Processo Civil Barbosa Moreira Vol i

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Kariny Oliveira Loures PROCESSO CIVIL BRASILEIRO Jos Carlos Barbosa Moreira

O exerccio da ao e as condies que limitam esse exerccio, as chamadas condies da ao. Denominao talvez um pouco imprpria, melhor seria condies do legtimo exerccio do direito de ao. Ficaria talvez longo demais, ento consagrou-se o uso desta expresso abreviada: CONDIES DA AO. Ateno: no se trata de pressupostos da existncia do direito de ao. O direito de ao existe sem qualquer condicionamento. Trata-se apenas de requisitos que devem ser levados em conta no momento em que o direito de ao concretamente exercido, dizem respeito ao exerccio e no existncia do direito. Vimos que a primeira dessas condies a chamada legitimao para a causa, e deve ser apreciada no seu aspecto ativo e no seu aspecto passivo. A ao deve ser proposta pela pessoa a quem a lei reconhece qualidade para isso, o legitimado ativo, e deve ser proposta em face da pessoa que a lei indica, isto , o legitimado passivo. A lei nem sempre indica isto de maneira expressa. H porm uma idia geral, como vimos, que nos permite saber quem o legitimado ativo e quem o legitimado passivo para um determinada ao. Qual esse critrio? Ele se baseia na relao jurdica de direito material que vai ser discutida naquele processo. O sujeito ativo dessa relao jurdica normalmente o legitimado ativo para a causa, e o sujeito passivo dessa relao jurdica normalmente o legitimado passivo para a causa. Assim, por ex., numa ao de cobrana de dvida, normalmente, ordinariamente, o legitimado ativo o suposto credor, e o legitimado passivo o suposto devedor. So esses os casos de legitimao ordinria. Vimos tambm que excepcionalmente a lei pode atribuir a uma pessoa diversa daquela que figura como titular da relao jurdica de direito material, a possibilidade de propor a ao em seu prprio nome para defender um direito que, se existir, no ser seu e sim de outrem. a chamada legitimao extraordinria, ou anmala. Vimos alguns exemplos: o condmino de edifcio de apartamentos, embora no sendo credor de outro condmino que est em mora no pagamento das contribuies de condomnio, pode contudo propor a ao para cobrana, caso o prprio condomnio no o faa atravs do sndico. Outro exemplo: o acionista de uma S.A. que pode no caso de omisso da prpria sociedade num determinado prazo, propor ao para responsabilizar civilmente os diretores que houverem porventura praticado ato lesivo ao patrimnio da sociedade, sendo certo que credora a sociedade e no o scio, e portanto h uma separao, uma no

2 concordncia entre o titular da relao jurdica material e o legitimado para a causa. Vimos que em certos casos como nestes a que nos referimos agora, a legitimao extraordinria no exclue a legitimao ordinria, isto , pelo fato de o condmino poder cobrar em Juzo de outro condmino a contribuio atrasada, no se deduza que o condomnio fique impedido de fazlo. A legitimao extraordinria coexiste com a ordinria. H uma legitimao concorrente, h uma pluralidade de legitimados, qualquer deles pode propor a ao. Em casos mais raros, quando a lei atribui a uma outra pessoa esta possibilidade de propor a ao por direito alheio, retira do prprio titular a mesma possibilidade. o caso do bem dotal, do dote, em relao ao qual apesar de ele pertencer, como vimos, mulher e no ao marido (no entra na comunho de bens ainda que seja esse o regime adotado), no obstante, a nica pessoa que tem legitimao para propor aes relativas ao bem dotal o marido e no a mulher. Nesse caso a legitimao extraordinria exclue a legitimao que seria ordinria. Isto at aqui foi uma ligeira recapitulao do que fra dito da outra vez. Vamos acrescentar umas breves observaes ainda sobre o problema da legitimao ad causam, ou legitimatio ad causam, ou legitimidade para causa tudo isso a mesma coisa. O problema da legitimao realmente simples quando se trata de relao jurdica entre duas pessoas. A de um lado e B do outro, porque normalmente os legitimados so os prprios sujeitos da relao jurdica material, salvo exceo legal. Ento nessas hipteses o problema muito simples. Complica-se quando h uma pluralidade de titulares, direitos que pertencem a vrias pessoas, por exemplo no condominio pro indiviso, isto , no condomnio em que no h partes determinadas distribuidas entre os condminos. Duas, trs, vinte ou cinqenta pessoas podem ser donas de uma casa. No que A seja dono da cozinha e B do quarto de dormir. A e B so condminos de toda a casa pro indiviso, isto , sem partes divididas. Outro exemplo: obrigaes solidrias, aquelas nas quais h vrios credores, cada um dos quais com direito dvida toda, ou ento vrios devedores cada um dos quais obrigado a pagar por inteiro a dvida. As coisas a j se tornam um pouquinho menos simples. No caso de ofensa ao direito que no de um s, de vrios, quem legitimado para reclamar em Juzo a reintegrao do direito lesado? Mais de uma soluo concebvel em tese. Por exemplo: poderamos imaginar que pertencendo o direito a vrias pessoas, o conjunto delas teria que aparecer propondo a ao, todas elas em conjunto. Se so elas em conjunto que tm o direito, ento elas em conjunto deveriam propor a ao. Em outras palavras, a ao s estaria regularmente proposta se fosse proposta pela totalidade dos co-titulares. uma

3 soluo possvel, mas no uma boa soluo, por motivos bvios: ningum pode ser obrigado a litigar em Juzo. Ento se um deseja propor a ao e o outro no, de duas uma: ou se obriga o segundo a propor, o que um absurdo, ou se impede o primeiro de propor porque o outro no quer aderir, o que tambm um absurdo. Se eu sou condmino de algum numa casa, e vejo que terceiro a est danificando, convoco meu outro condmino para propor ao contra ele. Se o outro concorda, perfeitamente, nada impede que a ao seja proposta por ambos, ambos so sem dvida legitimados, ambos os condminos. Porm, suponhamos que meu outro condmino por comodismo, preguia, amizade ao terceiro, ou por outra razo qualquer, no queira; eu, que estou sendo prejudicado, se tivesse que propor ao em conjunto com ele, de duas uma: ou o obrigaria a ir comigo perante o juiz, soluo absurdamente inaceitvel, ou ficaria eu impedido de tomar uma providncia que, no entanto, me interessa tanto quanto a ele. Ento, o que que a lei faz nesses casos? Atribui uma legitimao concorrente mas no necessariamente conjunta, isto , qualquer dos titulares, sozinho, pode propor a ao, tem legitimao ad causam. O problema se torna ainda mais complicado quando se trata de um interesse cujos titulares no so determinados. So chamados interesses difusos ou coletivos. Por exemplo, o interesse na preservao da sanidade do ambiente, o interesse na proteo da natureza e do equilbrio ecolgico. Assuntos obviamente na moda e que tm seus reflexos no campo processual. O interesse na conservao das obras de arte, dos monumentos histricos, o interesse na honestidade das mensagens de propaganda, os interesses da difuso da cultura, do acesso s fontes de informao. Quem o titular? Vocs, eu, todos. No so relaes personalizadas, so relaes que transcendem a esfera individual e nem sequer podem ser circunscritas a um nmero determinado de pessoas. Ao contrrio do que acontece no condomnio, nas obrigaes solidrias, em que sabem perfeitamente que o direito coletivo mas pertence a uma classe fechada, determinada, delimitada. Aqui no. Quais so os interessados, por exemplo, em que no se destruam as reservas florestais de uma pas? A rigor, a humanidade inteira. Quando aquele doido quebrou o nariz da Virgem, na Piet de MICHELANGELO, que est na Baslica de So Pedro, porventura foi s o Museu do Vaticano que sofreu dano? Ou foi toda a humanidade que sofreu? Ento so interesses chamados difusos exatamente porque no se concentram numa ou noutra pessoa e nem sequer num crculo determinado de pessoas. Esse problema tem sido alvo de grande interesse por parte dos estudiosos nos ltimos tempos, no tanto no Brasil onde as idias geralmente quando chegam depressa chegam com mais ou menos 50 anos de atraso, mas em sociedades que pensam mais em certas coisas, e diversas solues foram estudadas.

4 Depois ns vamos ver que ns no estamos to atrasados assim nesse particular, porque temos um instrumento legal que at certo ponto ajuda a resolver essas situaes. Mas curioso: ns temos a lei mas ningum se ocupa dela, e nem se usa a Lei, usa-se pouco, usa-se menos do que seria de esperar. Outros pases no tm a lei e vivem se preocupando com o assunto. H vrias solues, uma absurda seria exigir que todos os interessados participassem - essa impossvel, ns nem sequer sabemos quais so eles e quantos so. Legitimar cada um individualmente, esta a soluo mais bvia. Nem sempre ela muito satisfatria por motivos que facilmente se compreendem: uma pessoa sozinha ter que litigar com entidades muito poderosas. Suponhamos que algum queira propor uma ao para obstar, para impedir que se realize determinada atividade capaz de causar a poluio da bacia hidrogrfica que rega determinada regio. Provavelmente esta pessoa vai se defrontar no processo com adversrios muito mais poderosos do ponto de vista financeiro - uma empresa. Ento, na prtica, essa soluo no inteiramente satisfatria porque ela pe face a face litigantes de recursos muito diferentes. O litigante que tem mais recursos geralmente leva vantagem. (Refiro-me s vantagens bvias: sustentar durante mais tempo o processo, fazer despesas maiores, contratar melhores advogados, peritos, etc). Uma multi-nacional por exemplo. Outra idia que tem surgido seria a de, sem excluir a possibilidade dessa legitimao individual (no se deve excluir porque na prtica o indivduo em geral no se aventura, ele parte para uma espcie de comodismo, e no est muito a fim de se amolar com causas coletivas - o nosso esprito de coletividade muito rarefeito confessemos, dificilmente aceitamos a idia desse trabalho, dessas despesas, para tentar impedir a poluio de um rio. A tendncia "no vai adiantar nada, deixa pra l". E alm disso h de fato as dificuldades objetivas alm das subjetivas). Mas no se deve excluir, pode aparecer um heri que queira levar a cabo a aventura. O que se poderia imaginar ao lado disso, dar legitimao a quem? Aos rgos pblicos, ao Ministrio Pblico, por exemplo, a idia tem surgido. Poderia funcionar talvez quando a outra parte fosse uma entidade inteiramente privada, sem relao com a Administrao Pblica, sem, digamos infiltrao na Adm. Pblica. Talvez, mas em muitos casos no assim. E a outra parte pode ser at um ente pblico. Um Prefeito maluco, por exemplo, que queira construir em Ouro Preto um monumento inteiramente em desconformidade com o estilo arquitetnico da cidade, estragando por completo a beleza do conjunto. Ento, se se trata de uma entidade pblica, esta soluo de rgo pblico no funciona. Outra idia que tem surgido seria de conferir legitimao nesses casos a entidades particulares, associaes que se proponham lutar por essas finalidades, que sejam criadas com esse objetivo. Comeam a aparecer no Brasil: Sociedade dos Amigos do Bairro Tal, Associaes de Proteo Natureza. Ento

5 h essas entidades. Na Itlia existe uma certa notoriedade chamada Itlia Nostra, que tem como finalidade precpua lutar pela preservao das belezas naturais, das obras de arte, dos monumentos histricos. Toda vez que surge uma ameaa, um atentado a algum desses bens, a Itlia Nostra intervem, e j foi reconhecida em Juzo, houve j decises judiciais que reconheceram a esta associao legitimao para reclamar em Juzo. Ela prope a ao. Eis a um assunto que devem tomar como objeto de suas reflexes. Que soluo propor para esse caso do ponto de vista processual? H trs aspectos: 1 - (que mais de direito material): Esses interesses so reclamveis em Juzo? isto , algum tem o direito de reclamar isto em Juzo? ou simplesmente isso a uma literatura abstrata? Quando a Constituio, por exemplo, diz que as obras de arte, ou stios dotados de beleza paisagstica, ficam sob a proteo do poder pblico, que quer dizer isto? Nada? ou quer dizer alguma coisa? Se quer dizer alguma coisa, ento todos ns podemos exigir que o poder pblico efetivamente proteja, seno no quer dizer nada. Se est na Constituio uma regra jurdica, se uma regra jurdica tem que ter consequncias. um problema interessante e muito atual. No Direito Brasileiro existe um caso muito interessante que o da Ao Popular, alis prevista na Constituio da Repblica e regulada por uma lei de 1965. lei n 4717, de 29 de junho de 1965, uma lei singularmente bem feita sob vrios ngulos, uma verdadeira exceo na teratolgica (teratologia=estudo das monstruosidades) produo legislativa dos ltimos tempos. A lei da Ao Popular, contudo, tem seus defeitos, mas vamos comear pelos mritos. Ela prev a possibilidade, confere a qualquer cidado brasileiro legitimao ativa para propor aes destinadas a anular atos lesivos ao patrimnio pblico. Mas a lei foi suficientemente inteligente para no limitar o conceito de patrimnio pblico aos aspectos puramente econmicos. Ela considera patrimnio pblico o conjunto dos bens no apenas de valor econmico, mas de valor esttico, artstico, histrico, paisagstico, turstico. Ento quando, por exemplo, algum se lembrar de por abaixo o Po de Acar (coisas to estranhas como essa tem acontecido) ou o aterro final e definitivo da Baa de Guanabara, qualquer um dos senhores, cidado brasileiro, pode entrar em Juzo para impugnar esse ato. Ento por esse aspecto a lei interessante, sobretudo pela amplitude que ela deu ao conceito de patrimnio pblico. No s o dinheiro, so esses outros bens que constituem o patrimnio pblico de toda a coletividade nacional. O defeito da lei, a despeito de inmeras solues inteligentssimas que ela deu a certos problemas, como os efeitos da sentena, por exemplo, que um dos problemas srios nesse tipo de ao: se um s propuser a ao, a sentena vale para os outros ou s vale para ele? Estudaremos mais adiante, quando tratarmos da sentena e seus efeitos e da coisa julgada. Por enquanto

6 estamos atravessando os umbrais da grande Catedral do Processo, a coisa julgada est l no altar-mor. Ainda temos grande caminho a percorrer para chegar l. Ento, a lei, que deu soluo inteligentssima a certos problemas, foi menos feliz, a meu ver, quando limitou s pessoas fsicas, ao indivduo, esta legitimao. Poderia t-la conferido a pessoas jurdicas, que so geralmente mais poderosas, tm melhores condies de enfrentar uma disputa judiciria desse teor. Mas de qualquer maneira trata-se de instituto digno do maior apreo e que deveria ser usado com maior freqncia do que . Talvez porque muita gente no saiba que ela existe ou por culpa de nosso comodismo. Mas tem havido algumas aes interessantes. Houve uma no Esprito Santo contra um ato que determinou a derrubada de uma reserva florestal de cuja preservao dependia o abastecimento normal de gua a vrias localidades. A floresta protege as nascentes, como sabem. Aqui mesmo no Rio houve algumas contra o aterro da Lagoa Rodrigo de Freitas, outra contra a entrega de reas de praas pblicas a entidades privadas retirando da populao em geral a oportunidade de ali passar seus momentos de lazer. Em So Paulo, contra a derrubada de um prdio considerado de valor histrico, para construir em seu lugar uma estao do Metro. Enfim, tm havido algumas, mas so poucas em relao ao que se passa. Os senhores vem que o processo no aquela coisa burocrtica que alguns supem, porque tudo se resolve nele - atravs do processo que as coisas tm que realizar-se, que os direitos tm que ser garantidos. Do contrrio, no adianta nada dizer: voc tem direito disso, ou daquilo. Se no houver um juiz a quem possa recorrer e que esteja em condies de lhe dar uma tutela, cad o direito que est escrito na lei, no Cdigo Civil, no Cdigo Comercial, na prpria Justia? O desaguadouro, a foz, o esturio, o processo. O processo que, em ltima anlise, tem que funcionar bem; do contrrio no h proteo de direito algum. Ento, eis a algumas reflexes crticas sobre o problema da legitimao para agir. O 2 requisito o chamado interesse processual, a segunda das chamadas condies da ao. Quando que a gente tem interesse em alguma coisa? Quando til e necessrio recorrermos a ela. Por exemplo, os senhores tm interesse em que os professores cumpram o elementar dever de lhes dar aulas, porque isto til e necessrio. Ora, a mquina judiciria, o aparelho judicirio do Estado, aquilo a que se chama a Justia, no no sentido de virtude, mas no sentido de organismo, um aparelho muito dispendioso, complexo, exige atividades de um nmero enorme de pessoas, e para que funcione de um modo razovel no deve ser sobrecarregada com matrias suprfluas. Compreendem perfeitamente que para que um rgo funcione bem, preciso que se incumba daquilo que realmente vale a pena, e deixe de lado o que no vale a pena, o que no interessa, o que no til e no necessrio. Os senhores tm, p.ex., um

7 computador - no vo pedir ao computador que se encarregue de todas as somas ou de todas a multiplicaes por dois; seria sobrecarreg-lo inutilmente. A mesma coisa acontece com o aparelho judicirio. Ele no deve ser sobrecarregado exatamente para que possa funcionar melhor naquilo em que precisa funcionar. Da deriva o princpio de que no se deve admitir que uma pessoa use a mquina judiciria, seno quando isto lhe seja til em tese e lhe seja necessrio. uma conseqncia direta do que acabo de dizer. No se deve admitir que qualquer um aparea diante do juiz e tome o seu tempo com assuntos para cuja soluo no se precisa do juiz. Ento, exige-se de quem v a Juzo que tenha interesse processual, isto , que realmente precise do auxlio do rgo judicial e no queira utiliz-lo por mero capricho, por esprito demandista, por mania de litigar. Por exemplo, se um funcionrio pblico pode obter da Administrao Pblica aquilo a que se julga com direito, bastando que faa um simples requerimento e apresente perante a repartio competente, no se justifica que ele v pedir isto em Juzo, que v propor uma ao contra a Adm. Pblica para v-la condenada a proporcionar-lhe um benefcio que ela estava inteiramente disposta a proporcionar sem necessidade disso. Logo, essa pessoa no tinha interesse em utilizar-se da mquina judiciria, estava em condies de obter o mesmo resultado sem necessidade de que o rgo judicial fosse chamado a arrazoar toa. Ou ento, a situao tal que nunca a pessoa poder obter o que pleiteia, ou por outra, o resultado do processo nunca lhe poder ser proveitoso, no lhe trar nenhum benefcio, ela estar litigando sem qualquer perspectiva de proveito prtico. Por exemplo, algum vai a Juzo porque Fulano havia feito um testamento e depois fez outro revogando o primeiro. Mas esse segundo que revogou o primeiro nulo: Fulano no estava em seu Juzo perfeito. O autor quer que o segundo testamento seja anulado para que prevalea o primeiro. Vai o juiz ao primeiro testamento e verifica que essa pessoa que est pleiteando isso, no contemplada no primeiro testamento, ao contrrio at excluda. Ento, mesmo que seja verdade o que ela est dizendo, isto , que o segundo testamento tenha sido feito em condies tais que no seja vlido, nenhum benefcio ela ter se o juiz atender o seu pedido. O resultado do processo para ela incuo. Ela no tem interesse, o processo para ela no ter nenhuma utilidade. No outro caso no apresentava necessidade, neste nem sequer apresenta utilidade. Interesse de agir ou interesse processual a segunda das chamadas condies processuais. A terceira a que o Cdigo se refere a possibilidade jurdica do pedido. Quem vai a Juzo deve fazer ao juiz um pedido juridicamente possvel, dentro do nosso ordenamento, e no pedir uma coisa impossvel, excluda pela lei. Mesmo que tenha razo, mesmo que os fatos descritos sejam verdadeiros, se

8 a lei exclue aquela possibilidade o juiz no poder considerar o que a pessoa pretende. Ento o processo resultaria em vo, mquina girando no vazio. At algum tempo atrs, por ex., o pedido de divrcio era no Brasil um pedido juridicamente impossvel. Nunca o juiz poderia atender, porque no havia divrcio. Ento, vale a pena realizar o processo, chamar testemunhas, fazer percia, examinar documentos, etc, e no fim a que resultado chegar? A nenhum nenhum proveito para ningum, porque a providncia no existe. Hoje h o divrcio, mas no h, por ex., a possibilidade da pessoa que j obteve uma vez o divrcio e se casou de novo, pedir novo divrcio. A lei probe. No se pode pedir mais do que um divrcio. Ento, vejam bem, mesmo que esteja presente algum daqueles fatos que em tese poderiam servir de fundamento decretao do divrcio, intil estud-los, porque de antemo j se sabe que a providncia requerida impossvel. Eis a o que se chama a possibilidade jurdica do pedido - que o pedido seja possvel; se o pedido impossvel, se a lei o exclui, seria absolutamente intil realizar o processo, e sendo intil seria nocivo porque faria gastar o tempo, a energia e o dinheiro de uma poro de gente, em vo. NO PROCESSO, TUDO QUE NO NECESSRIO PROIBIDO. guardem esta frase. No mundo do processo s se pode fazer aquilo que preciso fazer, exatamente para evitar que a mquina judiciria trabalhe no vazio, em vo. Ento, o que no necessrio proibido. Na vida privada, no direito material, no. S no processo. Porque daria lugar a esta conseqncia: causar uma sobrecarga intil na mquina judiciria. O Cdigo de Processo Civil faz referncia expressa a essas trs condies no art. 267, VI. Vejam a primeira observao que se deve fazer a isso: A enumerao, a meu ver, no deve ser considerada exaustiva - a prpria linguagem do Cdigo insinua que pode haver outras condies. E efetivamente as h. Por ex., certas aes devem ser propostas em determinado prazo, ultrapassado o qual elas no podem se mais propostas. Ao Renovatria de contrato de locao de imvel destinado a fim comercial ou industrial, s pode ser proposta dentro dos ltimos 6 meses de vigncia do contrato que se deseja renovar. Mas estas trs so as condies chamadas genricas, porque elas se aplicam a todas as aes em geral. Da o relevo que se d a elas. Ateno: a leitura de alguns livros pode fazer supor que s existem essas condies, legitimidade, interesse processual e possibilidade jurdica. "As condies da ao so ...". Mas apenas isso, essas so as

9 condies genricas aplicadas a toda e qualquer ao. Ento seria extinto o processo sem fundamento genrico. Eis a a conseqncia da falta de alguma das condies do artigo. Quando o direito de ao exercido sem que estejam presentes todas as condies, qual a conseqncia? O juiz deve extinguir o processo, por fim ao processo sem julgamento do mrito, isto , sem apreciar o contedo, sem apreciar se existe ou no existe o direito material postulado pelo autor. Essa competncia da maior importncia, e difere nitidamente daquela que ocorre quando o autor, o proponente, no tem razo. Vejam estes dois exemplos: A, casado com B, prope ao de desquite, prope ao de separao judicial. Alega que a conduta da cnjuge tal que no admite a vida em comum. A parte legtima para propor a ao? Sem dvida - s ele. Ele tem interesse processual? Sim. O pedido juridicamente possvel? , a lei permite. Porm ele no consegue provar o fato que alegou, a conduta irregular de B. O juiz, embora reconhecendo que A tem o direito de ao, que todas as condies da ao esto cumpridas, verifica que ele no tem aquele direito material alegado. No conseguiu provar aquele direito. C, entretanto, que amigo do cnjuge A, prope que A se separe de B, narrando os fatos que incriminam a conduta da cnjuge B. Estes fatos podem at ser verdadeiros, mas C no parte legtima na ao. Neste caso o juiz no examinar o processo. Ele o extinguir e julgar C carecedor de ao (carncia de ao). importante saber que uma coisa improcedncia, e outra carncia. A improcedncia a falta do direito material, ao passo que a carncia a falta de legitimao. O juiz tem o dever de fiscalizar a presena dessas condies: 1 - legitimao; 2 - interesse processual; 3 - possibilidade jurdica do pedido. O juiz aprecia essas condies ex officio (espontaneamente, independente de provocao).

INDIVIDUALIZAO DAS AES Consiste em saber como se identifica uma ao que tenha sido concretamente exercitada. O Estado s tem o dever de prestar jurisdio uma vez. Para cada conflito de interesses deve corrresponder um processo. Encerrado o processo, a ao no pode ser proposta, nem outra ao pode ser proposta, durante o decurso, assim como uma ao no pode ser proposta duas vezes.

10 Existem critrios de confronte de duas aes para sabermos se no idnticas ou no. Art. 301 2 CPC - Elementos de individualizao ou elementos das aes. 1) Elemento subjetivo - as partes. Quem est litigando, autor e ru. autor: aquele em cujo nome se pede a providncia. ru: aquele defronte a quem a providncia pedida. Ex.: ao de menor - representante legal. autor: o menor. 2) Elemento objetivo - o pedido (objeto da ao). No pedido, distinguem-se dois aspectos: Ex.: o autor pede a condenao do ru ao pagamento de uma dvida (a condenao refere-se a um bem - dinheiro). Ento temos: providncia pleiteada pelo autor -> objeto imediato do pedido (direto). O bem -> objeto mediato do pedido (que por intermdio dessa providncia o autor est pleiteando - pedido indireto). 3) Causa do pedido - causa de pedir - causa petendi. o porqu, a razo, o fundamento da pretenso do pedido (por que se est litigando). Efeitos jurdicos - resultam da incidncia da regra jurdica sobre um fato (podem resultar de fatos simples ou de fatos complexos). Causa petendi - o fato ou o conjunto de fatos, que ao ver do autor resultam naquele fato jurdico por ele afirmado. Os dispositivos legais em que se funda o autor, e so por ele invocados, no integram a causa petendi. A qualificao jurdica dada ao fato pelo autor, tambm no integra a causa petendi. "Art. 264 - Ao autor unilateralmente vedado modificar ..." Ex.: se numa alegao algum (o autor) deseja modificar um fato do processo, como erro para dolo, no se altera a causa petendi. Ex.: no Cd. Civil permitido ao doador revogar a doao se o donatrio atentar contra a sua vida ou caluni-lo. Se numa ao de revogao de doao, o doador alegar que o donatrio atentou contra a sua vida, mas depois diga que no, que s o caluniou, no poder faz-lo sem o consentimento do ru, porque a causa petendi foi alterada. Se no exemplo acima, o autor alega o mesmo tipo de fato, a reproduo do mesmo fato em data posterior, trata-se de outra causa petendi. Numa ao de separao judicial, o autor alega o adultrio e depois alega outro adultrio historicamente diferente (seria necessrio o consentimento do ru ou uma nova ao). Dois funcionrios que se julgam na mesma situao pleiteiam um s benefcio administrativo para si. So dois pedidos semelhantes, e a causa petendi no a mesma, pos cada um

11 faz o pedido para si prprio (duas concurso, pensam que o mesmo teve publicao de um edital) e por isso diferentes, o pedido e a causa petendi aproveitar a ambos. aes). Duas pessoas que fizeram um um vcio que pode invalid-lo (falta de pedem a sua anulao. Os autores so so os mesmos. A anulao do concurso

Para cada lide um processo. No pode ser exercitada a mesma ao, nem conjuntamente, nem sucessivamente.

CLASSIFICAO DAS AES 1) Quanto natureza do direito de que o autor se afirma titular: 1) Aes reais - so aquelas fundadas num suposto direito real. O autor afirma-se titular de um direito real. Ex.: ao reivindicatria ( domnio dir. real) 2) Aes pessoais - so as que se baseiam no direito pessoal. 2) Quanto natureza do bem que constitui o objeto mediato do pedido: 1) Aes mobilirias - aquelas cujos pedidos tm por objeto mediato um bem mvel. 2) Aes imobilirias - aquelas cujos pedidos tm por objeto mediato um bem imvel. 3) Aes que se baseiam na natureza da providncia jurisdicional pleiteada pelo autor: Existem 3 tipos de processo: Processo de conhecimento - formular a regra jurdica. Processo de execuo - transformar a realidade, ajustando-a ao direito (aquilo que deve ser). Processo cautelar - no propriamente uma 3 espcie do gnero, mas se contrape em bloco s outras duas espcies citadas. Antecipadamente assegura a eficcia prtica dos processos de conhecimento e de execuo. A esses trs tipos de processo correspondem 3 tipos de tutela jurisdicional (executiva, de conhecimento e cautelar) Ao - o direito jurisdio.

12 Aes de conhecimento - visam a uma providncia cognitiva (emisso de uma sentena). Aes executivas - visam tutela executiva. Aes cautelares - visam tutela cautelar. So trs tipos de aes que se justapem. O critrio o do objeto mediato do pedido. I. AS AES DE CONHECIMENTO comportam sub-espcies. Art. 4 - a ao visa apenas a que o Juiz declare a existncia ou inexistncia de uma relao jurdica. OBS: Normalmente no se pleiteia a declarao da existncia de fatos, mas sim de relaces jurdicas. I.1) Aes declaratrias - positivas ou negativas Positivas - quando o autor pede a declarao da existncia da relao jurdica. Negativa - quando o autor pede a declarao da inexistncia da relao jurdica. Visam declarao de um fato. referindo-se a um fato. uma ao declaratria

I.2) Ao constitutiva ou de reparao - (porque constitui situao jurdica nova) - Cria, modifica ou extingue situaes jurdicas. Ex.: algum pede uma separao judicial alegando um fato suficiente. O Juiz verifica as provas, e quais as normas jurdicas aplicveis, e se dessa aplicao resulta para o autor o direito de separar-se. Nessa ao o Juiz deve decretar a separao, criando, inovando, constituindo uma nova situao jurdica. O autor era casado, agora est separado. I.3) Ao condenatria - o Juiz no s declara a existncia de uma situao creditcia, como obrigar o ru a pagar. II- AS AES EXECUTIVAS pressupem que o processo de conhecimento esteja terminado em relao quela matria. Atuao prtica, e preponderantemente material. (Apreende bens). Em regra o processo de execuo pressupe o processo de conhecimento, um titulo judicial que autoriza a apreenso. Mas a lei prev determinados casos de execuo de ttulos extrajudiciais. Ex.: Nota Promisria - instaura-se desde logo o processo de execuo.

13 III - AES CAUTELARES - destinam-se a resguardar o resultado de um processo de conhecimento ou de execuo. Asseguram antecipadamente o resultado desses processos. Num caso ou noutro, constituem um instrumento a servio do resultado de outro processo. Tm a finalidade instrumental em relao aos outros tipos de processo, e esses se destinam a preservar a observncia do direito material. No so espcies do mesmo gnero. Os processos de conhecimento e de execuo so instrumentos do processo cautelar. A ao cautelar o instrumento do direito material. Instrumento do instrumento. 1) Processo de Conhecimento 1.1 - Ao declaratria 1.1.1 - positiva 1.1.2 - negativa 1.2 - Ao constitutiva ou de reparao 1.3 - Ao condenatria 2) Processo Executivo 3) Processo Cautelar

O

PROCESSO

A teoria geral do processo civil repousa sobre trs tpicos fundamentais: JURISDIO, AO E PROCESSO. Vamos passar agora ao terceiro tpico fundamental desta parte introdutria da nossa disciplina, que o Processo. J sabemos que o dever do Estado de prestar jurisdio, isto , de fazer justia, corresponde da parte daqueles que esto sujeitos ao seu poder, o direito de exigir essa prestao jurisdicional, e a esse direito se chama DIREITO DE AO. Quando uma pessoa, exercendo o seu direito de ao, comparece perante o rgo estatal incumbido de prestar jurisdio e lhe submete o pedido de uma providncia de natureza jurisdicional, o Estado vai promover a realizao de uma srie de atos, de atividades destinadas a alcanar o objetivo de prestar justia. A prestao jurisdicional como bem se compreende, no algo que possa

14 ser oferecido instantaneamente, necessria a prtica de uma srie de atos que se prolongam no tempo, por vezes mais do que seria razovel, mas no entanto sempre se desenrolam ao longo de algum tempo. Todos esses atos, por vezes de natureza muito diversa, so ligados, se unem uns aos outros, pela sua finalidade comum, pelo seu fim, h uma unidade teleolgica, finalstica, todos eles se destinam a permitir que o Estado se desincumba de seu dever de prestar jurisdio. Ao conjunto desses atos que se praticam com essa finalidade, da prestao da jurisdio, que se d o nome de PROCESSO. Processo, portanto, o conjunto de atos atravs dos quais se realiza a funo jurisdicional. De sorte que ntima a relao entre o conceito de processo e os dois anteriores, o de jurisdio e o de ao. O processo o instrumento da jurisdio. atravs dele que o Estado cumpre o seu dever de prestar jurisdio, e tambm atravs do processo que se satisfaz o direito do cidado a obter a prestao jurisdicional, isto , que se satisfaz o direito de ao. Vejam que esses trs conceitos so interligados. Ao e jurisdio de certo modo de contrapem, a ao o direito jurisdio, e o processo o conjunto de atos que se praticam com a finalidade de que seja prestada a jurisdio, e portanto seja satisfeito o direito de ao. O processo no deve ser confundido com o conjunto dos documentos, dos papis que registram a prtica desses vrios atos. Quando se fala em processo, a idia do leigo a de um calhamao de papis. "Passa ali e apanha o processo ..." uma frase corriqueira mas no uma frase tcnica. Aquilo a que se d o nome de "processo", tecnicamente se denomina AUTOS - os autos do processo, isto , o conjunto dos documentos nos quais fica registrada, documentada, a prtica dos atos cujo conjunto forma o processo. Esta maneira de dizer prpria dos leigos e no dos senhores. A prestao jurisdicional a manifestao daquela tutela a que me referi em nossa primeira conversa: O Estado, editando a norma jurdica abstrata e genrica que dever disciplinar a conduta dos membros da coletividade, faz a promessa de zelar pela observncia dessas normas atuando-as efetivamente diante de situaes concretas. Essa tutela pode manifestar-se de diversas maneiras. H uma primeira forma de tutela, cognitiva, isto , intelectual. Trata-se de ver se a pessoa que foi pedir a tutela jurisdicional realmente a merece, isto , se o autor tem razo naquilo que pediu. E o desfecho dessa atividade o ato denominado Sentena. A sentena o ato no qual o Juiz julga a causa, isto , estabelece quem tem razo e quem no tem, acolhe ou rejeita a providncia que lhe pleiteada. Pelo menos isso que ocorre normalmente num processo frutfero, num processo realmente eficaz. O seu desfecho deve consistir normalmente no

15 pronunciamento do Juiz dando razo a quem a tem. denomina-se Sentena. Esse pronunciamento

H um tipo de tutela que visa essencialmente a prolao de uma sentena e o processo a isso destinado, o processo no qual se realiza essa atividade, tendente emisso de uma sentena, recebe a denominao de Processo de Conhecimento ou de Cognio. Exatamente porque nele a atividade do Juiz uma atividade essencialmente cognitiva, isto , o Juiz conhece a matria que lhe foi submetida, verifica os fatos, aplica aos fatos o direito pertinente e conclui. Tudo isso se passa num plano intelectual, digamos assim, fisicamente nada acontece, materialmente nada acontece. Ento a ns temos a primeira classe, a primeira espcie de processo - processo de conhecimento ou de cognio, disciplinado no Livro I do CPC, e que visa essencialmente emisso de uma sentena. O processo de conhecimento um processo de "fabricao" de uma sentena (imagem talvez vulgar) e todas as vezes que um processo desembocar numa sentena, estamos diante de um processo de conhecimento - o sinal infalvel que o caracteriza. Mas h uma segunda modalidade de tutela que j no consiste nisso, seno em ter atividade concreta, atua praticamente aquilo que foi decidido na sentena. Os senhores compreendem perfeitamente que por si s a sentena no modifica materialmente o mundo exterior. Por ex. no Processo Penal: no momento em que o rgo judicial profere uma sentena de condenao morte, isso no significa que nesse momento a pessoa condenada morra. A no ser que ao ter cincia do fato seja vtima de enfarte fulminante. Mas isso um mero acaso, um fato acidental. Quer dizer, a sentena no modifica o mundo visvel. Ento isso no basta. Muitas vezes, preciso fazer atuar aquilo que ficou decidido na sentena. O Juiz condena o ru a pagar determinada importncia ao autor, nem por isso o dinheiro sai voando do patrimnio do devedor para entrar no bolso do credor. Ento h necessidade de um outro tipo de atividade destinada a fazer com que aquilo realmente acontea. Este outro tipo de tutela, denomina-se Tutela Executiva, e sua atuao se faz atravs de um segundo tipo de processo, denominado Processo de Execuo, que, veremos mais tarde, no se funda unicamente ou necessariamente numa sentena. Pode fundar-se numa sentena e isto ocorre na maioria dos casos; ou ento num outro ttulo que a lei para esse fim equipare a uma sentena, permitindo desde logo que se pratiquem atos materiais, palpveis, concretos, sensveis, destinados a colocar as coisas nos seus devidos lugares. Ento temos dois tipos de processo, processo de conhecimento e processo de execuo. Estas duas espcies podem ser reunidas num gnero, porque ambas visam satisfao do direito. Visam a reparar uma leso ou a prevenir uma ameaa, satisfazendo o titular do direito lesado ou ameaado. Mas ao lado desses dois tipos de processo, que podem formar um gnero comum,

16 abrangente de ambos (e talvez se possa denominar, a essa modalidade, de tutela satisfativa, exatamente porque visa a satisfao), h ainda outra possibilidade a de uma tutela que no visa diretamente a satisfazer, mas apenas a assegurar um estabelecimento de condies para que outro processo tenha um resultado praticamente eficaz. Uma tutela, digamos assim, mediata, de 2 grau, que no visa a satisfazer o direito e sim a assegurar a eficcia prtica do processo que tende a satisfazer o direito. Ento o segundo processo - linha auxiliar do primeiro, satlite do primeiro - esse tipo de tutela que apenas serve para evitar o risco de um processo intil, d-se o nome de Tutela Cautelar. uma cautela que se toma. Por ex.: receia-se que o devedor porventura vindo a ser condenado, se coloque numa posio tal que torne intil a condenao. Como? Ocultando, desviando seus bens, por exemplo, de tal maneira que, no momento em que a sentena fosse ser executada, nada se encontraria para fazer recair a execuo. um perigo que se corre. Para conjurar esse perigo pode-se tomar uma providncia de natureza cautelar que consistiria em apreender bens do devedor, provisoriamente, evitando que ele os dissipe ou desvie, de tal modo que esses bens ficassem reservados para uma eventual futura execuo. Ao apreendermos os bens, ns no temos em vista diretamente satisfazer o direito do credor - at porque possvel que nesse momento ainda nem sequer se saiba ao certo se aquele crdito existe ou no. apenas uma precauo que se toma. Ento, ao lado dos processos que visam a satisfao, ns temos esse terceiro tipo que visa apenas ao resguardo provisrio da eficcia de alguma outra providncia. uma providncia auxiliar. A esse tipo de tutela secundria denominamos tutela cautelar, e o processo em que ela se realiza recebe a denominao de Processo Cautelar. Ento, temos trs tipos, trs espcies de processo conforme o tipo de tutela jurisdicional neles exercida: o processo de conhecimento, o processo de execuo e o processo cautelar. Os dois primeiros no seu conjunto podendo ser filiados a um gnero comum que seria o da tutela satisfativa, e por oposio a eles o processo puramente cautelar. Outra noo que deve ser agora exposta a de PROCEDIMENTO. Todo processo desenrola-se de acordo com um modelo indicado na Lei. Os atos processuais no se praticam arbitrariamente, de qualquer maneira, em qualquer ordem, por qualquer forma. A lei os disciplina, a lei regula a seqncia dos atos processuais, a forma, o modo pelo qual devem eles ser praticados. Ela no deixa isso ao capricho do Juiz, e muito menos ao capricho das partes. Ns encontramos na lei um figurino, um padro, um modelo, ou melhor dizendo, vrios modelos, de acordo com os quais o processo deve ser conduzido. A esta forma, esta maneira externa que reflete o modo pelo qual os atos do processo se encadeiam sucessivamente e se praticam uns aps outros

17 que se d a denominao de PROCEDIMENTO. O processo o conjunto de atos, o procedimento o modo pelo qual estes atos se vo praticando sucessivamente. E nem todos os processos adotam o mesmo procedimento. A lei varia o modelo de acordo com diversos fatores quer sero examinados oportunamente. Encontramos na lei vrios tipos de procedimento. Saber qual deles deve ser utilizado num determinado processo questo da maior importncia. Porque o processo deve ser realizado segundo a lei e se a lei prescreve para ele um determinado modelo, esse e no qualquer outro modelo que deve ser seguido, obviamente. Mas o que importa no momento - porque mais tarde chegaremos ao ponto em que se tornar oportuno expor e caracterizar os diversos procedimentos, que os senhores fixem que as duas palavras, Processo e Procedimento, no significam exatamente a mesma coisa. O processo o conjunto de atos e o procedimento a fisionomia externa do processo. E se o processo tem uma fisionomia externa, h de ter tambm alguma realidade interna. Que que constitui a realidade interna desta srie de atos? Aparentemente, se ns observamos na prtica o desenvolvimento do processo, vamos perceber que uma poro de atos se praticam - atos praticados pelo Juiz, pelas partes, e at mesmo por outras pessoas que colaboram nas atividades. Mas alguma coisa une esses atos por dentro - h um fio que passa por dentro de todas as prolas do colar. As prolas so os vrios atos, mas eles no esto soltos no espao, esto unidos, vinculados, encadeados, assim como olhando para um colar no se v o que que mantm unidas as vrias prolas. No processo alguma coisa de semelhante se descobre - aqueles vrios atos aparentemente autnomos, na realidade esto unidos, formam no seu conjunto uma unidade. Ora, que so esses atos? Vejam bem: quando algum pratica um ato porque pode, ou deve, ou precisa pratic-lo. Claro, um ato sempre a manifestao de alguma coisa que ou se pode fazer ou se deve ou se precisa fazer. Ento cada ato que surge no processo a manifestao de alguma coisa que existe que permite a esse ato surgir, ser praticado. Que que est por trs de tudo isso? Est um conjunto de situaes jurdicas das vrias pessoas que tomam parte nesse drama processual, nessa novela. As pessoas quais so? Principalmente o Juiz e as Partes, eventualmente outras. Se alguma dessas pessoas pratica um ato no processo porque tinha de pratic-lo, ou pelo menos podia pratic-lo. Ento essa pessoa exerceu um poder, um direito, uma faculdade ou um dever. Ora, isso significa que as pessoas que participam do processo so titulares, nele, de deveres, de direito, de faculdades, etc., que lhes permitem ou lhes impem a prtica desses vrios atos. Ora, quando diversas pessoas esto ligadas entre si, ou situadas umas diante das outras, por deveres, direitos, faculdades, etc. que que dizemos? Que essas pessoas esto ligadas por uma relao jurdica. O Direito atribui a essas pessoas essas diferentes posies jurdicas em face umas das outras.

18 Se o processo um conjunto de atos com uma finalidade una, praticados por diversas pessoas que ao pratic-los ou se desincumbem de deveres ou exercem direitos, sinal que por trs desse colar de atos, dessa fileira de atos, existe alguma coisa ligando essas pessoas. Por trs dos atos do processo existe uma relao jurdica que prende entre si todas essas pessoas que participam dessa atividade processual. Da falar-se de uma RELAO JURDICA PROCESSUAL. Se no houvesse para ningum o direito de pratic-los, ou o dever ou a faculdade ou o nus de pratic-los, eles no seriam praticados. Ento se eles se praticam porque algum pode, deve, etc., e esse algum est numa posio jurdica ativa ou passiva diante de outro. Modernamente, isto , desde o sculo XIX, fala-se em Relao Jurdica Processual para designar o vnculo que se forma entre as vrias pessoas que participam da atividade processual, o Juiz e as partes essencialmente, eventualmente outras. Esta relao jurdica processual tem certas caractersticas um pouco diferentes das relaes jurdicas que os srs. conhecem das outras disciplinas. A relao no Direito Civil, em regra, uma relao jurdica esttica, isto , uma vez estabelecida ela se conserva tal qual era at que se extinga. Ela no se transforma, uma relao fixa. Algum contrai uma dvida, a dvida existe tal como contrada, at sua extino. A relao jurdica processual uma relao dinmica, como um caleidoscpio. A cada ato que se pratica surge uma nova situao em que nascem novos direitos e novos deveres que vo sendo exercidos, vo se consumindo, vo se extinguindo, e nem por isso a relao acaba. Ela sempre a mesma at o fim, embora a sua fisionomia v se modificando a cada instante. Ela tem, portanto, esse carter dinmico, uma relao complexa, uma relao progressiva, comporta em si no somente um direito para um, uma obrigao para outro, e sim um feixe ou vrios feixes de direitos, deveres, obrigaes, etc., que se vo exercendo e mudando, nascendo e morrendo e se transformando continuamente desde o princpio at o fim do processo. E ela no se confunde de maneira nenhuma com a relao jurdica que o autor afirma existir entre ele e o ru no plano material. Quando o autor diz "Eu sou credor do ru e quero cobrar a dvida", ele est afirmando a existncia de uma relao jurdica de direito material, de direito civil no caso, se for um direito civil. Agora, o fato dele ir a Juzo e propor uma ao em face deste ru, entre ele e o ru e o Juiz, se forma uma relao jurdica nova, distante desta. Aquele relao de direito material pode at no existir. Tanto pode que perfeitamente concebvel que ao fim do processo o Juiz diga: "No senhor, eu no condeno o ru a lhe pagar porque ele nada lhe deve". Ento o Juiz afirma que aquela alegada, suposta, hipottica relao de direito material inexiste. Agora, a relao jurdica processual, essa

19 claro que existe. Existe e perdurou todo o tempo em que o processo se desenrolou. Elas so inteiramente distintas e uma autnoma em relao outra. As relaes jurdicas de direito material podem ser de direito privado ou de direito pblico, mas a relao jurdica processual sempre uma relao jurdica de direito pblico. O processo regido pelo direito pblico. uma atividade, uma das funes bsicas do Estado. Quando a relao jurdica material alegada pelo autor no existe, o pedido improcedente, isto no afeta a relao jurdica processual, ela existia autonomamente, independentemente em face da outra. Quais so ento as caractersticas essenciais dessa relao jurdica processual? Ela , como disse, uma relao complexa, dinmica e progressiva e autnoma em relao a de direito material. Para que a relao jurdica processual possa instaurar-se, possa nascer, necessria a presena de determinados requisitos. E para que ela possa, alm de nascer, ter vida vlida, isto , existir validamente, so necessrios outros tantos requisitos. A esses requisitos necessrios para que o processo, encarado como relao jurdica processual, isto , olhado na sua substncia ntima e no no seu feitio exterior, exista, para que exista o processo, algumas coisas so necessrias, e para que ele exista validamente, outras coisas a mais so necessrias. A esses requisitos a doutrina tem chamado pressupostos processuais. Pressupostos processuais so os requisitos necessrios para que o processo exista e para que ele seja vlido. E j a podem-se distinguir duas espcies de pressupostos processuais - os pressupostos de existncia e os pressupostos de validade. Ento vejamos: Que preciso haver para que possa existir o processo? Se aqui, por exemplo, a ttulo de mtodo didtico, simulssemos, e viesse um dos srs. com um esboo de uma petio inicial de uma ao, e eu dissesse: "O Juiz pega a petio inicial, l, e depois despacha: Cite-se o ru." Isto seria o processo, juridicamente falando? Pode-se dizer que foi instaurado o processo, se eu dissesse isso? No. Ento o que que falta para que seja o verdadeiro processo? Falta, em primeiro lugar, algum que esteja investido do poder de julgar, falta o rgo jurisdicional. (O professor, por acaso, Juiz, porm aqui no est na sua funo de Juiz.) No h portanto aqui na sala o Juiz, h uma pessoa que exerce o cargo, o poder judicial, mas aqui no est nessa qualidade, portanto no est podendo aqui despachar a petio de ningum. Mas no s o Juiz que falta. Voc trazendo esta petio inicial est realmente na posio de algum que pleiteia uma prestao jurisdicional do Estado? Ou est s treinando como aluno? Se voc trouxer a petio que eu mandei, voc no est pleiteando, no est sendo autor, no est sendo parte.

20 A pessoa fsica que voc aponta na sua petio como sendo o devedor, tambm no h. Ento no h nesse processo nem Juiz, nem partes, e o processo no pode existir sem Juiz e sem partes. Esses elementos tm de preexistir ao processo. Tm de existir antes do processo. Por isso mesmo eles so pressupostos. Para que o processo exista, preciso que antes disso exista um rgo investido de jurisdio, e duas pessoas que possam assumir nesse processo a posio de partes, uma que seja autor e outra que possa ser ru, sem o que no h processo possvel. Mas no basta isso. Suponhamos que eu aqui estivesse no exerccio da minha funo como Juiz, na qualidade de Juiz. Estou sentado aqui e um dos srs. pretende cobrar de outro uma dvida hipottica. Suponhamos que A deva a B uma importncia, e B esteja querendo cobrar dele essa importncia em Juzo. Ento aqui est o Juiz, ali est o autor e ali est o ru. Ento esto presentes os trs. J h processo? O que que necessrio: Que o credor B se digne a se mexer. Sem isso eu no me mexo. A jurisdio uma funo cujo exerccio depende de uma cutucada por parte do particular. O Juiz no sai a cata de causas para julgar, ele no se move. O Juiz inerte, quer dizer, s atua provocado. Ento preciso que algum aperte o boto, como se algum ligasse um tomada. Se ningum disser nada o processo no comea. A parte tem que se mover para por em movimento o Juiz. Ento, B tem que vir aqui dizer: "Peo a V.Exa. que condene A etc.,etc." Ento, alm dos elementos que eu diria estticos, preciso um movimento dinmico, um movimento destinado a acionar a fasca que desencadeia o movimento processual, e que no parte do Juiz, parte da parte. "Art. 262 - O processo civil comea por iniciativa da parte, mas se desenvolve por impulso oficial." Depois de iniciado, o Juiz deve toc-lo para a frente, porm no o Juiz que o inicia, a iniciativa cabe parte. Ningum obtem justia sem ped-la. Pode-se mesmo aplicar a frase "Quem no chora no mama". Ento, preciso que haja rgo com jurisdio, partes, e esse ato de apertar o boto. Esse ato chama-se Demanda - o ato pelo qual algum pede a prestao jurisdicional. Esses so os pressupostos de existncia do processo. Agora, para que o processo seja vlido preciso que cada um desses elementos seja revestido de certas qualidades. Respectivamente: A) O rgo de jurisdio pode ser um qualquer? No. No qualquer Juiz que pode julgar qualquer causa. H um diviso de trabalho que delimita a competncia de cada um. A j um requisito no para que o processo exista, mas para que seja regular, seja correto e portanto vlido. Ento, em

21 correspondncia com o rgo de jurisdio que o pressuposto de existncia, o pressuposto de validade a competncia desse rgo. B) Em relao s partes: menores podem litigar em Juzo por si mesmos? Uma criana de 12 anos pode? No pode. Um louco sob interdio pode? Normalmente no pode. Ento preciso que as partes sejam capazes. A capacidade corresponde competncia. Reparem que um atributo anlogo. A competncia do rgo judicial, a capacidade das partes. uma analogia. C) E preciso que a demanda seja oferecida em forma regular, de acordo com a lei. No de qualquer maneira. No pode ser feita oralmente, tem que ser feita por escrito (Art. 156) e s em portugus. Eis ai os pressupostos de validade do processo. Quais so os sujeitos da relao jurdica processual? Quais so os sujeitos de qualquer relao jurdica? So as pessoas que assumem em face umas das outras, direitos, deveres obrigaes, faculdades, etc. Sujeitos de relaes jurdicas so sempre essas pessoas. E quem que assume tais posies no processo? J sabemos que essencialmente trs pessoas, pelo menos, a saber: o Juiz (no a pessoa fsica do Juiz, e sim o rgo judicial- no o Dr. Fulano ou o Dr. Sicrano, o Juiz como rgo do Estado), e as partes. Esses so os sujeitos principais do processo. Hoje esse conceito mais ou menos tranqilo mas nem sempre foi. Vocs encontram nos livros a esse respeito uns grficos. Quase todo livro tem esses grficos. Quando se defrontarem com esses grficos no pensem que os diversos participantes do processo esto lanando flechas uns na direo dos outros. No se trata de uma representao grfica de uma luta de ndios. Aquelas setinhas pretendem simbolizar as posies jurdicas dessas pessoas umas diante das outras. O primeiro grfico quer dizer o seguinte: Aqui concebia-se a relao jurdica processual apenas entre autor e ru, i.e., entre as partes. Segundo essa concepo, que se chama concepo linear, ou segundo outros, retilnea, s as partes que tm direitos e deveres umas em relao s outras, o Juiz no. Esta concepo est totalmente abandonada, ela remonta a um autor chamado KOHLER, cuja teoria, contudo, hoje no mais adotada. claro que o Juiz tambm tem em face das partes poderes, deveres, ningum pode negar isso. Agora aqui, que o Juiz sujeito da relao processual hoje no se discute. O que ainda se discute se alm das relaes entre o Juiz e cada uma das partes, como ali, se tambm existe no processo uma relao jurdica entre as partes, autor e ru. Afirmam alguns autores, negam outros. claro que no plano do direito material a relao entre as partes, o Juiz no tem nada com ela, o

22 crdito, a dvida. Mas isso outra coisa. Pois bem, at hoje se discute, e h uma teima em torno disso. A meu ver existe a relao jurdica no apenas de cada uma das partes para com o rgo judicial, mas tambm entre elas. H certos deveres, certos direitos, que uma das partes no processo tem diretamente para com a outra; pelo menos um: o direito do vencedor de haver do vencido o reembolso das custas que ele, vencedor, dispendeu e dos honorrios do seu advogado. Em todo o processo, ao terminar, o vencido deve pagar (art. 20). Uma das partes pelo simples fato de ser vencedora tem perante a outra o direito de receber o que pagou em custas e os honorrios de seu advogado. Conseqentemente, a outra tem obrigao de pagar isso, e da uma relao que sem dvida alguma se estabelece entre as partes. Ento, a meu ver, seria prefervel a concepo atribuda a WACH. Mas eu no brigo por ela, estou apenas expondo. Ento os sujeitos principais da relao jurdica processual so, sem dvida alguma, o rgo judicial e as partes. Eventualmente outras pessoas que tambm assumem no processo deveres ou direitos ou faculdades, por exemplo, as testemunhas: a pessoa chamada ao processo para depor sobre fatos que interessam soluo do litgio, pelo fato de ser convocada assume o dever de comparecer. Ento, a testemunha no Juiz, nem parte, mas assume o dever de comparecer e dizer a verdade, seno pode sofrer uma pena (falso testemunho). Ento, sujeito eventual, sujeito acidental, sujeito secundrio. Os auxiliares dos Juzes, o Oficial de Justia que realiza a citao, tm uma poro de deveres mas tambm tm faculdades - ele pode fazer isto, pode fazer aquilo, pode arrombar a porta sob determinadas circunstncias para fazer uma penhora, por exemplo. Ento outras pessoas podem tambm assumir a posio de sujeito, mas so eventuais, no so necessrias. Necessrias so aquelas trs: o Juiz e as partes. A parte que prope a ao chama-se autor, e a parte em face da qual a ao proposta chama-se ru. Estes so os sujeitos necessrios, essenciais, principais, da relao jurdica processual. Aquela srie de atos praticados pelo rgo jurisdicional, pelas partes, formam o que se chama de processo. A lei atribui a essas diversas pessoas, faculdades para atingir o fim, que a prestao de justia. Estando essas pessoas que participam do processo dotadas de deveres, direitos, faculdades, diz-se por essa razo que todas elas esto ligadas entre si por uma relao jurdica, que por motivos bvios toma o nome de relao jurdica processual. Se esto ligadas graas aos laos de cada uma em face das outras, em que consistem essas diversas posies que o sujeitos assumem, um diante do outro? Esse o contedo da relao jurdica. Em que consiste uma relao jurdica? O casamento faz nascer uma relao jurdica. Eu tenho direitos e deveres para com o meu cnjuge. Qual o contedo? Conjunto dos deveres e direitos que assumem um perante o outro. O que compe o contedo da relao jurdica processual? a soma, o conjunto dessas vrias posies jurdicas

23 que cada um assume diante do outro. Quem exerce jurisdio? o rgo estatal num plano de prenncia em relao aos outros. Ele exerce poderes de direo do processo. Os poderes do Juiz so diversos e se manifestam em vrios campos. Em relao prova (instrutria) tende a acentuar-se no processo civil moderno. Vo at a fiscalizao da regularidade (poder de polcia no sentido do D. Administrativo). O Juiz tem tambm deveres, sendo o primordial o de prestar jurisdio, pronunciar-se sobre o que se lhe requer. Ao Juiz no dado abster-se de um pronunciamento. O Juiz pode indeferir, no pode rasgar nem queimar o processo. Outro dever o que motiva as suas decises. O Juiz deve expor as razes que o levam a decidir dessa ou daquela maneira. A razo deve ser exposta. O Juiz exerce poderes sobre as partes, que possuem: 1) Direito; 2) Faculdades; 3) Deveres e 4) nus. 1) DIREITOS - uma categoria ativa -> vantagem - titulares de direito subjetivo, possibilidade de exigir de outrem que manifeste comportamento. Faa ou deixe de fazer. Diz-se que a primeira pessoa tem direito subjetivo em face da segunda e esta deve em face da primeira. Quando a primeira pessoa comea a exercer o direito de ao, ela instaura o processo. Se desdobra no processo a relao processual dinmica e progressiva. O Estado suporta todo o contedo mltiplo do direito de ao 2) FACULDADES - uma categoria ativa -> vantagem (Direito diferente de faculdade. A diferena tnue, mas possvel, e devemos faz-la. O direito algo correspondente a um dever. A faculdade a possibilidade de eu fazer ou no alguma coisa, no havendo correspondncia na atitude de outra pessoa. A faculdade se esgota em mim mesmo. A parte renuncia, ela tem a faculdade de renunciar, tem a faculdade de testar). 3) DEVERES - Aspecto passivo. Direitos e deveres so correlatos. A parte tem o dever de lealdade - Arts. 16 e 19 do CPC, reembolso das custas e honorrios por ela pagos. O verbo de dever eu devo. 4) NUS - Est para o dever assim como a faculdade est para o direito. O dever me impe agir desta ou daquela maneira, o nus me impe agir dessa ou daquela maneira em meu prprio benefcio. O verbo no campo do nus eu preciso fazer isto. Ex.: Se eu quiser observar a paisagem do Po de Acar eu preciso pegar o trem, pagar a passagem. No processo h nus. O mais conhecido o nus da prova. Se eu descumpro, eu privo a mim mesmo de ter uma vantagem. O Juiz tem poderes, no tem nus.

PRINCPIOS GERAIS QUE INSPIRAM O PROCESSO E O PROCEDIMENTO

24 No se encontram em regra na lei, e por isso mesmo so princpios. Ns inferimos no exame sintomtico do texto. Esses princpios expressam valores polticos (idias), o atendimento tcnico (visam o melhor funcionamento) e se espelham na lei. s vezes esses princpios se apresentam em dupla, contrapostos, porque a sociedade no unvoca. Ela presta reverncia simultnea a dois valores que puxam para um lado e para o outro. A ordem jurdica o contrapeso. De um lado a justia e do outro a segurana. No processo se atendermos s ao valor justia, este se choca coma a segurana. A situao jurdica no pode ficar incerta. A lei procura conciliar esses dois valores (justia e segurana). H uma polaridade de valores. Os princpios que regem os processos variam conforme o tempo. A priori, no se pode afirmar que o princpio tal. No processo civil, por exemplo, um princpio que tem sido mencionado como merecedor de acatamento o da ORALIDADE. O princpio oposto que o da ESCRITURAO, que importante para o processo no se evaporar. O processo deve ser tanto quanto possvel oral. Deve haver uma oportunidade para que as partes possam fazer valer sua oportunidade oralmente, na medida que importante para o Juiz formar sua convico (olhando o ru, ele, o Juiz, pode verificar se a pessoa fica plida ou vermelha com as perguntas). Esse princpio se desdobra em diversos aspectos. Para que uma causa seja bem julgada, quando se usa a prova testemunhal, o Juiz deve entrar em contato direto. Outro princpio que entre o momento de ouvir e julgar no se escoe muito tempo - CONCENTRAO PROCESSUAL. Deve haver identidade fsica, e ainda o princpio DISPOSITIVO, que parte da idia que o rgo de jurisdio deve em certa medida atuar na proporo que as partes o provoquem - Art. 262 CPC (se a parte pedir menos, mesmo que ela tenha direito a mais, o Juiz no pode conceder - arts. 128 e 460, CPC). O Juiz no pode julgar nem ultra petitum, nem extra petitum. Outro princpio o INQUISITIVO, expressa a idia que o Juiz no mero espectador, passivo, do duelo das partes. Ele tem posio atuante no processo. O Juiz no est adstrito prova, pode determinar outras, em matria pericial por exemplo. Ele pode espontaneamente (ex officio) pedir que se determine as causas da doena por um mdico, por exemplo. Outro princpio o do CONTRADITRIO ou da IGUALDADE DE TRATAMENTO DAS PARTES. o reflexo no campo processual da isonomia constitucional (art. 5 CF). As partes devem ter chances iguais, ou equivalentes. Ex.: se uma das partes junta um documento, o Juiz no pode decidir sobre aquele documento sem permitir que a outra parte tambm o faa. Art. 397 CPC e art. 125, I, expressam esse princpio.

25 Princpio da ECONOMIA PROCESSUAL - Toda a mquina deve ser posta para funcionar com o mximo de produo e com o mnimo de trabalho ou esforo. No se pode exigir do rgo judicial um modo de agir mais complicado, se possvel mais facilmente (art. 130 CPC). O processo deve ser conduzido da maneira mais simples possvel. No mundo do processual, tudo que no necessrio proibido. O princpio da PRECLUSO: nosso processo tem estrutura escalonada, hierrquica. Esse princpio indica que uma vez ultrapassada a fase prpria para uma determinada atividade, esta no pode mais ser realizada. H um momento para requerer. A parte deve usar de todos os argumentos que lhe so dados, de uma vez, de forma oportuna (contestao - rebate). Se o autor se esqueceu de fazer determinada impugnao no pode mais fazer. Isso leva a uma coisa curiosa: deve-se usar de todas as munies, mesmo de uma linha de argumentao que se choque com a outra, ou seja, contraditria. Por exemplo: o autor diz que o ru deve. O ru diz que nada deve, mas se devia j pagou, e se devia e no pagou o autor perdoou a dvida. O PRINCPIO DA EVENTUALIDADE (defesa) COROLRIO DO PRINCPIO DA PRECLUSO.

FORMAO, SUSPENSO E EXTINO DO PROCESSO

Sabemos que o processo constitui uma relao jurdica dinmica, no sentido de que no se esgota num s momento. uma relao jurdica que se prolonga no tempo e que est sujeita, portanto, alm da sua formao, a eventualmente suspender-se e sofrer uma paralisao temporria, e necessariamente a extinguir-se. Vamos tratar aqui hoje de saber como nasce, como termina e em virtude de que eventualmente deve extinguir-se a relao processual. O Cdigo trata da formao, da suspenso e da extino do processo de conhecimento no livro destinado ao processo de conhecimento, no Ttulo VI do Livro I - Da Formao, da Suspenso e da Extino do Processo. De modo que antes, no Livro II destinado ao processo de execuo tambm no Ttulo VI - os senhores vo encontrar l - Da Suspenso e da Extino do Processo de Execuo. No vamos estudar hoje aqui esses tpicos referentes ao processo de execuo, porque envolveria esse estudo o exame de noes que os srs. s vo adquirir mais tarde quando estudarem o processo de execuo. Veremos ento como essa matria se projeta l. Vamos nos restringir aqui, portanto, ao estudo da formao, da suspenso e da extino do processo de conhecimento. Em primeiro lugar, a FORMAO DO PROCESSO. Como que nasce o processo de conhecimento, como que ele se forma. A formao no

26 se opera em uma etapa s. O processo se forma em duas etapas, em duas fases que se sucedem. Sabemos que o processo envolve necessariamente autor, Juiz e ru. O processo s completa a sua formao quando esses trs protagonistas j se acham atuando na relao processual, quando j se acham presentes na relao processual. A primeira etapa da formao do processo de conhecimento a PROPOSITURA DA AO. No primeiro momento o autor se dirige ao Juiz pleiteando a tutela jurisdicional atravs de uma petio, atravs da petio inicial. O art. 263 trata exatamente de fixar esse momento, a propositura da ao, que a 1 etapa da formao do processo de conhecimento. O problema aqui consiste em saber quando , em que momento, se considera proposta a ao. Vamos ver mais adiante a relevncia da determinao desse momento. A essa indagao responde a primeira parte desse dispositivo (art. 263) com duas solues, conforme a hiptese. Os srs. podem conceber que haja no Foro onde se vai ajuizar a ao, apenas um Juiz e apenas um Escrivo; ou podem conceber que haja mais de um Juiz que seja em tese competente para apreciar aquela causa, que tenha em tese atribuio para processar e julgar aquela causa. Ou que, havendo um s Juiz, haja mais de um Escrivo. Quer haja mais de um Juiz, quer haja mais de um Escrivo, ser evidentemente necessrio que se proceda a uma distribuio prvia entre eles, a fim de que se saiba qual o rgo que efetivamente, dentre aqueles que existem no lugar, que ir processar o julgamento da causa. Conforme esses dois casos, o Cdigo estabelece o momento em que se considera proposta a ao. Se for necessria a distribuio, a distribuio que assinala a propositura da ao. Considera-se proposta a ao quando a distribuio for necessria, no momento em que ela ocorra, no momento em que se verifique a distribuio. Se a distribuio no necessria, a ao se considera proposta no momento em que o Juiz despachar a petio inicial. Esse conceito muito importante; importante saber determinar em que momento a ao se considera proposta. Ex.: o Cdigo Civil estabelece que a Ao de Contestao de Paternidade que tem o marido em relao a filhos nascidos de sua mulher, s pode ser proposta pelo marido. Apenas ele tem a possibilidade de contestar, na constncia do casamento, a paternidade dos filhos nascidos de sua mulher. Mas encontramos no C.Civil tambm uma regra que estabelece que, uma vez proposta pelo marido a ao, se ele vier a falecer, os herdeiros dele podero continuar conduzindo o processo. Propor s ele pode, mas uma vez que ele tenha proposto os herdeiros podero continuar. De tal maneira que, se o autor, no exemplo o marido, vier a falecer depois da propositura da ao, possvel que os sucessores dele dem continuidade ao processo; mas se ele falece anteriormente

27 propositura da ao, esse resultado no ser alcanado. Dessa maneira, interessa a saber em que momento a ao se considera proposta. Outro exemplo: o art. 87 do CPC (os srs. estudaro mais tarde a competncia e tero oportunidade de aprofundar as noes necessrias compreenso desse dispositivo - ele entra aqui apenas com exemplo), diz o seguinte: "Determina-se a competncia no momento em que a ao proposta..." Suponhamos ento o seguinte: eu tenho que propor uma ao contra um meu devedor e existe uma regra do CPC que diz que esse tipo de ao que eu tenho que mover contra o meu devedor deve ser ajuizada no local onde ele tem domiclio. Eu devo propor a ao no local onde ele tem domiclio. Eu proponho a ao. No momento determinado de acordo com aqueles critrios que ns vimos, no momento em que se verifica o propositura da ao, suponhamos que ele tenha domiclio aqui no Rio de Janeiro, de maneira que eu instauro o processo aqui no Foro da Cidade do Rio de Janeiro. Mas posteriormente, ele vem a mudar. Evidentemente o processo no poderia seguir as alteraes de domiclio do devedor, de modo que o Direito se v compelido a fixar um momento no qual se deva aderir queles critrios necessrios para determinar a competncia do Foro, o lugar onde se deve propor a ao. O momento esse estabelecido no art. 87 do CPC. Ento a esto dois exemplos destinados a ilustrar a relevncia de determinar o momento em que se considera a ao proposta. A propositura da ao constitui, como disse, a primeira etapa da formao do processo. Ela j estabelece entre o autor que pleiteia a tutela jurisdicional e o Juiz uma relao jurdica. Evidentemente, o Juiz a quem se entrega uma petio inicial no pode engavet-la, tem o dever de pronunciar-se sobre ela. De tal maneira que j esse dever de um lado, da parte do rgo jurisdicional, e o correspondente direito que tem o autor de ver apreciada num sentido ou noutro a sua petio, j constituem uma relao jurdica, j configuram o incio da relao jurdica processual. Mas, evidentemente, enquanto esto no processo apenas autor e rgo judicial, est faltando uma figura importante do processo, que o ru. Dessa maneira, a formao do processo, embora seja iniciada com a propositura da ao, s vai completarse a partir do momento em que se convocar o ru ao processo, atravs de um ato que se denomina de CITAO. Portanto, s a citao que vai completar, que vai consumar a formao do processo. O processo se forma judicialmente, portanto, atravs de duas fases, a primeira delas a propositura da ao que estabelece um vnculo entre autor e Juiz, e a segunda atravs da qual se completa, se integra o processo, que a convocao do ru, o chamamento, a citao do ru.

28 Formado o processo, qual o objetivo que se tem em vista alcanar nele? Qual o alvo a que tende o processo de conhecimento? A emisso de uma SENTENA, que aprecie o pedido formulado pelo autor, julgando-o procedente ou improcedente. Esse o destino normal do processo de conhecimento. Vrias atividades possivelmente sero praticadas entre esses dois marcos - a formao e a prolao da sentena. Ser praticada atividade probatria, as partes tero a oportunidade de determinar atravs dos meios adequados a veracidade daquelas afirmaes que elas fazem no processo. O Juiz vai ter que verificar o valor daquelas provas, convencendo-se que determinados fatos esto provados e outros no esto. Vai ter que verificar qual o Direito aplicado, o Direito subjetivo, quais as normas jurdicas abstratas, genricas, aplicadas quela situao que ficou comprovada nos Autos. E vai finalmente prolatar uma sentena a respeito do pedido formulado pelo autor. Vai acolher o pedido ou vai rejeit-lo, vai julg-lo procedente ou improcedente, vai proferir, em suma, uma sentena. Ns deveramos dizer que normalmente esse o modo pelo qual se extingue o processo. Normalmente, se tudo funcionar bem, se tudo correr bem, o ltimo ato praticado no processo ser uma deciso que acolha ou rejeite o pedido formulado pelo autor. As coisas porm no so sempre to simples assim. No Direito Brasileiro, assim como em quase todos os ordenamentos jurdicos, uma vez proferida em 1 grau, em 1 instncia, uma deciso a respeito do pedido do autor, uma sentena de mrito, ser possvel que aquele que ficou vencido manifeste para um rgo normalmente hierarquicamente superior, o seu inconformismo. Ser possvel que se impugne a sentena, que a sentena seja impugnada atravs do meio que se denomina de Recursos. Diante da possibilidade da interposio de Recursos, ser possvel que, proferida em 1 grau, em 1 instncia, um sentena de mrito, o processo a no termine. Porque o recurso vai provocar um prolongamento daquele processo. E poder ser admitido um, podero ser admitidos dois ou mais recursos, conforme o caso. Vai chegar o momento, porm, em que no se admitir mais nenhum recurso; ou porque no cabe mesmo mais nenhum, ou porque normalmente aquele que tinha a possibilidade de recorrer deixar esgotar-se em branco o prazo de que dispunha para recorrer. Nesse momento, a deciso se torna irrecorrvel. E ns, tecnicamente, dizemos que ela transitou em julgado. Trnsito em julgado isso - a irrecorribilidade da sentena. o fenmeno que consiste em uma deciso no comportar mais recursos. Com preciso, quando que ns podemos entender que se extingue normalmente o processo de conhecimento? Quando transita em julgado uma deciso de mrito. Quando se torna irrecorrvel uma deciso que tenha julgado procedente ou improcedente o pedido formulado pelo autor. Esse o modo normal de se extinguir o processo de conhecimento: trnsito em julgado da deciso de mrito.

29 Decises de mrito so decises que versam sobre o pedido. Ento, normalmente, o processo de conhecimento de extingue dessa forma. O Cdigo prev, porm, determinados fatos que podem impedir que se atinja o processo esse resultado. Determinados fatos que vo acarretar a extino do processo sem que surja para o rgo judicial a oportunidade de pronunciar-se a respeito do pedido do autor (s o autor que formula tecnicamente o pedido). Determinados acontecimentos podem provocar a extino do processo sem julgamento do mrito, sem que surja a oportunidade do rgo judicial apreciar o pedido e rejeit-lo ou acolh-lo. Poderamos chamar a esses fatos de modos anormais de extino do proc. de conhecimento. Normalmente, levando em conta a finalidade do processo, este s vai extinguir-se quando transitar em julgado uma deciso de mrito. Excepcionalmente vai o processo extinguir-se sem que surja uma deciso desse tipo. justamente esse critrio, a referncia ao mrito, que utilizado pelo legislador para disciplinar essa matria - a extino do processo. O art. 267 do CPC relaciona as causas que conduzem extino do processo sem julgamento do mrito. O art. 269, as causas que provocam a extino do processo com julgamento do mrito.

Extino do Processo SEM JULGAMENTO DO MRITO Quando que se extingue o processo sem julgamento do mrito? O primeiro inciso do art. 267 refere-se hiptese de o Juiz indeferir a petio inicial. J no primeiro contato que o Juiz tem com a inicial, a lei confere a ele o poder de trancar praticamente no nascedouro o processo. Por determinados motivos que vamos estudar mais tarde, permite-se isso. J no primeiro contato indeferir a petio inicial, praticamente evitando a formao do processo. Normalmente, as causas que autorizam o Juiz a indeferir a petio inicial no dizem respeito ao pedido do autor. Normalmente, no est o Juiz autorizado a indeferir a inicial porque desde logo reconhea que o autor tem ou no tem razo. So questes de outro tipo que se colocam neste primeiro momento. Questes que no dizem respeito ao mrito do processo, que no dizem respeito ao pedido. Por exemplo: as condies da ao - a falta de legitimidade ativa ou passiva, uma das causas que autorizam o Juiz a indeferir a inicial. Ento, normalmente o indeferimento da inicial se baseia em questes diversas do mrito (art. 267). Essa regra a rigor tem uma exceo. Existe um caso, parece que apenas um caso, em que o Juiz pode indeferir por razes de mrito - prescrio e decadncia. Mas veremos isso mais tarde. O Cdigo se baseou em que normalmente o indeferimento da inicial no envolve uma

30 apreciao do mrito, no envolve um exame do pedido, e por isso colocou a no art. 267. Inciso II, art. 267 - Extingue-se o processo sem julgamento do mrito quando ficar parado por mais de um ano por negligncia das partes. As partes se desinteressam do andamento do processo, durante mais de um ano no se praticam atos processuais. O Cdigo no quer que essa situao perdure indefinidamente, e permite a, portanto, que se d trmino ao processo quando isso acontece. Quer por uma falta do ru, quer por uma falta do autor, quer dependa do ru o ato a que est condicionado o andamento do processo, quer dependa do autor esse ato, ficando o processo parado por mais de uma ano sem que se verifique a prtica de atos processuais, vai ser possvel extinguir o processo sem que o Juiz aprecie o pedido. O inciso III do art. 267 trata de fato semelhante referente porm exclusivamente ao autor. Extingue-se o processo sem julgamento do mrito quando, por no promover os atos e diligncias que lhe competir, o autor abandonar a causa por mais de 30 dias. Aqui tambm a inrcia do autor e o prazo ser mais curto por razes bvias. Se foi o autor quem pleiteou a tutela jurisdicional, deve se esperar que ele demonstre o maior interesse em que o processo atinja to rapidamente quanto possvel o seu desfecho. De maneira que o autor que deveria ser o maior interessado em dar prosseguimento ao processo. Omitindo um ato do qual est dependendo esse prosseguimento, e se essa omisso perdurar por 30 dias, o Cdigo autoriza a que se d fim ao processo sem julgamento do mrito. Sobre esses dois casos, a paralisao do processo durante mais de um ano, e o abandono da causa pelo autor, estabelece o Cdigo no 1 do art. 267 o seguinte: "O Juiz ordenar no casos dos ns II e III, o arquivamento dos autos, declarando a extino do processo, se a parte intimada pessoalmente no suprir a falta em 48 horas." Se o Juiz verifica que ou o processo est parado h mais de uma ano ou que o autor est omitindo ato de que depende o prosseguimento, o Juiz vai determinar a intimao pessoal, ou s do autor, ou de ambas as partes, para que em 48 horas promovam o ato que est faltando. Se promoverem, no vai encerrar-se o processo; se em 48 horas, porm, perdurar a omisso, a ento vai extinguir-se o processo sem julgamento do mrito. A intimao pessoal, no o advogado do autor nem o advogado do ru, o autor e o ru, diretamente, no por intermdio do advogado. OBS.: Todo ato que o Juiz pode fazer de ofcio, quer dizer, que ele pode fazer independentemente de provocao das partes, as partes podem solicitar a ele que faa. No seria lgico que ns impedssemos as partes de pleitear uma providncia que o Juiz, de ofcio, pudesse conceder. O problema o oposto - saber se sem provocao do ru, no caso de abandono pelo autor, o Juiz poderia tomar essa providncia, determinar a intimao do autor para que em 48 horas

31 praticasse o ato e se ele no praticar nesse prazo, encerrar o processo. No necessariamente em benefcio do ru, o ru pode ter interesse em que o mrito seja julgado, ele pode estar confiante nas suas razes. O caso do inciso II refere-se negligncia de ambas as partes, quer dizer ambos revelam desinteresse pelo processo. H quem entenda que esse n II inaplicvel porque ou a omisso do autor e nesse caso em 30 dias estaria caracterizado o abandono da causa, ou do ru e em regra a inatividade do ru irrelevante para o prosseguimento do processo. Eu ainda tenho a esperana, para salvar o n II, de achar um caso em que a omisso do ru seja relevante. Mas reconheo que no fcil encontrar uma hiptese de aplicao do n II. Primeiramente, o processo s pode estar parado ou por omisso do Juiz, do autor, ou do ru. Do Juiz, evidentemente, a soluo no estaria em extinguir o processo. Do autor, em 30 dias j teria ficado caracterizado. E realmente a regra geral que a inatividade do ru irrelevante para o desfecho do processo. Ento: 30 dias deixando de praticar o autor um ato que lhe compete, caracteriza-se o abandono da causa e com aquela providncia estabelecida no 1, o Juiz vai poder extinguir o processo sem julgar o mrito. O outro caso o do processo ficar paralisado por mais de uma ano por negligncia das partes, autor e ru. essa a diferena entre ambos. No n II a negligncia seria de ambas as partes, o que est l, de uma ou de outra ou de ambas. No n III o prazo menor porque supe-se que o autor tenha maior interesse em alcanar o desfecho do processo e a opo dele, autor. Inciso IV - Extingue-se o processo sem julgamento do mrito "quando se verificar a ausncia de pressupostos de constituio e de desenvolvimento vlido e regular do processo." Trata-se dos pressupostos processuais cuja noo os srs. j tm. Elementos e requisitos de validade do processo. Pode acontecer que no decorrer do processo se manifeste uma nulidade que seja insuprvel, que no comporte remdios, ou que no seja suprida oportunamente, isto , no prazo que o Juiz determinar para o suprimento dela. Num caso ou noutro, em funo da ausncia de uma pressuposto processual, vai o processo extinguir-se. Por exemplo: No art. 13 do CPC, trata-se da incapacidade, de como suprir a incapacidade processual das partes. "Verificando a incapacidade processual ou a irregularidade de representao das partes, o Juiz suspendendo o processo, marcar prazo razovel para que seja sanado o defeito." No sendo cumprido o despacho dentro do prazo, se a providncia couber ao autor, o Juiz decretar a nulidade do processo. E acrescento eu, vai extingui-lo. Inciso V - Extingue-se o processo sem julgamento do mrito "quando o Juiz acolher a alegao de perempo, litispendncia ou coisa julgada."

32 O conceito de PEREMPO est no Cdigo. fornecido pelo pargrafo nico do art. 268: "Se o autor der causa por trs vezes extino do processo pelo fundamento previsto no inciso III (que o referente ao abandono da causa pelo autor omitindo durante 30 dias ato que lhe competia praticar) do artigo anterior, no poder intentar nova ao contra o ru pelo mesmo objeto, ficando-lhe ressalvada entretanto a possibilidade de alegar em defesa os seus direitos." Ento isto: o autor instaura o processo. No desenrolar dele, deixa de praticar ato que lhe cabia por 30 dias e o processo extinto sem julgamento do mrito. Pela segunda vez instaura o processo pela mesma ao, pela segunda vez faz a mesma coisa, deixa de praticar um ato que lhe cabia e por causa disso em funo do inciso III do art. 267, o juiz extingue o processo sem julgamento do mrito. Instaura um terceiro, e se verifica exatamente a mesma coisa. A partir desse ponto o Direito d um basta. Esse cidado no poder mais instaurar processo exercendo aquela mesma ao. O Direito no permite que pela quarta vez ele instaure um processo quando das trs vezes anteriores ele abandonou o processo por mais de 30 dias. Isto PEREMPO. Consiste nisso. Os pressupostos dela so, portanto, durante trs vezes haver ocorrido a extino do processo sem julgamento do mrito em funo de o autor haver deixado de praticar por mais de 30 dias ato que que lhe cabia. Agora vejam: a perempo um fenmeno puramente processual. Ela no extingue, se que o autor tinha aquele direito de que estava se afirmando titular, se que aquele direito realmente existia, a perempo no vai extinguir aquele direito. Do ponto de vista do direito material ele permanecer titular daquele direito. Se ele estava cobrando um crdito, por exemplo, ocorrida a perempo, ele no vai poder promover a ao de cobrana, ou se promover, o processo se extinguir sem julgamento do mrito, por causa da perempo. Mas isso no significa que, em virtude da perempo, aquele crdito dele seja extinto. Ele permanecer de posse deste direito material na mesma situao em que se encontrava, apesar da perempo. E a prova disso est no final desse pargrafo nico do art. 268: "Ficando ressalvada entretanto a possibilidade de alegar em defesa o seu direito." Imaginem o seguinte: Eu proponho uma ao condenatria a fim de que determinado indivduo seja compelido a me pagar uma importncia. Verifica-se a perempo. Eu permaneo titular do meu crdito. S no poderei mais pretender num quarto processo que aquele pedido seja apreciado. Agora suponham que esse indivduo de quem eu estava cobrando, seja por sua vez credor meu e que eu em consequncia seja tambm devedor dele. Eu credor e devedor, ele credor e devedor. J sabem que crditos que se contrapem, atendidos determinados requisitos, at o ponto em que concorrerem, eles se compensam, eles se extinguem mutuamente. Pois bem, suponhamos agora que, verificada a perempo, esse indivduo proponha contra mim uma ao a fim de que eu lhe pague uma certa importncia. Eu lhes pergunto: em virtude da perempo,

33 estarei eu impedido de alegar que tenho um crdito contra ele? No, porque a perempo se restringe apenas a isso, a impedir que haja um julgamento a respeito desse pedido. Se restringe ao plano processual sem afetar o plano do direito material, sem afetar o direito subjetivo de que eu eventualmente seja titular. Inciso V: Os dois fenmenos previstos no inciso, que do ensejo extino do processo sem julgamento do mrito so a litispendncia e a coisa julgada. Ns s devemos dar aqui desses dois institutos uma noo extremamente ligeira. Os srs. vo estud-los mais tarde. Mas muito simples: o Estado tem o dever de prestar jurisdio, mas no tem o dever de prestar jurisdio mais de uma vez. De tal maneira que, se pendente um processo no qual se exerceu uma ao, esta mesma ao venha a ser novamente proposta e venha a dar ensejo formao de um outro processo, este segundo processo vai se extinguir necessariamente sem que surja para o Juiz a possibilidade de apreciar o pedido. Isso a LITISPENDNCIA. A mesma ao no pode ser exercida mais de uma vez quer concomitantemente quer sucessivamente. A essa proibio correspondem essas duas figuras: se instaurado o processo, se verifica que anteriormente a ele aquela ao j havia sido proposta, que h um processo pendente a respeito daquela matria, extingue-se esse segundo processo sem julgamento do mrito. Ou, se instaurado um processo, se verifica que aquele pedido que o autor est formulando j foi julgado atravs de uma deciso transitada em julgado, vai extinguir-se o processo em funo da COISA JULGADA, que se formou em razo do resultado daquele primeiro processo. Se a matria, portanto, j foi julgada, ou se encontra pendente de julgamento, o segundo processo vai se extinguir. O inciso VI estabelece que se extingue o processo sem julgamento do mrito quando no concorrer qualquer das condies da ao, como: a possibilidade jurdica, a legitimidade das partes e o interesse processual. O inciso VII diz que extingue-se o processo sem julgamento do mrito, pelo COMPROMISSO ARBITRAL - um ato que duas ou mais pessoas celebram com a finalidade de submeter uma disputa, um litgio, um conflito de interesses que haja entre elas, a um terceiro que se denomina de rbitro. um particular a quem se submete a soluo de um litgio, por acordo entre as partes. um instituto regulado no Cdigo Civil e no Processo Civil tambm. Se, instaurado o processo, se verifica que anteriormente a ele, ou at no curso dele, as partes haviam estipulado que aquele litgio de que se est tratando ali, deveria ser resolvido por um terceiro, o processo vai extinguir-se sem apreciao do pedido.

O inciso VIII trata de uma hiptese muito importante. Extinguese o processo sem julgamento do mrito quando o autor desistir da ao.

34 Desistncia da ao ou desistncia do processo um ato do autor atravs do qual ele renuncia a obter uma deciso sobre o pedido que formulou. Ele abre mo, ele desiste da obteno da providncia que pleiteou. Essa a DESISTNCIA DA AO, que em absoluto se confunde com uma figura que tambm parte do autor mas que consiste em ele abrir mo no de obter aquela providncia que pleiteou, mas do prprio direito de que se afirmou titular. Uma coisa o autor desistir de obter naquele processo uma deciso de mrito, e outra coisa o autor se despojar daquele direito de que ele se supunha titular. Ele renuncia ao direito que afirmava ter. So dois institutos diferentes: a desistncia da ao e a renncia ao direito material afirmado pelo autor, ou a renncia pretenso manifestada pelo autor. No primeiro caso, na desistncia da ao, nada impedir que o autor instaure mais tarde um outro processo pleiteando a providncia de que ele desistiu no primeiro processo. No caso da renncia ao direito, evidentemente isso no ser possvel. Se ele abriu mo do direito, se renunciou quele direito que supunha ter, ele no vai poder mais tarde pretender que esse direito seja observado. Na desistncia da ao no h uma composio daquele conflito de interesses, a lide permanece em aberto, ao passo que na renncia no, a lide solucionada atravs de um ato do autor. Poderia parecer primeira vista que apenas o autor teria condies de verificar se lhe seria til ou no desistir da ao. Em outras palavras, deveria parecer que ao ru s interessasse a desistncia da ao, que fosse sempre em todos os casos proveitoso para o ru a desistncia da ao. Isso no verdade. Ns podemos perfeitamente imaginar que o ru tenha todo o interesse em que o pedido seja julgado. Inclusive porque ele pode estar confiante das provas que ele tem, do direito de que ele por sua vez se tenha afirmado titular. Ento, ele pode preferir que aquele processo conduza logo ao julgamento do mrito que ele considera ser favorvel a ele, ao invs de ver o autor desistir daquele processo e ele se sujeitar a ser mais tarde novamente incomodado pelo autor com processo semelhante quele. exatamente por isso que, a partir de um determinado momento no processo, a desistncia da ao s eficaz, s produz essa conseqncia de extinguir o processo sem julgamento do mrito, com o consentimento do ru. 4, art. 267 - "Depois de decorrido o prazo para resposta, o autor no poder sem o consentimento do ru desistir da ao." At o momento da resposta, o autor pode unilateralmente desistir da ao, abrir mo de obter naquele processo uma deciso de mrito. A partir da, decorrido o prazo para a resposta, depende da anuncia do ru. Inciso IX - Extingue-se o processo sem julgamento do mrito quando a ao for considerada intransmissvel por disposio legal. H determinados direito subjetivos que s existem enquanto existem os respectivos

35 titulares. Por ex.: o direito de separar-se. Falecendo um dos cnjuges, no se transmite a ningum o direito de separar-se. At porque no haveria separao mais vigorosa e duradoura do que aquela provocada pelo falecimento. Ento, num caso desses, sendo o exerccio do processo um direito com essas caractersticas e vindo a falecer no processo o titular desse direito, no se transmitindo para ningum aquele direito, o processo vai necessariamente ter que extinguir-se sem que ocorra apreciao do pedido. O exemplo seria a separao judicial. Se no curso do processo de separao judicial um dos cnjuges falece, o processo se extingue. Em primeiro lugar porque intransmissvel no a ao como diz o Cdigo, mas aquele direito de que se afirma titular o autor. Em segundo lugar, porque faleceu o titular daquele suposto direito. O processo extingue-se, portanto, sem julgamento