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    225A PRECARIZAO ESTRUTURAL DO TRABALHO NA CIVILIZAO DO CAPITAL EM CRISE: o precariado comoenigma contemporneo

    R. Pol. Pbl., So Lus, Nmero Especial, p. 225-239, julho de 2014

    A PRECARIZAO ESTRUTURAL DO TRABALHO NA CIVILIZAO DO CAPITAL EMo precariado como enigma contemporneo

    Alba Maria Pinho de CarvalhoUniversidade Federal do Cear (UFCE)

    o precariado comoenigma contemporneo No contexto da civilizao contempornea do capital, este artigo enfoca a precarizao estrutural do trabalho,a expressar uma nova morfologia laboral, na temporalidade histrica da crise estrutural do capital. Salienta a nova forma da sua vida e na cotidianeidade. Demarca a universalidade da condio de proletariedade, como condio existencial

    se amplia e ganha visibilidade nos pases capitalistas considerados centrais. Delineia vias analticas distintas na busca de a ser desvendado pelo pensamento crtico e radical neste sculo XXI. Crise do Capital, condio de proletariedade, precarizao estrutural do trabalho, precariado.

    the precariatas a contemporaneous enigmaWithin the context of the current civilization of capital, this article approaches the structural precariousnessof labor, that tends to express a new work morphology, in the historical timeline of the capital crisis It highlights the new

    enlarged form of labor precariousness, within the limits of the machine-facture process, that brings forth experiencesfrom different segments of workers giving shape to the estrangement of the man-who-works that is seen along his dailylife. It demarcates the universality condition of the proletariat ,as an existence-related situation of men and women wholive under the bourgeoisie, at a time of global capitalism. It analyses the surge and constitution of precariousness as asocial stratum from the working class that is gaining space and visibility in major capitalist countries in this second decade scenario, shaping up the social basis of social movements that made their way to the Brazilian life in June and July of thinking within the current century.Capital crisis, proletariat condition, structural precariousness of labor, labor precariousness.

    Recebido em: 13.12.2013. Aprovado em: 06.01.2014.

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    o sistema do capitalno sculo XXI

    XX, e limiar do sculo XXI, o sistema do capital esta vivenciar um processo de aceleradas mutaes,

    vinculadas a um desenvolvimento da cincia e datecnologia sem limites e sem controles, apartadodas necessidades humanas e desconectado datica da sustentabilidade e do cuidado. A revoluoda informtica e da comunicao, combinada coma tendncia do capitalismo para ampliar a lei dovalor a mais e mais dimenses da vida social,transformam o modo de produo e o modo devida. a civilizao contempornea do capital1, aencarnar a sua nova temporalidade histrica, nombito de uma dupla demarcao: novo momentono desenvolvimento do capitalismo, nos marcosda ;momento histrico de explicitao da criseestrutural do capital2. So tempos de mudanas terica, mobilizando a imaginao dialtica, nodesvendamento crtico das novas condies deexpanso ilimitada do capital, em novas conexesde tempo e espao. Eis uma tarefa epistemolgico-poltica do sculo XXI, a impor uma agenda deestudos e discusses.

    tecnologizao da cincia, sob a gide das forasciberntico-informacionais, o sistema do capitalvem efetivando transformaes no seu padro deacumulao e nos seus mecanismos de valorizao,passando a encarnar novas formas de dominao so formas de dominao abstratas, impessoais, penetrantes, a perpassarem a economia, a poltica, 2012b). inconteste o poderio do dinheiro nestemomento contemporneo, a consubstanciar a lgica

    mundializao, permeando a totalidade das relaessociais:

    Produz-se por dinheiro, especula-sepor dinheiro, mata-se por dinheiro,corrompe-se por dinheiro, organiza-setoda a vida social por dinheiro, s sepensa em dinheiro. Cultua-se o dinheiro,o verdadeiro deus da nossa poca umdeus indiferente aos homens, inimigoda arte, da cultura, da solidariedade,da tica, da vida do esprito, do amor.

    sem limites. (BENJAMIN, 2004, p. 2).

    De fato, uma temporalidade histrica, instabilidade e da insegurana, a explicitar-se, nocenrio mundial de 2008, na crise do capital.

    presente, grave e profunda, constituindo uma crise

    de acumulao e valorizao do capital3. uma crisecom permanentes desdobramentos e deslocamentos afeta a humanidade como um todo (MSZROS,2009; 2013). Eclodiu com intensidade dramtica nos se autodenominam capitalistas avanados. EstadosUnidos, potncia imperial, motor do mundoonde a trilhes de dlares, encarna grave ameaa de uma terremoto econmico para o mundo todo. A Europadesmonta-se em sua aparente e tradicional solidez eestremece mergulhada em crise sem precedentes ea austeridade passa a ser um modo de vida impostoa populaes de determinadas naes europeias.

    E a crise, nos seus permanentesdeslocamentos e distintos ritmos, chega aos pasesda Amrica Latina, com o esgotamento do ciclode crescimento, nos marcos de uma acumulao sculo XXI e limiar da segunda: entrada do capital

    capitalistas considerados avanados, deslocam-se para as regies nomeadas de perifricas; como uma potncia exportadora e importadora,com extraordinria demanda por produtos primriosagrcolas e minerais (CARVALHO, 2013). E, capital ganham visibilidade em 2013, evidenciandoa instabilidade e o risco dos arranjos do modelobrasileiro, nos circuitos hbridos do ajuste e doneodesenvolvimentismo (CARVALHO; CASTRO,

    2013).Nenhum pas pode evocar imunidade a estacrise estrutural do capital, nem mesmo a China, de um dia para outro, em meio a uma turbulncia(MSZROS, 2013).

    Em verdade, o sistema do capital, no sculoXXI, confronta-se com uma crise civilizacional,expressando a insustentabilidade do seu modo defuncionamento, fundado na sua expanso predatriae sem limites, a manifestar-se numa articulao decrises: ambiental, climtica, alimentar, energtica, e uma profunda crise de sentidos. E, mltiplos soos fenmenos indicadores desta crise civilizatria:uso intensivo e indiscriminado de recursos naturais,

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    beirando ao dbcle; a privatizao exacerbadade bens comuns: a gua, o ar, a biodiversidade;a expulso do prprio processo de trabalho decentenas de milhes de trabalhadores/trabalhadoras do capital; precarizao estrutural do trabalho;

    universalizao da condio de proletariedade eprecarizao existencial; violncias e inseguranassempre em aprofundamento; excluses sociais eapartaes; consumismo ilimitado como modo deexistncia social; a lgica da descartabilidade aperpassar a totalidade das relaes sociais.

    Nesse contexto de transformaes, crises eriscos constituem o mundo social dominado pelaexpanso da lgica do capital, em detrimento dalgica das necessidades humanas. A rigor, esta lgicade expanso do capital no tem limites e controlese, precisamente, nesse momento contemporneodo capitalismo, acentua e agrava a sua tendnciadestrutiva, no poupando nada, nem ningum, aminar as condies fundamentais de sobrevivnciahumana e a colocar em risco o planeta Terra. Nestesentido, Istvn Mszros (2013, p. 6) alerta para agravidade dos problemas atuais do capitalismo nocontexto da crise estrutural do capital, a afetar at a[...] dimenso mais fundamental do controle socialmetablico da humanidade, incluindo a natureza de e sua tese da destruio criativa acontecendo no sistema do capital, nesta novatemporalidade histrica, umaproduo destrutiva.

    O sistema parece atingir o limite de suas do prprio capitalismo e seus permanentesdeslocamentos. Como bem sinaliza David Harvey(2011), em tempos de crise, torna-se evidentea prpria irracionalidade do capitalismo. Assim,Mszros (2013), atualizando a alternativa histrica,circunscrita por Rosa de Luxemburgo Socialismoou Barbrie Barbrie, se tivermos sorte. E

    o capitalismo se aproxima rapidamente da sua dos tempos, indicando como quatro cavaleiros doapocalipse sistema (problemas de propriedade intelectual, aluta vindoura por matria-prima, comida e gua) eo crescimento explosivo de divises e exclusessociais. David Harvey (2011), reconhecendo ser so momentos de paradoxos e possibilidades e,desse modo, diferentes alternativas podem surgir.Abre-se, assim, um campo de polmicas sobre ofuturo do sistema do capital como contradio em

    processo.

    Esta crise contempornea do capital, comocrise estrutural de valorizao, ganha visibilidade trabalho, gestando a nova precariedade estrutural dotrabalho, como dimenso constitutiva do sistema docapital, nesta sua temporalidade histrica no sculo

    XXI. o [...] novo (e precrio) mundo do trabalhono sculo XXI. a exigir um sistema categorialnovo (ALVES, 2013)4. De fato a exigncia daampliao conceitual e de alargamento analtico no Coutinho (1994), buscando apropriar-se, no mbitopensamento crtico, das novas determinaes emediaes nos circuitos dos movimentos da Histria.

    do sculo XX e limiar dos anos 2000, nos marcos daexpanso ilimitada e destrutiva do capital, sustenta- extremo individualismo e ao imobilismo, operantes concorrncia do mercado, do produtivismo impe-se,cada vez mais, como ideologia dominante (HARVEY,2011). o predomnio de uma cultura do mercado,da produtividade e da descartabilidade. Assim,materializando a dinmica expansionista ilimitadado mercado, institui-se a cultura do descartvel, as formas de sociabilidades contemporneas:descartabilidade de objetos, de relaes, de

    trabalhadores(as).Nos circuitos da crise estrutural, os governos

    dos Estados Unidos da Europa e de outras partesdo mundo parecem redescobrir o estatismo todo

    privatizado (ANTUNES, 2009), fazendo ressurgir a partir da legitimao do intervencionismoestatal como caminho de salvao. De fato, do capital em crise, se faz explcito, declarado ereconhecido pelos arautos do neoliberalismo,

    devotos do livre mercado. primeira dcada do sculo XXI, proclama oregresso do Estado, ou seja, a volta do Estado no desvendamento deste momento na civilizao do Estado hoje, explcito nos circuitos de crisee, velado, no passado recente de dominncianeoliberal constitui elemento decisivo nosprocessos de acumulao e valorizao do capitalnos percursos da mundializao e seus ciclos deajuste (CARVALHO, 2010). Neste sentido, Istvn(Mszros, 1997) categrico: o sistema capitalistano sobrevive um dia sequer, sem uma dasmltiplas formas de interveno massiva do Estado.Inegavelmente, o Estado um dos elementos do

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    ncleo constitutivo do sistema de sociometabolismodo capital (MSZROS, 2002), atuando, de formas de desenvolvimento da civilizao do capital.

    Logo, o alardeado regresso do Estado um falso regresso, ou melhor dizendo, encarna o

    paradoxo do regresso sem partida (CARVALHO,2010). A rigor, a proclamao de tal regresso no seno a volta do Estado ao centro da cena pblica,a partir do desmonte da mitologia neoliberal do livremercado a regular a vida social.

    macia do Estado e das instituies globais, pararesolver a crise. A rigor, novas regulaes do internacionais e proclamam idelogos do capital no constituem alternativa de soluo para essacrise global do sistema do capital na condio deuma crise sistmica. Assim, os detentores do capital medidas institucionais de enfrentamento da crise revolucionando a morfologia social do trabalho.

    A rigor, uma dimenso chave da crise estruturale sistmica do capital a corroso do trabalho, comfortes expresses em naes europeias, atingidasnos circuitos da crise, nos Estados Unidos e comfortes repercusses no mundo do trabalho em fenmeno contemporneo, a precarizao estrutural

    do trabalho, a consubstanciar uma

    [...] nova forma de precarizao do vividas de trabalhadores e trabalhadoras (ALVES, 2013, p.10).

    2 PRECARIZAO ESTRUTURAL DA FORA marco da novatemporalidade histrica do sistema do capital nosculo XXI

    Hoje, sem paralelos em toda a era moderna,acirra-se, na civilizao contempornea do capital,a contradio circunscrita por Marx, nos Grundrisse[1857-1858] (2011): a crescente substituio dotrabalho vivo de homens e mulheres pelo trabalhomorto 5, efetivao revolucionamento do homem-e-da-tcnica, ou,o revolucionamento da prpria relao homem-

    conceitua de maquinofatura, como terceira formade produo social do capital6, circunscrevendo onovo (e precrio) mundo do trabalho, ao longo dostrinta anos perversos do capitalismo global, nos

    trabalha. Este revolucionamento homem-tcnica, permita a constituio de homens com pensamentos

    mais conformistas. (ALVES, 2013, p. 24). Desse homotecnologicus, a encarnar a ciberhominizao. Repe-

    de reposio meramente virtual, isto ,posio de possibilidades contraditriascontidas na nova base tcnica, o novo tecnolgico` um feixe de contradiesreais (o virtual um modo de ser do real

    efetivamente contraditrio). (ALVES,2013, p. 26).

    Adentrando nesta nova forma de produo histrica, o sistema do capital, com a mediaoda cincia e da tecnologia, vai prescindindo dapresena fsica e do prprio sabere do prprio fazerdo trabalhador, com o predomnio das chamadasmquinas inteligentes, nos circuitos ciberntico-informacionais, incorporadas a redes digitais.

    Gesta-se, assim, o crescimento e a ampliao daprecariedade laboral, materializada no desempregoe nos mltiplos processos de precarizao, aalastrar-se no conjunto da classe trabalhadora, emseus distintos segmentos e diferentes categorias

    Graa Druck (2009), no intuito de captar, commais preciso, modalidades de precarizao emcurso no mundo do trabalho na contemporaneidade delineiam vias de investigao: precarizao dasformas de mercantilizao da fora de trabalho;

    precarizao da organizao e das condies de

    trabalho; precarizao das condies de seguranano trabalho; precarizao das condies derepresentao e organizao sindical; precarizaodo processo de construo das identidades individuale coletiva. laboral ampliada adentra os diferentes domniosda vida, capturando a prpria subjetividade doshomens e mulheres trabalhadores(as), nesta novaordem do capital. Assim, a precarizao do trabalho global, seria no apenas precarizao do trabalho,no sentido da fora-de-trabalho como mercadoria,

    mas seria tambm a precarizao do homem-que-trabalha, no sentido de precarizao existencial,atingindo o homem como ser genrico. Com efeito,

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    a perpassar a relao trabalho-vida. Giovanni Alvesassim explicita a constituio desta precarizao

    A nova precariedade salarial, ao alterara dinmica da troca metablica entre oespao-tempo de vida e espao-tempode trabalho, em virtude da desmedidada jornada de trabalho, corri o espao-tempo de formao de sujeitos humano-genricos, aprofundando, desse modo, cotidianidade de homens e mulheres pessoal a mero trabalho assalariado(ALVES, 2013a, p. 86-87).

    Em verdade, na temporalidade histrica dacrise estrutural do capital, no sculo XXI, constitui-

    se uma nova forma de precarizao estrutural dotrabalho: a precarizao da fora de trabalho-subsumida-ao-sistema-de-mquinas. A rigor, a estranhamento dos indivduos, o seu completo precarizao, ao atingir o trabalho e a prpria vida do do ser genrico do homem, implica a corroso dacapacidade humana de negao da negao daalienao e do estranhamento social. De fato, tem-se

    a capturada subjetividade do homem-que-trabalha, conclui Alves (2013a, p. 10; 26:

    [...] a forma radical de dominao docapital como sistema sociometablico [...]o capital atinge seu limite radical, isto , ocapital atinge a sua prpria raiz, o homem,ou melhor, as relaes sociais no sentidoda constituio/deformao do sujeito

    capitalismo manipulatrio mantm sob tensoo homem integral. Concretamente, homenstrabalhadores e mulheres trabalhadoras vivenciama precarizao laboral e a precarizao da prpriaexistncia, comprometendo a sade, a perspectivade vida e a insero na totalidade das relaessociais. O sofrimento no trabalho, sob mltiplasformas, leva ao adoecimento fsico e mental, comdoenas caractersticas da epidemiologia laboral. capital torna-se totalidade social e o estranhamento

    do lazer. A rigor, o lazer torna-se meramente ummomento de subjetivao estranhada do capital.(ALVES, 2013a) Lazer consumo. E o consumismotorna-se uma forma de existncia social. Na

    era do capitalismo manipulatrio, em temposcontemporneos, o estranhamento alarga-se paraesferas do lazer e do consumo. Em verdade, coma terceira forma de produo social do capital, tem-se uma disputa, de forma radical, pela subjetividade

    E, essa manipulao da subjetividade gesta umadisputa ntima, a dilacerar homens trabalhadorese mulheres trabalhadoras nas suas experincias e restringindo seu espao-tempo de vida. emblemtico desta nova temporalidade do capitalo surto de adoecimentos mentais no mundo do de precarizao do trabalho, nas condies da criseestrutural do capital, assume a dimenso da barbriesocial (ALVES, 2013a).

    No esforo de apreenso e desvendamentodesse novo e precrio mundo do trabalho, nacivilizao do capital em crise, Giovanni Alves (2012;2013) circunscreve uma fecunda via analtica, aodemarcar, como um fenmeno contemporneo, nodecorrer dos trinta anos perversos de capitalismoglobal (dcadas de 1980/1990/ anos 2000): auniversalizao da condio de proletariedade7,como condio existencial de homens e mulheres a universalizao da precarizao do trabalho,

    cada vez mais estranhado, e da vida estranhada tendo o consumismo como forma de existncia. Estauniversalizao da condio de proletariedade, comocondio de existncia (des)humana, encarna-se em disseminam na civilizao contempornea do capitalem crise: instabilidade, insegurana, descontroleexistencial, incomunicabilidade, corroso do carter,deriva pessoal e sofrimento, risco e periculosidade,

    experimentao e manipulao, prosasmo edesencantamento, ausncia de projeto de vida,resignao. Tais atributos existenciais da condiode proletariedade

    [] permeiam as mltiplas relaessociais no sistema do capital em temposde capitalismo global, tornando-seatributos da vida social estranhada.

    Assim, a universalizao da condio deproletariedade acompanha o movimentovoraz do capital, a constituir a chamadamodernidade-mundo (ALVES, 2013a).

    Que marca a nova temporalidade histrica nacontemporaneidade.

    No contexto da universalizao da condiode proletariedade, a estender-se no mbito do

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    capitalismo global, emerge e constitui-se a novacamada social da classe trabalhadora: o precariado,a manifestar-se, com intensidade e amplitude, nosconsiderados pases capitalistas centrais, com

    permeia o sistema do capital em crise a interpelar aimaginao dialtica. O precariado a multidoda marca as ltimas dcadas do sculo XX, adentrando assumir novas propores, intensidade e amplitude.

    se circunscreve no cenrio contemporneo, nacondio de uma camada social de classe? esta histricos no plano da existncia social. Senovejamos!

    So milhes de trabalhadores jovens-adultoscom alta escolaridade, desempregados ou inseridos salrios, sem projetos de vida e perspectiva de futuro. uma multido de jovens proletrios assalariados,vinculados a camadas mdias, com nveis elevados de empregos precrios, a viver em situao deinsegurana econmica e social, sem identidadeocupacional, sem garantia de direitos e tomadospelo sentimento de ansiedade perante o futuro.

    uma camada da classe trabalhadora em construo,a vivenciar a precarizao do trabalho e da prpriavida, precisamente nesta articulao contemporneaentre faixa geracional (jovens-adultos), graueducacional (alta escolaridade) e forma de inserono trabalho e no mundo social (precarizada, instvele insegura)(ALVES, 2012a; 2013a; 2013b; 2013c).

    No mundo do capital em seu tempo histricode crise estrutural, o proletariado circunscreve umacoletividade de despojados no caso da Gerao Rascade Portugal, como aGerao Sem-Sem: sem trabalho, sem casa, sem

    acesso a direitos... ou, ento, como na condiodos Indignados, na Espanha, como a Gerao Ni-Ni: ni estudia, ni trabaja continuamente hipotecado, com a impossibilidadede fazer planos, vivendo imerso no dia a dia, no aquie no agora 2013a). Em verdade, tem-se em curso um novo modode controle sociometablico do capital, operandofraturas salientes na experincia do tempo social, de trabalhadores jovens-adultos, vivem numaespcie de presentismo contnuo, sem uma relao vivem e sem perspectiva de futuro.

    grupos de juventudes frustradas e revoltadas pases capitalistas globais, nos circuitos da crise, desencantamento e pela indignao a expressar-se

    de forma crescente. Este precariado encarna o perigode uma Bolha Educacional Global (STANDING,2013; ALVES, 2013): milhes de jovens-adultos frustrados pela nova dinmica do capitalismo global,encarnando a frustrao com a educaocomo viade insero no mundo do trabalho.

    Em verdade, este precariado umaexpresso peculiar, no contexto das juventudes, do a chamadapopulao sobrante se no das excluses e incluses como contradio em processo, nesta sua novatemporalidade histrica, atingiu um estgio em de homens e mulheres do prprio processo de funcionamento e revelando-se incapaz de incluir estapopulao sobrante, condenando, assim, amplos juventudes, na condio de um exrcito global deexcedentrios, imersos na insegurana do presente

    e sem perspectivas de futuro, constitui uma enfticaautocondenao do prprio sistema do capital,desvelando a natureza estrutural da sua crise(MSZROS, 2009).

    De fato, o

    [...] surgimento e ampliao doprecariado expe a verdadeira naturezada crise estrutural, isto , a contradioradical entre desenvolvimento das forasprodutivas e irrealizao estrutural daspromessas civilizatrias do capital(ALVES, 2013a, p.196).

    Assim, o precariado, ao dar visibilidade condio existencial a universalizar-se no mundosocial do capital em processo de crise estrutural, do estranhamento, aviltando e dilacerando odesenvolvimento da personalidade humana de rumo, sem perspectiva e sem projeto de vida, emmeio a uma crescente precarizao existencial.

    O precariado, a mundializar-se no sculoXXI, ganha visibilidade no cenrio contemporneo,

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    incomodar as classes dominantes e a tensionar tentativa de enfrentamento da crise do capital, emseus permanentes deslocamentos. A rigor, noscircuitos da crise, a multidodo precariado irrompe,

    com intensidade e amplitude, na semiperiferia doncleo orgnico do sistema do capital a exemplode Portugal, Espanha, Itlia e Grcia onde seexplicitam, com vigor, contradies mais candentesda ordem burguesa. No entanto, ao mostrar a suauniversalidade, como expresso peculiar da crise docapital, o precariado emerge, com fora, no coraodo Imprio da acumulao rentista, os EEUU, mais precarizao estrutural, no mbito do trabalho e daprpria existncia social estranhada, no contexto de social norte-americana. E, o precariado eclode empases da Amrica Latina, denunciando a condiode precariedade a partir de diferentes bandeirasde luta. E chega ao Brasil, em junho/julho 2013, no na gesto das cidades nas rotas do capital, aencarnar o ento denominado padro FIFA, em precariado revela-se na cena pblica, na sua luta porreconhecimento como sujeito social, constituindo

    uma rede de movimentos transnacionais, reunidos nos governos, reviravoltas no sistema do capital, formas do fazer poltico.

    De fato, o precariado uma multido global capitalismo mundializado e suas formas de trabalho a Coria do Sul a constituir uma potencial fora,

    gestada no limite das contradies, representandoum campo de tenses a se acumularem,expressando-se em ansiedade, raiva, insegurana,frustrao e indignao.

    precariado, um conceito em disputa

    nosso tempo histrico, circunscreve um campo dediscusso e de investigao. Em verdade, tem-seum conceito em disputa, com diferentes sentidos e

    distintas vertentes explicativas8

    . O cerne do debateconceitual , justamente, a natureza do precariadona condio de segmento social em consolidaona civilizao contempornea do capital. Trata-

    se de uma nova classe social ou de uma camada trabalhadores precarizados neste mundo do trabalho precarizado. essa uma polmica circunscrita nas

    9, The Precariat:The New Dangerous Classde 2011, publicada emportugus em 2013, com o ttulo O Precariado: anova classe perigosa; Giovanni Alves10 de estudos O enigma do precariado e a novatemporalidade histrica, sendo o autor da obraDimenses da Precarizao do Trabalho, publicadaem 2013, e, igualmente, em 2013, produz artigossobre o precariado no Brasil e sua revolta nasmanifestaes de junho/julho; Ruy Gomes BragaNeto11 autor da obra A Poltica do Precariado: dopopulismo hegemonia lulista, publicada em 2012,produzindo, em 2013, artigos sobre as rebeliesjuvenis.

    Abrindo o debate no campo acadmico-poltico, Guy Standing, a partir de apresentaesem dezesseis pases para grupos de acadmicos,estudantes e ativistas, consolida, em sua obra de2011, a concepo do precariado como uma classe-em-formao, dividida entre grupos revoltados e

    frustrados, mas unidos pela insegurana e pelo membros de minorias, sem acesso a direitos e rendaestvel; jovens com ensino superior frustrados e do capitalismo industrial, sem a opo de seguiras carreiras dos pais, ocupando postos de menorstatus (STANDING apud CAZES, 2013)12. Considera como possibilidade perturbadora, uma poltica de

    inferno, podendo, tambm, forjar uma nova polticade paraso no se trata da classemdia oprimidaou de uma classe baixa, tampouco precariado tem um fardo distintivo de insegurana eum conjunto diferente de reivindicaes, possuindouma existncia precria. Vincula a emergncia eexpanso do precariado ao modelo neoliberale suaagenda centrada na competitividade do mercado, apermear todos os aspectos da vida. Assim, avaliaStanding (2013, p. 15)

    transferncia de riscos e insegurana

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    para os trabalhadores e suas famlias.O resultado tem sido a criao de um muitos milhes de pessoas ao redor domundo sem uma ncora de estabilidade.Eles esto se tornando uma nova classeperigosa.

    E contundente em seu alerta: [...] precisamosurgentemente acordar para o precariado global. Hmuita raiva por a e muita ansiedade. (STANDING,2013, p.11).

    Em sua construo conceitual, Guy Standingcircunscreve o precariado como classe-em-formao, a partir da insegurana no trabalhoem suas mltiplas formas, destacando, como umelemento-chave, a falta de uma identidade segura quatro

    A: raiva (anger em ingls), anomia, ansiedade ealienao. E explicita:

    A raiva decorre tanto da frustraodiante das vias aparentemente de relativa privao [...] O precariadose sente frustrado no s por causa detoda uma vida de acenos de empregostemporrios, com todas as inseguranas nenhuma construo de relaes de

    tambm no tem nenhum meio de a pessoa em suspenso entre a profundaautoexplorao e o desengajamento(STANDING, 2013, p. 41).

    Giovanni Alves, em sua construo analtica dialtica, concebe o precariado no como uma classeemergente, mas, sim, como uma camada social daclasse do proletariado, constituda na convergncia

    categorial de trs variveis: faixa etria, escolaridadee insero salarial (ALVES, 2012; 2013a; 2013b;2013c; 2013d). Assim, o precariado em Alves,como camada social da classe do proletariado, adultos, altamente escolarizados, inseridos emrelaes salariais precrias. E, em um processo deaproximaes, buscando dar maior preciso tericaa cada varivel, no sentido de conferir precisocategorial ao conceito, Alves explicita:

    Juventude- O precariado uma camadasocial constituda pela juventude. Esta

    a percepo imediata da categoria:trata-se de um fenmeno social declasse predominantemente juvenil.

    Ora utilizamos o termo jovens, outrasvezes, jovens-adultos. Na verdade,existem controvrsias sobre o conceito faixas etria, podemos estabelecer o

    seguinte: dos 18 aos 35 anos de idadepodem ser considerados jovens-adultos.No se trata de demarcao biolgica,mas sim scio-cultural [...]Escolaridade - O precariado umacamada social constituda por jovens-adultos altamente escolarizados. Nose trata meramente de escolarizao expectativas de insero ocupacional de dos anseios e sonhos da civilizao e famlia. Nesse caso, a escolarizaocapaz de elevar as expectativas derealizao pessoal como trabalhadorassalariado, consumidor e chefe defamlia ideais burgueses tem sido aescolarizao superior (teoria do capital um tipo de escolarizao formadora deexpectativas de realizao pessoal do propicia reconhecimento social, status e

    no plano dos anseios, sonhos eexpectativas dos ideais burgueses histrica do capital (o capitalismofordista-keynesiano). Por outro lado, oensino mdio apenas a etapa inicialda escolarizao capaz de elevar asexpectativas de insero ocupacional burgus[...]Insero salarial o precariado acamada social inserida em atividadessalariais precrias. Com a crisedo padro fordista-keynesiano de

    contratao salarial, surge uma srie de futuro das individualidades pessoais declasse. A frustrao das expectativasse realiza com a insero precria nomercado de trabalho. Na verdade, asempresas implodem o ideal de carreira a trajetria do sujeito, ampliando o diz respeito a emprego e renda. o possui no apenas um componente

    de precarizao salarial, mas tambmum componente de precarizaoexistencial, precarizao do homem-

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    233A PRECARIZAO ESTRUTURAL DO TRABALHO NA CIVILIZAO DO CAPITAL EM CRISE: o precariado comoenigma contemporneo

    R. Pol. Pbl., So Lus, Nmero Especial, p. 225-239, julho de 2014

    precria do precariado no apenassalarial no sentido restrito, mas possuium elemento existencial trata-se deuma insero precria nas relaes detrabalho e de vida: trabalho precrio e social (o precariado est imerso na

    precarizao dos servios pblicos deeducao e sade, sendo manipuladosintensamente pelo consumo, produoe poltica) (ALVES, 2013d, p.1 e 2)13.

    Ruy Braga, em uma interpretao marxista, ampliando o conceito para os trabalhadoresprecarizados, enfatizando a precariedade comodimenso intrnseca do processo de mercantilizaodo trabalho. Explicita ele como fundamento da suaconstruo conceitual:

    mercantilizao do trabalho, do cartercapitalista da diviso do trabalho e da a precariedade constitutiva da precariado no deve ser interpretadocomo o antpoda do salariado, seuoutro bastardo ou recalcado. Narealidade, ele a prpria condio deexistncia do salariado: tanto na Europa o compromisso fordista mostrou-se nacional e sindicalizada da classe e migrante. (BRAGA, 2012, p.17)

    E delineia, ento, uma concepo ampla egeneralizante do precariado:

    precarizados so uma parte da classetrabalhadora em permanente trnsito

    entre a possibilidade da exclusosocioeconmica e o aprofundamentoda explorao econmica [...] A do precariado nos obriga tambm adiferenci-lo dos , por isso mesmo, tendencialmente maisestveis, da classe trabalhadora. Em a frao mais mal paga e explorada doproletariado urbano e dos trabalhadoresagrcolas, excludos a populaopauperizada e o lumpemproletariado, do capitalismo perifrico. (BRAGA,2012, p.19).

    polmica conceitual do precariado no debate categoria em disputa. Incidindo o foco analtico discordncia de fundo entre Guy Standing e os

    campo do marxismo, a mobilizarem a imaginao do precariado no contexto da civilizao do capital.Para Alves e Braga no se trata de uma classenova como defende Standing e, sim, de umsegmento, uma camada social do proletariado. A precariado. Braga amplia a concepo de precariadopara o proletariado precarizado como a frao mais mal paga e explorada doproletariado urbano e trabalhadores agrcolas, precariado, existe uma aproximao com Standing imigrantes e membros de minorias, jovens do tpicos do capitalismo industrial. J Giovanni Alves,buscando dar conta de um fenmeno da novatemporalidade do capital em crise, circunscreve adultos, altamente escolarizados, inseridos

    ampliao do precariado para o contingente detrabalhadores precarizados, no mundo do trabalhocontemporneo, compromete a capacidadeexplicativa desta categoria analtica, desfocando ofenmeno marcante nesta temporalidade histrica e este amplo e crescente segmento de jovens- mundo do trabalho e na prpria vida social,mergulhados na insegurana e sem perspectivade presente e de futuro. Deste modo, com estaampliao, o conceito de precariado perde o seupoder explicativo, no sentido da teorizao nos a situar-me nesta polmica conceitual, assumo,como base de minhas investigaes sobre oprecariado, a vertente analtica de Giovanni Alves, entendimento do fenmeno precariado, efetivando-se aproximaes categoriais, a exigir permanentecrtica e autocrtica (ALVES, 2013c; 2013d).

    Nas trilhas analticas de Giovanni Alves, merece a sua precariedade ampla e ampliada, a encarnar

    a universalizao da condio de proletariedade.De fato, o precariado, como verdadeira contradioviva manipulao da ordem burguesa e por isso vive,

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    234 Alba Maria Pinho de Carvalho

    R. Pol. Pbl., So Lus, Nmero Especial, p. 225-239, julho de 2014

    com maior intensidade, a precarizao do trabalho, sentido de precarizao existencial (ALVES, 2013b).E explicita Alves:

    No se trata apenas da precarizao de jovens inseridos em relaes detrabalho precrias, mas a precarizaoexistencial ou precarizao do homem- de existncia alienada da vida urbanaprecria. (ALVES, 2013b, p. 2)

    precarizao da circulao e da mobilidade urbanaprecria, a precarizao do tempo de vida assolado e alienante. E conclui:

    A precarizao do trabalho deriva noapenas da organizao do trabalho just in time, promovendo uma novadimenso de desefetivao humano-genrica: a precarizao existencial trabalha [...] o precariado tende aestar convulsionado, deste modo, peloestranhamento posto como carncia defuturidade e de realizao pessoal [...] o

    em carecimentos sociais e carecimentosradicais prprias da condio deproletariedade. (ALVES, 2013b, p. 2 -3).

    O precariado, imerso na precariedade salariale na precaridade existencial, incorpora a ideologia docapitalismo global, encarnando os valores-fetichesda mercantilizao e do individualismo. A rigor,

    [...] no plano da conscincia socialcontingente, a gerao precria`possui uma conscincia liberal, tendo com seus templos de consumismo. [...](ALVES, 2013, p.203).

    a gerao Y, a encarnar a manipulaointensiva e extensiva na sociedade em rede. De fato,o precariado tornou-se alvo privilegiado do poderioda ideologia na ordem burguesa global, a operar,principalmente, no espectro moral-intelectual. Emmeio a esta manipulao, no limite do trabalho eda vida estranhados, o precariado encarna reaes

    contra-hegemnicas, sendo emblemticos os modo coletivo, em sua peculiaridade, a ordem daprecarizao estrutural do trabalho. Em verdade, o

    precariado a contradio em processo, impondo aopensamento crtico uma ampla via de investigaosobre a sua subjetividade, no sentido de captar osmovimentos da ideologia, a operarem nos coraese mentes desta gerao precria, no contexto de umcapitalismo manipulatrio em crise.

    uma viainvestigativa em aberto

    perifrico, no mbito dos processos mundiaisde acumulao, particularmente no Brasil, aprecarizao laboral no um fenmeno novo,caracterizando a sociedade urbana industrial desdeas suas origens. No entanto, nos ltimos trintaanos e, de forma peculiar, no sculo XXI, este expresses, alastrando-se no interior do capitalismoglobal, nos mais diferentes contextos, sobremodo a pode nomear de morfologia social do trabalho nosanos 2000, encarnando uma nova precariedade e constitui-se o precariado no Brasil, em suasexpresses peculiares, constitudo por um conjuntode categorias sociais: estudantes de nvel mdio ounvel superior, recm-graduados desempregadosou inseridos em relaes salariais precrias; ou

    ainda por jovens empregados precarizados (ALVES,2013c).

    O desvendamento crtico da emergncia,constituio e expresses peculiares do precariadona cena brasileira remete, necessariamente, a umaanlise do momento contemporneo do capitalismono Brasil, discutindo as expresses da crise do capitalentre ns e a atual insero brasileira nos processos das polticas de ajuste e no neodesenvolvimentismo,a desvendar o modelo brasileiro rentista-extrativista,

    ancorar a dinmica macroeconmica no consumo eo consumo no crdito (CARVALHO, 2013a; 2013b;CARVALHO; CASTRO, 2013)14.

    Neste Brasil do sculo XXI de dependnciaredobrada chamado neodesenvolvimentismo, Giovanni Alves(2012b), ao analisar a nova morfologia social dotrabalho, com o surgimento de um novo metabolismo do crescimento do emprego por tempo indeterminadoe da reduo da taxa de informalidade a partir de2003, a nova precariedade salarial manifestou-sepelo aumento, em termos absolutos e relativos, dapresena de trabalhadores perifricos, inseridos emrelaes de trabalho precrias. De forma inconteste,

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    235A PRECARIZAO ESTRUTURAL DO TRABALHO NA CIVILIZAO DO CAPITAL EM CRISE: o precariado comoenigma contemporneo

    R. Pol. Pbl., So Lus, Nmero Especial, p. 225-239, julho de 2014

    o fenmeno da terceirizao cresceu, no Brasil, nos

    [...] a nova precariedade salarial noBrasil se manifesta, no apenas pelo tambm pela adoo, nos locais de da jornada de trabalho e da remuneraosalarial15.

    Assim, o precariado, nesta nova particulares. Neste sentido, cabe destacar duasencarnaes emblemticas da gerao precriana vida brasileira do sculo XXI: amplo segmento

    instituies pblicas e no chamado Terceiro Setor,a vivenciar mltiplas formas de precarizao dotrabalho, sobremodo nos circuitos da terceirizaoe de precarizao da vida, mergulhado no risco ena insegurana econmica e social (CARVALHO,2012); os teleoperadores da indstria de call centere sua insero laboral intensamente precarizada,atingindo e comprometendo a sade e a vida dessestrabalhadores(as).

    Adentrando no universo de trabalho e de vidado precariado brasileiro, constata-se a precarizaoampliada do trabalho, circunscrita por Alves (2013a;2013b; 2013c; 2013d): precarizao salarial em

    rotatividade do trabalho, contratos precrios, baixossalrios, frustrao de expectativas de carreira;precarizao existencial, encarnado no padro devida estranhado, atingindo e comprometendo a So jovens-adultos carentes de vida com sentidos,projetos e utopias, carentes de vida plena. Estaprecarizao existencial manifesta-se na conjugaode distintas dimenses, cabendo enfatizar: modo devida em ritmo acelerado, vidas no limite e no risco,

    imersas no presentismo e sem perspectivas de futuro; estranhado e tempo livre manipulado pelo consumo vida urbana precarizada com a precariedade deservios pblicos nas cidades brasileiras: transportepblico, sade, educao, segurana pblica, carecimentos radicais de futuridade e de realizaopessoal, atingir estes jovens-adultos escolarizados ecom insero precria nas relaes de trabalho e na

    e se amplia no Brasil do sculo XXI, despojado de

    em junho/ julho de 2013, em mais de trezentas e rebelies

    juvenis

    dos protestos nas ruas das cidades brasileiras.(ALVES, 2013c, p.1).

    uma aposta em aberto

    Em meio a polmicas e discusses, impe- precariado nos movimentos da Histria? Qual oseu futuro? Para onde o precariado est a levar acivilizao do capital em crise?

    ontolgica, em aberto, cabe delinear elementos-chave na constituio do ser do precariado, nestatemporalidade histrica de crise estrutural docapital. Nessa perspectiva, cabe demarcar a sua (2013b, p. 2) assim explicita:

    como camada social do proletariado, em si e para si, profundamente incorpora as contradies candentes

    da ordem do capital em sua etapa de precariado constitudo por jovensaltamente escolarizados, ele tende,por um lado, a incorporar a contradioradical entre, por um lado, os sonhos deconsumo e anseios de ascenso social,e por outro, os carecimentos radicaisinscritos na busca por uma vida plenade sentido carecimentos radicaisincapazes de serem realizados no seio precariado reside a contradio radicalda forma-mercadoria entre valor detroca e valor de uso (2013b, p. 2)

    considerando esta contraditoriedade caracteriza o precariado como a nova classe

    perigosa expanso pode levar a umapoltica de infernoou auma poltica de paraso, a depender dos rumos desua formao como uma classe-para-si.

    Em um processo de aproximaes sucessivasna problematizao em curso, importante delinear,

    constitudo por trabalhadores assalariados jovens- invisibilidade social de sua natureza de classe. A

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    R. Pol. Pbl., So Lus, Nmero Especial, p. 225-239, julho de 2014

    rigor, a precariedade estrutural do trabalho determina vida, desenvolvam identidades fragmentadas,pulverizadas com a imploso dos laos desolidariedade. a precarizao das identidadesindividuais e coletivas, como sinaliza Druck (2009).

    Nestes processos identitrios precrios, noconseguem constituir uma conscincia de classe.Avalia Giovanni Alves (2012a, p. 2)

    A ampliao da condio deproletariedade do precariado ocorre,paripassu, com o incremento da manipulao entendimento dos indivduos histricosmundiais, a auto-conscincia de classe.

    A invisibilidade social da natureza declasse do precariado o processoideolgico supremo do capitalismo

    se ampliam as contradies vivas docapital, impulsiona-se com intensidade,a desefetivao humano-genrica, isto, a precarizao dos sentido humanoscapazes de negao da negao. Umdos alvos privilegiados da manipulaosocial so hoje, os jovens proletrios para si, a contradio suprema do capitalem sua fase de crise estrutural.

    nos circuitos da crise do capital, no incio da

    segunda dcada do sculo XXI, multides dessesjovens precrios, nas cidades europeias, norte-americanas, latino-americanas e, particularmente,nas cidades brasileiras, no limite de sua angstia,de sua frustrao e indignao, tomam conscinciade sua situao de vulnerabilidade e inseguranaeconmica e social, assumindo novas formasdo conceber e do fazer poltico, a articular apotencialidade de universalizao do ciberespao ea possibilidade histrica de coletivizao da gora,

    esperar de sua mobilizao e singulares formas deorganizao poltica, materializadas nas grandes o mundo, marcando o ano de 2011, na Europa, nosEstados Unidos e em pases da Amrica Latina,como ano rebelde, com ampla divulgao miditica,espetacularizando o regresso da poltica, a (re)constituir, em tempos contemporneos do sculoXXI, praas e ruas em espaos pblicos. No Brasil, asurpresa histrica das rebelies juvenis marca o anode 2013, como o nosso ano rebelde, transformandoa onda massiva de protestos e a intensa represso Confederaes!

    E passada a fase espetacular das ondasmassivas de protestos e revoltas, as mobilizaes

    do precariado continuam e consolidam-se, semo impacto da surpresa histrica modo privatizante de viver, sem a cobertura dachamada grande mdia e restrita ao espao das

    do sistema do capital mundializado e as instituiesdemocrticas, sedimentadas nos circuitos histricosdo capitalismo? Quais as potencialidades e limitesda sua insurgncia e indignao como uma multidoglobal de destitudos e despojados a constituir, hoje,a multido do precariado? esse um campo de debates e investigaes!

    Guy Standing (2011; 2013) sustenta aexigncia histrica do precariado ser consideradocomo classe emergente, em suas inseguranas no mbito das polticas pblicas. E defende aexigncia da universalizao dos Programasde Renda Bsica, no sentido da redistribuio mercantil do capital, constituindo a alternativapara enfrentar o capitalismo contemporneo eatender o precariado em sua necessidade vital desegurana.

    o precariado, a conferir visibilidade, nos primrdios destituda de propriedade proclamada por Marx

    e Engels estaria a encarnar a oportunidade indivduos histrico-mundiais empiricamente universais, cabendo, nestaperspectiva, considerar o papel da Internet, com seusblogs alternativos e redes sociais, na construo dasindividualidades histrico-mundiais.

    Em verdade, o precariado, como enigmacontemporneo, constitui uma interpelao concreto pensado, no pleno exerccio da imaginaodialtica exigncia histrica, a conscincia crtica, capaz de

    surgem nesta nova temporalidade da civilizao docapital em crise. a construo do pensamentocrtico, no processo permanente de ampliaesconceituais, como fardo histrico do tempo presente,buscando criar condies sociometablicas para anegao da negao.

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    individualidades pessoais imersas na condio deproletariedade. A multido expressa o ser-a (dasein) condio de alienao/estranhamento social.

    8 Guy Standing (2013, p. 26, 27), ao empreender o

    o uso do termo no sentido de demarcando alguns foi usado pela primeira vez pelos socilogos francesesnos anos 1980, para descrever os trabalhadores

    popular. Na Itlia, o termo precariato` tem sido pessoas cumprindo tarefas casuais e com baixasrendas, indicando a existncia precria com umestado de vida normal [...] Na Alemanha, o termo temsido usado para descrever no apenas trabalhadores tm esperana de integrao social [...] No Japo, otermo tem sido usado como sinnimo de trabalhadorpobre embora tenha evoludo como um termo

    com o movimento japons do Dia do Trabalho e oschamados sindicatos freeter, formados por jovens e de vida [...] O Japo tem produzido um grupo de

    jovens trabalhadores conhecidos como freeters

    Arbeiter, sido forado a um estilo de emprego casual." Cabe

    Standing, Giovanni Alves e Ruy Braga desenvolvem debate em aberto, a exigir esforo sistemtico deinvestigao, na vinculao dialtica Histria e Teoria.

    9 Guy Standing Professor de Estudos deDesenvolvimento na Escola de Estudos Orientaise Africano (SOAS). Junto com o senador EduardoSuplicy e o professor Claus Offe, co-presidenteda BIEN (Rede Planetria pela Renda Bsica/ BasicIncome Earth Network).

    10 Giovanni Alves professor da UNESP-Marilia, livre-

    Aderrelio de caro - Sonhos, expectativas e aspiraesde jovens empregados do novo (e precrio) mundo dotrabalho no Brasil (2003-2013). um dos lderes do Estudos da Globalizao,e da RET - Rede de Estudos do Trabalho.

    11 Rui Gomes Braga Neto socilogo brasileiro,especialista em sociologia do trabalho. Atualmente,trabalha como professor do Departamento de Cincias Humanas da Universidade de So Paulo

    (USP) onde coordenou o Centro de Estudos dosDireitos da Cidadania (Cenedic). editor da revistaOutubro (Revista do Instituto de Estudos Socialistas).

    12 Trata-se de uma entrevista, por e-mail, concedida referncia na matria de Cazes, publicada emcaderno do Jornal O Globo de 19 de outubro de 2013,conforme consta nas Referncias.

    13

    trabalha de per si cada uma das trs variveisconstituintes do precariado, em sua construoanaltica, foi apresentada em texto de um e-mail em pelo mestrando de Sociologia da UniversidadeFederal do Cear (UFC) Francisco Raphael CruzMaurcio, a partir de amplas discusses desenvolvidas

    orientei, no primeiro semestre de 2013, no Programa da sntese conceitual ento sistematizada por Alves,

    14 Para uma anlise do Brasil Contemporneo no sculo neodesenvolvimentismo, ver produes circunscritasnas Referncias: Brasil en el siglo XXI: insercin en

    del Estado de Alba Carvalho; Posio do Brasilno contexto latinoamericano: dependncia nastramas da autonomia e do subdesenvolvimentode Alba Carvalho; Crise do capital e dilemas dodesenvolvimento: padro brasileiro de insero nocapitalismo mundializado de Alba Carvalho e AlbaCastro. A partir desta anlise do modelo brasileiro,

    da morfologia social do trabalho no Brasil no sculoXXI, investigando as expresses do precariado nacena brasileira contempornea.

    15 nova morfologia do trabalho no Brasil na dcadade 2000, nos marcos da nova precariedade salarial

    da Universidade de Coimbra, em 2012. Estetrabalho - devidamente explicitado nas refernciascircunscreve a temporalidade histrica no interior da

    Brasil, nos anos 2000, analisando a nova morfologia sociometabolismo laboral.

    Alba Maria Pinho de CarvalhoAssistente SocialDoutora em Sociologia pela Universidade Federal doCear (UFC)Professora do Departamento de Cincias Sociais daUniversidade Federal do Cear (UFC)E-mail: [email protected]

    Universidade Federal do Cear UFC CEP: 60020-181