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WANDERLÉA OLIVEIRA SANTOS PROTOCOLOS DE LEITURA: UMA PROPOSTA INTERDISCIPLINAR Mestrado em Língua Portuguesa PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO São Paulo 2007

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WANDERLÉA OLIVEIRA SANTOS

PROTOCOLOS DE LEITURA: UMAPROPOSTA INTERDISCIPLINAR

Mestrado em Língua Portuguesa

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

São Paulo2007

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WANDERLÉA OLIVEIRA SANTOS

PROTOCOLOS DE LEITURA: UMAPROPOSTA INTERDISCIPLINAR

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia UniversidadeCatólica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título deMestre em Língua Portuguesa, Linha de Pesquisa Leitura, Redação e Ensinode Língua, sob a orientação do Profº Drº João Hilton Sayeg de Siqueira.

PONTÍFICIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

São Paulo2007

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Protocolos de leitura: uma proposta interdisciplinar

Wanderléa Oliveira Santos

Aprovada em / /

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________

_________________________________________

_________________________________________

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Autorizo, exclusivamente para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ouparcial desta dissertação por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos, desde quecitada a fonte.

Wanderléa Oliveira [email protected]

Assinatura: ____________________________Local e Data: __________________________

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DEDICATÓRIA

Ao Profº João Hilton com carinho.

Agradeço a Roberto, meus pais e amigos pela dedicação e compreensão.

A Beatriz com amor.

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RESUMO

As dificuldades em trabalhar a leitura em sala de aula motivaram esta

pesquisa sobre a leitura, que centra-se nas práticas de leitura de professores

de História. Trata-se de averiguar como fatos históricos e sociais são

mediados através do texto. O objetivo é incentivar uma prática pedagógica

de leitura a partir da criação de protocolos de leitura, numa perspectiva

interdisciplinar, entre as disciplinas de Língua Portuguesa e História, no

Ensino Fundamental. A construção de protocolos de leitura exige uma visão

múltipla sobre leitura, em que a ética seja capaz de superar cânones e

construir uma interpretação crítica. Esta submetida à retórica, verdade,

textualidade e razão, contribuindo para a formação de um sujeito-leitor, num

trabalho coletivo entre educandos e educadores.

Palavras-chaves : leitura, protocolos de leitura, interdisciplinaridade.

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ABSTRACT

Reading protocols : an interdisciplinary proposal

The difficulties to work with reading activity in classroom motivated this

research about reading, which focuses the reading practice of History teachers.

It investigates how historical and social facts are mediated through the text. The

aim is to encourage a reading pedagogical practice from the creation of reading

protocols, in an interdisciplinary proposal, between the subjects Portuguese

Language and History in the primary school. The construction of reading

protocols demands a multiple vision about reading, in which the ethic is able to

surpass canons and build a critical interpretation. This one submitted to the

rhetoric, truth, textuality and reason, contributing to the education of a subject-

reader, in a collective work among educators and students.

Key- words: reading, reading protocols, interdisciplinary.

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Sumário

Introdução .................................................................................................... 09

1. Fundamentação teórica

1.1. Reflexões teóricas sobre a leitura na escola .................................................. 11

1.2. Concepções de leitura ................................................................................... 21

1.3. Protocolos, estratégias e diversidades de leitura ........................................... 25

1.4. Uma aproximação entre estratégias e protocolos .......................................... 38

2. Procedimentos de leitura dos professores de História em sala de aula

2.1. Introdução ..................................................................................................... 43

2.2. O perfil da escola e da professora A .............................................................45

2.2.1. A proposta de leitura A ................................................................................. 46

2.2.2. Análise da proposta A ................................................................................... 49

2.3. O perfil da escola e da professora B .............................................................51

2.3.1. A proposta de leitura B ................................................................................. 53

2.3.2. Análise da proposta B ................................................................................... 55

2.4. O perfil da escola e da professora B1 ........................................................... 56

2.4.1. A proposta de leitura B1 ............................................................................... 57

2.4.2. Análise da proposta B1 ................................................................................. 58

2.5. O perfil da escola e da professora C .............................................................60

2.5.1. A proposta de leitura C ................................................................................. 62

2.5.2. Análise da proposta C ................................................................................... 63

2.6. O perfil da escola e da professora D .............................................................64

2.6.1. A proposta de leitura D ................................................................................. 66

2.6.2. Análise da proposta D ................................................................................... 67

2.7. Uma perspectiva interdisciplinar de proposta de leitura: Língua Portuguesa

e História ....................................................................................................... 69

3. O texto

3.1. Introdução ..................................................................................................... 80

3.2. Dona Leocádia enfrenta a Gestapo. (Olga, de Fernando Morais, trecho do 80

capítulo 17)...................................................................................................

4. Uma leitura de Olga

4.1. Introdução ..................................................................................................... 82

4.2. Uma leitura .................................................................................................... 83

5. Algumas conclusões .................................................................................... 94

6. Bibliografia .................................................................................................. 97

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Introdução

Este trabalho pretende investigar como o professor de História, por meio

da leitura, constrói percursos de sentidos para o texto, em sala de aula, no

Ensino Fundamental.

A escolha da disciplina História não foi aleatória. Trata-se de averiguar

como fatos históricos e sociais são mediados através do texto na sala de aula.

Comumente, os trabalhos de leitura centram-se na disciplina de Língua

Portuguesa, e pretende-se verificar como textos são trabalhados em outras

disciplinas quanto a procedimentos de leitura.

Inicia-se pela disciplina de História por ser uma matéria que trabalha

quase que essencialmente com textos no tratamento de seus conteúdos. Esse

direcionamento possibilitará um caminho interdisciplinar entre História e Língua

Portuguesa, o qual será a base para a construção de protocolos de leitura.

Nosso tema é a construção de protocolos de leitura, numa perspectiva

interdisciplinar. Ler é uma ação que pode ser praticada individualmente ou em

grupo, dentro ou fora do ambiente escolar, que utiliza nossa língua e lida com

os sentidos da visão ou audição. Entretanto, foca-se no professor a

necessidade de uma prática pedagógica que permita ao aluno o

desenvolvimento crítico sobre os textos trabalhados na escola.

Assim, foi definido o problema central deste trabalho: as dificuldades em

trabalhar a leitura em sala de aula. Como o professor constrói uma

interpretação crítica? Boa parte das dificuldades é motivada pela falta de uma

ação pedagógica que permita o desenvolvimento de práticas críticas de leitura.

O professor é peça-chave no processo de construção da interpretação

do texto, considerando as diversas leituras, e possibilitando uma leitura crítica e

não apenas informativa para o aluno. Justifica, pois, analisarmos percursos

para a construção de protocolos de leitura, numa perspectiva interdisciplinar

entre Língua Portuguesa e História.

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No capítulo 1, apresentaremos a fundamentação teórica necessária às

reflexões históricas sobre a leitura na escola, concepções de leitura, protocolos

e diversidades de leitura e, também, uma aproximação entre protocolos e

estratégias.

No capítulo 2, investigaremos os procedimentos de leitura de cinco

professoras de História, através da elaboração de suas propostas de leitura.

Para ampliar a análise dessas práticas em sala de aula, traçaremos um perfil

de cada escola e professora.

Abordaremos também, neste capítulo, uma perspectiva interdisciplinar

de leitura entre disciplinas de Língua Portuguesa e História para a construção

dos protocolos de leitura.

No capítulo 3, selecionaremos o livro Olga, de Fernando Morais. Essa

biografia revela fatos marcantes do cenário político nacional, os quais fazem

parte do conteúdo programático da maioria das escolas de ensino fundamental,

ciclo II, na oitava série. Analisaremos apenas um trecho, em que Luís Carlos

Prestes está na prisão. Ele recebe a carta de Olga e descobre que ela está viva

e tem uma filha.

No capítulo 4, realizaremos uma leitura do trecho, capítulo 17, de Olga,

de Fernando Morais, conscientes de que outras leituras são possíveis e que a

nossa revela apenas uma proposta neste tempo e espaço em que vivemos.

Finalizaremos com algumas conclusões sobre as práticas de leituras das

professoras, práticas estas que revelam aspectos fundamentais à nossa

reflexão sobre construção de protocolos de leitura.

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1. Fundamentação teórica

1.1. Reflexões históricas sobre a leitura na escola

Todo o mundo a nossa volta é passível de leitura. Lemos os outdoors, as

expressões fisionômicas, as artes plásticas, as emoções, os panfletos, notas

fiscais, rótulos de alimentos, sinais de trânsito e outros. Nosso mundo é um

mundo de leitura!

Nessa leitura de mundo cabe a reflexão de Paulo Freire (2003) sobre a

importância do ato de ler. Ele nos lembra que é um processo que envolve “uma

compreensão crítica, a qual não se esgota na decodificação pura da palavra

escrita ou da linguagem escrita, mas antecipa e alonga-se na inteligência do

mundo. Uma compreensão do texto a ser alcançada por sua leitura crítica

implica a percepção das relações entre texto e contexto”.

Para o educador, a consciência pessoal sobre compreensão crítica

construiu-se ao longo de sua vida, desde a infância na leitura do mundo e

depois com a leitura da palavra, esta que nem sempre foi ao longo de sua

escolarização, como ele mesmo denomina, a leitura da “palavramundo”.

As lembranças do garoto Paulo permitiam “ler” o mundo em que vivia de

forma significativa; nas palavras do autor “re-crio e re-vivo”, experiências

anteriores à leitura da palavra escrita. Desse contexto, fazia parte o universo da

linguagem dos mais velhos com os seus gostos, receios e valores.

Paulo Freire revela-nos que a decifração da palavra fluiu naturalmente

para da “leitura” de seu mundo particular. Foi alfabetizado no chão do quintal

de sua casa, à sombra das mangueiras, com palavras de seu próprio mundo e

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não do mundo de seus pais. O chão foi seu quadro-negro; gravetos, o giz.

Quando chegou à escolinha, já estava alfabetizado, porém com a professora a

leitura da palavra, da frase, da sentença, jamais significou a ruptura com a

“leitura” do mundo.

Através da professora, a leitura da palavra foi leitura da “palavramundo”,

nos primeiros anos escolares. Depois veio a percepção crítica, durante o

chamado curso ginasial, em que não havia “lições de leitura, no sentido

tradicional dessa expressão. Eram momentos em que os textos se ofereciam à

inquieta procura de professor e alunos”.

Atuando como professor, nosso mestre Paulo Freire, comenta que os

termos gramaticais não eram reduzidos a “tabletes de conhecimento” que

deveriam ser engolidos pelos alunos. Tudo era proposto à curiosidade de forma

“dinâmica e viva” no corpo dos textos estudados ou elaborados pelos próprios

alunos.

Sua crítica recai também sobre ler um texto como descrição de um

objeto para uma memorização mecânica. Esta não resulta em conhecimento,

assim como a insistência na quantidade de leitura sem o devido

aprofundamento nos textos. É uma crítica à “magicização (sic) da palavra”, a

qual para combater requer “ler sempre e seriamente, os clássicos neste ou

naquele campo da saber, de nos adentrarmos nos textos, de criar uma

disciplina intelectual, sem a qual inviabilizamos a nossa prática enquanto

professores e estudantes”.

Suas experiências de leitura formaram uma “arqueologia” sobre a

compreensão do complexo ato de ler, presente em sua proposta de

alfabetização de adultos. Esta, acima de tudo, um ato político e um ato de

conhecimento que não podem ser reduzidos à memorização mecânica. A ajuda

do educador não pode significar aos educandos uma anulação da criatividade e

responsabilidade deles na construção de sua linguagem escrita e na leitura

dessa linguagem.

Essa proposta conjuga um ato de ler crítico e político, carregado de

significação da experiência existencial de cada educando e não do educador;

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Sobre o ensino formal da leitura e as relações de poder e política,

Manguel (op. cit) revela-nos uma prática muito comum herdada da escolástica,

entre os séculos XII e XIII por filósofos, em que “pensar é uma arte com leis

meticulosamente fixadas”. Era um método de leitura capaz de conciliar à

religião católica aos argumentos da razão humana, numa concordia

discordantium, harmonia entre opiniões divergentes. O que para o autor era

uma forma de preservar idéias e não trazê-las à tona.

A escolástica seguia os preceitos da retórica de Aristóteles, que era a

arte de persuadir em qualquer questão. Para Manguel, “a essência do método

escolástico consistia em pouco mais que treinar o estudante a considerar um

texto de acordo com certos critérios preestabelecidos e oficialmente aprovados,

os quais eram incutidos neles à custa de muito trabalho e sofrimento”.

Aprender a ler dependia mais do esforço e perseverança do aluno do

que de sua inteligência. Até o século XVI, a escolástica esteve presente em

todas as universidades européias e aparatos católicos. O início dessa prática

de leitura dá-se com a queda do sistema romano, por volta do século IV e V, e

ganha força no século IX, após Carlos Magno ordenar que todas as igrejas e

catedrais ofereçam treinamento para clérigos nas artes da leitura, escrita, canto

e cálculo.

Mesmo após o crescimento das cidades, um século depois, as escolas

continuavam como Carlos Magno concebeu: fisicamente, as aulas eram

ministradas em grandes salas, o professor à frente, no alto, num atril, com um

livro aberto e uma vara de vidoeiro à mão e seus pupilos em bancos.

As escolas voltavam-se para a educação dos meninos a partir dos seis

anos até treze ou catorze, quando iam para universidade. As meninas ficavam

sob os cuidados das mães. Era comum as meninas aprenderem a ler,

principalmente, se fossem destinadas à carreira de freira. Caso contrário, às

leituras não sagradas, havia o temor de trocas de correspondências

indecorosas e apaixonadas.

Na escolástica, a leitura era ensinada a partir do lectio: identificação de

elementos gramaticais de cada frase, depois a littera, o sentido literal do texto

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para depois atingir o sensus, significado do texto segundo interpretações

preestabelecidas. Por fim, a sententia, discussões sobre as opiniões de

comentadores aprovados.

Esse método de ensino não se estruturava sobre leitura de textos

originais e nunca atingia um ponto de vista pessoal. Era comum saber recitar e

comparar interpretações, porém falar e escrever latim eram quase inatingível.

Contribuíam para isso, por exemplo, a pouca pontuação do texto, uso

irregulares de maiúsculas e minúsculas. As abreviações aleatórias também

dificultam, o aluno devia saber não só as sílabas como também uma infinidade

de abreviações, que ocorriam por economia de papel e até pressa dos jovens

em anotar o que o mestre falou.

A situação do ensino da leitura começa a alterar-se quando os ideais do

Humanismo passaram a valorizar as interpretações humanas. Entretanto, os

alunos ainda não tinham autonomia para interpretar plenamente. Como na

escola francesa de Sélestat, por volta de 1400, em que as regras de gramática

passaram a ser explicadas e não simplesmente decoradas e copiadas da

lousa. Descartaram-se as glosas e comentários tradicionais em favor dos

textos clássicos dos Pais da Igreja, e valorizou-se e a orientação e discussão

desses textos.

Crato Hofman, professor de Sélestat, anos mais tarde, tinha como

prioridade desenvolver em seus alunos a capacidade de ler com fluência,

correção e inteligência, habilmente “ordenhando o texto para cada gota de

significado”. Todavia, a caligrafia, “arte de escrever belamente”, não era

deixada de lado; incentivava também a elaboração de um Index rerum et

verborum (Índice das coisas e verbos), a fim de que os alunos pudessem

interpretar e traduzir com autoridade.

Nesse período, a invenção da imprensa facilitou o acesso e aumentou a

quantidade de livros. Uma mudança que gerou uma comunidade leitora capaz

de absorver a ideologia católica e um conhecimento humano mais abrangente.

As escolas de tradição alemã, por exemplo, no século XIV, estavam

abertas a todos: ricos ou pobres, meninos e meninas, a partir dos doze anos de

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idade, que aprenderiam ler, escrever, cantar e aritmética. Até o século XVII, o

latim ainda era a língua de maior prestígio. Porém, no início do século XVI as

línguas vernáculas começam a ganhar força, graças a Martinho Lutero, que

publicou a Bíblia em alemão. Através de decretos governamentais, Suécia e

Dinamarca determinaram leitura em vernáculo da Bíblia, nas igrejas e, assim, o

latim vai perdendo seu espaço.

Para Manguel, a passagem do método escolástico para sistemas mais

liberais de pensamento alterou também o papel do erudito e do professor em

que a busca do conhecimento era sucumbida a certas regras, cânones e

sistemas aprovados de ensino. Os humanistas passavam avante uma leitura

“correta” e comum estabelecida, mas também ofereciam aos alunos a

perspectiva humanista mais vasta e pessoal. Os alunos reagiram

circunscrevendo o ato de ler ao seu mundo e experiência íntimos e afirmando

sobre cada texto sua autoridade de leitores individuais.

Para ilustrar ainda mais o ensino da leitura, Manguel (1997:105-111)

conta-nos como, no fim século XIX, certo jovem adorava ler e odiava a escola.

Primeiro vamos caracterizar, através de Manguel, o “alicerce”, ideais históricos

desta escola, fundados em 1782, quando o imperador José II promulgou um

érido, o Toleranzpatent, que teoricamente aboliu a maioria das barreiras entre

judeus e não-judeus no Sacro Império Romano, com a intenção de assimilá-los

à população cristã.

A nova lei tornou compulsória para os judeus a adoção de nomes e

sobrenomes alemães, o uso oficial da língua alemã, o alistamento militar e a

freqüência às escolas seculares alemãs. Um século após essa lei, em 15 de

setembro de 1889, na cidade de Praga, o menino Franz Kafka foi matriculado

na escola, aos seis anos de idade.

Ao longo dos estudos, esse jovem foi aprovado facilmente por todos os

anos e do seu ponto de vista conseguiu “esgueirar-se do primeiro para o

segundo ano do ginásio, depois para o terceiro e assim por diante”. Ele

completa: “agora que chamei por fim a atenção deles, evidentemente logo serei

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posto na rua, para a imensa satisfação de todos os homens honrados, livres de

um pesadelo”.

A escola incomodou profundamente Kafka. Na época, o ano escolar era

composto de dez meses, com um terço dedicado às línguas clássicas. O

restante do tempo distribuído em aulas de alemão, geografia, história e um

pouco para aritmética. Tcheco, francês e educação física eram opcionais,

porém o pior era ser obrigado “a decorar a lições e vomitá-las quando exigido”,

reclamava.

Os professores culpavam os alunos pela falta de apreço e os tratavam

com desprezo, segundo carta de Kafka à sua noiva, em que escreveu:

“Lembro-me de um professor que ao ler a Ilíada para nós costumava dizer: ‘É

uma pena ter que ler isto para gente como vocês. Vocês não podem

compreender, e mesmo se pensassem que podem, não entendem nada. É

preciso ter vivido bastante até compreender um fragmento mínimo’”.

Amigo e biógrafo de Kafka, Max Brod, considerava o ensino religioso

fraco. Uma vez que os alunos judeus eram em maior número que os

protestantes e católicos, eram eles que ficavam na sala para ouvir uma síntese

das aulas da história judaica, em alemão, e recitação de orações em hebraico,

uma língua desconhecida para eles.

O jovem Kafka libertou-se somente mais tarde quando desenvolveu suas

próprias leituras. Buscava muitos sentidos e não somente o literal de cada livro.

Fez uma ponte entre com os antigos talmudistas, para quem a Bíblia continha

uma multiplicidade de sentidos e cuja busca contínua era o objetivo de nossa

viagem na Terra. Kafka revela a um amigo: “Lemos para fazer perguntas”.

A tradição talmúdica tinha o objetivo de explorar e elucidar o texto em

todos os níveis concebíveis de sentido e discutir os comentários feitos desde o

texto original. A literatura talmúdica transformou em textos auto-regeneradores

que se desdobravam a cada leitura, não substituindo, mas incluindo todos os

anteriores, segundo Manguel.

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historicidade de sentidos, por sua sedimentação histórica, assim como a

intertextualidade.

Para o autor, ao traçar o perfil do leitor brasileiro na escola, ficou óbvio a

presença de três instâncias ideológicas: jurídica, econômica e política. Essas

ideologias não estão fundamentadas no sentido de “falsidade” nem de “visão

de mundo”, tampouco de “idéias”. Elas são feitas de práticas, um espaço

ideológico contraditório em que estão intrínsecas diferentes formações

discursivas. A leitura convive num espaço entre prática escolar e outras

práticas correntes em nossa sociedade.

No espaço jurídico, a leitura, a interpretação e o ensino de gramática são

constantemente julgados e avaliados pelo educador. Os testes e as provas

moldam o leitor da instituição escolar. Outra característica é a restrição quanto

ao trabalho de arquivo e memória que, segundo o autor, revela uma herança

do período colonial. Este com uma história particular de construção de

arquivos, marcada pela censura, pela dependência externa e pela escassez de

material.

Nos primeiros séculos de colonização só eram permitidas a circulação

de livros religiosos e de textos indicados pelas normas da Companhia de

Jesus. Na história recente, o Brasil viveu sob ditaduras que deixaram marcas

em seus arquivos e bibliotecas. Enquanto enfatizava-se nas escolas o caráter

experimental (ao modo das “feiras de ciências”), as bibliotecas e os próprios

laboratórios das escolas públicas se extinguiam.

No espaço econômico, a leitura e o livro são tratados como algo que se

pode vender, trocar, emprestar, guardar, acumular. Por isso, revela o comércio

de lojas e editoras, ou seja, um mercado que visa à produção e à venda. Por

outro lado, revela que cabe às bibliotecas a manutenção, a valorização e o

empréstimo. Há uma administração, conforme interesses em jogo.

Outro aspecto relevante, nesse espaço, segundo Nunes, é que a leitura

está determinada pelo fortalecimento de certos setores econômicos como a

indústria eletrônica, de informática e comunicação, bem como com as editoras

e os jornais.

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Além disso, há uma divisão entre a escola pública e a escola privada em

que os fatores econômicos determinam as diferentes práticas de leitura:

aquisição de livros, formação de bibliotecas, gastos com pessoal, entre outros.

E ainda, vendo a leitura como trabalho, percebe-se em diversos domínios a

construção e a sustentação de interpretações com finalidades específicas: na

escola, na administração pública, na propaganda, na universidade, nas

instituições religiosas. Há um trabalho social da leitura que em sua divisão

configura diferentes perfis de leitores.

Na administração da leitura, o livro é um bem de consumo sujeito ao

comércio. O livro é um produto que pode vender bem ou não e conforme

interesses determinados por apoio editorial. Já o leitor, é localizado em meio

às relações de produção do modo capitalista “produtividade”, “rendimento”,

“organização”, “competência”, “eficiência”, “rapidez”. Esses termos metaforizam

o campo da leitura e do espaço econômico, são gestos que orientam para as

práticas de administração de empresas, de gerenciamento das forças

produtivas, presentes na escola, nos meios de comunicação, no cotidiano.

Na escola, esses gestos de leitura estão presentes nas avaliações,

controles em diário de classes, boletins, históricos, nas técnicas de estudo e

memorização; em práticas de ensino que envolve a elaboração de fichas,

contagem de livros lidos, avaliações dos textos, eleição de frases e palavras-

chaves, modelos interpretativos em forma de perguntas e testes de múltipla

escolha.

Esses procedimentos, para Nunes, estimulam uma burocracia da

interpretação, e podem levar o educando à mecanização da leitura, asfixiado

nas malhas administrativas e inserido na repetição da construção dos bancos

de dados.

Nesse espaço econômico o autor ainda salienta a apropriação das

novas tecnologias nas práticas de leitura, que estão alterando as relações entre

leitor e texto. Há softwares para fins de armazenagem e gerenciamento de

dados, edição de textos, elaboração de tabelas, e também possibilitam técnicas

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de composição, montagem, editoração, conjugando texto, imagem, sons,

organização de funções enunciativas, e outras.

As novas tecnologias, sob o aspecto econômico, aparentam neutralidade

porque é preciso considerar os fatores de oferta e demanda, circulação e de

modo de tratamento dos textos, segundo interesses particulares. Na escola, a

aquisição de livros está sujeita às verbas que dispõe. Freqüentemente, opta-se

por edições mais baratas, de impressão inferior, ou pacotes de livrarias

especializadas. A demanda do leitor parte de sistemas de distribuição através

de perfis socioeconômicos, leitores ideais, consumidores virtuais.

O perfil do leitor da escola pública no Brasil tem se caracterizado pelo

aspecto de ensino de massa, homogeneizado, imagem produzida pela política

educacional e pelas condições econômicas em vigor no país.

No espaço político, Nunes aborda dois aspectos: a leitura como discurso

que em si constitui uma forma política, a qual produz sentidos por sujeitos e

para sujeitos, e o aspecto de dominação política e sua relação com práticas de

leitura.

Em diversos domínios culturais o autor analisa a proliferação de práticas

de leitura definidas por especialistas, os quais estabelecem sentidos e técnicas,

enquanto que grupos anônimos repetem esses gestos e sustentam essas

interpretações.

Há dominação do discurso Liberal na leitura, numa ilusão de que

se pode ler “tudo” e “o que quiser” com conhecimento de “todos sentidos”,

numa imagem de leitor “heróico”, que por sua própria iniciativa, sem limitações

da censura ou condições financeiras.

Essas práticas colocam em cena a formação individual do sujeito-leitor,

a “edificação” do leitor em confronto com a administração da leitura,

despontando como resultado a falta de uma política que conduz a deficiência

institucional. Por isso, na opinião do autor, os professores dedicam-se ao fazer

individual do aluno.

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A ausência de bibliotecas, de recursos para aquisição de livros, de

funcionários, de coordenação pedagógica, aliada ao desinteresse político dos

governantes influencia a prática do professor, submetendo-o a essa situação.

Então, a história particular do leitor brasileiro é marcada pela não-

legitimidade de uma tradição lingüística da oralidade, pela dependência

econômica e tecnológica, pela desigualdade de condições de leitura, pela

utilização não-crítica de modelos interpretativos, segundo Nunes (op.cit).

1.2. Concepções de leitura

“Não restam dúvidas de que é isto a leitura:

reescrever o texto da obra dentro do texto de nossas vidas.”

Roland Barthes

Pensar em trabalhar leitura em sala de aula implica uma postura aberta

às diversidades, sejam de teorias, sejam de posturas pedagógicas. Ao longo da

história humana o conceito sobre leitura foi sendo alterado e expandido. Em

Orlandi (2001), encontramos a noção polissêmica de leitura, capaz de

acomodar, se não todas, pelo menos boa parcela das diversas correntes

teóricas.

Para Orlandi (2001:7-9), leitura, numa visão mais ampla, é a atribuição

de sentidos, tanto para a escrita quanto para a oralidade; concepção usada

para dizer “leitura de mundo”, que carrega posturas ideológicas; no sentido

acadêmico, é a construção de um aparato teórico e metodológico de

aproximação de um texto e que possibilita várias leituras; há também leitura

veiculada à alfabetização em que se aprende ler e escrever.

Já em Scholes (1989:22-25), numa apresentação socioconstrutivista, a

leitura é conceituada a partir do momento em que “se quisermos ler de facto,

temos de ler o nosso próprio livro no texto que temos diante de nós; há que se

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Para Scholes (op.cit.), “é impossível penetrarmos nos textos que lemos,

porém eles são capazes de entrar em nós; é isso que precisamente constitui a

leitura”. Desse modo, existe a necessidade de aprofundarmos nos meandros

da composição do texto e o relacionarmos com o nosso mundo, numa visão

particular de cada leitor.

Solé (op.cit.), pressupõe que “para ler é necessário dominar as

habilidades de decodificação e aprender as distintas estratégias que levam à

compreensão”. Também supõe que “o leitor seja um processador ativo do

texto, e que sua leitura seja um processo constante de emissão e verificação

de hipóteses que levam à construção da compreensão do texto – de

comprovação de que a compreensão realmente ocorre”.

Para Orlandi (op. cit.), o que delimita os sentidos atribuídos à leitura é a

idéia de interpretação e de composição. Se muitos são os sentidos, a autora

faz um recorte na perspectiva discursiva. Sendo assim, a leitura seria

trabalhada e não ensinada. A escrita e a oralidade fazem parte da instauração

de sentidos. Há um sujeito-leitor com suas especificidades e história, sentidos e

sujeitos são historicamente determinados. Há múltiplos e variados modos de

leitura e, enfim, a vida intelectual relaciona-se com os modos e efeitos de

leitura de cada época.

O ponto de partida em Orlandi é que a leitura é produzida e para tal

esbarra na legibilidade. Esta, para ser alcançada, depende da relação

estabelecida entre texto e leitor. Um leitor virtual que pode ser “cúmplice ou

adversário” do autor do texto. A interação inicia-se no jogo entre leitor virtual e

leitor real, que por si já é um embate crítico, de confronto. Existirão

interlocutores no desencadeamento do processo de atribuição de sentidos, em

que sujeitos e sentidos ocorrem simultaneamente.

Portanto, nesse jogo, as regras e os lances mais bonitos dependem do

que um autor quis dizer e o que realmente o texto despertou no leitor. Um

sujeito-leitor capaz de inferir e confrontar a intencionalidade do escritor. Capaz,

também de relacionar seu tempo e sua história para construir sentidos

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conforme o texto lido. Esses interlocutores serão sempre mediados pelo texto,

que este revelará ao leitor o que seu escritor pretendia expor.

Por isso, é necessário avaliar essa relação ora conflitante ora

reconfortante, de confronto, que nos leva para um mundo imaginário, ou não,

porém sempre significante. Através dessa relação, sujeito-leitor e texto, o leitor

poderá lançar um olhar mais crítico sobre seu cotidiano. Há personagens,

histórias e autores que nos acompanham para o resto vida, sempre nos

ensinando, remodelando e criticando.

O contexto e os objetivos são fundamentais no momento da leitura,

porque sujeitos e sentidos são elementos do processo da significação. Por

isso, Orlandi (op. cit.) alerta-nos sobre a impossibilidade de pensar num autor

controlador de toda a significação de seu texto, bem como a existência de um

texto transparente e de única significação e um leitor onisciente capaz de

absorver todos os sentidos.

Além disso, “existe uma tensão entre paráfrase e polissemia”. Na

primeira, há reprodução ou reconhecimento de um sentido que se supõe dado

pelo autor. A segunda define-se por atribuição de múltiplos sentidos e, ambas,

estão inseridas na idéia de produção de leitura. Uma produção que deriva de

posições relativas, histórica e socialmente, determinadas, que unem o

simbólico (lingüístico) e o imaginário (ideológico), nas palavras de Orlandi.

O que percebemos num texto, porém não é imediatamente detectado.

Orlandi (op. cit) chama de relações de forças, em que os interlocutores têm seu

lugar social e os sentidos são determinados pelos que produzem. É daí que

nasce a relação entre discurso e formações ideológicas, que produzirá

diferentes leituras.

Acreditamos que todos nós, professores, pretenderíamos abordar todas

as intenções do texto, da visão do autor. Ainda, assim, permaneceriam

questionamentos sobre a visão do leitor, dos leitores, de cada um de nossos

alunos. Estes sujeitos são capazes de relacionar um texto ao seu universo

particular e durante a leitura produzem sentidos diversos.

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Para expandir um pouco mais sobre o conceito de leitura e a produção

de sentidos, Scholes (op. cit.) recorre a metáforas de movimentos, como linhas

retas, em vai e volta, e também um movimento circular de posturas centrípetas

e centrífugas.

A leitura centrípeta concebe o texto em sua intenção original, no centro,

reduzindo-o ao seu puro núcleo de intencionalidade não mesclada. Já na

centrífuga, a vida do texto percorre a circunferência constantemente,

possibilitando novos significados.

Enfim, a leitura é antes de tudo um processo, contudo criativo e crítico,

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livres, com autonomia suficiente para enfrentar os mais diversos textos que são

distribuídos e consumidos em nossa sociedade.

Scholes (1989-66:67) centra Jacques Derrida na possibilidade de

criação de protocolos de leitura. A expressão protocolos de leitura é de Derrida,

a qual Scholes debate e centraliza, claramente, em seu trabalho.

”A leitura é transformadora... Mas tal transformação não pode

efectuar-se de qualquer maneira; exige protocolos de leitura. Por que não dizer

francamente: não encontrei ainda um que me satisfizesse”. Jacques Derrida

A franqueza de Derrida talvez desanime muitos e muitos educadores

que esperam encontrar protocolos, regras de leitura, capazes de uma ação

interpretativa. A busca de protocolos torna-se quase impossível, justamente

porque seu objetivo seria a interpretação, a existência da verdadeira

interpretação.

Por isso, Scholes alerta-nos que a estrutura do ser humano ergueu-se

sob a interação. Comunicamos e temos a necessidade de permutar

significados àqueles que identificamos como semelhantes.

Entretanto, a alternância entre escritor e leitor equilibra e contraria nosso

desejo de comunicação, porque “como leitores não podemos ignorar as

intenções dos escritores sem incorrer num acto de violência textual que

ameaça a nossa própria existência como seres textuais”, segundo Scholes.

Reside nessa alternância o aspecto importante de criarmos protocolos como

criamos outros códigos e hábitos.

Se a missão é difícil, não cremos que seja impossível. Ela, talvez, não

seja unilateral. Sobre os protocolos, Scholes (1989:92-104) diz que ele mesmo

precisa ler Derrida de forma centrífuga ou exorbitante. Ou seja, afastar-se-á do

centro da discussão de acordo com sua própria leitura e interesse.

Scholes cerca-se de seu próprio aparato científico. Pergunta-nos se é

possível estabelecer uma relação entre teoria e prática interpretativa. O ponto

crucial é sabermos se há como metodizar e ensinar a melhor prática

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interpretativa. Para esse embate há, em princípio, oposição entre leitura

rigorosa e leitura centrífuga ou exorbitante.

Uma leitura centrípeta movimenta-se no centro e duplica o sentido

original do texto com respeito e fidelidade. Porém, como somos incapazes de

ser respeitosos, necessitamos da leitura centrífuga, da margem da esfera com

múltiplas possibilidades, que caracteriza a leitura exorbitante (ou rigorosa).

Esta considerada uma boa prática e capaz de superar os cânones.

Para Orlandi (op.cit) há uma tensão entre o processo de leitura

parafrástica e polissêmica. Tensão entre o mesmo e o diferente, o que constitui

a linguagem. É preciso esclarecer, que para a autora, não há oposição e sim

tensão. Esta é sociohistoricamente constituída, razão pela qual ela se muda e

mantém a mesma.

Através desta idéia de tensão, podemos estabelecer uma relação

dialética entre os conceitos das leituras parafrástica e polissêmica,

conceituadas por Orlandi, e centrípeta e centrífuga, por Scholes, fundamental à

nossa intenção de criar de um processo de leitura, ou melhor, um protocolo.

Essa relação é possível porque a tensão, própria da linguagem, para

Orlandi equivale à oposição de Scholes, esta apenas uma oposição inicial,

superficial, que buscará uma união nas circunferências do texto na construção

de uma interpretação.

A parafrástica, que nos oferece o sentido literal do texto dado pelo autor,

equivale à leitura centrípeta, que se centra no original, na intencionalidade não

mesclada do autor. A polissêmica que possibilita múltiplos sentidos ao texto,

está diretamente relacionada à centrífuga, que percorre uma circunferência,

abrindo diversos significados. Unidas são capazes de proporcionar um

processo de leitura mais abrangente de um texto.

Para esse processo de leitura mais abrangente ainda precisamos

estabelecer quais são os interlocutores, os objetivos de leitura, as condições de

produção, as condições histórico-sociais e ideológicas. É preciso ressaltar,

neste momento, que Solé (op.cit.) baseia-se na interação entre o texto e o

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leitor, que julgamos também essencial ao cruzarmos os conceitos destas

leituras.

Então, o primeiro passo para criação de um protocolo de leitura é ter

uma visão múltipla sobre leitura. Visão esta que englobe a multiplicidade de

conceitos teóricos, conforme abordagem no tópico anterior deste trabalho.

A partir desse momento, trataremos esse processo de leitura como um

passo essencial à criação de um protocolo de leitura. Razão pela qual,

adotaremos o termo protocolo, apesar de ainda não formalizadas todas as suas

instâncias.

Na visão de Scholes, o rigor de Derrida é uma oposição à verdade, a

uma verdade como revelação, fora de um tempo e lugar. Uma valorização

disfarçada da hermenêutica niilista. Uma “ausência da verdade, idéia de

verdade apenas como amuleto indispensável e não como garantia

extratextual”.

Ele afirma que “Derrida é um hermenêuta-niilista”, uma caracterização

que nos revela ser aparentemente contraditória. Isto, porque a Hermenêutica

surge, no século XIX, como salvaguarda da verdade depois que ficou

insustentável a visão fundamentalista do texto. Ou seja, inicialmente, opõe-se

ao fundamentalismo, sem conotações religiosas, que previa um escritor

infalível e uma linguagem perfeita, num contexto intemporal, e este perpetuaria

o verdadeiro significado.

O fundamentalismo textual carrega consigo a dificuldade do leitor

perceber todos os propósitos do escritor, quer propósitos conscientes quer

inconscientes. Foi essa dificuldade que modelou os princípios da

Hermenêutica, que passa a rejeitar a possibilidade da verdade interpretativa e

da verdade fundamental, resultando num ceptismo. Esse termo, Scholes

concilia com niilismo, assentado na descrença e dúvida sobre a existência de

uma verdade suprema.

Um niilismo comum em que não existe a verdade; bem como, o erro,

resultando na validade de todas as convicções, ou melhor, todas as práticas

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interpretativas. Entretanto, para Scholes, o termo hermenêutica-niilista é uma

necessidade, apesar de ser paradoxal, frente à criação de novos protocolos de

leitura. Haja vista, Derrida afirmar que “a recuperação do significado de um

texto equivale à busca de uma verdade susceptível de ser garantida apenas

por um absoluto platônico impossível”.

A hermenêutica-niilista possibilita o rigor derridiano, uma leitura rigorosa

que se opõe a noção de verdade, leva-nos à desconstrução, que se constitui

de sinais.

A desconstrução é a différance, esta mera asserção sobre linguagem,

em termos históricos como atividade puramente diferencial e diferenciadora,

uma meta-racionalidade. Contrapõe a noção de código, contexto, presença,

respectivamente.

Segundo Scholes, o rigor, pensamento aparentemente contraditório de

Derrida, revela a necessidade dos protocolos de interpretação ou cânones.

Estes necessários à interpretação e ao ensino da leitura, porém ainda não

encontrados.

Para atingir uma leitura exorbitante sobre Derrida, Scholes o lerá à luz

de seus próprios interesses pessoais e métodos; fragmentará, confrontando e

contrastando os pensamentos derridianos com os de outros filósofos.

O rigor, para Scholes, faz Derrida aproximar-se dos protocolos de leitura

porque busca de união entre leitura rigorosa, exorbitante, centrípeta e

centrífuga para que nós, professores, possamos ler e continuar a ensinar

outras pessoas a assim procederem, numa busca de seus próprios protocolos,

de forma crítica.

A teoria não será capaz de impor protocolos nem crítica, porém a prática

obrigar-nos-á a recorrer à teoria para entendermos como e por que elaboramos

nossos protocolos, segundo Scholes.

Desse modo, o ser humano não está fora da textualidade. O cerne da

investigação de Scholes (op. cit) é “a leitura encarada como permuta, onde a

textualidade actua como meio. Sob a designação de retórica, consideraremos a

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leitura como uma economia textual, onde prazer e força são permutados entre

produtor e consumidores de textos, tendo sempre em vista que os escritores

têm de consumir a fim de produzir e que os leitores têm de produzir a fim de

consumir”.

Para um discurso ainda mais retórico, o autor considera a ética

interligada e dependente da retórica em que nos deparamos com os problemas

das funções, dos efeitos e dos objetivos da leitura e da escrita. Assim, ele

analisará se é possível sabermos para que serve a leitura e se existe uma ética

capaz de conduzir a leitura em todas as situações ético-políticas.

Há controvérsia sob o debate da ética e retórica. Algumas considerações

sobre Retórica são importantes para ampliarmos o conceito de desconstrução,

elaborado por Derrida, fundamentado na ética, para essa nossa busca sobre os

protocolos de leitura.

Como nos ensina Tringali (1988:38-40), na Retórica Sofística, verdade e

justiça são relativas, não importando o justo ou injusto, cobiçando apenas

ganhar a causa, e desconsiderando os aspectos éticos sob a égide do discurso

persuasivo.

Platão combateu esses princípios retóricos, em que o discurso

persuasivo deve agir sobre o conteúdo; o conteúdo salva ou condena a

persuasão. A Retórica deve ser justa e a justiça é a suprema felicidade do

homem. Sob o império da Dialética, no sentido platônico, a Retórica é a ciência

suprema do Bem, da Justiça, da Verdade, do Amor.

Já Sócrates tenta conciliar os sofistas com Platão, pois a sabedoria de

nada nos valeria sem a Retórica, e esta é uma arte de bem pensar, bem viver e

bem falar. Depois dessa tentativa reconciliadora, Aristóteles, sem desvalorizar

a elocução, dá mais dignidade ao conteúdo que a expressão. A Retórica passa

a ser a arte de descobrir, em qualquer questão, os meios de persuadir. Quanto

às objeções platônicas, responde que o mau uso que se faça de uma coisa não

a invalida. Desse modo, Aristóteles opõe dialética à persuasão, à busca da

verdade.

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Na Retórica Antiga, fundamentada por Aristóteles, a discussão é

baseada no provável, e leva-nos à dialética aristotélica, entre a verdade e

aparência da verdade. É preciso ser persuasivo. Como a persuasão distancia-

se da verdade, para ganhar o embate não basta, somente, ser justo ou

verdadeiro. É preciso ser convincente diante do auditório. Este identificar-se-á

e será mobilizado pelo ethos, caráter, do seu orador. O discurso persuasivo

age através do logos, a razão, e move o auditório através dos que falam

(ethos), e estes que despertam pathos, paixão.

Na visão de Scholes (1998:118-119), Derrida preocupa-se com uma

ética da leitura e não com uma leitura da ética em que reside uma diferença

entre leitura e ação. Na desconstrução, existe uma relutância em entre deixar

ler e lançar um livro a outra pessoa, relutância em interromper a ação da

textualidade e aceitar as limitações da ação. A desconstrução está fora de uma

ética extratextual, a fim de preservar sua liberdade.

A Retórica também será importante para Scholes confrontar com a

poesia, abordando a questão da desconstrução e da ética. Para o autor, uma

retórica da leitura está baseada num contraste binário do que chamamos

poesia, literatura ou arte. A retórica ocupa a parte negativa desse binarismo.

Para Scholes, em Aristóteles encontramos a opinião de que retórica e

dialética representam “contrapartidas”, e sugere que retórica e a poesia sejam

íntimas aliadas, concebidas para suscitarem paixões. Ao contrário de Platão,

que afirma que a dialética é um meio de purificação do pensamento. A retórica

aristotélica concebeu três tipos de persuasão: baseado na personalidade do

orador, no domínio da emoção da assistência e do raciocínio ou argumentação.

Scholes afirma que a razão manifesta-se sempre textualizada em

conjunto com a emoção, como tecido numa teia de fios da razão entremeada

de fios da emoção. Esta constitui a metáfora de “economia textual”, uma

permuta de valores.

A economia textual é marcada por trocas de força ou poder e de prazer

ou deleite. A retórica da economia textual está baseada no fluxo de prazer e da

força gerados por qualquer texto. Essa idéia de retórica envolve certo desvio de

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soberania textual. Ocorre quer o texto seja um poema, quer um anúncio

publicitário.

A economia de força e prazer é idêntica, e todas essas trocas textuais

iniciam-se por um momento inebriante, catártico. É necessário um

restabelecimento após este momento inebriante, em que se dá a análise

crítica. Os textos são retóricos se permutarem tanto força como prazer. Não há

fronteira nítida entre retórica e arte, como não há entre vida textualizada e vida

vivida.

Para Scholes, a teoria da retórica ajuda-nos a decidir se um texto é bem

ou mal concebido, mas não nos dá diz se ele advoga objetivos bons ou maus.

Ela também auxilia-nos a perceber as trocas de prazer e de energia em

qualquer situação textual, mas não esclarecerá se tais permutas são ou não

válidas. O que nos elucidará a esse respeito?

Na visão do autor, Hegel enfrentou ainda outro problema o da

textualidade estar tão inexoravelmente condicionada à mudança histórica que

as melhores versões da ética e de política perdem a eficácia ao longo do

tempo, havendo necessidade de reformulá-las. O problema é relacionar um

dado texto com um código de comportamento geral.

Scholes esclarece o que pretende dizer é que todos os discursos éticos

sem a

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inevitavelmente às exigências da retórica e às vicissitudes da interpretação,

sujeitá-los ao regime completo da temporalidade e da textualidade.

A própria ação de pensar nesses protocolos de leitura, de imaginá-los e

de construí-los é também textualizá-los. Tudo quando se exprime no capítulo

da ética tem de ser provisório, estando na totalidade comprometido com uma

dialética histórica sem garantia de uma teleologia do absoluto à qual

pretendamos ter acesso.

Concluindo, após a desconstrução através de Scholes, a construção de

protocolos exige a mesma postura diante as leituras, as interpretações e as

críticas: não há uma verdade suprema. A diferença entre verdade e mentira

dependerá das estruturas sociais, ideológicas, políticas e históricas de cada

leitor.

O que para Scholes demonstrará que “dentro dessas estruturas, certas

leituras revelam-se melhores do que outras, e certos textos melhores do que

outros, por motivos que devemos persistir em articular. Há de se continuar a

ler, a reescrever os textos que lemos nos textos das nossas vidas e também a

reescrever estas à luz de tais textos”.

Como dissemos no início deste capítulo, a motivação da criação de

protocolos de leitura é a interpretação. Professor algum, como observamos,

poderá impor uma verdade suprema à interpretação de seus alunos. A verdade

sucumbida à interpretação é relativa, varia conforme o tempo e a sociedade de

cada leitor.

As leituras poderão oferecer interpretações melhores ou piores conforme

nossa capacidade retórica, interesses, poder e política, em nossa sociedade.

Um protocolo de leitura ou de interpretação é a desconstrução. É Uma busca

da verdade submetida à ética, uma leitura ética.

Após este aprofundamento na criação de protocolos de leitura,

passaremos a analisar a questão das estratégias. Solé (1998) aborda o

trabalho com a leitura sob o uso das estratégias, que os professores deveriam

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ter em mente ao iniciarem seus trabalhos. O que é melhor: um protocolo ou

uma estratégia?

De modo geral, é ponto pacífico para a autora que, para ler,

necessitamos apreender habilidades de decodificação e estratégias capazes

de promover a compreensão, bem como, supõe que o leitor seja um

processador ativo do texto, ou seja: um leitor que verifica se suas hipóteses

confirmam-se ou não, sempre ciente do controle da sua compreensão.

Então, para a autora “assumir o controle da própria leitura, regulá-la,

implica ter um objetivo para a leitura, assim como poder gerar hipóteses sobre

o conteúdo que se lê. Mediante previsões, aventuramos o que pode suceder o

texto. Graças à sua verificação, através dos diversos indicadores existentes no

texto, podemos construir uma interpretação, compreendemos. Por isso, a

leitura pode ser considerada um processo constante de elaboração e

verificação de previsões que levam à construção de uma interpretação”.

Para Solé (op. cit.), estratégias são “procedimentos de caráter elevado”,

ações coordenadas e finalizadas que necessitam de objetivos. Por isso, é

fundamental ter em mente que precisamos ensiná-las para que nossos alunos

possam atingir a compreensão leitora.

As estratégias envolvem procedimentos cognitivos e metacognitivos, ou

seja, somos capazes de conhecer nosso próprio conhecimento, refletir sobre

nossas ações e planejá-las, temos controle e regulamentação. Dessa forma,

elas não podem ser vistas como receitas ou técnicas prontas e infalíveis.

Devemos ensiná-las como uma capacidade de representar e solucionar

problemas, tendo flexibilidade para encontrar soluções durante nossas ações.

Para muitos educandos, um texto é um amontoado de problemas a

serem resolvidos. Desde um levantamento léxico até a idéia-núcleo. Então, que

recursos devemos lançar para facilitar a compreensão leitora? É fundamental

considerar três aspectos relevantes em pessoas alfabetizadas, segundo Solé,

comuns numa perspectiva cognitivista/construtivista demonstradas a seguir.

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O primeiro aspecto, uma propriedade denominada considerate texts, por

alguns autores, corresponde a clareza e coerência dos conteúdos do texto, da

familiaridade ou conhecimento da sua estrutura e do nível aceitável de seu

léxico, sintaxe e coesão interna. Na promoção de uma aprendizagem

significativa, essa compreensão está dentro da “significatividade lógica” do

conteúdo que deve ser aprendido.

O segundo, revela o grau de conhecimento prévio do leitor em relação

ao conteúdo do texto, numa aprendizagem significati

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2. Ativar e aportar à leitura os conhecimentos prévios relevantes para os

conteúdos em questão. Que sei sobre o conteúdo do texto? Que sei sobre

conteúdos afins que possam ser úteis para mim? Que outras coisas sei que

possam me ajudar sobre o autor, o gênero, o tipo do texto?

3. Dirigir a atenção ao fundamental, em detrimento do que pode parecer

mais trivial (em função dos propósitos perseguidos; v. ponto 1). Qual é a

informação essencial proporcionada pelo texto e necessária para conseguir o

meu objetivo de leitura? Que informações posso considerar pouco relevante,

por sua redundância, seu detalhe, por serem pouco pertinentes para o

propósito que persigo?

4. Avaliar a consistência interna do conteúdo expressado pelo texto e

sua compatibilidade com o conhecimento prévio e com o “sentido comum”.

Este texto tem sentido? As idéias expressadas neste têm coerência?

5. Comprovar continuamente se a compreensão ocorre mediante a

revisão e a recapitulação periódica e a auto-interrogação. Que se pretendia

explicar neste parágrafo – subtítulo, capítulo? Qual a idéia fundamental que

extraio deste? Posso reconstruir o fio dos argumentos expostos? Posso

reconstruir as idéias contidas nos principais pontos? Tenho uma compreensão

adequada destes?

6. Elaborar e provar inferências de diversos tipos, como interpretações,

hipóteses e previsões e conclusões. Qual poderá ser o final deste romance?

Que sugeriria para resolver o problema exposto? Qual poderia ser – por

hipótese – o significado desta palavra que me é desconhecida? Que pode

acontecer com este personagem?

A todos esses itens, a autora acrescenta que as estratégias devem

ajudar o leitor a escolher seus próprios caminhos ao se deparar com problemas

na leitura. Além de que, devido à utilidade, está subjacente a idéia de revisão e

mudança da própria direção quando fosse necessário.

Segundo a autora, as estratégias também podem ser selecionadas

conforme o desenvolvimento da leitura em sala de aula. As estratégias

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pertinentes e prévias à leitura seriam as que permitem estabelecermos os

objetivos e os conhecimentos prévios.

Durante a leitura, são importantes as que permitem estabelecer

inferências de diferentes tipos, rever, comprovar a própria compreensão

enquanto se lê, e tomar as decisões adequadas diante do erro ou falhas de

compreensão. Além de, durante e depois da leitura, utilizar estratégias

dirigidas a recapitular o conteúdo, a resumi-lo e a ampliar o conhecimento.

Para Koch (2002:32-39) estratégicas textuais relacionam-se a

organização da informação, de formulação, de referenciação, de

“balanceamento” (“calibragem”) entre o explícito e implícito.

Ela discorre sobre as estratégias de organização da informação, ressalta

o dado/novo. Uma informação já dada, responsável pelo que vai ser dito no

espaço cognitivo do interlocutor, se introduz uma nova, criando isotopias sobre

os conhecimentos já partilhados.

Nas estratégias de formulação encontramos funções cognitivas e

interacionais para vários tipos de inserção e de reformulação, as quais facilitam

a compreensão dos interlocutores e coordenam de uma estrutura referencial,

sem ser supérfluo.

As estratégias de referenciação, um tipo de remissão através de

recursos gramaticais ou léxicos. Há, ainda, estratégias de “balanceamento” do

explícito/implícito.

É também essencial ter clara a noção de gênero textual porque cada um

vincula uma seleção de idéias, que produzirá efeitos de sentidos. Além disso, o

professor deve refletir sobre os conhecimentos necessários ao processamento

textual: lingüístico, enciclopédico e interacional.

Dessa maneira, o professor focalizará melhor seu trabalho de leitura

porque “balanceará” os implícitos, que podem ser recuperáveis por meio das

inferências.

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Nossa sociedade exige determinadas situações e convenções

discursivas. Um aluno, ao ler um texto do gênero requerimento na escola, não

utilizará o mesmo conhecimento para ler uma crônica ou carta de reclamação a

um banco. Haja vista que os papéis sociais alteram-se conforme as posições

desempenhadas pelos interlocutores de um texto.

Os sentidos de um texto são construídos num jogo interativo entre os

interlocutores. Não vamos ignorar as diversas concepções sobre texto.

Entretanto, adotaremos a concepção de interação entre os sujeitos, que

desempenham uma atividade sociocomunicativa com objetivos sociais.

Assim, segundo Koch (2003:17), “há lugar, no texto, para toda uma

gama de implícitos, dos mais variados tipos, somente detectáveis quando se

tem como pano de fundo, o contexto sociocognitivo dos participantes da

interação”.

Costa Val (1994:4-16), chama textualidade um conjunto de

características que tornam um texto realmente um texto e não um amontoado

de frases. São fatores pragmáticos envolvidos no processo sociocomunicativo

e ocorrem sob três aspectos: pragmático, semântico-conceitual e formal.

Intencionalidade, aceitabilidade, situacionalidade, informatividade e

intertextualidade são fatores relacionados ao material conceitual e lingüístico

do texto sob a noção de coerência pragmática.

No aspecto semântico conceitual temos a coerência textual que

relaciona aspectos lógicos, semânticos e cognitivos, são conhecimentos

partilhados entre os interlocutores que promoverão sentidos através das

inferências e pressuposições ativadas durante a leitura.

No aspecto formal encontramos a coesão, manifestação lingüística da

coerência, relacionada à conectividade do texto em suas articulações

gramaticais e lexicais.

Um texto, aparentemente, compreensível para o educador poderá ser

considerado, extremamente, difícil para o educando. Coerência, coesão e

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todos os demais fatores de textualidade de um texto dependerão das conexões

estabelecidas pelo educando.

Entretanto, acreditamos que essas conexões podem e devem ser

mediadas e discutidas pelo educador, expandindo sua prática de leitura em

sala de aula.

Uma prática social de leitura influencia a construção de sentidos e dos

textos da nossa sociedade. Os textos trabalhados em sala de aula têm

relevância na construção e percepção de mundo de nossos educandos.

Estarão produzindo, ou reproduzindo, discursos e efeitos de sentidos conforme

lêem e discutem os textos apresentados e mediados pelo educador.

Os educandos poderão reproduzir o senso-comum ou o poder

dominante, porém preferimos uma prática que leve à construção de uma visão

crítica a partir dos conhecimentos e sentimentos deles.

1.4. Uma aproximação entre estratégias e protocolos

Todos os educadores, quaisquer que sejam suas disciplinas, devem

assumir a responsabilidade do ensino e do uso da linguagem, além de estar

engajados em todo o processo de leitura e sentidos construídos durante a

utilização de um texto oral ou escrito.

Ao trabalhar leitura em sala de aula, é necessário averiguar os sentidos

que vão sendo construídos. A ação do professor é fundamental, porque ele é

um leitor, que em sua posição social promoverá a interpretação de textos,

numa comunidade escolar. É importante sabermos como e qual interpretação o

professor desenvolve.

Sobre a busca de protocolos, verificamos com Scholes, no item anterior

deste trabalho, que a dificuldade maior seria a existência da verdadeira

interpretação. Esta que, jamais, será atingida porque nossas interpretações

estarão sujeitas a um leitor, inserido num momento histórico-social e, por isso,

alteram-se os princípios da ética e da política.

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A busca da ética leva-nos a um protocolo de leitura, a uma leitura ética.

Esta baseada numa economia textual, em trocas de força e prazer. Então, os

protocolos dependem da retórica e das interpretações. Dessa forma, caberá ao

professor um papel retórico em que a interpretação estará vinculada à leitura,

sujeita à razão e à emoção.

A verdade textual talvez não exista, porém não significa que devemos

desistir de procurar a diferença entre verdade e mentira. A verdade varia

conforme fatores sociais, políticos e históricos. O educador deve ser alguém

capaz de situar-se em seu tempo na busca da melhor interpretação,

relacionando texto, homem e sociedade. Formando, assim, uma leitura crítica,

um leitor crítico.

Conforme Solé (op.cit), necessitamos de um procedimento em que “a

leitura pode ser considerada um processo constante de elaboração e

verificação de previsões que levam à construção de uma interpretação”,

também citada no tópico anterior. A autora destaca sempre a necessidade de

estabelecermos objetivos para o trabalho com a leitura. Ressalta que “o leitor

constrói o significado do texto. Isto não quer dizer que o texto em si mesmo não

tenha sentido ou significado”. Também lembra-nos sobre a importância de

reconhecermos as diferentes estruturas do texto, estas que veiculam, impõem

e restringem a escrita. Por isso, mesmo que intuitivamente auxiliam na

compreensão das informações veiculadas pelo texto.

A essa altura cabe, nesta análise, definir o que é um procedimento. Solé

recorre a Coll (1987:89) sobre o que seria um procedimento: regra, técnica,

método, destreza ou habilidade. Mais precisamente, um procedimento

consistiria um conjunto de ações ordenadas e finalizadas, isto é, dirigidas à

consecução de uma meta.

Para a autora, alguns procedimentos, como amarrar o cadarço do tênis,

são realizados de forma automatizada. Tanto que se pararmos para pensar e

realizar essa ação passo a passo será difícil e demorada. Outros

procedimentos, como cozinhar, seguimos instruções que nos garantem a

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execução de um objetivo em que nossa ação é praticamente controlada por

essas instruções.

Entretanto, ao decidir se é melhor buscar o filho na escola antes de fazer

compras e levar uma cópia de um artigo a um colega que o pediu, ou

invertemos a ordem dessas tarefas para melhor ação e execução, estamos

falando de procedimentos, porque repensamos, alteramos e executamos uma

série de tarefas conforme melhor julgamos.

Para ligarmos, pois, o termo procedimento à estratégia cabe unir

componentes essenciais para Solé: autodireção e autocontrole. Ou seja, há um

objetivo e a consciência deste, bem como supervisão e avaliação do

comportamento em função dos objetivos que o guiam e da possibilidade de

modificá-lo, em caso de necessidade. Desse modo, percebemos que os

procedimentos são também papéis essenciais no trabalho de leitura do

educador.

Numa concepção construtivista do ensino e da aprendizagem escolar,

Sole (op.cit) expõe três idéias fundamentais sobre o uso de estratégias para

ativar a compreensão leitora, que veremos a seguir.

A primeira considera a situação educativa com um processo de

construção conjunta, o qual educadores e educandos compartilham

progressivamente significados mais amplos e complexos e dominam

procedimentos com maior precisão e rigor. Ambos também tornam-se

progressivamente mais adequados a entender e incidir sobre a realidade

presente nos textos. Sendo um processo de construção, não se pode pedir que

tudo se resolva adequadamente e de uma só vez; bem como, parece claro,

embora o educando seja o protagonista, o educador também desempenhará

um papel de destaque.

Na segunda idéia, o educador exerce uma função de guia, à medida que

garante o elo entre a construção que o educando pretende realizar e as

construções socialmente estabelecidas. Estas, por sua vez, traduzem-se nos

objetivos e conteúdos prescritos pelos currículos. Estamos perante um

processo de construção conjunta que caracteriza por constituir participação

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guiada em que a situação educativa ajude o aluno a contrastar e relacionar seu

conhecimento prévio com o que vai ser necessário abordar essa situação.

A terceira idéia, que se aproxima da anterior, são processos de

andaimes. Uma metáfora do “andaime” é empregada por Solé3 para explicar o

papel do ensino com relação à aprendizagem do educando. Durante uma obra,

os andaimes são colocados um pouco acima e contribuem para a construção;

depois do edifício pronto, os andaimes são retirados sem deixar rastros e sem

que o edifício caia. Dessa forma, processar-se-ia a ajuda do ensino, à medida

que o educando torna-se competente, serão retirados os andaimes para

garantir a autonomia do educando.

Solé une essas três idéias, situações de ensino–aprendizagem, em torno

das estratégias de leitura como processos de construção conjunta, em que se

estabelece uma prática guiada através do qual o educador proporcionará aos

educandos os andaimes necessários para que possam dominar

progressivamente essas estratégias e utilizá-las depois da retirada das ajudas

iniciais.

Nesse momento, já é possível responder o que é melhor: protocolo ou

estratégia. Do nosso ponto de vista, a união dos dois. Protocolo ou estratégia é

um desafio de leitura para educadores e educandos na busca da melhor

interpretação, na construção de sentidos. No melhor entendimento e a análise

do educando enquanto sujeito-leitor, na relação estabelecida entre o texto e

seu mundo pessoal, social e político.

Esse desafio deve ser perseguido em parceria entre educadores e

educandos, à luz da descoberta, da criatividade, da curiosidade e da ajuda

mútua da melhor prática de leitura. A leitura pode e deve ser praticada fora ou

dentro do ambiente escolar. Entretanto, nosso interesse, nesse momento,

centra-se na leitura desenvolvida em sala de aula pelo educador.

Gostaríamos de aproximar os termos protocolo e estratégia como

recursos. Por um lado, temos a necessidade de aprofundarmos nos textos lidos

3 A autora faz referência a WOOD, D. J.; BRUNER, J. S.; ROSS, G. (1976) The role of tutoring inproblem solving. Journal of Child Psychology and Psychiatry, 17, p. 80-100.

44

44

para que seja possível estabelecer as mais diversas conexões entre o texto e

nosso mundo, na construção de uma interpretação crítica. Por outro, há o

desafio do educador ser capaz de acionar essas conexões.

O trabalho do educador é muito grande: formar leitores. De nossa parte,

um protocolo de leitura deve garantir uma compreensão leitora que nos

conduzirá à formação de cidadãos críticos, autônomos e felizes em relação à

leitura. Queremos que as práticas de leitura nas escolas sejam livres, porém

debatidas, contestadas e contextualizadas tanto por educadores quanto por

educandos.

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45

2. Procedimentos de leitura das professoras de Hist ória

em sala de aula

“O bom leitor é aquele que sabe que há outras leituras”.

Eni PulcinelliOrlandi

2.1. Introdução

Para este trabalho, realizado ao longo dos anos de 2005 e 2006,

solicitamos a cinco professoras, da disciplina de História, que elaborassem

uma proposta de leitura para o trecho inicial do capítulo 19, de Olga, de

Fernando Morais, para as oitavas séries, do ensino fundamental, ciclo II.

Alguns critérios foram necessários para a seleção das escolas. O

primeiro, é que as todas pertencessem à rede pública de ensino da Grande

São Paulo. O segundo que, preferencialmente, elas pertencessem a Diretoria

Guarulhos –Norte, da rede estadual, do município de Guarulhos, São Paulo. A

partir disso, foram escolhidas três unidades escolares, numa delas temos a

colaboração de duas professoras.

Na busca por mais uma escola, encontramos a disponibilidade de uma

professora de uma unidade pública municipal, do bairro de São Miguel, próximo

a Guarulhos. Totalizando, quatro escolas públicas e cinco professoras da

oitava série.

Quando as professoras souberam deste trabalho, aceitaram dar suas

contribuições prontamente. Acreditamos que não é necessário expor os nomes

46

46

delas nem das escolas, apesar de que ambas as partes consentiram no amplo

uso acadêmico das informações prestadas.

Antes de expor as propostas, gostaríamos de acrescentar que nos

preocupamos em traçar um perfil destas professoras em relação às propostas

de leituras que desenvolvem, em sala de aula, bem como dos alunos.

Nenhuma delas trabalha, exclusivamente, com o livro didático. Elas já

têm uma prática de utilizar textos diversos, extraídos de jornais, revistas ou

livros. Quando oferecemos o trecho da biografia de Olga, solicitamos que cada

uma escrevesse como trabalharia este texto, descrevendo todas as etapas da

leitura com os alunos. Realizamos, também, uma pequena entrevista,

individualmente, com as seguintes perguntas:

a) Há quanto tempo trabalha na educação?

b) Há quanto tempo trabalha nesta unidade escolar?

c) Qual sua formação acadêmica?

d) O que é texto?

e) O que é leitura?

f) Quando trabalha a leitura o que é mais importante?

g) Como a leitura é avaliada?

h) Quais dificuldades são encontradas na leitura de um texto?

i) Como as dificuldades são superadas?

Contudo, ainda restava traçar um perfil leitor dos alunos. E, por isso,

recorremos ao SARESP (Sistema de Avaliação do Rendimento escolar do

Estado de São Paulo), aplicado no ano de 2005, quando conversamos com as

professoras. Analisamos somente os índices obtidos, pela oitava série, do

Ensino Fundamental, da Diretoria Guarulhos–Norte, na prova de Leitura, a qual

o período matutino obteve índice de aproveitamento 53,5%, o vespertino 56,5%

e o noturno 48,5%.

47

47

Nessa avaliação, com 26 questões de múltiplas escolhas, são utilizados

alguns gêneros textuais, como crônica, histórias em quadrinhos, mapas e

outros para mediar habilidades leitoras, como reconhecer o tema do texto;

identificar o conflito gerador do enredo; inferir uma informação implícita e

explicita; reconhecer os efeitos de sentidos do uso de recursos gráficos,

sonoros, semânticos ou estilísticos; distinguir causa/conseqüência, fato/opinião

ou definição/exemplo; reconhecer os elementos organizacionais e estruturais

do gênero; associar uma palavra ao seu referente; identificar a ordem

seqüencial de procedimentos e fatos.

Na escola municipal, do bairro de São Miguel, houve uma sondagem

diagnóstica, do Projeto Ler e Escrever, da rede municipal de ensino, no ano de

2006. Nesta sondagem há, praticamente, as mesmas habilidades leitoras

exigidas no SARESP, além de contar também com as exigências de

habilidades escritoras. Então, o perfil leitor dos alunos das escolas

selecionadas foi apontado através de uma análise das avaliações das

instituições públicas.

2.2. O perfil da escola e da professora A

A primeira escola selecionada, que denominamos escola A, inclusive,

esta e as demais denominações não expressam valoração alguma, está

localizada bem próximo ao Aeroporto Internacional de Guarulhos, onde há um

conjunto habitacional de apartamentos, de classe média baixa.

Esta escola, atualmente, atende alunos do ensino fundamental e médio,

dos ciclos I e II. No prédio há quadras poliesportivas, cantina, pátio, sala de

informática, biblioteca, entre outros espaços.

No SARESP, esta escola obteve aproveitamento de 60,1%, na oitava

série, do período matutino. Média superior a Diretoria Guarulhos-Norte que foi

de 53,5%, no período vespertino.

Nossa primeira professora, denominada, também A, durante a entrevista

realizada, na escola, revelou que há dez anos trabalha no magistério e há dois

48

48

anos na mesma escola. Possui licenciatura plena em História e Geografia e até

o momento não fez especialização alguma, apesar de ter interesse.

Sobre o que é texto, respondeu que é “uma coisa que você passa, lê,

explica, texto é contextualizar as vertentes que achei. É o que está no

conteúdo”.

Sobre o que é leitura, respondeu “interpretação do texto”. Ao trabalhar o

texto, o mais importante na leitura é o que “o aluno aprende, que entenda a

minha linguagem. Se estou com um texto, estou trabalhando o contexto, pego

as partes mais importantes para contextualizar. A ele (o aluno) cabe criticar, a

crítica é muito importante, principalmente, a crítica construtiva quando parte do

aluno. Até para eu ir melhorando a cada dia. É uma reflexão”.

Essas concepções sobre texto e leitura e a importância da leitura, em

sala de aula, demonstram que, intuitivamente, para a professora texto é uma

interação entre os sujeitos, mesmo que de forma parcial, numa perspectiva

socioconstrutivista do conceito sobre leitura.

A avaliação da leitura é feita de forma escrita e falada, sobretudo

valorizando a interpretação do educando. Não há uma nota específica, muitas

vezes, só “um ponto a mais por ler e se dedicar à leitura do texto trabalhado”.

Nesse aspecto, a professora realiza o que Solé (op.cit) chama de avaliação

inicial, obtém uma informação sobre a bagagem do que o aluno aprendeu.

Entretanto, não há menção sobre uma avaliação somativa nem formativa

sobre o processo da leitura.

Sua maior dificuldade refere-se ao livro didático, considerado “muito

fraco”, além de poucos livros paradidáticos serem enviados para as escolas,

bem como jornais e revistas. Estes periódicos poderiam dar “estrutura melhor”

em sala de aula. Assim, teríamos “outros tipos de textos para trabalhar os

mesmos assuntos”. Essa dificuldade é sanada com a utilização de jornais,

revistas e livros da sua casa.

Até este momento podemos analisar que há uma preocupação em

utilizar diversos gêneros textuais, apesar de não vincular, ou destacar, esta

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49

necessidade à melhor compreensão leitora. Há uma percepção da professora

sobre as instâncias ideológicas de distribuição e consumo dos livros na escola,

conforme Nunes (op. cit.).

Sobre a interpretação dos textos, é interessante que seu ideal é

construí-la a partir de uma visão crítica do aluno. Demonstrando, certa

consciência sobre o ato de ler como uma forma política e ética. Entretanto, este

aspecto será bem analisado mais adiante sobre a proposta de leitura.

2.2.1. A proposta de leitura A

A proposta de leitura entregue pela professora foi estruturada da

seguinte forma:

a) Antes da leitura do texto, ela conversou com os alunos sobre o

assunto que seria abordado na sala de aula: a biografia de Olga Benário,

explicando, primeiro, os seguintes tópicos:

CONTEXTO HISTÓRICO

• Alemanha;

• Regime totalitário (nazismo);

• Estado Forte;

• Suspensão do individualismo e da liberdade.

CAUSAS

• Crise econômica de 1929;

• Nacionalismo frustrado (Versalhes).

CARACTERÍSTICAS

• Totalitarismo;

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50

• Anticomunismo;

• Unipartidarismo;

• Militarismo;

• Racismo;

• Eliminação da oposição e das raças consideradas inferiores,

segundo o governo nazista (judeus e negros, por exemplo).

CARACTERÍSTICAS BRASILEIRAS

• Descontentamento com as metas e planos do governo Getúlio

Vargas;

• Formação de grupos de oposição ao governo – AIB (Ação

Integralista Brasileira) e ANL (Aliança Nacional Libertadora);

b) Logo após a explicação destes tópicos a professora fez, na lousa, um

quadro comparando as características dos dois principais grupos ideológicos

na época do governo de Getúlio Vargas.

AIB ANL

Líder Plínio Salgado Luís Carlos Prestes

Tendência Fascista Esquerdista

Nacionalismo Nacionalismo

Totalitarismo Reforma Agrária

Unipartidarismo Governo PopularIdéias

Anticomunismo Não pagamento da dívida

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51

c) Explicou este quadro e comentou outros itens: Tentativa de chegada

ao poder por parte da ANL (Intentona Comunista); Repressão do movimento

pelo Governo Central; Prisão de suspeitos ligados com a ANL, entre eles Luís

Carlos Prestes e sua companheira, Olga Benário Prestes, de origem judaica,

que, mesmo estando grávida, foi entregue à Alemanha nazista de Hitler.

d) Depois dessa explicação, a professora relatou que, quando Olga

estava na Alemanha, redigiu uma carta a Prestes, a qual dava notícias acerca

da filha que tiveram juntos. A seguir, ela distribuiu uma cópia do texto para os

alunos lerem.

e) Nessa última fase, trabalhando leitura e interpretação da carta dentro

do contexto histórico, a professora esperou os alunos lerem o texto. Em

seguida, debateu com eles a censura praticada pelas forças armadas e pelos

regimes ditatoriais e opressores, tanto no Brasil como na Alemanha, sobre a

dificuldade com que uma carta saia da Alemanha e chegava até a cela de um

preso político no Brasil ou em outros países.

A professora debateu também que há, na atualidade, a atuação de

grupos de oposição a regimes vigentes, como os ataques de onze de

setembro, nos Estados Unidos, prisão em Guantánamo, Al Qaeda, Guerra no

Afeganistão e no Iraque, Ato Patriótico estadunidense, grupos extremistas,

entre muitos outros existentes na conjuntura mundial.

Depois comentou sobre os direitos e garantias fundamentais versus

governos autoritários. Questionou os alunos sobre até que limite os governos

podem ser autoritários a ponto de suprimirem direitos e garantias fundamentais

dos indivíduos. Garantias estas de natureza histórica, conquistadas desde os

primórdios da existência humana.

Citou a liberdade de expressão, liberdade de ir e vir, direito à vida, direito

de viver, entre muitas outras garantias asseguradas pela nossa atual

constituição federativa, a dignidade humana, os preceitos de sua existência,

prisões de presos políticos versus dignidade humana. Abordou também a

história das Constituições Federais brasileiras, sobretudo as Constituições de

52

52

1934, 1937 e 1988, similaridades e divergências e as conquistas adquiridas

pela população ao logo do tempo e da história.

2.2.2. Análise do procedimento A

Observamos que houve a preocupação da professora em elaborar e

aplicar um planejamento prévio como proposta de leitura, que vamos

considerar como um procedimento:

Para Solé (op. cit), estratégias são procedimentos de caráter elevado,

essenciais à autodireção e ao autocontrole. A autora demonstra que, para os

alunos atingirem uma compreensão leitora, é preciso estabelecer objetivos,

utilizar estratégias antes, durante e depois e incentivar o educando a uma

interação com o texto, levando-o a uma leitura crítica.

A primeira estratégia da professora ocorre antes da leitura do texto,

através dos quatro primeiros itens, quando ela explica o contexto histórico e

político do Brasil e da Alemanha em que Olga viveu e expõe na lousa o quadro

comparativo dos dois principais grupos ideológicos na época do governo de

Getúlio Vargas.

Fica clara a intenção da professora em contextualizar a postura da

Alemanha e do Brasil, situando para o aluno a falta de liberdade de expressão,

como durante o nazismo, que a liberdade foi suprimida em nome de uma nova

ordem, segregando os valores universais em favor de uma ideologia racista e

intolerante às diferentes religiões e ideologias.

A origem desse contexto é expressa pelo fim da Primeira Guerra

Mundial, quando a Alemanha sofre um duro golpe polí

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54

nesta altura do texto, a leitura deveria ser menos informativa, sobretudo, mais

formativa de um leitor-sujeito, no ambiente escolar.

Seria oportuno abrir espaço, explicitamente, para a fala dos seus alunos.

As estratégias da professora poderiam prever este espaço, anotando na lousa

os tópicos principais do que os alunos expressam. Assim, poderia ativar

conhecimento prévio e inferências sobre o texto ou fatos da época. Num breve

momento, esta oportunidade esvai-se quando ela cita o ataque de onze de

setembro aos Estados Unidos. Este fato, com certeza, conhecido pelos alunos,

porém não desencadeia um balanceamento sobre o texto.

2.3. O perfil da escola e da professora B

Passaremos agora à análise do perfil da segunda escola selecionada,

localizada num bairro da periferia, cercada por favelas, a oito quilômetros do

Aeroporto Internacional de São Paulo, na cidade de Guarulhos.

Essa unidade escolar atende crianças e adolescentes que freqüentam

da quinta série do Ensino Fundamental ao terceiro ano do Ensino Médio. Há

uma quadra, pátio com um pequeno refeitório, biblioteca, salas ambientes e,

recentemente, a sala de informática estava desativada, devido a reformas em

todo seu prédio.

Na avaliação do SARESP, sobre leitura, a escola teve aproveitamento

de 48,7%, na oitava série, período matutino. Média inferior ao aproveitamento

geral da Diretoria de Ensino Guarulhos-Norte que foi de 53,5%.

A professora denominada B informou que possui licenciatura em História

e complementação pedagógica. Há dezesseis anos trabalha no magistério e

nesta escola há oito. Deixou a unidade escolar recentemente, e trabalha em

outra como vice-diretora.

Sobre o que é texto, respondeu que é informação, orientação: “São as

informações contidas no corpo, em formato de escrita, que passam informação

e orientação, aí temos texto acadêmico, texto informativo e outros”.

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A professora acredita que texto é informação, que pode ser vinculada

em diversos gêneros textuais. Já por leitura, ela entende ser “a interpretação

do texto”.

Ao trabalhar a leitura o mais importante para essa professora é “a

interpretação em si e que o aluno saiba ler a mensagem implícita, as

entrelinhas”.

Sobre o processo de avaliação, a professora disse que “a leitura em si

não é avaliada, mas as atividades dadas posteriormente exigem o

conhecimento do texto e são avaliadas com nota”.

Desse modo, até esta etapa, percebemos que ela própria não tem uma

consciência clara sobre sua prática de leitura, que se estende até a produção

textual do seu aluno.

Sua maior dificuldade ao trabalhar a leitura em sala de aula é “o

desinteresse, falta de motivação, preguiça, literalmente, por parte do aluno.

Eles gostam se há uma questão bem fácil com resposta, facilmente, localizada

no texto. Como, por exemplo, ‘quem descobriu o Brasil? ’ Ai, eles acham

escrito lá‘ quem descobriu o Brasil foi Pedro Álvares Cabral’. Eles ficam felizes

e contentes acham que a resposta é muito fácil. Agora se pergunto: ‘de que

forma? Como aconteceu? ’, exigindo nova leitura e interpretação para lançar a

resposta, fica complicado. A dificuldade do aluno é a preguiça mesmo, ou falta

de interesse, para ir a fundo. Esta disciplina força ler as entrelinhas, como em

qualquer texto seja uma reportagem de jornal, na TV”.

Essa dificuldade é driblada com constantes esclarecimentos sobre a

importância de ler e da disciplina de História. “Vou apontando para o aluno, que

numa atividade utilizo questões chamadas ‘bobas’, exigindo a localização de

uma informação explícita. Achou? Agora vamos avançando nas atividades e no

grau de dificuldade. Tanto que, sempre a última atividade é a produção de um

texto, sobre as informações geradas no primeiro plano. Assim, vão

contextualizando”.

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Percebemos, até este trecho, que a visão dessa professora sobre seu

trabalho com a leitura se aproxima, como na proposta anterior, de uma visão

interacionista, em que os educandos deveriam construir sua interpretação a

partir do texto, esta motivada pela ação do educador. Ela se preocupa com a

diversidade de gêneros textuais e como as idéias são vinculadas pelos textos.

Busca ajudá-los a construir sentidos inferidos através dos implícitos, “das

entrelinhas” e dos explícitos “questões bobas”.

A professora percebe a necessidade de avançar e retroceder ao texto

para construírem uma interpretação. Entretanto, não estabelece, junto aos

educandos, o objetivo para a leitura que poderia instaurar um elo entre o texto

e os seus alunos, como recomenda Solé (op.cit).

A professora ainda ressaltou, ao final de nossa conversa, que seus

alunos têm muitas dificuldades. “Eles empacam na própria disciplina, pois não

fazem uma ponte entre o passado e o presente. Vira um bicho de sete

cabeças, primeiro acham que redação não tem em História”.

Esse trecho nos revela que ela tem consciência sobre seu papel em

relação à leitura. Entretanto, vamos analisar em seguida sua proposta para

verificar se há relação entre esta dificuldade e o desenvolvimento de seu

trabalho.

2.3.1. A proposta de leitura B

Nessa proposta também há um planejamento prévio por parte da

professora que esquematiza como conduzirá a leitura em sala de aula do

começo ao fim do processo.

a) Primeiro os alunos recebem a cópia do texto e o lêem em sala de

aula.

b) A professora retoma partes do texto e aos poucos estabelece a

contextualização através de algumas palavras a situação do Brasil, naquela

época. Destaca primeiro os trechos que apontam o esquema de segurança no

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57

governo Getúlio e a conjuntura internacional (2.ª Guerra). Comentando as

seguintes palavras relacionadas ao Brasil: tribunal, Prestes (partido

Comunista), prisão, Sobral Pinto (advogado), cartas censuradas e Filinto Müller

(integralismo). Sobre o cenário internacional, destaca: Gestapo, nazista, Cruz

Vermelha.

c) Depois dessa explicação sobre o contexto político com base nas

informações retiradas do texto Olga, a professora destaca outros principais

pontos, como a temporalidade: 1937, ano relacionado ao governo

constitucional, integralismo versus aliancismo (Prestes), Intentona Comunista,

prisão do casal.

d) Há solicitação de uma atividade: os alunos devem elaborar um texto

ou roteiro que localize o leitor historicamente no tempo.

e) Outra atividade é solicitada para ser desenvolvida em casa: levantar

informações através de pesquisa em sites de busca da Internet sobre a

conjuntura internacional no período em questão. (Europa – nazismo – Adolf

Hitler).

f) A professora utiliza o CD-room A 2.ª Guerra – holocausto na sala de

informática para visualizar os horrores dos campos de concentração nazista.

g) A professora exibe em sala de aula o filme Olga, de Jaime Monjardim.

Após a sessão propõe uma discussão sobre o filme e destaca a cena

relacionada ao texto.

h) Após a releitura do texto solicita que os alunos relatem a experiência

do que é ler um texto, imaginar a cena, e depois assistir um filme, o qual toda a

cena já vem construída.

i) Os alunos deverão realizar mais uma atividade: Elaborar um desenho

ou história em quadrinhos sobre a primeira parte do texto, que relate a emoção

de Prestes com a leitura da carta de Olga.

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58

2.3.2. Análise da proposta B

Nessa proposta fica clara uma distância entre a visão

interacionista que a professora possui e sua prática de leitura em sala de aula.

Ela ressalta em seu perfil a importância dos gêneros textuais, porém em

momento algum seu trabalho foca as idéias vinculadas ao gênero do texto

trabalhado. Essa oportunidade perde-se, principalmente, quando ela, no item b,

acertadamente destaca palavras essenciais do texto, relacionando, por

exemplo, tribunal a situação da justiça brasileira e a prisão de Prestes.

A oportunidade de trabalhar o gênero passa mais uma vez, no item c,

em que a professora traça uma linha temporal entre texto e contexto. Ou seja,

a abertura de uma carta explicita o lugar, data e destinatário, como Olga

demonstra “(27) Berlim, abril de 1937. (28) Meu Carli”.

Entretanto, a professora preocupa-se somente com as informações do

ano governado por Getúlio Vargas, relacionando-o ao integralismo, este

alinhado ao pensamento fascista, em contraponto a Prestes e seu aliancismo,

um movimento de oposição ao governo. Acreditamos que suas explicações

foram motivadas pelo texto, porém não há um posicionamento claro sobre a

narrativa ou sobre a carta.

No item d, a professora inicia um processo de leitura que Solé (op. cit.)

julga essencial: avaliações que possam mediar todo o processo de leitura. Os

alunos deverão elaborar um texto (ou roteiro) para situarem-se no tempo,

instaurando, assim, um princípio de leitor-sujeito.

Depois, em casa, deveriam consultar sites de buscas da internet sobre

Europa, nazismo e Hitler, prosseguindo na coleta de informações. No final, há

solicitação de uma história em quadrinhos ou desenho sobre a emoção de

Prestes. Nesta última atividade, a professora preocupa-se com a emoção do

aluno, numa tentativa de identificação pessoal.

Nos itens f e g, a professora abandona o texto e inicia um trabalho com

CD-room e o filme de Olga. Ou seja, o gênero inicial é descartado para ser

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59

relido numa comparação com o filme. Do nosso ponto de vista, filme passa ser

um subterfúgio à leitura do texto.

2.4. O perfil da escola e da professora B1

Esta escola é a mesma do item anterior, da professora B. Por

isso, prosseguiremos somente com os dados desta professora denomina B1.

A professora informou que é formada em Estudos Sociais, com

licenciatura em História, possui pós-graduação, lato sensu, em Estudos dos

Problemas Brasileiros e Geografia e trabalha na Educação desde 1985. Está

nesta unidade escolar há um ano, apenas, e não tem cargo efetivo, situação

oposta de sua colega.

Sobre o que é texto, respondeu que é “linguagem” e leitura “é

interpretação do texto”. O mais importante em seu trabalho com a leitura é que

o aluno seja capaz de relacionar a História com nossa sociedade, que ele

tenha uma visão crítica.

Durante as leituras desenvolvidas, percebeu que “a maior dificuldade é a

pouca compreensão que os alunos têm das palavras do texto, sendo que

alguns ainda apresentam dificuldade com a língua”, relatou.

Percebemos que a professora tem uma visão voltada para a

comunicação. Acreditamos que ao usar o termo “linguagem” pensa na forma

escrita que transmite uma mensagem a alguém. Sobre leitura, verificamos que

está relacionada à interpretação, a qual seu aluno deveria comparar com a

sociedade em que vive.

A avaliação é feita conforme a participação dos seus alunos nos debates

em sala de aula e nas atividades de escrita e pesquisa, que solicita após o

assunto abordado.

Sobre a forma como supera as dificuldades, ela disse que recorre ao

“uso do dicionário e retorno ao texto”. Desta forma, percebemos que a

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60

professora se prende muito ao sentido explícito, literal, das palavras. Talvez,

porque alguns alunos ainda apresentam dificuldades de decodificação da

língua.

Outro problema enfrentado refere-se ao pouco interesse dos alunos.

“Eles não se expõem, preferem ficar despercebidos. Para incentivá-los, levo-os

à biblioteca para pesquisa. Seleciono outros textos interligados com o assunto

trabalhado. Às vezes, também peço ajuda do professor de Português ou de

Leitura”.

Do nosso ponto de vista, esse modo de agir tira o foco do texto

selecionado e volta-se para o conteúdo, ou informação, da matéria. Todavia,

vamos analisar sua proposta para ampliar essa idéia.

2.4.1. A proposta de leitura B1

A proposta entregue pela professora revela, assim como as outras, um

planejamento prévio, o qual estabelece como conduzirá a leitura, que

solicitamos ao longo de suas aulas.

a) A professora inicia o trabalho com uma leitura individual do texto: A

Revolução de 1930 (visão dos tenentes), e General Waldomiro Castilho de

Lima, interventor federal no estado de São Paulo.

b) Depois uma nova leitura é solicitada, desta vez a carta escrita em

agosto de 1929, por Luís Carlos Prestes. In: Mary Del Priore. Documentos de

História do Brasil de Cabral aos anos 90, São Paulo, Scipione, 1997.

c) Nesta fase, a professora faz uma série de comentários sobre a

atuação da Coluna Prestes. Inclusive, utiliza um mapa para situar o território

percorrido, destacando as dificuldades enfrentadas na maioria dos estados.

Ressalta que, somente no Maranhão e no Piauí, a Coluna teve certa adesão

popular, porque a população interiorana estava atrelada a uma estrutura

coronelística. Situa que esses fatos ocorrem entre os anos de 1924 e 1926.

61

61

d) A professora distribui o trecho do texto Olga, de Fernando Morais,

para uma leitura em grupo.

e) O próximo passo é assistir um recorte do filme Olga, de Jaime

Monjardim, que destaca o trecho em que Olga é deportada para a Alemanha e

embarca num navio da Alemanha nazista.

f) A professora faz um esclarecimento sobre o momento político do

casal, que a esta altura fazia parte do Partido Comunista. Destaca o “ir e vir”, o

momento político e a ameaça comunista.

g) A proposta termina com a solicitação de uma atividade: elaboração de

uma charge com o tema “Ideologia do Partido Nazista”.

h) A professora sugere duas propostas de leituras: Uma epopéia

brasileira: A coluna Prestes, de Anita Leocádia Prestes. Moderna, e Rebeliões

tenentistas, de Eline Maira Ianni Segatto e José Antônio Segatto, Ática.

2.4.2. Análise da proposta B1

Verificamos que a proposta da professora foge completamente do texto

solicitado por nós. Primeiro, há uma preocupação com o conteúdo da

disciplina. Sabemos que este está relacionado ao texto oferecido; por isso,

nosso trabalho volta-se para as práticas de leitura em sala de aula.

Essa preocupação com a transmissão de informação fica óbvia nos itens

a e b, em que ela trabalha com a leitura de outros textos para resgatar a

trajetória de Prestes.

Segundo, no item c, a professora continua com as informações e utiliza

um mapa do Brasil para mostrar a extensão territorial percorrida por Prestes e

seu desempenho político.

Somente no item d, ela distribui o texto para uma leitura em grupo.

Dessa forma, fica evidente que o texto é somente um pretexto das abordagens

em sala de aula. Não verificamos nada que ao longo desse processo os textos,

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62

quaisquer textos, tivessem um encaminhamento para despertar uma leitura

pessoal, criativa ou dialética, como diz Scholes (op.cit).

É uma leitura que se encerra na informação e na decodificação da

língua, como se esta fosse capaz de criar uma significação ou interpretação. A

professora procede desse modo porque, conforme relatou-nos, sua maior

dificuldade “é a pouca compreensão que os alunos têm das palavras do texto”.

Do nosso ponto de vista, ocorre nessa proposta o que Freire (op.cit.)

chama de “magicização da palavra”, não há “a inquieta procura de professores

e alunos” para a construção de uma interpretação. A quantidade de textos

selecionados e indicados não revela “adentramento” em nenhum deles.

Essa proposta contraria todas as correntes teóricas, aceitas e discutidas

neste trabalho sobre leitura. Sobretudo, o que Paulo Freire acredita sobre um

“ato de ler crítico e político, carregado de significação da experiência existencial

de cada educando e não do educador; um movimento do mundo à palavra e

vice-versa”.

Os itens seguintes (e, f, h) confirmam essa análise. A professora exibe

parte do filme Olga, comenta sobre o momento político e a conjuntura política.

Talvez, até nesse momento, esse filme pudesse resgatar ou despertar o

interesse sobre o texto. Entretanto, o texto não é abordado direta ou

indiretamente.

A professora explica o que foi o Nazismo, mas não observa esse tópico

presente no texto quando Prestes revela: (19) “Pelo menos os nazistas daqui

terão de arranjar um tradutor para censurar minhas cartas, (20) desafiou”.

As informações sobre o Nazismo são importantes e caracterizam a

ideologia da política alemã da época. Não há garantias de que essas

informações despertarão sensibilidade e crítica sobre o sofrimento de Olga,

que ficou esquecida nas linhas do texto.

A atividade solicitada dá margem para que o aluno assimile o Nazismo

como quiser, porém sem embate crítico algum. Uma charge sobre a ideologia

63

63

nazista pode ser simplesmente uma banalização dos momentos mais

contundentes de nossa história humana.

Temos consciência de que a professora jamais pensaria ou provocaria

banalização de propósito. Entretanto, sua prática inconsciente de leitura, em

sala de aula, conduz a uma leitura superficial do texto. Ela tem conhecimento

crítico e político sobre o assunto, mas a proposta não revela uma leitura crítica

para seus alunos.

2.5. O perfil da escola e da professora C

Esta escola chamada C está localizada na periferia de Guarulhos,

também a oito quilômetros do Aeroporto Internacional de São Paulo. Possui

uma quadra poliesportiva, uma cantina, biblioteca (com uma funcionária

designada para o atendimento de alunos), sala de informática, pátio com

refeitório e outras acomodações de praxe na rede pública.

Na avaliação de leitura do SARESP obteve aproveitamento de 55%, no

período matutino, média um pouco superior a Diretoria de Ensino Guarulhos-

Norte, que foi de 53,5%.

Durante a entrevista a professora informou que trabalha na Educação há

seis anos e. nesta unidade escolar, há quatro anos. Ela possui licenciatura

plena em História e não tem especialização.

Sobre o que é texto, respondeu que “é um conjunto de informações,

informações diversas”. E sobre Leitura disse que “está relacionada ao texto.

Para você entender o texto, tem que ler. Para mim é isso, leitura de um texto,

qualquer tema. Para se chegar a uma interpretação, a leitura seria o veiculo”.

Quando ela trabalha a leitura em sala de aula, o mais importante é “a

interpretação do aluno. Para isso, acho fundamental saberem o significado das

palavras. Como já havia dito, anteriormente, sempre peço para eles trazerem

mini-dicionário. Às vezes, eu mesma pego na direção. Para que à medida que

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65

dicionário: “Dificuldades de interpretação de textos, eles têm dificuldades.

Acredito que seja por não saberem o significado das palavras”.

Essa dificuldade de interpretação também tem outra hipótese formulada

pela professora: “Às vezes, é preguiça. Eles respondem qualquer coisa, só

para dizer que responderam. Aí, quando leio está tudo errado. Há falta de

interesse”.

A superação dessas dificuldades está relacionada à avaliação: “Como

disse, dou nota para ver se isso estimula, mas infelizmente, às vezes, não

funciona. Aquele aluno que não está a fim de estudar pouco se importa”.

Acreditamos que o uso do dicionário pode auxiliar a leitura dos

educando ao longo de todo o processo de leitura, porém nesta proposta não há

espaço para eles descobrirem os sentidos inferidos e não somente literais.

2.5.1. A proposta de leitura C

A proposta entregue pela professora inicia com um

esclarecimento sobre seu modo de pensar e agir sobre a Leitura, em sala de

aula, entremeados ao esquema da aula.

a) A professora esclareceu que sua metodologia de ensino, inclui

solicitar aos alunos, que tragam sempre às aulas um mini-dicionário de

Português. Independentemente, se são do ensino fundamental, do ciclo II, ou

do ensino médio, e também da série em que estão cursando.

b) Nesse item, a professora esclarece sua concepção de Leitura, a qual

se não conseguimos compreender o que estamos lendo, fatalmente não

conseguiremos aprender. Também comenta que desde que lhe impuseram

adotar livros didáticos, de História, para o ensino fundamental, do ciclo II, não

teve mais argumentos e acabou cedendo.

c) Ela passou a dar nota de leitura. A cada frase ou parágrafo, pede uma

pausa ao aluno e vai esmiuçando, enfatizando sempre o significado das

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palavras, seus sinônimos, conceitos, que derivam de determinados verbos.

Indaga “onde está o sujeito oculto” (sujeito desinencial ou implícito), brinca que

está “testando a Língua Portuguesa”. Também entra na área de Matemática,

ensina o cálculo entre quantidade de anos e séculos, através de operações

simples para calcular quantos anos viveu determinada personagem da História,

o tempo que ela viveu fora de seu país, a porcentagem de terras ociosas no

Brasil, entre outros.

d) No caso da carta de Olga Benário Prestes para o marido Luís Carlos

Prestes, primeiramente pede que a leiam e juntos. Analisa e questiona trechos,

explica o significado de Gestapo, Comunismo, Nazismo, Fascismo e os

relaciona com a ditadura militar no Brasil, mais precisamente o governo de

Getúlio Vargas.

e) A proposta encerra-se com a solicitação de um trabalho de pesquisa:

ler ou assistir a biografia de Olga.

2.5.2. Análise da proposta C

Ao descrevermos a proposta como foi-nos entregue, confirmamos a

concepção de Leitura vinculada à alfabetização, a uma decodificação da língua

que nos levaria a compreensão de informações, como revelam os dois

primeiros itens.

Em seguida, a professora demonstra consciência sobre a imposição de

certas leituras, “instâncias ideológicas de economia”, através da distribuição e

consumo de livros na escola. Acreditamos que há certa insatisfação com os

conteúdos e qualidade dos livros, apesar de que não houve espaço para

ampliar essa idéia.

A professora também demonstra preocupação em fazer um trabalho

atualizado, interdisciplinar. No seu ponto de vista, os conceitos e

conhecimentos de outras matérias são importantes, porém tudo é realizado por

67

67

ela mesma. Curiosamente, é no item c que percebemos algumas estratégias

de leitura.

Nesse momento, mais rico de sua prática de leitura, demonstra que

pára a leitura a cada instante, faz comentários, relaciona o significado das

palavras ao texto, busca informações sobre qual é sujeito desinencial ou

implícito, situa seu aluno no tempo, calculando os anos de diferença entre eles

e a personagem.

Em seguida, no item d, há um bom momento em que a professora e

alunos lêem o texto juntos. Ela explica o significado explícito de palavras

importantes (Gestapo, Comunismo, Nazismo, Fascismo), relacionando texto a

contexto.

A professora desconsidera os significados implícitos, como “(29) Antes de

tudo”, no início da carta de Olga, que se refere ao contexto político que a

protagonista está inserida e devido à censura não pode ser criticado. Esse

implícito na carta relaciona-se a Gestapo, Comunismo, Nazismo e Fascismo.

Entretanto, esses últimos itens perdem-se com a solicitação de um

trabalho de pesquisa: ler ou assistir a biografia de Olga. Do nosso ponto de

vista, ficam vagos os objetivos da leitura. E antes da leitura instaurar-se como

processo acaba em leitura de outros textos.

O final dessa proposta desconsidera os conhecimentos prévios e

inferências que os alunos podem ativar e revela uma tentativa de que eles

sozinhos construam uma interpretação, bem como, não há relação ao gênero

textual.

A concepção de leitura como alfabetização, no final das contas, limita

todo o processo de leitura do texto. Seus pronunciamentos também revelam a

falta de identificação dos alunos com a leitura e aproximam-se dos comentários

da professora anterior.

Sobre esses fatos há, novamente, presença da “magicização da palavra”

e falta de “adentramento” e de “inquieta procura” na construção de uma

interpretação.

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2.6. O perfil da escola e da professora D

Passaremos agora a nossa quarta escola, uma unidade municipal, que

está localizada em São Miguel, bairro da zona leste da capital paulista. Essa

unidade está cercada por um enorme e popular conjunto habitacional, em que

parte significativa de seus moradores, que compõem a comunidade escolar, é

oriunda de favelas.

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palavras. Outra dificuldade é a compreensão, interpretação. Eles não

conseguem analisar e refletir”.

A superação dessas dificuldades ocorre “trabalhando com projetos

integrados com outros colegas. Colocando outras formas de leitura, como

cinema, teatro, dança e música, mas sempre em parceira com os colegas de

português, geografia e arte”.

Questionamos também se, com esse processo, que envolve os colegas,

o assunto trabalhado é retomado. Ela explicou que “normalmente, com esses

projetos, a gente coloca um tema gerador e cada um fica com uma parte, etapa

desse projeto”.

De acordo com as informações da professora, verificamos que suas

idéias conduzem à noção polissêmica de leitura, de Orlandi (op. cit.). Além de

que a construção de seu processo de interpretação vincula princípios da visão

socioconstrutivista de leitura, de Scholes (op. cit.).

O trabalho realizado de forma conjunta com demais professores revela-

nos os princípios da interdisciplinaridade, na qual os professores dividem

conhecimentos e tarefas, durante o trabalho da leitura.

Seu modo de avaliação demonstra que há uma preocupação com a

verificação da leitura ao longo de etapas, porém vamos observar se isso

procede após a análise da proposta, bem como, se a questão da alfabetização

é tratada como as professoras B1 e C.

2.6.1. A proposta de leitura D

A professora entregou-nos uma proposta dividida em três etapas:

trabalho individual, trabalho em grupo e explorando a interdisciplinaridade, que

contem o seguinte:

1) PROPOSTA DE TRABALHO INDIVIDUAL

a) Ler o texto e situar o momento histórico brasileiro e analisá-lo;

70

70

b) Identificar as causas da prisão de Luís Carlos Prestes;

c) Relacionar a conjuntura mundial com a situação brasileira.

2) PROPOSTA DE TRABALHO EM GRUPO

Assistir, em classe, o filme Olga e em grupos:

a) Coletar dados sobre o período 1930 -1945;

b) Comparar a carta com a respectiva cena do filme (proposta

individual);

c) Organizados os itens 1 e 2, os grupos elaborarão painéis que serão

expostos em murais na escola.

Esse processo requer pesquisa e os alunos deverão fazer consulta à

Internet, ao livro Olga, de Fernando Morais, ao livro didático e outros

disponibilizados pelo grupo.

3) EXPLORANDO A INTERDISCIPLINARIDADE

a) Nas aulas de Português, os alunos realizarão a reescrita da carta;

b) Utilizando o laboratório de informática, as cartas serão digitadas e

enviadas por e-mail aos colegas da turma;

c) Nas aulas de história e geografia ocorrerão debates sobre:

globalização e avanços tecnológicos.

2.6.2. Análise da proposta D

71

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Durante a análise dessa proposta, ficou evidente que essa professora,

assim como as demais, preocupa-se em elaborar um esquema para esta aula,

que consideraremos um procedimento de leitura.

Verificamos que na primeira etapa, denominada proposta de trabalho

individual, há pouco valor ao texto. Este funciona mais como um pretexto das

informações sobre a conjuntura política e a prisão de Prestes.

Essa análise do item A é confirmada através da próxima etapa, trabalho

em grupo, em que o texto passa a ser o filme Olga, de Jaime Monjardim. O

primeiro objetivo torna-se a coleta de dados sobre o período de 1930 a 1945.

É um período extremamente longo em que há diversos acontecimentos

políticos, como: prisão do casal Prestes, deportação e morte de Olga, golpe do

Estado Novo, consolidação de regimes de caráter fascista em alguns países

europeus e no Brasil, anistia de Prestes, Segunda Guerra Mundial e outros.

Portanto, todas essas informações devem ser assimiladas pelos alunos

através dos comentários da professora e da utilização de textos, como trecho

da biografia de Olga, de Fernando Morais, que foi substituído pelo filme Olga,

este transferido para livros didáticos e textos da Internet.

Acreditamos que a diversidade textual e de leituras são benéficas para

os alunos, porém cada uma deve seguir um objetivo específico com começo,

meio e fim.

Nesse item B, também notamos a presença da primeira tarefa:

elaboração e exposição de painéis. Um momento interessante que pode

mediar a leitura do aluno, que está no meio de um processo. Todavia, a

quantidade de informações dispersa a atenção ao primeiro texto.

Na última etapa, ocorre o momento mais rico e interessante da proposta

dessa professora. O primeiro texto é retomado com ênfase a sua segunda

parte, a carta de Olga. A professora de Língua Portuguesa entra no processo

com a reescrita da carta, a qual, certamente, trabalhará as características do

gênero carta.

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As cartas dos alunos serão digitadas e enviadas por e-mail, que é um

73

73

2.7. Uma perspectiva interdisciplinar de leitura: L íngua Portuguesa e

História

Ao pensarmos numa proposta interdisciplinar de leitura faz-se

necessário esclarecer que não vamos ignorar as diversas concepções teóricas

sobre o termo interdisciplinaridade. Entretanto, adotaremos as concepções de

Fazenda (2002:20-40) sobre o assunto.

Segundo a autora, para conceituarmos o termo interdisciplinaridade

temos de aceitar que há “variação no nome, no conteúdo, na forma de

atuação”. Na terminologia mais corrente, encontramos pluri, multi, inter e

transciplinaridade que revelam gradações na coordenação e cooperação entre

as disciplinas.

Em multi e pluridisciplinaridade encontramos uma atitude de

justaposição de conteúdos de disciplinas heterogêneas ou a integração de

conteúdos numa mesma disciplina atingindo-se quando muito o nível de

integração de métodos, teorias ou conhecimentos. Já num nível de

transdisciplinaridade há idéia de transcendência e superioridade científica,

negando a possibilidade de diálogo, este fundamental a interdisciplinaridade.

Na interdisciplinaridade há uma relação de reciprocidade, de

mutabilidade, um regime de co-propriedade, possibilitando um diálogo entre os

interessados. Para Fazenda, é “atitude”, em que a colaboração entre as

disciplinas conduz a uma “interação”, a uma “intersubjetividade”. Não há

pretensão de “construção de uma superciência, mas uma atitude frente ao

problema do conhecimento, uma substituição da concepção fragmentária para

a unitária do ser humano”.

Aceitar a interdisciplinaridade como uma atitude implica em primeiro

lugar verificar qual a atitude dos professores e instituições de ensino diante

deste desafio. Indo mais além, quais seriam a utilidade, as barreiras e a

importância de uma proposta interdisciplinar, no nosso caso uma proposta

interdisciplinar de leitura entre Língua Portuguesa e História para o ensino

fundamental.

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74

Para Fazenda (op.cit.), a interdisciplinaridade surge como “meio de

romper o encasulamento da Universidade e incorporá-la à vida uma vez que a

torna inovadora ao invés de mantenedora de tradições”. É uma proposta de

integrar o ser humano sem hiatos entre “a atividade profissional e a formação

escolar”.

Qualquer um de nós, ao relembrar os anos escolares, talvez, já tenha se

perguntado o porquê de aprendermos determinadas coisas na escola, estas

que pareciam totalmente desvinculadas do nosso mundo e sem utilidade.

O objetivo da interdisciplinaridade é resgatar a unidade do Saber. Seu

valor e aplicabilidade verificam-se tanto numa formação geral, profissional e de

pesquisadores a fim de superar a dicotomia ensino-pesquisa, permitindo uma

educação permanente em que se aprenda a aprender, com respeito à opinião

do outro para a formação de um sujeito crítico e inserido “num mundo Múltiplo

e não Uno”, como destaca Fazenda.

A autora alerta sobre o risco de confundir-se interdisciplinaridade com

integração, para “entreter” as pessoas enquanto a reflexão e a crítica são

postas de lado, perdendo a oportunidade de mudança social. A integração é

um passo anterior à interdisciplinaridade e age como possibilidade de atingir

uma “interação”. “É a integração o início de um relacionamento, é conhecer e

relacionar conteúdos, métodos, teorias ou outros aspectos do conhecimento”,

em um nível multi ou pluridisciplinar.

Já a interação, diferentemente da integração, é condição indispensável à

interdisciplinaridade, uma vez que esta é uma forma de compreender e

modificar o mundo, em que vive o homem. Superar as barreiras existentes

entre as pessoas e instituições é uma necessidade anterior à aplicabilidade da

interdisciplinaridade.

Não é tarde para relembrar que nas escolas os conhecimentos são

organizados em torno das disciplinas, num currículo que reflete nossos valores

e costumes, definidos por nossa sociedade e determinados num tempo e

espaço.

Atualmente, no ensino fundamental, ciclo II – de 5.ª a 8.ª séries, nas

escolas estaduais paulistas as disciplinas estão distribuídas, conforme

75

75

resolução SE n.º 2, de 11 de janeiro 2006, numa matriz curricular básica, em

que a Base Nacional Comum e Parte Diversificada constituem-se em: Língua

Portuguesa, Língua Estrangeira Moderna, Educação Física, História,

Geografia, Matemática, Ciências Físicas e Biológicas e Ensino Religioso.

Segundo Fazenda (op.cit.), o termo interdisciplinaridade aparece pela

76

76

das relações do homem com a sociedade e com a cultura, dos objetivos da

Política Educacional.

Na dimensão socioantropológica, procuraria resolver em que extensão,

condições socioeconômico e culturais, implicam a construção dos currículos e

o levantamento de dados, a fim de que se equacionem os problemas e

possibilidades socioeconômicas.

A dimensão psicológica visaria à distinção de objetivos possíveis dos

improváveis de serem atingidos, além de sua operacionalização. Estabeleceria

ainda quais as experiências de aprendizagem mais significativas para o

educando, à luz do conhecimento que dele se obtenha, bem como a

organização efetiva dessas experiências. Estariam a ela afeitas inclusive as

orientações vocacional e profissional.

A autora conclui que “a indicação 1/72-CEE indica que o planejamento

curricular é produto da capacitação pessoal, recursos institucionais, materiais e

cooperação de outras instituições e, nesse sentido, faz-se necessário um

enfoque interdisciplinar, entendido como uma construção que envolve a

totalidade dos múltiplos setores componentes das instituições escolares”.

A cada dia a sociedade em que vivemos impõe novos desafios ao

trabalho do professor, às competências do ofício de ser professor. Não é o

caso de mudar tudo, porém faz-se necessária uma mudança na atitude, que

esta tenha a pretensão de formar cidadãos críticos e autônomos para vida e a

profissão, de forma conjunta.

Sobre o papel do professor, Perrenoud (2000: 13-21) convida-nos a

uma “viagem em torno das dez novas competências para ensinar”, baseada no

referencial de competências, adotado em Genebra em 1996 para formação

contínua de professores.

Perrenoud alerta-nos que esse ofício “não é imutável. Suas

transformações passam principalmente pela emergência de novas

competências (ligadas, por exemplo, ao trabalho com outros profissionais ou à

evolução didática) ou pela acentuação de competências reconhecidas, por

exemplo, para enfrentar a crescente heterogeneidade dos efetivos escolares e

a evolução de programas”.

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77

A prova dessa mutabilidade é que o autor reconhece que há 30 anos

não tratávamos de temas como tratamento das diferenças, de avaliação

formativa, de situações didáticas, de prática reflexiva, de metacognição.

Acreditamos que uma reflexão sobre as dez competências é um passo a

mais para o professor efetive um trabalho interdisciplinar na escola. Abaixo

reproduziremos um referencial completo, com os dez domínios de

competências reconhecidas como prioritárias na formação contínua dos

professores do ensino fundamental.

Competência de referência Competências mais específi cas a

trabalhar em formação contínua

(exemplos)

1. Organizar e dirigir situações de

aprendizagem

• Conhecer, para determinada

disciplina, os conteúdos a serem

ensinados e sua tradução em

objetivos de aprendizagem.

• Trabalhar a partir das

representações dos alunos.

• Trabalhar a partir dos erros e dos

obstáculos à aprendizagem.

• Construir e planejar dispositivos e

seqüências didáticas.

• Envolver os alunos em atividades

de pesquisas, em projetos de

conhecimento.

2. Administrar a progressão das

aprendizagens.

• Conceber e administrar situações-

problema ajustadas ao nível e às

possibilidades dos alunos.

• Adquirir uma visão longitudinal

dos objetivos do ensino.

• Estabelecer laços com as teorias

subjacentes às atividades de

78

78

aprendizagem.

• Observar e avaliar os alunos em

situações de aprendizagem, de

acordo com uma abordagem

formativa.

• Fazer balanços periódicos de

competências e tomar decisões de

progressão.

3. Conceber e fazer evoluir os dispositivos

de diferenciação

• Administrar a heterogeneidade no

âmbito de uma turma.

• Abrir, ampliar a gestão de classe

para um espaço mais vasto.

• Fornecer apoio integrado, trabalhar

com os alunos portadores de

grandes dificuldades.

• Desenvolver a cooperação entre

os alunos e certas formas simples

de ensino mútuo.

4. Envolver os alunos em suas

aprendizagem e em seu trabalho

• Suscitar o desejo de aprender,

explicitar a relação com o saber, o

sentido do trabalho escolar e

desenvolver na criança a

capacidade de auto-avaliação.

• Instituir e fazer funcionar um

conselho de alunos (conselho de

classe ou de escola) e negociar

com eles diversos tipos de regras e

contratos.

• Oferecer atividades opcionais de

formação, à la carte.

• Favorecer a definição de um

projeto pessoal do aluno.

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79

5. Trabalhar em equipe • Elaborar um projeto de equipe,

representações comuns.

• Dirigir um grupo de trabalho,

conduzir reuniões.

• Formar e renovar uma equipe

pedagógica.

• Enfrentar e analisar em conjunto

situações complexas, práticas e

problemas profissionais.

• Administrar crises ou conflitos

interpessoais.

6. Participar da administração da escola • Elaborar, negociar um projeto da

instituição.

• Administrar os recursos da escola.

• Coordenar, dirigir uma escola com

todos os seus parceiros (serviços

paraescolares, bairro, associações

de pais, professores de língua e

cultura de origem).

• Organizar e fazer evoluir, no

âmbito da escola, a participação

dos alunos.

7. Informar e envolver os pais. • Dirigir reuniões de informação e de

debate.

• Fazer entrevistas.

• Envolve os pais na construção dos

saberes.

8. Utilizar novas tecnologias • Utilizar editores de textos.

• Explorar as potencialidades

didáticas dos programas em

relação aos objetivos do ensino.

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80

• Comunicar-se à distância por meio

da telemática.

• Utilizar as ferramentas multimídia

no ensino.

9. Enfrentar os deveres e os dilemas

éticos da profissão.

• Prevenir a violência na escola e

fora dela.

• Lutar contra os preconceitos e as

discriminações sexuais, étnicas e

sociais.

• Participar da criação de regras de

vida comum referentes à disciplina

na escola, às sanções e à

apreciação da conduta.

• Analisar a relação pedagógica, a

autoridade, a comunicação em

aula.

• Desenvolver o senso de

responsabilidade, a solidariedade e

o sentimento de justiça.

10. Administrar sua própria formação

contínua.

• Saber explicitar as próprias

práticas.

• Estabelecer seu próprio balanço de

competências e seu programa

pessoal de formação contínua.

• Negociar um projeto de formação

comum com os colegas (equipe,

escola, rede).

• Envolver-se em tarefas em escala

de uma ordem de ensino ou

sistema educativo.

• Acolher a formação dos colegas e

participar dela.

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Competência de referência Competências mais específicas a

trabalhar em formação continua

(exemplos).5

Claro está que esse referencial não esgota tampouco elucida todas as

competências, porém é uma direção e uma grande ajuda na construção de

uma identidade, às vezes perdida, necessária ao trabalho do professor. A

ausência de um referencial dá margem às especulações e incertezas de toda

natureza.

Qualquer professor, ao analisar o quadro, reconhecerá nessas dez

competências práticas já incorporadas, bem como novidades ainda não

pensadas, entretanto, possíveis ao bom desenvolvimento de seu trabalho.

Talvez, ainda tenhamos questionamentos sobre as competências. Por

isso, Rios (2004:121-135) alerta que equivocadamente havia uma dicotomia

entre as dimensões técnicas e políticas das competências do professor. A

mediação é a existência de um caráter dialético, formando uma competência

técnico-ético-política.

Para Rios, “o professor necessita, além de dominar conhecimentos, ter

uma determinada forma de atuação que permita que o conhecimento chegue a

seus alunos. É a perspectiva técnica em que se associam teoria e prática.

Entretanto, o professor não pode ser qualificado de competente se não tiver

uma visão crítica de por que ensinar, para que ensinar, qual o significado que

tem este ensinamento no contexto social do qual se faz parte, de que

interesses se está a serviço”.

O trabalho do professor jamais será estático ou solitário, precisará de

mobilidade, diálogo, engajamento político e social, considerando nossos

valores e cultura. É no outro (docentes ou discentes) que se completa e se

expande. Por isso, necessita de uma práxis interdisciplinar.

Rios propõe um caráter coletivo da competência. O isolamento numa

atitude individualista impede a intersubjetividade, a interdisciplinaridade. Esta

5 Perrenoud (op. cit) Fonte: Arquivo Formação contínua. Programa dos cursos 1996-1997, Genebra,ensino fundamental, Serviço de aperfeiçoamento, 1996. Esse referencial foi adotado pela instituiçãomediante proposta da comissão partidária da formação.

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82

possível somente na interlocução de duas ou mais disciplinas, de uma

interlocução criadora na qual se transcende o espaço da subjetividade para ir

ao encontro de muitas subjetividades, disciplinas em diálogo.

Nossa sociedade não comporta mais um conhecimento fragmentado em

disciplinas estanques. Vivemos num mundo globalizado que urge um saber

interdisciplinar.

Por isso, propomos uma perspectiva interdisciplinar de leitura entre as

disciplinas de Língua Portuguesa e História, no ensino fundamental. Estas

poderiam proporcionar ao educando a criação de um protocolo de leitura, em

que educadores e educandos, em parceria, construiriam uma leitura crítica.

Para essa proposta, são necessários alguns princípios já analisados nos

capítulos anteriores, bem como a noção que cada educando e educador seja

capaz de construir seus próprios protocolos. Não há receitas prontas e sim

alguns caminhos, comuns a todos nós, que podem ser seguidos:

• Uma visão múltipla sobre leitura e nossa competência, como

educadores, para formar leitores capazes de enfrentar os diversos

textos utilizados em nossa sociedade;

• A posse de uma ética para superação dos cânones, submetida à

retórica e a interpretação, bem como um estado provisório sobre

a verdade;

• Uma razão textualizada à emoção, uma textualidade

condicionada a história, sociedade e tempo;

• Um educando que verifica se suas hipóteses de leitura

confirmam-se, ou não, ciente da sua própria compreensão;

• Estabelecimento de objetivos de leitura por parte de educandos e

educadores, numa aprendizagem significativa, na qual a utilização

de estratégias ocorra durante todo o percurso de leitura com

autodireção e autocontrole;

• Um trabalho coletivo, de co-produção entre educadores e

educandos, na relação com e para o outro, numa proposta

interdisciplinar de leitura.

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83

Acreditamos que a construção de protocolos de leitura é uma missão

interdisciplinar e possível de ser concretizada nas escolas. Exigirá

planejamento, co-produção e competência de todos.

3. O texto

3.1. Introdução

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84

Para a elaboração do corpus deste trabalho sobre leitura, selecionamos

um trecho da biografia de Olga Benário, escrita por Fernando Morais. A

seleção foi motivada por alguns aspectos específicos:

a) Olga Benário constitui uma figura emblemática dos jovens de sua

época que acreditavam num comunismo internacional, este configurado numa

ideologia que se propunha alterar as relações das classes sociais;

b) A trajetória de Olga está ligada a Luís Carlos Prestes. Uma união, que

escreveu algumas páginas importantes da nossa história política brasileira,

situada num tempo de acirramento das posturas ideológicas e, portanto, fim do

diálogo e da crítica;

c) O momento histórico vivido por Olga é objeto de estudo nas nossas

escolas de ensino fundamental. Desse modo, interessa-nos as práticas de

leituras desenvolvidas pelos professores, em sala de aula, sobre um texto com

esse tema.

Para cumprir nossos, objetivos escolhemos o trecho inicial desta obra

narrativa, do capítulo dezenove: Dona Leocádia enfrenta a Gestapo. É um

trecho em que o narrador revela-nos a situação de Prestes ao receber uma

carta de Olga, informando que sobrevivia e que a filha deles já estava com

quatro meses de vida; uma paternidade até o momento desconhecida por

Prestes. O trecho, reproduzido a seguir, contém algumas marcas numéricas

introduzidas por nós para auxiliar a leitura do capítulo seguinte deste trabalho.

3.2. Dona Leocádia enfrenta a Gestapo (Olga, Fernan do Morais,

trecho do capítulo 17)

Dona Leocádia enfrenta a Gestapo

(1) A notícia de que era pai, (2) de que Olga estava viva, (3) de que a mãe

e as irmãs estavam bem, (4) encheu (5) de esperança (6) um Prestes (7) às

portas da condenação por um tribunal (8) de exceção. (9) Ele releu dezenas de

vezes, a carta da mulher e da mãe (10) no cubículo em que (11) continuava

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85

preso. (12) Quando (13) Sobral Pinto (14) informou-o de que tinha obtido

autorização para que respondesse à correspondência de Olga, ele fez (15) uma

exigência. Sabendo que as cartas eram censuradas, primeiro (16) pela polícia

de Filinto Müller, (17) no Brasil, depois (18) pela Gestapo, em Berlim, pediu ao

advogado que lhe comprasse uma gramática alemã e um dicionário em

alemão. (19) “Pelo menos os nazistas daqui terão de arranjar um tradutor para

censurar minhas cartas”, (20) desafiou. (21) Munido de apenas dois livros e

valendo-se dos (22) rudimentos que aprendera com Olga, passou a escrever em

alemão à mulher. (23) Semanas depois receberia a primeira resposta – (24) um

bilhetinho que, passando pelo crivo da polícia nazista, fora remetido à Cruz

Vermelha, em Genebra, e depois às mãos de dona Leocádia, na França, que o

enviara ao escritório de Sobral Pinto, no Rio de Janeiro, (25) pousando

finalmente na (26) cela de Prestes:

(27) Berlim, abril de 1937.

(28) Meu Carli:

(29) Antes de tudo, quero falar da (30) nossa menina, que já tem (31) mais

de quatro meses. Sua aparência física é uma mistura de (32) nós dois. (32) Tem

os cabelos escuros, como os teus, a tua boca e as tuas mãos. Os olhos são

grandes e azuis, mas não claros como os meus. Os dela têm um (34) azul de

violetas. Tudo isso cercado por uma tez muito suave, branca, e por bochechas

cor-de-rosa, muito bonitas. (35) Como eu gostaria que tu a conhecesses. Mas o

mais bonito é o sorriso. Sorri tão bonito que nos leva a esquecer (36) tudo o que

há de ruim neste mundo. Imagino como tu brincarias com ela, puxando-lhe,

tenho certeza, os cabelos (37) alegremente arrepiados.

(38) Nossa mãe mandou-me tua fotografia. É freqüente eu passar horas,

com a nossa pequena (39) Anita Leocádia no colo, a olhar a foto, como se

estivesse a teu lado. Já faz mais de um ano que estamos separados, mas

acharei forças para esperar o dia feliz em que estaremos de novo juntos.

(40) A tua, Olga.

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4. Uma de leitura de Olga

4.1. Introdução

Para a realização dessa leitura, é preciso algumas considerações: Não

há neste trabalho a pretensão de uma leitura única, muito menos definitiva

sobre o trecho escolhido. Há uma busca sobre uma leitura que considere o

trabalho dos professores de Língua Portuguesa e História, do Ensino

Fundamental, numa exploração de detalhes do texto, para uma visão crítica

sobre a vida de Olga Benário.

É uma leitura que buscou unir os sentidos de uma leitura parafrástica,

polissêmica, centrípeta e centrífuga, numa visão múltipla de leitura, numa

perspectiva interdisciplinar em que estas duas disciplinas são capazes de

ampliar conceitos, de contribuir para a formação de um sujeito-leitor, inserido

numa sociedade em que os valores e costumes estão submetidos à ética.

A ética submetida a uma atitude crítica de nossos educandos para

superação do senso comum. O objetivo é que eles próprios sejam capazes de

um questionamento sobre si, sobre o outro e com o outro.

É papel social de o educador formar cidadãos críticos, a leitura é um

caminho para esse objetivo. Sob nosso ponto de vista, a leitura de textos

poderá ser realizada de forma interdisciplinar. Que as escolas e educadores

elaborem e selecionem seus textos, seus conteúdos, suas metodologias, suas

aulas.

Um enfoque interdisciplinar de leitura eliminará as barreiras entre as

disciplinas e as pessoas para a construção de Saber integrado. Como sugere

Fazenda, numa nova metodologia e linguagem, para a construção de uma

nova Pedagogia, a Comunicação.

Não há como perpetuar significados para os textos, e o trabalho com a

leitura necessita de uma ação unificadora, uma leitura da “palavramundo”,

como ensina Paulo Freire, com todos os esforços de nossos educadores. Seja

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com a utilização da informática ou giz e lousa. É da competência de todos os

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Em contrapartida, na oração principal o verbo (4) encheu, no pretérito

perfeito, revela que algo surgiu e rompeu com a idéia de mesmice. O narrador

privilegia a ação em que algo novo aconteceu àquele homem: encheu, ou

melhor, foi preenchido um vazio. Uma ação concluída e transformadora. Esse

verbo também contribui para a coesão seqüencial do texto. Há nele uma

progressão da estrutura da narrativa.

Há um complemento verbal: “um Prestes”, que revela toda a fragilidade

da personagem. No trecho a respeito da notícia que chega para (6) “um

Prestes”, o uso do artigo indefinido constrói um sentido para o substantivo

subseqüente. Esse artigo constrói a idéia de desiludido, solitário e sem

perspectiva e, sobretudo, um homem retratado até esse momento do texto. Há

também um adjunto nominal: “de esperanças”, fundamental, que complementa

a idéia da multiplicidade de Prestes.

Ele sequer conhecia o destino de Olga. A identidade dessa personagem,

citada logo no início do texto (2), é revelada pela sua importância na vida de

Prestes. Essa importância pode ser notada quando o substantivo próprio Olga,

modaliza-se para (9) mulher. Esse substantivo comum mulher, já caracteriza as

relações amorosas estabelecidas entre eles. Não se trata de uma mulher

qualquer, mas a Olga de Prestes, a mãe de sua filha. É comum, entre nós, o

uso desta palavra mulher para se referir à esposa.

Ela “estava viva” (2), então, inferimos a possibilidade de morte. O que

levaria Olga à morte? Passamos analisar a gravidade das circunstâncias

daquele momento, o adjetivo “viva” remete-nos à morte. Nesta carta não

interessa se ela está bonita, feliz, mais magra ou mais gorda, se o parto foi

natural ou cesariana como ocorre com qualquer mulher que comentamos no

nosso cotidiano.

Após essa gestação, o crucial é a sobrevivência, a notícia que chega

prova que Olga sobreviveu (foi presa, enviada para a Alemanha, sob tutela da

Gestapo, submetida a torturas e trabalhos braçais). Sobre sua mãe e irmãs (3)

consta que estavam bem, talvez seguras, e não exatamente bem, porque bem

nenhuma família fica quanto um dos seus está preso. Um singelo bem-estar

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devido às circunstâncias, principalmente, porque não estavam presas como

ele.

Prestes também vislumbrava a morte, (7) “às portas de um tribunal de

exceção”, um fim na prisão. A esperança contagia Prestes mesmo sendo

iminente seu julgamento, porém não enfrentará um tribunal comum, e sim “um

tribunal de exceção” (8). Esta locução adjetiva caracteriza a justiça da época. O

que nos leva a exceção? O senso comum nos diz que a justiça é igual para

todos, mas com Prestes estava sendo diferente. Nossa atual constituição diz

que “todos são iguais perante a lei”. A constituição da época, como quase

todas, contém a preservação dos Direitos Humanos.

Que crime ele cometeu para não enfrentar a justiça comum e

igualitária? De antemão já sabemos de sua condenação, porém o julgamento

ainda nem aconteceu. Naquele momento de sua vida, restava-lhe somente o

julgamento. Já era dada como certa a condenação e o pouco direito à defesa,

porque vivíamos no ditatorial governo de Vargas.

Agora, no momento vivido por Prestes, renovam-se as forças com as

leituras daquelas preciosas notícias. Fica nítida a importância daquela

correspondência e a infinidade com que foi lida através da hipérbole: (9) “ele

releu dezenas de vezes”.

Além de tão vitais aquelas notícias, o que mais faria Prestes num

cubículo (10)? O uso do substantivo cubículo em vez de cela já nos dá a

dimensão do pouco espaço, das mínimas condições da carceragem.

Há quanto tempo estaria preso? No texto fica evidente que ele

“continuava preso” (11), o pretérito imperfeito, de aspecto durativo, dá uma

noção de ação prolongada, que ainda não chegou ao seu fim.

O advérbio de tempo quando (12) remete-nos a novo momento do texto,

há uma progressão textual, e entra em cena mais uma personagem: “(12)

Quando Sobral Pinto (13) informou-o de que tinha obtido autorização para que

respondesse à correspondência de Olga” (14).

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Sobral Pinto era o advogado que “tinha obtido a autorização” (14). Esta

voz passiva do verbo demonstra a fragilidade da ação. Seu sujeito é agente

recebedor da autorização, lhe foi dada, concedida e revela a ação daquela

justiça. Não foi um direito assegurado pelo advogado, mas uma benevolência

do regime político da época.

Ciente de que se tratava de uma benevolência e não de um direito,

Prestes responderia a Olga em alemão! Era o momento de mais uma vez

resistir. Ele “fez uma exigência” (15), na verdade Prestes não estava em

condições de exigir nada daquele regime governamental, porém pretendia

resistir, brigar, dar trabalho, mostrar sua ideologia. Provar que era capaz de

incomodar, mostrar-se múltiplo.

Podemos inferir, primeiro, que Filinto Müller seria humilhado por não

conseguir ler a correspondência em alemão. Segundo, “pela polícia de Felinto

Müller” (16), a preposição de revela-nos a origem desse aparato público. Não

era a polícia do Estado, (17) do Brasil, mas uma polícia personificada num

proprietário. Um opositor, neste momento antagonista de Prestes. É sabido que

Felinto Müller liderava as forças de repressão de Getúlio Vargas.

A Gestapo (18), a polícia alemã, não lhe meteria medo. Ao situarmos no

texto pessoas, local e instituições (Felinto Müller, Brasil e Gestapo) já

percebemos, implicitamente, que essa censura não era exclusividade

brasileira.

O trecho seguinte revela o pensamento de Prestes sobre a polícia

brasileira: Em “Pelo menos os nazista daqui (...)” (19), nazista é um termo

associado à Gestapo, porém para Prestes tínhamos nazistas aqui (Brasil) e lá

(Alemanha). O advérbio aqui evidencia a ideologia vigente no contexto

histórico.

É evidente a intenção da personagem em dar trabalho à polícia de Filinto

Müller para lerem sua correspondência. Mostra sua resistência na finalização

do trecho: “desafiou” (20). Ele não tinha fluência na língua alemã, porém o

pouco conhecimento seria suficiente.

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Resistira “munido” (21), verbo que nos remete ao léxico de guerra; bem

como “os rudimentos” (22) seriam suas armas: apenas dois livros, fechando o

cerco bélico. Dessa forma, consolida seu ethos de soldado resistente. O

mesmo, que anos antes comandou a Coluna Prestes, um movimento contra o

domínio político oligárquico, e um dos motivos de seu aprisionamento.

A exceção era a marca daquela época. A primeira resposta de Olga

chega (“semanas depois receberia” (23)), talvez, quinze, trinta ou quarenta dias.

Não sabemos, precisamente, quantos dias. Entretanto, já imaginamos uma

infinidade de dias, seguido pelo verbo no futuro imperfeito que prolonga ainda

mais esta idéia.

O tempo voa e hoje a tecnologia, com toda a sua rapidez, fazem

algumas pessoas se esquecerem do longo percurso de uma carta, naqueles

tempos. Atualmente, apesar dos cerceamentos ainda existentes, temos

modernas e ágeis agências de correios; um celular que propicia comunicação

até entre presos comuns de dentro dos presídios brasileiros, burlando a polícia

local.

Além de tudo isso, ainda há a Internet, quebrando dezenas de barreiras

e suscitando tantas outras por parte de governos receosos e restritivos. Essa

ferramenta veloz e direta é capaz de conectar pessoas em qualquer parte do

planeta. Hoje uma mensagem pela Internet permite agilidade. É provável que

até o extremista Bin Laden tenha tido a sua conexão para calcular e comandar

as ações terroristas ao World Trade Center, nos Estados Unidos.

Situação bem diferente do primeiro bilhete de Olga. Melhor, “um

bilhetinho” (24). Diminuto, carinhoso e frágil, contudo sua importância não está

em seu tamanho e, sim, em seu conteúdo. O bilhetinho, não mais a

“correspondência”, como o narrador cita no início do fragmento, foi lido e

aprovado pela Gestapo, enviado à Cruz Vermelha, em Genebra, repassado à

França, onde se encontrava dona Leocádia, esta que o remete ao advogado

Sobral Pinto, no Rio de Janeiro. Somente depois de lido e, novamente,

aprovado foi entregue a Prestes.

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Uma correspondência que veio de longe, depois de muitos caminhos e

vigilância acabou “pousando” (25), na cela (26), e não mais no cubículo. O

restrito universo de Prestes alcançou novos horizontes, graças à modalização

de cubículo para cela, ampliando horizontes.

Até esse ponto, o texto revela a mesmice e a demora para Prestes

conseguir algo. Contribuem para essa idéia a utilização de um parágrafo

extenso, construído, principalmente, por verbos no imperfeito.

Evidencia-se nessas situações a intencionalidade do autor em criar e

recriar valores semânticos no contexto histórico–político da época em que

viviam as personagens retratadas na biografia de Olga.

Como caberiam naquele bilhetinho (24) os sofrimentos e as privações da

prisão e da vida? Para uma militante bem treinada, como Olga era, é uma

missão simples escrever uma mensagem. Saberá encolher bem as palavras,

sem se esquecer dos que amam. Na situação em que se encontrava, ela pôde

comentar muitos detalhes sobre aquele momento de sua vida. Deveria ser

breve, esta carta não teria privacidade. Mesmo sendo breve, num bilhete, não

se desvencilhou de sua ideologia.

Sabemos que o gênero textual carta, é uma correspondência, ligeira,

com o propósito de mencionar ocorrências de grande ou pequena importância.

Uma carta revela certa dose de formalidade, quanto à sua estrutura (local,

data, saudação, emprego do vocativo, mensagem, saudação final e

assinatura). Pode ser usada para a troca de confidências entre os amantes;

avisos restritos entre políticos ou entre funcionários de uma empresa; entre

pais e filhos para relembrar obrigações domésticas, e tantas outras finalidades.

Este, como qualquer outro gênero textual, é uma atividade humana

discursiva, que revela nossas atividades, papéis e relações sociais por meio da

linguagem (Meurer op. cit). É através da comunicação que o ser humano

transgride, refuta, concilia e critica o mundo em que vive. E marca suas

posições ideológicas relacionando o gênero, o léxico, o contexto e o seu

interlocutor.

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Olga inicia sua correspondência situando-se no tempo e no espaço:

“Berlim, abril de 1937(27)”, como o gênero exige. Escolhera bem as palavras

porque sabe que a correspondência será lida por muitas pessoas, e ela e

Prestes estão presos.

Ela está bem distante do Rio de Janeiro, mas o início da

correspondência evidencia o grau de intimidade e afetividade entre os

interlocutores “Meu Carli (28)”. Não se trata de um Carlos qualquer, e sim de um

Carlos específico, como oferece o pronome possessivo. Convém salientar que,

apesar desta nomenclatura, Olga emprega o pronome com caráter afetivo,

como foi dito anteriormente, e não como idéia de posse.

O que vem em seguida já nos leva a inferir o profundo sentido das

dificuldades vividas pelo casal: “Antes de tudo (27)”. É o implícito na voz de

Olga. Este estrato gramatical está numa propriedade de hipertaxe, eleva-se de

uma simples de locução adverbial para uma idéia fundamental dentro do texto.

Se alguém quiser saber o que de fato acontece, terá que inferir o

significado desse “antes de tudo”. No discurso, essa superordenação anuncia a

censura pela qual a carta era submetida, e não será revelada. O texto segue

abordando somente as questões sentimentais em relação à família. Da

separação dos laços não só familiares como ideológicos.

A locução prepositiva “antes de” coloca-se como marcadora do tempo,

sua axiologia temporal, antes do momento presente em que se encontra a

personagem quando redigia sua correspondência. Distancia-se do passado e

revela somente o momento em que vive, conforme a preposição de com seu

traço semântico, dinâmico de origem em relação a “tudo”. E que será esse

tudo, a origem de tudo?

A garra e resistência de Olga ficam nítidas neste enunciado. Será que

primeiro falaria que o mais importante era a filha e depois o “tudo”? Esse “tudo”

é tão vital, que está implícita a questão político-ideológica e não será revelada,

obviamente.

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Como falar da família sem situar-se no mundo em que vive? Esse “tudo”

de Olga é indefinido, como a vida dela nesse momento! Ficará a cargo de sua

biografia determinar seu “tudo”, porque não serão reveladas na carta as suas

últimas impressões sobre o mundo que a cerca. As relações de poder

existentes entre ela e seus adversários ficam registradas, subentendidas,

porque a forte censura da prisão não permitiria a Olga situar-se como sujeito

ativo de seus ideais e crenças.

Um aprofundamento neste “antes de tudo”, sucinta: o que viveu essa

mulher antes desta carta? Esse “tudo” revelaria sua origem, desde sua

adolescência em que preferiu a luta pelos direitos dos trabalhadores alemães

ao invés de levar uma vida tranqüila e alheia à sociedade injusta em que vivia.

Como esqueceria a adolescente militante e comunista em Munique, Alemanha,

sua terra natal?

Ela e seus jovens amigos que foram capazes de resgatar em pleno

tribunal, na prisão de Moabit, seu antigo namorado Otto Braun, acusado de

“alta traição à pátria”, em 1928. Foi assim que Olga adquiriu respeito e

notabilidade entre os seguidores do partido comunista para planejar e executar

ações. Iniciava, então, uma vida clandestina que culminaria com a chegada a

Moscou, Rússia.

O partido comunista russo, na época, sonhava transformar a sociedade,

recrutava e financiava jovens de todas as partes do mundo que pudessem

levar adiante a causa comunista, como Olga Benário. Lá, em território russo,

recebeu rigoroso treinamento militar. E destacou-se a tal ponto que foi

convocada a escoltar e a proteger um jovem brasileiro, Luís Carlos Prestes,

também treinado pelos comunistas.

Esse “antes de tudo” seria, talvez, desde quando os dois se passaram

por um jovem casal de portugueses, recém-casados, em lua-de-mel pelo

mundo com destino final no Brasil? Uma missão que virou romance.

Apaixonados, planejariam e executariam a tomada pelo poder. Um ideal que

Prestes acalentava desde a Coluna. A viagem até o Brasil uniu para sempre a

vida dos dois.

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O movimento arquitetado pelos comunistas brasileiros fracassou devido

a pouca adesão, traições políticas e forte contra-ataque do Governo Vargas.

Prestes e Olga foram presos quando ela nem sabia que estava grávida. Para

vingar-se de Prestes o governo entrega Olga aos alemães.

Ela não se nega a felicidade da maternidade, nesse momento, mais do

que nunca, único. Valoriza tanto a maternidade como o amor pelo

companheiro. Todavia sua mente engajada e lutadora situa desde o início sua

frustração com o mundo que a cerca.

Na carta seria impossível traçar qualquer paralelo entre o presente e o

passado se não investigássemos as marcas lingüísticas. O futuro incerto

estava na figura da filha que acabara de nascer. E Olga afirma: “quero falar da

nossa menina (30)”. Não seria um assunto proibido, sendo, também, de suma

importância para o casal.

Fica clara a distância que envolve o casal: “já tem mais de quatro

meses” (31) que a criança nascera. Como um pai não acompanha a gestação e

muito menos o nascimento da filha? Ela o trata de forma tão carinhosa e,

portanto, a distância, então, não seria fruto de uma briga conjugal.

Não há como negar a comoção que as palavras de Olga carregam.

Acreditamos que em muitas pessoas desperta a emoção que traz o nascimento

de um filho. Como Olga, qualquer família busca encontrar semelhanças e

diferenças naquele pequenino ser que chegou. É um momento superior, antes

de tudo, que não pode ser furtado nem proibido. Os laços familiares não se dão

neste trecho da carta somente por mera formalidade, sobretudo há afinidade

política e ideológica. A prisão representa a separação de todos esses laços.

A fragilidade da situação, refletida também em sua filha, que ainda não

conhece o pai. A mãe sonha com o primeiro encontro familiar. Nesse momento,

a mãe vive numa pequena cela com seu bebê, a comida é racionada. As

colegas de prisão, às escondidas, colaboram com a alimentação de Olga para

que o aleitamento se prolongue ao máximo, retardando a separação fatal entre

mãe e filha.

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gigantesca. Certamente, ainda não está como ela queria, contudo houve quem

vivesse e lutasse contra aquele poder dominante.

Olga possui uma mãe, em comunhão com Prestes. É evidente o

tratamento carinhoso dado à sogra: “Nossa mãe mandou-me tua fotografia (38)”.

Dona Leocádia resume o ideal político e familiar, de uma união marcada não só

pelo amor como pela admiração ideológica. Esta senhora envia a foto de

Prestes, que lhe serve de esperança naquele local tão aterrorizador.

Seu momento profundamente solitário mostra-lhe uma janela: a própria

maternidade e a adoção de uma mãe. Uma mãe biológica era algo já

esquecido e deixado aos quinze anos, em Munique, onde a adolescente Olga

abraça a causa comunista e corta vínculos familiares.

A mãe de Olga, em sua biografia, era uma judia burguesa totalmente

avessa à atuação política da filha que, mais tarde, não se sensibilizou com os

apelos de dona Leocádia para livrar, pelo menos, a neta da prisão. O pai era

um advogado justo e atencioso às causas dos menos favorecidos, porém na

ocasião já estava morto.

Olga sabe que esse futuro é incerto. Cita o nome da filha Anita Leocádia:

“É freqüente eu passar horas, com nossa pequena Anita Leocádia no colo, a

olhar a foto, como se estivesse ao seu lado (39)”. A filha e a foto de Prestes é

uma presença constante.

A escolha do nome da filha demonstra o quanto ela é de luta, o quanto

queria mudar o mundo com sua garra feminina. Valoriza a história daqueles

que lutaram por um ideal. Além de militarmente preparada para acompanhar

Prestes, Olga demonstra também conhecimento e admiração pelas causas

brasileiras.

Anita Garibaldi6 era o nome da companheira do italiano Giuseppe

Garibaldi, um dos líderes da Revolução Farroupilha. A brasileira Anita

abandonou o marido para seguir o amor e os ideais de Garibaldi. Os dois foram

para a Itália, onde lutaram e morreram pela unificação italiana.

6 MORAIS, Fernado. Olga. 17.ª ed., São Paulo, Cia. Das Letras, 1994, p.189.

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Leocádia, o nome da mãe de Prestes, é a mãe que Olga adotou e

jamais encontraria pessoalmente. A mãe que do lado de fora da prisão correu o

mundo divulgando as arbitrariedades ocorridas nas prisões de Olga e Prestes.

As ações e os apelos públicos de dona Leocádia livraram Anita do campo de

concentração nazista, porém não chegaram a tempo de livrar Olga da câmara

de gás.

O ideal que levou Olga a abraçar a causa comunista e a unir-se a

Prestes move suas últimas esperanças. A prisioneira não só sonha com a

liberdade como diz: “acharei forças para esperar o dia feliz em que estaremos

de novo juntos (40)”. Ela buscará forças para sobreviver e defender a si e a sua

criança.

O fecho de sua correspondência realça mais uma vez a idéia de união

amorosa e ideológica: “A tua, Olga”. Em quem o ethos de guerrilheiro confiaria

seu corpo e sua alma? A um companheiro!

5. Algumas conclusões

Nas propostas apresentadas pelas professoras, percebemos

semelhanças e diferenças. Um traço comum entre todas, algumas com menor

intensidade, revela que as professoras têm consciência sobre a importância

dos gêneros textuais.

Entretanto, essa importância não é resgatada na hora da leitura em sala

de aula. Predomina uma leitura de informações, sem a reflexão da

intencionalidade do autor, dos vínculos mantidos pela estrutura textual. Em

nenhum momento houve a reflexão de que todos, educadores e educandos

debruçar-se-iam sobre a narrativa de uma mulher, chamada Olga Benário.

Uma narrativa, qualquer que seja, está presente no cotidiano de nossos

educandos. Inclusive, eles próprios são donos de uma narrativa pessoal escrita

até aquele instante em sala de aula. O que há em comum ou divergente entre a

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história de Olga e a história deles? Essa questão também não foi formulada,

porém poderia despertar a empatia e interesse dos educandos.

Cabe ressaltar que os textos são diferentes e posicionamos-nos

diferentemente diante deles na hora da leitura. Nossas expectativas de leitura

mediante uma poesia são diferentes de uma bula de remédios, estas, por sua

vez, também são diferentes diante uma notícia de jornal.

O texto em si também torna-se informação nas propostas, exceto na

proposta A, em que fica mais evidente um potencial de leitura a partir do texto e

contexto. Entretanto, há acúmulos de fatos históricos. Como já mencionamos, a

informação é importante, contudo o acúmulo dela sobrecarrega o

“balanceamento” da leitura. A cada passagem do texto, educadores e

educandos poderiam, aos poucos, construir uma significação, através de

sentidos explícitos e implícitos; este último, praticamente, negligenciado.

As inferências são hipóteses de leituras, que serão ou não confirmadas

pelo texto ou pela análise do professor. Essas inferências podem ser um

gancho para uma informação detalhada, mas nunca ignoradas por informações

prontas que o educando capte sozinho.

Uma dificuldade comum às propostas B1, C e D é o processo de

alfabetização que nossos educandos se encontram. Todas as professoras

apresentaram propostas de leitura para a oitava série, do ciclo II, em que a

idade gira em torno de catorze anos. Portanto, não era esperado problema tão

grave e comum como decodificação da língua.

Conscientes de seus papéis, as professoras tentam superar essa

dificuldade inicial de leitura. Entretanto, a leitura da palavra não pode ser

desvinculada da leitura da “palavramundo”. A construção de uma interpretação

sobre qualquer texto ou palavra parte de nossas experiências pessoais.

Como diz Scholes (op.cit.), se quisermos ler fato temos que ler o nosso

próprio livro no texto diante nós, há de torná-lo pessoal conforme Paulo Freire

em sua consciência sobre o ato de ler como ato político, como a leitura da

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palavra não desvinculada da “palavramundo”. A ortografia e sentido explícito

não conduzem sozinhos à construção de um “ato de ler”, de uma “leitura ética”.

As práticas de leituras adotadas pelas professoras são conseqüências e

influências da ausência de uma política educacional que garanta não só o

acesso à escola, mas também o pleno desenvolvimento dos educandos.

Algumas propostas também indicam tarefas na sala de informática,

porém, somente na escola municipal há um professor designado para esta

sala. A falta de uma pessoa responsável pelo uso desse ambiente inviabiliza e,

pelo menos, dificulta muito o desenvolvimento das propostas.

Nas escolas A, B e C são constantes também a falta de manutenção dos

computadores, que não passam de dez em cada escola. É comum o rodízio de

alunos por aula, fechamento dessas salas ou não cumprimento das tarefas por

parte dos alunos. Essa realidade cerceia as propostas e revelam as instâncias

econômicas, políticas e jurídicas para o desenvolvimento da leitura no

ambiente escolar.

As professoras demonstraram que trabalhar a leitura em sala de requer

um planejamento prévio por parte do professor. Como qualquer aula que nos

propomos a desenvolver. Assim, o uso de estratégias ou protocolos de leitura é

fundamental na construção do processo de interpretação.

Estratégias e protocolos não são objetos de aprendizado em si mesmos.

São recursos que o educador utiliza para despertar o interesse da leitura e para

instaurar o sujeito-leitor, que enfrentará os mais variados discursos e precisará

efetuar uma leitura não só informativa, mas crítica.. Nesse aspecto acreditamos

que uma perspectiva interdisciplinar de leitura poderá conduzir a construção de

um protocolo de leitura. Somente a escola D, da rede municipal, esboçou esta

preocupação. Acreditamos que as dificuldades encontradas sejam por falta de

uma práxis interdisciplinar.

A interdisciplinaridade pode ajudar nossos professores no

desenvolvimento de suas competências. Para isso, é preciso repensar nossa

atitude frente aos desafios de formar leitores críticos. Um trabalho conjunto,

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interdisciplinar, aliviará a sobrecarga de tarefas escolares, carga horária

extensa e formação insuficiente.

A interdisciplinaridade requer tempo e dedicação para planejamento e

execução, porém acreditamos que é de grande contribuição para os

professores no desenvolvimento de suas competências. Ou pelo menos, no

reconhecimento de que o outro é parceiro, é co-produtor de um trabalho que

não deve nunca ser isolado.

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Porto Alegre: ArtMed, 1998.

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