Pronomes de Tratamento

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PRONOMES DE TRATAMENTO Página escrita por Rubem Queiroz Cobra Ao fazer um convite, enviar uma carta, uma petição, um cumprimento, e na conversação em um evento social onde encontra autoridades, é comum a pessoa se perguntar qual o pronome de tratamento que deve empregar, em meio às dezenas de expressões que se convencionou considerar as mais respeitosas. efinidos no âmbito das Boas-maneiras (1) , os pronomes de tratamento são palavras que exprimem o distanciamento e a subordinação em que uma pessoa voluntariamente se põe em relação a outra, a fim de agradá-la e ensejar um bom relacionamento. Porém, seu emprego abusivo poderá afetar negativamente a dignidade da pessoa que os emprega; é o que se chama sabujice. O Aurélio define os pronomes de tratamento como "palavra ou locução que funciona tal como os pronomes pessoais". Os gramáticos, por sua vez, ensinam que esses pronomes são da terceira pessoa, substituindo o "tu" da segundo pessoa. Isto é fácil de entender. A base desses pronomes são certos qualificativos como: Excelentíssimo, Reverendo, Magnífico, Eminente, etc. As formas pronominais diretas e indiretas respectivas a esses exemplos são: Vossa Excelência, Sua Excelência, Vossa Reverendíssima, Sua Reverendíssima, Vossa

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CERIMONIAIS

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PRONOMES DE TRATAMENTO

PRONOMES DE TRATAMENTOPgina escrita porRubem Queiroz Cobra

Ao fazer um convite, enviar uma carta, uma petio, um cumprimento, e na conversao em um evento social onde encontra autoridades, comum a pessoa se perguntar qual o pronome de tratamento que deve empregar, em meio s dezenas de expresses que se convencionou considerar as mais respeitosas. efinidos no mbito das Boas-maneiras(1), os pronomes de tratamento so palavras que exprimem o distanciamento e a subordinao em que uma pessoa voluntariamente se pe em relao a outra, a fim de agrad-la e ensejar um bom relacionamento. Porm, seu emprego abusivo poder afetar negativamente a dignidade da pessoa que os emprega; o que se chama sabujice.

O Aurlio define os pronomes de tratamento como "palavra ou locuo que funciona tal como os pronomes pessoais". Os gramticos, por sua vez, ensinam que esses pronomes so da terceira pessoa, substituindo o "tu" da segundo pessoa.

Isto fcil de entender. A base desses pronomes so certos qualificativos como: Excelentssimo, Reverendo, Magnfico, Eminente, etc. As formas pronominais diretas e indiretas respectivas a esses exemplos so: Vossa Excelncia, Sua Excelncia, Vossa Reverendssima, Sua Reverendssima, Vossa Magnificncia, Sua Magnificncia, e Vossa Eminncia, Sua Eminncia. Usando-as, no falo diretamente com a pessoa mas, estando em sua presena, eu me dirijo a ela representada por aquilo que ela tem de notvel; uma qualidade que tomada pelo substantivo (ou nome) respectivo.

Por exemplo, a uma pessoa bela, eu diria "Vossa Beleza gostaria de sentar-se ao meu lado?" dirigindo-me sua beleza, como se dissesse "Ela, a tua beleza, gostaria de sentar-se ao meu lado?". Poderia tambm falar a respeito dela a uma terceira pessoa dizendo: "Sua Beleza j se foi!" ou "Sua Beleza est de mau humor". Quando reconheo na pessoa excelsas virtudes e excelncia moral, falo dela: "Sua Excelncia deu-me uma ordem" (A excelncia dela deu-me uma ordem).

Mas a questo, do ponto de vista gramatical, um pouquinho complicada. Afinal, por que se diz "Vossa Excelncia" e no "Tua Excelncia" como segunda pessoa do singular? Ocorre que um modo de reconhecer ou afirmar com mais nfase empregar os pronomes no plural, substituindo "tu" por "vs", "tua" por "vossa", etc. Assim na prece "Vs sois o Todo Poderoso", em lugar de "Tu es o Todo Poderoso".

Quando digo "Vossa Excelncia", eu estou a dizer que, alm de reconhecer na pessoa a sua excelncia moral, tambm reconheo a grandeza da sua virtude. Ento o significado "Ela, a tua excelncia" passa a ser "Ela, a vossa (grandiosa) excelncia". O verbo fica na terceira pessoa do singular porque a concordncia feita com a qualidade "excelncia" e no com o pronome possessivo "Vossa". Mas importante lembrar que, por hbito, "seu" e "sua" so empregados naturalmente em lugar de "teu" e "tua", e "vosso" e "vossa" em muitas regies do Brasil. Resulta disso uma certa tendncia ao emprego incorreto da frmula mais suave de tratamento direto "Sua Excelncia", em lugar de "Vossa Excelncia", como em "Sua Excelncia me permite?"

Voc. Ao tempo dos governos por "Direito Divino", os cargos eram considerados sagrados e toda autoridade representava a autoridade divina. Ento, o povo comum preferiu, de modo mais prtico, enaltecer uma qualidade nos poderosos que lhe interessava mais de perto: a "misericrdia" ou "merc" das autoridades. Da dirigir-se o povo s pessoas mais importantes por "Vossa Merc". O pronome "Voc" uma contrao da alocuo "Vossa Merc", e por essa razo que usado como terceira pessoa, pois a concordncia d-se com uma qualidade que representa a pessoa poderosa, sua magnanimidade ou "Merc".

Respeito ao cargo. Penso que uma falsa idia considerar os pronomes de tratamento como necessrios para manifestar respeito pelo cargo pblico que uma pessoa ocupa. Esses cargos, em uma democracia, so conferidos pelo povo e nenhum deles representa autoridade sobre pessoas; representam apenas responsabilidade pelo cumprimento da Lei no setor especfico da autoridade respectiva.

Porm, quando a autoridade pblica tende a ser atrabiliria e aterrorizante, o medo , com certeza, um fator no inconsciente coletivo que leva ao excesso de frases e cumprimentos laudatrios em que a subservincia uma defesa e a sabujice uma estratgia. No Estado Moderno, onde existe verdadeiramente Justia e os funcionrios do Poder so corretos, os cidados no precisam temer a arbitrariedade, e por isso o tratamento no enfrenta nenhuma barreira e pode dispensar perfeitamente estas formas fantasiosas e ultrapassadas de tratamento com origem nos crculos da tirania por direito divino e nos meios oficiais corruptos.

O respeito pelo cargo de uma autoridade, ou pela autoridade mesma, ou pela pessoa que exerce a autoridade, consiste em respeitar a Lei por cujo cumprimento ela responsvel, e no em cham-la de "excelentssima".

O emprego de "Senhor". Como dito, os pronomes de tratamento so expresses do distanciamento e da subordinao em que uma pessoa voluntariamente se pe em relao a outra, a fim de agrad-la e ensejar um relacionamento corts. O principal pronome de tratamento, consagrado universalmente e o nico que as pessoas comuns devem usar como necessria manifestao de respeito, no importa a quem estejam se dirigindo, "Senhor"/"Senhora" usando-se sempre o tratamento direto. A expresso "Vossa Senhoria", a forma indireta.

O homem comum, mesmo quando se dirige ao Presidente da Repblica, ou quando fala dele, no deve utilizar mais que "Senhor Presidente" e "O Senhor Presidente". Ento seria perfeitamente polido o tratamento na frase: "Senhor Presidente, o Senhor pode conceder-me uma audincia?", e o mesmo vlido para o tratamento com qualquer autoridade, inclusive juizes, reitores, deputados e senadores.

de notar, e isto eu acho muito importante, que tambm no tratamento que se d ao reitor de uma universidade pode ser obrigatrio o emprego daqueles anacrnicos pronomes de tratamento apenas para os professores e funcionrios da universidade, que so seus subordinados, e para a burocracia, se a universidade for federal, estadual ou municipal. No caso de se tratar de uma universidade particular, apenas se o seu Conselho Universitrio criar um Protocolo contendo tal determinao estaria o seu corpo docente obrigado a empregar o pronome "Magnfico Reitor" ou "Vossa Magnificncia". Portanto, nesse caso, se voc quer chamar o seu reitor de Magnfico com propriedade, apresse a aprovao do Protocolo da sua Instituio estabelecendo tal preciosismo.

Os alunos das universidades tanto pblicas quanto privadas, quando dirigem seus requerimentos ao Reitor, no esto obrigados a trat-lo por "Vossa Magnificncia" nem a enderear sua petio "Ao Magnfico Reitor" uma vez que no pertencem Instituio, apenas a freqentam. O tratamento que devem dar ao Reitor apenas "Senhor Reitor".

O emprego de "Doutor". A palavra "Doutor" tem dois nicos significados e, consequentemente, deveria ser empregada somente nos casos a eles pertinentes: "mdico", por tradio, ou um determinado grau de estudo universitrio obtido em uma especializao alm do bacharelado.

O emprego indevido de "Doutor" comum entre a gente mais humilde e sem instruo, e por funcionrios mal preparados, que associam a palavra Doutor a um status social ou a um nvel de autoridade superior ao seu. Essas velhas divises no so condizentes com a democracia. necessrio lembrar que no existe lei que obrigue uma pessoa comum a tratar uma outra por Doutor. Esse tratamento s obrigatrio nos meios acadmicos para aqueles que fizeram defesa (antigamente pblica) de tese. To pouco um tratamento discriminatrio desse tipo poder ser um dever de Civilidade ou de Boas-maneiras. Quando estabelecer um novo relacionamento, limite-se ao uso de "Senhor", e no utilize "Doutor", exceto numa relao profissional, se assim desejar, caso esteja sob os cuidados de um profissional formado.

Camarada, Companheiro, Irmo. Os crculos e organizaes privadas podem criar o seu protocolo para observncia entre seus membros, e assim acontece com a Igreja, com uma empresa, com partidos polticos, ou um simples clube esportivo. uma posio da filosofia socialista que todas as pessoas so parte do Estado e por isso as formas de tratamento discriminatrias no so cabveis. O mesmo pode acontecer por parte de denominaes religiosas que desejam enfatizar entre os fieis a noo de igualdade perante o sagrado. Nesses casos, o tratamento indireto parecido com os anteriormente vistos, mas no feito com base em uma qualidade da pessoa mas com respeito sua condio de igual, expressa por substantivos como "Camarada,", "Companheiro", "Irmo", etc; por exemplo: "O Irmo est satisfeito?", "O Camarada me permite?".

Problemas do Cerimonial. Nos crculos fechados da diplomacia, do clero, da burocracia governamental, do judicirio, etc., ainda existe o emprego codificado (So obrigatrios por Lei) de pronomes de tratamento laudatrio, hierarquizados pela importncia oficialmente atribuda a cada cargo (Maior importncia: Excelentssimo Senhor; menor importncia, Ilustrssimo Senhor, etc.).

A Presidncia da Repblica Federativa do Brasil editou em 1991 um minucioso manual com todos os tons obrigatrios para o trato oficial em todos os nveis, federal, estadual ou municipal, com o emprego de "Excelentssimo", "Magnfico", "Santssimo" "Eminncia Reverendssima" ou, no mnimo "Ilustrssimo Senhor". Diz o manual que por tratar-se de "tradio". claro ento que o manual est transformando essa "tradio" em norma a ser obedecida. Porm, essas normas no podem ser obrigatrias para o cidado comum, e devem ser entendidas como normas de Protocolo, obrigatrias apenas entre os prprios burocratas, e no trato oficial com autoridades estrangeiras e da Igreja, que muito as apreciam e exigem.

Note-se que existem trs formas:

a) Apenas o qualificativo, utilizado no endereamento. Ex.: Ao Magnfico Reitor da Universidade do Gama.

b) O tratamento direto, com nfase, como na frase: "Vossa Excelncia, o que me ordena?" ou simples: "Sua Excelncia, o que me ordena?"

c) O tratamento indireto, quando falamos a um terceiro a respeito da autoridade: "Sua Excelncia o Ministro me fez portador dessa mensagem congratulatria".

Alguns exemplos:

Vossa Excelncia ( V. Ex. ).Emprega-se, no meio oficial para:

Presidente da Repblica Vice-Presidente da Repblica Ministros de Estado Chefe do Estado Maior das Foras Armadas Chefe do Gabinete Militar da Presidncia da Repblica Chefe do Gabinete Civil da Presidncia da Repblica Consultor Geral da Repblica Chefe do Servio Nacional de Informaes Presidentes e Membros das Assemblias Legislativas dos Estados Governadores de Estado e Vice-Governadores Prefeitos Municipais Secretrios de Estado Senadores Deputados Juizes do Trabalho, Juizes de Direito e Juizes Eleitorais Procurador Geral da Repblica Embaixadores e Cnsules Generais e Marechais Forma de endereamento:: Excelentssimo Senhor (Exm. Sr) e Meritssimo Senhor (MM) para juizes

Vossa Senhoria ( V. S. ), emprega-se, no meio oficial para: Funcionrios graduados Organizaes comerciais e industriais Particulares em geral Forma de endereamento: Ilustrssimo Senhor (Ilm. Sr.)

Vossa Eminncia ( V. Em. ), emprega-se, no meio oficial para:

Cardeais Forma de endereamento: Eminentssimo Senhor ( Emm. Sr. )

Vossa Excelncia Reverendssima ( V. Ex.. Rev.ma ), emprega-se, no meio oficial para:

Arcebispos e Bispos Forma de endereamento: Excelentssimo Senhor ( Exm. Sr. )

Vossa Santidade ( V .S. ). emprega-se, no meio oficial para:

Papa Forma de endereamento: Santssimo Padre ou Beatssimo Padre...

Reverendo ( Rev.do.), emprega-se, no meio oficial para:

Sacerdotes Clrigos Religiosos Forma de endereamento: Reverendo...

Vossa Magnificncia, emprega-se, no meio oficial para:

Reitores de Universidades Forma de endereamento: Magnfico Reitor...

Vossa Majestade ( V. M. ), emprega-se, no meio oficial para:

Imperadores Reis Rainhas Forma de endereamento: A Sua Majestade, Rei ....(ou Rainha)

Vossa Alteza ( V. A.), emprega-se, no meio oficial para:

Prncipes e Princesas Forma de endereamento: A Sua Alteza, Prncipe... (ou Princesa)

O leitor que desejar, poder encontrar mais detalhes e exemplos no MANUAL DE REDAO DA PRESIDNCIA DA REPBLICA (1991)

Concluso. sem dvida uma questo que interessa Filosofia Moral, o fato de algum, - por fora de lei ou de normas, ou simples tradio, - ser obrigado, ou de alguma forma coagido a empregar expresses laudatrias como "Dignssimo", "Excelentssimo" "Ilustrssimo", ou a se ajoelhar ou se curvar, obrigatoriamente, diante de uma pessoa. Por significar uma discriminao, esse constrangimento afeta a igualdade de tratamento garantida na Declarao dos Direitos Humanos.

A boa tendncia em Boas Maneiras guardar a tradio, porm, devido s novas formas de comunicao, o tratamento entre os cidados tornou-se bastante simples. O que Boas Maneiras prescrevem que se manifeste respeito com propriedade e simplicidade, sem exageros. Ir ao ponto de chamar algum de "Excelncia", "Meritssimo", "Ilustrssimo" ou "Majestade" em qualquer situao, mesmo oficial, sem sombra de dvida um exagero ridculo. Porm, mesmo nas democracias mais liberais e cultas, enquanto houver pessoas que no se reconheam como indivduos comuns e acreditem que o tratamento cerimonioso que empregarem, com cuidadosa discriminao em vrios graus de adequao e propriedade, ser prova de seu refinamento e superioridade social, o cacoete laudatrio haver de continuar.

Rubem Queiroz Cobra

Disponvel em: http://www.cobra.pages.nom.br/bmp-pronomes.html