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Preço € 1,00. Número atrasado € 2,00 L’O S S E RVATORE ROMANO EDIÇÃO SEMANAL Unicuique suum EM PORTUGUÊS Non praevalebunt Ano XLVIII, número 48 (2.492) Cidade do Vaticano quinta-feira 30 de novembro de 2017 y(7HB5G3*QLTKKS( +_!#!#!&!{! No Myanmar o Papa recordou que rancor e vingança não são o caminho para alcançar a reconciliação Como sanar as feridas da violência A senda da cura GIOVANNI MARIA VIAN Há um ano a visita do Papa ao Myanmar teria parecido «um pu- ro sonho», disse o arcebispo de Yangon, cardeal Charles Bo, na saudação ao Pontífice que tinha acabado de celebrar a missa na qual participaram católicos vindos de todas as parte do país: muitas dezenas de milhares de pessoas que participaram na liturgia com um recolhimento impressionante. «Somos como Zaqueu, no meio das nações não podíamos ver o nosso pastor. E como Zaqueu fo- mos chamados: desce, quero ir à tua casa», disse depois o cardeal, evocando assim o episódio da vi- sita de Jesus ao publicano, narra- da no Evangelho de Lucas no iní- cio do capítulo 19. E agora «vol- tamos para casa com uma ex- traordinária energia espiritual, or- gulhosos de ser católicos», por- que «hoje aconteceu um mila- gre», exclamou o arcebispo. O agradecimento do cardeal, o primeiro que vestiu a púrpura ro- mana na história do país, expli- cou da melhor forma o significa- do da visita, a primeira de um Pontífice ao Myanmar. E, por sua vez, ele apresentou-se como um peregrino, que veio aqui «para ouvir e aprender de vós» e ofere- cer «palavras de esperança e con- solação». Palavras que indicaram a vereda da cura das numerosas feridas, «tanto visíveis como invi- síveis». Um caminho que a Igre- ja, minoritária mas muito «viva» nesta nação, está a indicar concre- tamente a «um grande número de homens, mulheres e crianças, sem distinções de religião nem de pro- veniência étnica», realçou o Papa Francisco. Depois, num país quase inteira- mente budista, o Pontífice encon- trou-se com o mais importante organismo religioso, constituído por cerca de cinquenta monges, Os rostos sorridentes de um grupo muito colorido de crianças acolhe- ram Francisco à sua chegada ao Myanmar. No centro da atenção me- diática mundial pela primeira visita de um Papa, o país quis mostrar a sua parte melhor: uma representação dos milhões de jovens que vivem nesta antiga nação. No Myanmar o Papa abordou no- vamente todos os temas queridos ao seu magistério: respeito pelos direi- tos ao diálogo entre as religiões para promover a paz; defesa dos pobres e tutela do meio ambiente. Temas que estiveram no centro do encontro rea- lizado à tarde no arcebispado com a mais alta autoridade militar do país, o general Min Aung Hlaing. Duran- Dedicada a migrantes e refugiados a mensagem pontifícia para o dia mundial de 2018 Homens e mulheres em busca de paz Conferência no Vaticano Por um desenvolvimento sustentável PÁGINA 16 Os migrantes e refugiados, «ho- mens e mulheres em busca de paz», estão no centro da mensa- gem do Pontífice por ocasião do 51º dia mundial da paz, que será celebrado a 1 de janeiro de 2018. Apresentada na manhã de 24 de novembro — no dia seguinte ao significativo momento de oração presidido pelo Papa Francisco na basílica vaticana para implorar a paz para dois países martirizados por conflitos e violências, o Sudão do Sul e a República Democrática do Con- go — a mensagem exorta a abra- çar «com espírito de misericór- dia os que fogem da guerra e da fome, ou que são obrigados a deixar as suas terras por causa de discriminações, perseguições, pobreza e degradação ambien- tal». PÁGINAS 10, 11 E 13 CONTINUA NA PÁGINA 8 monges budistas, reunido no Kaba Aye Centre, Francisco exortou os lí- deres religiosos a falar «com uma só voz afirmando os valores perenes da justiça, da paz e da dignidade fun- damental de cada ser humano». O Papa deslocou-se para o aeroporto internacional, onde se despediu do país e se transferiu para a segunda etapa da viagem, o Bangladesh. PÁGINAS 2 A 9 misso de solidariedade e de assistên- cia em apoio de tantas pessoas «sem distinções de religião ou de prove- niência étnica». Precisamente o tema da «cura» das feridas foi retomado com vigor nos outros dois encontros que ritmaram o dia do Papa. Com o conselho supremo “sangha” dos encontro com os prelados do país concluiu este dia A missa para os jovens celebrada na Catedral da Imaculada Concei- ção de Yangon, na manhã de quin- ta-feira 30 de novembro, foi o último ato da visita do Sumo Pontífice ao Myanmar. No final da celebração o te o diálogo falaram, entre outros assuntos, sobre a si- tuação do país neste momen- to de transição. Diante das autoridades po- líticas e civis do Myanmar, o Papa indicou a via mestra da «reconciliação nacional» a um país «que sofreu muito e ainda sofre, por causa de conflitos internos e de hostili- dades». No discurso pronun- ciado no audotorium da In- ternational Convention Cen- tre da capital Nay Pyi Taw a 28 de novembro, na conclu- são do segundo dia da via- gem na Ásia, reafirmou que «o futuro do Myanmar deve ser a paz». Ao responder às palavras de saudação de Aung San Suu Kyi, conse- lheira de Estado e ministra dos Negócios Estrangeiros — a qual confirmou a necessida- de de levar por diante o pro- cesso de paz no país, referin- do-se à difícil situação no es- tado de Rakhine — o Pontífi- ce indicou a “cura das feri- das” como «prioridade políti- ca e espiritual fundamental» do Myanmar. A primeira missa pública de um Pontífice no território do Myanmar — celebrada na manhã de quarta-fei- ra 29 de novembro em Yangon — ofereceu a Francisco a ocasião para agradecer à Igreja local o compro-

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L’O S S E RVATOR E ROMANOEDIÇÃO SEMANAL

Unicuique suum

EM PORTUGUÊSNon praevalebunt

Ano XLVIII, número 48 (2.492) Cidade do Vaticano quinta-feira 30 de novembro de 2017

y(7HB5G3*QLTKKS( +_!#!#!&!{!

No Myanmar o Papa recordou que rancor e vingança não são o caminho para alcançar a reconciliação

Como sanar as feridas da violência

A sendada cura

GI O VA N N I MARIA VIAN

Há um ano a visita do Papa aoMyanmar teria parecido «um pu-ro sonho», disse o arcebispo deYangon, cardeal Charles Bo, nasaudação ao Pontífice que tinhaacabado de celebrar a missa naqual participaram católicos vindosde todas as parte do país: muitasdezenas de milhares de pessoasque participaram na liturgia comum recolhimento impressionante.«Somos como Zaqueu, no meiodas nações não podíamos ver onosso pastor. E como Zaqueu fo-mos chamados: desce, quero ir àtua casa», disse depois o cardeal,evocando assim o episódio da vi-sita de Jesus ao publicano, narra-da no Evangelho de Lucas no iní-cio do capítulo 19. E agora «vol-tamos para casa com uma ex-traordinária energia espiritual, or-gulhosos de ser católicos», por-que «hoje aconteceu um mila-gre», exclamou o arcebispo.

O agradecimento do cardeal, oprimeiro que vestiu a púrpura ro-mana na história do país, expli-cou da melhor forma o significa-do da visita, a primeira de umPontífice ao Myanmar. E, por suavez, ele apresentou-se como umperegrino, que veio aqui «paraouvir e aprender de vós» e ofere-cer «palavras de esperança e con-solação». Palavras que indicarama vereda da cura das numerosasferidas, «tanto visíveis como invi-síveis». Um caminho que a Igre-ja, minoritária mas muito «viva»nesta nação, está a indicar concre-tamente a «um grande número dehomens, mulheres e crianças, semdistinções de religião nem de pro-veniência étnica», realçou o PapaFr a n c i s c o .

Depois, num país quase inteira-mente budista, o Pontífice encon-trou-se com o mais importanteorganismo religioso, constituídopor cerca de cinquenta monges,

Os rostos sorridentes de um grupomuito colorido de crianças acolhe-ram Francisco à sua chegada aoMyanmar. No centro da atenção me-diática mundial pela primeira visitade um Papa, o país quis mostrar asua parte melhor: uma representaçãodos milhões de jovens que vivemnesta antiga nação.

No Myanmar o Papa abordou no-vamente todos os temas queridos ao

seu magistério: respeito pelos direi-tos ao diálogo entre as religiões parapromover a paz; defesa dos pobres etutela do meio ambiente. Temas queestiveram no centro do encontro rea-lizado à tarde no arcebispado com amais alta autoridade militar do país,o general Min Aung Hlaing. Duran-

Dedicada a migrantes e refugiados a mensagem pontifícia para o dia mundial de 2018

Homens e mulheres em busca de paz

Conferência no Vaticano

Por um desenvolvimentosustentável

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Os migrantes e refugiados, «ho-mens e mulheres em busca depaz», estão no centro da mensa-gem do Pontífice por ocasião do51º dia mundial da paz, que serácelebrado a 1 de janeiro de 2018.

Apresentada na manhã de 24de novembro — no dia seguinteao significativo momento deoração presidido pelo PapaFrancisco na basílica vaticanapara implorar a paz para doispaíses martirizados por conflitose violências, o Sudão do Sul e aRepública Democrática do Con-go — a mensagem exorta a abra-çar «com espírito de misericór-

dia os que fogem da guerra e dafome, ou que são obrigados adeixar as suas terras por causade discriminações, perseguições,pobreza e degradação ambien-tal».

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monges budistas, reunido no KabaAye Centre, Francisco exortou os lí-deres religiosos a falar «com uma sóvoz afirmando os valores perenes dajustiça, da paz e da dignidade fun-damental de cada ser humano». O

Papa deslocou-se para o aeroportointernacional, onde se despediu dopaís e se transferiu para a segundaetapa da viagem, o Bangladesh.

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misso de solidariedade e de assistên-cia em apoio de tantas pessoas «semdistinções de religião ou de prove-niência étnica». Precisamente o temada «cura» das feridas foi retomadocom vigor nos outros dois encontrosque ritmaram o dia do Papa. Com oconselho supremo “sangha” dos

encontro com os prelados do paísconcluiu este dia

A missa para os jovens celebradana Catedral da Imaculada Concei-ção de Yangon, na manhã de quin-ta-feira 30 de novembro, foi o últimoato da visita do Sumo Pontífice aoMyanmar. No final da celebração o

te o diálogo falaram, entreoutros assuntos, sobre a si-tuação do país neste momen-to de transição.

Diante das autoridades po-líticas e civis do Myanmar, oPapa indicou a via mestra da«reconciliação nacional» aum país «que sofreu muito eainda sofre, por causa deconflitos internos e de hostili-dades». No discurso pronun-ciado no audotorium da In-ternational Convention Cen-tre da capital Nay Pyi Taw a28 de novembro, na conclu-são do segundo dia da via-gem na Ásia, reafirmou que«o futuro do Myanmar deveser a paz». Ao responder àspalavras de saudação deAung San Suu Kyi, conse-lheira de Estado e ministrados Negócios Estrangeiros —a qual confirmou a necessida-de de levar por diante o pro-cesso de paz no país, referin-do-se à difícil situação no es-tado de Rakhine — o Pontífi-ce indicou a “cura das feri-das” como «prioridade políti-ca e espiritual fundamental»do Myanmar.

A primeira missa pública de umPontífice no território do Myanmar— celebrada na manhã de quarta-fei-ra 29 de novembro em Yangon —ofereceu a Francisco a ocasião paraagradecer à Igreja local o compro-

página 2 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 30 de novembro de 2017, número 48

L’OSSERVATORE ROMANOEDIÇÃO SEMANAL

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Mensagem de reconciliaçãoO cardeal secretário de Estado em vésperas da viagem do Santo Padre

«Nestes dois países a comunidadecatólica constitui uma minoria noseio de maiorias respetivamente mu-çulmana no Bangladesh e budista noMyanmar. É lógico que o Papa en-corajará estas comunidades — alémde as confirmar na fé — a serem umapresença de paz, de reconciliação ede solidariedade na própria socieda-de, por conseguinte, a trabalhar so-bretudo pelo bem comum»: para ocardeal Pietro Parolin esta é a men-sagem prioritária que o Pontífice le-vará ao Sudeste asiático por ocasiãoda sua terceira viagem ao continente,de 26 de novembro a 2 de dezem-bro. O secretário de Estado, que co-mo de costume acompanhará Fran-cisco, falou sobre isto numa entrevis-ta à Secretaria para a comunicaçãoconcedida a Alessandro Di Bussolo.

À pergunta sobre quem serão osprimeiros destinatários da mensagempontifícia, o purpurado respondeuindicando precisamente as comuni-dades cristãs, chamadas a não per-manecer «alheias à própria realida-de», mas ao contrário a ser «final-mente integradas e capazes de daruma contribuição ao crescimento ci-vil e pacífico destes países».

Contributo que não pode prescin-dir do diálogo e da colaboração comas religiões maioritárias da área. Por-tanto, Francisco encontrar-se-á tam-bém com os líderes religiosos locaispara indicar, observou o cardeal Pa-rolin, «o que sempre propôs nos paí-ses onde estão presentes várias reli-giões, diversos grupos religiosos».Aliás, acrescentou, «as religiões po-dem contribuir notavelmente para apaz, o desenvolvimento, a reconcilia-ção, a convivência pacífica entre ospovos no seio dos países, sobretudose se unirem para trabalhar nestesentido».

No que diz respeito aos ventos deguerra que voltaram a soprar naÁsia com as tensões entre a Coreiado Norte e os Estados Unidos daAmérica, o secretário de Estado re-cordou que o Pontífice pediu váriasvezes que «se tentem resolver ascontrovérsias existentes». E «o factode se encontrar na Ásia, muito maispróximo desta área de crise queatualmente perturba e preocupa omundo inteiro, será uma ocasião pa-ra renovar este apelo». Também por-que «o Santo Padre está sempre dis-posto a oferecer toda a sua ajuda e ada Santa Sé para procurar enfrentare resolver estes problemas através danegociação e do encontro». Por estarazão, é de esperar que «mais umavez, nesta circunstância, renovará es-te apelo, ciente de que sem estesmeios não há possibilidade de resol-ver de maneira pacífica estas situa-ções tão preocupantes, consciente —como já os Papas repetiram váriasvezes — de que nada está perdidocom a paz e tudo o pode ser com a

guerra, sobretudo se se trata, comona perspetiva, de uma guerra atómi-ca».

Interpelado sobre a questão dosrefugiados que vivem em condiçõesdesumanas em ambos os países, opurpurado evidenciou que o Papa«manifestou em diversas ocasiões asua atenção em relação à situaçãodestes refugiados», por exemplocom o apelo lançado no final do Re-gina caeli de 24 de maio de 2015.Apelos, explicou, que em primeirolugar «visam sempre insistir sobre oacolhimento e, portanto, exprimirtambém apreço e agradecimento aospaíses que assumem a responsabili-dade por estas pessoas que fogem,que necessitam de ajuda, de assistên-cia devido à situação de grande vul-nerabilidade e de sofrimento em quese encontram. Além disso, peranteeste drama, convidou a comunidadeinternacional a oferecer toda a assis-tência humanitária possível». E, porfim, o apelo exige «uma solução es-tável destes problemas, sobretudo re-lativamente ao Estado de Rakhineno Myanmar e aos refugiados quevivem esta situação. Uma soluçãoduradoura — esclareceu o cardeal Pa-rolin — que deve ser procurada portodos os atores, todos os protagonis-tas, com espírito humanitário, tendoem conta também a importância pa-ra as pessoas, para a população, deter uma nacionalidade e cientes deque somente esta solução duradoura

pode oferecer estabilidade, paz e de-senvolvimento àquela área e a todasas regiões de conflito».

Sucessivamente, o entrevistadorfez referência à pobreza como conse-quência também das inundaçõescausadas pelas mudanças climáticas.«Na Laudato si’ — respondeu a pro-pósito o secretário de Estado — oPapa evidencia a relação entre asmudanças climáticas e a pobreza, nosentido que são os pobres que maissofrem os efeitos das mudanças cli-máticas. E os países pobres são osmais expostos a estes fenómenos».

Demonstra-o precisamente o caso doBangladesh, «onde existe esta rela-ção entre pobreza, mudança climáti-ca e degradação ambiental»; emborao purpurado não tenha deixado defrisar «que foram dados passos im-portantes quer no que diz respeitoao cuidado do meio ambiente, comofoi reconhecido pelo programa dasNações Unidas para o ambiente,quer na luta contra a pobreza». Gra-ças a estes «bons passos em frente»hoje «milhões de pessoas saíram dasituação de pobreza extrema». E is-so «encoraja o país» a prosseguir«nesta direção, sem esquecer que énecessária também a ajuda da comu-nidade internacional, a qual não po-de desinteressar-se destas situações,mas deve apoiar os esforços» dequem luta contra a pobreza.

Por fim, o jornalista frisou o dú-plice encontro de Francisco com osjovens, tanto no Myanmar quantono Bangladesh. «São — comentou ocardeal Parolin — países jovens, amaioria da população é constituídapor jovens e, por conseguinte, aIgreja não pode desinteressar-se des-ta ampla camada de pessoas quealiás constituem o futuro do país, asesperanças para o porvir do país».De resto, concluiu, «a Igreja deveajudar também a sociedade a inte-ressar-se» pelos jovens, para que «atodos sejam dadas oportunidades,que lhes possam permitir crescer eter um futuro positivo».

Francisco no Myanmar

Diálogo para promover a concórdiado nosso enviadoGIANLUCA BICCINI

Os rostos sorridentes de um grupomuito colorido de crianças acolhe-ram Francisco à sua chegada aMyanmar. No centro da atençãomediática mundial pela primeira vi-sita de um Papa, o país quis mos-trar a sua parte melhor: uma repre-sentação dos milhões de jovens quevivem nesta antiga nação, cuja his-tória se perde na noite dos tempos,mas é demograficamente muito jo-vem. As meninas que receberam oPontífice tinham o rosto adornadocom a thanakha, um pó extraído damadeira usado para a maquiagem epara se proteger do sol que naquelaregião é muito forte. Os meninosvestiam o longyi, traje típico de al-godão amarrado na cintura comouma espécie de saia-calça.

O Airbus A330 da Alitalia com oPontífice a bordo aterrou em Yan-gon às 13h20, horário local, apóscerca de dez horas de voo. No iní-cio da viagem o Papa, como de cos-tume, saudou a tripulação e os jor-nalistas do séquito: «Boa noite, e

muito obrigado pela companhia.Obrigado pelo vosso trabalho quesemeia sempre tanto bem. Desejo-vos uma boa estadia. Dizem quefaz demasiado calor, sinto muito,mas pelo menos que seja frutuoso».

Ainda a bordo do avião, o Pontí-fice foi saudado pelo núncio apos-tólico D. Paul Tschang In-Nam epelo chefe do protocolo. Ao descerda escada anterior, Francisco foi re-cebido por um ministro delegadodo presidente da República, pelascrianças em trajes tradicionais queagitavam bandeirinhas com as coresnacionais e por alguns bispos dopaís, chefiados pelo primeiro car-deal do Myanmar, o salesianoCharles Maung Bo, arcebispo me-tropolitano de Yangon.

No aeroporto, a cerimónia deboas-vindas teve lugar de formasimples, sem discursos oficiais, coma apresentação das delegações. De-pois, Francisco subiu a bordo deum automóvel azul e transferiu-separa o paço arquiepiscopal, ondereside. O paço arquiepiscopal, dearquitetura italiana está localizadoatrás da catedral católica de Saint

Mary e hospeda também a sede daConferência episcopal. À espera doPapa havia muitas pessoas em festa,e tantas outras apinhadas nas estra-das do trajeto, ao longo do qualFrancisco pôde ter as suas primeirasimpressões sobre esta terra. SobreYangon parece que vigia a cúpolade ouro revestida de quatro mil dia-mantes da Shwegadon Paya, a pa-goda mais sagrada do Myanmar, naqual se conservam relíquias de Bu-da. Construída há 2500 anos, mede99 metros de altura e é visível detodas as partes da cidade. De resto,o budismo teravada é professadopor quase 90 por cento da popula-ção, enquanto os cristãos são só 5por cento e os muçulmanos 3,5.

Yangon, com quase seis milhõesde habitantes, é a maior cidade dopaís mas não é a capital. Conservao esplendor do passado glorioso deantigos reinos e vestígios evidentesda dominação britânica. O própriopalácio do presidente da câmaramunicipal católico Maung MaungSoe é em estilo colonial de cor lilás

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número 48, quinta-feira 30 de novembro de 2017 L’OSSERVATORE ROMANO página 3

Integração nacionale respeito dos direitos

Apelo durante o encontro com as autoridades do Myanmar

O momento central do segundo dia daviagem papal ao Myanmar foi oencontro realizado com as autoridadesdo país, os representantes da sociedadecivil e os membros do corpodiplomático. O Papa Franciscosaudou-os no International ConventionCenter de Nay Pyi Taw, onde esteve naparte da tarde de 28 de novembro. Aseguir, o texto do discurso.

Senhora Conselheira de EstadoIlustres membros do Governoe outras AutoridadesSenhor CardealVeneráveis Irmãos no EpiscopadoDistintos membrosdo Corpo DiplomáticoSenhoras e Senhores!

Expresso vivo reconhecimento peloamável convite para visitar o Myan-mar e agradeço à Senhora Conse-lheira de Estado as suas cordiais pa-lavras.

Estou muito grato a todos aquelesque trabalharam incansavelmentepara tornar possível esta visita. Ve-nho sobretudo para rezar com a pe-quena mas fervorosa comunidade ca-tólica da nação, para a confirmar nafé e encorajá-la no esforço de contri-buir para o bem da nação. Motivode contentamento é o facto de a mi-nha visita se realizar depois do esta-belecimento formal das relações di-plomáticas entre o Myanmar e aSanta Sé. Apraz-me ver esta decisãocomo sinal do empenho da naçãoem prosseguir o diálogo e a coope-ração construtiva dentro da comuni-dade internacional alargada, bem co-mo em renovar o tecido da socieda-de civil.

Gostaria também que a minha vi-sita pudesse atingir toda a popula-ção do Myanmar e oferecer uma pa-lavra de encorajamento a todosaqueles que estão a trabalhar paraconstruir uma ordem social justa, re-conciliada e inclusiva. O Myanmarfoi abençoado com o dom de umabeleza extraordinária e numerososrecursos naturais, mas o maior te-souro dele é, sem dúvida, o seu po-vo, que sofreu muito e continua asofrer por causa de conflitos civis ehostilidades que duraram muito tem-po e criaram profundas divisões.Uma vez que agora a nação está atrabalhar por restaurar a paz, a curadestas feridas não pode deixar de seruma prioridade política e espiritualfundamental. Só posso expressarapreço pelos esforços do Governoem enfrentar este desafio, em parti-cular através da Conferência de Pazde Panglong, que reúne os represen-tantes dos vários grupos numa tenta-tiva para pôr fim à violência, criarconfiança e garantir o respeito pelosdireitos de quantos consideram estaterra como a sua casa.

Com efeito, o árduo processo deconstrução da paz e reconciliaçãonacional só pode avançar através docompromisso com a justiça e do res-peito pelos direitos humanos. A sa-bedoria dos antigos definiu a justiçacomo a vontade de reconhecer a ca-da um aquilo que lhe é devido, en-

quanto os antigos profetas a consi-deraram como o fundamento da pazverdadeira e duradoura. Estas intui-ções, confirmadas pela trágica expe-riência de duas guerras mundiais, le-varam à criação das Nações Unidase à Declaração Universal dos Direi-tos Humanos como base dos esfor-ços da comunidade internacional pa-ra promover a justiça, a paz e o pro-gresso humano em todo o mundo epara resolver os conflitos através dodiálogo, e não com o uso da força.Neste sentido, a presença do CorpoDiplomático entre nós testemunha

não só o lugar que oMyanmar ocupa entreas nações, mas tam-bém o compromissodo país em manter eperseguir estes princí-pios fundamentais. Ofuturo do Myanmardeve ser a paz, umapaz fundada no res-peito pela dignidadee os direitos de cadamembro da socieda-

podem ajudar a extirpar as causasdo conflito, construir pontes de diá-logo, procurar a justiça e ser umavoz profética para as pessoas que so-frem. É um grande sinal de esperan-ça o facto de que os líderes das vá-rias tradições religiosas deste país seestejam comprometendo a trabalharjuntos, com espírito de harmonia erespeito mútuo, pela paz, pela ajudaaos pobres e pela educação nos valo-res religiosos e humanos autênticos.Quando procuram construir umacultura do encontro e da solidarieda-de, eles contribuem para o bem co-mum e colocam as bases morais in-dispensáveis para um futuro de es-perança e prosperidade para as gera-ções vindouras.

Hoje aquele futuro já está nasmãos dos jovens da nação. Os jo-

de, no respeito por cada grupo étni-co e sua identidade, no respeito peloEstado de Direito e uma ordem de-mocrática que permita a cada umdos indivíduos e a todos os grupos— sem excluir nenhum — oferecer asua legítima contribuição para obem comum.

No trabalho imenso da reconcilia-ção e integração nacional, as comu-nidades religiosas do Myanmar têmum papel privilegiado a desempe-nhar. As diferenças religiosas não de-vem ser fonte de divisão e difidên-cia, mas sim uma força em prol daunidade, do perdão, da tolerância eda sábia construção da nação. As re-ligiões podem desempenhar um pa-pel significativo na cura das feridasemocionais, espirituais e psicológicasdaqueles que sofreram nos anos deconflito. Impregnando-se de tais va-lores profundamente enraizados, elas

Saudação aos líderes religiosos do país

Pluralidade, riqueza para a pazNa manhã de terça-feira 28 de novembro o Papaencontrou-se no refeitório do arcebispado com um grupo de17 líderes religiosos do Myanmar. Publicamos a seguir anossa tradução da saudação que o Pontífice lhes dirigiuem espanhol.

Antes de tudo, obrigado por terdes vindo. Talvez eudeveria ter visitado cada um de vós, mas fostes genero-sos e poupastes-me este esforço. Obrigado.

Enquanto faláveis, veio-me à mente uma oração,uma oração que recitamos frequentemente, tirada doLivro dos Salmos: “Como é bom ver os irmãos uni-dos”. Unidos não quer dizer iguais, unidade não é uni-formidade, também no seio da própria confissão. Cadaum tem os próprios valores, as suas riquezas e tambémas suas faltas.

Somos diferentes e cada confissão tem as suas rique-zas, as suas tradições, as suas riquezas para oferecer,para partilhar. E isso só pode acontecer se vivermos em

paz. E a paz constrói-se no coro das diferenças. A uni-dade realiza-se sempre com as diferenças.

Por três vezes um de vós usou a palavra “harmonia”.Esta é a paz: é harmonia. Nós, neste tempo em quenos é concedido viver, experimentamos uma tendênciaa nível mundial rumo à uniformidade, a tornar tudoigual. Isto significa matar a humanidade. Esta é umacolonização cultural. Devemos compreender a riquezadas nossas diferenças — étnicas, religiosas, populares —e o diálogo nasce precisamente destas diferenças. E apartir destas diferenças aprendemos do outro, como ir-mãos.... Como irmãos que se ajudam mutuamente aconstruir este país, que inclusive sob o ponto de vistageográfico tem muitas riquezas e diferenças. A nature-za no Myanmar é muito rica em diferenças. Não deve-mos ter medo das diferenças. O nosso Pai é Uno, nóssomos irmãos. Amemo-nos como irmãos. E se discutir-mos entre nós, que seja como irmãos, que se reconci-liam imediatamente, que voltam a ser sempre irmãos.Penso que só assim se constrói a paz.

Agradeço-vos terdes vindo visitar-me. Na realidade,sou eu que vos estou a visitar, e gostaria que pelo me-nos espiritualmente acolhêsseis esta visita: a visita demais um irmão.

Obrigado. Construí a paz. Não vos deixeis uniformi-zar pela colonização das culturas. A verdadeira harmo-nia divina cria-se através das diferenças. As diferençassão uma riqueza para a paz.

Muito obrigado. E permito-me recitar uma oração,de irmão para irmão. Uma antiga bênção que nos in-clui a todos: “Que o Senhor vos abençoe e vos proteja.Faça brilhar o seu rosto sobre vós e vos mostre a suagraça. Dirija para vós o seu rosto e vos conceda a paz”.O brigado!

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página 4 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 30 de novembro de 2017, número 48

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Diálogo para promover a concórdia

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vens são um dom a estimar e en-corajar, um investimento que sóproduzirá um bom rendimento nabase de oportunidades reais deemprego e de uma educação dequalidade. Trata-se de um requisi-to impelente de justiça intergera-cional. O futuro do Myanmar,num mundo em rápida evoluçãoe interconexão, dependerá da for-mação dos seus jovens, não sónos campos técnicos, mas sobre-tudo na formação para os valoreséticos de honestidade, integridadee solidariedade humanas, que po-dem garantir a consolidação dademocracia e o crescimento daunidade e da paz em todos os ní-veis da sociedade. De igual modoa justiça intergeracional requerque as futuras gerações herdemum meio ambiente que não estejacorrompido pela ganância e a de-predação humana. É indispensá-vel que os nossos jovens não se-jam espoliados da esperança e dapossibilidade de empregar o seuidealismo e os seus talentos naprojetação do futuro do seu país,melhor, da família humana intei-ra.

Senhora Conselheira de EstadoQueridos amigos!Nestes dias, quero encorajar osmeus irmãos e irmãs católicos aperseverar na sua fé e a continuara expressar a sua mensagem dereconciliação e fraternidade atra-vés de obras caritativas e humani-tárias, de que toda a sociedadepossa beneficiar. Espero que, narespeitosa cooperação com os se-guidores de outras religiões e comtodos os homens e mulheres deboa vontade, contribuam paraabrir uma nova era de concórdiae progresso para os povos destaamada nação. Longa vida aoMyanmar! Agradeço-vos pelaatenção e, formulando votos dasmelhores felicidades no vosso ser-viço ao bem comum, sobre todosvós invoco as bênçãos divinas desabedoria, força e paz.

O brigado!

Às autoridades

Na capital do Myanmar

Juntos com confiançado nosso enviadoGIANLUCA BICCINI

«Sobre todo o amado povo doMyanmar invoco as bênçãos divinasde justiça, paz e unidade»: a fraseescrita pelo Papa no livro de honrado palácio presidencial em Nay PyiTaw engloba todo o sentido do se-gundo dia da viagem no país asiáti-co, o primeiro ritmado por compro-missos públicos.

De facto, na parte da tarde de 28de novembro o Pontífice transferiu-se de Yangon para a nova capitalonde tiveram lugar os encontros comas autoridades nacionais. A bordode um avião da companhia de ban-deira, a Myanmar Airways Interna-tional, chegou uma hora depois ao

aeroporto local, que se localiza noterritório da arquidiocese de Manda-lay, governada por D. NicholasMang Thang. Francisco foi recebidopor um ministro delegado do presi-dente da República da União doMyanmar. Aquela “união” que oatual governo com dificuldade está atentar recompor entre todos os com-ponentes que habitam a “terra dasmil pagodas”, depois das feridas quedurante anos deixaram profundas ci-catrizes sobretudo nas etnias minori-tárias.

Construída como uma cidadelablindada no meio dos arrozais ecampos de cana de açúcar, a “sededos reis” — isto significa Nay PyiTaw — é a capital, alojando os escri-tórios do governo, desde 2005. Éuma espécie de aglomerado urbano“fantasma”, não obstante conte comum milhão de habitantes; e tem-se asensação de isolamento principal-mente na zona ministerial, onde porrazões de segurança e de defesa fo-ram escavadas valas entre os váriosedifícios, interligados só através depontes futuristas.

De automóvel Francisco percorreuas largas avenidas — algumas che-gam a ter vinte pistas e podem serusadas por aviões militares para des-colar e aterrar — que levam à resi-dência presidencial, onde se realizoua cerimónia de boas-vindas. No jar-dim muito cuidado e verdejante nafrente do edifício neoclássico, brancocomo as altas colunas que circun-dam o seu perímetro, teve lugar aapresentação das respetivas delega-ções. Depois o Pontífice e o chefede Estado e de governo Htin Kyawsubiram juntos a ampla escadariaque leva para o interior do edifício.Antes de posar para a foto com opresidente diante das bandeiras bir-mana e vaticana, Francisco assinou olivro de honra.

Depois do encontro particular eda sucessiva apresentação dos fami-liares do chefe de Estado, entre osquais a esposa Su Su Lwin, teve lu-gar a troca dos dons: o Papa ofere-ceu a cópia de uma narração ilustra-da da vida de Buda, realizada pelaBiblioteca apostólica vaticana, a qualreproduz em particular a estadia naantiga cidade birmana de Rajagaha.

No mesmo cenário realizou-setambém o encontro sucessivo — quedurou cerca de vinte minutos — coma conselheira de Estado e ministrados negócios estrangeiros, Aung SanSuu Kyi. Prémio Nobel da paz em1991, a senhora — protagonista deuma luta corajosa pela democraciaque pagou com quinze anos de pri-são domiciliar — só pôde retirar oprestigiosos reconhecimento em2012. O Papa ofereceu-lhe um tríticode medalhas, recebendo dela um cá-lice de prata.

Depois dos encontros em Nay PyiTaw, Francisco foi ao InternationalConvention Centre, onde pronun-ciou o primeiro discurso oficial daviagem. Um grupo de jovens, queexecutou uma coreografia com músi-cas locais, deu-lhe as boas-vindas namoderna estrutura. Representavamalgumas das 135 etnias da nação eentre eles havia uma menina queusava os caraterísticos anéis que or-nam o longo pescoço das famosas

“m u l h e re s - g i r a f a ”. Entregaram aoPontífice um ramalhete de flores,acompanhando-o juntamente comAung San Suu Kyi.

Na presença das autoridades, derepresentantes da sociedade civil edo corpo diplomático, Francisco res-pondeu à saudação em inglês quelhe foi dirigida pela conselheira deEstado. Diante do Papa a “senhora”,como é chamada, referiu-se à difícilsituação do Rakhine que atraiu aatenção do mundo, concluindo opronunciamento com um «continue-mos a caminhar juntos com confian-ça» pronunciado em italiano.

Por sua vez, o Papa evocou os te-mas da Conferência de paz de Pan-glong de 2016, a primeira depois da-quela de 12 de fevereiro de 1947 quesancionou o nascimento do Estadomoderno unindo diversas etnias dopaís: os Birmanos, que constituem acomponente maioritária, e as mino-rias Chin, Kachin e Shan. A todosdesejou um futuro de paz baseadono respeito das diferenças e na soli-dariedade. De resto, o Myanmar éuma das nações mais pobres do con-tinente e conta um milhão de desa-brigados internos. Desde 2010 o go-verno civil realizou reformas gra-duais e libertou os opositores, con-vocando eleições livres. E agora, de-pois de décadas de isolamento, veri-fica-se um discreto desenvolvimento,associado a uma contínua transfor-mação social. Um pequeno boomeconómico impulsionado pelos seto-res do turismo, pela exportação depetróleo e gás, pela indústria manu-fatureira e tecnológica. Certamente aagricultura continua a empregar 70por cento da população, mas a urba-nização está a reduzir os terrenosdaquela que até à segunda guerramundial era considerada “a tigela dearroz asiática”.

Ao contrário, infelizmente nasáreas rurais proliferam outras cultu-ras: com efeito, o país é um dosmaiores produtores mundiais deópio. Nas regiões montanhosas donorte, dentro do famigerado “triân-

gulo de ouro” — que além do Myan-mar, inclui também a Tailândia e oLaos — os trabalhadores das “aldeiasda papoula” são explorados pelossenhores da droga. E quem tentarfugir (os expatriados nos países vizi-nhos são mais de quatro milhões)acaba vítima do tráfico de seres hu-manos, com o risco de redução emescravidão. Nas mesmas rotas flores-ce também o contrabando de madei-ra, sobretudo tek, e de pedras pre-ciosas, jades e rubis, provenientes daexploração selvagem do subsolo edo vasto desmatamento, comparávelsó ao Brasil e à Indonésia.

No final da tarde o Papa deixouas ruas desertas da capital e após umbreve voo, entrou de novo naquelascaóticas e superlotadas de Yangon,onde na parte da manhã tinha rece-bido a visita de cerca de vinte líderesreligiosos. O encontro teve lugar porvolta das 10h00 no episcopado, resi-dência pontifícia no Myanmar. Du-rante cerca de quarenta minutos reu-niram-se monges budistas das váriastradições, líderes islâmicos e hindus,o chefe da pequena comunidade ju-daica e delegados das principais de-nominações cristãs, entre os quaisum católico da minoria kachin, umarcebispo anglicano, um pastor ba-tista e o presidente do MyanmarCouncil of Churches. Depois deuma breve introdução do bispo dePathein, D. John Hsane Hgyi, res-ponsável pela comissão para o diálo-go inter-religioso e o ecumenismono âmbito da conferência episcopal,alguns dos presentes tomaram a pal-vra. Em seguida o Papa improvisouum discurso em espanhol, abordan-do o tema da unidade na diversida-de.

Por fim, antes de celebrar a missana capela do episcopado, o Pontíficesaudou o líder budista Sitagu Saya-daw: um encontro que representaum sinal de encorajamento à convi-vência fraterna como única via apercorrer pelo povo do Myanmarpara encontrar a paz.

e violeta, com decorações que re-presentam pavões, nagas (divinda-de em forma de serpente) e tor-reões em três níveis.

No meio das amplas avenidas ar-borizadas e dos lindos parques co-meçam a aparecer o cimento, o açoe os vidros de arranha-céus futuris-tas. Passado e presente coexistem,disto são expressão os automóveisrumorosos, com a condução à di-reita, que com toques de buzinapedem passagem aos velhos riqui-xás de estilo chinês. Um mosaicode etnias, línguas e religiões animao maior centro económico e cultu-ral do Myanmar. Entretanto, au-mentam também as favelas, inequí-vocos sinais de uma crescente po-breza urbana. Espelho de um paísno qual, segundo cálculos recentes,30 por cento dos 53 milhões de ha-

bitantes vive em condições de ab-soluta indigência.

No Myanmar o Papa volta a en-contrar todos os temas queridos aoseu magistério: respeito pelos direi-tos, o diálogo entre as religiões pa-ra promover a paz, a defesa dospobres e a tutela do meio ambien-te. Temas que estiveram no centrodo encontro realizado à tarde noarcebispado com a mais alta autori-dade militar do país, o general MinAung Hlaing. A do comandante-chefe das Forças armadas foi umavisita de cortesia: iniciada às 17h55,durou cerca de quinze minutos.Durante o diálogo falaram, entreoutros assuntos, sobre a situaçãodo país neste momento de transi-ção. O encontro concluiu-se com ointercâmbio de dons: o Papa ofere-ceu uma medalha da viagem, o ge-neral, uma harpa em forma de bar-co e uma tigela de arroz decorada.

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Cartão de visita

No início da manhã de quarta-feira,29 de novembro, terceiro dia daviagem ao Myanmar, o Papa celebroua missa no Kyaikkasan Ground, umaárea de cerca de 60 hectares nocoração de Yangon. A seguir, o texto dahomilia proferida por Francisco.

Amados irmãos e irmãs!Há muito tempo que anelava por es-te momento da minha vinda ao país.Muitos de vós viestes de longe e deáreas montanhosas remotas, e nãopoucos mesmo a pé. Eu vim comoperegrino para vos ouvir e aprenderde vós, e para vos oferecer algumaspalavras de esperança e consolação.

A primeira Leitura de hoje, do Li-vro de Daniel, ajuda-nos a ver comoera limitada a sabedoria do rei Bal-tasar e dos seus videntes. Sabiam co-mo louvar «os deuses de ouro, deprata, de bronze, de ferro, de madei-ra e de pedra» (Dn 5, 4), mas nãopossuíam a sabedoria para louvar aDeus em cujas mãos estão a nossavida e a nossa respiração. Ao contrá-rio, Daniel tinha a sabedoria do Se-

nhor e era capaz de interpretar osseus grandes mistérios.

O intérprete definitivo dos misté-rios de Deus é Jesus. Ele é a sabedo-ria de Deus em pessoa (cf. 1 Cor 1,24). Jesus não nos ensinou a sua sa-bedoria com longos discursos ou pormeio de grandes demonstrações depoder político ou terreno, mas coma oferta da sua vida na cruz. Às ve-zes, podemos cair na armadilha deconfiar na nossa própria sabedoria,mas a verdade é que facilmente per-demos o sentido da direção. Então énecessário lembrar-nos de que dispo-mos, à nossa frente, de uma bússolas e g u ra : o Senhor crucificado. Nacruz, encontramos a sabedoria, quepode guiar a nossa vida com a luzque provém de Deus.

E da cruz vem também a c u ra . Lá,Jesus ofereceu as suas feridas ao Paipor nós: mediante as suas feridas,somos curados (cf. 1 Pd 2, 4). Quenunca nos falte a sabedoria de en-contrar, nas feridas de Cristo, a fon-te de toda a cura! Sei que muitos noMyanmar carregam as feridas daviolência, quer visíveis quer invisí-

do pão e do vinho. No dom da Eu-caristia, com os olhos da fé, não sóreconhecemos o dom do seu corpo esangue, mas aprendemos também aencontrar repouso nas suas feridas,sendo nelas purificados de todos osnossos pecados e extravios. Buscan-do refúgio nas feridas de Cristo,possais vós, queridos irmãos e irmãs,experimentar o bálsamo salutar damisericórdia do Pai e encontrar aforça de o levar aos outros, ungindocada uma das suas feridas e doloro-sas lembranças. Deste modo, sereistestemunhas fiéis da reconciliação eda paz que Deus quer que reine emcada coração humano e em todas ascomunidades.

Eu sei que a Igreja no Myanmarjá está a fazer muito para levar obálsamo salutar da misericórdia deDeus aos outros, especialmente aos

mais necessitados. Há sinais clarosde que, mesmo com meios muito li-mitados, numerosas comunidadesproclamam o Evangelho a outrasminorias tribais, sem nunca forçarou constringir, mas sempre convi-dando e acolhendo. No meio de tan-ta pobreza e inúmeras dificuldades,muitos de vós prestam assistênciaprática e solidariedade aos pobres eaos doentes. Através das canseirasdiárias dos seus bispos, sacerdotes,religiosos e catequistas, e particular-mente mediante o louvável trabalhodo Catholic Karuna Myanmar e dagenerosa assistência prestada pelasPontifícias Obras Missionárias, aIgreja neste país está a ajudar umgrande número de homens, mulherese crianças, sem distinções de religião

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GI O VA N N I MARIA VIAN

Tanto inesperadas pelo grande número de pessoasapinhadas ao longo das ruas de Yangon, quantogentis e festivas no estilo foram as boas-vindas aoPapa Francisco, primeiro Pontífice que visita oMyanmar, onde católicos e cristãos são uma pe-quena minoria. E ressoaram com muita clareza assuas palavras pronunciadas de surpresa, após oencontro com um grupo de representantes religio-sos no arcebispado da cidade. Bergoglio manifes-tou-lhes imediatamente, num discurso improvisa-do em espanhol, a convicção e a confiança de queprecisamente os diversos credos, unidos mas nãouniformes, podem contribuir através das suas di-ferenças para a construção da paz e da harmonia.

Quase um espontâneo cartão de visita com oqual o hóspede, tão gentilmente recebido, seapresentou a toda a população. E que o Papaconfirmou algumas horas mais tarde na nova ca-pital do país, Nay Pyi Taw, circundada pelo verdede florestas imensas, falando às autoridades e aocorpo diplomático depois de ter ouvido a calorosasaudação da conselheira de Estado e ministra dos

Negócios estrangeiros, Aung San Suu Kyi, queem 1991 recebeu o prémio Nobel da paz.

Só poucos meses após a instauração de normaisrelações diplomáticas entre o Myanmar e a SantaSé, no início de maio passado, o Pontífice expli-cou o objetivo da sua visita. Ou seja, antes de tu-do, «rezar com a pequena mas fervorosa comuni-dade católica da nação, para a confirmar na fé epara a encorajar na fadiga de contribuir para obem do país». Igreja pequena, na qual pela pri-meira vez em 2014 foi celebrada a beatificação dedois mártires, um catequista autóctone e um mis-sionário italiano, enquanto em 2015 Franciscocriou o primeiro cardeal originário do país, Char-les Bo, arcebispo de Yangon, que nestes dias ohospeda na sua casa.

Minoria ao lado de outras num país quase to-talmente budista, não obstante muitas dificulda-des o catolicismo está comprometido na edifica-ção de «uma ordem social justa, reconciliada e in-clusiva», garantiu o Papa. Com efeito, na históriarecente do Myanmar multiplicaram-se os confli-tos, que deixaram uma pesada herança de divi-sões. Assim, hoje «a cura destas feridas impõe-se

como uma prioridade política e espiritual funda-mental», cadenciou o Pontífice.

Politicamente, o «processo de construção dapaz e da reconciliação nacional só pode progrediratravés do compromisso em prol da justiça e dorespeito pelos direitos humanos», recordou Fran-cisco. E explicou que esta paz deve ser «fundadano respeito pela dignidade e pelos direitos de ca-da membro da sociedade, no respeito por todosos grupos étnicos e pela sua identidade, no res-peito pelo estado de direito e por uma ordem de-mocrático que permite a cada indivíduo e a cadagrupo — sem excluir ninguém — oferecer a sua le-gítima contribuição para o bem comum».

Palavras muito claras, às quais o Papa acrescen-tou o que já tinha antecipado aos representantesreligiosos com os quais se encontrou na parte damanhã em Yangon. Ou seja, que «as diferençasreligiosas não devem ser fonte de divisão e dedesconfiança, mas sobretudo uma força para aunidade, o perdão, a tolerância e a sábia constru-ção do país». Contribuindo deste modo para cu-rar «as feridas emotivas, espirituais e psicológicasde quantos sofreram nos anos de conflito».

Deus foi derramado nos nos-sos corações (cf. Rm 5, 5).Com o dom do Espírito, Je-sus torna cada um de nóscapaz de ser sinal da sua sa-bedoria, que triunfa sobre asabedoria deste mundo, eda sua misericórdia, que dáalívio mesmo às feridasmais dolorosas.

Na véspera da sua pai-xão, Jesus deu-se aosApóstolos sob as espécies

veis. A tentação é respondera estas lesões com uma sabe-doria mundana que, como ado rei na primeira Leitura,está profundamente deturpa-da. Pensamos que a cura pos-sa vir do rancor e da vingan-ça. Mas o caminho da vin-gança não é o caminho de Je-sus.

O caminho de Jesus é radi-calmente diferente. Quando oódio e a rejeição O conduzi-ram à paixão e à morte, Elerespondeu com o perdão e acompaixão. No Evangelho dehoje, o Senhor diz-nos que, àsua semelhança, podemostambém deparar-nos com arejeição e tantos obstáculos,mas nessa ocasião dar-nos-áuma sabedoria a que nin-guém pode resistir (cf. Lc 21,15). Aqui Ele fala do EspíritoSanto, por Quem o amor de

Em Yangon o Papa pediu para vencer a tentação do rancor e da vingança

Como sarar as feridas da violência

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ou de origem étnica. Posso teste-munhar que aqui a Igreja está viva,que Cristo está vivo e está aquiconvosco e com os vossos irmãos eirmãs das outras Comunidadescristãs. Encorajo-vos a continuar apartilhar com os outros a inestimá-vel sabedoria que recebestes, oamor de Deus que brota do Cora-ção de Jesus.

Jesus quer dar esta sabedoria emabundância. Ele premiará certa-mente os vossos esforços por espa-lhar sementes de cura e reconcilia-ção nas vossas famílias, comunida-des e na sociedade alargada destanação. Porventura não nos disseEle que a sua sabedoria é irresistí-vel (cf. Lc 21, 15)? A sua mensagemde perdão e misericórdia obedece auma lógica que nem todos quere-

rão compreender, e que encontraráobstáculos. Contudo o seu amor,revelado na cruz, é definitivamenteimparável. É como um “GPS espiri-tual” que nos guia infalivelmenterumo à vida íntima de Deus e aocoração do nosso próximo.

A Santíssima Virgem Maria se-guiu o seu Filho mesmo na escurasubida ao monte Calvário e acom-panha-nos em todos os passos danossa viagem terrena. Que Ela nosobtenha sempre a graça de sermensageiros da verdadeira sabedoria,profundamente misericordiosos paracom os necessitados, com a alegriaque brota de repousar nas feridas deJesus, que nos amou até ao fim.

Deus vos abençoe a todos! Deusabençoe a Igreja no Myanmar!Abençoe esta terra com a sua paz!Deus abençoe o Myanmar!

Missa em Yangon

O Pontífice exortou os budistas a um compromisso comum para combater ódio e intolerância

Uma só voz para falar de esperança

Sinto grande alegria por estar con-vosco. Agradeço ao Ven. BhaddantaKumarabhivamsa, Presidente da Co-missão Estatal Sangha Maha Naya-ka, as suas palavras de boas-vindas eos seus esforços na organização daminha visita aqui hoje. Ao saudar-vos a todos, permiti-me manifestarparticular apreço pela presença deSua Excelência Thura Aung Ko, Mi-nistro dos Assuntos Religiosos e daCultura.

O nosso encontro é uma ocasiãoimportante para renovar e fortaleceros laços de amizade e respeito entrebudistas e católicos. É também umaoportunidade para afirmar o nossoempenho pela paz, o respeitoda dignidade humana e ajustiça para todo o homem emulher. E não é só noMyanmar, mas em todo omundo, que as pessoasprecisam deste testemu-nho comum dos líderesreligiosos. Com efeito,quando falamos a umasó voz afirmando o va-

peito pela vida, bem como numa es-piritualidade solícita e profundamen-te respeitadora do meio ambiente.Como sabemos, estes valores são es-senciais para um desenvolvimentointegral da sociedade, a começar pe-la unidade mais pequena e mais es-sencial que é a família para depoisse estender à rede de relações quenos põem em estreita conexão, rela-ções essas radicadas na cultura, napertença étnica e nacional, e, em úl-tima análise, na pertença à humani-dade comum. Numa verdadeira cul-tura do encontro, estes valores po-dem fortalecer as nossas comunida-des e ajudar o conjunto da socie-

dade a irradiar a tão necessária

Myanmar. Bem sei que, no passadomês de abril, a Conferência dos Bis-pos Católicos organizou um encon-tro de dois dias sobre a paz, em queparticiparam os chefes das diferentescomunidades religiosas, juntamentecom embaixadores e representantesde agências não governamentais.Devendo aprofundar o nosso conhe-cimento mútuo e afirmar a nossa in-terligação e destino comum, são es-senciais tais encontros. A verdadeirajustiça e a paz duradoura só podemser alcançadas, quando forem garan-tidas a todos.

Queridos amigos, possam os bu-distas e os católicos caminhar juntospor esta senda de cura e trabalharlado a lado pelo bem de cada habi-tante desta terra. Nas Escrituras cris-tãs, o Apóstolo Paulo desafia os seusouvintes a alegrar-se com os que es-tão alegres, a chorar com os quechoram (cf. Rm 12, 15), carregandohumildemente os pesos uns dos ou-tros (cf. Gl 6, 2). Em nome dosmeus irmãos e irmãs católicos, ex-presso a nossa disponibilidade paracontinuar a caminhar convosco e aespalhar sementes de paz e de cura,de compaixão e de esperança nestaterra.

De novo vos agradeço por me ter-des convidado para estar hoje aquiconvosco. Sobre todos vós, invoco abênção divina da alegria e da paz.

vicções religiosas. Tais esforços nãosão em caso algum prerrogativa ape-nas de líderes religiosos, nem são decompetência exclusiva do Estado.Mas é a sociedade inteira, são todosaqueles que estão presentes na co-munidade que devem partilhar o tra-balho de superar o conflito e a in-justiça. No entanto, é responsabili-dade particular dos líderes civis e re-ligiosos garantir que cada voz sejaouvida, de tal modo que os desafiose as necessidades deste momentopossam ser claramente compreendi-dos e confrontados num espírito deimparcialidade e mútua solidarieda-de. A propósito, congratulo-me como trabalho que a Panglong PeaceC o n f e re n c e está a fazer, e rezo poraqueles que guiam este esforço paraque possam promover uma partici-pação cada vez maior de todos osque vivem no Myanmar. Isto contri-buirá certamente para o compromis-so de promover a paz, a segurança euma prosperidade que seja inclusivade todos.

Para que estes esforços produzamfrutos duradouros, tornar-se-á neces-sária, sem dúvida, uma maior coope-ração entre líderes religiosos. A esterespeito, quero que saibais que aIgreja católica é um parceiro dispo-nível. As oportunidades de encontroe diálogo entre os líderes religiososrevelam-se um fator importante napromoção da justiça e da paz no

luz.O grande desafio dos nossos dias

é ajudar as pessoas a abrir-se aotranscendente; ser capazes de olhar-se dentro em profundidade, conhe-cendo-se de tal modo a si mesmasque sintam a sua interconexão comtodas as pessoas; dar-se conta deque não podemos permanecer isola-dos uns dos outros. Se devemos es-tar unidos, como é nosso propósito,é necessário superar todas as formasde incompreensão, intolerância, pre-conceito e ódio. Como podemosconsegui-lo? As palavras de Budaoferecem a cada um de nós umaguia: «Vence o rancor com o não-rancor, vence o malvado com a bon-dade, vence o avarento com a gene-rosidade, vence o mentiroso com averdade» (Dhammapada, XVII, 223).Sentimentos semelhantes se expres-sam nesta oração atribuída a SãoFrancisco de Assis: «Senhor, fazei-me instrumento da vossa paz. Ondehouver ódio fazei que eu leve oamor, onde houver ofensa que eu le-ve o perdão, (...) onde houver trevasque eu leve a luz, e onde houvertristeza que eu leve a alegria».

Que esta Sabedoria continue ainspirar todos os esforços para pro-mover a paciência e a compreensão ecurar as feridas dos conflitos que, aolongo dos anos, dividiram pessoasde diferentes culturas, etnias e con-

lor perene da justiça, da paz e dadignidade fundamental de todo oser humano, oferecemos uma palavrade esperança. Ajudamos os budistas,os católicos e todas as pessoas a lu-tarem por uma maior harmonia nassuas comunidades.

Em cada época, a humanidade ex-perimenta injustiças, momentos deconflito e desigualdade entre as pes-soas. No nosso tempo, porém, estasdificuldades parecem ser particular-mente graves. Embora a sociedadetenha conseguido um grande pro-gresso tecnológico e, em todo omundo, as pessoas estejam cada vezmais conscientes da sua humanidadee destino comuns, as feridas dosconflitos, da pobreza e da opressãopersistem e criam novas divisões. Aestes desafios, não devemos jamaisresignar-nos. Pois sabemos, com ba-se nas nossas respetivas tradições es-pirituais, que existe realmente umcaminho para avançar, há um cami-nho que leva à cura, à mútua com-preensão e respeito; um caminho ba-seado na compaixão e no amor.

Quero expressar a minha estima atodos aqueles que vivem, no Myan-mar, segundo as tradições religiosasdo Budismo. Através dos ensina-mentos de Buda e do testemunhozeloso de tantos monges e monjas, opovo desta terra foi formado nos va-lores da paciência, tolerância e res-

Após o almoço no arcebispado o Papa deslocou-se para oKaba Aye Center, lugar símbolo do budismo teravadaonde, na tarde de quarta-feira 29 de novembro, seencontrou com o conselho supremo “sangha” dos mongesbudistas. A seguir as palavras do Pontífice.

número 48, quinta-feira 30 de novembro de 2017 L’OSSERVATORE ROMANO página 7

Aos bispos o Papa pediu para ajudar os fiéis a superar as divisões

M e n s a g e i ro sde reconciliação

Com o encontro com os bispos doMyanmar — realizado na tarde dequarta-feira, 29 de novembro, numsalão do complexo adjacente aoarcebispado de Yangon — concluiu-se oterceiro dia da visita papal.Publicamos o discurso pronunciado porFra n c i s c o .

Eminência, queridos Irmãos Bispos!Hoje foi, para todos nós, um dia so-brecarregado mas de grande alegria!De manhã, celebramos a Eucaristiajuntamente com os fiéis vindos detodo o país e, de tarde, encontramosos líderes da comunidade maioritáriabudista. Gostaria que o nosso en-contro, nesta noite, fosse um mo-mento de serena gratidão por estasbênçãos e de tranquila reflexão so-bre as alegrias e os desafios do vossoministério de pastores do rebanhode Cristo neste país. Agradeço a D.Félix [Lian Khen Thang] as palavrasde saudação que me dirigiu em vos-so nome; a todos vos abraço comgrande afeto no Senhor.

Desejo agrupar os meus pensa-mentos à volta de três palavras: c u ra ,acompanhamento e p ro f e c i a .

A primeira, c u ra . O Evangelho,que pregamos, é sobretudo umamensagem de cura, reconciliação epaz. Por meio do sangue de Cristona cruz, Deus reconciliou consigo omundo e enviou-nos para ser mensa-geiros daquela graça sanadora, graçade cura. Aqui no Myanmar, estamensagem tem uma ressonância es-pecial, pois o país está empenhadoem superar divisões profundamenteradicadas e construir a unidade na-cional. O vosso rebanho traz os si-nais deste conflito e gerou valorosastestemunhas da fé e das tradiçõesantigas; assim, para vós, a pregaçãodo Evangelho não deve ser apenasuma fonte de consolação e fortaleza,mas também um apelo a favorecer aunidade, a caridade e a cura na vidado povo. A unidade, que partilha-mos e celebramos, nasce da diversi-dade (não esqueçamos isto: nasce dadiversidade); valoriza as diferençasentre as pessoas como fonte de mú-tuo enriquecimento e de crescimen-to; convida-as a reencontrarem-seumas com as outras, numa culturado encontro e da solidariedade.

Que o Senhor vos conceda, novosso ministério episcopal, experi-mentar constantemente a sua guia eajuda no compromisso de favorecera cura e a comunhão em todos osníveis da vida da Igreja, de modoque o santo Povo de Deus, o vossorebanho, possa, através do seuexemplo de perdão e amor reconci-liador, ser sal e luz para os coraçõesque anelam por aquela paz que omundo não lhes pode dar. A comu-nidade católica no Myanmar pode-se orgulhar do seu testemunho pro-fético de amor a Deus e ao próximo,que se traduz no compromisso a fa-vor dos pobres, daqueles que estãoprivados de direitos e sobretudo,nestes tempos, a favor dos inúmerosdesalojados que, por assim dizer, ja-zem feridos na beira da estrada. Pe-ço-vos que transmitais a minha grati-

dão a todos aqueles que, como oBom Samaritano, trabalham com ge-nerosidade para levar o bálsamo dacura a eles e ao próximo que passanecessidade, sem olhar a religiãonem etnia.

O vosso ministério de cura encon-tra uma expressão particular noem-penho pelo diálogo ecuménico e acolaboração inter-religiosa. Rezo pa-ra que produzam abundantes frutos,na reconciliação da vida do país, osvossos incessantes esforços por cons-truir pontes de diálogo e vos uniraos seguidores doutras religiões te-cendo relações de paz. A conferênciainter-religiosa de paz, realizada emRangum na primavera passada, foium testemunho importante, aosolhos do mundo, da determinaçãodas religiões a viver em paz e rejeitarqualquer ato de violência e de ódioperpetrado em nome da religião.

E, neste ministério de cura, lem-brai-vos que a Igreja é um «hospitalde campo». Curar, curar feridas, cu-rar as almas, curar. A vossa primeiramissão é esta: curar, curar os feridos.

A segunda palavra, que vos deixonesta noite, é acompanhamento. Umbom pastor está constantemente p re -sente no seu rebanho, guiando-o en-quanto caminha a seu lado. Gostode lembrar que o pastor deveria pos-suir o odor das ovelhas; mas tam-bém o odor de Deus. Não vos es-queçais: também o odor de Deus.Nos nossos dias, somos chamados aser uma «Igreja em saída» a fim delevar a luz de Cristo a todas as peri-ferias (cf. Evangelii gaudium, 20).Como bispos, as vossas vidas e ovosso ministério são chamados aconformar-se a este espírito de en-volvimento missionário, sobretudoatravés das visitas pastorais regularesàs paróquias e comunidades que for-mam as vossas Igrejas locais. Este éum meio privilegiado para acompa-nhar, como pais amorosos, os vossossacerdotes no compromisso diário defazer crescer o rebanho em santida-de, fidelidade e espírito de serviço.Falei de acompanhar os sacerdotes:mantende-vos próximo dos sacerdo-tes; não esqueçais que o próximo

mais próximo que um bispo tem, éo sacerdote. Que cada sacerdote nãosó conheça, mas sinta que ele temum pai no bispo.

Pela graça de Deus, a Igreja noMyanmar herdou, daqueles quetrouxeram o Evangelho a essa terra,uma fé sólida e uma ardente ânsiamissionária do trabalho. Sobre estesfundamentos estáveis e em comu-nhão com os presbíteros e os religio-sos, continuai a permear o laicadocom o espírito dum autêntico disci-pulado missionário e a procurar umasábia inculturação da mensagemevangélica na vida diária e nas tradi-ções das vossas comunidades locais.A este respeito, é essencial a contri-buição dos catequistas; o seu enri-quecimento formativo deve perma-necer para vós uma prioridade. Enão esqueçais que os catequistas sãoos pilares da evangelização em cadaparó quia.

Sobretudo quero pedir-vos umempenhamento especial no acompa-nhamento dos jovens. Velai pela suaformação nos sãos princípios moraisque os guiarão ao enfrentar os desa-fios dum mundo ameaçado pelas co-lonizações ideológicas e culturais. Opróximo Sínodo dos Bispos não tra-tará apenas destes aspetos, mas in-terpelará diretamente os jovens, es-cutando as suas histórias e envolven-do-os no discernimento comum so-bre o modo como proclamar melhoro Evangelho nos anos futuros. Umadas grandes bênçãos da Igreja noMyanmar é a sua juventude e, emparticular, o número de seminaristase noviços. E por isso agradecemos aDeus. No espírito do Sínodo, porfavor, envolvei-os e sustentai-os noseu percurso de fé, pois, através doseu idealismo e entusiasmo, são cha-mados a ser evangelizadores felizes econvincentes dos seus coetâneos.

A minha terceira palavra, paravós, é p ro f e c i a . A Igreja no Myanmardá testemunho diariamente do Evan-gelho, através das suas obras educa-tivas e caritativas, da sua defesa dosdireitos humanos, do seu apoio aosprincípios democráticos. Oxalá pos-sais colocar a comunidade católicaem condições de continuar a ter umpapel construtivo na vida da socie-dade, fazendo ouvir a sua voz nasquestões de interesse nacional, no-meadamente insistindo no respeitopela dignidade e os direitos de to-dos, particularmente dos mais po-bres e vulneráveis. Tenho confiançaque o quinquénio de estratégia pas-toral, que a Igreja desenvolveu nocontexto mais amplo da construçãodo Estado, produzirá fruto abundan-te não só para o futuro das comuni-

dades locais mas também do país in-teiro. Aludo especialmente à necessi-dade de proteger o meio ambiente eassegurar uma correta utilização dosricos recursos naturais do país a bemdas gerações futuras. A custódia dodom divino da criação não pode serseparada duma sã ecologia humanae social. De facto, «o cuidado autên-tico da nossa própria vida e das nos-sas relações com a natureza é insepa-rável da fraternidade, da justiça e dafidelidade aos outros» (Laudato si’,70).

Queridos Irmãos Bispos, agradeçoa Deus este momento de comunhãoe rezo para que este nosso encontronos fortaleça no compromisso desermos pastores fiéis e servidores dorebanho que Cristo nos confiou. Seique o vosso ministério é exigente eque muitas vezes sentis, tal como osvossos sacerdotes, «o cansaço do diae o seu calor» (Mt 20,12). Exorto-vos a manter o equilíbrio tanto nasaúde física como na espiritual, e apreocupar-vos paternalmente com asaúde dos vossos sacerdotes.

E, falando de saúde espiritual,lembrai-vos do primeiro dever dobispo. Quando chegaram aos pri-meiros cristãos as queixas dos hele-nistas porque eram descuradas assuas viúvas e os filhos, os apóstolosreuniram-se e «inventaram» os diá-conos. E Pedro, ao proclamar estanotícia, anuncia também o dever dobispo, nestes termos: «A nós, com-pete-nos a oração e o anúncio daPalavra» (cf. At 6, 1-6). A oração é oprimeiro dever do bispo. À noite, noexame de consciência, cada um denós, bispos, deverá interrogar-se:«Quantas horas rezei hoje?»

Queridos irmãos, exorto-vos amanter o equilíbrio na saúde física ena espiritual. Sobretudo encorajo-vos a crescer todos os dias na oraçãoe na experiência do amor reconcilia-dor de Deus, porque é a base davossa identidade sacerdotal, a garan-tia da solidez da vossa pregação e afonte da caridade pastoral com queconduzis o povo de Deus pelas sen-das da santidade e da verdade. Comgrande afeto, invoco a graça do Se-nhor sobre vós, sobre os sacerdotes,os religiosos e sobre todos os leigosdas vossas Igrejas locais. Peço, porfavor, que não vos esqueçais de rezarpor mim.

E agora convido-vos a rezarmostodos juntos — vós em birmanês, euem espanhol — a Ave-Maria a NossaSenhora.

[Ave Maria]Abençoe-vos Deus Todo-Poderoso

Pai, Filho e Espírito Santo.

página 8 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 30 de novembro de 2017, número 48

Pedras para o futuro

Do nosso enviadoGIANLUCA BICCINI

Para a histórica primeira missa cele-brada publicamente por um Pontífi-ce no solo do Myanmar, o pequenorebanho da Igreja local respondeucom entusiasmo à voz do pastorcom “cheiro de ovelha”. No terceirodia da sua viagem à Ásia, na parteda manhã Francisco presidiu à Euca-ristia na presença de cento e cin-quenta mil fiéis provenientes até dasaldeias de montanha mais distantes.E no final da tarde encontrou-secom o episcopado de uma nação naqual os católicos são apenas seiscen-tos e cinquenta mil num total decinquenta e seis milhões de habitan-tes. Entre os dois encontros com estacomunidade viva e dinâmica, no si-nal do diálogo entre as religiões, oPapa quis visitar também um lugarsímbolo do budismo, a “pagoda dapaz mundial”, falando ao conselhosupremo “sangha” dos monges.

Sob indicação do arcebispo deYangon, que pediu para antecipar amissa antes que o calor e a umidadese tornassem insuportáveis, Francis-co foi muito cedo ao KyaikkasanGround, uma área verde no centroda antiga capital.

Imponente o palco em forma degigantesca pagoda dourada sobre aqual montaram o altar, com umaclara evocação à cultura da maioriabudista do país. De resto, aqui oscatólicos são só um quarto da mino-ria cristã, que por sua vez representa4 por cento da população. «Mas umpor cento, que corresponde a seis-centos e cinquenta mil pessoas, já émais do dobro em relação às que ha-via no ano da independência em1947» explicou o salesiano MarianoSoe Naing, estreito colaborador docardeal Bo.

Um pequeno mas eloquente sinalde vitalidade, devido também ao en-gajamento dos missionários italianosdo Pime, como os sacerdotes PaoloManna e Clemente Vismara, beatifi-cados respetivamente em 2001 e2011, e como o seu irmão de hábitomártir Mario Vergara, proclamadobeato em 2014 juntamente com o ca-

tequista local Isidoro Ngei Ko Lat,protomártir da Igreja do Myanmar.Com o seu testemunho deram novalinfa à planta da Igreja, que brotoudo anúncio evangélico do qual pre-cisamente em 2014 foi celebrado oquinto centenário. Hoje ela conta 16circunscrições eclesiásticas, reagrupa-das ao redor das arquidioceses deMandalay, de Taunggyi e de Yan-gon, com cerca de vinte bispos, pou-co menos de mil sacerdotes diocesa-nos e religiosos, quase 1500 consa-grados e consagradas. Entre os lei-gos, 90 por cento pertencentes às et-nias karen e kayah, há mais de 2500catequistas, enquanto as vocações aosacerdócio e à vida religiosa flores-cem numerosas. As dioceses, os ins-titutos e as congregações gerem uma

universidade, dez colégios e mais de250 escolas, além de cerca de dezhospitais, cem postos médicos, doisleprosários, sete centros de assistên-cia para idosos, duzentos orfanatos ecreches, situados nas zonas rurais eurbanas. Sem esquecer os diversosprojetos de desenvolvimento da agri-cultura, para garantir a subsistência,os cuidados e a educação aos maispobres, que no Myanmar são deve-ras muitos. Em particular, a Cáritas,aqui conhecida como “Ka ru n a ”,através de 750 agentes espalhadosem todo o país, além de intervir nasemergências, inaugurou mil escolasprimárias gratuitas. Porque saúde eeducação são os dois âmbitos nosquais os católicos deram e conti-nuam a dar um contributo funda-mental para o processo de constru-ção da identidade de uma naçãomosaico, composta por tantas etnias.

Em sinal de atenção a esta reali-dade, durante o rito litúrgico, naoração dos fiéis foram lidas inten-ções nas línguas das minorias ka-chin, kayah, chin, karen e shan. OPontífice usou o cálice do primeirobispo missionário no Myanmar e umbáculo de madeira realizado artesa-nalmente e que lhe foi oferecido pe-los refugiados católicos kachin, queagora se encontram no campo de re-fugiados da cidade de Winemaw.Devido às difíceis condições nasquais se encontram, não puderam ira Yangon. De resto, as distâncias sãonotáveis e os custos elevados, a pon-to que entre os participantes na cele-bração muitos tiveram que se deslo-car a pé caminhando por três ouquatro dias. E para quem optou pe-lo comboio, o governo pôs à dispo-sição bilhetes gratuitos. Chegaramdos Estados do norte, onde as co-munidades católicas são mais nume-rosas, vestidos com os trajes tradicio-nais coloridos e munidos de sombri-nhas de papel e bambu para se pro-teger do sol. Com eles também fiéisprovenientes das nações vizinhas, co-mo a Tailândia o Vietname e a Ín-dia. E não faltaram, entre os presen-tes, muçulmanos, hindus, budistas e,naturalmente, líderes e membros dasIgrejas cristãs.

Vestindo os paramentos verdescom motivos ornamentais douradosno estilo oriental, Francisco presidiuà Eucaristia, concelebrada por cercade dez cardeais, em prevalência asiá-ticos, por numerosos bispos e sacer-dotes do Myanmar. E no final quissaudar pessoalmente todos os pur-purados e os prelados participantes.

Animada por cânticos com a incon-fundível sonoridade do continente, amissa foi celebrada em inglês e emlatim, com o trecho do Evangelhode Lucas (21, 12 ss.) proclamado nalíngua local. Depois de ter dado iní-cio com a tradicional expressão deboas-vindas “Mingalaba”, que susci-tou o aplauso dos presentes, o Papana homilia pronunciada em italiano— com tradução alternada em birma-nês por parte de um sacerdote —exortou a olhar para a cruz a fim dereencontrar a cura para as feridas daviolência, pondo de lado rancor evingança.

Temas retomados no final da tar-de, quando na catedral de Saint Ma-ry Francisco concluiu o exaustivodia encontrando-se com a Conferên-cia episcopal do Myanmar. A sua re-flexão inicialmente interrompida porum pequeno black out elétrico, foicentrada nos temas da cura, doacompanhamento e da profecia. OPontífice enriqueceu o texto italianopreparado — distribuído aos presen-tes numa versão inglesa — com di-versas inserções improvisadas, pedin-do ao intérprete, monsenhor Miles,para traduzir os vários acréscimos.Em particular, o Papa convidou osprelados a permanecer próximos dosseus sacerdotes e dos catequistas,que são os “p i l a re s ” da evangeliza-ção, e recordou que a tarefa princi-pal do bispo é a oração. O Pontíficeelogiou também a estratégia pastoralquinquenal adotada e a organizaçãoda conferência sobre a paz de abrilpassado, com a participação de che-fes religiosos, embaixadores e repre-sentantes de Ongs. Por fim, a refe-rência à imagem bíblica do bom sa-maritano que se detém para socorreros muitos desabrigados quer no inte-rior do país quer nas nações confi-nantes jazem feridos na beira da es-trada. Antes de concluir Franciscopediu que rezassem a Nossa Senho-ra, os bispos em birmanês e ele emespanhol.

Na despedida Francisco saudoupessoalmente cada prelado e benzeuas primeiras pedras de dezesseisigrejas, do seminário maior e danunciatura apostólica. Depois, forado salão pousou para a foto com ostrezentos seminaristas que represen-tam o futuro da Igreja no Myanmar,recitando com eles a Ave-Maria. Porfim, voltando para o arcebispado en-controu à sua espera trinta irmãosde hábito jesuítas que desempenhama própria missão em terra birmane-sa.

CO N T I N UA Ç Ã O DA PÁGINA 1

numa «significativa ocasião pararenovar os vínculos de amizade erespeito entre budistas e católicos»,como observou imediatamente Ber-goglio. Além de ser «uma oportu-nidade para afirmar o nosso com-promisso em prol da paz, do res-peito pela dignidade humana e pe-la justiça», e para ajudar ambas asreligiões «a lutar por uma maiorharmonia nas suas comunidades»,acrescentou o Papa.

Também no discurso aos mongesvoltou a ser abordado o tema dacura, que Francisco tinha indicadopoucas horas antes, durante a mis-sa, desejando que os budistas e oscatólicos possam «caminhar juntosao longo desta senda de cura, tra-balhando lado a lado pelo bem decada habitante desta terra». Nestatarefa de superar as consequênciasdos conflitos que, durante décadas,

ensanguentaram o país, a Igreja ca-tólica é «um parceiro disponível»,garantiu o Pontífice. Mas sem es-quecer que «o grande desafio dosnossos dias é ajudar as pessoas aabrir-se ao transcendente». Traba-lhando juntos para superar todasas hostilidades, cientes de umaconsonância entre as duas tradiçõesreligiosas que, ambas, afirmam anecessidade de vencer o mal com ob em.

E finalmente o Papa falou de cu-ra pela terceira vez aos bispos,num discurso que desenvolveu comoutras duas palavras: acompanha-mento e profecia. Dirigindo-se atestemunhas do Evangelho que de-vem acompanhar o rebanho, tendosim «o cheiro das ovelhas», comorepete muitas vezes, mas também«o cheiro de Deus». Sem esquecerque a primeira tarefa do bispo é aoração.

A senda da cura

número 48, quinta-feira 30 de novembro de 2017 L’OSSERVATORE ROMANO página 9

O encorajamento do Papa na missa celebrada com os jovens

Não tenhais medode confiar na misericórdia de Deus

Com a missa para os jovens celebradana Catedral da Imaculada Conceiçãode Yangon, na manhã de quinta-feira30 de novembro, concluiu-se a visitado Sumo Pontífice ao Myanmar. Nofinal da celebração o Papa deslocou-separa o aeroporto internacional damesma cidade, onde se despediu dopaís iniciando a segunda etapa daviagem, que o levou ao Bangladesh.

Quando já se aproxima do fim a mi-nha visita à vossa linda terra, uno-me convosco para agradecer a Deusas muitas graças que recebemos nes-tes dias. Contemplando-vos a vós,jovens do Myanmar, e a todos aque-les que nos acompanham fora destacatedral, quero partilhar uma fraseda primeira Leitura de hoje que res-soa dentro de mim. Tirada do profe-ta Isaías, é retomada por São Paulona sua Carta à jovem comunidadecristã de Roma. Escutemos uma vezmais estas palavras: «Que bem-vin-dos são os pés dos que anunciam asboas novas!» (Rm 10, 15; cf. Is 52, 7)

Queridos jovens do Myanmar,veio-me a vontade de aplicar a vós

cisam das vossas orações e da vossasolidariedade, mas também da vossapaixão pelos direitos humanos, pelajustiça e pelo crescimento daquiloque Jesus dá: amor e paz.

Mas gostaria também de vos pro-por um desafio. Ouvistes com aten-ção a primeira Leitura? Nela, SãoPaulo repete três vezes a palavra«sem». É uma palavra pequena, masque nos faz pensar sobre o nosso lu-gar no projeto de Deus. De facto,Paulo formula três perguntas que eugostaria de colocar, pessoalmente, acada um de vós. A primeira: «Comohão de acreditar sem terem ouvidofalar d’Ele?» A segunda: «Comohão de ouvir falar, sem um mensa-geiro que O anuncie?» A terceira:«Como há de um mensageiro anun-ciar, sem ser enviado?» (cf. Rm 10,14-15).

Gostaria que todos vós pensásseisprofundamente nestas três questões.Mas não tenhais medo! Como pai(talvez fosse melhor dizer avô!) be-névolo, não quero deixar-vos sozi-nhos perante tais perguntas. Permiti-me oferecer-vos alguns pensamentos

n’Ele, precisam de O en-contrar em pessoas quesejam autênticas, pessoasque sabem ouvir. Certa-mente é o que vós que-reis ser. Mas só o Se-nhor pode ajudar-vos aser genuínos. Por issofalai com Ele na oração.Aprendei a ouvir a suavoz, falando serenamen-te com Ele no íntimo dovosso coração.

Mas falai tambémcom os santos, com osnossos amigos no Céuque nos podem inspirar.Como Santo André, quehoje festejamos. Era umsimples pescador e tor-nou-se um grande már-tir, uma testemunha do

gritar, mas não com a voz, não; gos-taria que gritásseis com a vida, como coração, de modo a ser sinais deesperança para quem está desanima-do, uma mão estendida para quemestá doente, um sorriso acolhedorpara quem é estrangeiro, um apoiocarinhoso para quem está sozinho.

A última pergunta de Paulo é:«Como há de um mensageiro anun-ciar, sem ser enviado?». No final daMissa, seremos todos enviados apartilhar com os outros os dons querecebemos. Isto poderia ser um pou-co desanimador, já que nem sempresabemos aonde nos pode enviar Je-sus. Mas Ele nunca nos envia, semao mesmo tempo caminhar ao nossolado e sempre um pouco à nossafrente, para nos introduzir em novase magníficas partes do seu Reino.

No Evangelho de hoje, como éque o Senhor envia Santo André eseu irmão Simão Pedro? Dizendo-lhes: «Segui-me» (Mt 4, 19). Eis oque significa envio: não atirar-se pa-ra a frente com as próprias forças,mas seguir Cristo! O Senhor convi-dará alguns de vós a segui-lo comosacerdotes, tornando-se assim «pes-cadores de homens». Outros, cha-má-los-á para se tornarem pessoasconsagradas. E outros ainda, chamá-los-á à vida matrimonial, para serempais e mães amorosos. Seja qual fora vossa vocação, exorto-vos: sede co-rajosos, sede generosos e, sobretudo,sede alegres!

Aqui, nesta linda Catedral dedica-da à Imaculada Conceição, encorajo-vos a olhar para Maria. Quando dis-se “sim” à mensagem do Anjo, Elaera jovem como vós. Mas teve a co-ragem de confiar na boa nova queouvira e de a traduzir numa vida defiel dedicação à sua vocação, de to-tal doação de si mesma e de comple-to abandono à solicitude amorosa deDeus. Como Maria, possais ser to-dos dóceis mas corajosos em levarJesus e o seu amor aos outros!

Queridos jovens, com grande afe-to, confio todos vós e vossas famíliasà sua intercessão materna. E peço-vos, por favor, que vos lembreis derezar por mim. Deus abençoe oMyanmar [Myanmar pyi ko Payar-thakin Kaung gi pei pa sei]!

amor de Jesus. Mas, antes de se tor-nar um mártir, cometeu os seus errose precisou de ser paciente, aprenden-do gradualmente como ser um ver-dadeiro discípulo de Cristo. Tam-bém vós não tenhais medo de apren-der com os vossos erros! Possam ossantos guiar-vos até Jesus, ensinan-do-vos a colocar as vossas vidas nasmãos d’Ele. Sabeis que Jesus é cheiode misericórdia. Então partilhai comEle tudo o que tendes no coração:os medos e as preocupações, os so-nhos e as esperanças. Cultivai a vidainterior, como faríeis com um jardimou com um campo. Isso requer tem-po, requer paciência. Mas como umagricultor sabe esperar o crescimentoda seara, assim também a vós, se ti-verdes paciência, o Senhor concede-rá a graça de produzir muito fruto,um fruto que depois podereis parti-lhar com os outros.

A segunda pergunta de Paulo é:«Como hão de ouvir falar, sem ummensageiro que O anuncie?». Eisuma grande tarefa, confiada espe-cialmente aos jovens: ser «discípulosmissionários», mensageiros da boanova de Jesus, sobretudo para osvossos coetâneos e amigos. Não te-nhais medo de gerar confusão, decolocar perguntas que façam as pes-soas pensar! Nem tenhais medo, seàs vezes notardes que sois poucos edispersos por aqui e por ali. OEvangelho cresce sempre a partir depequenas raízes. Por isso, fazei-vosouvir! Gostaria de vos pedir para

que vos possam guiar no caminhoda fé e ajudar-vos a discernir aquiloque o Senhor está a pedir-vos.

A primeira pergunta de São Pauloé: «Como hão de acreditar sem te-rem ouvido falar d’Ele?». O nossomundo está cheio de tantos ruídos edistrações que podem sufocar a vozde Deus. Para que outros sejam cha-mados a ouvir falar d’Ele e a crer

estas palavras depois de ter ouvidoas vossas vozes hoje enquanto cantá-veis. Sim, bem-vindos são os vossospés, e é bom e encorajador ver-vos,porque nos anunciais «uma boa no-va», a boa nova da vossa juventude,da vossa fé e do vosso entusiasmo.Claro, vós sois uma boa nova, por-que sois sinais concretos da fé daIgreja em Jesus Cristo, que nos trazuma alegria e uma esperança que ja-mais terão fim.

Alguns se interrogam como é pos-sível falar de boas novas quandotantos sofrem ao nosso redor. Ondeestão as boas novas, quando tantainjustiça, pobreza e miséria estendea sua sombra sobre nós e o nossomundo? Contudo gostaria que destelugar partisse uma mensagem muitoclara. Gostaria que as pessoas sou-bessem que vós, homens e mulheresjovens do Myanmar, não tendes me-do de acreditar na boa nova da mi-sericórdia de Deus, porque essa boanova tem um nome e um rosto: Je-sus Cristo. Como mensageiros destaboa nova, estais prontos a anunciaruma palavra de esperança à Igreja,ao vosso país, ao mundo inteiro. Es-tais prontos a anunciar a boa novaaos irmãos e irmãs que sofrem e pre-

número 48, quinta-feira 30 de novembro de 2017 L’OSSERVATORE ROMANO página 10/11

Homens e mulheres em busca de pazDedicada aos migrantes e refugiados a mensagem de Francisco para o dia mundial de 2018

Os «migrantes e refugiados: homens emulheres em busca de paz» estão nocentro da mensagem do Papa para o 51ºdia mundial da paz, que será celebrado a1 de janeiro de 2018.

1. Votos de pazPaz a todas as pessoas e a todas as na-ções da terra! A paz, que os anjosanunciam aos pastores na noite de Na-tal,1 é uma aspiração profunda de todasas pessoas e de todos os povos, sobre-tudo de quantos padecem mais dura-mente pela sua falta. Dentre estes, que

vimento harmónico, para não serem co-mo o construtor insensato que fez malos cálculos e não conseguiu completara torre que começara a construir.4

2. Porque há tantos refugiadose migrantes?

Na mensagem para idêntica ocorrên-cia no Grande Jubileu pelos 2000 anosdo anúncio de paz dos anjos em Be-lém, São João Paulo II incluiu o núme-ro crescente de refugiados entre os efei-tos de «uma sequência infinda e hor-renda de guerras, conflitos, genocídios,

Em muitos países de destino, genera-lizou-se largamente uma retórica queenfatiza os riscos para a segurança na-cional ou o peso do acolhimento dosrecém-chegados, desprezando assim adignidade humana que se deve reco-nhecer a todos, enquanto filhos e filhasde Deus. Quem fomenta o medo con-tra os migrantes, talvez com fins políti-cos, em vez de construir a paz, semeiaviolência, discriminação racial e xenofo-bia, que são fonte de grande preocupa-ção para quantos têm a peito a tutelade todos os seres humanos.8

Todos os elementos à disposição dacomunidade internacional indicam que

Precisamos de lançar, também sobrea cidade onde vivemos, este olhar con-templativo, «isto é, um olhar de fé quedescubra Deus que habita nas suas ca-sas, nas suas ruas, nas suas praças (...),promovendo a solidariedade, a fraterni-dade, o desejo de bem, de verdade, dejustiça»,10 por outras palavras, realizan-do a promessa da paz.

Detendo-se sobre os migrantes e osrefugiados, este olhar saberá descobrirque eles não chegam de mãos vazias:trazem uma bagagem feita de coragem,capacidades, energias e aspirações, paraalém dos tesouros das suas culturas na-tivas, e deste modo enriquecem a vida

com a tutela dos direitos humanos fun-damentais. Recorda-nos a Sagrada Es-critura: «Não vos esqueçais da hospita-lidade, pois, graças a ela, alguns, sem osaberem, hospedaram anjos».13

«Proteger» lembra o dever de reco-nhecer e tutelar a dignidade invioláveldaqueles que fogem de um perigo realem busca de asilo e segurança, de im-pedir a sua exploração. Penso de modoparticular nas mulheres e nas criançasque se encontram em situações ondeestão mais expostas aos riscos e aosabusos que chegam até ao ponto de astornar escravas. Deus não discrimina:«O Senhor protege os que vivem emterra estranha e ampara o órfão e a viú-va».14

«Promover» alude ao apoio para odesenvolvimento humano integral demigrantes e refugiados. Dentre os nu-merosos instrumentos que podem aju-dar nesta tarefa, desejo sublinhar a im-portância de assegurar às crianças e aosjovens o acesso a todos os níveis deinstrução: deste modo poderão não sócultivar e fazer frutificar as suas capaci-dades, mas estarão em melhores condi-ções também para ir ao encontro dosoutros, cultivando um espírito de diálo-go e não de fechamento ou de conflito.A Bíblia ensina que Deus «ama o es-trangeiro e dá-lhe pão e vestuário»; daía exortação: «Amarás o estrangeiro,porque foste estrangeiro na terra doEgito».15

Por fim, «integrar» significa permitirque refugiados e migrantes participemplenamente na vida da sociedade queos acolhe, numa dinâmica de mútuoenriquecimento e fecunda colaboraçãona promoção do desenvolvimento hu-mano integral das comunidades locais.«Portanto — como escreve São Paulo —já não sois estrangeiros nem imigrantes,

mas concidadãos dos santos e membrosda casa de Deus».16

5. Uma proposta paradois Pactos internacionais

Almejo do fundo do coração que sejaeste espírito a animar o processo que,no decurso de 2018, levará à definição eaprovação por parte das Nações Uni-das de dois pactos globais: um paramigrações seguras, ordenadas e regula-res, outro referido aos refugiados. En-quanto acordos partilhados a nível glo-bal, estes pactos representarão um qua-dro de referência para propostas políti-cas e medidas práticas. Por isso, é im-portante que sejam inspirados por sen-timentos de compaixão, clarividência ecoragem, de modo a aproveitar todasas ocasiões para fazer avançar a cons-trução da paz: só assim o necessáriorealismo da política internacional não

se tornará uma capitulação ao cinismoe à globalização da indiferença.

De facto, o diálogo e a coordenaçãoconstituem uma necessidade e um de-ver próprio da comunidade internacio-nal. Mais além das fronteiras nacionais,é possível também que países menos ri-cos possam acolher um número maiorde refugiados ou acolhê-los melhor, sea cooperação internacional lhes dispo-nibilizar os fundos necessários.

A Secção Migrantes e Refugiados doDicastério para o Serviço do Desenvol-vimento Humano Integral sugeriu 20pontos de ação17 como pistas concretaspara a implementação dos supramen-cionados quatro verbos nas políticaspúblicas e também na conduta e açãodas comunidades cristãs. Estas e outrascontribuições pretendem expressar o in-teresse da Igreja católica pelo processoque levará à adoção dos referidos pac-tos globais das Nações Unidas. Um talinteresse confirma uma vez mais a soli-citude pastoral que nasceu com a Igrejae tem continuado em muitas das suasobras até aos nossos dias.

6. Em prolda nossa casa comum

Inspiram-nos as palavras de SãoJoão Paulo II: «Se o “sonho” de ummundo em paz é partilhado por tantaspessoas, se se valoriza o contributo dosmigrantes e dos refugiados, a humani-dade pode tornar-se sempre mais famí-lia de todos e a nossa terra uma real“casa comum”».18 Ao longo da história,muitos acreditaram neste «sonho» e assuas realizações testemunham que nãose trata de uma utopia irrealizável.

Entre eles conta-se Santa FranciscaXavier Cabrini, cujo centenário do nas-cimento para o Céu ocorre em 2017.Hoje, dia 13 de novembro, muitas co-munidades eclesiais celebram a sua me-mória. Esta pequena grande mulher,que consagrou a sua vida ao serviçodos migrantes tornando-se depois a suaPadroeira celeste, ensinou-nos comopodemos acolher, proteger, promover eintegrar estes nossos irmãos e irmãs.Pela sua intercessão, que o Senhor nos

conceda a todos fazer a experiência deque «o fruto da justiça é semeado empaz por aqueles que praticam a paz».19

Vaticano, 13 de novembro de 2017,Memória de Santa Francisca Xavier

Cabrini, Padroeira dos migrantes

1 Cf. Lucas 2, 14.2 An g e l u s (15/I/2012).3 JOÃO XXIII, Carta enc. Pacem in terris,106.4 Cf. Lucas 14, 28-30.5 Mensagem para o Dia Mundial daPaz de 2000, 3.6 BENTO XVI, Mensagem para o DiaMundial do Migrante e do Refugiadode 2013.7 N. 25.8 Cf. Discurso aos Diretores nacionaisda Pastoral dos Migrantes, participan-tes no Encontro promovido pelo Con-selho das Conferências Episcopais daEuropa (22/IX/2017).9 BENTO XVI, Mensagem para o DiaMundial do Migrante e do Refugiadode 2011.10 Exort. ap. Evangelii gaudium, 71.11 JOÃO XXIII, Carta enc. Pacem in terris,106.12 Mensagem para o Dia Mundial doMigrante e do Refugiado de 2018(15/VIII/2017).13 H e b re u s 13, 2.14 Salmo 146, 9.15 D e u t e ro n ó m i o 10, 18-19.16 Efésios 2, 19.17 «20 Pontos de Ação Pastoral» e «20Pontos de Ação para os Pactos Glo-bais» (2017). Cf. também DocumentoONU A/72/528.18 Mensagem para o Dia Mundial doMigrante e do Refugiado de 2004, 6.19 Ti a g o 3, 18.

as migrações globais continuarão amarcar o nosso futuro. Alguns conside-ram-nas uma ameaça. Eu, pelo contrá-rio, convido-vos a vê-las com um olharrepleto de confiança, como oportunida-de para construir um futuro de paz.

3. Com olharcontemplativo

A sabedoria da fé nutre este olhar,capaz de intuir que todos pertencemos«a uma só família, migrantes e popula-ções locais que os recebem, e todos têmo mesmo direito de usufruir dos bensda terra, cujo destino é universal, comoensina a doutrina social da Igreja. Aquiencontram fundamento a solidariedadee a partilha».9 Estas palavras propõem-nos a imagem da nova Jerusalém. O li-vro do profeta Isaías (cap. 60) e, em se-guida, o Apocalipse (cap. 21) descre-vem-na como uma cidade com as por-tas sempre abertas, para deixar entrargente de todas as nações, que a admirae enche de riquezas. A paz é o sobera-no que a guia, e a justiça o princípioque governa a convivência dentro dela.

e o bem de cada um deles.Quem estiver animado por este olhar

será capaz de reconhecer os rebentosde paz que já estão a despontar e cui-dará do seu crescimento. Transformaráassim em canteiros de paz as nossas ci-dades, frequentemente divididas e pola-rizadas por conflitos que se referemprecisamente à presença de migrantes ere f u g i a d o s .

4. Quatro pedras miliáriaspara a ação

Oferecer a requerentes de asilo, refu-giados, migrantes e vítimas de tráficohumano uma possibilidade de encon-trar aquela paz da qual andam à procu-ra, exige uma estratégia que combinequatro ações: acolher, proteger, promo-ver e integrar.12

«Acolher» faz apelo à exigência deampliar as possibilidades de entrada le-gal, de não repelir refugiados e migran-tes para lugares onde os aguardam per-seguições e violências, e de equilibrar apreocupação pela segurança nacional

Uma voluntária da Cruz vermelhacom um jovem migrante (Ansa)

Nicole Theresia Spitzwieser, «Refugiados»

trago presente nosmeus pensamentos ena minha oração, que-ro recordar de novo osmais de 250 milhõesde migrantes no mun-do, dos quais 22 mi-lhões e meio são refu-giados. Estes últimos,como afirmou o meuamado predecessorBento XVI, «são ho-mens e mulheres,crianças, jovens e ido-sos que procuram umlugar onde viver empaz».2 E, para o en-contrar, muitos delesestão prontos a arris-car a vida numa via-gem que se revela, emgrande parte dos ca-sos, longa e perigosa,a sujeitar-se a fadigase sofrimentos, a en-frentar arames farpa-dos e muros erguidospara os manter longeda meta.

Com espírito de mi-

das nações que os aco-lhem. Saberá vislum-brar também a criati-vidade, a tenacidade eo espírito de sacrifíciode inúmeras pessoas,famílias e comunida-des que, em todas aspartes do mundo,abrem a porta e o co-ração a migrantes e re-fugiados, inclusive on-de não abundam osre c u r s o s .

Este olhar contem-plativo saberá, enfim,guiar o discernimentodos responsáveis go-vernamentais, de mo-do a impelir as políti-cas de acolhimento atéao máximo dos «limi-tes consentidos pelobem da própria comu-nidade retamente en-tendido»,11 isto é, to-mando em considera-ção as exigências detodos os membros daúnica família humana

sericórdia, abraçamos todos aquelesque fogem da guerra e da fome ou seveem constrangidos a deixar a própriaterra por causa de discriminações, per-seguições, pobreza e degradação am-biental.

Estamos cientes de que não bastaabrir os nossos corações ao sofrimentodos outros. Há muito que fazer antesde os nossos irmãos e irmãs poderemvoltar a viver em paz numa casa segu-ra. Acolher o outro requer um compro-misso concreto, uma corrente de apoiose beneficência, uma atenção vigilante eabrangente, a gestão responsável de no-vas situações complexas que às vezes sevêm juntar a outros problemas já exis-tentes em grande número, bem comorecursos que são sempre limitados. Pra-ticando a virtude da prudência, os go-vernantes saberão acolher, promover,proteger e integrar, estabelecendo me-didas práticas, «nos limites consentidospelo bem da própria comunidade reta-mente entendido, [para] lhes favorecera integração».3 Os governantes têmuma responsabilidade precisa para comas próprias comunidades, devendo asse-gurar os seus justos direitos e desenvol-

“limpezas étnicas”»5 que caraterizaramo século XX . E até agora, infelizmente,o novo século não registou uma verda-deira viragem: os conflitos armados eas outras formas de violência organiza-da continuam a provocar deslocaçõesde populações no interior das fronteirasnacionais e para além delas.

Todavia as pessoas migram tambémpor outras razões, sendo a primeira de-las «o desejo de uma vida melhor, uni-do muitas vezes ao intento de deixarpara trás o “desesp ero” de um futuroimpossível de construir».6 As pessoaspartem para se juntar à própria família,para encontrar oportunidades de traba-lho ou de instrução: quem não podegozar destes direitos, não vive em paz.Além disso, como sublinhei na Encícli-ca Laudato si’, «é trágico o aumento demigrantes em fuga da miséria agravadapela degradação ambiental».7

A maioria migra seguindo um per-curso legal, mas há quem tome outroscaminhos, sobretudo por causa do de-sespero, quando a pátria não lhes ofere-ce segurança nem oportunidades, e to-das as vias legais parecem impraticá-veis, bloqueadas ou demasiado lentas.

página 12 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 30 de novembro de 2017, número 48

Discurso aos franciscanos

Frades menoresQueridos irmãos!O “Senhor Papa”, como lhe chama-va Francisco, recebe-vos com alegriae em vós acolhe os irmãos francisca-nos que vivem e trabalham no mun-do inteiro. Obrigado por aquilo quesois e por quanto fazeis, especial-mente a favor dos mais pobres ed e s f a v o re c i d o s .

«Todos sejam designados indistinta-mente como frades menores», lê-se naRegra não bulada.1 Com esta expres-são São Francisco não fala de algofacultativo para os seus irmãos, masmanifesta um elemento constitutivoda vossa vida e missão.

Com efeito, na vossa forma de vi-da, o adjetivo “menor” qualifica osubstantivo “irmão”, conferindo aovínculo da fraternidade uma quali-dade própria e caraterística: não é amesma coisa dizer “irmão” ou “ir-mão menor”. Por esta razão, falandode fraternidade é necessário ter bempresente esta caraterística típica fran-ciscana da relação fraterna, que exi-ge de vós uma relação de “irmãosm e n o re s ”.

Onde se inspirou Francisco paracolocar a menoridade como elemen-to essencial da vossa fraternidade?2

Sendo Cristo e o Evangelho op-ções fundamentais da sua vida, po-demos afirmar com toda a segurançaque a menoridade, embora não des-provida de motivações ascéticas e so-ciais, nasce da contemplação da en-carnação do Filho de Deus e resu-me-a na imagem de se tornar peque-nino, como uma semente. É a mes-ma lógica do “sendo rico, se fez po-bre por vós” (cf. 2 Cor 8, 9). A lógi-ca do “desp ojamento”, que Francis-co cumpriu concretamente quando«se despojou, até à nudez, de todosos bens terrenos, para se doar intei-ramente a Deus e aos irmãos».3

A vida de Francisco foi marcadapelo encontro com Deus pobre, pre-sente no meio de nós em Jesus deNazaré: uma presença humilde e es-condida que o Pobrezinho adora econtempla na Encarnação, na Cruz ena Eucaristia. Por outro lado, sabe-mos que uma das imagens evangéli-cas que mais impressionou Franciscofoi a do lava-pés dos discípulos daÚltima Ceia.4

A menoridade franciscana apre-senta-se para vós como lugar de en-contro e de comunhão com Deus:como lugar de encontro e de comu-nhão com os irmãos e com todos oshomens e mulheres; por fim, comolugar de encontro e de comunhãocom a criação.

A menoridadeé lugar de encontro com DeusA menoridade carateriza de ma-

neira especial a vossa relação comDeus. Para São Francisco o homemnada possui a não ser o próprio pe-cado, e o seu valor é igual ao quetem diante de Deus e nada mais.Por isso, a vossa relação com Ele de-ve ser a de uma criança: humilde econfiante e, como a do publicano doEvangelho, ciente do seu pecado. Eprestai atenção ao orgulho espiritual,ao orgulho dos fariseus: é a pior dasmundanidades.

Uma caraterística da vossa espiri-tualidade é ser uma espiritualidade

de restituição a Deus. Todo o bemque há em nós ou que podemos fa-zer é o dom d’Aquele que para SãoFrancisco era o Bem, «todo o bem,o sumo bem»5 e tudo deve ser resti-tuído ao «altíssimo, omnipotente eBom Senhor».6 Nós fazemos istoatravés do louvor, fazemos istoquando vivemos de acordo com a ló-gica evangélica do dom, que nos le-va a sair de nós mesmos para encon-trar os outros e acolhê-los na nossavida.

A menoridade é lugarde encontro com os irmãos

e com todosos homens e mulheres

A menoridade vive-se antes de tu-do na relação com os irmãos que oSenhor nos deu.7 Como? Evitandoqualquer comportamento de supe-rioridade. Isto significa desenraizaros julgamentos fáceis sobre os outrose falar mal dos irmãos pelas costas —isto está nas “Admo estações”! — 8 re -jeitar a tentação de usar a autorida-de para subjugar os outros; evitar fa-zer com que sejam “pagos” os favo-res que fazemos aos outros, enquan-to nós consideramos como devidos

os que os outros fazem a nós; afastarde nós a ira e a perturbação pelo pe-cado do irmão.9

A menoridade vive-se como ex-pressão da pobreza que professas-tes,10 quando se cultiva um espíritode não apropriação nas relações;quando se valoriza o positivo que háno outro, como dom que vem doSenhor; quando, especialmente osMinistros, exercem o serviço da au-toridade com misericórdia, como ex-prime, magnificamente, a Carta aum Ministro,11 a melhor explicaçãoque Francisco nos oferece sobre oque significa ser menor em relaçãoaos irmãos que lhe foram confiados.Sem misericórdia não há fraternida-de nem menoridade.

A necessidade de manifestar avossa fraternidade em Cristo fazcom que as vossas relações interpes-soais sigam o dinamismo da carida-de, razão pela qual, enquanto a jus-tiça vos levará a reconhecer os direi-tos de cada um, a caridade transcen-de estes direitos e chama-vos à co-munhão fraterna; porque não são osdireitos que vós amais, mas os ir-mãos, que deveis acolher com respei-to, compreensão e misericórdia. Sãoimportantes os irmãos, não as estru-turas.

A menoridade deve ser tambémvivida em relação a todos os homense mulheres com os quais vos encon-trais no vosso ir pelo mundo, evitan-do com o máximo cuidado qualqueratitude de superioridade que vospossa afastar dos outros. São Fran-cisco exprime claramente esta instân-cia nos dois capítulos da Regra nãobulada onde põe em relação a esco-lha de não se apropriar de nada (vi-ver sine proprio) com o acolhimentobenévolo de cada pessoa até à parti-lha da vida com os mais despreza-dos, com quantos são consideradosverdadeiramente os menores da so-ciedade: «Cuidem os irmãos, ondequer que estejam [...], de não seapropriar de qualquer lugar nem dis-putá-lo a outrem. E todo aquele quedeles se acercar, seja amigo ou ad-versário, ladrão ou bandido, rece-bam-no com bondade».12 Mais ain-da: «E devem sentir-se satisfeitosquando estão no meio de gente co-mum e desprezada, de pobres e fra-cos, enfermos, leprosos e mendigosde rua».13

As palavras de Francisco levantamquestões como fraternidade: ondeestamos? Com quem estamos? Comquem estamos em relação? Quemsão os nossos preferidos? E, dadoque a menoridade interpela não só afraternidade, mas cada um dos seuscomponentes, é oportuno que todosfaçam o exame de consciência sobreo próprio estilo de vida; sobre asdespesas, sobre o vestir, sobre o queconsideram necessário; sobre a pró-pria dedicação aos outros, sobre oescapar do espírito de cuidar dema-siado de si mesmos, até da própriafraternidade.

E, por favor, quando desempe-nhardes qualquer atividade em proldos “mais pequeninos”, dos excluí-dos e dos últimos, nunca o façais deum pedestal de superioridade. Aocontrário, pensai que tudo o que fa-zeis por eles é um modo de devolvero que recebestes gratuitamente. Co-mo admoesta Francisco na Carta atoda a Ordem: «Nada de vós mes-mos retenhais para vós».14 Criai umespaço acolhedor e disponível paraque entrem na vossa vida todos osmenores do vosso tempo: os margi-nalizados, homens e mulheres quevivem nas nossas ruas, nos nossosparques ou nas estações; os milharesde desempregados, jovens e adultos;muitos doentes que não têm acessoaos cuidados adequados, muitos idosabandonados; as mulheres maltrata-das; os migrantes que buscam umavida digna; todos os que vivem nasperiferias existenciais, privados dedignidade e também da luz doEvangelho.

Abri os vossos corações e abraçaios leprosos do nosso tempo e, de-pois de ter tomado consciência damisericórdia que o Senhor teve con-vosco,15 sede misericordiosos comeles, como o vosso pai São Francis-co;16 e, come ele, aprendei a ser «en-fermos com os enfermos, aflitos comos aflitos».17 Tudo isto, longe de serum sentimento vago, indica uma re-lação tão profunda entre pessoasque, transformando o vosso coração,vos levará a compartilhar o destinodeles.

CO N T I N UA NA PÁGINA 13

Percurso comumA fundação de uma única universidade franciscana foi anunciada aoPapa no início da audiência, pelo ministro-geral dos capuchinhosMauro Jöhri, em nome dos membros das famílias franciscanas da pri-meira ordem e da terceira ordem regular. Ilustrando o «percurso queestamos a realizar juntos» desde 2013, quando por ocasião da visita aAssis o Pontífice nos exortou a «permanecer unidos», o religioso refe-riu também que a 8 de dezembro deste ano, em Rieti (Itália), «vai co-meçar um novo caminho, uma fraternidade» composta por frades me-nores, conventuais e capuchinhos, e que já foram «empreendidos pro-jetos de estreita colaboração, como por exemplo os cursos trimestraisde formação para os missionários em Bruxelas», na Bélgica, e os «cur-sos de atualização destinados aos formadores das três ordens masculi-nas em África».

«Na vossa forma de vida, o adjetivo “menor” qualifica o substantivo “irmão”,conferindo ao vínculo da fraternidade uma qualidade própria e caraterística»,disse o Papa a um grupo de franciscanos pertencentes à Primeira ordem e àTerceira ordem regular, recebidos em audiência na manhã de quinta-feira, 23 denovembro, na Sala Clementina.

número 48, quinta-feira 30 de novembro de 2017 L’OSSERVATORE ROMANO página 13

CO N T I N UA Ç Ã O DA PÁGINA 12

Aos franciscanos

Terras feridasOração pelo Sudão do Sul e a República Democrática do Congo

P re c e se ajudas concretas

A menoridadelugar de encontro

com a criaçãoPara o Santo de Assis, a criação

era «como um livro esplêndido ondeDeus nos fala e transmite algo da suabeleza».18 A criação «pode ser com-parada ora a uma irmã, com quempartilhamos a existência, ora a umaboa mãe, que nos acolhe nos seusbraços».19

Hoje — sabemos — esta irmã emãe rebela-se porque se sente mal-tratada. Diante do deteriorar-se ge-neralizado do meio ambiente, peço-

vos que como filhos do Pobrezinhoentreis em diálogo com toda a cria-ção, emprestando-lhe a vossa vozpara louvar o Criador e, como faziaSão Francisco, tende por ela um cui-dado especial, superando qualquercálculo económico ou romantismo irra-cional. Colabora em várias iniciativaspara o cuidado da casa comum, re-cordando sempre a relação estreitaque há entre os pobres e a fragilida-de do planeta, entre economia, de-senvolvimento, cuidado da criação eopção pelos pobres.20

Queridos irmãos, renovo-vos o pe-dido de São Francisco: E sejam me-n o re s . Deus preserve e faça crescer avossa menoridade.

Sobre todos vós invoco a bênçãodo Senhor. E, por favor, não vos es-queçais de rezar por mim.

O brigado!

1 6, 3: FF 23.2 Cf. 1 Cel 38: FF 386.3 Carta ao Bispo de Assis para ainauguração do Santuário do Despoja-mento, 16 de abril de 2017.4 Cf. Regra não bulada 6, 4: FF 23;Admoestações 4, 2: FF 152.5 Louvores ao Deus Altíssimo, 3: FF

261.6 Cântico do Irmão Sol, 1: FF 263.7 Cf. Te s t a m e n t o , 14: FF 116.

8 Cf. Ad m o e s t a ç õ e s , 25: FF 174.9 Cf. ibid., 11: FF 160.10 Cf. Regra bulada, 1, 1: FF 75; Ad -moestações, 11: FF 160.11 Cf. FF 2 3 4 - 2 3 7.12 7, 13-14: FF 26.13 9, 2: FF 30.14 2, 29: FF 221.15 Cf. 1 Cel 26: FF 363.16 Cf. Te s t a m e n t o : FF 110-131.17 Lenda dos três companheiros, 59: FF

1470.18 Carta. enc. Laudato si’, 12.19 Ibid., 1.20 Cf. ibid., 15-16.

Uma oração para «lançar sementes de paz na terrado Sudão do Sul e da República Democrática doCongo, e em qualquer terra ferida pela guerra»: comestas palavras o Papa Francisco explicou osignificado da celebração presidida na basílica de SãoPedro na tarde de quinta-feira, 23 de novembro.

Esta tarde, com a oração, queremos lançar semen-tes de paz na terra do Sudão do Sul e da Repú-blica Democrática do Congo, e em qualquer terraferida pela guerra. No Sudão do Sul já tinha de-cidido realizar uma visita, mas não foi possível.Sabemos contudo que a oração é mais importan-te, porque é mais poderosa: a oração age com aforça de Deus, ao qual nada é impossível.

Por isso agradeço de coração a quantos progra-maram esta vigília e se dedicaram à sua realiza-ção.

«Cristo Ressuscitado convida-nos. Aleluia!».Estas palavras do cântico em língua swahili acom-panharam a procissão de entrada, com algumasimagens dos dois países pelos quais rezamos demodo particular. Nós cristãos acreditamos e sabe-mos que a paz é possível porque Cristo ressusci-tou. Ele doa-nos o Espírito Santo, que invoca-mos.

Como nos recordou há pouco São Paulo, JesusCristo «é a nossa paz» (Ef 2, 14). Na cruz, Ele as-sumiu sobre si todo o mal do mundo, inclusive ospecados que geram e fomentam as guerras: a so-berba, a avareza, a cobiça do poder, a mentira...Jesus venceu tudo isto com a sua ressurreição.Apareceu «no meio dos seus amigos e disse: «Paza vós!» (Jo 20, 19.21.26). Repete-o também a nósesta tarde, aqui: «Paz a vós!».

Sem ti, Senhor, vã seria a nossa oração, e ilusó-ria a nossa esperança de paz. Mas Tu estás vivo eages para nós e connosco, Tu, nossa paz!

O Senhor Ressuscitado derrube os muros dainimizade que hoje dividem os irmãos, sobretudono Sudão do Sul e na República Democrática doCongo.

Socorre as mulheres vítimas de violência naszonas de guerra e em todas as partes do mundo.

Salva as crianças que sofrem por causa de con-flitos que não lhes dizem respeito, mas que lhesroubam a infância e por vezes até a vida. Quantahipocrisia ao silenciar ou negar os massacres demulheres e crianças! Aqui a guerra mostra o seurosto mais terrível.

O Senhor ajude todas as crianças e os pobresdo mundo a continuar a acreditar e a esperar queo Reino de Deus está próximo, está no meio de

nós, e é «justiça, paz e alegria no Espírito Santo»(Rm 14, 17). Ampare todos aqueles que, dia apósdia, se esforçam por combater o mal com o bem,com gestos e palavras de fraternidade, respeito,encontro e solidariedade.

O Senhor fortaleça nos governantes e em todosos responsáveis um espírito nobre, reto, firme ecorajoso na busca da paz, através do diálogo e danego ciação.

O Senhor conceda a todos nós que sejamos ar-tífices de paz onde nos encontrarmos, em família,na escola, no trabalho, nas comunidades, emqualquer ambiente; “lavando os pés” uns aos ou-tros, à imagem do nosso Mestre e Senhor. A Ele aglória e o louvor, hoje e nos séculos. Amém.

Um contributo concreto para o socorro àspopulações da República Democrática do Congo— em particular para os habitantes da região doGrande Kasai, atingidos há diversos meses peloconflito que causou mais de três mil equatrocentas vítimas, além de enormes danosmateriais — foi oferecido pelo Papa Franciscoatravés do Dicastério para o serviço dodesenvolvimento humano integral. O anúncio foifeito pelo Pontífice durante a celebração presididano altar da Cátedra na qual se rezou pela paznesse país africano e no Sudão do Sul. A ajudaserá distribuída entre as dioceses congolesas maisatingidas e destinada a obras de assistência.Também outras instituições, como váriasConferências episcopais e organismos de caridade,entre os quais a Caritas Internationalis, já se

dedicaram há tempos a responder às necessidadesmais urgentes. Sinais de esperança e desolidariedade fraterna que querem testemunhar apresença de Deus e de Maria onde há dor,necessidade de ajuda, miséria, desespero e onde ohomem sofre. Assim, sob o olhar da imagem deNossa Senhora de Valme, o Papa presidiu àoração, na qual participaram muitos sacerdotes,religiosos, religiosas, homens e mulheres engajadosa favor da paz naquelas terras. Não só católicos,mas também anglicanos e luteranos, e pertencentesa outras religiões, sobretudo muçulmanos ebudistas. Em particular, estavam presentes osafricanos residentes em Roma, que quiseramoferecer o seu testemunho de solidariedade paracom as populações sofredoras dos dois países.

página 14 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 30 de novembro de 2017, número 48

Mensagem vídeo pontifícia para o festival da doutrina social da Igreja

Trabalho para os jovens

A primeira faculdade de direito canônico do Brasil

Em benefício do povo de Deus

Estimados irmãos e irmãs!Saúdo todos vós, participantes no 7°Festival da Doutrina Social da Igre-ja, que este ano tem como título “Fi-delidade e mudança”. Esta expres-são, que intencionalmente suscitauma certa “s u r p re s a ” lógica, leva-nosa considerar que, na realidade, serfiel exige a capacidade de mudar.

Pensemos na experiência deAbraão, que a Bíblia nos mostra co-mo modelo de fé. Quando já eraidoso, Deus disse-lhe: «Deixa a tuaterra, a tua família e a casa de teupai, e vai para a terra que Eu temostrar. Farei de ti uma grande na-ção; abençoar-te-ei e exaltarei o teunome, e tu serás uma fonte de bên-çãos» (Gn 12, 1-2). Para ser fiel,Abraão teve que mudar, partir. A Pa-

lavra de Deus ajuda-nos a distinguiras duas “faces” da mudança: a pri-meira é a confiança, a esperança, aabertura à novidade; a segunda é adificuldade de deixar as certezas, pa-ra ir ao encontro do desconhecido.Com efeito, faz-nos sentir mais tran-quilos, permanecer no nosso am-biente, conservar, repetir palavras egestos de sempre — isto faz-nos sen-tir mais seguros — em vez de sair,partir, empreender novos processos.

Então, perguntemo-nos o queacontece se mantivermos a nossa fi-delidade a Deus e ao homem. Nahistória de Abraão vimos o efeito dachamada do Senhor: mudou radical-mente a sua vida, levou-o a entrarnuma nova história, abriu-lhe hori-zontes inesperados, com novos céus

e novas terras. Quando se respondea Deus, ativa-se sempre um proces-so: acontece algo inédito que nosconduz para onde nunca teríamosimaginado. Isto é importante: ativa-se sempre um processo, vai-se emfrente, não se ocupam espaços, masativam-se processos.

Fidelidade ao homem significasair de si para encontrar a pessoaconcreta, o seu rosto, a sua necessi-dade de ternura e de misericórdia,para a fazer sair do anonimato, dasperiferias da existência. Fidelidadeao homem significa abrir os olhos eo coração aos pobres, aos enfermos,aos desempregados, aos numerososferidos pela indiferença e por umaeconomia que descarta e mata, abrir-se aos refugiados em fuga da violên-cia e da guerra. Fidelidade ao ho-mem significa vencer a força centrí-peta dos próprios interesses, interes-ses egoístas, e criar espaço para apaixão pelo próximo, rejeitar a ten-tação do desespero e manter viva achama da esperança.

Deste modo a fidelidade a Deus ea fidelidade ao homem convergemnum movimento dinâmico que ad-quire a forma da mudança de nósmesmos e da transformação da reali-dade, superando imobilismos e con-veniências, criando espaços e traba-

lho para os jovens e para o seu futu-ro. Pois a mudança é saudável nãosó quando as coisas correm mal, masinclusive quando tudo funciona beme somos tentados a acomodar-nosnos resultados alcançados. Ampliaro nosso serviço, levar os outros aparticipar nos nossos projetos, dila-tar os espaços da criatividade signifi-ca enfrentar o desafio da mudançaprecisamente para permanecermosfiéis a Deus e ao homem. Pareceuma contradição, mas a fidelidade éeste caminho que ativa processos enão nos permite deter-nos nos espa-ços que nos impedem qualquer cria-tividade, espaços que no fim seorientam no sentido do sempre se fezassim.

Ao transmitir-vos esta breve men-sagem, dirijo uma saudação fraternala Sua Excelência D. Zenti, Bispo deVerona, cidade que hospeda o Festi-val da Doutrina Social da Igreja, aoPadre Vincenzi e a todos os colabo-radores, relatores e voluntários. Façovotos a fim de que esta iniciativacontribua para animar e apoiar amissão evangelizadora da Igreja nomundo do trabalho, da economia eda política.

Abençoo-vos e peço-vos, por fa-vor, que oreis por mim. Obrigado!

Publicamos em seguida o texto da mensagem vídeo que o Pontífice transmitiu natarde de 23 de novembro, por ocasião da inauguração em Verona da sétimaedição do Festival da doutrina social da Igreja, encerrado no dia 26 esubordinado ao tema: «Fidelidade e mudança». Nessa circunstância também opresidente da República italiana Sergio Mattarella enviou uma mensagem aocoordenador dos trabalhos, monsenhor Adriano Vincenzi, frisando que «os temasabordados nos quatro dias de debate representam uma agenda relevante para ofuturo»: os territórios, as emergências sociais e o valor do associacionismo para acoesão. Eis o apreço do chefe de Estado italiano por «uma iniciativa que encora j eos jovens a participar na mudança do nosso país em nome do bem comum,desenvolvendo modelos ancorados em virtudes cívicas, consolidando redes desolidariedade e comunidade, promovendo a equidade».

Para atender à demanda de recursoshumanos especializados, a Faculda-de de Direito Canônico São PauloApóstolo, localizada na cidade deSão Paulo, forma anualmente inú-meros mestres em Direito Canônico.Com efeito, para São Paulo afluemclérigos e leigos de todo país, embusca de sólida formação jurídica.Os alunos, depois de graduados, sa-

ga o título de “doutor em DireitoCanônico” e, por enquanto, é a úni-ca instituição educacional eclesiásticabrasileira que possui autorização deRoma para conferir o referido diplo-ma. De fato, explica o cônego dr.Martin Segú Girona, decano e dire-tor da faculdade, que a escola pau-listana foi erigida por decreto daCongregação para a Educação Cató-lica: “No Brasil existem alguns insti-tutos de Direito Canônico, agrega-dos ou afiliados a universidades eu-ropeias, mas que formam apenasmestres. Até a fundação da nossa fa-culdade em São Paulo, por decretoda Congregação para a EducaçãoCatólica, o doutorado só era possí-vel para quem fosse estudar fora dopaís”. Comenta, ainda, Segú: “Sab e-mos que a estada no exterior é cus-tosa e difícil para os padres, imagi-ne, então, para os leigos”. E arrema-ta o decano: “Além disso, a Igrejano Brasil desfruta de todas as condi-ções para ofertar excelentes cursoseclesiásticos e esperamos que os vizi-nhos dos países latino-americanostambém frequentem nossa faculda-de; serão muito bem-vindos!”.

Na opinião do doutor EdsonSampel, professor de Direito Consti-tucional Canônico, é importante quehaja cada vez mais leigos advogados,fazendo o mestrado em Direito Ca-nônico. “O advogado, com sua for-mação jurídica, combinada com oimprescindível adestramento teológi-co, torna-se ótimo canonista, tantoquanto o padre”, afirma o docente.“E isto redunda em benefício do po-vo de Deus”, enfatiza Sampel.

O secretário da faculdade, padreJean Rafael Barros, explica que aFaculdade foi inaugurada em abrilde 2014, com a presença de váriasautoridades civis e eclesiásticas, in-clusive do núncio apostólico. O ar-cebispo de São Paulo é o grão-chan-celer nato da faculdade. No que dizrespeito aos estudantes cursando omestrado, sublinha que há sempremais clérigos; em particular, eviden-cia: “neste semestre, temos uns 90%de padres. Entretanto, há leigos eleigas e a presença desses fiéis ésempre importantíssima, porque aju-da a complementar a formação cien-tífica com a experiência profissionalsecular”.

Relativamente à importância de seobter o diploma de doutorado emDireito Canônico, o secretário da fa-culdade esclarece que vários cargoseclesiásticos exigem o doutorado,como, por exemplo, juiz canônico,

defensor do vínculo e até mesmo ad-vogado. No entanto, padre Barrossublinha que, dada a escassez depessoal habilitado, a autoridade ecle-siástica tem admitido o mestrado ou,até mesmo, certa experiência, porémo ideal é que se cumpra o dispostona lei canônica. Além disso, o dou-torado abre as portas para o ensinode Direito Canônico, ou seja, a fa-culdade também forma futuros pro-fessores universitários.

Concluindo, o secretário remarcaque a faculdade oferece outros cur-sos, como por exemplo aqueles dire-cionados aos párocos, pequenos cur-sos ministrados para advogados quequeiram atuar nos tribunais eclesiás-ticos nas causas de nulidade do sa-cramento do matrimônio. Ademais,assinala, «nossa Semana de DireitoCanônico é sempre concorrida e es-tamos pensando em outros cursosbreves que sejam úteis às dioceses,paróquias, institutos e assim pordiante».

tisfeitos os requisitos do código ca-nônico, atuarão em tribunais ecle-siásticos, no poder executivo das cú-rias, nas assessorias dos institutos re-ligiosos, na administração de univer-sidades católicas, enfim, onde querque a presença do canonista seja re-levante.

A Faculdade de Direito CanônicoSão Paulo Apóstolo também outor-

Cônego Martin Segú Girona,Reitor da faculdade

número 48, quinta-feira 30 de novembro de 2017 L’OSSERVATORE ROMANO página 15

O Papa à polícia rodoviária e ferroviária

Profissionalismo e humanidadeao serviço da segurança

Profissionalismo e humanidade devemdistinguir o trabalho das forças daordem em prol da tutela da segurança,recordou o Papa Francisco no discursoaos dirigentes e funcionários da direçãogeral da Polícia rodoviária eferroviária italiana, durante aaudiência que teve lugar na manhã de20 de novembro na sala Clementina. Aseguir, as palavras do Sumo Pontíficenessa ocasião.

Prezados irmãos e irmãs!Estou feliz por vos receber hoje epor dialogar convosco, Dirigentes eAgentes da Polícia Rodoviária e daPolícia Ferroviária. Agradeço aoChefe da Polícia as suas amáveis pa-lavras de introdução.

Cada cidadão deve sentir-se gratopelo trabalho que desempenhais emnome do Estado e da coletividade,que visa garantir, através de umamultiplicidade de funções, a segu-rança daqueles que viajam pelas es-tradas e pelos caminhos de ferro. Onosso mundo vê multiplicar-se osdeslocamentos, de forma que umamobilidade eficiente e segura se tor-nou exigência primária e imprescin-dível para uma sociedade que queracompanhar o desenvolvimento egarantir o bem-estar dos seus mem-b ro s .

Ao longo das estradas, o trabalhode controle das violações, de regula-rização do trânsito, de prevenção,socorro e averiguação dos acidentes,deve ter em consideração uma reali-dade — rodoviária — cada vez maiscomplexa e tumultuosa. Além dascarências do sistema rodoviário, quenecessita de enormes investimentosnos campos da modernização e dasegurança, é preciso ter em conside-ração o escasso sentido de responsa-bilidade por parte de numerososmotoristas, que muitas vezes pare-cem não dar-se conta das conse-

quências até graves da sua desaten-ção (por exemplo, com o uso impró-prio dos telemóveis) ou da sua im-p ru d ê n c i a .

Isto é causado por uma pressa epor uma competitividade assumidascomo estilo de vida, que tornam ou-tros motoristas obstáculos ou adver-sários a superar, transformando asestradas em pistas de “fórmula 1” e alinha do semáforo na partida de umgrande prémio. Num contexto seme-lhante, as multas não são suficientespara aumentar a segurança, mas énecessária uma ação educativa, quesuscite maior consciência sobre asresponsabilidades que temos em re-lação a quantos viajam ao nosso la-do.

Esta ação de sensibilização e in-cremento do sentido cívico, tanto nosetor rodoviário como no ferroviário,deveria obter todos os frutos possí-veis da experiência que vós, homense mulheres da Polícia, acumulais to-dos os dias nas estradas e nos cami-nhos de ferro, no vosso contato ime-diato com as pessoas e com as pro-blemáticas. Além disso, o fio diretoentre os agentes de bordo e as sedescentrais permite realizar em todo oterritório um trabalho de supervisãoconstante, no qual é essencial a vos-sa tarefa de Dirigentes, que garan-tem a coordenação, a comunicaçãodos resultados e a interação.

Inclusive o setor ferroviário repre-senta um âmbito fundamental na vi-da do país, também ele necessitadode manutenção e investimentos es-truturais, cuja insuficiência causa to-dos os dias dificuldades a milhõesde trabalhadores pendulares e via-jantes, e muitas vezes, infelizmente,como a crónica recente nos mostrou,provoca acidentes até mortais. Aqui-lo que encontrais todos os dias noscaminhos de ferro é como um micro-cosmo, pelo qual passam as realida-

tante com as pessoas faz com que aparticularidade do vosso profissiona-lismo seja dada não somente pelaelevada competência que é exigidade vós, mas também por uma pro-funda retidão — que leve a nunca seaproveitar do poder do qual dispon-des — e por um alto nível de huma-nidade.

Tanto nas ações de controle comonas de repressão, é importante con-fiar num uso da força que nunca de-genere em violência. Para esta finali-dade, são necessários sabedoria e au-tocontrole, sobretudo quando oagente policial é visto com descon-fiança ou sentido quase como inimi-go, e não como guardião do bemcomum. Infelizmente, este último éum mal difundido, que em certasáreas alcança o ápice de uma contra-posição entre o tecido social e o Es-tado, juntamente com quantos o re-p re s e n t a m .

Também a vós, como fiz com todaa Igreja e a sociedade durante o anojubilar de 2015, sugiro um estilo demisericórdia no cumprimento dasvossas funções. Misericórdia não ésinónimo de debilidade, e tambémnão exige a renúncia ao uso da for-ça; ao contrário, significa ser capazde não identificar o culpado com o

crime que ele cometeu, acabandopor lhe causar um dano e por gerarum sentido de desforra; significatambém envidar o esforço de com-preender as exigências e as razõesdas pessoas que encontrais no vossotrabalho. Isto requer que useis mise-ricórdia inclusive nas inúmeras situa-ções de fragilidade e de dor que en-frentais quotidianamente, não ape-nas no caso de acidentes de váriasnaturezas, mas também no encontrocom pessoas necessitadas ou desfa-v o re c i d a s .

Para concluir, invoco o vosso san-to Padroeiro, São Miguel Arcanjo,descrito no livro bíblico do Apoca-lipse enquanto luta contra Satanás,em defesa da mulher que deu à luzo Salvador (cf. 12, 1-6). Esta imagembíblica leva-nos a refletir sobre a lutasempre em curso entre o bem e omal, à qual nunca podemos renun-ciar. Na perspetiva bíblica, este em-bate tem como primeiros protagonis-tas Deus e Satanás, um que repre-senta a plenitude do bem e daquiloque é favorável ao homem; e o outroque encarna o mal e aquilo que seopõe ao bom êxito da existência hu-mana.

Inclusive prescindindo de umaótica de fé, é importante reconhecera realidade desta luta entre o bem eo mal, que se trava no nosso mundoe até dentro de nós mesmos. Cons-cientes deste desafio decisivo, seriauma loucura permitir o mal ou atésó pretender manter-se neutro. Pelocontrário, a cada um é pedido queassuma a própria parte de responsa-bilidade, colocando em ação todasas energias das quais dispõe paracontrastar o egoísmo, a injustiça e ai n d i f e re n ç a .

Todos nós devemos agir assim,mas vós estais em primeira linha naluta contra aquilo que ofende o ho-mem, cria desordem e fomenta a ile-galidade, impedindo a felicidade e ocrescimento das pessoas, sobretudodos mais jovens. O vosso serviço,com frequência não adequadamentevalorizado, insere-vos no âmago dasociedade e, devido ao seu alto va-lor, não hesito em defini-lo uma mis-são, que há de ser cumprida comhonra e profundo sentido do dever,em vantagem do homem e do bemcomum.

Invoco de Deus a sua bênção eproteção paterna sobre vós e vossasfamílias, e peço-vos por favor queoreis por mim.

Inaugurada a nova nunciatura apostólica na Malásia

Diálogo e compreensão para construir a pazNos dias 23 e 24 de novembro o ar-cebispo substituto da Secretaria deEstado visitou Kuala Lumpur, naMalásia, para a inauguração da no-va sede da nunciatura apostólica.Na cerimónia oficial de quinta-feira23, estavam presentes Dato’ Sri Re-ezal Merican, vice-ministro para osNegócios Estrangeiros em represen-tação do primeiro-ministro, os bis-pos malaios e o bispo vigário apos-tólico de Brunei, o corpo diplomá-tico, vários sacerdotes, religiosos,religiosas e um grande número deamigos da nunciatura.

O substituto transmitiu a sauda-ção do Pontífice ao sultão Muham-mad V e agradeceu ao núncio Jose-ph Marino e aos seus colaboradoresque, além do engajamento quotidia-no no cumprimento da sua missão,assumiram a responsabilidade daconstrução da nova sede, ponto dereferência e de orgulho da comuni-

dade católica malaia. Por sua vez, ovice-ministro evidenciou os bons re-lacionamentos existentes entre aMalásia e a Santa Sé, recordando

que as relações diplomáticas foramestabelecidas em 2011, e desde mar-ço de 2016 há um embaixador noVa t i c a n o .

des mais diferenciadas ecom o qual viajais, paraoferecer segurança, pre-venção e repressão doscrimes.

No âmbito ferroviário,assim como nas estradas,a ação da Polícia exigeum elevado profissiona-lismo e especialização, eportanto uma atualiza-ção contínua no conhe-cimento das leis e nautilização dos instru-mentos e da tecnologia.Depois, o contato cons-

página 16 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 30 de novembro de 2017, número 48

Emprego e meio ambiente no centrodo desenvolvimento sustentável

O Papa pediu aos sindicatos que superem as tentações do individualismo coletivista

«Os sindicatos e os movimentos de trabalhadores devem ser por vocação peritosem solidariedade. Mas a fim de contribuir para o desenvolvimento solidário, peço-vos que eviteis» as tentações do individualismo coletivista e da corrupção,recomendou o Papa Francisco na seguinte mensagem que enviou ao Cardeal PeterKodwo Appiah Turkson, no encerramento da conferência sobre o trabalho, que tevelugar no Vaticano a 23 e 24 de novembro por iniciativa do Dicastério para oserviço do desenvolvimento humano integral.

de encontro».10 Todos os dias, mi-lhões de pessoas cooperam para odesenvolvimento mediante as suasatividades manuais ou intelectuais,nas grandes cidades ou nas áreas ru-rais, desempenhando cargos comple-xos ou simples. Todas elas consti-tuem a expressão de um amor con-creto pela promoção do bem co-mum, de um amor civil.11

O trabalho não pode ser conside-rado uma mercadoria, nem sequerum mero instrumento na cadeia pro-dutiva de bens e serviços,12 mas, da-do que é essencial para o desenvolvi-mento, tem a prioridade em relaçãoa qualquer outro fator de produção,inclusive o capital.13 Daqui deriva o

Quando o modelo de desenvolvi-mento económico se baseia unica-mente no aspeto material da pessoa,ou quando beneficia apenas alguns,ou quando danifica o meio ambien-te, provoca um grito, tanto dos po-bres como da terra, que «reclama denós outro rumo».19 Para ser sustentá-vel, este rumo deve colocar no cen-tro do desenvolvimento a pessoa e otrabalho, mas integrando a proble-mática do trabalho com a do meioambiente. Tudo está interligado, edevemos responder de maneira inte-gral.20

Uma contribuição válida para talresposta integral por parte dos tra-balhadores é mostrar ao mundoaquilo que conheceis bem: o vínculoentre os três “T”: terra, teto e traba-lho.21 Não queremos um sistema dedesenvolvimento económico que au-mente o número de desempregados,nem de pessoas desabrigadas ou semterra. Os frutos da terra e do traba-lho são para todos,22 e «devem serdistribuídos equitativamente a to-

entre trabalho e meio ambiente obri-ga-nos a redefinir os tipos de ocupa-ção que queremos promover no fu-turo e aqueles que devem ser substi-tuídos ou recolocados, como podemser, por exemplo, as atividades daindústria de combustíveis fósseis po-luentes. A fim de proteger a nossamãe terra, é iniludível uma passagemda indústria energética atual parauma mais renovável. Mas é injustoque esta transição seja paga com otrabalho e com a casa dos mais ne-cessitados. Isto é, o preço da extra-ção da energia da terra, bem comumuniversal, não pode recair sobre ostrabalhadores e as suas famílias. Aeste propósito, os sindicatos e osmovimentos que conhecem a ligaçãoentre trabalho, casa e terra têm umagrande contribuição a dar, e devemo f e re c ê - l a .

Outro contributo importante dostrabalhadores para o desenvolvimen-to sustentável consiste em evidenciaruma tríplice conexão, um segundojogo de três “T”: desta vez, entretrabalho, tempo e tecnologia. No res-peitante ao tempo, sabemos que a«contínua aceleração das mudanças»e «a intensificação dos ritmos de vi-da e de trabalho», que alguns deno-minam «ra p i d a c i ó n », não favorecemo desenvolvimento sustentável, nemsequer a sua qualidade.26 Sab emostambém que a tecnologia, da qualrecebemos muitos benefícios e tantasoportunidades, pode impedir o de-senvolvimento sustentável, quando éassociada a um paradigma de poder,domínio e manipulação.27

No contexto atual, conhecido co-mo a quarta revolução industrial, ca-raterizado por esta “rapidação” e pe-la sofisticada tecnologia digital, pelarobótica e pela inteligência artifi-cial,28 o mundo tem necessidade devozes como a vossa. São os trabalha-dores que, na sua luta pela justa jor-nada de trabalho, aprenderam a en-frentar uma mentalidade utilitarista,de breve alcance e manipuladora.Para esta mentalidade, não importase existe degradação social e am-biental; não importa o que se usa eo que se descarta; não importa se hátrabalho forçado de crianças ou se orio de uma cidade é poluído. A úni-ca coisa que importa é o lucro ime-diato. Tudo se justifica em funçãodo deus dinheiro.29 Dado que mui-tos de vós contribuístes no passadopara combater esta patologia, hojeocupais uma boa posição para a po-der corrigir no futuro. Peço-vos queenfrenteis esta difícil temática e quenos mostreis, segundo a vossa mis-são profética e criativa,30 que é pos-sível uma cultura do encontro e docuidado. Hoje já não está em jogoapenas a dignidade de quem temuma ocupação, mas a dignidade dotrabalho de todos, e da casa de to-dos, a nossa mãe terra.

Por isso, e como afirmei na Encí-clica Laudato si’, temos a necessida-de de um diálogo sincero e profun-do para voltar a definir a ideia detrabalho e o rumo do desenvolvi-mento.31 Mas não podemos ser ingé-nuos e pensar que o diálogo aconte-

Venerado IrmãoSenhor Cardeal

Peter K. A. TurksonPrefeito do Dicastério

para o Serviço do DesenvolvimentoHumano Integral

Nestes dias, convocados pelo Dicas-tério para o Serviço do Desenvolvi-mento Humano Integral, os repre-sentantes de várias organizações sin-dicais e movimentos de trabalhado-res reuniram-se em Roma para refle-tir e se confrontar sobre o tema «DaPopulorum progressio à Laudato si’. Otrabalho e o movimento dos traba-lhadores no centro do desenvolvi-mento humano integral, sustentávele solidário». Agradeço a Vossa Emi-nência e aos colaboradores, e dirijo aminha cordial saudação a todos.

Na sua Encíclica Populorum pro-g re s s i o , o Beato Paulo VI afirma que«o desenvolvimento não se reduz aum simples crescimento económico.Para ser autêntico, deve ser inte-gral», ou seja, promover integral-mente cada indivíduo e também to-das as pessoas e todos os povos.1 Edado que «a pessoa floresce no tra-balho»,2 a doutrina social da Igrejapôs em evidência, em diversas oca-siões, que esta não é uma questãoentre muitas outras, mas sobretudo a«chave essencial» de toda a questãoso cial.3 Com efeito, o trabalho «con-diciona o desenvolvimento não sóeconómico, mas também cultural emoral das pessoas, da família, da so-ciedade».4

Como base do florescimento hu-mano, o trabalho constitui uma cha-ve para o desenvolvimento espiri-tual. Segundo a tradição cristã, ele émais do que um simples agir; é, so-bretudo, uma missão. Colaboramoscom a obra criadora de Deus quan-do, através do nosso trabalho, culti-vamos e conservamos a criação (cf.Gn 2, 15);5 no Espírito de Jesus, par-ticipamos na sua missão redentoraquando, mediante a nossa atividade,damos sustento às nossas famílias erespondemos às necessidades donosso próximo. Jesus, que «passou amaior parte dos anos da vida sobre aterra, junto de um banco de carpin-teiro, dedicando-se ao trabalho ma-nual,»6 e consagrou o seu ministériopúblico para libertar as pessoas dedoenças, de sofrimentos e da própriamorte,7 convida-nos a seguir os seuspassos através do t ra b a l h o . Destemodo, «cada trabalhador é a mão deCristo que continua a criar e a prati-car o bem».8

Além de ser essencial para o flo-rescimento da pessoa, o trabalho étambém uma chave do desenvolvi-mento social. «Trabalhar com os ou-tros é trabalhar para os outros»,9 e ofruto deste agir oferece uma «oca-sião de intercâmbios, de relações e

imperativo ético de «defender ospostos de trabalho»,14 de criar outrosnovos em proporção ao aumento darentabilidade económica,15 e é neces-sário também garantir a dignidadedo trabalho.16

No entanto, como observava Pau-lo VI, não se deve exagerar a “místi-ca” do trabalho. A pessoa «não éapenas trabalho»; existem outras ne-cessidades humanas que devemoscultivar e ter em consideração, comoa família, os amigos e o descanso.17

Por conseguinte, é importante recor-dar que qualquer trabalho deve estarao serviço da pessoa, e não a pessoaao serviço do trabalho,18 e isto com-porta que devemos pôr em questãoas estruturas que prejudicam ou ex-ploram as pessoas, as famílias, as so-ciedades e a nossa mãe terra.

dos».23 Este tema adquire relevânciaespecial em relação à propriedade daterra, quer nas áreas rurais quer nasurbanas, e às normas jurídicas quegarantem o acesso à mesma.24 E aeste respeito, o critério de justiça porexcelência é o destino universal dosbens, cujo «direito universal ao seuuso» constitui o «primeiro princípiode toda a ordem ético-social».25

É pertinente recordar isto hoje,quando nos preparamos para cele-brar o 70° aniversário da DeclaraçãoUniversal dos Direitos do Homem, etambém num momento em que osdireitos económicos, sociais e cultu-rais devem ser tidos em maior consi-deração. Mas a promoção e a defesade tais direitos não se pode realizarem detrimento da terra e das gera-ções vindouras. A interdependência

Emilio Vedova, «Interior de fábrica» (1946-1950)

número 48, quinta-feira 30 de novembro de 2017 L’OSSERVATORE ROMANO página 17

cerá naturalmente e sem conflitos.São necessárias pessoas que traba-lhem sem parar para dar vida a pro-cessos de diálogo a todos os níveis:no plano da empresa, do sindicato,do movimento; a nível de bairro ede cidade, regional, nacional e glo-bal. Neste diálogo sobre o desenvol-vimento, todas as vozes e visões sãonecessárias, mas especialmente as vo-zes menos ouvidas, as das periferias.Conheço o esforço de muitas pes-soas para fazer sobressair estas vozesnas sedes onde se tomam decisõessobre o trabalho. Peço-vos que assu-mais este nobre compromisso.

A experiência ensina que, paraque um diálogo seja frutuoso, é pre-ciso começar a partir daquilo que te-mos em comum. Para dialogar sobreo desenvolvimento é conveniente re-cordar o que nos irmana como sereshumanos: a nossa origem, a pertençae o destino.32 Sobre esta base, pode-remos renovar a solidariedade uni-versal de todos os povos,33 incluindoa solidariedade com os povos do fu-turo. Além disso, poderemos encon-trar o modo de sair de uma econo-mia de mercado e financeira que nãoconfere ao trabalh0 o valor que me-rece, e orientá-la para outra, na quala atividade humana é o centro.34

Os sindicatos e os movimentos detrabalhadores devem ser por vocaçãoperitos em solidariedade. Mas a fimde contribuir para o desenvolvimen-to solidário, peço-vos que eviteis trêstentações. A primeira, do individua-lismo coletivista, ou seja, protegerunicamente os interesses daquelesque representais, ignorando os ou-tros pobres, marginalizados e excluí-dos do sistema. É necessário investirnuma solidariedade que vá maisalém das muralhas das vossas asso-ciações, que tutele os direitos dostrabalhadores, mas sobretudo daque-les cujos direitos nem sequer são re-conhecidos. Sindicato é uma palavrabonita, que deriva do grego dikein(fazer justiça) e syn (juntos).35 Porfavor, fazer justiça juntos, mas emsolidariedade com todos os margina-lizados.

O meu segundo pedido é que evi-teis o câncer social da corrupção.36

Assim como, em certas ocasiões, «apolítica é responsável pelo própriodescrédito por causa da corrup-ção»,37 também acontece o mesmocom os sindicatos. É terrível a cor-rupção daqueles que se dizem “sin-dicalistas”, que se põem de acordocom os empresários e não se interes-sam pelos trabalhadores, deixandomilhares de colegas sem trabalho; es-

te é um flagelo que mina as relações,destruindo muitas vidas e tantas fa-mílias. Não deixeis que os interessesilícitos arruínem a vossa missão, tãonecessária na época em que vivemos.O mundo e a criação inteira aspiramcom esperança a ser libertados dacorrupção (cf. Rm 8, 18-22). Sedepromotores de solidariedade e de es-perança para todos. Não vos deixeiscorromp er!

O terceiro pedido é que não vosesqueçais do vosso papel de educaras consciências para a solidariedade,o respeito e o cuidado. A consciên-cia da crise do trabalho e da ecolo-gia deve traduzir-se em novos estilosde vida e políticas públicas. Para darvida a estes estilos de vida e leis, te-mos necessidade que as instituiçõescomo as vossas cultivem virtudes so-ciais que favoreçam o florescimentode uma nova solidariedade global,que nos permita evitar o individua-lismo e o consumismo, e que nosmotivem a pôr em questão os mitosde um progresso material indefinidoe de um mercado desprovido de re-gras justas.38

Espero que este Congresso produ-za uma sinergia capaz de propor li-nhas de ação concretas a partir doponto de vista dos trabalhadores, ca-minhos que nos levem a um desen-volvimento humano integral, susten-tável e solidário.

Agradeço-lhe novamente, SenhorCardeal, assim como àqueles queparticiparam e ofereceram a própriacontribuição, e a todos envio a mi-nha Bênção.

Vaticano, 23 de novembre de 2017

1 N. 14.2 Discurso à Confederação Italianados Sindicatos dos Trabalhadores(Cisl), 28 de junho de 2017.3 João Paulo II, Carta Enc. L a b o re me x e rc e n s (1981), 3.4 Pontifício Conselho «Justiça ePaz», Compêndio da Doutrina Socialda Igreja (2005), n. 269.5 Cf. Concílio Ecum. Vaticano II,Constituição Past. Gaudium et spes,34; João Paulo II, Carta Enc. Labo-rem exercens (1981), 25.6 Carta Enc. Laborem exercens, 6.7 Cf. Compêndio da Doutrina Socialda Igreja, n. 261.

8 Ambrósio, De obitu Valentinianiconsolatio, 62, cit. in Compêndio daDoutrina Social da Igreja, n. 265.9 João Paulo II, Carta Enc. Centesi-mus annus (1991), 31.10 Compêndio da Doutrina Social daI g re j a , n. 273; cf. Carta Enc. Laudatosi’, 125.11 Cf. Discurso à Confederação Ita-liana dos Sindicatos dos Trabalhado-res (Cisl); Carta Enc. Laudato si’,231.12 Cf. João Paulo II, Carta Enc. La-borem exercens, 7.13 Cf. Compêndio da Doutrina Socialda Igreja, n. 276.14 Exortação Apost. Evangelii gau-dium, 203.15 Cf. ibid., 204.16 Cf. ibid., 205.17 Cf. Discurso à Confederação Ita-liana dos Sindicatos dos Trabalhado-res (Cisl).18 Cf. Compêndio da Doutrina Socialda Igreja, n. 272.19 Carta Enc. Laudato si’, 53.20 Cf. ibid., 16, 91, 117, 138 e 240.21 Cf. Discurso aos participantes noencontro mundial dos movimentospopulares, 5 de novembro de 2016.22 Cf. Carta Enc. Laudato si’, 93.

23 Concílio Ecum. Vaticano II, Cons-tituição Past. Gaudium et spes, 69.24 Cf. Compêndio da Doutrina Socialda Igreja, n. 283.25 Carta Enc. Laudato si’, 93.26 Ibid., 18.27 Cf. ibid., 102-206.28 Cf. J. Manyika, Technology, jobs,and the future of work. McKinseyGlobal Institute. Nota informativapreparada pelo Fórum Mundial“Fo r t u n e ” — Time, dezembro de2016 (atualizada em fevereiro de2017).29 Trata-se de um perigoso «relativis-mo prático»: cf. Carta Enc. Laudatosi’, 122.30 Cf. Discurso à Confederação Ita-liana dos Sindicatos dos Trabalhado-res (Cisl).31 Cf. nn. 3 e 14.32 Cf. Carta Enc. Laudato si’, 202.33 Cf. ibid., 14, 58, 159, 172 e 227.34 Cf. Discurso à Confederação Ita-liana dos Sindicatos dos Trabalhado-res (Cisl).35 Cf. ibid.36 Cf. Exortação Apost. Evangeliigaudium, 60.37 Carta Enc. Laudato si’, 197.38 Ibid., 209-215.

O embaixador de Montenegroapresentou as credenciais

A 23 de novembro o Paparecebeu Sua Excelênciao Senhor MiodragVlahović, Embaixadorde Montenegro, paraa apresentação das cartascom as quais é acreditadojunto da Santa Sé

Sua Ex.cia o senhor Miodrag Vlahović, novo embaixador de Montenegrojunto da Santa Sé, nasceu em Dakovica (Kosovo), a 15 novembro de 1961.É casado e tem três filhas. Formou-se em direito na faculdade de juris-prudência de Montenegro Veljko Vlhović em Titograd (Podgorica, 1981),especializando-se depois em contratos de comércio internacional em Lei-den na Holanda (1991).

Desempenhou os seguintes cargos: fundador de Studeks (projeto cultu-ral para Estudantes) em Podgorica, Titograd (1985); secretário internacio-nal e membro da presidência federal, União juvenil socialista da Jugoslá-via (SSOJ), Belgrado (1986-1988); titular da MConsult Ldt, uma das pri-meiras sociedades particulares de consultas em Montenegro (desde 1990),fundador do comité dos cidadãos para a Paz, Movimento paz montene-grino (1991-1992) e organizador da primeira manifestação pela paz emMontenegro, a 17 de julho de 1991; editorialista do semanário «Monitor»(1991-1993); secretário internacional da Aliança liberal de Montenegro —LSCG (1992-1993); membro do parlamento da República de Montenegro(1992-1994); membro fundador do Centro para a democracia e os direitoshumanos — CEDEM (1998); presidente do Movimento Montenegro inde-pendente (1999); editorialista do semanário «Monitor» (1999-2000); dire-tor do Centro para os estudos regionais — CERS (1999-2004); membro doConselho da Open Society Institute Montenegro (2002-2004); ministrodos Negócios Estrangeiros (julho de 2004 — novembro de 2006); embai-xador nos Estados Unidos da América, no Canadá e na Islândia com re-sidência em Washington Dc (2006-2010); embaixador no Ministério dosnegócios estrangeiros (2010-2014); editorialista do jornal «Probjeda» (des-de 2014); presidente da União democrática de Montenegro — CDU (2014-2016); embaixador no ministério dos Negócios estranegiros (desde 2016).

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Missa matutina em Santa MartaTe r ç a - f e i r a21 de novembro

Não às colonizaçõesideológicas

O cristão deve dar o seu testemunhodiante das «colonizações ideológicase culturais» que soam como verda-deiras «blasfémias» e suscitam «per-seguições» furiosas. Introduzindomás «novidades», chegando até aconsiderar normal «matar as crian-ças» ou perpetrar «genocídios» para«anular as diferenças», procurandofazer «tábula rasa» de Deus com aideia de ser «modernos» e ao passocom os tempos. Como exemplo con-creto para responder às «coloniza-ções culturais e espirituais que nossão propostas» o Papa apresentou otestemunho de Eleazar, sugerido pe-la liturgia.

«Na primeira leitura — com efeito,observou imediatamente o Pontíficereferindo-se ao trecho tirado do se-gundo livro dos Macabeus (6, 18-31)— ouvimos o martírio de um homemque foi condenado à morte por fide-lidade a Deus, à lei, numa persegui-ção: há muitos motivos de uma per-seguição mas podemos citar os trêsprincipais».

Antes de mais há «uma persegui-ção apenas religiosa: vou contra atua fé porque a minha fé diz não ecom o poder que tenho exerço aperseguição» explicou Francisco.«Outra perseguição, outro motivopode ser religioso, cultural, históri-co, político, religioso-político, quan-do se mistura o religioso com o polí-tico», acrescentou, exortando a pen-sar «na guerra dos trinta anos, nanoite de São Bartolomeu: guerras re-ligiosas ou políticas». «Outro moti-vo de perseguição — disse o Papa —é puramente cultural: chega uma no-va cultura que quer fazer tudo novoe faz tábula rasa das tradições, dahistória, inclusive da religião de umpovo: o que acontece na leitura dehoje, o martírio de Eleazar é típicodeste estilo cultural».

«Ontem teve início a narraçãodesta perseguição cultural» explicouFrancisco referindo-se aos excertos

quer impor ao povo de Israel estehábito único, tudo se faz assim, nãohá liberdade para outras coisas».Mas «alguns aceitaram porque pare-cia algo bom: “Não, é verdade, de-vemos ser como os outros”». E essaspessoas «que chegavam às novas ins-tituições — afirmou Francisco —manda embora este, elimina as tradi-ções e o povo começa a viver de mo-do diverso».

Eis que «para defender a história,a fidelidade do povo, para defenderas tradições verdadeiras, as boas tra-dições do povo, fazem-se algumasresistências». A primeira leitura dehoje, explicou o Pontífice, narra-nosque «Eleazar não quer. Era um ho-mem digno, muito respeitado e nãoaceita aquilo». E como ele «muitosoutros, no livro dos Macabeus sãonarradas as histórias destes mártires,destes heróis».

colonizações culturais que acabampor perseguir também os crentes».

De resto, afirmou o Pontífice,«não é preciso ir muito longe paraver alguns exemplos: pensemos nosgenocídios do século passado, queeram culturais, novos: “Todos iguaisquem não tem o sangue puro, fora...Todos iguais, não há lugar para asdiferenças, não há lugar para os ou-tros nem para Deus”».

Eis a «raiz perversa», disse o Pa-pa. «Diante destas colonizações cul-turais que escondem a perversidadede uma raiz ideológica — observou —Eleazar, ele mesmo, faz-se raiz: é in-teressante, Eleazar morre pensandonos jovens». De facto, disse Francis-co, «por três vezes, no final da nar-ração de hoje, fala-se dos jovens».Eleazar afirma: «Portanto, abando-nando agora como forte esta vida,mostrar-me-ei digno da minha idadee deixarei aos jovens um exemplo

sas não são tão diferentes e são mis-turadas». E «esta é a raiz perversa: anovidade de Deus nunca faz umamistura, uma negociação: é vida, vaiem frente, é raiz boa, faz crescer,olha para o futuro».

Ao contrário, afirmou o Papa «ascolonizações ideológicas e culturaisolham só para o presente, renegam opassado e não olham para o futuro:vivem no momento, não no tempo,e por isso nada nos podem prome-ter». E «com este comportamentode tornar todos iguais e cancelar asdiferenças cometem o pecado hor-rendo de blasfémia contra Deus cria-dor». Portanto, recordou Francisco,«todas as vezes que aceitamos umacolonização cultural e ideológica pe-camos contra Deus criador porquese pretende mudar a criação que Elefez».

Contudo, advertiu o Pontífice,«contra este facto que aconteceumuitas vezes ao longo da história háum só remédio: o testemunho, isto éo martírio». Há alguns como Elea-zar que dão «o testemunho da vida,pensando no futuro, na herança quedeixarei com o meu exemplo. Namaioria o testemunho de vida: vivoassim, sim, dialogo com os que nãopensam como eu, mas o meu teste-munho é assim, segundo a lei deDeus, segundo o que Deus me con-cedeu».

Francisco sugeriu que olhemos pa-ra o exemplo de Eleazar: «Naquelemomento ele não pensou: “deixo di-nheiro a este, deixo isto” não, pen-sou nos jovens, no futuro, na heran-ça do próprio testemunho, pensouque aquele testemunho teria sido pa-ra os jovens uma promessa de fecun-didade e diante da raiz perversa elemesmo se fez raiz para dar vida aosoutros». Portanto, concluiu o Pontí-fice, «este exemplo nos ajude talveznos momentos de dúvida, diante dascolonizações culturais e espirituaisque nos são propostas».

Pão quotidiano para os pobresO cardeal Amato beatificou em Detroit o padre Casey

Pobres, doentes, marginalizados edesabrigados eram os prediletos dopadre Francis Solanus Casey, recor-dou o cardeal Angelo Amato, pre-feito da Congregação para as cau-sas dos santos, durante a beatifica-ção do frade menor capuchinho,realizada a 18 de novembro, emFord Field — Detroit, nos EstadosUnidos da América.

Trata-se, observou o purpuradona homilia, da segunda beatificaçãode um sacerdote nascido nos Esta-dos Unidos, depois do missionárioStanley Francis Rother, realizadano dia 23 de setembro passado, emOklahoma City. Enquanto o beatoStanley Rother morreu mártir na

Guatemala, assassinado por ódio àfé, o beato Casey alcançou a santi-dade na sua pátria, «subindo diapor dia os degraus que levavam aoencontro com Deus, através doamor aos irmãos necessitados».

O cardeal recordou que o religio-so «permanecia em jejum paradoar» o próprio almoço aos pobres.Além disso, «passava horas e horascom paciência a receber, ouvir eaconselhar as pessoas, cada vezmais numerosas, que se dirigiam aele». Praticamente a maior parte dotempo que transcorria na portariado convento era dedicada «à escutados outros: das nove da manhã àsnove da noite, quase sem interrup-

ção». Quando o chamavam en-quanto almoçava, atendia imediata-mente dizendo: «Comer não é tãoimportante como procurar ajudaralguém».

Só existia uma pequena “man-cha” na sua vida, observou o pur-purado: «De facto, segundo os ir-mãos de hábito, o padre Solanusnão tinha talento para a música».Por isso, após o primeiro insucessona comunidade «com simplicidadee humildade, para não perturbar opróximo, aos domingos à noite, ia àcapela com o seu violino e tocava

CO N T I N UA NA PÁGINA 19

Por conseguinte, «é precisodiscernir as novidades. Estanovidade é do Senhor, vemdo Espírito Santo, da raizde Deus ou vem de umaraiz perversa?». E assim«antes, sim, era pecado, nãose podia matar as crianças;mas hoje pode, não temproblema, é uma novidadep erversa».

«Ontem as diferençaseram claras, como Deus asfez, a criação era respeitada;hoje somos mais modernos:fazes, compreendes, as coi-

Vincent Van Gogh, «Três raízes»

«introduzir as ideias ou osdeuses, não: as instituições,isto é, este povo que nasce-ra, crescera sob a lei do Se-nhor, sob o amor do Se-nhor, através dos seus diri-gentes, faz entrar novas ins-tituições, nova cultura quefazem tábula rasa de tudo:cultura, religião, lei, tudo.Tudo é novo».

«A “mo dernidade” é umaverdadeira colonização cul-tural, uma autêntica coloni-zação ideológica», afirmouo Papa. E «deste modo

bíblicos propostos pela liturgia. «Al-guns — continuou — vendo o podere também a beleza magnífica de An-tíoco Epifânio, e a cultura que vinhadaquela parte, disseram: “Vamos efaçamos aliança com as nações queestão ao nosso redor, são modernas,elas têm uma modernidade maior,são atuais; nós continuamos com asnossas tradições, que não servem pa-ra nada».

A tal propósito o Pontífice quisrepetir precisamente as palavras daEscritura: «Pareceu bom aos seusolhos este raciocínio e alguns do po-vo tomaram a iniciativa, foram tercom o rei que lhes ofereceu a facul-dade de introduzir as instituiçõespagãs das nações». E assim, acres-centou Francisco, não pediram para

«Assim vai em frente sempre —prosseguiu — uma perseguição nasci-da de uma colonização cultural,ideológica, que destrói, torna tudoigual, não é capaz de tolerar as dife-renças». Em particular, afirmouFrancisco «há uma palavra-chave naleitura de ontem — tirada do primei-ro livro dos Macabeus — quando co-meça esta narração: “Naqueles diasbrotou uma raiz perversa”», isto é«Antíoco Epifânio». Portanto, insis-tiu o Papa, «arranca-se a raiz do po-vo de Israel, que é substituída poresta raiz, qualificada como perversaporque fará crescer no povo de Deuscertos hábitos novos, pagãos, mun-danos e crescer com o poder, com odomínio». Este é «o caminho das

nobre para que saibam enfrentar amorte com prontidão e nobreza». E«outras duas vezes fala dos jovens».Resumindo «Eleazar, o mártir, aque-le que dá a vida, por amor a Deus eà lei, faz-se raiz para o futuro: isto é,dá vida, faz crescer o povo e diantedaquela raiz perversa que nasceu eprovocou esta colonização ideológicae cultural, há esta outra raiz que dáa própria vida para fazer crescer of u t u ro » .

«É verdade, aquilo que chegou doreino de Antíoco era uma novida-de», acrescentou o Papa, convidan-do a questionarmo-nos se «as novi-dades são todas más, todas». A res-posta é «não». De resto «o Evange-lho é uma novidade, Jesus é umanovidade, é a novidade de Deus».

número 48, quinta-feira 30 de novembro de 2017 L’OSSERVATORE ROMANO página 19

INFORMAÇÕESAudiências

O Papa Francisco recebeu em audiên-cias particulares:

A 23 de novembroSua Ex.cia o Senhor Miodrag Vlaho-vić, Embaixador de Montenegro, pa-ra a apresentação das Cartas Cre-denciais.Sua Beatitude o Senhor Cardeal Bé-chara Boutros Raï, Patriarca de An-tioquia dos Maronitas (Líbano); D.Giovanni d’Aniello, Núncio Apostó-lico no Brasil; D. Giacomo GuidoOttonello, Núncio Apostólico na Es-lováquia; e D. Vitus Huonder, Bispode Chur (Suíça).

A 24 de novembroO Senhor Cardeal Fernando Filoni,Prefeito da Congregação para aEvangelização dos Povos; D. LuisFrancisco Ladaria Ferrer, Prefeito daCongregação para a Doutrina da Fé;e D. Francesco Giovanni Brugnaro,Arcebispo de Camerino — San Seve-rino Marche (Itália).

A 25 de novembroSua Ex.cia o Senhor António JoséEmauz de Almeida Lima, Embaixa-dor de Portugal, para a apresentaçãodas Cartas Credenciais.O Senhor Cardeal Marc Ouellet,Prefeito da Congregação para osBispos; e D. José Rodríguez Carbal-lo, Secretário da Congregação para

os Institutos de Vida Consagrada eas Sociedades de Vida Apostólica.

Renúncias

O Santo Padre aceitou a renúncia:

No dia 24 de novembroDe D. Dieter Geerlings, ao cargo deAuxiliar da Diocese de Münster(Alemanha).

Nomeações

O Sumo Pontífice nomeou:

A 23 de novembroBispo de Teramo-Atri (Itália), D.Lorenzo Leuzzi, até esta data Auxi-liar da Diocese de Roma.Auxiliares de Roma, os Rev.dos Pa -dres Daniele Libanori, S.I., até estadata Reitor da Igreja de «San Giu-seppe dei Falegnami al Foro Roma-no», e Paolo Ricciardi, do clero ro-mano, até agora Pároco da Paróquiade São Carlos em Sezze, simultâneae respetivamente eleitos Bispos Titu-lares de Buruni e de Gabi.

D. Daniele Libanori, S.I., nasceu nodia 27 de maio de 1953, em Ostellato(Itália). Foi ordenado Sacerdote a 11de junho de 1977.

D. Paolo Ricciardi nasceu em Roma(Itália), a 14 de março de 1968. Re-

cebeu a Ordenação sacerdotal no dia 2de maio de 1993.

A 28 de novembroAuxiliares de Comodoro Rivadavia(Argentina), os Rev.dos Padres Ale-jandro Pablo Benna, do clero da Ar-quidiocese de Buenos Aires, até ago-ra Pároco da Paróquia São Franciscode Assis em Lavallol, e Roberto Ál-varez, do clero da Arquidiocese deCórdova, até hoje Pároco da Paró-quia Nossa Senhora do Rosário eAdministrador da Paróquia NossaSenhora de Fátima em Cosquín, sil-mutânea e respetivamente eleitosBispos Titulares de Vardimissa e deSozopolis in Haemimonto.

D. Alejandro Pablo Benna nasceu a12 de novembro de 1959 em BuenosAires (Argentina). Foi ordenado Sacer-dote no dia 14 de novembro de 1987.

D. Roberto Álvarez nasceu no dia 5de maio de 1968 em Córdova (Argen-tina). Recebeu a Ordenação sacerdotala 14 de dezembro de 1998.

Auxiliar da Arquidiocese de San Jo-sé (Costa Rica), o Rev.do Pe. DanielFrancisco Blanco Méndez, do cleroda mesma Arquidiocese, até esta da-ta Vigário-Geral e Pároco da Paró-quia Virgen del Carmen em San Jo-sé, simultaneamente eleito Bispo Ti-tular de Pulcheriopolis.

D. Daniel Francisco Blanco Méndeznasceu em San José (Costa Rica), nodia 4 de outubro de 1973. Foi ordena-

do Sacerdote a 8 de dezembro de2000.

Prelados falecidos

Adormeceram no Senhor:

No dia 20 de novembroD. István Konkoly, Bispo Eméritode Szombathely (Hungria).

O venerando Prelado nasceu emKerkaszentmiklos (Hungria), a 5 demarço de 1930. Foi ordenado Sacerdoteno dia 20 de junho de 1954. Recebeua Ordenação episcopal em 11 de julhode 1987.

No dia 24 de novembroD. Gabriel Simo, ex-Auxiliar de Ba-foussam (Camarões).

O saudoso Prelado nasceu em Bapa(Camarões), a 15 de março de 1937.Recebeu a Ordenação sacerdotal no dia27 de março de 1966. Foi ordenadoBispo em 26 de abril de 1987.

No dia 25 de novembroD. Rosendo Huesca Pacheco, Arce-bispo Emérito de Puebla de los Án-geles (México).

O ilustre Prelado nasceu em Ejutla(México), a 3 de março de 1932. Foiordenado Sacerdote no dia 28 de outu-bro de 1956. Recebeu a Ordenaçãoepiscopal em 24 de agosto de 1970.

D. Sotir Ferrara, Bispo Emérito dePiana degli Albanesi di Sicilia (Itá-lia).

O saudoso Prelado nasceu em Pianadegli Albanesi (Itália), no dia 5 de de-zembro de 1937. Foi ordenado Sacerdo-te a 19 de novembro de 1960. Recebeua Ordenação episcopal em 15 de janeirode 1989.

No dia 26 de novembroD. Vicente García Bernal, BispoEmérito de Ciudad Obregón (Méxi-co).

O venerando Prelado nasceu emFresnillo (México), no dia 5 de abrilde 1929. Recebeu a Ordenação sacer-dotal a 4 de abril de 1953. Foi orde-nado Bispo em 24 de maio de 1988.

D. Christian Vicente F. Noel, BispoEmérito de Talibon (Filipinas).

O saudoso Prelado nasceu em Astu-rias (Filipinas), no dia 17 de novembrode 1937. Foi ordenado Sacerdote a 19de março de 1961. Recebeu a Ordena-ção episcopal em 30 de novembro de1981.

D. José Pedro Pozzi, S.D.B., BispoEmérito de Alto Valle del Río Negro( A rg e n t i n a ) .

O venerando Prelado nasceu em Vi-mercate (Itália), no dia 12 de julho de1925. Recebeu a Ordenação sacerdotala 25 de novembro de 1951. Foi ordena-do Bispo em 24 de setembro de 1993.

Início de Missãode Núncios Apostólicos

D. Andrzej Józwowicz, ArcebispoTitular de Lauriaco, em Ruanda (18de julho).D. Ghaleb Bader, Arcebispo Titularde Mathara in Numidia, na Repú-blica Dominicana (18 de outubro).

CO N T I N UA Ç Ã O DA PÁGINA 18

Beatificado o padre Casey

músicas religiosas irlandesas diantedo tabernáculo».

O cardeal recordou também quedurante a grande depressão de1929, «a fim de ajudar as muitaspessoas que passavam fome», obeato criou «com o apoio de ben-feitores, uma cozinha para a distri-buição gratuita de sopa aos po-bres». Certa vez, o pão acabou e«na fila ainda tinha duzentas pes-soas à espera de algo para comer».O padre Solanus «aproximou-se dafila e começou a rezar o Pai-Nos-so». Depois de pouco tempo, «ou-viu-se bater à porta e apareceu umpadeiro com um grande cesto cheiode pães e muitos outros alimentos».Quando as pessoas viram isto «co-meçaram a chorar de comoção» e opadre Solanus simplesmente co-mentou: «Vede, Deus providencia.Ninguém sofrerá privações se pu-sermos a nossa confiança na divinaP ro v i d ê n c i a » .

O cardeal comentou que parasustentar a sua cozinha da caridade,o beato «perambulava para persua-dir agricultores e empresas a doaros alimentos segundo esta intenção.Por conseguinte, eram frequentes asvisitas às quintas para recolher asprovisões de alimentos». A vida dobeato, acrescentou o prefeito, é«uma exemplar página evangélica,vivida com intensidade humana ecristã». É uma página «a ser lidacom edificação e comoção e imitadacom fervor». Elevando o capuchi-nho americano às honras dos alta-

res, o Papa Francisco «apresenta-oa toda a Igreja, como discípulo fielde Cristo, bom pastor. Hoje a Igre-ja e a sociedade ainda precisam doexemplo e das obras do padre Sola-nus», garantiu o cardeal prefeito.

Ele via os outros, sobretudo ospobres, «não como um peso ouobstáculo para o seu caminho deperfeição, mas como uma estradade luz do esplendor divino». Astestemunhas afirmaram que «amor,fé e confiança eram os três pontosque ele sempre pregava ao povo».O seu anúncio «não era estéril nemdesencarnado», porque era acompa-nhado «pela prática concreta da fé,da esperança e da caridade na vidade todos os dias». Enquanto hou-ver uma centelha de fé, dizia habi-tualmente, não nos podemos desen-corajar nem entristecer.

Tendo nascido numa família ir-landesa de profundas convicçõescatólicas, «para ele a fé era a heran-

nus, «passou de uma comunidadede fé para outra». «O padre Sola-nus vivia de fé. A sua figura pareciacircundada por uma auréola sobre-natural».

O purpurado comentou que «re-zava sempre, sobretudo diante dotabernáculo. A oração era a suaprática constante de piedade».Além disso, tinha uma «filial vene-ração mariana e recitava o terçocom devoção». A prática dos sacra-mentos dava-lhe «segurança e cora-gem para o futuro». A sua fé pro-funda «permitia-lhe um acolhimen-to fraterno dos outros, independen-temente da sua raça ou religião».De facto, «rabinos e ministros depelo menos dezasseis congregaçõesprotestantes visitavam-no com fre-quência para debates e conselhos».São significativas as palavras docardeal John Francis Dearden: «Opadre Solanus praticava o ecume-nismo muito antes do Vaticano II».

Padre Francis Solano Casey (à esquerda)com um irmão capuchinho

ça mais preciosa paraenfrentar as dificulda-des da vida». O senti-do da presença provi-dencial de Deus era«vivo não só nos mo-mentos formais da ora-ção, da liturgia e doestudo, mas tambémnas situações do dia adia da sua existênciafamiliar». Assim quan-do o jovem BernardoCasey entrou na ordemdos capuchinhos tor-nando-se Francis Sola-

página 20 L’OSSERVATORE ROMANO quinta-feira 30 de novembro de 2017, número 48

No Angelus o Papa pediu orações pela viagem ao Myanmar e ao Bangladesh

Sinal de proximidade e esperançaManifestou pesar pelo massacre no Egito e rezou pela Ucrânia

Depois de ter comentado a página evangélica sobre ojuízo final, o Papa pediu aos fiéis que o acompanhemcom a oração na viagem ao Myanmar e aoBangladesh. Fê-lo durante o Angelus recitado napraça de São Pedro, ao meio-dia de domingo 26 den o v e m b ro .

Bom dia, queridos irmãos e irmãs!Neste último domingo do ano litúrgico celebra-mos a solenidade de Cristo Rei do universo. Asua realeza é de guia, de serviço, e também umarealeza que no fim dos tempos se afirmará comoo juízo. Hoje temos diante de nós Cristo comorei, pastor e juiz, que indica os critérios de per-tença ao Reino de Deus. Aqui estão os critérios.

A página evangélica abre-se com uma visãograndiosa. Dirigindo-se aos seus discípulos, Jesusdiz: «Quando o Filho do Homem voltar na suaglória, e todos os anjos com Ele, sentar-se-á noseu trono glorioso» (Mt 25, 31). Trata-se da soleneintrodução da narração do juízo universal. Depoisde ter vivido a existência terrena em humildade epobreza, Jesus apresenta-se agora na glória divinaque lhe pertence, circundado pelos exércitos an-gélicos. A humanidade inteira é convocada peran-te Ele, e Ele exerce a sua autoridade separandouns dos outros, como o pastor separa as ovelhasdos cabritos.

Àqueles que colocou à sua direita, diz: «Vinde,benditos de meu Pai, tomai posse do Reino quevos foi preparado desde a criação do mundo, por-que tive fome e destes-me de comer; tive sede edestes-me de beber; era peregrino e acolhestes-me; nu e vestistes-me; enfermo e visitastes-me; es-tava na prisão e viestes ter comigo» (vv. 34-36).Os justos ficam surpreendidos, porque não se re-cordam de um dia ter encontrado Jesus, e muitomenos de o ter ajudado desse modo; mas Ele de-clara: «Todas as vezes que fizestes isto a um des-tes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mes-mo que o fizestes» (v. 40). Esta palavra nuncadeixa de nos impressionar, porque nos revela atéque ponto chega o amor de Deus: a ponto de seidentificar connosco, contudo não quando esta-

mos bem, quando estamos sadios e felizes, não,mas quando estamos em necessidade. É desta for-ma escondida que Ele se deixa encontrar, que nosestende a mão como mendigo. É assim que Jesusrevela o critério decisivo do seu juízo, ou seja, o

amor concreto pelo próximo em dificuldade. Re-vela-se assim o poder do amor, a realeza de Deus:solidário com quantos sofrem, para suscitar emtoda a parte atitudes e obras de misericórdia.

A parábola do juízo prossegue, apresentando orei que afasta de si quantos, durante a própria vi-da, não se preocuparam com as necessidades dosirmãos. Também neste caso, eles ficam surpreen-didos e perguntam: «Senhor, quando foi que tevimos com fome, com sede, peregrino, nu, enfer-mo, ou na prisão, e não te socorremos?» (v. 44).Está subentendido: “Se te tivéssemos visto, certa-mente ter-te-íamos ajudado!”. Mas o rei respon-derá: «Todas as vezes que deixastes de fazer isso aum destes pequeninos, foi a mim mesmo que odeixastes de fazer» (v. 45). No final da nossa vida,seremos julgados sobre o amor, ou seja, sobre onosso compromisso concreto de amar e servir Je-sus nos nossos irmãos mais pequeninos e necessi-tados. Aquele mendigo, esse necessitado que es-tende a mão é Jesus; aquele doente que devo visi-tar é Jesus; esse preso é Jesus; aquele faminto éJesus. Pensemos nisto!

Jesus virá no fim dos tempos para julgar todasas nações, mas vem ter connosco todos os dias,de muitas maneiras, e pede-nos que o acolhamos.A Virgem Maria nos ajude a encontrá-lo e a rece-bê-lo na sua Palavra e na Eucaristia, e ao mesmotempo nos irmãos e nas irmãs que sofrem a fome,a doença, a opressão e a injustiça. Que os nossoscorações o acolham no hoje da nossa vida, parasermos por Ele recebidos na eternidade do seu Rei-no de luz e de paz.

Após a prece mariana, o Pontífice voltou a exprimiro seu pesar pelo massacre ocorrido a 24 de novembrono Egito. Depois, falou da beatificação na Argentinada madre Catalina de María Rodríguez, convidandoem seguida os fiéis a rezar pela Ucrânia, narecordação da tragédia do Holodomor, e pela suaviagem à Ásia.

Causou-nos grande dor, na sexta-feira passada, anotícia do massacre ocorrido numa mesquita anorte do Sinai, no Egito. Continuo a rezar pelasnumerosas vítimas, pelos feridos e por toda aque-la comunidade, tão duramente atingida. Deus noslivre destas tragédias e sustente os esforços de to-dos aqueles que trabalham pela paz, a concórdiae a convivência. Naquele momento, as pessoas re-zavam; também nós, em silêncio, oremos por elas.

Ontem, em Córdova, na Argentina, foi procla-mada Beata a madre Catalina de María Rodrí-guez, fundadora da Congregação das HermanasEsclavas del Corazón de Jesús, primeiro institutoreligioso feminino de vida apostólica na Argenti-na. Tendo vivido no século XIX, Catalina foi pri-meiro casada e, depois de ter ficado viúva, consa-grou-se a Deus e dedicou-se ao cuidado espirituale material das mulheres mais pobres e vulnerá-veis. Louvemos o Senhor por esta «mulher apai-xonada pelo Coração de Jesus e pela humanida-de».

Saúdo de modo especial a comunidade ucra-niana, que recorda a tragédia do H o l o d o m o r, amorte por fome provocada pelo regime stalinista,com milhões de vítimas. Rezo pela Ucrânia, a fimde que a força da fé possa contribuir para curaras feridas do passado e promover hoje caminhosde paz.

Hoje à noite começarei a Viagem Apostólica aoMyanmar e ao Bangladesh. Peço-vos que meacompanheis com a oração, a fim de que a minhapresença seja para aquelas populações um sinalde proximidade e de esperança.

Desejo bom domingo a todos. E, por favor,não vos esqueçais de rezar por mim. Bom almoçoe até à vista!

Novo embaixador de Portugalapresentou as credenciais

Sua Excelência o Senhor António José Emauzde Almeida Lima, novo embaixador de Portugaljunto da Santa Sé, nasceu em Lisboa a 5 de no-vembro de 1956. É casado e tem três filhas. For-mou-se em direito (Universidade católica portu-guesa, Lisboa).

Desempenhou os seguintes cargos: funcioná-rio no ministério dos negócios estrangeiros(Mne), de 1984 a 1988; segundo secretário deembaixada em Londres (1989-1992); conselheirode embaixada junto da Delnato/Ueo, Bruxelas(1993); conselheiro de embaixada em Maputo

(1994 — junho de 1998); diretor dos serviços pa-ra a América do Norte junto do Mne (julho de1998 — janeiro de 2001); chefe de gabinete doministro dos negócios estrangeiros e das comu-nidades portuguesas (outubro de 2003 — agostode 2004); vice-diretor-geral das relações bilate-rais (setembro de 2004 — 2005); cônsul-geral noRio de Janeiro (2006-2011); membro executivodo conselho de administração da Aicep (janeiro— maio de 2012). Desde junho de 2012 é chefedo protocolo de Estado, com status de embai-x a d o r.

O Papa quis confiar também a sua terceira viagem à Ásiaà proteção da Virgem: na noite de sábado,

25 de novembro, foi à basílica de Santa Maria Maiorpara rezar aos pés da Salus populi Romani.

Na manhã de sábado, 25 de novembro,o Santo Padre recebeu em audiênciaSua Excelência o SenhorAntónio José Emauz de Almeida Lima,embaixador de Portugal, o qualapresentou as cartas com as quaisé acreditado juntoda Santa Sé