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UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO MESTRADO CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO: DESENVOLVIMENTO OU RETROCESSO DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS SOCIAIS? NÁDIA AHMAD OMAR ALI Canoas, 2006.

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UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO

MESTRADO

CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO: DESENVOLVIMENTO OU RETROCESSO DOS DIREITOS

E GARANTIAS FUNDAMENTAIS SOCIAIS?

NÁDIA AHMAD OMAR ALI

Canoas, 2006.

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UNIVERSIDADE LUTERANA DO BRASIL PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO

MESTRADO

CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO: DESENVOLVIMENTO OU RETROCESSO DOS DIREITOS

E GARANTIAS FUNDAMENTAIS SOCIAIS?

NÁDIA AHMAD OMAR ALI

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Luterana do Brasil para obtenção do título de Mestre em Direito Orientador: Dr. Wilson Steinmetz

Canoas, 2006.

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Dedico, aos meus filhos Camila, João e

Alaian, companheiros de bravas batalhas,

pelo amor, carinho e estímulo que me

ofertaram, dedico-lhes essa conquista como

gratidão.

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Agradeço, sinceramente a ajuda prestimosa

de meu orientador, Dr. Wilson Steinmetz,

pela paciência, carinho e maestria com que

sempre me acolheu;

Agradeço a meus professores, que sempre

honraram a docência com suas aulas

inesquecíveis;

Agradeço a meus colegas pelo convívio,

apoio e estímulo.

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RESUMO

Investigaram-se as Convenções Coletivas de Trabalho, sua evolução histórica e legislativa, abordando aspectos relevantes que levam a uma reflexão sobre o papel destas convenções no Brasil contemporâneo, enfatizando seu impacto concreto para os interesses das classes trabalhadoras: avanço ou retrocesso dos direitos e garantias sociais. Faz menção ao papel dos direitos fundamentais como princípios norteadores, para a mantença de direitos e aceitação de novas condições de trabalho, bem como analisa a possibilidade de incorporação das cláusulas normativas aos contratos individuais de trabalho. Enfatiza, também, a autonomia privada coletiva como meio de um Estado Democrático de Direito desenvolver suas relações laborais, econômicas e pessoais. Para o desenvolvimento da pesquisa em tela, foi empregado o método dedutivo, que após exaustivo estudo doutrinário, legal e jurisprudencial, logrou alcançar algumas conclusões assertivas acerca da matéria proposta. Apesar de todo o histórico da evolução das leis trabalhistas demonstrarem um alicerce no princípio da proteção ao empregado, hodiernamente a tendência que se mostrou presente neste trabalho foi a flexibilização das leis trabalhistas. Flexibilização deve ser compreendida no sentido de equilíbrio das relações entre empregados e empregadores, com a participação ativa das partes interessadas, gerando normas a partir das convenções coletivas sem detrimento das normas anteriormente vigentes.

Palavras-chave: Convenção coletiva de trabalho - Relações de emprego - Direitos fundamentais sociais - Autonomia privada coletiva - Negociação coletiva - Flexibilização trabalhista.

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ABSTRACT

The current assignment is about Collective Working Conventions and their legislative and historic evolution. Relevant aspects are approached, leading to a reflection about the role of these conventions in modern Brazil and emphasizing their impact on work force’s interests: either progressive or retrogressive Social Guarantees and Rights.It mentions the role of Fundamental Rights as a principle to the Right maintenance and the acceptance of new work conditions as well. It also analyses the possibility of incorporation of normative clauses related to individual work contracts. There is an emphasis on the collective private autonomy as a way to enhance labor, economical and personal relation in a Democratic State.For screen research development, a deductive methodology was used, and after some legal and jurisprudential studies some assertive conclusions have been reached.Even though all the history of labor laws has shown principles of protection to employees, nowadays there is a tendency to a labor law flexibility.Flexibility may be understood as a balance between employers and employees relationship, including an active participation of all involved members, producing rules from collective conventions, never disregarding the previous ones. Key-words: Collective Conventions – Fundamental Rights – Collective Private Autonomy

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...................................................................................................................... 8 I CONTRATO COLETIVO DE TRABALHO.................................................................. 12 1 CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES .......................................................................... 12 2 CONCEITO....................................................................................................................... 15 2.1 TERMINOLOGIA........................................................................................................... 16 2.2 EVOLUÇÃO DO CONTRATO COLETIVO DE TRABALHO NO BRASIL................ 17 3 DISTINÇÃO ENTRE CONTRATO COLETIVO E CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO............................................................................................................... 19 4 PROBLEMATIZAÇÃO: INCORPORAÇÃO DAS CLÁUSULAS NORMATIVAS NOS CONTRATOS INDIVIDUAIS DE TRABALHO ................................................. 23 4.1 NATUREZA JURÍDICA DAS NORMAS COLETIVAS (CONVENÇÕES E ACORDOS COLETIVOS) .............................................................. 26 4.2 VALIDADE, VIGÊNCIA E EFICÁCIA DAS NORMAS COLETIVAS DE TRABALHO: UMA QUESTÃO DE APLICABILIDADE DAS MESMAS (ACORDOS COLETIVOS E CONVENÇÕES COLETIVAS DE TRABALHO) ........... 30 4.2.1 Validade ....................................................................................................................... 31 4.2.2 Vigência ....................................................................................................................... 33 4.2.3 Eficácia......................................................................................................................... 35 4.2.4 Aplicabilidade das normas coletivas .......................................................................... 36 4.3 INCORPORAÇÃO DAS CLÁUSULAS NO CONTRATO INDIVIDUAL (TEORIAS)...................................................................................................................... 40 II ULTRATIVIDADE DAS NORMAS COLETIVAS COMO MEIO DE POSTERGAR A VIGÊNCIA DAS NORMAS COLETIVAS FACE A NOVA NEGOCIAÇÃO COLETIVA.......................................................................................... 47 1 NOÇÕES GERAIS ........................................................................................................... 47 1.1 ALTERAÇÕES IN MELLIUS E IN PEJUS DAS CONVENÇÕES COLETIVAS E A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA................................................................... 48 2 FUNÇÃO DO ESTADO NAS RELAÇÕES PRIVADAS, SUPORTE PARA A DEFESA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS .............................................................. 51 2.1 RESPONSABILIDADE DO ESTADO ........................................................................... 57 3 IMPORTÂNCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES PRIVADAS FACE A CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO EM CONFRONTO COM A LEI ............................................................................................ 58

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4 FUNÇÃO, TUTELA E FORÇA JURÍDICA DOS PRECEITOS RELATIVOS AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS............................................................................... 61 5 AUTONOMIA PRIVADA INDIVIDUAL E AUTONOMIA PRIVADA COLETIVA: UMA SINGELA DISTINÇÃO.................................................................. 64 5.1 AUTONOMIA PRIVADA COMO FONTE DE DIREITO E O LIMITE CONSTITUCIONAL....................................................................................................... 67 5.1.1 Autonomia privada e autonomia da vontade ............................................................ 73 5.1.2 “Status” constitucional das convenções coletivas...................................................... 74 5.2 DESREGULAMENTAÇÃO OU FLEXIBILIZAÇÃO: FORMAS DE GARANTIR OU EXTINGUIR OS DIREITOS SOCIAIS? .................................................................. 78 5.3 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS COMO LIMITES ÀS CONVENÇÕES E ACORDOS COLETIVOS, UMA VEZ AUTORIZADOS PELA CONSTITUIÇÃO FEDERAL ......................................................................................... 85 6 PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO...................................................................................... 90 6.1 NORMAS COLETIVAS AQUÉM E ALÉM DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS ....... 91 6.2 NORMAS COLETIVAS NOS LIMITES DA INDISPONIBILIDADE RELATIVA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS ........................................................................... 95 6.3 NORMAS COLETIVAS NOS LIMITES DA INDISPONIBILIDADE ABSOLUTA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS ........................................................................... 97 6.4 AS CONVENÇÕES COLETIVAS COMO MEIO DE OPERACIONALIZAR E POTENCIALIZAR OS DIREITOS FUNDAMENTAIS ................................................. 98 CONCLUSÃO.................................................................................................................... 103 REFERÊNCIAS................................................................................................................. 106

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INTRODUÇÃO

Existem várias formas de composição dos conflitos trabalhistas na legislação

brasileira. Em primeiro lugar é interessante salientar que os conflitos podem ser

resolvidos a nível individual ou coletivo. Sendo que no individual as partes em litígio

podem compor a lide extrajudicialmente através de negociações, acordos ou outros

meios que as próprias partes elegerem, e também de forma processual, provocando o

Estado para que exerça o seu papel jurisdicional, decidindo “suprapartes” e impondo sua

decisão, uma vez que as partes envolvidas não conseguem, sozinhas, resolver seus

conflitos laborais.

Os conflitos trabalhistas também podem ser resolvidos a nível coletivo, daí a

necessidade de representantes para as categorias econômicas e profissionais, através de

seus respectivos sindicatos. É verdade que, em se tratando de acordos ou convenções

coletivas, a empresa poderá pactuar diretamente com os empregados ou representantes

de comissões de empregados, no caso de acordos e, no caso de convenções, ambos serão

representados por seus sindicatos respectivos. De forma diferente ocorre para os

dissídios coletivos, onde as partes legítimas devem estar representadas por seus

sindicatos respectivos, além de provocarem a prestação jurisdicional, conforme

disciplina a lei brasileira.

Os conflitos a nível coletivo podem ser resolvidos na forma autocompositiva ou

heterocompositiva. Na primeira forma de composição da lide os litigantes podem valer-

se de acordos coletivos ou convenções coletivas. Na segunda forma podem valer-se da

arbitragem ou dissídios coletivos. Em qualquer delas, visam encontrar um ponto de

equilíbrio entre os dois pólos, com interesses normalmente antagônicos.

Este trabalho de pesquisa pretende demonstrar a validade das normas coletivas

face aos direitos fundamentais, abordando ao menos dois aspectos enfrentados acerca

das convenções coletivas, que são: a incorporação das cláusulas normativas (normas

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coletivas) nos contratos individuais de trabalho; e o desenvolvimento ou retrocesso do

conteúdo normativo face aos direitos fundamentais.

Para tanto, foi necessário o estudo das diversas espécies de cláusulas oriundas de

uma negociação coletiva, além do posicionamento doutrinário, constitucional e

jurisprudencial dos nossos tribunais laborais.

É sabido que a Constituição Federal do Brasil, em seu artigo 114, outorga

poderes à criação de normas coletivas no âmbito particular das categorias, através das

negociações coletivas, e, após esgotadas as tratativas negociais, autoriza o uso da

arbitragem ou da instauração de dissídios coletivos quando inexitosas as tratativas

negociais. Em quaisquer dessas formas em que a doutrina as classifica em autônomas ou

heterônomas, as cláusulas acordadas têm força de lei, como disciplinam os artigos 611,

611 § 1º, da CLT e art. 114 § 2°, da Constituição Federal. Assim, na segunda hipótese, a

Constituição outorga poder legiferante aos Tribunais Regionais do Trabalho e ao

Tribunal Superior do Trabalho, dada sua competência jurisdicional, sempre que as

negociações coletivas resultem inexitosas e as partes, através de seus sindicados

instaurem dissídios coletivos. O Poder Judiciário possui atribuição normativa de acordo

com preceito constitucional, forte em seu artigo 114 § 2º da CF/88 antes da E.C. n. 45,

e após a mesma, no mesmo diploma, embasada no modelo corporativista italiano,

“Carta del Lavoro”de Mussolini, Lei italiana nº 563/26, art. 13 .

Pode parecer um absurdo, mas inúmeras vezes cogitou-se da possibilidade do

Poder Judiciário criar direitos em fase de primeiro grau, mais especificamente nas

sentenças proferidas pelas Varas do Trabalho, à semelhança do que ocorre nas

sentenças normativas, principalmente com relação aos dispositivos constitucionais de

eficácia limitada (ou reduzida), que carecem de legislação complementar. Poder-se-ia

perquirir acerca da responsabilidade do Estado, pela ausência de tutela aos seus

cidadãos, quando da demora da criação de Lei que resolva de imediato tantos problemas

emergentes, e, aparentemente, sem solução imediata. Reforça-se esta indagação, quando

é sabido que o Poder Executivo legisla por meio das medidas provisórias. Se o Poder

Executivo pode, por que não o Poder Judiciário com precedente nas sentenças

normativas?

É bem verdade que o que foi dito acima demonstra exatamente o oposto da

tendência do sistema jurídico brasileiro, pois o mesmo acentua-se progressivamente num

sistema pluralista e descentralizador, apesar de suas raízes fortes no sistema estatutário,

no qual assegura tutela mínima aos empregados.

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O sistema pluralista admite a inserção de vários outros tipos de ordenamentos

jurídicos, em especial, peculiar às convenções coletivas, a saber, a autonomia privada

coletiva, com respaldado num sistema democrático de direito. Através da República

Federativa do Brasil em sua expressão constitucional assegura a todos os cidadãos os

direitos fundamentais, que por muitas vezes se torna ineficaz, em sua tutela, por falta de

legislação complementar que assegure o exercício real de um direito fundamental,

oriundo, a exemplo de uma norma constitucional programática, ou de eficácia limitada

(ou reduzida).

Daí o porquê da necessidade das categorias, de um lado empregador e de outro

empregado, acordarem sobre novas condições de trabalho, que incorporarão (ou não) aos

contratos individuais de trabalho, resolvendo bilateralmente questões de ordem social,

econômica e laboral de uma forma mais eqüitativa.

Esses direitos criados por meio do processo negocial estão diretamente

assegurando o exercício de direitos fundamentais de segunda geração, por estarem

relacionados à matéria de ordem salarial, e portanto, substancial para as pessoas.

Desta forma se estaria afastando a intervenção do Estado, permitindo às partes

diretamente uma composição mais satisfatória e particularizada para cada empregador, e

seus respectivos empregados, ou integrantes de uma determinada categoria, devidamente

autorizados pelo Estado (seu papel democrático).

Observa-se ainda que o nosso sistema legislativo teve por base o sistema romano-

germânico, que na antigüidade demonstrou a forma “sui generis” de aplicar o direito

através da análise dos casos concretos, proferindo muitas sentenças constitutivas do

próprio direito, o que foi largamente estudado nas Institutas Justinianéias, no período

romano do dominato (27 aC - 565).

Diferentemente, aplica-se esta matéria quando fala-se em países que adotam o

sistema anglo-saxão, pois nestes, a partir das decisões, o direito passa a ser largamente

aplicado a casos semelhantes. Assim, possuem as Cortes poder originário para orientar a

solução do conflito.

Este trabalho analisa a evolução do Direito Coletivo do Trabalho, bem como o

papel dos direitos fundamentais no desenvolvimento dessas normas. Seja face ao poder

negocial e constitutivo do direito, seja pelo papel norteador dos direitos fundamentais na

criação das normas coletivas, e posteriormente demonstrar posicionamento doutrinário e

jurisprudencial acerca da incorporação ou não dessas cláusulas aos contratos individuais

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de trabalho, bem como alterações in mellius e in pejus, tendo como marco a Constituição

Federal de 1988.

Demonstra e analisa os conflitos existentes entre autonomia privada coletiva e

direitos fundamentais, bem como a taxinomia da autonomia privada coletiva do ponto de

vista constitucional.

A importância da autonomia privada coletiva como fonte normativa frente a um

sistema predominantemente estatutário, democrático e capitalista.

Finalmente, a tendência evolutiva das normas coletivas no século XXI.

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I CONTRATO COLETIVO DE TRABALHO

1 CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

Este capítulo destina-se inicialmente ao conceito de contrato coletivo,

terminologia utilizada no Brasil, distinção entre contrato e convenção coletiva, formas

de solução dos conflitos coletivos, possibilidade de incorporação das cláusulas

normativas nos contratos individuais, natureza jurídica de tais normas, entre outros

pontos afins.

O Direito Coletivo do trabalho se presta para a criação de novas condições de

trabalho que se agregam aos contratos individuais do trabalho. As formas de solução dos

conflitos coletivos de trabalho dividem-se em: formas autônomas e formas heterônomas.

Na hipótese das formas autônomas, encontram-se as convenções e os acordos

coletivos de trabalho, que segundo a doutrina1 possuem cláusulas de natureza contratual

e obrigacional2, ambas com força normativa, devidamente autorizadas pelo Estado.

Posiciona-se a jurisprudência no sentido de que as cláusulas contratuais vigem no prazo

assinado (E. 277 do TST). Entretanto, as cláusulas de natureza obrigacionais, no dizer

de Sérgio Pinto Martins, incorporariam aos contratos individuais de trabalho.

Há que se observar que o Estado abre espaço para a autonomia privada coletiva

criar novas condições de trabalho, fazendo as vezes da lei, considerando-se que o Poder

Legislativo não consegue acompanhar a evolução da sociedade. Salienta-se para tanto,

no âmbito trabalhista, as mudanças decorrentes da economia, robótica, globalização,

entre outros, onde freqüentemente há substituição do homem pela máquina, gerando

desemprego em índices altíssimos.

Este contexto coloca em risco o direito dos trabalhadores ao emprego e a

garantirem a sua subsistência, além dos direitos fundamentais assegurados pela Carta

Magna, que devem ser exercitados para assegurar-se um Estado Democrático de Direito.

1 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2004. p. 159.

Posiciona-se na mesma orientação MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 834.

2 As cláusulas obrigacionais, também denominadas por RUSSOMANO contratuais, constituem, segundo referido autor, “o objeto secundário da negociação, mesmo que, eventualmente, adquiram notória relevância”. (RUSSOMANO, Mozart Victor. Princípios gerais de direito sindical. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000. p. 153).

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Há que se considerar outro aspecto relevante para a evolução dos direitos

fundamentais e principalmente para seu exercício, evitando que figurem apenas no

papel, que é a mudança do papel sindical no Brasil. No modelo anterior à Carta Magna

de 1988, tinha-se um modelo de sindicato que atendia à vontade do Estado exercendo a

longa manus, onde o Estado regia os sindicatos, manipulando-os para obtenção de suas

metas e políticas governamentais à semelhança do modelo fascista italiano de

Mussoline.

Para a criação de uma entidade sindical, era necessário que a mesma fundasse

uma associação profissional, para depois transformá-la em sindicato, com a autorização

do Estado, através da famosa carta de investidura sindical, outorgada pelo Ministério do

Trabalho. Sem isso, as associações profissionais não eram consideradas entidades

sindicais e tampouco poderiam representar os interesses da categoria.

O constituinte, em 1988, resolveu alterar este modelo, afastando o Estado do

processo de reconhecimento das entidades sindicais, proibindo a intervenção estatal para

a criação, organização e funcionamento das entidades sindicais, concedendo-lhes

autonomia privada coletiva para a criação de novas condições de trabalho, que

atendessem as reais necessidades das categorias profissionais, observado o equilíbrio,

expresso nas possibilidades das categorias econômicas.

Assim, o Estado abdica de seu papel legiferante, reservando-se ao controle das

condições mínimas, asseguradas constitucionalmente, a todos os trabalhadores.

Observam-se no mínimo dois aspectos positivos: primeiro, que os direitos fundamentais

básicos estão assegurados pelo Estado; segundo, que as negociações coletivas

proporcionam condições para a regulamentação de normas programáticas ou normas de

eficácia limitada (ou reduzida)3, que se assim não fosse, não passariam de simples

escrituras no papel.

Agora, verificam-se os aspectos negativos: primeiro, até mesmo os direitos

fundamentais básicos, assegurados pelo Estado, podem sofrer flexibilizações, sempre

que o texto constitucional estabelece uma regra, e em seguida uma exceção, por

exemplo: artigo 7°, inciso VI, da CF (irredutibilidade salarial, salvo acordo ou

convenção coletiva); artigo 7°, inciso XIV, da CF (jornada de seis horas para o trabalho

realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva). Observa-

se que aos poucos o Estado vem afastando o seu papel normativo tutelar, fragilizando,

3 SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p.

103-134.

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desta forma, os direitos fundamentais dos trabalhadores. Segundo: delega competência

para os particulares estabelecerem regras, exatamente para equilibrar estas lacunas,

porém impõe prazos de vigência de tais normas, não reconhecendo a lei, em sua

plenitude, a incorporação das mesmas aos contratos individuais de trabalho, salvo na

hipótese da nova redação dada ao artigo 114, § 2°, inserida pela E. C. n° 45, e orientação

jurisprudencial n° 41, da SDI, do TST, recentemente, pronunciadas pelo Egrégio

Tribunal Superior do Trabalho4.

Acertadas algumas arestas, poder-se-ia dizer que o Estado vem afastando aos

poucos a sua ingerência na elaboração das normas trabalhistas, concedendo aos

particulares força para tanto, concretizando de certa forma, os ideais de um Estado

Democrático de Direito.

Na hipótese das formas heterônomas, encontram-se a arbitragem e a prestação

jurisdicional5. No Brasil a arbitragem é facultativa. Por isso, quando as partes não obtêm

êxito na negociação coletiva podem instaurar dissídios coletivos. Há quem defenda que

o Poder Normativo dos Tribunais Laborais reflete resquício do poder fascista do Estado

nas relações privadas, razão pela qual existe forte apelo para a extinção do poder

normativo dos tribunais trabalhistas.

Nesse diapasão, estuda-se a relevância da E. C. N° 45, em especial no artigo 114,

§ 2°, da CF, pois com a nova redação, o que se entende é que enquanto as partes não

acordam ou conveniam novas condições de trabalho, em decorrência da expiração do

prazo de vigência de tais instrumentos normativos, vigem as cláusulas anteriores.

Numa nova orientação, a Constituição assegura a vigência das cláusulas

normativas anteriores, enquanto a categoria não resolve o conflito coletivo, afastando

4 OJ n° 41, SDI do TST: “Preenchidos todos os pressupostos para a aquisição da estabilidade decorrente de

acidente ou doença profissional, ainda durante a vigência do instrumento normativo, goza o empregado de estabilidade mesmo após o término da vigência deste.” Observam Jouberto de Quadros Cavalcante e Francisco Ferreira Jorge Neto,“a matéria, como se visualiza, é polêmica. Entendemos, em respeito à autonomia privada coletiva, que a integração é pelo prazo do instrumento, não interagindo de forma definitiva com os contratos individuais, exceto quando for o caso de vantagem individualmente adquirida (como é o caso da estabilidade pela norma coletiva). Talvez fosse melhor que a matéria fosse legislada, dirimindo-se as dúvidas doutrinárias e jurisprudenciais.” CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa; JORGE NETO, Francisco Ferreira. Manual de direito do trabalho. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004. p. 1578.

5 Há quem arrole como formas heterônomas: a arbitragem, a jurisdição, a conciliação e a mediação. Vide comentários de Delgado, nota de roda-pé n° 197 e sua abordagem sobre o tema: “Há autores que consideram a conciliação e a mediação meios autocompositivos, reservando a heterocomposição apenas a jurisdição e a arbitragem. Afinal nas duas primeiras figuras não se entregaria ao terceiro o poder d e decidir o litígio, ainda que sendo inegável sua participação na dinâmica compositiva.” (DELGADO, Mauricio Godinho. Direito coletivo do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2003. p. 205).

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dos tribunais, competência funcional para legislar através de suas sentenças normativas,

quando se tratar de matéria negociável.

2 CONCEITO

Para conceituar contrato coletivo de trabalho, mister referir que a expressão foi

inserida em nosso ordenamento jurídico com a Carta Magna de 1937, mais

especificamente no artigo 137, a e b. Ao se aprovar a CLT, com o Decreto-lei n°

5.452/1943, foi mantido o nome contrato coletivo em seu artigo 611. “Entendia-se por

contrato coletivo de trabalho o convênio de caráter normativo em que dois ou mais

sindicatos representantes das categorias econômicas e profissionais estabeleciam

condições para reger as relações individuais de trabalho, no âmbito de suas

representações.”6 Nesta época, o conteúdo dos contratos coletivos de trabalho obrigava

apenas os associados do sindicato, podendo ser estendido a toda a categoria por ato do

Ministério do Trabalho.

Amauri Mascaro Nascimento define contrato coletivo de trabalho dizendo:“é um

instrumento normativo negociado. Porém, mais amplo. É negociado pelas cúpulas

sindicais e empresariais, as centrais, as confederações, as federações etc.”7

Sérgio Pinto Martins faz uma referência à Recomendação da OIT, Organização

Internacional do Trabalho de nº 91, de 1951, afirmando que a mesma define os contratos

coletivos como:

Todo o acordo escrito relativo às condições de trabalho ou emprego, celebrado entre um empregador, um grupo de empregadores ou uma ou várias organizações de empregadores, por um lado, e, por outro, uma ou várias organizações representativas de trabalhadores ou, na falta delas, por representantes dos trabalhadores interessados, devidamente eleitos e autorizados por ele, de acordo com a legislação do respectivo país.8

6 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p.789. 7 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito do trabalho. 27. ed. São Paulo: LTr, 2001. p. 552. 8 MARTINS, op. cit., p. 678.

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Conforme depreende-se da leitura do artigo 611, com redação originária dada

pelo Decreto-lei 5.452/43, o texto legal refere-se ao contrato coletivo como convênio.9

Dito convênio só poderia ser celebrado entre sindicatos.

Como observa Carlos Alberto Gomes Chiarelli,

o que se evidencia, num exame final, é que o contrato coletivo, malgrado o princípio de sua unidade, apresenta-se fragmentado interiormente, detendo, na área negocial, os efeitos de natureza obrigacional [...] Os efeitos de natureza normativa, no entanto, [...] atestam um pressionar do interesse coletivo sobre o particular [...].10

2.1 TERMINOLOGIA

Para Orlando Gomes, a terminologia adotada para esta figura varia de acordo com

os ordenamentos jurídicos. Convenção Coletiva de Trabalho é a denominação mais

aceita na França, Bélgica e Luxemburgo. Contrato Coletivo, na Itália, onde outras

denominações foram propostas, como Concordato di Tarifa (Messina), Regolamento

Corporativo (Costamagna), Trattato intersindicale e outras. Na Alemanha a

denominação clássica é o Tarifvertrag, contrato de salários, adotado, também, nos países

de língua germânica. Uma espécie é o chamado Betriebsvereibarung, acordo de

estabelecimento, estipulado entre o empresário e o pessoal da empresa. Nos países

anglo-saxônicos, predomina a Expressão collective bargaining, pela primeira vez usada

em 1891, por Sydney Webb.

Na Espanha franquista e Portugal salazarista, pelas características políticas desses

países, não era praticada a convenção coletiva, substituída que estava pelas

regulamentações oficiais; entretanto, lei recente na Espanha, regulando as convenções

coletivas, sugeriu a um autor a denominação de Contrato Coletivo Intra-Sindical

(Botija). 11

9 GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Élson. Curso de direito do trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.

576. O autor destaca que o convênio só poderia ser celebrado entre instituições sindicais, com fundamento no artigo 138, da Constituição de 1937.

10 CHIARELLI, Carlos Alberto Gomes. Direito coletivo do trabalho. São Paulo: LTR, 1990. v. 2, p. 139. 11 GOMES, op. cit., p. 587-88.

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17

No Brasil, ficamos entre as duas expressões: contrato coletivo de trabalho e

convenção coletiva de trabalho. A primeira expressão inserida na Constituição de 1937 e

a segunda expressão, inserida com a Constituição de 1946 retomando a Constituição de

1934.

2.2 EVOLUÇÃO DO CONTRATO COLETIVO DE TRABALHO NO BRASIL

Em meados de 1932, surgiu no Brasil, pela primeira vez, a denominação

“convenção coletiva de trabalho”, com o Decreto n° 21.761, de 23/08/32.

As convenções coletivas de trabalho foram reconhecidas originariamente pela

Constituição de 1934, em seu artigo 121, I, § 1°, “j”12. Tinham como finalidade

estabelecer condições mínimas de trabalho para os contratos individuais de trabalho.

O contrato coletivo de trabalho foi inserido no ordenamento jurídico brasileiro

com a Constituição de 1937, sob a denominação de contrato coletivo de trabalho, e no

artigo 611, da CLT denominado por convênio coletivo de trabalho.

Observa-se que em 1937 os contratos coletivos de trabalho, pactuados entre

associações devidamente reconhecidas pelo Estado, obrigavam a todos os seus

associados, conforme previsão no artigo 138, da Constituição de 1937, ao contrário da

Carta Del Lavoro, referida por Sérgio Pinto Martins, que já previa que os contratos

coletivos de trabalho tinham aplicação a toda a categoria.13

Referidos contratos coletivos de trabalho poderiam ser estendidos a todos os

membros das respectivas categorias por ato do Ministério do Trabalho, Indústria e

Comércio, conforme artigo 612, da CLT, com redação daquela época, ou seja, do

governo de Getúlio Vargas, inspirado no regime fascista italiano, de cunho

eminentemente corporativista.

A Constituição de 1946 repete a Constituição de 1934, utilizando novamente a

expressão convenções coletivas de trabalho, conforme artigo 157, XIII. Com o Decreto

n° 229, de 28/02/67 os artigos 611 a 625, da CLT ganham nova redação, eliminando a

expressão contrato coletivo. Juntamente com a adoção da expressão convenção coletiva

de trabalho, o Decreto n° 229/67 também cria os chamados acordos coletivos de

12 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 809. 13 Ibidem, p. 789.

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trabalho, distinguindo entre ambos, principalmente os sujeitos convenentes ou

acordantes. As convenções coletivas de trabalho referem-se aos acordos de caráter

normativo celebrados entre sindicatos de empregados e empregadores a respeito de

novas condições de trabalho, ao passo que os acordos coletivos são os acordos de caráter

normativo celebrados entre o sindicato da categoria profissional e uma ou mais

empresas, a respeito de novas condições de trabalho.14

A Constituição de 1967, e o artigo 165, XIV, da EC n° 1, de 1969, mantêm a

expressão convenção coletiva de trabalho. Porém, em fevereiro de 1988, a CUT

apresenta à FIESP uma pauta de reivindicações, estabelecendo novas regras a respeito

da negociação, com a possibilidade de ajustes por níveis, tanto no setor econômico,

regional ou da instalação fabril, assim como as formas de composição dos conflitos

coletivos de trabalho, prazo de vigência, conteúdo e renúncia bilateral do poder

normativo da Justiça do Trabalho. A essas regras deu-se o nome de contrato coletivo de

trabalho.15

A Constituição Federal vigente, em seu artigo 7°, inciso XXVI, reconheceu as

convenções e os acordos coletivos de trabalho.

Em que pese existir oscilações no emprego das expressões ‘contrato coletivo de

trabalho´ e ‘convenção coletiva de trabalho´, ambas indiscutivelmente pertencem ao

ramo do direito coletivo do trabalho. Para Amauri Mascaro Nascimento direito coletivo

“é o ramo do direito do trabalho que estuda os sindicatos, as demais organizações

sindicais, a representação dos trabalhadores nas empresas, os conflitos coletivos de

trabalho e suas formas de solução, inclusive, as convenções coletivas e a greve”.16

Conceituando ainda direito coletivo do trabalho, leciona Octávio Bueno Magano:

“Direito coletivo é a parte do direito do trabalho que trata da organização sindical, da

negociação e da convenção coletiva de trabalho, dos conflitos coletivos do trabalho e

dos mecanismos de solução dos mesmos conflitos”.17

Constitucionalmente o instituto foi reconhecido nas constituições de 1934 (art.

121, I, §° 1°, “j”); de 1937 (art. 137); de 1946 (art. 157, XIII); de 1967 (art. 165, XIV);

de 1969 (art. 166) e de 1988 (art. 7°, inciso XXVI).18

14 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito do trabalho. 27. ed. São Paulo: LTr, 2001. p. 550-

51. 15 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 790. 16 NASCIMENTO, op. cit., p. 58. 17 MAGANO, Octávio Bueno. Manual de direito do trabalho: direito coletivo do trabalho. São Paulo: LTr,

1993. p. 11. 18 TEIXEIRA JUNIOR, João Régis. Convenção coletiva de trabalho. São Paulo: LTr, 1994. p. 31.

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3 DISTINÇÃO ENTRE CONTRATO COLETIVO E CONVENÇÃO COLETIVA

DE TRABALHO

Segundo Sérgio Pinto Martins, “contrato coletivo de trabalho estaria ligado aos

mecanismos de autocomposição, que prevaleceriam sobre os de tutela, na solução dos

conflitos coletivos de trabalho, ou que seria uma forma de contratação a nível nacional,

que iria passando a níveis inferiores visando à solução das controvérsias coletivas de

trabalho”.19

O Ministro do Tribunal Superior do Trabalho Gelson Azevedo, em participação

realizada no livro do juiz Georgenor de Sousa Franco Filho20, tece algumas

considerações acerca da matéria. Considera que países mais adiantados ou de nível

socioeconômico semelhante ao do Brasil adotam os dois sistemas legiferantes

predominantes que são: I- O Sistema Estatutário, oriundo da lei; II- O Sistema Negocial,

oriundo da manifestação de vontade individual ou coletiva, para disciplinar as relações

de trabalho.

Em nosso país vige o sistema estatutário (lei), onde a maioria dos direitos e

obrigações que se estabelecem entre empregados e empregadores são diretamente

determinados por lei, deixando em segundo plano a eficácia da autonomia da vontade

coletiva, com espaço menor, impondo sua limitação.21

A expressão “contrato coletivo” retrata um aspecto civilista ao falar em contrato,

reportando-se à expressão utilizada pela Constituição de 1937. Hodiernamente, entende-

se que o contrato coletivo de trabalho vai além do conteúdo contratual, abrangendo

também o caráter normativo e obrigacional, referindo-se nesse especial, Sérgio Pinto

Martins cita as convenções e os acordos coletivos.22 Muito embora, o que se deve

observar, segundo o Ministro Gelson de Azevedo, é a diferenciação existente entre as

duas figuras, os contratos e as convenções, a partir da análise desenvolvida pelo mesmo,

19 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 653. 20 FRANCO FILHO, Georgenor de Sousa. Curso de direito coletivo do trabalho: estudos em homenagem ao

Ministro Orlando Teixeira da Costa. São Paulo: LTr, 1998. p. 322 et seq. 21 “A limitação, de regra, é tão grande que, na prática, pouco resta à liberdade de manifestação, seja individual,

seja coletiva. Nesse sistema estatutário, quando as relações trabalhistas se estremecem, são levadas, de regra, ao poder judiciário para sua composição; (II) e o sistema negocial, em que a maioria dos direitos e obrigações trabalhistas é estabelecida pela vontade dos contratantes, empregados e empregadores. Ou seja, cientes esses de seus reais problemas, de suas necessidades e dificuldades para minorá-las ou supera-las, estabelecem, por manifestação de vontade, as regras que passam a reger seu relacionamento, sem prejuízo, por certo, da existência de uma regulamentação legal oficial mínima.” (Ibidem, p. 322).

22 MARTINS, op. cit., p. 791.

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sob dois enfoques: o primeiro de natureza cultural-ideológica; e o segundo de natureza

técnico-instrumental.

Afirma o Ministro Gelson Azevedo:

Relativamente à primeira, se remontarmos a história do sindicalismo no Brasil, vamo-nos defrontar com um modelo que foi copiado do sistema facista italiano. Lá, como aqui, o que se pretendeu com certo modelo de estruturação e organização sindicais, retirando-lhes a autonomia, foi criar sindicatos que pudessem servir ou não atrapalhar os propósitos ideológicos do Estado.

Em que medida, do ponto de vista prático, isto foi estabelecido? Vamos relembrar: para criar-se um sindicato, até 04.10.88, era preciso, antes, criar-se uma associação profissional, preencher uma série de requisitos e, apresentando inúmeros documentos, requerer ao Ministério do Trabalho a outorga da Carta Sindical. A concessão desta, por sua vez, dependia de uma autoridade inserida em estrutura executiva própria, com a faculdade de protela-la ou mesmo indeferí-la, segundo critérios nem sempre objetivos. [...] Já a análise técnico-instrumental permite visualizar, organizacionalmente, um sistema de representação bilateral, por categorias profissionais e econômicas ou por profissões, restrita a sindicato e unívoca no mesmo âmbito geográfico e, instrumentalmente, a expressão do resultado da negociação coletiva frutífera limitada ao acordo e à convenção coletiva. [...] Embora formalmente parecido com o acordo coletivo e com a convenção coletiva, o contrato coletivo de trabalho deles se diferencia substancialmente. [...] No aspecto subjetivo, acordo e convenção estão limitados pela representação por sindicato, federação ou confederação, sucessivamente, observada sempre a bilateralidade referida. No contrato coletivo, os sujeitos acordantes poderiam extrapolar o estrito limite da representação sindical por categorias ou por profissões, abrindo espaço, exemplificativamente, para entidades tais como centrais sindicais ou outras que viessem a ser criadas ou, ainda, para acordos intercategoriais profissionais e econômicos diferentes, mas com interesses inter-relacionados. 23

O contrato coletivo de trabalho poderia ser considerado de âmbito nacional ou de

natureza interprofissional. Já a convenção coletiva de trabalho forma-se através da

relação entre sindicatos que representam respectivamente os integrantes de uma

determinada categoria na esfera profissional e econômica.

O contrato coletivo nos moldes da Constituição de 1937 era aplicado

especialmente aos associados do sindicato. A convenção coletiva, segundo legislação em

vigor, é aplicada a todos os integrantes da categoria, desde que atinja o quorum mínimo

para sua aplicabilidade e seja deliberado em Assembléia Geral. Razão pela qual a CLT a

define como o acordo de caráter normativo, celebrado entre sindicatos representativos

de categorias econômicas e profissionais, no âmbito das respectivas representações.

23 FRANCO FILHO, Georgenor de Sousa. Curso de direito coletivo do trabalho: estudos em homenagem ao

Ministro Orlando Teixeira da Costa. São Paulo: LTr, 1998. p. 323-24.

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21

Faz-se necessário referir-se aos acordos coletivos de trabalho, como sendo esta

uma modalidade que permite ajustes mais estreitos entre sindicatos profissionais e uma

ou mais empresas. Neste caso, a norma obriga apenas as partes acordantes, pacta sunt

servanda, respeitando de certa forma o estado democrático de direito, e devolvendo aos

acordantes o respeito ao Princípio da Igualdade, num setor de tantas desigualdades

econômicas.

O legislador foi sábio ao criar os acordos coletivos de trabalho, pois desta forma

não estaria obrigando todas as empresas a cumprirem as mesmas regras, haja visto a

desigualdade econômica entre os empregadores. Assim, empregadores interessados

ganharam a liberdade de pactuar diretamente com seus empregados, representados pelo

sindicato, interesses “sui generis”, observada a regra mais favorável ao empregado, uma

vez estabelecida em convenção coletiva, mesmo que posteriormente, conforme previsto

no artigo 620, da CLT.

Apesar da Constituição Federal de 1967 alterar a nomenclatura referente ao

resultado das negociações coletivas, para convenção coletiva e acordo coletivo, observa-

se que remanesce nos textos legais a expressão “contrato coletivo de trabalho”, como

por exemplo, no artigo 444, da CLT, referido em nota de roda-pé n° 24. Outros

exemplos, podem ainda ser citados, tais como: a Lei n° 8.630, de 25/02/1993, que regula

as atividades nos portos, também passou a se referir ao contrato coletivo nos artigos: 18,

parágrafo único, 19, I, 22,28,49 e 57, § 1°. O inciso IV do artigo 83 da Lei

Complementar n° 75/93, que estabelece a competência do Ministério Público do

Trabalho, para propor ação que declare a nulidade de cláusula de contrato, convenção e

acordo coletivo.

Independentemente da nomenclatura a ser adotada, a questão a ser desenvolvida

em outro item está relacionada à validade, vigência e eficácia de tais normas coletivas

face ao Sistema estatutário, dominante em nosso país. Muito embora o que se percebe

com a globalização, é que o Estado vem dando espaço às relações privadas, mesmo que

coletivas, permitindo às partes, diretamente, criar novas condições de trabalho,

reservando-se ao papel eminentemente tutelar. Para tanto, observa-se a força dos

dispositivos legais contidos nos artigos 9° e 444, da CLT.24

24 BRASIL. “Artigo 9°: Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir

ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente consolidação. E artigo 444: As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes.”

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22

Nesse diapasão, Orlando Gomes preleciona,

o princípio da liberdade contratual na estipulação do conteúdo da convenção coletiva está limitado pela regra prevista nos artigos 9° e 444 da CLT (disposições contrárias às disposições de proteção ao trabalho), pelas disposições contrárias à ordem pública, à moral (Código Civil) e à liberdade sindical. Seria, portanto inadmissível uma cláusula convencional coletiva do tipo da closed shop, union shop ou de exclusão de ingresso de empregados.25

Traço importantíssimo foi dado pela própria CLT, ao definir tais acordos

coletivos, como sendo de caráter normativo. Assim, evidenciam a natureza normativa de

tal instituto, mesmo tratando-se de contratos que expressem a autonomia da vontade

coletiva,26 sendo a autonomia privada um princípio fundamental do direito privado, bem

como do direito civil.

Relevante destacar ainda que o contrato coletivo de trabalho não se encontra

conceituado em nossa legislação, tratando-se de um instrumento normativo negociado,

porém mais amplo. É negociado pelas cúpulas sindicais e empresariais, as centrais, as

confederações, as federações etc. Nesse ponto, não se confunde com a convenção

coletiva e o acordo coletivo, que são instrumentos normativos das bases sindicais, e não

das cúpulas. Assim, afirma Amauri Mascaro Nascimento, ”desse modo a situação legal

dessa figura está indefinida. Diante desse quadro, no plano geral, o contrato coletivo de

trabalho é um corpo sem rosto, enquanto o Congresso Nacional não enfrentar a fundo a

questão”.27

Considerando-se que as normas coletivas devam ser criadas a partir das entidades

sindicais, e aplicadas no âmbito de suas representações, o que prevalece do ponto de

vista negocial são os acordos coletivos e as convenções coletivas disciplinados pela CLT

e assegurados constitucionalmente, conforme artigo 7°, inciso XXVI. Pelo menos

enquanto prevalecer o Princípio da Unicidade Sindical e for atribuída à entidade sindical

a legitimidade para representar os interesses coletivos ou individuais da categoria,

25 GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Élson. Curso de direito do trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.

585-86. 26 “Na verdade, o contrato coletivo não vai ter um conteúdo estritamente contratual, mas normativo e

obrigacional , (grifo nosso), assim como ocorre com o acordo e a convenção coletiva, em certo período, a respeito de condições de trabalho” (MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 791).

27 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito do trabalho. 27. ed. São Paulo: LTr, 2001. p. 552.

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inclusive em questões judiciais ou administrativas, conforme artigo 8°, inciso III, da

Constituição Federal vigente.28

As palavras firmes de Mauricio Godinho Delgado demonstram a não

institucionalização do contrato coletivo de trabalho, na negociação coletiva trabalhista.29

Godinho, ainda, apresenta algumas dubiedades decorrentes da utilização da

expressão contrato coletivo de trabalho, como a seguir transcreve-se:

Na verdade, a denominação contrato coletivo de trabalho tem se mostrado algo equívoca na história do Direito brasileiro. A CLT já utilizou a expressão, antes da reforma de 1967, para designar o diploma negocial coletivo que tipificava, correspondendo ao que hoje se chama convenção coletiva do trabalho (artigos 611 e seguintes da CLT, regulando pacto entre sindicatos econômicos e profissionais). Pelo Dec.-lei n° 229, de 1967, abandonou-se a denominação contrato coletivo.

Passou-se, então, a diferenciar em dois os diplomas da negociação coletiva: a convenção coletiva de trabalho (que substituía o antigo contrato coletivo) e o recém-criado acordo coletivo de trabalho.

A expressão ‘contrato coletivo de trabalho também já foi utilizada na doutrina para designar certa modalidade de contrato componente do Direito Individual do Trabalho´- o contrato plúrimo (como o contrato de equipe, por exemplo). [...] Em conseqüência, deve-se reservar a expressão contrato coletivo de trabalho como designativo de figura do Direito Coletivo do Trabalho, situada, do ponto de vista doutrinário, ao lado das duas congêneres tipificadas na CLT, convenção e acordo coletivo de trabalho.30

Por isso, a partir de agora, o estudo se direciona às normas coletivas de trabalho,

de forma mais objetiva aos acordos coletivos e às convenções coletivas.

4 PROBLEMATIZAÇÃO: INCORPORAÇÃO DAS CLÁUSULAS NORMATIVAS

NOS CONTRATOS INDIVIDUAIS DE TRABALHO

A problematização, que esta dissertação aborda, está vinculada à incorporação

das cláusulas de acordos ou convenções coletivas nos contratos individuais de trabalho,

28 GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Élson. Curso de direito do trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.

515. “Unicidade Sindical significa o reconhecimento pelo Estado, ou pela categoria profissional contraposta, de apenas um sindicato, como representante de toda uma profissão.”

29 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2004. p. 1387. “O contrato coletivo de trabalho é, no Brasil, ainda hoje, figura não institucionalizada na negociação coletiva trabalhista, em contraponto às duas figuras tradicionais existentes, que foram objeto de estudo nos itens III e IV, anteriores (Acordos e Convenções Coletivas). A lei não a tipificou e regulou, nem os seres coletivos trabalhistas tiveram interesse ou força organizativa para implementar, costumeiramente, sua presença no âmbito social. Não tem tido, por isso, aplicação prática na dinâmica justrabalhista do país”.

30 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2004. p. 1387-388.

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vistas como fontes normativas formais autônomas, reconhecidas pela Constituição

Federal vigente, muito embora haja entendimento de que suas cláusulas vigem no prazo

assinado, conforme Súmula n° 277 do TST.

Referido entendimento encontra-se prejudicado pela nova redação dada ao artigo

114 § 2°, da Constituição Federal, face à Emenda Constitucional n° 45, mesmo que

referindo-se unicamente às sentenças normativas.

O artigo 114, § 2°, da CF dispõe que “a Justiça do Trabalho, ao decidir o conflito,

respeitará as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as

convencionadas anteriormente”.31

No Direito Coletivo do Trabalho, soluciona-se os conflitos coletivos a partir da

negociação coletiva, na qual as categorias, através de seus respectivos sindicatos,

deverão comparecer, para a realização de Assembléia Geral (artigo 612, da CLT).

Os sindicatos só poderão celebrar convenções ou acordos coletivos de trabalho

por deliberação em Assembléia Geral especialmente convocada para esse fim consoante

o disposto nos respectivos Estatutos, dependendo a validade da mesma do

comparecimento e votação. O quorum mínimo está previsto em lei, para deliberação de

acordos ou convenções coletivas.

A distinção entre ambas refere-se, entre outros elementos, aos sujeitos integrantes

da negociação e a extensão da aplicação ou abrangência da norma coletiva.

Os acordos coletivos são celebrados entre os sindicatos representativos das

categorias profissionais e uma ou mais empresas da correspondente categoria

econômica, que estipulam condições de trabalho, aplicáveis no âmbito da empresa ou

das empresas acordantes às respectivas relações de trabalho.

As convenções coletivas de trabalho são celebradas entre dois ou mais sindicatos

representativos de categorias econômicas e profissionais que estipulem condições de

trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais de

trabalho.

31 BRASIL. “O § 2° do artigo 114 da Constituição teve nova redação determinada pela Emenda Constitucional

n° 45/04. A Justiça do Trabalho pode decidir o dissídio coletivo, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente. Assim, as disposições convencionadas anteriormente em convenções ou acordos coletivos passam a integrar o contrato de trabalho e não podem ser modificadas nos dissídios coletivos. Haverá, contudo, a possibilidade de redução ou supressão em posterior acordo, convenção ou contrato coletivo de trabalho, mas não por dissídio coletivo. O citado dispositivo vem confirmar, analisando-o a contrario sensu, o que já era previsto na Súmula 277 do TST” (MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 818).

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Assim, os acordos coletivos alcançam apenas as empresas acordantes, enquanto

que as convenções coletivas se estendem a todos os integrantes da categoria, observadas

as respectivas representações.32

Os acordos e as convenções coletivas são formas autônomas de solução dos

conflitos coletivos. Não havendo êxito na negociação coletiva, a autocomposição não

será possível. Assim, a Constituição Federal, em seu artigo 114, § 2°, faculta às partes,

quando inexitosa a conciliação, eleger a arbitragem ou instaurar dissídios coletivos de

natureza econômica, conhecidas como formas heterônomas de solução dos conflitos

coletivos de trabalho, face a intervenção de um terceiro (pessoa física ou jurídica e o

Estado respectivamente), para a solução do conflito.33

Embora cancelada a Instrução Normativa n°4 /93 do TST, para a instauração do

dissídio coletivo, se faz necessário esgotar as tentativas conciliatórias.34

Assim, observa-se que o processo para a solução dos conflitos coletivos é linear,

pois segue passo a passo o previsto na legislação, até que se alcance o objetivo final,

qual seja: buscar um equilíbrio entre as necessidades de uma categoria profissional e as

possibilidades da respectiva categoria econômica, criando novas condições de trabalho,

respeitadas as disposições legais mínimas de proteção e as convencionadas

anteriormente.

Revela-se de outra banda aspectos relevantes, quanto ao papel do Estado, que ora

assegura normas de tutela mínimas, e, ao mesmo tempo abre espaço para o campo da

autonomia coletiva privada criar novas condições de trabalho, que ficam cercadas dentro

de limites mínimos e máximos para sua criação.

Nas palavras de Wagner D. Giglio,

o resultado da autocomposição dos conflitos coletivos depende da liberdade da negociação, e essa liberdade requer igualdade de situação, que já não existe mais. A pressão exercida pelas condições da economia atual, de desemprego generalizado, sem perspectiva de melhora, torna ineficazes as formas tradicionais de composição dos conflitos: a negociação direta, a mediação e a

32 As respectivas representações correspondem à base territorial de representação das entidades sindicais que

participam do processo negocial, respeitado o Princípio da Unicidade sindical. “Entretanto, manteve o sistema de unidade sindical (art. 8°, II, CF/88), [...]” (DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2004. p. 1331).

33 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de direito processual do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTR, 2004. p. 733. “As formas de solução dos conflitos coletivos podem ser: a) autocompositivas, como os acordos coletivos, as convenções coletivas e a mediação;b) heterocompositivas, como a arbitragem e a jurisdição.”

34 “A ação coletiva trabalhista tem por pressuposto objetivo e essencial a ocorrência de tratativas conciliatórias prévias ou a recusa à negociação ou à arbitragem, segundo disposição expressa dos artigos 114, § 2°, da Constituição Federal e 616, § 4°, da CLT, que de modo cabal deve ser comprovado pelo suscitante (TST, RO-DC 54.189/92.1, Ursulino Santos, Ac. SDC 207/93).

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conciliação delas resultantes. Como conseqüência das condições atuais, o resultado dessas formas de autocomposição dos conflitos coletivos têm sido bastante desfavoráveis aos trabalhadores: na melhor das hipóteses, são mantidos os direitos anteriores e garantidos, temporariamente, os empregos: na pior, reduzem-se benefícios, negociam-se rescisões contratuais e generaliza-se a insatisfação, que vai eclodir nas etapas seguintes de negociação.35

O artigo 615, da CLT, prevê que “o processo de prorrogação, revisão, denúncia

ou revogação total ou parcial de Convenção ou Acordo ficará subordinado, em qualquer

caso, à aprovação de Assembléia Geral dos Sindicatos convenentes ou partes acordantes,

com observância do disposto no artigo 612”. Daí, depreende-se que qualquer alteração,

somente terá validade se condicionada à Assembléia Geral.

O TST já manifestou-se sobre a questão em julgado RODC 53/2004, bem como

no teor da Orientação Jurisprudencial n° 41 da SDI-1 do TST. Os quais serão analisados

no item 4.3, adiante.

4.1 NATUREZA JURÍDICA DAS NORMAS COLETIVAS (CONVENÇÕES E

ACORDOS COLETIVOS)

Para explicitar a natureza jurídica das convenções coletivas, mister referir as

teorias que a fundamentam. Entre elas destacam-se, na visão de Luiz Fernando Basto

Aragão: a Teoria do Mandato, Gestão de Negócios, Estipulação em Favor de Terceiro,

Personalidade Moral Fictícia, Solidariedade Necessária, Representação Legal e Pacto

Social. 36 Observa-se, que o autor supra citado, elenca as teorias integrantes do grupo

das teorias civilistas ou contratuais.

35 GIGLIO, Wagner D. Solução dos conflitos coletivos: conciliação, mediação, arbitragem, resolução oficial e

outros meios. Revista LTr, São Paulo, v. 64, n. 3, p. 307 et seq., mar. 2000. 36 ARAGÃO, Luiz Fernando Basto. Noções essenciais de direito coletivo do trabalho. São Paulo: 2000, p. 97-

9. Referidas teorias são mencionadas na obra de Mauro Medeiros, como teorias integrantes do grupo das teorias civilistas ou contratuais. Existindo, ainda, teorias que pertencem ao grupo da transição ou mistas e teorias jurídico-sociais ou regulamentares. MEDEIROS, Mauro. A interpretação da convenção coletiva de trabalho. São Paulo: LTr, 2003. p. 33-40. Explica, ainda o autor, na mesma obra que: a) a teoria civilista ou contratual é oriunda dos conceitos clássicos de Direito Civil, tendo sua esteira no Princípio da Autonomia da Vontade; b) a teoria de transição ou mista referindo-se às teorias extracontratuais, destacando o autor a do pacto social, a da solidariedade necessária, a do uso e costume industrial; c) as teorias jurídico-sociais repelem a idéia de contrato e os princípios clássicos de Direito Civil. São elas: a da instituição corporativista e a da lei delegada.

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Vejamos do que trata cada uma das teorias supra mencionadas:

TEORIA DO MANDATO: sustentam que os sindicatos, ao celebrarem contratos

coletivos, agem como mandatários dos associados do sindicato, como se os associados

dessem ao sindicato uma procuração para agir em seu nome e, por isso, se obrigam pelo

que o sindicato deliberar. O que acontece é que o sindicato age em nome próprio, o que

acaba por invalidar tal teoria.

GESTÃO DE NEGÓCIOS: na gestão de negócios uma pessoa administra o

negócio de uma outra que se encontra ausente, sem antes ter recebido consentimento

para administrar. Ora, há consentimento expresso para a celebração da convenção

coletiva, o que bem demonstra que a teoria da gestão de negócios é inaceitável a

propósito das convenções coletivas.

ESTIPULAÇÃO EM FAVOR DE TERCEIRO: segundo esta teoria, o sindicato

age como estipulante, fixando cláusulas em favor de seus associados, que são os

beneficiários da estipulação. Sucede que a estipulação em favor de terceiro é um tipo de

contrato pelo qual um dos contratantes deve pagar, etc., alguma coisa a uma terceira

pessoa, o que não acontece nas convenções coletivas, em que os integrantes da categoria

profissional beneficiada pelo contrato nada recebem de qualquer dos sindicatos que os

assinam.

PERSONALIDADE MORAL FICTÍCIA: segundo esta teoria, a validade dos

contratos coletivos decorre de a personalidade do sindicato confundir-se com a de seus

associados. Entre nós, contudo, como a lei reconhece aos sindicatos uma personalidade

diversa daquela de seus associados, a teoria torna-se imprestável.

SOLIDARIEDADE NECESSÁRIA: funda-se na subordinação do interesse

individual ao da maioria do grupo, por necessidade social. A subordinação existente,

porém, é ao interesse coletivo e não à vontade da maioria. A intervenção do Ministério

do Trabalho, onde se processa o depósito de uma via da convenção, não importa em

policiamento do convencionado.

REPRESENTAÇÃO LEGAL: pela teoria da representação legal, amplamente

aceita na Itália, o sindicato tem poderes de representação concedidos pela lei para

celebrar convenções coletivas em nome de todos os membros da categoria profissional,

que ficam obrigados, da mesma forma que, em direito civil, o representado fica obrigado

pelos atos praticados por seu representante legal. Essa é uma das teorias mais aceitas

quando o sindicato tem realmente poder de representação de toda a categoria.

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PACTO SOCIAL: de acordo com essa teoria, os empregados e empregadores, ao

ingressarem em seus respectivos sindicatos, estão celebrando com estes um pacto pelo

qual se obrigam a aceitar, antecipadamente, as deliberações da maioria dos associados.

Daí ser obrigatório o cumprimento das convenções coletivas. Os adversários dessa teoria

dizem que ela é inaceitável porque acarreta renúncia incompatível com a liberdade

contratual. Essa objeção, parece-nos precária, uma vez que, seja qual for o motivo pelo

qual têm validade as convenções coletivas, elas estão acima dos contratos individuais,

que devem adaptar-se ao que nelas está contido.

A natureza jurídica da convenção coletiva, para Octavio Bueno Magano,

trata-se de negócio jurídico resultante da autonomia das partes convenentes. Vale dizer que se particulariza como negócio jurídico bilateral, ou, mais especificamente, como contrato normativo. É contrato porque expressa o mútuo consenso das partes convenentes, a respeito de um objeto e é normativo em virtude de sua aptidão para determinar o conteúdo dos contratos individuais. A normatividade inerente à convenção coletiva de trabalho provém do poder transferido ao sindicato ou outro agrupamento legitimado a celebrá-la, pelos indivíduos que se inserem na organização.37

Para José Martins Catharino,

as normas convencionadas ou acordadas, extintas, “revogadas” ou “denunciadas”, para o futuro, já incorporadas, mais contratos de emprego, continuam vigindo, residual e contratualmente, na esfera individual e subjetiva. Assim, como a norma criada não tem aplicação retroativa (CF, art. 153, § 3°), e sim imediata ou não, a norma de destruição está na mesma situação temporal: não pode prejudicar “o direito adquirido” e o ato jurídico perfeito.38

Segadas Vianna39, assim como Mauro Medeiros40, referem os três grupos der

teorias que tentam explicar a natureza jurídica das convenções coletivas, quais sejam: As

teorias civilistas são: a do mandato, a da gestão de negócio, a da estipulação em favor de

terceiros e a da personalidade moral fictícia e representação legal; as teorias

extracontratuais são: teoria do pacto social, da solidariedade necessária e do uso e

costume industrial; as teorias jurídico-sociais são: teoria da instituição corporativa e a

37 MAGANO, Octávio Bueno. Manual de direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 1986. v. 3. 38 CATHARINO, José Martins. Tratado elementar de direito sindical. 2. ed. São Paulo: LTr, 1982. 39 VIANNA, Segadas. Negociação coletiva de trabalho: instituições de direito do trabalho. 19. ed. São Paulo:

LTr, 2000. p. 1173. 40 MEDEIROS, Mauro. A interpretação da convenção coletiva de trabalho. São Paulo: LTr, 2003. p. 21, diz:

“A definição eleita por nós é a de Magano, acima mencionada, pois, consoante o próprio mestre afirma, opta pela síntese e contém o gênero próximo (negócio jurídico) e a diferença específica (condições de trabalho), assim obedecendo às regras da lógica formal.”

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teoria regulamentar, também conhecida por teoria da lei delegada.41 Posicionam-se

Vianna e Mauro Medeiros, pela teoria da lei delegada. Concluindo que a solução

extracontratual e da lei delegada parece inevitável. Primeiro por tratar-se de convenção;

e segundo porque a convenção obriga a todos inominadamente, e mesmo não tendo

poder de derrogar leis estatais, pode ampliar os benefícios que, nessas, são condições

mínimas, e crias novas condições de trabalho.

Segundo Délio Maranhão42 a natureza jurídica da convenção coletiva é definida

pela teoria do contrato-regra, “juridicamente, é um ato jurídico, próprio do Direito do

Trabalho, de natureza ao mesmo tempo normativa e contratual: contrato-ato-regra”.

Para Süssekind:

As relações jurídicas diretas que da convenção coletiva possam

nascer entre os sindicatos convenentes são de inegável natureza contratual, entrando no esquema clássico da figura do contrato. Este, porém, supõe uma relação individual. Ora, a convenção coletiva estabelece normas que vão reger as relações individuais dos integrantes das categorias a que tais normas se aplicam. Quem as estabelece? – as próprias categorias. [...] Se o conflito de interesses, que se soluciona por meio de uma convenção coletiva, é coletivo e envolve, por isso, interesses abstratos dos grupos interessados, dessa natureza coletiva dos interesses em conflito há de decorrer, necessariamente, o caráter normativo da solução convencional. A convenção, pois, como ato-regra no plano coletivo, preenche a mesma finalidade do contrato no plano individual: atividades de cooperação para solucionar conflitos de interesses. A função social é a mesma, o que muda é a natureza dos interesses em jogo.43

Para Délio Maranhão, segundo sua obra intitulada “Direito do Trabalho”, o autor

faz uma digressão sobre a natureza jurídica das convenções coletivas, e por certo não

deixa de mencionar a frustração das teorias da contratualidade e extracontratuais, que

isoladamente não se bastam, razão pela qual defende o caráter dualista da natureza

jurídica das convenções coletivas, afirmando: “O ato jurídico é um só. Mas não é só

contrato, nem só ato-regra. É, por isso, uma figura jurídica sui generis: normativa, por

um lado, contratual, por outro.Um contrato normativo, que não se enquadra nos moldes

clássicos do contrato, como nos moldes clássicos da sentença não se enquadra a sentença

normativa.”44

41 VIANNA, Segadas. Negociação coletiva de trabalho: instituições de direito do trabalho. 19. ed. São Paulo:

LTr, 2000. p. 1171-77. 42 MARANHÃO, Délio; CARVALHO, Luiz Inácio B. Direito do trabalho. 17. ed. Rio de Janeiro: Fundação

Getúlio Vargas, 1993. p. 40. 43 SÜSSEKIND, Arnaldo et al. Instituições de direito do trabalho. 19. ed. São Paulo: LTr, 2001. v.2, p. 1175. 44 MARANHÃO, op. cit., p. 333. O autor faz referência à sua conclusão, partindo de estudos feitos sobre a

classificação dos atos jurídicos segundo Duguit. Vide DUGUIT, Leon. Traité de droit constitucionel. Paris: Boccard, 1927. v. 1, p. 322. “Vê-se aparecer uma primeira categoria de atos jurídicos, os que são feitos com a intenção de produzir uma modificação nas regras de direito. São os que chamamos atos-regra. Tem um caráter objetivo...”

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4.2 VALIDADE, VIGÊNCIA E EFICÁCIA DAS NORMAS COLETIVAS DE

TRABALHO: UMA QUESTÃO DE APLICABILIDADE DAS MESMAS (ACORDOS

COLETIVOS E CONVENÇÕES COLETIVAS DE TRABALHO)

Para Wilson Steinmetz, a vinculação dos particulares a direitos fundamentais

trata-se de um problema de eficácia jurídica.45 Considerando-se que as normas coletivas,

em especial os acordos e as convenções coletivas expressam a vontade dos integrantes

de uma determinada categoria, e para tanto, têm-se regras de eficácia e aplicabilidade a

observar, faz-se pertinente o estudo da eficácia das normas coletivas, para que através da

autonomia privada coletiva (autonomia privada é princípio fundamental do direito

privado)46 respeitem-se e assegurem-se direitos fundamentais aos trabalhadores e

empregadores.

Os direitos sociais estão previstos no artigo 7° da Constituição Federal vigente,

em seus 34 incisos (um amplo rol de direitos dos trabalhadores)47 cujo catálogo não é

apenas taxativo, admitindo-se outros direitos fundamentais, por intermédio da cláusula

de abertura propiciada pelo artigo 5°, § 2°, da CF.

O Estado, através da Constituição Federal, que retrata o Estado Democrático de

Direito, reconhece a vontade do povo, desde que observadas regras mínimas, que visam

o equilíbrio entre os particulares, assegurando-lhes o exercício da cidadania.

Para um melhor aproveitamento do tema, faz-se necessário a distinção entre os

conceitos de vigência, validade e eficácia, observando-se que há confusão entre eles,

entre os constitucionalistas, e não por menos na área trabalhista.

45 STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2004.

p. 40. 46 Ibidem, p. 189. 47 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,

2003. p. 73-4.

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4.2.1 Validade

Para J. H. Meirelles Teixeira, citado por Wilson Steinmetz, validade é “a

propriedade da conformidade (adequação, compatibilidade) da norma jurídica a normas

de hierarquia jurídica superior.”48

Observada a nota de n. 46, a validade formal das convenções coletivas, estaria

exemplificativamente, na observância de realização de Assembléia Geral, quorum e

legitimidade das entidades sindicais. E, a validade material, expressaria-se na

observância do conteúdo entre as normas constitucionais e infraconstitucionais, sempre

para beneficiar o trabalhador, v. g., artigo 7°, incisos XIII e XVI, da CF (prevê adicional

de no mínimo 50% para as horas extras) e cláusulas de convenções coletivas que

normalmente prevêem um adicional maior para as horas extras, v.g., adicional de 50%

para as duas primeiras horas extras e adicional de 100% para as subseqüentes. O que não

poderia acontecer, seria a norma coletiva prever um adicional inferior ao mínimo

previsto na Constituição.

Para João de Lima Teixeira Filho, o principal requisito de validade dos

instrumentos normativos autocompositivos é que sejam subscritos por entidades

sindicais, com existência legal. Refere-se o autor aos atos constitutivos, devidamente

registrados em Cartório, tendo em vista a prerrogativa constitucional conferida ao

Sindicato no artigo 8°, VI, da CF.49

Ao estabelecer os princípios que norteiam o direito sindical, a Constituição

Federal em seu artigo 8°, I, preestabeleceu o Princípio da Autonomia Sindical. Dito

Princípio proíbe ao Estado autorizar a fundação de um sindicato, bem como veda ao

Poder Público a interferência e a intervenção na Organização Sindical.

48 TEIXEIRA apud STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo:

Malheiros, 2004. p. 41. Argumenta ainda, Steinmetz: “Distingue-se entre conformidade formal e conformidade material. Daí por que o uso das expressões “validade formal” e “validade material”. A validade formal é determinada pela observância das competências pessoal, procedimental e material – fixadas por norma(s) de hierarquia jurídica superior (sobretudo por normas constitucionais de competência) – para a criação e introdução da norma no sistema jurídico passivo. A validade material é determinada pela não-contradição entre o conteúdo da norma inferior e o de norma(s) superior(es). A propriedade da validade jurídica caracteriza a pertinencialidade de uma norma jurídica a um dado sistema jurídico, isto é, “a relação de pertinência da norma com o sistema [jurídico positivo]”. Vide nota n. 33, da obra referida.

49 SÜSSEKIND, Arnaldo et al. Instituições de direito do trabalho. 19. ed. São Paulo: LTr, 2001. v. 2, p. 1181.

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O artigo 612, da CLT, estabelece os requisitos de validade das normas coletivas,

dizendo: [...] dependendo a validade da mesma do comparecimento e votação, em

primeira convocação, de 2/3 (dois terços) dos associados da entidade, se se tratar de

Convenção, e dos interessados, no caso de Acordo, e, em segunda, de 1/3 (um terço) dos

membros. 50

Uma vez atendidos o quorum para comparecimento e votação, tais normas

deverão ser depositadas e registradas em órgão competente, qual seja: Ministério do

Trabalho e Emprego, conforme preceituam os artigos 613 e 614, da CLT51, passando a

viger a partir do terceiro dia do depósito, realizado dentre os oitos dias destinados à

assinatura do instrumento normativo.

Observa-se, posicionamento contrário, referente à validade das normas coletivas

condicionadas ao prazo de depósito e publicação, defendido por João de Lima Teixeira

Filho,

H – Registro. O artigo 614 da CLT também tornou-se letra morta. O contexto dentro do qual brotou já feneceu definitivamente. O Ministério do Trabalho não é mais a longa manus estatal para controlar o sindicato e os atos por ele produzidos, nos seus relacionamentos internos ou externos. Nenhuma conseqüência jurídica produzirá o arquivamento do acordo ou da convenção coletiva após o oitavo dia de sua assinatura. Trata-se de ato de depósito, despojado de conteúdo homologatório. Nem sanção administrativa há. Ao Ministério do Trabalho está “vedada a apreciação do mérito” dos instrumentos

50 “A limitação do direito de votos aos “interessados” no acordo é sustentada em lógica irretorquível: os

empregados de outras empresas, ainda que da mesma categoria profissional, não têm de se manifestar sobre o resultado de uma negociação aplicável apenas aos empregados de uma única empresa. Só os empregados desta, isto é, aqueles detentores de interesse direto nas condições negociadas, devem deliberar pela aprovação ou rejeição da contraproposta. A interferência de estranhos no âmbito de eficácia da norma autônoma compromete sua validade.” (SÜSSEKIND, Arnaldo et al. Instituições de direito do trabalho. 19. ed. São Paulo: LTr, 2001. v.2, p. 1181).

51 BRASIL. “Artigo 613, da CLT: As convenções e os acordos deverão conter obrigatoriamente: I- designação dos sindicatos convenentes ou dos sindicatos e empresas acordantes; II- prazo de vigência; III- categorias ou classe de trabalhadores abrangidas pelos respectivos dispositivos; IV- condições ajustadas para reger as relações individuais de trabalho durante sua vigência; V- normas para a conciliação das divergências surgidas entre os convenentes por motivos da aplicação de seus dispositivos; VI- disposições sobre o processo de sua prorrogação e de revisão total ou parcial de seus dispositivos; VII- direitos e deveres dos empregados e empresas;

VIII- penalidades para os sindicatos convenentes, os empregados e as empresas em caso de violação de seus dispositivos. Parágrafo único. As convenções e os acordos serão celebrados por escrito, sem emendas nem rasuras, em tantas vias quantos forem os sindicatos convenentes ou as empresas acordantes, além de uma destinada a registro.” “Artigo 614, da CLT: Os sindicatos convenentes ou as empresas acordantes promoverão, conjunta ou separadamente, dentro de 8 (oito) dias da assinatura da convenção ou acordo, o depósito de uma via do mesmo, para fins de registro e arquivo, no Departamento Nacional do Trabalho, em se tratando de instrumento de caráter nacional ou interestadual, ou nos órgão regionais do Ministério do Trabalho nos demais casos. § 1°. As convenções e os acordos entrarão em vigor 3 (três) dias após a data da entrega dos mesmos no órgão referido neste artigo.”

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normativos autônomos “e dispensada sua publicação no Diário Oficial. (art. 1° da Portaria MTb n° 865, de 14.9.95).52

A lei estabelece a forma escrita dos instrumentos normativos, sem emendas nem

rasuras.

As convenções e os acordos coletivos têm aplicação circunscrita ao “âmbito das

respectivas representações” (art. 611). Assim, os acordos ou convenções celebrados

entre sindicatos que não participem da negociação, ou que mesmo participando

transcendam os rígidos limites do enquadramento sindical estatal, não terão validade.

4.2.2 Vigência

Novamente, para Steinmetz vigência é “a possibilidade que torna exigível a

observância (obediência) da norma jurídica (exigibilidade ou obrigatoriedade da norma

jurídica), em um determinado espaço a partir de um determinado tempo, enquanto a

norma jurídica não for declarada inválida (Lex prima facie valet) ou não for ab-

rogada”.53

Quanto à vigência das normas coletivas, o artigo 614, § 3°, da CLT, disciplina

que: “Não será permitido estipular duração de acordo ou convenção superior a 2 (dois)

anos”.

João de Lima Teixeira Filho entende que é perfeitamente possível estabelecer

prazo superior a dois anos, “apenas a limitação de sua vigência estará restrita ao que

permite a lei”.54

“Condição imprescindível para a vigência dos acordos e convenções coletivas é

que tenham a necessária publicidade para conhecimento dos interessados”.55

Disciplina a CLT, que a vigência das normas coletivas autônomas, inicia-se três

dias após o depósito das mesmas, no órgão do Ministério do Trabalho (regional ou

nacional, conforme o caso) devidamente assinadas, conforme artigo 614, § 1°, da CLT.

52 TEIXEIRA FILHO apud SÜSSEKIND, Arnaldo et al. Instituições de direito do trabalho. 19. ed. São Paulo:

LTr, 2001. v. 2, p. 1183. 53 Vide nota n. 29, STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo:

Malheiros, 2004. p. 40-1. 54 TEIXEIRA FILHO, op. cit., p. 1184. 55 TEIXEIRA FILHO, loc. cit.

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José Augusto Rodrigues Pinto56, chama a atenção para o fato que tal disposição

infraconstitucional não foi recepcionada pela Constituição Federal vigente, e diz,

“nenhuma formalidade se antepõe à eficácia da Convenção Coletiva, uma vez assinada

pelas partes legitimadas à celebrá-la, nada impedindo seu registro público para efeitos

de emprestar-lhe validade erga omnes, por efeito da publicidade”.

Contudo, o mesmo autor admite existir tendência jurisprudencial recente do

Tribunal Superior do Trabalho, nada referindo sobre existência ou não, de antinomia

entre a regra da CLT e o Princípio da Autonomia (art. 8º, inciso I, da CF). Apontando

ilustrativamente, o sentido da Orientação Jurisprudencial 34 da Secção de Dissídios

Coletivos daquela Corte.57

Para Mauricio Godinho Delgado,

ressalta-se, porém, que, mesmo considerando-se obrigatório o depósito administrativo do diploma autônomo, ele preserva seu caráter de documento comum às partes (sejam as partes coletivas, sejam apenas empregado e empregador, individualmente considerados). Nessa qualidade, sua prova em juízo pode ser feita mesmo em fotocópia simples, não autenticada (Orientação Jurisprudencial 36, Seção de Dissídios Individuais do TST) Logo, cabe àquele que alegar a irregularidade administrativa, comprová-la com a respectiva certidão negativa do órgão público depositário.58

A seguir, transcreve-se as Orientações Jurisprudenciais referidas, para fins

didáticos:

OJ 34 da SDC (TST): “É desnecessária a homologação, por tribunal trabalhista,

do acordo extrajudicialmente celebrado, sendo suficiente, para que surta efeitos, sua

formalização perante o Ministério do Trabalho (art. 614 da CLT e art. 7°, inciso

XXXVI, da Constituição Federal)”.

OJ 36 da SDI-1 (TST): “O instrumento normativo em cópia não autêntica possui

valor probante, desde que não haja impugnação ao seu conteúdo, eis que se trata de

documento comum às partes”.

Têm-se por vigência de uma norma coletiva, a observância da base territorial de

representação sindical e o prazo de vigência estabelecido em cláusula, no próprio

documento. Vaticina o artigo 114, § 2°, da CF que após o término de vigência das

56 RODRIGUES PINTO, José Augusto. Direito sindical e coletivo do trabalho. São Paulo: LTr, 1998. p. 220-

21. 57 RODRIGUES PINTO, loc. cit. 58 Idem. Direito coletivo do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2003. p. 146.

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normas coletivas, deverão ser respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao

trabalho, bem como as convencionadas anteriormente.

Depreende-se da leitura do texto constitucional, que após o término da vigência

de uma norma coletiva, a mesma poderá prorrogar-se no tempo, temporariamente.

Adriana Carrera Calvo, interpretando o artigo constitucional supra referido, nos

diz, “de fato, se a Justiça do Trabalho: (a) só atua quando não há convenção coletiva em

vigor; e (b) tem de respeitar disposições convencionais mínimas, (c) só se pode concluir

que as cláusulas convencionais continuam agarradas aos contratos individuais, mesmo

depois do prazo da convenção”.59

4.2.3 Eficácia

Ao abordar a temática sobre a eficácia das normas coletivas, Orlando Gomes

levanta uma questão relevante defendida por Chiarelli no 1° Congresso Internacional de

Direito Social,60 que ora transcreve-se:

[...] afirmou que o problema da eficácia da convenção coletiva não é seu, mas de sua fonte de validade. Sua eficácia e validade derivam de norma do ordenamento jurídico que, expressa ou tacitamente, faz da convenção coletiva fato de produção jurídica. Sua solução não pode derivar da análise do modo de formação e do conteúdo da convenção coletiva, em si mesmos considerados, que permanecem na sua estrutura um ato de formação bilateral, uma “convenção”, entendido como tal o momento do cumvenire in idem placitum das posições inicialmente opostas.61

Diz Orlando Gomes: “a eficácia da convenção coletiva é regulada pelo

ordenamento jurídico”.62

Steinmetz leciona:63 “a eficácia, por sua vez, é o predicado da norma que se

refere à capacidade técnica de produzir efeitos jurídicos. Assim, norma jurídica eficaz é

59 CALVO, Adriana Carrera. A ultratividade das convenções coletivas e acordos coletivos. Jus Navigandi,

Teresina, ano 9, n. 644, 13 abr. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6449> Acesso em: 20 mai. 2006.

60 GOMES; Orlando; GOTTSCHALK, Élson. Curso de direito do trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 2003. nota n° 39, p. 584.

61 GOMES; GOTTSCHALK, loc. cit. 62 GOMES, GOTTSCHALK, loc. cit. 63 STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2004.

p. 40 et seq.

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aquela que pode ou deve ser aplicada porque está apta a produzir os efeitos técnicos

previstos ou dela esperados. A eficácia não se confunde com a vigência e a validade”.

Renato Rua de Almeida, ensina que

são as cláusulas normativas que apresentam a questão da eficácia ultracontraente da convenção coletiva de trabalho. Tanto na convenção coletiva de trabalho de eficácia limitada (ao obrigar apenas os associados das partes contratantes) quanto na convenção coletiva de trabalho de eficácia erga omnes ou geral (ao obrigar pessoas estranhas aos quadros associativos), os efeitos são ultracontraentes. O direito positivo brasileiro adota a eficácia geral, ao prescrever no artigo 611 da Consolidação das Leis do Trabalho que a convenção coletiva de trabalho é um acordo de caráter normativo, celebrado por sindicatos representativos das respectivas categorias econômicas e profissionais, que estipulam condições de trabalho, aplicáveis no âmbito das respectivas representações, às relações individuais de trabalho. A Constituição de 1988 acolheu a representação da categoria econômica ou profissional por uma única organização sindical da mesma base territorial (art. 8°, II), reconhecendo e recepcionando, portanto, a eficácia geral da convenção coletiva de trabalho (art. 7°, XXVI).64

A questão da eficácia geral da convenção de trabalho acaba por obrigar

associados e não associados. Razão pela qual poder-se-ia afirmar que a eficácia geral da

convenção coletiva de trabalho (e não a eficácia limitada) afrontam a autonomia privada

coletiva (Convenção 98 da OIT) e a liberdade sindical (Convenção 87 da OIT). Nesse

sentido afirma Renato Rua de Almeida,65 “a eficácia geral das convenções coletivas de

trabalho se reveste de importância peculiar, pois as cláusulas normativas regulam todos

os contratos individuais de trabalho no âmbito das categorias representadas e não apenas

os contratos firmados pelos associados”.

4.2.4 Aplicabilidade das normas coletivas

Magano e Mallet tratam da aplicabilidade dos direitos sociais afirmando que “o

problema da aplicabilidade das normas constitucionais relaciona-se com a possibilidade

de sua atuação”. Referidos autores endossam o dizer de José Afonso da Silva.66

64 ALMEIDA, Renato Rua de. Das cláusulas normativas das convenções coletivas de trabalho: conceito,

eficácia e incorporação nos contratos individuais de trabalho. Revista LTr, São Paulo, v. 60, n. 12, p. 1602-605, dez. 1996.

65 Ibidem, p. 1602-605. 66 MAGANO, Octávio Bueno; MALLET, Estêvão. O direito do trabalho na constituição. 2. ed. Rio de

Janeiro: Forense, 1993. p. 28. Ver também, SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 63-6.

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Segundo Kelsen, “não se confundindo com o tema da eficácia social da norma

(conduta humana verificável na ordem dos fatos)”.67

Steinmetz corrobora com a questão, quando diz:

ainda com relação à eficácia, para efeito de exclusão da ambigüidade, faz-se a distinção entre eficácia jurídica e eficácia social. A eficácia jurídica, como escrito, refere-se à propriedade técnica de produção de efeitos jurídicos. A eficácia social refere-se à observância e, por conseguinte, à realização fática da norma jurídica. É o que se denomina efetividade das normas jurídicas. A eficácia é potencialidade técnico-jurídica; a efetividade é potencialidade já consumada ou materializada em resultados empiricamente verificáveis. [...] Estabelecidas as devidas definições e distinções, já é possível argumentar em favor da tese de que a expressão “eficácia das normas de direitos fundamentais nas relações jurídicas entre particulares” descreve de forma mais clara e rigorosa o problema da vinculação dos particulares a direitos fundamentais.68

Magano ressalta em sua obra: “a eficácia diz respeito à aplicação ou execução da

norma jurídica, conceito que se não confunde tampouco com o de validade, quer dizer,

força imponível, nem com o de vigência, isto é, tempo de atuação da norma. A

aplicabilidade – repita-se – não corresponde senão à possibilidade de atuação da

norma”.69

Destacando ainda, a classificação norte-americana das normas constitucionais

em: (normas auto-aplicáveis e normas não auto-aplicáveis).

José Afonso da Silva classifica as normas constitucionais quanto a eficácia e

aplicabilidade em: “(1) normas de eficácia plena e aplicabilidade direta, imediata e

integral; (2) normas de eficácia contida e aplicabilidade direta e imediata, mas

possivelmente não integral; (3) normas de eficácia limitada, a) declaratórias de

princípios institutivos ou organizativos, e b) declaratórias de princípio programático”.70

Retomando o conceito de norma eficaz e apta para produzir efeitos, passa-se a

análise do dispositivo constitucional contido no artigo 7°, inciso XI, da CF (participação

nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente,

participação na gestão da empresa, conforme definido em lei). A lei n. 10.101, de 19 de

dezembro de 2000, prevê que o benefício será concedido aos trabalhadores, mediante

67 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Tradução J. Cretella Jr. e Agnes Cretella. 3. ed. São Paulo: Revista

dos Tribunais, 2003. p. 71-2. 68 STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2004.

p. 46. 69 MAGANO, Octávio Bueno; MALLET, Estêvão. O direito do trabalho na constituição. 2. ed. Rio de

Janeiro: Forense, 1993. p. 28. Ver também, SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 28.

70 SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 86.

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negociação. Nesse caso, além da disposição constitucional, há regramento em lei, ambas

válidas e vigentes. Porém, nem a norma constitucional, nem a lei são suficientes para a

aplicabilidade da norma jurídica pertinente à participação nos lucros e resultados da

empresa. Referida norma carece de eficácia, pois não há como aplicá-la sem o

procedimento negocial, que no caso em tela, é o requisito formal e material para que

produza os efeitos técnicos. Assim, conclui-se que as convenções coletivas também se

prestam para dar eficácia à norma jurídica. A lei n. 10.101 é vigente e válida, só não tem

eficácia (efeito), enquanto não for objeto de negociação coletiva entre sindicatos.

Ao tratar do rol dos direitos sociais, Ingo Wolgang Sarlet questiona sobre o não

enquadramento ao catálogo de direitos fundamentais, o artigo 7°, inciso XI, da CF. Data

máxima vênia, não se pretende opor aos ensinamentos de Sarlet, mas entende-se

perfeitamente possível uma reflexão acerca da matéria. Considerando-se que o trabalho

e o salário são direitos fundamentais, e que todo trabalhador tem direito à um salário

justo e digno, que por óbvio não pode ser satisfeito pelo salário mínimo. É bastante

aceitável, que através de complementos salariais busque um nível de vida digno,

assegurado pelo princípio da dignidade da pessoa humana. Sendo assim, a participação

nos lucros e resultados é uma forma lícita de empregados alcançarem um salário justo

(respeitada a condição de que a PL não constitui, ao menos tecnicamente, a

remuneração). A Constituição Federal, no artigo 7°, inciso IV, assegura ao salário

mínimo, reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo. O salário representa

a subsistência do trabalhador, assim a PL estaria alcançando um direito digno da pessoa

humana.

Crê-se nessa possibilidade, face ao catálogo dos direitos fundamentais serem

abertos e não taxativos como refere Sarlet.71

Fortalecendo a tese da eficácia, Steinmetz afirma, “é possível a existência de

norma jurídica vigente e válida sem eficácia.72

Salienta-se, por oportuno, a tese da separação entre “eficácia” e “aplicabilidade”,

muito embora haja entendimento de que possam ser tratadas como sinônimos.73

Sob outro enfoque, acerca dos direitos fundamentais e o antagonismo de

interesses, no que concerne a participação dos lucros e resultados, aprecia-se a fala de

71 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,

2003. p. 73 72 STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2004.

p. 42. 73 A título de ilustração: Ibidem, p. 43, notas 41-43.

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Luiz José Guimarães Falcão, ninguém discorda de que todos devem ter direito à vida, à

intimidade, à honra, ao trabalho. O consenso termina ou começa a se modificar quando a

vida em sociedade exige dos homens que se despojem de bens materiais, que abandonem

o sentimento de propriedade. A participação dos empregados nos lucros ou resultados da

empresa provoca esse tipo de reação, pois a primeira sensação do empresário é a de que

o lucro de seu negócio é algo de sua propriedade, que não deve ser compartilhado com

ninguém mais, salvo se sócio do empreendimento. [...] Nesse aspecto, o que se verifica é

a luta de alguém (o proprietário da terra) contra todos os que pretendem dela se

adonar, ainda que seja sob a proteção da lei e conseqüentemente do Estado. A lei

sempre é tida como injusta pelo dono da terra. Não é fácil a solução para tal tipo de

problema, pois o que existe forte e muito marcante é o sentimento de propriedade e de

posse contra a necessidade de sobrevivência daqueles muitos que necessitam da terra

para trabalhar e viver. Nesse aspecto, o quadro revela a luta de um contra todos, situação

de difícil solução equânime de parte do legislador.74

No enfoque supra referido, existem dois direitos fundamentais em questão: a

propriedade e a participação nos lucros e resultados. Conforme ensinamentos de

Steinmetz,75a questão se converge para o conteúdo essencial dos direitos fundamentais.

Independentemente da teoria a ser adotada (absoluta ou relativa) para a adoção do

princípio da proporcionalidade, em que pese suas críticas opositoras. O que se

vislumbra, no caso em tela, é a inteligência do legislador, ou a solução encontrada para

ficar “em cima do muro”, quero dizer: legisla sobre os dois direitos fundamentais

(propriedade e participação nos lucros e resultados) como forma de exercício do

princípio da dignidade da pessoa humana, entretanto vincula a eficácia da lei que

regulamenta a participação nos lucros e resultados à negociação coletiva .

Assim, transfere para a autonomia da vontade, a efetividade da lei n. 10.101, sem

que afronte imediatamente o direito de propriedade dos empresários.

A autonomia privada coletiva (na expressão do conteúdo em acordos coletivos e

convenções coletivas), garante os direitos fundamentais, não obstante a iniciativa

privada versus trabalho.

74 RODRIGUES, Aluísio. Direito constitucional do trabalho. São Paulo: LTr, 1997. v. 2, p. 268. 75 STEINMETZ, Wilson. Colisão de direitos fundamentais e princípio da proporcionalidade. Porto Alegre:

Livraria do Advogado, 2001. p. 160-63.

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4.3 INCORPORAÇÃO DAS CLÁUSULAS NO CONTRATO INDIVIDUAL

(TEORIAS)

As cláusulas de acordos ou convenções coletivas podem ser de natureza:

obrigacional ou normativa.

As cláusulas obrigacionais, em tese, extinguem-se com o término da vigência

normativa. Já as cláusulas normativas aderem aos contratos individuais de forma

definitiva, justificam que as novas condições de trabalho não podem vir a prejudicar o

empregado consoante o artigo 468, da CLT76. Vide OJ n° 41, da SDI-1, do TST e

comentários de Francisco Ferreira Jorge Neto e Jouberto de Quadros Pessoa

Cavalcante.77

As cláusulas obrigacionais extinguem-se com o término da vigência da norma

coletiva.78 A dúvida ocorre justamente quanto às cláusulas normativas. Na doutrina

existem duas correntes a analisar o tema: a primeira justificando a incorporação das

cláusulas normativas no contrato de trabalho e a segunda ponderando pela não

incorporação.

A seguir, elenca-se argumentos à favor e contra a incorporação das cláusulas

normativas nos contratos individuais de trabalho.

Teoria da incorporação: argumentos:

a) Alegam que as novas condições de trabalho não podem vir a prejudicar o

empregado, encontrando respaldo no artigo 468, da CLT;79

76 CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa; JORGE NETO, Francisco Ferreira. Manual de direito do

trabalho. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004. p. 1577. 77 OJ n° 41, SDI do TST: “Preenchidos todos os pressupostos para a aquisição da estabilidade decorrente de

acidente ou doença profissional, ainda durante a vigência do instrumento normativo, goza o empregado de estabilidade mesmo após o término da vigência deste.” Observa o autor: “A matéria, como se visualiza, é polêmica. Entendemos, em respeito à autonomia privada coletiva, que a integração é pelo prazo do instrumento, não interagindo de forma definitiva com os contratos individuais, exceto quando for o caso de vantagem individualmente adquirida (como é o caso da estabilidade pela norma coletiva). Talvez fosse melhor que a matéria fosse legislada, dirimindo-se as dúvidas doutrinárias e jurisprudenciais.” CAVALVANTE apud JORGE NETO, Francisco Ferreira. Manual de direito do trabalho. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004. p. 1578-79.

78 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 815. 79 BRASIL. Artigo 468, da CLT: “Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas

condições por mútuo consentimento, e, ainda assim, desde que não resultem, direta ou indiretamente,prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.”

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b) Que a convenção coletiva tem caráter normativo (611, da CLT);80

c) Que as disposições do contrato individual não podem contrariar disposição de

convenção coletiva ou acordo coletivo (619, da CLT);81

Considera-se que as vantagens habitualmente concedidas ao empregado não são

suscetíveis de supressão. Vide Súmulas 45, 60, 63, 172 e 241 do TST.82

d) Produzem direito adquirido83, artigo 5°, inciso XXXVI, da CF.84

e) Produzem os efeitos da Súmula 51, do TST.85

80 BRASIL. Artigo 611, da CLT: “Convenção coletiva de trabalho é o acordo de caráter normativo, pelo qual

dois ou mais sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais de trabalho.” Diz Valentim Carrion, comentários ao artigo 611, da CTL: “A distinção fundamental entre o contrato individual de trabalho e a convenção coletiva lato sensu, é que, enquanto o primeiro cria a obrigação de trabalhar e de remunerar, a convenção coletiva prevê direitos e obrigações para os contratos individuais em vigor ou que venham a celebrar-se; como se diz, é mais uma lei do que um contrato. Tem a vantagem de descer a minúscias e, melhor que a lei, adaptar-se às circunstâncias específicas das partes, do momento e do lugar.” (CARRION, Valentin. Comentários à consolidação das leis do trabalho. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2000).

81 BRASIL. Artigo 619, da CLT: “Nenhuma disposição de contrato individual de trabalho que contrarie normas de convenção ou acordo coletivo de trabalho poderá prevalecer na execução do mesmo, sendo considerada nula de pleno direito.”

82 Súmulas do TST, n. 45: “Serviço suplementar. A remuneração do serviço suplementar, habitualmente prestado, integra o cálculo da gratificação natalina prevista na Lei n. 4.090, de 13 de julho de 1962.” Súmula n.. 60: “Adicional noturno. Integração no salário e prorrogação em horário diurno. (incorporada a Orientação Jurisprudencial n° 6 da SDI-1) I- O adicional noturno, pago com habitualidade, integra o salário do empregado para todos os efeitos. (ex- Súmula 60 – RA 105/1974, DJ 24-10-1974) II- Cumprida integralmente a jornada no período noturno e prorrogada esta, devido é também o adicional quanto às horas prorrogadas. Exegese do artigo 73, § 5°, da CLT. (ex- OJ 6 – inserida em 25-11-1996)”. Súmula n. 63: “Fundo de garantia. A contribuição para o fundo de garantia do tempo de serviço sobre a remuneração mensal devida ao empregado, inclusive horas extras e adicionais eventuais.” Súmula n. 172: “Repouso remunerado. Horas extras. Cálculo. Computam-se no cálculo do repouso remunerado as horas extras habitualmente prestadas. Ex-prejulgado n. 52.” Súmula n. 241: “Salário-utilidade. Alimentação. O vale para refeição, fornecido por força do contrato de trabalho, tem caráter salarial, integrando a remuneração do empregado, para todos os efeitos legais.”

83 “Saliente-se, ainda, o teor do Enunciado n° 51 do TST, bem como a própria figura do direito adquirido. Para os que negam a incorporação, a justificativa repousa no argumento de que as condições ajustadas nos instrumentos normativos somente são válidas pra o respectivo prazo de vigência (arts. 613, IV e 614, §°, CLT)”. (CAVALVANTE apud JORGE NETO, Francisco Ferreira. Manual de direito do trabalho. 2. ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2004. p. 1578).

84 BRASIL. Artigo 5°, inciso XXXVI, da CF: “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;”

85 Súmula n. 51, do TST: “Norma regulamentar. Vantagens e opção pelo novo regulamento. Artigo 468 da CLT. (incorporada a orientação jurisprudencial n° 163 da SDI-1) I- As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento. (ex-Súmula 51 – RA 41/1973, DJ 14/06/1973}. II- Havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito de renúncia às regras do sistema do outro. (ex- OJ 163 – inserida em 26-03-1999}. Redação determinada pela Resolução n° 129, se 05 de abril de 2005.

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f) Aplicação do Princípio da proteção nas relações de trabalho86.

g) Aplicação da E. C. n. 45, alterando o disposto no artigo 114, § 2° , da CF.87

Teoria da não incorporação: argumentos

a) A autonomia coletiva é o aspecto objetivo da liberdade sindical.88

b) Não aplicabilidade do artigo 468, da CLT, nos contratos coletivos.89

c) Ausência de legitimidade para os sindicatos criarem normas.90

86 “17. Significado: O princípio de proteção se refere ao critério fundamental que orienta o Direito do Trabalho

pois este, ao invés de inspirar-se num propósito de igualdade, responde ao objetivo de estabelecer um amparo preferencial a uma das partes: o trabalhador. Enquanto no direito comum uma constante preocupação parece assegurar a igualdade jurídica entre os contratantes, no Direito do Trabalho a preocupação central parece ser a de proteger uma das partes com o objetivo de, mediante essa proteção, alcançar-se um a igualdade substancial e verdadeira entre as partes.” (RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de direito do trabalho. Tradução Wagner Giglio. São Paulo: LTr, 1978. p. 27). Lembre-se que o artigo 8°, da CLT dispõe que na ausência de disposições legais ou contratuais, as autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por equidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho.

87 “O § 2° do artigo 114 da Constituição leva o intérprete a entender que a Justiça do Trabalho pode estabelecer normas e condições em dissídios coletivos de natureza econômica, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente. As condições legais mínimas são as previstas na Constituição e na legislação ordinária, como, por exemplo, adicional de horas extras de 50%, aviso prévio de 30 dias etc. Já que as disposições convencionais não podem ser modificadas pela Justiça Obreira, pode-se pensar que haveria a incorporação das convenções ou acordos coletivos aos contratos de trabalho, havendo, assim, o entendimento de que as cláusulas da convenção ou acordo anteriores ao julgamento, por serem garantias mínimas dos trabalhadores, irão se incorporar ao contrato de trabalho. O Poder Judiciário não poderá elimina-las, o que ficará a cargo das próprias partes interessadas, em razão da autonomia privada coletiva que possuem, o que poderá ser feito em novo acordo ou convenção coletiva, mas não por meio de dissídio coletivo.” (MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 817). Orlando Gomes fala do efeito da “ultra-atividade” da convenção coletiva, para explicar a sua vigência após o prazo de duração, enquanto as partes discutem a elaboração de uma nova. As cláusulas ajustadas anteriormente, já radicadas nos usos das empresas pela sua prolongada execução, subsistem até a emanação de novo convênio coletivo. Vide GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Élson. Curso de direito do trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 589.

88 “Ora, diante da liberdade “contratual” existente, somado à igualdade das partes no momento da negociação, é forçoso reconhecer que o ajustado tem eficácia plena.” (TEIXEIRA JUNIOR, João Régis. Convenção coletiva de trabalho. São Paulo: LTr, 1994. p. 74-5). Depreende-se da leitura, que as partes são livres para pactuar acerca do prazo de vigência das normas coletivas, não havendo óbice, se assim entendessem, em pactuar sobre a incorporação das cláusulas normativas. Entretanto, não estabelecendo-se esta regra, o contraponto está previsto no texto legal que estipula prazo de vigência limite, na própria lei, sendo que o mesmo resta fixado em cláusula convencional.

89 Referido dispositivo celetista é próprio dos contratos individuais de trabalho, que por sua natureza distinguem-se dos contratos coletivos de trabalho. O primeiro alcança apenas as partes contratantes, enquanto o segundo é aplicável a todos os integrantes de uma determinada categoria.

90 “É possível afirmar que os sindicatos não têm poder normativo algum! [...] É preciso ressaltar que as entidades sindicais têm a prerrogativa de firmar “Acordos e Convenções Coletivas de Trabalho”, refletindo o poder e a vontade das categorias representadas. Considerando a natureza contratual dos instrumentos normativos, e sendo contrato-norma (Kelsen), não resta qualquer dúvida quanto ao efeito obrigacional das cláusulas avençadas, que não se confunde com o poder normativo do Estado.” (TEIXEIRA JUNIOR, João Régis. Convenção coletiva de trabalho. São Paulo: LTr, 1994. p. 76-7.). A afirmativa do autor é sustentada, entre outros argumentos, na mudança de modelo sindical, anterior à Constituição e posterior à mesma, no que tange ao poder de ingerência do Estado na criação, organização e funcionamento de uma entidade sindical. Segundo ele, com a Constituição de 1988, desapareceu a figura dos sindicatos como “exercentes de funções delegadas do Estado”. A partir da Constituição de 1988, os sindicatos passaram a personalidade jurídica de direito privado.

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d) Caráter temporário das convenções coletivas, com vigência temporal

limitada.91

e) Desmotivação das categorias para a negociação coletiva.92

f) Contraponto ao direito adquirido.

Os ensinamentos de Maurício Godinho Delgado, apontam três correntes

principais, para explicar a aderência das regras coletivas aos contratos coletivos de

trabalho. São elas: a aderência irrestrita; posição interpretativa e aderência limitada por

revogação.

“A primeira (aderência irrestrita) sustenta que os dispositivos de tais diplomas

ingressam para sempre nos contratos individuais, não mais podendo deles ser

suprimidos. Na verdade, seus efeitos seriam aqueles inerentes à cláusulas contratuais,

que se submetem à regra do artigo 468, CLT”.93 Enfraquecida a partir da Constituição de

1988, que impulsionou a negociação coletiva no Brasil.

A segunda (aderência limitada pelo prazo), refere:

Que considera que os dispositivos dos diplomas negociados vigoram no prazo assinado a tais diplomas, não aderindo indefinidamente a eles (aderência limitada pelo prazo). Aplicar-se-ia, aqui, o mesmo critério do Enunciado 277, TST (embora este se dirija à sentença normativa, como se sabe). Tal vertente tem tido prestígio significativo na jurisprudência dos últimos anos, certamente pelo fato de ter assimilado o caráter de norma jurídica hoje inerente aos dispositivos convencionais.94

A terceira corrente, defende a (aderência limitada por revogação):

Para esta posição intermediária, os dispositivos dos diplomas negociados vigorariam até que novo diploma negocial os revogasse. É óbvio que a revogação consumar-se-ia não apenas de modo expresso, podendo também se passar tacitamente (tal como acontece com qualquer norma jurídica). A revogação tácita ocorreria, por exemplo, em virtude de o novo diploma regular o conjunto da matéria omitindo preceitos da velha convenção ou acordo coletivo, independentemente de haver efetiva incompatibilidade entre dispositivos novos e antigos; ocorreria também se despontasse incompatibilidade entre os preceitos confrontados.95

91 “[...] Entretanto, assinala-se o caráter temporário das convenções coletivas, com vigência temporal limitada,

de maneira a se impossibilitar a sua integração aos contratos individuais” (BATALHA apud TEIXEIRA JUNIOR, João Régis. Convenção coletiva de trabalho. São Paulo: LTr, 1994. p. 78.).

92 “A tese da incorporação das cláusulas da norma coletiva traz desestímulo à negociação coletiva, em razão de que o empregador não irá querer a integração no contrato de trabalho de algo que será permanente e não mais poderá ser negociado.” (MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 819).

93 DELGADO, Maurício Godinho. Direito coletivo do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2003, p. 156. 94 Ibidem, p. 157. 95 DELGADO, loc. cit.

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Com certeza, a terceira posição retrata maior equilíbrio e responsabilidade por se

harmonizar aos interesses do Direito Coletivo, visa regulamentar provisoriamente os

interesses das partes convenentes, aperfeiçoando as condições laborais. A seguir

demonstra-se três casos de aplicabilidade possíveis, conforme corrente referida

anteriormente.

Primeiro caso

Recentemente o TST julgou neste sentido (aderência limitada por revogação),

considerando a nova redação do artigo 114, §°, da CF. A Justiça do Trabalho pode

decidir o dissídio coletivo, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao

trabalho, bem como as convencionadas anteriormente. No RODC 53/2004, TST aplica

Emenda Constitucional 45 e mantém cláusula preexistente de dissídio.96

Neste caso, o Tribunal Superior do Trabalho decidiu manter, em dissídio

coletivo, cláusulas preexistentes referentes à participação nos lucros e resultados e

abono salarial único. As duas cláusulas foram estabelecidas em dissídio coletivo, de

2003, do Sindicato das Sociedades de Crédito, Financiamento e Investimento de Minas

Gerais e o Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de Belo

Horizonte, Região e Outros, e mantidas pelo Tribunal Regional do Trabalho de Minas

Gerais (3ª Região) no dissídio coletivo de 2004.

No recurso, o sindicato patronal contestou “o deferimento, nas mesmas condições

do ano anterior, de parcela referente à participação nos lucros e resultados, bem como de

abono salarial, porque essas vantagens, mais do que quaisquer outras, realmente somente

podem decorrer de livre negociação coletiva.” Também alegou que houve a

recomposição dos salários pelo índice total do INPC do período, não se justificando o

acréscimo do abono.

A lei que trata da participação dos trabalhadores nos lucros e resultados da

empresa (n° 10.101/2000) condiciona esse benefício à negociação entre as partes,

mediante a constituição de uma comissão paritária ou celebração de acordo coletivo, o

que, segundo Barros Levenhagen, “se traduz na imprescindibilidade da negociação entre

os protagonistas das relações coletivas de trabalho”.

96 O relator ministro Barrros Levenhagen ressaltou que a objeção do sindicato patronal ao abono foi suplantada

pela evidência de que a categoria profissional já havia recebido esta verba anteriormente, acumulado com a recomposição salarial, “sem que houvesse demonstração contundente da inviabilidade financeira da sua revalidação em sede de dissídio coletivo” (BRASIL. Superior Tribunal do Trabalho. RODC 53/2004. Notícias do Tribunal Superior do Trabalho, Brasília, 20 abr. 2005. Disponível em: <http:://www.tst.gov.br>).

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No caso, porém, trata-se de cláusulas preexistentes, cuja manutenção é prevista

na Emenda Constitucional n° 45, disse o relator,“esse comando já se achava

subentendido na antiga redação do parágrafo 2° do artigo 114, que assinalava caber à

Justiça do Trabalho estabelecer normas e condições, respeitadas as disposições

convencionais e legais mínimas de proteção ao trabalho”.

Segundo caso

A Orientação Jurisprudencial n° 41 da SDI-1, do TST, assegura estabilidade aos

empregados que sofrerem acidente ou doença profissional, atendidos os requisitos

legais, ainda durante a vigência do instrumento normativo, não perdendo a condição de

estável, após o término da vigência deste.

Renato Rua de Almeida, citado por Francisco Ferreira e Jouberto de Quadros,

explica o que chama de vantagem individualmente adquirida,

no entanto, há uma exceção ao princípio da não incorporação definitiva das cláusulas normativas nos contratos individuais de trabalho. Trata-se da hipótese que o direito francês convencionou chamar de vantagem individualmente adquirida por força da aplicação de cláusula normativa. Essa exceção foi consagrada no direito francês pela Lei Auroux, de 13 de novembro de 1982 (Código do Trabalho, artigo L, 132-8, alínea 6), que serve, inclusive, de elemento para o juiz brasileiro decidir, aplicando a incorporação definitiva da cláusula normativa no contrato individual de trabalho, diante da falta de disposição legal expressa, com efeito amplo, por ser o direito comparado um método importante de integração do direito, conforme, aliás, previsto pelo artigo 8° da CLT. As vantagens individuais, no dizer de Gerard Couturier, são aquelas diretamente relacionadas ao empregado, distinguindo-se das vantagens coletivas dirigidas à representação eleita ou sindical dos trabalhadores na empresa (Convenção 135 da OIT), que no caso do direito brasileiro seria, por exemplo, alguma vantagem especial dos representantes eleitos pelos empregados para a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA’s), prevista pelo artigo 163 da CLT, ou daquelas relacionadas à organização interna de trabalho na empresa (garantias disciplinares, alteração de horário, intervalos etc.). Em complemento, essas vantagens, para se incorporarem aos contratos individuais de trabalho, devem estar individualmente adquiridas, isto é, o empregado tenha delas se beneficiado ou implementado as condições para beneficiar-se. Por último, tais vantagens individuais devem ter caráter continuado e não casual ou ocasional, bem como não depender de evento futuro e incerto..97

97 ALMEIDA apud JORGE NETO, Francisco Ferreira. Manual de direito do trabalho. 2. ed. Rio de Janeiro:

Lúmen Júris, 2004. p. 1578-79.

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Terceiro caso

A revogação da Lei 8.542/92 e a vigência dos instrumentos normativos. O § 1° do

artigo 1° da lei n° 8.542/92 disciplinou que as cláusulas dos acordos, contratos e

convenções coletivas de trabalho integram os contratos individuais de trabalho e

somente poderão ser reduzidas ou suprimidas em posterior acordo, convenção ou

contrato coletivo de trabalho.

Para Sérgio Pinto Martins,

não se diga que tal dispositivo, por estar contido numa lei de política salarial, não se aplica ao contrato, pois ele mesmo dispõe que há a integração das cláusulas da norma coletiva no contrato individual de trabalho. Pouco importa que tal lei seja norma de política salarial, pois as leis podem tratar de vários assuntos ao mesmo tempo, e não de um único. A Lei n° 10.192/2001, em seu artigo 10, estabelece que os salários e demais condições referentes ao trabalho continuam a ser fixados e revistos na respectiva data-base, por intermédio de livre negociação coletiva. Isto mostra que as cláusulas das normas coletivas passam a não mais se incorporar ao contrato de trabalho depois da perda de sua vigência, pois podem também ser modificadas na data-base anual. O artigo 18 da Lei n° 10.192 revoga o §° do artigo 1° da Lei n° 8.542/92. Assim, pode-se dizer, agora, que as cláusulas de normas coletivas não se incorporam aos contratos individuais de trabalho, pois o único dispositivo que assim dispunha expressamente foi revogado.98

Há que se fazer, uma interpretação atenta ao posicionamento do autor, no que

refere-se a revogação do artigo 1°, § 1° da Lei n° 8.542/92, considerando-se a Emenda

Constitucional n° 45 e a redação do artigo 114, § 2° da Constituição Federal.

Existe a possibilidade legal de prorrogar-se o valor salarial anteriormente

avençado, bem como, as condições de sua reposição, respeitando, desta forma, as

disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas

anteriormente.

98 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 818.

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II ULTRATIVIDADE DAS NORMAS COLETIVAS COMO MEIO DE

POSTERGAR A VIGÊNCIA DAS NORMAS COLETIVAS FACE A NOVA

NEGOCIAÇÃO COLETIVA

1 NOÇÕES GERAIS

Ultra, prefixo que significa além de, excesso, conforme Dicionário Escolar da

Língua Portuguesa.99 De acordo com as regras gerais de Direito do Trabalho, as normas

coletivas poderão estabelecer condições mais vantajosas aos trabalhadores, observado o

princípio da tutela.

Para Adriana Leandro de Sousa,

observado este mínimo, podem os contraentes estabelecer entre si outras regras a serem observadas por eles, geradoras de direitos e deveres para ambos. Comumente, tais normas são firmadas nos regulamentos de empresa, que têm como conceito o conjunto de normas de ordem técnica e disciplinar prevendo direitos e obrigações aos empregados e patrões, que não podem desrespeitá-las face à adstrição a elas, sob pena de infringirem os contratos de trabalho ou alterá-los (art. 468, da CLT). Tais cláusulas, por se incorporarem definitivamente aos contratos de trabalho, têm cunho adesivo, ou seja, são impostas aos empregados, que as aceitam tácita ou expressamente sem contestá-las ao iniciar a prestação de serviços ou no curso desta. Tornam-se, igualmente, inafastáveis, haja vista o entendimento sumulado no En. 51 do C. TST.100

Por meio das negociações coletivas, as partes poderão criar novas condições de

trabalho, como aliás autoriza o próprio texto legal em seu artigo 611 e seguintes da

CLT.

Orlando Gomes ao explicar “ultra-atividade” da convenção coletiva diz que “os

autores referem-se, também, ao efeito da ‘ultra-atividade` da convenção coletiva, para

significar a sua vigência após o prazo de duração, enquanto as partes discutem a

elaboração de uma nova”.101

99 BUENO, Francisco da Silva. Dicionário escolar da língua portuguesa. 11. ed. Rio de Janeiro: Fename,

1980. 100 SOUSA, Adriana Leandro de. A incorporação de cláusulas de acordo ou convenção coletiva nos contratos

de trabalho. Gênesis, Curitiba, v. 7, n. 42, p. 758-804, jun. 1996. 101 GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Élson. Curso de direito do trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.

589.

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Estariam as partes asseguradas pela vigência da norma pré-existente, enquanto

negociam as novas condições de trabalho para o período de vigência imediatamente

posterior.

Quando a doutrina refere-as às “novas condições de trabalho”102, entenda-se

mantença ou modificação total ou parcial das cláusulas pré-existentes. Assim os

empregados e empregadores ficam livres a cada processo negocial, para deliberarem

aquilo que lhes for mais vantajoso.

Emílio Gonçalves103 ensina que:

[...] uma vez celebrada, passa a convenção coletiva a constituir contrato tipo, aplicando-se aos contratos de trabalho vigentes e impedindo que, nos contratos de trabalho que vierem a ser ajustados posteriormente, possam ser inseridas condições contrárias ou em desacordo com as que tiverem sido ajustadas no pacto coletivo. Neste sentido o disposto no artigo 619, da CLT [...].

1.1 ALTERAÇÕES IN MELLIUS E IN PEJUS DAS CONVENÇÕES COLETIVAS E A

DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Como visto anteriormente, segundo doutrinadores citados, as normas coletivas,

na expressão da autonomia coletiva da vontade, podem flexibilizar-se em detrimento de

cláusulas in melius, para criação de cláusulas in pejus, desde que respeitada a vigência

das mesmas.

Para Rodrigo Goldschmidt,

o artigo primeiro da Constituição estabelece que a República Federativa do Brasil tem como fundamentos, entre outros que expressamente arrola, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa. Ditos fundamentos, vistos numa perspectiva sistêmica, ao mesmo tempo em que inspiram as normas constitucionais, embasam também o direito do trabalho. De fato, por detrás do conflito entre capital (livre iniciativa) e o

102 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2004. p. 1376. “As

convenções coletivas, embora de origem privada, criam regras jurídicas (normas autônomas), isto é, preceitos gerais, abstratos e impessoais, dirigidos a normatizar situações ad futurum”.

103 GONÇALVES, Emílio. Vigência ultratemporal das cláusulas normativas de convenção coletiva de trabalho. Revista de Direito do Trabalho, São Paulo, v. 12, n. 68, p. 76, jul./ago. 1987.

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trabalho está o homem, cuja dignidade, em última análise, as normas constitucionais e trabalhistas visam (e devem necessariamente) preservar.104

Cuidar da dignidade da pessoa humana ao criar normas coletivas que visam

interesses antagônicos, faz-se essencial para o respeito ao cidadão. E, não é missão fácil

como parece ser, considerando-se que os empregadores enfrentam diariamente situações

complexas a serem resolvidas no plano econômico e tributário.

Com essa perspectiva, Carmen Camino,105 parafraseada por Rodrigo

Goldschmidt,

registra que o direito do trabalho está passando por uma crise sem precedentes, gerada pela globalização da economia, que dita feroz concorrência no mercado internacional, sem alterar para as profundas desigualdades históricas, filosóficas, culturais e econômicas dos povos. Essa crise, segundo a mencionada autora, deságua no questionamento de alguns postulados fundamentais do direito do trabalho, vistos como óbices ao progresso econômico dos povos. Nessa linha, prossegue dizendo que, na flexibilização dos princípios e na desregulamentação das regras, privilegia-se a autocomposição entre empregados e empregadores e a gradativa retirada do Estado da relação entre capital e trabalho. Com olhos críticos, Camino adverte sobre a necessidade de adequar a atividade produtiva à concorrência de mercado, sem maior atenção ao custo social que daí possa advir para as economias subdesenvolvidas ou em fase de desenvolvimento, mediante uma indiscriminada flexibilização dos princípios trabalhistas, o que constitui retrocesso e não evolução.106

José Roberto Dantas Oliva, bem salienta a possibilidade de alterações in pejus às

cláusulas de convenção ou acordo coletivo de trabalho, uma vez que os direitos

conquistados podem ser reduzidos ou suprimidos. Tal posicionamento é pacífico em

nossos tribunais, muito embora esteja em pleno vigor o teor do artigo 468, da CLT, que

veda qualquer alteração do contrato de trabalho que modifique, para pior, as condições

anteriormente existentes.

Isso se dá a despeito da respeitabilidade do prazo de vigência estipulado nos

pactos coletivos de no máximo dois (2) anos (art. 614, § 3°, da CLT), expirado referido

104 GOLDSCHMIDT, Rodrigo. Reflexões sobre o direito do trabalho e flexibilização: o trabalho, a livre

iniciativa e a dignidade da pessoa humana: uma visão sistemática. Passo Fundo: UPF, 2003. p. 132. 105 CAMINO, Carmen. Direito individual do trabalho. Porto Alegre: Síntese, 1999. p. 70. “Os contratos, as

convenções e os acordos coletivos de trabalho consusbstanciam, também, regras gerais e abstratas, aptas a disciplinar as relações de trabalho no âmbito de determinado segmento da atividade econômica. São normas estabelecidas em comum acordo, entre representações do capital e do trabalho, pelos próprios interessados e destinatários do seu comando, no âmbito da livre negociação categorial”.

106 Ibidem, p. 132-33.

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prazo cessarão também, automaticamente, os direitos naqueles previstos, a não ser que

renovados por novos convênios.107

Com a revogação definitiva108 dos §§ 1° e 2° da L. 8.542/92 pelo art. 18 da L.

10.192, de 14.02.2001 (que dispõe sobre medidas complementares ao Plano Real e dá

outras providências), perdeu força a tese da incorporação de vantagens conferidas por

cláusulas normativas aos contratos individuais de trabalho. É que o revogado parágrafo

1° previa: “as cláusulas dos acordos, convenções ou contratos coletivos de trabalho

integram os contratos individuais de trabalho e somente poderão ser reduzidas ou

suprimidas por posterior acordo, convenção ou contrato coletivo de trabalho”.109

Mas diante deste contexto, como ficariam os direitos fundamentais dos

trabalhadores? Para tanto, passaremos a estudar no item 3 (infra), a importância dos

direitos fundamentais nas relações privadas face a convenção coletiva de trabalho em

confronto com a lei.

Salienta-se por oportuno que a lei não pode sucumbir diante dos convênios

coletivos, justamente porque a mesma possui o poder que o Estado necessita para

regulamentar as relações jurídicas entre as partes mantendo-as em harmonia e paz

social.110

107 OLIVA, José Roberto Dantas. Convenções e acordos coletivos:conteúdo, alterações in mellius e in pejus e

teorias do conglobamento. E da acumulação. A proposta de prevalência do negociado sobre o legislado. Síntese Trabalhista, Porto Alegre, n. 153, p. 110-143, mar. 2002.

108 Os dispositivos já haviam sido revogados anteriormente por Medidas Provisórias, sendo que a última, a MP 2.074-73, de 2001, foi convertida na lei em questão.

109 OLIVA, op. cit., p. 125. 110 DESZUTA lembra que o PODER é exercido pela LEI. Nesse aspecto: “ESTADO DE DIREITO, conforme

retrata DESZUTA, Joe Ernando. Um direito do trabalho mínimo ou um mínimo de direito do trabalho? bases para um novo direito do trabalho. Revista Justiça do Trabalho, Porto Alegre, n. 255, p. 41-2, mar. de 2005, nas palavras do autor expressam, “o Estado de Direito, por sua vez, - que representa a noção de Estado Moderno -, se estabelece a partir do momento em que o Direito é quem regula o exercício do Poder, ou seja, o poder é exercido por legem – por meio de leis genéricas e abstratas – e sub lege – onde todo o Poder se submete ao Direito.”

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2 FUNÇÃO DO ESTADO NAS RELAÇÕES PRIVADAS, SUPORTE PARA A

DEFESA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Hodiernamente fala-se em autonomia da vontade coletiva, atribuindo-se à

negociação coletiva poder normativo, afastando-se o Estado de seu papel controlador,

protetor das relações coletivas, e por conseqüência das individuais.

Com o Princípio de Tutela, atribui-se ao Estado o dever de criar leis que

assegurem os direitos da sociedade, principalmente aos menos favorecidos. Por isso,

diz-se que os direitos trabalhistas são impositivos, indisponíveis, irrenunciáveis, e que

caracterizam-se por normas de ordem pública.

Para Délio Maranhão,

no direito comum, a regra é a da disponibilidade dos direitos privados patrimoniais. Em matéria de trabalho, a indisponibilidade dos direitos prende-se à natureza predominantemente dos interesses em jogo. Pode ser: a) absoluta, quando a tutela legal do trabalho envolve, predominantemente, interesse público (salário mínimo: art. 7°, da CF) ou interesse abstrato de categoria (normas resultantes de convenção coletiva ou sentença normativa).

Nesses casos, o interesse imediato e predominantemente tutelado não é o do indivíduo como tal, mas como membro de uma classe social ou de uma categoria profissional; b) relativa, quando por ser o direito, em princípio, disponível, tutelando, predominantemente, interesse individual, cabe ao seu titular a iniciativa de defendê-lo, como no caso do salário do contrato. Nunca se verifica a plena disponibilidade dos direitos oriundos da relação de trabalho, ainda que de caráter privado e patrimonial. A limitação decorre do artigo 468, da CLT, que considera nula a alteração, mesmo bilateral, das condições do contrato, desde que prejudicial ao empregado. A nulidade é, no entanto, relativa, dependendo sua declaração do exercício, pelo empregado, através de ação judicial, de um direito subjetivo em que prepondera o interesse privado, sujeito, por isso, à prescrição, na vigência do contrato, os créditos resultantes dessa nulidade (art. 7°, XXIX, da CF).111

O Estado sinaliza, através de leis ordinárias e constitucionais, as garantias

mínimas aos trabalhadores, para efetivação de seu papel tutelar, a fim de que, em

processo negocial, conquistem novas condições de trabalho, respeitadas as normas de

ordem pública.

O artigo 444, da CLT, disciplina que “as relações contratuais de trabalho podem

ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não contravenha

às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis

111 MARANHÃO, Délio; CARVALHO, Luiz Inácio B. Direito do trabalho. 17. ed. Rio de Janeiro: Fundação

Getúlio Vargas, 1993. p. 40.

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e às decisões das autoridades competentes”. Assim como o artigo 9° do mesmo diploma

prevê que, “serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar,

impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação”.

Seguindo-se este raciocínio, fica fácil, por óbvio, concluir que o papel do Estado

é indispensável, para garantir aos “hipossuficientes”112 seus direitos sociais

fundamentais.

Razão assiste a Norberto Bobbio, quando afirma que:

Só de modo genérico e retórico se pode afirmar que todos são iguais com relação aos três direitos sociais fundamentais (ao trabalho, à instrução e à saúde); ao contrário, é possível dizer, realisticamente, que todos são iguais no gozo das liberdades negativas. E não é possível afirmar aquela primeira igualdade porque, na atribuição dos direitos sociais, não se podem deixar de levar em conta as diferenças específicas, que são relevantes para distinguir um indivíduo de outro, ou melhor, um grupo de indivíduos de outro grupo.” [...] É supérfluo acrescentar que o reconhecimento dos direitos sociais suscita, além do problema da proliferação dos direitos do homem, problemas bem mais difíceis de resolver no que concerne àquela “prática” de que falei no início: é que a proteção destes últimos requer uma intervenção ativa do Estado, que não é requerida pela proteção dos direitos de liberdade, produzindo aquela organização dos serviços públicos de onde nasceu até mesmo uma nova forma de Estado, o Estado social. Enquanto os direitos de liberdade nascem contra o superpoder do Estado – e, portanto, com o objetivo de limitar o poder - , os direitos sociais exigem, para sua realização prática, ou seja, para a passagem da declaração puramente verbal à sua proteção efetiva, precisamente o contrário, isto é, a ampliação dos poderes do Estado.113

Norberto Bobbio, em sua obra intitulada “Estado, Governo e Sociedade: Para

uma teoria geral da política”, aborda as várias espécies de Estado, do feudal ao social e

para defini-lo, entre outros, faz referência ao conceito jurídico de Estado que é feito

através de três elementos constitutivos: o povo, o território e a soberania. Para tanto, cita

Mortati, que diz: “Estado é um ordenamento jurídico destinado a exercer o poder

soberano sobre um dado território, ao qual estão necessariamente subordinados os

sujeitos a ele pertencentes”. Referindo até mesmo, os que afirmam não ser possível

definir o Estado, e as associações políticas, como Weber. 114

112 Expressão utilizada por Cesarino Junior citado por Américo Plá Rodrigues, quando refere-se aos obreiros.

Vide também, RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de direito do trabalho. Tradução Wagner Giglio. São Paulo: LTr, 1978. p. 29. “Cesarino Jr. A resumiu numa frase feliz: ‘Sendo o direito social, em última análise, o sistema legal de proteção dos economicamente fracos (hipossuficientes), é claro que, em caso de dúvida, a interpretação deve ser sempre a favor do economicamente fraco, que é o empregado, se em litígio com o empregador´”.

113 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução Carlos Nelson Coutinho. 10. ed. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p. 71-2.

114 Idem. Estado, Governo, Sociedade: para uma teoria geral da política. Tradução Marco Aurélio Nogueira. 9. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2001. p. 94.

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Mônica Sette Lopes nos traz uma constatação importante para a função do Estado

nas relações privadas, como segue: “Todavia, como precedente para o situar da

convenção coletiva está precisamente a autonomia coletiva, a qual, por certo, choca-se

com o intervencionismo estatal, induzindo a que se pontuem, no contexto do sistema

jurídico, os mecanismos com os quais se pode ou se deve exercer o poder autônomo de

editar norma jurídica vinculante”. 115

Maria Cristina Haddad de Sá,116 em análise à omissão estatal, afirma:

Envolto por uma política liberal, o Estado se fazia omisso à questão social, donde surgiu a necessidade de os trabalhadores se organizarem em sindicatos. [...] Nesse clima, envolvendo inclusive as greves, os trabalhadores aos poucos foram conseguindo concessões, a princípio de natureza salarial, até as mais diversas conquistas. Essa autonomia é o resultado da iniciativa dos particulares; é tolerada pelo Estado, mas não elaborada por ele. Embora esses órgãos tenham autonomia, importante lembrar que ela é relativa, encontrando os seus limites na própria lei.

Exatamente no papel legiferante é que o Estado117 pode garantir os direitos

fundamentais118, frente à autonomia privada coletiva. Mesmo que represente a vontade

das partes, não se pode esquecer que estamos diante do capital versus trabalho, que a

fim e ao cabo representam interesses antagônicos.

Facilmente aqui teríamos colisão de princípios de direitos fundamentais, por

tratar-se de interesses antagônicos, por um lado a empresa, buscando o fortalecimento

econômico, ou simplesmente lutando para manter-se; e por outro lado, o empregado,

sempre almejando conquistas econômicas em decorrência de sua força produtiva. Ambos

115 LOPES, Mônica Sette. A convenção coletiva e sua força vinculante. São Paulo: LTr, 1998. p. 83. 116 SÁ, Maria Cristina Haddad. Negociação coletiva de trabalho no Brasil. São Paulo: LTr, 2002. p. 36. 117 A crise do sistema intervencinista em 1929, leva a seguinte conclusão: Para Keynes, apud Octavio Bueno

Magano, “A inadequação do modelo foi diagniosticada por Keynes, como decorrente da não utilização de todas as potencialidades da economia, o que, a seu turno, ocasionava o desemprego. A maneira de a suportar seria se ocupar o Governo não de equilibrar as próprias contas, mas de assegurar a demanda efetiva, suficiente para manter o pleno emprego. Surge, assim, o arcabouço teórico do Estado-Providência, implantado primeiramente na Inglaterra, após a Segunda Grande Guerra Mundial, através do Plano Beveridge, mediante a instalação de aparatoso sistema de seguridade.” (MAGANO, Octávio Bueno; MALLET, Estêvão. O direito do trabalho na constituição. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. p. 5). Vide também nota n. 8, da obra citada, onde o autor elenca as providências estatais para a solução dos problemas econômicos sob a chamada dos princípios norteadores do Estado Providência, como sendo os seguintes: “1) não há bem-estar sem renda satisfatória oriunda do trabalho; 2) incumbe ao estado assegurar, por via de política fiscal, redistribuição de renda; 3) o Estado deve ser o principal responsável contra riscos sociais como doenças, invalidez, desemprego; 4) as aplicações de numerários em favor dos grupos sociais mais vulneráveis podem ser feitas de vários modos: prestações diretas do estado; subvenções que visem à diminuição de preços de bens e produtos essenciais, como transporte, saúde, educação.”

118 ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedida, 1987. p. 11-42. Refere-se o autor às três dimensões dos direitos fundamentais ao longo de sua evolução, tais como: perspectiva jusnaturalista ou filosófica; perspectiva universalista ou internacionalista e perspectiva estadual ou constitucional.

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têm razão, têm direitos a defender, os empregadores, o desenvolvimento econômico, a

mantença de empregos, a diminuição de custos; enquanto os empregados reivindicam

melhores salários, melhores condições de trabalho, com respeito à saúde, para

assegurarem ou conquistarem um nível de vida digno, que lhes oportunize a saúde, a

educação e o trabalho.

Após analisar vários autores, notadamente Gino Giugni, citado por Mauro

Medeiros, conclui que:

A autonomia coletiva favorece o direito à livre negociação coletiva, a transferência do poder normativo do Estado para a ordem sindical-profissional, o poder dos grupos sociais, de auto-elaboração da regra jurídica, a tutela sindical no lugar da estatal, distinguindo entre os direitos, aqueles que podem ser protegidos pela lei e aqueles que podem ser negociados pelos sindicatos.119

Após a fala de Gino Giugni citado por Mauro Medeiros, percebe-se que a

autonomia privada individual e coletiva mantém relações diferentes com o Estado. Na

autonomia privada individual, o Estado tende a impor limites, para assegurar os direitos

individuais, agindo como um Estado intervencionista. Na autonomia privada coletiva, o

Estado delega poderes aos grupos, devidamente organizados (entidades sindicais) para

solucionar os conflitos coletivos de trabalho, através das negociações coletivas, das

quais surgirão as convenções coletivas ou acordos coletivos com força normativa,

autorizada pelo próprio Estado, em lei. Delega poderes à autonomia coletiva da vontade,

cedendo ao intervencionismo, porém, distinguindo entre os direitos que devem ser

protegidos pela lei e aqueles que podem ser negociados pelos sindicatos.

Segundo Leon Duguit:120

Portanto, a discussão acerca do fim a que se destina o Estado, ou poder político, pode ser esclarecida considerando-se que o poder político tem por fim realizar o direito, comprometendo-se, em virtude do direito, a realizar tudo que estiver ao seu alcance para assegurar o reino do direito. O Estado fundamenta-se na força, e a esta força legitima-se quando exercida em conformidade com o direito. Não aceitamos, nos moldes de Ihering, o direito como a política da força, mas sim que o poder político é a força a servi-lo.

Sendo o fim do Estado essencialmente um fim de direito, e só podendo manifestar a sua atividade em conformidade com o direito e dentro de seu domínio, os atos que venham a ser realizados devem estar classificados segundo o efeito desencadeado no mundo do direito. Assim chegamos a distinguir como funções do Estado: a legislativa, a jurisdicional e a administrativa.

119 MEDEIROS, Mauro. A interpretação da convenção coletiva de trabalho. SãoPaulo: LTr, 2003. p. 72. 120 DUGUIT, Leon. Fundamentos do direito. Tradução Márcio Pugliese. São Paulo: Ícone, 1996. p. 51-2.

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Na função legislativa, o Estado constitui o direito objetivo ou regra de direito; elabora a lei que se impõe a uma sociedade, e por ser a expressão do direito objetivo, sobrepõe-se a todos. Pela função jurisdicional, o Estado intervém, nas ocasiões de violação do direito objetivo ou nas contestações relativas à existência ou extensão de uma situação jurídica subjetiva; ordena a reparação, repressão ou anulação, conforme o caso, quando há dolo do direito objetivo; estabelece as medidas pertinentes para assegurar a consecução de situações jurídicas subjetivas de que reconhece a existência e a extensão.

Enquanto função administrativa, o Estado consuma atos jurídicos, isto é, intervindo nos limites do direito objetivo, cria situações jurídicas subjetivas ou efetiva providências, gerando uma situação legal ou objetiva.

Oportuno salientar que:

Em razão desta concepção, que Kelsen denominou “monista”, estamos trabalhando com uma noção de Direito que não pode mais ser mantida em nossa época, ou seja, estamos todos insistindo em manter um tipo de Direito, um conhecimento sobre o Direito, que seria mais apropriado para o século passado, ou, no máximo, para o início do século XX. [...] Isto, em resumo, que nós não podemos mais manter o mesmo tipo de raciocínio jurídico, ligado somente à noção de Estado, sem com isto deixar de compreender a irrupção no cenário político de outros atores sociais, em algumas questões, até mais importantes que o próprio Estado.121

De outra banda, Paulo Dourado de Gusmão enfatiza o pluralismo jurídico sob a

seguinte orientação:

Examinado a história, chega-se à conclusão de que o direito pode surgir independentemente da ação do Estado. Já se disse que as convenções coletivas de trabalho, expressão, como querem uns, do direito social,122 atestam o declínio da lei e a sua impossibilidade de disciplinar relações que só os grupos interessados poderão fazê-lo de forma a satisfazer os interesses em conflito.123

121 ROCHA, Leonel Severo. Prefácio. In: BARZOTTO, Luis Fernado. O positivismo jurídico contemporâneo:

uma introdução a Kelsen, Ross e Hart. São Leopoldo: Unisinos, 1999. Ver especificamente prefácio de Leonel Severo Rocha, pp. 9-12. Observa-se mais um trecho do autor mencionado: “Outrossim, saliento que a resposta não passa pela dicotomia simplista entre Estado ou não Estado, ou, entre sociedade, em uma perspectiva mais fechada ou mais aberta, mas principalmente pela elaboração de toda uma nova lógica para se entender o paradoxo, de que o estado persiste, simultaneamente, em muitas questões como soberano e em outras não. Precisamos abrir a perspectiva de um raciocínio muito mais amplo para poder pensar que, em certos aspectos, o Estado continua forte, e em outros aspectos não tem mais nenhuma condição de interferir.” (Ibidem, p. 11).

122 GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao estudo do direito. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1978. p. 235. “Direito Social. – Entre o direito público e o direito privado se encontra o direito social. É o direito governado pela solidariedade social, em que o egoísmo e os interesses individuais de seus destinatários estão subordinados ao interesse social, de modo a integrar o indivíduo e as pessoas jurídicas (empresas, sociedades comerciais etc.), partes das relações jurídicas que deles brotam, em uma ordem de coordenação e paz social.”

123 Ibidem,p. 153.

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Assim, vê-se que as funções do Estado não se limitam aos poderes legislativo,

judiciário e executivo, e sim, cada vez mais ampliam sua competência e estabelecem

parcerias com o plano privado, para governar conjuntamente com o indivíduo,

possibilitando a atuação da sociedade no crescimento da mesma, trilhando os princípios

da igualdade e da dignidade da pessoa humana.

Os quatro status de Jellinek124 servem para demonstrar a relação do indivíduo

com o Estado, quaisquer que sejam suas características. O status deve ser uma situação,

distinguindo-se de um direito125.

O autor distingue quatro status, a seguir expostos:

a) Status Passivo – o indivíduo estaria subordinado aos poderes estatais, sendo,

neste contexto, meramente detentor de deveres, e não de direitos, significando de outra

banda, que o Estado possui a competência de vincular o cidadão juridicamente por meio

de mandamentos e proibições.

b) Status Negativo – Jellinek toma por base a idéia de ser dotado de

personalidade, reconhecendo ao indivíduo o status negativus, que consiste numa esfera

individual de liberdade imune ao jus imperii do Estado.

c) Status Positivo – Complementaria o status negativus, no qual ao indivíduo

seria assegurada juridicamente a possibilidade de utilizar-se das instituições estatais e

de exigir do Estado determinadas ações positivas. (Direitos a prestações estatais,

incluindo os direitos sociais).

d) Status Ativo – por fim Jellinek, complementa sua teoria com o reconhecimento

de um status civitatis ao cidadão, no qual este passa a ser considerado titular de

competências que lhe garantem a possibilidade de participar ativamente na formação da

vontade estatal, v.g. o direito de voto.

Diante do exposto, tem-se que, para um Estado Democrático de Direito, mister

que a sociedade participe mais, seja mais ativa, mais responsável, mais cúmplice do

processo de criação de normas e eficácia das mesmas. Entretanto, é sabido que sua

atuação cada vez mais significativa está relacionada à forma de interação com o Estado,

124 ALEXY, Robert. Teoría de los derechos fundamentales. Tradução Ernesto Garzzón Valdés. 2. ed. Madrid:

Centro de Estúdios Internacionales, 2001. p. 247-266. 125 Ibidem, p. 248. Diz o autor “Jellinek describe de variada manera qué es um status. Importância central tiene

su caracterización como “uma relación com el Estado que califica al individuo”. Un status es pues una relación del individuo con el Estado, cualesquiera que sean sus características. En tanto relación que califica al individuo, el status debe ser una situación y, en tanto tal, distinguirse de un derecho. Ello es así porque, como Jellinek lo expressa, tiene como contenido el “ser” jurídico y no el “tener” jurídico de una persona.” (Ibidem, p. 148).

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para tanto, busca isso num processo de desenvolvimento social, e também porque o

papel do Estado está para um Estado Social e não mais para um poder autocrático, sem

contudo, perder o poder estatal.126

2.1 RESPONSABILIDADE DO ESTADO

Ao falar-se em responsabilidade do Estado pela busca de normas que venham

atender aos anseios, tanto dos trabalhadores, como da classe patronal, relevante

questionar-se o grau de envolvimento entre poder político na esfera socioeconômica.

Esse aspecto é lembrado por José Felipe Ledur, quando trata da responsabilidade do

Estado pela busca de soluções para a falta de trabalho.127

Por analogia, poder-se-ia indagar sobre a responsabilidade do Estado na

fiscalização das normas coletivas que nascem no plano privado. Pois, o Estado ao

delegar competência aos particulares para ditarem regras, com força de norma, não pode

abdicar de seu poder mandamental, pois a ele compete o poder de legislar sobre matéria

trabalhista, conforme a Constituição Federal.

Para Konrad Hesse, a questão da Constituição Federal corresponde à realidade

fática ou jurídica e guarda relação com o ser e o dever-ser. Diz o autor,

graças à pretensão de eficácia, a Constituição procura imprimir ordem e conformação à realidade política e social. Determinada pela realidade social e, ao mesmo tempo, determinante em relação a ela, não se pode definir como fundamental nem a pura normatividade, nem a simples eficácia das condições sócio-políticas e econômicas.128

Assim, é insubstituível o papel do Estado na fiscalização das normas coletivas de

trabalho. Em especial, destaca-se o papel crescente do Ministério Público do Trabalho,

que através de ações anulatórias de cláusulas convencionais vem garantindo um certo

126 DELGADO, Mauricio Godinho. Democrocia e justiça: sistema judicial e controle democrático no Brasil.

São Paulo: LTR, 1993. p. 22. Diz o autor: “Democracia importa não apenas em distribuição ampliada do poder, mas, também, fundamentalmente, em controle societário sobre o poder distribuído. A natureza coercitiva do Estado impõe, desse modo, em uma Democracia, a institucionalização de controles democráticos sobre esse mesmo Estado. Noutras palavras, é próprio e inseparável ao imperativo democrático o estabelecimento de mecanismos de controle sobre as diversas instâncias do poder estatal.”

127 LEDUR, José Felipe. A realização do direito ao trabalho. Porto Alegre: Fabris, 1998. p. 147. 128 HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Tradução Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre:

Fabris, 1991. p. 15.

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equilíbrio entre a vontade dos particulares e os interesses do Estado, no que concerne a

tutela das próprias partes convenentes, reparando-se lesões de massa129.

José Cláudio Monteiro de Brito Filho atribui a participação mais ativa do

Ministério Público do Trabalho à criação de novos instrumentos para o desempenho

deste, como é o caso da ação anulatória e da lei Complementar n. 75/93 – Lei Orgânica

do Ministério Público da União.130

3 IMPORTÂNCIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES

PRIVADAS FACE A CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO EM

CONFRONTO COM A LEI

Assim como o Estado possui sua parcela de responsabilidade face ao exercício e

eficácia dos direitos fundamentais, também os particulares a possuem. Durante a

passagem dos séculos os direitos fundamentais se apresentaram com necessidades

distintas, dependendo do momento histórico em que foram vivenciados. A evolução dos

mesmos ao longo da história refletiram uma nova conduta social tanto do Estado face

aos particulares, como também dos próprios particulares entre si, e, em sua relação com

o Estado.

A importância dos direitos fundamentais pode ser vista sob suas diversas

gerações. Aqui enfatiza-se sua importância sempre relacionada às relações privadas, ou

seja: a sua importância face ao papel das convenções coletivas no Direito Coletivo do

Trabalho, que historicamente está vinculada aos direitos fundamentais de segunda

geração, predominando no século XX.

Edgard de Oliveira Lopes diz:

Proclamados nas Declarações solenes das Constituições marxistas e também na Constituição de Weimar, os direitos de segunda geração exerceram um papel preponderante nas formulações constitucionais após a segunda guerra. Cingidos ao princípio da igualdade – sendo esse a razão de ser daqueles – os direitos de segunda geração são considerados como sendo os

129 BRITO FILHO, José Cláudio Monteiro de. O Ministério Público do Trabalho e a ação anulatória de

cláusulas convencionais. São Paulo: LTr, 1998. p. 29. 130 Este salto é percebido por Hugo Nigro Mazzilli, que leciona que “a LOMPU muito avançou em matéria de

funções, atribuições e instrumentos de atuação do Ministério Público” (MAZZILLI, Hugo Nigro. Regime jurídico do Ministério Público. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 248).

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direitos sociais, culturais, coletivos e econômicos, tendo sido inseridos nas constituições das diversas formas de Estados sociais. 131

Quanto a esses direitos de segunda geração, salienta Bonavides:

[...] atravessaram, a seguir uma crise de observância e execução, cujo fim parece estar perto, desde que recentes constituições, inclusive a do Brasil, formularam o preceito da aplicabilidade imediata dos direitos fundamentais. De tal sorte, os direitos da segunda geração tendem a tornar-se tão justificáveis quanto os da primeira; pelo menos esta é a regra que já não poderá ser descumprida ou ter sua eficácia recusada com aquela facilidade de argumentação arrimada no caráter programático da norma.132

Ledur chama a atenção para o fato de que os direitos de primeira geração se

afirmaram contemporaneamente à formação do Estado Liberal. Trata-se de direitos que

traduzem afirmação do indivíduo com o propósito de impor limites à intervenção do

Estado no domínio privado.133

O mesmo não ocorre com os direitos de segunda geração, pois ao tratar de

direitos sociais, evidenciou-se que o indivíduo não era um ser tão autônomo como

pensava o Iluminismo, mas sim um ser frágil, indefeso e inseguro. Motivação suficiente

para que o Estado assumisse papel diferente com relação às minorias. Razão pela qual

retoma o seu papel tutelar, e, legisla a favor dos grupos sociais e das minorias.134

Urge ressaltar a importância dos direitos fundamentais, em especial nesse

momento histórico, que muito bem demonstra o cenário carecedor de proteção mais

eficaz. Se não bastasse, a história se repete, revelando-se carecedora de muito mais

direitos do que os anteriormente referidos, justamente pela crescente desigualdade social

e o desemprego135.

131 LOPES, Edgard de Oliveira. Os direitos fundamentais sob ótica das influências ético-filosóficas, consoante

o magistério de Hans Kelsen, Miguel Reale e Willis Santiago Guerra Filho. Jus Navigandi, Teresina, v. 6, n.56, abr. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.Br/doutrina/texto.asp?id=2872> Acesso em: 27 jun. 2006.

132 Vide BONAVIDES. Paulo. Curso de direito constitucional. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 518. 133 LEDUR, José Felipe. A realização do direito ao trabalho. Porto Alegre: Fabris, 1998. p. 159. 134 Ibidem, p. 161. 135 Ledur fala sobre “a íntima conexão entre os direitos civis e políticos [...] e os direitos sociais é cada vez mais

enfatizada, a ponto de se levantarem dúvidas acerca da consolidação da democracia e do Estado de Direito, se não forem enfrentados problemas como a crescente desigualdade social e o desemprego. Na verdade, se a pessoa não tem como prover adequadamente a sua existência mediante o acesso a uma moradia, à educação, à saúde, à previdência, ao trabalho, não terá aptidão para ser “cidadão privado”, mesmo porque sua dignidade estará comprometida. A falta dessas condições vitais não permitirá que venha a ser um “cidadão público”, que contribua na formação da vontade política direta e na pré-formação da vontade política da Nação, [...]”. (Ibidem, p. 162).

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Um dos motivos pelos quais as convenções coletivas de trabalho se apresentam

em confronto com a lei, no dizer de Arnaldo Süssekind, está relacionado com nosso

desenvolvimento econômico, o qual está freiado pelas elevadas taxas de juros e

tributação em cascata, além do baixo poder de consumo da grande maioria da

população.136

Além deste fato, o sistema legal foi objeto de flexibilização em importantes

aspectos da relação de emprego, os quais serão arrolados a título exemplificativo.

Lembrando-se ainda que o projeto de lei que introduz parágrafo primeiro ao artigo 618

da CLT permite que convenções e acordos coletivos prevaleçam, salvo em excepcionais

hipóteses, sobre a lei ordinária.

Direitos objeto da flexibilização: a) redução geral e transitória dos salários até

25%, por acordo sindical, quando a empresa for afetada substancialmente em situações

excepcionais da conjuntura econômica (L. 4.923/65); b) ampla liberdade patronal para

despedir os empregados (L. 5.017/66, que instituiu o regime do FGTS agora substituída

pela L. 8.036/90; c) quebra do princípio da irredutibilidade salarial por acordo ou

convenção coletiva (art. 7°, VI, da CF de 1988); d) flexibilização das jornadas de

trabalho mediante compensação de horários estipulada em acordo ou convenção coletiva

(art. 7°, CF, objeto do art. 6° da L. 9.601/98, que deu nova redação ao art. 59 da CLT);

e) ampliação da jornada de seis horas nos turnos ininterruptos de revezamento por meio

de negociação coletiva (art. 7°, XIV, da CF); f) contrato de trabalho provisório com

ampla redução de direitos (L. 9.601/98); g) redução das hipóteses de salário-utilidade

(L. 10.243/2001); h) suspensão de 2 a 5 meses do contrato de trabalho (MP 2.164, de

2001).

Relevante destacar que a reforma introduzida pelo parágrafo primeiro do artigo

618, da CLT não ocasiona maior valorização às convenções coletivas, como instrumento

de conquistas da classe trabalhadora, mas o que se está pretendendo, segundo Márcio

Túlio Viana, é “desvalorizá-la, utilizando-a para destruir o que foi construído”.137

Jorge Luis Souto Maior, em artigo intitulado “O futuro do direito do trabalho no

Brasil, se aprovado o projeto de lei que altera o artigo 618 da CLT”, transcreve o

parágrafo como passará a ser, se aprovado: “As condições de trabalho ajustadas

136 SÜSSEKIND, Arnaldo. A convenção coletiva de trabalho em confronto com a lei. Síntese Trabalhista,

Porto Alegre, n. 159, p. 5-8, set. 2002. 137 VIANA, Márcio Túlio. O novo papel das convenções coletivas de trabalho: limites, riscos e desafios.

Revista TST, Brasília, v. 67, n. 3, jul./set. 2001.

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mediante convenção ou acordo coletivo prevalecem sobre o disposto em lei, desde que

não contrariem a Constituição Federal e as normas de segurança e saúde do trabalho”.

O mesmo autor diz:

Esta alteração, se aprovada concretamente, permitirá que sindicatos de trabalhadores e sindicatos de empregadores, ou sindicatos de trabalhadores e empresas, diretamente, firmem cláusulas normativas estabelecendo direitos inferiores àqueles previstos na legislação trabalhista, com exceção das normas relativas à saúde e segurança do trabalhador.138

Evidencia-se mais uma vez que Estado e particulares não podem perder de vista

os direitos fundamentais, senão estaríamos retrocedendo aos séculos passados, abrindo

mão de conquistas que sem dúvida buscam o equilíbrio e desenvolvimento da sociedade.

4 FUNÇÃO, TUTELA E FORÇA JURÍDICA DOS PRECEITOS RELATIVOS

AOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Diante do exposto no item acima, ressalta-se a importância do papel dos direitos

fundamentais no ordenamento jurídico, para que possam efetivamente assegurar e

garantir o exercício dos direitos dos trabalhadores. Para Gomes Canotilho as funções dos

direitos fundamentais são: função de defesa ou liberdade, função de prestação social,

função de proteção perante terceiros e função de não-discriminação.139

Não basta um rol de intenções ou o próprio reconhecimento doutrinário da função

dos direitos fundamentais para que os mesmos se omitizem. Necessárias são a força

jurídica dos preceitos relativos aos direitos fundamentais e a sua tutela.

Abaixo transcrevem-se as funções dos direitos fundamentais na visão de Gomes

Canotilho:

A primeira função dos direitos fundamentais – sobretudo dos direitos, liberdades e garantias – é a defesa da pessoa humana e da sua

138 MAIOR, Jorge Luiz Souto. O futuro do direito do trabalho no Brasil, se aprovado o projeto de lei que altera

o art. 618 da CLT. Síntese Trabalhista, Porto Alegre, n. 163, p. 11-7, jan. 2003. 139 CANOTILHO, Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1998. p.

405-09. Ver também, GSCHWENDTNER, Loacir. Direitos fundamentais. Jus Navigandi, Teresina, v. 5, n. 51, out. 2001. Disponível em:< http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?=2075> Acesso em: 27 jun. 2006.

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dignidade perante os poderes do Estado (e de outros esquemas políticos coactivos).140

Os direitos a prestações significam, em sentido estrito, direito do particular a obter algo através do Estado (saúde, educação, segurança social). É claro que se o particular tiver meios financeiros suficientes e houver resposta satisfatória do mercado à procura destes bens sociais, ele pode obter a satisfação das suas “pretensões prestacionais” através do comércio privado (cuidados de saúde privados, seguros privados, ensino privado)141

Função de proteção perante terceiros: Muitos direitos impõem um dever ao estado (poderes públicos) no sentido de este proteger perante terceiros os titulares de direitos fundamentais. [...] Diferentemente do que acontece com a função de prestação, o esquema relacional não se estabelece aqui entre o titular do direito fundamental e o estado (ou uma autoridade encarregada de desempenhar uma tarefa pública) mas entre o indivíduo e outros indivíduos.142

Função de não discriminação A partir do princípio da igualdade e dos direitos de igualdade específicos consagrados na constituição, a doutrina deriva esta função primária e básica dos direitos fundamentais: assegurar que o Estado trate os seus cidadãos como cidadãos fundamentalmente iguais. Esta função de não discriminação abrange todos os direitos.143

A título de informação, as expressões “direitos do homem” e “direitos

fundamentais” são freqüentemente utilizadas como sinônimos. Entretanto, segundo a sua

origem e significado, podem apresentar dois sentidos, a saber:144 “a) direitos do homem

são direitos válidos para todos os povos e em todos os tempos (dimensão jusnaturalista-

universalista); b) direitos fundamentais são os direitos do homem, jurídico-

institucionalmente garantidos e limitados espacio-temporalmente”.

Em que pese o estudo das funções dos direitos fundamentais abranger todos os

direitos, destaca-se a presença de suas funções no exercício da autonomia privada,

objetivando a criação de novas ou melhores condições de trabalho com intuito de

assegurar, manter ou criar oportunidades de dignificação da classe obreira. Por

conseqüência, qualificando a sociedade face ao Estado Democrático de Direito.

A seguir passa-se a discorrer sobre a força jurídica dos preceitos relativos aos

direitos fundamentais, tendo-se em vista a vinculação das entidades públicas e das

entidades privadas.

140 CANOTILHO, Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1998. p.

405. Ver também, GSCHWENDTNER, Loacir. Direitos fundamentais. Jus Navigandi, Teresina, v. 5, n. 51, out. 2001. Disponível em:< http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?=2075> Acesso em: 27 jun. 2006.

141 Ibidem, p. 406. Diz o autor: “a função de prestação dos direitos fundamentais anda associada a três núcleos problemáticos dos direitos sociais, econômicos e culturais”. V. g., direitos à moradia, prestações médicas e hospitalares, escolas, segurança, rendimento mínimo, subsídio de desemprego, bolsas de estudo, etc.

142 CANOTILHO, op. cit., p. 407. Ver notas 25 e 26. 143 CANOTILHO, loc. cit. 144 ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais. Coimbra: Almedina, 1983. p. 3 et seq.

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A vinculação das entidades públicas dirige-se, em primeiro lugar, ao legislador,

enquanto órgão do Estado.

Para que os preceitos constitucionais relativos aos direitos, liberdades e garantias,

vinculem-se às entidades públicas e não se banalizem, se faz presente a necessidade do

reforço do caráter obrigatório dos mesmos.145

Para Andrade,

a vinculação das entidades públicas referida no n° 1 do art. 18° estende-se por isso a todos os preceitos constitucionais e não vale apenas para os direitos, liberdades e garantias. O que se poderá dizer, no entanto, é que nesta matéria específica, confrontada sobretudo com a relativa aos direitos sociais, a vinculação do legislador é maior e mais íntima.146

Com relação à vinculação de entidades privadas aos preceitos relativos aos

direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, a Constituição portuguesa de 1976 a

entende como vinculativa. No entanto, não se pode esquecer que:147

Indivíduo era concebido isoladamente no espaço social e político e a Sociedade e o Estado eram considerados dois mundos separados e estanques, cada um governado por uma lógica de interesses própria e obedecendo, por isso, respectivamente, ao direito privado ou ao direito público, não admira que os direitos fundamentais pudessem ser e fossem exclusivamente como direitos do indivíduo contra o Estado.

Dita posição cede espaço às mudanças operadas na realidade política e social, das

quais resultou a nova ordem a que se convencionou chamar “sociedade técnica de

massas”.

Em novos tempos, a paz social, o bem-estar coletivo, a justiça e a própria

liberdade não podem realizar-se espontaneamente numa sociedade industrializada,

complexa, dividida e conflitual. Parafraseando Andrade é necessário que o Estado regule

os mecanismos econômicos, proteja os fracos e desfavorecidos e promova as medidas

necessárias à transformação da sociedade numa perspectiva comunitariamente assumida

de bem público.

Assim, refere o autor:

Os direitos fundamentais ganham uma dimensão objetiva: eles são também normas (de valor) constitucionais que aos poderes públicos cabe

145 ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais. Coimbra: Almedina, 1983. p. 264-65. 146 Ibidem, p. 265. 147 ANDRADE, op. cit., p. 272.

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respeitar, mas igualmente fazer respeitar como interesses públicos fundamentais – esbate-se o antagonismo indivíduo-Estado, que tinha a força criadora dos direitos do homem.148

No plano privado, também, os direitos fundamentais devem ser aplicáveis nas

relações entre privados, destacando como ponto de partida a dignidade humana, a

integração e a responsabilidade do indivíduo na sociedade.

Para a preservação de tão nobres propósitos é fundamental que os direitos

fundamentais sejam tutelados, para que não se fragilizem diante da complexitude da

sociedade.

Segundo Andrade, “a garantia principal dos direitos fundamentais resulta deles

próprios, do seu enraizamento na consciência histórico-cultural da humanidade e da sua

tradução estrutural em cada sociedade concreta”.149

A tutela jurídica dos direitos fundamentais opera-se através de todos os ramos de

direito, tais como: do direito penal, do administrativo, do civil, do trabalho, do

comercial, substantivo ou processual.

No que tange a proteção jurídico-institucional, os direitos fundamentais podem

ser constitucionalmente protegidos contra todos os órgãos de soberania nas hipóteses de:

a) estado de sítio; b) revisão constitucional; c) em face do legislador ordinário (daí que a

Constituição estabelece uma reserva de lei formal para os direitos, liberdades e

garantias).

5 AUTONOMIA PRIVADA INDIVIDUAL E AUTONOMIA PRIVADA

COLETIVA: UMA SINGELA DISTINÇÃO

O modelo corporativista Getuliano de relações de trabalho foi adotado pelo

Brasil, para a criação das entidades sindicais. Apesar da crescente atuação sindical

brasileira, referida pelo autor Adriano Guedes Laimer, que destaca o modelo

corporativista nas relações de trabalho e excepciona o caso das que o modelo

corporativista não atende às 150”greves gerais, organização das centrais sindicais,

estabelecimento de algumas organizações em locais de trabalho por meio de acordos

148 ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais. Coimbra: Almedina, 1983. p. 273. 149 Ibidem, p. 313. 150 LAIMER, Adriano Guedes. O novo papel dos sindicatos. São Paulo: LTr, 2003. p. 36.

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coletivos e de ações políticas dessas entidades nos debates de questões de interesses da

sociedade brasileira, especialmente nas questões tributárias, previdenciárias,

trabalhistas, nas privatizações e nas propostas de regulamentação de diversos setores,

como o financeiro”, diz o autor, “apesar dessas conquistas, constata-necessidades dos

sindicatos que almejam e necessitam de instrumentos legais que lhes garantam uma

maior efetividade na sua atuação e em negociações coletivas. É por isso que se busca

uma alternativa ao modelo corporativista. A melhor alternativa é a autonomia privada

coletiva, que deve ter sua conceituação desenvolvida de acordo com as condições e

necessidades nacionais”.151

Partindo-se da autonomia privada individual, passa-se à conceituá-la e apontar as

diferenças para com a definição de autonomia privada coletiva. Iniciando-se com o

conceito de Steinmetz, exposto a seguir.

Segundo Steinmetz, “define-se a autonomia privada como o poder atribuído pela

ordem jurídica aos particulares para que, livres e soberanamente, auto-regulamentem os

próprios interesses (direitos, bens, fins, pretensões)”.152

No que concerne ao trabalho, ora apresentado, verifica-se que a autonomia

privada que aborda-se é a coletiva, também conhecida como autonomia coletiva. Para

tanto, observa-se, comentário feito por Adriano Guedes Laimer, no sentido de que

autonomia privada e autonomia privada coletiva não possuem o mesmo sentido.153

Para Amauri Mascaro Nascimento, autonomia privada individual “é uma fonte de

instauração de vínculos de atributividade que se expressam por meio da atividade

negocial dos particulares”.154 “O que a diferencia fundamentalmente da autonomia

privada coletiva”.155

Gino Giugni, citado por Laimer, faz referência ao artigo 39 da Constituição

Federal Italiana, no qual consta que “a organização sindical é livre”, compreendendo que

o Princípio da Liberdade é uma contraposição ao sistema corporativista, dizendo:

151 LAIMER, Adriano Guedes. O novo papel dos sindicatos. São Paulo: LTr, 2003. p. 36. 152 STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2004.

p. 190-91. Refere-se, ainda o autor, dizendo: “a autonomia privada manifesta-se como um poder de autodeterminação e de autovinculação dos particulares. No exercício da autonomia privada, os particulares tornam-se legisladores dos próprios interesses, seja para criar direitos, seja para criar deveres”.

153 LAIMER, op. cit., p. 37. Acompanham a idéia do autor, vários doutrinadores, como v.g., Giuliano Mazzoni, Amauri Mascaro Nascimento, Gino Giugni, Pedro Paulo Teixeira Manus, entre outros.

154 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Direito sindical. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 10. 155 LAIMER, op. cit., p. 37.

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Em nosso ordenamento constitucional, ao contrário, a faculdade de efetuar a defesa e promoção dos interesses envolvidos no mundo do trabalho é atribuída aos próprios sujeitos protagonistas do conflito, como afirmação de sua posição de liberdade. A eles é reconhecida a faculdade de unirem-se para prover a defesa dos próprios interesses, escolhendo livremente, no exercício da própria autonomia, os meios mais convenientes para tal fim.156

Em que pese a Constituição Italiana adotar o Princípio da Liberdade, como

anteriormente citado, relevante mencionarem-se os dispositivos Constitucionais

brasileiros que defendem os Princípios da Autonomia, Liberdade e Unicidade Sindicais,

vistos no artigo 8°, da Constituição de 1988, e seus incisos. Nesse aspecto, também o

Brasil elegeu a patamar Constitucional a Autonomia Privada Coletiva.

Pedro Paulo Teixeira Manus define autonomia privada coletiva da seguinte

forma:

A autonomia privada coletiva, no âmbito do direito coletivo do trabalho, é o poder das entidades sindicais de auto-organização e auto-regulamentação dos conflitos coletivos do trabalho, produzindo normas que regulam as relações atinentes à vida sindical, às relações individuais e coletivas de trabalho entre trabalhadores e empregadores.157

Carlos Alberto Gomes Chiarelli indica como terceira faceta da liberdade a

autonomia sindical, identificável como a liberdade dinâmica da associação profissional.

Diz o autor: “Seu objetivo seria o de assegurar à entidade o direito de autogovernar-se,

livre de comandos externos. Daí, a idéia, repetida usualmente por juristas hispânicos, de

que a autonomia sindical compor-se-ia de diversas faculdades básicas, tais como:

autonomia constitutiva, ação sindical e faculdade federativa (como sendo as

exponenciais)”.158

Plá Rodrigues diz: “em todo o direito do trabalho há um ponto de partida: a união

dos trabalhadores e um ponto de chegada: a melhoria das condições dos trabalhadores.

Direito individual e direito coletivo do trabalho são simplesmente distintas maneiras de

percorrer o mesmo itinerário”.159

A distinção entre autonomia privada individual e autonomia privada coletiva

cinge-se na possibilidade que o indivíduo possui de livre e soberanamente auto-

156 LAIMER, Adriano Guedes. O novo papel dos sindicatos. São Paulo: LTr, 2003. p. 37. 157 MANUS, PEDRO Paulo Teixeira. Negociação coletiva e contrato individual de trabalho. São Paulo: Atlas,

2001. p. 102. 158 CHIARELLI, Carlos Alberto. O trabalho e o sindicato: evolução e desafios. São Paulo: LTr, 2005. p. 195-

96. 159 RODRIGUES, Américo Plá. Princípios de direito do trabalho. Tradução Wagner Giglio. São Paulo: LTr,

1978. p. 24.

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regulamentar os próprios interesses, ao passo que na autonomia privada coletiva o que

for deliberado, em regra, pelos sindicatos, alcança a todos os integrantes de uma

determinada categoria.

5.1 AUTONOMIA PRIVADA COMO FONTE DE DIREITO E O LIMITE

CONSTITUCIONAL

Inicialmente faz-se as seguintes observações acerca das fontes do Direito nos

ensinamentos de Sílvio de Salvo Venosa:“a expressão fontes do Direito tem dois

sentidos: origem histórica ou diferentes maneiras de realização do Direito. Aqui, no

sentido que ora interessa, temos o aspecto de fonte criadora do Direito”.160

Existem dois sistemas jurídicos, a saber: o sistema denominado romano-

germânico, em que tem cabal proeminência a lei escrita, e o sistema Common Law, dos

países de língua inglesa ou de colonização inglesa, em geral, que é um sistema,

basicamente, de direito não escrito, vazado em normas costumeiras e precedentes.

Observa ainda o autor que “embora nosso ordenamento de leis seja escrito, legalmente

se reconhecem outras fontes, como vimos no citado art. 4° da Lei de introdução ao

Código Civil".161

Mesma autorização, quanto ao pluralismo normativo, encontra-se no artigo 8°, da

Consolidação das Leis do Trabalho. Observa-se em seu texto que sempre que

inexistirem disposições legais ou contratuais ficará o Estado autorizado a dirimir o

conflito valendo-se, conforme ocaso, da jurisprudência, da analogia, da eqüidade e

outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e,

ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira

que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.

Ainda com relação às fontes do Direito, relevante reportar-se as fontes

normativas próprias do Direito do Trabalho. Para tanto, reporta-se a doutrina de Orlando

Gomes que inicialmente chama a atenção para o fato de que “a Constituição é a mais

importante fonte formal de produção estatal do Direito do Trabalho. Certos princípios

fundamentais foram inscritos na Constituição de 5 de outubro de 1988, como, de resto,

160 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2006. v. 1, p. 9. 161 Ibidem, p. 10.

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já havia sido, anteriormente, consagrados, em grande parte, pelas Constituições de 1934,

1937, 1946, 1967 e de 1969”.162 Registre-se que o autor, em sua obra, refere-se aos

direitos sociais previstos no artigo 7°, da CF, como princípios fundamentais.

Em que pese as fontes geradoras de direitos e obrigações serem fontes

normativas, há que se observar uma hierarquia entre elas, que segundo o autor é de

considerável utilidade pública.

Para Orlando Gomes, “a diversidade de procedência das normas que preenchem o

conteúdo do contrato de trabalho lhes enseja o choque, criando o problema da

prevalência de uma regra sobre outra. Daí a necessidade de hierarquizar cuidadosamente

as várias fontes, a fim de se obter orientação para solucionar os possíveis conflitos”.163 164 Apresenta, ainda, algumas regras para a solução dos conflitos decorrentes do choque

entre normas, a saber:

a) havendo conflito entre as fontes imperativas de produção estatal e as de

produção internacional, prevalecem as últimas;

b) havendo conflito entre as fontes estatais e as de produção mista (sentença

coletiva), prevalecem as primeiras;

c) havendo conflito entre as fontes de produção mistas (sentença coletiva) e as

fontes de produção profissional pura (usos e costumes, regulamento de empresa e

convenções coletivas), prevalecem as primeiras;

d) havendo conflito entre as normas oriundas da fonte profissional pura (usos e

costumes, regulamento de empresa, convenção coletiva), prevalecem as de âmbito mais

generalizado.

162 GOMES, Orlando; GOTTSCHALK, Élson. Curso de direito do trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p.

34. 163 GOMES; GOTTSCHALK, loc. cit. 164 Diante da diversidade de normas, ou seja, da existência do pluralismo jurídico , em especial no direito do

Trabalho, questiona-se a atividade jurígena do Estado. Vide GOMES; GOTTSCHALK, op. cit., p. 53. Que ora transcreve-se: “A atividade jurígena do Estado, segundo a dogmática tradicional que lhe reconhece o monopólio da criação da lei, não estaria, na atualidade, sendo posta em dúvida, diante de uma pluralidade de fontes do direito, como as que se vem de analisar no presente capítulo?”

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Segundo Arnaldo Süssekind, a ordem hierárquica das fontes do Direito do

Trabalho é a seguinte: Constituição, lei, regulamento, sentença normativa, convenção

coletiva de trabalho e costume.165

Feitas as considerações sobre as fontes do direito, transcreve-se a fala de

autonomia privada por Pontes de Miranda166, “autonomia privada é o que Pontes de

Miranda chama de “auto-regramento da vontade”. A vontade constitui para o autor um

suporte fático ao qual as regras jurídicas aludem. Pontes vê a vida social tecida em

interesses aquém da esfera jurídica e esta como “zona colorida em que a) os fatos se

fazem jurídicos, b) relações nascidas independentemente do direito se tornam jurídicas,

e c) relações jurídicas, nascidas, portanto, no direito, se estabelecem”. Somente parte da

atividade humana é absorvida pelo jurídico. Esta deixa um campo de ação aos privados

“em que a relevância jurídica não implique disciplinação rígida da vida em comum”. A

atividade do auto-regramento da vontade “é o espaço deixado às vontades, sem se

repelirem do jurídico tais vontades”. Autonomia privada significa, em outras palavras,

“a possibilidade de os atos se tornarem jurídicos, constituírem regras”.167

Segundo Luigi Ferri, citado por Dorothee168, “a lei dá aos singulares o poder de

criar direito objetivo. Sem esse poder não há norma negocial, pois ‘a norma negocial se

liga ao sujeito privado e à sua vontade, através da mediação do poder em que consiste a

autonomia privada, assim como a norma legislativa se liga ao sujeito Estado através do

poder legislativo`. A autonomia privada baseia-se, para Ferri, numa ‘autorização`

(Ermächtigung), o que significa que o particular forma direito não como ente público ou

delegado deste, mas sim como poder próprio, pois a palavra Ermächtigung pode ser

traduzida de modo exato somente através de uma paráfrase como a seguinte: atribuição

de poder ou outra semelhante.”

165 SÜSSEKIND, Arnaldo et al. Institutições de direito do trabalho. 19. ed. São Paulo: LTr, 2001. v. 1, p. 171.

Diz ainda o autor: “mas, nesse particular, o que importa deixar claro é que a regulamentação estatal das relações de trabalho exprime um mínimo de garantias reconhecidas ao trabalhador. Praticamente, todas as normas legais em matéria de trabalho são cogentes, imperativas. Mas sua inderrogabilidade pela vontade das partes, ou por outra fonte de direito, há de ser entendida sem perder de vista que elas – como ficou dito – traduzem um mínimo de garantias, que não pode ser negado, mas que pode, sem dúvida, ser ultrapassado: a derrogação de tais normas é admitida num sentido favorável aos trabalhadores.”

166 MIRANDA, Pontes de. Tratado de direito privado. 3. ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1970. p. 54. 167 RÜDIGER, Dorothee Susanne. O contrato coletivo no direito privado: contribuições do direito do trabalho

para a teoria geral do contrato. São Paulo: LTr, 1999. p. 85. 168 Ibidem, p. 86.

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Considerando-se que a autonomia privada é um poder, e desde que não importe

quem o exerça, como síntese a tese de Ferri, Dorothee faz um linck com as observações

históricas feitas por Jellinek, dizendo: “para esse autor, a solidariedade humana baseia-

se principalmente na espontaneidade, além da organização planejada”.169

Dorothee faz uma pergunta para ser respondida pela teoria do ordenamento

jurídico complexo de Bobbio, qual seja: “Trata-se, em outras palavras, de decidir se a

autonomia privada deve ser considerada como um resíduo de um poder normativo

natural e privado, antecedente ao Estado, ou como um produto do poder originário do

Estado”. Resposta: “Esse dilema é resolvido por Bobbio pela teoria do ordenamento

jurídico complexo que se baseia no fato de que as normas fluem de vários canais: da

sociedade civil, que não é uma sociedade natural sem leis, mas sim uma sociedade com

normas de gêneros variados, e do poder soberano, que se autolimita e, em relação ao

poder negocial, ‘subtrai a si mesmo uma parte do poder normativo`. Com a teoria do

ordenamento jurídico complexo, Bobbio concilia positivistas e jusnaturalistas e

acrescenta um dado importante à discussão dos limites da autonomia privada”.170

O Estado de Direito é o Estado dos cidadãos.171 A sociedade desempenha papel

de Titular do Poder Constituinte, conforme ensinamentos de J.J. Gomes Canotilho:172

Povo, porém, não é um conceito unívoco mas plurívoco (F. Muller). Só o povo, entendido como um sujeito constituído por pessoas – mulheres e homens – pode “decidir” ou deliberar sobre a conformação da sua ordem político-social. nas democracias actuais, concebe-se como uma “grandeza pluralística” (P. Häberle), ou seja, como uma pluralidade de forças culturais, sociais e políticas tais como partidos, grupos, igrejas, associações, personalidades, decisivamente influenciadoras da formação de “opiniões”, “vontades”, “correntes” ou “sensibilidades” políticas nos momentos preconstituintes e nos procedimentos constituintes.

169 RÜDIGER, Dorothee Susanne. O contrato coletivo no direito privado: contribuições do direito do trabalho

para a teoria geral do contrato. São Paulo: LTr, 1999. p. 87. Jellinek apud Dorothee Susanne Rüdiger, que diz: “[...] a primeira forma de solidariedade, a não-refletida, permanece excluída da consciente ação do Estado dirigido por determinados fins. Os fenômenos psíquicos de massa, cuja existência e efeitos são a base para as grandes mudanças no estado geral dos povos, se são influenciados diretamente pelo Estado, não são por ele criados. Religiões, nacionalidades, classes sociais, etc., nascem independentemente do Estado. O Estado pode protege-las, incentiva-las, favorecer seu desenvolvimento e sua eficácia, mas não cria-las... Nascidas da sociedade, as novas forças sociais só podem ser superadas pela própria sociedade.”

170 Ibidem, p. 89. 171 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução Carlos Nelson Coutinho. 10. ed. Rio de Janeiro: Campus,

1992. p. 61. 172 CANOTILHO, Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1998. p.

75.

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71

Muito embora, a Constituição só se compreende através do Estado.173 174 175

Para José Felipe Ledur, “a Constituição é a norma fundamental do Estado e

também da Sociedade”.176

Assim, evidencia-se cada vez mais a importância da Constituição para uma

sociedade. Nesse sentido, Joe Ernando Deszuta diz:

Ainda que a lei se constitua em fonte estatal de Direito por excelência, há uma multiplicidade de fontes e até de ordenamentos paralelos que por vezes desafiam a unidade do ordenamento estatal. A função unificadora da Constituição pode ser entendida como uma tentativa de harmonizar e condicionar – mediante a previsão de um plano de juridicidade superior e vinculativo de todos os poderes públicos e privados – a produção do direito em uma sociedade heterogênea e pluralista, inclusive com o estabelecimento de mecanismos que inviabilizem ou dificultem a disponibilidade do conteúdo da norma.177

Segundo Kelsen:

Da Constituição em sentido material deve distinguir-se a Constituição em sentido formal, isto é, um documento designado como Constituição que – como Constituição escrita – não só contém normas que regulam a produção de normas gerais, isto é, a legislação, mas também normas que se referem a outros assuntos politicamente importantes e, além disso, preceitos por força dos quais as normas contidas neste documento, a lei constitucional, não podem ser revogadas ou alteradas pela mesma forma que as leis simples, mas somente através de processo especial submetido a requisitos mais severos. Estas determinações representam a forma da Constituição que, como forma, pode assumir qualquer conteúdo e que, em primeira linha, serve para a estabilização das normas que aqui são designadas como Constituição material e que são o fundamento de Direito positivo de qualquer ordem jurídica estadual.178

Depreende-se que a autonomia privada, como fonte de direito, esbarra no limite

da lei, seja constitucional ou infraconstitucional.

173 CANOTILHO, Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1998. p.

89, nota 8. 174 “O conceito de Estado Constitucional servirá para resolver este impasse: a constituição é uma lei

proeminente que conforma o Estado.” (Ibidem, p. 89). 175 Ibidem. Eis aqui a justificativa da origem do poder, numa tentativa de definir o Estado Democrático de

Direito: “O Estado Constitucional, para ser um estado com as qualidades identificadas pelo constitucionalismo moderno, deve ser um Estado de direito democrático. Eis aqui as duas grandes qualidades do Estado constitucional: Estado de direito e Estado democrático.”

176 LEDUR, José Felipe. A realização do direito ao trabalho. Porto Alegre: Fabris, 1998. p. 62. 177 DESZUTA, Joe Ernando. Um direito do trabalho mínimo ou um mínimo de direito do trabalho? bases para

um novo direito do trabalho. Revista Justiça do Trabalho, Porto Alegre, n. 255, p. 46, mar. de 2005. 178 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 247-48.

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Nos ensinamentos de Roppo179, a validade do contrato vincula-se à lei, sendo esta

fonte do regulamento contratual sob pena de sanção da nulidade, além da vontade das

partes.180 Refere-se ainda o autor: “a lei deve contudo tutelar, além do interesse do

pretenso representado, também o do terceiro que contratou com o pretenso

representante”.

A liberdade de conformar, segundo as suas conveniências subjetivas, o conteúdo

do contrato limita-se às disposições legais previstas no Código Civil, Constituição

Federal e leis especiais. O regulamento contratual resulta construído através de um

concurso de fontes: na sua determinação participam a vontade das partes, as valorações

do juiz e as disposições da lei. Sendo que as últimas podem assumir a veste de normas

dispositivas ou de normas imperativas.181

Parafraseando Enzo Roppo, as vicissitudes da contratação coletiva das relações

de trabalho não podem ser absolutizadas e generalizadas indevidamente. Para o autor a

existência de um movimento sindical organizado e atuante no plano das reivindicações

sustentadas pela arma da greve não podem sucumbir, sob pena faltarem os próprios

pressupostos para realizar-se aquela recuperação da “contratualidade” num pé de

igualdade substancial entre as partes contrapostas do contrato. Remédio para a solução

do problema, diz o autor,

consiste, então, em regra, numa intervenção autoritária externa do poder público – geralmente do legislador – que reage às restrições ou à expropriação de facto da liberdade contratual das <partes débeis>, restringindo, por sua vez, mas com prescrições normativas formais, a liberdade contratual das <partes fortes> do contrato, pois já sabemos que é o exercício da liberdade contratual dos contraentes em posição de superioridade econômica e social a causar directamente a supressão da liberdade contratual dos contraentes em posição econômica e socialmente deteriorada.182

179 ROPPO, Enzo. O contrato. Tradução Ana Coimbra e M. Januário C. Gomes. Coimbra: Almedina, 1988. p.

124. 180 Ibidem, p. 187. 181 ROPPO, op. cit., p. 187-90. 182 ROPPO, op. cit., p. 327.

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5.1.1 Autonomia privada e autonomia da vontade

Enzo Roppo define autonomia da vontade como “a autonomia da vontade,

exercício de liberdade, forma a base da autonomia privada, sendo o lado subjetivo num

processo de criação de uma norma – o contrato. Pois o contrato é, até etimologicamente,

ao mesmo tempo um processo e um regramento”.183

Tomando-se por base a distinção feita por Enzo Roppo, entre processo e

regramento, conclui-se que, “autonomia privada é um poder jurídico, liberdade no

sentido positivo, um ‘livre para` o auto-regramento, ao passo que a autonomia da

vontade é um direito subjetivo, liberdade no sentido negativo, um ‘livre de` imposições

de terceiros, deixando um espaço para um processo que cria o contrato”.184

Num sistema capitalista, a autonomia da vontade cada vez mais encontra um

espaço crescente. “A autonomia privada é a afirmação de que o contrato, além de uma

relação jurídica, cria normas, está a serviço do capitalismo liberal”.185

Assim, mais uma vez, evidencia-se o poder das convenções coletivas e da

autonomia privada coletiva nas relações de trabalho. Na medida em que afasta a

intervenção Estatal, mais ganha poder. Relevante destacar que o Estado deve preservar

uma parcela mínima de direitos à sociedade, em especial aos trabalhadores. Caso

contrário, referidos direitos podem ser atingidos, em conseqüência à alteração do artigo

618, da CLT, com base no projeto de lei n. 5.483/2001, que altera sua redação. 186

Referida alteração permitirá prevalecer o negociado sobre o legislado.

183 ROPPO, Enzo. O contrato. Tradução Ana Coimbra e M. Januário C. Gomes. Coimbra: Almedina, 1988. p.

125 et seq. 184 Ibidem, p. 125-29. 185 GOMES, Orlando. Contratos. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1984. p. 17. 186 Ipojucan Demétrius Vecchi, em participação no livro Reflexões sobre o direito do trabalho e flexibilização,

faz o seguinte comentário, expressando posicionamento contrário a autonomia privada coletiva, quando diz: “Nessa análise crítica pretendemos demonstrar que o projeto se apresenta como mais uma proposta que está na onda da chamada “flexibilização do direito do trabalho”, pregada pelo neoliberalismo, que poderá impor, caso aprovado, uma série de problemas jurídicos a serem resolvidos. O projeto em questão tenta implementar uma viragem histórica no direito do trabalho nacional, pois sairíamos de uma matriz heterônoma de produção de direito para adentrarmos em uma matriz autônoma de produção de direito, com ênfase na chamada “autonomia privada coletiva”. (FREITAS, José Mello de et al. Reflexões sobre o direito do trabalho e flexibilização.Passo Fundo: UPF, 2003. p. 17).

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5.1.2 “Status” constitucional das convenções coletivas

As convenções coletivas e os acordos coletivos são reconhecidos pela

Constituição Federal de 1988, em seu artigo 7°, inciso XXVI. Inicialmente, resta saber o

“status” das convenções coletivas de trabalho na Constituição Federal de 1988.

Referida tarefa, nada pacífica doutrinariamente, carece de algumas análises, para

que justifiquem-se as posições diversas acerca da matéria.

Ingo Wolgang Sarlet realça em sua obra que a CF aderiu a um conceito

materialmente aberto de direitos fundamentais, muito embora, apesar de contidos no

catálogo dos direitos fundamentais no sentido material, nem todos se posicionam

favoravelmente a esta idéia.187

Para o autor referido, Vieira de Andrade e Manoel Gonçalves Ferreira Filho

identificam direitos apenas formalmente fundamentais, dizendo que: “[...] na verdade,

poderiam constituir normas de cunho organizatório, ou mesmo regras que poderiam

simplesmente constar da legislação infraconstitucional”.188

Existem direitos fundamentais que assumem a aparência de normas

organizacionais, em virtude de sua forma de positivação.

Sarlet refere, ainda, que os direitos catalogados no artigo 7°, incisos XI e XXIX,

a título exemplificativo, não guardam relação direta com a proteção da dignidade

humana ou que decorram de forma inequívoca dos princípios e do regime da nossa

Constituição como posições essenciais do indivíduo na sua dimensão individual e

social.189

Observa-se que Sarlet embasa sua afirmativa na relação direta entre direitos

fundamentais e dignidade humana, ao passo que Paulo Bonavides faz a relação dos

direitos fundamentais em duas posições: a liberdade e a igualdade.190

Segundo Bonavides, tocante aos direitos sociais básicos, a Constituição define

princípios fundamentais, como os valores sociais do trabalho e a livre iniciativa;

187 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 3ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,

2003. p. 140. 188 SARLET, loc. cit. 189 SARLET, loc. cit. 190 “Com efeito, não é possível compreender o constitucionalismo do Estado social brasileiro contido na Carta

de 1988 se fecharmos os olhos à teoria dos direitos sociais fundamentais, ao princípio da igualdade, aos institutos processuais que garantem aqueles direitos e aquela liberdade e ao papel que doravante assume na guarda da Constituição o Supremo Tribunal Federal.” (BONAVIDES. Paulo. Curso de direito constitucional. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 338).

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estabelece objetivos fundamentais para a república como o desenvolvimento nacional, a

erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e

regionais, abrangendo genericamente a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a

segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos

desempregados.

O artigo 7° da Constituição, declina direitos sociais especificamente em favor dos

trabalhadores, entre outros, o seguro-desemprego, o fundo de garantia do tempo de

serviço, o salário mínimo, o piso salarial, o décimo terceiro salário, a participação nos

lucros, a jornada semanal de quarenta e quatro horas de trabalho, o repouso semanal

remunerado, a licença à gestante com duração de cento e vinte dias, a licença-

paternidade, o reconhecimento das convenções coletivas e acordos coletivos de trabalho.

Como se vê, o novo texto constitucional imprime uma latitude sem precedentes

aos direitos sociais básicos, dotados agora de uma substantividade nunca conhecida nas

Constituições anteriores, a partir da de 1934. [...] A igualdade se converte aí no valor

mais alto de todo o sistema constitucional, tornando-se o critério magno e imperativo de

interpretação da Constituição em matéria de direitos sociais.

Demais, prendendo-se ainda a esse último aspecto, se considerarmos os direitos

sociais básicos direitos absolutos, como foram reputados os direitos da liberdade durante

o predomínio do velho Estado de Direito, têm eles aplicabilidade imediata; remetidos

todavia àquela primeira posição teórica, que os inferioriza perante os chamados direitos

da liberdade – nessa hipótese, ainda quando em grau constitucional – ficariam via de

regra sujeitos às reservas da lei.191

Considerando-se que o direito fundamental à igualdade é o que mais tem

mostrado importância no Direito Constitucional de nossos dias, mostra-se como o

direito-guardião do Estado social.192

Diante do exposto, demonstra-se que a partir do direito fundamental à igualdade,

alicerce do Estado social, é possível incluir-se no catálogo dos direitos fundamentais,

inclusive a participação nos lucros e resultados, pelos motivos que passa a expor:

a) considerando-se que o valor do salário mínimo nacionalmente unificado,

assegurado pelo Governo do Estado, não é suficiente para garantir uma vida digna ao

cidadão brasileiro, hoje fixado em R$350,00; e, b) que a CF assegura a mantença do

poder aquisitivo do salário mínimo no artigo 7°, inciso IV, com reajustes periódicos,

191 BONAVIDES. Paulo. Curso de direito constitucional. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 339-40. 192 Ibidem, p. 341.

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capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia,

alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social.

O Governo Federal, deveria manter um salário mínimo digno. Ocorre que é

responsabilidade do Estado garantir o bem estar social, razão pela qual, uma das

alternativas utilizadas, ficaria a cabo da autonomia privada coletiva, que

conscientemente e dentro dos limites financeiros da iniciativa privada, descobre uma

forma legítima de tornar os salários dos trabalhadores mais próximo do ideal

constitucional, que acima de tudo, exterioriza uma necessidade fundamental.

Para Macio Ribeiro do Valle,

não há como se duvidar da importância do ajuste coletivo para uma melhor harmonização entre capital e o trabalho e mesmo o alcance da paz social, por meio de melhores condições de vida para o trabalhador e de maior produtividade para a empresa. A lei, por si, embora, repita-se se lhe deva reservar a fixação de direitos mínimos, [...].193

Sob outro ângulo, agora mais amplo, partindo-se do princípio de que as

convenções coletivas alicerçam-se na autonomia privada, pode-se afirmar que a mesma

está constitucionalmente protegida ou tutelada.

Steinmetz identifica na Constituição Federal brasileira de 1988, fundamentos a

tutela constitucional da autonomia privada, referindo-se aos direitos de liberdade (CF,

art. 5°, caput), o princípio de livre iniciativa (CF, art. 1°, IV e art. 170, caput), o direito

ao livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão (CF, art. 5°, XIII), o direito

de propriedade (CF, art. 5°, caput e XXII), o direito de herança (CF, art. 5°, XXX), o

direito de convenção ou de acordo coletivo (CF, art. 7°, XXVI), o princípio da proteção

da família, do casamento e da união estável (CF, art. 226, caput, § de 1° a 4°),

concluindo o autor: “[...] e cuja conclusão é o poder geral de autodeterminação e

autovinculação das pessoas tutelado pela Constituição.194

Traz à baila outras premissas desse silogismo dizendo,

Se todos esses princípios e direitos constitucionais mencionados contêm um conteúdo básico de autodeterminação e autovinculação da pessoa, então a autonomia privada – que é um poder geral de autodeterminação e de autovinculação – também é constitucionalmente protegida ou tutelada.

193 VALLE, Márcio Ribeiro do. Conteúdo normativo e obrigacional do ajuste coletivo. A negociação coletiva

como fator de restrição ao poder normativo. In: VIDOTTI, Tárcio José (Org.). Direito coletivo do trabalho em uma Sociedade Pós-Industrial. São Paulo: LTr, 2003. p. 335.

194 STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 200.

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Dizendo, ainda, de outro modo, a tutela constitucional da autonomia privada deflui desses princípios e direitos expressos no texto constitucional.195

Mesmo autor, traz ainda, outros dois argumentos para a mesma conclusão, quais

sejam: a) o direito de propriedade; b) o princípio da livre iniciativa. Concluindo

respectivamente: a) o exercício do direito de propriedade exige o instituto do contrato,

se o instituto do contrato tem por princípio fundamental a autonomia privada e se a

Constituição protege o direito de propriedade, então a Constituição protege a autonomia

privada; b)ao eleger a livre iniciativa como princípio constitucional fundamental, a

Constituição também tutelou a autonomia privada.

Pode-se afirmar que a autonomia privada é um bem constitucionalmente

protegido.

Relevante salientar sobre a possibilidade de colisão entre direitos fundamentais,

mais especificamente entre direto fundamental e autonomia privada. 196

Há de considerar-se, ainda, a natureza da autonomia privada coletiva, que

destaca-se no tempo e no espaço em razão de uma necessidade de interesses e idéias das

comunidades particulares.197

Muito embora, não devam ser utilizadas como sinônimos, as expressões

autonomia privada e autonomia privada coletiva, sem dúvida demonstram que o

pluralismo jurídico, acaba por conquistar o prestígio sobre o monismo jurídico.198

195 STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos particulares a direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2004.

p. 200-01. 196 Vide hipótese fundamental da teoria da eficácia imediata em STEINMETZ, Wilson. A vinculação dos

particulares a direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 200 e ss. Reporta-se aos casos da análise da jurisprudência da Corte Constitucional alemã, cf. Gilmar Ferreira Mendes, p. 39 e decisão do Tribunal Federal do Trabalho, de 3 de dezembro de 1954, citada por Ernst Forsthoff, em notas de rodapé ns. 60 e 61, p. 166.

197 Para RÜDIGER, Dorothee Susanne. O contrato coletivo no direito privado: contribuições do direito do trabalho para a teoria geral do contrato. São Paulo: LTr, 1999. p. 94-5. “O fundamento histórico do desenvolvimento na teoria da autonomia privada coletiva é a reorganização do direito do trabalho no âmbito do direito privado, após a experiência corporativista fracassada na Itália. [...] A teoria da autonomia privada coletiva serve como fundamento da atividade sindical privada em contraposição à atividade desenvolvida no âmbito de direito público onde se localiza até o final da Segunda Grande Guerra. Politicamente, o exercício da autonomia coletiva se contrapõe à atividade normativa estatal autoritária; os sindicatos deixam de ser instrumentos de poder público para serem associações de direito privado. Isso significa que agora estão livres para firmar contratos coletivos. Estes, por sua vez, não têm mais caráter de normas públicas, mas encontram-se localizadas no direito privado. Finalmente, são os interesses de grupos, interesses particulares, e não gerais.”

198 “Dessa maneira, apresenta-se o pluralismo como teoria política de fundo da doutrina da autonomia privada coletiva.” (Ibidem, p. 95).

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A mudança do sistema monista, para o sistema do pluralismo jurídico, vem de

encontro com os propósitos de um Estado Democrático de Direito. Aos poucos afasta o

poder do Estado, reconhecendo-lhe o poder para o Estado atingir os propósitos da

sociedade.199

Carmen Camino questiona:

Ainda a propósito da corrente pluralista, há divergência, quanto a constituírem fontes formais, o contrato individual de trabalho e o regulamento de empresa. Há quem sustente a impossibilidade de se emprestar a tais institutos o status de fonte formal de Direito (concepção tradicional). Isso porque o contrato individual de trabalho consubstancia direito subjetivo, do qual sustentam apenas relações jurídicas e não normas objetivamente consideradas. Coerentemente afasta-se, também, a possibilidade do regulamento de empresa constituir fonte formal de Direito. Entre os doutrinadores brasileiros que adotam a concepção tradicional, estão Délio Maranhão e José Martins Catharino. Em oposição, Octavio Bueno Magano, [...] Acompanha-o Evaristo de Morais Filho, quanto ao regulamento de empresa, embora com restrições ao contrato de trabalho.200

5.2 DESREGULAMENTAÇÃO OU FLEXIBILIZAÇÃO: FORMAS DE GARANTIR

OU EXTINGUIR OS DIREITOS SOCIAIS?

Na visão do economista José Pastore a flexibilização é um Contrato Coletivo por

via Democrática. Refere-se a Nova Zelândia que, em 1991, através do Congresso

Nacional, reformou amplamente o seu sistema de relações do trabalho ao aprovar a “Lei

da Contratação do Emprego”.201

Referida Lei, expressa uma visão revolucionária, forte o bastante para enfrentar a

competição galopante que toma conta da economia mundial. Diz Pastore que as

principais inovações foram as seguintes:

1) Os empregados das empresas ganharam o direito de se associar, ou não, a

outros empregados para defender os seus interesses no local de trabalho, o que abriu a

porta para contratos individuais;

199 “Não é um simples poder dar-se normas, entendido como liberdade, mas sim uma potestas, um poder com

conotação política. Esse poder cria um ordenamento jurídico privado, um ordenamento subordinado e reconhecido pelo Estado.” (Ibidem, p. 86).

200 CAMINO, Carmen. Direito individual do trabalho. Porto Alegre: Síntese, 1999. p. 68-9. 201 PASTORE, José. Contrato coletivo por via democrática. Síntese Trabalhista, Porto Alegre, n. 55, p. 121-22,

jan. 1994.

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2) Os empregadores passaram a ser obrigados a reconhecer os agentes e a via

de negociação escolhidos pelos empregados;

3) Em todos os contratos, individuais ou coletivos, passou a ser compulsório

o estabelecimento dos procedimentos voluntários de resolução dos conflitos

econômicos, ficando para os tribunais apenas os conflitos de direito.

Comenta, finalmente que “Para uma sociedade onde a sindicalização era

obrigatória, a arbitragem compulsória e a negociação altamente concentrada, esta

guinada em direção à liberdade, voluntarismo e descentralização foi espetacular”.202

Ubiracy Torres Cuóco em seu artigo Contrato Coletivo e sua utilização no Brasil,

apresenta afinal conclusões sobre a temática, onde uma delas refere-se ao Contrato

Coletivo “como forma nova (para os brasileiros) de flexibilização do direito, o contrato

coletivo tende a se generalizar;”203

Márcio Flávio Salem Vidigal afirma:

As convenções e acordos coletivos do trabalho no ordenamento jurídico brasileiro devem atender aos princípios constitucionais de sustentação ao primado do trabalho e à melhoria das condições sociais do trabalhador e, por isso, qualquer disposição normativa criada em sede de produção legislação privada (acordos ou convenções) não poderá afastar-se deste princípio do Estado Constitucional de Direito, não podendo colocar-se em antagonismo aos referidos princípios. O reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho inserido no art. 7°, inciso XXVI, da Constituição Federal não permite, absolutamente, a adoção indiscriminada de cláusulas normativas contrárias às garantias mínimas do trabalhador, estejam estas localizadas na própria Lei Maior ou sediadas na esfera infraconstitucional..204

O autor destaca em seu artigo que, a flexibilização deve ser entendida como

“exceção”, devendo somente ser utilizada quando autorizada pela texto constitucional ,

o que ocorre por meio das expressões “salvo” e “facultada” nas hipóteses específicas

dos incisos VI, XIII e XIV do art. 7°, da CF.

202 Justifica Pastore que, as causas para a necessidade das respectivas mudanças deram-se por conta da

competição e da necessidade de ampliar o emprego. Situação bastante similar a do Brasil, e que acabou por inspirar o autor a fazer tal comparação. Lembrando-se ainda que, “os sindicatos a se concentrarem nos problemas das empresas e seus respectivos empregados – e não em temas nacionais que tinham pouco a ver com as necessidades do microcosmo empresarial que, afinal, é quem garante a produção e o emprego (Ibidem, p. 122).

203 CUÓCO, Ubiracy Torres. Contrato coletivo e sua utilização no Brasil. Revista LTr, São Paulo, n. 59, p. 923, jul. de 1995. Mister, referir-se que o autor faz distinção entre o contrato coletivo e a convenção coletiva, e sustenta sua existência na Lei n. 8.542/92, artigo 1°, entretanto, referida lei foi revogada, conforme mencionado no Capítulo I, item 4.2, Terceiro Caso, pela Lei n. 10.192/01, art. 18.

204 VIDIGAL, Márcio Flávio Salem. Limites à flexibilização na convenção coletiva e nos acordos coletivos no ordenamento jurídico brasileiro. Revista TRT – 3ª R., Belo Horizonte, v. 54, n. 25, p. 219-24, jul. 1994/jul. 1995.

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Ainda, por oportuno, ressalva-se que o art. 7° situado no Capítulo “Dos Direitos

Sociais”, está inserido no Título II, que trata “Dos Direitos e Garantias Fundamentais” e

mesmo assim o próprio texto constitucional abre espaço para a flexibilização dos

direitos sociais.

Há que se fazer, relevante distinção entre flexibilização e desregulamentação do

Direito do Trabalho.

No entender de Arnaldo Süssekind205,

a desregulamentação do Direito do Trabalho, que alguns autores consideram uma das formas de flexibilização, com esta não se confunde. A desregulamentação retira a proteção do Estado ao trabalhador, permitindo que a autonomia privada, individual ou coletiva regule as condições de trabalho e os direitos e obrigações advindos da relação de emprego. Já a flexibilização pressupõe a intervenção estatal, ainda que básica, com normas gerais abaixo das quais não se pode conceber a vida do trabalhador com dignidade. Precisamente porque há leis é que determinados preceitos devem ser flexíveis ou estabelecer fórmulas alternativas para sua aplicação.

Amauri Mascaro Nascimento206 enuncia que, o ordenamento jurídico brasileiro

“inicia um novo período no qual terá que rever os seus padrões anteriores e refazer, em

outras bases, a sua legislação, fase na qual terá que combinar a função tutelar do Direito

do Trabalho com a função ordenadora dos interesses recíprocos dos parceiros sociais”.

Relevante salientar que, independentemente da forma de flexibilização a ser

adotada pelo Brasil, mister, garanta-se um mínimo de direitos através da tutela estatal.207

205 SÜSSEKIND, Arnaldo et al. Instituições de direito do trabalho. 19. ed. São Paulo: LTr, 2001. v. 1, p. 209-

10. 206 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Tendências de flexibilização das normas regulamentadoras das relações

de trabalho no Brasil. Revista LTr, São Paulo, n. 59, p. 1023, nov. de 1995. 207 GIGLIO, Wagner D. O sindicalismo diante da crise. Revista Justiça do Trabalho, Porto Alegre, n. 235, p. 7-17, jul.

2003. Nesse artigo, o autor, após determinar os fatores determinantes para a situação atual, elegendo três de maior relevância, quais sejam: as transformações políticas, a globalização da economia e a revolução tecnológica, salienta a influência do capitalismo e a distorção da legislação protecionista do ser humano trabalhador. Destaque à sua fala: “Sem oposição, sem freios ou controles, sentiram-se os países capitalistas livres para impor, na prática, sua ideologia de crescimento econômico a qualquer custo, como se o homem estivesse a serviço da Economia. A filosofia que fundamenta o Direito do Trabalho foi profundamente contestada, passando a se entender que a legislação protecionista do ser humano trabalhador constituía um empecilho, um entrave ou obstáculo ao desenvolvimento nacional. Aí se encontra a raiz dos movimentos chamados de “desregulação” ou desregulamentação, cujas expressões mais divulgadas são a terceirização e a flexibilização. A terceirização não passa de um eufemismo para a velha “marchandage”, ou seja, a comercialização da força de trabalho como mercadoria; e a segunda expressão mal disfarça o refluxo no sentido de anular a legislação do trabalho, no intuito de diminuir a proteção do trabalhador contra os abusos e excessos impostos pelos empresários, em nome de um melhor rendimento do trabalho.” De forma oposta pronuncia-se Jorge Luiz Souto Maior, mesmo relativizando a precariedade da legislação pertinente, diz:”O manuseio dos fundamentos, princípios e normas do Direito do Trabalho, sob uma perspectiva humanista, permite que se mantenha a vocação protetiva deste ramo do direito mesmo diante de novos e cada vez mais criativos modelos de produção que se criam para atender apenas aos reclamos da economia, dos empresários e de todos nós, vorazes consumidores.” (MAIOR, Jorge Luiz Souto. A terceirização sob uma perspectiva humanista. Revista Justiça do Trabalho, Porto Alegre, n. 249, p. 26-36, set. de 2004).

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Sem parecer repetitivo, e para maior clareza dos pensamentos, arrolam-se três

possíveis posições conclusivas a saber: a) desregulamentação, sem o mínimo de tutela

estatal, coloca os trabalhadores numa situação vulnerável e bastante delicada,

considerando-se que o mercado é competitivo e excludente; b) flexibilização das normas

asseguradas por lei, acarretaria um limite à autonomia privada coletiva, assegurando um

núcleo mínimo de direitos aos trabalhadores e, c) autonomia privada coletiva

concomitantemente aos princípios fundamentais estabelecidos pela Constituição Federal

e normas infraconstitucionais, harmonicamente sendo desenvolvidas, visando o interesse

prático das partes.

Joe Ernando Deszuta, entretanto, traz uma visão mais ampla acerca da Teoria

Garantista construída nas seguintes bases: o Positivismo Jurídico, não apenas formalista

ou clássico, como orientação teórica; o Constitucionalismo como um novo paradigma

do Direito para o estabelecimento de uma normatividade superior – A Constituição –

suprema, vinculante de todos os poderes públicos e privados, como limites formais e

substanciais para a produção normativa; os Direitos Fundamentais como limites

materiais a todos os Poderes; uma matriz liberal identificada com a busca da plena

liberdade (prestações negativas) e com o comprometimento social para a implementação

dos Direitos Sociais (prestações positivas), mas que não estende o garantismo ao direito

de propriedade e às liberdades econômicas; a centralidade da pessoa humana como

categoria prevalente da Sociedade e da Organização Estatal. Feitas as considerações

sobre a linha de pesquisa do autor referido, o mesmo demonstra um discurso

preocupante e questionável acerca do Direito do Trabalho Mínimo ou um Mínimo de

Direito do Trabalho?, quando questiona,

é necessário, também, o estabelecimento de distinção para o que tem sido objeto de alguma confusão entre flexibilização, desregulamentação e globalização, na busca de um Estado mínimo (agora também de um Direito mínimo) e um mercado máximo, sinalizando para um retorno à barbárie e ao que se tem denominado de neofeudalismo.208 Trata-se de um discurso cínico que promete a inclusão – desregulamentar para incluir!!?? – mas que na verdade promove a desagregação e a exclusão social, com absoluto desprezo aos Direitos Sociais e conseqüentemente, à Dignidade da Pessoa Humana e à Igualdade como princípios e valores de uma sociedade.209

208 FARIA apud DESZUTA, Joe Ernando. Um direito do trabalho mínimo ou um mínimo de direito do

trabalho? bases para um novo direito do trabalho. Revista Justiça do Trabalho, Porto Alegre, n. 255, p. 41-2, mar. de 2005.

209 FARIA apud DESZUTA, loc. cit.

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Por óbvio que, quando se fala em desregulamentação de direitos, se estaria

partindo do pressuposto da existência da lei, em seus diversos graus hierárquicos.

Entretanto, como entre nós predomina o sistema pluralista legiferante, não seria

prudente, ignorar os centros de positivação das normas regulamentadoras dos direitos

sociais. Pois quando se fala em desregulamentar, vêm à mente a idéia de destruir e por

conseqüência, substituir por algo diferente.210

José Carlos Arouca doutrina por uma situação presente, bastante delicada e

comprometedora dos direitos e garantias fundamentais, principalmente da classe

trabalhadora.

Na visão do jurista a globalização, o neoliberalismo estão intimamente ligados ao

capitalismo que representa um sério risco aos direitos e garantias fundamentais da classe

operária. Vale-se das palavras de José Martins Catharino, “tem o neoliberalismo como

figurino que, todavia, não passa de liberalismo. Para o mestre baiano, segundo as idéias

neoliberais a pretensão inverte a natureza protecionista do direito do trabalho, para

beneficiar a empresa, à empresa capitalista”.211 212

Benedito Calheiros Bomfim apud José Carlos Arouca afirma,

a globalização nada mais é que o velho liberalismo, que a pátria do tempo parecia haver relegado à história, apresentado sob nova roupagem e características modernas [...] A filosofia do neoliberalismo é a da minimização ou eliminação da intervenção do Estado na economia e nos conflitos sociais, a restauração do contratualismo do século XIX, a prevalência da negociação entre as partes, a irrestrita liberdade de comércio internacional, a inteira abertura do mercado aos produtos estrangeiros. O liberalismo, desconsiderando a ética e a moral, reduz o homem e as relações de trabalho a valores materiais pecuniários. Sua natureza mercantilista, despida de ética, vê as pessoas como mercadorias, peças descartáveis. È um sistema desumano,

210 RÜDIGER, Dorothee Susanne. O contrato coletivo no direito privado: contribuições do direito do trabalho

para a teoria geral do contrato. São Paulo: LTr, 1999. p. 103. O pluralismo jurídico como meio de preservação do ordenamento jurídico.

211 AROUCA, José Carlos. O sindicato em um mundo globalizado. São Paulo: LTr, 2003, p. 392. Ver também AROUCA, José Carlos. Flexibilização normativa no direito do trabalho constituído. Repertório IOB de Jurisprudência, São Paulo, n. 16/96, p. 284, ago. de 1996.

212 “O liberalismo tinha como postulado a liberdade contratual, competindo aos contratantes, livremente, estipularem as regras e condições a serem observadas, sem que fosse admitida a intervenção de terceiros, inclusive do Estado. E isto se dava, também, é claro, na contratação da mão-de-obra. Luciano Athayde Chaves anota que “sob o império do liberalismo, as fábricas se faziam aos olhos do antigos mestres artesãos, como a escravidão do trabalho”. Em seu apoio cita David Landes: “ As fábricas pareciam prisões aos olhos do pessoal da velha guarda (artesãos e mestres das corporações de ofício). Onde foi, então, que os primeiros donos de fábrica encontraram sua força de trabalho? Onde mais senão entre aqueles que não podiam dizer “não”? Na Inglaterra, isso significou crianças, recrutadas compulsoriamente (compradas), com freqüência em asilos de indigentes, e mulheres, em especial as jovens solteiras”. AROUCA, José Carlos. O sindicato em um mundo globalizado. São Paulo: LTr, 2003. p. 393. Ver também AROUCA, José Carlos. Trabalho, cidadania e estado: uma visão crítica sobre o liberalismo contemporâneo. Trabalho e Doutrina, n. 24, p. 134, mar. 2000.

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selvagem, em que a miséria da maioria alimenta a opulência de uma minoria privilegiada. E citando Moacyr Werneck de Castro, prossegue,

neoliberalismo [...] é a expressão do velho liberalismo em nossa época, a substituição do sonho de um Estado de bem-estar pelo jogo do mercado, um jogo que se diz livre, mas onde predomina um capital internacional cada vez mais ganancioso e assustador pela sua extrema mobilidade (JORNAL DO BRASIL, 1° de abr. de 1977).

Calheiros vai além e diz, “esse modelo tem levado os Estados não pertencentes ao

primeiro mundo à recessão, a privatizações predatórias de empregos, com a conseqüente

desnacionalização de seus parques industriais, humilhação da soberania nacional,

redução dos direitos sociais, flexibilização e desregulamentação dos direitos

trabalhistas”.

Finalmente, valendo-se de um dos principais teóricos do capitalismo brasileiro,

em grande parte responsável pela economia do regime militar, Delfim Neto argumenta

que:

A postura dogmática de alguns economista com relação ao nível de emprego e à distribuição de renda produzidos pelo funcionamento do mercado é preocupante. Aceitam como um mal ‘natural’ todas as misérias produzidas pela redução do ritmo de crescimento da economia. Atribuem, com maior ‘naturalidade’ ainda, o desemprego apavorante que nos assola às dores do parto que precedem o nascimento da economia brasileira para o mundo globalizado. Ignoram que a política econômica adotada nos últimos nove anos não nos levou à globalização: estamos sendo simplesmente metabilizados pelo sistema econômico mundial. [...]

Em outro escrito, diz Calheiros, referindo-se às conseqüências de nossa política

cambial e monetária, admitiu que “as empresas nacionais foram dizimadas” (Folha de

São Paulo, 14 de jul. e 04 de ago. de 1999)”.213

Percebe-se que gama expressiva na doutrina reconhece à autonomia privada das

normas coletivas, forma avassaladora de exterminar com os direitos sociais, ainda mais,

sabendo-se dos projetos de leis que visam alterações214 constitucionais, em trâmite no

Congresso Nacional, afastando-se óbices técnicos e processuais à sua implantação.

213 AROUCA, José Carlos. O sindicato em um mundo globalizado. São Paulo: LTr, 2003, p. 393-94. Vide

também, AROUCA, José Carlos. globalização, reformas e desemprego, Trabalho e Doutrina, n. 23, p. 8 et seq., dez. de 1999.

214 “Modificações propostas. Para alcançar esses objetivos, o Ministério do Trabalho está propondo um conjunto de reformas. A primeira é uma Proposta de Reforma Constitucional, modificando-se os Artigos 8° e 114 da Constituição. O objetivo é fortalecer os sindicatos, rompendo o monopólio de representação sindical para democratizar a representação dos trabalhadores, eliminar a contribuição compulsória e

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Evaristo de Morais Filho ressalta, “quem primeiro pensou em desregulamentação,

nos primórdios do regime de exceção foi Roberto Campos, que idealizou o regime do

FGTS 215 para substituir a estabilidade no emprego e a indenização de antiguidade.

Atendia, assim, tardiamente, as exigências dos investidores estrangeiros, que desde o

Governo Dutra, pediam a extinção do direito de manter o emprego”.216

Ainda, na fala de José Carlos Arouca, “a desregulamentação da legislação de

proteção ao trabalho segue paralelamente ao afastamento do Estado das relações de vida

e abandono de seu papel tradicional de regulador do equilíbrio necessário do capital,

contendo sua expansão desenfreada e dando-lhe função social”.217

Acompanhando a fala, Luiz Carlos Amorim Robortella quando afirma,“o trabalho

subordinado deve ser abandonado”. 218

Conclui Arouca dizendo:

A desregulamentação num sistema democrático que mantém ativa a oposição, inclusive ideológica, mesmo alinhada aos princípios neoliberais, não se atreve a promover de pronto a ruptura com o direito social, comprometendo todo o arcabouço protecionista, já enraizado na tradição do país, além de representar conquistas preciosas e não simplesmente dádivas de governos populistas. Mas não disfarça a volúpia reformista, querendo a um só tempo flexibilizar direitos individuais e coletivos fundados basicamente na estruturação sindical. Vê-se, assim, que não possui relevância a preocupação da doutrina em distinguir o que é flexibilização do que possa ser desregulamentação. Mas não deixa de assumir natureza desregulamentadora a redução pouco a pouco dos meios de proteção social.219

Diante do exposto, observa-se que a autonomia privada coletiva por si só não

representa meio de extinção dos direitos e garantias sociais. O que deve ser levado em

conta é quem são os titulares do direito coletivo, bem como seus destinatários. Nessa

linha de raciocínio, conclui-se que as normas serão ditadas, em negociação coletiva,

prevalecendo por óbvio a vontade do mais forte, no caso, os empresários, o capital, pois

estabelecer o ritmo e a natureza da transição para um sistema de mais negociação e menos poder estatutário. A nova organização sindical deve oferecer alternativas de representação aos trabalhadores, modificar e democratizar as suas formas de financiamento, aumentando, assim, a eficácia da ação do sindicato. Propõe-se, ainda, a eliminação do poder normativo da Justiça do Trabalho que teria, desta forma, sua atuação restrita aos conflitos de direito” (AROUCA, José Carlos. O sindicato em um mundo globalizado. São Paulo: LTr, 2003. p. 402).

215 BRASIL. Lei n. 5.107/66. 216 MORAIS FILHO, Evaristo de. O direito e a ordem democrática. São Paulo: LTr, 1998, p. 48. Referido

também na obra de AROUCA, op. cit., p. 397-98. 217 AROUCA, op. cit., p. 398. 218 ROBORTELLA, Luiz Carlos Amorim. O moderno direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1994. p. 48. 219 AROUCA, op. cit., p. 407-08.

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ao simples fato de não aceitarem as reivindicações da classe operária, pode-se

vislumbrar o lado em que a corda se romperá.

Não se trata de uma relação da sociedade com o Estado, pura e simplesmente,

mas de uma relação entre particulares que defendem interesses antagônicos, sob o alvitre

do Estado.

5.3 OS DIREITOS FUNDAMENTAIS COMO LIMITES ÀS CONVENÇÕES E

ACORDOS COLETIVOS, UMA VEZ AUTORIZADOS PELA CONSTITUIÇÃO

FEDERAL

Em verdade, quando fala-se em direitos fundamentais como limites às

convenções coletivas, também poder-se-ia estar analisando os limites à flexibilização na

convenção coletiva. Pois também é correto afirmar que os próprios direitos

fundamentais estariam sob a mira de uma flexibilização, como demonstrado no Capítulo

II, item 5.2.

Na lição de Norberto Bobbio220, também referido por Gschwendtner,221 sem

direitos do homem reconhecidos e protegidos, não há democracia; sem democracia, não

existem as condições mínimas para a solução pacífica dos conflitos.

Gschwendtner observa que:

Hodiernamente os direitos fundamentais estão sendo deslocados da dogmática jurídico-constitucional para as chamadas teorias da justiça, para as teorias sociais e para as teorias econômicas do direito, talvez devido à propalada crise da constituição e das teorias de direitos fundamentais; razão pela qual, se faz necessário que a dogmática e a prática dos direitos fundamentais regressem ao espaço jurídico-constitucional, em face da chamada estabilidade pura preconizada pelo modelo de Constituição do Estado, onde os direitos fundamentais são reconhecidos, consagrados e garantidos pelo ESTADO.222

Ainda, Gschwendtner afirma que os Direitos Fundamentais são colocados no

mais alto degrau das fontes dos direitos: as normas constitucionais.

220 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Tradução Carlos Nelson Coutinho. 10. ed. Rio de Janeiro: Campus,

1992. p. 34. 221 GSCHWENDTNER, Loacir. Direitos fundamentais. Jus Navigandi, Teresina, v. 5, n. 51, p. 3, out. 2001.

Disponível em:< http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?=2075> Acesso em: 27 jun. 2006.

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Assim, num primeiro momento, os Direitos Fundamentais, sob a guisa de normas

constitucionais, não deveriam ser flexibilizados. Exatamente para assegurar e garantir o

exercício dos direitos fundamentais, através das convenções coletivas, não permitindo

que as mesmas, sob o escopo da autonomia privada coletiva, distanciem direitos aos

trabalhadores.

Cita-se um exemplo, pinçado na Constituição Federal por Washington Luiz da

Trindade, quando da análise dos artigos 8°, da CF e 617, § 1°, da CLT, e art. 7°, inciso

XIV, da CF, o mesmo assevera a aceitação da derrogabilidade do texto fundamental

frente à negociação coletiva dos interessados, quando inscreveu, nas alturas de norma

constitucional, a jornada de seis horas.223

Melchíades Rodrigues Martins – em artigo escrito sobre, projeto de lei que

modifica o artigo 618 da CLT e que trata da prevalência do negociado sobre o legislado

– destaca aspectos relevantes sobre a matéria, principalmente sobre os limites

constitucionais do negociado sobre o legislado.

Conceitua inconstitucionalidade e aponta a inconstitucionalidade dos dispositivos

contidos no projeto de lei.

Cita Carmem Lúcia Antunes Rocha que diz:

A constitucionalidade é a medida de todas as normas. O padrão de validade jurídica das normas que compõem o sistema de Direito é a Constituição. A sua qualidade paramétrica deriva, em parte, de sua fundamentalidade, entendida aqui como o ponto de modelação e sustentação de todo o sistema normativo e como origem de todas as normas, e, em parte, de sua supremacia, inteligida como a primariedade e a superioridade material e formal que ela ostenta. Como Lei Fundamental e Suprema, a Constituição é a única e superior vertente de validade de todas as normas, as quais somente têm existência plena se compatíveis e conforme a ela. 224

222 GSCHWENDTNER, Loacir. Direitos fundamentais. Jus Navigandi, Teresina, v. 5, n. 51, p. 5, out. 2001.

Disponível em:< http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?=2075> Acesso em: 27 jun. 2006. 223 TRINDADE, Washington Luiz da. O direito e o avesso nos contratos coletivos de trabalho. Revista do

Direito Trabalhista, Brasília, n. 5, p. 67-8, maio 1995. 224 MARTINS, Melchíades Rodrigues. Projeto de Lei que modifica o art. 618 da CLT e que trata da prevalência

do negociado sobre o legislado: limites constitucionais. Revista do TRT da 15ª Região, n. 17, p. 65-78, dez. 2001, Ver nota n. 3, ROCHA, Carmem Lúcia Antunes. Constituição e constitucionalidade. Belo Horizonte: Lê, 1991. p. 98.

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Ainda, evidencia a lição de Lenio Luiz Streck:

A Constituição é um espaço garantidor das relações democráticas entre o Estado e a Sociedade. [...] Constituição significa constituir alguma coisa; é fazer um pacto, um contrato, no qual toda a sociedade é co-produtora. Desse modo, violar a Constituição ou deixar de cumpri-la é o descumprir essa constituição do contrato social. Isso porque a Constituição – em especial a que estabelece o Estado Democrático de Direito, oriundo de um processo constituinte originário, após a ruptura com o regime não-constitucional autoritário, no contexto de que o contrato social é a metáfora na qual se fundou a racionalidade social e política da modernidade, vem a ser explicação desse contrato social.225

Outrossim, Melchíades conclui:

Assim, as normas constitucionais que regem os direitos sociais

fazem parte do pacto, do contrato da qual toda a sociedade é co-produtora e, como não poderia deixar de ser, elas dão sustentação aos direitos dos trabalhadores, que é a base de uma convivência social saudável entre os diversos atores sociais, tanto que os aludidos direitos inserem-se no Título II, da Carta Magna, que tratam dos direitos e garantias fundamentais (arts. 5° a 17).226

A Constituição representa o manancial dos direitos e garantias dos trabalhadores,

fruto de inúmeras e árduas conquistas dos mesmos, não podendo a lei ou qualquer outro

centro de positivação ignorar seus postulados, salvo quando para criar novas condições

de trabalho mais favoráveis aos trabalhadores, respeitados os limites permitidos para

a negociação coletiva.

Ao afirmar que a Constituição representa uma unidade e que tem por corolários

os direitos e garantias fundamentais, o sentido emprestado ao caput do art. 7°, qual seja,

que são direitos dos trabalhadores, além daqueles assegurados nos incisos do

mencionado artigo, outros que visem à melhoria de sua condição de vida, não poderiam

ser desrespeitados. Diz Melchíades227 que, “o raciocínio exposto ganha mais força

quando se constata que os limites para negociação já ficaram previstos na Carta Magna

para aqueles direitos que são revestidos da mais alta importância para os trabalhadores,

no caso, a redução de salário, jornada de trabalho e turnos ininterruptos de

revezamento”.

225 MARTINS op. cit., p. 67. Vide nota n. 5. STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica (em) crise: uma

exploração hermenêutica da construção do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999. p. 214. 226 MARTINS, loc. cit. 227 MARTINS op. cit., p. 67. Vide nota n. 5. STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica (em) crise: uma

exploração hermenêutica da construção do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999. p. 214. p. 67. Vide nota n. 5. STRECK, Lenio Luiz. Hermenêutica jurídica (em) crise: uma exploração hermenêutica da construção do Direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999.

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Em contrapartida, observa-se que a Constituição Federal, ao estabelecer limites

para a negociação coletiva, verbi gratia, quando refere-se à salários, não explicita o

quanto é possível flexibilizar. No artigo 7°, inciso VI, da CF, disciplina:

“irredutibilidade do salário, salvo o disposto em acordo ou convenção coletiva”, porém

não explicita um limite para essa redução, transferindo para a autonomia privada

coletiva essa missão, a priori, finalisticamente constitucional.

A Constituição Federal ao transferir para a autonomia privada coletiva, a solução

de conflitos coletivos de natureza econômica, enfraquece suas próprias normas

constitucionais, abdicando de seu papel garantista.

No artigo 7°, inciso XIII, da CF, disciplina: “duração do trabalho normal não

superior à oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de

horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva”, quando

existem regimes compensatórios convencionados que desrespeitam o limite previsto no

artigo 59, § 2°, da CLT, qual seja: “[...] de maneira que não exceda, no período máximo

de 1 (um) ano, à soma das jornadas semanais de trabalho previstas, nem seja

ultrapassado o limite máximo de 10 (dez) horas diárias. Vide, v.g., regimes 4 x 2 de

trabalho dos vigias, de 12 horas diárias.

E, no artigo7°, inciso XIV, da CF, disciplina, “jornada de seis horas para o

trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva”,

se possibilita a negociação, não precisava criar um inciso próprio para os turnos

ininterruptos de revezamento, poderia valer-se da regra geral, que permite contratação

em número inferior ao previsto como limite diário 8 (oito) horas.228 Destaca-se

fundamento de jurisprudência do TST229 Mesmo com autorização constitucional para

negociação coletiva, em matéria de turnos ininterruptos de revezamento,

é preciso que esse direito, que não é irrestrito, seja exercido dentro de

princípios e regras que não comprometam a higidez físico-psíquica e

financeira do empregado. O acordo coletivo em exame, conforme retrata o

228 A título ilustrativo, reporta-se ao Acórdão prolatado nos autos de Embargos em Recurso de Revista n° TST

– E-RR-382.825/97.0 – SBDI - I, em que é embargante DARCI JOSÉ MARTINS e embargada HABITAÇÃO CONSTRUÇÕES E EMPREENDIMENTOS LTDA. “ACORDAM os Ministros da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho,por maioria, vencido o Exmo. Ministro Rider Nogueira de Brito, conhecer do recurso de embargos quanto ao tema “turnos ininterruptos de revezamento – jornada superior a 6 horas fixada em acordo coletivo sem contraprestação remuneratória – inconstitucionalidade da cláusula”, por divergência jurisprudencial e violação do artigo 7°, XIV, da Constituição Federal, e, no mérito, dar-lhes provimento para restabelecer a decisão de primeiro grau.

229 Refere-se ao acórdão mencionado na nota de n. 83, supra.

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acórdão recorrido, prevê jornada de 8 horas para o labor em turno ininterrupto

de revezamento. Com todas as vênias, ineficaz o referido reajuste, na medida

em que permite a prorrogação do trabalho em turno ininterrupto de 6 para

8 horas, sem contraprestação remuneratória das 7ª e 8ª horas, circunstância

que compromete não apenas a saúde do trabalhador, como também seu ganho.

Recurso de embargos conhecido e provido.230

A matéria é complexa, por isso, oportuna reflexão acerca da doutrina de J.J.

Gomes Canotilho,

a interrogação formulada em quarto lugar aproxima-nos da complexa problemática do conteúdo e legitimidade de uma constituição e dos limites do poder constituinte. Adiante será explicitada a seguinte tese: o poder constituinte, embora se afirme como poder originário, não se exerce num vácuo histórico-cultural. Ele “não parte do nada” e, por isso, existem certos princípios – dignidade da pessoa, justiça, liberdade, igualdade – através dos quais poderemos aferir da bondade ou maldade intrínsecas de uma constituição.231

Sob nova semântica, os direitos fundamentais não são absolutos nem ilimitados.

Na lição de José Carlos Vieira de Andrade232, ficam os direitos sociais sujeitos a três

espécies de limitações: “as imanentes, as derivadas de conflito e as resultantes de

intervenção normativa”.

As imanentes decorrem da natureza do direito considerado e das fronteiras

estabelecidas pela própria Constituição ao criá-lo ou recebe-lo. Referidas limitações são

expressas, quando formuladas claramente no texto constitucional, ou implícitas, quando

decorrentes da interpretação deste.233 Cite-se, verbi gratia, a proibição ao trabalho, de

menores de 16 (dezesseis) anos, salvo na condição de aprendiz.234 Caso de limite

implícito, vislumbra-se ao assegurar que são direitos de todos os trabalhadores urbanos e

rurais, aviso prévio de no mínimo 30 (trinta) dias, não sendo verdadeira a recíproca para

230 “E isso porque o princípio da liberdade contratual não pode ter o alcance de derrogar todo um sistema legal

imperativo de proteção ao empregado, mormente quando se procura preservar sua higidez físico-mental.” Acórdão n° TST – E – RR 382.825/97.0 – SBDI – I.

231 CANOTILHO, Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. 5. ed. Coimbra: Almedina, 1998. p. 66.

232 ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976. Coimbra: Almedina, 1987. p. 213 et seq.

233 Vide comentários de MAGANO, 1993, p. 32. 234 Vide art. 7°, inciso XXXIII, da CF/88.

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o caso do empregado que dá o aviso e que se enquadre nas condições do artigo 487, I, da

CLT.235

Os limites derivados de conflitos manifestam-se quando a Constituição protege

simultaneamente dois valores em contradição concreta, de modo que a esfera de

proteção de um deles invade a de outro. Não se trata de solucionar o problema por meio

da ordem hierárquica de valores, e sim de harmonização dos valores em conflito,

comprimindo-se o menos possível cada um deles.

Os limites resultantes de intervenção normativa ocorrem em virtude de um certo

grau de imprecisão e fluidez de que, freqüentemente, se ressentem as normas

constitucionais.236

6 PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO

O princípio da adequação setorial negociada, trata de saber, em que medida as

normas juscoletivas podem se contrapor às normas jusindividuais imperativas estatais

existentes. Para tanto, Maurício Godinho Delgado frisa dois critérios autorizativos:

a) quando as normas autônomas juscoletivas implementam um padrão setorial de direitos superior ao padrão geral oriundo da legislação heterônoma aplicável; b) quando as normas autônomas juscoletivas transacionam setorialmente parcelas justrabalhistas de indisponibilidade apenas relativa (e não de indisponibilidade absoluta).237

Explica o autor,

no primeiro caso especificado (quando as normas autônomas juscoletivas implementam um padrão setorial de direitos superior ao padrão geral oriundo da legislação heterônoma aplicável), as normas autônomas elevam o patamar setorial de direitos trabalhistas, em comparação com o padrão geral imperativo existente. Assim o fazendo, não afrontam sequer o princípio da indisponibilidade de direitos que é inerente ao Direito Individual do Trabalho.238

235 Empregado que receber salário efetuado por semana ou tempo inferior. 236 “Falando do art. 37, II, da Lei Magna, em exercício do direito de greve, essa possibilidade não pode, de

modo algum, ser negada, notadamente em se tratando de direito fundamental, que, nos termos do § 1°, do art. 5°, da Constituição, tem aplicação imediata. O que fica na dependência de lei complementar são as restrições que o legislador poderá estabelecer para o seu exercício.” MAGANO, Octávio Bueno; MALLET, Estêvão. O direito do trabalho na constituição. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. p. 35-6.

237 DELGADO, Maurício Godinho. Direito coletivo do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2003. p. 158-59. 238 Ibidem, p. 160.

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No segundo caso (quando as normas autônomas juscoletivas transacionam setorialmente parcelas justrabalhistas de indisponibilidade apenas relativa – e não de indisponibilidade absoluta) o princípio da indisponibilidade de direitos é realmente afrontado, mas de modo a atingir somente parcelas de indisponibilidade relativa. Estas assim se qualificam quer pela natureza própria à parcela mesma (ilustrativamente, modalidade de pagamento salarial, tipo de jornada pactuada, fornecimento ou não de utilidades e suas repercussões no contrato, etc.), quer pela existência de expresso permissivo jurídico heterônomo a seu respeito (por exemplo, montante salarial: art. 7°, VI, CF/88; ou montante de jornada: art. 7°, XIII e XIV, CF/88).239

Outros aspectos relevantes são destacados por Delgado, a) são amplas as

possibilidades de validade e eficácia jurídicas das normas autônomas coletivas em face

das normas heterônomas imperativas; b) existem limites jurídicos objetivos de limitação

à criatividade jurídica da negociação coletiva trabalhista; c) não prevalecem mediante

ato estrito de renúncia, considerando-se que devem promover transação (despojamento

bilateral ou multilateral, com reciprocidade entre os agentes envolvidos); d) não

prevalecem quando ultrapassarem os limites da indisponibilidade absoluta, sendo que

tais normas têm como papel tutelar o interesse público, por constituir um patamar

civilizatório mínimo que a sociedade democrática não concebe ver reduzido em qualquer

segmento econômico-profissional, sob pena de se afrontarem a própria dignidade da

pessoa humana e a valorização mínima deferível ao trabalho (arts. 1°, III e 170, CF/88).

Verbi gratia, podemos citar a anotação da Carteira de Trabalho e Previdência Social, o

pagamento do salário mínimo, as normas de medicina e segurança do trabalho.240

No Brasil, podemos identificar três níveis de fontes normativas que proíbem

absolutamente a quebra das garantias mínimas, firmadas no ordenamento jurídico. São

elas: normas constitucionais (por exemplo: art. 7°, incisos VI – irredutibilidade salarial,

XIII – limite à jornada de trabalho e XIV – jornada de seis horas para os turnos

ininterruptos de revezamento), normas de tratados e convenções internacionais (art. 5° §

2°, CF/88), e as normas legais infraconstitucionais (dispositivos antidiscriminatórios,

normas de identificação profissional, normas salariais mínimas e normas relativas à

saúde e segurança no trabalho).

6.1 NORMAS COLETIVAS AQUÉM E ALÉM DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

239 DELGADO, Maurício Godinho. Direito coletivo do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2003. p. 160.

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A priori, neste item tenta-se demonstrar cláusulas de convenções coletivas que

desrespeitem as regras mínimas, mesmo que as mesmas sejam posteriormente declaradas

nulas pelos Tribunais, ou no caso de válidas, referirem-se às normas de

indisponibilidade relativas (referidas no item anterior).

O que se pretende demonstrar é que referidas cláusulas, efetivamente passam pelo

crivo de uma negociação coletiva, e expressam a vontade da maioria, principalmente

quando representam a mantença de outros direitos em prol da flexibilização de

conquistas anteriormente consagradas.

Mônica Sette Lopes, bem lembra,

por outro lado, se não é possível alcançar as típicas relações jurídicas de direito público no rol dos pontos negociáveis, também não será viável fixar diretrizes coletivas aquém dos conteúdos mínimos da Constituição, entre estes não abrangidos os pontos em que ela definiu expressamente a possibilidade de livre atração pela norma coletiva. A noção de conteúdo mínimo não é contudo unívoca e pode ser que a negociação estabeleça padrões de prestação e contraprestação que, em sua substância, constituam opção mais vantajosa para os empregados como linha de tutela e segurança.241

A título de exemplo, passa-se a demonstrar algumas normas convencionadas, que

não atendem o regramento mínimo estipulado na norma constitucional ou

infraconstitucional, como segue:

a) Férias de no máximo 18 dias para os empregados que trabalhem em regime de

jornada de trabalho parcial, vide art. 58 – A, da CLT e art. 131 – A, da CLT. Ao passo

que a Constituição Federal quando reporta-se ao instituto das férias, por lógica, está a

contemplar o previsto no artigo 129 e ss, da CLT, ou seja no mínimo 30 (trinta) dias,

após 12 (doze) meses de labor contínuo ao mesmo empregador.

b) Intervalos Interjornadas, equivale à 11 horas entre jornadas de trabalho, não

podendo ser inferior ao número de horas destinadas à saúde e segurança do trabalhador.

Transcreve-se cláusula 24ª, § 3°, da convenção coletiva de trabalho 2006 – Sinpro/RS –

Sinepe/RS que altera para 9 (nove) horas o número mínimo entre jornadas, “Parágrafo

terceiro – O intervalo intrajornada poderá exceder intervalo entre o término da jornada

de um dia e o início da jornada deverá contemplar, no mínimo, 09 (nove) horas

consecutivas.”

240 DELGADO, loc. cit. 241 LOPES, Mônica Sette. A convenção coletiva e sua força vinculante. São Paulo: LTr, 1998. p. 284.

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Segundo Maurício Godinho Delgado, 242

Intervalos Interjornadas: repercussões jurídicas de seu desrespeito – As normas jurídicas que regulam os intervalos interjornadas também são imperativas.(Grifo nosso). Por essa razão, seu desrespeito na prática contratual implica, no mínimo, falta administrativa cometida pelo empregador (art. 75, CLT) – que detém o controle da organização do trabalho e da prestação de serviços (e por esta é beneficiada). Além de tal repercussão, outro importante efeito pode resultar da afronta a essas normas jurídicas, de acordo com o tipo de intervalo afrontado.

No caso em tela, refere-se o autor da hipótese a) Desrespeito ao Intervalo

Interjornadas, é de caráter imperativo, não sendo do tipo remunerado, porém ressalva

tese contrária,

contudo, seu efetivo cumprimento é de crucial relevância não apenas para a saúde e segurança do trabalhador, como ainda para permitir razoável integração pessoal do obreiro no seio de sua família e de sua comunidade mais ampla. A frustração de tal cumprimento (e dos objetivos desse intervalo) causa real prejuízo ao obreiro e à própria comunidade em que deveria ser integrado. Por tais razões, é que em certas situações concretas, em que o sistema de organização do trabalho já institui um adicional desgaste e isolamento familiar e social do trabalhador (como o regime de turnos ininterruptos de revezamento), a jurisprudência já pacificou que “as horas trabalhadas em seguida ao repouso semanal de vinte e quatro horas, com prejuízo do intervalo mínimo de onze horas, devem ser remuneradas como extraordinárias, inclusive com o respectivo adicional” (Enunciado n. 110, TST).

No tocante ao desrespeito ao intervalo mínimo de onze horas, a ordem jurídica

não tem regra clara.

c) Base de cálculo para o adicional de insalubridade: a Constituição Federal em

seu art. 7°, inciso XXIII, garante aos trabalhadores urbanos e rurais, adicional de

remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei, no

entanto muitas categorias firmam cláusulas em convenções coletivas fixando como base

de cálculo, para o adicional de insalubridade, o salário mínimo, em repetição ao

enunciado na lei, art. 192, da CLT. Mormente, vale-se de fundamentação de sentença

prolatada no processo de n. 00357-2006-005-04-00-1, que tramita na 5ª Vara do

Trabalho de Porto Alegre/RS, para demonstrar análise feita pelo juízo, com intuito de

assegurar ao obreiro a tutela de dispositivo constitucional que consagra direito

fundamental, que ora transcreve-se: “[...] Saliento, por oportuno, que a adoção da

remuneração da autora como base de cálculo encontra justificativa no disposto do artigo

242 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTr, 2004. p. 934-35.

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7° da Constituição Federal, que, em seu inciso XXIII, trata expressamente de adicional

de remuneração. O dispositivo consagra direito fundamental que diz com a higidez

física e mental do homem trabalhador. Como tal, não pode ser interpretado de modo a

restringir sua abrangência. No particular, observo que a exegese de norma

constitucional, cuja natureza é manifestamente principiológica, deve ser contaminada

pela elementar noção de que nosso Estado Democrático de Direito tem por fundamento a

dignidade da pessoa humana e a valorização social do trabalho. Um exame da norma de

modo comprometido com esses corolários, determina a interpretação mais favorável ao

obreiro. No caso, incide, também, o princípio tuitivo que informa o Direito do Trabalho.

Portanto, entendo que o inciso XXIII do artigo 7° da Constituição Federal, ao fazer

referência ao adicional de remuneração, pretendeu inovar ao quanto dispõe o artigo 192

da CLT. Este dispositivo refere:

Salário mínimo da região como base de cálculo do adicional de insalubridade. Sua redação foi alterada por Lei de 1977. À época, tal como agora, havia previsão de que o salário mínimo correspondesse a um montante capaz de suprir integralmente as necessidades de sobrevivência do homem trabalhador. Passadas quase três décadas, o valor do salário mínimo representa cada vez menos o conceito contido no inciso IV do mesmo artigo 7° da Constituição Federal. Calcular adicional de salário com base no valor nacionalmente fixado como mínimo implica retirar a eficácia da norma que prevê o pagamento do adicional de insalubridade, cujo escopo é evidentemente preventivo e não meramente pecuniário. Em outras palavras, o valor correspondente a tal adicional deve ser significativo, pena de tornar atrativo o descumprimento das normas de proteção capazes de elidir eventuais situações de insalubridade.

d) Regime de compensação de horas que inobserva os limites do artigo 59 § 2°,

da CLT, limita a jornada de trabalho, em regime compensatório, a dez horas diárias.

Transcreve-se Acórdão do Processo: 00673-2003-301-04-00-0 (RO):

EMENTA: REGIME COMPENSATÓRIO DE HORÁRIO. IRREGULARIDADE. A harmonização dos artigos 59 e 61 da CLT evidencia que em situação normal o núcleo do direito fundamental assegurado no inciso XIII do art. 7° da Constituição Federal estará preservado se não excedidas as dez horas diárias. O sistema de compensação horária, ainda que autorizado por norma coletiva, é irregular quando desrespeita o limite máximo de horas extras previsto em lei.243

243 Processo: 00673-2003-301-04-00-0 (RO), Juiz: José Felipe Ledur, data da publicação: 19/12/2005.

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A título de exemplo, passa-se a demonstrar algumas normas convencionadas, que

excedem o regramento mínimo estipulado na norma constitucional ou

infraconstitucional, como segue:

a) Trabalho com jornada de 40 horas semanais com dispensa aos sábados e

domingos, sem prejuízo do salário.

b) Cláusula 16ª da convenção coletiva de 2004 – SINDEF/RS – SECOVI/RS,

“AVISO PREVIO – ACRÉSCIMO – Os empregados com 45 (quarenta e cinco) ou mais

anos de idade e com 5 (cinco) ou mais anos consecutivos no mesmo condomínio, ao

serem demitidos terão direito a 45 (quarenta e cinco) dias de aviso prévio, desde que

preencham ambos os requisitos”.

c) Hipoteticamente, cláusula “y” da convenção coletiva de 2006 – Sindicato “A”,

“Adicional de 50% sobre as duas primeiras horas e 100% para as subseqüentes”.

d) Hipoteticamente, cláusula “h” da convenção coletiva de 2006 – Sindicato “B”,

“Adicional noturno de 25% calculado sobre a hora diurna”.

6.2 NORMAS COLETIVAS NOS LIMITES DA INDISPONIBILIDADE RELATIVA

DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

O princípio da indisponibilidade de direitos é realmente afrontado, mas de modo

a atingir somente parcelas de indisponibilidade relativa, tais como: montante salarial,

art. 7°, VI, da CF/88; ou montante de jornada, art. 7°, XIII e XIV, da CF/88244.

A Lei 9.601/88 que disciplina o trabalho a prazo determinado, implementada

mediante negociação coletiva, prevê entre outros direitos, o percentual de recolhimento

do FGTS a menor, comparada à legislação que regulamenta o FGTS (Lei n. 8.036/90).

Neste caso, vê-se flagrante desrespeito ao princípio da igualdade, pois possibilita a

existência de contratos de trabalho de diversos empregados com um mesmo empregador,

onde entre eles alguns contratos recolhem 8% de contribuição fundiária e outros 2%

conforme Lei nº 9.601/98.

244 DELGADO, Mauricio Godinho. Direito coletivo do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2003. p. 160.

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Diga-se que referida lei, possui como pré requisito para sua aplicabilidade, que

seja objeto de negociação coletiva entre os interessados da categoria. Detecta-se

flagrante inconstitucionalidade, ferindo Princípio da Igualdade e o respeito à dignidade

da pessoa do trabalhador.

O mesmo ocorre quando a lei prevê férias de no máximo 18 dias para os contratos

de trabalho a tempo parcial, “par time job”, regulamentado pelo artigo 58-A, da CLT

(red. MP 2.164/01).

Quando a legislação ordinária em seu art. 130, da CLT dispõe, “após cada

período de 12 (doze) meses de vigência do contrato de trabalho, o empregado terá

direito à férias, na seguinte proporção: I- 30 (trinta) dias corridos, quando não houver

faltado ao serviço mais de 5 (cinco) vezes”. Observa-se que o requisito legal para gozar

trinta dias de férias é o período de vigência de 12 (doze) meses de trabalho e não

exceder 5(cinco) faltas no mesmo período aquisitivo. Logo, os contratos de trabalho a

tempo parcial, não teriam em tese, requisito distinto capaz de prescindir a Constituição

Federal e legislação infraconstitucional. Muito embora, criados sob a chancela de

proteção aos trabalhadores contra o desemprego.

Irredutibilidade de salário, salvo acordo ou convenção coletiva, nos termos do

artigo 7°, inciso VI, da CF.245 Observa-se que o permissivo constitucional para reduzir

salários, estaria respaldado em normas infraconstitucionais que somente admitem tal

hipótese, quando fundamentarem-se nos seguintes casos: a) o decorrente de força maior ,

previsto no artigo 503, da CLT, e em que se fala de redução de até 25% do salário; b) o

previsto na Lei nº 4.923/65, admitindo, na hipótese de conjuntura econômica

desfavorável, redução de jornada com conseqüente redução salarial de até 25%; c) o

derivado do artigo 2º da Lei nº 3.207/57, em que se permite a transferência de viajante

de zona de trabalho, com redução de vantagens, assegurada tão-somente a remuneração

mínima equivalente à média dos salários percebidos nos doze meses anteriores à

transferência.246

245 VIDIGAL, Márcio Flávio Salem. Limites à flexibilização na convenção coletiva e nos acordos coletivos no

ordenamento jurídico brasileiro. Revista TRT – 3ª R., Belo Horizonte, v. 54, n. 25, p. 223, jul. 1994/jul. 1995. MAGANO, Octávio Bueno; MALLET, Estêvão. O direito do trabalho na constituição. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. p. 103-04.

246 MAGANO, Octávio Bueno; MALLET, Estêvão. O direito do trabalho na constituição. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1993. p. 104.

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Segundo Chiarelli247, “parece claro que tais hipóteses de redução salarial,

perfeitamente válidas, quando cotejadas com o artigo 468 da CLT, de que constituíam

exceções, não podem mais prevalecer, à luz da regra de irredutibilidade introduzida na

Constituição”.

Jornada de 6 (seis) horas para os turnos ininterruptos de revezamento, salvo

acordo ou convenção coletiva. Podendo a mesma ser prorrogada para oito horas.

6.3 NORMAS COLETIVAS NOS LIMITES DA INDISPONIBILIDADE ABSOLUTA

DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

Ocorre quando a norma constitucional estabelece direitos e garantias assegurados

em seu patamar mínimo, não sendo possível negociar acerca deles, sob pena de ferir-se o

princípio da dignidade da pessoa humana, bem como o princípio da igualdade e a

valoração mínima ao trabalho.

Cite-se, verbi gratia, o art. 7°, inciso V, da CF, “piso salarial proporcional à

extensão e à complexidade do trabalho,” Piso Regional instituído pela Lei

Complementar n° 103, de 14 de julho de 2000, e, art. 7°, inciso IV, da CF, “salário

mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, [...]”.

Pode-se inserir nesse contexto, a anotação de CTPS, o pagamento do salário

mínimo, as normas de medicina e segurança do trabalho.248 Refere-se ainda, à dignidade

da pessoa humana, art. 1°, III, da CF/88 e art. 170, caput, da CF/88 que disciplina sobre

a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa.

As estabilidades constitucionais, em regra absolutas, podem sofrer ameaça face

às normas coletivas que, estabelecem a perda do direito estabilitário, pelo decurso de

prazo para sua comunicação ao empregador. São formas indiretas de tentar invalidar as

garantias sociais pertinentes à estabilidade. Tais disposições são consideradas

inconstitucionais pelos Tribunais laborais, pois, v. g., asseverados na Constituição

Federal, tal como é o caso da gestante que possui estabilidade no emprego da

confirmação da gravidez até o quinto mês após o parto, art. 10, inciso II, “b” dos Atos

das Disposições Constitucionais Transitórias. Nesse diapasão, algumas convenções

247 CHIARELLI, Carlos Alberto. Trabalho na Constituição. São Paulo: LTr, 1990. v. 2, p. 89. 248 DELGADO, Mauricio Godinho. Direito coletivo do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2003. p. 160.

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coletivas prevêem prazo para a comunicação do estado gravídico, sob pena de

decadência do direito a estabilidade.

Estabilidade da gestante, afastada até então às empregadas domésticas, por falta

de inclusão no artigo 7°, parágrafo único, da CF/88. Recentemente a lei n° 11.324, de 20

de julho de 2006, assegura aos domésticos, estabilidade decorrente da gravidez e férias

de trinta dias.

Vaticina a CF direito à estabilidade da gestante, sem delimitação ou restrição à

qualidade de grávida249, entretanto, o artigo 7°, da CLT, excluía aos domésticos os

direitos consolidados, salvo expressa disposição legal em contrário. Tal disposição legal

não exclui de todo, a possibilidade da norma constitucional, considerar o direito à

gestante lato sensu, pois não exclui da qualidade de trabalhadora gestante, nenhuma

categoria de obreira, seja por ser norma constitucional posterior à norma consolidada,

seja por pretender o constituinte um avanço nesse aspecto.

6.4 AS CONVENÇÕES COLETIVAS COMO MEIO DE OPERACIONALIZAR E

POTENCIALIZAR OS DIREITOS FUNDAMENTAIS

As convenções coletivas de trabalho foram eleitas ao patamar de fontes

normativas, pela Constituição da República Federativa de 1988.250 251

249 Vide art. 10, inciso II, alínea “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias – ADCT. 250 Mister referir as palavras de RÜDIGER, Dorothee Susanne. O contrato coletivo no direito privado:

contribuições do direito do trabalho para a teoria geral do contrato. São Paulo: LTr, 1999. p. 85. “Autonomia privada significa, em outras palavras, a possibilidade de os atos se tornarem jurídicos, constituírem regras”.

251 Para Pugliatti apud RÜDIGER, Dorothee Susanne. O contrato coletivo no direito privado: contribuições do direito do trabalho para a teoria geral do contrato. São Paulo: LTr, 1999. p. 86, “autonomia privada significa “potestà di darsi um ordinamiento”. Não é um simples poder dar-se normas, entendido como liberdade, mas sim uma potestas, um poder com conotação política. Esse poder cria um ordenamento jurídico privado, um ordenamento subordinado e reconhecido pelo Estado. Segundo a concepção de Pugliatti, há uma pluralidade de ordenamentos jurídicos no seio de uma sociedade: o ordenamento estatal, que tem uma “posição proeminente e tendencialmente monopolistica”, e a comunidade dos privados, composta por corpos sociais, com seus ordenamentos jurídicos próprios e independentes. O ato negocial, a declaração ou manifestação da vontade, é, para o autor, um ato da autonomia privada, destinada ao auto-regulamento de interesses próprios dos privados”.

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Segundo Luigi Ferri apud Dorothee Susanne Rüdiger, “a lei dá aos singulares o

poder de criar direito objetivo”.252

Mônica Sette Lopes253 doutrina em sua obra, inovadora sobre o tema relacionado

à Convenção Coletiva e sua força vinculante, em que muito bem destaca Valentin

Carrion no prólogo de referida obra, a saber,

ressalte-se, outrossim, que a conotação da convenção coletiva como parte integrante de um sistema jurídico ganha desdobramentos em suas esferas conceituais que a interligam no tempo, no espaço e no que toca aos sujeitos e ao objeto por ela alcançados. A autonomia do instituto, como agente executório de normas programáticas, alerta o estudioso para o exame da eficácia contida das normas maiores, dos princípios de sua autoaplicabilidade ou, ao mesmo tempo, da vinculação legitimadora estrita de que se acha provida cada regra maior, cujos parâmetros são porém determinantes na criação das normas legais de direito público estrito.

Em que pese, a competência para legislar sobre matéria trabalhista, ser atinente à

União. Por diversos motivos, já vistos, o Estado autoriza os particulares, na expressão da

autonomia privada coletiva, a criar novas condições de trabalho, seja pela demora estatal

em adequar normas mais específicas à sociedade laboral, seja pela necessidade de as

categorias criarem regras mais próximas ao seu cotidiano, ou ainda, para adequarem as

necessidades categoriais às possibilidades econômicas, resultantes de um processo

evolutivo, globalizado e neoliberal.

A Constituição Federal, em pleno século XXI, deveria deixar de apenas

proclamar direitos fundamentais, e sim garantir sua plena eficácia, no entanto ainda

depara-se com normas programáticas e normas de eficácia contida ou limitada. Entre

inúmeros casos, cita-se, verbi gratia, o art. 7°, inciso XXI, da CF/88, “aviso prévio

proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei”.

Aqui, como em outros casos, as convenções coletivas atuam como meio de

operacionalização dos direitos e garantias assegurados na Constituição Federal.

252 FERRI apud RÜDIGER, Dorothee Susanne. O contrato coletivo no direito privado: contribuições do direito

do trabalho para a teoria geral do contrato. São Paulo: LTr, 1999. p. 86. 253 LOPES, Mônica Sette. A convenção coletiva e sua força vinculante. São Paulo: LTr, 1998. p. 5.

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Ainda, art. 7°, inciso XI, da CF, “participação nos lucros, ou resultados254,

desvinculada da remuneração, e, excepcionalmente, participação na gestão da empresa,

conforme definido em lei;” referido anteriormente no Capítulo I, item 4.2.4.

Em verdade, as convenções coletivas representam muito mais ao que parece, pois

refletem uma forma de atuação diferente do Estado, como bem salienta Octavio Bueno

Magano255 ao desenvolver sobre democracia pluralista, no item Participação dos

Trabalhadores nos Resultados ou Lucros das Empresas,

democracia pluralista. É esse o quadro com o qual nos defrontamos. Esse quadro é absolutamente incompatível com a realidade dos nossos dias. Agora, cada vez mais, precisamos tomar consciência de que vivemos numa global village. O mundo se tornou um só. Pela rapidez dos meios de comunicação, o mundo é um só. Você pega um telefone e fala imediatamente com uma pessoa onde quer que ela esteja. [...] Num mundo de concorrência universal, o país que não estiver preparado para enfrentar a concorrência vai perecer. De forma que, dentro do quadro atual, é preciso que a nossa preocupação máxima seja a de nos prepararmos para enfrentar a concorrência internacional. Mas para isso é necessário que tiremos aquele excesso de carga que estamos sempre a carregar, que nos impede de caminhar com firmeza e rapidez. Precisamos nos desvestir desse pesadíssimo modelo de corporativismo e entrar numa nova era, numa era de flexibilização. E isso é perfeitamente possível, porque a Constituição de 88, embora seja muito contraditória, em um de seus preceitos deixou bem acentuado que o ideal a ser alcançado é corporativista e darmos possibilidade de desenvolvimento ao moderno modelo de democracia pluralista, criando condições de trabalho flexíveis através do o de uma democracia pluralista. E o que significa uma democracia pluralista? Significa a possibilidade de pluralidade partidária, mas também ideológica, religiosa e, como não poderia deixar de ser, de pluralidade dos organismos sociais, sobretudo nas entidades de trabalhadores e das entidades de empregadores, a fim de que estas entidades possam ter autonomia. E ter autonomia é ter o poder de auto-realizar o próprio interesse, o interesse do grupo organizado. Há condições propícias para nos desvestirmos daquele pesadíssimo modelo entendimento dos diversos parceiros sociais, com a prática cada vez mais intensa dos procedimentos de autocomposição, que são a negociação coletiva, o contrato coletivo, a convenção coletiva, o acordo coletivo. Creio que o governo atual intuiu bem a necessidade dessa modificação, a necessidade de abandonar o modelo de tutela e passar para um modelo mais flexível de entendimento através dos procedimentos de autocomposição. Posso dizer com segurança que ele deixou refletida essa tendência em duas áreas bem significativas: a da participação em lucros e resultados e a área da livre negociação. Nas duas áreas vê-se claramente isso, o intuito do governo de abandonar o regime tutelar e passar para o regime da autocomposição”.

254 ARAGÃO, Luiz Fernando Basto. Noções essenciais de direito coletivo do trabalho. São Paulo: 2000. p.

131. Conceitua lucro ou resultado, como segue: “Lucro é o rendimento econômico positivo auferido por uma empresa, em atividade produtiva, no mundo capitalista. Para a obtenção do lucro, é indispensável que a diferença decorrente da operação contábil que subtrai as despesas da receita seja positiva (renda, ganho, etc.). O lucro (do latim lucrum) é a remuneração própria do empresário”. Vide também, MAGANO, Octavio Bueno. Política do trabalho. São Paulo: LTr, 1997, v. 3, p. 50 et seq. “A Constituição Federal de 1988 ao incluir a expressão “resultado” acrescentou, nos dias dos trabalhadores urbanos e rurais, o recebimento de vantagens relacionadas aos efeitos positivos, independentemente da obtenção do lucro, como estímulo, reconhecimento e valorização do trabalho, criando um clima motivacional em correspondente aumento da integração do empregado na empresa. A empresa pode atingir um resultado operacional positivo, embora não tenha havido lucro e, por esse resultado, o empregador conceder vantagens remuneratórias aos seus empregados/trabalhadores”. (Ibidem, p. 131).

255 Ibidem, p. 52-3.

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Outro exemplo, que bem demonstra o papel das convenções coletivas como meio

de operacionalizar, não só os direitos e garantias constitucionais de natureza

programática ou de eficácia limitada (ou reduzida), mas os direitos acordados e

incluídos nas cláusulas de uma convenção coletiva ou acordo coletivo, são as cláusulas

convencionais punitivas. Estas funcionam, equivalentemente ao papel de sanção, por

descumprimento de uma norma estatal256 257, verbi gratia, se exceder o limite de

velocidade permitido sofrerá pontuação na carteira além de multa, e, dependendo da

gravidade do caso, apreensão do veículo e da carteira de motorista. Em contrapartida, ao predominar um sistema estatutário, limita-se a evolução das

normas oriundas da autonomia privada coletiva, como bem destaca Mônica Sette Lopes

ao dizer, “a contratação coletiva não tinha raízes na prática. A outorga ao Estado de

papel preponderante como fonte normativa também no que concerne às normas

trabalhista constitui, simultaneamente, causa e conseqüência da hipotrofia do exercício

da autonomia coletiva”.258259

Ainda, afirma Mônica Sette Lopes, “a supremacia ou a precedência de

dispositivos de lei imperativa indica a presença do Estado, ainda como fonte reguladora

básica, como centro de definição de tutela”.260

Segundo Antônio Álvares261,

põe em relevo o papel do Estado, na edição de normas reguladoras, na medida em que, reconhecendo nele obstáculo à plena autonomia do sindicato, não vê

256 BOBBIO, Norberto. Estado, Governo, Sociedade: para uma teoria geral da política. Tradução Marco

Aurélio Nogueira. 9. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2001. p. 94, parafraseando Kelsen, “Na rigorosa redução que Kelsen faz do Estado a ordenamento jurídico, o poder soberano torna-se o poder de criar e aplicar direito (ou seja, normas vinculatórias) num território e para um povo, poder que recebe sua validade da norma fundamental e da capacidade de se fazer valer recorrendo inclusive, em última instância, à força, e portanto do fato de ser não apenas legítimo mas também eficaz (legitimidade e eficácia referenciam-se uma à outra;”.

257 BOBBIO, loc. cit. Ainda referenciando Kelsen, “Com a terminologia de Kelsen, o Estado enquanto ordenamento coativo é uma técnica de organização social: enquanto tal, isto é, enquanto técnica, ou conjunto de meios para um objetivo, pode ser empregado para os fins mais diversos”.

258 LOPES, Mônica Sette. A convenção coletiva e sua força vinculante. São Paulo: LTr, 1998. p. 64. 259 Cita como razões à hipotrofia da autonomia coletiva: “a fragilidade dos sindicatos, a abundância e a

exaustão do tratamento legislativo, a competência normativa da Justiça do Trabalho e as limitações impostas pela legislação sobre política salarial, sinais todos eles de uma intensa participação do Estado.” Citado pela própria autora, traz posição de Magano sobre o tema, que ora transcreve-se: “ “intensa atividade legiferante na área trabalhista”; o Poder Normativo da Justiça do Trabalho; política salarial estatal; debilidade dos sindicatos; formação deficiente dos lideres sindicais – Cf. MAGANO, 1972, pp. 165-172. “Sobre as dificuldades de implantação do sistema negociado no Brasil”, cf. PASTORE, José. Flexibilização dos mercados de trabalho e contratação coletiva. São Paulo: LTr, 1994, p. 13–5. “ Observações integrantes da nota n. 3, da obra, LOPES, op. cit, p. 64.

260 LOPES, op. cit., p. 158. 261 SILVA, Antônio Álvares da. Natureza jurídica da convenção coletiva. 1976. Tese (Doutorado). – Faculdade

de Direito, Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 1976. p. 158.

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aspectos positivos na concessão ao grupo da mesma competência outorgada ao Estado, fundando-se em que, se assim fosse, “o grupo teria autonomia plena e legislativa como o próprio Estado, o que exorbitaria as funções da convenção coletiva, que serviria de instrumento de ditadura social dos sindicatos e não como meio de sua emancipação.262

Por meio do Estado ou dos particulares, individualmente ou coletivamente, o que

não se pode perder de vista é o respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana,

nesse aspecto transcreve-se palavras sábias de Ingo Wolfgang Sarlet263,

Consoante já restou destacado, o princípio da dignidade da pessoa

impõe limites à atuação estatal, objetivando impedir que o poder público

venha a violar a dignidade pessoal, mas também implica (numa perspectiva

que se poderia designar de programática ou impositiva, mas nem por isso

destituída de plena eficácia) que o Estado deverá ter como meta permanente,

proteção, promoção e realização concreta de uma vida com dignidade para

todos, podendo-se sustentar, na esteira da luminosa proposta de Clèmerson

Clève, a necessidade de uma política da dignidade da pessoa humana constitui

não apenas a garantia negativa de que a pessoa não será objeto de ofensa e

humilhações, mas implica também, num sentido positivo, o pleno

desenvolvimento da personalidade de cada indivíduo. Neste contexto, não

restam dúvidas de que todos os órgãos, funções e atividades estatais

encontram-se vinculados ao princípio da dignidade da pessoa humana,

impondo-se-lhes um dever de respeito e proteção, que se exprime tanto na

obrigação por parte do Estado de abster-se de ingerências na esfera individual

que sejam contrárias à dignidade pessoal, quanto no dever de protegê-la (a

dignidade pessoal de todos os indivíduos) contra agressões oriundas de

terceiros, seja qual for a procedência, vale dizer, inclusive contra agressões

oriundas de outros particulares, especialmente – mas não exclusivamente –

dos assim denominados poderes sociais (ou poderes privados).

262 SILVA, Antônio Álvares da. Natureza jurídica da convenção coletiva. 1976. Tese (Doutorado). – Faculdade

de Direito, Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 1976. p. 158. 263 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais: na Constituição Federal

de 1988. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002. p. 110-11.

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CONCLUSÃO

Num Estado Democrático de Direito, as convenções coletivas de trabalho visam

assegurar aos cidadãos o exercício pleno dos direitos fundamentais.

Com a Declaração Universal dos Direitos do Homem (dezembro de 1948), lutou-

se pela normatização dos direitos fundamentais, que ao longo de suas dimensões buscou

preservá-los e regulamentá-los progressivamente, iniciando-se pela tutela à propriedade

e à liberdade.

Mais tarde, buscou-se o direito a prestações por parte do Estado, encontrando nos

direitos fundamentais de segunda dimensão o avanço à tutela dos direitos sociais, à

educação, à saúde, ao trabalho, à uma vida digna, entre outros, refletindo a tutela estatal

em proteção aos direitos individuais.

Com o advento do neoliberalismo, a tendência dominante foi afastar a

intervenção do Estado, dando maiores poderes aos particulares para criarem novas

condições de trabalho no âmbito trabalhista.

Assim, nas últimas décadas, as convenções coletivas de trabalho obtiveram maior

espaço para operacionalizar os direitos e garantias do homem trabalhador.

O baixo desenvolvimento econômico, altas taxas de juros e tributação,

desemprego, baixo poder de consumo264, entre outros, são fatores que distanciam os

interesses dos integrantes de uma determinada categoria, bem como demonstram

algumas das dificuldades que os patrões enfrentam para honrar os direitos dos

trabalhadores.

Por conseqüência, o legislador abre a possibilidade da flexibilização das normas

trabalhistas a fim de adequá-las ao novo contexto social, sem, contudo, ignorar os

direitos fundamentais, assegurados que estão na Constituição vigente.

264 SÜSSEKIND, Arnaldo. A convenção coletiva de trabalho em confronto com a lei. Síntese Trabalhista,

Porto Alegre, n. 159, p. 5-8, set. 2002.

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Mesmo assim, face aos fatores anteriormente referidos, vê-se que os direitos

fundamentais podem sofrer abalo265 em sua regulamentação e, por conseqüência, em seu

exercício, em especial quando a própria Constituição Federal admite a flexibilização de

direitos que ao longo dos tempos e lentamente fizeram uma evolução no contexto social.

Muito embora garantidos pela Constituição Federal, a maioria dos direitos

trabalhistas encontra a especificação destes mesmos direitos fixada na legislação

infraconstitucional.266

Nesse diapasão, tramita no Congresso Nacional projeto de lei que altera o artigo

618, da CLT. Referido projeto dita que as normas conveniadas prevalecem sobre o

disposto em lei.267

Questão é que, fruto de um Estado Democrático de Direito, surgiram vários

ordenamentos jurídicos, dentro de um mesmo ordenamento jurídico macro ou originário.

Assim, tanto o Estado como a Sociedade, e em particular, a autonomia privada

coletiva ganharam poder, com a devida autorização estatal, para criar normas coletivas

no âmbito do Direito do Trabalho, a priori Coletivo, e que, conseqüentemente, alastra-se

aos contratos individuais de trabalho.

Observa-se ainda que o disposto no artigo 468 da CLT já não alcança proibição

às reformas in pejus de cláusulas de convenções coletivas, substanciadas no

entendimento da súmula 277 do TST.

Souto Maior conclui, e endosso sua palavras para a conclusão deste trabalho,

de todo modo, mesmo que não se consiga impedir o avanço destas irresponsáveis reformas trabalhistas, a nova realidade que venha a ser criada acabará representando a reconstrução das fontes materiais, históricas, que motivaram o surgimento do direito do trabalho e assim o direito social, inevitavelmente, ressurgirá das cinzas, com configurações diferentes e possivelmente até mais eficazes do que as que existem hoje em dia, pois que essencial para a paz social. Regras direcionadas às relações de trabalho, com a função de equilibrar as forças sociais e alcançar uma justiça social, não deixarão de existir, pelo menos enquanto a presente ordem mundial for mantida e se baseie na

265 SÜSSEKIND, Arnaldo. A convenção coletiva de trabalho em confronto com a lei. Síntese Trabalhista,

Porto Alegre, n. 159, p. 5-8, set. 2002. p. 7. Cita-se como exemplos:redução salarial, ampla liberdade patronal para despedir os empregados, contrato de trabalho provisório com ampla redução de direitos, redução das hipóteses de salário-utilidade, etc...

266 Como exemplo para essa afirmativa o autor expõe, “a Constituição garante o direito a férias, mas é a lei que especifica que estas têm duração de trinta dias e que serão obrigatoriamente concedidas após doze meses de duração do contrato de trabalho. Assim, seguindo-se, unicamente, os critérios de uma interpretação literal, a negociação coletiva poderia, sem desrespeitar a CF, fixar férias de dez dias ao ano”. MAIOR, Jorge Luiz Souto. O futuro do direito do trabalho no Brasil, se aprovado o projeto de lei que altera o art. 618 da CLT. Síntese Trabalhista, Porto Alegre, n. 163, p. 11, jan. 2003.

267 MAIOR, loc. cit.

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necessidade de preservação da dignidade humana, cuja importância foi destacada na Declaração Universal dos Direitos Humanos e nos diversos tratados e convenções internacionais criados após a 2ª Guerra. Enquanto existir uma ordem jurídica, um Estado que a efetive e uma sociedade na qual se possibilite um convívio pacífico, será possível extrair fundamentos jurídicos coercitivos para que a superexploração do trabalho (a servidão e a escravidão) não retorne a habitar a nossa realidade.268

O contrato coletivo de trabalho apresenta-se como nova forma de flexibilização

do direito. Vale perquirir se os requisitos de validade do contrato serão suficientes para

garantir os direitos sociais da classe trabalhadora.

Pelo estudo feito conclui-se que dia a dia os direitos fundamentais sociais vêm

sofrendo árdua desregulamentação.

Os trabalhadores, para manterem seus empregos ou até mesmo conquistarem seu

primeiro emprego, condicionam-se a receber cada vez menos direitos.

268 MAIOR, Jorge Luiz Souto. O futuro do direito do trabalho no Brasil, se aprovado o projeto de lei que altera

o art. 618 da CLT. Síntese Trabalhista, Porto Alegre, n. 163, p. 16-7, jan. 2003.

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CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO: DESENVOLVIMENTO OU RETROCESSO DOS DIREITOS

E GARANTIAS FUNDAMENTAIS SOCIAIS?

POR

NÁDIA AHMAD OMAR ALI Dissertação submetida ao Corpo Docente do Programa de Pós-

Graduação em Direito da Universidade Luterana do Brasil, como parte dos

requisitos necessários para obtenção do título de

Mestre em Direito

Área de Concentração: Direitos Fundamentais

Orientador: Prof. Dr. Wilson Steinmetz

Comissão de Avaliação: Dr. José Luiz Ferreira Prunes

Dr. Germano Schwartz

Dr. Leonel Pires Ohlweiler

Prof. Dr. Wilson Steinmetz

Coordenador do PPGDir