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PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU DIREITO PROCESSUAL CIVIL A PÓS QUE ACOMPANHA VOCÊ | www.posestacio.cers.com.br Primeiras impressões do recurso de apelação no Novo CPC RENATO PESSOA MANUCCI Procurador Jurídico da Câmara Municipal de Bragança Paulista Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Especialista em Direito Civil e Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Professor Tutor do curso de Pós-Graduação em Direito Processual Civil da Estácio/CERS. Professor Universitário Advogado 1. Introdução. 2. Definição. 3. Cabimento. 4. Apelação contra decisão interlocutória não agravável. 5. Regularidade formal e procedimento. 6. Efeitos. 6.1 Efeito devolutivo. 6.2 Efeito suspensivo. 7. Teoria da causa madura. 8. Súmula Impeditiva de Recursos. Conclusão. Referências.

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PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

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Primeiras impressões do recurso de apelação no Novo CPC

RENATO PESSOA MANUCCI

Procurador Jurídico da Câmara Municipal de Bragança Paulista

Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Especialista em Direito Civil e Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Professor Tutor do curso de Pós-Graduação em Direito Processual Civil da Estácio/CERS.

Professor Universitário

Advogado

1. Introdução. 2. Definição. 3. Cabimento. 4. Apelação contra decisão

interlocutória não agravável. 5. Regularidade formal e procedimento. 6. Efeitos.

6.1 Efeito devolutivo. 6.2 Efeito suspensivo. 7. Teoria da causa madura. 8. Súmula

Impeditiva de Recursos. Conclusão. Referências.

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1. Introdução

A apelação constitui importante instrumento de combate a eventuais erros de

julgamento ou de procedimento em que possa incorrer o magistrado no julgamento da

causa submetida a sua apreciação. Até porque a falibilidade é inerente ao ser humano. O

estudo e compreensão desta espécie recursal evita a perpetuação de injustiças, sendo de

suma importância o conhecimento de suas regras procedimentais.

De fato, os equívocos na interposição da apelação, em última análise,

prejudicam o jurisdicionado, razão pela qual os operadores do direito, sobretudo os

advogados, devem dedicar especial atenção no momento da interposição do recurso.

Com a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil (doravamente

denominado tão só “NCPC” ou “CPC de 2015”), a tendência é a pacificação das

controvérsias existentes à luz do Código de Processo Civil vigente (doravamente

denominado tão só “CPC vigente” ou “CPC de 1973”). A mudança exigirá a revisitação

dos principais tópicos relacionados ao recurso, sendo esta a motivação que inspirou a

elaboração do presente ensaio.

Assim, foram revistos aspectos conceituais e processuais do recurso de apelação,

notadamente sua definição, cabimento, regularidade formal, procedimento e efeitos,

bem como as implicações do novo Estatuto Processual em sua sistemática.

2. Definição

A apelação é comumente etiquetada como “recurso por excelência”, na medida

em que “constitui o principal instrumento por meio do qual atua o princípio do duplo

grau de jurisdição, permitindo ampla atividade cognitiva pelo órgão ad quem. É

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recurso advindo da apellatio romana, sendo utilizado por quase todos os países do

mundo civilizado”1.

Cássio Scarpinella Bueno lembra que “certamente por força de suas razões e

desenvolvimento histórico, é a partir dela [apelação] que a própria teoria geral dos

recursos foi e pode ser construída […]2”.

Trata-se de recurso adequado para impugnar sentença, terminativa ou definitiva,

levando a causa para reexame no órgão jurisdicional hierarquicamente superior. No

entanto, importa registrar que existem situações excepcionais em que, embora o

provimento jurisdicional caracterize típica sentença, não será hipótese de cabimento do

recurso de apelação.

Em suma, “apelação […] é o recurso que se interpõe das sentenças dos juízes de

primeiro grau de jurisdição para levar a causa ao reexame dos tribunais do segundo

grau, visando a obter uma reforma total ou parcial da decisão impugnada, ou mesmo

sua invalidação”3.

3. Cabimento

O art. 513 do CPC de 1973, cujo conteúdo foi reproduzido no art. 1.009, caput

do CPC de 2015, estabelece que a apelação é o recurso cabível para impugnar qualquer

tipo de sentença, seja terminativa ou definitiva. Assim, a compreensão do cabimento

desta espécie recursal pressupõe a definição da sentença como ato jurisdicional.

Originariamente, a sentença era caracterizada como típico provimento

jurisdicional que extinguia o processo, com ou sem resolução de mérito. A propósito,

elucidativa as lições de Humberto Theodoro Júnior:

1 DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito

Processual Civil. Vol. 03: Meios de Impugnação às Decisões Judiciais e Processo nos Tribunais. 12ª

ed. Salvador: Juspodivm, 2014, p. 107. 2 BUENO, Cássio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil. Vol. 05: Recursos.

Processos e incidentes nos Tribunais. Sucedâneos recursais: técnicas de controle das decisões

jurisdicionais. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 114. 3 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I: Teoria Geral do

Direito Processual Civil e Processo de Conhecimento. 55ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 1926.

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[…] Não era o conteúdo do decisório o relevante para distinguir a sentença

da decisão interlocutória, mas o seu efeito processual, o que tornava muito

simples o sistema recursal. A apelação cabia contra a sentença, e o agravo,

contra a decisão interlocutória, de modo que a apelação nunca seria utilizável

para interromper o processo em prejuízo de sua marcha em busca da solução

final para a causa. Contra as decisões interlocutórias, o agravo seria o recurso

apropriado, sem efeito suspensivo, e sem qualquer tumulto ao feito ainda em

andamento, já que se processaria em instrumento à parte, quando tivesse que

chegar ao conhecimento do tribunal antes de sentenciado o processo em

primeiro grau de jurisdição.4.

A reforma operada pela Lei 11.232, de 22 de dezembro de 2005, que instituiu a

ideia de processo sincrético no qual a efetivação da decisão judicial é mera fase do

processo de conhecimento, dispensada a instauração de nova relação jurídica

processual, modificou a referida sistemática. Sobre o tema, Fredie Didier Jr. et al

assevera:

Na realidade, a modificação da definição legal de sentença serviu apenas para

adaptar-se, tecnicamente, à nova sistemática do processo, cuja estrutura

afasta a existência de um processo autônomo de execução, sendo certo que, a

partir do seu início de vigência, o processo será um só, com duas fases: a de

acertamento e a de cumprimento. A sentença, em essência, é aquele ato do

juiz que extinguiu o processo sem julgamento do mérito ou que resolveu todo

o mérito, pondo termo à fase de acertamento ou de cumprimento. E é contra

esse ato judicial que cabe a apelação.5.

O NCPC repetiu a referida concepção, esclarecendo no § 1º do art. 203 que

“ressalvadas as disposições expressas dos procedimentos especiais, sentença é o

pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à

fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução”. A nova

Codificação, em boa hora, acolheu sugestão da doutrina, que já reconhecia a existência

de sentenças impugnáveis por outras espécies recursais que não a apelação, a exemplo

da decisão que julga a execução fiscal, da sentença no procedimento dos juizados

especiais, que é impugnável por recurso inominado, bem como da sentença que julga a

liquidação de sentença e decreta a falência.

A Lei 1.060, de 05 de fevereiro de 1950, de forma totalmente dissonante ao

regime recursal da apelação, dispôs em seu art. 17 que “caberá apelação das decisões

proferidas em consequência da aplicação desta lei; a apelação será recebida somente

4 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I … p. 1928/1929. 5 DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito

Processual Civil. Vol. 03 …, p. 107/108.

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no efeito devolutivo quando a sentença conceder o pedido”. A doutrina majoritária

entende que o preceptivo legal deve ser interpretado sistematicamente para evitar

situações absurdas e tumultos processuais, de modo que, quando a assistência judiciária

for concedida no bojo do processo, por meio de decisão interlocutória, será recorrível

por agravo de instrumento; quando concedida por decisão proferida em procedimento

apartado, será impugnável por recurso de apelação.

O NCPC resolveu a controvérsia ao elencar entre as matérias impugnáveis por

agravo de instrumento, especificamente no V do art. 1.015, “a rejeição do pedido de

gratuidade da justiça ou acolhimento de pedido de sua revogação”, além de revogar o

art. 17 da Lei 1.060/50 (art. 1.072, inciso III). De outro lado, havendo pedido de

assistência judiciária formulada no curso do processo e rejeitado na sentença, cabível

será o recurso de apelação, por força do princípio da unirrecorribilidade recursal

consagrado, inclusive, no § 3º do art. 1.009 do CPC de 2015.

Portanto, a apelação é o instrumento adequado para a parte pleitear a reforma ou

a invalidação de sentença em qualquer espécie de procedimento, ressalvadas eventuais

disposições expressas de determinados procedimentos especiais.

4. Apelação contra decisão interlocutória não agravável

O § 1º do art. 1.009 do CPC de 2015, inovando a ordem jurídica processual

vigente, prescreveu que “as questões resolvidas na fase de conhecimento, se a decisão a

seu respeito não comportar agravo de instrumento, não são cobertas pela preclusão e

devem ser suscitadas em preliminar de apelação, eventualmente interposta contra a

decisão final, ou nas contrarrazões”. Por conseguinte, tornou-se inócua a função do

agravo retido, previsto na legislação vigente, que foi, acertadamente, suprimido pela

nova Codificação.

Assim, consagrou-se, definitivamente, o princípio da irrecorribilidade das

decisões interlocutórias em separado, seguindo o legislador a experiência bem sucedida

dos Juizados Especiais Cíveis, instituídos pela Lei 9.099, de 26 de setembro de 1995.

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Consequência desta nova concepção é possibilidade que tem o recorrente de

formular em um só recurso duas pretensões recursais, em típica cumulação imprópria de

pedidos: uma contra a decisão interlocutória e outra contra a sentença propriamente dita.

Em outras palavras, formulando o recorrente pedido recursal impugnando tanto as

questões resolvidas em decisão interlocutória quanto as questões decididas na sentença,

o acolhimento do primeiro pleito prejudica o conhecimento do segundo.

Vale frisar, por outro lado, que as decisões interlocutórias insuscetíveis de

impugnação imediata não dependem de qualquer protesto da parte interessada no curso

do processo para que sejam contestadas ao final no recurso de apelação. Nesse sentido,

interessante os comentários do professor Cássio Scarpinella Bueno ao novel comando

legal:

O Projeto da Câmara ia além ao criar figura desconhecida no direito

processual civil brasileiro, um “protesto”, apenas para evitar que a questão

precluísse, permitindo que ela fosse reavivada em apelo ou em contrarrazões.

Felizmente, o Senado, na última etapa do processo legislativo, recusou a

proposta que, bem entendida, tornava a extinção do agravo retido mais

nominal do que substancial, formalizando, desnecessariamente, o processo e

comprometendo, até mesmo, um dos pontos anunciados, desde a Exposição

de Motivos do Anteprojeto. No sistema que prevaleceu, cabe insistir, basta

que o interessado, na apelação ou nas contrarrazões, suscite a decisão não

agravável de instrumento – que não estará atingida pela preclusão – para

permitir sua revisão pelo Tribunal competente6.

A compreensão da recorribilidade das decisões interlocutórias perpassa o estudo

do cabimento do agravo de instrumento, cujas hipóteses foram taxativamente previstas

no art. 1.015 do NPCPC7. Vale dizer, a questão decidida incidentalmente no curso do

6 BUENO, Cássio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo: Saraiva, 2015, p.

646. 7 “Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre:

I - tutelas provisórias;

II - mérito do processo;

III - rejeição da alegação de convenção de arbitragem;

IV - incidente de desconsideração da personalidade jurídica;

V - rejeição do pedido de gratuidade da justiça ou acolhimento do pedido de sua revogação;

VI - exibição ou posse de documento ou coisa;

VII - exclusão de litisconsorte;

VIII - rejeição do pedido de limitação do litisconsórcio;

IX - admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros;

X - concessão, modificação ou revogação do efeito suspensivo aos embargos à execução;

XI - redistribuição do ônus da prova nos termos do art. 373, § 1o;

XII - (VETADO);

XIII - outros casos expressamente referidos em lei.

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processo somente não ficará acobertada pela preclusão caso não seja possível sua

impugnação imediata por agravo de instrumento.

Não obstante, quando as matérias constantes do sobredito dispositivo legal

forem enfrentadas na sentença, integrando capítulo próprio do ato decisório, o recurso

cabível será a apelação, por força do disposto no § 3º do art. 1.009 do NCPC. Aliás, a

referida norma era de todo desnecessária, tendo em vista que, à luz do princípio da

unirrecorribilidade recursal, a sentença que, em diferentes capítulos, enfrenta questões

impugnáveis por agravo e apelação, deve ser impugnada por esta última.

De resto, tratando-se de ampliação do cabimento do recurso de apelação, é

imprescindível detalhar os efeitos práticos da inovação em relação aos processos em

curso. Em tema de direito intertemporal, vigora a regra do tempus regit actum (“o tempo

rege o ato”), ou seja, a lei processual é aplicável aos processos em curso, resguardados

os atos processuais praticados sob a vigência da legislação pretérita.

Todavia, a referida regra sofre temperamentos inerentes ao regime recursal, na

medida em que, para a determinação da lei aplicável ao recurso, é indispensável

verificar se a legislação estava em vigor quando da prolação da sentença. Assim, tendo

em vista as disposições da Lei Complementar 95, de 26 de fevereiro de 1998 (art. 8º, §§

1º e 2º), e considerando que o NCPC foi publicado em 17 de março de 2015, as inéditas

disposições da apelação serão aplicáveis às sentenças proferidas a partir de 18 de março

de 2016.

No mesmo sentido os Enunciados 354 e 355 do Fórum Permanente de

Processualistas Civis, in verbis:

Enunciado 354: O art. 1.022, § 1º [art. 1.009, §§ 1º e 2º, na versão

sancionada], não se aplica às decisões proferidas antes da entrada em vigor

do CPC.

Enunciado 355: Se, no mesmo processo, houver questões resolvidas na fase

de conhecimento em relação às quais foi interposto agravo retido na vigência

do CPC/1973, e questões resolvidas na fase de conhecimento em relação às

quais não se operou a preclusão por força do art. 1.022, § 1º, do CPC, aplicar-

se-á ao recurso de apelação o art. 523, § 1º, do CPC /1973 em relação

àquelas, e o art. 1.022, § 1º, do CPC em relação a estas [art. 1.009, §§ 1º e 2º,

na versão sancionada].

Parágrafo único. Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase

de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de

inventário.”.

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5. Regularidade formal e procedimento

A regularidade formal constitui pressuposto de admissibilidade recursal

consistente nas formalidades indispensáveis para que o apelo tenha seguimento, tais

como a qualificação das partes, causa de pedir recursal e pedido de reforma/anulação da

sentença recorrida, além dos procedimentos para tanto. Nesse cenário, o NCPC repetiu a

mesma sistemática do CPC vigente, dispondo o caput do art. 1.010 que a apelação será

interposta por petição dirigida ao juízo de primeiro grau, a qual conterá os nomes e a

qualificação das partes, a exposição do fato e do direito e as razões do pedido de

reforma ou de decretação de nulidade, bem como o pedido de nova decisão.

Interposto o recurso, o apelado será intimado para apresentar contrarrazões

recursais (§ 1º), podendo interpor recurso adesivo, caso preenchidos os pressupostos

específicos desta forma de recorrer, hipótese em que o apelante será intimado para

apresentar contrarrazões (§ 2º). Cumpridas as mencionadas formalidades, serão os autos

remetidos ao tribunal pelo juiz, independentemente de juízo de admissibilidade (§ 3º).

Aqui reside a maior inovação do CPC de 2015 no que tange ao procedimento

recursal: o fim do juízo bipartido de admissibilidade do recurso de apelação. De fato, no

sistema do CPC de 1973, atualmente em vigor, interposta a apelação, o juízo a quo

realiza o primeiro juízo de admissibilidade do recurso, o qual, sendo positivo, importa

na intimação do recorrido para apresentar contrarrazões e na remessa dos autos ao juízo

ad quem, oportunidade em que será realizado novo juízo de prelibação (reexame da

matéria).

Com a entrada em vigor do NCPC, portanto, caberá ao Tribunal ad quem

realizar o juízo de admissibilidade da apelação, não sendo lícito ao juízo a quo fazê-lo

(Enunciado 99 do Fórum Permanente de Processualistas Civis). A nova sistemática,

entretanto, somente tem aplicação às apelações pendentes de admissibilidade ao tempo

da entrada em vigor do NCPC, de modo que o exame da admissibilidade destes recursos

competirá ao Tribunal de segundo grau (Enunciado 356 do Fórum Permanente de

Processualistas Civis).

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Eventual desrespeito ao novo comando legal, ensejará flagrante usurpação a

competência do tribunal, cabendo reclamação na forma do art. 988, inciso I, do CPC de

2015. Nesse sentido prescreve o Enunciado 207 do Fórum Permanente de

Processualistas Civis que “cabe reclamação, por usurpação da competência do tribunal

de justiça ou tribunal regional federal, contra a decisão de juiz de primeiro grau que

inadmitir recurso de apelação”.

6. Efeitos

A interposição de qualquer recurso produz alguns efeitos, tais como devolver a

matéria impugnada ao conhecimento do órgão ad quem (efeito devolutivo); impedir a

preclusão temporal (efeito obstativo); impedir a execução da decisão recorrida (efeito

suspensivo), dentre outros. No presente estudo, contudo, serão objeto de análise os

efetivos suspensivo e devolutivo à luz das novas disposições do CPC de 2015.

6.1 Efeito suspensivo

O NCPC repetiu a regra do CPC vigente, prevendo que a apelação é recurso

dotado de efeito suspensivo automático – ope legis (art. 1.012, caput) –, é dizer, uma

vez interposto, os efeitos da sentença recorrida ficam suspensos até o julgamento da

insurgência do apelante. Sobre o tema, Cássio Scarpinella Bueno, após lembrar que o

Anteprojeto e o Projeto do Senado propunham a extinção do efeito suspensivo

automático da apelação, tece duras críticas ao modelo aprovado:

[…] Trata-se, com o devido respeito, de um dos grandes retrocessos do novo

CPC que se choca frontalmente com o que, este respeito, propuseram o

Anteprojeto e o Projeto do Senado. Infelizmente, o Senado, na derradeira fase

do processo legislativo, não recuperou a sua própria proposta (art. 968 do

Projeto do Senado), mantendo, em última análise, a regra de que a apelação,

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no direito processual civil brasileiro, tem (e continua a ter) efeito

suspensivo.8.

Outrossim, o § 1º do art. 1.012 do NCPC elencou em rol taxativo as hipóteses

em que o recurso de apelação não terá efeito suspensivo, estabelecendo que produzirá

efeitos imediatamente após sua publicação a sentença que: I. homologa divisão ou

demarcação de terras; II. condena a pagar alimentos; III. extingue sem resolução de

mérito ou julga improcedentes os embargos do executado; IV. julga procedente o

pedido de instituição de arbitragem; V. confirma, concede ou revoga tutela provisória;

VI. decreta a interdição. Substancialmente não houve inovações.

A bem da verdade, houve uma unificação no tratamento dos efeitos da apelação,

deslocando-se a regra do art. 1.184 do CPC vigente para o inciso VI. Deveras, no

regime processual vigente, a sentença que decreta a interdição é constitutiva e produz

efeitos a partir de sua prolação (ex nunc). Portanto, não se trata de novidade da nova

Codificação.

Uma observação ainda se faz pertinente: o inciso IV do art. 520 do CPC vigente

não foi contemplado no rol do § 1º do art. 1.012 do NCPC, na medida em que este

diploma processual extinguiu o processo cautelar autônomo e transferiu o seu conteúdo

para as tutelas provisórias, sendo suficiente a previsão do inciso V. Aliás, o Enunciado

217 do Fórum Permanente de Processualistas Civis esclareceu que “a apelação contra o

capítulo da sentença que concede, confirma ou revoga a tutela antecipada da evidência

ou de urgência não terá efeito suspensivo automático”.

De resto, o CPC de 2015, nos §§ 3º e 4º do art. 1.0129, positivou os meios para a

atribuição de efeito suspensivo à apelação dotada apenas de efeito devolutivo (efeito

suspensivo ope judicis), simplificando os procedimentos para tanto. Cássio Scarpinella

Bueno enaltece a alteração ao afirmar que “resolvendo dúvida fundada do CPC atual, o

8 BUENO, Cássio Scarpinella. Novo Código … p. 646. 9 “Art. 1.012 …

[…]

§ 3o O pedido de concessão de efeito suspensivo nas hipóteses do § 1o poderá ser formulado por

requerimento dirigido ao:

I - tribunal, no período compreendido entre a interposição da apelação e sua distribuição, ficando o

relator designado para seu exame prevento para julgá-la;

II - relator, se já distribuída a apelação.

§ 4o Nas hipóteses do § 1o, a eficácia da sentença poderá ser suspensa pelo relator se o apelante

demonstrar a probabilidade de provimento do recurso ou se, sendo relevante a fundamentação, houver

risco de dano grave ou de difícil reparação”.

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§ 3º do art. 1.012 admite que o pedido seja formulado diretamente ao tribunal no

período entre a interposição de apelação e sua distribuição. Nesse caso, fica o relator

prevento (inciso I); se a apelação já tiver sido distribuída, a competência para apreciar

o pedido é do próprio relator (inciso II)”10.

6.2 Efeito devolutivo

A apelação devolve ao juízo ad quem o conhecimento da matéria impugnada

(art. 1.013, caput, NCPC; art. 515, caput, CPC vigente), incumbindo, portanto, à parte

apelante delimitar o objeto da impugnação (tantum devolutum quantum appelatum).

Trata-se da extensão do efeito devolutivo, na medida em que “ao deduzir o pedido de

nova decisão, o recorrente fixa a extensão da devolutividade, a fim de que o tribunal

possa julgar o recurso […] O objeto do julgamento pelo órgão ad quem pode ser igual

ou menos extenso comparativamente ao julgamento do órgão a quo, mas nunca mais

extenso”11.

Além da extensão, o efeito devolutivo pode ser estudado sob o enfoque da

profundidade, delimitando-se em que medida o tribunal poderá apreciar a questão

impugnada, observando as limitações impostas pelo recorrente ao interpor o recurso

(extensão). Com efeito,

Uma vez fixada a extensão do efeito devolutivo, a profundidade será uma

consequência natural e inexorável de tal efeito, de forma que independe de

qualquer manifestação nesse sentido pelo recorrente. A devolução de todas as

questões e fundamentos que digam respeito ao capítulo da decisão

devidamente impugnado e devolvido no plano horizontal é automática,

decorrendo da própria lei e não da vontade das partes.12.

10 BUENO, Cássio Scarpinella. Novo Código … p. 650. 11 DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito

Processual Civil. Vol. 03 …, p. 118. 12 NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 2ª ed. São Paulo: Método,

2011, p. 579/580.

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Os comandos dos §§ 1º e 2º do art. 1.013 do CPC de 201513, que reproduzem as

regras dos §§ 1º e 2º do art. 515 do CPC de 1973, derivam da profundidade do efeito

devolutivo. Fredie Didier Jr. et al, comentando os dispositivos correspondentes à

Codificação ainda vigente, mas em lição aplicável ao novo diploma processual,

assinala:

Conforme resulta dos parágrafos do art. 515, é amplíssima, em profundidade,

a devolução das questões. Não se cinge às questões efetivamente resolvidas

na decisão recorrida: abrange também as que nela poderiam tê-lo sido. Nisso

se compreendem: a) questões examináveis de oficio; b) questões que, não

sendo examináveis de oficio, deixaram de ser apreciadas, a despeito de

haverem sido suscitadas abrangendo, aqui, segundo Bernardo Pimentel

Souza, as questões acessórias (ex. juros legais), incidentais (ex. litigância de

má-fé), questões de mérito e outros fundamentos do pedido e da defesa.14.

7. Teoria da causa madura

Derivada do efeito devolutivo, a teoria da causa madura, também conhecida

como efeito desobstrutivo da apelação, permite ao tribunal o julgamento imediato do

mérito da demanda, quando da apreciação de recurso que impugne sentença terminativa.

Em outros termos, a teor do § 3º do art. 515 do CPC vigente, que positivou a teoria da

causa, é lícito ao tribunal, ao reformar sentença terminativa em sede de apelação,

proceder ao imediato julgamento do mérito da causa, desde que esta verse

exclusivamente questões de direito e esteja em condições de imediato julgamento.

À luz do dispositivo, portanto, são pressupostos para a aplicação do efeito

desobstrutivo da apelação:

versar a causa sobre questão exclusivamente de direito: a jurisprudência do

STJ interpreta ampliativamente este requisito, conjugando-o com as

13 “Art. 1.013 …

[…]

§ 1o Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e

discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas, desde que relativas ao capítulo

impugnado.

§ 2o Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a

apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais”. 14 DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito

Processual Civil. Vol. 03 …, p. 93.

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disposições 330, inciso I, do CPC vigente, para abranger, igualmente, na

cognição pelo juízo ad quem as questões de fato para as quais seja

dispensável a produção de prova oral15;

estar em condições de imediato julgamento: significa que, havendo

necessidade de dilação probatória, o Tribunal deverá cassar a sentença e

determinar o retorno dos autos ao primeiro grau de jurisdição, sob pena de

supressão de instância e violação ao princípio do duplo grau de jurisdição.

Não obstante, a doutrina não se contenta com a interpretação isolada e literal do

referido preceptivo legal. “Razões de ordem sistemática aconselham que se exija a

formulação de requerimento do recorrente para a aplicação do dispositivo, tendo em

vista que a delimitação ‘daquilo-que-tem-de-ser-decidido’ pelo órgão jurisdicional é,

no ordenamento brasileiro, matéria adstrita ao princípio dispositivo e, pois, à

provocação da parte interessada”16.

Por conseguinte, “[…] se a questão relativa à aplicação do art. 515, § 3º, surgir

com o julgamento já iniciado, a hipótese é de sua suspensão para que as partes (e

eventuais terceiros) possam manifestar-se sobre a questão, ‘convertendo-se o

julgamento em diligência […]”17.

O NCPC, ampliando o cabimento da teoria da causa madura, prescreveu no § 4°

do art. 1.013:

Art. 1.013 …

[…] § 3o Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal

deve decidir desde logo o mérito quando:

I - reformar sentença fundada no art. 485;

II - decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites

do pedido ou da causa de pedir;

III - constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que

poderá julgá-lo;

IV - decretar a nulidade de sentença por falta de fundamentação.

15 STJ, EREsp 874.507/SC, Corte Especial, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 19.06.2013, DJe

01.07.2013. 16 DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso de Direito

Processual Civil. Vol. 03 …, p. 122. 17 BUENO, Cássio Scarpinella. Curso Sistematizado … p. 86.

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8. Súmula Impeditiva de recursos

A admissibilidade da apelação, no regime do CPC de 1973, é bipartida,

realizando o juízo a quo o controle inicial dos pressupostos de recorribilidade, enquanto

o órgão ad quem procede ao reexame da matéria no momento oportuno. Nessa linha, o §

1º do art. 518 do CPC vigente, com a redação da Lei 11.276/2006 (tendência de

valorização dos precedentes), estabeleceu que o juiz não receberá o recurso de apelação

quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de

Justiça ou do Supremo Tribunal Federal. Cuida-se da denominada súmula impeditiva

de recursos que, para a doutrina majoritária, é um pressuposto de admissibilidade

específico da apelação.

O CPC de 2015 alterou completamente a admissibilidade do recurso de

apelação, tornando, consequentemente, desnecessária a manutenção da súmula

impeditiva de recursos. Isso porque, por força do disposto no § 3º do art. 1.010 do novo

diploma processual, interposto o recurso e apresentada as contrarrazões, serão os autos

remetidos ao tribunal pelo juízo a quo, independentemente de juízo de admissibilidade.

Noutras palavras, o juízo de admissibilidade da apelação é realizado em momento único

pelo órgão ad quem.

Na verdade, pela nova sistemática, incumbirá ao relator, em decisão

monocrática, negar seguimento ao recurso ou julgar desde logo seu mérito, quando

presentes as hipóteses dos incisos III a V do art. 932 do NCPC18, nos termos do art.

1.011, inciso I, do mesmo diploma legal.

18 Art. 932. Incumbe ao relator:

[…]

III - não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os

fundamentos da decisão recorrida;

IV - negar provimento a recurso que for contrário a:

a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;

b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento

de recursos repetitivos;

c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de

competência;

V - depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida

for contrária a:

a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal;

b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento

de recursos repetitivos;

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Conclusão

O NCPC não modificou a estrutura da apelação, que continua sendo o recurso

cabível para impugnar sentença, terminativa ou definitiva. Talvez a maior inovação

resida na possibilidade de impugnação das questões incidentais não impugnáveis

imediatamente por agravo de instrumento. Na verdade, a referida sistemática já tem

previsão no ordenamento jurídico processual desde o advento da Lei 9.099/95, que

consagrou o princípio da irrecorribilidade das decisões interlocutórias em separado.

No mais, o novo diploma processual colmatou algumas lacunas existentes no

sistema vigente, a exemplo dos meios para a concessão de efeito suspensivo à apelação,

além de incorporar diversas críticas doutrinárias e orientações jurisprudenciais.

c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de

competência

[…]”.

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Referências

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. STJ, EREsp 874.507/SC rel. Min. Arnaldo

Esteves Lima. Diário de Justiça Eletrônico. Brasília, 1º jul. 2013.

BUENO, Cássio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil Anotado. São Paulo:

Saraiva, 2015.

_______________________. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil. Vol.

05: Recursos. Processos e incidentes nos Tribunais. Sucedâneos recursais: técnicas

de controle das decisões jurisdicionais. São Paulo: Saraiva, 2008.

DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de. Curso

de Direito Processual Civil. Vol. 03: Meios de Impugnação às Decisões Judiciais e

Processo nos Tribunais. 12ª ed. Salvador: Juspodivm, 2014, p. 107.

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. 2ª ed. São

Paulo: Método, 2011,

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. II: Teoria

Geral do Direito Processual Civil e Processo de Conhecimento. 55ª ed. Rio de

Janeiro: Forense, 2014.