PRODUÇÃO TEXTUAL NA ESCOLA E AUTORIA: COMO OS … SOUSA... · com o PROFLETRAS possibilidades de...
Transcript of PRODUÇÃO TEXTUAL NA ESCOLA E AUTORIA: COMO OS … SOUSA... · com o PROFLETRAS possibilidades de...
CLAUDIA LESSA ALVES SOUSA
PRODUÇÃO TEXTUAL NA ESCOLA E AUTORIA: COMO OS TEXTOS ESCRITOS NAS AULAS DE LÍNGUA
PORTUGUESA PODEM SER AUTORAIS
Memorial apresentado ao Mestrado Profissional em
Letras (PROFLETRAS), Instituto de Letras,
Universidade Federal da Bahia, como requisito para
obtenção do título de Mestre em Letras.
ORIENTADORA: Prof.ª Dr.ª Simone Souza de
Assumpção
SalvadorBa
2015
Sistema de bibliotecas da UFBA
S725 Sousa, Claudia Lessa Alves.
Produção textual na escola e autoria: como os textos escritos nas
aulas de Língua Portuguesa podem ser autorais / Claudia Lessa
Alves Sousa. - 2015.
140 f.: il.
Or Orientadora: Profª.Drª. Simone Souza de Assumpção.
Dissertação (mestrado) - Universidade Federal da Bahia, Instituto
de Letras, Salvador, 2015.
1. Escrita – Análise – Estudo de casos. 2. Língua Portuguesa –
Estudo e ensino. 3. Prática de ensino. 4. Ensino fundamental. I.
Assumpção, Simone Souza de. II. Universidade Federal da Bahia.
Instituto de Letras. III. Título.
CDD – 469
CDU – 028.4
A
Mariluce, minha mãe.
José Raimundo, meu pai.
Ricardo e Sérgio, meus irmãos.
Alessandro, meu companheiro.
Heitor e Estevão, meus filhos, por serem comigo.
AGRADECIMENTOS
A Deus, por mais esta oportunidade nesta vida.
A minha mãe Mariluce, ao meu pai José Raimundo, aos meus irmãos Ricardo e Sérgio, ao meu
marido Alessandro, aos meus filhos Heitor e Estevão, pelo amor e pela compreensão ilimitados.
A todos os meus professores da vida inteira, em especial: Deraldo Valois (in memorian), Márcia
Góes, Tânia Freitas,e Welton Fonseca.
A minha orientadora, professora doutora Simone Souza de Assumpção, pela recepção, pelo
cuidado, pelo estímulo à autonomia, sempre.
Aos amigos: Andréia Vieira, Jaqueline Daltro, Lauana Vilaronga, Márcia Humildes, Maria de
Fátima Silva, Marisa Roberto, Mônica Sepúlveda, Sérgio Couto por significarem realmente a
palavra amizade.
Ao terceto: Cláudia Rocha, Joseli Querino e Antonio Máximo por saberem ser o que são e
ensinarem pelo exemplo.
Aos verdadeiros mestres do Mestrado Profissional em Letras (PROFLETRAS), professores
doutores: Alvanita Almeida, José Henrique Freitas, Júlio Neves, Márcio Muniz, Mônica de
Menezes Santos, Simone Souza de Assumpção, Simone Bueno Borges da Silva, Suzane Lima
Costa.
Aos colegas do PROFLETRAS, companheiros dessa trajetória.
Aos professores que compuseram a banca para a qualificação: professora doutora Simone
Bueno Borges Silva e professor doutor Luciano Amaral Oliveira pelas orientações
imprescindíveis.
Às professoras que constituíram a banca de defesa: professora doutora Maria do Socorro
Oliveira e professora doutora Raquel Nery Lima Bezerra.
À Universidade Federal da Bahia (UFBA) e ao Instituto de Letras da UFBA.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) por oportunizar
com o PROFLETRAS possibilidades de mudanças no ensino Língua Portuguesa em escolas da
rede pública.
À coordenação do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID), sub-
projeto Letras, às professoras-supervisoras e aos alunos-bolsistas.
À equipe gestora do Colégio Estadual Monsenhor Manoel Barbosa e aos colegas professores.
Aos alunos muito, muito especiais do 6º ano, turma B, turno matutino de 2014 do Colégio
Estadual Monsenhor Manoel Barbosa por me permitirem aprender com eles, também aos seus
pais e responsáveis por confiarem no meu trabalho.
À equipe gestora da Escola Municipal Luiza Mahim e aos colegas professores pelo apoio e pela
confiança.
Para os cartógrafos, a cartografia – diferentemente
do mapa: representação de um todo estatístico – é
um desenho que acompanha e se faz ao mesmo
tempo que os movimentos de transformação da
paisagem. Paisagens psicossociais também são
cartografáveis. A cartografia, nesse caso,
acompanha e se faz ao mesmo tempo que o
desmanchamento de certos mundos – sua perda de
sentido – e a formação de outros: mundos que se
criam para expressar afetos contemporâneos, em
relação aos quais os universos vigentes tornaram-
se obsoletos.
(Suely Rolnik, 2011, p. 23)
SOUSA, Claudia Lessa Alves. Produção textual na escola e autoria: como os textos escritos
nas aulas de Língua Portuguesa podem ser autorais. 142 f., 2015. Memorial/Dissertação
(Mestrado Profissional em Letras) – PROFLETRAS – Instituto de Letras, Universidade Federal
da Bahia, Salvador, 2015.
RESUMO
O presente trabalho é uma pesquisa qualitativa de caráter etnográfico e memorialístico e visa
avaliar, a partir de exercícios propostos pela professora, se nos textos produzidos pelos alunos
do 6º ano B, turno matutino, do Colégio Estadual Monsenhor Manoel Barbosa (Salvador,
Bahia), há indícios de autoria e a relação que se estabelece entre o exercício de autonomia e a
prática autoral. Para tanto, a professora selecionou um conjunto de atividades com o objetivo
de se discutir as concepções de leitura e escrita, considerando os elementos que fazem parte do
processo de produção textual, desde a leitura de mundo e a interação com o outro, até a escrita
e o reconhecimento de si como autor. A escolha dessa população se deu pelo fato de o 6º ano
do Ensino Fundamental ser a fase no período de escolarização na qual o estudante terá que:
manejar novas disciplinas em conjunto com as já conhecidas; aprender a lidar com a
segmentação de conteúdos e diferentes professores especialistas que se responsabilizam apenas
por suas áreas. Essa é uma etapa, de certo modo, confusa e inquietante para os educandos e para
todos que fazem parte da comunidade escolar. Numa perspectiva que focaliza a concepção de
língua como espaço-tempo de interação humana – em que os sujeitos constroem e são
construídos – foram escolhidos exercícios de leitura e escrita das situações do cotidiano. À
professora de Língua Portuguesa coube abrir questões sobre a importância da leitura e,
principalmente, da escrita e da reescrita enquanto instrumentos de interação com o outro e
estimular os alunos à descoberta de informações sobre as práticas autorais e autônomas na
escola. Para tanto, a orientação metodológica seguida nessa pesquisa se ampara nos conceitos
de etnografia e autobiografia dos pressupostos teóricos de André (1995), Bortoni-Ricardo
(2008), Camargo (2010), Fino (2003, 2008), Genzuk (2003), Rolnik (2011), na propositura e
execução de sequências didáticas, de Antunes (2009), Cosson ( 2006) Marcuschi (2008),
Schneuwly e Dolz (2004), Schneuwly, Dolz e Noverraz (2004), Solé (1998) e, para as
discussões sobre autoria, Possenti (2001, 2002), Orlandi (2008, 2012) e Tfouni (2008, 2010)
entre outros.
.
Palavras-chave: Escrita. Autoria. Escola. Formação
SOUSA, Claudia Alves Lessa. Textual production in school and authorship: how texts
written in Portuguese classes can be authorial. 142 f., 2015. Memorial/Dissertation
(Professional Master’s Degree in Letters) – PROFLETRAS – Letters Institute, Federal
University of Bahia, Salvador, 2015.
ABSTRACT
This study is a qualitative study of ethnographic and memorialistic and aims to assess, from
exercises proposed by the teacher in the texts produced by the students of 6th grade B, morning
shift, the Colégio Estadual Monsenhor Manuel Barbosa (Salvador, Bahia) there is evidence of
authorship and the relationship established between the exercise of autonomy and copyright
practice. Therefore, the teacher has selected a set of activities with the aim of discussing the
conceptions of reading and writing, considering the elements that are part of the text production
process, from the world of reading and interacting with each other, to the writing and
recognition of oneself as an author. The choice of this population was made because of the 6th
year of elementary school is the phase in schooling period in which the student will have to:
handle new disciplines along with the already known; learn to deal with the segmentation of
content and different specialist teachers who are responsible only for their areas. This stage, in
a way, confusing and unsettling for students and for all who are part of the school community.
A perspective that focuses on the conception of language as human interaction in space-time -
in which the subjects build and are built - reading exercises were chosen and written in everyday
situations. To the teacher of Portuguese fell open questions about the importance of reading and
especially writing and rewriting as interaction tools with each other and encourage students to
discover information on authorial and autonomous practices in school. Therefore, the
methodological approach taken in this research supports herself on the concepts of ethnography
and autobiography of the theoretical assumptions of André (1995), Bortoni-Ricardo (2008),
Campbell (2010), Fine (2003, 2008), Genzuk (2003) Rolnik (2011), and bringing the teaching
execution sequences, Antunes (2009), Cosson (2006) Marcuschi (2008), Schneuwly and Dolz
(2004), Schneuwly, Dolz and Noverraz (2004), sole (1998) and for discussions about
authorship, Possenti (2001, 2002), Orlandi (2008, 2012) and Tfouni (2008, 2010) among others.
.
Keywords: Writing. Authorship. School. Formation
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURAS
Figura 1 – Construção dos autorretratos imagéticos ............................................................... 59
Figura 2 – Aluna com seu autorretrato imagético ................................................................... 60
Figura 3 – Aluno com seu autorretrato imagético ................................................................... 60
Figura 4 – Reprodução dos autorretratos da aluna Glícia ....................................................... 64
Figura 5 – Reprodução dos autorretratos do aluno Paulo........................................................ 64
Figura 6 – Reprodução dos autorretratos da aluna Anita ........................................................ 65
Figura 7 – Reprodução dos autorretratos do aluno Reinaldo .................................................. 65
Figura 8 – Reprodução dos autorretratos do aluno Paulo........................................................ 65
Figura 9 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano ...................... 72
Figura 10 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano .................... 73
Figura 11 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano .................... 74
Figura 12 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano .................... 75
Figura 13 – Reprodução de página do livro Escrever e criar – é só começar! 6ª série: a
redação através do jogo e da literatura ..................................................................................... 78
Figura 14 – Reprodução de trecho do livro didático Vontade de saber português 6º ano....... 80
Figura 15 – Reprodução de trecho do livro didático Vontade de saber português 6º ano....... 81
Figura 16 – Reprodução de trecho do livro didático Vontade de saber português 6º ano....... 82
Figura 17 – Livros de literatura ............................................................................................... 85
Figura 18 – Quadro com os livros de literatura ....................................................................... 86
Figura 19 – Aluna com o livro de literatura escolhido ............................................................ 88
Figura 20 – Aluno com o livro de literatura escolhido ............................................................ 88
Figura 21 – Aluna com o livro de literatura escolhido ............................................................ 89
Figura 22 – Reprodução da primeira versão da sinopse sobre o filme Prova de fogo elaborada
pela aluna Mirna e revisada pela aluna Diana .......................................................................... 95
Figura 23 – Reprodução da primeira versão da sinopse sobre o filme Prova de fogo elaborada
pela aluna Renata e revisada pela aluna Iara ............................................................................ 96
Figura 24 – Reprodução da primeira versão da sinopse sobre o filme Prova de fogo elaborada
pelo aluno André e revisada pelo aluno Gilberto ..................................................................... 97
Figura 25 – Reprodução da primeira versão da sinopse sobre o filme Prova de fogo elaborada
pela aluna Diana e revisada pela aluna Mirna .......................................................................... 98
Figura 26 – Reprodução da segunda versão da sinopse sobre o filme Prova de fogo elaborada
pela aluna Diana ....................................................................................................................... 98
Figura 27 – Reprodução da primeira versão da sinopse sobre o filme Prova de fogo elaborada
pela aluna Tatiana e revisada pela aluna Beatriz ...................................................................... 99
Figura 28 – Reprodução da segunda versão da sinopse sobre o filme Prova de fogo elaborada
pela aluna Tatiana ................................................................................................................... 100
Figura 29 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano .................. 101
Figura 30 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano .................. 102
Figura 31 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano .................. 103
Figura 32 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano .................. 104
Figura 33 – Livros produzidos pelos alunos do 6º ano B ...................................................... 109
Figura 34 – Livros produzidos pelos alunos do 6º ano B ..................................................... 109
Figura 35 – Reprodução de trecho do autorretrato escrito do aluno Alex............................. 114
Figura 36 – Reprodução de trecho do autorretrato escrito do aluno André .......................... 114
Figura 37 – Reprodução de trecho do autorretrato escrito do aluno Ian ............................... 115
Figura 38 – Reprodução de trecho do autorretrato escrito da aluna Mirna ........................... 115
Figura 39 – Reprodução de trecho do autorretrato escrito da aluna Anita ............................ 115
Figura 40 – Segunda versão da sinopse sobre o livro elaborada pela aluna Iara .................. 118
Figura 41 – Primeira versão da sinopse sobre o livro elaborada pela aluna Beatriz ............. 118
Figura 42 – Segunda versão da sinopse sobre o livro elaborada pelo aluno Gilberto ........... 118
Figura 43 – Primeira versão da sinopse sobre o livro elaborada pelo aluno Sílvio............... 120
Figura 44 – Segunda versão da sinopse sobre o livro lido elaborada pelo aluno Sílvio ....... 120
Figura 45 – Primeira versão da sinopse sobre o livro elaborada pelo aluno Eduardo........... 121
Figura 46 – Segunda versão da sinopse sobre o livro elaborada pelo aluno Eduardo........... 122
GRÁFICOS
Gráfico 1 – O que é leitura? ..................................................................................................... 39
Gráfico 2 – A leitura é… ......................................................................................................... 40
Gráfico 3 – O que é escrita? .................................................................................................... 42
Gráfico 4 – A escrita é… ......................................................................................................... 43
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Quem são as pessoas da sua família que têm o costume de ler? ........................... 41
Tabela 2 – O que as pessoas de sua família leem? .................................................................. 41
Tabela 3 – Quais são as pessoas da sua família que têm o costume de escrever? ................... 44
Tabela 4 – Sobre o que as pessoas de sua família escrevem? ................................................. 44
SUMÁRIO
1 PARA COMEÇAR A CARTOGRAFIA... ........................................................................ 13
2 CARTOGRAFIAS DO CAMPO ........................................................................................ 17
2.1 A professora-pesquisadora ......................................................................................... 17
2.2 A escola ...................................................................................................................... 30
2.3 Os alunos .................................................................................................................... 34
3 CARTOGRAFIAS DA ESCRITA ..................................................................................... 46
3.1 Familiarização com a sala de aula ............................................................................. 48
3.1.1 Sequência didática 1 ............................................................................................. 56
3.1.2 Sequência didática 2 ............................................................................................ 84
4 CARTOGRAFIA DOS ACHADOS ................................................................................. 111
4.1 Autonomia e autoria ......................................................................................................... 111
5 CARTOGRAFIA PRONTA: CONTORNO ................................................................... 124
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 127
APÊDICE A - Questionário .................................................................................................. 134
APÊNDICE B – Solicitação de autorização .......................................................................... 140
13
1 PARA COMEÇAR A CARTOGRAFIA...
Se a leitura é Fonte e espaço de formação, o que não dizer da
escrita, do exercício da escrita? Com todas as letras e marcas
que definem a condição social da escrita, não há como
desconsiderar a relação que se estabelece, solitária, necessária,
tensa, de tortura criadora que confere um lampejo de existência
a si mesmo, porque escreve.
Camargo (2010, p. 14)
O trecho acima sintetiza o que vivencio: a tensão que solicita o exílio para mergulhar
em busca das minhas memórias. São lembranças que me conduzem à reflexão sobre a
intervenção que propus para mim, enquanto professora-pesquisadora, e para a escola em que
trabalho, especificamente, a turma de 6º ano B, turno matutino, no Colégio Estadual Monsenhor
Manoel Barbosa, localizado na Boca do Rio, Salvador, Bahia.
O caminho tortuoso de rememoração, de (re)invenção e escrita de mim – porque nem
sempre as lembranças estão tão claras e resolvidas e, nesse exercício, o eu que se materializa
apresenta-se como descolado, projetado enquanto ser plástico e fluido atravessado pelas
subjetividades do próprio caminho desse fazer – poderá revelar nuances de quem eu sou e/ou
de quem eu quero mostrar que sou através da escrita, essa tentativa de legitimação enquanto ser
social, cultural e ideologicamente localizado: professora de Língua Portuguesa, aluna e
pesquisadora no Mestrado Profissional em Letras na Universidade Federal da Bahia.
Por muito tempo, entendi que biografia e autobiografia eram uma espécie de luxo,
exclusividade de pessoas com prestígio real ou criado pela mídia. Entretanto, após a leitura do
livro A importância do ato de ler, de Paulo Freire (1989), a biografização tornou-se para mim,
uma espécie de espaço democrático para registro da existência humana. Dessa forma, as
reflexões sobre a minha história apresentam-se imprescindíveis nesse relato, para perceber e
oferecer aos outros possibilidades de compreensão sobre o percurso de minha prática enquanto
professora de Língua Portuguesa em escolas públicas da rede básica de ensino na cidade de
Salvador. A busca que se perscruta no ato de biografar-se traz à tona – como um filme a que se
assiste – vivências explicativas das escolhas, persistências ou desistências responsáveis por
provocar em mim, professora-pesquisadora, a vontade e a necessidade de ressignificar-me.
Não acredito que vontade e necessidade sejam suficientes para efetivar a ressignificação
profissional e pessoal. Penso que há que se desconstruir e reconstruir concepções e fazeres de
um percurso, é preciso aprender a se constituir e a continuar. Descontruir, nesse caso, no sentido
14
de desmontar para entender a essência e reconstruir como remontar com a consciência das
partes.
Em meu fazer pedagógico, a referida busca tem se concretizado em inquietações que
orientam a cartografar a mim mesma, expor e viver meu desejo de professora-pesquisadora de
Língua Portuguesa: “participar, embarcar na constituição de territórios existenciais,
constituição de realidade” (ROLNIK, 2011, p. 66). Para isso, utilizo o “manual do cartógrafo”
sugerido pela autora citada, segundo o qual se deve ter: “um critério, um princípio, uma regra
e um breve roteiro de preocupações” (ROLNIK, 2011, p. 67, grifo da autora). Considerando
o critério do cartógrafo como o grau de abertura para a vida que cada um se permite a cada
momento (ROLNIK, 2011, p. 68), entendo que ele se concretiza na concepção de língua que
norteia a minha práxis ainda impregnada das teorias que tratam a linguagem como expressão
do pensamento ou instrumento de comunicação apenas e, por isso, modelam o processo de
ensino-aprendizagem numa perspectiva tradicional: com o professor como a única Fonte de
conhecimentos, cabendo a ele apenas transmiti-los, não havendo sequer preocupação com o
contexto e a necessidade das situações de sala de aula. Os alunos são apenas simples aprendizes
do que está pronto e definido e encontram-se anulados em suas possibilidades de participação
para a construção do que lhes é significativo conhecer. De acordo com Travaglia (2009, p. 21-
23), essas concepções se traduzem em visões monológicas da língua em que não se consideram
as circunstâncias sociais, históricas e ideológicas de seu uso. Há muito venho tentando mudar
intuitivamente, incluindo a visão de que a língua é lugar de interação humana, no processo de
ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa, pois é perceptível que as concepções consideradas
mais tradicionais não servem como fundamentos únicos ao que é proposto para o trabalho com
Língua Portuguesa no Ensino Fundamental.
No que se refere ao princípio do cartógrafo, o que me interessa é revisitar minha prática,
avaliá-la e ressignificá-la, uma vez que, se a língua que é meu instrumento e objeto de trabalho
(e vida) não é imutável, tenho a consciência de que minha prática também não pode ser. Então
buscar “canais de efetuação da vida” (ROLNIK, 2011, p. 68) é o que pretendo, ao propor
simultaneamente uma intervenção no ser professora, quando procuro reflexões teórico-práticas,
e no fazer pedagógico, que buscará atender a uma entre as várias demandas existentes na turma
de 6º ano do Ensino Fundamental (no que concerne à produção de textos dentro da disciplina
Língua Portuguesa) na unidade escolar à qual sou vinculada – Colégio Estadual Monsenhor
Manoel Barbosa. Aqui entendo intervenção como um processo em que não estarei sozinha nem
empoderada pela ideia de que sou a única que sabe exatamente o que fazer e qual será o
15
resultado de minhas ações; todos os partícipes, o meio e o inesperado são essenciais para que a
intervenção e o desenho dela estejam autorizados.
O caminho percorrido pela intervenção que proponho para mim e para minha prática
na turma de 6º ano também se constituirá em investigação dele mesmo, análise que tem como
implicação idealizada a transformação social. Embora esse seja o fim ideal, não há como deixar
de considerar a regra do cartógrafo que, em minha travessia, se apresenta como saber
reconhecer meu limite de atuação e interferência no que foi posto como problema e como
possibilidade de intervenção.
Quanto ao roteiro de preocupações do cartógrafo, tão particular quanto universal, esse
singrar dentro da escola, da sala de aula e da minha prática suscita inquietações demandadas
principalmente da forma como vejo, me posiciono, concebo, vivo e permito o que está a minha
volta. O contato com as subjetivações inerentes a esse caminhar, a consciência acerca do papel
político, a ansiedade, o querer fazer e acertar, compõem o meu roteiro de preocupações num
desenho ambivalente porque são elementos que fazem parte do meu modus vivendi,
impulsionam-me na busca e podem se mostrar como entraves na apreciação da realidade a que
me proponho.
Essa apreciação enquanto postura de cartógrafa e a proposta de intervenção são
absolutamente o novo, que, mesmo desejado há muito, representam um campo de
possibilidades e impossibilidades onde piso cautelosamente, já que acredito no que tomei para
mim: “Todas as entradas são boas, desde que as saídas sejam múltiplas” (ROLNIK, 2011, p.
65).
As entradas dessa cartografia materializam-se como um estudo de cunho etnográfico
e vêm registradas num texto memorialístico organizado em quatro seções: “Cartografias do
campo”, “Cartografia da escrita”, “Cartografia dos achados” e “Cartografia pronta: contorno”.
Em “Cartografias do campo”, trago os desenhos da minha história enquanto aluna
escritora e posterior professora de Língua Portuguesa, traçando uma relação entre essas duas
trajetórias que, ao final, se constituem como uma. Procuro refletir sobre a constituição do ser
professora, agora pesquisadora instituída pelo Mestrado Profissional em Letras
(PROFLETRAS), relacionando esse processo às motivações do meu fazer docente em escolas
da rede pública na cidade de Salvador. Os detalhamentos ali presentes buscam revelar-me como
um ser ainda em formação. Consciente disso e, por essa razão, imbuída em compreender ainda
mais o ensino-aprendizagem da disciplina Língua Portuguesa, propus a intervenção “Produção
textual na escola e autoria: como os textos escritos nas aulas de Língua Portuguesa podem ser
autorais” como um movimento contínuo, embora permita a retrospecção como estratégia para
16
repensar, valorar e constituir mais adiante. Também trago o ambiente em que trabalho e que
serviu de motivação e terreno para a pesquisa-intervenção, o Colégio Estadual Monsenhor
Manoel Barbosa. Trata-se de uma descrição que também se apresenta como reflexão sobre o
chão da escola e a sua alma sob a perspectiva de quem partilha esse cotidiano há mais de uma
década. Finalizando esse recorte, apresento o perfil dos alunos que vivenciaram comigo as aulas
de Língua Portuguesa no ano letivo de 2014 e, portanto, corresponsáveis pela realização da
pesquisa.
“Cartografia da escrita”, da mesma forma que o capítulo anterior, oferece a descrição
reflexiva sobre todo o proceder da intervenção em sala de aula e fora desta porque demonstra
como as aulas aconteceram, as concepções que as embasaram, bem como as apreciações
posteriores ao fazer, agora entendido como práxis, uma vez que se constitui como um processo
refletido e refratado.
As reflexões e refrações consequentes da intervenção orientam o capítulo “Cartografia
dos achados” em que ponho os escritos dos alunos em apreciação para discutir uma das
concepções de autoria que, no caso específico da intervenção, representa o princípio adequado
às discussões e sua relação com o exercício da autonomia dentro da escola.
“Cartografia pronta: contorno” vem para concluir o desenho proposto pelo memorial.
No entanto, não tenho a intenção de utilizá-lo como ponto final do processo formativo que foi
dado a conhecer na cartografia. Por isso o subtítulo “contorno”. Concluo consciente de que todo
fim é uma nova possibilidade de começo. Daí seu caráter de finito, mas não definitivo.
17
2 CARTOGRAFIAS DO CAMPO
2.1 A professora-pesquisadora
Final do segundo semestre do ano de 1990, revejo-me preenchendo o formulário para
inscrição no vestibular da Universidade Estadual de Feira de Santana. Entre todas aquelas
opções, três cursos faziam-me curiosa: Licenciatura em Letras, Licenciatura em Matemática e
Administração de Empresas. Não tinha ideia mais detalhada do que cada um dos cursos poderia
me oferecer em termos de formação profissional, apenas que a decisão poderia levar-me a
ensinar Língua Portuguesa e uma língua estrangeira, ensinar Matemática ou administrar uma
empresa.
O que me conduziu a optar por prestar o concurso para ser professora de Língua
Portuguesa e de língua estrangeira, já que isso representava ir de encontro à minha formação
em Educação Básica, uma vez que fiz o Curso Científico?
Recordo dois episódios e o valor de ambos na minha formação enquanto aluna e futura
professora. Lembrar o que pensei, trazer ao presente o que passou, mas que continua marcando
sua presença indelével, é estar no entremeio do tempo, num espaço privilegiado de quem tem
acesso ao que a memória e a finalidade desse texto permitem. Porque, enquanto memorial, vejo
esta escrita como um híbrido entre o que Passeggi (2010, p. 21) apresenta como definição para
memoriais acadêmico e de formação, considerados como memoriais autobiográficos:
O memorial acadêmico é aquele que é escrito por professores e/ou pesquisadores do
ensino superior sob a forma de uma narrativa reflexiva sobre sua trajetória intelectual
e profissional. As finalidades desse tipo de memorial são múltiplas: (...) objeto de
concurso público para ingresso na carreira docente e/ou em outras funções em
instituições de ensino superior, (...) instrumento de avaliação para progressão
funcional, (...) constituição da memória de um grupo, de uma instituição, etc. O
memorial de formação caracteriza-se por ser escrito, geralmente, durante o processo
de formação, inicial ou continuada, ser acompanhado por um professor orientador e
ser concebido como trabalho de conclusão de curso superior (TCC ou TFC). (grifo da
autora)
A hibridização textual configura um escrito que deve atender às injunções da academia,
ser uma narrativa reflexiva sobre o percurso intelectual, profissional e formativo anterior e,
principalmente, mais contemporâneo, de quem propôs uma intervenção1 para atender a uma
1 Refiro-me ao projeto de intervenção “Produção textual na escola e autoria: como os textos escritos nas aulas de
Língua Portuguesa podem ser autorais” apresentado durante o Mestrado Profissional em Letras oferecido pela
Universidade Federal da Bahia em 2013 e motivo deste memorial.
18
demanda emergente em uma das turmas de 6º ano do Ensino Fundamental no Colégio Estadual
Monsenhor Manoel Barbosa.
Desse modo, o memorial que se inicia aqui, híbrido de nuances de vários gêneros,
mantém o caráter essencialmente autobiográfico e reflexivo, permitindo a revelação, a análise,
a aprendizagem de quem escreve sobre si mesmo, sobre o outro, sobre o mundo – a
“palavramundo”. (FREIRE, 1998, p. 9)
A escrita de um memorial autobiográfico leva-me a assumir a postura de cartógrafa
(ROLNIK, 2011) no sentido de busca e constatação de elementos que compõem a paisagem de
mim mesma: professora de Língua Portuguesa, aluna do PROFLETRAS na Universidade
Federal da Bahia (UFBA) e pesquisadora. É um exercício “antropofágico”, e ainda seletivo,
porque conduzido pelo desejo de me pôr a conhecimento num dado lugar e obter legitimação
do que proponho. Nessa antropofagia, devorar lembranças significa retroalimentar-me de
hipóteses sobre a (verdadeira?) natureza do que sou e do que tem me constituído enquanto
professora de Língua Portuguesa e aluna do PROFLETRAS. Também é um exercício de
escritura, porque reivindica a inscrição de mim mesma na produção de sentidos (CORACINI,
2010) deste texto. O leitor, neste caso, não pode ser ignorado. A legibilidade deverá estar em
sua essência:
Escrever um texto é dá-lo a ler, torná-lo público, expô-lo a interpretações
(in)esperadas, à violência da leitura que é sempre tradução; e para isso, é preciso que
seja legível, que obedeça à lei do texto que, como afirma Derrida (1974), está no outro
e vem do outro. (CORACINI, 2010, p. 30)
Volto ao mapa de minha trajetória, seleciono os referidos episódios para refazer as rotas
numa posição diferente e privilegiada: como alguém que vê o já vivido e tem a oportunidade
de pensar sobre seus desdobramentos. São paisagens que, no momento de rememoração,
configuram-se como a cartografia que se delineia neste memorial.
Lembro-me nitidamente, ainda no Ensino Fundamental (antigo 1º grau), precisamente
nas 7ª e 8ª séries, de a professora de Matemática lançar desafios e perguntar quem poderia
resolvê-los no quadro e explicar o raciocínio aos colegas. Sempre me esquivei; no entanto, a
professora Tânia Freitas dava um jeito de levar todos os alunos a responderem aos exercícios.
Chegou minha vez. Fui, resolvi, expliquei. Os colegas aplaudiram – faziam isso com todos que
iam ao quadro – e a professora disse algo como “Menina, você tem talento. Vai ser professora
de Matemática. Eu já sei.” Gostei e repeti as participações até o último ano. Essas palavras que
reverberaram em minha mente por anos, principalmente porque estudava em escola particular
19
e todos os meus colegas só pensavam em profissões que davam continuidade à tradição da
família: direito, medicina, administração, odontologia, engenharia, etc. foram resgatadas no
momento da escolha para o vestibular. Penso que, na época do Ensino Fundamental, talvez
percebesse que havia algo de diferente comigo. Considero que o comentário da professora
Tânia Freitas despertou em mim a percepção de que o conhecimento pode ser compartilhado e
que o outro que interage com você nesse processo deve ser considerado sempre. Acredito que
repensar o significado das ações da professora Tânia Freitas tem um papel fulcral no curso de
escrita deste memorial.
O outro episódio data do Ensino Médio (na época Segundo Grau), no primeiro ano. A
professora de Língua Portuguesa, Literatura e Redação, Márcia Góes, propôs a produção de um
texto descritivo em duplas – não havia trabalho com gêneros especificamente, mas práticas com
os tipos textuais: narração, descrição e dissertação. Eu e uma colega muito próxima rapidamente
decidimos o que faríamos e lembro que, durante a construção, ríamos muito e vivíamos o efeito
de sentido de cada palavra escrita – antecipando, prevendo, conduzindo, de certo modo,
orientando a percepção do interlocutor. Utilizamos os dois horários para a escrita enquanto a
maioria entregou a produção no final do primeiro horário. Fizemos rascunho e depois é que
“passamos a limpo” no formulário entregue pela professora. Depois de uma semana, novamente
aula de Redação. A professora principiou a aula comentando os textos descritivos elaborados e
disse que leria um que lhe chamou a atenção, sem revelar os autores. Um texto autoral talvez.
Revejo a cena, eu e a colega, muito ansiosas, porque imaginávamos que fosse o nosso. Foi.
Vergonha, orgulho, medo: sentimentos que me tomaram durante a leitura do texto. A turma em
furor com a leitura não permitia que a professora lesse com a continuidade que ela desejava;
ria-se muito, lançavam-se hipóteses sobre o “objeto” descrito, também havia muxoxos e
acusações. Não recordo o que aconteceu na aula após a leitura, apenas a professora nos
chamando ao final, quando todos já haviam ido embora, para comentar o texto, elogiar e
perguntar o que faríamos na universidade. Fiquei em silêncio – outras memórias não me
deixavam respirar: achava que ia ser professora de Matemática. Hoje sei que não disse a ela
porque tinha dúvidas. A professora Márcia Góes sugeriu que pensássemos em cursos como
Publicidade, Jornalismo, Direito, Letras e reafirmou que tínhamos facilidade com a escrita.
Essas dúvidas foram enxertadas a cada aula de Língua Portuguesa com as possibilidades de
conhecer, exercitar e aplicar o que era apresentado. Havia a preocupação da professora em
aproximar os conteúdos da disciplina à nossa realidade de aluno adolescente na década de 1990,
também em ouvir quais eram nossas expectativas, reclamações e incertezas e em atendê-las o
quanto fosse possível e consoante com os objetivos de ensino a que ela se propunha.
20
Em que medida esses acontecimentos influenciaram minha escolha profissional?
Titubear diante da escolha profissional apresenta-se como clichê, não para quem vive a
dúvida, muito menos para mim que volto para refletir sobre o que vivenciei no corpo desejante
diante daquela situação limite. Vozes referenciais misturavam-se: das professoras Tânia Freitas
e Márcia Góes, dos colegas e de outros professores – estes dois últimos a indicar o caminho da
tradição familiar em relação aos estudos, algo que eu não tinha: minha mãe não chegou a
concluir o Ensino Fundamental 2 e meu pai apenas seguiu até o Ensino Médio
profissionalizante, embora da parte deles não faltasse incentivo na busca pelos saberes
institucionalizados ou não, mas, conforme os dois, conhecer sempre foi o caminho para a
formação de pessoas melhores. Fardo pesado esse da escolha.
Marquei então determinada: curso de Licenciatura plena em Letras com Inglês na
primeira opção e de Licenciatura em Matemática na segunda opção. Não segui a tradição que a
ideologia das escolas que frequentei cultivava e por ela eram sustentadas.
“A pessoa é para o que nasce.” Célebre constatação de uma das três irmãs cegas
paraibanas – Maria – capturada no documentário homônimo de Roberto Beliner (2002) que
aqui transmuto para “a pessoa torna-se para o que nasce”. Não há determinismo, apenas
determinações e escolhas. Optei por ser professora, segui a tradição da família: minha mãe,
minha avó materna (em suas visitas semestrais) e meu pai sempre foram nossos professores –
somos três filhos – e dos filhos alheios.
Cinco semestres depois da entrada no universo da Universidade Estadual de Feira de
Santana, estou eu em sala de aula como professora contratada da rede pública estadual de
ensino, Escola Estadual Edith Mendes da Gama e Abreu, turno noturno, 1º ano do Ensino
Médio. Recordo-me de sentir um tremor de medo e de ansiedade diante de olhos cansados do
dia, cansados do tempo, incrédulos quanto a mim. Tão gentis e sábios foram aqueles alunos ao
compreender e aceitar minha inexperiência e minha determinação em ser professora como
Tânia Freitas e Márcia Góes.
Ser professora como outras professoras. Repetir os modelos? Sim, pareceu no início que
só teria que fazer o que as professoras faziam. Os conhecimentos reproduzidos pela academia
pouco ajudavam diante das possibilidades da realidade de sala de aula. Essa percepção
modificou a minha determinação em seguir os modelos que conhecia.
Cada turma é uma turma: aprendi rapidamente. Entretanto, demorei mais para entender
por que os conteúdos que aprendi na Educação Básica não faziam sentido para os meus alunos
e já tinha percebido que a formação da licenciatura não me ajudaria, as teorias pareciam
distantes do que pulsava à minha frente. Intuitivamente sabia que havia algo errado com o que
21
eu tentava ensinar ou com os métodos ou com os recursos. Tentava adaptações que ora pareciam
ter ajudado, ora, não. O que eu não sabia até então é que as concepções de língua que me
constituíram estavam tão entranhadas em mim que não poderia vislumbrar outras formas
plausíveis de ver e viver o ensino da Língua Portuguesa. Aulas de língua funcionavam assim:
ensino de gramática e de leitura com compreensão, interpretação e produção de textos. Contudo,
a insignificância delas, cada vez mais crescente, incomodava muito. A tradição2 formou-me, na
Educação Básica e na licenciatura, deu-me um mapa pronto que ali, na sala de aula, não oferecia
direções seguras.
Os caminhos começaram a se reconfigurar quando comecei a questionar e a tentar criar
outra forma de ensinar língua. Não lembro se formulei as mesmas questões propostas por
Geraldi (2011, p. 40): “por que ensinamos o que ensinamos?” e “para que as crianças aprendem
o que aprendem?”. Registro apenas que havia um incômodo e um desconforto em relação ao
que fazia.
Fui ser jornalista. Época que representa nessa trajetória o desenho de uma ilha onde
estive isolada para pensar sobre o desconforto. Tempos de muita escrita, muitas realidades e
descobertas, grande decepção... Não com o trabalho no Jornal Feira Hoje, mas comigo mesma,
devido a minha insatisfação em estar naquele lugar de repórter. Ver a vida do outro, (d)escrevê-
la como a realidade que clama por ser mostrada, legitimada como existência digna ou indigna
não me preenchia.
Pedi demissão e voltei ao exercício do magistério, agora, em escolas da rede particular.
Tive uma permanência curta nesse outro lugar de educação formal. Tempo suficiente para
terminar a licenciatura e a Especialização em Linguística Aplicada à Língua Portuguesa.
Conhecer a Linguística Aplicada ofereceu-me possibilidades de percursos – Sociolinguística,
Linguística Textual, Discurso, Fonética e Fonologia – representou um certo empoderamento
em relação ao que eu queria: dar significado à minha prática e ao que eu me propunha ensinar.
Era o que eu queria e quero e essa conclusão veio há pouco. Na época, não discernia insatisfação
de desejo e necessidade. Não intencionava fazer um mestrado. Pretendia experimentar mais o
ensino e a aprendizagem na escola, na base. Fiz concursos para professor da rede pública de
ensino nas esferas estadual e municipal em Salvador.
2 Tradição que se refere às concepções de língua (GERALDI, 2001) como expressão do pensamento ou
instrumento de comunicação e ignora-a em sua condição de lugar de/para interação humana.
22
Vieram as experiências3 em escolas da rede pública de ensino estadual e municipal em
Salvador. Outros mundos, novas experimentações e vontade de desistir. As situações –
concebidas como problemas - causadas pelo choque entre concepções de educação e de mundo
diferentes alimentaram durante um tempo a vontade de desistir de ser professora. A ideia de
mudar a minha prática e adequá-la à realidade e aos interesses dos alunos tomava corpo e me
expunha, deixava-me vulnerável diante do “sistema de educação”, oscilava entre o que era
esperado de uma professora da educação pública e o que acreditava fazer sentido ser essa
professora.
Não desisti e a Escola Municipal Amélia Rodrigues, onde trabalhei por 12 anos, foi
determinante nesse aspecto. Nosso primeiro diretor, professor Deraldo Valois, foi quem
incentivou a formação de um ambiente no qual predominava a valorização do outro e a certeza
de que éramos educadores e podíamos sê-lo da melhor forma possível. Por isso abraçou nossa
vontade de viver a educação e muitos projetos entre os quais destaco a “Escola Interativa”,
oferecido pela Cipó – Comunicação Interativa, organização não-governamental. Esse projeto
possibilitou a capacitação de professores e alunos-monitores para práticas fundadas na
educação pela comunicação com objetivos guiados pelas demandas da comunidade escolar e
orientou-nos a implementar uma emissora de rádio na unidade escolar e a programação desta.
Vivi a capacitação e a simultânea preparação da rádio, tentando levar o que aprendia para a
outra escola em que trabalhava, sem sucesso. Numa escola maior com muito mais professores,
a maioria já muito próxima da aposentadoria – o que não determina desinteresse pelo novo –
foi impossível. Fiz o que pude sozinha, infelizmente.
Houve ainda o curso de formação continuada GESTAR II (Gestão da Aprendizagem
Escolar), especificamente direcionado a professores da rede básica e pública de ensino da esfera
estadual que ensinam Língua Portuguesa e Matemática para alunos do 6º ao 9º ano. Foram 400
horas em que se priorizava a discussão de teorias ligadas à educação e à construção individual
e coletiva de atividades posteriormente aplicadas e relatadas num portfólio e também durante
os encontros presenciais. A formadora buscava levar à apreciação e à discussão aspectos-chave
das teorias de Jean Piaget, Henri Wallon, Lev Semenovitch Vygostky, Sírio Possenti, João
Wanderley Geraldi, Angela B. Kleiman, Luiz Antônio Marcuschi, Luiz Carlos Travaglia e
outros e instigando-nos a pensar como poderíamos aplicar em sala de aula aquelas contribuições
teóricas.
3 Entendo experiência a partir do conceito proposto de Larrosa (2002, p. 21): o que nos passa, nos acontece, nos
toca.
23
Um espaço-tempo vivido e experimentado porque buscava (e ainda busco) tornar minha
prática pedagógica significativa para mim mesma e para meus alunos, embora não houvesse
disponibilidade para conhecimento teórico mais aprofundado. À época, sentia essa necessidade,
já que, enfim, poderia associar teoria e prática. Não que as entendesse apenas separadas: ainda
as percebia numa relação de hierarquia em que a primeira estava sempre em posição mais
relevante. O “diálogo” promovido pelo GESTAR II principiou o esboço de um imaginar crítico,
exercido e praticado na nomeação e renomeação do mundo: ensino-aprendizagem – norteando
sua reconstrução. (BERTHOFF, 2011, p. 33)
Algo mudou na minha forma de trabalhar. Porém, não foi o bastante para que eu pudesse
vivenciar os resultados idealizados. O que acontecia era a experimentação com pouca segurança
e uma convicção muito maior de que o sistema educacional e suas imposições não cabiam na
sala de aula, não eram suficientes para que houvesse a garantia da experimentação dos
conhecimentos linguísticos para a performance do texto escrito: o saber que transformado em
saber como e em saber quando e por quê (GARCEZ, 2010, p. 19) (grifos meus). Acreditava,
ainda, que poderia mostrar a cada aluno o quanto ele poderia ser capaz de mudar sua realidade
apenas estudando, descobrindo a vida e o mundo.
Diante dessa nítida vontade minha, percebi uma necessidade dos alunos, principalmente
aqueles que entravam no 6º ano: produção de textos adequada à demanda da realidade deles.
Resolvi fazer um trabalho específico para esse contexto. Não sabia muito bem como organizar
o que pretendia e estar em conformidade com as diretrizes curriculares enviadas pela Secretaria
de Educação do Município de Salvador para orientar nossa prática e com a obrigatoriedade
sacralizada do uso do livro didático, mas, baseando-me nos Parâmetros Curriculares Nacionais,
construí um projeto de leitura e produção textual direcionado aos alunos de uma das turmas de
6º ano em que dava aulas na escola municipal. Tive, desde o início, o apoio do coordenador
pedagógico, o professor e pedagogo Welton Fonseca, que, como eu, ficava muito incomodado
com os comentários dos outros professores em relação aos alunos que eram matriculados na
referida série: “Esses meninos são analfabetos!”, “Todos têm problemas de alfabetização!”,
“Eles não sabem ler, nem escrever, nem assinar o próprio nome!”, “Você que é de Português,
faça alguma coisa! Bota esses meninos para ler e escrever!” Além disso, compartilhava comigo
a visão de um ensino de Língua Portuguesa que fugia do tradicional: leitura de textos
pertencentes a gêneros variados, momentos de discussão acerca das interpretações demandadas
das leituras, produção de textos que fizessem sentido diante das necessidades dos alunos e
aprendizado e aplicação de conteúdos gramaticais necessários à interação provocada por essas
situações. Por ter entendido a necessidade do que eu propunha, durante as reuniões com os pais,
24
o professor Welton Fonseca sempre destacava que o trabalho com a turma era diferente do
habitual devido às dificuldades que os alunos apresentavam em relação à leitura e à escrita.
O “trabalho diferente” era muito simples; apenas promovia a leitura de livros da
biblioteca da escola durante um dia por semana durante o tempo da aula, a produção de
sinopses, anúncios e resenhas (chamadas de “opiniões” pelos alunos) com espaço para
reescritas comentadas coletivas e individuais, a avaliação das atividades propostas (leitura,
escritas e reescritas) bem como leitura de outros textos trazidos pelos alunos ou pertencentes ao
livro didático. O “diferente” era que não havia o trabalho predominante e descontextualizado
com a gramática normativa nem exercícios exclusivamente realizados a partir do livro didático.
Foi um ano difícil e, ao final dele, os resultados não eram animadores: muitos alunos dessa
turma ficaram em recuperação nas outras disciplinas, embora a maioria tenha sido aprovada
para a série seguinte. A turma permaneceu quase em sua totalidade a mesma e só voltou a estar
comigo no 9º ano. Percebi que muitos estavam bem melhores em relação à escrita e à oralidade;
pareciam mais seguros nos usos da Língua Portuguesa instituídos como padrão. Na época,
atribuí essa segurança a fatores como amadurecimento, valorização do papel da escola, apoio
da família e, por último, à familiaridade com o “meu” modo de trabalho. Não conferi nenhum
valor ao “trabalho diferente” feito junto com eles três anos antes. Nesse ano e no seguinte,
muitos deles fizeram seleção para o Instituto Federal de Educação e Tecnologia da Bahia e
foram selecionados. Não soube imediatamente; só muito tempo depois um dos alunos
comentou: “Só lembrei da senhora na prova de redação. Fácil demais.” Nunca trabalhei com
eles nada para concurso nenhum. Neste ano (2014), mais surpresa: três ex-alunos da mesma
turma na Universidade Estadual da Bahia fazendo suas graduações e lembrando o valor do
trabalho feito em 2007 para a vida deles.
As lembranças desses meninos e meninas fizeram-me acreditar que o “trabalho
diferente” poderia ser retomado de uma forma mais sistematizada e fundamentada
teoricamente. Acredito que o desenvolvimento da competência textual4 é imprescindível na
formação do aluno-cidadão. Por isso, organizo o conteúdo da disciplina nessa perspectiva de
produção escrita contextualizada da qual a reescrita é uma das etapas. Parece-me impossível
um trabalho em Língua Portuguesa na Educação Básica que não tenha esse enfoque. No entanto,
essa não tem sido a prática que percebo nas escolas em que trabalho. Não raro, os alunos relatam
que não têm o costume de reescrever seus textos após revisões. Lembro-me de que, quando fui
4 Competência textual é, segundo Travaglia (2009, p. 18), a capacidade de, em situações de interação comunicativa,
produzir e compreender textos considerados bem formados, valendo-se de capacidades textuais básicas: a
formativa, transformativa e a qualificativa.
25
professora-supervisora5 no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID)
Letras na UFBA, os alunos-bolsistas, ao tomarem contato (observação) com as aulas de Língua
Portuguesa por mim ministradas no Colégio Estadual Monsenhor Manoel Barbosa, também
relataram que nunca tinham experienciado a produção escrita de modo contextualizado e
vinculado à reescrita. Penso que, até mesmo com eles, os alunos-bolsistas, a produção textual
em todas as suas etapas (apreciações, leituras, discussões, revisões, reescritas) também foi
vivenciada no período em que, após leituras e discussões suscitadas a partir do livro A
importância do ato de ler: em três artigos que se completam de Paulo Freire (1989) e do que
experimentavam nas observações das aulas, construíram um artigo baseado na experiência de
leitura do grupo. A importância do ato de ler em três etapas que se completam representa a
análise acerca do valor constitutivo da leitura para a vida dos bolsistas e estudantes da
Licenciatura em Letras na UFBA. Representa também a oportunidade que tive de pensar sobre
as minhas memórias enquanto sujeito que lê e escreve e faz disso seu trabalho. A compreensão
sobre como a minha formação leitora e escritora culminou na minha escolha profissional
começou a ser delineada nesse período.
Rememorar o passado longínquo e o recente e percorrer caminhos já trilhados é pisar
num terreno já conhecido que, ao ser materializado pela escrita, faz pensar sobre minha prática
de professora durante esses 21 anos. Sou confrontada com o fato de que ainda estou em
formação, menos ansiosa talvez, porém com as mesmas inquietações agigantadas ano letivo
após ano letivo: que Língua Portuguesa quero ensinar? O que eu quero é o mesmo que os alunos
querem e precisam?
A entrada recente no PROFLETRAS, em 2013, permitiu que as questões referidas
assumissem status mais consistente e permitissem a valoração das minhas tentativas de
adequação do ensino de Língua Portuguesa à realidade e às necessidades das comunidades
escolares em que trabalhei e trabalho. Isso significa que a percepção que já norteava minhas
aulas no sentido oposto ao orientado pelas concepções de língua, de leitura e de escrita
constituidoras de minha formação enquanto aluna e professora tem respaldo teórico. Um novo
olhar para a bipartição do indivisível: prática e teoria sustentando possibilidades. Até então,
era-me impossível conceber teoria e prática em um mesmo nível, imbricadas. A dicotomia
estabelecida passa a ser repensada e, em meio a leituras e discussões, provocações como estas
propostas por Hissa (2013, p. 77) fazem-me refletir sobre o que eu experimentei enquanto
5 Entre dezembro de 2012 e fevereiro de 2014.
26
professora até então e a possível reconsideração sobre como teorias e práticas sempre estiveram
ali presentes.
Mas o aprender não seria o preenchimento recíproco entre práticas e teorias? (...)
Teoria é conhecimento sistemático e resultante de práticas empíricas. Poder-se-ia
dizer que a teoria resulta da experimentação do mundo que, por sua vez, permitiria
sua transformação. A construção teórica do discurso já é prática.
Possibilidades que assumem o contorno – e começam a redefinir o desenho da minha
existência enquanto professora – de outra visão do processo de ensino-aprendizagem de Língua
Portuguesa efetivamente mais centrado no entendimento da língua como lugar de interação
entre seres ativos, atores e construtores sociais que, dialogicamente, se constroem e são
construídos nos textos (KOCH e ELIAS, 2012), sejam eles orais ou escritos. Penso, desse modo,
o dialógico como parte da natureza humana e tomo como parâmetro Bakhtin (2006, p. 115):
Na realidade, toda palavra comporta duas faces. Ela é determinada tanto pelo fato de
que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém. Ela constitui
justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte. Toda palavra serve de
expressão a um em relação ao outro. Através da palavra, defino-me em relação ao
outro, isto é, em última análise, em relação à coletividade. [...] A palavra é o território
comum do leitor e do interlocutor.
Este memorial constitui-se como uma cartografia em elaboração e, por isso, em
constante diálogo com o que tem se tornado real no universo das possibilidades teórico-práticas
da intervenção “Produção textual na escola e autoria: como os textos escritos nas aulas de
Língua Portuguesa podem ser autorais”. Uma aventura de pensar para narrar, narrar para pensar
tempos e espaços constituintes do meu aprendizado acerca de minha experiência como
professora.
A intervenção compõe-se de uma paisagem em que constam as situações que vivi
enquanto produtora de textos e enquanto professora de Língua Portuguesa em escolas da rede
pública de ensino. Ao apresentar um plano de trabalho-pesquisa para turmas de 6º ano do
Ensino Fundamental, utilizei memórias e reflexões sobre minha prática, experiência para
delinear um perfil provisório para a unidade escolar, para os alunos, para as demandas... O
caráter provisional justifica-se pelo fato de que o pensar e o produzir o projeto acontecerem no
ano anterior à intervenção e também ao caso específico de se tratar do 6º ano que, no CEMMB,
é o ano inicial, já que esta escola atende ao Ensino Fundamental 2, ao Ensino Médio e à
Educação de Jovens e Adultos.
As minhas inquietações enquanto professora – já mencionadas aqui – conduziram uma
trajetória que oscilava muito em termo de concepções de língua. No entanto, reconheço que o
27
tradicional e o normativo sempre alicerçaram as minhas práticas, embora isso representasse um
incômodo.
Nesse terreno, o projeto de intervenção, antes uma projeção a partir da realidade, teve
como objetivo geral perceber como o processo de escrita na escola pode ser autoral. Esse
objetivo apresenta-se como a materialização de questionamentos advindos de minha condição
de professora6, reelaborados e traduzidos como uma possibilidade de ensino de Língua
Portuguesa na Educação Básica. Constitui-se também como a proposição de um fazer no
processo de ensino-aprendizagem posto neste memorial e, por isso, disposto em diálogo. A
possibilidade de me autocentrar como detentora e controladora do saber esmaece-se neste
desenho cartográfico porque o dialógico constitui-me e permite-me a experiência de ser
professora.
Acredito que, no processo de ensino-aprendizagem de Língua Portuguesa, esses
questionamentos são essenciais para que o professor busque as respostas e conduza sua prática
baseada nelas. Entretanto, a concepção de língua adotada pelo professor é o elemento norteador
que poderá fazê-lo perscrutar caminhos que lhe apontem modos de fazer coerentes com o
contexto histórico-social do qual faz parte ou conservem-no no lugar de repetir fórmulas
descontextualizadas. Dessa forma, se eu entendo a língua como o que foi sintetizado por
Marcuschi (2008, p. 61) – “um sistema de práticas com o qual os falantes/ouvintes
(escritores/leitores) agem e expressam suas intenções com ações adequadas aos objetivos em
cada circunstância, mas não construindo tudo como se fosse uma pressão pura e simples” –
será possível a mim compreender o processo de ensino-aprendizagem que proponho (a mim
mesma e aos alunos) e tentar soluções para os problemas que surjam em sala de aula.
Se possuímos uma justificativa para se ensinar leitura e escrita, é porque temos
estabelecido em nossas concepções de ensino que o domínio desse binômio, na sociedade
grafocêntrica da qual fazemos parte, é uma das condições para legitimação enquanto ser social,
aqui entendido não como Fonte única de sentido, nem como ser assujeitado (MARCUSCHI,
2008, p. 68-69), porém, aquele que se constrói na presença do outro.
É para o aluno como sujeito da linguagem, “aquele que ocupa um lugar no discurso e
que se determina na relação com o outro” (MARCUSCHI, 2008, p. 71), que a escola deve ser
pensada. Para isso, há que se deixar espaço para se tratar do processo de produção do texto
como um todo, desde as leituras que vão dar suporte para que os alunos explorem e proponham
as ideias pretendidas – inclua-se aí a “leitura” de mundo, da “palavramundo” (FREIRE, 1998,
6 Refiro-me àqueles questionamentos propostos por Geraldi (2011, p. 40): “Por que ensinamos o que ensinamos?”
e “Para que as crianças aprendem o que aprendem?”, anteriormente citados.
28
p. 9) – até a transferência gráfica dessas ideias. Esse processo de registrar o que se pretende e
tornar “claras” ao leitor suas ideias não pode ser resumido apenas às etapas de planejamento e
de registro: a reescrita, após a releitura que reavalia, reorganiza, pode ser necessária até mais
que uma vez.
No entanto, essa prática não tem feito parte do cotidiano escolar que tenho vivenciado:
textos são propostos pelo professor, escritos pelos alunos, corrigidos pelo professor, devolvidos
com breves comentários, no máximo. Não existe uma devolutiva planejada para a reescrita
(aqui considerada como todo o processo de reconstrução textual) baseada na ativação de
conhecimentos linguísticos, enciclopédicos, textuais e interacionais (KOCH; ELIAS, 2012, p.
37-52).
A prática com reescrita textual parece ser uma possibilidade de estimular a revisão da
escrita entre os alunos, está de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua
Portuguesa (1998, p.77):
a refacção faz parte do processo de escrita: durante a elaboração de um texto, se releem
trechos para prosseguir a redação, se reformulam passagens. Um texto pronto será
quase sempre produto de sucessivas versões. Tais procedimentos devem ser ensinados
e podem ser aprendidos.
Além disso, é minha hipótese que a escrita exercida como processo pode levar os alunos
a exercitar a sua constituição como autor. Nesse exercício constitutivo, autonomia e autoria
aparecem imbricadas: o autor surge da prática da autonomia e esta reforça-se pelo saber-se e
exercitar-se autoral. No sentido proposto por César (2011, p. 93) citando Castoriadis, a
autonomia apresenta-se como pretensa7 superação das diferentes formas de heteronomia –
regulação e legislação do outro – e associa-se à formação da autoria, o fazer refletido, lúcido,
sustentado sobre um saber efetivo, mas não absoluto e ilusório (CÉSAR, 2011, p. 92).
Rodrigues (2011, p.17-18) considera que há condições para a construção do sujeito-
autor: a publicização do escrito, a responsabilidade de quem escreve e o reconhecimento do
outro. A exposição possibilita a quem escreve a oportunidade de ver a si mesmo com o olhar
de leitor; a responsabilidade diz respeito à capacidade de responder pelo que criou, vendo-o
como seu e vendo-se como criação de si mesmo e o reconhecimento do outro. Essas condições
compatibilizam-se com a concepção de autoria proposta por Tfouni (2010, p. 55-56), para quem
7 O termo “pretensa” tem a intenção de significar a ilusão acerca da desconsideração da heteronomia, uma vez que
a condição de linguagem humana pressupõe a interação e o dialogismo, enquanto atividades responsivas que
imanentemente conduzem a existência do sujeito em sociedade e demandam valoração constante de si mesmo, do
outro e de si para o outro.
29
autor e sujeito do discurso estão em inter-relação constituindo-se como aquele capaz de
estruturar seu texto procurando encaminhar o leitor a posições específicas de leituras desse
texto.
Considerando esse panorama, a autoria estará em relação imbricada com o poder?
Respondo afirmativamente quando concebo que o autor é aquele que está autorizado ao
discurso e que se autoriza e é autorizado pelo seu discurso. Discurso este constituído pelos
discursos de outros e para outros. O empoderamento configura-se nessa relação entre autorizar
o outro a reconhecer-lhe em sua autonomia e responsabilidade por um dizer e, por isso, ser
autorizado e valorado pelo outro.
Nesse contexto, a consideração e a valorização das práticas de letramento já
internalizadas e utilizadas pelos alunos é essencial para que, se necessário, outras sejam
mobilizadas e, no conjunto, conduzam-nos ao maior domínio das competências de leitura e
escrita. Prática de letramento aqui é compreendida como proposto por Kleiman (2005, p.12):
conjunto de atividades envolvendo a língua escrita para alcançar um determinado objetivo numa
determinada situação, associada aos saberes, às tecnologias e às competências necessárias para
sua realização.
O projeto de intervenção apresentado propôs observar se o exercício de escrita e
reescrita de textos por alunos do 6º ano, materializados em gêneros discursivos pertencentes ao
domínio discursivo interpessoal, representou produções com indícios autorais. A escolha de
gêneros pertencentes ao domínio discursivo interpessoal deve-se ao fato de que, a priori,
parecem conferir mais explicitamente o status de autor a quem escreve. Entretanto, outros
gêneros poderão ser requeridos pelo contexto e deverão ser alvo de estudo também. O que
aconteceu e será explicitado em sequência.
Desse modo, idealizei os seguintes objetivos específicos:
reconhecer a concepção de linguagem que tem norteado meu fazer pedagógico;
apropriar-me das teorias sobre letramento, gêneros discursivos, escrita e reescrita
textual, autoria, autonomia;
conhecer a cultura escolar da qual faço parte;
entender o processo que envolve a produção de textos;
observar as habilidades relacionadas à escrita já adquiridas pelos alunos da turma de 6º
ano;
30
compreender a reescrita como etapa fundamental do processo de escrita, exercitando-a
e valorizando-a de modo que os alunos a percebam como necessária nas práticas pertencentes
ao contexto escolar e fora deste;
identificar se a escrita e a reescrita de textos constituem-se como espaços de construção
da autoria na escola especificamente para a turma de 6º ano;
reunir e publicizar as produções textuais dos alunos.
2.2 A escola
Os deslocamentos percorridos nesta aventura de narrar e dar a conhecer trazem-me para
o ambiente em que trabalho como professora: o que há de físico e humano em sua constituição.
O Colégio Estadual Monsenhor Manoel Barbosa (doravante CEMMB) – em que trabalho no
regime estatutário de 20 horas semanais há 15 anos e também ambiente para o qual propus a
intervenção já mencionada – está localizado no Conjunto Guilherme Marback, setor 2, s/n,
bairro do Imbuí. Muito próxima dos bairros Boca do Rio e Pituaçu, essa unidade escolar foi
inaugurada há quase 30 anos. Inicialmente seu nome era Escola de 1º Grau Monsenhor Manoel
Barbosa e atendia às séries iniciais do Ensino Fundamental, na época, chamada de Educação
Integrada. Ficou nessa condição por dois anos até que, em 1986, passou a oferecer apenas o
Ensino Fundamental II. Em 2003 estendeu sua abrangência às turmas do Ensino Médio. Essa
Unidade Escolar funciona em três turnos e com os níveis assim distribuídos: matutino e
vespertino com Ensino Fundamental II e Ensino Médio que também é oferecido no noturno
junto com a EJA II (Educação de Jovens e Adultos).
A matrícula do letivo de 2015 registrou 1025 solicitações para os três turnos. Segundo
o que observo e sou informada pela coordenação pedagógica, o alunado do CEMMB é formado
por indivíduos das classes populares e é originário principalmente dos bairros Boca do Rio,
Pituaçu, Costa Azul, mas há também aqueles de outros relativamente próximos: Pernambués,
Sussuarana, Mussurunga. No início de cada ano letivo, os discentes são informados sobre os
horários do colégio que são assim definidos:
turno matutino que tem início das aulas às 7h30min (intervalo ocorre em dois
momentos: de 9h10min até 9h30min e de 10h até 10h20min) e término às 12 horas;
turno vespertino que tem início das aulas às 13h30min (intervalo ocorre em dois
momentos: de15h10min até 15h30min e de16 h até 16h20min) e término às 18 horas;
turno noturno que tem início às 19h e término, às 22h.
31
O CEMMB possui 16 salas de aula, todas equipadas com TV Pendrive, sendo que uma
dessas é de informática (que dispõe de 10 computadores os quais devem ser utilizados pelos
alunos durante as aulas da disciplina Informática), já tivemos internet wi-fi aberta; há ainda uma
sala de vídeo com aparelhos de som, TV e DVD e dois projetores multimídia, uma quadra
poliesportiva descoberta, uma área de convivência que também é refeitório, uma cozinha,
almoxarifados, salas para secretaria, diretoria, vice-direção, coordenação pedagógica e para o
Programa Mais Educação8. Há ainda uma biblioteca que tem 2000 títulos, que possui sistema
de empréstimo das obras para todos que pertencem à comunidade escolar e estejam cadastrados
para tal: alunos, professores e funcionários.
No que se refere à estrutura administrativo-pedagógica, o CEMMB apresenta:
um diretor: Gideon Ribeiro Cardoso e três vice-diretoras: Ana Paula Costa Ganem
(matutino), Aldenízia dos Santos (vespertino), Maria José Caldas Melo (noturno);
duas coordenadoras pedagógicas: Jonalina Márcia Mendes Carvalho, Rita Samara
Araújo Machado Santos e a coordenadora do Projeto Mais Educação: Maria de Fátima
Sales da Silva.
um total de 45 professores.
O espaço do colégio é cedido semanalmente para a comunidade que utiliza a quadra
poliesportiva para a realização de campeonatos de futebol e a cozinha para o preparo de
refeições distribuídas à população carente do bairro e redondezas. Acredito que sejam atitudes
positivas uma vez que demonstram à comunidade que o espaço da escola pode ser utilizado
para além do que tem sido feito normalmente: aulas em salas; cadeiras enfileiradas; exercícios
no quadro, no livro, no caderno, uma atividade extra esporádica como uma visita a um museu,
ou a algum ponto da cidade.
Com estrutura física razoável e muito melhor do que tenho visto em outras escolas da
rede estadual em Salvador, percebo algumas falhas que vêm se renovando há alguns anos.
Os aparelhos de TV Pendrive não funcionam há muito. Quando eram novos, havia a
ideia de que poucos podiam lidar com a tecnologia e os professores, em sua maioria, sequer
tentaram. Ficaram esperando uma capacitação da secretaria, o que não aconteceu. Os poucos
professores que tentaram fazer uso da TV encontraram como entrave a pouca disponibilidade
dos funcionários em providenciar as chaves que abriam os cadeados dos dispositivos
8 Criado como uma estratégia para introduzir a ampliação da jornada escolar, esse programa permite às escolas
públicas municipais e estaduais que o aceitem, conforme o projeto educativo em curso, optar por desenvolver
atividades para acompanhamento pedagógico; educação ambiental; esporte e lazer; direitos humanos em educação;
cultura e artes; cultura digital; promoção da saúde; comunicação e uso de mídias; investigação no campo das
ciências da natureza e educação econômica.
32
antivandalismo que ainda hoje guardam os aparelhos que continuam lá nas salas. Ocupam um
espaço de possibilidades tornadas inviáveis.
Isso acontece também com os computadores da sala de informática: além do número ser
pequeno para turmas com 35 alunos, encontram-se sem uso devido à falta de manutenção que
só pode ser realizada por empresas cadastradas pela Secretaria de Educação que não
comparecem para fazer o serviço, mesmo já tendo sido informadas da necessidade. A rede wi-
fi representa outra situação de descaso: a informação que tenho é que técnicos da mesma
Secretaria de Educação desativaram-na no ano passado (2014) e reativaram-na, porém, com
uma senha que é desconhecida por todos.
A quadra descoberta não oferece condições de ensino-aprendizagem das modalidades
esportivas de modo minimamente confortável e as aulas de Educação Física ficam limitadas à
teoria nas salas de aula convencionais e partidas de futebol. Devido a isso, ouço comentários
negativos das estudantes sobre as aulas e vejo a baixa frequência delas nessas aulas. Não foi
sempre assim. Entre os anos 2000 e 2002, havia outras modalidades esportivas como handebol,
voleibol e ginástica rítmica e uma maior participação dos estudantes nas aulas e nos
campeonatos internos e externos promovidos pela própria coordenação e professores da escola
e de outras unidades escolares do entorno.
O Programa Mais Educação não funciona a contento devido a vários fatores, entre eles
estão os recursos não repassados pelo órgão público em tempo hábil, a falta de especialização
dos instrutores e a baixa remuneração paga a eles, as tentativas malsucedidas de articulação
entre a coordenação do programa e as necessidades reais dos alunos da escola. Tudo isso resulta
em baixa adesão, desinteresse e abandono por parte dos estudantes.
Esse é o chão em que piso pelo menos quatro vezes por semana. Realidade que digo
conhecer e que me surpreende sempre, pois o novo chega todos os dias reelaborado a partir do
que já está lá e não reconheço sempre porque não tenho como dar conta do todo. Tento interferir
em algumas de suas refrações. O 6º ano é uma delas.
No Ensino Fundamental de nove anos, o 6º ano se constitui como um divisor de águas,
porque representa uma nova forma de se vivenciar a escola: o aluno terá que administrar as
novas disciplinas somadas às já conhecidas; a segmentação de conteúdos, que antes poderiam
ser abordados mais interdisciplinarmente; os professores especialistas que se responsabilizam
apenas por suas áreas e conduzem o aprendiz a fragmentar suas responsabilidades escolares.
Não há como negar que essa é uma etapa, de certo modo, confusa e inquietante para os
educandos e para todos que fazem parte da comunidade escolar. Ao professor da disciplina
Língua Portuguesa, especialista que é, caberá dar continuidade ao desenvolvimento das
33
habilidades que tornem os alunos competentes nos usos da leitura e da escrita nas mais diversas
situações. No entanto, o que tem se observado é que, de acordo com a concepção de língua que
fundamenta a prática do professor, esse objetivo poderá não ser alcançado.
Nesse contexto, já há alguns anos, nós, os professores de Língua Portuguesa, também
os de outras disciplinas, que trabalhamos na referida escola, temos verificado as dificuldades
dos alunos em acompanhar os conteúdos previstos para o citado ano e, não raro, expomos que
eles “têm problema de alfabetização”, “não sabem ler nem escrever”, “não conseguem copiar
do quadro sem errar”, “não são capazes de reescrever um texto”. É uma realidade muito
semelhante àquela descrita anteriormente da escola municipal onde desenvolvi o referido
“trabalho diferente”. Fato é que, no CEMMB nos anos de 2009 até 2012, os índices de
reprovação no 6º ano estão entre 25% a 43%, algo que pode ser creditado às dificuldades de
adaptação ao ano como também àquelas demandadas da problemática acerca da escrita e da
leitura já identificadas no discurso de nós, os professores.
Tentativas têm sido feitas pela coordenação pedagógica, professores e direção em
reverter o quadro descrito: os professores que trabalham com o 6º ano são aqueles que preferem
estar com os menores. Por isso, organizam os conteúdos das disciplinas que lecionam conforme
o que percebem como necessidade dos alunos tanto em relação aos conceitos, como também às
atitudes deles diante da realidade de 6º ano; as reuniões com os pais e responsáveis acontecem
por ano de escolarização com a presença da maioria dos professores, também da coordenadora,
da vice-diretora e do diretor, momento em que são passadas informações sobre o funcionamento
da escola e discutidos temas considerados relevantes para os presentes.
Percebo uma preocupação real com os alunos e seus responsáveis. A escola caminha
na direção de um trabalho mais contextualizado, embora, reconheço, muito ainda pode ser feito
e retomado de práticas anteriores, como oferecer aos responsáveis pelos alunos de todos os anos
condições de participação no cotidiano escolar. Falta também a criação de uma cultura de
diálogo com a comunidade para que ideias tornem-se práticas relevantes para todos: alunos e
seus responsáveis, professores, coordenadores, diretores, funcionários.
Por pensar como Marcuschi (2008, p. 53), que a “escola tem como função primária
levar o aluno a bem se desempenhar na escrita, capacitando-o a desenvolver textos em que os
aspectos formal e comunicativo estejam bem conjugados”, sou levada a acreditar que o
“tratamento” dado pelo professor de Língua Portuguesa aos conteúdos deve ser alicerçado na
compreensão do que é importante – ser significativo, situado e real para a comunidade – para
a aprendizagem, também, que os alunos devem ter a mesma consciência e ser capazes de se
legitimarem enquanto sujeitos que interagem pela e na linguagem.
34
Nesse sentido, quando há a constatação sobre as deficiências de leitura e de escrita em
relação aos alunos do 6º ano, algo a mais precisa ser feito e o caminho, acredito, deve ser
trilhado por todos os partícipes porque são os letramentos propiciados pelas disciplinas
curriculares que podem reverter essa realidade.
2.3 Os alunos
A determinação e a necessidade em responder às perguntas propostas por Geraldi9
(2011, p. 40) e, antes mesmo, às minhas questões, levam-me a iniciar a cartografia sobre o outro
que me constitui como professora: o aluno do 6º ano B do turno matutino do CEMMB.
O procedimento para esse desenho cartográfico foi inicialmente a produção e vivência
de uma sequência didática – descrita no capítulo subsequente – com atividades específicas para
esse (re)conhecer de mais um partícipe da sala de aulas da disciplina Língua Portuguesa. Nesta
sequência didática, a primeira atividade proposta pretendeu levar os alunos à reflexão sobre si
mesmos e à representação das conclusões. Após a motivação com a leitura e discussão do
poema “Quem sou eu?”, escrito por Pedro Bandeira, e questões trazidas por mim e pelos
próprios alunos, estes construíram dois autorretratos com recortes, desenhos, figuras com os
temas “Quem sou eu?” e “Como as pessoas me veem?”. A atividade culminaria com a
apresentação oral e posterior exposição do que foi confeccionado. Entretanto, houve pedidos
em usar o código verbal para essas atividades, o que resultou em duas atividades: a imagética
permeada por legendas e a escrita.
Enquanto cartógrafa e professora-pesquisadora, observadora participante (FINO, 2008,
p. 3), que promove uma investigação sobre e para a prática pedagógica como um movimento
de caráter contínuo e cambiante entre reflexão e ação, estar aberta ao que o campo oferece como
demanda é imprescindível. A produção escrita não estava prevista, mas constituiu-se como
recurso potente para (re)conhecê-los como meus alunos. Os textos produzidos (imagéticos e
escritos), juntamente com um questionário, foram utilizados para a representação do perfil
daqueles que constituem a outra parte do fazer pedagógico.
Esse questionário, que se encontra no Apêndice A (p. 135), é composto de 32 questões
organizadas em quatro partes, a saber:
Parte 1 – Informações pessoais
9 As questões propostas por Geraldi são “Por que ensinamos o que ensinamos?” e “Para que as crianças aprendem
o que aprendem?”.
35
Parte 2 – Informações sobre o que concebem como leitura
Parte 3 – Informações sobre o que concebem como escrita
Parte 4 – Informações sobre conceito e importância de leitura e de escrita
As questões foram elaboradas com base nas informações que, sob meu ponto de vista,
seriam importantes para o alcance do objetivo anteriormente mencionado. Para isso, baseei-me
no modelo de perguntas contido em Rojo (2009). Esta autora, ao final de cada capítulo da obra
referida, propõe uma série de atividades para reflexão sobre os pressupostos abordados. No
capítulo 3, “Letramentos da população brasileira: alfabetismo funcional, níveis de alfabetismo
e letramento(s)” (ROJO, 2009, p. 41-57), a autora compartilha a narração de um dia na vida de
D. Naná para ilustrar todos os eventos de letramento dos quais a personagem participa e
questiona se a realidade dessa senhora está presente na vida de outros brasileiros. Para
responder a esse questionamento, menciona dados do Indicador de Alfabetismo Funcional
(INAF) analisados por outros autores. O INAF 2001 tem como objetivo principal oferecer
informações qualificadas (descritores) sobre as habilidades e práticas de leitura, escrita e
matemática dos brasileiros entre 15 e 64 anos de idade. Também considera o alfabetismo como
“a capacidade de acessar e processar informações escritas como ferramenta para enfrentar as
demandas cotidianas” (ROJO, 2009, p. 44), conceito que, segundo a autora, é bastante
complexo e sociohistoricamente determinado. Lembra, justificando a observação anterior, que,
na primeira metade do século passado, alfabetizado era aquele que sabia escrever o próprio
nome e hoje essa capacidade seria definida como um nível mínimo de alfabetismo. Ainda n
esse capítulo, informações sobre gosto e frequência de leitura dos brasileiros são demonstradas
como aspectos que contradizem a máxima popular “Brasileiro não gosta de ler”, além das que
são referentes à relação mais negativa entre a escola e o sexo masculino, levam à reflexão sobre
o empoderamento, autoestima e protagonismo cidadão do brasileiro. A autora apresenta ainda
as implicações que os dados discutidos podem ter para os letramentos na escola, sugerindo
caminhos de mudança. Em seguida, são dispostas três atividades direcionadas ao leitor,
enquanto interessado em educação linguística e enquanto professor curioso em relação ao perfil
letrado de seus alunos. Encerrando a seção, Rojo propõe atividades cuja finalidade é conhecer
as práticas e eventos de letramento familiares às pessoas de um modo geral e também aos
alunos. Essas atividades serviram de norteamento teórico para os questionamentos contidos no
referido questionário.
Raffel (1999, p. 153-175) e Brantley (1999, p. 274-298) também ofereceram suporte na
elaboração e organização das perguntas, já que propõem diretrizes tanto quanto à pesquisa
qualitativa em sua concepção exploratória como também no que diz respeito à formulação do
36
questionário. Como são originárias da área de Marketing, essas autoras trazem orientações que
envolvem mais diretamente o modo de fazer. Isso pode ser vantajoso porque proporciona uma
visão clara do que pode ser elaborado no que concerne ao questionário. No entanto, pode trazer
desvantagem se for concebido como fórmula pronta para copiar, adaptar e aplicar. Não foi o
caso na atividade desenvolvida (o questionário), já que o propósito do referido instrumento não
está vinculado aos dados numéricos, mas às informações e interpretações das respostas em
consonância com outras abordagens vivenciadas no campo.
O questionário pode ser considerado como um dos traços componentes desse desenho
materializado como o projeto de intervenção que proponho para a turma de 6º ano mencionada.
Movida pelo desejo de conhecer os estudantes, assumo a máscara de cartógrafa e, no
“movimento de criação de sentido” (ROLNIK, 2011, p.37), sigo o manual do cartógrafo dado
à apreciação por Rolnik (2011, p.65-72) e ainda, as orientações de Vóvio e Souza (2005, p. 41-
64) acerca dos “Desafios metodológicos em pesquisas sobre letramento”.
Assim sendo, apresento mais uma vez os requisitos para apreensão e desenho da
realidade que vivencio: um critério, um princípio, uma regra e um breve roteiro de
preocupações. O critério é, conforme Rolnik, fundamentalmente, o grau de abertura para a vida
que cada um se permite (2011, p. 68) e tem como pressuposto o princípio e a procura pela vida
em expansão. Por isso, tende a mudar de princípio sempre que tiver de engendrar novos
caminhos. O meu critério e o meu princípio dizem respeito à busca que faço neste momento:
conhecer meus alunos, saber quem são, como são, talvez, por que são e o que tenho me
permitido nessa investigação-apreensão que é reconhecer-me como parte do campo, revisitar
minhas lembranças enquanto aluna e professora, estar disposta à escuta e a conceber outras
estratégias e planejamentos. Depreende-se daí a regra de ouro do cartógrafo: “há um limite de
tolerância para a desorientação e reorientação dos afetos, um ‘limiar de desterritorialização’”
(ROLNIK, 2011, p. 68, grifos da autora) que se configura como reconhecer meu limite de
apreensão da realidade e de interferência sobre o que está posto. O roteiro de preocupações trata
das questões que me fizeram ir a campo e de outras decorrentes do processo cartográfico inicial:
Quem são esses estudantes? Qual o grau de intimidade que têm com a leitura e com a escrita?
A escola é reconhecida como espaço para o exercício dessas habilidades? Como eles concebem
essas habilidades?
Vóvio e Souza (2005) consideram que, embora o questionário seja um instrumento
pertencente à abordagem quantitativa, este pode ser utilizado combinado com outros
instrumentos para que se possa chegar à compreensão do contexto pesquisado. As autoras
também propõem que uma investigação direcionada pela abordagem sociocultural sobre o
37
letramento deve ter dados gerados e construídos por aqueles que se encontram envolvidos na
investigação, sem que se deixe de atender aos objetivos da pesquisa, numa espécie de
negociação entre as partes. Acrescentam ainda as pesquisadoras:
a preocupação fundamental no processo de geração de dados parece-nos ser a de
reunir um variado conjunto de informações que aproximem o pesquisador dos
sujeitos, de suas histórias e práticas declaradas, da apreensão e da compreensão de
suas realidades e do contexto sócio-histórico em que estão imersos. (VÓVIO;
SOUZA, 2005, p. 50)
Desse modo, o “olho-do-visível” com o “olho vibrátil”10 (ROLNIK, 2011, p. 31, 39, 53)
do cartógrafo apontam para a constituição do perfil da turma de 6º ano B. Auxiliando esse
movimento estão a sensibilidade e a intuição11 de professora e agora pesquisadora. E ainda, a
compreensão de que esse proceder etnográfico encaminha à observação da realidade a partir da
posição de indivíduo pertinente a ela, mas com um olhar “estrangeiro” porque perscruta
entendimentos sob um paradigma antes inexistente.
Num primeiro olhar, de natureza mais descritiva, percebe-se que o questionário em suas
seis páginas foi respondido completamente por 34 alunos dos 35 frequentes e matriculados na
turma, sendo que 34 desses instrumentos foram considerados válidos (um dos alunos não
compareceu durante os dias de aplicação). Esse aproveitamento decorreu da forma de aplicação:
a cada aula de 40 minutos duas páginas foram respondidas, à medida que as questões eram lidas
por mim, professora-pesquisadora. É preciso salientar que, na tabulação dos questionários, foi
utilizado o programa IBM SPSS Statistics 2012 que possibilitou a geração de quatro gráficos e
quatro tabelas. Em vista disso, as respostas utilizadas foram agrupadas em categorias pensadas
a partir do padrão de repetição e similaridade que apresentaram e outras foram transcritas do
modo como registradas pelos alunos no questionário.
O 6º ano B matutino do CEMMB tem 20 meninos e 15 meninas com idade entre 11 e
12 anos. A maioria dos alunos é natural de Salvador, Bahia (91, 2%), e moradora da comunidade
onde a unidade escolar está localizada, a Boca do Rio (97,1%). Esses alunos ainda têm a
brincadeira como atividade mais frequente quando não estão na escola, moram com seus pais
ou com um deles e irmãos e, neste tipo de constituição familiar, a presença da mãe é dominante
(33,3%), seguida dos irmãos (24,1%) e pai (21,8%). Na triangulação (BORTONI-RICARDO,
10 Conforme Rolnik (2011), olho-do-visível corresponde ao olhar natural e físico do ser humano; já o olho vibrátil,
ao corpo sensível diante das consequências dos encontros entre os corpos e suas reações. 11 Sensibilidade e intuição entendidas como um saber resultante do fazer pedagógico de quem está ideologicamente
implicado na cena. 12 De acordo com a IBM, o SPSS Statistics é um software de análise estatística que fornece os principais recursos
necessários para executar um processo de análise: desde o planejamento de construção de dados até a geração de
relatórios com base nas análises.
38
2008, p. 61) dessas informações com textos escritos produzidos por esses mesmos alunos com
a temática “Quem sou eu? ”, foi possível observar que em 72,72% (24 dos 33 textos entregues)
existe menção à família, uma indicação de que a presença desta é um referencial significativo
para cada um deles. Este fato foi confirmado em roda de conversa realizada com a intenção de
avaliar as atividades desenvolvidas nas primeiras semanas de aula.
A roda de conversa aconteceu durante dois horários e começou com a realização de uma
dinâmica de relaxamento com música, seguida da distribuição de bombons e posterior entrega
dos textos produzidos nas aulas anteriores. Após reverem todo o material, foram convidados a
expressar suas opiniões sobre as aulas, os pontos positivos e negativos, como achavam que
poderiam ser as próximas aulas, se achavam importante estar na escola, o que sugeriam como
conteúdos para o aprendizado, se a família era importante para a aprendizagem.
Durante a referida roda de conversa, no momento em que se trouxe à discussão “a
família e sua importância”, houve maior participação dos alunos presentes com comentários
bastante similares e complementares: “Sem ela eu não teria nascido” (Vânia)13. “Um ajudar o
outro.” (Sílvio), “Incentivo” (Renata), “Meu pai está sempre me incentivando a estudar para
quando eu crescer ter um bom emprego” (Reinaldo).
As perguntas contidas no questionário direcionam para a organização de informações
que julguei importantes na época e que me conduziram à descoberta de aspectos e de relações
antes invisíveis. O envolvimento com o corpus parece fazer, neste caso, com que eu me afaste
da situação para entendê-la; contudo este é um afastamento simulado, no sentido de que não
posso deixar de ser quem sou primeiramente: professora de Língua Portuguesa do 6º ano turma
B do turno matutino do CEMMB. As informações que tenho à minha disposição afetam-me
(também são afetadas por mim porque ganham contornos resultantes do encontro) e levam-me
a compreender como o que está posto interage com meu desejo: conhecer essas meninas e esses
meninos.
Meninas e meninos que afirmam gostar de ler (76,5%) – os que não gostam somam
23,5% – entendem, em sua maioria, a leitura como decodificação (50%) e aprendizado (32,5%):
“É quando agente pega tipo um papel e ler o que tem lar, isso e leitura. (sic)14” (Márcia) e
“Leitura é um modo de você aprender coisas diferentes.” (Diana). Houve aqueles que não
responderam (7,5%) e também os que consideraram a leitura como preparo para o futuro (5%):
“Leitura é muito importante por que se você não souber ler nunca vai conseguir um trabalho”
(Ian). O Graf. 1 explicita esses dados e traz a categoria “Outros” (5%) que organiza as respostas
13 Os nomes dos alunos foram substituídos por outros fictícios para preservar suas identidades. 14 A transcrição dos registros escritos dos alunos respeita o modo como estes constam nos questionários.
39
sem repetição ou similaridade com as que foram registradas. São respostas que expressam a
leitura como forma de diversão e comunicação: “Leitura é um modo de se comunicar.” (Mirna)
Fonte: Dados construídos pela professora-pesquisadora
Também reconhecem a leitura como muito importante (76,5%) e importante (17,7%)
para o aprendizado (41,2%) – este aspecto já citado como definição para leitura – “Porque
aprende muitas coisas.” (Anita) e para a formação imediata ou futura (29,4%): “Porque se você
tiver um dever pra tira (sic) do texto, você tem que ler.” (Leila), “Porque é para um futuro
melhor.” (Beatriz), como demonstra o Graf. 2.
Gráfico 1 – O que é leitura?
Outros; 5,0%
Futuro; 5,0%
Aprendizado; 32,5%
Decodificação; 50,0%
Não responderam; 7,5%
O que é leitura?
Outros
Futuro
Aprendizado
Decodificação
Não responderam
40
Fonte: Dados construídos pela professora-pesquisadora
Ao cruzar as informações registradas no questionário, posso apresentar duas possíveis
interpretações:
as respostas acerca da importância da leitura são fórmulas prontas, preparadas para
garantir a simpatia e/ou não-perseguição do professor de Língua Portuguesa e/ou advindas
do discurso dos mais velhos;
ou esses alunos têm uma concepção de leitura que encara essa atividade em dois níveis:
o da escola/sala de aula (obrigação) e o fora da escola/sala de aula (o prazer).
As respostas que corroboraram para a sugestão das hipóteses anteriores revelam que as
preferências de leitura estão entre o que é publicado em redes sociais como Facebook e
WhatsApp (40,3%), revistas (17,1%) e jornais (8,5%): notícias, romances, esportes, poesias,
comédias que não estão relacionadas diretamente com o que é da escola (sala de aula), local
que fica em terceira posição (20,7%) quando são mencionados os lugares onde eles têm maior
contato com a leitura – a própria casa (31,7%) e biblioteca (24,4%).
Outro aspecto relacionado às práticas de letramento dos estudantes diz respeito à
influência da família: 94,1% afirmam que na família outras pessoas têm o costume15 de ler,
15 A referência ao costume não pôde ainda ser esclarecida em termos de frequência. Em roda de conversa posterior,
os alunos não conseguiram responder com qual frequência essas pessoas leem.
Muito importante76,5%
Importante 17,7%
Pouco importante2,9%
Insignificante 2,9%
A leitura é...
Muito importante
Importante
Pouco importante
Insignificante
Gráfico 2 – A leitura é…
41
dentre esses, a mãe é a mais referida (38,6%), seguida do pai (25%). A Tab. 1 descreve com
mais detalhes essas informações:
Tabela 1 – Quem são as pessoas da sua família que têm o costume de ler?
Quem são as pessoas da sua
família que têm costume de ler?
Respostas
Ocorrências Percentual
Pai 11 25,0%
Mãe 17 38,6%
Irmãos 7 15,9%
Outros 9 20,5%
Total 44 100,0% Fonte: Dados construídos pela professora pesquisadora
Outra informação depreendida é que mães e pais têm preferência pela leitura de jornais
(29,3%), bíblia (22%) e revistas (19,5%). A Tab. 2 explicita melhor os dados coletados:
Tabela 2 – O que as pessoas de sua família leem?
O que as pessoas da sua
família leem?
Respostas
Ocorrências Percentual
Jornais 12 29,3%
Bíblia 9 22,0%
Revistas 8 19,5%
Outros 12 29,3%
Total 41 100,0% Fonte: Dados construídos pela professora pesquisadora
Tais dados levam à explicação sobre a escolha dos alunos: são suportes, gêneros aos
quais eles têm acesso em suas casas, ambiente em que eventos de letramento – situações
caracterizadas pelo uso da fala relacionada a textos escritos e livros, envolvendo a compreensão
dos textos (KLEIMAN, 2005, p. 23) – parecem ser frequentes.
Se há eventos de letramento em casa, em outros ambientes, a prática de leitura também
é significativa: 70,6% dos alunos responderam que pessoas do círculo de amizade/convivência
têm costume de ler, sendo que os amigos e colegas de classe respondem por 73,3% das
ocorrências de companhia para a leitura. A opção destes concentra-se nas revistas e nas histórias
em quadrinhos.
O fato de estarem aparentemente expostos a eventos de letramento, dentro e fora do seio
familiar, talvez explique por que alunos e alunas, em sua maioria, consideram a escrita como
42
ação e registro de ideias (60%): “Uma coisa que escrevemos tipo livros, revistas e Etc... (sic).”
(Leila); aprendizado (20%): “Escrita é muito importante, escrita é aprender a escrever.” (Iara);
comunicação (8,6%): “É uma forma de se comunicar.” (Rogério). A categoria “Outros” (11,4%)
demonstrada no Graf. 3 representa aqueles que não responderam ou registraram não saber o
que é escrita. O referido gráfico ilustra o quantitativo dessas concepções.
Fonte: Dados construídos pela professora-pesquisadora
A escrita também é definida como muito importante (60,6) e importante (39,4%).
Essas definições foram justificadas de modo abrangente:
aprendizado (16,2%): “importante por que as pessoas aprende (sic) escrever
melhor.” (Renata);
formação (16,2%): “É a escrita que gera a leitura e dar (sic) futuro.” (Martim);
necessidade/utilidade (13,5%): “Porque a gente precisa dela.” (Vânia);
ajuda a prática escolar (10,8%): “Para que agente possa tipo fazer um Bom
texto, responde com a palavra correta as Questões (sic).” (Márcia).
O Graf. 4 demonstra a situação referida:
Gráfico 3 – O que é escrita?
Registro 60%Aprendizado 20%
Outros 11,4%
Comunicação8,6%
O que é escrita?
Registro
Aprendizado
Outros
Comunicação
43
Fonte: Dados construídos pela professora-pesquisadora
Chama a atenção também que, no cruzamento das respostas, do total dos que
responderam fazer uso da escrita (97,1%), 65,9% dizem utilizá-la principalmente na escola; em
casa o índice é de 22,7%. Ainda sobre a escrita na escola – ação e registro de ideias – têm-se
que:
38,9% das respostas sobre o que se escreve são concernentes a atividades
escolares: “Copiar todos os dever no caderno (sic).” (José);
depois aparecem assuntos próprios do Facebook (25,9%) e
dos diários (11,1%).
Em relação à leitura, registram-se duas diferenças:
a instituição escolar como reconhecidamente local de uso da escrita e
a “existência” admitida de aulas de escrita: 85,3% dos alunos responderam
afirmativamente, talvez devido a esse reconhecimento.
Nesse caso, é válida uma observação: no dia de aplicação desta última parte do
questionário, os alunos, certamente já acostumados com a dinâmica das perguntas, sentiram-se
Muito importante60,6%
Importante 39,4%
A escrita é...
Muito importante
Importante
Gráfico 4 – A escrita é…
44
mais seguros para respondê-las, ainda que insistissem em fazê-lo primeiro oralmente – já que
eu estava lendo para todos. Numa dessas ocorrências, um aluno respondeu negativamente, ao
que outro imediatamente retorquiu que estavam na escola para ler e escrever o que,
provavelmente influenciou as respostas.
Ainda se comparando as questões sobre a leitura e a escrita (O que é “leitura”? e O que
é “escrita”?), é possível identificar similaridades: no que diz respeito a ambas estarem
relacionadas ao aprendizado (Graf. 1 e Graf. 3) e aos questionários registrarem o percentual
igual para a utilização da leitura e da escrita pelos familiares – 94,1%. Nesses percentuais, a
mãe aparece com maior recorrência (45,3% para escrita e 38,6% para leitura) seguida do pai
(22,6% para escrita e 25% para leitura). A Tab. 3 traz o detalhamento:
Tabela 3 – Quais são as pessoas da sua família que têm o costume de escrever?
Quem são as pessoas da sua
família que têm o costume de
escrever?
Respostas
Ocorrências Percentual
Mãe 24 45,3%
Pai 12 22,6%
Irmãos 7 13,2%
Outros 10 18,9%
Total 53 100,0%
Fonte: Dados construídos pela professora pesquisadora
A escrita entre eles materializa-se em listas de mercado, bilhetes, estudo, mensagens,
SMS (Short Message Service), Facebook. Confira Tab. 4.
Tabela 4 – Sobre o que as pessoas de sua família escrevem?
Sobre o que as pessoas da sua família
escrevem?
Respostas
Ocorrências
Percentual
Lista de mercado 9 17,6%
Estudo 7 13,7%
Bilhetes 9 17,6%
Cartas 1 2,0%
Facebook 3 5,9%
Mensagens/SMS 6 11,8%
Outros 16 31,4%
Total 51 100,0%
45
Fonte: Dados construídos pela professora pesquisadora
Na roda de conversa realizada posteriormente para avaliação das atividades
desenvolvidas e tentativa de esclarecimento de questões suscitadas a partir do questionário, os
alunos mostraram-se muito preocupados com a presença da filmadora. Embora tenhamos
conversado algumas vezes sobre essa possibilidade, foi notável o quanto ficaram incomodados
com a situação. Alguns alunos que se revelaram participativos em sala com reflexões, sugestões
e com a organização das aulas não se manifestaram verbalmente, mesmo quando chamados à
participação. As questões quanto ao valor, ao aprendizado, à crítica e às sugestões sobre as
atividades desenvolvidas até o momento da roda foram respondidas muito superficialmente por
poucos alunos. Como já explicitado anteriormente, a maior participação nessa atividade deu-se
com relação ao papel e à importância da família para a vida deles.
Enfim, o perfil da turma: meninos e meninas pré-adolescentes, moradores da Boca do
Rio, que estão inseridos em práticas letradas em boa parte do tempo de suas vidas; eles dizem
gostar de ler, o que, para a maioria, normalmente não acontece na escola ou na sala de aula; e
escrever prioritariamente na escola; têm pais e mães, amigos que são leitores de revistas,
jornais, Bíblia, mídias de relacionamento, escritores de listas, bilhetes, mensagens, histórias,
ações com as quais se identificam e também praticam16. A concepção de leitura da turma parece
determinar que esta existe para atividades obrigatórias que são pré-requisitos para um futuro
longínquo – talvez, por isso, sem sentido e representatividade na escola – e para deleite,
informação, apreensão do mundo real e pulsante quando se apresenta necessária e plena em
significado. Já a escrita assume o contorno de exercício escolar, um elemento imprescindível
sem o qual a escola não tem razão de existir e também de prática de interação com o outro e
consigo mesmo.
16 Parece haver uma contradição entre os alunos revelarem que escrevem principalmente na escola e afirmarem
que, em ambientes extraescolares, também fazem usos da escrita. Acredito que a aparente contradição pode ser
explicada com base na comparação entre o volume de materiais escritos na escola (exercícios, produção de textos,
avaliações etc.) e aquele resultante de usos para além do ambiente escolar: bilhetes, mensagens em redes sociais,
listas de compras etc.
46
3 CARTOGRAFIAS DA ESCRITA
A valoração creditada à escrita em nossa sociedade foi percebida por mim muito cedo.
As experiências pessoais e profissionais que se constituíram a partir de seu uso, o respaldo das
orientações oficiais e a dificuldade já referida quanto à conquista da habilidade de escrever dos
alunos conforme os padrões definidos pela escola levaram-me, há muito, a elegê-la como foco
nas atividades de Língua Portuguesa associada às práticas de leitura.
A conexão entre leitura e escrita, no início da minha atuação docente, pareceu a mim
uma relação de causa e consequência: quanto mais se exercitava a leitura, maior a habilidade
para a escrita. A minha formação escolar e acadêmica apontava nessa direção, incluindo-se
também a premissa de que a habilidade para a escrita estava proporcionalmente condicionada
ao volume de conhecimento gramatical aprendido. Herança das concepções de linguagem cujo
foco na língua como um sistema pronto para expressão do pensamento ou como instrumento de
comunicação excluíam o sujeito-leitor/escritor do sistema linguístico, ora considerando-o como
(pré)determinado por esse mesmo sistema, ora centralizando-o na posição de controlador de
uma representação mental transcrita que deve ser apreendida com a mesma essência com a qual
foi idealizada. Nos dois panoramas, o texto, seja na perspectiva de quem escreve ou naquela de
quem lê, é um produto17 que deve ser concebido através do código ou da utilização mental
deste.
Na prática de sala de aula, essas orientações funcionaram por muito pouco tempo.
Acredito que nunca foram efetivamente muito úteis. O encontro entre as subjetividades18
durante as aulas jogou-as por terra. Identifico algumas ocasiões que ilustram o exposto. Havia
alunos que conseguiam “dominar” o código (conhecimento gramatical), embora não fossem
capazes de escrever um texto em que demonstrassem esse saber em associação à coerência e
pertinência das ideias transcritas. Por outro lado, havia alunos que conseguiam produzir textos
coerentes e pertinentes quanto à exposição de fatos e ideias e não tinham “domínio” da
modalidade padrão da língua. Ainda havia aqueles que se apresentavam como leitores e/ou
oradores competentes e não revelavam habilidades equivalentes na escrita. A produção textual,
segundo essas concepções, era orientada por uma perspectiva linear e mecânica composta de
17 Refiro-me ao texto como produto porque, segundo as formas de conceber a linguagem seja como expressão do
pensamento ou como instrumento de comunicação, há a ideia de que o texto só é bem produzido e lido por quem
domina o código, o que é o bastante e o suficiente para dispensar linearidade, clareza e o caráter de definitivo ao
que está escrito. 18 Subjetividades entendidas como formas de interação do ser humano com o mundo conforme as suas relações
com a realidade: como o simboliza, como o compreende, como o refuta, como o sente. Tfouni (2010, p. 74) afirma
que essa concepção de subjetividade se refere ao “lugar que o sujeito do discurso ocupa para falar de si próprio. ”
47
três fases: pré-escrita, escrita, reescrita, em acordo com o modelo teórico positivista-
experimental ou com o modelo cognitivista que pressupunha um sujeito escritor individualizado
e concebia como contexto da escrita o estímulo, a pré-escrita, o começo, a elaboração textual,
a reformulação e a edição que ocorrem simultaneamente e se influenciam mutuamente
(GARCEZ, 2010, p. 24-27). Não se considerava a linguagem como lugar de interação humana,
apenas a mecanicidade do processo.
A busca pela reconstrução da minha prática encaminhou-me a vislumbrar uma
possibilidade de ensino-aprendizagem e, sob a luz das orientações baseadas no
sociointeracionismo de Vygostky, ações foram pensadas e vividas em sala, mas muito
incipientemente, com resultados quase esperados ou também nenhum. Nesse período, a minha
formação tradicional compunha um quadro difícil de ser modificado e foi caracterizado por
uma miscelânea metodológica: muitas vezes tradicional; algumas, interacional.
A concepção de que a linguagem é uma construção social originada e sustentada
pela/na/para a interação entre os sujeitos serve de teoria fundante para as sequências de aulas
(didática) planejadas e executadas na intervenção proposta como projeto durante o primeiro
semestre do PROFLETRAS na UFBA. Imprescindíveis foram os estudos teórico-práticos
realizados nos três semestres para a (re)constituição desse “novo” paradigma.
Dessa forma, faz-se necessário esclarecer que, como movimento19 metodológico da
pesquisa qualitativa, a referida intervenção, embora planejada a priori, construiu-se
substancialmente à medida que foi vivida – um desenho nos moldes da cartografia viva que é o
chão de uma sala de aula. As vicissitudes inerentes do fazer pedagógico real no tempo-espaço
de escola pública na cidade de Salvador no ano letivo 2014 – paralisações de funcionários de
apoio das escolas, tempo de aula reduzido em 10 e 20 minutos durante três unidades didáticas,
falta de energia elétrica e de merenda escolar, aulas suspensas devido ao excesso de chuva,
feriados estendidos, campanhas de vacinação e de medicação para os alunos – revelaram-se
como situações não previstas e de influência significativa no constituir da intervenção.
Diante do contexto explicitado, segue a descrição do movimento metodológico
vivenciado com os alunos do 6º ano turma B no turno matutino no Colégio Estadual Monsenhor
Manoel Barbosa aqui concebido como familiarização porque significou conhecimentos.
Explico ainda que, por ser professora-pesquisadora, o desenho dessa cartografia apresenta
superposições e simultaneidades de ações, reflexões, acontecimentos. O intercâmbio entre essas
19 Chamo de movimento porque pressupôs idas e vindas, revisões, reflexões, reescritas.
48
ações reforça o caráter qualitativo20 da pesquisa que se constituiu a partir do seguinte corpus:
um questionário aplicado com os alunos, uma roda de conversa, três produções textuais
(incluindo as reescritas) desses mesmos alunos e o diário de bordo formulado pela professora-
pesquisadora.
3.1 Familiarização com a sala de aula
A primeira fase desse movimento foi concebida com o objetivo de conhecer os alunos
individualmente – já explicitado na seção anterior “Cartografias do campo: Alunos” – e utilizou
uma sequência de encontros (ocorridos durante as aulas) de teor etnográfico. Fundamentar os
procedimentos na pesquisa etnográfica significa entender a investigação como um plano de
trabalho aberto, flexível, cujos focos são revistos constantemente, as técnicas de coleta,
reavaliadas, os instrumentos, reformulados e os fundamentos teóricos repensados (ANDRÉ,
1995, p. 30); enfim, um processo de descobertas. À época, foi a metodologia adequada ao
caminhar inicial da intervenção.
Posteriormente, compreendi que o proceder etnográfico esteve presente em todo o
processo, desde a fase de preparo e reconhecimento de mim mesma – autoetnografia: interface
do paradigma interpretativista cuja centralidade está na compreensão dos significados
atribuídos por mim mesma, professora-pesquisadora, às minhas ações – passando pelo
momento de ações e reflexões dentro da sala de aula e fora desta até este instante em que me
proponho a escrever, repensar, revisar, reescrever, levar a púbico essa experiência.
A postura de cartógrafa revela-se ainda mais a partir dessa fase de familiarização em
que as ações iniciais buscaram conhecer os alunos e possibilitar que eles me conhecessem
também. Desse modo, considerarei, nesta cartografia, o que foi efetivamente trabalhado e
constituído nas semanas de (re)conhecimento. Conceber essas semanas de convivência como
um período de (re)conhecimento significa compreender que, mesmo estando na mesma unidade
escolar por mais de uma década, a cada ano letivo, o fazer pedagógico se (re)inventa para
sobreviver e conviver com as subjetividades que chegam, as que já são conhecidas e que se
moldam no decorrer dos anos. A escola é assim.
As sequências didáticas construídas durante a intervenção sofreram influência de muitas
vozes lidas, ouvidas, experienciadas: Antunes (2008), Cosson (2006), Goulemot (2001),
20 Segundo Bortoni-Ricardo (2008, p. 34), a pesquisa qualitativa tem como objetivo entender e interpretar
fenômenos sociais pertencentes a um dado tempo-espaço.
49
Kleiman (2005; 2007), Koch e Elias (2012), Leffa (1999), Marcuschi (2008), Meurer (1997),
Oliveira (2010), Rojo e Cordeiro (2004), Schneuwly e Dolz (2004), Schneuwly, Dolz e
Noverraz (2004), Soares (2012), Solé (1998), entre outros e que são retomadas durante toda a
escrita.
As reflexões que vão delineando os traços nessa cartografia encaminham para o fato de
que não há novidade na utilização de textos nas aulas de Língua Portuguesa, mas o modo como
essa utilização se deu ao longo dos anos é que tem se revelado como ponto de partida para o
que foi proposto como intervenção na pesquisa. Assim, conforme Rojo e Cordeiro (2004, p. 7-
16), desde a década de 1980, no Brasil, o texto tem sido a base para o ensino-aprendizagem da
Língua Portuguesa. Esse posicionamento foi caracterizado pela mudança de foco nas aulas da
referida disciplina, substituindo o ensino com base na gramática normativa e em todos os seus
regramentos pelo ensino procedimental, fundamentado na leitura de textos e produções escritas
elaboradas a partir dessas leituras (também chamado de ensino criativo). Em seguida, muda-se
parcialmente o foco e o texto passa a ser usado como suporte para o desenvolvimento de
estratégias e habilidades de leitura e redação. Essa abordagem trouxe como consequência o
ensino dos “tipos textuais escolares, por excelência – narração, descrição e dissertação” (ROJO;
CORDEIRO, 2004, p. 8) – como formas globais e ainda como pretexto do princípio de que o
domínio das regras potencializa o saber fazer. A percepção de que efetivamente não havia
resultados satisfatórios com a abordagem descrita e a instituição dos Parâmetros Curriculares
Nacionais de Língua Portuguesa, no final da década de 1990, orientaram as práticas de ensino
de textos conforme a noção dos gêneros discursivos, considerando-se os contextos de circulação
e produção desses, incluindo os de natureza oral. Essa mudança de concepção constituiu a
virada discursiva ou enunciativa.
Advinda de uma escola de base tradicional anterior à virada enunciativa, aprendi com
textos, como pretextos, que a língua é normativa e que o domínio desse princípio garantiria
proficiência exemplar em leitura e em escrita. Como professora de Língua Portuguesa, também
aprendi que o modelo tradicional de ensino-aprendizagem dessa disciplina na escola não cabe
como possibilidade universal e irrefutável nem para mim, muito menos para os alunos. Não que
os estudantes sejam piores ou melhores; o que há é a mudança de paradigmas que nos orientam
a atender às demandas sociais, culturais, políticas, econômicas e históricas do mundo, levando-
nos, talvez nos impondo, a pensar em possibilidades tão logo transformadas em práticas
significativas. Uma delas é entender o ensino da Língua Portuguesa não apenas na perspectiva
da normatividade, mas, e, principalmente, sob a égide das regularidades, uma língua-em-função
50
(ANTUNES, 2009, p. 37) que seja assumida em sala de aula como o que ela é: esteio das
práticas sociais humanas.
A língua-em-função trabalhada nas aulas de Língua Portuguesa aparece experienciada
em textos pertencentes ao universo dos sujeitos-alunos ou ainda por eles desconhecidos, no
entanto, necessários a sua formação e influência crítica perante o mundo. A consciência dessa
necessidade é que justifica a utilização de textos materializados em gêneros diversos, embora,
como alerta Antunes (2009, p. 38-39), a escola que tem como “preocupação a formação do
cidadão deve estabelecer como objeto de estudo textos que se constituem como construções e
interpretações de um dizer e de um fazer, que existem como ‘ponto de encontro’ (grifo da
autora) entre dois sujeitos historicamente presentes num aqui e agora definidos”.
Nesse diálogo com os autores referidos – que considero uma conversa no entrelugar
instituído como leitura, inferência, criação – ainda me detenho nas reflexões de Antunes (2009,
p. 53) quando esta lembra que o ensino de Língua Portuguesa precisa
chegar no âmbito das práticas sociais e, daí, ao nível das práticas discursivas (grifo
da autora), domínios em que, na verdade, são definidas as convenções do uso
adequado e relevante da língua, desse domínio é que se pode perceber os modos de
construção dos textos concretos, aqueles historicamente reais e situados no tempo e
no espaço.
O grande desafio está em como fazer essa passagem sem incorrer em equívocos, como
utilizar a teoria com as velhas práticas de ensino de uma língua apenas sob as perspectivas
gramatical e textual desvinculada da realidade histórico-cultural dos alunos e, por isso, pouco
significativas.
Consciente desse desafio e em busca de uma dentre as diversas maneiras de ensino de
Língua Portuguesa, é que propus a intervenção baseada no estudo de gêneros discursivos
demandados a partir da realidade e da necessidade discursiva dos alunos. Koch e Elias (2012,
p. 61) lembram-nos, inclusive, de que o domínio do gênero consiste no próprio domínio da
situação comunicativa, o que pode ser assegurado mediante o ensino das aptidões requeridas
por um determinado gênero. Estas autoras trazem ainda que o ensino a partir dos gêneros pode
ser uma forma de empoderar professores e alunos. Os primeiros teriam mais liberdade e
segurança para planejar um ensino significativo que poderia facultar aos aprendizes
conhecimentos mais abrangentes sobre as práticas de linguagem nas práticas sociais.
Sendo um estudo de cunho etnográfico – o que não significa chegar ao campo sem
nenhuma pretensão ou hipótese –, as minhas intenções enquanto cartógrafa e professora-
51
pesquisadora levaram-me a delinear a intervenção sob a forma de sequências didáticas
organizadas conforme os direcionamentos apresentados por Dolz e Schneuwly (2004). A
escolha dessa metodologia deveu-se ao entendimento de que essa forma de organização dos
procedimentos didáticos é o que mais se adequa ao trabalho com gêneros discursivos e
letramento literário, considerando-se o ambiente em que a língua é concebida como lugar de
interação humana.
Segundo Dolz e Schneuwly (2004, p. 43), as sequências didáticas são estratégias que
buscam confrontar os alunos com práticas de linguagem historicamente construídas, os gêneros
discursivos, para lhes dar a possibilidade de reconstruí-las e delas se apropriarem. A
reconstrução e a apropriação dependem da interação de três fatores:
as práticas de linguagem que serão aprendidas, já que, ao mediar a comunicação,
fazemos-no através dos gêneros discursivos; nesse ponto concordam Antunes
(2009) e Dolz e Schneuwly (2004): não há como conceber um trabalho em
língua na perspectiva interacionista, fora do domínio dos gêneros discursivos;
as capacidades de linguagem dos aprendizes que dizem respeito às aptidões para:
adaptar-se às características inerentes ao contexto de uma situação discursiva;
mobilizar modelos discursivos e dominar operações de natureza psicolinguística
além de unidades linguísticas adequadas;
as estratégias de ensino dispostas na sequência didática cujo objetivo principal
é intervir de maneira positiva na progressão das habilidades dos alunos.
Cada um desses três fatores foi elemento balizador para as etapas (conjunto de aulas)
das duas sequências didáticas construídas para a intervenção. Essas sequências resultam da
apropriação dos direcionamentos apresentados por Schneuwly e Dolz (2004), Dolz, Noverrraz
e Schneuwly (2004), Cosson (2006) e Solé (1998) quanto à organização sistemática do ensino
com base nos gêneros discursivos e no letramento literário, como já referido. A aproximação
entre as proposituras desses autores no que se refere à metodologia em sala de aulas de Língua
Portuguesa pareceu-me muito oportuna para a intervenção, ainda mais quando o foco do fazer
pedagógico é a leitura e a escrita na perspectiva das práticas de letramentos.
Desse modo, nas sequências descritas adiante, os momentos de leitura e escrita
encontram-se, na maioria das etapas, intercalados, o que suscita, pelo menos, uma questão: se
parto da premissa de que é possível identificar traços autorais na escrita dos alunos, por que
incluir entre as atividades aquelas prioritariamente de exercício da leitura?
A explicação é que acredito no caráter de indissolubilidade entre práticas de leitura e de
escrita, ainda mais no ambiente escolar, mais especificamente, nas aulas de Língua Portuguesa,
52
espaço-tempo autenticamente dedicado ao ensino, à aprendizagem, à produção e à utilização de
textos. O que construí, no sentido de realização teórico-prática, buscou levar em consideração
os letramentos existentes na sala de aula e as oportunidades em que a interação – práticas de
linguagem (SCHNEUWLY; DOLZ, 2004, p. 62) – permitiu ampliação dos conhecimentos dos
alunos acerca do papel da leitura e da escrita em nossa sociedade. A escolha de alguns gêneros
já usualmente presentes na escola – poema, letra de música, diário pessoal, relato de
experiência, resumo, filme, trailer, romance, sinopse, resenha – fundamentou-se nas
considerações já referidas e também na necessidade de demonstrar o valor da escola enquanto
lugar que pode construir um link entre o que acontece fora dela em termos de práticas sociais
de uso da escrita e o que pode vir a fazer parte das aulas, bem como o movimento inverso: as
práticas de escrita apreendidas na escola utilizadas para além de seus muros.
Reconheço e concordo que os gêneros, quando escolarizados, ganham uma nuance
artificial, como afirmam Schneuwly e Dolz (2004, p. 65):
A particularidade da situação escolar reside no seguinte fato que torna a realidade
bastante complexa: há um desdobramento (grifo dos autores) que se opera em que o
gênero não é mais instrumento de comunicação somente, mas é ao mesmo tempo
objeto de ensino-aprendizagem. O aluno encontra-se num espaço do “como se” (grifos
dos autores), em que o gênero funda uma prática de linguagem que é, necessariamente,
em parte fictícia, uma vez que é instaurada com fins de aprendizagem.
No entanto, acredito que cabe à escola ser esse espaço-tempo para valorização e
ampliação do conhecimento de mundo do aluno quando busca potencializar o que cada um traz
e o que é institucionalmente considerado como digno para alicerçar uma sociedade também
digna para a existência humana. Nesse caso, levar em conta os gêneros discursivos conhecidos
dos aprendizes, utilizando-os como ponto de partida para outras experiências de linguagem é o
princípio seguido na intervenção. Compreendo que esse tipo de procedimento aproxima os
alunos da escola na medida que aquilo que é aprendido ganha significado porque está associado
ao que já se sabe.
Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p.82), quando expõem o procedimento “sequência
didática” para o oral e a escrita, enfatizam que a finalidade daquela é auxiliar os alunos a
dominarem melhor um gênero, de forma que possam escrever ou falar adequadamente em
situações de comunicação. Aqui esclareço que a palavra comunicação, muito utilizada por esses
autores, não remonta à concepção de língua enquanto instrumento meramente de comunicação.
Esses pesquisadores, em diversas oportunidades, informam que a comunicação a que se referem
diz respeito à interação humana pela e na linguagem através das práticas, atividades e ações de
53
linguagem. O esquema desse modelo de sequência didática constituiu-se como uma das
fundamentações para a experiência de ensino-aprendizagem que exponho neste memorial, uma
vez que traz subsídios teórico-práticos sobre o processo de produção textual que é a base da
intervenção.
Assim, são quatro as fases (etapas) da sequência que compreendem a apresentação da
situação, a produção inicial, os módulos e a produção final. Na apresentação inicial, é
explicitado aos alunos o trabalho que será desenvolvido, oferecendo a estes o maior número
possível de detalhes acerca do gênero abordado, a justificativa e a finalidade de escolha, o
destino da produção final. A produção inicial refere-se à produção textual inicial motivada
numa situação mais próxima da realidade e que tem por objetivos: fornecer ao professor uma
visão geral sobre as habilidades linguístico-textuais dos alunos para que possa, a partir daí,
construir os módulos de atividades potencializadoras das habilidades pré-existentes e
iniciadoras daquelas que precisam ser conquistadas; e demonstrar para os alunos o que eles são
capazes de construir. Dolz, Noverraz e Schneuwly (2004, p. 87) afirmam que a produção inicial
é o primeiro lugar de aprendizagem da sequência didática. Vejo razão nessa afirmação, porque
professores e alunos têm, por meio dessa atividade e conforme os encaminhamentos previstos
e realizados, a oportunidade de conhecer sobre si em relação aos conteúdos e sobre os outros e
acionar estratégias para superação das dificuldades. Entretanto, para que essa capacidade seja
desenvolvida, é preciso que existam momentos na sequência com atividades direcionadas ao
despertar dessa consciência.
Entendo que os módulos, estabelecidos como ocasiões para reforço dos aspectos
positivos, revisão, correção das produções, podem ser também o espaço-tempo de
autoavaliação tanto do professor no que concerne ao seu trabalho, quanto dos estudantes, em
relação ao que aprendem ou não aprendem. Além disso, os módulos, embora tenham existência
estabelecida a priori, configuram-se como etapas de natureza plástica dependente das
necessidades de cada turma. A produção final corresponde ao encerramento da sequência
culminada com a elaboração do texto final resultante do que foi conquistado nas etapas
anteriores.
Ainda sobre a organização do proceder durante a intervenção, serviram-me as
orientações de Cosson (2006, p. 33) quanto ao trabalho para letramento literário: proporcionar
para os alunos sempre o que é atual21 e contemporâneo, mesmo que representem o cânone. Esta
é uma abordagem que busca o equilíbrio através da escolha diversificada de textos conforme
21 Para Cosson (2006), obras literárias atuais são aquelas que possuem valor para os leitores independentemente
de serem contemporâneas a eles.
54
critérios como gênero, complexidade, faixa etária etc. Com base na premissa de que a leitura
não é uma atividade apenas individual, mas um comportamento social em que o significado não
está apenas no leitor nem no texto, mas também nas convenções de interação social em que
ocorre o ato de leitura (LEFFA, 1999, p. 27), os procedimentos adotados na sequência didática
procuraram sempre seguir a proposta de letramento literário idealizada por Cosson (2006).
Para este autor, o processo de leitura pode ser concebido em três etapas: a antecipação,
a decifração e a interpretação e, conforme a abordagem teórica conciliadora, aparecem
concretizadas numa sequência básica composta por quatro passos: motivação, introdução,
leitura e interpretação (COSSON, 2006, p. 51).
A motivação é a etapa que visa preparar os alunos para a leitura do texto através de
atividades que promovam uma aproximação do leitor com a obra. A introdução objetiva
apresentar o autor e a obra e estimular os aprendizes a pensarem nos motivos que levaram à
escolha de um autor ou texto e não de outro; além disso, alerta Cosson (2006, p. 61) que essa
não deve ser uma atividade que demande muito tempo, apenas o suficiente para contextualizar
o texto (até fisicamente quando se tratar de livros) e seu autor.
A leitura é a etapa que permite o acompanhamento de como os alunos leem, no sentido
de identificar possíveis dificuldades, auxiliar a superação delas, orientar para os objetivos da
leitura. Para isso, são estabelecidos intervalos, que são momentos específicos para discussão de
aspectos inerentes à obra com socialização de comentários. Esses intervalos possibilitam ao
professor verificar o grau de legibilidade da obra, de interesse e de letramento dos alunos.
A interpretação, segundo Cosson (2006, p. 64), é a parte de entretecimento dos
enunciados, que constitui as inferências, para chegar à construção de sentido do texto, dentro
de um diálogo que envolve autor, leitor e comunidade e, devido a sua complexidade, pode ser
pensada para a proposta de letramento literário, em dois momentos: o interior e o exterior. O
interior, de caráter individual, compreende a leitura, a decifração das palavras, quando o texto
ganha sentido para quem lê e está condicionado por interferências externas. O exterior consiste
na exposição da interpretação como algo construído, significado em determinada comunidade,
com o compartilhamento e a ampliação do que foi constituído individualmente durante a leitura
e pode ser registrado e socializado fora dos muros da sala e da escola.
As ideias de Solé (1998, p. 67-161), quanto à necessidade de ensino-aprendizagem das
estratégias de leitura na escola, são complementares às orientações de Cosson (2006). Com esse
foco, Solé (1998, p. 75) propõe que o professor atue de modo contínuo nas três etapas que
compõem o processo de apreensão da leitura: antes, durante e depois. As estratégias, nessas
etapas, permitirão desde a adoção de objetivos de leitura e a atualização de conhecimentos
55
prévios relevantes, passando pelo estabelecimento de inferências várias, a revisão e a
comprovação da própria compreensão durante a leitura e a tomada de decisões cabíveis diante
de erros e falhas na compreensão até culminarem na recapitulação, no resumo do conteúdo e na
ampliação do conhecimento adquirido durante e depois da leitura.
Para Solé (1998, p. 76), o papel do professor é essencial nesse processo de ensino-
aprendizagem em que atua como modelo e proporciona situações através das quais os alunos
são orientados a agirem com autonomia e a gerirem as suas estratégias para ler textos. A autora
entende “as situações de ensino-aprendizagem que se articulam em torno das estratégias de
leitura como processos de construção conjunta, nos quais se estabelece uma prática guiada
através da qual o professor proporciona aos alunos andaimes necessários para que possam
dominar progressivamente essas estratégias e utilizá-las depois da retirada das ajudas iniciais.”
(2006, p.77)
Concordo com Solé (1998, p. 92-93) quando esta defende que nenhuma tarefa de leitura
deve ser iniciada sem que os alunos se encontrem motivados e saibam o sentido da atividade.
Nas atividades de leitura vivenciadas durante a intervenção, sempre informei para os alunos o
que seria feito, além de reforçar que eles seriam capazes de fazê-lo e que o resultado seria algo
interessante e significativo. Além disso, levei em conta outra ideia dessa autora: a leitura
compartilhada. Nesse momento, as atividades são pensadas e executadas com a intenção de dar
suporte aos alunos durante a leitura, verificando as dificuldades e auxiliando-os, socializando
modos de pensar sobre o que está sendo lido. A leitura compartilhada é semelhante ao processo
de “andaimagem” trazido por Cosson (2006), que o denomina de intervalo da sequência básica
do letramento literário.
A leitura como produção de sentidos, como defendido por Goulemot (2001, p. 107-121),
foi o que pretendi com as ações das duas sequências didáticas, porque parti do pressuposto de
que, principalmente na escola, leitura e escrita representam traços de um mesmo desenho,
estando, muitas vezes tão imbricadas que aquilo que se pensa metodologicamente para uma
parece servir como pressuposto para a outra. A “andaimagem” referida para a leitura também é
a base do processo de escrita, sobretudo da reescrita.
A leitura e a escrita solicitam de quem lê e escreve a utilização de sua “biblioteca
cultural”, a condição, conforme Goulemot (2001, p. 115), para constituir sentidos. Dessa forma,
cabe ao professor de Língua Portuguesa planejar situações que orientem os alunos a acionar as
memórias acerca dos textos lidos e escritos, porque esse exercício de reencontro é que pode
deixá-los à vontade para vivenciar a textualidade na escola. Considero a textualidade como
proposto por Marcuschi (2008, p. 97): “resultado de um processo de textualização”, em que o
56
texto se constrói a partir de uma relação imbricada e interativa entre linguagem, cultura e
sujeitos localizados historicamente.
As duas sequências apresentadas a seguir partem desse pressuposto e, como já
explicitado anteriormente, são o resultado das orientações teórico-práticas descritas. Ei-las
rememoradas, numa reescrita que mantém o original enquanto ato praticado, mas desdobra-o a
partir das reflexões inerentes a este momento.
3.1.1 Sequência didática 122
Objetivo principal: Conhecer o perfil dos alunos matriculados e frequentes na turma
de 6º ano B, turno matutino, do Colégio Estadual Monsenhor Manoel Barbosa a partir do que
eles pensam sobre si mesmos.
Desenvolvimento
1ª etapa: 2 h/a23
Objetivos específicos: Ler o poema “Quem sou eu?” de Pedro Bandeira e, a partir dessa
leitura, refletir sobre e construir uma resposta para a pergunta que é o título do texto lido.
No primeiro encontro com a turma, nas aulas de 40 minutos24 cada, preferi fazer uma
dinâmica rápida de concentração para que conversássemos mais calmamente. É importante
trazer que os horários, nessa turma de 6º ano, eram divididos em três dias, sendo dois com uma
aula de 50 minutos após o intervalo e um dia com duas aulas (100 minutos) também após o
intervalo, perfazendo um total de quatro aulas semanais (200 minutos). As aulas, após o
intervalo para a merenda, têm sempre o início mais agitado e é uma prática, nesta unidade
escolar, entre alguns professores do 6º ano, promover, sempre que possível, atividades de
concentração. Propus a leitura do poema de Pedro Bandeira “Quem sou eu?”, não sem, antes,
provocá-los acerca do conteúdo do texto que seria lido, pedindo-lhes que lançassem hipóteses
que foram anotadas no quadro. Eis o poema:
Quem sou eu?
Pedro Bandeira
Eu às vezes não entendo!
22 As aulas que constituem essa sequência ocorreram entre 14 de abril e 12 de junho de 2014. 23 A sigla h/a: corresponde à quantidade de minutos utilizados em cada aula na Educação Básica que compreende
os Ensinos Fundamental e Médio; desse modo, são utilizados 50 minutos de uma hora para cada aula. 24 Esclareço que as aulas tiveram seus tempos reduzidos em 10 ou 20 minutos por diversas razões durante o ano
letivo de 2014. Os motivos mais frequentes foram as paralisações dos funcionários de apoio (auxiliares de
disciplina, da secretaria da escola, de limpeza e de cozinha) e a falta de alimentos para o preparo da merenda
escolar.
57
As pessoas tem um jeito
De falar de todo mundo
Que não deve ser direito.
Aí eu fico pensando
Que isso não está bem.
As pessoas são quem são,
Ou são o que elas têm?
Eu queria que comigo
Fosse tudo diferente.
Se alguém pensasse em mim,
Soubesse que eu sou gente.
Falasse do que eu penso,
Lembrasse do que eu falo,
Pensasse no que eu faço
Soubesse por que me calo!
Porque eu não sou o que visto.
Eu sou do jeito que estou!
Não sou também o que eu tenho.
Eu sou mesmo quem eu sou!
Fonte: BANDEIRA, Pedro. Quem sou eu? In: LAJOLO, Marisa. (Org.). Palavras de encantamento. São
Paulo: Moderna, FNDE, 2001. (Coleção Literatura em minha casa, vol. 1).
Distribuí o texto, fiz a primeira leitura oralizada e fomos conferir as sugestões
registradas. Em seguida, orientei-os para a leitura individual e silenciosa e iniciamos a discussão
sobre o conteúdo do poema. Lancei algumas questões para que pensassem em casa, avisando-
os, que, na aula seguinte, conversaríamos sobre as perguntas. Ei-las: Quem é você? Quem é
você dentro da comunidade onde vive? Quem é você aluno?
A escolha de um texto poético deveu-se ao entendimento de que sua temática e seu
gênero eram mais adequados ao objetivo de estimular os alunos a refletirem sobre os sentidos
nele presentes e participarem mais efetivamente das discussões acerca do tema “identidade”.
Compartilho com Cosson (2006, p. 17) a ideia de que o texto literário “nos diz o que somos,
nos incentiva a desejar e expressar o mundo por nós mesmos”. Além disso, utilizar um texto
para estimular a elaboração de outros textos, – no caso específico dessa oficina, textos orais e
escritos não necessariamente pertencentes ao mesmo gênero – é uma prática muito comum nas
aulas de Língua Portuguesa e acredito ter sido o caminho eficiente nesse caso.
Ainda sobre a utilização de texto para produção de outros, concordo com Oliveira (2010,
p. 107) que, em determinadas situações, um texto pode ser usado como pretexto pedagógico,
58
principalmente quando se tem em vista o desenvolvimento da capacidade de produção de novos
textos materializados em outros gêneros pelos alunos. O pretexto pedagógico difere do pretexto
descontextualizado e habitual em aulas de Língua Portuguesa: trazer textos ou trechos para
apenas promover o aprendizado de regras gramaticais. Pedagogicamente, é o uso de textos no
contexto de sua produção, circulação e leitura (LAJOLO, 2009, p. 107) que servirão como base
para construção de sentidos a partir da história e do conhecimento de mundo dos alunos. São
os sentidos impregnados em textos escritos ou orais que, por sua vez, facultarão a produção de
outros sentidos. A exteriorização e o compartilhamento dessas produções eram o que me
interessavam à época e ainda hoje.
Nos dois encontros seguintes, cada um com uma aula de 30 minutos e em dias
alternados, retomamos o poema com comentários meus e dos alunos sobre os versos que mais
chamaram a atenção e se eles refletiam de algum modo algo a vida deles. Depois passamos à
discussão das três questões propostas no primeiro encontro com os alunos se inscrevendo para
fala, ora livremente, ora induzidos. Muitas das respostas foram anotadas no quadro e, no final,
disse-lhes que eles estavam construindo o perfil de suas personalidades, um autorretrato, mas
gostaria de ver aquilo materializado, em minhas mãos, e propus que trouxessem o material de
Arte25, folhas de papel A4 e revistas para o próximo encontro.
2ª etapa: 3 h/a
Objetivo específico: Construir o perfil individual, respondendo à pergunta “Quem sou
eu?” através de imagens.
Nesse encontro, com duas aulas seguidas e reduzidas a 60 minutos, trouxe-lhes uma
apresentação com slides em Powerpoint para mostrar-lhes o que é um autorretrato, mas não
pudemos utilizá-la porque não havia energia elétrica nas salas de aula. Então, procedemos com
a explicação mais teórica e sucinta para chegar até a proposta de construção de um autorretrato
de cada aluno. O autorretrato imagético deveria responder à pergunta discutida: “Quem sou
eu?”
Expliquei-lhes que utilizariam o material de Arte requisitado na aula anterior e as
revistas para compor com as imagens um autorretrato na folha A4. Quando compreenderam
que era um texto imagético, ficaram felizes; porém, alguns relataram dificuldade em conseguir
encontrar imagens nas revistas ou até mesmo desenhar algo que os representasse legitimamente.
Então propuseram escrever um texto no lugar do autorretrato imagético. Não concordei
inicialmente, mas prometi-lhes que depois teriam a oportunidade de escrever. À época, ainda
25 No CEMMB, o material de Arte corresponde a: lápis, borracha, régua, tesoura, lápis de cor, canetas coloridas,
cola, tintas, pincéis.
59
muito impregnada do “poder” a mim concedido como professora, não fui sensível o suficiente
para escutar essas vozes.
A construção do texto imagético foi, em primeira instância, lançada para tentar fugir do
padrão de escrita já habitual nas aulas de Língua Portuguesa, desmontando a ideia de que só há
possibilidade de escrita e leitura na presença do código verbal escrito. A ideia ocorreu após
ouvir alunos perguntarem no primeiro dia de aula se eu, como professora de Língua Portuguesa,
iria colocá-los para escrever muito. Disse-lhe que não de uma vez só, mas aos poucos e de modo
que tivesse sentido para eles.
O registro do diário de campo levou-me a pensar no autorretrato imagético. Na época,
essa ideia pareceu-me a mais adequada, já que a escrita inicialmente planejada havia sido, de
certo modo, refutada por alguns alunos. Ademais, entrevi a oportunidade de vê-los trabalhando
com o novo, algo que lhes estimulasse a ir além do código escrito, na posição tradicional de
sentar-se, pensar, escrever, entregar o escrito à professora e voltar a sentar e esperar novas
instruções. Houve a vontade de vê-los caminhar entre os colegas, negociar a troca de materiais,
folhear as revistas, desenhar, admirar ou não o resultado e facultar-lhes pensar que não só se
escreve nas aulas de Língua Portuguesa. As Fig. 1, Fig. 2 e Fig. 3 que seguem ilustram
momentos da composição dos autorretratos imagéticos.
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
Figura 1 – Construção dos autorretratos imagéticos
60
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
Fonte: Acervo da professora-pesquisadora
No fim das aulas, recolhi os autorretratos iniciados para devolvê-los no encontro da
outra semana.
No encontro seguinte, em uma aula, retomamos a construção do autorretrato. Porque
havia percebido que alguns alunos tinham inserido “legendas” nas figuras utilizadas na
Figura 2 – Aluna com seu autorretrato imagético
Figura 3 – Aluno com seu autorretrato imagético
61
composição do autorretrato, comentei essa atitude e reforcei com os estudantes que, se
quisessem, poderiam fazer como os colegas. Observei que os alunos pareceram não se importar
muito com o comentário, também, posteriormente, constatei que não acataram a sugestão de
inserção de legendas nas figuras na segunda parte do autorretrato. Apenas aqueles que fizeram
na primeira atividade, mantiveram as legendas na composição anterior. Em seguida, lancei a
pergunta “Como as outras pessoas me veem?” para que pensassem e trouxessem as respostas
na aula seguinte. Nessa aula, após socializarmos algumas respostas, conversamos sobre como
a opinião das pessoas pode influenciar nossa forma de viver, de ver e de ser. Orientei-os sobre
como seria o próximo encontro com dois horários: daríamos continuidade ao nosso percurso
imagético compondo uma segunda face do autorretrato. A segunda atividade representaria as
opiniões sobre a pergunta “Como as pessoas me veem?”.
3ª etapa: 2 h/a
Objetivo específico: Construir a segunda parte do autorretrato, respondendo à pergunta
“Como as pessoas me veem?”
Nos dois horários dedicados à construção da segunda etapa do autorretrato, retomamos
rapidamente, como forma de contextualizar a atividade que seria desenvolvida, as discussões
da aula anterior e orientei os alunos a construir o autorretrato com imagens. Poucos tiveram
dificuldade com a representação através de recortes, figuras, desenhos e pediram para escrever
as suas opiniões. Após refletir algum tempo, disse-lhes que poderiam fazê-lo naquele momento
ou em outro posterior, já que era um pedido que ainda permanecia. Ao final das aulas, os
autorretratos foram recolhidos e, como muitos ainda não tinham sido concluídos devido à
redução no tempo das aulas, combinamos que terminariam na outra semana.
4ª etapa: 1 h/a
Objetivo específico: Concluir a segunda parte do autorretrato e revisar o material
produzido.
Nesse momento, os alunos concluíram os seus autorretratos e tiveram oportunidade de
revisar e refazer o que já estava pronto. A apreciação dos textos imagéticos com a intenção de
verificar a adequação destes às intenções de seus autores foi um dos aspectos levantados durante
a atividade em que comentamos sobre o fato de estarmos em interação com outras pessoas em
boa parte do nosso dia. Disse-lhes que apresentariam coletivamente seus textos no próximo
encontro e aqueles que já o faziam em pequenos grupos mostraram-se empolgados. Outros
questionaram e sugeriram apenas expor num mural em sala de aula mesmo. A ideia não foi
muito bem-vinda, uma vez que outros trabalhos já haviam sido expostos e alunos dos turnos
62
vespertino e/ou noturno destruíram as produções. Diante do impasse, ficamos de pensar em
casa e trazer as propostas na próxima aula.
5ª etapa: 2 h/a
Objetivo específico: Socializar os autorretratos oralmente.
Iniciamos a aula com a discussão acerca das propostas sobre o que fazer com os
autorretratos. Os alunos foram taxativos em não querer expor na sala nem no mural geral do
pátio externo com receio de que fossem rasgados. No CEMMB, é muito frequente a atitude de
retirarem ou rasgarem os cartazes afixados nos murais das salas de aula e aqueles localizados
pelos corredores ou no pátio da unidade escolar. O que tenho observado é que, normalmente,
os materiais depredados são os que representam trabalhos dos alunos. Nem sempre isso
aconteceu na escola. Estou lá há 15 anos e, nos anos iniciais desse meu percurso, havia
exposições de atividades e ornamentação constantes sem que nada fosse retirado sem a
permissão dos responsáveis. Talvez essa atitude seja reflexo da mudança no proceder
pedagógico dos professores. Anteriormente, percebia o estímulo e a prática constante em expor
e valorizar os trabalhos de todos na escola, principalmente as atividades da disciplina Arte.
Além disso, as docentes de Arte sempre auxiliavam nas apresentações das outras disciplinas.
No entanto, com a aposentadoria dessas professoras, os substitutos que chegaram à escola não
costumam agir de modo semelhante as suas antecessoras. Entendo que não é ético
responsabilizar os professores de Arte por demover os estudantes dessa cultura de destruição,
nós, professores de outras áreas, temos a obrigação de desmontar esse hábito e mostrar aos
estudantes a importância de respeitar o espaço-tempo de dizer do outro.
Apresentei então a solução de arquivar não só os autorretratos como também todas as
atividades desenvolvidas em uma pasta individual que seria exposta no fim do ano letivo e,
posteriormente, entregue a eles. Concordaram. Em seguida, passaram a livremente expor seus
autorretratos e comentá-los. Após algumas participações, levantei a questão se, mesmo tendo
falado sobre as produções, ainda sentiam necessidade de escrever sobre as perguntas
motivadoras “Quem sou eu?” e “Como as pessoas me veem?”. Perguntaram-me se isso
significaria nota. Afirmei que tudo que faziam era avaliado; então decidiram que fariam o texto.
Orientei-os que a produção seria em classe, o que desagradou alguns, pois tinham a intenção de
escrever em casa ou na banca26. Não concordei, justificando que em sala poderia orientá-los e
avaliá-los melhor.
26 A banca, como é conhecido o reforço escolar particular, é muito frequente na comunidade escolar do CEMMB.
O que tenho observado é que esse recurso é utilizado pelos pais ou responsáveis pelos alunos em duas situações:
ou porque não têm condições de acompanhar os filhos em suas tarefas escolares por conta do trabalho ou outra
63
Em seguida, passamos à apresentação dos autorretratos imagéticos. A intenção foi que
eles se sentissem livres e começassem a perceber a necessidade de organizarem-se para falar e
para ouvir. Orientei-os quanto à importância em ouvir e permitir que o colega se expressasse.
Durante as apresentações, a proficiência de alguns chamou a atenção e falamos novamente
sobre adequação, intenção e aceitação referentes aos textos produzidos.
Com essas atividades, fechei o ciclo em que eu buscava conhecer os alunos a partir da
visão que tinham de si. Um aspecto decorrente dessas atividades foi o fato dos alunos
reconhecerem esses momentos como importantes para si mesmos, tempo-espaço para
perceberem-se como pessoas que têm uma individualidade, uma constituição, uma história de
vida única dentro daquela sala de aula e ainda formada a partir da interação com os outros. Os
comentários sobre as atividades registrados no final endossam essa percepção: “Eu gostei por
causa da forma de responder e conhecer sobre a nossa vida.” (André); “Eu acho muito bom
aprender coisas novas todos os dias e com essas atividades eu aprendi quem sou eu de
verdade.”(Beatriz); “Gostei dessas atividades porque a gente interage, aprende mais.” (Ian);
“Achei muito importantes as atividades que fizemos, assim nos conhecemos melhor e nos
divertimos. Nessas atividades expressamos quem somos!” (Iara). Além disso, houve uma boa
participação dos alunos, muitos opinaram e foi perceptível a preocupação com a aprovação dos
outros.
A produção dos autorretratos ainda se revelou como a oportunidade de fortalecimento
do vínculo entre mim e os alunos e entre eles mesmos. Deixar-se ver pelos seus pares e por mim
legitima-lhes um papel num grupo que lhes impõe valoração. Coracini (2010, p. 46), quando
considera a escrita na escola, afirma que o “aluno deve ter a possiblidade de se dizer, mais do
que dizer, de se expor, mais do que expor, para que vivencie a experiência do estranhamento, a
construção de si” porque essa prática oferece a chance de torná-lo protagonista de sua própria
história, inclusive a história de aprendizagem na escola. Acredito que essa consideração
também foi válida para a atividade de construção dos autorretratos imagéticos: a descontração
e o comprometimento da maioria com a atividade endossaram a valoração positiva acerca da
construção. Essa era a impressão que me conduziu a pensar e insistir no autorretrato imagético
e que se tornou constatação no decorrer do ano letivo. Também houve a contrapartida: conhecê-
los naquele momento fez-me reconhecê-los em seus escritos e em suas atitudes. Acredito que
o planejamento da sequência didática 2 foi orientado por essa percepção de cada um e do todo.
limitação ou porque é solicitado pela coordenação que o aluno tenha um acompanhamento devido a dificuldades
de aprendizado – que, na maioria das vezes, é entendido como necessidade de alguém que o ensine a fazer as
tarefas, embora possa ser de outras ordens.
64
Alguns autorretratos encontram-se reproduzidos a seguir através das Fig. 4, Fig. 5, Fig.
6, Fig. 7 e Fig. 8:
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
Figura 5 – Reprodução dos autorretratos do aluno Paulo
Figura 4 – Reprodução dos autorretratos da aluna Glícia
65
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
Figura 7 – Reprodução dos autorretratos do aluno Reinaldo
Figura 8 – Reprodução dos autorretratos do aluno Paulo
Figura 6 – Reprodução dos autorretratos da aluna Anita
66
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
6ª etapa: 4h/a
Objetivos específicos: Produzir um texto escrito que também fosse um autorretrato,
respondendo às perguntas: “Quem é você?” “Como as pessoas o(a) veem?” “Quem é você
dentro da comunidade onde vive?” “Quem é você aluno?”. Discutir a importância de planejar
a produção de um texto.
Utilizamos dois horários para a produção do autorretrato escrito com base no que foi
construído e discutido nas últimas aulas, incluindo as questões para reflexão. Disse-lhes que o
texto teria a quantidade de linhas necessárias para dar conta do que eles decidissem revelar
porque essa foi a primeira pergunta que me fizeram. Depois, expliquei que todo texto para ser
escrito precisa de um planejamento: o escritor deve estabelecer sobre o quê, como, para quem,
para que e de onde vai falar. Foram minutos de explicação que pareceram não fazer muito
sentido para eles, porque queriam escrever o quanto antes. Deixei-os iniciar a escrita, até
começarem as perguntas: “Tem que ter título?” “É uma história?” “Como eu começo?” “Posso
começar com ‘era uma vez’?” Retomamos a questão do planejamento, o pensar sobre o que vou
escrever, como, por que, para quê e para quem e fomos exemplificando. Como havia pouco
tempo de aula, pedi que registrassem nos cadernos o que foi discutido porque fariam os textos
na outra aula.
67
No dia seguinte, devido à inexistência de professor para duas disciplinas em outras
turmas, o horário de aulas foi remanejado e tivemos dois horários seguidos, fato que permitiu a
escrita dos textos, a socialização voluntária e a entrega deles. O momento de socialização
permitiu, mais uma vez, a percepção de como o grupo se comportava em relação aos colegas
que leram seus textos, revelando as incompatibilidades, as implicâncias de uns em relação a
outros, o respeito, o medo e a desmontagem de algumas tendências preconceituosas muito mais
fortemente que no encontro de exposição dos autorretratos.
Muito além disso, foi visível o empoderamento que a exposição de si para os outros
causou nos alunos: aqueles que foram aplaudidos ficaram visivelmente felizes com o
reconhecimento; outros, que não quiseram ler, prontificaram-se a fazê-lo em busca também da
notoriedade naquele momento e depois porque, em outras oportunidades, ainda houve
comentários elogiosos sobre os textos e seus autores. Retomamos a discussão sobre as questões
abordadas nas aulas anteriores: adequar o que se fala ou que se escreve, segundo suas intenções
para que quem vê, ouve ou lê tenha a possibilidade de aceitá-lo.
Tomar os autorretratos imagéticos para escrever sobre eles ou a partir deles permitiu aos
alunos o exercício da recognição – segundo Berthoff (2011, p. 21), configura-se “a própria
forma e configuração da exploração criativa e do pensamento crítico” – e reinvenção do escrito
de si nas composições. Olhar e olhar mais uma vez é fundante no processo de revisão e reescrita
de textos porque implica na avaliação de si, para si e para o outro. Tornar escritas as imagens
fê-los começar a vivenciar explicitamente o dialogismo presente na interação constitutiva
daquela atividade e a perceber a escrita materializada em suas atitudes.
A observação comparativa entre os autorretratos imagéticos e os escritos faz-me
perceber que as produções escritas mantiveram correspondência com as imagens selecionadas
para as composições dos autorretratos. Entre as 29 atividades completas (autorretratos
imagéticos e textos escritos) apenas três não trazem relação direta entre as figuras e os relatos
escritos. Penso que, embora não tenha aceito de início a produção de textos escritos para compor
os autorretratos, a situação de interação e de conhecimento com os colegas foi positiva e
descontraída. Além disso, a minha negativa não retirou deles o desejo e o compromisso27 com
a escrita, já que apenas uma aluna não fez o texto escrito.
27 Desejo e compromisso que não entendo ingenuamente como atitudes desinteressadas no valor das atividades
revertidos em notas para o bimestre letivo. É frequente o interesse dos alunos em saber se a atividade vale alguma
pontuação para decidirem se farão ou não, comportamento pleno em sentido quando consideramos a cultura escolar
que o institui como algo que lhe é inerente. Não estipulei valor, mas insisti, como sempre faço, que eles são
avaliados em todas as atividades.
68
As imagens utilizadas nos autorretratos permitiram, enquanto representações situadas
naquele contexto, espelhar o modo como os alunos se viam e queriam ser vistos. Os princípios
da intencionalidade, da aceitabilidade e da adequação28 orientaram o proceder dos alunos que
buscavam antecipar o olhar do leitor para suas composições, ora admirando-as, ora consultando
os colegas ou a mim, ora rasgando-as, refazendo-as ou recusando-se a prosseguir. Acredito que
o olhar, a escolha, o recorte e a colagem das figuras assemelha-se muito ao processo de escrita
de textos. Há um cuidado na construção das maiorias dos autorretratos, um fazer que os alunos
experimentaram nos autorretratos imagéticos e que pude perceber na escrita de seus textos.
7ª etapa: 2 h/a
Objetivo específico: Assistir, ouvir, ler, discutir a música “Linhas tortas”, de Gabriel O
Pensador, relacionando as opiniões com o que foi elaborado e aprendido nas últimas aulas.
Nas duas aulas que seguiram, propus a apreciação da canção “Linhas tortas”, de Gabriel
O Pensador, cuja letra segue:
Linhas tortas
Gabriel O Pensador
Alguns às vezes me tiram o sono, mas não me tiram o sonho
Por isso eu amo e declamo, por isso eu canto e componho
Não sou o dono do mundo, mas sou um filho do dono
Do verdadeiro Patrão, do verdadeiro Patrono
- E aí, Gabriel, desistiu do cachê?
- Cancelei um trabalho aí pra não me aborrecer.
- Explica isso melhor, o que foi que você fez?
- Tá tudo bem, eu explico pra vocês:
Tudo começou na aula de português
Eu tinha uns cinco anos, ou talvez uns seis
Comecei a escrever, aprendi a ortografia
Depois as redações, para a nossa alegria
Professora dava tema-livre, eu demorava
Pra escolher um tema, mas depois eu viajava
E nessas viagens, os personagens surgiam
28 Intencionalidade, aceitabilidade e adequação são critérios de textualização e foram utilizados conforme
Marcuschi (2008, p. 93-133).
69
Pensavam, sentiam, choravam, sorriam
Aí a minha tia-avó, veja só você
Me deu de aniversário uma máquina de escrever
Eu me senti um baita jornalista, tchê
Que nem a minha mãe, que trabalhava na TV
Depois, já aos quinze, mas com muita timidez
Fiquei muito sem graça com o que a professora fez
Ela pegou meu texto e leu pra turma inteira ouvir
Até fiquei feliz mas com vontade de fugir
Então eu descobri que já nasci com esse problema
Eu gosto de escrever, eu gosto de escrever, crer ver
Ver, crer, eu gosto de escrever e escrevo até poema
Meu Pai, eu confesso, eu faço prosa e verso
Na feira eu vendo livro, no show eu vendo ingresso
Na loja eu vendo disco, já vendi mais de um milhão
Se isso for um crime, quero ir logo pra prisão
- Ih, pensador, isso é grave, hein!
É, vovó dizia que eu já escrevia bem
Tentei me controlar, me ocupar com um esporte
Surf, futebol, mas não era o meu forte
Um dia eu fiz uns raps e achei que tava bom
Me batizei de Pensador e quis fazer um som
Ficar famoso e rico nunca foi minha meta
Minha mãe já era isso, eu só queria ser poeta
Meu pai, um homem sério, um gaúcho de POA
Formado em medicina, não podia acreditar
Ao ver o seu garoto Gabriel
Com um fone nos ouvidos viajando com a caneta no papel
- O que você tá fazendo? Vai dormir, moleque!
- Ah, pai, peraí, eu só tô fazendo um rap!
Ninguém sabia bem o que era, mas eu tava viciado naquilo
E viciei uma galera!
70
Meu Pai, eu confesso, eu faço prosa e verso
Na feira eu vendo livro, no show eu vendo ingresso
Na loja eu vendo disco, já vendi mais de um milhão
Se isso for um crime, quero ir logo pra prisão
Não tô vendendo crack, não tô vendendo pó
Não tô vendendo fumo, não tô vendendo cola
Mas muitos me disseram que o que eu faço é viciante
E vicia os estudantes quando eu entro nas escolas
Até os professores às vezes se contaminam
Copiam minhas letras e textos e disseminam
Sementes do que eu faço, já não sei se é bom ou mau
Mas sei que muito aluno começa a fazer igual
Escrevendo poemas, escrevendo redações
Fazendo até uns raps e umas apresentações
Me lembro dos meus filhos e a saudade é cruel
Solidão me acompanha de hotel em hotel
Casamento acabou, eu perdi na estrada
O amor que ainda tenho é o amor da palavra
É falar e cantar, despertar consciências
Dediquei a vida a isso e maior recompensa
É servir de referência pra quem pensa parecido
Pra quem tenta se expressar e nunca é ouvido
É olhar pra minha frente e enxergar um mar de gente
E mergulhar no fundo dos seus corações e mentes
É esse o meu mergulho, não é o do Tio Patinhas
É esse o meu orgulho, escrever as minhas linhas
Eu escrevo em linhas tortas, inspirado por alguém
Que me deu uma missão que eu tento cumprir bem
Escuto os corações, como um cardiologista
Traduzo o que eles dizem como faz qualquer artista
Que ganha o seu cachê, que é fruto do trabalho
De cigarra e de formiga, e eu não sei o quanto eu valho
71
Mas eu sei que quando eu ganho, divido e multiplico
E quanto mais eu vou dividindo, mais fico rico
Rico da riqueza verdadeira que é de graça
Como um só sorriso que ilumina toda a praça
Sorriso emocionado de um senhor experiente
Em pé há duas horas debaixo do sol quente
Ouvindo os meus poemas em total sintonia
Eu sou ele amanhã, e hoje é só poesia.
FONTE: http://www.vagalume.com.br/gabriel-pensador/linhas-tortas.html. Acesso em 05 de abril de
2014.
Começamos com a previsão do que seria apreciado com a sugestão de hipóteses sobre
o conteúdo do texto, em que gênero discursivo ele pareceria, o porquê do título, quem seria o
autor do texto. Depois passamos à apresentação do clipe. Em seguida, propus a comparação do
que foi proposto inicialmente com os que os alunos depreenderam após a apreciação do clipe.
Também fiz uma explanação participada sobre o texto da música e sua proximidade com o
poema. Depois, partimos para a audição e a leitura da música e passamos aos comentários
acerca dos significados e leituras dos alunos. No final, propus questões norteadoras para serem
resolvidas em casa: 1. Por que, conforme o que você viu, leu e ouviu, o texto foi intitulado
“Linhas tortas”? 2. Você acha que o texto referido é um relato pessoal? Explique. Transcreva
do texto trechos que confirmem sua resposta. 3. Há alguma semelhança entre o que temos feito
em classe e o que o personagem do texto fez? Explique. 4. Você vê algo em comum entre a sua
história de vida e a do personagem do texto? Justifique.
8ª etapa: 3 h/a
Objetivos específicos: Apresentar as respostas dadas às questões norteadoras e discuti-
las. Compreender a língua como variável, as características das modalidades oral e escrita da
língua, das variedades coloquial, padrão e a relação destas com a escola. Começar a produzir
relatos pessoais.
Inicialmente, fizemos a retomada do texto “Linhas tortas” com a socialização das
respostas e explanação participada sobre modalidades oral e escrita da língua, Português
Brasileiro, variedades coloquial e padrão e como todas essas modalidades estão presentes na
escola. Utilizamos como exemplificações as sugestões dos alunos e excertos da letra da canção
72
trabalhada nas aulas anteriores. Para finalizar, os alunos fizeram os exercícios no livro
didático29 que retomam os conteúdos referidos, depois corrigimos coletivamente.
Seguem as reproduções das páginas do livro didático onde constam os exercícios
referidos (Fig. 9, Fig. 10, Fig. 11 e Fig. 12)
Fonte: Tavares e Conselvan, 2012.
29 O livro didático utilizado pelo 6º ano é Vontade de saber português 6º ano de Rosimeire Aparecida Alves
Tavares e Tatiane Brugnerotto Conselvan.
Figura 9 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano
73
Fonte: Tavares e Conselvan, 2012
Figura 10 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano
74
Fonte: Tavares e Conselvan, 2012
Figura 11 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano
75
Fonte: Tavares e Conselvan, 2012
Figura 12 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano
76
Na aula seguinte, após uma conversa rápida sobre os conteúdos abordados, propus a
escrita de um relato sobre o que aconteceu nas aulas com discussão sobre como essa prática
pode ter importância para alunos e professores. Em seguida, houve a escrita coletiva desse relato
(O que aconteceu hoje? Isso foi importante? Por quê? O que poderia ser diferente?) e elaboração
de cronograma para as escritas posteriores. A intenção com essa última atividade era mobilizar
os alunos para mais uma escrita em que eles pudessem se expressar numa narrativa pessoal,
reveladora de si e dos outros. Inicialmente, a atividade foi realizada sem a sistematização de
um relato pessoal, apenas escrevemos conforme o que eles pensavam como modelo do gênero
referido.
9ª etapa: 1 h/a
Objetivos específicos: Retomar a leitura do relato produzido coletivamente, para
reforço da atividade e percepção do nível de compreensão e aceitação da turma. Estabelecer
acordo sobre o cronograma de escrita individual dos relatos.
Começamos a aula com a leitura do relato coletivo construído no encontro anterior, ao
mesmo tempo em que revisava os conteúdos registrados e chamava-lhes a atenção para a
utilidade daquela escrita. Ao terminarmos a leitura comentada, propus a elaboração de um
cronograma de escrita individual de relatos após cada dia de aula da semana. No entanto, os
alunos foram muito resistentes e recusaram-se a escrever esses textos. Sugeri que os textos
fossem escritos numa página da internet, num grupo fechado no meu perfil do Facebook, mas
ainda assim, não aceitaram. Argumentaram alguns: “Ah, professora, Facebook, não é pra isso,
não!” (Gilberto); “O Face não é pra coisa de escola” (Leon); “O Facebook é para nossa vida
particular, não da escola.” (Jorge)30 e outros apenas assentiram. Contra-argumentei que esse
tipo de atitude estava na moda e na mídia, citei o caso da estudante de Santa Catarina, Isadora
Feber, que conseguiu, por meio de seus relatos no Facebook sobre a escola, mudar muita coisa
na realidade da sua unidade escolar31. Os alunos disseram conhecer a história, mas não cederam.
Pedi que pensassem melhor e trouxessem as reflexões para a próxima aula. Eu também faria
isso, e o diário de bordo seria meu instrumento.
10ª etapa: 6 h/a
Objetivos específicos: Discutir a produção dos relatos. Experienciar a reescrita dos
autorretratos, através da revisão dos aspectos da formatação do texto e da pontuação básica.
30 As falas foram transcritas dos registros do meu diário de bordo. 31 O perfil da estudante citada no Facebook tem o seguinte link https://www.facebook.com/DiariodeClasseSC.
77
Com cautela, consciente de que, embora fosse uma intervenção o que eu estava
propondo para os alunos, não poderia impor, nos moldes do ensino tradicional, uma escrita.
Lancei a pergunta sobre o que haviam decidido sobre os relatos. Se acredito no ensino-
aprendizagem que faça sentido para os atores do processo, a desconsideração da autonomia de
escolha dos sujeitos-alunos seria algo impensável, ainda mais quando se trata do aprendizado
da escrita como um processo significativo. Soma-se a isso o fato de, naquele momento,
conceber a sala de aula como um campo de pesquisa de caráter etnográfico, por isso suscetível
ao improvável, por isso, não previsto e impossível de ser controlado por decisões a priori.
Os alunos mantiveram-se irredutíveis: não aceitaram fazer os relatos. Teria que repensar
e replanejar os próximos passos.
Partimos para a devolutiva dos autorretratos produzidos para que fossem reescritos.
Iniciei a aula explicando que fariam a revisão do texto produzido há duas semanas e que, depois
de algumas discussões, fariam a reescrita. Perguntei-lhes quem costumava ler o que escrevia
antes de encaminhar ao interlocutor. Com base nas respostas, a maioria garantiu que assim
procediam. Fiz novo questionamento: por que reescrever um texto pode ser necessário?
Responderam: “Para ficar certo.”, “Para quem ler entender”.
Em seguida, pedi que dissessem o que para eles era importante para compor um texto.
Enquanto falavam, fui escrevendo no computador e projetando no quadro: “organização”,
“palavras corretas”, “ideias boas” foram os exemplos. De acordo com as respostas, questionei
se apenas na escola é que se deveria fazer reescrita de textos produzidos. Disseram que sim e
que não. Perguntei-lhes se, nas redes sociais ou em outras situações de escrita, eles não
revisavam o que haviam registrado. A maioria considerou que sim. Apresentei um texto de Ruth
Rocha em que há marcas de revisão feitas pela própria autora e seus respectivos comentários.
(Fig. 13).
78
Fonte: Rocha e Flora, 1996
A maioria dos alunos disse já ter lido ou ouvido falar na autora. Trouxe dados
biográficos de Ruth Rocha e propus que pensassem se o que ela fazia com os textos seria
Figura 13 – Reprodução de página do livro Escrever e criar – é só começar! 6ª série: a redação através
do jogo e da literatura
79
possível fazer com os nossos. O texto de Ruth Rocha foi utilizado como modelo para as ações
que pretendia ensinar.
Depois, aproveitando as respostas, expliquei-lhes que avaliaríamos coletivamente
alguns trechos retirados dos textos produzidos por eles para verificarmos como se faz uma
revisão, tendo como base alguns pontos. Como os textos já tinham sido vistos por mim, lancei
a sugestão de que os pontos seriam: formatação textual (margens, parágrafo, título); noção de
pontuação (uso da vírgula em enumerações e diante dos adjuntos adverbiais de lugar e tempo
deslocados e uso dos pontos final, de interrogação e exclamação) e separação silábica.
Assim, passamos à apreciação de dois trechos produzidos por alunos da turma para
leitura e identificação do que precisa ser revisto (neste momento, os alunos foram convidados
a propor soluções viáveis para os problemas encontrados e foram explicados e reconstruídos os
conceitos de margem, parágrafo, separação silábica e pontuação básica de acordo com o que os
trechos permitiram) e reescrita coletiva dos trechos transcritos com posterior registro individual
no caderno.
Depois, retornamos ao conteúdo “pontuação” em exercícios propostos pelo livro
didático para análise, comparação e reforço baseados no que o aluno já sabia e do que seria
novo para ele. As reproduções das páginas do livro didático utilizadas nessa atividade
encontram-se representadas pelas Fig. 14 , Fig. 15 e Fig. 16.
80
Fonte: Tavares e Conselvan, 2012
Figura 14 – Reprodução de trecho do livro didático Vontade de saber português 6º ano
81
Fonte: Tavares e Conselvan, 2012
Figura 15 – Reprodução de trecho do livro didático Vontade de saber português 6º ano
82
Fonte: Tavares e Conselvan, 2012
Figura 16 – Reprodução de trecho do livro didático Vontade de saber português 6º ano
83
Em seguida, fizemos a apreciação de mais dois trechos dos textos produzidos pelos
alunos para reescrita coletiva com retomada do conteúdo revisado. Finalmente, os alunos
partiram para a reescrita individual do texto produzido na 6ª etapa.
11ª etapa: 3 h/a
Objetivo específico: Responder ao questionário de pesquisa.
Durante três aulas, em dias alternados, os alunos responderam ao Questionário de
pesquisa sobre principalmente, leitura, escrita, escola e cujo objetivo principal foi estabelecer
um perfil dos alunos com informações. Fracionar o questionário em três partes permitiu que os
alunos pudessem acompanhar a leitura oralizada feita por mim, professora, além de evitar que
respondessem sem a atenção devida em razão do cansaço ou desinteresse.
12ª etapa: 2 h/a
Objetivos específicos: Organizar o portfólio com as atividades produzidas e avaliar
oralmente e por escrito o processo vivenciado nas últimas semanas.
Nas duas aulas, os alunos foram orientados a organizar as atividades elaboradas,
socializá-las livremente, depois, fizeram-no durante a roda de conversa. Esse procedimento foi
utilizado com o objetivo de facilitar a interação entre os alunos, proporcionando uma visão
ampla da sala e dos colegas por todos ali presentes. O funcionamento da roda de conversa
demanda a organização da sala em círculo ou semicírculo, com a presença de um mediador,
que propõe questões para serem respondidas por todos e conduz as participações para que os
presentes possam falar e ouvir quantas vezes forem necessárias e livremente; além disso, fica
facultado a todos também dirigirem questionamentos.
A escrita deste memorial faz-me perceber o quanto de intransigência esteve presente em
minha postura nessa primeira experiência enquanto professora-pesquisadora. Vejo-a e reflito
que o tradicionalismo e o autocentramento dos quais tento despir-me ainda se encontravam
orientando minha prática. O “poder’ a mim concedido como professora, modelada conforme a
ideia de que enquanto estiver nessa posição sou detentora do conhecimento acerca do que é
melhor, do que é necessário aprender, garantiu-me o conforto de decidir o que para mim era o
válido na ocasião de construção dos autorretratos imagéticos e, em seguida, na proposição de
escrita dos relatos pessoais. Porque ainda estava no processo de compreensão do proceder
etnográfico, não fui capaz de descobrir-me nessa condição. A responsabilidade em fazer a
investigação acontecer de acordo com o que eu previa sobre o campo (a sala de aulas de Língua
Portuguesa) também contribuiu para esse direcionamento teórico-prático.
84
Compreendo-me diante da impossibilidade naqueles momentos em dar-me conta de que
a escola, embora alicerçada em princípios que lhe sustentam como lugar da regulamentação, do
controle ou da correção dos corpos (FOUCAULT, 1987, p. 118), pode instigar a busca por
outras formas de constituí-la.
Aqui vejo como os princípios metodológicos da pesquisa etnográfica propostos por
Genzuk (2003, p. 3-4) – naturalismo, compreensão e descoberta – manifestam-se porque o
cenário natural é o ambiente ideal para descobrir, compreender a cultura do grupo, uma vez que
a investigação se desenvolve como um processo em que a indução e as descobertas ocorrem
simultaneamente. A sala de aula, os alunos, a professora e a escola compõem esse ambiente e
fazer parte dele deu-me o privilégio de não ser estranha; contudo essa vantagem reverteu-se e
significou obstáculo, já que conhecer demais a realidade, acostumou-me a ela e garantiu-me o
“poder” de antecipar compreensões sem esperar o tempo necessário que a observação
etnográfica indica.
Proceder etnograficamente como professora-pesquisadora lembra-me de Freire (1996,
p. 12) quando este propõe refletirmos sobre aprender e ensinar: “aprender precedeu ensinar, ou,
em outras palavras, ensinar se diluía na experiência fundante de aprender.” A cartografia, que
se desenha como escrita do memorial, conduz-me a rememorar e refletir retrospectiva e
prospectivamente sobre a minha prática como professora de Língua Portuguesa, concedendo-
me o status de ser aprendiz do ensinado.
3.1.2 Sequência didática 232
Objetivos gerais: Mobilizar os alunos a compreenderem a reescrita como parte
essencial e já praticada no dia a dia de muitos para a produção de textos, de modo que, nesse
exercício e hábito, eles desenvolvam autonomia de escrita e percebam-se autores.
Desenvolvimento
Entre a última atividade descrita e esta que inicia a nova sequência, houve o período de
férias de meio de ano. Por isso, a atividade inicial foi pensada para situar novamente os alunos
dentro do processo que começamos no período anterior: entender e tomar para si a concepção
de que a escrita não é só o produto, mas um processo que deve ser experienciado e pensado
dentro e fora da escola.
32 As aulas que constituem essa segunda sequência ocorreram entre 14 de julho e 12 de dezembro de 2014.
85
Etapa 1: 2 h/a
Objetivos específicos: Trazer livros de literatura para leitura. Estabelecer junto com os
alunos uma produção escrita a partir das leituras realizadas dos livros referidos.
Concordo com Cosson (2006, p. 31) que toda liberdade de escolha do que ler na escola
sempre se constituirá como uma escolha dentro de uma seleção feita por outrem (professor(a),
bibliotecário(a), coordenador(a)). Ainda assim, por acreditar que a escolha guiada pode levar
ao querer optar de uma maneira mais livre, trouxe para os alunos livros cuja temática, em sua
maioria, encontra-se na escrita de diários pessoais ou relatos em primeira pessoa.
Antes das férias de meio de ano, já os havia avisado que traria uma proposta diferente
para os próximos bimestres. Assim, cheguei na sala antes dos alunos e distribuí os livros33 sobre
as mesas para que ficassem bem à disposição da curiosidade inerente àqueles alunos. A Fig. 17
e a Tab. 5 trazem esses livros.
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
33 A maioria dos livros foram comprados por mim, também há alguns exemplares que foram enviados para
avaliação por representantes de editoras.
Figura 17 – Livros de literatura
86
Figura 18 – Quadro com os livros de literatura
1. A conquista da vida (Giselda Laporta Nicolelis, Ilust. Laerte Silvino)
2. Capitão Cueca, vol. 4 (Dav Pilkey)
3. Cida: a empreguete – um diário íntimo (Leusa Araújo)
4. Destrua esse diário (Keri Smith)
5. Diário de aventuras de Ellie – A aluna nova (Ruth McNally Barshaw)
6. Diário de aventuras de Ellie – A verdadeira jogadora (Ruth McNally
Barshaw)
7. Diário de aventuras de Ellie – Amizade é o bicho (Ruth McNally Barshaw)
8. Diário de um banana 1 (Jeff Kinney)
9. Diário de um banana 2 (Jeff Kinney)
10. Diário de um banana 6 (Jeff Kinney)
11. Diário de uma garota nada popular 1 (Rachel Renée Russel)
12. Diário de uma garota nada popular 3 (Rachel Renée Russel)
13. Diário de uma garota nada popular 4 (Rachel Renée Russel) – Dois
exemplares
14. Diário de uma garota nada popular 5 (Rachel Renée Russel)
15. Diário do futuro 1 (Mirai Nikki) – Três exemplares
16. Diário do futuro 2 (Mirai Nikki)
17. Fala sério, mãe! (Thalita Rebouças)
18. Fala sério, pai! (Thalita Rebouças)
19. O adivinhador (Daniel Funes e Sandra Mello, Ilust. Miguel Bezerra)
20. O diário de Dan – Dane-se! (Dan Kirchnev) – Dois exemplares
21. O diário de Dan – Que danado! (Dan Kirchnev)
22. O gênio do crime (João Carlos Marinho) – Dois exemplares
23. O segredo da casa amarela (Giselda Laporta Nicolelis, Ilust. Rogério Borges)
24. Os amores do meu pai (Sônia Rodrigues, Ilust. Márcio Koprowski)
25. Percy Jackson - A batalha do labirinto (Rick Riordan)
26. Percy Jackson - A maldição do titã (Rick Riordan)
27. Poeira de ouro (Cândida Vilares, Ilust. Vera Vilhena)
28. [email protected] (Telma Guimarães)
87
Continuação da Fig. 18
29. Quem fica com Felipe? (Ilsa Lima Monteiro, Ilust. Rogério Borges)
30. Surpresas da vida (Jair Vitória, Ilust. Alexandre Segrégio)
31. Terror na escola (Thomas Brezina, Ilust. Bernard Förth)
32. Um dia do outro mundo (Márcia Kupstas, Ilust. Thaís Linhares)
Fonte: Autoria própria
Quando entraram, ficaram surpresos e muito curiosos. Confesso que foi difícil
conseguir ser ouvida durante muito tempo, já que todos falavam e queriam garantir seu livro.
Expliquei que os livros eram para eles escolherem. Decidimos a organização da escolha e, antes
de começar a distribuição, avisei-lhes que, por estarem em uma escola, na aula de Língua
Portuguesa, teria que haver um retorno da leitura que fariam e que preferia que fosse algo
escrito. A sugestão apareceu imediatamente: “A gente fala sobre o livro.” (José). “Como
assim?” (Professora-pesquisadora). “Escreve como é o livro, a história.” (José). “Que tal um
diário, em que vocês vão registrando essa leitura? Como as coisas que mais chamam a atenção
ou porque são muito boas ou muito ruins?” (Professora-pesquisadora). “Ah, não! Diário é coisa
de menina. Era bom um texto só, uma folha.” (José). “Vocês acham que diário é coisa de
menina? E o Facebook é o quê? É uma espécie de diário, sabiam? Mas se querem um texto só,
tudo bem. A turma concorda que seja um texto só ou querem um diário de leitura?”. A maioria
preferiu um texto só. Prossegui: “Esse texto que fala sobre o livro pode ser uma sinopse. Vocês
sabem o que é uma sinopse?”. “É aquele texto que aparece quando a gente aperta a tecla do
controle da Sky para saber sobre o filme.” (Leon). “Sim, é isso mesmo. Então será uma sinopse.
Todos concordam?”, finalizei. Boa parte assentiu com a cabeça e apressaram-me para a
distribuição dos livros, o que foi feito em seguida.
A escolha do gênero diário ainda demonstra a minha tentativa em encaminhar a escrita
dos alunos para o relato. Acreditava na época que poderia ser mais evidente a utilização de
marcas autorais em textos pertencentes ao domínio discursivo interpessoal. Marcuschi (2008,
p. 194-196) apresenta um estudo em que sistematiza gêneros textuais conforme os domínios
discursivos a que pertencem e as modalidades de uso oral e escrito da língua. O relato e o diário
pessoal aparecem elencados como pertencentes ao domínio interpessoal. Assim os considerei
88
também, partindo do pressuposto que seriam gêneros já escolarizados e artificialmente
realizados; de certo modo, estariam fora de sua situação estabilizada de uso.
As figuras que seguem (Fig. 19, Fig. 20 e Fig. 21) são demonstrativas do primeiro
contato dos alunos com os livros de literatura.
Fonte: Acervo da professora-pesquisadora
Fonte: Acervo da professora-pesquisadora
Figura 19 – Aluna com o livro de literatura escolhido
Figura 20 – Aluno com o livro de literatura escolhido
89
Fonte: Acervo da professora-pesquisadora
Aceitar a sinopse mostrou-me mais uma vez o que foi assumir-me como cartógrafa e
seu critério e princípio (ROLNIK, 2011, p. 65-72): estar aberta para a vida e buscá-la em sua
expansão, que entendo como estar disposta a experimentar o que se acorda como realidade sem
que pense, ingenuamente, que não afetará nada ou ninguém e nem será afetado. O desenho
desse real com seus acidentes e mutações (a minha imposição do autorretrato imagético em
detrimento do perfil escrito requerido por alguns alunos, a rejeição dos alunos ao relato e ao
diário e preferência deles pela sinopse) constitui o registro cartográfico que é este memorial.
Durante seis semanas, perfazendo doze horas-aula, os alunos fizeram a leitura dos livros.
Poucos terminaram antes do prazo. A grande maioria não conseguiu finalizar. Assim sendo,
resolvi enviar os livros para casa de seus leitores num dos vários feriados do período, ainda
mais porque sabia, que entre o final de setembro e o final de outubro, praticamente não teríamos
aulas com dois horários seguidos, já que, às sextas-feiras, a escola estaria fechada devido à
cessão ao Tribunal Regional Eleitoral e aos feriados.
Etapa 2: 2 h/a
Objetivo específico: Verificar e utilizar o conhecimento dos alunos acerca do gênero
sinopse para o primeiro registro escrito.
Figura 21 – Aluna com o livro de literatura escolhido
90
Iniciamos as aulas com a verificação sobre o que os alunos sabiam sobre sinopse. Em
seguida, iniciei uma exposição oral com slides para Powerpoint sobre o assunto e confirmamos
ou não as hipóteses iniciais. Apresentei as sinopses do livro e do filme homônimo A culpa é
das estrelas e fizemos leituras comparativas, destacando aspectos como: para que serve uma
sinopse, a quem esse texto é dirigido, o que é destacado da obra. Abaixo encontram-se as
sinopses.
Sinopse - A Culpa é das Estrelas - John Green
A culpa é das estrelas narra o romance de dois adolescentes que se conhecem (e se
apaixonam) em um Grupo de Apoio para Crianças com Câncer: Hazel, uma jovem de
dezesseis anos que sobrevive graças a uma droga revolucionária que detém a
metástase em seus pulmões, e Augustus Waters, de dezessete, ex-jogador de basquete
que perdeu a perna para o osteosarcoma. Como Hazel, Gus é inteligente, tem ótimo
senso de humor e gosta de brincar com os clichês do mundo do câncer - a principal
arma dos dois para enfrentar a doença que lentamente drena a vida das pessoas.
Inspirador, corajoso, irreverente e brutal, A culpa é das estrelas é a obra mais
ambiciosa e emocionante de John Green, sobre a alegria e a tragédia que é viver e
amar.
Mais informações em: www.aculpaedasestrelas.com
Fonte: Disponível em: <http://www.skoob.com.br/livro/247555-
a_culpa_e_das_estrelas> Acesso em 11 de agosto de 2014.
Sinopse – A culpa é das estrelas: O filme
Não recomendado para menores de 12 anos
Diagnosticada com câncer, a adolescente Hazel Grace Lancaster (Shailene Woodley)
se mantém viva graças a uma droga experimental. Após passar anos lutando com a
doença, ela é forçada pelos pais a participar de um grupo de apoio cristão. Lá, conhece
Augustus Waters (Ansel Elgort), um rapaz que também sofre com câncer. Os dois
possuem visões muito diferentes de suas doenças: Hazel preocupa-se apenas com a
dor que poderá causar aos outros, já Augustus sonha em deixar a sua própria marca
no mundo. Apesar das diferenças, eles se apaixonam. Juntos, atravessam os principais
conflitos da adolescência e do primeiro amor, enquanto lutam para se manter otimistas
e fortes um para o outro.
Fonte: Disponível em: <http://www.adorocinema.com/filmes/filme-218926/ >Acesso
em 11 de agosto de 2014.
Depois apresentei o trailer do filme A culpa é das estrelas para efeito de comparação
com os textos lidos e também o trailer da animação Garoto Cósmico. Propus o exercício de
imaginarmos como seria a história desse garoto apresentado no trailer apenas com o que viram
no vídeo e produzimos coletivamente um pequeno texto nos moldes da sinopse. Sugeri que
assistíssemos à animação já que ficaram curiosos com a história. Não concordaram porque
alguns argumentaram que era um desenho e eles não eram mais crianças, ideia que contagiou a
maioria. Rapidamente ofereci outro filme, Prova de fogo, que foi aceito após dois alunos que
já haviam assistido explicarem um pouco sobre a história. Utilizei esse momento para chamar
a atenção sobre o que os dois alunos fizeram: uma sinopse oral. Combinamos que assistiríamos
ao filme no próximo encontro e que faríamos uma sinopse individual dele.
91
O filme Prova de fogo foi utilizado como sugestão por trazer a história de uma
adolescente americana, estudante de escola pública de periferia, negra e pobre que consegue ser
vencedora do campeonato nacional de soletração nos Estados Unidos. A narrativa é empolgante
e geralmente muito elogiada pelos alunos que se identificam com o perfil da personagem
principal Akeelah Anderson.
Os alunos já conheciam o gênero sinopse e puderam exercitá-lo como produtores ou
interlocutores na oralidade. Por que utilizá-lo para o ensino? Utilizo como argumento o que
Kleiman (2007, p. 4) defende quanto a assumir o letramento como objetivo do ensino conforme
a concepção social da escrita (e da leitura) em que estas são consideradas “práticas discursivas
com múltiplas funções e inseparáveis dos contextos em que se desenvolvem”, o que contrasta
com a concepção tradicional em que o aprendizado da leitura e da escrita resume-se à aquisição
de competências e habilidades restritas ao uso escolar. Segundo a concepção social da escrita
(e da leitura), a questão norteadora para o professor, durante o planejamento das atividades
didáticas, é “Quais os textos significativos para o aluno e sua comunidade?” já que, dentro dessa
abordagem, as práticas sociais de uso da escrita constituem o eixo estruturante das atividades
cuja escolha não está condicionada apenas à progressão do mais simples para o mais complexo,
mas às necessidades e familiaridades dos alunos.
Ademais, facultar escolhas aos aprendizes valoriza-os e, ao mesmo tempo, atribui-lhes
as responsabilidades acerca dessas escolhas. Acredito que esse seja um dos meios de exercitar
a autonomia entre os alunos, legitimá-los em suas potências. A base da instituição escolar é
contraditória porque não permite que a potência de cada um de seus partícipes seja creditada,
talvez nem percebida e, simultaneamente, pretende empoderá-los e “oferecer-lhes” o
conhecimento. Por existir como ambiente coletivo, a atuação da escola tem um sentido de
homogeneizar e padronizar todos que a frequentam.
Esse tratamento, dentro da escola e da sala de aula, uniformiza e deslegitima, muitas
vezes, seus atores, na medida em que os conteúdos, as metodologias, os recursos e as avaliações
são determinadas sem reputar-lhes o direito a escolhas e decisões quanto ao que é significativo
para si individual e coletivamente.
Etapa 3: 3 h/a
Objetivo específico: Assistir ao filme Prova de fogo.
Apreciação do filme Prova de fogo em dois dias. Fracionar a exibição do filme foi a
alternativa encontrada para compensar a falta de disponibilidade de aulas seguidas num mesmo
dia. Tal atitude tem aspectos positivos, como oportunizar aos alunos que faltaram assistir ao
filme no outro dia de apresentação e permitir comentários entre os alunos acerca do que
92
observaram durante a exibição, e negativos, como a quebra da sequência fílmica e a
consequente perda de informações sobre a história. Ainda assim, o filme foi muito elogiado e
aclamado pelos alunos.
Ao final da exibição, passamos à discussão sobre os aspectos observados como
significativos na história e revisamos os conhecimentos construídos sobre o gênero sinopse.
Também fizemos o planejamento do texto que seria produzido, relembrando as perguntas: O
que farei? Como farei (O que vou destacar? Que variedade da língua vou usar?)? Quem lerá?
Para que farei? Nesta última pergunta, propus que, a partir desse texto, todas as atividades deles
fariam parte de uma exposição que contaria a história de escrita de cada um durante o ano letivo
de 2014. Concordaram e ficamos de discutir como seria a exposição em outra oportunidade. A
produção textual ficou como tarefa de casa.
Ao expor aos alunos mais uma vez o planejamento textual, pretendi que estes
começassem a praticar a produção de seus textos escritos, entendendo-a como um trabalho
(KOCH; ELIAS, 2012, p. 36) no qual o sujeito tem algo a dizer e o faz sempre em relação ao
outro, utilizando, para isso, estratégias linguísticas, textuais, pragmáticas, cognitivas,
discursivas e interacionais num exercício de compor e recompor durante o percurso da
atividade. As perguntas utilizadas para ajudar no planejamento visaram ativar a compreensão
dessas estratégias resultantes dos conhecimentos – linguísticos, enciclopédicos, textuais,
interacionais – construídos por esses alunos sobre a língua que usam e as práticas sociais que
são por ela atravessadas e possibilitadas. Meurer (1997, p. 22-26) defende que a autenticidade
de um texto resulta da utilização dos critérios de textualidade por seu escritor, uma vez que os
referidos critérios funcionam como parâmetros para que aquele texto se constitua como uma
prática social. Acredito que a autenticidade de um texto está permeada por outras características
também, não excludentes, mas complementares, como a implicação de si no que se escreve com
a consciência de que, ao autorizar a leitura de um texto seu, está garantido seu reconhecimento
como sujeito que tem algo a dizer e pode ser valorizado por isso.
Etapa 4: 3 h/a
Objetivos específicos: Socializar as sinopses34 e submetê-las à leitura dos colegas.
Originalmente, a primeira aula dessa etapa era para que os alunos, que quisessem,
lessem suas sinopses diante da classe e que as submetessem à leitura e avaliação dos colegas
em sistema de parceria em duplas. Entretanto, a maioria não trouxe o texto pronto de casa.
Então, propus que fizessem em classe, momento que utilizei para estar mais perto deles,
34 As sinopses sobre o filme Prova de fogo não foram consideradas na análise dos traços autorais, já que nem todos
os alunos fizeram essa atividade.
93
esclarecendo dúvidas, principalmente quanto à grafia dos nomes dos personagens, já que o
filme é norte-americano. Os textos foram finalizados e entregues a mim.
Na aula subsequente, orientei que fariam a leitura dos textos em duplas com o objetivo
de cada um dos colegas ler e avaliar se o texto produzido pelo parceiro era uma boa sinopse
para o filme assistido e se estava em conformidade com o que até então foi discutido:
formatação de texto em prosa (sinopse), pontuação, separação silábica, usos de maiúsculas e
minúsculas. Fizemos lembretes no quadro. Combinamos também que não se poderia riscar o
texto do colega, apenas escrever uma observação no final da página destacando o que o texto
tinha de bom e o que precisaria melhorar, além disso, que se evitasse consultar o parceiro para
resolver dúvidas quanto ao que trazia o texto. Esclareço que as duplas foram escolhidas entre
eles mesmos; pouco interferi. O tempo da aula acabou e orientei que deveriam fazer a reescrita
do texto original de acordo com as observações dos colegas.
Essa atividade pretendeu aproximar os alunos do sentido da escrita como uma situação
de interação, prática de linguagem na qual o outro (interlocutor) que, no momento da escrita,
era virtual, imaginado, agora está presente; é o interlocutor presentificado que, ao ler o texto,
fará suas interpretações. Além disso, a revisão em duplas permitiu que cada um demonstrasse
em relação ao outro e a si os conhecimentos adquiridos em matéria de leitura e de escrita,
espaço-tempo de construção inter e intrapsíquica de saberes (GARCEZ, 2010, p. 80).
Outro aspecto a ser considerado ainda com relação a esta atividade diz respeito ao
combinado anterior de que as atividades da turma seriam publicizadas como histórias de escrita
individuais, o que orientou a vontade de revisar os textos.
Etapa 5: 2 h/a
Objetivo específico: Fazer a segunda reescrita da sinopse do filme assistido a partir das
orientações da professora marcadas no texto e discutidas durante as aulas.
Nessa etapa, a turma foi dividida em duas para que eu pudesse dispensar uma atenção
maior aos alunos para a terceira versão da sinopse. Em cada uma das aulas, iniciei relembrando
o filme assistido; em seguida, orientei-os para a atividade que fariam com os textos que já
tinham reescrito conforme observações dos colegas. Chamei a atenção dos alunos para os
aspectos que motivam uma interação linguística: a intenção, a adequação e a aceitação
(MARCUSCHI, 2008, p. 93-133). Conversamos principalmente sobre o que é um texto dentro
do processo de interação verbal situado e real (o texto como uma forma de dialogar com que o
lê, por isso a escrita deveria estar adequada ao leitor, à situação de leitura). Depois, discutimos
sobre os aspectos para os quais deveriam dispensar atenção durante esta outra reescrita, que
94
deveria ser antecedida por uma leitura atenciosa. Entreguei os textos e eles passaram a ler e a
fazer a nova versão enquanto eu ficava à disposição para as dúvidas eventuais.
A leitura do próprio texto também é o momento em que o escritor assume o status de
interlocutor de sua produção. A consciência desse papel durante a revisão pode potencializar a
capacidade de autoavaliar-se segundo os critérios de intencionalidade, aceitabilidade e
adequação, levando-o a procurar ajustar seu texto aos objetivos e finalidades pertinentes à
pratica de linguagem em que está inserido. Prática de linguagem que se situa em uma dada
prática social cuja natureza dialógica é inerente e pulsante. É de responsabilidade do professor
de Língua Portuguesa, portanto, estimular os alunos a perceber e utilizar com propriedade esse
teor de dialogicidade da linguagem (ANTUNES, 2009, p. 89).
Diante dessa realidade, cabe à escola ensinar os regramentos da produção textual e
também chamar a atenção dos alunos para as possibilidades dessa produção. São regramentos
que devem ser contextualizados e demandados das situações reais de interação verbal
vivenciadas.
Quando defende o estudo da língua-em-função sob a perspectiva dos gêneros, Antunes
(2009, p. 214) propõe que o ensino-aprendizagem nas aulas de Língua Portuguesa privilegie a
gramática da língua, “a gramática requisitada pelos gêneros, em função do que poderia
estabelecer, com mais precisão e muito mais consistência, o alcance das regras e,
principalmente, o impulso para minimizar o estudo das nomenclaturas e das irrelevâncias
classificatórias.” Desse modo, os regramentos assumem significado já que têm uso
contextualizado.
Como foi um dia de aula logo após um feriado, alguns alunos não compareceram e
devido ao cronograma “apertado” não houve tempo de reunir esses estudantes para realização
da mesma atividade.
Em momento posterior a essas aulas, conversei com alguns alunos e perguntei-lhes
como avaliavam essa atividade de leitura e revisão do texto do colega. Alguns revelaram que
gostaram da dinâmica de poder ler e opinar sobre o texto do colega, mas acrescentaram a
dificuldade que tiveram em ler as produções. O que verifiquei, ao observar as orientações
registradas pelos alunos, foi que a maioria pontuou positivamente a produção dos colegas e, em
seguida, abordou aspectos já trabalhados nas aulas anteriores: pontuação, paragrafação, usos de
maiúsculas e minúsculas, acréscimo de mais informações, como elementos da narrativa fílmica.
As reproduções (Fig. 22, Fig.23 e Fig. 24) que seguem permitem uma visão mais detalhada
dessa atividade.
95
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
Figura 22 – Reprodução da primeira versão da sinopse sobre o filme Prova de fogo elaborada
pela aluna Mirna e revisada pela aluna Diana
96
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
Figura 23 – Reprodução da primeira versão da sinopse sobre o filme Prova de fogo
elaborada pela aluna Renata e revisada pela aluna Iara
97
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
Figura 24 – Reprodução da primeira versão da sinopse sobre o filme Prova de fogo elaborada pelo
aluno André e revisada pelo aluno Gilberto
98
Além disso, as reescritas, após a revisão dos colegas, constituíram-se de textos mais
organizados quanto à forma, havendo também outros que buscaram adaptar seus escritos com
base nas sinopses prontas encontradas em sites. Atribuo esses procedimentos, que partiram da
iniciativa própria deles, à tentativa de deixar seus textos melhores. Reproduzo alguns textos a
seguir (Fig. 25, Fig. 26, Fig. 27 e Fig. 28):
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
Figura 25 – Reprodução da primeira versão da sinopse sobre o filme Prova de fogo elaborada
pela aluna Diana e revisada pela aluna Mirna
Figura 26 – Reprodução da segunda versão da sinopse sobre o filme Prova de fogo
elaborada pela aluna Diana
99
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
Figura 27 – Reprodução da primeira versão da sinopse sobre o filme Prova de fogo elaborada
pela aluna Tatiana e revisada pela aluna Beatriz
100
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
Etapa 6: 3 h/a
Objetivo específico: Fazer uma apresentação oral do livro de literatura lido.
Em duas aulas, expliquei-lhes que, no encontro seguinte, faríamos apresentações orais
sobre os livros lidos individualmente. Combinamos como seria a atividade, estabelecendo um
roteiro sobre o que poderia ser falado: título, autor, ilustrador, breve resumo até onde tinham
feito a leitura, expectativa quanto ao término da história. Alguns perguntaram se poderiam
escrever para falar, disse-lhes que, se quisessem poderiam. Depois passamos à exposição sobre
o que é um resumo e como fazê-lo. Exercitamos com dois textos existentes no livro didático,
ambos, narrativas de ficção. Com o primeiro texto, fizemos um resumo escrito coletivo no
quadro, que os alunos registraram nos seus cadernos e com o segundo texto, estimulei que os
estudantes fizessem o resumo oral. Nesse momento, a participação de alguns estimulou a
cooperação de outros. Os textos referidos seguem reproduzidos nas Fig. 29 e Fig. 30 (primeiro
texto) e Fig. 31 e Fig. 32 (segundo texto).
Figura 28 – Reprodução da segunda versão da sinopse sobre o filme Prova de fogo
elaborada pela aluna Tatiana
101
Fonte: Tavares e Conselvan, 2012
Figura 29 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano
102
Fonte: Tavares e Conselvan, 2012
Figura 30 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano
103
Fonte: Tavares e Conselvan, 2012
Figura 31 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano
104
Fonte: Tavares e Conselvan, 2012
Na outra aula, organizamos a sala em círculo e os alunos fizeram as exposições. Metade
da turma conseguiu falar sobre os livros. No entanto, nenhum dos alunos trouxe o texto pronto
e escrito. Combinamos que os outros poderiam apresentar o livro na aula seguinte.
Figura 32 – Reprodução de página do livro Vontade de saber português 6º ano
105
Etapa 7: 3 h/a
Objetivos específicos: Continuar com as exposições orais sobre os livros e sistematizar
o gênero sinopse.
Começamos com as exposições orais sobre os livros; poucos alunos quiseram
apresentar-se porque disseram-se tímidos. Em seguida, conversamos sobre a atividade
desenvolvida: um exercício para a produção escrita que fariam sobre os livros: a sinopse. A
partir dessa conversa, fiz nova exposição participada sobre esse gênero, destacando os tempos
verbais característicos, presença de adjetivos e substantivos e exercícios para classe.
Etapa 8: 2 h/a
Objetivos específicos: Orientar a produção da sinopse e combinar os critérios de
empréstimo dos livros e data de entrega do texto.
Devido aos feriados previstos e não previstos sempre recaindo sobre os dias de uma e
duas aulas, combinei com os alunos que não haviam terminado a leitura do livro para que o
levassem para casa durante o feriado e os dias subsequentes e concluíssem o processo. Logo
depois, definimos que a produção da sinopse seria extraclasse com entrega marcada para o dia
de devolução do livro, dali a dez dias. Relembramos também a necessidade de planejamento
para a escrita, reforçando os princípios já discutidos nas produções anteriores: Quem lerá o
texto? Em que situação? O que, como e para que vou escrever?
Etapa 9: 2 h/a
Objetivos específicos: Entregar os livros e as produções escritas e organizar a exposição
das atividades.
Poucos alunos compareceram à escola após os dias de feriado; logo, a devolução dos
livros e a entrega dos textos foi bem fracionada. Fizemos um esboço da exposição combinada
no início do ano letivo e deixamos para concluir o planejamento quando a classe tivesse maioria
de alunos.
Após esse dia, ficamos uma semana sem aulas, devido à paralisação dos funcionários
que trabalham em regime de terceirização e que, no CEMMB, são responsáveis pela limpeza,
organização dos corredores, preparo da merenda e trabalhos administrativos na secretaria.
Etapa 10: 2 h/a
Objetivo específico: Reescrever a sinopse do livro.
Após a entrega da maioria dos textos, fiz a devolutiva e, durante a orientação para a
reescrita, percebi que muitos já o faziam ou procuravam os colegas para mostrar-lhes a primeira
versão. Fizemos uma parada e quis saber o motivo, a necessidade de reescrever um texto.
Respostas como: “Para consertar o que está errado.” (Renata), “Para ver se o que eu queria dizer
106
eu disse.” (Ian) e outras semelhantes foram as que mais ocorreram. Perguntei-lhes por que
tinham acrescido a opinião nas sinopses. Ficaram espantados e questionaram aqueles que a
tinham feito se não era para dar a opinião sobre o livro. Disse-lhes que não havia problema;
eles só haviam feito algo parecido como uma resenha, o que demonstrava “um diferencial”
neles. Foi visível a satisfação de uns e a pressa dos outros alunos em reescrever e inserir suas
opiniões.
Marcuschi (2008, p. 154) defende o princípio da impossibilidade de se comunicar
verbalmente sem que seja através de textos que se materializam em gêneros, o que o aproxima
teoricamente de Antunes (2008) e Koch e Elias (2012) já que essas autoras também pensam os
gêneros dessa forma e acreditam que o trabalho em salas de aula de Língua Portuguesa deve
fundamentar-se na abordagem dos gêneros como mecanismos de interagir social, cultural e
historicamente e transformar(-se) pela língua. Por concordar com os autores referidos,
considero a reflexão de Marcuschi (2008, p. 154) – “os gêneros textuais operam, em certos
contextos, como forma de legitimação discursiva, já que se situam numa relação sócio-histórica
com Fontes de produção que lhes dão sustentação além da justificativa individual” – como
oportunidade para entender o movimento de inserção da opinião sobre os livros nas sinopses.
A hipótese é que a existência do gênero, conforme a teoria de Bakhtin (2011), como tipo
relativamente estável de enunciado, escolhido pela esfera, pela necessidade temática, pelo
participante da interação e pelo desejo ou pela intenção enunciativa do locutor já se encontra
em certo domínio pelos alunos que, munidos dos conhecimentos, sentiram-se autorizados a
trabalhar a plasticidade desse instrumento.
Etapa 11: 2 h/a
Objetivo específico: Planejar a exposição com as atividades dos alunos.
Nos dois horários de aula, a intenção era planejar definitivamente a exposição com as
atividades dos alunos. No entanto, esse era o dia de divulgação dos resultados (notas) da IV
unidade didática, o que causou grande desconcentração nos alunos. Conseguimos definir a data
para a exposição, assim como as equipes de trabalho (organização, decoração, comunicação).
Na aula seguinte, tivemos que rever a data, já que o calendário escolar sofreu uma
modificação com a diminuição de dias e os alunos que estavam aprovados seriam dispensados
para as férias uma semana antes do prazo previsto. Após expor a situação e verificar quem
poderia ainda permanecer na escola para o evento, decidimos adiar a exposição para a primeira
ou segunda semana de aula do ano letivo 2015.
Acredito necessário acrescentar os desdobramentos das atividades desenvolvidas
anteriormente. Durante a IV unidade, os alunos insistiram na leitura do segundo livro, o que
107
fizemos. Os livros foram escolhidos e eles os leram seguindo as mesmas regras da primeira
rodada. No entanto, não foi preciso adverti-los quanto ao modo de trabalho a partir das leituras.
Alguns alunos logo perguntaram: “O que a gente vai fazer dessa vez?” (Gilberto), “O que a
gente vai escrever? Uma sinopse? Então é muito fácil.” (Ian). Respondi que a sinopse poderia
ser feita, mas faríamos algo mais interessante: um relato de leitura. Expliquei-lhes como seria:
em intervalos semanais ou quinzenais, eles teriam que escrever sobre o livro e eu daria as folhas
específicas para isso.
Começamos pela capa do livro; comentamos sobre a importância do título, dos nomes
do autor e do ilustrador, da ilustração presente, chamei-lhes atenção para as intenções presentes
nessa parte; distribuí as folhas e orientei que fizessem a capa. Em seguida, lancei as perguntas:
“Por que você escolheu esse livro?”, “O que você espera dessa leitura?” As respostas foram
registradas por eles na segunda página da folha dobrada. Depois retomaram a leitura do dia. No
final da aula, os alunos foram orientados a registrar na folha colorida a data da leitura, a página
em que pararam e o que mais quisessem. No encontro de leitura seguinte, eles leram e
continuaram a fazer a capa do relato.
No outro encontro, lancei as questões para serem respondidas em mais uma folha
colorida e dobrada ao meio: “Até agora, qual a sua opinião sobre o que leu?”, “ Sobre o que o
livro trata?” Observei que a maioria dos alunos não dava muita importância à escrita porque se
detinha mais na leitura. Propus então que expusessem oralmente, na próxima etapa, as respostas
dadas às perguntas. Assim o fizemos, com a exposição de alguns já que nem todos quiseram
participar e boa parte pediu para voltar a ler os livros.
Após mais um encontro para leitura, propus a questão: “O conteúdo do livro tem se
mostrado interessante? Explique e exemplifique.” Com a sala organizada em círculo, os alunos
responderam conforme o interesse de cada um. Orientei-os para que registrassem na outra folha
colorida dobrada as questões e os comentários individuais.
Esse seria o penúltimo encontro para leitura; porém, tivemos que acrescentar mais dois
porque grande parte dos alunos não estava próxima de finalizar a atividade (leitura). Portanto,
no outro encontro, lancei a questão: “Como você avalia a experiência de leitura desse livro?
Conte para a escola.” Discutimos que essa questão era a última e que deveriam respondê-la,
preferencialmente, após terminar de lerem os livros. Um aluno perguntou se era para fazer um
resumo e o colega respondeu: “A gente não faz resumo, faz sinopse.” (José). Orientei-os que
poderiam fazer uma sinopse, mas deveriam dar a opinião sobre o livro atual e, se quisessem,
sobre o livro lido anteriormente. Falamos outra vez sobre como planejar o texto. Ficaram mais
dois encontros lendo e escrevendo.
108
No penúltimo encontro, um aluno, que durante o último bimestre do ano letivo pouco
compareceu à escola, vendo os colegas com as folhas coloridas e com os livros comentou: “Essa
professora é esperta. Fez todo mundo escrever um livro sobre o livro.” (Leon). Os alunos que
estavam mais dispersos, ouviram a consideração do colega e percebi que tomaram
conhecimento ali que haviam construído um livro. Interferi perguntando se eles acharam ruim,
ao que responderam e afirmaram categoricamente que não. No último encontro de leitura, foi
visível a preocupação em organizar o trabalho. Antes de entregar para avaliação, perguntei-
lhes: “Como se sentiram escrevendo um relato de leitura? Utilizaram o que foi discutido nas
aulas para construir o livro?” No entanto, os alunos queriam mostrar para os colegas seus
trabalhos. Então, propus que fizéssemos um círculo e expusessem sobre eles. Assim o fizeram
de forma descontraída. Um dos alunos perguntou: “Professora, a senhora vai ser professora da
gente no próximo ano?” (Roberto). Respondi que não sabia, mas gostaria e quis saber o motivo.
“Para a gente poder ler mais livros e fazer isso (apontou para o livro).” (Roberto). “Gostaram
da atividade? Poderíamos então colocá-las na nossa exposição?”, perguntei. Concordaram em
sua maioria e ficou acertado que seria mais uma atividade para a exposição.
A realização do segundo momento de leitura aconteceu a pedido dos alunos. A produção
escrita por etapas teve por objetivo mostrar a eles que poderiam escrever um relato pessoal sem
preconceito e com a finalidade de expor para a escola por que os livros que leram eram
recomendados ou não. Não houve tempo para a reescrita dos textos produzidos nos “livros”;
porém, durante os registros escritos ocorridos nas aulas, os alunos esforçaram-se para a escrita
adequada, uma vez que era frequente virem a mim resolver dúvidas, além de consultar os
colegas. Além disso, após definirmos que a produção faria parte da exposição, um aluno de
nome Roberto perguntou: “Mas a gente vai reescrever tudo antes, né?”. “Sim, na primeira
semana de aula do próximo ano letivo, faremos a reescrita, pelo menos, do último texto. Pode
ser?” (Professora-pesquisadora). “E quem perder de ano, vai participar?” (Karina). “Claro que
sim. Nós organizaremos. Fiquem tranquilos.” (Professora-pesquisadora). As aulas já haviam
acabado, as produções foram entregues a mim, alguns com muito cuidado depositavam na mesa,
outros até beijaram-nas...
Os livros produzidos encontram-se representados nas Fig. 33 e Fig. 34 seguintes:
109
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
Figura 33 – Livros produzidos pelos alunos do 6º ano B
Figura 34 – Livros produzidos pelos alunos do 6º ano B
110
A vontade de ler, a consciência de que sua escrita é reconhecida, a importância
concedida ao outro e ao futuro foram as atitudes dos alunos observadas por mim como
construções empreendidas durante a intervenção. Acredito que a preocupação inicial em ser
obrigado a escrever muito não se materializou durante as aulas pela maioria dos alunos. Pondero
que a escrita não era um problema para eles desde o início, como eu havia pressuposto. As
negativas quanto a escrever se deram para refutar aquilo que não lhes servia: a escrita sem
contexto, desprovida do caráter de prática social.
Se os alunos do 6º ano B entendem a escrita como forma de interação com o outro, as
propostas levadas, em princípio, por mim não significaram a oportunidade de interação.
Percebo que, ao se negarem a aderir a elas, eles exerceram a autonomia...
Outro aspecto observado é que, diante das respostas dadas no questionário – 76,5%
consideram a leitura muito importante – a valoração creditada à leitura está atrelada ao conteúdo
de prazer que ela pode proporcionar, mesmo em situação de atividade escolar.
Diante disso, considero que, nessa segunda sequência didática, apropriei-me um pouco
mais do proceder etnográfico, destituindo-me, em parte, do status de poder decidir
individualmente o que deve acontecer com a coletividade. Em sala de aula de Língua
Portuguesa, assumir essa postura significa começar a conceber o processo de ensino-
aprendizagem sob outra perspectiva, a que leva em consideração as vicissitudes do campo,
aprende a compreendê-las e a interagir com elas.
Ter a consciência de meu limite de atuação dentro do que propus como intervenção e
ainda de que minhas preocupações se resumiam no princípio defendido por Freire (1996, p. 38)
– “é que o trabalho do professor é o trabalho do professor com os alunos e não do professor
consigo mesmo” – constitui um dos legados da intervenção e da escrita deste memorial.
111
4 CARTOGRAFIA DOS ACHADOS
4.1 Autonomia e autoria
A ética de cartógrafa que me orienta a perceber o quanto a vida se expõe a minha escuta
e o quanto estou disposta a ouvi-la, também me norteia a registrar a história de escrita dos meus
alunos durante o ano letivo de 2014. Nesse desenho cartográfico, percebo, de acordo com as
posturas e produções, a autonomia que eles foram revelando em relação à escrita e, de uma
maneira mais ampla, ao estar na escola. A autonomia para refutar o que não lhes faria sentido
escrever, para escolher o que julgaram pertinente, para lançar-se na prática da escrita na escola
e a todos os seus regramentos, inclusive da reescrita.
Percebo que houve um querer assumir a aventura de fazer tudo de novo e a mostrar-se
ao outro através de seus escritos. No início, poucas foram as vezes em que alguns, ao entregarem
as suas produções, colocaram-nas por baixo das que lá estavam ou advertiram que não deveriam
ser lidas imediatamente. Depois, com o decorrer do ano letivo, os alunos depositavam seus
textos sem o receio da minha intervenção sobre eles. A assunção de demanda e a construção da
autoridade constituem formas de vivenciar as aulas advindas das decisões que tomaram e suas
consequentes responsabilidades. Decidiram escrever sinopse e responsabilizaram-se em fazê-
lo conforme os critérios de intencionalidade, aceitabilidade e adequação (MARCUSCHI, 2008,
p. 93-133) que pretendiam e que foram requeridos pelo contexto.
Escreveram e reescreveram porque sabiam que seria para o outro da comunidade
escolar, não apenas para a mecânica da correção pela professora. A possibilidade de
reconhecimento instigou-os a buscar uma escrita que lhes representasse como o que eram:
leitores de literatura juvenil que requereram e garantiram um tempo-espaço para seu dizer na
escola.
A escola é, em sua essência, lugar da disciplina, da homogeneização que individualiza
cada um dos seus partícipes, estabelece para eles sanções, graus de avanço ou estagnação
conforme seu desempenho individual em exercícios que separam por categorias de aptidões. É
assim com a separação dos conteúdos em disciplinas, dos alunos em filas, do tempo pedagógico,
dos exercícios que classificam conservando-os na mesma classe ou promovendo-os à classe
seguinte. Toda a estrutura da escola vem organizada com o intuito de controlar os indivíduos e
orientá-los conforme interesses de uma instância maior que, geralmente, não lhes representa
como deveria.
112
Desse modo, acredito que estimular a autonomia dos alunos, estar disposta a ouvir e
apreender seus interesses, principalmente no que diz respeito ao trabalho com língua,
dessacraliza, de certa forma, a escrita escolar como uma obrigação sem sentido. Penso que lhes
oferece também um ambiente propício para que entendam o lugar que ocupam e o que pode ser
conquistado para além desse lugar. Foi perceptível também o deslocamento de concepção dos
aprendizes acerca da escrita na escola. Antes vista como existente apenas nos exercícios dos
livros didáticos ou dos cadernos, passa a ocupar um lugar de autoria. Trata-se de autoria como
uma vivência de quem se sente empoderado e capaz de se expor para a comunidade escolar
através da escrita com sentido, autorizando-se e autorizando o outro a interagir pela linguagem.
A observação dos textos produzidos pelos alunos, especificamente os autorretratos e as
sinopses dos livros, leva-me a interpretá-los35 sob duas perspectivas: uma que abrange a prática
exaustiva de exercícios na escola e outra que define a escola como o lugar que propicie o aluno
a passar de enunciador para autor.
Segundo Foucault (1987, p. 117-194), a escola é “aparelho de exame ininterrupto”
porque tem em sua base a disciplina com a repetição de tarefas cujo objetivo é comparar para
medir e sancionar, normalizando os alunos, tornando-os hábeis para tarefas definidas a priori
ou excluindo-os36. A produção textual nas aulas de Língua Portuguesa, conforme a realidade
que tenho visto nas escolas em que estive nesses últimos anos, segue esse padrão e resume-se
ao treino de habilidades para obtenção de notas classificatórias, já que tem como fundamento a
ideia de que a prática exaustiva é a responsável única pelo sucesso na escrita.
Acredito que, ainda assim, essa organização não “apaga” o aluno em sua forma de dizer
e de se posicionar contra a ordem vigente. Tomo como exemplo a recusa de alguns alunos, já
referida anteriormente, diante de atividades que propus e não faziam sentido para eles. Diante
dessa situação, algumas questões ocorrem: Se não fossem esses alunos, os outros teriam
aceitado os projetos de escrita trazidos por mim? E como seriam os textos escritos pelos alunos?
Seriam meros produtos de enunciadores?
Orlandi (2008, p. 80-81) indica que “a escola deve propiciar a passagem
enunciador/autor de tal forma que o aprendiz possa experimentar práticas que façam com que
ele tenha o controle dos mecanismos com os quais está lidando quando se escreve.” Cabe ao
professor de Língua Portuguesa compreender que a sala de aula é lugar para entendimento e
35 Refiro-me à interpretação que se põe como uma injunção, conforme Orlandi (2012, p. 64): “face a qualquer
objeto simbólico, o sujeito se encontra na necessidade de “dar” sentido, construir sítios de significância”. 36 Possenti (2011, p. 21) também comenta sobre essa função excludente e punitiva da escola: “A alteração dos
rumos políticos poderia produzir como um de seus efeitos que a escola não continuasse sendo tão grosseiramente,
pelo menos, uma maquinaria destinada a excluir, para usar termos de Foucault.”
113
uso da língua-em-função (ANTUNES, 2009, p. 37), atividade social com objetivo de interação
e intervenção humana, e que deve ser possibilitado aos alunos agir autonomamente, decidindo
por que, para que e como fazer uso das textualidades.
Acredito que ter esse olhar duplicado orienta-me a inferir que a autonomia dos alunos
também foi transposta para seus textos escritos. A negação cedeu lugar para a interposição de
sua marca, sua forma de dizer dentro do que já está dito. A preferência por escreverem sobre si
(autorretrato escrito) e por falarem sobre o livro lido (sinopse) deu-lhes a oportunidade de se
fazerem ler, ouvir e entender mais uma vez e, consequentemente, serem legitimados por isso.
Compreendo esse fazer dos estudantes como uma vivência autoral consequente do grau de
autonomia que exerceram.
Quando penso em autoria em textos produzidos por alunos do Ensino Fundamental,
concordo com o posicionamento de Orlandi (2012, p. 69) para quem o autor é aquele “que
consegue formular, no interior do formulável, e se constituir, com seu enunciado, numa história
de formulações”. O tratamento que os alunos dispensaram aos gêneros escolhidos por eles
demonstra a apropriação, o grau de letramento que dispunham e culminou com a produção de
sentidos outros para uma escrita escolarizada. Esse deslocamento proposital na escrita de
gêneros apresenta-se com a intenção de criar efeitos de sentido para o leitor com quem se
estabelece uma relação de cumplicidade. Tfouni (2010) – assim como Orlandi (2012) – , utiliza
os princípios da Análise do Discurso segundo Pêcheux e define autor como:
aquele que estrutura seu discurso (oral ou escrito) de acordo com o princípio
organizador contraditório, porém necessário e desejável, que lhe possibilita uma
posição de autorreflexibilidade crítica no processo de produção de seu discurso […]
fato este que provocaria, no próprio texto, um retorno constante à forma como aquele
sentido está sendo produzido, sem que isso impeça que ele seja constantemente
produzido. (TFOUNI, 2010, p. 43)
Acredito que a autorreflexibilidade crítica no processo de produção dos textos pode ser
fortalecida no momento em que os estudantes retomam seus textos e reescrevem-nos. A
consciência de que suas intenções com a escrita estão ali demonstradas e a necessidade de
aceitação por parte de seu interlocutor leva-o a adequar o seu dizer até que consiga a
cumplicidade referida e a certeza de que suas intenções foram concretizadas.
Estou convencida de que a prática de voltar constantemente ao que escreve para colocar-
se no lugar do leitor e antecipar a interlocução está relacionada ao perfil de autor referido por
Bakhtin (2011, p. 191-192) como aquele “que é para o leitor o conjunto de princípios criativos
que devem ser realizados, a unidade dos elementos transgredientes da visão”, que possui o
114
“excedente de visão e conhecimento” (BAKHTIN, 2011, p. 11)37, por isso é essencial e
constituído de autoridade diante do leitor na condução de sua leitura. Condução esta que se
forma como o princípio contraditório referido por Tfouni (2010). O autor tem sua existência
fundada na relação entre a ilusão de imaginar-se como a origem de seu dizer e de pretender que
aquilo que diz seja a tradução literal de seu pensamento com outra ilusão, a de construir um
produto linear, coerente, coeso.
Saber que suas produções seriam publicizadas, expostas para a comunidade escolar,
provocou nos alunos o desejo de interagir mais incisivamente com o provável leitor dos seus
textos? Respondo afirmativamente quando considero a presença nas produções da necessidade
de conversar com esse possível leitor. Isso demonstra que o escritor voltou ao texto, assumiu a
condição de leitor e escreveu de modo a convencê-lo, a tornar o seu discurso aceito. O texto
escrito assume a condição de conversa mais íntima com seu leitor. Compreendo essa atitude
como um “movimento de criação de sentido” (ROLNIK, 2011, p.37), “indício da autoria”
(POSSENTI, 202, p. 121) enquanto exercício de antecipar-se à interlocução, revendo seu dizer
e adequando-o ao suposto perfil de seu interlocutor.
Nos textos, observo que essa conversa mais íntima ocorreu com o uso de expressões
mais frequentes na modalidade oral e coloquial da língua e também presente em gêneros
usualmente originários das redes sociais e do domínio discursivo interpessoal. Os excertos que
seguem são exemplos do referido uso ( Fig. 35, Fig. 36, Fig. 37, Fig. 38 e Fig. 39):
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
37 Bakhtin desenvolve sua visão acerca da autoria em textos literários, porém achei pertinente trazê-la como
fundamento para análise dos textos escritos pelos alunos, uma vez que, em todo o processo de escrita dos textos,
a consciência de que há um princípio da dialogicidade no uso da linguagem foi trabalhada.
Figura 36 – Reprodução de trecho do autorretrato escrito do aluno André
Figura 35 – Reprodução de trecho do autorretrato escrito do aluno Alex
115
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
FONTE: Acervo da professora-pesquisadora
Ocorrências como as exemplificadas e outras como: “e isso foi a minha história”
(Gilberto); “Bom, essa é minha vida, espero que tenha gostado” (Roberto); “Essa é a minha
vida” (Lucas); “Muito obrigado pela oportunidade.” (Leon) estão presentes em 56% (19 dos 34
textos) das produções entregues pelos alunos. A inserção dessas marcas provoca um
deslocamento na concepção de que a escrita, na escola, deve seguir apenas o padrão formal da
língua para que seja reconhecida. Até mesmo depois da reescrita, que nessa fase e nas outras
que se seguiram, significou chamar a atenção para os critérios de intencionalidade,
aceitabilidade e adequação dos escritos, as expressões permanecem.
Possenti (2002, p. 105) entende a autoria como “um efeito simultâneo de um jogo
estilístico e de uma posição enunciativa” engendrados por quem escreve; portanto, a percepção
acerca do potencial autoral de um texto (um bom texto) depende da compreensão de como este
foi construído. Há que se ler desmontando o texto para que se possa estabelecer a relação entre
o modo como foi construído e os efeitos de sentido que produz. Assim, o autor sugere:
Penso que um texto bom só pode ser avaliado em termos discursivos. Isto quer dizer
que a questão da qualidade do texto passa necessariamente pela questão da
subjetividade e de sua inserção num quadro histórico – ou seja, num discurso – que
lhe dê sentido. O que se poderia interpretar assim: trata-se tanto de singularidade
quanto de tomada de posição. (POSSENTI, 2002, p. 109)
Figura 39 – Reprodução de trecho do autorretrato escrito da aluna Anita
Figura 37 – Reprodução de trecho do autorretrato escrito do aluno Ian
Figura 38 – Reprodução de trecho do autorretrato escrito da aluna Mirna
116
As análises dos textos produzidos pelos alunos do 6º ano B seguem essa orientação.
Busco traços de singularidade e de tomada de posição no dizer presente nos textos escritos
desses estudantes. O dizer a que me refiro é o discurso “como um tipo de sentido – um efeito
de sentido, uma posição, uma ideologia – que se materializa na língua, embora não mantenha
uma relação biunívoca com recursos de expressão da língua”. (POSSENTI, 2009, p. 16).
Fundamentando-me nesse conceito é que sugiro que as expressões destacadas nos excertos
anteriores buscam singularizar o discurso que intenciona a legitimação de seus pares.
Durante as reescritas, preferir deixá-los livres quanto ao acréscimo, à supressão ou à
mudança de foco foi uma estratégia utilizada que considerei positiva. Ao sinalizar nos textos e
tornar motivo das aulas questões como organização de margens, pontuação, separação silábica,
usos de maiúsculas e de minúsculas, pretendi que não fossem impactados de modo negativo
quanto à primeira escrita. Ademais, o conceito de texto bem escrito está longe do formato de
uma produção em que não aconteçam equívocos em relação ao uso da língua. A escola e o
professor têm a dupla função de valorizar os conhecimentos trazidos pelos alunos e
proporcionar a aquisição de outros a partir do eles já sabem.
Com base nessa premissa, vejo que esse papel do professor como mediador não se
configura como algo fácil de cumprir, já que as fórmulas prontas não funcionam e o modelo de
escola que temos não permite, muitas vezes, a quebra de paradigmas já tão cristalizados. O
processo de ensino-aprendizagem pertence ao humano e, como tal, tem a possibilidade de ser
adaptado, refletido, replanejado e refeito conforme o contexto em que se faz presente. A
sensibilidade para a constatação e a coragem para iniciar a mudança de concepção são os
pressupostos necessários ao desempenho da referida mediação.
Acredito que a pressuposição acerca da possibilidade de reconhecer indícios de autoria
em textos escolares seja um movimento em busca dessa mediação que se apoia na valoração
positiva do que os alunos fazem e encontra formas de mostrar que existem outros modos de se
representar pela língua.
Na produção da sinopse sobre o livro de literatura lido individualmente, também percebi
a validade desse movimento. Os alunos, ao serem confrontados com a obrigatoriedade de um
retorno escrito sobre a obra que leriam, propuseram “falar sobre o livro”, ao que retorqui que
seria uma sinopse, gênero que alguns mostraram conhecer de outro lugar fora da escola, um
recurso de TV por assinatura. Por já ter conhecimento sobre o gênero e perceber significado
nele, os alunos sentiram-se seguros para fazer na escola o que já lhes era habitual, o que gerou
um grau maior de motivação para uma produção escolar. Ainda, quando aceitei a sugestão, a
117
turma sentiu-se, de certo modo, livre, valorizada e empoderada para dizer o que já sabia. A
escolha da sinopse também pode ser vista como uma tomada de posição acerca do que se quer
aprender. Mesmo sendo o já conhecido, os alunos sabem que virão outros conteúdos a partir
dali e preferem utilizar o que já conhecem como elemento de partida para o desconhecido, o
que representa autonomia.
A escolha de livros adequados à faixa etária, com um certo apelo midiático e narrativas
em primeira pessoa foi um procedimento oportuno para motivá-los à leitura tão desconfortável
em classe. Serviu-me como apoio a ideia proposta por Cosson (2006, p. 65) quanto à leitura
que faz sentido:
quando interpretamos uma obra, ou seja, quando terminamos a leitura de um livro e
nos sentimos tocados pela verdade do mundo que ele nos revela, podemos conversar
sobre isso com um amigo, dizer no trabalho como aquele livro nos afetou e até
aconselhar a leitura dele a um colega ou guardar o mundo feito de palavras em nossa
memória.
Os alunos anteciparam-se à leitura, propondo essa “conversa” sobre o que leriam e que
foi moldada como sinopse; porém, o gênero não deixou de ter um tom de diálogo com o
interlocutor. A leitura desses textos revelou a permanência da marca de interação identificada
nos autorretratos escritos e a inserção de opinião acerca dos livros. Nos 30 textos entregues, 22
exemplares contêm opiniões, às vezes, explícitas, outras apoiadas nas expressões que buscam
a interação com o leitor. Entendo que todo uso da língua está condicionado às escolhas
linguísticas que determinam o posicionamento de quem escreve ou fala. No entanto, o que trago
são amostras de uma tomada de posição mais explícita, seja pela eleição de termos em
detrimento de outros, seja pela organização dessa parte do texto em lugar de destaque (com
uma linha em branco acima). Reconheço nesse fazer dos alunos a apropriação do gênero sinopse
como viés para exposição da sua própria marca, tentativa de individualizar o discurso e
delimitar o seu lugar nele. Os excertos seguintes (Fig. 40, Fig. 41, Fig. 42) são demonstrativos
do que há nos textos:
118
Fonte: Acervo da professora-pesquisadora
Fonte: Acervo da professora-pesquisadora
Fonte: Acervo da professora-pesquisadora
Figura 41 – Primeira versão da sinopse sobre o livro elaborada pela
aluna Beatriz
Figura 40 – Segunda versão da sinopse sobre o livro elaborada pela aluna Iara
Figura 42 – Segunda versão da sinopse sobre o livro elaborada pelo aluno Gilberto
119
Os textos (Fig. 40, Fig. 41 e Fig. 4238) trazem três situações observadas no processo de
escrita e reescrita dos mesmos: a primeira, diz respeito aos textos em que a tentativa de interação
maior com o leitor foi inserida na segunda versão; a segunda, aos casos em cuja primeira versão
já constavam explicitamente a opinião e a marca de interação com o leitor que raramente foram
suprimidas na segunda versão e a terceira, nas quais a opinião foi inserida na segunda versão.
Retomo o ponto de vista de que a reescrita dos textos, após a revisão, levou-os a
pretender a legitimação percebida nos textos dos colegas lidos em classe e valorados
positivamente pela maioria. A singularidade e o estilo podem ser percebidos no ir e vir do texto
que se escreve e se reescreve, onde se acrescentam ou se eliminam detalhes que aproximem o
interlocutor de seu autor. Adoto aqui a definição de estilo como a seleção dos recursos
linguísticos que é feita de acordo com as possibilidades disponíveis na língua, ainda que,
conforme Fiad (2008, p. 221), não há como considerar estilo desvinculado dos gêneros do
discurso.
A autoria relacionada ao processo de escrita e reescrita, parece estar relacionada à
recognição, definida por Souza (2000, p.21) como processo de construção de um novo saber a
partir do confronto entre os saberes que uma pessoa já possui e outras informações, concepções
e pensamentos. Berthoff (2011, p. 20-23) define a recognição como ato fundamental da mente,
o exercício de olhar, de fazer novamente. Também associa-a à reinvenção e ambas são
responsáveis pelas analogias e disanalogias que compõem o processo de significação do mundo.
O que é, então, o registro escrito senão uma forma de (re)significar o mundo? Penso que a
(re)significação ocorrida a partir do exercício da autonomia constitui-se como um espaço-tempo
propício ao dizer autoral.
Acrescento mais alguns excertos para a comparação entre as versões. No primeiro (Fig.
43), a primeira versão da sinopse sobre o livro A Maldição do Titã, o aluno provoca uma
interação explícita com os interlocutores: “se quiserem uma historia boa de verdade leiam o
livro Maldição do titã (sic)”. No segundo (Fig. 44), ele reescreve seu texto, reorganizando a
forma e as ideias, além de suprimir a interação explícita com o interlocutor, entretanto, não o
38 Segue a transcrição do texto de Gilberto (Fig. 42):
“Sinopse
Fala serio pai
A sinopse a de fala serio pai começa quando o nene esta na barriga depois e na maternidade, ai vem 2 (meses, a
fralda, 6 meses, o coco gigante 2 anos, nao e a mamãe 3 anos. Duvido Dor no coraçao tricolor, 4 anos e o judô
perguntas e mais perguntas e etc…
Esse livro otimo gostei mas tem o problema eque não tem as coisas que eu queria que tivesse faltou muita coisa.”
120
ignora, já que expressa sua opinião sobre o livro: “Eu acho esse livro muito bom. novos semi
deuses e com uma batalha epica esse livro é epico. Uma aventura com Monstros semi deuses
deuses e ciclope e um acampamento que e o bicho esse eo Resumo do livro. Maldição do titã
(sic).”
Fonte: Acervo da professora-pesquisadora
Fonte: Acervo pessoal da professra-pesquisadora
Figura 43 – Primeira versão da sinopse sobre o livro elaborada pelo aluno Sílvio
Figura 44 – Segunda versão da sinopse sobre o livro lido elaborada pelo aluno Sílvio
121
No texto seguinte (Fig. 4539), o aluno escreve sua sinopse a partir do que considera
relevante na história de O diário de um Banana: Rodrick é o cara!; no entanto, na segunda
versão do mesmo texto (Fig. 46), ele burila um pouco a grafia e adequa a forma, além de
adicionar, no final, a opinião e a interação explícitas: “e o livro pra mim e muito bom e espero
que voces gostem” (sic).
Fonte: Acervo da professora-pesquisadora
39 Segue a transcrição das produções escritas de Eduardo (Fig. 45 e Fig. 46) na ordem em que estão no texto:
“Sinopse: Diario de um banana
Rodrick É o cara!
O diario fala de um menino chamado Greg Relfey que não perdoa ter gostado das suas ferias de verão. e seu irmão
mais velho chamado: Rodrick ele não se dava bem com o seu irmao Greg e só viviam brigando. apesar que Greg
e fasia as suas aulas de natação com o seu irmao Rodrick e mesmo assim ele não parecia ter gostado muito dessas
suas ferias de verão e assim segue a Historia.”
“Diario de um banana
Rodrick e o cara!
O diario fala de um menino chamado greg Helfey que não pareca ter gostado das suas ferias de verão. E seu irmão
mas velho chamado Rodrick ele não se dava bem com o seu irmão greg e fasia as suas aulas de natação com o seu
irmão Rodrick e mesmo assim ele nao pareca ter gostado munto dessas suas ferias de verão e assim segue a
Historia.
e o livro pra mim e muito bom e espero que voces gostem.”
Figura 45 – Primeira versão da sinopse sobre o livro elaborada pelo aluno
Eduardo
122
Fonte: Acervo da professora-pesquisadora
Ao escolher utilizar em seus textos a opinião explícita sobre o livro lido e/ou a interação
direta com o possível leitor, os alunos provocaram uma reestruturação no modelo de gênero
trabalhado. O conhecimento acerca do gênero também autorizou esses estudantes a trabalhar a
plasticidade do modelo. Julgar essa escolha como um erro ou não aprendizado do conteúdo é
negar o conceito de gênero discursivo proposto por Bakhtin (2011, p. 262): enunciado
relativamente estável, escolhido conforme a esfera, a necessidade, o participante da interação,
o desejo ou intenção enunciativa. Fiad (2008, p. 233) propõe que atitudes como essa dos alunos
do 6º ano B podem ser entendidas como “resultado das relações intergenéricas que indicam a
circulação dos sujeitos por diferentes esferas de atividade humana onde os gêneros são
produzidos” e isso, a meu ver, demonstra como as práticas de letramento em que os alunos
estão inseridos influenciam na vivência das práticas escolares de uso da língua. Ao retomar os
dados obtidos com a aplicação do questionário, constato que a utilização frequente da escrita
em mídias de relacionamento (WhatsApp e Facebook) pode ser um fator determinante para esse
fato. No questionário aplicado, a questão: “Onde você mais escreve?” revelou que 22 dos 34
alunos (64,7%) utilizam o computador e 11 (32,4%) o celular.
Penso que, nesse contexto, há a singularização das práticas de escrita delimitadas pelas
configurações de suas histórias de vida, das práticas e atividades experienciadas em seus
cotidianos as quais encontram-se circunscritas “ao contexto sócio-histórico que emoldura” suas
existências (VÓVIO; SOUSA, 2005, p. 43-44).
Quando proponho observar se os textos elaborados pelos alunos do 6º ano B são
autorais, intenciono principalmente fazer esses alunos perceberem e internalizarem que a escola
pode ser um espaço para interação entre os conhecimentos que eles já trazem de outros espaços
Figura 46 – Segunda versão da sinopse sobre o livro elaborada pelo aluno Eduardo
123
e aqueles que são direcionados por essa instituição. Mais do que isso: vislumbro que essa
interação deve significar um posicionamento autônomo na direção de poder participar
ativamente da escolha sobre o que é necessário aprender. Seria essa uma forma de democratizar
o processo de ensino-aprendizagem?
No contexto de produção escrita (e também oral) que descrevi até aqui, pretendi
demonstrar como é possível um ambiente em que os usos da língua nas aulas de Língua
Portuguesa sejam autorais. Ao pressupor a existência de autoria no dizer dos alunos do 6º ano
B matutino do CEMMB, busquei fundamentação em ideias que significam um deslocamento
das noções de autoria usualmente discutidas como aquela proposta por Foucault (1992) em que
o autor será definido conforme a obra que produzir ou como fundador de discursividades. O
referencial teórico adotado para discutir autoria tem como alicerce a Análise do Discurso
francesa, sobre a qual existem muitas discussões que não foram abordadas aqui. Como
cartógrafa, apropriei-me do que se mostrou significativo para “descobrir que matérias de
expressão misturadas a quais outras, que expressões de linguagem favorecem a passagem das
intensidades que percorrem” (ROLNIK, 2011, p. 65-66) meu corpo (professora-pesquisadora)
no encontro com outros corpos (alunos do 6º B). Entender esse movimento foi minha pretensão.
A hipótese de que autonomia e autoria estariam imbricadas no processo de ensino-
aprendizagem nas aulas de Língua Portuguesa pôde ser constatada à medida que a intervenção
foi acontecendo e sendo alvo de reflexão. A superação da legislação e julgo do outro remodela-
se como a abertura para o diálogo. Escrever no 6º ano B matutino teve essa conotação. Proceder
etnograficamente revelou a dimensão de oportunidades que o campo oferecia e a minha
limitação inicial em lidar com elas. O posterior registro sob a forma de cartografia neste
memorial ampliou as possibilidades de rever o desenho que se constituía elaborado por tantas
mãos e reflexões.
124
5 CARTOGRAFIA PRONTA: CONTORNO
O que importa é que, para ele (o cartógrafo), teoria é sempre
cartografia – e, sendo assim, ela se faz juntamente com as paisagens
cuja formação ele acompanha.
Rolnik (2011, p. 65)
A percepção acerca dos meus limites na cartografia que é a escrita deste memorial leva-
me a percorrer caminhos que orientam a refletir como se construiu o meu aprendizado e as
consequências dessa construção. Estar no campo sala de aula de Língua Portuguesa; ser,
portanto, professora-pesquisadora permitiu-me compreensões, perlaborações, descobertas não
estabelecidas a priori: entradas que me constituíram no que sou agora. São as possibilidades
que começam a se delinear a partir dos contornos que podem ser retomados a partir de outros
pontos, já que os referenciais mudam conforme a posição ocupada pelo sujeito.
As questões propostas por Geraldi (2011, p. 40) – “por que ensinamos o que
ensinamos?” e “para que as crianças aprendem o que aprendem?” – serviram de ponto de partida
para a reflexão sobre o meu proceder em sala de aula e consequentes tentativas de mudança.
Ao propor uma intervenção no modo como vinha tentando dar conta do ensino-aprendizagem
da escrita, pretendi primeiro entender o que (não) funcionava e porque (não) funcionava nas
minhas aulas.
A dificuldade em perceber o quanto a minha formação influencia a minha prática e em
mudar a minha postura em sala de aula foram os entraves mais significativos nesse caminhar.
É que só desejar o novo não basta. Há que se permitir ver o desejo do outro, entendê-lo e
embarcar nas possibilidades desse encontro: oportunidades de viver o real social, um roteiro
novo resultante da participação dos envolvidos. Assim descubro o entrelaçamento imanente
entre teoria e prática.
Uma cartografia só pode ser constituída nessa condição de espaço-tempo para observar,
descobrir, desmontar, (re)significar, construir contextos para nossa existência enquanto
humanidade.
Pressupor que a escrita dos alunos pode ser autoral e que isto significaria o exercício da
autonomia assume-se como um indício de que a teoria já estava imbricada na prática. O que
faltava era a minha percepção sobre isso. Ser professora por mais de 20 anos ofereceu-me os
subsídios para essa proposição, embora tenha sido necessário também percorrer novamente os
caminhos da práxis na academia. Compreendo que essa pressuposição, para ser constatada,
dependia apenas de mudanças de concepção em minha prática e da tomada de consciência
125
acerca de como o discurso escolar está montado com suas contradições, seus cerceamentos e
suas injustiças. A contradição, enquanto característica inerente à ação de valorar do ser humano,
deve ser compreendida, relativizada, contestada e desmontada sempre; cerceamento e injustiça
também devem ser compreendidos no cerne de suas formações e combatidos sempre e ainda
enfaticamente. Penso que o professor não pode se eximir dessa demanda que, por estar tão
patente e arraigada na estrutura educacional, escapa à visão, à compreensão e ao enfrentamento.
Reconhecer o dizer autônomo e autoral dos alunos não foi uma questão de ensiná-los a
proceder de tal modo. Mais do que isso, significou pôr-me a escuta, buscar “canais de efetuação
da vida” (ROLNIK, 2011, p. 68), “negociar” e aceitar a validade dos desejos ali existentes. A
partir dessa transformação em meu proceder, pareceu-me que houve o ensino-aprendizagem
nas minhas aulas. Compreendi que o saber antecipado é apenas o princípio do saber que vai ser
construído. Desse modo, planejar aulas significa estar atenta e flexível ao que é real e próprio
no contexto da sala de aula, da escola e da comunidade. A experiência de duas décadas em sala
de aula não deve ser a confirmação do autocentramento e do “poder” de quem é invariavelmente
a única que sabe.
Quanto às respostas aos questionamentos postos por Geraldi (2011, p. 40), tenho
algumas oriundas do fazer refletido e vivenciado durante a intervenção. Preciso alertar que não
são definitivas, mas que, neste momento, formam a minha compreensão acerca de tudo que
experienciei: uma entre as múltiplas saídas que a escrita deste memorial me põe à escolha.
Ensinamos40 o que ensinamos porque, enquanto professores, pretendemos sempre o que
é melhor para os alunos (ou para nós mesmos), conforme a nossa vontade e também de acordo
com o que nos é imposto pelas instâncias oficiais. Talvez ainda nos faltem a reflexão e a
abertura ao diálogo e à mediação. Se já temos outra concepção de ensino-aprendizagem da
Língua Portuguesa na escola, colocamo-nos na posição de escuta, mediação e aprendizado entre
os quereres e os saberes pulsantes na sala de aula.
Acredito que as crianças apenas aprendem o que se mostra significativo para elas. A
estrutura da escola colabora no sentido de fazer acreditar que há aprendizado sempre e, quando
isso não acontece, a responsabilidade é exclusiva do professor ou do aluno. Neste caso, refiro-
me à aprendizagem do que é instituído oficialmente. As crianças sabem muito e cabe ao
professor valorizar esses conhecimentos e possibilitar um ambiente em que outros sejam
40 O uso da primeira pessoal do plural nesse parágrafo tem como objetivo dar continuidade coesiva à pergunta
proposta. É preciso que fique claro que a resposta se refere a mim e a minha experiência em três escolas da rede
pública de ensino na cidade de Salvador.
126
construídos. Além disso, é preciso dar espaço a elas para exercerem ainda mais a autonomia
que lhes pertence e ainda não foi totalmente disciplinada, talvez apagada, pela escola.
O contorno do território “Produção textual na escola e autoria: como os textos escritos
nas aulas de Língua Portuguesa podem ser autorais” conclui um dos desenhos possíveis para a
paisagem dessa intervenção. Ainda, aponta para o dizer (e fazer) autoral e autônomo meu,
enquanto professora-pesquisadora em formação que, nesse sentido, autoriza-se a tal e autoriza
a interlocução com o outro. Posiciono-me, dessa forma, no contradiscurso que desmonta e
enfrenta o já estabelecido e tornado rotina diante dos alunos que entram no 6º ano: “Esses
meninos não sabem ler nem escrever!”, “São todos analfabetos! Como chegaram ao 6º ano?”.
Embora reconheça que ainda estou no início dessa nova trajetória que comecei a percorrer há
pouco.
As apreciações deste memorial deverão compor novos desenhos, novas cartografias:
constituição de mundos dispostos a outras apreciações numa espécie de continuum que a
interação pela linguagem proporciona… Assim percebo a formação inerente à
escrita/constituição desta cartografia, deste memorial.
127
REFERÊNCIAS
ANDRÉ, Marli Elisa Dalmazo Afonso de. Etnografia da prática escolar. Campinas: Papirus,
1995.
ANTUNES, Irandé. Língua, texto e ensino. São Paulo: Parábola Editorial, 2009.
ARFUCH, Leonor. O espaço biográfico: dilemas da subjetividade contemporânea. Trad.
Paloma Vidal. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2010.
BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. Tradução de Paulo Bezerra. São Paulo:
Editora WMF Martins Fontes, 2011.
BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. 2. ed. 2006. Disponível em: <
file:///C:/Projeto%20de%20interven%C3%A7%C3%A3o/MARXISMO_E_FILOSOFIA_DA
_LINGUAGEM.pdf > Acesso em 01 de dezembro de 2014.
BANDEIRA, Pedro. Quem sou eu? In: LAJOLO, Marisa. (Org.). Palavras de encantamento.
São Paulo: Moderna, FNDE, 2001. (Coleção Literatura em minha casa, vol. 1).
BANDEIRA, Pedro. Quem sou eu? Disponível em:
<http://pensador.uol.com.br/poemas_de_pedro_bandeira/> Acesso em 14 de abril de 2014.
BERLINER, Roberto; CHEUICHE, Jacques; DOMINGUES, Leonardo. A pessoa é para o
que nasce. [Longa-metragem]. Direção de Roberto Berliner e produção de Jacques Cheuiche
e Leonardo Domingues. Rio de Janeiro, TvZero, 2004, 85min, estéreo, color, 35mm.
BERTHOFF, Ann. Prefácio. In: FREIRE, Paulo; MACEDO, Donaldo. Alfabetização: leitura
do mundo, leitura da palavra. Tradução Lólio Lourenço de Oliveira. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 2011. p. 11-32.
BORBA, Valquíria Claudete Machado; CALIL, Eduardo. Processos de escrita na escola:
breve panorama de alguns estudos franceses e brasileiros. Manuscrítica: Revista de Escrita
Genética. v.14, Vitória - Espírito Santo, p. 177-184.
BORTONI-RICARDO, Stella Maris. O professor pesquisador:introdução à pesquisa
qualitativa. São Paulo: Parábola Editorial, 2008.
BRANTLEY, Bobbi. Elaboração de questionários e formulários. In: MALHOTRA, Naresh K.
A pesquisa em marketing: uma orientação aplicada. São Paulo: ARTMED, 1999, p. 274-298.
128
BRASIL. Lei n. 8069, de 13 de julho de 199. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do
Adolescente e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm> Acesso em 10 de setembro de 2014.
BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: língua portuguesa. Ensino Fundamental.
Terceiro e quarto ciclos. Brasília: MEC/SEF, 1998.
BRASIL. Decreto 7083, 27 de janeiro de 2010. Dispõe sobre o Mais Educação. Brasília. Casa
Civil. Sub-chefia para assuntos jurídicos. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Decreto/D7083.htm Acesso em18
de abr. de 2015.
CAMARGO, Maria Rosa Rodrigues Martins (Org.). Leitura e escrita como espaços
autobiográficos de formação. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010.
CARDOSO, Cancionila Janzkoski. A socioconstrução do texto escrito: uma perspectiva
longitudinal. Campinas: Mercado de Letras, 2002.
CÉSAR, América Lúcia Silva. Construção da autoria. In: CÉSAR, América Lúcia Silva.
Lições de abril: a construção da autoria entre os índios Pataxó de Coroa Vermelha. Salvador:
EDUFBA, 2001. p. 85-99.
CIPÓ – Comunicação Interativa. Disponível em: < http://www.cipo.org.br/portal/# > Acesso
em 29 de agosto de 2014.
CORACINI, Maria José Rodrigues Faria. Discurso e escrita: entre a necessidade e a
(im)possibilidade de ensinar. In: ECKERT-HOFF, Beatriz Maria; CORACINI, Maria José
Rodrigues Faria. (Orgs.) Escrita de si e alteridade no espaço papel-tela: alfabetização,
formação de professores, língua materna e estrangeira. Campinas, São Paulo: Mercado de
Letras, 2010. p. 17-50.
COSSON, Rildo. Letramento literário: teoria e prática. São Paulo: Contexto, 2006.
CULPA das estrelas, A. Trailer. Disponível em: <
https://www.youtube.com/watch?v=e_rghkWLjEI> Acesso em 10 de agosto de 2014.
CULPA das estrelas, A. Sinopse do filme. Disponível em:
<http://www.adorocinema.com/filmes/filme-218926/ >Acesso em 11 de agosto de 2014.
CULPA das estrelas, A. Sinopse do livro. Disponível em:
<http://www.skoob.com.br/livro/247555-a_culpa_e_das_estrelas> Acesso em 11 de agosto de
2014.
DOLZ, Joaquim; SCHNEUWLY, Bernard. Gêneros e progressão em expressão oral e escrita
– elementos para reflexões sobre uma experiência suíça (francófona). In: SCHNEUWLY,
129
Bernard; DOLZ, Joaquim. Gêneros orais e escritos na escola. Tradução e organização
Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas: Mercado de Letras, 2004. p. 35-60.
DOLZ, Joaquim; NOVERRRAZ, Michèle; SCHNEUWLY, Bernard. Sequências didáticas
para o oral e a escrita: apresentação de um procedimento. In: SCHNEUWLY, Bernard;
DOLZ, Joaquim. Gêneros orais e escritos na escola. Tradução e organização Roxane Rojo e
Glaís Sales Cordeiro. Campinas: Mercado de Letras, 2004. p. 81-108.
DURAN, Marília Claret Geraes. Colocar-me por escrito – escrever um memorial. Educação
& Linguagem. v. 12, n. 20, p. 132-147, jul-dez. 2009. Disponível em: <
file:///C:/Users/Claudia/Downloads/Colocar-me%20por%20escrito.pdf> Acesso em 15 de
julho de 2014.
FIAD, Raquel Salek. Ensino e autoria. In: TFOUNI, Leda V. (Org.). Múltiplas faces da
autoria. Injuí: Editora Unijuí, 2008. p. 217-236.
FINO, Carlos Nogueira. FAQs, Etnografia e observação participante. SEE – Revista Europeia
de Etnografia da Educação, 3. 2003, p. 95-105. Disponível em: <
http://www3.uma.pt/carlosfino/publicacoes/20.pdf > Acesso em 12.06.14
FINO, Carlos Nogueira. A etnografia enquanto método: um modo de entender as culturas
(escolares) locais. In: ESCALLIER, Christine e VERÍSSIMO, Nelson (Orgs.) Educação e
Cultura. Funchal: DCE – Universidade da Madeira, 2008. p. 43-53. Disponível em <
http://www3.uma.pt/carlosfino/publicacoes/22.pdf> Acesso em 12.06.14.
FREIRE, Paulo; MACEDO, Donaldo. Alfabetização: leitura do mundo, leitura da palavra.
Tradução Lólio Lourenço de Oliveira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2011.
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 23. ed. São
Paulo: Cortez, 1989.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 25. ed.
São Paulo: Paz e Terra, 1996.
FOUCAULT, Michel. Disciplina. In: FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da
prisão. Tradução Raquel Ramalhete. Petrópolis: Vozes, 1987. p. 117-193.
GAROTO CÓSMICO. Trailler. Disponível em: <
https://www.youtube.com/watch?v=PlhWo98GXB0> Acesso em 10 de agosto de 2014.
GARCEZ, Lucília Helena do Carmo. A escrita e o outro: os modos de participação na
construção do texto. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2010.
GENZUK, Michael. A Synthesis of Ethnographic Research. Occasional Papers Series. Center
of Multilingual, Multicultural Research (Eds). Center for Multilingual, Multicultural
130
Research, Rossier School of Education. Los Angeles: University of Southern California,
2003. Disponível em: < http://www-bcf.usc.edu/~genzuk/Ethnographic_Research.html>
Acesso em 01.06.14.
GERALDI, João Wanderley. Concepções de linguagem e ensino de português. In: GERALDI,
João Wanderley (Org.) O texto na sala de aula. São Paulo: Ática, 2011. p. 39-46.
GESTAR (Gestão da Aprendizagem Escolar). Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12380:gestar-
ii&catid=315:gestar-ii&Itemid=642 > Acesso em 10 de setembro de 2014.
GOULEMOT, Jean Marie. Da leitura como produção de sentidos. In: CHARTIER, Roger
(dir). Práticas de leitura. Tradução de Cristiane Nascimento. 2. ed. São Paulo: Estação
Liberdade, 2001. p.107-116.
HISSA, Cássio Eduardo Viana. Entrenotas: compreensão de pesquisa. Belo Horizonte:
Editora UFMG, 2013.
IBM, SPSS Statistics, version 20.0. [s.l.]. Disponível em: < http://www-
01.ibm.com/software/analytics/spss/products/statistics/> Acesso em 10 de junho de 2014.
JOSSO, Marie-Christine. Experiências de vida e formação. Rio Grande do Norte: Editora da
UFRN, 2010.
KLEIMAN, Angela. Preciso ensinar letramento? Não basta ensinar a ler e a escrever?
Campinas: UNICAMP, 2005.
KLEIMAN, Angela. Letramento e suas implicações para o ensino de língua materna. Signo,
Santa Cruz do Sul, v. 32, n. 53, p. 1-25, dez. 2007.
KOCH, Ingedore Villaça; ELIAS, Vanda Maria. Ler e escrever: estratégias de produção
textual. São Paulo: Contexto, 2012.
KOCH, Ingedore Villaça; ELIAS, Vanda Maria. Ler e compreender: estratégias de produção
textual. São Paulo: Contexto, 2013.
LAJOLO, Marisa. O texto não é pretexto: será que não é mesmo? In: ZILBERMAN, Regina;
RÖSING, Tânia (Org.). Escola e leitura: velha crise, novas alternativas. São Paulo: Global,
2009. p. 99- 112.
LARROSA, Jorge. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. (Tradução João
Wanderley Geraldi). Revista Brasileira de Educação, 19, Jan/Fev/Mar, 2002. Disponível em:
< http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n19/n19a02.pdf > Acesso em 18 de agosto de 2014.
131
LEFFA, Vilson José. Perspectivas no estudo da leitura: Texto, leitor e interpretação textual.
In: LEFFA, Vilson José. PEREIRA, Aracy E. (Orgs.). O ensino da leitura e produção textual:
Alternativas de renovação. Pelotas: Educat, 1999. p. 13-37.
LUBISCO, Nídia Maria Lienert; VIEIRA, Sônia Chagas. Manuel de estilo acadêmico:
trabalhos de conclusão de curos, dissertações e teses. 5. ed. Salvador: EDUFBA, 2013.
MACEDO, Roberto Sidnei. Etnopesquisa crítica e multirreferencial nas ciências humanas e
na educação. 2. ed. Salvador: EDUFBA.
MARCUSCHI, Luiz Antônio. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São
Paulo: Parábola Editorial, 2008.
MEURER, José Luiz. Esboço de um modelo de produção de textos. In: MEURER, José Luiz;
MOTTA-ROTH, Désirée. (Orgs.). Parâmetros de textualização. Santa Maria: Editora UFSM,
1997, p. 13-28.
OLIVEIRA, Luciano Amaral. Coisas que todo professor de português precisa saber: a teoria
na prática. São Paulo: Parábola Editorial, 2010.
ORLANDI, Eni Pulcinelli. Nem escritor nem sujeito: autor. In: ORLANDI, Eni Pulcinelli.
Discurso e leitura. São Paulo: Cortez, 2008. p. 75-84.
ORLANDI, Eni Pulcinelli. Autoria, leitura e efeitos do trabalho simbólico. Campinas: Pontes
Editores, 2012.
PASSEGGI, Maria da Conceição. Memoriais autobiográficos: escritas de si como arte de
(re)conhecimento. In: CORDEIRO, Verbena Maria Rocha. e SOUSA, Elizeu Clementino de
(orgs.). Memoriais: literatura e práticas culturais de leitura. Salvador: EDUFBA, 2010. p. 19-
42.
PASSEGGI, Maria da Conceição; CÂMARA, Sandra Cristinne Xavier da. Memorial
autobiográfico: uma tradição acadêmica no Brasil. In: PASSEGGI, Maria da Conceição;
VICENTINI, Paula Perin; SOUZA, Elizeu Clementino de (Orgs.). Pesquisa autobiográfica:
narrativas de si e formação. Curitiba: CRV, 2013, p. 29-47.
PASSEGGI, Maria da Conceição. Memoriais de formação: processos de autoria e
(re)construção identitária. In: Conferência de Pesquisa Sociocultural, 3, 200. Campinas.
Anais. Campinas, 2000. Disponível em: <http://fae.inicamp.br/br200/trabs/1970.doc>. Acesso
em 23 de agosto de 2014
PENSADOR, Gabriel O. Linhas tortas. Disponível em: http://gabrielopensador.com.br/linhas-
tortas/. Acesso em 10 de maio de 2014.
132
POSSENTI, Sírio. Enunciação, autoria e estilo. Revista da FAEEBA. Salvador: UNEB, n. 15,
jan./jun., p. 15-22, 2001.
POSSENTI, Sírio. Indícios de autoria. Perspectiva. Florianópolis, v. 20, n. 01, p. 105- 124,
jan/jun. 2002.
POSSENTI, Sírio. Os limites do discurso: ensaios sobre o discurso e o sujeito. São Paulo:
Parábola Editorial, 2009.
PROVA de fogo: uma história de vida. Direção: Doug Atchison. Produção: Daniel
Llewelyn, Laurence Fishburne , Michael Romersa, Nancy Hult, Sidney Ganis. Intérpretes:
Angela Basset, Keke Palmer, Laurence Fishburne. Roteiro: Doug Atchison. Drama, Estados
Unidos, 1 DVD, 112min, Lionsgate Films/Vídeo Filmes, 2006.
RAFFEL, Carol. Concepção da pesquisa exploratória. In: MALHOTRA, Naresh K. A
pesquisa em marketing: uma orientação aplicada. São Paulo: ARTMED, 1999, p. 153-175.
ROCHA, Ruth. Fragmento. In: ROCHA, Ruth; FLORA, Anna. Escrever e criar – é só
começar! 6ª série: a redação através do jogo e da literatura. São Paulo: FTD, 1996, p. 48.
RODRIGUES, Alessandra. Escrita e autoria: entre histórias, memórias e descobertas.
Campinas: Mercado de Letras, 2011.
ROJO, Roxane; CORDEIRO, Glaís Sales. Apresentação: gêneros orais e escritos como
objetos de ensino: modo de pensar, modo de fazer. In: SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ,
Joaquim; colaboradores. Gêneros orais e escritos na escola. Tradução e organização Roxane
Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas: Mercado de Letras, 2004. p. 7-16.
ROJO, Roxane. Letramentos múltiplos, escola e inclusão social. São Paulo: Parábola
Editorial, 2009.
ROLNIK, Sueli. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. Porto
Alegre: Sulina Editora da UFRGS, 2011.
SILVA, Ana Lúcia Gomes da; SERPA, Luiz Felippe Santos Perret. O gênero memorial como
dispositivo de formação e autoformação: reflexões iniciais. In: CORDEIRO, Verbena Maria
Rocha; SOUSA, Elizeu Clementino de (Orgs.). Memoriais: literatura e práticas culturais de
leitura. Salvador: EDUFBA, 2010. p. 79-107.
SCHNEUWLY, Bernard; DOLZ, Joaquim. Gêneros orais e escritos na escola. Tradução e
organização Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro Campinas: Mercado de Letras, 2004.
SILVA, Jane Quintilano G. O memorial no espaço da formação acadêmica: (re)construção do
vivido e da identidade. Perspectiva, Florianópolis, v. 28, n. 2, p. 601-624, jul./dez. 2010,
133
Disponível em: <
http://www.pucminas.br/imagedb/mestrado_doutorado/publicacoes/PUA_ARQ_ARQUI2012
1016140628.pdf >. Acesso em 20 de agosto de 2014.
SOARES, Magda. Metamemória-memórias: travessia de uma educadora. São Paulo: Cortez,
1991.
SOLÉ, Isabel. Estratégias de leitura. Porto Alegre: Artmed, 1998.
SOUZA, João Francisco. Educação Escolar, nosso fazer maior, des(a)fia o nosso saber:
Educação de Jovens e Adultos. Recife: Edições Bagaço, 2000.
TAVARES, Rosemeire Aparecida Alves.; CONSELVAN, Tatiane Brugnerotto. Vontade de
saber português. 6º ano. São Paulo: FTD, 2012.
TFOUNI, Leda Verdiani. Letramento e alfabetização. São Paulo: Cortez, 2010.
TFOUNI, Leda Verdiani. Autoria e contenção da deriva. In: TFOUNI, Leda Verdiani. (Org.).
Múltiplas faces da autoria. Injuí: Editora Unijuí, 2008. p. 141-158.
TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Ensino de gramática numa perspectiva textual interativa. In:
AZAMBUJA, Jorcelina Qeuiroz de (Org.). O ensino de língua portuguesa para o 2° grau.
Minas Gerais: UFU, 1996, p.107 - 156.
TRAVAGLIA, Luiz Carlos. Gramática e interação: uma proposta para o ensino de
gramática. São Paulo: Cortez, 2009.
VÓVIO, Claudia Lemos; SOUZA, Ana Lúcia Silva. Desafios metodológicos em pesquisas
sobre letramento. In: KLEIMAN, Angela; MATENCIO, Maria de Lourdes Meirelles. (Orgs.)
Letramento e formação do professor: práticas discursivas, representações e construções do
saber. Campinas: Mercado de Letras, 2005. p. 41-64.
VYGOSTKY, Lev Semenovich. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes
Editora Ltda, 1991. Disponível em: <
http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/vygotsky-a-formac3a7c3a3o-social-da-
mente.pdf>. Acesso em 07 de fevereiro de 2015.
VYGOSTKY, Lev Semenovich. Pensamento e linguagem. Disponível em
http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/vigo.html Acesso em 10 de janeiro de 2015.
134
APÊDICE A - Questionário
COLÉGIO ESTADUAL MONSENHOR MANOEL BARBOSA
DISCIPLINA: LÍNGUA PORTUGUESA PROF.ª: CLAUDIA LESSA
ANO LETIVO: 2014 ANO/SÉRIE: 6º/5ª ENSINO FUNDAMENTAL 2
QUESTIONÁRIO
OBJETIVOS:
As questões propostas abaixo têm como objetivos:
conhecer melhor você, que é aluno do 6º ano (5ª série) turno matutino no Colégio Estadual
Monsenhor Manoel Barbosa e
utilizar esse conhecimento como objeto de estudo/pesquisa (em que está garantido o sigilo
das informações prestadas por você) e também para a elaboração de um planejamento
adequado às suas necessidades de aprendizagem.
INSTRUÇÕES:
Responda às questões com calma, procurando ser sincero(a) e expondo a verdade.
Este questionário não tem valor de nota para a unidade didática, mas é muito importante
para todos nós.
Utilize caneta azul ou preta.
PARTE 1
1. Qual o seu nome completo?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
2. Qual sua data de nascimento?
__________________________________________________________________________
3. Em que cidade e estado você nasceu?
__________________________________________________________________________
4. Em que bairro mora?
__________________________________________________________________________
5. Com quem você mora?
135
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
PARTE 2
1. O que você mais gosta de fazer quando não está na escola?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
2. Você gosta de ler? (Marque apenas uma alternativa)
( ) Sim
( ) Não
2.1 Justifique a resposta da questão anterior.
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
3. O que você mais gosta de ler?
( ) Revistas
( ) Livros didáticos
( ) Livros religiosos
( ) Livros paradidáticos
( ) Jornais
( ) Panfletos
( ) Outros. Quais?_______________________________________________________
4. Quando você quer ler, que assunto(s) mais lhe interessa(m)?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
136
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
5. Onde você tem maior contato com a leitura?
( ) Na biblioteca
( ) Na casa de outras pessoas
( ) Na escola
( ) Na igreja
( ) Em sua própria casa
( ) Outros lugares Quais?_________________________________________________
6. Na escola, você tem aulas de “leitura”? (Marque apenas uma alternativa)
( ) Sim
( ) Não
6.1 Como são essas aulas?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
7. Na sua família, outras pessoas têm o costume de ler? (Marque apenas uma alternativa)
( ) Sim
( ) Não
7.1 Quem são essas pessoas? O que elas leem?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
8. Em seu círculo de amizades/convivência, as pessoas têm o costume de ler? (Marque
apenas uma alternativa)
( ) Sim
( ) Não
137
8.1 Quem são essas pessoas?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
8.2 O que elas (essas pessoas) leem?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
PARTE 3
1. Você costuma escrever? (Marque apenas uma alternativa)
( ) Sim
( ) Não
1.1 Sobre o que escreve?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
2. Em qual desses lugares você mais escreve?
( ) Em casa
( ) Na escola
( ) Na igreja
( ) Outros. Quais?________________________________________________________
3. Onde você mais escreve?
( ) Caderno
( ) Diário
( ) Computador
( ) Livro
138
( ) Celular
( ) Outros. Quais? ________________________________________________________
4. Na sua família, as pessoas têm costume de escrever? (Marque apenas uma alternativa)
( ) Sim
( ) Não
4.1 Quem são essas pessoas?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
4.2 Sobre o que elas (as pessoas da sua família) escrevem?
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
_______________________________________________________________________
5. Na escola você tem aulas de “escrita”? (Marque apenas uma alternativa)
( ) Sim
( ) Não
5.1 Como são essas aulas?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
PARTE 4
1. O que é “leitura”?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
139
2. A “leitura” é: (Marque apenas uma alternativa)
( ) insignificante
( ) pouco importante
( ) importante
( ) muito importante
2.1 Justifique sua resposta anterior.
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
3. O que é “escrita”?
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
4. A “escrita” é: (Marque apenas uma alternativa)
( ) insignificante
( ) pouco importante
( ) importante
( ) muito importante
4.1 Justifique sua resposta anterior.
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
__________________________________________________________________________
140
APÊNDICE B – Solicitação de autorização
Solicitação de autorização
Neste segundo semestre, daremos continuidade às atividades que fazem parte de um
projeto cujo objetivo é tornar possível aos alunos do 6º B/5ª B turno matutino do Colégio
Estadual Monsenhor Manoel Barbosa, a partir da reescrita textual, a conquista da competência
escritora (ou textual41) e da consciência de si como sujeito autor, pois acreditamos que esses
são dois requisitos fundamentais para a formação de cidadãos críticos e conscientes de seu papel
perante a sociedade e a humanidade. Trata-se do projeto de intervenção “Reescrita textual:
construção/descoberta de si enquanto sujeito autor” proposto por mim, professora de
Língua Portuguesa desta unidade escolar há 14 anos, para o Mestrado Profissional em Letras
(PROFLETRAS), oferecido pela Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Dessa forma, venho solicitar aos senhores, pais, mães e/ou responsáveis, a permissão
para utilização de imagens, áudios e produções textuais dos referidos alunos para fins de
pesquisa.
Desde já agradeço a colaboração dos senhores e senhoras no sentido de autorizarem seus
filhos a participarem do projeto de pesquisa. Reforço que estou à disposição para maiores
esclarecimentos.
Atenciosamente,
Claudia Lessa Alves Sousa
Professora de Língua Portuguesa e Aluna do PROFLETRAS/UFBA
Eu, ________________________________________________, autorizo meu filho/minha
filha __________________________________________do sexto ano do Ensino
Fundamental, turma B, turno matutino do Colégio Estadual Monsenhor Manoel Barbosa a
participar do projeto de pesquisa “Reescrita textual: construção/descoberta de si
enquanto sujeito autor”.
Salvador, ____ de julho de 2014.
_______________________________________________________________
Pai/Mãe e/ou responsável
41 Competência textual é, segundo Travaglia (2009, p. 18), a capacidade de, em situações de interação
comunicativa, produzir e compreender textos considerados bem formados, valendo-se de capacidades textuais
básicas: a formativa, transformativa e a qualificativa.