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1Projeto Entrelaçando Histórias

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Prefácio

Agradecimentos

Ana Gern

“Amar é ao mesmo tempo simples e forte, pacificante e incentivador. Custa exatamente o preço ao mesmo tempo doloroso e alegre de tantas paciências e impaciências entrelaçadas”. Abade PIERRE

“Ninguém trabalha sozinho. Tenho certeza de que somente a imersão de várias pessoas juntas num trabalho forma um processo criativo”.

Jaime Lerner

Este livreto coordenado por Ana Gern e realizado pela Sociedade Cultural Alemã de Joinville se insere no projeto”Entrelaçando Histórias”, aprovado pela Lei de

Incentivo à Cultura, ao Turismo e ao Esporte- SEITEC, do Governo do Estado de Santa Catarina. O bordado é uma das mais fortes expressões culturais dentro da categoria do artesanato, mas se constata que há pouco conhecimento sobre as raízes históricas do bordado alemão, bem como são quase inexistentes os registros a respeito em Joinville e região. O objetivo do projeto foi recuperar essa expressão cultural, trazida pelos nossos imigrantes, sendo de início realizado pesquisa sobre a história e as técnicas do bordado desde as suas mais remotas origens, bem como o conhecimento do bordado no Brasil, em Santa Catarina e em Joinville. As informações foram levantadas pela historiadora e professora Raquel S.Thiago e pela especialista em design Ana Gern, junto às bordadeiras e familiares da região de Joinville e arredores, ao Arquivo Histórico de Joinville, ao Museu Nacional da Imigração de Joinville, à Sociedade Cultural de Joinville, bem como internet e literatura especializada. Uma vez obtidos os dados, o seguinte passo foi registrar nesse trabalho o ensaio”Uma História do Bordado no Tecido Social”, redigido por Raquel S.Thiago e também descrever no artigo”Entrelaçando Histórias”os tipos de pontos e maneira como são executados, extraídos dos diversos”Wandschoner”observados no decorrer das entrevistas. Uma das tradições que foram trazidas pelos nossos imigrantes alemães, eram os”Wandschoner”, os protetores da parede, que serviam de adorno e para decoração interna das casas, com frases escritas em alemão, dando boas vindas aos visitantes e abençoando suas casas. Tendo como referência esses bordados, o próximo passo foi desenvolver uma coleção de almofadas por Ana Gern, fazendo releitura da aplicação desses pontos, resultando em almofadas poéticas cheias de AMOR, ALEGRIA E PAZ. Essas almofadas,desenvolvidas como linha do tempo entre passado e presente, foram cuidadosamente bordadas nas três oficinas oferecidas gratuitamente, dando continuidade a esta importante expressão cultural que é o bordado. Finalizando o projeto, foi concebida uma exposição da coleção desenvolvida nas oficinas e de bordados antigos já existentes na Casa da Memória, aberta a todo o público de Joinville, possibilitando conhecer as raízes culturais desse gênero de artesanato. Esse projeto fez renascer uma ebulição de conhecimentos, de sentimentos, de histórias, de sonhos que não podem morrer. Temos que dar continuidade caminhando para um aprofundamento na pesquisa, consolidando concretamente essa conexão entre o passado e o presente.

À equipe:

Daisy Dalberto - designer gráfica

Leni Zimmermann - professora das oficinas de bordados e bordadeira das

amostras

Luzie Pries - costureira das almofadas

Nelci Teresinha Seibel - assessoria de imprensa

Raquel S.Thiago - pesquisadora

Às entrevistadas:

Adelina Lenshow - Ângela Tiburtius - Brigitte Brandenburg - Carmen

Gehrmann - Ingrid Welling - Irene e Adenide Bozler - Iris Eberhardt Boldt

- Jutta Hagemann - Lenir Borges - Maria Eugênia Jensen - Norma Jahn

Baumer - Regina Colin - Rosita Larson da Silveira - Ondina Kunde - Wally

Schossland - Yolanda Daher

Às que emprestaram com amor os bordados antigos:

Ângela Tiburtius - Brigitte Brandenburg - Claudete Tereza Rodrigues -

Iris Eberhardt Boldt - Jutta Hagemann - Lídia Brandenburg - Margit Olsen

- Maria Eugênia Jensen - Myrta Trinks - Norma Kricheldorf - Raul Gern -

Rosita Larson da Silveira - Rosvita Gehrmann - Verônica Pabst

Aos colaboradores:

Brigitte Brandenburg - apoio na pesquisa

Juliana Silveira - apoio nas fotografias

Héctor Hugo Robles - apoio na exposição

Margit Olsen - apoio na organização

Regina Colin - apoio nas traduções

Sônia Regina Lourenço - coordenadora do Museu Nacional de Imigração

As instrutoras e aos grupos da Fundação 25 de Julho

Risco da década de 20, bordado por Jutta Hagemann

(1980).

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Uma História do Bordado no Tecido SocialRaquel S.Thiago

“acredito firmemente que o bordado seja a linha que conecta as mulheres em todos os séculos da nossa história”

Lee Albrecht

Ao utilizarmos agulha e linha para bordar, estamos praticando uma das mais antigas artes aplicadas da história. Sua função é essencialmente estética. Afirma-

se que o bordado tenha se originado com o ponto cruz de que se tem registros desde a pré-história. Descobertas arqueológicas revelam que o ponto cruz era usado na costura das vestes, em geral feitas com peles de animais. Mas como bordar sem agulhas e fios? Bem, a criatividade encarregou-se de transformar ossos em agulhas e as tripas de animais ou fibras vegetais no material mais adequado para suas confecções. Com o passar dos milênios chegaram as modernas linhas de bordar, fabricadas com os mais diversos materiais, das fibras vegetais ao ouro. Um fóssil, encontrado na Rússia, cujas vestes eram adornadas com grânulos de marfim, nos faz acreditar que o bordado com aplicações já era apreciado pelo homem há 30 mil anos a.C. Nas civilizações antigas que se desenvolveram na Mesopotâmia, entre os rios Tigre e Eufrates região do atual Iraque, o bordado foi muito cultivado. Em várias passagens da Bíblia há referência à arte de bordar. Lee Albrecht em seu texto”História de um bordado”relata que encontrou na Bíblia, o livro mais antigo da humanidade, que as mulheres bordavam e transmitiam seus sentimentos mais íntimos já desde a antiguidade. No livro de Provérbios (970-700 a.C.) há uma passagem que diz: busca lã e linho e de bom grado trabalha com as mãos...faz para si cobertas, veste-se de linho fino e púrpura (1). Homero fala dos bordados de Helena e Andrômaca, nos quais essas princesas documentaram episódios da guerra de Tróia. Vários exemplos de belos bordados e indícios de um excelente trabalho das civilizações antigas ainda hoje sobrevivem. As amostras podem ser encontradas desde o Antigo Egito, China, Pérsia, Índia e Inglaterra.

Se quisermos definir como se opera o bordado, podemos dizer que, com muita habilidade manipula-se uma agulha em um determinado ponto com o uso de fios de lã, seda, ouro, prata, etc., de forma a formar uma figura. Existem dois tipos de bordado, o”platt- stickerei”e o “erhaben-stickerei”. O primeiro é um bordado plano, também conhecido como bordado francês – sobre lã ou tela. Com modelos próprios, é uma das formas mais fáceis e mais populares de bordado. O segundo, é mais difícil, exige muita prática pois é usado na elaboração de letras, nomes, algarismos, flores, brasões ou outros modelos sobre musselina, casimira, seda, veludo, algodão”Battist”, incluindo pontos de base para lenços, echarpes, golas, faixas, vestidos de baile, bandeiras e escudos, toalhas para altar, etc. Este bordado envolve realmente trabalho artístico. A partir da era das grandes navegações que promoveram intenso intercâmbio cultural entre os povos, uma infinidade de novidades chegou ao ocidente. O ponto cruz disseminou-se pela Europa, Ásia e Estados Unidos, principalmente pela Inglaterra onde, em 1598, foram encontrados os primeiros trabalhos. Os europeus apropriaram-se de muitas técnicas orientais, mas cada país acabou definindo seu próprio estilo de bordar. São reflexos e imagens da sua história, sua cultura e tradições. Apesar de ser acessível à população em geral, o bordado transforma-se em verdadeira jóia quando na sua execução são empregados fios de ouro, prata e seda com muito luxo e ostentação. Esse bordado acabou por tornar-se um símbolo de riqueza e poder. No entanto, complementa-se, também, o bordado, com materiais mais rústicos, como sementes, conchinhas, palha, contas de vidro ou de madeira, etc., de modo que pode ser usado e apreciado tanto por um”marajá”oriental, como por pessoas de poucas posses. Na verdade, tanto os materiais como as fontes

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de inspiração estão neste vasto manancial que é a natureza: o mar, as florestas, as montanhas, os rios, e sua beleza sempre está ligada à excelência do artista que o executa. De fato, o bordado é uma arte aristocrática por um lado, e democrática por outro. Por volta do século sete em diante, o bordado tornou-se algo comum na Europa, intensificando-se de modo tal que abadias e mosteiros se transformaram em verdadeiras oficinas de artesanato. Muitas mulheres trabalhavam nesses conventos, onde bordavam os ornamentos para as igrejas, alimentando quase

uma indústria de bordado que teria atingido alto padrão de luxo e beleza.

Também nos castelos o bordado fazia parte do cotidiano de rainhas e suas

damas. Daí surgiram, em bordados, armas, brasões, escudos e pendões

bordados a cores e em ouro e prata.

No século dezesseis difundiu-se o costume de bordar cenas semelhantes a pinturas, reproduzindo temas religiosos, históricos, assim como cenas do cotidiano, levando-nos a pensar que à medida que o bordado se tornava uma técnica variada em pontos e temáticas, associava-se a outras artes como o desenho e a pintura. Assim, em geral os desenhos a serem bordados passaram a ser cópias daqueles que os artistas ou desenhistas criavam. A invenção das técnicas de impressão por Gutenberg, no século XV, permitiu que o saber deixasse de ser um privilégio dos abastados, mudando drasticamente o mundo inteiro: para além de aperfeiçoar a escrita e facilitar a leitura, os textos poderiam facilmente ser feitos de uma forma rápida e eficaz. A cultura e o conhecimento, até então considerados privilégios aristocráticos apenas acessíveis a determinadas classes, passam a popularizar-se pela tipografia, dando, desta forma, oportunidades iguais para quem quisesse alargar seus conhecimentos e instruir-se (2). Para o bordado, a fabulosa invenção trouxe os livros com modelos e amostras variadas, instruções para a execução dos diversos pontos, enfim, libertou as bordadeiras dos privilégios dos”iluminados”. Os diferentes tipos de bordado então, disseminaram-se no mundo inteiro. O Brasil que por cerca de 300 anos foi colônia de Portugal, manteve seu território com dimensões continentais e, através da imigração européia, africana e asiática teve oportunidade de dialogar com diferentes tradições culturais, refletindo-se também no bordado. Na Idade Média encontramos o Bordado de Blackwork, executado por Catarina de Aragão, casada com Henrique VIII, em 1509, época em que, o bordado era ensinado e restrito às mulheres da corte Até à Renascença o bordado foi empregado quase exclusivamente para ornamentar as vestes religiosas ou civis.

dezoito, que recebem o nome de Sampler ou Panos de Amostra. Neles, as mulheres começaram a bordar as letras do alfabeto, situações típicas do seu mundo tais como casas, árvores, animais, plantas. Encontramos nesses panos, muitas vezes, referências, a versículos Bíblicos e poemas; elas copiavam e bordavam as letras, já que nessa época a leitura e a escrita eram restritas aos homens (3). O século dezessete foi o marco dos bordados em toalhas de mesa, e o século XVIII das roupas íntimas, dando origem ao bordado a branco, assim chamado porque se executa sobre toda espécie de tecido branco, com linhas de algodão, linho ou torçal da mesma cor do fundo. O bordado a branco também abrange o mesmo gênero de trabalho feito com cores delicadas, tom sobre tom. Os pontos mais empregados no bordado a branco são os do bordado de passagem, que se faz executando os contornos e as nervuras do desenho com pontos também chamados de passagem, e depois preenchendo-os com esses mesmos pontos (4). A essa variedade pertence o bordado recortado ou festão, que consiste em bordar e recortar o tecido, sem que desfie, seguindo os contornos de um desenho denteado. As variações desse tipo de bordado são o ponto veneziano, o ponto renascença e o ponto richelieu. O bordado a cheio, ou ponto real, se faz sobre tecidos leves, como a cambraia, a opala, a batista e a musselina, por meio de um ponto horizontal que abraça o tecido tanto embaixo quanto em cima. O bordado inglês mistura o bordado de recorte e o cheio. O bordado de renda executa-se puxando fios de um tecido leve ou com aplicações mais ou menos complicadas (5). O bordado madeirense aplica várias dessas variações de pontos e técnicas, mas adquiriu um estilo próprio disseminando-se por vários continentes. Existe desde o início do povoamento do arquipélago, mas foi só a partir da segunda metade do século dezenove que este produto manufaturado começou a ser reconhecido como mercadoria do sistema de trocas da ilha da Madeira com o exterior e entrou na economia familiar de muitos madeirenses. É muito apreciado no Brasil. Com o passar do tempo e de um intenso intercâmbio cultural, definiram-se três tipos de bordado: o bordado a branco, o bordado de cor, que inclui os trabalhos de ouro e prata, e o bordado sobre tela, que inclui a tapeçaria, executado a agulha com lãs ou sedas. Consiste o bordado de cor no uso de fios tintos em todas as cores e tons, e de fios de ouro e prata; já foi empregado pelos povos orientais. Os principais bordados de cor são os bordados de aplicação ou em relevo, o bordado mosaico, o recamo, o bordado de transporte e a guipure. O bordado de cor tradicionalmente se faz representar nos trabalhos folclóricos em todo o mundo, bastante valorizados. Neste aspecto o Brasil soube muito bem tirar proveito das suas cores e luminosidade de país tropical, principalmente para ornamentar as fantasias dos desfiles de carnaval. O bordado de aplicação ou em relevo é aquele cujos ornamentos sobressaem e ganham relevo graças à colocação, por baixo dos pontos, de algodão, feltro, cartão ou pergaminho, que os sustêm. No bordado mosaico, reúnem-se pedaços de tecido de diversas cores. (6) Já o bordado de transporte se executa trabalhando as partes do desenho em separado, para depois colocá-las sobre o tecido-base. O recamo é obtido cosendo-se no tecido-base galões, cordões e passamanaria, por meio de pontos bem juntos. Na guipure, uma série de bordados de aplicação se mistura, incluindo-se, em geral, entre seus elementos ouro, prata e pedras preciosas. Os paramentos litúrgicos quase sempre são bordados

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Sampler ou Panos de Amostra

A partir daí o bordado passou a ser usado mais amplamente, em decoração de interiores, tapeçaria, nos móveis estofados, bandôs. A Itália destaca-se, neste período, como o centro de todas as artes e seus bordados tornaram-se referência para toda a Europa. Pode-se encontrar, em museus da Europa, pedaços de tecidos bordados no século

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nesse tipo (7). Pertencem também a essa categoria o bordado a matiz, conhecido como pintura a agulha, pois os fios estão dispostos de modo a imitar o mais possível a coloração natural dos objetos e o bordado de cadeia, gênero antigo e muito empregado no Oriente, que se fazia com os dedos e agulhas de coser. Mais tarde passou a ser executado com agulhas de crochê; e o ponto de nós, que se produz com uma seqüência de nós simples, cegos, ou corrediços, que formam uma roseta (8). No bordado árabe, o ouro, a prata e as pérolas reúnem-se com fios de cor, ora sobre tecidos transparentes, gazes ou musselinas, ora sobre tecidos espessos e até couro, para aí desenhar modelos da maior fantasia. As letras árabes entrelaçadas, ou arabescos, dão a esse bordado seu cunho particular. O bordado chinês e o japonês usam uma variedade enorme de tonalidades de fios, o que lhes confere efeitos de luz e de cores de grande beleza (9).

:: Uma História do Bordado no Tecido Social

na roupa feminina no início do século dezenove, nos anos vinte. Desde essa época tornou-se um trabalho muito afeito ao público feminino. A cada mudança na moda, aumentava o interesse, valorizando sobremaneira o bordado, tanto nos trabalhos mais simples como em peças de alto luxo. Tornou-se especialmente forte na França, Suíça, Saxônia, Würtenberg e Inglaterra, e iniciou em tempos mais recentes na Áustria, Silésia e Bélgica (12).

O bordado no Brasil - No Brasil a arte do trançado e da tecelagem indígena, são referência importante quando falamos do artesanato nativo. Darcy Ribeiro, antropólogo apaixonado pela cultura dos povos indígenas da América, destaca a arte de trançar e tecer ; as vestimentas e as máscaras de entrecasca, feitas pelos Tukuna e primorosamente pintadas; as admiráveis redes ou maqueiras de fibra de tucum do Rio Negro; as belíssimas vestes de algodão dos Paresi que lamentavelmente, só se podem ver nos museus (13). No entanto, a colonização portuguesa, acabou por trazer ao Brasil não somente a cultura européia mas também a africana, resultando em interessante intercâmbio cultural. Ao incorporarem em seus trajes elementos da cultura européia, como saias com bico de renda, batas e camisus bordados em richelieu, as mulheres negras por meio de uma simbologia contida na vestimenta, exprimiam características do panorama cultural, histórico e econômico no qual possuíam determinadas funções e papéis sociais (14). O ponto richelieu surgiu na Europa do século quinze, como um tipo de bordado intermediário entre o bordado tradicional e a renda, que só apareceria tempos depois.”Relacionado diretamente ao emprego do bordado às roupas brancas, esse tipo de bordado intermediário distingue-se por sua técnica, realizada com pontos cortados – os picots – aplicados sobre um fundo de tecido aberto, no qual os fios foram sendo delicadamente retirados até formarem verdadeiros vazios entre os motivos (15)”.

Bordado Richelieu

Bordado chinês

O bordado sobre tela ou talagarça executa-se sobre um tecido de trama frouxa, que serve de guia para contar os pontos; uma vez pronto o trabalho, a tela é desfiada, deixando sobre o tecido-base apenas o bordado. A tapeçaria também emprega os pontos contados sobre um fundo de tela que permanece. Tem esse nome porque o resultado final do trabalho aparenta a tapeçaria tecida no tear. Pode ser feita com lãs, sedas ou fios metálicos (10). No início do século vinte surgiu o bordado a máquina. Esse tipo de bordado requer bastante trabalho por parte do bordador, que tem de movimentar braços e pernas para bordar e tem pouco rendimento comparado a outras formas de bordar. Na década de cinqüenta, surgiu o bordado em máquina de costura zig-zag industrial, garantindo uma produtividade maior, exigindo do bordador, entretanto, mais habilidade e agilidade. Acompanhadas de softwares de criação, aliaram ao antigo prazer de bordar, a facilidade, a praticidade, a produtividade e a elevação da renda. Desde seu surgimento, as bordadeiras eletrônicas e os softwares de criação de bordados têm sido aprimorados constantemente. A cada ano surgem novos modelos com mais recursos para facilitar o trabalho dos bordadores. A partir das bordadeiras eletrônicas cresceu muito o número de homens envolvidos no trabalho de bordados, tanto na parte de software quanto na operação das máquinas (11). A indústria do bordado do nosso tempo tornou-se popular

A denominação richelieu tem origem na França entre 1624 e 1642, pelo uso freqüente nos paramentos de Armanol Jean du Plessis, cardeal e duque de Richelieu. Curioso que o nome de origem francesa tenha sido tão apropriado pela cultura afro-brasileira, a ponto de ser um dos símbolos da elegância na roupa das baianas de acarajé. Marca da relação de um povo com a sociedade de sua época, os tecidos, ferramentas religiosas e

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adornos ultrapassaram as barreiras do tempo e do espaço e hoje são, ao mesmo tempo, documentos históricos, peças estéticas e por vezes sagradas, verdadeiros símbolos de resistência, identidade e auto-afirmação (16). Num país como o Brasil não é de admirar que manifestações culturais trazidas por tantas correntes migratórias nos quinhentos anos de nossa história, tivessem sofrido, de uma forma ou de outra, adaptações à medida que interagiam com o meio ambiente. Assim, as várias regiões do Brasil desenvolveram seus modos de bordar, de acordo com suas especificidades e interesses. Em algumas regiões o bordado tornou-se interessante gerador de emprego e renda: Eis exemplos que merecem ser citados:

Bordados da Caatinga (PI): Localizado a 615 quilômetros de Teresina, Dom Inocêncio é um município situado no sul do Estado do Piauí. Com 10 mil habitantes, a economia da cidade se sustenta principalmente da agricultura de subsistência e da pecuária. Foi em Dom Inocêncio que surgiu, em 1963, o projeto Bordados da Caatinga, com o objetivo de fazer com que o homem sertanejo permaneça na sua terra natal, para que não seja obrigado a migrar para as grandes cidade no período da seca. A tradição local do bordado começou a ser ensinada na escola do município, para as meninas, e tornou-se uma das mais importantes ferramentas de geração de renda nos longos períodos de estiagem. Trata-se do resultado de um forte trabalho educacional, e um dos patrimônios da localidade. Conseqüentemente foi criada a marca”Bordados da Caatinga”que expandiu as possibilidades de comercialização. Atualmente são conhecidos nacional e internacionalmente e comercializados em países como Estados Unidos, França, Itália, Alemanha e Inglaterra. Bordados de Ibitinga (SP): Ao longo dos anos a produção do bordado, em Ibitinga, consolidou uma cadeia produtiva que engloba cerca de 2.100 estabelecimentos comerciais, industriais e de serviços, responsáveis por aproximadamente 35 mil empregos diretos e indiretos (dados de 2010) (17). No Ceará o bordado é, junto da agricultura e da pesca, uma das fontes de sustento de diversas localidades e tornou-se uma alternativa para as mulheres das comunidades litorâneas, enquanto esperavam seus maridos voltarem da pesca, que durava vários dias. Uma das características do bordado da região são as formas geométricas criadas em peças de linho. O tecido recebe uma espécie de goma para ficar mais rígido e depois é trabalhado à mão, seja cortando, desfiando ou cozendo, dependendo do efeito que se queira dar à renda. Essa técnica, que também é conhecida por labirinto, faz muito sucesso entre os que visitam o Estado devido à perfeição com que é executado (18). Assim como no Piauí, em São Paulo e no Ceará, outras regiões, cada qual a seu modo, como já foi dito, desenvolve atualmente o bordado já reconhecido como fonte de renda alternativa.

O Estado de Santa Catarina é privilegiado, na medida em que recebeu, em seu território diversas correntes migratórias: portugueses, africanos, açorianos, alemães, italianos, ucranianos, poloneses, além dos indígenas que aqui se encontravam e já desenvolviam diversos tipos de artesanato. Pode-se afirmar que o Estado de Santa Catarina constituiu-se num mosaico cultural cuja

riqueza é uma das suas especificidades. O livro”Feito a mãos”- O Artesanato em Santa Catarina, nos brinda com um texto que diz com rara inspiração sobre esta riqueza:

“difícil saber o que causa maior encantamento: os movimentos apressados das mãos que cruzam os bilros para produzir um dos sem-números de pontos de renda, a calmaria metódica das tesouradas que, de miolo em miolo, dão vida ao richelieu ; o ritmo enérgico e contínuo da batida do pente de um tear ou o passear de agulhas que bordam coloridas flores. Cada uma dessas técnicas que, há séculos transformam fio em obras de arte, revela um pouco da própria personalidade da artesão que a adotou (...) ¨

O crivo é um dos bordados mais típicos da herança açoriana. Parte da desconstrução do tecido, que precisa ser todo desfiado no bastidor:”depois é tapar, urdir e casear”(19). Assim como as mulheres nordestinas bordam durante à espera do marido pescador, as açorianas faziam a renda de bilro, quando seus maridos lançavam-se ao mar e demoravam meses e meses. Este costume foi trazido para Santa Catarina. Assim surgiram, além do crivo e da renda de bilro, o ponto labirinto, o ponto corrente açoriano, o ponto corrente alemão, ou ponto Blumenau, o ponto perna cheia. A rebuscada sinuosidade de flores e folhas do bordado richelieu difundiu-se Brasil afora e estão presentes também em Santa Catarina.

Bordado de Crivo

O bordado ucraniano, que também entrou em Santa Catarina pelas mãos da mulher imigrante, é caracterizado principalmente pelas cores vermelho e preto. Porém, dependendo da mensagem pretendida, podem aparecer o verde, o amarelo e o azul. As formas geométricas e a simbologia cristã ucraniana são o ponto forte deste bordado, cultivado no Planalto Norte de Santa Catarina, como Mafra, Itaiópolis e Rio Negro, Canoinhas e localidades vizinhas.

:: Uma História do Bordado no Tecido Social

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O mais claro brilho do sol de Deus ilumina dentro desta casa.

O bordado em Joinville

Em Joinville o bordado tem forte influência dos colonizadores europeus que fundaram, em 1851, a Colônia Dona Francisca. Esses colonos trouxeram consigo sua cultura,

conhecimentos e tradições, os quais tentaram reproduzir no Brasil. Embora as listas dos navios registrem a entrada de muitos lavradores na colônia, sua chegada demarcou um incremento técnico em profissões como marceneiro, funileiro, sapateiro, tecelão, oleiro, e tantas outras necessárias ao desenvolvimento de um núcleo de colonização. Com eles chegaram, igualmente, o teatro, a poesia, o jornalismo, a dança, a música e o artesanato, em boa parte representado pelos bordados em tecidos e tapeçarias. Apesar disso, não podemos considerar que em Joinville construiu-se uma cultura exclusivamente européia. É sempre bom lembrar que ao imigrante não cabe simplesmente transpor sua cultura, mas adaptá-la ao novo ambiente, e com ele interagir. Muitas receitas da culinária alemã viram-se modificadas no momento em que se substituía a farinha de trigo pela farinha de milho ou mesmo a mandioca. Assim como na culinária, a arquitetura sofreu modificações, embora refletindo fortemente a cultura européia. Nessa ótica, podemos supor que o bordado, nos primeiros tempos, dependia da existência de tecidos importados, assim como de fios, de agulhas e tudo mais que fosse necessário. Na falta desses produtos, ou ficava-se sem bordar, ou buscava-se uma forma criativa de suprir tais necessidades. Como o bordado não é uma atividade essencial à sobrevivência humana, supõe-se que nos primeiros tempos quem os apreciasse, entre os menos abastados, teria que cuidar muito bem daqueles que fizeram parte da sua bagagem. A maioria dos colonos era de origem humilde e vítima da grave crise econômica e social que invadira o Imperio Alemão no século dezenove, motivo pelo qual a maioria deles buscou a sobrevivência em outros continentes. Um anúncio de 20 de fevereiro de 1864, permite constatar a dependência de produtos importados não somente na Colônia, mas em todo o Brasil. No entanto, demonstra que, apesar da dependência, o comércio crescia aceleradamente nos primeiros treze anos da Colônia Dona Francisca:

“Acabo de receber nova remessa da Europa: tecidos de lã e algodão para paletós e calças. Panos, casimiras, linho grosso para roupas de trabalho, linho nas cores cinza, azul e branco, couro inglês, lenços de seda e algodão, camisas prontas, tecidos finos de algodão, cassa estampada, panelas de ferro, frigideiras, moedores de café, pás. Brochas de pedreiro, vassouras de pêlo e muitos outros artigos, preços módicos”.

Fios para bordados não constam da lista, o que nos faz supor que realmente nos primeiros anos da colonização, não era comum a prática do bordado entre a população. Acredita-se, pois, que bordados finos podem ter existido, porém entre as senhoras e jovens mais abastadas, esposas, filhas ou parentes dos

Diretores da Colônia ou acionistas da Companhia Colonizadora de Hamburgo. Apenas sete anos após fundada a Colônia, em 1858, surgiu a Sociedade Ginástica de Joinville não somente como um órgão agregador entre colonos, mas também como reflexo da grande campanha de reestruturação da ginástica verificada em toda a Alemanha. Em janeiro de 1863, o associado Sr. Hermann Lepper lançou a idéia da aquisição de uma bandeira para a Sociedade. Naquele momento de união de forças para fazer vingar a ainda débil colônia, a idéia foi aceita por todos, que resolveram arrecadar o dinheiro necessário até julho daquele mesmo ano, para que se pudesse encomendar, da empresa Hietel, de Leipsig, Alemanha, uma bandeira bordada, cujo simbolismo significasse o papel daquela sociedade para o desenvolvimento da Colônia Dona Francisca (20). Foi com orgulho que a população ficou sabendo, pela edição de 15 de setembro de 1866 do Kolonie Zeitung, que”Uma bandeira, com magnífico bordado, de J.H. Hietel, em Leipzig, no valor de 109 taleres, chegou no último navio de imigrantes (Marie Block) para a nossa Sociedade Alemã de Ginástica”. Na edição de 24 de novembro de 1866, o jornal comentava as comemorações do décimo segundo aniversário da sociedade, cujo ponto alto fora a sagração da bandeira. Em 1874 o bordado aparece como item da primeira exposição agro-industrial de Joinville, na qual Marie Fiebiger ganhou o segundo prêmio, entre outros concorrentes, afirma a pesquisadora Brigitte Brandenburg. Bordados e trabalhos manuais para meninas desde o início faziam parte do currículo das escolas em Joinville. Por volta de 1970, com a lei 5692 de reforma do ensino, a disciplina”Educação Artística”substituiu a de Trabalhos Manuais e o bordado desapareceu da sala de aula (21). Encontra-se algumas referências ao bordado na Colônia, nos anúncios do Jornal Kolonie Zeitung nos primeiros tempos de colonização. No ano de 1881 temos um anúncio usando especificamente a palavra bordado. Foi em 1º de outubro daquele ano, quando Cäcile Hempel anunciava o seguinte:”Qualquer trabalho manual feminino como bordados, costura branca etc., é executado com rapidez e por preços módicos”.

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O ”wandschoner”, protetor de parede, é um artesanato típico da Alemanha e trazido para Joinville pelas famílias imigrantes alemãs. Após o nascimento dos filhos, a mulher já não se dedicava tanto aos trabalhos manuais em função das tarefas de

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casa, ficando o bordado a cargo das meninas que, então, tinham mais tempo para esses trabalhos. O wandschoner foi o bordado mais usado nos primeiros tempos da colônia por ser popular. Eram feitos em tecidos de sacos de trigo, de onde também se buscava o fio, desfiando o tecido (22). Em geral o wandschoner tem no centro uma mensagem bordada, como um provérbio popular ou determinada citação bíblica, ou mesmo agradecendo a Deus, sempre escritos em alemão. Com o passar do tempo, as mensagens tornaram-se recomendações ou frases jocosas (23). Em torno da mensagem geralmente são bordados ramos de flores nas cores azul e vermelho. Nas paredes, refletem e transmitem valores e normas das famílias (24). Dona Wally Schossland, ex- modelista da malharia Bozler, conta que o azul representava fidelidade e o vermelho o amor. Os pontos mais comumente usados eram ponto cruz, ponto cheio e ponto haste. E D. Jutta Hagemann, ainda lembra dos wandschoner que decoravam e protegiam as paredes dos quartos dela e dos irmãos, em geral bordados com motivos de histórias infantis como a da Branca de Neve. A senhora Ingrid Welling afirma que grande parte dos wandschoner eram bordados nas cores azul cobalto e vermelho, nos tecidos etamine, linho e granitê. Acrescentou, ainda que predominava a cor azul, por ser a cor mais firme, ou seja, que não desbotava facilmente. Dona Ingrid guarda lembranças de tenra idade, quando tinha apenas cinco anos e o idioma alemão fora proibido durante a Campanha de Nacionalização imposta pela política de Getúlio Vargas durante a Segunda Guerra Mundial. Conta que da janela da casa em que moravam, ela e sua família espiaram entre as frestas, soldados surrando um casal de velhos que moravam onde hoje se localiza a Casa da Memória.Como se não bastasse a surra, destruíram seus livros e os wandschoner. Tal fato teria impressionado profundamente seu pai que, no outro dia queimou todos os wandschoner, destruiu diversos livros, mas escondeu um que contava histórias em alemão. Enrolado em panos, o livro permaneceu por muito tempo no sótão da casa. A repressão e o medo fizeram com que a arte de bordar wandschoner fosse quase abandonada pelas mulheres. (25) Além dos wandschoner, D. Ingrid lembra que também se enfeitava a casa com bordados nas toalhas de mesas e nas prateleiras dos armários, nos panos compridos que escondiam as toalhas da mão e de louça, no saco de guardar cebola e no porta-pegador de panelas. Estes bordados foram uma tradição ensinada de mãe para filha.

Outro bordado da região da antiga Polônia também trazido pela mulher imigrante, enriqueceu muitos enxovais de roupa de cama e mesa. É o weisstickerei, bordado branco,feito quase sempre com linha branca, sobre linho branco, em geral com o ponto cheio. Por volta de 1500 encontrava-se peças desse bordado em mosteiros católicos que se tornaram luteranos após a Reforma na Charnenca, em Buxtehude, região da baixa saxônia. Regina Colin, professora de alemão, conta que há uma expressão popular nas famílias de origem alemã em Joinville,”Es geth nach Buxtehude”que se diz que quando alguém te incomoda, o mesmo que”mandar às favas”(26). Pode-se dizer que o bordado fino ou o bordado a branco das décadas de 1940, 1950, em Joinville, mantinham as mesmas técnicas trazidas da Europa. Mesmo porque, passadas as dificuldades dos primeiros tempos, era hábito em Joinville, as pessoas mandarem buscar na Alemanha revistas, almanaques, livros, manuais que trouxessem novidades como riscos, pontos e descrição de técnicas. Entre as décadas de 1940 e 1970, aproximadamente, grande parte das moças da classe média joinvilense freqüentaram as aulas da D. Marieta Stock, falecida em 1972, mas que ficou na lembrança das suas alunas pelo bom gosto nos riscos e na combinação das cores dos bordados que ensinava. Eram bordados finos, geralmente em linho ou cambraia.

Weisstickerei, bordado por Jutta Hagemann (1965), risco da D. Marieta Stock.

Toalha e guardanapo, bordados com gráfico baseado em um jogo de chá inglês, por Marieta Stock, de 1946.

D. Jutta Hagemann é de opinião que D. Marieta tinha um estilo próprio, seu bordado era facilmente identificado.”A gente via que era da Marieta, o conjunto todo, do risco ao formato das flores, as cores (...)“. D. Jutta conta, também, do hábito de bordar em casa, principalmente à noite escutando rádio.

“A minha mãe bordava muito, mais do que eu e minha irmã. Bordávamos em casa, não tinha televisão, então, à noite era bordar e escutar rádio. E assim eu bordei todo o meu enxoval e da minha irmã também. Eu lembro que depois, quando chegou a televisão, eu sempre dizia: eu não vejo televisão, eu escuto televisão. Então, de fato, eu bordei todo o meu enxoval, bordei da Margot, minha irmã, depois das crianças. Ainda tenho muitas peças desses bordados que minhas filhas usaram, depois meus netos, e agora os bisnetos. Tornou-se uma tradição de família“.

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Ao ser indagada sobre o significado dos bordados da D.Marieta D. Jutta responde: ”olha, as moças todas bordavam para o enxoval e automaticamente cada uma queria uma coisa mais bonita do que a outra para a expor na EFA - Exposição de Flores e Artes Domiciliares de Joinville que começou em 1936”(27). De fato, a EFA, representando valiosa oportunidade de exposição dos trabalhos, passou a ser, além do enxoval, o primeiro objetivo de D.Marieta e suas alunas, que esperavam ansiosamente o mês de novembro quando acontecia o principal evento cultural da cidade, expondo um misto de flores, artes domiciliares e depois artes plásticas. D. Jutta associa a EFA ao nome da sua amiga Erica Schlemm que bordava com esmero panôs com aplicações em feltro, ”era uma entusiasta das artes, ajudou na organização da EFA desde o início“.

Erica Schlemm, panô, década de 60.

Toalha de Natal, bordada por Hertha Lehr (1945/1950)

Souvenir EFA.

No âmbito artístico, a Exposição de Flores e Artes Domiciliares despontou como um marco. Inicialmente destinada às flores e artes domiciliares, a exemplo dos bordados de dona Marieta Stock e dos quadros bordados da Frau Trinks, rapidamente passou a mostrar objetos raros e valioso, partes de coleções particulares, como miniaturas do Sr. Engels, as porcelanas francesas e portuguesas do Sr. Rodrigo Lobo, os vasos chineses de Max Keller,

a coleção de xícaras antigas de Frau Grünsch e mais uma variedade de objetos, pinturas a óleo e aquarelas. Foi o espaço criado pela EFA que reuniu pela primeira vez obras de arte domiciliares, objetos raros e artes plásticas num só local, quando foi possível, então, ter-se uma idéia do aparato cultural da classe média e da elite joinvilense (28).

Afirma D. Jutta que algumas moças aprenderam com D. Marieta e tornaram-se bordadeiras profissionais. ”Algumas trabalharam para o Rolf Kasemodel, que tinha loja em São Paulo e era casado com minha prima. Ele organizava os enxovais dos quatrocentões de lá, isto é, das famílias paulistanas tradicionais e muitos dos bordados eram feitos aqui. Ele riscava e mandava para cá. E aqui ele tinha bordadeiras que trabalhavam para ele, entre elas D. Loni Klein” (29). A memória privilegiada de D. Jutta lembra bordadeiras de que já não temos notícia como D. Hertha Lehr que bordou na mesma época da D. Marieta no mesmo estilo. E Frau Hühlemann, cujos trabalhos, feitos à máquina, eram tão perfeitos que”parecia à mão, não tinha uma falha do lado avesso. Você não via, você tinha que olhar muito bem para saber que era à maquina“. Lembra ainda, D. Jutta, que D. Brigitte Wendel bordava somente monogramas para os enxovais de cama, mesa e os lenços.

D. Ingrid Welling, também bordou na D. Marieta e conta que, para criar os riscos a mestra se inspirava em revistas de bordados como a Rakan, e também em estampas de tapetes. Então criava o seu próprio risco, carregado de detalhes:”a toalha era toda bordada, só tinha um pequeno espaço para pôr o vaso”comenta D. Ingrid. Criados os riscos, estes eram passados, através de carbono para tecidos, que eram bordados com linha da Ilha da Madeira, que na verdade eram fabricadas na Inglaterra, Clarck’s Anchor e na França, DMC. As joinvilenses adquiriam essas linhas de vendedores madeirenses que de vez em quando apareciam na cidade. Quando demoravam a aparecer, adquiria-se o fio em Curitiba, na loja Princesa localizada no edifício Asa. A associação com a Ilha da Madeira deu-se pela tradição dos belíssimos e rebuscados bordados que as mulheres da Ilha faziam usando essa linha. Interessante que em Joinville, na loja Singer vendia-se as linhas nacionais, mas tanto D.Marieta como as alunas torciam o

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Colcha bordada por Eugênia Kumlehn.

Peça bordada por Alice Monich

Coube a D. Alice Monich o precioso legado de D. Marieta que três anos antes de sua morte, passou-lhe a tarefa de dar continuidade às aulas de bordado, além de lhe confiar os riscos que hoje estão com sua neta Rosita Larson da Silveira. Após o falecimento da mestra, D. Alice assumiu suas alunas continuando com as aulas por mais de vinte anos (32).

anos. Recorda que a fábrica produzia enxovais de bebê em tecidos de algodão e lã e eram bordados com a linha varicor, motivos de rosinhas e bichinhos, em gola de organza e cetim, pagão para bebê, babador, mandrião. Os tipos de pontos eram: cheio, haste, rococó e sombra (34). Um bordado europeu muito difundido em Joinville décadas atrás, foi o meio ponto bordado em tecido muito fino, o voal suíço, que se usava para cortinas. É um trabalho muito minucioso, pois o pano não é riscado, os pontos são contados e em muitas cores. Em geral os motivos são florais e, por sua delicadeza, além das toalhas, era bordado em roupinhas para bebês e tantas outras peças. Usava-se em quadros, cujas molduras eram feitas na casa Pieper, assim como armações para bandejas e cinzeiros. A senhora Eugênia Kumlehn é a referência mais marcante como bordadeira do meio ponto em voal suíço, cujos modelos copiava de revistas européias. Sua neta, Maria Eugênia Jensen, herdou o acervo da avó e guarda com muito cuidado toalhas em vários tamanhos, roupas para bebês, amostras e uma colcha belíssima, que a avó bordou para o seu enxoval. Maria Eugênia conta que a avó começou a bordar para fora depois que o marido faleceu, além de assumir as funções antes exercidas pelo marido, como representante da fábrica de fósforos Fiat Lux (35).

A Sra. Lenir Borges, que aprendeu a arte do meio ponto com Frau Kumlehn, como era chamada D.Eugênia, relata que os bordados eram feitos no tecido voal bege ou branco, com um fio de meada de seis fios Mouline, com 20 a 30 cm de comprimento para não embolar, bordado nos tipos de ponto: meio ponto e sombra. É uma técnica de difícil execução, porquanto exige paciência, habilidade manual e boa visão: o voal é preso num bastidor, a agulha muito fina vai cravando o meio ponto no tecido onde não há riscos para orientar a bordadeira. Os pontos são contados no modelo escolhido (36). Frau Kumlehn contratava outras bordadeiras para aumentar sua produção que era muito requisitada. Tinha muitos conhecidos e ”isso se tornou uma corrente” comenta Maria Eugênia. Quando o Governador Luiz Henrique foi Prefeito da cidade, alguns dos presentes da Prefeitura para os visitantes de fora, eram quadros, bandejas ou cinzeiros com os bordados da Frau Kumlehn. Muitas das amigas compravam tanto para seu uso como para presentes, principalmente quando viajavam para a Alemanha, ocasião em

Peças bordadas por Helga Tiburtius.

nariz diante da inferioridade da mercadoria que não tinha brilho. Os tipos mais comuns de pontos bordados na D. Marieta eram ponto sombra, ponto cheio, ponto richelieu, ponto haste ou ponto atrás, ponto máquina, festão para recortar o tecido, bainha aberta, bainha aberta tipo roletê. D. Ingrid conta, ainda, que algumas alunas tornaram-se professoras de bordados e ministraram aulas às gerações seguintes, referindo-se às senhoras Helga Tiburtius e Alice Monich (30). D. Helga não gostava de bordar numa cor só, dando preferência ao colorido principalmente nas cores amarelo, azul, vermelho e rosa. Vendia seus bordados para conhecidos e em lojas, além de bordar vestidos de noiva com predarias (31).

Aos 89 anos, a senhora Wally Prox Schossland, filha de alemães, recorda o tempo em que foi modelista da Malharia Bozler. Trabalhou ali durante aproximadamente 30 anos. Conta que na Malharia, os riscos dos bordados eram criados a partir de modelos da revista Handarbeiten, como também da observação da natureza. As roupinhas para bebê da Bozler tornaram-se referência na composição dos enxovais. Pessoas de outras cidades ou estados vinham a Joinville só para comprar as roupinhas bordadas da afamada malharia (33). D. Irene Bozler, 97 anos, carrega consigo a história da malharia que comandou por durante aproximadamente cinqüenta

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que Frau Kumlehn aproveitava para encomendar tecidos que provavelmente não encontrava no Brasil. Os fios eram nacionais, da marca Âncora que comprava na Casa Edmundo e mais tarde na Casa Willy. Como ela era representante da Fiat Lux, presenteava as esposas dos representantes dos outros estados, e também as esposas do diretores da empresa (37). Não somente bordados finos, em linho, cambraia ou percal, estiveram na pauta dos enxovais das moças joinvilenses: D. Margot Wetzel foi professora dos bordados de ponto cheio para um lado, um ponto de tradição alemã, muito difundido nos anos cinqüenta e sessenta, o”ponto chato”, segundo D. Iris Eberhardt Boldt. Quando o tecido era grosso, o risco era furado com vários pontinhos no papel e passado com uma tinta à base de querosene, para o tecido. As linhas usadas para o bordado eram grossas.

Risco da D. Margot Wetzel, década de 60.

Yolanda Daher relata que os riscos eram feitos no papel manteiga, picotados com um aparelho, colocados em uma mesa quadrada sobre um quarto da toalha. Em seguida passava-se um pó preto de sapateiro misturado a parafina, com uma bucha sobre a toalha. Depois de riscada, a toalha era passada a ferro, ainda úmida, pelo avesso. Depois bordava-se uma amostra num canto da toalha, com a seleção de cores e juntava a quantidade de fios necessários. Diz Yolanda que os bordados eram feitos em tecidos finos e grossos, as linhas eram da Hering e da Círculo, nos pontos: cheio, haste, ponto-cruz riscado, pintura de agulha, picuru, espinho. Eram bordados em três tons, escuro, médio e claro, geralmente nas cores azul, amarelo, marrom, palha, verde oliva, verde garrafa, vermelho e brique (parecido com laranja) que Frau Wetzel vendia para lojas tradicionais de Joinville como Tilp, Richlin, Boehm, e também para São Paulo e Curitiba. Yolanda Daher foi aluna e depois auxiliar da Frau Wetzel, e confessa: tenho muitas saudades daquele tempo, pois com D. Margot Wetzel aprendi muitos costumes alemães, como os ovinhos de Páscoa, a casa enfeitada no Natal, as cucas, a reunião de crochê com as amigas (38). A partir dos anos sessenta do século vinte, o bordado perde a referência como uma atividade nobre exercida pelas mulheres prendadas. Com algumas exceções, já não se bordava os enxovais, que passaram para as mãos das bordadeiras profissionais. O movimento feminista que teve seu auge naqueles tempos levou muitas mulheres para os escritórios, empresas e principalmente para as universidades, uma vez que buscava-se direitos iguais aos dos homens e, portanto, tinham que provar que executariam com

NOTAS1. www.escoladebordado.com.br/historia.html2. www.infopedia.pt/$prensa-de-gutenberg3. www.escoladebordado.com.br/historia.html4/5/6/7/8/9/10. www.emdiv.com.br/mundo/povosetradicoes/1722-o bordado-e-sua-historia.html 11. www.coatscrafts.com.pt/Lavores/Bordados/Sobre/12. Brigitte Brandenburg, citando a Revista Bazar 13. www.historiadaarte.com.br/arteindigena.html)14/15/16. http://adm.cultura.ba.gov.br/conteudo/noticias/na-midia impresso/identidade- ancestral/) 17. www.bonde.com.br/bonde18. http://ombudspe.org.br/brasilquilombola/19. Feito a mãos - O Artesanato em Santa Catarina/Editado por Tarcisio Mattos, Florianópolis, Tempo Editorial, 2008, p.7920. Sociedade Ginástica de Joinville. São Paulo: Cia Melhoramentos,1958, p.3921. Iris Eberhardt Boldt - depoimento para Ana Gern, 17-08-201022. Norma Jan Baumer - depoimento para Ana Gern, 09-08-201023. Regina Colin. depoimento para Ana Gern, 05-08-201024. Brigitte Brandenburg - depoimento para Ana Gern, 31-08-201025. Ingrid Welling - depoimento para Ana Gern 26. Regina Colin- depoimento para Ana Gern27. Jutta Hagemann - depoimento para Raquel S.Thiago e Ana Gern, 19-10-201028. Raquel S.Thiago. Joinville: Cultura e História. In: Joinville 150 anos. Joinville: Instituto Joinville 150 anos, 2001, p.2129. Jutta Hagemann - idem30. Ingrid Welling - idem31. Ângela Tiburtius - depoimento para Ana Gern, 06-11-201032. Rosita Larson da Silveira - depoimento para Ana Gern - 10-11-201033. Wally Prox Schossland - depoimento para Ana Gern, 10-09-201034. Irene Bozler - depoimento para Ana Gern - 31-08-201035. Maria Eugênia Jensen - depoimento para Raquel S.Thiago e Ana Gern, 25-1-201036. Lenir Borges - depoimento para Ana Gern, 09-08-201037. Maria Eugênia Jensen - idem38. Yolanda Daher - depoimento para Ana Gern, 16-08-2010

:: Uma História do Bordado no Tecido Social

maestria as tarefas até então confiada a eles. Com isso o bordado foi ficando de lado e o status conferido à mulher prendada em artes domiciliares,cedeu lugar à mulher que estudava, fazia universidade, trabalhava em escritório ou exercia alguma atividade intelectual. Por outro lado, a tecnologia avançava a ponto de deixar em segundo plano os trabalhos manuais. A televisão, por exemplo, não só fragilizou as conversas e o diálogo familiar, como também fez com que muitas mulheres relaxassem no bordado, tricô, crochê, ou costura, pois diferentemente do rádio, que permitia a execução de qualquer trabalho e ser ouvido ao mesmo tempo, a televisão exige maior atenção. Não somente os ouvidos, mas os olhos eram exigidos para que se usufruísse da maravilha da imagem televisiva que então, para encantamento de todos, estava dentro de casa. Não por acaso, o cinema passou a ser menos freqüentado. Atualmente pode-se perceber um retorno ao bordado, mas já em outros papéis e significados, pois a história segue seu curso afirmando sempre que um tempo não se repete em outro tempo, mas se apropria do que há de mais sólido no pilar do conhecimento acumulado pela humanidade. Com o bordado não foi diferente.

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12Projeto Entrelaçando Histórias

:: Wandschoner

“Não reclame o

amanhã, que te dá o esforço e o

trabalho. É tão bom cuidar de

pessoas que amamos.”

“Inicie o dia com o espírito alegre.”

“Onde o amor faz as pazes com a sorte, ali está o melhor lar do mundo.”

“Vem Senhor Jesus seja o nosso Convidado. Abençoe o que Você nos deu. Amém.”

“Deus irá prover o hoje e o amanhã.”

Os Wandschoner

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13Projeto Entrelaçando Histórias

“Limpo brilhantemente e varrido. Todas as mãos rapidamente se exercitam.”

“Abençoarei os lares onde a imagem do meu coração for exposta e

venerada.”

“O ser humano precisa de um lugarzinho sendo mesmo bem pequeno. Do qual ele pode dizer, olhe aqui, isto é meu. Aqui eu vivo, aqui eu amo, aqui eu descanso. Aqui é o meu lar, aqui estou em casa.”

“No momento certo um bom gole. Alegra o coração tanto no idoso

como no jovem.”

:: Wandschoner

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14Projeto Entrelaçando Histórias

:: Entrelaçando Histórias

Entrelaçando Histórias ... Em cada ponto, um conhecimento, uma história, um sonho...

Observando os diversos “Wandschoner”, protetores de parede, da pesquisa

realizada para o projeto “Entrelaçando Histórias”, registramos vinte e

dois pontos de bordado que serão mostrados como são executados nesse

artigo. Estes pontos foram ensinados pela professora Leni Zimmermann,

nas oficinas de bordado desse projeto.

A expressão popular nas famílias de origem alemã em Joinville -

“LANGER FADEN, FAULES MÄNCHEN”, que se diz “Fio comprido,

menina preguiçosa”, era ensinada para as moças fazerem um bordado

caprichoso. Com o fio comprido, se perde o brilho e desfia.

Uma sugestão de tamanho de fio, a pessoa mede do seu nariz a

extensão do seu umbigo. Assim o braço não cansa e fica um bordado

bonito (1).

NOTAS1. LENI ZIMMERMANN- depoimento para as alunas- outubro de 2010.3. ADELINA LENSHOW- depoimento para Ana Gern - 27-08-2010. - ARAUJO, Altair C. de. Noventa Pontos de Bordado. Ediouro. Rio de Janeiro, 1980.- Cem Pontos de Bordado. Corrente. São Paulo, 1979.

1. CORRENTE

7. AMARRA

16. PONTO CRUZ13. PONTO

CHATO

2. HASTE

8. APANHADO

17. MARGARIDA DUPLA

14. PONTO CHEIO

3. CASEADO

9. TRANÇADO

18. CABEÇA DE SETA

15. APANHADO JACOBINO

19. BAINHA ABERTA20. TEIA DE

ARANHA21. BRUXA OU RUSSO

22. PONTO ESPINHO

4. ALINHAVO

10. PONTO RETO

5. NÓ FRANCÊS

11. MARGARIDA

6. PÉ DE GALINHA

12. AREIA

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15Projeto Entrelaçando Histórias

1. Ponto CORRENTE (KETTENSTICH)

2. Ponto HASTE (STIELSTICH)

3. Ponto CASEADO (KNOPFLOCHSTICH)

4. Ponto de ALINHAVO (VORSTICH)

Trabalhe da esquerda para a direita fazendo pontos levemente inclinados, regulares, ao longo da linha do desenho. O fio sai sempre à esquerda do ponto anterior. Esse ponto é usado para hastes de flores, contornos, etc. Pode também ser usado como uma cobertura; carreiras de Ponto de Haste feitas bem juntas dentro de um desenho até cobri-lo completamente.

Estes pontos são feitos da mesma maneira. A única diferença é a distânci entre os pontos, num mais largo, e no outro bem juntos. Puxe a agulha na linha inferior, introduza-a na posição certa na linha superior, fazendo um ponto reto para baixo com a linha por baixo da ponta da agulha. Puxe o ponto para formar uma laçada e repita. Este ponto pode ser trabalhado em tecidos próprios para bordado sobre fios contáveis.

Puxe a agulha no alto da linha e mantenha-a presa com o polegar esquerdo. Introduza a agulha no mesmo lugar de onde saiu a última vez e puxe-a a uma curta distância, mantendo o fio por baixo da ponta da agulha.

Passe a agulha por cima e por baixo do tecido, fazendo os pontos no direito do mesmo comprimento. Os pontos do avesso devem ser também do mesmo tamanho, porém metade do tamanho, ou menor que os pontos do direito.

5. Ponto NÓ FRANCÊS (KNÖTCHENSTICH)

6. Ponto PÉ DE GALINHA (FISCHGRÄTENSTICH)

Puxe a agulha no lugar onde será feito o ponto, mantenha a linha presa com o polegar esquerdo e enrole a linha duas vezes na agulha com em A. Ainda mantendo a linha presa firmemente, gire a agulha para trás ao ponto de partida e introduza-a bem junto ao lugar de onde saiu a linha (veja a seta). Passe a agulha para o avesso do tecido e arremate no caso de um nozinho só, ou passe para o lugar onde será feito o ponto seguinte, como em B.

Fig. A - Puxe a agulha no centro superior do desenho, mantenha o fio para baixo com o polegar esquerdo, introduza a agulha um pouco à direita no mesmo nível e faça um pontinho para baixo até o centro, conservando a linha por baixo da ponta da agulha. A seguir, introduza aagulha um pouco à esquerda no mesmo nível e faça um ponto para o centro, conservando a linha por baixo da ponta da agulha. Faça estes dois movimentos alternadamente.

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16Projeto Entrelaçando Histórias

:: Entrelaçando Histórias

7. Ponto de AMARRA (DOPPELTER STEPPSTICH)

8. Ponto APANHADO

Este ponto é feito da esquerda para a direita. Fig. A. Puxe a agulha na linha do desenho, introduza-a um pouco à um pouco a direita na linha e traga-a à esquerda justamente na metade do comprimento do ponto e com a linha abaixo da agulha. Fig. B. Faça o ponto seguinte da mesma maneira mas com a linha acima da agulha. Continue desta maneira, alternando a posição da linha. Este ponto pode também ser trabalhado em tecidos de fios iguais como cânhamo, etamine, etc.

MODO 1: Desça quatro fios na vertical. Vire a agulha para a esquerda, pegando um fio. Volte à agulha para a direita, pegando um fio e saia com a agulha no centro. Repita o movimento.

MODO 2: Estenda um fio ao longo do traçado do desenho e com a outra linha, prenda o fio estendido ao tecido, com pontinhos feitos a intervalos regulares. A linha que prende o fio estendido pode ser de cor diferente.

Faça este ponto com o Ponto Corrente (A) (veja nº1), mas prenda cada laçada com um pontinho (B). Este ponto pode ser feito individualmente ou em grupos para formar pétalas de flores.

Este ponto é feito da direita para a esquerda e é geralmente usado no Bordado Negro Espanhol para o contorno do desenho. Faça o Ponto Haste (veja nº 2) primeiro e depois com outra agulha na linha, enrole cada Ponto Atrás, sem apanhar o tecido.

Este ponto é mostrado como pontos individuais espaçados feitos de modo regular e irregular. Algumas vezes os pontos são de tamanho variado. Os pontos não devem ser feitos nem muito longos nem muito frouxos. O ponto pode também ser feito em tecidos de fios iguais.

Este ponto simples de cobertura é composto de pequenos Pontos Retos (veja nº10) de igual tamanho, dispostos a espaços regulares sobre o desenho, conforme mostrado no diagrama.

9. Ponto TRANÇADO

10. Ponto RETO (SPANNSTICH)

11. Ponto MARGARIDA (MARGERITENSTICH)

12. Ponto AREIA

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17Projeto Entrelaçando Histórias

Fig. A - Puxe a agulha na linha inferior direita da cruz e introduza-a no alto da mesma linha, fazendo um ponto através do tecido para a linha inferior esquerda. Continue até o fim da carreira desta maneira. Fig. B - Complete a outra metade da cruz. É importante que a metade superior de cada ponto caia sempre na mesma direção.

Puxe a agulha no lado direito inferior, introduza-a quatro fios acima e quatro fios à esquerda e puxe-a quatro fios abaixo, formando assim um meio ponto cruz; continue desta maneira até o fim da carreira. Complete a outra metade da cruz, conforme mostrado. O Ponto Cruz pode ser feito tanto da esquerda para a direita, conforme mostrado, como da direita para a esquerda. É importante que a metade superior de todos os pontos caia na mesma direção.

Borde como se fossem Pontos Retos (veja nº10) feitos bem unidos de lado a lado de um desenho, conforme mostrado no diagrama.

Se preferir faça primeiro um enchimento de Ponto de Alinhavo ou de Ponto Corrente por baixo. Isto dá um efeito de relevo. É necessário que a beirada fique perfeita. Não faça os pontos muito longos, para que não sejam puxados para fora de lugar.

13. Ponto CHATO

16. Ponto CRUZ (KREUZSTICH)

Faça um pontinho alternadamente em cada lado do espaço a ser preenchido, com a ponta da agulha sempre saindo na beirada do desenho. Duas linhas podem ser traçadas no centro do desenho, como guias para o tratamento do ponto. Os pontos devem ser bem unidos e cruzados uns sobre os outros.

15. Ponto APANHADO JACOBINO (ou Ponto Treliça)

Este ponto faz uma bonita cobertura para miolos de flores ou de desenhos onde um efeito aberto é necessário. Consiste de pontos longos (fios estendidos) espaçados uniformemente, feitos de lado a lado de um desenho, horizontal e verticalmente como em (A) ou diagonalmente (B); então o cruzamento dos fios é preso com os pontinhos que podem ser pequenos pontos inclinados ou Ponto Cruz (veja nº16).

14. Ponto CHEIO (PLATTSTICH) e Ponto CHEIO COM ENCHIMENTO

:: Entrelaçando Histórias

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18Projeto Entrelaçando Histórias

:: Entrelaçando Histórias

19b. BAINHA ABERTA ou “AJOUR” em ziguezague

19c. BAINHA ABERTA ou “AJOUR” entrelaçado

19d. BAINHA ABERTA ou “AJOUR”

Faça este ponto com o Ponto Corrente (veja nº1), mas prenda cada laçada com um pontinho, como no Ponto Margarida simples (veja nº11). Depois repita o mesmo movimento com uma laçada menor.

17. Ponto MARGARIDA DUPLA

19a. BAINHA ABERTA ou “AJOUR” (HOHLNAHTSTICH)

18. Ponto CABEÇA DE SETA

Fácil e ótimo para contornos ligeiros, use linha bem grossa e brilhante para melhor realce. Como sempre, olhe os desenhos A e B e siga cuidadosamente os seus traçados.

Meça a largura necessária. Corte os fios (sugestão seis fios) no centro e desfie gradualmente em direção a cada lado até onde foi marcada a barra. Pelo lado avesso, cerzir os fios desfiados. Corte a sobra dos fios. O número de fios pode variar de acordo com o tecido ou desenho desejado.

Esta variação é feita da mesma maneira que o Ponto “Anjour”, porém é necessário um número ímpar de fios em cada grupo apanhado de fios na primeira carreira. Na segunda carreira, os grupos são divididos pela metade, para que cada grupo fique composto pela metade dos fios de um grupo e metade do grupo vizinho. A segunda carreira é começada e terminada por um meio grupo.

Faça o Ponto Ajour básico primeiro. Emenda um fio longo bem no centro do lado direito dos fios do desfiado. Fig. A. Passe a agulha pela frente de dois grupos de fios amarrados e introduza a agulha da esquerda para a direita por baixo do segundo grupo. Fig. B - Torça o segundo grupo por cima do primeiro, introduzindo a agulha por baixo do primeiro grupo da direita para a esquerda. Puxe a agulha.A linha entrelaçada deve ser puxada com firmeza para ficar esticada através dos grupos torcidos.

Em ziguezague ou entrelaçado com o Ponto Bruxo (veja nº21) no meio - Faça o ponto “ajour” em ziguezague ou entrelaçado. Pule os fios (sugestão oito fios) e repita novamente o ponto “ajour” em ziguezague ou entrelaçado. Na parte não desfiada fazer o ponto bruxa, usando dois blocos de fio.

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20. TEIA DE ARANHA

Comece com um Ponto de Mosca feito em direção ao centro do círculo, conforme mostrado em A, e então faça dois Pontos Retos, um em cada lado da Cauda do Ponto de Mosca, no centro do círculo. Isto divide o círculo em cinco partes iguais e os raios formam a base da tela. Faça a seguir um cerzido por cima e por baixo dos raios até encher o círculo como em B. Em Bainhas Abertas os raios não são completamente cobertos, e somente metade do círculo é preenchido, o que dá um efeito de cobertura rendada e aberta.

21. Ponto BRUXA (ou Russo) (HEXENSTICH)

Puxe a agulha na linha inferior à esquerda e introduza-a na linha superior um pouco à direita, fazendo um pontinho para a esquerda com a linha abaixo da agulha. A seguir introduza a agulha na linha inferior um pouco à direita e faça um pontinho para a esquerda com a linha acima da agulha. Estes dois movimentos são repetidamente até o fim. Para melhor efeito, o tecido apanhado pela agulha e os espaços entre os pontos devem ser sempre de igual tamanho. Este ponto pode ser enlaçado com linha da mesma cor ou de cor diferente. Use uma agulha de ponta redonda para o enlaçado e não apanhe tecido algum. O Ponto Russo pode também ser trabalhado em tecido para o bordado sobre os fios contáveis.

22. Ponto ESPINHO (KREUZNAHTSTICH)

Faça um pontinho alternadamente em cada lado do espaço a ser preenchido, com a ponta da agulha sempre saindo na beirada do desenho. Duas linhas podem ser traçadas no centro do desenho, como guias para o tratamento do ponto. Os pontos devem ser bem unidos e cruzados uns sobre os outros.

Curiosidade sobre o Ponto BruxaD. Adelina Lenshow conta que aprendeu que o ponto bruxa, “hexenstich”, quando se bordava no “wandschoner”, era para espantar os maus espíritos (2).

:: Entrelaçando Histórias

Joinville, novembro de 2010.

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