Produção de peróxido de hidrogênio e atividade de enzimas...

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1 Artigo original/Original Article Produção de peróxido de hidrogênio e atividade de enzimas antioxidantes de macrófagos peritoneais em resposta ao BCG (Bacilo de Calmette-guérin) em modelo murínico de desnutrição proteico-energética Hydrogen peroxide production and activity of antioxidant enzymes of peritoneal macrophages in response to BCG (Bacillus Calmette-guérin) in a murine model of protein-energy malnutrition OSMARINA DA PAIXÃO E SILVA 1 ; RICARDO AMBRÓSIO FOCK 2 ; MARCELO MACEDO ROGERO 3 ; PRIMAVERA BORELLI 2 1 Universidade Federal do Pará, Instituto de Ciências da Saúde, Faculdade de Farmácia. 2 Universidade de São Paulo, Faculdade de Ciências Farmacêuticas. 3 Universidade de São Paulo, Faculdade de Saúde Pública. Endereço para correspondência: Primavera Borelli, Laboratório de Hematologia Experimental, Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas, Faculdade de Ciências Farmacêuticas, Universidade de São Paulo, Avenida Prof. Lineu Prestes, 580. São Paulo, SP CEP 05508-900 Brasil. E-mail: [email protected] ou [email protected] PAIXÃO E SILVA, O.; FOCK, R. A.; ROGERO, M. M.; BORELLI, P. Hydrogen peroxide production and activity of antioxidant enzymes of peritoneal macrophages in response to BCG (Bacillus Calmette-guérin) in a murine model of protein-energy malnutrition. Nutrire: rev. Soc. Bras. Alim. Nutr. = J. Brazilian Soc. Food Nutr., São Paulo, SP, v. 36, n. 3, p. 1-14, dez. 2011. Protein-energy malnutrition (PEM) modifies resistance to infection, impairing a number of physiological processes, changing specific and nonspecific immune responses. Macrophages, which are directly involved in several aspects of immunity, may have their functions altered in the malnourishment condition, possibly playing a significant role in the immune deficiency observed in malnourished individuals. Two-month-old male Swiss mice were induced to PEM with a low-protein diet containing 4% protein as compared to 20% protein in the control diet. When the experimental group had lost about 20% of their original body weight the animals from both groups received intraperitoneal injections of 10 7 units of BCG (Bacillus Calmette-guérin) and after 7 days they were used in the experiments. We evaluated the complete blood count, peritoneal cellularity and hydrogen peroxide production, besides the activities of glutathione peroxidase, superoxide dismutase and catalase in peritoneal macrophages stimulated with BCG. Malnourished animals presented anemia, leukopenia and severe reduction of peritoneal cellularity. The production of hydrogen peroxide and the activity of glutathione peroxidase, superoxide dismutase and catalase were found to be significantly lower in macrophages from malnourished animals. These findings suggest that malnourished animals present a deficient response to BCG. These findings may be partly responsible for a decrease in the bactericidal and fungicidal activities observed in the malnourished mice. These data lead us to infer that the nutritional status interferes with the activation of macrophages and with the capacity to mount an immune response. Keywords: Protein-Energy Malnutrition. Macrophages. Hydrogen Peroxide. Glutathione Peroxidase. Superoxide Dismutase. Catalase. ABSTRACT

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Artigo original/Original Article

Produção de peróxido de hidrogênio e atividade de enzimas antioxidantes de macrófagos peritoneais em resposta ao BCG (Bacilo de Calmette-guérin) em modelo murínico de desnutrição proteico-energéticaHydrogen peroxide production and activity of antioxidant enzymes of peritoneal macrophages in response to BCG (Bacillus Calmette-guérin) in a murine model of protein-energy malnutrition

OSMARINA DA PAIXÃO E SILVA1; RICARDO AMBRÓSIO FOCK2;

MARCELO MACEDO ROGERO3; PRIMAVERA

BORELLI21Universidade Federal do

Pará, Instituto de Ciências da Saúde, Faculdade

de Farmácia.2Universidade de São Paulo,

Faculdade de Ciências Farmacêuticas.

3Universidade de São Paulo, Faculdade

de Saúde Pública.Endereço para

correspondência:Primavera Borelli,

Laboratório de Hematologia Experimental, Departamento

de Análises Clínicas e Toxicológicas, Faculdade

de Ciências Farmacêuticas, Universidade de São Paulo,

Avenida Prof. Lineu Prestes, 580. São Paulo, SP

CEP 05508-900 Brasil.E-mail: [email protected] ou

[email protected]

PAIXÃO E SILVA, O.; FOCK, R. A.; ROGERO, M. M.; BORELLI, P. Hydrogen peroxide production and activity of antioxidant enzymes of peritoneal macrophages in response to BCG (Bacillus Calmette-guérin) in a murine model of protein-energy malnutrition. Nutrire: rev. Soc. Bras. Alim. Nutr. = J. Brazilian Soc. Food Nutr., São Paulo, SP, v. 36, n. 3, p. 1-14, dez. 2011.

Protein-energy malnutrition (PEM) modifies resistance to infection, impairing a number of physiological processes, changing specifi c and nonspecifi c immune responses. Macrophages, which are directly involved in several aspects of immunity, may have their functions altered in the malnourishment condition, possibly playing a signifi cant role in the immune defi ciency observed in malnourished individuals. Two-month-old male Swiss mice were induced to PEM with a low-protein diet containing 4% protein as compared to 20% protein in the control diet. When the experimental group had lost about 20% of their original body weight the animals from both groups received intraperitoneal injections of 107 units of BCG (Bacillus Calmette-guérin) and after 7 days they were used in the experiments. We evaluated the complete blood count, peritoneal cellularity and hydrogen peroxide production, besides the activities of glutathione peroxidase, superoxide dismutase and catalase in peritoneal macrophages stimulated with BCG. Malnourished animals presented anemia, leukopenia and severe reduction of peritoneal cellularity. The production of hydrogen peroxide and the activity of glutathione peroxidase, superoxide dismutase and catalase were found to be signifi cantly lower in macrophages from malnourished animals. These fi ndings suggest that malnourished animals present a defi cient response to BCG. These fi ndings may be partly responsible for a decrease in the bactericidal and fungicidal activities observed in the malnourished mice. These data lead us to infer that the nutritional status interferes with the activation of macrophages and with the capacity to mount an immune response.

Keywords: Protein-Energy Malnutrition. Macrophages. Hydrogen Peroxide. Glutathione Peroxidase. Superoxide Dismutase. Catalase.

ABSTRACT

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RESUMORESUMEN

La desnutrición proteico-energética modifi ca la resistencia a infecciones, alterando diversos procesos fi siológicos, mudando la capacidad de respuesta inmune, específi ca y no específi ca. Los macrófagos, células implicadas directamente en varios aspectos de la inmunidad, pueden tener sus funciones alteradas en condiciones de desnutrición desempeñando posiblemente un papel signifi cativo en la defi ciencia inmune observada en individuos desnutridos. En este estudio se utilizaron ratos Swiss machos, de 2 meses de edad, en los cuales fue inducida desnutrición proteico-energética por medio de una dieta que contenía 4% de proteína. El grupo control recibió una dieta estándar con 20% de proteína. Cuando el grupo experimental presentó una pérdida de 20% de su peso corporal original, se le administraron 107 unidades de BCG (Bacilo de Calmette-guérin), por vía intraperitoneal, y después de 7 días los animales fueron sacrifi cados para evaluación de diversos índices: hemograma, celularidad peritoneal, la producción de peróxido de hidrógeno y las actividades glutatión peroxidada, superóxido dismutasa, y catalasa en macrófagos peritoneales estimulados con BCG. Los animales subalimentados presentaron anemia, leucopenia y reducción de la celularidad peritoneal. La producción de peróxido de hidrógeno y la actividad de las enzimas glutatión peroxidada, superóxido dismutasa, y catalasa fue más baja en macrófagos de animales desnutridos. Los resultados sugieren que los ratos desnutridos presentan una respuesta defi ciente a BCG lo que explica en parte la disminución de la actividad bactericida y fungicida observada en animales desnutridos. Estos resultados permiten deducir que el estado nutricional interfi ere en la actividad de los macrófagos y en su capacidad de respuesta inmunológica.

Palabras clave: Desnutrición proteico-calórica. Macrófagos. Peróxido de hidrógeno. Glutatión peroxidada. Superóxido dismutasa. Catalasa.

A desnutrição proteico-energética (DPE) altera a capacidade de resistência à infecção, alterando diversos processos fisiológicos, mudando a capacidade de respostas imunes específi cas e não específi cas. Os macrófagos são células envolvidas diretamente em diversos aspectos da imunidade, podem ter suas funções alteradas em condições de desnutrição desempenhando, possivelmente, um papel signifi cativo na imunodefi ciência observada nesses indivíduos. Camundongos Swiss, machos, de dois meses de idade, foram induzidos a DPE com uma dieta contendo baixa concentração de proteína (4%) em comparação à dieta controle (20%). Quando o grupo experimental perdeu aproximadamente 20% de seu peso corpóreo original, estes foram considerados aptos aos experimentos. Animais de ambos os grupos receberam injeção intraperitoneal contendo 107 unidades de BCG (Bacilo de Calmette-guérin) e após 7 dias foram sacrificados e utilizados nos experimentos. Avaliamos o hemograma, a celularidade peritoneal assim como a produção de peróxido de hidrogênio e a atividade da glutationa peroxidase, superóxido dismutase e catalase em resposta ao BCG em macrófagos peritoneais. Os animais desnutridos apresentaram anemia, leucopenia e a redução severa da celularidade peritoneal. A produção de peróxido de hidrogênio e a atividade das enzimas glutationa peroxidase, superóxido dismutase e catalase foi signifi cativamente menor nos macrófagos de animais desnutridos. Estes resultados sugerem que os animais desnutridos apresentem uma resposta defi ciente ao BCG, e que, em parte, podem explicar a diminuição nas atividades bactericidas e fungicidas observadas em animais desnutridos. Estes dados permitem deduzir que o estado nutricional interfere na ativação dos macrófagos e na sua capacidade de resposta imune.

Palavras-chave: Desnutrição proteico-calórica. Macrófagos. Peróxido de hidrogênio. Glutationa peroxidase. Superóxido dismutase. Catalase.

PAIXÃO E SILVA, O.; FOCK, R. A.; ROGERO, M. M.; BORELLI, P. Peróxido de hidrogênio e enzimas antioxidantes em desnutrição proteico-energética. Nutrire: rev. Soc. Bras. Alim. Nutr.= J. Brazilian Soc. Food Nutr., São Paulo, SP, v. 36, n. 3, p. 1-14, dez. 2011.

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INTRODUÇÃO

Estudos clínicos e epidemiológicos demonstram a associação entre desnutrição

e infecção. A DPE modifi ca os mecanismos específi cos e inespecífi cos de resistência

do organismo, modifi cando a resposta infl amatória. As relações entre desnutrição e

resposta inflamatória são complexas e ainda não estão totalmente esclarecidas

(CHANDRA, 2002; KEUSCH, 2003; SCRIMSHAW, 2010). Dados da literatura e do nosso

grupo evidenciam que a DPE compromete a migração celular, o espraiamento, a

fagocitose, a atividade bactericida e fungicida, bem como alterações na produção de

interleucina (IL)-1α, IL-6 e fator de necrose tumoral (TNF)-α (BORELLI et al., 1998;

FOCK et al., 2007).

Os macrófagos são classifi cados de acordo com o seu estado de ativação: em

residentes, infl amatórios ou ativados. Os macrófagos residentes representam células

teciduais que não foram expostas a substâncias estranhas, apresentando discreta atividade

funcional como, por exemplo, reduzida taxa de síntese de espécies reativas de oxigênio.

Quando macrófagos residentes são expostos à administração intraperitoneal de BCG,

estas células apresentam taxas elevadas de síntese de citocinas como IL-1 e TNF-α,

de ânion superóxido (O2•–) e peróxido de hidrogênio (H2O2), aumento da atividade

fagocítica, microbicida e tumoricida, atividades estas que caracterizam o estado ativado

dos macrófagos (BELLOSTA; BERNINI, 2005; LI et al., 2009).

Na eliminação de patógenos, por macrófagos, estão envolvidos processos

não oxidativos, que envolvem secreção de proteínas catiônicas com propriedades

antibiótico-like (defensina, catepsina G), lisozima, colagenase, elastase e proteínas

ácidas, e processos oxidativos, como a liberação de espécies reativas de nitrogênio

como óxido nítrico (NO) e de oxigênio como O2•–, H2O2, radical hidroxil (•OH) e

oxigênio singlete (1O2), eventos estes denominados de ‘burst” oxidativo (SCHLESINGER;

HORWITZ, 1991; YAMADA et al., 1987).

Para que esses eventos se iniciem, faz-se necessária à ativação do complexo

enzimático da NADPH oxidase. Este complexo catalisa a redução do oxigênio para

ânion superóxido usando NADPH proveniente da via das pentoses como doador

de elétrons. O O2•– produzido pode dismutar-se espontaneamente ou pela ação da

enzima superóxido dismutase, produzindo H2O2 e oxigênio (BABIOR, 1984). O H2O2

desempenha função fundamental no processo de morte microbiana e, por ser um forte

oxidante é capaz de degradar biomoléculas tanto in vivo como in vitro com potente

ação bacteriostática e bactericida (BALDECK; MARQUIS, 2008). Além disso, H2O2

pode gerar outros produtos de poder microbicida ainda mais potente como o •OH ou

formando hipohaleto oxidante(BABIOR, 1984; HALLIWELL, 1994).

Por outro lado, as células possuem um sistema de defesa antioxidante que

interage e inibe a ação da maioria dos radicais livres gerados. Em indivíduos saudáveis,

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esses radicais livres são controlados pela ação de enzimas antioxidantes (glutationa

peroxidase, superóxido dismutase e catalase) e por antioxidantes não enzimáticos

(ascorbato, tocoferóis e uratos) (SIES, 1993). Se houver um desequilíbrio neste sistema

podem ocorrer danos aos tecidos devido a alterações na integridade e funcionalidade

celular em função do estresse oxidativo (AERTS et al., 1995).

O objetivo deste trabalho foi avaliar a capacidade de produção de peróxido de

hidrogênio e a atividade de enzimas antioxidantes (glutationa peroxidase, superóxido

dismutase e catalase), em macrófagos peritoneais de camundongos inoculados com

BCG e submetidos à DPE.

MATERIAL E MÉTODOS

RAÇÕES

As rações foram preparadas na forma de granulado, sendo utilizada a caseína como

fonte proteica. Ambas as rações eram isocalóricas, diferindo apenas na percentagem de

proteínas. A mistura acrescida à ração foi elaborada, segundo o American Institute of

Nutrition, AIN 93G (REEVES; NIELSEN; FAHEY, 1993) (Tabela 1).

Tabela 1 – Composição percentual das rações

Componentes1

Ração I (Controle) Ração II (Hipoproteica)

(g/kg ração)

Caseína (>85% proteína) 200 40

Sacarose 100 100

Celulose 10 10

Óleo de milho 80 80

Mistura salina2 40 40

Mistura vitamínica2 10 10

Amido 560 720

1Dieta isocalórica fornecendo 1716.3kJ/100g (410.6kcal/100g).2Mistura vitamínica e salínica foram preparadas de acordo com o American Institute of Nutrition (20).

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ANIMAIS

Foram utilizados camundongos Swiss, machos, de 2 a 3 meses de idade, obtidos do

Biotério de Produção e Experimentação do Conjunto das Químicas da Universidade de São

Paulo. Os animais foram alocados em gaioleiros metabólicos, recebendo, ad libitum, ração

comercial e água durante o período de adaptação (21 dias), sendo mantidos sob temperatura

de 22-25°C e ciclo de luz de 12 horas (claro/escuro). Ao fi nal desse período, os animais

foram distribuídos em quatro grupos: controle (C), controle + BCG (C+BCG), desnutrido

(D) e desnutrido + BCG (D+BCG), sendo os grupos C e C+BCG alimentados com ração

contendo 20% de proteína (ração I), enquanto os grupos D e D+BCG foram alimentados

com ração contendo 4% de proteína (ração II) (Tabela 1). O peso corpóreo e o consumo

de ração foram determinados a cada 48 horas. A avaliação nutricional foi realizada pelo

controle do peso corpóreo, consumo de ração e determinação da concentração plasmática

de proteínas totais e de albumina. Este estudo foi aprovado pela Comissão de Ética no

Uso de Animais da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo.

INDUÇÃO DA INFLAMAÇÃO

Quinze dias após o início do protocolo experimental de desnutrição os animais

dos grupos C+BCG e D+BCG foram inoculados, intraperitonealmente (i.p.), com 1mL

de suspensão de BCG contendo 107 unidades viáveis de bacilos. Os animais foram

sacrifi cados 7 dias após a administração de BCG para a coleta de macrófagos peritoneais

ativados. Os animais do grupo D+BCG apresentavam redução de aproximadamente 15%

do peso corpóreo no momento da inoculação do BCG.

DETERMINAÇÃO DO HEMOGRAMA E DAS PROTEÍNAS PLASMÁTICAS

Os animais foram anestesiados com Xilazina e Quetamina na dose de 50mg/Kg

de massa corporal e o sangue total foi obtido por punção cardíaca. Amostras coletadas

em tubos com o anticoagulante EDTA na concentração fi nal de 1mg/mL de sangue

(EDTA, Sigma Chemical Company, St. Louis, MO), foram utilizados para a realização

do hemograma empregando-se as metodologias hematológicas padrão (DACIE; LEWIS,

1995). Os leucócitos e eritrócitos foram contados em câmara de Neubauer e a análise

diferencial realizada em extensões sanguíneas coradas por soluções de May-Grunwald e

Giemsa (Sigma Chemical Co., St. Louis, MO). O plasma foi separado por centrifugação e

a dosagem de proteínas totais e albumina foram determinadas por metodologia padrão

(DOUMAS; WATSON; BIGGS, 1971; GORNALL; BARDAWILL; DAVID, 1949).

OBTENÇÃO DE MACRÓFAGOS PERITONEAIS

Após sete dias do estímulo inicial com BCG, animais de todos os quatro grupos

(C, D, C+BCG e D+BCG) foram anestesiados, exanguinados e a cavidade peritoneal

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lavada com 5mL de meio de cultura McCoy’s 5A (Sigma®), pH 7,4, estéril, aspirando-

se a seguir, o líquido peritoneal, o qual foi acondicionado em tubos plásticos, estéreis

e mantidos em banho de gelo até a realização dos ensaios, no prazo máximo de

30 minutos. A contagem das células presentes no lavado peritoneal foi realizada

em câmara de Neubauer e a viabilidade avaliada com solução de Azul de Trypan (0,1%).

A identifi cação dos tipos celulares foi realizada em lâminas obtidas por citocentrifugação

de alíquotas da suspensão celular, coradas pelas técnicas de May-Grunwald e Giemsa

e esterase inespecífi ca.

PRODUÇÃO DE PERÓXIDO DE HIDROGÊNIO

Para avaliação da produção de peróxido de hidrogênio em macrófagos peritoneais

ativados foi utilizado o método de Pick e Mizel (1981). Em 1mL de solução contendo

NaCl 140mM (Merck Chemical® S.A), KH2PO4 1mM (Merck Chemical®, Alemanha),

Glicose 5mM (Merck Chemical®, Alemanha), 0,56mM vermelho de fenol (Merck

Chemical®, Alemanha), 20UI/mL solução de peroxidase raíz forte tipo VI (Sigma Chemical

Company®, EUA) e de superóxido dismutase 2mg/mL (Sigma Chemical Company®,

EUA) adicionou-se 1x106 macrófagos peritoneais. Paralelamente, foi feita uma curva

padrão (0-7µL) de peróxido de hidrogênio (Honeywell Riedel-de Haën®, Alemanha)

1mM. As amostras foram incubadas em estufa a 37°C, com atmosfera de 5% de CO2 por

1 hora. Após esse período, a reação foi interrompida pela adição em todos os poços de

10µL de NaOH 1M (Merck Chemical®, Alemanha). O total de peróxido de hidrogênio

formado foi quantifi cado espectrofotometricamente em leitor de ELISA (SLT Spectra®,

SLT Instruments, Áustria) em fi ltro com comprimento de onda de 620nm. As amostras

foram realizadas em quadruplicata.

ATIVIDADE DA GLUTATIONA PEROXIDASE

Foi utilizado o método descrito por Wendel (1981), para a avaliação da atividade

da glutationa peroxidase em macrófagos peritoneais ativados. Em 1mL de solução

contendo fosfato de sódio 143mM (Merck Chemical®, Alemanha), EDTA 6,3mM (Merck

Chemical®, Alemanha), NaN3 0,25M (Merck Chemical®, Alemanha), NADPH 0,12mM

(Merck Chemical®, Alemanha), Glutationa redutase (GSH-R) 0,25U/mL (Sigma Chemical

Company®, EUA), Glutationa (GSH) 1mM (Sigma Chemical Company®, EUA), tert-Butil

Hidroperóxido (TBH) 1,2mM (Merck Chemical®, Alemanha) adicionou-se 1x106 de

macrófagos peritoneais previamente lisados por sonicação em um sonicador Heat System

equipado com microponta, por 6 ciclos de 20 segundos. As amostras foram incubadas

a 37°C durante 10 minutos para ativar a Glutationa peroxidase (GSH-Px) com a GSH. A

reação foi iniciada pela adição de TBH 1,2mM e o consumo de NADPH foi monitorado

durante 6 minutos em leitor de ELISA (SLT Spectra®, SLT Instruments, Áustria). As amostras

foram processadas em triplicata. Para os cálculos da atividade enzimática foram utilizados

o valor de 6,22x103 M-1 cm-1 como coefi ciente de extinção molar.

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ATIVIDADE DA SUPERÓXIDO DISMUTASE

Ao avaliar a atividade da superóxido dismutase em macrófagos peritoneais ativados

foi utilizado o método de McCord e Fridovich (1969). Em 1mL de solução contendo fosfato

de sódio 50mM (Merck Chemical®, Alemanha), EDTA 1mM (Merck Chemical®, Alemanha),

xantina sódica 500mM (Sigma Chemical Company®, EUA), citocromo C 1µM (Sigma

Chemical Company®, EUA) adicionou-se 1x106 macrófagos peritoneais previamente

lisados por sonicação em um sonicador Heat System equipado com microponta, por 6

ciclos de 20 segundos. A atividade da enzima superóxido dismutase foi determinada pelo

consumo de citocromo C em leitor de ELISA (SLT Spectra®, SLT Instruments, Áustria).

As amostras foram processadas em triplicata. A atividade enzimática foi calculada,

considerando-se que 1 unidade da enzima é capaz de produzir uma inibição de 50%

da reação.

ATIVIDADE DA CATALASE

Para avaliação da atividade catalase a partir de macrófagos peritoneais ativados, foi

utilizado o método descrito por Volkovová et al. (1996). Em 1mL de solução contendo

tampão Tris-HCl 1 M (Merck Chemical®, Alemanha), EDTA 5mM (Merck Chemical®,

Alemanha), e H2O2 10mM, pH 8,0 adicionou-se 1x106 macrófagos peritoneais previamente

lisados por sonicação em um sonicador Heat System equipado com microponta, por

6 ciclos de 20 segundos. O consumo de H2O2 avaliado espectrofotometricamente em

leitor de ELISA (SLT Spectra®, SLT Instruments, Áustria) a 230nm a 30°C. As amostras

foram processadas em triplicata. Os cálculos foram baseados no coefi ciente de extinção

molar da água oxigenada 0,071 M-1 cm-1.

ANÁLISE ESTATÍSTICA

Os resultados foram submetidos à análise estatística (one-way ANOVA, p ≤ 0,05) e

comparados pelo teste múltiplo de Tukey, utilizando-se o programa estatístico Graphpad

Prism®. Os dados foram expressos como média e desvio padrão.

RESULTADOS

CONSUMO DE RAÇÃO, PESO CORPÓREO E PROTEÍNAS PLASMÁTICAS

Os animais dos grupos D e D+BCG apresentaram signifi cativa redução do consumo

de ração quando comparados com os animais controles (Tabela 2). Os animais do grupo

D apresentaram perda de peso corpóreo, sendo esta perda mais acentuada nos animais

D+BCG. Por outro lado, os animais dos grupos C e C+BCG ganharam peso ao longo

ensaio (Tabela 2).

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Tabela 2 – Consumo de proteína, variação de peso corpóreo, dosagem de proteínas e albumina plasmática, hemograma e contagem de células do exsudato peritoneal de camundongos controles (C) e Desnutridos (D) inoculados ou não com BCG

ParâmetrosC

(n=9)

C + BCG

(n=11)

D

(n=10)

D + BCG

(n=12)

Consumo de ração(g/dia/animal)

3,70 ± 0,30a 3,40 ± 0,31a 2,75 ± 0,20b 2,25 ± 0,20b

Consumo de proteína(g/dia/animal)

0,74 ± 0,11a 0,68 ± 0,13a 0,11± 0,05b 0,09 ± 0,04b

Variação de peso corpóreo (%)

8,57 ± 1,01a 8,28 ± 0,19a -13,4 ± 2,01b -37,5 ± 2,30c

Proteína plasmática(g/dL)

7,08 ± 1,10a 6,91± 1,80a 4,30 ± 0,81b 3,70± 1,01b

Albumina (g/dL) 3,91± 0,22a 3,30 ± 0,41a 2,42 ± 0,41b 2,10 ± 0,22b

Hemoglobina (g/dL) 11,41 ± 0,74a 10,11 ± 1,62a 6,22 ± 0,72b 5,11 ± 0,83b

Eritrócitos(x 106/mm3)

7,11 ±0,71a 6,90± 0,60a 5,43± 0,22b 5,12 ± 0,21b

Leucócitos totais (/mm3)

3245 ± 227a 12980 ± 2230b 1470 ± 65c 2130 ± 120d

Polimorfonucleares(/mm3)

621,1 ± 15,1a 9201,2 ± 1721,1b 186,2 ± 4,7c 301,1 ± 12,0d

Linfócitos (/mm3) 2410 ± 75a 4210 ± 1012b 1370± 40c 1407 ± 65d

Monócitos (/mm3) 91,1 ± 4,4a 580,0 ± 130,1b 10,10± 0,51c 8,11± 0,52c

Células totais peritoneais(x 106/mL)

2,70 ± 0,43a 3,92 ± 0,81b 1,61 ± 0,32c 1,91 ± 0,52a,c

Macrófagos peritoneais(x 106/mL)

2,01± 0,42a 3,31 ± 0,71b 1,22± 0,22c 1,70 ± 0,33a,c

Granulócitos peritoneais (x 106/mL)

0,10± 0,04a 0,40± 0,09b 0,05 ± 0,03a 0,20 ± 0,09a

Mastócitos peritoneais (x 106/mL)

0,10 ± 0,01 0,10 ± 0,02 0,04 ± 0,02 0,06 ± 0,02

Valores da média ± o desvio padrão. Médias com letras sobrescritas diferentes indicam diferença estatisticamente signifi cativa entre os grupos (p≤0,05). n = número de animais avaliados por grupo.

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HEMOGRAMA

Os animais dos grupos D e D+BCG apresentaram anemia com diminuição da

concentração de hemoglobina e do número de eritrócitos. Os animais do grupo D

apresentaram leucopenia com depleção do número de polimorfonucleares, linfócitos

e monócitos quando comparados aos respectivos controles (Tabela 2). Apesar de

os animais do grupo D+BCG apresentar discreto aumento do número de leucócitos

circulantes, esse aumento não foi tão evidente como nos animais do grupo C+BCG que

apresentaram acentuada leucocitose acompanhada de aumento do número de células

polimorfonucleares.

CELULARIDADE DO EXSUDATO PERITONEAL

Observamos signifi cativa redução da celularidade no exsudato peritoneal dos

animais do grupo D em relação aos animais do grupo C e C+BCG (Tabela 2). Animais

do grupo C+BCG apresentaram aumento do número de células no exsudato peritoneal

com aumento do número de células macrofágicas quando comparado com os demais

grupos. A comparação entre o número de células no exsudato peritoneal dos grupos D

e D+BCG não apresentou diferenças signifi cativas.

PRODUÇÃO DE PERÓXIDO DE HIDROGÊNIO

Os macrófagos peritoneais obtidos de animais do grupo C+BCG apresentaram

maior produção de peróxido de hidrogênio quando comparados ao grupo D+BCG. Não

observamos diferenças estatisticamente signifi cativas na produção de H2O2 quando

comparamos os grupos C e D (Tabela 3).

Tabela 3 – Produção de peróxido de hidrogênio e atividade das enzimas antioxidantes de células do exsudato peritoneal de camundongos controles (C) e desnutridos (D) inoculados ou não com BCG

ParâmetrosC

(n=9)C + BCG(n=11)

D(n=10)

D + BCG(n=12)

Produção de peróxido de hidrogênio (nM/1x106 células/mL)

0,32± 0,02a 1,72± 0,04b 0,25 ± 0,05a 0,85 ± 0,05c

Atividade da glutationa peroxidase (U/1x106 células/mL)

2,64 ± 0,07a 2,44 ± 0,08a 2,11 ± 0,09b 1,92 ± 0,07b

Atividade da superóxido dismutase (U/1x106 células/mL)

2,70 ± 0,07a 2,53 ± 0,08a 2,23 ± 0,07b 1,85 ± 0,09c

Atividade da catalase(U/1x106 células/mL)

342,1 ± 9,1a 320,1 ± 8,1a 276,0 ± 9,3b 227,1 ± 7,1c

Valores da média ± o desvio padrão. Médias com letras sobrescritas diferentes indicam diferença estatisticamente signifi cativa entre os grupos (p≤0,05). n = número de animais avaliados por grupo.

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GLUTATIONA PEROXIDASE

A atividade da glutationa peroxidase em macrófagos peritoniais obtidos de animais

do grupo C e C+BCG, apresentou valores maiores quando comparada às dos grupos D

e D+BCG, respectivamente. A atividade da glutationa peroxidase, nos animais do grupo

D+BCG, foi signifi cativamente menor do que as dos grupos C e C+BCG (Tabela 3).

SUPERÓXIDO DISMUTASE

A atividade da superóxido dismutase em macrófagos peritoniais de animais dos

grupos C e C+BCG, apresentou valores maiores quando comparada às dos grupos D e

D+BCG, respectivamente. A comparação entre os grupos D e D+BCG também apresentou

diferenças estatisticamente signifi cativas (p≤0,05) (Tabela 3).

CATALASE

A atividade da catalase em macrófagos peritoniais dos animais do grupo C e

C+BCG apresentou valores maiores quando comparada às dos grupos D e D+BCG,

respectivamente. Estes apresentaram a menor atividade de catalase entre todos os grupos

estudados. Na comparação entre os grupos D e D+BCG também não houve diferenças

signifi cativas (Tabela 3).

DISCUSSÃO

Alterações na dieta e no estado nutricional podem infl uenciar a resposta infl amatória

e diminuir a capacidade de resposta a infecções. Neste estudo, avaliamos a capacidade

de produção de peróxido de hidrogênio e atividade de enzimas relacionadas ao sistema

antioxidante de macrófagos peritoneais de camundongos, inoculados ou não com BCG,

em um modelo de DPE.

A resposta infl amatória está intimamente relacionada com o processo de reparo

que, em geral, tem a fi nalidade de eliminar, diluir ou imobilizar o agente agressor

e, independente da sua duração, defl agra uma série de processos que, tanto quanto

possível, reconstituem o tecido lesado (CHANDRA, 2002; KEUSCH, 2003; SCRIMSHAW,

2010). Os estados carenciais alteram os mecanismos de defesa do indivíduo, sendo a

desnutrição ainda um importante problema em saúde à medida que observamos as

graves consequências da desnutrição sobre o organismo, como alterações metabólicas,

neurológicas e modifi cações do sistema linfo-hemopoético que podem induzir à maior

predisposição a agentes infecciosos (FOCK et al., 2007; FOCK et al., 2010; POWANDA;

BEISEL, 2003).

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Neste trabalho, os animais alimentados com ração hipoproteica consumiram menor

quantidade de ração e, portanto, de proteínas, em relação aos controles. A redução da

ingestão de ração hipoproteica pode ser uma tentativa de atenuar o balanço nitrogenado

negativo instalado no organismo. A anorexia observada, aparentemente paradoxal, pode

ser explicada por modifi cações hipotalâmicas induzidas provavelmente por citocinas

proinfl amatórias como TNF-α e IL-1 (FRAYN, 1986; SCRIMSHAW, 2003) e ainda por

alterações das concentrações plasmáticas de aminoácidos de cadeia ramifi cada, que

podem modifi car a ação de neurotransmissores, comportamento que poderia ser um

processo adaptativo, visando evitar maiores alterações no balanço nitrogenado (YOUNG;

MARCHINI, 1990).

Após a indução do processo infl amatório/infeccioso pela administração de BCG,

a redução do consumo de alimento tornou-se ainda mais evidente, possivelmente

devido à ativação de mecanismos fi siológicos adaptativos, como a redução da taxa

do metabolismo basal, utilização mais efi ciente de energia, redução na renovação de

proteínas celulares (CATCHATOURIAN; ECKERLING; FRIED, 1980). Também observamos

que animais submetidos a um estado de desnutrição apresentam anemia, dados esses

que vêm de encontro com outros dados do grupo, em que demonstram que essa anemia

é decorrente de uma defi ciência na produção de precursores hematopoéticos e não de

menor disponibilidade de ferro (BORELLI et al., 2007).

As mudanças tanto na imunidade celular como humoral são signifi cativamente

moduladas pelo estado nutricional (CHANDRA, 2002). Frente a estímulos

inflamatórios/infecciosos, macrófagos de animais desnutridos não respondem

com a mesma intensidade ou da mesma maneira que macrófagos oriundos dos

animais nutridos, possibilitando ou permitindo o desenvolvimento dos processos

infl amatórios e/ou infecciosos (BORELLI et al., 1998; FOCK et al., 2007; FOCK et

al., 2010; SCRIMSHAW, 2010). A desnutrição modifi ca a resposta do organismo ao

patógeno, podendo ocorrer alterações na produção de anticorpos, na atividade

fagocitária, diminuição da migração e mobilização celular para os focos infl amatórios

(BORELLI; MARIANO; BOROJEVIC, 1995), bem como diminuição da síntese de citocinas

proinfl amatórias (FOCK et al., 2007).

O peróxido de hidrogênio desempenha função fundamental na morte

microbiana por ser um forte oxidante capaz de degradar biomoléculas, in vitro e in

vivo, podendo agir como potente agente bacteriostático (BALDECK; MARQUIS, 2008).

Porém, sua maior importância reside no seu potencial em gerar outras espécies reativas

de oxigênio com capacidade ainda maior (BALDECK; MARQUIS, 2008; HERMES-

LIMA; STOREY, 1993). Assim, sabendo-se que a formação de peróxido de hidrogênio

desempenha importante função no processo de resposta a agentes infecciosos, nossos

resultados corroboram com a literatura, nos quais encontramos, em macrófagos

peritoneais de animais desnutridos, menor capacidade em sintetizar peróxido de

hidrogênio quando estimulados.

PAIXÃO E SILVA, O.; FOCK, R. A.; ROGERO, M. M.; BORELLI, P. Peróxido de hidrogênio e enzimas antioxidantes em desnutrição proteico-energética. Nutrire: rev. Soc. Bras. Alim. Nutr.= J. Brazilian Soc. Food Nutr., São Paulo, SP, v. 36, n. 3, p. 1-14, dez. 2011.

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A maioria dos radicais livres formados é removida pela ação dos sistemas superóxido

dismutase, catalase e glutationa peroxidase (AERTES et al.,1995; HALLIWELL, 1994).

Em circunstâncias em que o superóxido e peróxido de hidrogênio não são removidos

sufi cientemente rápidos, eles podem reagir entre si e produzir o radical hidroxil que

iniciará uma cascata de peroxidação lipídica causando danos teciduais (BABIOR, 1984).

Golden e Ramdath (1987) sugeriram que um mecanismo de reparo e uma

proteção inadequada na desnutrição, podem causar a injúria mediada por radicais livres

e o desequilíbrio entre a produção de radicais livres e as respectivas neutralizações

poderiam ser decorrentes da diminuição das defesas antioxidantes que ocorrem durante

a desnutrição. A detoxifi cação de superóxido e peróxido de hidrogênio são catalisadas

pelas enzimas superóxido dismutase e catalase, respectivamente. O sistema glutationa

peroxidase também decompõe peróxidos orgânicos e inorgânicos, utilizando tripeptídio

glutationa como cossubstrato. Em nosso modelo, observamos que macrófagos peritoneais

de animais desnutridos, apresentam redução da atividade das enzimas antioxidantes

(glutationa peroxidase, catalase e superóxido dismutase) em comparação aos macrófagos

dos animais do grupo controle.

A glutationa peroxidase utiliza selênio como cofator, enquanto a superóxido

dismutase utiliza cobre, zinco e manganês (ZUO et al., 2006). Como nossos dados

demonstram que animais dos grupos D e D+BCG apresentaram redução da ingestão de

ração poderia existir também uma possível redução dos níveis desses minerais, o que

poderia explicar, ao menos em parte, a signifi cativa redução da atividade das enzimas

glutationa peroxidase e superóxido dismutase nos macrófagos peritoneais de animais

dos grupos desnutridos em comparação com seus controles.

A redução signifi cativa da ingestão de ração e de proteína verifi cada nos grupos D

e D+BCG em relação aos seus respectivos grupos controles pode favorecer a redução da

concentração plasmática do aminoácido glutamina (CUNHA et al., 2003). Este aminoácido

atua como precursor de glutamato em macrófagos peritoneais, sendo o glutamato um

dos aminoácidos envolvidos na síntese da glutationa (NEWSHOLME, 2001). Desse modo,

a redução da atividade da glutationa peroxidase pode estar relacionada à redução da

concentração do seu substrato (glutationa), fato esse relacionado com o consumo de

uma dieta hipoproteica.

CONCLUSÕES

Os resultados obtidos no presente estudo revelam que a desnutrição proteico-

energética altera mecanismos de detoxicação de radicais livres e reduz a capacidade de

produção de peróxido de hidrogênio em macrófagos estimulados com BCG e que, em

parte, pode explicar a diminuição nas atividades bactericidas e fungicidas observadas

em animais desnutridos.

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Recebido para publicação em 22/09/10.Aprovado em 25/08/11.

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