PROJETO PEDAGÓGICO DE LEITURA 2012 Merece...

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PROJETO PEDAGÓGICO DE LEITURA 2012 Merece uma crônica Macaé 2012 SUBSECRETARIA DE ENSINO FUNDAMENTAL COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA DO ENSINO FUNDAMENTAL COORDENAÇÃO DE ÁREA 6º AO 9º - LÍNGUA PORTUGUESA

Transcript of PROJETO PEDAGÓGICO DE LEITURA 2012 Merece...

  • PROJETO PEDAGGICO DE LEITURA 2012

    Merece uma crnica

    Maca

    2012

    SUBSECRETARIA DE ENSINO FUNDAMENTAL

    COORDENAO PEDAGGICA DO ENSINO FUNDAMENTAL

    COORDENAO DE REA 6 AO 9 - LNGUA PORTUGUESA

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    Sumrio

    1. Introduo ............................................................................................................. 3 2. Crnica .................................................................................................................. 4

    2.1 Histria das crnicas ............................................................................................. 4 2.2 Um olhar atento sobre o cotidiano ....................................................................... 4 2.3 Os muitos tons da crnica no Brasil ....................................................................... 5 2.4 De gnero jornalstico a gnero literrio ............................................................... 5

    3. Sugestes de atividades: 6 e 7 anos ................................................................... 6 Sugesto 1 .............................................................................................................. 7 Sugesto 2 ............................................................................................................. 16 Sugesto 3 ............................................................................................................. 22 Sugesto 4 ............................................................................................................. 27 4. Sugestes de atividades: 8 e 9 anos .................................................................... 36 Sugesto 1 .............................................................................................................. 37 Sugesto 2 ............................................................................................................. 51

    Sugesto 3 ............................................................................................................. 55 Sugesto 4 ............................................................................................................. 63 5. Crnicas: 6 ano .................................................................................................... 72 Crnicas: 7 ano ..................................................................................................... 88 Crnicas: 8 ano ..................................................................................................... 105 Crnicas: 9 ano .................................................................................................... 123 6. Biografias ............................................................................................................. 141 7. Referncias bibliogrficas ..................................................................................... 164

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    1. INTRODUO

    O Projeto Pedaggico de Leitura - 2012, implantado j no 1 bimestre pelas escolas municipais

    de 6 ao 9 ano, teve como tema inicial o tempo. O gnero trabalhado na ocasio foi o potico.

    Dando continuidade ao trabalho j iniciado por professores e responsveis pelas salas de

    leitura, o projeto, neste segundo bimestre, versar sobre o tema merece uma crnica.

    Em um primeiro momento, apresentaremos algumas concepes importantes para a

    compreenso do gnero, um pouco da sua historicidade e caractersticas bsicas.

    O tema merece uma crnica remete a um olhar diferenciado para a realidade que nos cerca,

    permitindo que possamos visualizar com certa literariedade o que se passa em nosso

    cotidiano. Alm disso, nos coloca na posio de observadores daquilo que tantas vezes passa

    despercebido aos nossos olhos.

    Nesta segunda parte do projeto apresentamos uma coletnea de sugestes de atividades que

    o professor ou responsvel pela sala de leitura pode utilizar em suas aulas. Tambm

    oferecemos uma srie de crnicas, dividas por ano de escolaridade e por poca de publicao.

    Quanto poca de publicao, sabemos que toda crnica um retrato literrio de sua poca.

    Da escolhermos autores e tempos distintos: Machado de Assis (1850 a 1920), Rubem Braga

    (1920-1950), Paulo Mendes Campos (anos 50), Stanislaw Ponte Preta (anos 60), Fernando

    Sabino (anos 70), Joo Ubaldo Ribeiro (anos 80), Luis Fernando Verssimo (anos 90) e Martha

    Medeiros (anos 2000).

    A escolha deve-se ao legado que cada autor deixou ao representar a sua poca. As sugestes

    de atividades abordam uma srie de outros autores to importantes quanto os citados acima.

    Contamos com a participao de todos para a continuao do Projeto Pedaggico de Leitura

    que tem por objetivo auxiliar na criao do hbito de leitura e na insero da literatura no

    cotidiano de todos os alunos.

    Boa leitura!

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    2. Crnica1

    Crnica um gnero de texto to flexvel que pode usar a mscara de outros gneros, como

    o conto, a dissertao, a memria, o ensaio ou a poesia, sem se confundir com nenhum deles.

    leve, despretensiosa como uma conversa entre velhos amigos, e tem a capacidade de, por

    vezes, nos fazer enxergar coisas belas e grandiosas em pequenos detalhes do cotidiano que

    costumam passar despercebidos.

    2.1 Histria das crnicas

    A palavra crnica, em sua origem, est associada ao vocbulo khrnos (grego) ou

    chronos (latim), que significa tempo. Para os antigos romanos a palavra chronica

    designava o gnero que fazia o registro de acontecimentos histricos, verdicos, na ordem em

    que acontecia, sem pretender se aprofundar neles ou interpret-los. Com esse sentido ela foi

    usada nos pases europeus.

    A crnica contempornea brasileira, tambm voltada para o registro jornalstico do cotidiano,

    surgiu por volta do sculo XIX, com a expanso dos jornais no pas. Nessa poca, importantes

    escritores, como Jos de Alencar e Machado de Assis, comearam a usar as crnicas para

    registrar de modo ora mais literrio, ora mais jornalstico, os fatos corriqueiros de seu tempo.

    interessante observar que as primeiras crnicas brasileiras so dirigidas s mulheres e

    publicadas como folhetins, em geral na parte inferior da pgina de um jornal.

    2.2 Um olhar atento sobre o cotidiano

    A crnica um gnero que ocupa o espao do entretenimento, da reflexo mais leve.

    colocada como uma pausa para o leitor, fatigado de textos mais densos. Nas revistas, por

    exemplo, em geral estampada na ltima pgina.

    Ao escrever, os cronistas buscam emocionar e envolver seus leitores, convidando-os a refletir,

    de modo sutil, sobre situaes do cotidiano, vistas por meio de olhares irnicos, srios ou

    poticos, mas sempre agudos e atentos.

    1 Abordagens tericas adaptadas do material da Olimpada de Lngua Portuguesa 2010.

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    2.3 Os muitos tons da crnica no Brasil

    A crnica um gnero que retrata os acontecimentos da vida em tom despretensioso, ora

    potico, ora filosfico, muitas vezes divertido. Nossas crnicas so bastante diferentes

    daquelas que circulam em jornais de outros pases. L esto relatos objetivos e sintticos,

    comentrios sobre pequenos acontecimentos, e no costumam expressar sentimentos

    pessoais do autor. Os cronistas brasileiros exprimem vivncias e sentimentos prprios do

    universo cultural do pas.

    No Brasil, h vrios modos de escrev-las. Se usa o tom da poesia, o autor produz uma prosa

    potica, como algumas crnicas escritas por Paulo Mendes Campos. Mas elas podem ser

    escritas de uma forma mais prxima ao ensaio, como as de Lima Barreto; ou ser narrativas,

    como as de Fernando Sabino. As crnicas podem ser engraadas, puxando a reflexo do leitor

    pelo jeito humorstico, ou ter um tom srio. Outras podem ser prximas de comentrios, como

    as crnicas esportivas ou polticas.

    2.4 De gnero jornalstico a gnero literrio

    Nem todas as crnicas resistem ao tempo. Publicadas em jornais e revistas, so lidas apenas

    uma vez e, em geral, esquecidas pelo leitor. A crnica literria, no entanto, tem longa durao

    e sempre apreciada pelo estilo de quem a escreve e pelo tema abordado.

    A produo de crnicas literrias muitas vezes tarefa encomendada a escritores j

    reconhecidos pela publicao de outras obras, como contos e romances. So esses autores

    que, usando recursos literrios e estilo pessoal, fazem seus textos perdurarem e serem

    apreciados apesar da passagem do tempo. Para conseguir esse efeito, os escritores no

    destacam o fato em si, mas a interpretao que fazem deles, dando-lhes caractersticas de

    retrato de situaes humanas atemporais. Os temas geralmente so ligados a questes

    ticas, de relacionamento humano, de relaes entre grupos econmicos, sociais e polticos.

    Em geral, na crnica a narrao capta um momento, um flagrante do dia a dia; o desfecho,

    embora possa ser conclusivo, nem sempre representa a resoluo do conflito, e a imaginao

    do leitor estimulada a tirar suas prprias concluses. Os fatos cotidianos e as personagens

    descritas podem ser fictcias ou reais, embora nunca se espere da crnica a objetividade de

    uma notcia de jornal, de uma reportagem ou de um ensaio.

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    3. Sugestes de Atividades :

    6 e 7 anos

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    Sugesto 12

    Dados da Aula

    O que o aluno poder aprender com esta aula

    Comparar a retratao do cotidiano em crnicas e fotografias. Identificar e analisar elementos que caracterizam o ofcio do cronista. Selecionar uma fotografia para complementar o sentido de uma crnica produzida por

    algum escritor pertencente ao jornalismo e/ ou literatura brasileira. Produzir uma narrativa informativa ou literria a partir de uma fotografia.

    Durao das atividades

    2 a 3 aulas de 50 minutos.

    Conhecimentos prvios trabalhados pelo professor com o aluno

    Desde a consagrao e definio da crnica como gnero textual, ela esteve associada ao radical grego cronos, que demarca a abordagem temtica do gnero atrelada ao tempo, ao transcorrer do cotidiano. Por ser difundida, muitas vezes, em jornais impressos - e aproximar-se de outros gneros que circulam nesse contexto, tais como a notcia, a reportagem e o artigo de opinio - a crnica est, de certa forma, agregada aos relatos factuais. No entanto, ao longo do sculo XX, esse suporte textual adquiriu outras nuances que apontam para registros entre o relato e a fico, entre o literrio e o informativo. Na contemporaneidade, tal como a fotografia, a crnica se estabelece, no como registro totalitrio ou enquadramento objetivo da cena, mas como um recorte instantneo, criativo, reflexivo, artstico, do cotidiano.

    Para incio da discusso acerca do gnero, o professor pode apresentar, em slides em data show, algumas notcias ou crnicas ilustradas que dialogam texto verbal e no verbal. Alm disso, vlido abordar os elementos distintivos entre a crnica e os outros gneros jornalsticos.

    Estratgias e recursos da aula

    Etapa 1 Paisagem crnica

    O objetivo desta atividade apresentar e identificar o ofcio de um cronista, a especificidade do seu trabalho e a concepo sobre o gnero crnica.

    2 Sugesto adaptada do site http://portaldoprofessor.mec.gov.br/.

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    O CRONISTA UM ESCRITOR CRNICO

    Affonso Romano de SantAnna

    O primeiro texto que publiquei em jornal foi uma crnica. Devia ter eu l uns 16 ou

    17 anos. E a fui tomando gosto. Dos jornais de Juiz de Fora, passei para os jornais

    e revistas de Belo Horizonte e depois para a imprensa do Rio e So Paulo. Fiz de

    tudo (ou quase tudo) em jornal: de reprter policial a crtico literrio. Mas foi

    somente quando me chamaram para substituir Drummond no Jornal do Brasil, em

    1984, que passei a fazer crnica sistematicamente. Virei um escritor crnico.

    O que um cronista?

    Lus Fernando Verssimo diz que o cronista como uma galinha, bota seu ovo

    regularmente. Carlos Eduardo Novaes diz que crnicas so como laranjas, podem

    ser doces ou azedas e ser consumidas em gomos ou pedaos, na poltrona de casa ou espremidas na sala de aula.

    J andei dizendo que o cronista um estilita. No confundam, por enquanto, com

    estilista. Estilita era o santo que ficava anos e anos em cima de uma coluna, no

    deserto, meditando e pregando. So Simeo passou trinta anos assim, exposto ao

    sol e chuva. Claro que de tanto purificar seu estilo diariamente o cronista estilita acaba virando um estilista.

    O cronista isso: fica pregando l em cima de sua coluna no jornal. Por isto, h

    uma certa confuso entre colunista e cronista, assim como h outra confuso entre

    articulista e cronista. O articulista escreve textos expositivos e defende temas e

    ideias. O cronista o mais livre dos redatores de um jornal. Ele pode ser subjetivo.

    Pode (e deve) falar na primeira pessoa sem envergonhar-se. Seu "eu", como o do poeta, um eu de utilidade pblica.

    Que tipo de crnica escrevo? De vrios tipos. Conto casos, fao descries, anoto

    momentos lricos, fao crticas sociais. Uma das funes da crnica interferir no

    cotidiano. Claro que essas que interferem mais cruamente em assuntos

    momentosos tendem a perder sua atualidade quando publicadas em livro. No tem

    importncia. O cronista crnico, ligado ao tempo, deve estar encharcado, doente de seu tempo e ao mesmo tempo pairar acima dele.

    12/6/88

    Texto extrado do jornal "O Globo" - Rio de Janeiro.

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    Para atividade a seguir, os alunos acessaro no Youtube uma adaptao do texto A ltima crnica, de Fernando Sabino. importante que eles identifiquem no curta-metragem qual o aspecto distintivo entre a profisso de um cronista em relao a de um articulista, colunista (conforme foi apontado por Affonso Romano SantAnna no texto anterior) ou jornalista responsvel por relatar uma notcia ou reportagem.

    http://www.youtube.com/watch?v=FgH8XuTv3ZM

    Etapa 2 Crnica: fotografia ntima/ paisagem potica

    Esta etapa contemplar uma das facetas da crnica que o relato subjetivo, descompromissado com o factual e que se apresenta quase como uma fotografia ntima de um sujeito ou espao.

    http://www.youtube.com/watch?v=FgH8XuTv3ZM

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    Texto-1

    NO AEROPORTO

    Carlos Drummond de Andrade

    Viajou meu amigo Pedro. Fui lev-lo ao Galeo, onde esperamos trs horas o seu quadrimotor. Durante esse tempo, no faltou assunto para nos entretermos, embora no falssemos da v e numerosa matria atual. Sempre tivemos muito assunto, e no deixamos de explor-lo a fundo. Embora Pedro seja extremamente parco de palavras, e, a bem dizer, no se digne de pronunciar nenhuma. Quando muito, emite slabas; o mais conversa de gestos e expresses pelos quais se faz entender admiravelmente. o seu sistema.

    Passou dois meses e meio em nossa casa, e foi hspede ameno. Sorria para os moradores, com ou sem motivo plausvel. Era a sua arma, no direi secreta, porque ostensiva. A vista da pessoa humana lhe d prazer. Seu sorriso foi logo considerado sorriso especial, revelador de suas boas intenes para com o mundo ocidental e oriental, e em particular o nosso trecho de rua. Fornecedores, vizinhos e desconhecidos, gratificados com esse sorriso (encantador, apesar da falta de dentes), abonam a classificao.

    Devo dizer que Pedro, como visitante, nos deu trabalho; tinha horrios especiais, comidas especiais, roupas especiais, sabonetes especiais, criados especiais. Mas sua simples presena e seu sorriso compensariam providncias e privilgios maiores.

    Recebia tudo com naturalidade, sabendo-se merecedor das distines, e ningum se lembraria de ach-lo egosta ou importuno. Suas horas de sono - e lhe apraz dormir no s noite como principalmente de dia - eram respeitadas como ritos sagrados, a ponto de no ousarmos erguer a voz para no acord-lo. Acordaria sorrindo, como de costume, e no se zangaria com a gente, porm ns mesmos que no nos perdoaramos o corte de seus sonhos.

    Assim, por conta de Pedro, deixamos de ouvir muito concerto para violino e orquestra, de Bach, mas tambm nossos olhos e ouvidos se forraram tortura da tev. Andando na ponta dos ps, ou descalos, levamos tropees no escuro, mas sendo por amor de Pedro no tinha importncia.

    Objetos que visse em nossa mo, requisitava-os. Gosta de culos alheios (e no os usa), relgios de pulso, copos, xcaras e vidros em geral, artigos de escritrio, botes simples ou de punho. No colecionador; gosta das coisas para peg-las, mir-las e ( seu costume ou sua mania, que se h de fazer) p-las na boca. Quem no o conhecer dir que pssimo costume, porm duvido que mantenha este juzo diante de Pedro, de seu sorriso sem malcia e de suas pupilas azuis porque me esquecia de dizer que tem olhos azuis, cor que afasta qualquer suspeita ou acusao apressada, sobre a razo ntima de seus atos.

    Poderia acus-lo de incontinncia, porque no sabia distinguir entre os cmodos, e o que lhe ocorria fazer, fazia em qualquer parte? Zangar-me com ele porque destruiu a lmpada do escritrio? No. Jamais me voltei para Pedro que ele no me sorrisse; tivesse eu um impulso de irritao, e me sentiria desarmado com a sua azul maneira de olhar-me. Eu sabia que essas coisas eram indiferentes nossa amizade e, at, que a nossa amizade lhe conferia carter necessrio de prova; ou gratuito, de poesia e jogo.

    Viajou meu amigo Pedro. Fico refletindo na falta que faz um amigo de um ano de idade a seu companheiro j vivido e pudo. De repente o aeroporto ficou vazio.

    ANDRADE, Carlos Drummond de. Cadeira de balano. Reprod. Em: Poesia completa e prosa. Rio de Janeiro: Jos Aguilar, 1973. p.1107-1108

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    Texto-2

    A RUA

    Joo do Rio

    Eu amo a rua. Esse sentimento de natureza toda ntima no vos seria revelado por mim se no julgasse, e razes no tivesse para julgar, que este amor assim absoluto e assim exagerado partilhado por todos vs. Ns somos irmos, ns nos sentimos parecidos e iguais; nas cidades, nas aldeias, nos povoados, no porque soframos, com a dor e os desprazeres, a lei e a polcia, mas porque nos une, nivela e agremia o amor da rua. este mesmo o sentimento imperturbvel e indissolvel, o nico que, como a prpria vida, resiste s idades e s pocas. Tudo se transforma, tudo varia o amor, o dio, o egosmo. Hoje mais amargo o riso, mais dolorosa a ironia. Os sculos passam, deslizam, levando as coisas fteis e os acontecimentos notveis. S persiste e fica, legado das geraes cada vez maior, o amor da rua. (...) A verdade e o trocadilho! Os dicionrios dizem: "Rua, do latim ruga, sulco. Espao entre as casas e as povoaes por onde se anda e passeia." E Domingos Vieira, citando as Ordenaes: "Estradas e rua pruvicas antigamente usadas e os rios navegantes se som cabedaes que correm continuamente e de todo o tempo pero que o uso assy das estradas e ruas pruvicas." A obscuridade da gramtica e da lei! Os dicionrios s so considerados fontes fceis de completo saber pelos que nunca os folhearam. Abri o primeiro, abri o segundo, abri dez, vinte enciclopdias, manuseei in-folios especiais de curiosidade. A rua era para eles apenas um alinhado de fachadas, por onde se anda nas povoaes...

    Ora, a rua mais do que isso, a rua um fator da vida das cidades, a rua tem alma! Em Benars ou em Amsterd, em Londres ou em Buenos Aires, sob os cus mais diversos, nos mais variados climas, a rua a agasalhadora da misria. Os desgraados no se sentem de todo sem o auxlio dos deuses enquanto diante dos seus olhos uma rua abre para outra rua. A rua o aplauso dos medocres, dos infelizes, dos miserveis da arte. No paga ao Tamagno para ouvir berros atenorados de leo avaro, nem velha Patti para admitir um fio de voz velho, fraco e legendrio. Bate, em compensao, palmas aos saltimbancos que, sem voz, rouquejam com fome para alegr-la e para comer. A rua generosa. O crime, o delrio, a misria no os denuncia ela. A rua a transformadora das lnguas. Os Cndido de Figueiredo do universo estafam-se em juntar regrinhas para enclausurar expresses; os prosadores bradam contra os Cndido. A rua continua, matando substantivos, transformando a significao dos termos, impondo aos dicionrios as palavras que inventa, criando o calo que o patrimnio clssico dos lxicos futuros. A rua resume para o animal civilizado todo o conforto humano. D-Ihe luz, luxo, bem-estar, comodidade e at impresses selvagens no adejar das rvores e no trinar dos pssaros.

    A rua nasce, como o homem, do soluo, do espasmo. H suor humano na argamassa do seu calamento. Cada casa que se ergue feita do esforo exaustivo de muitos seres, e haveis de ter visto pedreiros e canteiros, ao erguer as pedras para as frontarias, cantarem, cobertos de suor, uma melopia to triste que pelo ar parece um arquejante soluo. A rua sente nos nervos essa misria da criao, e por isso a mais igualitria, a mais socialista, a mais niveladora das obras humanas. A rua criou todas as blagues e todos os lugares-comuns. Foi ela que fez a majestade dos rifes, dos brocardos, dos anexins, e foi tambm ela que batizou o imortal Calino. Sem o consentimento da rua no passam os sbios, e os charlates, que a lisonjeiam e lhe resumem a banalidade, so da primeira ocasio desfeitos e soprados como bolas de sabo. A rua a eterna imagem da ingenuidade. Comete crimes, desvaria noite, treme com a febre dos delrios, para ela como para as crianas a aurora sempre formosa, para ela no h o despertar triste, e quando o sol desponta e ela abre os olhos esquecida das prprias aes, , no encanto da vida renovada, no chilrear do passaredo, no embalo nostlgico dos preges - to modesta, to lavada, to risonha, que parece papaguear com o cu e com os anjos...

    A rua faz as celebridades e as revoltas, a rua criou um tipo universal, tipo que vive em cada aspecto urbano, em cada detalhe, em cada praa, tipo diablico que tem dos gnomos e dos silfos das florestas, tipo proteiforme, feito de risos e de lgrimas, de patifarias e de crimes irresponsveis, de abandono e de

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    indita filosofia, tipo esquisito e ambguo com saltos de felino e risos de navalha, o prodgio de uma criana mais sabida e ctica que os velhos de setenta invernos, mas cuja ingenuidade perptua, voz que d o apelido fatal aos potentados e nunca teve preocupaes, criatura que pede como se fosse natural pedir, aclama sem interesse, e pode rir, francamente, depois de ter conhecido todos os males da cidade, poeira doiro que se faz lama e torna a ser poeira - a rua criou o garoto!

    Essas qualidades ns as conhecemos vagamente. Para compreender a psicologia da rua no basta gozar-lhe as delcias como se goza o calor do sol e o lirismo do luar. preciso ter esprito vagabundo, cheio de curiosidades malss e os nervos com um perptuo desejo incompreensvel; preciso ser aquele que chamamos flneur e praticar o mais interessante dos esportes - a arte de flanar: fatigante o exerccio?

    Para os iniciados sempre foi grande regalo. A musa de Horcio, a p, no fez outra coisa nos quarteires de Roma. Sterne e Hoffmann proclamavam-lhe a profunda virtude, e Balzac fez todos os seus preciosos achados flanando. Flanar! A est um verbo universal sem entrada nos dicionrios, que no pertence a nenhuma lngua! Que significa flanar? Flanar ser vagabundo e refletir, ser basbaque e comentar, ter o vrus da observao ligado ao da vadiagem. Flanar ir por a, de manh, de dia, noite, meter-se nas rodas da populaa, admirar o menino da gaitinha ali esquina, seguir com os garotos o lutador do Cassino vestido de turco, gozar nas praas os ajuntamentos defronte das lanternas mgicas, conversar com os cantores de modinha das alfurjas da Sade, depois de ter ouvido dilettanti, de casaca aplaudirem o maior tenor do Lrico numa pera velha e m; ver os bonecos pintados a giz nos muros das casas, aps ter acompanhado um pintor afamado at a sua grande tela paga pelo Estado; estar sem fazer nada e achar absolutamente necessrio ir at um stio lbrego, para deixar de l ir, levado pela primeira impresso, por um dito que faz sorrir, um perfil que interessa, um par jovem cujo riso de amor causa inveja...

    [...]

    (A alma encantadora das ruas, 1908)

    Disponvel em < http://www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros/resumos_comentarios/a/a_alma_encantadora_das_ruas> Acesso em 20 de abril de 2012.

    http://www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros/resumos_comentarios/a/a_alma_encantadora_das_ruas

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    Para a atividade com os dois textos, o professor pode sugerir que os alunos comparem as duas concepes dos objetos fotografados pelas lentes de Drummond e Joo do Rio.

    A sala ser divida em grupos para a anlise dos textos. No entanto, todos lero as duas crnicas. Um grupo de alunos construir uma tabela que contenha os aspectos de caracterizao do personagem (adjetivos escolhidos, descries, repeties, marcadores subjetivos) do texto 1. Os mesmos atributos sero empregados para a personificao da rua no texto 2. Pode ser sugerido que os alunos consultem dicionrios virtuais para tirar dvidas do significado de alguns vocbulos e alguns nomes de escritores e personalidades citadas podem ser pesquisados no Google. No final, podem ser comparadas as duas acepes e explicitados quais aspectos da dimenso subjetiva da crnica so abordados nos dois textos.

    Etapa 3 Biografando imagens

    Nesta etapa, o professor enviar as imagens a seguir para os alunos e solicitar que cada um selecione a fotografia desejada, observe detalhes da imagem e, antes de escrever uma crnica sobre a cena escolhida, faa um arquivo rascunho que contenha os direcionamentos:

    a) A crnica ser de abordagem: () informativa, () literria ou () hbrida.

    b) necessrio o uso de um narrador ou interventor reflexivo (escritor implcito) que fotografa e/ ou reflete sobre o que narrado?

    c) Quem so os personagens? Qual tipo de conflito ou progresso narrativa eles podem desencadear?

    d) Que tipo de interao os personagens estabelecem com o espao no qual eles esto inseridos?

    e) Qual seria o possvel desfecho para a crnica? Haveria interveno pessoal, subjetiva do escritor/ narrador?

    FOTO 1

    Sebastio Salgado Disponvel em: . Acesso em: 20 de abril de 2012.

    http://ideiasramificadas.zip.net/arch2009-06-01_2009-06-30.html

  • 14

    FOTO 2

    Boris Kossoy

    Disponvel em: Disponvel em: 20 de abril de 2012.

    FOTO 3

    Cartier-Bresson

    Disponvel em Acesso em 20 de abril de 2012.

    http://evolucaofrancesa.com.br/blog/a-gosto-da-fotografia/http://www.saibadesign.com/2010/09/cartier-bresson-um-olhar-lucido/

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    Etapa 4 Fotografando a crnica

    Como ltima etapa, o aluno acessar o site http://sitenotadez.net/cronicas/ ou pesquisar na biblioteca e selecionar crnicas cujo contedo reflita sobre um problema crnico, uma crtica social. Em seguida, por meio do Google imagens ou com o auxlio de revistas e jornais, ser selecionada uma foto que represente o tema ou a crtica destacada pelo escritor escolhido. O professor poder organizar uma exposio dos textos e das imagens.

    http://sitenotadez.net/cronicas/

  • 16

    Sugesto 23

    Dados da Aula

    O que o aluno poder aprender com esta aula

    * Ler e interpretar uma notcia de jornal demonstrando conhecimento sobre o gnero. * Produzir uma crnica coletiva observando suas especificidades. * Correlacionar as estruturas textuais de cada gnero textual: crnica e notcia. * Elaborar uma crnica, a partir de uma notcia de jornal .

    Durao das atividades: aproximadamente 3 aulas de 50 minutos

    Conhecimentos prvios trabalhados pelo professor com o aluno

    Ser necessrio que o aluno esteja inserido no processo de letramento e que j tenha tido contato com o gnero Notcia de Jornal.

    Estratgias e recursos da aula

    Momento 1

    O professor iniciar a aula projetando o texto abaixo no data-show para ler juntamente com a turma:

    3 Aula adaptada do site http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=23180

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    Texto 1

    Notcia de Jornal

    Fernando Sabino

    Leio no jornal a notcia de que um homem morreu de fome. Um homem de cor branca, 30 anos presumveis, pobremente vestido, morreu de fome, sem socorros, em pleno centro da cidade, permanecendo deitado na calada durante 72 horas, para finalmente morrer de fome.

    Morreu de fome. Depois de insistentes pedidos e comentrios, uma ambulncia do Pronto Socorro e uma radiopatrulha foram ao local, mas regressaram sem prestar auxlio ao homem, que acabou morrendo de fome. Um homem que morreu de fome.

    Um homem que morreu de fome. O comissrio de planto (um homem) afirmou que o caso (morrer de fome) era da alada da Delegacia de Mendicncia, especialista em homens que morrem de fome. E o homem morreu de fome.

    O corpo do homem que morreu de fome foi recolhido ao Instituto Anatmico sem ser identificado. Nada se sabe dele, seno que morreu de fome.

    Um homem morre de fome em plena rua, entre centenas de passantes. Um homem cado na rua. Um bbado. Um vagabundo. Um mendigo, um anormal, um tarado, um pria, um marginal, um proscrito, um bicho, uma coisa - no um homem.

    (Texto na ntegra disponvel no site: http://www.fotolog.com.br/spokesman_/70276847)

    Momento 2

    O professor conversar com os alunos acerca do contedo do texto. Para direcionar essa conversa, ele poder lanar perguntas como:

    Qual o assunto do texto? Como era o homem que morreu de fome? Algum ajudou esse homem? Quem era o homem que morreu? possvel identificar a opinio do autor a respeito desse acontecimento? Qual , na sua opinio, o sentimento do autor quanto ao fato de um homem morrer de

    fome na rua? No texto fica evidente como o autor ficou sabendo dessa notcia. Como ele se

    informou desse fato?

    http://www.fotolog.com.br/spokesman_/70276847

  • 18

    O que as autoridades fizeram diante desse acontecimento? Na sua opinio, por que o autor repete vrias vezes que o homem morreu de fome?

    Momento 3

    Aps essa primeira conversa, o professor indagar aos alunos se eles identificam algumas caractersticas nesse texto que podem o tornar diferente de outros textos como histrias narradas, poesias, receitas (e outros gneros que eles conhecem).

    Os alunos devero concluir que esse texto apresenta uma certa opinio do autor acerca de um acontecimento do cotidiano (Neste caso o fato de um homem morrer de fome).

    O professor informar aos alunos, caso eles ainda no conheam esse gnero, que o texto de Fernando Sabino uma CRNICA, e que as crnicas so textos narrativos, ligados vida cotidiana, escritos com uma linguagem coloquial (menos formal) e que deixam transparecer opinies dos autores. Geralmente, as crnicas so textos curtos que podem apresentar humor.

    Momento 4

    Para que os alunos possam compreender melhor as especificidades desse gnero, o professor apresentar a notcia de jornal abaixo para contrastar as diferenas entre os dois gneros e tambm para compar-los quanto s semelhanas:

    HOMEM MORRE DE FOME NO CENTRO DA CIDADE

    Um homem de cor branca, 30 anos presumveis, pobremente vestido, morreu de fome

    ontem, no centro da cidade, depois de ter permanecido por setenta e duas horas deitado

    na calada. Uma ambulncia do Pronto Socorro e uma radiopatrulha, chamadas

    insistentemente por comerciantes instalados nas proximidades, nada fizeram, alegando

    que o caso fugia s suas atribuies, era da alada da Delegacia de Mendicncia. O

    corpo foi recolhido ao Instituto Mdico Legal, onde aguarda identificao.

    (Notcia retirada do livro: Portugus: uma proposta para o Letramento. Livro 7. Autora: Magda Soares)

    Essa notcia ser lida e o professor perguntar aos alunos:

    Qual a semelhana entre os textos lidos? (Ambos apresentam o mesmo contedo, ou seja, o mesmo fato - um homem morreu de fome)

    Quais as diferenas entre os textos lidos? (A notcia apenas apresenta o fato com um certo distanciamento, j a crnica apresenta o fato sob um outro ngulo, menos informativo e acrescido de um comentrio implcito do autor)

    Nesse momento, a conversa ser conduzida para que os alunos compreendam que ambos os textos apresentaram o mesmo fato, mas que a CRNICA um texto que extrapola o campo da

  • 19

    mera exposio de um acontecimento e revela um carter de questionamento e indagao acerca da vida cotidiana.

    Momento 5

    O professor dir aos alunos:

    Imaginem a situao: uma mulher agredida na rua por um homem e ningum a defende.

    A partir desse fato e das consideraes acerca das caractersticas da crnica, ser proposto que a turma escreva coletivamente uma crnica, contando, de forma mais detalhada, o acontecimento acima, deixando transparecer uma opinio.

    Para tanto, importante que a turma decida coletivamente e apresente na crnica:

    1. Identidade da mulher 2. Quando e onde o fato ocorreu. 3. Por que ningum a defendeu. 4. Como a mulher ficou aps a agresso. 5. O que aconteceu no final.

    Esse texto poder conter quatro pargrafos, sendo importante lembrar que o primeiro deve apresentar o fato ocorrido e os demais devem fornecer mais detalhes, ainda contendo comentrios de forma no explcita, de acordo com as opinies dos alunos.

    Momento 6

    Em um outro momento, a notcia, publicada no jornal VS , no dia 24/05/10, abaixo reportada, ser apresentada para os alunos:

  • 20

    (Notcia retirada do site: http://4.bp.blogspot.com/_2DNDFChJs/TEXg36_97gI/AAAAAAAAABw/IGu_brHzI4Q/s1600/JORNAL.jpg)

    http://4.bp.blogspot.com/_2DNDFChJs/TEXg36_97gI/AAAAAAAAABw/IGu_brHzI4Q/s1600/JORNAL.jpg

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    O professor pedir que os alunos, em duplas, leiam e respondam s seguintes perguntas sobre a notcia de jornal.

    1. Quando essa notcia foi escrita? 2. Em qual jornal ela foi publicada? 3. Quem o autor dessa notcia? 4. Qual a manchete (Ttulo) da notcia? 5. Por que, em sua opinio, "me assassinada" est em destaque na manchete? 6. Qual o fato relatado na notcia? 7. Onde aconteceu o assassinato? 8. Como a mulher foi encontrada? 9. Para onde foram levadas as crianas que testemunharam o crime? 10. Qual outro problema j havia ocorrido com as crianas? 11. O que voc sente ao saber de uma violncia como a relatada? 12. H informaes na notcia a respeito do assassino?

    Momento 7

    Aps a atividade realizada, a professora pedir a diferentes duplas que respondam oralmente as perguntas, a fim de realizar uma correo e uma discusso do assunto.

    Em seguida, o professor pedir que as mesmas duplas relatem o acontecimento da notcia lida: assassinato de uma me testemunhado pelos filhos, em forma de uma crnica.

    Para tanto, ser necessrio que o professor relembre que uma crnica um texto narrativo que conta um acontecimento da vida social, com uma linguagem simples, no apresentando carter jornalstico de informao (como o caso da notcia) mas um carter de narrao ou contao de caso com criticidade.

    Momento 8

    Caso o professor queira ampliar os objetivos da aula e torn-la interdisciplinar poder propor ao professor de Histria que realize uma discusso com os alunos a respeito da criminalidade crescente em nossa sociedade.

    Recursos Complementares

    Caso o professor queira complementar a aula poder ler alguns exemplos de crnicas que podem ser encontrados no site: http://www.pensador.info/cronicas_de_luiz_fernando_verissimo/

    http://

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    Sugesto 34

    CRNICA: A ARTE DA VIDA NA SALA DE AULA

    Contedos Literatura, estudo de texto e gneros textuais Habilidades: Identificar a estrutura da crnica em diferentes formas e espaos de comunicao e desenvolver o hbito da leitura.

    Durao das atividades: 3 aulas

    A crnica o gnero mais confessional do mundo, pois o cronista tira os seus temas do prprio cotidiano e fala de tudo, de poltica a sentimentos pessoais, aberta ou disfaradamente, deixando ao leitor o prazer do desvendar. Talvez por isso seja um texto dos mais agradveis de ler e uma forma extremamente eficaz de seduzir o aluno para a leitura. Voc pode aproveitar o texto de Lya Luft publicado em VEJA, para fazer um estudo desse gnero textual, colocando os alunos no papel de autores.

    4 Sugesto adaptada da Revista Nova Escola. Disponvel em: Acesso em 02 de maio de 2012.

    http://revistaescola.abril.com.br/ensino-medio/cronica-arte-vida-sala-aula-531809.shtmlhttp://revistaescola.abril.com.br/ensino-medio/cronica-arte-vida-sala-aula-531809.shtml

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    Lya Luft

    Brasileiro no gosta de ler?

    A meninada precisa ser seduzida. Ler pode ser divertido

    e interessante, pode entusiasmar, distrair e dar prazer

    No a primeira vez que falo nesse assunto, o da

    quantidade assustadora de analfabetos deste nosso

    Brasil. No sei bem a cifra oficial, e no acredito muito

    em cifras oficiais. Primeiro, precisa ser esclarecida a

    questo do que analfabetismo. E, para mim,

    alfabetizado no quem assina o nome, talvez embaixo

    de um documento, mas quem assina um documento que

    conseguiu ler e... entender. A imensa maioria dos ditos

    meramente alfabetizados no est nessa lista, portanto

    so analfabetos um dado melanclico para qualquer

    pas civilizado. Nem sempre um povo leitor interessa a

    um governo (falo de algum pas ficcional), pois quem

    l informado, e vai votar com relativa lucidez. Ler e escrever faz parte de ser gente.

    Sempre fui de muito ler, no por virtude, mas porque em nossa casa livro era um objeto

    cotidiano, como o po e o leite. Lembro de minhas avs de livro na mo quando no

    estavam lidando na casa. Minha cama de menina e mocinha era embutida em

    prateleiras. Criana insone, meu conforto nas noites interminveis era acender o abajur,

    estender a mo, e ali estavam os meus amigos. Algumas vezes acordei minha me

    esquecendo a hora e dando risadas com a boneca Emlia, de Monteiro Lobato, meu

    dolo em criana: fazia mil artes e todo mundo achava graa.

    E a escola no conseguiu estragar esse meu amor pelas histrias e pelas palavras. Digo

    isso com um pouco de ironia, mas sem nenhuma depreciao ao excelente colgio onde

    estudei, quando criana e adolescente, que muito me preparou para o mundo maior que

    eu conheceria saindo de minha cidadezinha aos 18 anos. Falo da impropriedade, que

    talvez exista at hoje (e que no era culpa das escolas, mas dos programas

    educacionais), de fazer adolescentes ler os clssicos brasileiros, os romnticos, seja o

    que for, quando eles ainda nem tm o prazer da leitura. Qualquer menino ou menina se

    assusta ao ler Macedo, Alencar e outros: vai achar enfadonho, no vai entender, no vai

    se entusiasmar. Para mim esses programas cometem um pecado bsico e fatal, afastando

    da leitura estudantes ainda imaturos.

    Como ler um hbito raro entre ns, e a meninada chega ao colgio achando livro uma

    coisa quase esquisita, e leitura uma chatice, talvez ela precise ser seduzida: percebendo

    que ler pode ser divertido, interessante, pode entusiasmar, distrair, dar prazer. Eu sugiro

    crnicas, pois temos grandes cronistas no Brasil, a comear por Rubem Braga e Paulo

    Ilustrao Atmica Studio

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    Mendes Campos, alm dos vivos como Verissimo e outros tantos. Alm disso, cada um

    deve descobrir o que gosta de ler, e vai gostar, talvez, pela vida afora. No preciso que

    todos amem os clssicos nem apreciem romance ou poesia. H quem goste de ler sobre

    esportes, exploraes, viagens, astronutica ou astronomia, histria, artes, computao,

    seja o que for.

    O que preciso ler. Revista serve, jornal timo, qualquer coisa que nos faa

    exercitar esse rgo to esquecido: o crebro. Lendo a gente aprende at sem sentir,

    cresce, fica mais poderoso e mais forte como indivduo, mais integrado no mundo, mais

    curioso, mais ligado. Mas para isso preciso, primeiro, alfabetizar-se, e no s l pelo

    ensino mdio, como ainda ocorre. Os primeiros anos so fundamentais no apenas por

    serem os primeiros, mas por construrem a base do que seremos, faremos e

    aprenderemos depois. Ali nasce a atitude em relao ao nosso lugar no mundo, escolhas

    pessoais e profissionais, pela vida afora. Por isso, esses primeiros anos, em que se

    aprende a ler e a escrever, deviam ser estimulantes, firmes, fortes e eficientes (no

    perversamente severos). J se faz um grande trabalho de leitura em muitas escolas. Mas,

    naquelas em que com 9 ou 10 anos o aluno ainda no usa com naturalidade a lngua

    materna, pouco se pode esperar. E no h como se queixar depois, com a eterna

    reclamao de que brasileiro no gosta de ler: essa porta nem lhe foi aberta.

    Atividades

    1 aula - Apresente classe uma lista com as caractersticas da crnica:

    publicada geralmente em jornais ou revistas;

    relata de forma artstica e pessoal fatos colhidos no noticirio jornalstico e no cotidiano;

    consiste em um texto curto e leve, que tem por objetivo divertir e/ou fazer refletir criticamente sobre a vida e os comportamentos humanos;

    pode apresentar elementos bsicos da narrativa - fatos, tempo, personagens e lugar - com tempo e espao no limitados;

    o narrador pode ser observador ou se constituir em personagem;

    emprega a variedade informal da lngua;

    pode apresentar discurso direto, indireto e indireto livre.

    Comente que o cronista expe seu ponto de vista, seus comentrios e dedues, suas ironias e interpretaes a respeito de fatos (notcias ou dia-a-dia pessoal). Ele no tem, no entanto, por finalidade apenas a informao, mas sua universalizao para que as pessoas aprendam alguma coisa com o que , aparentemente, corriqueiro. Por isso, Lya Luft diz que esse o melhor gnero para trabalhar em sala de aula.

    Lendo alguns trechos de crnicas extradas de jornais e revistas, mostre que os cronistas transformam o cotidiano em literatura,. Depois disso, faa uma leitura coletiva do texto de Lya

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    Luft, ressaltando algumas caractersticas citadas anteriormente. Complete mostrando que a crnica nem sempre apresenta uma narrativa. Como neste caso, ela pode comentar, analisar, descrever, sugerir, exemplificar, de maneira leve e curta, o cotidiano. Certifique-se de que a moada percebeu que Lya no apenas informa sobre o problema da leitura nas escolas brasileiras, mas nos faz refletir e sugere sadas para melhorar.

    2 aula - De acordo com a disponibilidade da escola, leve os alunos sala de informtica e pea que, em pequenos grupos, pesquisem os autores citados em VEJA e alguns outros que o professor pode sugerir (de preferncia, autores locais). Os jovens devem procurar uma crnica que fale sobre um tema que eles considerem interessante. Esta busca pode ser feita tambm em livros de Literatura, na biblioteca, ou em jornais e revistas.

    Depois da escolha feita, eles devem identificar as caractersticas gerais da crnica escolhida para apresentar aos colegas, por meio de leitura e comentrios. Para no ficar muito longo, pode-se pedir que cada grupo identifique uma das caractersticas, lendo apenas o trecho referente a ela. Podem ser lidas por inteiro aquelas que despertarem maior envolvimento da turma. V destacando, durante as apresentaes, a importncia da coeso no desenvolvimento deste tipo de narrativa breve. As ideias e os fatos devem ser muito bem "costurados" para que o texto atinja seu objetivo.

    Finalmente, para a aula seguinte, encomende a produo individual de uma crnica com tema livre, usando os textos pesquisados como referncia.

    3 aula - Cada um l e comenta sua crnica, explicando por que escolheu aquele assunto. Vale a pena fazer uma rpida avaliao oral coletiva. Pode levar umas duas aulas, mas voc poder ver o crescimento do interesse em ler as prprias produes e confirmar, a partir disso, a teoria de Lya Luft de que as crnicas so um timo instrumento a ser usado para estimular a leitura e a escrita. D um tempo para a exposio de opinies e um breve debate sobre a tese do autor.

    Filme baseado na obra clssica de Gabriel Garcia Mrquez

    Voc pode tambm desenvolver mais a ideia, fazendo um projeto para um ms ou mesmo um bimestre. De qualquer forma, vale a pena fazer uma sesso do filme Crnica de uma Morte Anunciada - baseado no clssico de Gabriel Garcia Mrquez (veja indicao abaixo) e indicar a leitura de paradidticos da srie Para Gostar de Ler, cinco volumes com crnicas selecionadas

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    que so uma tima porta de entrada para o mundo da leitura. O ideal que as escolhas sejam feitas de acordo com a faixa etria e a familiaridade do grupo com a leitura.

    Outra atividade complementar que pode servir de concluso a transposio dos textos produzidos para o teatro ou mesmo para filmes de curta metragem - filmados com telefones celulares. uma boa maneira de deixar bem claro que a crnica representa o cotidiano.

    Quer saber mais?

    BIBLIOGRAFIA A Laranja da Crnica, Carlos Eduardo Novaes, em A Cadeira do Dentista e Outras Crnicas, Ed. tica, tel.: (11) 3990-1775 As Crnicas Revelam Minha Biografia, Raquel de Queiroz, em Cenas Brasileiras, Ed. tica FILMOGRAFIA Crnica de Uma Morte Anunciada, de Francesco Rossi, 1987, LK.

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    Sugesto 45

    LITERATURA NA ESCOLA - 7 ANO: CRNICAS DE LUS FERNANDO VERSSIMO

    Objetivos

    Estimular o gosto pela leitura; Desenvolver a competncia leitora; Desenvolver a sensibilidade esttica, a imaginao, a criatividade e o senso crtico; Estabelecer relaes entre o lido/vivido ou conhecido (conhecimento de mundo); Revelar o dilogo entre literatura e tradio cultural; Perceber as particularidades do gnero Crnica.

    Contedos Forma literria; Parfrase, anlise e interpretao; Alienao, Personificao e Coisificao; Ditadura Militar no Brasil.

    Durao das atividades: 5 aulas

    Material necessrio

    - Livro O Nariz e Outras Crnicas. Lus Fernando Verssimo, 112 pgs, Editora tica, Coleo

    Para Gostar de Ler.

    - Se possvel, um computador ligado Internet.

    Desenvolvimento

    1 etapa: Sondagem oral

    Pergunte se os alunos j ouviram falar do cronista Lus Fernando Verssimo. Conhecem alguma

    obra que ele publicou? E sobre Crnica, j ouviram falar?

    A partir desta primeira sondagem, inicie sua aula, apresentando turma o escritor, bem como

    o gnero crnica. Se julgar necessrio, entregue aos alunos o texto do boxe abaixo.

    5 Disponvel em: http://revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/pratica-pedagogica/literatura-escola-7o-ano-cronicas-luis-fernando-verissimo-556378.shtml Acesso em 02 de maio de 2012.

    http://www.atica.com.br/http://revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/pratica-pedagogica/literatura-escola-7o-ano-cronicas-luis-fernando-verissimo-556378.shtml

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    Lus Fernando Verssimo e o gnero Crnica

    Lus Fernando Verssimo se firmou como escritor por meio da profisso de jornalista. A partir de 1970, comeou a escrever crnicas para o jornal Folha da Manh e logo se consagrou como escritor.

    A definio do gnero Crnica at hoje uma questo polmica. Segundo o autor Jorge de S, no livro A Crnica, a aparncia de simplicidade "decorre do fato de que a crnica surge primeiro no jornal, herdando a sua precariedade, esse seu lado efmero de quem nasce no comeo de uma leitura e morre antes que se acabe o dia, no instante em que o leitor transforma as pginas em papel de embrulho, ou guarda os recortes que mais lhe interessam no arquivo pessoal. O jornal, portanto, nasce, envelhece e morre a cada 24 horas. Nesse contexto, a crnica tambm assume sua transitoriedade, dirigindo-se inicialmente a leitores apressados, que leem nos pequenos intervalos da luta diria, no transporte ou no raro momento de trgua que a televiso lhes permite. Sua elaborao tambm se prende a essa urgncia: o cronista dispe de pouco tempo para datilografar o seu texto, criando-o, muitas vezes, na sala enfumaada de uma redao. Mesmo quando trabalha no conforto e no silncio de sua casa, ele premiado pela correria com que se faz um jornal, o que acontece mesmo com suplementos semanais, sempre diagramados com certa antecedncia.

    pressa de escrever, junta-se a de viver. Os acontecimentos so extremamente rpidos, e o cronista precisa de um ritmo gil para poder acompanh-los. Por isso a sua sintaxe lembra alguma coisa desestruturada, solta, mais prxima da conversa entre dois amigos do que propriamente do texto escrito. Dessa forma, h uma proximidade maior entre as normas da lngua escrita e da oralidade, sem que o narrador caia no equvoco de compor frases frouxas, sem a magicidade da elaborao, pois ele no perde de vista o fato de que o real no meramente copiado, mas recriado. O coloquialismo, portanto, deixa de ser a transcriao exata de uma frase ouvida na rua, para ser a elaborao de um dilogo entre o cronista e o leitor, a partir do qual a aparncia simplria ganha sua dimenso exata.

    No livro "O Nariz", de Luis Fernando Verssimo, h uma crnica intitulada "Ela". Pea que os alunos anotem individualmente suas ideias a respeito deste ttulo. O que ele deve significar? 2 etapa: leitura compartilhada do conto "Ela" e contextualizao da obra: a dcada de 70 no Brasil Leia com a turma o conto "Ela" e pea que os alunos comentem suas impresses gerais. Em seguida pergunte se, aps a leitura, as ideias que tinham a respeito do significado do ttulo "Ela" se mantiveram ou foram alteradas? Justifique

    Pea para a moada elencar todas as referncias a fatos histricos e os ttulos de programaes de televiso que aparecem na crnica. Pergunte aos estudantes se entenderam essas referncias, se sabem, por exemplo, o que era o Sheik de Agadir - ttulo de uma novela da dcada de 1960 - citado na crnica.

    A turma certamente ter dificuldade em entender alguns fatos. Faa, ento, a contextualizao para a classe e apresente as questes poltico/histricas do Brasil na dcada de 1970 (saiba mais no texto abaixo). Se possvel, convide o professor de Histria para ajudar nessa segunda etapa. Lembre-se que, conforme os alunos se aproximam do Ensino Mdio, a tendncia a escola trabalhar mais com aqueles livros que o adolescente no conseguiria ler

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    por conta prpria, seja por uma linguagem mais elaborada do ponto de vista esttico, seja porque o livro pertence a uma poca cujas referncias o estudante desconhece. Cabe ao professor fornecer o repertrio e os esclarecimentos necessrios para que a leitura se torne acessvel ao aluno. "O Nariz", por ser uma coletnea de crnicas, no apresenta grandes desafios do ponto de vista da linguagem, mas muitas narrativas fazem referncias a questes polticas e sociais do Brasil que devem ser explicadas.

    Na dcada de 1970, o Brasil ainda vivia sob o peso da ditadura militar e do Ato Institucional No 5. No havia liberdade de imprensa e os opositores ao regime eram perseguidos e torturados.

    Sob interesse dos governos militares e aproveitando o milagre econmico e a vitria da seleo brasileira em 1970, surgiam slogans e canes ufanistas como "Brasil, ame-o ou deixe-o" e "pra frente Brasil"

    Foi tambm um tempo de expanso da indstria televisiva, da publicidade e dos meios de

    comunicao de massa. Toda criao artstica que escapasse censura era submetida a um

    forte esquema comercial. Em 1978, a novela Dancin`Days fazia sucesso com uma trilha sonora

    e figurinos baseados na Disco Music norte americana.

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    3 etapa: anlise da crnica "Ela"

    ELA Lus Fernando Verssimo

    Ainda me lembro do dia em que ela chegou l em casa. To pequenininha! Foi uma festa. Botamos ela num quartinho dos fundos. Nosso Filho Naquele tempo s tinha o mais velho ficou maravilhado com ela. Era um custo tir-lo da frente dela para ir dormir.

    Combinamos que ele s poderia ir para o quarto dos fundos depois de fazer todas as lies.

    - Certo, certo.

    - Eu no ligava muito para ela. S para ver um futebol ou poltica. Naquele tempo, tinha poltica. Minha mulher tambm no via muito. Um programa humorstico, de vez em quando. Noites Cariocas Lembra de Noites Cariocas?

    - Lembro vagamente. O senhor vai querer mais alguma coisa? , me serve mais um destes. Depois decidimos que ela podia ficar na copa. A ela j estava mais crescidinha. Jantvamos com ela ligada, porque tinha um programa que o garoto no queria perder. Capito Qualquer Coisa. A empregada tambm gostava de dar uma espiada. Jos Roberto Kely. No tinha um Jos Roberto Kely?

    - No me lembro bem. O senhor no me leva a mal, mas no posso servir mais nada depois deste. Vamos fechar.

    - Minha mulher nem sonhava em botar ela na sala. Arruinaria toda a decorao. Nessa poca j tinha nascido o nosso segundo filho e ele s ficava quieto, para comer, com ela ligada. Quer dizer, aos pouco ela foi afetando os hbitos da casa. E ento surgiu um personagem novo nas nossas casas que iria mudar tudo. Sabe quem foi?

    - Quem?

    - O Sheik de Agadir. Eu, se quisesse, poderia processar o Sheik de Agadir. Ele arruinou o meu lar.

    - Certo. Vai querer a conta?

    - Minha mulher se apaixonou pelo Sheik de Agadir. Por causa dele, decidimos que ela poderia ir para a sala de visitas. Desde que ficasse num canto, escondida, e s aparecesse quando estivesse ligada. Ns tnhamos uma vida social intensa. Sempre iam visitas l em casa. Tambm saamos muito. Cinema, Teatro, jantar fora. Eu continuava s vendo futebol e notcia. Mas minha mulher estava sucumbindo depois do Sheik de Agadir, no queria perder nenhuma novela.

    - Certo. Aqui est a sua conta. Infelizmente temos que fechar o bar.

  • 31

    - Eu no quero a conta. Quero outra bebida. S mais uma.

    - Est bem S mais uma.

    - Nosso filho menor, o que nasceu depois do Sheik de Agadir, no saa de frente dela. Foi praticamente criado por ela. mais apegado a ela do que a prpria me. Quando a me briga com ele, ele corre pra perto dela pra se proteger. Mas onde que eu estava? Nas novelas. Minha mulher sucumbiu s novelas. No queria mais sair de casa. Quando chegava visita, ela fazia cara feia. E as crianas, claro, s faltavam bater em visita que chegasse em horrio nobre. Ningum mais conversava dentro de casa. Todo mundo de olho grudado nela. E ento aconteceu outra coisa fatal. Se arrependimento matasse

    - Termine a sua bebida, por favor. Temos que fechar.

    - Foi a copa do mundo. A de 74. Decidi que para as transmisses da copa do mundo ela deveria ser bem maior. E colorida. Foi a minha runa. Perdemos a copa, mas ela continua l, no meio da sala. Gigantesca. o mvel mais importante da casa. Minha mulher mudou a decorao da casa para combinar com ela. Antigamente ela ficava na copa para acompanhar o jantar. Agora todos jantam na sala para acompanh-la.

    - Aqui est a conta.

    - E, ento, aconteceu o pior. Foi ontem, hora do DancinDays e bateram na porta. Visitas. Ningum se mexeu. Falei para a empregada abrir a porta, mas ela fez Shhh! sem tirar os olhos da novela. Mandei os filhos, um por um, abrirem a porta, mas eles nem me responderam. Comecei a me levantar. E ento todos pularam em cima de mim. Sentaram no meu peito. Quando comecei a protestar, abafaram o meu rosto com a almofada cor de tijolo que minha mulher comprou para combinar com a maquiagem da Jlia. S na hora do comercial, consegui recuperar o ar e a sentenciei, apontando para ela ali, impvida no meio da sala: Ou ela, ou eu!. O silncio foi terrvel.

    - Est bem mas agora v para casa que precisamos fechar. J est quase clareando o dia

    - Mais tarde, depois da Sesso Coruja, quando todos estavam dormindo, entrei na sala, p ante p. Com a chave de parafuso na mo. Meu plano era atac-la por trs, abri-la e retirar uma vlvula qualquer. No iria adiantar muita coisa, eu sei. Eles chamariam um tcnico s pressas. Mas era um gesto simblico. Ela precisava saber quem que mandava dentro de casa. Precisava saber que algum no se entregava completamente a ela, que algum resistia. E ento, quando me preparava para soltar o primeiro parafuso, ouvi a sua voz. Se tocar em mim voc morre. Assim com toda a clareza. Se tocar em mim voc morre. Uma voz feminina, mas autoritria, dura. Tremi. Ela podia estar blefando, mas podia no estar. Agi depressa. Dei um chute no fio, desligando-a da tomada e pulei para longe antes que ela revidasse. Durante alguns minutos, nada aconteceu. Ento ela falou outra vez. Se no me ligar outra vez em um minuto, voc vai se arrepender. Eu no tinha alternativa. Conhecia o seu poder. Ela chegara l em casa pequenininha e aos poucos foi crescendo e tomando conta. Passiva, humilde, obediente. E vencera. Agora chegara a hora da conquista definitiva. Eu era o nico empecilho sua dominao completa. S esperava um bom pretexto para me eliminar com um raio cattico. Ainda tentei parlamentar. Pedi que ela poupasse a minha vida. Perguntei o que ela queria, afinal. Nada. S o que ela disse foi Voc tem 30 segundos.

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    - Muito bem. Mas preciso fechar. V para casa.

    - No posso.

    -Por qu?

    - Ela me proibiu de voltar l.

    Disponvel em < http://mardepoesia.wordpress.com/2011/03/22/a-televisao-chico-buarque/> Acesso

    em 20 de abril de 2012.

    Em aulas expositivas dialogadas, analise a crnica "Ela" com a turma, obedecendo aos procedimentos de anlise literria organizados abaixo:

    1) Parfrase:

    A parfrase a primeira parte da anlise. Ela um resumo do enredo, um "contar a histria com as suas prprias palavras", por isso deve ser curta e objetiva, deve resumir-se apenas ao essencial. Finalizada a leitura compartilhada, pergunte aos alunos do que fala o texto?

    Exemplo:

    A crnica "Ela" conta a histria da influncia crescente da televiso na vida de uma famlia brasileira, entre as dcadas de 1960 e 1970.

    Confirme se a sala est de posse dessa compreenso mnima. Caso no esteja, retome a leitura compartilhada.

    2) Anlise:

    Analisar "desmontar" o texto, verificar quais so as partes que o compe e como elas se articulam. Cada obra literria tem inmeros elementos que, articulados, a constituem. A ideia no investigar todos - nem seria possvel - mas apenas alguns. Quais? A anlise deve construir argumentos que sustentem a interpretao. ela que vai conduzir o leitor atravs do seu raciocnio.

    No podemos nos esquecer tambm que, em arte, forma contedo. Por isso, preciso ressaltar a contribuio que alguns aspectos formais possam vir a ter na economia da crnica. O que so aspectos formais? So elementos que se referem menos diretamente a o que est sendo dito e mais ao como est sendo dito. O tipo de narrador, a caracterizao de algum

    http://mardepoesia.wordpress.com/2011/03/22/a-televisao-chico-buarque/

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    personagem, o tempo, o espao e o tipo de discurso so alguns dos elementos formais que podem ser fundamentais para desvendar mistrios.

    Ao observar a crnica escolhida, fcil perceber algo que, em sua forma, lhe chame a ateno. Por exemplo, o fato de a crnica "Ela" possuir inmeras referncias histricas no pode passar despercebido. Partindo do princpio que o escritor Lus Fernando Verssimo domina plenamente a sua arte, devemos acreditar que tais referncias contribuem para o sentido do texto.

    Outro elemento formal que chama ateno o fato de o pronome pessoal "ela" sugerir, desde o ttulo, uma personificao do objeto televisor. Tal personificao, que se intensifica ao longo do texto, tambm produtora de sentido.

    Existem inmeros elementos passveis de anlise em uma boa obra literria. Se tivermos um olhar atento no que se refere forma, ento j ser possvel traar um caminho seguro pelo qual nossa anlise pode seguir. Retomemos o tema depois.

    Exemplo de anlise

    O ttulo da crnica "Ela", por ser um pronome pessoal, sugere que a narrativa vai falar de uma pessoa do sexo feminino. Tal sugesto intensificada nas primeiras frases:

    "Ainda me lembro do dia em que ela chegou l em casa. To pequenininha! Foi uma festa."

    Em seguida, temos a impresso de que "Ela" , na verdade, um animalzinho de estimao:

    "Botamos ela num quartinho dos fundos. Nosso filho - naquele tempo s tnhamos o mais velho - ficou maravilhado com ela. Era um custo tir-lo da frente dela para ir dormir." Note que foram usadas citaes de trechos da crnica. Isso no s possvel como geralmente muito til. Quanto mais sua anlise der voz ao texto, melhor. Ento a crnica realiza uma primeira quebra de expectativa com efeito de humor: percebemos que se trata de um aparelho de TV.

    "- Eu no ligava muito pra ela. S pra ver um futebol, ou poltica. Naquele tempo tinha poltica. Minha mulher tambm no via muito. Um programa humorstico, de vez em quando. Noites Cariocas... Lembra de Noites Cariocas?- Lembro. Vagamente. O senhor vai querer mais alguma coisa."

    A partir do trecho acima, a crnica de Lus Fernando Verssimo diz a que veio: temos a percepo de que o narrador-personagem narra sua histria em dilogo com um interlocutor que, provavelmente, um garom que no parece muito disposto a escut-lo. Temos uma referncia ao golpe militar de 1964 ("Naquele tempo tinha poltica.") e podemos deduzir que os acontecimentos narrados tm incio antes do Golpe e o narrador fala ao garom ainda durante a represso. Temos tambm, completando a referncia temporal, a aluso a um programa televisivo de 1961: "Noites Cariocas".

    3) Comentrio:

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    O comentrio se faz necessrio no momento em que a anlise solicita informaes externas obra literria para elucidar seu sentido profundo. Isso porque a Literatura, apesar de sua relativa autonomia, faz parte do tecido social em que est inserida. Como explica Antonio Candido no livro Na sala de aula: caderno de anlise literria, as "circunstncias de sua composio, o momento histrico, a vida do autor, o gnero literrio, as tendncias estticas de seu tempo, etc. S encarando-a assim teremos elementos para avaliar o significado da maneira mais completa possvel (que sempre incompleta, apesar de tudo)". Nessa crnica as referncias histria do Brasil so de fundamental importncia para a compreenso do leitor. 4) Continuao da anlise:

    A partir de ento o narrador conta que a famlia comprou um aparelho maior e o mudou para a copa, interferindo nos hbitos da famlia. Note que ele jamais deixa de personificar a televiso:

    "A ela j estava mais crescidinha. Jantvamos com ela ligada, porque tinha um programa que o garoto no queria perder. (...) A empregada tambm gostava de dar uma espiada. Jos Roberto Kelly."

    Aqui vale recorrer novamente ao comentrio: Na entrada dos anos 60, a popularizao dos desfiles de carnaval marcou o incio da ascenso do samba-enredo e o declnio da marchinha e dos blocos. Jos Roberto Kelly foi um dos ltimos compositores que brilharam no gnero, com Cabeleira do Zez e Mulata I-I-I., antes do Ato Institucional no 5, de 1968.

    A narrativa continua contando como a televiso muda os hbitos da casa do narrador, assim como os da famlia brasileira: sua mulher comea a seguir apaixonadamente as telenovelas.

    "Foi ento que surgiu um personagem novo nas nossas vidas que iria mudar tudo. Sabe quem foi? - Quem? - O Sheik de Agadir. Eu, se quisesse, poderia processar o Sheik de Agadir. Ele arruinou meu lar."

    Conforme o tempo passa e as novelas despertam interesse da famlia, a TV avana da copa para a sala de visitas, interferindo na vida social do casal. O narrador passa a marcar o tempo em funo das telenovelas:

    "- Nosso filho menor, o que nasceu depois do Sheik de Agadir, no saa da frente dela. Foi praticamente criado por ela."

    Note que, medida em que aumenta a influncia do televisor, o recurso personificao o torna cada vez mais humano e imperativo, enquanto a famlia, por sua vez, vai se tornando cada vez mais objetificada:

    "Minha mulher sucumbiu s novelas. No queria mais sair de casa." "Ningum conversava dentro de casa." "Agora todos jantam na sala para acompanh-la."

    A situao chega ao limite com a novela DancinDays, de 1978, quando a esposa muda a decorao da sala para combinar com a maquiagem de Jlia -a atriz Snia Braga. O narrador/personagem pede famlia que escolha entre ele e a TV, mas a famlia responde com

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    um terrvel silncio. Quanto mais ele deseja contar sua histria, menos seu interlocutor deseja escut-lo, com pressa de fechar o bar:

    "_ Est bem. Mas agora v para casa que precisamos fechar. J est quase clareando o dia..."

    Ento a crnica entra no registro da fantasia, com o pai de famlia tentando desligar a televiso como quem comete um assassinato.

    "Se tocar em mim, voc morre". Uma voz feminina, mas autoritria, dura. Tremi. Ela podia estar blefando, mas podia no estar."

    Finalmente a crnica termina com a narrativa do fracasso do homem em se livrar do terrvel aparelho.

    "- Muito bem. Mas preciso fechar. V para casa. - No posso. - Por qu? - Ela me proibiu de voltar l."

    6) Interpretao: A interpretao corresponde questo "do que fala o texto?". Ela a exposio do sentido profundo da obra literria. ele que estamos buscando desde o incio. Quando analisamos, queremos saber o que est dito por meio dos silncios, nas entrelinhas; o que se origina da relao ntima entre forma e contedo. Se na anlise desmontamos o texto em partes, na interpretao temos de reorganiz-lo como um todo, um todo de sentido capaz de reunir forma e contedo. Afinal, do que fala a crnica de Lus Fernando Verssimo?

    Exemplo de interpretao

    "Ela" narra a influncia desagregadora da televiso na vida de uma famlia entre as dcadas de 60 e 80. Mais que isso, as inmeras referncias histricas presentes na crnica permitem traar um paralelo entre a famlia do narrador e a famlia brasileira. O humor crtico de L. F. Verssimo mostra como a populao brasileira se aliena diante da cultura de massa televisiva, tornando-se coisa, enquanto a televiso, personificada, torna-se gente.

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    4. Sugestes de Atividades :

    8 e 9 anos

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    Sugesto 16

    Dados da Aula

    O que o aluno poder aprender com esta aula

    Ler crnicas literrias;

    estabelecer relaes entre a notcia e a crnica literria; reconhecer os efeitos de sentido na (re)construo de notcias de jornal em crnicas

    do autor; reconhecer os elementos de estruturao da crnica; construir crnicas inspiradas em manchetes de jornal.

    Durao das atividades: 4 aulas de 50 minutos.

    Aula 1:

    Nesta aula ser feito um estudo do gnero crnica (texto literrio) relacionando-o com o gnero notcia (texto jornalstico).

    Trabalharemos as crnicas de Moacyr Scliar, publicadas na seo "Cotidiano" do jornal Folha de S. Paulo e transpostas para o livro O Imaginrio Cotidiano, de 2001.

    Esta relao no nova, visto que a crnica historicamente se fortalece no mesmo meio de publicao das notcias, o jornal impresso, e que a matria tanto de um quanto de outro gnero so os fatos dirios e corriqueiros, muitos, inclusive, no caso da crnica, tratados como pequenos acontecimentos do dia a dia, que passariam sem ser notados por sua pouca importncia.

    Porm, tais acontecimentos, nas letras dos grandes escritores tornam-se eternos ou, ao menos, relevantes para a reflexo dos leitores.

    A relao entre a crnica de Scliar e a notcia bastante interessante, como veremos, pois o autor baseia-se em acontecimentos publicados no mesmo jornal para criar seu texto literrio.

    6 Disponvel e: Acesso em 03 de maio

    de 2012.

    Capa do livro O Imaginrio cotidiano de 2001

    http://www.scliar.org/moacyr/livros/livros.htm

    http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=30851http://www.scliar.org/moacyr/livros/livros.htmhttp://www.scliar.org/moacyr/livros/livros.htm

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    1 ATIVIDADE

    Antes de adentrarmos o livro de Scliar e conhecermos as notcias que deram inspirao ao autor para as crnicas, importante lembrar aos alunos das caractersticas mais comuns nos dois gneros.

    Certamente seus alunos conhecem bem tais gneros, questione-os sobre o que poderia ser apontado como prprio de cada um e registre as informaes necessrias para compor um quadro comparativo.

    Provavelmente, o quadro comparativo seria como este:

    H outras caractersticas que se aplicam a um ou outro gnero e lembremos que pode haver muitas comuns entre eles.

    O quadro acima apenas uma referncia para o que se espera do registro aps a conversa com os alunos.

    Abaixo um link no qual h um resumo sobre a crnica literria.

    http://www.sitedeliteratura.com/Teoria/cronicas.htm

    A relao entre a crnica e a notcia publicadas em jornal muito prxima se pensarmos que os dois gneros tm relativamente uma vida curta.

    Em meio dinmica do cotidiano e pressa dos leitores, o texto curto e rpido da crnica, de linguagem aparentemente simples, perde-se do olhar da maioria dos leitores a cada dia, como bem afirma Jorge de S:

    http://www.sitedeliteratura.com/Teoria/cronicas.htm

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    A aparncia de simplicidade, portanto, no quer dizer desconhecimento das artimanhas artsticas. Ela decorre do fato de que a crnica surge primeiro no jornal, herdando a sua precariedade, esse seu lado efmero de quem nasce no comeo de uma leitura e morre antes que se acabe o dia, no instante em que o leitor transforma as pginas em papel de embrulho, ou guarda os recortes que mais lhe interessam num arquivo pessoal. O jornal, portanto, nasce, envelhece e morre a cada 24 horas. Nesse contexto, a crnica tambm assume essa transitoriedade, dirigindo-se inicialmente a leitores apressados, que leem nos pequenos intervalos da luta diria, no transporte ou no raro momento de trgua que a televiso lhes permite. (...)

    pressa de escrever, junta-se a de viver. Os acontecimentos so extremamente rpidos, e o cronista precisa de um ritmo gil para poder acompanh-los. Por isso a sua sintaxe lembra alguma coisa desestruturada, solta, mais prxima da conversa entre dois amigos do que propriamente do texto escrito. Dessa forma, h uma proximidade maior entre as normas da lngua escrita e da oralidade, sem que o narrador caia no equvoco de compor frases frouxas, sem a magicidade da elaborao, pois ele no perde de ser a transcriao exata de uma frase ouvida na rua, para ser a elaborao de um dilogo entre o cronista e o leitor, a partir do qual a aparncia simplria ganha sua dimenso exata. (S, p. 10-11).

    As crnicas escolhidas para esta aula poderiam ser um exemplo desta transitoriedade, se tivessem sido apenas publicadas no jornal impresso.

    Mas a partir do momento que seu autor decide transport-las para as pginas de um livro, as crnicas passam a ter um suporte mais slido, mais sofisticado e mais duradouro.

    Portanto, quando a crnica passa do jornal para o livro, sua existncia e seu valor como texto literrio se ampliam, podendo ser lido em qualquer tempo e no apenas em um dado momento da histria.

    Professor, distribua para os alunos o trecho de Jorge de S, citado acima, e, aps a leitura individual, inicie um debate na sala de aula objetivando analisar o comentrio do autor, relacionando suas ideias sobre as expectativas do leitor de crnicas e sobre a linguagem deste gnero com as caractersticas da crnica e da notcia apontadas anteriormente no quadro.

    Antes de passar para a segunda atividade, indique para os estudantes a pesquisa dos links abaixo que os levaro a um pouco de conhecimento sobre o autor Moacyr Scliar entrevistado no programa Roda Viva da TV Cultura.

    "Roda Viva" entrevista Moacyr Scliar:

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    http://www.youtube.com/watch?v=H2LWNhRDMTk

    http://www.youtube.com/watch?v=mLyyUDnplwM&feature=related

    http://www.youtube.com/watch?v=m1u2I-Ld2HU&feature=relmfu

    http://www.youtube.com/watch?v=j9i91fiaPdQ&feature=related

    Aps a pesquisa, pergunte a seus alunos quais as manifestaes mais curiosas e interessantes do autor sobre sua relao com o texto escrito.

    2 ATIVIDADE

    Professor, comente com seus alunos sobre as crnicas escolhidas para esta aula, retiradas do livro O imaginrio cotidiano, de Moacyr Scliar.

    Tais narrativas foram inspiradas em notcias publicadas no jornal Folha de S. Paulo, e inicialmente publicadas tambm naquele suporte. Apesar disso, o autor deixa claro no prefcio que deveria escrever fico, narrativas imaginrias, e no notcias. Os fatos reais so apenas uma luz para iluminar o caminho da imaginao do escritor.

    Abaixo, professor, indicaremos algumas crnicas do autor, retiradas das pginas do acervo eletrnico do jornal, assim como as notcias que inspiraram cada criao de Moacyr Scliar.

    Divida a turma em 8 pequenos grupos e estabelea como tarefa para a atividade a busca da notcia e da crnica neste suporte virtual.

    Caso possuam o livro, basta buscar a notcia no site do jornal e fazer a leitura da crnica no suporte que desejarem.

    Sorteie e distribua os textos aos grupos, alm de algumas questes para a apresentao aps a leitura:

    a) Qual a relao da crnica com a notcia? Aponte semelhanas temticas e as diferenas na composio dos gneros.

    b) Encontre nas notcias os dados reais, ou seja, identifiquem uma realidade especfica: local de ocorrncia, data, nome dos personagens envolvidos.

    Discuta com os colegas e conclua se o mesmo ocorre na crnica.

    c) Encontre no texto literrio de Moacyr Scliar marcas de uma linguagem menos formal: regionalismos, grias, construes coloquiais etc.

    http://www.youtube.com/watch?v=H2LWNhRDMTkhttp://www.youtube.com/watch?v=mLyyUDnplwM&feature=relatedhttp://www.youtube.com/watch?v=m1u2I-Ld2HU&feature=relmfuhttp://www.youtube.com/watch?v=j9i91fiaPdQ&feature=related

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    d) Quais os comentrios do narrador, situaes inslitas ou efeitos estilsticos de humor ou ironia presentes na crnica?

    Discuta com os colegas e conclua se o mesmo ocorre na notcia.

    e) Qual o foco dado ao tema na crnica? O texto literrio estimula o leitor a fazer algum tipo de reflexo sobre o fato cotidiano? Como vocs a interpretam?

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    Sugesto 27

    O que o aluno poder aprender com esta aula

    Compreender os objetivos do gnero; Conhecer as caractersticas do gnero; Identificar as caractersticas da crnica argumentativa a partir dos estudos realizados.

    Durao das atividades: 3 horas/ aula

    Conhecimentos prvios trabalhados pelo professor com o aluno

    Habilidades bsicas de leitura;

    Conhecimento sobre o gnero crnica narrativa;

    Noes de texto argumentativo/opinativo.

    Estratgias e recursos da aula

    Primeira parte:

    Professor: inicie a aula apresentado as imagens abaixo para os alunos. Aps a observao, pergunte-lhes o que elas sugerem, permita que os alunos levantem hipteses.

    7 Aula retirada do site: http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=28486

    http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=28486

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    Imagens disponveis em:

    http://www.google.com.br/images?hl=pt-br&um=1&ie=UTF-source=og&sa=N&tab=wi&biw=1024&bih=578&q=globaliza%C3%A7%C3%A3o&tbs=isch:1

    Professor: assim que os alunos terminarem as consideraes sobre as imagens, distribua cpia do texto Globalizao bom ou ruim? de Hila Rodrigues e selecione alguns alunos para realizarem a leitura em voz alta.

    Globalizao bom ou ruim?

    A palavra globalizao quer dizer a unio de todos os pases do mundo em busca de uma coisa s: desenvolvimento, crescimento e uma economia forte. Ou seja, muito trabalho, muita produo de bens para vender, muitos servios para oferecer, etc. No fundo, so aes voltadas para a gerao de riquezas que possam beneficiar a todos.

    O problema que, na prtica, as coisas ainda no esto acontecendo desta maneira. Os pases pobres continuam pobres. E os ricos continuam ricos e mais poderosos. O resultado que em alguns lugares, como o Brasil, grande parte das pessoas continua sem emprego e, portanto, sem dinheiro para levar uma vida melhor com boa alimentao, bom atendimento na rea de sade, boas escolas, etc.

    Na opinio das pessoas que organizam o Frum Social Mundial, a globalizao s tem sido boa para os pases do Primeiro Mundo, como os Estados Unidos, por exemplo. Os organizadores afirmam que no Brasil, onde muitas pessoas no tm sequer a chance de ir escola, ainda h muito o que fazer antes de discutir os interesses dos pases mais ricos. E foi exatamente para chamar a ateno desses pases mais desenvolvidos que os organizadores do Frum Social Mundial decidiram realizar suas reunies na mesma semana em que era realizado, na Sua, o Frum de Davos, que foi um encontro entre todos os representantes dos pases mais ricos. Eles se reuniram para discutir o futuro da economia em todo o mundo, ainda com base na globalizao.

    http://www.google.com.br/images?hl=pt-br&um=1&ie=UTF-source=og&sa=N&tab=wi&biw=1024&bih=578&q=globaliza%C3%A7%C3%A3o&tbs=isch:1%20http://www.google.com.br/images?hl=pt-br&um=1&ie=UTF-source=og&sa=N&tab=wi&biw=1024&bih=578&q=globaliza%C3%A7%C3%A3o&tbs=isch:1%20

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    Mas, no final, acabaram reconhecendo que o Frum Social Mundial foi importante para mostrar que nem todas as pessoas esto satisfeitas. E que uma parte do mundo tem propostas diferentes: melhorar os projetos sociais para a populao carente, gerar emprego para todos, e garantir justia, sade e educao nos pases mais pobres.

    HILA RODRIGUES. Estado de Minas, Belo Horizonte, 03 dez. 2001. (Adaptado.)

    Professor: aps a leitura comente com os alunos que como eles j estudaram, a crnica um texto curto cujo contedo se baseia em um fato do cotidiano. No entanto, a crnica lida se distingue das crnicas que eles esto acostumados a ler. (crnicas narrativas) Partindo desses comentrios proponha algumas questes para serem realizadas por escrito:

    1. Qual o tema abordado?

    2. O texto se baseou em qual fato ocorrido?

    3. De acordo com o texto, qual o significado da palavra globalizao? E quais so seus benefcios?

    4. Diferentemente das crnicas que vocs esto habituados a ler que tm como objetivo contar uma histria, qual o objetivo da autora do texto?

    5. Qual a opinio da autora sobre o assunto tratado?

    6. Quais so os argumentos utilizados pela autora para embasar sua opinio?

    7. Qual foi a atitude tomada pelos organizadores do Frum Social Mundial para demonstrar insatisfao?

    8. Normalmente a linguagem empregada na crnica argumentativa a variedade padro. Quanto ao tema do texto lido, podemos dizer que houve um tratamento objetivo e impessoal, ou subjetivo e pessoal? Por qu?

    9. No ltimo pargrafo, a autora apresenta as necessidades apontadas pelos pases pobres. Quais so as necessidades? Qual o propsito dessa explanao?

    Professor: faa a correo da atividade e oriente os alunos, caso seja necessrio, a completarem as respostas dadas. Atravs da correo e dos apontamentos certifique-se se os alunos esto compreendendo o objetivo e as caractersticas desse gnero.

    Segunda etapa:

    Professor: relembre aos alunos que o texto lido na atividade anterior tratava-se de uma crnica argumentativa na qual eram apresentados argumentos que justificavam e relacionavam as ideias defendidas pela autora do texto. Em seguida, solicite aos alunos que pesquisem notcias recentes sobre fatos polmicos como: trabalho infantil, escravizao da moda, violncia nas escolas, atitudes preconceituosas etc. Aps a coleta das notcias, eles se reuniro em dupla a fim de selecionarem uma das notcias pesquisadas para produzirem uma crnica argumentativa. Para tanto, os alunos devem seguir o roteiro abaixo:

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    1. Elabore um texto expondo seu ponto de vista sobre o assunto tratado na notcia selecionada. Faa uma breve introduo, apresentando o tema; depois crie argumentos para fundamentar o ponto de vista defendido. Crie uma concluso criativa.

    2. Empregue a variedade padro da lngua.

    3. Troque o texto com outra dupla. Verifique se o ponto de vista est claro, se os argumentos esto convincentes.

    4. Releia o texto e faa as sugestes de modificao necessrias.

    5. Reescreva o texto fazendo as alteraes sugeridas e, em seguida, apresenta-o para toda a classe.

    Professor: durante a realizao dessa atividade, oriente as duplas para a elaborao dos textos, bem como colabore para reescrita dos mesmos.

    Professor: primeiramente retome oralmente as caractersticas do gnero crnica, depois com a sua ajuda, proponha que os alunos escrevam um pargrafo sobre esse gnero. Para tanto, destaque que no pode faltar nesse texto:

    1. Qual o objetivo do texto? E o tema?

    2. Quais so as estratgias utilizadas para alcanar o objetivo proposto?

    3. Qual a linguagem normalmente empregada?

    Recursos Complementares

    Leitura complementar:

    Disponvel em:

    http://www.brasilescola.com/redacao/a-cronica-argumentativa.htm

    http://www.brasilescola.com/redacao/a-cronica-argumentativa.htm

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    Sugesto 38

    Dados da Aula

    O que o aluno poder aprender com esta aula

    Identificar os elementos organizacionais e estruturais da crnica. Identificar a finalidade do gnero textual crnica.Compreender as diferenas e

    semelhanas entre a crnica e a notcia. Conhecer as prticas sociais de produo e circulao da crnica. Conhecer crnicas variadas e envolver-se na produo desse gnero textual.

    Durao das atividades: 5 aulas de 50 minutos

    Conhecimentos prvios trabalhados pelo professor com o aluno

    O aluno deve ter algum conhecimento a respeito de notcias e da estrutura do jornal.

    Estratgias e recursos da aula

    Para orientar a aula, segue uma breve definio de crnica:

    Originalmente a crnica limitava-se a relatos verdicos e nobres, pois tratava-se da compilao

    de fatos histricos, apresentados segundo a ordem de sucesso no tempo, como o dia-a-dia da

    corte, as histrias, os reis, seus atos, etc. Mais tarde, entretanto, grandes escritores, a partir do

    sculo XIX passam a cultiv-la, refletindo com argcia e oportunismo, a vida social, a poltica,

    os costumes, o cotidiano, etc. do seu tempo em livros, jornais e folhetins.

    Contemporaneamente, no jornalismo, em coluna de peridicos, assinada, pode vir em forma de

    notcias, comentrios, algumas vezes crticos e polmicos, abordando temas ligados a atividades

    culturais (literatura, teatro, cinema, etc.), polticas, econmicas, de divulgao cientfica,

    desportivas, etc.. Atualmente tambm abrange o noticirio social e mundano. Conforme a esfera

    social que retrata, recebe o nome de crnica literria, policial, esportiva, poltica, jornalstica,

    etc.

    Quanto ao estilo, geralmente um texto curto, breve, simples, de interlocuo direta com o

    leitor, com marcas bem tpicas da oralidade. Quando predominantemente narrativa, possui

    trama, quase sempre pouco definida, sem conflitos densos, personagens de pouca densidade

    psicolgica, o que a diferencia do conto. Os motivos, na maior parte, extrados do cotidiano

    imediato. Alm do tipo narrativo, tambm pode ser do tipo argumentativo ou expositivo, como

    textos de opinio sobre temas diversos de diversas reas.

    COSTA, Srgio Roberto. Dicionrio de gneros textuais. Belo Horizonte: Autntica: 2008.

    8 8 Aula retirada do site http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=28409

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    ATIVIDADE 1:

    Leia com os alunos o seguinte trecho do texto O nascimento da crnica, de Machado de Assis:

    H um meio certo de comear a crnica por uma trivialidade. dizer: Que calor! Que

    desenfreado calor! Diz-se isto, agitando as pontas do leno, bufando como um touro, ou

    simplesmente sacudindo a sobrecasaca. Resvala-se do calor aos fenmenos

    atmosfricos, fazem-se algumas conjeturas acerca do sol e da lua, outras sobre a febre

    amarela, manda-se um suspiro a Petrpolis, e La glace est rompue; est comeada a

    crnica.

    No posso dizer positivamente em que ano nasceu a crnica; mas h toda a

    probabilidade de crer que foi coetnea das primeiras duas vizinhas. Essas vizinhas,

    entre o jantar e a merenda, sentaram-se porta, para debicar os sucessos do dia.

    Provavelmente comearam a lastimar-se do calor. Uma diria que no pudera comer ao

    jantar, outra que tinha a camisa mais ensopando que as ervas que comera. Passar das

    ervas s plantaes do morador fronteiro, e logo s tropelias amatrias do dito morador,

    e ao resto, era a coisa mais fcil, natural e possvel do mundo. Eis a origem da crnica.

    [...]

    Disponvel em: http://www.releituras.com/machadodeassis_menu.asp

    Aps a leitura, ajude os alunos a entenderem palavras que no conhecem no texto. Esse trabalho pode ser feito por meio de inferncias, buscando compreender a palavra no seu contexto, ou por meio do uso de dicionrio.

    Faa algumas perguntas para os alunos:

    Qual o assunto do texto lido? Segundo o autor, como a crnica comea? Por que ele considera que o calor um bom modo de comear a crnica? Que explicao dada no texto para o surgimento da crnica? Por que o autor afirma que a crnica nasce na mesma poca das primeiras vizinhas?

    IMPORTANTE: Caso perceba que os alunos ainda no entenderam o texto, elabore outras perguntas. Alm disso, solicite que um deles ou mais de um parafraseie o texto, uma vez que, quando o leitor consegue dizer o contedo do texto com as prprias palavras sinal claro de que o entendeu.

    Depois da atividade de compreenso do texto, pergunte para os estudantes que caractersticas pode-se inferir que a crnica tem, com base no texto lido. Espera-se que eles percebam que a crnica tem como caractersticas partir de um fato cotidiano, aparentemente banal, ao qual se d uma nova aparncia por meio do olhar do cronista.

    http://www.releituras.com/machadodeassis_menu.asp

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    ATIVIDADE 2

    Comece a aula exibindo para os alunos o seguinte vdeo:

    http://www.youtube.com/watch?v=jQVvKZQ9jOo&feature=related

    Explore com os estudantes a segunda parte do vdeo (a partir dos 2minutos). Explique para eles que nesse vdeo esto sendo entrevistados dois importantes cronistas brasileiros: Luiz Fernando Verssimo e Moacyr Scliar. Para maiores informaes sobre os dois, sugere-se a leitura de suas biografias, disponveis em:

    http://www.releituras.com/lfverissimo_bio.asp

    http://www.releituras.com/mscliar_bio.asp

    Relacione o vdeo assistido com o que foi discutido na aula anterior, especialmente a parte na qual Moacir Scliar fala que a crnica a forma literria dessa conversa informal e Remete ao cotidiano, com conotao literria. Reforce a ideia de que as crnicas, de modo geral, tentam dar uma nova roupagem aos fatos cotidianos. Para isso, pode ser lido para os alunos a seguinte fala de Fernando Sabino:

    A crnica algo para ser lido enquanto se toma o caf da manh, pois ela busca o

    pitoresco ou o irrisrio no cotidiano de cada um. o fato mido: a notcia em que

    ningum prestou ateno, o acontecimento insignificante, a cena corriqueira. Eu

    pretendia apenas recolher da vida diria algo de seu disperso contedo humano. Visava

    ao circunstancial, ao episdico. Nessa perseguio do acidental, quer num flagrante de

    esquina, quer nas palavras de uma criana, num incidente domstico, torno-me simples

    espectador.

    Fernando Sabino. Trecho presente em COSTA, Srgio Roberto. Dicionrio de gneros

    textuais. Belo Horizonte: Autntica: 2008.

    http://www.youtube.com/watch?v=jQVvKZQ9jOo&feature=relatedhttp://www.releituras.com/lfverissimo_bio.asphttp://www.rele