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PROJETO MARISTA PARA PLANEJAMENTO E AVALIAÇÃO

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PROJETO MARISTA PARA

PLANEJAMENTO E AVALIAÇÃO

PROJETO MARISTA PARA

PLANEJAMENTO E AVALIAÇÃO

CURRÍCULO EM MOVIMENTO

volume 5

ProvincialIrmão Davide Pedri

DIRETORIA EXECUTIVA DA REDE DE COLÉGIOS

Diretor ExecutivoIrmão Paulinho Vogel

Diretora EducacionalIsabel Cristina Michelan de Azevedo

Assessores EducacionaisAna Lucia C. F. SoutoDenize Munhoz da R. R. de SouzaFlávio Antonio SandiGilson FaisLaércio FurquimMaria de Lourdes Rossi Remenche

Assistente de PastoralAna Cristina S. L. Zeferino

AssistenteSilvana Luz

Rua Imaculada Conceição, 1155 ‑ 8º andarPrado VelhoCuritiba ‑ PR80215‑901

© Província Marista do Brasil Centro-Sul – 2009

AutoresFlávio Antonio SandiRicardo Santos Chiquito

Revisão TécnicaIsabel Cristina Michelan de Azevedo

Direção de Arte e Arte‑finalAndrea Vilela de Almeida

Assessoria EditorialElo Cultural Comunicação

Edição de TextoMarilu Maranho Tassetto

Revisão de TextoRosemary Lima

ImagensPhotodisc e Digital Vision/Getty Images Coleção CURRÍCULO EM MOVIMENTO

volume 1 Projeto Pedagógico Institucional

volume 2 Projeto Marista para a Educação Infantil

volume 3 Projeto Marista para o Ensino Fundamental

volume 4 Projeto Marista para o Ensino Médio

volume 5 Projeto Marista para Planejamento e Avaliação

volume 6 Projeto Marista para as Matrizes Curriculares

volume 7 Projeto Marista para o Ofício de Aluno

DA D O S I N T E R N AC I O N A I S D E C ATA L O G A Ç Ã O N A P U B L I C A Ç Ã O ( C I P )

( C Â M A R A B R A S I L E I R A D O L I V RO, S P, B R A S I L )

Projeto Marista para Planejamento e Avaliação / [autores Província Marista do Brasil Centro‑Sul, Flávio Antonio Sandi, Ricardo Santos Chiquito] . ‑ ‑ 1. ed ‑ ‑ São Paulo : FTD, 2009. ‑ ‑ (Coleção currículo em movimento ; v. 5)

ISBN 978‑85‑322‑7186‑0

1. Avaliação educacional 2. Currículos ‑ Planejamento 3. Educação ‑ Currículos 4. Irmãos Maristas ‑ Educação 5. Planejamento educacional I. Província Marista Brasil Centro‑Sul. II. Sandi, Flávio Antonio. III. Chiquito, Ricardo Santos. IV. Série.

09‑07875 CDD‑375.001

Í N D I C E S PA R A C AT Á L O G O S I S T E M Á T I C O :

1. Currículos : Planejamento e avaliação : Educação marista 375.001

Agradecimentos

Grupo de Estudos de Planejamento e Avaliação

Colégio Marista ArquidiocesanoJussara M. Moreira Goulart e Telma Luciene V. de Faria

Colégios Maristas de BrasíliaClaudia S. Honda e Júlio José Egreja

Colégio Marista de CascavelSergio Ladário e Denise M. Martini

Colégio Marista de CriciumaTânia B. Serafin Burigo

Colégio Marista Frei RogérioElisete Peruzzo e Mercedes L. Nascimento

Colégio Marista de LondrinaRaquel Calil Ruy e Rosane Cristina F. Gomes

Colégio Marista de MaringáIzildinha A. P. Ibanez

Colégio Marista Nossa Senhora da GlóriaAlexandra Faleiros A. Pereira

Colégio Marista ParanaenseLourdes R. Chyla

Colégio Marista Pio XIIRosi de Fátima G. Ramos

Colégio Marista de Ribeirão PretoLúcia Inês de Oliveira S. Montagnani

Colégio Marista Santa MariaAntoniella P. Cavassin

Colégio Marista de Santos Edinéia Monica de Andrade

Colégio Marista São FranciscoLiane Danieli

Colégio Marista São LuisVivian Roberta S. Lawin

Diretoria Executiva de Ação SocialBárbara P. Ferreira e Soeli T. Pereira

Editora FTDCarlos Rizzi e Sônia Oddi

APRESENTAÇÃO

xii

É com imensa alegria que apresentamos aos educadores compro‑metidos com a qualificação de sua própria prática mais um volume da coleção Currículo em Movimento. A escola marista, desde os tempos de seu fundador São Marcelino Champagnat – quando este se reunia aos irmãos maristas durante as férias para ensiná‑los nos trabalhos peda‑gógicos relativos às salas de aula –, sempre valorizou o aprimoramen‑to das ações docentes. Daí decorre nosso empenho em definir pro‑gramas educacionais, conteúdos curriculares e métodos de ensino à luz de um projeto educativo vinculado ao que há de melhor no pen‑samento pedagógico educacional.

O currículo escolar é um espaço de diálogo entre conceitos e

práticas, assim, configura-se como um projeto sociocultural no

qual os sujeitos interagem continuamente ao expressar suas ideias

e pontos de vista, ao selecionar os conhecimentos considerados

válidos para o desenvolvimento dos aprendizes, ao definir critérios

de avaliação etc.

Nesse sentido, entendemos que os sete volumes da coleção Currículo em Movimento contribuirão com o processo social promovido pela interlocução entre sujeitos e concepções teórico‑ideológicas, pois os temas selecionados abrangem questões pertinentes às institui‑ções escolares sob diferentes perspectivas (histórica, científica, psico‑lógica, política etc.).

Percebemos, assim, que na Diretoria Executiva da Rede de Colégios não se adota mais a noção de currículo como mera listagem de con‑teúdos de determinado componente curricular, pois entendemos que pelo currículo é possível gerar cultura, expressar posições sociais, valorizar as relações interpessoais e promover a construção de saberes e de subjetividades.

A P R E S E N TAÇ ÃO

xiii

Este volume trata de dois conceitos fundamentais para o trabalho do professor: o planejamento da ação didática e a avaliação das apren‑dizagens. Sabemos que o exercício profissional dos educadores é mar‑cado pela diversidade e ambiguidade, uma vez que cada um necessita lidar, ao mesmo tempo, com um conjunto de concepções educacionais que dizem respeito às inúmeras possibilidades de ação e com parâme‑tros preestabelecidos por órgãos governamentais, institucionais, éti‑cos e pessoais que influenciam a planificação didático‑pedagógica.

Para tanto, no dinamismo do cotidiano da escola, o professor deverá desenvolver competências e habilidades que possibilitem transpor conceitos da academia para as ações cotidianas em sala de aula, analisar os contextos individuais e sociais que se apresentam e compreender os avanços e as rupturas que são característicos do fazer educacional. Somente assim conseguirá corresponder às demandas da sociedade contemporânea, o que certamente exigirá um esforço con‑tínuo de atualização e desenvolvimento profissional.

Acreditamos que este texto poderá contribuir com a formação continuada dos professores, pois, ao propor revisitar as noções e as metodologias frequentemente utilizadas, convida cada um a superar a separação entre aprender e fazer, formação e ação, teoria e prática, pensar e fazer, trabalho manual e intelectual. Reconhecemos também que esses profissionais são sujeitos complexos, que aprendem conti‑nuamente por meio das relações sociais, culturais, políticas e outras que permeiam a vida de todo ser humano, por isso resolvemos parti‑cipar da sua formação, imaginando que, para a formação plena dos educadores, também devemos pensar na construção de cidadãos soli‑dários, comunicativos e investigativos. Afinal, os educandos são a razão principal da nossa missão.

Ir. Paulinho VogelDiretor Executivo da Rede de Colégios (DERC)

Isabel Cristina Michelan de AzevedoDiretora Educacional da DERC

INTRODUÇÃO 19

Planejamento e avaliaçãocomo uma prática construída no cotidiano 20

PLANEJAMENTO DE ENSINO 24

I SIGNIFICADOS E SENTIDOS 27

1. Planejamento e plano de ensino:diferentes, mas complementares 28

2. Desdobramento e composição do plano de ensino 31

3. Uma cena da vida dos professores:“O plano de ensino engessa a prática” 31

Aulas expositivas 33

Aulas problematizadoras 33

4. Planejamento e plano de ensino:artefatos socioculturais 34

5. O planejamento de ensino e sua história 34

6. Plano de ensino: um texto curricular 35

7. Outra cena da vida dos professores:“O plano de ensino estrutura e organiza o ensino” 37

8. O planejamento e o plano de ensino:território de luta cultural pelos significados 39

9. Plano de ensino:mecanismo eficiente de subjetivação,de produção de modos de ser sujeito 39

10. Por que fazemos planos de ensino 40

II COMPOSIÇÃO 43

1. O que existe no planejamento de ensino?E no plano de ensino? 44

2. Objetivos (didático, pedagógico, educacional):o que são 44

3. Objetivos didáticos no plano de ensino 49

4. Como considerar as taxionomias 50

A questão das taxionomias 51

Benjamin Bloom e outros (1952) 52

Gilbert e Viviane de Landsheere (década de 1970) 53

Eisner (1967) 53

Popham (1972) 54

Esteves (1968) 54

Hilda Taba (1975) 54

Romey (década de 1970) 55

Gagné (décadas de 1960/1970) 55

Mager e Beach (década de 1970) 56

D’Hainaut (década de 1970) 57

Meirieu (1998) 57

5. A impossibilidade de observar diretamentea aprendizagem 60

6. Indicadores de aprendizagem:meios para observar a aprendizagem 61

7. Finalidade dos eixos estruturantes 62

8. A importância dos conteúdos escolares 62

9. A transposição didática da matriz curricular para oplano de ensino 64

10. O que são as ações didáticas? 64

Mediação 65

Aula 70

Sequência didática 71

Estudo de meio 72

11. O plano de ensino na Educação Infantil 73

III O DIAGRAMA 77

sumário

AVALIAÇÃO DAS APRENDIZAGENS 82

I SIGNIFICADOS E SENTIDOS DA AVALIAÇÃO DAS APRENDIZAGENS: A DIFERENCIAÇÃO ENTRE AVALIAÇÃO E PROCESSO AVALIATIVO 85

1. A importância do significado atribuído à avaliação 86

2. Alguns saberes necessários à prática docentepara a implementação de uma práticade avaliação como processo 91

3. Avaliação e a comunicação entre escola, alunoe família 98

4. A correção como forma de comunicação doprocesso de avaliação 100

5. O “erro” como forma de potencializar e (re)significara prática pedagógica 101

6. A qualificação da nota ou do conceitoe a complexidade da aprendizagem 106

7. As aulas e seus tempos e espaços 110

8. Os indicadores:uma possibilidade de precisão da aprendizagem 112

9. A concepção de ensino-aprendizageme a prática pedagógica 113

10. Uma cena da vida de professores:“O número de alunos em sala inviabilizaa individualização do feedback” 115

11. A recuperação entendida como o progresso dasexperiências ao longo do processoensino-aprendizagem 117

12. As responsabilidades de professore aluno no processo de ensino-aprendizagem 119

II COMPOSIÇÃO DA AVALIAÇÃO DAS APRENDIZAGENS COMO PROCESSO 121

1. Caixa de diálogo 122

2. Pauta de observação:mapeamento das aprendizagens e informaçõespara professor e aluno 124

3. A aula e suas possibilidades:conhecimento e desenvolvimentodo pensamento mais criativo e menos rígido 127

Exemplo 1: Ciências Naturais 130

Exemplo 2: Biologia 131

Exemplo 3: História 132

Exemplo 4: Matemática 134

Exemplo 5: Química 136

Exemplo 6: Língua Portuguesa 138

4. Provas são entrelaçamentos entre objetivose indicadores, conteúdo e conhecimento 142

CONSIDERAÇÕES FINAIS 145

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 151

Planejar, avaliar e outros “aquilos” na prática docente 158

INTRODUÇÃO

20

I N T R O D U Ç ÃO

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Planejamento e avaliaçãocomo uma prática construída no cotidiano

O objetivo deste livro é fornecer uma ferramenta para o professor pensar sua prática considerando propostas mais atuais acerca do pro‑cesso de ensino‑aprendizagem. Ele foi construído com base nas ideias recolhidas nas visitas às escolas, em reuniões de estudos e em quase 300 representações de professores, formalizadas por meio de questio‑nário sobre planejamento e avaliação, das 16 unidades. Isso o carac‑teriza como um documento que promove o diálogo entre teoria e prática, entre escola e professores.

Muito se fala sobre formas de ensinar e aprender que sejam mais atuais. As demandas da sociedade atual, que não são tão atuais assim, e as que estão por vir, como diz Peter McLaren, exigem sujeitos que saibam ler e produzir o mundo com suas próprias palavras partindo de diferentes pontos de vista.

Para isso, este livro foi escrito visando à problematização de nossa prática, estimulando a negociação dos significados de planejamento e de avaliação e de outros conceitos que se relacionam com esses, como a concepção de aprendizagem e o que se entende por conhecimento. As discussões que estes textos irão favorecer darão visibilidade a nossa prática docente, atualizando‑a, à medida que cartografam itine‑rários para potencializar o ensino e a aprendizagem por meio do planejamento e da avaliação.

Ao mesmo tempo que este documento pretende problematizar,

também objetiva orientar nossa prática, por meio de um diálogo

entre a escola – professores, alunos, pais – e o conhecimento,

aquele que os alunos construirão e os que são próprios da prática

docente. É importante ressaltar que para ser bons professores não basta dar boas aulas, mas, sobretudo, saber explicar, com base em uma teoria, os efeitos da mediação que estabelecermos. Quando optamos por explorar um texto em vez de uma aula expositiva, faze‑mos essa escolha baseados em um planejamento e em uma avaliação.

Não são escolhas aleatórias, mas feitas com base em uma concep‑ção de aprendizagem, do entendimento do que seja conhecimento, considerando o que foi planejado anteriormente e por meio de uma avaliação (julgamento) do entendimento sobre o assunto, ou seja, embasamo‑nos na teoria, mas não em qualquer teoria.

Assim, planejamento e avaliação são faces de uma mesma moeda. Se planejarmos bem, avaliaremos melhor. Se avaliamos com qualidade é porque planejamos as ações didáticas visando ampliar as aprendizagens.

Quando planejamos, avaliamos as mediações que serão propicia‑das à luz da proposta pedagógica da escola. Um processo avaliativo se constitui por meio de um planejamento dessas mediações. O sucesso de um depende do sucesso do outro. Por isso dizemos que o resultado de um processo interessa tanto ao aluno como ao professor. As esco‑lhas de um interferem na performance do outro.

O capítulo que aborda o planejamento e o plano de ensino como artefatos culturais revela e produz a própria prática docente. O plano de ensino, por ser um texto curricular, produz os significados dos objetos dos quais trata, produz identidades pela lógica interna de seus discursos e, por essa perspectiva, podemos utilizá‑lo para favorecer melhores aprendizagens. Ao construir um plano de ensino devemos considerar os objetivos educacionais, didáticos e pedagógicos e a rela‑ção e a importância de cada um e entre eles. Durante a leitura desse

P R O J E T O M AR I S TA PAR A P L A N E JA M E N T O E AVAL I AÇ ÃO

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capítulo é interessante observar como os objetivos didáticos, indica‑dores de aprendizagem, as mediações e avaliação podem dialogar. Por fim, em relação às taxionomias sugeridas, é importante fazer a leitu‑ra não buscando assumir uma posição por uma ou outra, pois não se trata de uma questão de escolha, antes, deve‑se entender como cada uma pode contribuir para nos ajudar a pensar melhor o processo.

O capítulo que trata de avaliação discute os significados de avalia‑ção e como estes podem nos ajudar a relacionar as diferentes funções da avaliação com modos de mediar, com feedback e caixa de diálogo, com instrumentos de avaliação e planejamento de ensino, ou seja, abor‑da a dimensão prognóstica da avaliação. Entendemos que, por meio dos instrumentos de avaliação, das tarefas, por exemplo, podemos contar um pouco do que fazemos em sala de aula. Assim, nessa ideia subjaz outra: planejar para avaliar e, ao avaliar, melhorar o planejar.

Também nesse capítulo, aborda‑se outro aspecto muito impor‑tante: o significado de “nota qualificada/conceito qualificado”. Essa denominação foi utilizada porque a qualidade está entrelaçada a vários outros significados: avaliação, mediação, concepção de apren‑dizagem, conhecimento, conteúdo escolar, aula e outros. É impor‑tante perceber que nenhum conceito está ou pode ser entendido de modo isolado.

Este documento não se esgota nele mesmo, mas sinaliza o cami‑nho e a caminhada. Para aprofundar cada assunto, compondo uma ideia mais ampla, é necessário visitar os diferentes autores que possi‑bilitaram essa síntese, bem como os documentos da Educação Infantil e as Matrizes Curriculares.

Este texto propõe o desafio de ajudar a problematizar a educação que queremos promover para estes tempos e aqueles que virão. Não temos como controlar se cada aluno se empenhará o suficiente para autoproduzir‑se; contudo, nossas escolhas não podem cercear o pen‑samento crítico, nem do professor nem do aluno. Para nosso funda‑dor, segundo Sammon (2006, p. 26), SG, “[...] a educação era mais do

I N T R O D U Ç ÃO

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que um processo de transmissão de informações, fatos e personagens, [...]”, mas “[...] um meio poderoso de formação e transformação das mentes e dos corações das crianças e jovens”.

Assim, este texto pretende disseminar esse pensamento coletivo acreditando que cada um possa se encontrar, se identificar nestas ideias, que não têm ponto final, pois cada um construirá o seu texto, mas “atento aos sinais dos tempos”, como nos ensinou Champagnat.

PLANEJAMENTO DE ENSINO

ISIGNIFICADOS E SENTIDOS

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S I G N I F I C A D O S E S E N T I D O S

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Por outro lado, se o professor entende que o estudante não traz consigo certos saberes, anteriormente construídos e importantes para aprendizagens futuras, e não os reconhece e mobiliza, é provável que trace objetivos que centralizem a ação educativa em suas mãos, o que é evidenciado pelo uso de frases como: “levar o aluno a”, “desen‑volver no aluno”, “trabalhar o conceito de”. As operações cognitivas tendem a ser mais estreitas, pouco complexas e pouco exigentes, envolvendo níveis de aprendizagem mais básicos, como citar, identi‑ficar, apontar, classificar.

Já o plano de ensino é o momento de registro, é o produto do processo de planejamento, e é também processo, porque sua elabora‑ção se dá num movimento de desconstrução e reconstrução como práticas criticamente afirmativas,2 devendo ser aberto o suficiente a alterações, ajustes, manutenções, bem como para manter o impres‑cindível (após reflexões, questionamentos, diálogos com outros inter‑locutores). Sempre com equilíbrio, moderação e fundamentação.

Trata‑se de um ir e vir que não é negativo, não é perda de tempo, não pode ser visto como insegurança, como sentimento de estar per‑dido, mas como um momento em que o professor atualiza suas inten‑ções, um movimento de busca por novas alternativas e possibilidades. Nesse processo, o professor decide o que mantém e o que muda no plano de ensino em relação às suas experiências, tanto para o período letivo em curso como para o posterior, dependendo da sua avaliação.

O cuidado com as modificações deve ser uma constante na prática de planejar, pois alterar um objetivo, por exemplo, significa alterar tam‑bém as ações didáticas, as sequências didáticas, as aulas, a avaliação.

O planejamento de ensino é o contexto, um domínio mais amplo, e o plano de ensino é o texto. É potencialmente interessante pensar o plano como texto, pois texto indica o movimento da tessitura, arte de entrelaçar fios e linhas, trama de signos dotados de sentidos, pro‑dução de linguagem, de signos e significados, organizados como marcas linguísticas, estruturas, relações, em variadas redes de significantes. 2 Corazza, 2003.

1. Planejamento e plano de ensino:diferentes, mas complementares

Planejamento de ensino é processo, discussão, reflexão, negocia‑ção e produção de significado. É espaço‑tempo de construção de conhecimentos pedagógicos, educacionais, curriculares e didáticos. É lugar, mas também momento de diálogo entre os saberes dos profes‑sores e dos estudantes, de problematização, de traçar as possibilida‑des de ensino e aprendizagem.

No planejamento de ensino o que entendemos por (e o modo como o dizemos e o praticamos) ensino, aprendizagem, modos de ser estudante e modos de ser professor é elaborado e mobilizado. Assim, o planejamento de ensino funciona como uma espécie de solo episte‑mológico que é, a um só tempo, produto e produtor de conceitos, de significados, de formas de ver e maneiras de dizer a educação, o cur‑rículo, a escola e os sujeitos – professores e estudantes.

Quando o professor reconhece os saberes dos estudantes e suas culturas, outros objetivos são elaborados, indicando seu papel de potencializar o conhecimento dos estudantes, de mediar outras cons‑truções, ampliar a zona de desenvolvimento proximal 1 dos estudantes. As operações cognitivas presentes nos objetivos didáticos tendem a ser mais complexas, mais exigentes, mais amplas, envolvendo outras ações como compreender, entender, analisar, relacionar, que apon‑tam para o posicionamento crítico, criativo e produtivo do estudante em relação ao que lhe é problematizado.

1 No pensamento de Vygotsky, a zona de desenvolvimento pro-ximal (ZDP) é definida como uma distância (não geométri-ca, não medida, não linear, não definida por limites está-veis) entre aquilo que uma criança é capaz de realizar com uma certa autonomia e aquilo que é capaz de realizar considerando a presença de um elemento mediador, por exemplo, outra criança mais experiente naquela ação, um professor, um recurso cultural. Não se trata de pensar a ZDP como um vazio, mas como uma possibilidade de amplia-ção de conhecimentos, de sig-nificados, da trama de senti-dos. A ZDP é um campo de interações, relações, media-ções em que são produzidas as funções psicológicas supe-riores, como a aquisição de linguagem e o pensamento crítico.

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2. Desdobramento e composição do plano de ensino

Os planos de ensino são múltiplos, pois se referem a maior ou menor período de formação. Há aqueles mais gerais, como os planos anuais, bimestrais, trimestrais, semestrais. Há ainda os de maior detalhamento, como os semanais, quinzenais, mensais, de aula, de unidade, como veremos posteriormente.

Nas escolas da PMBCS, esses dois níveis acontecem concomitante‑mente. Um exemplo disso é o que ocorre nos planos bimestrais/tri‑mestrais em que os professores apresentam objetivos, conteúdos e indicadores de aprendizagem e ainda explicitam e descrevem a aula, ou um conjunto de aulas, construído no percurso ou previamente, as chamadas sequências de ensino‑aprendizagem.

3. Uma cena da vida dos professores:“O plano de ensino engessa a prática”

Nosso primeiro movimento deve ser o de entender o planejamen‑to de ensino como prática pedagógica. De maneira geral, o que obser‑vamos nas narrativas de professores é a organização da prática peda‑gógica dividida em três momentos, a saber:

l antes: o planejamento de ensino;

l durante: a aula, a ação didática, a prática pedagógica;

l depois: a avaliação da aprendizagem.

O que buscamos aqui é considerar o planejamento de ensino como uma prática política e cultural. Uma forma de pensar o ensino no ensino, de pensar a aprendizagem na aprendizagem. Nada separa‑do, distanciado e estanque, mas indissociável, como uma prática social, política e cultural de pensar e experimentar a educação, o currículo, a pedagogia na escola.

P L A N E JA M E N T O D E E N S I N O

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É uma prática de significação.No plano de ensino, exerce-se a autoria. A escrita de planos de

ensino pode ser uma autoria de transgressão, porque pode romper

com as formas hegemônicas de pensar o ensino e a aprendizagem,

porque pode perturbar os códigos fixos que têm determinado os

conteúdos escolares. Uma escrita praticada dessa forma é um movi‑mento de escrita e expressão, que se situa nas margens 3, naqueles lugares privilegiados em que o cotidiano é produzido, em micronarra-tivas – as narrativas de homens e mulheres comuns, daquelas pessoas que produzem conhecimento no cotidiano, na vida cotidiana, opon‑do‑se às grandes narrativas, àquilo que passa pela Grande Verdade, a voz dos vencedores, as classes e grupos sociais dominantes, proble‑matizando e questionando o próprio estatuto do conhecimento e da verdade.

Nas escolas da PMBCS, o processo de planejamento é preferencial‑mente participativo, envolvendo trocas e partilhas de experiências entre os professores da mesma série, de séries e níveis diferentes, da mesma área de conhecimento e até mesmo de outras áreas, rompen‑do fronteiras, alargando os limites, ultrapassando certos significados tomados como verdadeiros e estáveis. O planejamento envolve ainda interações com os estudantes, ou seja, o diálogo entre o professor e seus saberes e as experiências de aprendizagem com os saberes e as experiências que os estudantes já possuem.

Os planos de ensino, atualmente, são expressos por meio de um determinado layout. Há outras possibilidades de se experimentar sua escrita. Não existe, para essa escrita, uma forma única de apresenta‑ção. Assim, não é o layout que determina a qualidade do plano de ensino. Não desconsideramos a perspectiva de que as formas de expressão puxam as formas de conteúdo, mas, neste momento, esta‑belecemos como território de criação de uma escrita nova o diagrama com o qual convivemos.

3 As margens, conforme McLaren & Giroux (2000), se contra-põem àquilo que habitualmen-te entendemos como o centro do pensamento educacional dominante no Ocidente, des-tacando, por exemplo, a racio-nalidade como a forma privile-giada de conhecer. Na escrita educacional, o centro corres-ponde às receitas das taxiono-mias, aos padrões de definir objet ivos didáticos como expressão de mudança de comportamento, geralmente fragmentados e que acabam por isolar em disciplinas os objetos do saber. Uma escrita com base nas margens leva em consideração outras possi-bilidades de conhecer, de pen-sar e experimentar a vida e o mundo, de escrever currículo com traços mais culturais e políticos.

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Assim como o plano de ensino pode ser visto, de forma ampla, como um fluxo organizado de ideias, concepções e saberes, as formas de ensinar também não encerram um fim em si mesmas, podendo orientar formas de aprender, apesar de nem sempre se configurar uma relação tão direta.

Aulas expositivas

a) Centradas nas narrativas do professor, podem gerar como apren‑dizagem a memorização passageira. Porém, a vida dos estudantes dentro e fora da escola é intensa. Eles estão sujeitos a todo tipo de informação, dados os variados espaços socioculturais nos quais circulam. Nesses espaços, há diferentes conhecimentos, diferentes modos de ver o mundo. Tudo isso implica aprendizagens plurais.

b) Centradas nas narrativas do professor, podem gerar ainda apren‑dizagens significativas desde que essas narrativas levem em consi‑deração os saberes dos estudantes, partam de problemas concretos e relevantes, articulem diferentes saberes.

Aulas problematizadoras 4

Por sua vez, potencializam as perguntas, expandem o conheci‑mento, intensificam encontros com outras formas de ver e maneiras de dizer aquilo que se aprende. E mais: abrem ao estudante a possi‑bilidade de pensar o mundo e os saberes com uma narrativa própria, por meio de sínteses pessoais, por exemplo.

Assim, se, por um lado, o plano de ensino tende a controlar o que será ensinado, por outro, as aprendizagens são sempre inesperadas, vazantes, fugidias, mas não ocorrem ao acaso, espontaneamente. O professor‑problematizador deve estar atento a isso e deixar rotas aber‑tas ao fluxo das aprendizagens, preparando situações que instiguem os estudantes a ultrapassar fronteiras, experimentar possibilidades e potencialidades das múltiplas relações com o saber que a escola pode proporcionar.

4 Aula problematizadora é aque-la caracterizada pela constru-ção do conhecimento que se inventa e reinventa, favore-cendo sua compreensão e não sua aquisição como um dogma, como uma verdade imutável. Uma aula que tem perguntas inquietantes e que propõe experimentar outros pensa-mentos e outras pluralidades das práticas de linguagem.

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E é por meio do plano de ensino que o professor exerce a autoria dessa escrita que cria, mobiliza e revela as concepções, os significa‑dos, suas crenças e seus desejos, podendo, ainda, indicar como irão acontecer as aulas, as mediações, o processo avaliativo, as remediações.

Se essa escrita, por um lado, pode engessar a prática, por outro, também pode quebrar o que limita os movimentos. Engessa quando o professor predetermina o que será ensinado e aprendido e não (se) abre para o inesperado, não exerce o movimento do ir e vir ao plano de ensino, não faz adequações, nem revisões, não estabelece conexões com o mundo exterior, não promove diálogos com as culturas infan‑tis e juvenis. Se o professor cumpre programas, segue roteiros prefi‑xados, apenas dá aulas e não as cria, está simplesmente se limitando aos códigos existentes. Nesse caso, o foco do professor é ele mesmo, representado pelos conteúdos que narra. Nessa perspectiva, o ensino é tomado como um fim, uma ação última, podendo se dar fora de contexto, e atribuindo à avaliação, sobretudo, a função de verificar o que o estudante é capaz de reproduzir.

Mas o plano de ensino liberta os movimentos, se o professor acei‑ta que o processo de ensino e aprendizagem é dinâmico e que o plano não é capaz de controlar tudo, sendo necessárias mudanças durante o percurso. Assim, o professor assume a condição de protagonista, tornando‑se autor, escritor (na relação estabelecida entre professores, estudantes e conteúdos, nas interações e mediações), exercendo uma função de criação e de produção, não se tornando refém dos livros didáticos e de outros manuais. O foco é a aprendizagem do estudante. Esse professor age com critérios e rigor que servem para preparar suas aulas e ainda os instrumentos a serem utilizados na avaliação. Por isso, os bancos de questões passam a ser entendidos como fontes para inspirar professores a preparar suas próprias questões, podendo eles mesmos fornecer boas questões para as aulas, para os instrumentos de avaliação e lições de casa.

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O primeiro programa organizado de escolarização universal foi criado por Comenius, em meados do século XVII, com a Didactica magna (subtítulo: Como ensinar tudo a todos). Entretanto, a democra‑tização do acesso à educação formal levaria séculos para se tornar realidade. Até o início do século XIX, apenas os filhos da burguesia (europeia) tinham acesso à escolarização. Porém, a necessidade de qualificar a mão de obra para as atividades industriais cada vez mais exigentes e unificar as diferentes culturas que chegavam às cidades industriais motivaram a progressiva democratização do ensino. Assim, já no final do século XIX, a maior parte dos países industrializados tinha conseguido reduzir drasticamente a taxa de analfabetismo.

No Brasil, com a Revolução de 1930, criou‑se o Ministério da Educação e Saúde Pública para atender à crescente demanda de mão de obra especializada que as indústrias solicitavam. Ao longo da História, podemos acompanhar esse “pacto” silencioso (ou, por vezes, declarado) entre demanda social e currículo. Hoje, são os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Fundamental e Ensino Médio e os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil que atendem a essas demandas. Mas quais são elas? Será que fazemos a leitura crítica desses referenciais? Temos a opor‑tunidade de elaborar o currículo de nossas escolas, mas em quais referencias nos pautamos?

6. Plano de ensino: um texto curricular

O plano de ensino, segundo Silva (2003), pode ser pensado como texto curricular porque:

l produz e disciplina os significados;

l autoriza certos grupos e certas concepções, desautorizando

outros, dá voz e visibilidade a certas concepções e não a

outras;

P L A N E JA M E N T O D E E N S I N O

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4. Planejamento e plano de ensino:artefatos socioculturais

O planejamento e o plano de ensino são materialidade, uma espé‑cie de produção que possibilita entender e influenciar os processos de ensino e os processos de aprendizagem.

Nas Escolas Maristas da PMBCS, o planejamento e o plano de ensi‑no são tomados como um artefato – marcado pelas concepções de uma determinada espacialidade e de uma determinada historicidade – com o qual lutamos por significados mais éticos do que seja ensinar e aprender, do que seja estudante e professor, escola, currículo, edu‑cação. Por tudo isso, podemos pensar o planejamento/plano de ensi‑no como um texto político e cultural.

5. O planejamento de ensino e sua história

De acordo com Corazza (2003, p. 109), o planejamento de ensino pode ser pensado, histórica e genealogicamente, no contexto do “aparecimento da escola de massa, como solução para necessidades práticas de controle e regulação de uma nova categoria de análise e de governo, isto é, a população” . Com isso, o que vemos é que a criação do planejamento localiza‑se nos saberes e nas práticas econômicas, comerciais e industriais, uma vez que “a economia capitalista foi a primeira a colocar a necessidade de fazer planos, antes de agir, como requisito para o desenvolvimento das áreas comercial e de vendas” (idem, p. 110). Aos poucos, as novas organizações do trabalho e da produção no setor industrial exigiram planejamentos mais rigorosos, “que fizessem deste trabalho algo racional, eficaz e eficiente, a custos menores” (idem, p. 111). Essa prática de planejar as intervenções esten‑deu‑se progressivamente para os governos – capitalistas e socialistas –, sendo expressa pelas políticas públicas dos mais diversos setores.

S I G N I F I C A D O S E S E N T I D O S

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7. Outra cena da vida dos professores:“O plano de ensino estrutura e organiza o ensino”

O plano de ensino orienta a prática, dá uma espécie de norte, mas não pode restringir as possibilidades e perspectivas dessa prática. Não deve uniformizá‑la, mas, sim, dar‑lhe unidade, com coerência e con-sistência, admitindo as diferenças, novos rumos e olhares. O plano de ensino tem seus limites, seus entraves. Porém, sem ele, nossa ação e intervenção em uma prática educativa, como uma política cultural, ficam prejudicadas. As chances de desenvolver e de mediar boas aulas com base em bons planos de ensino são maiores.

Elaborar planos de ensino e colocá‑los em ação é um exercício ético e um compromisso político dos professores. Aqui, há um problema importante a ser discutido: é interessante pensar o planejamento de ensino como algo além de uma ferramenta que organiza a prática. O planejamento e o plano de ensino criam, inventam, potencializam novas formas de ensinar e aprender.

a) O planejamento de ensino é em si mesmo uma prática peda-

gógica, cultural, social e política. Isso implica considerar que

a prática pedagógica acontece antes da aula, já na etapa de

planejamento. Sua escrita é uma prática cultural, social e polí-

tica.

b) O planejamento de ensino configura uma prática baseada em

uma teoria, ou seja, duas construções epistemológicas que

acontecem juntas, o tempo todo. Não há nada mais prático

do que uma boa teoria. Na contemporaneidade, a teoria é

vista como um discurso sobre um determinado objeto do

conhecimento, que pode ser desconstruído e reconstruído e

que produz aquilo que passa por real, não mais visto como

uma verdade absoluta e inquestionável. Enfim, teoria e práti-

ca não são dicotômicas, são expressões usadas para tratar de

um mesmo objeto.

P L A N E JA M E N T O D E E N S I N O

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l fabrica os objetos epistemológicos, ou seja, os saberes de

uma determinada área do conhecimento, com base em léxico

e vocabulário próprios;

l constitui e institui o real que lhe serve de referente;

l inventa a escola e os sujeitos, suas ações e suas práticas cul-

turais;

l gera textos e discursos como aulas e também instrumentos

de avaliação;

l relaciona-se ao movimento da indústria cultural (livros didáti-

cos, paradidáticos, recursos audiovisuais).

Assim, se entendemos por currículo tanto a relação entre con‑teúdos ensinados, as formas e possibilidades de aprender e as identi‑dades que se criam nessa relação, quanto o resultado de uma seleção baseada em critérios contextualizados social e historicamente para atender a determinados interesses sociopolíticos e culturais, podemos inferir que o plano de ensino é um texto curricular, uma vez que esses elementos estão imbricados na sua escrita.

No currículo, podemos fazer as seguintes perguntas: O que ensi‑nar? Como ensinar? Por que ensinar isso ou aquilo? Para que ensinar? O que queremos com o ensino? Quais os seus efeitos? A que interes‑ses servimos? E o plano de ensino como texto curricular pode res-

ponder a essas perguntas por meio dos objetivos, dos indicadores

de aprendizagem, da maneira como escrevemos os conteúdos, das

formas de ensinar que selecionamos, dos instrumentos utilizados

no processo avaliativo. O plano de ensino pode ainda problematizar o próprio processo de ensino‑aprendizagem, lançando‑nos outras perguntas.

S I G N I F I C A D O S E S E N T I D O S

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8. O planejamento e o plano de ensino:território de luta cultural pelos significados

Nos momentos de planejamento de ensino, construímos e nego‑ciamos os significados e os sentidos do que seja ensinar, aprender, de conhecimento e conteúdos, de sujeitos (da educação, da escola, do currículo). Assim, o planejamento e o plano de ensino apresentam‑se como um espaço-tempo de produção de sentidos e daquilo que passará a constituir também o próprio cotidiano pedagógico.

Planejar o ensino e refletir sobre as aprendizagens tornam‑se espaços de tensões positivas e construtivas, um jogo de força, rela‑ções de poder. Nesse espaço complexo, o plano de ensino expressa também as concepções que temos sobre cultura, gênero, sexualidade, ética, religião, política, estética, o valor da subjetividade e tantos outros temas que são explicitados ou não, de um jeito ou de outro.

Essas concepções e reflexões tecem o processo e o produto da ação de planejar o ensino. Se optamos por determinada forma de escrever nossos planos de ensino é porque pensamos educação, currículo, ensi‑no e aprendizagem e professor e estudante de um modo particular.

9. Plano de ensino:mecanismo eficiente de subjetivação,de produção de modos de ser sujeito

O plano de ensino produz pessoas, tipos e modos de ser sujeito, estudante e professor. Produz posições sociais e culturais – posições de sujeito – assumidas por professores e estudantes, que são designados a ocupá‑las. Cidadão, crítico, responsável, autônomo, flexível, solidá‑rio, comunicador, pesquisador, ético, aberto ao transcendente, livre, detentor das normas‑padrão das diferentes linguagens presentes na escola... São esses os sujeitos do currículo que queremos? Se queremos

P L A N E JA M E N T O D E E N S I N O

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c) O planejamento é muito mais do que um mero organizador

do ensino. Restringir seu significado à dimensão exclusiva-

mente técnica é abrir mão de todo um processo de constru-

ção de formulações e entendimentos em torno do que seja

ensinar e aprender. Assim, a ação de planejar assume a todo

instante uma dimensão reflexiva, metacognitiva 5, cultural e

política.

d) O plano de ensino, por sua vez, não controla a ação educativa

porque nem todas as ações são previsíveis e asseguráveis.

Concebido como processo e produto, as aprendizagens e as

ações de ensino fluem, escapam. A complexa interação que é

a ação de ensinar e aprender é essencialmente dinâmica, ou

seja, para o mesmo plano de ensino, podemos encontrar dife-

rentes práticas, diferentes situações, diferentes aulas. As

características pessoais (e intransferíveis) de professores e

estudantes produzem diferentes ensinos e diferentes aprendi-

zagens. Um detalhe, uma pergunta de um estudante, um

assunto que acabou de sair num jornal modificam a aula,

perturbam (positivamente) o plano de ensino. Todavia, deve-

mos tomar cuidado para que a unidade dos processos peda-

gógicos não se perca.

A dimensão da organização presente no planejamento pode estar centrada na razão, na racionalidade técnica. Por que não nos valermos também da intuição, da sensibilidade, da percepção, da sensação, da arte para planejar?

5 A noção de metacognição aponta para um movimento de pensar sobre o próprio pensa-mento, de pensar suas apren-dizagens. Neste caso, pode ser interessante para o professor pensar sobre a própria prática ao planejar, gerando um movi-mento de avaliação (autoava-liação) e de traçar outras e novas perspectivas para o seu trabalho docente.

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P L A N E JA M E N T O D E E N S I N O

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assim, o que é preciso ser feito? O que faremos deles e com eles? E como esses sujeitos podem agir nos e com os nossos planos?

As características do estudante marista (ser solidário, comunica‑dor e pesquisador), bem como os princípios pedagógicos maristas, considerados na elaboração de objetivos e na escolha dos conteúdos ensináveis, têm a finalidade de forjar uma certa subjetivação, de pro‑duzir certos sujeitos particulares.

10. Por que fazemos planos de ensino

Há quem acredite que os planos de ensino são necessários somen‑te para fins burocráticos. Eles servem também para esse fim. As supervisões de ensino dos órgãos públicos que acompanham nossas escolas observam esses documentos nas visitas que realizam, assim como fazem com os diários de classe. Contudo, é insuficiente pensar o plano de ensino por essa perspectiva.

Nas escolas da PMBCS, damos atenção às exigências burocráticas, mas o plano de ensino serve a outros interesses, como: atender nosso modo de trabalho, materializar nossas concepções de ensino e apren‑dizagem, inscrever‑se no movimento contínuo de formação e qualifi‑cação profissional, constituir instrumento de reflexão sobre a prática, apontar (associado à avaliação) o modo como professores e estudantes percorrem o currículo escolar, problematizam e qualificam o proces‑so de ensino‑aprendizagem e avaliação.

IICOMPOSIÇÃO

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CO M P O S I Ç ÃO

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Há outros que se referem aos componentes curriculares e às séries, ou seja, tratam daquilo que uma determinada disciplina do quadro/grade curricular da escola pretende possibilitar aos estudantes numa determinada série. Esses objetivos são classificados como pedagógicos.

Há ainda aqueles que se referem diretamente ao processo de ensino‑aprendizagem e avaliação, que desenham o caminho percorri‑do por professores e estudantes no currículo escolar e são expressos pelas aprendizagens dos estudantes e pelas mediações dos professores. Esses objetivos aparecem nas matrizes curriculares e nos planos de ensino (anuais, semestrais, trimestrais, bimestrais), por isso são cha‑mados de objetivos didáticos.

Em síntese, os objetivos educacionais e pedagógicos não expressam num primeiro plano a ação do estudante, mas, antes, a intenção da escola, do componente curricular, da série. Esse é o caso dos exem‑plos a seguir:

l A escola tem por finalidade o pleno desenvolvimento do

aluno, seu preparo para o exercício da cidadania e sua quali-

ficação para o trabalho, propiciando uma educação inspirada

nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade

humana, contemplando ainda a continuidade dos estudos –

Objetivo Educacional.

l Possibilitar a leitura, interpretação e representação dos fenô-

menos geográficos – naturais, sociais, políticos, econômicos

e culturais – com base no entendimento das relações socie-

dade-espaço em suas diversas territorialidades, desde a local

até a mundial – Objetivo da Área de Geografia (Pedagógico).

l Apreender o sentido histórico da ciência como possibilidade de

leitura e compreensão de fenômenos naturais observados, ana-

lisando seu desenvolvimento, como construção humana, por

acumulação, continuidade e/ou rupturas de paradigmas a fim de

relacionar o avanço científico e tecnológico às transformações

1. O que existe no planejamento de ensino?E no plano de ensino?

No planejamento de ensino, podemos apontar: diálogos, refle‑xões, estudos, negociações, análises, sínteses, partilhas, questiona‑mentos, problematizações, conflitos. Se quisermos ter a história dos nossos processos é importante registrá‑los em atas para compor a memória pedagógica da escola e contribuir com os processos de for‑mação de professores.

E no plano de ensino, temos: objetivos – da escola, do componen‑te curricular, da série, didáticos (anuais, semestrais, bimestrais, tri‑mestrais) – eixos estruturantes, conteúdos (conceituais, procedimentais e atitudinais), indicadores da aprendizagem e ações didáticas.

2. Objetivos (didático, pedagógico, educacional):o que são

Em nossa prática de planejamento, podemos localizar a ocorrên‑cia concomitante de diversos objetivos, conforme sua abrangência.

Há aqueles objetivos mais amplos, que se referem às intenções da escola e que estão presentes na Proposta Pedagógica/Projeto Político‑Pedagógico: são os objetivos da escola. Denominados em nossa práti‑ca objetivos educacionais.

CO M P O S I Ç ÃO

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Para quê? Para entender os processos que produzem o mundo

contemporâneo.

Assim, “o que” refere‑se ao conteúdo, “como” sinaliza as estraté‑gias a serem utilizadas e “para que” refere‑se à finalidade (diretamente relacionada com os processos de construção dos sujeitos), numa pers‑pectiva de continuidade.

O objetivo didático é, pois, o meio pelo qual certas construções mentais tornam‑se possíveis, não sendo apenas um fim em si mesmo. Essas construções mentais são mais complexas e maiores do que os objetivos praticados nos trimestres/bimestres e, às vezes, até mesmo nos anuais. Dessa forma, os objetivos bimestrais/trimestrais devem estar a serviço dessas construções mentais.

O objetivo didático já foi entendido como mero comportamento observável num período em que aprender significava mudar o compor‑tamento. Porém, pautados em construções teóricas mais contempo‑râneas, assumimos que o objetivo corresponde à ação do estudante no processo de ensino, e aprendizagem, à intenção do professor ao longo de um determinado tempo didático. Indica ainda perspectiva, sentido, direção do processo de ensino, aprendizagem e avaliação e mais os resultados da aprendizagem (o que o estudante aprendeu) ao final de um período letivo.

Os objetivos, independentemente da sua classificação, tais como foram elaborados pelas pedagogias liberais, chamadas de tecnicistas e comportamentalistas, são estreitos, limitados e pontuais. Eles até podem ser utilizados como indicadores da aprendizagem em nossa proposta, pois contribuem para sinalizar com certa precisão os per‑cursos da aprendizagem. Ainda, o objetivo é uma espécie de energia que deflagra o movimento de professores e estudantes no currículo, desencadeando a criação do processo de ensino‑aprendizagem por meio do estabelecimento de limites flexíveis da ação pedagógica, tratando‑se, portanto, de uma decisão política.

P L A N E JA M E N T O D E E N S I N O

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da sociedade e do ambiente – Objetivo da Área de Ciências

Naturais (Pedagógico).

l Favorecer a compreensão da Dimensão Religiosa –

Religiosidade – e a identificação das diferentes formas utili-

zadas pelas comunidades para expressar a relação com o

transcendente – Fenômeno Religioso –, por meio do estudo

da pluralidade cultural religiosa, para a busca de respostas

norteadoras do sentido da vida, em vista da superação da

finitude humana, a fim de contribuir na construção do proje-

to de vida do aluno – Objetivo da Área de Ensino Religioso

(Pedagógico).

Por sua vez, os objetivos didáticos expressam o que o estudante poderá e deverá fazer (com certa autonomia) ao final de um determi‑nado período didático. Portanto, tais objetivos não se referem à ação do professor. Vejamos essa reflexão nos exemplos abaixo:

l Desenvolver o conceito de globalização por meio da leitura de

diferentes textos para entender os processos que produzem o

mundo contemporâneo é uma escrita que considera que o

estudante é quem desenvolverá tal conceito por meio de lei-

turas, pesquisas, interpretações, comparações, argumenta-

ções e sínteses. Os objetivos didáticos expressam aquilo que

os estudantes deverão realizar.

Os objetivos não devem expressar APENAS “o que ensinar”, mas devem procurar (sempre que possível) contemplar “como”, “por que” ou “para que”, para dar os contornos, embora flexíveis, ou para deli‑mitar ou dar amplitude ao objetivo e, assim, contextualizar o ensino e a própria aprendizagem do estudante. O exemplo anterior mostra essa relação:

O quê? Desenvolver o conceito de globalização.

Como? Por meio da leitura de diferentes textos.

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3. Objetivos didáticos no plano de ensino

Os objetivos didáticos podem ser anuais, semestrais ou bimes‑trais/trimestrais. A seguir, veremos em que eles diferem.

l Objetivos anuais: são os mais abrangentes, articulam-se dire-

tamente com o objeto de estudo da série/ano/componente

curricular e com os eixos estruturantes. São eles que geram e

produzem os conteúdos trimestrais/bimestrais. Por esse moti-

vo, não precisam de complementos: “como” e “para quê”.

l Semestrais: assemelham-se aos anuais, porém são menos

abrangentes.

l Bimestrais/trimestrais: são mais específicos, apresentam em

detalhes o objeto a ser estudado e como se associa ao obje-

tivo anual. É muito frequente encontrar objetivos trimestrais

no planejamento anual. Há professores que escrevem, por

exemplo, três objetivos didáticos anuais, sendo um para cada

trimestre. Isso deveria ser revisto, pois é mais interessante

mostrar como o objetivo de um determinado trimestre se

relaciona com o objetivo didático anual, ou como o anual se

desdobra nos trimestrais, para evidenciar a progressão das

aprendizagens. Vejamos um exemplo disso:

Objetivo didático anual de ER: Compreender por meio da simbo-

logia presente nas diferentes tradições religiosas a formação da

religiosidade do povo brasileiro.

Objetivo didático de um dado trimestre: Conhecer a simbologia

presente na religiosidade indígena por meio de comparações, para

compreender a formação da religiosidade do povo brasileiro.

Não esquecer: os objetivos didáticos devem conter, sempre que possível, “o que ensinar”, “como ensinar”, “para que/por que ensinar”. São mais complexos do que a tradicional fórmula verbo + conteúdo (em geral, um substantivo). Por esse motivo, aparecem em número mais

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Podemos associar o objetivo ao Conhecimento Potencial de Vygotsky, como algo que está distante, que ainda não é real, que ainda não é do repertório do estudante e que necessita de mediações para ser atingido. O Conhecimento Potencial situa‑se numa Zona de Desenvolvimento Proximal, um espaço psicológico, que articula o Conhecimento Real do estudante – aquilo que o estudante já sabe, as conexões, as articulações – ao Conhecimento Potencial – aquilo que o estudante ainda não é capaz de fazer sem ajuda. Nessa perspectiva, ensinar significa criar situações e estratégias que fomentem zonas sucessivas, e cada vez mais ampliadas, de desenvolvimento proximal e nelas intervir para desenvolver certas funções psicológicas superiores, que ainda não se formaram completamente e necessitam de media‑ções sociais para tanto. Assim, o objetivo pode ser tratado como potencial de aprendizagem.6

Conforme Giroux (1997), os objetivos podem ser pensados a partir dos macro‑objetivos que: fornecem os blocos teóricos; possibi‑litam as conexões entre os métodos, conteúdos e estrutura de um curso e estabelecem sua importância para a realidade social; possibi‑litam a construção de significados mediante a articulação das expe‑riências escolares e a vida cotidiana; permitem a análise dos conteúdos, valores e normas de um curso em relação aos fins pretendidos e aos meios utilizados; permitem diferenciar o conhecimento diretivo (para que fim?) do produtivo (instrumental, de aplicabilidade restrita e res‑tritiva); explicitam o currículo oculto; desenvolvem a consciência crítica e política dos estudantes.

Elaborados de forma clara, os objetivos permitem aos sujeitos do currículo – professores, estudantes e famílias – entender do que se trata o currículo e se situar nele.

6 Moreira, 1999.

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segundo grupo, como a de Meirieu, são importantes pela reflexão que fazem sobre a natureza social do conhecimento e da aprendizagem, com foco nos contextos sociais. Por isso, as taxionomias interessam aos professores: elas auxiliam na tomada de decisão quanto à operação cognitiva a ser desenvolvida e na escrita do próprio objetivo.

Também convém que os professores cuidem da atualização – filo‑sófica, psicológica, pedagógica – dessas taxionomias. Prestar atenção às concepções que sustentam tais proposições, pois a orientação teó‑rico‑metodológica define as classes, as categorias de operações cogni‑tivas com as quais lidamos, por meio do componente curricular. Vale destacar que as concepções que tínhamos de conhecimento nos anos 1950 não são mais as mesmas. Hoje, recorremos a elas porque possi‑bilitam que reorganizemos nossas operações cognitivas acerca do planejamento e que, inclusive, as problematizemos.

Algumas dessas taxionomias enfocam, principalmente, aspectos cognitivos, deixando de lado outras dimensões, tais como: aspectos motores, afetivos, atitudinais, culturais. Devemos prestar atenção também a esses aspectos.

A questão das taxionomias

As taxionomias ocuparam posição de relevo nas discussões e pro‑duções educacionais no período que se estende de meados da década de 1950 à década de 1970. A pedagogia dos objetivos e o que se cha‑mou, no Brasil, de tecnicismo são aplicações dessas formulações. A técnica de planejar, de escolher verbos, de identificar os comporta‑mentos observáveis são traços marcantes desse período.

Existem inúmeras taxionomias. A seguir, mapeamos algumas delas com base em diversos manuais de didática 7:

7 Carvalho, 1979; Martins, 1986; Mattos, 1970; Meirieu, 1998; Nérici, 1991; Penteado Junior, 1958; Schmitz, 1993.

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reduzido, variando conforme a quantidade de aulas do componente curricular. Em geral, trabalhamos com aproximadamente dois ou três objetivos por trimestre.

4. Como considerar as taxionomias

As taxionomias tratam de organizar e classificar operações cogni‑tivas (expressas pelo verbo) segundo uma certa escala de complexi‑dade. Por isso, elas não podem ser entendidas como meras listas que oferecem verbos para o planejamento de ensino. Dependendo da fun‑damentação teórica utilizada pelos autores de taxionomias, o resulta‑do é diferente, surgindo várias propostas taxionômicas.

Utilizar taxionomias, desde que tenham fundamentação teórica coerente com a concepção de currículo, pode ser uma perspectiva válida, pois permite que entendamos o caminho complexo da cons‑trução mental que o verbo indica no objetivo, ou seja, o verbo é uma tradução (e, às vezes, chega a ser uma redução) da operação mental a ser desenvolvida, mobilizada. Vejamos o seguinte exemplo.

Citar números primos. Esse citar refere‑se a uma operação mental pouco complexa para estar em um objetivo didático. O caminho per‑corrido pelo estudante para chegar ao citar é estreito e não possibilita problematização. O citar não é arranjado segundo uma variedade de outras operações mentais, está muito mais para um indicador que permite observar outra operação mental. Já um entender, compreender, conhecer traça um caminho mais interessante, mais complexo, mais intenso a ser percorrido.

Devemos explorar o que as taxionomias têm de melhor. É mais produtivo e interessante mapear diferentes taxionomias, pois os enfo‑ques são diversificados. Algumas são muito cognitivistas, outras já apresentam uma relativa abertura para as perspectivas socioculturais. As primeiras, como a de Bloom, são úteis pela sua precisão. Já as do

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— caracterização: capacidade de construir um sistema de valores

coerentes.

l Domínio psicomotor: referente ao uso e à coordenação dos

músculos, ligado às habilidades motoras usadas na escola.

— percepção: aquisição, pelos sentidos, de pistas para guiar a ati-

vidade motora;

— posicionamento: não executa os movimentos, mas dispõe o

corpo de forma correta;

— mecanização: referem-se a ações executadas integralmente;

— completo domínio de movimentos: ausência de erros, maestria

dos movimentos, consistência dos movimentos.

Gilbert e Viviane de Landsheere (década de 1970)

A discussão central situa‑se na provável impossibilidade de se trabalhar com a noção de sequência que certas taxionomias tendem a fixar. Assim, nem sempre é possível classificar o domínio ao qual pertence um dado objetivo. O que se busca com as taxionomias são as articulações de diferentes domínios e dos diferentes níveis de ope‑rações mentais dentro de um mesmo domínio.

Eisner (1967)

Indica três pontos‑chave: o caráter complexo e dinâmico do ensi‑no, a amplitude do conhecimento e os objetivos como critérios de avaliação curricular. O autor afirma que a educação é antes um pro‑cesso que um resultado, que a ênfase deve ser retirada dos objetivos e transferida para os processos pelos quais os seres humanos se edu‑cam e aprendem. Assim, ao enfatizar o processo, a atenção se volta ao conhecimento e à compreensão, opondo‑se à ênfase nos objetivos, que centram a atenção na informação e nas capacidades. Esta diferen‑ciação indica o rumo que o planejamento curricular (de ensino) toma quando privilegia esta ou aquela representação. A complexidade de

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Benjamin Bloom e outros (1952)

Os objetivos educacionais devem ser descritos de forma tal que

seja possível identificar as mudanças que são esperadas nos estu-

dantes, isto é, os modos como eles modificam seus pensamentos,

seus sentimentos e seus comportamentos. Essa taxionomia, voltada à avaliação, define os campos de conduta para dar fundamentação à posição dos objetivos no planejamento de ensino, que são os domí‑nios: cognitivo, afetivo e psicomotor.

l Domínio cognitivo: inclui os aspectos relativos à construção

do conhecimento e destina-se fundamentalmente à avalia-

ção. Apresenta os seguintes níveis:

— conhecimento: de fatos, termos, teorias etc.;

— compreensão: entendimento do significado;

— aplicação: capacidade de aplicar os níveis anteriores em situa-

ções novas e concretas;

— análise: capacidade de decompor em partes e ver as relações;

— síntese: capacidade de reagrupar as partes em uma relação nova

e significativa;

— avaliação: capacidade de julgar com base em critérios explícitos

e coerentes.

l Domínio afetivo: considerado referência não só ao aprendi-

zado em sala de aula, mas a todos os valores e atitudes que os

estudantes aprendem. Não há separação em relação ao domí-

nio cognitivo. As categorias afetivas são:

— recepção: disposição de prestar atenção;

— emissão de respostas: disposição de participar;

— valorização: capacidade de atribuir valor às coisas (aceitar, justi-

ficar, preferir, comprometer, compartilhar);

— organização: capacidade de reunir, comparar, relacionar valores

separados;

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— forem tomados como descritivos, ou seja, se descrevem o

tipo de conduta esperado, como o conteúdo, o comporta-

mento ou o contexto no qual essa conduta se aplica;

— forem evolutivos;

— representem caminhos para ser percorridos e não pontos

terminais;

— forem reais e incluírem somente o que pode ser transportado

para o currículo e para as experiências de aprendizagem (de

aula);

— forem amplos e expressarem todos os resultados pelos quais

a escola responde.

Romey (década de 1970)

Sua taxionomia expressa diferentes níveis de comportamento:

— comportamentos simples-mecânicos: rememorar, definir, lis-

tar, explicar;

— comportamentos medianamente exigentes: achar, fazer, com-

putar, identificar, reconhecer;

— comportamentos referentes às operações cognitivas mais

complexas: provar, analisar, comparar, contrastar, relatar, jus-

tificar, interpretar;

— comportamentos referentes ao pensamento original: inferir,

prever, descobrir, reorganizar, generalizar, discutir.

Gagné (décadas de 1960/1970)

Para o autor, há uma hierarquia de conhecimento e comporta‑mento que abrange desde fatos mais simples até os mais complexos e abstratos. A sequência dos diferentes tipos de desempenho na apren‑dizagem é a seguinte:

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expressar os objetivos comportamentais levou Eisner a propor os objetivos expressivos, que proporcionam ao professor um convite a explorar, a enfocar a diversidade do estudante. A educação é vista, pelo autor, como um processo e não apenas como resultados.

Popham (1972)

A classificação dos objetivos estabelece duas categorias: os com‑portamentais e os não comportamentais, sendo agrupados em domí‑nio cognitivo, afetivo e psicomotor:

l Domínio cognitivo: refere-se ao conhecimento, à informação

ou à capacidade intelectual;

l Domínio afetivo: refere-se aos sentimentos e às emoções

expressos em atitudes;

l Domínio psicomotor: refere-se ao uso da coordenação dos

músculos.

Esteves (1968)

Classifica os objetivos em gerais (complexos, amplos, precisam de mais tempo para ser atingidos) e específicos (simples, concretos e de curto prazo).

Hilda Taba (1975)

Sua proposta de taxionomia oferece uma estrutura que explicita os níveis de complexidade das disciplinas que aparecem no currículo, requerendo um juízo ordenado dos aspectos considerados importan‑tes. Para a autora, os objetivos têm uma variedade de funções, sendo as mais importantes: orientar as decisões sobre a seleção de conteú‑dos e as experiências de aprendizagem, e proporcionar critérios sobre o que deve ser ensinado e como deve ser ensinado. Tais funções serão atendidas se os objetivos:

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D’Hainaut (década de 1970)

Estabelece as seguintes atividades (e não comportamentos obser‑váveis) como respostas dadas pelos estudantes:

1. Reprodução ou repetição: repetição pura e simples do que

foi aprendido anteriormente numa mesma situação; enun-

ciar, reconhecer.

2. Conceituação: dar uma resposta comum a toda uma série de

situações que possuem aspectos comuns; reconhecer, identi-

ficar, classificar.

3. Aplicação de regras: respostas novas a uma classe de situações

já conhecidas; calcular, prever, aplicar, utilizar, determinar.

4. Mobilização e associação de respostas: dar respostas a situa-

ções novas; imaginar, criar, variar.

5. Resolução de problemas: numa situação nova o estudante é

capaz de encontrar soluções satisfatórias;

Meirieu (1998)

As operações mentais são agrupadas em quatro grandes tipos: dedução, indução, dialetização e divergência:

l Dedução: é o ato intelectual por meio do qual o sujeito é leva-

do a inferir uma consequência de um fato, de um princípio,

de uma lei, de uma regularidade. Deduzir é colocar pela pers-

pectiva das consequências de um ato ou afirmação, é per-

guntar “se isto é verdadeiro, o que isso implica?”, “se eu fizer

isso, o que vou produzir como reações?”. Tal operação é soli-

citada nos raciocínios matemáticos, pois a dedução nada

mais é que a prova dos fatos, a prova do efeito. A escola pode,

ao trabalhar com esse nível, criar situações hipotéticas nas

quais o estudante possa vivenciar, analisar situações-problema

“sem consequências”, experimentando, tendo a oportunidade

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1. Aprendizagem de sinal: reflexo condicionado, resposta a

uma observação.

2. Aprendizagem de resposta e estímulo: uma resposta para

determinado estímulo.

3. Encadeamento: ligação em cadeia das respostas a um estí-

mulo.

4. Associações verbais: aprendizagem de cadeias verbais, por

exemplo, memorização.

5. Discriminação múltipla: aprendizagem de uma série de

cadeias simples, por exemplo, diferenciar os nomes de vários

objetos.

6. Aprendizagem de conceito: aprender a dar resposta a uma

classe de estímulos que, aparentemente, podem divergir, por

exemplo, uso de conceitos sobre família, população.

7. Aprendizagem de princípios: aprender a cadeia de vários

conceitos.

8. Resolução de problemas: aprendizagem realizada por meio

dos vários princípios.

Mager e Beach (década de 1970)

Inspirados em Gagné, estabelecem as seguintes categorias de objetivos:

1. Discriminação: distinção entre uma coisa e outra, compara-

ção.

2. Resolução de problemas: tomar decisões sobre o que e como

fazer.

3. Recapitulação: consciência plena do que fazer.

4. Manipulação: saber como fazer.

5. Discurso: saber como expressar.

CO M P O S I Ç ÃO

59

A divergência permite explorar novas explicações, cria rela-

ções diferenciadas e soluções inéditas, possibilita estabelecer

relações com a criatividade, colocando em jogo a afetividade

e o imaginário.

No uso das taxionomias, é importante deixar claro que, na maioria das atividades escolares, as operações mentais exigidas dificilmente são isoladas, articulando‑se, com frequência, entre si. Nesse caso, o mais simples é identificar a operação mental dominante e organizar as ações didáticas em função dela, tomando cuidado para introduzir os recursos necessários. O importante aqui é o procedimento didático que será utilizado para questionar a respeito não só do que se quer que o estu‑dante saiba, pense, fale, escreva, mas sobre o que “se passa em sua cabeça” – as articulações que estabelece, as conexões que promove, as junções que viabiliza –, para que chegue onde quer.

As ações didáticas devem estar centradas em objetivos-núcleo,

permitindo que os estudantes ultrapassem certa concepção/visão

de mundo, das coisas, do saber, para alcançarem um estágio supe-

rior de compreensão. Não basta querer que o estudante concentre a aquisição do conhecimento em um ponto específico. Devemos nos questionar em que nível de complexidade e de abstração essas aquisi‑ções devem ser apresentadas para serem acessíveis e constituírem uma progressão decisiva. O primeiro estágio do procedimento didá‑tico consiste em levantar um número limitado de noções essenciais e em determinar seu registro de formulação para que corresponda a um nível de compreensão dos estudantes. O importante é que o estu‑dante perceba o sentido do que está sendo trabalhado, que possa enfrentar a complexidade da situação, e não seja levado a vê‑lo diluir‑‑se em uma quantidade de exercícios justapostos sem significado.

P L A N E JA M E N T O D E E N S I N O

58

de observar e perceber que se a situação fosse real teria

consequências.

l Indução: é o ato de poder ir do simples agrupamento de obje-

tos com uma característica comum à mais rigorosa conceitu-

ação, do estágio sensório motor (Piaget), ao estágio das ope-

rações concretas ou formais. Aqui, a hipótese é posta à prova

dos fatos que apresentam sua ação final. A dedução passa do

único ao múltiplo, a indução passa do múltiplo ao único. A

indução é uma operação essencial à medida que permite

alcançar abstração, portanto vencer a opacidade do mundo, a

“dispersão do sensível”, conforme Platão. O procedimento

indutivo permite realizar as atividades de formas diversas,

dando aos estudantes oportunidade de discuti-las, analisá-

las, compará-las, para então compreendê-las e estabelecer

relações. Por meio do questionamento e do diálogo, é possí-

vel o confronto das ideias e dos pensamentos, a percepção

das contradições e dos posicionamentos recíprocos.

l Dialetização: para o sujeito conseguir efetuar a compreensão

dos vários sistemas que nos envolvem, linguístico, econômi-

co, ecológico, matemático..., levando em conta as interações

de diversos elementos, ou diferentes variáveis, é preciso pro-

porcionar situações em que os estudantes possam experi-

mentar diferentes conceitos, estabelecendo confrontos de

ideias relacionadas entre si, para enfim interiorizar suas inte-

rações. A prática de jogos auxilia muito a desenvolver essas

habilidades, pois além de revelar a existência de conflitos,

permite compreender, na prática, de forma concreta, sua

natureza.

l Divergência: quando se efetiva a relação de elementos consi-

derados díspares, pertencentes a campos diferentes e cuja

formulação, criação, experimentação traz a novidade.

CO M P O S I Ç ÃO

61

6. Indicadores de aprendizagem:meios para observar a aprendizagem

Os indicadores de aprendizagem são instrumentos que possibili‑tam aos professores refletir sobre sua prática pedagógica. Por meio deles, a própria prática pedagógica é edificada. São elementos de organização da série.

Os indicadores de aprendizagem constroem a pista sobre a qual os conteúdos irão deslizar – o currículo. Permitem que os professores observem como seus estudantes percorrem o currículo. Os indicado‑res de aprendizagem são respostas à pergunta: “Como sei se meu estudante aprendeu?”. Assim, eles são sinais por meio dos quais o estudante mostra ao professor o que aprendeu.

Os indicadores de aprendizagem expressam o domínio do

conhecimento real, pois revelam o que o estudante já é capaz de

fazer com certa autonomia e permitem a visualização da dinâmica,

da mecânica do objetivo didático, ou seja, o seu funcionamento e a

sua extensão.

Ao dividir uma determinada operação cognitiva, não temos como resposta a mesma operação cognitiva em parcelas menores, mas, sim, outras que indicam o sentido da construção mental em foco (as arti‑culações entre as operações cognitivas).

Exemplo: O que faz do conhecer algo complexo é que se trata de uma articulação e combinação de uma variedade de operações meno‑res, como identifica, cita, aplica, explica, argumenta, relaciona, asso‑cia, exemplifica...

P L A N E JA M E N T O D E E N S I N O

60

5. A impossibilidade de observar diretamentea aprendizagem

Uma constatação: pessoas diferentes aprendem diferentemente, mesmo quando submetidas às mesmas experiências de aprendizagem, aos mesmos objetos de estudo. O que se sabe é que aprendemos por meio de signos, durante as mais diversas interações, tendo em vista que a aprendizagem é sempre mediada. O que conseguimos observar na prática docente são fragmentos da aprendizagem, certas expres‑sões materiais do aprender. Tudo o mais nos escapa. Tudo o mais são inferências. Por isso, construímos certos instrumentos que preten‑dem dar certa visibilidade às aprendizagens e que as façam “falar”.

Pensar a aprendizagem é um momento importante no planeja-

mento e no plano de ensino, pois dependendo da concepção que

temos de aprendizagem, teremos formas particulares de ensinar. E

formas de ensinar produzem formas particulares de aprender, o que

tem impacto na aula dos professores. O plano de ensino passa, então, a ser uma espécie de “arquitetura” do ensino e da aprendizagem.

É importante que o professor considere nas mediações, nas ações didáticas, as diferentes maneiras como crianças e adolescentes apren‑dem – auditivos, visuais, sinestésicos... Com isso, parece ser relevan‑te deixar disponíveis nas aulas diferentes recursos de aprendizagem, como: imagens, iconografias, mapas, músicas, filmes, exposição oral, esquemas escritos, construção de conceitos..., para contemplar dife‑rentes itinerários e possibilidades de aprendizagem.

CO M P O S I Ç ÃO

63

pode ser tudo aquilo que ocupa o tempo escolar, quer seja um saber sistematizado, quer não. Nessa perspectiva, eles podem ser produzi‑dos na interação entre a escola e o movimento da vida de nossas crianças e jovens, seus saberes e suas práticas culturais. Por isso, é importante ter uma visão crítica e ampliada para a palavra conteúdo, tão fluente nos discursos escolares.

Os conteúdos podem ser apresentados em nossos planos de ensino de forma estanque, numa escrita que os explicite de forma pronta e acabada, como Revolução Industrial, Números irracionais, Verbos, A Amazônia, e assim por diante. Entretanto, talvez fosse mais produ‑tivo pensar os conteúdos escolares sob a forma de temas, pois podem dar mais contexto ao objeto estudado. Assim, teríamos, por exemplo, A Revolução Industrial em diferentes narrativas, Os números irracionais e a ampliação do significado de número, Os diferentes empregos dos verbos em textos, A Amazônia nas relações de poder do mundo contemporâneo. Esses temas, por ser mais abrangentes, possibilitam as passagens e os fluxos de uma disciplina a outra, de um componente curricular a outro, atravessando o currículo, cruzando as possibilidades de narrar o mundo e a vida.

Uma das invenções curriculares dos anos 1960, que ainda fre‑quentam as práticas contemporâneas, é o chamado currículo em espiral de Jerome Brunner, para quem os conteúdos deveriam se apresentar nas escolas num movimento combinado de repetição e de progressão. Isso explica por que certos conteúdos são ensinados em diferentes séries e níveis de escolaridade, sempre acrescentando algo, complexificando o objeto, agregando referenciais.

P L A N E JA M E N T O D E E N S I N O

62

7. Finalidade dos eixos estruturantes

Os eixos estruturantes mobilizam, destacam as características prioritárias de um determinado componente curricular, pertencente a determinada área do conhecimento. Desse modo, enfatizam as con‑cepções de cada componente curricular, de cada área do conhecimen‑to assumidas pela PMBCS. Constituem importantes instrumentos que permitem a seleção e a organização de conteúdos, mas também po‑dem gerá‑los. Indicam ainda modos de trabalhar com os conteúdos: orientam para a prática, segundo metodologias específicas.

Os eixos estruturantes estão ligados à epistemologia do compo‑nente curricular, todavia, não lhe são inerentes. São construções sociais e culturais por meio das quais o componente curricular se mostra.

8. A importância dos conteúdos escolares

Conteúdos escolares são assuntos, temas, matérias a serem ensi‑nadas, programas das disciplinas acadêmicas, tudo o que é ensinável aos estudantes. São parcelas da cultura, selecionadas, organizadas e disponibilizadas na escola. Pensar os conteúdos escolares como cultu‑ra possibilita entendê‑los como instrumentos por meio dos quais torna‑se possível a leitura do mundo e sua significação no âmbito da escola.

Os conteúdos escolares habitualmente referem‑se aos saberes histórica e socialmente construídos e sistematizados. Porém, vale destacar que a sistematização implica relações de poder que possibili‑tam que certos saberes sejam convertidos em conteúdos escolares.

Dessa forma, os conteúdos escolares situam‑se num domínio de decisão política, uma vez que alguns são escolhidos para ser ensinados em detrimento de outros. Em uma visão ampliada, conteúdo escolar

CO M P O S I Ç ÃO

65

aspecto da formação do estudante (diagnóstica, formativa, somativa), também exerce influência no trabalho do professor.

O princípio que pode fundamentar as ações didáticas é o da mediação da aprendizagem, conforme vemos no pensamento de Vygotsky e de Reuven Feuerstein.

Mediação

Com Vygotsky, entendemos a mediação (simbólica) como proces‑so e não como uma posição intermediária entre dois pontos apenas, que estabelece a relação entre eles. Assim, a mediação é a própria relação que implica os processos de significação.

Para Vygotsky, o processo de estímulo‑resposta (formulado tam‑bém pela psicologia russa com Pavlov) é pensado agora em termos mais complexos, como um ato mediado, representado na relação triangular S (estímulo) – X (no ápice desse triângulo, o elo interme‑diário ou elemento mediador) – R (Resposta). A palavra elemento é oportuna por permitir a possibilidade de multiplicidade do agente mediador, podendo ser uma pessoa, uma palavra, um objeto, um símbolo, um signo.

Nessa perspectiva, é incorporado um elemento auxiliar ao esque‑ma S — R que facilita a complementação da operação por meios indi‑retos, ou seja, mediados.

Dessa forma, o desenvolvimento do indivíduo se dá com base nas relações mediadas que passam a predominar sobre as relações diretas. Isso porque Vygotsky entende que a relação do ser humano com o mundo não é uma relação direta, mas sim uma relação mediada, que se dá pela utilização de instrumentos e elementos que tecem as apro‑ximações e constroem significados. Nessa direção, as funções psicoló-gicas superiores são ferramentas auxiliares da atividade humana que medeiam a relação do ser humano com o mundo, uma relação que acaba por produzir o(s) significado(s) de mundo, de realidade. O uso de instrumentos e de signos promove, estabelece, cria, potencializa as mediações, como veremos nas ideias expostas a seguir.

P L A N E JA M E N T O D E E N S I N O

64

9. A transposição didática da matriz curricular para oplano de ensino

Um dos materiais que fornecem subsídios para a prática de plane‑jar é a matriz curricular. No entanto, os conteúdos e objetivos didáti‑cos dispostos nas matrizes curriculares não podem simplesmente ser transportados para os planos de ensino anual ou bimestral/semestral. É preciso fazer adequações, adaptações.

É preciso lembrar que os objetivos presentes na matriz referem‑se a períodos mais extensos do que um ano letivo ou bimestre/trimes‑tre. Há matrizes que trazem objetivos para todo um ciclo, por isso é preciso pensar na parcela do objetivo pertinente a uma determinada série. O mesmo acontece com os conteúdos.

10. O que são as ações didáticas?

As ações didáticas são a expressão do trabalho docente. Isso não significa que seja um trabalho isolado e centrado nesse sujeito, pelo contrário, entendemos a ação didática como o campo em que saberes, práticas e culturas são produzidos, na relação professor‑conhecimen‑tos‑estudantes.

As ações didáticas expressam as metodologias de ensino ado-

tadas pelo professor no processo de ensino-aprendizagem e

expressam e criam o que se entende por ensinar e aprender, por

professor e estudante.

As ações didáticas são hipóteses iniciais de trabalho, um roteiro. Por outro lado, muito acontece durante o tempo didático, no anda‑mento da prática pedagógica.

As ações didáticas podem ser reguladas, alteradas, modificadas. Elementos, conteúdos e sequências podem ser gerados e incorpora‑dos. O que atua nesse sentido é o próprio movimento da avaliação processual das aprendizagens que, além das funções associadas ao

CO M P O S I Ç ÃO

67

1. Intencionalidade e reciprocidade: a intencionalidade ocorre

quando o mediador orienta deliberadamente a interação

numa direção escolhida, selecionando, moldando e interpre-

tando o estímulo específico. A mediação é um ato intencio-

nal, no qual o mediador trabalha ativamente para focar a

atenção no estímulo. A reciprocidade ocorre quando existem

respostas do mediado (aprendiz) e uma indicação de que ele

está receptivo e envolvido no processo de aprendizagem. O

mediado está aberto para os inputs oferecidos pelo mediador

e demonstra cooperação. Essas são as condições principais

de uma interação de Experiência de Aprendizagem Mediada.

2. Significado: é a ideia de que algo é significativo ao aprendiz,

diz respeito ao seu cotidiano e tem uma finalidade. Aqui, o

mediador mostra interesse e envolvimento emocional, reflete

sobre a importância da atividade junto com o aprendiz e

revela o motivo pelo qual aquela atividade está sendo realiza-

da. O significado, nessa perspectiva, é uma fonte de energia,

o que dá movimento e velocidade à Experiência de Apren-

dizagem Mediada.

3. Transcendência: é o ir além da necessidade direta e imediata.

Boas atividades possibilitam isso. Permite ampliar e diversifi-

car o sistema de necessidades do estudante. O objetivo da

mediação da transcendência é promover a aquisição de prin-

cípios, conceitos ou estratégias que possam ser extrapolados

para outras situações além da presente.

4. Competência: é a relação de ajuda do mediador ao mediado,

para que este construa a autoconfiança necessária à partici-

pação com sucesso em uma dada atividade. É o percurso para

construir o sentimento de competência, de capacidade de

realizar algo. Porém, o mais importante não é necessariamen-

te alcançar o sucesso, mas a percepção do mediado de que

ele está tendo sucesso. Em outras palavras, é acreditar em si.

P L A N E JA M E N T O D E E N S I N O

66

l Uso de instrumentos: os instrumentos são elementos inter-

mediários entre o trabalhador e o objeto de seu trabalho,

ampliando as possibilidades de transformação da natureza,

pois carregam consigo as funções para as quais foram elabo-

rados. O trabalho, como atividade coletiva e intencional, mar-

ca o ser humano como uma espécie diferenciada. O trabalho

une natureza e homem e cria a cultura e história humanas.

l Uso de signos: são instrumentos psicológicos. A diferença é

que se trata de instrumentos internos do indivíduo. São ferra-

mentas que auxiliam nos processos psicológicos e nas ações

concretas, como os instrumentos. São códigos que represen-

tam situações concretas. Situam-se no domínio da abstração.

Assim, signos podem ser definidos como elementos que

expressam outros objetos, eventos, situações – a palavra

mesa nos remete à imagem do objeto mesa porque é uma

palavra (signo) da nossa cultura. Assim, os signos assumem o

papel de ser elemento mediador.

É potencialmente interessante também considerar as metodolo‑gias durante a mediação das aprendizagens com base nos critérios de mediação propostos pelo educador Reuven Feuerstein. Para o autor, a mediação é um modo especial de interação, pois a relação entre o mediador e o mediado se dá de forma intencional e planejada.

Segundo Souza (2004, p. 44), a mediação que beneficia o sujeito mediado é aquela que desencadeia a produção de processos mentais mais complexos, como a formulação de hipóteses e tomada de deci‑são. Para a autora, a mediação proposta deve ser compatível com a

distância existente entre o sujeito que aprende e o objeto a ser

conhecido. Se a mediação não for adequada à necessidade de

quem aprende, não estimulará a produção de construções mentais

mais elaboradas.

Vejamos os critérios propostos por Feuerstein que podem favore‑cer uma aprendizagem mediada com maior qualidade:

CO M P O S I Ç ÃO

69

l Mais que focar a atenção do estudante no conteúdo da lição,

deve buscar expandir o entendimento dos estudantes além

das necessidades imediatas do conteúdo.

l Mais que separar conceitos específicos para o ensino, precisa

ligar conceitos às experiências pessoais dos estudantes.

l Mais que proporcionar aos estudantes oportunidades para da-

rem respostas corretas com base nas informações dadas, deve

proporcionar a eles oportunidades para explorar, descobrir

uma informação relevante, criar conexões, construir signifi-

cado independente e cooperativamente.

l Mais que guiar os estudantes através de experiências de

aprendizagem como parte do currículo padrão, precisa adap-

tar atividades para que os estudantes se sintam desafiados e

ajudá-los a ser bem-sucedidos.

l Mais que proporcionar aos estudantes modelos específicos

para as atividades dadas, deve usar um vocabulário conheci-

do para processos cognitivos específicos e abordagens afeti-

vo/motivacionais para a aprendizagem.

l Mais que dar aos estudantes assistência por meio da divisão

das atividades, é auxiliá-los a aprender a construir as suas pró-

prias estratégias de aprendizagem para solucionar problemas.

l Mais que assegurar que alguma pessoa da classe compartilhe

a resposta correta com o grupo de estudantes, seu papel é

proporcionar tempo e assistência para que todos os estudan-

tes possam refletir sobre o processo e encontrar uma maneira

de chegar a uma resposta eficiente.

l Mais que elogiar e recompensar os estudantes por um

desempenho que corresponda aos padrões, precisa focar a

atenção deles na autoavaliação.

l Mais que proporcionar feedback à produção do estudante,

deve proporcionar feedback ao processo de aprendizagem.

P L A N E JA M E N T O D E E N S I N O

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5. Autorregulação e controle de comportamento: o mediador

possibilita que o mediado construa a consciência da necessi-

dade de se automonitorar e ajustar seu comportamento. O

mediado assume-se, adquire responsabilidade por si mesmo.

6. Compartilhamento: é a relação mediador-mediado no seu

sentido mais estreito. É a necessidade mútua de cooperação

num nível afetivo e cognitivo (interdependência). Compartilhar

envolve interação social e desenvolvimento do sentimento de

pertença e compromisso com o outro.

7. Individuação: é a construção do sentimento e da compreen-

são de que cada um é um ser único. A mediação da individu-

ação encoraja a autonomia e a independência em relação aos

outros, considerando a diferença, a diversidade e a perspecti-

va de partilhar a vida em sociedade.

8. Planejamento de objetivos: é a explicitação dos objetivos

pretendidos. Para tanto, é necessário planejar as ações que os

concretizarão.

9. Desafio: o mediador estimula o mediado a ser determinado, a

ter entusiasmo para executar tarefas, perseguir objetivos. É

importante ter clareza dos passos necessários para a realiza-

ção de tais tarefas e objetivos. Isso ajuda a construir o sentido

de motivação.

10. Automodificação: todos têm capacidade de mudar. É o prin-

cípio da modificabilidade cognitiva. O mediado escreve e

reescreve sua vida.

A Aprendizagem Mediada em sala de aula, conforme as concep‑ções de Reuven Feuerstein, define o professor como um mediador que:

l Mais que falar aos estudantes o que devem saber, tem o papel

de ajudá-los a refletir sobre o que já sabem e como esse

conhecimento se relaciona com o novo.

CO M P O S I Ç ÃO

71

vida, façam Ciência, Arte, Linguagem, Filosofia juntos, mais do que passá‑las prontas.

A aula deve representar o momento da oportunidade de diálogo entre professor e estudantes, para estabelecer uma relação de inter‑câmbio de conhecimentos e experiências, relações que devem ser intensas, abertas, não totalitárias com o saber. Assim, professores e estudantes sentem‑se imbricados no movimento de compartilhar a reelaboração dos conhecimentos e incentivados a criar outras possibi‑lidades de pensar e conhecer (Lopes, 2005).

Sequência didática

A sequência didática possibilita um entrelaçamento, subjacente ao conjunto de atividades, que permite estabelecer vínculos internos e articulações recíprocas entre os conteúdos e exercícios. Desse modo, as sequências podem estar centradas em conteúdos de uma área do conhecimento, integrar conteúdos de mais de uma disciplina, embo‑ra possam incluir em seu desenvolvimento uma fase em que sejam trabalhados conteúdos de outras áreas de conhecimento.

A sequência didática se opõe ao circuito didático dogmático com‑posto da comunicação da lição, do estudo individual pautado no livro didático, da repetição do conteúdo aprendido, sem discussão nem problematização, pelo julgamento por meio da nota do professor, opondo‑se também à escolha aleatória das atividades, apresentando‑se como alternativa às formas clássicas de ensino e trabalho escolar.

A sequência didática pode ser entendida como organização dos

momentos de uma aula ou de um conjunto de aulas, como se-

quência de atividades articuladas em torno de um objetivo de

aprendizagem ou como sequência de módulos de ensino, organi-

zados para melhorar determinada prática de linguagem, construída

pelo estudante. Esta última segue uma ordem gradual, busca resolver progressivamente as dificuldades dos estudantes e facilita a tomada de consciência da linguagem e dos conteúdos estudados.

P L A N E JA M E N T O D E E N S I N O

70

l Mais que favorecer discussões em classe, deve estimulá-los a

fazer perguntas e compartilhar insights com todos no grupo.

l Mais que ter a expectativa de que os estudantes terão um

desempenho muito melhor que os outros, seu papel é acredi-

tar que todos têm capacidade para aprender.

l Mais que estabelecer uma atmosfera na qual o sucesso é cal-

culado com base no quanto alguém sabe e com que rapidez

aprende, deve estabelecer uma atmosfera na qual o sucesso é

calculado com base no quanto alguém está disposto a aceitar

desafios e a aprender.

l Mais que assumir o papel de guardião do conhecimento que

é transmitido aos estudantes, deve se posicionar como apren-

diz, servindo de modelo de aprendizagem cooperativa e inde-

pendente.

Aula

Houve tempo em que pensamos a aula como espaço e tempo úni‑cos da transmissão de conteúdos, que se encontravam prontos. O professor falava e o aluno copiava.

Hoje, após tudo o que lemos, ouvimos, estudamos, pensamos, praticamos, é possível submeter a aula – tradicionalmente concebida – a questionamentos que possam alterá‑la no que se refere à forma e ao conteúdo, e também às relações interpessoais ali existentes, capa‑zes de mudar os papéis dos sujeitos da aula.

A aula pode ser vista como um momento em que professores

ensinem os estudantes a pensar, mais do que somente a memori-

zar. Ensinem os estudantes a questionar o mundo, mais do que

aceitá-lo passivamente. Ensinem os estudantes a criticar a Ciência,

mais do que recebê-la pronta e acabada (RONCA & TERZI, 1995, p. 51). E, mais do que isso, que professores e estudantes pensem juntos, experimentem juntos as potencialidades de ver e dizer o mundo e a

CO M P O S I Ç ÃO

73

autoestima, à capacidade de trabalho em equipe e ao relacionamento com colegas e professores. Ainda nessa linha, incluem‑se o desenvol‑vimento do senso de responsabilidade, habilidades de liderança e perseverança.

Alguns autores associam os aspectos afetivos aos aspectos cogni‑tivos. Seniciato e Cavassan (2004) sugerem que, numa aula de campo, outros saberes dos alunos são mobilizados, como as emoções, sensa‑ções, percepções, o que permite as conexões com aspectos da vida, da sua própria condição humana e, assim, além da razão, contribuem para a compreensão dos fenômenos, do mundo, da vida.

Desse modo, é necessário que o professor tenha consciência da diversidade de objetivos com que irá lidar em um estudo de meio, bem como das tensões que se estabelecem entre alguns desses objeti‑vos. A disputa entre afetivo e cognitivo e o confronto de expectativas são exemplos dos sintomas dessas tensões. A diversidade de práticas, enfim, indica a necessidade de se conhecer melhor as nuances dos processos que ocorrem nos estudos de meio, para que seja possível planejar e atuar conscientemente no desenvolvimento de atividades desse tipo.

11. O plano de ensino na Educação Infantil

A Educação Infantil segue outros códigos de planejamento de ensi‑no, adotando a estrutura denominada Dimensões. Nesse segmento, também se preveem objetivos e conteúdos, porém não agrupados em disciplinas. As Dimensões 8– da Consciência Planetária, da Acolhida e Relações Solidárias, da Religiosidade; da Criação e da Investigação – não se comportam como se fossem disciplinas. Assim, não há planos de ensino específicos para essa ou aquela Dimensão. O que pode ser feito é um único plano de ensino que apresente objetivos para todas as Dimensões, ou ainda objetivos que tratem, ao mesmo tempo, de mais

8 O Projeto Marista para a Educação Infantil apresenta como proposta de organiza-ção curricular as Dimensões elencadas e não as disciplinas como tradicionalmente vêm sendo trabalhadas.

P L A N E JA M E N T O D E E N S I N O

72

Na sequência didática:

1. nem todos os alunos realizam constantemente a mesma

coisa ao mesmo tempo;

2. as atividades são abertas, não apelam a uma solução única,

mas requerem invenção (originalidade);

3. as atividades são menos estereotipadas e, por isso, nem sem-

pre há respostas únicas;

4. as tarefas são mais globais porque nascem de problemas

reais;

5. o trabalho é assumido coletivamente;

6. as tarefas não são escolhidas em função de sua facilidade,

mas por sua utilidade prática ou pertinência;

7. algumas atividades são definidas progressivamente ao

longo do trabalho.

Estudo de meio

O meio pode ser entendido como um conjunto de elementos, fenômenos, acontecimentos, fatores de diversas naturezas no qual a vida e ação das pessoas têm lugar e adquirem significado. Nessa pers‑pectiva, o Estudo de meio (e seus similares, como trabalho de campo, atividade de campo, estudo de campo ou viagem de estudo, termos melhores do que excursão, saída, visita, passeio) busca apresentar aos estudantes a estreita relação existente entre aquilo que se aprende na escola e o que ocorre dentro e fora dela, em diferentes lugares com diferentes pessoas. Embora existam diferentes formatos, a proposta é integrar ao currículo uma ação fora dos muros da escola, reforçando conteúdos vistos em classe.

As possibilidades de aprendizagens no meio são amplas, pois envolvem muitos saberes de naturezas diversas. Uma delas aponta para os ganhos em sociabilidade, particularmente em relação à

75

P L A N E JA M E N T O D E E N S I N O

74

de uma Dimensão. O tom de particularidade de cada uma delas pode ser dado na descrição das estratégias de ensino, das ações didáticas.

Outra forma de planejar o ensino na Educação Infantil diz respei‑to aos projetos. Nesses, que também funcionam como textos curri‑culares, podemos abordar o que ensinar, como ensinar e por que ensinar isso ou aquilo.

O plano de ensino na Educação Infantil apresenta uma parte cheia, ou seja, os conteúdos que historicamente são trabalhados nesse segmento, aqueles que são tratados nos Referenciais Curriculares para a Educação Infantil, no nosso Projeto Marista para a Educação Infantil (as palavras-luz das Dimensões) e apresenta ainda uma parte vazia, que se refere àqueles conteúdos que as crianças trazem, seus interesses, von‑tades e desejos, seus gostos, suas interações com o mundo.

IIIO DIAGRAMA

78 79

PLANO ANUAL

Eixos Estruturantes:

Objetivos Didáticos: Conteúdos:

Objetivo do Componente Curricular:

Objetivo da Escola:

PLANO ANUAL

PLANO TRIMESTRAL / BIMESTRAL

Eixos Estruturantes:

Objetivos Didáticos: Indicadores de Aprendizagem:

Objetivo do Componente Curricular:

Objetivo da Escola:

PLANO TRIMESTRAL / BIMESTRAL / SEMESTRAL: PARTE 1

80 81

PLANO TRIMESTRAL / BIMESTRAL

Ações Didáticas:

PLANO TRIMESTRAL / BIMESTRAL / SEMESTRAL: PARTE 2

AVALIAÇÃO DAS APRENDIZAGENS

ISIGNIFICADOS E SENTIDOS DA

AVALIAÇÃO DAS APRENDIZAGENS:

A DIFERENCIAÇÃO ENTRE AVALIAÇÃO

E PROCESSO AVALIATIVO

86

S I G N I F I C A D O S E S E N T I D O S DA AVA L I AÇ ÃO DA S A P R E N D I Z AG E N S

87

Quando atribuímos à avaliação somente o papel de representar um momento de balanço das aprendizagens, às vezes, até mesmo inconscientemente, constituímos um jeito de avaliar que é essencial‑mente somativo. Isso significa que não estamos considerando o proces‑so de ensino‑aprendizagem efetivamente como um processo – contínuo e ininterrupto, mas apenas como um momento do processo, separado dos demais. Ou seja, estamos investindo nossos esforços exclusiva‑mente numa perspectiva em que o resultado da aprendizagem é cons‑tatado somente no final do período de formação, reduzindo conside‑ravelmente as possibilidades de uma ação mais efetiva, que favoreça uma regulação contínua durante todo o processo. Centralizar a expressão do aproveitamento das aprendizagens na sua condição final estreita o entendimento de processo, reduz a busca por informações visando à melhoria da qualidade do ensino e limita a ideia de desem‑penho dos alunos, classificando‑os em: aprovado; reprovado; em recuperação; está progredindo, está se esforçando etc.

Por outro lado, quando atribuímos à avaliação apenas o significa‑do de diagnóstica, estamos considerando que o levantamento de infor‑mações ocorre em um determinado momento do processo de ensino‑‑aprendizagem. Pensar e agir somente desse modo também empobre‑ce o processo de regulação. Se quisermos privilegiar a atuação e o desempenho do aluno, a regulação deve ser contínua (e não pontual), e essa continuidade sistemática acontece por meio das informações que levantamos. Desse modo, para a aprendizagem ser dinâmica e significativa é preciso considerar como parâmetros do diagnóstico as perguntas feitas pelos alunos, as atividades desenvolvidas em sala, as correções de tarefas, os trabalhos em equipe e outros trabalhos desenvolvidos dentro e fora da sala de aula. Sem essa visão sistêmica, como é possível estabelecer uma regulação contínua com informa‑ções recolhidas somente em momentos pontuais, uma ou duas vezes no trimestre?

1. A importância do significado atribuído à avaliação

Todos sabemos a importância da avaliação no processo de ensino‑‑aprendizagem, porém, a prática docente nos mostra que, muitas vezes, atribui‑se à avaliação o significado de uma atividade isolada do restante do processo, ainda que isso não apareça nos discursos. Isso pode ser percebido pelo uso de frases que expressam o entendimento do que seja avaliar como um momento pontual de verificação do ren‑dimento das aprendizagens dos alunos: registrar os resultados; verificar o nível de conhecimento; verificar se o aluno atingiu ou não os objetivos; ver se os alunos compreenderam ou não os conteúdos ensinados; medir o aproveitamento do aluno etc. Verifica‑se, ainda, que a avaliação é vista como momento de diagnóstico, que irá oferecer subsídios para orien‑tar novas possibilidades para as práticas docentes, como retomar o que não foi aprendido; perceber a dificuldade do aluno, entre outras.

Em nosso entendimento do que seja ensino, a aprendizagem, o planejamento, o currículo, os conteúdos, o aluno e o professor influenciam, ou, até mesmo, determinam a mobilização de saberes docentes.Nesse sentido, como sugere Charlot (2000, p. 55), todos esses fatores provocam uma reunião de forças, de modo que nós mes‑mos somos os recursos a serem mobilizados para nossas próprias aprendizagens, pois segundo o autor, educação é um investimento de cada um, por si mesmo, com a mediação do outro.Assim, todos nos mobilizamos como uma comunidade aprendente.

S I G N I F I C A D O S E S E N T I D O S DA AVA L I AÇ ÃO DA S A P R E N D I Z AG E N S

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l Uma prática prognóstica, pois visa melhorar as condições das

aprendizagens por meio do amparo da avaliação.

l Uma prática somativa, em certo sentido, uma vez que avalia-

mos depois da ação de formação, em final de processo. Porém,

o registro dos resultados das aprendizagens possibilita a aná-

lise e o julgamento para tomada de decisão em relação à con-

tinuidade ou não, ou à melhoria das práticas adotadas.

l Uma prática formativa, porque proporciona informações para

promover o aperfeiçoamento da qualidade do projeto peda-

gógico desenvolvido. A análise e o julgamento, nesse caso,

têm o objetivo de nortear as decisões de aprimoramento do

processo de ensino-aprendizagem e dos diferentes elementos

que o compõem. As informações sobre os avanços e as difi-

culdades nas aprendizagens interessam tanto aos alunos

quanto aos professores. As informações levantadas servem

para redimensionar as práticas de ambos.

l Uma prática normativa, em certo aspecto, pois à medida que

os resultados são socializados, o aluno adquire conhecimento

da sua performance em relação aos demais colegas da classe.

No entanto, essa classificação é uma consequência do pro-

cesso avaliativo e não uma finalidade dele.

l Uma prática que considera os registros dos desempenhos dos

alunos nas mais variadas atividades para usá-los a seu favor.

No entanto, os registros devem surgir como consequência e

não como uma finalidade do processo.

l Um recurso que propicia interpretar os dados das observa-

ções, explicitando, assim, um sentido para a prática docente e

possibilitando, ainda, apreciar em que medida os objetivos

planejados foram atingidos. Para tanto, atribuímos uma sínte-

se em nossos julgamentos, baseada em notação numérica ou

conceitos – a fim de expressar o qualitativo com base no

quantitativo.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

88

O importante para nossa prática não é somente levantar informa‑ções, mas, sobretudo, analisá‑las, e saber como mobilizar saberes para enfrentar as dificuldades no decorrer do ano letivo. Não basta

diagnosticar se os objetivos foram atingidos no final de um período

de formação, principalmente se esse for o final do trimestre/bimes-

tre. É preciso desencadear uma regulação do processo ensino-

-aprendizagem durante todo o processo de formação.

O significado que atribuímos à avaliação está relacionado a uma pedagogia diferenciada, que não se preocupa apenas com “o que é ensinado”, mas também “como” e “para que” ensinamos, sem focar exclusivamente em um único momento de verificação de conteúdo, em que o aluno deverá somente reproduzir o que aprendeu.

A nossa prática avaliativa se autorrecria, se autoalimenta num processo contínuo, por ser o professor um artista, o que cria. O pro‑fessor é aquele que inventa novas possibilidades de aprender por inventar novas maneiras de ensinar.

Pelo fato de a avaliação ser uma operação muito complexa, que envolve conceitos extensos e vários outros significados de contextos diversos, portanto, intensos, não é conveniente definir o que é avaliar (sob pena de capturar e enclausurar um significado, expurgando outros), mas, seguindo uma perspectiva que favoreça a significação do que seja avaliar, a proposta é falar extensiva e intensivamente sobre ela, evitando assim reduzir consideravelmente sua complexidade, com‑pondo uma representação fragmentada e limitada.

Nesse sentido, podemos afirmar que avaliar é:

l Uma prática diagnóstica, baseada em múltiplas informações

coletadas durante todo o processo, para favorecer uma regu-

lação contínua e um julgamento mais adequado das produ-

ções dos alunos, promovendo, assim, uma mediação que

esteja de acordo com as necessidades de cada um.

S I G N I F I C A D O S E S E N T I D O S DA AVA L I AÇ ÃO DA S A P R E N D I Z AG E N S

91

De modo geral, para saber se estamos construindo um processo avaliativo mais adequado a uma pedagogia diferenciada, podemos nos perguntar: a avaliação está a serviço das aprendizagens? Como isso acontece? Como a avaliação pode produzir dados para melhorar a aula, potencializando os feedbacks? Quando e de que forma podemos recolher as informações para tomada de decisão e julgamento para rever as práticas e o currículo? Se a resposta obtida encaminha a um processo de ensino‑aprendizagem na forma “aula‑exercitação‑prova‑‑recuperação”, com momentos bem definidos e isolados uns dos outros, é preciso rever os saberes e as práticas docentes.

Uma avaliação na perspectiva de processo é uma ação de julga‑mento, é manifestação de valor que se constitui com base em crité‑rios planejados e socializados, que se cria e recria com base em um universo de informações do próprio processo (contínuo e ininterrup‑to). É um processo que se autoalimenta. O problema não está em diagnosticar (e/ou em verificar as aprendizagens), mas em como, para que e o que se diagnostica.

Na escola da PMBCS, avaliar exige saberes docentes que possibili‑tem (re)significar o que entendemos por currículo, avaliação, conteúdo, conhecimento, mediação, educação, ser professor e ser aluno destes tempos. O significado que atribuímos a esses – e certamente a outros concei‑tos – gera o planejamento e a avaliação.

2. Alguns saberes necessários à prática docentepara a implementação de uma prática

de avaliação como processo

A avaliação tem sido usada como sinônimo de prova – “amanhã faremos uma avaliação”. Nesse caso, é provável que o conteúdo semân‑tico do conceito avaliação esteja reduzindo o significado de processo avaliativo a momentos pontuais, usados para fazer registros de uma performance, deixando de considerá‑los em mediações futuras.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

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l Uma prática que possibilita situar o aluno em relação aos

objetivos preestabelecidos. Nesse sentido, é também uma

avaliação criterial.

l Um instrumento que permite estabelecer uma articulação

entre o real e o possível, ou seja, entre os objetivos de forma-

ção e os resultados obtidos.

l Uma prática que solicita que o professor se comporte, ao

longo do processo, ora como auditor, ora como cientista, ora

como juiz. Como auditor, o professor faz um balanço das

aprendizagens por meio de uma análise minuciosa das

observações das atividades de sala, das provas, dos trabalhos,

da participação nas aulas, confrontando-o com os critérios

estabelecidos e socializados anteriormente. Como cientista,

age de modo a produzir as diferentes informações relevantes,

fazendo com que dialoguem entre si, para desvelar/revelar –

na medida do possível – as compreensões dos alunos e os

saberes docentes para que haja uma regulação contínua.

Como juiz, emite uma apreciação de valor, como se fosse um

crítico de arte (Vianna, 2000). Julga visando enriquecer as

características individuais por meio do acompanhamento do

progresso das aprendizagens dos alunos. E, ainda, ao pro-

nunciar seu julgamento deve ter a consciência de que o léxi-

co e o conteúdo semântico não são neutros e, tampouco,

apenas comunicam as aprendizagens, mas contribuem para

a formação de identidades, uma vez que as opções discursi-

vas geram relações entre professores e aluno.

l Um instrumento valioso, uma vez que possibilita colocar o

“erro” em discussão para potencializar as aprendizagens.

l Uma prática que privilegia o momento de aprendizagem.

Quando o aluno enfrenta uma tarefa, realiza o que denomi-

namos de metacognição, pois é nesse momento que elabora

um exame crítico sobre as coisas que faz.

S I G N I F I C A D O S E S E N T I D O S DA AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

93

A ideia de processo poderia ser significada como: marcha, fluxo ininterrupto, sucessão, nem sempre linear de situações, evolução.

Se um professor entende avaliação como prova, apenas um momen‑to pontual, é porque traz consigo saberes que validam essa concepção. As aulas serão compartimentalizadas em momentos de ensinar, de aprender, de verificar, de recuperar. No entanto, o problema não está só no fato de fragmentar o processo de ensino‑aprendizagem, mas, sobretudo, na maquinaria 9 utilizada para tutelar essa ideia.

Outro professor pode ter uma compreensão diversa sobre avalia‑ção, envolvendo outra maneira de contemplar as multiplicidades. Para esse professor, os momentos de ensinar‑aprender‑verificar‑recuperar continuam existindo, mas não têm limites tão definidos, pois as fron‑teiras de onde termina um e começa o outro são esmaecidas, pouco ou quase nada percebidas, uma vez que um intenso diálogo entre as partes viabiliza o ensinar e o aprender como um processo de ensino‑‑aprendizagem, influenciando‑se reciprocamente. Nesse processo, as performances dos alunos, obtidas nos mais variados tempos‑espaços, são usadas para potencializar mediações futuras.

No entanto, transformar em um processo os momentos de ensino e aprendizagem também não basta. Para encaminhar uma aprendiza‑gem mais inclusiva, voltada para as exigências da atualidade, devemos pensar na finalidade do que ensinamos. Os encaminhamentos que faremos vão depender da resposta que daremos a essa questão. No início do século XX, saber as quatro operações e operar com porcen‑tagens, por exemplo, era suficiente. Hoje se exige que uma pessoa saiba mais do que o domínio de procedimentos de cálculos. Ela pre‑cisa de saberes que possibilitem pensar o mundo por meio de múlti‑plas ferramentas matemáticas.

Nesse sentido, é significativo, ao planejar, considerar a natureza dos objetivos didáticos. Objetivos comportamentalistas, estreitos em sua complexidade, estruturados em verbo + conteúdo, possivelmente remetem à preocupação do ensino do conteúdo como um fim em si

9 Usa-se o termo maquinaria para lembrar que os signos e instrumentos que usamos pro-duzem objetos sobre os quais versam. Por meio de diferen-tes dispositivos produzem-se identidades. A linguagem é um dos mais significativos ele-mentos da maquinaria porque produz os objetos dos quais fala. É importante observar que a ideia-força que envolve o termo não está somente no uso dos signos e instrumentos que usamos para mediar, mas, sobretudo, no modo como os usamos, pois uma coisa é o uso e outra são as produções originadas pelo uso.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

92

Esses registros surgem do julgamento do professor sobre uma prova, um trabalho, uma tarefa, uma apresentação de seminário. Sempre, num sentido único, com o professor julgando o trabalho do aluno e, raramente, chamando para o diálogo.

Reconhecer a necessidade de valorizar processo-produto, compre‑endendo o exercício avaliativo como prática formativa, voltada à análise e reflexão do ensino e da aprendizagem, em sua totalidade, significa atinar para os numerosos e variados aspectos que facilitam ou prejudicam a aprendizagem. Significa ainda incluir o aluno como um sujeito ativo, que também se responsabilize pela sua performance. Como já foi dito, o sentido de nossa educação não está nos registros das performances dos alunos, mas nas aprendizagens. Os registros são fins e não finalidades da educação que promovemos.

Às vezes, a prática docente se reduz a um objetivo menor da

escola que é “aplicar provas para verificar o conteúdo”. É como se a

escola encontrasse a razão de sua existência nisso: imprimir nas

aulas o estilo de perguntas e respostas (questionários), incentivando

os alunos a memorizá-las e reproduzi-las ipsis litteris (pois isso é que

será validado). Como diz Ronca (1991, p. 18), a prova toma, então, uma dimensão tão grande que tudo passa a gravitar em torno dela, pois só se estuda: se tiver prova, para a prova, se cair na prova.

Para perceber a avaliação numa perspectiva processual, será neces‑sário transformar nosso modus operandi: mudar para transformar o processo de ensino‑aprendizagem. Isso significa que uma avaliação em processo não é simplesmente substituir duas provas bimestrais por cinco ou seis provas, propor mais trabalhos e tarefas. Avaliar em pro‑cesso exige que se analisem os aproveitamentos e se considerem as mediações que se seguirão. Não é o número de provas que definirá um processo, mas o que se faz com as informações que recolhemos. Dito de outro modo, um processo avaliativo das aprendizagens assume uma perspectiva de análise e reflexão sobre as atividades, a fim de reconhe‑cer os progressos e as dificuldades do professor e do aluno.

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95

(re)mediação. É um processo que se recria e se reinventa o

tempo todo por considerar aspectos das aprendizagens de

ontem, de hoje e de amanhã.

A seguir, apresentam‑se algumas ideias que podem ser utilizadas para mobilizar um contínuo e ininterrupto processo de ensino‑apren‑dizagem‑avaliação:

l A metáfora de transferência não traduz a riqueza das constru-

ções mentais que a metáfora da mobilização expressa.

Segundo Perrenoud (apud Dolz & Ollagnier, 2004, p. 47-48), a

transferência evoca um deslocamento do conhecimento do

lugar de sua construção para seu local de uso. Já a mobiliza-

ção se estabelece pelas relações entre conceitos e em dife-

rentes contextos. Ela acentua a atividade do indivíduo. O autor

afirma que a mobilização se relaciona com as construções

mentais mais complexas, como problematização, invenção,

criação, generalização etc. Nesse processo, os conhecimen-

tos são transformados, pois se ligam com outras situações, e

não simplesmente deslocados. Assim, não se favorece a

mobilização de conhecimentos pensando que basta “ensinar

bem” um dado conceito, de forma isolada. Essa é uma con-

cepção estéril de complexidade, efêmera, sem energia sufi-

ciente para problematizar, para gerar novas ideias, novos

conhecimentos. A mobilização, mas não só ela, tem a função

dinâmica de dar continuidade ao processo de ensino-apren-

dizagem-avaliação.

l A distribuição dos conteúdos da Matriz Curricular ao longo do

segmento reúne conceitos/procedimentos/atitudes que

demandam mais tempo para ser aprendidos do que outros.

Em alguns casos, um período (tempo letivo) disponibilizado é

pouco para a aprendizagem. Assim, o professor poderá articu-

lar conteúdos distintos ao longo de um processo de formação

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

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mesmo e não ao ensinar a pensar, acarretando práticas pedagógicas que levam à redução da aprendizagem na aquisição dos conteúdos por meio de uma uniformidade do ensino. Essa forma de olhar para o ensino e a aprendizagem traduz‑se em objetivos do tipo “aplicar o algoritmo da adição em situações‑problema”. Assim, ao estabelecer os objetivos do conteúdo a ser abordado, é importante considerar que:

l as pessoas não aprendem de forma linear e em pequenas

doses. As aprendizagens ocorrem pelas mais diferentes for-

mas: por rupturas, por saltos de qualidade, por ideias que atra-

vessam, que interceptam outras ideias, por ligações, por anco-

ragens. É um movimento que se dá por vários caminhos e, ao

mesmo tempo, em planos diversos. Aprender contempla dife-

rentes itinerários, diferentes saberes, múltiplas linguagens;

l as aprendizagens têm conexões com o presente, o passado e

o futuro, por isso a importância de planejar e elaborar planos

que as “energizem”. A forma e o modo com que os saberes

são tratados influenciam intensamente as aprendizagens dos

alunos. As metodologias usadas nas mediações devem encur-

tar as distâncias entre o conhecimento real e o potencial,

promovendo, na medida do possível, uma individualização

do ensino e da aprendizagem por considerar as múltiplas

formas de aprender;

l uma avaliação processual se caracteriza pela interação no

decurso do processo de formação, pois promove um diálogo

ininterrupto entre professor, aluno, conhecimentos prévios,

aprendizagem, ensino, conteúdo, metodologias, prova, tare-

fas, determinando que uma ação didática planejada para o

depois relacione-se com uma observação anterior e com uma

mediação do presente. Uma avaliação que aproxima os tem-

pos em certo sentido, pois não precisamos esperar um longo

período de formação para colher informações e promover a

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pesquisando, corresponsabilizando‑se pelo sucesso da sua aprendiza‑gem e a do seu colega.

Ninguém aprende no lugar do outro. Aprendizagem é algo idios‑sincrático. O professor que o tempo todo “dá aula” não recolhe infor‑mações para dinamizar o processo e deixa o aluno, que é quem pre‑cisa fazer para aprender, passivamente ouvindo e copiando.

Alguns outros significados que favorecem a dinamização do pro‑cesso de ensino‑aprendizagem:

l A mediação promovida pelo professor, por meio de símbolos

e instrumentos, é o que denominamos de regulação. Uma

avaliação cuja função é a regulação tem como propósito,

entre outros, descobrir a origem das dificuldades dos alunos.

Por isso, de acordo com Perrenoud, 1999; Hadji, 1994, 2001;

Moll, 2002, a mediação proposta pelo professor não deve ser

voltada a uma instrução que regule a atividade em si, mas

que focalize a aprendizagem.

l A autorregulação ocorre quando conseguimos aprender por

meio de um movimento interno de planejamento e monitora-

ção do próprio comportamento adequado às situações. O

processo autorregulatório deve ser entendido como flexível,

capaz de se ajustar a mudanças mais facilmente a partir de

um objetivo formulado, estimulando o inventar e o criar, pois

suas fontes não se apoiam em pedagogias comportamenta-

listas (estímulo-resposta).

l É por meio da autoavaliação que o aluno avalia o seu desem-

penho, aprecia sua própria performance com base nos obje-

tivos e indicadores de aprendizagem tidos como referenciais.

O próprio avaliador é quem realizou a ação. Para promover a

autoavaliação, os alunos precisam conhecer os critérios de

julgamento, compreendendo que não se trata de simples-

mente atribuir uma nota ou um conceito ao seu desempenho,

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

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bem maior do que um tempo letivo, contribuindo para poten-

cializar aprendizagens significativas.

l A problematização de determinados contextos, mesmo fora

da área do conhecimento, nos diferentes bimestres/trimes-

tres, por meio dos conteúdos e das formas de pensar também

constitui uma forma de aprender com significado.

l A distribuição dos conteúdos da Matriz Curricular ao longo

das séries/anos deve ser pensada, uma vez que os limites dos

conceitos não são rigorosamente delimitados. Alguns con-

teúdos não precisam ser esgotados durante um bimestre/

trimestre, mas podem ser explorados ao longo do ano. Há

conteúdos com grau de dificuldade maior e, de certa forma,

inusitados para o sujeito que aprende. Essa dinâmica consi-

dera o tempo da aprendizagem, pois há situações que um

bimestre/trimestre de formação não é suficiente para uma

aprendizagem com significado.

Significação, contextualização, construção, participação, corresponsa-bilidade, interação, entre outros, são conceitos que norteiam uma prática pedagógica baseada em pressupostos que fundamentam a ava‑liação processual, pois, por considerar o emaranhado de significados que envolvem um processo de avaliação e não somente o seu resulta‑do final, essa prática dialoga com o projeto mais amplo, o educativo, pondo‑se a serviço do desenvolvimento daquele que aprende.

Assim, há ainda outros significados que condicionam e, em certos aspectos, determinam as formas de mediação. Alguns conceitos como regulação, autorregulação, autoavaliação e feedback, dependendo da forma como é significado, gera um tipo de aprendizagem que prima pela reprodução fiel daquilo que o professor expõe, o oposto daquilo que se acredita. São conceitos mobilizados durante o período de formação de modo a propiciar situações em que o aluno seja ativo – fazendo, perguntando, interrogando, conscientizando‑se, corrigindo,

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avaliação podem proporcionar aos interlocutores a dimensão dos esforços envolvidos nas aprendizagens.

É interessante pensar que as comunicações que fazemos para alu‑nos e pais, por meio de instrumentos de avaliação, boletins, pareceres e relatórios não são desconectadas daquilo que fazemos em sala de aula. São textos que expressam e, em certo sentido, revelam como ocorrem as nossas práticas educativas, nosso jeito de ensinar.

Assim, no corpo dos instrumentos que usamos para avaliar, seja prova, teste, trabalho, seja atividade, deverão constar as seguintes informações:

l Os objetivos bimestrais/trimestrais que estão sendo avalia-

dos.

l Os indicadores de aprendizagem. Poderão ser aqueles plane-

jados para o bimestre/trimestre ou outros, próprios dos con-

teúdos do instrumento ou mesmo aqueles que o professor

julgar importante.

l Sinalização, com um “X”, na caixa de diálogo (ver p. 123), dos

indicadores que ainda precisam ser revistos por apresentarem

performance insatisfatória.

l Sinalização do nível de aprendizagem no instrumento, por

meio de conceitos, AI, APS, AS e APL (AI – Aprendizagem

Insuficiente; APS – Aprendizagem Parcialmente Suficiente; AS

– Aprendizagem Suficiente; APL – Aprendizagem Plena) ou

algarismos matemáticos, de 0 (zero) a 10 (dez).

A relevância de essas informações aparecerem no corpo dos ins‑trumentos justifica‑se, pois, por meio delas os alunos e os pais pode‑rão acompanhar os avanços das performances ou as dificuldades que ainda precisam ser retomadas. Por outro lado, essas informações pos‑sibilitam a gestão das aulas por parte dos professores, por considerar esses aspectos da aprendizagem.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

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mas de analisá-lo criticamente. Nesse cenário, a sala de aula

passa a ser um tempo-espaço onde os jovens encontrarão

acolhimento do olhar crítico sobre o que fazem, enquanto

fazem. Assim, deslocamos uma forma de entender o feedback

centrado no professor, para uma avaliação feita por colegas

durante as discussões, complementada pela autoavaliação.

Assim, percebemos que o significado de autoavaliação envol-

ve o da metacognição, ou seja, pensar sobre as coisas que se

faz enquanto faz.

l O feedback é uma ação de comunicação das aprendizagens e

do ensino. É uma retroinformação que realimenta o processo

em tempo contínuo. É um dispositivo pelo qual o aluno se

informa de sua eficiência num movimento ativo em busca da

compreensão do objeto. É um processo autorregulatório

oriundo de uma ativa atuação do sujeito que aprende enquan-

to faz. Por se caracterizar como uma informação, não é neces-

sário, nem viável, que se pratique individualmente. Isso enges-

saria todo o processo. Assim, ele poderá ser realizado coletiva-

mente por meio de aula expositiva, da própria tarefa, de

questionamentos, provas etc. Individualizamos quando aco-

lhemos os diferentes itinerários das aprendizagens dos alunos.

À medida que o tempo passa, o ideal é que os alunos sintam

menos necessidade dos feedbacks, por terem ampliado a

autorregulação e a metacognição (Perrenoud, 1999).

3. Avaliação e a comunicação entre escola, alunoe família

Perrenoud (1999, p. 147) afirma que, às vezes, as provas são uma das únicas formas que a escola utiliza para se comunicar com as famí‑lias. Assim, para informar mais e melhor, outros instrumentos de

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Quando emitimos um julgamento das produções dos alunos, estamos ajudando a compor uma imagem mais complexa (em repre‑sentações mentais) e diversificada da sua performance. A linguagem que empregamos não é isolada de contextos, de situações, de inten‑ções, por isso não é apenas o “X” que merece cuidado.

Nessa análise, podem ainda aparecer as proposições do tipo “você não entendeu, precisa se dedicar mais” ou “melhorar suas notas só depende de você”, que limitam a significação do processo de ensino‑‑aprendizagem, pois são construções que isentam o professor da res‑ponsabilidade pelo ocorrido, uma vez que o fracasso é atribuído tão somente ao aluno e, além disso, compõem um juízo equivocado, uma vez que nem sempre é uma questão de dedicação, mas, sim, de com‑preensão. Se o “erro” for de conhecimento, por exemplo, exigir mais “dedicação e atenção” não bastará para que o aluno o supere.

Produzimos subjetivações por meio de nossa prática discursiva. Dizer que um aluno é “zero” (por não acertar nada na prova) é muito diferente de dizer que “não foi possível observar as aprendizagens naquele instrumento”. Os discursos praticados fazem parte de uma rede intrincada de outros discursos. Eles são públicos, logo, não podemos ignorar os contextos em que são produzidos sob pena de delimitar muito estreitamente o processo de significação. Aprendemos que a linguagem não só retrata a realidade, mas também produz essa realidade.

5. O “erro” como forma de potencializar e (re)significara prática pedagógica

A escola, pelo seu discurso, tem atribuído ao erro um significado associado ao fracasso. O erro esteve (e é bem possível que ainda este‑ja) associado à derrota pessoal, à falta de inteligência. O dicionário Houaiss define o termo como “incorrer em erro, engano, deixar de

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4. A correção como forma de comunicação doprocesso de avaliação

Na correção de trabalhos, provas e outras atividades não podemos perder de vista que avaliar tem uma carga semântica que nos move. É certo, pelo que foi dito até agora, que não devemos corrigir apenas para sinalizar acertos e erros e fazer um registro nos diários, visando à construção de uma síntese numérica/conceitual, no final do trimes‑tre. Focando apenas essa perspectiva, deixamos outras de lado, não contemplando assim o significado de processo avaliativo. O significado que atribuímos ao processo avaliativo não ignora o seu aspecto soma-tivo, mas ele não é único.

Assim, ao corrigir provas ou outras atividades, devemos partir do princípio de que “precisamos levantar informações (aspecto diagnós‑tico) para melhorar as aprendizagens (aspecto prognóstico), favore‑cendo melhor regulação do processo (aspecto formativo), produzin‑do registros de desempenhos (aspecto somativo) como forma de sinalizar, com mais precisão, como as aprendizagens estão acontecen‑do, tanto para professores como para alunos e famílias.

Estendendo um pouco mais essa discussão, reiteramos que corri‑gir provas e atividades envolve mais do que simplesmente apontar erros com um “X” na correção das questões. Para enriquecer as

estruturas internas e ampliar as aprendizagens, as informações das

correções oferecidas aos alunos e às famílias precisam ser de

melhor qualidade, isso significa que devemos apontar caminhos

para outras possibilidades de aprendizagem e apresentar alternati-

vas de superação, o que só é possível quando conhecemos o grupo

de alunos a quem nos dirigimos.

É ainda importante lembrar que o “X” não é um signo inocente que pretende apenas sinalizar que houve um equívoco. É, antes disso, um sinal carregado de significado tanto para quem recebe quanto para quem dá. Remete a uma prática de ensino‑aprendizagem que estigmatiza muito mais do que estimula.

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que se entrecruzam, de verdades provisórias, de negociação de signi‑ficados. Assim, aprender é, entre outras instâncias, uma relação com o outro. Envolve uma elaboração pessoal e interna, é uma relação consigo mesmo, com os outros e com o mundo. Nós nos constituí‑mos como sujeitos por meio da aprendizagem, desde o âmbito fami‑liar e social até o acadêmico. Aprendemos porque enriquecemos nossas estruturas internas. Entendemos que um sujeito aprendeu não só porque as respostas estavam certas, porque reuniu informações, mas, sobretudo, porque houve relações construídas, mobilização de conhecimento e, consequentemente, compreensão. Somente pode‑mos aprender a partir do que já sabemos, se não sabemos, não pode‑mos aprender.

A crença de que a aprendizagem ocorre desse modo acolhe outro jeito de mediar a relação entre o aluno e o conhecimento. Se a apren‑dizagem envolve a relação entre o sujeito que aprende com os outros e com o mundo, precisamos (re)significar nossa aula. É fato que não oportunizamos a vivência de um conjunto de significados somente pela exposição.

Por meio da prática docente desenvolvemos maior complexidade das operações mentais. A análise de um determinado acontecimento, por exemplo, não é apreendida com o emprego de questões do tipo por que, quem, como, quando, cite, relacione uma coluna com outra, com-plete com V ou F. Quando analisamos, buscamos relacionar diferentes acontecimentos, estudar os diversos contextos envolvidos. Ao anali‑sar, estabelecemos um diálogo com variados conceitos, utilizamos outras operações.

O erro, nessa perspectiva, passa a ser entendido como algo intrín‑seco à própria ação de conhecer, como uma hipótese provisória, algo que será modificado e transformado na sequência das aprendizagens.

É correto dizer que Isaac Newton estava errado e que Einstein estava certo? Ou, então, que Euclides estava errado e Riemann o corrigiu? Quanto tempo os “gênios” se dedicaram aos estudos do que

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acertar [...] cometer uma falta”. A adoção desses significados pelas teorias de aprendizagem fez com que a escola, historicamente, traba‑lhasse o erro como infração e falha individual.

Nas escolas maristas da PMBCS, vislumbramos superar, por meio de nossa prática discursiva e dos recursos de aprendizagem, essa forma de “olhar” para as performances dos alunos. Nossas narrativas, em relação ao erro, devem ser derivadas da nossa visão de aluno, cur-rículo, aprendizagem, ensino, avaliação, conhecimento. Não devemos considerar o erro somente entendendo o aluno em ação, mas também, e, sobretudo, analisando a prática docente. Isso significa que tanto o professor quanto o aluno são responsáveis pelas não aprendizagens e ambiguidades do processo de ensino e aprendizagem.

Nosso entendimento do desvio em relação à norma, ao estabele‑cido como correto e esperado em cada conteúdo, deveria ser visto como um acontecimento natural de um processo que jamais estará livre de equívocos. Quando nos propomos a aprender algo, estabele‑cemos um diálogo entre nossas representações já construídas e o que é novo. O erro não ocupa o lado de fora do ato de aprender, está inse‑rido no próprio processo. Quem busca compreender corre o risco de, às vezes, optar por um caminho que não leva ao que é esperado. Não há como aprender sem errar.

Em muitos casos, a escola atribui ao erro um significado que está associado ao entendimento do que seja aprendizagem.Isso ocorre se entendemos aprendizagem como a cópia literal do conhecimento, cabendo, então, ao aluno a memorização do que o professor apresen‑ta, do que está nos livros, nas apostilas. As aulas, as provas, as tarefas, as correções, os discursos são criados com esse objetivo. Substitui‑se a (re)construção do conhecimento pela cópia fiel dele. Essa é uma visão comportamentalista da aprendizagem, pois só tem valor aquilo que é observável.

Nas escolas maristas da PMBCS, a aprendizagem deve ser entendi‑da como um esforço de investigação de idas e vindas, de pensamentos

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convencional do Sistema de Numeração Decimal, passou‑se a enten‑der esse desvio como um dos itinerários provisórios construídos pelas crianças na tentativa de se apropriarem da escrita convencional do Sistema de Numeração Decimal.

Nesse exemplo, consideramos que a criança, na tentativa de se apropriar de uma parcela da cultura, (re)construiu entendimentos que eram adequados para aquele momento. Aqui, especificamente em Matemática, reside mais um ponto importante: compreender a origem do erro para disponibilizar diferentes artefatos culturais (calendários, quadro valor‑lugar, ditado de números, fita métrica) e mobilizar pertinentemente os signos a fim de oferecer caminhos para suas tentativas de apropriação de conhecimentos selecionados pelo currículo. É como se disséssemos “o seu erro me interessa”. Assim, olhamos para o erro não apenas como uma dificuldade cognitiva, mas como um fato social, cultural, que se constitui historicamente.

Analisar os erros é uma etapa do processo, mas não é suficiente para ofertar uma aprendizagem adequada. Precisamos também dispo‑nibilizar mediação adequada às necessidades dos alunos. Julgar sua produção somente por meio das correções das provas restringe as possibilidades de influenciar a mediação e não estabelece uma relação de diálogo entre professor e aluno. A valorização exacerbada dos momentos formais tende a significar a avaliação como auditoria (iden‑tificar os desvios para punir os responsáveis): um age “contando o número de erros” e o outro “tentando fraudar”.

Ao focar nossa prática nas representações majoritárias que se construíram do erro, desvelamos e produzimos outros significados que se inter‑relacionam, negam‑se, complementam‑se, num conti-nuum de intensidades, abrindo outras perspectivas de trabalhar com o erro na sala de aula: certezas, incertezas, ignorância, motivação, cultura, o ensino, o próprio conteúdo, rituais que cercam os exames e outras instâncias que pertencem a uma das etapas do processo de ensino‑aprendizagem.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

104

descobriram e produziram? Newton, por exemplo, não foi “tocado” por uma maçã reveladora, que fez surgir, como num passe de mágica, a teoria da atração dos corpos. Era professor de Cambridge e já vinha se dedicando a esses estudos há muito tempo. Nesse processo, quan‑tos erros foram cometidos e quantas hipóteses superadas?

Outro aspecto que julgamos importante observar é a natureza dos conteúdos: os fatos, as atitudes, os procedimentos e os conceitos. Esses conteúdos exigem formas de ensinar, aprender e avaliar dife‑rentes umas das outras.

Para nós, o erro deve potencializar o processo de ensino‑aprendiza‑gem, pois nos revela as concepções que os alunos trazem acerca das suas aprendizagens, baseadas em seus conhecimentos e vivências pré‑vios. Se conseguimos explicar o “fracasso” na escola é porque os nos‑sos saberes favoreceram a compreensão lógica das incompreensões.

As fontes que produzem os equívocos das aprendizagens são várias e entendê‑las e explicá‑las faz parte dos saberes docentes. Esses desvios, próprios da aprendizagem, são construídos ao longo da vida, matiza‑dos por um espectro de fontes. O erro não nasce com o aluno. Ele pode surgir de uma pergunta elaborada pelo professor, da mediação usada pelo professor, pela mediação dos artefatos culturais, da relação entre o novo conhecimento e os conhecimentos anteriores. A distração, as diferenças culturais, as formas de os alunos estudarem condicionados pela prova, os tempos de aprendizagem de cada aluno, o significado que o professor atribui à aprendizagem e à mobilização de saberes, entre outras fontes, também favorecem o aparecimento de equívocos.

Confinar o erro ao aluno, como se ele fosse o único responsável, cerceia nossas possibilidades de intervenção. As mudanças na análise do que é “erro” podem ser ilustradas pelo seguinte exemplo: durante muito tempo, uma criança de 1.ª série (2.º ano) que escrevesse 200507 para representar 257 seria solicitada a corrigir seu erro, pois havia expresso um número diferente do proposto na tarefa. Hoje, no entanto, com as pesquisas de Delia Lerner sobre a aquisição da escrita

S I G N I F I C A D O S E S E N T I D O S DA AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

107

outros conceitos, enredados entre si, e um referencial teórico.

Significa dizer que para conhecer o IDH do Brasil, entre mui-

tas variáveis que compuseram o índice, precisamos compre-

ender como foram recolhidas as informações, qual foi o tra-

tamento matemático dado às variáveis que compuseram o

índice etc. A tradução que fazemos do fenômeno estudado

regula as práticas sociais, pois produz significados que circu-

larão entre os membros dessa comunidade. A informação de

que o IDH do Brasil é 0,792 não significa que o Brasil inteiro

tenha esse índice, pois há regiões onde ele é maior do que

essa síntese e outras onde é menor. Esse é um índice médio

para o Brasil.

l Quando se trata de nota ou conceito, se, por um lado, cada

um sintetiza o progresso das aprendizagens, por outro, não

diz tudo o que poderia dizer. Quem faz a análise empresta sua

própria voz aos indicadores. O gestor de um órgão público,

por exemplo, para tomar decisões adequadas, precisa de mais

informações sobre as variáveis que compuseram o IDH.

Conhecendo profundamente o assunto, fica mais fácil decidir

para qual setor direcionar os recursos. Assim, um professor,

visando potencializar as aprendizagens de seus alunos, deve

se interessar por saber quais foram as variáveis que interferi-

ram nessas aprendizagens.

l O processo avaliativo também pode ser entendido por essa

mesma perspectiva. As aprendizagens dos alunos, expressas

tanto em uma prova como no resultado do bimestre/trimes-

tre, indicadas por uma nota ou um conceito, são produzidas e

comunicadas com fundamentação em uma teoria, em uma

prática que se constituiu ao longo das aulas. Os resultados

obtidos pelos alunos são, em grande medida, reflexo daquilo

que aconteceu na sala de aula, durante certo período.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

106

6. A qualificação da nota ou do conceitoe a complexidade da aprendizagem

A qualificação de uma nota ou de um conceito se constitui ao longo do processo de ensino‑aprendizagem. Entendê‑la nessa pers‑pectiva favorece a comunicação entre professores, alunos e famílias, além de potencializar o ensino e as aprendizagens. Só informar quais conteúdos não foram aprendidos ao final de um bimestre/trimestre reduz muito o significado de qualificação da nota ou qualificação do conceito, então, o que podemos comentar sobre isso?

Para iniciar essa reflexão, vejamos alguns enunciados de indicado‑res de diferentes natureza.

l “O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil, em

2004, foi de 0,792.”

l “A nota obtida por Pedro em Língua Portuguesa foi 6,5.”

l “A performance de Maria no primeiro objetivo de Ciências foi

expresso por AS.”

Apesar de esses fenômenos serem de naturezas e contextos distin‑tos, é possível traçar linhas de pensamento que possibilitem entender a importância de qualificar a nota ou conceito. Os índices são sínteses que nos auxiliam a entender os fenômenos observados. Para compre‑ender melhor sua amplitude, podemos afirmar que:

l Os índices (ou indicadores) têm nas suas origens uma teoria

que os produz e faz circular seus significados. Eles não são

neutros. Os dados recolhidos passam por um tratamento que,

ao final, nos possibilitam dizer, por exemplo, que o IDH 10 do

Brasil, no ano de 2004, foi de 0,792. Tanto a coleta dos dados

como as interpretações dos indicadores estão amparados

num mesmo referencial teórico.

l O IDH do Brasil é expresso por um número. Como se trata de

um conceito, para produzi-lo, foram necessários muitos

10 O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) foi criado por Mahbud ul Haq, um paquista-nês, em 1990. Esse índice é usado para avaliar o desenvol-vimento humano dos paises com base em indicadores como: renda, alfabetização, educação, longevidade, natali-dade e outros. Os valores desse índice variam de 0 (nenhum desenvolvimento humano) a 1 (desenvolvimento humano pleno).

S I G N I F I C A D O S E S E N T I D O S DA AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

109

l Ao fissurarmos 11 o conceito de qualificado, encontraremos

vários outros conceitos subjacentes conforme mostra a Figura

1. A qualificação de uma nota/conceito representa a variabili-

dade didática e o envolvimento do professor e do aluno ao

longo de um período de formação (bimestre/trimestre/

semestre/ano...). É um processo que envolve muitos outros

conceitos.

11 Usaremos a ideia de “fissura” em vez de “quebra” como metáfora para expressar que um conceito está relacionado a tantos outros, pois a ideia de quebra nos remete a “pedaços separados ou unidades”, e a ideia de fissura nos sugere um todo inter-relacionado, como linhas que se intercruzam.

l Assim como são necessários investimentos em múltiplas

áreas para elevar o IDH, para elevar a nota de Pedro ou o con-

ceito de Maria será preciso que professor e aluno se voltem

para entender o que poderá ser melhorado e como encami-

nhar essas perspectivas futuras. Não se trata de retomar, de

fazer novamente o percurso, insistir no mesmo, mas de olhar

para as ações realizadas e dar-lhes novos enfoques e possibi-

lidades com vistas a uma significação que se estenderá até na

vida futura.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

108

l Os significados que atribuímos à aprendizagem determinam

a forma com que mobilizamos os saberes e artefatos cultu-

rais; a forma como produzimos determinados discursos que

influenciam as práticas sociais e as condutas dos sujeitos. A

informação inscrita num instrumento de avaliação ou no

boletim de resultados bimestrais/trimestrais é nada mais do

que a síntese de um diálogo entre certo modo de ensinar que

determinará certa forma de aprender.

l Entender a aprendizagem como construção de um processo

de significação faz da avaliação um dispositivo intencional de

percepção da intensidade e da extensão das aprendizagens,

potencializando o processo. A ideia geral é mais ou menos

assim: professores e alunos, cada um com sua função, seu

propósito, seu interesse, mobilizados para dar o melhor de si

para que cada um progrida na sua perspectiva. A nota 6,5 de

Pedro em Língua Portuguesa ou o conceito AS de Maria em

Ciências Naturais expressam esse esforço (re)construtivo de

ambos, professores e alunos. Esses indicadores contarão a

história vivida por professores e alunos durante o bimestre/

trimestre.

l Qualificamos a comunicação quando mobilizamos pertinen-

temente os signos e os artefatos culturais durante o período

de formação. Uma aula rica em possibilidades, que se baseia

no uso de diferentes recursos didáticos, tem mais qualidade

do que uma aula em que os alunos ficam, passivamente,

ouvindo as verdades sobre as coisas do mundo.

l O Relatório Individual e/ou Boletim expressa a qualidade do

processo de ensino-aprendizagem, pois muitas variáveis, que

dialogam entre si, fazem parte da intrincada teia que envolve

a dinâmica entre professores e alunos. A nota de Pedro em

Língua Portuguesa ou o conceito de Maria em Ciências

Naturais é uma informação que contém todo o esforço ativo

do professor, do aluno e da mediação mobilizada.

Figura 1. O conceito de nota qualificada e sua relação com outros conceitos.

nota qualificadaou

conceito qualificado

feedbackanálisedo erro

formas deaprender

concepção deaprendizagem

formas deensinar

conteúdos

planejamento

tarefas

outros

instrumentosde

avaliação

S I G N I F I C A D O S E S E N T I D O S DA AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

111

caracteriza por estabelecer um nível de dificuldade adequado

(proximal), ou seja, um desafio que não seja demasiadamente

difícil; ainda, favorecer uma performance assistida, uma rela-

ção de colaboração do mediador a partir dos objetivos traça-

dos; avaliando a independência do desempenho com autono-

mia. No entanto, é significativo para o processo de mediação

perceber que promover uma performance assistida é fazer

com o aluno, mas não por ele. Devemos saber diferenciar uma

instrução mecânica, baseada na simples exercitação, de uma

mediação que promove a ampliação da ZDP com base na teo-

ria de Vygotsky, lembrando que performance assistida não é o

mesmo que prática instrucional estereotipada (Moll, 2002, p. 9).

l Depois da formação, devemos pensar no balanço das apren-

dizagens. Nesse momento, professor e aluno se debruçarão

sobre os fatos para verificar a qualidade do esforço de cada

um. Ao professor interessa conhecer os efeitos de suas ações

e encaminhar continuamente formas de promover a regula-

ção. O aluno, tendo conhecimento de suas necessidades,

deve pôr-se em movimento para aprender o que não sabe,

para autorregular-se.

Assim, ao cumprir essas etapas e comunicar os balanços das aprendizagens ao final de um bimestre/trimestre, o fazemos baseados em uma teoria, ou seja, construímos as informações traduzindo as aprendizagens numa síntese numérica, ou por meio de conceito, for‑necida aos pais e aos alunos ao longo do período de formação.

A complexa dinâmica do aprender não é algo que se possa tradu‑zir em números, por isso o tratamento matemático não descreve, na sua essência e objetivamente, a verdade das ações de aprendizagem. A síntese numérica ou conceitual é apenas uma forma de traduzir em números ou conceitos, com base nos dados tomados, a natureza qualitativa do conhecimento. Assim, quando informamos que um

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

110

l O referencial teórico propicia uma visão do processo de

ensino-aprendizagem. Em um paradigma teórico, entende-se

que os conteúdos não foram suficientemente fixados, que

houve pouco treino por parte dos alunos, porque eles não

prestaram atenção às aulas, não responderam adequadamen-

te ao questionário, e os mesmos conteúdos serão novamente

cobrados em outra prova ou na etapa de recuperação etc. Já

em um paradigma reflexivo, a visão é de que os conteúdos

ainda não foram compreendidos, que houve pouco tempo

para os alunos interagirem com alguns conceitos já trabalha-

dos em algumas situações de aprendizagem. Ou seja, pela

perspectiva teórica, verifica-se se houve ou não acúmulo de

conhecimento e, pela outra, se houve ou não potencialidades

de construção. Não se analisa o fenômeno do ensino-apren-

dizagem sem que haja um julgamento ou, em outras pala-

vras, com neutralidade, mas sempre com as lentes de um

referencial teórico.

7. As aulas e seus tempos e espaços

Para qualificar uma nota ou conceito durante o período de forma‑ção, é preciso considerar três momentos: antes, durante e depois da formação.

l Antes da formação planejamos as ações didáticas, a media-

ção, analisamos os planos anteriores para conhecer as apren-

dizagens e as possíveis necessidades, ou seja, com base em

informações disponíveis planejamos as ações futuras.

l Durante a formação, com base no que foi planejado, disponi-

bilizamos diferentes recursos que possibilitem a apropriação

dos saberes. Devemos considerar que a mediação proposta

para atender a Zona de Desenvolvimento Proximal se

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113

precisão pretendida devemos construir bons indicadores (de aprendiza‑gens), pois eles propiciam informar com maior precisão o progresso das aprendizagens, quer usando nota, quer usando conceito.

Construir indicadores não é simples, uma vez que o fenômeno da aprendizagem é complexo. No entanto, podemos compor uma possi‑bilidade com base em vários conceitos, como a concepção de ensino‑‑aprendizagem, a mediação do processo, o próprio conceito/procedi‑mento a ser estudado/ensinado, as taxionomias etc. (ver p. 60 e 61).

Para melhor compreender os instrumentos de avaliação, aborda‑remos, a seguir, o processo de ensino‑aprendizagem.

9. A concepção de ensino-aprendizageme a prática pedagógica

Conforme Kramer apud Pozo (2002, p. 27), a concepção de aprendizagem formal, em um espaço especialmente reservado para isso, tem sua origem muito antes da era cristã:

[...] os primeiros vestígios desse tipo de atividade [aprendizagem] ocorreram há 5.000 anos, em torno de 3.000 a.C. O surgimento das primeiras culturas urbanas, após os assentamentos neolíticos no delta do Tigre e do Eufrates (próximo do atual Iraque), gera novas formas de organização social que requerem um registro detalhado. Nasce, assim, o primeiro sistema de escrita conhecido, que serve inicialmen‑te para expressar em tabuinhas de cera as contas e transações agrícolas, a forma de vida daquela sociedade, mas que se estende depois a muitos outros usos sociais. Com a escrita nasce também a necessidade de formar escribas. Criam‑se as “casas das tabuinhas”, as primeiras escolas de que há registro escrito, quer dizer, as primeiras escolas da história. Que concepção ou modelo de aprendizagem punha‑se em prática naqueles primeiros centros de aprendizagem formal? Pelo que algu‑mas dessas mesmas tabuinhas nos informam, tratava‑se do que hoje chamaríamos uma aprendizagem memorística ou repetitiva.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

112

aluno obteve 6,5 (seis e meio) ou AS (Aprendizagem Suficiente), devemos estar conscientes de que certamente há limitações nessa informação em razão da complexidade que envolve a aprendizagem. A seguir, discutiremos de que forma podemos diminuir a subjetivida‑de das informações no processo avaliativo.

8. Os indicadores:uma possibilidade de precisão da aprendizagem

Quando se formula uma pergunta e atribui‑se, por exemplo, 2,0 pontos pela resposta correta, quais foram os critérios adotados para determinar esse valor? Talvez pelo fato de a prova ter 5 questões e cada uma valer 2,0? Talvez por faltar 2,0 para inteirar 10,0 pontos? Ou ainda, valorar em 2,0 pontos, pois a questão foi considerada mais difícil? Percebe‑se que, mesmo usando a notação numérica, a subjeti‑vidade está presente. Dessa forma, verificamos que é impossível ambicionar exatidão quando os critérios são subjetivos. Essa dificulda‑de também se repete quando se aplicam conceitos. A impossibilidade não está na forma de comunicar, seja nota seja conceito, mas na natu‑reza daquilo que comunicamos, ou seja, a complexidade que envolve a aprendizagem.

Apesar de toda complexidade que envolve o processo de aprendi‑zagem, ainda assim é possível almejar precisão (e não exatidão) por meio da construção de indicadores de aprendizagens apropriados. Segundo Hadji (2001, p. 31), o sujeito avaliador, no caso, o professor, apresenta subjetividades que são impossíveis de serem superadas, e o objeto ava‑liado possui múltiplas dimensões, o que torna difícil determinar exa-tamente o que avaliar. A subjetividade do sujeito avaliador se dá pela sua compreensão acerca do assunto, por seu entendimento de avaliação, suas crenças, seu estado de ânimo, seus momentos de cansaço etc. Por isso, dizemos ser possível a precisão e não a exatidão. E para atingir a

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115

Como as formas de avaliar favorecem as formas de aprender, é significativo que, nas atividades planejadas, provas, aulas, no diálogo entre professor e aluno, a atenção se volte a perguntas que não fiquem centradas somente em operações mentais pouco complexas, como “Cite...”, “Relacione as colunas...”, “Aplique o algoritmo da soma...” etc., pois esse tipo de questão reduz a aprendizagem à memorização, deixando de lado a construção social do conhecimento e a reflexão.

Proporcionar outras relações do sujeito com o conhecimento é um dos desafios das escolas da PMBCS. Por isso favorecemos o enten‑dimento do que seja conhecer por meio de situações de aprendizagem que potencializem o “analisar”, o “julgar”, o “problematizar”, o “sin‑tetizar”. Essas são operações mentais que problematizam o conheci‑mento, significando‑o como dinâmico, incompleto e provisoriamente verdadeiro.

10. Uma cena da vida de professores:“O número de alunos em sala inviabiliza

a individualização do feedback”

Nossas representações de como praticar o feedback podem invia‑bilizar esse importante dispositivo. Qual aluno não gostaria de saber o que está errando e o por quê? Em muitos sentidos, nossos pressupos‑tos teóricos são as nossas maiores limitações.

É inegável que uma turma com muitos alunos dificulta uma devo‑lutiva do progresso das aprendizagens. Mas apenas dificulta, não impossibilita. Há outros elementos do fazer pedagógico que influen‑ciam intensamente a qualidade das aprendizagens. Nosso processo avaliativo tanto será melhor quanto mais interessante for a qualidade das informações produzidas e disponibilizadas aos alunos, ou seja, do feedback que receberem. Assim:

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

114

Esse pequeno fragmento dá uma ideia de como a história da aprendizagem humana se desenvolveu ao longo dos séculos. O signi‑ficado que atribuímos hoje à aprendizagem, ao conhecimento e ao ensi-no, por exemplo, se afasta consideravelmente do significado que as sociedades antigas atribuíam. Esses conceitos foram sendo significa‑dos por outros matizes à medida que as sociedades e as culturas foram sendo transformadas.

Para as sociedades antigas, aprender tinha o significado de memo‑rizar, pois as limitações tecnológicas daquela época dificultavam a conservação e a circulação daqueles saberes. Nesse sentido, era muito importante a memorização literal dos conhecimentos necessários àquelas sociedades para a garantia da transmissão da cultura às futu‑ras gerações. Assim, as técnicas mnemônicas se justificavam.

Em nossos dias, e isso ocorre há algum tempo, aprender ganhou novos significados e contornos. Os aparatos culturais, pelos quais fazemos circular as ideias e conhecimentos, e o significado de conhe‑cer dispensam a memorização entendida como cópia literal do objeto, dando‑lhe outra utilidade. Atualmente, o conhecimento não mais é significado como verdade absoluta, como se estivesse pronto e aca‑bado ao ser apresentado aos alunos. Ao contrário, o conhecimento exige investigação, reconstrução, integração, mobilização, relação. Conhecer é um movimento que vem de dentro para fora, condiciona‑do por um mundo excentrado e mediado pelos artefatos culturais e pelos indivíduos.

O modo com que significamos a aprendizagem influencia os modos de ensinar. Assim, é importante (re)significar a aula como um momento privilegiado do acesso dos sujeitos à cultura. Neste século de mudanças tecnológicas e culturais tão rápidas, pensar em educar um sujeito vem ganhando novas perspectivas. Educar‑se, segundo Charlot (2000, p. 53), é uma obrigação de que participamos, pois para ser sujeitos educados precisamos nos apropriar das coisas do mundo.

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117

os saberes de sua prática, adequando-os aos seus alunos

e turmas.

11. A recuperação entendida como o progresso dasexperiências ao longo do processo

ensino-aprendizagem

Nas Escolas Maristas a recuperação é entendida como processo integrante da aprendizagem. A própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Art. 24, V) orienta para uma recuperação de pre-ferência paralela ao período letivo, com a prevalência dos aspectos qua-litativos sobre os quantitativos.

A recuperação não deve ser vista somente como uma nova chan‑ce, pois recuperar é favorecer outras formas de mediação ao longo do período de formação, uma vez que não houve um entendimento ade-quado sobre os assuntos, em decorrência de uma série de variáveis. Esse modo de pensar amplia o planejamento de ensino. Uma recuperação paralela não está desvinculada do processo, ela se compõe pelos nexos estabelecidos com o processo, e isso envolve planejamento.

A proposta é pensar o processo de recuperação de modo que favoreça a autorregulação contínua, ou seja, inter‑relacionado com o fluxo das aulas. Desse modo, a recuperação readquire um sentido pedagógico, deixando de ter um sentido terapêutico.

A seguir, algumas ideias para se considerar ao integrar a recupe‑ração no processo de ensino‑aprendizagem:

l A elaboração de planejamentos/planos de ensino, propician-

do a distribuição de conteúdos, articulados em cada bimes-

tre/trimestre, os diferentes instrumentos de avaliação, a inte-

ração entre colegas, a individualização do ensino, a observa-

ção das aprendizagens são exemplos de mediação que

potencializa os modos de ensinar e aprender.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

116

l Para o processo de ensino-aprendizagem-avaliação, indivi-

dualizar não pode ser significado como dar um atendimento a

cada aluno (ou uma informação) isoladamente. Essa represen-

tação inviabiliza o feedback, principalmente em turmas muito

numerosas, como é o caso das turmas do final da escolariza-

ção básica. É evidente que a individualização do feedback

para uma criança das séries iniciais é mais particularizado que

para um aluno das séries finais, mas nunca será absolutamen-

te individual, pois isso engessaria o processo de ensino-

-aprendizagem-avaliação. Uma criança em início de escolari-

zação tem demandas diferenciadas de um aluno do final de

escolaridade. Um aluno do ensino médio, pela experiência de

aprendizagem escolar, move-se com mais autonomia e liber-

dade nos tempos e espaços escolares.

l A individualização do feedback se constitui não por informar

isoladamente cada aluno, mas pela multiplicidade de possibi-

lidades da intervenção docente considerando os múltiplos

ritmos de aprendizagem. É justamente essa multiplicidade

das capacidades de aprender que representa a riqueza poten-

cial do feedback.

l Se a mediação que promovemos em sala, e fora dela, contem-

plar e favorecer as múltiplas inteligências, a aprendizagem

com significado, o tempo de aprendizagem, a relação entre

os saberes e seus contextos, o diálogo entre as áreas do

conhecimento, o tratamento dado às hipóteses provisórias

(erro) etc. estaremos viabilizando a individualização do feed-

back. Observar as dificuldades dos alunos e discuti-las com

todos (sem nomear os sujeitos) é uma forma de dar um retor-

no do progresso das aprendizagens sem ter de fazê-lo aluno

por aluno. É claro que essa perspectiva tem um potencial para

uma criança no início da escolaridade e outra para um aluno

de ensino médio. Cabe ao professor mobilizar e fazer dialogar

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119

12. As responsabilidades de professore aluno no processo de ensino-aprendizagem

A educação que desejamos promover exige uma relação com o conhecimento de construção, de invenção, de imaginação, de possi‑bilidade.

Nesse sentido, uma nova maneira de entender a avaliação gera novos significados relacionados ao processo de formação. Os papéis do professor e do aluno devem ser matizados por outra perspectiva. O resultado das aprendizagens interessa tanto ao professor como ao aluno, os dois sujeitos do processo. Mas qual o papel que cada um desempenha durante o processo de formação?

l O professor cuida da regulação do processo, todavia esse zelo

não se traduz por meio de uma regulação centrada nele

mesmo, comumente explicitada como prática instrucional. É

significativo que o aluno participe das aprendizagens, regu-

lando sua própria atividade. Quem precisa aprender é quem

precisar saber fazer. O professor será aquele que cria condi-

ções para que essa perspectiva autorregularória se efetive

durante as aprendizagens. Assim, é potencialmente significa-

tivo que o aluno tenha conhecimento dos objetivos a serem

perseguidos e o que dele se espera. Com isso, a regulação

externa, favorecida pelo professor, deve ser substituída pela

ação do sujeito aprendente. O professor fará a intervenção

direta quando a autorregulação estiver obstruída.

l O aluno cuida de sua própria aprendizagem. Uma vez infor-

mado de suas necessidades e do que se espera dele, a tomada

de consciência e o investimento pessoal devem guiar a pró-

pria aprendizagem. As performances das atividades desenvol-

vidas passam a ter assistência do professor. Nesse sentido, o

professor cria um ambiente em que o aluno possa mobilizar

os seus saberes para atingir os objetivos propostos.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

118

l A avaliação em processo sugere que se proceda à substitui-

ção do esquema: Avaliação – feedback – nada por avaliação

– feedback – ajuste (Hadji, 2001, p. 123). Ajustar implica tomar

decisões para ampliar as aprendizagens continuamente ao

longo do processo, não configurando uma prática pontual

que ocorre, geralmente, apenas no final do processo.

l É imprescindível saber separar o que é “não aprendizagem”

de “dificuldade”. Para tanto, devemos considerar pelo menos

mais dois elementos, a inteligência (num sentido geral e

abrangente) e o tempo da aprendizagem (que varia de uma

pessoa para outra). Só isso já é suficiente para pensar num

processo de recuperação articulado com o fluxo ininterrupto

das aulas. A lógica que subjaz ao nosso processo de ensino-

-aprendizagem é oferecer tudo o que pudermos – não fazer

por eles – para potencializar as aprendizagens. Não avalia-

mos para “dar uma nota”, fazendo um balanço das aprendiza-

gens, mas para acompanhar as aprendizagens.

l A regulação do processo por meio da (re)mediação é signifi-

cativo quando articulado a outros elementos do processo

para promover as aprendizagens. Assim, a própria situação de

aprendizagem, as múltiplas inteligências, os instrumentos e

signos usados, os diferentes itinerários da aprendizagem, as

regulações feitas pelos colegas e por si próprios são disposi-

tivos que potencializam a recuperação e atribuem outro sig-

nificado para a (re)mediação.

A seguir, discutiremos as responsabilidades de professores e alu‑nos no processo de ensino‑aprendizagem.

S I G N I F I C A D O S E S E N T I D O S

121

IICOMPOSIÇÃO DA AVALIAÇÃO

DAS APRENDIZAGENS COMO PROCESSO

CO M P O S I Ç ÃO DA AVA L I AÇ ÃO DA S A P R E N D I Z AG E N S CO M O P R O C E S S O

123

Quando emitimos um julgamento de valor com base em um refe‑rente e em um referido 12 ajudamos a elaborar uma representação men‑tal da performance da aprendizagem. O que queremos dizer é que se há um pronunciamento, que não é neutro, precisamos de critérios que possibilitem uma síntese mais clara possível do objetivo a ser avaliado. Daí a importância da escolha dos indicadores de aprendizagens, de tal forma que auxiliem a traduzir o resultado das aprendizagens.

12 Chama-se de referente “ao conjunto das normas ou crité-rios que servem de grelha de leitura do objeto a avaliar; e referido àquilo que desse obje-to será registrado através desta leitura” (Hadji, 1994, p. 31-33). O referente é o modelo ideal e o referido é formado pelo conjunto dos observáveis e que é construído com ajuda de instrumentos de avaliação, aquilo que é idealmente dese-jado ou esperado.

122

1. Caixa de diálogo

Esse instrumento proporciona informações da performance das aprendizagens no corpo dos instrumentos de avaliação – os indicado‑res de aprendizagens presentes nas provas e outras atividades.

O objetivo é informar melhor o professor, o aluno e a família sobre o processo de ensino‑aprendizagem. Por meio da caixa de diá‑logo podemos promover a individualização do feedback. Para tanto, é importante lembrar que as constantes adequações do planejamento, realizadas durante ao ano, permitem construir indicadores de apren‑dizagens que possibilitem a produção de informações úteis ao proces‑so como um todo.

As informações recolhidas na caixa de diálogo alimentarão a pauta de observação (Figura 2). A ideia é potencializar um processo de ensino‑aprendizagem que se abra para o diálogo por meio da aprecia‑ção do diagnóstico da aprendizagem do aluno. Assim, esse feedback deve ser focado no processo, sem se perder em evasivas, pois precisa ser útil tanto para o aluno e a família como para o professor. Para emitir um juízo de valor, uma apreciação do trabalho do aluno, é necessário que os indicadores mapeiem os percursos das aprendiza‑gens com certa precisão.

Para informar, precisamos sinalizar com um “X” (os indicadores) aquilo que o aluno ainda precisa rever.

A seguir, um modelo de caixa de diálogo.

Figura 2. Caixa de diálogo.

COLÉGIO

MARISTA

Professor(a):

Disciplina: Matemática

Data:

ENSINO FUNDAMENTAL II

Aluno(a) No 9o ano

Conceito: / Notação Numérica:

Objetivo(a1): Explorar diferentes contextos por meio da potenciação com os diferentes tipos de números para ampliar os significados de conceitos matemáticos

Prezado(a) aluno(a), alguns aspectos de sua aprendizagem, assinalados abaixo, ainda precisamser revistos

1. Opera com números fracionários ( )

2. Opera com números decimais ( )

3. Aplica o conceito de Potenciação em Números Naturais ( )

4. Aplica o conceito de Potenciação em Números Racionais ( )

5. Utiliza adequadamente as regras de sinais para as operações de adição e subtração ( )

6 Utiliza adequadamente as regras de sinais para as operações de multiplicação e divisão ( )

7. Interpreta adequadamente os enunciados dos problemas ( )

CO M P O S I Ç ÃO DA AVA L I AÇ ÃO DA S A P R E N D I Z AG E N S CO M O P R O C E S S O

125

Quando usamos testes, provas, atividades de sala e tarefas para mapear as aprendizagens e observarmos que as questões contemplam somente operações do tipo “citar”, ou outras menos complexas, a emissão do julgamento será distinta de outra que recaia sobre ques‑tões que contenham operações mentais mais complexas, como “ana‑lisar”, “problematizar”, “argumentar” etc. Uma nota 9,0 ou conceito APL na primeira observação não terá a mesma extensão e intensidade que uma nota 9,0 ou conceito APL na segunda.

Os instrumentos utilizados e as informações obtidas têm entre si uma estreita relação de diálogo, complementam‑se, e isso contribui para melhorar o entendimento das famílias em relação à prática peda‑gógica promovida pela escola. Nos instrumentos de avaliação devem circular os objetivos pedagógicos que, em certa medida, sinalizam para alunos e famílias o que é valorizado pela escola e ainda abranger as experiências vividas pelos estudantes nos espaços de aprendizagens.

Para recolher essas informações usamos a pauta de observação. Essa pauta tanto serve para direcionar nosso olhar como para regis‑trar nossas observações acerca das aprendizagens. Assim, essa pauta poderá ser construída com base nos indicadores de aprendizagem sele‑cionados pelo professor. Esses indicadores poderão ter diferentes origens: os planos de ensino; os conteúdos do próprio instrumento usado para recolher as informações; as observações feitas durante as aulas (por meio das perguntas dos alunos, desenvolvimento das tare‑fas, entre outros).

Nessa pauta, sinalizamos com um “X” as dificuldades apresenta‑das, de modo a construir um mapa 13 ao longo do processo. Nesse mapa, os registros têm o objetivo de orientar as ações tanto do pro‑fessor como do aluno. Os indicadores de aprendizagem, usados na pauta de observação, são os mesmos que irão na caixa de diálogo das provas, atividades etc. São todos os indicadores usados para apreciar a performance dos alunos.

13 Entendendo mapa como algo flexível, reversível, suscetível de receber modificações cons-tantemente, com múltiplas entradas, perspectivas e possi-bilidades. Como uma possibili-dade de representação do real e não objetivamente o real.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

124

2. Pauta de observação:mapeamento das aprendizagens e informações

para professor e aluno

É de nosso conhecimento que, pela complexidade que caracteriza as aprendizagens, não podemos observá‑las diretamente, mas pode‑mos inferi‑las. Podemos imaginar, hipotetizar, interpretar por meio de nossos conhecimentos e de indicadores e elaborar boas pistas para mapear os seus itinerários.

As construções das pautas de observação alimentam a remedia‑ção, uma vez que o processo se nutre, de modo ininterrupto, do próprio contexto de sala de aula.

Por mais que a aprendizagem esteja inserida numa intrincada teia, num emaranhado de possibilidades difícil de analisar com objetivida‑de, devemos sempre tentar tornar mais explícitas e precisas as com‑preensões de nossos alunos acerca daquilo que planejamos. Como já dissemos, em vez de exatidão, buscamos precisão.

A precisão que desejamos está intimamente relacionada aos ins‑trumentos de avaliação e é obtida pela relação existente entre os valores atribuídos a cada questão e os indicadores usados para mapear as aprendizagens dos objetivos, e não simplesmente do uso de signos matemáticos ou conceitos. A afinidade entre o processo avaliativo e o planejamento deve ser uma conversa propositada, para que se influen‑ciem mutuamente. O processo avaliativo ganha em potencialidade à medida que o planejamento se reconstrói durante o ano letivo, com base nas informações recolhidas nos instrumentos.

Assim, a síntese numérica ou o conceito síntese poderão indicar melhor as aprendizagens conforme se atribui uma escala de valor mais adequada à complexidade exigida pelo indicador. Uma escala que explicite mais adequadamente a complexidade das aprendizagens. O tratamento matemático dispensado aos dados numéricos nada mais é do que “consequência” (e não “verdade sobre” ) da valoração atribuída a cada questão.

CO M P O S I Ç ÃO DA AVA L I AÇ ÃO DA S A P R E N D I Z AG E N S CO M O P R O C E S S O

127

É significativo ter consciência de que a pauta de observação e a caixa de diálogo são dispositivos didáticos 14 que produzem e fazem circular significados acerca das aprendizagens e do ensino promovi‑do, e devem ser usadas em favor das aprendizagens dos alunos, pro‑duzindo significados que possibilitem atitudes de confiança, de res‑peito, de motivação pela aprendizagem etc.

3. A aula e suas possibilidades:conhecimento e desenvolvimento

do pensamento mais criativo e menos rígido

Algumas vezes, as provas assumem a condição de “verificação dos conteúdos” para “passar de ano”. Foram elevadas a uma tal condição, ganharam um status na escola, que ficamos com a impressão de que “educamos” para as provas. Os discursos que circulam no tempo e no espaço da escola favorecem essa compreensão: “ele não está indo bem nas provas”; “preparamos para o vestibular”; “estudem, porque ama‑nhã tem prova”; “prestem atenção, pois isso cai na prova”.

Esses discursos criam uma relação com o conhecimento muito aquém do que deveria ser almejado. Muitos alunos traduzem o signi‑ficado de estudar como “memorização dos conteúdos tal como foram apresentados pelo professor”. E o aluno, em certo sentido, não está equivocado, pois tudo o que é feito em sala vai nessa direção: aula; questionários com respostas que facilitam a memorização; atividades de simples localização de palavras; provas que apresentam os mesmos estilos de perguntas feitas em sala, em forma de questionários para verificar se os “conhecimentos” foram memorizados. Ou seja, tudo o que se faz alimenta uma relação dogmática com o conhecimento. Que significado o aluno irá atribuir ao conhecimento ao passar por esse ritual? Uma espécie de cerimonial, alimentado pelo modus ope-randi da escola e do professor.

14 Dispositivos didáticos são os signos e instrumentos, como textos e perguntas, linguagens, instrumentos de avaliação e demais recursos – que empre-gamos em sala de aula para produzir os objetos do conhe-cimento. São ideias que se intercruzam, que provocam rupturas, põem em suspensão as verdades absolutas. As dife-rentes linguagens – pictórica, matemática, científica – e os discursos produzem o que será conhecido, são mapas de um território, com diferentes itinerários e possibilidades que se cruzam e produzem as coi-sas que são conhecidas. O objeto a ser conhecido é in-fluenciado por inúmeras variá-veis que se conversam, e os diálogos que se estabelecem, por visibilidade maior de uma variável ou outra, produzem o conhecimento que se caracte-riza pela provisoriedade. O dis-positivo não é a coisa em si, mas o que é capaz de fazer, de nomear, de tornar visto e dito, ou seja, a coisa e a sua produção.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

126

A pauta de observação visa compor um mapeamento do processo, favorecendo uma ampliação da significação, possibilitando olhar para as aprendizagens e antecipar as mediações, acolhendo a natureza diagnóstica/prognóstica da avaliação.

A seguir, sugerimos um modelo de pauta de observação:

Figura 3. Levantamento das necessidades por meio da pauta de observação.

Fulano

Beltrano

Ciclano

NOME/N o

Objetivo (a1)

Indicadores de Aprendizagem Indicadores

Objetivo (a2)

A B C D E F G H I A B C D E F G H I

x

x x x x

x

x

x

x x x

x x x

xx

x

x

x

x

x

PAUTA DE OBSERVAÇÃO

Professor(a) Disciplina Série Turma

A = Operar com números fracionários

B = Operar com números decimais

C =

A =

B =

C =

CO M P O S I Ç ÃO DA AVA L I AÇ ÃO DA S A P R E N D I Z AG E N S CO M O P R O C E S S O

129

atitudes. O ensino de conceitos abrange metodologias dife-

rentes do ensino de procedimentos ou fatos. Os conteúdos

têm naturezas distintas e exigem diferentes itinerários de

aprendizagem. Como as provas são reflexos das aulas, con-

templar formas distintas de ensinar e aprender favorece a

construção de instrumentos, para melhor verificar, diagnosti-

car e julgar as aprendizagens.

l As perguntas virão dos objetivos didáticos. Se não desejamos

somente verificar, mas também diagnosticar, com vistas a

potencializar o processo de recuperação, então a avaliação

precisa ser acima de tudo informativa, tanto para o professor

como para o aluno. Há perguntas que ajudam a criar o que

será avaliado: O que o aluno deverá saber sobre o que será

avaliado? O aluno compreendeu o quê? Se o aluno sabe fazer,

ou ser... o quê? Esses questionamentos não só interferem na

avaliação como também no ensino.

l Perguntas que se iniciam, por exemplo, por o que, quais,

quantos exigem respostas imediatas, prontas, tiram a capaci-

dade de mobilização dos conceitos e capturam os seus signi-

ficados, não favorecem a ideia da complexidade dinâmica do

conhecimento. São perguntas que não incentivam o pensa-

mento, pelo contrário, promovem e pedem a memorização

dos conteúdos. Quando substituímos as operações mentais,

desviamos o pensamento para outras possibilidades. Não se

trata de ignorá-las, elas têm sua importância, mas se restrin-

gir a elas é o problema.

A seguir, sugerimos alguns exemplos de questões, porém não devem ser vistos como modelos a serem seguidos, mas como possibi‑lidades de ampliação e problematização do conhecimento por meio do uso de operações mentais mais complexas.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

128

Sabemos que a prova é apenas um elemento do processo ensino‑‑aprendizagem‑avaliação, pois ela espelha o que professores e alunos fizeram durante as aulas, uma vez que não dá para fazer um exame desvinculado das discussões de sala. Ele expressa a intensidade e extensão dos esforços de professores e alunos. Fazer uma coisa e cobrar outra não é ético.

Pensar as formas de avaliação na perspectiva de processo é signi‑ficativo para compreender essa promoção do diálogo entre plano de ensino, aula, conteúdos, mediação e processo avaliativo. É um todo inter‑relacionado que faz circular significados do que seja aprender, ensinar, mediar, avaliar etc.

Somos responsáveis, de uma forma ou de outra, por esse tipo de ensino que vê a prova desvinculada do processo de ensino‑aprendiza‑gem‑avaliação. Pelo menos em algum momento do exercício do magistério já agimos considerando a prova como um ato isolado.

Sabemos que prova e aula guardam uma relação muito estreita. Segundo Ronca (1991, p. 29), nas aulas em que não se pensa, não se argumenta. O modelo de aula que planejamos e aplicamos condiciona os tipos de provas que fazemos.

Para trabalhar em uma perspectiva mais problematizadora do processo avaliativo, consideremos algumas ideias:

l O tempo e o espaço da aula devem ser aproveitados para

incentivar a pesquisa, a organização do pensamento, a inves-

tigação, a crítica, a criatividade. Mobilizando conhecimentos

e relacionando-os com outros conhecimentos e contextos,

produzem-se e negociam-se significados.

l Para perceber se uma pergunta é ou não interessante, deve-

se identificar qual operação mental o aluno realizará para

construir sua argumentação e respondê-la.

l A seleção de saberes da cultura envolve, entre outros aspec-

tos, a aprendizagem de fatos, conceitos, procedimentos e

CO M P O S I Ç ÃO DA AVA L I AÇ ÃO DA S A P R E N D I Z AG E N S CO M O P R O C E S S O

131

Exemplo 2: Biologia

A questão em forma de teste de vestibular:

Estrutura típica, composição, adaptação, reprodução, organização e

metabolismo são características:

a) Dos vegetais apenas.

b) Somente dos animais.

c) Das rochas.

d) Dos seres vivos.

e) Nenhuma das anteriores.

E aqui em uma perspectiva mais problematizadora:

Sobre uma mesa há dois ratinhos semelhantes em tamanho, forma e

cor. Um deles goteja um pouco de líquido, desloca-se em linha reta

até cair da mesa e emite um ruído como de engrenagens, que logo

cessa. O outro percorre a mesa em linha sinuosa, vai até a borda e

volta. Anda para lá e para cá, parecendo indeciso, à procura de algo.

De repente, dirige-se para um punhado de grãos, dos quais alguns são

mordiscados e ingeridos. Em seguida, esse ratinho urina e defeca e,

depois disso, volta para junto de seus filhotes, numa caixinha em cima

da mesa. Quais as características que você pode usar da descrição

acima para dizer que um dos dois ratinhos é um ser vivo? (Unicamp,

1988)

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

130

Exemplo 1: Ciências Naturais

1. Quais são os hábitos alimentares saudáveis?

2. O que são alimentos construtores?

3. Quais são os alimentos energéticos?

Podemos mexer na forma de elaboração das questões, primando mais pelo pensamento, por relacionar ideias, dando mais e melhores elementos para o professor julgar a compreensão do aluno:15

Quando estudamos os alimentos, descobrimos que, para ser saudá-

vel, um jovem pode ingerir entre 2.500 e 3.000 calorias diárias. Mas a

dieta balanceada de uma jovem deve se limitar, em média, a 2.200

calorias diárias. Os alimentos ingeridos precisam conter diversos tipos

de nutrientes, como carboidratos, lipídios, proteínas, sais minerais,

vitaminas e água.

1. Pense e escreva o que você comeu ontem nas refeições, inclusive

nos intervalos. Compare essa dieta com as porções sugeridas em

aula. Descubra se você tem hábitos alimentares saudáveis ou não

e justifique sua resposta.

2. Você se alimenta adequadamente? Você ingere alimentos inade-

quados? Em que momentos? O que fazer para mudar seus hábitos

alimentares, sem com isso eliminar os alimentos de que você mais

gosta?

3. Analisando as mudanças de hábitos alimentares relatadas na notí-

cia abaixo, você as considera saudáveis? Por quê? Responda a essa

pergunta levando em conta que uma alimentação balanceada

deve conter alimentos construtores, energéticos e reguladores.

Notícia no jornal Folha de S.Paulo:

O paulistano está trocando o macarrão da mama pela picanha do chefe.

Uma pesquisa do Datafolha revela que 47% dos paulistanos que almoçam

fora aos domingos preferem os pecados da carne contra 22% que defen-

dem a lasanha. “Não me importo de esperar até uma hora, porque é o meu

único passeio aos domingos”, diz o auditor Paulo Sampaio, minutos antes

de enfrentar uma picanha – a carne preferida dos paulistanos.15 Ronca, op. cit., p. 48.

CO M P O S I Ç ÃO DA AVA L I AÇ ÃO DA S A P R E N D I Z AG E N S CO M O P R O C E S S O

133

nesga fecunda da pátria, e dela também poderia resultar uma luta sangren-

ta, a ruína de uma província ou a formação de um novo Estado dentro do

Brasil. (“Ultimato Farroupilha”. Jornal Zero Hora, Porto Alegre, 19 set.

2003)

Após a leitura da carta, elabore um texto argumentativo destacando

os pontos de vista de Bento Gonçalves e suas relações com o regente.

Na sua argumentação, devem constar esclarecimentos às seguintes

questões:

a) o contexto político em que o Regente Feijó chegou ao poder, e o

grupo que ele representava;

b) as transformações político-territoriais que estavam em jogo no

período da Regência de Pe. Antônio Feijó;

c) as acusações da oposição acerca de sua política territorial;

d) a denominação dada ao movimento político tratado no texto;

e) o desfecho dado ao movimento.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

132

Exemplo 3: História

Se quisermos abordar a Revolução Farroupilha, podemos pergun‑tar: “O que foi a Revolução Farroupilha?”. Para esse tipo de questão, a tendência será responder: “A Revolução Farroupilha foi uma revolta ocorrida no Rio Grande do Sul entre os anos de 1835 a 1845”. Como aprendizagem é algo interno ao sujeito que aprende, podemos afirmar que ele sabe o que representou esse movimento social? É significativo para a aprendizagem nos perguntar que processos internos estão acontecendo quando um aluno se põe a responder a uma pergunta como essa. Para propostas assim, podemos refazer a pergunta, esti‑mulando uma operação mental mais complexa da seguinte maneira:

Leia com atenção a carta de Bento Gonçalves da Silva enviada no dia

20 de setembro de 1835 ao Regente Feijó, que comandava o governo

regencial, período intermediário entre a abdicação de Pedro I e a

decretação da maioridade de seu herdeiro, Pedro II:

Senhor

Em nome do povo do Rio Grande depus o governador Braga e entreguei o

governo a seu substituo legal Marciano Ribeiro. Em nome do Rio Grande do

Sul lhe digo que nesta província extrema, afastada dos corrilhos e conve-

niências da Corte, dos rapapés e salamaleques, não toleramos imposições

humilhantes nem insultos de qualquer espécie. O pampeiro destas para-

gens tempera o sangue rio-grandense de modo diferente de certa gente

que por aí há. Nós, rio-grandenses, preferimos a morte no campo áspero

da batalha às humilhações nas salas blandiciosas do Paço do Rio de

Janeiro. O Rio Grande é a sentinela do Brasil que olha vigilante pra o Rio da

Prata. Merece, pois, mais consideração e respeito. Não pode nem deve ser

oprimido pelo despotismo. Exigimos que o governo imperial nos dê um

governador de nossa confiança, que olhe pelos nossos interesses, pelo

nosso progresso, pela nossa dignidade, ou nos separaremos do centro e

com a espada na mão saberemos morrer com honra, ou viver com digni-

dade. É preciso que V. S. saiba, sr. Regente, que é obra difícil, senão impos-

sível, escravizar o Rio Grande, impondo-lhe governadores despóticos e ti-

rânicos. Em nome do Rio Grande, como brasileiro, lhe digo, sr. Regente,

reflita bem antes de responder, porque de sua resposta depende talvez o

sossego do Brasil. Dela resultará a satisfação dos justos desejos de um pu-

nhado de brasileiros que defendem contra a voracidade espanhola uma

CO M P O S I Ç ÃO DA AVA L I AÇ ÃO DA S A P R E N D I Z AG E N S CO M O P R O C E S S O

135

de gasolina (com três casas decimais e considerando os critérios

de arredondamento).

c) Comente: Em nosso país, a moeda apresenta no máximo duas

casas decimais. No entanto, os postos de combustíveis adotam os

preços da gasolina e de outros combustíveis com três casas deci-

mais. Tente uma possível resposta com argumentos adequados

explicando por que isso acontece, considerando as nossas discus-

sões sobre meios de transporte e inflação e/ou outros aspectos

que você julgar importantes.

O objetivo dessas ampliações é mostrar que, para uma análise mais significativa, não basta somente saber multiplicar números decimais. Para interpretar os elementos da nossa cultura precisamos considerar múltiplos aspectos e conhecimentos. Para um sujeito ser numeralizado nos dias de hoje, ou seja, ir além das habilidades matemáticas, é neces‑sário que também seja capaz de fazer apreciações de informações por meio de variados conceitos envolvendo diferentes contextos.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

134

Exemplo 4: Matemática

Habitualmente, tanto provas como atividades de aprendizagem em Matemática versam sobre conhecimentos procedimentais, especial‑mente aplicação de algoritmo. Sabemos que a performance em muitas atividades depende desses conhecimentos. Porém, em muitas situa‑ções, experienciamos a necessidade de outros saberes para fazer uma análise e tomar uma decisão. Até mesmo porque um algoritmo nunca está isolado do contexto que o gerou. Há situações em que se aplica um mesmo algoritmo para vários valores numéricos e, no entanto, as respostas exigem diferentes sínteses numéricas. Essa é uma discussão que precisamos considerar (entre outras) se pretendemos elaborar possibilidades de aprendizagens mais problematizadoras.

Vejamos um exemplo envolvendo números racionais, muito comum nos livros didáticos:

O preço do litro da gasolina é R$ 2,49. Calcule quanto será gasto se

abastecermos um automóvel com 45 litros desse combustível.

A resposta a essa pergunta exige uma simples aplicação do algo‑ritmo da multiplicação. A solução não exige grande esforço cognitivo para alunos de 6.º ano, por exemplo.

Poderíamos propor uma perspectiva mais problematizadora con‑siderando o mesmo assunto como contexto, sem deixar de exercitar o algoritmo da multiplicação. Nesse caso, a aplicação do algoritmo não é para dar a resposta, mas para ajudar a pensar, por meio do emprego de ferramentas matemáticas. Fazendo pequenas modifica‑ções na atividade, temos:

Em dezembro de 2007, em Curitiba, o preço do litro da gasolina era

comercializado nos postos de combustíveis a R$ 2,499.

a) Indique o valor, em reais, para abastecer um automóvel com 45

litros de gasolina nesse período.

b) Imagine que o preço da gasolina em dezembro de 2007 recebesse

dois aumentos sucessivos de 5%. Quanto passaria a custar o litro

CO M P O S I Ç ÃO DA AVA L I AÇ ÃO DA S A P R E N D I Z AG E N S CO M O P R O C E S S O

137

resistência do material (R) à passagem da corrente elétrica é expressa pela linguagem matemática como:

V = R . I

Pela equação, observamos que quanto maior a tensão, maior será a corrente, e quanto maior a resistência do material, menor será a corrente. A partir daí, o aluno precisa associar a corrente elétrica com a movimentação dos elétrons, devendo observar, na equação, qual elemento é o doador de elétrons. Para tanto, deve ter conheci‑mento das linguagens utilizadas para expressar o fenômeno e da rela‑ção entre o número de elétrons e de prótons em um átomo neutro, positivo e negativo.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

136

Exemplo 5: Química

Na pilha seca, a reação que possibilita a produção de uma ddp de 1,5

V é:

Zn + MnO2 + NH4 + g Zn+2 + Mn2O3 + NH3 + H2O.

Nela, o zinco (Zn) é o responsável pelo fornecimento de elétrons.

É correto afirmar que o zinco na pilha:

a) é o agente oxidante.

b) é o agente redutor.

c) sofre redução.

d) tem o seu NOX diminuído.

Ao alterar a questão, como veremos a seguir, podemos ampliar a compreensão do fenômeno estudado, pois a natureza das perguntas possibilita abordar outros significados dos conceitos e procedimentos, uma vez que favorece a articulação com diferentes áreas do conheci‑mento.

Sabemos que uma lanterna pode ser acesa por meio de uma pilha. As

pilhas usadas com esse intuito são normalmente as pilhas secas.

Nelas, a reação que possibilita a produção de uma ddp de 1,5 V é:

Zn + MnO2 + NH4 + g Zn+2 + Mn2O3 + NH3 + H2O.

Considerando esses e outros conhecimentos, explique como a pilha

consegue acender a lanterna. Qual dos elementos mostrados na

equação acima é responsável por acender a lanterna? Por que na

equação acima, expressa em linguagem química, a água apareceu

como produto após a reação?

Para responder a essas perguntas o aluno precisará relacionar conhecimentos de Física e de Química. Para que um equipamento elétrico funcione é preciso corrente elétrica, que ocorre pela movi‑mentação de cargas sob a ação de uma diferença de potencial. A rela‑ção entre a corrente (I), tensão ou diferença de potencial (V) e a

CO M P O S I Ç ÃO DA AVA L I AÇ ÃO DA S A P R E N D I Z AG E N S CO M O P R O C E S S O

139

Na sequência, discutiremos formas de ampliar a compreensão da lin‑guagem considerando a interdisciplinaridade e a contextualização, entre outros aspectos.

A ema

O surgimento da figura da Ema no céu, ao leste, no anoitecer, na

segunda quinzena de junho, indica o início do inverno para os índios

do sul do Brasil e o começo da estação seca para os do norte. É limi-

tada pelas constelações de Escorpião e do Cruzeiro do Sul, ou

Cut'uxu. Segundo o mito guarani, o Cut’uxu segura a cabeça da ave

para garantir a vida na Terra, porque, se ela se soltar, beberá toda a

água do nosso planeta. Os tupis-guaranis utilizam o Cut'uxu para se

orientar e determinar a duração das noites e as estações do ano.

A ilustração a seguir é uma representação dos corpos celestes que

constituem a constelação da Ema, na percepção indígena.

Disponível em: <http://almanaquebrasil.com.br/especiais/o-ceu-segundo-os-indios/> (adaptado).

Acesso em: 14 jul. 2009.

A próxima figura mostra, em campo de visão ampliado, como povos

de culturas não indígenas percebem o espaço estelar em que a Ema é

vista.

Disponível em: <http://gabarito.enem.inep.gov.br/enem2008/PROVA_ENEM_2008_FINAL_AMARELA.pdf.>

(adaptado). Acesso em: 27 fev. 2009.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

138

Exemplo 6: Língua Portuguesa

O ensino de Língua Portuguesa, durante muito tempo, esteve vinculado ao ensino de gramática tradicional, especialmente ao tra‑balho de descrição e prescrição de suas estruturas gramáticas, des‑considerando a variedade de gêneros, de linguagens e de possibilida‑des semânticas que permeiam as situações comunicativas.

Assim, eram recorrentes, nas atividades e provas escolares e nos vestibulares, questões que exploravam o plural dos nomes, por exem‑plo, dizer se é verdadeiro que as palavras ardil, funil, fóssil e réptil formam o plural mudando o -il para -is. Ou, ainda, identificar se os verbos coser/cozer foram empregados adequadamente em sentenças como: O alfaiate cose a roupa, enquanto sua mulher coze as verduras para o jantar.

Em muitos vestibulares ainda encontramos esse tipo de questão. Mas o objetivo desses exames é classificar alunos para ingressar em determinados cursos. Mesmo universidades públicas vêm abandonan‑do esse tipo de questão e adotando questões mais reflexivas e argu‑mentativas. No entanto, o objetivo da educação básica não é “escolher os melhores”, mas ensinar para que aprendam melhor e preparar os alunos para qualquer tipo de teste, inclusive os dos concursos vesti‑bulares.

O tipo de exercício citado acima evidencia uma concepção de linguagem reducionista que desconsidera o contexto e os sentidos que subjazem às situações de interação. A educação básica deve priorizar a reflexão sobre a língua, suas possibilidades semânticas e estruturais a fim de favorecer a apropriação e ampliação da produção oral e escri‑ta e a interpretação dos múltiplos textos que circulam no mundo, em outras palavras, deve desenvolver a competência leitora.

O exercício a seguir foi extraído do Enem 2008 e articula a lin‑guagem a uma rede ampla de conhecimentos, extrapolando a meta‑linguagem, além de explorar habilidades fundamentais à compreen‑são, como identificar, selecionar, comparar, relacionar, entre outras.

CO M P O S I Ç ÃO DA AVA L I AÇ ÃO DA S A P R E N D I Z AG E N S CO M O P R O C E S S O

141

l os diferentes significados das constelações para as culturas:

indígena e não indígena.

l discutir por que, observando o mesmo espaço estelar, um

conhecimento é considerado válido e outro não.

l explorar as diferentes linguagens, verbal e não verbal, a varia-

ção linguística e a influência do suporte textual na adequação

da linguagem e da produção de sentidos.

O estudo de diferentes linguagens favorece a composição do todo significativo e potencializa as possibilidades de leitura. O trabalho com essa pluralidade de linguagens propicia ampliar o processo de significação, pois colabora com o diálogo entre os diferentes compo‑nentes curriculares.

O diálogo entre as diferentes áreas de conhecimento faz da aula um tempo‑espaço de ampliação do conhecimento. Para isso, é impor‑tante pensar que:

l quando a escola se propõe a desenvolver, em suas atividades,

operações mentais mais complexas, favorece a negociação

de significados;

l mobilizar os conhecimentos em diferentes contextos é algo

que se aprende fazendo, por meio de boas perguntas que

favoreçam um pensamento mais rico em possibilidades, evi-

tando assim centrar as aprendizagens num pensamento cer-

ceado por poucas possibilidades de criação. A imaginação, o

julgamento com base em critérios, as sínteses e outras opera-

ções mentais mais adequadas são favorecidas pela problema-

tização dos diferentes contextos e pelo exercício de criação

de outras formas de ver os elementos da cultura. É durante as

aulas que criamos as condições para que isso aconteça;

l é preciso planejar como colher informações para avaliar a

produção do aluno, buscando indícios e indicadores de

aprendizagens em diferentes situações: provas, trabalhos,

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

140

Questão 1

Considerando a diversidade cultural focalizada no texto e nas figuras,

avalie as seguintes afirmativas (escolher entre as alternativas qual(is)

estão corretas).

I. A mitologia guarani relaciona a presença da Ema no firmamento

às mudanças das estações do ano.

II. Em culturas indígenas e não indígenas, o Cruzeiro do Sul, ou

Cut'uxu, funciona como parâmetro de orientação espacial.

III. Na mitologia guarani, o Cut'uxu tem a importante função de segu-

rar a Ema para que seja preservada a água da Terra.

IV. As Três Marias, estrelas da constelação de Órion, compõem a figu-

ra da Ema.

Questão 2

Assinale a opção correta a respeito da linguagem empregada no texto

"A Ema".

(A) A palavra Cut'uxu é um regionalismo utilizado pelas populações

próximas às aldeias indígenas.

(B) O autor se expressa em linguagem formal em todos os períodos do

texto.

(C) A ausência da palavra Ema no início do período “É limitada [...]”

caracteriza registro oral.

(D) A palavra Cut'uxu está destacada em itálico porque integra o voca-

bulário da linguagem informal.

(E) No texto, predomina a linguagem coloquial porque ele consta de

um almanaque.

Considerando as alternativas propostas, podemos potencializar as aprendizagens, explorando diferentes aspectos da cultura indígena e não indígena. São questões que podem ser usadas em séries e anos do Ensino Fundamental e Médio, pois seu contexto e sentidos possibili‑tam diversas abordagens, incluindo atividades interdisciplinares. Nessas duas questões, podemos explorar, entre outras ideias:

CO M P O S I Ç ÃO DA AVA L I AÇ ÃO DA S A P R E N D I Z AG E N S CO M O P R O C E S S O

143

l A mediação deverá visar não apenas os conteúdos, as com-

preensões, a habilidade, o ensino, mas sobretudo os proces-

sos, a competência, a autodescoberta, em que o pensar

envolva experiências mais ricas, como planejar, projetar,

imaginar, criar, intuir (Claxton, 2005).

l Ao analisar desse modo o processo de ensino-aprendizagem,

percebe-se que a mediação do professor deve ir além do que

ser um instrutor de alunos que obedecem e seguem passos,

com total dedicação e sem questionamentos. Atualmente,

saber pensar as coisas do mundo por meio do que aprende-

mos, ter a oportunidade de questionar, formular hipóteses,

imaginar, criar por meio das experiências vividas também na

escola é potencialmente mais interessante e adequado para

nos educar e educar a atual e as futuras gerações.

Devemos (re)significar os objetivos da escola. Oferecer aos alunos uma visão potencialmente mais rica do mundo por meio desses e de outros conteúdos curriculares.

Assim, à medida que o aluno se empenha em responder a uma prova, o faz influenciado pela mediação, sobretudo, vivida na aula. Analisando os objetivos, indicadores e instrumentos de avaliação con‑seguimos imaginar como circulam as informações que possibilitam a construção do conhecimento e também como se dá a mediação.

Para ajudar a pensar a sala de aula como um ambiente que poten‑cializa a aprendizagem podemos contar com as nossas Matrizes Curriculares.

AVAL I AÇ ÃO DA S AP R E N D I Z AG E N S

142

apresentações de seminários e trabalhos em equipe, tarefas

etc. As práticas pedagógicas estão inter-relacionadas. De

nada adianta fazer um bom plano de ensino se as aulas, as

provas, os trabalhos, as tarefas vão em outra direção.

4. Provas são entrelaçamentos entre objetivose indicadores, conteúdo e conhecimento

Em nosso entender, quando o aluno responde a uma prova, não está realizando uma atividade isolada, pois ela está conectada a dife‑rentes momentos de formação: antes, durante e depois. Isso quer dizer que a realização da prova deve ser significada como um aconte‑cimento muito especial, ou seja, momento de aprendizagem. Assim:

l O momento que a antecede se relaciona à mediação que foi

favorecida, ao plano de ensino, ao diagnóstico levantado,

entre outros aspectos que envolvem a aprendizagem. O

momento seguinte à avaliação contemplará aspectos da

aprendizagem que ainda precisam ser revistos ou que pode-

rão potencializar aprendizagens futuras.

l Por meio dos objetivos e dos indicadores podemos cartogra-

far aspectos da mediação favorecida em sala de aula. Os sig-

nos, os instrumentos, as metodologias, os conteúdos, as

relações, as concepções etc. nos dão indícios de como a

mediação foi realizada. É como se os objetivos e indicadores

fossem os óculos que nos fizessem ver o processo de ensino-

-aprendizagem. Uma escola cujo objetivo é privilegiar apenas

os conteúdos não estará preparando o alunado para um

mundo tecnológico, em constante mudança e com múltiplas

exigências de conhecimento e adaptação. Além disso, está

restringindo as potencialidades da mediação e, consequente-

mente, o potencial de aprendizagem.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

146

Depois de tudo que foi dito sobre planejamento e avaliação, o que mais podemos dizer?

Nestas últimas linhas, gostaríamos de acrescentar algumas pala‑vras que possam trazer mais alguma contribuição para pensar o planejamento de ensino e a avaliação das aprendizagens como uma prática em favor das aprendizagens.

Esta não é uma obra com um fim em si mesma. Não se trata de um documento que tem a pretensão de se esgotar o assunto. Se muito foi dito, há muito ainda por dizer. Cada professor ou professora, ao ler este documento, fará uma releitura de uma obra que teve início há algum tempo em cada sala de aula em que cada um esteve presente – professores e alunos. É uma obra que se recriará a cada nova leitura, a cada nova experiência.

Por isso, este documento não pode ser entendido como con-

junto de receitas, mas como ideias-força para problematizar a prá-

tica docente, dando-lhe novos contornos que possibilitem a

ampliação das aprendizagens. A complexidade é algo inerente à

prática docente e não se lida com ela seguindo uma prescrição. São

várias ideias que circulam nesse texto, e saber mobilizá-las depen-

derá de cada um de nós.

Mesmo diante da complexidade que envolve o processo de ensi‑no‑aprendizagem, arriscamos dar algumas possibilidades para com‑por os diversos saberes em outros e em novos saberes:

CO N S I D E R AÇÕ E S F I N A I S

147

l Ver o plano de ensino como um texto em que registramos

nossas intenções e revelamos nossa concepção de educação.

As ideias nele registradas são produtos de um processo de

planejamento. Um engenheiro, antes de se pôr a fazer uma

obra, a planeja. Do mesmo modo o professor, ao realizar os

registros, deve fazê-lo considerando alguns aspectos, como:

a distribuição dos conteúdos ao longo do ano; a mediação

proposta – a linguagem, os portadores de texto; a qualidade

do processo avaliativo; os objetivos a serem atingidos e os

indicadores de aprendizagens que nos possibilitam olhar para

esse objetivo.

l Algumas operações cognitivas são mais complexas que

outras; nesse sentido, as taxionomias nos ajudam a classificá-

-las. Não se trata de buscar um verbo em uma lista, mas de

considerar, durante a mediação, com base no planejamento

feito, operações mentais, mais ou menos complexas, expres-

sas por meio de um verbo. As taxionomias estão diretamente

relacionadas às concepções de aprendizagem, de ensino, de

professor e mediação proposta, pois não ensinamos alguém

a julgar ou a sintetizar determinadas ideias apenas ouvindo o

professor ou, ainda, pela aprendizagem de conteúdos durante

um curto período de formação. O desenvolvimento de opera-

ções mentais mais complexas demanda um planejamento

considerando como, para que e em qual tempo.

l É por meio da concepção de aprendizagem que as mediações

e o processo avaliativo serão pensados. A concepção de

aprendizagem determina todas as outras escolhas que se faz

e como se faz. Por exemplo, quando se avalia as performances

dos alunos emitindo um julgamento, faz-se com base no sig-

nificado que se atribui à aprendizagem.

P R O J E T O M AR I S TA PAR A P L A N E JA M E N T O E AVAL I AÇ ÃO

148

l A mediação proposta está relacionada diretamente à concep-

ção de aprendizagem. O professor é aquele que dá suporte às

aprendizagens (faz com e não faz por). É por meio da qualida-

de da mediação que se amplia a zona de desenvolvimento

proximal e promove-se o desenvolvimento das funções psi-

cológicas superiores.

l Durante o processo avaliativo, que acontece durante o perío-

do de formação, devem-se considerar, na mediação, as diver-

sas funções da avaliação – somativa, prognóstica, diagnósti-

ca, formativa –, e quando mobilizar esses significados para

dar suporte às aprendizagens. A avaliação é um dispositivo

didático que favorece a ampliação da zona de desenvolvi-

mento proximal.

l A qualidade do feedback está relacionada à concepção de

aprendizagem, ao significado que se dá ao processo formati-

vo, ao planejamento das aulas e à mediação proposta. Para

alguém que está aprendendo, ser informado de quantos erros

cometeu não é suficiente para promover aprendizagens.

Agindo assim considera-se somente a dimensão somativa da

avaliação. É preciso pensar como serão feitas as retomadas e,

nesse caso, o planejamento antecipado pode ajudar muito.

l A natureza dos conteúdos a ser ensinados – conceitos, fatos,

atitudes, procedimentos – determina as escolhas dos signos

e dos instrumentos usados na mediação. Sabemos que for-

mas de ensinar determinam formas de aprender. Como se

ensina dialoga com o significado de aprendizagem.

Enfim, são muitas ideias relacionadas entre si, a escolha de uma ou de outra vai exigir do professor saberes que vão além daqueles relacionados à formação específica. É interessante perceber que a qualidade da educação que promovemos está relacionada às escolhas que fazemos.

CO N S I D E R AÇÕ E S F I N A I S

149

Este texto é uma síntese, mas não uma síntese final. A partir de agora, continuará sendo escrito pelas mãos de professores e alunos em cada sala de aula. E começa a ser escrito agora.

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16 Manteve-se a grafia original do título da obra, pois sua p u b l i c a ç ã o é a n t e r i o r a o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

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Planejar, avaliar e outros “aquilos” na prática docente

“Quando aquilo apareceu na cidade, teve gente que levou um susto.Teve gente que caiu na risada. Teve gente que tremeu de medo. E gente que achou uma delícia. E gente arrancando os cabelos [...]. Outros também tinham certeza. Disseram: – Viva! Que bom! Até que enfim! [...]Muitos defenderam e elogiaram aquilo. Juraram que aquilo era bom. Que aquilo ia ser melhor para todos. Que esperavam aquilo faz tempo. Que aquilo era importante, bonito e precioso. Alguém decidiu acabar com aquilo [...]. Mas outro alguém disse não! E foi correndo esconder aquilo no fundo do coração”

Ricardo Azevedo. Se eu fosse aquilo...

O magistério faz pulsar em mim o desejo de pensar sobre tantos e tantos temas que povoam minha cabeça, ainda que muitas vezes de forma inconsciente, mas que existem e se materializam de um jeito ou de outro na minha prática docente. Pensar nos “aquilos” que atra‑vessam o campo do planejamento, da avaliação, da educação. Pensar no exercício de docentes, ora motivados, ora confusos, ora desanima‑dos. Muitos apaixonados por “aquilos” que sempre chegam como a melhor teoria do momento, a melhor opção de ensino. Alunos nocauteados por esses “aquilos” na forma como melhor foram com‑preendidos por seus professores. Nesse cenário, surgem defensores e acusadores, simpatizantes, praticantes e contestadores, questionado‑res e indiferentes, entusiastas e resistentes. Todos, ou pelo menos a maioria, queremos acreditar, dispostos a fazer o melhor pelos alunos e querendo aprender verdadeiramente a fazer teoria e prática juntas, no dia a dia.

Entre uma tentativa e outra, parece ser unanimidade que, ao professor, cabe no mínimo duas funções: planejar e avaliar.

Ao fazer o planejamento, o professor se baseia nos recursos dispo‑níveis, na faixa etária com que trabalha e seus conhecimentos prévios, suas necessidades e potencialidades e nos objetivos que pretende atingir.

159

É uma prática de projeção das estratégias de determinado período, e a organização destas não só legitima o fazer docente, como de fato é um instrumento valioso para guiar a ação em sala de aula. Planejar como uma forma de tecer as intervenções do professor, como um com‑promisso, como um traçado de um percurso e não como um simples querer sem fundamentação do professor, até porque, durante o pro‑cesso, se for preciso mudar um pouco a rota, por que não fazê‑lo? O planejamento visto assim passa a ser considerado como algo dinâ‑mico, que está sempre acontecendo, inacabado e aberto a tudo aquilo que se passa no cotidiano da sala de aula.

O planejamento de ensino constrói o processo ensino‑aprendiza‑gem e nesse movimento a avaliação aparece com um papel de signifi‑cativa importância, uma vez que tem relação direta com aquilo que entendemos por aprendizagem. Avaliar implica ser coerente com o percurso percorrido. Embora não haja consenso sobre a melhor forma de avaliar a aprendizagem do aluno, o certo é que não se pode fazer mau uso da avaliação, independentemente do contexto no qual ela esteja inserida. É importante, neste sentido, manter abertas per‑guntas que nos ajudem a ir mais longe: Que tipo de avaliação? O que avaliar? Para que avaliar? E assim colocar sempre a avaliação a serviço das aprendizagens, das novas aprendizagens, de novos estudantes, de um novo tempo.

Deixo aqui um pouco do meu pensamento, mas quero deixá‑lo com humildade, quem sabe como um “solo fértil para novas planta‑ções”. Tentei fugir da “consciência pedagógica centrada, colonizada e controlada pela escrita acadêmica da educação”, mas admito que é muito difícil romper com os “aquilos” com que me deparo sempre. O que procurei fazer foi um diálogo com a história, com os significados e conceitos produzidos no campo da educação. Para ir além e mais longe. Perseverando, sempre! Abrindo para outros e novos “aquilos” escondidos em nossos corações.

Fernanda Delicio FuckProfessora do Colégio Marista Arquidiocesano de São Paulo