Programa Antonio Sergio

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Camões, Poesia e Música Escola Secundária António Sérgio Sexta-feira | 25 Março 2011 | 21:30h Concerto Musical Coro AnimaMea AnimaMea | 2011

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Camões, Poesia e Música

Escola Secundária

António Sérgio

Sexta-feira | 25 Março 2011 | 21:30h

Concerto MusicalCoro AnimaMea

AnimaMea | 2011

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1. Programa

PAIXÃOAquela cativa que me tem cativo (v.o.) José Afonso (1929-1987)/ Luís de CamõesNa fonte está Lianor Anónimo, Cancioneiro Musical da Biblioteca de Paris / Luís de CamõesMinina dos olhos verdes Anónimo, Cancioneiro Musical da Biblioteca de Paris/ Luís de CamõesBusque amor novas artes, novo engenho poesia lida de Luís de CamõesPois meus olhos Luís de Freitas Branco (1890-1955)/ Luís de CamõesVerdes são os campos José Afonso (v.o.)/ Luís de Camões

ESPIRITUALIDADESôbolos rios que vão por Babilónia Poesia lida de Luís de CamõesSuper flumina Babylonis Orlando di Lasso (c.1532-1594)Regina coeli D. Pedro de Cristo (c.1550-1618)

ACULTURAÇÃOXicochi, xicochi Gaspar Fernandes (1585-1627)Carta a El Rei D. Manuel sobre o Achamento do Brasil Texto lido de Pero Vaz de CaminhaEl Arriero Mauro Nuñez (1902-1975)San Sabeya Gugurumbé Mateo Flecha el Viejo (1481-1553)

JOVIALIDADENão tragais borzeguis pretos Anónimo, Cancioneiro Musical da Biblioteca de ParisLa tricotea Anónimo, Cancioneiro Musical do PalácioA la vida bona (Chacona) Juan Arañes (+ c.1650)

INFORTÚNIOA Castro – Acto 4 Poesia lida de António FerreiraAlma minha da minh’alma Fernando Lapa (n.1950)A Última Nau – Mensagem Poesía lida de Fernando PessoaPuestos estan frente a frente Anónimo, publicada em 1629Aquela cativa que me tem cativo I José Afonso (harm. F. Lapa/ Luís de Camões)

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2. Notas ao Programa

O tema deste concerto é Camões, a Poesia e a Música.O mote é “Aquela cativa que me tem cativo”, uma das mais belas composições poéticas de Luís de Camões dedicada a uma escrava por quem andava de amores na Índia, Bárbara, de seu nome.A musicalidade da poesia de Camões está expressa na variedade de composições musicais feitas sobre os motes e as glosas camonianas ao longo destes quatrocentos anos. É por isso que o programa inclui peças musicais que se compunham e tocavam no tempo de Camões, que reflectem os contextos reli-giosos e sociais que influenciaram o nosso Poeta Maior, assim como músicas nossas contemporâneas sobre poemas camonianos.Destacamos a composição de Fernando C. Lapa, mui gentilmente dedicada ao Coro Anima Mea em Junho de 2009, sobre “cantiga de Camões a este moto: Ferro, fogo, frio e calma”.A execução musical será acompanhada pela leitura de alguns textos literários que sublinham, comen-tam e dialogam com a poesia musicada.O concerto está estruturado em cinco andamentos, reflectindo temas glosados pelo poeta: o primeiro (Paixão) e o último (Infortúnio); ou o contexto sociopolítico e religioso da época: os três temas do meio (espiritualidade, aculturação, jovialidade).

PAIXÃOOs olhos do poeta.Os olhos, instrumentos felizes da realidade mais real. Porque ver sempre foi tocar. Tocar uma a uma cada coisa com os olhos, antes da mão se aproximar para recolher os últimos brilhos de Setembro (em Eugénio de Andrade).Os olhos da alma porque o amor é cego. Só eles podem enxergar esse amor idealizado, personificado num ideal de mulher (em Luís de Camões). Esta era uma figura de retórica muito comum nas cantigas de amor galego-portuguesas que têm uma evidente influência provençal. O sentimento de contrastes (tão característicos do amor) do querer e não querer, da timidez e da violência impulsiva, do dese-jo e do doce-amargo da saudade. Camões herdou esta concepção platónica da Mulher e do Amor. Imaginara Platão que as manifestações da beleza que nós experimentamos são pálidas imitações do Belo Absoluto, só acessível aos deuses. Na lírica camoniana, nos sonetos, odes, canções e redondilhas, a mulher amada aparece iluminada por uma luz sobrenatural que lhe transfigura as feições carnais: luminosos são os cabelos de oiro, e o olhar resplandecente tem o condão de serenar o vento; a sua presença faz nascer as flores.

ESPIRITUALIDADEPara a história das religiões, o séc. XVI foi marcado por importantes movimentos de reformas, sepa-rações, perseguições: Lutero e Calvino lideram as mais importantes rupturas com a Igreja Católica. Em Inglaterra, Henrique VIII (de quem cantamos uma peça musical neste concerto) proclama-se protector da Igreja Inglesa e transmite essa prerrogativa aos seus sucessores fazendo assim nascer o anglicanismo.A Igreja Católica convoca o Concílio de Trento para reagir a esse movimento reformador. Foi o mais longo concílio da história da Igreja. Emitiu numerosos decretos disciplinares e especificou claramente a doutrina católica quanto à salvação, aos sacramentos e aos textos bíblicos, em oposição ao protes-

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tantismo. Unificou o ritual da missa de rito romano, abolindo as variações locais, instituindo a cha-mada “missa tridentina”. Foi criado o índice de livros proibidos (o “Índex Livrorum Prohibitorum”) e reorganizada a Inquisição. As edições impressas da poesia de Camões surgem sempre com a indicação da ‘licença do Supremo Conselho Geral da Santa Inquisição’ no frontispício.No Sul da Europa e na Península Ibérica em particular, a Reforma não penetrou e a Inquisição e a censura exercida pela Igreja Católica foram igualmente determinantes para evitar que as ideias refor-madoras fossem divulgadas em Portugal, Espanha e Itália, países católicos.Vamos ouvir peças de três compositores que tiveram uma grande influência no desenvolvimento da música sacra na Igreja Católica e na consolidação da Contra-Reforma.

ACULTURAÇÃOEste andamento do concerto dá conta de como a música foi, nesta época, instrumento de Evangelização dos Novos Mundos, que muitos entenderam como instrumento disciplinador e normalizador das ma-nifestações da Fé, e como acabou contaminada pela riqueza das diferenças de culturas e de modos diferentes de louvar a Deus. As sonoridades das vozes e dos instrumentos, da música dos sons e das palavras falam-nos de tro-cas culturais. Era o tempo das caravelas, esses barquinhos frágeis que se deitavam ao mar e leva-vam marinheiros, soldados, artífices, cronistas, missionários…e poetas. Os países ibéricos, Portugal e Espanha, tinham então pretensões ao domínio do mundo que trataram de dividir ao meio no Tratado de Tordesilhas. De Ceuta a Moçambique, à Índia e à China, Camões conviveu com esta afirmação geoestratégica, que determinou guerras santas e práticas desumanas e esclavagistas, mas também comunicação, partilha e defesa dos direitos humanos.

JOVIALIDADE“Joie de vivre”, a alegria de viver, na corte dos reis ou nas festas do povo, animadas por bobos ou por saltimbancos. Estes eram mundos em que Camões se sentia à vontade e onde a sua verve seria apreciada. Quanto ao “amor ardente”, não foi o próprio poeta que se mostrou dividido entre o límpido apelo dos sentidos e o amor platónico bebido em Petrarca e Santo Agostinho? É verdade que nenhuma poesia portuguesa partiu tanto dos sentidos para tanto se desprender deles. Além da Bárbara escrava, ‘aquela cativa que me tem cativo’, não sabemos quem o poeta tenha amado para lá das nunca nomea-das impolutas damas de corte ou das anónimas “ninfas de água doce” dos bordéis de Lisboa.

INFORTÚNIOCamões encarnou até à medula toda a nossa condição de portugueses errantes: pobreza, vagabunda-gem, cadeia, desterro. “Erros”, “má fortuna” e “amor ardente” se conjuraram para fazer daquele alto espírito do Maneirismo europeu uma das figuras mais desgraçadas da via-sacra nacional. Afinal, este homem que deixou fama de desabusado, este pobre soldado raso que regressa de Ceuta a “manquejar de um olho” (para o dizermos com terríveis palavras suas), que serviu na Índia durante cerca de três lustros sem sequer ter ganho para as passagens de regresso à pátria, este homem que, segundo um dos seus primeiros biógrafos, ao morrer não tinha um lençol para lhe servir de mortalha, estava destinado a consolidar a Hierarquia com o seu Canto – o supremo ressoar das águas de todos os nossos mares e de todos os nossos olhos (adaptado do prefácio de Eugénio de Andrade ao livro Versos e alguma prosa de Luís de Camões).

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3. Coro ANIMA MEA

O Coro Anima Mea, criado em 2004, corporiza um projecto musical que pretende divulgar o patrimó-nio da música vocal polifónica, em particular da música portuguesa e ibérica dos sécs. XVI - XVIII.Na sua intervenção cultural procura privilegiar públicos com menos oportunidades de contacto com a música coral desta época, promovendo concertos comentados com uma intenção pedagógica que visa despertar o gosto pela música e contribuir para o enriquecimento cultural dos cidadãos.O Coro Anima Mea é constituído por 18 elementos residentes na área do Grande Porto, e integra igual-mente intérpretes de órgão e flauta. Para os seus projectos, convida igualmente instrumentistas e cantores solistas.

Projectos já realizados (ano e local do concerto principal)- “Magnificat anima mea” – música centrada na figura de Maria” (2005, Igreja N. S. de Fátima, Porto);- “Música no Metro” (2005, 2006, 2007, Estações do Metro do Porto);- “Música e Evangelização - Intercâmbio musical entre Europa, África e América” (2006, Capela das Pereiras, Ponte de Lima);- “Ó Culpa Ditosa - Música da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus Cristo” (2007, Igreja de Valpradinhos, Macedo de Cavaleiros);- “Música no Parque” (2005, 2007, Parque Biológico de Gaia);- “À Escuta do Lugar - Música polifónica dos sécs. XVI/XVII” (2007, Mosteiro de Pitões das Júnias, Montalegre; 2009, Igreja do Mosteiro de Cête, Dia Internacional dos Monumentos e Sítios);- “Stabat Mater: música sacra na Paixão de Cristo” (2008, Convento de Arouca);- “João Rodrigues Esteves, compositor português do tempo de D. João V” (2008, Igreja românica de S. Pedro de Rates).

Elementos do coro Sopranos Argentina Nunes, Elisa Soares, Fátima Alves, Helena David, Inês Marques, Maria Eugénia Moreira Contraltos Graça Silva, Isabel Costa, Rosário David Tenores José Graça Rocha, Manuel Gomes, Vítor Passos Baixos António Santos, José António Coutinho, José Manuel Lima, José Portugal

Músicos convidadosPercussão Geoclândio Monteiro e Francisco PortugalCharango Gustavo NascimentoGuitarra Tiago GomesBarítono Solista Tiago Santos

Direcção MusicalFrancisco MeloNatural de Ponte de Lima, fez estudos de Guitarra Clássica, Piano, Canto, Direcção Coral e Ciências Musicais. Terminou o Curso Superior de Canto na classe de Fernanda Correia (CMP) e completou paralelamente a licenciatura em Engenharia Civil (FEUP). Prosseguiu estudos de licenciatura e pós-graduação em Ciências Musicais. Frequentou seminários de Direcção com Mário Mateus, Fernando Lopes-Graça, Erwin Liszt e Ward Swingle.Cantou como tenor no Grupo de Música Vocal Contemporânea, dirigido por Mário Mateus. Dirigiu, entre outros, a Orquestra da Tuna Académica da Universidade de Coimbra, o Orfeão Académico de Coimbra e o Círculo Portuense de Ópera (ma-estro-assistente).Tem realizado seminários, conferências, artigos e notas de programa para concertos.Leccionou nos Conservatórios de Música do Porto e de Braga, Escola Superior de Música de Lisboa e Universidade Nova de Lisboa. É desde 1998 Professor Adjunto da ESMAE (Escola Superior de Música, Artes e Espectáculo do Porto), tendo pre-sidido ao Conselho Científico (2002-2005).Design Gráfico Bernardo Portugal

Erros meus, má fortuna, amor ardenteEm minha perdição se conjuraram;Os erros e a fortuna sobejaram,Que pera mim bastava amor somente.

Tudo passei; mas tenho tão presenteA grande dor das cousas que passaram,Que as magoadas iras me ensinaramA não querer já nunca ser contente.

Errei todo o discurso de meus anos;Dei causa [a] que a Fortuna castigasseAs minhas mal fundadas esperanças.

De amor não vi senão breves enganos.Oh! quem tanto pudesse, que fartasseEste meu duro Génio de vinganças!

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