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Projeto de Pesquisa

Orientador: Thiago Fontelas Rosado Gambi

Grupo de pesquisa (UNIFAL-MG): Núcleo de Estudos em História Econômica e Economia Política (NEheEP)

Título: A importância da Ética na Economia Global

Ministério da Educação Universidade Federal de Alfenas - Unifal-MG Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALFENAS – UNIFAL/MG INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

BACHARELADO INTERDISCIPLINAR EM CIÊNCIA E ECONOMIA

A importância da Ética na Economia global

Paulo Henrique Medeiros Bragança

Orientador: Prof. Dr. Thiago Fontelas Rosado Gambi Departamento de Ciência e Economia – Campus Varginha

Varginha, Minas Gerais Maio de 2011

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A importância da Ética na Economia global

Resumo: A economia como disciplina autônoma surge no final do século XVIII com o

clássico A Riqueza das Nações, do filósofo moral Adam Smith. Ela nasce

intrinsecamente relacionada a questões morais, não se separando delas na análise

normativa das questões econômicas de um mundo em transformação. Contudo, na

busca pelo status de ciência, a economia afastou-se da normatividade e aproximou-se

cada vez da positividade da análise, aparentemente extinguindo sua preocupação com

as questões morais. Neste sentido, este projeto propõe analisar os textos mais

importantes de economistas e filósofos que discutem a relação entre economia e

ética, a fim de resgatar o debate sobre a importância da ética no estudo da economia.

Se os aspectos éticos são relevantes para a análise econômica, por que a economia se

afastou da ética? No contexto da economia global, por que questões morais, como a

pobreza ou a preservação do ambiente, estão sendo retomadas em sua relação com a

economia? São essas as indagações principais que norteiam este projeto.

Introdução

As questões morais e a ética ocupam o pensamento humano desde a

Antigüidade1 foi se desenvolvendo ao longo do tempo em diversas culturas ocidentais,

não só na Grécia, mas também no Império Romano e na Europa Medieval. Nesse

período histórico, a economia ainda não se apresentava como campo distinto do saber

e, na maior parte dos casos, as questões econômicas eram tratadas como questões

morais. Por exemplo, Aristóteles condenava o comércio para fins de ganho, quer dizer

uma questão econômica era tratada a partir de uma avaliação moral: trocar para

ganhar não era algo bom para o filósofo, uma vez que o objetivo primeiro da troca não

deveria ser o ganho, mas a satisfação de necessidades. Na Idade Média, a usura, isto é,

o ganho obtido com o empréstimo de dinheiro, era condenada moralmente pela

1 Ver, por exemplo, os trabalhos clássicos de Platão e Aristóteles, respectivamente, A República e a Ética a Nicômaco.

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Igreja, que, assim, legislava sobre o comportamento econômico da civilização cristã

(RONCAGLIA, 2005). Estes são apenas dois exemplos para ilustrar como as questões

econômicas e morais estavam intrinsecamente relacionadas no longo período de

tempo que antecede o século XIX (POLANYI, 2000; HEILBRONER, 1996).

No final do século XVIII, a economia ganha o status de disciplina autônoma, isto

é, como campo específico do saber, com a publicação, em 1776, do clássico A Riqueza

das Nações, de Adam Smith. De acordo Hunt (2005:37), e muitos outros autores da

história do pensamento econômico, Smith foi “o primeiro a elaborar um modelo

abstrato completo e relativamente coerente da natureza, da estrutura e do

funcionamento do sistema capitalista”. Nessa época, a disciplina era chamada

Economia Política e, como filósofo moral, Smith ainda considerava as questões morais

em suas análises. Ele assume que, por mais individual que sejam as ações humanas,

elas se concretizam na sociedade e, por isso,

são medidas por um instrumento de auto-controle, um outro eu, que avalia as conseqüências de nossas ações, pressupondo que nos colocamos no lugar dos outros, os objetos das mesmas. Neste sentido, se pressupomos que há um entendimento básico numa comunidade sobre o que são ações virtuosas, nossas ações podem ser avaliadas, juntamente com suas conseqüências, pela operação de um espectador imparcial: se uma comunidade, simples ou complexa, compartilha um conjunto de valores, nossas ações podem ser objeto de aprovação ou reprovação de acordo com os mesmos (SMITH apud SILVA, 2007:13).

Já no século XIX, a aceleração da produtividade calcada na Revolução Industrial e as

exigências da ciência moderna modificam o caráter do pensamento econômico e,

nesse contexto, a ética vai perdendo lugar no estudo da economia. Na verdade, Smith

faz parte de número pequeno de pensadores econômicos que se preocuparam com as

questões morais ou com a ética. O surgimento da teoria neoclássica, em meados do

século XIX, abriu o caminho para o tratamento positivo da economia,2 aproximando-se

da abordagem das ciências naturais. Dois exemplos ilustram a passagem de uma

economia normativa e positiva para uma economia pretensamente positiva apenas. O

2 Para uma discussão da economia positiva e normativa, ver, por exemplo, o trabalho de Arida (2003), baseado num ensaio escrito pelo autor em 1983.

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primeiro é o nome do livro de León Walras, Elementos de economia política pura, de

1874, em que os termos “economia política” e “pura” representam, respectivamente,

a normatividade que se perde e a positividade que predomina na análise econômica. O

segundo exemplo é que a disciplina passa a se chamar apenas Economia, pois o estudo

do comportamento social e político, implícito no nome Economia Política, já não

combinava com a ciência econômica.

Dessa maneira, para ganhar o status de ciência, a economia foi se afastando da

normatividade envolvida nas questões morais e se aproximando da positividade com

que eram tratadas as questões naturais, num processo em que a economia se

naturaliza, mas, ao mesmo tempo, se desumaniza, justamente por desconsiderar

aquilo que é inerente ao ser humano: sua condição social, seus valores. Essa foi a razão

pela qual os pensadores econômicos de meados do XIX tentaram separar, e opor,

economia normativa e economia positiva, distinguindo apenas esta última como

ciência econômica (MARÉCHAL, 2005).

No entanto, a separação ou oposição entre economia normativa e positiva, em

outras palavras, entre ética e ciência econômica, ainda que tentadas, foram apenas

aparentes (MARÉCHAL, 2005). E essa aparência se reforçou na medida em que o

capitalismo se desenvolveu. De fato, como nos diz Maréchal (2005:14), “ao

desmantelar um número cada vez maior de regulamentações sociais e simbólicas, o

capitalismo contemporâneo conseguiu libertar-se das regras éticas”. No entanto,

embora fosse esse o desejo de muitos pensadores econômicos modernos,

exploraremos neste projeto o argumento de que a economia não se separou da ética.

Concordamos com o filósofo e economista Serge Latouche (2003:11) quando diz que

“a modernidade repugna a ética, mas ao mesmo tempo esta é onipresente”. Se a ética

é onipresente, ela também está envolvida nas questões econômicas e, portanto, deve

ser importante para análise econômica. Ficamos então com a indagação: é mesmo

importante levar em conta considerações éticas na análise econômica? Por isso,

propomos a análise dos textos mais importantes de economistas e filósofos que

discutem a relação entre economia e ética, a fim de resgatar o debate sobre a

importância da ética no estudo da economia.

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Partimos da idéia de que “a perpetuação de uma vida autenticamente humana

na Terra só poderá ser realizada se for preservado um conjunto de valores morais”

(MARÉCHAL, 2005:15). Se é assim, precisamos enfrentar outra indagação: se os

aspectos éticos são relevantes para a análise econômica, por que a economia se

afastou da ética? Responder essa pergunta é necessário para evitarmos considerar os

economistas como pessoas despreocupadas com o comportamento moral. Mas não é

esse o caso, pois muitos pensadores econômicos modernos3 até falaram de questões

morais, porém, evitaram enfrentá-las em suas análises.

No entanto, por mais que esses pensadores tentassem afastar a normatividade

e as questões morais de suas teorias, na prática, sua condição social e seus valores

sempre estiveram presentes nelas. Muitos pressupostos e conceitos teóricos

assumidos para descrever o comportamento da economia de mercado carregam em si

forte carga de normatividade e refletem a influência dos valores no pensamento

daqueles que os formularam. Por outro lado, a desconsideração teórica das questões

morais pode perder aquilo que há de mais fundamental para entender determinados

comportamentos e processos, comprometendo o fazer teórico do economista e o

próprio resultado das teorias econômicas. Ao longo da pesquisa, tentaremos mostrar

em que situações isso ocorre e por que, mesmo assim, os economistas insistiam, e

ainda insistem, na separação artificial entre ética e economia (MARÉCHAL, 2005).

Nas últimas décadas, sobretudo no pós II guerra mundial, a ética começou a

ganhar terreno nos debates acadêmicos no campo da economia. Ainda que tenha

perdido força nas décadas neoliberais de 1980 e 1990, há um esforço por parte de

alguns economistas de se pensar novamente a relação entre ética e economia (por

exemplo, SEN, 1999). Assim, tentaremos desenvolver uma resposta para uma terceira

e última indagação: no contexto da economia globalizada, por que questões morais,

como a pobreza ou a preservação do ambiente, estão sendo retomadas em sua

relação com a economia? As indagações apresentadas acima são as que estruturam e

articulam este projeto.

3 Ver, por exemplo, Marshall e Pareto.

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Discussão Bibliográfica A questão ética nos remete a um conjunto de valores que, de certo modo,

orientam nossas ações na vida cotidiana. Portanto, ela é importante elemento na

definição do nosso comportamento em sociedade. Se a economia, tal como definida

pelos autores neoclássicos, é a ciência da alocação eficiente de recursos escassos e se

a eficiência dessa alocação depende do nosso comportamento, como deixar de lado a

questão ética na discussão econômica? É preciso incorporar, ou reincorporar, a ética

na esfera econômica de análise. Vários economistas e filósofos já escreveram sobre a

relação entre ética e economia. O que apresentamos a seguir é um panorama,

bastante sintético, dessa discussão.

Discutir ética e economia não é fácil e a leitura apressada pode levar o

pesquisador a cair em armadilhas conceituais, sendo muito recomendável para um

estudo desse tipo ter clareza nos conceitos que serão trabalhados. Por isso, antes de

iniciar o mencionado panorama bibliográfico, vamos deixar clara a distinção entre os

termos “moral” e “ética” que adotamos neste trabalho. Tal distinção é ainda

necessária para que, no decorrer da pesquisa, haja entendimento sobre nossas ações

individuais e suas conseqüências na sociedade.

A ética é um saber normativo, ou seja, que pretende refletir sobre nossas ações

individuais e emitir juízos de valor sobre elas. Porém, é preciso observar que nossas

ações são, em grande parte, movidas por algo que acreditamos ser melhor, um

conjunto de valores que orientam nossas ações. São esses valores que podemos

chamar de moral. Em síntese, neste trabalho, a ética “remonta à reflexão sobre as

diferentes morais e as diferentes maneiras de justificar a vida moral” (CORTINA e

MARTÍNEZ, 2005:9). Note que nas duas citações da introdução deste projeto - as de

Maréchal (2005:14), “ao desmantelar um número cada vez maior de regulamentações

sociais e simbólicas, o capitalismo contemporâneo conseguiu libertar-se das regras

éticas” e de Serge Latouche (2003:11), “a modernidade repugna a ética, mas ao

mesmo tempo esta é onipresente” -, o termo ética é usado no sentido que atribuímos

aqui à moral. A presença de um tratamento conceitual diverso em dois autores citados

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na apresentação de um simples projeto de pesquisa ilustra a armadilha conceitual a

que estamos sujeitos a todo momento, mas a qual tentamos cuidadosamente escapar.

A partir dessas considerações, podemos iniciar nosso panorama da literatura

que trata da relação entre economia e ética. Evidentemente a discussão sobre a ética

na filosofia é muito mais ampla. A preocupação com a ética econômica e social

propriamente dita corresponde apenas a uma parte do campo da ética. Primeiro, a

noção de ética econômica só faz sentido nas sociedades em que a atividade econômica

se diferenciou suficientemente de outros aspectos da existência. A esfera econômica é

definida pelo conjunto das atividades de produção e troca de bens e serviços. A ética

econômica é a parte da ética que trata dos comportamentos e das instituições

relativos à esfera econômica (PARIJS e ARNSPERGER, 2003). Mas estamos interessados

aqui em percorrer uma literatura que nos indique respostas para as indagações

formuladas na introdução: por que as questões morais são importantes para o estudo

da economia? Por que a economia se afastou da ética? Por que há uma retomada das

questões morais no contexto da economia global?

Os filósofos Daniel Hausman e Michael McPherson (1993:672), autores do

clássico Análise econômica, Filosofia Moral e Políticas Públicas, indicam a importância

das questões morais e da ética para a economia ao dizer que a ética é importante para

economistas, formuladores de políticas públicas e filósofos porque o comportamento

das pessoas é influenciado pela dimensão moral de suas vidas. Por isso, Maréchal

(2005:96) diz que “a análise econômica não pode ser concebida independente de

qualquer referência à ética”. Esses autores querem dizer que, se a economia se

preocupa com o comportamento humano e se esse comportamento é influenciado por

questões morais, a ética é necessariamente importante para o estudo das questões

econômicas. Ao envolver a ética como aspecto necessário ao estudo da economia, os

autores advertem para a necessidade de ampliar a normatividade da análise

econômica. Claro que as preocupações morais podem ser mais importantes para

certas áreas da economia do que para outras, mas o ponto é que a reflexão sobre a

relação entre economia e ética pode tornar o trabalho do economista mais efetivo,

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tanto no campo positivo como normativo da economia (HAUSMAN e MCPHERSON,

1993).

Um exemplo ajuda a ilustrar como as questões morais podem influenciar o

comportamento de um consumidor racional e maximizador tal como prevê a teoria

microeconômica. Imaginemos que esse consumidor vá a uma loja e procure um

produto que lhe dê certa utilidade. Lá, ele encontra dois produtos A e B. Ambos os

produtos satisfazem a sua necessidade. A diferença entre eles é que o bem A traz a

informação de que não degrada o meio ambiente. Neste momento, aparece a

influência das questões morais na escolha do consumidor. Sua utilidade poderia

aumentar com a escolha de A, caso a preocupação com a preservação do meio

ambiente fosse um valor para esse consumidor. Quer dizer, as questões morais

passam a permear a racionalidade da escolha. Mas se as questões morais são

importantes para o estudo da economia, por que ela fez um movimento para se

distanciar das questões morais?

Após o nascimento da ciência econômica no seio da filosofia moral, as teorias

foram se distanciando cada vez mais dos valores normativos e esses, apesar de nunca

terem desaparecidos por completo acabaram sendo reprimidos e deixados de lado

pela análise positiva. De acordo com Hirschman (1986:120),

a partir do século XVII, começou-se a estudar de perto o funcionamento efetivo do comércio e dos mercados; e os que se interessavam pelas questões econômicas fizeram certo número de descobertas tão chocantes quanto às de Maquiavel [nas questões políticas].

Se Maquiavel afirmava que as noções ordinárias sobre o comportamento moral

podem não ser regras adequadas para a condução do Estado, os economistas

afirmavam que tal comportamento ou a formulação de juízos de valor não eram

adequados para a elaboração da teoria econômica. O resultado desse movimento foi, a

nosso ver, certa desumanização da economia, paradoxalmente, uma ciência social cujo

objeto é o próprio ser humano. É o que parece, de fato, acontecer quando lemos

notícias como esta: apesar de “a agricultura cobrir hoje mais do que a totalidade das

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necessidades nutricionais que se exprimem no mundo não impede a subnutrição de

mais de 800 milhões de seres humanos” (MARÉCHAL, 2005:75).

Portanto, é razoável afirmar que os economistas do século XIX e XX não

conseguiram solucionar problemas econômicos fundamentais e isso passa pela

formulação da teoria econômica. È como diz Hirschman (1986:129): “a busca por cada

membro individual da sociedade de seu puro interesse particular é uma solução

nitidamente insuficiente”. Tal afirmação traz implícita a necessidade de se afirmar um

novo jeito de se pensar a economia que não pode deixar de lado a sociedade e as

questões morais nela envolvidas. Por isso, é preciso incorporar a ética, isto é, a

reflexão sobre as questões morais, à análise econômica. Segundo Maréchal (2005:98),

“só a ética pode vir compensar os efeitos destruidores de uma lógica maximizadora

abandonada ao seu livre jogo”. Tendo em vista essa necessidade,

os economistas reconheceram recentemente a existência de uma série de domínios onde o desempenho do mercado melhoraria enormemente se lhe fosse infundida a “benevolência”, ainda que sob a modesta forma de uma certa cooperação e troca de informações entre fornecedores e compradores (HIRSCHMAN, 1986:127).

Essas duas últimas passagens advertem para a necessidade de mudança na

abordagem econômica atual. Foi justamente essa necessidade que suscitou a

retomada da reflexão sobre a relação entre ética e economia nas últimas décadas. Mas

a retomada da ética na economia ultrapassa as questões teóricas e também dizem

respeito aos conflitos humanos, sociais e ambientais existentes no contexto da

economia global.

Como diz Maréchal (2005:76), “se a produção de bens de serviços em

quantidades cada vez mais importantes reduz mecanicamente certa escassez, é

também susceptível de aumentar ou mesmo de criar outras”. A economia global é

capaz de produzir cada vez mais, mas não consegue resolver o problema da

distribuição dos bens e dos novos problemas gerados a partir da expansão produtiva.

Um exemplo para ilustrar essa idéia é o uso do petróleo como principal fonte de

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energia. Os derivados do petróleo são os bens mais usados no globo, mas, ao mesmo

tempo, são os que mais poluem o ar e a água.

Apesar das advertências dos economistas e dos próprios problemas da

sociedade atual, a retomada da ética na análise econômica ainda é insuficiente para

promover a mudança teórico-conceitual necessária. De acordo com Letiche (1999:11),

embora a riqueza da atual literatura ética seja muito maior do que a parte incorporada à economia, a suposição extremamente restrita do comportamento auto-interessado que impera na economia tem impedido a análise de relações muito significativas.

Letiche tem razão ao indicar que a análise econômica perde vigor ao tratar os

seres humanos como homo oeconomicus, ente etéreo, sem valores ou classe social. É

preciso, pois, problematizar e estudar mais a relação entre ética e economia, pois

como observa Hirschman (1986:126),

o fato de que a necessidade do comportamento ético se faça sentir em certas situações nas quais o sistema de mercado e o interesse particular, deixados à sua própria ação, dariam resultados indesejáveis, não quer, naturalmente, dizer que esse comportamento se manifestará automaticamente.

Além disso, como afirmam Sen (1999) e Hausman e McPherson (1993), um

contato mais próximo entre ética e economia pode fazer muito bem não só para a

filosofia moral, mas também para a economia.

E assim concluímos que os economistas deveriam abrir novamente espaço para

a ética na formulação das teorias econômicas. Pensar a economia é também pensar

sobre as questões morais inerentes ao ser humano e à vida social. A ciência econômica

que se pretende positiva não deu conta de resolver de modo suficiente graves

problemas a que se propôs solucionar. O objetivo de eficiência na alocação dos

recursos escassos ainda não deu conta de problemas como a fome ou a destruição do

meio ambiente. Contudo, não se trata de abandonar a positividade, mas de promover

a retomada do aspecto normativo do estudo da economia, fundamental para a

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produção de uma ciência econômica aperfeiçoada, mais humana e, portanto, mais

capaz de dar respostas à sociedade para a solução de seus problemas.

Justificativa do Projeto

Apesar das advertências de que a ética é fundamental para aperfeiçoar a

análise econômica e, assim, contribuir para uma solução suficiente dos problemas

humanos, sociais e ambientais colocados no contexto da economia global, a relação

entre economia e ética é insuficientemente estudada. Sobretudo em cursos de

graduação em economia e filosofia.

Esta pesquisa se justifica, em primeiro lugar, por propor a reflexão sobre essa

relação. Apresentar claramente e destacar a importância da ética para a economia é

muito importante neste momento, pois, apesar da grande depressão em 1929, do

sucesso de Keynes a salvar o capitalismo e da recente crise financeira mundial, as

teorias econômicas positivas, como as neoclássicas, continuaram fortes. E é isso que

enseja a discussão crítica da abordagem atual da economia e a necessidade de se

debater a importância da ética na economia.

Em segundo lugar, a pesquisa se justifica por pensar a economia ligada a

questões humanas, sociais e ambientais urgentes. Problemas como imigração ilegal,

fome e aquecimento global estão diretamente relacionados à economia e à ética. É

preciso entender o afastamento entre economia e ética para entender porque, em

muitos casos, as respostas que a economia tem para questões daquele tipo são

insuficientes.

Em terceiro lugar, a pesquisa se justifica porque promove o resgate da reflexão

sobre os valores individuais e sociais e seus impactos sobre o comportamento

econômico. Tal resgate, a nosso ver, é fundamental para o encaminhamento de

soluções suficientes para os complexos problemas enfrentados pela sociedade no

contexto de uma economia global.

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Objetivos

O objetivo geral do projeto A importância da Ética para a Economia global é

mostrar a importância da ética para a economia e, por esse viés, fazer uma crítica à

abordagem econômica predominante atualmente. Para alcançar este objetivo geral,

definem-se os seguintes objetivos específicos:

1) Discutir a relação entre ética e economia e mostrar a importância da

primeira para a segunda;

2) Entender, por meio da história do pensamento econômico, como e por que

economia e ética se afastaram;

3) Analisar uma certa retomada da ética na economia atual e entender por

que os economistas se preocupam pouco com questões morais.

Metodologia

A metodologia a ser utilizada nesta pesquisa é predominantemente a revisão

bibliográfica sobre a relação entre economia e ética. Para isso, contaremos com o

acervo da Biblioteca da UNIFAL – Campus Varginha, as bibliotecas particulares de

professores do Instituto de Ciências Sociais Aplicadas (ICSA), bem como a pesquisa em

bases eletrônicas de dados, como o JSTOR e os periódicos CAPES. Além do material

levantado e lido para a elaboração do projeto, estruturamos uma lista de leituras nos

campos da economia, história e filosofia, que dará corpo ao trabalho. A estrutura que

guiou, e guiará, a seleção dos textos é a seguinte:

- Importância da ética para a economia;

- Separação entre ética e economia/ Economia positiva e normativa;

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- Economistas, ética e formulação de teoria econômica/ Por que economistas se

preocupam pouco com questões morais;

- Retomada da ética no contexto da economia global.

Ao final das leituras, pretendemos sistematizá-las e organizar as idéias

apreendidas sob a forma de artigo. A análise dos textos partirá da crítica à teoria

econômica vigente, procurará destacar seus pontos fracos e apontar a necessidade de

se considerar as questões morais e a ética no estudo da economia.

Referências bibliográficas

ARIDA, Pérsio. A história do pensamento econômico como teoria e retórica. In: RÊGO, J.M. e GALA, P. (orgs.). A História do Pensamento Econômico como teoria e retórica: ensaios sobre metodologia em Economia. São Paulo: Ed. 34, 2003.

CORTINA, Adela; MARTÍNEZ, Emílio. Ética. São Paulo: Loyola, 2005.

HAUSMAN, D. e MCPHERSON, M. Economic Analysis, Moral Philosophy and Public Policy. Cambridge: Cambridge University Press, 2006.

HAUSMAN, D. e MCPHERSON, M. Taking Ethics Seriously: Economics and Contemporary Moral Philosophy. Journal of Economic Literature, v.31, n.2 (Jun.1993), pp.671-731.

HEILBRONER, R. A História do pensamento econômico. 6. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1996.

HIRSCHMAN, Albert. A Economia como Ciência Moral e Política. São Paulo: Brasiliense, 1986.

HUNT, E.K. História do pensamento econômico. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.

LATOUCHE, Serge. Que Ética e Economia Mundiais: Justiça sem Limites. Instituto Piaget: 2003.

LETICHE, John. Prefácio. In: SEN, Amartya. Sobre ética e economia. São Paulo: Cia das Letras, 1999.

MARÉCHAL, Jean-Paul. Ética e Economia: Uma Opção Artificial. Instituto Piaget: 2005.

PARIJS, P. van e ARNSPERGER, C. Ética econômica e social. São Paulo: Loyola, 2003.

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POLANYI, K. A grande transformação: as origens da nossa época. Rio de Janeiro: Elsevier, 2000.

RONCAGLIA, Alessandro. The Wealth of Ideas. Cambridge: Cambridge University Press, 2005.

SEN, Amartya. Sobre ética e economia. São Paulo: Cia das Letras, 1999.

SILVA, C. E. G. da. Economia e ética. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007.

COMTE-SPONVILLE, André. O Capitalismo é Moral: Sobre Algumas Coisas Ridículas e Tiranias do Nosso Tempo. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

Resultados Esperados

Durante a pesquisa, apresentaremos resultados parciais na Jornada Científica

da Unifal-MG e, ao final, submeteremos o texto completo à sessão de comunicações

do Encontro Nacional de Política (ENEP) do próximo ano ou a outro evento científico

externo à Unifal-MG. Também submeteremos o texto à publicação em periódico

indexado.

Cronograma

O projeto será desenvolvido em 12 meses, seguindo o seguinte cronograma:

Ago/Out 2011

Nov/Dez 2011

Jan/Fev 2012

Mar/Mai 2012

Jun/Jul 2012

Levantamento e discussão da literatura

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Análise dos textos

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Sistematização dos resultados

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Ministério da Educação Universidade Federal de Alfenas - Unifal-MG Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação

Rua Gabriel Monteiro da Silva, 700 – Alfenas/MG – CEP 37130-000 Prédio 314 – Prédio “O” - Fone: (35) 3299 1067

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Anexo II: Formulário de avaliação do orientador Ciências Humanas, Sociais Aplicadas e Letras

Itens avaliados Valor

Máximo Pontuação atribuída

Pontuação observada

1. Titulação Doutorado 3 3 2. Produção Científica nos últimos cinco anos (15 pontos) Livro publicado com ISBN – 2,0 por livro 4 0 Capítulo de livro publicado com ISBN- 1,0 por livro 3 0 Organização de livro publicado com ISBN- 1,0 por livro 2 0 Artigos publicados em periódicos com ISBN – 1,0 por artigo 4 4 Artigos publicados em periódicos sem ISBN – 0,5 por artigo 1 1 Trabalho completo publicado em Anais de eventos científicos- 0,5 por trabalho (máximo 1,0 ponto) 1 1 3. Experiência de orientação, considerando os últimos cinco anos

Orientação (Iniciação Científica, Mestrado e Doutorado) 1,0 ponto por orientação 4 0 Orientação em andamento – 0,5 cada 2 0,5 Coordenação de projetos de pesquisa financiados por agências de fomento – 1 por projeto 2 0 Colaboração formal em projetos de pesquisa financiados por agências de fomento - 1 por projeto 2 0 Participação em bancas – 0,5 por participação 2 2 Total de pontos 30 11,5

Anexo III - Ciências Humanas, Sociais Aplicdas e Letras

Itens avaliados Valor

Máximo Pontuação atribuída

Pontuação observada

Desempenho acadêmico – 9,0 pontos 9 9 Participação em evento Científico – 1 por evento (máximo de 5,0 pontos) 5 3

Apresentação e/ou publicação de trabalhos em eventos científicos – 1,0 ponto por trabalho (máximo de 3,0 pontos) 3 0

Participação em projetos de pesquisa/extensão/monitoria – 1,0 ponto por participação (máximo de 3,0 pontos) 3 2 Total de pontos 20 14

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