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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE EDUCAÇÃO PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO JOIRA APARECIDA LEITE DE OLIVEIRA AMORIM MARTINS PROGRAMA CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS NO CONTEXTO DA POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA Cuiabá MT 2015

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS – GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

JOIRA APARECIDA LEITE DE OLIVEIRA AMORIM MARTINS

PROGRAMA CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS NO CONTEXTO

DA POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA

EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA

Cuiabá – MT

2015

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS – GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

JOIRA APARECIDA LEITE DE OLIVEIRA AMORIM MARTINS

PROGRAMA CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS NO CONTEXTO

DA POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA

EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA

Cuiabá – MT

2015

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JOIRA APARECIDA LEITE DE OLIVEIRA AMORIM MARTINS

PROGRAMA CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS NO CONTEXTO DA

POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO

SUPERIOR BRASILEIRA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Educação no Instituto de Pós

Graduação em Educação da Universidade Federal de

Mato Grosso, como requisito para obtenção de título

de Mestre em Educação. Área de concentração:

Educação. Linha de Pesquisa: Movimentos Sociais,

Política e Educação Popular.

Orientadora: Profª. Drª. Maria das Graças Martins

da Silva

Cuiabá – MT

2015

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Dados Internacionais de Catalogação na Fonte.

Ficha catalográfica elaborada automaticamente de acordo com os dados fornecidos pelo(a) autor(a).

Permitida a reprodução parcial ou total, desde que citada a fonte.

L533p Leite de Oliveira Amorim Martins, Joira Aparecida.Programa Ciência sem Fronteiras no contexto da política de

internacionalização da educação superior brasileira / JoiraAparecida Leite de Oliveira Amorim Martins. -- 2015

174 f. : il. color. ; 30 cm.

Orientador: Maria das Graças Martins da Silva.Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Mato Grosso,

Instituto de Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação,Cuiabá, 2015.

Inclui bibliografia.

1. Internacionalização. 2. Ciência sem Fronteiras. 3. Políticaseducacionais. I. Título.

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

PRÓ-REITORIA DE ENSINO DE PÓ-GRADUAÇÃO

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

Avenida Fernando Corrêa da Costa, 2367 - Boa Esperança - Cep: 78060900 - CUIABÁ/MT

Tel: 3615-8431/3615-8429 – Email: [email protected]

FOLHA DE APROVAÇÃO

TÍTULO: “Programa Ciência Sem Fronteiras no contexto da política de

internacionalização da educação superior brasileira”

AUTORA: Mestranda Joira Aparecida Leite de Oliveira Amorim Martins

Dissertação defendida e aprovada em 27 de março de 2015.

Composição da Banca Examinadora:

Presidente Banca/Orientadora Doutora Maria das Graças Martins da Silva

Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

Examinadora Interna Doutora Tereza Christina Mertens Aguiar Veloso

Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

Examinador Externo Doutor Marío Luiz Neves de Azevedo

Instituição: UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ/UEM

Examinadora Suplente Doutora Rose Cléia Ramos da Silva

Instituição: UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

CUIABÁ, 27/03/2015.

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AGRADECIMENTOS

Você não sabe o quanto eu caminhei

Pra chegar até aqui

Percorri milhas e milhas antes de dormir

Eu nem cochilei

Os mais belos montes escalei

Nas noites escuras de frio chorei, ei, ei, ei

Together, Together[...]

(A Estrada – Cidade Negra)

“Caminhei milhões de milhas”, mas nunca sozinha. Eis-me aqui, para agradecer a

todos que caminharam comigo em mais essa jornada em minha vida.

Em primeiro lugar, agradeço a Deus, pela capacidade física e mental e resiliência nos

momentos extremos.

Agradeço pelo amor, incentivo e compreensão de minha família, em especial a

minha mãe Inês, meu esposo Cristiano e minha filha Aline, pois eles “sonharam o meu

sonho” e por isso virou realidade.

Sou imensamente grata a minha orientadora, Profa. Dra. Maria das Graças, que

vivenciou cada segundo comigo a experiência de desvendar um tema contemporâneo, e por

ter sido incansável em suas correções detalhadas objetivando a lapidação do saber.

Igualmente agradeço a Profa. Tereza, o Prof. Mário e a Profa. Rose Cléia por

terem aceitado participar da minha banca, contribuindo com avaliações generosas e objetivas

para o aperfeiçoamento deste trabalho.

Também demonstro minha gratidão á todos docentes e os colegas discentes do

Programa de Pós-Graduação em Educação/UFMT e todos os membros do Grupo de

Estudos e Pesquisa em Políticas Educacionais (GEPDES) pelos vários momentos de

compartilhamento de conhecimento, alegrias e angústias vivenciados através do estudo.

Agradeço à UFMT, especialmente as pessoas vinculadas a Secretaria de Relações

Internacionais e a Reitoria, pela permissão para meu afastamento, pelo esforço dobrado dos

meus colegas às atividades profissionais durante minha ausência e pela a disponibilização de

informações sempre de forma solícitas.

Registro também a honra de partilhar esta experiência com pessoas que se tornaram

cada vez mais próxima, e me auxiliaram com suas sugestões, orientações, revisões e

conversas de “pé de orelha”: Prof. Paulo Teixeira, Prof. Vinícius Pereira, Profa. Irene

Cajal, e Brunna Carvalho (representando também todos estagiários da SECRI). Deixo aqui

meus sinceros agradecimentos a todos, que direta ou indiretamente, percorreram comigo essa

estrada.

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[...] quem define a coerência

macroeconômica de uma época é a

correlação de forças do período – e

hoje essa matemática foi

globalizada pela livre mobilidade

dos capitais, que potencializou seu

desafio.

Saul Leblon

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RESUMO

MARTINS, Joira Aparecida Leite de Oliveira Amorim. Programa Ciência sem Fronteiras no

contexto da politica de internacionalização da educação superior brasileira. 174 f. Dissertação

(Mestrado em Educação). Universidade Federal de Mato Grosso, 2015.

A dissertação discorre sobre o Programa Ciência sem Fronteiras (CsF), um programa do

Governo Federal Brasileiro que busca “[...] promover a consolidação, expansão e

internacionalização da ciência e tecnologia, da inovação e da competitividade brasileira por

meio do intercâmbio e da mobilidade internacional.” (BRASIL, 2014). O objetivo da pesquisa

é analisar a concepção e a implementação do Programa CsF, no contexto da política de

internacionalização da educação superior no Brasil. Trata-se de um estudo exploratório e de

caráter qualitativo, que utiliza entrevista semiestruturada com três representantes das

instituições idealizadoras e gestoras do CsF. A análise de dados, focalizando a idealização,

criação, objetivos, fomentos e adaptações do CsF, tendo em perspectiva a política de

internacionalização da educação superior, teve por base as seguintes categorias, a luz do

método dialético: concepção, contemplando formulação e criação, e a implementação,

abrangendo características e perspectivas. A pesquisa mostra que a política de

internacionalização da educação superior no Brasil, conforme o que se apresenta no Programa

CsF, tende a negligenciar a solidariedade mútua para se constituir em estratégia para o

fortalecimento do modelo político-econômico vigente.

Palavras-chave: Internacionalização; Ciência sem Fronteira; Políticas educacionais.

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ABSTRACT

MARTINS, Joira Aparecida Leite de Oliveira Amorim. The Science without Borders Program

within the internationalization of Brazilian higher education. 174 p. Thesis (Master´s

Education).Federal University of Mato Grosso, 2015.

This Master’s thesis is about the Science without Borders Program (CsF), a program created

by the Brazilian Federal Government to “consolidate, expand and internationalize Brazilian

science, technology, innovation and competitiveness by means of interchange and

international mobility” (BRAZIL, 2014). The objective of this research is to analyze the

conception and implementation of CsF within the internationalizing policies of Brazilian

higher education. This is an exploratory qualitative study, using semi-structured interviews of

3 representatives of the institutions that created and now manage CsF. Data analysis focuses

on CsF idealization, creation, objectives, foments and adaptations, according to the

perspective of internationalizing policies of higher education. The following categories were

analyzed, through the lens of the dialectical method: conception, encompassing idealization

and creation; and implementation, encompassing characteristics and perspectives. The

research shows that the internationalizing policies of higher education in Brazil, according to

data from CsF, tend to neglect mutual solidarity so as to reinforce the current political and

economical model.

Keywords: Internationalization; Science without Borders; Educational Policies.

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LISTA DE SIGLAS

ACCC Associação das Faculdades Comunitárias Canadenses.

ACE American CouncilEducation

AEU Associação Europeia de Universidades

AGCS Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços

ANDIFES

Associação Nacional Dirigentes de Instituições Federais de Ensino

Superior

ARI Assessoria de Relações Internacionais

AUCC Associação das Universidades e Colégios do Canadá

BIRD Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento

BM Banco Mundial

CALDO Consórcio das Universidades de Alberta, Laval, Dalhousie e Ottawa

CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior

CBIE Canadian Bureau for International Education

CDES Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social

CF Constituição Federal

CGRIFES

Conselho de Gestores de Relações Internacionais das Instituições

Federais de Ensino Superior

CHEA Council for Higher Education Accreditation

CIC CollegesAndInstitutes Canada

CMES Conferência Mundial sobre Ensino Superior

CNE Conselho Nacional de Educação

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

CONSEPE Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão

CP Chamadas públicas/editais

CRASP Conferência de Reitores de Escolas Acadêmicas da Polônia.

CsF Ciência sem Fronteiras

ENEM Exame Nacional do Ensino Médio

ENLACES

Espaço de Encontro Latino-Americano e Caribenho de Educação

Superior

EUA Estados Unidos da América

FATEC Faculdades de Tecnologia

FAUBAI Associação Brasileira de Educação Internacional,

FMI Fundo Monetário Internacional

GEPDES Grupo de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais

ICSID Centro Internacional para Resolução de Disputas sobre Investimentos

IDA Associação Internacional de Desenvolvimento

IES Instituição de Educação Superior

IF Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica

IFC Corporação Financeira Internacional

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IFES Instituição Federal de Educação Superior

IIE InstituteofInternationalEducation

IPI Imposto sobre produtos industrializados

IsF Inglês sem Fronteiras

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

MCTi Ministro da Ciência e Tecnologia e Inovação

MEC Ministério de Educação

MEO MyEnglishOnLine

MIGA Agência de Garantia de Investimento Multilaterais

NOVA Instituição Comunitária de Ensino Superior da Virginia do Norte

OMC Organização Mundial do Comércio

ONU Organização das Nações Unidas

PIBIC Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica

PIBIT

Programa Institucional de Bolsas de Iniciação em Desenvolvimento

Tecnológico e Inovação

PEC-PG Programa de Estudantes-Convênio de Pós- Graduação

PET Programa de Educação Tutorial

PNE Plano Nacional de Educação

PPGAS Pós-Graduação em Antropologia Social

PPGE Programa de Pós-Graduação em Educação

PROUNI Programa Universidade para Todos

RI Relações Internacionais

SECRI Secretaria de Relações Internacionais

SFM Sistema Financeiro Mundial

SISU Sistema de Seleção Unificada

UDF Universidade Distrito Federal

UDUAL União das Universidades da América Latina

UFMT Universidade Federal do Mato Grosso

UNAMAZ

Universidades dos Países Membros do Tratado de Cooperação

Amazônica

UNITWIN University Twinning and Networking Programme

UNESCO Organização das Nações Unidas para Educação, Ciências e Cultura

URJ Universidade do Rio de Janeiro

USP Universidade de São Paulo

VIC Voluntariado de Iniciação Científica

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Chamadas Públicas do Programa CsF – Modalidade graduação- sanduíche .......... 97

Tabela 2 - Vagas da 9ª Convocação – CAPES. ...................................................................... 108

Tabela 3 - IES destino classificadas no QS World University Rankings ................................ 132

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Síntese de Apresentação CNPq/MCTi ................................................................... 111

Figura 2 - Apresentação The Brazilian Scientific Mobility Program - Slide 7 ...................... 112

Figura 3 - Apresentação Ciência sem Fronteiras: Programa Brasileiro de Mobilidade

Científica - Slide 10 ................................................................................................................ 113

Figura 4 - Síntese de Apresentação Capes.............................................................................. 114

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Setor de Convênios/UFMT – 2008 a 2012 .......................................................... 119

Gráfico 2 - Convênios Ativos/UFMT – 2009 a 2013 ............................................................. 120

Gráfico 3 - Setor de Mobilidades/UFMT – 2008 a 2012 ....................................................... 120

Gráfico 4 - Setor de Mobilidades/UFMT – 2012 a 2013 ....................................................... 122

Gráfico 5 - Setor de Mobilidades/UFMT – 2012 a 2013 ....................................................... 122

Gráfico 6 - Estudantes da UFMT participantes da seleção para Programa CsF..................... 126

Gráfico 7 - Estatísticas do Programa CsF – UFMT – Perfil socioeconômico. ....................... 128

Gráfico 8 - Estatísticas do Programa CsF – UFMT – Perfil acadêmico. ............................... 129

Gráfico 9 - Estatísticas gerais do Programa CsF-I ................................................................. 130

Gráfico 10 - Estatísticas gerais do Programa CsF-II .............................................................. 131

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Revisão de literatura no Banco de Teses e Dissertações da CAPES, delimitação da

palavra-chave: internacionalização........................................................................................... 43

Quadro 2 - Delimitação das concepções sobre a internacionalização da educação superior ... 46

Quadro 3 - Documentos UNESCO acerca das diretrizes educacionais.................................... 63

Quadro 4 - Documentos BM acerca das diretrizes educacionais. ............................................ 74

Quadro 5 - Programa Ciência sem Fronteiras. Eventos marcantes – agosto de 2011 a outubro

de 2013 ..................................................................................................................................... 96

Quadro 6 - Destaques das Convocações do Programa CsF de 2011 a 2014 ............................ 99

Quadro 7 - Análise do Programa CsF pelos membros da CGRIFES/ANDIFES. .................. 105

Quadro 8 - Destaques dos Editais SECRI/UFMT para o Programa CsF de 2011 a 2013 ...... 124

Quadro 9 - Custo por bolsista/ano do Programa CsF ............................................................. 157

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 17

1. A POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO

CONTEXTO DAS MUDANÇAS SOCIAIS ........................................................................ 23

1.1 INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: ESBOÇO PARA UMA CONSTRUÇÃO

TEÓRICA ......................................................................................................................................................... 23

1.1.1 Geopolítica Mundial: breve delineamento do pós 2ª Guerra Mundial ................................................ 23

1.1.2 A particularidade brasileira ................................................................................................................ 30

1.1.3 Reflexos das políticas globais nas políticas de educação superior, com foco na internacionalização

33

1.2 A INTERNACIONALIZAÇÃO NAS PESQUISAS ACADÊMICAS ................................................ 41

1.3 CONCEITO DA INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR ................................. 46

2. A INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL ........... 50

2.1 A INTERNACIONALIZAÇÃO NAS POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO SUPERIOR BRASILEIRA ........... 50

2.2 INTERFACES ENTRE A POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR

MUNDIAL E BRASILEIRA ............................................................................................................................ 62

2.2.1 A UNESCO: perspectivas sobre a internacionalização da educação superior. .................................. 62

2.2.2 Banco Mundial: orientações educacionais .......................................................................................... 72

2.2.3 Interfaces dos organismos internacionais à política de internacionalização da educação superior

brasileira ...................................................................................................................................................... 78

3. O PROGRAMA CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS .......................................................... 81

3.1. CONTEXTO SÓCIO-POLÍTICO-ECONÔMICO NO PERÍODO DE CRIAÇÃO DO PROGRAMA

CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS ........................................................................................................................ 81

3.2. FISIONOMIA E FUNCIONAMENTO DO PROGRAMA CSF ................................................................ 90

3.2.1 Sobre a Graduação – Sanduíche ......................................................................................................... 96

3.2.2 Avaliação do Programa CsF por parte das agências executoras ..................................................... 110

3.3. UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO: A POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO

COMO FOCO ................................................................................................................................................. 115

3.3.1 Os editais SECRI/UFMT para seleção dos bolsistas CsF ................................................................. 124

3.3.2 Perfil dos bolsistas CsF na UFMT e no CsF ..................................................................................... 127

4. BUSCANDO ELEMENTOS PARA RESPOSTAS ...................................................... 135

4.1. METODOLOGIA .................................................................................................................................... 136

4.1.1 Metodologia das entrevistas .............................................................................................................. 137

4.2 ANÁLISE DOS DADOS .......................................................................................................................... 140

CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 154

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 159

APÊNDICE A ....................................................................................................................... 172

APÊNDICE B ........................................................................................................................ 173

APÊNDICE C ....................................................................................................................... 174

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INTRODUÇÃO

O presente estudo compõe a dissertação desenvolvida no Programa de Pós-

Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), junto ao

Grupo de Estudos e Pesquisas em Políticas Educacionais (GEPDES).

A pesquisa apresenta como tema central o Programa Ciência sem Fronteiras (CsF),

delimitando-se no contexto da política de internacionalização da educação superior no Brasil.

Nessa direção, estabelece o seguinte problema de pesquisa: Como se caracteriza, em termos

de concepção e implementação, o Programa Ciência sem Fronteiras, no âmbito da

política de internacionalização da educação superior no Brasil?

Acreditamos ser um estudo relevante pela perspectiva de desvelar as ações e

intenções desse programa governamental. Os estudos mostram que, desde a antiguidade, a

troca de informação entre povos era recorrente, principalmente no meio universitário, pois,

conforme Charle e Verger (1996, p.27), “As populações universitárias medievais eram

bastante móveis, uma vez que, em tese, nenhuma fronteira se opunha à circulação dos homens

nem à validade dos diplomas.”

Os autores também esclarecem que na Idade Média a mobilidade internacional já

se apresentava com as características de busca pelo estudo e a viagem em si, ou seja, “a

experiência existencial, a ocasião de visita a lugares célebres e de iniciação da sociabilidade –

estava investida de um valor educativo próprio” (CHARLE; VERGER, 1996, p.49). Porém, o

que parece diferenciar-se, atualmente, é a centralidade da questão e o aumento de interesse do

Estado sobre ela.

Essa tendência se intensifica largamente após a 3ª Revolução Industrial, também

conhecida como Revolução Digital ou Revolução Técnico-Científica Informacional1.

Conforme destaca Dias Sobrinho (2005, p.139):

A modernização dos meios de transporte e diversos programas de financiamento e

estratégias de organização de eventos e variados trabalhos de cooperação facilitam

muito a circulação de professores e estudantes. A cooperação acadêmica pode ser

altamente potencializada hoje em dia pela interconexão das instituições e de grupos

de pesquisadores, ou seja, pela constituição de redes mundiais permitindo o acesso

1 Iniciou-se em meados do século XX e correspondeu ao processo de inovações no campo da informática e suas

aplicações nos campos da produção e do consumo. As grandes realizações desse período são o desenvolvimento

da chamada química fina, a biotecnologia, a escalada espacial, a robótica, a genética, entre outros importantes

avanços (PENA, 2014).

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imediato a informações longínquas, unindo o local ao global. Atualmente, a

cooperação em rede pode prescindir da presença física (DIAS SOBRINHO, 2005,

p.139).

Temos vivido intensamente a interação entre países, sobretudo levando em conta

os aspectos econômicos, sociais, culturais, tecnológicos e políticos, ponto de vista que a

presente pesquisa propõe-se a explorar mais amiúde.

A Universidade, como instituição educadora, participa diretamente do cenário da

internacionalização, valendo-se de meios tecnológicos para desenvolver atividades de ensino

e pesquisa conjuntas à distância, bem como pelo intercâmbio acadêmico via mobilidade

recíproca de membros ou por participação em missões científicas e congressos internacionais.

Stallivieri (s.d., p.23) define a internacionalização universitária a seguir:

Como espaço gerador de conhecimento, a universidade tem contribuído para as

rápidas transformações tecnológicas, para a evolução dos meios de comunicação e

para a velocidade com que circulam as informações, que têm aproximado os povos e

têm feito com que as populações tenham acesso muito rápido e direto ao que está

ocorrendo nos lugares mais longínquos do globo, gerando um acelerado processo de

internacionalização. [...] Preparar cidadãos do futuro para um mundo interligado e

interdependente requer um sistema de educação superior cujo processo de

internacionalização permita o conhecimento direto e o respeito pela diversidade

cultural, promovendo, acima de todos os conceitos, o entendimento e o respeito pela

multiplicidade de valores e a tolerância entre os povos (STALLIVIERI, s.d., p.23).

Essa prática, tradicionalmente, teve como princípio a solidariedade e a

reciprocidade, tendo como objetivo o diálogo entre povos, fundado no respeito ao diferente e

na cooperação mundial.

Porém, nos últimos tempos, novos modos de conceber e operar os intercâmbios

internacionais da educação superior vem sendo desenvolvidos, ao que parece, podendo ser

exemplificado o próprio Programa Ciência sem Fronteiras, que utiliza como estratégia o

incentivo financeiro (montante inicial de R$3,1 bilhões)2, mediante pagamento de bolsas e de

taxas acadêmicas, para aumentar a presença de pesquisadores e estudantes brasileiros em

instituições “de excelência” no exterior e para atrair jovens talentos científicos e

investigadores para atuar no Brasil.

A partir dessas considerações, o nosso objetivo principal é analisar a concepção e a

implementação do Programa Ciência sem Fronteiras, no contexto da política de

2 Informação fornecida no pronunciamento da presidente Dilma Rousseff, na reunião do Conselho de

Desenvolvimento Econômico e Social realizada em julho de 2011 (Jornal Valor Econômico, 2011).

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internacionalização da educação superior no Brasil. Os objetivos específicos assim se

delineiam:

Contextualizar e caracterizar a política de internacionalização da educação

superior brasileira;

Identificar as interfaces entre a política de internacionalização da educação

superior mundial e brasileira;

Contextualizar e explicitar o funcionamento do Programa Ciência sem

Fronteiras no Brasil, no período de 2011 a 2014;

Caracterizar o processo de implementação do Programa Ciência sem

Fronteiras, segundo a delimitação do público alvo estudantes de graduação na

modalidade graduação – sanduíche, no período de 2011 a 2014, no enfoque da

Universidade Federal do Mato Grosso.

Ressaltamos que o estudo privilegia a análise dos processos de concepção e

implementação da política pública da internacionalização da educação superior, o que

significa que não vamos nos deter centralmente nos impactos e resultados do Programa.

A propósito, Gomes e Oliveira (2012, p. 23/27) destacam que estudos em políticas

públicas e, particularmente, de políticas de educação superior, podem ser agrupados em

quatro linhas a partir do foco de pesquisa que privilegiam: a) análises dos processos de

concepção e formulação das políticas públicas de educação superior; b) análises dos processos

e estratégias de implementação; c) análises e avaliações de impactos e resultados; d) e estudos

dedicados à descrição, análise e interpretação dos processos de concepção, formulação e

implementação, assim como analisam os impactos e resultados das políticas de educação

superior. Assim sendo, pelas limitações do tempo de estudo, nos ateremos aos itens “a” e “b”,

conforme apresentado pelos autores.

A opção em estudar essa temática deve-se a minha experiência profissional, pela

atuação desde 2008 na Secretaria de Relações Internacionais (SECRI) da UFMT, sendo uma

das responsáveis pela gestão do referido programa nas ações de internacionalização dessa

Instituição Federal de Educação Superior (IFES). Nesse espaço profissional, ricas vivências,

desafios e conflitos se apresentaram desde a implementação do programa, motivando o

desenvolvimento deste estudo.

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Esta pesquisa configura-se um estudo exploratório, de caráter qualitativo, seguindo o

entendimento de que no universo das Ciências Sociais a produção humana dificilmente pode

ser traduzida em indicadores quantitativos (MINAYO, 2011).

Consideramos neste estudo também o pensamento de Chizzotti (2000, p.80) quanto

à relação entre a orientação filosófica e pesquisas qualitativas: “[...] Valoriza a contradição

dinâmica do fato observado e a atividade criadora do sujeito que observa, as oposições

contraditórias entre o todo e a parte e os vínculos do saber e do agir com a vida social dos

homens.”

Para compor a coleta de dados, utilizamos entrevista semiestruturada, com um roteiro

orientativo de perguntas que o entrevistado tinha liberdade para falar sobre o tema da questão,

e, se preferisse, aprofundar algum aspecto relacionado ao mesmo, que julgasse pertinente.

Para o desenvolvimento da pesquisa sobre o Programa Ciência sem Fronteiras, os

locais de estudo foram as instituições idealizadoras e gestoras do referido Programa:

Ministério da Educação (MEC), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico (CNPq) e Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Ressaltamos que foi

feito convite para a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)

participar do presente estudo, porém, sem sucesso pela falta de resposta do referido órgão.

Os sujeitos entrevistados delimitam-se aos gestores dessas instituições, vinculados ao

segmento da internacionalização da educação superior. Optamos por resguardar sua

identidade. A presente pesquisa obteve parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa

com Seres Humanos, conforme n.º 801.651.

Enfatizamos que esta pesquisa é do tipo qualitativa, ou seja, não se configura um

estudo de caso, ainda que tenha como um dos entrevistados um representante de Instituição de

Educação Superior (IES) pública. O intuito desta pesquisa é utilizar o depoimento como

exemplo da implementação prática do CsF.

Para garantir melhor resultado do trabalho, consultamos a legislação, documentos

intitucionais, artigos, livros, sites, entre outros, mediante a coleta de documentação indireta,

constituindo a pesquisa documental e bibliográfica.

Esta pesquisa segue os preceitos do método dialético de investigação, que pretende

descobrir como se produz concretamente o fênomeno estudado por meio da busca da sua

essência, utilizando-se da crítica como princípio. Trata-se de buscar suas origens, causas,

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orientações, transformações, desenvolvimento e conexões, tendo como base o real, a prática e

o concreto em movimento. Esse método, segundo Frigotto (2010), procura explicações

coerentes e racionais para os fenômenos, apoiando-se numa visão da realidade como

totalidade, movimento e história, situando-os nas relações sociais e entendendo-os na trama

das contradições.

Na realização da pesquisa, consideramos, principalmente, as categorias filosóficas da

contradição e da totalidade, num processo de conhecer o fenômeno estudado pelos seus polos

contrários que, em movimento e tensão, se autoafirmam, seguindo o entendimento de Cury

(1987, p.30): “A contradição é destruidora e ao mesmo tempo criadora, já que se obriga

constantemente a superação.”

Vale ponderar que o método dialético de investigação é complexo, tornando-nos

estudantes da sua apropriação, sendo esta pesquisa o primeiro desafio de sua apreensão.

A dissertação organiza-se em quatro capítulos, na sequência: A política de

internacionalização da educação superior no contexto das mudanças sociais; A

internacionalização da educação superior no Brasil; O Programa CsF; e Buscando elementos

para as respostas.

O primeiro capítulo contextualiza brevemente o sistema capitalista a partir da 2ª

Guerra Mundial, percorrendo a organização político-econômica do estado de bem-estar social

(na ideologia keynesiana) do regime de acumulação fordista e a organização político-

econômica do neoliberalismo, que se articula com o regime de acumulação flexível

(toyotismo). O texto também adentra na realidade brasileira, evidenciando o novo-

desenvolvimentismo, que se estabelece em meados da década de 2000 no país. Tais estudos

têm a perspectiva de entender os reflexos das políticas globais nas políticas de educação

superior, em especial sobre a internacionalização nesse nível de ensino. Além disso, procura

estabelecer um marco conceitual sobre a internacionalização da educação superior a fim de

nortear as reflexões sobre o tema.

No capítulo seguinte, tratamos de aspectos relacionados aos processos de

internacionalização da educação superior brasileira. Primeiramente, discorremos numa

perspectiva histórica como se caracterizou pela implementação da internacionalização da

educação superior, desde o período colonial até a nova república, fazendo a correlação com os

principais dispositivos legais da educação, com foco na educação superior. Esse trajeto é

importante, na medida em que evidencia como se desenvolveu a internacionalização da

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educação superior no Brasil. Posteriormente, realizamos uma breve interface com as

influências de organismos internacionais3 na consolidação das políticas educacionais

brasileiras. Trata-se da necessidade de compreender as medidas impostas pelo Estado que

afetam a realidade concreta, evidenciando, sobretudo, como o sistema capitalista atua sobre a

questão, segundo seus interesses, considerando certo período histórico.

No terceiro capítulo, abordamos o contexto sócio-político-econômico referente ao

período de implementação do Programa CsF, para facilitar a compreensão da fisionomia e

funcionamento do programa. Além disso, apresentamos como exemplo o processo de

internacionalização na UFMT, ressaltando a inserção do Programa CsF em tal processo.

Finalmente, no último capítulo, apresentamos a análise dos dados obtidos nas

entrevistas feitas com os representantes de instituições ligados à concepção e à

implementação do Programa CsF, em interlocução com as informações já obtidas nos

capítulos anteriores, com o objetivo de buscar elementos para responder ao questionamento

norteador desta dissertação e suas questões secundárias.

Conclusivamente, analisamos que a internacionalização da educação superior no

Brasil, na perspectiva do que se apresenta no Programa CsF, tende a negligenciar a

solidariedade mútua para se constituir em estratégia para o fortalecimento do modelo político-

econômico vigente, posicionando-se em termos de relações internacionais com a essência da

transnacionalização da educação superior.

3 Seguiremos o entendimento de Bruno (2013, p.18): “O termo internacional, por sua vez, era e continua a ser

empregado para designar o inter-relacionamento entre várias nações. Uma organização internacional busca

produzir acordos entre grupos de várias nacionalidades, constituindo-se no palco em que atos nacionais são

realizados.” (BRUNO, 2013, p.18).

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1. A POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO

CONTEXTO DAS MUDANÇAS SOCIAIS

O presente capítulo contextualiza brevemente o sistema capitalista a partir da 2ª

Guerra Mundial, percorrendo a organização político-econômica do estado de bem-estar social

(na ideologia keynesiana) do regime de acumulação fordista e a organização político-

econômica do neoliberalismo, que se articula com o regime de acumulação flexível

(toyotismo). O texto também adentra na realidade brasileira, evidenciando o novo-

desenvolvimentismo, que se estabelece em meados da década de 2000 no país. Tais estudos

têm a perspectiva de entender os reflexos das políticas globais nas políticas de educação

superior, em especial sobre a internacionalização nesse nível de ensino. Além disso, procura

estabelecer um marco conceitual sobre a internacionalização da educação superior a fim de

nortear as reflexões sobre o tema.

1.1 INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: ESBOÇO PARA UMA

CONSTRUÇÃO TEÓRICA

1.1.1 Geopolítica Mundial: breve delineamento do pós 2ª Guerra Mundial

Como consequência da 2ª Guerra Mundial (1939 – 1945), no conflito dos países

aliados (Inglaterra, França, União Soviética, Estados Unidos da América, Brasil, entre outros)

contra os países do eixo (Alemanha, Itália e Japão), muitos ficaram destruídos, principalmente

os do eixo, que perderam o combate, apresentando-se a necessidade de investimento

financeiro externo para sua reconstrução.

Os Estados Unidos da América (EUA), do lado vencedor da guerra e com potencial

financeiro advindo da liderança da 3ª Revolução Industrial (início em 1940), cuja principal

característica é o uso de tecnologias avançadas no sistema de produção industrial com vista a

alavancar lucros expressivos, desenvolveram um plano de auxílio econômico denominado

Plano Marshall (1947).

O Plano, resumidamente, possuía como objetivos a reconstrução material, recuperação

e reorganização da economia dos países capitalistas, condicionados ao aumento das relações

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comerciais com o EUA, além de fazer frente aos avanços do socialismo nos países do leste

europeu.

Esse Plano foi propício para o EUA, pois, ao oferecer o auxílio condicionado,

conseguiu aumentar suas exportações e, principalmente, sua influência política sobre os países

auxiliados.

É importante citar que o período pós-guerra, conforme Harvey (1989, p.131), foi

marcado pela expansão do modo de produção baseado no fordismo (implementado,

primeiramente, nos EUA).

Foi consolidado e expandido no período de pós-guerra, seja diretamente, através de

políticas impostas na ocupação [...], ou indiretamente, por meio do Plano Marshall e

do investimento direto americano subsequente. Este último, que começou aos

poucos nos anos entre - guerras, quando as corporações americanas procuravam

mercados externo para superar os limites da demanda efetiva interna, tomou impulso

depois de 1945. Essa abertura do investimento estrangeiro (especialmente na

Europa) e do comércio permitiu que a capacidade produtiva excedente dos Estados

Unidos fosse absorvida alhures, enquanto o progresso internacional do fordismo

significou a formação de mercados de massa globais e a absorção da massa da

população mundial fora do mundo comunista na dinâmica global de um novo tipo de

capitalismo (HARVEY, 1989, p.131).

O autor ainda explicita o diferencial desse modelo econômico:

O que havia de especial em Ford (e que, em última análise, distingue o fordismo do

taylorismo) era a sua visão, seu reconhecimento explícito de que produção de massa

significa consumo de massa, um novo sistema de reprodução da força de trabalho,

uma nova política de controle e gerência do trabalho, uma nova estética e uma nova

psicologia, em suma, um novo tipo de sociedade democrática, racionalizada,

modernista e populista (HARVEY, 1989, p.121).

Com base nessa visão, o fordismo proporcionava trabalho disciplinado com renda e

tempo de lazer para consumir os produtos produzidos em massa, aliando-se à ideologia

keynisiana de promoção do estado de bem-estar social, ou seja, o Estado como agente

regulamentador da vida social, política e econômica do país em parceria com sindicados e

empresas privadas.

A influência política dos EUA foi fundante no Acordo de Bretton Woods, que tinha

como principal objetivo estabelecer disposições para 45 países aliados a fim de definir os

parâmetros que iriam reger a economia mundial após a 2ª Guerra, gerando um sistema

financeiro amplamente favorável aos EUA, que, a partir de então, passou a controlar de fato a

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economia mundial e o sistema de distribuição de capitais, transformando o dólar na moeda

forte do sistema financeiro mundial e fator de referência para as moedas dos outros

signatários do referido Acordo, como bem demonstra Harvey (1989, p. 131):

Tudo isso se abrigava [características do fordismo] sob o guarda-chuva hegemônico

do poder econômico e financeiro dos Estados Unidos, baseado no domínio militar. O

acordo de Bretton Woods, de 1944, transformou o dólar na moeda-reserva mundial e

vinculou com firmeza o desenvolvimento econômico do mundo à política fiscal e

monetária norte-americana (HARVEY, 1989, p. 131).

Reafirmando o posicionamento imperioso do EUA, Sampaio Jr (2010, p.45) relembra

citação de John K. Galbraith, escritor norte-americano conhecido por suas posições

keynesianas (apud BORON, 2004, p.138): “A globalização não é um conceito sério. Nós, os

norte-americanos, a inventamos para ocultar nossa política de penetração econômica – e,

poderíamos acrescentar, cultural e militar – no exterior.”

O Acordo de Bretton Woods previa a criação de instituições financeiras mundiais para

dar suporte às políticas e projetos de desenvolvimento do mundo todo, como o Banco

Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento sendo depois renomeado para Banco

Mundial (BM) e o Fundo Monetário Internacional (FMI), ambos com intuito de promover

injeção de capital na economia do país solicitante, no mesmo sistema de condicionamento de

preceitos de disciplina fiscal e jurídica ditados pelos dirigentes das instituições financeiras

mundiais.

Igualmente, com o final da 2ª guerra mundial, em 1945, foi criada a Organização das

Nações Unidas (ONU), com aspiração de manutenção da paz entre as nações mediante

mecanismos de segurança internacional, desenvolvimento econômico, definição de leis

internacionais e respeito aos direitos humanos e progresso social.

No âmbito da ONU, foi estabelecida a UNESCO, sigla para Organização das Nações

Unidas para Educação, Ciências e Cultura, que também promove direcionamentos os quais os

países participantes devem seguir, mediante documentos internacionais.

Em meados de 1960, o fordismo apresenta indícios de problemas na medida em que a

Europa Ocidental e Japão iniciam seus processos de expansão por meio do mercado de

exportação, tendo em vista seus mercados internos estarem saturados, criando, assim, um

cenário de competição, sob a dominação norte-americana. Os EUA, por sua vez, passam por

momentos de instabilidade econômica devido à queda de produtividade e da lucratividade

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corporativas, fato que gerou problema fiscal, que só seria sanado à custa de uma aceleração da

inflação, o que poderia tornar o dólar uma moeda-reserva internacional instável.

Harvey (1989, p.135) esclarece: “De modo mais geral, de 1965 a 1973 tornou cada vez

mais evidente a incapacidade do fordismo e do keynesianismo de conter as contradições

inerentes ao capitalismo.”

E acrescenta: “No espaço social criado por todas essas oscilações e incertezas, uma

série de novas experiências nos domínios da organização industrial e da vida social e política

começou a tomar forma.” (HARVEY, 1989, p.140). O autor se refere ao modelo de

organização industrial do toyotismo, conhecido como “modelo japonês”, pois foi

desenvolvido por Taiichi Ohno na fábrica da Toyota. Ou, como Harvey define:

A acumulação flexível, como vou chamá-la, é marcada por um confronto direto com

a rigidez do fordismo. Ela se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos

mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo

surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de

fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente

intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional. A acumulação

flexível envolve rápidas mudanças dos padrões do desenvolvimento desigual, tanto

entre setores como entre regiões geográficas, criando, por exemplo, um vasto

movimento no emprego no chamado “setor de serviços”, bem como conjuntos

industriais completamente novos em regiões até então subdesenvolvidas [...]. Ela

também envolve um novo movimento que chamarei de “compreensão do espaço–

tempo” [...] no mundo capitalista – os horizontes temporais da tomada de decisões

privada e pública se estreitaram, enquanto a comunicação via satélite e a queda dos

custos de transporte possibilitaram cada vez mais a difusão imediata dessas decisões

num espaço cada vez mais amplo e variegado (HARVEY, 1989, p.140).

Antunes (1999, p.48) explica a contradição de interpretações sobre a definição da

relação capital e trabalho no toyotismo. Com base em Sabel e Piore (1984), interpreta-o como

sendo uma nova forma de organização industrial, instaurando a especialização flexível e

defende a ideia que esse modelo é:

[...] mais favorável quando comparada ao taylorismo/fordismo, uma vez que

possibilitaram o advento de um trabalhador mais qualificado, participativo,

multifuncional, polivalente, dotado de “maior realização no espaço do trabalho”

(ANTUNES, 1999, p.48).

Em contrapartida, outros autores, como Tomaney (1996, p.157/158), não interpretam

como um novo modelo de organização do trabalho, mas sim como “[...] reconfiguração do

poder no local de trabalho e no próprio mercado de trabalho, muito mais em favor dos

empregadores do que dos trabalhadores.” Antunes (1999, p.48/49) complementa que

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Tomaney fez uma análise crítica sobre o assunto e concluiu que “[...] a tese da “nova

organização do trabalho” dotada de um “novo otimismo”, vem sido desmentida.”

Antunes (1999, p.50) assume a posição defendida por Tomaney e afirma que “[...] as

mutações em curso [toyotismo] são expressão da reorganização do capital com vistas à

retomada do seu patamar de acumulação e ao seu projeto global de dominação.”

Dentre as mutações desse novo modo organizacional, o toyotismo, podemos destacar a

notável implementação de emprego no setor de serviços a partir do início dos anos 1970, nos

ramos das consultorias, da assistência, das finanças, dos seguros, da saúde e da educação,

promovendo a valorização do empreendimento inovador e com ênfase na informação rápida,

precisa e eficiente colocando o acesso ao conhecimento científico e técnico como vantagem

competitiva tornando o saber, o conhecimento como mercadoria. Dessa forma, Harvey (1989,

p.151) expõe:

O próprio saber se torna uma mercadoria-chave, a ser produzida e vendida a quem

pagar mais, sob condições que são elas mesmas cada vez mais organizadas em base

competitivas. Universidades e institutos de pesquisa competem ferozmente por

pessoal, bem como pela honra de patentear primeiro novas descobertas científicas

[...] A produção organizada de conhecimento passou por notável expansão nas

últimas décadas, ao mesmo tempo que assumiu cada vez mais um cunho comercial

(como provam as incômodas transições de muitos sistemas universitários do mundo

capitalista avançado de guardiões do conhecimento e da sabedoria para produtores

subordinados de conhecimento a soldo do capital corporativo) (HARVEY, 1989,

p.151).

Vemos aqui os primeiros sinais assumidos pela educação no contexto do toyotismo e

neoliberalismo, os quais aprofundaremos adiante.

Ao retomarmos o contexto econômico-político, observamos que o toyotismo, aliado ao

esforço de superação dos países arrasados na 2ª Guerra Mundial, principalmente no Japão,

promoveu rápida recuperação do comércio externo dos países aliados e à medida que iam se

fortalecendo começaram os questionamentos sobre a liderança do EUA no Acordo de Bretton

Woods.

Aos poucos, o superávit na conta de transações correntes dos EUA foi diminuindo, até

que, em 1971, apresentou seu primeiro déficit. Para tentar recuperar a competitividade de sua

economia, esse país buscou convencer os aliados ao Acordo a valorizarem suas moedas de

forma coordenada para que o dólar desvalorizasse, sem que o preço do ouro em dólar

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variasse, mas não conseguiu, então, não viu outra forma a não ser romper com o Acordo de

Bretton Woods.

Fernandes (2009, s.p.) esclarece esse fim:

A justificativa imediata para romper com o acordo baseou-se no argumento de que o

desequilíbrio externo dos EUA era determinado por práticas comerciais desleais dos

países europeus e do Japão (14). Mas hoje está claro que o alcance desta decisão

crucial do Estado norteamericano foi muito maior do que se poderia imaginar na

época. O desenrolar das décadas seguintes demonstrou que o fim do padrão dólar-

ouro não foi uma derrota do capitalismo norte-americano, nem se tratou de uma

imposição natural dos mercados, mas sim de uma política estratégica bem

articulada. Daí surgiu um novo padrão monetário, o chamado dólar flexível, inédito

na história das relações internacionais, e ainda mais vantajoso para os EUA. Este

acontecimento também marca a volta da grande finança ao centro do poder, numa

espécie de revanche contra aqueles que lutaram contra a liberdade dos capitais no

período de Bretton Woods. Isso ficou evidente nos anos 1990 quando a vitória do

neoliberalismo parecia incontestável e o dólar se configurou como a moeda da

globalização financeira (FERNANDES, 2009, s. p.).

Após a ruptura do Acordo de Bretton Woods, em 1971, concomitante com a

fragilidade demonstrada pela crise do estado de bem-estar na ideologia do keynesianismo,

expressa por problemas reais, como superinflação, instabilidade econômica e estagnação nos

países capitalistas desenvolvidos, o neoliberalismo surgiu como uma reação política, uma

contraproposta ao Estado assistencialista, considerado excessivamente oneroso aos cofres

públicos. Iniciou-se então, um novo modelo de organização político-econômica, baseado na

concepção do neoliberalismo.

Moraes (2001, p. 32) lembra um evento importante antes do renascer neoliberal: os

documentos da chamada Comissão Trilateral, que alertavam que a sobrecarga do Estado

gerada pelos compromissos do bem-estar social do modelo keynesianismo levaria à

ingovernabilidade das democracias:

[...] autores como Samuel Huntington, Daniel Bell, Irving Kristol e Zbignew

Brzezinski enunciam um receituário inflexível: era preciso limitar a participação

política, distanciar a sociedade e o sistema político, subtrair as decisões

administrativas ao controle político (MORAES, 2001, p.32).

A citação apresenta princípios basilares do neoliberalismo: o Estado retraído da função

social e não regulamentadora da economia, ideologia que conquistou governos de países

desenvolvidos, como Inglaterra e EUA.

O neoliberalismo, tendo como patrono Friedrich von Hayek, em sua obra “O caminho

da Servidão”, lançada em 1944, entendia que o igualitarismo propagado pelo estado de bem-

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estar destruía a liberdade dos cidadãos e a vitalidade da concorrência, da qual dependia a

prosperidade de todos (HAYEK, 2010). Hayek defende com uma nova roupagem o

liberalismo clássico, construindo um paralelo contra o Estado mercantilista e as corporações,

que, conforme explica Moraes (2001, p.28):

Segundo eles, os inimigos vestiam agora outros trajes, mas revelavam as mesmas

taras e perversões. Um desses inimigos era o conjunto institucional composto pelo

Estado de bem-estar social, pela planificação e pela intervenção estatal na economia,

tudo isso identificado com a doutrina keynesiana. O outro inimigo era localizado nas

modernas corporações – os sindicatos e centrais sindicais, que, nas democracias de

massas do século XX, também foram paulatinamente integrados nesse conjunto

institucional. Além de sabotar as bases da acumulação privada por meio de

reivindicações salarias, os sindicatos teriam empurrado o Estado a um crescimento

parasitário, impondo despesas sociais e investimentos que não tinham perspectiva de

retorno (MORAES, 2001, p.28).

Em suma, o pensamento neoliberal apresentava como solução para crise do capital da

doutrina keynesiana a diminuição dos gastos públicos com políticas sociais e a adesão às

privatizações, como forma de beneficiar o mercado, o interesse individual.

Fiori (1997, p. 218) entende que o neoliberalismo foi concebido como um “casamento

virtuoso, ou pelo menos vitorioso, entre as ideias e o movimento real do capital.”

Especificando o movimento do setor de educação, principalmente da educação

superior, no mundo perante o contexto do neoliberalismo, temos a seguir citação

esclarecedora de Dias (2002, p.33):

No campo do ensino superior, a grande tendência dos últimos anos é a

comercialização favorecida pelo desenvolvimento das novas tecnologias e

estimulada pela OMC. O desenvolvimento da sociedade do conhecimento, que

representaria, se bem administrado, um grande instrumento para dividir as riquezas

no mundo, corre o risco de se tornar um fator adicional de dominação por parte de

poucos e de exclusão da maioria (DIAS, 2002, p.33).

Tal citação expõe que no contexto neoliberal a educação é tratada como mercadoria,

colocando-a como ferramenta para “dominação de poucos” e “exclusão da maioria”.

A seguir, adentramos com mais detalhe como se desenhou o contexto sócio-político-

econômico brasileiro a partir do período ditatorial (1964) até os dias atuais.

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1.1.2 A particularidade brasileira

Os chamados países subdesenvolvidos, destacando-se os países latino-americanos,

atravessaram momentos diversos nas décadas de 1950, 1960 e 1970 em relação aos países

desenvolvidos e não vivenciaram em essência o estado do bem-estar social do keysianismo,

tendo em vista as ditaduras militares impostas em países como Brasil, Argentina, Uruguai e

Chile.

No Brasil, a ditadura militar perdurou de 1964 a 1985, mesclando o caráter

autoritário com o desenvolvimentista, “[...] apoiado, articulado desde seu início pelos Estados

Unidos em conjunto com as forças de direita, extrema direita, civil e militar do Brasil.”

(ZENHA, 2014, s. p).

A ditadura se estabeleceu com o golpe militar que derrubou o governo do presidente

democraticamente eleito João Goulart, como uma reação à possibilidade de uma inclinação do

Brasil ao socialismo (ou a um modelo mais progressista). Entrou em decadência na medida

em que o governo não conseguiu mais estimular a economia, controlar a inflação crônica e os

níveis crescentes de concentração de renda e pobreza, impulsionando ao movimento pró-

democracia. Disso resultou a eleição de José Sarney, em 1984, que assumiu o cargo de

presidente de 1985 a 1990, iniciando o período conhecido como Nova República.

Vale ressaltar a interpretação de que no período ditatorial o pensamento

predominante era o nacional-desenvolvimentismo (1940-1970), conforme Castelo (2010,

p.192/193), que explica:

Nessa época, trabalhos seminais, gestados na Comissão Econômica para América

Latina e Caribe (Cepal) e no Instituto Superior de Estudos Brasileiros (Iseb),

começaram um processo de formulação de teorias explicativas das condições

estruturais do subdesenvolvimento da periferia do sistema mundial, com ênfase nas

especificidades da América Latina. Nascia o chamado nacional-

desenvolvimentismo, termo consagrado nos trabalhos de autores como Celso

Furtado, Hélio Jaguaribe, Candido Mendes, entre outros. [...] pois era possível

identificar características similares a todos os seus autores, entre as quais (i) a defesa

da autonomia e da soberania nacionais; (ii) a industrialização como meio mais

eficiente para a superação dos entraves ao desenvolvimento da periferia; (iii) o

Estado entendido como um agente estratégico promotor de políticas de planejamento

e bem-estar social; e, (iv) a participação ativa de uma intelligentsia culta e bem

formada na gerência de postos-chave do Estado (CASTELO, 2010, p.192/193, grifo

autor).

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Porém, as características citadas, principalmente no que tange ao investimento da

industrialização como meio de desenvolvimento do país, não alcançaram o esperado e o

subdesenvolvimento não foi superado, enfraquecendo tal pensamento. Fontes (2010, p.15)

considera que, para evitar retrocessos, visto que a sociedade estivera marcada por torturas,

massacres, censura e alísios forçados, além de uma economia esmorecida pelas dívidas do

período militar, o Estado faz alianças que configuram a reprodução do capital, via

neoliberalismo:

O estado de direito, logo que reconquistado, foi submetido às esdrúxulas alianças

entre a grande propriedade, amalgamando oligarquias, terratenentes, burguesias

industriais, agrárias, comerciais, bancárias, financeiras, compradoras e outras que,

novamente contra suas populações, convocaram capitais e poderes transnacionais

para tentar alcançar a última novidade de então, o neoliberalismo. Pela virulência

econômica das reestruturações e expropriações, pelas forças policiais, pela mídia

latifundiária, e também pela sedução das “parcerias” e de vultosos recursos

destinados a desviar para rumos adaptativos ( e não mais reivindicativos) a atuação

de setores das organizações de trabalhadores, conformou-se um capitalismo cujas

feições democráticas se enrijeciam, similares a um doloroso ricto (FONTES, 2010,

p.15).

A ideologia neoliberal foi imposta aos países da América Latina como condição para

renegociação de dívidas externas, que passaram a ter vigilância mais acirrada e gerenciamento

das economias pelo BM e FMI, fomentadores de tais recursos.

De acordo com Sader (2003, p.137), José Sarney teve um governo moderado que:

[...] teve como lema o que até recentemente seria considerado um grave pecado pelo

receituário vigente do Fundo Monetário Internacional – “Tudo pelo social” -, mesmo

que concebesse de forma assistencialista. Essas tendências brasileiras atrasaram a

aplicação no Brasil das políticas de ajuste fiscal (SADER, 2003, p.137).

A partir 1990, o modelo do neoliberalismo é inserido no Brasil, expressando-se nos

governos dos presidentes Fernando Collor/Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso. Esse

modelo político teve como base o Consenso de Washington, documento formulado pelo BM,

FMI e Tesouro dos EUA, que continha um conjunto de medidas destinadas aos países em

desenvolvimento para promover o ajuste macroeconômico, a exemplo de privatizações de

empresas estatais e serviços públicos e desregulamentação do Estado para diminuir a

interferência nos poderes privados.

Moraes (2001, p.39) destaca a ironia do fato de que após o povo conseguir o direito

ao voto, as decisões político-econômicas passaram a outro patamar, o das diretrizes mundiais.

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Durante os séculos XIX e XX, os movimentos trabalhistas haviam lutado para

conquistar o voto, o direito de organização e, assim, influir sobre a elaboração

politicas, definição de leis e normas. Agora que conquistaram esse voto, o espaço

em que se exerce é esvaziado em proveito de um espaço maior, mundializado, onde

eles não votam nem opinião (MORAES, 2001, p.39).

Porém, no final do século XX e início do século XXI, no contexto sul-americano, o

modelo neoliberal mostra sinais de crise e as reações populares emergem, como destaca

Castelo (2010, p.193):

[...] mostra sinais claro de esgotamento no plano econômico, com a persistência dos

desequilíbrios macroeconômicos, a redução dos direitos sociais e o aumento do

desemprego estrutural e do pauperismo relativo. A crise argentina de 2001 seria o

mais claro exemplo do fracasso neoliberal. As reações populares não tardam a

acontecer e a América do Sul vivencia um novo contexto histórico, indo em direção

contrária do resto do mundo. Um a um, os projetos neoliberais dão uma guinada à

esquerda; antigos dirigentes dos projetos neoliberais locais são defenestrados do

poder e novos governantes são eleitos com maciço apoio popular. Temos, assim,

uma janela histórica que abre possibilidades de movimentos políticos e ideológicos

contestatórios ao neoliberalismo (CASTELO, 2010, p.193, grifo nosso).

Nessa conjuntura, a ideologia do desenvolvimentismo ganha força no Brasil e

reaparece com novo termo: novo-desenvolvimentismo, sintetizado pelo projeto político

conduzido por Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010). Tal modelo representa o ressurgimento

das características do nacional-desenvolvimento, todavia, em uma realidade político-

econômica diferente, como ilustra Castelo (2010, p.194):

O termo “desenvolvimentismo” foi uma expressão marcante de um passado não tão

remoto, mas que com as transformações sociais ocorridas nestas últimas três

décadas, tornou-se antiquado, anacrônico. Logo, é preciso abandoná-lo, não somente

no sentido terminológico, mas dar-lhe um sentido conceitual inovador, adequado às

configurações do capitalismo contemporâneo. Para novos tempos, uma nova teoria;

para novos desafios, um novo projeto nacional. Daí o termo “novo-

desenvolvimentismo” (CASTELO, 2010, p.194).

O novo-desenvolvimentismo tem como principal objetivo aliar crescimento

econômico do país com distribuição de renda. Segundo Castelo (2010, p.196), “O Estado

seria uma espécie de ente político promotor de condições propicias para o capital investir seus

recursos financeiros e gerar emprego e renda para população em geral.” Então, o Brasil se

comprometeu a buscar o desenvolvimento aliado à parceria com os países desenvolvidos

mantendo os contratos vigentes e respeitando as diretrizes dos organismos internacionais.

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Certos intelectuais (CARCANHOLO, 2010; CASTELO, 2010; MARINI, 2010)

criticam esse modelo, pincipalmente, levando em conta a manutenção do Estado burguês

como complementar ao mercado, na tentativa de conciliar capital e trabalho.

Mesmo assim, Bastos (2012, p.799, grifo nosso) afirma que: “No Brasil, a conjuntura

foi oportuna para que os grupos desenvolvimentistas do governo Lula avançassem sobre o

domínio conservador das políticas macroeconômicas, processo que parece aprofundar-se no

governo Dilma.”

Dilma Rousseff, como Presidente da República (2011-2014), parece desenvolver seu

mandato na mesma diretriz: crescimento econômico com distribuição de renda aliado à

parceria com os países desenvolvidos e em desenvolvimento.

1.1.3 Reflexos das políticas globais nas políticas de educação superior, com foco na

internacionalização

Conforme já citado, Harvey (1989, p.151) explica que no sistema capitalista, sob o

neoliberalismo e o enfoque econômico na acumulação flexível e toyotismo, o saber, o

conhecimento científico e técnico ganham maior ênfase no processo de vantagem

competitiva, tornando-se uma mercadoria-chave, intrinsecamente ligada aos interesses

ideológicos e pragmáticos da reprodução e expansão do sistema. Como explica Harvey (1989,

p.151), “O próprio saber se torna uma mercadoria-chave, a ser produzida e vendida a quem

pagar mais, sob condições que são elas mesmas cada vez mais organizadas em base

competitivas.”

Isso posto, a aplicação dos princípios neoliberais na política educacional não foi

diferente dos princípios aplicados nas políticas globais, como ilustra Santos (2011, p. 32):

A inculcação ideológica serve-se de análises sistematicamente enviesadas contra a

educação pública para demonstrar que a educação é potencialmente uma mercadoria

como qualquer outra e que a sua conversão em mercadoria decorre da dupla

constatação da superioridade do capitalismo, enquanto organizador de relações

sociais, e da superioridade dos princípios da economia neoliberal, para potencializar

as potencialidades do capitalismo através da privatização, desregulação,

mercadorização e globalização (SANTOS, 2011, p. 32).

É importante ressaltar que o Estado é o protagonista para implementar e gerenciar as

políticas públicas, contudo, essas resultam de contradições e embates de interesses entre os

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envolvidos (organismos internacionais, movimentos sociais, Estado, partidos políticos),

conforme expressa Silva (2008, p.36):

O Estado resulta de certa construção histórica, de um campo de contradições e de

luta por interesses e projetos, que, por sua vez, emanam das forças diversas que

interagem na sociedade. Isso significa entende-lo como reflexo das relações sociais,

detentor de um poder que é, ao mesmo tempo, delimitado e relativo. Delimitado,

porque se caracteriza por uma hegemonia de classe; relativo, porque é também

penetrado pelos diversos estratos da sociedade, em ocasiões de maior ou menor

proporção. Por consequências, as políticas geridas pelo Estado são produtoras de

consensos e, ao mesmo tempo, portadoras de contradições (SILVA, 2008, p.36).

Nessa perspectiva dialética, salientando as contradições do processo, serão descritos

os posicionamentos de sujeitos sociais que interagem e contrapõem os interesses na

formulação da política de educação superior, assumindo enfoque no sentido da

internacionalização desse nível de ensino.

Um dos disseminadores do ideário neoliberal são os organismos internacionais,

sendo eles Organização Mundial do Comércio (OMC), BM, UNESCO, entre outros.

Evidenciamos dois posicionamentos confluentes na política de educação superior,

um por parte da OMC e outro pelo BM, apontados por Lima (2005, p.159) e Santos (2011,

p.24):

Justificando que a educação é um importante “capital humano”, para promoção do

crescimento econômico e do desenvolvimento individual e social, garantindo a

integração de cada país no comércio mundial, a OMC reivindica a necessidade do

estabelecimento de parcerias público-privadas para o financiamento da educação

superior, sinalizando, inclusive, a diluição das fronteiras entre público e privado

(LIMA, 2005, p. 159).

Basta referir o relatório do Banco Mundial de 2002 onde se assume que não vão

(isto é, que não devem) aumentar os recursos públicos na universidade e que, por

isso, a solução está na ampliação do mercado universitário, combinada com a

redução dos custos por estudantes [...]e com a eliminação da gratuidade do ensino

público (SANTOS, 2011, p.24).

Nos documentos dos referidos organismos, podemos identificar o princípio

neoliberal da privatização do ensino público, em consonância com o exposto por Santos

(2011, p.22-39), ao destacar dois “pilares” do projeto político-educacional do neoliberalismo:

a descapitalização da universidade pública e a transnacionalização do mercado universitário,

que significa respectivamente, diminuição de recursos para as universidades públicas e

abertura do mercado educacional transnacional. O autor esclarece que essas ações constituem

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um fenômeno global, ainda que tenham consequências diferentes no centro, na periferia e na

semiperiferia do sistema mundial (SANTOS, 2011, p.22-39).

O movimento de transformar a universidade de bem público em mercadoria ganha

impulso no fim da década de 1990. Dias (2002, p. p. 33) mostra as duas forças representativas

de interesses distintos expressas na Conferência Mundial sobre Educação Superior (1998),

cuja influência nos rumos da educação superior não pode ser subestimada, tendo em vista a

repercussão desse evento sobre vários países:

Em 1998, em Paris, durante a Conferência Mundial sobre Educação Superior

(CMES) na UNESCO, a comunidade acadêmica internacional e governos de mais de

180 países manifestaram, de maneira clara e insofismável, sua decisão de manter o

ensino superior como um direito e um bem público. No entanto, ao mesmo tempo e

sem fazer alarde, o secretariado da OMC, com o apoio de representantes de alguns

governos que contraditoriamente aprovaram a Declaração de Paris, manobrava para

criar normas que tratassem o ensino superior como uma mercadoria a ser

comercializada e liberalizada, retirando dos Estados nacionais, em termos práticos, o

direito de decidir com soberania sobre ações que visem formar cidadãos conscientes

e responsáveis (DIAS, 2002, p.33, grifo nosso).

Por sua vez, a OMC possui como regras gerais para todo serviço comercial o Acordo

Geral sobre o Comércio de Serviços (AGCS), de modo que: “O objetivo do AGCS, aprovado

em abril de 1994, é o de provocar uma liberalização progressiva dos serviços, inclusive os

educacionais.” (DIAS, 2002, p.48). É a partir de 1999, que em um documento relativo à área

de cobertura do AGCS, a educação passa a ser regulamentada na OMC como serviços de

educação, sendo aceito por todos os países membros, incluindo o Brasil. Porém, é necessário

que os membros estabeleçam acordos bi ou multilaterais entre si.

Em pesquisa, feita em janeiro de 2015 aos arquivos da OMC, identificamos que já

foram estabelecidos 683 acordos bi ou multilaterais, envolvendo 35 membros, sendo eles:

Austrália, Burundi, Cambodia, Canadá, Chile, China, Colômbia, Costa Rica, El Salvador,

EUA, Guatemala, Honduras, Índia, Islândia, Japão, Quênia, Malásia, Marrocos, México,

Niquaragua, Noruega, Nova Zelândia, Panamá, Paquistão, Peru, Reino de Bahraim, República

da Coréia, República Dominicana, Ruanda, Singapura, Suécia, Tailândia, Tanzânia, Uganda,

Vietnam (World Trade Organization, 2015).

Como podemos notar, o Brasil, apesar de ter aceitado a inclusão da educação como

serviços pela AGCS, ainda não formalizou qualquer acordo específico sobre o assunto, porém

muitas medidas vão nessa direção.

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Como exemplo da transnacionalização do mercado universitário no Brasil, podemos

citar a autorização dada, em 14 de maio de 2014, pelo Conselho Administrativo de Defesa

Econômica/Ministério da Justiça acerca da fusão das empresas de ensino superior Anhanguera

e Kroton tornando-a “[...] a maior companhia de ensino superior do mundo com mais de um

milhão de alunos.” (Jornal Folha de São de Paulo, 2015).

Tal fusão transnacional tem como características predominantes: que as empresas

atuem no mercado financeiro, possuam participação de originárias estrangeiras e aspirem por

recursos públicos, itens constantes na reportagem de capa “Os bilionários da Educação”,

escrito por Luciele Velluto, na revista Isto é Dinheiro, de 01/05/2013:

A união dos dois grupos educacionais foi bem recebida pelo mercado financeiro. No

acumulado da semana até quinta-feira 25, os papéis da Kroton e da Anhanguera

subiram 9,64% e 7,14%, respectivamente na Bovespa. Essa parceria também é

apontada como um possível catalisador para o ingresso de novos fundos de

investimentos no segmento. Anhanguera e Kroton cresceram, em boa medida,

graças ao suporte de gestão e aos recursos injetados pelos fundos. A primeira

com o brasileiro Pátria, a segunda com o Advent, dos EUA. A nova Kroton é um

colosso por qualquer ângulo que se analise (VELLUTO, 2013, p.43/44, grifo autor).

Apesar dessa permissão pelo Governo Federal, vale ressaltar a garantia

constitucional brasileira da existência de um sistema público de educação superior totalmente

gratuito oferecido pelas universidades e institutos federais. Assim, percebe-se o aspecto

contraditório do sistema, que assegura modelos opostos e que de algum modo se articulam.

Voltando ao AGCS, Dias (2002, p.49) cita, ainda, as modalidades incluídas no

mesmo:

[...] o fornecimento de serviços através das fronteiras, o consumo dos serviços no

estrangeiro, a presença comercial (quando, por exemplo, um estrangeiro torna-se

proprietário no território de outro país, como fazem as cadeias de hotéis) e a

presença de pessoas físicas (DIAS, 2002, p.49).

Santos (2011, p.34/35) especifica cada uma das modalidades, conforme:

A oferta transfronteiriça consiste na provisão transnacional do serviço sem que

haja movimento físico do consumidor. [...] O consumo no estrangeiro consiste na

provisão do serviço através do movimento transnacional do consumidor. [...] a

presença comercial e consiste em produtor privado de educação superior

estabelecer sucursais no estrangeiro a fim de aí vender os seus serviços. [...] a

presença de pessoas consiste na deslocação temporária ao estrangeiro de

fornecedores de serviços sediados num dado país, sejam eles professores ou

pesquisadores (SANTOS, 2011, p.34/35).

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Contudo, certas associações universitárias esboçam reações contra a inclusão

da educação como setor de serviços no AGCS/OMC:

No dia 28 de setembro de 2001, quatro grandes organizações universitárias da

Europa, Canadá e Estados Unidos enviaram ao governo do Canadá, ao representante

dos Estados Unidos na área de comércio junto à Comissão Europeia e aos governos

dos Estados europeus uma nota contrária à proposta da OMC de incluir o ensino

superior como um dos doze setores de serviço incluídos no AGCS (DIAS, 2002,

p.51).

As referidas organizações universitárias “ricas e de países ricos” (DIAS, 2002, p.52)

baseiam-se nos princípios da Conferência Mundial sobre o Ensino Superior (1998) na

UNESCO, que orienta manter o ensino superior como bem público:

Como enfatizaram as ONG´s “a razão de ser do ensino superior é a de servir o

interesse público e não de constituir uma ‘mercadoria’, fato que os Estados-

Membros da OMC reconhecem através de convenções e declarações da UNESCO e

de outras instâncias internacionais ou multilaterais” (DIAS, 2002 p.52).

O autor ainda afirma que:

As ONGs reclamam do fato de que, em muitos países, não se desenvolveu um

procedimento eficaz de consulta entre altos funcionários e representantes dos

estabelecimentos de ensino superior e indicam, com precisão, que os tribunais

comerciais interpretam de maneira restrita os acordos internacionais no que dizem

respeito à educação e, em particular, ao ensino superior (DIAS, 2002, p.53).

Contudo, a nota assinada pelas referidas organizações universitárias: Associação das

Universidades e Colégios do Canadá (AUCC), Associação Europeia de Universidades (AEU);

American Council Educaton (ACE); Council for Higher Education Accreditation (CHEA), é

ambígua, a julgar pela afirmação de que: “O ensino superior representa um serviço

completamente diferente da maior parte dos outros setores de serviço em função de seu

mandato público, que pode ser delegado, mas que é essencialmente público” (DIAS, 2002,

p.55, grifo nosso). Tal posicionamento pode, talvez, ser assim explicado “[...] pelo fato de

representarem entidades que, embora pública, passaram a adotar, em grande número, no

campo internacional e em suas relações com universidades dos países em desenvolvimento,

uma atitude igualmente comercial.” (DIAS, 2002, p.56).

Outra manifestação contrária à inclusão da educação como serviço regulamentado

pela AGCS aconteceu no Brasil em 2002:

Na oficina sobre Ciência e Tecnologia (“Ciência e Tecnologia, um instrumento para

a paz no Século XX, organizada durante Fórum Social de Porto Alegre, por

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iniciativa da Secretaria de Ciência e Tecnologia do Governo do Rio Grande do Sul),

seus participantes adotaram uma decisão, propondo um pacto global que, entre

outros, assegure os seguintes objetivos gerais: 1. A consolidação dos princípios de

ação aprovados na I Conferência Internacional sobre Ensino Superior [...],

promovida, pela UNESCO [...] 2. A exclusão do ensino superior do Acordo Geral de

Serviços da OMC [...] (DIAS, 2002, p.55).

Apesar das reações contrárias à mercadorização da educação, Dias (2002, p.35)

afirma que prevalece a tendência mercantil, conforme estimulada pela OMC:

No campo do ensino superior, a grande tendência dos últimos anos é a

comercialização favorecida pelo desenvolvimento das novas tecnologias e

estimulada pela OMC. O desenvolvimento da sociedade do conhecimento, que

representaria, se bem administrado, um grande instrumento para dividir as riquezas

no mundo, corre o risco de se tornar um fator adicional de dominação por parte de

poucos e de exclusão da maioria (DIAS, 2002, p.35).

O autor, ao retomar sobre o documento aprovado pela OMC para tratar o ensino

superior de forma mercantil, afirma que a justificativa é pautada num sofisma “[...] que, a

partir do momento em que se admitem instituições particulares como provedoras de ensino,

este torna-se comercial, aplicando-se, pois, a ele, as regras da OMC.” (DIAS, 2002, p.41).

Reitera, ainda, que no documento da OMC são demonstradas as suas verdadeiras intenções:

[...] desde o inicio dos anos 90, cerca de 1,5 milhão de estudantes universitários

estavam matriculados no Exterior, o que, sem dúvida, poderia representar um

mercado muito importante. Nos Estados Unidos, o número de estudantes

estrangeiros no período de 1989-1993 cresceu numa proporção de 3 a 6% ao ano.

Entre 1996 e 1997, o número de estudantes estrangeiros era quase meio milhão. Em

1995, o mercado global para o ensino superior era estimado em 27 bilhões de

dólares (DIAS, 2002, p. 43).

Uma das questões preocupantes envolvida no processo de comercialização da

educação superior refere-se à especialização, padronização e homogeneização do saber, isto é,

à recusa ao diferente, ao plural e ao controle ao acesso, pois saber é poder, conforme defende

Oliveira (2001, p.127):

Nesse processo, vê-se ocorrer uma nova síntese, na qual caminham as

especializações. Desse desencantamento, dessa constituição de práticas que são

saberes e são também poderes, o conhecimento transforma-se em algo que passa a

ser capaz de moldar a própria reprodução da sociedade, que passa a ser moldada

cada vez mais pelo acúmulo e pela radicalização das especializações. É nesse

momento, fatal na aventura do conhecimento, que o conhecimento vai se tornar uma

mercadoria. Este é o seu “calcanhar de Aquiles”. No momento em que as

especializações passam a ser um diálogo circunscrito aos especialistas, no momento

em que elas começam a moldar o próprio comportamento da Humanidade, o

conhecimento deu um passo decisivo e transformou-se em mercadoria. E uma

mercadoria só se reproduz pela sua mimese, pela sua homogeneidade; a mercadoria

recusa a diferença, recusa o diverso, recusa o plural; a mercadoria é univocidade.

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Nesse caminho, o capital apossou-se do conhecimento. Não do conhecimento para a

liberdade, mas do conhecimento como mercadoria, do conhecimento como molde de

produção da sociedade, do conhecimento como controle do acesso aos saberes e

poderes (OLIVEIRA, 2001, p.127).

Dias Sobrinho (2005, p.153) completa acerca do mercado atraente da educação

superior:

Em alguns países, os serviços de educação superior estão entre os cinco principais

itens de exportação e representam no mínimo 3% do total de serviços. Segundo

estudos da OCDE, os Estados Unidos faturam, por ano, somente em matrículas de

estudantes estrangeiros em cursos superiores, algo como 14 bilhões de dólares,

quantia que alcança algo como uma vez e meia a soma dos orçamentos públicos para

a educação superior do conjunto dos países latino-americanos. Calcula-se que o

comércio internacional de educação movimenta cerca de 30 milhões de dólares

anuais somente nos países da ODCE (DIAS SOBRINHO, 2005, p.153).

De fato, o mercado educacional internacional possui cifras expressivas4. Sob o eixo

da transnacionalização do mercado universitário, influencia a condução da política de

educação superior, principalmente, no seu processo de internacionalização.

Ao focar a internacionalização na educação superior, interesse primordial a este

trabalho, é importante esclarecer que a mesma articula-se à tradição da universidade como

contributo acadêmico mútuo. Nessa perspectiva, Dias Sobrinho (2005, p.139) explica:

Por vocação e tradição, a universidade tem sido uma instituição que preserva e

alimenta a dimensão internacional, seja pelo sentido da ciência e pelos critérios de

qualidade e cientificidade, isto é, pelos valores autenticamente acadêmicos, seja

pelas iniciativas práticas de intercâmbio institucionais e mobilidade de estudantes e

professores. [...] Fazem parte da tradição universitária as parcerias e vários tipos de

cooperação que objetivam aumentar a qualidade acadêmica, e a relevância social da

educação superior. O sentido predominante da internacionalização universitária tem

sido ao longo dos tempos o de colaboração acadêmica buscando o avanço da ciência

e da educação (DIAS SOBRINHO, 2005, p.139).

De acordo com Morosini (2006, p.97), o campo de estudos da internacionalização da

educação superior compreende a noção de relações entre nações, políticas, programas de

governo, sistemas e instituições de ensino superior, ressaltando a forma como lidam com o

sistema internacionalizado (MOROSINI, 2006).

A internacionalização da educação superior pode contribuir para desenvolver

habilidades interculturais, ampliação das vertentes do conhecimento acadêmico, visão

4 Como exemplo, podemos citar o próprio Programa Ciência sem Fronteiras, objeto de estudo dessa dissertação,

que teve como orçamento inicial o valor de R$3,1 bilhões, conforme pronunciamento da presidente Dilma

Rousseff, na reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social realizada em julho de 2011 (Jornal

Valor Econômico, 2011).

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holística do saber e larga vivência pessoal com objetivo de solidariedade mútua, de maior

tolerância entre povos e cooperação mundial.

Por quê? Azevedo e Catani (2012, p.274) esclarecem:

Isso porque a circulação de ideias e a educação, inclusive a superior,

necessariamente, implicam em compartilhamento de cultura e de conhecimento. Isso

pode ocorrer tanto em nível restrito, para as elites, quanto de maneira ampla, sem

discriminação de classes; tanto em plano nacional, com vista à unificação, como

internacional, para a promoção da solidariedade entre os povos. Assim, conceber

“cultura como civilidade” e “cultura como solidariedade”, de acordo com Eagleton

(2000, p.112), pode significar somente a reunião de “inimigos jurados”; porém,

também pode, de forma inversa, transformar essas junções (cultura/civilidade e

cultura/solidariedade) em potentes “aliados” (AZEVEDO; CATANI, 2012, p.274).

A categoria contradição contribui para analisar o fenômeno da

internacionalização de educação superior, mostrando os sentidos opostos presentes: “[...] o

sentido humanista da solidariedade e da civilidade, ou sentido coisificante da expansão

capitalista e da mercadorização (commodification).” (AZEVEDO; CATANI 2012, p.274).

Conforme já analisado, as políticas globais afetam as políticas de educação superior,

tendendo a tratar a educação como mercadoria, o que gera pressão para que as exigências do

mercado se sobreponham aos ideais da cooperação internacional solidária. Sendo assim, as

instituições de educação superior sofrem os efeitos de tais forças, inclinando-se a uma visão

mais pragmática, competitiva, de utilidade e de produção de inovações.

Santos (2011) designa o referido quadro por “transnacionalização do mercado

universitário”, dadas as suas características.

Dias Sobrinho (2005, p.141) explica a distinção entre ambos os conceitos de

internacionalização e de transnacionalização da educação superior:

Uma coisa é a internacionalização da educação superior, fundada na idéia do valor

universal do conhecimento e da formação e expressa pelas diversas formas de

cooperação entre instituições, pesquisadores, professores e estudantes. Isso incide

sobre organizações intergovernamentais, agências de cooperação e programas

institucionais. Coisa diferente é a transnacionalização. Diferentemente da

cooperação internacional, a transnacionalização tem como principais motivações a

competitividade e o lucro (DIAS SOBRINHO, 2005, p.141).

Nesse contexto, sobressai a premissa de que a universidade deve formar um

profissional para atender aos interesses imediatos do mercado de trabalho, do tipo descrito por

Antunes (1999, p.48), com base em Saber e Piore (1984): “um trabalhador mais qualificado,

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participativo, multifuncional, polivalente, dotado de “maior realização no espaço do

trabalho.”

O ponto propulsor que levou a universidade “produtora de conhecimento” para a

“universidade formadora de profissional para o mercado de trabalho” parece ter sido o

estabelecimento do Processo de Bolonha, na década de 1990. O referido processo criou um

Espaço Europeu de Ensino Superior, onde os membros se comprometeram a reformar seus

sistemas de ensino em busca de homogeneização, flexibilidade e competitividade

internacional, visando atender ao objetivo revelado por Dias Sobrinho (2009, p.134):

No fundo, a “Declaração de Bolonha” é o registro formal de um importante processo

que visa criar uma sólida convergência na educação superior europeia, a fim de que

esta responda adequada e eficientemente aos problemas, oportunidades e desafios

gestados pela globalização da economia. Daí a necessidade de adaptar os currículos

às demandas e às características do mercado de trabalho, impulsionar a mobilidade

de estudantes, professores e funcionários e, não menos importante, tornar a educação

superior atraente no mercado global (DIAS SOBRINHO, 2009, p.139).

Na América Latina e Caribe, parece não haver consenso nos entendimentos sobre a

educação superior, conforme o que professa Bolonha. Algumas iniciativas já foram tomadas

no sentido de fortalecimento sul-sul, a exemplo das redes universitárias: Espaço de Encontro

Latino-Americano e Caribenho de Educação Superior (ENLACES), União das Universidades

dos Países Membros do Tratado de Cooperação Amazônica (UNAMAZ) e União das

Universidades da América Latina (UDUAL), dentre outros. Porém, seu desenvolvimento

ainda é incipiente. Consequentemente, as universidades tendem a agir sozinhas e/ou em redes

nacionais para atuar na internacionalização da educação superior.

Devemos entender, enfim, que se trata de um processo permeado por contradições e

embates; portanto, complexo.

A seguir estabeleceremos um marco conceitual sobre a internacionalização da

educação superior a fim de nortear as reflexões sobre o tema.

1.2 A INTERNACIONALIZAÇÃO NAS PESQUISAS ACADÊMICAS

Por conceber o estado da arte5 como um procedimento metodológico fundamental

para apreensão da temática da internacionalização da educação superior, visando identificar o

5 Corroboramos com o conceito de estado da arte definido por Ferreira (2002, p.258) como sendo uma

ferramenta metodológica “[...] de caráter inventariante e descritivo da produção acadêmica e científica sobre o

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42

que estudiosos da área debatem acerca do assunto, identificamos as dissertações e teses do

banco de dados da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e

do banco de dados Domínio Público, biblioteca digital do Ministério de Educação (MEC).

Em ambos os bancos de dados, a pesquisa foi delimitada pela palavra-chave

“internacionalização”, correlacionada com a área de conhecimento educação e/ou educação

superior, sendo desprezadas outras relações existentes, como a da área de conhecimento

administração de empresas internacionais.

É pertinente informar que a pesquisa foi realizada em agosto de 2014, assim,

pesquisas que foram lançadas porventura nos portais eletrônicos posteriores a esse período

não serão encontradas no levantamento.

A pesquisa das dissertações e teses foi realizada apenas em meio eletrônico, sem

delimitar ano de publicação e/ou disponibilização nos portais. Metodologicamente, o

levantamento foi feito em três etapas: 1ª) Identificação das pesquisas; 2ª) Leitura dos

Resumos e download dos arquivos completos; 3ª) Leitura completa das pesquisas.

Na 1ª etapa, buscamos identificar a palavra-chave “internacionalização”, em nível de

Mestrado e Doutorado, por meio da leitura de seus títulos para verificar se pertenciam à área

de educação e/ou educação superior.

Na etapa seguinte, foi feita a leitura dos resumos buscando identificar o foco de

interesse da presente pesquisa, fazendo o download dos arquivos completos daquelas que se

aproximavam do nosso interesse.

Por fim, na 3ª etapa, realizamos uma leitura completa das pesquisas para apreensão

geral do que cada trabalho trazia, principalmente a respeito da internacionalização da

educação superior.

Nesse levantamento, foram identificadas quatro pesquisas no portal da CAPES e

nenhuma no portal Domínio Público- MEC, sendo todas dissertações de mestrados que

traziam algum debate sobre a internacionalização da educação superior.

No Quadro 1, expomos a referência e o objetivo de cada pesquisa.

tema que busca investigar, à luz de categorias e facetas que se caracterizam enquanto tais em cada trabalho e no

conjunto deles, sob os quais o fenômeno passa a ser analisado.”

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43

Quadro 1 - Revisão de literatura no Banco de Teses e Dissertações da CAPES, delimitação da palavra-

chave: internacionalização.

Ano Autor Título Objetivo Geral

2009 Batista, Janaina

Siegler Marques

O processo

de internacionalização das

instituições de ensino

superior: um estudo de caso na

Universidade Federal de

Uberlândia

A realização de um estudo de caso

sobre a dimensão institucional

da internacionalização na

Universidade Federal de Uberlândia

2013 Silva, Stella Maris

Wolff Da

Cooperação acadêmica

internacional da Capes na

perspectiva do Programa

Ciência sem Fronteiras

Nesta pesquisa foi feita uma revisão

dos Programas de Cooperação

Acadêmica Internacional

promovidos pela Coordenação de

Aperfeiçoamento de Pessoal de

Nível Superior (Capes) e na

exploração sobre o potencial desses

programas para contribuir com a

gestão do Programa Ciência sem

Fronteiras.

2013 Feijó, Rosemeri

Nunes

A internacionalização da

educação superior no Brasil:

um estudo de caso de alunos

estrangeiros do Programa de

Pós-Graduação em

Antropologia Social/UFRGS

A presente dissertação analisa o

Programa de Estudantes-Convênio

de Pós-Graduação (PEC-PG),

promovido pela CAPES e CNPq, por

meio do estudo de alunos

estrangeiros contemplados com esta

modalidade de bolsa, tomando o

Programa de Pós-Graduação em

Antropologia Social (PPGAS) da

Universidade Federal do Rio Grande

do Sul como estudo de caso.

2013 Mueller, Cristiana

Verônica

O processo

de internacionalização do

ensino superior: um estudo de

caso da Universidade Federal

do Rio Grande do Sul

A realização de um estudo de caso

sobre a dimensão institucional

da internacionalização na

Universidade Federal do Rio Grande

do Sul.

Fonte: Organizado pela autora, agosto de 2014.

Batista (2009) evidencia que a internacionalização da educação superior está

intrinsecamente ligada à tradição das universidades de promover parcerias e diversas

cooperações, visando aumentar a qualidade acadêmica e a relevância social da educação

superior.

A internacionalização universitária tem sido ao longo dos tempos resultado de

colaboração acadêmica buscando o avanço da ciência e da educação. Por razões

históricas e culturais, os mercados e projetos políticos diferem muito um dos outros,

resultando com isso, diferentes sistemas e instituições de educação superior,

facilitando assim, as estratégias de cooperação universitária, cativando a

internacionalização para objetivos de benefícios econômicos (BATISTA, 2009, p.

48).

Porém, afirma que: “As instituições de educação superior não existem para preparar os

novos conquistadores do mundo, mas fundamentalmente para formar cidadãos.” (BATISTA,

2009, p. 48).

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44

Ao final, a autora conclui que o conceito da internacionalização da educação superior

assumido pela Universidade Federal de Uberlândia se difere do enfoque que liga esse tema ao

setor mercadológico.

[...] a crença que a internacionalização pode ser uma alternativa para intolerância

política e social, além de atuar no auxilio da resolução de grandes problemas globais

(como violência, fome, miséria, uso inadequado de recursos naturais, desastres

ecológicos, etc.) contrariando assim o discurso mundial sobre a internacionalização

como fator preponderante de diferencial curricular e, por consequência profissional

e financeiro (BATISTA, 2009, p. 207).

Silva (2013, p.12), na introdução de seu trabalho, assim se posiciona:

[...] internacionalização é compreendida como inserção e visibilidade da ciência

brasileira apreciada por meio de publicações e revistas e eventos internacionais,

intercâmbio de estudantes e pesquisadores e realização de projetos conjuntos de

pesquisa, bem como a intensidade de programas de cooperação acadêmica (SILVA,

2013, p.12).

A autora, ao correlacionar a internacionalização da educação superior com o

Programa CsF, afirma:

Pode se depreender que a proposta do Programa Ciência sem Fronteiras, combina o

desenvolvimento da ciência, tecnologia e inovação em temas de interesse nacional,

como o processo de internacionalização, inclusive para atender a demanda reprimida

de qualificação de pessoal nessas áreas (SILVA, 2013, p.62).

Nesse sentido, demonstra sua compreensão de que o motivo de criação do Programa

CsF é “atender a demanda reprimida de qualificação de pessoal”, utilizando-se do processo de

internacionalização para esse fim.

Feijó (2013, p.36), por sua vez, faz relação entre os conceitos de globalização e de

internacionalização do ensino superior. A autora se baseia em Altbach e Knight (2007) para

expor que, apesar dos conceitos se inter-relacionarem, há distinções:

[...] podemos entender a globalização como um fenômeno mais abrangente, não se

referindo apenas a educação, mas também à economia e à cultura, envolvendo

acordo comerciais; enquanto a internacionalização relaciona-se com as práticas

exercidas no âmbito da educação por governos e instituições. Mas, se por um lado, a

internacionalização aparece como um fenômeno altamente valorizado no universo

acadêmico, alguns autores sugerem que não se pode perder de vista que tal

fenômeno se expandiu de forma vinculada ao processo de globalização; assim, a

lógica capitalista – que em certo sentido o orienta – também se faz presente no

processo de internacionalização (FEIJÓ,2013, p.36).

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45

A autora ainda cita que Knigth tem refletido acerca das possíveis consequências da

internacionalização como fuga de cérebros e mercantilização da educação, mas afirma que

essa preocupação “[...] está além dos limites e objetivos da discussão desta dissertação.”

(FEIJÓ, 2013, p.36). Porém, prevalece em seu texto a aceitação da internacionalização da

educação superior como processo de atendimento “[...] as exigências de suas comunidades, do

mercado de trabalho e das ações decorrentes do processo de integração” (FEIJÓ, 2013, p.38).

Por fim, Mueller (2013, p.26) adota o enfoque teórico de Knigth e privilegia a

dimensão institucional. Nesse ponto, esclarece:

A dimensão institucional é um elemento que compõe as novas interpretações

conceituais do processo de internacionalização do ensino superior. A gestão das

universidades se depara com um novo paradigma de criar uma cultura voltada à

cooperação internacional e de desenvolver ações voltadas ao desenvolvimento deste

processo de amplitude internacional assim como consolidar o espaço universitário

como local de difusão de saber global (MUELLER, 2013, p.26).

A autora ainda afirma:

Assim, a internacionalização surge em decorrência da globalização e se dá por

meio da criação de políticas e estratégias institucionais que possibilitam a

interação internacional de novos atores sociais baseados no domínio do

conhecimento (MULLER, 2013, p. 24).

Desta feita, podemos inferir que Mueller adota uma definição híbrida ou

contraditória para internacionalização, visando à solidariedade, e, no oposto, a

mercantilização da educação superior.

A partir do que foi exposto, podemos destacar sinteticamente as seguintes

predominâncias nos estudos:

- Evidência da inter-relação entre os conceitos globalização e internacionalização da

educação superior, por meio da afirmação de que esses conceitos são distintos, mas se

retroalimentam, pois a globalização vê na internacionalização um meio para atender sua

demanda por quadros profissionais com elevados níveis de qualificação e especialização; e a

internacionalização da educação superior vê a globalização como uma fonte de fomento para

sua expansão, mesmo que mercantilista; consequentemente, ambos atendem ao sistema

reprodutivo do capital.

- O conceito da internacionalização da educação superior possui distintas perspectivas

teóricas, prevalecendo a de que se trata de um processo complexo, dinâmico, trazendo as

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instituições de educação superior a responsabilidade de promover ações pragmáticas de

resposta às demandas do sistema global baseados no domínio do conhecimento.

- O conceito de internacionalização da educação superior sofreu alterações

convenientes para o sistema capitalista, não esse sendo motivo de questionamento por parte

das dissertações levantadas.

A partir disso, considerando a limitação de enfoques conceituais nas teses e

dissertações, direcionamo-nos para buscar as referências autorais dos referidos trabalhos na

perspectiva do tema “internacionalização da educação superior”.

1.3 CONCEITO DA INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR

Tendo realizado no item 1.2 um levantamento sobre as pesquisas que tratam do tema

“internacionalização” correlacionado com a área de conhecimento educação e/ou educação

superior no banco de dados da CAPES e no banco de dados Domínio Público, destacamos a

seguir as principais concepções sobre a internacionalização da educação superior, que se

apresentaram como referência para os autores das quatro pesquisas selecionadas no Banco de

Dissertações da CAPES.

Esquematicamente, o Quadro 2 apresenta o referido levantamento, sendo

considerado o ano de publicação da obra referenciada, o autor referenciado, a definição de

internacionalização apresentada e a fonte da citação, ou seja, da dissertação extraída do banco

de dados da CAPES.

Quadro 2 - Delimitação das concepções sobre a internacionalização da educação superior

Ano

Autor da

ideia A definição Fonte da citação

1994 Knight

[...] a internacionalização nas IES é ampla e constitui-se

num processo no qual se integra uma dimensão

internacional/intercultural ao ensino, pesquisa e aos

serviços de uma instituição. De acordo com a

perspectiva desta autora, a internacionalização é um

processo dinâmico que ultrapassa a simples realização

de atividades no âmbito internacional, até então

consideradas indicadores da internacionalização das

universidades. Muller, 2013, p. 25

1994

Brasil, Lei

de

Diretrizes

e Bases da

Educação.

A Lei de Diretrizes e Bases – LDB (art. 43) conceitua a

internacionalização como uma estratégia para

“promover a divulgação de conhecimentos culturais,

científicos e técnicos que constituem como patrimônio

da humanidade e comunicar o saber por meio do ensino, Silva, 2013, p. 11

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47

de publicações ou de outras formas de comunicação”.

1998 De Witt

De Witt (1998) destaca que a internacionalização é um

processo e ao mesmo tempo uma resposta à

globalização, mas não deve ser confundida com a

globalização por ela mesma. Internacionalização inclui

tanto aspectos locais como internacionais, bem como

elementos interculturais. Feijó, 2013, p. 35

2001

Van Der

Wende

Na perspectiva de Van der Wende (2001) é importante

que a internacionalização não seja caracterizada como

um fim em si, mas, um meio de atingir outros objetivos

específicos do ensino superior. Muller 2013, p. 25

2002

Marginson

e Rhoades

Para os autores Marginson e Rhoades (2002), a

internacionalização é definida como a globalização do

ensino superior, uma vez que as relações universitárias

e a criação de sistemas integrados são realizados além

do espaço nacional. Muller 2013, p. 25

2003

Gacel-

Ávila

Conforme Gacel-Ávila (2003), a internacionalização da

educação passou a ganhar espaço no século XX e

esteve originalmente vinculada ao movimento de

paz e relação de entendimento entre as pessoas. Muller 2013, p.24

2003 Qiang

Para Qiang (2003), é certo que o elemento chave do

termo internacionalização é a noção existente entre

nações e identidades culturais e por isso a

internacionalização do ensino superior é vista como uma

forma de um país responder ao impacto da

globalização. Muller 2013, p. 24

2003 Bartell

Segundo Bartell (2003), a internacionalização é um

processo avançado de trocas internacionais

decorrentes da realidade global. Muller 2013,p. 25

2004 Sebastián

Segundo Sebastián (2004, p. 16) , este é “um processo

de introdução da dimensão internacional na cultura e

estratégia institucional, em suas funções de

formação, pesquisa e extensão e também na projeção

de sua oferta e capacidade instalada.” Muller 2013, p.26/27

2004 Laus

Em um sistema fortemente regulamentado e

centralizado, o processo de internacionalização se inicia

de maneira induzida e em atenção às prioridades do

Estado se concretiza com uma ação concertada entre o

governo e as instituições em busca da criação de massa

crítica para impulsionar o desenvolvimento nacional

(LAUS, 2004). Batista 2013, p. 39

2004 Knight

[...] “the process of integrating an international,

intercultural or global dimension into the purpose,

functions or delivery of post-secondary education.”

Knight (2004, p. 11). Muller 2013, p.18

2005 Knight

Segundo esta perspectiva, a internacionalização é um

processo que leva as universidades a alterações em

toda sua estrutura organizacional e curricular, seus

regimes acadêmicos e suas relações com o exterior,

sendo que é no nível institucional o espaço onde

acontece o verdadeiro processo de

internacionalização (Knight, 2005). Muller 2013,p.18

2009 Altbach

Segundo a definição de Altbach (2009), existe

proximidade desses processos ao afirmar que a

globalização é uma realidade do século XXI

moldada pela economia mundial integrada pelas

novas tecnologias de comunicação e informação e

pelo surgimento de uma rede internacional do

conhecimento; já a internacionalização é definida Muller 2013, p.23

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48

como a variedade de políticas e programas que as

universidades e os governos implementam para

responder à globalização.

2010 De Witt,

Para De Wit (2010), esta mudança de compreensão do

papel estratégico da internacionalização nas IES

ocorrida ao longo dos últimos 25 anos, demonstra a

alteração deste enquanto processo meramente reativo

a um formato planejado na dimensão institucional,

nacional e internacional. Muller 2013, p. 27

Fonte: Organizado pela autora com base no Banco de Teses e Dissertações da CAPES, grifo nosso.

Fica evidenciado que as definições correspondem, em sua maioria, à ideia de que a

internacionalização da educação superior é um processo complexo, dinâmico, imputando às

instituições de educação superior a responsabilidade de promover ações pragmáticas, como

resposta às chamadas demandas da globalização.

De Wit (2002) adverte sobre o cuidado que se deve ter no uso do conceito da

internacionalização da educação superior:

[...] à medida que a dimensão internacional da educação superior ganha mais atenção

e reconhecimento, as pessoas tendem a usar o termo da forma que melhor satisfaça

aos seus propósitos. Uma definição mais focada é necessária para ser entendida com

a importância que ela merece. Mesmo se não houver concordância sobre a

definição, a internacionalização precisa ter parâmetros para ser avaliada e, portanto,

contribuir com a educação superior. Este é o motivo pelo qual o uso de uma

definição em construção com uma estrutura conceitual é relevante para

internacionalização do ensino superior. (DE WIT 2002, p.114).

Nesse sentido, acatamos o entendimento de Knigth (2010, s.p):

Internacionalização é um termo que significa diferentes coisas para diferentes

pessoas. Para alguns, significa uma série de atividades como a mobilidade

acadêmica para estudantes e professores; redes internacionais, associações e

projetos; novos programas acadêmicos e iniciativas de pesquisa. Para outros,

significa a transmissão de educação a outros países, através de novas disposições,

como as sucursais de universidades ou franquias, usando uma variedade de técnicas

presenciais e à distância. Para muitos, significa a inclusão de uma dimensão

internacional, intercultural e/ou global dentro do currículo e o processo de ensino-

aprendizado. Ainda outros veem a internacionalização como centros regionais de

educação, hot spots, aldeias de conhecimento. Os projetos de desenvolvimento

internacionais foram percebidos tradicionalmente como parte da internacionalização

e, mais recentemente, o aumento da ênfase no comércio da educação superior

também está sendo visto como internacionalização. Logo, a internacionalização é

interpretada e utilizada de maneira diferente nos países ao redor do mundo

(KNIGTH, 2010, s.p).

Portanto, este trabalho tratará a ideia de internacionalização da educação superior

como um processo. Isso se traduz em que “O sufixo "-ização" significa que a

internacionalização é um processo ou um meio de aprimorar ou atingir metas.” (KNIGTH,

2010, s. p), sendo assim, depende de qual meta se quer atingir. No caso da internacionalização

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da educação superior, ao referir à categoria contradição, pode assumir sentidos opostos: “[...] o

sentido humanista da solidariedade e da civilidade, ou sentido coisificante da expansão

capitalista e da mercadorização (commodification).” (AZEVEDO; CATANI, 2012, p.274).

Por entender que a internacionalização é um processo vocacional das instituições da

educação superior, retomamos Dias Sobrinho (2005, p.141), com o qual concordamos que a

internacionalização da educação superior se difere da transnacionalização da educação

superior.

Neste sentido, ao nos referir ao termo internacionalização da educação superior,

evocamos o sentido do “valor universal do conhecimento” pela solidariedade e, ao nos referir

à transnacionalização da educação superior, aludimos ao sentido mercantil.

É importante ressaltar, mais uma vez, a categoria contradição, pois muitos discursos

dos sujeitos sociais envolvidos se utilizam do termo internacionalização da educação superior

para ocultar sua essência de transnacionalização.

Isso considerando, o segundo capítulo aprofunda acerca da internacionalização da

educação superior no contexto das políticas brasileiras.

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2. A INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL

Neste capítulo, tratamos de aspectos relacionados aos processos de

internacionalização da educação superior brasileira. Primeiramente, discorremos, numa

perspectiva histórica, como se caracterizou a implementação da internacionalização da

educação superior desde o período colonial até a nova república, fazendo a correlação com os

principais dispositivos legais da educação, com foco na educação superior. Esse trajeto é

importante, na medida em que evidencia como se desenvolveu a internacionalização da

educação superior no Brasil. Posteriormente, será realizada uma breve interface com as

influências de organismos internacionais na consolidação das políticas educacionais

brasileiras. Trata-se da necessidade de compreender as medidas impostas pelo Estado que

afetam a realidade concreta, evidenciando, sobretudo, como o sistema capitalista atua sobre a

questão, segundo seus interesses, considerando certo período histórico.

2.1 A INTERNACIONALIZAÇÃO NAS POLÍTICAS DE EDUCAÇÃO SUPERIOR

BRASILEIRA

É possível observar, de certo modo, os primeiros indícios da internacionalização nas

políticas de educação superior brasileira desde o período colônia, quando cabia a Portugal ou

outros centros europeus a formação da elite brasileira no ensino superior. Marquês de Pombal,

ministro da Fazenda do rei D. José I, promoveu as Reformas Pombalinas6 com vista a

transferir a responsabilidade do ensino dos jesuítas para a Coroa Portuguesa. Nesse sentido,

conforme Amaral e Seco (s.d., p.9):

Quem tinha condições de cursar o ensino superior enfrentava os perigos das viagens,

para frequentar a Universidade de Coimbra ou outros centros europeus. Como as

"Reformas Pombalinas" visavam transformar Portugal numa metrópole como a

Inglaterra, a elite masculina deveria buscar respaldo fora, para poder servir melhor

na sua função de articuladora dos interesses da camada dominante (AMARAL;

SECO, s.d., p.9).

Fávero (2006, p.20) complementa:

6 Texto sobre Reformas Pombalinas (MACIEL; SHIGUNOV NETO, 2006).

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51

Portanto, não seria exagero inferir que Portugal exerceu, até o final do Primeiro

Reinado, grande influência na formação de nossas elites. Todos os esforços de

criação de universidades, nos períodos colonial e monárquico, foram malogrados, o

que denota uma política de controle por parte da Metrópole de qualquer iniciativa

que vislumbrasse sinais de independência cultural e política da Colônia (FÁVERO,

2006, p. 20).

Fávero (2006), em “A universidade no Brasil: das origens à reforma universitária de

1968”, discorre sobre as muitas tentativas de criação de universidades brasileiras desde o

Brasil Colônia (1530-1815), o Brasil Império (1822-1889) ao Brasil da Primeira República

(1890-1930). A autora informa que a Universidade do Rio de Janeiro (URJ) foi a primeira

universidade oficialmente criada pelo Governo Federal, em 1920. Ainda discorre sobre a

criação do Ministério de Educação e Saúde Pública, em 1930, bem como a criação da

Universidade de São Paulo (USP), em 1934, e da Universidade Distrito Federal (UDF), em

1935, a qual é importante destacar, tendo em vista um sinal da internacionalização nas

políticas de educação superior brasileira. Fávero (2006) informa que a formação do corpo

docente desta instituição se dá pela busca “[...] na Europa [de] professores para aquelas áreas

em que se considerava não haver, no Brasil, profissionais suficientemente preparados.”

(FÁVERO, 2006, p.26).

A autora ainda esclarece que “[...] de 1935 a 1945, a criação da Faculdade de

Filosofia, Ciências e Letras da USP e da Escola de Ciências da UDF [...] tiveram o mérito de

integrar, desde o início, estudiosos e cultores da ciência [...].” Destaca o pensamento de Paim

(1982, p.80-81), ao vincular pesquisa e intercâmbio internacional:

Como bem assinala Paim, a Escola de Ciências da UDF e a Faculdade Nacional de

Filosofia não apenas formaram os docentes das ciências exatas, mas prepararam

diversos pesquisadores que passaram a integrar os quadros do Instituto Oswaldo

Cruz, do Museu Nacional, do Departamento Nacional de Produção Mineral e do

Instituto de Tecnologia. O intercâmbio com instituições estrangeiras, a

participação em seminários e simpósios começam a fazer parte do trabalho dos

cientistas e pesquisadores, já agora de forma institucional (PAIM, 1982, p. 80-

81 apud FÁVERO, 2006, p. 28/29, grifo nosso).

A internacionalização da educação superior de forma institucional se configura com

a criação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da

Campanha Nacional de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (atual Capes –

Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) em 1951.

Antes de tratarmos da criação desses dois órgãos, é importante contextualizar o

aspecto sociopolítico da época. A propósito, ao evocarmos o pensamento sobre a universidade

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52

e suas ações, funções e organização, é imperativo apropriar-nos da categoria totalidade, que

contribui no sentido de considerar o contexto de inserção e as relações que se estabelecem.

Nesse sentido, Fávero (2006, p.18/19) expressa:

Para tanto, faz-se necessário ter conhecimento de sua realidade, criação e

organização, como funciona e se desenvolve, quais as forças que podem ser

mobilizadas a fim de empreender as mudanças almejadas. Todavia, tal

empreendimento não se faz sem relacionar essa instituição [universidade] com o

conjunto da sociedade, na ótica de sua dimensão política. O ponto de partida para

qualquer discussão sobre universidade não poderá ser, portanto, “o fenômeno

universitário” analisado fora de uma realidade concreta, mas como parte de uma

totalidade, de um processo social amplo, de uma problemática mais geral do país

(FÁVERO, 2006, p. 18/19).

Nessa perspectiva, a década de 1950 assim pode ser caracterizada:

[...] o início do segundo governo Vargas, e a retomada do projeto de construção de

uma nação desenvolvida e independente era palavra de ordem. A industrialização

pesada e a complexidade da administração pública trouxeram à tona a necessidade

urgente de formação de especialistas e pesquisadores nos mais diversos ramos de

atividade: de cientistas qualificados em física, matemática e química a técnicos em

finanças e pesquisadores sociais (CAPES, 2014).

Por conseguinte, o CNPq e a Capes foram criados com o objetivo de atender a

necessidade de formação de especialistas e pesquisadores para o então projeto de

desenvolvimento do país.

Os dois principais órgãos de fomento nacionais possibilitaram financiamento para

práticas de relações internacionais na pós-graduação, de acordo com o exposto por Morosini

(2008, p.293):

No Brasil a internacionalização da educação superior sempre veio acoplada ao

desenvolvimento dos programas de pós-graduação. Esses são fomentados pela

cooperação internacional apoiada pelas duas principais agências governamentais – o

Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a

Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

(MOROSINI, 2008, p.293).

A referida autora ainda esclarece que “O CNPq [...] vem apoiando a formação de

recursos humanos [...] e a pesquisa científica [...]. E a Capes volta-se, prioritariamente, à

capacitação de recursos humanos, via programas de pós-graduação.” (MOROSINI, 2008,

p.294).

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53

De acordo com a Lei 1.310, de 15 de janeiro de 1951, que criou o CNPq, as

competências desse Conselho são:

a) promover investigações científicas e tecnológicas por iniciativa própria, ou em

colaboração com outras instituições do país ou do exterior;

b) estimular a realização de pesquisas científicas ou tecnológicas em outras

instituições oficiais ou particulares, concedendo-lhes os recursos necessários, sob a

forma de auxílios especiais, para aquisição de material, contrato e remuneração de

pessoal e para quaisquer outras providências condizentes com os objetivos visados;

c) auxiliar a formação e o aperfeiçoamento de pesquisadores e técnicos, organizando

ou cooperando na organização de cursos especializados, sob a orientação de

professores nacionais ou estrangeiros, concedendo bolsas de estudo ou de pesquisa e

promovendo estágios em instituições técnico-científicas e em estabelecimentos

industriais no país ou no exterior;

d) cooperar com as universidades e os institutos de ensino superior no

desenvolvimento da pesquisa científica e na formação de pesquisadores;

e) entrar em entendimento com as instituições, que desenvolvem pesquisas, a fim de

articular-lhes as atividades para melhor aproveitamento de esforços e recursos;

f) manter-se em relação com instituições nacionais e estrangeiras para

intercâmbio de documentação técnico-científica e participação nas reuniões e

congressos, promovidos no país e no exterior, para estudo de temas de interesse

comum;

g) emitir pareceres e prestar informações sobre assuntos pertinentes às suas

atividades e que sejam solicitados por órgão oficial;

h) sugerir aos poderes competentes quaisquer providências, que considere

necessárias à realização de seus objetivos (BRASIL, 1951, grifo nosso).

Por sua vez, o Decreto nº 29.741, de 11 de Julho de 1951, que institui a CAPES,

determina que a comissão deva:

a) promover o estudo das necessidades do país em matéria de pessoal

especializado, particularmente nos setores onde se verifica escassez de pessoal em

número e qualidade;

b) mobilizar, em cooperação com as instituições públicas e privadas, competentes,

os recursos existentes no país para oferecer oportunidades de treinamento, de modo

a suprir as deficiências identificadas nas diferentes profissões e grupos profissionais;

c) promover em coordenação com os órgãos existentes o aproveitamento das

oportunidades de aperfeiçoamento oferecidas pelos programas de assistência

técnica da Organização das Nações Unidas, de seus organismos especializados e

resultantes de acordos bilaterais firmados pelo Governo brasileiro;

d) promover, direta ou indiretamente, a realização dos programas que se

mostrarem indispensáveis para satisfazer às necessidades de treinamento que não

puderem ser atendidas na forma das alíneas precedentes;

e) coordenar e auxiliar os programas correlatos levados a efeito por ógãos da

administração federal, governos locais e entidades privadas;

f) promover a instalação e expansão de centros de aperfeiçoamentos e estudos

pós-graduados (BRASIL, 1951, grifo nosso).

Evidencia-se assim, o trato da internacionalização da educação superior de forma

institucional, vinculado à pesquisa e à pós-graduação.

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Podemos citar, ainda, a título de exemplo, o que é divulgado sobre a história da

Capes:

Em 1953, é implantado o Programa Universitário, principal linha da Capes junto às

universidades e institutos de ensino superior. Teixeira7 contrata professores

visitantes estrangeiros, estimula atividades de intercâmbio e cooperação entre

instituições, concede bolsas de estudos e apoia eventos de natureza científica

(CAPES, 2014).

Continuando a síntese histórica dos fatos relacionados ao tema da

internacionalização da educação superior, retomamos o período ditatorial imposto pelo golpe

militar (1964-1985), o que já foi introduzido no capítulo anterior, para esclarecer sobre as

medidas adotadas com relação à universidade brasileira nessa época.

Fávero (2006, p. 30) destaca a três medidas nesse sentido:

[...] o plano de assistência técnica estrangeira, consubstanciado pelos acordos

MEC/USAID [Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional]; o Plano Atcon (1966) e o Relatório Meira Mattos (1968). Concebida como estratégia

de hegemonia, a intervenção da USAID na América Latina se processa de modo

integrado, nos anos 60, em várias áreas e sob três linhas de atuação: assistência

técnica; assistência financeira, traduzida em recursos para financiamento de projetos

e compra de equipamentos nos EUA, além da assistência militar, concretizada pela

vinda de consultores militares norte- americanos ao Brasil e do treinamento de

militares brasileiros nos Estados Unidos, assim como do fornecimento de

equipamentos militares [...] (FÁVERO 2006, p.30).

Dias (2012, p.58 apud UNESCO, 2012) assevera:

Quanto ao modelo dos Estados Unidos, realmente, não há mais o que se aprender

com ele. O que o modelo tinha de bom (a dinâmica e a flexibilidade do sistema de

créditos, por exemplo) e de ruim (sobretudo o conteúdo padronizado) foi aplicado

no Brasil com as leis de 1968. (DIAS, 2012, p.58 apud UNESCO, 2012).

Fica evidente a profunda participação dos Estados Unidos durante a ditadura militar,

em várias áreas. Na educação superior isso se evidenciou por meio da Lei Nº 5.540, de 28 de

novembro de 1968, conhecida como Reforma Universitária de 1968.

Martins (s.d. p.16) caracteriza a Reforma Universitária de 1968 como produtora de

efeitos paradoxais no ensino superior brasileiro:

Por um lado, modernizou uma parte significativa das universidades federais e

determinadas instituições estaduais e confessionais, que incorporaram gradualmente

7 Anísio Teixeira foi o primeiro secretário-geral da Capes, de 1951 a 1964. (BRASIL/Capes, disponível em: <

http://www.capes.gov.br/historia-e-missao>. Acesso em: 09 set.2014.).

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as modificações acadêmicas propostas pela Reforma. Criaram-se condições

propícias para que determinadas instituições passassem a articular as atividades de

ensino e de pesquisa, que ate então – salvo raras exceções – estavam relativamente

desconectadas. Aboliram-se as cátedras vitalícias, introduziu-se o regime

departamental, institucionalizou-se a carreira acadêmica, a legislação pertinente

acoplou o ingresso e a progressão docente à titulação acadêmica. [...] por outro lado,

abriu condições para o surgimento de um ensino privado que reproduziu o que

Florestan Fernandes denominou o antigo padrão brasileiro de escola superior, ou

seja, instituições organizadas a partir de estabelecimentos isolados, voltados para a

mera transmissão de conhecimentos de cunho marcadamente profissionalizante e

distanciados da atividade de pesquisa, que pouco contribuem com a formação de um

horizonte intelectual crítico para a análise da sociedade brasileira e das

transformações de nossa época [...] (MARTINS, s.d., p.16).

No documento da Reforma Universitária de 1968, não se localiza menção à acerca da

internacionalização da educação superior, mas vale destacar por Martins (s.d., p.26/27) o

pensamento de Currie e Newson (1998, s. p.) sobre os sinais da transnacionalização nesse

nível de ensino:

No processo de escalada da privatização, algumas instituições particulares de perfil

comercial romperam as fronteiras regionais, associaram-se comercialmente com

estabelecimentos estrangeiros, colocaram ações na bolsa de valores e, mais

recentemente, passaram a atuar em outros países (CURRIE; NEWSON, 1998, s. p.

apud MARTINS, s.n., p.26/27).

Após a Reforma Universitária de 1968, outro importante documento a ser citado é a

Constituição Brasileira de 1988, já na Nova República (1985 até dias de hoje), que Castro

(2008, p.1) resumidamente, assim explicita:

Os anos que se seguiram ao fim do regime militar foram marcados por grande

entusiasmo democrático. Após longo período de restrições às liberdades civis e

políticas, iniciava-se uma nova fase histórica no Brasil, cujo traço essencial seria,

conforme sentimento bastante difundido entre as elites intelectuais e políticas, a de

uma participação mais ativa dos cidadãos e da sociedade na condução dos rumos do

País. Desse modo, o atraso e as contradições nacionais poderiam, finalmente, ser

enfrentados e superados, ainda que à custa de muita determinação e esforço.

Embora a realidade dos fatos acabasse por revelar a ingenuidade dessa visão, a

convocação e os trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte (ANC) abriram

espaço para novo otimismo em relação ao futuro imediato da nação. Naturalmente,

logo os embates no seio da ANC evidenciaram, mais uma vez, a verdadeira natureza

do jogo político e dos diferentes interesses que o anima. No entanto, o ambiente era

fortemente favorável a que os direitos civis, políticos e sociais fossem os mais

amplos possíveis. Nasceu, desse modo, o vigor com o qual o texto constitucional de

1988 estipulou os direitos à educação (CASTRO, 2008, p.1, grifo nosso).

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Na Constituição de 1988, podemos cogitar em seu preâmbulo o sentido humanista e

de civilidade nas relações internacionais, visto pautar-se na ordem internacional como solução

pacífica das controvérsias:

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional

Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício

dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o

desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade

fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e

comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das

controvérsias [...] (BRASIL, 1988).

Outro destaque refere-se à Emenda Constitucional de 30/04/1996, que oficializa a

possibilidade de admissão de estrangeiros pelas universidades: “Permite a admissão de

professores, técnicos e cientistas estrangeiros pelas universidades brasileiras e concede

autonomia às instituições de pesquisa científica e tecnológica.” (BRASIL, 1996).

Igualmente, um documento a ser destacado é a Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional (LDB), nº 9.394/96, de 20 de dezembro de 1996, que, da mesma forma, não registra

explicitamente sobre a política de internacionalização da educação brasileira. Porém,

podemos frisar o Art.48, como segue:

Art. 48. [...] § 2o Os diplomas de graduação expedidos por universidades

estrangeiras serão revalidados por universidades públicas que tenham curso do

mesmo nível e área ou equivalente, respeitando-se os acordos internacionais de

reciprocidade ou equiparação. § 3o Os diplomas de mestrado e de doutorado

expedidos por universidades estrangeiras só poderão ser reconhecidos por

universidades que possuam cursos de pós- graduação reconhecidos e avaliados, na

mesma área de conhecimento e em nível equivalente ou superior (BRASIL, 1996).

Conforme o referido artigo, fica estipulado que apenas as universidades públicas

podem revalidar diplomas obtidos no exterior, notificando mais uma vez que a

operacionalização das ações da internacionalização da educação superior é na esfera

institucional das universidades públicas.

Há de referenciar que a LDB consolidou a reforma da educação brasileira, conforme

afirma Aguiar (2010, p.721):

Essa reforma altera a estrutura legal, as diretrizes e bases do modelo instaurado com

a reforma universitária de 1968. Neste contexto, a LDB favorece as mudanças na

organização acadêmica, no padrão de avaliação, de financiamento, de gestão, de

currículo e de produção do trabalho acadêmico, com amplas repercussões, no campo

universitário e na identidade das IES. (AGUIAR, 2010, p.721).

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Morosini (2008, p. 287), igualmente, expõe que a LDB foi um marco no sistema

educacional brasileiro:

A LDB nº 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), de 20 de

dezembro de 1996, foi um dos marcos normativos dessa mudança. Hoje, estamos

diante de um sistema complexo e diversificado pendendo para um modelo híbrido,

heterônimo e neoprofissional (Sguissardi, 2003), em um sistema de educação

superior caracterizado pela: concentração em regiões desenvolvidas do país;

expansão; privatização; centralização da avaliação de IES e/ou de cursos; e, mais

recentemente, pela internacionalização da educação superior (MOROSINI, 2008,

p.287).

Ao suscitar sobre a Constituição Federal (CF) de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional (LDB) de 1996, é preciso analisar o Plano Nacional de Educação

(PNE), que é ancorado nessas duas legislações. O art.214 da CF promulga que é a lei que

estabelecerá o Plano Nacional de Educação, e a LDB determina que no prazo de um ano, após

sua publicação, a União deverá encaminhar o referido Plano ao Congresso Nacional.

De acordo com a Emenda Constitucional n.º59, de 2009, o Plano Nacional de

Educação deve ser:

[...] de duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação

em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de

implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus

diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes

públicos das diferentes esferas federativas (BRASIL, 2009).

Na Lei no 10.172, de 9 de janeiro de 2001, é aprovado o PNE 2001 – 2010, o qual no

item sobre Educação Superior indica as seguintes diretrizes:

Nenhum país pode aspirar a ser desenvolvido e independente sem um forte sistema

de educação superior. Num mundo em que o conhecimento sobrepuja os recursos

materiais como fator de desenvolvimento humano, a importância da educação

superior e de suas instituições é cada vez maior. [...] A importância que neste plano

se deve dar às Instituições de Ensino Superior (IES), mormente à universidade e aos

centros de pesquisa, erige-se sobre a constatação de que a produção de

conhecimento, hoje mais do que nunca e assim tende a ser cada vez mais é a base

do desenvolvimento científico e tecnológico e que este é que está criando o

dinamismo das sociedades atuais. As IES têm muito a fazer, no conjunto dos

esforços nacionais, para colocar o País à altura das exigências e desafios do Séc.

XXI, encontrando a solução para os problemas atuais, em todos os campos da vida e

da atividade humana e abrindo um horizonte para um futuro melhor para a sociedade

brasileira, reduzindo as desigualdades. [...] Esse núcleo estratégico [as

universidades] tem como missão contribuir para o desenvolvimento do País e a

redução dos desequilíbrios regionais, nos marcos de um projeto nacional. Por esse

motivo, estas instituições devem ter estreita articulação com as instituições de

ciência e tecnologia – como aliás está indicado na LDB (art. 86). No mundo

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contemporâneo, as rápidas transformações destinam às universidades o desafio de

reunir em suas atividades de ensino, pesquisa e extensão, os requisitos

de relevância, incluindo a superação das desigualdades sociais e

regionais, qualidade e cooperação internacional. [...] Finalmente, é necessário rever

e ampliar, em colaboração com o Ministério da Ciência e Tecnologia e com as

Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa, a política de incentivo à pós-graduação

e à investigação científica, tecnológica e humanística nas universidades (BRASIL,

2001, grifo nosso).

Dessas diretrizes, é possível interpretar que a cooperação internacional é considerada

como requisito de relevância, como um “algo a mais” a ser alcançado pelas universidades,

associando-a às atividades de ensino, pesquisa e extensão, visando contribuir para o

desenvolvimento do País e a redução dos desequilíbrios regionais. Ou seja, utilização da

educação com meio para aspiração do país desenvolvido, justificando que a produção do

conhecimento é hoje a base do desenvolvimento científico e tecnológico, propulsor para uma

sociedade desenvolvida.

Vale recordar (conforme tratado no capítulo 1) que o neoliberalismo insere-se no

Brasil a partir de 1990, por meio dos projetos políticos presididos por Fernando Collor (1990-

1992), Itamar Franco (1992-1994) e Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), promovendo

alterações no modelo econômico, sobretudo com privatizações e diminuição de participação

do Estado na prestação de serviços públicos. Apesar da primeira proposta do PNE ter sido

apresentada pelas representações de associação civil organizada da sociedade brasileira, ela

não foi aprovada, como cita Bonamigo et al. (2012, p.2):

Esta proposta apresentada à Câmara, entretanto, não foi encaminhada, tampouco

aprovada. De 1998 a 2000, o governo de Fernando Henrique Cardoso alterou e

adequou o Plano ao ideário partidário hegemônico daquele período. Somente no

início de 2001 foi aprovado o Plano Nacional da Educação - PNE pela Lei n° 10.172

de 10/01/2001, com vários vetos, em especial, a emenda que propunha o

investimento de 10% do Produto Interno Bruto em educação (BONAMIGO et al.,

2012, p.2).

Justifica-se, assim, nas diretrizes do PNE aprovado em 2001 que as universidades

“[...] tem como missão contribuir para o desenvolvimento do País e a redução dos

desequilíbrios regionais, nos marcos de um projeto nacional.” (BRASIL, 2001), sendo a

cooperação internacional uma das alternativas para esse fim.

Ainda sobre o contexto sociopolítico, evocamos a afirmação de Aguiar (2010,

p.712): “Aliás, vale ressaltar que, dois anos após a aprovação do PNE, houve mudança do

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governo no Brasil e a agenda das políticas educacionais, a partir de 2003, foi reorientada, com

ênfase, sobretudo, na expansão da educação pública de qualidade.”

Decorrida a década do primeiro PNE aprovado (2001-2010), iniciou-se a formulação

do próximo PNE, somente aprovado em 2014, pela Lei n.º13005, de 25 de junho de 2014,

passando a ter vigência de 2014 a 2024.

Antes de nos deter no PNE 2014-2024, é preciso enfatizar a oficialização da criação

do Programa CsF, em 2011, por se tratar do tema principal deste estudo.

O CsF foi criado, oficialmente, pelo Decreto n.º 7.642, de 13 de dezembro de 2011,

com objetivo principal de:

[...] propiciar a formação e capacitação de pessoas com elevada qualificação em

universidades, instituições de educação profissional e tecnológica, e centros de

pesquisa estrangeiros de excelência, além de atrair para o Brasil jovens talentos e

pesquisadores estrangeiros de elevada qualificação, em áreas de conhecimento

definidas como prioritárias (BRASIL, 2011).

Esse é o primeiro programa que trata com exclusividade das ações da

internacionalização brasileira vinculadas à educação superior no sentido de enviar estudantes

brasileiros de nível de graduação ao exterior. Foi criado pelo Governo Federal, sendo

financiado pelas agências de fomento CAPES e CNPq, incluindo com maior ênfase o envio

de estudantes de graduação ao exterior.

Por ser o destaque da presente pesquisa, discorremos detalhadamente acerca dele no

próximo capítulo.

Retomando sobre o PNE aprovado em 2014, temos que a internacionalização da

educação superior transfere-se do âmbito das “diretrizes” para o âmbito das “estratégias”, as

quais relacionamos a seguir, considerando primordialmente as Metas 12,13 e 14 do referido

PNE.

A Meta 12 trata da educação superior, tendo o objetivo de:

[...] elevar a taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% (cinquenta por

cento) e a taxa líquida para 33% (trinta e três por cento) da população de 18

(dezoito) a 24 (vinte e quatro) anos, assegurada a qualidade da oferta e expansão

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para, pelo menos, 40% (quarenta por cento) das novas matrículas, no segmento

público (BRASIL, 2014).

A estratégia destacada é a 12.12, que visa “consolidar e ampliar programas e ações

de incentivo à mobilidade estudantil e docente em cursos de graduação e pós-graduação, em

âmbito nacional e internacional, tendo em vista o enriquecimento da formação de nível

superior;” (BRASIL, 2014, grifo nosso). Fica representado aqui que a ação de mobilidade

nacional e/ou internacional é vista como enriquecimento da formação tanto do estudante

como do docente.

A Meta 13 visa:

elevar a qualidade da educação superior e ampliar a proporção de mestres e doutores

do corpo docente em efetivo exercício no conjunto do sistema de educação superior

para 75% (setenta e cinco por cento), sendo, do total, no mínimo, 35% (trinta e cinco

por cento) doutores (BRASIL, 2014).

De algum modo aproximando do tema central dessa pesquisa, focamos na estratégia

13.7, que trata da busca por maior visibilidade nacional e internacional das atividades da

educação superior:

13.7) fomentar a formação de consórcios entre instituições públicas de educação

superior, com vistas a potencializar a atuação regional, inclusive por meio de plano

de desenvolvimento institucional integrado, assegurando maior visibilidade

nacional e internacional às atividades de ensino, pesquisa e extensão [...].

(BRASIL, 2014, grifo nosso).

Já na Meta 14, é tratada especificamente a pós-graduação stricto sensu,

estabelecendo que se deva “elevar gradualmente o número de matrículas na pós-

graduação stricto sensu, de modo a atingir a titulação anual de 60.000 (sessenta mil) mestres e

25.000 (vinte e cinco mil) doutores.” (BRASIL, 2014).

Nas estratégias 14.1 e 14.2, evidencia-se o financiamento via agências oficiais de

fomento (como principais, a CAPES e o CNPq), que possuem também a competência de

financiar as ações da internacionalização da educação superior, vinculadas à pesquisa e à pós-

graduação.

14.1) expandir o financiamento da pós-graduação stricto sensu por meio das

agências oficiais de fomento;14.2) estimular a integração e a atuação articulada entre

a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES e as

agências estaduais de fomento à pesquisa; (BRASIL, 2014).

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Nas estratégias a seguir relacionadas, é notória a referência à participação das ações

de internacionalização da educação superior na pesquisa e na pós-graduação, com o objetivo

de aumentar qualitativa e quantitativamente o desempenho científico e tecnológico do País.

14.9) consolidar programas, projetos e ações que objetivem a internacionalização

da pesquisa e da pós-graduação brasileiras, incentivando a atuação em rede e o

fortalecimento de grupos de pesquisa;14.10) promover o intercâmbio científico e

tecnológico, nacional e internacional, entre as instituições de ensino, pesquisa e

extensão;14.13) aumentar qualitativa e quantitativamente o desempenho científico e

tecnológico do País e a competitividade internacional da pesquisa brasileira,

ampliando a cooperação científica com empresas, Instituições de Educação Superior

- IES e demais Instituições Científicas e Tecnológicas – ICTs [...] (BRASIL, 2014,

grifo nosso).

Todas as metas e estratégias do PNE 2014-2024, incluindo bolsa de estudos no Brasil e

no exterior, deverão ser financiadas por recursos públicos, conforme previsto no artigo 5º, §

4o:

§ 4o O investimento público em educação a que se referem o inciso VI do art. 214

da Constituição Federal e a meta 20 do Anexo desta Lei engloba os recursos

aplicados na forma do art. 212 da Constituição Federal e do art. 60 do Ato das

Disposições Constitucionais Transitórias, bem como os recursos aplicados nos

programas de expansão da educação profissional e superior, inclusive na forma de

incentivo e isenção fiscal, as bolsas de estudos concedidas no Brasil e no exterior,

os subsídios concedidos em programas de financiamento estudantil e o

financiamento de creches, pré-escolas e de educação especial na forma do art. 213

da Constituição Federal (BRASIL, 2014, grifo nosso).

Até então podemos perceber que não há documentos oficiais que tratem da política

de internacionalização da educação superior de forma específica, e, sim, ações institucionais

que possibilitam as relações internacionais da educação superior aliada prioritariamente à

pesquisa e pós-graduação, além, é claro, da criação do Programa CsF, com ênfase no âmbito

da graduação.

Há, portanto, de mencionar a alteração ocorrida em relação à internacionalização da

educação superior quanto ao uso da expressão “diretrizes” para “estratégias”, no Plano

Nacional de Educação 2014-2024. Isso evoca ações práticas imediatas e em curto prazo para

implementação do processo de internacionalização da educação superior. Nesse bojo, tem-se a

própria criação do Programa CsF.

Cabe entender o que motivou tais ações do Governo; para tanto, será preciso buscar

relações entre a política mundial e o Brasil acerca do tema estudado, o que é tratado no item

seguinte.

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2.2 INTERFACES ENTRE A POLÍTICA DE INTERNACIONALIZAÇÃO DA

EDUCAÇÃO SUPERIOR MUNDIAL E BRASILEIRA

O tema internacionalização da educação superior vem assumindo destaque nas

políticas de educação superior contemporâneas, conforme esclarece Morosini (s.d., p.1): “É a

partir da década 90 e neste novo milênio que ela vem se fortificando no panorama mundial”.

Assim sendo, nosso objetivo é analisar os documentos de diretrizes dos organismos

internacionais a partir de 1990, mais propriamente da UNESCO e do Banco Mundial, para

buscar as interfaces entre a política de internacionalização da educação superior mundial e a

brasileira.

A escolha da UNESCO e do Banco Mundial deu-se porque ambos apresentam como

missão o apontamento de diretrizes que influenciem as políticas dos países membro,

especialmente na área de educação, sendo o Brasil partícipe dos dois organismos.

2.2.1 A UNESCO: perspectivas sobre a internacionalização da educação superior.

A UNESCO, parte integrante da ONU, trata especificamente dos assuntos sobre

educação, ciência e cultura. Conforme Cunha (apud WERTHEIN, 2002, p. 9):

A UNESCO, em cumprimento ao seu mandato de subsidiar a construção de uma

cultura de paz, mediante o intercâmbio educacional, científico e cultural entre os

povos, reuniu, ao longo de sua existência de mais de meio século, um acervo de

conhecimentos, de experiências e de compromissos fundados na ética e na equidade,

que a credenciou como uma das organizações mais bem preparadas para enfrentar as

incertezas e as desigualdades do nosso tempo (CUNHA, grifo nosso, apud

WERTHEIN, 2002, p.9).

Justifica-se, assim, a necessidade de abordar suas orientações acerca da

internacionalização da educação superior, para depois correlacionar com as políticas

educacionais adotadas no Brasil.

Analisaremos os documentos destaque da UNESCO com relação às diretrizes

norteadoras sobre a educação, prioritariamente a educação superior, buscando evidenciar o

tema principal deste estudo: internacionalização da educação superior.

Temos como destaque os seguintes documentos da UNESCO:

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Quadro 3 - Documentos UNESCO acerca das diretrizes educacionais

Ano Documento

1990 Declaração Mundial sobre Educação para Todos: satisfação das necessidades básicas de

aprendizagem.

1995 Política de Mudança e Desenvolvimento no Ensino Superior;

1998 Tendências da Educação Superior para o Século XXI;

2008 Conferência Regional de Educação Superior na América Latina e no Caribe;

2009 Conferência Mundial sobre Ensino Superior

2010 Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI,

intitulado “Educação: um tesouro a descobrir”.

2012 Desafios e perspectivas da Educação Superior Brasileira para a próxima década 2011-2021.

Fonte: Organizado pela autora, com base nos documentos da UNESCO.

Em 1990, a UNESCO, financiada pelo BM, realizou a Conferência Mundial de

Educação para Todos, em Jomtien, na Tailândia, adotando a premissa fundamental da

Declaração Mundial sobre Educação para Todos: satisfação das necessidades básicas de

aprendizagem, tendo como objetivo central a educação básica.

Nessa conferência, mesmo tendo como foco a educação básica, podemos

correlacionar ao tema da internacionalização da educação o artigo 10, intitulado “Fortalecer a

solidariedade internacional”, que indica que as ações de internacionalização devem seguir o

princípio da solidariedade internacional:

1. Satisfazer as necessidades básicas de aprendizagem constitui-se uma

responsabilidade comum e universal a todos os povos, e implica solidariedade

internacional e relações económicas honestas e equitativas, a fim de corrigir as

atuais disparidades económicas (UNESCO, 1990, s.p.)

A referida conferência derivou em maior consolidação entre Brasil e UNESCO, já

que após esse momento (mais precisamente em 1992) o Ministério da Educação e a UNESCO

assinaram um acordo de cooperação amplo, que resultou, já em 1993, no primeiro plano de

trabalho com o MEC, como mecanismo auxiliar à decisão do Governo de elaborar o Plano

Decenal de Educação para Todos (UNESCO, 2014).

No final deste ano (1993), o Brasil apresentou o “Plano Decenal Brasileiro”, focado

no objetivo central da reunião, ou seja, na priorização da educação básica, cumprindo, assim,

o compromisso feito de levar à UNESCO um plano de educação para o Brasil, tendo em vista

ainda não ter assumido os acordos estabelecidos em 1990, em Jomtien.

Em 1995, foi publicado o documento “Política de Mudança e Desenvolvimento no

Ensino Superior” que atende o pleiteado na 27ª sessão da Conferência Geral da UNESCO, em

1993, com o objetivo de promover uma síntese “[...] daquilo que a UNESCO vê como

tendências maiores em ensino superior, e também tenta formular uma perspectiva para a

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Organização referente às políticas-chaves neste campo.” (MAYOR, 1995, p. 8, apud

UNESCO, 1995, p.8).

O Diretor-Geral da UNESCO, Federico Mayor, responsável pela elaboração de tal

documento, adverte:

Este documento deve ser considerado como uma parte importante da contribuição da

UNESCO para o debate em todos os aspectos da educação nesta virada de século,

inclusive o ensino superior. Deve ser considerado como um ponto de partida para

iniciativas e atividades que promovam o ensino superior e a pesquisa e como um

passo importante para a revitalização do suporte para o ensino superior no mundo

(MAYOR, 1995, p.8 apud UNESCO, 1995).

Na introdução desse documento a internacionalização é citada como um dos maiores

desafios enfrentados pelo ensino superior num mundo de rápida mudança, destacada pelo

autor como um dos três tópicos principais: relevância, qualidade e internacionalização. Para

ele, essa última é “[...] a característica inerente ao ensino superior que tem crescido

consideravelmente na última parte desde século.” (MAYOR, 1995, p.27, apud UNESCO,

1995).

No item “Tendências do Ensino Superior” é interessante destacar a menção sobre

“Aumento de internacionalização”:

[...] o número de pessoas que buscam ensino superior fora de seus países de origem

aumentou em quase 30% durante a última década: de cerca de 920.000 em 1980 para

mais de 1,2 milhões em 1990. A maioria (mais de 750.000 em 1990) veio de países

em desenvolvimento (MAYOR, 1995, p.40 apud UNESCO, 1995).

Mayor (1995, p.39) adverte que o aumento da mobilidade “[...] ganha um significado

adicional à luz das tendências atuais do comércio global, da economia e integração política e

da necessidade crescente de entendimento intercultural.” O autor assim resume sua

preocupação: “Em outras palavras, enquanto os benefícios do estudo no exterior são cada vez

mais reconhecidos, os custos envolvidos fazem com que ele se torne privilégio dos países (ou

estudantes) que podem pagá-lo.” (MAYOR, 1995, p.41 apud UNESCO, 1995).

No item “Respostas do Ensino Superior – Uma nova visão”, a internacionalização é

posta como um dos lemas norteadores que determinam a posição estratégica do ensino

superior na sociedade, sendo que “[...] deve basear-se em parceria genuína, mútuo respeito e

solidariedade.” (UNESCO, 1995, p.75, apud UNESCO, 1995).

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Ao finalizar o documento “Política de Mudança e Desenvolvimento no Ensino

Superior”, Mayor (1995, p.89, apud UNESCO, 1995) resgata a missão institucional da

UNESCO “[...] de manter, aumentar e difundir o conhecimento [...] através do encorajamento

(...) do intercâmbio de pessoas ativas no campo da educação, ciência e cultura.”

O autor, igualmente, cita o programa das cátedras University Twinning and

Networking Programme (UNITWIN) da UNESCO, lançado em 1991, como uma ação prática

da UNESCO em relação a esse tema.

O programa foi planejado para desenvolver elos em redes nas instituições de ensino

superior, em níveis inter-regionais, regionais e sub-regionais, a fim de promover o

desenvolvimento institucional, a divisão de fundos e facilitar o intercâmbio de

conhecimento e experiência, assim como o intercâmbio de funcionários e

estudantes. O programa está baseado no espírito de solidariedade acadêmica,

necessária para colocar em movimento um processo que estabeleça ligações fortes e

duráveis entre o ensino superior e as instituições científicas do mundo (MAYOR,

1995, p. 91, grifo autor, apud UNESCO, 1995).

Em 1998, realizou-se a Conferência Mundial sobre Ensino Superior (CMES),

convocada pela UNESCO, em Paris, que teve aprovação de dois documentos: “Declaração

Mundial sobre a Educação Superior no Século XXI: Visão e Ação” e “Marco de ação

prioritária para a mudança e o desenvolvimento da educação superior”, sendo ambos

estruturais para a publicação dos anais “Tendências da Educação Superior para o Século

XXI”.

A CMES foi convocada com o objetivo de propor soluções para os desafios da

educação superior mundial, considerando que:

A educação superior tem dado ampla prova de sua viabilidade no decorrer dos

séculos e de sua habilidade para se transformar e induzir mudanças e progressos na

sociedade. Devido ao escopo e ritmo destas transformações, a sociedade tende

paulatinamente a transformar-se em uma sociedade do conhecimento, de modo que

a educação superior e a pesquisa atuam agora como componentes essenciais do

desenvolvimento cultural e socioeconômico de indivíduos, comunidades e nações

(UNESCO, 1998, p.20, grifo autor).

No documento “Declaração Mundial sobre a Educação Superior no Século XXI: Visão

e Ação”, destacamos a internacionalização da educação superior em três momentos:

1º Nas considerações iniciais do documento: “Considerando ainda que a cooperação e o

intercâmbio internacionais são os caminhos principais para promover o avanço da educação

superior em todo o mundo.” (UNESCO, 1998, p.22, grifo da entidade).

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2º No item “Da visão à ação, Artigo 11. Avaliação da qualidade”:

b) a qualidade requer também que a educação superior seja caracterizada por sua

dimensão internacional: intercâmbio de conhecimentos, criação de redes interativas,

mobilidade de professores e estudantes, e projetos de pesquisa internacionais,

levando-se sempre em conta os valores culturais e as situações nacionais

(UNESCO, 1998, p.29).

3º No item “Da visão à ação, Artigo 15. Compartilhar conhecimentos teóricos e práticos

entre países e continentes”:

a) O princípio de solidariedade e de uma autêntica parceria entre instituições de

educação superior em todo o mundo é crucial para que a educação e a formação em

todos os âmbitos motivem uma compreensão melhor de questões globais e do papel

de uma direção democrática e de recursos humanos qualificados para a solução de

tais questões, além da necessidade de conviver com culturas e valores diferentes. O

domínio de múltiplos idiomas, os programas de intercâmbio de docentes e

estudantes, e o estabelecimento de vínculos institucionais para promover a

cooperação intelectual e científica devem ser parte integrante de todos os sistemas

de educação superior.

b) Os princípios de cooperação internacional com base na solidariedade, no

reconhecimento e apoio mútuo, na autêntica parceria que resulte, de modo

equitativo, em benefício mútuo, e a importância de compartilhar conhecimentos

teóricos e práticos em nível internacional devem guiar as relações entre instituições

de educação superior em países desenvolvidos, em países em desenvolvimento, e

devem beneficiar particularmente os países menos desenvolvidos. Deve-se ter em

conta a necessidade de salvaguardar as capacidades institucionais em matéria de

educação superior nas regiões em situações de conflito ou submetidas a desastres

naturais. Por conseguinte, a dimensão internacional deve estar presente nos planos

curriculares e nos processos de ensino e aprendizagem.

c) Deve-se ratificar e implementar os instrumentos normativos regionais e

internacionais relativos ao reconhecimento de estudos, incluindo os que se referem à

homologação de conhecimentos, competências e aptidões dos formandos,

permitindo que estudantes mudem de curso com maior facilidade e tenham mais

mobilidade dentro dos sistemas nacionais e na sua movimentação entre eles

(UNESCO, 1998, p.31/32).

No documento “Marco de ação prioritária para a mudança e o desenvolvimento da

educação superior”, a internacionalização da educação superior é citada como parte do item:

“1. Ações prioritárias na esfera nacional”, subitem: “m) promover e facilitar a mobilidade

nacional e internacional do pessoal docente e de estudantes, como parte essencial da

qualidade e relevância da educação superior.” (UNESCO, 1998, p.38).

Por sua vez, em “3. Ações prioritárias no plano internacional”, em particular as

futuras iniciativas da UNESCO podem assim ser destacadas:

10. A cooperação deve ser concebida como parte integrante das missões

institucionais de entidades e sistemas de ensino superior. [...] [11.] todos os

setores da sociedade envolvidos com a educação superior devem promover a

mobilidade acadêmica internacional [...] 13. A UNESCO [...] deve promover uma

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ação com o objetivo de aliviar os efeitos negativos da “perda de quadros” e levar

a um processo dinâmico de “ganho de talentos”. [...] 14. Dentro deste marco, a

UNESCO deve: a) promover uma melhor coordenação entre organizações

intergovernamentais, supranacionais e não governamentais, agências e

fundações financiadoras de programas já existentes e projetos visando a

cooperação internacionais em educação superior (UNESCO, 1998, p.42/43,

grifos da entidade).

O próximo documento a ser destacado sobre a política da Educação Superior da

UNESCO é a Declaração da Conferência Regional de Educação Superior na América Latina e

Caribe8, em 2008. O mesmo serviu como base de análise para identificar as principais

demandas da América Latina e Caribe com vistas à preparação da Conferência Mundial de

Educação Superior, que aconteceria no ano seguinte, em 2009.

Acerca do assunto internacionalização da educação superior, temos a registrar o item

“H-Integração regional e internacionalização”, no que tange ao dever de construir um Espaço

de Encontro Latino-Americano e Caribenho de Educação Superior (ENLACES) por tratar-se:

[...] de uma iniciativa básica para alcançar a integração regional em aspectos

fundamentais, a saber: o aprofundamento de sua dimensão cultural; o

desenvolvimento das potencialidades acadêmicas que consolidem as perspectivas

regionais em face aos mais prementes problemas mundiais; o aproveitamento dos

recursos humanos para criar sinergias em escala regional; a superação de

discrepâncias na disponibilidade de conhecimentos e capacidades profissionais e

técnicas; a construção do saber sob a perspectiva do bem-estar coletivo e a criação

de competências para a conexão orgânica entre o conhecimento acadêmico, o mundo

da produção, o trabalho e a vida social, com atitude humanista e responsabilidade

intelectual (UNESCO, 2008, s.p., apud Revista da Avaliação da Educação Superior,

2009, p.245).

Nesse âmbito, é mencionada a necessidade de consolidar a cooperação Sul-Sul

conforme também exposto no item H: “3. No plano internacional é preciso fortalecer a

cooperação da América Latina e do Caribe com as outras regiões do Mundo, particularmente

a cooperação Sul-Sul e, dentro desta, com os países africanos.” (UNESCO, 2008, s.p., apud

Revista da Avaliação da Educação Superior, 2009, p.246).

Em 2009, na Conferência Mundial de Ensino Superior (CMES), realizada na sede da

UNESCO, em Paris, correlacionando com o tema internacionalização da educação superior,

temos:

8 Esta conferência realizou-se com o apoio do Instituto Internacional da UNESCO para a Educação Superior na

América Latina e no Caribe (IESALC-UNESCO) e o Ministério de Educação Nacional da Colômbia, com a

colaboração dos governos do Brasil, Espanha, México e da República Bolivariana da Venezuela. Os

participantes destacaram a tarefa substancial realizada pelo IESALC-UNESCO na preparação e realização do

referido evento (UNESCO, 2008, s.p. apud Revista da Avaliação da Educação Superior, 2009).

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24. Cooperação internacional na educação superior deve ser baseada na

solidariedade e no respeito mútuo, além de na promoção de valores humanísticos e

diálogo intercultural. Como tal, pode ser estimulada apesar da crise econômica.

25. Instituições de educação superior ao redor do mundo têm uma responsabilidade

social de ajudar no desenvolvimento, por meio da crescente transferência de

conhecimentos cruzando fronteiras, especialmente nos países subdesenvolvidos, e

trabalhando para encontrar soluções comuns para promover a circulação do saber e

aliviar o impacto negativo da fuga de cérebros.

26. Redes de universidades internacionais e parcerias são uma parte dessa solução e

auxiliam no crescimento do entendimento mútuo e da cultura de paz.

27. Parcerias para pesquisa e equipe e intercâmbio de estudantes promovem a

cooperação internacional. O encorajamento de uma mobilidade acadêmica mais

amplamente equilibrada deveria ser integrada em mecanismos que garantam

colaboração genuína, multicultural e multilateral.

28. Parcerias devem promover a criação de capacidades de conhecimento nacional

em todos os países envolvidos e, desse modo, garantir fontes mais diversificadas de

pesquisa coletiva de alta qualidade e produção de conhecimento, em escala global e

regional (UNESCO, 2009, p.3).

Nos documentos da UNESCO, analisados de 1990 a 2008, o princípio fortemente

destacado acerca das ações de internacionalização da educação superior é o da solidariedade,

além da menção recorrente de que a educação superior trata-se de um bem público.

Porém, no evento realizado em 2009, ao mesmo tempo em que constam esses

princípios, abre-se oportunidade para ações da transnacionalização da educação superior,

conforme podemos observar:

29. Para que a globalização da educação superior beneficie a todos, é essencial

que ela proporcione a igualdade de acesso e de sucesso a fim de promover a

qualidade e respeitar a diversidade cultural, bem como a soberania nacional.

30. A globalização enfatizou a necessidade do estabelecimento de um sistema de

reconhecimento e de garantia de qualidade juntamente com a promoção de uma rede

ao redor desses Sistemas.

31. A disposição transfronteiriça de educação superior pode fazer uma

contribuição significativa para a educação superior fornecida, oferecendo educação

de qualidade, promovendo valores acadêmicos, mantendo a relevância e respeitando

os princípios básicos de diálogo e cooperação, reconhecimento mútuo pelos direitos

humanos, diversidade e soberania nacional.

32. Educação Superior transfronteiriça pode também criar oportunidades para

que aqueles que fornecem educação superior de baixa-qualidade ou fraudulenta

sejam contestados. As fornecedoras de diplomas falsos (‘falsificadoras de diploma’)

são um problema sério. Combater as ‘falsificadoras de diploma’ requer esforços em

múltiplas frentes em nível nacional e internacional (UNESCO, 2009, p.3).

Há de se questionar o porquê de tal abertura. Para responder, é preciso analisar

novamente o contexto sócio-político-econômico mundial vivenciado no presente século XXI.

Nessa linha, recordamos o já exposto sobre o predomínio político-econômico

neoliberal aliado ao regime de acumulação flexível (toyotismo). Essa combinação resulta na

tendência mundial de tratar a educação de forma comercial. Ao que parece, há nisso

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subjacente a cessão por parte da UNESCO à pressão da OMC (citada no capítulo 1) de

considerar a educação superior como parte integrante do Acordo Geral sobre o Comércio de

Serviços (AGCS), ou seja, como uma mercadoria.

Em 2010, foi publicado um relatório, a pedido da UNESCO, pela Comissão

Internacional sobre Educação para o século XXI, denominado “Educação: um tesouro a

descobrir”.

Nesse documento, primeiramente, é exposto como parte dos horizontes, no capítulo

1. Da comunidade de base à sociedade mundial, a saber:

A interdependência planetária e a globalização são os principais fenômenos de nosso

tempo; eles já estão em marcha e vão deixar sua marca profunda no século XXI.

Desde já, eles exigem uma reflexão abrangente – para além das áreas da educação e

da cultura – sobre o papel e as estruturas das organizações internacionais (UNESCO,

2010, p.27).

O tema internacionalização da educação superior, de forma mais específica, é citado

em dois capítulos: no sexto, intitulado “Da educação básica à universidade”, e no nono, “A

cooperação internacional: educar a aldeia global”.

No sexto, destacamos a orientação de que “A universidade deve ocupar o centro do

sistema educacional [...]” (UNESCO, 2010, p.34) e de que a universidade deveria

desempenhar quatro funções essenciais:

1. preparação para a pesquisa e para o ensino; 2. oferta de uma formação, em

diferentes áreas, bastante especializada e adaptada às necessidades da vida

econômica e social; 3. abertura a todos para responder aos múltiplos aspectos do que

se designa por educação permanente, em sentido lato; 4. cooperação internacional

(UNESCO, 2010, p. 34).

No capítulo nono, destacamos as seguintes orientações:

•A necessidade de uma cooperação internacional – que deve ser repensada

radicalmente – é válida também para a área da educação; trata­se de uma questão

que implica não só os responsáveis pelas políticas educativas e os professores, mas

também todos os atores da vida coletiva. [...]

•Modificar a orientação da política de assistência para uma perspectiva de parceria,

ao favorecer, especialmente, a cooperação e o intercâmbio no âmago de grupos

regionais. [...]

• Incentivar a conversão de dívidas, a fim de compensar os efeitos negativos – sobre

as despesas com a educação – das políticas de ajuste e de redução de déficits interno

e externo.

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• Ajudar no fortalecimento dos sistemas educacionais nacionais ao encorajar as

alianças e a cooperação entre os ministérios em nível regional, e entre países que

enfrentam problemas semelhantes.

• Ajudar os países a enfatizar a dimensão internacional do ensino ministrado

(programas de estudo, recurso às tecnologias da informação, cooperação

internacional).

• Incrementar novas parcerias entre as instituições internacionais que se dedicam à

educação, lançando, por exemplo, um projeto internacional que tenha o objetivo de

divulgar e implementar o conceito de educação ao longo da vida, a partir do modelo

de iniciativa interinstitucional que culminou na Conferência de Jomtien.

• Constituir um conjunto de indicadores destinados a detectar as disfunções mais

graves dos sistemas educacionais, relacionando, por exemplo, diversos dados

quantitativos e qualitativos: nível de despesas com a educação, taxa de desperdício,

desigualdades de acesso, falta de eficácia dos diferentes setores do sistema,

deficiente qualidade de ensino, condição dos docentes etc. [...]

• Incentivar, por intermédio da UNESCO, a cooperação intelectual na área da

educação: Cátedras UNESCO, Escolas Associadas, partilha equitativa do saber entre

países, divulgação das tecnologias da informação, intercâmbio de estudantes e de

pesquisadores.

• Fortalecer a ação normativa da UNESCO a serviço de seus Estados­ Membros, por

exemplo, no que diz respeito à harmonização das legislações nacionais com os

instrumentos internacionais (UNESCO, 2010, p. 37/38).

Os citados documentos mostram ênfase na cooperação internacional como função

das universidades, além de que ela é necessária no processo educacional. Igualmente, indicam

que se deve atuar com parceria e não com assistencialismo, buscar aliança com países que

enfrentam problemas semelhantes, constituir indicadores avaliativos dos sistemas

educacionais, e, finalmente, promover intercâmbios e buscar a flexibilização/harmonização

com as legislações internacionais.

Para encerrar a abordagem sobre os direcionamentos da UNESCO, destacamos o

documento “Desafios e perspectivas da Educação Superior Brasileira para a próxima década

2011-2021.”, justamente por se tratar das influências mundiais nas políticas brasileiras na

presente década.

A publicação é fruto da parceria UNESCO e o Conselho Nacional de Educação

(CNE) do Ministério da Educação (MEC), que, por meio de oficina de trabalho, promoveu

reflexões sobre as principais demandas e desafios da política de ES para a próxima década,

especialmente à luz da elaboração do novo PNE 2011-2020.

Incluímos esse documento nas considerações sobre a UNESCO porque apresenta

como um dos eixos temáticos “Experiências recentes de inovação na educação superior: o

contexto internacional”. Nesse âmbito, promoveram-se palestras para discorrer sobre os

aspectos da internacionalização, regionalização e mundialização da educação superior, por

meio de mesa de debates mediada por conselheiros do CNE.

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Como estamos examinando os documentos da UNESCO, não discorremos sobre as

opiniões dos palestrantes acerca do assunto, visto que pretendemos averiguar a posição

assumida pelos parceiros institucionais: UNESCO e CNE, o que se expressa no capítulo final

do referido documento, intitulado “4. Documento final: Desafios e perspectivas da educação

superior brasileira para a próxima década”.

No subitem “II - Educação superior no Brasil: perspectivas para 2011-2020”

destacamos a afirmação:

Os novos desafios gerados pelo avanço da globalização tecnológica, econômica e

cultural começam a exigir dos atores envolvidos com a ES a responsabilidade de

viabilizar as reformas necessárias para sua consolidação no cenário nacional e

ampliar sua presença internacional, na perspectiva de um desenvolvimento

socialmente justo e sustentável (UNESCO; CNE, 2012, p.162).

Os autores do documento (representantes da UNESCO e do CNE) consideram

fundamental para responder aos desafios e perspectivas da educação superior implementar

políticas e ações estratégicas que promovam e estimulem:

i. fortalecimento do regime de colaboração entre os entes federados; ii. uma

articulação que englobe as quatro áreas: educação, ciência, tecnologia e inovação;

iii. estímulo aos programas de intercâmbio e à integração internacional da

educação no país (UNESCO; CNE, 2012, p.162, grifo nosso).

Para concluir, no documento, os autores asseveram que:

Em síntese, um dos maiores desafios da ES brasileira é a implementação de uma

política que tenha como foco o conjunto do sistema, e não apenas uma parte dele.

Tal política deverá atentar para as características desse sistema, composto por

instituições públicas e privadas, com diferentes formatos organizacionais, múltiplos

papéis e funções locais, regionais, nacionais e internacionais. Ao mesmo tempo,

essa política deve respeitar as premissas de expansão com garantia de padrões de

qualidade, gratuidade nos estabelecimentos públicos, gestão democrática e

autonomia, respeito à diversidade e sustentabilidade financeira. Por fim,

consideramos que é preciso pensar os desafios da ES para os próximos dez anos,

tendo em vista que a principal característica do mundo atual é a mudança constante e

ininterrupta, acelerada pelas novas tecnologias, e cujos efeitos afetam todo o planeta

e praticamente todas as áreas e condições da atividade e da vida do homem e da

sociedade. Assim, é preciso pensar o futuro do ES, assumindo valores e princípios e

articulando ações e estratégias que permitam cumprir sua missão num mundo em

constante mudança (UNESCO; CNE, 2012, p.162).

Como se nota, as ações da internacionalização da educação superior são concebidas

como estratégicas para os desafios do porvir.

Num exame sobre o conjunto dos documentos estudados da UNESCO, observamos

que predomina o tratamento da internacionalização da educação superior como cooperação

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solidária. Mas ressaltamos que toda construção política possui o movimento dialético de

posições congêneres e opostas, conforme evidenciado por Dias (2012, p.55, apud UNESCO;

CNE):

Apesar da restrição de certos funcionários internacionais, os princípios de 1998

[cooperação solidária] foram ratificados no comunicado final expedido pelos

participantes da Segunda Conferência Mundial sobre Educação Superior, organizada

pela UNESCO, em julho de 2009 (DIAS, 2012, p.55, apud UNESCO; CNE).

Frisamos que mesmo mantendo o princípio de cooperação solidária da primeira

CMES, de 1998, a segunda CMES, de 2009, cedeu espaço para ações afetas à

transnacionalização da educação superior, ou seja, ações de “cooperação comercial”.

Há de se destacar que a UNESCO é financiada por patrocinadores, dentre eles o

Banco Mundial:

Portanto, seu sucesso depende dos recursos investidos e do suporte oferecido por

diferentes fontes: Instituições de Educação Superior dos países desenvolvidos,

associados aos projetos de Cátedras; Instituições dos países em desenvolvimento,

envolvidos no Programa; Organizações governamentais e não governamentais;

Organizações não governamentais de Educação Superior; Possíveis patrocinadores

(UNESCO, 2014).

Esse registro incita-nos a examinar as orientações do Banco Mundial acerca da

internacionalização da educação superior, para identificar congruências e divergências

existentes entre tais organismos.

2.2.2 Banco Mundial: orientações educacionais

O Banco Mundial (BM) é composto pelas instituições: Banco Internacional para

Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), Associação Internacional de Desenvolvimento

(IDA), Corporação Financeira Internacional (IFC), Centro Internacional para Resolução de

Disputas sobre Investimentos (ICSID) e a Agência de Garantia de Investimento Multilaterais

(MIGA). Trata-se de uma instituição financeira internacional que fornece empréstimos para

países em desenvolvimento, consoante com o exposto por Soares (2009, p. 18): “[...] pode-se

dizer que foi apenas ao longo dos anos 50 que o Banco Mundial foi adquirindo o perfil de um

banco voltado para financiamento dos países em desenvolvimento, tal como é hoje.”

(SOARES, 2009, p.18).

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O BM é presidido pelos Estados Unidos desde sua fundação, detém 17,1% do poder de

voto, cabendo ao Brasil apenas 1,7% desse poder. (SOARES, 2009, p.16) esclarece:

Os estatutos do Banco Mundial estabelecem que a influência nas decisões e votações

é proporcional à participação no aporte de capital, o que tem assegurado aos EUA a

presidência do Banco desde a sua fundação, e hegemonia absoluta entre as cinco

nações líderes [1º EUA, 2º Japão, 3º Alemanha, 4º França e 5º Reino Unido] na

definição de suas políticas e prioridades (SOARES, 2009, p.16).

Os empréstimos são feitos mediante condicionalidades:

O Banco Mundial passou a impor uma série de condicionalidades para concessão de

novos empréstimos. Mediante essas condicionalidades, o Banco Mundial (tal como

o FMI) passou a intervir diretamente na formulação da política interna e a

influenciar a própria legislação dos países (SOARES, 2009, p.21).

Importa destacar que o BM é “[...] o maior captador mundial não soberano de

recursos financeiros, exercendo profunda influência no mercado internacional.” (SOARES,

2009, p.15). Ademais, ressaltamos que sua influência sobre as políticas de educação e saúde a

partir da década de 1970 foi significativa:

Assim, até a década de 1960, a educação e a saúde eram secundárias para este

Organismo. A situação começou a mudar a partir da década de 1970 com George D.

Woods (1963-1968) e definitivamente, na gestão de Robert S. McNamara (1968-

1981) (LEHER, 1998, p. 202). O Banco Mundial passou a ampliar os investimentos

em projetos para o setor social, destacando-se o setor educacional, a saúde e o

desenvolvimento agrícola, considerados de suma importância (BUENO;

FIGUEIREDO, 2012, p.2).

O BM passou a priorizar a educação em seus documentos com “[...] vista não apenas

como instrumento de redução da pobreza, mas principalmente como fator essencial para a

formação de “capital humano” adequado aos requisitos do novo padrão de acumulação.”

(SOARES, 2009, p.30).

A exemplificar, temos o documento “Relatório No. 20475-BR - O Combate à

Pobreza no Brasil”, que faz constatações, traça tendências e perfis da pobreza no Brasil, além

de promover direcionamentos na política para promover a redução da pobreza. Sobre a

educação, destaca: “Se houver um grande empenho no sentido de melhorar a educação,

haverá também uma redução significativa da pobreza [...] especialmente se for possível

melhorar a focalização dos recursos.” (BANCO MUNDIAL, 2001, p. 11).

Conforme Bueno e Figueiredo (2012, p.5):

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Nesta direção, para o Banco Mundial direcionar esforços para o atendimento do

grupo socialmente vulnerável, poderia ser traduzido pelo investimento em políticas

focalizadas que atendessem às necessidades mínimas dos sujeitos em situação de

pobreza. Incentivos sociais como a educação e a saúde básicas, segundo o Banco

Mundial, são suficientes para aliviar a pobreza, já que “[...] ajudam a fortalecer o

capital humano dos pobres e aumenta sua renda” (BANCO MUNDIAL, 2001, p. 7-

16). A defesa em valorizar o capital humano, por parte do Banco Mundial, teve

como objetivo aumentar a produtividade dos mais pobres, visando incluí-los no

sistema econômico, no mercado de consumo e influir sobre sua conduta política

(BUENO; FIGUEIREDO, 2012, p.5).

Resumidamente, podemos interpretar que o BM passou a ver na educação uma forma

de alívio da pobreza e impulso ao desenvolvimento do sistema capitalista, colocando o capital

humano dos pobres como fundamental para elevar a economia do país.

Soares (2009, p.15) destaca a importância do BM nos dias de hoje:

O Banco Mundial exerce profunda influência nos rumos do desenvolvimento

mundial. Sua importância hoje deve-se não apenas ao volume de seus empréstimos e

à abrangências de suas áreas de atuação, mas também ao caráter estratégico que vem

desempenhando no processo de reestruturação neoliberal dos países em

desenvolvimento, por meio de políticas de ajuste estrutural (SOARES, 2009, p.15).

Fundamenta-se dessa forma a necessidade de analisar as orientações do BM acerca

da internacionalização da educação superior.

A seguir, no Quadro 4, relacionamos os documentos do Banco Mundial que

apontaram diretrizes norteadoras para a educação, prioritariamente, a educação superior.

Quadro 4 - Documentos BM acerca das diretrizes educacionais.

Ano Documento

1994 Higher Education: The Lessons of Experience

2002 Higher Education in Brazil: Challenges and Options

2011 Learning for All - Investing in People’s Knowledge and Skills

to Promote Development: World Bank Group Education Strategy 2020

Fonte: Organizado pela autora, com base em documentos do Banco Mundial.

Em 1994, o BM publicou o documento “Higher Education: The lessons of

experience” com objetivo de obter lições da experiência recente, informar e aguçar a

discussão de políticas tanto no BM quanto aos “países clientes”, com vista a melhorar as

formas de suporte em educação pela instituição financeira.

Esse documento não trata especificamente da internacionalização da educação

superior, mas se torna importante por expor os quatro pilares considerados primordiais para a

eficiência das universidades: incentivo ao desenvolvimento das universidades privadas, fontes

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de recurso público e privado, aumento da autonomia e responsabilidade institucional,

consequentemente, sendo menos dependente da participação estatal, ou seja, possível redução

da injeção de recursos públicos.

Valdemar Sguissardi, no artigo “Rumo à Universidade Mundial – e a Universidade

será feita à sua Imagem e Semelhança” (que conforme o autor também poderia ser escrito em

forma de questões) faz alusão desse título ao documento do BM ora citado e assevera:

Este texto visa responder, ainda que parcialmente, a essas questões e mostrar como

na última década se foi estruturando, em especial a partir dos países do primeiro

mundo (particularmente, anglo-saxônicos) e das recomendações e ações de

organismos multilaterais (financeiros) um novo modelo de universidade mundial –

neoprofissional, heterônoma, operacional, empresarial e competitiva – que está

sendo feito à imagem e semelhança dos interesses do atual estágio de acumulação do

capital (SGUISSARDI, 2005, p.7/8).

Em 2002, o BM produziu o documento “Higher Education in Brazil: Challenges and

Options”, a pedido do governo brasileiro:

O Governo do Brasil está analisando opções para melhorar e reestruturar o ensino

superior ao longo das próximas duas a três décadas. A pedido do Ministro da

Educação, Sr. Paulo Renato, o Banco realizou uma avaliação do estado do ensino

superior e fez recomendações sobre como a sua finalidade, estrutura, escopo,

recursos e governança poderia evoluir para melhor atender as necessidades do país

(BANCO MUNDIAL, 2002, p.vi, tradução nossa).

Nesse documento, em sua primeira fase, o trabalho analítico feito entre o ministro

Paulo Renato, os membros do Conselho Nacional de Educação, reitores, autoridades federais

de ensino superior e técnicos do BM levaram à identificação dos cinco problemas principais

acerca da educação superior brasileira:

i. aumento da cobertura; ii. reforçar a autonomia gerencial e incentivar a eficiência a

nível institucional; iii. a mudança do papel do Governo Federal; iv. a melhoria da

qualidade de ensino, e v. identificar e reunir apoio de parceiros (BANCO

MUNDIAL, 2002, p.vi, tradução nossa).

Após oficinas de debate, o documento final elaborou recomendações com relação ao

acesso equitativo, qualidade, relevância e eficiência. Também não vimos no referido

documento nenhum direcionamento acerca da internacionalização da educação superior, mas

merece registro a recomendação de privatização das universidades públicas, além do

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investimento público nas universidades privadas, demonstrando, assim, o trato da educação

como mercadoria.

Finalmente, o documento “Learning for All - Investing in People’s Knowledge and

Skills to Promote Development: World Bank Group Education Strategy 2020”, publicado em

2011 pelo BM, teve como objetivo auxiliar os países no direcionamento de suas políticas, o

que foi assim justificado:

Estamos vivendo um período de mudanças extraordinárias. O impressionante

crescimento dos países de renda média, liderada por China, Índia e Brasil,

intensificou o desejo de muitas nações para aumentar a sua competitividade através

da construção de mais força de trabalho altamente qualificados. Os avanços

tecnológicos estão mudando perfis profissionais e habilidades, além de oferecer

possibilidades de aprendizagem acelerada. Persistentemente elevados níveis de

desemprego, especialmente entre os jovens, têm destacado o fracasso dos sistemas

de ensino para preparar os jovens com as competências adequadas para o mercado

de trabalho e têm alimentado apelo a uma maior oportunidade e responsabilidade.

Expandir e melhorar a educação são fundamentais para a adaptação à mudança para

enfrentar esses desafios. Simplificando, os investimentos em educação de

qualidade levam a um crescimento e desenvolvimento econômico mais rápido e

sustentável (BANCO MUNDIAL, 2011, p.v, tradução e grifo nossa).

Fica evidenciado, mais uma vez, que para o BM a educação está intrinsecamente

ligada ao crescimento e desenvolvimento econômico do país, ou seja, como um fator

econômico.

Nesse documento, constam duas prioridades do Banco com relação à educação ao

longo da próxima década: 1. fortalecer a capacidade dos sistemas de ensino para atingir as

metas de aprendizagem; 2. contribuir para a construção de uma base de conhecimento global

de alta qualidade nos sistemas de ensino.

Na prioridade 1, o Banco afirma: “A nova estratégia reconhece explicitamente que as

oportunidades de aprendizagem vão além daqueles oferecidos pelo setor público, bem como

para além dos programas tradicionais formais.” (BANCO MUNDIAL, 2011, p. 34, tradução

nossa), deixando explícita a necessidade de parceria entre o Governo e as instituições de

educação do setor privado.

Outro ponto a destacar nessa prioridade refere-se a: “Um foco especial de política de

ensino superior é promover a ciência, tecnologia e inovação através da utilização mais eficaz

das parcerias entre universidades.” (BANCO MUNDIAL, 2011, p. 36, tradução nossa).

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Talvez esteja aqui a priorização de áreas do Programa CsF, objeto principal deste estudo, o

qual examinaremos no próximo capítulo.

Na prioridade 2, “contribuir para a construção de uma base de conhecimento global de

alta qualidade nos sistemas de ensino”, destacamos:

Durante a próxima década, o Banco continuará a apoiar o desenvolvimento e

utilização de dados de educação regular. Ele irá apoiar os esforços dos países

parceiros para medir tanto o desempenho do aluno (ou seja, os resultados da

aprendizagem) e o desempenho global dos sistemas de ensino em uma base

regular e sistemática, e utilizar esses dados para informar políticas e investimentos

na educação (BANCO MUNDIAL, 2011, p. 39, tradução e grifo nosso).

Vemos aqui indícios de padronização da avaliação das universidades na citação antes

grifada (“o desempenho global dos sistemas de ensino uma [única] base regular e

sistemática”).

Além das prioridades, vale destacar na Parte 4. “Alavancas de Implementação da

Nova Estratégia”, o subitem “Geração de Conhecimento e Intercâmbio”, pois se abre aqui

investimentos na cópia das boas práticas (benchmarking9) da educação de outros países via

cooperação internacional:

Na área de geração de conhecimento e intercâmbio, o Banco irá concentrar os seus

esforços no desenvolvimento e utilização de uma abordagem de sistema, apoiar a

avaliação de aprendizagem dos alunos, a ampliação da base de conhecimento

utilizando avaliações de impacto e outras pesquisas, e promovendo a troca de

conhecimento entre os países. [...] Por fim, além de ajudar a preencher lacunas

importantes no conhecimento, o Banco tem o compromisso de intermediar trocas de

conhecimento. Melhor compreensão dos pontos fortes dos vários sistemas, os

resultados de aprendizagem, e as possíveis soluções para os problemas

permitirão aos países para aprender com as experiências uns dos outros. Grande parte desse aprendizado será Sul-Sul, que os países procuram exemplos de

abordagens bem sucedidas em outros países em situações similares. Pesquisa em

educação nos países mais ricos também produz lições para os países em

desenvolvimento, permitindo a aprendizagem Norte-Sul, e porque os países ricos

não têm o monopólio sobre as boas práticas de ensino, aprendizagem Sul-Norte tem

um grande potencial também (BANCO MUNDIAL, 2011, 60 e 64, tradução e grifo

nosso).

9 Este termo “benchmarking” é utilizado pelo Banco Mundial ao informar que está sendo construído um

programa denominado “System Assessment and Benchmarking for Education Results (SABER)”, que possui a

função de abordar programas de educação nacionais, bem- sucedidos ou fracassados, em países ao redor do

mundo com objetivo de disseminação de boas práticas. De acordo com palestrante Carlos Hilsdorf (2010, s.p.)

“Benchmarking é uma ferramenta de gestão que consiste na mensuração da performance de uma organização,

permitindo que ela compare sua eficiência com a de outras organizações, frequentemente com a empresa líder do

segmento ou outro concorrente muito relevante.”. HILSDORF, Carlos. O que é benchmarking? Disponível em: < http://www.administradores.com.br/artigos/negocios/o-que-e-benchmarking/48104/> Acesso em: 29 set. 2014.

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De acordo com o observado nos documentos, não aparecem explicitamente menções

diretas sobre a internacionalização da educação superior, mas há orientações para área de

educação superior com medidas que podem influenciar, diretamente ou não, tais como:

incentivo à privatização, incentivo ao investimento dos recursos públicos no setor privado,

criação de um sistema único de avaliação global da educação e a utilização da ferramenta

empresarial denominada benchmarking.

2.2.3 Interfaces dos organismos internacionais à política de internacionalização da educação

superior brasileira

Primeiramente, ressaltamos que os organismos internacionais promovem diretrizes,

direcionamentos, sugestões, mas cabe aos governos nacionais adotarem ou não tais

orientações. No âmbito dos governos nacionais, toda construção de política possui o embate

de forças, seja dos favoráveis, seja dos contrários, implicando forças a atuarem sob interesses

diversos. Essa complexa seara requer abranger os prós, os contras, os condicionantes e as

consequências envolvidas, sob o contexto sócio-político-econômico do país.

Por isso, ao dimensionar os documentos da UNESCO e do BM e suas influências na

construção da política de internacionalização da educação superior brasileira, vimos certo

envolvimento do país, com ajustes, adaptações, reações. Não há apenas consentimento, há

negação também. Por exemplo, na análise do documento publicado em 2002, o Banco

Mundial orienta que, para expansão do acesso, uma das soluções é “iii) cobrando taxa de

matrícula em universidades públicas.” (BANCO MUNDIAL, 2002, p. xiii), mas o movimento

docente, estudantil, movimentos sociais, certas forças políticas, etc. resistiram e foram

vitoriosos nessa questão, até então.

Nessa perspectiva, retomamos o pensamento de Silva (2008), que aborda o Estado

como reflexo das relações sociais, campo de disputa, de consensos e de contradições.

De forma resumida, a partir da análise feita nesta dissertação acerca dos documentos

da UNESCO e do BM, podemos destacar as seguintes orientações acerca da área de educação:

UNESCO:

1. Promove orientações sobre as ações de internacionalização da educação superior;

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2. Entende que ações de internacionalização da educação superior podem ser utilizadas

como ações meio para obtenção da cultura de paz entre povos;

3. Refere-se, predominantemente, ao princípio da solidariedade internacional, porém a

partir de 2009, abre-se oportunidade para ações da transnacionalização da educação

superior;

4. Entende a internacionalização como um dos maiores desafios institucionais

(universidades e sistemas de educação superior) a operar num mundo em rápidas

mudanças;

5. Menciona a preocupação com a elitização das ações de internacionalização da

educação superior;

6. Considera que as ações da internacionalização da educação são os caminhos

principais para promover o avanço da educação superior em todo o mundo, como

parte essencial da qualidade e relevância da educação superior;

7. Traz à responsabilidade da UNESCO, promover uma ação com o objetivo de aliviar

os efeitos negativos da “perda de quadros” e levar a um processo dinâmico de

“ganho de talentos”. Além de promover uma melhor coordenação entre organizações

envolvidas em programas já existentes e projetos visando à cooperação internacional

em educação superior;

8. Orienta sobre a necessidade de criação do Espaço do Encontro Latino-Americano e

Caribenho de Educação Superior (ENLACES), como forma de consolidar a

cooperação Sul-Sul;

9. E, identificada que a cooperação internacional, recomenda que se deve atuar com

parceria e não com assistencialismo, constituindo indicadores avaliativos dos

sistemas educacionais, promovendo intercâmbios e buscando a

flexibilização/harmonização com as legislações internacionais.

BM:

1. Promove orientações acerca da área de educação superior, sem especificar a

internacionalização da educação superior;

2. Considera primordial para eficiência das universidades: incentivo ao

desenvolvimento das universidades privadas, fontes de recurso público e privado,

aumento da autonomia e responsabilidade institucional, consequentemente, sendo

menos dependente da participação estatal, ou seja, possível redução da injeção de

recursos públicos;

3. Acredita que educação está intrinsecamente ligada ao crescimento e desenvolvimento

econômico do país, ou seja, como um fator financeiro;

4. Traz como foco especial de política de ensino superior a promoção da ciência,

tecnologia e inovação através da utilização mais eficaz das parcerias entre

universidades;

5. Orienta para criação de um sistema único de avaliação global da educação;

6. E, instrui investimentos na cópia das boas práticas (benchmarking) da educação de

outros países via a cooperação internacional.

Para entender as correlações entre o conjunto de orientações citadas e as políticas

educacionais adotadas no Brasil, resgatamos a seguir o exposto no item 2.1 deste capítulo. Ou

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seja: de forma também sintética, elencamos os posicionamentos assumidos pelo Brasil acerca

do tema da internacionalização da educação superior:

1. Desde a criação das universidades federais as ações da internacionalização de

educação superior vincularam-se à prática da pesquisa e à pós-graduação;

2. O processo de internacionalização da educação superior é visto como

responsabilidade institucional das universidades com possibilidade de fomento

público pelos órgãos: CAPES e CNPq;

3. Institucionalmente, entende-se como primordial o princípio da solidariedade

internacional no sentido humanista da civilidade, porém, evidenciaram-se algumas

ações da transnacionalização da educação superior;

4. Internacionalização é visto como relevante pelas universidades por contribuir para o

desenvolvimento do País e a redução dos desequilíbrios regionais;

5. Criou-se o primeiro programa que trata com exclusividade das ações de

internacionalização brasileira vinculadas à educação superior, financiado pelas

agências de fomento CAPES e CNPq, que inclui com maior ênfase o envio de

estudantes de graduação ao exterior;

6. Nas diretrizes da presente década, entende-se a internacionalização no campo das

“estratégias”, ou seja, envolvendo práticas para promoção da qualidade e relevância

da educação superior, e para o aumento qualitativo e quantitativo do desempenho

científico e tecnológico do País.

Diante do conjunto de elementos apurados, percebemos uma adesão híbrida às

orientações dos organismos internacionais ora estudados, estando presentes adaptações,

ajustes e embates entre os sujeitos envolvidos.

Considerando que o único documento formal que trata da internacionalização da

educação superior, delimitando-se ao envio de estudantes brasileiros em nível de graduação

ao exterior, é o da criação do Programa CsF, evidencia-se a necessidade de analisar

detalhadamente tal programa para entender o posicionamento brasileiro frente à tendência de

adesão mundial ao citado processo, o que realizamos no próximo capítulo.

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3. O PROGRAMA CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS

Neste capítulo, abordamos o contexto sócio-político-econômico referente ao período

de implementação do Programa CsF, para facilitar a compreensão do funcionamento do

programa. Além disso, apresentamos como exemplo o processo de internacionalização na

UFMT, ressaltando a inserção do CsF em tal processo.

3.1. CONTEXTO SÓCIO-POLÍTICO-ECONÔMICO NO PERÍODO DE CRIAÇÃO DO

PROGRAMA CIÊNCIA SEM FRONTEIRAS

Conforme já abordado, no final do século XX até os presentes dias, há um

predomínio mundial político-econômico do neoliberalismo. Na América Latina, mais

especificamente no Brasil, apresenta-se uma configuração político-econômica que muitos

autores interpretam como novo desenvolvimento.

Com relação ao regime de produção, esse é prioritariamente pautado no modelo da

acumulação flexível (toyotismo), que, de acordo com Harvey, fundamenta-se na informação e

na internacionalização do mercado financeiro.

A respeito da informação, Harvey (1989, p. 150) esclarece:

Com efeito, na medida em que a informação e a capacidade de tomar decisões

rápidas num ambiente deveras incerto, efêmero e competitivo se tornaram cruciais

para os lucros, a corporação bem organizada tem evidentes vantagens competitivas

sobre os pequenos negócios. A “desregulamentação” [...] significou muitas vezes um

aumento da monopolização [...] em setores como empresas de avião, energia e

serviços financeiros. Num dos extremos da escala de negócios, a acumulação

flexível levou a maciças fusões e diversificações corporativas (HARVEY, 1989,

p.150).

Sobre a internacionalização do mercado financeiro, Harvey (1989, p.152) assevera:

O segundo desenvolvimento, que foi muito mais importante do que o primeiro, foi a

completa reorganização do sistema financeiro global e a emergência de poderes

imensamente ampliados de coordenação financeira. Mais uma vez, houve um

movimento dual; de um lado, para a formação de conglomerados e corretores

financeiros de extraordinário poder global; e, do outro, uma rápida proliferação e

descentralização de atividades e fluxos financeiros por meio da criação de

instrumentos e mercados financeiros totalmente inéditos. [...] A formação de um

mercado de ações global, de mercados futuros de mercadoria (e até de dívidas)

globais, de acordos de compensação recíproca de taxas de juros e moedas, ao lado

da acelerada mobilidade geográfica de fundos, significou, pela primeira vez, a

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criação de um único mercado mundial de dinheiro e de crédito[...] (HARVEY, 1989,

p.152).

Considerando a afirmação de que “o sistema do capital é orientado para expansão e

movido pela acumulação” (MÉSZÁROS, 2002, p.100, grifo autor), o mesmo não medirá

esforços no sentido da sua reprodução, independentemente dos desafios que encontrar pela

frente e das consequências globais que possam acarretar.

Mesmo sob “normalidade” de perturbações e bloqueios cíclicos relativamente

limitados, a destruição que acompanha as consequentes crises socioeconômicas e

políticas pode ser enorme, como revelam os anais do século XX [...]. Portanto, não é

muito difícil imaginar as implicações de uma crise sistêmica, verdadeiramente

estrutural; ou seja, uma crise que afete o sistema do capital global não apenas em

um de seus aspectos – o financeiro/monetário, por exemplo – mas em todas as suas

dimensões fundamentais, ao colocar em questão a sua viabilidade como sistema

reprodutivo social (MESZÁROS, 2002, p.100, grifo autor).

Neste sentido é que não poderíamos deixar de evidenciar a crise de 2008, citada por

autores (BASÍLIO; OREIRO, 2009; BRESSER-PEREIRA, 2009; FERGUSON, 2013;

KRUGMAN, 2009; SICSÚ, 2009; entre outros) como a maior do sistema capitalista desde a

crise de 1929, tendo suas consequências ainda presentes na economia mundial, sobretudo,

sobre a internacionalização do mercado financeiro.

Sicsú (2009, p.144/145) esclarece o que foi a crise de 2008 e como ela desdobrou-se

em três crises: crise de crédito, crise de liquidez e crise patrimonial. Conforme o autor:

O sistema financeiro ofereceu aos americanos de renda mais baixa e instável o sonho

da casa própria. Ao mesmo tempo, ofereceu aos de cima outro sonho, o da alta

rentabilidade financeira – já que as operações tradicionais, como a concessão de

crédito, estavam remunerando muito aquém dos seus sonhos financistas. O sonho

dos de baixo era compatível com o sonho dos de cima. Diferentemente das empresas

e outros entes, os americanos de baixo (os indivíduos do grupo subprime)

supostamente poderiam pagar aos de cima juros mais altos. O sistema pactuou os

sonhos dos “subcidadãos” com os sonhos das superinstituições financeiras. As

operações de financiamento imobiliário ao grupo de “subcidadãos” eram de alto

risco por estarem garantidas pelo trabalho, por vezes, informal e por rendas,

potencialmente, variáveis. E, finalmente, chegou o dia em que as garantias

evaporaram. Chegou o dia em que as prestações da casa própria não puderam mais

ser pagas. Uma das formas de pactuação dos sonhos foi estabelecer contratos de

financiamento imobiliário com juros altos, mas com percentuais diferenciados ao

longo do tempo. No começo do contrato, as taxas de juros eram baixas, depois eram

muito altas para compensar a redução da primeira fase. Até o final de 2006, a maior

parte dos contratos ainda estava na fase de juros mais baixos (e, portanto, a

inadimplência era reduzida). Posteriormente, na fase de juros mais altos, a prestação

elevada não cabia no rendimento dos “subcidadãos” e os empréstimos deixaram de

ser validados. Esse é o desenho da crise de crédito que atingiu a economia norte-

americana. O sistema financeiro vendeu a dívida que carregava dos “subcidadãos”

para as super-instituições, remunerando-as com elevadas taxas de juros,

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proporcionais ao risco da operação. Quando foi percebido que a dívida dos de baixo

não estava sendo validada, decidiu-se vender o papel lastreado na capacidade de

pagamento dos “subcidadãos”. Quase que simultaneamente, todos tomaram a

mesma decisão. Por razões óbvias, os papéis passaram a valer quase nada. Quando

os preços de ativos entram em deflação aguda, diz-se, então, que o mercado entrou

em crise de liquidez. Esses papéis de alto risco e remuneração compunham o ativo

de muitas instituições financeiras nos Estados Unidos. Os valores de passivos são

mais rígidos do que de ativos. Se por um lado, a maior parte dos ativos das

instituições financeiras é cotada pelo mercado, por outro, os seus passivos estão

registrados em contratos. Assim, passivos e ativos se desequilibraram. Foi isto que

tornou o capital de diversas instituições insuficiente para garantir a continuidade de

suas operações. A terceira crise, então, adentrou a economia: a crise patrimonial.

Primeiro foi a crise de crédito, que se transformou em crise de liquidez que, por sua

vez, se transformou em crise patrimonial (SICSÚ, 2009, p.144/145).

Oreiro (2011, s.p.), ao abordar as origens da crise de 2008, afirma que ela se espalhou

pelo mundo em poucos meses:

Começou nos Estados Unidos após o colapso da bolha especulativa no mercado

imobiliário, alimentada pela enorme expansão de crédito bancário e potencializada

pelo uso de novos instrumentos financeiros, a crise financeira se espalhou pelo

mundo todo em poucos meses. O evento detonador da crise foi à falência do banco

de investimento Lehman Brothers no dia 15 de setembro de 2008, após a recusa do

Federal Reserve (Fed, banco central americano) em socorrer a instituição. Essa

atitude do Fed teve um impacto tremendo sobre o estado de confiança dos mercados

financeiros, rompendo a convenção dominante de que a autoridade monetária norte-

americana iria socorrer todas as instituições financeiras afetadas pelo estouro da

bolha especulativa no mercado imobiliário (OREIRO, 2011, s. p., grifo nosso).

Ferguson (2014, s.p.), em entrevista à Revista Época, pelo jornalista Rodrigo Turrer,

declara que as causas da crise de 2008 assim se apresentam:

O excesso de poder político do mercado financeiro. Nos últimos 30 anos, houve uma

enorme concentração do poder econômico de vários tipos de indústrias nas mãos de

poucas pessoas. Isso fez com que esses grupos tivessem capacidade de influenciar a

política americana. No caso do mercado financeiro, isso foi ainda mais acentuado

por causa do contínuo enfraquecimento das regras para o setor, desde o governo

Ronald Reagan (1981-1989) até hoje. Ao mesmo tempo, os serviços financeiros se

globalizaram. O mercado financeiro ganhou um poder de barganha e controle

inigualável. Nesse mesmo período, o poder do dinheiro tornou-se mais presente na

política americana. A partir do governo Reagan, o financiamento de campanhas saiu

de uma faixa de US$ 20 milhões a US$ 30 milhões, em 1970, para US$ 900

milhões, em 2012. A importância do dinheiro na política americana aumentou.

Então, as grandes fortunas do mercado financeiro conseguiram exercer cada vez

mais influência política, e o setor financeiro tornou-se sem princípios. O resultado

foi à crise de 2008 (FERGUSON, 2014, s. p.).

O mesmo autor, ao responder ao questionamento “Por que o senhor acha que o setor

financeiro é mais danoso que outros setores da economia?”, afirma:

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Porque ele é totalmente diferente das outras indústrias do capitalismo. Qualquer

crise ou instabilidade do setor financeiro pode causar a derrocada de toda a

economia, de uma forma que os outros setores não podem. Desregulamentado, o

mercado financeiro é mais perigoso que qualquer outro. Se uma empresa aeronáutica

constrói aviões que caem o tempo inteiro, todos percebem. Há um clamor popular,

governos investigam para descobrir o que houve de errado e tentam regular. O

mesmo vale para outras indústrias. Quando falamos do setor financeiro, isso não se

aplica. O mercado financeiro pode fazer estragos enormes antes que percebam que

há algo errado ali. Por isso, a regulação é necessária, mais que em outros setores

(FERGUSON, 2014, s. p.).

Já De Paula e Ferrari Filho (2009, p.142/143), no artigo intitulado “A crise das

finanças desregulamentadas: o que fazer?”, constatam que não existem regras na globalização

financeira:

A internacionalização do sistema financeiro tem alterado substancialmente a

natureza e os determinantes da dinâmica econômica mundial: a conjugação entre a

desregulamentação dos mercados financeiros e inovações financeiras – tais como

securitizações e derivativos – a livre mobilidade de capitais e a flexibilidade e a

volatilidade das taxas de câmbio e de juros têm, por um lado, limitado a ação das

políticas macroeconômicas domésticas e, por outro, sido responsáveis tanto pelas

frequentes crises de balanço de pagamentos das economias emergentes, quanto pelas

crises de liquidez e solvência, como a recente crise financeira internacional. Este

processo de globalização financeira, em que os mercados financeiros são integrados

de tal forma a criar um “único” mercado mundial de dinheiro e crédito, acaba, por

sua vez, diante de um quadro em que inexistem regras monetário-financeiras e

cambiais estabilizantes e os instrumentos tradicionais de política macroeconômica

tornam-se crescentemente insuficientes para conter os colapsos financeiros (e

cambiais) em nível mundial, resultando em crises de demanda efetiva (DE PAULA;

FERREIRA FILHO, 2009, p.142/143).

Também ao analisarem a crise de 2008 fazem as seguintes reflexões:

Em primeiro lugar, ela põe em xeque os benefícios concretos da globalização

financeira, com mercados financeiros desregulados, inclusive nos países

desenvolvidos. Em segundo lugar, ela nos remete, a partir das medidas de natureza

fiscal e monetária implementadas pelos EUA e países da Zona do Euro e do Japão –

tais como injeção de liquidez e de capital nos sistemas financeiros por parte das

autoridades econômicas destes países e a redução sincronizada da taxa básica de

juros dos principais bancos centrais mundiais – para se evitar uma recessão

econômica aguda, tanto a repensar o próprio papel do Estado na economia quanto à

necessidade de re-regulamentar os sistemas financeiros domésticos e reestruturar o

sistema financeiro mundial (SFM). (DE PAULA; FERREIRA FILHO, 2009, p.143).

A partir do exposto, podemos interpretar que a inexistência ou a limitação de regras

ampliam as atividades especulativas de risco e que a ação estatal é necessária para restaurar a

estabilidade do sistema financeiro mundial, evitando um efeito dominó devastador.

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E foram as ações estatais dos países, por meio de injeção de recursos financeiros no

mercado, que desacelerou o furor da crise, tanto nos EUA quanto em outros países do mundo.

De acordo com D´Almeida (2011, p. 9):

Em 20 de setembro de 2008, o Governo Bush anunciou um pacote de salvamento do

sistema financeiro americano, que envolvia a criação de um fundo de US$ 700

bilhões a ser administrado pelo Tesouro Americano [...]. O objetivo era a compra de

títulos hipotecários de posse das instituições, visando à restauração da confiança no

sistema financeiro americano e o “desempoçamento” do crédito, que se encontrava

literalmente paralisado. Portanto, dentro da perspectiva de que o problema era

somente de liquidez, a estratégia passava por injetar reservas nos bancos, via compra

de ativos problemáticos, ou seja, uma solução pelo lado do ativo (D´ALMEIDA,

2011, p.9).

Em 2009, com a mudança de governo nos EUA com a eleição de Barack Obama, as

consequências sociais da crise continuavam dramáticas “[...] uma vez que os índices de

desemprego permaneciam em torno de 10% e cerca de 860 mil mutuários tiveram suas casas

retomadas no ano anterior.” (D´ALMEIDA, 2011, p. 11). Então, o novo presidente precisou

fazer outra intervenção estatal visando aumentar o poder de consumo da população e evitar o

aprofundamento da recessão: “em 17 de fevereiro de 2009, o novo presidente assinou um

novo plano, que visava ampliar as medidas fiscais que foram estimadas em 5,6% do PIB.”

(D´ALMEIDA, 2011, p.11).

No Brasil, o governo atuou de forma direta, conforme exposto por Rêbelo (2011, p.

74):

O Banco Central, por seu turno, injetou mais de 2 bilhões de dólares no mercado,

com o escopo de se preservar instituições financeiras e manter o crédito para o

consumo. Baixaram-se os juros da taxa Selic e reforçou-se a liquidez do BNDES,

almejando-se o financiamento da economia. Somando-se a isso, os empréstimos em

bancos públicos cresceram no mesmo período pós- inauguração da “crise” no Brasil,

chegando ao índice de 29,7% entre agosto de 2008 e junho de 2009, em comparação

com o crescimento de 7,51% dos bancos privados, no mesmo período (RÊBELO,

2011, p.74).

De igual forma, o governo precisou intervir na economia de forma indireta, por meio

de fornecimento de benefícios fiscais às empresas para manter a economia aquecida e os

postos de trabalho. De acordo com Rêbelo (2010), o fomento pode ser ilustrado pelo incentivo

financeiro por parte da Caixa Econômica Federal às construtoras de imóveis, corte do imposto

sobre produtos industrializados (IPI) para material de construção, automóveis e

eletrodomésticos (chamados de linha branca).

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A intervenção direta e indireta na economia pelos governos mundiais se deu pelo fato

de que a crise de 2008 atingiu tanto o mercado financeiro mundial quanto as questões sociais,

conforme afirma Castelo Branco (2008, s. p.), que cita três efeitos nessa direção:

Os efeitos da crise financeira já se fazem presentes no mundo do trabalho. A falência

de diversas empresas, bem como a diminuição do crédito em circulação, reduzem os

níveis de consumo e investimento, o que gera, consequentemente, a queda no nível

das atividades econômicas. O resultado mais imediato deste ciclo econômico

descendente é o aumento do desemprego dos trabalhadores. [...] Um segundo

efeito da crise financeira sobre a classe trabalhadora, e que merece a nossa atenção,

é o aumento do pauperismo. A tendência – a curto, médio e longo prazos – é a

deterioração do bem-estar social dos trabalhadores. [...] Por fim iremos abordar um

terceiro efeito socioeconômico da crise sobre a “questão social”. O aumento dos

preços dos alimentos, estimulado pelo aumento dos preços dos combustíveis e dos

insumos agrícolas, tem crescido muito ultimamente (CASTELO BRANCO, 2008,

s.p., grifo nosso).

Nas questões sociais, podemos ilustrar como a crise de 2008 atingiu a educação

nos EUA. O jornalista Rodolfo Stancki, no Jornal eletrônico Gazeta do Povo, publicou em

agosto de 2012, reportagem intitulada “Crise econômica afeta a educação superior nos EUA”.

Nessa reportagem, o jornalista cita o relatório da empresa de consultoria Bain & Company,

publicado em julho de 2012, em que consta a informação de que um terço das instituições de

educação superior, públicas e privadas está passando por dificuldades financeiras.

Stancki (2012, s. p.) assevera que “O levantamento afirma que a dívida das

faculdades cresce até 12% ao ano. O débito dos empréstimos feitos por estudantes para pagar

a universidade ultrapassa US$ 1 trilhão [...].” Ressalta ainda que as instituições de ensino

superior nos Estados Unidos são pagas, tanto as públicas quanto as privadas, sendo que as

públicas são menos onerosas por serem subsidiadas por impostos do governo norte-

americano (STANCKI, 2012, s. p.).

O jornalista completa a informação com uma fala da professora Areta Galat, do

Núcleo de Relações Internacionais do Centro Universitário FAE: “Como todas essas

instituições têm um valor, a crise de 2008 afetou muito a vida dos estudantes e, por

consequência, de várias escolas.” Segundo ela, quem fez empréstimos para pagar a faculdade

antes da explosão da “bolha imobiliária”, agora precisa lidar com a dívida (STANCKI, 2012,

s. p.).

Como exemplo, podemos ainda citar os efeitos da crise de 2008 no estado da

Califórnia – EUA baseado na interpretação da publicação da Chronicle of Higher Education,

feita pelo jornalista Carlos Orsi, na Revista de Ensino Superior em agosto de 2012, por meio

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da reportagem “Crise econômica e demanda crescente pressionam universidades públicas na

Califórnia”:

Os cortes de verba afetam todo o sistema: a Universidade da Califórnia perdeu US$

1 bilhão de financiamento estadual desde 2008, uma queda de 25%. As faculdades

comunitárias perderam US$ 668 milhões no mesmo período, uma queda de 24%. E

a Universidade Estadual viu sua dotação cair 30%, perdendo US$ 900 milhões

(ORSI, 2012, s. p.).

Além da intervenção econômica, os EUA, epicentro da crise de 2008, ao que parece,

iniciaram logo em 2009, na administração do presidente Barack Obama, uma nova forma de

diplomacia em suas relações internacionais.

No evento da 5ª Cúpula das Américas, realizado em 2009, na República de Trinidad

e Tobago, o referido presidente busca aproximação com os países da América Latina,

conforme cita Auken (2009, s. p.) na reportagem “Cúpula das Américas termina sem acordo

sobre crise econômica”:

O principal papel efetuado pelo presidente americano foi tentar refazer a política dos

EUA na região, apresentando seu governo como uma radical ruptura com a postura

confrontante da administração Bush. Ele enfatizou que os Estados Unidos estavam

na cúpula “para escutar e não somente para falar” e para avançar em uma nova

relação entre os EUA e os países ao sul, baseada no “respeito mútuo e igualdade”

(AUKEN, 2009, s. p.).

Em 2011, Barack Obama visitou a América Latina, incluindo o Brasil, com intuito de

aproximação iniciada na 5ª Cúpula das Américas, conforme exposto pelos jornalistas

Anselmo Massad e João Peres na reportagem “Visita de Obama indica atenção maior dos EUA à

América Latina e ao Brasil”, na Rede Brasil Atual, em março de 2011:

Segundo analistas, a visita iniciada pelo Brasil neste sábado (19), incluindo também

Chile e El Salvador, é uma tentativa de aprofundar laços e de convencer os países da

região de que as intenções de Obama são, de fato, de promover uma "parceria entre

iguais", como ele próprio sugeriu na Cúpula das Américas de 2009 (MASSAD;

PERES, 2011, s. p. ).

Nessa mesma reportagem, os jornalistas trazem ainda a situação do Brasil ao citar o

posicionamento do governo Lula e do governo Dilma:

Além disso, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva promoveu uma expansão nas

relações Sul-Sul, o que quer dizer priorizar nações como China, Venezuela e Irã. A

diversificação de parcerias comerciais é defendida como forma de evitar uma

dependência excessiva de uma única potência e foi parte da resposta mais rápida do

país à crise financeira internacional de 2008 e 2009, que teve nos Estados Unidos

sua origem e epicentro.[...]Apesar de não haver indicações de mudanças na política

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externa, Dilma Rousseff ofereceu sinais de que quer trabalhar com Obama para

reverter o declínio relativo no comércio bilateral durante os últimos anos e explorar

outras iniciativas que, segundo ela, podem ajudar o Brasil a se tornar um país de

classe média até o fim desta década (MASSAD; PERES, 2011, s. p. ).

Os jornalistas concluem qual é o interesse de tal visita:

A visita deste fim de semana pode ser vista como um sinal do interesse do

mandatário da Casa Branca de aproveitar o momento favorável nas relações,

especialmente em um contexto em que o Brasil é a oitava economia do mundo, com

perspectiva de crescimento sustentável pelos próximos anos (MASSAD; PERES,

2011, s. p. ).

Marco Aurélio Garcia, assessor-chefe da Assessoria Especial da Presidenta da

República, em entrevista concedida à imprensa do Itamaraty, às vésperas da vinda do

presidente do EUA ao Brasil, afirma:

É bom lembrar que nós tivemos uma reunião muito importante entre o presidente

Obama e os presidentes sul-americanos em Trinidad e Tobago durante uma reunião

das Américas e que, lamentavelmente, a partir daquele momento não houve o

desenvolvimento que nós esperávamos que pudesse haver. Mas eu acho que agora

está se retomando essa possibilidade de aprofundar a relação com os Estados Unidos

e nós vemos isso com muita alegria, com muita expectativa (BRASIL, 2011).

No Brasil, a primeira visita de Barack Obama, realizada nos dias 19 e 20 de março de

2011, estabeleceu dez acordos de relação bilateral entre Brasil e EUA em áreas relacionadas

ao comércio exterior, eventos esportivos, energia e educação.

Ao especificar a área de educação, objeto do estudo em tela, o principal documento

assinado pelo EUA e Brasil, na visita em 2011, foi o “Memorando de Entendimento para o

estabelecimento do Programa Diálogos Estratégicos Brasil- EUA a ser celebrado entre a

Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior ( CAPES/MEC) e a

Comissão para o intercâmbio educacional entre os Estados Unidos da América e o Brasil (

Comissão Fulbright)”.

Nesse documento é mencionado como objeto:

1. Estabelecer o Programa Diálogos Estratégicos Brasil-EUA (CAPES/Fulbright)

buscando aprofundar a cooperação entre acadêmicos de instituições brasileiras e

estadunidenses em áreas que sejam mutuamente benéficas para as comunidades

acadêmicas de ambos os países.

2. Fomentar a cooperação acadêmica e o intercâmbio entre pesquisadores de

alto nível brasileiros e estadunidenses em programas de pós-graduação stricto

sensu, mediante a visita de docentes e pesquisadores de alto nível a programas de

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pós-graduação stricto sensu ministrados no Brasil e nos EUA (BRASIL, 2011, grifo

nosso).

Fica evidenciado que esse documento “abre portas” para a criação de programas de

cooperação acadêmica internacional, ou seja, trata-se da gestação do Programa Ciência sem

Fronteiras.

Essa afirmação se confirma, considerando o citado pelo Diretor de Relações

Internacionais da CAPES, Márcio de Castro Silva Filho, em entrevista cedida para Jornal da

Ciência, em 03/11/2011: “Obama perguntou à presidente brasileira por que não há muitos

brasileiros estudando nos EUA, se atualmente existem 130 mil chineses e 120 mil indianos

nas universidades americanas.”

Viana (2014, p. 10), no artigo “A reação Norte-Americana ao programa Ciência sem

Fronteiras”, ao refletir sobre as relações bilaterais de educação entre os EUA e o Brasil,

conclui que:

Pode-se entender o programa do governo brasileiro como uma resposta ao

andamento e o contexto das relações internacionais bilaterais entre Brasil e Estados

Unidos. Ainda, responde à intensificação para o desenvolvimento das Ciências e

Tecnologias, dentro do âmbito mais amplo dos GPDs [U.S -Brazil Global

Partnership Dialogue ] e da parceria Brasil-Estados Unidos para o século 21,

ocorridos em 2012. Como foi verificado, tais parcerias ditaram a reação norte-

americana ao que se refere à operacionalização do programa naquele país, reação

positiva e alinhada à visão estratégica dada ao assunto (VIANA, 2014, p.10).

Resumidamente, ousamos fazer a seguinte análise conjuntural:

EUA – Epicentro da crise de 2008; consequências também na área de educação;

promotor de alta tecnologia; busca por nova diplomacia e aproximação com a América Latina

com vista a expandir sua econômica e ideologia.

BRASIL – Crise de 2008 com menor ênfase; situado entre as oito maiores economias

mundiais; deficitário em alta tecnologia; princípios do novo-desenvolvimentismo

(crescimento econômico com distribuição de renda aliado à parceria com os países

desenvolvidos, respeitando certas diretrizes dos organismos internacionais); do ponto de vista

da aproximação com o EUA, há o interesse em apropriar-se de conhecimento tecnológico e

inovador.

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Temos, então, um encontro de interesses: aquele que possui alta tecnologia e precisa

de recursos financeiros e o que possui recurso financeiro e precisa de alta tecnologia.

Podemos apontar como um dos resultados o Programa Ciência sem Fronteiras.

3.2. FISIONOMIA E FUNCIONAMENTO DO PROGRAMA CSF

O CsF foi idealizado pelo governo da Presidente Dilma após a visita do Presidente

dos Estados Unidos da América, Barack Obama, em março de 2011.

O surgimento do CsF é tratado por Catani e Silva Júnior ( 2013, p.171):

Em 25 de janeiro de 2011, o presidente Barack Obama anunciou, em discurso do

Estado, a importância da relação bilateral Brasil- Estados Unidos. Visitou Brasília e

Rio de Janeiro (março de 2011), quando se encontrou com a presidente Dilma

Rouseff. Foi nessa visita que o Programa CsF foi comentado como uma área

estratégica de desenvolvimento (Entrevista concedida pelo professor William L.

Gertz, do American Institute For Foreing Study, ao professor João dos Reis Silva

Júnior na cidade de Nova York em 12 de julho de 2012) (CATANI; SILVA

JÚNIOR, 2013, p.171).

O primeiro anúncio sobre o Programa foi feito pelo Ministro da Ciência e Tecnologia

e Inovação (MCTi), Aloisio Mercadante, na 38ª reunião do Conselho de Desenvolvimento

Econômico e Social (CDES), em julho de 2011, em Brasília. Na ocasião, Mercadante

destacou que hoje o Brasil é o 13º no ranking de produção científica mundial, média cinco

vezes maior que a do restante das outras nações, mas que o país precisa produzir mais

patentes e que o Programa Ciência sem Fronteiras surge com este intuito, destacando que se

trata de “[...] os melhores estudantes do Brasil, nas melhores universidades do mundo. Assim

poderemos superar o maior desafio do país e dar um salto quântico na formação para áreas

estratégicas de forma sustentável, ampliando os setores de média e alta tecnologia.” (CsF,

2011).

Como se percebe, o Programa CsF nasce para estimular o avanço da ciência nacional

em tecnologia, inovação e competitividade, por meio da expansão da mobilidade

internacional, utilizando-se como estratégia o incentivo financeiro para aumentar a presença

de pesquisadores e estudantes brasileiros em instituições de excelência no exterior e para

atrair jovens talentos científicos e investigadores para trabalhar no Brasil. Tem-se como

objetivo principal:

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[...] propiciar a formação e capacitação de pessoas com elevada qualificação

em universidades, instituições de educação profissional e tecnológica, e centros

de pesquisa estrangeiros de excelência, além de atrair para o Brasil jovens

talentos e pesquisadores estrangeiros de elevada qualificação, em áreas de

conhecimento definidas como prioritárias (BRASIL, 2011).

Para entendermos a construção desse Programa, precisamos contextualizá-lo

cronologicamente. Logo após o anúncio em agosto de 2011, iniciou-se a primeira convocação

para o Programa CsF, por meio da Chamada Pública CAPES n.º 01/2011 (Diário Oficial da

União n.°166, 29/08/11), que tornou pública a seleção por IES brasileiras de estudantes de

graduação em áreas e temas de estudo de interesse para o Brasil, para realização de disciplinas

e estágios em Universidades dos Estados Unidos da América no âmbito do Programa CsF,

sendo contemplado com bolsa de intercâmbio CAPES, custeios de viagem e o pagamento das

taxas acadêmicas na instituição estrangeira. Porém, cabia à CAPES escolher a Universidade

destino, com apoio da agência educacional Institute of International Educacion – IIE.

Em setembro de 2011, o CNPq entrou em contato com os Coordenadores do

Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) e Programa Institucional de

Bolsas de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação (Pibit) das Universidades

brasileiras com intuito de apresentar o Programa CsF e explicar que cada Universidade

receberia uma quota de vagas para contemplar estudantes bolsistas e ex-bolsistas dos PIBIC,

PIBIT, Programa Voluntariado de Iniciação Científica (VIC) e Programa de Educação

Tutorial (PET) que estivessem matriculados e cursando a graduação para participarem do

referido Programa (CsF, 2011).

A ideia presente era aperfeiçoar sua formação no exterior e estimular suas

competências e habilidades para o desenvolvimento científico e tecnológico, o

empreendedorismo e a inovação. O CNPq disponibilizou um documento com mais de 330

instituições que os candidatos poderiam escolher e determinou que a negociação da

vaga/estada deveria ser feita pelos pesquisadores e Universidades brasileiras, cabendo à

instituição estrangeira a palavra final sobre receber ou não o estudante contemplado.

No decorrer de agosto a dezembro de 2011, houve muitos desencontros de

informações entre os órgãos fomentadores, as Universidades brasileiras e os candidatos10

.

10

Fatos vivenciados pela autora a partir da experiência profissional para implementar o Programa CsF numa IES

brasileira.

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A principal dificuldade da chamada pública-CAPES foi encontrar locais disponíveis,

no âmbito do calendário do Edital, para efetuar a prova de proficiência em inglês exigida,

tendo em vista que somente as grandes cidades do Brasil possuem instituições habilitadas

para aplicarem tal prova, com calendário pré-definido e para um número reduzido de

estudantes, gerando assim um grande impasse aos candidatos. Na época, a CAPES teve que

repensar esse requisito e articular com a empresa administradora da prova e as Universidades

brasileiras uma parceria para atender a demanda do CsF.

Na forma de execução do programa pelo CNPq a maior dificuldade foi justamente a

responsabilidade imposta aos pesquisadores e às Universidades brasileiras de negociar as

vagas/estada do estudante nas instituições estrangeiras. Primeiro, porque poucos

pesquisadores já mantinham relações institucionais com os pesquisadores do exterior e

segundo porque quando havia o contato para estabelecer as negociações os parceiros

estrangeiros não sabiam do que se tratava, não conheciam o Programa CsF. Para tentar

amenizar a situação, o próprio CNPq emitiu uma carta de apresentação do Programa,

multilíngue, para que os candidatos pudessem enviá-las ao exterior apresentando o programa

e pleiteando vaga, mesmo assim poucas quotas foram contempladas nas universidades

brasileiras.

Era latente, nos dois órgãos, um desentendimento sobre quais cursos de nível

superior pertenciam às áreas elegíveis do Programa CsF, causando confusão entre os

estudantes, as universidades brasileiras e os órgãos executores.

Tendo em vista a forma atribulada e desarmônica da gestão desse programa pelos

órgãos executores, CAPES e CNPq, a Presidência da República tomou para a si a

responsabilidade de instituir oficialmente o programa e suas diretrizes.

Assim sendo, o Programa CsF foi oficialmente instituído em 13/12/2011, pelo

Decreto n.º 7.642 da Presidência da República, como um programa do Governo Federal

Brasileiro que “ [...]busca promover a consolidação, expansão e internacionalização da ciência

e tecnologia, da inovação e da competitividade brasileira por meio do intercâmbio e da

mobilidade internacional.” (BRASIL/CsF, 2014).

O programa tem como objetivos definidos no artigo 2, do Decreto de criação:

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I - promover, por meio da concessão de bolsas de estudos, a formação de estudantes

brasileiros, conferindo-lhes a oportunidade de novas experiências educacionais e

profissionais voltadas para a qualidade, o empreendedorismo, a competitividade e a

inovação em áreas prioritárias e estratégicas para o Brasil; II - ampliar a participação e a mobilidade internacional de estudantes de cursos

técnicos, graduação e pós-graduação, docentes, pesquisadores, especialistas,

técnicos, tecnólogos e engenheiros, pessoal técnico-científico de empresas e centros

de pesquisa e de inovação tecnológica brasileiros, para o desenvolvimento de

projetos de pesquisa, estudos, treinamentos e capacitação em instituições de

excelência no exterior; III - criar oportunidade de cooperação entre grupos de pesquisa brasileiros e

estrangeiros de Universidades, instituições de educação profissional e tecnológica e

centros de pesquisa de reconhecido padrão internacional; IV - promover a cooperação técnico-científica entre pesquisadores brasileiros e

pesquisadores de reconhecida liderança científica residentes no exterior por meio de

projetos de cooperação bilateral e Programas para fixação no País, na condição de

pesquisadores visitantes ou em caráter permanente; V - promover a cooperação internacional na área de ciência, tecnologia e inovação; VI - contribuir para o processo de internacionalização das instituições de ensino

superior e dos centros de pesquisa brasileiros; VII - propiciar maior visibilidade internacional à pesquisa acadêmica e científica

realizada no Brasil; VIII - contribuir para o aumento da competitividade das empresas brasileiras; e IX - estimular e aperfeiçoar as pesquisas aplicadas no País, visando ao

desenvolvimento científico e tecnológico e à inovação ( BRASIL, 2011).

Ficou estabelecido desde então que o programa se desenvolveria de acordo com duas

modalidades principais: 1) formação e capacitação de pessoas com elevada qualificação em

universidades, instituições de educação profissional e tecnológica, e centros de pesquisa

estrangeiros de excelência; 2) atração de jovens talentos, principalmente brasileiros, e

pesquisadores renomados estrangeiros para vir ao Brasil desenvolver projetos de pesquisa por

cooperação científica e tecnológica. Os dois pontos seriam submetidos a financiamento de

bolsas e fomento à pesquisa.

A primeira modalidade possui como público alvo: 1) estudantes de graduação na

modalidade graduação – sanduíche, 2) estudantes de doutorado na modalidade doutorado-

sanduíche, 3) candidatos graduados ou mestres à formação plena de doutoramento na

modalidade doutorado pleno, 4) candidatos doutores na modalidade pós-doutorado e

docentes, pesquisadores e estudantes de cursos técnicos e superiores oferecidos por institutos

de formação profissional e tecnológica na modalidade educação profissional e tecnológica.

A segunda modalidade possui como público alvo: 1) jovens cientistas de talento,

principalmente brasileiros, com destacada produção científica ou tecnológica na modalidade

jovens talentos e 2) lideranças internacionais, estrangeiros ou brasileiros, com expressiva

atuação no exterior na modalidade pesquisadores visitantes estrangeiros.

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Nesse mesmo documento, foi detalhada a forma de gestão, divulgação e fomento. Para

gerir o referido programa foram criados dois Comitês, um de Acompanhamento e

Assessoramento e outro Executivo.

O Comitê de Acompanhamento e Assessoramento tem como membros representantes:

1 da Casa Civil da Presidência da República, 1 do Ministério da Educação, 1 do Ministério da

Ciência, Tecnologia e Inovação, 1 do Ministério das Relações Exteriores, além do Presidente

do CNPq e do Presidente da CAPES . Assumirá a presidência deste Comitê o representante do

Ministério da Educação e o Ministério da Ciência e Tecnologia, alternadamente a cada 12

meses.

Esse Comitê possui como principais atribuições propor ações, metas, indicadores,

áreas prioritárias, bem como acompanhamento, divulgação e avaliação do referido programa

visando seu bom desenvolvimento, numa postura estrategista.

No Comitê Executivo, também há mais um membro representante de cada órgão

descrito no outro Comitê acima, além da presença dos presidentes do CNPq e CAPES. Porém,

sendo presidido primeiramente pelo representante do Ministério da Ciência e Tecnologia e

Inovação para depois de 12 meses alternar com o representante do Ministério da Educação, e

assim sucessivamente pelo tempo de existência do referido programa.

O Comitê possui uma característica administrativa, tendo com principais atribuições

estabelecer cronograma, critérios de seleção dos bolsistas e das instituições participantes e

valores e períodos de bolsas, além de identificar centros e lideranças no exterior de interesse

para o Brasil.

No âmbito da gestão, ficou estabelecido que o modo de divulgação do processo de

concessão das bolsas é por chamadas públicas promovidas pela CAPES e CNPq,

conjuntamente, levando-se em conta o mérito dos candidatos e dos projetos, respeitadas as

especificidades de cada entidade executora.

O fomento do programa ocorre pelas dotações orçamentárias da União, por meio dos

Ministérios de Educação e de Ciência e Tecnologia e Inovação consignadas, que, anualmente,

complementam os orçamentos da CAPES e CNPq, respectivamente, os quais já desenvolviam

e desenvolvem cooperação internacional e concessão de bolsas no exterior, independente do

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Programa CsF. Além disso, há possibilidade de participação de outras fontes de recursos,

provenientes de entidades públicas e privadas.

Na ocasião do primeiro anúncio do referido programa (julho/2011), foi publicado em

meios de comunicação que o CNPq concederia o montante de 35 mil bolsas e a CAPES o

montante de 40 mil bolsas, totalizando 75 mil bolsas, com investimento governamental inicial

de 3 bilhões de reais e 160 milhões de reais, respectivamente. Porém, o Governo esperava que

o investimento crescesse com a iniciativa privada arcando com mais 25 mil bolsas, para

garantir 100 mil bolsas até 2014/2015.

Até o momento (abril de 2015) temos a informação de que a iniciativa privada

assumiu o financiamento de 26 mil bolsas (CsF, 2015) o que faz supor que ao longo de 2015 a

meta pretendida de oferta de bolsas pelo governo seja cumprida.

É importante ressaltar que ficou instituído em 09/01/2013, pela Portaria

Interministerial n.1, do Ministério da Educação, que as áreas e temas prioritários de atuação

do programa são:

I - engenharias e demais áreas tecnológicas;

II - ciências exatas e da terra;

III - biologia, ciências biomédicas e da saúde;

IV - computação e tecnologias da informação;

V - tecnologia aeroespacial;

VI - fármacos;

VII - produção agrícola sustentável;

VIII - petróleo, gás e carvão mineral;

IX - energias renováveis;

X - tecnologia mineral;

XI - biotecnologia;

XII - nanotecnologia e novos materiais;

XIII - tecnologias de prevenção e mitigação de desastres

naturais;

XIV - biodiversidade e bioprospecção;

XV - ciências do mar;

XVI - indústria criativa;

XVII - novas tecnologias de engenharia construtiva; e

XVIII - formação de tecnólogos.

(BRASIL, 2013)

Isso sinaliza que as áreas são limitadas, focadas em ciência, tecnologia e inovação

(conforme indica o Banco Mundial em seu documento publicado em 2011), definidas

exclusivamente pelo interesse do governo federal e sem perspectiva de alteração.

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3.2.1 Sobre a Graduação – Sanduíche

Neste trabalho, delimitaremos as análises apenas na primeira modalidade do

Programa CsF- a formação e capacitação de pessoas com elevada qualificação em

universidades, instituições de educação profissional e tecnológica, e centros de pesquisa

estrangeiros de excelência, no recorte do público alvo estudantes de graduação – sanduíche,

no período de exercício de 2011 a 2014.

O Quadro 5, a seguir apresentado, sistematiza, cronologicamente, eventos marcantes

que se sucederam, considerando o período de abrangência do CsF. Tem-se expectativa, com

isso, de mostrar a fisionomia geral do programa e sua evolução, por meio das sucessivas

normatizações estabelecidas.

Quadro 5 - Programa Ciência sem Fronteiras. Eventos marcantes – agosto de 2011 a outubro de 2013

Data Descrição Agosto de 2011 1ª convocação para o Programa CsF, através da Chamada Pública CAPES n.º 01/2011,

com destino para as Universidade dos EUA. Setembro de

2011 CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico entrou em

contato com os Coordenadores do Programa de Iniciação Científica e Tecnológica

(PIBIC/PIBIT) das Universidades brasileiras para apresentar o Programa CsF e explicar

que cada Universidade receberia uma quota de vagas para contemplar estudantes

bolsistas e ex-bolsistas dos Programa de Iniciação Científica. Agosto a

Dezembro de

2011

Período marcado por recorrentes desencontros de informações entre os órgãos

fomentadores, as Universidades brasileiras e os candidatos, principalmente a respeito da

definição dos cursos elegíveis. 13/12/2011 Publicação do Decreto n.º 7.642 da Presidência da República, que instituiu oficialmente

o Programa CsF. Nesse mesmo documento foi detalhada a forma de gestão, divulgação

e fomento. Dezembro de

2011 2ª convocação para o Programa CsF, através das Chamadas Públicas 102 até 106.

Março de 2012 3ª convocação para o Programa CsF, através das Chamadas Públicas de 108 até 116. Agosto de 2012 4ª convocação para o Programa CsF, através das Chamadas Públicas de 117 até 124. Novembro de

2012 5ª convocação para o Programa CsF, das Chamadas Públicas de 126 até 134.

18/12/2012 Publicação da Portaria Interministerial n.1466, do Ministério da Educação, que intuiu

oficialmente o Programa Inglês sem Fronteiras (IsF). 09/01/2013 Publicação da Portaria Interministerial n.1, do Ministério da Educação, que definiu

definitivamente as áreas e temas prioritários de atuação do Programa CsF. Fevereiro de

2013 6ª convocação para o Programa CsF, através das Chamadas Públicas 136 até 142.

24/04/2013 Veto do Ministério de Educação brasileiro da Chamada Pública n.º 127 com destino às

Universidades de Portugal, justificado pelo fato da elevada procura por Portugal, em

detrimento dos países de outra língua, considerando que o Programa possui como um

dos objetivos principais incentivar a proficiência em uma segunda língua. Maio de 2013 7ª convocação para o Programa CsF, através das Chamadas Públicas de 143 até 155. Outubro de 2013 8ª convocação para o Programa CsF, através das Chamadas Públicas de 156 até 174. Agosto de 2014 9ª convocação para Programa CsF através das Chamadas Públicas de 179 até 204.

Fonte: Organizado pela autora, segundo documentos do Programa CsF.

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97

Ao longo do período examinado, parece ser possível afirmar que o programa constrói-

se apressadamente, sem o necessário planejamento e discussão entre os envolvidos,

acarretando desencontros de informações e, inclusive, divulgação de atos oficias posteriores à

implementação de ações a eles relacionadas.

No que tange à modalidade delimitada nesta pesquisa (graduação-sanduíche), até o

presente momento (outubro de 2014) foram lançadas 101 chamadas públicas, as quais são

agrupadas em nove convocações, que se referem a um conjunto de chamadas públicas

lançadas num dado período.

A Tabela 1, na sequência, apresenta os países que sediam as instituições onde se

destinam os estudantes de graduação brasileiros, bem como o mês de lançamento das

convocações, as chamadas públicas as quais pertencem às convocações (mantendo a

numeração utilizada pelo programa) e o total de vezes em que o país participou das chamadas

públicas divulgadas.

Tabela 1 - Chamadas Públicas do Programa CsF – Modalidade graduação- sanduíche

Lançamento Convocações/N.ºs das Chamadas por País

Ano 2011 2011

2012 2012 2012

20122

013 2013 2013 2013 2014

Mês Ago Dez Mar Ago Nov Fev Mai Out Ago

Convocações 1ª 2ª 3ª 4ª 5ª 6ª 7ª 8ª 9ª Total

Canadá* 108/

109 120/

124

147/149

/152 168/171 188/189/204 12

EUA* 01

CAPES 102 117

131/13

2 143 156 180/196 9

Bélgica* 110/

111

140/

141 175/176 186/187 8

Austrália* 112 119 148/153 167/172 184/185 8

Alemanha 103 118 144 157 181 5

Reino Unido 106 123 151 170 195 5

Coreia do Sul 114 121 150 169 190 5

França 104 128 158 182 4

Itália 105 130 159 183 4

Espanha 115 126 178 191 4

Holanda 116 122 177 193 4

Hungria 129 146 164 201 4

Japão 135 145 165 202 4

Finlândia 142 154 173 192 4

Suécia 133 160 197 3

Noruega 134 161 198 3

China 136 163 200 3

Irlanda 138 162 199 3

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Fonte: Dados organizados pela autora, com base nas chamadas públicas divulgadas.

*Países com mais de uma agência de cooperação;

** Chamada pública cancelada; estudantes selecionados redirecionados para outro país.

É possível notar, como destaque, que o Canadá totalizou sua participação em doze

chamadas públicas ao longo do período estudado (2011-2014). Além desse país, com maior

incidência nas chamadas públicas divulgadas, constam os Estados Unidos da América com

nove. Não por acaso, são países onde se localizam instituições de ensino superior que

aparecem com frequência em posições de frente em rankings11

internacionais, o que,

inclusive, pode sinalizar uma intencionalidade da política educacional brasileira em aliar-se à

lógica competitiva inerente a esse processo.

Cabe ressaltar, ao considerar as IES receptoras dos estudantes, que algumas não

figuram positivamente em institutos de classificação, o que parece contradizer a intenção de

“formação e capacitação de pessoas com elevada qualificação em universidades, instituições

de educação profissional e tecnológica, e centros de pesquisa estrangeiros de excelência.”

(BRASIL, 2011). Nesse sentido, a título de exemplo: a Chamada Pública n.º 132 anunciou a

destinação dos bolsistas para as Universidades e Instituições Comunitárias Historicamente

Negras dos EUA, bem como uma lista das 31 instituições contempladas pela referida

chamada. Porém, segundo levantamento realizado em março de 2014, no site dos rankings:

The World Reputations Rankings e QS World University Rankings, nenhuma se classifica

nesses rankings como as “melhores do mundo”. Percebe-se um afrouxamento com relação à

posição das IES de destino, senão veja-se o divulgado no site oficial do Programa CsF,

subitem Instituições de Destino, acessado em 29/09/14:

Os estudantes e pesquisadores do Ciência sem Fronteiras terão o seu treinamento nas

melhores instituições e grupos de pesquisa disponíveis, prioritariamente entre os

mais bem conceituados para cada grande área do conhecimento de acordo com os

principais rankings internacionais (CsF, 2014, grifo nosso).

11

A título de exemplo, tem-se: The World Reputations Rankings

(<http://www.timeshighereducation.co.uk/world-university-rankings/2014/reputation-ranking> e QS World

University Rankings (<http://www.topuniversities.com/university-rankings/world-university-

rankings/2013#sorting=rank+region=+country=+faculty=+stars=false+search= >).

Áustria 139 166 203 3

Nova

Zelândia 155 174 194 3

Portugal 113 127** 2

Polônia 179 1

TOTAL GERAL CsF 101

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A lógica de rankiamento de instituições de ensino superior suscita questionamentos,

por exemplo, os critérios utilizados na escolha das melhores, e apenas a evidenciamos neste

texto porque os gestores do Programa CsF valorizam a questão, conforme a citação anterior.

No que segue, o Quadro 6 destaca as principais alterações ocorridas ao longo das

convocações públicas do CsF, na modalidade de bolsas de graduação-sanduíche divulgadas

no período de 2011 a 2014. Ressaltamos novamente que convocações é um grupo de

chamadas públicas/editais (CP) lançadas na mesma época, sendo cada número correspondente

a um país de destino.

Quadro 6 - Destaques das Convocações do Programa CsF de 2011 a 2014

Convocação Descrição

1ª Convocação

CP CAPES n.º

01/2011

Data: Ago/2011

- CsF foi executado por dois órgãos separadamente, Capes e CNPq.

- Cabe a IES a responsabilidade pela organização e acompanhamento do processo de

apresentação das candidaturas e pela respectiva homologação junto a CAPES.

2ª Convocação

CP n.º 102 a 106

Data: Dez/2011

-A execução do CsF passou a ser conjunta, Capes e CNPq, através de representações

nos comitês: 1.Acompanhamento e Assessoramento e 2. Executivo. As IES

assumiram apenas o papel de homologadoras de elegibilidade dos candidatos.

-Ampliaram as modalidades de proficiência linguística e oportunizaram curso de

idioma intensivo no exterior, antes da mobilidade acadêmica.

3ª Convocação

CP n.º 108 a 116

Data: Mar/2012

-Alteraram o período de integralização do curso de 40%-80% para 20%-90% no

requisito de elegibilidade do candidato.

-Excluíram o requisito de apresentação de comprovantes da nota do Programa

Universidade para Todos (Prouni) ou do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) com

nota no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) igual ou superior a 600 pontos

para as candidaturas individuais.

4ª Convocação

CP n.º117 a 124

Data: Ago/2012

-Redefiniram a responsabilidade das IES, ficando apenas como homologadoras das

inscrições e validação da documentação comprobatória dos prémios e participação de

programas científicos.

-Extinguiram a modalidade de candidatura individual, porém, a apresentação dos

comprovantes dos Prêmios Jovem Cientista, Iniciação Científica e Olimpíadas da

Matemática e/ou de Ciências foram incorporadas na única modalidade vigente da

referida convocação, por adesão das IES brasileiras.

- Incluíram o dispositivo “Etapas de análise das candidaturas” para facilitar a

compreensão por parte dos candidatos e IES Brasileiras.

5ª Convocação

CP n.º 126 a 134

Data: Nov/2012

-Obrigaram o teste de proficiência linguístico para Espanha, até então não

requisitado.

-Incluíram dois subitens que limitavam a participação dos estudantes das áreas de

ciências biológicas e saúde no ciclo clínico, ou seja, nas atividades práticas de cursos

como Medicina, Enfermagem, Farmácia etc. Além de limitar a participação dos

estudantes das áreas de comunicação social que eram alocados na área “Indústria

Criativa”.

-Criaram dispositivos de proteção de possíveis ações judiciais: Recursos Financeiros,

Recursos Administrativos e Impugnação da Chamada.

- Delimitaram vagas específicas para estudantes matriculados em curso de graduação

tecnológica ou engenharias das Instituições da Rede Federal de Educação

Profissional e Tecnológica (IF) ou de Universidades ou Faculdades de Tecnologia

(FATEC).

-Aparece pela primeira vez a destinação dos bolsistas para as Universidades e

Instituições Comunitárias Historicamente Negras dos EUA.

-Vetaram a chamada pública n.º127, destinada a Portugal.

6ª Convocação -Incluíram a informação que caberá à CAPES e ao CNPq definirem a pertinência das

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100

CP n.º136 a 142

Data: Fev/2013

candidaturas às diversas áreas e temas, conforme o curso de origem dos candidatos.

- Incluíram os dispositivos “Atribuição das IES Brasileiras” e “Atribuição do

Programa CsF”, determinando a atuação de cada um dentro das etapas do referido

programa.

- Incluíram a solicitação de informações socioeconômicas e de origem racial do

candidato no Formulário de Inscrições.

7ª Convocação

CP n.º143 a 155

Data: Mai/2013

-Incluíram “Ter obtido nota no ENEM igual ou superior a 600 pontos, em exames

realizados a partir de 2009.”.

-Distribuíram os selecionados por nível de conhecimento linguístico, proporcionando

curso de língua de 2 a 6 meses e calendário adaptado.

-Implementaram a prova de proficiência em inglês gratuitamente para os países

EUA, Canadá, Hungria e Japão.

-É lançada chamada pública para Canadá ACCC – Associação das Faculdades

Comunitárias Canadenses.

8ª Convocação

CP n.º156 a 174

Data: Out/2013

-Incluíram: “Ter se inscrito no processo seletivo interno da sua IES. É dever do

candidato buscar informação junto à sua universidade a respeito da existência deste

processo seletivo interno.”

-Países com integralização diferenciada: Noruega de 40% a 90%, Suécia de 60% a

90%.

-Mantiveram a distribuição dos selecionados por nível de conhecimento linguístico.

-Implementaram a prova de proficiência em inglês gratuitamente para os países

(EUA, Noruega, China, Hungria e Japão).

9ª Convocação CP

n.°179 a 204

Data: Ago/2014

- É lançada primeira chamada pública para Polônia CRASP- Conferência de Reitores

de Escolas Acadêmicas da Polônia.

- É informada a quantidade de vagas gerida por cada órgão de fomento, sendo 5.500

vagas geridas pelo CNPq para as chamadas dos países: Polônia, Austrália, Bélgica,

Canadá (CALDO e CBIE), Coreia do Sul, Espanha, Finlândia, Holanda, Nova

Zelândia e Reino Unido. E 8.550 vagas geridas pela Capes para as chamadas dos

países: Alemanha, Áustria, Canadá (CIC), China, EUA (IIE e Nova), França,

Hungria, Irlanda, Itália, Japão, Noruega e Suécia.

- Alegando incompatibilidade curricular, incluíram limitação para alocação de

disciplinas de ciclo clínico para os candidatos matriculados em cursos das áreas da

Saúde, Ciências Biológicas ou Indústria Criativa, por exemplo os cursos de:

medicina, enfermagem, nutrição, farmácia, fisioterapia, terapia ocupacional,

odontologia, veterinária e design, nas chamadas dos países: Polônia, Bélgica e

Canadá – CBIE.

- E por exigência da agência internacional de cooperação, alegando também

incompatibilidade curricular, excluíram cursos das áreas da Saúde, Ciências

Biológicas ou Indústria Criativa, por exemplo: medicina, medicina veterinária,

enfermagem, odontologia, terapia ocupacional, farmácia, fonoaudiologia, cinema,

design, nutrição entre outras, nas chamadas dos países: EUA, Alemanha, França,

Austrália, Coreia do Sul, Irlanda, China, Hungria, Japão, Áustria, Canadá (CIC e

CALDO).

- Acrescentaram que todas as comunicações no âmbito das chamadas serão

realizadas por intermédio do endereço de e-mail ou endereço de correspondência

cadastrados no Currículo Lattes do candidato.

- Na etapa de homologação das candidaturas, acrescentaram a avaliação por parte da

IES Brasileira, da elegibilidade de área e temas do candidato dependendo das

restrições de cada chamada.

- Efetuaram alteração no critério de desempate, colocando como ordem: 1° Maior

nota do ENEM, 2° Prêmio acadêmico ou mérito, 3º Maior nota de proficiência, 4°

Maio período de integralização e 5° Participação de programa de iniciação científica.

Sendo que na 8° convocação a ordem era: 1º Maior nota de proficiência, 2º Maio

período de integralização, 3º Participação de programa de iniciação científica e 4°

Prêmio acadêmico ou mérito.

Fonte: Dados organizados pela autora, com base nas chamadas públicas divulgadas pelo CsF.

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101

A primeira grande alteração ocorrida nas chamadas públicas foi justamente no âmbito

da execução, sendo caracterizada por dois momentos: antes da instituição oficial do Programa

CsF e após sua instituição oficial.

Antes da instituição oficial, ou seja, de agosto a dezembro de 2011, o programa foi

executado por dois órgãos separadamente, cada um com sua forma de gestão já explicitada

anteriormente. Após sua instituição oficial, ou seja, a partir de 13/12/2011, a execução passou

a ser conjunta por meio de representações nos comitês criados.

É importante ressaltar que a forma assumida antes da instituição oficial do referido

programa pelo CNPq foi extinta, de modo que as quotas não usadas até a criação oficial do

programa foram devolvidas aos Comitês. Por sua vez, a Chamada Pública-CAPES n.º

01/2011 foi usada como base nas convocações seguintes para criação das chamadas públicas.

Ao analisarmos a 2ª convocação, percebemos que a administração federal do CsF,

após oficialmente criado, assumiu completamente a gestão do programa, deixando as IES

brasileiras apenas como homologadoras de elegibilidade dos candidatos. Nesse escopo,

ampliou o público alvo através da alteração de matriculados em curso de bacharelado para

curso de nível superior e também pela aceitação de outras modalidades de proficiência

linguísticas, além de esclarecer dúvidas acerca das áreas contempladas e de oportunizar cursos

intensivos de idioma no exterior.

Da 1ª convocação para 2ª, destacamos a redução da participação das IES no processo

de escolha do bolsista. No primeiro momento, a IES tinha a responsabilidade pela organização

e acompanhamento do processo de apresentação das candidaturas e pela respectiva

homologação junto a CAPES, porém, alterou-se a responsabilidade da seleção para o

Programa CsF. Ao que parece o programa preserva a gestão estatal, provavelmente, para não

sofrer interferências na sua matriz estrutural.

Identificamos na 3ª convocação que o CsF, buscando ampliar o público alvo, alterou

consideravelmente o requisito do período de integralização do curso, pois, ao transferir de

40%-80% para 20%-90%, passam a serem elegíveis estudantes que cursam o seu primeiro

semestre de estudos, mas que, dependendo do seu tempo total de curso, terão integralizado até

o início da viagem, setembro/2012, o mínimo exigido. Ao mesmo tempo, os estudantes que

estão próximos à finalização do curso também poderão concluir seus estudos no exterior,

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102

retornando ao Brasil apenas para colação de grau. Outra estratégia adotada foi excluir o

requisito de apresentação de comprovantes da nota do Programa Universidade para Todos

(Prouni) ou do Sistema de Seleção Unificada (Sisu) com nota no Exame Nacional do Ensino

Médio (Enem) igual ou superior a 600 pontos para as candidaturas individuais.

Sobre a proficiência, foi alterado principalmente o momento em que será ofertado o

curso de idiomas, ou seja, na 2ª convocação se previa para antes do início das atividades

acadêmicas e na 3ª convocação para concomitante às atividades acadêmicas.

Além disso, persistiam os desencontros acerca dos cursos de nível superior que

pertencem às áreas e temas do programa. Tal fato levou o Ministério da Educação a publicar

em 09/01/2013 a Portaria Interministerial n.1, que estabelece as áreas e temas prioritários de

atuação do programa.

Até então, ou mais exatamente, nas 1ª, 2ª e 3ª convocações, a forma de participação

no Programa CsF previa duas modalidades, uma pela IES brasileira aderindo ao programa e

outra mediante candidatura individual destinada a estudantes das IES brasileiras que não

aderiram ao programa. Porém, nessa 4ª convocação, a modalidade de candidatura individual

foi extinta. Salientamos que nessa convocação incluiu-se o dispositivo sobre as “Etapas de

análise das candidaturas” com o objetivo de facilitar o entendimento a respeito do processo de

seleção por parte dos candidatos e das IES brasileiras.

Podemos observar que a obrigatoriedade da candidatura individual de apresentar

comprovantes dos Prêmios Jovem Cientista, Iniciação Científica e Olimpíadas da Matemática

e/ou de Ciências foi incorporada na única modalidade vigente da referida convocação, por

adesão das IES brasileiras.

Depois da primeira experiência do programa em enviar estudantes para Espanha sem

exigir o teste de proficiência linguístico, foi necessário estabelecer o referido teste visando

melhor desempenho acadêmico e convivência social dos bolsistas, obrigatoriedade incluída na

5ª convocação.

Ainda com problemas de interpretação dos cursos elegíveis das áreas e temas, foi

anexada a todas chamadas desta 5ª convocação uma listagem contendo todos os cursos

elegíveis e acrescentados dois subitens que limitavam a participação dos estudantes das áreas

de ciências biológicas e saúde no ciclo clínico, ou seja, nas atividades práticas de cursos como

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103

Medicina, Enfermagem, Farmácia etc. Além disso, foi limitada a participação dos estudantes

das áreas de comunicação social que eram alocados na área “Indústria Criativa”.

Fica notório que, mesmo depois da portaria do Ministério da Educação que instituiu

as áreas e cursos de atuação do programa, as dúvidas acerca de área elegível persistiam.

Registramos também a criação dos dispositivos Recursos Financeiros, Recursos

Administrativos e Impugnação da Chamada, visando proteger o programa de possíveis ações

judiciais.

É importante evidenciar que somente a chamada pública 128 – França ofereceu curso

intensivo de idioma aos candidatos escolhidos pelo programa.

Na 5ª convocação, houve três fatos inéditos. Primeiro, a Chamada Pública n.º 131

apresentou-se com o objetivo de destinar 200 estudantes regularmente matriculados em curso

de graduação tecnológica ou engenharias das Instituições da Rede Federal de Educação

Profissional e Tecnológica (IF) ou de Universidades ou Faculdades de Tecnologia (FATEC)

relacionadas às áreas prioritárias do programa para Instituições Comunitárias de Ensino

Superior dos EUA.

Segundo, a Chamada Pública n.º 132 anunciava a destinação dos bolsistas para as

Universidades e Instituições Comunitárias Historicamente Negras dos EUA, inclusive, com

uma pequena descrição sobre o histórico e desempenho das mesmas, bem como uma lista das

31 instituições contempladas pela referida chamada.

Finalmente, o terceiro fato inédito refere-se ao anúncio na mídia do veto do

Ministério de Educação brasileiro da Chamada Pública n.º 127 com destino às Universidades

de Portugal, em 24 de abril de 2013, logo após o término do prazo para comunicação da

aprovação ou indeferimento das candidaturas estipulado do cronograma (17 de abril de 2013).

Tal veto foi justificado pelo fato da elevada procura por Portugal em detrimento dos países de

outra língua, sendo que o programa possui como um dos objetivos principais incentivar a

proficiência em uma segunda língua.

Na 6ª convocação, tem-se a definição final de que quem estabelece a elegibilidade da

candidatura com relação às diversas áreas e temas são a CAPES e o CNPq, bem como a

definição sobre as atribuições das IES e do Programa CsF acerca da sua operacionalização.

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104

Ambas, somente após um ano e meio de execução do Programa CsF, demonstrando, mais

uma vez, a forma aligeirada e imprecisa de sua construção.

Resumidamente, da 1ª à 6ª convocação, é possível observar que o programa foi sendo

alterado no sentido de ir se adaptando às dificuldades encontradas, seja no período de

integralização do curso que o candidato deve estar situado para poder participar, seja no curso

de idiomas ou mesmo na definição dos cursos elegíveis. Ao que se sinaliza, são alterações

processadas com o objetivo de obter sucesso na meta estabelecida: “O projeto prevê a

utilização de até 101 mil bolsas em quatro anos para promover intercâmbio, de forma que

estudantes de graduação e pós-graduação façam estágio no exterior com a finalidade de

manter contato com sistemas educacionais competitivos em relação à tecnologia e inovação.”

(CsF, 2011).

Já na 7ª convocação, destaca-se a relação com outra política de acesso por meio do

requisito de nota do ENEM – Exame Nacional Ensino Médio, utilizado como prova para

ingresso em diversas instituições de ensino superior no Brasil.

Na definição da 8ª convocação, chama atenção a ênfase de que os candidatos devam

se inscrever no processo seletivo interno das IES de origem. Provavelmente, isso se deva à

manifestação das IES nas reuniões de Coordenadores Institucionais do Programa CsF,

requerendo autonomia institucional. Em outras palavras, significa o pleito de atendimento

prioritário às regras próprias das IES, que são deliberadas por seus órgãos colegiados.

Um exame comparativo das informações constantes na 6ª, 7ª e 8ª convocações

permite inferir que o Programa CsF continua reagindo às demandas da sociedade,

reconhecendo a necessidade de adaptações por meio de ações que vão desde centralizar a

gestão nos órgãos CAPES/CNPq até a parceria com o curso de inglês online My English On

Line (MEO) para ensino do idioma inglês. No mesmo sentido, posteriormente, a adaptação

veio pela criação de um “co-programa”, denominado Inglês sem Fronteiras. Observa-se,

ainda, adequações como a publicação oficial sobre quem define áreas prioritárias, a

implementação de dispositivos de segurança jurídica, o veto a Portugal, a ênfase na última

convocatória sobre a obrigatoriedade do estudante se inscrever no processo seletivo interno

das IES, entre outras.

Um dos exemplos que podemos citar como reação da sociedade refere-se ao Oficio

CGRIFES n.01/2013, de 21/06/2013, documento emitido pelo Conselho de Gestores de

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105

Relações Internacionais das Instituições Federais de Ensino Superior/CGRIFES, da

ANDIFES – Associação Nacional Dirigentes de Instituições Federais de Ensino Superior.

Com base no citado documento, o Quadro 7 sintetiza os pontos considerados

negativos do Programa CsF e as sugestões de melhoria apresentadas pela ANDIFES:

Quadro 7 - Análise do Programa CsF pelos membros da CGRIFES/ANDIFES. 1. Exclusão das Humanidades e das Artes,

injustificável para um programa com tal envergadura

e com este nome;

1. Abertura de editais de mobilidade de alunos de

graduação para as áreas excluídas do Programa

Ciência sem Fronteiras, ou lançamento de novo

programa com outro nome, mas capaz de atender os

estudantes de graduação das áreas excluídas pelo

CsF; 2. Exclusão de continentes inteiros como destino de

estudantes de graduação;

2. Abertura de editais de mobilidade de alunos e

professores para a América Latina e a África, ainda

que prevendo mobilidades mais curtas e mais

vinculadas à pesquisa ou à iniciação científica

internacional; 3. Mobilidade basicamente unidirecional na

graduação, desconsiderando possibilidades de

internacionalização em casa;

3. Atribuição de um caráter bidirecional à

mobilidade prevista pelo CsF e, consequentemente,

apoio à oferta de disciplinas em inglês e espanhol

em cursos de graduação e pós-graduação das IFES,

incremento da oferta de disciplinas de português

como língua estrangeira pelas IFES e criação das

condições mínimas necessárias para a recepção de

estrangeiros, sobretudo no quesito moradia, tudo

isso mediante o lançamento de editais de estímulo; 4. Inúmeras dificuldades operacionais na gestão do

programa devido à falta de pessoal qualificado e à

divisão do trabalho entre duas agências com

histórias e práticas distintas;

4. Aproveitamento das competências instaladas nas

RIs das IFES na gestão do programa e

estabelecimento de fóruns constantes de

monitoramento e avaliação do programa envolvendo

seus representantes institucionais e os responsáveis

pelas RIs nas IFES, sobretudo os colegiados de seus

representantes institucionais, notadamente

CGRIFES e FAUBAI; 5. Dificuldades na obtenção de informações a

respeito dos processos em curso;

5. Maior transparência, agilidade e precisão na

divulgação das informações a respeito dos processos

em curso; 6. Falta de diálogo sistemático das agências com as

RIs das IFES, o que desperdiça competências

instaladas e provoca erros;

6. Abertura de fóruns de diálogo constante com as

RIs das IFES, sobretudo com os colegiados de seus

representantes institucionais, notadamente

CGRIFES e FAUBAI;

7. Privilégio das relações de balcão em detrimento

da mediação das RIs, com consequente prejuízo do

estabelecimento de vínculos institucionais entre as

IFES e as instituições estrangeiras, em favor de

relações individualizadas centradas nos bolsistas, o

que contribui para enfraquecer o processo de

internacionalização nas IFES, colocando em risco os

objetivos propalados pelo programa;

7. Envolvimento das RIs das IFES como parceiras

institucionais da gestão do programa, e não como

meras executoras do mesmo, além do

estabelecimento de fóruns constantes de

monitoramento e avaliação do programa envolvendo

seus representantes institucionais e os responsáveis

pelas RIs nas IFES, sobretudo os colegiados de seus

representantes institucionais, notadamente

CGRIFES e FAUBAI; 8. Aparente privilégio de critérios políticos em

detrimento de critérios técnico-acadêmicos na

seleção das universidades de destino;

8. Envolvimento das RIs das IFES na definição de

ao menos uma parte das universidades de destino

dos intercambistas, com privilégio dos acordos de

cooperação já celebrados por cada IFES;

9. Falta de controle por parte das universidades de 9. Envolvimento das RIs das IFES na definição de

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106

origem sobre a escolha das universidades de destino;

ao menos uma parte das universidades de destino

dos intercambistas, com privilégio dos acordos de

cooperação já celebrados por cada IFES; 10. Mudança de atitude dos parceiros tradicionais

das IFES no exterior, que passaram a cobrar por

vagas que anteriormente eram gratuitas, por vezes

desrespeitando os acordos que previam

reciprocidade;

10. Envolvimento das RIs das IFES na definição de

ao menos uma parte das universidades de destino

dos intercambistas, com privilégio dos acordos de

cooperação já celebrados por cada IFES;

11. Tratamento padronizado das universidades

brasileiras que estão em diferentes estágios no

processo de internacionalização, como, por exemplo,

a desconsideração dos acordos de cooperação

existentes entre as IFES e instituições estrangeiras;

11. Estabelecimento de um percentual do total de

bolsas do programa (uma cota) a ser destinado às

IFES, que as administrariam destinando-as às

universidades parceiras, observadas as

condicionantes impostas pelas agências de fomento

gestoras do CsF, com o intuito de respeitar a

autonomia das IFES e as características regionais de

cada uma e de otimizar as parcerias já estabelecidas; 12. Soluções imediatistas, paliativas e onerosas para

a questão da proficiência linguística.

12. Abertura de editais que estimulem o incremento

da proficiência linguística dos estudantes das IFES

valendo-se dos quadros locais das universidades,

que devem ser ampliados, investimento na criação

de centros de idiomas nas universidades e no ensino

de idiomas nos níveis fundamental e médio de

ensino. Fonte: Dados organizados pela autora com base no OF. CGRIFES n. 01/2013 - Conselho de Gestores de

Relações Internacionais das Instituições Federais de Ensino Superior – CGRIFES/ANDIFES.

Dessa lista extensa de críticas e sugestões, chama atenção a falta de diálogo entre os

idealizadores do CsF com os executores, ou seja, as IES. É notório que o programa preserva a

gestão estatal, com reduzida participação das IES brasileiras, provavelmente para não sofrer

interferências na sua matriz estrutural. Porém, a centralização dá sinais de contrariar um dos

objetivos divulgados em seu documento de criação: “[...] IV. Estimular iniciativas de

internacionalização das universidades brasileiras [...].” (Decreto n. 7.642, de 13/12/2011).

Essa pode ser vista como uma das contradições identificadas no Programa CsF. Além

do exposto, é possível afirmar como marcante o discurso ufanista a ele associado em

discursos oficiais, suscitando variados questionamentos. Como exemplo, podemos citar o

pronunciamento da Presidente Dilma Rousseff na cerimônia de regulamentação do Programa

CsF, em 13/12/2011:

Nós somos, de fato, um país muito rico. Nós temos petróleo, nós temos minério,

nós... aí, eu quero agradecer, mais uma vez, à Vale, à Petrobras pela sua

participação. Nós temos também uma agricultura bastante competitiva e produtiva,

nós temos uma indústria. Mas, o que nós temos certeza que vamos precisar, nos

próximos anos, é de homens e mulheres muito bem preparados, muito bem

capacitados e que tenham condições de permitir que o nosso país adentre à

economia do conhecimento, sendo capaz de produzir ciência, de inovar e de

absorver tecnologia e transformar (BRASIL, 2011).

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Com base no modelo de produção e veiculação do conhecimento científico de países

desenvolvidos que nos serve de referência (cujos países também são submetidos a

desigualdades sociais), questionamos se o Brasil poderá alcançar a almejada posição de

partícipe do primeiro mundo, via desenvolvimento tecnológico.

Dando continuidade à análise das convocações, em agosto de 2014 foi lançada a 9ª

convocação, após 10 meses da 8ª convocação, ou seja, com o dobro de tempo médio de

lançamento entre uma convocação e outra. Ressaltamos que essa convocação está em plena

fase de execução, significando ainda não ter bolsistas contemplados.

Acerca da 9ª convocação, temos que destacar a limitação ou exclusão total de alguns

cursos das áreas da Saúde, Ciências Biológicas e Indústria Criativa, destacadamente

Medicina, por alegação de incompatibilidade curricular. Isso parece ser resultado de uma

reação negativa por parte dos cursos de origem do estudante. Ou seja: os estudantes não

conseguem compatibilizar ao seu currículo na IES de origem o novo conteúdo recebido no

exterior, o que os obriga a retornar os estudos de onde pararam ao sair para o intercâmbio,

com grandes possibilidades de atraso na integralização curricular.

Como exemplo, podemos citar a fala da estudante Maria Clara Pestana, bolsista do

CsF no Canadá de 2012 a 2013, ao Jornal Último Segundo, em 06/06/2014, na reportagem

intitulada “Ciência sem Fronteiras: aluno é pouco orientado e não tem disciplinas validadas”:

Todas as cinco matérias que eu fiz eram da minha área de formação. Mas até agora

apenas duas foram aceitas como créditos na minha universidade. Outra eu consegui,

ao menos, transformá-la em atividade complementar, porque ela não foi validada. É

uma pena, queria ter aproveitado as cinco (PESTANA, 2014 apud BALMANT et

al., 2014).

Nessa reportagem, são descritas como responsáveis pela falta ou limitação de

reconhecimento: falta de chancela de coordenadores de cursos antes da viagem, livre escolha

de matérias por parte do bolsista e resistência de universidades do País na validação de

disciplinas cursadas no exterior.

Outro destaque nessa convocação é a citação, pela primeira vez, das vagas por

países, porém, somente das geridas pela CAPES, conforme Tabela 2, que demonstra

claramente o país de destino com maior número de vagas: EUA.

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Tabela 2 - Vagas da 9ª Convocação – CAPES.

País Vagas

EUA (IIE e

NOVA) 5600

Alemanha 500

França 500

Itália 500

Suécia 100

Noruega 100

China 100

Hungria 300

Japão 100

Áustria 50

Canadá 200

Irlanda 500

Total 8550 Fonte: Dados organizados pela autora, com base nas chamadas públicas divulgadas pela CAPES.

Há de se ressaltar, igualmente, que todo o contato do Programa CsF é direto com o

estudante, isto é, a IES brasileira parece ser preterida na relação com o programa. Por sua

vez, sobre as IES brasileiras, retorna a responsabilidade quanto à análise da elegibilidade dos

estudantes nas áreas e temas do referido programa.

Ao identificarmos o percurso transcorrido pelo Programa CsF, podemos observar

que:

1) O programa possui gestão estatal centralizadora, com reduzida participação das IES

brasileira, para não sofrer interferências na sua matriz estrutural;

2) O programa vai se adaptando às dificuldades encontradas na sua implementação,

imputando ajustes, seja no período de integralização, no curso de idiomas ou na

definição dos cursos elegíveis, com a finalidade de obter sucesso na meta estabelecida;

e, principalmente,

3) O programa prima por garantir o foco principal em consonância ao projeto

econômico-social vigente, no que tange a:

Meritocracia – É evidenciado com sistema de classificação, tendo pontuação acrescida

para candidatos que tenham sido contemplados com prêmios acadêmicos e de mérito,

sendo eles: Prêmios Jovem Cientista, Iniciação Científica e Olimpíadas de Matemática

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e/ou de Ciências e ainda demais premiações de mérito acadêmico. E também

acrescidos para candidatos que tenham participação em programas de iniciação

científica, tecnológica ou docência e para candidatos que já possuam domínio

linguístico em outro idioma. Além, é claro, do corte de elegibilidade pela nota no

ENEM igual ou superior a 600 pontos, incluído a partir da 7ª convocação.

Vertente científica e tecnicista – As áreas e temas, apesar das constantes alterações,

mantiveram seu foco em cursos científico-tecnicistas com intuito de suprir a

necessidade de mão de obra técnica qualificada para as indústrias e empresas de

tecnologia que se despontam no país como Vale, Petrobras, Eletrobras etc;12

Parceria com países 1º Mundo – As chamadas públicas visavam maciçamente países

da América do Norte e Europa, com destaque para Canadá e Estados Unidos da

América, que juntos somam 21% do total de chamadas ofertadas. Ressaltamos que

houve um afrouxamento com relação às IES de Acolhimento, no que diz ao termo

“para as melhores universidades do mundo”, que passou a ser “para as melhores

universidades do mundo disponíveis”, enfatizando a inclusão de chamadas específicas

para IES Comunitárias e Historicamente Negras dos Estados Unidos da América, que

não estão no ranking das melhores universidades do mundo.

Parceria público - privada – Tanto IES públicas quanto IES privadas nacionais podem

enviar bolsistas para IES públicas ou privadas no exterior, e vice-versa, garantindo-se

o repasse público para pagamento das taxas acadêmicas privadas. No outro sentido,

por acolher doações privadas a fim de fomentar bolsas para futuros trabalhadores do

mercado produtivo.

Os itens aqui referidos são basilares para o projeto econômico-social pautado no

novo-desenvolvimentismo, que, de acordo com Fontes (2010, p.13):

[...] promete recuperar os desafios perdidos da América Latina e propulsar, enfim, a

recuperação do “atraso” do continente. Essa modernização asseguraria a expansão

do consumo, num mercado interno ampliado e plenamente integrado ao mercado

mundial (FONTES, 2010, p.13).

O principal objetivo desse projeto político- social – econômico é delineado por

Castelo (2010, p.194) como “de crescimento econômico combinado com uma melhora

12

Essas são empresas que já possuem acordo firmado com o Programa CsF, tratam-se de “ empresas

financiadoras atuam em conjunto com o CNPq e a CAPES, com a finalidade de apoiar e complementar o

Programa Ciência sem Fronteiras [...]” (BRASIL/CsF,2014).

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substancial nos padrões distributivos do país.” A ligação entre tal modelo social e o CsF

parece estar em que o crescimento econômico do país e a equidade social se dão pela

formação de profissionais altamente qualificados, técnico-cientistas, que seriam capazes de

promover a competitividade empresarial brasileira aliada às grandes potências internacionais.

Ao mesmo tempo, a formação no exterior contribuiria para que os estudantes se tornassem

profissionais flexíveis, adaptáveis, dinâmicos, que possuiriam competência para aprender a

aprender e submeter-se ao novo.

Adicionalmente, a seguir, abordamos a avaliação do CsF por parte da CAPES e CNPq.

3.2.2 Avaliação do Programa CsF por parte das agências executoras

Em 07 de outubro de 2014, após o período de inscrição dos candidatos da 9ª CP, os

coordenadores institucionais CsF das IFES foram convocados para uma reunião em Brasília

com a finalidade de apresentar avaliação geral do programa por parte das agências executoras

Capes e CNPq e demais assuntos burocráticos da 9ª convocação vigente.

Estiveram presentes como representantes das agências executoras para proferir as

apresentações: Sr. Glaucius Oliva, Presidente do CNPq; Sr. Paulo Beirão, Diretor de

Cooperação Institucional do CNPq; Sr. Jorge de Almeida Guimarães, Presidente da CAPES,

Sra. Denise de Menezes Neddermeyer, Diretora de Relações Internacionais da CAPES; e, Sr.

Adi Balbinot Junior, Coordenador-Geral de Acompanhamento e Monitoramento de

Resultados da CAPES.

A seguir, evocaremos os destaques de cada apresentação proferida. Iniciamos com o

Sr. Glaucius Oliva, Presidente do CNPq, com a apresentação intitulada “The Brazilian

Scientific Mobility Program”.

Na Figura 1, é exposta a distribuição das bolsas por país destino e área prioritária,

bem como ensinamentos e avaliação do Programa CsF pelo CNPq/MCTI.

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Figura 1 - Síntese de Apresentação CNPq/MCTi

Fonte: Dados organizados pela autora, com base na apresentação The Brazilian Scientific Mobility Program,

proferida pelo Sr. Glaucius Oliva acerca da avaliação do Programa CsF.

Nessa apresentação, ficam demonstradas as informações expostas ao longo deste

estudo: que os EUA são o país que mais recebe os bolsistas CsF, com cerca de 30% do total

de enviados, e a área de estudo predominante é engenharia e demais áreas tecnológicas.

Também informam os “ensinamentos do programa”, demonstrando que as ações ali citadas

foram criadas apenas após a implementação do programa, parecendo tratar-se de ações

corretivas motivadas pela falta de planejamento devido a sua precipitada execução.

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Destacamos, na Figura 4, primordialmente, a avaliação do Programa CsF pelo

CNPq/MCTi, por meio da resposta de 8900 relatórios finais dos bolsistas CsF/CNPq acerca

da participação no referido programa, que demonstra avaliação positiva quanto à excelência

das universidades no exterior e ao desempenho dos bolsistas. Porém, atesta que cerca de 3.200

bolsistas que responderam ao presente relatório tiveram menos que a metade das disciplinas

reconhecidas no Brasil, significando, automaticamente, atraso na conclusão do curso.

Acentuamos que atraso na conclusão de curso representa mais recursos públicos ou pessoais

para o egresso CsF conquistar o diploma.

A Figura 2 expõe o slide 7 da apresentação Sr. Oliva, informando como será a

participação dos Coordenadores Institucionais do Programa CsF, na versão 2.0, com previsão

de início em 2015.

Figura 2 - Apresentação The Brazilian Scientific Mobility Program - Slide 7

Fonte: Apresentação The Brazilian Scientific Mobility Program, proferida pelo Sr. Glaucius Oliva acerca da

avaliação do Programa CsF.

Acreditamos que essas informações vêm ao encontro do reivindicado pelas IES

brasileiras aos órgãos executores acerca da relação preterida institucionalmente, tendo em

vista o contato de o referido programa ser direto com o bolsista.

A seguir, na Figura 3, evidenciamos o slide 10: Avaliação Ciência sem Fronteira 1,

exibida pelo Sr. Paulo Beirão, Diretor de Cooperação Institucional do CNPq em sua

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apresentação intitulada “Ciência sem Fronteiras: Programa Brasileiro de Mobilidade

Científica”.

Figura 3 - Apresentação Ciência sem Fronteiras: Programa Brasileiro de Mobilidade Científica - Slide 10

Fonte: Apresentação Ciência sem Fronteiras: Programa Brasileiro de Mobilidade Científica, proferida pelo Sr.

Paulo Beirão acerca da avaliação do Programa CsF.

Temos a destacar no presente slide que o orçamento global do Programa CsF atingiu

5,2 bilhões de reais, cerca de 68% a mais que o inicialmente divulgado de 3,1 bilhões de reais

(conforme informado na página 12), e a predominância de participação das IES brasileiras

privadas (72%), constatando a característica da parceria público-privada, uma faceta do

projeto do novo-desenvolvimento do país.

Vale ressaltar, igualmente, a diferença entre as informações dos egressos da Figura 1

e 3, pois que a Figura 1 é baseada nas respostas dos bolsitas CsF/CNPq que responderam ao

relatório final e a Figura 3 é baseada em uma análise geral, intercâmbios geridos tanto pelo

CNPq quanto pela CAPES, o que demonstra dissonância quanto à percentagem de créditos

integralmente aceitos pela IES brasileiras. Podemos ver que a Figura 1 informa que seria

64,29% quem conseguiu reconhecer mais da metade (+50%) das disciplinas cursadas, ao

passo que a Figura 3 cita que 70% dos bolsistas conseguiram reconhecer todas (100%) as

disciplinas.

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Dando continuidade à síntese das apresentações, evidenciamos as informações

fornecidas pela CAPES, por meio do Sr. Adi Balbinot Junior, Coordenador-Geral de

Acompanhamento e Monitoramento de Resultados da CAPES.

A Figura 4 expressa sobre o relatório final de atividades respondido pelos bolsistas

CsF/CAPES.

Figura 4 - Síntese de Apresentação Capes

Fonte: Apresentação Reunião de Coordenadores Institucionais do Programa Ciência sem Fronteiras, proferida

pelo Sr. Adi Balbinot Junior, Coordenador-Geral de Acompanhamento e Monitoramento de Resultados da

CAPES.

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Na Figura 4, há a divulgação da avaliação dos bolsistas acerca das IES destino sobre

duas vertentes: 1. qualidade de ensino e competência; e 2. infraestrutura. Além disso, trata da

comparação da IES brasileira de origem com a IES de destino no exterior em três quesitos: 1.

infraestrutura; 2. método de avaliação; e 3. ensino.

Podemos notar pela avaliação dos bolsistas que, quanto ao método de avaliação e

ensino, as IES brasileiras estão equiparadas às IES estrangeiras, ficando aquém apenas no

quesito infraestrutura, o que pode ser justificado pelo contexto histórico sócio-político

vivenciado pelo Brasil, como ditadura militar e cortes do neoliberalismo, em comparação com

os países da América do Norte e Europa, que vivenciaram o “bem – estar social”, permitindo-

lhes, portanto, construir ao longo da história uma base de desenvolvimento.

Adicionalmente, consta na Figura 4 a avaliação geral da experiência no exterior pelo

bolsista CsF, mostrando que mais de 90% dos consultados consideram como bom ou ótimo, o

que indica o êxito no referido programa, porém não são expostos os referenciais para tal

decisão, isto é, se foram vivências pessoais ou acadêmicas.

De modo geral, as agências executoras consideram o programa CsF um sucesso e de

grande relevância, conforme destacou Sr. Jorge de Almeida Guimarães, Presidente da

CAPES na referida reunião: “O programa despertou nos jovens e, sobretudo na graduação,

enormes oportunidades e levou milhares deles a conquistar novas possibilidades e

perspectivas. Isso nos anima cada vez mais.” (CAPES, 2014). Entretanto, reconhecem alguns

“contratempos” no caminho de sua execução, e que estarão aprimorando procedimentos

burocráticos para a versão 2.0, prevista para 2015.

A seguir, exemplificamos como ocorreu na prática a criação e a implementação do

Programa CsF em uma IES brasileira: a Universidade Federal de Mato Grosso. Tal ilustração

se apresenta como uma forma de melhor compreender a materialização desse programa.

3.3. UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO: A POLÍTICA DE

INTERNACIONALIZAÇÃO COMO FOCO

A UFMT foi criada em 1970, porém o primeiro ato institucional acerca do interesse

de seu processo de internacionalização se deu apenas em 01/08/1989, pela Portaria do

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116

Gabinete da Reitoria nº328/89 que designou o Prof. Paulo Speller como Assessor do Reitor,

ficando ao seu encargo assuntos inerentes às Relações Internacionais. O Reitor a época era o

Prof. Augusto Frederico Muller Junior, que dirigiu a instituição de 1988 a 1992.

É importante esclarecer que, de acordo com a estrutura organizacional da instituição

à época, trata-se apenas de um cargo de Assessor indicado pelo Reitor, o que implica a sua

ligação direta à Reitoria, sem necessariamente que as Relações Internacionais constituíssem

uma unidade institucional.

Porém, para fins de diferenciação com os demais cargos de assessores da Reitoria,

utilizou-se a denominação “Assessoria de Relações Internacionais”, conforme demonstra o

Relatório de Gestão de 1988-1992:

Durante os últimos anos, as possibilidades de intercâmbio entre a UFMT e

universidades e organismos internacionais ampliaram-se consideravelmente,

levando a reitoria a criar uma Assessoria de Relações Internacionais para coordenar

e acompanhar todos esses contatos e ações conjuntas.” (UFMT, RELATÒRIO DE

GESTÃO DO PERÍODO DE 1989 a 1992, p.37).

O cargo de assessor possuía como missão assessorar o reitor na elaboração e na

execução de políticas que propiciassem uma maior inserção da instituição no contexto

mundial.

O processo de internacionalização da UFMT começou incipiente, com poucos

contatos internacionais, sendo, inclusive, viabilizados “seja da decisão política dos dirigentes

[...] seja do corpo científico das várias áreas da UFMT [...]” (UFMT, Relatório de Gestão

1992-1996, p.141), manifestando ações tanto institucionais como individuais, ou seja, de

pesquisador para pesquisador.

A trajetória revela a influência da conjuntura sócio-política vivenciada no Brasil. Na

década de 1990, com forte corte de recursos financeiros, as universidades federais motivadas

pela ideologia do neoliberalismo, vivenciaram um processo lento de ações para a

interncionalização. Nesse contexto, a UFMT tinha como foco a América Latina e Caribe e

Europa.

Na década seguinte, na gestão do Reitor Prof. Paulo Speller, nos períodos de 2000-

2004 e 2004-2008, foi indicada como Assessora de Relações Internacionais a Profa. Maria

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Inês Portugal. Temos a destacar a informação: “A partir de 2000, a UFMT ampliou

consideravelmente suas atividades de intercâmbio e cooperação com o exterior [...]”. “Esses

protocolos”, informa a Assessora de Relações Internacionais, Maria Inês Guimarães Portugal,

“permitem, no mínimo, que nossos estudantes possam estagiar em qualquer parte do mundo

sem pagar as taxas cobradas por universidades estrangeiras.” (UFMT, RELATÓRIO DE

GESTÃO 2000-2008, p.108).

Ainda no âmbito da Gestão do Prof. Speller e da Profa. Maria Inês, foi publicado o

Balanço Social – Gestão 2000-2003. Acerca das relações internacionais, traz: “A UFMT, nos

últimos três anos, buscou expandir sua interlocução também para o exterior, com instituições

de pesquisas e universitárias de todos os continentes, mas especialmente com aquelas que

estão próximas, na América do Sul.” (UFMT, BALANÇO SOCIAL 2000-2003, p.49). Mas

há de se considerar também, seguindo informações dos relatórios de gestão da época, o

aumento de parcerias com instituições da América do Norte, que, em 1992-1996 computavam

9%, depois de 1996-2000 aumentou para 21% e, no período de 2000-2008, atingiu 38%,

demonstrando abertura cada vez mais para os países norte-americanos.

Acerca de mobilidades internacionais, “A Assessoria de Relações Internacionais

buscou favorecer o intercâmbio dos estudantes da UFMT com universidades estrangeiras,

atuando nos programas de mobilidade acadêmica, tais como o Bolsas Luso-Brasileiras,

Erasmus Mundus e outros individuais. Quanto aos estudantes estrangeiros, recebe anualmente

[período de 2000-2008] uma média de dez alunos de diferentes países.” (UFMT,

RELATÒRIO DE GESTÃO 2000-2008, p.108), explicando assim que já havia mobilidades

internacionais, porém sem registro quantitativo exato.

Antes de adentrar no próximo período de gestão da UFMT (2008-2012), há

necessidade de relembrar a conjuntura sócio-política do final do século XX e início do século

XXI, em que o modelo neoliberal mostrava sinais de crise e a ideologia do novo-

desenvolvimentismo foi impulsionada pelo projeto político conduzido por Luiz Inácio Lula da

Silva (2003-2010). Em suma, o Estado, mesmo que numa marcha lenta, a princípio, passou a

investir mais recursos públicos em ações e programas sociais, contemplando a educação e

também a internacionalização da educação superior.

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Do ponto de vista da UFMT, as iniciativas empreendidas acerca da

internacionalização no período de 1989 a 2008: “[...] resultaram em projetos e programas de

considerável sucesso, propiciando oportunidades de cooperação com instituições de ensino e

pesquisa de diversos países.” (UFMT/SECRI, 2014).

Nesta dissertação, daremos ênfase ao período de 2008 a 2012 e de 2012 aos dias

atuais, por ser o período da passagem da fase embrionária da internacionalização da UFMT

para uma ação institucionalizada nesse campo.

Em 2008, ao iniciar uma nova gestão na reitoria, a ARI promoveu a cooperação

internacional da UFMT via Planejamento Estratégico Participativo. Tal planejamento foi

traçado no “Relatório de Oficina de Planejamento Estratégico 2008-2018”, o qual definiu

metas para dez anos e, mais propositivamente, a missão de: “Prospectar oportunidades,

induzir, propor e executar políticas para a inserção internacional visando à promoção e o

desenvolvimento da UFMT.”

Conforme informa o Relatório de Gestão do período de 2008 a 2012:

[...] a ARI elaborou projetos para a captação de recursos, participou de editais

(Erasmus Mundus; Programa de Mobilidade Mercosul etc.), propôs e mediou a

filiação da UFMT a redes e consórcios universitários, elaborou normas, criou

programas de apoio à mobilidade e apoio iniciativas das unidades acadêmicas [...].

(UFMT, RELATÓRIO DE GESTÃO DO PERÍODO DE 2008 A 2012, p.36).

Para a SECRI/UFMT, há duas instâncias principais de atuação: o Setor de Convênio

e o Setor de Mobilidades. Conforme o Relatório de Gestão de 2012/2013:

[...] O setor de convênio destina-se a prospectar, articular, facilitar e

instrumentalizar as parcerias a serem formalizadas com instituições internacionais,

além de gerenciar e garantir a execução de parcerias vigentes. Propicia também o

apoio a iniciativas de pesquisadores da UFMT no âmbito internacional e a

participação da UFMT em redes de cooperação internacional, além de elaborar,

acompanhar e divulgar editais de estímulos a parcerias internacionais. [...] O setor

de mobilidade tem a finalidade de propor, executar ou acompanhar programas de

intercâmbios internacionais, fomentando e apoiando a mobilidade recíproca de

estudantes, docentes e técnicos administrativos. Este setor subdivide-se em

Mobilidades Outgoing e Mobilidades Incoming. Mobilidade outgoing, ou

mobilidade out, viabiliza o envio ao exterior, orienta e auxilia a todos os membros

da comunidade acadêmica da UFMT interessados em estudar ou pesquisar em

instituições de outros países (UFMT, RELATÓRIO DE GESTÃO DE 2012/2013,

grifos nossos).

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119

No que segue, apresentamos a evolução da cooperação internacional da UFMT,

evidenciando os setores de Convênios e de Mobilidades no período de 2008 a 2012.

Inicialmente, o Gráfico 1 mostra os dados do Setor de Convênios.

Gráfico 1 - Setor de Convênios/UFMT – 2008 a 2012

Fonte: Relatório de Gestão/UFMT 2008/2012. Evolução anual de convênios internacionais na UFMT (2008-

2012)

É perceptível o aumento de convênios ativos (convênios vigentes), passando de 25,

em 2009, para 57, em 2012. Já os convênios em andamento (em fase de assinatura, ainda não

vigentes) evoluíram de 29, em 2009, para 81, em 2012.

Porém, ao compararmos apenas os números de convênios ativos fornecidos pelo

Gráfico 1 com o número do Relatório de Gestão/UFMT 2012 – 2013, que totaliza 32

convênios ativos, observamos uma redução considerável de convênios a partir de 2011,

coincidentemente, a partir do ano de lançamento do Programa CsF (agosto de 2011),

conforme segue:

Ativos Inativos EmFirmamento

25 14

4

56

9 15

61

6 7

57

17 24

2009 2010 2011 2012

Em Andamento

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120

Gráfico 2 - Convênios Ativos/UFMT – 2009 a 2013

Fonte: Dados organizados pelas autoras, com base nos Relatório de Gestão/UFMT

No âmbito de parcerias internacionais, de 2000 a 2008, destaca-se a priorização dos

países da América do Norte (38%) e o equilíbrio dos países da América Latina e Caribe

(31%) e Europa (31%). Porém, de 2008 em diante, ampliam-se parcerias com a Europa

(46%), diminuem com a América Latina e Caribe (22%) e América do Norte (24%) e abrem-

se novas frentes de ação, como Ásia e África (UFMT, RELATÓRIO DE GESTÃO 2000-

2008; 2008-2012; 2012-2013).

Em relação ao Setor de Mobilidades, o Relatório de Gestão de 2008-2012 informa:

Gráfico 3 - Setor de Mobilidades/UFMT – 2008 a 2012

Fonte: Relatório de Gestão/UFMT 2008/2012. Mobilidade estudantil na UFMT

É notório o desenvolvimento do setor de mobilidades, principalmente, com relação

ao envio de estudantes brasileiros ao exterior. Notamos que, em 2008, foram enviados 2

estudantes e recebidos 27, ao passo que, em 2012, foram enviados 110 e o número dos

recebidos decresce para 7 estudantes.

25

56 61 57

32

2009 2010 2011 2012 2013

Convênios Ativos

Convênios Ativos

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121

É importante esclarecer que a entrada e saída quantitativa de estudantes é instável e

não cumulativa. A exemplificar, temos a mobilidade de estrangeiros na UFMT, que inicia

com 27 em 2008, 3 em 2009, 21 em 2010, 3 em 2011, terminando com 7 em 2012 (UFMT,

RELATÓRIO DE GESTÃO DO PERÍODO DE 2008 a 2012). Na realidade, os primeiros 27

estudantes estrangeiros, ora citados, foram herdados das gestões anteriores, sendo vinculados

ao Programa de Estudantes Convênios de Graduação (PEC-G), programa do governo federal

brasileiro com objetivo de “oferecer oportunidades de formação superior a cidadãos de países

em desenvolvimento com os quais o Brasil mantém acordos educacionais e culturais.”

(BRASIL/MEC, 2014) e que completa 50 anos neste ano de 2015. Por sua vez, os demais

estudantes contabilizados são novos, inseridos no ano referido.

Vale ressaltar que o CsF foi lançado em agosto de 2011 e a UFMT a ele aderiu, de

início informalmente, tão logo foi lançado, e depois via Termo de Adesão, em dezembro de

2011. A iniciativa proporcionou reflexos no que tange ao envio de estudantes ao exterior em

2012, tendo em vista que o programa prevê apenas o envio de estudantes de graduação na

modalidade graduação – sanduíche.

Em 2012, com a reeleição da administração superior da UFMT, a ARI foi

reestruturada para Secretaria de Relações Internacionais (SECRI), passando a ter autonomia

na diretriz do processo de internacionalização da UFMT. Essa alteração foi marcante, tanto

que, com relação ao Setor de Mobilidades, as legendas dos gráficos descritos no Relatório de

Gestão 2012-2013 indicam: “[...] ao período de gestão pela ARI, de 2008 a 2011, período de

transição ARI para SECRI, em 2012, e o início do período de gestão da SECRI, em 2013.”

No Gráfico 4, é possível identificar informações relativas ao Setor de Mobilidade,

inicialmente de 2008 a 2011, e, após, nos anos de 2012 e de 2013, sendo que o retratado

refere-se à ida de estudantes às instituições de outros países.

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Gráfico 4 - Setor de Mobilidades/UFMT – 2012 a 2013

Fonte: Relatório de Gestão/UFMT 2012/2013. Mobilidades Out.

Podemos observar que, no período em foco (2008-2013), considerando a graduação,

os anos de 2012 e 2013 se destacam acentuadamente, o que se deve à vigência do CsF na

UFMT.

Por sua vez, o Gráfico 5 mostra dados das Mobilidades In, que se refere à entrada de

estudantes estrangeiros na UFMT, compreendendo o período de 2009 a 2011 e os anos de

2012 e 2013.

Gráfico 5 - Setor de Mobilidades/UFMT – 2012 a 2013

Fonte: Relatório de Gestão/UFMT 2012/2013. Mobilidades In.

Nessa modalidade, considerando a graduação, percebe-se um declínio em 2012 e

2013, o que é assim justificado pela instituição:

2008 a2011

2012 2013

73

106

149

3 2 2

Mobilidades Out

Graduação

Pós-Graduação

2009 a 2011 2012 2013

Graduação

Pós-Graduação

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[...] os números são bem menos expressivos que na modalidade out pelo fato de a

língua portuguesa ser pouco atrativa para estrangeiros, por não oferecermos cursos

em língua inglesa, por não oferecermos cursos de português para estrangeiros, pela

localização e o pouco conhecimento sobre a UFMT e pela carência de recursos

que financiem a vinda de estudantes para o Brasil (UFMT, RELATÓRIO DE

GESTÃO DE 2012/2013, grifos nossos).

Reparamos que o fluxo basicamente se constitui na direção da saída de estudantes do

Brasil. Já o inverso apresenta fluxo menor, o que é atribuído, inclusive, à falta de

financiamento que estimule o processo. Diante disso, podemos indagar se o órgão nacional

deveria respaldar a vinda de estudantes, e, se fosse o caso, sob que argumentos e condições.

Contudo, é preciso reconhecer que a SECRI/UFMT busca mediante outros

programas a possibilidade de enviar estudantes ao exterior, bem como programas para receber

estrangeiros, além de aumentar convênios e apoiar projetos de pesquisas conjuntos. O

Relatório de Gestão 2012/2013 reitera esse movimento:

Buscando atrair um maior número de estrangeiros para a UFMT, a Secri está

desenvolvendo diversos tipos de mídia (eletrônica e impressa) para a divulgação

multilíngue da Instituição, dando maior visibilidade e apoiando, desta forma, a

participação em missões, eventos e reuniões internacionais. Ainda visando criar um

ambiente mais propício à atração de estudantes estrangeiros para a UFMT,

propusemos e tivemos a aprovação pelo Consuni do Programa de Bolsas

Expandindo Fronteiras (BEF), destinado aos estrangeiros pertencentes a instituições

conveniadas com a UFMT [...] (UFMT, RELATÓRIO DE GESTÃO DE

2012/2013).

O conjunto de iniciativas, no entanto, não possui a expressividade do CsF, um

programa com financiamento e apelo midiático que se destacam, dando sinais, na instituição

estudada, de monopolizar as ações de internacionalização.

É importante ressaltar que a UFMT aprovou em seu Conselho de Ensino, Pesquisa e

Extensão (CONSEPE), em 28/07/2014, a Resolução n.º74/2014, que dispõe sobre intercâmbio

internacional para a comunidade acadêmica da UFMT. Essa resolução justifica tais ações a

partir das seguintes considerações:

CONSIDERANDO o caráter fundamental do intercâmbio de ideias para a própria

constituição das universidades, desde o seu surgimento; a possibilidade de se

concretizar esse intercâmbio através do envio de membros da comunidade universitária

da UFMT a outras instituições de educação superior (IES) no exterior, assim como a

recepção de acadêmicos estrangeiros na UFMT;

CONSIDERANDO o investimento realizado pelo Governo Federal nos processos de

intercâmbio acadêmico, através de seus diferentes organismos de fomento ao ensino,

pesquisa e extensão;

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CONSIDERANDO a necessidade de promover a participação da UFMT em

associações, consórcios, redes e acordos de cooperação com outras IES, de forma a

propiciar condições para o intercâmbio internacional da comunidade acadêmica;

CONSIDERANDO a melhoria da qualidade na pesquisa, no ensino e na extensão e a

consequente visibilidade que a universidade pode alcançar diante da comunidade

acadêmico-científica através da promoção do intercâmbio internacional;

CONSIDERANDO a ineficácia da Resolução CONSEPE n.º 118/2002 frente ao novo

cenário da internacionalização da educação superior

CONSIDERANDO que no Plano de Desenvolvimento Institucional da UFMT consta

em sua visão “Tornar-se referência nacional e internacional como instituição multicampi

de qualidade acadêmica, consolidando-se como marco de referência para o

desenvolvimento sustentável da região central da América do Sul, na confluência da

Amazônia, do Cerrado e do Pantanal.” (BRASIL/UFMT, 2014).

Do exposto, fica evidenciada uma síntese da institucionalização da política de

internacionalização da educação superior na UFMT.

3.3.1 Os editais SECRI/UFMT para seleção dos bolsistas CsF

Abaixo, no Quadro 8, são enfatizados os editais lançados pela UFMT, destacando as

principais alterações ocorridas ao longo da implementação do CsF nesta IFES em seus

requisitos específicos que determinam a excelência da candidatura, na modalidade de bolsas

de graduação-sanduíche divulgadas no período de 2011 a 2014. Assim sendo, ao explanar o

processo de implementação do CsF, pretendemos esboçar sua fisionomia no âmbito dessa

instituição.

Relembramos que se entende por convocações um grupo de chamadas

públicas/editais (CP) lançadas na mesma época, sendo cada número correspondente a um país

de destino.

Quadro 8 - Destaques dos Editais SECRI/UFMT para o Programa CsF de 2011 a 2013

Convocação Descrição

1ª Convocação

CP CAPES n.º

01/2011

Data: Ago/2011

Edital ARI 002/2011

- UFMT

Requisitos específicos da UFMT:

-Estar matriculado em curso de bacharelado ou licenciatura presencial nas áreas e

temas indicados no item 1. Os estudantes de cursos de licenciatura ou outras áreas

de bacharelado, somente poderão se inscrever se comprovarem o envolvimento

em projetos de pesquisa em um dos temas descritos no item 1 deste edital, através

de declaração emitida pela Pró-Reitoria de Pesquisa - PROPEq.

-Possuir coeficiente geral igual ou superior a 6,5.

- Apresentar declaração emitida pelo colegiado de curso do compromisso de

reconhecimento dos créditos obtidos pelos estudantes de graduação nas

instituições americanas, com pleno aproveitamento dos estudos e do respectivo

estágio, entendido tal reconhecimento como sendo parte das exigências e do

currículo disciplinar de formação do estudante.

- As inscrições de estudantes que já participaram de mobilidade internacional

poderão ser aceitas, em baixa prioridade, após analise caso a caso pela ARI.

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- Apresentar documentação exigida pelo presente Edital.

Processo de candidatura interna deve ser feito via processo.

2ª Convocação

CP n.º 102 a 106

Data: Dez/2011

Edital ARI 004/2011

- UFMT

Requisitos alterados na UFMT: - Estar matriculado em curso de bacharelado ou licenciatura presencial nas áreas e

temas indicados no item 1.

Processo de candidatura diretamente do site do Programa CsF.

3ª Convocação

CP n.º 108 a 116

Data: Mar/2012

Edital ARI 002/2012-

UFMT

Requisitos alterados na UFMT:

- Possuir, no máximo, duas (02) reprovações e que já tenham sido cursadas e com

aprovação; ou possuir coeficiente geral igual ou superior a 6,0.

-Apresentar toda documentação exigida e no prazo estipulado conforme

cronograma do programa, ou seja, até 30/04/2012.

Se selecionado, apresentar Declaração de Pleno reconhecimento de estudos no

Exterior.

Processo de candidatura diretamente do site do Programa CsF.

4ª Convocação

CP n.º117 a 124

Data: Ago/2012

Edital ARI 007/2012

- UFMT

Mantiveram-se os requisitos anteriores na UFMT e acrescentaram

apresentação dos documentos: -Comprovante de participação em programas de iniciação científica ou

tecnológica, quando houver. A comprovação se dará através de Declaração da

Pró-Reitoria de Pesquisa (PROPEq), que deverá ser requerida pelo e.mail:

[email protected] , com cópia para [email protected] , informando o

nome do estudante e do orientador.

-Comprovante de participação em programa de docência, quando houver, através

de Declaração do Coordenador de Área/PIBID.

- Declaração de Integralização Curricular, conforme Anexo deste Edital. Este

documento deverá ser enviado, devidamente assinado e carimbado pelo

Coordenador de Curso, para e-mail: [email protected] , até último dia da

inscrição conforme calendário do programa.

Processo de candidatura diretamente do site do Programa CsF.

5ª Convocação

CP n.º 126 a 134

Data: Nov/2012

Edital ARI 009/2012

- UFMT

Sem alterações.

6ª Convocação

CP n.º136 a 142

Data: Fev/2013

EDITAL SECRI

001/2013 - UFMT

Mantiveram-se os requisitos anteriores na UFMT e acrescentaram:

O estudante selecionado deverá acatar todos os princípios estabelecidos no

Código de Conduta, divulgado no site: www.ufmt.br/secri , assim como

apresentar Termo de Responsabilidade de Manutenção Financeira que porventura

ultrapassarem os benefícios recebidos pelo referido Programa, devidamente

assinado pelos pais ou responsáveis legais com reconhecimento de firma em

cartório.

Processo de candidatura diretamente do site do Programa CsF e no site da

SECRI.

7ª Convocação

CP n.º143 a 155

Data: Mai/2013

EDITAL SECRI

005/2013 - UFMT

Requisitos alterados na UFMT: - Possuir, no máximo, 2 (duas) reprovações e que elas já tenham sido cursadas

com aprovação conforme determina a Resolução CONSEPE n.º 118/2002;

Processo de candidatura diretamente do site do Programa CsF e no site da

SECRI, acrescentou-se:

- O discente que for contemplado, após todas as fases, pelo Programa CsF deverá

entrar com um processo de afastamento via Secretária de Relações Internacionais,

devendo também participar de reuniões convocadas por esta Secretaria com a

finalidade de orientar os futuros bolsistas na fase de pré-mobilidade.

8ª Convocação

CP n.º156 a 174

Data: Out/2013

EDITAL SECRI

Requisitos alterados na UFMT: - Ter integralizado o número mínimo e não ter atingido o número máximo de

créditos conforme especificado no texto da Chamada Pública do país de interesse,

no momento do início previsto da viagem de estudos, comprovado pela

“Declaração de Integralização Curricular” (anexo I);

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009/2013 - UFMT - Ter sua candidatura aprovada pelo Colegiado de Curso, comprovado pela

“Solicitação de Candidatura CsF” (anexo II);

Processo de candidatura diretamente do site do Programa CsF e no site da

SECRI. Destaque-se o lançamento na UFMT do Manual CsF e o Folder CsF.

9ª Convocação CP

n.º179 a 204

Data: Ago/2014

EDITAL SECRI

004/2014 - UFMT

Mantiveram-se os requisitos anteriores na UFMT e acrescentaram:

IV. Ser considerado um estudante de excelência de acordo com critérios

estabelecidos pelo colegiado de curso na UFMT, conforme determina a Resolução

CONSEPE n.º 74/2014.

Fonte: Dados organizados pela autora, com base nos editais divulgados.

Em face do apresentado, observamos que os ajustes promovidos priorizam atender às

necessidades do CsF, sobretudo no que se refere ao maior número de candidatos elegíveis e

agilidade no processo de homologação das candidaturas pela IES.

É importante ressaltar a Resolução CONSEPE n.º 74/2014, artigo 10, inciso IV, que

estabelece:

IV. Ser considerado aluno de excelência de acordo com critérios estabelecidos

por decisão do colegiado de curso de origem, homologado pela respectiva

Congregação e PROEG, que deverá dar ciência à SECRI (BRASIL/UFMT,

2014).

Isso significa que é delegado (a partir da 9ª Convocação) aos cursos de origem

estabelecer os critérios de excelência para seleção dos estudantes ao intercâmbio internacional,

ou seja, a elegibilidade dos candidatos a participar do CsF.

No Gráfico 6, demonstramos dados da 1ª à 8ª convocação (2011 a 2013) do CsF, na

UFMT, quanto à participação dos estudantes. Além disso, registramos que não é possível

aferir a 9ª convocação por estar ainda em execução:

Gráfico 6 - Estudantes da UFMT participantes da seleção para Programa CsF

Fonte: Secretaria de Relações Internacionais. Jul/2014.

946

621

329

32

Inscritos Pré-Sel. UFMT Contemplados Desistência

CsF UFMT - Geral

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127

É possível verificar pelo número de inscritos uma acentuada procura, o que vai

afunilando diante da pré-seleção e dos efetivamente contemplados.

Além de examinar as chamadas públicas/editais do Programa CsF e da UFMT para

entender seu funcionamento, consideramos pertinente abordar o perfil dos bolsistas

contemplados, o que a seguir se apresenta.

3.3.2 Perfil dos bolsistas CsF na UFMT e no CsF

A SECRI, com o objetivo de caracterizar o perfil socioeconômico dos contemplados

pelo Programa CsF na UFMT, enviou questionário para aproximadamente 190 estudantes

atendidos na modalidade graduação-sanduíche, no período de agosto/2011 a maio/2013, tendo

recebido 109 respostas. Evidenciamos alguns desses dados, socioeconômicos e acadêmicos,

retratados nos gráficos 7 e 8 a seguir.

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Gráfico 7 - Estatísticas do Programa CsF – UFMT – Perfil socioeconômico. Fonte: Secretaria de Relações Internacionais. Março/2014.

Dessa síntese, verificamos que os estudantes contemplados apresentam proporção

equivalente quanto ao gênero, são massivamente solteiros e realizarão sua primeira viagem

internacional. Os dados da renda familiar indicam que aproximadamente 38% dos

entrevistados estão enquadrados no item de 05 a 10 salários mínimos, o que correspondia, em

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2014, à escala de R$ 3.620,00 a R$ 7.240,00. Segundo a renda média bruta familiar no mês em

reais, pelo enquadramento do Critério Brasil (ABEP referenciando o LSE 2012 Ibope Media,

2012), notamos que os entrevistados pertencem majoritariamente às classes A e B. Finalmente,

79% dos estudantes não trabalham, possuindo gastos custeados, o que sugere uma

participação predominantemente elitizada no CsF.

Gráfico 8 - Estatísticas do Programa CsF – UFMT – Perfil acadêmico. Fonte: Secretaria de Relações Internacionais. Março/2014.

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Já com relação ao perfil acadêmico, são, majoritariamente, estudantes que farão seu

primeiro intercâmbio, estão alocados na capital do estado de Mato Grosso, encontram-se no

meio do período de integralização do curso de origem, pertencem às áreas de conhecimento

priorizadas pelo CsF, representada, sobretudo, por engenharias, saúde e biológicas. Quase a

metade dos entrevistados não participa de Programa de iniciação científica, contradizendo um

dos interesses primordiais citados nas convocações do Programa CsF. Além disso, os

estudantes estão pontuados com maior ênfase no início da escala do ENEM elegível para o

referido programa, ou seja, entre 600 a 700 pontos. Há de ressaltar o elevado nível de

desconhecimento de idioma estrangeiro, justificando, assim, a necessidade do Programa

Inglês sem Fronteiras para conseguir atenuar essa deficiência.

Com a finalidade de comparar os dados da UFMT com os dados gerais do programa,

buscamos junto à home page oficial os dados publicados no “Painel Eletrônico”, que contém

informações atualizadas até agosto/2014, isto é, considerando os números apenas do período

da 1ª à 8ª convocação (2011 a 2013). Destacamos os principais dados por meio do Gráfico 9 e

10:

Gráfico 9 - Estatísticas gerais do Programa CsF-I Fonte: Programa Ciência sem Fronteiras/Painel de Controle. Acesso em outubro/2014.

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Resumidamente, podemos destacar no Gráfico 9 que o programa registra 70.188

bolsas implementadas, ou seja, já atingiu cerca de 70% de sua meta final que é 101.000 bolsas

implementadas até 2015. Porém, ao considerar o anteriormente exposto (ou seja, que na 9ª

convocação há disponíveis 8.550 vagas geridas pela CAPES e 5.500 pelo CNPq), a

possibilidade é que se possa atingir 84.238 bolsas implementadas, significando não atingir a

meta tão aspirada. A menos que haja maior número de chamadas públicas de graduação e pós-

graduação, ou até programas aderentes, que venham somar no cálculo final pretendido.

Ademais, evidenciamos no Gráfico 9 que 82% das bolsas implementadas foram para

a modalidade de graduação-sanduíche, predominantemente da região sudeste com 50% das

bolsas implementadas, com certa equidade de gêneros masculino e feminino (considerando

sua magnitude nacional).

O Gráfico 10 informa sobre a distribuição de bolsas CsF implementadas por área

prioritária de conhecimento e por país de destino.

Gráfico 10 - Estatísticas gerais do Programa CsF-II

Fonte: Programa Ciência sem Fronteiras/Painel de Controle. Acesso em outubro/2014.

Observamos que, de acordo com o Gráfico 10, o foco é sobre a área de engenharia e

demais áreas tecnológicas, que contemplam 45% do total de bolsas implementadas e com

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132

destino prioritário para os Estados Unidos da América, com aproximadamente 30% do total

de envio de estudantes.

Essa última informação faz refletir acerca da Tabela 1, que trata sobre as chamadas

públicas divulgadas. Nessa tabela, o Canadá tem 12 chamadas e os EUA têm 9, porém, ao

comparar com o número de bolsistas contemplados, temos 6.325 para o Canadá e 20.358 para

EUA, representando que os números de chamadas abertas para um país pode não

corresponder ao país de destino preeminente.

Independente do país de destino, aguçamos o interesse em saber acerca dos bolsistas

CsF oriundos da UFMT, se os mesmos foram alocados em instituições consideradas de

excelência pelo programa CsF, ou seja, entre as 100 melhores dos rankings mundiais.

Consultamos os Anuários UFMT/SECRI do ano de 2012, divulgado em 2013, e o de

2013, divulgado em 2014, no site do QS World University Rankings divulgados em 2012,

2013 e 2014, e chegamos aos seguintes números:

Tabela 3 - IES destino classificadas no QS World University Rankings

Registros Não classificadas Classificadas de

0-100 Classificadas de

101-700 Total

2013/2014

IES 42 11 31 84

Estudantes 52 17 37 106

2012/2013 IES 19 3 8 30

Estudantes 22 3 13 38 Fonte: Dados organizados pela autora, com base no QS World University Rankings.

Concluímos que foram enviados 7% dos bolsistas CsF UFMT de 2012 e 16 % dos

bolsistas CsF UFMT de 2013 para IES classificadas pelo ranking entre as 100 melhores

universidades do mundo, ou seja, mais de 80% dos bolsistas CsF UFMT foram enviados para

as IES pior classificadas pelo QS World University Ranking.

Esta análise vem ao encontro da notícia “Ciência sem Fronteiras tem 13,8% de bolsistas em

universidades 'top' 100”, divulgada em 13/11/2014, pelo site G1:

Entre as 100 melhores universidades do mundo, de acordo com o ranking Times Higher

Education, divulgado no início de outubro, há 5.425 estudantes brasileiros que

obtiveram bolsa pelo programa Ciência sem Fronteiras. O número representa 13,8% dos

39.091 brasileiros, de graduandos a pesquisadores realizando pós-doutorado, que estão

atualmente em universidades do exterior por meio do programa do governo (FABIANO,

2014, grifo autor).

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133

Ainda na mesma notícia, consta a avaliação por parte do secretário executivo do MEC,

Luiz Claudio Costa: "Desde o início do programa, foi uma determinação que nós trabalhássemos

alocando os estudantes nas melhores universidades do mundo, então esse número que nós temos de

13,8% dos alunos entre as 100 melhores é extremamente importante." (FABIANO, 2014).

O depoimento da autoridade do MEC leva a crer que contemplar menos de 20% dos

bolsistas CsF em IES bem rankiadas seja suficiente para um programa que teve como primeiro

anúncio “[...] os melhores estudantes do Brasil, nas melhores universidades do mundo. [...]”

(CsF, 2011). Há de se recordar que todas as IES destino receberam taxas acadêmicas para

receber os bolsistas brasileiros CsF, com recursos públicos.

Em suma, de modo geral, ao comparar os dados estatísticos da UFMT/SECRI com

os dados gerais do Programa CsF, identificamos congruência de informações.

Igualmente percebemos que o processo de internacionalização na UFMT iniciou bem

antes do lançamento do CsF, embora o mesmo tenha se tornado o “carro chefe” a partir da

adesão institucional. Mesmo promovendo iniciativas diversificadas para trazer estudantes

estrangeiros, verificamos que a UFMT ajustou sua política de internacionalização às

proposições do CsF e sobre ele concentra as ações de internacionalização.

O exame de documentos da UFMT demonstrou que o CsF sintoniza com uma

diretriz considerada importante pela instituição, a mobilidade outgoing, que se expandiu a

partir do referido programa. A esse propósito, avaliamos que priorizar o movimento de envio

de estudantes para fora do país expressa alguns significados. Sugere um reconhecimento de

que o conhecimento científico “de excelência” deve ser buscado prioritariamente no exterior,

o que suscita questionamentos, seja sobre o modelo de produção do conhecimento, seja sobre

o modelo de desenvolvimento dos países de destino.

É importante destacar que a SECRI/UFMT considera que o movimento das

mobilidades deve ocorrer em mão dupla, porém, a falta de investimentos no incoming

prejudica a vinda de estrangeiros. São barreiras a serem enfrentadas, visto que a vinda de

acadêmicos estrangeiros poderia valorizar e alavancar o conhecimento local.

Esse aspecto, agregado ao que explicita as características do CsF, suscita

questionamentos, entre os quais a função social do conhecimento produzido na universidade

(a quem se destina? em que se referencia?) e os benefícios que a internacionalização então

priorizada pode resultar às instituições de ensino e ao país.

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Em busca de resposta a esses e outros questionamentos, no próximo capítulo

entrevistamos representantes de instituições ligados à criação e implementação do Programa

CsF.

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4. BUSCANDO ELEMENTOS PARA RESPOSTAS

Neste capítulo, apresentamos a análise dos dados obtidos nas entrevistas feitas com

os representantes de instituições ligados à concepção e à implementação do Programa Ciência

sem Fronteiras, em interlocução com as informações já obtidas nos capítulos anteriores, com

o objetivo de buscar elementos para responder ao questionamento norteador desta dissertação:

Como se caracteriza, em termos de concepção e implementação, o Programa Ciência

Sem Fronteiras, no âmbito da política de internacionalização da educação superior no

Brasil? Nessa direção, as questões norteadoras secundárias foram: Qual a função social do

conhecimento produzido na universidade? A quem se destina? Em que se referencia? E os

benefícios que a internacionalização então priorizada pode resultar às instituições de ensino e

ao país?

A propósito, conforme Gomes e Oliveira (2012, p.22/23), a análise dos processos de

concepção e formulação das políticas públicas de educação superior:

[...] trata-se de estudos que focalizam o contexto de concepção e formulação das

políticas públicas, nos quais em geral se destacam que o texto da política não pode

ser lido e entendido sem a compreensão do contexto. O contexto significa o espaço

social no qual se movimenta os diferentes sujeitos individuais e coletivos que se

envolvem no debate, que influenciam as decisões, que orientam a elaboração e que

decidem os termos, categorias e conceitos que se incorporam ao texto-documento

(GOMES; OLIVEIRA, 2012, p. 22/23).

Acerca de análise dos processos e estratégias de implementação, asseveram que:

[...] trata-se de estudos que procuram desvelar os processos e estratégias

relacionadas com as práticas sociais e institucionais em torno da materialização de

uma determinada política pública. Esse tipo de análise não reduz tais processos e

estratégias apenas ao terreno institucional e as ações dos sujeitos nele envolvidos,

mas procuram mapear as etapas ou fases do processo de implementação, destacando

muitas vezes que o contexto de formulação realizou-se a definição geral ou

específica de como a implementação deveria ocorrer. No entanto, observa-se que a

grande preocupação dessas análises é entender como se coloca em prática a política

pública a partir das ações de sujeitos que geralmente não participaram de sua

elaboração. [...] Em geral, pode-se dizer que tais estudos são capazes de trazer, à

superfície, a recepção, reação e resistência que a comunidade acadêmica, ou

segmentos desta constrói em relação à determinada política pública (GOMES;

OLIVEIRA, 2012, p. 26/27).

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136

4.1. METODOLOGIA

Esta pesquisa configura um estudo exploratório, de caráter qualitativo, assim

definido por Minayo (2011, p.21):

[...] ela trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das

crenças, dos valores e das atitudes. Esse conjunto de fenômenos humanos é

entendido aqui como parte da realidade social, pois o ser humano se distingue não só

por agir, mas por pensar sobre o que faz e por interpretar suas ações dentro e a partir

da realidade vivida e partilhada com seus semelhantes (MINAYO, 2011, p.21).

Para compor a coleta de dados, utilizamos entrevista semiestruturada, “[...] que

combina perguntas fechadas e abertas, em que o entrevistado tem a possibilidade de discorrer

sobre o tema em questão sem se prender à indagação formulada” (MINAYO, 2011, p.64).

Evocamos, ainda, o pensamento Triviños (2013, p. 146):

Podemos entender por entrevista semiestruturada, em geral, aquela que parte de

certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses, que interessam à

pesquisa, e que, em seguida, oferecem amplo campo de interrogativas, fruto de

novas hipóteses que vão surgindo à medida que se recebem as respostas do

informante. Desta maneira, o informante seguindo espontaneamente a linha de seu

pensamento e de suas experiências dentro do foco principal colocado pelo

investigador, começa a participar na elaboração do conteúdo da pesquisa

(TRIVINOS, 2013, p.146, grifo do autor).

Cabe esclarecer que a pesquisa procurou orientar-se pelo método dialético de

investigação, que tem a crítica como princípio. Para Frigotto (2010, p.84), essa referência

teórica: “tem de dar conta da totalidade, do específico, do singular e do particular. Isto implica

dizer que as categorias totalidade, contradição, mediação, alienação não são apriorísticas, mas

construídas historicamente”, pois as mesmas se modificam historicamente e precisam ser

sempre “revisitadas” e “reconstruídas” (FRIGOTTO, 2010).

Nessa perspectiva, utilizamos como fonte de inspiração e como suporte à dissertação,

principalmente, as categorias filosóficas da contradição e da totalidade por entender que

ambas possibilitam conhecer o fenômeno estudado das partes para o todo e do todo para as

partes, num movimento de ir e vir, como a práxis humana. Tais categorias se integram a

outras categorias filosóficas ao longo da análise, como a aparência e a essência.

Cury (1989, p.27) define tais categorias da seguinte forma:

A categoria contradição (poder-se-ia denomina-la de lei, dado seu alcance

globalizante) é à base de uma metodologia dialética. Ela é o momento conceitual

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explicativo mais amplo, uma vez que reflete o movimento mais originário do real. A

contradição é o próprio motor interno do desenvolvimento. Conceber uma tal

metodologia sem a contradição é praticamente incidir num modo metafísico de

compreender a própria realidade. A racionalidade do real se acha no movimento

contraditório dos fenômenos pelo qual esses são provisórios e superáveis. A

contradição é sinal de que a teoria que a assume leva em conta que ela é o elemento-

chave das sociedades. [...] A categoria da totalidade justifica-se enquanto o homem

não busca apenas uma compreensão particular do real, mas pretende uma visão que

seja capaz de conectar dialeticamente um processo particular com outros processos

e, enfim, coordená-lo como uma síntese explicativa cada vez mais ampla (CURY,

1989, p.27, grifo autor).

Nessa trilha, as categorias contradição e totalidade contribuem para retratar o

fenômeno de estudo, possibilitando decifrar seus movimentos contrários. O estudo promove a

revelação do fenômeno por meio, inicialmente, da sua decomposição em partes, processo que

é seguido pela junção das partes e, por fim, produzindo-se a sua síntese complexa.

A esse respeito, Kosik (1976) afirma:

O conceito da coisa é compreensão da coisa, e compreender a coisa significa

conhecer-lhe a estrutura. A característica precípua do conhecimento consiste na

decomposição do todo. A dialética não atinge o pensamento de fora pra dentro, nem

de imediato, nem tampouco constitui uma de suas qualidades; o conhecimento é que é

a própria dialética em uma das suas formas; o conhecimento é a decomposição do

todo. O ‘conceito’ e a ‘abstração’, em uma concepção dialética, tem significado de

método que decompõe o todo para poder reproduzir espiritualmente a estrutura da

coisa, e, portanto, compreender a coisa (KOSIK, 1976, p. 14).

Ressaltamos que as categorias foram definidas no percurso desta dissertação, sendo o

momento da análise de dados o ápice desta definição. Igualmente, é importante ponderar que

a orientação pelo método dialético de investigação é um grande desafio, tendo em vista sua

complexidade, o que nos faz estudante contínuo da sua apreensão. Assim sendo, o presente

estudo constitui uma primeira aproximação ao método.

4.1.1 Metodologia das entrevistas

Para o desenvolvimento da pesquisa sobre o Programa Ciência sem Fronteiras, os

locais de estudo foram as instituições idealizadoras e gestoras do referido programa,

delimitando-nos aos líderes dessas instituições, vinculados ao segmento da

internacionalização da educação superior. Optamos por resguardar o seu anonimato. Os 03

(três) sujeitos entrevistados foram:

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Representante da Secretaria de Educação Superior do Ministério da Educação,

com o objetivo de captar a idealização do Programa CsF e sua relação com a

política de internacionalização da educação superior no Brasil;

Representante da Secretaria de Relações Internacionais da Universidade

Federal de Mato Grosso, com o objetivo de ilustrar a implementação do

Programa CsF em uma universidade brasileira;

Representante do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico, com o objetivo de captar a operacionalização do Programa CsF e

sua relação com a política de internacionalização da educação superior no

Brasil, pelo olhar de uma das agência de fomento.

Elaboramos um roteiro com dez questões que pretendiam tratar fundamentalmente

dos eixos: internacionalização da educação superior, política de internacionalização da

educação superior e do Programa CsF, bem como a inter-relação entre os mesmos.

As entrevistas, que se realizaram em setembro de 2014, foram gravadas, mediante

consentimento dos participantes e, posteriormente, transcritas para análise. O tempo médio de

cada uma foi aproximadamente 30 minutos. Quanto ao local, as entrevistas foram realizadas

no escritório de cada representante, ou seja, na sede da SESU e na sede do CNPq, ambos em

Brasília-DF e, na sede da SECRI/UFMT em Cuiabá-MT.

Ressaltamos que os entrevistados são gestores das instituições que representam,

possuem mais de 30 anos de atuação na área de educação superior e políticas públicas.

A escolha, portanto, deu-se por considerar que, dada a posição de dirigentes, são os

responsáveis pela definição da política pública de internacionalização da educação superior

brasileira, tornando a discussão mais rica, possibilitando a problematização do tema, o

desvendar da concepção e implementação de tal política, além de trazer elementos da prática

vivenciada.

Para estruturar o conteúdo das entrevistas, selecionamos o material a ser trabalhado

na descrição e utilizamos os procedimentos apresentados por Biklen e Bogdan (1994):

- rever as páginas das transcrições das entrevistas, numerando-as sequencialmente,

agrupando-as por tipo de material semelhante;

- proceder à leitura do material, assinalando palavras, frases ou parágrafos que se

julga necessário selecionar por conterem elementos importantes ao trabalho de pesquisa.

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Devem abranger conteúdos em que haja variedade, repetição ou que se deseja explorar por

sua pertinência e relevância em relação aos objetivos da pesquisa;

- a partir dessa seleção, iniciar a determinação preliminar de categorias de

codificação, desenvolvendo para cada uma destes códigos de identificação e anotando em

separado. Voltar ao texto, atribuindo os códigos às unidades de análise correspondentes. Por

unidades de análise entendem-se as “partes das suas notas de campo, transcrições ou

documentos que caem dentro de um tópico particular representado pela categoria de

codificação.” (BIKLEN; BOGDAN, 1994, p. 233);

- observar, então, a viabilidade das categorias que se criou, realizando alterações, se

for o caso, e criando subcategorias.

As categorias empíricas norteadoras da análise são: concepção e implementação,

justamente por serem elementos fundamentais do objetivo geral a qual se quer obter, sendo

que as mesmas seguem o entendimento de Gomes e Oliveira (2012) conforme referenciado na

página 124.

As categorias de codificação empregadas foram extraídas do conteúdo das

entrevistas após realizar as sínteses necessárias do conjunto dos depoimentos, sendo assim

definidas: A. formulação – no sentido da idealização; B. criação – no sentido da obra em si;

C. características – no sentido de descrição; D. perspectivas – no sentido de

desdobramentos futuros.

Ainda sim, houve a necessidade da criação de subcategorias, sendo elas: a.

definição; b. política; c. agenda; d. motivação; e. ponto de vista; f. fragilidades; e, g.

pontos positivos.

Essas mesmas categorias são apresentadas no esquema a seguir:

Concepção: categoria empírica

A. Formulação: categoria de codificação

Subcategorias:

a. Definição;

b. Política;

c. Agenda;

d. Motivação.

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B. Criação: categoria de codificação

Subcategoria:

e. Ponto de vista.

Implementação: categoria empírica

C. Características: categoria de codificação

Subcategorias:

f. Fragilidades;

g. Pontos positivos.

D. Perspectivas: categoria de codificação

Esclarecemos que os participantes da pesquisa também receberam codificação de

acordo com o segmento a que pertencem: MEC, CNPq e UFMT, de forma a resguardar o

anonimato pactuado.

4.2 ANÁLISE DOS DADOS

Conforme já explicado, as questões das entrevistas foram abertas, o que propiciou

um número expressivo e diversificado de respostas.

Procuramos apresentar uma síntese do que foi exposto pelos entrevistados,

destacando as citações que tiveram maior incidência ou as que julgamos mais interessantes

trazer à tona por proporcionarem elementos importantes para análise.

Os depoimentos que transcrevemos conforme expressa o entrevistado são

registrados entre aspas e em negrito. Já alguns, por serem muito longos ou repetitivos, são

sintetizados, procurando ser fiel à ideia principal ali contida, sendo, então, registrados em

negrito, sem aspas.

Sendo assim, ao analisar as categorias concepção/ formulação/definição em busca

de apreender o que o entrevistado entende por internacionalização da educação superior,

tivemos os seguintes depoimentos:

[...] é a introdução da dimensão intercultural na educação superior, em função principalmente do

crescente processo de globalização. Então, essa aceleração do processo de globalização, lançou um desafio,

vamos dizer assim, para as universidades. Hoje você tem que falar a língua e ter essa vivência intercultural

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também. E é nesse aspecto da interculturalização do estudante, oportunizar o estudante a trabalhar,

conhecer, a lidar com o diferente (UFMT).

[...] é, sobretudo, o movimento de troca que se faz e que desemboca na realização de trabalhos

conjuntos, a partir de um intercâmbio, que inicialmente serve para nós nos conhecermos e que resulte nesse

trabalho de parceria conjunta etc (SESU).

“É que muitas pessoas tendem a confundir o CsF como “A” internacionalização, e o programa é

na verdade um elemento importante para a efetiva internacionalização, mas que não se limita ao programa.”

(SESU).

[...] no Brasil, nós só teremos o processo de internacionalização da educação superior quando a

gente tiver estes dois, essa ação passiva no sentido de mandar [para o exterior] equilibrada com a ativa no

sentido de receber [no Brasil], ou seja, um processo de que contempla essa mobilidade de estudante,

pesquisadores nos dois sentidos (CNPq).

Pelos depoimentos, podemos inferir que a internacionalização da educação superior é

entendida pelo representante da UFMT como algo amplo, ou seja, como dimensão

intercultural na educação superior, sendo um desafio da globalização às universidades. Por

sua vez, é entendida pelos representantes da SESU e CNPq, principalmente, como um

processo de mobilidade internacional. Porém, a mobilidade nada mais é que um elemento do

processo de internacionalização da educação superior.

Evocamos novamente o pensamento de Knigth (2010, s.p), ao afirmar que

“Internacionalização é um termo que significa diferentes coisas para diferentes pessoas.”. E

também a advertência de De Wit (2002), ao asseverar:

[...] à medida que a dimensão internacional da educação superior ganha mais

atenção e reconhecimento, as pessoas tendem a usar o termo da forma que

melhor satisfaça aos seus propósitos. Uma definição mais focada é necessária para

ser entendida com a importância que ela merece. Mesmo se não houver

concordância sobre a definição, a internacionalização precisa ter parâmetros para ser

avaliada e, portanto, contribuir com a educação superior. Este é o motivo pelo

qual o uso de uma definição em construção com uma estrutura conceitual é relevante

para internacionalização do ensino superior (DE WIT 2002, p.114, grifo nosso).

Nesse sentido, fica evidenciado que o conceito ainda está em construção, não há

concordância sobre a definição e esta precisa ser definida para que haja harmonia no

entendimento do que é e para que se propõe, de forma a trazer contributos à educação

superior.

Ainda sobre o tópico da definição, o representante do SESU, ao ser questionado

sobre a definição do Programa CsF, se é internacionalização da educação ou da ciência,

expôs:

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“É a internacionalização da educação com ênfase nas ciências duras, nas tecnologias, então ai as

coisas se confundem, mas eu diria que o impacto é na educação, sobretudo na volta do estudante.” (SESU,

grifo nosso).

Esse questionamento surgiu porque, no site institucional do Programa CsF, consta a

definição “Ciência sem Fronteiras é um programa que busca promover a consolidação,

expansão e internacionalização da ciência e tecnologia, da inovação e da competitividade

brasileira por meio do intercâmbio e da mobilidade internacional.” (BRASIL, 2014, grifo

nosso). Porém, o programa é citado nos meios de comunicação como sendo um programa de

internacionalização da educação superior, causando paradoxos, que o próprio representante da

SESU reconhece.

A disparidade de entendimentos sobre o que seja a internacionalização da educação

superior parece dificultar o país a definir ações que a ela se referem. É como se cada sujeito

desse cenário (governo, instituição de ensino, estudantes, pesquisadores) buscasse foco

diferenciado, deixando evidências de que ainda não há uma política pública brasileira definida

acerca do tema.

Nesse sentido, ao analisar as categorias concepção/formulação/política, nosso

intuito era identificar se o Brasil, na visão dos entrevistados, possui uma política de

internacionalização da educação superior definida. Em caso positivo, pautada em que aspectos

e sob qual inspiração de modelo ou, em caso negativo, se é importante criá-la. Assim, temos:

“Eu acho que ela está em construção porque você dizer que um programa como o CsF, por

exemplo, é uma política, é muito pretencioso. [...] Dá para chamar isso de política de internacionalização do

ensino superior se você não está internacionalizando as universidades?!Não dá. Isso é política de

internacionalização do aluno de educação superior.”(UFMT).

“Nós temos uma política, ela está claramente delineada [...] E tanto é assim, que agora no Plano de

Desenvolvimento Universitário que está sendo pactuado entre o MEC e as Universidades federais, já levado

pela ANDIFES nas audiências que as universidades tiveram com a presidenta Dilma. [...]Então quer dizer,

você veja, é uma política que se explicita, é uma política que tem uma instrumentalização clara, tem um

planejamento e tem os recursos necessários, entretanto, nós vamos respeitar a autonomia das universidades,

então cada universidade vai formular seu PDU, isso a partir do Plano de Desenvolvimento Institucional da

universidade, que será atualizado, e é atualizado, quer dizer é a universidade que vai definir isso, a partir de

suas prioridades regionais, da sua inserção nacional e da sua internacionalização.” (SESU).

Quanto à inspiração, o Brasil não se inspirou em nenhum modelo de outro país. Não, está

acontecendo ao contrário. Outros países é que estão se espelhando no Brasil (SESU).

“Não, não tem. Tem um programa forte mis uma política não tem, arquitetada no sentido de

montar estratégias... não tem, precisaria ter.[...]Bom, como eu disse eu não vejo uma política de

internacionalização. Eu vejo um programa, uma ação forte que poderá vir a, digamos assim, depois,

englobado dentro de uma política.[...] Porque a gente não tem uma política, a gente precisa de uma política,

que a gente pode se apropriar dos erros que cometemos, dos muitos acertos que a gente teve no programa

para melhorar e aprofundar esse processo de internacionalização. ”(CNPq).

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Olha, o seguinte, os casos clássicos em internacionalização baseados em mobilidade de

pesquisadores e estudantes são os casos de países asiáticos, como China e Coréia, que mandam massivamente

estudantes e pesquisadores para o exterior. [...] o procedimento agressivo com relação a isso, mas se difere

por causa do financiamento, que no Brasil é majoritariamente por recursos públicos (CNPq).

Por meio desses depoimentos, identificamos divergências. Primeiramente, o

representante da SESU afirma com firmeza que há uma política de internacionalização de

educação superior definida e que está sendo materializada em forma do Plano de

Desenvolvimento Universitário, ao passo que os representantes da UFMT e do CNPq

afirmam que não há tal política.

Ao buscar o documento citado pelo Representante da SESU, identificamos que, em

maio de 2014, a ANDIFES entregou a presidente Dilma Rousseff uma proposta de

desenvolvimento para as Universidades Federais, para os próximos dez anos, intitulada “Uma

agenda de desenvolvimento para as Universidades Federais”, que contém a

internacionalização como uma das dimensões prioritárias do documento, porém trata-se

apenas de uma proposta. Tanto é que na reportagem “Andifes debate CT&I, autonomia e

delibera sobre entrega de proposta para presidenciáveis”, publicada em setembro de 2014, no

site da ANDIFES, consta a seguinte informação:

Durante a reunião do Conselho Pleno, foi deliberado que a proposta para o

desenvolvimento das universidades, elaborada pela Andifes, será entregue a todos os

presidenciáveis, como já feito à presidente Dilma Rousseff em maio. A iniciativa da

Andifes visa apresentar aos candidatos à Presidência da República a posição e

importância das Universidades Federais, ao relatar no documento os avanços

alcançados com a expansão dos últimos anos e propor diretrizes para uma nova

etapa de crescimento destas instituições. O documento é baseado em seis eixos

principais; desenvolvimento regional, desenvolvimento nacional, inovação

tecnológica, internacionalização, formação de professores e educação a

distância. Agenda de Desenvolvimento Para as Universidades Federias,

também reafirma o compromisso das instituições com o desenvolvimento

econômico e social do país e com as políticas educacionais ao propor um projeto

articulado com o Plano Nacional de Educação (PNE) (ANDIFES, 2014, grifo autor).

Desta forma, apesar do representante do SESU afirmar que existe tal política, ela não

é reconhecida pelos sujeitos e o documento de referência trata-se ainda de uma proposta.

A segunda divergência é acerca da inspiração, pois para o representante da SESU o

Brasil está sendo modelo para outros países, mas para o representante do CNPq o Brasil se

inspira na magnitude dos números de países asiáticos, como China e Coreia do Sul.

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Ao questionar se a internacionalização da educação superior é agenda prioritária para

o Brasil, pela categoria concepção/formulação/agenda, temos :

“Eu acredito que nos últimos anos sim. O Programa CsF é um demonstrativo disso.[...] Mas essa

prioridade, essa horizontalização da internacionalização é mais recente e eu acho que a vitrine dela é o CsF.

[...] A gente pode colocar o Programa CsF como marco divisor de águas, antes dele e depois dele.”(UFMT).

Em termos de política institucional essa é uma política prioritária da nossa administração da

reitora Maria Lucia, resultando inclusive na criação da SECRI. Mas não foi por causa do Programa CsF que

foi criada a SECRI (UFMT).

“Sim, cada vez mais, você tem na verdade um crescendo ai de priorização da internacionalização.

[...] A internacionalização é uma prioridade, está inserida na política do MEC em relação às universidades

federais e tem um substrato material que é o PNE, inclusive, para planejamento e financiamento.” (SESU).

“Bom, eu entendo que [o Brasil] colocou [a internacionalização na agenda] e atrasado! [...] o

Programa CsF eu acho que ele deu um passo decisivo, um programa governamental, deu um passo decisivo

no sentido de ter como prioridade isso.”(CNPq).

Aqui identificamos um consenso: todos os entrevistados acreditam que o Brasil tem

colocado a internacionalização da educação superior como prioridade em sua agenda, e o fez

principalmente pelo Programa CsF. Mas qual a motivação para tal? Temos como respostas

dos entrevistados para a categoria concepção/formulação/motivação:

“[...] na realidade essa é uma imposição de uma realidade que é maior do que nós. Uma realidade

internacional e isto está posto dentro da agenda internacional hoje, e o país que ficar a margem disso vai

acabar ficando prejudicado.” (UFMT).

“[...] o mundo está globalizado, e a educação superior tem que acompanhar este processo, então por

isso é uma prioridade.” (SESU).

“[...] o principal motor, eu acho, foi essa questão relacionada com a baixa produtividade da

economia brasileira.” (CNPq).

Identificamos que os entrevistados explicam a priorização na agenda sobre o tema

internacionalização da educação superior pelo contexto político-econômico que estamos

vivenciando. Conforme demonstrado no capítulo 2, há um direcionamento dos organismos

internacionais para que os países elejam esse tema como prioridade, o que, inclusive,

oportuniza ações da transnacionalização da educação superior, ao tratar como resposta à

globalização ou devido à baixa produtividade da economia brasileira.

Além da formulação, suscitou-nos saber acerca da criação do Programa CsF, ou seja,

qual é o ponto de vista dos representantes entrevistados. Primeiramente, separamos os

depoimentos em: O que? Para quem? Por quê? Após, agrupamos a síntese dos depoimentos

na categoria concepção/criação/ponto de vista.

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Vale explicar que foi solicitado que cada entrevistado fizesse uma escala de

prioridades que caracterizasse os sujeitos envolvidos (instituições parceiras internacionais;

instituição brasileira, bolsista e a política de internacionalização da educação superior

brasileira), entre o mais beneficiado e o menos, beneficiando com a criação e a

implementação do Programa CsF, conforme o quadro abaixo.

1 – Prioritário 2- Mediano 3 – Menos que a média 4- Menos prioritário

Desta feita, demonstramos a seguir o depoimento do representante da UFMT:

O que?

“Primeira coisa, esse numero 100 mil ninguém sabe até hoje de onde veio, então isso já mostra

uma falta de planejamento do programa. [...] O Programa CsF não passa de um programa exportador de

alunos[...]Olha, a priorização das áreas segue a lógica do mercado. E dentro desta lógica que o país tem que

competir, a escolha foi correta.” (UFMT).

Para quem?

“Você tem universidade[no exterior] que não tem aluno, porque a população está envelhecendo,

então para eles é um grande negócio receber os nossos alunos CsF por que eles conseguem manter a

população estudantil, pagando taxa, e todo mundo consegue manter os seus empregos, então é um bom

negócio para eles.”(UFMT).

“Para a instituição é 2, porque foi um divisor de aguas mas poderia ser melhor. Para o bolsista é 2

também, porque se ele fosse mais bem elaborado, se desse para bolsista fazer um plano de estudos melhor, ele

aproveitaria melhor a experiência internacional sem perder muito tempo para colação de grau dele. Para o

parceiro internacional é excelente, está ganhando taxa acadêmica, fazendo internacionalização em casa e

não esta assumindo compromisso nenhum conosco, com o Brasil, com a instituição. É a melhor coisa do

mundo. Para a política da internacionalização da educação superior, ele é abaixo da média porque se fosse

mais bem pensado, elaborado, planejado e executado, ele traria resultados muito melhores, seria um

programa, que traria sob o ponto de vista economicidade para o contribuinte, seria muito melhor, nós

poderíamos tirar muito mais proveito para o contribuinte, para as instituições.” (UFMT).

Por quê?

“A crise de 2008 foi uma crise crônica porque está aqui até hoje, [...] isso é claro, teve rebatimento

das instituições externas, e isso é claro, fez com que o Obama saísse como garoto propaganda e viesse aqui ao

Brasil, fazer o desafio para a Dilma, e ela como é uma pessoa que não é de fugir de desafios, ela aceitou o

desafio do Obama.” (UFMT).

“[...] a globalização da economia é isso, um engolindo o outro, um competindo com o outro, e isso

acaba refletindo na mão de obra, o país que tiver a mão-de-obra mais barata e produzir mais, é isso que vai

ganhando.” (UFMT).

O Brasil é muito isolado. O Brasil era e ainda é um país extremamente fechado sob o ponto de vista

da internacionalização. Isso vem também do fato de nossas universidades serem muito fechadas a essa

interação com o exterior (UFMT).

De forma sucinta, o ponto de vista defendido pela UFMT parece ser que o Programa

CsF possui uma magnitude em termos numéricos de bolsas, trata-se de um programa

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exportador de alunos, que prioriza áreas segundo a lógica do mercado e tem como escala de

beneficiados: 1. instituições parceiras internacionais; 2. instituição brasileira e bolsista; e 3. a

política de internacionalização da educação superior brasileira. Finalmente, que foi criado por

uma demanda dos EUA, devido à crise de 2008 e à globalização, considerando o fato de o

Brasil precisar romper o isolamento em suas relações internacionais.

Adiante, o depoimento do representante da SESU:

O que?

“[...] é um número cabalístico. Cem mil é muita coisa [...] para um país da dimensão do Brasil

ainda que a gente tenha um numero pequeno de estudantes nas nossas universidades, vem crescendo, cem mil

é um número bastante razoável. [...] Mas foi um primeiro momento e nós vimos que estávamos corretos. [...]

Mas o dados estão mostrando que vamos atingir as 101 mil bolsas no final deste ano e já estamos quase

chegando lá.” (SESU).

“Eu diria que é “um” programa e não “o” programa. [...] O Programa CsF, obviamente, tem uma

dimensão tal, que não tem como dizer que ele é apenas um elemento, é um elemento fundamental e ele está

servindo de base para toda repercussão em outras ações, outros editais.[...] CsF, de grande sucesso o

programa [...] ” (SESU).

Para quem?

“Olha, é difícil fazer uma escala porque na verdade todos são prioritariamente beneficiados. Todos

são 1.” (SESU).

Por quê?

“Porque o Brasil sempre esteve de costas para o exterior.” (SESU).

Ao resumir o ponto de vista da SESU acerca da criação do Programa CsF, temos que

o entrevistado entende que o programa possui uma magnitude em termos numéricos de

bolsas, porém acredita ser um número razoável, levando em conta a dimensão do país.

Considera um elemento fundamental para as ações de internacionalização da educação

superior do país, mas afirma não ser o único. Acredita que todos os sujeitos (instituições

parceiras internacionais; instituição brasileira, bolsista e a política de internacionalização da

educação superior brasileira) são beneficiados da mesma forma. E acredita, igualmente, que o

programa foi criado pelo fato de o Brasil ser muito isolado em suas relações internacionais.

Por fim, temos o ponto de vista do CNPq:

O que?

Essa pergunta é um verdadeiro mistério. Então, teria sido uma sugestão do presidente Barack

Obama de mandar 100 mil para EUA porque os chineses têm mais de 250 mil. Então, ele queria que

mandasse 100 mil para EUA. Acerca da priorização de áreas, eu vejo o seguinte, muito coragem da

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presidenta fazer isso, porque no Brasil trabalhar com prioridade é uma coisa muito complicada, sempre dá

muita reclamação[...]Mas eu acho que esse é um ponto positivo do programa, pois se abrissem para todas as

áreas, a gente ia fazer um bando de coisa e nada (CNPq).

“[...] foi um programa que veio de cima para baixo, em cima das duas agências, e que pelo respeito

que as agências tem com as instituições, as instituições aderiram e também a maioria delas viu que era bom

[...]” (CNPq).

“Acho ele fundamental, ele veio para mexer com uma situação que estava confortável para todo

mundo.” (CNPq).

Para quem?

“A prioridade aqui é no estudante, para que ele vivencie uma experiência diferente que ele tem

aqui, tenha oportunidade de aprofundar seus conhecimentos linguísticos, ter uma outra cultura, contato com

outra cultura acadêmica, de pesquisa, cultura de maneira geral com outra sociedade.[...]Em segundo lugar,

as instituições no Brasil, porque se elas – elas são inteligentes, mas se elas forem muito inteligentes elas

podem aproveitar esse, todo esse material que está voltando do exterior, para rediscutir seus processos e

procedimentos internos, que eu considero atrasado.[...] O parceiro internacional é importante como

instrumento, não é um ator assim[..] Porque nós contratamos, são pessoas, então eles tem interesse, então

colocaria como 4 ou 5 na escala. Para construção de uma política o programa é 3 lugar.” (CNPq).

Acerca da participação das instituições brasileiras na criação do programa, a participação foi

pequena, o programa foi de “cima para baixo”, uma decisão. [...] Isso é o egoísmo das instituições [...] Você

vê como eles estão olhando para o próprio umbigo, isso é uma atitude típica da universidade brasileira hoje,

de algumas, olhar para o umbigo dela, não olha para o Brasil como um todo. E o programa vem olhar para o

Brasil como um todo [...] (CNPq).

Por quê?

“Eu ouvi falar que teria sido uma provocação do presidente americano à presidenta Dilma numa

reunião que ele teve aqui no Brasil, ele fez uma visita no Brasil.[...] a criação do programa já estava sendo de

certa forma gestada quando o presidente visitou, estava em discussão essa questão de abrir mais [...]Então, já

estava sendo discutido isso, com a vinda do presidente Obama houve uma provocação extra que redundou

nestas 100 mil bolsas.”(CNPq).

Em síntese, o relato do ponto de vista do CNPq sobre a criação do Programa CsF

evidenciou que o mesmo possui uma magnitude em termos numéricos de bolsas; que o

destino prioritário são os EUA; que a priorização de áreas foi uma atitude corajosa da

presidente e uma decisão governamental imposta aos sujeitos executores; e que o programa é

fundamental. Considera, ainda, que tem como escala de beneficiados: 1.bolsista; 2. instituição

brasileira; 3. a política de internacionalização da educação superior brasileira; e 4 ou 5 as

instituições parceiras internacionais. O representante faz um adendo no sentido de que as

instituições brasileiras tiveram pouca participação na criação do programa e as classifica

como “egoístas” por não olharem o Brasil como um todo. E, por fim, acerca do por quê o

programa foi criado, assevera que teria sido por uma provação do presidente Barack Obama à

Dilma Rousseff.

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Ao focalizar a categoria concepção/criação/ponto de vista, assinalamos a

convergência dos entrevistados em considerar a magnitude do programa, a necessidade de

priorização de áreas para atender a demanda reprimida de formação de quadros das “ciências

duras” e tecnológicas, considerando a lógica do sistema capitalista. Igualmente, os

entrevistados corroboram que a criação do programa foi motivada pela provocação dos EUA,

e também pelo isolamento do Brasil em suas relações internacionais. Porém, identificamos

divergência na escala de prioridade dos beneficiados do Programa CsF, sendo possível assim

sintetizar:

UFMT: 1. instituições parceiras internacionais; 2. instituição brasileira e bolsista e 3.

a política de internacionalização da educação superior brasileira.

SESU: 1. instituições parceiras internacionais; 1. instituição brasileira; 1. bolsista e 1.

a política de internacionalização da educação superior brasileira.

CNPq: 1.bolsista; 2. instituição brasileira; 3. a política de internacionalização da

educação superior brasileira; e 4 ou 5 as instituições parceiras internacionais.

Evidenciamos que cada representante, ao indicar os beneficiados, possui um olhar

institucional diferente, que, inclusive, pode decorrer da falta de uma política pública definida

acerca do tema em questão.

Continuamos nossa exposição, desta vez, na categoria implementação/fragilidades.

Inicialmente, buscamos unir os depoimentos por temática afim, estabelecendo: 1.

planejamento e gestão; 2. vínculo institucional; 3. priorização de áreas; 4 . avaliação

institucional; 5. conhecimento de língua estrangeira; e, 6. adaptação psicológica.

1. Planejamento e gestão

Então, é um programa que foi mal planejado, eu diria também que ele foi mal concebido, que os

operadores que somos nós, não fomos ouvidos. Ele tem uma série de erros na implementação, a gente vê que

há uma concentração de poder na CAPES e no CNPq e não precisava ser assim. [...] O programa se deu de

uma forma bastante atribulada, não só na UFMT, mas no Brasil todo [...] As agências se comunicavam

diretamente com os estudantes e não conosco, então foi uma série de atropelos por causa da meta ambiciosa e

do prazo curto imposto pelo governo. Nós éramos chamados a Brasília [...] onde eles se limitavam a ler edital

para nós [...] Você imagina algumas universidades (que não foram poucas) que não tinham experiência

nenhuma com isso. Isso caiu com todo atropelo que foi o início do CsF,[...] nós tivemos muita dor de cabeça

pela forma como o programa foi implementado, imagina as outras universidades.[...] Ele apesar de dar

visibilidade a nossas IES, atropela muito o nosso trabalho, passou por cima, patrolou o que a gente já fazia. A

minha avaliação negativa é no aspecto da gestão. (UFMT).

“[...] porque ele é centralizado nas duas agências” (SESU).

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“Na verdade, o que nós encontramos aqui, um programa dessa dimensão, que não existia, e você

colocar 100 mil pessoas, 100 mil bolsas, os problemas que nós tivemos foi praticamente nada.” (SESU)

“Nós estamos atrasados com relação a internacionalização.” (CNPq).

“A participação foi pequena, o programa foi de “cima para baixo”, uma decisão.[...] Eu diria que

para um segundo momento, a gente tem que melhorar muito a participação das instituições, estar mais junto

do programa, discutindo mais com elas as formas[...]” (CNPq).

2. Vínculo institucional

[...] eu acho que ele não cria vínculos entre as instituições [...] vínculo institucional que é aquilo

que realmente traria, sob o ponto de visto de uma política de internacionalização universitária. [...] O CsF

não está nos trazendo isso, pelo contrário, o CsF evita isso, na medida em que aquelas universidades, que

alguns anos atrás estariam dispostas a firmar convênio conosco, hoje não querem mais, porque preferem

receber um aluno CsF que paga taxa administrativa [...]E o que nós vemos hoje é que as universidades não

querem mais esse tipo de convênio porque elas querem a taxa. [...] Vou começar pelo “ não ganhos”, esses

são os convênios e as parceria que nós poderíamos estabelecer. O governo fala que o estudante vai para fora,

criar vínculos, cria laços, que bom! Mas que bom se a instituição que ele estuda também pudesse criar esses

laços, que seriam mais duradouros, para que a instituição também se internacionalizasse (UFMT).

3. Priorização de áreas

“[...] humanidades prestam um serviço à sociedade, no sentido de que a universidade é a única

instituição que a sociedade paga para criticar ela própria, e quem faz isso, são as humanidades, o programa

peca desse lado.” (UFMT).

“É priorizou-se onde nós tínhamos fragilidades, nas ciências ditas duras, tecnologias, saúde,

ciências da informação, engenharias, porque nós não temos programas em número suficiente, abrangência

suficiente, com padrão internacional que permitissem receber todos esses estudantes e pesquisadores”.

(SESU).

4. Avaliação institucional

Prejuízo? teve sim. Vamos ver como é que o MEC vai avaliar as universidades. Um [dos critérios de

avaliação] é o tempo de permanência dos alunos [para integralização curricular]. Eu espero que o atraso na

colação de grau dos alunos CsF[não seja considerado] para não prejudicar os indicadores da universidade

junto ao MEC. (UFMT).

“Para a instituição que representa, obviamente que ela é beneficiada, e aqui cabe um parêntese (

nós estamos enfrentando bons problemas)[...]Então, quer dizer, o que inicialmente, parece um problema é um

bom problema no sentido de que cabe a nós, nossas universidades, conhecerem, fazerem uma avaliação do

que nós fazemos aqui, e nós nos ajustarmos a essa maneira mais independente, mais ativa do estudante, do

que o que nos temos hoje e em muitos casos que o estudante é um participante, se pode dizer assim,

passivo.”(SESU).

“Eu fui professor universitário, e sei que a universidade não diferencia muito do tempo que eu

deixei a universidade não, está do mesmo jeito, parecendo a mesma coisa. Tem algumas ilhas de excelência

etc, mas na média quadro e giz, aluno sentado, tendo centenas de aulas durante uma semana, sem

oportunidade de ser criativo[...]” (CNPq).

5. Conhecimento de língua estrangeira

“Primeira delas, nós brasileiros não falamos uma segunda língua” (SESU).

“[...] com todas as dificuldades de língua, de logística, duas agencias CAPES e CNPq assumindo o

compromisso, que significou para as duas um trabalho imenso e ainda significa, tiveram que receber um

reforço na sua estrutura, então foi um desafio grande” (SESU).

6. Adaptação psicológica

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“[...] é evidente que algum problema você vai ter,...sempre tem um problema de adaptação

psicológica, o impacto da língua que você não domina, algum problema de saúde.” (SESU).

De forma geral, podemos notar que as fragilidades do Programa CsF surgem com

falhas em seu planejamento e gestão, consequentemente, em sua implementação, fato

comprovado também pelas análises documentais já exploradas.

A questão da falta de vínculo institucional entre as instituições de ensino brasileiras e

estrangeiras é ressaltada apenas pelo representante da UFMT, não sendo objeto de análise por

parte dos representantes de instituições idealizadoras e gestoras, SESU e CNPq. Aliás, pelo

CNPq, isso é uma reivindicação “egoísta” por parte das instituições brasileiras.

A priorização de área é considerada fragilidade por não incluir as humanidades e

pelo Brasil não ter programa suficiente para atender a demanda de todas as áreas.

A avaliação institucional é cogitada como fragilidade no sentido de que as

instituições brasileiras precisam repensar seus processos para se aproximarem do que os

entrevistados da SESU e CNPq consideram de “excelência”, ou seja, a forma como são

geridas as instituições estrangeiras. Com relação ao representante da UFMT, é no sentido de

como a instituição brasileira será avaliada pelo MEC no quesito permanência do estudante, já

que o bolsista CsF tem grandes chances de atrasar a integralização curricular, segundo o

entrevistado.

Também é suscitada a fragilidade do conhecimento de línguas estrangeiras por parte

dos bolsistas, bem como a falta de estrutura e logística por parte das agências executoras do

programa, além da citação de possíveis problemas de adaptação psicológicas por parte dos

bolsistas no exterior.

Todas essas fragilidades estão presentes na descrição da fisionomia e funcionamento

do Programa CsF, retratando a forma abrupta da sua criação, sem planejamento, imposta às

agências CAPES e CNPq, com desencontros de informações entre as agências, as

universidades e os bolsistas, sendo necessário que a Presidência da República tomasse para si

a responsabilidade de definir papéis e funções instituindo, oficialmente, o Programa CsF

somente seis meses após seu lançamento. Além disso, foram destacados os problemas de

conhecimento de língua estrangeira que provocaram a criação do subprograma Inglês sem

Fronteiras e, ainda, a falta de diálogo dos órgãos do MEC com as instituições de educação

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brasileira, conforme também constatado no OF. CGRIFES n. 01/2013 - Conselho de Gestores

de Relações Internacionais das Instituições Federais de Ensino Superior –

CGRIFES/ANDIFES.

Contudo, o Programa CsF também possui pontos fortes, sendo evidenciadas na

categoria implementação/pontos positivos. Também buscamos unir os depoimentos por

temática afim, estabelecendo: 1. expertise da instituição de educação brasileira; 2.

visibilidade; 3. agências: Capes e CNPq; 4. embaixadas e consulados brasileiros; 5.

priorização de área; e, 6. repercussão internacional.

1. Expertise da Instituição de educação superior brasileira

“[...] apoio da administração superior [...] Isso é claro, beneficiou também o CsF, nós tivemos

aumento de equipe, de infraestrutura, enfim, se você comparar hoje com 2008 a situação é totalmente

diferente, mas não só por conta do CsF.” (UFMT).

“Resumindo, a experiência da UFMT com outros programas, com outras parcerias foi uma

facilidade para UFMT implementar o Programa CsF.” (UFMT).

2. Visibilidade

“O Programa CsF tem e teve o grande mérito de nos dar visibilidade, às instituições superior

brasileira, passamos a ter visibilidade internacional, o que nos não tínhamos antes, isso é inegável. [...] O

Brasil entrou no mapa mundi da internacionalização. [...] Olha, eu analiso de forma positiva na UFMT

devido a visibilidade que esse programa deu as ações da SECRI e, por conseguinte, ao processo de

internacionalização da universidade.” (UFMT).

3. Agências: CAPES e CNPq

“Realmente a CAPES e o CNPq têm uma equipe de funcionários empenhados, trabalham bastante,

mas eles não têm culpa se a chefia não planejou o programa, isso veio de cima com planejamento a desejar.”

(UFMT).

Olha, eu avalio de uma forma, talvez seja um dos programas mais exitosos do atual governo porque

as duas agências são muito competentes no que fazem, tem experiência consolidada de mandar gente para o

exterior, bons contatos no exterior. Uma das coisas essenciais é a credibilidade das agências, de quem está

mandando, e também a possibilidade de contato que essas duas agências, através dos dois presidentes, tiveram

um êxito muito grande.” (CNPq).

4. Embaixadas e consulados brasileiros

“[...] embaixadas e consulados brasileiros foram espetaculares[...]” (SESU).

5. Priorização de áreas

“Então eu acho que foi um dos pontos fortes do programa: a coragem de determinar prioridades.”

(CNPq).

6. Repercussão internacional

“Nós tivemos oportunidade de receber vários Ministros da Educação aqui, da Ciência e Tecnologia,

eu fui testemunha de vários encontros, todos eles elogiam intensamente. Países que não recebem,

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reivindicando receber, para serem incluídos no programa. Países querendo conhecer o programa para

replicar na realidade de seu país.” (SESU).

Sintetizando os pontos positivos, fica evidenciado que, apesar da pouca participação

das instituições brasileiras na criação do Programa CsF, sua expertise em atuar com outros

programas de internacionalização facilitou a implementação do CsF. Além, é claro, da

atuação empenhada por parte das agências CAPES e CNPq e das embaixadas e dos

consulados brasileiros. Porém, reiteramos que o ponto forte de destaque foi a visibilidade

conquistada pelo Brasil que “entrou no mapa mundi da internacionalização” (UFMT),

reproduzindo, assim, uma repercussão internacional positiva.

Tais pontos positivos também estão referendados nos efeitos pós-CsF na

exemplificação dada por meio da análise do processo de internacionalização na UFMT

principalmente acerca do seu aumento agressivo nas estatísticas pela mobilidade outgoing.

Finalmente, como última categoria temos a implementação/ perspectivas, com o

objetivo de detectar os desdobramentos futuros de tal programa:

“Vamos ver agora. Eu não posso te falar ainda, como é que isso está e se isso vai impactar porque

eu não duvido muito, conhecendo, infelizmente um pouco a máquina pública brasileira como funciona, que

amanhã a gente sofra algum prejuízo.” (UFMT).

“Aquele estudante que vai fazer mobilidade para fora ele mantem contatos, ele vai ativar este

contatos, vai talvez, fazer uma pós-graduação, vai fazer um mestrado, sobretudo um doutorado.” (SESU).

“[...] a reivindicação para que as humanidades também integrem.” (SESU).

“[...] estamos agora [com] iniciativas outras, idiomas sem fronteiras, a internacionalização da pós-

graduação, o uso de uma segunda disciplina sobretudo o inglês, eventualmente outras, na pós-graduação.”

(SESU).

“[...] claro que com diretrizes claras, dar um pouco mais de autonomia às universidades, para ela

tomar decisões, tipo em que áreas ela acha importante, o que o PDU [Plano de Desenvolvimento

Universitário] daquela universidade está priorizando para o desenvolvimento regional, e mesmo nacional, e

que vai ter um impacto na instituição, na região, esse é um elemento que talvez seja agregado no ano que

vem.” (SESU).

“Sim, nós queremos que vocês recebam nossos estudantes/pesquisadores, mas nós queremos a

contrapartida, que vocês venham e vamos colocar no ar um programa para vocês aprenderem o português,

como nós estamos aprendendo a sua língua.” (SESU).

“O CsF 2.0 inicia no próximo ano[...] Eu diria que para um segundo momento, a gente tem que

melhorar muito a participação das instituições, estar mais junto do programa, discutindo mais com elas as

formas[...]” (CNPq).

Acerca do futuro, temos a confirmação por meio do relato do entrevistado do CNPq

de que o Programa CsF 2.0, lançado em julho de 2014, inicia em 2015. Os relatos mostram

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que, nesse segundo momento, poderá ser pensada uma forma de melhorar a participação das

instituições brasileiras na implementação do programa, dando-se um pouco mais de

autonomia às universidades. Talvez as humanidades integrem o programa, e, quiçá, haja

requisição de contrapartida aos parceiros internacionais, conforme expõe o representante da

SESU.

Há também, nos relatos feitos, perspectivas acerca do fortalecimento de outras

iniciativas de internacionalização da educação superior, como o Programa Idiomas sem

Fronteiras, a internacionalização na pós-graduação incluindo o retorno dos ex-bolsistas CsF

para fazer a pós-graduação no exterior. Ademais, permanece o receio do representante da

UFMT sobre a forma como as instituições brasileiras serão avaliadas no quesito permanência

de estudantes devido ao possível atraso de integralização curricular dos bolsistas CsF.

Ao longo da análise em busca de elementos para as respostas às questões suscitadas

no início deste capítulo, conseguimos promover aproximações relativas. Em outras palavras,

“um processo de trabalho de aproximações sucessivas da verdade que, por ser histórica,

sempre é relativa.” (FRIGOTTO, 1997, p. 87).

Segundo Silva (2008), a realidade, por ser histórica, está sempre em construção. A

autora ainda cita Frigotto: “ao iniciarmos uma pesquisa dificilmente temos um problema, mas

uma problemática.” (1997, p. 87).

Nesse sentido, os depoimentos coletados parecem atestar, em grande parte, o

apresentando ao longo dos capítulos anteriores, destacando-se, principalmente, o contexto

sócio-político-econômico vigente no Brasil para a criação e a implementação do Programa

CsF.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente dissertação teve como objetivo principal analisar a concepção e a

implementação do Programa Ciência sem Fronteiras, no contexto da política de

internacionalização da educação superior no Brasil.

A partir do estudado, parece-nos que a principal constatação é que não existe uma

política de internacionalização da educação superior plenamente definida no Brasil. Há uma

política em construção, em que os sujeitos envolvidos ainda discutem sobre o assunto,

tentando estabelecer sua posição no embate de forças, no qual o Estado, em última instância,

tem a responsabilidade de estabelecer e manter a política pública, o que o configura como

“[...] um meta-ator das políticas públicas [...]” (HARVEY, 1989, p.174).

Essa constatação parece desestruturar a questão principal norteadora de toda essa

dissertação: Como se caracteriza, em termos de concepção e implementação, o Programa

Ciência Sem Fronteiras, no âmbito da política de internacionalização da educação superior no

Brasil? Assim sendo, se não há política instituída, a reflexão fundamental poderia ser: Qual a

representatividade do Programa CsF na definição da política de internacionalização da

educação superior no Brasil?

O nosso entendimento sobre política pública refere-se a um conjunto intencionado de

ações ou diretrizes sobre determinado tema social com vista a cumprir um objetivo, o que,

geralmente, é realizado pelo Estado.

Vimos que a concepção e a implementação do Programa CsF, mesmo sem expressar

exatamente a política de internacionalização como um todo, traduz posicionamentos e

características as quais esboçam uma ideia consistente de internacionalização. Isso pode ser

demonstrada ao longo da pesquisa documental e também pelos depoimentos dos sujeitos

entrevistados.

Sendo assim, para entender o posicionamento assumido pelo Brasil acerca da

internacionalização da educação superior, é preciso adentrar aos pormenores do Programa

CsF.

A julgar pelo que podemos analisar até então, o Programa CsF atende à lógica do

sistema capitalista, em consonância com os princípios do novo-desenvolvimentismo:

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crescimento econômico do país e equidade social. Além disso, caracteriza-se como um

elemento fundamental na política de internacionalização da educação superior no Brasil, que,

salientamos novamente, ainda está em construção.

O referido programa fortalece a perspectiva mundial de induzir as instituições de

ensino a priorizar a produção de conhecimento para atendimento à demanda de formação de

quadros de pessoal, principalmente técnicos-cientistas, tendo em vista a demanda de

profissionais altamente qualificados, principalmente nas áreas de ciência, tecnologia e

inovação, com intuito de promover a competividade empresarial brasileira no mundo

globalizado, e, consequentemente, promover o crescimento econômico do país.

Há de se ressaltar que havia instituições de educação brasileiras que já desenvolviam

atividades da internacionalização da educação superior antes do Programa CsF, tendo como

princípios básicos a isenção de taxas acadêmicas e a aproximação com países do mesmo

continente sul-americano ( conforme demonstrado sobre o processo de internacionalização da

UFMT), entretanto, sem o mesmo destaque midiático e de investimentos governamentais

dados ao CsF.

Em relação ao princípio da equidade social, no que concerne ao CsF, a intenção é

elevar o número nacional de profissionais altamente qualificados para que tenham melhores

condições financeiras, ou seja, alto valor no mercado. “Quem sabe aplicar os conhecimentos e

gerenciar os processos que os transformam em riquezas tem grande prestígio social e alto

valor no mercado. Daí decorre o prestígio de áreas tecnológicas [...].” (DIAS SOBRINHO,

2005, p.76/77).

Esse pensamento do governo brasileiro parece estar pautado na explicação de Dias

Sobrinho (2005, p.75):

A divisão internacional entre os ricos e pobres tem agora uma conotação muito

fortemente ligada à globalização capitalista. Não basta aos países ter grandes

riquezas naturais. Não atingirão estágios elevados de desenvolvimento, não terão

futuro, se não investirem consistentemente em formação humana. É a educação que

acrescenta valor à vida humana. Pobreza e exclusão relacionam-se com as

carências de conhecimento e desprovimento dos meios de aquisição de

aprendizagens e informações. Conhecimento e informação atualizados são

instrumentos poderosos de desenvolvimento e de inclusão social (DIAS

SOBRINHO, 2005, p.75, grifo nosso).

Contudo, há de se afirmar que elevar o padrão financeiro de quem detém o

conhecimento implica em excluir aqueles que não se enquadram em tal perfil profissional,

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característica da sociedade do conhecimento, também explicada por Dias Sobrinho (2005,

p.75): “Entretanto, também não há como omitir os efeitos deletérios da má distribuição das

benesses da globalização, especialmente no que diz respeito ao conhecimento. A sociedade e

a economia do conhecimento incluem e excluem [...].”

Numa leitura questionadora da realidade em foco, podemos interpretar que o discurso

de redenção social via conhecimento e promessa de conduzir a sociedade a um tempo de

prosperidade pode não se sustentar, caso não envolva reformas sociais de caráter abrangente,

a exemplo de uma profunda distribuição de renda e de superação das relações sociais pautadas

na desigualdade social. No que tange à educação, reformas abrangentes implicariam, dentre

outras questões, o pleno acesso à educação superior em instituições formadoras reconhecidas

como referências sociais.

A propósito, Silva (2008, p. 3) resgata análises de Barros (2002) sobre a questão da

produção do conhecimento na atualidade, permitindo-lhe concluir que o mundo está dividido

em blocos que interagem: dos países desenvolvidos ou altamente industrializados, que se

baseiam no crescimento da ciência como principal atividade geradora de conhecimento e na

aplicação da tecnologia ao progresso produtivo e social; a outra, como maioria, dos países

dependentes, onde faltam recursos, instituições, capital humano, legado cultural, provocando

uma incapacidade de gerar conhecimento científico em larga escala. De forma ilustrativa, é

informado que, segundo Barros (2002), em 1995, Estados Unidos, Japão e Europa detinham

74,8% da produção científica mundial, evidenciando a correlação entre a capacidade de

pesquisa e o poder econômico.

Essa análise traz à tona outra característica do Programa CsF que é a sua parceria

com países desenvolvidos, principalmente os EUA, que receberam aproximadamente 30%

dos bolsistas CsF, atendendo o asseverado por Altbach (2001, p.71, apud DIAS SOBRINHO,

2005, p.84): “As nações do Terceiro Mundo são basicamente ‘consumidoras’ de

conhecimento dependentes das nações industrializadas no que respeita à investigação, às

interpretações dos avanços científicos e, em geral, à informação.”

Podemos afirmar que o Brasil está na condição de consumidor de conhecimento

tendo em vista a forma como o CsF foi concebido (ou seja, buscar e referenciar-se no

conhecimento produzido fora do país), e, principalmente, a característica de pagamentos de

taxas acadêmicas internacionais. Para exemplificar, temos o quadro abaixo que demonstra os

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valores iniciais negociados entre o Programa CsF e os parceiros internacionais, em novembro

de 2011, às vésperas do lançamento das chamadas da 2ª convocação do referido programa.

Quadro 9 - Custo por bolsista/ano do Programa CsF

País Valor/ Ano/ por

Bolsista CsF

Referência

EUA US$35.950 Taxas escolares + Acomodação

Reino Unido £15.000 Taxas escolares + Acomodação + Curso de

Idioma

Alemanha € 2.500 Taxas administrativas + Curso de Idioma

Itália € 2.500 Taxas administrativas + Curso de Idioma

Fonte: Dados organizados pela autora, com base na apresentação “CsF: Um programa especial de

mobilidade internacional em ciência, tecnologia e inovação”, CNPq, novembro de 2011.

Independentemente do valor gasto pelo recurso público nacional, a contradição

básica parece ser a utilização, por parte do programa analisado, do termo internacionalização

da educação superior, que expressa, na verdade, a comercialização da educação. Em outras

palavras, a transnacionalização da educação superior.

Interpretamos, portanto, que a internacionalização da educação superior oculta uma

essência: a transnacionalização. Isso vem no sentido advertido por De Wit (2002, p.114 apud

MUELLER, 2013, p.25) sobre o cuidado que se deve ter no uso do conceito da

internacionalização da educação superior:

[...] à medida que a dimensão internacional da educação superior ganha mais atenção

e reconhecimento, as pessoas tendem a usar o termo da forma que melhor satisfaça

aos seus propósitos. Uma definição mais focada é necessária para ser entendida com

a importância que ela merece. Mesmo se não houver concordância sobre a

definição, a internacionalização precisa ter parâmetros para ser avaliada e, portanto,

contribuir com a educação superior. Este é o motivo pelo qual o uso de uma

definição em construção com uma estrutura conceitual é relevante para

internacionalização do ensino superior (DE WIT 2002, p.114, apud MUELLER,

2013, p.25).

Entendemos que a internacionalização da educação superior deve ter como norteador

o “valor universal do conhecimento”, num processo de troca mútua e solidária, ou seja, de

‘mão dupla’, em busca de soluções para questões globais como fome, doenças,

sustentabilidade etc. Ou até em busca de soluções locais/regionais, que venham a ser

compartilhadas para melhoria da qualidade de vida da sociedade como um todo.

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Acreditamos que a experiência da cooperação internacional pode desenvolver

habilidades interculturais, ampliação das vertentes do conhecimento acadêmico, visão

holística do saber, larga vivência pessoal e vínculos pessoais e institucionais, podendo

promover maior tolerância entre povos, tanto para o indivíduo participante de uma

modalidade da internacionalização (intercâmbio, pesquisas conjuntas etc.) quanto para as

instituições de educação superior envolvidas no cenário.

Mas a transnacionalização da educação superior pouco traz de resultado aos

partícipes do processo. Trata-se de uma relação comercial de venda de conhecimento e que

depende da habilidade do comprador para ter a certeza que está comprando o produto ideal

para suas necessidades.

Esse fato pode ser demonstrado pela característica do Programa CsF, que, pela

avaliação do representante da instituição de educação superior entrevistado, pouco trouxe de

resultado institucional por tratar sobremaneira da mobilidade outgoing, em detrimento de

outras tantas modalidades possíveis do processo de internacionalização da educação superior.

Segundo o entrevistado: “O governo fala que o estudante vai para fora, criar vínculos, cria laços, que

bom! Mas que bom se a instituição que ele estuda também pudesse criar esses laços, que seriam mais

duradouros, para que a instituição também se internacionalizasse.” (UFMT).

A partir desse conjunto, analisamos que a internacionalização da educação superior

no Brasil, na perspectiva do que se apresenta no Programa CsF, tende a negligenciar a

solidariedade mútua para se constituir em estratégia para o fortalecimento do modelo político-

econômico vigente, posicionando-se em termos de relações internacionais com a essência da

transnacionalização da educação superior.

Em tal perspectiva, resta-nos questionar: será que, assumindo essa posição, o Brasil

poderá efetivamente vencer as barreiras das desigualdades que o caracterizam socialmente,

além de potencializar o crescimento do país e da ciência, avançando na direção dos interesses

societários e da sua autonomia?

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172

APÊNDICE A

Roteiro para entrevista com Representante da SECRI- UFMT

1) O que entende por internacionalização da educação superior?

2) O Brasil tem colocado a internacionalização da educação superior como prioridade em

sua agenda? Por quê?

3) O Brasil possui uma política de internacionalização da educação superior?

3.1 Caso sim, pautada em que aspectos fundamentais?

3.2 Caso responda que não, considera importante criá-la? Por quê?

4) Como se caracteriza, em termos de concepção, o Programa Ciências Sem Fronteiras

(CsF), no âmbito da política de internacionalização da educação superior no Brasil?

Considera que o CsF é o programa fundamental desta política?

5) Como avalia a implementação do Programa CsF para cumprimento da meta

estabelecida de fornecimento de mais de 100 mil bolsas em 4 anos (2011 a 2015)?

6) Como vê a priorização de áreas do conhecimento por parte do Programa CsF?

7) Enumere conforme escala prioridade abaixo, como caracteriza o mais beneficiado e o

menos beneficiado com a criação e implementação do Programa CsF e justifique sua

escolha:

1 – Prioritário 2- Mediano 3 – Menos que a média 4- Menos prioritário

______ para a instituição que representa;

______ para o bolsista do programa;

______ para o parceiro internacional:

______ para a política de internacionalização da educação superior no Brasil:

Justifique sua escolha:

8) Como se deu o processo de adesão e implementação do Programa CsF pela UFMT?

Quais foram os gargalos e as facilidades?

9) Quais são os benefícios, prejuízos ou não ganho por parte da UFMT na implementação

do Programa CsF considerando o processo de internacionalização desta IFES?

10) Como avalia de modo geral, em termos de concepção e implementação, o Programa

CsF, no âmbito da política de internacionalização da UFMT?

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APÊNDICE B

Roteiro para entrevista com Representante do SESU-MEC

1) O que entende por internacionalização da educação superior?

2) O Brasil tem colocado a internacionalização da educação superior como prioridade em

sua agenda? Por quê?

3) O Brasil possui uma política de internacionalização da educação superior?

2.1 Caso sim, pautada em que aspectos fundamentais?

2.2 Caso responda que não, considera importante criá-la? Por quê?

4) O Brasil se inspira ou se inspirou em modelos de outros países para conceber a sua

política ou as suas ações de internacionalização da ES?

5) Em setembro de 2013, enquanto representante da UFMT, participei da Oficina sobre a

Internacionalização da Educação Superior, convocada pela SESU/MEC,o qual teve

como resultado um material de diagnóstico da atual situação da internacionalização da

educação superior nas universidades públicas do Brasil, objetivando auxiliar as decisões

futuras do MEC. Quais foram os desdobramentos após esta oficina?

6) Como se caracteriza, em termos de concepção, o Programa Ciências Sem Fronteiras

(CsF), no âmbito da política de internacionalização da educação superior no Brasil?

7) Como se chegou ao número de mais de 100 mil bolsas, em 4 anos, para áreas

tecnológicas? Houve algum estudo prévio para exiguidade desta meta?

8) Como avalia a implementação do Programa CsF para cumprimento da meta

estabelecida de mais de 100 mil bolsas em 4 anos (2011 a 2015)?

9) Como vê a priorização de áreas do conhecimento por parte do Programa CsF?

10) Enumere a escala de prioridade conforme o quadro abaixo, como caracteriza o mais

beneficiado e o menos beneficiado com a criação e implementação do Programa

Ciências sem Fronteiras e justifique sua escolha:

1 – Prioritário 2- Mediano 3 – Menos que a média 4- Menos prioritário

______ para a instituição que representa;

______ para o bolsista do programa;

______ para o parceiro internacional:

______ para a política de internacionalização da educação superior no Brasil

Justifique sua escolha:

11) Considera que o CsF é o programa fundamental da política de internacionalização do

pais?

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174

APÊNDICE C

Roteiro para entrevista com Representante do CNPq

1) O que entende por internacionalização da educação superior?

2) O Brasil tem colocado a internacionalização da educação superior como prioridade em

sua agenda? Por quê?

3) O Brasil possui uma política de internacionalização da educação superior?

2.3 Caso sim, pautada em que aspectos fundamentais?

2.4 Caso responda que não, considera importante criá-la? Por quê?

4) O Brasil se inspira ou se inspirou em modelos de outros países para conceber a sua

política ou as suas ações de internacionalização da ES?

5) Como se caracteriza, em termos de concepção, o Programa Ciências Sem Fronteiras

(CsF), no âmbito da política de internacionalização da educação superior no Brasil?

6) Como se chegou ao número de mais de 100 mil bolsas, em 4 anos, para áreas

tecnológicas? Houve algum estudo prévio para exiguidade desta meta?

7) Como avalia a implementação do Programa CsF para cumprimento da meta

estabelecida de mais de 100 mil bolsas em 4 anos (2011 a 2015)?

8) Como vê a priorização de áreas do conhecimento por parte do Programa CsF?

9) Enumere a escala de prioridade conforme o quadro abaixo, como caracteriza o mais

beneficiado e o menos beneficiado com a criação e implementação do Programa

Ciências sem Fronteiras e justifique sua escolha:

1 – Prioritário 2- Mediano 3 – Menos que a média 4- Menos prioritário

______ para a instituição que representa;

______ para o bolsista do programa;

______ para o parceiro internacional:

______ para a política de internacionalização da educação superior no Brasil

Justifique sua escolha:

10) Considera que o CsF é o programa fundamental da política de internacionalização do

pais?