Por dentro da fábrica de açúcar
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Transcript of Por dentro da fábrica de açúcar
Como aumentar a produção de energia elétrica sem novos investimentos Pág. 15
Um novo teste para diagnóstico da cisticercose humana Pág. 20
Propostas para a educação em sociedades indígenas Pág. 22
Por dentro da fábrica de acúcar , Projeto Genoma Cana
. .. . va1 sequenc1ar genes relacionados com o metabolismo da sacarose e com a resistência da planta Pág. 8
EDITORIAL
Investindo em pesquisa em beneficio da sociedade
A boa ciência e a tecnologia criativa têm sempre um fim social - mais imediato ou mais longínquo, mais claro ou mais encoberto, o que importa é que elas o têm. E entre outras leituras possíveis do material reunido nesta edição do Notícias FAPESP, ele certamente nos sugere essa da finalidade social das pesquisas científicas e tecnológicas e, por conseqüência, dos investimentos que lhes são destinados.
Tomemos por exemplo, a matéria de capa sobre o lançamento do Projeto Genoma Cana, no qual estão previstos investimentos de R$ 8 milhões. O relato dessa nova iniciativa da FAPESP, com apoio da Copersucar, mostra que o Brasil está entrando uma vez mais em uma área de ponta, e estratégica, da pesquisa científica internacional - a de genoma de plantas. E o faz ocupando, de saída, uma posição de liderança em relação às pesquisas de cana-de-açúcar, dados o porte de seu projeto e a sofisticação da tecnologia (ESTs) que está utilizando. Registrese que essa liderança foi enfatizada pelos especialistas estrangeiros da área, que se reuniram na FAPESP, nos dias 12 e 13 de abril, e revelaram de pronto seu interesse em estabelecer parcerias com os pesquisadores de São Paulo.
Mas o projeto Genoma Cana, a par dessa espécie de internacionalidade científica que lhe confere um charme adicional , tem uma outra característica fundamental : seu profundo enraizamento na economia nacional. Como se sabe, o Brasil é o maior produtor de cana-de-açúcar, responsável por 25% da produção mundial, dos quais 60% saem de São Paulo. Nesse Estado, a agroindústria da cana movimenta R$ 8 bilhões por ano e gera 600 mil empregos diretos.
Ora, são precisamente dados dessa natureza que demonstram que aumentar substancialmente o conhecimento sobre a cana-de-açúcar- até então não há genes identificados dessa planta -, descobrindo, por exemplo, genes responsáveis pelo metabolismo da sacarose ou pela resistência dessa gramínea a
doenças e pragas, tem notórios efeitos sociais. Porque esse conhecimento pode permitir saltos incalculáveis nos programas de melhoramento genético da cana, nos quais o país já tem uma tradição de três décadas, capazes de levar a variedades com teor de sacarose muito mais alto e muito mais resistentes, com poderoso impacto direto sobre a renda do setor. E sabemos todos que um tal aumento de renda pode beneficiar não só empresários e trabalhadores desse setor mas in·igar a economia do país como um todo, que, se politicamente bem administrada, resulta sempre em indiscutíveis benefícios sociais.
Tomemos outro exemplo de pesquisa apresentada no material desta edição: o projeto temático sobre planejamento da operação de sistemas de energia hidrelétrica. As conclusões desse estudo apontam para uma possibilidade real de aumento da produção nacional de energia sem investimentos pesados em grandes obras de engenharia e sem problemas para o meio ambiente. Entendemos que, particulannente num momento em que o país se mostra carente de recursos, mesmo para investimentos essenciais, o patente significado económico e social dessa pesquisa chega a dispensar maiores considerações.
Vale a pena perceber o sentido social do investimento em pesquisa também na matéria sobre um novo teste para detecção da cisticercose humana. Simples, prático, barato e eficiente, ele substitui um caro teste importado ou métodos muito mais complexos de diagnóstico, inacessíveis à população de baixa renda - justamente a mais atingida por essa doença transmitida pela carne de porco contaminada. E para concluir, sentido social , sentido de construção verdadeira e necessária da cidadania neste país, é o que s·e percebe como pano de fundo do projeto sobre educação dos povos indígenas que estamos noticiando.
Exemplos assim é que têm dado à FAPESP a tranqüilidade de reafinnar que aplicar dinheiro em ciência e tecnologia não é gasto, é investimento. É fonnação de PIB.
Prof. Dr. Celso de Barros Gomes Equipe Responsável Coordenador- Prof. Dr. Francisco
RomeuLandi
Notícias FAPESP é uma publicação mensal da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo.
Conselho Superior
Prof. Dr. Carlos Henrique de Brito Cruz (Presidente)
Dr. Mohamed Kheder Zeyn (Vice-Presidente)
Prof. Dr. Adi/san Avansi de Abreu Prof. Dr. Alain Florent Stempfer Prof. Dr. Antônio M. dos Santos Silva
Dr. Fernando Vasco Leça do Nascimento Prof. Dr. Flávio Fava de Moraes Prof. Dr. José Jobson de A. Arruda Prof. Dr. Maurício Prates de Campos Filho Prof. Dr. Paulo Eduardo de Abreu Machado Prof. Dr. Ruy Laurenti
Conselho Técnico-Administrativo
Prof. Dr. Francisco Romeu Landi (Diretor Presidente)
Prof. Dr. Joaquim J. de Camargo Engler (Diretor Administrativo)
Prof. Dr. José Fernando Perez (Diretor Científico)
2 PESP
Editora responsável- Mari/uce Moura (MTB-2242)
Editora executiva - Maria da Graça Mascarenhas
Editor assistente: Fernando Cunha Arte - Moisés Dorado Capa: Hélio de Almeida Foto: lvson Colaboradores: Carlos Fioravanti,
Margareth Lemos, Mário Leite Fernandes, Mauro Bel/esa, Roberto Medeiros e Rodrigo Arco e Flexa
FAPESP- Rua Pio XI, nº 1500, CEP: 05468-901 -Alto da Lapa São Paulo- SP- Te!: {011) 838-4000 Fax: {011) 838-4117 Este informativo está disponível na homepage da FAPESP: http://www.fapesp.br - E.mail: [email protected].
OPINIÃO -------------
O século da inovação
O Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo está comemorando cem anos de existência. Nascido em 1899, no âmbito da Escola Politécnica, inicia uma caminhada rumo ao segundo centenário, ajustando-se à expectativa de que o século XXI será o "século da inovação". Forja, em seus 72 laboratórios, mais de 3 mil ensaios, testes e análises voltados fundamentalmente para mudanças de rumo na área privada e no setor público.
O !PT está no caminho certo. A inovação é a palavra-chave que abre as portas do futuro. Estudo recente divulgado pela revista The Economist mostra-a como a melhor alternativa para a expansão dos negócios. O inovador despreza o investimento especulativo e não faz isso apenas porque é um bom sujeito. Além do gesto construtivo, ele adota uma opção inteligente: as inovações geram muito mais lucro do que meras especulações comerciais. A taxa média de retorno de 17 inovações de sucesso nos Estados Unidos , durante uma década, foi de 56 %, enquanto a de todos os investimentos da economia norte-americana, nos últimos 30 anos , ficou em 16%.
Os inovadores japoneses, de olho no consumo doméstico, diminuíram o tamanho do videocassete lançado em 1974. Eles encolheram tudo: o preço, a embalagem e a fita , que se reduziu a três quartos de polegada. Este videocassete compacto entrou para a história do mercado. É, juntamente com o telefone celular, o produto mais comprado no mundo.
Os Estados Unidos vivem um extraordinário momento de prosperidade e a inovação jogará um papel decisivo no prolongamento desta fase auspiciosa. Mais de 50% do crescimento norte-americano vem de indústrias novas, com pouco mais de dez anos de existência, que reformularam seus processos.
Embora a inovação possa verificarse em qualquer área de atividade, ela está mais acentuadamente vinculada à dimensão tecnológica. A tecnologia exige não apenas atenção das empresas, mas também das nossas universidades, dos institutos de pesquisas e principalmente dos governos. As recentes notícias sobre o setor de cítricos, que não só se tornou competitivo aqui no Brasil e no mercado internacional, mas a conquista do setor produtivo norte-americano por empreendedores brasileiros na região da Flórida, mostra bem como a inovação determina
Jacques Marcovitch
o êxito empresarial e setorial. Hoje, boa parte da capacidade produtiva de cítricos no sul dos Estados Unidos é de propriedade de empresários brasileiros.
Em nosso tempo, quando os meios tecnológicos tornam-se obsoletos de um dia para outro, nenhum projeto de governo pode deixar de acompanhá-los no mesmo ritmo veloz. Trata-se de uma variável política indispensável, pois envolve o destino e a soberania dos Estados . A comemoração do primeiro centenário do !PT é uma ocasião propícia para reiterar observações neste sentido, que tenho feito de várias formas, em ocasiões diversas, pois este é o procedimento imperativo para quem dirige uma universidade.
Abandonar os cientistas à própria sorte é um erro que pode até afetar a estabilidade democrática . Nos países em desenvolvimento, não havendo uma prioridade estratégica a programas de Ciência e Tecnologia, o retrocesso é inevitável. Se o Brasil não agir hoje para construir o seu futuro , simplesmente não haverá futuro. Não me refiro ao futuro apenas como o tempo que sucede ao presente, mas como o tempo em que a ciência de hoje vai finalmente produzir seus frutos.
A América Latina e o Brasil foram atingidos pelos vendavais que abalam quase todas as economias do mundo. O governo central empenha-se numa inadiável tarefa de ajustar as contas públic<JS. Percebe-se, porém, que esta iniciativa, embora justa, comete dois desvios perigosos: corta recursos de programas sociais já limitados e diminui drasticamente verbas já escassas na área de Ciência e Tecnologia. Uma exceção e um paradigma de consciência estratégica é a FAPESP, em São Paulo, que a despeito de todas as crises vem zelando exemplarmente pelo progresso da ciência.
Quando questionam políticas restritivas e opostas àquela implementada pela FAPESP, as universidades e institutos de pesquisa não agem em causa própria, mas como braços do Estado. Atuam como núcleos onde Ciência e Tecnologia interagem diuturnamente para a construção da modernidade. Têm o dever de empreender esforços, inclusive na área política.
Os políticos de qualidade serão os interlocutores certos para dialogar com a comunidade científica, em busca dos meios adequados de traba lho comum e dos recursos indispensáveis a um projeto nacional de Ciência e Tecnologia inse-
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rido e plenamente relacionado com a comunidade internacional. É ilusão supor que as causas triunfam por si mesmas e que basta ser justas para alcançar os melhores resultados.
A matéria da The Economist registra que o professor Gregory Daines, da Universidade de Cambridge, aponta a inovação como a religião emergente no se to r industrial deste final de século. Ela começa a ser uma espécie de teologia unificadora das políticas de centro, de esquerda e de direita . Cumpre-se a profecia do economista francês Jean-Baptiste Say, que , por volta de 1800, cunhou a palavra empreendedor, hoje tão em moda. Ele dizia que o empreendedor "transfere os recursos econômicos de uma área de baixa produtividade para uma área onde ela é maior e oferece maior rentabilidade".
Cambridge, com mais de 700 anos de existência, tem hoje a maior concentração de alta tecnologia entre as universidades da Europa. O seu Reitor, sir Alec Broers, esteve recentemente na USP e observou que esta posição foi alcançada porque a inovação passou a ser sua prioridade número um. Toda universidade moderna deve agir assim para criar novas fontes de financiamento, manter o ritmo das pesquisas e garantir seus objetivos no milênio vindouro.
Jacques Marcovitch é reitor da Universidade de São Paulo (USP) e autor do livro A Universidade (lm)possível
NO A NO AS NO AS NO N A~ N NOTAS N A N N
Recado da Nature: América Latina precisa estabelecer cooperação científica A ciência na América Lati
na foi objeto de um suplemento especial da Nature de 1 o de abril, do qual o Notícias FAPESP publicará um excerto em uma de suas próximas edições. O suplemento foi destacado no editorial da revista, com um recado especial para pesquisadores e gestores da política de ciência e tecnologia na América Latina: é preciso que se faça um esforço de cooperação científica entre os países da região para tornar sua produção científica competitiva.
Segundo o editorial, apesar das recentes dificuldades econômicas do Brasil, a América Latina está em condições de ampliar sua já crescente contribuição para a ciência mundial. Observa-se ali que as circunstâncias do dia-a-dia continuam dificeis para os pesquisadores da região, que seu progresso,
por vezes, parece vacilante, com os governos sempre introduzindo novos esquemas de apoio a ciência, e não encontrando, depois, recursos para mantê-los.
A despeito disso, afirma o editorial, a influência internacional de cientistas latino-americanos está em franco crescimento e todos os indícios são de que continuará assim.
Pesquisa no Mackenzie A Universidade Presbite
riana Mackenzie criou uma comissão especial, a Mackpesquisa, para organizar um sistema de pesquisa. Dirigida pelo reverendo Nilson de Oliveira, a comissão está propondo a constituição de um fundo próprio, formado por 2% do orçamento da Universidade, destinado exclusivamente às ati vi-
dades de pesquisa. A idéia é que essa reserva inicial sirva para alavancar novas fontes de recursos.
No dia 28 de abril, o diretor presidente da FAPESP, Francisco Romeu Landi, fez uma palestra na Universidade, sobre o funcionamento da Fundação, seus di versos programas e como deles participar.
A vez da biblioteca eletrônica Depois do SciELO, a nova
investida da FAPESP em relação a acesso eletrônico de periódicos científicos é o Programa Biblioteca Eletrônica - ProBE, que será lançado em 18 de maio próximo, às 11 horas, na sede da Fundação. Durante a solenidade, serão assinados os dois contratos que formalizam o programa: o primeiro, estabelece um consórcio entre USP, UNESP, UNICAMP, UFSCar, UNIFESP e BIREME, que será a base operativa do programa; o segundo, assinado entre aFAPESPe a Elsevier Science Inc., propicia a disponibilização dos 606 títulos desta editora holandesa, através da RedeANSP, aos pesquisado-
res ligados às instituições consorciadas. Isto representa adisponibilização desses periódicos para cerca de I 0.500 pesquisadores.
O ProBE não ficará restrito, no entanto, apenas aos periódicos científicos da Elsevier - este é seu primeiro passo. Segundo Rosaly Fávero, coordenadora operacional do programa, acordos com outras editoras de publicações científicas já estão sendo estudados, e poderão elevar a base do ProBE a uns poucos milhares de títulos.
A Adesão das demais bibliotecas do Estado de São Paulo ao programa está prevista e vai ser analizada pelo consórcio.
Em seguida, vem o recado direto da publicação inglesa: diz ele que, enquanto pesquisadores de países amplamente desiguais da região se empurram para competir e colaborar com seus pares melhor financiados dos Estados Unidos e da Europa, torna-se cada vez mais importante que reconheçam o quanto podem aprender com a experiência de seus vizinhos. O editorial admite que, na verdade, a maioria gostaria de trabalhar mais estreitamente com seus pares de países vizinhos, mas, acrescenta, há pouco incentivo atualmente nesse sentido. Afinal, é muito mais fácil trabalhar dentro de uma colaboração internacional se pelo menos uma ponta dessa colaboração é adequadamente financiada - leia-se Estados Unidos e Europa.
A Nature destaca que em-
bora haja muitos exemplos isolados de colaboração científica entre os países da região, não há, no momento, qualquer estratégia geral para combinar recursos de modo a fortalecer a base científica da região. Lembra que a colaboração na pesquisa entre norte e sul é inevitavelmente assimétrica, com limites em sua utilidade para a parte mais fraca , lembra que na Europa a cooperação científica desempenhou um papel significativo no desenvolvimento de capacitações científicas nacionais e sentencia: "a América Latina enfrenta agora um desafio semelhante". Por fim, aposta que se quiserem construir economias competitivas, as principais potências da região - Brasil, Argentina e México - terão de enfrentar a necessi-dade de uma cooperação pan regional.
Físicos, mulheres prejudicadas na carreira
Apenas 6% dos fisicos, nos Estados Unidos, são mulheres. Ainda assim, sua ascensão na carreira tem se revelado dolorosamente lenta. Por quê?, pergunta um editorial da Nature de 25 de março passado. A resposta, pelo menos em parte, consta do relatório de uma·pesquisa realizada para a Comissão sobre a Situação de Mulheres na Física da American Physical Society e apresentada naquela semana na reunião anual da sociedade, em Atlanta, Georgia.
Segundo o estudo, coordenadoporLaurieMcNeil,da Universidade da Carolina do Norte, e Marc Sher, do College ofWilliam and Mary, na Virgínia, ser parte de um casal de fisicos pode representar um obstáculo crítico aoprogressodamulhernacarreira. E há um grande número de fisicas casadas com fisicos, ou seja, 45% delas, enquanto apenas 6% dos fisicos são casados com colegas de profissão. Isso ascoloca com freqüência na delicada situação de ter de procurar emprego junto com o marido, numa área onde a disponibilidade de vagas não é das melhores. E o resultado é que sua situação pro-
fissional tennina sendo afetada. Em levantamento feito no
ano passado junto a 620 casais de cientistas, sendo sempre um dos parceiros um fisico, nada menos que 60% dos entrevistados disseram que um dos parceiros foi obrigado a aceitar um emprego científico de nível mais baixo, um emprego fora da área científica ou a ficar sem emprego, dada a dificuldade que tiveram para encontrar dois postos científicos no mesmo local.
Parte dos casais relatou que havia sido menos considerado ou absolutamente desconsiderado para postos de trabalho, quando tomava-se claro que constituía wn casal de cientistas da mesma área. As normas contra nepotismo são, freqüente e incorretamente, invocadas como motivo para wna instituição não se dispor a ajudar os cônjuges a encontrarem prego ali.
Chamou particularmente a atenção das pesquisadoras algumas atitudes sexistas que lhes foram relatadas e que elas acreditavam já haver desaparecido.
Por exemplo, um empregador em potencial disse a um candidato que sua parceira "não devia estar mesmo trabalhando".
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NOTAS NO~AS NO~AS NO,..AS NOTAS W A~ NO~.L NOTAS ) AS NOTAS NOTAS NOTAS NOTAS NOTAS
Tudo pela qualidade das revistas científicas Especialistas dos Estados
Unidos, México e Brasil estiveram reunidos na FAPESP, de 6 a 8 de abril, discutindo critérios de avaliação e seleção de revistas científicas para sua inclusão em bibliotecas eletrônicas e os impactos desses periódicos nos estudos sobre a produção científica. A conclusão principal do encontro foi que qualidade e possibilidade de aprimoramento contínuo de conteúdo devem ser, no Brasil, os pré-requisitos para a inclusão e a permanência das revistas em bibliotecas eletrônicas.
O workshop foi promovido pelo Projeto SciELO - Scientijic Eletronic Library Online, coordenado pelo Centro LatinoAmericano e do Caribe de Informação em Ciências da Saúde -Bireme, com apoio da FAPESP. Iniciado em fins de 1996, o SeiELO hoje disponibiliza27 revistas científicas nacionais pela Internet, segundo a originalidade e mérito científico de seu conteú-
Já foram selecionados os laboratórios que vão integrar a rede do Projeto Genoma Cana. Vale observar que alguns deles vão trabalhar simultaneamente em seqüenciamento e em anotação de dados. A lista completa dos laboratórios - que estamos publicandonaseçãodeNotas,por~ que já estavam fechadas as páginas da reportagem sobre o Genoma Cana quando saiu o resultado da seleção - é a seguinte: Coordenador de DNA: Paulo Arruda- Centro de Biologia Molecular e de Engenharia Genética da Unicamp.
Cooperação Internacional: William Lee Bumquist- Centro de Tecnologia Copersucar
LaboratóriodeBioinformática: João Meidanis e João Carlos Setúbal - Instituto de Computação daUnicamp
Laboratórios de Anotação de Dados: Adilson Leite -Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética, Unicamp
do, a periodicidade adequada para cada área da ciência e a pontualidade com que é publicada. Mas, de acordo com Abel Packer, coordenador operacional do projeto, "em situações críticas ou que mereçam uma análise mais detalhada", as revistas passarão a ser submetidas a um comitê nacional de avaliação, que começará a atuar no segundo semestre, e cuja tarefa será assessorar o projeto exatamente na aplica-
ção dos critérios validados no workshop.
O SciELO também pretende desenvolver e adotar um sof tware de apoio ao processo de avaliação, similar ao RevMex, apresentado pela representante do Centro Nacional de Informação e Documentação do México, G ladys F aba. "Um sistema como este auxilia o especialista a verificar ponto por ponto, à medida em que lê cada artigo, tudo o que
Os laboratórios do Genoma Cana Antonio Vargas de Oliveira Figueira - Centro de EnergiaNuclearnaAgricultura, USP Carlos Frederico Martins Menck - Departamento de Microbiologia, Instituto de Ciências Biomédicas, USP Eiko Eurya Kuramae-Izioka Defesa Fitossanitária, Unesp/ Botucatu Eugênio César Ulian- Centro de Tecnologia da Copersucar Francisco Gorgonio da Nóbrega -Instituto de Pesquisa e Desen- · volvimento, Univap Helaine Carrer - Departamento de Biologia, Esalq, USP Luís Eduardo Aranha CamargoDepartamento de Entomologia Agrícola, Patologia Vegetal e Zoologia, Esalq, USP Luiz Lehman Coutinho- Departamento de Produção Animal, Esalq,USP Marie-Anne Van Sluys - Departamento de Botânica, Instituto de Biociências, USP Paulo Cavalcanti Gomes Ferreira- Departamento de Bioquímica Médica, Instituto de Ciências Biomédicas, UFRJ SuzeleideCastroFrança- Depar-
tamento de Biotecnologia Vegetal, Unaerp
Laboratórios de Seqüenciamento Celso Luís Marino - Departamento de Genétiéa, Instituto de Biociências, Unesp Éder Antonio Giglioti-Departamento de Biologia Vegetal, Centro de CiênciasAgrárias, UFSCar Eiko Eurya Kuramae-Izioka -DefesaFitossanitária, Unesp/Botucatu Flavio Henrique da Silva-Departamento de Genética e Evolução, Unifesp Francisco Gorgonio da Nóbrega - Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento, Univap Helaine Carrer - Departamento de Biologia, Esalq, USP Luís EduardoAranhaCamargoDepartamento de Entomologia Agrícola, Patologia Vegetal e Zoologia, Esalq, USP Luiz Lehman Coutinho- Departamento de Produção Animal, Esalq, USP Luís Roberto Nunes- Núcleo Integrado de Biotecnologia, Universidade de Mogi das Cruzes
s 'SP
se refere à normalização quanto ao conteúdo, atribuindo, ao final, um peso à revista como um todo", diz Packer.
O SciELO, segundo James Testa, diretorde desenvolvimento editorial do Institute for Scientific Information-ISI, adota o mesmo padrão básico da instituição em que ele trabalha- a qualidade da publicação - , embora não comercialize seu banco de dados. No caso do ISI, exige-se que a revista seja publicada há pelo menos um ano ou esteja na terceira ou quarta edição. Quando surgem periódicos dirigidos a áreas novas da ciência, com corpo editorial reconhecido pela comunidade científica, flexibiliza-se a aplicação dos critérios, sem abrir mão, contudo, do necessário ineditismo da contribuição. Limitações de caráter econômico também devem orientar a seleção. Segundo Testa, "a base de dados não pode crescer indefinidamente".
Manoel Victor Franco LemosBiologia Aplicada àAgropecuária, Unesp Maria Helena de Souza Goldman - Departamento de Biologia, USP!Ribeirão Preto Maria Inês Tiraboschi FerroDepartamento de Tecnologia, UNESP/Jaboticabal Maria Luísa Penteado Natividade Targon-Centro de Citricultura "Sylvio Moreira", IAC Marie-Anne Van Sluys- Departamento de Botânica, Instituto de Biociências, USP Maurício Bacci Jr.-Centro de EstudosdelnsetosSociais,Institutode Biociências, Unesp!Rio Claro Otavio Henrique Thieman-Instituto de Física, USP/São Carlos Roberto Vicente Santelli - Departamento de Bioquímica, Instituto de Química, USP Suely Lopes Gomes, Departamento de Bioquímica, Instituto de Química, USP Suzelei de Castro França- Departamento de Biotecnologia Vegetal, Unaerp Walter José Siqueira-Centrode Genética, Biologia Molecular e Fitoquírnica, IAC
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
ENTREVISTA
C&T e o setor produtivo
José Aníbal: uma das metas é a integração pequenas empresas por meio da incorporação de tecnologia
A articulação entre a pesquisa científica e o desenvolvimento econômico de São Paulo deve ser intensificada com a transferência de tecnologia, abertura de linhas de crédito e ampliação de mercados, principalmente para a pequena e média empresa. Para o secretário da Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico do Estado de São Paulo (SCTDE), José Aníbal, este é o grande desafio de sua gestão. Segundo ele, São Paulo tem uma enorme capacidade empreendedora e uma massa crítica de excelente qualidade para casar a tecnologia que gera com os diferentes setores da economia, beneficiando diretamente o cidadão através da melhor relação qualidade/preço. "A pesquisa básica não deve ser abandonada, mas queremos acoplar muito mais do que é produzido hoje por nossa Ciência e Tecnologia ao processo produtivo", resume.
Na sua opinião, para atingir esse objetivo, programas de estímulo à inovação tecnológica, como os que a FAPESP já vem incrementando, devem ser melhor explorados à medida em que os diagnósticos da Secretaria evoluírem. "Precisamos identificar os nós para poder desatá-los e, para isso, iremos disponibilizar uma informação ampla sobre o setor de Ciência e Tecnologia do Estado a todos os interessados." De acordo com o secretário, há uma cultura que não aproxima as universidades e os centros de pesquisa pau-
listas do setor produtivo e é necessário promover ações específicas para infonnar pequenos e médios empresários sobre os recursos de que eles podem dispor nas universidades estaduais e institutos de pesquisa paulistas. Isso pode fortalecer a imagem dessas instituições e colocá-las em posição mais privilegiada para discutir seus problemas atuais mais importantes. "O efeito multiplicador dessa medida deve ser muito grande. O conta to com as empresas também poderá habilitar a universidade para estabelecer novas parcerias, prestar serviços e obter resultados financeiros disso", conclui José Aníbal.
Um exemplo de bons resultados quando esta rede de infonnações funciona com eficiência, segundo o secretário, é o projeto Prumo - Projeto de Unidades Móveis de Atendimento Tecnológico às Pequenas Empresas do Setor Plástico, financiado pela FAPESP no âmbito do Programa de Inovação Tecnológica em Parceria e desenvolvido em parceria entre o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), o Sebrae - Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de São Paulo e o Instituto Nacional do Plástico (INP). Desde o dia I 5 de março o Prumo começou a operar veículos utilitários dotados de equipamentos de ensaio e uma equipe formada por um engenheiro e um técnico. O objetivo do projeto é levar tecnologia às pequenas empresas transformadoras de plástico, preparando-
6 'SP
as para ganhar novos mercados dentro e fora do país.
A Secretaria tem dois principais universos de ação. O primeiro inclui ações para atrair novos investimentos, ampliar os já existentes e solucionar os problemas que possam, eventualmente, levar empresas estabelecidas em São Paulo a sair do Estado. Nesse sentido, o secretário afirma que se dedicará menos à elaboração de planos, para trabalhar mais fortemente sobre os já existentes.
O segundo universo, que engloba a integração competitiva das pequenas e médias empresas através da incorporação de tecnologia ao processo produtivo, vai mais além. A Secretaria pretende agir diretamente na obtenção de crédito dirigido ao investimento, capital de giro e comercialização pararevitalizar essas empresas. Para isso, de acordo com o secretário,a Nossa Caixa Nosso Banco já está credenciada junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), e o Banco do Brasil já demonstrou interesse em criar uma linha especial de fmanciamento voltada exclusivamente para setores como os de calçados, plásticos, têxtil, metalmecânica e cerâmica.
Outra frente de atuação envolve o desenvolvimento de mercados, principalmente externos. Nesse ponto, são as exportações que preocupam o secretário. Para ele, essa atividade não pode ser entendida como secundária, mas como condição fundamental para uma integração ativa, e não subalterna, ao mercado globalizado.
Apesar de ter superado em mais de 100% as expectativas na primeira gestão do governador Mário Covas, José Aníbal acredita que o Estado tem todas as condições de atrair ainda mais recursos da iniciativa privada, mas prefere não quantificá-los. "O investimento virá. Só precisamos criar um ambiente propício para isso. São Paulo tem mercado, recursos humanos, infra-estrutura e uma enorme disposição do governo para disputar esse investimento. Não vamos entrar na guerra fiscal, mas também não ficaremos contemplati vos. Vamos agir", conclui.
No futuro, o secretário acredita que São Paulo vai se tomar a capital de serviços do hemisfério sul- uma vocação que deve gerar muitos empregos. Para isso, técnicos da SCTDE já estudam alternativas. E uma delas, informa José Aníbal, deve ser posta em prática ainda este ano: um convênio com a Agência Nacional do Petróleo para criar uma extensão, na área química, da Escola Politécnica da USP na região do ABC paulista. "Essa estrutura consolidará o pólo petroquímica do ABC", prevê o secretário.
FÓRUNS
Articulação conjunta O Fórum das Fundações de Amparo à
Pesquisa (FAPs) reuniu-se em Brasíli a, no dia 26 de abril, retomando as articulações, iniciadas no ano passado, visando o fortalecimento e maior participação desses órgãos nos sistemas estaduais e nacional de Ciência e Tecnologia. Na pauta da reunião, pe la manhã, estava a di scussão sobre as novas propostas do Ministério da Ciência e Tecnologia para o setor. À tarde, as FAPs reuniram-se com o Fórum Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de Ciência e Tecnologia e tomaram conhecimento de sua carta-documento, dirigida ao ministro Luís Carlos Bresser Pereira, posicionando-se sobre as proposições do Ministério, apresentadas pelo secretário executivo do ministério, Carlos Américo Pacheco (veja ao lado a íntegra do documento).
No encontro das FAPs, um dos vicepresidentes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Denis Lerrer Rosenfield, falou da divisão operacional do órgão em três grandes áreas - Exalas, Humanas e Biológicas -, cada uma de responsabilidade de um vice-presidente. A cada seis meses, um dos vice-presidentes assumiria a coordenadoriageral das três áreas. A preocupação das FAPs com relação a essa nova estrutura é quanto à possibilidade de descontinuidade administrativa.
Mas um dos temas mais discutidos no encontro foi a relação das F APs com o CNPq. Para os dirigentes das Fundações, o Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia vai realmente se fortalecer quando as F APs estiverem fortalecidas. Isto pressupõe a sua autonomia - problema da esfera dos governados estaduais - e um diálogo mais amplo e democrático com o CNPq, de modo a fazer com que as Fundações participem das decisões de política científica e tecnológica.
Essa questão se tomou mais evidente, a partir da proposta anunciada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia de transferir para as FAPs a responsabilidade pelo repasse de parte dos recursos destinados a projetos contratados no âmbito do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) e Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PADCT). Além da crítica por não participarem da análise dos projetos e da decisão de sua contratação, os dirigentes das FAPs receiam que as Fundações tenham de arcar com investimentos tradicionalmente feitos pelo governo federal e inviáveis para amaioria delas, que sofrem com a fa lta de recur-
sos. E as diferentes situações vividas pelas FAPs podem acabar por deteriorar o sistema nacional. O mesmo receio fo i manifestado pelos secretários estaduais de Ciência e Tecnologia.
Na reunião do Fórum dos Secretários, Carlos Américo Pacheco fa lou sobre os cinco objetivos do Ministério: consolidação e ampliação do aparato de Ciência e Tecnologia do país; insti tuição de um sistema nacional de inovação; seleção de áreas estratégicas para o país; melhoria da qualidade de vida e preparação do país para a sociedade de informação. A fonna de implementar esses objetivos passaria por uma nova agenda de gestão apoiada
principalmente em análise de resultados, um novo padrão de alocação de recursos orçamentários e pelo desenvolvimento regional.
A próxima reunião do Fórum das FAPs fo i agendada para os dias 15 e 16 de julho próximo, em Porto Alegre, por ocasião da realização da 51' Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), tendo como tema "A Avaliação das Pesqui sas". As FAPs decidiram, também, constituir formalmente o seu Fórum. Até julho próximo deverá estar elaborado o estatuto da nova entidade. A primeira diretoria será eleita na reunião de Porto Alegre.
A CARTA-DOCUMENTO DOS SECRETÁRIOS Senhor Ministro:
Ao mesmo tempo em que cumprimenta Vossa Excelência, o Fórum Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de Ciência e Tecnologia solicita a sua atenção, em nome de todos os secretários presentes na reunião ordinária de26de abril de 1999, realizada em Brasília, para o que segue:
1) Os Secretários manifestam a sua satisfação em saber que o Ministério da Ciência e Tecnologia pretende definira nova política de C&"T para o país. Nesse sentido, o Fórum se propõe a, junto com o MCT, envidar todos os esforços, nos Estados, no sentido de construir uma política nacional de C& T que tenha como centralidade essa articulação, atraindo a participação de todos os atores relevantes.
2) Para sistematizar a participação dos Secretários de C&T na construção da nova política, o Fórum decidiu criar 3 comissões operacionais, segundo as agenaas já definidas pelo MCT para formular a nova política (ecomunicadas ao Fórum pelo Secretário Executivo do Ministério): a) Gestão de C&T, b) Financiamento de C&T e c) C& T para o Desenvolvimento Regional. Decidiu-se também criar uma comissão especial para acompanhar arenovação dos incentivos da Lei de Informática (Lei 8248).
3) Em função da decisão anterior, as comissões estão compostas conforme descrito abaixo, com os seus respectivos coordenadores. No momento oportuno, os coordenadores escolhidos no Fórum estarão procurando o Ministério para obter mais informações sobre o andamento dos trabalhos da formulação da política, segundo as linhas e as agendas propostas pelo MCT, para que os Secretários possam coordenar ações conjuntas com esse objetivo.
As comissões são as seguintes: Comissão de Gestão de C&T: MG (coordenadora
Margareth S. Andrade, Secretária de C& T), SC, PE. Comissão de C& T para o Desenvolvimento Regio
nal: CE (coordenador: Ariosto Holanda, Secretário de C&T),AM, PA, PE, MT, SC, PB, PI, MS, RO,AL.
Comissão de Financiamento de C& T: RS (coordenador: Adão Villaverde), PR, RO, RJ, SP, DF, CE, MS.
Comissão da Lei de Informática de C& T: SP (coordenador. José Aníbal P. de Pontes), PR, RJ, PE, BA, DF.
4) Durante a reunião, foram discutidas também as últimas propostas do MCT para que os Estados e regi-
7 PESP
ões assumam encargos e responsabilidades que, historicamente, sempre foram atributos do Governo Federal. Essas propostas podem significar uma mudança que não seja meramente conjuntural no Sistema Federal de C& T, podendo atingi-lo em seu conjunto, com repercussões nos Sistemas Estaduais a ele associados. Os secratários se referiam particularmente às propostas materializadas na posição expressa pelo MCT relativamente aos projetas já contratados com as agências federais de fomento para o ano de 1999, conforme apresentado em reunião com as FAPs.
5) As medidas podem implicar na fragmentação do Sistema Federal de C& T, impedindo a viabilização do desenvolvimento económico, social e auto-sustentável do país. Mais ainda, podem caracterizar um processo de mudança estrutural que implicaria numa paulatina desobrigação do Estado Nacional com a formulação e o financiamento das ações relacionadas à Ciência e Tecnologia no país.
6) Além da fragmentação, também caberia ser destacado que a adoção da política de repasses para os estados, acarretaria uma sobrecarga às instituições de fomento regionais (FAPs), na medida em que elas passam a arcar com investimentos tradicionalmente demandados ao Governo Federal.
7) Neste contexto, o Fórum de Secretários de C& T posiciona-se contrário aos repasses de encargos e responsabilidades, entendendo que os estados não têm condições de suportar tais condições, bem como entende ser importante que o Governo Federal cumpra os compromissos já assumidos. Ao mesmo tempo, o Fórum irá se dirigir a toda a comunidade científica e tecnológica dos estados propondo que a mesma inicie, deforma urgente, em cada região, um amplo debate sobre a política proposta. Entende ser necessário que o conjunto da sociedade brasileira participe deste processo, a fim de que seja retomado, de forma ampla e democrática, o debate sobre a necessidade objetiva de uma política nacional de C& T.
8) Por fim, é necessário um amplo esforço no sentido de mostrar e pressionar a área económica do Governo Federal, visando viabilizar de forma efetiva alocação de mais recursos financeiros às agências de fomento do Ministério da Ciência e Tecnologia.
Fórum Nacional de Secretários Estaduais para Assuntos de Ciência e Tecnologia
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
GENOMACANA
Tecnologia de ponta Com a presença de pesquisadores bras i
leiros e do exterior, do ministro da Ciência e Tecnologia, Luíz Carlos Bresser Pereira, do Coordenador de Pesquisa Agro pecuária da Secretaria de Agricultura do Estado de São Paulo, Lourival Carmo de Mônaco, do presidente da Copersucar- Cooperativa dos Produtores de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo, Homero Correa de Arruda Filho e do presidente da FAPESP, Carlos Henrique de Brito Cruz, a FAPESP lançou oficialmente, nos dias 12 e 13 de abril, o Projeto Genoma Cana. Uma iniciativa conjunta com a Copersucar, o projeto prevê o seqüenciamento de genes de grande significado para a agro indústria da cana-de-açúcar, especialmente aqueles relacionados com o metabolismo da sacarose e com a resistência da planta a pragas e doenças. O lançamento foi feito durante um workshop internacional, organizado pelo Dr. William Burnquist, pesquisador da Copersucar, que reuniu os maiores especialistas em genoma de cana-de-açúcar.
Num dos lados do auditório daFAPESP, Paulo Arruda, coordenador de DNA do Projeto Genoma Cana, olhou os especialistas de várias partes do mundo reunidos em São Paulo e comentou: "Para nós, isso é muito bom, pois podemos tirar proveito de outras tecnologias, que eles já dominam, e atingir mais
facilmente nossos objetivos". Em outro lado, quem falava era Barbara Huckett, do centro de pesquisas da SouthAfrican Sugar Association, a associação dos produtores sul-africanos de cana-de-açúcar. "O convite que recébi para estar aqui demonstra uma intenção de compartilhar experiências desde o início", afirmou. "Esta é uma maneira muito especial de fazer um bom projeto", acrescentou.
A doutora Huckett não estava sozinha em sua apreciação. Todos os especialistas que participaram do workshop de apresentação do Projeto Genoma Cana à comunidade científica internacional, no auditório da Fundação, consideraram tímidos seus programas com relação ao brasileiro. E mais. Reconheceram que a verba de US$ 8 milhões destinada ao projeto e a competência já instalada da rede virtual de laboratórios Organização para Seqüenciamento e Análise de Nucleotídeos (ONSA-de Organizationfor Nucleotide Sequencing andAnalysis)) colocam o grupo de São Paulo na liderança mundial da pesquisa do genoma da cana-de-açúcar.
Os resultados do workshop já estão começando a aparecer. No fim de abril, de acordo com Arruda, estavam bem adiantados os entendimentos para uma parceria com Jean CristofGlaszmann, pesquisador do CIRAD, o instituto francês de pesquisas sobre agricul-
tura tropical e subtropical, para um mapeamento conjunto de elementos identificados pelos pesquisadores de São Paulo; e também com Andrew Paterson, da Universidade da Geórgia, dos Estados Unidos, que acaba de receber uma verba deUS$ 3,5 milhões para fazer o seqüenciamento genético do sorgo. O sorgo e a cana-de-açúcar são geneticamente
Paulo Arruda, coordenador de DNA do Projeto
Ministro Bresser Pereira fala durante lançamento do Projeto Genoma Cana
parentes muito próximos e a cooperação entre as equipes de pesquisa dos dois projetas pode resultar em descobertas decisivas, não só para essas plantas mas para as gramíneas em geral. "Com os demais estrangeiros, também deverá haver interação, em maior ou menor escala, mas ela ainda se está definindo", informou o coordenador.
"Certamente, há possibilidade de colaboração entre o CIRAD e o projeto brasileiro, que trará um volume enorme de informações para a comunidade científica envolvida com a cana", afirmou Laurent Grivet, do instituto francês, que participou do workshop. "Os Estados Unidos e o Brasil teriam muitos benefícios se coordenassem os programas do sorgo desenvolvidos por nós e o Genoma Cana da FAPESP", declarou Andrew Paterson, da Universidade da Geórgia. "Juntos, poderíamos aprender como usar melhor os resultados desses importantes projetas. Como líder do projeto do sorgo, fico muito entusiasmado com essa possibilidade", completou.
Importância econômica . O interesse dos especialistas da Africa do
Sul, Austrália, Estados Unidos e França presentes ao workshop se justifica. O domínio do conhecimento do genomade plantas e das tecnologias relacionadas com a genética vegetal é atualmente um dos maiores interesses de cientistas de todas as partes do mundo. Trata-se de uma área tão estratégica que a Fundação Nacional de Ciência dos Estados Unidos (NSF) e várias agências de fomento à pesquisa norte-americanas se uniram para realizar o Plant Genome lnitiative, um projeto que propõe o seqüenciamento genético de todas as plantas de grande importância económica. A NSF, aliás, investiu somente em 1998 nada menos de US$ 85 milhões em seu programa de pesquisas de genoma de plantas.
Para o Brasil, ampliar o conhecimento genético sobre cana-de-açúcar é fundamental para sua economia- o que justifica o empenho e as iniciativas da FAPESP na área. O Brasil é o maior produtor de cana-de-açúcar,
responsável por 25% da produção mundial, e, desse total, 60% saem do Estado de São Paulo. Só nesse Estado, a cana movimenta negócios da ordem de R$ 8 bilhões por ano e é responsável por 600 mil empregos diretos. São Paulo é líder mundial em produtividade da cana-de-açúcar, obtendo o menor custo de produção do mundo, e importante exportador de açúcar. Era natural que um projeto relacionado com a cana se seguisse ao sucesso do Projeto Genoma-Xylella, relacionado com a produção de laranja.
"O desafio do próximo século para a humanidade é a ampliação da produção de alimentos e fibras de forma amigável com o meio ambiente", declarou o diretor científico da FAPESP, José Fernando Perez. "Isso vai depender da nossa capacidade de fazer biotecnologia", acrescentou. Perez lembrou ainda que a idéia de fazer um projeto genomados genes expressos da cana de açúcar surgiu na Copersucar e foi trazida à FAPESP pelo profes~or Carlos Vogt, diretor executivo do Uniemp Fórum Permanente das Relações Universidade e Empresa. "A proposta foi analisada pela nossa assessoria, que nos garantiu que o projeto não só era viável como respondia a uma
A partir da esq., Homero de Arruda Filho, Carlos Vogt e Fernando Reinach
9 PESP
atualidade", disse o diretor científico da FAPESP, assinalando, ainda, que o Projeto Genoma Cana tem uma vocação nacional.
Falando na cerimônia de lançamento do projeto, o ministro da Ciência e Tecnologia, Luís Carlos Bresser Pereira, pediu que os cientistas defendam as plantas transgênicas, atualmente sob ataque de grupos ambientalistas. De acordo com o ministro, projetas para mapear os genes de um organismo, quando são lançados, recebem o apoio de toda a comunidade científica. Mas, quando os conhecimentos obtidos são postos em prática e se avizinham das plantas transgênicas, surgem os protestos. O ministro citou especialmente as exigências do completo conhecimento das conseqüências das modificações de um organismo antes de seu uso, o chamadofull knowledge.
"Estamos entre cientistas e sabemos que, pelo menos depois de Karl Popper, uma exigência dessas é absolutamente ridícula", disse Bresser Pereira. "Existe conhecimento provável, falseável , mas exigir full knowledge é voltar ao tempo das cavernas", acrescentou. Popper, um filósofo da ciência britânico de origem austríaca, morto em 1994, defendia a idéia de que a atitude científica, diante de uma hipótese, não é procurar casos particulares que a confirmem, mas procurar casos que a tomariam falsa . A ciência progrediria por conjeturas e refutações, num processo que tende ao conhecimento objetivo.
De qualquer maneira, a F APESP não está sozinha no Projeto Genoma Cana. Ele tem a participação da Cooperativa dos Produtores de Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo (Copersucar), inclusive no financiamento do programa. Não é pouca coisa. A Copersucar pesquisa o melhoramento da cana-de-açúcar há mais de 30 anos. Os conhecimentos adquiridos nessas pesquisas estarão à disposição do projeto. "O melhoramento genético da canade-açúcar foi um dos primeiros projetas do Centro de Tecnologia da Copersucar, em 1969, e continua até hoje como o programa que detém a maior parcela do nosso esforço", disse o presidente da Copersucar, Homero
Correa de Arruda Filho, acrescentando: "Hoje, os conhecimentos em genética molecular passaram a ser aplicados em cana-deaçúcar. O complexo sistema bioquímico que a planta utiliza para produzir açúcar já não é mais uma caixa preta, mas estamos longe de conhecer os 50 mil genes da planta. O Projeto Genoma Cana da FAPESP veio de encontro aos nossos objetivos e necessidades".
Identificação Em princípio, um projeto genoma se
destinaria a descrever e definir todos os genes de uma planta. Não é o que vai acontecer no Genoma Cana. A prioridade é identificar genes relacionados com o metabolismo da sacarose no interior da planta, a resistência da p Janta a pragas e doenças e a tolerância a condições adversas de clima e solo. Para isso, será usado o método das Expressed Sequence Tags (EST), uma tecnologia de seqüenciamento mais rápida e baseada apenas nas porções dos genes expressos, que codificam proteínas.
Do genoma total de uma planta, apenas entre I% e 5% se referem a genes expressos. Os outros genes são classificados como junk (lixo), ou seja, genes que aparentemente não têm função , ou estão relacionados apenas com a sobrevivência e a manutenção das células. O mesmo método está sendo usado no Brasil pelo Projeto Genoma Humano do Câncer, financiado pela FAPESP e Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, e , nos Estados Unidos, pelos projetos dos genomas do rato, da soja e do milho.
A estratégia de execução do Genoma Cana é idéia do coordenador de DNA do projeto, Paulo Arruda, professor do Departamento de Genética do Instituto de Biologia e diretor do Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética(CBMEG) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Arruda optou por realizar a anotação do genoma à medida que as ESTs vão sendo geradas. Isto é, ao mesmo tempo em que os genes da canade-açúcar forem conhecidos, doze grupos estarão realizando o chamado data mining (mineração de dados), ou seja, buscando em bancos de dados de todo o mundo genes semelhantes, ou já descritos, que possam estar relacionados com o metabolismo da cana-de-açúcar ou sua resistência a patógenos ou fatores de estresse, como secas e geadas.
Dezenas de milhares O Projeto Genoma Cana deverá se
qüenciar pelo menos 50 mil genes, ou 300 mil ESTs. Cerca de duas mil seqüências já foram geradas e a intenção é chegar a20 mil até o fim deste ano. Cada seqüência tem SOO nucleotídeos ou 0,5 KB, a kilobase, unidade de medida dos nucleotídeos. É importante destacar que a utilidade do projeto não pára na canade-açúcar. "Já encontramos seqüências do genoma da cana que são praticamente homólogas às do câncer de mama", disse o professor Arruda. "A proteína indutora da prolactina também está lá. Vamos caracterizá-la, ver o
que ela faz e, quem sabe, enriquecer um alimento com essa proteína", completou.
ções entre os laboratórios e o setorde bioinformática. João Carlos Setúbal e João Meidanis, do Laboratório de Bioinformática da Unicamp, veteranos do Projeto GenomaXylella, vão comandar a parte de bioinformática do
A função de Arruda é gerar as bibliotecas de cDNA, di stribuir os clones para seqüenciamento e coordenar o fluxo de informa-
Desfile de cérebros O workshop de abril reuniu no auditório da FAP ESP representantes de alguns dos mais importantes institutos do mundo ligados a pesquisas
com a cana-de-açúcar. Entre os representantes estrangeiros, estavam:
*Stevens Brumbley, pesquisador do Bureau of Sugar Experiment Station, em Queensland, na Austrália. Trabalha com dois projetas genoma,
um relativo à própria cana-de-açúcar e outro a uma bactéria que produz uma doença na planta. Também investiga fatores não-biológicos
que causam estresse na cana.
* Laurent Grivet, do Centre de Cooperation lnternationale en Recherche Agronomique Pour le Development (CIRAD), centro de pesquisas sobre
agricultura tropical e subtropical financiado pelo governo francês. Estuda a contribuição das diversas espécies do gênero Saccharum para a formação do
Saccharum officinarum, a cana-de-açucar comercial.
* Barbara Huckett, da estação experimental da South African Sugar Association, entidade dos produtores sul-africanos. Pesquisa desde 1995 o DNA da cana-de-açúcar, mas com um projeto muito tímido
quando comparado ao brasileiro. Tem apenas uma máquina, capaz de gerar oito seqüências por dia.
*John Manners, do Centro de Pesquisas de Patologia de Plantas Tropicais, do CSIRO, órgão de pesquisas do governo australiano,
e da Universidade de Queensland em Brisbane. Trabalha na identificação dos genes que controlam a formação de sacarose nos
talos da planta da cana-de-açúcar.
* Blake Meyers, pesquisador do Departamento de Biotecnologia da empresa DuPont, nos Estados Unidos. Estuda ESTs de milho e arroz.
Sua empresa tem um banco de dados maior que o Genebank, o site da Internet que dá acesso às seqüências de projetas
genoma feitos por instituições públicas.
* Erik Mirkov, virologista de plantas do Departamento de Patologia e Microbiologia de Plantas da Estação Agrícola Experimental da
Universidade Texas A & M, do Texas, Estados Unidos. Trabalha com seqüências de vírus, tentando obter plantas transgênicas resistentes a vírus e insetos. Um dos seus objetivos é conseguir novas variedades
comerciais resistentes de cana.
*Paul Moore, pesquisador-chefe do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos para frutas tropicais e cana-de-açúcar, pesquisador do Centro de
Pesquisas Agrícolas do Hawai eco-fundador do Consórcio Internacional para a Biotecnologia da Cana-de-Açúcar. Trabalha há 30 anos com cana. O Consórcio
já tem um projeto de cooperação com a Copersucar.
* Andrew Paterson, pesquisador do Centro de Pesquisas Riverbend, da Universidade da Geórgia, chefe do projeto genoma do sorgo, financiado pela
Fundação Nacional da Ciência (NSF) dos Estados Unidos. Estuda as relaçõ~s entre os cromossomas de diversas plantas,
especialmente entre a cana, o sorgo e o arroz.
* Jeffrey Tomkins, pesquisador associado e professor assistente do Genomics lnstitute da Universidade Clemson, da Carolina do Sul, Estados Unidos. Seu instituto tem a maior biblioteca de BACs (Bacterial Artificial Chromossomes), vetares que carregam grandes pedaços de DNA, usados para clonar porções
não expressas dos genes, de animais e plantas do mundo.
Io 'ESP
projeto. Nos laboratórios da CBMEG, também na Unicamp, os biólogos Edson Kemper e André Luiz Vettore estão preparando as bibliotecas, ou seja, as coleções de clones do DNA da cana-de-açúcar.
A seleção dos grupos inscritos para participar do projeto, já foi feita (veja seção NOTAS, página 5) . "Participar de projetas como este é levar a infra-estrutura e a competência metodológica dos laboratórios para um nível de competição internacional", afirmou MarieAnne Van Sluys, do Departamento de Microbiologia da Universidade de São Paulo (USP), um dos inscritos para participar do projeto.
Participarão do seqüenciamento quinze laboratórios, que serão equipados com aparelhos Perkin Elmer ABI 3 7796, de 96 canaletas, capazes de produzir 200 seqüências por dia. Calcula-se que 100 pesquisadores serão envolvidos no projeto. As descobertas do Genoma Cana só serão divulgadas quando os pesquisadores esgotarem as possibilidades de patentes. Depois disso, serão colocadas num banco de dados público internacional, o Genebank.
Completando vazios O projeto precursor da FAPESP na área dos
genomas, o Genoma Xylella, para o seqüenciamento da bactéria Xylel/a fastidiosa, causadora da Ciorose Variegada dos Citros, a doença do amarelinho, está um ano adiantado com relação ao programa previsto. Os cientistas, atualmente, analisam as seqüências geradas do genoma e as comparam com outras já descritas e arquivadas em bancos de dados internacionais e identificam as próprias descobertas. O coordenador de DNA do projeto, Andrew Simpson, já enviou um pedido de patente para os Estados Unidos.
O esforço final é fechar os gaps, ou buracos na seqüência de bases do DNA, do genoma da bactéria. Os cientistas costumam comparar os gaps a peças que faltam num quebra-cabeças. Para seqüenciar o DNA, foi preciso quebrá-lo em pequenos pedaços, distribuídos pelos 331aboratórios da rede Onsa. Na montagem final do quebra-cabeças, descobriu-se que o genoma da Xylella era pelo menos 20% maior do que se esperava. Até agora, foram seqüenciados 2,3 MB. A Xylella já é a quinta maior bactéria seqüenciada no mundo.
O Genoma Humano do Câncer, um acordo de cooperação firmado em março entre a FAPESP e o Instituto Ludwig de Pesquisa sobre o Câncer, se destina a descobrir novos genes, a partir da investigação do material genético de tumores cancerígenos. Deverá, assim, entrar em regiões codificadoras ainda não exploradas do genoma humano. A coordenação está examinando os grupos que se candidataram para participar do projeto, com o objetivo de montar a rede de laboratórios.
Mais dois projetosestãoacaminho. Um é o Genoma Funcional daXylella, a verificação das funções dos genes identificados no seqüenciamento e as proteínasqueeles codificam. Outro é ogenoma daXantomonas campestris, a bactéria causadora do cancro cítrico, uma das doenças que causam os maiores prejuízos aos laranjais brasileiros.
CONVÊNIOS
Assinados acordos com instituições francesas
Os projetas temáticos financiados pela FAPESPagorapoderãocontarcomacolaboração de jovens doutores franceses com destacado desempenho científico ou tecnológico. Acordo nesse sentido foi finnado entre a Fundação e o Comitê Francês de Avaliação da Cooperação Universitária com o Brasil (COFECUB), durante visita do ministro da Educação Nacional, Pesquisa e Tecnologia da França, ClaudeAllégre, a São Paulo, em abril.
A preferência à participação nesses projetos será dada a candidatos franceses que tenham concluído o doutorado até cinco anos antes da solicitação da bolsa. Os selecionados receberão bolsa mensal no valor de R$ 2.570,00.As bolsas serão concedidas por um período de um ano, com a possibilidade de prorrogação anual por até três anos. Será exigido do candidato bons conhecimentos de inglês. Apesar de desejável, a proficiência em português não será pré-requisito. As passagens de ida e volta serão de responsabilidade doCOFECUB.
OCOFECUBdivulgarájuntoàsuniversidades e instituições de pesquisa francesas a relação de coordenadores dos projetas temáticos em andamento interessados em receber bolsistas para pós-doutoramento em São Paulo. O candidato encaminhará a documentação simultaneamente ao coordenador do projeto e ao COFECUB. Caberá ao coordenador encaminhar a solicitação de bolsa à FAPESP, que decidirá sobre a concessão·ou não num prazo de três meses.
Na mesma ocasião foi assinado um acordo entre o Centro de Cooperação Internacional em Pesquisa Agronômica para o Desenvolvimento (CIRAD), da França, e a FAPESP, com o objetivo de intensificar a colaboração na área da pesquisa agronômica e ciências conexas aplicadas ao desenvolvimento tecnológico e à inovação.
As modalidades de cooperação previstas são: intercâmbio de pesquisadores envolvidos em projetos conjuntos; realização de programas e projetos conjuntos de pesquisa e de desenvolvimento; realização de conferências, cursos, seminários e simpósios; difusão e valorização dos resultados, métodos e técnicas desenvolvidos e obtidos em conjunto. A implementação dessas atividades ocorrerá através de acordos específicos.
O CIRAD e a FAPESP poderão convidar outras instituições de cooperação técnica ou de apoio financeiro, comunidades científicas, acadêmicas ou comerciais para participar das iniciativas previstas. O Instituto Nacional de Pesquisa Agronômica da Fran-
.JJIAPESP
ça poderá ser incluído como parceiro no acordo.
Cooperação em mão dupla A visita da delegação de Claude Allégre
no dia 16 de abril a São Paulo possibilitou a assinatura de diversos acordos de cooperação científica, tecnológica, educacional e cultural entre instituições francesas e brasileiras, além de compromissos firmados diretamente entre os governos francês e brasileiro. Na USP, foi estabelecido acordo entre o Conservatoire National des Arts e Métiers (CNAM) e a Escola Politécnica, para cooperação na área de materiais po I i méricos, sobretudo. A USP também assinou um protocolo de intenções com a Fundação Nacional de Ciências Políticas da França para o estabelecimento de convênio nas áreas de ensino, pesquisa ou extensão de serviços à comunidade. Ainda na USP, Allégre, que é um geoquímico de renome internacional, fez a conferênciaA Formação da Terra, assistida por mais de 400 pessoas, no Auditório da Escola Politécnica.
No mesmo dia, na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp ), Allégre e dirigentes de instituições de pesquisa francesas reuniram-se com a diretoria da FAPESP, quando foram firmados os acordos de cooperação. Na ocasião, o presidente do Conselho Superior da Fundação, Carlos Henrique de Brito Cruz, fez uma apresentação da agência paulista e o diretor científico, José Fernando Perez, discorreu sobre os diversos programas da F APESP. Foi observado que as prioridades francesas citadas pelo ministroinovação tecnológica, genoma e incentivo à formação de jovens pesquisadores - são muito semelhantes às adotadas pelaFAPESP.
Em seguida, houve uma conferênciadebate sobre formação tecnológica, no Salão Nobre da Fiesp, com a participação do ministro francês, do ministro de Ciência e Tecnologia brasileiro, Luiz Carlos Bresser Pereira, do secretário de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Econômico doEstado de São Paulo, José Aníbal, do presidente da Fiesp, Horácio Piva, do diretor de Desenvolvimento Tecnológico da Fiesp, Osíris Silva, e do presidente do Senai, FábioAidar.
Allégre também esteve na Unicamp e no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron em Campinas. Sua visita se estendeu ainda ao Rio de Janeiro, Brasília - onde firmou protocolos de cooperação com o governo brasileiro - e a Manaus.
POLÍTICA CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA
IPT
O berço da tecnologia paulista
O Instituto de Estudos Avançados (IEAUSP), a Academia de Ciências do Estado de São Paulo e a F APESP promoveram, no dia 15 de abril, no auditório da Fundação, o seminário A Tecnologia e a Retomada do Desenvolvimento, marcando o início das comemorações em homenagem ao centenário do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). Na pauta do seminário, o passado - a história do IPT e a sua contribuição pioneira para o desenvolvimento tecnológico do Estado de São Paulo-e o futuro, ou como modernizar sua estrutura e atuação, numa sociedade cada vez mais exigente de competência tecnológica. A homenagem ao Instituto, presenteado pela FAPESP com uma placa de prata, estendeu-se a dois de seus ilustres pesquisadores, já falecidos: Adriano Marchini e João Luiz Meiller, responsáveis pela inclusão, na Constituição Estadual de 194 7, do artigo que previu a criação da FAPESP e tomou possível o início de seus trabalhos a partir de 1962.
O evento contou com a presença do reitor da Universidade de São Paulo, Jacques Marcovitch, do presidente e do superintendente do !PT, respectivamente Alberto Pereira de Castro e Plínio Assmann, do presidente da Academia de Ciências de São Paulo, Walter Colli, do diretor presidente da FAPESP, Francisco Romeu Landi, do ex-presidente da FAPESP e pesquisador emérito do IEA, Alberto Carvalho da Silva, do secretário de Comércio e Serviços do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, Hélio Mattar, e do superintendente da área de operações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Carlos Gastaldoni.
Criado em 1899, com o nome de Gabinete de Resistência de Materiais, o IPT, além
de servir para o estudo prático dos estudantes da Escola Politécnica de São Paulo, prestava serviços a empresas, especialmente na área de construção civil, e ao governo, em projetas de infra-estrutura, como transporte e energia. Em 1926, foi reorganizado como Laboratório de Ensaios de Materiais e, em 1934, depois de anexado à USP, transformou-se no Instituto de Pesquisas Tecnológicas. Dez anos depois, tomou-se uma autarquia. Ao longo desses cem anos, o Instituto esteve à frente da pesquisa tecnológica no Estado, nas mais diversas áreas, colocando a sua competência e o seu acervo à disposição da indústria paul iSta. Hoje, segundo seu presidente, Alberto Pereira de Castro, o IPT está empenhado no estabelecimento de parcerias entre equipes técnicas e a indústria para acompanhar as mudanças em curso. "Essa é uma nova estratégia do Instituto, que veio se somar às antigas, que continuam válidas. A cada mês, o número de casos de êxito está crescendo. Estamos fazendo um movimento de ascensão, que consiste em focar os problemas da indústria em parceria íntima com suas equipes técnicas."
Francisco Romeu Landi, diretor presidente da FAPESP, assinalou que os desafios do próximo século exigem não apenas a reciclagem técnica, com a permanente formação de novos profissionais, mas também uma nova forma organizacional para o IPT. "A exportação e o suporte à pequena e média empresa são vitais para a busca de maior competitividade. E para isso é necessária uma nova forma jurídica, maior flexibilidade para realização de trabalhos e uma postura de pesquisadores sintonizada com a modernidade que aí está", disse.
Para o reitor Jacques Marcovitch, da
12 fSP
USP, esse processo deve serrápido. "Em nosso tempo, quando os meios tecnológicos tornam-se obsoletos de um dia para o outro, nenhum projeto de governo pode deixar de acompanhá-los no mesmo ritmo veloz. Trata-se de uma variável política indispensável, pois envolve o destino e a soberania dos estados", afirmou. Abandonar os cientistas à própria sorte, de acordo com Marcovitch, é um erro que pode afetar até a estabilidade democrática. "Se o Brasil não pensar seu futuro da mesma fonna como os pioneiros o fizeram, simplesmente não haverá futuro" , disse, referindo-se aos frutos que a ciência pode produzir. Sobre a política federal, Marcovitch assinalou que, embora empenhado corretamente na tarefa de ajustar as contas públicas, o governo central comete dois desvios perigosos: "corta recursos de programas sociais já limitados e diminui drasticamente verbas já escassas na área de ciência e tecnologia, comprometidas na gestão anterior do mesmo governo". Para o reitor da USP, "uma exceção e um paradigma de consciência estratégica é a F APESP, que, a despeito de todas as crises, vem zelando exemplannente pelo progresso da ciência no âmbito do Estado de São Paulo, com repercussões para o Brasil".
Para continuar a ampliaras fronteiras da tecnologia, o diretor técnico do IPT, Vicente Mazzarella, concorda que o exemplo dos desbravadores do passado deve ser seguido. "Temos que mudar, percebendo ou mesmo adivinhando a direção e o sentido das mudanças
do mercado, da economia, do mundo, da sociedade, nos antecipando a elas", acrescentou. Lembrando a contribuição do IPT na indústria aeronáutica para a construção e experimentação de planadores e aviões, na década de 30, ele afirmou que o momento atual aponta a direção para onde o Instituto deve ousar e voar mais alto "em grandes temas e em formas de atuação inovadoras, dinâmicas, eficazes eco-responsáveis nos resultados". O Prumo - Projeto de Unidades Móveis de Atendimento Tecnológico às Pequenas Empresas do Setor Plástico, recém- iniciado por meio de uma parceria entre o IPT, o Serviço de Apoio às Micros e Pequenas Empresas de São Paulo (Sebrae) e o Instituto Nacional do Plástico (INP), com aporte financeiro da FAPESP, ilustra, segundo Mazzarella, esta nova maneira de trabalhar.
O diretor superintendente do Instituto, PlínioAssmann, lembrou que, para desenvolver a sociedade, o IPT abriu caminhos no domínio de tecnologias e, hoje, o conjunto de seus 72laboratórios proporciona uma amplitude de atuação muito diversificada para atender a esse desafio. Nessa direção, ele informa que o Instituto pretende participar da organização de um complexo de competência tecnológica em conjunto com a USP, começando pela implantação de cursos de mestrado profissional para promover outras associações que permitam interação em todos os campos da tecnologia. "Mestres e alunos são um acervo importante demais para ficar distantes do maior e mais diversificado parque de laboratórios do país", completou.
Para Hélio Mattar, secretário de Comércio e Serviços do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, a competência tecnológica alicerçada na produção e na infra-estrutura é a base para ambicionar uma participação maior nos mercados globalizados. "Embora exportar mais seja muitíssimo importante, a questão é participar de redes e alianças internacionais, aprender a participar do novo jogo da globalização. Para o Brasil acompanhar esse processo, é preciso acelerar a transição da etapa de pesquisa e tecnologia para a etapa do conhecimento e da inovação. Só redes integradas que pennitam uma convergência crescente nos interesses e ações do establishment acadêmico-científico, dos institutos de pesquisa, dos usuários finais da tecnologia com apoio financeiro significativo poderão propiciar tal processo."
Mattar acredita que, para oferecer maior eficiência ao cidadão, é preciso priorizar o funcionamento integrado em redes que envolvam o setor produtivo, as universidades, os institutos e o governo, voltadas para estratégias convergentes e baseadas em conhecimentos e inovação. "O IPT tem um papel importante nesse esforço, como parceiro de empresas em projetas de desenvolvimento, fornecedor de serviços tecnológicos, centro de referência de informação tecnológica e participante indutor do processo de normalização nacional", concluiu.
PROJETO TEMÁTICO
FÍSICA
Novo equipamento ajuda a estudar superficies dos materiais
Na década de 1930, muitos cientistas ainda acreditavam que o silício era um metal, devido às suas propriedades elétricas. Estavam errados, porque o material que eles tinham à mão era impuro e eles não sabiam. Só depois da caracterização do material, que levou à produção de um silício puro, sedescobriu que ele era um semicondutor. As suas propriedades semicondutoras tomaram po·ssível a abertura de portas que conduziram aos chips e aos modernos computadores. "Isso mostra como é importante a caracterização dos materiais", diz o fisico George Kleiman, que, com outro fisico , Richard Landers, coordena o Grupo de Física de Superficies do Instituto de Física Gleb Wataghin, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp ).
Caracterizar materiais faz parte do trabalho de Landers e Kleiman. Há mais de 20 anos, seu grupo estuda as propriedades fisicas das superficies dos materiais. A superficie é a "pele" do material, com apenas uma ou duas camadas de átomos e com uma espessura de poucos angstroms (um angtrom é um décimo de milionésimo de milímetro), com as quais os materiais interagem com seu meio ambiente. As suas propriedades podem ser muito diferentes daquelas do interior da amostra. Algumas ligas metálicas, por exemplo, se formam apenas na superficie e não existem na forma massiva. "E um trabalho típico de pesquisa básica, que pode ser a base, no futuro, de materiais inteiramente novos", informa Landers.
13 'SP
Em julho de 1997, o trabalho do grupo ganhou novas perspectivas com a entrada em funcionamento, na mesma cidade de Campinas, do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS). Passou a ser possível fazer, aqui mesmo no Brasil, experiências que envolvem feixes potentes, mas finíssimos, de raios X ou ultravioletas, e descobrir não só como os elétrons ficam distribuídos nos átomos do material, isto é, a sua estrutura eletrônica, mas também a sua estrutura cristalográfica geométrica, ou seja, a maneira como seus átomos estão distribuídos no espayo.
Ultra-alto-vácuo Para desenvolver melhor suas pesquisas,
porém, o grupo da Unicamp precisava desenvolver um equipamento especial, uma estação de ciências da superficie, para trabalhar acoplada às linhas de luz do LNLS. Foi onde entrou a FAPESP. Um projeto temático Estudo da Estrutura Eletrônica de Ligas Metálicas por Luz Síncrotron coordenado pelo professor Landers e aprovado pela Fundação, colaborou decisivamente para tomar possível a construção do aparelho. Com essa base, o grupo partiu para o trabalho. Aproveitou componentes usados em outros equipamentos e comprou alguns novos. Conseguiu, também, recursos do Programa Nacional de Grupos de Excelência (Pronex), da Financiadora de Estudos e Projetas (FINEP) e da própria Unicamp. Ao todo, juntou recursos de aproximadamente US$ 500 mil.
A estação de ciências da superficie já está em uso em Campinas. Ela trabalha com um espectrômetro de elétrons de alta resolução e um difratômetro de elétrons de baixa energia. Juntos, esses dispositivos permitem a realização de observações bastante detalhadas das propriedades dos elétrons dos átomos da superficie estudada. Para evitar impurezas que inviabilizariam as experiências, as amostras ficam numa câmara de ultra-alto-vácuo.
O equipamento fica sob responsabilidade do grupo da Unicamp, mas já foi usado no LNLS por outros grupos, da mesma Unicamp, da Universidade Federal de Minas Gerais, da Universidade Federal do Rio de Janeiro e por equipes argentinas. A decisão de partilhar o equipamento com outros grupos permite que os recursos financeiros aplicados pelas agências de fomento alcancem objetivos ainda mais amplos.
O equipamento, porém, ajuda a fazer do Grupo de Física das Superficies um dos usuários mais freqüentes do LNLS. Seu trabalho segue duas linhas fundamentais. Um é o de que na superficie de um material podem for-
Cinco técnicas Os cientistas usam cinco técnicas
para fazer experiências com o objetivo de entender as
superfícies de materiais. São elas:
Espectroscopia de totoelétrons excitados por Raios X-Permite analisar os fotoelétrons (ou seja, elétrons produzidos pela absorção de luz, ou fótons) arrancados dos níveis de caroço ( elétrons mais próximos do núcleo). Dá informações sobre a composição química da superfície e da região imediatamente abaixo da superfície, dependendo da energia dos fótons excitadores. Também dá informações sobre a estrutura eletrônica e o ambiente químico dos átomos pesquisados.
Espectroscopia de fotoelétrons excitados por Ultravioleta- Coloca em evidência a banda de valência (ou seja, elétrons que contribuem para as ligações químicas) e os níveis rasos de caroço (elétrons pouco ligados) dos átomos da superfície do material estudado.
Difração de fotoelétrons- Permite saber a posição geométrica dos átomos de uma superfície, incluindo a distância e os ângulos entre átomos.
Difração de elétrons de baixa energia- É essencial para esclarecer a estrutura cristalográfica da superfície de monocristais, que pode ser bem diferente do arranjo dos átomos das camadas do interior do material. É útil também para saber como os átomos adsorvidos se posicionam numa superfície.
Espectroscopia de elétrons Auge r- É muito útil para controlar a limpeza da amostra do material em estudo. Pode ser utilizada para diminuir ambigüidades na identificação das ligações químicas de átomos superficiais.
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Padrões Leed (low Energy Electron Diffraction) de um cristal de Paládio (Pd<111>) (a) antes e (b) depois da deposição de - 2 monocamadas de Cobre
mar-se ligas de natureza às vezes diferentes do resto do material, abrindo a possibilidade de surgirem materiais inteiramente novos, com propriedades desconhecidas. Outro é que as propriedades superficiais de diversas ligas são fundamentais como catalisadores, ou seja, agentes de reações químicas.
"É uma área de pesquisa muito importante, pois entre 80% e 90% dos processos industriais exigem algum tipo de reação catalítica", diz o professor Kleiman. Os químicos em catálise e os engenheiros químicos vêm fazendo enormes progressos no desenvolvimento de processos catalíticas para aplicações industriais. Mas boa parte do entendimento dos processos de catálise heterogênea ainda é empírico. Mesmo em reações bem caracterizadas, ainda não se conhece completamente o papel catalítico de várias superficies.
O professor Kleiman acredita que, num futuro ainda distante, será possível preparar um manual de catálises, com base no entendimento dos conceitos fundamentais do papel dos catalisadores nos processos químicos. Assim, será possível otimizar cada reação, sabendo-se com certeza quais as substâncias mais convenientes e mais econômicas que se deve juntar para formar o catalisador. "É ufn futuro distante, mas o problema é muito importante", afirma.
Amostras As experiências do grupo seguem um ci
clo complexo. Começa com a preparação das amostras a ser analisadas. As amostras de ligas metálicas poli cristalinas, ou seja, compostas de pequenos cristais com orientação aleatória, são fabricadas num laboratório existente no próprio Instituto de Física Gleb Wataghin. Para isso, usam-se técnicas metalúrgicas convencionais e equipamentos como um fomo de arco e fusão por meio de feixes de elétrons.
Outros tipos de amostras são modificações das superficies de substratos monocristalinos, como de cobre, ouro ou paládio, com o objetivo de produzir ligas superficiais. Essas modificações são feitas no próprio equipamento. O passo inicial é limpar todas as impurezas de superficie por erosão iônica. Para mantê-las limpas, a câmara na qual é feito o processo opera com ultra-alto vácuo. A amostra, então, é aquecida, para reorganizar e recristalizar a superficie. Em seguida,
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com o uso de um evaporador, um pequeno número de átomos é incorporado à superficie, seguindo a orientação cristalográfica da superficie do material.
Todo o processo é acompanhado com cuidado, medindo-se a estrutura eletrônica e o arranjo atômico. Os pesquisadores acompanham o estado da superficie da amostra e verificam se a superficie fonnada corresponde mesmo à desejada. Só depois é que começa a experiência propriamente dita, quando a câmara que contém o material é acoplada a uma das linhas de luz síncrotron do LNLS. Os pesquisadores usam principalmente as linhas SGM (Espectroscopia de Raios X moles), SXS (Espectroscopia de Raios X Moles II) e TGM (Espectroscopia de Ultravioleta).
A estação de ciências da superficie facilita muito o processo. Ela tem mecanismos destinados ao preparo de amostras e para o manuseio dos materiais durante as experiências, como trasladares, dispositivos que mudam o ângulo da amostra com relação ao feixe de raios vindo da fonte de luz síncrotron. Mesmo assim, a equipe da Unicamp já está pensando em modificações e atualizações tecnológicas. "Pesquisamos numa área muito competitiva da Física", diz o professor Kleiman. "Não queremos ficar defasados com relação aos nossos concorrentes".
No projeto temático coordenado por Landers, participam, ainda, outros fisicos do Instituto de Física da Unicamp, o fisico Pedro Nascente, do Departamento de Engenharia de Materiais da Universidade Federal de São Carlos, o tisico pesquisador de Pós-Doutorado Jonder Morais, e o doutorando Abner de Siervo, além de outros estudantes e técnicos do Instituto. Juntos, eles tentam decifrar os enigmas presentes na "pele" dos materiais.
Perfil : Richard Landers, 53 anos, é físico formado pela
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Fez doutoramento sobre mecanismos de crescimento de cristais (Universidade de Marselha e nicamp) e pósdoutorado no Labmatório Maurial Lefort (CNRS), Nancy, França. Nos ulti os 3 anos te se dedicado ao estudo dos fenômenos que ocorrem em superfícies sólidas e ao desenvolvimento de instrumentação científica relacionada com análise pores ectroscopia de elétrons. É professor do Instituto de F1sica Gleb Wataghin, da Unicamp.
PROJETO TEMÁTICO
O Brasil pode aumentar em 3% a produção nacional de energia elétrica, sem grandes obras de engenharia ou problemas para o meio ambiente, como o alagamento dos vales de rios. Parece pouco? Esses 3% correspondem à produção média de uma usina de 2 mil megawatts, mais do que gera a usina de Porto Primavera, inaugurada em fevereiro no Rio Paraná. Ou ao consumo de 7,3 milhões de consumidores residenciais de classe média. Pois saiba: esse aumento muito necessário de produção pode vir de uma simples mudança de conceito.
Trabalhando num projeto temático financiado pela FAPESP, uma equipe coordenada pelo professor Secundino Soares Filho, da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp ), desenvolveu um programa de computador que promete esse aumento de produção e ainda mais. Ainda não se fez, por exemplo, um cálculo preciso das economias resultantes da aplicação do projeto. Mas elas podem ser significativas.
A base do projeto está numa mudança de conceito. O Brasil tira 95% da energia elétrica que consome das usinas hidrelétricas. Mas a quantidade de água existente nas represas que alimentam essas usinas segue o curso da natureza, aumentando ou diminuindo devolume conforme as chuvas e o fluxo dos afluentes dos grandes rios. O que a equipe do professor Soares sugere é a coordenação dessas
águas. As represas perto das cabeceiras dos rios controlariam o fluxo da água de maneira que as situadas mais adiante, perto da foz, ficariam sempre cheias. Com reservatórios mais cheios, essas usinas poderiam produzir mais energia. Ou seja, trata-se de uma questão de gerenciamento.
Há ainda um fato r estratégico. "O gerenciamento mais cuidadoso dos reservatórios contribuiria para reduzir o risco de racionamento de energia, previsto para os próximos anos, se os investimentos no setor continuarem a ser postergados", lembra o pesquisador. Para atender a um crescimento médio no consumo de 5% ao ano, serão necessários investimentos deUS$ 8 bilhões por ano, até 2007. A proposta da equipe da Unicamp levaria a um aumento de produção equivalente a investimentos deUS$ 3,6 bilhões em novas usinas e linhas de transmissão, reduzindo a necessidade de novas obras.
Tecnologia própria A tecnologia nesse campo tem, quase
que obrigatoriamente, de ser desenvolvida no Brasil. "Não é uma área em que se possa basear exclusivamente em tecnologia externa", afirma o professor Soares. O país, dependente em 95% da energia hidrelétrica, é um caso raro no mundo. Em quase todos os lugares, a eletricidade vem principalmente de usinas termelétricas, funcionando a petróleo, gás ou carvão e, em alguns casos, como na França,
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de usinas atômicas. Numa usina termelétrica, é relativamente fácil relacionar o combustível e a geração de energia. Calcula-se quanto a usina vai consumir, encomenda-se o combustível necessário e o problema está resolvido.
Não é o que acontece com a energia hidrelétrica. O volume de águaquechega à usina varia bastante ao longo do ano e pode oscilar muito, inclusive de um ano para outro. Isso faz com que os responsáveis pelas usinas sejam extremamente cautelosos. Se a usina gastar toda a água que tem agora para produziromáximodeenergia,podeviruma seca daqui a pouco e a represa não terá água para atender ao consumo. "Se, por outro lado", comenta o pesquisador, "se guardar a água e vier uma cheia, a energia hidráulica que poderia ter sido usada para gerar eletricidade será desperdiçada."
Atualmente, o planejamento do uso da água é feito a longo, médio e curto prazos pela Centrais Elétricas Brasileiras S. A. - Eletrobrás, a holding do governo federal que cuida do setor. AEletrobrás controla as empresas federais de geração de energia, como a Fumas Centrais Elétricas, a Companhia Hidro-Elétrica do São Francisco (CHESF) e a Centrais Elétricas do Norte do Brasil (Eletronorte). Além disso, tem participações acionárias nas empresas estaduais de geração de energia elétrica, como a CESP, em São Paulo, e a Copel, no Paraná.
O planejamento de longo prazo traçado pela Eletrobrás tem caráter estratégico e trabalha com estimativas de produção para os cinco anos seguintes. A análise de médio prazo, com uma abordagem tática, enfoca o comportamento do sistema cinco semanas à frente. Já o estudo de curto prazo, essencialmente operacional, estabelece o modo de operação das usinas na semana ou mesmo no dia seguinte. "O Brasil não está atrasado nessa área, mas nem sempre as questões técnicas prevalecem", observa o pesquisador da Unicamp. As usinas brasileiras, lembra ele, ftmcionam de modo homogêneo, de acordo com a regra de operação "paralela", como um único e imenso pulmão. Todas se esvaziam juntas na época de menos chuva, geralmente entre maio e outubro, no Sudeste, e se enchem juntas na época da cheia, entre novembro e abril.
Apoio da Fapesp
MS
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Oceano AtlãnUco
A idéia do professor Soares é romper com essa uniformidade no tratamento das usinas e criar novos métodos para otimizar o aproveitamento da água. Essa é a base do projeto temático, Planejamento da Operação de Sistemas de Energia E tétrica Predominantemente Hidrelétricos, que ele coordenou. Esse trabalho, de quatro anos, contou com um apoio financeiro da FAPESP no
O programa desenvolvido pelos pesquisadores permite selecionar usinas cujas operações se deseja planejar. Como exemplo, foram escolhidas três grandes usinas do Sistema Sudeste: Fumas e Marimbando (de Fumas Centrais Elétricas) e Água Vermelha (CESP), que se encontram uma após a outra, no Rio Grande (em destaque). O conjunto gerador de energia funciona como se existissem apenas as três. Para um horizonte de 60 meses, são tomadas cinco repetições de uma seqüência de vazões de doze meses (a média do histórico de vazões para as três usinas). Veja os resultados dos exemplos nos gráficos abaixo.
Operação otimizada O gráfico acima mostra o comportamento dos reservatórios das três usinas para atender à demanda de energia elétrica. Água Vermelha e Marimbando permanecem cheias durante os 60 meses, enquanto Fumas diminui seu nível de armazenamento em alguns períodos e seu reservatório encontra·se cheio no final de cada ano. Embora a operação tenha utilizado água de seu reservatório, o volume se recuperou antes do início do período de seca do ano seguinte.
Trajetória de Volumes- Otimizador 110
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Operação em paralelo T rajetória de Volumes- Operação em Paralelo
110,.----------------------,
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Os reservatórios são esvaziados em uma proporção única de seu volume útil: se uma das usinas deles perde 10% de seu volume útil, as demais também devem perder 1 0%. Como o volume é medido em porcentagem, reservatórios maiores perdem volumes maiores de seus armazenamentos. O gráfico ao lado apresenta somente uma curva porque , operando em paralelo, os
~ reservatórios de Fumas, Marimbando e o de
0 -1-----~---~---~---~-----l Água Vermelha obedecem ao mesmo ritmo o 12 " 36 •a so de esvaziamento e de enchimento.
CONCLUSÃO A operação em paralelo consome mais água dos reservatórios do que a operação otimizada, para uma mesma demanda. No final dos 60 meses, funcionando em paralelo, os reservatórios não conseguem recuperar-se inteiramente e acabam com menos de 55% do volume útil disponível. A operação otimizada gera o mesmo valor de energia e deixa os reservatórios cheios no final, em condições mais favoráveis para atender a futuras demandas de energia.
valor de R$ 250 mil para cada um dos dois períodos em que foi dividido, empregados sobretudo na aquisição de estações de trabalho, microcomputadores e outros equipamentos de informática. O laboratório com os equipamentos encontra-se na Faculdade de Engenharia Elétrica da U nicamp, mas a pesquisa também teve a colaboração de pesquisadores da Faculdade de Engenharia Civil da Unicamp e da Escola de Engenharia e do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da Universidade de São Paulo (USP) em São Carlos.
Em conjunto, os especialistas criaram, testaram e aprimoraram o chamado Sistema de Apoio ao Planejamento Estratégico (Sape), um programa que permite planejar a operação das usinas a longo, médio e curto prazos. Ele está em uso já há dois anos, pelos pesquisadores e por engenheiros de empresas do setor elétrico que passam por cursos de aperfeiçoamento no laboratório da Unicamp. O Sape trata cada hidrelétrica individualmente, de acordo com uma regra de operação não paralela, e não de modo homogêneo, como nos programas adotados pela Eletrobrás. Assim, em épocas de seca ou de cheia, as usinas em cascata, ou situadas no mesmo rio, não enchem e esvaziam seus reservatórios ao mesmo tempo, mas da melhor maneira possível para o conjunto.
As implicações são mais di retas para as chamadas usinas de montante, situadas mais próximas das nascentes dos rios, como Em-
Secundino Soares Filho, que criou um novo
borcação, no Rio Paranaíba, na divisa dos Estados de Minas Gerais e de Goiás, ou Furnas, no Rio Grande, perto da fro nteira en-
Aplicações imediatas A pesquisa desenvolvida na Unicamp já ofe
receu aplicações imediatas. O engenheiro elétrico Clóvis Tadeu Salmazo, que fez um curso de especialização no laboratório do professor Soares, aplicou os conhecimentos adquiridos no projeto na otimização da operação das turbinas das usinas da Copel, a empresa estadual de geração de eletricidade do Paraná, onde trabalha. Como parte da sua tese de mestrado, que concluiu em 1996, Salmazo analisou um dia de operação do sistema hidrelétrico paranaense, formado por três usinas hidrelétricas e 631inhas de transmissão. Em seguida, refez a programação do funcionamento das turbinas, procurando reduzir as perdas de produção e de transmissão de energia. Comparou os resultados obtidos na prática, de acordo com as metodologias convencionais da empresa, e verificou que seria possível obter um ganho de 2,5% no rendimento das turbinas.
"Na prática, as expectativas de ganho de rendimento das turbinas se confirmaram", diz Salmazo. O modelo, em uso há dois anos na Copel, teve outra vantagem, a redução dos gastos com manutenção das máquinas, segundo ele. A pesquisa de otimização das turbinas, premiada em 1995 no 13' Seminário Nacional de Produção e Transmissão de Energia Elétrica, realizado em Camboriú, no Estado de Santa Catarina, provoca um comentário do professor Soares. "As perdas no sistemas hidrelétricos são muito maiores na produção do que na transmissão da energia, mas o setor elétrico ainda não se deu conta disso", afirma.
tre São Paulo e Minas. No projeto, seus reservatórios trabalham mais do que os das usinas de jusante, mais próximas da foz, para regular a vazão do rio. Continuam a produzir energia, mas ao longo do ano permanecem com o reservatório menos cheio do que as outras. Como controlam a vazão da água, mantêm cheios os reservatórios das usinas de jusante, que podem ass im produzir energia elétrica com mais eficiência. Vale lembrar: quanto mais cheio oreservatório, maior a energia produzida para um mesmo volume de água que passa pelas turbinas, pois, quanto maior a queda da usina, maior a pressão da coluna de água sobre as turbinas.
Montante e jusante A equipe da Unicamp sabe que não
será fácil transformar a idéia em realidade. "A melhor solução para o conjunto nem sempre é melhor para as partes, pois pode favorecer uma usina e prejudicar outra", diz ele. A Fumas Centrais Elétricas, por exemplo, que possui mais usinas de montante, de acordo com as regras da Unicamp produziria menos, para beneficiar as usinas da Cesp, predominantemente de jusante. Mas, como diz o professor Soares, "com o modelo em vigor, as usinas de montante, as de jusante e o próprio país estão perdendo". Ele acredita que as novas idéias possam ser mais bem recebidas conforme for avançando o processo de privatização das empresas de geração de energia elétrica, já em andamento.
Um dos marcos das transformações institucionais do setor elétrico ocorreu em março, duas semanas antes do apagão que deixou às escuras mais da metade do país, quando a Eletrobrás transferiu a coordenação nacional do setor para uma empresa
Otimização na tela Uma das telas iniciais do Sape mostra um
esquema com o conjunto das usinas hidrelétricas brasileiras em seus respectivos rios. Fica claro, assim, que no Rio Grande, por exemplo, há dez usinas seguidas. Cada uma interfere uma no comportamento da outra. Cada usina possui uma base de dados, que incluem suas características físicas, o potencial de produção de energia e o histórico das vazões mensais desde 1930. É possível selecionar uma, duas ou até mesmo todas as usinas mostradas no esquema inicial e a seguir solicitar ao programa a forma ótima de operação de cada uma delas. Essas informações abastecem o módulo de otimização do Sape, que elabora gráficos mostrando a melhor forma de operar as usinas, a quantidade de energia a ser gerada e a eventual necessidade de participação das usinas termelétricas, mês a mês.
Em seguida, o módulo de simulação indica as conseqüências do planejamento das usinas, segundo diversas formas de visualização de resultados, como o volume do reservatório, a energia gerada e a vazão tanto da usina como do rio. "Testamos alguns modelos de simulação e conseguimos resultados mais favoráveis do que os apresentados pelos modelos da Eletrobrás", diz Marcelo Augusto Cicogna, engenheiro civil e um dos autores do programa. Sua pesquisa de doutoramento consiste na elaboração de uma nova versão de um simulador, que ele pretende concluir em dois anos, capaz de comparar os diversos modelos propostos para o sistema brasileiro. Por enquanto, os programas da Eletrobrás e os da Unicamp não conversam entre si. "Aí, sim, vamos poder confirmar o quanto a nossa política de operação é a melhor", diz Cicogna.
privada, a Operadora Nacional do Sistema (ONS), formada pelas companhias estatais e particulares do setor elétrico. A essa coordenação nacional, que estabelece as diretrizes sobre as formas de operação das usinas, com ênfase na eficiência do aproveitamento dos recursos hídricos e energéticos, caberia também compartilhar osganhos gerados com a nova regra da Unicamp, equilibrando os ganhos e as perdas das usinas de modo a compensar o prejuízo de operadoras isoladas que proporcionaram o beneficio coletivo.
Perfil: O professor Secundino Soares Filho, 49 anos, é
engenheiro mecânico, graduado pelo Instituto Tecnológico da Aeronáutica em 1972. Fez mestrado e doutorame()Jo na área de Engenharia Elétrica na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e P,ós-doutoramento em sis emas de potência n Universí ade McGill , no Canadá, em 1989 e 1990. É professor titular e chefe do departamento de Engenharia de Sistemas da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação da Unicamp.
PROJETO TEMÁTICO
Grande parte das pessoas associa os ftmgos imediatamente ao mofo de paredes úmidas ou a alimentos estragados, como o pão embolorado. Poucos se dão conta da importância dos fungos para o equilíbrio dos ecossistemas ou mesmo como indicadores das alterações produzidas pelo ser humano no meio ambiente.
De acordo com a bióloga Iracema Helena Schoenlein-Crusius, pesquisadora da Seção de Micologia e Liquenologia do Instituto de Botânica da Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, as escolhas de locais para conservação da biodiversidade jamais levam em conta as comunidades microbianas: "Isso pode fazer com que importantes espécies de fungos sejam perdidas, com conseqüências desconhecidas para a manutenção da vida nos ambientes terrestre e aquático". O projeto temático Estudo de Fungos em Ambientes Terrestre e Aquático: Uma Contribuição para Avaliação e Conservação da Biodiversidade, coordenado pela bióloga, é o tipo de trabalho que preenche parte dessa lacuna.
O projeto está identificando fungos de dois ecossistemas: a Represa de Guarapiranga, na Zona Sul de São Paulo, e o Rio Manjolinho, em São Carlos, a 300 km da Capital. O estudo da represa está concentrado no Instituto de Botânica, onde Schoenlein-Crusius conta com a assistência do mestrando Christian Wellbaum (Unesp) e da estagiária Marilene Domingues. O trabalho no Rio Monjalinho é desenvolvido por MimaJanuário Leal Godinho, professora da Universidade Federal de São Carlos, com a colaboração da mestranda Elaine Malosso. O projeto estuda os fungos no ambiente terrestre (solo e folhedo)
e no ambiente aquático (folhedo submerso), comparando a diversidade das micotas (populações de fungos) das duas regiões, que sofreram interferência humana diversa.
Schoenlein-Crusius cita a cientista inglesa Marta Christensen, que relacionou cerca de vinte fimções principais exercidas pelos fungos na natureza,. Entre elas estão as de decompor a matéria orgânica, mineralizar e imobilizar nutrientes, reservando-os para o ambiente. "Os fungos são importantes para os vegetais, pois transportam nutrientes, promovem o intercâmbio de íons e alteram o n'lovimento de água e elementos químicos através das partes aéreas das plantas. Nas raízes das plantas, podem formar associações simbióticas, as micorrizas, dinamizando o fluxo
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de nutrientes. Também podem estimular a germinação de sementes, por meio da ruptura do tegument?, (camada protetora de algumas sementes).
Mas esses organismos exercem importantes funções também com relação ao solo. Ali, os fungos podem acumular materiais tóxicos e atuar sobre a pem1eabilidade- uma vez que retêm a umidade- e agregação da terra. E mais. Sua participação na cadeia alimentar pode ser direta, pois são consumidos por organismos como os ácaros, e indireta,já que elevam a "palatabilidade" dos substratos para seres que se alimentam de detritos, principalmente nos ecossistemas aquáticos. A importância dos fungos para os animais também se revela no seu papel como predadores (fun-
gos nematófagos e insectícolas) e mutualistas (fungos cultivados em '~ardins" de fonnigas ).
Os fungos apresentam interações complexas entre si, acrescenta Schoenlein-Crusius: "Os mecanismos de competição entre as espécies envolvem a produção de antibióticos, ocupação de espaço por meio do crescimento de hifas (filamentos) e síntese de enzimas específicas para metabolização de diversos substratos".
Diversidade No âmbito do projeto, foram feitas co
letas bimestrais de amostras de solo, fo lhedo e água dos ambientes entre agosto de 1997 e agosto de 1998. No caso da represa, isso foi feito em seis pontos, que coincidem com pontos de coleta de amostras da Sabesp. Atualmente o projeto encontra-se na fase de identificação dos fungos presentes nas amostras. Essa fase deve tenninar em julho/agosto deste ano. Depois, será preciso correlacionar os dados de fungos com as variáveis levantadas.
Até abril , foram identificadas 45 espécies de fungos presentes no solo e 40 encontradas no folhedo submerso da região da represa. Nos riosMonjolinhoeJacaré-Guaçú foram identificadas 20 espécies de fungos aquáticos. Uma surpresa dessa fase do projeto foi a existência de diversas linhagens do gênero Penicillium no ambiente terrestre da represa. "Talvez essa constatação recomende um estudo mais específico sobre as potencialidades desses fungos para, por exemplo, a produção de algum antibiótico ou depuração de efluentes."
O gênero Penicillium é extremamente comum no solo e abrange espécies cosmopolitas (aquelas que estão presentes em muitos ecossistemas). Entre as utilizações das espécies desse gênero na indústria, destacam-se a produção de antibióticos e de queijos ( camen-
bert, brie, gorgonzola e outros). "Para compreender a elevada incidência dePenicillium no ambiente terrestre e aquático da Represa de Guarapiranga estamos confrontando a ocorrência das suas espécies com as variáveis ambientais que foram determinadas no projeto. Com isso poderemos evidenciar melhor que condições favorecem a presença desse fungo no ambiente", explica Schoenlein-Crusius. Isso significa que os pesquisadores em busca de diversas espécies de Penicillium quem sabe com potencialidades interessantes - , saberão como e onde encontrá-las com maior facilidade.
É sabido que há fungos comuns a praticamente todos os sistemas; outros são raros e alguns são típicos de um determinado sistema. Todavia, a diversidade de fungos no solo, na água e no substrato vegetal da represa foi mais uma surpresa para os pesquisadores: "Das 45 espécies de fungos identificados no solo das margens da represa, 32 espécies foram isoladas pela primeira vez na região do manancial".
Ergosterol Um subproduto do projeto está sendo a
quantificação de ergosterol - um esteróide produzido pelos fungos- contido no folhedo submerso dos dois ambientes aquáticos. "Devido às dificuldades técnicas para separar o fungo do substrato onde ele se encontra, pode-se quantificar a biomassa fúngica através da determinação de moléculas específicas produzidas por esses organismos e a sua subseqüente relação com a massa mice-1 ia! (filamentos de fungos) seca." Essa quantificação do ergosterol em biomassa de fungos filamentosos é pioneira no Brasil. Até o momento, a substância só havia sido quantificada na formação de associação micorrízica (fungos e raízes) em eucalipto. "Iiá fa lta de dados no país para se conhecer, com
maior amplitude, a distribuição geográfica, as interações ecológicas e a diversidade dos fungos decompositores de substratos vegetais, tanto nos ambientes aquáticos quanto terrestres. Essas informações são importantes para avaliar a capacidade desses organismos para o processamento da matéria orgânica e na dinâmica trófica (nutricional) do ecossistema."
Um dos estudos que derivam desse projeto é a avaliação específica sobre a capacidade de assimilação de certas substâncias pelos fungos . A represa é submetida à sulfatação toda vez que a Sabesp constata que o teor de clorofi la e número de algas excedeu o limite toleráve l. São lançados sulfato de cobre e peróxido de hidrogênio com a preocupação de evitar que as algas produzam toxinas. "Supomos que esse tratamento interfere na diversidade dos fungos, porque é um fato r de seleção. Está sendo feito um estudo com enfoque mais aplicado: alguns fungos estão sendo testados quanto à tolerância ao cobre e ao peróxido e também quanto à sua capacidade de absorver essas substâncias. Se os fungos sobreviverem a uma quantidade razoável das substâncias e conseguirem retê-las, é recomendável um estudo aprofundado sobre a viabilidade de utili zação dessa biomassa fúngica num sistema de filtro biológico, para tratamento de água ou de efluentes industriais."
Perfil: A professora Iracema Helena Schoenlein-Cru
sius, 37 anos, é bióloga, com pós-graduação (mestrado e doutorado) em Biologia Vegetal pela Unesp de Rio Claro.Aiém de pesquisadora científica da Seção de Micologia e Liquenologia do Instituto de Botânica desde 1987, é professora credenciada do curso de pós-graduação na área de Microbiologia Aplicada da Unesp de Rio Claro.
Desmoronamentos em Guarapiranga A Represa do Guarapiranga, responsável
pelo abastecimento de água de 3 milhões de pessoas na Grande São Paulo, tem sofrido um processo de degradação há anos, em função de loteamentos clandestinos, desmatamento e lançamento de esgotos. "Alguns trechos das margens e as pequenas ilhas estão sofrendo rápido assoreamento, possivelmente em resposta às oscilações do volume de água contido no manancial e aos efeitos antrópicos sofridos pelo solo", diz a bióloga Iracema Schoenlein-Crusius.
Medidas têm sido tomadas para reverter a situação, como é o caso do recém-criado Parque Ecológico do Guarapiranga, com 260 hectares de área, às margens da represa e incorporando parte das várzeas dos rios Embu-Mirim e Piraporinha. Outras medidas, entretanto, segundo ela, devem ser adotadas com urgência para reflorestar e recuperar o solo da represa- inclusive das ilhas- e restabelecer o equilí-
brio ecológico do ambiente. "O perfil da fertilidade do solo, associado à baixa umidade e às características climáticas da região, podem levar à salinização, erosão e, conseqüentemente, a eutrofização (acúmulo de fósforo e nitrogénio) do manancial."
Schoenlein-Crusius lembra que, num estudo preliminar realizado no Instituto de Botânica, descobriu-se que o solo do entorno da represa estava desmoronando.lsso foi constatado na Ilha dos Eucaliptos, onde os próprios eucaliptos estavam caindo na água, eutrofizando a represa e gerando riscos para as pessoas que utilizam barcos no local. As constatações do projeto temático indicam a necessidade de um estudo urgente das propriedades físicas do solo das margens e das ilhas da represa por uma equipe de pedologistas (especialistas em solo), para a recuperação ou melhoria das condições do terreno e, com isso, garantir a qualidade da água para abastecimento.
INOVAÇÃO TECNOLÓGICA
SAÚDE
Descobrindo o inimigo Uma das doenças mais traiçoeiras do
sistema nervoso central é a neurocisticercose. Difícil de ser diagnosticada, só é descoberta por um teste importado, muito caro, ou por métodos como a tomografia e a punção de líquido cefalorraquiano, complexos e de difícil acesso a pessoas de baixa renda. E são justamente essas pessoas as mais atingidas pela doença. Causada pelas larvas da Taenia solium, a solitária, um parasita que vive no organismo humano, a neurocisticercose tem como intermediário o porco criado em más condições de higiene. No Brasil, estima-se que cerca de 140 mil pessoas sofrem dessa doença, que pode causar lesões cerebrais graves e a morte. É possível que o número de vítimas seja até maior. Como o controle é precário e os sintomas demoram para aparecer, muitas pessoas podem ter neurocisticercose sem saber.
Quadro negro? Nem tanto. Um grupo de pesquisadores da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (USP) acaba de desenvolver um teste simples, prático, barato e eficiente para descobrir os portadores da doença. E feito com uma simples amostra de sangue da pessoa e o resultado está pronto em algumas horas. A pesquisa, Purificação e Caracterização de Antigenos de Cisticercos para o Desenvolvimento de Reagentes Diagnósticos para Cisticercose Humana, é o resultado de uma parceria da equipe com a FAPESP e com o laboratório francês Biolab-Mérieux. Após um ano de trabalho, o grupo da USP desenvolveu o teste, do tipo ELISA (EnzymeLinked Immuno Sorbent Assay). O teste está em fase de aperfeiçoamento. Dentro de um ano, deverá estar em fase de produto comercial.
"Nosso objetivo era desenvolver um teste que pudesse ser aplicado no soro, a parte do sangue onde estão os anticorpos, como uma alternativa à coleta de líquido cefalorraquiano, retirado por punção lombar", explica a pesquisadora Adelaide José Vaz, professora de Imunologia da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP e coordenadora do projeto. Segundo a professora, a grande vantagem do teste é que ele pode ser feito na clínica geral, na rede pública de atendimento, antes de o paciente ser encaminhado a um neurologista. Com isso, o diagnóstico será mais precoce e pode-se conhecer a real situação da doença no país.
Meningite e epilepsia A preocupação com a cisticercose vem
acompanhando a pesquisadora desde 1987, quando ela trabalhava no Instituto Adolfo
Lutz, em São Paulo. Nos últimos 12 anos,juntamente com outros pesquisadores do Departamento de Neurologia da Faculdade de Medicinada USP, a professora Adelaide aprofundou-se no estudo da neurocisticercose, a forma mais grave da cisticercose, doença que se desenvolve em pessoas contaminadas com os ovos da Taenia solium, o parasita popularmente conhecido como solitária. Quando o sistema nervoso central é afetado, o paciente pode apresentar sintomas graves, como a meningite, e pode desenvolver epilepsia, o sintoma mais freqüente, distúrbios mentais e psíquicos, cefaléia e hipertensão intracraniana.
A doença está diretamente ligada às condições de higiene do ambiente. Geralmente, sua incidência é alta em áreas onde não há água tratada e rede de esgoto e atinge pessoas que não observam cuidados com a higiene, como lavar as mãos antes de manipular alimentos, por exemplo. Isso significa que educação sanitária e investimentos em saneamento básico também são fatores muito importantes para o controle da doença.
"O principal veto r é o próprio homem, que desenvolve a Taenia solium no intestino após ingerir carne de porco contaminada", explica a pesquisadora. Até esse estágio, o problema pode ser tratado e eliminado sem problemas para o paciente. Mas, uma vez instalada, a Taenia é uma fonte imensa de perigo. A cada dia, o hóspede indesejável põe entre30mil a 50 mil ovos microscópicos, que, expelidos com as fezes, invadem o meio ambiente. Se ingeridos por meio de água ou alimentos contaminados, os ovos vão transfor-
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mar-se em cisticerco, ou larva, e provocar a doença. Atingindo o cérebro, o que era no primeiro momento um simples parasita provoca a neurocisticercose, completando o ciclo da doença (Veja no quadro o ciclo de contaminação).
Intermediário No meio do caminho, como hospedeiro
intermediário, geralmente está o porco. Isso porque o animal, que também desenvolve cisticercose, é criado com freqüência em pequenas propriedades sem os cuidados de higiene necessários. Ele costuma ser alimentado com uma mistura de restos de comida, que pode facilmente conter fezes humanas. A carne de porcos criados nessas condições chega clandestinamente ao consumidor, sem passar pela fiscalização sanitária. Se estiver infectada, leva o parasita diretamente à mesa das pessoas.
Graças à parceria com a FAPESP e o Biolab-Mérieux, que financiaram meio a meio o projeto, num valor de cerca de R$ 80 mil , o novo ELISA para cisticerco já foi testado, com sucesso, em pacientes tratados pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. "Até agora, só dispomos de um teste importado e caro, o Imunoblot, nem sempre disponível", comenta a professora Adelaide.
Inicialmente, para conhecer melhor a neurocisticercose, os pesquisadores analisaram a resposta imunológica humoral, ou a produção de anticorpos, de 59 pacientes, em diferentes fases de evolução da doença, por meio de amostras do líquido cefalorraquiano,
do plasma e da saliva. "A partir de 1990, decidimos então estudar o soro, separando-o por um processo de centrifugação", explicou a coordenadora do projeto.
Mas, então, na presença do parasita original, a Taenia solium, surgiu a primeira difi culdade: como no soro também havia anticorpos para outros tipos de parasitoses, as reações eram sempre cruzadas e, portanto, inespecíficas. Esses primeiros resultados evidenciaram a necessidade de que os antígenos de cisticerco fossem purificados, para tornar possível o desenvolvimento dos reagentes diagnósticos.
Multiplicação em camundongos Havia mais um complicador: para obter
o reagente purificado, seria necessário um número bem maior de cisticercos. Até então, eles eram retirados diretamente da carne de porco contaminada, um processo lento, de pouco rendimento e de muito risco. "Resolvemos o problema cultivando um outro parasita, a Taenia crassiceps, similar à T solium, com a qual tem antígenos comuns", lembra a professoraAdelaide. Esses cisticercos, inoculados em camundongos, multiplicam-se rapidamente no peritônio do animal. Em 90 dias, obtémse uma quantidade 100 vezes maior que aresultante do trabalho com a carne de porco.
O reagente purificado é obtido por métodos imunoquímicos. O parasita, em extrato bruto, passa por dois processos: a cromatografia de afinidade com lectinas e a eletroforese em gel de acrilamida. No fim, obtêmse frações purificadas e específicas do cisticerco. Com elas, fica aberto o caminho para o teste imunoenzimático, um kit composto por reagentes, soluções e pelo antígeno específico para cisticercose humana.
Para que o teste possa funcionar satisfatoriamente em condições de ambulatório, ainda é preciso aperfeiçoar alguns detalhes, como as di luições ideais e o tempo de incubação. Completado esse trabalho, o BiolabMérieux pretende começar a produzir o kit em
Ciclo biológico da teníase- cisticercose
Doença de lugares com más condições sanitárias A cisticercose humana é uma das infecções do
sistema nervoso central mais graves e freqüentes. Sua incidência relaciona-se principalmente com fatores sócio-econômico-culturais. Constitui um sério problema de saúde pública em regiões de condições sanitárias deficientes e em áreas desenvolvidas que recebem imigrantes de regiões onde a infecção é endémica.
No Brasil, uma análise dos dados publicados de 1915a 1995sobreadoençaconsideracomoárea endémica de neurocisticercose os Estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná, Minas Gerais e Espírito Santo e o Distrito Federal. O mesmo estudo classifica como áreas de casos ocasionais os Estados da Bahia, Maranhão, Pernambuco, Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte.
escala comercial. Isso deverá ocorrer ainda dentro de um ano.
Alta letalidade Uma das conseqüências da aplicação do
novo teste será conhecer melhor a situação real da doença. De acordo com dados recolhidos pela equipe da USP, existe a possibilidade de haver um doente para cada 100 mil habitantes no Brasil, com índice de letalidade bastante alto: entre 15% e 25% das pessoas que contraem a doença morrem em conseqüência dela.
A neurocisticercose tem uma evolução crônica. Os sintomas são brandos no começo da infecção e as seqüelas podem aparecer meses ou mesmo anos depois do início da doença. Como não há sintomas específicos, o tratamento é feito de acordo com a doença desenvolvida - corticóides, no caso de meningite, anticonvulsivos, se ocorrer epilepsia, antiinflamatórios e analgésicos. Uma vez localizado o parasita, faz-se um acompanhamento constante da doença até que ele se degenere, o que pode ocorrer só depois de alguns
ovo
Os fatores que contribuem para a natureza endémica da doença são o consumo de carne de porco infectada, controle precário de fezes de indivíduos portadores do parasita e presença de hortas e pomares próximos a confinamentos de porcos, especialmente quando irrigados com água contaminada ou fertilizados com fezes humanas.
Também oferecem risco de contaminação fontes de água próximas a pocilgas e sanitários, maus hábitos de higiene ambiental e pessoal, inspeção inadequada ou ausente de carnes e açougues e educação sanitária deficiente. Embora os suínos estejam associados freqüentemente ao problema, é o homem o único hospedeiro da forma adulta do parasita e o responsável pela manutenção do ciclo parasitário, eliminando os ovos da Taenía nas fezes.
anos. A cirurgia para remoção do parasita é uma alternativa raramente utilizada, devido aos riscos de uma intervenção desse tipo.
O projeto de inovação tecnológica está sendo desenvolvido no Laboratório de Análises Clínicas e Toxicológicas da FCF/USP. Conta com a participação dos pesquisadores Mauro Peralta, professor titular de Microbiologia do Instituto de Microbiologia da UFRJ; José Livramento e LuizMachado, professores do Departamento de Neurologia da Faculdade de Medicina da USP; Walter Ferreira, professor do Instituto de Medicina Tropical e diretor-científico do laboratório Biolab-Mérieux; da aluna pós-graduanda Alessandra Pardini; e dos alunos em iniciação científica Thaís Barea e Wesley Correa.
Perfil : A pesquisadora Adelaide José Vaz, de 41 anos, é professora de Imunologia da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo, pela qual se formou. É mestra e doutora em Ciências, na área de Imunologia, pelo Instituto de Ciências Biomédicas da USP. Durante sete anos, foi pesquisadora científica do Instituto Adolfo Lutz. Desde essa época, estuda a cisticercose humana.
Causada pelas larvas da Taenia solium, a solitária, um
parasita que vive no organismo humano, a neurocistircercose tem
como intermediário o porco criado em más condições de higiene
PROJETO TEMÁTICO
ANTROPOLOGIA
Os novos caminhos da educação indígena
Criança Kayapó: a busca de uma política educacional voltada para a diversidade étnica e cultural dos povos indígenas
Já se passaram quase cinco séculos. Mas o Brasil ainda começa a aprender a lidar com a sua variedade étnica e cultural. Especialmente no caso dos povos que já estavam aqui antes de 1500. Despojados das suas terras e massacrados no tempo da Colônia e também da República, os índios somente foram reconhecidos como cidadãos brasileiros plenamente capazes pela Constituição de 1988. A fronteira entre a promulgação das leis e a transformação da realidade, no entanto, continua enorme. Entre os desafios a ser enfrentados, está a educação indígena.
"Essa proposta significa construir junto com os índios uma forma de educação que trabalhe tanto com a visão de mundo dos povos indígenas quanto com a realidade ao seu redor. Realidade agora ampliada pela globalização." É o que aponta a antropóloga Aracy Lopes da Silva, coordenadora do MariGrupo de Educação Indígena do Departamento deAntropologia da USP. "Isso significa um projeto de educação no qual o índio seja sujeito ativo, elaborando e transmitindo oconhecimento junto à sua comunidade", afirma a antropóloga.
O Mari ("conhecer", na I íngua Kayapó) é uma das mais atuantes entidades nacionais preocupadas com a educação dos índios. Criado em 1988, o grupo foi formado por antropólogos e estudantes que abraçaram a causa indígena no final dos anos 70. Formado atualmente por 25 pesquisadores, além de colaboradores ligados a diferentes instituições, o Mari desenvolve projetos de estudos e assessorias. Com anos de experiência acumulada
em trabalhos de campo, o grupo é também responsável por um ambicioso programa de pesquisa na área da educação indígena.
Trata-se do projeto temático Antropologia, História e Educação: a Questão IndígenaeaEscola.lniciadoem 1995,comoapoio da FAPESP, seu objetivo é discutir as possibilidades de uma educação para a diversidade, dentro do universo da história e da antropologia. "O projeto surgiu do desafio de transformar a experiência da educação indígena em objeto de reflexão acadêmica", dizAracy Lopes da Silva, que é professora da pós-graduação em Antropologia da USPe do Departamento de Antropologia da Unicamp.
Linhas de pesquisa As linhas de pesquisa do projeto compre
endem assuntos como a produção e a transmissão do conhecimento nas aldeias. "Essa é uma pesquisa que investiga fonnas próprias de aprendizado da criança indígena, como as brincadeiras e os jogos de socialização", diz Aracy.
Outro campo de estudo trata da relação simbólica que os índios têm com a natureza, assim como o uso que seus diferentes povos fazem do meio ambiente. "Esse caminho de pesquisa permite uma discussão mais ampla sobre o conhecimento humano, além da sua contribuição para a questão ambiental, como em projetos de manejo sustentável", aponta a antropóloga.
Também são temas de investigação a organização política dos índios e o ensino da história indígena. "Esse é um pedaço da histó-
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ria do Brasil muito pouco conhecido", diz a coordenadora do Mari. Por falar na falta de infonnação sobre a cultura indígena, uma das pesquisas que integram o projeto aponta justamente para a permanência de uma imagem estereotipada dos índios, mesmo com o aumento do noticiário da mídia sobre o assunto, depois da EC0-92.
"Muitos dos livros didáticos para o ensino fundamental ainda reincidem nos mesmos problemas de sempre, como a ocultação da presença contemporânea do indígena na sociedade ou o estranhamento da possibilidade de que ele possa sair da ' idade da pedra'", afinna Aracy Lopes da Silva. "Há casos em que o estereótipo tem um valor positivo, como o índio guardião da floresta . Mas isso também tem um lado ruim, cujas conseqüências costumamos ver nos jornais. Se um índio corta uma árvore, ele é condenado por isso, não importa quais eram as circunstâncias em que o fato ocorreu", diz a antropóloga Mariana Kawall Leal Ferreira, coordenadora do Marie autora de uma pesquisa sobre o ensino de matemática entre tribos indígenas.
Trabalho de campo Muitas das pesquisas do Mari são di
retamente ligadas ao trabalho de campo. O
Aracy Lopes da Silva (à direita) e Mariana Kawall Leal Ferreira: "Uma educação a favor do índio e não contra ele'.
que também gera novos desdobramentos no projeto. "O pesquisadornão visita uma aldeia apenas para recolher informações, indo depois embora", diz a antropóloga Mariana Kawall Leal Ferreira, que faz pós-doutoramento no Departamento de Antropologia da USP. "É comum as comunidades indígenas oferecerem uma troca. Se você está real izando uma pesquisa na aldeia, então também deve dar aulas para aquela comunidade", conta Mariana Kawall. "Como nem todos os pesquisadores têm experiência pedagógica, resolvemos realizar oficinas internas no Mari voltadas para situações como essa", diz a antropóloga.
Outra atividade importante desenvolvida pelo Mari é a prestação de assessoria para órgãos governamentais e comunidades indígenas. Muitas vezes , o grupo é procurado por representantes de aldeias interessados na elaboração de projetos específicos, como financiamento para programas de uso sustentável do meio ambiente ou sobre problemas de saúde. O trabalho de assessoria também tem interesse acadêmico. "São experiências importantes para a reflexão da antropologia política", afirma Aracy Lopes da Silva.
Mudança da realidade O interesse cada vez maior pela edu
cação indígena vem ao encontro de uma nova realidade experimentada pelos povos indígenas brasileiros. Realidade que é conseqüência da crescente mobilização dessas populações desde os anos 70. Depois do reconhecimento constitucional do índio como um cidadão pleno, em 1991, a sua escolari-
Livro destinado ao ensino de matemática em escolas indígenas do país. No detalhe, ilustração feita por estudante índio
zação tomou-se uma atribuição do Ministério da Educação. Mais do que uma operação burocrática, a medida abriu espaço para o desenvolvimento, pela primeira vez no Brasil, de uma política educacional voltada para a diversidade étnica e cultural dos povos indígenas. Afinal , desde a colonização, a educação indígena quase sempre foi um domínio exclusivo de missões religiosas.
"A grande vantagem dessa medida é a inclusão da educação indígena no sistema nacional de educação, forçando o governo a criar novos parâmetros curriculares para ás escolas indígenas", afirma Aracy Lopes da Silva. "Uma educação a favor do índio, e não contra ele", diz a antropóloga. "Essa leigarante a liberdade de construção de escolas diferenciadas, que atendam às necessidades de cada uma das comunidades, com a participação dos próprios índios", destaca Aracy. "O problema é que muitos quadros das secretarias de educação não estão preparados para lidar com a especificidade dessa nova demanda", aponta a pesquisadora. Assim, essa é uma equação que somente poderá ser resolvida com a participação di reta dos povos indígenas na tomada de decisões. "O exercício desses direitos depende da presença dos índios no comando do processo", afirma a antropóloga.
Os números indicam um aumento nessa participação. Depois da Constituição de 1988, as organizações indígenas se multiplicaram pelo País. "Uma das pesquisas do grupo identificou quase 300 organizações e associações indígenas que nasceram nos últimos dez anos, muitas das quais formadas por professores índios", aponta a pesquisadora.
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Um dos frutos das assessorias prestadas pelo Marijunto a comunidades indígenas, assim como do trabalho de grupos de outras universidades e ONGs, é a publicação pelo Ministério da Educação de livros elaborados por professores índios.
O Grupo de Educação Indígena da USP também organiza exposições sobre o universo dos índios em escolas da rede pública, além de distribuir textos de divulgação científica. Entre os livros gerados pelas pesquisas do Mari , está um dos trabalhos de maior fôlego já realizados nessa área no Brasil. Trata-se da obra A Temática Indígena na Escola - novos subsídios para professores de 1 o e r graus, organizada por Aracy Lopes da Silva e Luís Donisete Benzi Grupioni e editada em conjunto com a Unesco e o Ministério da Educação.
Novos horizontes As populações indígenas pesquisadas
pelo Ma ri abrangem regiões do norte ao sul do País. São povos como os Kaingang (do Rio Grande do Sul), Guarani (litoral de São Paulo), Terena (interior de São Paulo), Maxakali (Minas Gerais), Xavante (Mato Grosso), Xerente (Tocantins), índios do Uaça (norte do Amapá), Timbira (Maranhão) e Tukano (Amazonas).
"Esse é um conjunto diversificado, tendo cada povo as suas especificidades", aponta Aracy Lopes da Silva. Algumas comunidades enfrentam situações dificeis, como os índios Guarani , no litoral de São Paulo. "Nessa região, existe uma situação de miséria e fome crônica", afirma Mariana Kawall Leal Ferreira. "Pretendemos criarnúcleos de pesquisa voltados para questões específicas dentro da temática comum da educação indígena, como a área de saúde e educação", diz Mariana.
O projeto temático desenvolvido pelo Mari também deverá ter outros desdobramentos. "Um campo importante que ainda tem muito para ser feito é o da sistematização de informações sobre a situação das escolas indígenas", afirma Aracy Lopes da Silva. "Temos ainda a intenção de estudar as relações entre arte, estética, cultura material e a educação indígena", diz a antropóloga. Por fim, o grupo também tem como proposta realizar uma análise da extensa bibliografia voltada para a educação, lingüística e antropologia que vem sendo produzida no Brasil.
Perfil: Aracy Lopes da Silva é doutora em Antropologia
Social pela Universidade de São Paulo, onde leciona desde 1974, com pós-doutorado na Universidade de Harvard. Estados Unidos. Foi presidente da Comissão Pró-Índio de São Paulo e atualmente é coordenadora do Mari- Grupo de Educação Indígena da USP. É autora do livro Nomes,e Amigos: da Prática Xavante a uma Reflexão sobre os Jê, e organizadora dos livros A Questão da Educação ln ígena Brasileira e A Questão Indígena na Sala de Aula: Subsídios para Professores de 1 o
e 2° Graus.
LIVRO
Um olhar sobre a juventude Olhamos para os jovens de hoje com cer- ciedades regeneram, através da juventude, seu
ta complacência nostálgica. Este olharémoti- estilo de vida. Assim, o jovem deve ser com-vado pela nossa memória do passado, porque preendido como um elo necessário do presen-afmal ninguém resiste à tentação de compa- te com o passado, exatamente porque transita rara geração mais recente com a efervescente de um tempo para outro, encarnando a vaca-juventude dos anos 60 e 70. O resultado é que, ção- transformadora ou conservadora- do nestacomparação,a juventude contemporânea seu próprio tempo. sempre perde, pois acaba sendo qualificada Na segunda parte do livro, temos uma pela "ausência da capacidade de reflexão", pela reavaliação da militância política dos j o-"passividade com relação a valores" ou pela vens nos anos 90. Revelando amplo "falta de empenho transformador". O vício domíniodotema,aautoraanalisatodas desse olhar saudosista está no apego à idéia as possibilidades de constituição da . preconcebida de que haveria uma essência da subjetividade jovem, tanto no perver-"condição juvenil" como portadora de utopi- so cenário mundial, comandado pelara-as e de projetos de transformação social. Atra- cionalidade autoritária da modernidade, vés de uma rigorosa abordagem histórica das quanto no cenário brasileiro, na cultura do formas de militância política da juventude dos medo que caracterizou a "geraçãoAl-5", ague-anos 90, Reinvenções da Utopia, a militân- la que viveu sua adolescência sob a ditadura cia política de jovens nos anos 90, de Janice militar. Formados num momentodedesarticu-Tirelli Ponte de Souza, publicação da Hacker lação completa da sociedade civil brasileira, Editores e FAPESP, tem o mérito de desmisti- em que se conjugaram a busca da neutraliza-ficar e corrigir os vícios desse olhar compla- ção completa da capacidade crítica dos indi-cente que chegou até a contaminar os estudos víduos, o controle voltado para a ausência da sobre o tema. prática política e a consolidação defmitiva da
Nos anos 60 e 70 a efervescência da ju- economia capital is ta de mercado, os indivídu-ventude foi tamanha que chegou mesmo a es- os desta geração sofreram uma dupla e grave timular uma farta produção acadêmica; pou- privação: de seus direitos e do conhecimento cos se lembram de que tínhamos até uma "so- da lógica desta privação. O resultado consti-ciologia da juventude". Já há algum tempo que tu irá parte de pesada herança para as gerações o jovem não era objeto de estudo ou, seguintes- para recuperar a condição de su-pelo menos de pesquisas mais vas- jeitos, os jovens assumiram uma ideologia tas, que situassem a juventude - ~ subjetivista, expressa em pautas indivi-esta condição transitória da vida- duais de comportamentos, o que, em par-como elo de ligação histórica entre o te, seguia a conversão geral da família às ide-passado e o futuro das sociedades. Além ologiasdo bem-estardo corpo, do sexo e do psi-de um pesquisa concreta sobre o comporta- quismo, típicas das sociedades de consumo.A mentopolíticodosjovensnestadécadaqueen- vitória do princípio autoritário se expressaria cerra o século, Reinvenções da Utopia faz noprópriocotidianodosjovens,comasubsti-uma reavaliação completa do próprio concei- tuição do protesto pela apatia descompromis-to de juventude. Há uma essência juvenil? sada do "deixa prá Já" ou do "tudo bem".
Os estudos de diferentes áreas como a O que restou desta ideologia da privaci-psicologia ou a sociologia caracterizaram a dade herdada pela atual geração? Há sinais de juventude como uma condição transitória, movimento político jovem no Brasil, na era da destacando quase sempre alguns de seus tra- globalização e da "modernidade-mundo"? A ços diferenciadores: transitoriedade, ambigüi- resposta está na pesquisa empírica- calcada dade, momento de suspensão da vida social, em amostragem e estudo realizado através do individuação, vivênciadeumacrisepotencial método das histórias de vida em Florianópo-e, por fim, um intrínseco estado de revolta ou !is (SC) - e apresentada na parte final do li-"mal-estar juvenil". Janice Tire IIi demonstra vro. A trajetória de jovens no Movimento Na-que esses traços podem demarcar um certo cional de Meninos de Rua, na Pastoral da Ju-"território" da juventude, mas, vistos como ventude, na União de Negros de SC, no movi-comportamentos inatos, isolados das situações mento Sindical Bancário e até no movimento concretas vividas pelos jovens, não conse- Anarco-Punk é analisada, não apenas a partir guem explicarnada. Intenções, utopias, iconoclastias, projetos, rebeldias, transgressões, são elementos concretos nas relações vividas pela juventude, mas não têm validade científica quando situados fora do tempo e da história. A juventude não é uma essência e sim uma construção sociocultural, a juventude não é, ela se faz. A biografia do jovem cruza-se com a his
tória e nela confinna sua identidade, ao mesmo tempo em que asso-
lfJAPESP SECRETARIA DA CIÊNCIA TECNOLOGIA E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO
do seu impacto na sociedade ou, em ai guns casos, do seu reconhecimento pelo governo mas, sobretudo a partir da vivência concreta de gente como Beto, Ana, Eder, lone, Laia, Kiko, Gina, Caco, Téo, Beth, Teca e Bia - nomes fictícios de jovens reais que compõem o painel vivo de trajetórias militantes, na segunda parte do livro.
Distanciados das utopias revolucionárias, seus depoimentos e histórias mostram que eles são parte de uma geração individualista, pois só aceitam engajar-se
numa causa coletiva que não interfira na sua autonomia individual. Mas nem por
isso suas pautas reivindicatórias se confundem com o centralismo burocrático, com o dogmatismo sindical, com o assistencialismo institucional ou com as bandeiras do senso comum da classe média, no seu crônico projeto de ascensão social. Ao contrário do que ocorreu noutros tempos, a lógica desses jovens não é discursiva, mas visual, suas referências não são utopias revolucionárias e sua organização política é reinventada como uma nova espécie de tribalização. Militância, para eles, é dedicaçãoàelaboraçãodeprojetossociaisque acabam sendo parte de suas vidas. É uma concepção limitada, talvez a única possível nesta época de fim das utopias - mas atribui um papel social à juventude e dá sentido ao imediatismo apaixonado desses jovens. Possuem, finalmente, um discernimento ético que os diferencia e aproxima das gerações revolucionárias do passado, pois representam uma parcela de nossa juventude que ainda tem a coragem de se envergonhar diante da carência econômica, da discriminação hipócrita, da violência endêmica e da injustiça social.
Só o futuro dirá se esses personagens, brilhantemente revelados pelo livro Reinvenções da Utopia, serão os multiplicadores de uma nova ética social,já que eles claramente representam a transiçãoentreumcomportamento político superado e um outro, que nossa época ainda não se mostrou capaz de definir completamente.
GOVERNO DO ESTADO DESAOPAULO