Princípios de direito do trabalho (1)

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Princípios do Direito do Trabalho 1. Conceito Os princípios jurídicos, são, em essência, as estruturas basilares do ordenamento jurídico do País. O princípio é um ponto de partida. Um fundamento. O princípio de uma estrada. É o seu ponto de partida, ensinam os juristas. Os princípios são os primeiros passos no caminho de uma regulação, em direção aos quais devem seguir os demais. Para a ciência do direito, os princípios são proposições ideais que vão informar toda a compreensão do fenômeno jurídico. Constituem-se em diretrizes centrais, em balizas a serem seguidas e respeitadas, e que, depois de inferidas, se reportam a um sistema jurídico, informando-o. Os princípios são os primeiros passos no caminho de uma regulação, em direção aos quais devem seguir os demais. Abrigam em seu núcleo uma diretriz muito mais densa do que uma simples regra, embasam uma ciência e fornecem subsídios à sua correta compreensão e interpretação. No auspício de que um determinado ramo jurídico seja autônomo, é preciso se aferir se reúne uma série de quesitos, dentre os quais estão situados os princípios diretores que inspiram os caracteres distintivos dos demais ramos jurídicos. 1

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Princípios do Direito do Trabalho

1. Conceito

Os princípios jurídicos, são, em essência, as estruturas basilares do ordenamento jurídico do País.

O princípio é um ponto de partida. Um fundamento. O princípio de uma estrada. É o seu ponto de partida, ensinam os juristas. Os princípios são os primeiros passos no caminho de uma regulação, em direção aos quais devem seguir os demais.

Para a ciência do direito, os princípios são proposições ideais que vão informar toda a compreensão do fenômeno jurídico. Constituem-se em diretrizes centrais, em balizas a serem seguidas e respeitadas, e que, depois de inferidas, se reportam a um sistema jurídico, informando-o.

Os princípios são os primeiros passos no caminho de uma regulação, em direção aos quais devem seguir os demais. Abrigam em seu núcleo uma diretriz muito mais densa do que uma simples regra, embasam uma ciência e fornecem subsídios à sua correta compreensão e interpretação.

No auspício de que um determinado ramo jurídico seja autônomo, é preciso se aferir se reúne uma série de quesitos, dentre os quais estão situados os princípios diretores que inspiram os caracteres distintivos dos demais ramos jurídicos.

Ao se sustentar a autonomia do Direito do Trabalho, não se pode negar que o mesmo tem princípios próprios, diferentemente dos que inspiram outros ramos do direito.

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Quando se afirma a autonomia do Direito do Trabalho como ramo específico do direito, sustenta-lhe essa idéia o fato de possuir uma série de princípios próprios, específicos.

Os princípios de direito de trabalho se constituem nas linhas diretrizes ou postulados que inspiram o sentido das normas trabalhistas e configuram a regulamentação das relações de trabalho.

2. Função dos princípios

Os princípios tem várias funções das quais se destacam: INFORMADORA, NORMATIVA E INTERPRETATIVA. Função informadora – serve de fonte de inspiração ao legislador e de fundamento para as normas jurídicas.

Função normativa – serve como fonte supletiva, nas lacunas ou nas omissões da lei.

Função interpretativa – serve como critério orientador para os intérpretes e aplicadores da lei.

O artigo 8º da CLT disciplina claramente que na falta de disposições legais ou contratuais o intérprete pode socorrer-se dos princípios do Direito do Trabalho.

Evidencia-se, pois, o caráter informador dos princípios, de orientar o legislador na fundamentação das normas jurídicas, assim como o de fonte normativa, para suprir lacunas ou omissões da lei.

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3. Motivos que justificam a aplicação dos princípios O Direito do Trabalho se constitui em um instrumento por meio do qual se busca a promoção da Justiça Social. O pano de fundo do Direito do Trabalho é a proteção e a paz social no mundo do trabalho.

Os princípios que se formam no direito do trabalho fornecem ao intérprete uma possibilidade de identificar os componentes novos que a sociedade injetou na norma, trazidos pela realidade dos fatos, pela mudança nos usos e costumes, pelas novas idéias.

Desta forma, os princípios indicam a verdadeira finalidade da lei: a que a atualidade requer e não a que orientou a criação da mesma.

Porém, os princípios devem ser aplicados conforme objetivos: Se é bem verdade que o direito do trabalho é animado pelo sentido de ajuste a situações concretas que visam a proteção do trabalho, não é menos verdadeiro que os mesmos não podem ser aplicados contra a lei.

Portanto, existem limites ao emprego dos princípios de direito do trabalho, de modo que o resultado da interpretação não seja absurdo, ilógico, contraditório ou que viole os dispositivos legais.

A compreensão desse limite é muito importante na medida em que os princípios gerais de direito do trabalho foram recepcionados pelo sistema jurídico trabalhista para atribuir-lhes uma função relevante como fonte subsidiária do direito.

4. Fundamento legal da aplicação dos princípios no direito do trabalho

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Art. 4º., LICC - Quando a lei for omissa, juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

Art. 8º., CLT - As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.

5. Os princípios se constituem em fonte do direito do trabalho?

Não. A única função de caráter normativo dos princípios é constituída pela atuação como fonte supletiva em caso de omissão da lei.

Os princípios se converteram em critérios de orientação do legislador a serviço de um pensamento de justiça social. Em nenhum caso vigem como fontes de direito de uma forma direta, mas envoltos e expressos por outras normas.

6. Princípios Gerais de Direito

Os princípios gerais de direito, aplicando-se aos diferentes segmentos especializados do direito, preservam a noção de unidade da ordem jurídica, mantendo o direito como um efetivo sistema, ou, em outras palavras, um conjunto de partes coordenadas.

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Cumpre ressaltar que qualquer dos princípios gerais que se aplique subsidiariamente ao direito do trabalho deverá sofrer uma necessária compatibilização com os princípios e regras gerais próprias desse ramo jurídico especializado, de sorte que a inserção da diretiva geral não se choque com a especialidade inerente ao ramo trabalhista. Do mesmo modo, saliente-se que os princípios gerais se incorporam as próprias diretrizes centrais da noção do direito (por exemplo: princípio da lealdade e princípio da boa-fé) ou, ainda, as diretrizes centrais dos sistemas jurídicos contemporâneos (por exemplo: princípio da inalterabilidade dos contratos).

Tendem, pois, a ser princípios que se irradiam por todos os segmentos da ordem jurídica, desvelando um papel de extrema importância no sentido de garantir a coerência integrada à totalidade do universo normativo de uma sociedade política.

7. Princípios Constitucionais Gerais

Os princípios constitucionais fazem a congruência, o equilíbrio e a essencialidade de um sistema jurídico legítimo.

A Constituição Federal de 1988 não revelou expressamente os princípios informadores do Direito do Trabalho. Todavia, no seu art. 1º ao sublinhar os fundamentos da República Federativa do Brasil, referiu:

III – a dignidade da pessoa humanaIV – os valores sociais do trabalho

Também ao relacionar os princípios gerais da atividade econômica, aludiu

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no seu artigo 170:

caput – valorização do trabalho humano caput – justiça social inciso II - função social da propriedade inciso VIII – busca do pleno emprego.

Também o princípio da isonomia, afirmado pelo art. 5º, I da CF, correspondente às Convenções da OIT 100 e 111.

8. Princípios de Direito do Trabalho

Ao lado dos princípios gerais do direito, comuns a todos os ramos dogmáticos ou a grande parte deles, existem os princípios especiais de uma disciplina jurídica.

A essa regra não refoge o direito do trabalho que tem sua autonomia pacificamente assentada e reconhecida e, como tal, possui princípios especiais, próprios de sua disciplina. Acentua Plá Rodriguez que várias definições de princípios do direito do trabalho já foram propostas, mas destaca a de autoria de Alonso Garcia que assim preleciona “Aquelas linhas diretrizes ou postulados que inspiram o sentido das normas trabalhistas e configuram a regulamentação das relações de trabalho, conforme critérios distintos dos que podem encontrar-se em outros ramos do direito”.

Partindo da proposição de que os princípios são idéias fundamentais e informadoras da organização jurídica trabalhista, concluímos que os princípios de direito do trabalho constituem o núcleo do ordenamento jurídico do trabalho, não podendo, assim, haver contradição entre eles e os preceitos legais.

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Tais princípios estão acima do direito positivo, enquanto lhe servem de inspiração, mas não podem tornar-se independentes dele. Ainda que os princípios inspirem, informem, elaborem o conteúdo do direito positivo, estão, de certo modo, condicionados por este. O estudo dos princípios de direito do trabalho é de vital importância na medida a delimitá-lo de modo que não perca sua estrutura conceptual.

Os princípios normativos do trabalho são, na verdade, diretrizes que orientam as normas de um ramo do direito independente e que, ainda, podem ter um caráter interpretativo.

A classificação dos princípios especiais do direito do trabalho, seu fundamento, sua definição e suas funções protetivas, dentre outros aspectos. têm sido objeto de diferentes posicionamentos, confrontando grande variedade de opiniões. Em face dessa diversidade de posicionamentos, elegemos alguns autores e vamos expor a idéia de cada um deles com vistas a conduzir ao perfeito entendimento do tema. Para tanto, buscamos delinear o assunto através das obras de Américo Plá Rodriguez que propõe os seguintes princípios:

01. PRINCÍPIO DE PROTEÇÃO; 02. PRINCÍPIO DA IRRENUNCIABILIDADE DOS DIREITOS;03. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DA RELAÇÃO DE EMPREGO;04. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA REALIDADE;05. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE;06. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ.

A - Princípio de Proteção Tal primado consubstancia-se num critério fundamental orientador do direito do trabalho: ao invés de inspirar-se num propósito de igualdade,

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baseia-se em um amparo preferencial a uma das partes da relação de emprego: o trabalhador.

Depreende-se, pois, que o fundamento deste princípio está diretamente ligado à razão de ser do direito do trabalho: nivelar desigualdades. Este princípio vigora e é aceito em todo o direito do trabalho. É necessário, porém, estabelecer-se com precisão o alcance de tal princípio, como adiante indicado:

a. inspira todas as normas de direito do trabalho e que deve ser levado em conta na sua aplicação;

b. não permite que se faça qualquer coisa em nome da proteção do trabalhador e também não é possível substituir-se ao legislador. Seu campo de aplicação, portanto, é limitado e desde que se respeite esse balizamento, não há ameaça contra a segurança jurídica;

c. não pode ser utilizado como regra de interpretação de prova.

d. não é necessária sua consagração no direito positivo, mas seu valor não pode ser tal que se imponha contra uma norma de direito positivo;

e. a recepção pelo direito positivo pode ocorrer de forma substantiva e de forma instrumental.

O ilustre doutrinador uruguaio Américo Plá Rodriguez sustenta que o princípio de proteção reúne três formas distintas de expressão: in dúbio pro operário, norma mais favorável e condição mais benéfica.

a. REGRA “IN DUBIO, PRO OPERARIO”;

Este é o critério que tanto o juiz como o intérprete, devem levar em conta

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todas as vezes que uma norma possuir vários sentidos diferentes e uma escolha tiver que ser feita: deve prevalecer aquele sentido que for o mais favorável ao trabalhador.

Tal regramento encontra justificativa na autonomia do direito do trabalho. Admitindo-se seu caráter especial, qual seja, a de permitir uma proteção maior à parte mais fraca no contrato de trabalho: o trabalhador.

Mas para que essa regra possa ser aplicada são necessária duas condições:a. deve existir dúvida sobre o alcance da norma legal; b. não deve estar em desacordo com a vontade do legislador.

Além da obediência dessas condições, essa regra interpretativa os seguintes limites:a. a sua possível aplicação em matéria de prova dos fatos;b. quando a dúvida recair sobre a forma de administrar ou dirigir uma empresa, a solução deve ser a de inclinar-se em favor do patrão;c. quanto às leis de previdência social, não se aplicaria este princípio.

b. REGRA DA NORMA MAIS FAVORÁVEL

O sentido verdadeiro dessa regra surge quando existem várias normas que são aplicáveis a uma mesma situação jurídica. No âmbito da hermenêutica jurídica não existe problema a respeito, pois entre normas de diferentes graus hierárquicos deve-se considerar aplicável a norma de grau superior e entre normas de mesmo grau hierárquico, prevalece a que foi promulgada mais recentemente.

Mas o princípio da norma mais favorável é justamente aquele que torna o direito do trabalho peculiar. Não se considera aqui uma ordem hierárquica predeterminada, mas, em caso concreto, deverá ser aplicada a norma mais favorável ao trabalhador.

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A aplicação desta regra deve obedecer aos seguintes princípios orientadores:

a. a comparação entre as normas deve ser efetuada considerando o conteúdo de cada uma delas;

b. ao se comparar as normas deve-se levar em consideração a situação de toda a coletividade trabalhadora interessada, e não apenas a situação de um único trabalhador considerado individualmente;

c. a questão de saber se uma norma é ou não mais favorável aos trabalhadores não dependem da apreciação subjetiva dos interessados. Deve ser resolvida objetivamente, em função dos motivos que tenham inspirado as normas;

d. o confronto de duas normas deve ser feito de uma maneira concreta, indagando se a regra inferior é, no caso, mais ou menos favorável aos trabalhadores;

e. como a possibilidade de melhorar a condição dos trabalhadores constitui uma exceção ao princípio da intangibilidade da regra imperativa hierarquicamente superior, não se pode admitir a eficácia de uma disposição inferior, embora se possa duvidar de que seja efetivamente favorável aos trabalhadores.

c. REGRA DA CONDIÇÃO MAIS BENÉFICA

Esta regra pressupõe a existência de uma situação concreta, anteriormente reconhecida, e determina que ela deve ser respeitada, na medida em que for mais favorável ao trabalhador que a nova norma aplicável.

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Embora pareça estar essa regra bastante relacionada com as anteriores, distingue-se de ambas: da primeira, por ser mais geral, aparecer na realidade como manifestação da mesma e ter formulação jurídico-positiva expressa; da segunda, por acarretar uma aplicação de norma de favor, embora não referida à caracterização geral, mas a uma situação concreta e determinada.

B – Princípio da Irrenunciabilidade

É um princípio de muita importância no campo do Direito do Trabalho, tanto que os autores são unânimes em aceitar sua vigência.

A irrenunciabilidade é a impossibilidade do empregado abrir mão voluntariamente dos direitos concedidos pela legislação trabalhista em benefício próprio.

A renúncia, por sua vez, equivale a um ato voluntário pelo qual uma pessoa se desliga de um direito reconhecido a seu favor e o abandona (negócio jurídico unilateral que determina o abandono irrevogável de um direito, dentro dos limites estabelecidos pelo ordenamento jurídico).

A proibição de renunciar importa em excluir a possibilidade de poder realizar-se, de maneira válida e eficaz, o desligamento voluntário dos direitos, no âmbito alcançado por aquela proibição. O direito do trabalho, em linhas gerais, entra nessa proibição. “Com efeito, ao contrário do que no direito comum, onde rege o princípio da renunciabilidade, no direito do trabalho vige o princípio oposto, que é o da irrenunciabilidade. Ou seja, nos restantes ramos do direito alguém pode privar-se voluntariamente de uma faculdade, ou de uma possibilidade, ou de um benefício que possui, enquanto que neste setor do direito isso não é possível: ninguém pode privar-se das possibilidades ou vantagens estabelecidas em seu proveito próprio”.

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Há, no entanto, os que crêem que essa peculiaridade do direito do trabalho não importa na quebra do princípio geral, porque sempre há limitações. Entre elas podem surgir as que abrangem o direito trabalhista e que excluem, portanto, a aplicação do princípio da irrenunciabilidade na área do Direito do Trabalho.

Há diversas formas de expor o fundamento deste princípio. Alguns se baseiam em outro princípio mais profundo e transcendente, que é o princípio da indisponibilidade; outros o vinculam à noção de ordem pública; outros o apresentam como foram de limitação da autonomia da vontade.

Essas quatro posições possuem uma grande afinidade entre si, a ponto de nem sempre ser fácil distinguí-las, tanto que muitos autores as invocam simultaneamente.

Mas qual é o preciso alcance da irrenunciabilidade? Plá Rodriguez informa que somente De La Cueva e, de forma menos enfática, De Ferrari, sustentam que a totalidade das normas trabalhistas são irrenunciáveis. Os demais autores costumam utilizar expressões mais imprecisas, como “a maioria das normas”, “a generalidade das normas”, etc.

Alguns autores, ainda, fazem uma classificação, distinguindo as normas irrenunciáveis das renunciáveis e fixando diferentes graus de irrenunciabilidade.

Mas qual são as normas realmente irrenunciáveis? Este é um problema derivado do caráter não absoluto da irrenunciabilidade. Algumas vezes a irrenunciabilidade decorre do próprio conteúdo da norma, seja de forma explícita (que é a mais simples: ocorre quando se estipula expressamente a caráter interrogável ou de ordem pública da

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norma). Outras vezes a irrenunciabilidade decorre da ratio legis, isto é, da finalidade objetivada pela norma.

A utilidade dessa explicação é a de manifestar que não se requer um reconhecimento expresso no direito positivo, para que a norma possa ser considerada irrenunciável.

Um outro aspecto a ser analisado diz respeito a se saber se algumas dessas renúncias que estão proibidas se forem intentadas individualmente, podem ser válidas se forem realizadas coletivamente, através de um sindicato e por meio de uma convenção coletiva.

É preciso distinguir-se dois pressupostos:

a. que as partes negociadoras modifiquem direitos trabalhistas dos trabalhadores, procedentes das anteriores convenções coletivas;

b. que se estipule em uma convenção coletiva a possibilidade de que os trabalhadores renunciem a direitos emergentes das convenções coletivas.No primeiro pressuposto deve-se partir da base do predomínio do interesse coletivo sobre o individual, sem prejuízo do respeito aos direitos adquiridos pelo indivíduo.

O segundo pressuposto coloca o problema de se as partes negociadores da convenção podem autorizar renúncias por parte dos trabalhadores atuando individualmente. Em princípio, os direitos procedentes das convenções coletivas são tão irrenunciáveis. Só caberia a possibilidade da renúncia na hipótese, na da provável na prática, de que as próprias normas da convenção coletiva houvessem autorizado essa renúncia.

Quais são os efeitos da violação do princípio da irrenunciabilidade? Dada a índole das normas declaradas

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irrenunciáveis, as renúncias que ocorrerem contra as mesmas carecem de qualquer efeito: são absolutamente ineficazes, ou seja, insanavelmente nulas.

O que se considera nulo é a cláusula e não o contrato, que permanece vigente.

Esta é uma peculiaridade do Direito do Trabalho, porque no direito comum a nulidade, como regra, tem como conseqüência a inexistência do ato como tal.

Como resultado disso tudo, a cláusula anulada será automaticamente substituída pela norma renunciada ilicitamente. O vazio que normalmente a nulidade deixa se preenche, no direito do trabalho, automaticamente, com as normas estabelecidas por este e que não devessem ser desconhecidas ou renunciadas.

Mas é importante ressaltar que os serviços prestados, mas em decorrência de um contrato nulo, não perdem seu valor. Devem ser, portanto, retribuídos. A nulidade do contrato tem efeito ex nunc, e não ex tunc.

C – Princípio da Continuidade da Relação de Emprego

Para compreender este princípio devemos partir da base que o contrato de trabalho é um contrato de trato sucessivo, ou seja, que a relação instantânea de certo ato, mas perdura no tempo. A relação empregatícia não é efêmera, mas pressupões uma vinculação que se prolonga”.

Tudo o que vise a conservação da fonte de trabalho e a dar segurança ao trabalhador, gera um benefício não só a ele, mas também para a empresa e para a sociedade, na medida em que contribui para aumentar o lucro e a melhorar o clima social das relações entre as partes.

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É preciso esclarecer, porém, que não é somente o fato de ser a relação de emprego de trato sucessivo que justifica o princípio, pois existem outras relações dessa índole nas quais atua o mesmo princípio. Essa característica explica que haja surgido, mas não logra justificá-lo: é uma condição necessária, mas não suficiente.

Este princípio expressa a tendência atual do Direito do Trabalho de atribuir à relação desemprego a mais ampla duração, sob todos os aspectos.

Não resta dúvida que este princípio é estabelecido em favor do trabalhador.

Como conseqüência, nada impede que deixe de ser invocado ou exercido por este, se por qualquer circunstância preferir não fazê-lo. Em tal hipótese não se apresenta o problema da irrenunciabilidade porque, se assim ocorresse, o prazo estaria operando como uma limitação para o trabalhador, com a conseqüência de que nos encontraríamos diante do contrato de trabalho por toda a vida, o o legislador quis evitar. Com maior razão ainda, o empregador não pode invocar este princípio para se opor à renúncia ou ao abandono do emprego pelo trabalhador.

Assim, salvo nos casos de contrato por prazo determinado e na medida em que a solvência econômica do trabalhador empreste algum significado prático à responsabilidade em que possa vir a incorrer, em todos os demais casos o trabalhador é livre para denunciar o contrato e deixar de trabalhar.

Plá Rodriguez expõe as seguintes projeções para mostrar qual é o verdadeiro alcance desse princípio:

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a. preferência pelos contratos por prazo indeterminado;b. amplitude para a admissão das transformações do contrato;c. facilidade para manter o contrato, apesar dos descumprimentos ou nulidades em que se haja incorrido;d. resistência em admitir a rescisão unilateral do contrato, por vontade do empregador; e. interpretação das interrupções dos contratos como simples suspensões; e f. manutenção do contrato nos casos de substituição do empregador.

O autor adverte, porém, que todas essas projeções denotam tendências, orientações, inclinações, não se tratando de regras absolutas, precisas e rígidas. Admitem exceções, limitações e restrições. Mas o importante é sempre lembrar que marcam uma orientação predominante.

D – Princípio da Primazia da Realidade

Este princípio significa que, em caso de discordância entre o que ocorre na prática e o que emerge de documentos ou acordos, deve-se dar preferência aos fatos (contrato-realidade). O significado que deve-se atribuir a este princípio é o da prevalência dos fatos sobre as formas, formalidades ou as aparências.

Isto significa que, em matéria de trabalho, o que vai importar é o que ocorre na prática, muito mais do que aquilo que conste em documentos, formulários e instrumentos de controle.

É claro que não se pode concluir absolutamente que esta primazia dos fatos sobre os documentos pactuados significa que as estipulações contratuais carecem de todo valor.

A existência da relação de trabalho (trabalho de fato) não exclui o

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surgimento do contrato. As estipulações contidas no contrato de trabalho não são inúteis, já que contam com a presunção, a seu favo, de refletir a vontade comum das partes. Enquanto não se demonstre que a conduta das partes foi diferente, prevalece a presunção emanada do texto do contrato.

O que não se pode fazer é invocar um texto escrito para pretender que ele prime sobre os fatos. Plá Rodriguez arregimenta: “na oposição entre o mundo real dos fatos efetivos e o mundo formal dos documentos, não resta dúvida de que se deve preferir o mundo da realidade”. (18) (18) Id., Ibid.. Pág. 141

Mas para que se possa evocar tal princípio, em primeiro lugar exige-se boa-fé (princípio da boa-fé). A realidade reflete sempre e necessariamente a verdade. Afirmar invariavelmente o império da realidade equivale a render tributo ao princípio da boa-fé, que inspira e sustenta toda a ordem jurídica, como uma exigência indispensável da própria idéia de justiça. E – Princípio da Razoabilidade

Este princípio consiste na afirmação de que o ser humano, em suas relações trabalhistas, procede e deve proceder conforme à razão.

Esta afirmação não é exclusiva do Direito do Trabalho, mas própria de todos os ramos do direito. Toda ordem jurídica se estrutura em torno de critérios de razão e de justiça, que partem da natureza da pessoa humana e buscam concretizar um ideal de justiça.

Mas está claro que a pertinência de um princípio desta natureza é mais necessário naquelas áreas onde a índole de praxes normativas deixam amplo campo para a decisão individual. Trata-se de um limite ou um freio formal a ser aplicado naquelas áreas do comportamento onde a norma

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não pode prescrever limites muito rígidos e onde a norma não pode prever a infinidade de circunstâncias possíveis.

No Direito do Trabalho este princípio tem duas grandes formas de aplicação:

a. em alguns casos serve para medir a verossimilhança de determinada aplicação ou solução; b. em outros casos atua como obstáculo, como limite de certas faculdades cuja amplitude pode prestar-se à arbitrariedade.

F – Princípio da boa-fé

O trabalhador deve cumprir seu contrato de boa-fé, mas, ao mesmo tempo, essa obrigação de boa-fé alcança o empregador, que também deve cumprir lealmente suas obrigações.

Este princípio é visto como um princípio geral, que informa a totalidade de regulamentação, com características de postulado moral e jurídico.

A boa-fé se refere à conduta da pessoa que considera cumprir realmente com seu dever, pressupondo uma posição de honestidade e honradez no comércio jurídico, porque contém implícita a consciência de não enganar, não prejudicar, nem causar danos.

Este princípio abrange ambas as partes do contrato, e não apenas uma delas. Além disso, este princípio deve ser levado em conta para a aplicação de todos os direitos e obrigações que as partes adquirem como conseqüência do contrato de trabalho.

Um problema que Plá Rodriguez coloca é o saber se este princípio inclui diversas formas atípicas de greve (ex. trabalho mais lento, trabalho com desleixo, etc).

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Para o autor, porém, o problema da licitude ou não dessas formas de luta não deve ser analisado em relação ao cumprimento ou violação do princípio da boa-fé. Deve-se partir da idéia de que todo meio de luta, por sua própria natureza, tende a prejudicar a outra parte. Caso contrário, não serve como meio de luta.

Assim, não é possível invocar, para condenar um meio de luta, a existência de um dever que seria violado, pois se trata justamente disso: violar um dever existente, senão não seria um meio de luta.

Salvo a sabotagem e outras formas que com ela se assemelham, qualquer outra forma de luta pode ser considerada como uma forma de greve, mas o autor acredita que este problema não pode ser resolvido em função do princípio da boa-fé, que pressupõe o cumprimento normal do contrato.

Doutrina de Maurício Godinho Delgado: Sustenta que todo sistema, inobstante ser formado por um conjunto mais ou menos amplo de partes ou categorias coordenadas, terá sempre em alguma delas o seu ponto central. Nessa linha de pensamento, divisiona os princípios especiais de direito do trabalho da seguinte forma:

01.PRINCÍPIO DA NORMA MAIS FAVORÁVEL;02. PRINCÍPIO DA CONDIÇÃO MAIS BENÉFICA;03. PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DA RELAÇÃO DE EMPREGO;04. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA REALIDADE SOBRE A FORMA;05. PRINCÍPIO DA IRRENUNCIABILIDADE DOS DIREITOS LABORAIS.

01. Princípio da Norma mais Favorável

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Assinala que dentre o conjunto de princípios que compõem o direito individual do trabalho, o da norma mais favorável é o mais importante, seja pela diferenciação que demarca entre o ramo jurislaboralista o restante do universo normativo, seja pela sua abrangência que tem nesta área especializada do direito.

Informa esse princípio que, no processo de interpretação e aplicação do direito, o operador jurídico situado perante um quadro de conflito de normas, deverá escolher aquela mais favorável ao trabalhador, a que melhor realize o sentido teleológico do direito do trabalho.

Na pesquisa e eleição dessa norma mais favorável, o intérprete e aplicador do direito deverá submeter-se a algumas considerações objetivas, que permitam preservar o caráter científico da compreensão e apropriação do fenômeno jurídico. Em primeiro plano, haverá de ter em conta não o trabalhador específico objeto da incidência da norma em certo caso concreto, mas o trabalhador inserido num contexto mais amplo, por exemplo, categoria profissional.

Num segundo plano, não poderá o operador jurídico permitir que o uso do princípio da norma mais favorável comprometa o caráter sistemático da ordem jurídica, elidindo o patamar da cientificidade a que se deve submeter todo processo de interpretação e aplicação do direito.

Deste modo, o encontro da norma mais favorável não se pode fazer mediante uma separação tópica e casuística de normas, acumulando-se preceitos favoráveis ao empregado e praticamente criando-se ordens jurídicas próprias e provisórias em face de cada caso concreto, como parece resultar do enfoque proposto pela teoria da acumulação.

Pelo contrário, o operador jurídico deve buscar a norma mais favorável enfocando globalmente o conjunto de normas componentes do sistema, discriminando no máximo os preceitos em função da matéria, de modo a

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não perder, ao longo desse processo, o caráter sistemático da ordem jurídica e os sentidos lógico e teleológico básicos que sempre devem sempre informar o fenômeno do direito.

O autor sustenta que o princípio da norma mais favorável atua em tríplice dimensão no direito do trabalho. Na fase pré-jurídica, como critério de política legislativa, influindo no processo de construção do direito do trabalho. Essa influência é muito clara, especialmente em contextos políticos democráticos, colocando em franca excepcionalidade diplomas que agridam a direção civilizatória essencial que é pertinente ao direito do trabalho.

Na fase jurídica, atuando quer como critério de hierarquia de normas jurídicas, quer como princípio de interpretação de tais normas.

Como critério hierárquico permite eleger como norma prevalecente, em uma dada situação de conflito de normas, aquela que forma mais favorável ao trabalhador, observados os procedimentos acima indicados.

Como princípio de interpretação de direito, permite a escolha da interpretação mais favorável ao trabalhador, caso anteposta ao intérprete uma variedade de hipóteses interpretativas em face de uma norma obscura enfocada.

02. Princípio da Condição mais Benéfica

O autor sustenta que o princípio da condição mais benéfica deveria ser cognominado de princípio da cláusula mais benéfica, posto que não se trata de condição, tecnicamente, mas sim de cláusula contratual.

Tal princípio contempla a garantia de preservação, ao longo do contrato, da cláusula contratual mais benéfica ao trabalhador, revestida de caráter

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de direito adquirido, tal qual insculpido no Artigo 5º, XXXVI da Carta Política.

Incorporado pela legislação trabalhista através do Artigo 468 da CLT e Enunciados 51 e 288 do C. Tribunal Superior do Trabalho, o princípio informa que cláusulas contratuais benéficas somente poderão ser suprimidas caso suplantadas por cláusulas posteriores ainda mais benéficas, ainda mais favoráveis, mantendo-se intocadas (direito adquirido) em face de qualquer subsequente alteração menos favorável ao contrato ou regulamento de empresa.

A bem da verdade, o princípio da cláusula mais benéfica encerra induvidosa manifestação do princípio da inalterabilidade contratual, assimilado, com adequações, pelo direito do trabalho ao direito comum.

Da análise desse princípio juslaboral exsurge, com eloquência decisiva, que no direito do trabalho, como regra, não vigora o critério da autonomia da vontade do qual deriva a prevalência de normas dispositivas no âmbito do direito obrigacional civil. No segmento trabalhista prevalece a constrição à autonomia da vontade, aceita como instrumento assecuratório eficaz de certas fundamentais garantias ao empregado, instituídas por ser ele hipossuficiente na relação contratual firmada.

As normas justrabalhistas são, pois, essencialmente imperativas, não podendo, de maneira geral, ter sua regência contratual afastada pela simples manifestação de vontade de partes.

03. Princípio da Continuidade da Relação de Emprego

Preconiza o autor que o princípio da continuidade da relação de emprego atende aos interesses do direito do trabalho no sentido de garantir a

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permanência do vínculo de emprego, com a integração dos trabalhadores na estrutura e dinâmica empresariais. Apenas mediante tal permanência e integração é que a ordem justrabalhista poderia cumprir satisfatoriamente o objetivo teleológico do direito do trabalho de assegurar melhores condições – sob a ótica obreira – de pactuação e gerenciamento da força de trabalho em determinada sociedade.

A Carta Política de 1988, realçando os princípios contidos em legislações constitucionais anteriores, também colocou o princípio da continuidade da relação de emprego em patamar de relevância jurídica, harmonizando, em parte, a ordem trabalhista à diretriz desse princípio.

Deste modo, afastou a anterior incompatibilidade do instituto do FGTS com qualquer eventual sistema de garantias jurídicas de permanência do trabalhador no emprego – afastamento implementado ao estender o FGTS a todo e qualquer empregado 9Art. 7º, III, exceto o doméstico).

Do mesmo modo, fixou as regras da “relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos – (Art. 7º, I).

Adicionalmente, lançou a idéia de “aviso prévio proporcional ao tempo de serviço”, “nos termos da lei” (Art. 7º, XXI), indicando o reforço da noção de contingenciamento crescente à prática de ruptura imotivada do contrato empregatício.

Embora a jurisprudência venha firmando-se no sentido de negar eficácia imediata a qualquer dos últimos preceitos constitucionais, é evidente o redirecionamento que sua instigante existência provoca na própria cultura jurídica potestivamente dominante nas décadas mais recentesw.

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BIBLIOGRAFIA:

DELGADO, Maurício Godinho - Princípios do direito do trabalho. Revista Ltr - Legislação do Trabalho, São Paulo, 59(04): 472-82, abr. 1995.

LIMA, Francisco Meton Marques de - Princípios de direito do trabalho na lei e na jurisprudência. São Paulo, Ltr, 1994.

LUCA, Carlos Moreira de - Os fundamentos constitucionais do direito coletivo do trabalho brasileiro. Revista Ltr - Legislação do Trabalho, São Paulo, 57(07): 809-15, jul. 1993.

MATTIOLI, Maria Cristina - Reflexões acerca das relações de trabalho no Brasil e perspectivas de um novo modelo. Revista Ltr - Legislação do Trabalho, São Paulo, 58(11): 1324-26, nov. 1994.

NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho. 10ª ed. atual. São Paulo, Saraiva, 1992.

PLÁ RODRIGUEZ, Américo - Princípios de direito do trabalho. Trad. por Wagner D. Giglio. 2ª tiragem, Ltr; ed. da Universidade de São Paulo, 1993.

REALE, Miguel - Lições preliminares de direito. 11ª ed. rev. São Paulo, Saraiva, 1984.

RUPRECHT, Alfredo J. - Os princípios do direito do trabalho. Trad. por Edilson Alkimin Cunha. São Paulo, Ltr, 1995.

XAVIER, Carlos Alberto Moreira - Do comportamento para autonomia privada coletiva. Revista Ltr - Legislação do Trabalho, São Paulo,

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59(03): 361-63, mar. 1995.

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QUESTÃO A SER DEBATIDA SOBRE O ASSUNTO

QUESTÃO: Faça uma breve explanação sobre os princípios constitucionais gerais aplicáveis ao Direito do Trabalho e sobre os princípios constitucionais específicos do Direito do Trabalho insculpidos na Carta Maga de 1988.

Princípios constitucionais gerais aplicáveis ao direito do trabalho:

Artigo 1º da CF: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III – a dignidade do ser humano; (...) IV – os valores sociais do trabalho”.

Os instrumentos normativos que incidem sobre as relações de trabalho devem visar, sempre que pertinente, a prevalência dos valores sociais do trabalho.

E a dignidade do trabalhador, como ser humano, deve ter profunda ressonância na interpretação e aplicação das normas legais e das condições contratuais de trabalho.A condenação do trabalho forçado, objeto das Convenções nº 29 e 105 da OIT, por exemplo, faz sintonia com o estatuído nos incisos III e IV do artigo em comento.

Artigo 193 da CF: “A ordem social tem como base o princípio do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça social”

Observa-se por este enunciado, que a Constituição traz o trabalho como a base da ordem social e, através dele, poderá ser atingido o bem-estar e a justiça social.

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Artigo 170 da CF: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (...) III – função social da propriedade; (...) VIII – a busca do pleno emprego”Verifica-se que o artigo 170, ao relacionar os princípios gerais da atividade econômica, seguiu a orientação do estatuto básico anterior, aludindo à “valorização do trabalho humano” (caput); a “justiça social” (caput); a “função social da propriedade” (III) e a “busca do pleno emprego” (VIII)

Artigo 5º da CF: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos dessa Constituição (...)”.

O princípio da isonomia enunciado no art. 5º, I, da CF corresponde às Convenções nº 100 e 111 da OIT, que tratam, respectivamente, da igualdade de remuneração entre homens e mulheres e da discriminação de emprego e profissão.

Artigo 227 da CF: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

O princípio estatuído no artigo 227 da CF, segundo o qual o menor tem direito à proteção especial, se sintoniza com a Convenção nº 182 da OIT,

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que trata sobre a proibição das piores formas de trabalho infantil e ação imediata para sua eliminação.

Entre as piores formas de trabalho estão a escravidão e práticas análogas, como a venda e tráfico de crianças, a servidão por dívida e o trabalho forçado. Também se inclui aí a exploração sexual de crianças, o aliciamento de crianças pelo tráfico de entorpecentes ou qualquer trabalho que possa ser prejudicial à saúde ou ao desenvolvimento físico e moral das crianças ou, ainda, que ameace sua segurança.O princípio da boa-fé: é desejável que o empregado procure, de boa-fé, cumprir as obrigações pactuadas, visando ao melhor rendimento no trabalho, enquanto o empregador deve cumprir, por si ou pelos seus prepostos, com lealdade e boa-fé, as obrigações que lhe cabem.

Princípios específicos do direito do trabalho: Os princípios específicos do direito do trabalho podem ser aferidos, por indução, do conjunto de normas adotadas pela CF a respeito dos direitos individuais e coletivos do trabalho são eles:

Princípio da proteção do trabalhador. Tal princípio enuncia a intervenção básica do Estado nas relações de trabalho, visando a opor obstáculos à autonomia da vontade. Dele decorrem outros

a) irrenunciabilidade de direitos: ao trabalhador é vedado dispor sobre direitos a ele assegurados pela lei;

b) “in dubio pro operário”: aconselha o intérprete a escolher, entre duas ou mais interpretações viáveis, a mais favorável ao trabalhador, desde que não afronte a nítida manifestação do legislador, nem se trate de matéria probatória;

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c) condição mais benéfica: determina a prevalência das condições mais vantajosas para o trabalhador, ajustadas no contrato de trabalho ou resultantes do regulamento de empresa, ainda que vigore ou sobrevenha norma jurídica imperativa prescrevendo menor nível de proteção e que com esta não sejam elas incompatíveis;

d) norma mais favorável: aplica-se, em cada caso, a norma que for mais favorável ao trabalhador, independentemente de sua colocação na escala hierárquica das normas jurídicas;

e) primazia da realidade: a relação evidenciada pelos fatos define a verdadeira relação jurídica estipulada pelos contratantes, ainda que sob capa simulada não correspondente à realidade;

f) integralidade e intangibilidade do salário: visa proteger o salário dos descontos abusivos, garantir sua impenhorabilidade e assegurar-lhe posição privilegiada em caso de insolvência do empregador.

Além disso, os artigos 7º e 8º da Carta Magna, alusivos aos direitos fundamentais do trabalhador, referem alguns princípios de relevo:

a) o princípio da não discriminação que proíbe diferenças de critério de admissão, de exercício de funções e salário por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil (art. 7º, XXX), ou critério de admissão e de salário em razão de deficiência física (art. 7º, XXXI) e, bem assim que se distinga, na aplicação das normas gerais, entre os respectivos profssionais (art. 7º, XXXII).

b) o princípio da continuidade da relação de emprego, o qual, embora não seja, inflexível, posto que a Constituição de 1988, não consagrou a estabilidade absoluta do trabalhador no emprego, emana, inquestionavelmente, das normas sobre a indenização devida nas despedidas arbitrárias, independentemente do levantamento do FGTS

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(art. 7º, I) e do aviso prévio para denúncia do contrato de trabalho proporcional à antigüidade do empregado (art. 7º, XXI).

c) o princípio da liberdade sindical (art. 8º, caput). Entretanto, referida liberdade é relativa, pois os próprios incisos do art. 8º impõem a unicidade de representação sindical por categoria profissional ou econômica (II) e a tributação compulsória dos integrantes das correspondentes categorias.

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