Processamento dos dados - JGLGjglg.uma.pt/Ens/Aulas/a0000104/a0000104.pdfCAPÍTULO 9. PROCESSAMENTO...

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Capítulo 9 Processamento dos dados 9.1 Propagação não estatística de erros Suponhamos que é possível estabelecer uma relação de proporcionalidade directa (ver secção3.2) en- tre duas variáveis. Por exemplo, o preço de uma habitação (y, variável dependente) é directamente proporcional à área de construção (x, variável independente): y = a 1 x Podemos assumir que a ordenada na origem será nula porque quando a área tender para zero, o preço tenderá obviamente para zero também. Se tivermos em conta as unidades de y ([y]= ) e de x ( [x]= m 2 ) podemos facilmente concluir que a 1 representa o preço por unidade de área ( /m 2 ) (ver secção 4.5). y/kx/m 2 1 2 3 4 0 1 2 3 4 δx δy 1 δy 2 y = x y = 0.2x Figura 9.1: Impacto de uma variação unitária da variável independente (x) sobre a variável dependente (y) para uma relação linear 43

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Capítulo 9

Processamento dos dados

9.1 Propagação não estatística de errosSuponhamos que é possível estabelecer uma relação de proporcionalidade directa (ver secção3.2) en-tre duas variáveis. Por exemplo, o preço de uma habitação (y, variável dependente) é directamenteproporcional à área de construção (x, variável independente):

y = a1x

Podemos assumir que a ordenada na origem será nula porque quando a área tender para zero, opreço tenderá obviamente para zero também. Se tivermos em conta as unidades de y ([y] = €) e de x�[x] = m2

�podemos facilmente concluir que a1 representa o preço por unidade de área

�€/m2

�(ver

secção 4.5).

y/k!

x/m21 2 3 40

1

2

3

4

!x

!y1

!y2

y=x

y=0.2x

Figura 9.1: Impacto de uma variação unitária da variável independente (x) sobre a variável dependente(y) para uma relação linear

43

9.1. PROPAGAÇÃO NÃO ESTATÍSTICA DE ERROSCAPÍTULO 9. PROCESSAMENTO DOS DADOS

Na figura 9.1 é apresentada uma representação gráfica da relação entre a área de construção eo preço em duas zonas diferentes. A azul temos uma zona de construção mais cara

�1k€/m2

�e a

vermelho uma zona de construção mais barata�200€/m2

�.

Se ao fazer-se a medição da área de construção houver uma discrepância entre o valor medido e oreal, haverá uma maior repercussão no preço para quem estiver a construír na zona mais cara (desdeque o erro de área seja o mesmo). Por exemplo, se o valor de área medido for maior em �x = 1m2

do que o valor real, quem construír na zona azul terá um prejuízo de �y1 = 1 k€ enquanto que quemconstruír na zona vermelha terá um prejuízo de �y2 = 200€!

Diz-se que a discrepância na medição da área propagou-se até ao preço.É claro que a discrepância propagada não depende só da zona (declive da recta). Dentro da mesma

zona terá maior prejuízo o construtor que tiver sobrevalorizado mais a área.Do ponto de vista matemático podemos então concluir que:

. quanto maior for o declive da recta de y (variável dependente) em função de x (variável indepen-dente), maior será a discrepância da variável dependente (�y).

. quanto maior for a discrepância cometida ao avaliar a variável independente (�x), maior será adiscrepância da variável dependente (�y).

Podemos então esboçar uma primeira tentativa de estimar a discrepância da variável dependente emfunção das grandezas de que depende:

�y = a1�x (9.1)

O declive de uma recta em geral é dado pela derivada da variável dependente em ordem à variávelindependente

⇣dydx

⌘. Isto implica que a equação (9.1) pode ser modificada para:

�y =

dy

dx�x (9.2)

Nesta secção começou-se por descrever um situação de discrepância na medição da variável indepen-dente (e.g. sabia-se que a área medida tinha sido sobrevalorizada em 1m2). Na prática, não sabemos seum valor medido subvaloriza ou sobrevaloriza o valor real porque isso implicaria o conhecimento deste.

Mas nem tudo está perdido. Suponhamos que de alguma forma conseguimos descobrir um limitemáximo do erro da medição da variável independente 4xMax. Em linguagem matemática, existe ummajorante do erro de x. Podemos modificar a equação (9.2) para determinar o erro máximo que avariável dependente 4yMax poderá tomar:

4yMax =

����dy

dx

����4xMax (9.3)

As alterações efectuadas foram:

. substituíu-se o termo discrepância (�y) pelo termo erro (4y).

. a derivada⇣

dydx

⌘foi substituída pelo seu módulo

��� dydx���.

Como sabemos dos capítulos 5, 6 e 7 a discrepância e o erro são bem diferentes. A discrepância é bemdefinida e pode tomar um valor positivo ou negativo. O erro é por definição uma medida de incerteza.Ou seja, o erro não tem sinal. Uma vez que a derivada pode tomar valores negativos teve que se tomaro seu módulo.

Para uma função f (x1, . . . , xN ) de N variáveis independentes, a equação geral do majorante doerro é dada por:

�f (x1, . . . , xN ) =

NX

i=1

✓����@f

@xi

���� ·�xiMax

◆(9.4)

44

CAPÍTULO 9. PROCESSAMENTO DOS DADOS 9.2. CASOS PARTICULARES

9.2 Casos particulares

9.2.1 Adição

A adição de duas medições experimentais tem um erro absoluto máximo dado por:

� (x1 + x2) = �x1 +�x2 (9.5)

Por exemplo, consideremos dois objectos com comprimentos conhecidos. O objecto A tem umcomprimento de 9.500mm e o objecto B tem um comprimento de 7.500mm. Pretende-se avaliar qualé o comprimento total dos dois objectos a partir da medição individual dos mesmos.

Se a medição for feita com a régua da figura o resultado das medições será: (10.0± 0.5) mm parao objecto A e(8.0± 0.5) mm para o objecto B. Ou seja, ambos os valores foram arredondados porexcesso.

7 mm 8 mm

B

7.500 mm

9 mm 10 mm

A

9.500 mm

Figura 9.2: Soma de erros máximos do aparelho

A estimativa da soma dos comprimentos dos objectos será de 18.0mm e o valor real é 17.000mm.O exemplo foi escolhido para ilustrar a pior situação possível de arredondamento e mostrar que nessasituação o erro de arredondamento total será de 1.0mm. Logo o majorante do erro da soma é de 1mme o resultado da soma dos valores experimentais será:

(10.0± 0.5) mm + (8.0± 0.5) mm = (18± 1) mm

9.2.2 Subtracção

A subtracção de duas medições experimentais tem um erro absoluto máximo dado por:

� (x1 � x2) = �x1 +�x2 (9.6)

Podemos exemplificar com os objectos da figura 9.2. O objecto A tem um comprimento de 9.500mme o objecto B tem um comprimento de 7.500mm.

Suponhamos que na medição com a régua da figura o resultado das medições foi: (10.0± 0.5) mmpara o objecto A e(7.0± 0.5) mm para o objecto B porque este parecia estar mais perto da divisão dos7mm. Ou seja, o primeiro valor foi arredondado por excesso e o segundo por defeito.

Pretende-se avaliar qual é a diferença de comprimento entre os dois objectos a partir da mediçãoindividual dos mesmos.

A estimativa da diferença dos comprimentos dos objectos será de 3.0mm e o valor real é 2.000mm.Nesta situação limite o erro total de arredondamento foi de 1.0mm. Podemos então concluír que omajorante do erro da diferença é de 1mm e o resultado da subtracção dos valores experimentais será:

(10.0± 0.5) mm � (7.0± 0.5) mm = (3± 1) mm

9.2.3 Produto

O produto de duas medições experimentais tem um erro relativo máximo dado por:

� (x1x2)

x1x2=

�x1

x1+

�x2

x2(9.7)

45

9.3. PROPAGAÇÃO ESTATÍSTICA DE ERROS CAPÍTULO 9. PROCESSAMENTO DOS DADOS

9.2.4 Divisão

A razão entre duas medições experimentais tem um erro relativo máximo dado por:

� (

x1/x2)

x1/x2

=

�x1

x1+

�x2

x2(9.8)

9.2.5 Potenciação

A potência de grau n de uma medição experimental tem um erro relativo máximo dado por:

� (xn1 )

xn1

=

����n�x1

x1

���� (9.9)

9.2.6 Produto de potências

O produto das potências de duas medições experimentais (uma de grau n e a outra de grau m) temum erro relativo máximo dado por:

� (xn1x

m2 )

xn1x

m2

=

����n�x1

x1

����+����m

�x2

x2

���� (9.10)

9.2.7 Exponencial

A exponencial de uma medição experimental tem um erro relativo máximo dado por:

� (e↵x1)

e↵x1= |↵�x1| (9.11)

9.2.8 Logaritmo

O logaritmo de uma medição experimental tem um erro absoluto máximo dado por:

� (ln↵x1) =

�����x1

x1

���� (9.12)

9.3 Propagação estatística de erros

Quando a variação de uma grandeza é resolúvel (ver a subsecção6.3.1) é possível que o erro padrãoseja superior ao erro máximo do aparelho. Neste caso o erro experimental passa a ser o erro padrão(ou seja, um erro estatístico). A variável medida pode ser representada por uma distribuição normal.

Como consequência, qualquer operação realizada sobre uma ou mais variáveis pode ser vista comouma operação realizada sobre uma ou mais distribuições normais.

Nas subsecções abaixo fizeram-se simulações de operações sobre variáveis que seguem uma distri-buição normal. Foram gerados pseudo-aleatoriamente com uma distribuição normal [7] 15000 valorespara cada uma das variáveis iniciais x1 e x2.

9.3.1 Adição

A adição de duas variáveis com distribuição normal resulta numa nova variável com distribuição normal:

46

CAPÍTULO 9. PROCESSAMENTO DOS DADOS 9.3. PROPAGAÇÃO ESTATÍSTICA DE ERROS

Figura 9.3: Soma de x1 ⇠ N (3.0000, 0.1000) com x2 ⇠ N (2.0000, 0.1000)

A largura (e.g. desvio padrão) da distribuição resultante é maior do que a largura de qualquer dasdistribuições iniciais.

Nesta simulação a média da soma foi de 4.9996 e o desvio padrão de 0.1426.Se aumentasse ainda mais o número de valores de x1 e x2, o desvio padrão iria tender para 0.1414.

Porquê este valor? Observa-se que os quadrados dos desvios padrão são aditivos ou seja:

�2(x1 + x2) = �2

(x1) + �2(x2) (9.13)

e por isso:

� (x1 + x2) =

p0.10002 + 0.10002 =

r2

100

= 0.1414

A discrepância do desvio padrão da soma foi de +0.02%.Tendo em conta que o erro padrão não passa de um desvio padrão (ver a secção 5.4) podemos

então naturalmente inferir que o erro da soma será dado por:

� (x1 + x2) =

q(�x1)

2+ (�x2)

2 (9.14)

Tal como na equação (9.5) o erro da soma é calculado a partir dos erros absolutos das parcelas.Nesta simulação observou-se também que a média da soma (4.9996) tende para a soma das médias

de x1 e x2 (5.0000). A discrepância foi de �0.01%.

9.3.2 Subtracção

Tal como aconteceu para a adição, a subtracção de duas variáveis com distribuição normal resulta numanova variável com distribuição normal:

47

9.3. PROPAGAÇÃO ESTATÍSTICA DE ERROS CAPÍTULO 9. PROCESSAMENTO DOS DADOS

Figura 9.4: Subtracção entre x1 ⇠ N (3.0000, 0.1000) e x2 ⇠ N (2.0000, 0.1000)

A largura (e.g. desvio padrão) da distribuição resultante também é maior do que a largura dequalquer das distribuições iniciais.

Nesta simulação a média da subtracão foi de 0.9991 e o desvio padrão de 0.1412.

Se aumentasse ainda mais o número de valores de x1 e x2, o desvio padrão iria tender para 0.1414.Ou seja, do ponto de vista da largura da distribuição resultante, não existe diferença entre a distribuiçãoda soma e da subtracção:

� (x1 � x2) =

q(�x1)

2+ (�x2)

2 (9.15)

A discrepância do desvio padrão da subtracção foi de �0.02%.

Tal como na equação (9.6) o erro da subtracção é calculado a partir dos erros absolutos das parcelas.

Nesta simulação observou-se também que a média da diferença (0.9991) tende para a diferença dasmédias de x1 e x2 (1.0000). A discrepância foi de �0.09%.

9.3.3 Produto

O produto de duas variáveis com distribuição normal resulta numa nova variável com distribuiçãonormal:

48

CAPÍTULO 9. PROCESSAMENTO DOS DADOS 9.3. PROPAGAÇÃO ESTATÍSTICA DE ERROS

Figura 9.5: Produto entre x1 ⇠ N (3.0000, 0.1000) e x2 ⇠ N (2.0000, 0.1000)

Ao contrário do que acontece para a adição e a subtracção, a largura (e.g. desvio padrão) dadistribuição do produto não é necessariamente maior que a largura de qualquer das distribuições iniciais.

No caso desta simulação a média do produto foi de 5.9995 e o desvio padrão de 0.3632.Se aumentasse ainda mais o número de valores de x1 e x2, o desvio padrão iria tender para 0.3606.

De onde vem este valor? Observa-se que para o produto, os quadrados dos desvios padrão relativos sãoaditivos ou seja:

✓� (x1 · x2)

x1 · x2

◆2

=

✓� (x1)

x1

◆2

+

✓� (x2)

x2

◆2

(9.16)

e por isso:

� (x1 · x2) = 6.0000

s✓0.1000

3.0000

◆2

+

✓0.1000

2.0000

◆2

=

r13

100

= 0.3606

A discrepância do desvio padrão do produto foi de +0.04%.Tendo em conta que o erro padrão não passa de um desvio padrão (ver a secção 5.4) podemos

então naturalmente inferir que o erro da soma será dado por:

� (x1x2)

x1x2=

s✓�x1

x1

◆2

+

✓�x2

x2

◆2

(9.17)

Note-se que tal como na equação (9.7) o erro do produto é calculado a partir dos erros relativosdos factores.

Nesta simulação observou-se também que a média do produto (5.9995) tende para o produto dasmédias de x1 e x2 (6.0000). A discrepância foi de �0.01%.

9.3.4 Divisão

A divisão de duas variáveis com distribuição normal resulta numa nova variável com distribuição normal:

49

9.3. PROPAGAÇÃO ESTATÍSTICA DE ERROS CAPÍTULO 9. PROCESSAMENTO DOS DADOS

Figura 9.6: Divisão entre x1 ⇠ N (3.0000, 0.1000) e x2 ⇠ N (2.0000, 0.1000)

Na divisão também é possível que a largura (e.g. desvio padrão) da distribuição final não seja maiorque a largura de qualquer das distribuições iniciais. Foi exactamente o que aconteceu nesta simulação,a média da divisão foi de 1.5032 e o desvio padrão foi de 0.0907.

Tal como para o produto, os quadrados dos desvios padrão relativos são aditivos:

✓� (

x1/x2)

x1/x2

◆2

=

✓� (x1)

x1

◆2

+

✓� (x2)

x2

◆2

(9.18)

logo nesta simulação o valor assintótico do desvio padrão é:

� (

x1/x2) = 1.5000

s✓0.1000

3.0000

◆2

+

✓0.1000

2.0000

◆2

=

r13

1600

= 0.0901

A discrepância do desvio padrão da divisão foi de +0.04%.Tendo em conta que o erro padrão não passa de um desvio padrão (ver a secção 5.4) podemos

então naturalmente inferir que o erro da soma será dado por:

� (

x1/x2)

x1/x2

=

s✓�x1

x1

◆2

+

✓�x2

x2

◆2

(9.19)

Podemos notar novamente que tal como na equação (9.8) o erro da divisão é calculado a partir doserros relativos dos factores.

Nesta simulação observou-se também que a média da razão (1.5032) tende para a razão entre asmédias de x1 e x2 (1.5000). A discrepância foi de +0.21%.

9.3.5 Potenciação

A potenciação de uma variável com distribuição normal resulta numa nova variável com distribuiçãotambém normal:

50

CAPÍTULO 9. PROCESSAMENTO DOS DADOS 9.3. PROPAGAÇÃO ESTATÍSTICA DE ERROS

Figura 9.7: Quadrado (potência de ordem 2) de x1 ⇠ N (3.0000, 0.1000)

É possível que a largura (e.g. desvio padrão) da distribuição final seja menor que a largura dadistribuição inicial.

No caso desta simulação a média da potência foi de 9.0061 e o desvio padrão de 0.6043.Na potenciação, o quadrado do desvio padrão relativo é igual (a menos da constante multiplicativa

n2) ao quadrado do desvio padrão relativo da variável inicial:

✓� (xn

1 )

xn1

◆2

=

✓n� (x1)

x1

◆2

(9.20)

por isso, nesta simulação o desvio padrão tenderá para:

� (xn1 ) = 3.00002

s✓2

0.1000

3.0000

◆2

= 3.00002 ⇥ 2

0.1000

3.0000= 0.6000

A discrepância do desvio padrão da potência foi de +0.05%.Tendo em conta que o erro padrão não passa de um desvio padrão (ver a secção 5.4) podemos

então naturalmente inferir que o erro da soma será dado por:

� (xn1 )

xn1

=

s✓n�x1

x1

◆2

=

����n�x1

x1

���� (9.21)

Podemos notar novamente que tal como na equação 9.9 o erro da divisão é calculado a partir deum erro relativo. Se juntarmos este facto ao de que a potenciação é apenas um ou mais produtossucessivos, esta semelhança poderá levar à ideia de que a equação 9.21 poderia também ser escrita(inspirada na equação 9.17) da seguinte forma:

� (xn1 )

xn1

=

� (x1x1 . . . x1)

x1x1 . . . x1=

s

n

✓�x1

x1

◆2

51

9.3. PROPAGAÇÃO ESTATÍSTICA DE ERROS CAPÍTULO 9. PROCESSAMENTO DOS DADOS

Esta equação está ERRADA porque a equação 9.17 refere-se a uma multiplicação de variáveisindependentes. Ora, x1 não é com certeza independente de si própria!

Nesta simulação observou-se também que a média da distribuição da potência (9.0061) tende paraa potência da média de x1 (9.0000). A discrepância foi de +0.07%.

9.3.6 Produto de potências

O produto de potências de variáveis com distribuição normal resulta numa nova variável com distribuiçãotambém normal:

Figura 9.8: Produto do quadrado (potência de ordem 2) de x1 ⇠ N (3.0000, 0.1000) por (potência deordem 1) de x2 ⇠ N (2.0000, 0.1000)

Neste caso também é possível que a largura (e.g. desvio padrão) da distribuição final seja menorque a largura de qualquer das distribuições iniciais. Nesta simulação, a média do produto de potênciasfoi de 18.0151 e o desvio padrão foi de 1.5168.

Observa-se que o quadrado do desvio padrão relativo do produto de potências é uma combinaçãolinear dos quadrados dos desvios padrão relativos das variáveis iniciais em que os coeficientes são n2 em2:

✓� (xn

1xm2 )

xn1x

m2

◆2

=

✓n� (x1)

x1

◆2

+

✓m� (x2)

x2

◆2

(9.22)

por isso, nesta simulação o desvio padrão tenderá para:

� (xn1x

m2 ) =

�3.00002 · 2.00001

�s✓

2

0.1000

3.0000

◆2

+

✓1

0.1000

2.0000

◆2

=

r225

100

= 1.5000

A discrepância do desvio padrão do produto de potências foi de +0.09%.Tendo em conta que o erro padrão não passa de um desvio padrão (ver a secção 5.4) podemos

então naturalmente inferir que o erro da soma será dado por:

� (xn1x

m2 )

xn1x

m2

=

s✓n�x1

x1

◆2

+

✓m�x2

x2

◆2

(9.23)

52

CAPÍTULO 9. PROCESSAMENTO DOS DADOS 9.3. PROPAGAÇÃO ESTATÍSTICA DE ERROS

Podemos notar novamente que tal como na equação 9.10 o erro do produto de potências é calculadoa partir dos erros relativos dos factores e respectivos expoentes.

Mais uma vez observou-se que a média da distribuição do produto de potências (18.0151) tendepara o produto das potências das médias de x1 e x2 (18.0000). A discrepância foi de +0.08%.

9.3.7 Exponencial

A exponencial de um variável com distribuição normal tem também uma distribuição normal:

Figura 9.9: Exponencial de x1 ⇠ N (3.0000, 0.1000)

Neste caso também é possível que a largura (e.g. desvio padrão) da distribuição final seja menorque a largura da distribuição inicial. Nesta simulação, a média da exponencial foi de 20.1740 e o desviopadrão foi de 2.0386.

Observa-se que o quadrado do desvio padrão relativo da exponencial é igual (a menos da constantemultiplicativa ↵2) ao desvio padrão da variável inicial:

✓� (e↵x1

)

e↵x

◆2

= (↵� (x1))2 (9.24)

nesta simulação o desvio padrão tenderá então para:

� (e↵x1) = e3.000 ⇥ 1⇥ 0.1000 = 2.0086

A discrepância do desvio padrão da exponencial foi de +0.15%.Tendo em conta que o erro padrão não passa de um desvio padrão (ver a secção 5.4) podemos

então naturalmente inferir que o erro da soma será dado por:

� (e↵x1)

e↵x1=

q(↵�x1)

2= |↵�x1| (9.25)

Ao contrário dos casos anteriores temos uma “mistura” de tipos de erro: temos um erro relativocalculado a partir de um erro absoluto (tal como na equação 9.11).

Observou-se também que a média da distribuição da exponencial (20.1740) tende para a exponencialda média de x1 (20.0855). A discrepância foi de +0.44%.

53

9.3. PROPAGAÇÃO ESTATÍSTICA DE ERROS CAPÍTULO 9. PROCESSAMENTO DOS DADOS

9.3.8 Logaritmo

O logaritmo de um variável com distribuição normal tem também uma distribuição normal:

Figura 9.10: Logaritmo de x1 ⇠ N (3.0000, 0.1000)

Neste caso também é possível que a largura (e.g. desvio padrão) da distribuição final seja menorque a largura da distribuição inicial. Foi o que aconteceu nesta simulação. A média do logaritmo foide 1.0978 e o desvio padrão foi de 0.0336.

Observa-se um comportamento inverso ao de uma exponencial: o quadrado do desvio padrão dologaritmo é igual (a menos da constante multiplicativa ↵2) ao desvio padrão relativo da variável inicial:

�2(ln↵x1) =

✓� (x1)

x1

◆2

(9.26)

nesta simulação o desvio padrão tenderá então para:

� (ln↵x1) =0.1000

3.0000= 0.0333

A discrepância do desvio padrão do logaritmo foi de +0.02%.

� (ln↵x1) =

s✓�x1

x1

◆2

=

�����x1

x1

���� (9.27)

Tal como para a exponencial temos uma “mistura” de tipos de erro mas na ordem inversa: temosum erro absoluto calculado a partir de um erro relativo (tal como na equação 9.12).

Observou-se também que a média da distribuição do logaritmo (1.0978) tende para o logaritmo damédia de x1 (1.0986). A discrepância foi de �0.07%.

9.3.9 Exemplos numéricos de propagação de erros

ver secção

54

CAPÍTULO 9. PROCESSAMENTO DOS DADOS 9.4. QUE TIPO DE PROPAGAÇÃO UTILIZAR?

9.3.10 Caso geral

A ideia subjacente à propagação estatística de erros é semelhante à ideia apresentada na secção 9.1para a propagação não estatística de erros. Ou seja, o erro da função f depende da forma como estavaria com as variáveis xi. No entanto há uma diferença fundamental: no final do cálculo obtemos umerro padrão em vez de um majorante do erro. Logo, numa propagação estatística de erro TODOS ostermos �xi terão que ser erros padrão.

Em vez de uma soma de erros máximos passamos a ter neste caso uma raíz quadrada da soma dequadrados de erros padrão:

�f (x1, . . . , xN ) =

vuutNX

i=1

✓@f

@xi·�xi

◆2

(9.28)

9.4 Que tipo de propagação utilizar?O erro obtido pelo método estatístico (equação 9.28) será sempre menor que o obtido pelo métodonão estatístico (equação 9.4), logo o primeiro permite estreitar o intervalo que contém o valor realda grandeza. A única desvantagem é que no método estatístico existe uma probabilidade não nula(ainda que pequena) do valor real da grandeza estar fora do intervalo de confiança. Mesmo assim, essaprobabilidade é quantificável.

Pesados os prós e os contras, podemos distinguir 3 situações principais:

9.4.1 Uma medição

Uma medição única de uma grandeza é sempre incompleta. Não existe informação sobre a sua precisão(não existe uma estimativa do desvio padrão) logo o erro padrão é desconhecido.

A medição única deve ser SEMPRE EVITADA (espero que esse facto se torne ainda mais claro nassubsecções abaixo).

Há porém situações em que uma segunda medição não é possível ou é muito difícil de conseguir.Neste caso o único erro disponível é o majorante do erro. É necessário ter uma ideia da ordem degrandeza da flutuação estatística típica (

µ/x). O aparelho de medição deve ter uma resolução muitobaixa de forma a garantir que a variação não é resolúvel (EMA � µ).

Por exemplo, uma folha de papel A4 sofre alterações do seu comprimento com a temperatura,humidade relativa, etc.. No entanto, para condições perto da pressão e temperatura normais (PTN) asalterações são inferiores a 1mm, logo não resolúveis.

Se há a hipótese da variação da medição ser resolúvel então não é possível ter um nível de confiançae o resultado deve ser descartado.

Os casos apresentados nesta secção (9.4.1) assumem que a medição tem variação não resolúvel.

9.4.1.1 Propagação a partir de apenas uma variável

Neste caso deve-se dizer que a propagação correcta é a propagação não estatística a partir desta variável(apesar das equações serem exactamente as mesmas para os dois tipos de propagação). O nível deconfiança do resultado final será de 100% de que o valor real da grandeza está dentro do intervalo[x� EMA, x+ EMA].

9.4.1.2 Propagação conjunta com outras variáveis

Suponhamos que se pretende medir uma massa volúmica ⇢ indirectamente a partir de duas variáveis:a massa m e o volume V :

⇢ =

m

V

Fizeram-se 100 medições do volume e apenas uma da massa. Os resultados finais das mediçõesdirectas são os seguintes:

m = (6± 1) gV = (3.359± 0.004) cm3

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9.4. QUE TIPO DE PROPAGAÇÃO UTILIZAR? CAPÍTULO 9. PROCESSAMENTO DOS DADOS

O erro experimental da massa é o erro máximo do aparelho e o erro experimental do volume é oerro padrão (o erro máximo do aparelho era 0.001 cm3).

Temos então um dilema: o majorante do erro da massa sugere que utilizemos a propagação nãoestatística mas o erro padrão do volume sugere uma propagação estatística.

A propagação de erros deve fazer-se para valores experimentais com o mesmo grau de confiança.Caso contrário, não sabemos o grau de confiança a atribuir ao resultado final.

Não podemos diminuir o grau de confiança do intervalo da massa mas podemos aumentar o grau deconfiança do intervalo do volume. Logo, por exclusão devemos optar pela propagação não estatística.

Para garantir que o grau de confiança do intervalo do volume é de 100% temos que utilizar não±1 mas ±3 erros padrão: o intervalo de confiança do volume passa de V = (3.359± 0.004) cm3 paraV = (3.359± 0.012) cm3 (como vimos na subsecção 5.6.1, num intervalo de confiança de ±1 erropadrão o nível de confiança é apenas de 68%. Ao aumentarmos o intervalo para ±3 erros padrão, onível de confiança aumenta para mais que 99%)

Aplicando a equação 9.8, o erro experimental será dado por:

�⇢ = ⇢

✓�m

m+

�V

V

◆=

6 g3.359 cm3

✓1

6

+

3⇥ 0.004

3.359

◆= 0.3 g cm�3

Logo o resultado experimental é:

⇢ = (1.8± 0.3) g cm�3

A desvantagem de termos sido forçados a optar pela propagação não estatística é que sabemos comum grau de confiança de 100% que o valor real está entre 1.5 g cm�3 e 2.1 g cm�3 mas o intervalo éenorme.

A maior fonte de incerteza reside na medição da massa. O erro relativo da massa (17%) é muitomaior que o erro relativo do volume (0.1%) e por isso tem maior impacto na estimativa do erro damassa volúmica (o erro relativo do resultado é de 17%).

9.4.2 Duas ou mais medições

9.4.2.1 Propagação a partir de apenas uma variável

Tal como em 9.4.1.1, as equações são exactamente as mesmas para os dois tipos de propagação masa interpretação do resultado final pode ser diferente conforme o tipo adoptado:

. Se o erro experimental da variável inicial for um erro padrão (µ � EMA), a propagação correctaé a propagação estatística. É possível quantificar o nível de confiança do resultado experimental(e.g. 68% de que o valor real estar dentro do intervalo [x� µ, x+ µ])

. Se o erro experimental da variável inicial for um erro máximo do aparelho (µ < EMA), apropagação correcta é a propagação não estatística. É também possível quantificar o nível deconfiança do resultado experimental: se assumirmos que o aparelho está bem calibrado, o nívelde confiança será de 100% de que o valor real estar dentro do intervalo [x� EMA, x+ EMA].

9.4.2.2 Propagação conjunta com outras variáveis

Variação resolúvel Suponhamos que modificamos a experiência feita em 9.4.1.2. Melhoramos aresolução da balança e fazemos a medição da massa 100 vezes.

Os resultados finais das medições directas passam a ser os seguintes:

m = (5.818± 0.002) gV = (3.359± 0.004) cm3

O erro experimental da massa é o erro padrão (o erro máximo do aparelho era 0.001 g) e o erroexperimental do volume é o erro padrão (o erro máximo do aparelho era 0.001 cm3).

Neste caso como temos informação estatística e os erros experimentais são erros padrão, devemosoptar pela propagação estatística do erro. Aplicando a equação 9.19, o erro experimental será dadopor:

�⇢ = ⇢

s✓�m

m

◆2

+

✓�V

V

◆2

=

5.818 g3.359 cm3

s✓0.002

5.818

◆2

+

✓0.004

3.359

◆2

= 0.001 g cm�3

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CAPÍTULO 9. PROCESSAMENTO DOS DADOS 9.5. ALGARISMOS SIGNIFICATIVOS

Logo o resultado experimental é:

⇢ = (1.732± 0.001) g cm�3

O erro relativo do volume (0.1%) é uma ordem de grandeza maior que o erro relativo da massa(0.03%) e por isso teve maior impacto na estimativa do erro da massa volúmica (o erro relativo doresultado foi de 0.1%).

Podemos então afirmar que existe uma probabilidade de:

. 68% do valor real da massa volúmica estar dentro do intervalo [1.731, 1.733] g cm�3.

. 95% do valor real da massa volúmica estar dentro do intervalo [1.730, 1.734] g cm�3.

. maior que 99% do valor real da massa volúmica estar dentro do intervalo [1.729, 1.735] g cm�3.

Variação não resolúvel Retomemos o exemplo da experiência anterior. Suponhamos que repetimosas medições de massa e volume várias vezes e o valor experimental é sempre o mesmo (variação nãoresolúvel - ver a subsecção 6.3.2). Como é que isso pode acontecer? Neste caso basta que a resoluçãodos aparelhos diminua uma ordem de grandeza.

Os resultados finais das medições directas são os seguintes:

m = (5.82± 0.01) gV = (3.36± 0.01) cm3

Ambos os erros experimentais (da massa e do volume) são erros máximos do aparelho.Neste caso não temos informação estatística mas a repetição sugere que os erros padrão, apesar de

desconhecidos são menores que os erros máximos do aparelho.Devemos por isso optar pela propagação não estatística do erro. Aplicando a equação 9.8, o erro

experimental será dado por:

�⇢ = ⇢

✓�m

m+

�V

V

◆=

5.82 g3.36 cm3

✓0.01

5.82+

0.01

3.36

◆= 0.01 g cm�3

Logo o resultado experimental é:

⇢ = (1.73± 0.01) g cm�3

O erro relativo do volume (0.3%) é da mesma ordem de grandeza do erro relativo da massa (0.2%).O erro relativo da massa volúmica é então de 0.6% (não dá 0.5% por causa dos arredondamentos doserros relativos do volume e da massa).

O grau de confiança de que o resultado real está entre 1.72 g cm�3 e 1.74 g cm�3 é de 100%.

Variação não resolúvel com variação resolúvel Imaginemos que no exemplo da subsecção 9.4.1.2a medição da massa foi feita 100 vezes e o resultado foi sempre o mesmo:

m = (6± 1) g

A variação da massa não é resolúvel mas a variação do volume é resolúvel. Neste caso devemosfazer exactamente o mesmo tratamento que foi feito na subsecção 9.4.1.2. O intervalo de confiançado volume deve ser aumentado para ±3 erros padrão de forma aos graus de confiança para ambasas variáveis ficarem equiparados. A propagação deve ser não estatística e o resultado apresenta ummajorante do erro.

9.5 Algarismos significativosQuando realizamos uma medição obtemos um resultado numérico. Consideram-se algarismos significa-tivos todos aqueles que são retirados directamente do aparelho de medida excepto aqueles:

. que não têm significado físico

. cuja única função é indicar qual é a ordem de grandeza do número

. que variam continuamente durante a medição

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Bibliografia

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