Por que ainda existe trabalho escravo?

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www.arquidiocesedesaopaulo.org.br | 11 a 16 de dezembro de 2014 | Reportagem | 11 Zara, Renner e Casas Pernam- bucanas estão na lista das empre- sas condenadas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) por manter pessoas em situação aná- loga à escravidão. A multa de R$ 2,5 milhões e a sentença contra a Casas Pernambucanas foi profe- rida na sexta-feira, 5, em primeira instância, na capital paulista. A problemática do trabalho escravo está sendo largamente discutida este ano nas comunida- des católicas devido ao tema da Campanha da Fraternidade sobre o tráfico humano e, como disse Padre Ricardo Rezende Figueira, professor de direitos humanos na Universidade Federal do Rio de Janeiro, “conhecer é o primeiro passo para compreender o dra- ma”. Embora tenha sido conside- rado referência mundial no com- bate ao trabalho escravo, em de- claração feita pelo coordenador do Projeto de Combate ao Traba- lho Escravo no Brasil, da Organi- zação Internacional do Trabalho Durante a 4ª Reunião de Autoridades Nacionais em Matéria de Tráfico de Pessoas, que aconteceu em Brasília, os governos de 35 países do continente americano se comprometeram a seguir o Segundo Plano de Trabalho contra o Tráfico de Pessoas, cuja adoção oficial aconteceu na sexta-feira, 5. Além dis- so, foi aprovada a Declaração de Brasília, que reitera a condenação do tráfico de pessoas em todas as suas formas de manifestação e destaca a necessidade de ações de prevenção e de recursos para políticas pú- blicas, entre outras medidas. Com Agência Brasil BRASIL ADERE AO PLANO DE TRABALHO CONTRA O TRÁFICO DE PESSOAS TEMA DA CAMPANHA DA FRATERNIDADE EM 2014, TRABALHO ESCRAVO TEM CRESCIDO NAS ZONAS URBANAS DO PAíS NAYÁ FERNANDES [email protected] outros casos na mesma oficina”, contou America. Relatório de Direitos Humanos Daniela Stefano é a jornalista responsável pela organização do Relatório de Direitos Humanos deste ano. O lançamento, organi- zado pela Rede Social, aconteceu na quarta-feira, 10, em São Paulo. O Relatório também participa do projeto Autor na Praça pela 11ª vez e será lançado no sábado, 13, na Praça Benedito Calixto, na ca- pital. A jornalista explicou que, em- bora os temas sejam recorrentes, eles ganham enfoques diferentes a cada edição. “Dois temas que a gente sempre trata são a educação e o trabalho. Em relação ao traba- lho, o foco deste ano está nos jo- vens e sobre a educação, o autor enfatizou os projetos apresenta- dos nas campanhas eleitorais pre- sidenciais”, completou Daniela. Ela chamou atenção para o texto sobre pessoas em situação de rua, que têm como título: “O canto da sereia: população em situação de rua e direitos huma- nos no Brasil”, escrito por Alde- ron Costa, ouvidor externo na Ouvidoria Geral da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, fundador e vice-presidente da Organização Civil de Ação Social (OCAS), instituição que edita a Revista Ocas. (OIT), Luiz Machado, o País ain- da enfrenta situações críticas de violação de direitos humanos no que se refere ao cumprimento das leis trabalhistas. Em São Paulo, a maioria dos casos ainda acontece na zona ru- ral, mas esse número tem cresci- do no meio urbano, sobretudo na construção civil e no ramo têxtil. O problema tende a se agravar com a chegada de imigrantes que vêm em busca de emprego e, mui- tas vezes, por falta de informação ou mesmo devido a dificuldades com a língua, ficam vulneráveis aos aliciadores. “A lei contra a escravidão e o problema que invade a cidade” foi o título do artigo escrito por Ricardo, Edna Galvão e Suliane Sudano para o livro lançado na quarta-feira, 10, em São Paulo pela Rede Social. “Direitos Hu- manos no Brasil 2014”. É um relatório que está na 15ª edição, anualmente escrito a várias mãos, com textos de autores que atuam em movimentos e organizações sociais com objetivo de mostrar um panorama da atual conjun- tura. Escravidão na cidade O artigo, escrito no Rio de Janeiro, desenvolve a questão a partir da aprovação do Projeto de Emenda Constitucional (PEC) sobre o trabalho escravo. “A PEC foi aprovada e isso é positivo. O problema é que a bancada rura- lista está querendo redefinir o que é trabalho escravo. A definição já foi realizada e consta, desde 2003, no artigo 149 do Código Penal Brasileiro. Agora, o que se busca no Congresso é retomar esta de- finição e isso seria um retrocesso”, explicou Padre Ricardo. Segundo o Professor, o pro- blema central é essa proposta de redefinição. “Se chegarem a fazer isso, teria sido melhor não aprovar a PEC. A principal mudança que a bancada quer refere-se à reten- ção da liberdade, quando o eixo deve ser o da ofensa à dignidade.” Sobre as empresas multadas recentemente, Padre Ricardo mostrou-se espantado, pois mes- mo depois de tantas medidas, inclusive legais, elas continuam a insistir em atos criminosos. “Em São Paulo há uma lei estadual que prevê, além da multa, a proibição de a empresa funcionar no Esta- do durante 5 anos. Ainda assim, são muitas as empresas que estão com problemas nesta área. Esse é só mais um caso”, constatou. Na capital paulista, a situa- ção dos bolivianos nas oficinas de costura é um problema tanto sério, quanto parece ser igno- rado. America Joselin Viruez, é boliviana e mora em São Paulo há três anos. Recentemente, ela aju- dou a libertar de uma oficina do Brás uma amiga que estava sendo ameaçada. “Fui lá com outro amigo e o dono não queria me deixar falar com a A.F. Disse a ele que iria chamar a polícia, e, então, ele ce- deu. Minha amiga estava sendo ameaçada e tinha medo, inclusive de ser abusada, pois havia visto Multas milionárias são suficientes para frear a exploração do ser humano? MPF Vamos limpar essa mancha da nossa sociedade. Ministério Público Federal Seu direito, nosso dever. Fotos: João Roberto Ripper

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A humanidade ainda se permite ter pessoas em situações análogas à escravidão. Não há respeito pela dignidade, há a busca exagerada pelo lucro. Hoje, dia de lembrar que precisamos ainda lutar pelos direitos humanos.

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Zara, Renner e Casas Pernam-bucanas estão na lista das empre-sas condenadas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) por manter pessoas em situação aná-loga à escravidão. A multa de R$ 2,5 milhões e a sentença contra a Casas Pernambucanas foi profe-rida na sexta-feira, 5, em primeira instância, na capital paulista.

A problemática do trabalho escravo está sendo largamente discutida este ano nas comunida-des católicas devido ao tema da Campanha da Fraternidade sobre o tráfico humano e, como disse Padre Ricardo Rezende Figueira, professor de direitos humanos na Universidade Federal do Rio de Janeiro, “conhecer é o primeiro passo para compreender o dra-ma”.

Embora tenha sido conside-rado referência mundial no com-bate ao trabalho escravo, em de-claração feita pelo coordenador do Projeto de Combate ao Traba-lho Escravo no Brasil, da Organi-zação Internacional do Trabalho

Durante a 4ª Reunião de Autoridades Nacionais em Matéria de Tráfico de Pessoas, que aconteceu em Brasília, os governos de 35 países do continente americano se comprometeram a seguir o Segundo Plano de Trabalho contra o Tráfico de Pessoas, cuja adoção oficial aconteceu na sexta-feira, 5. Além dis-

so, foi aprovada a Declaração de Brasília, que reitera a condenação do tráfico de pessoas em todas as suas formas de manifestação e destaca a necessidade de ações de prevenção e de recursos para políticas pú-blicas, entre outras medidas.

Com Agência Brasil

Brasil adere ao Plano de TraBalho conTra o Tráfico de Pessoas

TeMA DA CAMPANhA DA FRATeRNiDADe eM 2014, TRABAlho eSCRAvo TeM CReSCiDo NAS zoNAS uRBANAS Do PAíS

Nayá [email protected]

outros casos na mesma oficina”, contou America.

Relatório de Direitos Humanos

Daniela Stefano é a jornalista responsável pela organização do Relatório de Direitos Humanos deste ano. O lançamento, organi-zado pela Rede Social, aconteceu na quarta-feira, 10, em São Paulo. O Relatório também participa do projeto Autor na Praça pela 11ª vez e será lançado no sábado, 13, na Praça Benedito Calixto, na ca-pital.

A jornalista explicou que, em-bora os temas sejam recorrentes, eles ganham enfoques diferentes a cada edição. “Dois temas que a gente sempre trata são a educação e o trabalho. Em relação ao traba-lho, o foco deste ano está nos jo-vens e sobre a educação, o autor enfatizou os projetos apresenta-dos nas campanhas eleitorais pre-sidenciais”, completou Daniela.

Ela chamou atenção para o texto sobre pessoas em situação de rua, que têm como título: “O canto da sereia: população em situação de rua e direitos huma-nos no Brasil”, escrito por Alde-ron Costa, ouvidor externo na Ouvidoria Geral da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, fundador e vice-presidente da Organização Civil de Ação Social (OCAS), instituição que edita a Revista Ocas.

(OIT), Luiz Machado, o País ain-da enfrenta situações críticas de violação de direitos humanos no que se refere ao cumprimento das leis trabalhistas.

Em São Paulo, a maioria dos casos ainda acontece na zona ru-ral, mas esse número tem cresci-do no meio urbano, sobretudo na construção civil e no ramo têxtil. O problema tende a se agravar com a chegada de imigrantes que vêm em busca de emprego e, mui-tas vezes, por falta de informação ou mesmo devido a dificuldades com a língua, ficam vulneráveis aos aliciadores.

“A lei contra a escravidão e o problema que invade a cidade” foi o título do artigo escrito por Ricardo, Edna Galvão e Suliane Sudano para o livro lançado na quarta-feira, 10, em São Paulo pela Rede Social. “Direitos Hu-manos no Brasil 2014”. É um relatório que está na 15ª edição, anualmente escrito a várias mãos, com textos de autores que atuam em movimentos e organizações

sociais com objetivo de mostrar um panorama da atual conjun-tura.

Escravidão na cidadeO artigo, escrito no Rio de

Janeiro, desenvolve a questão a partir da aprovação do Projeto de Emenda Constitucional (PEC) sobre o trabalho escravo. “A PEC foi aprovada e isso é positivo. O problema é que a bancada rura-lista está querendo redefinir o que é trabalho escravo. A definição já foi realizada e consta, desde 2003, no artigo 149 do Código Penal Brasileiro. Agora, o que se busca no Congresso é retomar esta de-finição e isso seria um retrocesso”, explicou Padre Ricardo.

Segundo o Professor, o pro-blema central é essa proposta de redefinição. “Se chegarem a fazer isso, teria sido melhor não aprovar a PEC. A principal mudança que a bancada quer refere-se à reten-ção da liberdade, quando o eixo deve ser o da ofensa à dignidade.”

Sobre as empresas multadas

recentemente, Padre Ricardo mostrou-se espantado, pois mes-mo depois de tantas medidas, inclusive legais, elas continuam a insistir em atos criminosos. “Em São Paulo há uma lei estadual que prevê, além da multa, a proibição de a empresa funcionar no Esta-do durante 5 anos. Ainda assim, são muitas as empresas que estão com problemas nesta área. Esse é só mais um caso”, constatou.

Na capital paulista, a situa-ção dos bolivianos nas oficinas de costura é um problema tanto sério, quanto parece ser igno-rado. America Joselin Viruez, é boliviana e mora em São Paulo há três anos. Recentemente, ela aju-dou a libertar de uma oficina do Brás uma amiga que estava sendo ameaçada.

“Fui lá com outro amigo e o dono não queria me deixar falar com a A.F. Disse a ele que iria chamar a polícia, e, então, ele ce-deu. Minha amiga estava sendo ameaçada e tinha medo, inclusive de ser abusada, pois havia visto

Multas milionárias são suficientes para frear a exploração do ser humano?

MPFVamos limpar essa mancha

da nossa sociedade.

Ministério Público FederalSeu direito, nosso dever.

Fotos: João Roberto Ripper