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Projetos Empresariais de Responsabilidade Social no Brasil Atual Cláudia Pfeiffer * Apresentação Esse “position paper” foi elaborado a partir de estudos e pesquisas sobre a participação recente de empresas privadas na resolução de problemas das cidades brasileiras 1 e sobre seleção e avaliação de projetos sociais em “grantmakers” brasileiras 2 . Com base em enfoque de gerenciamento de projetos, criado e desenvolvido no âmbito da cooperação internacional para o desenvolvimento 3 , na experiência profissional da autora e em sua visão sobre a situação social brasileira atual. E visando contribuir para influenciar e subsidiar a prática socialmente responsável das empresas em “comunidades”. Sintetiza reflexões da autora sobre Responsabilidade Social da Empresa em “comunidades”, apresentando: uma definição de atuação empresarial socialmente responsável no Brasil atual; uma tipologia de projetos empresariais considerados socialmente responsáveis; aspectos que devem ser considerados no gerenciamento desses projetos. Ele foi apresentado no I Encontro de Professores Universitários sobre Responsabilidade Social da Empresa, promovido pelo Instituto Ethos de Responsabilidade Social e pela Federação de Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG), o qual realizou-se em Belo Horizonte, em 18 de outubro de 2002. * Cláudia Pfeiffer é Socióloga, Mestre e Doutora em Planejamento Urbano e Regional pela UFRJ. Trabalha no Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (IPPUR), da UFRJ. E é sócia/consultora/instrutora da MPP Management de Projetos e Processos Ltda, uma empresa de consultoria e treinamento em gerenciamento de projetos. 1 Os resultados desse estudo encontram-se na publicação: Pfeiffer, Cláudia. Por que as empresas privadas investem em projetos sociais e urbanos no Rio de Janeiro? Rio de Janeiro: Editora Agora da Ilha, 2001. 2 Essas entrevistas foram realizadas em 2002, com a finalidade de colher subsídios para organização de curso sobre critérios para seleção e avaliação de projetos sociais, a ser ministrado pela MPP Management de Projetos e Processos Ltda, no primeiro semestre de 2003. 3 Trata-se do enfoque PCM/ZOPP, desenvolvido pela Cooperação Alemã para o Desenvolvimento (GTZ), com base no Quadro Lógico, instrumento para planejar e gerenciar mudanças, criado pela Agência Americana para o Desenvolvimento Internacional (USAID).

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Cláudia Pfeiffer *

Apresentação Esse “position paper” foi elaborado a partir de estudos e pesquisas sobre a participação recente de empresas privadas na resolução de problemas das cidades brasileiras1 e sobre seleção e avaliação de projetos sociais em “grantmakers” brasileiras2. Com base em enfoque de gerenciamento de projetos, criado e desenvolvido no âmbito da cooperação internacional para o desenvolvimento3, na experiência profissional da autora e em sua visão sobre a situação social brasileira atual. E visando contribuir para influenciar e subsidiar a prática socialmente responsável das empresas em “comunidades”. Sintetiza reflexões da autora sobre Responsabilidade Social da Empresa em “comunidades”, apresentando:

uma definição de atuação empresarial socialmente responsável no Brasil atual;

uma tipologia de projetos empresariais considerados socialmente responsáveis;

aspectos que devem ser considerados no gerenciamento desses projetos. Ele foi apresentado no I Encontro de Professores Universitários sobre Responsabilidade Social da Empresa, promovido pelo Instituto Ethos de Responsabilidade Social e pela Federação de Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG), o qual realizou-se em Belo Horizonte, em 18 de outubro de 2002.

* Cláudia Pfeiffer é Socióloga, Mestre e Doutora em Planejamento Urbano e Regional pela UFRJ.

Trabalha no Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (IPPUR), da UFRJ. E é sócia/consultora/instrutora da MPP Management de Projetos e Processos Ltda, uma empresa de consultoria e treinamento em gerenciamento de projetos.

1 Os resultados desse estudo encontram-se na publicação: Pfeiffer, Cláudia. Por que as empresas privadas investem em projetos sociais e urbanos no Rio de Janeiro? Rio de Janeiro: Editora Agora da Ilha, 2001.

2 Essas entrevistas foram realizadas em 2002, com a finalidade de colher subsídios para organização de curso sobre critérios para seleção e avaliação de projetos sociais, a ser ministrado pela MPP Management de Projetos e Processos Ltda, no primeiro semestre de 2003.

3 Trata-se do enfoque PCM/ZOPP, desenvolvido pela Cooperação Alemã para o Desenvolvimento (GTZ), com base no Quadro Lógico, instrumento para planejar e gerenciar mudanças, criado pela Agência Americana para o Desenvolvimento Internacional (USAID).

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Introdução Desde a década de 80, assiste-se a um crescente envolvimento do segmento empresarial da sociedade na promoção da idéia da importância da filantropia privada, da cidadania empresarial, do investimento social privado e da responsabilidade social da empresa para:

o desenvolvimento e a consolidação de uma economia de mercado ou do capitalismo moderno no país;

a prosperidade geral do país; a construção de um país democrático; o desenvolvimento social, econômico e ambientalmente sustentável da

nação; o desenvolvimento humano e global sustentável4.

Desse movimento vem resultando o desenvolvimento de diversos projetos sociais, bem como o surgimento de organizações sem fins lucrativos, de origem empresarial, dentre as quais cabe destacar o Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (GIFE) e o Instituto Ethos de Responsabilidade Social, que se propõem, respectivamente, como missão:

aperfeiçoar e difundir conceitos e práticas do uso de recursos privados para o bem comum5;

disseminar a prática da responsabilidade social empresarial ajudando as empresas a compreender e incorporar, de forma progressiva, o conceito do comportamento empresarial socialmente responsável; implementar políticas e práticas que atendam elevados critérios éticos, contribuindo para alcançar sucesso econômico sustentável a longo prazo; assumir suas responsabilidades com todos aqueles que são impactados por suas atividades; demonstrar aos seus acionistas a relevância de um comportamento socialmente responsável para o retorno de longo prazo sobre seus investimentos; identificar formas inovadoras e eficazes de atuar em parceria com as comunidades na construção do bem-estar comum; prosperar, contribuindo para um desenvolvimento social, econômico e ambientalmente sustentável6.

Passadas duas décadas do início desse movimento, no entanto, a sociedade brasileira continua apresentando como uma de suas principais características: um número inaceitável de pessoas vivendo em condições reconhecidas socialmente como não sendo dignas. Atuação Empresarial Socialmente Responsável Não se poderia esperar que o movimento empresarial, brevemente relatado, e seus resultados, tivessem a capacidade de solucionar problemas sociais

4 A esse respeito, consultar a publicação Pfeiffer (2001), referida em nota anterior. 5 A missão do GIFE foi retirada do site www.gife.org.br 6 A missão do Instituto Ethos foi retirada do site www.ethos.org.br

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brasileiros como o destacado, uma vez que, acredita-se, esses problemas decorrem do fato de, até o presente momento, não se ter implementado no país um projeto de desenvolvimento de sociedade, que tivesse como propósito real garantir a dignidade e o desfrute da existência, como um direito inalienável e alcançável, a todos os seus habitantes. Um projeto baseado na concepção de que é preciso redefinir o lugar da função produtiva no conjunto das atividades sociais, para que tais dignidade e desfrute se tornem uma realidade; e para cuja construção e implementação faz-se necessário um grande esforço do Governo, em seus diversos níveis, das Empresas e das Organizações da Sociedade Civil. Entretanto, pode-se esperar, ainda, que tal movimento contribua, de alguma forma, para que um número cada vez maior de pessoas adquira condições de vida reconhecidas socialmente como dignas. Esta seria uma atuação empresarial socialmente responsável no contexto econômico, social e político atual. Mas como fazer isto? Partindo-se do pressuposto de que vivemos em um país em que as oportunidades não são iguais para todos - o que leva a que a grande maioria de sua população não tenha possibilidade nem capacidade de fazer escolhas adequadas para o crescimento/desenvolvimento salutar de si mesmo e de sua família, e muito menos, de inserir-se competitivamente no mercado de trabalho, alcançando posições que lhe permita usufruir das benesses do desenvolvimento -, contribuir para que um número cada vez maior de pessoas adquira condições de vida reconhecidas socialmente como dignas pode ser entendido como realizar ou apoiar projetos que contribuam para que um número cada vez maior de pessoas adquira tais possibilidade e capacidade. Mas que tipos de projetos apresentam esse potencial? Projetos Empresariais de Responsabilidade Social Em primeiro lugar, projetos que contribuam para a melhoria da qualidade do ensino público e projetos de reforço escolar. Não basta as crianças e os adolescentes de grupos sociais „desfavorecidos“ pelo modelo de desenvolvimento econômico e social brasileiro vigente estarem na escola pública. Na escola pública, eles precisam, por um lado, ter acesso aos mesmos conhecimentos e recursos transmitidos/acessíveis nas boas escolas, geralmente, privadas - conhecimentos e recursos estes considerados adequados para uma inserção produtiva e satisfatória na sociedade; e, por outro lado, ter condições de assimilá-los e utilizá-los. Em segundo lugar, projetos voltados para ampliar as condições de empregabilidade de jovens e adultos não inseridos no mercado de trabalho, seja através do aumento de sua escolaridade ou de sua profissionalização em atividades para as quais haja mercado de trabalho. Esses tipos de projetos podem

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resultar na obtenção de rendimentos por esses jovens e adultos – o que, sem dúvida, é fundamental, para uma condição de existência digna. Com o mesmo potencial de gerar rendimentos para aqueles que não os tem ou que os tem em quantidade insuficiente, devem ser mencionados os projetos voltados especificamente para a geração de trabalho e renda. Na direção de contribuir para a existência digna de grupos desfavorecidos pelo modelo de desenvolvimento econômico e social brasileiro, também cabe mencionar os projetos voltados para a transmissão de informações relevantes para o exercício da cidadania. Sentir-se cidadão, saber os caminhos para se tornar um cidadão, são passos importantes na construção de uma vida digna. E, na mesma linha, projetos voltados para o levantamento da auto-estima e o desenvolvimento da resiliência de grupos estigmatizados pela sociedade. É preciso valorizar-se e ter a capacidade de superar situações difíceis para não sucumbir frente às adversidades do cotidiano. Por fim, cale destacar a importância de projetos que visem a orientação/apoio às “famílias” na educação de seus filhos. Sem a colaboração ativa e consciente das famílias nesse processo, o futuro do país estará seriamente comprometido. Aspectos a Serem Considerados no Gerenciamento dos Projetos Se todos esses tipos de projetos apresentam a potencialidade de contribuir para que um número cada vez maior de pessoas adquira a possibilidade e a capacidade de fazer escolhas adequadas para o seu desenvolvimento e de sua família, para inserir-se na sociedade de forma produtiva e satisfatória; para que esta potencialidade seja desenvolvida, eles devem ser planejados com os propósitos de:

promover melhorias ou mudanças sociais que permaneçam durante um período de tempo indefinido, após a conclusão do projeto, ou seja, melhorias ou mudanças sociais sustentáveis - principalmente os voltados para a melhoria da qualidade do ensino público, a geração de renda e a orientação/apoio às “famílias” na educação de seus filhos, os quais não tem essa qualidade intrínseca;

inspirar políticas públicas, pois assim seus benefícios poderão ser ampliados para muito além de seus grupos-objetivos.

Para verificar se os projetos realizados contribuíram, de fato, para o alcance das finalidades e propósitos acima destacados, o alcance de seus resultados e objetivos e seu impacto social devem ser avaliados, para o que faz-se indispensável um gerenciamento eficiente.