PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO … Goncalves... · Roland Barthes A MENSAGEM...

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA ANÁLISE DAS MÍDIAS A MENSAGEM FOTOGRÁFICA NAS CONOTAÇÕES JORNALÍSTICAS DA CAMPANHA POLÍTICA PARA PREFEITURA DE SÃO PAULO EM 2012 IVAN GONÇALVES FEITOSA FILHO ORIENTADORA: Profa. Dra. LEDA TENÓRIO DA MOTTA São Paulo 2015

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM

COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA

ANÁLISE DAS MÍDIAS

A MENSAGEM FOTOGRÁFICA NAS CONOTAÇÕES JORNALÍSTICAS DA

CAMPANHA POLÍTICA PARA PREFEITURA DE SÃO PAULO EM 2012

IVAN GONÇALVES FEITOSA FILHO

ORIENTADORA: Profa. Dra. LEDA TENÓRIO DA MOTTA

São Paulo

2015

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PROGRAMA DE ESTUDOS PÓS-GRADUADOS EM

COMUNICAÇÃO E SEMIÓTICA

ANÁLISE DAS MÍDIAS

A MENSAGEM FOTOGRÁFICA NAS CONOTAÇÕES JORNALÍSTICAS DA

CAMPANHA POLÍTICA PARA PREFEITURA DE SÃO PAULO EM 2012

IVAN GONÇALVES FEITOSA FILHO

ORIENTADORA: Profa. Dra. LEDA TENÓRIO DA MOTTA

Dissertação apresentada à Banca

Examinadora da Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo como exigência

parcial para obtenção do título de Mestre em

Comunicação e Semiótica, sob orientação

da Profa. Dra. Leda Tenório da Motta

São Paulo

2015

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Banca Examinadora

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DEDICATÓRIA

Este trabalho é dedicado aos meus pais – Ivan Feitosa, Ivete

Maria e dona Carminha, ao meu filho Pedro Ivan, e à minha esposa

Elaine Cunha. Vocês são a razão de tudo.

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AGRADECIMENTOS

À agência de fomento à pesquisa brasileira CAPES, pelo apoio

financeiro.

À minha orientadora Profa. Dra. Leda Tenório da Motta, pelos

ensinamentos e por me apresentar ao mundo barthesiano.

Aos membros da banca de qualificação e defesa, Prof. Dr. Juan Droguett

e Profa. Dra. Lúcia Santaella, cujas sugestões foram de extrema importância

para a melhor compreensão e o desenvolvimento deste trabalho.

À Profa. Renata Victor, da Universidade Católica de Pernambuco, pelo

incentivo e pelo desafio barthesiano.

À equipe da Hemeroteca Mário de Andrade – especialmente o pessoal

de apoio à pesquisa e reserva de material.

Ao Prof. Duílio Lanzoni, pelo suporte na impressão dos exemplares.

À Lucilla da Silveira Leite Pimentel, pelo ajuda na revisão de língua

portuguesa do trabalho e pelas valiosas sugestões.

Aos meus alunos e ex-alunos, pelas experiências proporcionadas em

sala que contribuem para reflexão do verdadeiro sentido da educação.

A todos aqueles que, de alguma forma, contribuíram para me fazer ver

na pesquisa uma forma de contribuir para uma melhor compreensão dos

ensinamentos de Roland Barthes.

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RESUMO

Esta pesquisa situa seu objeto de estudo, a «mensagem fotográfica», no

âmbito do jornalismo na campanha política à Prefeitura de São Paulo em 2012

e tem por objetivo a análise das tensões entre a denotação e a conotação.

Trabalha com a hipótese barthesiana segundo com a qual as mensagens

midiáticas desenvolvem sistemas conotados, de dupla significação, uma das

quais – a mensagem conotada – oferece as categorias necessárias para a

análise da imagem e do texto, e seus desdobramentos na mídia impressa que

influenciam notavelmente a escolha do leitor/eleitor, sendo esta última questão

a que justifica a proposta da dissertação. A principal contribuição do trabalho

consiste na aplicação das categorias da «mensagem fotográfica» às

publicações de mídia impressa de dois veículos midiáticos no contexto de uma

campanha política. Metodologicamente, a pesquisa é bibliográfica, analítica e

documental, de caráter qualitativo, mostrando como tais mensagens

ultrapassam, pela conotação, os limites da informação denotativa. O corpus da

pesquisa abrange as publicações dos dois jornais de maior circulação no país:

O Estado de São Paulo e a Folha de São Paulo, em seus registros

inseparavelmente fotográficos e textuais das referidas campanhas. A

fundamentação teórica para o campo da fotografia compreende a teoria

barthesiana – notadamente aquela proposta em Mitologias - exegeses de obras

específicas do autor, como O Óbvio e o Obtuso, Câmera clara, «A Mensagem

fogtográfica» e Aventura semiológica. Para o campo do jornalismo, exploram-

se as imagens introduzindo elementos de valorização significativos a respeito

do tratamento jornalístico de tal campanha eleitoral, essencialmente centrado

em mostrar as características definidoras da imagem global dos candidatos e

dos partidos concorrentes, a intenção comunicativa de ambos os jornais no seu

posicionamento ideológico que vai ao encontro da crítica em Mitologias.

Palavras-chave: Roland Barthes, Fotografia, Conotação, Mídia Impressa,

Campanha Política.

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ABSTRACT

This research situates its object of study, the « photographic message », in the

context of the journalism in the political campaign to the cityhall of São Paulo in

2012 and has as main target the analysis of the tensions between denotation

and connotation. It works with the barthesian hypothesis in agreement in which

the media messages develop connoted systems, of double signification, one of

which – the connoted message – offers the necessary categories for the

analysis of the image and of the text, and its ramifications in the printed media

that influence notably the choice of the reader/voter, being this last question that

justifies the proposal of the dissertation. The main contribution of the work

consists of the application of the categories of the « photographic message » to

the publications of printed media of two media vehicles of the context of a

political campaign. Metodologicaly, the reaearch is bibliographical, analytical

and documentary, of qualitative character, showing like such messages exceed,

for the connotation, the limits of the denotative information. The corpus of the

research includes the publications of two newspapers of major circulation in the

country: O Estado de Sao Paulo and A Folha de Sao Paulo, in their inseparably

photographic and textual registers of the above-mentioned campaigns. The

theoretical fundamentation for the field of the photography understands the

barthesian theory – especially that proposal in Mythologies - exegesis of

specific works of the author: The Obvious and the Obtuse, Camera Lucida,

«The Photographic Message» and Semiologic Adventure. For the field of the

journalism, the images are explored introducing significant elements of increase

in value as to the journalistic treatment of such a political campaign, essentially

centered in showing the defining characteristics of the global image of the

candidates and of the competing parties, the communicative intention of both

newspapers in his ideological positioning which goes and meets the criticism in

Mythologies.

key words: Roland Barthes, Photography, Connotation, Printed Media, Political

Campaign.

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SUMÁRIO

PÁG.

INTRODUÇÃO...................................................................................................01

Capítulo 1. A MENSAGEM FOTOGRÁFICA NO CONTEXTO REFERENCIAL

DO JORNALISMO ............................................................................................18

1.1. Mitologias do entorno social e o processo fotográfico ...........................19

1.2. A mensagem fotográfica conotada e entorno de uma campanha política

...........................................................................................................................30

1.3. A campanha política para prefeitura da cidade de São Paulo em 2012

...........................................................................................................................44

1.3.1. A Folha de São Paulo .............................................................................47

1.3.2. O Estado de São Paulo ..........................................................................47

1.3.3. As eleições para prefeitura de São Paulo em 2012.................................48

Capítulo 2. CATEGORIAS E PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE.....................53

2.1. A trucagem e o protagonismo sarcástico da campanha.............................57

2.2. Pose e tipos sociais dos candidatos ..........................................................63

2.3. Objetos a serviço das ideologias representadas .......................................68

2.4. Fotogenia – foco e luz do candidato em cena ...........................................74

2.5. Esteticismo – aquém e além da arte de fotografar ....................................80

2.6. Sintaxe – fotogramas da ação política .......................................................86

Capítulo 3. MITO E MENSAGEM FOTOGRÁFICA..........................................94

3.1. Trucagem – a alteração proposital da imagem fotográfica denotada

................................................................................................................96

3.1.1. Das bandeiras partidárias às notações caricatas no tom do debate

político eleitoral ...............................................................................................103

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3.2. Pose – entre a objetividade e a subjetividade do estereótipo social

..............................................................................................................106

3.2.1. Posicionamento e pose na corrida eleitoral...........................................112

3.3. A sintaxe e a declinação significante do sentido...................................117

3.3.1. Fotogramas de um passeio eleitoral......................................................124

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...........................................................................126

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..............................................................134

BIBLIOGRAFIA...............................................................................................135

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INTRODUÇÃO

“A noção de mito pareceu-me desde logo

designar estas falsas evidências;(..)O mito

é uma liguagem”.

Roland Barthes

A MENSAGEM FOTOGRÁFICA NAS CONOTAÇÕES JORNALÍSICAS

DA CAMPANHA POLÍTICA PARA A PREFEITURA DE SÃO PAULO EM 2012

é um estudo pautado pela conotação da mensagem jornalística que tem como

ponto de referência o texto para a escolha das imagens que ilustram, reforçam

e projetam o contexto informativo e de comunicação de atualidade para leitores

que são, por sua vez, espectadores/eleitores. Considera a mensagem

fotográfica conforme a proposta do projeto semiológico de Roland Barthes.

Em um primeiro momento, este trabalho se baseia em uma perspectiva

analítica sobre as campanhas políticas de um modo geral, e de José Serra e

Fernando Haddad para a prefeitura de São Paulo em particular. O período

contemplado vai de 1º de agosto a 31 de outubro de 2012 – período em que

foram oficializadas as candidaturas e no qual aconteceram, efetivamente, as

campanhas políticas. Nesse período trimestral as estratégias comunicativas

afloram e transformam-se em fonte de interesse para os leitores/eleitores.

Em um segundo momento, foi feita a coleta do corpus que se deu a

partir da escolha de capas dos próprios jornais que anunciavam o andar do

processo pré-eleitoral, seja com imagens, chamadas de capa do jornal ou do

caderno interno, e textos complementares; consideraram-se igualmente

cadernos específicos para o período agosto-outubro. No caso da Folha: Poder

e Eleições. No Estado: Nacional e Eleições.

O primeiro capítulo estabelece os pressupostos teóricos da «mensagem

fotográfica» no contexto referencial do jornalismo. Parte da obra Mitologias

para estabelecer como o mito converte-se na categoria do imaginário social

capaz de dar conta do entorno cultural, assim como do processo fotográfico

emergente. Considera-se a mensagem fotográfica conotada como ponto de

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partida para a análise de uma campanha política, haja vista a prática do

fotojornalismo neste sentido. Por fim, descreve-se o cenário da cidade

escolhida e do momento histórico, político, social e cultural noticiado pela Folha

de São Paulo e por O Estado de São Paulo ao informar e comunicar a situação

pré-eleitoral.

O segundo capítulo constitui-se na análise do discurso dessa campanha

eleitoral, trazendo à tona as categorias da «mensagem fotográfica» –

trucagem, pose, objetos, fotogenia, esteticismo e sintaxe – que incidiram, por

sua vez, no protagonismo, no desenho e nos procedimentos da mesma, e nos

codificadores que permitem a interpretação de tais categorias.

O terceiro capítulo abrange as categorias propostas e o contexto da

página completa que ajudam a reconstrução da trama global da notícia

eleitoral, declinando na categoria da trucagem na sua relação direta com a

imagem fotográfica, da pose que permite a dialética entre a objetividade e

subjetividade dos estereótipos sociais, e a sintaxe, que assinala o sentido

crítico da mensagem semiotizada.

Foram utilizadas como fontes de pesquisa referências bibliográficas,

pesquisas em hemerotecas para captação das capas dos referidos jornais –

que abordam a campanha política para a Prefeitura –, tomando como

procedimentos também metodológicos algumas regras básicas a serem

consideradas para a interpretação fotográfica.

Segundo Barthes, as conotações jornalísticas estabelecem um modelo

de comunicação relacionado com a cultura de massa e com o papel da mídia

na contemporaneidade, afetando os modos de sentir, pensar e agir de seus

receptores. Partindo dos pressupostos de Mitologias, em que o autor desvela

os verdadeiros interesses midiológicos, propõe-se uma metodologia capaz de

desmitificar a articulação das mensagens da mídia impressa - sobretudo, no

que se refere à escolha da imagem fotográfica na sua função referencial, isto é,

na forma como a informação é produzida, armazenada e divulgada bem antes

de ser publicada.

A campanha política para a Prefeitura de São Paulo vem de encontro a

um dos fatores essenciais da mensagem conotada: o ideológico. No sentido

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lato, ideologia é a forma de mascarar ou ocultar as contradições sociais e

dominação imperante, invertendo o modo de processar o pensamento sobre a

realidade. Assim, a ideologia é uma forma de produção do imaginário social

que corresponde aos anseios da classe dominante como meio eficaz de

controle social e de amenizar os conflitos de classe, seja invertendo a noção de

causa e efeito, seja silenciando questões que impedem a tomada de

consciência do cidadão de sua condição histórica.

Nesse sentido, tal campanha oferece um cenário interessante à

decodificação da notícia veiculada pela Folha de São Paulo e O Estado de São

Paulo, dois jornais de vertentes ideológicas diferentes que informam a cidade

brasileira que é hoje em dia o centro nevralgico da informação e da

comunicação no país.

A principal transformação deste trabalho esteve ligada ao se considerar

literalmente o caráter paradoxal entre a mensagem denotada e a mensagem

contada, destacando-se que a opção de Barthes afere diretamente o caráter

histórico, ideológico e social que o jornalismo tem como prática. Sendo assim,

abdicou-se desse caráter paradoxal para demonstrar através de um profiquo

corpus de pesquisa a validez das categorias conotativas da mensagem

fotográfica: trucagem, pose, objetos, fotogenia, esteticismo e sintaxe.

Deste modo, criaram-se tabelas de análise das imagens fotográficas

sobre a campanha eleitoral para a Prefeitura de São Paulo em 2012;

publicadas nos dois jornais Folha e O Estado de São Paulo. Trata-se de um

estudo quantitativo e qualitativo que introduz elementos de valoração

significativos a respeito do tratamento jornalístico de dita campanha,

especificamente centrado em mostrar características definitórias da imagem

global dos partidos e líderes políticos concorrentes na mesma.

Tomando como princípio a própria eloquência informativa da fotografia,

realizou-se uma análise do conteúdo do corpus no qual são contemplados três

grupos de indicadores: 1) atributos documentais – valores denotativos; 2)

codificação fotográfica – valores conotativos; e 3) o tratamento em páginas ou

maquetação – valores conotativos.

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Enfim, a dissertação abre-se à crítica através das categorias da

trucagem, pose e sintaxe com o fim de demonstrar como estas influenciaram

diretamente no resultado dessas eleições. Do ponto de vista dos

procedimentos metodológicos, considerou-se a página completa do jornal para

a visualização mais abrangente e global do noticiado, da intenção comunicativa

do meio e dos efeitos produzido em leitores, espectadores ou eleitores.

Tais categorias são apresentadas pelo semiólogo francês em O óbvio e

o obtuso (1990), onde Barthes estabelece uma relação dessas categorias com

a fotografia a fim de analisar a mensagem fotográfica em busca da

compreensão do mito.

Portanto o objeto é a «mensagem fotográfica» no âmbito teórico e,

sobretudo, metodológico proposto por Barthes, uma vez que a fotografia

transmite a essência em si do real/literal, criando uma brecha com o

objeto/referente em termos de representação. A escolha do objeto se deu a

partir da leitura de Mitologias (Barthes, 2006, p.162), principalmente, do artigo

«Fotogenia eleitoral».

A obra de Roland Barthes, que apresenta seu olhar e suas análises dos

mitos contemporâneos, revela a densa camada de significações que envolvem

todos os fenômenos e objetos da vida ordinária e que mostram como a ideia de

realidade não deixa de ser absolutamente histórica. Nesse sentido, validam-se

os contextos midiáticos da cultura paulistana.

Em Mitologias, o autor se apresenta como crítico, mas também como

estilista dos mitos que rodeiam a cultura de massas. Segundo o semiólogo

francês, a vida cotidiana nutre-se de mitos: o catch, o strip-tease, a publicidade,

o automóvel, o turismo e das eleições, entre outros, que sempre desbordam o

sentido. Isolados da atualidade que lhes dá nascimento, de pronto aparece o

abuso ideológico que ocultam. Aqui Barthes dá conta de tudo isto com a

preocupação formulada no ensaio que fecha a obra de reconciliar o real e os

seres humanos, a descrição e a explicação, o objeto e o saber.

Por isso, a análise semiológica do cotidiano abrange também o processo

político das eleições, no que se refere a uma das categorias, a fotogenia dos

candidatos na divulgação de sua imagem. Com isto, inaugura-se uma prática

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intelectual que continua até os dias de hoje, e que busca transcender o corte

entre a «objetividade do sábio» e a «subjetividade do escritor».

Existe, como afirma Barthes no seu artigo: «A mensagem fotográfica»

(IN O óbvio e o obtuso), uma redução: de proporção, perspectiva e cor. A

imagem não é o real e sim uma analogia – analogon – perfeita, o que para o

senso comum define a fotografia. Aparece, assim, a principal característica da

imagem fotográfica: trata-se de uma mensagem sem código, da qual se pode

inferir de imediato que a mensagem fotográfica é uma mensagem contínua

(Barthes, 1990, p.15).

Tal mensagem contínua supõe uma fonte emissora, um canal de

transmissão e um meio receptor. A fonte é o grupo de pessoas que redigem o

jornal. O meio é o público leitor; e o canal o jornal. A estrutura da fotografia está

longe de ser isolada, mantém comunicação com outra estrutura: o texto.

Ambas – uma formada por palavras e outra por linhas, superfícies e tons –

suportam a totalidade da informação. Existe uma redução, como já dito, da

mesma ao passar a ser uma imagem, mudanças na proporção, perspectiva e

cor. Mas, nunca chega a ser uma transformação, é o analogon perfeito da

realidade: é insistentente uma mensagem sem código. O próprio Barthes no

texto se faz a pergunta: existem mensagens sem código? Toda e qualquer

reprodução analógica da realidade – desenho, pintura, cinema, teatro – seriam

mensagens sem código aparente. Como entender isto? As fotografias não

estão «codificadas». Mostra-se o que é na suposta necessidade de codificá-

las. Está tudo aí, à vista, pois não se pode confundir código com conteúdo.

De todas as estruturas de informação, a fotografia seria a única que está

exclusivamente constituída e ocupada por uma mensagem «denotada» que

esgotaria por completo seu ser. Perante uma fotografia, o sentimento de

«denotação», ou se preferir, de plenitude analógica, é tão forte, que sua

descrição é literalmente impossível, já que descrever é justamente anexar à

mensagem denotada um relevo ou uma mensagem secundária.

Mas, há uma probabilidade de que a «mensagem fotográfica» – pelo

menos a mensagem jornalística – seja conotada através do contexto. A

conotação não se deixa necessariamente captar de imediato na mensagem em

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si. No entanto, pode ser induzida de certos fenômenos que têm lugar na

produção e a recepção da mensagem: por um lado, a fotografia jornalística é

objeto de trabalho, selecionado, composto, construído e tratado segundo as

normas profissionais, estéticas e ideológicas, que são outros fatores da

conotação; e por outro, essa mesma fotografia não é só percebida e recebida,

mas também lida e relacionada mais ou menos conscientemente pelo público

que a consome, com uma reserva tradicional dos signos.

Então, há de se lembrar que na fotografia, a mensagem denotada é

absolutamente analógica, isto é, que não recorre a código nenhum, é contínua;

a mensagem conotada contém um plano de expressão e um plano de

conteúdo, significantes e significados, obrigando, pois, a um verdadeiro

deciframento.

Enfim, a conotação, ou seja, a imposição de um sentido segundo a

mensagem fotográfica propriamente dita, elabora-se nos diferentes níveis de

produção da fotografia – seleção, tratamento técnico, enquadramento,

paginação. Estes procedimentos são conhecidos e nomeados como categorias;

o estudo se limita a traduzi-los em termos estruturais. A rigor, haveria que

separar os três primeiros – trucagem, pose e objetos – dos três últimos –

fotogenia, esteticismo e sintaxe –, já que nos três primeiros procedimentos o

que produz a conotação é uma modificação do real, isto é, da mensagem

denotada – e é evidente que este preparativo não é próprio da fotografia.

Parte-se do princípio de que na mensagem fotográfica coexistem duas

mensagens: a analogia perfeita da realidade – efeito da luz sobre a placa

fotográfica – e a retórica da linguagem fotográfica – produto da história e da

cultura. Por esta razão, a primeira mensagem que denota é realista, objetiva e

literal. Já a segunda mensagem conotada é simbólica e ligada à realidade

social. Este realismo barthesiano combina justamente o realismo mimético e o

estudo da vida dos signos na sociedade.

A retomada do pensamento de Barthes se justifica na medida em que o

realismo que predominava no século XIX era um realismo que fixava sua

atenção sobre a imagem como se esta fosse um reflexo – mímesis. Nesse

sentido, a fotografia objetiva rivalizava com a arte objetiva. Durante aquele

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século apareceram vários estilos realistas. O primeiro estilo de grande difusão

foi a fotografia de estúdio, que rapidamente deslocou os retratistas. Logo, o

desenvolvimento tecnológico gradualmente aumentou a mobilidade da câmera

e os fotógrafos inventaram novas convenções, muitas vezes, com anseios

científicos, para os propósitos da antropologia, do jornalismo, da geografia e da

documentação das condições sociais e urbanas da época. O principal desafio

deste realismo veio dos fotógrafos que tentaram introduzir a criatividade e

apontar valores estéticos à arte de fotografar, indo além do estilo realista.

Até meados do século XX, vários autores começaram a questionar

seriamente esse realismo mimético não do ponto de vista artístico, mas do

ponto de vista das normas sociais que produzem, transformam ou dirigem a

leitura da imagem. No esteio destas constatações, o trabalho vai de encontro

ao contexto social das campanhas eleitorais divulgadas pela mídia impressa de

dois jornais de ampla divulgação e repercussão na sociedade brasileira de um

modo geral e da paulistana em particular.

Já na contemporaneidade, o resgate do projeto semiológico de Roland

Barthes resulta importante e atual, pois as tendências em fotografia hoje se

concentram em vários processos: o uso das tecnologias, a escolha do tema, os

estilos convencionais, as práticas sociais, a recepção, a interpretação, a

difusão, a legitimação e os próprios usos sociais da imagem como tal.

Para tanto, resulta importante abordar o tema das campanhas eleitorais

narradas na imprensa, haja vista que elas são decisivas em termos de

organização social e no exercício do poder. Deste modo, este estudo procura

demonstrar através da análise dos meios que a construção da mensagem

lança um papel essencial para a argumentação da imagem e da palavra que se

imbricam.

Dentro dos elementos não linguísticos que dão forma aos meios de

comunicação, em especial os jornais, a imagem ocupa um lugar preponderante

como material gráfico. No jornalismo contemporâneo é de tal transcendência

que cumpre o papel informativo – observa-se a profunda transformação

ocorrida na ênfase dada às matrizes visuais em detrimento das verbais –, já

que transmite aspectos de um fato noticiável. O material gráfico que pode ser

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encontrado em um jornal refere-se a ilustrações, retratos, caricaturas ou breves

histórias em quadrinhos. A imagem desenhada foi evoluindo para a nota de

humor em que se ironizam ou satirizam situações e personagens da realidade

– neste caso, deve-se pensar nas situações em que os candidatos às eleições

aparecem nessas circunstâncias. Trata-se de uma forma de expressão que tem

maior repercussão na atualidade.

Por isso, a mensagem fotográfica traz enfaticamente este tipo de

material que apresenta uma variedade de expressões entre as que

predominam histórias e caricaturas. A fotografia, por sua parte, será o material

gráfico predominante nas unidades de análise desta pesquisa.

Para Roland Barthes há duas observações fundamentais: a fotografia é

um objeto dotado de autonomia estrutural, e a fotografia jornalística é uma

mensagem em si. E o conjunto desta mensagem está formado por: uma fonte

emissora, que é a redação e o grupo técnico que cuida do jornal; o meio

receptor, que é o público/eleitor; e um canal de transmissão que é o jornal em

si. Para Barthes é um conjunto de mensagens, já que desde a compaginação

até o nome mesmo do meio constituem um saber que afeta diretamente a

leitura da mensagem – por exemplo, uma mesma fotografia pode ter diversos

sentidos se se publica em um jornal ou outro/ daí a escolha de duas mídias

impressas. Na base desta configuração, estabelece-se uma teoria da

comunicação, um método semiológico capaz de analisar o corpus de ambas as

mídias e a aplicação em busca de níveis de significância.

A conotação não se deixa necessariamente captar de imediato no nível

da mensagem, mas se pode induzir de certos fenômenos que têm lugar no

nível de produção e de recepção da mensagem. A principal observação que se

faz da análise de Barthes neste trabalho é que o código de conotação é

histórico e cultural. Em um código conotativo, os signos são gestos,

expressões, condutas, efeitos que promovem em certo sentido o uso dado por

uma determinada sociedade. Estes pressupostos presentes no artigo «A

mensagem fotográfica» se reforçaram na proposta de pesquisa na sua

fundamentação teórica e metodológica.

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Enfim, a significação, isto é, a relação: significante e significado, é

sempre histórica, sempre elaborada por uma sociedade – paulistana – no caso

das mídias impressas escolhidas. Por esta razão a análise da fotografia

depende do «saber» do leitor/eleitor, e adquire significado de acordo com o

meio em que se expõe e ao trabalho de produção ao qual se submete. Sendo

assim, o título desta dissertação traz explícitamente a questão de uma

mensagem sem código – mensagem denotada – que se recria a partir da

mensagem conotada.

Qual é então o papel que joga o texto informativo dessas mídias

impressas junto à fotografia? Hoje o texto constitui-se em uma «mensagem

parasita» que tem como finalidade conotar a imagem, impondo um ou mais

significados secundários. Em princípio, a imagem ilustra o texto; na atualidade,

a imagem se faz mais consistente pelo texto, já que este acrescenta cultura,

moral e imaginação. A mensagem linguística pode cumprir duas funções a

respeito da imagem. Uma delas, a mais frequente nas fotografias de imprensa,

é a de ancoragem; nesses casos o texto ou a palavra fixa um de todos os

possíveis significados que pode ter a imagem. Outra função é a do relevo, a

qual não implica uma relação de redundância entre a mensagem verbal e a

imagem visual, o texto não duplica informação presente na imagem, mas traz

uma nova informação.

Desta forma, a proposta primeira deste trabalho foi analisar a campanha

eleitoral à Prefeitura de São Paulo em 2012 sob as categorias da mensagem

conotativa da trucagem, pose, objetos, fotogenia, esteticismo e sintaxe, a fim

de apresentar algumas propostas:

1) Explorar os fundamentos da crítica ideológica barthesiana de Mitologias

com o fim de estabelecer os procedimentos de desmontagem pela

desmitificação propostos por Barthes.

2) Estabelecer os pressupostos teóricos e metodológicos da «mensagem

fotográfica» para fundamentar as categorias da conotação propostas

para a análise do corpus do projeto.

3) Contextualizar social e culturalmente a campanha eleitoral à Prefeitura

de São Paulo em 2012 no tratamento dado à informação tanto do ponto

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de vista da Folha de São Paulo quanto do ponto de vista de O Estado de

São Paulo.

4) Caracterizar cada uma das categorias da mensagem conotativa com

exemplos ilustrativos de cada uma delas.

5) Interpretar o corpus do projeto de pesquisa, considerando os

fundamentos do primeiro e segundo capítulos da estrutura da

dissertação com o intuito de demonstrar como as categorias da

conotação influenciam o leitor/eleitor na hora de votar e nos resultados

da eleição.

Para isso, partiu-se do pressuposto de que uma mídia impressa exerce

influência na captura de imagens intencionalmente trabalhadas ou conotadas

junto ao texto para produzir um efeito de sentido eficaz no leitor/eleitor. Desta

forma, as categorias da mensagem fotográfica reforçam o teor ideológico da

mídia na sua tentativa de persuadir o leitor/eleitor a respeito dos modos de

pensar e de agir perante um processo eleitoral. Os resultados das eleições

para a Prefeitura de São Paulo demonstram que as categorias da trucagem,

pose e sintaxe são as mais eficazes para este fim.

A fundamentação teórica deste trabalho reside naquele apontado por

Roland Barthes em Mitologias ([1954-1956]2006), em que está colocada a

questão das tensões entre o conotado e o denotado no campo da fotografia

contemporânea.

Mitologias é uma coleção de 53 ensaios breves que Barthes escreveu

para uma revista literária sob a rúbrica «mitologia do mês». Essa coluna foi a

forma com a qual Barthes fez frente à explosão da cultura de massas na

década seguinte à Segunda Guerra Mundial – a chegada de um grupo híper

mercantilizado de meios: revista, cinema, rádio, televisão, que configurava a

vida social de todos em um nível mais profundo, como uma espécie de nova

forma de gravidade psicológica. Barthes propôs a cultura de massa a partir de

Newton para identificar as leis de seu comportamento, provar suas tensões e

deixar de manifesto os limites invisíveis de sua influência.

A ideia básica de Barthes nesta obra é que os discursos de uma cultura

de massa escalonam-se ou distendem-se em mitologias. O projeto semiológico

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consistiria em decodificar tais escalonamentos. Esse autor não foi o único a

escrever nos anos 50 sobre esse tipo de trivialidades. Mas seu tom foi único:

um rigor individual teórico que plasmou em aforismos e fez compreender as

coisas familiares do cidadão. Muitas das suas ideias do autor se aplicam

poderosamente à cultura contemporânea – daí a atualidade de seu

pensamento –, como aconteceu com a França do pós-guerra. Nisto reside, por

exemplo, a análise já citada das fotos de campanha – ainda populares hoje em

dia – nas quais os políticos olham à distância, para o futuro.

Barthes define a fotografia como uma nova alucinação, falsa no nível da

percepção, mas verdadeira no nível do tempo. E, em relação à imagem

fotográfica, considera que a fotografia só adquire seu valor pleno com a

desaparição irreversível do referente, com o passar do tempo.

«Na realidade, aquilo que permite ao leitor consumir o mito

inocentemente é o fato de ele não ver no mito um sistema semiológico, mas

sim um sistema indutivo: onde existe apenas uma equivalência, ele vê uma

espécie de processo causal: o significante e o significado mantêm, para ele,

relações naturais» (Barthes, 2006, p.152). É esse jogo de significação que dá

embasamento ao objeto de pesquisa desta dissertação.

A lição básica de Mitologias é que as mídias ultrassignificam

excessivamente seus discursos. E, se a cultura do século XXI tem adotado

algumas das lições de Barthes, o que se explora não é a cultura de massas,

mas uma crítica da mesma, a disecção barthesiana de tudo, sem importar a

trivialidade. Isto acontece em todas as partes agora, quase sempre em tempo

real. E esta análise crítica é vital, interessante e consumível como a cultura que

se discute. Neste sentido, Mitologias situa o crítico no meio e entre, ele não é

um consumidor regular de cultura, entretanto, é alguém profundamente imerso

nela, o suficiente como para apreciar seus mecanismos internos.

No caso deste trabalho, trata-se da aplicabilidade do método

semiológico proposto por Barthes à análise das mídias jornalísticas escolhidas.

O semiólogo defende a ideia de que a fotografia vai além do que se vê e seu

sentido estaria mais associado à essência ou ao referente que acompanha as

imagens.

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Em relação ao método proposto para a análise do corpus, existem três

planos de análise de uma fotografia jornalística: o denotativo, o conotativo e o

cultural. O primeiro se vincula à condição e perfeição analógica da imagem, ao

significado associado à realidade que se observa e que poderia ser

considerada a equivalência da «significação primária ou natural» da iconologia

de Panofsky. O segundo corresponderia aos significados dos significantes que

desbordam a representação da realidade e se relacionam com os elementos do

conteúdo. O terceiro consiste em uma contextualização da visualização da

imagem, levando em consideração os condicionadores sociais e históricos do

momento do espectador.

Da obra derradeira de Roland Barthes A câmera clara ([1980] 2011),

resgata-se a interpretação de sua teoria virando para uma subjetividade pura

que lhe permite realizar um dos textos mais influentes da perspectiva

interpretativa de raiz fenomenológica. Provavelmente influenciado pela sua

monografia «Sobre a fotografia» (1971), Barthes desenvolve e aplica um novo

método de análise que experimenta consigo mesmo, dissecando suas imagens

mais estimadas, enfatizando o protagonismo do receptor.

Dentro desta nova visão personalizada, o autor introduz dois conceitos

fundamentais na sua teoria: studium e o punctum. Enquanto o studium significa

interesse, gosto por algo ou alguém, o estudo cultural da fotografia, seu campo

conotativo conduz a alguma coisa; o puctum viria em busca do analista e o

atravessaria como uma flecha, «seria essa imagem que provoca um

estremecimento do nível subjetivo» da pessoa a partir de suas experiências

pessoais.

Existe um puctum que evidentemente está relacionado com a forma,

mas, por outro lado, também existe um puctum que perturba em nível

cronológico, ligado ao tempo. Este último certifica a caducidade, mostra a

tragédia passada, presente ou futura e, tudo por sua vez, girando entorno do

horror do fim inevitável: a morte. Neste sentido, ao observar uma fotografia se

assiste por sua vez a uma paradoxal dualidade: a realidade atual e a realidade

passada. Os fotógrafos convertem-se, assim, em inconscientes «agentes da

morte».

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Outra referência a este quesito está em O Óbvio e o Obtuso

([1964]2009), onde Barthes visualiza que a fotografia permite ao fotógrafo

escamotear a preparação para a cena que se pensa captar. Reforça-se nesta

obra que a leitura da fotografia sempre é histórica, pois depende de um saber,

do saber do leitor, como se fosse uma língua que só é inteligível para aquele

que aprende seus signos.

Igualmente, observa-se que o texto e a imagem são os principais

procedimentos da conotação da imagem fotográfica – trata-se de técnicas – e,

assim mesmo, pode-se considerar o texto que acompanha a fotografia,

constituída em mensagem, um significante destinado a comentar a imagem,

isto é, infundindo nela um ou vários significados.

Desta forma, a imagem não significa por si, é a palavra que lhe dá

sentido. Essa imagem funciona como um retorno episódico à denotação, a

partir de uma mensagem principal, no entanto, hoje em dia, pode-se visualizar

a amplificação da imagem por parte do texto. A conotação não se vive já, mas

como ressonância natural da denotação fundamental, a qual constitui a

analogia fotográfica, de modo que o processo como um todo se caracteriza

como algo da ordem cultural.

A fotografia, segundo Barthes, guarda certa autonomia frente ao controle

do fotógrafo e dos fotografados. A placa fotográfica pode captar elementos não

previstos, não controlados, já que seu referente é tudo o que aparece à lente.

Nas próprias palavras de Barthes (1984, p.114), a «essência» da fotografia é

sua conexão concreta com o referente real.

Por ser considerado o autor que melhor corresponde aos propósitos

desta dissertação, seus referenciais teóricos concentraram-se na obra de

Roland Barthes. Partiu-se do presente de uma atividade considerada trivial,

como uma campanha de política eleitoral, tratada pela mídia impressa no seu

afã de mitificar práticas sociais.

Um dos primeiros passos dos procedimentos adotados consistiu em

fazer um levantamento bibliográfico na obra de Roland Barthes, capaz de

mostrar a atualidade de seu projeto semiológico no que se refere a esse

período trimestral em que as estratégias comunicativas afloraram e

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transformam-se em fonte de interesse para os leitores/eleitores. Fundamentou-

se teórica e metodologicamente os conceitos de mensagem denotativa e

conotativa, assim como a imbricagem de ambas na «mensagem fotográfica».

Por fim, com outras obras reforçou-se o conteúdo para a elaboração do

primeiro capítulo, assim como a escolha das imagens mais representativas de

cada uma das categorias da conotação.

Um segundo passo neste sentido foi a coleta do corpus que se deu a

partir da escolha de capas dos próprios jornais que anunciavam o andar do

processo pré-eleitoral, seja com imagens, chamadas de capa do jornal ou do

caderno interno e textos complementares.

Foram utilizados como procedimentos também metodológicos algumas

regras básicas a serem consideradas para a interpretação fotográfica:

1º Sujeitos/Conteúdos

Analisam-se fotografias selecionadas e publicadas nas capas do jornal e

nos cadernos específicos das eleições que bem refletem episódios

diretos da mesma – palanques, visitas, entrevistas, entre outras.

Também são incluídas as fotografias do mesmo tema publicadas em

outras secções do jornal, além das capas antes mencionadas e dos

suplementos. São excluídas dessa seleção e do estudo as imagens

fotográficas que, ainda aparecendo nos espaços indicados, por seu

conteúdo e tamanho reduzido carecem de significado informativo.

2º Desenho e procedimento

Toma-se como ponto de partida a ideia de que a análise do conteúdo

pode ser utilizada para dissecar/desmitificar qualquer produto de

comunicação midiática, para conhecê-lo em profundidade, para saber

como foi feito, para inferir e predizer seu mecanismo de influência. Esta

técnica de pesquisa quantitativa se apresenta como idônea para a

finalidade deste trabalho.

Dado que a fotografia é uma representação icônica da realidade datada

da mensagem que além do mais, possui um caráter polissêmico, a

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mesma pode ser admitida como objeto adequado para a análise do

conteúdo. Realiza-se uma ficha matriz para codificar o conteúdo de

todas as unidades de análise, em cuja construção tem-se utilizados

critérios gerais previamente definidos e aceitos pela comunidade

científica. Os registros codificados durante a pesquisa, um por cada

unidade de análise, voltar-se-ão para base de dados sobre a qual se

executarão consultas específicas para estabelecer, classificar e

quantificar as características denotativas e conotativas das fotografias.

3º Instrumentos

O instrumento utilizado para a análise dos dados foi parte dessa

documentação na matriz ou base de dados composta por um conjunto

de indicadores agrupados em três categorias básicas, que interessam

ao propósito da pesquisa: atributos documentais, traços de codificação

fotográfica e de composição/diagramação.

O primeiro instrumento é denotativo – o que se mostra na fotografia –,

enquanto que os restantes são os que refletem a parte conotativa da

imagem – o que se sugere, por meio da mediação subjetiva do fotógrafo

e do diagramador. Aprecia-se neste desenho uma dupla concordância

com as ideias de Barthes sobre a «mensagem fotográfica» com a

presença na fotografia de mensagens denotadas e conotadas; também

o propósito do fotojornalismo como a notificação de acontecimentos

reais, interpretados visualmente por um fotógrafo e orientados por

critérios de contingência, mediatizados por vários processos

codificadores – fotográfico, informativo e de impressão fotomecânica.

A matriz de análise/base de dados foi concebida pelo critério de

adequação às características concretas que apresentam as fotografias

analisadas, obviando alguns aspectos pouco significativos e priorizando

outros.

Elaboraram-se para isto tabelas que recolhem as categorias e

indicadores que compõem a matriz documental ou base de dados:

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Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo Identificação do candidato.

Papel Função do protagonista

principal/candidato.

Partido Partido político ao qual pertence.

Episódio Enquadramento episódico específico da

imagem.

Data de obtenção Identificação da data da captação da

imagem.

Meio Folha de São Paulo/O Estado de São

Paulo.

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Campo de visão captado: geral, grupal ou

curto.

Impressão gestual Gestualidade que mostra o candidato.

Ação/Estaticismo Valor dinâmico visível do candidato

Cenografia Entorno, elementos do ambiente,

vestuário.

Verticalidade Captação em picado ou contrapicado.

Equilíbrio Predomínio compositivo de simetria ou

assimetria.

Angulação Presença de efeitos de grande angular ou

objetiva.

Simbolismo Presença de gestos ou objetos

simbólicos.

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Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página Publicação de capa do jornal ou caderno.

Tamanho Medição em colunas de páginas do jornal.

Correspondência fotografia/Fato noticioso Concordância entre o assunto central e a

fotografia.

O método proposto neste trabalho segue as orientações do próprio

Barthes, uma vez que a desconstrução traz uma estratégia para desmascarar e

expor as inconsistências e contradições que desmentem qualquer interpretação

unívoca, «correta» ou mimética. Este método desconstrutivista tenta

desestabilizar o texto e produzir uma «contra-leitura». Assim, permite ver como

as narrativas textual e fotográfica estão montadas sobre uma estrutura de

dimensões e hierarquias instáveis e questionáveis. Tal estratégia não tenta

construir uma «verdade», mas ver como se tem construído uma «verdade

sobre alicerces arbitrários».

Este trabalho ancora-se na linha de pesquisa Análise das Mídias,

fundamentada na teoria da semiótica discursiva abraçada por Roland Barthes

no espectro semiológico de seu projeto, e na pesquisa sobre o «neutro», o

sentido velado em oposição ao conotado do mito da Profa. Dra. Leda Tenório

da Motta, que orienta esta dissertação.

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CAPÍTULO 1

A mensagem fotográfica no contexto referencial do jornalismo

Este capítulo inicial trata da imagem fotográfica tal como definida por

Roland Barthes em algumas das principais obras do seu projeto semiológico. O

autor sustenta que a mensagem denotada leva a descrever literalmente uma

fotografia que, por sua vez, sempre conduz a uma inevitável conotação, é a

língua a qual permite tal descrição e, portanto, esta se vê condicionada

culturalmente.

A partir da atualidade do mito na sua obra-prima Mitologias que trata do

entorno social na sua convergência com a imagem fotográfica, a proposta de

análise se dá entre a crítica ideológica da linguagem e a desmontagem das

linguagens pretendidas na análise1. Nesse sentido, as categorias da trucagem,

pose, objetos, fotogenia, esteticismo e sintaxe serão aplicadas à forma em que

O Estado de São Paulo e a Folha abordam a campanha política dos candidatos

à Prefeitura de São Paulo em 2012.

A proposta de uma leitura da imagem na imprensa é relevante uma vez

que a imagem tem se convertido, cada vez com mais força, em um elemento

essencial para a configuração dos meios impressos. Semelhante aos textos, as

imagens devem ser analisadas em sua forma – expressão – e seu conteúdo –

significado. O caráter diversificado reconstrói a imagem e os textos com uma

ampla gama de modos de representação e comunicação.

A leitura da imagem discrimina os distintos elementos que conformam a

imagem jornalística no processo de eleições. Por esta razão, as aplicações das

categorias da mensagem conotada se transferem ao corpus do trabalho que

contempla o período entre 1º de agosto a 31 de outubro de 2012 nos jornais

Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo.

1 Dados biográficos relevantes sobre Roland Barthes podem ser encontrados no livro Roland Barthes –

uma biografia intelectual (2011), de Leda Tenório da Motta. Neste trabalho favorecem-se aspectos teóricos e metodológicos em detrimento do percurso vital do autor, assinalado pela autora, que ressalta a imbricagem dessa trajetória com o conjunto e a atualidade da obra do crítico francês, sobretudo em mitologias.

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1.1. Mitologias do entorno social e o processo fotográfico

Barthes é um desmitificador de imaginários e oferece novas formas de

ver o mundo. Na década de 1950, lançou sua obra-prima Mitologias, coletânea

que reúne uma série de artigos publicados em jornais e revistas que falam dos

mitos do cotidiano social. Suas mitologias continuam em evidência na

contemporaneidade no que se refere aos temas abordados pela mídia no seu

afã de discutir questões da esfera pública.

Para o semiólogo, o mito é uma forma de fala, despolitizada e produzida

pela conotação. Trata-se de uma distorção, deformação da realidade ou

ideologia. O mito, neste sentido, não nega as coisas, apenas as torna

inocentes, oferecendo-lhes uma significação natural e eterna, com a mediação

de seu caráter imperativo. O mito não se define pelo objeto de sua mensagem,

mas por sua forma2. Pode ser pronunciado através de várias representações

de um fato, de um anúncio, de uma reportagem, ou de uma fotografia

jornalística, entre outras. Usa mensagens factuais, denotativas, mas explora

acima de tudo a conotação.

Barthes sustenta que a função do mito na mídia é a neutralização e

eternização da sociedade burguesa, transformando uma contingência histórica

em transcendente. Estudou a mídia, relacionando-a com o contexto social e

cultural. Concebeu que o signo deve ser estudado tanto na língua quanto na

fala, isto é, através de uma semiologia ativa que se preocupa com o afazer

cotidiano3. O signo é então relativo e histórico, não uma verdade absoluta.

Deste modo, Barthes rompe com Saussure e vai para um estruturalismo

2 O próprio autor é categórico ao afirma que: «a noção de mito pareceu-me desde logo designar estas

falsas evidências... o mito é uma linguagem» (p. 7). E como tal, insere-se na abordagem estruturalista, sendo fiel ao legado de Ferdinand Saussure que prefigurou o projeto semiológico na continuidade que Barthes deu ao mesmo.

3 Tal projeto de uma semiologia sobre o mito favorece a fala, o autor o explica dizendo: « ...é da língua

de que o mito se serve para construir o seu próprio sistema; e o próprio mito, a que chamarei metalinguagem, por que é uma segunda língua, na qual se fala da primeira» (p. 137). Assim, Barthes reforça o dito na nota anterior.

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dialético, uma percepção que relaciona o signo com seu contexto sócio-

histórico: o translinguístico que interessa ao autor4.

Certamente, a mídia foi objeto invariável em seus estudos,

considerando-a como ponto de partida e chegada, aplicou categorias

originalmente constituídas para sua compreensão. A fundamentação inter e

transdisciplinar das categorias barthesianas permite aplicá-las à análise das

mídias e seus produtos, aliada ao campo teórico e prático, descobrindo o poder

da forma e a invariância estrutural. Nisto reside o interesse deste trabalho que

toma o mito da política eleitoral como um acontecimento histórico presente na

trivialidade do dia a dia para desmitificar a forma através da qual a mídia

impressa lida com este tipo de situação.

Em Mitologias, Barthes reúne cinquenta breves artigos publicados na

revista mensal Letters Nouvelles a partir de 1952. Neste livro, o autor

desmitifica a cultura social, deixando de lado a crítica literária para ser um

crítico da sociologia espontânea. Isto o demonstra ao destruir fetiches da

burguesia francesa dos anos cinquenta. Passa a analisar o mito como um

sistema semiológico e penetra no campo reservado à ciência, com base em

assuntos do cotidiano e com o princípio de realizar por um lado, uma crítica

ideológica da linguagem da cultura de massas e por outro, uma desmontagem

dessa linguagem que se dá por meio da análise.

Barthes consegue decodificar os mitos em que se consideram inúmeros

aspectos de uma realidade mascarada pela imprensa, o cinema, a arte e pelos

demais veículos de comunicação, sempre a serviço dos intesses ideológicos.

A obra citada está dividida em duas partes: a primeira «mitologias» é

constituída por ensaios nos quais Barthes posiciona-se como um

desmitificador, buscando tratar da significação dos mitos contemporâneos,

explorando cenas da vida cotidiana francesa. Na segunda parte «o mito é uma

fala» (BARTHES, 2006: p. 199) trata-se o mito como um sistema semiológico,

4 Sobre essa inovação do estruturalismo dialético, Barthes afirmar: «é preciso não esquecer que,

contrariamente ao que sucede na linguagem comum, que me diz simplesmente que o significante exprime o significado, devem-se considerar em todo o sistema semiológico não apenas dois, mas três termos diferentes...temos, portanto, o SIGNIFICADO, o SIGNIFICANTE e o SIGNO, que é o total associativo dos dois primeiros termos» (p. 134-135).

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isto é, revestido da capacidade de analisar a forma e o conteúdo, sendo este

último o conceito que possibilita as relações entre a natureza e a história.

Assim, nesta dissertação alguns desses ensaios são considerados como

procedimentos de análise e, a segunda parte, como a fundamentação teórica e

metodológica da análise.

Deste modo, o mito define-se também como um sistema de

comunicação historicamente determinado, uma fala que não se define pelo

objeto de suas mensagens, mas pela maneira como esse discurso é proferido.

Perante suas limitações formais, impõe-se a subjetividade como intenção

comunicativa universal.

O mito como sistema semiológico é caracterizado como a ciência das

formas, haja vista que estuda as significações, independente de seu conteúdo.

Barthes enfatiza que a fala mítica é formada por uma matéria que visa uma

comunicação apropriada, situando o mito em uma relação de dependência de

uma ciência geral dos signos proveniente e extensiva à linguística. A

semiologia é a ciência das formas, explorando o fato que define o mito como

um valor de equivalência. No sistema semiológico existem três conceitos

diferentes: significante, significado e signo5. Este último é pleno e cheio de

sentido graças à imbricagem dos primeiros. Esta equação é repensada a partir

do próprio projeto de Barthes em relação à mensagem fotográfica.

Barthes é herdeiro do sistema semiológico intuído por Ferdinand de

Saussure, que estudou um sistema específico: a língua e, nesse sistema, o

significado equivale ao conceito, o significante a sua imagem acústica e o signo

que estabelece a relação entre o conceito e a imagem podendo chegar ao

sentido da mensagem.

No texto «O mito, hoje», vem à tona o aporte de Sigmund Freud (1856-

1939) que nos seus estudos sobre o psiquismo –«inconsciente» – um

termo/conceito é constituído pelo «sentido manifesto» do comportamento e o

5 A equivalência do mito com o sistema semiológico aparece em Barthes quando este diz: «... o mito é

um sistema particular, visto que ele se constrói a partir de uma cadeia semiológica que existe já antes dele: é um sistema semiológico segundo. O que é signo no primeiro sistema, transforma-se em simples significante no segundo» (p. 136).

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«sentido latente» ou próprio do sonho. O terceiro termo refere-se à correlação

dos dois primeiros: o próprio sonho na sua totalidade, atos falhos ou as

neuroses entendidas como compromissos e economias, realizadas graças à

junção da forma –significante –, e de sua função intencional – significado.

Nesse sentido, o sonho de Freud não é apenas um conteúdo manifesto nem

um conteúdo latente, mas a relação entre ambos (BARTHES, 2006: p. 204). A

equivalência dos termos usados por Freud com a teoria do mito de Barthes

resultam interessantes, sobretudo, para entender que o conteúdo latente é o

que precisa ser relacionado com o manifesto da fala para entender a

mensagem na sua totalidade6.

Tanto em Saussure quanto em Freud a mensagem é o resultado da

exploração do nível icônico e indicial na semiótica peirciana, aos quais Barthes

dá o nome de denotação e conotação 7 . Observa-se igualmente que o

semiólogo francês colhe do primeiro o sentido estrutural do signo e do segundo

suas equivalências. Certamente, Barthes faz extensivo seu método semiológico

com ênfase no referente, isto é, na realidade na qual o signo está inserido,

sendo este o ponto original e nodal no qual o autor constroi sua teoria da

mensagem conotada (IDEM, p.210).

De Jean Paul Sartre, Barthes destaca uma crítica na qual o significado

se assenta na crise original do sujeito – usando como exemplo a separação da

mãe com Baudelaire: poeta, flâneur e teórico da arte francesa –; na literatura

como discurso, em que forma ou significante estabelecem a dualidade

6 A partir de Mitologias, Barthes reforça o caráter imbricante da mensagem: «sabemos agora que o

significante pode ser encarado, no mito, sob dois pontos de vista: como termo final do sistema linguístico, ou como termo inicial do sistema mítico. Precisamos, portanto, de dois nomes: no plano da língua, isto é, como termo final do primeiro sistema, chamarei ao significante – SENTIDO... no plano do mito, chamar-lhe-ei – FORMA. Quanto ao significado, não há ambiguidade possível: continuaremos a chamar-lhe conceito. O terceiro termo é a correlação dos dois primeiros: no sistema da língua é o signo; mas não se pode retomar esta palavra sem ambiguidade, visto que, no mito (e isto constitui a sua particularidade principal) o significante já é formado pelos signos da língua. Chamarei ao terceiro termo do mito, SIGNIFICAÇÃO... porque o mito tem efetivamente uma dupla função: designa e notifica, faz compreender e impõe» (p. 138-139).

7 Deste modo, a relação que une o conceito do mito ao sentido é essencialmente uma relação de

deformação... para Freud, o sentido latente do comportamento deforma o sentido manifesto, assim, no mito, o conceito deforma o sentido. Naturalmente, esta deformação só é possível porque a forma do mito já é constituída por um sentido linguístico» (p. 143). Nesse sentido, Barthes encontra no método psicanalítico freudiano uma correspondência entre o conteúdo manifesto do sonho, isto é, o relato do mesmo e o conteúdo latente que corresponde à interpretação que sugere o analista na exploração das produções do inconsciente.

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simétrica e arbitrária do signo que, por sua vez, também se instaura em outra

crise -a do discurso que define a obra, gerando significação. Por esta razão, o

projeto semiológico responde a um esquema tridimensional da forma, mas não

funciona sempre do mesmo modo, seu campo é a linguagem, portanto, está

sujeita à leitura e ao deciframento nesse sentido8.

Assim, o mito responde ao esquema tridimensional básico: significante,

significado e signo. Havendo um sistema semiológico secundário em que o

signo corresponde à totalidade associativa de um conceito e de uma imagem

no primeiro sistema da língua, transformando-se em significante no segundo

sistema. As matérias-primas da fala mítica às quais Barthes faz referência – a

língua propriamente dita, fotografia, pintura, cartaz, rito, objeto, entre outras –,

por mais diferentes que sejam inicialmente, do momento em que são captadas

pelo mito reduzem-se a uma função significante: o mito vê nela uma mesma

matéria-prima; sua unidade provém do fato de serem todas reduzidas ao

simples estatuto de linguagem objeto.

Para chegar a isto, o mito incorpora dois sistemas semiológicos, um

deslocado em relação ao outro. No primeiro sistema linguístico, a língua –

linguagem/objeto – o mito utiliza a linguagem para construir seu sistema. Trata-

se de uma metalinguagem porque é uma segunda língua que fala da primeira.

Em decorrência disto, Barthes sinaliza que o semiólogo deve tratar da mesma

maneira a escrita e imagem, considerando que ambas são signos para

alcançar o limiar do mito ao possuir a mesma função significante, a linguagem

do objeto representado (BARTHES, 2006: p. 206).

O significante no mito é o termo final do sistema linguístico ou como

termo final do sistema mítico. No plano da língua, termo final do primeiro

sistema. O significado é nomeado como conceito, em ambos os sistemas, já o

8 O esquema tridimensional da forma em Barthes supõe a «crise do sujeito», apontada por Sartre na

seguinte citação de Mitologias: «Mas o ponto capital em tudo isto é que a forma não suprime o sentido,

empobrece-o apenas, afasta-o, conservando-o à sua disposição. Cremos que o sentido vai morrer, mas é uma morte suspensa: o sentido perde o seu valor, mas conserva a vida, que vai alimentar a forma do mito. O sentido passa a ser para a forma como uma reserva instantânea de história, como uma riqueza submissa, que é possível aproximar e afastar numa espécie de alternância rápida: é necessário que a cada momento a forma possa reencontrar raízes no sentido, e aí se alimentar... jogo de esconde-esconde entre o sentido e a forma que define o mito. A forma do mito não é um símbolo... é uma presença emprestada» (p. 140).

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terceiro termo, a correlação dos dois primeiros: no sistema da língua é

chamado de signo e, no mito de significação, porque «o mito tem efetivamente

uma dupla função: designa e notifica, faz compreender e impõe» (BARTHES,

2006: p. 208).

Em «forma e conceito», o significante no mito apresenta

simultaneamente o sentido e a forma, pleno de um lado, vazio do outro. A

forma, diz Barthes, não suprime o sentido, o conservado à sua disposição. O

sentido teria a morte suspensa, conservando-se vivo no mito. A forma do mito

não é simbólica, pois, segundo Barthes, retomando o exemplo do negro da

capa da Paris Match, não é cumplice do conceito de imperialismo francês e se

constitui como uma presença emprestada através do conceito, uma história

nova e incorporada no mito.

Por isto, a principal característica do conceito de mito é ser apropriado,

pois permite que uma história nova seja incorporada no mito9. O conceito

corresponde a uma função precisa e define-se como tendência, já que um

significado pode ter vários significantes; como no exemplo anterior, é possível

encontrar muitas imagens que representem ou signifiquem o imperialismo

francês. O conceito, deste modo, é qualitativamente mais pobre do que o

significante - limita-se com frequência a reapresentar ou reapresentar-se.

No final de «forma e o conceito», Barthes reafirma que o conceito é um

elemento constituinte do mito e o trabalho do analista consiste em nomear

esses conceitos10.

Do item «a significação», o autor disse que esta é própria do mito, ele

não esconde nada e tem a função de deformar. Tal deformação é possível

porque a forma do mito é constituída por um sentido linguístico. No primeiro

sistema, o da língua, o significado não pode deformar nada, porque o

significante, como já dito, é vazio, arbitrário, não oferece resistência nenhuma.

9 «Sabemos que o mito é uma fala definida pela sua intenção, muito mais do que pela sua literalidade»

(p. 145). A atualidade do mito parece ser uma preocupação constante de Barthes que propõe a desmitificação de certos hábitos pelos meios de comunicação social.

10 Trata-se justamente de uma alusão direta ao trabalho crítico para o qual: «... tudo se passa como se a

imagem provocasse naturalmente o conceito, como se o significante criasse o significado» (p. 150-151).

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No mito, o significante apresenta duas faces: uma plena, que é o sentido

e, uma vazia, que é a forma. O conceito deforma a face plena, o sentido.

Sendo o mito um valor, uma espécie de álibi. O sentido existe sempre que

apresente uma forma, mesmo que seja para distanciar o sentido. Sendo assim,

o caráter do mito é imperativo e interpelatório, pois surge de um conceito

histórico que vem diretamente da contingência, obrigando-se a acolhida da

ambiguidade expansiva ou motivação.

A significação mítica não chega a ser completamente arbitrária, é

sempre, como já dito, motivada, contendo fatalmente uma analogia do sentido

e da forma. O mito é assim um sistema ideográfico puro no qual as formas são

ainda motivadas pelos conceitos que representam, sem encobrir a totalidade

representativa desse conceito (BARTHES, 2006: p. 118).

Em «Leitura e decifração do mito», a questão da análise fica mais em

evidência, partindo do pressuposto que Barthes propõe três tipos diferentes de

leitura semiológica do mito:

1ª. Focalização no significante vazio – o conceito preenche a forma do

mito sem ambiguidades, a significação volta a ser literal.

2ª. Focalização do significante pleno, distinguindo o sentido da forma,

produzindo a deformação que um provoca no outro, é destruída a significação

do mito. Tal focalização do analista que decifra o mito e compreende a

deformação.

3ª. Focalização do significante do mito, enquanto totalidade de sentido e

forma, a significação é ambígua e ocorre uma leitura de acordo com a dinâmica

própria do mito. A focalização é dinâmica e o leitor vive o mito como uma

história verdadeira e irreal (IDEM, p.220).

Contudo, o mito não é uma mentira nem uma confissão. Trata-se de

uma inflexão imperfectível e indiscutível, o tempo e o saber nada lhe podem

acrescentar ou subtrair. Assim, o mito é lido inocentemente quando não é lido

como um sistema semiológico, mas como um sistema indutivo, isto é, quando

há uma equivalência se lê como processo causal, no qual significante e

significado mantém relações naturais, todo sistema semiológico é, portanto, um

sistema de valores (IDEM, p. 223).

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Por fim, em «Mito como linguagem roubada» destaca-se que a função

específica do mito é de transformar um sentido em forma. A língua, segundo

Barthes, oferece uma fraca resistência ao mito, pois ele pode desenvolver um

segundo esquema, a partir de qualquer sentido ou a partir da própria privação

do sentido. Esta questão do roubo do mito à linguagem demarca a análise a

ser realizada do corpus das campanhas políticas à Prefeitura de São Paulo

como uma conjugação de duas críticas: a ideológica e a semiológica e seus

respectivos métodos (BARTHES, 2006: p. 229).

Em «A burguesia como sociedade anônima», «O mito é uma fala

despolitizada», «O mito, na esquerda», «O mito, na direita» e «Necessidade e

limites da mitologia» justifica-se o método desconstrutivista de Barthes que

reforça a ideia de que o mito nunca está no «grau zero» da língua11.

A ideia básica de Barthes é que o funcionamento da cultura de massas é

análogo à mitologia. Sustenta logo na primeira parte de Mitologias que o

trabalho cultural realizado previamente pelos deuses e as sagas épicas –

ensinar os cidadãos os valores de uma sociedade, proporcionando uma

linguagem comum – o fazem agora as estrelas de cinema, os anúncios

publicitários e os candidatos às eleições que representam ideologicamente o

projeto de um partido político.

Muitas das ideias de Barthes se aplicam poderosamente à cultura

contemporânea como o fizera outrora com a França da pós-guerra. Aí fica, por

exemplo, a análise das fotografias de campanha eleitoral – «Fotogenia

eleitoral», popular ainda hoje – em que os políticos olham à distância: «O olhar

se perde nobremente no futuro, não afronta, domina e fecunda outro domínio»,

o qual se deixa sem definir castamente, trata-se de um além respeituosamente

indefinido (IDEM, p. 164).

Quase todas as fotografias dos chamados «santinhos» de três quartos

de cara são ascencionais, o rosto se eleva para uma luz sobrenatural, que o

11 Para falar de que o mito nunca está no «grau zero da língua», Barthes refere-se a um sistema que

supõe a experiência real da imagem fotográfica que antecede a inserção do texto na sua análise crítica: «...é da língua de que o mito se serve para construir o seu próprio sistema; e o próprio mito, a que chamarei metalinguagem, por que é uma segunda língua, na qual se fala da primeira» (p. 137).

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banha e o transporta à esfera de uma humanidade superior, assim o candidato

alcança o Olímpo dos sentimentos elevados, onde todas as contradições

políticas se resolvem. Isto da fotogenia e da pose se aplica a personagens

públicos tais como o Che Guevara, Obama, o Papa Francisco, entre outros que

têm sua figura representada nas fotografias.

A lição básica de Mitologias é a de que as mídias ultrassignificam

abusivamente seus discursos 12 . Se a cultura do século XXI tem adotado

algumas das lições de Barthes, é o que é a blogosfera a não ser uma caixa de

Petri da semiologia amadora – a descodificação de tudo? Isto sugere, no

entanto, uma das principais diferenças entre os Estados Unidos pós-milenial e

a França dos anos 1950. Barthes escreveu sobre o que se pensava que era a

cultura de massas: um momento em que a relação do cidadão médio com as

imagens mudava rapidamente, quando os textos compartilhados pelas pessoas

comuns foram repentinamente não só religiosos, cívicos ou locais, mas globais:

um conjunto comum de imagens extraídas do entretenimento comercial.

O amanhecer desse tipo de cultura há muito tempo ocorreu. Hoje se vive

pelo menos no final da tarde, possivelmente o ocaso. Internet, como é notória,

chegou e fraturou a base do modelo antigo. Em lugar de simplesmente

absorver passivamente uma série de broadcasts de Planet Mídia, os

consumidores participam diretamente na criação da cultura.

O que está sendo explorado na contemporaneidade não é a cultura de

massa, mas a crítica desse tipo de cultura – a dissecção barthesiana de tudo,

sem importar que tão trivial esta seja. Isto sucede em todas as partes agora,

quase sempre no tempo real. E essa análise crítica é tão vital, interessante e

consumível como a cultura que se discute. Considere-se, por exemplo, a forma

em que a crônica televisiva tem se convertido em uma forma criativa quase

independente. Assim, a análise crítica da cultura popular converteu-se em uma

espécie de cultura pop. Aproxima-se de algum tipo de singularidade: um

colapso da criatividade e da crítica.

12 Barthes mostra o tempo todo preocupação, uma busca pelo sentido último das coisas: «através do

conceito, toda uma história nova é implantada no mito...» (p. 141).

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Um crítico da cultura está, por definição, no meio e entre: não é um

consumidor regular de cultura e, no entanto, é alguém perfeitamente imerso

nela, o suficiente como para apreciar seus mecanismos internos. Barthes

escreveu sobre a cultura de massas, quase sempre, como proscrito radical.

Esta é uma das principais fontes do poder de Mitologias. Ele era uma figura

marginal na cena intelectual francesa, escrevendo em uma revista literária, não

para os consumidores de cultura de massa, mas para outros intelectuais. De

fato, um dos aspectos mais chamativos da obra é o desprezo de Barthes à

pequena burguesia, o público objetivo da cultura que ele dissecava – O

«inimigo fundamental», escreve, é a «norma burguesa» (BARTHES, 2006: p.

233).

Mitologias muitas vezes é um livro agressivo, e o que enfurecia a

Barthes era o «senso comum» que ele identificou como a filosofia da

burguesia, um modo de pensamento que sistematicamente entende que as

coisas complexas são simples, que as coisas desconcertantes são evidentes,

que as coisas locais são universais – em síntese, que as fantasias culturais

compartilhadas por todas as contingências sujas do poder, o dinheiro e as

histórias são, de fato, a ordem natural do universo. O trabalho do crítico, na

opinião de Barthes, não consiste em revelar esses mitos de sentido comum,

mas pronunciá-los como fraudulentos. O crítico tem de seu lado a história, não

a cultura. E a história insiste Barthes «não é um bom burguês».

É difícil imaginar na atualidade muitos críticos posicionando-se fora da

cultura pop na medida em que o Barthes o fez. A cultura de massas tem

crescido e evoluído; tem-se «naturalizado» mais a fundo e, portanto, voltou-se

mais resistente à crítica, inclusive quando floresce a crítica cultural. Essa crítica

vem com muita mais frequência das profundezas da cultura, com a atitude

dominante da aceitação.

Tudo isto formula a questão: a crítica profundiza ou debilita as forças,

fazendo do crítico alguém melhor qualificado para interpretar ou simplesmente

reduz aos analistas a simples jogadores no grande teatro capitalista da cultura

de massa? Mitologias é um livro dedicado inteiramente à cultura pop dos anos

de 1960, surpreendente e relevante na atualidade – contemporaneidade.

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Destas ideias surgidas da obra referencial podem se transpor os

conceitos do autor com o fim de entender sua utilidade para a proposta que

envolve a análise da campanha eleitoral para a Prefeitura de São Paulo em

2012. Na análise da estrutura do mito das eleições, Barthes formula três

conceitos teóricos: significante, significado e signo, dos dois sistemas

semiológicos que compõem esse mito – o linguístico, que define o mito como

uma linguagem, um sistema de comunicação que transmite uma mensagem, e

o mítico contemporâneo que pode ser transportado, em termos estruturais,

para o mundo antigo, bem como para o processo eleitoral13.

Considerando que o significante no mito se encontra no final dos

sistemas linguístico e ao princípio do sistema mítico, formando assim uma

corrente contínua de significação. Para distingui-los Barthes nomeia o

significante linguístico como sentido, e o significante mítico como forma. Ao

significado, em ambos os casos, o denomina conceito e ao signo, em ambos os

casos, significação. Explicando a respeito desta diferenciação das categorias

de análise que propõe a forma em que se relacionam ou combinam pode

mudar a função do sistema. Isto é:

Quando o significante – sentido – pertence ao sistema da língua –

linguagem objeto – o significado é chamado de conceito e o signo

que é resultante da combinação destes dois é chamado de

significação. E quando o significado se encontra no sistema do

mito – metalinguagem –é chamado de forma. Entretanto, a

diferença entre forma e sentido é que, no sentido o significante

tem uma riqueza de informação, é representativo da história, do

contexto; uma memória, uma ordem comparativa de fatos e de

ideias razoáveis que demonstram que o sentido já está construído

sobre a significação, o que lhe permite se sustentar. E na forma o

significante se despoja de todo sentido, de história, de ideias, de

contexto, e só ficam letras por assim dizer, só ficam signos que

bem podem representar algo como as simples pictografias – A, E,

13 Partindo do princípio que se estabelece através da natureza do signo na relação deste com seu referente na realidade, Barthes insiste: «conforme se vê, a significação é o próprio mito, exatamente como o signo saussuriano é a palavra» (p. 143).

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I, O, U – os símbolos como o da cruz, são só captados como uma

simples imagem sem informação a decodificar; são apenas

imagens ou palavras sem sentido útil, o que acontece apesar da

característica do significado que pode ter vários significantes.

Por isso, para que o mito adquira vida, necessita que a forma –

significante no mito – retome o sentido – significante na língua –

da linguagem objeto, para assim ter informação intercambiando o

objetivo pelo subjetivo e o racional e comprovável pelo subliminal.

Isto se consegue ao modificar o enfoque, o contexto e a forma em

que se codifica a mensagem, que em princípio contém informação

lógica, é modificada por outro elemento, mesmo que não seja

mencionado na análise de Barthes. Isto é, o indivíduo, o ser

humano. É este que ao transmitir a informação, como uma

mensagem por meio de qualquer forma de linguagem – oral,

escrita, gestual, entre outras – tem a capacidade de modificá-lo

no momento de expressá-lo ou interpretá-lo, segundo sua própria

concepção ideológica e cultural. É por isto que o mito não possui

a característica – contrário ao que se pode pensar – de ser

perpétuo, isto é, que o mito através do tempo está condenado a

perecer, a se alterar, pois se baseia na história e a história, com

seu processo de evolução e de iluminação no conhecimento, é

que em determinado momento decide sobre o futuro do mito,

qualquer que este seja, decide se desaparece, se transforma ou

continua ou transcende o cenário social.

1.2. A mensagem fotográfica conotada e o entorno de uma campanha

política

Apoiado nos postulados dos modelos clássicos de Lasswell e de

Shannon e Weber, Roland Barthes analisa a fotografia de imprensa partindo da

perspectiva de oferece a configuração da imagem como esquema

comunicativo. Não se limita à análise em bruto da imagem, mas enfatiza

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estudar também o texto que a rodeia. Qualquer imagem pertencente às

páginas de um jornal poderia participar nos modelos citados.

Desenha-se, assim, uma teoria da comunicação baseada na redação do

jornal como emissor, sendo o receptor, o público que lê o jornal. Barthes leva

em consideração, neste sentido, a situação do indivíduo dentro do sistema

social, como se verá mais à frente. O jornal é o canal. Suas características

conformam uma trama complexa de mensagens textuais que rodeiam a

fotografia: títulos, pé da fotografia, etc.; já a mensagem é a fotografia, dividida

em dois planos, conotativo e denotativo. O contexto fica por conta da situação

social do indivíduo, influências cognitivas, ideológicas e perceptivas.

O daguerrótipo, em 19 de agosto de 1839, foi o processo que marcou o

início da fotografia. Este permitiu fixar a imagem da camara obscura pela ação

da própria luz. Cabe mencionar que existiram anteriormente outros

procedimentos que se aproximavam a lograr um registro visual, mas nem

permanente nem transportável.

Passaram-se quarenta anos até que as fotografias se tornassem ato de

presença massiva nas páginas dos livros e jornais, o que ocorreu muito antes

do que o cinema e a televisão fariam da imagem algo cotidiano.

Quando a fotografia inicia sua atividade, um grupo de fotógrafos

britânicos queria que suas obras recebessem o mesmo trato que a arte de seu

tempo. Aspiravam ao reconhecimento popular e ao direito de pendurar suas

fotografias nas exposições ao lado das pinturas entre os anos de 1850 e 1870,

as discussões eram a respeito da decisão se a fotografia era arte ou ciência

(KOSSOY, 2009). Algo parecido à discussão na atualidade sobre se a

fotografia digital é arte ou só um produto resultado dos avanços tecnológicos.

A aparição desses novos avanços tecnológicos, como a câmera portátil

e a película em rolo, ofereceu aos aficcionados a oportunidade de influenciar

cada vez mais o desenvolvimento do processo. Desde então, pode-se presumir

que a fotografia já sofria manipulações como recurso ou meio para comunicar

ou mostrar algo.

Deste modo, originou-se uma obra muito mais interpretativa e naturalista

que forçou o movimento artístico a derivar para o pictorialismo. Durante o

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desenvolvimento deste estilo, na imagem importava menos o conteúdo que seu

atrativo estético.

A harmonia e o equilibrio foram os meios para unificar os elementos da

imagem. Evitaram-se os temas feios e mundanos - o detalhe é frequentemente

substituído pela difusão e manipulação do tom. O pictorialismo fotográfico se

desenvolveu durante os anos de 1880 e finais de 1920. Foi o movimento no

qual os artistas puderam expressar sua personalidade e seu talento. A

tendência geral apontava para um trabalho mais objetivo, ainda não

rigorosamente realista.

Aqui aparece o termo objetivo sob a ideia de pensar a fotografia como

fiel representação da realidade fotografada. Assim o sustenta Roland Barthes

em seu texto sobre «A mensagem fotográfica» (IN: O óbvio e o obtuso, 1990):

«de certo, a imagem não é o real; mas ela é pelo menos seu perfeito analogon,

e é precisamente esta perfeição analógica que, para o senso comum, define a

fotografia». Isto seria já um ponto de partida para pensar que a fotografia em si

mesma não é geradora de conflitos éticos, pois a imagem é desde uma análise

denotativa uma reprodução direta da realidade que parou mediante um

processo físico-químico – ou digital. Mas, cabe aqui pensar, do ponto de vista

conotativo, o que pode provocar como mensagem uma imagem fotografada –

não fotográfica.

A partir de 1920, a fotografia objetiva ou novo realismo rompeu a forma

mais radical com o pictorialismo. Uma série de fotógrafos prestou atenção às

novas tendências da arte moderna e se dedicaram a realizar imagens realistas

e rigorosamente detalhadas. As imagens não haveriam de ter nenhum tipo de

difusão nem ser manipuladas durante sua positivação, porque se tratava

justamente de potenciar suas qualidades fotográficas: riqueza tonal e rigor

extremo na reprodução do detalhe. Estas ideias de a fotografia se tornar um

registro de motivos «corriqueiros» supôs naquela época uma autêntica

revolução – ao parecer a mesma revolução que provoca na atualidade a

crudeza ou transparência de toda e qualquer fotografia.

Muitos foram os estilos fotográficos que se sucederam até os dias de

hoje, o dinamismo, o estruturalismo e simbolismo; o romantismo, o surrealismo,

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entre outros, foram marcados ao longo do tempo: conceitos, técnicas e modos

diferentes de registrar motivos. Mas quem verdadeiramente condiciona e

transforma o motivo fotografado é a mensagem que, desde a própria

subjetividade, pode significar uma imagem. Disse Barthes: «Surge assim o

estatuto particular da imagem fotográfica: é uma mensagem sem código,

proposição de que é necessário extrair imediatamente um corolário importante:

a mensagem fotográfica é uma imagem contínua» (BARTHES, 2009, p.13).

Destes pressupostos sobre a mensagem fotográfica, enunciados por

Barthes, pode-se inferir que o conteúdo dessa mensagem é uma redução da

realidade, que nunca deve ser entendida como uma transformação desta. Não

é a essência em si, não é o real, e sim a analogia perfeita de uma realidade. E

é isso o que perante o senso comum define a fotografia: a imagem fotográfica é

uma mensagem sem código.

Fruto das características próprias do canal, Barthes propõe diferenciar

duas estruturas, a linguística e a fotográfica, que formam um todo coerente.

Apesar da fusão entre texto e fotografia, na hora de analisar a imagem da

imprensa é necessário descompor a mistura em cada um de seus

componentes. Neste sentido, estas constatações levam àquilo que esta

dissertação está formulando: a análise da mídia impressa sob essas duas

categorias da mensagem fotográfica.

Dado que a fotografia se concebe como um elemento que representa a

realidade, parte da mensagem da mesma, e não requer do uso de um código

para processar seu significado. Esta tendência da fotografia de imprensa ser

um reflexo especular da realidade constitui sua característica mais importante:

é a única estrutura informativa de um jornal cujo caráter denotativo está pleno.

Entretanto, é impossível que a imagem seja exclusivamente denotativa:

a objetividade da fotografia é um mito desde o instante em que o fotógrafo

configura a câmera para o clique. Distinguem-se, portanto, dois planos na

mensagem fotográfica: o denotativo – objetivo, não requer código – e o

conotativo – subjetivo. Dito de outro modo: coexistem duas mensagens

fotográficas; uma delas, análoga, pertence ao plano denotativo e se relaciona

com a capacidade de a imagem capturar a realidade; a outra, a mensagem

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retórica que pertence ao plano conotativo e se relaciona com a leitura subjetiva

que realiza o leitor/eleitor, o público de um modo geral.

A conotação da fotografia de imprensa se constrói ao longo de todos os

processos de produção da mesma, e está intimamente relacionada com a

estrutura textual. Embora o plano denotativo da fotografia não requeira do

conhecimento de um código comum entre o fotógrafo e o público, o plano

conotativo não só se baseia em um código cultural, mas é em si mesmo, uma

codificação da imagem.

Trata-se a conotação como uma atividade capaz de integrar o ser

humano, e definir um tipo de sociedade. Codificar uma imagem permite por sua

vez a comprovação mesma do ser como tal e provar uma razão e uma

liberdade. Portanto, o fotojornalismo, desde sua conformação, codifica um

modo de ser e de agir de uma sociedade, estabelece seus próprios limites – e,

quiçá também, os justificam desde sua conotação, provocando reações

opostas, dualidades conscientes ou inconscientes.

Por isso se fala que a fotografia faz de um objeto inerte uma linguagem e

transforma a incultura da arte na mais social das instituições. Dilemas éticos

são gerados desde as instâncias de conotação, já que a fotografia em si

mesma é uma analogia da realidade fotografada, como já dito anteriormente. A

prudência pode ser uma maneira de enfrentar cada instante de significação,

buscando o equilíbrio na ação mesma, além do resultado. A história por trás da

fotografia é algo que não se pode saber apenas olhando a imagem, essa

essência também afeta o conteúdo.

Portanto, qual seria a ética jornalística que está por trás desse

conteúdo?

Barthes assinala em O óbvio e o obtuso seis elementos que intervêm na

mensagem conotativa – tais elementos passam a se chamar de categorias da

mensagem conotativa que servirão à análise dos produtos midiáticos

escolhidos que tratam do mito das eleições. Vejamos algumas imagens dos

jornais:

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1. A trucagem que intervém dentro do plano denotativo, alterando de raiz

o significado da fotografia e aproveitando a credibilidade que esta

oferece como reflexo da realidade.

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2. A pose que se refere às pessoas que aparecem na fotografia e que

influi notavelmente na percepção subjetiva, até o ponto de sugerir

pureza, juventude, cansaço; maldade, corrupção e violência, entre

outras. A interpretação da pose tem um forte arraigo nos estereótipos

sociais.

3. Os objetos, também os objetos que aparecem na fotografia permitem

associar ideias: política/eleições, livros/cultura, bola/esporte,

revólver/violência, mercado/alimentação.

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4. Fotogenia. Segundo o Dicionário teórico e crítico do cinema (2003) de

Jacques Aumont e Michel Marie, a palavra fotogenia apareceu em 1851

para designar os objetos que «produzem» – na realidade, refletem – luz,

suficientemente para impressionar a placa fotográfica. Depois que essa

técnica foi aperfeiçoada pela invenção de emulsões cada vez mais

sensíveis, o termo designa, progressivamente, uma qualidade da

«produção de luz», e dos objetos associados. O objeto fotogênico – na

maioria das vezes, um rosto – é aquele que «sai» bem na fotografia, que

é valorizado por ela, e aparece de uma maneira inesperada,

interessante, poética, encantadora (AUMONT e MARIE, 2003: p. 136). A

beleza que retrata a imagem ou a própria imagem como «suporte»

depende dos mecanismos da tirada e reprodução da mesma –

iluminação, enquadramento, exposição e impressão.

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5. O esteticismo pode ser considerado de maneira ambígua. Quando a

fotografia, por sua composição e tratamento, configura-se como uma

pintura ou quando trata de impor um significado mais sutil ou complexo

daquilo que permitem outros procedimentos de conotação.

6. A sintaxe se dá quando as imagens se apresentam a modo das

histórias em quadrinhos dos comics ou os fotogramas de um filme. As

séries de fotografias fazem com que o significante não se encontre no

nível de cada fragmento – fotograma – mas em nível global.

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Outro ingrediente da mensagem fotográfica na imprensa é o texto, que

rodeia a imagem trazendo à tona vários significados secundários. Pode ser

inclusive uma das técnicas conotativas mencionadas anteriormente. Apesar de

a fotografia jornalística ter sido concebida, em principio, como uma ilustração

da palavra, a imagem tem adquirido protagonismo até o ponto de inverter o

esquema. A imagem nem sempre complementa o texto, mas é o texto que

complementa a imagem. Poderia se dizer que o texto conota a imagem e que,

ao mesmo tempo, a imagem contagia seu plano denotativo ao texto, dando-lhe

objetividade. Existe uma relação parasita entre ambos.

O texto tem, definitivamente, a capacidade de amplificar as conotações

que já estão inclusas na fotografia, acrescentando um novo significado ou

contradizendo a imagem. Este efeito de conotação tem muito a ver com a

apresentação do texto: quanto mais proximidade houver entre o texto e a

imagem, maior será a sensação de conotação. Por exemplo, o efeito de

conotação das legendas é menos evidente que o do grande título do artigo.

Tanto as conotações, que têm origem na captura da imagem, como

aquelas acrescentadas pelo texto que a rodeia têm sua origem: nas

concepções culturais do público – leitor do jornal e eleitor no processo de

eleições –, na bagagem histórica que tem configurado seus conhecimentos e

ideologias e, em definitivo, em sua percepção.

Pode-se distinguir a conotação perceptiva - fruto do próprio mecanismo

de percepção - da conotação cognitiva, que depende do conhecimento do

indivíduo; e conotação ideológica ou ética que introduz razões ou valores à

leitura da imagem. A respeito da conotação cognitiva, cabe destacar a citação

de Barthes: «é provável que uma boa fotografia de imprensa – e elas são

todas, pois são selecionadas – jogue facilmente com o suposto saber dos seus

leitores, escolhendo as cópias que comportem a maior quantidade possível de

informação desse gênero de maneira a euforizar a leitura, ao se fotografar»

(BARTHES, 2001). A fotografia de um modo geral deve também cumprir todos

os rigores da ética jornalística em relação a sua veracidade, precisão e

objetividade.

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Enfim, a fotografia de imprensa – Folha e Estado de SP – oferece duas

mensagens – ou planos –: o denotativo e o conotativo. Este último depende do

próprio mecanismo de produção da fotografia e de sua relação com o texto,

ambos os aspectos influenciados pelo contexto sociocultural do fotógrafo – ou

da redação – e do receptor – leitor/eleitor.

O fotógrafo capta um momento que já foi, registrou esse instante

decisivo, assim se refere Henri Cartier-Bresson no artigo «O momento

decisivo» (1952). Bresson fala do momento que é fotografado como o momento

que morreu. A relevância desse instante cobra sentidos diferentes segundo

públicos diferentes, mas verdadeiramente o momento foi «único e que jamais

se repetirá», talvez o fotógrafo seja o único capaz de compreendê-lo.

Retomando Barthes: «a conotação proveniente do saber é sempre uma

força tranquilizadora: o ser humano gosta de signos, e gosta que estes sejam

claros». O problema da conotação ideológica – no sentido lato do termo – ou

ética, introduz na leitura da imagem razões e valores. Trata-se de uma

conotação forte, pois exige um significante muito bem elaborado, quase

sintático: encontro de personagens, desenvolvimento de atitudes, constelação

de objetos. Poderia então se imaginar uma sorte de lei: quanto mais direto é

um trauma, tanto mais difícil a conotação; ou o efeito de uma fotografia é

inversamente proporcional a seu efeito traumático.

Por conseguinte, a aplicabilidade desses princípios teóricos e

metodológicos da «mensagem fotográfica» como objeto de estudo reforça a

ideia de que dentro dos elementos não linguísticos dão forma aos meios de

comunicação; em especial para a Folha de São Paulo e O Estado de São

Paulo a imagem fotográfica ocupa um lugar de destaque.

No jornalismo contemporâneo é de vital transcedência a imagem que

cumpre um papel informativo, pois transmite aspectos de um fato noticiável,

como são as eleições para a Prefeitura de São Paulo. Sendo assim, o material

coletado para efeitos deste trabalho contempla a própria capa de cada um

desses jornais e as fotografias do interior dos cadernos especiais dedicados às

eleições. Trata-se de um material gráfico como desenhos – ilustrações,

retratos, caricaturas, vinhetas, HQ’s – ou fotografias.

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No entanto, esses procedimentos só fazem sentido na medida em que

se trabalhe o contexto no qual as significações se reconhecem. Como o próprio

Barthes faz ao caracterizar em Mitologias o âmbito político do processo

eleitoral em um ou vários de seus ensaios. Em «Fotogenia eleitoral» referem-

se às práticas corriqueiras dos «santinhos», retratos eleitorais nos quais a

fotografia tem um poder transformador, neles a chamada esfígie do candidato –

imagem – estabelece um elo entre ele e seus eleitores. As mídias noticiam os

programas de governo de cada um deles, mas também reconstroem o clima

físico e psicológico do itinerário em que, segundo o autor, se expressa uma

morfologia nos modos de sentir, pensar e agir. Nesse sentido, a fotografia

restabelece um fundo paternalista. Certamente, por conta da liderança como

modelo a seguir.

Na medida em que a fotografia é uma elípse da linguagem e de uma

condensação de todo esse contexto social e político no qual afloram uma série

de problemas a serem solucionados. Por isso, os candidatos apelam ao

individualismo no sentido de oferecer a seus eleitores um estatuto social e

moral, colocando-se como o melhor exemplo a ser seguido. Assim, o ensaio

também sugere a reflexão extensiva ao posicionamento coletivo em relação à

política e às motivações que dependem de todas as circunstâncias mentais,

eróticas, familiares e de bem-estar. Desta forma, o candidato põe-se como

exemplo: produto e isca. A imagem converte-se em um espelho familiar e

conhecido que encarna valores de um idealismo social e de um empirismo

burguês capaz de produzir efeitos de sentido, sobretudo, a respeito da moral,

apelando à família, à pátria, à honra e ao combate contra as ameaças daqueles

que representam o outro partido.

Um ato social como as eleições para a Prefeitura de São Paulo instala

no público leitor/eleitor certos critérios que determinam condutas e

comportamentos. A comunicação é um ato social, tal como o manifesta Jürgen

Habermas em «A ética comunicativa» (IN: Teoria do agir comunicativo, 2012):

em toda comunicação se pressupõem as bases de um comportamento justo e

correto. Nessa obra, o filósofo alemão, que fez parte do grupo de pensadores –

críticos – da Escola de Frankfurt, discute três áreas temáticas: o conceito de

racionalidade comunicativa; uma concepção de sociedade em dois níveis,

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capaz de amarrar o paradigma da ação e do sistema; e uma abordagem

teórica, que tenta explicar os paradoxos da modernidade subordinando o

mundo da vida, já estruturado do ponto de vista comunicativo. No que se refere

à ética do discurso, aplicável às mídias impressas, Habermas fala do

desdobramento de sua produção teórica, associada ao discurso libertador

dentro de um processo de emancipação política.

Já que a fotografia é um meio ou linguagem enquanto comunicativa, seja

por analogia ou de modo referencial sobre algo, incide como ato que provoca

no público leitor/eleitor uma reação. A imagem é produto da cultura,

consequentemente a constitui, e como tal tem certa função reguladora sobre os

modos de convivência. Se a fotografia é linguagem, a linguagem é uma

condição de convivência.

Para que haja convivência deve existir responsabilidade como valor

primário e consciente, e só a prudência possibilita ter sentido dos limites

daquilo que está permitido fazer.

Agir com responsabilidade e prudência permite resolver problemas

morais; essa capacidade se vê resguardada por normas socialmente mutáveis,

enquanto o processo moral se conforma desde fora das leis, princípios,

critérios que constroem uma trama própria do processo eleitoral. Aí se localiza

também a fotografia, como um emaranhado de realidades configuradas de

maneira objetiva, mas desenhadas subjetivamente.

As mídias que «usam» a imagem fotográfica deveriam medir os limites

em suas formas de expressar e evidenciar representações ou são os

leitores/eleitores os que estabelecem seus próprios níveis de análise –

denotado e conotado – sem fixar prudência e responsabilidade que marquem

limites justos? Respeitar a dignidade humana – a própria e a alheia – seria o

valor ético que delimite a consciência moral dos eleitores?

A análise do corpus neste trabalho mostra a «mensagem fotográfica»

com hipotéticas epígrafes que complementam a imagem, mas que análise faz o

leitor/eleitor de cada imagem? Mais ainda: que análise fará quando

posteriormente continue observando as mesmas imagens com textos

diferentes? E as mídias escolhidas fotografam com responsabilidade e

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prudência uma realidade construída segundo a memória e princípios

individuais? A Folha e O Estado de São Paulo poderiam significar uma

fotografia descontextualizando seu momento trans-histórico que a produz?

Pode-se desvincular a própria fotografia de sua intenção comunicativa real ou

imaginada? Pode-se pensar a «mensagem fotográfica» desde uma consciência

moral enquanto reflete o paradoxo da ética?

Na busca de respostas a estas indagações, apresenta-se no item a

seguir o contexto sócio-histórico que permite localizar e posicionar a

«mensagem fotográfica» como imagem, para logo focalizar o protagonismo

ideológico e a função social da fotografia como texto cultural gerador de

significações e conflitos institucionalizantes.

A cidade de São Paulo não é só considerada um centro nevrálgico da

atividade econômica do Brasil, mas também um eixo urbanístico

contemporâneo da informação e da comunicação. Por este motivo, as eleições

políticas converteram-se em um chamaris para analistas destes campos do

conhecimento. Trata-se de um processo de toma de decisões nas quais os

eleitores escolhem com um voto àquele que, neste caso, ocupará a Prefeitura

da cidade na chamada democracia representativa.

O mecanismo habitual de participação política dos cidadões na

democracia liberal são as instituições chamadas partidos políticos. Ainda

existem outros mecanismos para a representação de candidaturas eleitorais –

coalizões eleitorais, agrupamentos de eleitores, entre outras. Esse jogo político

configurou o cenário no qual esse processo das «eleições» se deu na cidade

de São Paulo no ano de 2012.

Contudo, vale destacar que o contexto midiático aparece como o único

fator capaz de articular críticas ao poder público, convertendo-se em ataques

ao governo. Isto é, quando falham as estruturas de mediação entre os cidadãos

e o sistema político, passa-se à midiatização destas relações. Mas, este estudo

examina a forma como a mídia impressa – Folha e O Estado de São Paulo –

noticia o processo eleitoral, deixando latente na «mensagem fotográfica» mitos

que por sua natureza ideológica precisam ser interpretados.

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1.3. A campanha política para prefeitura da cidade de São Paulo em

2012

«A 25 de Janeiro do Ano do Senhor de 1554

celebramos, em paupérrima e estreitíssima casinha, a

primeira missa, no dia da conversão do Apóstolo São

Paulo e, por isso, a ele dedicamos nossa casa!»

Pe. José de Anchieta14

A povoação de São Paulo de

Piratininga – hoje mais

conhecida como «terra da

garoa», «Sampa» ou

simplesmente São Paulo, se

estabelece em 25 de janeiro de

1554 com a construção de um

colégio jesuíta, cujo propósito era

catequizar os índios que viviam

na região, no alto de uma colina

íngreme, entre os

rios Anhangabaú e Tamanduateí.

Capital do Estado de São Paulo,

a cidade na atualidade está entre

as mais globalizadas do mundo,

além de ser considerada a mais populosa de todo hemisfério sul americano.

Desde as suas origens, a cidade esteve ligada ao apóstolo padroeiro das

comunicações e tanto seu desenvolvimento quanto a sua projeção a situam

entre as grandes metrópolis do mundo contemporâneo.

Um dos maiores produtores e exportadores de café do final do século

XIX e começo do século XX, São Paulo foi fortemente afetada pela Primeira e

pela Segunda Guerra Mundial, e pela Depressão de 1929. No período colonial, 14

Informação obtida no site da Paróquia e Santuário Nacional Nossa Senhora do Loreto. Página (http://www.loreto.org.br/anchieta-o-apostolo-do-brasil/) acessada em julho de 2014.

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São Paulo ainda era uma cidade em construção, dependente econômica,

política e socialmente de Portugal. Já no período republicano, vivia seu auge

político e uma maturidade organizacional que lhe garantiam destaque no

cenário nacional e internacional, seja pelo seu desenvolvimento econômico que

lhe garantia lugar de destaque mundial no cultivo do café, seja pelo

desenvolvimento urbano.

A Primeira Guerra Mundial (que teve início em 1914 e durou até 1918) e

a Segunda Grande Guerra (que durou de 1939 a 1945) trouxeram uma série de

limitações políticas e de ordem econômica para o Brasil. Politicamente, o país

buscava ampliar seu prestígio junto ao EUA e reforçar suas alianças políticas

interna e externamente.

Em 24 de outubro de 1929 teve início a recessão econômica mundial,

com a queda da Bolsa de Valores de Nova Iorque, que culminou em altas taxas

de desemprego e diminuição do PIB (Produto Interno Bruto) não só nos EUA,

mas em vários países. Em função disso, os Estados Unidos, que era o maior

comprador de café do Brasil, deixaram de comprar este produto, e o seu preço

caiu no mercado mundial, causando uma crise econômica no país. Diante

dessa crise cafeeira, vários empresários investiram na industrialização da

economia. Tais acontecimentos forçaram os «senhores do café» a abandonar a

cafeicultura e investir na industrialização da cidade, tornando São Paulo o

maior centro industrial brasileiro – o que atrairia para cidade, migrantes de todo

o Brasil – notadamente do Nordeste – e imigrantes de todo o mundo. Nesse

sentido, São Paulo transformou-se em uma capital cosmopolita, onde vivem

pessoas de várias partes do mundo.

Outro período de grande importância política e social foi o da ditadura

militar no Brasil (1964-1985). Este período fez da cidade de São Paulo um

lugar ainda mais destacado no âmbito político nacional. Várias manifestações e

movimentos surgiram a partir dos anseios por mudança de uma população que

já se sentia sufocada em seus direitos civis.

Ao todo são 1.522,986 km2 que abrigam uma população atual de cerca

de 20 milhões de habitantes na cidade brasileira mais influente do cenário

global atual. É considerada a sétima cidade mais populosa do mundo, e uma

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das mais importantes do ponto de vista cultural, econômico e político. Não por

acaso, o lema da cidade de São Paulo, presente no seu brasão é a frase latina

Non ducor, duco - que significa «Não sou conduzido, conduzo».

A importância do município é tanta que sedia 63% dos grupos

internacionais instalados no país e 17 dos 20 maiores bancos de comércio. Um

dos grandes centros financeiros do Brasil e do mundo, a cidade sempre

despertou o interesse econômico e político de vários segmentos.

O aspecto cultural também faz São Paulo se destacar no cenário

nacional e sulamericano. A cidade abriga centros culturais como o Museu de

Arte de São Paulo – MASP –, Teatro Municipal de São Paulo, Museu da Língua

Portuguesa, Museu de Arte Sacra, e Museu do Ipiranga, só para citar alguns15.

Esta cidade foi palco de diversos movimentos artísticos extremamente

relevantes para a história do Brasil. O «movimento modernista brasileiro», por

exemplo, que se consagra com a Semana de Arte Moderna de 1922,

apresentou nomes como Mário de Andrade e Oswald de Andrade para o

mundo.

Também considerada um dos principais centros de comunicação do

Brasil e da América Latina, São Paulo é sede de grandes grupos de

comunicação nas áreas de televisão, rádio, jornalismo impresso, publicidade,

entre outros. Na área impressa, a cidade abriga dois dos principais e mais

influentes jornais diários do país: a Folha de São Paulo, e O Estado de São

Paulo.

Desta forma, tanto O Estado de São Paulo quanto a Folha de São Paulo

são mídias impressas que representam dois posicionamentos ideológicos

diferentes no contexto da cultura de massas no Brasil, de um modo geral, e da

cidade de São Paulo em particular. Por isso mesmo o objeto desta pesquisa é

o estudo da mensagem fotográfica da campanha política para prefeitura de São

Paulo a partir das imagens publicadas nos referidos jornais entre 1º de agosto

e 31º de outubro de 2012, sendo este o corpus de análise.

15

Várias informações foram obtidas a partir do site da própria prefeitura da cidade de São Paulo (http://www.capital.sp.gov.br/portal/) acessado em 09 de julho de 2014.

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1.3.1. A Folha de São Paulo

«A história da Folha começa em 1921, com a criação do jornal Folha da

Noite». Em julho de 1925 é criado o jornal “Folha da Manhã”, edição matutina

da Folha da Noite. A Folha da Tarde é fundada após 24 anos. Em 1º de janeiro

de 1960, os três títulos da empresa se fundem e surge o jornal “Folha de São

Paulo”. É assim que a página deste jornal apresenta sua história16.

Foi um grupo de jornalistas, liderados por Olival Costa e Pedro Cunha,

que fundou em 19 de fevereiro de 1921 a Folha. O jornal tinha como proposta

editorial textos mais curtos e claros, com enfoque mais noticioso e menos

opinativo, com agilidade e proximidade com os assuntos cotidianos dos

trabalhadores urbanos. A “Folha” surgira em oposição ao principal jornal da

cidade: “O Estado de São Paulo”.

1.3.2. O Estado de São Paulo

Representante das elites rurais e de posição mais conservadora e

tradicional, “O Estadão”, como é conhecido o jornal O Estado de São Paulo, foi

fundado com base nos ideais de um grupo de republicanos em 04 de janeiro de

1875, e com o nome de A Província de São Paulo – usado até 31 de dezembro

de 1889, um mês após a instituição da República no Brasil.

O jornal foi o pioneiro em venda avulsa no país – fato que era motivo de

chacota pela concorrência naquela época. O mais curioso é que a venda

avulsa foi impulsionada pelo imigrante francês Bernard Gregoire que, montado

16

A Folha de São Paulo. Página (http://www1.folha.uol.com.br/folha/circulo/historia_folha.htm) Visitada em 20 de julho de 2014.

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a cavalo, saía às ruas tocando uma corneta para chamar a atenção do público

— e que, décadas depois, viraria o próprio símbolo do jornal, como se pode ver

até hoje.

Politicamente, ambos os jornais sempre foram bastante ativos. O Estado

de São Paulo, por exemplo, declarou em seu editorial do dia 25 de setembro de

2010, intitulado – O mal a evitar –, o apoio ao candidato à Presidência da

República José Serra, afirmando que o candidato é «o que tem melhor

possibilidade de evitar um grande mal para o País», e criticou o então

presidente Lula pelas suas acusações de que a imprensa brasileira estaria se

comportando «como um partido político», bem como pela «escandalosa

deterioração moral» de seu governo17.

Num levantamento realizado pelo portal “Brasil de Fato” sobre o

comportamento dos três jornais de maior circulação no Brasil – “O Estado de

São Paulo”, “O Globo” e “Folha de São Paulo” foi feito a partir das manchetes

de primeira página publicadas por estes jornais sobre a campanha de Dilma

Rousseff, entre os dias 28 de agosto e 27 de setembro de 201018.

Nesses trinta dias, O Estado de São Paulo produziu 22 capas negativas

à candidata petista. No mesmo período, o jornal trouxe somente uma capa com

manchete positiva – «Inquérito da PF esvazia tese de crime político na receita»

- no dia 16. Também houve três manchetes consideradas neutras e quatro

abordando assuntos não ligados às eleições.

1.3.3. As eleições para prefeitura de São Paulo em 2012

De acordo com as informações disponíveis no site do Tribunal Superior

Eleitoral – TSE –, a eleição para prefeitura da cidade de São Paulo ocorreu em

7 de outubro: vereadores e 1º turno para prefeito, e em 28 de outubro: 2º turno

para prefeito, tendo sido eleito o candidato do Partido dos Trabalhadores –PT –

, Fernando Haddad, com 55,57% dos votos válidos.

17 Editorial: O mal a evitar. Em O Estado de São Paulo, de 25 de setembro de 2010. Página visitada em 20 de julho de 2014. 18 Brasil de Fato. Página (http://www.brasildefato.com.br/node/3320) visitada em 10 de julho de 2014.

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Ao todo, concorreram à prefeitura de São Paulo 12 candidatos: Ana

Luiza – PSTU, Anaí Caproni – PCO, Carlos Giannazi – PSOL, Celso

Russomanno – PRB, Eymael – PSDC, Fernando Haddad – PT, Gabriel Chalita

– PMDB, José Serra – PSDB, Levy Fidelix – PRTB, Miguel – PPL, Paulinho da

Força – PDT, e Soninha – PPS.

Os candidatos foram escolhidos após convenção de seus partidos, que

decidiram quem sairia candidato na disputa da prefeitura mais cobiçada do

Brasil, disputando o voto dos mais de 20 milhões de eleitores, de acordo com o

último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.

Gabriel Chalita, então deputado federal, teve sua candidatura anunciada

em 24 de junho de 2012, pela coligação do Partido do Movimento Democrático

Brasileiro – PMDB – com o Partido Social Cristão – PSC –, Partido Trabalhista

Cristão – PTC – e Partido Social Liberal – PSL19.

José Serra anuncia oficialmente sua candidatura em 25 de março,

quando vence as prévias do Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB –,

com 52% dos votos válidos. O partido firmou coligação com o Partido Social

19 Site do candidato http://www.chalita.com.br/, Acessado em 1º.de junho de 2014.

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Democrático – PSD –, Democratas – DEM –, Partido da República – PR –, e

Partido Verde – PV20.

Fernando Haddad, então Ministro da Educação, é indicado pelo Partido

dos Trabalhadores – PT – por consenso, haja vista o apoio direto que recebeu

da presidente da República, Dilma Rousseff, e do ex-presidente Lula21.

Celso Russomanno, em 30 de junho, foi anunciado pelo Partido

Republicano Brasileiro – PRB –, como candidato oficial do partido para

prefeitura de São Paulo22.

Carlos Giannazi, então deputado estadual, é confirmado como candidato

oficial do PSOL em 31 de março de 201223.

Paulo Pereira – Paulinho da Força – indicado pelo Partido Democrático

Trabalhista – PDT24.

Soninha Francine foi anunciada pelo Partido Popular Socialista – PPS –

como candidata25.

Ana Luiza indicada pelo Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados

– PSTU; Miguel Perez, pelo Partido Pátria Livre – PPL; e Anaí Caproni, pelo

Partido da Causa Operária – PCO26.

Levy Fidélix, pelo Partido Renovador Trabalhista Brasileiro – PRTB27.

José Eymael, pelo Partido Social Democrata Cristão – PSDC28.

Muitos dos candidatos eram praticamente desconhecidos da população

– chamados de «candidatos ninicos» pela imprensa, haja vista o espaço na

mídia e a publicidade acerca de Celso Russomanno – PRB –, Fernando

Haddad – PT –, Gabriel Chalita – PMDB – e José Serra – PSDB. Os quatro

candidatos juntos somaram 94,93% de todos os votos válidos no primeiro

turno.

20

Site do candidato http://serra45.com.br/, Acessado em 1º.de junho de 2014. 21

Site do candidato http://pensenovotv.com.br/, Acessado em 1º.de junho de 2014. 22

Site do candidato http://celsorussomanno.com.br/, Acessado em 1º.de junho de 2014. 23

Site do candidato http://giannazi50.com.br/, Acessado em 1º.de junho de 2014. 24

Site do candidato http://www.paulinhoprefeito12.com.br/, Acessado em 1º.de junho de 2014. 25

Site da candidata http://www.soninha.com.br/23/, Acessado em 1º.de junho de 2014. 26 Não foram encontradas as páginas dos candidatos. 27

Site do candidato http://levyfidelix.com.br/, Acessado em 1º.de junho de 2014. 28 Site do candidato http://www.eymael27.com.br/, Acessado em 1º.de junho de 2014.

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São Paulo é hoje considerado o principal centro financeiro da América

do Sul. Com o 10º maior PIB – produto interno bruto – do mundo, de acordo

com o IBGE, a cidade é responsável por 11,5% de todo o PIB do país. Além

disso, a capital paulista carrega um histórico político e cultural bastante

relevante na história do país.

Notadamente, é só a partir de agosto de 2012 que, efetivamente,

começa-se a observar um trabalho político mais dirigido à campanha para as

eleições municipais. Previamente, o que se notava era muita especulação

política.

Como de costume, várias emissoras e portais de internet organizaram

debates para que os candidatos expusessem suas propostas. Todavia,

nenhum dos debates contou com a presença de todos: os candidatos Miguel

Manso, Ana Luiza, Eymael e Anaí Caproni não foram convidados para nenhum

debate.

No dia 02 de agosto de 2012, no debate organizado pela Rede

Bandeirantes, estiveram presentes José Serra, Celso

Russomanno, Fernando Haddad, Soninha Francine, Gabriel

Chalita, Paulinho da Força, Carlos Giannazi e Levi Fidélix.

No dia 03 de setembro de 2012, no debate organizado pela Rede

TV e Folha de São Paulo, estiveram presentes José Serra, Celso

Russomanno, Fernando Haddad, Soninha Francine, Gabriel

Chalita, Paulinho da Força, Carlos Giannazi e Levi Fidélix.

No dia 17 de setembro de 2012, no debate organizado pela TV

Cultura, O Estado de São Paulo e Youtube, estiveram presentes

José Serra, Celso Russomanno, Fernando Haddad, Soninha

Francine, Gabriel Chalita, Paulinho da Força, Carlos Giannazi e

Levi Fidélix.

No dia 24 de setembro de 2012, no debate organizado pela Rede

Gazeta e Portal Terra, estiveram presentes José Serra, Celso

Russomanno, Fernando Haddad, Soninha Francine, Gabriel

Chalita, Paulinho da Força, Carlos Giannazi e Levi Fidélix.

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Os debates organizados pela Rede Record (01/10) e Rede Globo

(04/10) foram cancelados pelas emissoras.

Já no segundo turno, os candidatos José Serra e Fernando Haddad

estiveram presentes a três debates: da Rede Bandeirantes (18/10), SBT

(24/10) e Rede Globo (26/10). Já os debates da Rede Gazeta (15/10), TV

Cultura, e Rede TV (21/10) foram rejeitados pelos candidatos. E o debate na

Rede Record (22/10) foi cancelado pela emissora.

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CAPITULO 2

Categorias e procedimentos de análise

A «mensagem fotográfica» precisa ser analisada através dos produtos

midiáticos – notícias – elaborados pelos jornais que serviram de suporte

aoprocesso de Eleições. A notícia é um relato informativo, no qual é preciso

mostrar com as regras de construção e elaboração – enunciação –, referindo-

se a um fato inovador e não muito comum, ou à relação entre esses fatos

novos ou atípicos, ocorridos dentro de uma comunidade ou um em

determinado âmbito específico, seja este político como no caso das Eleições,

econômico ou social.

Dentro do jornalismo dos meios de comunicação, trata-se de um gênero

no qual a notícia é um «recorte da realidade» sobre um fato da atualidade, que

merece ser informado por um tipo de critério de relevância social.

Assim, este capítulo se propõe à retomada das categorias sugeridas por

Roland Barthes de trucagem, pose, objetos, fotogenia, esteticismo e sintaxe.

Com este propósito, foi feita uma seleção de todas as notícias que

compreendem o período recortado desde as pré-eleições até o resultado das

urnas, configurando deste modo o corpus da pesquisa.

Entretanto, é o protagonismo da campanha que fala dos principais

candidatos e de sua ligação com o partido que representam, alavancando

tabelas que situam episódios retratados pela Folha e O Estado de São Paulo,

respectivamente. Também é montada outra tabela que se refere ao desenho e

aos procedimentos da campanha. Coloca-se a ênfase em aspectos formais da

fotografia, que podem oferecer pistas importantes para entender o caráter

sugestivo das impressões, gestos e ações complementadas pela

contextualização dos espaços carregados de significação e que aparecem

como pano de fundo na linha da análise contextual.

Por fim, os indicadores de codificação de página mapeiam a notícia que

fusiona o texto e a imagem fotográfica, promovendo a mensagem adscrita aos

veículos midiáticos selecionados.

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Foram analisadas fotografias selecionadas e publicadas nas capas do

jornal e nos cadernos específicos das eleições que bem refletem episódios

diretos da mesma – palanques, visitas, entrevistas, entre outras. Também

foram incluídas as fotografias do mesmo tema publicadas em outras seções do

jornal, além das capas antes mencionadas e dos suplementos. Foram

excluídas dessa seleção e do estudo as imagens fotográficas que, mesmo

aparecendo nos espaços indicados, por seu conteúdo ou tamanho reduzido

carecem de significado informativo.Com este intuito, criaram-se 3 tabelas de

classificação: 1) indicadores e atributos documentais; 2) indicadores de

codificação fotográfica; 3) indicadores de codificação de página.

Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo Identificação do candidato.

Papel Função do protagonista

principal/candidato.

Partido Partido político ao qual pertence.

Episódio Enquadramento episódico específico da

imagem.

Data de obtenção Identificação da data da captação da

imagem.

Meio Folha de São Paulo/O Estado de São

Paulo.

Esta tabela serve para a identificação do candidato no seu exercício

político como representante de um partido. O enquadramento específico da

fotografia permite observar as determinantes contextuais do tempo e do espaço

reconstruídos pelo meio que está noticiando. Serão usadas as abreviações

FSP para Folha de São Paulo, e OES para O Estado de São Paulo.

A mesma foi aplicada a cada uma das categorias da «mensagem

fotográfica» de ambos os veículos de comunicação.

Tomou-se como ponto de partida a ideia de que a análise do conteúdo

pode ser utilizada para dissecar/desmitificar qualquer produto de comunicação

midiática, com o fim de conhecê-lo em profundidade, saber como foi feito,

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inferir e predizer seu mecanismo de influência. Esta técnica de pesquisa

quantitativa se apresenta como idônea para a finalidade deste estudo.

Dado que a fotografia é uma representação icônica da realidade datada

da mensagem que, possui um caráter polissêmico, a fotografia pode se admitir

como objeto adequado para a análise do conteúdo. Realizou-se mais uma ficha

matriz para codificar o conteúdo de cada uma das unidades de análise –

categorias da «mensagem fotográfica» –, em cuja construção tem se utilizado

critérios gerais previamente definidos e aceitos pela comunidade científica.

Os registros codificados durante a pesquisa, um para cada unidade de

análise ou categoria, converteram-se na base de dados sobre a qual se

executaram consultas específicas para estabelecer, classificar e quantificar as

características denotativas e conotativas das fotografias.

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Campo de visão captado: geral, grupal ou

curto.

Impressão gestual Gestualidade que mostra o candidato.

Ação/Estaticismo Valor dinâmico visível do candidato

Cenografia Entorno, elementos do ambiente,

vestuário.

Verticalidade Captação em picado ou contrapicado.

Equilíbrio Predomínio compositivo de simetria ou

assimetria.

Angulação Presença de efeitos de grande angular ou

teleobjetiva.

Simbolismo Presença de gestos ou objetos

simbólicos.

Esta segunda tabela também faz referência ao protagonismo dos

principais candidatos à Prefeitura, salientando-se nela o aspecto formal da

«mensagem fotográfica». Assim, desde o enquadramento que delimita o

escopo da imagem até o simbolismo do gestual e das ações fotografadas,

deixam entrever os aspectos subjetivos e subjetividade dos candidatos.

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O instrumento utilizado para a análise dos dados é parte dessa

documentação na matriz ou base de dados composta por um conjunto de

indicadores agrupados em três categorias básicas, que interessam ao

propósito deste trabalho: atributos documentais, traços de codificação

fotográfica e de composição/diagramação.

O primeiro é denotativo – o que se mostra na fotografia –, enquanto que

os restantes são os que refletem a parte conotativa da imagem – o que se

sugere, por meio da mediação subjetiva do fotógrafo e do diagramador.

Aprecia-se neste desenho uma dupla concordância com as ideias de Barthes

sobre a «mensagem fotográfica» com a presença na fotografia de mensagens

denotadas e conotadas, e com o propósito do fotojornalismo como a notificação

de acontecimentos reais, interpretados visualmente por um fotógrafo e

orientados por critérios de contingência, mediatizados por vários processos

codificadores – fotográfico informativo e de impressão fotomecânica.

A matriz de análise/base de dados foi concebida pelo critério de

adequação às características concretas que apresentam as fotografias

analisadas, evitando alguns aspectos pouco significativos e priorizando outros.

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página Publicação de capa do jornal ou caderno.

Tamanho Medição em colunas de páginas do jornal.

Correspondência fotografia/Fato noticioso Concordância entre o assunto central e a

fotografia.

Enfim, esta última tabela de catalogação é para inferir mais tarde, no

capítulo 3, o contexto de página que acompanha a notícia neste capítulo 2

recortada.

A seguir, a apresentação das categorias da «mensagem fotográfica»,

cada uma delas acompanhada da notícia anunciada por O Estado de São

Paulo e a Folha, as tabelas com os indicadores fotográficos e uma breve

síntese da mensagem, fruto da fusão da imagem e do texto.

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2.1. A trucagem e o protagonismo sarcástico da campanha

Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo José Serra

Papel Candidato à prefeitura de SP em

2012.

Partido PSDB

Episódio Imegem de José Serra comparada a

Hitler

Data de obtenção 10/08/12

Meio O Estado de São Paulo.

Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Curto

Impressão gestual José Serra está falando e com a mão

direita levantada.

Ação/Estaticismo Estáticos, pois o candidato tem o

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movimento paralisado.

Cenografia Por se tratar de uma imagem

capturada com o plano mais fechado,

vê-se pouca informação ao fundo (o

nome São Paulo).

Verticalidade Picado – plongée.

Equilíbrio Há predomínio da simetria na

imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

teleobjetiva.

Simbolismo O simbolismo se dá pela comparação

do gesto do candidato José Serra à

imagem de Adoph Hitler fazendo o

mesmo gesto, comparando Serra a

Hitler.

Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página OESP, 10/08/12, Cad.Nacional, pág.

A11

Tamanho As fotos ocupam as 2,5 colunas das 6

colunas do jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Há correspondência, pois o próprio

texto trata da falha da campanha de

Fernando Haddad ao comparar Serra

a Hitler. Há. Inclusive, um comentário

do próprio candidato Fernando

Haddad informando que o profissional

responsável havia sido desligado.

A notícia veiculada por O Estado de São Paulo mostra o candidato

Fernando Haddad em visita a uma cooperativa de catadores de lixo –

aproximação artificial –, a partir da qual se faz a declaração de que a

divulgação do «rap» que compara José Serra com Hitler resultou inadequado

para os efeitos de sua campanha. Daí a trucagem que mostra do lado

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esquerdo a figura do ditador nazista na mesma pose de José Serra, o

paralelismo reflexo de uma imagem e da outra, mostrando de modo irônico e

mordaz, igualdade nos modos de agir politicamente de ambas as figuras

políticas.

Mesmo havendo a intervenção de duas categorias da «mensagem

fotográfica», a que prevalece é a trucagem sarcástica e de zombaria feita pelo

marqueteiro da campanha de Haddad, desligado pelo procedimento malicioso

e desleal ao jogo político. Na utilização desta categoria usa-se a denotação

com um interesse metódico de comparar ambas as fotografias para produzir

significação na medida em que existe um signo que esboça um código

histórico: Adolf Hitler e José Serra candidato à Prefeitura de São Paulo no

processo eleitoral de 2012.

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Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo José Serra, Celso Russomanno, e

Fernando Haddad.

Papel Candidatos à prefeitura de SP em

2012.

Partido PSDB, PRB e PT

Episódio Painéis dos candidatos fotografados

no centro de SP

Data de obtenção 07/10/12

Meio Folha de São Paulo.

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Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Geral

Impressão gestual A imagem dos painéis dos candidatos

aparece como se estivessem

«posando para foto».

Ação/Estaticismo Estáticos, pois se trata de painéis dos

candidatos. E dinâmico se

considerarmos o movimentos dos

carros ao fundo.

Cenografia Os painéis dos candidatos estão de

pé, na entrada do túnel do

Anhangabaú, com carros em

movimento ao fundo.

Verticalidade Picado – plongée.

Equilíbrio Há predomínio da simetria na

imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

objetiva normal.

Simbolismo O simbolismo se dá pelo dinamismo

que o ir e vir dos carros ao fundo

simboliza, retratando bem «a cidade

que não pára» São Paulo. Além disso,

os painéis, da maneira como foram

fotografados, parecem ser os próprios

candidatos – tecnicamente

empatados posando para foto.

Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página FSP, 07/10/12, Capa.

Tamanho A foto ocupa todas as 6 colunas do

jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Há concordância da foto – painéis dos

três candidatos – com o título da

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matéria – «São Paulo enfrenta

empate triplo inédito para prefeito» –

porque aparecem Serra, Russomanno

e Haddad, e junto a eles a

porcentagem de intenção de voto de

cada um.

Sob o título de «empate triplo e inédito», a Folha utiliza o recurso da

trucagem para mostrar os candidatos José Serra do PSDB, Celso Russolmano

do PRB e Fernando Haddad do PT na corrida para a Prefeitura de São Paulo.

Ao fundo a entrada do túnel Anhangabaú no centro que representa o

movimento constante de uma cidade que não pára, tamanho o fervilhar

metropolitano. Sobrepostas, as imagens deles com as devidas porcentagens

28, 27 e 24% das intenções de votos, denota a questão do empate técnico nas

pesquisas, mas deixa de manifesto os «meandros escuros» dessa corrida

eleitoral que deixou o candidato do PRB fora do 2º turno. Usa-se o tal recurso a

favor da credibilidade particular da fotografia, seu poder denotativo na

composição cujo significante é a atitude (da imagem) dos candidatos em pose.

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2.2. Pose e tipos sociais dos candidatos

Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo Fernando Haddad

Papel Candidato à prefeitura de SP em 2012

Partido PT

Episódio Entrevista de Fernando Haddad à

OESP

Data de obtenção 09/10/12

Meio O Estado de São Paulo.

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Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Curto

Impressão gestual Braços apoiados sob a mesa e mãos

juntas

Ação/Estaticismo Estático e com olhar dirigido à frente.

Cenografia O candidato veste um paletó

preto/azul e uma camisa azul clara.

De fundo, vê-se uma imagem sua, de

campanha, com um leve desfoque.

Verticalidade Picado – plongée

Equilíbrio Há predomínio da simetria na

imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

teleobjetiva – meia-tele.

Simbolismo O simbolismo se dá pela sua própria

imagem ao fundo

Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página OESP, 09/10/12, Cad. Especial, pág.

H3

Tamanho A foto ocupa 3 das seis colunas do

jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Há concordância da foto com o texto

por se tratar de uma entrevista.

A categoria fotográfica de pose aparece na entrevista de O Estado de

São Paulo feita a Fernando Haddad – o busto do candidato –, o título noticiado

«Serra tem ética seletiva», apresenta o candidato do PT sério – uma reserva

de atitudes estereotipadas que constitui, neste caso, os significados prontos

para a ocasião –, com os olhos em direção ao entrevistador e as mãos sobre a

mesa, dedo indicador assinalando pontos relevantes de sua fala na superfície

da mesa no decorrer da entrevista. Na imagem de fundo, o mesmo Haddad

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aparece quase na mesma pose, acentuando-se pelo tamanho, traços de

fotogenia. Nada mais apropriado para tratar o tema da ética de seu adversário

que um ar de seriedade para transmitir confiança aos meios a respeito de um

posicionamento nesse sentido. O leitor/eleitor recebe como simples denotação

o que de fato é a estrutura dupla, uma seriedade denotada perante a crítica de

Haddad à ética seletiva conotada.

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Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo Fernando Haddad e Lula

Papel Candidato à prefeitura de SP em

2012, e o ex-presidente da República.

Partido PT

Episódio Encontro com Lula

Data de obtenção 23/08/12

Meio Folha de São Paulo.

Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Curto

Impressão gestual Mão na orelha (Haddad), e mão

levada à testa (Lula)

Ação/Estaticismo Estático e com olhar para baixo.

Cenografia O candidato veste um paletó

preto/azul e uma camisa azul clara.

Lula usa um casaco bege claro. Ao

fundo, vêem-se outras pessoas com

um leve desfoque.

Verticalidade Picado – plongée

Equilíbrio Há predomínio da simetria na

imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

teleobjetiva – meia-tele ou objetiva

normal.

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Simbolismo O simbolismo se dá pelo gestual de

ambos, que transmite a ideia de

preocupação.

Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página FSP, 23/08/12, Cad.Poder/

Eleições2012, pág.A12

Tamanho A foto ocupa 4 das seis colunas do

jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Há concordância da foto com o texto

por se tratar de uma foto que

transmite a ideia de preocupação, e

pelo fato de Haddad ter sido

questionado sobre o apoio de Paulo

Maluf à sua campanha.

A Folha traz uma fotografia que usa o recurso da pose em que aparece

Lula, «padrinho» da campanha de Fernando Haddad. Lula com a mão

esquerda na testa, olhos fechados, com a cabeça para baixo em um gesto de

descrédito. Haddad com a mão esquerda segurando a orelha, de olhos

abertos, esboçando um leve sorriso perante o inquérito da mídia a respeito da

biografia de Maluf. O candidato à Prefeitura rebate as críticas falando que é

contra a «fulanização» do debate, aproveitando para atacar a seus adversários.

A pose do ex-presidente e do candidato à Prefeitura se dá em função desse

conceito que consiste em atribuir nome ou identificação a pessoas cuja

identificação não interessa discutir, pois a mensagem que vem da junção da

imagem fotográfica e do texto consiste em dizer: não adianta fulanizar o debate

porque faz parte do jogo político conquistar aliados.

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2.3. Objetos ao serviço das ideologias representadas

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Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo José Serra

Papel Candidato à prefeitura de SP em 2012.

Partido PSDB

Episódio Entrevista à FSP na casa do candidato

Data de obtenção 28/10/12

Meio Folha de São Paulo.

Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Geral

Impressão gestual Na foto, o candidato aparece com a mão

elevada à testa.

Ação/Estaticismo Estático, pois não há elementos na foto

que transmitem ideia de movimento.

Cenografia O candidato está com a mão elevada à

testa, e ao fundo veem-se vários livros na

sua biblioteca.

Verticalidade Picado – plongée

Equilíbrio Há predomínio da assimetria na imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

objetiva normal ou meia tele.

Simbolismo O simbolismo se dá pelos livros ao fundo

– passa a ideia de erudição e, pelo gesto

da mão à testa, faz alusão ao

pensamento/refexão.

Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página FSP, 28/10/12, Cad. Eleições2012, pág.9

Tamanho A foto ocupa todas as 6 colunas do jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Embora o título da matéria seja – Carga

Pesada –, a mesma faz alusão ao que

espera do candidado José Serra, caso

vença as eleições para Prefeitura de SP.

Aqui fica clara a ideia de mostrar ao

público um Serra pensador e preparado,

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especialmente pelas frases de campanha

que ilustram a matéria.

A Folha explora objetos em entrevista feita a José Serra, começando na

lateral esquerda com grandes aspas que transcrevem literalmente a fala do

candidato do PSDB, acentuando a volta à disputa pela Prefeitua de São Paulo.

Questionado a respeito de sua saída do governo em 2006, ele comenta o fato e

sobre a padrinhagem de Kassab. Nesse clima de eleições, no qual o tema do

mensalão que coloca na berlinda o PT, a biblioteca de sua casa oferece o

embasamento dos livros a sua proposta eleitoral. Serra na lateral direita de

perfil, com mão à testa, demonstra preparo, erudição e a inteligência de um

candidato com experiência.

Logo abaixo, sob o título «carga pesada», refere-se à perda no passado

na corrida eleitoral à presidência do Brasil em disputa com Lula do PT. A

matéria do jornal disse que o candidato, agora à Prefeitura, aumentou seu ritmo

para evitar a derrota em São Paulo. O objeto é, justamente, o carrinho de feira

que remete ao passado do pai feirante cujo filho agora o carrega cheio de

caixas de frutas na zona oeste da cidade da qual quer ser prefeito.

O sentido conotado destes signos são os livros e o carrinho de feira, que

fazem parte da biblioteca de Serra e da história do candidato, respectivamente.

Esses objetos fotografados são indutores frequentes de associação de ideias.

A conotação dessas unidades significantes é explicitada em ambos os textos, o

primeiro ao se referir ao traço intelectual do candidato, e o segundo, a um

passado de trabalho e esforço.

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Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo Fernando Haddad

Papel Candidato à prefeitura de SP em

2012.

Partido PT

Episódio Lula e Haddad na sede do PT

Data de obtenção 23/08/12

Meio O Estado de São Paulo.

Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Geral

Impressão gestual O candidato Fernando Haddad sorri

ao ver o ex-presidente Lula mostrar

uma camisa preta com o número 13 e

o nome Lula.

Ação/Estaticismo Estático, pois não há elementos na

foto que transmitam ideia de

movimento.

Cenografia O candidato está em meio a várias

pessoas na sede do PT, e ao lado de

Lula sorri ao ver o ex-presidente

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mostrar uma camisa preta com o

número 13 e o nome Lula.

Verticalidade Contra-picado – contra-plongée

Equilíbrio Há predomínio da simetria na

imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

objetiva normal.

Simbolismo O simbolismo se dá pela expressão

de alegria do candidato Fernando

Haddad ao sorrir ao ver a camisa

preta com o número 13 e o nome de

Lula. Diferente do que muitos pensam

ao associar o número treze ao azar,

aqui ele parece representar a sorte,

diante das expressões de felicidade

de ambos.

Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página OESP, 23/08/12, Capa.

Tamanho A foto ocupa as 2,5 das 6 colunas do

jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Não há concordância da foto –

Haddad e Lula na sede do PT – com

o título da matéria – Lewandowski

condena Valério, seus sócios e ex-

diretor do BB. O que há é a palavra –

Ofensiva – seguida de uma

fotolegenda com a informação sobre

a foto.

O Estado de São Paulo traz a imagem de Lula com uma camiseta preta

que tem o número 13 do partido, sendo este um número da sorte para o

mesmo. Ao lado, Haddad dando uma gargalhada na sede do partido pela

«sacada» de seu principal padrinho de candidatura. O objeto é próprio de uma

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disputa de futebol que reforça a ofensiva, título na lateral esquerda fora da

imagem. Do lado direito, Serra sorri levemente e o ângulo insinua um contorno

em direção a essa ofensiva. O título “explicações” alude à defensiva perante as

acusações vindas desses dois adversários. A camiseta nº13 possui um sentido

conotado que sugere, mais uma vez, o jogo político do PT na corrida à

Prefeitura de São Paulo.

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2.4. Fotogenia – foco e luz do candidato em cena

Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo Fernando Haddad

Papel Candidato à prefeitura de SP em

2012.

Partido PT

Episódio Projetos e propostas de governo

Data de obtenção 17/10/12

Meio Folha de São Paulo.

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Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Curto

Impressão gestual O candidato do PT, Fernando

Haddad, aparece falando.

Ação/Estaticismo Estático pois não há elementos na

foto que transmitem ideia de

movimento.

Cenografia O candidato aparece em um plano

fechado com uma imagem parcial

desfocada ao fundo (ex-presidente

Lula?).

Verticalidade Picado (plongée) e contra-picado

(contra-plongée)

Equilíbrio Há predomínio da simetria na

imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

teleobjetiva.

Simbolismo O simbolismo se dá pela luz

lateralizada no rosto do candidato,

quase que lhe atribuindo uma áurea.

Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página FSP, 17/10/12, Cad.Poder, pág.A10

Tamanho A foto ocupa 2 das 6 colunas do

jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Há concordância da foto pois se trata

do próprio candidato Fernando

Haddad.

Sendo a fotogenia um recurso que foca na imagem do candidato, a

Folha faz um paralelo entre Serra e Haddad na apresentação dos seus planos

de governo para a Prefeitura de São Paulo. O título afirma que o plano de

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Serra depende das ações de Geraldo Alckmin. Insiste em que esse programa

de partido depende de uma parceria com o governo estadual. As imagens de

ambos os candidatos aparecem em um paralelismo. De um lado Serra, olhando

da direita para esquerda, sério, boca fechada com os olhos quase fechados. Já

Haddad, da esquerda para direita, com os olhos para cima e com a boca

aberta, se projeta para o interior do jornal.

A mensagem conotada está na própria imagem dos candidatos,

«sublimada», como disse Barthes, por técnicas de iluminação, impressão e

revelação que prefiguram o sentido ideológico dessas figuras públicas.

De ambos os planos comparados, aparecem ítens essenciais à vida da

metrópole: investimento em metrô, ensino técnico, criação de novos hospitais e

corredores de ônibus, entre seis prioridades da Prefeitura.

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Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo José Serra, Celso Russomanno, e

Fernando Haddad

Papel Candidatos à prefeitura de SP em

2012.

Partido PSDB, PRB e PT

Episódio Disputa Eleição para prefeitura de SP

Data de obtenção 07/10/12

Meio O Estado de São Paulo.

Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Curto

Impressão gestual Na sequência de fotos, os candidatos

aparecem com uma iluminação

levemente lateralizada.

Ação/Estaticismo Estático, pois não há elementos na

foto que transmitam ideia de

movimento.

Cenografia A imagem dos candidatos foi

capturada em um plano mais curto.

Verticalidade Picado – plongée

Equilíbrio Há predomínio da simetria na

imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

teleobjetiva – meia tele.

Simbolismo O simbolismo se dá pela expressão

de felicidade – todos aparecem

sorrindo –, talvez por estarem

empatados, de acordo com as

pesquisas divulgadas.

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Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página OESP, 07/10/12, Cad. Eleições2012,

pág. H1

Tamanho A foto ocupa as 6 colunas do jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Há concordância das fotos – Serra,

Russomanno e Haddad – por serem

os três candidatos empatados e à

frente nas pesquisas de voto.

A rubrica do título «Eleições embolam/disputa voto a voto» traz a

imagem dos três candidatos à Prefeitura no final do primeiro turno. As três

fotografias se enquadram dentro da categoria de fotogenia da «mensagem

fotográfica». Os candidatos aparecem sorrindo para seus eleitores com os 26%

das intenções de voto. José Serra do PSDB é o de aparência mais velha, com

um sorriso aberto e a boca levemente inclinada. O candidato aparece com uma

camisa azul e por baixo camiseta branca. Celso Russolmano sorri, mas com a

boca fechada, olhando diretamente para os holofotes. No último quadro,

Fernando Haddad mostra um sorriso aberto condizente com o olhar, cujo olho

esquerdo aparece levemente fechado.

Neste sentido, a fotogenia considera a fotografia como uma estrutura

informativa relevante, cuja mensagem está na imagem dos três candidatos

acima com porcentagens idênticas na corrida eleitoral. As três imagens

também são sublimadas pelas técnicas da focalização, da iluminação, da

impressão e da revelação feita pelo veículo.

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2.5. Esteticismo – aquém e além da arte de fotografar

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Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo Fernando Haddad

Papel Candidato à prefeitura de SP em

2012.

Partido PT

Episódio Entrevista à OESP

Data de obtenção 31/10/12

Meio O Estado de São Paulo.

Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Geral

Impressão gestual Haddad gesticula com as mãos sob a

mesa, apontando para frente.

Ação/Estaticismo Estático e com olhar dirigido para

frente.

Cenografia O candidato veste terno cinza, uma

camisa branca, e uma gravata listrada

vermelha. Ao fundo, veem-se as

imagens do próprio Haddad e da

presidente Dilma, levemente

desfocadas.

Verticalidade Picado – plongée

Equilíbrio Há predomínio da assimetria na

imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

objetiva normal.

Simbolismo O simbolismo se dá pela imagem de

fundo – em especial da presidente

Dilma sorridente, transmitindo a ideia

de apoio e confiança. Além disso, a

própria vestimenta e pose do

candidato passam a ideia de

seriedade.

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Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página OESP, 31/08/12, Cad. Poder,

Eleições2012, pág.A12

Tamanho A foto ocupa 4 das seis colunas do

jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Há concordância da foto com o texto

por se tratar de uma entrevista, e pelo

fato da imagem passar a ideia de

aprovação/consenso por parte do

partido, haja vista que a entrevista foi

feita no diretório de campanha no

centro de SP.

O Estado de São Paulo mostra esteticismo na fotografia na

sobreposição de imagens, em primeiro plano Fernando Haddad de terno,

falando de seu plano de governo, as mãos esticadas para frente em paralelo,

assinalam uma via, um caminho a seguir, reforçando o titular da proposta de

coalição. Ao fundo uma imagem enorme da presidente Dilma sorrindo e

também em primeiro plano a imagem serena do candidato do PT. A leve

inclinação do plano fotográfico deixa entrever a proposta de ação do partido e a

negativa de Haddad de não fazer um «toma lá dá cá».

Nessa linha, o esteticismo é também uma composição visual

deliberadamente inclinada para significar e impor um significado mais sutil e

complexo, como é a coalizão política em uma corrida eleitoral que conta com o

apoio da presidente, mas, sobretudo, com a clareza e a delimitação do líder

daqueles partidos que venham a aderir a essa proposta.

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Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo José Serra e Padre Marcelo Rossi

Papel Candidato à prefeitura de SP em 2012

e religioso da Igreja Católica.

Partido PSDB

Episódio Encontro com Padre Marcelo Rossi

Data de obtenção 31/08/12

Meio Folha de São Paulo.

Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Curto

Impressão gestual Serra aparenta estar emocionado –

expressão de choro

Ação/Estaticismo Estático e com olhar para o padre,

que fala ao microfone.

Cenografia O candidato veste um casaco escuro

e uma camisa azul clara. O Padre

Rossi usa uma batina preta e branca.

Ao fundo, vê-se a imagem de Nossa

Senhora e o menino Jesus entre os

dois, levemente desfocada.

Verticalidade Picado – plongée

Equilíbrio Há predomínio da simetria na

imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

teleobjetiva.

Simbolismo O simbolismo se dá pela imagem

religiosa, que representa o sagrado,

no momento em que o candidato

recebe a benção do Padre durante a

missa.

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Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página FSP, 31/08/12, Cad.Poder, pág.A14

Tamanho A foto ocupa 2 das seis colunas do

jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Há concordância da foto com o texto

por se tratar de uma foto que transmite

a ideia de benção/religiosidade, e pelo

fato de Serra (aparentar) estar

esmocionado.

A Folha traz o tucano José Serra emocionado em uma cerimônia

religiosa celebrada pelo padre Marcelo Rossi. Ao fundo, a imagem estilizada de

Nossa Senhora com uma auréola de estrelas e o menino Jesus nos braços; a

figura do Messias fica no meio, entre o padre e o candidato à Prefitura de São

Paulo. A Virgem inclinada para o lado de Serra, como se estivesse olhando

para ele, reveste o momento sacro. Rossi veste roupas litúrgicas com um

microfone na mão. O candidato tucano olha para o padre, portando uma vela

devocional.

O esteticismo se dá de maneira ambígua na fotografia. Trata-se, neste

caso, de uma composição visual deliberadamente tratada para significar

«espiritualidade» estática, traduzida em termos de um cerimonial litúrgico.

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2.6. Sintaxe – fotogramas da ação política

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Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo José Serra

Papel Candidato à prefeitura de SP em

2012.

Partido PSDB

Episódio Evento de campanha em Ermelino

Matarazzo.

Data de obtenção 22/09/12

Meio O Estado de São Paulo.

Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Geral

Impressão gestual Na sequência de fotos, o candidato

aparece chutando a bola de futebol.

Ação/Estaticismo Dinâmico, pois há elementos na foto

que transmitem ideia de movimento.

Cenografia O candidato está em meio a várias

pessoas em um campo de futebol e,

ao bater um pênalti, seu sapato sai do

pé junto com a bola.

Verticalidade Picado – plongée

Equilíbrio Há predomínio da assimetria na

imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

objetiva grande angular.

Simbolismo O simbolismo se dá pela sequência

de 3 imagens do do candidado se

preparando para bater o pênalti e o

sapato voando junto com a bola de

futebol, transmitindo a ideia de falta

de habilidade e conhecimento sobre o

assunto.

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88

Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página OESP, 22/09/12, Cad.Nacional,

Eleições 2012, pág. A6

Tamanho A foto ocupa as 6 colunas do jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Há concordância da foto com a

fotolegenda por apontar que o

candidato estava “gastando sola de

sapato – e todo o resto”, talvez se

referindo ao desgaste da própria

imagem do candidato, que foi capa

em diversas publicações.

A sequência fotográfica de O Estado de São Paulo que mostra o

candidato do PSDB José Serra jogando futebol, durante um evento de

campanha realizado em Ermelindo Matarazzo, corresponde à categoria de

sintaxe da «mensagem fotográfica». Os fotogramas sob o título «gastando sola

de sapato» apresentam em um primeiro momento Serra perdendo o sapato ao

cobrar um falta. A seguir, o sapato voou do pé direito e, por fim, Serra ficou

sem meia. O texto que descreve esta situação informa que, após o chute, Serra

perdeu o sapato do pé direito, o goleiro defendeu a cobrança e o sapato

atravessou a rede e foi parar atrás do gol. Em entrevista, Serra disse que

sentia que o sapato ia sair, rindo de sua tentativa fracassada. Numa segunda

cobrança, o tucano consegue marcar, mas o goleiro afirma que desta vez

deixou a bola entrar.

Neste caso, o recurso da sintaxe possibilita a leitura discursiva de três

fotografias transformadas em uma sequência de movimento. Movimento este

que deixa entrever a ação política de Serra.

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Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo José Serra

Papel Candidato à prefeitura de SP em

2012.

Partido PSDB

Episódio Caminhada pelo centro de SP

Data de obtenção 28/09/12

Meio Folha de São Paulo.

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Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Curto

Impressão gestual Na sequência de fotos, o candidato

aparece sendo beijado na boca por

uma eleitora, e depois com a

expressão de assustado.

Ação/Estaticismo Dinâmico, pois há elementos na foto

que transmitem ideia de movimento.

Cenografia O candidato está em meio a várias

pessoas no centro de SP, há alguns

manequins em frente a uma loja, e

uma mulher de casaco vermelho.

Verticalidade Picado – plongée – e contra-picado –

contra-plongée

Equilíbrio Há predomínio da simetria na

imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

objetiva normal.

Simbolismo O simbolismo se dá pela sequência

de 2 imagens do candidado sendo

beijado na boca pela vendedora, e

depois com o olhar assustado, visto

que ele não esperava tal atitude.

Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página FSP, 28/09/12, Cad. Poder,

Eleições2012, pág.A13

Tamanho A foto ocupa as 2,5 colunas das 6

colunas do jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Não há concordância da foto: Serra

sendo beijado por uma eleitora, com o

título da matéria: Alckmin vai

intensificar presença em atos pró-

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Serra. O que há é uma coluna com o

subtítulo «Apaixonada, lojista dá dois

beijos na boca de candidato».

Todavia, a imagem ganhou destaque

em diversas publicações pelo fato

inusitado.

Em relação às fotografias da Folha que exploram a categoria da sintaxe,

mostra-se uma lojista que pega de surpresa o candidato do PSDB e o beija na

boca. Com o título em caixa de texto azul aparece a palavra «fogo» e, na

segunda fotografia, Serra ainda se recuperando do imprevisto e, assustado,

olha para a lojista que comemora a sua conquista, mas uma caixa de texto azul

na lateral inferior direita aponta a palavra «paixão». Também o texto relata que

Talita Coelho declara seu amor ao candidato tucano e que se pudesse casaria

com ele. O festejo se dá na entrada da loja em que a vendedora de roupas tem

alguns manequins.

Esta leitura discursiva de duas fotografias transforma-se em uma

sequência que vai do instante em que a vendedora toma a iniciativa e, de

maneira espotânea, beija na boca Serra até o momento em que este, ainda

assustado, recupera-se do choque que isso representou. Há uma sequência de

movimento, mais estático que na imagem anterior, mesmo assim, existe por

parte do candidato uma variação de atitude.

De uma maneira geral, as categorias da «mensagem fotográfica»

mostram-se ricas em recursos que apontam para a significação e o sentido.

Não pode haver nesse sentido uma fragmentação da imagem fotográfica. Muito

pelo contrário: deve haver uma leitura em chave que una a imagem conotada

pelo texto e discurso do jornal à imagem denotada que justifique a escolha.

Podem coexistir em uma notícia mais de uma categoria, mas sempre haverá

uma categoria predominante, como o demonstram as análises acima

referenciadas.

Em particular, a trucagem, por exemplo, impõe para

leitores/espectadores e eleitores uma aproximação a um universo artificial feito

pela intervenção e manipulação das imagens com um interesse metódico,

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localizado dentro do plano da denotação e valendo-se da credibilidade

particular da fotografia. A pose é basicamente a leitura de atitudes, gestos e

movimentos corporais, em muitos casos estereotipados, o que constitui o

elemento de significação preparado pelo meio para conseguir um efeito que

provém do analógico e que fundamenta a fotografia digital ou qualquer outra

técnica da objetiva. Dos objetos - ou pose dos mesmos - pode-se inferir que

tais objetos são indutores frequentes para a associação de ideias e para

desenvolver temas propostos pelos veículos de comunicação.

A fotogenia por sua vez, é um recurso que ajuda a imagem dos

candidatos no que se refere ao foco, iluminação, impressão e revelação da

fotografia que trabalha com efeitos estáticos, assim não há arte nesta ação e

sim sentido. O esteticismo como categoria se explica quando uma fotografia se

faz composição visual, deliberadamente tratada para significar ou imprimir um

significado mais sutil e complexo do que permitem os outros procedimentos da

conotação. Enfim, a sintaxe propõe uma leitura discursiva da fotografia,

transformando-a em uma sequência que representa movimento, repetição,

variações de atitude e tipificação, entre outras.

Especificamente, a «mensagem fotográfica» contida nos veículos

jornalísticos Folha e O Estado de São Paulo declinaram as notícias da

campanha para a Prefeitura de São Paulo com trucagens sarcásticas,

sobretudo, feitas a Serra pela Folha. Já a pose de Serra em O Estado de São

Paulo resulta mais comportada, séria e com um enorme repertório intelectual

para legislar a cidade. Nesse mesmo sentido, Serra é colocado próximo dos

livros também por O Estado de São Paulo, já o ex-presidente Lula é noticiado

pelo apoio ao candidato Fernando Haddad pela Folha, presenteando-o com

uma camiseta do jogo mais popular no Brasil. A fotogenia deixa em evidência o

rosto em foco com incidência de luz em três candidatos empatados

tecnicamente nas intenções de votos dos eleitores. O esteticismo utilizado por

ambos os jornais também divide ideologicamente as estratégias de

comunicação dos partidos. Por um lado, o aquém corresponde às composições

fotográficas que colocam em primeiro plano a realidade do processo eleitoral;

por outro lado, o além é quando a composição se abre ou projeta para outros

âmbitos da subjetividade, como a arte, a religião e imagens de culturas nativas.

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Por fim, a sintaxe, que é a via que leva a fotografia em direção ao movimento

como efeito de sentido, relaciona-se diretamente com o julgamento ideológico

das ações dos candidatos e partidos.

Neste eixo de reflexões, fruto da análise, se impõe a decodificação, da

qual se ocupa este estudo no capítulo a seguir. Não sem antes insistir em

alguns significantes do mito que vieram à tona neste capítulo. São eles: «ética

seletiva», «fulanização», «carga pesada», «jogo político» «camiseta 13»,

«imagem sublimada», «apaixonada», «espiritualidade estática», «toma lá dá

cá», «gastando sola de sapato», entre outras.

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CAPITULO 3

Mito e mensagem fotográfica

A problemática da comunicação de massas, nascida no seio da

sociologia, particularmente nas sociedades industrializadas, tem originado a

exigência de metodologias que estabeleçam o conteúdo não explícito das

mensagens, seus problemas e princípios. Roland Barthes, pioneiro do

estruturalismo francês, cuja obsessão fundamental foi combater as falsas

evidências impostas pelo poder no interior das linguagens e dos códigos,

propõe em Mitologias um método de desmitologização.

Ante a adoração mitológica da tecnologia dos meios de comunicação, o

semiólogo francês anteriormente citado defende a ideia de que escrever sobre

isto é um gesto de emancipação cultural.

A reflexão proposta neste capítulo conclusivo assinala a intencionalidade

comunicativa das mídias e seus pressupostos básicos. A incidência mais

importante dos meios de comunicação massiva na sociedade não deriva de

seu impacto tecnológico, mas da mediação ideológica – «a ideologia é a

mensagem». Quem impõe tal mediação é a sociedade com a estrutura de seus

códigos, e não os aparelhos eletrônicos com seus circuitos e redes, cujos

efeitos tecnológicos podem ser em definitivo regulados pelos mecanismos de

controle social.

A partir desses princípios teóricos formulados no primeiro capítulo deste

trabalho, estabeleceu-se um recorte metodológico nas categorias conotadas da

«mensagem fotográfica», também anunciadas por Barthes em obras

posteriores a Mitologias. Embora as categorias da mensagem fotográfica

estejam sistematizadas em O óbvio e o obtuso, e em obras seguintes – tratam-

se de momentos diferentes da produção barthesiana –, escolheu-se o gênero

do ensaio que o autor utilizou nessa primeira obra para a desmitologização da

«mensagem fotográfica» veiculada pelas mídias: O Estado de São Paulo e A

Folha de São Paulo.

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Esse gênero é um tipo de texto em prosa que analisa, interpreta ou

avalia um tema de maneira oficial ou livre. Considera-se um gênero literário,

igual à poesia, à narrativa e ao drama. Trata-se de um escrito sério e

fundamentado que sintetiza um tema significativo – política/eleições –, possui

um caráter preliminar e introdutório e, por último, apresenta argumentos e

opiniões sustentadas, neste caso, no corpus da pesquisa.

Sendo assim, os ensaios que constituem este último capítulo explicam,

analisam e interpretam o tema político das eleições para a Prefeitura de São

Paulo em 2012. Mesmo que no ensaio não exista a obrigatoriedade

documental, o corpus do trabalho segue o rigor das notícias no percurso desse

processo.

Uma vez instituídas estas premissas, estabeleceu-se uma metodologia

de análise de ambas as mídias impressas, na tentativa de isolar aqueles

elementos que intervêm no processo de sistematização da mensagem

fotográfica e constituem o conteúdo ideológico dos meios. Usaram-se tabelas

montadas em função de indicadores e atributos documentais; indicadores de

codificação fotográfica, e indicadores de codificação de página para, enfim,

ensaiar na linha da desmitologização proposta por Barthes.

Nesse sentido, procurou-se apenas ensaiar a respeito desse processo

inaugurado pelo semioticista, sem nenhuma pretensão, a não ser seguir as

suas orientações sobre o modo de desmitologizar a «mensagem fotográfica»

das mídias escolhidas para este propósito.

Por esta razão, o capítulo aborda através de três ensaios a

aplicabilidade do processo de desmitologização às três categorias – trucagem,

pose, sintaxe – que juntas representam mais de 55% das imagens veiculadas

por O Estado de São Paulo e pela Folha de São Paulo na transmissão das

«mensagens fotográficas» veiculadas no processo eleitoral, segundo

demonstram o corpus do trabalho.

O primeiro ensaio, intitulado «Das bandeiras partidárias às notações

caricatas no tom do debate político eleitoral», descreve o código da trucagem

como possibilidade da imagem ser retocada, transferida ou transformada em

função da intencionalidade comunicativa das alianças políticas. Aborda a

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caricatura como a expressão mais eloquente para o tema político durante o

processo eleitoral.

O segundo ensaio, intitulado «Posicionamento e pose na corrida eleitoral

à Prefeitura de São Paulo», analisa as estratégias ideológicas por meio da

metáfora da corrida eleitoral, que são colocadas em função dos interesses dos

partidos e das mídias também como uma estratégia de posionamento – pose

do partido e das mídias, determinando os efeitos de pose do candidato.

O terceiro ensaio, intitulado «O esteticismo da fotografia jornalística no

contexto cultural das eleições», interpreta os efeitos de sentido provocados

pelas mídias na convergência das tecnologias e da arte, sobretudo, quando se

trata do fenômeno contemporâneo da catarse oferecido aos leitores/eleitores.

3.1 . Trucagem – a alteração proposital da imagem fotográfica denotada

Roland Barthes, em Mitologias ([1954-1956]2006), coloca a questão das

tensões entre o conotado e o denotado no campo da fotografia contemporânea.

Especificamente no texto «Fotogenia eleitoral», Barthes trata com maestria o

papel da fotografia em campanhas políticas eleitorais, um jogo entre a

realidade, tanto histórica quanto simbólica; e a linguagem, neste mesmo

sentido, tentando explorar a «complexa retórica» resultante da interpretação da

relação imagem/texto.

Mitologias é uma coleção de 53 ensaios breves que Barthes escreveu para

uma revista literária sob a rúbrica «mitologia do mês». Esta coluna foi a forma

com a qual Barthes fez frente à explosão da cultura de massas na década

seguinte à Segunda Guerra Mundial – a chegada de um grupo

hipermercantilizado de meios: revista, cinema, rádio, televisão – que

configuravam a vida social de todos em um nível mais profundo, como uma

espécie de nova forma de gravidade psicológica. Barthes propôs a cultura de

massa a partir de Newton para identificar as leis de seu comportamento, provar

suas tensões e deixar de manifesto os limites invisíveis de sua influência.

A ideia básica de Barthes nessa obra é que o funcionamento de uma cultura

de massa é análogo à mitologia. O projeto semiológico consistiria em

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desmitificar tais mitos. Barthes não foi o único a escrever nos anos 50 sobre

esse tipo de trivialidades. Mas seu tom foi único: um rigor individual teórico que

modelou aforismos e fez compreender as coisas familiares do cidadão. Muitas

das ideias do autor se aplicam poderosamente à cultura contemporânea – daí a

atualidade de seu pensamento –, como aconteceu com a França do pós-

guerra. Nisto reside, por exemplo, a análise das fotos de campanha – ainda

populares hoje em dia – nas quais os políticos olham à distância para o futuro.

Barthes define a fotografia como uma nova alucinação, falsa no nível da

percepção, mas verdadeira no nível do tempo. E, em relação à imagem

fotográfica, considera que a fotografia só adquire seu valor pleno com a

desaparição irreversível do referente com o passar do tempo. Para Barthes,

«na realidade, aquilo que permite ao leitor consumir o mito inocentemente é o

fato de ele não ver no mito um sistema semiológico, mas sim um sistema

indutivo: onde existe apenas uma equivalência, ele vê uma espécie de

processo causal: o significante e o significado mantêm, para ele, relações

naturais». É esse jogo de significação que dá embasamento ao objeto de

pesquisa deste trabalho.

A lição básica de Mitologias é que tudo significa algo, sobretudo as coisas

que tentam parecer além do significado. E, se a cultura do século XXI tem

adotado algumas das lições de Barthes, o que se explora não é a cultura de

massas, mas uma crítica da mesma: a dissecção barthesiana de tudo, sem

importar a trivialidade. Isto acontece em todas as partes agora, quase sempre

em tempo real. Esta análise crítica é vital, interessante e consumível como a

cultura que se discute. Neste sentido, Mitologias situa o crítico no meio e entre

- ele não é um consumidor regular de cultura, mas, no entanto, é alguém

profundamente imerso nela, o suficiente para apreciar seus mecanismos

internos.

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Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo Celso Russomanno, Fernando

Haddad e José Serra

Papel Candidatos à prefeitura de SP em

2012.

Partido PRB, PT, e PSDB respectivamente.

Episódio Charge de Celso Russomanno,

Fernando Haddad e José Serra.

Data de obtenção 30/09/12

Meio O Estado de São Paulo.

Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Geral

Impressão gestual Celso Russomanno está

caracterizado com o fardamento da

Guarda Municipal, ladeado por um

cão; Fernando Haddad segura um

bilhete único ao lado de uma placa de

um ponto de ônibus; e José Serra

está caracterizado como um professor

tendo ao fundo um quadro negro.

Ação/Estaticismo Estáticos, pois a imagem dos

candidatos têm o movimento

paralisado.

Cenografia Por se tratar de uma charge há uma

contextualização com signos que

representam a principal proposta de

campanha de cada candidato: Celso

Russomanno: ampliar o efetivo da

Guarda Civil Metropolitana; Fernando

Haddad: criar o bilhete único mensal

que permite o uso ilimitado em ônibus

municipais por uma tarifa de R$140

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100

(trabalhador) e R$70 (estudantes); e

José Serra: criar uma rede municipal

de ensino técnico.

Verticalidade Picado – plongée.

Equilíbrio Há predomínio da simetria na

imagem.

Angulação Apresenta uma visão geral, mas sem

uso de objetiva por se tratar de uma

charge.

Simbolismo O simbolismo se dá pela

caracterização de cada candidato a

partir de sua princiapal proposta de

campanha.

Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página OESP, 30/09/12, Cad.Nacional, pág.

A6

Tamanho As imagens ocupam todas as 5

colunas do jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Há correspondência, pois o título da

matéria (“As bandeiras levantadas

pelos favoritos”) remete à

caracterização feita nas imagens dos

candidatos. O próprio texto analisa as

propostas de campanha de cada

candidato e busca ouvir especialistas

nas áreas de saúde, educação,

segurança e transporte para avaliar o

projeto de cada candidato.

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101

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102

Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo Celso Russomanno, José Serra,

Fernando Haddad e Gabriel Chalita.

Papel Candidatos à prefeitura de SP em

2012.

Partido PRB, PSDB, PT, e PMDB

Episódio Charge dos candidatos

Data de obtenção 22/09/12

Meio Folha de São Paulo.

Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Geral

Impressão gestual A imagem dos painéis dos candidatos

aparece como se estivessem

«posando para foto».

Ação/Estaticismo Estáticos, pois a imagem dos

candidatos tem o movimento

paralisado.

Cenografia A imagem caricaturada dos

candidatos aparece como se

estivessem dançando ou tocando um

instrumento musical.

Verticalidade Picado – plongée.

Equilíbrio Há predomínio da simetria na

imagem.

Angulação Prioriza-se um plano geral.

Simbolismo O simbolismo se dá pela distorção

feita na imagem de cada candidato

somada à referência musical

(simbolizada pelos gestos e

instrumentos musicais).

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103

Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página FSP, 22/09/12, Cad. Poder, A14.

Tamanho A foto ocupa 4 das 6 colunas do

jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Há concordância das charges –

candidatos dançando ou tocando

instrumentos – com o título da matéria

– «Candidatos tentam fugir de fórmula

surrada nos jingles» – porque

aparecem Russomanno, Serra,

Haddad e Chalita dançando.

Das bandeiras partidárias às notações caricatas no tom do debate político

eleitoral

Tanto O Estado de São Paulo quanto A Folha utilizam a trucagem como

um código da conotação que influencia a leitura da imagem fotográfica de seus

leitores. Na busca por refletir o cenário político das eleições para a Prefeitura

de São Paulo em 2012, ambas as mídias desenvolvem um discurso jornalístico

no qual assumem clichês, estereótipos e modelos culturais para declinar as

ideologias da redação e fazê-las produzir efeitos de sentidos sobre seus

leitores/eleitores. Além desses códigos e aquém de sua literalidade analógica,

a fotografia é uma marca referencial dessa realidade mostrada e determinada

pelo tempo e espaço do jornal direcionado às massas.

Assim, a trucagem, que trabalha com a imagem fotográfica na sua fonte

documental, pode ser retocada, transferida ou simplesmente transformada em

outra imagem, porta-voz de um enunciado, sendo este político, eleitoreiro ou

partidário. Tal código parece fazer parte de um jogo no qual interessam apenas

os resultados. Neste sentido, a caricatura converteu-se na expressão máxima

da trucagem como crítica bem-humorada e de deboche dos partidos políticos e

de seus candidatos. A técnica consiste em escolher os traços mais marcantes

de um personagem político e de exagerá-los ou simplificá-los para causar

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104

comicidade ou para destacar um defeito ligado à sua conduta moral, que, aliás,

parece ser uma estratégia crucial em tempos de eleição.

O Estado abre sua página mostrando as raízes do problema político

incrustadas na aposta dos princípios ideológicos; acreditar neles e na

necessidade de agentes públicos que cuidem e protejam a lei parece ser o

oráculo que introduz à materia objeto da trucagem. É como se houvesse um

corte também radical em relação ao gênero da matéria principal.

Claro, a informação vem da mídia, não podia ser de outra forma, em se

tratando dos programas de governo que apresentam de forma minimalista. As

três bandeiras mais eloquentes das intenções de voto são: Celso Russomanno,

Fernando Haddad e José Serra. A essência da trucagem apresenta a figura

oriunda da imagem fotográfica, pelo menos isso é costume na caricatura

jornalística, que traz os três personagens de cabeça grande em relação ao

restante do corpo, as pernas arqueadas e os pés convergindo à frente.

Contudo, a primeira encarna o agente da guarda civil metropolitana,

acompanhado de um cachorro, também treinado para esta função. O apito para

chamar a atenção recolhe um traço da personalidade do candidato, que se une

à farda daquele que bate continência ao propósito do PRB. A segunda é a

bandeira do usuário do transporte coletivo que sorri no ponto de ônibus,

segurando o bilhete único, rumo ao itinerário petista. A terceira alça o emblema

do PSDB, na haste do ensino técnico de um professor com experiência,

indicando o respeito que se deve ter pela tradição magisterial.

Tratam-se das bandeiras de campanha que, como em qualquer

juramento, representam apenas promessas caricaturizadas que podem virar

marcas de gestão. Chama a atenção o dado surprendente: apenas o candidato

do PT segura a bandeira do usuário, seja por acaso ou de modo proposital –

vide a assesoria de propaganda –, o código de trucagem conota da imagem

seu poder identificatório com o público usuário desta mídia.

Já A Folha, nessa mesma linha, vai para as desculpas do apelo popular

da chamada «fórmula surrada dos jingles» que deram o tom musical verdadeiro

à campanha. Mas, antes, cabe à função fática, aplicada ao leitor nessa dança,

responder qual é a música que quer dançar? Sabe-se dos efeitos da música

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105

sobre aqueles que são bons dançarinos, sobre aqueles que terminam,

literalmente, dançando conforme a música e, aqueles que deixam o baile por

aborrecimento ou falta de opção. Nessa sátira da Folha aparece um novo

dançarino: «Chalita» que parece igual aos outros três candidatos saídos de

uma gafieira.

Russomanno, de amarelo, dança axé, sertanejo universitário e a

lambada porque “é dez e ninguém se engana”- nem com a letra, nem com sua

retórica propagandística; Serra, de preto, também na onda do sertanejo

universitário, evoca o clamor de seus eleitores que o querem de imediato no

comando da Prefeitura; ele não tem tempo a perder; Haddad, de azul, em um

mix de recitação, erudito, balada pop e rap, ressalta na letra a imagem de um

homem novo para um tempo novo da cidade, mesmo sendo ele o próprio

semblante de velhos correligionários do partido; e Chalita, de cinza, exalta o

rock rural, em primeiro lugar, mostrando que o sonho de sua candidatura

urbana nessa balada é uma «coisa de louco».

Por um lado o ritmo, por outro, a letra; ambas as categorias notadas

vêm ao encontro de reforço das caricaturas, que usam como referente a

denotação da imagem fotográfica - pelo menos do rosto; já a aplicação plástica

das cores nas roupas contribuem à técnica da trucagem, que permite ao leitor

se identificar com o gosto «da galera», como diria Caetano, citado no pé da

página, a propósito de um comício relâmpago no Rio. Essa é a missão, visão e

valores de uma mídia como A Folha, que clama pelo consentimento popular de

seus leitores.

Entre as bandeiras e o som, a trucagem da imagem fotográfica resulta

em um recurso mais do que apropriado quando se trata de campanhas

eleitorais. A alteração proposital da realidade, como um selo de garantia para o

leitor/eleitor, converte-se em um traço de estilo que define, por um lado, uma

mídia formal destinada a leitores informados e preocupados com o acontecer

político do país e, por outro, uma mídia mais popular destinada a leitores

interessados em aspectos anedóticos e espetaculares da informação.

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106

3.2 Pose – entre a objetividade e a subjetividade do estereótipo social

A iminência dos novos cenários de campanhas políticas reascende a

discussão sobre as estratégias de posicionamento de candidatos e propostas

perante as exigências do público eleitor, frente ao reconhecimento da

crescente diversidade populacional na qual emergem questões de índole

procedimental como oportunidades e formas de divulgação. Por isso, a primeira

questão a levar em consideração nesta pesquisa é a mensagem fotográfica

atrelada aos meios de comunicação, que na contemporaneidade exibem uma

grande quantidade de meios e linguagens.

O público cidadão tem se especializado, o que significa que é cada vez

mais heterogêneo – e ao mesmo tempo mais informado; há uma enorme

dispersão informativa, distintas modalidades de entretenimento, ócio e

alienação da realidade, assim como os próprios meios proporcionam distintas

modalidades de percepção do mundo, da verdade observada e relatada.

Nestes cenários de complexidade comunicacional cabe destacar o valor do

discurso político como via de consolidação de uma representação subjetiva,

paradoxal e compartilhada. Trata-se da enunciação que postula valores

apoiados em situações de desigualdade e iniquidades vivenciadas, não

imaginárias, para que a partir daí os meios convoquem vontades

aparentemente dispersas e diversas.

O grande problema atribuído às campanhas políticas por parte da cidadania

é que estas campanhas são mais bem campanhas publicitárias da imagem, ao

invés de campanhas políticas de ideias e projetos. Neste sentido, para Barthes,

a pose assume lugar de destaque por apresentar o candidato à luz de uma

mensagem que vai além.

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108

Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo Lula, Marta Suplicy, Fernando

Haddad, e Dilma Rousseff.

Papel Ex-presidente do Brasil, ex-ministra do

governo Dilma, Candidato à prefeitura

de SP em 2012, e atual presidente o

Brasil, respectivamente.

Partido PT

Episódio Comício em Itaquera

Data de obtenção 02/10/12

Meio O Estado de São Paulo.

Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Curto

Impressão gestual Ex-presidente Lula aplaudindo, Marta

Suplicy falando ao microfone, e

Fernando Haddad abraçado à

presidente Dilma Rousseff.

Ação/Estaticismo Estático e com olhar dirigido ao

público.

Cenografia O candidato Fernando Haddad veste

um casaco preto/azul e uma camisa

vermelha, ladeado pela presidente

Dilma – também de vermelho – sob os

aplauss do ex-presidente Lula vendo a

ex-ministra Marta Suplicy discursar

sob um palanque. Ao fundo, várias

pessoas do partido com um leve

desfoque.

Verticalidade Picado – plongée

Equilíbrio Há predomínio da simetria na

imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

meia-tele e um corte na foto final.

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109

Simbolismo O simbolismo se dá pelo tom de

vermelho da camisa do candidato

Haddad, do vestido da presidente

Dilma, da bandeira do PT ao fundo e

pela presença dos nomes de maior

representatividade no partido: Lula e

Marta.

Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página OESP, 07/10/12, Eleições 2012,

Nácional, pág. A5

Tamanho A foto ocupa as seis colunas do

jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Há concordância da foto com o texto

por usar no título da matéria uma

frase dita pela presidente Dilma

«Estou aqui metendo o bico», vendo-

se a presença da presidente no

palanque no candidato Haddad.

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111

Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo Fernando Haddad

Papel Candidato à prefeitura de SP em

2012.

Partido PT

Episódio Comício de Fernando Haddad em

Itaquera

Data de obtenção 02/10/12

Meio Folha de São Paulo.

Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Curto

Impressão gestual Na foto vê-se o candidato Fernando

Haddad ladeado do ex-presidente

Lula e da presidente Dilma Rousseff,

que aparece ao centro com os braços

levantados e dados ao candidato e a

Lula.

Ação/Estaticismo Estático, pois não há elementos na

foto que transmitam ideia de

movimento.

Cenografia O candidato está em meio a várias

pessoas em um palanque de comício

em Itaquera, junto ao ex-presidente

Lula e à presidente Dilma Rousseff,

de braços dados.

Verticalidade Picado – plongée.

Equilíbrio Há predomínio da simetria na

imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

teleobjetiva ou meia-tele.

Simbolismo O simbolismo se dá pela presidente

do Brasil estar ao centro da imagem,

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112

demonstrando seu apoio ao

candidado, e quase que celebrando

uma possível vitória.

Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página FSP, 02/10/12, Cad. Eleições2012,

pág.1

Tamanho A foto ocupa as 6 colunas do jornal.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Há concordância da foto com o fato

noticioso porque vê-se a presiente

Dilma marcando presença no comício

de Haddad, demonstrando seu

irrestrito apoio ao

candidado,demonstrando «...o dever

de meter o bico em SP».

Posicionamento e pose na corrida eleitoral à Prefeitura de São Paulo

O partido, a mídia e o candidato, esse é o gride de largada de cada

escuderia na corrida eleitoral à Prefeitura de São Paulo. Antes da largada, o

partido político precisa se posicionar. Tal posicionamento consiste no ato de

determinação perante a situação atual do país e cabe a esse dar conta da

imagem que deseja veicular através da mídia. Já a pose é um código da

conotação que, uma vez decupado, assume sua qualidade de gesto

convencional atribuído ao candidato. Entre o posicionamento do partido e a

pose do candidato, a evolução dos sistemas de informação, destinados a dar

suporte aos processos de tomada de decisão, dão à mídia um papel decisivo

nessa corrida, tratando cuidadosamente dos processos de tomada de decisão

de seus leitores/eleitores e se aproveitando do momento para capturar

audiência.

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113

Nesse cenário competitivo de «corrida maluca», a fotografia jornalística

trabalha por captar os traços dos candidatos a partir de uma reserva de

atitudes estereotipadas, devidamente capturadas, registradas e projetadas na

campanha. Estas se convertem em um elemento de significação ideológica a

favor dos princípios emblemáticos do partido. Na pista dos interesses e do

oportunismo, a política e o consenso político seguem o fluxo em e através da

mídia.

Os partidos usam a mídia para seus fins - ganhar na reta final, e os

jornalistas fazem da política o centro de suas reportagens para captar

audiência. Desde diversas repartições dos poderes do Estado, dos partidos

políticos e de outras instituições, exerce-se uma influência direta nos conteúdos

dos meios de comunicação – diretivas sobre o tratamento de um tema ou do

veto sobre assuntos e personagens do cenário público. A mídia é

definitivamente, nos dias de hoje, a fonte mais importante da apreensão da

realidade dos eleitores/leitores da fórmula 13, 45, 10 e 15, entre as mais

cotadas para o grande prêmio da Prefeitura de São Paulo em 2012.

A maior parte do conhecimento do cidadão a respeito da competição

vem das crônicas informativas da mídia. Todo dia começa uma luta nessa

«sociedade da midiocracia», por conseguir a atenção do público sobre os

acontecimentos informativos, luta esta que se dá em diferentes planos. Por um

lado, os candidatos competem pela atenção da mídia; por outro, a mídia

compete para conseguir a atenção de seus leitores/eleitores.

Tudo leva a crer que existem alianças entre a mídia e os partidos

políticos - é isso o que impede o pluralismo ideológico na mídia. Somados a

isto, os interesses econômicos dos veículos midiáticos permitem que cada um

mostre apenas o que lhe interessa mostrar. Levando em consideração que só

uma minoria do eleitorado obtem informação por meio de diversas fontes,

conclui-se que existe ainda grande desinformação e suprainformação - e isto

não faz bem à comunidade porque o espectador que não é informado não pode

ter opinião, e o espectador que não tem opinião não pode tomar decisões. Por

fim, o espectador que não pode tomar decisões não é um espectador com

«liberdade de expressão» para escolher por quem vai torcer na corrida.

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114

Não é à toa que a categoria da pose é estatísticamente a mais usada

pela Folha e o Estado de São Paulo – veja-se o corpus deste trabalho. O

brasileiro insiste em considerar que ainda o poder político toma conta do país,

em uma espécie de reedição das culpas de seus antepassados, sem enxergar

no fenômeno da globalização e do multiculturalismo uma oportunidade ímpar

de sair desse engodo e garantir bons resultados.

Mas, vamos aos veículos e seus corredores. A pose destes últimos está

fundamentada na artificialidade proposta pelos modelos e/ou pelo próprio

fotógrafo. Sabe-se que alguém que posa se metamorfoseia, monta-se para o

registro fotográfico do jeito que quiser; e ao fazê-lo, constrói o modelo através

do qual deseja ser conhecido e visto nas mídias sociais.

A pose do modelo prepara a leitura desejada dos significados da

conotação. Definindo-se a partir das atitudes estereotipadas que constituem

feitos já de significação, uma espécie de gramática histórica da conotação

iconográfica que busca seus materiais na cultura de massa. A mensagem dos

veículos não é a pose em si do condutor do veículo, mas os sentidos que ela

transmite sobre o piloto. Aparentemente, ao leitorado/eleitorado é uma imagem

que produz uma mensagem denotada, no entanto, é uma estrutura dupla,

composta de denotação e conotação, como se veio observando em outros

grides de largada.

Então, vejamos: O Estado de São Paulo traz o candidato Fernando

Haddad na pista 13 do PT junto a Lula, Marta Suplicy e a presidenta Dilma

Rousseff, que disse estar aí na corrida para justamente «meter o bico». Tanto o

candidato em segundo plano quanto a presidente em primeiro levam o

vermelho como a cor distintiva do partido, e a comitiva bate palmas e sorri no

comício celebrado na Zona Leste de São Paulo. O ato organizado da escuderia

é para responder às declarações de Serra sobre o «mensalão». Lula chama os

da escuderia tucana de intolerantes. Esta fala politizada se opõe ao mito da

corrida eleitoral, permanecendo o tempo todo fiel ao ideal da política partidária,

pois a revolução esquerdista, sempre velada, adequa-se à comodidade de

suas utopias e não à necessidade que esta escuderia tem de se reafirmar no

cenário político da cidade de oposição.

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115

Da pose de Haddad e o posicionamento da sua equipe, estabelece-se o

itinerário do PT em relação ao regime de propriedade, ordem e ideologia

projetada para a cidade. Observa-se o direcionamento do veículo O Estado de

são Paulo para uma leitura crítica de negação, do «capitalismo pelo

capitalismo», e à rejeição a este meio que o usa como alvo de suas críticas. Ao

passar do real para sua representação, o PT se acomoda aos fatos que lhe

oferecem interesses partidários, mas não se integra aos novos valores que

propõe o fenômeno da globalização às escuderias em competição, sendo o

candidato e sua pose apenas um pretexto partidário que signatariamente aceita

o patrocínio do Bradesco, via TV aberta, uma «Presença lado a lado» junto ao

eleitor do PT e contra o PSDB. O apelo na TV de Haddad é o voto útil para

chegar ao segundo turno na corrida eleitoral.

Em contrapartida, a Folha perante essa mesma notícia, acrescenta

«Dilma diz ter o dever de meter o bico em São Paulo». Agora, é a escuderia

inteira que levanta os braços ao céu em sinal de culto ao princípio do dever no

exercício de cidadania e da liberdade de expressão. Lula pede apoio a Haddad.

E Dilma só o estava apoiando porque Lula pediu. O óbvio não está nesse pacto

entre os petistas de apoiar a candidatura de Fernando Haddad. O óbvio está no

complemento da frase da manchete, «estou aqui metendo meu bico porque

São Paulo é um fato» e, sobretudo, o lugar onde moram milhões de brasileiros

eleitores. Não se tem como dirigir o Brasil sem meter o bico em São Paulo, dirá

a seguir a atual presidente.

Depois deste episódio, Haddad ouvirá da madrinha que se ela fosse um

«certo candidato» ela ficaria de bico fechado. Logo, o jornal traz a imagem de

Serra fazendo um sinal de positivo e com a boca aberta. Mais um comercial,

viagem da presidente será pago pelo PT para ninguém sequer imaginar o uso

da máquina pública na direção da corrida da fórmula 13.

Enfim, o recurso estilístico do posicionamento na fotografia jornalística

está destinado a mostrar a pose do partido, enquanto, a pose propriamente dita

dirige-se ao candidato que representa esse partido por meio de gestos, atitudes

e comportamentos condizentes com sua ideologia. Na corrida eleitoral, O

Estado de São Paulo é a mídia que mitologiza pela ordem, usando uma

linguagem que imuniza o imaginário coletivo, com logística para compreender o

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116

real atrelado ao fato econômico dos gastos do mensalão. A Folha, por sua vez,

despolitiza o mito neoliberal através de uma linguagem operatória ligada a seu

objetivo de forma transitiva: entre o objeto e o sujeito só existe um ato, o

político, transformando o real em uma experiência revolucionária da população

paulistana. Nessa experiência, a fala do oprimido e excluído é real, emergente

e essencial.

Por esta razão, a desmitologização barthesiana é mais do que

necessária para entender os verdadeiros propósitos dos meios de

comunicação social no contexto eleitoral para a Prefeitura de São Paulo, cujos

resultados são eloquentes a respeito desse processo que faz eco na atual

situação política do país.

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117

3.3 A sintaxe e a declinação significante do sentido

Qualquer estudo ligado à imagem assinala de entrada um problema

ligado às suas origens. Na origem do mito da imagem está a ausência e o

desejo de conservar um vestígio físico da presença por meio do registro, com o

fim de abolir o tempo. Desta forma, a categoria fundadora da imagem não é a

figuração ou imitação de algo que já existe, mas sim a necessidade de

prolongar o contato, a proximidade e o desejo de que o vínculo permaneça.

REGIS DEBRAY (1994) afirma que a imagem nasce da morte, como uma

negação do nada e prolongação da vida, de tal forma que entre o representado

e sua representação se produza a transferência da alma.

Sendo assim, a imagem fotográfica não é uma simples metáfora dessa

ausência, mas uma imagem técnica, produto da modernidade que recupera

essa carga mítica da origem. Contudo, Roland Barthes afirma que a fotografia

é literalmente uma emanação do referente da realidade. Deste modo, a

fotografia conduz ao universo iconográfico uma imagem precisa, objetiva e

literal, porém em essência é um signo emanado diretamente de seu referente.

Isto é, a imagem é testemunha real no passado do corpo ao qual faz

referência. Este é o chamado noema da fotografia que certifica que o referente

já foi. Essa faculdade de atestar o que foi, de reter o que se desvanece, é a

memória, constitutiva da condição humana. Tanto a noção do real quanto a

essência da identidade individual dependem da memória, fazendo com que a

vida seja em essência movimento e transformação.

Deste modo, a memória vincula o passado e o presente, produzindo

uma dupla operação: abolir o tempo e, ao mesmo tempo, representá-lo. É essa

a operação que a fotografia realiza através da detenção, do corte – clique -, a

redução de um instante coloca em evidência o excluído, ou seja, a

continuidade, o tempo que flui. Talvez esta seja a questão fundamental da

fotografia, quem olha uma fotografia valoriza o salto entre o momento em que o

objeto passou e o presente em que se contempla a imagem. A memória, neste

sentido, une o atual com o passado e a ela se recorre para rastrear as origens

das coisas, mas também para decifrar de alguma maneira o que virá. Sendo

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118

assim, este trabalho indaga a respeito das campanhas políticas que oferecem

uma prefiguração do sentido, uma vez que se assentam neste princípio.

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120

Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo José Serra, Gabriel Chalita, Fernando

Haddad, e Celso Russomanno

Papel Candidatos à prefeitura de SP em

2012.

Partido PSDB, PMDB, PT, e PRB

Episódio Candidatos ‘gastam sola’ com roteiros

conhecidos

Data de obtenção 06/08/12

Meio O Estado de São Paulo.

Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Geral

Impressão gestual Os quatro candidatos aparecem

andando de bicicleta, e em outro

momento aparecem tomando café e

em companhia do público.

Ação/Estaticismo Estático, embora a posição do

candidado sugira um certo movimento

que foi congelado.

Cenografia Os candidatos vestem roupas

esportivas quando estão andando de

bicicleta, e variam do formal ao casual

quando estão tomando café junto ao

público.

Verticalidade Picado – plongée

Equilíbrio Há predomínio da assimetria na

imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

objetiva normal ou meia tele.

Simbolismo O simbolismo se dá pela imagem de

desportista que todos querem

transmitir quando andam de bicicleta;

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121

E de populares quando tomam um

cafezinho em meio ao público.

Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página OESP, 06/08/12, Cad. Nacional,

pág.A8

Tamanho As fotos ocupam praticamente

metade da página (5 das 6 colunas da

meia-página).

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Há concordância da foto com o texto

pelo fato de a expressão “gastar sola”

ter o sentido de “andar”.

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123

Tabela 1 – Indicadores de atributos documentais

Protagonismo Fernando Haddad, Gabriel Chalita e

José Serra

Papel Candidatos à prefeitura de SP em

2012.

Partido PT, PMDB e PSDB, respectivamente.

Episódio Candidatos vão à missa

Data de obtenção 13/10/12

Meio Folha de São Paulo.

Desenhos e procedimentos da campanha

Tabela 2 – Indicadores de codificação fotográfica

Enquadramento Curto

Impressão gestual Tanto a imagem do Haddad quanto do

Serra aparecem sérios e

compenetrados.

Ação/Estaticismo Estático e com olhar para frente.

Cenografia A imagem dos candidatos em meio ao

ato religioso em meio a elementos

simbólicos da igreja católica (biblia,

batina, etc.)

Verticalidade Picado – plongée

Equilíbrio Há predomínio da assimetria na

imagem.

Angulação É provável que tenha sido usada uma

meia-tele/teleobjetiva.

Simbolismo O simbolismo se dá pela imagem dos

candidatos em meio ao ato religioso,

denotando a seriedade e o

compromisso com os ensinamentos

de Deus.

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124

Correspondência fotográfica – codificadores da campanha

Tabela 3 – Indicadores de codificação de página

Página FSP, 13/10/12, Pode, A10

Tamanho A foto ocupa 3 das seis colunas do

jornal da meia-página.

Correspondência fotografia/Fato

noticioso

Há concordância da foto com o texto

por se ver o ambiente de uma igreja.

Fotogramas de um passeio eleitoral

A sintaxe é o código da fotografia que retrata o movimento da imagem,

mesmo que esta seja capturada e sinalizada apenas pelo enquadramento ou

pelo posicionamento do objeto – candidato e partido –, insinuando a ordem de

deslocamento, mobilidade e direção.

Trata-se de uma categoria propícia à desmitologização, por isso a

técnica do fotograma e o mito no passeio eleitoral. Na maioria das vezes, essa

ação sequencial está ligada à visitação política dos candidatos a lugares

estratégicos durante o tempo de campanha. Não é à toa que é a categoria

preferida dos leitores/eleitores do Estado e da Folha de SP. Algumas vezes,

para pedalar de capacete pelas ruas da urbe paulistana, outras, para a

peregrinação à missa e ganhar o voto de eleitores fieis e, claro, rumo à padaria

para tomar um cafezinho com seus fregueses.

Com isto, mostra-se serviço por parte do candidato que frequenta os

lugares onde o povo se sente à vontade, forçando uma situação de

proximidade com coisas corriqueiras como saúde, crenças e cultura local.

Vinda do pressuposto discursivo dos objetos-sígnicos, a sintaxe opera

no interior da mensagem fotográfica, produzindo um encadeamento dos

acontecimentos que se ordenam no tempo e no espaço para dar um sentido

mais dinâmico e eleitoreiro à realidade em ritmo de repetição.

Pensar na desmitificação das imagens imbricadas aos textos em ambos

os jornais, é como imaginar o antes e o depois do instante fotografado, porque,

como se sabe, o interesse é sempre «sair bem na foto». Algumas vezes, é a

imagem que movimenta o texto, em outras, o texto que movimenta a imagem.

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125

Ambos os códigos, denotados e conotados, mobilizam o olhar do leitor,

conduzido pelo itinerário político do partido que, todas as vezes, é mobilizado

pela mídia.

Desses itinerários, o Estado de São Paulo mostra a «gastação de sola»

dos candidatos à Prefeitura que seguem o roteiro das ruas da zona Leste pela

qual pedalam, vão ao templo religioso e à padaria da esquina. A

intencionalidade desses passeios segue a programação de uma pauta

ideológica bem clara sobre os princípios do bem-estar do cidadão comum que

investe em qualidade de vida.

Nisso, o jornal apresenta pelo menos quatro dos candidatos realizando

esses itinerários que exaltam a seriedade de Serra, a familiaridade usual de

Haddad, o oportunismo de Russomanno e a vibração de Chalita. Embora, tais

candidatos fora do foco da mídia, não realizem este tipo de visitações no seu

dia a dia, mas, em se tratando da campanha eleitoral, vale o voto.

Em contrapartida, a Folha leva seus leitores a uma visita mais

espiritualizada, mostrando Haddad e Serra comungando nessa ocasião do

corpo de Cristo que é a Igreja, a católica, apostólica romana; antes desta visita

canônica havia sido a igreja protestante a anfitrioa de tão ilustres visitantes. O

primeiro dos candidatos escuta de modo casual a pregação do ministro durante

a liturgia da palavra, o segundo, mais formal e austero, participa do fim desse

momento litúrgico em que o padre beija as Sagradas Escrituras em sinal de

veneração.

Embora o espaço seja sagrado, os candidatos parecem não se

fraternizar no momento da paz promovido pelo ato. Estiveram no mesmo culto

como mostram as tomadas, em distintos horários e, ao final, proferiram

acusações via imprensa, em um gesto pagão de pura heresia. Neste sentido, o

ato de desmitologização funciona como uma espécie de exorcismo, que

expurga a imagem fantasiada do candidato possuído por um corpo que não lhe

pertence.

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126

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Destacou-se neste trabalho o valor teórico da «mensagem fotográfica»

que no contexto da referencialidade – informação de atualidades – do

jornalismo sucede a escolha da imagem com o intuito de reforçar o contexto

histórico, político e cultural da mensagem transmitida. Deste modo, a

conotação adquire um papel importante para informar e comunicar a

leitores/eleitores sobre o processo eleitoral em pauta. Este princípio no qual se

insere a «mensagem fotográfica» revela o caráter «desmitificador» proposto

por Roland Barthes na célebre obra Mitologias. Desmitificar, portanto, constitui-

se em um elemento essencial da crítica em que o mito é constitutivo do

imaginário social que se analisa.

A partir do princípio que na «mensagem fotográfica» coexistem duas

mensagens: a analógica, ligada diretamente à imagem, e a simbólica, à

realidade social, escolheu-se esta última para justificar a legitimidade da

imagem no uso que o jornalismo faz dela no contexto contemporâneo da

cultura midiática. Por isso, o uso das tecnologias, a escolha dos temas, a

inovação nos estilos, as práticas políticas de divulgação, recepção e interação

vêem à tona na interpretação do corpus desta dissertação.

Dos objetivos formulados, o geral realizou-se de forma completa, haja

vista o uso do corpus da Campanha Eleitoral para a Prefeitura de São Paulo

em 2012, seja para a ilustração das categorias da «mensagem fotográfica»,

seja para a análise da mesma no período contemplado do dia 1º de agosto ao

31º de outubro de 2012. No que se refere aos objetivos específicos, também

foram contemplados a fundamentação crítico-ideológica da proposta

barthesiana, extraída de Mitologias, relacionada com a desmontagem e

desmitificação, assim como a atualização do contexto social e cultural no qual

se deu a Campanha Política e a aplicação das categorias da «mensagem

fotográfica» expressas na Folha e em O Estado de São Paulo.

Pode-se constatar a influência da mídia sobre o público leitor/eleitor que

escolheu Fernando Haddad, como prefeito da cidade de São Paulo, a

exploração feita sobre a pose, a trucagem e a sintaxe na imagem do candidato

que recebeu o apoio irrestrito de figuras emblemáticas de seu partido,

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permitindo inferir o peso da mídia que lhe deu apoio, do mesmo modo que a

assessoria de imprensa, o trabalho de propaganda e o uso das tecnologias

digitais a favor da imagem de um prefeito jovem e com projeto inovador.

A fundamentação teórica capitalizou-se na obra de Roland Barthes

Mitologias e em «A mensagem fotográfica», utilizando-se apenas alguns

reforços em obras consideradas menores para este propósito.

Sobre a metodologia foi feito um levantamento do corpus em anexo que

veio ao encontro da leitura de Mitologias e aos princípios da «mensagem

fotográfica», resultando em uma análise de sujeitos e conteúdos, isto é do

protagonismo, do desenho da campanha e seus procedimentos, como também

dos codificadores da campanha que foram tabelados.

Deste modo, a estrutura ficou constituída por um primeiro capítulo que

contém os alicerces teóricos e metodológicos da «mensagem fotográfica»,

suas categorias e o contexto sócio-cultural das mídias escolhidas para este

propósito. O segundo capítulo foi uma amostragem dessas categorias

anunciadas e acompanhadas da notícia jornalística junto às tabelas de

classificação. Já o terceiro capítulo interpretou a página completa do jornal na

qual as notícias eram colocadas conforme os critérios de comunicação da

mídia impressa, mais um ensaio para cada uma das três categorias de maior

destaque nos jornais (pose, trucagem e sintaxe) de acordo com a pesquisa.

Contudo, este estudo trouxe alguns conteúdos como resultados a

considerar:

Do estruturalismo dialético de Barthes considerou-se o aspecto mais

imediato da percepção na tríade: signo, contexto sócio-histórico e o

translinguístico, utilizado pela mídia impressa na imbricagem da imagem e do

texto na mensagem jornalística. Mitologias (1952) desbrava uma sociologia

espontânea na qual o mito converte-se em um sistema semiológico eficaz para

a crítica ideológica da cultura de massas.

A conotação das narrativas midiáticas é uma categoria formal dos meios

impressos que constituem a sua mensagem, e a própria imagem emite um

significado que secretamente supera o teor do imediato. Este conceito é um

elemento essencial do mito e o trabalho de análise consiste em nomear este

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conceito. Nesta mesma linha, constatou-se que os processos de significação

trabalham a formação do sentido linguístico que vão além da significação

mítica motivada por um sentido ideológico da forma.

Para a análise desses mitos, que circulam no contexto social, levou-se

em consideração a proposta de leitura de Barthes que sugere: 1) a focalização

no significante vazio, conceito que preenche a forma do mito sem

ambiguidades, assim o significado é literal ou denotado; 2) a focalização do

significante pleno que discerne o sentido da forma que produz deformação; e 3)

a focalização do significante do mito, que transforma o sentido em forma. A

ideia principal destes procedimentos é que a cultura de massas é análoga às

mitologias. Uma ideologia política representada que se corresponde com a

cultura contemporânea. Tudo significa algo, sobretudo, as coisas que tentam

parecer além do seu significado. Neste ponto, infere-se um projeto semiológico

reinventado de Barthes em relação ao estruturalismo de seus antecesores,

prefigurando um futuro na dissecção de tudo aquilo que pode resultar trivial.

No meio de uma «sociedade de consumo» e do «espetáculo», o projeto

semiológico de Barthes atualiza-se no contexto histórico, político, econômico e

estético em que se codifica o papel do ser humano, segundo a própria

concepção ideológica e cultural.

Nessa linha, a introdução da dissertação assinalou o estudo da

mensagem fotográfica dentro do projeto semiológico de Barthes, adequando-o

ao modelo de comunicação no contexto da cultura de massa e ao papel da

mídia na contemporaneidade. Trata-se de uma campanha recente que trouxe

como novidade a escolha de um prefeito do partido de oposição ao governo de

São Paulo, estabelecendo, assim, um jogo político no qual a desmitologização

permitiu visualizar o papel dos meios de comunicação no resultado dessas

eleições.

A escolha da imagem fotográfica feita pela mídia impressa nos níveis de

produção, armazenagem e divulgação das notícias, antes de sua publicação,

corresponde a um trabalho de bastidores no qual prevalecem as negociações

entre os partidos, a mídia e os candidatos. E por se tratar de ideologias

dominantes, que mascaram e ocultam as contradições econômicas, políticas,

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129

sociais e culturais de uma cidade que é centro neuronal do sistema, estas

deixam em evidência a necessidade de desmitologizá-las na base do próprio

corpus dos jornais trazidos à pauta neste trabalho.

Sobre o projeto de pesquisa que serviu de pretexto à dissertação, ele foi

necessário porque teve a função de ser um arcabouço preenchido com o objeto

– a mensagem fotográfica, extraída de uma das obras posteriores à Mitologias,

mas que a resgata no afã de situar a desmitologização como uma metodologia

ad-hoc ao momento da campanha. Só se pode ser crítico perante essas e

outras situações do cotidiano político no Brasil uma vez que o distanciamento

se faz mais que necessário para dissertar a respeito. Justificou-se a imbricação

da mensagem denotada e conotada como resposta à miragem do paradoxo e

perante o realismo barthesiano, e, assim, concentraram-se os esforços em

analisar a campanha eleitoral no corpus de ambos os jornais. Nesse instante,

constatou-se que as amostras serviriam de suporte à critica ideológica dos

mitos ali presentes, suscetíveis de serem interpretados conforme o princípio

semiológico do apelo.

A hipótese no começo parecia um clichê, a influência das mídias na

captura de imagens. Mas com o passar do tempo, foi se transformando em um

processo bem claro de escolha, tratamento e consolidação na eleição do

candidato mais popular, resultado da mídia de maior tiragem e penetração nas

classes sociais emergentes de São Paulo. Fruto disto e de outros fatores

determinantes, como as negociações, anteriormente citadas, demonstrou-se

que o papel da mídia nesses processos é categórico.

Ao encontro disto, a fundamentação teórica se calcou na obra

Mitologias, de Roland Barthes, que é o embrião dos mitos contemporâneos que

perpassam a realidade social, e “A Mensagem Fotográfica”, que define uma

das práticas fundamentais do jornalismo, entre a obviedade dessa realidade e

o obtuso da intencionalidade comunicativa das mídias.

Por esta razão, os procedimentos metodológicos escamotearam os

princípios ideológicos para estabelecer uma direção em prol da perspectiva

crítica, cuja antessala foram as tabelas sugeridas, na qualificação, e que

assinalaram questões relativas aos atributos documentais na linha da

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denotação e da conotação dos traços, também documentais da composição e

diagramação da mensagem fotográfica presentes no corpus.

A atualidade do mito é a principal lição de Mitologias – obra prima que

aborda a realidade social da França na década de 1954. Ela serviu de modelo

para transferência operada ao entorno social da cidade de São Paulo na sua

convergência com as mídias impressas de caráter informativo e

comunicacional: O Estado de São Paulo, e a Folha de São Paulo. Dentro da

prática profissional da fotografia jornalística foram desmontadas nas suas

linguagens através das categorias da trucagem, pose, objetos, fotogenia,

esteticismo e sintaxe. Por sua vez, foram aplicadas na forma como estes

jornais abordaram a campanha política à prefeitura da cidade.

Assim, veio à tona que a leitura da imagem impressa é usada como

força expressiva do texto que outrora era o baluarte dessas mídias. Neste

sentido, constatou-se que o mito não se define apenas objeto de sua

mensagem, mas pela forma em que este se apresenta. Deste modo, os clichês,

estereótipos e modelos culturais verbais deram lugar às formas visuais dos

mesmos .

Do sistema semiológico do significante, significado e signo propostos por

Barthes, inferiu-se a noção de signo como um conceito pleno e cheio de

sentido, graças à imbricagem dos primeiros na sua relação com a mensagem

fotográfica que interessava decupar.

A fotografia impressa demandou uma análise direta na base das

categorias da trucagem, da fotogenia – a qual já existia um modelo utilizado

pelo próprio Barthes – e dos objetos, sendo a pose, o esteticismo e a sintaxe

categorias mais indiretas da latência do mito.

Nessa aproximação ao método de desmitologização, configurou-se um

modelo de comunicação no qual o emissor, a redação dos jornais O Estado de

São Paulo e Folha de São Paulo, sendo eles mesmos o canal ou veículo

através do qual se transmite a mensagem fotográfica nos dois planos,

denotativo e conotativo, indo ao encontro do contexto da situação social que a

cidade de São Paulo vivenciou na campanha eleitoral de 2012.

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Entre a objetividade da fotografia e o contraponto de sua mensagem

fotográfica, ancorou-se o mito da objetividade, fazendo com que o texto

complete a imagem, preenchendo-a de sentido e fazendo da conotação um

surtidor de novos significados. O contexto histórico, econômico, social e político

de São Paulo converteu-se, assim, no pivô de uma contemporaneidade na qual

esses jornais foram decisivos para definir a vaga para prefeitura da cidade de

São Paulo em 2012.

Sendo as categorias da pose, sintaxe e trucagem as mais utilizadas

pelas mídias impressas do Estado e a Folha de São Paulo, a desmitologização

formulou-se como o processo mais do que necessário para desvelar suas

verdadeiras intenções destas. Para isto, o ensaio resultou o gênero mais

apropriado para explorar os aspectos qualitativos da pesquisa.

Em relação à trucagem, o Estado que postou 25 imagens,

correspondendo a 6,26% do total dos dados coletados e, a Folha, com 69

imagens que correspondem a 14,87% do total, concluiu-se que o uso

emblemático dos programas de governo propostos pelos candidatos, cujas

denotações caricatas ironizadas por meio do exagero resultaram eficazes como

proposta. Atribuiu-se a esses a função midiática esperada pelo partido e pelos

leitores/eleitores de ambas as mídias, sendo a Folha a que utilizou a categoria

como uma estratégia comunicativa mais popular em detrimento da fotogenia

usada pelo Estado.

Já a pose se conjugou em torno do posicionamento do partido que

determinou a pose do candidato propriamente dita, nela o Estado escoou 173

imagens que equivalem a 43,36% e a Folha 186 imagens, 40,09%. Entendeu-

se a pose, em primeiro lugar como posicionamento do partido e, em segundo

lugar, como a pose decorrente do candidato. Ambas as ações demonstram o

potencial da categoria nesse processo da corrida eleitoral que, por um lado, no

caso do Estado, mitologiza a ordem no país e, por outro, a Folha terminou

despolitizando o mito econômico na sua formulação neoliberal como pode se

observar no gráfico a seguir:

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CATEGORIAS

Por fim, a sintaxe que traçou os itinerários de viagens dos candidatos e

seus partidos, O Estado colocou 136 imagens, 34,9% das mesmas, e a Folha

com 149 imagens, ou seja, 31,11% demonstraram, assim, como o leitor/eleitor

monitora os movimentos do candidato convertidos em um signo do partido,

simbolizado pela mitologização dos veículos na tentativa de consagrar suas

alianças partidárias. Não sendo a diferença porcentual muito expressiva,

ambas as mídias utilizaram a pose na sua dupla acepção como um recurso

eficaz de campanha, valorizando o uso da própria imagem como pode se

constatar no gráfico abaixo:

IMAGENS PUBLICADAS

4225

13

173

136

10

38

69

8

186

149

14

0

20

40

60

80

100

120

140

160

180

200

OESP

FOLHA SP

388

11

407

57

0

50

100

150

200

250

300

350

400

450

Fotografias Charges/Caricaturas

OESP FOLHA SP

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133

Estas últimas constatações deram-se em relação principalmente ao

segundo turno da campanha eleitoral à Prefeitura de São Paulo, no qual os

candidatos José Serra e Fernando Haddad, representando o PSDB e o PT

respectivamente, foram noticiados tanto por O Estado de São Paulo quanto

pela Folha de São Paulo que alavancaram através da pose e da sintaxe os

partidos mais representativos do país. Coube estabelecer a diferença às

categorias da fotogenia e da trucagem, decisivas no escrutínio final.

O resultado concluído demonstrou que o candidato vencedor era

possuidor de competências relacionadas com a imagem do usuário do

transporte coletivo, posando o tempo todo ao lado dos «padrinhos no poder» e

marcando nas suas ações um plano do governo sintonizado com as tendências

de gestão, renovadas nas suas bases partidárias, pelo menos isso foi o que a

mídia mostrou antes da consagração do candidato escolhido.

Conclui-se que esta dissertação abre uma série de possibilidades

importantes à leitura da mensagem fotográfica conotada pelas mídias

impressas, na sua tentativa de informar e comunicar, utilizando a mitologização

como uma linguagem direcionada às massas. No entanto, os especialistas do

campo da comunicação têm a obrigação de saber desmitologizar estes

procedimentos a favor da crítica com o devido distanciamento. Cada vez mais

a crítica é mais do que necessária em uma sociedade «deslumbrada» com os

desdobramentos do imaginário coletivo e «indiferente» com os compromissos

simbólicos do poder perante os desafios econômicos que demanda a cultura

contemporânea.

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