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PRATICAS PEDAGOGICAS NO ENSINO SUPERIOR: ESTAGIO
INTERDISCIPLINAR,FORMAÇÃO POR COMPETÊNCIA E CULTURA
DIGITAL
O artigo discute o ensinar, o aprender e avaliar com metodologias inseridas na cultura
digital. Selecionamos três práticas de docentes universitários em que a reflexão, o
trabalho colaborativo e a expressão criadora são eixos para que a aprendizagem ocorra.
As autoras analisam três experiências exitosas em que elementos da cultura digital estão
presentes, discutindo a presença do portfólio digital, da construção colaborativa em rede
e da criação de animações em práticas docentes em cursos de graduação e de pós-
graduação na área da saúde, nas licenciaturas, serviço social e gestão de negócios. O
referencial teórico se baseia em autores como Eisner, Freire, Fullan & Hargreaves e
Vygotsky dentre outros, e nas pesquisas das autoras. As tecnologias digitais integradas
às práticas apresentadas no artigo são de acesso gratuito. Os resultados encontrados nas
práticas relatadas sugerem que a presença das tecnologias digitais nos processos de
ensino e aprendizagem baseadas em critérios negociados a priori de maneira ativa e
participativa abrem espaço para o repensar não apenas das aulas mas da construção do
planejamento e no currículo delineado pelo curso. Outro dado levantado é que ensinar e
aprender na cultura digital não necessariamente precisa de grandes investimentos em
tecnologias digitais de informação e comunicação para tornar possível a construção
colaborativa de um processo de aprendizagem significativa. Ao trazer o relato das três
experiências realizadas no Ensino Superior para discutir o ensinar, aprender e avaliar
com metodologias ativas inseridas na cultura digital, espera-se contribuir com as
reflexões com relação à importância da integração das tecnologias digitais às práticas
pedagógicas de maneira significativa, crítica e que esteja a serviço da promoção da
aprendizagem.
Palavras-Chave: Ensino Superior, Metodologias Ativas, Cultura Digital
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
3739ISSN 2177-336X
PRÁTICAS DOCENTES NA CULTURA DIGITAL EM INSTITUIÇÕES DE
EDUCAÇÃO SUPERIOR
Martha Prata-Linhares (UFTM)
Cristina Zukowsky-Tavares (UNASP)
Resumo
O artigo discute o ensinar, o aprender e avaliar com metodologias inseridas na cultura
digital. Selecionamos três práticas de docentes universitários em que a reflexão, o
trabalho colaborativo e a expressão criadora são eixos para que a aprendizagem ocorra.
O artigo discute a presença do portfólio digital, da construção colaborativa em rede e da
criação de animações nas práticas docentes. O referencial teórico se baseia em autores
como Eisner, Fullan & Hargreaves e Vygotsky dentre outros, e nas pesquisas das
autoras. As tecnologias digitais integradas às práticas apresentadas no artigo são de
acesso gratuito. Ao trazer o relato das três experiências realizadas no Ensino Superior
para discutir o ensinar, aprender e avaliar com metodologias ativas inseridas na cultura
digital, esperamos contribuir com as reflexões com relação à integração das tecnologias
digitais às práticas pedagógicas.
Palavras-chave: Ensino Superior. Metodologias ativas. Cultura digital.
1 INTRODUÇÃO
A presença das tecnologias digitais nos ambientes de aprendizagem sejam eles
em salas de aula virtuais ou presenciais em muitos casos ainda é um desafio aos
professores. Os motivos são diversos passando por dificuldades com a infra estrutura
das instituições de ensino superior (IES), currículos rígidos, ou até mesmo pela ausência
de formação para integrar as tecnologias de informação e comunicação (TIC) em suas
práticas ao ensinar e avaliar.
A intenção desse artigo é discutir experiências exitosas em que elementos da
cultura digital estejam presentes. Assim, trazemos três relatos: o primeiro é a respeito da
construção de um e-portfólio no processo de estudo e vivência dos saberes docentes
com pós-graduandos na área da saúde tendo como eixos norteadores a reflexão, criação
e a inserção na cultura digital; o segundo relato trata da adoção da construção do
conhecimento com a utilização do trabalho colaborativo em uma das disciplinas de um
curso Lato Sensu e o terceiro é a criação de animações de massinha de modelar com
alunos de cursos de Licenciaturas e do Serviço Social com a perspectiva da presença da
expressão criadora como mola propulsora da aprendizagem.
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2 O e-portfolio no processo de construção de saberes docentes
O cenário desse relato foi a disciplina de Formação Didático Pedagógica em
Saúde ministrada pelo Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em Saúde –
CEDESS da Universidade Federal de São Paulo, que tem como objetivo a preparação
dos pós-graduandos para o exercício da função docente. A disciplina propõe uma
reflexão crítica do papel da docência no ensino da saúde em consonância com o atual
contexto de políticas de saúde e educação. Com este objetivo, pretende que os pós-
graduandos tenham uma visão ética e humanística do relacionamento professor-aluno
desenvolvendo atributos para que o professor possa se engajar com novas práticas
educacionais no contexto do atual cenário político-educacional. As estratégias de
ensino–aprendizagem utilizadas compreendem uma diversidade de práticas como mapa
conceitual, mesa redonda, trabalho em pequenos grupos, estudo de casos, exposição
dialogada e nesse relato o destaque foi o e-portfólio.
Optamos por descrever e refletir sobre essa prática uma vez que a mesma se
mostra como uma alternativa para a construção de saberes docentes e foi utilizada pela
pesquisadora como principal ferramenta de formação no período de dois anos com os
pós graduandos em saúde. Nesse relato em especial o trabalho foi construído com um
grupo de 30 pós-graduandos de diferentes áreas da saúde.
O processo iniciou com uma sensibilização introdutória e caracterização da
estratégia de ensino e avaliação. No entendimento de Belair e Van Nieuwenhoven
(2012) o desencadear de processos formativos na área educacional com o portfolio
reflexivo podem se reportar a duas funções distintas: a utilização do portfolio para fins
de certificação ou mesmo de promoção profissional e no contexto de formação ou
desenvolvimento profissional. No caso do relato em curso optamos pela segunda
função. O trabalho reflexivo contínuo com o portfólio pode ser construído acionando
plataformas físicas ou digitais de interação, acionando trabalhos individuais ou
coletivos. Nossa opção nessa experiência foi com o trabalho coletivo no cenário virtual.
O e-portfolio foi utilizado como uma ferramenta agregadora de experiências e
vivências com diferentes estratégias de ensino no ambiente digital. Um processo crítico
- reflexivo fundamentou cada documentação processual, registrando como aconteceu a
apropriação de competências pedagógicas/docentes.
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Tudo começou no primeiro dentre dez encontros que completariam 60 horas de
atividades presenciais e à distância na elaboração do e portfolio coletivo de formação. À
princípio a partir do conceito de portfolio foram negociadas coletivamente a estrutura
dos registros, e acordados os critérios de avaliação. Os critérios apontaram a
organização em torno dos itens estabelecidos fomentando produções de qualidade com
o devido fundamento nas reflexões e a construção processual para alimentar o diálogo e
favorecer o feedback. A primeira escrita foi realizada pelos pós graduandos destacando
fragmentos da sua história de vida: “quem eu sou, minhas escolhas profissionais e de
pesquisa, porque estou aqui e minhas expectativas com relação ao curso de formação
didático pedagógica”. As autobiografias foram incorporadas na introdução do e
portfolio o que já estabelecia um vínculo e pertencimento do pós graduando no espaço
em que poderiam exercer protagonismo e autoria. Cada um dos dez encontros
presenciais priorizou saberes da docência em diálogo com os grupos destacando
temáticas como: a constituição do ser docente em saúde, o planejamento educacional, o
currículo e suas interfaces, teorias da aprendizagem e ambientes colaborativos on line, a
ética em sala de aula, o papel das estratégias de ensino, das tecnologias de informação e
comunicação e a avaliação educacional. O processo de construção do e - portfólio
compreendeu também uma avaliação parcial e pontual em um dos encontros por meio
da ferramenta Grupo de Verbalização e Grupo de Observação (G.V.G.O.) em que
verbalizaram suas estratégias de construção do trabalho coletivo, acrescida de uma
avaliação interpares e um registro conclusivo do processo de formação docente.
O e-portfolio facilita a interação entre estudantes e professores, redimensionando
tempos e espaços, permitindo a inclusão de uma nova forma de conceber e agir ao
ensinar tendo em vista o objeto do conhecimento que se tem em foco. Atualmente, o
ensino e a aprendizagem não estão circunscritos ao trabalho dentro de determinado
espaço físico, nem restritos apenas a uma única forma de registro. A interação face a
face pode ser combinada com a educação à distância e provocar mudanças que
abrangem os agentes educacionais no Ensino Superior. Isso implica repensar
inicialmente o pequeno espaço da sala de aula, presencial ou à distância, acionando
variadas linguagens. Ensinar, aprender e avaliar no espaço digital implica na construção
, avaliação e expansão de interfaces em ambientes digitais, páginas da web, em que os
participantes seguem pesquisando textos, vídeos, imagens, áudios, recebendo e
enviando novas mensagens, sintetizando aprendizagens, aprofundando dilemas e
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caminhos para a abordagem e resoluções de problemas, discutindo questões em fóruns
ou em salas de aula virtuais (LOUREIRO e ZUKOWSKY -TAVARES) O e-portfolio
possibilitou respostas a novos desafios para o ensinar e aprender de forma ativa e
contextualizada com a prática docente ou profissional em diferentes áreas do
conhecimento.
Ao escolher o Blogguer (Figura 1) como o formato de interação on line para o e-
portfolio dos cinco grupos da turma (foi definido que teríamos um endereço de cada
“blogfólio” no formato de um hiperlink que foi acessado apenas pelos integrantes da
turma e seus professores). Tínhamos acordado também que todos os pós graduandos em
formação além de colaborarem com os seus registros reflexivos deveriam visitar os e-
portfolios de outros colegas e tecer comentários.
Figura 1: Página introdutória do e - portfolio de um dos grupos no Blogger
É interessante observar como uma equipe descreve os bastidores de suas ações
de formação que denominaram como “making off das ações”. Falam do processo e
percurso de aprendizagem que os acompanhou:
“Desde o primeiro dia de curso, nos reunimos e fizemos o seguinte acordo: TODOS NÓS
IREMOS NOS DEDICAR E PARTICIPAR DAS ATIVIDADES ATÉ O FIM! Foi uma das
frases que marcou cada um de nós e desde então tivemos a certeza que chegaríamos ao final
desta trajetória com louvor. Inicialmente criamos duas formas de comunicação em grupo:
email e whatsapp (A Figura 3 exemplifica esse tipo de diálogo intermediário) Nos dividimos e
cada integrante ficou responsável por reunir todos os “resumos” e formar um único texto que
agrupasse a opinião de todos. Desta forma, pudemos sempre somar informações. Cada um de
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nós tem um perfil: mais descritivo, mais reflexivo, mais teórico...enfim! Concluímos que, o
fato de cada integrante fazer o seu próprio “resumo” foi uma experiência bastante rica. Não
podemos deixar de dizer que nós nos consideramos o grupo mais heterogêneo e mais
atarefado!! Temos horários completamente diferentes, mas acima de tudo, NÃO TEMOS
HORÁRIOS LIVRES. As nossas diferenças se complementaram, a falta de tempo de todos
motivou um ao outro para que tudo desse certo!” (Grupo 3)
Já outra equipe destaca:
“A comunicação constante foi muito benéfica, pois entre nós nos incentivávamos, discutíamos,
tirávamos dúvidas, oferecíamos diferentes pontos de vista e surgiam novas ideias” (Grupo 5).
O envolvimento continuo com o objeto da aprendizagem, a possibilidade de
fazer uso do e portfolio para construção das aprendizagens e vivenciar um modelo de
avaliação alternativo baseado nos critérios negociados a priori de maneira ativa e
participativa abre um espaço para o repensar não apenas das aulas mas da construção do
planejamento no qual se insere e no currículo delineado pelo curso a fim de que se
estabeleça coerência no desenrolar das ações:
A construção dos processos ensino-aprendizagem e avaliação em
ambientes digitais representam um forte estímulo para repensar o
currículo como um todo e o sistema de avaliação que se deseja tendo
em vista prosseguir com a utilização de metodologias mais ativas e
problematizadoras no ensino. Dessa forma “novas metas educacionais
continuarão a emergir, e o processo de crítica e reflexão sobre o que é
importante aprender, e como isso pode ser avaliado autenticamente,
precisa ser institucionalizado e curricularmente planejado”(
RIDGWAY, McCUSKER. E PEAD, 2004, p.4)
Os estudantes registram debates e construções ocorridas em classe e ampliam o
referencial de leitura e estudo (Figura 2) sistematizando-os com metáforas, imagens,
pesquisas, gráficos, mapas, links, vídeos, o que dinamiza o ensinar, aprender e avaliar.
Figura 2: Registros da aula sistematizados no e portfolio e expandidos com
outros referenciais de estudo.
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Um dos grupos concluiu os registros no e-portfolio relatando:
Diante do que nos foi apresentado durante essas duas semanas de ensino inovador em
pedagogia e saúde, pudemos repensar os velhos modelos aos quais estávamos habituados e
perceber um horizonte que se abre para avanços, sem repudiar os paradigmas que nos
conduziram até aqui. (Grupo 4).
Buscando romper com modelos tradicionais de interação professor aluno na
construção e avaliação de aprendizagens podemos ressaltar “ a legitimidade de alternativas
mais abertas e mais dinâmicas como é o caso da implantação de portfolios reflexivos” (SÁ-
CHAVES, p.19, 2004)
Os pós-graduandos em saúde se inseriram na cultura digital de forma criativa e
reflexiva. Ressaltamos que o e- portfolio, permeado pelo trabalho colaborativo favoreceu a
construção de saberes docentes, dentre eles a própria capacidade de avaliar e redirecionar
ações em percurso.
3 Construção de conhecimento de forma colaborativa: acionando metodologias
ativas pelo uso da internet
Atualmente o ensino superior passa por uma grande turbulência no que tange às
questões de utilização de metodologias ativas para propiciar uma aprendizagem
significativa. Este relato traz uma experiência em programa de pós-graduação Lato
Sensu de um curso em Gestão de Negócios, em uma instituição particular na cidade de
São Paulo. Esse curso se desenvolve no período noturno, com profissionais com no
mínimo três anos de experiência profissional.
O currículo do curso é novo e está em andamento há dois anos, é um processo
que está em construção. A proposta do curso é que os alunos sejam co-construtores do
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currículo e do processo ensino aprendizagem em cada disciplina. Nessa perspectiva
procura-se trazer o trabalho colaborativo para a sala de aula, com aulas que façam
sentido para o seu dia a dia de trabalho e que eles possam construir novos
conhecimentos a partir dos já instalados, de forma compartilhada e colaborativa.
Entendemos por trabalho colaborativo sendo aqueles que, segundo Parrilla
(1996, apud ARNAIZ, HERRERO, GARRIDO e DEHARO,1999) todos os
componentes de um grupo compartilham as decisões tomadas, e são igualmente
responsáveis pela qualidade do que é produzido conjuntamente, conforme suas,
possibilidades e interesses.
Dessa forma no processo colaborativo, ao trabalharem juntos, os membros de
um grupo se apoiam, visando alcançar os objetivos comuns, que foram coletivamente
negociados, estabelecendo relações de liderança compartilhada, confiança mútua e
corresponsabilidade pela condução das ações.
Segundo a literatura, Vygotsky (1989) é um dos autores que embasa um grande
número de estudos voltados para o trabalho colaborativo nas escolas. Vygotsky
argumenta que esse tipo de atividade realizada de forma conjunta propicia vantagens
diferenciadas que não estão disponíveis na aprendizagem individualizada. Aqueles que
dela participam alteram seu aprendizado, modificando seus processos de pensamento,
pois são mediados pelos relacionamentos com os demais membros do grupo, gerando
novos modelos referenciais que servirão de base para novos comportamentos,
raciocínios e para os significados que damos às coisas e pessoas.
Para os estudiosos Alvares e Del Rio (1996) aquele que aprende toma
emprestado de forma gradativa, os modelos de seus interlocutores mais capacitados
podendo dessa forma ultrapassar seus limites.
Sendo assim o processo de construção conjunta de um novo conhecimento ou
ampliação de um já existente aumenta o processo de motivação, comprometimento, de
construção de significado e ressignificação, contribuindo para a aprendizagem dos
alunos e para minimizar a reprovação.
Entretanto para que essa construção colaborativa ocorra existe a necessidade de
uma transformação na forma de atuação dos professores, eles devem sair do centro do
processo de aprendizagem para atuarem como orientadores, mediadores desse processo.
Segundo Norwicks e Daniel (1997) esses profissionais enfrentarão dificuldades a partir
de dois parâmetros principais complementares e inter relacionados: a) engajamento
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ativo, que se refere à forma como os professores propiciarão as oportunidades de
aprendizagem de qualidade; b) nível de tolerância: diz respeito aos limites dos desafios
que os professores conseguem enfrentar.
Fullan e Hargreves (2000, p.xi) defendem a conciliação de dois tipos de
atividades: as individuais e as grupais, pois uma sem a outra limita o potencial trabalho
dos professores e alunos, é necessário que haja uma interação entre ambas as
modalidades.
Voltando à experiência no programa de pós-graduação ressaltamos que um dos
propósitos é trazer as metodologias ativas para os processos de aprendizagem dos
alunos. Assim, esse programa tem em sua proposta que os alunos sejam protagonistas
de seu processo de aprendizagem e que os professores atuem como mediadores do
processo de aprendizagem, organizando os temas juntamente com os alunos, e
selecionando os tópicos essenciais que devem estar nos processos de pesquisa sobre os
temas selecionados conjuntamente e presentes nos painéis, seminários, e outros.
Essa experiência ocorreu numa das disciplinas do programa, na qual todo o
processo de construção da dinâmica do componente curricular foi realizado em grupo
tendo o professor como o mediador do processo de aprendizagem, com atividades
coletivas e individuais selecionadas e programadas conjuntamente.
O curso tem uma proposta de ensino híbrido e as atividades presenciais são o
espaço em que se planeja as etapas da pesquisa dos temas a serem trabalhados. O
professor orienta o processo tanto nas atividades presenciais como nas atividades à
distância. Durante o percurso do curso os grupos apresentam seus temas para os demais
colegas, para receber a contribuição de todos. Ao final da disciplina os grupos
apresentam seu trabalho, com analises críticas, comparativas e gerando cenários
possíveis para um futuro desdobramento, além de construírem um artigo de forma
coletiva.
Esses artigos são compartilhados com todos os grupos, encaminhados para a
revista da instituição para serem selecionados e futuramente publicados.
Para a realização desse trabalho os alunos utilizam tecnologias digitais presentes
na internet, na web 2.0 como TWIKI, e Google DRIVE. É uma maneira de ensinar e
aprender que não há necessidade de grandes investimentos em tecnologias digitais de
informação e comunicação para tornar possível a construção colaborativa de um
processo de aprendizagem significativa.
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4 A criação de animações de massinha de modelar com alunos de cursos de
Licenciaturas e do Serviço Social: um processo que tem a expressão criadora como
mola propulsora.
Um dos desafios dos docentes que lecionam para as turmas dos cursos de
Licenciatura e do Serviço Social é buscar a aprendizagem de seus alunos com práticas
que vençam a provocação do cansaço que muitas vezes supera o interesse dos alunos
que realizam esses cursos. As atividades dos cursos são desenvolvidas no período
noturno e seus alunos em grande parte são trabalhadores que realizam seus cursos
depois de uma jornada de trabalho.
Ao perguntar para um grupo de alunos da disciplina “Tecnologias de informação
e comunicação na aprendizagem de Química” de uma universidade pública a respeito de
como eles gostariam que fosse o espaço da sala de aula de seu curso eles responderam
que gostariam que fosse “um espaço diferente”, que “o professor tem que ser diferente”,
que gostariam de ter “mais liberdade”, “mais conforto na sala de aula”, “internet o
tempo todo”, “tecnologias digitais disponíveis e ao alcance de todos” e “trabalho em
grupo”. Ao serem indagados sobre o que seria esse “professor diferente” eles
explicaram que era o professor que saía da frente da sala de aula e o espaço diferente
estava relacionado a não ser uma sala de aula com carteiras enfileiradas, mas sim com
algumas estações de trabalho e mesas para trabalhos em grupo. A liberdade estava
relacionada a ser livre na sala de aula para locomover e aprender de maneira diferente.
Quando trabalhamos trazendo a criação de animações para fazer parte das
aprendizagens dos alunos percebemos que o espaço da sala de aula se aproxima da
perspectiva apontada pelos estudantes da Licenciatura em Química. A aproximação,
além de estar na presença das tecnologias de informação e comunicação e de um
docente que sai da frente da sala de aula e vai ao encontro dos alunos que trabalham ora
em grupos ora individualmente em carteiras não enfileiradas, está também na palavra
liberdade.
O sentido que damos à palavra liberdade é o de permitir e incentivar no
estudante a curiosidade em detrimento à memorização mecânica do ensino dos
conteúdos, não tolher a sua criação e “capacidade de aventurar-se” (FREIRE, p. 24,
1998).
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Na expressão de Harrison & Hummel (2010) as animações são uma
apresentação rápida de uma sequência de imagens estáticas que criam a ilusão de
movimento (Fig. 3). Elas podem ser uma maneira criativa e divertida de contar estórias
e contribuir para a construção de conhecimentos. De acordo com Silva (2007) temos
registro da presença dessa linguagem como recurso para abordar temas da área de saúde
já na segunda década do século XX com o considerado pai da animação Winsor McCay
no vídeo de 6 minutos, “A história de um mosquito” em que conta a história de um
mosquito gigante que atormenta um homem dormindo. Porém da época de McCay para
os dias de hoje muita coisa mudou e a chegada das tecnologias digitais de informação e
comunicação transformaram a nossa realidade e cada vez mais estamos imersos em uma
cultura digital. Assim, além de assistirmos à filmes em salas de cinema, também temos
acesso às essas produções em praticamente qualquer lugar com os dispositivos móveis,
por exemplo. Porém, o mais importante é que não somente temos a possibilidade de
acessar esses conteúdos digitais, mas também podemos ser criadores de conteúdos
digitais.
Em pesquisas recentes Prata-Linhares, Bossler, Caldeira (2014,2015) mostraram
que a experiência na Universidade Federal do Triângulo Mineiro com a criação de
animações proporciona um processo de aprendizagem em que a criatividade e a
ludicidade estão presentes junto a um processo de re elaboração de conhecimento.
Afirmam que enquanto os alunos criam histórias, modelam os bonecos, imaginam os
cenários e os movimentos em cena, os cursistas “expressam-se quanto aos conceitos e
representações da realidade, podendo revelar incertezas e enganos relacionados aos
conteúdos e conhecimentos” (p. 80, 2014). Há uma promoção do diálogo em um
processo de reflexão e análise crítica.
Figura 3: Animação Los Hermanos, Curso do Serviço Social UFTM, 2013
Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=pL4nnkvrkEU
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Sendo uma linguagem artística, a animação está inserida no campo das artes e as
funções cognitivas do seu processo de criação também podem ser ressaltadas nas
palavras de Einsner (2002, p 9) ao afirmar que “As funções cognitivas da arte incluem
as mais sofisticadas formas de soluções de problemas imagináveis através dos mais
nobres vôos da imaginação” .
Um aspecto a ser ressaltado é que apesar de ser uma prática que necessita das
tecnologias digitais de informação e comunicação, a criação de animações pode ser
realizada fora de contexto urbano, com dispositivos móveis digitais para tirar fotografias
(celular ou máquinas fotográficas digitais) e acesso a um computador para a edição do
filme. A experiência se mostrou exitosa mesmo em ambientes com poucos recursos
tecnológicos (PRATA-LINHARES, BOSSLER, CALDEIRA, 2014,2015).
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
As práticas relatadas têm aspectos relevantes para serem pensados ao planejar
metodologias para aprendizagem e avaliação em cursos do ensino superior: o trabalho
colaborativo, a reflexão, a expressão criadora e a inserção da cultura digital. Outro dado
que pensamos ser importante é que as tecnologias digitais integradas nas práticas
apresentadas são de acesso gratuito, bastando somente ter internet disponível.
Assim, ao trazer o relato de três experiências para discutir o ensinar, aprender e
avaliar com metodologias ativas inseridas na cultura digital, esperamos contribuir com
reflexões com relação à integração das tecnologias digitais nas práticas pedagógicas.
Apoio financeiro: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq).
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DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIA PROFISSIONAL EM
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU: UMA EXPERIÊNCIA
INOVADORA
CECILIA GAETA
Cecilia Gaeta,
Marcos T Masetto
Resumo.
Em tempos de intensos questionamentos sobre a formação profissional no ensino
superior, nos propomos, neste texto, a apresentar e discutir uma experiência pedagógica
diferenciada: a criação e a realização de um curso de pós-graduação lato sensu cujo
currículo se estruturou para o desenvolvimento profissional por competência. A
elaboração do curso buscou responder ao questionamento sobre como desenvolver uma
formação eficaz que atendesse às expectativas de especialização e de atuação
competente na área específica de “Administração e Organização de Eventos”.
Pretendiamos também, superar duas modalidades de ensino: (i) centrado na transmissão
de conteúdo específico ilustrado por algumas visitas técnicas e estudos de casos; ou (ii)
organizado com algumas atividades isoladas/pontuais de desenvolvimento de
competências. Neste contexto elaboramos uma proposta baseada no “currículo por
competência”, estruturada em dois eixos: (i) construção de acervo de conhecimento
específico utilizando metodologias inovadoras; (2) vivências em situações de
aprendizagem profissionais. Justifica-se esta opção a partir de uma concepção de
competência que assumimos e que foi refinada a partir de estudos bibliográficos de
Sacristan, Perrenoud, Le Boterf, Roldão, Santos, Fleury e Zabalza para definir “quem é
o profissional competente e o que diferencia suas ações”. Em nosso entender o conceito
de competência está intrinsecamente relacionado à ação eficaz: um profissional
competente mobiliza, critica e sinergicamente, recursos que permitam a eficacia em
uma intervenção.
Ao final da experiência ficamos gratificados ao constatar a viabilidade de
desenvolver processos educacionais baseados em situações de aprendizagem
didaticamente organizadas para o desenvolvimento de competencias na pós-graduação
lato sensu. Verificamos também a eficiência de aprendizagem e da preparaçao
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profissional ao envolver os alunos paulatinamente em situações reais e proprias de sua
area de atuação.
Palavras chaves: desenvolvimento de competência, pós-graduação lato sensu,
formação de profissionais.
Introdução.
No contexto de mudança que estamos vivenciando, muito se tem discutido sobre
a formação de profissionais no ensino superior para que possam atender às demandas do
mundo atual. Inserido nesta discussão estão os cursos de pós-graduação lato sensu que
têm em seu propósito atualizar e especializar profissionais para atuação qualificada no
mercado de trabalho. A partir deste panorama consideramos pertinente apresentar e
refletir sobre uma experiência educacional diferenciada: o planejamento e implantação
de um curso de pós-graduação lato sensu com o objetivo de especializar profissionais do
trade turístico especializado na área de eventos.
Este projeto originou-se dos recorrentes comentários de alunos de que, ao final
do curso anteriormente ofertado, se sentiam despreparados para uma atuação
competente. Nosso primeiro diagnóstico, ao analisar o currículo do curso de
especialização que vinha sendo oferecido, apontou a estrutura curricular disciplinar e a
metodologia de transmissão de informações e estudos de casos com professores
“profissionais da área” como insuficiente para atender `as expectativas dos alunos
Apresentou-se então o desafio que norteou nossa pesquisa: como reorganizar o
currículo de um curso de pós-graduação lato sensu para profissionais da área de Eventos
que especializasse para a atuação competente?
Buscamos neste projeto, também superar duas modalidades de ensino que
constatamos em pesquisas anteriores apresentaram-se frágeis em seus resultados: (i) um
processo de ensino centrado na transmissão de conteúdo específico ilustrado por
algumas visitas técnicas e estudos de casos; e (ii) um curso organizado com algumas
atividades isoladas/pontuais de desenvolvimento de competências, sem integração com
o currículo.
Baseamo-nos em um referencial epistemológico que sustentasse um novo
paradigma curricular que se adaptasse às necessidades de especialização de um curso de
pós-graduação lato sensu. Optamos por um currículo que privilegiasse o
desenvolvimento de competência profissional ao longo do curso a partir de situações de
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aprendizagem específicas da área de eventos. Como metodologia optamos pelo estudo
por projetos.
Neste contexto definimos o seguinte objetivo: Construir e implantar de forma
participativa, um currículo de especialização focado no desenvolvimento de
competência profissional na área de Eventos.
Antes de apresentarmos o projeto, sentimos necessidade de discutir o conceito
de competência que balizou nossa ação. Por se tratar de um termo passível de muitas
interpretações, consideramos válida a reflexão sobre “agir com competência” que
construímos e adotamos como norteador de nosso projeto.
Retomando o conceito de competência.
A discussão e aplicação do “ensino por competências” se iniciou na
década de 80 nos países anglo-saxões, se difundiu pela França e daí para os demais
países. Surgiu em um contexto de mudanças de paradigmas educacionais e culturais, e
apresentou-se como uma alternativa ao ensino focado na transmissão do conhecimento e
da fragmentação dos conteúdos, que prepara os estudantes para prestar exames e não
para enfrentar situações reais do mundo de trabalho contemporâneo.
Pozo (1998) defende que para fazer frente à realidade da rápida disseminação da
informação presente no mundo contemporâneo é preciso tornar os alunos, pessoas
capazes de enfrentar situações e contextos que possuem grande velocidade de mudança.
No Brasil esta tendência aporta na década de 1990, influenciada principalmente
pelas discussões de Perrenoud (1999, 2000, 2002) que, conceptualiza competência
como “saber agir”, “saber em ação”, “saber em uso”. O que significa mobilizar
“esquemas de ações” que permitem utilizar conhecimentos e experiências anteriores, no
momento certo e com discernimento para a resolução de um desafio.
A abrangência do termo, desde então, tem promovido uma serie de
interpretações e estudos que vão complementando o sentido original e imprimindo
complexidade ao termo, fazendo com que “competência” ocupe lugar de destaque nas
discussões educacionais do ensino superior no Brasil.
Jobert (2003) aponta que a competência expressa a capacidade de obter um
desempenho em situação real de produção. Interessando-se pela situação de efetivação
da atividade, não se está mais ao lado da teoria, isto é da forma como as coisas
supostamente se apresentam e se regulam, mas da prática. Complementa afirmando que
para agir com competência o individuo reporta-se a seu acervo de conhecimentos,
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habilidades, atitudes e experiências e requisita aqueles que lhe proporcionarão recursos
para resolver adequadamentre a questão profissional que se apresenta.
Machado (2002) caracteriza competência a partir de 3 elementos: pessoalidade
(a competência é própria de pessoas e não de objetos); âmbito de atuação (onde se
exerce a competência e sempre em um contexto de relações) e a mobilização (a
capacidade de recorrer ao que se sabe para alcançar o projetado, o desejado).
Roldão (2009) argumenta que a educação “competencializadora” não dispensa
nenhum saber, antes exige mais e diversos saberes, acrescidos da sua articulação
orientada para a possibilidade de uso (cognitivo, prático, intelectivo, de fruição entre
outros)
Entendemos que o desenvolvimento de competência profissional pressupõe
intenso e complexo processo cognitivo reflexivo: agir com competência significa, diante
de uma determinada situação, ser capaz de mobilizar de modo eficiente, um conjunto de
recursos pessoais e profissionais que compõem seu acervo, visando uma ação eficaz.
Em outras palavras, entendemos que agir com competência significa que diante
de uma situação específica, será necessário compreender o contexto, analisar a
problemática, estabelecer necessidades e prioridades e elaborar um plano de
intervenção. A partir de então, identificar, selecionar, combinar e ativar em seu acervo
pessoal e profissional, os conhecimentos, habilidades e atitudes que deverão ser
utilizados para enfrentar a situação. Esta mobilização precisa ser eficiente, ou seja, de
forma correta, pertinente, criativa, simultânea e sinérgica para se obter uma ação eficaz
de intervenção.
Figura 1. Conceito de competências
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Masetto e Gaeta (2015)
O planejamento participativo e a fomação da equipe:
Outra preocupação que norteou a elaboração do projeto foi a integração dos
professores e coordenadores de curso ao novo paradigma. Sendo que a maioria deles
eram profissionais da área de eventos e precisavam se aproximar de questões
pedagógicas, organizamos diversas atividades durante o planejamento do novo currículo
utilizando dinâmicas de sensibilização, planejamento participativo para a elaboração do
projeto, elaboração de tutoriais e material de apoio didático, oficinas de planos de
ensino, e um sistema de monitoria e acompanhamento.
Percebemos também a importância estratégica de ter o coordenador de curso a
favor do projeto. Ele se tornou a peça chave para fazer o curso acontecer: desde resolver
problemas institucionais (espaços de aprendizagem, processos de secretaria acadêmica,
disponibilização de material didático especifico, aplicação de controles financeiros,
estabelecimento de parcerias com o mercado de eventos, entre outros) até a mobilização
e motivação de alunos e professores para a adesão e manutenção do projeto. Além de
incluirmos o coordenador como membro ativo e com poder decisório em todas as ações
referentes ao planejamento e implantação do curso, construímos junto com ele um
tutorial para orientação da equipe e um instrumento de monitoria do processo que
facilitasse seu trabalho e apontasse objetivamente as necessidades de intervenção.
Processo de desenvolvimento da competência profissional:
A competência profissional não se desenvolve espontaneamente. No nosso
entender requer um processo de construção simultâneo e sinérgico entre:
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A construção e/ou atualização, organização e sistematização de saberes proprios
de uma determinada profissão.
O desenvolvimento da capacidade de mobilizar de forma crítica e sinérgica os
recursos que possui para uma ação eficaz.
Neste sentido organizamos o currículo do curso de formação de profissionais de
Eventos em dois eixos articulados ao longo do curso:
Conjunto de atividades de caráter interdisciplinar, para o desenvolvimento de
referencial teórico e prático referentes à criação, planejamento, logística e gestão
de recursos em eventos. Tratando-se de um curso de especialização, focamos na
construção de acervo para o desenvolvimento de competência profissional
específica para eventos.
Conjunto de atividades supervisionadas, transversal ao currículo, para apoio ao
“Projeto pratico de eventos” que prevê a criação, organização e administração de
evento real, A prática reflexiva em situações profissionais de aprendizagem.
Perrenoud (1999, p.33) explica: é na possibilidade de relacionar
pertinentemente, os conhecimentos anteriores e os problemas que se reconhece a
competência.
O curso se desenrola em num processo contínuo de integração entre as atividades
promovidas pelos eixos que vão aumentando de complexidade a cada etapa do
desenvolvimento da competência profissional. As etapas baseiam-se em metodologias
que buscam integração entre a teoria e a prática, orientando-se para análise e
intervenção em situações-problema reais visando sua solução e proporcionando a
construção paulatina e crítica da competência profissional.
Figura 2. Tutorial de apresentacao da estrutura do curso
Gaeta (2012)
A estrutura do curso:
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O perfil do egresso estabelecido e que balizou a organização curricular, foi:
Ao final do curso, espera-se que o egresso tenha desenvolvido
competência para a administração e organização de eventos, estando preparados
para planejar, criar e gerir negócios relativos aos diversos segmentos desse
setor, de forma eficiente e rentável”. (Projeto Pedagógico 2012, p.6)
A etapas iniciais do curso inserem o aluno no curso, explicando seus objetivos e
funcionamento, explicitando seu papel como produtor de um evento real al‟em de
contextualiza o universo em que irá trabalhar, integrando-o ao panorama dos negócios
neste segmento, clarificando e especificando conceitos sobre gestão de negócios,
classificação e tipologia de eventos, e ressaltando a sistemática de planejamento de um
evento em: pré-evento, trans-evento e pós-evento.
As etapas seguintes giram em torno do Pré evento. Os alunos em grupos,
apoiados em suas experiências anteriores, nas discussões das etapas iniciais preparam-se
para apresentar uma proposta consistente e justificada para a realização de um evento.
Após esta apresentação os professores e alunos se debruçarão nas propostas de eventos,
discutirão referenciais teóricos-práticos específicos para analise técnica da viabilidade
econômica e operacional das proposições. Ao final, os alunos terão tido oportunidade de
desenvolver a competência necessária para a elaboração de projetos de eventos e
juntamente com os professores elegem a proposta mais adequada para ser realizada.
As próximas etapas têm o foco no trans evento, ou seja a realização do evento
projetado. Em um movimento de construção teórico - prática e conjunta entre
professores e alunos desenvolvem-se atividades integradas que oferecendo subsídios
para o planejamento e execução do evento. No dia em que o evento ocorre outros
profissionais da área são convidados a participar, observando os processos e atitudes
dos alunos e elaborando um relatorio critico que será estudado na etapa posterior. „É um
momento crucial do curso, pois os alunos estarão interagindo com seu público
potencial, em uma situação de atividade profissional real. Várias situações problemas
podem surgir e eles precisam mobilizar vários recursos desenvolvidos no curso até
então, para soluciona-las. Os professores estarão presentes dando o apoio que for
necessário, mas a execução do evento será da responsabilidade dos alunos. A
oportunidade é de exercitar a competência profissional desenvolvida para o
planejamento operacional e a organização de eventos.
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Chegamos às etapas finais: pós- evento. Alunos, professores e profissionais da
área convidados, tem oportunidade de discutir a avaliação do evento realizado na etapa
anterior, nos aspectos: planejamento, processo, atitude e resultados, sob o ponto de
vista da gestão do negócio. Os relatórios elaborados durante o evento servem de ponto
de partida para a confrontação entre conceitos e referenciais teóricos desenvolvidos nas
etapas anteriores, o resultado operacional do evento e desempenho dos alunos. É
também neste momento que os alunos terão a oportunidade de avaliar seu desempenho
enquanto profissionais de eventos, a competência desenvolvida e os ajustes necessários.
Esta etapa culminará com um detalhado relatório elaborado por cada aluno, que deverá
conter: a justificativa, descrição e avaliação técnica do evento no ponto de vista do
aluno e sua auto avaliação no processo. Este relatorio apresenta a formatação e
característica do TCC (trabalho de conclusão de curso).
Considerações finais.
Os resultados têm sido positivos. O curso está em andamento desde 2012, com
duas turmas de 40 alunos por ano. As avaliações finais tanto dos alunos como dos
professores, coordenadores e da instituição têm sido favoráveis. Os profissionais que
tem avaliado os eventos tem demonstrado surpresa positiva pela competência
demonstrada pelos alunos
O processo de monitoria construído e preenchido regularmente pelos
coordenadores em pareceria com todos os envolvidos, tinha como objetivo: acompanhar
e avaliar e acompanhar as turmas do curso de pós-graduação em Administração e
Organização de Eventos em seus aspectos organizacionais, gerenciais e pedagógicos. Os
dados têm apontado que diminuíram consideravelmente os comentários de final de
curso dos alunos sobre sentirem-se despreparados para a atuação competente. Os
professores estão mais envolvidos no processo de aprender e comprometidos com os
resultados. Seus planos de trabalho estão mais elaborados e focados na construção
conjunta de competência profissional, Há mais entrosamento e troca de experiências. E
uma verdadeira colaboração na execução do evento. Gerencialmente a instituição
aponta resultados positivos, com evasão baixa.
Pedagogicamente constatamos também a eficiência de aprendizagem e da
preparaçao profissional ao envolver os alunos paulatinamente em situações reais e
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proprias de sua area de atuação. Os eventos organizados apresentam excelente
qualidade demonstram competência profissional dos alunos.
O processo que vivenciamos nos permite enfatizar a viabilidade de desenvolver
processos educacionais baseados em situações de aprendizagem didaticamente
organizadas para o desenvolvimento de competências na pos-graduacao lato sensu.
Bibliografia
FLEURY, M.T. FLEURY A. Construindo o conceito de competência. Revista
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MACHADO, N.J. Sobre a idéia de competência. In Perrenoud P. and all As
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professores e o desafio da avaliação. Porto Alegre: Artmed, 2002
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SACRISTÁN, , José Gimeno, Educar por Competências – O que há de novo? ,
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ZABALZA, Miguel, A. , O estágio e as práticas em contextos profissionais na
formação universitária, São Paulo, Cortez Editora, 2014
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3760ISSN 2177-336X
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ESTÁGIO INTERDISCIPLINAR: CONSTITUIÇÃO DOS COMPONENTES
PRÁTICOS DA FORMAÇÃO EM OUTROS OLHARES
Elize Keller-Franco (UNASP)
Silvana Alves Freitas (PUC-SP, bolsista CNPq)
Thiago Schulze (IFSP)
Resumo
As mudanças que vêm ocorrendo no contexto mundial e nacional, o avanço e a
disseminação das tecnologias da comunicação e da informação, a internacionalização da
economia dentre outros fatores, têm confrontado o Brasil a rever seus programas de
formação e pensar em processos inovadores para formação de profissionais no Ensino
Superior. Nesse sentido, um dos aspectos que tem ocupado o centro dos debates refere-
se aos componentes práticos da formação, em especial o estágio. Neste trabalho,
focaremos essa temática trazendo para análise uma pesquisa de abordagem qualitativa
realizada em cursos de formação inicial de professores. Com base na interpretação dos
dados obtidos mediante análise documental, considera-se que o redimensionamento dos
componentes práticos da formação e das questões problemáticas que lhes vêm sendo
colocadas passam pela superação do paradigma técnico-disciplinar que funciona por
separação para dar espaço à viabilização de propostas curriculares integradoras na
perspectiva interdisciplinar em que prática e teoria encontram-se imbricadas ao longo
do curso.
Palavras-chave: Formação docente; Estágio Interdisciplinar; Currículo Inovador.
1 INTRODUÇÃO
As mudanças no mundo contemporâneo impactam a educação como um todo,
tanto por seu conteúdo e suas demandas, como pela velocidade em que elas têm
ocorrido, impondo desafios no âmbito da educação institucionalizada, especialmente no
Ensino Superior, responsável pela formação de docentes, cidadãos, profissionais e
sujeitos neste contexto social. É a formação desses sujeitos que nos mobiliza em buscar
novos olhares sobre os cursos de Licenciaturas no sentido de (re)pensar a formação por
eles oferecida.
Dentre os vários aspectos a serem (re)vistos, a prática constitui-se em fator de
especial relevância, como salienta García (1999), por ser um dos componentes que mais
tem despertado atenção na formação inicial de professores. Para Tardif (2011), o
principal desafio para a formação de professores nos próximos anos será o de abrir um
espaço maior para os conhecimentos práticos dentro do currículo. O autor defende que a
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revisão da formação profissional dos professores deve se apoiar num sólido repertório
de conhecimentos fortemente articulado com as práticas profissionais.
A importância dos saberes experienciais na profissionalização do ensino e na
formação docente nos leva a indagar como os cursos de Licenciatura têm concebido e
organizado os componentes práticos, em especial o estágio, em seus currículos de
formação de professores.
A partir deste questionamento nos propomos neste trabalho a relatar, analisar e
discutir uma experiência em andamento nos cursos de Licenciatura em Artes, Ciências e
Linguagem e Comunicação da Universidade Federal do Paraná-Unidade Litoral, nos
quais os componentes práticos da formação, em especial o estágio, inseridos em uma
proposta curricular alternativa vêm sendo ressignificados e trabalhados sob perspectivas
interdisciplinares.
Nossas considerações apoiam-se em uma pesquisa de abordagem qualitativa,
utilizando como procedimentos a análise documental e a observação in loco.
2 O ESTÁGIO NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Para Tardif (2011), os saberes que servem de base para a formação docente não
se resumem aos conhecimentos teóricos obtidos na universidade e produzidos pelas
pesquisas na área da educação, englobam os saberes que se constroem na prática
cotidiana dos professores, na relação com os pares e no confronto com as condições da
profissão. Esses saberes experienciais são dinamizados na confluência da história de
vida individual, da história familiar, do contexto social, do contexto de trabalho na
escola com suas rotinas, regras e valores, dos atores educativos, das experiências
escolares prévias e da bagagem formativa.
[...] Se é verdade que a experiência do trabalho docente exige um
domínio cognitivo e instrumental da função, ela também exige uma
socialização na profissão e uma vivência profissional através das quais
a identidade profissional vai sendo pouco a pouco construída e
experimentada e onde entram em jogo elementos emocionais,
relacionais e simbólicos que permitem que um indivíduo se considere
e viva como um professor e assuma, assim, subjetivamente e
objetivamente, o fato de fazer carreira no magistério (TARDIF, 2011,
p.108).
Considerar a prática como campo de conhecimento, que se produz na interação
entre os cursos de formação e o “lócus” no qual se desenvolvem as práticas educativas,
implica conferir a ela um estatuto epistemológico capaz de superar a visão tradicional
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que atribui à formação prática um caráter de aplicação de conhecimentos produzidos
fora do contexto real em que acontece o exercício da profissão, ou ainda, uma
instrumentalização técnica baseada na imitação e reprodução de modelos.
Pimenta e Lima (2012) com base em Sacristán defendem que a proposta da
epistemologia da prática
considera inseparáveis teoria e prática no plano da subjetividade do
professor, pois sempre há um diálogo do conhecimento pessoal com a
ação. Esse conhecimento não é formado apenas na experiência
concreta do sujeito em particular, podendo ser nutrido pela “cultura
objetiva”, ou seja, pelas teorias da educação, de modo a possibilitar
aos professores trazê-lo para as situações concretas, configurando seu
acervo de experiência „teórico-prático‟ em constante processo de
elaboração. Assim, a teoria, além de seu poder formativo, dota os
sujeitos de pontos de vista variados sobre a ação contextualizada. Os
saberes teóricos propositivos se articulam, pois, aos saberes de ação
dos professores e da prática institucional, ressignificando-os e sendo
por eles ressignificados (PIMENTA; LIMA, 2012, p 49).
Essa concepção em que teoria e prática são inter-relacionadas não tem tido
representatividade nos cursos de formação de professores. Usualmente, esses cursos
apresentam uma organização curricular em que os componentes curriculares são
dicotomizados em teóricos e práticos. Essa fragmentação encontra eco no próprio marco
legislatório voltado para os cursos de formação docente, em que são propostas cargas
horárias especificas para práticas, para estágios e para conteúdos de natureza científica
cultural (RESOLUÇÃO CNE/CP n.º 2/2002 e RESOLUÇÃO CNE/CP n. 2/2015).
Observa-se, ainda, que essa contraposição entre teoria e prática “se traduz em espaços
desiguais de poder na estrutura curricular, atribuindo-se menor importância à carga
horária denominada prática” (PIMENTA; LIMA, 2012, p. 34).
Schon (2000) destaca que a visão dominante nos meios acadêmicos confere uma
posição privilegiada ao conhecimento geral e teórico, posição esta, que se manifesta
numa hierarquia de conhecimentos: em primeiro lugar a ciência básica, em seguida a
ciência aplicada e por último o ensino prático. O status das profissões estaria, também,
intimamente relacionado à ênfase que é atribuída na formação do conhecimento
denominado científico.
No movimento teórico recente que confere estatuto epistemológico aos saberes
experienciais é possível perspectivar a superação da pretensa dicotomia entre atividades
teóricas e atividades práticas. Nessa concepção, todos os componentes curriculares são
ao mesmo tempo teóricos e práticos.
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Essa perspectiva pressupõe alterações na dominante lógica disciplinar que
orienta a organização curricular de grande parte dos cursos de formação de professores.
Na lógica disciplinar, há uma nítida separação entre disciplinas ditas “científicas”
(psicologia, filosofia, didática, sociologia, etc.) que se apresentam como unidades
autônomas, fechadas em si mesmas e as disciplinas mais voltadas para os saberes
práticos como as metodológicas e os estágios. Essas últimas ficam para o final do curso
quando os alunos vão “aplicar” os conhecimentos declarativos nos espaços onde se dá o
exercício profissional, na maioria das vezes, sem um adequado acompanhamento e sem
um processo de reflexão que estabeleça relações entre os fundamentos teóricos e
situações do contexto profissional.
Para Tardif (2011), a formação de professores gravita em torno “da lógica
disciplinar” que ao se desenvolver com base na especialização e fragmentação se torna
pouco significativa para o aluno. O autor argumenta que seria aconselhável abrir um
espaço maior para a lógica profissional nos programas de formação de professores:
Essa lógica profissional deve ser baseada na análise das práticas, das
tarefas e dos conhecimentos dos professores de profissão; ela deve
proceder por meio de um enfoque reflexivo, levando em conta os
condicionantes reais do trabalho docente e as estratégias utilizadas
para eliminar esses condicionantes na ação (TARDIF, 2011, p. 242).
A perspectiva aqui apresentada pressupõe mudanças na concepção e na
organização das práticas nos cursos de formação de professores, o que nos impulsiona a
buscar alternativas, como as que passamos a relatar e analisar a seguir.
3 A UFPR LITORAL E OS NOVOS CENÁRIOS NA FORMAÇÃO DOCENTE:
O ESTÁGIO INTERDISCIPLINAR
A UFPR Setor Litoral nasce no século XXI em meio a uma virada paradigmática
da ciência e da universidade e como tal busca constituir-se sob um novo paradigma
educacional. Em seu Projeto Político Pedagógico (2008), expressa a missão de
consolidar-se como um agente de desenvolvimento comunitário, tendo como objetivo
propiciar à região litorânea e Vale do Ribeira, qualidade de vida compatíveis com a
dignidade humana e a justiça social.
Está localizada no município de Matinhos, região litorânea do Paraná que
enfrenta desafios econômicos, sociais, ambientais e educacionais decorrentes de uma
ocupação desordenada, com fluxo intenso nos meses de verão e interrupção nas demais
épocas do ano. A universidade alicerça seu compromisso com o desenvolvimento
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socioeconômico e cultural em um projeto educacional que integra os poderes públicos
federal, estadual e municipal, unindo forças em torno de um projeto de universidade
emancipatório e inovador.
Nesse contexto, a formação de professores adquire papel relevante para
viabilização desse novo paradigma de desenvolvimento sustentável e recebe um espaço
de centralidade na proposta que desencadeou a criação dos cursos de formação inicial
de professores (Licenciaturas) instituídas a partir de 2008 com os cursos de Licenciatura
em Ciências e Artes e em 2009 o curso de Licenciatura em Linguagem e Comunicação.
O seu Projeto Político Pedagógico (PPP) baseia-se na perspectiva
interdisciplinar da construção do conhecimento e na valorização da formação integral
dos estudantes. Tem por objetivo construir o processo ensino-aprendizagem associado à
realidade local e à necessidade de formação em todos os níveis de ensino.
Para situar o estudante, desde o início do curso, acerca das questões ambientais,
culturais, políticas, econômicas e sociais dessas regiões, unindo a teoria e a prática
profissional, os espaços curriculares de aprendizagem superam a tradicional organização
disciplinar. São constituídos de três eixos: os Projetos de Aprendizagem, os
Fundamentos Teórico-Práticos e as Interações Culturais e Humanísticas.
No espaço dos projetos de Aprendizagem, os alunos, orientados por
professores, desenvolvem projetos que ampliam a aprendizagem e os desafiam a
construir processos autônomos na busca do conhecimento, aliando os interesses
pessoais com as necessidades da comunidade.
Os fundamentos teórico-práticos são selecionados com base nas diretrizes
curriculares de cada curso e nos saberes necessários à execução dos projetos de
aprendizagem, organizados por módulos contemplam uma abordagem integrada e
contextualizada do conhecimento.
As Interações Culturais e Humanísticas visam possibilitar a sensibilização, a
compreensão e a valorização da cultura local e articular os saberes científicos, culturais,
populares e pessoais. Esse espaço constitui-se de oficinas oferecidas por docentes,
discentes e membros da comunidade e viabilizam a participação integrada de estudantes
de diversos cursos.
Além desses três eixos, o currículo se organiza em fases com focos norteadores:
1ª Fase: Conhecer e Compreender; 2ª Fase: Compreender e Propor; 3ª Fase: Propor e
Agir.
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3.1 O estágio na UFPR Litoral
Os Projetos Políticos Pedagógicos dos três cursos analisados dedicam um
capítulo às orientações, normatizações e finalidades relativas aos estágios. Os cursos
dispõem de uma Comissão Orientadora de estágio (COE) a qual possui a
responsabilidade de buscar parcerias e proceder aos Termos de Convênios e
Compromisso firmados entre os estudantes e o campo de estágio; divulgar, facilitar e
mediar o acesso dos estudantes aos campos de estágio; articular reuniões semestrais
com os orientadores e supervisores; realizar visitas ao campo de estágio; gerir demandas
apresentadas por supervisores, orientadores, estagiários e instituições campo de estágio,
dentre outros (PPC Linguagem e Comunicação, 2011; PPC Licenciatura em Ciências,
2010; PPC Licenciaturas em Artes, 2008).
O PPC traz orientações detalhadas para elaboração dos planos de atividades
elaborados pela COE, pelo professor orientador e pelos alunos, bem como atribuições
de cada um desses. A elaboração e apresentação de ementas com um direcionamento
específico para cada semestre permitem antever um programa intencional de estágio.
A avaliação do estágio se dá a partir de um processo contínuo, envolvendo
responsabilidade, presença em campo, ética nas ações desenvolvidas, competência
teórico-metodológica, capacidade de articulação entre os conhecimentos produzidos em
sala e a vivência em campo, postura acadêmico-profissional durante o processo,
relatórios, resenhas, artigos, portfólios, seminários parciais e finais das atividades
desenvolvidas, sendo de responsabilidade do estudante, professor orientador e
supervisor de campo.
Dessa forma, observa-se que as Licenciaturas da UFPR Litoral ao serem
concebidos e normatizados de forma clara e completa, apresentam um cenário diferente
ao encontrado na pesquisa realizada por Gatti e Nunes (2009) em que o estágio nas
licenciaturas apresentava-se de forma bastante imprecisa.
Quanto ao lócus, o mesmo é desenvolvido em contextos formais e não formais
de ensino, promovendo a articulação entre a universidade, o Núcleo Regional de
Educação de Paranaguá e as Secretarias Municipais de Educação do Litoral Paranaense
e Vale do Ribeira. Podem, ainda, constituir campos de estágio as ONGS, movimentos
sociais, classes em assentamentos, canteiros de obras, instituições de caráter
sociocultural, instituições de educação a distância (EAD), projetos ou programas
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institucionais que desenvolvam ações pedagógicas (PPC Linguagem e Comunicação,
2011; PPC Licenciatura em Artes, 2008; PPC licenciatura em Ciências, 2010).
O estágio na UFPR Litoral ganha uma dimensão ampliada ao ser concebido não
só como um recurso de aprendizagem para formação inicial, mas também, para a
formação continuada de professores.
Art. 2º - [...] Parágrafo único: O período em que os estagiários estão
em campo contribui para o seu desenvolvimento acadêmico,
retroalimenta temáticas a serem trabalhadas dentro do curso e
potencializa parcerias entre a universidade e a comunidade,
subsidiando, assim, pesquisas de estudantes e professores do curso,
bem como a realização de atividades de extensão, de formação
continuada, conforme preconiza o Projeto Político Pedagógico do
Setor Litoral (PPC Linguagem e Comunicação, 2011, p. 57).
Para que o estágio tenha significado na formação do futuro professor é
fundamental que pesquisa, crítica, ação e avaliação sejam construídas
e compartilhadas pelos envolvidos: estagiário, supervisor (campo) e
orientador (UFPR) [...] (PPC Linguagem e Comunicação, 2011, p.
55).
A compreensão da Universidade sobre a importância de estabelecer relações
articuladoras de formação com o campo que recebe os futuros docentes caminha na
direção acenada por Roldão (2007) em que a universidade e os contextos de trabalhos
estabeleçam processos mútuos de formação/investigação. Destaca-se, ainda, que essa
relação de parceria investigação/formação deve contemplar possibilidades formativas
também à universidade e seus docentes. Os professores que atuam na formação inicial
da graduação encontram-se muitas vezes distanciados, ou até em alguns casos, nunca
exerceram a profissão no contexto profissional (educação básica) para o qual estão
formando os futuros docentes.
Buscar aproximação com os “práticos da profissão” (TARDIF, 2011) deve ser
considerada uma modalidade importante de formação continuada para os docentes
universitários. Nesse intercâmbio, o estágio torna-se uma via tanto para a formação
continuada dos professores formadores como para os professores da escola que são
desafiados “a rever suas certezas, suas concepções do ensinar e do aprender e seus
modos de compreender, de analisar, de interpretar os fenômenos percebidos nas
atividades de estágio” (PIMENTA; LIMA, 2011, p.114).
3.2 A perspectiva interdisciplinar do estágio na UFPR Litoral
A proposta Pedagógica que vem sendo desenvolvida na UFPR Litoral concebe o
conhecimento e o processo formativo como uma totalidade articulada com a realidade
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concreta em seus contextos profissionais e socioculturais. A articulação entre a teoria e
a prática, entre o ensino, a pesquisa e a extensão e a abordagem interdisciplinar da
construção do conhecimento, são princípios fundantes do projeto que se viabilizam nas
etapas curriculares: 1ª Fase: Conhecer e Compreender - Compreensão crítica da
realidade (um a dois semestres); 2ª Fase: Compreender e Propor - Aprofundamento
metodológico científico (um a quatro semestres); 3ª Fase: Propor e Agir - Transição
para o exercício profissional (um a dois semestres), bem como, na organização
curricular constituída dos três eixos: Projetos de Aprendizagem (PA), Interações
Culturais e Humanísticas (ICH) e os Fundamentos Teórico-práticos (FTP).
Tal concepção e organização curriculares vêm delineando um novo caminho na
direção apontada por Zabalza (2004, p.174) “faz anos que venho defendendo que o
estágio prático não é mais um componente dos cursos (como se representasse mais uma
disciplina ao currículo), mas um componente transversal da formação que deve influir e
ser influenciado por todas as disciplinas”.
Essa direção é visível no Curso de Artes, onde o estágio supervisionado
obrigatório, como é comumente chamado, recebe a denominação de “vivências nos
espaços educacionais”, constituindo módulos que se integram aos demais.
Observa-se como um primeiro aspecto distintivo, a mudança da terminologia,
pois o termo estágio supervisionado carrega conotação negativa e autoritária, como
consideram Pimenta e Lima (2011), caracterizando formas rígidas e burocráticas de
aproximação com os contextos profissionais. Essa expressão, segundo as autoras, é
herança da pedagogia tecnicista, que fortaleceu o estágio como componente prático e
isolado das disciplinas teóricas dos currículos.
Destaca-se, nesse curso, a superação do estágio como um apêndice extra no
currículo, pois: “Todos os módulos do Curso de Licenciatura em Artes foram
desenhados com o objetivo de subsidiar a integração entre as quatro linguagens
artísticas e as práticas pedagógicas do professor de Artes em formação” (PPC
Licenciatura em Artes, 2008, p.39). Cada semestre aborda uma das linguagens artísticas
(Artes Visuais, Dança, Música e Teatro). O módulo “Vivências nos espaços
Educacionais” (estágio) foca a linguagem artística que está sendo trabalhada naquele
semestre: “Vivências Educativas em Artes Visuais”, “Vivências Educativas em Dança”
etc. Os demais módulos, e, em especial o módulo Seminário de Prática de Ensino de
Artes, também, abordam a linguagem vivenciada naquele semestre.
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O estágio concretizado dessa forma possibilita um vai e vem entre os saberes
trabalhados no curso e os saberes da prática, numa perspectiva interdisciplinar em que a
prática e a teoria se encontram indissociadas na análise, na reflexão e no trabalho
docente:
Trata-se de pensar em uma estrutura curricular dinâmica que articula
formação intelectual com a dimensão prática, propiciando que os
futuros profissionais compreendam o mundo do trabalho e suas
possibilidades de intervenção para superar os desafios encontrados em
um determinado contexto sócio-cultural. Dentro de uma proposta
flexível de módulos que articulam os saberes, habilidades e
competências necessárias à formação do futuro professor de Artes, a
presente proposta estimula uma aprendizagem mediada pelo
pensamento crítico e reflexivo e pelas ações em direção à autonomia
do sujeito (PPC Artes, 2008, p 37, 38).
Nos demais cursos, o estágio está fundamentado em uma nova abordagem que o
concebe como um campo de conhecimento e espaço de produção de saberes docentes
em que os dados da realidade são tomados como objeto de reflexão em conjunto com os
referenciais teóricos da formação.
Art. 9º - [...] as atividades de Estágio Supervisionado visam à inserção
gradativa do profissional em formação nos processos escolares,
devendo abarcar três situações, que embora distintas, não são lineares,
ou seja, é desejável que se desenvolvam dialeticamente, por meio da
ação/reflexão/ação nos espaços e processos da escola campo. Está
implícita em todos os momentos a observação, o diálogo, a pesquisa, a
ação e o aprofundamento teórico.
INSERÇÃO I – envolve atividades relacionadas com o diagnóstico do
contexto social em que se organiza o trabalho pedagógico, bem como
a análise das correlações que se estabelecem entre o cotidiano das
organizações escolares, a comunidade interna e externa e as
exigências da sociedade contemporânea.
INSERÇÃO II – caracteriza-se pela análise multidimensional do
processo educacional em sala de aula e nos demais espaços
educativos, abordando propostas de construção do conhecimento
centrado no processo ensino-aprendizagem percebido em todas as suas
dimensões: características, etapas, tipologias e teorias, seus fatores de
influência e problemas, suas práticas didático-pedagógicas, suas
práxis avaliativas.
INSERÇÃO III – intervenção do profissional em formação no
processo educativo garantindo o aperfeiçoamento da evolução e das
especificidades dos processos utilizados na educação básica,
focalizando, sobretudo, o conhecimento específico da área das
ciências, permeado por princípios filosóficos e políticos que sustentam
a docência emancipatória (PPC Licenciatura em Ciências, 2010, p.98).
O estágio é apresentado como um importante componente formativo que deve
ser desenvolvido “de forma articulada com o processo de formação e com a realidade
local, proporcionando ao estudante a construção da aprendizagem relacionada às
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diferentes áreas do conhecimento científico, social, cultural e docente de forma
dinamizada e contextualizada” (PPC Licenciatura em Ciências, 2010, p.97).
No entanto, a sua estruturação na matriz curricular, ainda, conserva uma
configuração muito próxima dos formatos tradicionais em que o estágio constitui um
componente curricular ao lado dos demais, aí incluídos para atender as exigências de
caráter legal.
Essa realidade levou-nos a considerar a possibilidade de que a persistente
questão do estágio, em que teoria e prática se encontram fragmentadas, só poderá ser
equacionada quando deixarmos de pensar no estágio como um componente curricular
extra e darmos vez para propostas curriculares mais integradoras e interdisciplinares.
Defendemos essa ideia, considerando a possibilidade de que na proposta da
UFPR Litoral esse componente curricular poderia ser dispensado, pois o “estágio” (ou o
que se espera dele) está implícito e ao mesmo tempo intencionalmente presente, de
forma natural e integrada no currículo desde o início do curso.
O presente projeto pedagógico do curso segue a estrutura do PPP do
Setor Litoral e, a partir dela, elege eixos norteadores que ajudam a
conectar os saberes artísticos e pedagógicos necessários à formação de
um professor de Artes atuante e transformador.
Na primeira fase (Conhecer e compreender) privilegia-se o estímulo
ao conhecimento e a compreensão do papel do licenciado em artes,
problematiza-se os aspectos da atuação profissional na realidade local
articulada ao contexto regional, estadual e nacional. Neste momento, a
observação e debate da realidade devem auxiliar no desenvolvimento
do senso crítico, estimulando a (re) interpretação e a (re) significação
do que se observa, a partir da articulação entre os pressupostos
teórico-práticos e as diferentes áreas de conhecimentos e saberes
artísticos.
A segunda fase (Compreender e Propor) corresponde ao segundo e
terceiro ano do curso. Os módulos contribuem para que o estudante
articule o contexto local com os diversos aspectos teórico-prático-
pedagógicos e artísticos que serão abordados nessa fase. O trabalho
proporciona o desenvolvimento e aprofundamento dos conteúdos
necessários para compreender a articulação entre os processos
educacionais e as diferentes linguagens artísticas. A construção desse
conhecimento dá-se por aplicação constante dos conhecimentos
sistematizados, pela reflexão e pela investigação da prática artística e
da prática pedagógica.
Na terceira fase (Propor e Agir) objetiva-se uma imersão do estudante
nas experiências vivenciadas ao longo do curso e uma atuação mais
efetiva no seu universo de trabalho. Busca-se uma reflexão das
experiências vivenciadas nos projetos de aprendizagem, nas interações
culturais e humanísticas, nos fundamentos teórico-práticos e nas
vivências nos espaços educacionais, que possibilitam realizar a síntese
à medida que se encerra o curso. Os projetos de aprendizagem
trabalhados desde o primeiro ano do curso constituem espaços
pedagógicos que no terceiro ano devem ser finalizados (e
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transformados em trabalhos de conclusão de curso), constituindo,
assim, uma das ferramentas essenciais no aprendizado e no exercício
profissional do futuro professor de Arte. Nos fundamentos teórico-
práticos, trabalhados ao longo do curso, almeja-se a integração entre
os saberes artísticos (Artes Visuais, Dança, Música e Teatro) com as
práticas pedagógicas e com outros saberes, estimulando a atuação
conjunta de professores de diversas formações em um mesmo módulo,
privilegiando a interdisciplinaridade como princípio fundamental para
o desenvolvimento do curso. Esse projeto curricular procura, ainda,
tomar como ponto de partida o contexto no qual o curso está inserido,
a história de vida dos professores em formação, matrizes culturais a
partir das quais as vidas desses estudantes foram construídas, seus
desafios, e suas particularidades em articulação com a realidade
social. Ao fazer isso, objetiva-se instrumentalizá-los para agir dessa
mesma forma com seus futuros estudantes no contexto sócio-cultural
em que vivem. (Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em
Artes, 2008, p.38, 39).
É possível considerar que os cursos de Licenciatura da UFPR Litoral, em
especial, Ciências e Linguagem e Comunicação ao incluir o termo estágio na matriz
curricular para adequar-se as exigências legais acabaram por perder sua identidade.
Reconhecemos a importância de Diretrizes Nacionais, mas indagamos se a legislação a
respeito das práticas sob a forma de normatizações não tem sido um fator impedidor de
avanços ao segmentar formação científico-acadêmica e formação prática?
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A experiência analisada aponta para uma transformação em relação ao estágio.
Observa-se um programa intencional de estágio nos Projetos Pedagógicos dos três
cursos contendo detalhamentos sobre objetivos, atividades, formas de acompanhamento
e avaliação. Chama atenção a estreita parceria entre a universidade e as escolas de
educação básica, o apoio institucional e as políticas de estágio que favorecem o
estabelecimento de nexus entre os saberes trabalhados nos cursos de formação com o
campo de atuação dos profissionais.
No entanto, a principal contribuição da pesquisa, emergiu da característica
distintiva da proposta curricular da UFPR Litoral. Ao partir de situações
problematizadoras reais, ampliar a compreensão destas no diálogo com o conhecimento
sistematizado e produzir novas compreensões voltadas para propostas de transformação,
caminha na direção de uma concepção de formação que supera a dicotomização entre
formação teórica e prática.
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Nessa organização curricular, a problematização, a análise, a pesquisa e a
proposição das situações do ensinar e aprender presentes nos ambientes profissionais
permeiam todos os momentos do processo formativo numa perspectiva interdisciplinar.
A experiência analisada levantou a possibilidade de que enquanto conservarmos
organizações curriculares que funcionam por especialização e fragmentação,
dificilmente conseguiremos desfazer o nó do estágio que deflagra a dicotomização entre
teoria e prática.
REFERÊNCIAS
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Porto Editora, 1999.
GATTI, B. A.; NUNES, M. R. N. (org) Formação de professores para o ensino
fundamental: estudo dos currículos das licenciaturas em Pedagogia, Língua Portuguesa,
Matemática e Ciências Biológicas. TEXTOS FCC, V. 29, 2009.
PIMENTA, S. G.; LIMA, M. S. L. Estágio e Docência. 7 ed. São Paulo: Cortez, 2012.
ROLDÃO, M. do C. Formar para a excelência profissional: pressupostos e rupturas nos
níveis iniciais da docência. Educação e Linguagem, São Bernardo do Campo, ano 10,
v.1, n.15, p. 18-42, jan./jun. 2007.
SCHON, D. Educando o profissional reflexivo: Um novo design para o ensino e a
aprendizagem. Porto Alegre: ARTMED, 2000.
TARDIF, M. Saberes docentes e formação. 12 ed. Petrópolis: Vozes, 2011.
ZABALZA, M. A. O ensino universitário: seu cenário e seus protagonistas. Porto
Alegre: Artmed, 2004.
UFPR Litoral. Projeto Político Pedagógico da UFPR Litoral. Matinhos, 2008.
______. Projeto Político Pedagógico de Curso Licenciatura em Ciências. Matinhos,
2010.
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2011.
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