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Gêneros textuais

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Gêneros textuaisCapítulo 3

1. O que são gêneros textuais?

A distinção entre tipo de texto e gênero textual não é de forma alguma uma ciência exata; para fins pedagógicos, porém, podemos fazer a seguinte distinção: a divisão em tipos de texto leva em conta principalmente fatores internos ao próprio texto (especialmente a presença de certas estruturas discursivas, como os verbos de ação no texto narrativo), enquanto a categorização em gêneros textuais dá uma importância maior aos fatores externos, especialmente a intenção do autor e a presença do texto em situações reais de produção.

Dessa forma, podemos dizer que a narração é um tipo de texto, pois contém algumas características constantes, como personagens e enredo, independente-mente da intenção de seu autor ao escrevê-la; porém, o romance, a piada e a crô-nica são gêneros textuais, pois cada um deles atende a uma necessidade específica de seu autor. Da mesma forma, pode-se afirmar que o romance histórico, a novela televisiva e o conto policialsãosubgêneros,emrazãodeumaespecificidadeaindamaior das intenções de seus autores.

Um conceito que ajuda a compreender o surgimento dos gêneros textuais é o materialismo histórico,umateoriadefendidapelofi lósofoalemãoKarlMarx(1818-1883).Segundoele,emnossasociedade,aestruturamaterial(infraestrutura)deter-mina a estrutura imaterial (superestrutura). Ou seja, as pessoas vivem em um

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mundo afetado por coisas materiais, concretas, como a oferta de alimento, o clima e a presença de meios de produção variados. É a partir desses recur-sos materiais que se desenvolvem os elementos imateriais, como a religião, a cultura e as relações de classe.

Para citar um exemplo mais próximo dos gêneros textuais: com o sur-gimento da Internet, desenvolveram-se gêneros como a mensagem ins-tantânea e os posts de twitt er. Ou seja, um recurso material (a Internet) possibilitou o aparecimento de gêneros, que são imateriais. Isso não ocorreu apenas porque o meio estava disponível, mas também por-que muitas pessoas sentiram a necessidade desses gêneros até então inéditos. Uma das caraterísticas do twitt er, por exemplo, é ser muito rápido, algo cada vez mais valorizado no mundo contemporâneo.

Sabendo, portanto, que todo gênero cumpre uma função que seus usuários acham importante, vamos entender melhor como elesseorganizam:podemosdizerqueosgênerostextuaissãodefi-nidos por cinco elementos: propósito, autor, interlocutor, meio e linguagem.

1.1. Propósito: o que o texto quer atingir?

A característica mais importante: um texto só funciona se o seu autor sabe exatamente o que pretende com ele. Por isso, a primeira pergunta a ser feita antes de se começar a escrever é “qual é o resul-tado que eu pretendo atingir com este texto?”.

O propósito do texto determina sua escrita. Recursos que fun-cionam bem em determinado texto podem não fazer sentido em um texto que tenha um propósito diferente. Por exemplo, uma lin-guagem poética pode funcionar bem se o propósito do texto for emocionar ou entreter, mas talvez atrapalhe um texto cujo pro-pósito é informar.

Note que um texto pode (e costuma) conter mais de um propósito. Um romance, por exemplo, pode emocionar, entreter, informar e instruir ao mesmo tempo. O importante é que o autor, consciente do resultado que pretende obter, mobilize os recursos mais adequados a cada propósito. Se ele pretende infor-mar, por exemplo, é provável que o texto seja mais direto e menos pessoal. Também é recomendável, nesse caso, que o autor, ao planejar o texto, dê mais ênfase à qualidade de suas informações que ao valor literário de suas frases, por exemplo.

1.2. Autor e interlocutor: quem escreve e quem lê o texto?

Outra etapa importante envolve estabelecer as características do interlocu-tor a quem o texto se dirige e também as características que o autor pretende transmitir por meio da escrita. Os dois são descritos conjuntamente aqui por-que o mais importante não são as características de cada um deles separada-mente, e sim a relação que se estabelece entre os dois.

Por exemplo, se o autor e o interlocutor são amigos próximos, o texto poderá fazer brincadeiras e terá uma linguagem mais descontraída. No entanto,seomesmoautorescreverparaumarevistacientífica,teráum

cuidado maior para não demonstrar características pessoais e usará uma linguagem mais formal. Dessa forma, podemos dizer que as caracterís-ticas do interlocutor mudaram a forma como o autor aparece no texto.

Muitostextosapresentamoquepodemoschamardeautor impes-soal;issonãosignificaqueotextonãotemumautor,massimqueoautor não se revela no texto. Dois exemplos são a dissertação e o edi-torial de jornal.

Outra etapa importante envolve estabelecer as características do interlocu-tor a quem o texto se dirige e também as características que o autor pretende transmitir por meio da escrita. Os dois são descritos conjuntamente aqui por-que o mais importante não são as características de cada um deles separada-mente, e sim a relação que se estabelece entre os dois.

Por exemplo, se o autor e o interlocutor são amigos próximos, o texto poderá fazer brincadeiras e terá uma linguagem mais descontraída. No entanto,seomesmoautorescreverparaumarevistacientífica,teráum

cuidado maior para não demonstrar características pessoais e usará uma linguagem mais formal. Dessa forma, podemos dizer que as caracterís-ticas do

Muitostextosapresentamoquepodemoschamardesoal;issonãosignificaqueotextonãotemumautor,massimqueoautor não se revela no texto. Dois exemplos são a torial de jornal.

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Como o telespectador pode enxergar o desenvolvimento do jogo, a narração se torna menos importante. Não é realmente necessário descrever o que está ocorrendo, mas comentar aspec-tos da partida que talvez sejam menos óbvios para o público.

Por causa da ausência de imagem, o rádio exige que o nar-rador seja muito mais ativo, descrevendo detalhes do jogo que seriam perceptíveis para qualquer torcedor no estádio.

Uma primeira distinção a ser feita entre os vários possíveis interlocutores é aseguinte:trata-sedeumpúblicogenéricoouumleitorespecífico?

Quantomaisespecíficoforointerlocutor,maioréanecessidadedeconhe-cer suas características e levá-las em conta durante a produção do texto. Quanto mais genérico for o público, maior deve ser a preocupação do autor em não dire-cionardemaisoseutextoparaumconjuntoespecíficodepessoas.Porexemplo,é bastante conhecida a orientação para não usar argumentos religiosos em um texto dissertativo. Esse é um conselho útil devido ao fato de que a dissertação é um tipo de texto voltado a um leitor genérico, universal. Dessa forma, o uso de argumentos religiosos acabaria por restringir o número de leitores que se sen-tiria convencido pelo texto. Por outro lado, em uma carta dirigida a um interlo-cutor religioso, o uso de argumentos desse tipo é aceitável.

1.3. Meio: como o texto é veiculado?

Omeio, também chamado pormuitos de ‘mídia’ (que significa literalmente‘meios’,noplural),éosuportefísiconoqualotextoéapresentado.Eaquiestamosnos referindo não apenas a textos escritos, já que a voz ou a imagem também são meios.

Uma palestra, por exemplo, pode ter o mesmo propósito e o mesmo público de um artigo de opinião. No entanto, o fato de as pessoas estarem ouvindo as pala-vras, em vez de lê-las, deve causar mudanças na elaboração da mensagem. Um texto pode ter períodos mais longos, pois o leitor conta com a possibilidade de, ao não compreender algo, voltar e ler novamente. Já em uma palestra, é muito prová-vel que o autor use mais pontuação, para que haja pausas após os momentos mais importantes, e que as informações centrais sejam destacadas por meio de sua repetição (já que não é possível, por exemplo, destacá-las em negrito ou com uma fonte maior). Imagine um jogo de futebol sendo veiculado nos objetos a seguir:

jogo, a narração se torna menos importante. Não é realmente necessário descrever o que está ocorrendo, mas comentar aspec-tos da partida que talvez sejam menos óbvios para o público.

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1.4. Linguagem: como o texto é e scrito?

A forma como a linguagem é trabalhada no texto (com maior ou menor formalidade, em prosa ou em verso, por exemplo) também depende de sua situa-ção de produção. Um texto escrito em um site voltado ao público infantil, por exemplo, buscará uma linguagem mais simples, enquanto um texto publicado em um jornal lido por cientistas poderá ser mais técnico, buscando o uso de ter-mos precisos.

Uma confusão muito comum ocorre entre os conceitos de formalidade e clareza; muitos acreditam que um texto informal é necessariamente mais claro que um texto formal, quando o contrário pode ser verdade. Um texto formal é o que respeita a forma, adere a um padrão de escrita (sem o uso, por exemplo, de coloquialismos e regionalismos), enquanto um texto informal costuma ser mais específico: as gírias usadas para se dirigir a um público paulista, por exemplo,podem não ser as mesmas que um público amazonense compreenderia. Dessa forma, é perfeitamente possível escrever um texto formal (mas não rebuscado, ou seja,comtermosexcessivamentedifíceisepedantes)comointuitodeaumentaraclareza de suas ideias para o público leitor.

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Anotações

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NarraçãoCapítulo 4

Veremos, a partir de agora, como organizar os elementos de um texto narra-tivo. Ao contrário do que muitos acreditam, escrever uma boa narração não signi-ficasoltaracriatividade.Pelocontrário:namaioriadosconcursosevestibulares,as melhores narrações são aquelas que cumprem cuidadosamente a tarefa pedida. É perfeitamente possível escrever um bom texto mesmo sem ter nenhuma ideia extremamente original.

1. O texto narrativo

Escrever um texto narrativo é, essencialmente, preencher cinco elementos:

Personagens – Quem participa da históriaUma personagem, em uma narração, é alguém que cumpre dois requisitos: • tem função narrativa (algo que ela faz interfere na história);• tem características (personalidade).

Características são o que diferencia uma personagem de outra. Se você decidir que sua história terá duas mulheres como personagens e uma se chamará Daniela e a outra, Alessandra, você ainda não tem duas persona-gens: tem apenas dois nomes, mas, no momento em que você mostrar que uma das mulheres é inteligente, rica e curiosa e a outra é distraída, gosta de música e trabalha como aeromoça, aí sim terá o primeiro passo para torná-las personagens.

Falta apenas decidir o que elas vão fazer na narração, já que ninguém conta uma história sobre pessoas que vivem suas vidas normalmente.

Se você ainda não se sente seguro para elaborar personagens interessantes, não se desespere: haverá muito mais detalhes sobre o processo de criação de per-sonagensnasaulasespecíficasdenarração.

Enredo – O que acontece na históriaUm enredo é composto, basicamente, de dois elementos: equilíbrios e confl i-

tos; um equilíbrio é qualquer situação rotineira, com a qual a personagem já esteja acostumada.Umconflito,poroutrolado,éumasituaçãoqueinterrompearotinadapersonagemeprecisaserresolvida.Podemosdizer,também,quetodoconflitogera a pergunta: “o que vai acontecer?”. Note, no entanto, que um equilíbrio não é necessariamentealgobom,nemumconflitoésempreruim.Porexemplo,ummen-digo que vive embaixo de uma ponte está em uma situação equilibrada, pois está acostumadocomela.Mas,seeledescobrirqueéherdeirodeumaenormefortuna,issorepresentaráumconflito,poiséumasituaçãoqueinterfereemsuarotinaeprecisa ser resolvida.

Na maioria dos enredos, haverá a seguinte estrutura:1. Equilíbrio inicial: uma situação rotineira para a personagem, que poderia

durarporumtempoindefinido.2. Conflito:umasituaçãoproblemáticaqueprecisaserresolvidaparaquea

personagem volte a uma rotina. 2.1 Clímax:momentomaistensodoconflito.3. Equilíbriofinal:umasituaçãonovamenterotineira,mesmoquediferente

da inicial.

Narrador – Quem conta a históriaQuem conta a história é o narrador, que pode ser dividido em várias categorias

e subcategorias. Um narrador que participa dos eventos que ele mesmo narra é chamado narrador em 1ª pessoa, ou narrador-personagem; há o narrador em 3ª pessoa, que não participa da história e não faz nenhuma referência a si mesmo durante a narração. Uma segunda categorização é aquela que separa o narrador em 3ª pessoa em dois tipos: o narrador em 3ª pessoa observador e o narrador em

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3ª pessoa onisciente. O observador conta apenas o que seria visível para alguém que observasse de longe o desenrolar dos acontecimentos, enquanto o onisciente pode revelar os sentimentos e pensamentos dos personagens.

Nemsempreaescolhadonarradorcabeaoautordotexto.Muitosvestibulares,porexemplo,determinamqueahistóriadeveráserescritaem1ªou3ªpessoa.Dequal-quer forma, essa é uma decisão que o autor deve tomar antes de começar a escrever o texto e que não pode ser mudada depois, pois uma transformação como essa abalaria profundamente a estrutura da narração.

Tempo – Quando ocorre a históriaO tempo, em uma narração, representa a localização temporal da história e sua

duração: ela se passa durante a Segunda Guerra Mundial, na época do ImpérioRomano ou no futuro distante? Ela conta um dia na vida de alguém ou a história de três gerações? Essa escolha não pode ser feita ao acaso, já que ela interfere no desen-volvimento da história. Por exemplo, se você escreve uma narração que ocorre no iníciodoséculoXIX,vaiserdifícilincluirnelaumaperseguiçãodecarros.Lembre-se, além disso, de que é necessário tratar o tempo (e também o espaço, como veremos logo adiante) como personagem: ele deve ser caracterizado, não citado. Não é uma boaideiacomeçarumahistóriadizendo:“eraodia19deoutubrode1979,quando,derepente...”; isso não irá tornar a narração mais interessante, e o leitor provavelmente não vai se lembrar da data quando estiver lendo o segundo parágrafo do seu texto.

Em vez de citar datas, tente usar o tempo para criar uma atmosfera para a histó-ria. É mais importante dizer que a história se passa numa noite quente de verão (o que ajuda o leitor a imaginar a situação) do que informar a data exata (que, na maioria das vezes,nãosignificanadaparaoleitor).

Espaço – Onde ocorre a históriaO mesmo que foi dito para o tempo vale para o espaço: a escolha do local onde

sepassaahistórianãopode serarbitrária,pois elamodificaanarração.Portanto,antes de começar a escrever, pense qual local é mais adequado à história que você quer contar.

Uma dúvida muito comum é: quanta informação sobre o espaço eu preciso pas-sar para o leitor? Devo mostrar que a história se passa em uma determinada cidade ou isso é óbvio? Devo dizer o nome do país ou basta descrever a casa do personagem?

A resposta é simples: cada história pede um tipo de cenário. Por exemplo, em uma história de amor, normalmente o quarto da personagem é mais importante que o nomedopaís.JáemumahistóriasobreaSegundaGuerraMundial,émuitoimpor-tante saber se o protagonista está, por exemplo, no campo de concentração de Aus-chwitz ou na Normandia (província francesa ocupada pelo exército nazista, onde os aliados desembarcaram no Dia D, assim chamado porque foi o dia em que se iniciou aretomadadaEuropapelosaliados.EssaéabatalhamostradanocomeçodofilmeO resgate do soldado Ryan).

1.1. Temas para praticar

Escolha um dos temas a seguir e produza um texto de acordo com as instruções.

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Narração PUCCamp-SP

“Uma propaganda na TV alerta a população sobre equívocos provocados pelo fato de pessoas terem o mesmo nome, explorando o caso dos homônimos de modo bem-humorado.”

No saguão de um aeroporto, um homem carrega uma pequena tabuleta com o nome da pessoa que espera, a quem, evidentemente, nunca vira antes. Quando chega, o homem cujo nome está escrito na tabuleta é levado para casa, onde sua suposta famí-lia o espera com uma festa de boas-vindas.

Na hora do encontro, evidencia-se o engano: o recém-chegado, que nada tem de oriental, é recep-cionado por uma família de japoneses. No aero-porto, o japonês esperado pela família perma-nece aguardando.”

Redija uma narração em que se relate um caso de engano vivido por duas personagens homônimas. O narrador que você escolher deve contar como o equí-voco se gerou e explorar a reação tanto dessas perso-nagens quanto de outras presentes na situação ima-ginada. Procure ser bem criativo no desfecho.

Narração UEL-PR

1. Não se esqueça de focalizar o tema proposto.2. A sua redação deve, necessariamente, referir-

se ao texto de apoio ou dialogar com ele. Atenção: evite mera colagem ou reprodução.3. Organize sua redação de modo que preencha

entre 20 (mínimo) e 25 (máximo) linhas plenas, con-siderando-se letra de tamanho regular.

4. Observe o espaçamento que indica início de parágrafo.

5. Use a prosa como forma de expressão.6. Crie um título para a sua redação e coloque-o

na linha adequada.

A foto (ao lado) , feita pelo fotógrafo amador HaruoOhara(1909-1999),registraapresençadeduascrianças brincando em uma área rural. A menina empunha uma sombrinha e o garoto usa chapéu, o que sugere um dia de Sol. As crianças não têm brin-quedos e se divertem com o que encontram naquele momento. O garoto segura com firmeza a escada,demonstrando zelo e cuidado com a companheira de diversão.

Com base nesses elementos e na observação da imagem, elabore um texto narrativo em que as lacu-nas dessa cena sejam preenchidas por personagens, conflitoseações,numdeterminadotempoeespaço.

(OHARA, H. Jornal de Londrina,9nov.2009,p.01)

2. Elementos da narração: personagens

Leiaatentamentealetradacançãoaseguir,prestandoespecialatençãoàsper-sonagens que dela fazem parte:

Um dia ele chegou tão diferente do seu jeito de sempre chegarOlhou-a de um jeito muito mais quente do que sempre costumava olharE não maldisse a vida tanto quanto era seu jeito de sempre falarE nem deixou-a só num canto, pra seu grande espanto, convidou-a pra rodar

ChicoBuarqueeViníciusdeMoraes,Valsinha.

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Note que a canção anterior conta uma história sobre duas pessoas: uma delas um homem (chamado apenas de ele no decorrer do texto) e a outra uma mulher (ela). O que acontece na história se deve a uma mudança de comportamento do personagem ele, que um dia chega em casa diferente do modo como costu-mava ser. Tanto ele quanto ela são personagens nessa história: são eles que realizam as ações narradas e a personalidade deles é importante, porque determina como eles reagem aos fatos.

2.1. Como elaborar personagens

Uma personagem, em uma narração, é alguém que cumpre dois requisitos:

• tem função narrativa (algo que ele faz interfere na história);

• tem características (personalidade).Como já mencionado, características são o que

diferencia uma personagem de outra. Sabemos tam-bém que, em narrações curtas, com as de vestibular, toda personagem deve ter uma função narrativa.

Vamos aprofundar agora o conceito de caracte-rística afirmando o seguinte: toda característica

deve ter função narrativa. Ou seja, da mesma forma que toda personagem deve fazer algo, em algum momento, que mude o rumo natural da história, é importante que cada característica, de cada uma das personagens, tenha um significado. Se dizemosque uma personagem é um homem baixo, em algum momento a baixa estatura dele deverá ser importante para o enredo (por exemplo, ele conseguirá passar por um local estreito, pelo qual uma pessoa mais alta nor-malmente não passaria).

Tendo em mente essa necessidade, podemos con-cluir uma outra regra a respeito das características: as características mais interessantes são as que têm maior probabilidade de interferir na história. O fato de uma personagem ter olhos azuis pode até ter impacto em um enredo, mas isso é improvável. É muito mais esperado que uma característica como “rico”, “insano” ou “voador” faça diferença no texto. Para compreendermelhor essa afirmação, devemosentenderqueascaracterísticaspodemserclassifica-das em grupos distintos.

2.1.1. Tipos de características

Físicas

Umacaracterísticafísicacorrespondeaalgoquefazpartedocorpodaperso-nagem. Por exemplo: alto, baixo, gordo, magro, careca... muitas vezes, quando nós descrevemosalguém,damosênfaseàscaracterísticasfísicas,poissãoelasqueper-mitem a uma pessoa reconhecer outra que nunca havia visto antes. Porém, em umanarração,raramenteascaracterísticasfísicassãoasmaisimportantes.Elasaté podem ajudar o leitor a construir uma imagem mental do personagem, enri-quecendo a narração, mas não terão a mesma importância das características que definemomododeagirdopersonagem.

Sociais

As características sociais são aquelas que não dependem apenas do per-sonagem, mas também de sua interação com outras pessoas no grupo social.

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Por exemplo: rico, pobre, famoso, desconhecido, popular... Entre as características sociais,háumaquesedestacaem importância:aprofissão/ocupaçãodoperso-nagem. Com essa característica, conseguimos imaginar várias outras, principal-mente psicológicas. Um personagem que seja cientista, por exemplo, tem maior probabilidade de ser inteligente e concentrado, enquanto um agente secreto deve ser corajoso, habilidoso e frio. É claro que isso não é obrigatório: nada impede que umpersonagemtenhaumacaracterísticaquenãocombinacomsuaprofissão,oquepodeserinclusiveafontedoconflitonoenredodanarração(descobriremosoqueéconflitonaspróximasaulas).

Psicológicas

As características psicológicas costumam ser as que mais interferem no enredo e que, portanto, devem ser trabalhadas com mais cuidado. Uma característica psi-cológica é aquela que diz respeito ao modo de o personagem agir e reagir aos even-tos. Por exemplo: calmo, nervoso, tímido, expansivo, exigente, conformado, feliz, triste... As características psicológicas, mais ainda que as demais, devem ser clara-mente demonstradas com ações, para que o personagem pareça verossímil (tam-bém veremos o que é verossímil logo mais). Se você diz que alguém é inteligente, por exemplo, isso não basta para que os leitores acreditem nessa característica. É necessário mostrar o personagem em questão fazendo alguma coisa que demanda inteligência (por exemplo, resolvendo um enigma complexo).

Características extremas

As características mais importantes, como já vimos, são aquelas que têm maior possibilidade de interferir no rumo da história. Dos três tipos apresenta-dos, aquele que melhor se adapta a essa função é o das características psicoló-gicas. É mais provável que o modo de uma personagem agir e reagir tenha mais relevâncianotextodoquesuaaparênciavenhaacausaralgumimpacto.Mastemos de chamar a atenção para outro pré-requisito das características que interferem na história: elas devem ser extremas, ou seja, distantes da média. Se umapersonagemtem1,70mdealtura,usacalçasjeans e camiseta branca, traba-lha em um banco, gosta de futebol e toma cerveja com os amigos no happy hour, dificilmente essas características terão importância no texto. Faça um teste:imagine um homem qualquer, e provavelmente você terá imaginado uma perso-nagem parecido com o descrito anteriormente. Se você mencionar uma pessoa qualquer, o seu leitor também irá imaginar alguém com características comuns. Logo,édesnecessáriomostraressetipodecaracterística.Poroutrolado,seapersonagem é um agente secreto, tem 2,2 m de altura e coleciona bombas em forma de bichos de pelúcia, essas características devem ser demonstradas.

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2.2. Temas para praticar

Narração Unicamp-SP Um rico empresário recebeu o bilhete acima, apósosequestrodeseufilho.Escrevaumanarrativarelatando esse sequestro e seu desfecho.

Instruções geraisAs três personagens mencionadas a seguir

devem fazer parte da história.Dorisgleison Silva: ex-investigador de polícia,

com um morto em seu passado e nenhuma perspec-tiva de futuro.

Fátima Zoraide: dona de banca de jornal, viciada em bombons e vidente nas horas vagas.

P.C. Júnior: menino prodígio que, aos 12 anos,vale cada centavo do meio milhão de dólares exigido como resgate.

• Suanarrativadeveráserem1ª pessoa. O nar-rador deverá ser, obrigatoriamente, uma das três personagens descritas.

• Se achar necessário, você poderá criar outras personagens.

3. Elementos da narração: enredo

Enredo, em uma narração, é a sequência de fatos que ocorrem na história em ordem cronológica. Elaborar enredos coerentes é fundamental para fazer uma boa narração.

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3.1. Elementos do enredo

Um enredo é composto, basicamente, de dois elementos: equilíbrios e con-fl itos. Um equilíbrio é qualquer situação rotineira, com a qual o personagem já estejaacostumado.Umconflito,emcontrapartida,éumasituaçãoqueinterrompea rotina do personagem e precisa ser resolvida. Podemos dizer também que todo conflitogeraapergunta:“Oquevaiacontecer?”.Note,noentanto,queumequilí-brionãoénecessariamentealgobom,nemumconflitoésempreruim.Porexem-plo, um mendigo que vive embaixo de uma ponte está em equilíbrio, pois está acos-tumado à situação. No entanto, se ele descobrir que é herdeiro de uma enorme fortuna,issorepresentaráumconflito,poiséumasituaçãoqueinterfereemsuarotina e precisa ser resolvida.

Confl ito: situação que tende a ser interrompida, tornando-se um novo equi-líbrio.Háduasmaneiraspelasquaisissopodeocorrer:épossívelqueoconflitopermaneça por um longo tempo, de maneira que, eventualmente, deixa de ser uma situação estranha e se torna parte da rotina. Um exemplo que você talvez já tenha vivido é o momento de se mudar para uma nova casa: durante algum tempo, tudoénovo,mas,gradualmente,anovacasavaificandomaisemaisnatural e a situação de viver nela se torna rotineira.

Aoutraformapelaqualoconflitopodeencerrar-seéumainterrupçãoabrupta,emqueacausadoconflitoéeliminadaeoequilíbrioérestaurado.Umexemploéumadisputadecampeonatodefutebol:duranteojogo,asituaçãovaificandocadavezmaistensa,mas,assimquesoaoapitofinal,essatensãoéimediatamenteinter-rompida e se inicia um novo equilíbrio, que pode ser diferente do que existia antes do jogo.

Já mencionamos uma estrutura típica de enredo:1. Equilíbrio inicial: uma situação rotineira para a personagem, que poderia

durarporumtempoindefinido.2. Conflito:umasituaçãoproblemáticaqueprecisaserresolvidaparaquea

personagem volte a uma rotina. 2.1 Clímax:momentomaistensodoconflito.3. Equilíbriofinal:umasituaçãonovamenterotineira,mesmoquediferente

da inicial.Agora, vamos mostrar uma estrutura mais completa e introduzir o conceito de

Pontodevirada.Aestruturaficaráassim:

Podemos observar que os pontos de virada surgem imediatamente antes dos conflitos.Issonosajudaráadefiniroqueéumpontodevirada:éoexatomomentoem que uma situação rotineira (o equilíbrio) é interrompida. Por exemplo, se o equilíbriocorrespondeàpersonagememumasaladeaulaeoconflitoéumataque

1 – Equilíbrio inicial2– Pontodevirada13– Conflito14 – Equilíbrio médio5 – Ponto de virada 26– Conflito27 – Clímax 8– Equilíbriofinal

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terrorista à escola, o ponto de virada pode ser o momento em que se ouve a pri-meira explosão. Nesse momento, todos interrompem o que estão fazendo, alguns alunos se escondem, outros gritam, outros saem às janelas para ver o que aconte-ceu.Nãosesabeaindaqualéoconflito(poderiaserumacidente,umataqueouuma brincadeira de mau gosto), mas se percebe claramente um rompimento do equilíbrio.

3.2. Tema para praticar

Narração – PUCCamp-SP

Proposta III – narração

Observe as fotos e o texto que segue.

Foto I Foto II

Texto: O que um dia vou saber, Não sabendo eu já sabia.

Epígrafe de conto de Guimarães Rosa

Com base nas fotos, redija uma narração em que o rapaz da segunda foto – ainda menino, na primeira – conte a história para comprovar o que diz o texto. Se você quiser, pode tomar o cavalo como metáfora, isto é, pode substituí-lo por qualquer outro elemento que lhe pareça mais sugestivo para organizar seu relato.

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