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O PESO DO RACISMO SOB A ESTÉTICA DA MULHER NEGRA: Um paradoxo da isonomia social brasileira. Isabela Caroline de Aguiar Gama 1 Prof. Ramon Olímpio 2 RESUMO O presente artigo tem por objetivo problematizar os estereótipos acerca da estética da população negra, questionado a ideia de isonomia social, a fim de denunciar a violação do direito à identidade da mulher negra. Tal proposta se mostra relevante porque pode proporcionar um panorama contemporâneo da representação da mulher negra na sociedade brasileira, evidenciando o problema do racismo e o processo de conquista de direitos e de valorização de sua identidade. Discute-se sobre a imposição de um padrão de beleza ideal como mecanismo de desconstrução dos estereótipos negativos relacionados à mulher negra. Para tanto, pretende-se desenvolver o trabalho a partir da análise dos depoimentos de mulheres negras que sofrem racismo diariamente devido ao seu cabelo e outros elementos relacionados à sua estética capilar. Palavras-chave: Mulheres negras; Estética capilar; Racismo; Identidade; Isonomia. THE WEIGHT OF RACISM UNDER THE AESTHETICS OF BLACK WOMAN: A paradox of Brazilian social isonomy. ABSTRACT This article aims to problematize the stereotypes about the aesthetics of the black population, questioned the idea of social isonomy, in order to denounce the violation of the right to the identity of black women. This proposal is relevant because it can provide a contemporary panorama of the representation of black women in Brazilian society, highlighting the problem of racism; the process of conquering rights and valuing their identity, from the discussion on the imposition of an ideal beauty pattern; as a mechanism of deconstruction of the negative stereotypes related to the black woman. Therefore, we intend to develop the work from the analysis of the testimonies of black women who suffer racism daily due to their hair and other elements related to their aesthetic capillary. Keywords: Black women; Hair aesthetics; Racism; Identity; Isonomy. 1 Graduanda em Direito pela Faculdade Internacional da Paraíba FPB. 2 Professor Orientador. Graduando em Direito pelo Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ), Advogado, Especialista em Direito Tributário e Processual Tributário pela Escola Superior de Advocacia Flósculo da Nóbrega (ESAPB), Pós-Graduado em Direito Eleitoral e Processual Eleitoral pela Escola Superior de Advocacia Flósculo da Nóbrega (ESAPB); Mestre em Direito Humanos, Cidadania e Políticas Públicas pelo Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Membro da Comissão de Direito Difusos e Relações de Consumo e da Comissão de Biodireiro e Direito Sanitário da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Paraíba.

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O PESO DO RACISMO SOB A ESTÉTICA DA MULHER NEGRA:

Um paradoxo da isonomia social brasileira.

Isabela Caroline de Aguiar Gama1

Prof. Ramon Olímpio2

RESUMO

O presente artigo tem por objetivo problematizar os estereótipos acerca da estética da

população negra, questionado a ideia de isonomia social, a fim de denunciar a violação do

direito à identidade da mulher negra. Tal proposta se mostra relevante porque pode

proporcionar um panorama contemporâneo da representação da mulher negra na

sociedade brasileira, evidenciando o problema do racismo e o processo de conquista de

direitos e de valorização de sua identidade. Discute-se sobre a imposição de um padrão

de beleza ideal como mecanismo de desconstrução dos estereótipos negativos

relacionados à mulher negra. Para tanto, pretende-se desenvolver o trabalho a partir da

análise dos depoimentos de mulheres negras que sofrem racismo diariamente devido ao

seu cabelo e outros elementos relacionados à sua estética capilar.

Palavras-chave: Mulheres negras; Estética capilar; Racismo; Identidade; Isonomia.

THE WEIGHT OF RACISM UNDER THE AESTHETICS OF BLACK WOMAN: A paradox of Brazilian social isonomy.

ABSTRACT

This article aims to problematize the stereotypes about the aesthetics of the black

population, questioned the idea of social isonomy, in order to denounce the violation of

the right to the identity of black women. This proposal is relevant because it can provide a

contemporary panorama of the representation of black women in Brazilian society,

highlighting the problem of racism; the process of conquering rights and valuing their

identity, from the discussion on the imposition of an ideal beauty pattern; as a mechanism

of deconstruction of the negative stereotypes related to the black woman. Therefore, we

intend to develop the work from the analysis of the testimonies of black women who suffer

racism daily due to their hair and other elements related to their aesthetic capillary.

Keywords: Black women; Hair aesthetics; Racism; Identity; Isonomy.

1 Graduanda em Direito pela Faculdade Internacional da Paraíba – FPB.

2Professor Orientador. Graduando em Direito pelo Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ),

Advogado, Especialista em Direito Tributário e Processual Tributário pela Escola Superior de Advocacia

Flósculo da Nóbrega (ESAPB), Pós-Graduado em Direito Eleitoral e Processual Eleitoral pela Escola

Superior de Advocacia Flósculo da Nóbrega (ESAPB); Mestre em Direito Humanos, Cidadania e Políticas

Públicas pelo Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos da Universidade Federal da Paraíba

(UFPB), Membro da Comissão de Direito Difusos e Relações de Consumo e da Comissão de Biodireiro e

Direito Sanitário da Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Paraíba.

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INTRODUÇÃO

Nos dias atuais acontece um processo de naturalização e de imposição do padrão

estético branco eurocêntrico que nega a outros grupos raciais3, constituintes da

sociedade brasileira, o direito a sua identidade. Um bom exemplo é o da população negra,

que enfrenta uma situação paradoxal: tem os símbolos e elementos que constituem a sua

identidade inferiorizados, estigmatizados e ridicularizados, e ao mesmo tempo, tem que

conviver com o processo de apropriação cultural4 desses elementos, por quem

historicamente foi fundamental para o processo de negativação da sua identidade.

Podemos identificar na nossa sociedade atual um fenômeno comercial que

torna moda os elementos e símbolos da estética5 negra como tendência, desde que

não estejam sendo utilizados pela população negra. No caso da mulher negra, essa

situação paradoxal fica bastante evidente em: se usar turbante e colar de búzios, por

exemplo, ela será identificada, de forma pejorativa, como macumbeira, se a mulher

branca usar os mesmos acessórios, passará a ser sinônimo de elegância e moda.

No caso do cabelo crespo, quando a mulher negra usa tranças, dreadlock ou black

power6, é considerada feia e com aparência de suja, quando a mulher branca usa, passa ser

sinônimo de estilo. Aqui se caracteriza uma contradição da sociedade, que se constitui a partir

da relação entre o racismo e o capitalismo, ou seja, a apropriação dos elementos da estética

3 O conceito de raça neste artigo, não se baseia em princípios biológicos, mas sim, no princípio de raça

como uma construção social e cultural desenvolvido no decorrer do processo histórico. De acordo com a

pesquisa de Nilma Gomes no livro Corpo e Cabelo Como Símbolos da Identidade Negra, o fenótipo de

uma pessoa não pode ser considerado como um simples conjunto de elementos biológicos, porque são

eles que expressam racismo e desigualdade racial (editora Autêntica, 2008).

4 Apropriação Cultural conceitua-se como significados culturais ou religiosos de determinados símbolos,

tratando das relações de privilégios que envolvem raça, classe, etnia e religiosidade. Logo, para prática da

apropriação cultural, é necessário á existência de dois critérios: o esvaziamento de um significado cultural e o

envolvimento de alguma espécie de privilégio de raça, classe, etnia ou religiosidade (ARAÚJO). 5ESTÉTICA – é uma palavra grega que quer dizer sensação, percepção. É, dentro da ciência, um ramo da filosofia cujo objeto é o estudo do belo, do seu inverso que é a ausência da beleza e do sentimento que um ou outro causa em nós. Falar do que é belo ou não é relativo, ou deveria sê-lo, por que quaisquer sociedades acabam criando padrões estéticos (Ramos, 2014).

6 A trajetória do Black Power teve início ainda nos anos 1920, por Marcus Garvey ativista tido como o precursor

do movimento no negro na Jamaica. No entanto, foram ás mulheres as grandes protagonistas dessa histórica.

Entre muitas, Ângela Davis, que surgiu como uma das principais figuras nesta luta. Ativista desde os primeiros

anos de sua juventude, a norte-americana fez parte do Partido Comunista e também do movimento Panteras

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Negras. Em pouco tempo Ângela havia se tornado uma das principais referências na luta pelos direitos dos

negros e muito deste respeito vinha de seu afro, que de tão imponente, se tornava como mais uma maneira de

intimidar opressores, não abrindo mão de seu Black Power (VIEIRA).

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negra pelo mercado da moda não contribui para valorização da beleza da

mulher negra, pelo contrário, reforça a ideia de um padrão branco

eurocêntrico, de uma ralação de afro-conveniência7.

Devemos compreender que afro-conveniência resulta da relação entre o racismo

e o capitalismo, de interesses individuais que possibilita determinações que legitimam,

reforçando os estereótipos negativos relacionados à população negra. E no caso

especifico da mulher negra, resulta também do “nó patriarcado” (SAFFIOTI, 2004, p.115),

da fusão da questão racial e da questão de gênero, perpassando a estrutura social, onde

ocorrem todas as relações sociais, que torna a situação da mulher negra mais complexa.

É interessante perceber que essa mulher pode sofrer o racismo proveniente das

relações advindas desse “nó patriarcado”, tanto de forma direta como de forma indireta.

Podemos ter como exemplo, as relações no mercado de trabalho, mas especificamente

em escritório de negócios, a mulher negra pode sofrer racismo de forma direta: ser

descartada no primeiro momento por entendimento que o perfil estético da mulher negra

não se enquadra no padrão da “boa aparência” para contratação de uma secretária.

Por outro lado, esse racismo também atua de forma indireta, que muitas vezes pode

passar despercebido: ele acontece através da sua hipersexualização, como o escritório que

trabalha com o público masculino, entende que ter uma secretária “mulata” com determinados

“atributos” pode agradar seus clientes. Mostrando que tanto de forma direta ou indireta, o que

prevalece não é sua capacidade profissional e sim, sua condição racial.

O exemplo do racismo indireto apresenta bem como funciona a afro-

conveniência, e como ela, neste caso, ajuda a reforçar o ditado popular do período da

colonização: “preta pra trabalhar, mulata pra fornicar e branca pra casar”. Dentro dessa

análise, a mulher negra pode ser vista como: [...] objetos da satisfação sexual dos

homens, reprodutoras de herdeiros, [...] (de) novas reprodutoras. [...] (Como prestadora)

de serviços sexuais a seus dominadores (SAFFIOTI, 2004, p. 105 com nosso grifo).

Por essas e por outras podemos afirmar que, discutir as questões relacionadas á

situação da mulher negra no Brasil, é necessariamente, abordar dois dos assuntos mais

7 Consiste em afirmar ou negar a raça/etnia de forma bastante conveniente e oportunista. Pode ser identificado

através de dois grupo: O primeiro deles formados por negros e negras que assumem (pelo menos publicamente) sua

negritude “apenas” em detrimento de privilégios. E o segundo grupo, é formado pelos brancos. Por mais que

argumentem que tiveram um bisavô negro ou que a definição deveria ser através de exames de DNA, quando nos

referimos aos brancos levamos em consideração fatores do fenótipo. Ser branco no Brasil garante os privilégios

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similares aos que Steve Biko chama de “passaporte”, mas, declarar-se negro permite o acesso a uma parte do bolo

que historicamente foram detentores e agora, veem sendo repartida através dessas ações afirmativas, sendo pessoas

duplamente beneficiadas: por serem brancos e por se autodeclararem negras (OLIVEIRA).

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delicados nos dias atuais: a questão de gênero e a questão racial, elementos estruturais e

estruturantes das relações culturais, sociais e econômicas da sociedade brasileira.

Assim, o objetivo do presente trabalho é falar um pouco sobre o direito

à identidade que, quando manifestado pelas mulheres negras através do uso

de cortes de cabelos específicos, gera preconceito de cor e gênero. Para tanto,

foi dividido em três tópicos e uma pesquisa de campo.

O primeiro tópico faz uma relação entre o direito à identidade e a estética

da mulher negra, com a realização de um levantamento histórico acerca do

movimento do black power e a questão do empoderamento feminino da mulher

negra através da aceitação e uso de estilos que são naturais ao tipo de cabelo.

No segundo tópico, foi abordado o princípio da igualdade (isonomia) e o paradoxo

que circula esse princípio, no sentido que homens e mulheres devem ser iguais perante a lei,

conforme artigo 5°, inciso II da Constituição, assim como não pode haver nenhum tipo de

preconceito de raça, cor, sexo ou preconceito de qualquer outra natureza. Ocorre, entretanto,

que há um patriarcalismo muito forte no Brasil, ou seja, a mulher fica em situação de

desigualdade, sem falar no preconceito de raça. Assim, a mulher negra se encontra em uma

situação de dupla desvantagem, o que vai de encontro com o suposto princípio da isonomia.

Por fim, o terceiro tópico traz uma pesquisa realizada com o intuito de colher depoimentos

de mulheres negras acerca de situações envolvendo preconceito, principalmente em função do uso

estético de penteados afro. Para tanto, foram levantados mais de 170 questionários, dos quais

foram escolhidos sete como amostra para o presente trabalho. O tópico buscou demonstrar que

mulher negra que opta por assumir sua identidade e manifestá-la através de cortes de cabelos

específicos se encontra em situação de fragilidade ainda maior.

Espera-se que este trabalho possa servir de base para a elaboração de novos projetos,

bem como traga notoriedade ao tema, tendo em vista sua grande relevância social e jurídica.

1 A ESTÉTICA COMO INSTRUMENTO POLÍTICO DA MULHER NEGRA EM

BUSCA DO DIREITO À IDENTIDADE

O cuidado com a estética negra representou a luta para reverter à imagem

negativa da população negra construída socialmente no decorrer do processo histórico

brasileiro. Aconteceu a incorporação de uma representação negativa de si mesmo,

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construída pelo outro e por uma condição histórica e social de desigualdade, que fez com

que a população negra tivesse que significar tal representação (MONTES, 2000).

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É nesse campo de reação e reversão que se localiza várias formas de expressão

da estética como instrumento político, representados nos estilos de penteados black

power, dreadlock e nas mais variadas formas de tranças usados pelos ativistas negros no

continente e na diáspora africana no passado e no presente (GOMES, 2008).

No Brasil esse processo de reação e reversão da representação negativa passou

necessariamente pela positivação não só da origem africano, como também, pela valorização

da cor da pele, da textura do cabelo e dos traços físicos que são características fundamentais

para determinar se um indivíduo pode sofrer mais ou menos racismo na sociedade brasileira.

Entretanto, apesar do preconceito e de um processo de seletividade

existente que envolve raça e gênero, as mulheres seguem no processo de

valorização da estética negra e na reafirmação do cabelo crespo como

principal símbolo de sua identidade, assumindo dessa forma, um lugar muito

determinado como sujeito político, dando magnitude à luta contra o racismo.

Figueiredo (2010) enfatiza que o cabelo é, em alguns casos, um fator mais importante

do que a cor da pele para classificação racial e que por conta dessa importância o movimento

negro brasileiro toma o cabelo natural como símbolo de afirmação da identidade.

O discurso proferido pelo movimento é o de estabelecer uma regra contrária à regra

vigente, e se a regra é alisar o cabelo visando dissimular a sua condição étnica racial, a

contrarregra é afirmar os fenótipos, não alisar o cabelo (Cunha, 1991). Dessa forma:

Ao propor a afirmação do cabelo, o movimento negro não o isola de um conjunto de

roupas e adereços que comporiam uma nova estética (Maués, 1991; Vieira,1989). O

discurso da militância negra em torno do cabeço é basicamente contestatório e

pretende a destruição de imagem dual construída na sociedade ocidental. Nela, o

negro encontra associado à feiura, à burrice, à sujeira, etc., em contraposição ao

branco visto como bom, belo e justo (FIGUEIREDO, 2010, p.7).

Hoje, na contemporaneidade, podemos falar em “beleza negra”, expressão

tomada de empréstimo do movimento black is beautiful, cuja denominação marcou forte

presença nos movimentos na luta da população negra nas décadas de 1960 e 1970. Pois,

se tratando de estética, a mulher negra foi buscar em seus cabelos o meio de mostrar sua

representatividade na sociedade, levando essa temática aos movimentos sociais negros e

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feministas, com o intuito de fazer com que a mulher negra se sinta bonita e se enxergue

para além da sua cor de pele e a textura de seus cabelos.

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Esse empoderamento provém principalmente do protagonismo do

feminismo negro8, que proporcionou um movimento de combate ao alisamento

compassivo dos cabelos das mulheres negras. Um processo denominado de

transição capilar, que consiste em deixar o cabelo crescer para gradualmente ir

cortando toda química restante até deixa-lo definitivamente natural.

Essas mulheres têm utilizado o seu protagonismo para influenciar

outras mulheres a também assumirem seus cabelos naturais e reconhecerem

em seus cabelos crespos sua identidade, libertando-se das amarras históricas

da branquitude, da síndrome de inferioridade constante.

2 O PRECONCEITO DE GÊNERO E DE RAÇA COMO PARADOXO DA ISONOMIA

SOCIAL BRASILEIRA

A mulher negra sofre a partir da fusão do racismo e do preconceito de gênero,

quando analisamos os indicadores socioeconômicos, ela vem atrás do homem

branco, da mulher branca e do homem negro de acordo com a pirâmide social. Tal

hierarquização nos ajuda a problematizar a ideia de isonomia social brasileira. No que

diz respeito à formação desse princípio, Cármen Lúcia Antunes Rocha afirma que:

O princípio jurídico da igualdade é o que a sociedade quer que ele seja. Não é

obra de Deuses, nem de formas heterônomas, nem de forças exógenas que se

impõem a uma sociedade com explicações mistificadas (...). A igualdade no

Direito é arte do homem. Por isto o princípio jurídico da igualdade é tanto mais

legítimo quanto mais próximo estiver seu conteúdo da ideia de Justiça em que

a sociedade acredita na pauta da história e do tempo (ROCHA, 1990, p 28).

No que tange os conhecimentos a cerca desde assunto, sabe-se que o

constitucionalismo brasileiro sempre adotou o Princípio da Igualdade em suas cartas, o que

ora não significa que sempre houve o respeito e acatamento ao mesmo. Quanto ao direito à

identidade da mulher negra, a sua não observância fere os princípios da dignidade da pessoa

humana e o da isonomia, cominando em um processo de hierarquização social que se baseia

8 O Feminismo Negro é um movimento social e um segmento protagonizado por mulheres negras, com o objetivo

de promover e trazer visibilidade às suas pautas e reivindicar seus direitos. No Brasil, seu início se deu no final da

década de 1970. O Movimento Negro tinha sua face sexista, as relações de gênero funcionavam como fortes

repressoras da autonomia feminina e impediam que as ativistas negras ocupassem posições de igualdade junto aos

homens negros; por outro lado, o Movimento Feminista tinha sua face racista, preterindo as discussões de recorte

racial e privilegiando as pautas que contemplavam somente as mulheres brancas. A luta das feministas negras é uma

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batalha contínua para nivelar seu lugar ao lugar das mulheres brancas, pois, se há tanto por que as mulheres brancas

precisam lutar, é bastante preocupante o fato de que as mulheres negras nem sequer conquistaram igualdade quando

em comparação com outros indivíduos do seu próprio gênero (ARRAES).

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no fator de gênero e de racial, conforme prevê a Constituição em seu art. 5°, I ,

senão vejamos:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: I – homens e mulheres são iguais em direito e obrigações, nos termos desta Constituição (BRASIL,1988).

A mulher negra sofre racismo ao ser posicionada em uma escala de

inferioridade e de desigualdade de gênero e de raça, dessa forma fica evidente que o

princípio da isonomia pode ser questionado a partir experiência da mulher negra.

Ademais, o estatuto da igualdade racial formalmente na Lei 12.288/10

define que a desigualdade racial é toda situação injustificada de diferenciação

de acesso e fruição de bens, serviços e oportunidade nas esferas pública e

privada, em virtude de raça, cor, descendência ou origem nacional e étnica.

Quando falamos de desigualdade de gênero e raça, da luta contra a discriminação

das mulheres negras, expomos um debate sobre as pessoas, que em grande parte, se

encontram em condição de vulnerabilidade social e que historicamente, não tiveram sua

cidadania garantida, e consequentemente, o seu direito á identidade não foi respeitado.

O paradoxo antes mencionado se caracteriza quando analisamos a situação da

mulher negra na sociedade brasileira, uma vez que expõe a fragilidade da ideia igualdade de

direitos nos tempos atuais. Segundo os dados aprestados pela Articulação de Mulheres

Negras Brasileiras (MULHER NEGRA - DADOS ESTÁTISTICOS)9, a remuneração de duas

mulheres negras juntas corresponde ao valor de uma mulher branca, para exemplificar melhor,

o rendimento anual médio de uma mulher negra, na região metropolitana de São Paulo, em

2002, foi de R$ 412,00, já para uma mulher branca foi de R$ 765,00.

Entre a população negra, a taxa de desemprego é maior do que entre a população

branca. Segundo dados do estudo Retrato das desigualdades de gênero e raça, do Instituto de

Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), entre as mulheres brancas, o desemprego é de 9,2%,

enquanto entre as mulheres negras, ultrapassa os 12%. Dados do Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística (IBGE) mostram que as mulheres negras, quando comparadas com

9 Segundo dados aprestados pela Articulação de Mulheres Negras Brasileiras (MULHER NEGRA - DADOS ESTÁTISTICOS), a população brasileira é constituída por 50,79% de mulheres, desse

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percentual, 44% são mulheres negras, representado 23% da população brasileira. Esse contingente populacional considerável não significou proporcionalmente representatividade politica que lhes garantissem melhorar os seus indicadores socioeconômicos (INSTITUTO BUZIOS).

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outros segmentos da população, são as que se sentem mais inseguras em

todos os ambientes, até mesmo em suas próprias casas.

Esse padrão de vulnerabilidade se repete em outros indicadores de violência,

segundo o Ministério da Saúde (2012), a mulher negra representa 62,8% das vitimas de

mortalidade materna e 65,9% das vitimas da violência obstétrica (Caderno de Saúde Pública,

Fiocruz, 2014). As mulheres negras representam, segundo a Central de atendimento à

mulher/2013 (balanço do disque 180), 59,4% das mulheres que sofreram violência domestica.

A taxa de homicídio por agressão apresentado pelo Diagnostico dos Homicídios

no Brasil (Ministério da Justiça, 2015), mostra que 68,8% das mulheres mortas por

agressão são mulheres negras. O estudo mostra que estaticamente, a chance de uma

mulher negra ser assinada é duas vezes maior que uma mulher branca.

O Mapa da Violência (2015), no tópico homicídios das mulheres no Brasil,

mostra que, em 2013, a taxa de homicídio entre as mulheres brancas caiu 9,8% e entre

as mulheres negras subiu 54,2%. O índice de homicídio de mulheres negras segue a

tendência dos índices da população negra em geral, sempre inclinado para cima.

Segundo dados do IBGE e do Ipea (2010), a população negra é vítima de agressão em

maior proporção que a população branca – seja homem ou mulher, jovem ou adulto.

No que diz respeito à educação, segundo o Retrato das Desigualdades de

gênero e raça (IPEA, 2011), podemos perceber a distorção idade-série que no

ensino médio atinge 38,2% das jovens negras, contra 24,1% das mulheres

brancas. Também podemos percebe a discrepância entre as mulheres no ensino

superior, a taxa de escolarização de mulheres brancas no ensino superior é de

23,8%, enquanto, entre as mulheres negras, esta taxa é de apenas 9,9%.

Diante dos dados apresentados, podemos perceber como as relações sociais são

construídas para legitimar a constituição de uma hierarquização, com base no preconceito de

gênero e de raça, que coloca a mulher negra no pior patamar da pirâmide social. Essa

perspectiva nos apresenta à necessidade de observar os estigmas produzidos por uma

sociedade desigual, violenta e, sobretudo, desrespeitosa no seu trato para com a mulher, e em

particular, para com as mulheres negras. Sobre o tema, tem-se o seguinte:

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Se todos são socializados para ser machistas, não poderá esta sociedade

mudar, caminhando para a democracia plena? Este processo é lento e

gradual e consiste na luta feminista. Trocar homens por mulheres no

comando daria, com toda certeza, numa outra hierarquia, mas sempre uma

hierarquia geradora de desigualdades. (SAFFIOTI, 2004, p. 94).

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O que vemos neste cenário é que, apesar das conquistas das mulheres na sociedade

brasileira, as mulheres negras, continuam sem acesso a sua cidadania plena, enfrentado um

jogo desigual na lógica cultural, social e econômica do país. Na maioria das vezes, ocupam os

piores cargos e quando ocupam melhores, recebem salários mais baixos. Desenvolvem uma

luta diária para garantia da assistência básica por parte do Estado, para compensar

minimamente o processo de exclusão pelo qual passou e ainda passa na sociedade brasileira.

Como mostram os dados aqui apresentados, a mulher negra ainda está sendo

subalternizada, sobretudo, inferiorizada pelo gênero masculino, até mesmo, pelos homens

negros, em uma sociedade que ainda guarda o ranço machista e racista da sociedade

patriarcal escravista que compreende a mulher negra como cidadã de segunda categoria:

A mulher negra na sua luta diária durante e após a escravidão no Brasil, foi contemplada como

mão de obra, na maioria das vezes não qualificada. Num país em que só nas últimas décadas

desse século, o trabalho passou a ter o significado dignificante o que não acontecia antes,

devido ao estigma da escravatura, reproduz-se na mulher negra “um destino histórico”. É ela

quem desempenha em sua maioria os serviços domésticos, os serviços em empresas públicas

e privadas recompensadas por baixíssimas remunerações. São de fato empregos onde as

relações de trabalho evocam as mesmas da escravocracia (NASCIMENTO, B., 2007, p. 128).

É inegável que a história deixou marcas no corpo e na mente da mulher negra.

Marcas de papéis sociais que persistem em negar a sua especificidade, construída no decorrer

do processo histórico, minimizando o seu papel na sociedade brasileira a condição do

trabalho, ao um corpo para satisfazer os desejos sexuais dos senhores contemporâneos.

No período da escravidão a mulher negra lutou pela sua dignidade humana, o

fim do período, não lhe garantiu de fato e de direito a sua cidadania plena. De certa

forma, passou da condição de “coisa”, de “objeto”, de “semi-humana” para condição

de cidadã de segunda categoria: O racismo não surgiu de uma hora para outra. Ele é

fruto de um longo processo de amadurecimento, objetivando usar mão-de-obra barata

através da exploração dos povos colonizados (SANT’ANA, 2005, p.42)

Ocupando, ainda, o último lugar na escala social, carregando grandes

desvantagens em um sistema desigual e injusto, de base machista e racista; que

insiste e persiste em conservar, contemporizar e divulgar a suposta inferioridade

da mulher negra; que remete não só ao período escravocrata, mas acima de tudo,

é atualizado em tempos atuais como argumento, para justificar o não

cumprimento, por parte do Estado Brasileiro, dos direitos básicos á mulher negra.

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Diante do apresentado e discutido, a partir situação da mulher negra na sociedade

brasileira, podemos questionar o princípio da isonomia social no brasil. A diferença do direito

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escrito e do direito colocado em prática, ou seja, questionar a seletividade do

direito na sociedade brasileira.

Essa seletividade passa necessariamente pelo perfil social, de gênero e de raça

do público que aciona e que está sendo acionado pela justiça brasileira, e aqui está o

nosso foco, compreender o racismo contra a mulher negra, a partir da estigmatização de

sua estética, principalmente de sua estética capilar, e como esse processo fere o seu

direito de identidade racial e coloca em cheque o principio da isonomia social.

3 DESVALORIZAÇÃO DA IDENTIDADE DA MULHER NEGRA ATRAVÉS DE SUA

ESTÉTICA CAPILAR

Definido por muitos como “a moldura do rosto”, o cabelo pode dar

informações sobre as origens, pertencimento a grupos sociais e hábitos de

uma pessoa, aproximando ou afastando indivíduos enquanto elementos de

identidade corporal. Eles possuem uma grande capacidade de expressão

simbólica vinculados a um contexto sociocultural (KING, 2015, p. 8).

Na sociedade brasileira foi imposto um padrão de beleza ideal que estigmatiza todo

perfil estético que destoa desse padrão ideal. Dentro dessa perspectiva, a estética branca

passou a ser sinônimo de beleza e a estética negra passou a ser sinônimo de feiura.

A referida premissa atinge diretamente a mulher negra, principalmente no que diz

respeito a sua estética capilar. O seu cabelo crespo sempre foi associado e representado

como algo ruim e inferior, gerando uma pressão social, que impõe a mulher negra, a

necessidade de buscar o padrão da estética capilar branca, para se encaixar nos

parâmetros de beleza eurocêntrica adotada na sociedade brasileira (GOMES, 2008, p.161).

Tais parâmetros são naturalizados e introjetados na mentalidade coletiva

fazendo com que, as mulheres negras e brancas, cresçam educadas para acreditar

nos estigmas que atribuem negatividade ao cabelo crespo, impondo a “ditatura do

alisamento”, “referenciando” o cabelo liso como um dos elementos que

constituem o ideal de beleza superestimado nos dias atuais.

A representação de como a pressão social do padrão estético branco atua

para a construção da identidade da mulher negra, pode ser problematizado a partir

da ilustração da vida real, através do documentário sobre estética e cabelos Afros:

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“Espelho, Espelho Meu!” (2011): “Dou prancha sim, quando aliso fica mais bonito,

alisado, vai amansar ele, vai melhorar, os meninos vão olhar mais pra mim”.

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Soa forte e impactante ouvir tal declaração de uma menina, em uma faixa etária entre 11 á

12 anos, apenas, afirmando com tamanha autonomia que alisa seus cabelos para agradar aos

demais, e que, consequentemente, torna-se dependente deste método agressor, singularmente para

uma criança/adolescente, em uma tentativa de adequar-se a uma sociedade que na verdade deveria

adequar-se a ela. De acordo com os estudos de Nilma Gomes:

Nesse processo de enraizamento, os ciclos da infância e a da adolescência são momentos

significativos. E é durante esse período que a relação negro/cabelo se intensifica. O desejo

manifesto pela criança negra de alterar o “estilo” do seu cabelo

é algo complexo. Ele diz respeito á construção dessa criança conquanto

sujeito em relação à própria imagem e também é resultado de relações

sociais assimétricas, baseadas na imposição de modelos de homem, de

mulher, de adulto, de raça e de etnia (GOMES, 2008, p.176).

O documentário ajuda a destrinchar a formação da identidade das mulheres negras,

principalmente a partir da discussão de sua estética capilar, ou seja, do processo de construção de

uma consciência pautada nos estereótipos negativos, levando a mulher negra abrir mão de forma

compulsiva e paranoica de sua estética natural em detrimento da estética branca, como melhor

forma para ser aceita, de se sentir valorizada e de se sentir bonita ante a sociedade.

Apresenta-se também, esta mesma problematização da mulher negra que vive em

conflito com sua identidade a partir da dramaturgia que encena a vida real, através do

filme/seriado: “Cara Gente Branca” (2014), que retrata a história de cinco jovens negros que

tem suas vidas correlacionadas em uma conceituada Universidade norte-americana para

elites, sentindo na pele como é ser universitário em um ambiente predominado pelo padrão

estético da branquitude. Como, em destaque, a vida da personagem Coco Conners e sua

relação consigo mesma. Uma aspirante a socialite negra, que esconde sua identidade e cabelo

ao usar uma peruca com fios alisados e diz que: “ Ser negra é uma coisa irritante”.

A discussão a partir dessa ilustração da vida real (documentário) como da dramaturgia

que encena a vida real (filme) nos ajuda a materializar o problema da imposição de um padrão

estético branco e de suas consequências para a mulher negra, quando a mesma não consegue

enxergar em si, sua identidade e beleza como mulher, ocasionado pela opressão de um padrão que

sempre afirmou sua inferioridade através do racismo (explícito ou velado).

F10: Porque, assim, o branco tem o liso né. Então o negro tem o cabelo já crespo, ás

vezes chega a ser carapinho mesmo. Mas vem daí a influência do branco sobre o crespo,

eu acho que, quando você não tem noção do que é ser negro, você se cobra muito

aquele cabelo maravilhoso, aquela coisa bonita de passar a mão, de cair, de: “Ai, o meu

cabelo é lindo, maravilhoso.” Quando a gente tem uma noção do que é ser realmente

negro, a gente se aceita com o cabelo que a gente tem. Eu, por

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10 F,36 anos, professora, em entrevista para pesquisa de campo sobre a estética negra no livro “SEM PERDER A RAIZ: CORPOR E CABELO COMO SÍMBOLO DA IDENTIDADE NEGRA”, autêntica,2008.

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exemplo, eu daria tudo para ter o meu cabelo anelado, sabe, eu daria tudo para

ter o meu cabelo anelado. Mas não consigo tê-lo crespo. Não sei te explicar

porque mas não consigo ...Talvez seja, nem seja por mim mesma, seja pela

cobrança ...cê chega num lugar para trabalhar se você ... eles olham. Você

chega num pra se divertir...ás vezes cê tá passando na rua, aí um grita de lá:”

Vamos pentear o cabelo?” Ou então cantam aquela musiquinha, assim, “ Nega

do cabelo duro, qual é o pente que te penteia...” (GOMES, 2004, p.190).

Dessa forma, no que diz respeito á questão racial no Brasil, do direito

e da valorização da identidade da negra, especificamente da mulher negra,

passa necessariamente, de maneira geral, pela discussão da estética da

população negra e de maneira especifica, pela discursão da estética capilar da

mulher negra, atualmente muito expressa e sobretudo, questionada.

3.1 MULHER NEGRA E A DOR DO RACISMO SOB SEUS CABELOS

Nilma Gomes, que em seu papel como autora, tornou-se minha inspiração, afirma em

relação a sua pesquisa de campo que: “Não parto do pressuposto de que esse campo

conflitivo se restringe á construção da identidade negra. Qualquer processo identitário é

conflitivo na medida em que ele serve para me afirmar como um “eu” diante de um “outro”. A

forma como esse “eu” se constrói está intimamente relacionada com a maneira como é visto e

nomeado pelo “outro” (Gomes, 2008). Propondo-me a partir desta afirmativa, um ponto de

partida para exemplificar essa espécie de processo conflitivo, que neste artigo, assim como no

livro da referida autora, também envolve a mulher negra. Com o objetivo de mostrar de uma

forma real, através de minha pesquisa, que o racismo contra o cabelo crespo e outras

características do fenótipo afro, de fato, existe. A pesquisa atingiu, em curto prazo de apenas

duas semanas, um grande índice de depoentes, que me levaram a complexidade de escolher,

entre tantas declarações, apenas algumas para apresentar neste presente trabalho, sob o

critério de escolha os relatos mais impactantes, bem como, declarações que envolvem o ramo

jurídico nas situações de racismo vividas por elas (GAMA, 2017).

A análise desse racismo e suas consequências perante a mulher negra, a partir do

preconceito em torno de sua estética capilar se baseia no estudo que pesquisou11 o ponto de

11A pesquisa encontra-se disponível na íntegra no endereço eletrônico

(https://docs.google.com/forms/d/1W8QfVQ3OtWHkJWoR7EvI6TD8SrRcVY_Y8hAS8kQo/edit?userstoinvite

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[email protected]&ts=59f9a4e7#responses). Realizada no período de 04 á 15 de setembro de 2017, pelo

coletivo Afrobelas, criado no presente ano para desenvolver estudos sobre a estética e identidade da mulher

negra.

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vista das mulheres negras a respeito do cabelo crespo e dos acessórios de

identificação comuns da cultura negra.

As mulheres que participaram do estudo foram questionadas se já haviam

sofrido preconceito por causa do cabelo ou por conta de outra forma de identificação

comum á cultura negra? Através dos depoimentos, tornou-se evidente as práticas

contínuas de racismo sofridas pelas mulheres negras em consequência da sua

estética/identidade negra. Por identidade, considerem-se os seguintes dizeres:

Por IDENTIDADE podemos entender que seja o aspecto coletivo de um conjunto de

características pelas quais algo ou alguém é definitivamente reconhecível,

conhecido; é um conjunto de elementos que permitem saber quem uma pessoa é.

Pelo próprio processo histórico de colonização e escravização, há uma dificuldade

na definição e no desenho da identidade negra ainda nos dias atuais. Ao tempo da

escravidão, a produção da identidade negra nas Américas deu-se por meio de

processos paralelos; pela via de Desafricanização e pela Racialização. Os africanos

aqui escravizados foram forçados a esquecer suas origens, para assumirem a sua

condição subalterna de “negros” (RAMOS, 2014, p.3)

Podemos perceber um processo de rejeição as características estéticas

relacionadas á população negra: o uso de roupas com estampas africanas,

turbantes, colares e, principalmente, a rejeição ao uso do cabelo estilo black

power, dreadlocks, trançado, entre outros modelos.

O cabelo não faz parte de um componente apenas estético, mas

também cultural, podendo atingir os campos: religioso, étnico, social, político

e das preferências estéticas pessoais.

O tratamento dado ao cabelo pode ser considerado uma das maneiras de

expressar uma tensão. A consciência ou o encobrimento desse conflito, vivido

na estética do corpo negro, marca a vida e trajetória dos sujeitos. Por isso,

para o negro, a intervenção no cabelo e no corpo é mais do que uma questão

de vaidade ou de tratamento estético. É identitária. (GOMES, 2008, p.33).

A construção da identidade capilar para mulheres negras ultrapassa o campo

do ser individual para atingir o coletivo. O cabelo torna-se um símbolo de

representação cultural consciente e inconsciente em diversas sociedades,

consolidando o significado do seu poder, onde embora seja uma característica física

e pessoal, por se tratar de estética, torna-se um símbolo mais público do que privado.

De 176 respostas recebidas no questionário realizado, que por ser virtual, possibilitou

a participação de mulheres negras12 residente de outros Estados, além da Paraíba, como São

Paulo e Rio Grande do Sul. Os dados mostram que deste número de declarantes, 94,3%

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12 Por ser tratar de delicadas situações provenientes do racismo, preservaremos o anonimato das mulheres negras que foram declarantes nesta pesquisa.

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sofrem racismo, sendo 75,4% de forma velada e 24,6 de forma explícita.

Segundo as entrevistadas “A” e “B”:

Foram muitas as situações nesses 11 anos que assumi meus cabelos, citarei

uma só para atestar que mesmo estando em destaque na mídia não estamos

livres do preconceito. Ao apresentar um programa de tv, um telespectador

comentou que "queria tacar fogo nos meus cabelos de bombril". Fui ridicularizada na frente dos meus familiares por assumir meu cabelo afro.

Quanto mais me defendia, mais piadas vinham e mais eles riam. Sai correndo

chorando de tanto constrangimento. Fui á delegacia para fazer um B.O. mas, o

delegado foi contra mim e disse que pra ele não tinha acontecido uma injúria

racial. Discuti com ele e expus em detalhes tudo que passei e mesmo assim

tive dificuldades em registrar a queixa. O delegado era branco e acredito que

também era racista, pois todo racista não reconhece situações de racismo.

Estes depoimentos ajudam a perceber como o racismo ainda é muito forte na nossa

sociedade, como uma mulher negra fora do seu “lugar” comum de subalternidade encomenda

no Brasil; também nos mostra que o primeiro alvo dos ataques racistas é a estética da mulher

negra tanto de forma agressiva, como em forma de brincadeiras de mau gosto.

Segundo a entrevistada “C”: “Já disseram que era pra eu alisar o cabelo porque só eu

precisava saber que ele era duro, as outras pessoas não”, como se o cabelo crespo fosse

coisa feia, mal, imoral, uma afronta ao ideal de beleza branca, que deve ser escondido da

sociedade brasileira. A estética negra incomoda de uma forma, ao ponto das pessoas saírem

do seu lugar de privacidade para violar o espaço de privacidade do outro.

Esse incômodo não é só causado pelo cabelo crespo e sim pelo conjunto de

elementos que forma estética negra. Segundo a entrevistada “D”: “[...] Falar que não

tenho cara de engenheira, quando uso turbante [...], ou quando, a entrevistada “E” relata

que: “Sou docente do ensino superior na rede privada de ensino no RS. E ouço com

frequência que as roupas que visto são "casuais e que não pareço docente por isso!”.

A estética negra também é geralmente o primeiro caminho para se manifestar o

racismo institucional, é utilizada como subterfugio para impedir o acesso em determinado

espaço público; para negar determinados direitos; para ser reprovada em uma entrevista

de emprego, ou seja, nas varias instâncias da sociedade brasileira. Como nos relata a

entrevistada “F”: “Tive várias experiências, a mais marcante foi uma gerente de uma loja

afirmar que eu tinha que alisar meu cabelo para conseguir o emprego de vendedora”.

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Nos dias atuais existe uma norma ética que leva as pessoas serem politicamente

corretas, mas mesmo assim, nos momentos de muita tensão ou de muita alegria essas

pessoas são levadas a expressar o seu incômodo em relação á estética negra, suas visões

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preconceituosas que atacam de forma direta ou indireta a população negra,

como nos relata a entrevistada “G”:

Na faculdade uma colega de classe interrompeu minha fala onde eu falava da

importância de se desconstruir e o quão foi e é demorado o processo, ela

interrompeu para dizer que minha mãe certamente sempre alisou meus cabelos,

pois, alisados proliferaria menos piolhos, ou seja, ela disse que uma criança com

cabelo afro tem mais propensão a ter piolhos, isso em uma faculdade onde o tema

da aula era o racismo, o vídeo que estávamos discutindo falava de desconstrução.

Foi muito ruim, pois ela trabalha em escola com crianças e ela afirmou na tentativa

de se justificar que um cabelo afro natural tem mais piolhos que de uma criança

com cabelo liso. Segundo ela, tem duas filhas uma do cabelo cacheado e outra liso

por isso ela poderia falar e afirmou, riu e debochou.

Ao analisar os questionários fica evidente que as mulheres negras convivem

com um olhar social construído historicamente que eleva o padrão estético branco como

expectativa, como padrão ideal a ser perseguido. Ao desenvolver essa pressão social, a

sociedade brasileira constrói uma hierarquia em termos sociais, culturais e econômicos,

reforçada a partir da estatização da estética negra, minimizando e desprezando a

identidade da mulher negra por considera-las distantes do padrão do ideal.

Os relatos expõem a problemática da pressão social em torno da estética

negra, em especial da relação entre o cabelo crespo e mulher negra, como fator

que vem causando discussão e conflito na vida da população negra, uma vez que

acontece uma desvalorização da beleza negra, em detrimento da supervalorização

da beleza branca, afirmando e reforçando os estigmas de inferioridade da

população negra, em especial os que cercam a identidade da mulher negra.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A problematização dos estereótipos acerca da estética da população negra nos

possibilitou refletir e questionar a ideia de isonomia social presente na Constituição Brasileira,

a partir da experiência da mulher negra, ou seja, do pressuposto do direito a identidade e

consequente, do pressuposto da violação dos seus direitos, que lhes colocam em condições

desfavoráveis na pirâmide social nos dias atuais na sociedade brasileira.

Analisar a ideia de isonomia social a partir da experiência da mulher negra

possibilitou refletir o processo de estigmatização da estética negra, que ocasiona uma

pressão social que contribui para negação da identidade negra, fazendo com que, a

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mulher negra negue os seus traços estéticos naturais e culturais em detrimento de

um padrão estético artificial apresentado como um padrão de beleza ideal.

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No que diz respeito ao direito a identidade, passa necessariamente, de

maneira geral pela discussão da estética da população negra e de maneira especifica,

pela discursão da estética capilar da mulher negra nos dias atuais. De maneira geral, a

discussão da estética foi usada politicamente de duas maneiras: para negar o direito à

identidade da população negra, principalmente através da negativação dos elementos

físicos e culturais que caracterizam o fenótipo da população negra e para reivindicar

uma identidade especifica, de origem africana, através do processo de positivação da

estética negra desenvolvido pela própria população negra.

De maneira específica, tem sido utilizada como instrumento politico

principalmente pelas as mulheres negras, no processo de reivindicação do

direito e valorização de sua identidade e contra os estigmas racistas,

construídos ao seu respeito no decorrer do processo histórico do Brasil.

É a partir desse pressuposto que acontece o que poderíamos denominar do

nascimento de uma nova perspectiva da negritude na contemporaneidade, que

confronta o sistema de beleza opressor, obsessivo pelos padrões de beleza europeus,

e ao tempo, proporciona a vivenciar da autoafirmação em um processo de

reivindicação do direito de sua identidade através da valorização da estética negra.

É o advento da formulação de uma proposta de intervenção estética que

postula o direito à beleza para e da população negra; o desenvolvimento de ações que

constroem um discurso afirmativo usando a internet, em destaque, como espaço de

organização e articulação das mulheres negras, que estimula a valorização dos fios

crespos naturais, mostrando diferentes formas de usar o cabelo e como cuidar dele.

Os coletivos dessas mulheres surgem por todo país em escolas,

universidades, nas regiões periféricas e não periféricas, exigindo o respeito às

diferenças e estimulando o uso da estética capilar negra, apresentando o

cabelo crespo como sinônimo da história de resistência da população negra.

Podemos afirmar que temos duas culturas de tratamento distintas, no que diz respeito

à estética negra: uma de negação e outa de afirmação, que historicamente tem influenciado

diretamente na constituição da personalidade da mulher negra, diante da complexidade da sua

situação na sociedade brasileira, possibilitando subsídios para questionar o princípio da

isonomia social no Brasil como um dos pilares da ideologia da democracia racial.

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Dessa forma, a relação entre estética negra e o princípio da isonomia social à partir

da mulher negra, apresentou e denunciou a lógica da afro-conveniência. Assim, essa lógica

nega a identidade negra como princípio de organização politica em prol dos direitos da

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população negra, sobre o argumento de que vivemos em uma sociedade miscigenada,

por isto, fica impossível identificar o que é ser negro na sociedade brasileira.

E ao mesmo tempo, é reservado um espaço precarizado para população negra na

sociedade brasileira, no que diz respeito às condições básicas de cidadania, sobre alegação

de que essa realidade só acontece porque ela é a maioria nessa sociedade; justificado o seu

lugar da não educação, do (sub)desemprego, da marginalidade e da violência; mostrando que

por questões de gênero e raça, existem alguns poucos, mais iguais do que a imensa maioria.

Essa realidade tem sido historicamente encoberta e ignorada para justificar a ideologia da

democracia racial, fundamentada no principio da isonomia social brasileira.

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