Potencial energético da floresta portuguesa

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1 O potencial energético da floresta portuguesa: análise do potencial energético disponível para as centras termoeléctricas a biomassa florestal lançadas a concurso T. Mateus Biomassa e Biocombustíveis, Mestrado de Energias Renováveis, Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto Tel. 916539169 E-mail: [email protected]; [email protected] Resumo Este relatório pretende avaliar a potência máxima eléctrica possível tendo como recurso energético – o potencial da biomassa florestal e a biomassa florestal com maior facilidade e menor custo de exploração – a nível global e local. Pretende-se também avaliar os resultados obtidos a nível local com as potências máximas de ligação à rede para cada distrito concedidas através de concurso lançado pela DGGE. I. Introdução A biomassa é considerada uma fonte de energia renovável porque o seu ciclo de vida provém da existência do Sol, como fonte de energia. Através do processo de fotossíntese, a energia solar é captada pela clorofila das plantas que a converte em energia química, processando o dióxido de carbono (CO 2 ), água e minerais em compostos orgânicos e oxigénio (O 2 ). A combustão da biomassa vai libertar o CO 2 anteriormente capturado, que mais tarde voltará a entrar no processo, dando início a um novo ciclo. Por esse motivo, a queima da biomassa não provoca mais emissões de Gases com Efeito de Estufa (GEE). A biomassa é assim uma resposta positiva às alterações climáticas, pelo que a sua utilização, como fonte energética, reveste-se dum cariz estratégico para cumprir os demais objectivos nacionais e internacionais. A floresta portuguesa cobre cerca de 38% do território. Esse valor demonstra claramente o potencial da Biomassa sólida em Portugal. Contudo, a área florestal tem sofrido reduções ao longo dos anos, ao ser devastada por contínuos incêndios, geralmente ocasionados por mão criminosa e uso indevido do fogo. Figura 1 – Ciclo do carbono. Figura 2 – Densidade de área florestada no território nacional.

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Estudo sobre o potencial energético da floresta portuguesa para produção de energia, através da biomassa.

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O potencial energético da floresta portuguesa: análise do potencial energético disponível para as centras termoeléctricas a biomassa

florestal lançadas a concurso

T. Mateus

Biomassa e Biocombustíveis, Mestrado de Energias Renováveis, Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto

Tel. 916539169

E-mail: [email protected]; [email protected] Resumo Este relatório pretende avaliar a potência máxima eléctrica possível tendo como recurso energético – o potencial da biomassa florestal e a biomassa florestal com maior facilidade e menor custo de exploração – a nível global e local. Pretende-se também avaliar os resultados obtidos a nível local com as potências máximas de ligação à rede para cada distrito concedidas através de concurso lançado pela DGGE. I. Introdução A biomassa é considerada uma fonte de energia renovável porque o seu ciclo de vida provém da existência do Sol, como fonte de energia. Através do processo de fotossíntese, a energia solar é captada pela clorofila das plantas que a converte em energia química, processando o dióxido de carbono (CO2), água e minerais em compostos orgânicos e oxigénio (O2). A combustão da biomassa vai libertar o CO2 anteriormente capturado, que mais tarde voltará a entrar no processo, dando início a um novo ciclo. Por esse motivo, a queima da biomassa não provoca mais emissões de Gases com Efeito de Estufa (GEE). A biomassa é assim uma resposta positiva às alterações climáticas, pelo que a sua utilização, como fonte energética, reveste-se dum cariz estratégico para cumprir os demais objectivos nacionais e internacionais.

A floresta portuguesa cobre cerca de 38% do território. Esse valor demonstra claramente o potencial da Biomassa sólida em Portugal. Contudo, a área florestal tem sofrido reduções ao longo dos anos, ao ser devastada por contínuos incêndios, geralmente ocasionados por mão criminosa e uso indevido do fogo.

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A limpeza das matas é um factor de prevenção contra incêndios e o produto obtido pode ter finalidades energéticas de interesse considerável. Com essa lógica, foi definido em Resolução de Conselho de Ministros (RCM nº 63/2003) a meta de 150 MW de potência instalada com origem em biomassa florestal, até 2010.

Com o objectivo de cumprir a meta, o Governo lançou, em Fevereiro de 2006, um concurso para atribuição de capacidade de injecção de potência na rede do Sistema Eléctrico de Serviço Público (SEP) para energia eléctrica produzida em centrais termoeléctricas a biomassa florestal, totalizando um valor de 100 MW.

É classificado como biomassa florestal, a fracção biodegradável dos produtos, e dos desperdícios de actividade florestal. Inclui as operações de condução (ex: desbaste e desrama) e da exploração dos povoamentos florestais, ou seja: ramos, bicadas, cepos, folhas, raízes, cascas;

O aproveitamento da biomassa florestal para fins energéticos é encarado não só como um instrumento de luta contra incêndios e contra a redução de GEE, como é um factor positivo para oportunidades de negócio em diversas fileiras, para o desenvolvimento económico e criação de emprego em zonas rurais, para a redução da dependência energética e contribuição para o mix energético.

Figura 4 – Os factores positivos do aproveitamento da biomassa florestal.

Figura 3 – Distribuição dos Incêndios Florestais em 2002, por Tipo de Causa.

Fonte: DGF/CNGF

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II. O recurso Actualmente, a floresta ocupa 3.349.327 hectares, ou seja, cerca de 38% do território continental, segundo dados da Direcção Geral das Florestas (DGF).

A área arborizada tem, inclusivamente, condições para aumentar, caso sejam aproveitadas as extensas áreas de incultos e improdutivos que, segundo a DGF, ocupam aproximadamente 2.300.000 ha.

Quanto à distribuição das áreas dos povoamentos florestais por espécie dominante, verifica-se que o pinheiro bravo, o sobreiro, o eucalipto e a azinheira são as quatro principais espécies, ocupando, no seu conjunto, quase 85 % da área da floresta portuguesa.

O pinheiro bravo é a espécie florestal que ocupa maior área, cerca de 976 mil hectares, na sua maior parte localizados na região Centro e Norte Litoral do País. É uma espécie de grande importância económica, sendo o sustentáculo das indústrias de serração, de painéis e aglomerados e de pasta para papel.

O eucalipto é hoje uma componente importante da paisagem portuguesa, ocupando 672 mil hectares, correspondendo a cerca de 7,5% do território continental e a aproximadamente 20% da floresta nacional. A expansão desta espécie é relativamente recente em Portugal (meados do séc. XX) e coincide com a instalação e crescimento da indústria papeleira.

De acordo com o Quadro 2, os distritos com maior área florestal são os distritos vizinhos de:

� Zona centro do país: Castelo Branco, Portalegre e Santarém, totalizando 28% da área florestal;

� Zona sul do país: Évora, Setúbal e Beja, totalizando 31% da área florestal

Na realização do fórum “Energias Renováveis em Portgal” foi efectuada uma avaliação do potencial disponível da biomassa florestal, que foi avaliado numa quantidade anual de 2 milhões de toneladas [3].

Quadro 1 – Os factores positivos do aproveitamento da biomassa florestal.

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Região \ Espécie Pinheiro1 Eucalipto Azinheira Sobreiro Total Total (%) Aveiro 56.457 69.293 0 0 125.750 4% Beja 13.430 42.539 162.307 91.856 310.132 11%

Braga 32.238 42.591 0 0 74.829 3% Bragança 32.089 7.556 14.742 19.614 74.001 3%

Castelo Branco 158.417 69.272 28.520 26.233 282.442 10% Coimbra 119.215 49.823 68 0 169.106 6%

Évora 10.776 24.455 147.614 145.359 328.204 11% Faro 14.916 28.612 8.558 39.863 91.949 3%

Guarda 64.113 3.247 4.243 1.691 73.294 3% Leiria 106.827 36.660 407 136 144.030 5% Lisboa 9.131 28.385 0 1.634 39.150 1%

Portalegre 19.145 44.863 71.767 139.502 275.277 9% Porto 25.682 42.139 0 0 67.821 2%

Santarém 78.933 99.497 2.967 117.811 299.208 10% Setúbal 84.660 28.530 16.259 127.619 257.068 9%

Viana do Castelo 37.805 14.352 0 0 52.157 2% Vila Real 74.632 4.507 1.136 1.025 81.300 3%

Viseu 115.253 35.828 2.989 470 154.540 5% Total 1.053.719 672.149 461.577 712.813 2.900.258 4%

1Inclui as espécies do pinheiro bravo e pinheiro manso. Quadro 2 – Superfície dos povoamentos puros e mistos dominantes (em ha).

Quadro 3 – Potencial disponível de biomassa florestal. Fonte: fórum “Energias Renováveis em Portgal”

Tipo de floresta Quantidade [milhões de ton/ano]

Matos 0,6 Biomassa proveniente de áreas

ardidas 0,4

Ramos e Bicadas 1,0 Total 2,0

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III. Avaliação do máximo potencial eléctrico possível

Para a avaliação da contribuição da biomassa florestal na produção nacional de electricidade “verde”, pretende-se estimar a potência máxima eléctrica possível através do potencial disponível de biomassa florestal (Quadro 3).

Para esse efeito as considerações efectuadas foram:

� Poder Calorífico Inferior (PCI) de 15 MJ/kg;

� Disponibilidade (disp) de 7884 horas (90%);

� Rendimento eléctrico (ηe) típico duma central de combustão em grelha: 25%.

O cálculo da estimativa da potência e energia eléctrica máxima para o aproveitamento da biomassa florestal é realizado por intermédio da equação 1 e 2, respectivamente:

ee disp

PCIcombPOT η××= (1)

dispPOTeEe ×= (2)

Sendo: • comb: representa a quantidade de combustível, neste caso, o potencial disponível

de biomassa florestal; • POTe: representa a potência eléctrica; • Ee: representa a energia eléctrica.

Através das equações apresentadas, foi possível estimar o potencial máximo da energia eléctrica e potência a instalar mediante o aproveitamento de toda biomassa florestal:

� A potência máxima é de 264 MWe; � A energia máxima é de 2.1 TWh.

Caso fosse possível instalar a potência de 264 MWe com uma capacidade de produção de 2.1 TWh, a biomassa florestal representaria entre 8 a 9 % da electricidade renovável produzida em 2010, isto é, 3 a 4 % de toda a electricidade produzida.

IV. Avaliação dos resíduos florestais qualitativos disponíveis em cada distrito

O capítulo II faz referência à globalidade dos resíduos florestais possíveis, mas certos resíduos podem ser difícil de obter ou explorar. Assim, para uma análise da quantidade disponível dum recurso florestal com maior teor qualitativo, não foram considerados: as espécies de composição misto dominado, os matos, biomassa provenientes de áreas ardidas, carvalhos, castanheiros, outras folhosas e outras resinosas.

Foram considerados como resíduos florestais os topos e ramos dos pinheiros e eucaliptos resultantes do processamento dos toros, a casca do eucalipto que em alguns casos é retirada ainda no eucaliptal e, por fim, os ramos obtidos após a poda dos sobreiros e das azinheiras, o que corresponde a um total de 87% da área florestal.

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Dessa forma, pode-se avaliar o verdadeiro potencial de cada central termoeléctrica a biomassa, visto que as situações não consideradas podem ter efeito na redução do binómio eficiência / custo do funcionamento global da central, na redução da produção energética da central (baixo PCI) e/ou por acarretarem uma exploração difícil dos terrenos (maior custo).

Os resíduos considerados passaram a ser referenciados neste relatório por resíduos de alto valor qualitativo. Exploração do pinheiro

As árvores resultantes do corte final serão processadas pela indústria da madeira, ficando geralmente os resíduos na floresta. A massa de ramos e topos, MRT (kg verdes/árvore) com 57.6% de humidade [5], está correlacionada com o Diâmetro à Altura do Peito medido a 1.30m acima do solo (DAP), medido em cm, de acordo com a seguinte equação [6]:

604.1*463.0 DAPM RT = (3)

O DAP é estimado em função da idade da árvore, T (em anos), através da equação 4:

SITDAP *3.911*0.290 20.320 −+= (4)

Onde SI é o índice do local (SI = 3, para solos de baixa qualidade).

Para o caso de não serem realizados cortes intermédios durante o tempo de vida do povoamento, mas apenas um corte raso final aos 43 anos, o DAP é de 21.1 cm.

Em resultado, a quantidade total de resíduos é de 61.4 kg verdes/árvore em 43 anos. Ou seja, a produção média anual de resíduos de pinheiro é de 1.4 kg verdes/árvore, ou 0.6 kg secos/árvore.

Exploração do eucalipto

O eucalipto é essencialmente utilizado pela indústria da pasta de papel, onde cerca de metade dos toros dão entrada sem casca, sendo esta previamente retirada na floresta [7]. Foi considerado um tempo de rotação médio de 10 anos, ao fim do qual as árvores atingem um DAP de 12.5cm [5].

A correlação entre a massa de ramos e topos, MRT (kg verdes/árvore), é dada pela equação 5, sendo a humidade destes resíduos de 52.6% [5]:

756.1*1785.0 DAPM RT = (5)

E a massa da casca, MC (kg verdes/árvore), é dada através da equação 6, sendo a humidade destes resíduos de 59.5% [5]:

798.2*01432.0 DAPM C = (6)

Em resultado, a quantidade total de resíduos são os resultantes dos ramos e topo (cerca de 15.1 kg/árvore) e metade da massa da casca (16.8 kg/árvore), o que resulta num valor médio de 23.5 kg verdes/árvore em 10 anos. Ou seja, a produção média anual de resíduos de eucalipto é de 2.3 kg verdes/árvore, ou 1.1 kg secos/árvore.

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Exploração da azinheira e do sobreiro

Os resíduos da exploração da azinheira e do sobreiro constituem a lenha, a qual, ao contrário do que sucede com os resíduos florestais, é extremamente valorizada pela sua utilização em lareiras domésticas e também pelas pequenas indústrias de fabrico de produtos tradicionais.

A quantidade média de resíduos obtidos da exploração da azinheira e do sobreiro é 30 kg/árvore e a sua periodicidade é de 9 anos [8]. Ou seja, a produção média anual de resíduos é de 3.3 kg verdes/árvore, ou de 1.4 kg secos/árvore (considerando uma humidade semelhante à do pinheiro).

Estimativa dos resíduos

A densidade média para as diferentes espécies foi calculada através de uma média ponderada dos povoamentos puros e mistos dominantes presentes na 3ª revisão do Inventário Florestal Nacional (IFN) [9], representados nos quadros 4 e 5.

Classe de densidade

(N/ha)

< 300 300-599 600-899 900-1199 1200-1499 > 1500 Total Espécie Composição

ha ha ha ha ha ha ha

Puro 335.077 207.691 94.963 55.037 22.987 14.637 730.392

Misto dominante

158.177 59.849 14.169 11.199 2.283 0 245.677

Total 493.254 267.540 109.132 66.236 25.270 14.637 976.069 Pinheiro

Total (%) 51% 27% 11% 7% 3% 1% 100%

Puro 226.730 99.620 117.869 54.549 38.355 36.107 573.230

Misto dominante 57.250 22.591 12.450 4.194 0 2.434 98.919

Total 283.980 122.211 130.319 58.743 38.355 38.541 672.149 Eucalipto

Total (%) 42% 18% 19% 9% 6% 6% 100%

Quadro 4 – Classe de densidade do pinheiro e eucalipto para povoamentos puros e mistos dominantes.

Classe de densidade

(N/ha)

< 40 40-79 80-119 120-159 160-199 > 200 Total Espécie Composição

ha ha ha ha ha ha ha

Puro 122.553 185.254 141.293 75.466 38.494 29.242 592.302

Misto dominante 53.174 25.687 25.273 5.825 4.256 6.297 120.512

Total 175.727 210.941 166.566 81.291 42.750 35.539 712.814 Sobreiro

Total (%) 25% 30% 23% 11% 6% 5% 100%

Puro 243.550 99.621 28.773 2.416 3.878 9.015 387.253

Misto dominante 52.322 18.966 3.036 0 0 0 74.324

Total 295.872 118.587 31.809 2.416 3.878 9.015 461.577 Azinheira

Total (%) 64% 26% 7% 1% 1% 2% 100%

Quadro 5 – Classe de densidade do sobreiro e azinheira para povoamentos puros e mistos dominantes.

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A densidade média para as diferentes espécies está representada no quadro 6.

Resíduos (ton/ha/ano) Espécie IFN (N/ha) Base

húmida Base seca

Pinheiro 412 0,588 0,249 Eucalipto 545 1,279 0,575 Azinheira 41 0,138 0,058 Sobreiro 83 0,276 0,117

Total 2,281 0,999 Quadro 6 – Densidade e estimativa de resíduos por área e ano.

Os valores das densidades florestais para os diferentes povoamentos, calculados a partir dos dados do IFN, foram extrapolados para todo o País. A estimativa dos resíduos florestais anuais para cada região é apresentada no quadro 7, tendo sido calculada através dos valores do quadro 6 e das áreas dos diferentes povoamentos (quadro 2).

De acordo com as estimativas realizadas (quadro 6), a produção anual de resíduos em Portugal é 1.740 mil toneladas verdes, ou seja, 759 mil toneladas secas/ano. A distribuição dos resíduos indica que só os distritos de Castelo Branco e Santarém representam quase ¼ dos resíduos florestais gerados no país. Os resultados obtidos mostram que a produção de resíduos deve-se essencialmente à exploração do pinheiro e do eucalipto, as quais são responsáveis por cerca de 85% dos resíduos florestais.

O valor obtido para a biomassa florestal pode ser comparado com o valor definido no fórum “Energias Renováveis para Portugal”, o qual tem um desvio de 24%, que pode ser justificado pela não consideração da área florestal relativa a outras espécies (13%) e/ou o valor apresentado no fórum estar relacionado com biomassa de uma certa humidade ao contrário da biomassa em base seca calculada neste capítulo.

Para avaliação energética da biomassa florestal de alto valor qualitativo representa, tomaram-se as seguintes considerações na aplicação da utilização da equação 1 para o cálculo da potência máxima tendo em conta o recurso disponível:

� Poder Calorífico Inferior (PCI) de 20 MJ/kg, relativo a uma biomassa com boa qualidade energética e na base seca;

� Disponibilidade (disp) de 7884 horas (90%);

� Rendimento eléctrico (ηe) típico duma central de combustão em grelha: 25%.

O resultado obtido para a potência foi de 134 MWe e para a energia eléctrica de 1,1 TWh. Esses valores calculados dão uma ideia da potência e energia que, com uma exploração mais fácil e menos custosa, se consegue obter a nível nacional.

Pretende-se agora efectuar o mesmo raciocínio, desta vez por distrito e comparar os resultados obtidos com as potências eléctricas que se pretendem instalar mediante o lançamento do concurso.

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Região Base Pinheiro1 Eucalipto Azinheira Sobreiro Total húmida 33.200 88.647 0 0 121.847

Aveiro seca 14.077 39.829 0 0 53.906

húmida 7.898 54.420 22.332 25.348 109.998 Beja

seca 3.349 24.451 9.469 10.748 48.016 húmida 18.958 54.487 0 0 73.445

Braga seca 8.038 24.481 0 0 32.519

húmida 18.870 9.666 2.028 5.413 35.978 Bragança

seca 8.001 4.343 860 2.295 15.499 húmida 93.159 88.620 3.924 7.239 192.942

Castelo Branco seca 39.499 39.817 1.664 3.069 84.050

húmida 70.106 63.739 9 0 133.854 Coimbra

seca 29.725 28.638 4 0 58.367 húmida 6.337 31.285 20.311 40.112 98.045

Évora seca 2.687 14.057 8.612 17.008 42.363

húmida 8.772 36.603 1.178 11.000 57.553 Faro

seca 3.719 16.446 499 4.664 25.328 húmida 37.702 4.154 584 467 42.907

Guarda seca 15.986 1.866 248 198 18.298

húmida 62.821 46.899 56 38 109.813 Leiria

seca 26.636 21.072 24 16 47.748 húmida 5.370 36.313 0 451 42.133

Lisboa seca 2.277 16.315 0 191 18.783

húmida 11.258 57.393 9.875 38.496 117.022 Portalegre

seca 4.774 25.787 4.187 16.322 51.070 húmida 15.103 53.909 0 0 69.011

Porto seca 6.403 24.221 0 0 30.625

húmida 46.417 127.287 408 32.510 206.623 Santarém

seca 19.681 57.190 173 13.784 90.829 húmida 49.785 36.499 2.237 35.217 123.738

Setúbal seca 21.109 16.399 949 14.932 53.388

húmida 22.232 18.361 0 0 40.592 Viana do Castelo

seca 9.426 8.249 0 0 17.676 húmida 43.888 5.766 156 283 50.093

Vila Real seca 18.609 2.591 66 120 21.385

húmida 67.776 45.835 411 130 114.152 Viseu

seca 28.737 20.594 174 55 49.560 húmida 619.650 859.882 63.509 196.704 1.739.745

Total seca 262.732 386.346 26.928 83.402 759.408

1Inclui as espécies do pinheiro bravo e pinheiro manso. Quadro 7 – Resíduos anuais estimados, por espécie (ton./ano).

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V. Avaliação dos resíduos florestais na proximidade de cada central termoeléctrica lançada a concurso

Em Fevereiro de 2006, o Governo abriu 15 concursos para atribuição de capacidade de injecção de potência nas redes do sistema eléctrico de serviço público e pontos de recepção associados para energia eléctrica produzida em centrais termoeléctricas a biomassa florestal.

A potência máxima conjunta para os concursos, que abrangem 12 distritos, é de 100 MWe.

A selecção dos locais para as centrais termoeléctricas teve sobretudo em conta os seguintes critérios:

� Privilegiar zonas com elevada fitomassa;

� Privilegiar zonas com elevado risco estrutural de incêndio;

� Evitar zonas de sobre-posição com grandes “consumidores” de biomassa actuais e potenciais (centrais de cogeração e centrais térmicas que utilizam biomassa ou pontos de ligação já obtidos para futuras centrais a biomassa).

O distrito de Castelo Branco destaca-se com quatro concursos, logo seguido por Vila Real com três. Já os distritos de Viana do Castelo, Braga, Guarda e Viseu são abrangidos por dois concursos cada um. Com um concurso apenas surgem Bragança, Coimbra, Portalegre, Santarém, Beja e Faro.

Foram definidas duas tipologias de central:

� 2 a 5 MVA: orientadas para as dinâmicas locais;

� 10 a 11 MVA : orientados para grupos industriais.

Os futuros concorrentes serão classificados tendo em conta a caracterização do combustível que pretendem utilizar (só biomassa florestal ou biomassa + combustível de apoio), a solidez e sustentabilidade do fornecimento da unidade, a eficiência da tecnologia de produção da electricidade, o aproveitamento do calor e os contributos para a inovação e dinamização do sector.

Actualmente, existe em Portugal duas centrais termoeléctricas que utilizam biomassa florestal como principal combustível: a central da EDP de 9 MW, em Mortágua e a da Centroliva de 3 MW, em Vila Velha de Ródão.

De acordo com informação disponibilizada pela Direcção-geral de Geologia e Energia (DGGE), já existem outros processos em licenciamento para 140 MW, dessa forma, a potência a instalar até 2010 permitirá passar da meta de 150 para 250 MW, próximo do potencial máximo que é possível instalar (calculado no capítulo III).

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Figura 7 – Áreas prioritárias definidas pela DGGE para ligação à Rede Eléctrica Nacional (REN) de

centrais termoeléctricas a biomassa.

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N.º Lote

Distrito Potência (MVA)

1 Vila Real Entre 5 até 11 MVA

2 Vila Real Até 2 MVA

3 Viana do Castelo e Braga

Entre 5 até 10 MVA

4 Viana do Castelo e Braga

Até 5 MVA

5 Vila Real Entre 5 até 11 MVA

6 Bragança Até 2 MVA

7 Castelo Branco e Guarda

Até 2 MVA

8 Viseu e Guarda

Entre 5 até 10 MVA

9 Viseu Até 5 MVA

10 Castelo Branco

Entre 5 até 10 MVA

11 Castelo Branco e Coimbra

Até 3 MVA

12 Castelo Branco

Entre 5 até 10 MVA

13 Portalegre Entre 5 até 10 MVA

14 Santarém Até 6 MVA

15 Beja e Faro

Até 3 MVA

Figura 8 – Locais seleccionados para concurso para ligação de centrais termoeléctricas a biomassa à REN.

Tendo em conta a localização por distrito de cada central termoeléctrica (figura 8) e da biomassa florestal disponível em cada distrito (quadro 7) é possível quantificar se o recurso qualitativo disponível é suficiente para alimentar cada unidade de produção de electricidade. Para esse efeito, tomaram-se as seguintes considerações na aplicação da utilização da equação 1 para o cálculo da potência máxima tendo em conta o recurso disponível:

� Poder Calorífico Inferior (PCI) de 20 MJ/kg, relativo a uma biomassa com boa qualidade energética e na base seca;

� Disponibilidade (disp) de 7884 horas (90%);

� Rendimento eléctrico (ηe) típico duma central de combustão em grelha e duma central por gaseificação em ciclo combinado de 25 e 35%, respectivamente.

Os resultados obtidos encontram-se no quadro 8.

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Potmáx disponível (MWe) Fracção entre

Potmáx possível e Potmáx disponível

N.º de lotes Distrito

Capacidade instalada

(MVA)

Potmáx possível (MWe)

Resíduos florestais

disponíveis (ton_secas/ano)

Combustão em grelha (η=25%)

Gaseificação em ciclo

combinado (η=35%)

Combustão em grelha (η=25%)

Gaseificação em ciclo

combinado (η=35%)

1, 2 e 5 Vila Real 24 21,6 21.385 3,8 5,3 16% 24%

3 e 4 Viana do Castelo e

Braga 15 13,5 50.195 8,8 12,4 59% 92%

6 Bragança 2 1,8 15.499 2,7 3,8 137% 212% 7, 10, 11, 12 e Vila Velha de Ródão

Castelo Branco

26 23,25 84.050 14,8 20,7 57% 89%

7 e 8 Guarda 6 5,4 18.298 3,2 4,5 54% 84%

8, 9 e Mortágua Viseu 20 18 49.560 8,7 12,2 44% 68%

11 Coimbra 1,5 1,35 58.367 10,3 14,4 685% 1066%

13 Portalegre 10 9 51.070 9,0 12,6 90% 140%

14 Santarém 6 5,4 90.829 16,0 22,4 267% 415%

15 Beja e Faro 3 2,7 73.345 12,9 18,1 431% 670%

Quadro 8 – Avaliação da disponibilidade de resíduos florestais de alto valor qualitativo disponível para alimentação das centrais termoeléctricas em concurso a instalar em cada distrito.

Pela análise dos resultados obtidos apresentados no quadro 8, pode-se verificar que certas centrais termoeléctricas terão dificuldade em obter biomassa florestal (valores a vermelho).

Situações críticas analisadas:

Grau A – O caso mais crítico é o distrito de Vila Real – lotes 1, 2 e 5. Para esse distrito é possível para ligação à REN 21,6 MWe (24 MVA) de potência, contudo, os resíduos florestais disponíveis de alto valor qualitativo possibilitam uma potência entre 3,8 e 5,3 MWe, ou seja, o recurso disponível representa apenas 16 a 24 % do que seria desejável.

Grau B – Numa situação menos crítica mas ainda bastante preocupante está o distrito de Viseu – lotes 8 e 9 – com um recurso disponível a representar 44 a 84% do desejável.

Grau C – Os distritos de Viana de Castelo e Braga, Castelo Branco e Guarda – lotes 3, 4, 7, 8, 10, 11 e 12 – também se encontram numa situação crítica, mas menos preocupante, com valores a representar de 54 a 92% do desejável.

Grau D – Numa situação menos crítica está o distrito de Portalegre – lote 13 – com um valor, para rendimentos mais baixos, a 90% do desejável.

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VI. Conclusões A biomassa florestal potencial pode permitir a instalação duma potência de 264 MWe com uma capacidade de produção de 2.1 TWh, que poderá representar entre 8 a 9 % da electricidade renovável produzida em 2010, isto é, 3 a 4 % de toda a electricidade produzida.

Contudo, nem toda a biomassa florestal é de fácil exploração, descontando os resíduos florestais de exploração difícil e custosa, a potência máxima para 134 MWe e a energia eléctrica para 1,1 TWh.

Através duma análise local (a nível de distrito), chega-se à conclusão que certas centrais termoeléctricas em concurso terão dificuldade em obter biomassa florestal de baixo custo e fácil exploração. Os distritos com centrais termoeléctricas abrangidas a essa problemática que merecem maior preocupação são: Vila Real e Viseu.

As centrais termoeléctricas 1, 2 e 5, relativos ao distrito de Vila Real, vão encontrar difíceis problemas para a obtenção da energia florestal desejável ao seu funcionamento. Em termos estimativos, o aproveitamento de todo e qualquer recurso de biomassa florestal só permitirá obter o máximo de 50% do recurso desejável. Especulando sobre o funcionamento dessas centrais, diria que vão ser providos com a tecnologia de gaseificação (pelo menos as 2 centrais de maior dimensão - lote 1 e 5), vão aproveitar toda e qualquer biomassa florestal disponível, vão requerer a uma energia de apoio até 40% e possivelmente irão realizar uma gestão de devastação. Devido à eventual política de devastação para nutrirem energeticamente as centrais, será necessária uma fiscalização apertada para avaliar a condução da exploração da biomassa florestal.

As centrais termoeléctricas 8 e 9, relativos ao distrito de Viseu, vão ter de lidar com alguns problemas a nível de recurso disponível. Esse facto também se deve à situação de já se alojar uma outra central nesse mesmo distrito – a central de Mortágua. Especulando sobre o funcionamento dessas centrais, diria que pelo menos a maior central vai ser provida com a tecnologia de gaseificação, vão aproveitar toda e qualquer biomassa florestal disponível e/ou vão requerer uma certa energia de apoio, até 30%.

As centrais termoeléctricas 3, 4, 7, 8, 10, 11 e 12, poderão ter alguns problemas a nível de recurso disponível. Para os evitar, as centrais deverão funcionar com altos rendimentos eléctricos, possivelmente através da tecnologia de gaseificação, e aproveitar bem todos os resíduos florestais disponíveis.

Caso a central termoeléctrica 13, relativa ao distrito de Portalegre, funcionar com a tecnologia de gaseificação, não terá problemas relativamente ao aproveitamento dos resíduos florestais disponíveis.

As centrais termoeléctricas de Bragança (lote 6), Coimbra (lote 11), Santarém (lote 14) e Beja-Faro (lote 15), não deverão encontrar problemas relativamente à biomassa florestal disponível, o que possivelmente os relaciona com o facto de serem as centrais em concurso de maior viabilidade económica.

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VII. Referências [1] Direcção Geral dos Recursos Florestais: www.dgrf.min-agricultura.pt

[2] Portal das Energias Renováveis: www.energiasrenovaveis.com

[3] ADENE/INETI (2001). Fórum Energias Renováveis em Portugal. Relatório Síntese. Ed. ADENE/INETI, Lisboa

[4] Direcção Geral de geologia e Energia (2006). Estratégia Nacional para a Energia - a criação duma rede de centrais a biomassa dedicadas.

[4] Dias, J. (2002). Utilização da biomassa: avaliação dos resíduos e utilização de pellets em caldeiras doméstica. Instituto Superior Técnico de Lisboa, Lisboa

[5] Fernandes, P. (1998). Residual biomass in the Vale do Sousa region, Northern Portugal. Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Vila Real

[6] Silva, R., Tavares, M., Páscoa, F. (1991). Residual biomass of forest stands – Pinus pinaster Ait. and Eucalyptus globulus Labill, Actas nº 5, 10º Congresso Florestal Mundial, Paris. Citado em CBE (1993) e Fernandes (1998)

[7] Associação Nacional da Indústria Papeleira: www.celpa.pt. Boletim Estatístico 2000

[8] Gil, L. (1998). Cortiça. Produção, Tecnologia e Aplicação, Ed. INETI, Lisboa

[9] Direcção Geral das Florestas (2001). Inventário Florestal Nacional – 3ª revisão