação jurídica alterada, se considerarmos a possibilidade de declaração ex officio da prescrição, segundo a regra disposta no § 5º, do art. 219/CPC, de aplicação algo controvertida no âmbito do Processo do Trabalho, mas aceita por este autor como expressamente declarado. 15

O demandado apresenta defesa indireta quando agrega ao processo fato novo, que impede, modifica ou extingue o direito do autor. Isso acontece quando o demandado aduz uma exceção substancial (defesa indireta de mérito que não pode ser conhecida ex officio pelo magistrado – art. 326/CPC) ou uma objeção substancial (defesa de mérito que pode ser examinada de ofício pelo Juiz*). Se houver defesa indireta, haverá necessidade de réplica, pois o autor tem o direito de manifestar-se sobre o fato novo que lhe foi deduzido. A existência de defesa indireta repercute na distribuição do ônus da prova, que é do réu em relação aos fatos novos (art. 333, II, do CPC), e na possibilidade de cisão da confissão, que é princípio incindível (art. 354 do CPC) – (DIDIER, 2.004, p. 60). * O texto precede o § 5º, do art. 219/CPC, com sua redação atual.

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um direito em si mesma. Ademais, já sabemos que o que prescreve não é a

pretensão, mas sim o seu exercício.

Noutras palavras, Humberto Theodoro Junior, discorrendo sobre o tema,

notadamente em sede de execução, ensina que a prescrição é uma defesa de

que se vale o devedor para inibir a pretensão do credor de exigir a prestação

conforme título da obrigação (THEODORO JR, 2.007, p. 193).

A exceção de prescrição é um direito que se exerce contra os interesses

do titular da pretensão, sendo a ela antecedente, e que pode ser argüido em

qualquer grau de jurisdição, nos moldes do art. 193/NCC.

Importante perceber, contudo, que para atuar como exceção, a

prescrição precisa ser argüida, ou exercida, na expressão de Pontes de

Miranda, pois uma coisa é o direito de excepcionar, e outra a atividade

exceptiva, que é a exceção (MIRANDA, 1.955, p. 17).

Destarte, a se considerar válido o conhecimento de ofício da prescrição,

como atualmente preconizado no § 5º, do art. 219/CPC, a prescrição como

exceção deixa de existir, neste específico caso16. Transforma-se, então, noutro

fenômeno jurídico, como veremos adiante. A exceção, todavia, segue intacta,

pois co-existe como possibilidade de defesa, como em José Marcos Rodrigues

Vieira (nota de rodapé 35) e em Fredie Didider Jr (nota de rodapé 37).

Convindo mais uma vez com o autor em referência, temos que quem se

defende vai contra o que o golpeia. Ataque contra ataque. Assim, a defesa, dita

também, objeção, contraria a projeção de sua pretensão. E se a exceção não

corta, não objeta, sua eficácia afirma-se, e a outra eficácia, em virtude disso,

fica encoberta. Por isso mesmo, se oposta a exceção e esta desaparece (o

exemplo citado, próprio para a época, é da renúncia), sua eficácia, que fora

encoberta, descobre-se (MIRANDA, 1.955, p. 18).

O essencial é perceber que havendo o descobrimento da causa que

impedia que a pretensão seguisse seu curso, esta ganha o antigo vigor. Nesse

16 Em atualizada obra, afirma José Marcos Rodrigues Vieira que: “diremos que o Código de 2.002 transfundiu, um no outro, dois conceitos, apontados por Pugliese como entre si incompatíveis, os conceitos romanos de actio: o direito à res in iudicium deducta e o de direito à liberação da formula – díade de que teria se valido Winscheid, para escapar às críticas de Müther. Tal dualidade conceitual explica a seqüência histórica: a generalização da prescriptio, passando de exceptio do pretor, a ato do réu, foi, com o ônus da litis contestatio, assimilada à obligatio. O que, no plano da extinção dos direitos, apagaria, como observado, a diferença entre os absolutos e os relativos. A prescrição das ações, reais e pessoais, dependia da exceptio articulada pelo réu, tanto quanto o direito litigioso dependia do contraditório. Embora verdadeiros os dois conceitos de actio do direito clássico, quer o da actio nata, quer o do livramento da formula – interessa à prescrição (que era e é exceção) o período pós-clássico, que se serviu dos conceitos ditos incompatíveis, para compor a litis contestatio em atos distintos do autor e réu” (VIEIRA, 2.007, p. 104/105).

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sentido, temos que o direito de exceção preexiste à exceção, que é o seu

exercício, e só diz respeito à própria eficácia do ius exceptionis. Vale dizer: não

tem qualquer eficácia se descoberto, nem antes de ser declarado (quando

considerado como exceção).

Em suma, excetuar é alegar que há ou houve razão para não se prestar

alguma obrigação, sendo que a única pessoa contra a qual a matéria pode ser

argüida a prescrição é em face do credor, daí porque sua oponibilidade é a

este limitada. Sua eficácia, entretanto, depende de declaração judicial.

No âmbito estritamente processual, entretanto, a prescrição

originariamente se inseria no rol das exceções substanciais, significando,

assim, uma defesa indireta17, deduzida como uma preliminar de mérito,

conforme a sistematização do CPC/39 (Código de Processo Civil anterior ao

atual) porquanto objetivava exatamente inibir a satisfação da pretensão

deduzida sem tangenciar seu cerne. Entretanto tal distinção já cumpriu seu

papel histórico, pois o inciso IV, do art. 269/CPC vigente, preceitua que há

resolução de mérito quando o juiz pronuncia a prescrição, trazendo o instituto

em análise, insofismavelmente, para o mérito da causa.

Não obstante, a doutrina clássica guarda tal distinção, o que é

cientificamente valioso, pois permite enriquecer a classificação das

possibilidades de defesa.

Quanto à prescrição intercorrente, contudo, por não ser mais um

fenômeno pré-processual, o momento de sua argüição ocorre após o

implemento temporal decorrente da inércia da parte que, intimada, não praticou

atos processuais de sua exclusiva alçada. Destarte, a apresentação de defesa

ou outro ato processual subseqüente não importa em preclusão para que o

interessado evoque o fato jurídico que impede o prosseguimento da demanda.

A prescrição, contudo, não se passa no plano da existência da

pretensão, nem no plano de validade do ato jurídico; é fato que ocorre no plano

da eficácia, onde se pode indagar se existe o efeito prescritivo, que é o

encobrimento da eficácia da pretensão ou de seu exercício.

17

A defesa direta seria a contestação, onde o mérito seria impugnado.

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Sendo assim, parte da doutrina continua a entender que a exceção de

prescrição permanece exercendo seus efeitos no mundo jurídico, em situação

na qual é essencial a alegação expressa da parte.

A despeito disso, recentemente surgiu outro fenômeno jurídico a ensejar

o reconhecimento judicial. A declaração, ex officio, da prescrição, inclusive

intercorrente, nos moldes do § 5º, do art. 219/CPC, com a redação que lhe foi

dada pela Lei 11.280/06, onde o caráter publicista do processo na atualidade

emerge com toda força, praticamente impondo o comando ao magistrado, ao

afirmar que: o Juiz pronunciará, de ofício, a prescrição. Acessoriamente, traz

ainda outro efeito para o mundo processual. É que não mais havendo a

necessidade da parte alegar a exceção de prescrição, art. 190/NCC, o instituto,

sob esta angulação, perde sua natureza de exceção18.

A conclusão a que chegamos é no sentido de que a opção legislativa

criou um fato jurídico novo, ainda carente de sistematização na doutrina

ampliada. Isso porque, embora haja a possibilidade de conhecimento de ofício

da prescrição, subsiste a permissão para o expresso requerimento, exercível

por meio de exceção. Assim, havendo pedido formulado pela parte para a

declaração judicial da prescrição, tal possibilidade importa numa exceção,

instituto que permanece íntegro. Lado outro, se o magistrado a declarar por

iniciativa própria, seguindo o comando legal, não será uma exceção, porquanto

a declaração judicial não tem natureza jurídica de defesa, e sim de um ato de

lógica jurídica, entendendo-se este como abrigo de proposições normativas.

1.3. Compreendendo a pretensão

Exercer a pretensão é exigir a prestação. Entretanto, convém notar que

exceção não é pretensão, porquanto esta última é técnica de ataque, enquanto

a primeira é técnica de defesa, nos moldes da doutrina majoritária

estabelecida. Imprescindível, contudo, considerar as idéias lançadas no tópico 18

Em sentido oposto, Fredie Didier Jr., para quem a prescrição não perdeu sua natureza de exceção substancial. Alterou-se o regramento processual da prescrição, que, embora uma exceção substancial, tem regime jurídico de objeção, porquanto a possibilidade de conhecimento de ofício é opção legislativa e não teórica. Isso porque, em seu entendimento, permanece em vigor o art. 191/NCC, com a possibilidade de renúncia da prescrição (DIDIER JR. 2.006, p. 61-62).

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anterior, inclusive com nova categoria jurídica para a prescrição declarada de

ofício, bem como o lúcido posicionamento de Elio Fazzalari, atribuindo valioso

aumento de importância ao instituto da exceção, equiparando-o ao exercício do

direito de ação, onde, por meio de exceção, tem o réu o mesmo espaço

probatório do autor, com as garantias processuais inerentes.

No direito processual, exceção é utilizada como sinônimo de defesa em

geral, ou então, mais especificamente, como alegação de fatos que não

contradizem os alegados na inicial, mas são capazes de excluir a condenação

do demandado.

Depois de tanto se falar em eliminação da pretensão, mister aclarar,

afinal, quê vem a ser a tal pretensão19, consoante as teorias sobre sua

natureza jurídica e sua categorização.

Originariamente fora configurada como um direito subjetivo ou como um

poder, mais na esfera do Direito Civil, enquanto costuma figurar como ato

jurídico junto aos processualistas, porquanto estaria no plano da declaração de

vontade, uma vez que seria dirigida a outro sujeito. A despeito de tudo isso, a

pretensão afigura-se muito mais como um instituto autônomo, consistente na

possibilidade de se exigir uma prestação, ou, na expressão de Carnelutti, para

quem a:

“pretensão é a exigência da subordinação do interesse

alheio ao próprio” (CARNELUTTI, 1.973, p. 28).

A pretensão tem origem na actio nata e pressupõe uma norma jurídica

subjacente, servindo com termo a quo para a contagem do prazo prescricional

do que se quer, do que se exige, na medida em que seu conteúdo se expressa

como um conjunto de possibilidades, que se traduzem por faculdades a serem

exercidas pelo titular, ou seja, a própria exigibilidade20.

19

Existe uma aceitação corrente entre os juristas de que o vocábulo alemão anspruch corresponde à palavra pretensão no vernáculo. Conquanto não tenha sido objeto principal de nenhuma discussão conhecida em língua portuguesa, tal afirmação de correspondência léxica tornou-se lugar comum em toda a literatura sobre o tema, embora possa ter um significado não correspondente ao da língua alemã, a que sentenciamos ser o de aspiração (FONTES, 2.002, p. 14). 20

A categoria jurídica assim posta ressalva a fundamental distinção entre direito e interesse, bem colocada por Vicente Maciel, donde exsurge que a primeira constatação é a de constituem-se categorias distintas postas no campo das 'situações jurídicas'. O termo interesse comporta dois sentidos básicos, sendo um subjetivo, que é permeado de 'conotações psicológicas' por envolver impulsos, desejos, motivação; e um sentido objetivo, como o que é ou se torna relevante, vantajoso, importante a um sujeito. É na inter-relação dos dois sentidos que ocorre a transição do 'interesse como motivação para o interesse como objeto em que se projeta o desejo de satisfação de necessidades ou anseios

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Estando este trabalho estruturado em aspectos processuais, convém

diferenciar os aspectos materiais e processuais da pretensão21. Coube a Adolf

Wach, apud André Fontes, forçar a distinção entre a pretensão e a pretensão

processual. Tal fato ocorreu pela necessidade de se considerar que também se

tinha contra o Estado uma exigência de tutela de direitos, distinta daquela

exigência que se faria valer contra o devedor. Deste modo, se o conceito de

pretensão estava adstrito ao § 194, I, do Código Civil Alemão, que consagrava

como direito de exigir de outro uma ação ou uma omissão, no direito

processual teria ela um sentido diferente: significaria toda a exigência feita

numa demanda. De maneira que teria ela natureza pública e não seria uma

emanação ou expressão do direito subjetivo privado.

É digno de nota que o estudo em que Wach anuncia a tese da teoria da

pretensão processual (a pretensão de declaração) integrava uma obra em

homenagem a Windscheid, onde aproveitava para fazer um elogio às idéias do

festejado processualista e desenvolvia, na oportunidade, a tese da Teoria da

Pretensão como Proteção do Direito. A linha da teoria da pretensão como ato

jurídico muito se valeu das conclusões de Wach, ao ponto de se identificarem

pretensão e pretensão processual, mas com um conceito denominado pela

última; por isso, esta poderia ainda ser definida como a vontade declarada de

um sujeito de obter um dado provimento jurisdicional (FONTES, 2.002, p. 41).

Retomando a questão da subjetividade do direito à prestação, temos que

a pretensão seria o direito de exigir a prestação (ou até o poder de exigir a

prestação), no dizer de Frank Peters, em cuja obra afirma que a pretensão é o

direito subjetivo relativo mais importante que existe, e para quem a pretensão

processual é apenas uma pretensão afirmada, cuja existência o Juiz ainda tem

humanos'. Do mero interesse da subjetividade, o interesse passa a adquirir concretude, objetivando-se em coisas e bens com os quais o sujeito se relaciona, passando a adquirir valor (MACIEL JÚNIOR, 2.006, p. 46). 21 Na doutrina nacional, José Marcos Rodrigues Vieira explica que: “Já não haverá de ocupar-nos, pois, a palavra 'pretensão', como pretensão processual, mas a pretensão pré-processual, de sentido puro, limítrofe do direito substancial, do próprio campo da actio nata. Cabe invocar o magistério de Goldschmidt, lembrando que a ZPO também fala em anspruch, este, a afirmação de direito no processo, não tem nada a ver com o correspondente do BGB (§ 194). 'Aquele não significa mais que um direito pretendido; este, um direito existente'. São precisas, a propósito, as palavras de Pugliese: No campo do direito civil e processual a mais afortunada, senão a mais feliz, doutrina de Windscheid foi a da 'pretensão' (Anspruch). A densa manifestação de elucubrações germânicas e depois também italianas sobre este ambíguo conceito encontra seu ponto de partida nas poucas frases que lhe dedicou Windscheid ao contemplar na pretensão o equivalente moderno da actio e pela primeira vez a delineou como situação jurídica substancial e não identificável, por outra parte, com o direito subjetivo, do qual teria representado melhor uma emanação. Doutrina que o próprio Windscheid reelaborou, modificando-a, nas 'Pandectas' e que alcançou seu apogeu com a explícita formulação legislativa (§ 194 do Código Civil Alemão). Parece que aí vai beber Carnelutti a inspiração para a tese de que a prescrição não afeta nem a ação, nem o direito, nem muito menos, a pretensão (anspruch), mas, em realidade, a relação jurídica material” (VIEIRA, 2.007, p. 102/103). * Nota do autor: “ZPO” corresponde ao Código de Processo Civil Alemão, enquanto “BGB” ao Código Civil do mesmo país.

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que examinar e, além disso, uma pretensão processual pode estar sustentada

por várias pretensões de direito material, nos moldes do § 194, I, de seu

Código Civil (PETERS, 1.997, p. 11/12).

Se no direito alemão, onde realmente deitamos a origem conceitual da

pretensão (anspruch), como a concebemos modernamente (por certo que,

historicamente, também atribuímos a origem à actio romana22), esta se afigurou

até aqui como um poder. E, para nós, brasileiros, ou melhor, em língua

portuguesa, a sujeição ao poder de exigir deve ser entendida como uma

responsabilidade processual.

Esta idéia, aliás, surgiu a partir da crítica de Carnelutti23 sobre a

natureza civil da responsabilidade, mais se acomoda sob a perspectiva de

nosso modelo constitucional. Segundo os adeptos dessa linha de orientação, a

responsabilidade seria correlata à possibilidade executória estabelecida na lei,

de maneira que estaria distante de qualquer fenômeno obrigacional e mais

adequada aos institutos de direito processual, portanto de direito público. Tais

premissas foram arredadas sob a designação de Teoria Unitária da Obrigação,

aqui entendida como sendo aquela que atribui à responsabilidade uma

natureza processual, ou seja, de sujeição do patrimônio do devedor aos atos

coativos e expropriatórios da execução forçada, e deve estar conexa à anterior

situação da responsabilidade referente ao direito substancial.

Ficam, evidentemente, fora desses parâmetros as pretensões ou

responsabilidades exclusivamente processuais, como as decorrentes de

cautelares ou de má-fé desenvolvida pela parte no curso da demanda.

A pretensão se relaciona ainda com a exceção e com a prescrição. E o

ponto de contato com este último instituto é o que mais guarda pertinência com

a proposta deste trabalho. Convindo mais uma vez com André Fontes, temos

que a exceção pode estar em sentido material e em sentido processual, e em 22

As legis actiones compreendiam declarações perante o magistrado, revestidas de solenidade, a respeito do objeto da querela. Não havia exposição de fundamentos de fato ou causa petendi. O magistrado cingia-se a verificar se os atos das partes eram legais e tentar conciliá-las por meio dos pacta. Não lograsse sucesso a sua tentativa, cumpria-lhe remeter os contendores a um Juiz, cuja escolha ficaria a cargo das partes. Com efeito, sustenta José Marcos, que eram cinco as legis actiones: legis action sacramento; legis actio per iudicis postulationem; legis actio per condictionem; legis actio per manus iniectionem e legis actio per pignoris capionem, sendo que a primeira ocupa o lugar de procedimento comum, sempre que a lei não indicasse outra; a segunda era prevista na Lei das XII Tábuas para os créditos originários da stipulatio (promessa solene) ou para a partilha hereditária, sendo estendida pela Lex Licinia às divisões de coisa comum; a terceira foi criada pela Lex Silia para os créditos de 'certa pecunia' ou quantia certa e foi estendida pela Lex Calpurnia aos créditos de 'certa res' (coisa certa); a quarta modalidade havia contra o iudicatus, quem já condenado a pagar uma quantia, sendo a matriz da execução, só que ainda sobre a pessoa e não sobre o patrimônio do executado e, por fim, a legis actio per pignoris capitionem, que rendia ensejo ao apossamento de coisas do devedor, sem a necessidade do magistrado autorizar o credor (VIEIRA, 2.002, p. 6-10). 23

Nesse sentido, CARNELUTTI, Francesco. Processo di esecuzione. Cedam. Pádua. 1.929, p. 101.

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qualquer caso o seu emprego pressupõe a condição de demandado. A

exceção em sentido substancial, ou seja, como contra-direito é o meio

autônomo com que se tende a neutralizar a pretensão. Em sentido processual,

é o meio com o qual o demandado se defende, opondo algo a que se fez valer

por meio de uma ação, seja negando as alegações iniciais, seja introduzindo

novos fatos para que o Juiz leve em conta, dentro da ampla discursividade que

o processo constitucionalizado deve assegurar.

Qualquer que seja o ambiente em que isso ocorre, a exceção não deixa

de ser um direito potestativo24, de maneira que o legitimado para argüir a

exceção contra uma pretensão deduzida bastará exercer esse direito em

direção ao pretendente. Ela não tem influência na substância da pretensão

deduzida, que não se extingue nem mesmo com a ocorrência da prescrição.

Várias são, entretanto, as concepções sobre as quais podemos perceber

a pretensão. Sob o ponto de vista subjetivo, temos a subordinação de alguém

ao interesse alheio, mas na linha carnelutiana não só não seria direito

subjetivo, como também sequer pressupõe direito subjetivo, pois pode ser

deduzida tanto por quem tem, quanto por quem não tem direito. Assim, se

houver inadimplemento poderá o titular exigi-la, até que a prescrição seja

argüida ou declarada de ofício. A partir daí não haverá a possibilidade de exigir,

mas continuará a existir o direito subjetivo.

Também poderá a pretensão ser vista como um ato jurídico. Destarte

seria um ato, ou seja, algo que se faz e não que se encontra à disposição. Vale

dizer: mera manifestação de vontade. Entretanto, é inegável, o ato resulta de

uma manifestação de potestade, que é sua causa imediata.

Buscando um pouco mais de pragmatismo, encontramos na obra de

José Marcos Rodrigues Vieira, onde este comenta trabalho de Nelson Luiz

Pinto, a objetividade que convém para a compreensão do instituto. Assim esta:

24 Sobre os direitos potestativos, e aí com total pertinência com a categoria jurídica da pretensão, convém deixar claro que potestativos são os direitos exercitáveis mediante os quais determinadas pessoas podem influir, com uma declaração de vontade, sobre situações jurídicas de outras. São direitos insuscetíveis de violação, pois a eles não corresponde qualquer prestação. Se exercitáveis através de simples declaração de vontade do titular, são direitos potestativos puros. Independem, inclusive, de acesso aos tribunais, com numa revogação de mandato. Outros direitos potestativos são exercitáveis também mediante a vontade do titular, mas com exigência judicial em caso de resistência (não em relação ao conteúdo do direito, mas somente quanto à sua forma de exercício extrajudicial). A via judicial é exercitada subsidiariamente, como numa dissolução de sociedade. Por fim, há aqueles que somente podem ser invocados mediante o exercício obrigatório do direito de ação, onde não há campo para disponibilidade, pelo que, mesmo que o sujeito passivo aceite que o direito seja exercitado extrajudicialmente, isto não poderá ocorrer, pois, em verdade, visa a lei a conceder maior segurança para determinadas situações jurídicas, cuja alteração tenha possíveis fortes reflexos na ordem pública. As ações serão, portanto, constitutivas, como por exemplo numa anulatória (GAGLIANO & PAMPLONA FILHO, 2.002, p. 486/487).

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“A nosso ver, tanto a prescrição quanto a decadência vão

atingir, diretamente, o fundamento de uma pretensão

processual. O que seria, então, o fundamento de uma

pretensão processual? Em certa medida, podemos dizer

que o fundamento de uma pretensão processual é a

materialização do que se costuma chamar de 'pretensão

de direito material', seria a vontade interna do sujeito

titular do direito material expressada em forma de

fundamento de uma pretensão processual”.

E prossegue, tratando a pretensão com a espontaneidade conveniente:

“Não falamos em 'pretensão de direito material', apesar de

reconhecermos que essa expressão é utilizada pela

maioria dos doutrinadores. Esta, para nós, não existe

como realidade no direito brasileiro. É apenas uma

realidade do pensamento, uma vontade interna, está na

mente daquele que tem um direito subjetivo. Nada pode

atingi-la, molestá-la. Essa vontade interna do sujeito só

passará a ter relevância jurídica, quando servir de

fundamento para a dedução, em juízo, de uma pretensão

processual. Somente enquanto fundamento de uma

pretensão poderá ela ser atingida, molestada, o que pode

ocorrer através da prescrição...”.

Não menos lúcida é a sua conclusão, cuja transcrição se mostra também

valiosa:

“O que será atingido pela prescrição e pela decadência é

o fundamento da pretensão processual, a pretensão

fundada. Será atingido aquele elemento que,

processualmente, possibilitaria um julgamento de

procedência...”.

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Tais conclusões encaminham o fenômeno para uma situação pré-

processual, não obstante somente se verificar no processo, o que faz José

Marcos asseverar: “ora, pouca diferença da pretensão de direito material,

apenas que processualmente revelada ou em tanto que processualmente

revelada” (VIEIRA, 2.007, p. 108).

Discorrendo sobre a distinção entre direito e interesse, Vicente de Paula

Maciel Júnior, revela suas conclusões, cuja comparação ajusta-se à idéia que

aqui queremos expressar. Consoante o entendimento do mesmo, temos que:

“... existem interesses que são de qualidade diversa, por

apresentarem conotação jurídica. Sofrem a apreensão

axiológica segundo a valoração predeterminada na

norma. São, na linguagem de Rodolfo de Camargo

Mancuso (1.988, p. 14), situados no plano 'ético-

normativo'. Esses interesses como uma possibilidade de

vantagem a ser atingida, tomados dentro de uma

perspectiva do direito material e desde que tenham sido

juridicamente regulados, são relevantes para o direito,

carecendo de proteção. Negada a satisfação dos

interesses juridicamente tutelados no plano material,

nasce o interesse de agir no plano processual. A relação

jurídica processual também exige para a sua formação a

existência do interesse. E a doutrina processual

(LIEBMAN, 1.985, p. 150-161) entende existir o interesse

quando há necessidade da tutela jurisdicional através do

processo”... (MACIEL JÚNIOR, 2.006, p. 46).

Se em termos objetivos a distinção não chega a ser tão revelante, como

a segura doutrina apontada e a jurisprudência raramente consegue perceber, é

insofismável que o instituto passa por crescente investigação, inclusive no

sentido de se reconhecer a pretensão como categoria de poder ou como

possibilidade jurídica, face aos efeitos processuais do fenômeno e, sobretudo,

ao modelo de Estado adotado pelo Brasil.

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A crítica que precisa ser colocada é no sentido de que o direito

processual, nacional e estrangeiro, em sua maioria, enxerga ainda hoje a

pretensão como um poder. Todavia, no âmbito do Estado Democrático de

Direito, o homem (titular da pretensão), não é mais o detentor do poder, que

passa a se estruturar nos espaços discursivos democraticamente estabelecidos

para que o processo se desenvolva legitimamente.

Enfaticamente coloca Vicente Maciel que: “é um erro da doutrina a

pressuposição de que os sujeitos têm poderes. A partir do deslocamento do

foco de atenção do sujeito para a norma a idéia de personificação de poderes

no sujeito se esvaziou. Os indivíduos, até mesmo o Estado, nas sociedades

que adotam o paradigma do Estado Democrático de Direito não possuem nem

podem possuir poder algum” (MACIEL JÚNIOR, 2.006, p. 117).

Não é só a transformação do poder e/ou da possibilidade que nos aflige.

Temos, assim, que a pretensão não pode mais ser vista como uma

faculdade ou uma aspiração, mas como um direito à veiculação da ação, com

amparo no inciso XXXV, do art. 5º/CF. Talvez até como uma categoria

diferenciada de poder (sob determinada perspectiva), face à possibilidade de

se exigir um comportamento. A situação antecedente, de meio pelo qual o

sujeito adimple a função a qual se propõe, define o poder, mas não a amplitude

da possibilidade contida na pretensão, nem esta em nossos dias. Sendo assim,

a pretensão nos moldes atuais há de ser vista como uma nova categoria

jurídica, desafiando a Filosofia do Direito e a Teoria Geral do Processo a nos

oferecer consistentes subsídios para que os cultores do direito, notadamente

do direito processual possam teorizar o fenômeno e seus efeitos, a fim de

explicá-lo ao mundo contemporâneo.

O grande problema a ser resolvido no Século XXI, é que as origens do

instituto da ação, da exceção e da prescrição foram concebidas levando-se em

consideração seus efeitos no âmbito do direito eminentemente privado.

Todavia, o ambiente onde tais efeitos se potencializam é de direito público,

porquanto processual. Assim, a acomodação harmônica fica prejudicada, assim

como a própria compreensão de tais institutos, sobretudo quando se pretende

percebê-los jungidos aos princípios que informam o Estado Democrático de

Direito.

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Nesse sentido, não é diferente com a pretensão. Com efeito, esse

fenômeno é identificado na obra de Riccardo Orestano e explicado por Vicente

de Paula Maciel Júnior. A transcrição é longa e parcialmente indireta25, mas se

justifica pela contundência de seus argumentos e pela precisão das idéias,

numa visão particularmente feliz do que aqui se quer expressar e do impacto

causado por tais fatos na ciência processual. Eis o posicionamento revestido

de esmerado acerto:

“A elaboração do direito privado entendido como sistema

de direitos subjetivos deu origem ao estudo sobre os

atributos da pessoa. A formação do direito público,

entendido como conjunto das normas de organização do

ordenamento político desencadeou o aprofundamento dos

estudos entorno do problema do Estado e da soberania.

(ORESTANO, 1.978, p. 21).

Para Orestano, como essa mudança de ponto de vista e

no desmembramento da unidade conceitual do direito

começa ‘o drama da ciência processual’.

A intenção de formar um sistema de direito privado

baseado no indivíduo e na atividade produtora de

conseqüências jurídicas leva gradualmente a uma cisão

entre o sistema de direitos (aqui entendido como sistema

de direitos subjetivos) e as normas processuais. As

normas de direito privado passam a ter maior importância

que as normas de direito público e do que a própria

atuação, a aplicação do direito” ORESTANO. 1.978, p.

21).

Convém explicitar que nem mesmo o Direito Civil, talvez o com maior

vocação privatística, hoje se alinha com o uso ilimitado ou irresponsável da

propriedade, objeto de sua maior expressão. Esta deve atender à sua função

25

Achamos importante uma vez mais justificar a citação parcialmente indireta, porquanto tão mal compreendida. O acesso à obra estrangeira, mesmo neste mundo globalizado, não é exatamente tranqüilo. Em segundo lugar, penso apreciável a interpretação levada a efeito pelo professor brasileiro. A busca de suporte para nossas idéias no direito estrangeiro é digna de elogios, todavia a valorização dos pesquisadores de nossa terra nos parece essencial.

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social e os interesses dos demais membros da sociedade, com integral

observância do direito público. E prossegue:

“O novo modelo de direito privado desencadeia uma

exclusão conceitual e material da matéria processual do

novo sistema. O processo passa a ser visto como um

conjunto de meios postos à disposição e a serviço dos

particulares para a tutela e a realização de situações e de

pretensões cuja existência e fundamento são

considerados pré-existentes e independentes do

momento em que se torna necessária a coação

(ORESTANO, 1.978, p. 22).

Particularmente forte é o ocorrido na ciência alemã na

segunda metade de Século XVIII e dos primeiros

decênios do Século XIX, quando na sétima edição das

Pandectas, em 1.928, Heise dá uma nova configuração à

obra, que possuía até então três volumes. Ele exclui um

de seus volumes que era dedicado ao estudo do direito

público e do processo, marcando cientificamente a

posição desse movimento que se vinha delineando na

Escola Alemã no sentido de reafirmar o primado do direito

privado e, em especial, do direito civil como seu veículo

de expressão (ORESTANO, 1.978, p. 22-23).

A partir de então e em face do movimento do direito civil

no sentido de estabelecer e sobrepor seus parâmetros

científicos, os demais ramos do direito também partiram

para uma auto-afirmação e a construção dos seus

padrões científicos. No processo cada vez mais se

acentua a tendência de uma construção teórica na qual se

separam os direitos materiais dos direitos processuais, o

que gera evidentes repercussões na construção dos

institutos processuais, notadamente na ação” (MACIEL

JÚNIOR, 2.006, p. 76-77).

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O texto nos conduz à percepção que a dificuldade em se compreender

os institutos mencionados, sendo que agora o que nos interessa é a pretensão,

consiste exatamente na mudança dos paradigmas nos quais os institutos se

suportam. O conceito de ação está em reconstrução, assim como a exceção

(sem se falar em seu conhecimento de ofício, fenômeno tipicamente

processual, que, conforme nossa conceituação importa num ato de lógica

jurídica) como não poderia deixar de ser, também a prescrição. A pretensão,

fenômeno bem mais recente, já concebido neste cenário mutante, nos clama

por novas reflexões.

Felizmente a teoria começa a responder a tais indagações, como

disposto nos dois capítulos seguintes, inclusive trazendo a prescrição para o

âmbito processual, com aplicação segundo os preceitos de ordem pública,

mitigando os deletérios efeitos do período de transição denunciados por

Riccardo Orestano e tão bem percebidos pelo professor mineiro.

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CAPÍTULO 2

A POSIÇÃO CIENTÍFICA DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE

Grande número de ordenamentos jurídicos, pelo menos no universo

denominado civil law, possui um código de direito material e outro de direito

processual, sendo que em alguns coexistem dois ou mais códigos desta ou

daquela espécie26.

A CLT é o melhor exemplo, mas nem sempre é fácil determinar a melhor

localização de tal ou qual dispositivo, e o legislador se deixa guiar muitas vezes

por critérios que variam de um país para outro27, ou que colocam em plano

inferior as preocupações de índole científica. Daí a ocorrência de intromissões

e de superposições: regras pertinentes ao direito civil insinuam-se em códigos

processuais, ou vice-versa (a doutrina chama-lhes de heterotópicas), ou então

certos assuntos se vêem tratados a um só tempo na CLT, no NCC e no CPC

(MOREIRA, 2.002, p. 111 e 112).

Como todas as matérias tratadas nos diplomas apontados são

infraconstitucionais, resolvidas no plano da legislação ordinária federal, sob o

ponto de vista da legalidade, não importam em contundente problema formal. A

questão é que todas essas normas tencionam se protrair no tempo, e

considerando-se as alterações sociais, econômicas, científicas, técnicas e

éticas, seus textos passam a exibir sinais de fadiga. E deixando de

corresponder aos anseios da sociedade, inúmeras leis extravagantes

emergem, algumas delas criando verdadeiros micros sistemas, que não se

acomodam com adequado ajuste ao diploma central regente da matéria28.

26 Cf. item 10.1, do Capítulo 10, sobre o direito processual argentino. 27 Na Itália, por exemplo, encontram-se numerosas disposições acerca das provas no Codice Civile, e todo um capítulo consagrado à Tutela giurisdizionale dei diritti, onde se cuida das sentenças constitutivas, da coisa julgada material e seus limites subjetivos. E ainda em parte considerável, da execução forçada. A questão da classificação das normas em materiais e processuais suscitou, naquele país, debate doutrinário, no qual sustentou DENTI, com a apoio, em substância, de CAPPELETTI, que os problemas concretos de aplicação da lei deveriam resolver-se à luz de critérios não necessariamente fundados na atribuição das regras sobre prova a um ou a outro daqueles ramos da ciência jurídica: vide, do primeiro autor, o relatório apresentado ao VIII Simpósio Nacional da Associazione italiana fra gli studiosi del processo civile, de 1.983, p. 263 e ss.; do segundo, o texto da intervenção no mesmo Simpósio, publicado, sob o título Un avenimento metodologico, in: Processo e ideologie, Bolonha, 1.969, p. 253 e ss. 28

Exemplo disso é o prazo para embargos pela Fazenda Pública no processo do trabalho, pois a CLT trata a matéria em seu artigo 884, fixando o prazo em 5 (cinco) dias. Não faz qualquer menção aos embargos opostos pelos órgãos públicos e como inexiste omissão, não há de se falar em aplicação subsidiária do CPC. Entretanto, como este também dispõe de regra expressa, há quem entenda está a matéria disposta no art. 730/CPC, com o prazo de 10 (dez) dias para a interposição. E não fosse o bastante, vem o artigo 1º-B, acrescentado à Lei 9.494/97 pela MP 2.180-35/2.001, de constitucionalidade duvidosa, eis que a matéria não encerra a urgência capaz de justificar a edição de uma Medida Provisória, e ainda dispõe sobre a matéria de um terceiro modo.

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Sendo assim, questões pontuais e que transcendem ao campo de

aplicação de determinada disciplina, apesar do entendimento da unidade do

direito a partir de matriz constitucional, para efeito metodológico de

compreensão do fenômeno, melhor estariam acomodadas junto à Teoria Geral

do Direito, como é o caso da prescrição, cuja abrangência suplanta os

contornos do direito material. E pela mesma razão, melhor estaria também a

prescrição intercorrente posta no âmbito da Teoria Geral do Processo, na

medida em que transborda sua atuação para todo o direito processual, e não a

este ou aquele seguimento.

2.1. Na Teoria Geral do Direito

Por tudo quanto o exposto, pensamos não haver mais dúvida que o

instituto da prescrição se ajustaria adequadamente no âmbito da Teoria Geral

do Direito, porquanto a esta cabe a perspectiva de uma observação abrangente

das instituições jurídicas em todos os seus aspectos, buscando traçar

definições de conceitos que possam ser aplicados a todas às áreas do direito.

Não é o que se constata nos dias de hoje29, lamentavelmente.

Várias obras deste fabuloso seguimento jurídico foram consultadas, e o

fenômeno da prescrição não estava contemplado.

O tempo, percebido pelos sentidos e pela consciência, é versado, assim

como a prática dos atos jurídicos nas teorias, entretanto, a prescrição

propriamente dita não.

Parece-nos oportuno deixar de registrar as obras consultadas, por dupla

razão: primeiro porque nada acrescentaria, face à ausência de considerações

em torno do tema, e segundo para não expor desnecessariamente seus

autores, porquanto a proposta aqui lançada, de nova sistematização do

instituto da prescrição é efetivamente nova, não havendo de se censurar quem

29

Outro não é o entendimento de Bruno Resende Rabelo, que dedicou sua dissertação de mestrado ao tema, concluindo que: “À semelhança dos demais temas contemplados na Parte Geral do Código Civil, prescrição e decadência não são temas que se limitam ao campo do Direito Civil ou mesmo ao do Direito Privado. Sua inserção no diploma civilista fez com que os cursos de direito, de um modo geral e por todo o Século XX, os estudassem nos programas de Direito Civil e não, como nos parece mais apropriado, na disciplina Teoria Geral do Direito ou naquelas afeitas ao Direito Processual, já que é no processo que a prescrição produzirá efeitos” (RABELLO, 2.005, p. 1).

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escreveu noutro tempo. Tomara que em novas edições tal realidade seja

também objeto de pesquisa, com a conseqüente incorporação.

2.2. Na Teoria Geral do Processo

Como se constata, a prescrição intercorrente é um instituto que

transcende o campo de aplicação especializado do direito processual, razão

pela qual, metodologicamente deve integrar a Teoria Geral do Processo.

Inexplicavelmente os tratadistas raramente se ocupam de tal mister.

Com efeito, em pesquisa formulada junto aos mais festejados processualistas

não foi encontrada qualquer menção direta ao tema. Todavia, face à natureza

processual de nossa busca, procedemos a um exame mais acurado nesta

área.

No âmbito da Teoria Geral do Processo, os autores abordam

incidentalmente o tema quando tratam da exceção, ou quando querem

distinguir algum instituto.

Nesse sentido, Manuel Galdino da Paixão Júnior, se refere à prescrição,

mas não para conceituá-la ou inseri-la como objeto de estudo da Teoria Geral

do Processo, mas sim para distinguir o instituto da prescrição, da ação.

Teve, contudo, a grandeza de definir a prescrição30. E o fez com a

objetividade que o caracteriza. Diz certeiro, que: “prescrição é a perda da

pretensão” (PAIXÃO JÚNIOR, 2.002, p. 94).

Rosemiro Pereira Leal aborda o tema ao dispor das exceções,

salientando que o CPC reservou o termo exceção, numa compreensão

terminológica, às exceções incidentes, também chamadas de instrumentais

(art. 304 e ss./CPC). E aí, explica que:

“Distinguiu o CPC, sem discerni-los, dois institutos:

contestação e exceção, quando, a rigor, esta é gênero

contestatório e aquela simples espécie de defesa. 30

Na referida obra diz mais, que as pretensões de efeitos imediatos predominantemente declaratórios são imprescritíveis, ob. cit. p. 95. Todavia, mesmo em tais demandas, convém acrescer: há incidência da prescrição intercorrente.

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44

Invertidamente o CPC inseriu as defesas contra a

formação do processo e contra o mérito, sejam diretas,

indiretas, processuais (dilatórias ou peremptórias) ou

mesmo substanciais (prescrição e decadência), e

rotulando de exceções as meramente incidentais-

instrumentais (art. 299) constantes de alegações de

incompetência, impedimento ou suspeição... omissis ...

Para nós, cumpre ressaltar que via excepcionis é toda

matéria de defesa, inclusive a reconvenção que visa

excluir a pretensão do autor por dedução de direito

contraposto...” omissis ... Em existindo uma ação em

andamento (procedimento) contra alguém, resta evidente

que é a exceção forma de exclusão da ação, mesmo que

se emprestem à exceção vestimentas nomenclaturais ao

sabor de sistemáticas processuais variadas. Para a

reflexão que aqui colocamos, o instituto da defesa

extravasa os conceitos regulamentares do CPC para,

frente à Constituição vigente, assumir excetividade plena

pelo contraditório e ampla defesa, como fundamento do

Estado Democrático de Direito” (LEAL, 2.004, p. 177).

Consoante o pensamento revelado, fica evidente que para o autor

mencionado, a prescrição é exceção, bem como que o seu conhecimento de

ofício deve ser precedido do indispensável contraditório.

Traz ainda uma contribuição marcante, pois percebe o instituto da

prescrição como um fenômeno de direito processual (tal como aqui defendido,

entretanto no tocante à prescrição intercorrente), destacando ainda o referido

autor o caráter institucional, como na passagem abaixo transcrita.

Sua clareza é magistral. Assevera em sua Teoria Geral do Processo

que:

“A prescrição e a decadência, no entanto, são institutos

do direito processual, porque a perda do prazo de

exercício de direito só é aferível pela declaração

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jurisdicional, não se operando pleno-jure. A lei não

impede que alguém, a pretexto de perda de direitos pela

fluência do tempo legal indicado na norma in-abstrato,

ingresse em juízo para pleitear tais direitos, embora saiba

da impossibilidade de sentença favorável, porque o

direito-de-ação , como direito de movimentar a jurisdição,

é incondicionado, imprescritível e não suscetível de

decadência, tal como se lê no art. 5º, XXXV, CR/88” –

grifos do original (LEAL, 2.001, 168).

A perquirição chegou à obra clássica de Antônio Carlos de Araújo Cintra,

Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco. Sobre prescrição, como

aventado, nada há objetivamente. Entretanto, na abordagem sobre a exceção,

podemos colher relevante posicionamento sobre o tema.

Assim o pensamento deles está exposto:

“... fala-se da exceção do réu no sentido de contradizer.

Exceção, em sentido amplo, é o poder jurídico de que se

acha investido o réu e que lhe possibilita opor-se à ação

que lhe foi movida. Por isso, dentro de uma concepção

sistemática do processo, o tema da exceção é

virtualmente paralelo ao da ação... omissis ... O autor,

através do exercício do direito de ação, pede justiça,

reclamando algo contra o réu; este, através da exceção,

pede justiça, solicitando a rejeição do pedido. Tanto como

o direito de ação, a defesa é um direito público subjetivo,

constitucionalmente garantido como corolário do devido

processo legal e dos postulados em que se alicerça o

sistema contraditório do processo. Tanto o autor,

mediante a ação, como o réu, mediante a exceção, têm

um direito ao processo” (CINTRA et alli, 1.991, p.

241/242).

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Assim como nas demais obras, em Ovídio Baptista da Silva, o tema da

prescrição é abordado quando se fala nas exceções substanciais, onde o

mestre de tantas gerações exibe o vigor de seu raciocínio:

“Pode, no entanto, acontecer que o direito e a ação

existam, mas alguma circunstância exterior faça com que

a ação tenha sua eficácia suspensa ou, até mesmo,

modificada ou extinta. Pense-se no que acontece quando

ocorre a prescrição da ação. O direito que teve prescrita a

respectiva ação não desaparece; continua a existir,

apenas destituído de acionabilidade. O credor de uma

dívida prescrita continua credor, de tal modo que, se o

devedor lhe pagar, o pagamento é válido e não pode ser

repetido. Da mesma maneira, embora não sendo

acionável o crédito, justamente por ter havido a prescrição

da ação, o credor poderá opô-lo, como defesa, para

compensá-lo com o eventual crédito contrário que seu

devedor tiver contra si. Essas duas manifestações da

existência do direito que teve prescrita sua ação

demonstram que a prescritibilidade é algo exterior ao

direito e a própria ação, no sentido de que pressupõe a

permanência do direito e o ter existido, íntegra, a ação.

Ação que prescreveu foi a ação que existiu, regularmente

formada por todos os seus elementos” (SILVA, 2.002, p.

276).

Temos, assim, quatro das teorias do processo mais conhecidas do País

e o pensamento de seus autores em torno da prescrição. Não como instituto

próprio, a exceção de Rosemiro Pereira Leal, mas como exceções

substanciais, sendo que sobre a prescrição intercorrente propriamente dita,

fenômeno exclusivamente processual, nada foi visto. Encontra-se ainda

totalmente incompreendido.

Tomara que com o alerta agora feito, este tema tão importante para a

ciência processual, não só pelos seus efeitos, mas também como instituto

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genuíno e que deita seus efeitos de modo avassalador sobre a pretensão,

outro fenômeno tipicamente processual, possa cair no gosto dos

processualistas.

2.3. Conceito de prescrição intercorrente

Os institutos de direito derivam, basicamente, de fenômenos sociais.

Importam em dados e valores culturais que vão pouco a pouco se

sedimentando e buscando suporte no plano teórico.

Nesse contexto, não é possível precisar a origem do instituto da

prescrição intercorrente. Traços legislativos como os indicados no capítulo

seguinte servem de ensejo, bem como a jurisprudência indicada adiante,

inclusive com os precedentes que suportam as súmulas hoje existentes, que

serviram de inspiração. Todavia, a própria Teoria Geral do Processo consiste

num fenômeno recentíssimo, quanto mais o instituto em exame.

Deve ser considerada ainda a superposição de normas e a ausência de

doutrina cientificamente estruturada, em quaisquer dos ramos jurídicos que se

envolvem com a prescrição.

Neste trabalho, vimos firme atuação do instituto em vários campos, e,

paradoxalmente, total carência metodológica da Teoria do Direito e na Teoria

do Processo. Isso induz à percepção de outro fenômeno contemporâneo, da

interpenetração de seguimentos distintos, a partir de disposições filosóficas e

constitucionais, revelando a necessidade de construções teóricas capazes de

explicar tais fatos31.

Há de se considerar ainda que, no Estado Democrático de Direito, a

construção do provimento jurisdicional é plural, envolvendo legislador, Juiz e

partes, os quais, dentro de um espaço discursivo, com amplo contraditório,

onde os institutos de direito material e processual se complementam para a

formação do provimento. Este acentua características ora de um seguimento e

ora de outro, tudo com o escopo de melhor atender aos jurisdicionados.

31

Importante considerar o deslocamento da prescrição do direito privado para o público, nos moldes expostos no capítulo anterior e nos primeiros tópicos deste.

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48

A conclusão é que o conceito de prescrição está em transformação,

enquanto o conceito de prescrição intercorrente encontra-se em fase de

elaboração. Destarte, partimos da contribuição dado por aqueles que

escreveram sobre o assunto até aqui, para efeito de levantamento, e, ao final,

agregamos mais um.

Vejamos.

José Manoel Arruda Alvim, diz que:

“A chamada prescrição intercorrente é aquela relacionada

com o desaparecimento da proteção ativa, no curso do

processo, ao possível direito material postulado,

expressado na pretensão deduzida; quer dizer, é aquela

que se verifica pela inércia continuada e ininterrupta no

curso do processo por seguimento temporal superior

àquele em que ocorre a prescrição em dada hipótese”

(ALVIM, 2.006, p. 34).

Na percepção de Bruno Resende de Rabello:

“A prescrição intercorrente constitui modalidade de

prescrição qualificada pela especial circunstância de se

consumar durante o curso de um processo judicial movido

pelo titular da pretensão” (RABELLO, 2.005, p. 23).

Demonstrando seu entendimento sobre o tema, Arnor Serafim Junior,

afirma que:

“A doutrina e a jurisprudência consagram o uso da

expressão ‘prescrição intercorrente’, para designar aquele

tipo de prescrição que se caracteriza pela fluência do

prazo respectivo durante o curso da relação processual e

que possui estribo legal no parágrafo único do art. 202 do

Código Civil, segundo o qual ‘a prescrição interrompida

recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou

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do último ato do processo para a interromper” (SERAFIM

JUNIOR, 2.006, p. 84).

Finalmente, diante da pesquisa levada a efeito, podemos concluir que a

prescrição intercorrente é um instituto de direito processual, que importa na

ineficácia do exercício da pretensão em decorrência da inatividade do

demandante em efetivar atos processuais de sua alçada exclusiva, por prazo

superior ao que lhe foi consagrado para deduzir a pretensão em juízo.

2.3.1. Prescrição intercorrente em fase de conheci mento: uma

proposta de lege ferenda

A prescrição decorre de dois fatos bem objetivos: o passar do tempo e a

inatividade de quem busca a satisfação de sua pretensão32. E sua admissão na

fase de execução é uma realidade. Há amparo doutrinário, jurisprudencial, e

mais recentemente até mesmo no direito positivo, conforme já explicitado.

A soma dos fatores alinhados faz emergir um fato processual relevante,

que conduz à extinção da execução, embora a declaração de prescrição

intercorrente não seja uma das hipóteses constantes do art. 764/CPC, de

aplicação supletiva no processo do trabalho, sem qualquer objeção33.

Diante disso, o reconhecimento de que se trata de modalidade extralegal

de extinção da execução parece inexorável. E tão bem aceito quanto isso, o

fato de que o passar do tempo aliado à inatividade do demandante, em fase de

conhecimento, faz emergir também a figura jurídica do abandono da causa,

tipificada no inciso III, do art. 267/CPC, na qual a demanda é extinta sem

resolução de mérito quando o autor não promover os atos e diligências a seu

cargo.

32

O transcurso do tempo é algo intrínseco à própria vida, deitando seus efeitos no mundo jurídico, inclusive processual. E, nesta seara, quando se alia à falta de iniciativa do detentor da pretensão, os ônus decorrentes estão por toda parte. Na prescrição, inciso XXIX, do art. 7º/CF e no art. 11/CLT; na preclusão, artigos 183 e 473/CPC; na perempção, nos artigos 731 e 732/CLT, bem como no art. 836/CLT. São institutos que não se confundem, entretanto projetam seus efeitos em decorrência do mesmo fato. 33

Art. 794/CPC. Extingue-se a execução quando: I – o devedor satisfaz a obrigação; II – o devedor obtém, por transação ou por qualquer outro meio, a remissão total da dívida; III – o credor renunciar ao crédito.

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Tal situação jurídica decorre da preclusão34, que é um importante fator

de estruturação do procedimento, pois, no dizer do já referido José Marcos

Rodrigues Vieira, “o processo é uma estrutura progressiva de preclusões”

(VIEIRA, 1.998, p. 91), onde a preclusão emerge como perda de uma

possibilidade processual no curso da demanda, ou ainda no dizer de

(CHIOVENDA, 1.993, p. 233), consiste numa “perda, extinção ou consumação

de uma faculdade processual”, ou ainda, segundo o comando constante do

artigo 183/CPC, para o qual decorrido o prazo, extingue-se,

independentemente, de declaração judicial, o direito de praticar o ato, salvo se

a parte provar que assim procedeu por evento alheio à sua vontade. E embora

este fato jurídico não seja habitualmente consagrado como uma modalidade de

prescrição intercorrente, em gênese outra natureza jurídica não tem, pois pode

induzir numa inaptidão ao exercício eficaz da pretensão, como adiante exposto.

Sua pertinência com o objeto deste estudo é tanta, que Luiz Guilherme

Marinoni, ao discorrer sobre a preclusão, aduz:

“... como se observa, a preclusão consiste – fazendo-se

um paralelo com as figuras de direito material, como a

prescrição – na perda de 'direitos processuais', que pode

decorrer de várias causas. Assim como acontece com o

direito material, também no processo a relação jurídica

estabelecida entre os sujeitos processuais pode levar à

extinção de direitos processuais, o que acontece, diga-se,

tão freqüentemente quanto nas relações jurídicas de

direito material. A preclusão é o resultado dessa

extinção...” (MARINONI, 2.006, p. 624).

Como se percebe, ontologicamente, os atos são semelhantes, e, por

esta razão, os efeitos jurídicos deles decorrentes também. Por isso, não podem

ser díspares, apesar da prescrição intercorrente declarada na fase de

execução conduzir à extinção da execução, enquanto o abandono da causa, na 34 Convém destacar, porquanto passa sem a devida atenção pelos doutrinadores, que a preclusão é um instituto da maior importância para o processo desenvolvido no Estado Democrático de Direito, pois “... é a maior garantia que têm as partes de que a estrutura do procedimento não pode ser alterada ou anulada por atos de arbítrio, conveniência, revisão, retorno, reabertura, cancelamento, recomeço, senão pelos modos que a lei rigorosamente dispuser”. (LEAL, 2.001, p. 167).

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etapa inicial do processo acarreta, de lege lata, apenas à extinção sem

resolução de mérito.

Em comum o fato de que ambas as figuras importam em extinção da

demanda. Vejamos, contudo, o efeito temporal noutros institutos,

estabelecendo também semelhanças a fim de viabilizar a tese a ser proposta.

Façamos uma analogia com o instituto da coisa julgada. Em princípio

totalmente distinto da prescrição intercorrente, entretanto, tanto um quanto

outro podem ser argüíveis como exceção, bem como conhecidos ex officio.

A fim de vivificar mais a imagem, tomemos como exemplo o inciso V, do

art. 267/CPC, para o qual a coisa julgada é motivo de extinção do processo,

sem resolução de mérito, carecendo de alegação da parte, enquanto pela regra

do § 1º, do art. 301/CPC, o mesmo instituto pode ser declarado pelo

magistrado independente de provocação.

A doutrina mais abalizada também percebe pontos de tangência entre os

dois institutos. Com efeito, o magistério seguro de Eduardo Talamini, que

destaca:

“A preclusão e a coisa julgada são institutos

inconfundíveis ainda que em parte inspirados nos

mesmos princípios (segurança jurídica, proteção da

confiança...): a preclusão apenas opera internamente ao

processo; a coisa julgada projeta-se para fora da relação

processual em que se formou. A preclusão destina-se a

conferir segurança e previsibilidade ao jurisdicionado e

eficiência à máquina jurisdicional35, no curso do processo.

Liga-se à garantia do devido processo legal, no sentido de

processo razoável. A coisa julgada inspirada em

semelhantes valores, visa preservar o resultado da

atuação jurisdicional” (TALAMINI, 2.005, p. 132).

35

Outro não é o motivo da prescrição intercorrente.

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Naturalmente que, sob rígida observação há de se considerar que a

extinção do processo neste último caso é com resolução de mérito, enquanto

no abandono da causa seria sem esta.

Destarte, por ora, precisamos apenas ter em mente que a preclusão e a

prescrição intercorrente são institutos jurídicos que objetivam a duração

razoável do processo e o exercício do direito posto à disposição em tempo

adequado, respectivamente no e por meio do processo. A discrepância está na

origem, intra-processual na preclusão, enquanto pré-processual a da

prescrição – mais que, sintomaticamente pode ser retomada intra-

processualmente. Todavia, face à dimensão dada pelo Novo Código Civil à

pretensão, a aproximação é maior, vez que a prescrição só se interrompe uma

só vez, conforme literal disposição do caput do artigo 202/NCC.

Retomemos o primeiro exemplo. Se na fase de conhecimento a parte

que abandona a causa tem o feito extinto sem resolução de mérito, tal decisão

fará coisa julgada apenas formal, permitindo que a demanda seja novamente

proposta. Entretanto, a interrupção da prescrição, derivada do despacho do

Juiz que ordenou a citação já terá produzido seus efeitos jurídicos na demanda

anterior. Curioso será que, quando da renovação da instância, pudesse dar-se

nova ordem de citação sem eficácia interruptiva (já que teria ocorrido uma vez).

Haveria, então, uma segunda oportunidade de eficácia interruptiva? Ou a

extinção sem resolução de mérito apagaria o primeiro efeito, devolvendo a

situação ao momento da violação do direito, regido pelo artigo 189/NCC,

passível de interrupção prescricional, já pelo novo ajuizamento, por única vez?

Para a resposta tem-se de considerar que é da tradição do Direito Civil

brasileiro, como observa Câmara Leal36, que, qualquer que seja o resultado da

demanda – procedência ou improcedência, ou mesmo extinção sem resolução

de mérito a eficácia interruptiva permanece mantida, sendo retomado o curso

da prescrição após o último ato do processo, considerado hábil a interrompê-la.

E que, tratando-se de pretensão diversa, haveria a integralidade do respectivo

prazo, a contar daquele último ato do processo anterior.

Confirma-o, de modo mais claro, o Novo Código Civil. Não se pode

sustentar o curso pelo remanescente de prazo já interrompido, se para a

36

“... que a prescrição perdura desde a propositura até o último ato da ação, mesmo se julgada improcedente ou extinta sem julgamento de mérito...” (LEAL, 1.959, p. 197).

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mesma pretensão. E, a se considerar o reingresso em juízo (sob os mesmos,

pedido e causa de pedir), após o abandono da causa a nova ordem de citação

não poderia gerar nova interrupção prescricional. Se for verdadeiro que a

interrupção prescricional é única a cada pretensão, o reingresso em juízo com

a mesma demanda (mesma pretensão) não poderia, sob qualquer

interpretação, ensejar nova eficácia interruptiva.

Eis porque cogitando da prescrição intercorrente durante a cognição

preferimos sugerir que o julgador não mais extinga o processo na hipótese de

abandono da causa pelo autor. Deverá mantê-lo arquivado provisoriamente,

enquanto não se ultime o prazo prescricional, que terá seu curso retomado por

inteiro a contar do momento em que exigido o comparecimento pessoal da

parte ou de sua intimação a tomar as providências a seu cargo: será bastante

que decorra o lapso prescricional atribuído pelo direito material à pretensão,

para o pronunciamento, ex officio, da prescrição.

Mais ainda, se considerarmos que, para a interrupção da prescrição no

processo do trabalho basta a simples distribuição, eis que não há momento

formal para a deliberação acerca da citação, sendo o ato de chamamento do

réu para se defender no processo praticado automaticamente pela Secretaria

da Vara, mais fácil será o seu desate. Isso porque, uma vez distribuída a

demanda ficam as partes definitivamente cadastradas no sistema de

distribuição. Assim, havendo nova propositura, fato perfeitamente possível

diante da motivação da extinção da demanda por abandono da causa, o novo

feito judicial irá invariavelmente para a mesma unidade jurisdicional que

primeiro conheceu da demanda, na medida em que haverá identidade de

partes, e, portanto, prevenção.

Isso já acontece ordinariamente em todos os foros informatizados, a fim

de assegurar o princípio do Juiz Natural, impedindo que a parte escolha o

julgador que quer para apreciar seus pedidos, o que, como decorrência, ainda

dá azo a uma distribuição mais equânime de processos entre os Juízes. Esta

medida adotada pelos tribunais e referendada pelo CNJ – Conselho Nacional

de Justiça, sem qualquer oposição das partes, seus advogados, Ministério

Público ou OAB, fundamenta-se na inteligência do disposto no inciso II, do

artigo 253/CPC.

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54

Sendo assim, objetivando tomar a justiça mais célere e eficaz, todavia

sem perda de eficiência ou das garantias constitucionalmente asseguradas, a

proposta que se faz, de lege ferenda, é que havendo o abandono da causa, em

vez de a mesma ser extinta sem proveito algum, com perdas e custos para

todos, fique apenas arquivada com integral avanço do prazo prescricional,

interrompido pela única vez possível por meio da distribuição ou citação,

dependendo do âmbito do dissídio.

Melhor explicando: considerando-se que não há mais a figura jurídica da

supressão de instância; que a distribuição ficará permanentemente apontada

no respectivo fôro; que havendo identidade de partes e de pretensão deduzida,

a demanda será conduzida para o mesmo julgador; que a primeira distribuição

já terá interrompido a prescrição pela única vez possível, a solução mais hábil

para o processo é o simples arquivamento por prazo igual ao assegurado

legalmente para o exercício do direito eficaz de ação, nos moldes da Súmula

150/STF.

A proposta ora apresentada é no sentido de que, havendo o abandono

da causa na fase de conhecimento, em vez de extinção sem julgamento do

mérito, com a possibilidade de repetições, em total abuso de direito e em

infringência à garantia constitucional da procedimentalidade em tempo

adequado37, a chamada duração razoável do processo, fundamentada no

inciso LXXVIII, do art. 5º/CF, seja o feito apenas arquivado provisoriamente,

desde que a parte seja intimada previamente para dar andamento ao feito,

praticando ato de sua alçada exclusiva, e não o faça no prazo assinalado.

Abre-se então a contagem do prazo de prescrição intercorrente, o qual, uma

vez implementado, determinará a conclusão dos autos ao Juiz, a fim de que

este, também após a oitiva das partes, ou seja, abrindo espaço para o

contraditório, possa examinar se a prescrição intercorrente já se consumou,

ainda que em fase de conhecimento, da qual o processo jamais saiu. E se

37 Interessante notar que a busca do tempo adequado para o procedimento é um compromisso comum a todos os cultores do direito, surgindo propostas a cada instante. Luiz Otávio Linhares Renault, traz também a sua, com um mecanismo inédito. Propõe, também de lege ferenda: “... seria de bom alvitre e de largo efeito profilático se, no bojo de cada processo, as partes pudessem de antemão deduzir pedido declaratório e obter prévio e imediato pronunciamento sobre o eventual descumprimento da garantia constitucional referente a sua tramitação em prazo razoável, consoante prescrito no art. 5º, inciso LXXVIII, isto é, uma declaração simultânea à sentença ou ao acórdão, muito simples de ser proferida, atestando se o processo foi ou não, a partir de critérios objetivos, solucionado em prazo razoável, para fins de criteriosa, segura e firme atribuição de responsabilidade ao Estado pelos danos causados com o retardamento e que poderia ser apurada até mesmo executada nos próprios autos, assegurado o direito de regresso contra eventual responsável nos caos de dolo ou culpa, como previsto no art. 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal (RENAULT, 2.006, p. 475).

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positivo, a conseqüência será a extinção do processo, agora com resolução de

mérito, com base no § 5º, do art. 219/CPC, c/c o art. 769/CLT, harmonizando-

se a regra proposta com o direito processual e a correlata prescrição

intercorrente que se verifica, até aqui, apenas na fase de execução.

Nem se diga que a proposta afronta o princípio dispositivo, porquanto

este atribui às partes toda a iniciativa, seja na instauração, seja em seu

impulso.

Convém por em destaque que a disponibilidade da demanda foi

assegurada, todavia a parte se mostrou desidiosa, contrariando o interesse

público, sendo este manifestado por meio de atuação em tempo adequado por

parte do Poder Judiciário, em decorrência de inércia que somente pode ser

atribuída à parte, ou seja, esta que deixou de dar atuação ao princípio

dispositivo.

2.4. Distinção com a pretensão executória

A prescrição intercorrente é a que se verifica durante a realização do

processo, seja na fase de conhecimento, conforme proposta formulada no item

anterior, seja na fase executória, por abandono de quem deduz a pretensão ou

a executa, sempre que sua inércia não possa ser suprida pelo julgador. Já a

prescrição da pretensão executória38, no processo do trabalho, ocorre quando

o credor deixa escoar in albis o prazo de dois anos para dar início à busca da

satisfação do julgado39, nos moldes da Súmula 150/STF (integralmente aceita

38 Os tribunais superiores, às vezes, são induzidos a estabelecer tal distinção, como o fez o Tribunal Superior do Trabalho nos autos AIRR-1.808/1979-008-05-00, publicado no DJ de 11/11/05, sendo relevante destacar que é, inclusive, caso de admissão de RR, por violação direta à Constituição Federal, na medida em que o inciso XXIX, de seu art. 7º, trata expressamente de matéria prescricional. No julgado apontado, o Ministro relator assim se expressa: “... entendeu o juízo da execução que se tratava de prescrição intercorrente e considerando-se que a mesma é inaplicável no processo do trabalho afastou sua incidência. Data venia, assim não entendemos. É caso de aplicação da regra contida no art. 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal, estando irremediavelmente prescrita a promoção da execução... o caso não trata da prescrição intercorrente, que é aquela que acontece no curso da ação e decorre de inércia da parte. Assim, a argüição efetivada pelo demandado diz respeito à própria pretensão...”. 39

Bruno Rabello distingue, com acerto, tais fatos jurídicos, afirmando que “É importante deixar claro que não se pode considerar como intercorrente a prescrição da pretensão executiva, pois esta não se configura durante o curso de nenhum processo...”; e mais: “... outra prova incontestável de que se trata de nova pretensão pode-se extrair do art. 741/CPC que, ao enumerar as matérias que podem ser alegadas em sede de embargos à execução de título judicial, contempla a prescrição, desde que superveniente à sentença. Prescrição superveniente à sentença, passível de ser alegada em embargos, só pode ser prescrição da pretensão executiva, nunca a prescrição da pretensão que deu origem ao processo de conhecimento em que o título executivo se formou” (RABELLO, 2.005, p. 17).

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no campo de aplicação do Direito Processual do Trabalho), contados do dia

seguinte ao que foi cientificado do trânsito em julgado da decisão que constituiu

o crédito40.

Idem em relação à transação judicial devidamente homologada, diante

de sua natureza jurídica de decisão judicial com resolução de mérito, nos

termos do parágrafo único do art. 831/CLT, para o qual o termo que vier a ser

lavrado em virtude de conciliação vale como decisão irrecorrível, salvo para a

Previdência Social, quanto às contribuições que lhe forem devidas. Trata-se,

pois, de hipótese análoga à prevista no inciso III, do artigo 269/CPC.

Não é só o título judicial que dá ensejo a prescrição da pretensão

executória, porquanto são também títulos executivos perante a Justiça do

Trabalho, os TAC (termos de ajustamento de conduta) firmados perante o

Ministério Público do Trabalho e os termos de conciliação, estes formalizados

diante das CCP (Comissões de Conciliação Prévia), segundo o comando

insculpido no art. 876/CLT, e como tais, sujeitos à prescrição caso não tenha

sua execução iniciada dentro do biênio legalmente assegurado (artigo 11/CLT,

c/c o inciso XXIX, do art. 7º, da Constituição Federal).

O parágrafo único, do aludido artigo 876/CLT, com a redação que lhe foi

dada pela Lei 11.457/07, preceitua ainda que serão executadas ex officio as

contribuições sociais devidas em decorrência de decisão proferida pelos Juízes

e Tribunais do Trabalho, resultantes de condenação ou homologação de

acordo, inclusive sobre os salários pagos durante o período contratual

reconhecido.

Impõe-se seja considerada ainda a regra disposta no § 5º, do art. 475-

J/CPC, acrescentado pela Lei 11.232/05, pela qual: não sendo requerida a

execução no prazo de 6 (seis) meses, o Juiz mandará arquivar os autos, sem

prejuízo de seu desarquivamento a pedido da parte, por duas razões bem

objetivas. Primeiro porque dispõe sobre o tema em análise, e segundo porque

parte da doutrina processual do trabalho entende que tal norma tem atuação

nos feitos processados pela Justiça do Trabalho.

Nesta última regra quer parecer que o legislador fez apenas uma opção

de política judiciária, afastando da atuação do Juiz um processo no qual a parte * Precisa ficar claro que a consideração final foi levada a efeito antes da extinção da autonomia da execução no processo civil. 40

Súmula 150/STF: “Prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação”.

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não esteja demonstrando o interesse esperado por parte de quem obtém êxito

em demanda judicial, como quem pretende “liberar” o julgador para ocupar-se

com outros feitos, onde o cumprimento da sentença é verdadeiramente

almejado.

Andou mal, contudo. Esqueceu-se de que a execução é mera fase, bem

como do impulso oficial, consagrado na norma positivada, na doutrina e na

jurisprudência.

O comando legal comentado, contudo, em nada altera as conclusões

aqui estabelecidas, em relação à prescrição intercorrente. Isso porque,

havendo como o Juiz impulsionar a execução de ofício, sobretudo no processo

do trabalho, deverá assim proceder. Se o processamento depender de

iniciativa exclusiva da parte, deverá ser esta intimada para a realização do ato.

E, diante de sua inércia, arquivados os autos ou não, o prazo da prescrição

intercorrente se abrirá, contado do último ato processual praticado. Destarte,

eventual pedido de desarquivamento dos autos após o esgotamento do prazo

prescricional, efeito algum poderá produzir.

2.5. Prova da prescrição intercorrente

Há de se indagar, por fim, se há um meio adequado para a produção de

prova do implemento da prescrição intercorrente, sendo a resposta negativa.

Basta o simples confronto de datas, matéria que, por inteligência da norma

constante do inciso I, do art. 334/CPC, independe de prova41.

2.6. Interrupção da prescrição intercorrente

Nosso Código Civil destina toda uma seção às causas que interrompem

a prescrição. Embora derivem de fonte de direito material e a idéia deste

estudo é valorizar a percepção da prescrição enquanto fenômeno de direito

41

Convém lembrar, convindo uma vez mais com Vilson Alves, a necessidade do preenchimento de alguns requisitos, a saber: a) a possibilidade da pretensão; b) a prescritibilidade dessa pretensão; c) o transcurso do prazo prescricional, desde que não submetido às imunidades dos artigos 197 a 204/NCC, e d) o não exercício da pretensão (ALVES, 2.006, p. 80).

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processual, a essencialidade do exame normativo exige tal consideração. Isso

porque, há situações lá descritas que são exclusivamente processuais, atuando

como causas capazes de interromper a prescrição intercorrente.

Antes de pontuar os casos, não nos parece exagerado destacar, mais

uma vez, a interseção do direito preferencialmente privado (civil), com o direito

público (processual), o que ocorre pelas razões já expostas neste Capítulo. O

fato é que logo na primeira hipótese descrita na norma de direito material,

inciso I, do art. 202/NCC, temos como causa que interrompe a prescrição, o

despacho do Juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o

interessado a promover no prazo e na forma da lei processual.

Além da questão da tecnicidade, outro motivo não há para maiores

comentários, sobretudo porque a sistemática do Direito Processual do Trabalho

para a citação é outra, o que torna a norma em apreço, aqui, menos relevante.

Outros aspectos são mais próprios, como a assertiva constante do art.

203/NCC, no sentido de que a prescrição pode ser interrompida por qualquer

interessado, fator que legitima herdeiros e sucessores dos demandantes a

buscar, obviamente pela via judicial, a interrupção da prescrição intercorrente.

E numa interpretação extensiva, até mesmo credores do titular do crédito

exeqüendo poderiam se apresentar, quiçá, como interessados no impulso do

processo, desde que a paralisação tenha ocorrido por falta de ativação por

parte do interessado, em caso de iniciativa exclusiva, insuscetível de ser

suprida pelo impulso oficial, e desde que sejam aceitos como intervenientes no

pólo ativo.

A CLT garante tal possibilidade, ao preceituar no art. 878, que a

execução poderá ser promovida por qualquer interessado, ou ex officio...

Norma civil que guarda integral recepção no processo do trabalho, é a

que diz que a interrupção por um dos credores solidários aproveita aos outros,

assim como a interrupção efetuada contra o devedor solidário envolve os

demais e seus herdeiros.

A Consolidação das Leis do Trabalho não trata de causas interruptivas

da prescrição, seja na parte de direito material, seja na parte de direito

processual. A Súmula do TST, todavia, preceitua em seu verbete 268 que: a

ação trabalhista, ainda que arquivada, interrompe a prescrição somente em

relação aos pedidos idênticos.

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59

Esta é a única hipótese genuinamente trabalhista de interrupção da

prescrição, lembrando que a jurisprudência é fonte de direito, nos moldes do

art. 8º/CLT.

Não obstante, algumas normas de processo civil geradoras de

interrupção prescricional estendem seus efeitos no processo do trabalho, assim

como outras provenientes de legislação especial, como as constantes da Lei de

Recuperação Judicial e Falências – LRF, nº. 11.101/05.

Seguindo a orientação metodológica do CPC, temos a sistemática de

seu artigo 219, o qual, com as devidas adaptações, encontra campo fértil para

sua aplicação do processo do trabalho. O texto positivo assim estabelece:

Art. 219. A citação válida torna prevento o juízo, induz a

litispendência e faz litigiosa a coisa; e, ainda, quando

ordenada por Juiz incompetente, constitui em mora o

devedor e interrompe a prescrição (grifo nosso).

§ 1º. A interrupção da prescrição retroagirá à data da

propositura da ação.

§§ 2º. e 3º, omissis.

§ 4º. Não se efetuando a citação nos prazos mencionados

nos parágrafos antecedentes, haver-se-á por não

interrompida a prescrição (grifo nosso).

A norma disposta é absolutamente clara em seus propósitos, sendo

oportuno apenas acrescentar que os parágrafos omitidos referem-se aos

prazos nos quais a diligência citatória precisa ser efetivada para que tenha

validade. No âmbito do processo do trabalho, a regra geral é o cumprimento do

ato processual em tela por meio de citação postal, bem mais ágil. E somente

quando não há êxito, é que o Juiz do Trabalho costuma mandar expedir

mandado para cumprimento por Oficial de Justiça.

Certamente algum intérprete mais tolerante poderia dizer que os prazos

fixados na norma processual civil àquele processo se destinam, não havendo

espaço para a mesma rigidez no processo do trabalho. Entretanto, nosso

convencimento é no sentido de que o sistema precisa atuar de modo orgânico.

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Isso significa que a simplicidade procedimental preconizada para o processo do

trabalho não pode servir de apoio permanente para a desídia da parte.

Por tudo o quanto evidenciado neste trabalho, o fenômeno temporal tem

capital importância para o direito, sobretudo nesta transição da prescrição do

campo do direito preferencialmente privado para o direito público, onde o

tempo do processo eleva-se à categoria de direito fundamental de 5ª geração.

Assim, o interesse na satisfação demanda em tempo adequado transcende o

mero desejo individual, fazendo com que o interesse da sociedade como um

todo prevaleça.

Sendo assim, duas alternativas surgem para construção do provimento

jurisdicional. Na primeira, auto-integrativa, não se aplica supletivamente o

processo civil. Logo, não há de se falar em interrupção da prescrição, exceto

na restrita hipótese preconizada na súmula 268/TST.

Lado outro, querendo às partes e o julgador a aplicação das disposições

processuais civis, hão de precisar efetivar o ato citatório na forma ali

estabelecida, porquanto o princípio da norma mais favorável se aplica apenas

ao Direito do Trabalho, e não ao Direito Processual do Trabalho.

Na fase executiva, idêntico tratamento, por inteligência do art. 617/CPC.

Remanescia ainda, no processo civil, a regra constante do art. 777/CPC,

pela qual a prescrição das obrigações, interrompida com a instauração com a

instauração do concurso universal de credores, recomeça a correr no dia em

que passar em julgado a sentença que encerrar o processo de insolvência.

A Nova Lei de Recuperação e Falência, nº. 11.101/05, embora não

tenha revogado expressamente o referido art. 777/CPC, ao dispor de modo

diverso sobre parte dele, sugere parcial revogação tácita. Ademais, convém

observar que esta última norma preocupou-se, especificamente, com o

processo do trabalho, o fazendo o artigo 6º e seus parágrafos.

Art. 6º/LRF. A decretação da falência ou o deferimento do

processamento da recuperação judicial suspende o curso

da prescrição e de todas as ações e execuções em face

do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares

do sócio solidário.

§ 1º omissis.

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§ 2º É permitido pleitear, perante o administrador judicial,

habilitação, exclusão ou modificação de créditos

derivados da relação de trabalho, mas as ações de

natureza trabalhista, inclusive as impugnações a que se

refere o art. 8º desta Lei, serão processadas perante a

Justiça Especializada até a apuração do respectivo

crédito, que será inscrito no quadro-geral de credores pelo

valor determinado em sentença.

§ 3º omissis.

§ 4º Na recuperação judicial, a suspensão de que trata o

caput deste artigo em hipótese nenhuma excederá o

prazo improrrogável de 180 (cento e oitenta) dias contado

do deferimento do processamento da recuperação,

restabelecendo-se, após o decurso do prazo, o direito dos

credores de iniciar ou continuar suas ações e execuções,

independentemente de pronunciamento judicial.

§ 5º Aplica-se o disposto no § 2º deste artigo à

recuperação judicial durante o período de suspensão de

que trata o § 4º deste artigo, mas após o fim da

suspensão, as execuções trabalhistas poderão ser

normalmente concluídas, ainda que o crédito já esteja

inscrito no quadro-geral de credores.

§§ 6º, 7º e 8º omissis (grifos nossos).

Imprescindível deixar claro que a competência para conhecer as

demandas decorrentes dos créditos trabalhistas inadimplidos é da Justiça do

Trabalho, nos moldes do § 2º, do art. 6º, da norma supra transcrita. Todavia,

somente quando houver efetiva controvérsia a ser solucionada por meio de

pretensão judicialmente resistida, porquanto havendo a ausência de

pagamento apenas por incapacidade do falido, há de se ativar a habilitação

diretamente no processo falimentar.

No tocante à recuperação judicial, deferido seu processamento,

consoante disposição contida no artigo 6º e no inciso III, do art. 52/LRF, fica

suspensa a prescrição das demandas apontadas contra o devedor, por seis

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meses, como modo de preservação de seu patrimônio para atender os

compromissos da sociedade empresarial.

Nada obstante, pela exceção do § 1º, do art. 6º/LRF, terá

prosseguimento a ação que demandar quantia ilíquida. Temos que nesta

exceção também se enquadram as demandas trabalhistas até a fase de

liquidação, sendo suspensa a partir dessa etapa.

Não são afetadas, contudo, pelo processamento da recuperação judicial

as execuções fiscais, inexistindo a suspensão do processo, salvo com a

concessão de parcelamento do débito, obtido nos termos do CTN (art. 155-A e

187) e da legislação ordinária específica (art. 6º, § 7º, da LRF).

A suspensão mantém-se até o término do prazo de 180 dias,

restabelecendo-se os direitos dos credores de iniciar ou continuar suas

demandas, independentemente de pronunciamento judicial (art. 6º, § 4º, da

LRF), no caso de não ter sido aprovado o plano de recuperação judicial e

prevista a novação da dívida exigida.

Havendo a suspensão dos prazos prescricionais, mantém-se válido o

período já transcorrido, sendo reiniciada a contagem no ponto em que havia

sido paralisado, a partir da sentença de encerramento da recuperação, no caso

de não ter sido saldado o débito (PAPALÉO DE SOUZA, 2.006, p. 172).

Lembra ainda o autor em referência, que a recuperação judicial atinge os

credores trabalhistas, bem como aqueles de demandas civis decorrentes de

acidentes de trabalho, de competência da Justiça do Trabalho, quando se tratar

de empregadores constituídos como empresas de médio e grande porte, pois,

na hipótese do plano de recuperação especial, destinado às microempresas e

empresas de pequeno porte, não há limitação prescricional, conforme art.

71/LRF, ou seja, efeito algum trará ao credor trabalhista, que poderá pleitear

perante a Justiça do Trabalho sem qualquer limitação, inclusive de ordem

prescricional.

Tudo isso considerado, temos que se a norma estabelece a suspensão

do processamento das demandas voltadas contra o recuperando ou falido, a

prescrição intercorrente há, como corolário, de se interromper também, pelos

interregnos assinalados na LRF, sendo que novo prazo se inicia, contado do

momento de cessação dos efeitos do benefício legal.

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CAPÍTULO 3

O REGIME JURÍDICO DA PRESCRIÇÃO

No sentido léxico, temos prescrição como sendo: ato ou efeito de

prescrever; norma, preceito, regra; indicação exata, determinação ou ordem;

perda da ação atribuída a um direito, que fica assim juridicamente

desprotegido, em conseqüência do não uso dela durante determinado tempo; a

maneira pela qual se extingue a punibilidade do autor de um crime ou

contravenção, por não haver o Estado exercido contra ele no tempo legal o seu

direito de ação, ou por não ter efetivado a condenação que lhe impôs

(FERREIRA, 1.997, p. 1.387).

Ainda em sentido léxico, e consultando a mesma fonte, o famoso

dicionário “Aurélio”, intercorrente é o que se mete de permeio; que sobrevém

enquanto outra coisa dura (FERREIRA, 1.997, P. 957).

No Dicionário Jurídico, da Academia Brasileira de Letras Jurídicas,

prescrição é o resultado da inércia do titular de um direito em mover a ação

respectiva, e prescrição extintiva, a perda do direito à ação por inércia do titular

– dita também “prescrição liberatória” (SIDOU, 1.990, p. 437), sendo que

inexiste o vocábulo intercorrente ou prescrição intercorrente, no referido livro.

3.1. Direito do Trabalho e Processual do Trabalho

Considerando-se a multiplicidade de assuntos cuja competência

pertence à Justiça do Trabalho, vários os prazos prescricionais são assinalados

na CLT, tanto em sua parte destinada ao direito material, quanto na parte que

cuida do direito processual. E o TST, pela mesma razão, é pródigo de criar

verbetes dispondo sobre o tema.

Sendo assim, serão transcritas apenas as normas que guardam maior

pertinência com o assunto objeto desta investigação.

A prescrição trabalhista, contudo, deriva de fonte mais expressiva, pois a

própria Constituição Federal se ocupa do tema. O faz no inciso XXIX, do art. 7º,

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cujo caput afirma que são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de

outros que visem à melhoria de sua condição social: ... omissis...

XXIX – ação, quanto aos créditos resultantes das relações

de trabalho, com prazo prescricional de 5 (cinco) anos

para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de 2

(dois) anos após a extinção do contrato de trabalho.

O artigo 11/CLT também o faz42. Nele está assentado que:

Art. 11. O direito de ação quanto a créditos resultantes

das relações de trabalho prescreve: I – em 5 (cinco) anos

para o trabalhador urbano, até o limite de 2 (dois) anos

após a extinção do contrato; II – em 2 (dois) anos, após a

extinção do contrato de trabalho, para o trabalhador rural.

(Inciso revogado pela Emenda Constitucional nº. 28 de

25/5/2.000, DOU 26/5/2.000). § 1º - O disposto neste

artigo não se aplica às ações que tenham como objeto

anotações para fins de prova junto à Previdência Social.

Vedados os §§ 2º e 3º.

O Tribunal Superior do Trabalho buscou especificar a mens legis, por

meio da Súmula 308, que aborda a prescrição qüinqüenal, sendo a mesma

incorporada a OJ – Orientação Jurisprudencial 204, da SDI-1, onde a Corte

estabelece:

308. I – Respeitado o biênio subseqüente à cessação, a

prescrição da ação trabalhista concerne às pretensões

imediatamente anteriores a cinco anos, contados da data

do ajuizamento da reclamação e, não, às anteriores ao

42 Como salientado na introdução, parte minoritária da doutrina entende que o inciso XXIX, do art. 7º/CF, revogou o art. 11/CLT, acabando com a chamada prescrição parcial. Assim, consoante a norma constitucional, teria o demandante sempre o direito de rever os últimos cinco anos do contrato de trabalho, não importando o interregno entre o distrato e a data do ajuizamento da reclamação, desde que, naturalmente, seja respeitado o prazo de dois anos após a extinção do pacto (MACIEL JÚNIOR, 1.996, p. 520).

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qüinqüênio da data da extinção do contrato. (ex-OJ 204 –

inserida em 08.11.2.000). II – A norma constitucional que

ampliou o prazo de prescrição da ação trabalhista para 5

(cinco) anos é de aplicação imediata e não atinge

pretensões já alcançadas pela prescrição bienal quando

da promulgação da CF/88. (ex-Súmula 308 – Res.

6/1.992, DJ 05.11.1.992. * Súmula com redação

determinada pela Res. TST 129/2.005 (DJU

20.04.2.005)43.

Os menores trabalhadores também mereceram regra especial, dispondo

o art. 440/CLT que:

Art. 440. Contra os menores de 18 anos não corre

nenhum prazo de prescrição.

No âmbito exclusivamente processual, o texto consolidado reservou

norma específica para abordar a prescrição, notadamente dispondo sobre a

prescrição da pretensão executiva, embora alguns manuais, equivocadamente,

tratem a norma como relativa à prescrição intercorrente.

O artigo 884/CLT dispõe em seu caput sobre o meio de viabilização dos

embargos à execução, para, logo em seguida, disciplinar no parágrafo primeiro

a matéria que pode ser oponível. Ficam assim dispostos:

Art. 884. Garantida a execução ou penhorados os bens,

terá o executado cinco dias para apresentar embargos,

cabendo igual prazo ao exeqüente para impugnação.

§ 1º. A matéria de defesa será restrita às alegações de

cumprimento da decisão ou do acordo, quitação ou

prescrição da dívida.

§§ 2º, 3º, 4º e 5º, omissis.

43 A OJ 204, da SDI-1, foi cancelada, diante de sua incorporação pela Súmula 308, com a redação que lhe foi dada pela Res. 129/2.005, do TST.

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66

O artigo 889/CLT também nos interessa mais de perto, porquanto

disciplina a possibilidade de aplicação da Lei dos Executivos Fiscais no

processo do trabalho, no qual há regra expressa sobre a prescrição

intercorrente. Diz a norma celetista:

Art. 889. Aos trâmites e incidentes do processo da

execução são aplicáveis, naquilo em que não

contravierem ao presente Título, os preceitos que regem o

processo dos executivos fiscais para a cobrança judicial

da dívida ativa da Fazenda Pública Federal.

Quanto à normatividade dos executivos fiscais, remeto o leitor ao item

4.4, deste mesmo Capítulo. Entretanto, buscando facilitar a compreensão, fica

aqui registrado o teor do art. 40/LEF, bem como seu § 4º, com a redação que

lhe foi dada pela Lei 11.051/2.004:

Art. 40. O Juiz suspenderá o curso da execução,

enquanto não for localizado o devedor ou encontrados

bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses

casos, não correrá o prazo de prescrição.

§ 4º. Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver

decorrido o prazo prescricional, o Juiz, depois de ouvida a

Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a

prescrição intercorrente e decretá-la de imediato.

O direito intertemporal também contou com a preocupação normativa da

CLT, dispondo seu art. 916:

Art. 916. Os prazos de prescrição fixados pela presente

Consolidação começarão a correr da data da vigência

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desta, quando menores do que os previstos pela

legislação anterior44.

Este o regime normativo vigorante atualmente entre nós, notadamente

na parte que mais se aproxima com o corte epistemológico estabelecido.

Entretanto, convém perquirir a origem da prescrição em matéria trabalhista.

Quem bem considera o assunto é Amauri Mascaro Nascimento. Aliás,

exibe em sua obra levantamento da evolução histórico-legislativa45 da

prescrição trabalhista, estabelecendo algumas fases. A primeira antecedeu a

própria instalação da Justiça do Trabalho, em 1.941; a segunda vai dessa

ocasião até a Consolidação das Leis do Trabalho, em 1.943 e a terceira

desenvolve-se desse diploma normativo até a Constituição Federal de 1.988.

O Decreto nº. 23.103, de 1.933, fixava, em seu artigo 17, prazo para a

reclamação à autoridade administrativa da não concessão de férias. A norma

apontada assim estabelecia: “toda reclamação relativa à não concessão de

férias deverá ser dirigida à autoridade competente, pelo interessado ou pelo

sindicato a que estiver associado, dentre do prazo de um ano após o término

do prazo estabelecido no art. 5º, sob pena de prescrição”.

Esta a primeira manifestação brasileira em matéria prescricional

trabalhista.

A Lei 62, de 1.935, que antecedeu como lei geral aplicável a todo

comerciário e industriário à CLT, dispunha, em seu art. 17, que o direito à

indenização criada naquela lei prescreve em um ano, a contar da data da

despedida.

Instalada a Justiça do Trabalho em 1.941, ainda como Corte

Administrativa, vigorou o Decreto-Lei 1.287, de 1.939; o art. 101 dispunha que:

“não havendo disposição especial em contrário, prescreve em dois anos

qualquer reclamação perante a Justiça do Trabalho”, sendo ainda tais regras

mantidas pelo Decreto 6.596, de 1.940, que aprovou o Regulamento da Justiça

do Trabalho. Este modificou, todavia, a regra disposta no art. 227, cuja redação

passou a ter a seguinte redação: “Não havendo disposição especial em

44 O STF posteriormente tratou do assunto da redução do prazo prescricional e os efeitos decorrentes deste fato no âmbito processual, o fazendo por meio da Súmula 445, verbis: A Lei 2.437/55, que reduz prazo prescricional, é aplicável às prescrições em curso na data de sua vigência (1º/1/1.956), salvo quanto aos processos então pendentes. 45 Sobre os executivos fiscais, considerar o Decreto-Lei nº. 960, de 17 de dezembro de 1.938, também anterior à CLT.

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contrário, qualquer reclamação perante a Justiça do Trabalho prescreve em

dois anos, contados da data do ato ou fato que lhe der origem”, estabelecendo,

assim, o dies a quo (NASCIMENTO, 2.007, p. 325).

Depois disso veio a CLT e, posteriormente, as disposições trazidas pela

Constituição Federal, todas já mencionadas, sendo, contudo, relevante

considerar que a Estatuto do Trabalhador Rural, Lei 4.214, de 2 (dois) de

março de 1.963, em seu art. 175, preceituava que: a prescrição dos direitos

assegurados pelo mesmo aos trabalhadores rurais só ocorrerá após 2 (dois)

anos da cessação do contrato de trabalho. E este regramento vigorou até a Lei

5.889, de 1.973, que modificou o referido estatuto, mantendo, contudo, o prazo

prescricional do trabalhador rural, que somente veio a sofrer alteração com a

EC 28/2.000, cuja disciplina legal pode ser constatada no Capítulo 5, item 5.1.

Nosso tema central não passa sem a arguta percepção dos autores de

Direito do Trabalho. Juslaboralistas da dimensão intelectual de Maurício

Godinho Delgado e Alice Monteiro de Barros, não deixam de enfrentar o tema

em suas substanciosas obras.

O primeiro afirma que “intercorrente é a prescrição que flui durante o

desenrolar do processo”, salientando ainda que, proposta a ação, interrompe-

se o prazo prescritivo, para voltar a consumar-se até mesmo antes que o

processo termine. Feita esta digressão, coloca o conflito sumular, entre o

verbete 327, do STF e o 114/TST, trazendo a indagação: afinal, qual a posição

da prescrição intercorrente no processo do trabalho?

Respondendo, aduz que na medida em que o direito é fórmula de razão,

lógica e sensatez, obviamente não pode admitir, com a amplitude do processo

civil, a prescrição intercorrente em ramo processual caracterizado pelo franco

impulso oficial. Cabendo ao Juiz dirigir o processo, com ampla liberdade (art.

765/CLT), indeferindo diligências inúteis e protelatórias (art. 130/CPC), e,

principalmente, determinando qualquer diligência que considere necessária ao

esclarecimento da causa (art. 765/CLT), não se pode tributar à parte os efeitos

de uma morosidade a que a lei busca fornecer instrumentos para seu eficaz e

oficial combate. De par com isso, no processo de conhecimento, tem o Juiz o

dever de extinguir o processo, sem resolução de mérito, caso o autor abandone

o processo, sem praticar atos necessários à sua condução ao objetivo

decisório final (art. 267, II e III e 1º, CPC). A conjugação desses fatores torna,

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de fato, inviável a prescrição intercorrente no âmbito do processo de cognição

trabalhista. Por isso o texto da Súmula 114 do TST (DELGADO, 2.006, p. 281).

Os argumentos supra expendidos são os utilizados pelo doutrinador para

negar a aplicação da prescrição intercorrente na fase de conhecimento,

estendendo seus efeitos para a fase de liquidação. Entretanto, entabula outro

raciocínio no que pertine à omissão reiterada na fase de execução. E

prossegue:

“... há uma situação que torna viável, do ponto de vista

jurídico, a decretação da prescrição na fase executória do

processo do trabalho – situação que permite harmonizar,

assim, os dois verbetes de súmula acima especificados

(Súmula 327/STF, e Súmula 114, TST). Trata-se da

omissão reiterada do exeqüente no processo, em que ele

abandona, de fato, a execução, por um prazo superior a

dois anos, deixando de praticar, por exclusiva omissão

sua, atos que tornem fisicamente possível a continuidade

do processo. Nesse específico caso, argüida a prescrição,

na forma do artigo 884, § 1º, CLT, pode ela ser acatada

pelo Juiz executor, em fase do art. 7º, XXIX, CF/88,

combinado com o referido preceito celetista, ressalvada a

pronúncia de ofício, a teor da Lei nº., 11.280/2.006, se for

o caso” (DELGADO, 2.006, p. 281).

Finaliza com a perspicaz observação de que a ausência de atos

executórios derivada de falta de bens do executado, ou de seu

desaparecimento, não enseja a decretação da prescrição, pois a inércia

processual não pode ser imputada ao exeqüente. Assim, a alternativa

processual que emerge para o Juiz executor, em tais situações, será aquela

prevista no art. 40, §§ 2º e 3º, da Lei 6.830/80 (aplicável ao processo do

trabalho por força do art. 889/CLT), segundo a obra do autor em comento.

Vale dizer, decorrido o prazo máximo de um ano, sem que seja

localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o Juiz ordenará o

arquivamento dos autos. Porém, fica aberta a ressalva: encontrados que

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sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os seus bens, os autos serão

desarquivados para prosseguimento da execução.

Mais cometida, Alice Monteiro de Barros afirma que a prescrição

intercorrente verifica-se durante a tramitação do feito na Justiça, paralisado por

negligência do autor na prática de atos de sua responsabilidade, destacando

que antes do advento da Súmula 114/TST, admitia-se a inflexão do instituto,

com as cautelas impostas pela natureza tutelar do direito do trabalho e pelas

características do sistema processual trabalhista, desde que a paralisação do

feito tivesse como causa única a inércia do autor na prática de atos de sua

responsabilidade (BARROS, 2.005, p. 995). Todavia, no seu sentir, com a

uniformização da jurisprudência pelo TST, não mais houve espaço para sua

verificação perante a Justiça do Trabalho.

3.2. Direito Civil e Processual Civil

O Código Civil vigorante (referido neste trabalho como “NCC”, ou Novo

Código Civil, justamente para se diferençar do antigo diploma, ainda tão

presente em nossas mentes) encontra-se consubstanciado na Lei 10.406, de

10 de janeiro de 2.002, e reserva inúmeros dispositivos a regular a prescrição,

estabelecendo múltiplos prazos para que a pretensão se torne ineficaz46.

A primeira norma atinente, disposta em seu artigo 189, traduz com

clareza invulgar o significado da prescrição, preceituando que violado o direito,

nasce para o titular a pretensão47, a qual se extingue, pela prescrição, nos

prazos a que aludem os artigos 205 e 206. E logo adiante, que a exceção

prescreve no mesmo prazo em que a pretensão.

Por certo que a norma atual andou melhor do que a revogada que

confundia pretensão e ação, contudo não escapou à justa crítica por parte de

José Carlos Barbosa Moreira sobre o preceito, porquanto a simples violação

46 O Novo Código Civil tomou partido da polêmica doutrinária. Pôs a pretensão como posterius em relação ao direito subjetivo material (rejeitados, entre outros brasileiros, Amílcar de Castro e Homero Freire e acolhido, entre outros, por Pontes de Miranda). Pôs a pretensão como prius em relação à ação (VIEIRA, 2.007, p. 101). 47 Inspira-se tal entendimento no direito alemão. O 194 do Bürgerliches Gesetzbuch, com toda clareza, aponta a pretensão (anspruch) como o objeto da prescrição (verjährung). E conceitua a pretensão como “o direito de exigir de outrem um fazer ou um não fazer”, conforme BGB – Allegemeiner Teil.

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não constitui pressuposto para a pretensão. Assim, acertadamente pondera, a

despeito de ostentar um viés concretista de difícil justificação nos dias atuais,

que:

“Na parte inicial do art. 189, diz-se que ‘violado o direito,

nasce para o titular a pretensão’. No rigor da lógica, não é

exato supor que a violação efetiva do direito (a uma

prestação) constitua pressuposto necessário do

nascimento da pretensão. Se esta consiste na exigência

de que alguém realize a prestação, duas hipóteses, na

verdade, são concebíveis: uma é a de que aquele que

exige realmente faça jus à pretensão, mas há outra: a de

se esteja exigindo sem razão – ou porque o direito

inexista, ou porque não haja sofrido violação, ou ainda

porque a prestação, por tal ou qual motivo, não seja

exigível. Mas compreende-se que o legislador se haja

expressado como se expressou: a regra tem como

pressuposto a existência de fundamento para a

pretensão, e assim há de ser entendida” (MOREIRA,

2.002, p. 115).

A parte in fine também mereceu sua censura, com poética concepção

cuja transcrição se justifica.

“Outro reparo concernente à declaração, constante da

parte final do art. 189, de que a pretensão ‘se extingue’

pela prescrição. É curioso como a idéia de extinção reluta

em sair de cena. O novo Código Civil, que acertou em

afastar a tese da extinção da ação, deixa entrar pela

janela o que havia expulsado pela porta. Não é só a ação

que a prescrição se revela importante para extinguir: a

pretensão também” (MOREIRA, 2.002, p. 115).

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Norma cogente que baliza toda a justiça brasileira é a constante do

artigo 192 (sem precedente no código revogado), para a qual os prazos de

prescrição não podem ser alterados por acordo entre as partes, o que significa

dizer que o interregno prescricional somente poderá decorrer de disposição

positivada. Assim, qualquer convenção em contrário, eventual alteração dos

lapsos prescricionais, não produzirá efeito jurídico entre particulares e

tampouco entre estes e a administração pública. Temos, assim, que qualquer

declaração de vontade, neste particular, não produzirá efeito jurídico, ou seja,

será nula.

O diploma atual inova ainda no tocante ao momento em que a

prescrição pode ser argüida. Segundo o comando do artigo 193/NCC, a

prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, enquanto o

regime anterior preconizava que a prescrição poderia ser alegada em qualquer

instância, sendo certo que o vocábulo designava processo e não divisão

jurisdicional. A alteração efetivada modifica integralmente o alcance da norma,

produzindo contundente efeito no âmbito processual, sugerindo permitir que

todas as cortes recursais revejam o mérito da decisão de origem, com a

possibilidade de modificá-la, eventualmente sem os indispensáveis:

contraditório e pré-questionamento. Parece um equívoco, situação que exige a

providencial adequação por parte da jurisprudência.

Sendo possível que o julgador conheça a prescrição inclusive de ofício,

e podendo a parte a quem aproveita alegar até mesmo junto aos tribunais

superiores (pela norma civil), e não sendo da tradição da justiça brasileira dar

vista às partes quando os feitos encontram-se nos tribunais, há de se presumir

que a matéria será conhecida de pronto, importando em pernicioso

cerceamento de defesa sua aplicação de imediato, ou seja, sem que a parte

possa ter oportunidade de alegar algum fato impeditivo à sua consumação. E

se não for assim, o pré-questionamento é que ficará sem utilidade.

Esta regra certamente é, todavia, a mais eficaz para possibilitar o pleno

curso da prescrição intercorrente, dando uma nova dimensão ao instituto.

Na estruturação originária do Novo Código Civil, dispunha o seu artigo

194, que o Juiz não podia suprir, de ofício, a alegação de prescrição, salvo

quando favorecia a absolutamente incapaz, como era da tradição brasileira.

Todavia, a Lei 11.280/06, que deu nova redação ao § 5º, do art. 219/CPC,

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admite que o magistrado conheça a prescrição de ofício, revogando o aludido

art. 194/NCC. E o fez expressamente, conforme seu art. 11.

Preceito recepcionado pelo Direito do Trabalho48 é o disposto no art.

195/NCC, pelo qual cidadãos relativamente incapazes e as pessoas jurídicas

têm ação contra os seus assistentes ou representantes legais, que derem

causa a prescrição, ou não a alegarem oportunamente. Por certo que, numa

primeira acepção, aqueles que não dispõem de plena capacidade não terão

contratos de emprego ou trabalho produzindo efeito, entretanto, há tarefas que

os relativamente capazes são hábeis para executar, bem como qualquer um

pode ter sua capacidade reduzida em função dos fatos clínicos inerentes ao

homem, após a formalização do pacto laboral, abrindo importante em espaço

para atuação da regra apreciada.

A regra subseqüente também deita seus efeitos sobre o direito laboral,

tanto material quanto processual, porquanto a prescrição iniciada contra uma

pessoa continua a correr contra o seu sucessor.

Há causas ainda que impedem ou suspendem a prescrição, como as

apontadas no artigo 197/NCC, que dispõe que não corre a prescrição, entre

cônjuges, na constância da sociedade conjugal; entre ascendentes e

descendentes durante o poder familiar; entre tutelados ou curatelados e seus

tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela. Obviamente que tais

preceitos não foram idealizados para a realidade trabalhista, entretanto, não

menos certo é que poderá haver pacto laboral entre as pessoas listadas na

norma em análise (não há vedação legal, além de ser razoavelmente comum

em alguns seguimentos, como nas atividades rurais, empresas familiares,

pequenos estabelecimentos comerciais e assim por diante), inclusive sob a

perspectiva civil, agora também debaixo da apreciação da Justiça do Trabalho,

depois do advento da EC 45/2.004.

Salienta o artigo 198/NCC que também não corre a prescrição contra os

incapazes, fazendo alusão ao artigo 3º, onde estão elencados os menores de

48 O artigo 8º/CLT possibilita que, na falta de disposições legais ou contratuais, os Juízes do Trabalho decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e norma gerais de direito, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público. E para dar vazão a esta norma, dispõe seu parágrafo único que o direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste.

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dezesseis anos49; os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o

necessário discernimento para a prática desses atos, e os que, mesmo por

causa transitória, não puderem exprimir sua vontade. Em idêntica situação

estarão os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos

Municípios50, e contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em

tempo de guerra.

Também quando a demanda se originar de fato que deva ser apurado

no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença

definitiva51, nos moldes do art. 200/NCC. E não são raros os casos em que os

ilícitos civil ou trabalhista, de apreciação da Justiça do Trabalho acarretam em

persecução penal, notadamente nas hipóteses de justa causa por ato de

improbidade, apropriação indébita, furto, roubo, atos lesivos à honra ou a

integridade física, os assédios sexuais e, até mesmo, a revelação de segredos

de empresa em determinados casos.

A alínea a, do inciso IV, do art. 265/CPC, de irrestrita aplicação no

processo do trabalho, autoriza a suspensão do processo de tais casos,

embora, não seja habitual o acolhimento de tal pretensão nos feitos

processados perante a Justiça do Trabalho, face ao caráter existencial dos

pedidos formulados. Em geral, os fatos, mesmo constituindo, em tese, ilícitos

penais também, são apreciados consoante a prova dos autos, no que pertine

ao impacto para a continuação da relação de trabalho, independente do

posterior prosseguimento da competente ação penal, normalmente muito mais

demorada. Todavia, quanto ao fato de não correr a prescrição em tais casos,

parece ser a solução mais justa e adequada.

O mesmo fato jurídico pode muito bem ser apreciado sob variadas

angulações e por tribunais diversos, seja por motivação derivada de

competências distintas, como na hipótese versada, seja nos casos de

competência concorrente. E o efeito do ato na abordagem trabalhista

49 Vale lembrar que o trabalho lícito no Brasil inicia-se aos 16 anos, salvo na excepcional condição de aprendiz, quando poderá ser a partir do 14 anos, sob rígidas condições. E assim, o alcance dessa regra poderia ser drasticamente reduzido, entretanto, há de se considerar que a realidade poderá ser diferente da preconizada na norma, fazendo emergir trabalho efetivo entre menores, cujos efeitos hão de merecer pronunciamento judicial, com a indispensável recomposição, ao menos material, da força de trabalho dependida. 50 Não seria um exagero estender tal benefício aos trabalhadores ausentes a serviço das autarquias e fundações, por simples coerência constitucional. 51

A recente Lei 11.596, de 29 de novembro de 2.007, já em vigor, altera o caput do art. 117/CP, para definir como causa interruptiva da prescrição a publicação da sentença ou acórdão “recorrível” (sic), o que significa dizer inexistir mais em nosso ordenamento a necessidade da “sentença definitiva”, retratada no art. 200, do Código Civil.

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recomenda imediata investigação, com o conseqüente julgamento, diante da

urgência dos créditos ali retratados. Havendo justo óbice, como uma

impostergável causa de interrupção ou suspensão da prescrição, ou fundada

dúvida quanto à autoria do delito, parece razoável que a Corte trabalhista tenha

o critério de considerar o lapso temporal transcorrido, aceitando a postulação

em prazo superior ao biênio prescricional, em estrita obediência à norma civil,

face aos efeitos da interrupção da prescrição.

As causas que interrompem a prescrição são tratadas também no

Código Civil, a partir do artigo 202, sendo absolutamente relevante destacar

que esta somente poderá ocorrer uma vez52, dando-se por despacho do Juiz,

mesmo que incompetente que ordenar a citação, se o interessado a promover

no prazo e na forma da lei processual.

O protesto judicial é outra das causas de interrupção, inciso II, da norma

apontada, sendo que a prescrição interrompida recomeça a correr da data do

ato que a interrompeu, ou do último ato do processo para interrompê-la.

Ademais, pode ser interrompida por qualquer interessado.

Por fim, a realidade de que a interrupção da prescrição por um credor

não aproveita aos outros; semelhantemente, a interrupção operada contra o co-

devedor, ou seu herdeiro, não prejudica aos demais coobrigados.

Quanto à solidariedade, de certo modo comum na esfera trabalhista53, a

interrupção efetuada contra o devedor solidário envolve os demais e seus

sucessores, a exemplo do disposto no § 1º, do artigo 204/NCC.

52

Sobre a unicidade da interrupção prescricional, destaca José Marcos Rodrigues Vieira, que passo a transcrever, que o tema ainda não foi atraiu o pronunciamento dos estudiosos na vigência do Novo Código Civil, e o primeiro embate nos remete à celebérrima (o superlativo é do autor) 'Introdução' de Pugliese à Polémica Windscheid versus Müther. Ali, ao analisar o novo conceito de actio em face dos problemas dos jusromanistas, o professor italiano nega que Windscheid tivesse solucionado as decorrentes relações da actio com o processo e com o direito substancial, 'salvo talvez em matéria de prescrição'. Não nos parece, porém, bastante o tom da crítica, restrita ao aspecto particular de que, 'em matéria de extinção o equívoco [de uma comum origem das ações reais e das ações pessoais] é inócuo, sendo natural que a extinção da ação [ou da pretensão] comporte a extinção do direito e que se possa expressar uma em termos de outra'. Nem nos parece ter assim demonstrado Pugliese, como veremos, o aludido equívoco. E prossegue o Prof. José Marcos, com a exuberância que lhe é peculiar. Assinale-se que Pugliese verbera, como equívoco, como falseamento doutrinário, subversão das fontes, a actio de Windscheid – o anspruch, direito ao qual 'o Estado deveria prestar tutela' – vertida em 'um direito a que o estranho desistisse da violação'. Direito cuja generalização é 'fantasia, à qual as fontes não dão nenhum apoio'. E que não existiria no campo da 'actio in rem', que 'deve tutelar imediatamente o direito real, não um novo direito originado da violação do primeiro. Ora, essa a grande crítica não teria surpreendido Windscheid, que, reconhecido, embora, que a 'vontade do titular, de que outra vontade se submeta à sua, é da essência da obrigação, mas não do direito real', antecipava a resposta: 'com isso não se explica, se é que a actio constitui efetivamente um direito, como pode ter lugar uma actio antes de violar-se essa vontade' (VIEIRA, 2.007, p. 102). 53 O § 2º, do art. 2º/CLT, assegura que sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.

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Finalmente, na esfera do Direito Civil, contam-se os prazos, variados

conforme a pretensão, dispostos nos artigos 205 e 206, do Código Civil, muitos

deles totalmente aplicáveis junto à Justiça Especializada do Trabalho. E apesar

de ainda comportar alguma cizânia na jurisprudência dos Tribunais Regionais

do Trabalho, e também junto ao TST, quer parecer que o entendimento de que

a prescrição dos feitos civis, de apreciação da Justiça do Trabalho deve ser

aquela prevista neste ramo do direito. Afinal, a justiça é do trabalho e não da

CLT. Assim, quando atua Direito Civil, a prescrição aplicável há de ser a

estabelecida na lei civil.

O dissenso ocorre porque o art. 643/CLT preceitua que: “os dissídios

oriundos das relações entre empregados e empregadores, bem como de

trabalhadores avulsos e seus tomadores de serviços, em atividades reguladas

na legislação social, serão dirimidos pela Justiça do Trabalho, de acordo com o

presente Título e na forma estabelecida pelo processo judiciário do trabalho”,

sendo desnecessário relembrar a existência de normas celetistas sobre matéria

prescricional.

A norma apontada, contudo, refere-se apenas aos contratos de

emprego, ou seja, relações trabalhistas stricto sensu, sendo a exceção nela

efetivamente mencionada (avulsos), como no art. 652/CLT, em sua redação

original.

Os que se inclinam pela prescrição trabalhista fundam o raciocínio no

inciso XXIX, do art. 7º/CF, que trata das ações quanto aos créditos das

relações de trabalho”, mas esquecem-se que as demandas podem ter natureza

diversa. Assim, numa demanda em que se busque a reparação dos danos

estéticos, por exemplo, decorrentes de exercício profissional, civil ou

trabalhista, mas de competência da Justiça do Trabalho, o direito posto em

juízo deriva de um direito de personalidade, matéria não versada no

ordenamento jurídico trabalhista nacional, razão pela qual a prescrição

aplicável somente pode mesmo ser a civil.

Com efeito, a análise dos casos deve ser feita a cada caso, de modo a

que o julgador possa identificar a prescrição aplicável, consoante à natureza da

pretensão deduzida pela parte.

Temos, destarte, a prescrição anual para demandar contratos de seguro,

tão comuns em área trabalhista, às vezes até por disposição constitucional e

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noutras convencional, bem como a trienal para a reparação civil, aí envolvidos

os acidentes de trabalho e as seqüelas deles decorrentes, os danos morais e

materiais, dentre outros54.

Convém lembrar ainda que, para o Direito Civil, a prescrição extingue a

responsabilidade do devedor. Assim, transcorrido o prazo prescricional, o

devedor terá a faculdade de pagar se quiser. Do ponto de vista da

responsabilidade, a obrigação estará extinta. No entanto, se enfocarmos o

débito, a obrigação nunca se extinguirá, tanto que se houver o pagamento

espontâneo, não poderá ser repetido, exatamente por ser devido e válido

(FIUZA, 2.006, p. 376).

O Código de Processo Civil trata da prescrição em mais de uma dezena

de artigos, o faz no artigo 37, 269, IV, 295, IV, 617, 741, VI, 746, 777, 810, 811,

IV, não sendo, por óbvio, o caso de se transcrever ou comentar todos eles,

porque fogem ao escopo deste trabalho, com mitigados efeitos perante a

Justiça do Trabalho. A proposta aqui levada a efeito é justamente realçar o

Direito Processual do Trabalho, com seus supostos e institutos, bem como os

que lhe são subjacentes.

Apesar da limitação mencionada, contudo, indispensável destacar o

inciso VI, do art. 741/CPC, porquanto trata objetivamente da prescrição

intercorrente, dispondo em seu caput que: na execução contra a fazenda

Pública, os embargos só poderão versar sobre: ...omissis... VI – qualquer

causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como o pagamento,

novação compensação, transação ou prescrição, desde que superveniente à

sentença (grifo meu), além do § 5º, do art. 219, também do CPC, tantas vezes

já referido.

54 Um exemplo extremamente elucidativo é o vazado na ementa do processo 00565-2006-062-03-00-0-RO, oriundo do TRT/3, onde a 4ª T., pela relatoria do Juiz Emerson José Alves Lage, aplica não só a prescrição civil, mas também a responsabilidade civil, em feito julgado por uma Corte trabalhista. Ficou assim decidido: As teorias a respeito da responsabilidade civil pelo acidente de trabalho evoluíram da responsabilidade extracontratual ou aquiliana para a responsabilidade contratual, onde raramente o trabalhador conseguia desincumbir-se de seu encargo probatório. Depois, evoluiu-se para teoria da responsabilidade objetiva (sempre prevista em lei) e, finalmente, para a teoria do risco profissional, etapa em que hoje nos encontramos e que ganhou realce com o parágrafo único do art. 927 do Código Civil de 2.002, que estabelece a responsabilidade decorrente do risco normal que oferece a atividade desenvolvida e que gera riqueza ao empregador. Nestes casos, a culpa do empregador no evento danoso é irrelevante, bastando a presença do dano e do nexo de causalidade, já que a obrigação de indenizar surge automaticamente do risco da atividade empreendida. DJU de 11.08.2.007.

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3.3. Direito Penal e Processual Penal

No Código Penal, Decreto-lei nº. 2.848, de 7 (sete) de dezembro de

1.940, a punibilidade55 por ser declarada extinta pela prescrição, conforme

inciso IV, de seu art. 107, assim como esta pode ocorrer antes mesmo do

trânsito em julgado da sentença (intercorrente, portanto) , nos moldes do art.

109/CPC, com a redação que lhe foi dada pela Lei 7.209/84.

A prescrição poderá ainda ser declarada, mesmo depois de transitar em

julgado a sentença condenatória (situação que a deixa sob o mesmo

fenômeno), de acordo com o art. 110/CP, também com redação modificada

pela última lei apontada56.

Convém deixar claro desde logo, que a expressão extinção da

punibilidade foi introduzida em nosso ordenamento através da Exposição de

Motivos do Código Penal de 1.940, em substituição aos errôneos conceitos

contidos na rubrica eleita pela antiga legislação, de extinção da ação penal e

da condenação, que tanto se distanciava do conceito de pretensão, vértice em

que se estriba a prescrição sob a concepção contemporânea.

A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença, situação jurídica

que importa em extinção da pretensão punitiva e que, assim, não deixa dúvida

em relação ao caráter correlato com a prescrição intercorrente (e que não se

confunde com as causas de exclusão do crime), começa a correr desde o dia

em que o crime se consumou; no caso de tentativa, do dia em que cessou a

atividade criminosa; nos crimes permanentes, do dia em que cessou a

permanência; nos crimes de bigamia e nos de falsificação ou alteração de

assentamento do registro civil, da data em que o fato se tornou conhecido.

O termo inicial da prescrição após a sentença condenatória irrecorrível,

hipótese de extinção apenas da pretensão executória, hipótese análoga à

extinção da pretensão executiva entre nós, encontra-se disciplinada pelo artigo

112/CPC, e começa a correr: do dia em que transita em julgado a sentença

55 O poder-dever de punir, conferido abstratamente ao estado, materializa-se apenas com a efetiva ofensa a uma norma penal. É só então que surge a chamada punibilidade, pressuposto da pena. Bem por isso, para se chegar ao seu conceito é imprescindível esclarecer que o conceito de crime limita-se ao fato típico, antijurídico (ilícito) e culpável. E a punibilidade não integra o conceito de crime, do qual é mera conseqüência. Assim, temos que a punibilidade decorre da conjugação de três elementos que compõem o delito, quais sejam: a tipicidade, a antijuridicidade e a culpabilidade (ROSENTHAL, 2.005, p. 28). 56 Interessante notar que o dinheiro ou objetos dados como fiança ficarão sujeitos ao pagamento das custas, da indenização do dano e da multa, se o réu for condenado, ainda no caso de prescrição depois da sentença condenatória, artigo 336/CPP e seu parágrafo único.

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condenatória, para o acusado, ou a que revoga a suspensão condicional da

pena ou do livramento condicional.

A prescrição não deixa de operar seus efeitos nem mesmo diante da

evasão do condenado, quando é regulada pelo tempo restante da pena, de

acordo com o art. 113/CP, ou nos casos de penas que não importem em

privação da liberdade, como nas penas de multa, esta com amparo no art. 114,

do mesmo diploma.

Importante inovação veio trazida pela Lei 11.596, de 29 de novembro de

2.007, que entrou em vigor na data de sua publicação, alterando o inciso IV, do

art. 117/CP, para definir como causa interruptiva da prescrição a publicação da

sentença ou acórdão condenatório recorrível, e não mais apenas a sentença,

de modo que a prescrição intercorrente não venha a solapar a pretensão

punitiva do Estado, ou seja, o direito positivo viabilizando um fator que impede

a prescrição durante o lapso de tramitação do feito.

O Código de Processo Penal, Decreto-lei 3.689, de 3 (três) de outubro

de 1.941, também regula a matéria, dispondo no inciso II, de seu artigo 43, que

a denúncia ou queixa será rejeitada quando já estiver prescrita a punibilidade,

pela prescrição ou outra coisa.

3.4. Direito Tributário: material e processual

O Código Tributário Nacional, instituído pela Lei 5.172, de 25 (vinte e

cinco) de outubro de 1.966, elenca em seu artigo 156, as causas de extinção

do crédito tributário, sendo a prescrição uma delas, conforme o inciso V, da

norma em questão, enquanto o caput do artigo 173/CTN, afirma que o direito

de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco)

anos.

Para a cobrança, no entanto, dispõe o art. 174/CTN, que a ação para

este fim prescreve em 5 (cinco) anos, contados da data de sua constituição

definitiva. E por constituição definitiva do crédito tributário, devemos entender

como aquela em que o lançamento tornou-se definitivo, insusceptível de

modificação pelos órgãos incumbidos de fazê-lo. Já o lançamento é definitivo

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quando efetivado, quando não mais possa ser objeto de recurso por parte do

sujeito passivo ou de revisão por parte da administração (COELHO, 2.005, p.

834).

A execução judicial para a cobrança da Dívida Ativa da Fazenda Pública,

tributária e não tributária da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos

Municípios e respectivas autarquias, no entanto, é regida pela Lei 6.830, de 22

de setembro de 1.980, e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil.

Este último diploma processual nos interessa mais de perto, no

particular, por dupla razão, a uma porque é aplicável ao processo do trabalho,

como já vimos, consoante o artigo 889/CLT, e a duas porque contém regra

expressa sobre a prescrição intercorrente.

A norma mais interessante está disposta no artigo 40, que declara que o

Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor

ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora e, nesses casos,

não correrá prazo de prescrição (há plena equivalência com a norma constante

do inciso III, do art. 791/CPC). E os seus incisos preconizam que, uma vez

suspensa a execução deverá ser dada vista ao Procurador da Fazenda

Nacional, obviamente para que este possa diligenciar no sentido de encontrar o

devedor ou seus bens, somente podendo haver o arquivamento da demanda

após um ano. Todavia, sobrevindo um ou outro, o processo poderá ser

desarquivado, também como já restou demonstrado. E aí fica a perniciosa

idéia de uma eterna indefinição, fato totalmente contrário ao direito, que só

serve para alimentar a ânsia da administração pública em arrecadar, em

passividade censurável57.

Analogia justificada é a que encontramos na lição do penalista italiano

Girolano Penso, apud BECHO, que considera:

“o tempo, com sua ação modificadora de todos os

acontecimentos humanos, ainda que não cancele,

enfraquece enormemente, com seu decurso, a

recordação das ações humanas de maneira que, após um

57 Se numa execução da Fazenda Pública, que podemos entender lastrada no interesse de toda a sociedade, já não é aceitável que uma demanda se eternize em pretenso proveito do credor, com muito mais razão há de ser censurável tal fato no âmbito privado, como ocorria no processo do trabalho (e ainda ocorre, ao mesmo parcialmente, isto é, na fase de conhecimento), porquanto incidente a mesma norma.

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longo lapso de tempo, proporcional à gravidade do crime,

a memória da ação ilícita se debilita diante da consciência

pública: toda a preocupação, a ânsia, os alarmes que se

disparam no momento de um crime, se descolorem

através do curso do tempo, acabando por envolver-se,

mais ou menos inteiramente, pelo véu do esquecimento”

(BECHO, 2.005, p. 126).

Não só o Direito Tributário e o seu correlativo processamento, mas

também o próprio Direito Processual58, objeto de nossa investigação, se

ressentem dos efeitos decorrentes do transcurso temporal59. Esses antigos

ensinamentos, escritos sobre as prescrições penais, veiculam a idéia comum

do efeito do passar do tempo ou pelo tempo nas relações sociais deixadas em

aberto. O direito não pode socorrer ao credor inerte, mesmo que esse credor

tenha realizado alguns poucos atos para buscar seus direitos, mas que

posteriormente tenha retornado ao seu estado de inação, deixando de praticar

atos que demonstrem a busca pelo devedor ou por seus bens.

A sensata libertação veio apenas com a Lei 11.051, de 29 de dezembro

de 2.004, que acrescentou um quarto parágrafo ao aludido artigo 40,

estabelecendo que, se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido

o prazo prescricional, o Juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de

ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato60.

Não é demasiado por em evidência que se trata de uma faculdade do

magistrado (“... poderá, de ofício, reconhecer...), diferentemente da disposição

58 O efeito do tempo nas relações processuais é objeto de magnífico artigo de Fernando Horta Tavares, com o título Tempo e Processo, onde conclui ser possível, contudo, formular uma Teoria da Efetividade do Direito, fruto do adequado equilíbrio entre o processamento de pedidos amparados em tutelas provisórias – os procedimentos de urgência de tutela de direitos fundamentais, pela via das antecipações de tutela e cautelares – e o respeito aos Princípios do Contraditório, da Isonomia e da Ampla Defesa, e da Reserva Legal, porque regentes do Estado de Direito Democrático, de que não se pode afastar. Esta harmonia pode ser alcançada com modificações operacionais, seja no funcionamento da máquina judiciária seja na utilização de determinadas técnicas procedimentais, sem malferimento do Processo devido, muito menos com sumarização de cognição (TAVARES, 2.006, p. 223). 59 Nesse sentido a lúcida comparação levada a efeito por Luiz Otávio Linhares Renault, para quem a simples aceleração do procedimento não responde aos ideais de justiça, pelo que observa: “Enquanto as outras ciências lutam para igualar ou superar o tempo na sua dinâmica, rejeitando-o na sua dilação interior, empurrando-o para além de sua natureza, o processo luta para incorporá-lo razoavelmente a fim de instituir um modelo ideal, tentando alias à idéia de tempo diferido o ideal de justiça (RENAULT, 2.006, p. 453). 60 Convém notar que o tema central é controvertido não só no processo do trabalho, justificando a um só tempo esta pesquisa, mas também a comparação com outros ramos do direito, onde a mesma norma atua e, portanto, o celeuma persiste. Renato Becho, ao comentar o § 4º, do art. 40/LEF exclama: “praticamente por 25 anos os estudiosos do direito tributário têm debatido sobre a existência, no sistema jurídico nacional, da prescrição intercorrente nos executivos fiscais. A discussão perdurou – assim entendemos – desde a Lei 6.830/80 até a Lei 11.051/04”. (BECHO, 2.005, p. 124).

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contida no § 5º, do artigo 219/CPC, com a redação que lhe foi dada pela Lei

11.280/06, onde o julgador não tem essa prerrogativa. Nesta última o comando

legal é rígido, asseverando que “o Juiz pronunciará, de ofício, a prescrição”.

Seja como for, necessário reconhecer que a norma em questão afigura-

se muito mais como um preceito de direito processual61, do que como preceito

de direito tributário. Todavia, o entendimento de que a LEF deve ser

compatibilizada com o CTN está consolidado no STJ. Nesse sentido:

O art. 40 da Lei 6.830/80 deve ser aplicado em harmonia

com o art. 174/CTN, ocorrendo a prescrição após o

transcurso do prazo qüinqüenal sem a manifestação do

credor. Precedentes: REsp 125.504/PR, 2ª T., Min. João

Otávio Noronha, DJ 12.05.2.003; REsp 331.484/PE, 1ª T.,

Min. Luiz Fux, DJ 27.05.2.002; AGREsp 439.560/RO, 1ª

T., Min. Paulo Medina, DJ 14.04.2.003.

A pesquisa jurisprudencial acima transcrita integra a obra referida, onde

o professor paulista conclui que a Lei 11.051/04 não poderia ter inserido texto

diverso do que o fez. Um dispositivo que declarasse a imprescritibilidade na

suspensão da execução, ainda que prevista em lei complementar, que viesse

como um adendo ao art. 174/CTN, seria inconstitucional. (BECHO, 2.005, p.

133).

Concluindo, temos a Súmula 314/STJ, que afasta qualquer dúvida

pertinente à aplicação da prescrição intercorrente nas execuções fiscais,

servindo, inclusive de inspiração para o Direito Processual do Trabalho, bem

como para o processo comum. Verbis: “Em execução fiscal, não localizados

bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual inicia-se o

prazo da prescrição qüinqüenal intercorrente”.

A lei vigorante e a Súmula mencionada deixam a clara impressão que a

antiga controvérsia é, hoje, coisa do passado, embora haja quem entenda que

a prescrição em matéria tributária somente possa vir a ser regulamentada

61 Importante, contudo, acentuar que o processo, como direito-garantia constitucionalizado e fundante da atuação, criação, modificação ou exclusão de Direito na pós-modernidade, não está sujeito às vicissitudes do tempo, que, sendo um efeito que flui por si mesmo, não se submete a modificações externas, tampouco, tem força para causar prejuízos aos litigantes (TAVARES, 2.006, p. 223).

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através de Lei Complementar62. Oxalá outros ramos do direito que ainda

convivem com tal aporia, no verbete se inspirem para construir soluções

remansosas.

62

Aliás, sobre o tema em matéria tributária faz-se ainda outra censura de ordem formal, no sentido de que o art. 174/CTN, com a redação que lhe foi dada pela LC 118/05, que atribuiu a simples despacho do Juiz a possibilidade de interromper a prescrição, independente de efetiva ciência do devedor é inconstitucional. Isso porque, além de não existir razões jurídicas suficientes para se justificar o tratamento desigual entre as partes, vez que a interrupção do prazo prescricional nas demandas movidas em face da Fazenda Pública continua a exigir a ciência desta, a norma viola os princípios constitucionais do devido processo legal e do contraditório. Naturalmente é indispensável que se faça chegar ao devedor a informação de que o prazo prescricional está interrompido, evitando que ele se desfaça de meios probatórios que possam ser úteis. A interrupção do prazo por meio de ato processual, sem a certeza de que a outra parte tomou conhecimento disso não condiz com o devido processo legal (RABELLO, 2.005, p. 117).

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CAPÍTULO 4

ANÁLISE DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE À LUZ DA

DOUTRINA PROCESSUAL DO TRABALHO

A prescrição intercorrente é enfrentada pelos mais eminentes

processualistas, sendo que devido ao específico escopo deste trabalho, sua

busca está focada nos principais jus-processualistas, de modo a demonstrar

como este autônomo ramo do direito processual enfrenta o tema.

Neste capítulo estão sendo tratados os autores que escreveram sobre a

prescrição intercorrente antes da EC 45, que, como vimos, alterou

significativamente o alcance, bem como a aceitação do instituto central deste

trabalho. Isso porque, a partir de então, com as demandas civis, a admissão da

prescrição intercorrente necessariamente passou a ser contemplada sob

aspecto diverso.

A pesquisa revela que historicamente sempre se admitiu a prescrição

intercorrente, a despeito do restritivo entendimento cristalizado na Súmula

114/TST, havendo os que a admitem abertamente, como Rodolfo Pamplona

Filho e Wilson de Souza Campos Batalha, e os que a negam na fase de

conhecimento e a admitem na fase de execução, como Aroldo Plínio

Gonçalves e Wagner Giglio, embora este último reconheça a extinção da

demanda em fase de conhecimento por abandono da causa, o que este autor

considera providência processual de efeito prático equivalente, na medida em

que importa também em extinção do processo. E também aqueles que vêem o

instituto com certo hibridismo, ou seja, negando sua aplicação, mas não

deixando de perceber uma ou outra exceção, como Isis de Almeida, e aqueles

que apenas veladamente reconhecem sua pertinência, como Coqueijo Costa,

tudo como demonstrado adiante.

Ao lado desses ícones do Direito Processual do Trabalho, quem não

poderia deixar de ser considerado é Valentin Carrion, autor da célebre “CLT

Comentada”, que a tantas gerações de juslaboralistas ajudou e ainda continua

a ser editada até hoje, mesmo após sua morte, por seu filho. Nela há

testemunho coerente de pensar e agir, pois já naquela época admitia

abertamente a prescrição intercorrente, tanto como doutrinador, quanto como

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Desembargador Federal do Trabalho no Tribunal Regional do Trabalho da 2ª

Região, São Paulo, decidindo no mesmo sentido.

Vejamos ambos os exemplos:

“Paralisada a ação no processo de cognição ou no da

execução, por culpa do autor, por mais de dois anos,

opera-se a chamada prescrição intercorrente; mesmo que

caiba ao Juiz velar pelo andamento do processo (CLT, art.

765), a parte não perde, por isso, a iniciativa; sugerir que

o Juiz prossiga à revelia do autor, quando este não

cumpre os atos que lhe foram determinados, é como

remédio que mata o enfermo. Pretender a inexistência da

prescrição intercorrente é o mesmo que criar a ‘lide

perpétua’ (Russomano, Comentários à CLT), o que não

se coaduna com o direito brasileiro. Entretanto, a

prescrição intercorrente trabalhista é contestada por

grande parte da doutrina (Süssekind, Comentários;

Amaro, Tutela, v. 1) e por Súmula do TST (114), apesar

de haver lei expressa que a prevê (CLT, art. 884, § 1º)”

(CARRION, 2.001, p. 78)

E, depois, como magistrado mantém a linha, citando na obra indicada o

seguinte aresto:

PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. APLICA-SE NO

PROCESSO DO TRABALHO. Não fosse assim, inexistiria

o texto da CLT, art. 884, § 1º: ‘A matéria de defesa será

restrita às alegações de... prescrição da dívida’. Esta só

pode ser a prescrição intercorrente63, pois a do processo

de cognição já está preclusa nessa fase. Assim também o

STF, Súmula 327. Proc. TRT/SP 37.465/97, Valentin

Carrion, Ac. 9ª T. 19.867/98 (CARRION, 2.001, p. 79). 63

Imprescindível alertar que não admito que a regra do § 1º, do art. 884/CLT trate de prescrição intercorrente, e sim de prescrição da pretensão executiva, como adiante demonstrado. A citação foi feita apenas para evidenciar que há dezesseis anos, com as regras positivadas disponíveis, Carrion já enfrentava a questão.

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Nesse sentido, a primeira alusão cabe ao preclaro Professor Doutor

Aroldo Plínio Gonçalves, a quem muito deve Direito Processual do Trabalho, o

qual não se esquiva em conceituar a prescrição intercorrente, afirmando que:

“seria aquela que surge no curso de uma demanda já proposta, em razão de o

feito ter ficado em estado de inércia por período suficiente para acolhê-la”.

Todavia, conclui que após o CPC/39, que consagrou o impulso processual de

ofício pelo Juiz64, o instituto da prescrição intercorrente estaria banido do direito

brasileiro. E que no CPC/73 outro não é o caminho escolhido pelo legislador,

pois no código vigente se repete a orientação anterior, agora no inciso II, do art.

125, que garante que o Juiz velará pela solução rápida do litígio e traz sua

grande pedra de toque ao estabelecer no art. 262, que o processo começa por

iniciativa da parte, mas se desenvolve por impulso oficial (GONÇALVES, 1.987,

p. 62/63 e 65/66).

Na fase executiva, entretanto, a indicação é noutro sentido65, trazendo o

referido autor à colação o exemplo da liquidação por artigos, propondo: “Pode o

Juiz, ou por outra, seria aconselhável que o Juiz instaurasse a liquidação ou

formulasse os artigos? Sem dúvida que não. E não poderia, porque,

vinculando-se psicologicamente ao ato de iniciativa, comprometeria sua

imparcialidade66”. Ao final remata, afirmando que taxativamente há prescrição

na execução, no processo do trabalho.

Aduz ainda que uma vez ajuizada a demanda, fica interrompida a

prescrição que só começa a correr com o trânsito em julgado da sentença ou

do acórdão, bem como diante de descumprimento de transação judicial,

conforme § 1º, do art. 841/CLT. E não sendo, por conseguinte, promovida a

execução pelo Juiz ex officio ou por qualquer interessado, findo o lapso

temporal de dois anos estará prescrita a pretensão executiva, em face do

64

Cf. artigos 112, 201, V, 266, I e II, e 296, I, do CPC/39. 65 Na obra de Aroldo Plínio há expressa repulsa em se admitir a verificação de prescrição intercorrente na fase de conhecimento, exclamando o mesmo: “Por fim, é, de todo, impossível confundir-se a ‘prescrição intercorrente’, inaceitável, quer no Processo Civil, quer no Processo do Trabalho, com as hipóteses de decreto de ‘extinção do processo sem julgamento de mérito’, previstas nos incisos II e III, do art. 267, do Código de 1.973. A ‘negligência da parte’ ou o ‘abandono da causa’ não conduz nunca ao acolhimento de prescrição, mas à extinção do processo sem julgamento do mérito’ (por ‘negligência da parte’ ou ‘abandono da causa’) são institutos que se repelem, prevalecendo este último, expressamente regulamentado em lei (art. 267, do CPC), e que incumbe ao Juiz aplicar nos casos levados a decidir” (GONÇALVES, 1.987, p. 66). 66

Ob. cit. p. 84.

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disposto na Súmula 150/STF, para a qual “prescreve a execução no mesmo

prazo de prescrição da ação67”.

Alerta-nos ainda Aroldo Plínio que, o simples fato do Juiz, ex officio, ou a

requerimento da parte determinar a apresentação de cálculos não interrompe a

prescrição, pois esta só se interrompe com a citação do executado, nos moldes

do art. 880/CLT c/c o art. 617/CPC.

Não é demais lembrar que esta última regra preceitua que a propositura

da execução, deferida pelo Juiz, interrompe a prescrição, mas a citação do

devedor deve ser feita com a observância do art. 219, ou seja, citação válida.

O prazo prescricional nas diversas modalidades de liquidação existentes

à época foi também considerado na obra comentada, todavia deixarei de

mencionar aqui, diante da revogação integral do Capítulo VI do CPC, que

tratava em seus artigos 603 a 611, da liquidação de sentença, conforme Lei

11.232/05.

Idem quanto aos comentários ao art. 40, da Lei 6.830/80, porquanto

realizados antes do advento do § 4º, acrescentado pela lei 11.051/04, que

passou a dispor explicitamente da prescrição intercorrente, sendo que ambas

as realidade estavam contempladas na obra comentada, respectivamente às

páginas 86 e 92.

Direito Processual do Trabalho de Coqueijo Costa é um dos mais

clássicos livros escritos no Brasil sobre o tema. E nele o autor segue uma

lógica compatível com o seu tempo (convém lembrar que a primeira edição é

de 1.977), não admitindo abertamente a prescrição intercorrente no âmbito do

processo do trabalho. Entretanto, em postura avançada, também não renega o

instituto, deixando inclusive transparecer que gostaria de ir além.

Ao tratar do tema em análise afirma que: “... no direito do trabalho tem

sido repelida a prescrição intercorrente, não obstante súmula do STF em

contrário nº. 327” (COSTA, 1.996, p. 242). Assim colocando a questão, quer

parecer que não se afina com o entendimento dominante, deixando o problema

em aberto e tratando a ciência de modo exacerbadamente impessoal, como

quem rejeita o entendimento dominante. Fez, todavia, gosto em evidenciar que

67

O trabalho em análise foi concebido antes de vir à luz o parágrafo único do art. 876/CLT, assim disposto: “Serão executadas ex officio as contribuições sociais devidas em decorrência de decisão proferida pelos Juízes e Tribunais do Trabalho, resultantes de condenação ou homologação de acordo, inclusive sobre os salários pagos durante o período contratual reconhecido”.

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a posição do Supremo Tribunal Federal era diferente, ou seja, que admitia a

prescrição intercorrente.

E continuando no aludido parágrafo (idem, ob. cit.), afirma: “... a

execução, que é ação68, também prescreve, mesmo na Justiça do Trabalho,

onde pode ser instaurada ex officio pelo Juiz de primeiro grau”.

Pelo que se deflui de sua obra, a impressão que fica é a de um homem

com algum conflito em torno do tema, porquanto o mesmo era Ministro do

Tribunal Superior do Trabalho, que era contrário à admissão da prescrição

intercorrente. Assim, nos julgados que participava, a posição da Turma era

contrária a aplicação do instituto. Parece, contudo, que como professor da

Universidade Federal da Bahia, talvez quisesse externar ponto de vista

diferente, admitindo a prescrição intercorrente, nos moldes reconhecidos pelo

STF, como destacou.

O pensamento defendido por Isis de Almeida é no sentido de que a

prescrição intercorrente não pode ocorrer no âmbito do processo do trabalho,

em decorrência do disposto no art. 878/CLT, o qual torna, no seu dizer

“impossível, teoricamente, a paralização do processo...”, ainda mais porque o

art. 765, também da CLT, preconiza que os juízes velarão pelo andamento

rápido das causas (ALMEIDA, 1.994, p. 70).

O autor agora referido era um experiente magistrado trabalhista, e

conhecendo os meandros do foro, aventou possibilidade em que sua aplicação

seria proveitosa. Aduziu que, se a parte tem o dever legal de praticar

determinado ato, não apenas o ônus, e este não pode ser suprido pelo Juiz, de

ofício, e o feito fica paralisado por mais de dois anos, apesar de cientificada e

advertida, a respeito, a parte permanece omissa, seria o caso da extinção do

processo, pela ocorrência da preclusão máxima, ainda que tal situação não

esteja contemplada entre as hipóteses de extinção da execução previstas no

art. 794/CPC (ALMEIDA, 1.994, p. 70/71).

Não quis, no entanto, dar-se por vencido. Constrói, assim, hipótese

diversa para acomodar o verbete da Súmula 114/TST. Diz que a inércia da

parte, na forma mencionada, poderia ser enquadrada no disposto dos incisos II

e III, do art. 267/CPC. E nem seria preciso esperar dois anos, justamente para

68

À época a execução era positivada como demanda autônoma.

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89

não caracterizar a prescrição intercorrente, proibida pela Súmula 114/TST,

devendo o processo ser declarado extinto, por abandono da causa. Destarte,

ainda de acordo com a obra citada, por aplicação dessas disposições do CPC,

a paralização, mesmo ocorrendo na fase de conhecimento, acarretaria, na

prática, em um resultado equivalente a uma prescrição intercorrente, no seu

dizer (ALMEIDA, 1.994, p. 71).

Em síntese apertada, diz Pamplona Filho que prescrição intercorrente é

a que decorre de prolongada inércia da parte, no curso da ação. E que o

instituto tem por finalidade apenar a parte autora do feito, por ter deixado

transcorrer in albis um determinado longo lapso temporal sem diligenciar certos

atos dos quais tinha o ônus de se desincumbir (PAMPLONA FILHO, 1.996, p.

35). Salienta ainda que tal inércia é exclusiva da parte, jamais podendo se

aplicar a prescrição intercorrente em virtude de implemento temporal derivado

do próprio Poder Judiciário.

Aduz mais, que a maioria dos juslaboralistas percebe o processo sob o

prisma inquisitório e não dispositivo como no direito processual comum, e que

a norma do art. 878/CLT visa possibilitar o ius postulandi, de acordo com o art.

4º, da Lei 5.584/70. E que, além disso, somente nas causas de alçada poder-

se-ia justificar o impulso oficial.

Feitas tais considerações, assevera que não há por que não se aceitar a

possibilidade de incidência da prescrição intercorrente, desde que, obviamente,

a paralisação de feito tenha decorrido de culpa do autor e, ao final, apresenta

duas conclusões.

A primeira que nos processos em que a alçada for fixada em quantia

superior ao dobro do salário mínimo legal ou em que as partes se encontrarem

assistidas por profissional da advocacia, não há de se falar em impulso oficial,

sendo perfeitamente aplicável a prescrição intercorrente. E a segunda que nos

processos de alçada exclusiva da Varas do Trabalho ou quando as partes

estiverem no exercício do ius postulandi, pode-se aplicar a prescrição

intercorrente, desde que o ato, que deveria ser praticado pelo autor, não possa

ser realizado pelo juízo, no exercício da faculdade do impulso oficial.

(PAMPLONA FILHO, 1.996, p. 36/41 - passim).

Wagner D. Giglio é mais um clássico autor aberto ao reconhecimento da

prescrição intercorrente no processo do trabalho, inclusive na fase de

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conhecimento, embora nesta não tenha a quase irreverência de proclamar,

talvez por questão principiológica. Então, como efeito processual equivalente,

sustenta a extinção do processo por negligência da parte, aduzindo,

claramente, que não se trata de prescrição intercorrente, mas sim de pena pelo

desinteresse (GIGLIO, 2.007, p. 269).

Deixa, contudo, transparecer sua real convicção ao abordar o tema na

fase de execução, ao asseverar que mesmo antes do advento da reforma da

execução, por inteligência do art. 880/CLT, sempre lhe pareceu prevalente o

princípio da unicidade do processo. E assim desprezava a discussão se a

prescrição da execução seria a mesma da ação, obra citada página 536.

Cria interessante silogismo para rejeitar a tese da inaplicabilidade,

ponderando que: a prescrição decorre da inércia do titular de direito subjetivo

em provocar o Poder Judiciário a reconhecê-lo, por sentença, ou a satisfazê-lo,

por meio de execução do julgado. E objeta: se a execução trabalhista pode ser

promovida ex officio, a provocação da parte seria dispensável e não haveria

como cogitar de sua inércia, portanto. E sem a inércia da parte, lembramos

mais uma vez, não há como cogitar de prescrição. Donde se concluiria,

obrigatoriamente, que no processo trabalhista, ao contrário do que ocorre no

processo comum, a execução jamais seria atingida pela prescrição.

Aí a censura levada a efeito pelo referido autor, que afirma ser o

argumento atrativo, mas exibe sua falha, vez que a iniciativa do Juiz em

provocar a execução não elimina totalmente a da parte, pois existem atos

processuais que apenas esta pode praticar69. E lembra as sentenças que

estabelecem condições para seu cumprimento, como a que ordena o

pagamento de certa quantia pela entrega do produto da plantação feita pelo

trabalhador rural, em contrato de meação, ou ainda a que determina o

pagamento da condenação em verbas decorrentes de despedimento imotivado,

após a devolução do imóvel ocupado pelo empregado a título de salário-

habitação.

São, realmente, exemplos cuja clareza salta aos olhos e nos conduzem

para o inexorável reconhecimento da prescrição intercorrente no processo do

trabalho, porquanto a execução não poderia ser promovida ex officio, 69

Ilse Marcelina Bernardi Lora, em sua obra Prescrição no Direito do Trabalho, sustenta que a prescrição intercorrente deve ser admitida no processo do trabalho, contando-se o prazo do último ato processual praticado no feito, com intimação das partes (LORA, 2.001, p. 163).

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dependendo de cumprimento de condição pelo exeqüente. E se este

permanecer inerte, a prescrição deve vir a ser declarada (GIGLIO, 2.007, p.

537).

Na seqüência põe em evidência a enunciação do art. 11/CLT, ao dispor

que “prescreve em dois anos o direito de pleitear a reparação de qualquer ato

infringente” de seus dispositivos, possibilitando interpretar em sentido lato que

a reparação se refere tanto à execução com a propositura da demanda; traz à

colação a Súmula 327/STF e o art. 40/LEF, todos tendente à admissão da

prescrição intercorrente. E em conclusão, faz referência ao § 1º, do art.

884/CLT, que ao limitar a matéria de defesa que pode ser alegada nos

embargos à execução ao “cumprimento da decisão ou do acordo, quitação ou

prescrição da dívida” (grifos do original), acolheu, explicitamente, a prescrição

intercorrente, posto que a prescrição da pretensão não pode ser alegada em

execução.

Consoante esta última norma apontada, afirma ainda o autor em foco

que, por haver norma expressa na CLT a regular à espécie, não há de se falar

em aplicação subsidiária do processo comum, bem como que a prescrição

intercorrente deve ser aplicada ex officio, porquanto matéria de interesse

público (GIGLIO, 2.007, p. 538).

Suportado pela ousadia de quem escreve contra o entendimento da

maior Corte trabalhista, Wilson de Souza Campos Batalha sustenta que não há

argumento válido para se desconsiderar a prescrição intercorrente no Direito

Processual do Trabalho, e que a mesma pode ser declarada, inclusive, sem a

intimação para que a parte impulsione o feito sob pena de aplicação do

instituto70.

Com efeito, afirma que a prescrição é conseqüência da inércia do titular

do direito (sic) que tanto pode ocorrer ao ensejo da propositura da ação quanto

ao abandono dos atos que lhe incumbem no curso do processo. O impulso

oficial, que caracteriza o processo do trabalho, também caracteriza o processo

comum e não obsta que o abandono da causa possa ocorrer pela falta de

prática de atos que incumbem à parte (embora os fatos jurídicos sejam

70

Situação jurídica com a qual não podemos hoje comungar, porquanto após o advento da CF/88, é impossível atuar plenamente as garantias constitucionais processuais sem o contraditório, sobretudo porque pode bem a parte demonstrar validamente alguma causa interruptiva da prescrição.

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diferentes – eventual compatibilização deveria vir de lege ferenda, como

proposto no Capítulo 2, item 2.3.1).

A justificar o pensamento exposto, indica o autor cuja obra está sendo

comentantada, que, sob sua percepção, a prescrição intercorrente opera seus

efeitos ope legis, independendo de notificação ou intimação à parte para dar

andamento ao feito, sendo, no entanto, de se destacar que o entendimento

esposado nesta derradeira colocação não se amolda ao processo

constitucionalizado (BATALHA, 1.996, p. 48).

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CAPÍTULO 5

AS RECENTES ALTERAÇÕES LEGISLATIVAS

O passar do tempo sempre teve preponderante relevância para o direito.

A velocidade das informações, contudo, encurtou a sensação de seu

transcurso diante das relações humanas, obrigando o direito a se movimentar

para atender de modo mais ajustado o interesse de seus tutelados.

As inspirações estrangeiras também se tornaram mais fluídas, eis que

no mundo globalizado as distâncias se relativizaram e com os dados

disponíveis mais rapidamente, precisamos transformar o direito nacional de

maneira ágil, preferencialmente buscando um alinhamento com os avanços

experimentados pelos demais países sobre determinada matéria e o tempo

destinado para seu exercício.

Sendo assim, prazos prescricionais foram encurtados e o interesse da

sociedade na administração judiciária está a clamar por um Poder Judiciário

mais transparente, rápido e eficaz71. Nesse diapasão, solapar a pretensão de

quem não exerce seus direitos em tempo razoável atinge o patamar de direito

meta-individual, razão pela qual o legislador habilitou o Juiz a extinguir a

demanda em tais casos, liberando-o para atender direitos verdadeiramente

urgentes e desejados avidamente pelas partes72.

Mais ainda, as sucessivas reformas do CPC, que culminaram com a

abolição da actio iudicati, no campo do cumprimento das sentenças, e com a

implantação em caráter geral da executio per officium iudicis, possibilitaram a

dotação de extraordinário vigor para a inclusão definitiva, na Teoria Geral do

Processo, da prescrição intercorrente, como adiante tratado nos dois últimos

diplomas legislativos aqui referidos, exigindo da doutrina uma rápida geração

71 A despeito da tendência de agilização processual, uma norma recente, a Lei 11.101, de 9 de fevereiro de 2.005, que regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária – LRF, estabelece, em seu artigo 6º, que a decretação da falência ou o processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário, sendo que na recuperação judicial, a suspensão em hipótese nenhuma excederá o prazo de 180 dias. 72 “O processo não pode mais ser encarado sob uma ótica liberal, segundo a qual seu andamento estaria condicionado exclusivamente a atos praticados pelo autor. Também o réu tem interesse em obter solução definitiva da lide e, por isso mesmo, o sistema põe à sua disposição os mesmos mecanismos e oportunidades dadas ao autor. Soma-se a isso o reconhecido interesse estatal em compor a lide, motivo pelo qual os processualistas afirmam que, mesmo versando o conflito sobre direitos disponíveis, uma vez tendo esse sido submetido ao Poder Judiciário, não há mais que se falar em disponibilidade plena, pois exsurge o interesse público em solucioná-lo” (RABELLO, 2.005, p. 25).

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de teorias hábeis à compreensão deste instituto tão importante e até hoje numa

espécie de limbo jurídico.

5.1. EC 28/2.000 – Trabalhadores rurais

O tema prescricional é de tal ordem relevante no âmbito do direito do

trabalho, não é demais repetir, que a própria Constituição Federal o disciplina

no inciso XXIX, de seu artigo 7º, com a redação dada pela EC 28, de 25 de

maio de 2.000, cujo caput afirma que são direitos dos trabalhadores urbanos e

rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XXIX – ação, quanto aos créditos resultantes das relações

de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para

os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois

anos após a extinção do contrato de trabalho.

A Constituição Federal quando veio à luz era mais generosa com os

trabalhadores rurais, conferindo-lhes tutela diferenciada, em virtude da

precariedade de informações legais no campo. Aliás, no passado já era assim,

como no artigo 175, do antigo Estatuto do Trabalhador Rural e da Lei 5.889/73,

e mesmo do artigo 11/CLT. Naturalmente que andou bem por um lado,

porquanto não é razoável a Carta Maior estabelecer distinções entre os

cidadãos, por outro, não menos certo que é que cabe ao estado promover

métodos eficazes para a promoção integral do direito de todos.

O fato é que na gênese o referido inciso XXIX era composto de duas

alíneas, sendo que, na última, letra “b”, estabelecia-se que a demanda do

rurícola poderia ser ajuizada até dois anos após a extinção do contrato, em

situação jurídica muitíssimo mais vantajosa do que a atual, porquanto poderia

ver revisto todo o seu pacto laboral, desde que exercesse seu direito de ação

em até dois anos.

A regra atual manteve derradeira condição, entretanto, ao equipará-lo

com o trabalhador urbano, acabou por suprimir a possibilidade de revisão

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integral de seu ajuste empregatício, sempre que superior a cinco anos

contados da data de extinção do contrato.

A doutrina e a jurisprudência, contudo, trataram de recomendar

aplicação justa da norma, onde o tempo transcorrido antes da vigência da EC

28/2.000 não era contado para efeito de verificação do prazo prescricional do

rurícola. Com isso, a norma nova não teve aplicação retroativa.

A EC 28/2.000 não foi observada em relação a contratos que cessaram

antes de 28 de maio de 2.000. Nesse caso, foi aplicada a lei vigente na data da

cessação do pacto laboral, que não previa limitação de prazo prescricional em

cinco anos. Entender em sentido contrário seria dar efeito retroativo à norma

constitucional. O prazo de cinco anos só poderia mesmo ser aplicado a contar

da vigência (MARTINS, 2.007:2, 44).

5.2. Lei 10.406/02 – Código Civil – Prazos das dema ndas

O Código Civil em vigor, instituído pela Lei 11.406/02, também tratou de

diminuir os lapsos temporais para a extinção da pretensão, a começar pelo tipo

mais genérico, pelo qual no antigo regime a prescrição geral era vintenária,

artigo 177, enquanto pelo artigo 205/NCC ocorre em dez anos, nos casos em

que a lei não fixar prazo menor.

Nem mesmo créditos de natureza existencial escaparam da tosa, haja

vista que a pretensão para haver prestações alimentares era de cinco anos, e

pela regra vigente de apenas dois anos. E assim dentre inúmeras outras

hipóteses descritas na lei civil, seguindo a tendência indistinta de encurtamento

dos prazos prescricionais.

5.3. Lei 11.051/04 – Prescrição intercorrente na LE F/CLT

A Lei 11.051, de 29 de dezembro de 2.004, que acrescentou o § 4º, ao

art. 40, da Lei 6.830/80, que dispõe sobre a cobrança da dívida ativa da

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fazenda pública, conhecida como lei dos executivos fiscais, é aplicável

duplamente perante a Justiça do Trabalho. Primeiro pelas execuções nela

fundadas, em cumprimento ao disposto no inciso VI, do art. 114/CF, que atribui

competência à Justiça do Trabalho para julgar as ações relativas às

penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de

fiscalização das relações de trabalho, e segundo pela regra constante do art.

889/CLT, pelo qual:

aos trâmites e incidentes do processo de execução são

aplicáveis, naquilo em que não contravierem ao presente

título, os preceitos que regem o processo dos executivos

fiscais para a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda

Pública Federal.

Pela regra recém incorporada,

se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido

o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda

Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição

intercorrente e decretá-la de imediato.

Parece de todo oportuno evidenciar que a facultatividade permitida na

norma, quando diz... poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente...,

limita-se exatamente à hipótese disposta, ou seja, o Juiz terá como opção de

aplicar a prescrição intercorrente apenas nos casos em que a verificar de

ofício. Vale dizer, argüida pela parte, sua declaração deverá ser levada a efeito

inexoravelmente, sem a opção referida.

5.4. Lei 11.280/06 – CPC – Conhecimento de ofício d a prescrição

A Lei 11.280/06, que alterou o § 5º, do art. 219/CPC, dispõe que o juiz

pronunciará de ofício a prescrição (a opção constante da norma anteriormente

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comentada deixa de existir), não faz qualquer restrição ao tipo de prescrição

que será reconhecida de ofício, o que pode ensejar o reconhecimento de ofício

da prescrição intercorrente, medida, inclusive, que caminha em sintonia com os

anseios da sociedade, e que se reverberam no Poder Judiciário de modo a

tornar a justiça cada vez mais ágil e efetiva73.

Impõe-se o destaque de que inexistindo o dever da parte argüir a

prescrição, seja ela intercorrente ou não, ocorre um efeito acessório junto à

ciência processual. Surge nova categoria capaz de definir a natureza jurídica

da prescrição intercorrente como ato de ofício. É que, sendo assim e somente

neste caso, ela perde a condição de exceção, fato jurídico típico que apenas

pode existir ante à efetiva alegação da parte, nos moldes do solapado art.

190/NCC.

Ao ensejo, se a prescrição intercorrente for conhecida de ofício pelo

magistrado, sua natureza jurídica passa a ser de ato de lógica jurídica.

O conhecimento de ofício da prescrição, em situação que o eleva à

categoria de norma cogente, é perfeitamente possível, inclusive no âmbito do

Direito Processual do Trabalho, aliás, como já era antes mesmo do implemento

da norma em análise, por força do § 4º, do art. 40/LEF. Entretanto, nesta há

exigência positivada de prévia ciência do credor, justamente para que possa

este apresentar qualquer fato jurídico que se mostre como um óbice.

Na regra destinada aos administrados, ou seja, quando a parte não

conta com a proteção extraordinária que o Estado reserva para si, a lei nada

falou. Todavia, em linha com a busca de uma aplicação democrática do direito

processual, convém à doutrina estabelecer mais uma condição: que a

prescrição intercorrente jamais seja aplicada sem a observância do

contraditório, de modo a que possa também o cidadão comum opor-se através

dos meios dispostos na lei, à aplicação da regra, inclusive renunciando a

prescrição, fato perfeitamente possível no processo comum, conforme art.

191/NCC, como também no especializado, face aos termos do art. 8º/CLT.

73 A questão tem levantado acaloradas discussões, havendo quem enalteça a inovação, bem como quem a rechace com veemência, inclusive fora do espectro dos jusprocessualistas, como Alexandre Freitas Câmara, que concebe o pronunciamento da prescrição de ofício pelo magistrado como uma invasão, absolutamente desarrazoada e irracional, na esfera da autonomia privada dos participantes de dada relação jurídica obrigacional. (CÂMARA, p. 43, 2.006).

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Exclusivamente quanto à sua aplicabilidade no processo do trabalho,

convém destacar algumas conclusões trazidas recentemente pela doutrina.

Para Ney Maranhão,

... a proclamação ex officio, autorizada pelo artigo 219, §

5º, do CPC, com a redação conferida pela Lei 11.290/06,

demonstra que o instituto foi alcandorado ao nível de

matéria de ordem pública; e que o art. 219, § 5º, do CPC

é plenamente aplicável ao Direito Processual do

Trabalho... (MARANHÃO, 2.007, p. 14).

Como a matéria é recente, ainda não se constata uma tendência

doutrinária a despontar como majoritária. E, de igual modo, a questão ainda

está em fase reflexiva junto aos tribunais, sendo que poucos deles chegaram a

apreciar, in concreto.

Opinando como convém a quem se dispõe a escrever sobre dado tema,

entendemos que a norma processual civil pode e deve ser aplicada no

processo do trabalho, pois a entrega da prestação jurisdicional, como bem da

vida que é, em tempo adequado, é matéria de ordem pública74, não podendo o

Estado-Juiz ficar como mero expectador da desídia da parte que, intimada não

dá andamento do feito, sem a possibilidade de fazer algo (extinguir o feito),

sobretudo se depois irá ser questionado sobre o tempo médio de tramitação

dos feitos judiciais. Lado outro, compete ao Juiz, como agente inserido, impedir

a manifestação de casos de abuso de direito.

74 A extinção do processo vai ocorrer por inércia da parte, e não simplesmente para “acabar com o processo”, vez que este não é um dos objetivos do Estado. Com efeito, a celeridade consiste em método de aplicação do direito processual, e não em um fim hábil a solapar as expectativas dos indivíduos, por meios de métodos infraconstitucionais tendentes a facilitar à extinção do processo sem motivação sustentável, bem como incompatíveis com a organização estatal brasileira.

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CAPÍTULO 6

OS EFEITOS DA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº. 45/2.004

A Emenda Constitucional nº. 45, de 8 de dezembro de 2.004, a chamada

Reforma do Judiciário trouxe para a competência da Justiça do Trabalho a

possibilidade de conhecer e julgar todas as pendengas decorrentes de relações

de trabalho, e não mais as históricas relações de emprego, fato jurídico que

transformou a Corte Laboral em Justiça do Trabalho efetivamente, e não mais

em “Justiça da CLT”, eis que lhe ampliou o espectro, permitindo-lhe julgar

todas as demandas fundadas no valor do trabalho.

Andou bem a Emenda Constitucional, porquanto se existe uma Justiça

Especializada em matéria trabalhista, realmente não faz o menor sentido que

questões que lhe são afeitas, por afinidade, sejam apreciadas por Cortes

diversas.

A reforma não foi completa, porquanto parte dessas atribuições ficaram

de fora da possibilidade de conhecimento pela Justiça do Trabalho, como os

crimes contra a administração da justiça, trabalho escravo e assim por diante.

Ademais, por perniciosa interferência da Associação dos Juízes Federais -

AJUFE, entidade que congrega os Juízes da Justiça Federal comum, foi

interposta a ADIN nº. 3.395-6, onde foi requerida a declaração de

inconstitucionalidade do inciso I, do artigo 114/CF, com a redação que lhe foi

dada pela referida EC 45/2.004.

Tal preceito afirma que compete à Justiça do Trabalho processar e julgar

as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito

público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos

Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

A norma é totalmente compatível com a Constituição Federal, entretanto

como importava em supressão de parte da competência da Justiça Federal

comum, motivou o manejo da aludida demanda. E nela, pela pena do Ministro

Nelson Jobim (através de regramento regimental de constitucionalidade

duvidosa, na medida em que não se assenta em nosso sistema orgânico a

declaração de ineficácia da norma maior, por decisão de única pessoa), então

componente do Supremo Tribunal Federal, foi acolhido o pedido liminar

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ficando suspensa, ad referendum, toda e qualquer interpretação dada ao inciso

I, do art. 114/CF, com a redação que lhe foi dada pela EC 45/2.004, que inclua

na competência da Justiça do Trabalho a apreciação de causas que sejam

instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a ele vinculados por típica

relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo, conforme DJ

de 4 de fevereiro de 2.004, sendo a mesma depois referendada pelo Tribunal

Pleno, situação jurídica que persiste até os dias de hoje.

A conseqüência jurisprudencial da alteração levada a efeito na Lei Maior

(EC/45), entretanto, foi o agravamento de um fato que já vinha se verificando

há algum tempo. Referimo-nos ao alinhamento do Direito Processual do

Trabalho com o direito processual comum.

O fenômeno já vinha sendo percebido, sobretudo após o aumento muito

acentuado do número de candidatos ao concurso público de provas e títulos ao

cargo de Juiz do Trabalho Substituto, o que contribuiu para o aprofundamento

do grau de complexidade dos exames, bem como um maior inter-

relacionamento com outras disciplinas constantes do programa fixado pelo

Tribunal Superior do Trabalho. Isso acarretou num recrutamento mais amplo,

do que aquele antigo, dentre os operadores do mundo laboral.

Os magistrados de investidura mais recente, com a magnífica formação

que os levou à aprovação em certame dificílimo, contam com rebuscada

formação em direito processual e, assim, buscam uma atuação mais formal

desse importante seguimento da ciência processual. Assim, sua aplicação junto

ao Processo do Trabalho tornou-se mais refinada, entretanto, mais distante dos

antigos princípios que a colocam na vanguarda de outrora.

O Processo do Trabalho, então, encontra-se, atualmente, mais formal do

que o próprio processo comum. Exemplo disso é a citação para a fase de

conhecimento, ainda necessária entre nós, por conta do art. 880/CLT e já

abolida no processo civil. Situações análogas são percebidas na Ação Civil

Pública, em casos de substituição processual e assim por diante.

Tais fatos geraram ainda deletério efeito decorrente, pois a falta de

atuação do processo do trabalho com seus valores originários fez com que os

mesmos não fossem revistos e atualizados segundo a matriz constitucional

contemporânea.

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Princípios importantes como o da ultra petição, ainda hoje observados

no Direito Processual do Trabalho estrangeiro, ficaram carentes de uma

releitura capaz de adequá-los ao paradigma estabelecido pelo legislador

constituinte, que, afinal, pôs na Constituição Federal inúmeros princípios e

normas garantidoras do direito de ação e do modo de exercer este direito,

constitucionalizando o processo e deixando a CLT um tanto desalinhada com

tais conquistas do povo brasileiro. Destarte a doutrina processual do trabalho

precisa, urgentemente, revisitar seus institutos, para criar teorias novas

capazes de adaptá-los aos preceitos e garantias processuais vigorantes, como

único meio de permitir sua atuação adequada.

Não é só. Os intérpretes que antes tinham o dever se examinar se o

processo comum era compatível com o processo do trabalho, na forma do art.

769/CLT, para sua aplicação suplementar nos casos omissos, hoje precisam

ainda ver se as próprias normas processuais trabalhistas se ajustam bem à

CLT, tamanha é a descaracterização do Direito Processual do Trabalho, por

sucessivas alterações legislativas, que criaram um processo sincrético e sem a

indispensável unidade principiológica e sistemática.

De qualquer forma, a aproximação com o processo comum é um dado

de realidade. Assim, institutos como a prescrição intercorrente, de admissão

mais aceita no processo civil, hão de estar mais presentes no mundo

processual laboral. Por isso, urge que a teoria esteja apta a suportar tais

fenômenos.

O problema é que os estudiosos que gostam de Direito do Trabalho,

para este ramo autônomo da ciência jurídica se dirigem, voltando suas

pesquisas para os fenômenos típicos de direito material. E os investigadores

mais afeitos ao direito processual, ainda que militem em área trabalhista,

emprestam suas inteligências para o desenvolvimento da Teoria Geral do

Processo e o Processo Civil, porquanto mais estrutura é cientificamente mais

atraente e instigante, sob certa perceptiva.

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CAPÍTULO 7

O TRATAMENTO DOUTRINÁRIO DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENT E

APÓS A REVISÃO CONSTITUCIONAL

O cotejo com o passado (Capítulo 4) revela que a percepção do instituto

da prescrição intercorrente, pela doutrina, pouco se alterou.

A dinâmica da vida pressupõe um avançar contínuo. No decorrer dos

tempos, premido pelos avanços, em especial os tecnológicos, que atingem

índices notáveis e que causam surpresa mesmo àqueles com mentes mais

ousadas, o homem ainda sente necessidade de manter regras que assegurem

a paz social e permitam aos indivíduos estabelecer relações obrigacionais

livres do temor de ver propostas contra si demandas fundadas em obrigações

contraídas há longo tempo (LORA, 2.001, p. 17).

No âmbito do processo a atuação de qualquer instituto deve atender

aos ideais democráticos assegurados na Constituição Federal da República

Federativa do Brasil, permitindo um processo democratizado e com intensa

participação do Juiz e das partes para a construção de um provimento plural,

isto é, com garantias plenas de efetiva participação.

Assim sendo, no Estado Democrático de Direito, o Juiz precisa indicar às

partes que o feito encontra-se passível de ser julgado extinto pela ocorrência

de prescrição intercorrente, de modo a possibilitar a um só tempo que o autor

ou exeqüente impulsione o feito ou aponte causas capazes de obstar o fato

central. Ao réu ou executado, embora não caiba, em princípio, qualquer

atividade imediata, resta-lhe ficar suficientemente atento a fim de checar seu ex

adverso tomou as medidas determinadas pelo Juiz ou apresentou fato que

obste a extinção do feito, no prazo assinalado. Isso porque, permanecendo o

demandante de posição de inércia, convém ao demandado fomentar logo a

extinção da demanda.

Vejamos agora como o tema tem sido tratado na doutrina processual

trabalhista, de modo a estabelecer um confronto com o passado, checando

objetivamente se algo mudou, bem como buscar antever as tendências de

aplicação do instituto no futuro, tanto na doutrina quanto na jurisprudência.

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No aporte doutrinário contemporâneo estão sendo considerados autores

que discorrem sobre o instituto da prescrição intercorrente após a

implementação das alterações legislativas indicadas.

A base são os cursos de Direito Processual do Trabalho, de alguns dos

autores mais lidos e comentados, subministrada por artigos constantes de

publicações especializadas.

Carlos Henrique Bezerra Leite aborda a prescrição intercorrente em

duas passagens, sendo a primeira quando trata das possibilidades de resposta

do réu, notadamente em sede de contestação, como contestação indireta de

mérito75 (LEITE, 2.007, p. 505). Depois, após explicitar o dissenso sumular,

tantas vezes referido, assegura categoricamente ser aplicável a prescrição

intercorrente no processo do trabalho, inclusive com pronunciamento de ofício,

nos moldes do § 5º, do art. 219/CPC, bem assim como matéria argüível pelo

demandado.

Diz, então, o Professor Capixaba:

“De nossa parte, pensamos ser aplicável a prescrição

intercorrente no processo do trabalho, como, aliás, prevê

o art. 884, § 1º, da CLT, que consagra a prescrição como

matéria de defesa nos embargos à execução. Ora, tal

prescrição só pode ser a intercorrente76”... (LEITE, 2.007,

p. 505).

No trecho seguinte, admite o instituto sob outra angulação, aduzindo

sem rebuços que:

“... cremos que o executado por argüir a prescrição

intercorrente ou o Juiz pode pronunciá-la de ofício, nos

termos do art. 219, § 5º/CPC”... (LEITE, 2.007, p. 505).

75

Bezerra Leite afirma que há mais de um modo do réu opor-se ao mérito (pedido) formulado pelo autor, daí porque a contestação pode ser direta ou indireta. Assim, afiança que na contestação indireta de mérito, também cognominada de exceção substancial, o réu reconhece o fato constitutivo do direito do autor, mas opõe um outro fato impeditivo, modificativo ou extintivo do pedido formulado na petição inicial. Os primeiros provocam a ineficácia dos fatos constitutivos alegados pelo autor; os segundos implicam em alteração dos fatos constitutivos, enquanto os derradeiros são os que eliminam ou tornam sem valor a obrigação assumida pelo réu (LEITE, 2.007, p. 499). 76

Com a devida venia vamos discordar, porquanto a prescrição tratada na norma em comento não é a intercorrente e sim da pretensão executiva, como já explicitado neste trabalho.

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A guisa de fundamentação do entendimento esposado, opõe-se ainda

aos entendimentos daqueles que afirmam que assim procedendo estaria o Juiz

violando o art. 878/CLT (impulso ex officio), argumentando que a execução

trabalhista pode se iniciar de ofício, mas a liquidação por artigos depende de

iniciativa da parte77. E que sem o título executivo líquido e certo, não há como

ser promovida a execução. 78

Lembra ainda o § 4º, do art. 40/LEF, ratificando sua possibilidade de

aplicação de ofício da matéria aqui tratada, destacando ainda que após a

ampliação da competência da Justiça do Trabalho, o assunto há de fomentar “a

cizânia doutrinária e jurisprudencial”, ob. cit. p. 506, o que é fato incontestável e

este trabalho procurar começar a harmonizar.

Na fase de execução, volta ao tema, quando aborda as matérias

passíveis de argüição em sede de embargos do executado79, § 1º, do art.

884/CLT (LEITE, 2.007, p. 967), salientando que a prescrição de que trata a

norma não é aquela que poderia ter sido alegada (daí a crítica levada a efeito

na nota de rodapé na página anterior) pelo réu no processo de conhecimento,

consubstanciada na Súmula 153/TST, e sim aquela que surge após o

reconhecimento do crédito pela sentença exeqüenda ou relativa à pretensão do

credor de título executivo extrajudicial. Vale dizer, a prescrição que diz respeito

à fase de execução, indicando ser o caso de aplicação da Súmula 150/STF,

pela qual “prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação”.80

Acrescenta mais, afirmando que a modalidade de prescrição

superveniente à sentença é de difícil aplicação no processo do trabalho na

execução de título judicial, porquanto a lei permite que tal modalidade

executória possa ser promovida de ofício, mas que em se tratando de

77

Idem enquanto pender condição suspensiva a cargo do credor. 78

O entendimento comentado merece, contudo, discreta e respeitável observação, porquanto estava o autor a falar de aplicação da prescrição intercorrente em fase de conhecimento e estrutura seus argumentos em fato da fase de execução, o que não parece sistematicamente adequado. 79

Expressão que o tratadista prefere à de embargos do devedor, porquanto, no seu dizer, as Leis 11.232/05 e 11.382/06 extinguiram o processo de execução de título judicial, salvo quanto à Fazenda Pública, e mantiveram apenas os embargos do executado na hipótese de processo de execução por título extrajudicial. E ainda porque qualquer interessado pode promover a execução, art. 878/CLT (LEITE, 2.007, p. 959). 80

Necessário esclarecer que o verbete 153, da Súmula do TST, diz que: “não se conhece de prescrição não argüida na instância ordinária”, sendo o mesmo inserido por meio da RA 102/1.982. E a matéria está disciplina de modo totalmente diverso pelo art. 193/NCC, que preceitua que a prescrição pode ser argüida em “qualquer grau de jurisdição”.

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execução de título extrajudicial, incide a referida Súmula no processo do

trabalho81.

O problema das súmulas antagônicas também é colocado (327/STF

versus 114/TST), mas o autor dá razão ao STF, porquanto intimado o

exeqüente para ato que só a ele incumbe e o interessado permanece inerte por

mais de anos, pontifica que, “nesse caso, poderá o Juiz da execução, mediante

requerimento do devedor nos embargos opostos, pronunciar a prescrição

intercorrente e julgar extinto o processo de execução” (LEITE, 2.007, p. 968).

Anui também com o § 4º, do art. 40/LEF, reconhecendo ser a regra

aplicável ao processo do trabalho, consoante art. 889/CLT82.

O tema da prescrição intercorrente é tratado duas vezes na obra de

Cleber Lúcio de Almeida, uma vez na fase de conhecimento, no capítulo que

estuda processo e procedimento e outra na fase de execução, quando comenta

a matéria dos embargos previstos no § 1º, do art. 884/CLT (ALMEIDA, 2.006,

p. 291 e 940).

Conceitua a prescrição intercorrente como a que se verifica no curso do

processo, em face da omissão da parte no seu impulso e, como não poderia

deixar de ser, apresenta o incompreensível hiato sumular. Dito isto, apoiado na

obra de Aroldo Plínio Gonçalves referida no Capítulo 4, aduz que com o

impulso oficial preconizado no art. 262/CPC, pelo qual o processo começa por

iniciativa da parte, mas se desenvolve por impulso oficial, e com a regra

inserida no art. 765/CLT, que, no seu dizer, encampa o aludido impulso oficial,

conclui que não cabe no processo do trabalho a prescrição intercorrente83, por

incompatibilidade com o impulso oficial.

81

Também escrevendo sobre a prescrição intercorrente nos dias atuais, Arnor Serafim Junior sustenta que sua admissão no processo trabalhista, embora intensamente controvertida, é perfeitamente possível, propondo ainda que ela se configura como ’gênero’, de modo a que possa atuar nas diversas fases processuais, havendo pelo menos três ‘espécies’, no seu dizer: a) no processo de conhecimento (pretensão condenatória); b) na fase de liquidação de sentença condenatória (pretensão executória), e, c) no processo de execução propriamente dito, ou seja, excluída a fase de acertamento, liquidação ou pré-execução (SERAFIM JUNIOR, 2.006, p. 84). 82 Outro autor contemporâneo acentua que se nenhuma manifestação juridicamente consistente for apresentada pelo credor, declarará o Juiz, ex officio, extinta a execução, com julgamento de mérito, por força do decurso da prescrição bienal trabalhista. Caso contrário, encontrar-nos-íamos diante da esdrúxula situação de vermos os arquivos da Justiça do Trabalho abarrotados de autos poeirentos à espera infinda de que o devedor apareça para quitar o débito ou de que sejam bens para serem penhorados. É óbvio que tal atitude não se coaduna com os princípios processuais da celeridade, da economia e da racionalidade (PRATA, 2.007, p. 9). 83

No mesmo sentido o magistério de Manoel Carlos Toledo Filho, para quem, na exata medida em que o direito do trabalho tem por seu instrumento de viabilização o processo judicial que lhe é correlativo, o princípio de proteção a este igualmente se agrega. E, assim, as regras de direito processual comum prescindem de um prévio e pleno enquadramento na moldura do princípio de proteção, sendo essa a premissa de sua eficácia. E vai mais longe, assegurando que o Juiz do Trabalho ao aplicá-la estará contribuindo para a debilitação do direito material pela via do processo (TOLEDO FILHO, 2.006, p. 70).

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Abre, contudo, uma exceção, afirmando que quando o feito fica

paralisado por mais de dois anos, na fase de execução (talvez melhor fosse

especificar a fase de liquidação), por reiterada omissão do exeqüente, argüida

a prescrição, pode ela ser acatada pelo Juiz executor.

O livro Direito Processual do Trabalho, de Sérgio Pinto Martins, já está

na 27ª edição, fato que o coloca como um estupendo sucesso editorial. Nele a

prescrição intercorrente é abordada em duas oportunidades, uma na fase de

conhecimento, como uma das possibilidades de defesa do réu, e outra vez

como matéria passível de alegação nos embargos à execução, portanto em

fase executória.

Antes de chegar à parte que mais nos convém, faz preciosa crítica ao

abordar a prescrição, salientando entender que a regra contida no art.

193/NCC (a prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, pela

parte a quem aproveita) fere o contraditório e é inconstitucional, por macular o

inciso LV, do art. 5º/CF. Sustenta que prescrição é matéria de defesa, na qual o

réu deve alegar todos os motivos de fato e de direito com que impugna a

pretensão do autor, nos moldes do art. 300/CPC, onde se inclui a prescrição.

Logo a prescrição não pode ser alegada após ser oferecida a defesa, pois viola

o contraditório e suprime instância (MARTINS:2, 2.007, p. 293).

Adiante afirma ser aplicável ao processo do trabalho a norma contida no

§ 5º, do art. 219/CPC, com a redação que lhe foi dada pela Lei 11.280/06, por

inexistir regra expressa na CLT sobre a matéria, razão pela qual entende ser

aplicável a normatividade do processo comum.

Sobre a compatibilidade, art. 769/CLT, sustenta:

“... a nova redação do § 5º do art. 219 do CPC prestigia

mais a segurança jurídica e a celeridade processual, em

detrimento do direito do credor e da justiça do direito

postulado... trata-se de norma jurídica de ordem pública84,

que será aplicada de ofício pelo Juiz. O processo não

pode ficar tramitando longos anos se existe a prescrição.

84

No particular alinha-se ao posicionamento aqui defendido, convindo conosco que: “É dever do Estado velar pela rápida solução dos litígios entre as partes. De certa forma, é a aplicação do inciso LXXVIII, do art. 5º/CF, no sentido de que, no âmbito judicial, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (MARTINS:2, 2.007, p. 294).

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Sob esse aspecto envolve economia processual na

tramitação do processo, evitando a prática de atos inúteis

para depois ser declarada a prescrição” (MARTINS:2,

2.007, p. 294).

Esta a parte em que aborda a prescrição em fase de conhecimento, na

forma apontada. Não trata, objetivamente, sobre a prescrição intercorrente

nesta fase do processo. Entretanto, ao asseverar que a prescrição de ofício é

aplicável ao processo do trabalho, e como tal norma não exclui ou veda sua

aplicação intercorrente, de modo incidental podemos concluir que Pinto

Martins, acaba por admitir a prescrição intercorrente no processo trabalhista.

Razoável ainda inferir que para tanto a prévia intimação do ex adverso é

imprescindível, porquanto o único meio pelo qual se pode efetivamente

assegurar o princípio constitucional do contraditório, exaltado na obra em

referência.

Na parte que trata da matéria que pode ser argüida em embargos à

execução, por óbvio na fase executiva, item “27.19.1.1”, página 707, dedica

todo um tópico à matéria. O problema é colocado em sede doutrinária, onde a

conclusão a que se chega é a seguinte:

“A prescrição de que fala o § 1º do art. 884/CLT só pode

ser, porém, a prescrição intercorrente85, quando a parte

vai alegá-la nos embargos, pois é a prescrição que corre

na execução. Assim, se a própria CLT regula a matéria,

não há como se aplicar a Lei 6.830/80. No entanto, a

posição que prevalece na Justiça do Trabalho é a da

Súmula 114 do TST. Mesmo em se tratando se prescrição

intercorrente, o Juiz pode declará-la de ofício, § 5º do art.

219 do CPC” (MARTINS:2, 2.007, p. 707-708).

Interessante notar, ao final, que pela sua ótica a existência da

normatividade preconizada no § 1º, do art. 884/CLT, exclui a aplicação do § 4º,

85

Convém realçar mais uma vez a possibilidade de ser, data venia, a prescrição da pretensão executiva.

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do art. 40/LEF, em posição sui generis, não encontrada nos demais autores

verificados.

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CAPÍTULO 8

A COMPREENSÃO SUMULAR E OS VALORES POSTOS PARA

HARMONIZAÇÃO DOS VERBETES PRESCRICIONAIS COM O PROC ESSO

CONSTITUCIONALIZADO

O direito ocidental conhece basicamente dois grandes sistemas

jurídicos, um o da common law, utilizado predominantemente nos países anglo-

americanos, e outro, da civil law, de tradição romanística, formado pelas

nações latinas e germânicas86. Entretanto, longe de serem antagônicos, estão

cada vez mais se aproximando, quase que numa suplementação, como

assinala (MEDEIROS, 2.005, p. 75) para quem o juiz dos países deste último

sistema está construindo o direito, pela jurisprudência, e os juízes do sistema

da common law utilizando-se da lei (statute law) para fundamentar suas

decisões.

A fiscalização judicial dos atos públicos e privados, em proporção cada

vez maior, faz com que as supremas cortes envolvam-se de modo crescente

com atividades judicantes, tais como os demais tribunais superiores e as cortes

intermediárias. Então, o complexo fenômeno jurídico da atualidade faz com que

haja uma busca por efetividade, fazendo com que os tribunais procurem se

orientar por seus precedentes, pelas decisões paradigmáticas, que acabam por

consolidar-se em modelos para futuras resoluções que digam respeito a casos

semelhantes, o que, no dizer de (LARENZ, 1.997, p. 611), “é útil à uniformidade

e à continuidade da jurisprudência e, ao mesmo tempo, sobretudo à segurança

jurídica”.

Podemos dizer que a justiça brasileira já nasceu sumulada, porquanto a

mudança da corte portuguesa para o Brasil, ensejou a edição do Alvará de 10

de maio de 1.808, criando na colônia uma Casa de Suplicação, sendo por aqui

86 O sistema de direito romano-germânico formou-se na Europa Continental e é aí que ainda hoje conserva o seu principal centro, ainda que, devido aos fenômenos de expansão ou recepção, numerosos países extra-europeus tenham aderido a este sistema ou extraído dele alguns dos seus elementos. É possível, entretanto, estabelecer relações entre as duas famílias. Países de direito romano-germânico e países de common law tiveram uns com os outros, no decorrer dos séculos, numerosos contatos. Por isso, quanto à substância, soluções muito próximas, inspiradas por uma mesma idéia de justiça, são muitas vezes dadas às questões pelo direito nas duas famílias. A tentação para falar de uma família de direito ocidental é tanto mais forte quanto é certo que existem, em certos países, direitos que não se sabe bem a qual das duas famílias pertencem, na medida em que tiram alguns elementos de cada qual. Entre estes direitos mistos podem citar-se os direitos da Escócia, de Israel, da África do Sul e das Filipinas (DAVID, 1.993, p. 20).

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considerada o Superior Tribunal de Justiça, que, mais tarde, deu origem o

Supremo Tribunal Federal. E considerando-se que a referida Casa de

Suplicação tinha os mesmos poderes da lisboeta, os assentos (equivalentes às

súmulas) da corte de origem acabaram por ter valor também no Brasil,

sobretudo porque somente a partir de 1.850, com o famoso Regulamento 737,

o Brasil passou a dispor de leis próprias sobre organização judiciária.

O Supremo Tribunal Federal, contudo, sempre resistiu em aplicar os

assentos da antiga Casa de Suplicação, entretanto, nada fez, objetivamente,

para alterar esta situação durante muito tempo. E somente com uma emenda

de seu Regimento Interno, datada de 28 de agosto de 1.963 é que veio a

instituir a “súmula da jurisprudência predominante”, levando a doutrina

(STRECK, 1.998, p. 109), a asseverar que embora prevista pela primeira vez

no direito brasileiro em 1.973, com o advento do art. 479/CPC, que diz verbis: o

julgamento, tomado pelo voto da maioria absoluta dos membros que integram o

tribunal, será objeto de súmula e constituirá precedente na uniformização da

jurisprudência, as súmulas já eram utilizadas entre nós desde 1.964, pelo

Supremo Tribunal Federal87.

O fato é que as súmulas caíram no gosto brasileiro, a tal ponto que a

EC/45, de 2.004, acresceu o art. 103-A, na Constituição Federal, dispondo que

o Supremo Tribunal Federal poderá de ofício ou por provocação, mediante

decisão de dois terços dos seus membros, depois de reiteradas decisões sobre

matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na

imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder

Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal,

estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na

forma estabelecida em lei, tudo conforme regulamento feito pela Lei 11.417/06.

Para o Direito Processual do Trabalho, contudo, tais permissivos não

encerram tanta novidade. Isso porque, o antigo § 1º, do art. 902/CLT assim

prescrevia: “Uma vez estabelecido o prejulgado, os Tribunais Regionais do

Trabalho, as Juntas de Conciliação e Julgamento e os Juízes de Direito

87

Ainda de acordo com Streck, as súmulas não são elaboradas mediante um processo autônomo. Na verdade, são elas o produto, enfim, o resultado do procedimento de uniformização da jurisprudência, consoante o art. 479/CPC. Ob. cit. p. 112.

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investidos na jurisdição da Justiça do Trabalho ficarão obrigados a respeitá-lo”,

numa acepção extra-constitucional de prejulgado vinculante88.

Tal norma, a despeito de ter o extraordinário valor de ser uma norma de

vanguarda, tanto que, como visto dois parágrafos antes, veio a se

consubstanciar em norma constitucional (art. 103-A/CF), era, consoante a

Carta Magna da época, inconstitucional, conforme posicionamento da Corte

Suprema e conduzindo à sua revogação pela Lei 7.033/82.

Não é demasiado destacar que precedente judicial deve ser entendido

como a decisão anterior de um caso semelhante submetido a julgamento.

Assim, os precedentes decorrem das decisões dos tribunais superiores e

devem ser observados pelos demais Juízes integrantes da estrutura judiciária.

Nem tudo que consta do julgado se configura precedente, porquanto

apenas as questões de direito se dirigem aos casos futuros e somente deve ser

respeitado aquilo que for considerado necessário para a decisão. Esse

princípio denomina-se ratio decidenti (princípio geral que justifica o caso), que

se contrapõe ao obter dicta ou dicta (pronunciamentos não indispensáveis) –

vide nota de rodapé nº. 2 (AGUIAR, 2.005, p. 174).

No âmbito do Tribunal Superior do Trabalho foram criadas as Súmulas

por proposta elaborada pelos Ministros Raymundo de Souza Moura, Tostes

Malta e Lima Teixeira, cuja iniciativa foi incorporada pelo Regimento Interno

daquela corte, publicado no DJU de 18.12.79, cujo texto atual repete que as

teses sobre as quais haja jurisprudência uniforme no Tribunal Pleno serão

consubstanciadas em súmulas, para os efeitos dos artigos 894, b e 896, da

Consolidação das Leis do Trabalho.

O vocábulo súmula vem do latim, summula, significando sumário ou

restrito. E em sentido jurídico, os objetivos primordiais da Súmula89 são

estabilizar a jurisprudência e facilitar a missão dos interpretes do direito, os

quais seguem os “standards” voluntária ou compulsoriamente, conforme sejam

ou não vinculantes, na crença de que são decorrentes da percepção de

experimentados juristas, ou seja, valem como paradigmas que explicitam o

88

As súmulas classificam-se em persuasivas ou vinculantes. A primeira carece de impositividade, enquanto a derradeira é obrigatória, ou seja, erga omnes. Convém ainda lembrar que o precedente pode ser caracterizado pela força que promana do ratio decidendi. Dessa força não participa os dicta que tem força apenas persuasiva (SÁ, 1.996, p. 62). 89

Não é demais lembrar que Súmula é o conjunto de decisões de uma corte de justiça, ou seja, ela é única por tribunal. Múltiplos, portanto, são os seus tópicos, tecnicamente chamados de verbetes.

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direito, servindo como proposta de solução para as controvérsias que estejam

sendo analisadas90.

A doutrina formula ainda uma classificação de Súmulas (STRECK,

1.998,p. 169, 174, 182 e 193), indicando que há Súmulas tautológicas, que

valem mais pelo fato de serem Súmulas do que pelo próprio conteúdo, ou seja,

para segurança jurídica; Súmulas intra legem, meramente interpretativas,

assumindo função calibradora dos marcos formais do ordenamento jurídico;

Súmulas extra legem, que visam ampliar ou restringir a norma e, por fim, as

Súmulas contra legem, que extrapolam os limites da própria norma,

contrariando-a.

O que a Súmula efetivamente não poderá fazer é, ao lado de seu

indispensável papel de uniformizar a jurisprudência, se estabelecer como uma

forma alternativa das funções jurisdicional e legislativa, excluindo-as,

preterindo-as, ou, tampouco, sacrificando-as (NEVES, 1.983, p. 652/653).

Seu limite é, portanto, o de mera sistematização jurisprudencial,

unificando-a para uma aplicação otimizada e ágil, de acordo com a

normatividade concebida para um direito democrático.

Assim, se a própria lei, norma em sentido genuíno para ser aplicada

deve prover de fonte totalmente orientada segundo matriz constitucional, com

muito mais razão a súmula para que seja hábil a produzir seus efeitos precisa

estar focada nas garantias constitucionais. Isso porque, o acesso à jurisdição

ocorre mediante o direito de ação criado pela norma constitucional, podendo,

inclusive, ser entendido como sendo direito fundamental incondicionado de

movimentar a jurisdição, através da instauração do procedimento, e de

participar na construção do provimento, através da discursividade, no âmbito

da processualidade (LEAL, 2.004, p. 78/79).

90 BRASIL. Art. 103-A/CF. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício, ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais, órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esfera federal, estadual, e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. § 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de norma determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre os órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica. § 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor ação direta de inconstitucionalidade. § 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar súmula aplicável ou indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso.

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113

Nesse diapasão, a despeito do aspecto pragmático da adoção das

súmulas, que se revelam oportunas pela urgência de nossos dias e hábeis para

viabilizar julgamentos céleres, esgotando os estoques de distribuição nos

tribunais, parte da doutrina censura a adoção de súmula vinculante como

padrão de julgamento. Isso porque, a fundamentação das decisões judiciais

pressupõe o arrazoado trazido pelas partes no caso específico, bem como a

motivação das decisões judiciais, enquanto certo é que súmula, por si só, não é

fundamento e tampouco enseja, para sua criação, essa atividade preliminar

(com a participação de todos os interessados) no seio dos tribunais, respeitado

o contraditório e a ampla defesa.

Sendo assim, essa corrente sustenta que as súmulas são criadas em

realidade nua, ou seja, antes da instauração do processo, em uma realidade

não processualizada. Por conseguinte, as súmulas vinculantes não se

submetem à fiscalidade ampla e nem mesmo ao controle de

constitucionalidade, além de acabar por impedir a revisibilidade do

ordenamento jurídico (AGUIAR, 2.005, p. 196).

A crítica precisa ser analisada, pois considerando-se que nem toda

súmula é vinculante, tal entendimento conduz ao raciocínio que as súmulas

persuasivas podem ser válidas, desde que reflitam as garantias normativas.

Ademais, sequer as súmulas vinculantes são permanentes, sujeitando-se à

fiscalização incessante, por intermédio de prequestionamentos e de revisão ou

cancelamento por meio de provocação de todos os legitimados para ação

direta de inconstitucionalidade, conforme estabelecido no § 2º, do art. 103-

A/CF. Quanto à reversibilidade, basta que a parte demonstre em sua demanda

que inexiste plena adequação do verbete à hipótese, que afastada estará a

aplicação no caso concreto. E para concluir, há todo o posicionamento

doutrinário capaz de fornecer subsídios para a própria corte, por conta própria,

rever a conveniência de sua manutenção. Idem no tocante às alterações,

porquanto podem decorrer de inúmeros fatores, sendo usual o cancelamento

ou a revisão em virtude de alterações legislativas.

Evidentemente que pelos demais caminhos, ou seja, por construção

doutrinária e através de estímulos fornecidos nos processos pelos advogados,

a via é bem mais longa e sacrificada, mas nada que impeça o inexorável

avanço da ciência jurídica e o valor da jurisprudência estratificada.

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114

Além disso, o modelo constitucional de escolha de juízes (que são os

produtores de súmulas), por meio de concurso público de provas e títulos é

legítimo e consubstanciado no art. 93, da Constituição Federal, ou ainda

mediante a indicação de seus nomes em listas provenientes do Ministério

Público e da Ordem dos Advogados do Brasil, para a indicação pelo Chefe do

Poder Executivo, sendo este critério com arrimo na art. 94, da aludida Carta. E

considerando-se ainda que aos magistrados dos tribunais é assegurado o

direito de reunir sua jurisprudência uniforme em súmula (art. 103-A/CF), as

súmulas concebidas são dotadas de criteriosa legalidade.

Toda essa situação se amolda perfeitamente com os objetivos maiores

do Estado brasileiro, em sua expressão mais moderna, e em linha com o

propósito declarado no inciso LXXIII, do art. 5º/CF (acrescentado pela EC

45/2.004, a chamada Reforma do Poder Judiciário), que garante a todos, no

âmbito judicial e administrativo, a duração razoável do processo e os meios

que garantam a celeridade de sua tramitação.

A tramitação em tempo adequado, entretanto, jamais pode se descuidar

das garantias constitucionais processuais, vez que a velocidade no espaço

procedimental precisar atuar em sintonia com o devido processo constitucional

e observando-se o princípio da reserva legal, como bem assinalado na obra de

Fernando Horta Tavares, para quem:

“O novo princípio de direito fundamental da duração

razoável do procedimento (e não do processo) e da

celeridade de tramitação deve ser aplicado em estrita

complementariedade com os demais princípios regentes

da processualidade, isto é, isonomia, contraditório e

ampla defesa, de modo a se dar uma interpretação

sistêmica a este novo direito-garantia, também de índole

fundamental, como os demais” (TAVARES, 2.006, p. 223).

A disposição normativa posta em relevo cria um verdadeiro direito

fundamental à razoável duração do processo (certamente melhor estaria dito

procedimento, lembramos mais uma vez, convindo ainda com o autor supra

mencionado, mas seguimos com a terminologia observada na Constituição

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Federal), pois os direitos fundamentais constituem uma categoria jurídica,

constitucionalmente erigida e vocacionada à proteção da dignidade humana em

todas as dimensões, ou seja, exatamente o que significa um processo com

tempo adequado91.

A doutrina constitucional afirma que os direitos fundamentais possuem

natureza poliédrica, prestando-se ao resguardo do ser humano na sua

liberdade (direitos e garantias individuais), nas suas necessidades (direito

econômicos, sociais e culturais) e na sua preservação (direitos à fraternidade e

à solidariedade). Note-se, nesse aspecto, que os direitos fundamentais passam

a assumir também uma dimensão institucional, na medida em que pontuam a

forma de ser e atuar do Estado que os reconhece. Assim sendo, o Estado que

os proclama e protege assume uma formatação específica, estabelecida na

pauta de direitos fundamentais que encampa (ARAÚJO, 2.006, p. 111). E o

processo que não tarda em demasia atende a todos esses valores supremos

da dignidade humana e, assim, deve ser entendido e promovido pelo Estado.

Isso é tão expressivo que nos faz pensar se não estaríamos diante de

uma quinta geração de direitos humanos, lembrando que são de primeira

geração os direitos que fundamentam a liberdade, civil e politicamente

considerada; de segunda, os que asseguram a igualdade; de terceira aqueles

que abordam a fraternidade e a solidariedade, enquanto são chamados direitos

de quarta geração o direito à democracia, à informação e ao pluralismo

(BOBBIO, 1.990, p. 69/93, passim).

O direito ao exercício do direito de ação, com um processo de duração

razoável de tempo, suplanta todos os objetivos fundamentais do Estado até

aqui, pois permite ao cidadão, não só exercer o seu direito, mas obtê-lo em

num espaço de tempo satisfatório, ou seja, útil às suas necessidades e

expectativas.

Só assim a resposta estatal atenderá aos anseios sócio-culturais e

afetivos das partes, bem como saberão os seus convivas que o direito não

respeitado oportunamente foi devidamente reparado por meio de inflexão

estatal. E isso estabelece um fator cultural capaz de compelir às pessoas a

respeitarem voluntariamente o direito das outras, porquanto previamente

91 Também assim considera, em posicionamento pioneiro, Manoel Gonçalves Ferreira Filho, cf. Curso de Direito Constitucional, 32ª ed. Saraiva. São Paulo. 2006, p. 251.

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cientes que, de outro modo, serão processadas para tanto e que a resposta

não tardará.

Não é demais incluir o próprio Estado nisso, porquanto sabemos que até

ele conta com a morosidade de seu processamento, incluída a fase executiva,

o que lhe estimula a atuar políticas desajustadas com os princípios que se

obriga a reconhecer.

Temos, diante disso, que a duração do processo em tempo adequado

reverte como proveito para todos, não só para os litigantes. Um verdadeiro

fator de promoção social, educando os cidadãos.

Para concluir, a consideração de que o Direito Processual do Trabalho

também trata especificamente sobre o direito sumular, no § 3º, do art.

896/CLT92, verdadeiro stare decisis, salientando que os Tribunais Regionais do

Trabalho procederão, obrigatoriamente, à uniformização de sua jurisprudência,

nos termos do Livro I, do Título IX, Capítulo I, do CPC93, não servindo a súmula

respectiva para ensejar a admissibilidade do recurso de revista quando

contrariar Súmula da Jurisprudência Uniforme do Tribunal Superior do

Trabalho. Há, pois, necessidade de se demonstrar o preenchimento das

hipóteses dispostas em suas alíneas.

A divergência jurisprudencial ensejadora da admissibilidade, do

prosseguimento e do conhecimento do recurso há de ser específica, revelando

a existência de teses diversas na interpretação de um mesmo dispositivo legal

(o que na praxe forense leva à transcrição de inúmeros julgados, os quais,

hoje, são facilmente baixados dos sites dos próprios Tribunais Regionais),

embora idênticos os fatos que ensejaram, conforme Súmula 296/TST.

A comprovação da divergência, aliás, também se encontra sumulada,

nos moldes do verbete 337/TST, indicando os passos que a parte deve

92

A norma apontada está com a redação que lhe foi dada pela Lei 9.756/98, que, por sua vez, limita-se a reproduzir o artigo 14, da Lei 7.701/88 (norma exclusiva de Direito Processual do Trabalho), cujo objetivo é disciplinar o funcionamento das Turmas do TST. 93 O título em referência trata do processo nos tribunais, enquanto o capítulo da uniformização da jurisprudência. BRASIL. CPC. Art. 476. Compete a qualquer Juiz, ao dar o voto na turma, câmara ou grupo de câmaras, solicitar o pronunciamento prévio do tribunal, acerca da interpretação do direito quando: I – verificar que, a seu respeito, ocorre divergência; II – no julgamento recorrido a interpretação for diversa da que lhe haja dado outra turma, câmara, grupo de câmaras reunido. Parágrafo único. A parte poderá, ao arrazoar o recurso ou em petição avulsa, requerer, fundamentadamente, que o julgamento obedeça ao disposto neste artigo. Art. 477. Reconhecida a divergência, será lavrado o acórdão, indo os autos ao presidente do tribunal para designar sessão de julgamento. A secretaria distribuirá a todos os juízes cópia do acórdão. Art. 478. O tribunal, reconhecendo a divergência, dará a interpretação a ser observada, cabendo a cada Juiz emitir seu voto em exposição fundamentada. Parágrafo único. Em qualquer caso, será ouvido o chefe do Ministério Público que funciona perante o tribunal. Art. 479. O julgamento, tomado pelo voto da maioria absoluta dos membros que integram o tribunal, será objeto de súmula e constituirá precedente na uniformização da jurisprudência.

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preferencialmente seguir a fim de ter êxito. O indicativo é no sentido da parte

juntar certidão ou cópia autenticada do acórdão paradigma, ou ainda citar a

fonte oficial ou o repositório autorizado em que foi publicado; compete-lhe,

igualmente, transcrever, nas razões recursais, as ementas e/ou trechos dos

acórdãos trazidos à configuração do dissídio, demonstrando o conflito de teses

que justifique o conhecimento do recurso, ainda que os acórdãos já se

encontrem nos autos ou venham a ser juntados com o recurso.

A divergência apta a ensejar o recurso de revista deve ainda ser atual,

não se considerando como tal a ultrapassada por Súmula, ou superada por

iterativa e notória jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, nos moldes

do § 4º, da aludida norma.

Relevante ainda fazer menção ao fato de que cabe recurso de revista

para Turma do TST das decisões proferidas em grau de recurso ordinário, em

dissídio individual, pelos Tribunais Regionais do Trabalho, quando derem ao

mesmo dispositivo de lei federal interpretação diversa da que lhe houver dado

outro Tribunal Regional, no seu Pleno ou Turma, ou a Seção de Dissídios

Individuais do TST, ou a Súmula de Jurisprudência Uniforme da Corte,

conforme o caput do art. 896/CLT, c/c sua alínea a, e também que, a

jurisprudência é fonte de Direito Processual do Trabalho, por disposição

expressa, contida no art. 8º/CLT.

8.1. Modelos estatais: liberal, social e democrátic o de direito e a

função do Poder Judiciário em cada um deles.

Antes de se atingir o cerne da questão, importante é contextualizar o

ambiente que propiciou o surgimento o direito do trabalho e, por conseguinte, o

Direito Processual do Trabalho, de modo a explicitar, ainda que en passant seu

caráter de atuação sui generis, isto é, levando em consideração à disparidade

de forças entre os litigantes, ao contrário do direito civil, privatista como era

dois séculos atrás, o que o tornou um tanto revolucionário94.

94

O Direito Processual do Trabalho, enquanto esteve fiel às suas origens, sempre foi um direito de vanguarda, servindo-se de valores e critérios avançados para o seu tempo. Por isso, mal compreendido, foi injustamente taxado de

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Esses matizes se harmonizavam com o modelo de estado adotado, qual

seja o Estado Liberal, e não destoaram no Estado Social. Entretanto, para

atuação no âmbito do Estado Democrático de Direito, carece de alguma

reestruturação, possibilitando seu alinhamento com os anseios da sociedade

contemporânea, porquanto este último modelo consiste no resultado do

entrelaçamento dos princípios do Estado Democrático e do Estado de Direito, o

que ocorre através das normas constitucionais, sobretudo porque democracia

mais do que uma forma de Estado e de governo, é um princípio consagrado

nos modernos ordenamentos constitucionais como fonte de legitimação de

exercício do poder, que tem origem no povo (DIAS, 2.004, p. 102).

No primeiro modelo de estado aqui listado (que vai do fim do Século

XVIII até a Primeira Guerra), temos a afirmação da supremacia do indivíduo, a

necessidade de limitação do poder dos governantes e a crença quase religiosa

nas virtudes da razão, apoiando a busca da racionalização do poder (DALLARI,

1.995, p. 169), eis que no modelo anterior, absolutista, a figura do rei, do líder,

e, por que não do empregador, eram capazes de limitar a liberdade do

indivíduo e a estrutura política do momento exigia uma ruptura com o status

quo. A igualdade então devia derivar da lei, vontade teórica da maioria

representada pelos legisladores, mas que não se revelou capaz de garantir,

efetivamente, os direitos individuais tão desejados, por meio de inflexão estatal.

Assim, cabia ao Poder Judiciário dirimir conflitos interparticulares ou,

conforme o modelo constitucional, entre esses e a administração pública,

quando provocado, através de procedimentos devidos, aplicando o direito

material vigente de modo estrito, através de processos lógico-dedutivos de

subsunção do caso concreto às hipóteses normativas, sob os ditames da

igualdade formal, estando sempre vinculados ao sentido literal, no máximo

lógico, da lei, enfim, sendo a boca da lei (CATTONI DE OLIVEIRA, 1.998, p.

38/39).

A classe operária passou a ter espaço político, todavia ainda carente de

normatividade garantidora dos direitos sociais, já reconhecidos. Destarte surgiu

novo modelo constitucional de estado, o conhecido Estado Social, campo fértil

atécnico. O tempo passou, a ciência processual percebeu que ali estavam empregados métodos proveitosos e tratou de “inovar” o direito processual comum com seus regramentos. O fez em relação aos procedimentos, à técnica de conciliação, à audiência, e, mais recentemente, no tocante à execução. Lamentavelmente, no decorrer disso, os juslaboralistas numa tentativa de sistematizar o Direito Processual do Trabalho, ao aumentarem sua tecnicidade, o aproximaram do processo comum, importando em penoso retrocesso.

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para o desenvolvimento efetivo dos direitos comentados, pois os aspectos

econômicos se incorporaram às constituições, como a mexicana de 1.917 e a

de Weimar, 1.919, e, em decorrência, suportando o direito dos trabalhadores e

as garantias processuais dos mesmos.

Daí, o Estado até então liberal-abstencionista, qualificado por deveres

meramente negativos que se justificavam a partir da interpretação individualista

atribuída aos direitos fundamentais da liberdade, da igualdade e da

propriedade, tem sua esfera de atuação ampliada, tornando-se nitidamente

intervencionista no objetivo de também garantir direitos sociais mínimos aos

cidadãos (THIBAU, 2.007, p. 21).

O estado passa, destarte, a ser promotor dos direitos sociais, e ao Poder

Judiciário cabe, então, aplicar o direito material aos casos concretos

submetidos à sua apreciação, de modo construtivo (grifei), buscando o sentido

teleológico de um imenso ordenamento jurídico. Não se pretende mais à

literalidade da lei e a de uma enormidade de regulamentos administrativos ou a

uma possível intenção do legislador. Deve enfrentar os desafios de um direito

lacunoso, cheio de antinomias. E será exercida tal função através de

procedimentos que muitas vezes fogem ao ordinário, nos quais deve ser levada

mais em conta a eficácia da prestação ou tutela do que propriamente a certeza

jurídico-processual-formal (CATTONI, 1.998, p. 42).

Neste contexto é sistematizado o Direito Processual do Trabalho, assim

como o direito sumular. Entretanto, também este modelo estatal entra em

declínio, porquanto os cidadãos deixam de querer apenas as benesses do

Estado e passam a querer também intervir em seus desígnios, por meio de

uma plena democracia. E o provimento processual estatal começa a passar por

profunda reestruturação, culminando com as garantias estabelecidas neste

campo, na Constituição da República Federativa do Brasil de 1.988, sem que o

direito processual infra-constitucional tenha se acomodado bem a tais

preceitos. Daí o necessário e crescente esforço doutrinário para construir teoria

capaz de permitir aplicação das leis ordinárias em vigor, mas sem macular o

padrão estatal idealizado pelo legislador constituinte.

A atuação jurídica (não só judicial), pois há todo um pressuposto de

construção participativa do provimento jurisdicional, no Estado Democrático de

Direito, deve derivar de atos complexos e democraticamente estruturados. A lei

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precisa ser ajustada ao modelo de estado vigorante, bem como deve ser

elaborada por representantes democraticamente eleitos. Os julgadores devem

ter sido aprovados em concurso público de provas e títulos, participarem de

cursos de formação inicial e continuada, assim como garantir ampla liberdade

probatória, o contraditório mais extenso possível, enfim, o devido processo

legal95. As partes precisam se transformar em atores inseridos, com

participação assegurada, de modo a coadjuvar a indispensável participação de

seus advogados na construção coletiva do provimento jurisdicional, ampliando-

se o espectro do art. 133/CF.

Valiosíssima, portanto, a lição de Aroldo Plínio Gonçalves, mais de um

lustro antes da constituinte que concebeu a Constituição Federal de 1.988,

onde, estribado em Fazzalari, já realçava doutrinariamente que provimento

implica na conclusão de um procedimento, pois a lei não reconhece sua

validade, se não é precedido de atividade preparatória que ele estabelece. Mas

o provimento pode ser visto como ato final do procedimento não apenas porque

este se esgota na preparação do advento. Pode ser concebido como parte do

procedimento, como seu ato final, como o último de sua estrutura

(GONÇALVES, 1.992, p. 112).

Assim, o processo desenvolve-se como espécie do gênero

procedimento, todavia caracterizado pela intensa participação das partes na

preparação do provimento, levando o aludido autor a concluir que há processo

sempre onde houver o procedimento realizando-se em contraditório entre os

interessados, e a essência deste está na simétrica paridade da participação,

nos atos que preparam o provimento, daqueles que nele são interessados

porque, como seus destinatários, sofrerão seus efeitos (GONÇALVES, 1.992,

p. 115).

Tal realidade leva (LEAL, 2.002, p. 23 e 26) a exclamar que a

compreensão do Estado Democrático de Direito tem suas bases teóricas na

razão discursiva e não mais na filosofia do sujeito voltada à reprodução e

95 Tudo isso conduz para a indispensável segurança jurídica, que é um elemento constitutivo do Estado, implicando dizer que quem assina um contrato ou ajuíza uma demanda pode ter uma justa expectativa a respeito de suas conseqüências jurídicas. A segurança jurídica dos atos jurisdicionais é garantia constitucional. No que toca, porém, à uniformidade ou à estabilidade da jurisprudência, o seu sub-princípio da proteção da confiança garante, no máximo, uma previsibilidade ou calculabilidade, mas não uma certeza absoluta, porquanto o Juiz é livre para decidir segundo o seu convencimento fundamentado. O princípio da segurança jurídica, como é da própria natureza dos princípios jurídicos, está inserido no âmbito deontológico (de dever ser ou do mandado de otimização), estimulando o Juiz, na medida do possível, a não surpreender a comunidade jurídica com decisões extravagantes, a não ser que tenha razões poderosas para inovar, e o faça com exaustiva motivação (PRATA, 2.007, p. 11).

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reordenação do mundo da vida por decisões centradas na prescritividade da

tradição e autoridade. E sendo assim, o conceito de provimento passa a

significar o julgamento vinculado ao espaço técnico-procedimental-discursivo

do processo cognitivo co-extensiva da argumentação das partes, adquirindo

conotação de ato integrante final da estrutura do procedimento, retirando a

decisão da esfera individualista do julgador.

Após meditar sobre as reflexões doutrinárias até agora colacionadas,

mas sem a pretensão de emitir um conceito infalível sobre a função

jurisdicional, reputamos sustentável a idéia básica de se entender que, na

concepção estruturante do Estado Democrático de Direito, a função

jurisdicional ou jurisdição é atividade-dever do Estado, prestada pelos seus

órgãos competentes, indicados no texto da Constituição, somente possível de

ser exercida sob petição da parte interessada (direito de ação) e mediante a

garantia do devido processo constitucional, ou seja, por meio de processo

instaurado e desenvolvido em forma obediente aos princípios e regras

constitucionais, dentre os quais avultam o juízo natural, a ampla defesa, o

contraditório e a fundamentação dos pronunciamentos jurisdicionais, com o

objetivo de realizar imperativa e imparcialmente o ordenamento jurídico (DIAS,

2.004, p. 84).

8.2. A controvertida legitimidade sumular e aspect os do

contraditório

As atividades jurisprudenciais são múltiplas e se desenvolvem sobre

vários planos: sobre todos ou sobre alguns dos quais cada um de nós juristas

está concretamente empenhado. E quanto à escolha de normas jurídicas,

segundo o contexto histórico e o nível de aplicação, a escolha da norma pode

consistir no reconhecimento de uma norma determinada, e identificar-se com a

interpretação da mesma; ou ainda pode envolver, em medida mais ou menos

acentuada, a “criação” da norma. Assim, nos ordenamentos da civil law,

teóricos e práticos podem reconhecer e aplicar normas dadas, criadas, isto é,

em nível de legislação, enquanto nos ordenamentos de common law o Juiz age

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como um “law maker”, todavia move-se com “pés de chumbo”, seja pelo stare

decisis, isto é, por causa do vínculo com os precedentes, seja em função do

seu dever de indiretos conditores legis. (FAZZALARI, 2.006, p. 55).

O fato é que na atualidade a jurisprudência é tratada até mesmo como

fonte de direito, a conferir o art. 8º/CLT. Talvez, a rigor, a jurisprudência não

possa ser tida como propulsora de normas de caráter geral, abstrato e

impessoal como a lei, mas sim como um elemento suplementar de integração,

mas isso não a descaracteriza como fonte de direito96.

A civil law e a common law estão cada vez mais próximas, em vários

sistemas jurídicos. E nosso sistema, embora continue a pertencer à família

romano-germânica, tem cedido em proporção cada vez maior à influenciação

da common law.

Ainda como suporte em (PARENTE, 2.006, p. 26), a realidade hoje

impõe uma nova postura em relação à jurisprudência, não só como

orientadora, mas como determinadora de posições. Se a norma dificulta uma

interpretação única ou deixa a critério do Juiz fechar o tipo legal aberto, à

jurisprudência cabe esse papel condutor. Se houver precedente, ele deve ser

considerado. Havendo súmula, mesmo que não vinculante, o direito vindicado

emerge como amplamente plausível97, sobretudo num sistema inevitavelmente

lacunoso, cuja integração se faz necessária durante todo o tempo98.

Na contemporaneidade, Lênio Luiz Streck concebe a jurisprudência sob

a ótica propriamente jurídica, compreendendo três significados: a) em sentido

estrito, pode indicar a ciência do direito, também denominada dogmática

jurídica ou jurisprudência; b) em sentido amplo, pode referir-se ao conjunto de

96

Segundo o magistério de Rodolfo de Camargo Mancuso, o termo jurisprudência comporta cinco acepções: o primeiro, um conceito lato, capaz de abranger, de modo geral, toda a ciência do direito, teórica ou prática, seja elaborada por jurisconsultos, seja por magistrados. O segundo, ligado à etimologia do vocábulo, que vem de juris+prudencia, consistindo num conjunto de manifestação dos jurisconsultos (prudentes), ante questões jurídicas concretamente a eles apresentadas. Circunscrever-se-ia ao acervo dos hoje chamados pareceres, quer emanados de órgãos oficiais, quer de jurisperitos não investidos de funções públicas. O terceiro, o de doutrina jurídica, teórica ou prática ou de dupla natureza, vale dizer, o complexo das indagações, estudos e trabalhos, gerais e especiais, levados a efeito por juristas sem a preocupação de resolver imediatamente problemas concretos atuais. O quarto, o de massa geral das manifestações dos juízes e tribunais sobre as lides e negócios submetidos à sua autoridade, manifestações essas que implicam uma técnica especializada e um rito próprio, imposto por lei. O quinto, finalmente, o de conjunto de pronunciamento, por parte do mesmo Poder Judiciário, num determinado sentido, a respeito de certo objeto, de modo constante, reiterado e pacífico (MANCUSO, 2.007, p. 30). O mesmo autor, f. 49, sintetiza as funções da jurisprudência, como se as de interpretar a lei, vivificar a lei, humanizar a lei, suplementar a lei e, por fim, rejuvenecer a lei. 97 Quanto mais a sociedade exige que seja o Juiz um agente inserido, mais sua função criadora tem vazão, servindo suas ponderações como interpretação do direito, valendo como justificação para o direito aplicado ou in concreto. 98 O constitucionalista português Jorge Miranda classifica os atos jurisdicionais em duas grandes categorias: 1 – atos de conteúdo normativo, que no direito português abrangem atualmente apenas as declarações de inconstitucionalidade e de ilegalidade; 2 – atos de conteúdo não normativo, que seriam as sentenças, acórdãos e decisões interlocutórias (MIRANDA, 1.997, t. 5, p. 25).

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sentenças dos tribunais, e abranger tanto a jurisprudência uniforme como a

contraditória; c) pode significar apenas o conjunto de sentenças uniformes,

falando-se, nesse sentido, em ‘firmar jurisprudência’ ou ‘contrariar

jurisprudência’ (STRECK, 1.998, p. 83).

A grande função que hoje se espera seja desempenhada pela

jurisprudência brasileira, pressupõe que ela venha qualificada por um plus, a

saber, a sua aptidão a servir como parâmetro interpretativo para julgamento

dos casos afins. Essa é a grande contribuição que a jurisprudência

predominante e reiterada, especialmente a estratificada em Súmula, pode

oferecer à nossa práxis judiciária, propiciando benefícios diversos: a) para as

partes, na medida em que possibilita uma razoável previsibilidade quanto à

solução final do caso, operando assim como fator de segurança e de

tratamento judicial isonômico; b) para o Judiciário, porque a jurisprudência

sumulada agiliza as decisões, alivia a sobrecarga acarretada pelas demandas

repetitivas e assim abrevia o tempo entre o início e o final da demanda, espaço

esse que poderá ser empregado no exame de casos mais complexos e

singulares; c) para o próprio direito, em termos de sua eficácia prática e

credibilidade social, porque o tratar desigualmente as situações assemelhadas

é algo imanente a esse ramo do conhecimento humano, certo que o sentimento

do justo integra a essência do direito desde suas origens: jus est ars boni et

aequo (MANCUSO, 2.006, p. 55).

Estas considerações talvez não encerrem o mais singelo e genuíno

pensamento da academia, mas atendem aos anseios da sociedade e

representam, efetivamente, grande parte do pensamento dos integrantes do

Poder Judiciário brasileiro. Sendo assim, a doutrina não pode se tornar

hermética a ponto de sonhar com ideais inatingíveis e divorciados da realidade.

Melhor seguir teorizando e educando sempre, de modo a que as novas teses,

cientificamente estruturas e colocadas com elevação possam servir de bússola

segura a orientar os passos do Poder Judiciário do futuro99.

99 A criação da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados – ENFAM e da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho - ENAMAT, respectivamente pelo inciso I, do parágrafo único, do artigo 105 e pelo inciso I, do § 2º, do art. 111-A, ambos da CF, e o efetivo funcionamento de ambas, propicia isso, cabendo-lhes, dentre outras funções, regulamentar os cursos oficiais para o ingresso e promoção na carreira, garantem formação inicial e continuada aos magistrados, importa em significativo avanço, capaz de gerar cultura judiciária promotora dos anseios da sociedade e retratados nos ideais democráticos plasmados em nossa República.

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Já avançamos muito com o rompimento das antigas e autoritárias visões

de aplicadores do direito, no sentido de que a Constituição é o que os Juízes

dela afirmam, ou mesmo mais modernamente de que a lei reina, mas a

jurisprudência governa.

O essencial é cultivar sempre e elastecer o contraditório, pois este sim,

uma vez bem atuado irá garantir o espaço democrático de colocação de idéias

no processo, forçando o magistrado a se posicionar explicitamente sobre o seu

entendimento sobre elas, consoante a provas dos autos.

O contraditório, tal como está posto em nossa Constituição Federal,

deve ser entendido como um autêntico direito fundamental à argumentação

jurídica.

Este instituto deve ser visto na perspectiva de verdadeiro espaço que

consagra o respeito às partes dentro de um direito processual devidamente

processualizado, garantidor dos direitos fundamentais do cidadão. As súmulas

hão de ser vistas hoje, ao menos, como um mal necessário. Isso porque, num

Estado onde os direitos não são respeitados como uma crença coletiva,

compelindo os cidadãos a buscar justiça junto aos tribunais, redundando num

Estado demandista, se não for a jurisprudência sumulada e as ações coletivas,

que ainda não são exercidas como constitucionalmente previsto, a regra

agregada ao inciso LXXIII, do art. 5º/CF, jamais terá efeito pleno.

O conceito de contraditório está positivado na Constituição Federal e

plenamente teorizado do direito processual, embora somente tenha sido

constitucionalizado recentemente, porquanto somente passou a integrar a

Constituição Federal brasileira em 1.937 (art. 122, nº. 11, segunda parte). Foi

mantido nas constituições posteriores (1.946, art. 141, § 25; 1.967, art. 140, §

16, renumerado na emenda de 1.969 para art. 153, § 16). Atualmente, está

consagrado no art. 5º, LV, que declara: “aos litigantes, em processo judicial ou

administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e

ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. (FERNANDES, 2.005,

p. 65).

O importante, contudo, nesta quadra da civilização, não é mais destacar

o contraditório como mera garantia da bilateralidade, como na Roma Antiga,

como no brocardo jurídico audiatur altera pars, ou seja, um simples direito da

parte ser ouvida. Significa agora um mecanismo de construção do provimento

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jurisdicional pelo Juiz, onde este é coadjuvado pelas partes, mediante a

participação intersubjetiva destas, com direta influência na sentença100.

A participação crescente das partes, a fim de garantir um contraditório

eficaz e adequadamente posicionado com o Estado Democrático de Direito foi

sintetizado também por Aroldo Plínio Gonçalves, citado mais uma vez como

verdadeira referência doutrinária e, portanto, científica desta pesquisa, que

assevera que o contraditório desenvolveu uma dimensão mais ampla, não

como singela participação, ou mesmo como participação efetiva das partes no

processo, mas como verdadeira garantia de participação das partes, na

atividade de preparação da sentença101, aduzindo que:

“O contraditório não é o ‘dizer’ e o ‘contradizer’ sobre

matéria controvertida, não é a discussão que se trava no

processo sobre a relação de direito material, não é a

polêmica que se desenvolve em torno dos interesses

divergentes sobre o conteúdo do ato final. Essa será sua

matéria, o seu conteúdo possível.

O contraditório é a igualdade de oportunidade no

processo, é igual oportunidade de igual tratamento, que

se funda na liberdade de todos perante a lei.

É essa igualdade de oportunidade que compõe a

essência do contraditório enquanto garantia de simétrica

paridade de participação no processo” (GONÇALVES,

2.001, p. 127).

A conclusão é que o contraditório emerge como um critério inafastável

para a obtenção de legitimidade decisória no paradigma jurídico-constitucional 100

Num processo constitucionalizado, teríamos o princípio do contraditório como referente lógico-jurídico do processo, traduzindo, em seus conteúdos, pela dialeticidade necessária entre interlocutores que se postam em defesa ou disputa de direitos alegados, podendo, até mesmo, exercer a liberdade de nada dizer (silêncio), embora tendo direito-garantia de se manifestar. Daí, o direito ao contraditório ter seus fundamentos na liberdade jurídica de contradizer, que, limitada pelo tempo finito (prazo) da lei, converte-se em ônus processual se não exercida. Conclui-se que o processo, ausente o contraditório, perderia sua base democrático-jurídico-principiológica e se tornaria um meio procedimental inquisitório em que o arbítrio do julgador seria a medida imponderável da liberdade das partes. (LEAL, 2.004, p. 104). 101

Para melhor compreensão do contexto em que o contraditório se desenvolve, na precisa percepção científica de Aroldo Plínio Gonçalves, oportuno trazer a passagem de sua obra onde define a finalidade do processo, ou seja, o campo de atuação do contraditório. Assegura a eminente processualista que: “A finalidade do processo jurisdicional é, portanto, a preparação do provimento jurisdicional, mas a própria estrutura do processo, como procedimento desenvolvido em contraditório entre as partes, dá a dimensão dessa preparação: como a participação das partes, seus destinatários, aqueles que terão os seus efeitos incidindo sobre a esfera de seus direitos” (GONÇALVES, 1.992, p. 170).

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do Estado Democrático de Direito, e, convindo com Marcelo Cattoni, “uma das

garantias centrais dos discursos de aplicação jurídica institucional e condição

de aceitabilidade racional do processo jurisdicional” (OLIVEIRA, 2.000, p. 116),

valendo como uma garantia constitucionalmente assegurada às partes, como

modo de participação e fiscalização no processo, na fixação dos elementos de

construção da decisão judicial sob o prisma constitucionalmente assegurado

(THIBAU, 2.007, p. 109).

Afinal, na construção dos precedentes, das súmulas, há o necessário

contraditório? A resposta é afirmativa, embora este não seja atual. Com efeito,

apesar de somente a Corte participa diretamente da construção dos verbetes, o

contraditório, como requisito formal de validade do provimento, já havia sido

estabelecido oportunamente, isto é, nas épocas processualmente adequadas,

ou seja, quando tiveram as partes oportunidade para trazerem seus

argumentos.

Exatamente por meio do contraditório, terá o julgador a chance de

examinar se existe adequação da pretensão deduzida no processo, com

prejulgados sedimentados, sejam eles persuasivos ou vinculantes, formando o

convencimento do Juiz tanto sob o aspecto dedutivo, quanto indutivo. Tal

realidade é decorrente da própria estrutura processual, além de suportar e

qualificar a atividade judicante.

O provimento legítimo será, portanto, válido quando gerado em espaço

processualizado e com a participação dos destinatários, o que não retira do

Juiz a possibilidade de colocar seus conhecimentos à disposição das partes,

dando cumprimento ao disposto no inciso IX, do art. 93/CF.

8.3. Atuação sumular

Face ao exposto, temos a jurisprudência com uma atividade

preponderantemente estatal, pois os equivalentes jurisdicionais podem também

estabelecer sua jurisprudência, como as cortes arbitrais, que busca distribuir

justiça de modo mais ágil.

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Suas funções estão bem delineadas (conferir nota de rodapé nº. 12),

sendo seu objetivo maior o de abrir espaço para a atuação de um novo direito

fundamental, qual seja, o de permitir a duração razoável do processo,

buscando ainda eliminar a insegurança acarretada por respostas judiciárias

díspares. Isso porque, há indicativo de direito público na emissão de uma

versão oficial da interpretação da Justiça em casos análogos, de modo a atuar

a lei de forma uniforme.

A previsibilidade das decisões judiciais indica, de alguma maneira, que o

direito foi atuado segundo sua previsão normativa. Resta saber se esse direito

emana de fonte confiável e constitucionalmente adequada. Caso contrário, a

inconstitucionalidade deve ser denunciada desde logo. Não o sendo, há de se

imaginar que a interpretação feita a partir do direito posto é hígida,

naturalmente considerando-se a ampla liberdade probatória.

A questão de fundo consiste no esforço hermenêutico, mas para chegar

a tanto o caminho é longo. Se partirmos de uma norma produzida com respeito

às garantias constitucionais desde o momento da escolha dos legisladores; se

ela estiver suficientemente ajustada aos princípios idealizados na Carta

Política; se pretensão decorrente for deduzida perante o Juiz natural; se este

disponibilizar o devido processo legal, com os recursos e meios inerentes à

ampla liberdade probatória, podemos concluir pela validade do processo. E

sendo válido o processo, e reiteradas decisões forem produzidas num só

sentido, com a observância de todas as garantias constitucionais postas em

destaque, o conjunto dessas decisões irá fomentar a construção jurisprudencial

socialmente aceita e capaz de manifestar a vontade coletiva.

Certamente alguém pode opor objeção, supondo que a função criadora

da norma é exclusiva do Poder Legislativo. O argumento é arcaico, pois a

separação dos poderes é mitológica e cada vez menos aplicada de modo

rígido. Nos diversos sistemas constitucionais, cabe ao Judiciário julgar e

administrar; ao Executivo administrar e emitir normas (às vezes em excesso,

como nas Medidas Provisórias), e o Legislativo, além de criar as normas (às

vezes inconstitucionais), cabe-lhe julgar integrantes de outros poderes em

crimes de responsabilidade.

Nesse contexto do equilíbrio de forças na estrutura do Estado, que se

coloca o Direito Sumular, já que, cabendo ao Legislativo a edição das normas

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obrigatórias, gerais impessoais e abstratas; ao Executivo, o poder-dever de

aplicá-las de ofício e gerenciar a coisa pública, e ao Judiciário a tarefa de

interpretar as normas e aplicá-las ao caso concreto mediante provocação da

parte ou interessado, é preciso, então, verificar qual o espaço restante para a

jurisprudência estratificada em prejulgados, sobretudo em Súmulas

vinculantes102 e Súmulas impeditivas de recursos, na medida em que esses

assentos atuam como paradigmas – genéricos e abstratos: no caso das

vinculantes, para a solução de feitos análogos, pendentes e futuros (art. 103-

A/CF), e, no caso das impeditivas, no sentido de bloquear o acesso ao Tribunal

Ad quem (§ 1º, do art. 518/CPC). Verifica-se, então, que o problema se

apresenta bifronte, qual uma esfinge, com uma face voltada para o Legislativo,

a quem cabe editar normas de largo espectro eficacial, e outra face voltada

para o Judiciário, que, ordinariamente, emite uma resposta contida nos limites

da lide e restrita às partes, através dos limites subjetivos e objetivos da coisa

julgada (MANCUSO, 2.007, p. 90).

Nos dias que correm, entretanto, a crescente flexibilização da separação

dos poderes passa a admitir os precedentes e o efeito ultra partes ou erga

omnes do julgado coletivo. Esses trazem algum perigo, pois extrapolam a

jurisdição singular, onde os efeitos do julgado se aplicam exclusivamente sobre

os contendores e a plenitude dos argumentos são trazidos segundo a vontade

das partes. E considerando-se o dever do magistrado de fundamentar a

decisão, inciso IX, do art. 93/CF, a sentença tende a amoldar-se com exatidão

ao que lhe foi dado conhecer e decidir.

Temos, assim, que as Súmulas produzidas conforme o modelo de

processualidade democrática, ou seja, os princípios do Estado Democrático de

Direito, mostram-se benéficas e promotoras de direitos fundamentais. Há de se

ver, contudo, com um pouco mais de preocupação, os prejulgados derivados

de feitos coletivos e indicativos de padrão comportamental genérico e

vinculante, cuja teorização ainda está sendo construída. Todavia, sob esta

última angulação, o problema sumular escapa ao propósito deste trabalho103.

102 André Ramos Tavares afirma, em estudo sobre a súmula vinculante, que a entende como uma ponte de ligação entre decisões (especialmente de controle de constitucionalidade ou interpretativas) proferidas numa dimensão concreta e uma decisão (sumulada) proferida com caráter geral e abstrato (TAVARES, 2.007, p. 13). 103 Observar o dispositivo da EC 45/2.004 que restringiu o âmbito da súmula vinculante à matéria constitucional, conforme art. 103-A/CF.

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O que aqui nos interessa checar é até que ponto a divergência sumular

entre tribunais diversos é perniciosa para uma aplicação harmônica do direito,

considerando-se ainda a ausência de sintonia da Súmula trabalhista com a

doutrina deste ramo autônomo, e a inconsistente fundamentação a suportar o

posicionamento da Corte.

Vamos ao problema.

Se o objetivo da criação de súmula é justamente unificar o direito, ou,

pelo menos, convergir sua aplicação a casos concretos pra um só vetor, como

justificar o dissenso existente entre os verbetes 327/STF e 114/TST?

Relembrando as considerações feitas acerca da criação de súmulas no

Brasil, consoante a emenda do Regimento Interno do Supremo Tribunal

Federal, de 28 de agosto de 1.963, quando foi criada a Comissão de

Jurisprudência, para velar pela publicação e atualização da Súmula de

Jurisprudência Predominante. Para viabilizar a determinação foi constituída

uma comissão, composta pelos Ministros Victor Nunes Leal, relator, Gonçalves

de Oliveira e Pedro Chaves que, na última sessão plenária de 1.963

apresentou a proposta com os primeiros 370 verbetes, que então veio a ser

aprovada.

Naturalmente que o verbete 327, que muito nos interessa, estava aí

incluído, merecendo ser transcrita a explicação de Arnor Serafim Junior para os

seus termos.

“A Súmula 327 fez parte desse primeiro bloco, valendo

destacar que, naquela época, vigia a Constituição Federal

de 1.946, que estabelecia em seu art. 101: ‘ao Supremo

Tribunal Federal compete: ...julgar em recurso

extraordinário as causas decididas em única ou última

instância por outros Tribunais ou Juízes: letra a: quando a

decisão for contrária a dispositivo desta Constituição ou à

letra de tratado ou lei federal, (...), e, letra d: quando na

decisão recorrida a interpretação da lei federal invocada

for diversa da que lhe haja dado qualquer dos outros

tribunais ou o próprio Supremo Tribunal Federal'.

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Ou seja, à época da edição dessa Súmula, era

ampla a competência do STF para apreciação de recurso

extraordinário em ações trabalhistas, atendidos os

pressupostos já referidos”.

A situação, contudo, se alterou com a Constituição

Federal de 1.967, que em seu artigo 143 dispôs

expressamente que ‘as decisões do TST serão

irrecorríveis, salvo se contrariarem esta Constituição, caso

em que caberá recurso para o STF’.

“Com a supressão do recurso extraordinário em

matéria trabalhista (salvo se veiculassem argüição de

ofensa direta ao texto constitucional), a doutrina passou a

propugnar que as súmulas de jurisprudência do STF em

matéria trabalhista perderam muito de sua importância”

(SERAFIM JUNIOR, 2.006, p. 97).

Esse debate, de outra parte, ganhou novo alento coma promulgação da

Carta Magna de 1.988, que trouxe para o próprio texto constitucional, diversas

matérias de cunho eminentemente trabalhista, as quais, em princípio podem

ser veiculadas pela via do recurso extraordinário, voltando a temática à

apreciação última do STF.

Independentemente das controvérsias havidas em sede doutrinária, o

importante é frisar a amplitude constitucional da competência recursal do STF,

à época da edição da súmula sem desconsiderar, evidentemente, que a essa

corte superior compete precipuamente, a guarda da Constituição, e, a

uniformização da jurisprudência por ela realizada tem uma espécie de aura

constitucional, já que todas as normas legais do País se subordinam à

Constituição.

Sendo assim, prossegue o referido autor:

“E se assim é, não parece correto pretender-se

desconsiderar a diretriz traçada pela súmula do STF sob

a singela alegação de que, desde a Constituição de

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1.967, não mais subsiste a competência recursal que

propiciou a adoção de tal entendimento sumulado.

Se a tal competência não mais subsiste na amplitude

anterior, isso não implica desconsiderar a orientação

interpretativa outorgada pela mais alta Corte do País à

matéria, quando na fruição de inequívoca e ampla

competência.

Além disso, é mais do que correto dizer que '... as

súmulas do STF, ainda que tenham perdido o interesse

prático, com a supressão do recurso extraordinário em

matéria trabalhista, não perderam a precedência científica

decorrente da hierarquia judiciária e a importância

metodológica, em face do conteúdo constitucional

intrínseco em suas decisões'...” (SERAFIM JUNIOR,

2.006, p. 97-98).

Diante dessa lógica explicação, nos resta ponderar o quanto as súmulas

destinam-se à atender a fenômenos que se justificam cronologicamente, e

segundo determinado padrão constitucional, para o qual foram concebidas e

cuja atuação servem preferencialmente. Por isso a fiscalização incessante é

custo da democracia, devendo os cultores do direito, durante todo o tempo

fomentar que as cortes as revejam e adaptem seus termos ao modelo estatal

vigorante. E, não sendo possível, melhor é a imediata revogação do preceito,

como hoje é o desafio em relação ao verbete 114, da Súmula do TST.

Bem, voltando à indagação antes proposta, é imprescindível deixar

assentado que cada corte tem autonomia para estabelecer sua Súmula, por

inteligência do disposto nos artigos 96 e 99/CF, entretanto, uma divergência de

tamanha magnitude parece contrária ao direito e desafia uma investigação.

Partindo do direito posto, temos todo um capítulo no Código de Processo

Civil que trata da uniformização da jurisprudência, artigos 476 a 479, estando

assentado que compete a qualquer Juiz, ao dar o voto na turma, câmara, ou

grupo de câmaras, solicitar o pronunciamento prévio do tribunal acerca da

interpretação do direito quando verificar que, a seu respeito, ocorre

divergência, sendo que o parágrafo único da norma apontada faculta à parte

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equivalente iniciativa. Todavia, o procedimento em questão destina-se a

uniformização dentro de uma só corte.

Persiste, então, a principal indagação: como solver a divergência entre

tribunais distintos?

Inicialmente passemos a considerar o tratamento legal da matéria junto

aos tribunais do trabalho.

A Justiça do Trabalho também busca a desejada harmonização, através

do Recurso de Revista, previsto no art. 896/CLT, autorizando a alínea a sua

admissão quando os tribunais regionais do trabalho derem ao mesmo

dispositivo de lei federal interpretação diversa da que lhe houver dado outro

Tribunal Regional, no seu Pleno ou em Turma, ou a Seção de Dissídios

Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, ou a Súmula de Jurisprudência

Uniforme dessa Corte104.

Como adverte Bezerra Leite, a divergência jurisprudencial apta ao

cabimento de RR há de ser oriunda dos órgãos específicos da Justiça do

Trabalho prescritos expressamente na alínea a, do art. 896/CLT. Isso significa

que não se admitirá que a divergência seja originária: I – do mesmo tribunal,

seja do pleno ou de turma; II - de outros órgãos da própria Justiça do Trabalho

não indicados no dispositivo legal105; III – de outros órgãos de quaisquer ramos

do Poder Judiciário, nem mesmo do STF (LEITE, 2.007, p. 746).

Esta derradeira consideração reforça a idéia de que a solução somente

poderá mesmo vir por intermédio de esclarecimento doutrinário, a ensejar,

induzir um movimento de avanço jurisprudencial.

A divergência jurisprudencial, tomada em si mesma, é fenômeno

axiologicamente neutro, e mesmo previsível num regime de jurisdição singular,

onde impera o primado da norma escrita, aplicada em cada caso concreto, num

país de dimensões continentais, com Justiças diversas, organizadas por

critérios diferentes, e distribuídas nos planos local, regional e nacional

104

Sua própria Súmula, através do verbete 337 (incorporado pela Orientação Jurisprudencial 317, da SDI-1), estabelece procedimento que deve ser observado para a demonstração da divergência: I – para comprovação da divergência justificadora de recurso, é necessário que o recorrente: a) junte certidão ou cópia autenticada do acórdão paradigma ou cite a fonte oficial ou o repositório autorizado em que foi publicado; b) transcreva, nas razões recursais, as ementas e/ou trechos dos acórdãos trazidos à configuração do dissídio, demonstrando o conflito de teses que justifique o conhecimento do recurso, ainda que os acórdãos já se encontrem nos autos ou venham a ser juntados com o recurso (ex-Súmula 337/TST); II – a concessão de registro de publicação como repositório autorizado de jurisprudência do TST torna válidas todas as suas edições anteriores (ex-OJ 317). 105 Pela norma em exame, nem mesmo uma divergência entre a súmula de um tribunal regional e a súmula do TST ensejaria o recurso de revista.

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(MANCUSO, 2.007, p. 27), para quem o importante não é a divergência em si,

mas a forma, a intensidade ou as conseqüências em face dos destinatários.

Os destinatários da justiça distribuída dificilmente irão compreender por

que a lei, que deve ser isonômica, quando aplicada, chega a decisões tão

díspares, em casos rigorosamente iguais e em um só tempo.

No âmbito do Direito Processual do Trabalho há muito mais a se

considerar, porquanto além dos princípios informadores do direito processual

comum, há aqueles que são específicos e norteiam sua aplicação. Com efeito,

o critério de especialidade é técnico, objetivo e racional, além de

estruturalmente democrático, pois se constrói tomando em consideração as

particularidades fundamentais que deram origem e justificam a existência do

ramo jurídico especializado, particularidades essas que naturalmente são

desconsideradas pelos demais ramos especiais e, principalmente, pelo tronco

genérico. Por isso é que é tão fundante, necessária, imprescindível mesmo a

observância do critério da especialidade no exame das situações jurídicas

peculiares, em contraponto às normas estruturadoras do processo comum

(DELGADO, 2.007, p. 2).

O processo do trabalho não se estrutura, contudo, nos mesmos

princípios que informam o Direito Material do Trabalho (embora deles sofra

influência), posto que dispõe de plena autonomia (aliás, tal distinção está

sendo tomada puramente para efeito metodológico, subsistindo o entendimento

de que o sistema é único, estabelecido em matriz constitucional, variando

apenas quanto a procedimentalidade). O sistema suporta exatamente relações

jurídicas de direito de natureza existencial e, assim, comporta à técnica

jurisdicional criar meios para uma aplicação compatível com a substantividade

fundante106. E embora ainda careça de uma teoria geral mais densamente

sistematizada, tem se revelado mais ágil na satisfação dos direitos de seus

beneficiários, além de mais acessível, como a justiça deve ser.

A criação de métodos genuínos de aplicação é indispensável, pois assim

como o próprio Direito do Trabalho contemporâneo concebe mecanismos

106 A despeito do entendimento hoje predominante, da unidade do direito a partir de matriz constitucional, como método pedagógico e observando-se o estado da arte do Direito Processual do Trabalho, podemos considerar que a idéia é complementada no seguinte raciocínio, que trata do cotejo entre direito material e processual: “deve englobar legislação e jurisdição, numa unidade teleológica, ambas engajadas numa tarefa só de cunho social, que estaria a meio caminho se fosse confiada só à legislação e não teria significado algum se se cogitasse da jurisdição sem existirem normas de direito substancial”. (GRINOVER et alli, 2.007, p. 195).

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peculiares de atuação, já divorciados do protecionismo exacerbado que o

caracterizou num primeiro momento, mais ideológico do científico. E que, como

quer parecer, serve de suporte ainda hoje para a manutenção da Súmula

114/TST, tal como está.

Evidenciando a transição, a tese apresentada pelo Professor Arion

Sayão Romita, Presidente da Academia Nacional de Direito do Trabalho, no

47º Congresso Brasileiro de Direito do Trabalho, promovido pela Editora LTr,

em São Paulo, em junho de 2.007, intitulada Teoria Clássica do Princípio

Protetor e Flexibilização, na qual afirma inexistir a tão propagada “teoria do

princípio protetor”, destacando que:

“Se, ainda, com os léxicos, atribuirmos ao vocábulo

'teoria' o significa do 'doutrina ou sistema fundados nos

princípios fundamentais duma arte ou duma ciência',

saltará aos olhos a impropriedade do emprego da locução

'teoria do princípio protetor', já que o conjunto dos

princípios fundamentais duma arte ou duma ciência é que

constitui a teoria desta arte ou desta ciência, não se

admitindo à luz da lógica, que um princípio (seja ele qual

for) forme o objeto de uma teoria”. (ROMITA, 2.007, p.

53).

E prossegue:

“Não constitui função do direito – de qualquer dos ramos

do direito – proteger algum dos sujeitos de dada relação

social. Função do direito é regular a relação em busca da

realização do ideal de justiça. Se para dar atuação prática

ao ideal for necessária a adoção de alguma providência

tendente a equilibrar os pólos da relação, o direito

concede à parte em posição desfavorável alguma

garantia, vantagem ou benefício capaz de preencher

aquele requisito”. Idem.

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Rematando, assevera:

“O ideal de justiça se realiza quando o direito compensa

desigualdades iniciais pela outorga de garantias aptas a

igualar as posições (ou, pelo menos, atenuar a

desigualdade inicial)”. Ibidem.

Se assim é no Direito do Trabalho, com muito mais razão tal lógica deve

balizar o direito processual, cujo princípio da igualdade é essencial para o

decisionismo judicial.

Seguindo o magistério de Romita, se a noção de princípio incorpora, por

definição, a nota de generalidade e de eficiência temporal permanente, não se

pode validamente falar em “princípio da proteção” relativamente ao direito do

trabalho brasileiro, material ou processual, quer do ponto de vista sincrônico

quer do diacrônico.

O princípio há de ser geral, ou seja, aplicável à totalidade da disciplina.

Princípio que ora vale, ora não vale, não é princípio. Inaceitável é a existência

de um princípio inapto a abranger a totalidade do campo de atuação de certa

disciplina jurídica.

Por esta razão a prescrição intercorrente não pode ser considerada em

matéria processual do trabalho num setor e desertar noutro. Assim, não pode

ser aplicada pelo Supremo Tribunal Federal, com base na Súmula 327 e ser

desconsiderada no Tribunal Superior do Trabalho, com fincas na Súmula 114,

deste último.

Igualmente jamais pode ser o caso de sua aceitação nas demandas que

envolvem os executivos fiscais e não ser nas demais107. Além disso gerar a

inconsistência aqui tratada, atenta contra as garantias processuais

constitucionais. Ademais, sequer no campo do direito positivo há guarida para

tanto, pois o artigo 899/CLT, que autoriza expressamente a utilização da LEF 107

Nesse sentido, a percepção de Ney Maranhão, que comentando o § 5º, do art. 219/CPC, sustenta: “... é inteiramente aplicável ao Direito e ao Processo do Trabalho, pois presentes os requisitos dos art. 8º, parágrafo único, e 769, da CLT. Se a pretensão formulada, de acordo com o direito objetivo, não é mais exigível, nada mais justo e natural que seja assim considerada pelo Juiz, mesmo de ofício. Argumentações em sentido contrário, na verdade, estão a discordar do próprio direito objetivo ora em vigor, situando-se, assim, com a devida vênia, no plano da mera crítica ao direito legislado. Não se pode admitir que o Juiz, como sujeito imparcial no processo, possa querer 'beneficiar' uma das partes, deixando de pronunciar a prescrição, matéria que, de acordo coma lei atual, deve ser conhecida de ofício. Imagine-se a situação em que se o empregado for credor, não se aplica a prescrição de ofício; no entanto, se ele for devedor, o Juiz decreta a inexigibilidade do direito independentemente de argüição do empregador. O mesmo ocorreria se o consumidor fosse devedor e, em outra questão, fosse credor de direito não mais inexigível. Como se nota, corre-se o risco de se incorrer em casuísmo inadmissível, tornando o Juiz parcial, referendando conduta contrária ao Estado (democrático) de Direito” (MARANHÃO, 2.007, p. 9).

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nas execuções processadas perante a Justiça do Trabalho, não faz qualquer

restrição nas hipóteses de aplicabilidade.

Assim é que, também do ponto de vista diacrônico é inadmissível a

afirmação de um princípio de proteção no âmbito de aplicação do Direito

Processual do Trabalho, sobretudo pela literal autorização legal para sua

aplicação, conforme § 4º, do artigo 40, da Lei 6.830/80.

Noutra oportunidade o processo do trabalho deixa claro que tem

intenção de aplicar a prescrição da pretensão executiva. O faz no § 1º, do art.

884/CLT, que trata da matéria que pode ser oposta nos embargos à execução.

Vale a transcrição:

884. Garantida a execução ou penhorados os bens, terá o

executado 5 (cinco) dias para apresentar embargos,

cabendo igual prazo ao exeqüente para impugnação.

§ 1º A matéria de defesa será restrita às alegações de

cumprimento da decisão ou do acordo, quitação ou

prescrição da dívida. (Grifei).

Desnecessário qualquer esforço hermenêutico para bem compreender

que o processo do trabalho, como estrutura lógica, repele a Súmula 114/TST.

Convém notar ser indispensável a observância da unidade do sistema,

porquanto há total coerência no mesmo. Quando o alvo da proteção estatal era

o trabalhador, noutro modelo estatal, talvez fosse, de alguma forma razoável o

impedimento da aplicação da prescrição intercorrente, se em desproveito do

mesmo. Entretanto, não mais no modelo atual, fundado na dignidade da

pessoa humana e nas garantias de espaço democratizado para sua atuação

processual. Isso porque, num ou noutro cenário, a técnica processual

construída há se de suportar nos princípios que informam o direito processual

especial.

Deve-se buscar proteção somente por meio de políticas promocionais,

validamente estabelecidas, e não de atuação anacrônica do direito. Há de se

reconhecer um declínio do princípio tuitivo, porquanto no Estado Democrático

de Direito o estado não mais se encontra acima de classe ou categoria alguma,

e que qualquer intervenção estatal, ainda que no campo do direito positivo, no

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fundo, só serve para sub-repticiamente retroalimentar a posição de

inferioridade do mais débil, perpetuando sua exploração, na medida em que as

normas são postas pelos dominantes, ainda que sob aspectos aparentemente

generosos. Nesta quadra, somente através de garantias processuais plenas e

da construção de um provimento jurisdicional participativo, alinhado com nosso

modelo estatal é que as partes estarão sendo respeitadas, preservadas em

seus direitos e inclinadas para o desenvolvimento de suas consciências, ou

seja, construindo sua dignidade.

Somente por meio de tais critérios há de prevalecer, portanto, a força

atrativa de uma súmula. Atuar a Súmula 114/TST sem a exibição de métodos

sustentáveis importa em impedir a evolução da interpretação e menosprezar as

transformações sociais e a concepção do direito que iguala mediante critérios

reais de equilíbrio.

Não se pode mais aceitar súmulas estáticas, porquanto o procedimento

não está mais à disposição do Juiz. Destarte as cortes precisam encontrar um

critério bem delineado para aplicar a prescrição intercorrente de modo que não

seja instrumental. Afinal, se a Constituição da República reserva ao Supremo

Tribunal Federal a última palavra em matéria de interpretação de seu texto e,

por conseguinte, do direito nacional, o processo não pode servir de pretexto

para a exteriorização de poder.

Nesse sentido, Francesco Carnelutti, em sua Teoria Geral do Direito,

tratando do conflito de comandos jurídicos, e nesta categoria situa-se o conflito

sumular, sustenta que fontes diversas como diverso conteúdo, elidem-se umas

as outras, pois se várias coisas diferentes são prescritas, isso corresponde a

não ser prescrita nenhuma. Assim, aduz que:

“O excesso na produção de jurídica resolve-se, portanto,

em defeito, e os dois problemas, do muito e do muito

pouco, mostram, também aqui, no campo do direito, a sua

contigüidade... reclama uma eliminação do supérfluo, dir-

se-ia o mesmo do refugo, a qual se resolve na

prevalência de uma das normas ou dos preceitos em

conflito sobre o outro”.

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Competindo, pois, ao Supremo Tribunal Federal a última palavra sobre a

interpretação do conjunto normativo brasileiro e possuindo este verbete sobre

determinada questão, parece ilógico que outro tribunal possa dar entendimento

diverso a matéria, sobretudo em sentido diametralmente oposto.

O objetivo das súmulas é abreviar a prestação jurisdicional, e não

perpetuar os feitos judiciais através de conflitos aparentes, impróprios e

indesejados pelos jurisdicionados. Súmula contrária a súmula é fator de

instabilidade democrática, de multiplicação de recursos e processos, além de

gerar jurisprudência ilegítima, porquanto constitucionalmente inadequada, na

medida em que não respeita os princípios e a integridade do sistema.

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CAPÍTULO 9

ANÁLISE DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE À LUZ DA

JURISPRUDÊNCIA PROCESSUAL TRABALHISTA

Partindo a problematização de um dissenso entre súmulas,

imprescindível deixar de consultar a obra intitulada Direito Sumular, na qual são

comentadas as súmulas do Supremo Tribunal Federal, por Roberto Rosas,

que, ao abordar o verbete 327 assevera que se o autor não toma a iniciativa da

ação, ou se o beneficiário não lhe promove o andamento, ocorre a prescrição,

sendo que a mesma não pode se verificar no processo do trabalho porque a

norma do art. 878/CLT consiste em mera faculdade, e não em um dever do

Juiz (ROSAS, 1.998, p. 128).

A obra referida é prestigiada, com sucessivas edições, entretanto,

esquece-se o seu autor que, também no processo civil, o impulso oficial atua

como importante princípio, estando ainda positivado no artigo 262/CPC.

Destarte, pela razão exposta não se pode deixar de aplicar o verbete supra

mencionado.

Apesar do verbete 114, da Súmula do TST, conduzir a jurisprudência

trabalhista em sentido contrário à admissão da prescrição intercorrente, sempre

houve julgados em contundente oposição, como apontado in (BATALHA,

1.996, p. 48/49), que destaca os seguintes arestos:

É aplicável à Justiça do Trabalho a prescrição

intercorrente. A lei não se revoga por entendimentos

jurisprudenciais. A CLT prevê, como fundamento dos

embargos do executado, a prescrição, no art. 884 (a

matéria de defesa será restrita às alegações de...). Essa

prescrição só poderá ser intercorrente, posterior à

sentença do processo de cognição, posto que a anterior é

sepultada pela coisa julgada (TRT/SP 02850245733, Ac.

8ª T., 7.778/87, Rel. Juiz Valentin Carrion, DOE 1.6.87,

Synthesis, 6/88, p. 221).

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E também:

Conquanto tenha se pronunciado em contrário o Colendo

TST (Enunciado 114), cabível no processo do trabalho a

prescrição intercorrente, consoante entendimento

sumulado do excelso Pretório (Súmula 327). (TRT/9, AP

407/93, Ac. 2ª T., 13.231/93, Rel. Juiz Lauro Stellfeld,

Later 58/454).

O próprio TST, nem sempre aceita bem o verbete 114, de sua Súmula. E

não é de hoje. Em transcrição feita por (PRUNES, 1.998, p. 45), encontramos o

seguintes julgado:

Prescrição intercorrente. Entendo não ser aplicável o

Enunciado 114 do TST na hipótese de depender o ato

processual de iniciativa da parte. A prescrição

intercorrente é inaplicável na Justiça do trabalho quando

desacompanhado o reclamante de advogado, ou então

naqueles casos em que a paralisação do processo se dá

por motivo de desídia do juízo na efetivação de diligências

a seu cargo, tendo em vista o contido no art. 875/CLT que

consagra o princípio inquisitório, podendo o juiz, até

mesmo, instaurar execuções de ofício, a teor do art.

878/CLT. Não seria razoável estender-se tal interpretação

àqueles casos em que o estancamento do processo

acontece ante a inércia do autor em praticar atos de sua

responsabilidade, sob pena de permanecerem os autos

nas secretarias esperando pela iniciativa das partes ad

aeternum, prejudicando sobremaneira um dos princípios

básicos do processo trabalhista, ou seja, a celeridade

processual. Recurso não conhecido. TST, Ac. 6.448, de

22.11.95, RR 153542/94, 5ª T. DJ 16.2.96, p. 3.264, Rel.

Min. Armando Brito.

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Feita esta busca do que consta na doutrina sobre os padrões

jurisprudenciais de aplicação da prescrição intercorrente, vamos investigar de

modo mais profundo os precedentes que deram ensejo a cada um dos

verbetes de súmulas dos tribunais superiores, a começar pelo Supremo

Tribunal Federal, por dupla razão: primeiro que é a mais alta corte do País, e

segundo porque sumulou a matéria antes do TST, respectivamente em

dezembro de 1.963 e em novembro de 1.980.

9.1. Supremo Tribunal Federal

O verbete da Súmula do Supremo Tribunal Federal que trata de

prescrição intercorrente, como já demonstrado, é o 327, verbis: O direito

trabalhista admite a prescrição intercorrente, aprovado em sessão plenária de

13 de dezembro de 1.963, que teve como referências legislativas os artigos 11,

765 e 791, todos da CLT.

Serviram de precedentes os seguintes julgados: AI 14.744, publicado no

DJ de 14 de junho de 1.951; o RE 22.632, de 8 de novembro de 1.956; o RE

30.990, de 5 de julho de 1.958; o RE 32.697 de 23 de julho de 1.959; o RE

50.177, de 20 de agosto de 1.962; o RE 52.902 de 19 de julho de 1.963 e o RE

53.881, de 17 de outubro de 1.963.

O primeiro, cujo relator foi o Min. Luiz Gallotti, vem assim ementado:

Em matéria de prescrição, não há distinguir entre ação e

execução, pois esta é uma fase daquela. Ficando o feito

sem andamento pelo prazo prescricional, seja na ação,

seja na execução, a prescrição se tem como consumada.

Não excluí a aplicação desse princípio no pretório

trabalhista o fato de se facultar ali a execução ex officio

pelo Juiz. Excluiria, se o procedimento ex officio, ao invés

de uma faculdade fosse um dever do Juiz. Prescrição e

seu fundamento filosófico. Invocação descabida do art.

172, nº. V do Código Civil.

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O segundo aresto, da relatoria do Min. Ribeiro da Costa, em enxuta

ementa, diz apenas:

Reclamação trabalhista – prescrição – aplicação do art.

11 da Consolidação das Leis do Trabalho, combinado

com os art. 165 e 166, n. V, do Cód. de Processo Civil e

173, nos. IV e V e 174, nos. I, II e III do Código Civil.

O caso apreciado consistia na paralisação do feito por lapso superior a

dois anos, sem qualquer iniciativa da parte ou da “Procuradoria do Trabalho”,

ou seja, do atual Ministério Público do Trabalho.

O terceiro precedente, da relatoria do Min. Vilas Bôas, em apertadíssima

síntese, limita-se a asseverar:

Prescrição bienal em execução de sentença trabalhista.

Aplicação do art. 11/CLT”,

numa demanda na qual após o lapso temporal de dois anos sem a devida

movimentação processual, o Juiz de primeiro grau declarou a prescrição

intercorrente, mediante expresso requerimento da executada.

O quarto julgado teve com relator o Min. Afrânio Antônio Costa,

substituindo o Min. Rocha Lagoa, e ficou ementado nos seguintes termos:

Prescrição em processo trabalhista: nos termos do art.

791 da Consolidação das Leis do Trabalho,

empregadores e empregados poderão acompanhar as

reclamações até o final; é, assim, inequívoco que a

demora no prosseguimento do feito pode ser obstada pela

reclamação do Procurador ao Juiz; se tal não foi feito, há

que ser reconhecida a negligência do advogado do

empregado, verificando-se a prescrição,

sendo relevante notar que segundo consta do acórdão em análise, o Recurso

Extraordinário fora admitido de um Recurso de Revista, apreciado pelo TST, no

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qual se infere que a paralisação do feito se deu em virtude de ato do Juiz,

razão pela qual a Corte trabalhista havia afastado a prescrição intercorrente.

Entretanto, embora reconhecendo tacitamente que a falta de ativação do

processo derivou de ato judicial, ainda assim o Excelso Pretório entendeu por

bem em agasalhar a tese defensiva.

O quinto acórdão que motivou a edição do verbete, com a ementa

adiante transcrita. Verbis:

A prescrição intercorrente na Justiça do Trabalho. Conflito

de decisões. Pode ser argüida a prescrição

indiscriminadamente, seja na ação ou na fase executória.

Interessante constatar que no corpo do julgado faz-se alusão a voto do

Min. Victor Russomano, do TST, o qual não acolhendo a tese que acabou

prevalecendo no STF, sintetiza seu entendimento em três argumentos básicos,

aduzindo:

I – A consolidação apenas fala em prescrição “do direito

de reclamar”. Se esse direito é usado com a apresentação

da reclamatória em juízo, não pode mais prescrever,

porque já foi usado em definitivo. II – Pela forma de

redação do art. 11, pode entender-se que a prescrição

não corre mais, desde que seja ajuizada a ação. III – Se o

empregado apresentou a reclamatória em tempo hábil e

ficou ela, sem andamento célere, durante dois anos, a

culpa não é sua, mas sim, do órgão judiciário. Não é justo,

por isso que ele pague pelo ocorrido, perdendo seu

direito.

No mesmo sentido, transcreve doutrina de Délio Maranhão e aresto do

Min. Delfim Moreira, do TST. Entretanto, conclui que a prescrição pode ser

alegada em qualquer instância, a exemplo do disposto no art. 162, do Código

Civil vigente à época, apontando ainda divergência em torno da matéria na

própria Justiça do Trabalho, trazendo à colação para justificar o alegado o

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Acórdão da 1ª T. do TST, processo 2.914/58, DJ 4.9.59, pág. 3.079, cujo

relator foi o Min. Astolfo Serra e, em idêntico eixo, outro da Corte que analisava

o recurso. Ao final, rematou com a declaração de que em matéria de

prescrição, não há distinguir entre ação e execução, sendo esta uma fase

daquela, culminando com decisão unânime.

Há mais. O sexto julgado tem como relator o Min. Victor Nunes Leal,

vindo ementado em dois tópicos, da seguinte forma.

1) Na execução das obrigações de fazer, perante a

Justiça do Trabalho, é aplicável subsidiariamente o Cód.

Proc. Civil, (CPC, art. 1.014, c/c CLT, arts. 11 e 884, § 3º,

in fine). 2) Prescreve em dois anos o direito de executar

decisão trabalhista – CLT, art. 11).

A situação descrita no aresto é digna de explicitação, porquanto apesar

de não se declarar no caso a prescrição intercorrente, ficou definido que a

liquidação precisa ser ativada, ainda que pendente outras questões

processuais, sob pena de permitir o início da contagem do prazo fatal para a

extinção da execução.

Com efeito, a decisão informa que no julgado de origem, um trabalhador

teve seu pleito de reintegração provido e foi devidamente intimado para

prosseguir com sua vida laborativa útil. Todavia, em vez de retornar ao

trabalho, começou a discutir nos autos a forma em que a mesma deveria

ocorrer, havendo controvérsia em relação ao cargo no qual o retorno deveria se

dar, e, obviamente, na remuneração devida.

A corte entendeu que primeiro deveria ter se efetivado a reintegração, ou

a interposição tempestiva de embargos para habilitar a discussão em torno da

forma como o reingresso deveria se dar, a fim de possibilitar o exato

cumprimento do comando judicial.

Segue então o relator com seus argumentos a fundamentar o voto, num

esforço hermenêutico para permitir a compatibilização de diversos regramentos

positivados, todos aplicáveis ao caso, no seu sentir.

Objetivando seu desiderato, destaca o relator que “o direito comum é

subsidiário do trabalhista 'naquilo que não for incompatível com os princípios

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fundamentais deste (CLT, artigo 8º, parágrafo único). Quando se trata de

execução de dinheiro, a lei subsidiária é a dos executivos fiscais (CLT, art.

889). Na execução das obrigações de fazer e não fazer, a suplementação da

legislação trabalhista se faz com o Código de Processo Civil. O seu artigo

1.014 assim dispõe: 'Na execução para a prestação de fato, os embargos

serão opostos no prazo marcado para o cumprimento da condenação'. Esse

prazo é de cinco dias, nos termos do art. 884, § 2º, da Consolidação”.

Temos, assim, que a matéria versada no julgado não era exatamente

para a declaração de prescrição intercorrente, mas acerca do momento no qual

a liquidação válida deveria ocorrer. Entretanto, na ementa e no corpo do aresto,

a questão central desta pesquisa restou efetivamente tratada, porquanto se

não atiçada a liquidação tempestivamente, por ato da parte, não obstante a

pendenga de fatos incidentes há de se abrir a contagem do prazo prescricional

intercorrente, fulminante da execução.

Por fim o sétimo e último aresto que foi utilizado para a formação plena

da convicção dos ministros componentes da mais alta casa de jurisprudência

do País, no sentido de total admissão da aplicação da prescrição intercorrente

no âmbito do Direito Processual do Trabalho, vazado no julgamento do

Recurso Extraordinário nº. 53.881, cujo relator foi o Min. Ribeiro da Costa, que,

em decisão datada de 6 de agosto de 1.963, publicada no DJ de 17/10/63,

assim a ementou:

A prescrição da ação é a mesma da execução

começando a correr na data em que deveria tomar a

iniciativa do ato. Artigo 11 consolidado. Recurso

extraordinário improvido.

Trata-se de importantíssima decisão, porquanto a um só tempo gera três

efeitos de suma relevância: primeiro fixa o dies a quo da contagem do prazo

para a aplicação do instituto; segundo porque conclui em linha com sua

jurisprudência que a prescrição da execução é a mesma da ação, e no também

no processo do trabalho há incidência tanto para a propositura quanto para a

fase executiva, com igual interregno, ou seja, o reconhecimento da anterior não

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exclui nova incidência posteriormente; terceiro porque não serviu de base para

alicerçar a formação de um novo e consagrador verbete de sua Súmula.

Oportuno ainda trazer à luz a hipótese que estava sendo analisada. O

voto condutor revela que o tribunal estava apreciando um caso no qual a parte

deixou de promover a liquidação de sentença, o que redundou na paralisação

do feito por mais de cinco anos, situação que a corte entendeu como

inadequada, acomodando o desejo de ver extinta a execução pelo tácito

desinteresse da parte, a quem cabia com exclusividade impulsionar o feito

através da liquidação.

A lição possível de se inferir, embora não explícita, é que o impulso

oficial somente há se ser utilizado nos atos ordinatórios, na condução da

marcha processual. Assim, nos atos e diligências que são de alçada da parte,

como a liquidação, os efeitos da lei se circunscreve nos limites do artigo

791/CLT, que preceitua o acompanhamento permanente da parte, e não no

impulso oficial, também expressamente constante da normatividade.

9.2. Tribunal Superior do Trabalho

O Tribunal Superior do Trabalho sumulou a matéria em seu verbete 114,

criado pela Resolução Administrativa 116/80, publicada no DJ de 3 de

novembro de 1.980, que diz, verbis: É inaplicável na Justiça do Trabalho a

prescrição intercorrente, contando com aprovação em Sessão Plena Ordinária

de 22 de outubro de 1.980, ou seja, cerca de dezessete anos depois da

aprovação da Súmula do STF.

A decisão, entretanto, foi por maioria, ou seja, nem todos os ministros

aceitaram a inaplicabilidade da prescrição intercorrente. Com efeito, votaram

contra os Ministros: Hildebrando Bisaglia, Marcelo Pimentel, Miranda Lima,

Mozart Victor Russomano, Nelson Tapajós e Geraldo Starling Soares. Isso

significa que, considerando-se a composição do TST à época, foi uma

resolução muito discutida e cercada de grande controvérsia, com seis votos

contrários.

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A própria redação do verbete evidencia a existência de dissenso, na

medida em que assevera ser inaplicável, na Justiça do Trabalho, a prescrição

intercorrente, em flagrante oposição ao verbete antes comentado, lavrado pelo

STF, fôro em que o instituto veio a ser consagrado. Nesse sentido, a decisão

administrativa da corte trabalhista além de deixar transparecer seu viés político,

quiçá ideológico, pois traz em si algo de indisciplina judiciária, face à afronta ao

decidido em sentido contrário pelo tribunal que, efetivamente, pela estrutura

constitucional, traz a última palavra em matéria de justiça no Brasil.

Assim agindo, o TST, com a composição da época, em vez de contribuir

para a harmonização da jurisprudência brasileira, permitindo que a sociedade

compreenda os institutos jurídicos existentes em seu proveito, fomenta a

divergência, estimula a eternização dos litígios, os quais, em virtude do

dissenso sumular poderão chegar ao Supremo Tribunal Federal, em múltiplos

Recursos Extraordinários, com amplíssima possibilidade da corte maior julgar

em sentido contrário, ou seja, conforme sua Súmula.

Isso gera morosidade, ilusão para o jurisdicionado, decisões conflitantes

que só creditam desprestígio para o Poder Judiciário, e ainda impedem que

ambas as cortes tenham mais tempo e energia para o exame de casos

verdadeiramente inéditos e hábeis a desafiar a inteligência de seus ministros.

Feitas tais considerações, úteis a fomentar o debate e, quem sabe,

permitir que o TST possa rever o entendimento cristalizado, como é papel do

direito sumular e convém à harmonia judiciária, sobretudo após o implemento

da legislação ordinária, que expressamente autoriza a declaração da

prescrição intercorrente em matéria de conhecimento da Justiça do Trabalho (e

compatível com os princípios que informam o Direito Processual do Trabalho –

hipossuficiência do empregador-devedor em relação à União no caso dos

executivos fiscais), bem como da doutrina contemporânea, passemos a

investigar os precedentes que motivaram o verbete em análise.

Serviram de precedentes os seguintes julgados: E-RR-1.831/74,

publicado no DJ de 7 de outubro de 1.976; RO-AR-348/74, publicado no DJ de

9 de julho de 1.976; RR-4.362/75, publicado no DJ de 6 de julho de 1.976; RR-

5.242/75, publicado no DJ de 19 de outubro de 1.976, e RO-AR-306/76,

publicado no DJ de 6 de abril de 1.977.

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O primeiro, cujo relator foi o Min. Orlando Coutinho, traz simplória, mas

contundente ementa:

Inexiste, no processo trabalhista, a prescrição

intercorrente. Embargos não conhecidos.

No corpo do julgado, a interpretação das leis processuais, com a análise

de que no processo civil a extinção do processo, pela paralisação do feito por

negligência das partes, só tem lugar se o inerte, intimado pessoalmente, não

supre a falta, enquanto no processo trabalhista, “...quem responde pela

celeridade é o próprio Juiz ou Tribunal que conhece a causa (Russomano),

como dispõe o artigo 765/CLT, não revogado pelo art. 4º, da Lei 5.584/70, que

apenas reforçou o entendimento”. E prossegue, aduzindo que: “Tem o Juiz a

iniciativa da condução do processo, uma vez formulada a reclamação. Não se

pode responsabilizar o titular de um direito 'por uma inércia que não lhe pode

ser imputada' (Câmara Leal)”. Rematando, expõe que na hipótese em

julgamento, a inércia é atribuída ao juízo, que manteve os autos conclusos por

mais de dois anos, inocorrendo, então, a negligência dos reclamantes.

O segundo teve como relator o Min. Coqueijo Costa, encontra-se

ementado da seguinte forma:

Duas são as citações no processo executivo em sua

unidade, se tiver havido liquidação – (ALCIDES DE

MENDENÇA LIMA). A prescrição intercorrente é

incompatível com o processo do trabalho, máxime com o

processo executivo, em que há o impulso de ofício (CLT,

artigos 765 e 878).

Neste segundo julgado, entretanto, duas importantíssimas questões para

a compreensão do instituto em exame foram tratadas, a primeira onde se

demonstrou que a prescrição intercorrente estava sendo abordada em virtude

de inércia em fase de execução, onde a parte, após ter tido julgado como “não

provados” os seus artigos de liquidação, aduz que “ficou impossibilitada” de

agir.

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O argumento é frágil, porquanto uma vez não provados os artigos, cabe

a parte diligenciar no sentido de promover novos artigos, até que a matéria

esteja suficientemente esclarecida e permita a liquidação efetiva.

Trata-se, destarte, de inércia real da parte e que somente a ela pode ser

atribuída, nada cabendo ao juízo, ainda que considerado o princípio do impulso

oficial, e tampouco a parte ex adversa.

A segunda questão reputada relevante, é que a parte em seu arrazoado,

sustenta que a prescrição intercorrente teria sido interrompida com seu pedido

de levantamento do depósito recursal, matéria que foi rechaçada pelo Ministro

Barata Silva em seu voto vencido, com argumentos claros e auto-explicativos.

Nele, o Ministro, com a sabedoria de experimente magistrado, traz a

consideração da Turma que: “A circunstância do autor ter requerido o

levantamento do depósito recursal não importou em interrupção do prazo da

prescrição para formular a liquidação de sentença. Trata-se, no caso, de ato

secundário, amparado pelo que dispõe o § 1º, do art. 899, CLT. Sua prática

não importa em reconhecimento de qualquer outro direito dependente de

atuação da parte em decorrência da decisão então exeqüenda”.

A clareza dos argumentos impressiona, assim com as razões de

convencimento abordadas no acórdão também. Depois de tudo nos levar a crer

que a tese da prescrição iria sair vencedora, o voto, também sem maiores

explicações, conduz para a declaração da impossibilidade de aplicação do

instituto108.

Está assentado no acórdão:

Como salienta CLÁUDIO PENNA FERNANDEZ, somente

o executado tem legitimação ativa para embargar a

execução. O exeqüente não tem. Mas pode impugnar a

sentença de liquidação, através do agravo de petição

(artigo em LTr, abril de 74, pág. 318). No processo

comum, cabe apelação no efeito só devolutivo (art. 520, III

do CPC).

108 Convém observar que o Ministro Relator do Acórdão, no TST, é o mesmo importante doutrinador considerado no Capítulo 4 deste trabalho, e tanto como juiz quanto como professor, Coqueijo Costa mantinha as mesmas perplexidades quanto ao intrincado tema da prescrição intercorrente, deixando transparecer em dois momentos produtivos de sua existência, as dúvidas que o assaltavam.

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150

Não usou desse remédio o exeqüente. Mais de dois anos

passados, quis prosseguir na ação de execução.

Sendo o recurso uma faculdade, não recorrendo o

vencido na sentença de liquidação, prossegue-se na

execução. O indispensável é que quem promover a

liquidação, ou a execução, seja citado pessoalmente,

depois de julgada a liquidação e antes de se mover-se a

execução própria.

Portanto, como assinala ALCIDES DE MENDONÇA LIMA,

('Comentários do CPC', VI, Tomo II, pág. 619), duas são

as citações no processo executivo em sua unidade, se

tiver havido liquidação: o devedor tem de ser citado para a

liquidação e, depois de julgada, ser novamente citado

para a execução. Houve a “notificação”, mas é impossível

a prescrição intercorrente, aí, como em todo o processo

do trabalho, em que o impulso de ofício é marcante.

Há de se reconhecer, como é amplamente cediço, que o vocábulo

“notificação” é utilizado na CLT para significar a um só tempo dois atos

processuais, na sistemática do Código de Processo Civil. Cabe para a citação

propriamente dita, bem como a intimação. Entretanto, ambos os atos

processuais têm um só efeito, qual seja, o de dar efetiva ciência à parte que

está com o ônus de praticar o ato processual.

No caso é exame, não resta dúvida que o exeqüente fora notificado da

decisão. E considerando-se que a liquidação de sentença, por artigos, é ato

exclusivo da parte, sem a possibilidade de ser por outrem suprido, a decisão

mas compatível com os parâmetros oferecidos pelas partes para o Judiciário

conhecer, seguramente o reconhecimento, com a conseqüente declaração, da

ocorrência da prescrição intercorrente, como aliás, sinalizava o voto do ministro

relator, em grande parte em linha com o voto vencido.

Relator do terceiro aresto o Ministro Renato Machado, que entendeu por

bem formular a seguinte ementa:

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151

No Processo do Trabalho vigora o princípio do impulso

processual de ofício. Daí não se aceitar a possibilidade da

prescrição intercorrente. Revista conhecida e provida.

A ementa referida, embora de baixa cientificidade, revela, com bastante

nitidez, a opção política feita pelo TST. Ao julgar o mérito, sem qualquer

reserva, o Ministro relator, componente da Segunda Turma, aduz: “Tem

predominado, nesta Justiça, em face de suas peculiaridades, para que não

haja alternatividade de critério, o entendimento da não prevalência de

prescrição intercorrente, ainda que a inércia processual seja de

responsabilidade da parte, também porque cabe à Junta a função específica de

zelar pela rapidez processual”.

A fundamentação parece derivar genuína convicção pessoal do relator,

distanciada de razões juridicamente fundadas, revelando um momento em que

a Corte, em dado momento, e independente de critérios estabelecidos pelo

direito, entendeu por bem afastar a prescrição intercorrente apenas para não

prejudicar os interesses dos trabalhadores.

É bem verdade que a decisão veio à luz na vigência de uma

Constituição Federal com primados diferentes dos atuais. Todavia, é

incrivelmente injusto não se considerar a realidade dos autos e acobertar a

recalcitrante inatividade do trabalhador apenas porque ele ostenta essa

condição.

Mais um julgado cuja análise é oportuna, sobretudo porque a prescrição

intercorrente foi apreciada na fase de conhecimento, é o do quarto precedente,

da relatoria do Min. Lima Teixeira, e que se encontra assim ementado: “Revista

que é conhecida e que se dá provimento para que os autos retornem à Junta

para apreciar o mérito no estado atual do processo, pois a prescrição

intercorrente é inaplicável na Justiça do Trabalho”.

A decisão judicial refere-se a uma demanda paralisada em fase de

conhecimento, por culpa exclusiva do reclamante, como é incontroverso, o que

levou à extinção pelo motivo central deste estudo. E o recurso limita-se a

evocar a extraordinária proteção jurisprudencial, de modo a encobrir a desídia.

A Turma, em fundamentação que não levou mais do que uma linha e

meia de texto, conheceu a revista e, continuou laconicamente: “No mérito, dou

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provimento para cessar a prescrição intercorrente determinando o retorno dos

autos à Junta de Conciliação e Julgamento para apreciar o mérito...”.

Mais uma vez, a corte não enfrenta as aporias relativas ao instituto e sua

aplicação, fazendo, de novo, sua opção desmotivada. Não obstante, não

encontrou pacífica complacência em todos os integrantes da Turma, na medida

em que houve voto divergente, da lavra do eminente Ministro Hildebrando

Bisaglia, que imputava os ônus decorrentes da inatividade ao reclamante,

porquanto, in casu, cabia-lhe indicar o endereço de uma testemunha e a parte

deixou transcorrer todo o largo lapso prescricional sem se dignar a oferecer o

endereço atualizado da pessoa que conhecia o fato tratado na demanda.

O derradeiro precedente, sintético como o primeiro, deriva do sentimento

do Min. Rezende Puech e conta com a seguinte ementa:

A prescrição intercorrente não se aplica no âmbito da

Justiça do Trabalho.

A situação descrita neste último julgado, diz respeito a um Recurso

Ordinário em ação rescisória, onde a parte requer expressamente seja acolhida

a Súmula do Supremo Tribunal Federal sobre nosso tema. Entretanto, não

mereceu também maior explicação sobre a razão pela qual a mesma não

poderia contar com guarida. O voto diz apenas que:

“... a jurisprudência trabalhista, reiterada, é no sentido de

que o princípio da prescrição intercorrente não se aplica

ao processo trabalhista, dado o poder inquisitorial109 de

que é dotado o Juiz nesta Justiça Federal Especializada”.

Para nos atermos apenas nos casos versados nos feitos que geraram os

precedentes que deram origem à elaboração do verbete, temos hipóteses nas

quais um deixa de indicar endereço de sua testemunha, outro em que a parte

não renova os artigos de liquidação e assim por diante. São casos nos quais a

109

A declaração não se acomoda mais com os princípios processuais constitucionais estabelecidos na Constituição Federal de 1.988, onde a disponibilidade da demanda é fator regente, o que recomenda urgente revisão jurisprudencial, a partir de releitura de normas processuais encontradas na CLT. Ademais, convém pontuar que o papel do Juiz não se altera em função da Corte onde exerce sua judicatura, segundo a matriz constitucional apontada.

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153

iniciativa dos demandantes é absolutamente essencial para que o feito

pudesse prosperar, pois o julgador ainda que despachasse esses processos

todos os dias, nada poderia fazer para suprir a passiva situação de quem

deveria figurar como interessado. Daí porque é fora de propósito atribuir

exclusivamente ao Juiz o dever de impulsionar o feito. E, sendo assim, nada

mais sensato do que impor os ônus da demanda a quem efetivamente foi

buscar a prestação jurisdicional, sobretudo diante do princípio da inércia que

informa o direito processual.

Já é chegado o tempo de fomentarmos elementos teóricos hábeis a

motivar uma revisão da forma como o Tribunal Superior do Trabalho percebe o

problema, atribuindo exata responsabilidade aos litigantes.

Lamentavelmente ainda há entre nós trabalhadores sem um mínimo de

informação acerca de seus direitos, o que os torna alvo fácil de aproveitadores

e, assim, deveriam estar entre os demandantes mais ativos. Todavia o dever

de informação e promoção social é, num primeiro momento, reservado ao

Poder Executivo e, num segundo, a toda a sociedade. Jamais apenas ao Poder

Judiciário trabalhista, que não tem o dever e tampouco as condições para

suplementar tal atuação política.

Urge que os sindicatos e o Ministério Público do Trabalho, com as

atribuições que lhes são reservadas, cumpram efetivamente seus papéis.

A soma desses esforços conduz à Justiça para perto da sociedade,

porquanto a torna mais justa, equilibrada e equânime. Com efeito, nesta quadra

da humanidade, onde mundo a fora têm os tribunais o dever de motivar

suficientemente suas decisões, as opções meramente ideológicas vão

perdendo espaço.

Não poderíamos, ao final, deixar de fazer justa crítica à precária

fundamentação de algumas das decisões judiciais que serviram de suporte

para a sedimentação do verbete que clama por revisão, as quais, pela

percepção jurídica atual, nos causa espécie. Registramos, ao ensejo, não se

tratar de censura aos prolatores das mesmas, até porque numa pesquisa

jurisprudencial é preciso compreender o momento técnico-científico em que tais

valores foram considerados, mas sim destacar a maravilhosa conquista

democrática que importa no dever do julgador explicitar, motivadamente, os

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critérios, valores e fundamentos que serviram de balizamento para a formação

de sua convicção, consubstanciados no inciso IX, do art. 93/CF.

Com efeito, diz a norma referida:

Art. 93, IX/CF: todos os julgamentos dos órgãos do Poder

Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as

decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a

presença, em determinados atos, às próprias partes e a

seus advogados, ou somente a estes110, em casos nos

quais a preservação do direito à intimidade do interessado

no sigilo não prejudique o interesse público à informação.

O mais valioso, contudo, é constatar a passagem do princípio do

discurso para o princípio da democracia, ou da processualidade democrática,

onde a decisão somente se legitima com a uma fundamentação bem

consistente111.

A fundamentação ampla, a partir da norma constante no inciso IX, do art.

93/CF, já está na consciência de todos aqueles que se utilizam o direito

processual. Atualmente não bastam a simples interpretação os documentos e

do que as testemunhas disseram. Apenas isso não se presta a integralizar o

princípio. Sua ativação plena se dá com a fundamentação substancial, que é

aquela que se refere expressamente aos elementos de fato e de direito que

foram considerados para a decisão (ZAVARIZE, 2.004, p. 88), e

acrescentamos nós, fazendo-se ainda a exata adequação de tais elementos

aos escopos constitucionais, como efetiva condição de validade do julgado.

110 Soa absolutamente incompreensível como a norma pode restringir a presença somente aos advogados, deixando os constituintes dos mesmos do lado de fora da sessão, como tem sido interpretado por algumas Cortes. É, no mínimo, contraditório. 111 A evolução é fantástica, basta ver que no Regulamento 737, de 25 de novembro de 1.850, a primeira legislação pátria que dispunha sobre a motivação das decisões, o art. 232 dispunha apenas: a sentença deve ser clara, sumariando o Juiz o pedido e a contestação com os fundamentos respectivos, motivando com precisão o seu julgado, e declarando sob sua responsabilidade a lei, uso ou estilo em que se funda. O “Código de 39” (CPC promulgado pelo Decreto-Lei 1.608, de 18 de setembro de 1.939), ao tratar da sentença, exigia clareza e precisão, devendo estar conter relatório, fundamentos do fato e de direito e a decisão (incisos I a III, do art. 280). Segundo Zavarize, não estava cominada a pena de nulidade, em norma expressa, para o caso de ausência de motivação da sentença, mas assim se admitia, pois, caso contrário, a sentença não comporia a lide com justiça, havendo posicionamentos doutrinários no sentido de atribuir natureza de ordem pública ao preceito de motivação (ZAVARIZE, 2.004, p. 36). Ainda no sistema do código em questão, interessante notar que os motivos da sentença faziam coisa julgada, por força do art. 287, para o qual considerar-se-ão decididas todas as questões que constituam premissa da conclusão. E o código atual, Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1.973, continuou a adotar a obrigatoriedade da motivação das decisões, explicitando em diversos dispositivos o teor do princípio, como nos artigos 131, 165, 458, cuja transcrição deixamos de fazer, diante da atualidade da norma e de seu conhecimento geral, até chegarmos a sua elevação à categoria de princípio constitucional, como no inciso IX, do art. 93/CF.

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155

A decisão jurídica constitucionalizada há de ser construída baseada na

discursividade, para que o seu substrato seja compatível com o modelo

previsto na Carta Magna.

A jurisprudência contemporânea, no entanto, está a buscar novos

parâmetros para o balizamento em torno da prescrição intercorrente, ora

admitindo expressamente o instituto, sem qualquer ressalva, ora negando-o,

como na jurisprudência cristalizada, igualmente sem fundamentação plausível,

em cômoda posição sectária.

Há outros julgados, no entanto, nos quais a percepção do modelo estatal

já se encontra refletida. A consistente interpretação reconhece a existência do

fenômeno, todavia exige dupla vertente para sua atuação. Há necessidade de

co-existir o requerimento da parte, bem como a inércia derivar que ato

processual de atribuição exclusiva da parte.

9.2.1. Acolhimento expresso da prescrição intercor rente pelo TST

Há casos, muito raros, onde o Tribunal Superior do Trabalho assume

abertamente o ônus de julgar contra sua Súmula, destacando que são

episódios específicos que justificam a adoção de conduta assim. Todavia, é

um estímulo para todos aqueles que desejam o avanço jurisprudencial, afinal,

mais vale um passo-a-passo seguro. Nesse sentido, a 2ª Turma, pela pena do

Juiz convocado Luiz Carlos Gomes Godoi, de modo ousado, aponta o fato e

conclui com seus pares pela aplicação, no RR - 2316/1989-002-17-00,

ementado da seguinte forma:

... Esta Justiça Especializada já pacificou o seu

entendimento no sentido de que é inaplicável a prescrição

intercorrente no processo do trabalho, por isso que a

execução, mero desdobramento do processo de

conhecimento, pode ser promovida por qualquer

interessado, ou ex officio pelo próprio Juiz ou presidente

do tribunal competente, salvo, ante a inércia do credor, a

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teor do art. 878, da CLT. A exceção só se verifica na

hipótese em que o procedimento não poder ser

impulsionado pelo Juízo, como se dá na liquidação por

artigos”. Capturado em http://brs02.tst.gov.br. Acesso em

29/08/2.007.

Não é difícil ainda supor que a jurisprudência do Tribunal Superior do

Trabalho vá passar por significativa transformação nos próximos tempos,

porque somente agora, em fins de 2.007, teve seu quadro integralmente

recomposto (conforme a Reforma do Judiciário), por meio da nomeação de

mais de dez novos ministros. Um deles, Maurício Godinho Delgado, que tem

alentada produção intelectual, indica em sua obra que é possível a admissão

da prescrição intercorrente, ao menos na fase de execução112.

Sendo assim, encontrando espaço numa Corte que atua

colegiadamente, podemos supor que, por coerência à sua obra, julgará no

sentido de acolher a prescrição intercorrente, inclusive de ofício, como na

passagem transcrita em nota de rodapé.

9.2.2. Acolhimento tácito da prescrição intercorren te pelo TST

Noutros casos, o TST, nos dias de hoje, chega a se inclinar, ainda que

com alguma timidez, pela real existência da prescrição intercorrente. Assim,

mesmo negando sua aplicação, em linha com sua Súmula, incidentalmente

transcreve decisão de tribunal de origem (no caso o TRT/6, com sede em

Pernambuco, com os argumentos expendidos, como no RR 395/1.997-003-6-

40.3, onde as perplexidades da atualidade são expostas com preocupação pelo

Poder Judiciário. Destarte, vem à luz: 112 “... há uma situação que torna viável, do ponto de vista jurídico, a decretação da prescrição na fase executória do processo do trabalho – situação que permite harmonizar, assim, os dois verbetes de súmula acima especificados (Súmula 327/STF, e Súmula 114, TST). Trata-se da omissão reiterada do exeqüente no processo, em que ele abandona, de fato, a execução, por um prazo superior a dois anos, deixando de praticar, por exclusiva omissão sua, atos que tornem fisicamente possível a continuidade do processo. Nesse específico caso, argüida a prescrição, na forma do artigo 884, § 1º, CLT, pode ela ser acatada pelo Juiz executor, em fase do art. 7º, XXIX, CF/88, combinado com o referido preceito celetista, ressalvada a pronúncia de ofício, a teor da Lei nº., 11.280/2.006, se for o caso” (DELGADO, 2.006, p. 281).

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157

...”É que embora entenda de difícil caracterização, haja

visto o poder que o Juiz detém para conferir impulso

oficial ao processo, é possível a declaração da prescrição

intercorrente, na Justiça do Trabalho... Tais fundamentos

doutrinários conduzem à compreensão da razão pela qual

a prescrição intercorrente é um bem e não um mal; traduz

segurança jurídica e não o contrário; incita a efetividade

processual e rejeita a inércia. Afinal, à parte interessada

na solução definitiva da lide, incumbe buscar providências

judiciais e tomar as suas próprias, indicando ao Juízo,

inclusive, quando da suspensão a execução, que estão

sendo buscados meios à sua realização, evitando,

destarte, a extinção dela e retirando de circulação volume

(s), que apenas dificultam a organização do limitado

espaço físico das Varas e dos próprios servidores,

igualmente em número inferior ao preciso”.

Noutras feitas, mantendo o mesmo cuidado, no sentido de não afrontar

abertamente sua Súmula, deixa transparecer, ao reproduzir no corpo de seus

acórdãos, o posicionamento do Regional de origem, donde emergem os

argumentos que sustentam a prescrição intercorrente, como num esboço de

nova construção jurisprudencial. Assim foi com a decisão de sua Primeira

Turma, no aresto TST-AIRR-02269/1989-002-17-00.2, relatado por Guilherme

Bastos, onde convindo com o julgador a quo, citou em seu voto:

... “pleiteia a recorrente a reforma do respeitável decisum

a fim de ver afastada a prescrição intercorrente decretada

ao argumento de que não deu causa à paralisação do

feito. Sem razão, contudo. Refletindo melhor sobre a

matéria, entendo aplicável no processo laboral, a

invocação da jurisprudência do Excelso Pretório,

porquanto após o advento do despacho de fl. 25,

protocolado em 15/12/94, remetendo os autos ao arquivo

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158

provisório, somente em 25/02/97 o reclamante peticionou

na reclamatória ou seja, quase três anos depois, quando

há muito já havia o trânsito em julgado da sentença.

Denota-se o evidente descaso por parte do autor em

promover atos que lhe competia, quedando-se inerte

quando da remessa dos autos ao arquivo provisório. Ora,

em situação como a descrita, fica evidenciado que o

julgador a quo procedeu com acerto, ao invocar a Súmula

327/STF, considerados os ideais de economia e agilidade

na prestação jurisdicional. Seu raciocínio harmoniza-se,

ainda, com o espírito do art. 884, § 1º, da CLT. Não

parece mais razoável a aplicação do entendimento

consubstanciado no Enunciado 114/TST, momento

quando o estancamento do processo acontece ante à

inércia do autor em praticar atos de sua responsabilidade,

sob pena de permanecerem os autos nas secretarias

esperando pela iniciativa das partes ad aeternum,

prejudicando sobremaneira um dos princípios básicos do

processo trabalhista, ou seja, a celeridade processual”.

A técnica de reconhecimento da prescrição intercorrente no corpo no

julgado sem maior destaque na ementa volta a ocorrer, como no julgamento

proferido pela 2ª Turma113 do TST, em acórdão da relatoria do Min. Renato de

Lacerda Paiva, que traz à luz o arrazoado do TRT da 18ª Região, com sede em

Goiás. Destaca o voto condutor:

... “o tribunal a quo, ao apreciar a matéria, assim dispôs,

in verbis: discorrendo longamente sobre a prescrição

intercorrente e citando posicionamentos jurisprudenciais e

doutrinários, no sentido da tese defendida no presente

recurso, pretende a agravante sua aplicação ao caso em

113

A 5ª Turma não tem julgado diferente. Cf. RR-2846/1988-006-05-40, em Acórdão da relatoria do Min. Gelson Azevedo, unânime, publicado no DJ de 10/03/06, onde a prescrição intercorrente é admitida, com a declaração, inclusive, de que não há violação direta ao inciso XXIX, do art. 7º/CF, uma vez que mesmo não trata da prescrição da execução.

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159

deslinde, argumentando que o transcurso de quase sete

anos, sem nenhuma movimentação do exeqüente,

fulminou o seu direito. Analisando minuciosamente os

autos, extrai-se que, na fase executiva, especificamente

após frustrada a praça, foi o exeqüente intimado para que

requeresse o que entendesse de seu interesse sob pena

de recolhimento do processo ao arquivo, na data de

17/11/1995. O exeqüente deixou transcorrer, in albis, o

prazo concedido. Os autos, então foram recolhidos ao

arquivo, até manifestação do exeqüente. Na data de

04/09/2002, o juiz de primeiro grau determinou a

reavaliação do bem constritado para posterior designação

de praça. A executada, por intermédio da petição de fl.,

pediu o chamamento do feito à ordem, com o propósito de

declarar a prescrição intercorrente à presente execução...

...cediço que na processualística trabalhista existe

faculdade de o Juiz, de ofício, impulsionar a execução, o

que, em princípio, constituiria argumento inarredável para

obstar a declaração da prescrição intercorrente. Todavia,

o impulso, como se disse, é uma faculdade, não um

dever, e se o magistrado não movimenta a execução, é

da parte a obrigação de praticar os atos necessários à

consecução de seu fim, já que as lides não podem

eternizar-se e existem atos processuais que somente o

interessado pode praticar.

...decisão contrária afronta a segurança das decisões

judiciais e autorizaria a eternização da execução. Ante o

exposto, dou provimento ao recurso para o fim de

decretar a prescrição intercorrente, extinguindo a

execução com julgamento do mérito, nos termos do inciso

IV, do art. 269, do CPC”. (http://brs02.tst.gov.br. Acesso

em 29/8/2.007).

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Foi assim também no julgado RR – 1.351/2002-920-20-86, publicado no

DJ de 03/08/2.007, no qual a 4ª Turma, em acórdão relatado pela Min. Maria

de Assis Calsing, a Corte assim se pronunciou em recentíssima decisão:

...O Tribunal Regional do Trabalho da 20ª Região114,

negou provimento ao agravo de petição da reclamante,

mantendo a decisão proferida pela MM Juíza da vara de

Aracaju, que extinguiu o processo com resolução de

mérito, tendo em vista que a reclamante iniciou a

liquidação do julgado sem, contudo, fazer qualquer

ressalva quanto à não inclusão da parcela referente à

incidência das horas extras no cômputo da

complementação de aposentadoria. O Regional aplicou,

então, a prescrição intercorrente ao argumento de que:

consoante entendimento consagrado na Súmula 327 do

STF...

Isso deixa às claras a intenção de trazer os argumentos versados no

julgado de origem, numa tentativa de buscar novos rumos para a matéria, ou

mesmo de dar espaço para o debate. E nesse sentido, embora não

conhecendo o referido RR, a Ministra Calsing, faz questão de consignar seu

entendimento, abertamente favorável ao conhecimento da prescrição

intercorrente, assim se manifestando no aludido voto:

...Vê-se que o Juiz do Trabalho, no mais das vezes, não

pode promover a execução ex officio, ficando o

prosseguimento do processo a depender de ato da parte.

Em tais circunstâncias, sempre que o exeqüente

permanecer inerte por lapso superior a dois anos,

configurar-se-á a prescrição intercorrente, sob pena de se

eternizar o litígio (o destaque foi acrescentado).

114 Convém observar que trata-se de mais um Tribunal Regional aplicando a prescrição intercorrente, este com sede Aracaju/SE, em clara demonstração que o espaço para sua consagração no meio processual trabalhista está definitivamente aberto de norte a sul do País (observação do autor, não constante do acórdão referido).

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161

Há julgados ainda, é claro, onde a posição do TST é mantida, com base

na Súmula 114, entretanto, o julgamento dos recursos de revista evidencia que

o tribunal de origem acolheu a prescrição intercorrente. E considerando-se os

novos indicativos que vêm de todos os quadrantes deste imenso País,

oportuno revelar também o pensamento baiano. Com efeito, nos autos AIRR

1193/1995-131-05-40, a 2ª Turma do TST, em decisão que teve como relator o

Min. José Simpliciano Fontes de F. Fernandes, publicada no DJ de

08/06/2.007, rechaçou o conhecimento da matéria em estudo, entretanto,

revelou que o Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, com sede em

Salvador/BA, havia recepcionado a tese da agravante.

E mais, se não é excesso de percepção, quer parecer que o

convencimento íntimo do aludido Ministro é no sentido de se acolher a

prescrição intercorrente, porquanto assim se expressa:

...Em verdade, o que se verifica é que a inércia do

Agravado, suscitado pela empresa agravante, se

caracteriza, em verdade, como prescrição intercorrente115,

pois a paralisação mencionada, ocorrida entre 18/03/99 a

18/03/01, se verificou no curso do processo executório.

No entanto, o C. TST já pacificou entendimento no sentido

de que... (o destaque foi acrescentado).

9.3. Admissão integral da prescrição intercorrente em TRT

Como exsurge dos julgados proferidos pelo TST, vários Tribunais

Regionais têm admitido a prescrição intercorrente, à saber: 4ª Região, Rio

Grande do Sul, com sede em Porto Alegre; 5ª Região, Bahia, com sede em

Salvador; 6ª Região, Pernambuco, com sede em Recife; 10ª Região, com sede

115

Uma vez mais concluímos ser razoável acrescentar nosso pensamento, como contribuição doutrinária, porquanto interpretando a expressão utilizada pelo Ministro Relator, “... a inércia do agravado, suscitada pela empresa agravante, se caracteriza, em verdade, como prescrição intercorrente”..., há expressa admissão que o instituto existe, mas não está sendo aplicado apenas porque a Corte sumulou matéria em sentido contrário. A explicitação, contudo, demonstra que a timidez está ficando para traz, e que possivelmente a maior Corte trabalhista caminha para a mudança de entendimento.

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em Brasília; 18ª Região, Goiás, com sede em Goiânia; 20ª região, Sergipe,

com sede em Aracaju, além de muitos outros, notadamente o TRT da 15ª

Região, com sede em Campinas/SP, onde há o maior e mais expressivo

número de julgados admitindo a aplicação do instituto em exame, geralmente

sem rebuços.

Nesse sentido, o aresto cuja relatoria é da Juíza Ana Paula Pellegrina

Lockman, assim ementado:

EXECUÇÃO TRABALHISTA. PRESCRIÇÃO

INTERCORRENTE. Ainda que o entendimento

jurisprudencial sedimentado na Súmula nº. 114 do C. TST

seja no sentido de ser inaplicável a prescrição

intercorrente na Justiça do Trabalho, entendemos que a

mesma foi expressamente contemplada pelo legislador no

parágrafo primeiro do artigo 884 da CLT, ao dispor que a

matéria de defesa será restrita às alegações de

cumprimento da decisão ou do acordo, quitação ou

prescrição da dívida (grifos do original).

No julgado se diz que o dispositivo legal em apontado somente pode

reportar-se à prescrição intercorrente, haja vista que a ordinária apenas pode

ser argüida na fase de conhecimento, sendo inadmissível a modificação ou

inovação da sentença exeqüenda, na fase de liquidação do julgado, ex vi do

parágrafo primeiro do artigo 879 da CLT.

Lado outro, revela o tribunal que em se tratando de matéria

prescricional, a mesma não pode ser declarada de ofício, como ocorreu na

hipótese, e somente tem aplicação quando a paralisação vincula-se à prática

de atos de incumbência exclusiva do credor, o que não se verificou nos

autos116.

116

No julgado em referência há transcrição de outro julgado claro e positivo, da mesma Corte, que conta com a seguinte ementa: EXECUÇÃO – PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE – DECLARAÇÃO DE OFÍCIO – IMPOSSIBILIDADE. A prescrição, tanto na fase de conhecimento, quanto na fase de execução, não pode ser declarada de ofício pelo julgador, carecendo de provocação expressa da parte interessada – artigos 884, § 1º, da CLT; 194 do Novo Código Civil Brasileiro e 219, § 5º, do CPC. (TRT-15ª R., 1ª T., Proc. 01638-1988-001-15-00-3-AP. Rel. Juiz Luiz Antônio Lazarim, DOE 25/04/2.003). * Note-se que o julgado acima transcrito e o referido no corpo do texto são anteriores à modificação do § 5º, do art. 219/CPC.

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163

Vindo do mesmo Regional, o aresto 003231, da 5ª Turma do TRT/15,

Campinas, que em decisão de 30/01/2.001, em feito que teve como relator o

Des. Luís Carlos Cândido Martins Sotero da Silva, ficou assim ementado:

PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. INAPLICABILIDADE

DO ENUNCIADO 114 DO C. TST. CABIMENTO. Nada

obstante os termos do Enunciado nº. 114 do C. TST, é

perfeitamente aplicável a prescrição intercorrente na

Justiça do Trabalho, uma vez ausente a força vinculante

da Súmula. Ademais, o próprio estatuto obreiro prevê a

ocorrência desse instituto, na medida em que o inclui nas

matérias previamente delimitadas para argüição nos

embargos à execução (§ 1º, do art. 884). Entretanto,

imprescindível que a inércia seja do autor e que o ato que

devesse ser praticado fosse de sua exclusiva

responsabilidade.

Encerrando os julgados do aludido Tribunal Regional do Trabalho da 15ª

Região, o decidido nos autos 01125-1990-051-15-85-6, pela 5ª Turma, tendo

como Relator o Juiz João Alberto Alves Machado, em cuja ementa assevera:

PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. I – A aplicação da

prescrição intercorrente no âmbito do Processo do

Trabalho encontra previsão legal no artigo 884, § 1º da

CLT, e nesse sentido se orienta a Súmula 327 do STF. II

– A recente modificação da Lei 6.830/80, levada a efeito

pela edição da Lei 11.051/04, passou a possibilitar a

declaração da prescrição intercorrente, quando decorrido

seu prazo após a decisão de arquivamento dos autos. III –

Implementado o prazo bienal de prescrição, nos moldes

previstos pelo artigo 884, § 1º, da CLT, combinado com o

art. 7º, inciso XXIX, da CRFB, e tendo a parte interessada

requerido sua declaração (art. 194 do C. Civil), merece

ser provido o apelo, para se declarar a prescrição

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intercorrente, com amparo no artigo 40, § 4º, da Lei

6.830/80.

Decidiu a 2ª Turma do TRT/4, com sede em Porto Alegre/RS, nos autos

do processo 00975-1995-751-04-00-6-AP, em acórdão relatado pela Juíza

Denise Pacheco, que:

ACORDO PREVENDO MULTA PELO ATRASO NO

PAGAMENTO DOS SALÁRIOS DOS SUBSTITUÍDOS.

PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. FASE DE

LIQUIDAÇÃO. Pronuncia-se a prescrição intercorrente,

durante a fase dita de acertamento (liquidação de

sentença) quando, em havendo acordo firmado nos autos

contemplando obrigação futura, o sindicato-autor não

noticia nos autos, dentro do prazo de dois anos do

vencimento de cada parcela, o descumprimento do ajuste

no que respeita à data do pagamento dos salários dos

substituídos. Prescrição da ação executória no tocante à

multa relativamente ao período abrangido pela prescrição

bienal. Acórdão capturado na internet. Disponível em

<http://www.trt4.gov.br/nj4jurisp/juris>, capturado em

30/08/2007.

O TRT/10, com sede em Brasília, de modo igualmente lúcido, propicia o

avanço da jurisprudência nacional, como no julgado de sua 3ª T., pela relatoria

do Des. Marcos Roberto Pereira, no AP 1.334/03, em que admite a ocorrência

do fenômeno da prescrição intercorrente, negando sua aplicação, no entanto,

porquanto não demonstrado, na espécie em exame, que o fato pode ser

imputado apenas ao exeqüente.

PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. Se o próprio Juiz

condutor da execução pode impulsioná-la de ofício (CLT,

art. 878), não há coerência em imputar somente ao autor

a responsabilidade de inércia processual, observando-se,

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165

porém, que não se pode olvidar os casos em que a

impulsão do feito cabe, exclusivamente, ao demandante,

como, por exemplo, na pendência de artigos de

liquidação. A prescrição intercorrente é aplicável no

processo trabalhista, necessitando, no entanto, de uma

análise casuística. No caso em tela, não resta

caracterizada nos autos a responsabilidade exclusiva do

reclamante pela estagnação do processo, mormente

quando demonstrado o desinteresse da executada pela

solução do litígio, ao não comunicar alteração do

endereço e não apresentar bens passíveis de constrição.

- Acórdão capturado em <http://brs02.tst.gov.br/cgi-bin.>.

Acesso em 27/2/2.007.

Noutra feita o mesmo Regional inclina-se mais uma vez pela aceitação

do instituto em exame, numa busca de consolidação jurisprudencial.

EXECUÇÃO TRABALHISTA – PRESCRIÇÃO

INTERCORRENTE. A prescrição da dívida argüível após

a configuração do título executivo judicial não se confunde

com a prescrição de direito material e decorre da inércia

do credor em perseguir o crédito que lhe fora

reconhecido, em tácita renúncia em recebê-lo, evitando a

eternização da demanda e a sujeição do devedor às

vontades do Autor. A prescrição intercorrente, ao menos

na liquidação de sentença, é de inequívoca aplicação no

processo do trabalho, por força do art. 884, § 1º, da CLT,

que o Enunciado 114 do TST não tem poder de revogar,

prevalecendo, neste sentido, o entendimento maior da

Súmula 327 do STF. Embora o art. 884, § 1º, da CLT,

preveja os embargos à execução como momento

derradeiro para a argüição de prescrição da dívida,

consubstanciada no título executivo judicial trabalhista,

nada impede que, ainda no procedimento liquidatório,

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possa a parte invocá-la, obstando execução logicamente

extemporânea”. (TRT 10ª Região – AP

00137.1991.008.10.85-0, 3ª Turma, Rel. Juiz Alexandre

Nery de Oliveira – DJU 11.7.2.003).

9.4. Admissão parcial da prescrição intercorrente e m TRT

A inclinação pelos novos tempos faz-se sentir por todo o país,

entretanto, alguns tribunais ainda prestigiam a jurisprudência que parece tende

a desaparecer, como o da 3ª Região, Minas Gerais. Ainda assim, ao menos no

tocante à execução fiscal, ante a inegável realidade positivada a prescrição

intercorrente acaba consagrada (e aí de ofício), conforme no julgado 01599-

2006-103-03-00-3 AP, relatado pela Desª. Maria Perpétua Capanema F. de

Melo, assim ementado:

EXECUÇÃO FISCAL – PRESCRIÇÃO

INTERCORRENTE – COBRANÇA DE MULTA

ADMINISTRATIVA. Tratando-se de execução fiscal, o art.

40 da Lei 6.830/80, em seu parágrafo 4º, prevê a

possibilidade de ser a prescrição intercorrente

reconhecida de ofício e imediatamente decretada pelo

juízo, máxime quando a presente demanda diz respeito a

execução de dívida ativa referente à multa administrativa,

por infração a artigo da CLT que passa a ser equivalente

ao crédito tributário, no qual a ação de cobrança

prescreve em cinco anos, de conformidade com o artigo

174 do CTN. - DJ de 24/7/2.007.

No mesmo sentido o julgado 00225-2006-004-03-00-9-AP, da 8ª Turma

do TRT/3, cujo relator foi o Des. Heriberto de Castro, onde também em

executivo fiscal, o tribunal não hesitou em aplicação da prescrição

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intercorrente, mesmo sem a expressa manifestação da Fazenda Pública, vez

que a mesma havia sido devidamente intimada.

AGRAVO DE PETIÇÃO – PRESCRIÇÃO

INTERCORRENTE. A única condição imposta pelo § 4º,

do art. 40 da Lei 6.830/80, acrescentado pela lei

11.051/04 para que seja decretada a prescrição

intercorrente, é que seja ouvida a Fazenda Pública,

permitindo-lhe argüir eventuais causas suspensivas ou

interruptivas do prazo prescricional. Assim, concedida

vista à parte, e se esta deixou decorrer in albis o prazo

para manifestação a tal respeito, mostra-se infundada

qualquer irresignação contrária à decretação, de ofício, da

prescrição. Agravo a que se nega provimento. (Revista

74, do TRT/3, julho a dezembro de 2.006, p. 570).

Noutra feita, a mesma Turma, entretanto em decisão por maioria,

também em um executivo fiscal, acolhe a tese da prescrição intercorrente, com

estrita observância do contraditório, autos nº. 02239-2006-138-03-00-2-AP, em

Acórdão da relatoria da Desª. Denise Alves Horta, publicado no DJ de 24/3/07,

assim ementado:

EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE.

Em execução fiscal, a Lei 6.830/80, no art. 40, parágrafo

4º, autoriza o reconhecimento, de ofício, da prescrição

intercorrente, quando decorrido o prazo prescricional

contado do arquivamento provisório de que trata o

parágrafo 2º, do mesmo dispositivo legal, e ouvida a

Fazenda Pública. Deve ser observada a prescrição

qüinqüenal, com fundamento no art. 174 do CTN, no art.

1º, da Lei 9.873/99 e no art. 1º, do Decreto 20.910/32.

DECISÃO: A Turma, preliminarmente, à unanimidade,

conheceu do agravo de petição: no mérito, por maioria de

votos, negou-lhe provimento, vencida a Exma. Juíza

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Revisora que dava provimento ao recurso para cassada a

prescrição intercorrente, determinar que os autos

retornem à origem, prosseguindo-se no normal

andamento do executivo fiscal, como entender de direito.

Além das Turmas expressamente referidas nos julgados cujas ementas

estão transcritas, as demais, do TRT/3, a 1ª nos autos do AP- 00577-2006-002-

03-00-1, da relatoria do Juiz convocado José Eduardo Resende Chaves, DJ de

16/03/07; a 2ª, no AP-00755-2006-002-03-00-4, cujo relator foi o Des. Anemar

Pereira Amaral, DJ de 28/3/07; a 4ª, no também AP-01637-2005-022-03-00-7,

relatado pelo Juiz convocado Fernando Luiz G. Rios Neto e a 6ª Turma,

através do julgado AP-00457-2006-152-03-00-9, em acórdão processado pelo

Juiz convocado João Bosco Pinto Lara, todas, em feitos nos quais a União

Federal atuava como parte, conheceram a prescrição intercorrente, entretanto,

apenas em executivos fiscais.

Temos ainda um julgado da 3ª Turma, também do TRT/3, relatado pela

Desª. Alice Monteiro de Barros, onde a magistrada, a um só tempo, aplica a

prescrição intercorrente em matéria de executivo fiscal, e ainda esclarece que a

situação deve merecer tratamento diverso nas demais matérias trabalhistas. No

agravo em que é parte a União Federal, publicado no DJ de 30/03/06, há o

seguinte pronunciamento:

EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE

– DECLARAÇÃO DE OFÍCIO PELO JUIZ.

...Também considero aplicável a prescrição intercorrente

na execução fiscal, mesmo após a Emenda Constitucional

45/2.004. A restrição contida na Súmula 114 do TST

somente se aplica às lides que dizem respeito à relação

de emprego117, circunstância diversa daquela discutida no

caso em estudo, como já demonstrado acima. ...Releva

frisar, ainda, que após o decurso de determinado tempo

sem promoção da parte interessada, deve-se estabilizar o 117 Convém notar o posicionamento acerca da restrição da Súmula 114/TST, exclusivamente, às questões de versem sobre relações de emprego, dando lugar, por exclusão, à plena aplicação da prescrição intercorrente nos demais casos de competência da Justiça do Trabalho, inclusive nas lides de relações de trabalho.

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169

conflito, pela via da prescrição, impondo-se segurança

jurídica aos litigantes... ...Considera-se, por isso, que é de

cinco anos118 o tempo máximo de arquivamento do feito,

com possibilidade de retomada da execução. Após o

decurso desse lapso, consuma-se a pretensão de receber

a dívida que está fulminada pela prescrição119.

O progresso se faz sentir, contudo. A 1ª Turma, também do TRT/3, em

julgado recente admitiu a prescrição intercorrente fora dos casos de execução

fiscal. E em decisão unânime, proferida nos autos 00244-1.997-087-03-00-0-

AP, relatado pelo Des. Manuel Cândido Rodrigues, que assim se pronunciou:

PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. PROCESSO

TRABALHISTA. EXECUÇÃO. ADMISSIBILIDADE – Em

face dos verbetes sumulares dos Egrégios STF e TST,

aparentemente paradoxais, a doutrina tem harmonizado

os dois entendimentos, admitindo a prescrição

intercorrente, no processo de execução trabalhista, em

circunstâncias específicas, sempre que há inércia por

parte do exeqüente. DJ de 29 de junho de 2.007.

9.5. Admissão da prescrição intercorrente em outros tribunais

O Superior Tribunal de Justiça, buscando alinhar-se à proa, não tem

enfrentado o tema de outra forma, como se constata no julgado da relatoria do

Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 21/09/06, assim ementado:

118

Trata-se de executivo fiscal. 119

A pesquisa revela ainda que outro juslaboralista muito conhecido, autor consagrado e mestre de várias gerações, Christovão Piragibe Tostes Malta, quando Juiz Togado do TRT/1, com sede no Rio de Janeiro, e antes do advento da Súmula 114, em decisão de 16/01/79, AP 00684-78, publicada no DJRJ, ementa o julgado assim: “O processo trabalhista abriga a figura da prescrição intercorrente”, de forma clara e super objetiva, como é bem de seu gosto. Acórdão capturado em <http://www.trtrio.gov.br/cgi-bin/om>, em 28/8/2007.

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EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE.

O atual § 4º, do art. 40 da Lei 6.830/80, acrescido pela Lei

11.051/04, viabiliza a decretação da prescrição

intercorrente por iniciativa judicial desde que ouvida a

Fazenda Pública para argüir, se for o caso, causas

suspensivas ou interruptivas do prazo prescricional.

Sendo assim, por tratar-se de norma de natureza

processual, tem aplicação imediata, inclusive nos

processos em curso. Note-se que, anteriormente, a

jurisprudência deste Superior Tribunal tinha entendimento

diferente, no sentido de que o Juiz não podia reconhecer

a prescrição de ofício nos processos executivos fiscais

por envolver direito patrimonial (vedada pelo art. 219, §

5º, do CPC).

Outro aresto assaz elucidativo é o da lavra do Min. Francisco Falcão,

também do STJ120, no Agravo Regimental em Recurso Especial, processo

200400746516, onde a 1ª Turma, em decisão publicada no DJ de 01/07/2005,

estabelece.

EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE.

EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. ADMISSÃO.

PARALISAÇÃO POR MAIS DE CINCO ANOS. ART. 40

DA LEF. ART. 174 DO CTN. 1. As matérias passíveis de

serem alegadas em exceção de pré-executividade não

são somente as de ordem pública, mas também todos os

fatos modificativos ou extintivos do direito do exeqüente,

desde que comprovados de plano, sem necessidade de

dilação probatória. 2. É possível argüir-se a prescrição

intercorrente por meio de exceção de pré-executividade,

sempre que demonstrada por prova documental

120 O STJ, por suas turmas e sob a relatoria de diversos Ministros, tem entendido a matéria de modo uniforme. Cf. REsp 735.220/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Zavascki, DJ 16/05/2.005; REsp 819.678/RS, 2ª Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ 08/05/2.006; REsp 418.160/RO, 2ª Turma, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ 04/04/2.005, e assim por diante.

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inequívoca constante dos autos ou apresentada

juntamente com a petição. 3. Se a execução fiscal, ante a

inércia do credor, permanece paralisada por mais de

cinco anos, a partir do despacho que ordena a suspensão

do feito, deve ser decretada a prescrição intercorrente

suscitada pelo devedor. 4. Interrompida a prescrição, com

citação pessoal, e não havendo bens a penhorar, pode o

exeqüente valer-se do art. 40 da LEF, requerendo a

suspensão do processo e, conseqüentemente, do prazo

prescricional por um ano, ao término do qual recomeça a

fluir a contagem até que se complete o lustro. 5. A regra

do art. 40, da LEF, não tem o condão de tornar

imprescritível a dívida fiscal, já que não resiste ao

confronto com o art. 174/CTN.

Também o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, através de sua

Terceira Turma, em julgado de 4 de setembro de 2.007, em feito da relatoria do

Juiz José Antônio Lisboa Neiva, acolhe a prescrição intercorrente de ofício, em

Acórdão assim ementado:

AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO – EXECUÇÃO

FISCAL – PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE –

RECONHECIMENTO DE OFÍCIO – § 4º, DO ARTIGO 40

DA LEF – LEI 11.051/04 – Possibilidade do

reconhecimento da prescrição intercorrente de ofício,

depois de ouvida a Fazenda Pública, deve ser aplicada de

imediato, uma vez que se trata de norma processual. A

disciplina quanto à prescrição em si é de direito material

(prazo, contra quem corre), mas não a forma de conhecê-

la. Para efeito de caracterização de prescrição

intercorrente é assente na jurisprudência do E. Superior

Tribunal de Justiça que basta a paralisação por mais de

cinco anos, independente na natureza da dívida tributária,

por força do art. 174/CTN. Agravo interno conhecido e

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não provido. <http://www.trf2.gov.br> Acesso em 26 de

outubro de 2007.

O caso noticiado trata de execução fiscal movida pelo INSS, paralisada

por falta de iniciativa sua, que, quanto instado a tanto, limitou-se a dizer que a

regra que restou aplicada não servia para causa porque os fatos ocorreram

antes da Lei 11.051/04. A Corte considerou, entretanto, que a estipulação em

norma infraconstitucional quanto ao modo de se conhecer a prescrição

(mediante alegação da parte ou de ofício) não afronta qualquer dispositivo da

Constituição da República. E que a previsão contida no §, do art. 40/LEF, de

ouvir a Fazenda Pública tem por escopo oportunizar a argüição de possíveis

causas interruptivas, como as previstas no parágrafo único, do art. 174/CTN.

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CAPÍTULO 10

PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE TRABALHISTA

NO DIREITO COMPARADO

A prescrição intercorrente mostra-se como assunto tormentoso em

diversos sistemas, além do brasileiro. E isso ocorre, sobretudo porque a

maioria dos sistemas processuais modernos preza o impulso oficial, e este não

se acomoda sem esforço com a prescrição intercorrente. Então, optam

simplesmente por não enfrentar a controvertida matéria, apesar de o tempo ter

um efeito contundente nas relações humanas.

Há países que consagram o instituto em suas legislações, como a Itália,

bem como outros de vedam sua aplicabilidade, mas que a jurisprudência

acolhe, como na Argentina (no tocante apenas ao processo do trabalho).

Noutros há de ser argüida na primeira oportunidade, mas também a

jurisprudência admite em manifestações subseqüentes, como no sistema norte-

americano, situações que conduzem o operador do direito a uma

desconfortável percepção de tais fenômenos jurídicos. E também o sistema

português, aqui exposto, que também deixa de reconhecer em sua legislação o

importante instituto, porque consagra o impulso oficial.

10.1. Argentina

A prescrição intercorrente na Argentina é chamada de caducidad ou

perención de instancia (PIROLO, 2.006, p. 322) e está disciplinada nos artigos

310 a 318, do CPCCN, sendo um instituto densamente legislado se comparado

com as disposições legais que regem a matéria no Brasil.

Conta ainda com interessante norma que exclui da prescrição

intercorrente os feitos paralisados por falta de inércia judicial, aí incluídos os

atos devidos pelos auxiliares do Juiz, e além dos demais atos cuja iniciativa

seja da Corte. Exclui expressamente de tais efeitos os ausentes e os

incapazes; pode ser declarada de ofício (na esfera civil e comercial, mas tal

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174

procedimento tem sido admitido pela jurisprudência também na esfera

trabalhista); a matéria só é recorrível caso haja acolhimento da prescrição

intercorrente, bem como em segunda instância somente poderá retroceder

caso tenha sido declarada de ofício.

Outra curiosidade é que se a prescrição intercorrente for declaração em

primeira ou única instância, a demanda poderá ser repetida, inclusive com o

aproveitamento das provas já produzidas, além de tantas outras. Com efeito,

as peculiaridades do sistema argentino são de tamanha utilidade, que se

afigura muito produtiva a transcrição, inclusive de seus efeitos, a fim de nos

inspirar. Dizem, então, as normas apontadas:

Art. 310. A prescrição intercorrente ocorre quando não se

promover a demanda nos seguintes prazos:

1 – de seis meses, em primeira ou única instância;

2 – de três meses, em segunda ou terceira instância e em

qualquer das instâncias no procedimento sumaríssimo, na

fase executiva e nas execuções especiais e seus

incidentes;

3 – no que se opere a prescrição da ação, se for menor

do que os indicados anteriormente;

4 – de um mês, no incidente de prescrição intercorrente.

O incidente se inicia com a promoção da demanda, ainda

que não haja sido notificada da disposição.

Art. 311. Os prazos fixados no artigo anterior se

computam da data da última petição das partes, ou de ato

do Juiz, do Diretor de Secretaria/Escrivão121 ou seu

assistente, que tenha o objetivo de impulsionar o

processo; correrão nos feriados, salvo o recesso forense.

Para cômputo dos prazos se descontará o tempo em que

o processo estiver parado ou suspenso por convenção

das partes ou por determinação judicial.

121

No processo argentino, o Diretor de Secretaria ou Escrivão tem liberdade de praticar diversos atos processuais, em postura bem ampliada do que acontece entre nós nos art. 773, 777 e 781/CLT, bem como dos artigos 141 e § 4º, do art. 162/CPC.

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Art. 312. O impulso do processo por um dos litisconsortes

beneficiará os demais.

Concebidas as hipóteses e os prazos que são exigidos para a plena

aplicação do instituto, vejamos agora os fatos impeditivos consagrados pelo

sistema argentino.

Art. 313. Não se declarará a prescrição intercorrente:

1 – Nos procedimentos de execução de sentença, salvo

se se tratar de incidentes que não guardar relação estreita

com a execução forçada propriamente dita;

2 – Nos processos sucessórios e, em geral, nos de

jurisdição voluntária, salvo nos incidentes e juízos

incidentais em que eles forem suscitados;

3 – Quando os processos estiverem pendentes de

decisão e a demora for imputada ao tribunal, ou a

continuação do feito depender de uma atividade que o

código impuser ao Diretor de Secretaria/Escrivão;

Art. 314. A prescrição intercorrente se opera também

contra o Estado e seus estabelecimentos, os menores e

qualquer outra pessoa que não tenha a livre

administração de seus bens, sem prejuízo da

responsabilidade de seus administradores e

representantes. Esta disposição não se aplica aos

incapazes ou ausentes que careçam de representação

judicial em juízo.

Art. 315. Sem prejuízo do disposto no artigo seguinte, a

declaração de prescrição intercorrente poderá ser

requerida em primeira instância, pelo demandado; no

recurso, pelo recorrido.

O pedido em segunda instância importa na desistência do

recurso interposto pelo requerente.

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176

Ainda de acordo com a legislação portenha, que pela analítica descrição

dos casos nos quais o instituto pode ser manejado esperamos servir de

consistente suporte para nossa doutrina nacional. Adiante, seguindo com a

proveitosa transcrição, encontramos chancelada no ordenamento do país

vizinho a possibilidade do conhecimento da prescrição intercorrente de ofício.

Art. 316. A prescrição intercorrente será declarada de

ofício, sem outra formalidade a não ser a comprovação do

vencimento do prazo fixados no art. 310, sem qualquer

movimentação do feito.

Art. 317. A declaração de prescrição intercorrente só será

recorrível quando for procedente. Em segunda ou ulterior

instância, a declaração somente será suscetível de

invalidação se tiver sido declarada de ofício.

Art. 318. A prescrição intercorrente declarada em primeira

ou única instância não extingue a ação, podendo esta ser

exercida novamente, nem prejudica as provas já

produzidas. Se declarada nas instâncias posteriores, faz

coisa julgada.

A declaração no processo principal compreende a

reconvenção e seus incidentes, mas a destes não afeta a

causa originária.

Segundo o magistério do Professor Lino Palacio, da Universidad de

Buenos Aires, a prescrição intercorrente constitui um modo de extinção do

processo que tem lugar quando nele não se cumpre ato de impulso algum

durante os prazos estabelecidos pela lei, sendo que, no seu dizer, apesar da

Argentina contemplar também o impulso oficial, o instituto se justifica porque

não é admissível que a parte imponha a seu ex adverso a perda de tempo e de

dinheiro que consiste um processo indefinidamente aberto, pois interessa ao

Estado que, depois de um período de inatividade prolongada, sejam liberados

seus próprios órgãos da necessidade de prover as demandas, assim como

todos os devedores derivados da existência do processo (PALACIO, 2.004, p.

555).

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177

Diante disso, temos que pelo sistema argentino o fundamento da

prescrição intercorrente se estrutura a partir de um ponto de vista subjetivo, ou

seja a presunção de que o abandono do processo deriva da simples inatividade

processual prolongada, bem como da conseqüente conveniência de que, em

tais circunstâncias, o órgão judicial se desobrigue dos deveres que a

subsistência da demanda lhe impõe. E do ponto de vista objetivo, o

fundamento consiste na necessidade de se evitar a duração indeterminada dos

processos judiciais.

Ainda segundo a doutrina de Palacio, constituem pressupostos da

prescrição intercorrente: a existência de uma instância principal ou incidente; a

inatividade processual; o transcurso de um prazo122 e um provimento judicial

que a declare operada.

Pelo primeiro requisito deve-se entender por processo o conjunto de

atos processuais que se sucedem desde a interposição de uma demanda, o

requerimento que instaura o incidente processual ou a admissão de um

recurso; pelo segundo o pressuposto da prescrição intercorrente significa a

paralisação do tramitação processual útil, ou seja, o não cumprimento de ato

hábil pelas partes, pelo Juiz ou tribunal; restando claro que a tal prescrição não

é declarada quando pendente ato da Corte ou seus integrantes, aí incluídos os

auxiliares judiciais; que os prazos legais hajam se implementados, enquanto o

derradeiro motivo é benefício criado pela atividade de um dos litisconsortes

(PALACIO, 2.004, p. 558).

No sistema argentino é interessante notar que distintos são os efeitos da

prescrição intercorrente conforme se opere em primeira ou segunda instância.

No primeiro caso, como visto em decorrência da legislação, a demanda poderá

ser repetida, inclusive com o aproveitamento das provas, com a manutenção

do direito material íntegro (idem em relação à pretensão), enquanto nas demais

122

Ainda conforme Palacio, na obra citada, o art. 3º, da derrogada Lei 14.191, dispunha que: “a prescrição intercorrente se opera de pleno direito e verificado o vencimento do prazo, deve ser declarado de ofício, ordenando-se o arquivamento do processo. As partes ou os terceiros interessados poderão pedir sua declaração se o tribunal não o fizer”. Aí, assegura o professor portenho que a interpretação dessa norma dividiu a doutrina e a jurisprudência, ainda que esta última tenha se orientado em determinado momento por um critério uniforme. Parte da doutrina, fundando-se em certas expressões vertidas no debate parlamentar que precedeu a sanção da lei, entendeu que o termo 'de pleno direito', utilizado na norma, significavam que a prescrição se operava ipso iure como conseqüência do simples transcurso dos prazos legais e que, portanto, carecia de relevância qualquer ato das partes ou atuação do tribunal posteriores ao vencimento daqueles. E outros autores sustentavam que, não obstante a expressão utilizada pela lei, a prescrição intercorrente era suscetível de ser declarada quando não havendo sido declarada pelo Juiz ou tribunal no momento oportuno, tinha lugar um ato de impulso oficial que era consentido expressa ou tacitamente pela parte interessada na declaração de prescrição intercorrente. Destaca ainda que os tribunais na capital federal e a Corte Suprema aderiram à unanimidade a este critério.

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instâncias, uma vez acolhida, a postulação jamais voltará a produzir efeitos

úteis.

Outra curiosidade deste sistema latino-americano é que as custas serão

suportadas pelo autor, ou seja, por quem deu causa a declaração de prescrição

intercorrente, sendo distintas as custas da demanda principal e do incidente de

declarou a extinção da demanda por este fundamento, assim como de outros

incidentes.

Quanto a recorribilidade, a norma argentina preceitua que, em primeira

instância, somente será recorrível a decisão quando o incidente que houver

declarado a prescrição intercorrente for procedente, enquanto em segunda

instância, o julgado de tal ordem somente poderá ser revisto se a declaração

for de ofício, o que significa que em segundo grau a decisão será irrecorrível se

a declaração decorrer de requerimento da parte.

Estas são, contudo, regras de processo. E, em âmbito trabalhista,

contam com certa resistência para uma aplicação mais efetiva, pela mesma

razão que o TST luta em negar pleno vigor ao instituto da prescrição

intercorrente. O principal argumento é a possibilidade do impulso oficial, apesar

da aplicação do princípio do dispositivo aplicável em qualquer procedimento em

contraditório e de que o impulso oficial é mera faculdade. Vale dizer, lá também

não há obrigatoriedade do magistrado impulsionar demanda abandonada pela

parte, e que os efeitos deste decorrem objetivamente do que foi alegado pela

parte, ou seja, o julgador não poderá seguir por caminhos não aventados pela

parte, consoante o disposto no inciso VI, do art. 163/CPCCN, que afirma que a

sentença deverá conter a decisão expressa, positiva e precisa, de acordo com

as pretensões deduzidas em juízo, qualificadas segundo a lei, declarando o

direito dos litigantes e condenando ou absolvendo dos pedidos e da

reconvenção, no todo ou em parte.

Isso é assim porque em decorrência do princípio do dispositivo, a

colocação dos fatos em que se fundam as pretensões é dever das partes, em

atividade privativa, sendo vedado ao Juiz a possibilidade de verificar fatos não

afirmados pelos litigantes. Já quanto às normas jurídicas, não ocorre o mesmo,

por ser dever do magistrado obedecer ao ordenamento jurídico vigente,

prescindindo de invocação das partes, por também seguirem os argentinos o

brocardo latino iura novit cura.

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179

Este o regramento processual argentino. No espectro trabalhista,

entretanto, algumas particularidades são consideradas.

A Ley de Contrato de Trabajo, ou seja, a Lei 20.744, criada pelo Decreto

390, de 21 de maio de 1.976 (disposição legal equivalente à nossa CLT),

conhecida na Argentina como “LCT”, trata da prescrição em seus artigos 256 e

seguintes. É estabelecido um prazo comum de dois anos para todas as

pretensões relativas a créditos provenientes de relações individuais de trabalho

e esse prazo pode ser alterado por acordo individual ou coletivo. Isso significa

que transcorridos dois anos contados do momento em que a obrigação se

torna exigível, o empregador pode opor a prescrição do crédito, como meio de

se desobrigar. É o que se chama de prescripción liberatoria.

A norma laboral faz ainda uma referência à disposições do Código Civil,

em seu art. 257/LCT, sobre a aplicação do referido instituto. Assim, quem não a

opõe fica entendido que renunciou à mesma, já que os Juízes não podem

declarar a prescrição de ofício, por força do art. 3.964/CC.

O artigo 3.962/CC, por sua vez, preceitua que a prescrição deve ser

oposta na contestação, ou na primeira manifestação em juízo. E ainda segundo

a norma civil, a prescrição somente se interrompe uma vez, artigo 3.986/CC,

com suspensão de apenas um ano, mediante a interpelação do devedor.

Voltando a questão mais específica da prescrição intercorrente, temos

que o impulso oficial, tramitación de oficio ou impulso procesal de oficio123 cabe

não só ao juiz, mas também ao Ministério Público, sendo obrigatório após a

123

Além do regramento nacional, as províncias, que equivalem aos estados federados no Brasil, têm autonomia para legislar sobre Direito Processual do Trabalho, e o impulso oficial está presente na quase totalidade deles, mas há exceções e sistemas próprios, alguns bem interessantes. Há de tudo, regra específica para o processo do trabalho, aplicação supletiva do CPC, expressa admissão e também vedação. Vejamos os casos mais significativos. Na Capital Federal , a matéria está disposta na Lei 18.345, onde não está prevista a prescrição intercorrente no processo de conhecimento. Na Lei 4.799, de Catamarca , o impulso oficial está adstrito à fase de conhecimento, pois seu artigo 39 preceitua que será declarada a prescrição intercorrente quando não se impulsionar o feito dentro de dois anos a contar da última diligência realizada, salvo se o processo estiver paralisado por convenção das partes ou decisão do juiz de sobrestamento. A Lei 3.540, de Corrientes , diz que passado um ano sem que se ative a tramitação do processo por razões alheias ao juízo, deverão as partes serem intimadas para que em oito dias manifestem se têm interesse na continuação do processo, findo o qual se aplica o CPCCN. A Lei 639, de Formosa , trata também do impulso oficial, não só das partes, mas também do ministério público, entretanto quando for impossível o impulso oficial e estiver demonstrada inequivocamente a vontade das partes de abandonar o processo, pode ser adotado o CPCCN, naturalmente com a conseqüência aqui tratada. A Lei 986, de La Pampa , veda, expressamente, em seu artigo 4º, a declaração de prescrição intercorrente em feitos trabalhistas. Idem em relação à Lei 2.144, de Mendoza , art. 108. Hipótese totalmente diversa se verifica na província de Neuquén , conforme Lei 921, onde não há previsão legal sobre caducidad e, então seu art. 54 remete ao CPCCN. A Lei 1.504, de Rio Negro , faculta a aplicação da prescrição intercorrente, sempre que as partes, depois de intimadas, não impulsionarem o feito em cinco dias, art. 13. A Lei 5.298, de Salta , apenas preceitua o impulso oficial, incumbindo-lhe não só aos juízes, mas também aos secretários (cargo equivalente ao de Diretor de Secretaria entre nós), cabendo a estes últimos, inclusive, a possibilidade de despachar nos autos nesse sentido. A Lei de San Juan nº. 5.732, admite, expressamente a aplicação da prescrição intercorrente, também na forma prevista no CPCCN, art. 14. Em Santa Fé , o Código Procesal Laboral afirma, art. 37, que, após um ano de paralisação, devem as partes serem intimadas para impulsionar o feito em três dias, sob pena de declaração prescricional. Tierra del Fuego , Antártida e Islas del Atlântico Sur , também vedam a caducidad nos processos trabalhistas.

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prolação da sentença, nos feitos trabalhistas, ao contrário do que acontece no

âmbito do processo comum, civil e comercial. Os atos executivos são

proferidos pelo juiz, cabendo às partes mera atividade coadjuvante e,

naturalmente, de fiscalização dos atos judiciais, tudo com o objetivo de tornar o

crédito alimentar célere e efetivo, além de impedir que os direitos concedidos

aos trabalhadores pela lei de fundo não se tornem ilusórios, na expressão

poética do juslaboralista, também Professor da UBA Miguel Ángel Pirolo,

(PIROLO, 2.006, p. 41). Entretanto, lamentavelmente, a preocupação do

legislador argentino com a efetividade conta com curta sobrevivência, pois o

impulso oficial cessa com a citação para pagamento, conforme disposto no art.

132, etapa em que o desenvolvimento e a continuidade do processo ficam a

cargo exclusivo da parte interessada.

Seja como for, há julgados claros e positivos, a demonstrar o

posicionamento da Suprema Corte da Capital sobre a prescrição intercorrente

no processo do trabalho, um dizendo que sua declaração jamais pode ser

procedida sem prévia intimação para andamento e outra, no mesmo sentido,

mas com destino diferente porque a parte deixou de cumprir exatamente esta

determinação, o que atraiu a aplicação do já referido art. 310/CPCCN. Dois

outros arestos, da Corte Suprema de Justiça são trazidos, sendo que no

primeiro deles foi considerada válida a aplicação processual civil, junto àquela

Corte, que não se circunscreve à matéria trabalhista, ainda que num feito

decorrente da Justiça do Trabalho, e outra mitigando a aplicação processual

comum, justamente porque o feito era trabalhista. Vejamos os julgados,

dispostos, respectivamente:

Deve-se revogar a decisão que decretou de ofício a

prescrição intercorrente num processo trabalhista, se o

tribunal com antecedência a declaração não intimou às

partes para que produzam atividade útil para o

prosseguimento da tramitação, por ser este requisito

inafastável. Jara, Miguel AC. Transportes Servemar SA –

Suprema Corte de Justicia de la Provincia de Buenos

Aires – 13/3/2.002.

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181

A Suprema Corte de Justiça da Província de Buenos

Aires, nos autos Pavarini, Felipe H. contra Insycom SA,

sustenta que o impulso oficial de um processo trabalhista

é incompatível com a prescrição intercorrente, salvo se a

parte interessada deixar de cumprir a intimação para dar

andamento ao feito, pois isso denota abandono do

processo, abrindo espaço para a aplicação da norma

processual comum, que reconhece o instituto.

As normas do Código de Processo atinentes à prescrição

intercorrente são aplicáveis aos recursos de fatos

deduzidos perante a Corte Suprema, ainda quando se

originem de um pleito laboral. López de Berón, María del

Carmen contra Tursi, Domingo. Julgado em 2/2/1.993.

A natureza trabalhista do procedimento regulamentado

pela Lei 18.345 (Adla, XXIX-C, 2.653) não obsta que se

opere a prescrição intercorrente nas demandas em que

seja denegado o recurso extraordinário em tramitação na

Corte, pois nesta o procedimento não varia por razões

das particularidades do foro trabalhista. Frías, José contra

Estex SA. Julgado em 7/7/1.992.

Capturados em <http://csjn.gov.ar>. Corte Suprema de La

Nación Argentina. Acesso em 5 de maio de 2.007.

10.2. Estados Unidos

Antes de tudo, convém explicitar que embora o direito norte-americano

pertença à família da common law, o direito positivo exerce papel

acentuadamente marcante, sobretudo no direito processual, o que o coloca em

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posição bem distinta em relação ao direito inglês no qual busca inspirações em

gênese124.

A normatividade americana está estabelecida nas chamadas Federal

Rules of Civil Procedures, aplicáveis também às demandas nas quais seja

deduzida pretensão pertinente ao direito material do trabalho, ou seja, nos

casos de “labor law”, (KANE, 1.996, p. 15/31). Compõe-se de três partes, numa

das quais estão os cases, ou seja, precedentes jurisprudenciais emblemáticos

e que estruturam as decisões judiciais; os statutes, que importam em leis stricto

sensu, vale dizer: atos legislativos derivados exclusivamente do poder estatal

que lhes é inerente, ou casas legislativas125, e ainda as rules, que são

regramentos integrativos do sistema da common law, equiparadas às leis (as

rules significam normas para a família romano-germânica).

Nesse sistema a prescrição intercorrente é chamada de “statute of

limitation” (intercurrent), e precisa ser alegada pela parte a que aproveita na

primeira oportunidade que tem para falar nos autos após o implemento do

prazo prescricional, sob pena de preclusão, além de expor a parte que retardou

a prestação jurisdicional à custas adicionais e indenização pelo “stress”

emocional da perpetuação da demanda, embora a jurisprudência esteja

admitindo que a matéria venha como aditamento aos requerimentos já

formulados, a despeito da força preclusiva no sistema da common law.

O prazo prescricional decorre da natureza do pedido formulado, variando

num lapso de um a seis anos, enquanto as causas de sua interrupção alteram-

se conforme as rules, atuando de forma distinta nos estados, situação que atrai

a aplicação freqüente dos cases.

Muitas demandas típicas não contam com a prescrição definida na

legislação federal, o que remete os julgadores às legislações estaduais, bem

como aos precedentes, servindo esses dois últimos até mesmo como suporte

para decisões de casos processados perante as Cortes federais (SHREVE,

1.996, p. 226).

124

O peso da jurisprudência, com o tempo, foi perdendo seu alcance prático. Na verdade, os Juízes norte-americanos e, principalmente os dos tribunais superiores e os dos estados federados, nunca se sentem vinculados pelos precedentes. Podem, desse modo, limitar o alcance das decisões anteriores, chegando a reformá-las, através de uma dessenting opinion (SÈROUSSI, 1.999, p. 94). 125

Pode parecer redundante se falar em leis derivadas do Poder Legislativo, entretanto, no sistema norte-americano, ao lado dos statutes co-existem as rules, o que para nós também seriam leis, mas importam em normas juridicamente equiparadas, consistentes em: regras, princípios, regulamentos e até decisões judiciais, ou seja, métodos de integração do direito segundo o critério da common law.

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183

10.3. França

No interessante sistema processual francês, a jurisdição se divide em

judicial e administrativa, ambas reguladas pelo Nouveau Code de Procédure

Civile, diploma que também regula os conflitos em matéria trabalhista,

conforme o seu art. 879, sendo que a procedimentalidade destes está disposta

numa parte especial (Livro 5), porquanto tais pretensões são processadas

perante os Conseils de Prud’hommes, castiço conhecido dos juslaboralistas,

eis que utilizado como método de composição de conflitos trabalhistas desde

sua origem.

O procedimento nos tribunais que julgam matéria trabalhista, entretanto,

não dispensa a aplicação supletiva do CPC francês, a exemplo do que ocorre

entre nós, conforme disposição expressa126.

Sobre a prescrição intercorrente há regramento tanto na parte reservada

aos dissídios dos trabalhadores, quanto na parte que se destina aos cidadãos

em suas relações civis, respectivamente no artigo R. 516-3 e no artigo

386/CPC, devendo haver sua declaração quando as partes não derem

cumprimento, dentro de dois anos, aos atos processuais que o tribunal tenha

determinado.

Sendo assim, o simples decurso do tempo não enseja a declaração de

prescrição intercorrente. Há necessidade supletiva de haver o descumprimento

de uma ordem judicial, o que evidencia que, para o direito francês, remanesce

o caráter de penalidade no instituto.

A declaração deverá ser requerida pela parte a quem aproveita,

porquanto vedado seu reconhecimento de ofício, inclusive nos feitos em que

não se discute direito de natureza existencial. E seu prazo correrá até mesmo

contra os incapazes, embora remanesça, para estes, o direito de buscar

recomposição do prejuízo juntos aos seus tutores.

O prazo prescricional continua a correr nos casos de suspensão do

processo, salvo se esta se deu por tempo determinado, ou que esteja sendo

aguardado acontecimento certo, quando voltará a correr novo prazo

126 Oportuno trazer à colação, já que estamos tratando de direito estrangeiro, como referência ou inspiração, que no sistema francês, todas as demandas derivadas do mesmo contrato de trabalho, independente de terem sido ajuizadas pelo trabalhador ou pelo empregador, são admissíveis na mesma demanda, inclusive na fase recursal, naturalmente que garantido o contraditório, como meio de abreviar a prestação jurisdicional.

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prescricional a partir do transcurso do aludido interregno ou da realização do

acontecimento esperado (NORMAND et alli, 1.997, p. 212).

10.4. Itália

A Itália não dispõe de um Código de Processo do Trabalho, estando a

matéria pertinente à jurisdição trabalhista inserida no Códice di Procedura

Civile, aprovado pelo Decreto Real nº. 1.443, de 28 de outubro de 1.940, e que

entrou em vigor dois anos depois, precisamente nos artigos 409 e seguintes,

bem como em leis extravagantes, a exemplo da Lei 533, de 11 de agosto de

1.973, que trata do processo trabalhista e previdenciário (FINOCCHIARO,

1.997, p. 130).

Na fase de conhecimento a disposição existente diz respeito apenas à

extinção do processo por inatividade das partes, situação análoga ao abandono

previsto entre nós nos inciso II e III, do art. 267/CPC, sendo que inicialmente o

processo fica suspenso por um ano e, somente após é que se extingue.

O instituto que nos interessa, contudo, está no art. 630, do Código de

Processo italiano (parte afeita exclusivamente à execução), para o qual o

processo se extingue quando as partes não o impulsionam no prazo

estabelecido pelo Juiz. Curioso notar que se a determinação não houver sido

dada em audiência, é o escrivão que, agindo por delegação, intima às partes

para o necessário impulso processual.

A decisão que extingue o processo ou rejeita tal pleito é recorrível.

A doutrina afirma ser caso de extinção do processo, quando em uma

demanda já julgada se atinge o lapso temporal prescrito no art. 2.953, do

Código Civil italiano, sem que o credor tome a iniciativa de promover os atos de

acertamento próprios da execução forçada de sentença.

O prazo previsto na norma supra é de 10 anos, contados do trânsito em

julgado da decisão exeqüenda, após o que o processo se extingue, sendo que

o lapso em questão é considerado excessivo para a doutrina italiana

(REDENTI, 1.995, p. 91),

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A despeito de haver expressa previsão legal, adverte o mencionado

processualista que a prescrição intercorrente deve ser aplicada de modo

restritíssimo e não simplesmente ao gosto do Juiz por não vislumbrar interesse

da parte. Tampouco pode estender o instituto às outras hipóteses de extinção

do processo, que não a tratada no art. 630 do código de processo.

A prescrição intercorrente no sistema italiano opera-se de direito, mas

deve ser alegada pela parte interessada, ou seja, jamais poderá ser declarada

de ofício e, ainda assim, somente poderá ser pronunciada dez anos após a ter

sido a parte intimada para movimentar o feito.

10.5. Portugal

A legislação portuguesa em matéria de processo do trabalho está

sistematizada, inclusive com plena autonomia, porquanto a nação conta com

um Código de Processo do Trabalho, instituído pelo Decreto-Lei 480, de nove

de novembro de 1.999. Sua exposição de motivos pontua que o objetivo da

norma é acabar com a desarmoniza com a legislação processual civil, na qual

nem sempre é fácil estabelecer distinção entre a subsidiariedade de sua

aplicação ou a especialidade do Direito Processual do Trabalho, reconhecendo

que houve um percurso social e legislativo, com as incidências do mundo

juslaboral. E isso arcaizou, tornou inidôneas ou menos apropriadas as

previsões normativas, reclamando-se, por isso mesmo, a introdução de

preceitos de compatibilização com as novas realidades.

O diploma apontado, contudo, não tem regra expressa sobre a

prescrição intercorrente e sequer sobre a prescrição da pretensão, assim como

o próprio Código de Processo Civil de Portugal, que também não regulamenta

a questão, pois o sistema processual português prestigia o impulso oficial e

dispõe sobre a prescrição apenas no âmbito do direito material positivado.

Com efeito, no plano material a prescrição está disposta no art. 38, do

Decreto-Lei 49.408, de vinte e quatro de novembro de 1.969, o qual prescreve

que os créditos resultantes do contrato de trabalho e da sua violação ou

cessação, pertencentes à entidade patronal ou pertencente ao trabalhador,

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186

extinguem-se por prescrição, decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele

em que cessou o contrato de trabalho, sem prejuízo do disposto na lei geral

acerca dos créditos pelos serviços prestados no exercício de profissões liberais

(ROCHA, 1.999, p. 38).

Quanto ao aludido impulso oficial, a matéria encontra-se disposta no

item “1”, do art. 265, do CPC português, para o qual iniciada a instância,

cumpre ao Juiz, sem prejuízo do ônus de impulso especialmente imposto pela

lei às partes, providenciar o andamento regular e célere do processo,

promovendo oficialmente as diligências necessárias ao normal prosseguimento

da ação e recusando o que for impertinente ou meramente dilatório

(MESQUITA, 2.003, p. 195).

O permissivo para atiçar o processo comum está no item “2”, do art. 1º,

do Código de Processo do Trabalho, que faculta, nos casos omissos, recorrer-

se, sucessivamente, à legislação processual comum e aos princípios gerais de

Direito Processual do Trabalho.

10.6. Venezuela

A Ley Orgánica Procesal del Trabajo venezuelana, estabelece uma

jurisdição laboral autônoma e especializada, com forte preocupação em

assegurar a igualdade entre as partes, bem como dando extraordinário valor

aos princípios processuais, listando-os no campo do direito positivo. E sendo

de agosto de 2.002, quiçá seja hoje o mais recente diploma processual do

trabalho que firma a Justiça do Trabalho como jurisdição especializada127.

A autonomia do magistrado é exaltada, sendo-lhe assegurada, para o

desempenho da função, a busca da verdade através de todos os meios a seu

alcance, de modo a não prejudicar a irrenunciabilidade dos direitos

estabelecidos nas leis sociais, e chegando até o princípio da ultra-petição,

desde a matéria tenha sido discutida nos autos e esteja devidamente provada.

127

Convém por em destaque o valor assegurado aos princípios pelo direito positivo, preceituando o artigo 2º, que: “El juez orientará su actuación en los principios de uniformidad, brevedad, oralidad, publicidad, gratuidad, celeridad, inmediatez, concentración, prioridad de la realidad de los hechos y equidad”, num total de dez princípios cuja observância preconiza o legislador.

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187

O impulso oficial, naturalmente, nesse contexto, como era de se esperar,

encontra-se também presente, tanto na fase de conhecimento, art. 6º, quanto

na fase de execução, art. 181.

A despeito de tudo isso, a prescrição intercorrente também se encontra

plenamente disposta, tanto no Código de Processo Civil, quanto na Lei

Orgânica Processual do Trabalho, e o processo por ela se encerra, em ambos,

após um ano sem a execução de diligência das partes, conforme,

respectivamente, artigos 267 e 201, e pode ser declarada de ofício. Entretanto,

o referido ato processual extingue apenas a demanda. Vale dizer: poderá a

parte intentar nova proposição, valendo a anterior como causa impeditiva da

prescrição total. Sua repetição, contudo, somente poderá ser levada a efeito

após o interregno de noventa dias.

A jurisprudência trabalhista não tem a menor dúvida em chancelar a

extinção do processo em decorrência da prescrição intercorrente, após apenas

um ano de paralisação do feito, como em inúmeros casos verificados128.

128

Fazemos alusão aos feitos 4.199/01 e 4.281/03, da Corte do Estado de Nueva Esparta, acessíveis em <http://nueva-esparta.tst.gov.ve/decisiones/2.003/enero/284-20-4283-01-S-N.html>, com acesso em 21 de maio de 2.007, onde consta que: ... transcorrido mais de um ano desde a última atuação, que ocorreu em ..., sem que as partes tenham executado algum ato de procedimento, o que constitui um dos pressupostos para que proceda à prescrição intercorrente, o Juizado de Nueva Esparta, administrando a Justiça em nome da República e por autoridade da lei, declara... (tradução nossa).

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188

CAPÍTULO 11

PRAZOS PARA RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO INTERCORRE NTE

Antes de tudo convém esclarecer quando a prescrição pode ser argüida,

e ainda, se precisa ser argüida.

Para efeito de explicitação de entendimento, é importante deixar claro

desde logo que o termo inicial dos prazos de prescrição remonta à violação do

direito, ou seja, o momento de surgimento da pretensão129. E considerando-se

que a prescrição somente pode ser interrompida uma vez, na forma do art.

202/NCC, o manejo de atos volitivos tendentes à sua efetivação precisa ser

bem ponderado, sob pena de eventual interrupção irrefletida conduzir ao

fracasso da pretensão. Assim, um protesto ou uma demanda arquivada podem

ser fatais, porquanto mesmo em demanda extinta sem resolução de mérito os

efeitos da interrupção da prescrição se expandem.

Vale ressaltar que o preceito em análise é de aplicação integral no

direito do trabalho, estendendo seus efeitos para o processo do trabalho, sendo

certo que a regra ali contida (possibilidade única de interrupção da prescrição)

seja, talvez, a que mais espaço abriu para a plena efetivação da prescrição

intercorrente130.

A prescrição intercorrente, contudo, é um instituto cuja atuação do tempo

lhe é essencial. No dizer de José Manoel Arruda Alvim, rigorosamente, por

cada ato do processo, interrompe-se a prescrição, novamente, sempre com a

inutilização do período já decorrido. E só a partir da inércia, quando ao autor

couber a prática de ato, e este não vier a ser praticado, durante o prazo

superior ao da prescrição é que ocorrerá a prescrição intercorrente (ALVIM,

2.006, p. 26).

A grande indagação é saber como e quando, havendo a interrupção,

esta recomeça a correr, sendo que de acordo com o entendimento esposado

129 “A pretensão surgida com a violação do direito subjetivo não fica ad aeternum à espera que o titular a exerça e faça valer o seu conteúdo. Se de um lado é importante que seja assegurado tal exercício a fim de evitar prejuízos ao indivíduo investido nos atributos da pretensão, de outro não se afigura produtivo admitir que essa prerrogativa persista intacta indefinidamente no tempo, sob pena de levar insegurança ao obrigado e desnecessária tutela a quem revela desinteresse através da inércia em que se mantém” (MATIELLO, 2.003, p. 153). 130

Trata-se, contudo, de prescrição intercorrente com feições bastante diferentes daquela tradicionalmente consagrada, pois não consiste em sanção pela inércia da parte, mas sim decorrência do uso indevido da faculdade de interromper o prazo de prescrição. À liberdade de se interromper o curso do prazo prescricional veio se somar a responsabilidade pelo mau uso dessa faculdade (RABELLO, 2.005, p. 116).

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189

por Ilse Lora, “conta-se o prazo do último ato processual praticado no feito, com

intimação das partes” (LORA, 2.001, p. 163).

O artigo 219/CPC, pelo qual a citação válida torna prevento o juízo,

induz litispendência e faz litigiosa a coisa... indica também a resposta,

porquanto através dessa iniciativa, a parte efetivamente busca a satisfação do

direito que entende ter, exercendo sua pretensão. A partir daí pratica inúmeros

atos processuais que dinamizam o exercício do direito de ação e que impedem

que a ação do tempo frustre suas expectativas.

Sendo assim, enquanto há essa prática, todo e qualquer efeito

decorrente do tempo está afastado, somente voltando a incidir na forma do

parágrafo único do artigo 202/NCC, pelo qual a prescrição interrompida

recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou do último ato do

processo para a interromper. Vale dizer: depois de proposta a demanda, cabe

ao autor continuar indefinidamente a praticar os atos processuais até a integral

satisfação de sua pretensão, pois deixando o feito paralisado, o inexorável

efeito do tempo irá afastá-lo de seus objetivos e abrir o prazo para a contagem

do prazo da prescrição intercorrente.

Bem, exercendo-se a pretensão em juízo, interrompe-se a fluência do

prazo de material, bastando a mera distribuição do feito no processo do

trabalho, ou a determinação de citação no processo comum, inteligência do

inciso I, do art. 202/NCC e § 4º, do art. 219/CPC. A partir do momento em que

se interrompeu o prazo prescricional, outro (integral) começa a fluir, que é

exatamente o prazo da prescrição intercorrente.

Não sendo a matéria tratada na Teoria Geral do Direito, como deveria,

quer parecer que a regra contida no Direito Civil, e, portanto, destinada à toda a

sociedade, busca esclarecer a questão, ao estabelecer no artigo 193/NCC, que

a prescrição pode ser alegada em qualquer grau de jurisdição, pela parte a

quem aproveita.

A norma apontada é claríssima, mas acomoda-se apenas parcialmente

no Direito Processual do Trabalho. Vejamos.

Considerando-se que a CLT não aborda, especificamente, o momento

próprio para a argüição, por força do art. 8º/CLT, a regra civil pode ser

invocada para acobertar a matéria. Todavia, o TST tem Súmula

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regulamentando a questão, conforme verbete 153, pelo qual “não se conhece

de prescrição não argüida na instância ordinária”.

Oportuno mencionar que instância ordinária significa o juízo por onde

deve a causa principiar sua apreciação judicial. Por óbvio, preferencialmente

perante o Juiz de primeiro grau, entretanto, será também instância ordinária o

Tribunal Regional e até mesmo o próprio Tribunal Superior em causas de sua

competência originária (este exclusivamente nesta hipótese, pois fora desta

constitui a Corte Superior instância extraordinária).

A questão resolve-se através da interpretação do aludido artigo 8º/CLT,

pelo qual: as autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de

disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela

jurisprudência, por analogia, por eqüidade e por outros princípios e normas

gerais de direito, principalmente de direito do trabalho, e, ainda, de acordo com

os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum

interesse de classe ou particular prevaleça sobre o direito público.

É bem verdade que o seu parágrafo único autoriza a aplicação do direito

comum como fonte subsidiária, entretanto apenas naquilo em que não for

incompatível com os princípios fundamentais de Direito do Trabalho.

Tudo isso considerado, há de se concluir que a fonte supletiva somente

pode ser atiçada na falta de meio para auto composição. E levando-se em

conta que a jurisprudência é fonte de direito, que a matéria é sumulada pelo

TST, esta a posição científica que deve prevalecer, exceto se o magistrado,

com sua liberdade na apreciação da prova e do direito, inteligência do disposto

no art. 131/CPC, fundamentadamente, indicar que não irá aplicar o verbete em

questão, esclarecimento o motivo pelo qual entende imprópria sua atuação.

Não o fazendo, temos, assim, que em matéria trabalhista, em princípio, a

prescrição somente poderia ser argüida perante a instância originária131.

Atualmente temos de considerar, contudo, novo aspecto. Pela regra

constante do § 5º, do art. 219/CPC, com a redação que lhe foi dada pela Lei

11.280/06, o Juiz poderá conhecer a prescrição ex officio. E, sendo assim,

131 O Ministro Ives Gandra Martins Filho, do TST, se posiciona em idêntico eixo, aduzindo que a prescrição pode, em princípio, ser alegada originariamente em qualquer instância e grau de jurisdição (NCC, art. 193). No entanto, esse princípio se aplica exclusivamente às instâncias originárias (VT e TRT), uma vez que, nas instâncias extraordinárias, (TST e STF), toda matéria veiculada deve estar pré-questionada, conforme Súmula 153/TST (MARTINS FILHO, 2.004, p. 170).

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obviamente que os magistrados das instâncias extraordinárias também

poderão conhecer a prescrição, independente de provocação das partes.

Tal situação traz, então, uma exceção à regra disposta no verbete

apontado. Quando a prescrição for alegada pela parte a que aproveita, deverá

estar jungida à instância originária, e quando o instituto ensejar o conhecimento

de ofício poderá extrapolar tal limite, indo até a instância extraordinária. A

Súmula 153/TST não teria, assim, aplicação no particular, na medida não há de

se falar em pré-questionamento de matéria que pode ser conhecida de ofício.

No tocante à prescrição intercorrente, a questão comporta distinta

consideração. Isso porque, enquanto a prescrição de direito material somente

pode ser oponível entre nós na instância originária, a prescrição intercorrente

não sofre tal restrição, até porque, incompatível com o próprio instituto.

A prescrição intercorrente, como fenômeno processual que é, poderá

ocorrer inclusive nas instâncias extraordinárias, em quaisquer de suas

modalidades, isto é, alegada pela parte ou conhecida de ofício pelo Juiz.

Outra idéia que corrobora este entendimento é a previsão contida no §

1º, do artigo 884/CLT, porquanto a prescrição é matéria oponível em sede de

embargos à execução, e estes são processados e julgados pelo Juiz da

execução, embora esta última regra esteja a se referir à prescrição da

pretensão executiva.

Não há de se exigir ainda um meio especial para a comprovação da

prescrição intercorrente. Basta o simples transcorrer do tempo. Assim, uma vez

ultrapassado o biênio prescricional, estará o magistrado apto a reconhecer e

declarar a prescrição intercorrente seja de ofício, após a oitiva da parte contra a

qual sua pretensão está prestes a se escoar, seja mediante provocação do

interessado, mas com idêntico respeito ao contraditório.

Mais uma indagação pertinente é se a prescrição deve ser argüida pela

parte ou declarada de ofício pelo Juiz? Quer nos parecer, pela pesquisa

implementada, que o posicionamento majoritário inclinava-se pelo

entendimento que compete à parte argüir. Todavia, o entendimento em

contrário encontra mais adeptos continuamente, por dupla razão de ordem

constitucional, aliás, assaz importantes.

Sob a angulação inicial, o argumento seria de que a Constituição

Federal incluiu a prescrição no rol de direitos consagrados em seu art. 7º,

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inciso XXIX, passando, assim, a ser matéria cogente, de ordem pública, e que,

portanto, deve ser conhecida de ofício.

O esteio subseqüente é no sentido de considerar o tempo razoável de

tramitação do processo como direito fundamental, conforme inciso LXXXVIII,

do art. 5º/CF, onde a não aplicação de ofício da prescrição importa em atuação

inexata da Carta Maior.

O desate não é tão singelo assim, porquanto depende da prescrição que

estiver sendo examinada, pois conforme já foi visto aquela preceituada no § 5º,

do art. 219/CPC, está fora da discricionariedade do Juiz, exceto, é claro, na

remotíssima declaração de inconstitucionalidade da norma, enquanto na

prevista no § 4º, do art. 40/LEF, por exemplo, o magistrado somente deverá

declará-la se quiser132.

Na contagem dos prazos prescricionais, não há incidência da norma

prevista no artigo 184/CPC, onde se exclui o dies a quo e inclui-se o dies ad

quem. Assim, o último dia há de ser completo, ao passo que o primeiro dia em

que poderia ser exercida a pretensão conta-se somente a partir do dia

seguinte.

Ao ensejo, convém esclarecer que o Direito Processual do Trabalho tem

regra expressa sobre a contagem de prazos, conforme os artigos 774 e

775/CLT, onde está previsto, essencialmente, que os prazos contam-se a partir

da data em que for feita pessoalmente ou daquela que em que for publicado o

expediente da Justiça do Trabalho133. Sem falar que todas as intimações já são

geradas on line, isto é, quando o serventuário da justiça dá o andamento

132 Amauri Mascaro Nascimento, respeitadíssimo jusprocessualista, cujo Curso de Direito Processual do Trabalho já se encontra na 27ª edição, assim se posiciona: a prescrição, no processo trabalhista, a partir da reforma do processo de 2.006, passou a ser ato de iniciativa do Juiz, que tem o dever de decretá-la de ofício, por força do disposto no art. 219, § 5º, do CPC. O fundamento da aplicação é o princípio da subsidiariedade. A lei processual trabalhista não prevê a declaração oficial, razão pela qual é omissa, além de ser compatível com o processo trabalhista no qual há prazo de prescrição fixado na Constituição. Como dever do Juiz, a sua declaração atende à natureza e finalidade. É matéria de ordem pública constitucional visando a segurança jurídica. A sua finalidade é proteção do devedor para que não sofra, indefinidamente, a cobrança de uma obrigação que, pelo decurso do tempo, não é mais razoável que venha a ser exigida (NASCIMENTO, 2.007, p. 332). 133

Sobre os prazos processuais, temos: BRASIL. CLT, art. 774. Salvo disposição em contrário, os prazos previstos neste Título contam-se, conforme o caso, a partir da data em que for feita pessoalmente, ou recebida a notificação, daquela em que for publicado o edital no jornal oficial ou no que publicar o expediente da Justiça do Trabalho, ou, ainda, daquela em que for afixado o edital, na sede da Vara, Juízo ou Tribunal. Parágrafo Único. Tratando-se de notificação postal, no caso de não ser encontrado o destinatário ou no de recusa de recebimento, o Correio ficará obrigado, sob pena de responsabilidade do servidor, a devolvê-la no prazo de 48 horas, ao Tribunal de origem. Art. 775. Os prazos estabelecidos neste Título contam-se com exclusão do dia do começo e inclusão do dia do vencimento, e são contínuos e irreleváveis, podendo, entretanto, ser prorrogados pelo tempo estritamente necessário pelo Juiz ou Tribunal, ou em virtude de força maior, devidamente comprovada. Parágrafo Único. Os prazos que se vencerem em sábado, domingo ou dia feriado, terminarão no primeiro dia útil seguinte.

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processual no sistema, cumprindo a ordem do Juiz, automaticamente é

passada a mesma para o órgão da imprensa e para o e-mail cadastrado para

receber a informação oficial. Assim, na prática, a parte ou seu patrono ganham,

na maioria das vezes, dois dias a mais de prazo.

Em sede doutrinária está assentado que o prazo prescricional

intercorrente começa a fluir a partir do momento em que o titular da pretensão

deixa de movimentar o processo, quando lhe cabia isso. E a partir desse termo

inicial intercorrente o prazo prescricional, que se consuma com o advento do

terminus ad quem previsto no direito material sem que, antes dele, tenha a

parte suprido a falta (ALVES, 2.006, p. 661).

Segundo as regras postas no direito positivo, o prazo prescricional não

pode ser alterado por convenção entre as partes, nos moldes do art. 192/NCC,

ou seja, através de um negócio jurídico, para aumentar ou diminuir o interregno

legalmente estabelecido. Também pende para a nulidade, eventual ajuste que

vise pré-excluir causa de suspensão ou interrupção de prescrição134.

No direito material, o prazo da prescrição começa a correr a partir do

momento em que o direito se torna disponível, enquanto no âmbito processual

e mais especificamente da prescrição intercorrente, começa a correr do último

ato tendente a impulsionar o feito que foi praticado pelo demandante em

atendimento a um comando judicial ou por sua vontade, ante a falta de

indicação mais precisa. Entretanto, quando pretender declarar de ofício a

prescrição intercorrente, é de bom alvitre e democraticamente correto que o

Juiz intime a parte a dar efetivo andamento, sob pena de ver o processo

julgado extinto, com resolução de mérito, bem como dar ciência também à

outra parte, porquanto pode ensejar algum ato ou fato capaz de justificar a não

aplicação do instituto.

Oportuno lembrar que a prescrição intercorrente pode ocorrer tanto na

fase de conhecimento, quanto na fase de execução, sendo no primeiro caso

consoante a proposta de lege ferenda levada a efeito no item 2.3.1, do Capítulo

2.

134 Há de se imaginar, contudo, que eventual cláusula contratual prevendo um elastecimento do prazo prescricional, em benefício da parte mais fraca na relação (empregado em relação ao empregador, pois na execução fiscal em benefício do empregador seria vedado, diante do direito público), deve contar com guarida do Poder Judiciário. Lado outro, pode-se considerar também como direito público a extinção de demandas cujo exercício do direito de ação não foi exercido a tempo, extinguindo-se o feito com a declaração judicial de invalidade da cláusula ou convenção.

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Na fase executiva, a prescrição intercorrente pode atingir toda a

pretensão declarada, como também apenas parte dela. Com efeito, o julgado

pode contemplar prestações contínuas, como um complemento de

aposentadoria, uma indenização enquanto perdurar determinada condição e

assim por diante. Idem em relação ao direito de perceber frutos, dividendos e

outras prestações sucessivas decorrentes de trabalho ou ato ilícito.

Tais pretensões classificam-se como pretensões acessórias. E estas

podem, portanto, ser definitivas ou vitalícias ou temporárias.

Há prestações limitadas no tempo, como numa indenização

complementar a da Previdência Social, enquanto perdurar a incapacidade para

o trabalho. E a prescrição intercorrente pode encobrir total ou parcialmente tais

pretensões, consoante o momento em que o desinteresse do exeqüente faça

desaparecer sua possibilidade de exigir judicialmente o cumprimento.

Um último alerta é que durante o período de suspensão do processo,

seja a fase de conhecimento ou execução, a prática de atos processuais não é

tolerada, salvo os urgentes a fim de evitar danos irreparáveis. Logo, não se

pode admitir que o Juiz pronuncie a prescrição enquanto estiver suspenso o

processo (RABELLO, 2.005, p. 116).

11.1. Demandas trabalhistas stricto sensu

Segundo a regra da Súmula 150/STF, pela qual prescreve a execução

no mesmo prazo de prescrição da ação, e dispondo o inciso XXIX, do art.

7º/CF, que a pretensão resultante das relações de trabalho tem prazo

prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite

de dois anos após a extinção do contrato, em linha com o art. 11/CLT, temos

que, uma vez transitada em julgado a sentença ou o acórdão, ou não cumprido

o acordo, terão os interessados o prazo de dois anos para impulsionar o feito.

Idem em relação aos demais fatos do processo, em fase de conhecimento.

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11.2. Demandas civis de competência da Justiça do T rabalho

Aqui efetivamente existe uma complexa questão em torno do prazo

prescricional. Isso porque, após o advento da EC 45/2.004, há um enorme

dissenso jurisprudencial acerca de qual a prescrição aplicável nas demandas

em que a pretensão não envolve direito trabalhista stricto sensu.

Acontece dessa forma porque a Constituição Federal, bem como a CLT

dispõem de regras específicas sobre a prescrição trabalhista. Assim,

significativa parte da jurisprudência entende que não há de se buscar

supletivamente os prazos previstos no Código Civil, com robustos e

convincentes argumentos, lastrados ainda no art. 763/CLT, que estabelece que

nos feitos processados perante a Justiça do Trabalho as disposições aplicáveis

serão as definidas na CLT.

A outra corrente, não menos lúcida e com argumentos não menos

poderosos, sustenta que os prazos dispostos segundo as regras supra

referidas destinam-se exclusivamente para as pretensões trabalhistas. E mais,

que assim está preceituado porque, antes, a Justiça do Trabalho ocupava-se

apenas de relações de emprego, razão pela qual outra não poderia ser a regra.

A partir do momento em que a Justiça do Trabalho passa a conhecer e

julgar também questões de natureza diversa, pois o art. 114/CF, com sua atual

redação também insere em sua competência das relações de trabalho, sendo a

pretensão civil, os prazos prescricionais hão de ser os estabelecidos neste

diploma.

Tudo indica que esta última corrente tenha razão, porquanto sendo a

pretensão deduzida de natureza civil, a prescrição aplicável não há de ser de

outra ordem, por pura aplicação homogênea e coerente do sistema.

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CONCLUSÃO

A análise dos dados aqui trazidos revela que o Direito Processual do

Trabalho passa a acompanhar os demais ramos do direito processual,

reconhecendo e aplicando a prescrição intercorrente. Este instituto, aliás,

exclusivo do direito processual, deveria passar a integrar a própria Teoria Geral

do Processo, na medida em que se irradia em todos os seguimentos

processuais e significa autêntica garantia procedimental.

Podemos assegurar que dois fenômenos legislativos ocorridos em fins

de 2.004, um em novembro e outro em dezembro, quais sejam, o advento do §

4º, ao art. 40, da lei 6.830/80, que expressamente consagra a aplicação da

prescrição intercorrente e a Emenda Constitucional 45, ampliando a

competência da Justiça do Trabalho para conhecer e julgar matérias

extravagantes à relação de trabalho subordinado, são os condutores dessa

realidade. Não menos relevante outro fenômeno legislativo de janeiro de 2.002,

qual seja o caput do novo art. 202, do Código Civil, afirmando que a interrupção

da prescrição somente poderá ocorrer uma vez, situação jurídica que consagra

extraordinário vigor à prescrição intercorrente, porquanto toda vez que o

interregno preceituado no art. 190/NCC se implementar, emergirá límpida esta

causa de extinção do processo, com resolução de mérito, inclusive na fase de

conhecimento, após a suspensão do processo em casos de abandono da

causa, consoante a proposta de lege ferenda aqui formulada.

A nova redação do § 5º, do art. 219/CPC, que supletivamente estende

seus efeitos no Processo do Trabalho, é outro fator de contribuição decisiva

para a alteração da estrutura até agora verificada, pois regulamenta

regramentos estabelecidos na Constituição Federal, indicando ao Poder

Judiciário o caminho escolhido pela sociedade. Tal fato, inclusive, traz

importante contribuição científica para o Direito Processual, pois cria nova

categoria jurídica para a natureza jurídica do reconhecimento da prescrição ex

officio, na medida em que, sob esta angulação, perde seu status de exceção,

passando a alinhar-se como um ato de lógica jurídica, dentre aqueles

praticados pelo Juiz.

O reconhecimento e a aplicação do instituto em exame, contudo, de

forma alguma atenta contra os princípios que informam o Direito Processual do

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Trabalho, pois a doutrina sempre agasalhou o fenômeno do passar do tempo,

assim como a legislação processual do trabalho.

Esta realidade, aliás, ganhou extraordinário tônus com a Reforma do

Judiciário, porquanto a Emenda Constitucional que a chancelou veio a

incorporar o inciso LXXVIII, ao artigo 5º/CF, dizendo que a todos, no âmbito

judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os

meios que garantam a celeridade de sua tramitação. A assunção de um

compromisso desta magnitude pelo Estado brasileiro compromissa ainda mais

todos os artífices da construção jurídica, eis que a matéria se eleva como

expressão de direito humanos.

Outra conclusão a que se chega, é que o direito fundamental à ação, a

ser exercício não só com as garantias constitucionais processuais, mas

também em tempo razoável, constitui verdadeira quinta geração de direitos

humanos, situação que deixa a prescrição intercorrente como matéria de

ordem pública e objetivo do Estado, devendo ser aplicada em todos os

seguimentos do Poder Judiciário.

O Direito do Trabalho sempre foi irrenunciável, entretanto jamais foi

imprescritível.

Nesse sentido, imprescindível considerar o relevante papel da

jurisprudência, entretanto, se de um lado é certo que os tribunais têm plena

autonomia formar sua Súmula, não menos certo é que cabe ao Supremo

Tribunal Federal dar a última palavra em termos objetivos de interpretação do

direito, não havendo razão lógica e proveitosa dentro do sistema que acomode

verbete expressamente contrário à sua Súmula.

A jurisprudência até aqui resistente, passa a aceitar que ao lado do

impulso oficial, fatos alheios à vontade dos julgadores, por vezes, ensejam na

paralisação do processo e devem ensejar sua extinção, como garantia pessoal

do demandado e maneira de não desprestigiar a própria Justiça. Melhor que os

Juízes estejam mesmo ocupados com os processos cujos resultados são

desejados, do que comprometer a eficiência estrutural com o dispêndio de

energia em feitos desprezados pelos demandantes, pois a duração do

processo passou a ser um dos principais objetivos de Estado.

Ainda quanto a entendimento sumular, outra conclusão importante e

inédita é que, apesar do verbete nº. 153/TST preceituar que não se conhece de

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prescrição não argüida na instância ordinária, tal regramento não tem aplicação

junto à prescrição intercorrente, que pode ser suscita ou conhecida de ofício

em qualquer instância. Vale dizer, o pré-questionamento deixa de ter eficácia

plena por dupla razão: primeiro que a prescrição atualmente pode ser alegada

em qualquer instância, o que, por óbvio, inclui as instâncias extraordinárias, e

segundo porque se o fenômeno jurídico só se verificou nas Cortes superiores,

considerando-se que a parte somente deixar de praticar os atos a seu cargo

nesta esfera, temos que ali pode, então, ser declarada a prescrição

intercorrente.

Também a nova competência da Justiça Especializada agrega novos

valores culturais, no sentido de que institutos jurídicos acomodados noutros

sistemas passam a exercer influência entre nós. A percepção mais nítida

somente foi possível quando a Justiça do Trabalho passou a julgar execuções

fiscais, onde quem está menos estruturado no processo e, assim, histórico

merecedor de tutela diferenciada, passou a figurar também no pólo passivo da

demanda, minando a clássica resistência em se considerar o instituto em

estudo. Isso porque, nas execuções fiscais, o empregador, teoricamente o mais

capacitado, quando executado pela União Federal nos mesmos autos da

demanda, merece atuação dos princípios informadores do Direito Processual

do Trabalho, independente de ser em proveito do empregado ou do

empregador, porquanto ambos são destinatários de seus efeitos.

O perigo que isto pode representar, contudo, é a aplicação indistinta do

instituto, após ruir na doutrina a impossibilidade de reconhecimento da

prescrição intercorrente, e a esperada supressão ou alteração do verbete 114,

da Súmula do Colendo TST (situação até desejada para a coerente atuação do

direito), dado à sua condição anacrônica, sobretudo depois dos marcos

legislativos apontados. Daí a conveniência e oportunidade de se teorizar o que

está efetivamente ocorrendo, após o implemento dos agentes transformadores

apontados.

Sendo assim, sempre que a parte de menor sustentabilidade na situação

processual puder ser beneficiada com a declaração da prescrição intercorrente,

inexiste qualquer reserva para isso. E mesmo nos casos que o trabalhador, em

demanda típica, estiver sujeito ao fim do exercício de sua pretensão ou título

executivo, pela prescrição, ainda assim, se intimado a pronunciamento deixar

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escapar tal oportunidade, após o lapso temporal assinalado, deve ver extinto o

processo onde deixou de manejar seu interesse, nas hipóteses cujo impulso

oficial não possa suprir.

Várias são as ocasiões nas quais isso pode ocorrer. É assim com o

devedor numa Execução Fiscal, quando a demanda voltar seu vetor executivo

contra o trabalhador ou prestador de serviços, ou mesmo para beneficiar o

empregador ou tomador de serviços, quando este demandar contra o Poder

Público, como num mandado de segurança ou numa anulatória de infração

lavrada pela União Federal.

Não é só, pois afinal não é justo que o credor sujeite o devedor

eternamente ao seu jugo, impedido que o tempo que a tudo consome exerça

sua força numa situação jurídica processual.

O processo é essencialmente um instrumento de lealdade. Logo, se há

elementos capazes de viabilizar a execução, que sejam exigidos

imediatamente. Se não os houver, que se espere um tempo razoável para

tanto. E, depois, que se extinga a possibilidade, porquanto sua perpetuação

não beneficia as partes e contribui para o descrédito da Justiça, o que não

interessa a quem quer que seja, além de atentar contra objetivos estatais.

O notável artigo 878/CLT, pelo qual a execução poderá ser promovida

por qualquer interessado ou ex officio pelo Juiz prossegue com extraordinário

vigor, entretanto não tem o alcance para permitir a inércia deliberada da parte

no processo, na pendência de providência que lhe cabe com exclusividade. Em

tais casos, independente da natureza do direito perseguido, a aplicação da

prescrição intercorrente com a extinção do processo com resolução de mérito é

matéria que transcende o interesse individual das partes e funciona como

verdadeira garantia de direito fundamental, inciso LXXVIII, do art. 5º/CF,

podendo e devendo ser atuada até mesmo de ofício pelo Juiz, agente inserido

no processo e ouvinte dos anseios da sociedade em que exerce sua judicatura.

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