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VALTER LUIZ DE MACEDO PROVÍNCIA FLUMINENSE: um território a serviço da nação. Tese apresentada ao Curso de Doutorado do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Doutor em Planejamento Urbano e Regional. Orientadora: Prof. Dra. Fania Fridman Doutora em Economia pela Universidade de Paris VIII, França Rio de Janeiro 2008

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VALTER LUIZ DE MACEDO

PROVÍNCIA FLUMINENSE:

um território a serviço da nação.

Tese apresentada ao Curso de Doutorado do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Doutor em Planejamento Urbano e Regional.

Orientadora: Prof. Dra. Fania Fridman

Doutora em Economia pela Universidade de Paris VIII, França

Rio de Janeiro 2008

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FICHA CATALOGRÁFICA

M121p Macedo, Valter Luiz de. Província fluminense : um território a serviço da nação / Valter Luiz de Macedo. – 2008. 238 f. : il. ; 30 cm. Orientador: Fania Fridman. Tese (doutorado) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional, 2008. Bibliografia: f. 205-226. 1. Planejamento regional – Rio de Janeiro (Estado). 2. Território nacional. 3. Cidades e vilas – História. 4. Rio de Janeiro (Estado) - História. I. Fridman, Fania. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional. III. Título. CDD: 981.53

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VALTER LUIZ DE MACEDO

PROVÍNCIA FLUMINENSE:

um território a serviço da nação.

Tese apresentada ao Curso de Doutorado do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro como parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Doutor em Planejamento Urbano e Regional.

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Dedico este êxito à Roberta Azevedo da Silva por toda a base afetiva e apoio

constante e incondicional para a sua realização e por sua companhia, amor e

amizade em todos os momentos da minha vida.

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Como registrar os meus agradecimentos aqui?

Para não esquecer de ninguém, agradeço a todos que de alguma forma contribuíram

para que este trabalho pudesse ser construído.

Em especial, à minha orientadora Fania Fridman por todos os exemplos e incentivos

constantes em nossa intensa e já duradoura trajetória de pesquisa e amizade.

Também ao professor Maurício de A. Abreu (IGEO/UFRJ) pela sua presteza e

consideração ao aceitar irrestritamente participar da minha banca examinadora,

acrescentando-a em muito com as suas observações e presença.

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O primeiro cuidado de um individuo e de uma Nação he sua conservação. Primeiro se existe, para depois curar-se do modo de existir. O primeiro objecto he

vital, o modo de existir he segundário.

João Calda Vianna, Relatório do Presidente da Província do Rio de Janeiro

Quer se situe em 1558 ou no ano da graça de 1958, trata-se, para quem quer compreender o mundo, de definir uma hierarquia de forças,

de correntes, de movimentos particulares; depois, apreender de novo uma constelação de conjunto. (...) Cada ‘atualidade’ reúne movimentos de origem, de ritmo diferentes: o tempo de hoje data, ao mesmo tempo,

de ontem, de anteontem, de outrora.

Fernand Braudel, Escritos sobre a História

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RESUMO Nossa pesquisa toma por contexto o processo de organização territorial brasileira a partir dos interesses internos pós-Independência, quando surge um ideário de Nação, para investigar as práticas que consolidaram a integração do território da província fluminense. Partimos da hipótese de que a política territorial imperial visava o fortalecimento de uma unidade nacional e procuramos observar que tal objetivo extrapolava a ordem econômica assentada na produção agrícola, apontando para o papel preponderante desempenhado pelas cidades, que, em redes, serviram de instrumentos de regulação e de controle sobre suas regiões. Consideramos que o ideal de Nação desenvolvido serviu como retórica para o controle territorial e que o projeto nacional implementado foi, em essência, um projeto de natureza urbana articulado em um contexto regional. Por envolver a Corte e congregar a maior parte da nobreza e da renda do Império, além da constatação de que o seu número de núcleos urbanos triplicou no período considerado, admitimos o território fluminense e sua sociedade nobiliárquica e estratificada como laboratório para nosso trabalho. Nossa intenção consiste no estudo do processo de integração entre distintas regiões, entre produção e comércio, potencializado pelo advento das ferrovias, mas não iniciado através delas. Visamos, no conjunto das “ideologias geográficas” que nortearam o período imperial brasileiro e seu projeto nacional, identificar a natureza do espaço produzido no caso fluminense. Palavras-Chave: Província Fluminense. Território. Nação. Cidade e Região. Planejamento territorial.

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ABSTRACT The context of our research is the process of the Brazilian territorial organization through investigating the practices which solidified the integration of the lands of the fluminense province, from the internal interests during the period of post independence, when an idea of creating a Nation came up. We started from the hypothesis that the imperial territorial policy aimed at strenghthening a national unity and tried to observe that such objective overstepped the economical order settled in the agricultural production, pointed to the preponderant role played by the cities, which served as means of regulation and control over their regions. We considered that the ideal of a developed Nation served as a rhetoric for the territorial control and that the implemented national project was urban in essence, which was articulated in a regional context. We took the fluminense territory and its noble stratified society as a laboratory for our work, because the Court was involved and thus it congregated the most part of the nobility and the gains of the Empire. Besides, the triplication of urban centers was an evidence during that period. We mean to study the process of integration between distinct regions, between production and trade, powered but not started by the coming of the railroads. We aimed at identifying the nature of the development of the fluminense area in the set of the “geographical ideologies” which directed the Brazilian imperial period and its national project. Key-Words: Fluminense Province. Territory. Nation. City and Region. Territorial Planning.

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LISTA DE FIGURAS E QUADROS

Figura 1: Surgimento e evolução de núcleos urbanos coloniais a partir de um marco religioso. 123 Figura 2: Organograma da Administração Provincial 1834/1840 155 Figura 3: Organograma da Administração Provincial 1841/1846 156 Figura 4: Organograma da Administração Provincial 1846/1858 157 Figura 5: Organograma da Administração Provincial 1859/1875 158 Figura 6.1: Organograma da Administração Provincial 1876/1889 (1) 159 Figura 6.2: Organograma da Administração Provincial 1876/1889 (2) 160

Quadro 1: Inserção do Império em distintas periodizações da História do Brasil 99 Quadro 2: Comarcas, municípios e freguesias na província fluminense (1843) 145 Quadro 3: Obras de infra-estrutura de circulação na província fluminense em 1843. 177 Quadro 4: Legiões da Guarda Nacional na província fluminense em 1843. 184 Quadro 5: Distritos eleitorais da província fluminense e Corte (1856). 185 Quadro 6: Datas para entrega dos saldos de arrecadação provincial (1882). 191

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LISTA DE TABELAS E MAPAS

Tabela 1: Percentual brasileiro na produção mundial de café (1820-1889). 51 Tabela 2: Principais produtos brasileiros para exportação - % (1821-1890). 51 Tabela 3 : Vilas e cidades fluminenses criadas durante o período colonial. 126 Tabela 4 : Principais receitas da província fluminense no ano financeiro 1841/1842 133 Tabela 5 : Participações das províncias nas rendas gerais do Império (1859/1864) 133 Tabela 6 : Vilas e cidades fluminenses criadas durante o período imperial 136 Tabela 7: Receitas da província fluminense por repartições (1841/1842 e 1843/1844) 189

Mapa 1: América Latina em 1830 69 Mapa 2: Desmembramentos da Capitania de São Paulo no século XVIII 102 Mapa 3: Divisão político-administrativa e povoamento em 1822 106 Mapa 4: Comarcas, municípios e freguesias na província fluminense (1843) 125 Mapa 5: “ Certões” na Capitania do Rio de Janeiro no final do século XVIII 128 Mapa 6: Caminhos freguesias e aldeias na região de Vassouras no início do século XIX 135 Mapa 7: Aldeias, freguesias, vilas e núcleos coloniais na região de Campos (meados XIX) 143 Mapa 8: Comarcas na província fluminense (século XIX) 148

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SUMÁRIO

Introdução ...........................................................................................................

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1. A pesquisa e seus caminhos .......................................................................... 1.1. O viés geográfico-histórico ........................................................................ 1.2. Posturas diante do objeto ..........................................................................

18 20 29

2. Território e cidade no Brasil imperial ............................................................ 2.1. Notas sobre o período imperial brasileiro .................................................. 2.2. Do conceito de nação ao projeto nacional brasileiro ................................. 2.3. A base material da nação ..........................................................................

34 36 62 97

3. Cidade e nação na província fluminense ...................................................... 3.1. O território legado ...................................................................................... 3.2. O movimento da economia fluminense e suas cidades............................. 3.3. Operacionalizando o território....................................................................

117 118 131 149

Considerações Finais .........................................................................................

200

Referências Bibliográficas ................................................................................. Fontes de dados primários....................................................................................

205 219

Anexos 1. Os gabinetes do Segundo Reinado................................................................... 2. Reprodução de “A grande política” ...................................................................

227 228

Apêndices 1. Justiça no Brasil e no Rio de Janeiro................................................................ 2. Listagem dos Presidentes da Província Fluminense.........................................

230 233

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Introdução

Quando da transição do Brasil colonial para o Império, o termo “brasileiro” que,

muitas vezes, era confundido com o termo “brasiliense”, denotava, em alguns

casos, apenas aquele aqui nascido e, em outros, aquele aqui estabelecido, distante

que estava da sua acepção moderna de identidade coletiva. Tal distância era

compreendida pelo caráter secundário que esta questão mantinha quando da

subjugação do Brasil à sua metrópole. No que se refere ao vasto território e a

despeito do esforço português, a ocupação ainda era rarefeita, concentrada na faixa

litorânea, pouco articulada e formada por aglomerados urbanos simplórios. A capital

não fugia à regra.

Estes dois exemplos, capturados do cotidiano social e da base física da

colônia, mostram alguns dos obstáculos a serem superados a partir de 1822 quando

a proclamada independência exigiria um “pensar” e um “fazer” a respeito da

emancipação política do novo país. Processo este que, ancorado nas iniciativas do

liberalismo nascente europeu no que se referia à formação de unidades políticas

constitucionais, prontamente adotou a bandeira da Nação.

No entanto, aqui, o projeto nacional defendido estava assentado na

manutenção de características estruturais do momento histórico anterior como a

forte desigualdade de classes e a escravidão. Marca principal da construção do

Estado imperial brasileiro, o conservadorismo das elites dominantes assegurou uma

configuração política ímpar no contexto da América Latina. A viabilidade da

monarquia constitucional naquele momento foi garantida pelo viés patrimonialista e

pelo receio de revoltas escravas como o fora no Haiti ou de radicalizações

republicanas como se assistiu em toda a vizinhança.

Inaugurada nestes termos, a nação a ser criada teria que encontrar meios para

se fazer “brasileira” e abranger e ser soberana sobre seu território. Para além da

manutenção da saúde econômica, assentada na produção agrícola, seus mentores

deveriam preocupar-se com questões como a conquista de fronteiras, a

manutenção da ordem, a gerência do espaço interno e suas relações, a

arrecadação de impostos, a imposição de um credo, a unificação da língua e a

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“civilização” dos seus membros, tomada à moda dos preceitos europeus de

sociedade. Neste contexto, uma questão relevante passou a ser a integração

territorial e a configuração a ser adotada para o emergente espaço nacional. Nossos

estudos têm apontado para uma política imperial voltada para o fortalecimento desta

unidade através da instituição de vilas e cidades.

É exatamente diante da envergadura de tal projeto que, a nosso ver, o espaço

urbano foi tomado como elemento-chave pelos seus idealizadores que se serviram

da Nação como retórica para a manutenção do controle social e territorial nas

formas até então consagradas. Isto é, sem maiores rupturas. Para o trato de tal

questão, consideramos indispensável a pesquisa sobre a gênese da nação

brasileira, sua organização, suas normas, seus agentes e conflitos sociais,

sobretudo o papel da aristocracia que, concentrando a riqueza da Nação, era

agraciada com títulos nobiliárquicos e constituía a força política de apoio ao Império.

Neste caminhar, os núcleos urbanos (sobretudo as cidades) foram tomados como

centro do exercício do poder concentrando funções tanto administrativas quanto de

controle (inclusive social). E se a integração do todo físico da nação era questão de

ordem, foram tomados também como nós na rede de comunicações e de

transportes que haveria de ser montada.

Nos discursos e políticas nacionalistas daquele momento, o sentimento de

pertencimento ao Brasil e a identificação com o “ser” brasileiro emanariam dos

ambientes urbanos, pois deveriam comportar símbolos e sistemas de representação

do novo nível de progresso e civilidade a ser alcançado. Mais ainda: seria o meio

para se atingir a integração do território, assegurando as áreas de fronteira e

ocupando suas imensas áreas a partir das diretrizes estabelecidas na sede da Corte

centralizadora.

Falamos, no plano ideológico, de um projeto civilizatório que pretendia criar

uma história e uma identidade nacional brasileira e, no plano espacial, de uma rede

urbana e seus nós como forma de regulação e controle sobre as regiões.

Consideramos o ideal nacional apresentado como um projeto urbano em essência,

pois foi utilizado intencionalmente como símbolo em um projeto de controle

territorial.

Afirmamos que o processo de unificação do território brasileiro foi pensado

como meta que seria alcançada através da constituição de cidades, visto que é por

meio do conjunto delas que a produção, circulação e o consumo (no plano

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econômico) e a dominação (a partir da representação simbólica dos valores que

seriam emanados) acontecem efetivamente. Parece-nos que tal processo se

verificou no entorno imediato da capital imperial e, deste modo, originaram-se as

bases para a sua integração observada com descontinuidades nas décadas

posteriores.

A ocupação no Brasil do século XIX se deu, em boa parte, através de uma

política de instituição de núcleos coloniais que objetivavam uma conquista do

território baseada no elemento étnico europeu que responderia pelo uso técnico do

espaço e pelo idealizado branqueamento da população. Por lei, todos os municípios

do Império teriam a obrigação de instituir um núcleo colonial e, em cada um deles,

uma vila. Estudos recentes revelam que muitos desses núcleos implantados no

período, e que contavam com funções econômicas e finalidades geopolíticas e

civilizatórias previamente definidas, vieram a constituir-se em cidades que,

articulando-se aos demais núcleos urbanos ou diretamente à Corte, conformariam

uma rede (incipiente, mas integradora por possibilitar as comunicações

pretendidas). Nestes temos, o território fluminense e sua sociedade nobiliárquica e

estratificada configuram um laboratório para tal estudo. Afora a experiência dos

núcleos coloniais, foi significativo o número de vilas que no período imperial foram

elevadas à categoria de cidade. Por um processo ou por outro, a área do atual

Estado do Rio de Janeiro viu o seu número de núcleos urbanos (fossem cidades ou

vilas) mais que triplicar entre o final do período colonial e a década de 1890.

Sabemos que a ocupação do interior da província fluminense se iniciou durante

o século XVIII por conta da atividade mineradora nas Gerais. A abertura de

caminhos e a instalação de pousos durante o percurso caracterizaram uma certa

“empresa povoadora” controlada direta ou indiretamente pelo Estado que visava a

conquista do solo para satisfação do mercado interno e estrangeiro. Com objetivos

similares, importantes vias partindo da cidade do Rio de Janeiro ou chegando até

ela desenhavam o mapa das comunicações estabelecidas até então entre a Capital

e sua hinterlândia, seja em traçado “direto” rumo às minas (através de localidades

como Petrópolis e Três Rios) ou mais “circulares” como os que atingiam São Paulo

ou os que exploravam o baixo curso do rio Paraíba do Sul, na atual região norte do

Estado.

Abertos por particulares através de cláusula nas cartas de sesmarias e, em

muitos casos, aproveitando o traçado derivado de antigas vias de circulação

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indígena, tais caminhos foram essenciais para o estabelecimento de comunicações

e fluxos de mercadorias entre diversas localidades. Também, por estes caminhos,

surgiram aglomerados, pontos de feiras periódicas, vilas, cidades, sítios, fazendas,

além de outras estradas tributárias. E, sem precedentes, esta dinâmica

condicionada pela prática de abertura de novas vias de circulação foi intensificada

com a atividade cafeeira.

Observamos ainda que um comércio de gêneros alimentícios e de animais

que, originário das Minas Gerais se articulava com o Rio de Janeiro, deu origem a

um setor de subsistência mercantil também responsável pela ocupação do interior

fluminense. Os recursos e os caminhos das tropas tiveram destaque na expansão

da economia cafeeira e de seus valores sociais. Por estas vias de penetração,

fornecia-se à capital parte dos gêneros agrícolas que ela consumia, circulavam

informações e estabeleciam-se engenhos e demais fazendas de café. A articulação

entre produção e comércio, viabilizada pelo crescente número de vias de circulação

propiciou também a instalação de núcleos de povoamento, como mencionado.

Desta forma, podemos entender que desde os primórdios da ocupação e

exploração do território fluminense o eixo principal das atividades realizadas eram

as estradas coloniais, tendência que persistiu durante o século XIX quando as

grandes fazendas cafeicultoras no Vale do Paraíba e o dinamismo açucareiro na

região de Campos dos Goytacazes desempenharam papel de referência no “mapa

das interações possíveis”, ostentando a riqueza que sustentou o Império. De

contrapartida, algumas áreas da província, como o litoral sul em torno de Angra dos

Reis e Parati, viveram momento de decadência e isolamento por conta de novas

dinâmicas econômicas em outros locais e seus correspondentes eixos espaciais.

Sobre estas questões, ressaltamos a articulação de uma renda fundiária

brasileira e um capital produtivo internacional para a construção de ferrovias que

viriam agilizar a produção e consolidar uma infra-estrutura de transportes. O ponto a

ser considerado aqui é o que marca um processo de integração entre produção e

comércio entre distintas regiões, potencializado pelo advento das ferrovias, mas não

iniciado através delas. Vias de circulação e de comunicação, mesmo que mais

lentas, já estavam delineadas como testemunho da lógica social, política e

econômica em vigor no território. No entanto, e o caso fluminense nos mostra, a

“rede” pensada e estabelecida não fugia de sua definição teórica e afirmava o

caráter seletivo do espaço tornado território.

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O respeitado geógrafo Roberto Lobato Corrêa já apontou a lacuna existente

nos estudos sobre a estruturação do território brasileiro no que se refere à questão

das redes estabelecidas nos sucessivos momentos históricos. Foi adiante ao

afirmar que a análise acerca da organização sócio-espacial brasileira seria

enriquecida se compreendida à luz das relações entre rede urbana e oligarquias

rurais. Nossa intenção, assim, consiste em enfatizar o espaço fluminense,

pesquisando a organização territorial pensada para tal província, uma vez que não

se trata apenas do surgimento de núcleos articulados e com funções distintas, mas

de uma intenção no âmbito de um projeto maior.

A despeito da visão de que as práticas de planejamento territorial têm uma

tradição associada ao século XX, parece-nos relevante considerar as discussões

atuais em fóruns de História do Urbanismo e de Planejamento Urbano e Regional

que mostram que programas de ação governamental e intervenções de base

urbana no espaço brasileiro são mais antigos. As implicações deste fato nos levam

a novos entendimentos sobre a ordenação do “chão” fluminense.

Buscamos compreender a base territorial do planejamento político imperial e

observamos tal questão a partir do viés geográfico-histórico. Em outras palavras,

buscamos nas políticas territoriais e nos espaços produzidos as “ideologias

geográficas” que nortearam o império brasileiro quando de seu projeto nacional,

avaliando até que ponto as idéias de cidade e região foram efetivamente

operacionalizadas e relacionadas. Como dito, nossa lupa centra atenção no caso

fluminense.

Para tanto, esta tese está estruturada em três partes. Na primeira delas,

buscamos assinalar nossas posturas metodológicas diante do objeto e indicar os

caminhos tomados pela pesquisa. Nosso objeto se mostra aqui através de suas

principais características e questões sugeridas. A intenção é fundamentar a

necessidade de um olhar para os processos envolvidos através de suas relações

com a “ampla escala”. Também o é indicar a centralidade que o entendimento sobre

os mecanismos de representação e consciência do espaço assumem neste

trabalho.

Este, ao considerar a hipótese de um projeto nacional de unidade territorial a

partir de um urbano simbólico e também materialidade em suas relações com a

região em que se insere, aponta para duas questões operacionais imprescindíveis:

a compreensão desse ideário nacional e a configuração espacial que ele alude.

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Neste sentido, a segunda parte deste trabalho busca indicar as especificidades da

cena brasileira no período em tela buscando perceber o território como reflexo e

condição em cada momento. Entendemos que este esforço não seria possível sem

uma leitura sobre o arcabouço teórico a respeito da nação e do território e o fizemos

de forma a inserir o nosso objeto na própria discussão e não apenas na sua

seqüência.

A terceira e última parte desta tese resgata as considerações realizadas nas

unidades anteriores sobre a província do Rio de Janeiro a partir dos dados que nos

permitiram alinhar a pesquisa. Não se trata porém de apresentar nosso objeto neste

momento, mas de verificá-lo a partir das suas informações específicas. Aqui,

discursos do poder executivo, planos de infraestrutura física, documentos

administrativos, textos de lei, entre outros documentos, são examinados para se

buscar um entendimento sobre a conformação territorial fluminense em um contexto

em que o Estado monárquico brasileiro buscava ser nacional nos moldes de

sociedades que construíam a sua nação a partir de realidades outras. É a captura

desse descompasso que julgamos poder observar na escala da província.

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1. A pesquisa e seus caminhos

Analisar o processo histórico de formação do território fluminense durante o

século XIX, quando se realizou no Brasil a efetivação de um projeto nacional

significa observar como determinadas frações desse território passaram a se

configurar como espaços delimitados e diferenciados no contexto político,

econômico e social da província durante o período imperial. Tal temática torna-se

oportuna quando observamos que há um hiato na literatura sobre o Estado do Rio

de Janeiro naquilo que se refere à sua conformação territorial, não nos oferecendo

uma informação precisa sobre sua constituição.

Tentando contribuir para o preenchimento desta lacuna, o campo problemático

de nossa pesquisa pode ser enunciado como a relação entre o projeto de

constituição de Nação no Brasil pós-Independência e o processo de organização

urbana e territorial fluminense. Trabalharemos especificamente com a idéia de que o

projeto nacional pretendido para o Brasil independente pode ser visto como aquele

que, na base territorial, considera o urbano como mecanismo de articulação das

esferas regionais e, na vertente simbólica, pensa este urbano como instrumento

civilizatório. Através deste foco, observamos que se o processo de articulação do

território fluminense se deu através de uma economia agrícola e da consolidação de

uma aristocracia composta por senhores rurais que giravam em torno do poder

central, tal processo só poderia acontecer pela constituição de uma rede de cidades,

visto que é através dela que produção, circulação, consumo e dominação política

efetivamente acontecem.

Assim, partimos da premissa de que existiu uma relação direta entre cidade,

região e a política territorial imperial e, para dar conta de uma análise por este viés,

temos a consciência de que o nosso esforço deverá conjugar uma dimensão

temporal ao estudo de uma dada forma de organização do espaço. Seguindo os

ensinamentos de Santos (1985), quando nos alerta da “geografização” dos espaços

produzidos como resultado de um conjunto de variáveis que interagem entre si e que

mudam no transcurso da história dos lugares, pensamos priorizar os sistemas que

se sucedem em detrimento dos fatos isolados.

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No contexto da expansão econômica européia no período considerado,

indicamos as seguintes questões em nosso trabalho: 1) A partir da política colonial

portuguesa de gestão do espaço, pensamos nos termos do processo de

organização territorial fluminense que passam a vigorar no período pós-

Independência do Brasil, quando dos ideais nacionalistas; 2) Entendido que, do jogo

político em torno do Estado Imperial, consolidaram-se determinadas forças que

definiram os moldes da construção de valores e de espaços unificados, assinalamos

a emergência de um projeto centralizador/civilizador de base territorial urbana e

regional; 3) Por tal premissa, importante será entender as características de tal

política centralizadora no espaço que envolve a então capital do Brasil e sua

hinterlândia mais imediata, correspondente ao atual Estado do Rio de Janeiro; 4)

Ademais, há de se considerar as formas de ação dos atores envolvidos (Estado,

nobreza cafeeira e do açúcar e demais proprietários de escravos e de terras) para a

manutenção do prestígio e da legitimidade; e 5) Reflexo dos interesses em pauta,

pensamos na importância conferida às vias de comunicação e de circulação para a

unidade a ser dada ao território fluminense, reportando-nos aqui à operacionalidade

de uma rede urbana que permitiria a dinamização de distintas regiões comandadas

pela sede do poder imperial e que, diminuindo a autonomia municipal, possibilitou

arranjos políticos em torno de interesses regionais.

Tais questionamentos revelam os objetivos da tese. Em primeiro lugar,

relembramos que nosso trabalho está atento ao fato de que “o tema rede urbana e

oligarquias rurais parece ser de extrema relevância para se compreender a

organização sócio-espacial brasileira” (CORRÊA, 1998, p. 114), apresentando um

estudo sobre o território fluminense que se insere nos debates atuais sobre as

determinações históricas da urbanização brasileira. Em última análise, visamos

somar esforços no sentido de apresentar um “olhar” sobre o processo de ocupação

territorial na província do Rio de Janeiro que articula as dimensões do local e do

regional em um contexto de afirmação nacional. Nosso trabalho, ao tentar cumprir

seus objetivos e abordar as questões listadas, terá que buscar na

interdisciplinaridade o tratamento de seus marcos teóricos. Se já enfatizamos que

será priorizado o olhar da “geografia retrospectiva” nos moldes apresentados por

autores como Azevedo (1956, 1957a), Abreu (1996) e Moraes (2002), também é

verdade que não poderemos nos distanciar de campos disciplinares como o das

Ciências Políticas (no que se relaciona com as discussões sobre “nação”, “Estado”

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e “poder”), do Urbanismo em sua interface com a História (“urbanização pretérita”,

Império no Brasil) e com a própria Geografia (“território”, “rede geográfica”, “rede

urbana”, “região”).

Ao indicarmos tais campos, fica assinalado que nosso estudo sugere a hipótese

de que podemos pensar em um projeto nacional de unidade territorial a partir de um

urbano simbólico e também materialidade que considera a dimensão política da

região em que se insere. Dialogamos inicialmente com os escritos do historiador

francês Fernand Braudel e sua defesa em nome de uma “ampla escala” para se

compreender a História e, de forma específica, com os textos do geógrafo brasileiro

Antonio Carlos Robert Moraes quando discute a questão da representação e da

consciência do espaço.

1.1. O viés geográfico-histórico

Na linhagem da revolução metodológica no campo dos estudos históricos a

partir da revista Annales d’histoire Économique et Sociale, publicada na França em

1929 por Lucien Febvre e Marc Bloch, os trabalhos de Braudel o alçaram ao posto

de principal continuador e herdeiro de uma nova maneira de se conceber e escrever

a História. Aberto sem concessões à interdisciplinaridade em uma proposta em que

a Geografia e a Economia se revestiam de um interesse especial, Braudel ampliou a

dimensão do historiador ao observar o caminhar das sociedades humanas através

de seus variados ritmos, superando o método tradicional de olhar para o passado

através da escala humana, da ação dos “grandes homens”. Sem se desfazer do

interesse por esses relatos, ele concebe níveis distintos para os tempos da História,

centrando atenção nos processos mais extensos do que o da vida dos indivíduos.

Em última análise, ele buscava a relação entre os fatos e as estruturas que modelam

as sociedades, sejam elas materiais ou relativas às mentalidades. Com esta nova

postura metodológica, a História mudou de objeto uma vez que mudou de

temporalidade. Nas palavras do próprio autor:

A recente ruptura com as formas tradicionais da história do século XIX não foi uma ruptura total com o tempo curto. Sabe-se que ela

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redundou em benefício da história econômica e social, em detrimento da história política. Daí, uma reviravolta e uma inegável renovação; daí, inevitavelmente, modificações de método, deslocamentos de centros de interesses com a aparição de uma história quantitativa que, certamente, não disse sua última palavra (BRAUDEL, 1992, p. 47).

Neste processo de mudanças, a influência desempenhada por outras ciências

no grupo dos Annales muito se deveu ao monumental texto, organizado em 1903, do

geógrafo Vidal de la Blache sobre a história francesa. Neste trabalho, que no

contexto daquele país visava fundar um patriotismo legitimador da República, o autor

partia do território para construir a idéia de um grupo social que, limitado e

condicionado por circunstâncias objetivas do meio geográfico, havia constituído uma

pátria e um Estado. Não que Vidal de la Blache visse no meio impedimentos para os

impulsos sociais, mas lembrava dele como uma resistência a ser percebida e

impossível de ser dissociada da História. Assim, o tempo dos homens encontrava o

“atrito” do espaço, mas não o espaço através do determinismo físico defendido pela

Geografia que se fazia na Alemanha e que se afirmava como referência em tempos

de institucionalização desta ciência.1 Ao romper com esta corrente, acabou tomado

como influência no processo através do qual os historiadores descobriam no espaço

o elemento responsável por uma maior densidade do tempo histórico.

Em particular, para Braudel, a Geografia passou a configurar um instrumental

de trabalho que o possibilitaria encontrar as realidades mais lentas e importantes no

trato explicativo sobre as características observadas nos seus objetos de estudo.

Importante frisar que este instrumental passava agora a ser manuseado de forma

completamente distinta da tradição, uma vez que não mais se oferecia apenas para

descrição introdutória do meio físico a ser considerado. Nas obras assim

organizadas, estas introduções geográficas à História viam o espaço como palco

para os acontecimentos das sociedades. Através de Braudel, o espaço passou a ser

considerado também no âmbito da análise histórica como elemento condicionante e

reflexo da ação humana.

Este caminho possibilitou a mais importante mudança metodológica sentida na

História durante o século XX e aproximou de vez os textos dos Annales dos

1 Seguindo Moraes (1991), é paradigmático o fato de, no contexto de afirmação dos Estados Nacionais europeus, ter sido exatamente a Alemanha (com sua tardia unificação política) o principal locus de desenvolvimento da reflexão geográfica. É verdadeiro dizer que tal ciência encontrou expressivo desenvolvimento e reconhecimento exatamente nos países que dificuldades encontraram neste processo.

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geógrafos de ponta, notadamente franceses e alemães. Destes últimos, por

exemplo, Braudel tomou a habitual tríplice divisão da Geografia em “espaço”,

“economia” e “sociedade” como base analítica para o seu principal trabalho (“O

Mediterrâneo e o mundo mediterrâneo na época de Philippe II”) e suas postulações

quanto à episteme da História.

Para ele, esta tríplice divisão se confirma quando enfatiza que a História para

ser vista em “ampla escala” deve ser decomposta em três planos escalonados que

se referem aos distintos tempos em que transcorrem os acontecimentos estudados:

um “tempo geográfico”, um “tempo social” e um “tempo individual”. O primeiro se

refere à “história quase imóvel, a do homem em suas relações com o meio que o

cerca; uma história lenta no seu transcorrer e a transformar-se, feita com freqüência

de retornos insistentes, de ciclos incessantemente recomeçados”, o segundo tempo

à “história lentamente ritmada, (...) dos grupos [sociais] e dos agrupamentos” e o

terceiro tempo que se refere à história tradicional, da dimensão do indivíduo, a

história ocorrencial, dos eventos, “uma história com oscilações breves, rápidas,

nervosas” (BRAUDEL, 1992, p. 13-14).

Ao discorrer sobre este último, ele o considerou como “agitação de superfície” e

alertou:

Desconfiemos dessa história ainda ardente, tal como os contemporâneos a sentiram, descreveram, viveram, no ritmo de sua vida, breve como a nossa. Ela tem a dimensão de suas cóleras, de seus sonhos e de suas ilusões. (...) Os acontecimentos retumbantes não são amiúde mais que instantes, que manifestações dos largos destinos e só se explicam por eles (BRAUDEL, 1992, p. 14-15).

Ao falar ainda sobre a apropriação da História pelas demais ciências sociais,

enfatizou que a tendência era a de desconhecer um aspecto da realidade importante

para a primeira: a duração social, os “tempos múltiplos e contraditórios da vida dos

homens, que não são apenas a substância do passado, mas também o estofo da

vida social atual” (BRAUDEL, 1992, p. 43). E, neste sentido, para ele, que deu

ênfase ao fato de que “nada é mais importante, no centro da realidade social do que

a oposição viva, íntima, repetida indefinidamente entre o instante e o tempo lento a

escoar-se”, a conclusão a ser concebida ressaltava que os estudos importantes

realizados por historiadores vinham contribuindo para a afirmação da multiplicidade

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do tempo e da centralidade do “tempo longo” para as análises mais profícuas. Neste

sentido, é emblemática a seguinte citação:

Todo trabalho histórico decompõe o tempo decorrido, escolhe entre suas realidades cronológicas, segundo preferências e opções exclusivas mais ou menos conscientes. A história tradicional, atenta ao tempo breve, ao indivíduo, ao evento, habituou-nos há muito tempo à sua narrativa precipitada, dramática, de fôlego curto (BRAUDEL, 1992, p. 44).

E defendendo a “grande medida” como mecanismo de superação a este

entrave, enfatizou que a “nova história econômica e social” articula ao relato ou

“recitativo tradicional” um interesse pela “conjuntura que põe em questão o passado

por largas fatias: dez, vinte ou cinqüenta anos”, chamando a atenção para sua

premissa de que “bem além desse segundo recitativo, situa-se uma história de

respiração mais contida ainda, e desta vez, de amplitude secular: a história de longa,

e mesmo, de longuíssima duração” (BRAUDEL, 1992, p. 44).

Nestes termos, o autor passava a considerar como essencial o entendimento

das estruturas na compreensão voltada para o passado mais distante e que

persistia. Convém, no entanto, salientar que, aqui, ele tratou de diferenciar sua idéia

do próprio estruturalismo afirmando que:

Por estrutura, os observadores do social entendem uma organização, uma coerência, relações bastante fixas entre realidade e massas sociais. Para nós, historiadores, uma estrutura é sem dúvida, articulação, arquitetura, porém mais ainda, uma realidade que o tempo utiliza mal e veicula mui longamente. Certas estruturas, por viverem muito tempo, tornam-se elementos estáveis de uma infinidade de gerações; atravancam a história, incomodam-na, portanto, comandando-lhe o escoamento. Outras estão mais prontas a se esfarelar. Mas todas são ao mesmo tempo, sustentáculos e obstáculos. Obstáculos, assinalam-se como limites (envolventes, no sentido matemático) dos quais o homem e suas experiências não podem libertar-se. Pensai na dificuldade de quebrar certos quadros geográficos, certas realidades biológicas, certos limites da produtividade, até mesmo, estas ou aquelas coerções espirituais: os quadros mentais também são prisões de longa duração (BRAUDEL, 1992, p. 49-50).

Ao pensar desta forma, Braudel avançou em relação aos pioneiros da Annales

olhando para a História como um conjunto de rupturas e continuidades. Para ele, ela

traz não apenas o que muda (como pensava Marc Bloch), mas também

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permanências. Assim, pode compreendê-la como globalidade, marcada pela

dialética permanente entre mudança e não-mudança e associá-la a uma constante

interdisciplinaridade para o seu entendimento. E, neste sentido, dois outros

conceitos que ele associa à sua idéia de tempo longo e que são fundamentais em

nosso trabalho são os de “civilização” e o de “economia-mundo”.

O primeiro deles, cuja definição remonta do século XVIII, é, para o autor, a

própria tradução da “larga medida” por traduzir pares como estrutura-conjuntura e

instante-duração através de sua idéia de oposição à barbárie. O segundo conceito,

proveniente do pensamento alemão, interage com a questão da vida material em

sua relação com a história econômica e diz respeito às distintas regiões do planeta

integradas pela atividade econômica.

Nestes termos, se constrói a globalidade defendida em sua nova História. Para

o caso de crítica ou incompreensão, Braudel esclarece recorrendo ao quadro da

Europa entre os séculos XIV e XVIII e olhando, especificamente, para os seus

numerosos surtos de progresso e repetidos abalos de crises agrícolas estacionais:

A dificuldade, por um paradoxo apenas aparente, é discernir a longa duração no domínio onde a pesquisa histórica acaba de obter seus inegáveis sucessos: o domínio econômico. Ciclos, interciclos, crises estruturais ocultam aqui as regularidades, as permanências de sistema, alguns disseram de civilizações (...) evoquei após alguns outros, os traços principais do capitalismo comercial para a Europa Ocidental, etapa de longa duração. Não obstante todas as modificações evidentes que os percorrem, esses quatro ou cinco séculos de vida econômica tiveram uma certa coerência, até a agitação do século XVIII e da revolução industrial da qual ainda não saímos. Alguns traços lhes são comuns e permanecem imutáveis, enquanto que em torno deles, entre outras continuidades, mil rupturas e agitações renovavam o aspecto do mundo (BRAUDEL, 1992, p. 51-52).

Em síntese, a História decorrente dos escritos de Braudel é aquela que se

impõe por constantes variações e continuidades e na qual importantes eventos

nestes ciclos nem sempre são percebidos se a medida para a análise for a curta e

tênue escala temporal humana. Para o autor, os três tempos indicados devem ser

considerados pelo pesquisador para que ele fuja do inadmissível “erro historizante”

que consiste em trabalhar com uma dessas escalas em detrimento das demais.

Marcada a influência em nosso trabalho de uma análise histórica que perceba

também a longa duração, o outro ponto a ser destacado se refere à visão da

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Geografia como materialidade e representação. E, neste contexto, foi importante no

olhar sobre o nosso objeto a relação que Robert Moraes aponta entre a História do

Brasil e a questão do território (MORAES, 1988, 1991 e 2002). Com apoio decisivo

nestes textos, caminhamos na busca por um entendimento das determinações

geográficas de um momento específico do Brasil. Ao tentar a compreensão das

bases territoriais do discurso e das políticas imperiais, enfatizamos a dimensão

espacial como norteadora de pressupostos básicos do nosso processo histórico.

Nesses textos, ao discutir de modo sistemático o tema da representação e da

consciência do espaço, o autor distinguiu três níveis de sua abordagem: o do

“horizonte geográfico”, o do “pensamento geográfico” e o das “ideologias

geográficas”. A primeira destas abordagens faz referência ao conhecimento do

senso geral sobre o meio físico da superfície terrestre e está circunscrita ao conjunto

de informações geográficas do indivíduo comum. No estágio mais elaborado de

construção mental, o “pensamento geográfico” diz respeito àquela abordagem

constituída pelo discurso do saber culto e pelas representações sistemáticas e

normatizadas da consciência do espaço do planeta. Por sua vez, o autor considera

como “ideologias geográficas” o conjunto de representações sobre o espaço com um

caráter político explícito, conferindo ao território uma importância fundamental no

debate sobre as relações entre política e cultura e desvendando os diferentes usos

ideológicos da Geografia em momentos importantes da História.

Não é sem propósito que o autor, atentando para o contexto de afirmação das

nações européias, afirma que:

Na verdade, as teorias modernas dessa disciplina foram, em muito, veículos de legitimação das nacionalidades e dos respectivos projetos nacionais. O discurso geográfico foi, sem dúvida, um elemento central na consolidação do sentimento de pátria. Pode-se mesmo dizer que esse seria o principal núcleo divulgador da idéia da identidade pelo espaço (MORAES, 1991, p. 166).

A valorização dos atributos espaciais como base para as formulações

ideológicas de medidas de cunho político caracteriza o uso do território como

suporte e produto destas ações e, de uma forma geral, este processo resulta na

valorização de determinadas partes do território em detrimento das demais. Além do

mais, por esta análise, podemos perceber que o “pensamento geográfico” pode

constituir-se em veículo para as “ideologias geográficas”, mesmo que estas sejam

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antagônicas entre si. Interessa-nos, em particular, perceber como e quais temas

desta ciência estiveram presentes nos diversos tipos de representações discursivas

que emanam da vida política brasileira em determinados momentos de sua trajetória.

Entender tal questão requer pensar inicialmente que, de acordo com Moraes,

todo grupo ou indivíduo social carrega consigo uma forma particular de

representação do espaço e é decorrente dela que cada um projeta suas

intervenções materiais no meio concreto. Toda representação do espaço, portanto,

acaba por denotar uma ação política, pois se insere na produção material das

sociedades e na disputa por formas hegemônicas de ação entre os mesmos grupos

ou indivíduos sociais.

Se adotarmos uma concepção gramsciana de hegemonia na qual ela é

entendida como uma situação de domínio de uma dada classe ou indivíduo através

do controle tanto das condições intelectuais quanto materiais de produção,

“universalizando” seus interesses, perceberemos a centralidade do conceito de

“ideologias geográficas” para a reflexão sobre a produção material dos territórios,

tomados também como locus dos sistemas de representação dominante. Pensamos

ser esta ótica apontada eficaz para avaliar as questões do nosso trabalho, sobretudo

por ser o período imperial rico na construção de símbolos e sistemas de

representação para afirmação dos propósitos da nação que estava sendo

implantada.

A partir desta noção de “ideologia geográfica”, outros textos fundamentais para

a análise e compreensão da carga simbólica dos espaços se somaram em nosso

estudo, como os escritos de Milton Santos e de Pierre Bourdieu. Seguindo a linha

que discute tal questão a partir das ideologias dominantes, Santos (1999) nos

lembra que a totalidade social é composta por aspectos de realidade e de ideologia

e que esta última é importante ao produzir símbolos que assumem forma de objetos

concretos ou de discursos criadores do real. Lembramos ainda das “representações

objectais” definidas teoricamente por Bourdieu (1989) que se materializam em

coisas ou atos a partir de manipulações simbólicas que alvejam a determinação das

representações mentais que baseiam os interesses e os pressupostos dos agentes

sociais. Corroborando a idéia já apresentada, é importante reafirmar que, na base

das construções concretas está uma ideologia hegemônica e que a realidade é

densa de metáforas e se impõe através da produção recorrente de imagens e do

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imaginário que, naturalizando um pensamento dominante, o faz passar por único

(SANTOS, 2000).

Ao considerar tais questões a partir ainda desse olhar miltoniano, pensamos

que a análise dos fatos deve ser travada de maneira a perceber que o próprio

movimento da sociedade que se estuda transforma a significação de suas variáveis

constitutivas e “por isso mesmo, a cada nova divisão do trabalho, a cada nova

transformação social, há, paralelamente, para os fabricantes de significados, uma

exigência de renovação das ideologias e dos universos simbólicos, ao mesmo

tempo em que, aos outros, tornam-se possíveis o entendimento do processo e a

busca de um sentido” (SANTOS, 1999, p. 103).

No nosso estudo em particular, tais indicações impõem considerar que refletir

sobre a organização espacial em um território (sobretudo no que se refere à

conformação de sua rede urbana) significa considerar o discurso dominante e sua

gama de representações. Perguntamo-nos sobre as lógicas que norteiam a

conformação das morfologias espaciais, em especial aquelas concentradoras,

observando, por exemplo, o padrão de urbanização estabelecido, as relações da

economia imperial com a Europa e o modelo de desenvolvimento das economias

regionais. Ao eleger o modo como se redesenhou a rede de cidades fluminenses,

intentamos superar a prática comum de se considerar as variáveis econômicas

como determinantes nas dinâmicas territoriais e considerar a organização do

sistema urbano não como resultante, mas como parte constitutiva nos processos de

mudança na província e no império. A dinâmica e as alternativas de localização da

atividade econômica, bem como os movimentos da população, constituem-se em

aspectos indutores importantes e conformaram um território em constante

transformação. O movimento da economia associado às políticas de urbanização

acabou por imprimir formas fazendo-se valer de um conjunto de representações

como as de “sociedade moderna” e “nação”.

Por último, vale lembrar que, ao centrar nossa atenção na temática da rede

urbana, temos a consciência de que operamos com escalas ou, de forma mais

enfática, trabalhamos com o “problema da escala” tal como enunciado por Castro

(1995), que ressaltou ser esta uma estratégia de compreensão do real via

representação. Assim, nos é imposta a obrigação de laborar continuamente com a

mudança de escalas tanto cartográficas quanto as conceituais (ora a da rede

urbana, do espaço urbano e ora a da província). E com este rol de preceitos, é

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sempre oportuno resgatar Roberto Lobato Corrêa e o seu alerta de que o

importante, para o pesquisador, é não perder de vista as relações entre os modos

como o urbano pode ser geograficamente analisado, não esquecendo ainda de que

“a operação escalar não introduz uma visão deformada, geradora de dicotomia,

mas, ao contrário, ressalta as ricas possibilidades de se analisar o mundo real, o

urbano no caso, em dois níveis conceituais complementares” (CORRÊA, 2003, p.

136). O objetivo é o de chamar a atenção para os processos sociais que ocorrendo

no âmbito da rede urbana, conformam o espaço urbano ou vice-versa, entendendo

que tais conexões entre escalas impõem uma análise que as utilize como método

para dar unidade ao estudo do espaço tomado como objeto de pesquisa.

Podemos ainda resgatar a primeira citação desta unidade para reafirmar os

cuidados tomados para um trabalho consciente das variáveis que interagem entre si

e que podem mudar no transcurso da história dos lugares. Para cada aspecto desta

atenção, um grupo de indicações teóricas foi buscado para a nossa tentativa de

integração das diferentes escalas (inclusive de temporalidade) de análise. Afinal:

(...) não se pode fazer uma interpretação válida dos sistemas locais na escala local. Eventos à escala mundial, sejam os de hoje ou os de ontem, contribuem mais para o entendimento dos subespaços que os fenômenos locais. Estes últimos não são mais que o resultado, direto ou indireto, de forças cuja gestação ocorre à distância. Isto não impede que estes subespaços sejam dotados de alguma autonomia em razão do peso da inércia gerada pelas forças produzidas ou amalgamadas localmente (SANTOS, 1985, p. 22).

Os autores citados até o momento se somam nesta citação e nos mostram que

não existe uma escala ideal para a análise da realidade, uma vez que esta é

complexa e demanda soluções práticas para o entendimento do objeto. No mais,

sabemos que a cada enfoque sua variação ocorrerá pela importância e abrangência

das ações de cada grupo de atores sociais envolvidos. Por esta imposição envolver

juízo de valores, algumas posturas do texto merecem indicação. Assim, ressaltados

até aqui os pressupostos que orientam o nosso trabalho de tese, justificando a

opção pelo método geográfico-histórico e destacando a importância do discurso e

das escalas para o processo explicativo a respeito da formação territorial

fluminense, cabe indicar a seguir as posturas diante do objeto de pesquisa,

fortalecendo o caminho a ser trilhado.

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1.2. Posturas diante do objeto

Já havíamos dito que a área do atual Estado do Rio de Janeiro viu o seu

número de núcleos urbanos mais que triplicar entre o final do período colonial e a

década de 1890. Para sermos mais precisos, nela existiam 15 aglomerados urbanos

(entre cidades e vilas) antes de 1822 e, no pós-1889, já havia um total de 48 sedes

de municípios (CIDE, 1998). Se de caráter espontâneo, conveniente ou racional2, o

fato é que esse acréscimo carece de um entendimento no contexto do período

imperial brasileiro. E, no olhar para o nosso objeto e nossas questões, pensamos

nas janelas reflexivas propostas por importantes autores que têm se debruçado

sobre os “movimentos do pensamento” a serem considerados no trato prático e

metodológico da pesquisa nas ciências sociais. Em particular, nos apoiamos em

Bourdieu et al (2004) e em Lefèbvre (1995).

Por um lado, temos nos primeiros autores a radicalidade da crítica no sentido

de que eles defendem a reflexão sobre a efetiva relevância social e histórica do

trabalho do pesquisador, enfatizando que este é um ser com maneira específica de

pensar em relação aos demais membros do seu tempo e espaço. Desta forma,

assinalam a preocupação com uma análise constante do trabalho como medida

fundamental para se fugir da mecanização em que podem se transformar os

preceitos do método e para que não se ceda ao risco das prenoções e da

naturalização dos termos. O método do racionalismo aplicado, defendido pelos

autores, confirma e constrói um novo objeto real a cada momento da pesquisa, uma

vez que prega que os atos epistemológicos não são lineares e que, portanto, as

operações de pesquisa se consubstanciam na dialética teoria/verificação. E nela, as

teorias podem ser reconstruídas o tempo todo pelas especificidades do objeto.

Por outro lado, Lefèbvre, mesmo centrado no pensamento dialético, não

descarta de forma alguma o pensamento lógico, reconhecendo que sua construção

foi momento importante na história do conhecimento humano e continua

fundamental quando é necessário classificar, definir, organizar e distinguir

metodicamente os conteúdos do conhecimento. No entanto, e confirmando o que já

havíamos construído anteriormente, o autor enfatiza que a lógica formal parte da

2 Entre os estudiosos, no que se refere especificamente à formação urbana mineira, existe uma discussão sobre o caráter deste processo, existindo a defesa por um urbanismo espontâneo (Robert Smith e Sylvio de Vasconcellos), conveniente (Rodrigo Bastos e Cláudia Damasceno Fonseca) ou racional (Nestor Goulart Reis) (LIMA, 2006).

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não contradição (do que não muda, da estabilidade), sendo mais apropriada para a

pesquisa científica a lógica dialética por partir do princípio da contradição e

totalidade, segundo a qual a realidade é essencialmente processo, mudança, devir.

Partindo do pressuposto de que estamos sempre diante de verdades parciais,

Lefèbvre define um conjunto de categorias pelas quais o pensamento se move e

que consubstanciam tensões analíticas entre pares de termos polares, opostos e

indissoluvelmente relacionados. São eles: entendimento-razão, verdade-erro,

absoluto-relativo e mediato-imediato. A título de exemplo, no caso da primeira

tensão, o autor discorre sobre qual pensamento estará transitando da

decomposição de seu objeto em elementos para a restauração da unidade desse

mesmo objeto. O entendimento, aplicado aos objetos do conhecimento, buscará

definir seus elementos constitutivos que, por sua vez, isolados, tomam vida própria.

O pensamento em movimento recorre à razão no sentido de reconstituir o todo e a

razão irá proceder a esta reconstituição a partir da compreensão de como cada um

dos detalhes contribui para a constituição do todo. Desta forma, para ele, o

conhecimento se afirma, transitando ainda pelos demais pares analíticos.

As orientações indicadas até aqui não são mais que exercícios de vigilância

epistemológica que devemos incorporar ao nosso processo de pesquisa. Assim,

necessárias se fazem algumas reflexões. Em primeiro lugar, exercitando a

radicalidade da crítica a partir de Bourdieu et al (2004), vemos que, ao olharmos

para o nosso objeto de pesquisa, constatamos que a relevância do nosso trabalho

reside no fato de que, no contexto dos debates afins, ele caminha para a afirmativa

de que o controle do território fluminense no século XIX se deu através de uma

política de instituição de núcleos urbanos dotados de funções regionais

diferenciadas.

Até então, pensávamos que esta assertiva, considerada no projeto como uma

hipótese, era bastante para a realização do trabalho, observando apenas as

determinações para a criação de vilas e cidades. No entanto, quando nos dirigimos

ao objeto, percebemos que a idéia de algo semelhante a uma rede de cidades

pressupõe mais que os pontos físicos, implica as relações entre eles. A partir daí, o

tratamento teórico a respeito dessa rede teria que dar conta efetivamente da

natureza dessas relações e de suas informações e dados. Esta imposição do objeto

nos levaria para o questionamento sobre a posição ocupada pelo empírico em

nosso trabalho.

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Indagando sobre a natureza da tarefa analítica assumida em nossa pesquisa,

ficou nítida a necessidade de investigação sobre as premissas alegadas para a

criação por parte do governo imperial de vilas e cidades no território em questão.

Tal universo de investigação nos permite perceber que a tarefa analítica assumida

em nosso projeto se baseia em questões que devem ser pensadas tanto em sua

totalidade quanto na conexão dos seus elementos, acionando algumas das “regras

práticas” do método proposto por Lefèbvre (1995). Cabe ressaltar o contexto das

nossas questões para que possamos respondê-las.

Ao olharmos para o nosso objeto, enumeramos os seguintes fenômenos que

especificam o seu campo problemático: instituição de políticas de estruturação do

território para definição de fronteiras, articulação, integração e ordenação segundo

propósito pré-estabelecido (autorização para aberturas de caminhos, criação de

vilas e cidades, solicitação para abertura de portos fluviais, incremento nos fluxos de

pessoas e produtos no território são alguns exemplos). Estes fenômenos, por sua

vez, suscitam determinados agentes: o Imperador, os Presidentes da Província e os

“homens bons”3, representantes das Câmaras Municipais e, ao mesmo tempo,

senhores de terras e de escravos que, em sua maioria, eram agraciados com títulos

nobiliárquicos e constituíam a força política e econômica de apoio ao Império.

No tratamento empírico do nosso objeto, ficou evidente a necessidade do trato

teórico e metodológico das seguintes categorias-chave: a natureza do Estado em

vigor no período em questão (imperial, centrado no poder moderador e com

discurso nacionalista e integracionista), sua estrutura e distinções em relação ao

período anterior; a imbricação entre esferas da produção econômica e influências,

inclusive sociais, como norteadoras das relações de poder observadas no período

em estudo (interesses imediatistas nas práticas e discurso pseudo-nacionalista); e

as formas de uso do território fluminense, então sob os princípios de Nação e de

centralização do poder (políticas de ordenação territorial via instituição de núcleos

urbanos).

Em relação à estrutura do Estado em vigor no período considerado, a própria

Constituição Imperial denota a forma jurídico-institucional tomada, sendo ajustada a

cada momento via decretos promulgados que ora ampliavam, ora descentralizavam

o poder de decisão conferido ao Moderador, ora delegavam autonomia para as

3 Este termo era adotado desde o período colonial para designar todo aquele que possuía projeção social, geralmente pertencente à classe proprietária de terras e de escravos negros ou indígenas.

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localidades, ora as submetiam ao crivo do poder central em movimentos que

funcionam como termômetro dos seguidos levantes revolucionários ocorridos e das

pressões exercidas também pela “boa sociedade”4 do Império.

No que se refere às políticas de ordenação territorial, consideramos como

indicadores os decretos criando núcleos urbanos (vilas ou cidades), aldeias de

povoamento e núcleos coloniais ou promovendo arraiais e vilas a status superiores

na hierarquia urbana, anunciando licitação para abertura de caminhos e/ou criação

de vilas e benfeitorias territoriais (pontes, aterramentos, portos, etc). Também são

indicadores os Registros de Terras das diversas paróquias e freguesias da província

a respeito de sua dinâmica fundiária.

Estes aspectos específicos podem ser compreendidos, segundo Lefèbvre, a

partir da consciência de que todo objeto é totalidade e “unidade de contraditórios” e,

desta forma, lembramos que as condições econômicas e políticas vigentes no

nosso recorte temporal mantinham as contradições entre grupos concorrentes e o

Estado Imperial, além de estarem também presentes internamente em ambos os

casos. A articulação do território fluminense não ocorreu de maneira homogênea

nem atendendo a todos os interesses em questão. Observar este fato nos permite

fugir do risco da generalização.

No mais, ressaltemos que a lógica clássica cultiva o pensamento linear,

racional, buscando superar incertezas e dúvidas para se chegar à segurança de

“verdades” incontestáveis. A lógica dialética, por sua vez, considera a incerteza e o

contraditório como as bases da natureza do conhecimento e da realidade. Por esta

premissa, percebemos que todo conhecimento julgado objetivo, na verdade, se

inicia na esfera da subjetividade ficando registrado que nossas posturas e

vigilâncias em relação ao objeto de pesquisa se inserem em um contexto em que

não nos interessa o pragmatismo do método, mas o seu entendimento como

instrumento de reflexão.

Por fim, ao avançar nestas questões de caráter teórico e metodológico,

apontamos também para novos papéis do empírico em nosso trabalho e,

novamente seguindo as “regras práticas”, conseguimos aprofundar o nosso objeto

ao agregar a ele um novo ângulo analítico. Ao fazermos uso da expressão “ação

4 “Resgatada das reminiscências de Francisco de Paula Ferreira Rezende (1832-93) por Ilmar Mattos, a expressão procura designar a reduzida elite econômica, política e cultural do Império, que partilhava códigos de valores e de comportamento modelados na concepção européia de civilização” (NEVES, 2002a, p. 95).

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organizadora do território”, estamos nos referindo, em outras palavras, a uma

prática planejadora por parte do Estado visto que havia uma intencionalidade e

seletividade no uso do território. No entanto, sabemos ser “planejamento” um

conceito, uma construção datada e de uso direcionado. Atentamos, aqui, para o

problema da “naturalização dos termos”, da necessidade de superação das “pré-

noções” e para a importância do par dialético “imediato/mediato”. Achamos que a

pesquisa histórica apresenta grandes impasses metodológicos. Mas, ganhamos a

consciência de que não poderemos olhar para o passado, procurando nele o

presente e os seus termos. A tarefa parece ser a de atingir o século XIX e suas

lógicas, “distinguindo seus movimentos longos e impulsos breves”, fugindo das

naturalizações e buscando as conexões que revelem o específico em nosso objeto.

O primeiro passo será dado a seguir.

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2. Território e cidade no Brasil imperial

Analisar o período imperial brasileiro através de suas premissas e realizações

não tem sido tarefa fácil para os estudiosos, por conta das múltiplas nuances que

carrega. No entanto, importantes obras têm lançado luz sobre este momento

definidor de muitas das características atuais do Brasil e entre elas podemos citar

como referência para o debate os trabalhos de fôlego de Nelson Werneck Sodré

(1935), José Murilo de Carvalho (1988), Ilmar Mattos (1994), Richard Graham

(1997), Demétrio Magnoli (1997) e Lília Moritz Schwarcz (2000).

Do conjunto destas contribuições, entendemos que a ruptura do Brasil com os

coloniais laços de dominação pressupunha, evidentemente, a construção de um

novo Estado. Mais ainda: o novo arranjo institucional a ser montado estaria

fatalmente assentado em arraigados traços do conservadorismo que marcava o

arranjo social existente até então. O que nos chama a atenção é o fato de que não

são apenas os laços de sociabilidade estabelecidos que se manterão a partir da

Independência, mas também a forte relação (diríamos, a centralidade) já

estabelecida entre a dimensão espacial e a conformação desta sociabilidade.

Além do contexto histórico, que se inseria em um movimento externo de

expansão territorial e de ocupação de espaços, o desenvolvimento econômico,

político, social e cultural da colônia também fora pautado na apropriação de “novas”

terras de tal forma que todas as dimensões do poder passavam necessariamente

pela propriedade fundiária. Queremos enfatizar, a manutenção desta premissa

mesmo diante da emancipação em relação a Portugal e diante do fato que, apesar

dela, o Brasil ainda não havia se desvencilhado das frentes de povoamento.

A questão espacial é reforçada, então, com o advento da construção de um

novo Estado e, voltando aos autores enumerados, com a emergência de um projeto

nacional que lhe dará forma e a necessária e imposta identidade brasileira. Em uma

sociedade marcada por uma espacialidade latente que lhe imprimia uma dinâmica

social notadamente desigual e coercitiva, as representações da nação muitas vezes

foram reduzidas à consideração do país como apenas território (MORAES, 1988),

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justificando a busca pela unidade e por (mais) controle. Pensamos na importância

das cidades exatamente neste momento.

Assim, em nosso trabalho, mister se faz reunir os principais elementos que

definiram o Brasil depois de sua emancipação política no que alude, em especial, ao

contexto e fatos do Império que nos permitem refletir sobre a centralização

administrativa e o uso do território. Tal contexto se refere ao momento vivido na

Europa ao qual estávamos estreitamente relacionados. Se lembrarmos que, em boa

parte daquele continente, a industrialização e a urbanização foram a marca do

século XIX, estaremos fazendo alusão a uma conjuntura de mudanças que vinha

tomando corpo e que, ocorrendo também no âmbito das relações sociais, deu

origem a um modelo específico de sociedade instituída como “moderna”.

De forma meramente pedagógica, podemos apresentar esta sociedade a partir

das seguintes características gerais que se contrapõem àquelas “tradicionais”:

capitalismo como modo de produção, especialização de funções, diversidade de

valores individuais (diversidade ética, religiosa e normativa), estratificação social por

critério econômico, questionamento das bases da hierarquia social e alcance

crescente na escala mundial.5

No escopo dessas características estão processos como o ritmo inédito de

desenvolvimento tecnológico atingido por estas sociedades, o rompimento dos

antigos vínculos entre as atividades mundanas e a religião, a ascensão da

burguesia ao poder, o surgimento de ideologias proletárias, o desenvolvimento das

ciências, a expansão de sua influência e interconexão a quase todo o planeta6 e o

surgimento de novos marcos institucionais no âmbito dessas sociedades. A respeito

deste último processo, destacamos que:

Algumas formas sociais modernas simplesmente não se encontram em períodos históricos precedentes, tais como o sistema político do

5 Não se pode esquecer o fato de que “sociedade moderna” encontra nas ciências sociais diferentes acepções. No entanto, os clássicos da Sociologia, através de caminhos distintos, são unânimes quanto ao seu caráter conflituoso. Para Durkheim, o conflito provém da grande e progressiva divisão do trabalho, exigindo novos mecanismos de integração social como a normatização, a educação e a produção da consciência do pertencimento ao todo. Marx a definia por suas relações de produção, sendo a própria sociedade capitalista e seus mecanismos de exploração das classes sociais que expõem os limites da igualdade e liberdade. Por último, Weber a concebia pela ótica do conflito de valores, uma vez que notava nela a ausência de unidade em termos de justiça, ética e estética, decorrente que era de um longo processo de racionalização das atividades humanas. 6 Santos (1994) afirma que o nível técnico alcançado por aquelas sociedades permitia a consideração de alguns territórios com espaços internacionalizados, diferente do que ocorria na maior parte do planeta (já conhecido pela humanidade).

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Estado-Nação, a dependência por atacado da produção de fontes de energia inanimadas ou a completa transformação em mercadoria de produtos e trabalho assalariado. Outras têm apenas uma continuidade especiosa como ordens sociais pré-existentes. Um exemplo é a cidade. Os modernos assentamentos urbanos freqüentemente incorporam os lugares das cidades tradicionais e isto faz parecer que meramente expandiram-se a partir delas. Na verdade, o urbanismo moderno é ordenado segundo princípios completamente diferentes dos que estabeleceram a cidade pré -moderna em relação ao campo em períodos anteriores (GIDDENS, 1991, p.16).

Aqui estão alguns pressupostos da idéia de “nação” e suas imbricações com o

território. E, mais especificamente, com as cidades (modernas ou que assim

desejem ser). Neste sentido, ler a construção conceitual do primeiro termo nos dará

suporte para as reflexões sobre nosso objeto no que ele nos suscita em particular.

Por isso, esta unidade da tese se estrutura a partir das relações entre tais conceitos

no recorte temporal indicado e na constante relação entre o Brasil e suas

determinações externas.

Se lembrarmos que a Geo-História proposta considera um duplo vínculo entre

homem e natureza, assimilando as diferentes velocidades próprias dos processos

históricos, e observando-as em diferentes escalas, perceberemos que determinadas

realidades podem ser simultâneas e não necessariamente contemporâneas. Uma

vez que estávamos fortemente vinculados à Europa, mas em uma posição

subalterna em qualquer aspecto que se considerasse, olhar para o Império do Brasil

significa apreender, no contexto dos países de formação colonial, seus processos de

longa duração e os seus impulsos breves, que denotam suas particularidades.

Sigamos os fatos para tentar destacar o rebatimento das transformações materiais e

intelectuais européias na realidade que efetivamente nos interessa.

2.1. Notas sobre o período imperial brasileiro

A despeito da Inconfidência Mineira, no final do século XVIII, ou da abertura

dos portos “às nações amigas” em 1808, o processo de independência brasileira

começou a tomar faces concretas quando do regresso de D. João VI a Portugal em

agosto de 1821. Desde a criação do Reino Unido no Brasil, seis anos antes, as elites

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portuguesas haviam se empenhado por medidas que diminuíssem a importância

brasileira frente ao império lusitano cujo evento mais relevante foi a Revolução do

Porto em 1820 e a conseqüente convocação das Cortes Gerais Extraordinárias e

Constituintes da Nação Portuguesa no ano seguinte, forçando a volta do rei a

Lisboa.

Ao sair do Brasil, D. João VI deixou seu filho Pedro no papel de príncipe-

regente pensando em uma continuidade administrativa e política. No entanto, a

realidade não tardaria em mostrar novos caminhos uma vez que a aristocracia

latifundiária brasileira começou a observar na figura de D. Pedro a saída para uma

independência pacífica, pois o seu apoio impediria a atuação dos grupos

republicanos e abolicionistas e, ainda, a participação das camadas populares no

processo separatista. Diante do que ocorria nas demais regiões da América,

apostavam na manutenção da monarquia como garantia da unidade do país contra

possíveis movimentos revolucionários que pleiteassem a divisão territorial.

Contrariando os interesses de Portugal, sobretudo os propósitos

recolonizadores, D. Pedro iniciou uma série de reformas políticas e administrativas

que encaminhariam o Brasil para um confronto com as ordens vindas de D. João VI.

Estão, do início de 1822, entre elas, a nomeação de José Bonifácio (líder da

bancada brasileira nas Cortes Constituintes em Lisboa e ardoroso defensor da

independência e de uma monarquia constitucional, mesclando posições liberais e

conservadoras) para o cargo de Ministro do Reino e Estrangeiros (o mais alto

ocupado até então por um brasileiro) e a criação do Conselho de Procuradores

Gerais das Províncias do Brasil (uma espécie de parlamento que examinaria as

decisões vindas das Cortes, julgando a sua aplicabilidade na colônia). Em seguida,

recebeu amplo apoio da maçonaria do Rio de Janeiro, instituição de grande

influência nos movimentos de independência, através da condecoração com o título

de Protetor e Defensor Perpétuo do Brasil.

Se, por um lado, D. Pedro continuava a tomar medidas de cunho rebelde como

o decreto que qualificava como inimigas as tropas portuguesas desembarcadas no

Brasil sem o seu consentimento e o Manifesto às Nações Amigas, escrito por

Bonifácio, que assegurava o Brasil como “reino irmão de Portugal”, por outro lado, D.

João VI ampliava sua política de controle da colônia, anulando a convocação da

Constituinte proposta por seu filho para substituir o Conselho de Procuradores;

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ameaçando o envio de tropas militares e exigindo o imediato retorno do príncipe-

regente a Portugal.

Incentivado pelo Ministro do Reino e por sua esposa Leopoldina, proclama a

separação do Brasil em relação à Portugal, sendo coroado D. Pedro I no final

daquele 1822.7 Diferentemente de toda a América espanhola, o Brasil marcaria a

sua passagem do período colonial para a independência de forma pacífica por conta

de uma série de motivos específicos: o trono brasileiro passaria a ser ocupado por

um nobre da mesma casa reinante da antiga metrópole da qual era herdeiro em

linha direta de sua coroa e, sobretudo, a manutenção de uma ordem estruturada em

privilégios das elites, notadamente a manutenção do trabalho escravo. O Brasil, que

teve sua independência formal reconhecida internacionalmente apenas a partir do

Tratado de Paz e Amizade com Portugal de 1825, se configurou como o único país

independente da América do Sul adepto da escravidão como força de trabalho

característica e a única monarquia instaurada no continente no pós-emancipação.

Na tentativa de garantir e criar uma nova nação, (...) as elites do sul do país apostavam claramente na monarquia e na conformação de uma ritualística local. A realeza aparecia, em tal contexto, como o único sistema capaz de assegurar a unidade do vasto território e impedir o fantasma do desmembramento vivido pelas ex-colônias espanholas. É nesse sentido que a monarquia se transforma em um símbolo fundamental em face da fragilidade da situação (SCHWARCZ, 2000, p. 18).

No entanto, consolidar a independência do Brasil não foi missão fácil para D.

Pedro I que tinha que enfrentar os movimentos no interior das províncias que

contestavam sua autoridade e os embates na elaboração daquela que seria a

primeira constituição brasileira. Era necessário, portanto, um governo de equilíbrio,

discernimento e de apoio popular, mas os tons assumidos foram os da centralização

e do despotismo, minando sua base de apoio político ao desagradar interesses

provinciais. O primeiro grande embate ocorreu durante a Assembléia Constituinte

quando os grupos que o haviam apoiado iniciam a luta por interesses específicos e

trazem à tona três nítidas tendências políticas: a liberal (que, mesmo formada por

moderados e radicais, defendia uma monarquia constitucionalista que limitasse os

poderes do imperador ao reconhecer o legislativo como representante legítimo da

7 Como tudo era discurso, D. Pedro foi coroado imperador, sugerindo, apesar do direito monárquico, uma aproximação maior com um desejo popular que o título de rei não comportaria.

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nação a ser construída), a conservadora (que defendia um executivo forte e

centralizado pelo monarca como mecanismo institucional para manter a ordem social

e a unidade do Império) e a republicana (que, mesmo sem maior expressão, estaria

presente em todos os movimentos de oposição que caracterizaram o período).

Instalada em março de 1823 e presidida por Antônio Carlos Ribeiro de

Andrada, irmão de Bonifácio, a nossa primeira Assembléia Constituinte foi formada

por 80 deputados (dos quais bacharéis, padres, magistrados e senhores de terras e

de escravos formavam o conjunto) que, representando as províncias eram, na

maioria, comprometidos com ideais liberais. Este fato logo gerou um mal estar nos

trabalhos diante do poder absoluto pretendido por D. Pedro I. Mesmo assim, esses

seguiram em meio às discussões quanto à autoridade do imperador na Constituinte

e à cidadania dos portugueses residentes no Brasil (fato que assumiu contornos

críticos e ocasionou a separação dos constituintes entre um partido português e um

partido brasileiro).8 O anteprojeto da Constituição ficou pronto em novembro do

mesmo ano e, a despeito da maioria liberal e por conta dos interesses do imperador,

garantia alguns dos aspectos mais defendidos por conservadores (manutenção da

ordem escravocrata e atribuição de direitos políticos apenas aos detentores de

fortunas).

A este tempo, José Bonifácio, “tornou-se crítico veemente das atitudes

arbitrárias de D. Pedro e de suas ligações com os portugueses, escrevendo nas

páginas do periódico O Tamoio, que fundara, entrando em rota de colisão com o

imperador” (NEVES, 2002b, p. 425). Tais atritos motivaram a ação despótica por

parte do monarca de dissolver a Assembléia e ordenar a prisão e desterro às suas

lideranças, incluindo os irmãos Andrada. Dois pontos do texto elaborado pelos

deputados contrariaram D. Pedro I: o estatuto indissolúvel da Câmara, que seria

controlada pelas Forças Armadas, e o caráter apenas suspensivo atribuído ao veto

do imperador.

A primeira Constituição brasileira, outorgada em 25 de março de 1824, foi fruto

dos trabalhos de uma comissão especial nomeada por D. Pedro I para este fim. O

Conselho de Estado, formado por lideranças da ala conservadora estabelecia, desta

forma, um governo “monárquico, hereditário e constitucional representativo” formado

8 Aqui, “partido” é usado mais para se referir a um grupo em defesa de uma dada idéia do que no sentido que atribuímos à palavra atualmente. No Brasil, no sentido estrito do termo, foi verificado apenas em 1835 (criação do Partido Conservador) e em 1840 (quando foi fundado o Partido Liberal).

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por um poder Executivo, a ser exercido pelo próprio imperador e seus ministros

indicados, um Legislativo e um Judiciário, além de um quarto poder, o Moderador.

Este, por sua vez, garantia ao soberano o status de absolutista ao considerá-lo

inviolável e sagrado, não submetido a nenhuma instância legal e lhe conferindo veto

sobre questões dos demais poderes. Na verdade, o Moderador era exercido pelo

imperador e membros do Conselho de Estado, mecanismo institucional que marcaria

todo o período imperial, configurando-se no principal espaço de força e prestígio

político.

A força conferida ao imperador pela nova Carta delegava o poder de escolha

de senadores entre os três mais votados nas províncias, de dissolução ou

convocação da Assembléia Geral (órgão máximo do Legislativo, formado pela

reunião de suas duas casas: o Senado, vitalício, e a Câmara de Deputados, com

caráter temporário e também passível de suspensão pelo monarca) e o poder de

também dissolver ou convocar os Conselhos Provinciais.

A nova Constituição oficializava o Brasil como uma monarquia católica e que, a

despeito da manutenção da mão-de-obra escrava, dizia-se avançar na questão ao

abolir algumas formas de castigo aos cativos como o açoite e a marca de ferro

quente. Por sua vez, o processo eleitoral determinado na Carta, baseado no voto

censitário e na condição dos candidatos como brasileiros e católicos, estabelecia

dois turnos de maneira que um colégio eleitoral, decidido em votação primária,

escolheria em eleições secundárias senadores, deputados gerais e ocupantes das

cadeiras dos conselhos de províncias. A questão da renda marcava efetivamente a

exclusão da grande maioria da população brasileira tanto da possibilidade do

exercício da representação política quanto do próprio processo eleitoral, pois

determinava que apenas estariam aptos para o voto nas eleições primárias os

homens que comprovassem renda líquida anual superior a 100 mil réis e apenas

poderiam se candidatar às vagas do colégio eleitoral aqueles com renda líquida

anual superior a 200 mil réis, aumentando este piso se o candidato visasse vaga na

Câmara (400 mil réis) ou no Senado (800 mil réis).

O Primeiro Reinado não tardaria em enfrentar os primeiros levantes liberais

contra a Carta outorgada e a centralização política engendrada pelo imperador. A

título de exemplo, lembremos que ainda em 1824, estourou em Pernambuco a

Confederação do Equador, movimento que defendia a autonomia da região e a

organização federalista com governo representativo e republicano. Rapidamente

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envolveu as províncias vizinhas da Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará,

ganhando a adesão de separatistas nas capitais e no interior. A ação do governo

central, no entanto, foi efetiva na retomada de Recife e Olinda e na perseguição e

cerco aos líderes do movimento que conseguiram fugir para o interior. Em novembro

do mesmo ano, já estava contido e suas lideranças condenadas à morte, incluindo

Frei Caneca, o único morto por fuzilamento por conta da recusa dos subalternos em

enforcá-lo. À força, D. Pedro I foi sufocando os levantes contrários à independência

ou ao seu governo que se esboçavam no território a ser integrado sob a chancela

absolutista. Quanto à Constituição, perduraria, com poucas alterações, durante todo

o período imperial.

Em termos econômicos, o Primeiro Reinado manteve a antiga estrutura colonial

baseada na produção agro-exportadora. Entretanto, ao invés da dependência

portuguesa, o Brasil passou a gravitar na esfera da economia inglesa, os únicos

compradores dos nossos produtos primários e os nossos principais fornecedores de

mercadorias manufaturadas. Tal privilégio foi decorrente da intermediação da

Inglaterra no processo de independência, quando bancou o empréstimo para o

pagamento da indenização junto a Portugal, teve renovadas as vantagens

comerciais alcançadas com os tratados de 1810 junto a D. João VI e impôs o

compromisso do Brasil em relação à convenção internacional para o fim do tráfico de

escravos.

A atividade cafeeira, em plena expansão desde o início do século, passou a

representar quase 40% das exportações brasileiras já no final da década de 1820.

Inicialmente cultivado no município do Rio de Janeiro, conheceu grande expansão

no vale fluminense do rio Paraíba do Sul. A este tempo, a província congregou as

principais fazendas de café e as grandes fortunas que alicerçavam a economia

brasileira. É unânime o fato de que a renda dos “barões de café” sustentou o período

imperial até seu final e foi convertida, inclusive, em títulos nobiliárquicos e em

políticas de favorecimentos.9

O Brasil vivia um momento de dificuldade gerada pela crise nos preços

internacionais dos produtos que completavam as nossas exportações (algodão,

9 No império brasileiro, a nobreza era adquirida (não vinha e nem seguia linhagem) e formalizada através dos artigos 102 (item 11) e 142 (item 7) da Carta de 1824. Em última análise, o texto da lei assegurava a vontade pessoal do imperador como único fator determinante quando se tratava de nobilitar alguém. Segundo Guimarães (2002), apesar de constantes manifestações de desagrado, D. Pedro I chegou a conferir 119 títulos em seu curto reinado.

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cacau e açúcar) e agravada com a perda do nosso principal mercado consumidor de

tabaco, a África, por conta das pressões inglesas para o fim do tráfico negreiro. Os

lucros provenientes do café não cobriam os déficits da nossa balança comercial e a

política de D. Pedro I para lidar com a situação consistiu na desvalorização da taxa

cambial e na aquisição de empréstimo no exterior, a maior parte oriunda da

Inglaterra.

A crise econômica também possuía agravantes internos: as constantes revoltas

e sublevações nas províncias em oposição às ações centralizadoras faziam com que

muitos governos locais não repassassem os impostos à capital. Além do mais, a

forte relação entre governo central e grandes proprietários fazia com que o

imperador abonasse a cobrança de parte do imposto territorial de fazendas

comprometendo uma significativa fonte de recursos. Completando este quadro,

lembremos dos gastos elevados do governo com a independência e com a

repressão aos movimentos de rebelião. Em 1828, um outro evento de grandes

proporções também foi determinante para a perda de prestígio do soberano: os

enormes gastos e a derrota do Brasil na Guerra Cisplatina, quando o território da

província anexada em 1821 originou a República do Uruguai.

Na Câmara dos Deputados, uma forte e aberta oposição a D. Pedro I começou

a ser feita por liberais moderados e por federalistas (chamados de democratas). Os

moderados alegavam que a crise agro-exportadora, a violenta repressão à

Confederação do Equador, a perda da Província Cisplatina, os déficits no orçamento

e o perdão de importantes impostos comprovavam uma incapacidade do soberano

em lidar com tais questões, defendendo a manutenção do centralismo político-

administrativo do governo mas com um Legislativo mais forte e atuante. Os

democratas defendiam uma participação política mais ampla e um equilíbrio de

poderes entre o governo central e províncias. Reunindo muitos profissionais liberais

e comerciantes, defendiam inclusive idéias republicanas.10

A forte oposição ao monarca e a ebulição política que começava a ser

observada no Brasil motivaram a criação de diversos folhetins oposicionistas. 10 De Portugal, também vinham motivos para a desconfiança de muitos brasileiros em relação a D. Pedro I. Desde a morte de D. João VI, em 1826, quando fora proclamado sucessor natural do trono português (cargo ao qual renunciou em favor de sua filha Maria da Glória, ainda menor de idade), o monarca despertava suspeitas no Brasil de que pretendia, em algum momento, unir as duas Coroas. Quando seu irmão, D. Manoel, incumbido pelo próprio D. Pedro I a casar-se com a sobrinha e a exercer o poder como príncipe regente até a maioridade de Maria da Glória, fez-se proclamar rei em 1828, estabelecendo um governo absolutista em Portugal, o interesse e o envolvimento de D. Pedro I com as questões daquele país reforçaram as suspeitas de um possível golpe por parte do imperador.

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Mesmo com a forte censura do poder central, tais jornais faziam circular por todo

império severas críticas ao governo. Com destaque, listamos O Aurora Fluminense

(editado por Evaristo da Veiga no Rio de Janeiro), Sentinela da Liberdade (escrito

por Cipriano Barata em Pernambuco) e O Observador Constitucional (dirigido por

Líbero Badaró em São Paulo)11.

O ano de 1831 foi marcado por uma série de confrontos entre as facções

políticas presentes na cena brasileira e pela renúncia do imperador. Seus partidários

haviam conquistado a adesão dos portugueses residentes no país e este fato

intensificou o surgimento de diversos conflitos abertos nas províncias, a exemplo da

Noite das Garrafadas que opôs brasileiros e portugueses nas ruas da cidade do Rio

de Janeiro durante um ato de desagravo ao imperador. Em abril, devido às pressões

e à falta de apoio político que experimentava, D. Pedro I deixou o poder. Por força

da Carta que outorgara, a abdicação ocorreu em nome do parente masculino mais

próximo: seu filho Pedro, de cinco anos de idade. Consolidado este ato, partiu para a

Europa em uma embarcação inglesa. No Brasil, uma Regência, tríplice e provisória,

foi instituída para a sua administração.

O período que se seguiu foi marcado como um dos mais conturbados da

história brasileira, sendo caracterizado por grande violência social (uma vez que

estouraram diversas rebeliões nas províncias contra a unidade territorial desejada

pelo poder central) e por uma acirrada disputa por poder entre, pelo menos, três

facções que se desenharam no interior da elite política (liberais radicais, liberais

moderados e restauradores), dando início às organizações partidárias no Brasil. A

primeira dessas disputas ocorreu logo na formação da regência trina instalada no

mesmo dia da abdicação. Prevista pela própria Constituição, esta teve inicialmente

um caráter provisório devido à falta de quorum na Assembléia Geral para decidir

sobre o novo governo que atuaria até a maioridade do herdeiro do trono. A

composição da Regência denotaria os diferentes interesses em disputa.12

A Câmara, que entendia a forte centralização do governo de D. Pedro I como o

real motivo de sua perda de apoio e isolamento político, determinou uma série de

limitações ao poder da Regência e, entre elas, estava a proibição de dissolver 11 Este foi assassinado em 20 de novembro de 1830, data que marcou o fim na circulação d’O Observador. 12 A primeira Regência foi formada pelos senadores José Joaquim de Carneiro Campos (Marquês de Caravelas) e Nicolau de Campos Vergueiro, indicados respectivamente por restauradores e liberais moderados, e pelo brigadeiro Francisco de Lima e Silva, representante da ala mais conservadora do Exército.

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instituições do Legislativo. Na verdade, com tais manobras, o centro do poder no

Brasil passava a ser a própria Câmara, onde a ala liberal radical, mesmo sem

representante entre os regentes, obteve importantes vitórias nas votações.

Não tardou e, em meados do mesmo 1831, a Regência Trina Permanente foi

eleita pela Assembléia Geral de maneira a privilegiar as facções políticas com

expressão nas capitais e em meio às elites agrárias regionais, sendo composta por

nomes que representavam o sul e o norte do Império.13 Em oposição ao poder

central do Rio de Janeiro, esta representatividade logo se converteria em medidas

práticas favoráveis aos interesses regionais, como a criação da Guarda Nacional, a

aprovação do Código do Processo Criminal e, sobretudo, do Ato Adicional de 1834.

Aprovada pela Câmara, ainda em 1831, a Guarda Nacional desorganizou o

Exército ao estruturar-se de maneira descentralizada. Nela, os oficiais de alta

patente passaram a ser eleitos nas regiões de atuação, através de forte vinculação

com os membros das elites agrárias e agregados. A partir daquele momento,

instituía-se no Brasil uma força armada diretamente vinculada à aristocracia rural de

maneira que, para muitos historiadores, o coronelismo político passava a contar com

um dos seus componentes fundamentais.

Outra importante medida descentralizadora foi o Código do Processo Criminal,

aprovado em 1832. Esta legislação alterava a base jurídica e institucional vigente,

chegando ao nível de estabelecer que os juízes de paz, cujas indicações passavam

a caber de forma direta aos senhores locais, acumulariam amplos poderes nas

regiões sob suas jurisdições. E esse poder se referia, principalmente, à corporação

paramilitar recém-criada.

(...) a Guarda Nacional baseava sua atuação no município, paróquias e curatos, subordinada diretamente aos juízes de paz. De acordo com o primeiro regulamento, a milícia era composta por todos os brasileiros entre 21 e 60 anos que viviam sob o pátrio poder, desde que auferissem a renda mínima exigida para serem eleitores. (...) Se o exercício dos cargos eletivos [postos mais baixos do oficialato] era temporário (de quatro anos), o dos oficiais nomeados durava de acordo com os interesses da autoridade que os havia indicado (ENGEL, 2002, p. 318-319).

13 Esta segunda Regência, formada pelos deputados José da Costa Carvalho (Marquês de Montalvão) e João Bráulio Muniz (ambos da ala moderada) e pelo brigadeiro Francisco de Lima e Silva (mantido regente pela oficialidade conservadora), tratava de expressar a forte divisão que existia no Império entre províncias do norte e do sul (herança ainda da partição do território colonial em dois Estados: Grão-Pará e Maranhão e Brasil) (GRAHAM, 1997).

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Apesar do expressivo avanço liberal que tais medidas representavam, o marco

fundamental no plano institucional ocorreu em 1834 quando um conjunto de

mudanças na Constituição foi aprovado através de Ato Adicional. No bojo, o

Conselho de Estado (essencial na centralização do poder e que contava com nomes

do período de D. Pedro I) foi extinto, sendo transferidos para as províncias os

poderes policial e militar e o direito de elegerem suas assembléias legislativas.

Assegurava-se, assim, um decisivo marco legal para o poder regional, apesar do

Executivo local continuar sob indicação do governo central. Também, pelo Ato, foi

mantido o caráter vitalício do Senado e determinou-se o fim o regime de Regência

Trina, sendo substituído por uma Regência Una eletiva por quatro anos, em um

arranjo que, para alguns historiadores funcionou como uma experiência republicana

em meio ao regime monárquico.

Na visão conservadora de Oliveira Vianna, em sua crítica às políticas

descentralizadoras

(...) o que as experiências do Código do Processo Criminal e do Ato Adicional demonstram é que essas instituições liberais, fecundíssimas em outros climas, servem aqui, não à democracia, à liberdade de direito, mas apenas aos nossos instintos irredutíveis, de caudilhagem local, aos interesses centrífugos do provincialismo, à dispersão, à incoerência, à dissociação, ao isolamento dos grandes patriarcas territoriais do período colonial. (...) esta é, em suma, a tendência incoercível das nossas gentes do norte e do sul, todas as vezes adquirem a liberdade da sua própria direção (VIANNA, 1933, p.192).

Confirmando o conjunto de conquistas liberais, foi realizada a eleição prevista

no Ato para o cargo de regente. Empossado em 1835, o padre Antônio Diogo Feijó

(que havia ocupado o Ministério da Justiça entre junho de 1831 e agosto de 1832,

sendo eleito senador em 1833) se tornou o primeiro regente único do Brasil depois

de receber um total de 2.826 votos, pouco mais do que o seu concorrente

conservador. Defendendo o fortalecimento do poder Executivo, não completou o

mandato. Autoritário na condução do Estado, e com poucos recursos devido à

intensa oposição parlamentar, teve que enfrentar grandes rebeliões provinciais que

marcaram aquele período (como a Cabanagem, no Pará, e o início da Guerra dos

Farrapos, no Rio Grande do Sul). Sem bases próprias de apoio político, renunciou

em 1837. Tal fato marcou também o desgaste dos liberais e abriu espaço para uma

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vitória conservadora na Câmara dos Deputados, que escolheu Pedro de Araújo Lima

como o novo regente.

Assim, a segunda Regência Una foi marcada por uma forte reação às

conquistas liberais obtidas. Muitas foram abolidas e a Lei de Interpretação do Ato

Adicional, de 1840, que restringiu o poder provincial das Assembléias Legislativas e

da polícia Judiciária em nome do fortalecimento do poder central, motivou uma

inesperada aproximação dos liberais em relação à maioridade do imperador. Neste

intuito, aproveitaram a instabilidade política gerada com as dissidências no Senado e

na Câmara e com as revoltas e rebeliões que ocorriam em todo o Brasil (como a

continuidade da Guerra dos Farrapos, no Rio Grande do Sul, e a eclosão da

Sabinada, na Bahia, e da Balaiada, no Maranhão), contrárias à centralização

conservadora, passaram a reconhecer na restauração da monarquia uma saída para

a sua reaproximação ao poder.

Para contornar a pouca idade do príncipe herdeiro, os liberais lançaram uma

campanha pró-maioridade que, do Senado, ganhou as ruas e obteve eco na opinião

pública, sendo tema recorrente de discussão. Extrapolando os fechados círculos

políticos convencionais, a campanha dos moderados conseguiu seu intento

ajudando na queda dos conservadores. Com tal manobra e atropelando a

Constituição, os liberais conseguiram com que o príncipe sucessor fosse declarado

maior de idade, pondo fim ao período regencial. Este, como já dito, marcado por dois

importantes aspectos: os severos embates entre liberais e conservadores (que

dominaram a cena política e fizeram surgir os primeiros partidos no país) e a eclosão

de diversos motins, levantes, revoltas e rebeliões que avançaram de um estágio

mais inicial de organização, em seus primeiros anos, para um nível mais estruturado

e com a participação ativa de camadas populares livres e de escravos (como foram

os movimentos observados entre 1834 e 1840).14

14 No início do período regencial, motins militares contra o atraso no pagamento dos soldos ou em defesa da volta de D. Pedro I (ocorridos no Rio de Janeiro), levantes nacionalistas que queriam a expulsão dos portugueses ou o seu desarmamento (que estouram no Maranhão, em Pernambuco, na Bahia e no Rio de Janeiro), além de movimentos civis restauradores (espalhados pelos sertões de Pernambuco e Alagoas e pelo interior das Minas Gerais) foram caracterizados pelo pouco nível de organização e pela falta de base popular, sendo fácil e fortemente reprimidos pelas forças legalistas sob o comando do futuro Duque de Caxias, na época major Luis Alves de Lima e Silva. No entanto, a partir de 1834, o Brasil passou a ser sacudido por uma série de revoltas que, organizadas e com significativa adesão popular, ameaçaram romper a ordem social e política instituída desde os tempos coloniais. Cabanagem, Guerra dos Farrapos, Sabinada e Balaiada são exemplos dessas revoltas que, contra a ordem vigente, foram sufocadas (mas não sem dificuldade) pelas forças imperiais da Regência, que seria, ela também, sufocada pela manobra política da maioridade.

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O Segundo Reinado foi iniciado em 1840 com D. Pedro II sagrado imperador,

posto que ocuparia por 49 anos. Uma característica marcante desse período foi a

reorganização do poder que agregou liberais e conservadores em uma mesma

esfera política. No entanto, esta realidade não ocorreu sem intensas disputas entre

tais facções políticas. Em um primeiro momento, devido ao sucesso do movimento

da maioridade, o Partido Liberal ascendeu ao poder, formando quase que por

completo o seu ministério. Sua influência chegou ao ponto de pressionar D. Pedro II

para a dissolução da Câmara, majoritariamente conservadora. As primeiras eleições

do período, realizadas no mesmo ano e sob a marca da violência e da corrupção,

asseguraram ampla maioria aos liberais. Por sua vez, as pressões dos

conservadores resultaram em mais uma dissolução e, desta vez, a elite “áulica”

(grupo palaciano conservador que gravitava em torno do imperador) justificou o

movimento com denúncias de fraudes no referido processo eleitoral.

A partir da posse do novo ministério conservador, não tardaram medidas

polêmicas e uma das primeiras foi a Reforma do Código Criminal, centralizando as

ações judiciais e policiais em complementação à Lei de Interpretação do Ato

Adicional editada no ano interior. Como exemplo, a nova lei destituiu a maior parte

das funções dos juízes de paz, até então eleitos nos municípios, e as repassou para

juízes que, a partir daquele momento, seriam nomeados pelo governo imperial.

O descontentamento em relação a esta nova medida foi observado entre a elite

agrária de distintos pontos do Brasil sendo acordada a sua desobediência pelos

representantes liberais que iniciaram uma série de movimentos oposicionistas com

alguns, inclusive, evoluindo para a luta armada. Foram os casos da revolução liberal

em São Paulo (que eclodiu na capital em 1842 e contou com apoio do ex-regente

Feijó e da população de vilas próximas como Itu e Itapetininga) e em Minas Gerais

(que eclodira no mesmo ano, sendo sufocada em violento combate na vila de Santa

Luzia por forças legalistas comandadas pelo então Barão de Caxias, que também

derrotara os rebeldes de São Paulo). Apenas em 1844, os liberais voltariam ao

poder através de sucessivos governos até 1848, quando os conservadores, com um

ministério presidido pelo ex-regente Araújo Lima, retornam ao centro das decisões.

No entanto em 1847 um ato marcou o início de um processo de normalização

política e reestruturação do Estado: a criação, por decreto imperial, do cargo de

Presidente do Conselho de Ministros, nomeado por D. Pedro II e com poderes para

a escolha dos demais ministros. Neste novo arranjo institucional o presidente, depois

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de formar o ministério, obrigava-se a submetê-lo à Câmara dos Deputados para

avaliação e aprovação, cabendo ao imperador o papel de árbitro em caso de

discordâncias entre estas instâncias e o poder de demitir o gabinete ministerial ou

dissolver a Câmara.

Nos textos sobre o período é recorrente a associação de tal momento a uma

experiência parlamentarista no Brasil, ainda que diferente do modelo inglês por

conta da manutenção do Poder Moderador que detinha o voto final. Este sistema

político implantado acabava subjugando as demais instâncias do poder quando, por

exemplo, da composição do Conselho. Se este deveria merecer a confiança da

Câmara, além da do imperador, deste último dependia de forma mais direta. Nos

casos em que os deputados tentaram mudar o gabinete contra as preferências de D.

Pedro II, este não hesitou em usar suas atribuições do Moderador para dissolver a

Câmara, convocando novas eleições. A artimanha política contava com o peso

decisivo do governo nos processos eleitorais da época, garantindo uma composição

da Câmara de forma harmônica com o Conselho de Ministros por ele apoiado.

Assim, durante o longo tempo em que permaneceu no comando do Brasil, D.

Pedro II formou 36 ministérios diferentes que, de forma alternada, contemplavam o

Partido Liberal e o Partido Conservador (ver Anexo 1). Registra-se aqui a principal

característica política do Segundo Reinado: a alternância no governo de liberais e

conservadores ou a convivência de ambos na esfera do poder central. Houve,

inclusive, a criação de um Ministério da Conciliação em 1853, marcando a identidade

de interesses através de sua composição que privilegiava os dois partidos. Autores

diversos dão conta da crônica de época, enfatizando que, nas ruas e no interior era

recorrente o dito popular de que não havia nada mais semelhante a um “saquarema”

do que um “luzia” no poder.

É importante observar que medidas de conciliação entre tais frentes políticas

foram apenas possíveis com a sufocação dos últimos resquícios do liberalismo

radical e democrático que surgiram com o processo de independência do Brasil.

Neste sentido, a Rebelião Praieira, ocorrida na província de Pernambuco a partir de

1848, foi um momento decisivo. Iniciado quando os liberais moderados estavam no

poder central, o movimento foi o principal foco de uma onda de descontentamento

da ala radical do Partido Liberal que não aceitava a manutenção das leis centralistas

que combatiam e que estavam sendo defendidas e postas em prática pelos

moderados em sua aliança com D. Pedro II.

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Em Pernambuco, diferente do que ocorria em outros pontos do Império, o

governo estava sob o comando de um liberal radical, Antonio Pinto de Chichorro da

Gama15, com participação efetiva em grupos de oposição cerrada aos moderados do

partido.16 Também em Pernambuco, mesmo a despeito de todas as rebeliões

provinciais haverem sido sufocadas por forças legalistas desde meados de 1845, os

ideais revolucionários continuavam a alimentar correntes contrárias ao poder

monopolizador das famílias oligárquicas da região e ao controle local do comércio

exercido pelos portugueses. Tais fatos levaram os radicais a pensar em um

programa avançado para a sociedade brasileira em detrimento das orientações

majoritárias do seu partido.

Com a queda do gabinete liberal no Rio de Janeiro e, como já dito, a ascensão

de Araújo Lima como Presidente do Conselho de Ministros, um político conservador

mineiro foi nomeado para comandar Pernambuco e sufocar as manifestações de

descontentamento. A partir deste fato, os liberais radicais deflagraram a rebelião

que, iniciada em Olinda no final de 1848 com a adesão da população urbana pobre,

não tardou a espalhar-se por toda a Zona da Mata da província, mobilizando

pequenos arrendatários, boiadeiros, negros libertos e mascates em diversos

conflitos com forças legalistas em que se contam 23 baixas entre os soldados das

forças imperiais e 43 entre os rebelados.

No início de 1849, os praieiros lançam o “Manifesto do Mundo” em que

defendem o voto livre e universal, a irrestrita liberdade de imprensa, o fim do

Moderador, a efetiva independência dos poderes constituídos, a nacionalização do

comércio e a garantia do trabalho como meio de vida do cidadão. Tais pontos

denotavam o tom revolucionário do programa que, entretanto, não deixava de ser

ambíguo também ao se calar sobre o fim da escravidão.

A luta pelo “Manifesto” seguiu com novas empreitadas e após a tentativa

frustrada de ocupação de Recife, resolveu concentrar as ações no interior da

15 Mineiro de nascimento, Chichorro já havia sido, em 1837, indicado para a presidência da província do Rio de Janeiro. Ao falar do mandato do Visconde do Uruguai na província fluminense durante o período de 21 de abril de 1836 à 05 de agosto de 1840, Lacombe (1973, p. 12) relata que “Em 1836, elegera-se Deputado Geral pela mesma província, integrando o Partido Moderado, então em oposição ao Regente Feijó. Exonerado, por esse motivo da província fluminense a 15 de setembro de 1837, deveria passar o cargo a Antonio Pinto de Chichorro da Gama, nomeado por Carta Imperial dessa mesma data. Com a queda de Feijó (19 de setembro), porém, teve a demissão tornada sem efeito pelo novo Regente, Araújo Lima (conservador), que anulou igualmente, por Decreto de 19 de outubro, a nomeação de Chichorro (...)” 16 As reuniões aconteciam nas proximidades d’O Diário Novo, de tendência liberal, sito à rua da Praia, em Recife.

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província. Àquele momento, congregando mais de dois mil combatentes, os praieiros

deflagraram uma “guerra de guerrilhas” por meses em que morreram cerca de

trezentos deles. Em agosto do mesmo ano, ainda tentaram invadir a província

vizinha da Paraíba, mas sem êxito e com dificuldades em receber apoio de outras

localidades, perderam força até a captura do capitão de artilharia e líder das

guerrilhas Pedro Ivo Veloso da Silveira, fato que decretou o fim da rebelião.

O tom radical do movimento e a longa resistência que ofereceu às forças

imperiais fizeram com que a sua supressão fosse tomada como exemplar pelo poder

central e como marco do fim dos radicalismos no Império, facilitando a aliança

política impetrada por D. Pedro II e que seria oficializada com a criação, como já

dito, do Ministério da Conciliação. Sobre este contexto, é oportuno lembrar que

A preservação do Império acabaria sendo obra dos regentes e da elite política (...) sobretudo do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas, com a progressiva aquiescência das demais, todas concordes em que, de preferência à desordem e ao caos, era preferível defender a Constituição de 1824 na sua plenitude, sem prejuízo das desavenças políticas e ideológicas que separavam conservadores e liberais. Prevaleceu o compromisso, urdido pelos saquaremas – os conservadores fluminenses –, segundo o qual as divergências políticas do “mundo do governo”, nas palavras de Ilmar Mattos, deveriam ser resolvidas no espaço institucional do Parlamento, das eleições, do jogo político – e não por meio das armas. É certo que os liberais mais autênticos desejavam abrir mais o campo institucional para as contendas, suprimindo os institutos autocráticos do regime, sobretudo o Poder moderador, chave do sistema. Mas souberam conviver com ele até 1889 (VAINFAS, 2002, p.358).

A esta conjuntura política de estabilidade e de consolidação das instituições, o

Império brasileiro, após grandes contratempos, iniciou período de aparente

tranqüilidade, característica mais evidente do Segundo Reinado durante as décadas

de 1850 e 1860, quando também experimentou prosperidade e relativa

diversificação da economia, além de um notório processo de afirmação cultural. No

plano econômico, o café se consolidava como o principal produto de nossa pauta de

exportação “que em 1850 era o quarto item do comércio mundial” (LESSA, 2001, p.

265) e chegou a ter, na segunda metade do século XIX, cerca da metade de sua

produção total fornecida pelo Brasil17, conforme tabela a seguir:

17 No ano de 1850, a província fluminense respondia por mais de ¾ do café brasileiro (VITORINO, 2002, p. 158).

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Tabela 1: Percentual brasileiro na produção mundial de café (1820-1889). Período 1820/29 1830/39 1840/49 1850/59 1860/69 1870/79 1880/89 Percentual 18,18 29,70 40,00 52,09 49,07 49,09 53,63

Fonte: VITORINO (2002, p. 158). No entanto, há de enfatizar também que, no período em questão, a atividade

agrícola como um todo experimentou um importante processo de diversificação.

Apesar do café sustentar seus índices de crescimento e o cacau, proveniente do

recôncavo da Bahia, manter com oscilações a sua participação de períodos

anteriores, outros produtos dinamizaram a atividade: a borracha, responsável por

uma marcha de exploração na planície do rio Amazonas, chegaria a ocupar a

terceira posição entre nossas exportações no final do Império, e, sobretudo, o

algodão, cultivado em larga escala em boa parte das províncias nordestinas, que

viveria seu auge na década de 1860 quando foi o segundo produto de nossas

exportações, beneficiado que foi pela desorganização da produção norte-americana

durante os anos de sua Guerra de Secessão. A tabela abaixo detalha nossas

principais exportações durante o período imperial.

Tabela 2: Principais produtos brasileiros para exportação - % (1821-1890). Produtos 1821/30 1831/40 1841/50 1851/60 1861/70 1871/80 1881/90 Café 18,4 43,8 41,4 48,8 45,5 56,6 61,5 Açúcar 30,1 24,0 26,7 21,2 12,3 11,8 9,9 Algodão 20,6 10,8 7,5 6,2 18,3 9,5 4,2 Fumo 2,5 1,9 1,8 2,6 3,0 3,4 2,7 Cacau 0,5 0,6 1,0 1,0 0,9 1,2 1,6 Couros 13,6 7,9 8,5 7,2 6,0 5,6 3,2 Borracha 0,1 0,3 0,4 2,3 3,1 5,5 8,0

Fonte: FARIA (2002a, p. 249). Paralelo a essa dinamização da agricultura no Brasil, a pecuária, mesmo

voltada para o abastecimento do mercado interno e não sendo direcionada pelos

determinantes do comércio internacional, também se consolidou como uma atividade

econômica importante. Desenvolvida nos sertões18 do Império, acabou concorrendo

18 Segundo Romeiro e Botelho (2003), a palavra “sertão” era utilizada no período colonial para designar os lugares não povoados ou de povoamento escasso, com fronteiras incertas. Referia-se também aos locais desertos, incultos, selvagens. A definição chegou ao período imperial ainda com esta conotação, mas também já associada à idéia de “interior”, de território distante do litoral.

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para a efetiva ocupação e posterior povoamento de áreas como o oeste mineiro, o

noroeste paulista e o sul do Mato Grosso.

Além destas, uma outra atividade, até então pouco significativa devido aos

acordos comerciais brasileiros de exclusividade com a Inglaterra, iniciou sua

expansão: a indústria19. Embora não seja possível falar em uma industrialização no

país anteriormente à década de 1870 (LUZ, 1978) devido à ausência de políticas

governamentais efetivas de incentivo a esta atividade20, esforços isolados fizeram

com que, nos cinco primeiros anos da década de 1850, 40 patentes fossem

expedidas no Brasil em contraste com a única que havia sido registrada na década

anterior. A sua relativa expansão, juntamente com a do setor de serviços,

direcionada pela ação de importantes empreendedores que surgiram no período,

ocorreu nas décadas seguintes de tal sorte que, nos anos de 1860, mais empresas

industriais foram fundadas, além de bancos, caixas econômicas, companhias de

seguro, de colonização, de navegação a vapor, de transporte urbano e de gás, e

foram construídas as primeiras estradas de ferro do país.

É importante observar que o impulso em infra-estrutura aconteceu concentrado

nas áreas articuladas ao café: primeiro na província fluminense e depois na paulista.

Ainda na primeira metade do século XIX, a atividade cafeeira fez com que grandes

fazendas fossem estabelecidas no Vale do Paraíba do Sul, fazendo surgir e expandir

cidades como Valença, Vassouras e Piraí. No oeste de São Paulo, nos latifúndios de

terra roxa na área compreendida entre as atuais cidades de Campinas a Ribeirão

Preto, o café encontrou, já na década de 1850, as condições que tornariam esta

região sua principal produtora no Brasil a partir do final dos anos 1870.

Assentada na grande propriedade, na monocultura para exportação e no

trabalho escravo, a atividade cafeeira deslocou a primazia econômica das antigas

regiões agrícolas do Nordeste para o atual Sudeste e chegou a representar, no final

do período imperial, quase 62% da receita das vendas externas brasileiras,

garantindo os superávits da nossa balança comercial ao longo da década de 1860.

19 O termo “indústria” inexistia no século XIX com o significado econômico da atualidade e se confundia com manufatura. Nos dicionários de época, “indústria” era a “destreza para ganhar a vida” ou “fazer obras mecânicas” e como a “fábrica mecânica e oficina de artefatos, lanifícios, sedas, chapéus, panos” era denominada de “manufatura”, fica explicada a associação dos termos (FARIA, 2002b, p. 372). 20 Na historiografia brasileira, o termo “agrarismo” é usado para denotar a forte pressão que a elite agrária exercia junto ao governo contra os planos industrialistas (fosse criação de indústrias ou aprovação de tarifas protecionistas) e a favor dos produtos agrícolas, enfatizados como verdadeira riqueza nacional. Desta forma, o período imperial não chegou a formar no Brasil um grupo industrial.

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Paradoxalmente, o café representava a riqueza e o ponto frágil da economia

brasileira, uma vez que sua expansão continuada ao mesmo tempo que aquecia os

cofres da nação, anulava a segurança de uma diversificação econômica deixada

para trás com a decadência, nas últimas décadas do Império, de lavouras e regiões

tradicionais como as do açúcar e algodão. Tal dinâmica pode ser observada na

Tabela 2.

A riqueza cafeeira fez a província fluminense se destacar no cenário

econômico, político, cultural e territorial do Império. Por ter seu apogeu

conjuntamente ao do período imperial, a elite cafeicultora fluminense foi a que

melhor espelhou o momento através do poder efetivo e simbólico decorrente de suas

suntuosas fazendas e da influência imediata no Conselho do Imperador. De maneira

sintomática, cunhou-se a expressão “o Brasil é o Vale”. O oeste paulista, por sua

vez, marcaria a cena brasileira de forma decisiva quando da República.

O bom momento econômico que se vivia tinha também outras razões na sua

base: a fixação dos impostos de importação na faixa média de 30% através das

tarifas Alves Branco, em vigor desde 1844, conjuntamente com o fim do privilégio

inglês de pagar apenas 15% e a abolição do tráfico legal de escravos em 1850

proporcionaram uma redução nos gastos com importação e a liberação de capital

para investimento em atividades distintas da economia agrícola tradicional. Esta, em

contrapartida, foi severamente impactada com o fim do comércio legal de cativos

negros e com o conseqüente aumento do seu preço no mercado ilegal que se

instaurou internamente ao Império, intra e interprovincial. Foi neste contexto,

inclusive, que os senhores de engenho do Nordeste, com suas atividades já em

decadência, se estabeleceram como ofertadores de escravos para as fazendas de

café que se expandiam no Vale do Paraíba do Sul.

O vigor político e econômico do Império estimulou D. Pedro II a pensar em um

projeto de “redescoberta” do Brasil em que seus valores e traços históricos fossem

reunidos para a sua celebração. A questão em pauta era a da construção de uma

identidade brasileira e esta deveria servir à idéia de nação. As ações do monarca,

neste sentido, visavam cooptar homens das letras e artes para um movimento que

afirmasse um nacionalismo calcado na valorização do passado e dos traços culturais

presentes na realidade brasileira daquele momento.

No campo da história, literatura e pintura, vários foram os nomes que se

engajaram no movimento nascido da idéia e do financiamento do Imperador.

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Podemos pensar no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB)21 como

exemplo desse projeto nacionalista marcadamente conservador em harmonia com o

apogeu de um Império agrário e escravocrata. A presença e influência do monarca

na instituição eram constantes e decisivas, como também o eram os recursos

financeiros do governo que serviam, entre outros, para a concessão de prêmios aos

trabalhos e para o envio de inúmeros bolsistas à Europa (em especial, para a Torre

do Tombo em Portugal) para pesquisa e cópia da documentação ali depositada

sobre o Brasil. Financiado desta forma, Francisco Adolfo de Varnhagem publicou,

em 1854, a clássica obra “História Geral do Brasil” que, a despeito de inaugurar a

nossa historiografia, idealizava não sem propósitos, uma nacionalidade baseada nos

princípios de uma civilização branca.

O tom civilizatório e intencional como parte do projeto pretendido de nação

encontrou respaldo também na literatura que se fazia no Brasil, notadamente no

romantismo indianista em seu auge entre os anos de 1837 e 1869. Sem dúvida,

obras como “O Guarani” e “Iracema”, do deputado conservador José de Alencar, ao

mesmo tempo em que fundaram o romance no Brasil, o fizeram a serviço da

mistificação de uma sociedade em que os nativos foram retratados como “bons

selvagens” e belos. De contrapartida,

A política indigenista praticada pelo Império foi, em contraste com a colonial, bastante omissa, seguindo, em linhas gerais, o espírito do antigo diretório pombalino, que previa a integração dos “índios à civilização”, concedendo-lhes o foro de “vassalos livres” e estimulando sua inserção no mercado de trabalho – o que resultou, na prática, em forte exploração da mão-de-obra nativa nas áreas de fronteira. No entanto, foi no Império que a figura do índio acabaria elevada à condição de símbolo genuíno da nacionalidade, espécie de matriz de uma nacionalidade originária (VAINFAS, 2002b, p.367).

Sob influência do romantismo europeu e o seu repúdio aos modelos estéticos

clássicos, a nossa produção literária daquele momento, diferentemente dos

escritores franceses que recorriam à Idade Média como época heróica, buscava na

idealização dos índios os elementos a serem ressaltados para a construção de um

passado que pudesse ser lido como digno. Para casar-se com a história real, os

indígenas são mortos nestes romances, mas esta morte é apresentada como

21 Criado em 1838 na regência de Araújo Lima a partir do modelo do Institut Historique, fundado em Paris em 1834, o IHGB, que será observado mais adiante, sempre apresentou propósitos conservadores que se alinharam a uma construção heróica do Brasil.

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sacrifício necessário à emergência do Brasil civilizado, moderno e imperial. Foi,

nestes termos, que se tentou a formação de uma temática nacional.

A intenção de recontar em tons heróicos o passado brasileiro também se

expressou no universo da pintura e, nestes termos, a Academia Imperial de Belas

Artes, com financiamento do governo central, foi um vigoroso instrumento do projeto

de monumentalização do Brasil posto em prática pelo IHGB e pelo Imperador. Nela,

foram constantes as bolsas de estudo para a Europa concedidas a pintores

brasileiros que, por instruções, deveriam distanciar-se das novas diretrizes da arte

que atingiam aquele continente na época (como o realismo ou o paisagismo),

mantendo seus pincéis a favor de uma obra neoclássica como era do gosto de D.

Pedro II. De volta ao Brasil, nomes como Pedro Américo e Vítor Meireles acabaram

por definir os traços visuais mais marcantes da nação que se consolidava, sendo os

principais responsáveis por sua representação pictórica e fazendo escola na pintura

nacional.22 Neste período, o negro foi desconsiderado pelas artes brasileiras e o

indígena foi visto de forma romanceada, cabendo apenas ao branco a grandiosidade

de ações (inclusive sobre a natureza) e a civilidade.

O cenário musical da época também refletia este pressuposto. Embora as

modinhas de âmbito doméstico fossem um sucesso no Segundo Reinado, foi o canto

lírico a prioridade dada por D. Pedro II no campo especifico da música. Afeito às

operas, não poupou recursos para tentar transformar o Brasil em um importante

centro erudito e, neste contexto, encampou a idéia e financiou a criação do

Conservatório Nacional de Música, nos anos de 1850, voltado para a educação

musical de iniciantes de pouca renda, e fundou, em 1857, a Imperial Academia de

Música e Ópera Nacional, da qual saíram muitos músicos e compositores com

bolsas de aperfeiçoamento na Europa. Destes, o mais célebre foi Carlos Gomes,

autor da ópera “O Guarani”, baseada no romance de José de Alencar, que

apresentou às platéias do velho continente e dos Estados Unidos uma obra clássica

22 A memória visual da história brasileira até aquele momento, marcadamente idealizada e atendendo a encomendas do próprio governo imperial, se deve às telas destes dois pintores e à influência que exerceram em uma geração de discípulos. Episódios como “O grito do Ipiranga”, “A batalha do Avaí” e “Libertação dos escravos” foram recontados a partir dos quadros de Pedro Américo, enquanto que Vítor Meireles imaginou “A primeira missa no Brasil”, “A batalha naval do Riachuelo”, “A passagem de Humaitá” e “A batalha dos Guararapes”. Enquanto o primeiro seguiu vida política, sendo eleito deputado pelo Rio de Janeiro, o segundo dedicou-se à cátedra e, como professor da Academia, exerceu influência direta sobre muitos dos novos nomes da pintura brasileira. São exemplos de quadros que mantiveram a grandiosidade e a idealização como traços mais presentes na pintura da nossa história: “O último Tamoio” (de Rodolfo Amoedo), “A prisão de Tiradentes” (de Antônio Parreiras) e a “Proclamação da República” (de Henrique Bernadelli).

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composta em português e, bem ao gosto do projeto nacionalista do Imperador, com

temática brasileira (idealizada pelo indianismo romântico e que mostrava um Brasil

civilizado). Nos grandiosos espaços construídos para a música clássica no Brasil,

nos intervalos das árias, a elite imperial também discutia negócios e política.

E os números do Império brasileiro, neste momento de afirmação cultural das

elites, de tranqüilidade política e de prosperidade econômica mostravam fôlego

quando uma série de fatos novos começou a indicar a mudança. O “apogeu do

fulgor imperial”, denominação dada pelo historiador Capistrano de Abreu ao período

que engloba as décadas de 1850 e 1860, caminhava para o seu fim, motivado por

novas configurações no campo da política propriamente dito (o rompimento da

conciliação entre liberais e conservadores e o fortalecimento de um projeto

republicano) e em sua relação estreita com a economia (os efeitos danosos da

Guerra do Paraguai e o fim do escravismo).

Se foi a subordinação do liberalismo radical, conseguido com o fim da

Revolução Praieira, o fato que possibilitou a conciliação política das elites, foi o seu

ressurgimento na cena imperial que marcou o fim da aliança que sustentava D.

Pedro II. Mesmo em tempos de Ministério da Conciliação, as divergências sempre

estiveram postas quando uma corrente ou outra se sentia prejudicada com as

decisões tomadas ou com sua representatividade no Conselho. A Lei dos Círculos,

neste sentido, foi um exemplo desses impasses. Aprovada em 1855 a favor dos

liberais, estabelecia circunscrições que ultrapassavam os limites provinciais quando

da escolha de nomes dos candidatos ao Parlamento, diminuindo as intervenções

dos Presidentes de Província no ministério. Em 1860, setores conservadores

insatisfeitos com o seu texto conseguiram alterá-la e ampliar o número de deputados

eleitos pelo seu partido. A reação liberal foi intensa e, das discussões, uma nova

tentativa para manter a conciliação foi implantada através da Liga Progressista, que

se estabeleceu em 1862 e vigorou até 1868.

Neste período, os grandes gastos despendidos com a Guerra do Paraguai

(1864-1870) e os seus impasses políticos decorrentes de comandos nem sempre

vitoriosos ampliaram as diferenças entre liberais e conservadores no trato de tais

questões; uns discursando a favor de reformas profundas e outros tentando apenas

manter seus espaços no poder. Exemplificando este embate, que se arrastaria até o

final do Império, o texto a seguir mostra a conclusão a que chegou o deputado Tito

Franco, membro liberal do Conselho de Sua Majestade, sobre a atuação do

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seguidos gabinetes rivais em tempo de guerra. (Ver reprodução de parte do original

no Anexo 2)

Fonte: D’ALMEIDA (1877, p. 156).

As discussões também se acirrariam quanto ao fim do trabalho escravo e à

entrada de mão-de-obra estrangeira no Brasil. Publicamente, os liberais passam a

se comprometer com a causa abolicionista e têm seu gabinete demitido em 1868,

fato que acabou impulsionando a criação do Partido Liberal Radical de onde se

originou o Partido Republicano. Assim, rompia-se a conciliação entre as elites

imperiais e o apoio político com o qual contava o Imperador para a sua solidez no

poder.

As décadas de 1870 e 1880 marcaram a derrocada da monarquia quando a

forte oposição ao seu unitarismo formada por frentes abolicionistas, federalistas e

positivistas converge para uma solução republicana. Neste período, D. Pedro II

perdeu também o apoio da Igreja23 (quando suspendeu uma decisão dos bispos de

Olinda e do Pará que proibia a participação de maçons em confrarias e irmandades

católicas e, principalmente, quando em 1874 ordenou a prisão e punição destes

bispos que o desobedeceram na proibição) e do Exército (devido aos novos ideais

de organização que os militares adquiriram no contato com seus pares da Argentina 23 A união entre Estado e Igreja no período imperial estava assegurada pela Constituição de 1824, que descrevia as atribuições do clero (muitas delas inerentes ao Estado como registros de nascimentos, casamentos, óbitos e imóveis, pelas quais recebiam proventos do governo) e garantia ao Imperador a interferência nas questões religiosas através do padroado (que permitia ao monarca a indicação de nomes, a serem confirmados pelo Papa, para os principais cargos eclesiásticos) e do beneplácito (que, contrariando Roma, determinava que todas as bulas pontifícias apenas teriam validade no Brasil depois da aprovação do Imperador).

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e Uruguai, países republicanos, quando da Guerra do Paraguai; devido também à

disseminação da causa abolicionista entre eles, sobretudo com o intenso

recrutamento de negros libertos e cativos para as fileiras da guerra; e devido ainda à

adesão de muitos oficiais à doutrina positivista e à causa republicana). É na

conjuntura política do término da Guerra do Paraguai que:

(...) surge um exército nacional relativamente organizado, com o prestígio de haver vencido a guerra, e conseqüentemente credor da gratidão nacional, e vulnerável a pregações modernizadoras, especialmente aquelas que contemplassem um regime onde a ordem, a disciplina, e evidentemente seus garantidores, fossem prezados e cultivados (SANTOS, 1978, p. 37).

A partir de 1870, a causa abolicionista já estava presente no cotidiano de

amplos setores da sociedade brasileira. Entre a população que vivia nas cidades, a

discussão era mais evidente e a escravidão contestada e apontada como o

elemento responsável pelo atraso do Brasil em relação ao nível de civilização de

diversos países. A influência da expansão capitalista inglesa e do modo de ser da

sociedade francesa muito contribuiu para que um número considerável de

jornalistas, escritores, políticos, professores e militares associassem as idéias de

progresso às de trabalho livre, constituindo uma importante frente de resistência ao

sistema de escravidão no qual se assentava nossa economia e sociedade. No

período, a intelectualidade brasileira muito absorveu das idéias do inglês Herbert

Spencer e do francês Auguste Comte, fazendo com que o discurso da modernização

passasse por questões como progresso, civilização, ciência e liberdade assumindo

uma faceta conservadora.

A campanha abolicionista que ganhou as ruas do Império ecoava o discurso já

construído desde a década de 1820 quando José Bonifácio dizia ser a “instituição

nefasta” da escravidão “corruptora da moral e dos costumes” e “inibidora do

progresso e da indústria”. A diferença estava no contexto social e econômico dos

dois momentos, uma vez que nos anos 1870 o Brasil experimentava a expansão das

práticas capitalistas, o desenvolvimento dos centros urbanos, o crescimento da mão-

de-obra livre, a oposição de segmentos da sociedade ao trabalho compulsório, a

difusão da idéia de progresso e a pressão internacional pelo fim da escravidão,

sobretudo, quando a partir de 1865, o Brasil passou a ser o único país independente

da América a preservar tal sistema.

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Neste contexto, associações e publicações em defesa da liberdade dos negros

foram organizadas e nomes se afirmaram no movimento como os de Joaquim

Nabuco e José do Patrocínio. O primeiro destacou-se à frente da Sociedade

Brasileira contra a Escravidão (de 1880) e o segundo, da Confederação Abolicionista

(que, em 1883, congregava inúmeras associações espalhadas pelas províncias). Os

discursos proferidos pelos abolicionistas ganharam a Câmara, a imprensa24 e a

população mesmo assumindo uma postura cautelosa que unia a bandeira da

liberdade e do progresso à necessidade de manutenção da ordem e da lei,

sobretudo quando se ampliava a rebeldia dos escravos, com fugas muitas vezes

promovidas por militantes abolicionistas.

A resistência dos setores conservadores e dos senhores de escravos,

respaldados pela omissão ou parceria das autoridades governamentais, se deu sob

a forma de calúnias e difamações veiculadas pelos jornais de orientação regressista,

perseguições e ameaças de morte (sobretudo nas regiões interioranas), vigilância

aos jornais abolicionistas, proibição de “ajuntamento em praças e ruas” para coibir

eventos antiescravistas ou através de medidas paliativas como as leis do Ventre

Livre (aprovada em 1871 durante o gabinete conservador do Visconde de Rio

Branco, estabelecia liberdade apenas para os “ingênuos”, como os filhos de cativos

com menos de 8 anos de idade eram chamados)25 e dos Sexagenários (aprovada

em 1885 no governo conservador do Barão de Cotegipe, concedeu liberdade

apenas formal aos escravos com mais de 60 anos de idade, pois, na prática, eles

tinham que trabalhar até os 65 a título de indenização ao seus senhores). No

entanto, as pressões de diversos matizes contra a escravidão (fuga de escravos,

crescimento de quilombos, manifestações nas ruas do Império e incisivas

reivindicações abolicionistas no Parlamento) forçaram o gabinete conservador que

atuava em 1888 à aprovação da Lei Áurea em uma votação em que o texto recebeu

24 Além dos veículos da imprensa que noticiavam cada vez mais a temática da escravidão, muitos folhetins voltados especificamente à causa abolicionista foram lançados no período. O primeiro deles foi “Gazeta de Notícias”, fundado em 1876 na cidade do Rio de Janeiro. Depois, na mesma cidade, os mais influentes foram “O Abolicionista” (criado pela Sociedade Brasileira contra a Escravidão em 1880), a “Revista Ilustrada” (que usava charges para criticar o trabalho escravo e seus defensores), a “Gazeta da Tarde” e a “Cidade do Rio” (fundados por José do Patrocínio em 1880 e 1887, respectivamente), além do “Redenção” (criado em 1887 em São Paulo e que reunia muitos “caifazes”, abolicionistas que apoiavam ações como fugas e sublevações de escravos). 25 De uma forma geral, observou-se uma divisão de opiniões sobre a lei inclusive entre as províncias: aquelas que não dependiam tanto do trabalho escravo quanto no passado aceitavam-na sem maiores problemas, enquanto as diretamente relacionadas à atividade cafeeira mantinham firme posição contrária à sua aprovação. Na Câmara, quase 2/3 dos votos foram favoráveis à lei. Muitos dos deputados derrotados (a grande maioria do Sudeste) abraçaria depois a causa republicana.

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ainda 9 votos contrários, sendo 8 de deputados da província fluminense ligados ao

café do Vale do Paraíba.

Uma outra frente que muito concorreu para a derrocada da monarquia foi

aquela formada pelos descontentes com a forte centralização do poder e defensores

de uma organização federalista e republicana do Brasil. Mesmo que os ideais

republicanos já tivessem marcado presença desde o período colonial em muitas

revoltas e insurreições, o contexto dos anos 1870 promoveu dois fatos ao posto de

grande importância para o fortalecimento de tais idéias: o fim do bipartidarismo por

conta da criação, em 1865, do Partido Liberal Radical (que evoluiria para o Partido

Republicano) e a publicação pelo jornal “A República” (fundado em dezembro de

1870 na cidade do Rio de Janeiro) do “Manifesto Republicano”, texto que se tornou

referência para o movimento que se instituía no país, defendendo o federalismo e o

fim da união Estado/Igreja e do Senado vitalício.

Um sentimento liberal-republicano encontrou eco em outras províncias e

envolveu a ala mais dinâmica dos fazendeiros de café, os industriais de São Paulo e

do Rio de Janeiro (descontentes com a pouca acolhida que diziam ter no

Parlamento, dominado que estava pela aristocracia agrária) e as classes médias

urbanas de norte a sul que reivindicavam maior representação social. E nesta

marcha de adesão, em que diversos clubes e jornais voltados para a causa, foi

fundado o Partido Republicano, que passou a disputar cargos eletivos em 1876,

assistiu ao desenvolvimento de duas tendências internas: uma formada por

cafeicultores descontentes com a Lei do Ventre Livre e a outra formada por um

grupo urbano e abolicionista. Alguns dos membros da primeira tendência se

destacaram na direção das convenções realizadas pelo Partido Republicano

Paulista (PRP) em 1873, com a presença maciça de fazendeiros. Entre os da

segunda tendência, houve quem trabalhasse na aproximação do movimento com os

setores populares através de comícios e conferências (para tentar diminuir o

prestígio que o imperador e a Princesa Isabel desfrutavam junto aos mais humildes

da Corte, sobretudo entre os negros) e houve quem buscou apoio entre os militares

descontentes com a política imperial.

Uma terceira frente que concorreu para o fim da monarquia no Brasil foi a dos

positivistas, formada majoritariamente por militares do Exército. Importante observar

aqui o fato de que esta instituição tivera seu efetivo ampliado e seus equipamentos

aperfeiçoados com o aumento de seu prestígio político após a vitória no Paraguai e

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que, ao invés deste investimento consolidar seu apoio ao Império, reverte-se contra

ele por conta da aproximação de sua oficialidade às causas antiescravistas e

republicanas. Na base desta realidade, estava a mudança na composição social do

Exército observada desde o início dos anos de 1850. Até então, era comum a

dedicação de filhos das elites proprietárias de escravos à carreira militar, mas, face

aos baixos soldos, os cargos de oficiais passaram a ser ocupados por filhos de

burocratas ou de militares sem posses, acarretando um distanciamento entre estes e

a elite política do Império formada na maioria por bacharéis de Direito, a quem os

militares associavam a burocracia e a corrupção.

A este tempo a Escola Militar da Praia Vermelha, na Corte, proporcionou uma

coesão também entre os futuros oficiais do Brasil em sua rejeição às elites civis e

em defesa da república em nome da “ordem e progresso”. Sua ideologia encontrava

uma difusão significativa através de outras instituições como a Sociedade Positivista

do Rio de Janeiro (criada em 1876 e que originaria a Igreja Positivista do Brasil em

1881) e o Clube Militar (fundado em 1887 também na cidade do Rio de Janeiro).

No centro da Corte, nem a demissão do gabinete conservador de Cotegipe e

nem a abolição da escravatura, ambos em 1888, foram suficientes para apaziguar as

pregações positivistas, que se ampliavam pelos quartéis, e a propaganda

republicana, intensificada através da imprensa e de comícios. Os esforços do poder

central para reduzir a expansão destas “novas” idéias eram vistos, inclusive, nas

esferas provinciais como, por exemplo, nas tentativas de fiscalização do sistema de

ensino. O exemplo a seguir, retirado do relatório do presidente da província

fluminense a exato um mês da proclamação da República, é sintomático:

É quase nulla a fiscalisação dos inspectores e superintendentes. Servindo gratuitamente por livre nomeação do governo, elles são pela maior parte indifferentes ao que se passa na escola e levam as preocupações políticas para o terreno neutro da instrucção, onde deviam emmudecer todas as paixões e interesses. A inspeção das escolas deve ser permanente, pela intervenção e vigilância constante das autoridades locaes e, ao mesmo tempo, imprevista, inesperada, por intermédio de agentes directores da administração central (RIO DE JANEIRO, 1889, p. 39).

D. Pedro II ainda tentou reduzir as insatisfações estabelecendo um gabinete

liderado pelo liberal Visconde de Ouro Preto, em junho de 1889, mas as dificuldades

em implementar as reformas desejadas por republicanos e militares aceleraram as

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articulações para o golpe. A data de 15 de novembro se deu menos por

planejamento e mais por conta da necessidade de ação dos conspiradores devido

aos boatos de que o monarca já havia tomado conhecimento do plano.

Assim, mais um capítulo da vida política do Brasil tinha início por ato que

desconsiderava a lei e a população. O próprio Aristides Lobo, um dos articuladores

do golpe, ao retratar o fato em carta publicada no paulista “Diário Popular” no dia 18

seguinte, afirmou que “o povo assistiu bestializado” aos fatos julgando se tratar de

parada militar. Parte da população, principalmente a que tinha apreço pelo

imperador não aceitou a transição, sofrendo repressão por parte do novo governo

republicano quando das suas manifestações a favor da monarquia. Tais fatos

comprovam que o sentido etimológico da palavra “república” não fez parte do projeto

dos conspiradores que a instalaram. Ao contrário, o novo poder receava a

participação popular e a premissa da “ordem e progresso” reafirmou uma sociedade

determinada por suas elites.26

Sessenta e sete anos depois de inaugurada, a nação pleiteada para o Brasil

mostrava nítidos sinais de fragilidade. Se é correto afirmar que importantes

conquistas foram verificadas no período que se encerrava, também o é o fato de que

ela ainda carecia de maturidade, distante que estava do modelo teórico no qual se

baseara e da abrangência defendida por aqueles que discursaram em seu nome.

2.2. Do conceito de nação ao projeto nacional brasi leiro

Não há uma definição universal para nação devido à complexa natureza dos

elementos a que se refere. A acepção atual foi construída no discurso político

europeu com o advento da Revolução Francesa, “embora seu uso tivesse, naquele

período, bem distante da univocidade” (BOBBIO; MATTEUCI; PASQUINO, 2004, p.

795). Se na literatura o termo surgiu com o romantismo alemão ainda no século

XVIII, a teorização na qual foi tomada como fundamento natural do poder político em

26 Sob a presidência do Marechal Deodoro, o primeiro ministério republicano foi composto essencialmente por figuras que haviam participado ativamente da conspiração: Campos Sales (Justiça), Aristides Lobo (Interior), Rui Barbosa (Fazenda), Benjamin Constant (Guerra e o efêmero Ministério da Instrução Pública, Correios e Telégrafos), Eduardo Wandenkolk (Marinha), Quintino Bocaiúva (Relações Exteriores) e Demétrio Ribeiro (Agricultura, Comércio e Obras Públicas).

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sua fusão com o Estado apenas se estabeleceu em meados dos oitocentos, quando

se tornou constante o questionamento sobre os predicados a serem considerados

para que determinados agrupamentos humanos pudessem efetivamente ser

chamados de nação.

Uma consulta aos dicionários de época comprova o uso de distintas

interpretações ao termo antes do século XIX e, neste sentido, Guerra (2003) nos

lembra que sempre esteve associado à identidade étnica ou territorial. Sobre o

primeiro sentido, aponta que desde a Idade Média de acordo com dicionários

franceses e espanhóis da época o vocábulo se aplicava a grupos corporativos

fundados sobre uma origem comum - geográfica ou política, real ou suposta -

servindo para designar qualquer grupo com características semelhantes. A respeito

do segundo sentido, informa que o termo já estava associado à idéia de pátria,

considerada como território no qual se assentava um dado agrupamento humano

com características de nação. Desta associação, inclusive, o autor revela um

terceiro sentido, o político, que predominara por todo século XVIII associado

comumente a idéia de reino ou província. Sendo assim, “a nação que aparece aqui

é uma imagem com atributos múltiplos, precursora já da nação moderna, mesmo

que, no momento, se trate mais de um ideal que de uma realidade, tendo em vista

que os exemplos com que os dicionários ilustram sua definição não reúnem

precisamente tais características” GUERRA (2003, p. 37).

Em nosso trabalho, interessa-nos a análise que o autor elabora quando

observa a definição do termo quanto à sua extensão geográfica, constatando a

importância conferida às cidades como unidades políticas completas e elementos

de base para a unidade pretendida das nações.

Ao tomar o exemplo da monarquia espanhola à época dos Habsburgos, o autor

identifica “como um agregado de unidades políticas (européias e americanas) com

uma seqüência de seus elementos constitutivos que merece análise complementar”.

Para ele, “sua estrutura é claramente piramidal, com uma sobreposição de

comunidades políticas tendencialmente completa: cidades, províncias e reinos”, na

qual “o elemento de base, os fundamentos de toda a construção política são as

cidades” (GUERRA, 2003, p. 39), identificadas, inclusive, através de seus diferentes

tipos: “cabeças de Reino”, “as que têm voto em Cortes”, além das demais cidades,

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vilas e lugares sem representação específica. Voltaremos a esta questão quando

tratarmos especificamente do nosso objeto de estudo.27

Segundo Gellner (1996, p. 507), em tempos pré-modernos tal questão era

desprovida de resposta geral e, mais significativo ainda, não era colocada. Os seres

humanos eram membros de grupos de parentesco ou de organizações locais,

súditos de dinastias, adeptos de tipos de fé em geral ligados a uma legitimação

política, membros de estados sociais ritual ou juridicamente definidos, e assim por

diante. Nestas formações, a identificação cultural e a lealdade política eram

complexas e variáveis e a questão sobre a nação raramente era posta. Ela apenas

se difundiu (e de forma intensa) no contexto de um tipo peculiar de organização

sóciopolítica que, a partir do final do século XVIII, se disseminaria pela Europa

sendo reconhecida como “sociedade moderna”.

Neste processo, a nação deixou de ser atrelada a uma espécie de direito

natural das populações de congregar traços identitários de língua, cultura, religião e

tradições em um território a elas associado, para ser construída, teoricamente, a

partir da percepção de um mote indutor dessa identidade coletiva associado a

mecanismos de instrução e sob a tutela de um Estado. Assim, considerar a idéia de

sociedade em seu sentido moderno consiste em perceber que ela se confunde com

a própria idéia de Estado e, mais ainda, com a de Estado nacional. Para

compreender tal imbricação, destacamos a contribuição referencial para o debate

advinda de Charles Tilly (1996) e Reinhard Bendix (1996).

Ao observar a Europa no final da Idade Média, Tilly enumera as características

que possibilitaram uma uniformidade singular ao processo de formação do Estado

no continente: uma certa homogeneidade cultural advinda do Império Romano; base

camponesa desintegrada e submetida a um senhor de terras que intermediava as

relações entre os camponeses e o soberano; existência de cidades que já

apareciam como centros de comércio, comunicação, administração e manufaturas e

o estabelecimento de uma burguesia urbana com significativos laços com o campo.

27 Observando três dos mais importantes dicionários portugueses que surgiram ao longo dos séculos XVIII e XIX, o termo “nação” é percebido em suas transformações por Botelho (1988). De um significado mais próximo à definição de reino e senhorio, presente em uns, ele passa para considerações sobre cultura e governo comuns, em outros. Entretanto, em edição de 1891 do dicionário de Moraes e Silva, pela primeira vez o conceito articula-se ao de Estado e aproxima-se do de cidadania. Portanto, se ao findar o século XIX, o termo em sua dupla articulação, relacionava-se com os de povo e cultura, Botelho diz que é correto afirmar que os dicionários portugueses expressam os contornos que a questão nacional assumira na Europa em décadas anteriores e que transparece na bibliografia corrente sobre o tema.

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Do ponto de vista econômico, portanto, havia já uma certa complexidade nas

relações entre campo e cidade e estas estavam voltadas para a produção de

riqueza, fator que foi fundamental para a sustentação do Estado que estaria por vir.

Do ponto de vista político, o autor destaca que havia resistência ao poder do

soberano e locais para a sua expressão (as assembléias deliberativas locais), além

de uma notável capacidade de fazer e de ser bem sucedido na guerra.

Quanto a este último aspecto, Tilly diz ser central na formação dos Estados por

recorrer à coerção através da qual as demais condições podem ser aproveitadas.

Também determina a expansão contínua das forças armadas que, por sua vez,

requerem recursos e a gerência destes, sugerindo o desenvolvimento de

burocracias e inovações administrativas. A conexão entre estes itens é ativada

quando, em caso de resistências, a coerção é ampliada. Neste contexto, uma das

premissas básicas do Estado seria a coesão e lealdade de seus membros frente ao

próprio regime e à resistência a uma situação de ameaça externa, impondo então, a

criação de mecanismos que garantissem a participação política da população. A

construção nacional, para o autor, emerge quando se permitiu a instauração de um

sistema político no qual os governantes se comprometem com atividades de (re)

distribuição de recursos, oportunidades e justiça.

Não obstante às diferenças na formulação teórica de Tilly sobre o Estado

moderno em relação a outro autor de grande expressão no debate (Bendix),

podemos dizer que ambas se aproximam exatamente quando o cidadão é tomado

como estatuto desta nova configuração política, baseada sobretudo na constituição

de um governo direto que se sustenta no processo de homogeneização de suas

populações. Estes aspectos representam fatores importantes na questão do

nacionalismo que, para Tilly, vai ser entendido como a mobilização em torno do

Estado que, não apenas extrai recursos da população, mas se compromete com a

sua devolução sob alguma forma de compensação.

Para este autor, portanto, os Estados nacionais caracterizar-se-iam pela união,

numa estrutura central relativamente coordenada, de importantes organizações

militares, extrativas, administrativas, distributivas e produtivas, sendo relevante o

reconhecimento de que eles não se originaram de um modelo preconcebido, mas

foram “o resultado das necessidades, dos embates com outros Estados e das lutas

e negociações com classes diferentes da população” (TILLY, 1996, p. 75-76).

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O estreito relacionamento que se desenvolve entre os processos de

construção do Estado e de construção da nação é também explicitado por Bendix

(1996), embora em direção diferente da observada até aqui. Esse autor analisa o

processo de legitimação da autoridade pública por meio da burocratização que

caracteriza o que chama de “Estado-nação ocidental”. Para nós, interessa a

consideração de que o processo de construção desse tipo de comunidade política

passa necessariamente pela possibilidade de afirmação de uma autoridade pública

legítima, com base na burocracia, abrangendo o reconhecimento de direitos básicos

para os membros dessa comunidade política e o domínio de todo o território a ela

subordinado.

Para este raciocínio, o autor recupera o rompimento das relações tradicionais

entre as classes numa situação pré-moderna e a emergência de uma “autoridade

individualista” que passará a conviver com reivindicações e protestos em favor da

igualdade de direitos para os cidadãos e com a necessidade de codificação desses

direitos e correspondentes deveres. Na busca por legitimidade, fez-se urgente a

entrada das classes baixas na arena política através da permissão para

agrupamentos em associações e da ampliação dos sistemas de educação básica.

É neste momento que Bendix fala da constituição de uma burocracia estatal

fundada na hierarquia, impessoalidade e regulamentação legal e administrativa que,

composta por funcionários distantes das relações tradicionais, permite a

legitimidade e o alcance nacional da autoridade. Assim, o autor pode sintetizar o

que entende como principal característica do Estado moderno: a simbiose

construída entre Estado e nação através da simultaneidade e reciprocidade entre a

burocratização da autoridade pública e a extensão dos mecanismos de cidadania.

Se Tilly tinha entendido a construção do Estado e a construção nacional como

processos a princípio independentes, unidos em contextos específicos (e no caso

europeu, surgido a partir da necessidade do Estado legitimar-se para extração de

recursos através do consentimento dos seus membros), diferentemente de Bendix

que o concebe simultaneamente à idéia de nação, o fato é que ambos concordam

com a peculiaridade da moderna organização política européia denominada Estado

nacional. O primeiro sendo visto como sistema burocrático administrativo impessoal

e legalmente regulamentado enquanto o segundo, que legitima e completa o

primeiro, sendo entendido como o adjetivo que denota um grupo populacional

assistido em ampla maioria por direitos de cidadania.

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A equação que iguala a nação ao Estado e ao povo, tendo este surgido com a

adjetivação de “povo soberano”, foi apresentada por Hobsbawm (1990, p. 32) ao

considerar os marcos da Revolução Francesa. Entretanto, com o avançar do século

XIX, as construções teóricas burguesas a respeito do Estado nacional passaram a

dar importância fundamental a temas como etnicidade, língua comum, religião,

território e lembranças históricas comuns. Foi na esteira da expansão do liberalismo

na Europa, que a idéia de nação acabou por ser tomada como bandeira para a

organização de comunidades políticas marcadas pela unidade e pelo estatuto

constitucional. Unidade esta conseguida, em todos os seus níveis, através de uma

substancial carga simbólica caracteristicamente nacional e menos dinástica ou

religiosa como observado nas comunidades que, de acordo com a clássica

formulação de Benedict Anderson, tendem ao declínio com o advento na nação,

“uma comunidade política imaginada, e imaginada como implicitamente limitada e

soberana” (ANDERSON, 1989, p. 14).

De todas estas considerações, observamos que “é muito recente a invenção

da nação, entendida como Estado-nação, definida pela independência ou soberania

política e pela unidade territorial e legal” (CHAUÍ, 2000, p. 14). Ao seguir os estudos

de Hobsbawm, a autora nos informa que a nação é nascida por volta de 1830 na

Europa e que antes os termos políticos mais comumente empregados eram os de

povo e pátria.

Daquele historiador, Chauí se refere especificamente à periodização proposta

a respeito da invenção histórica do Estado-nação, do aparecimento da nação no

vocabulário político europeu e de suas mudanças nos momentos seguintes a partir

de três etapas. De 1830 a 1880, fala-se em “princípio da nacionalidade” (princípio

que definia quando poderia ou não haver uma nação ou um Estado-nação); de 1880

a 1918, tem-se a “idéia nacional” (quando o Estado, precisando mobilizar a

população a seu favor, lança mão de uma espécie de religião cívica: o patriotismo);

e de 1918 aos anos 1950-60, surge a “questão nacional” (quando observa-se a

consolidação de formas até extremadas de nacionalismos que, através das

comunicações de massa, transformava símbolos nacionais em parte da vida

cotidiana dos diversos indivíduos).

Aqui, é importante observar que:

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Nesta periodização, a primeira etapa vincula nação e território, a segunda a articula à língua, à religião e à raça, e a terceira enfatiza a consciência nacional, definida por um conjunto de lealdades políticas. Na primeira etapa, o discurso da nacionalidade provém da economia política liberal; na segunda, dos intelectuais pequeno-burgueses, particularmente alemães e italianos; e, na terceira, emana principalmente dos partidos políticos e do Estado (CHAUÍ, 2000, p. 16).

Ainda, segundo a autora, o ponto de partida dessas elaborações foi o

surgimento do Estado moderno da “era das revoluções”, definido por um território

contínuo, com limites e fronteiras estabelecidas e que agia política e

administrativamente sem sistemas intermediários de dominação, precisando ainda

do consentimento prático de seus “cidadãos válidos” para as políticas fiscais e

ações militares. Neste intuito, este Estado precisava enfrentar dois problemas

principais: de um lado, incluir todos os habitantes do território na esfera da

administração estatal e de outro, obter a lealdade dos habitantes ao sistema

dirigente, uma vez que a luta de classes, a luta no interior de cada classe social, as

tendências políticas antagônicas e as crenças religiosas disputavam essa lealdade.

A autora constata que, para dar a essa divisão econômica, social e política uma

forma de unidade indivisa, surge a idéia de nação tomada como solução.

Nação esta nos moldes apresentados até aqui em sua simbiose com o Estado.

No entanto, percebemos ser este Estado nacional uma resultante absolutamente

contingencial e singular do ponto de vista histórico e esta percepção é essencial

para observarmos que em grande parte do Terceiro Mundo o nacionalismo nutriu

um forte movimento anticolonial que, contraditoriamente, não se esforçou para

redefinir algumas das estruturas mais marcantes do período anterior. Também há

de se verificar que as pré-condições indicadas por Tilly e Bendix para a construção

do Estado moderno na Europa, por suas especificidades, não existiam nestes

arranjos sociais, tendo estes distintos pressupostos para a sua formação.

Na América Latina, a formação dos Estados Nacionais caracterizou-se por uma

série de lutas internas em defesa do unitarismo ou federalismo (disputa observada

no Brasil quando do seu período regencial) em um momento no qual se processava

a organização dos exércitos. Por questões estruturais diferentes do momento

europeu, a realidade política ou social entre as ex-colônias espanholas na América

(ver Mapa 1 a seguir) também não pode ser tomada a partir de afirmações gerais no

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pós-independência. E as razões para tal fato decorrem de quatro importantes

questões:

Mapa 1: América Latina em 1830

Fonte: BETHELL (2001, p. 266).

1) A diversidade étnica dos novos países era imensa e no caso da Bolívia,

Peru, Equador, Guatemala e, em menor grau, do México, poucos traços do grande

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contingente indígena foram assimilados pela cultura espanhola dominante. Ainda

mais, “nas sociedades em que a classe baixa era composta muito mais de pessoas

distintas em termos culturais da elite hispânica, era pequena a possibilidade de essa

classe envolver-se ativamente na política” (SAFFORD, 2001, p. 329); 2) A variação

geográfica da América espanhola, uma vez que, sem determinismos, nos países em

que a maior parte da população estava localizada em regiões costeiras (como na

região do rio da Prata, no Chile e na Venezuela) houve uma maior estabilidade

econômica e política decorrente da estreita relação com o mercado europeu e da

arrecadação de taxas de alfândega sobre os produtos comercializados ao passo

que esta dinâmica foi menos observada nos países em que grandes parcelas de

suas populações viviam isoladas em áreas montanhosas (como no caso do México,

da Guatemala e dos andinos); 3) As diferenças na herança colonial notadamente no

que se refere à importância da Igreja católica, mais presente na vida cultural e na

estrutura política e econômica de países como o México (de colonização mais

antiga e de grande importância durante todo o período de dominação espanhola) do

que em regiões de desenvolvimento mais recente como a Venezuela e os países da

bacia platina, onde o poder e os privilégios que a Igreja havia conquistado no

período colonial foram mais facilmente reduzidos ou eliminados com os processos

de independência; e 4) Aos distintos papéis desempenhados pelos militares das

colônias espanholas no campo da política sobretudo quando da independência, pois

no Peru e, principalmente, no México boa parte dos oficiais era composta por

criollos treinados pelos espanhóis às vésperas da separação que mantiveram suas

posições e organizados em grupo coorporativo, defendiam interesses de classe com

ativa participação na cena política. Em outros países, mesmo que com resultados

distintos, o exército foi desarticulado e reestruturado nos momentos seguintes à

independência.28

Compreender, portanto, a constituição das nações no nosso continente requer

passar por uma variedade de situações, procurando o específico e o geral em cada

uma. Além do mais, segundo os estudiosos da temática, o que se tem produzido diz

mais respeito ao plano da política estritamente nacional, geralmente obedecendo ao

28 Safford (2001, p. 330-331) cita que na Venezuela os oficiais heróis da independência, apesar das reivindicações, nunca atuaram efetivamente como grupo de interesse coorporativo, enquanto que no Chile e em Nova Granada os militares que haviam comandado o processo de separação logo se submeteram à elite econômica civil. Por sua vez, na Argentina, o exército profissional havia sido desarticulado por inteiro nos combates com os grupos milicianos locais.

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recorte da capital do país considerado e deixando para se estudar a análise das

idéias expressas pela elite em inúmeros materiais impressos. Não formam ainda um

conjunto sólido os estudos do processo político no plano local, dos grupos e

interesses em jogo ou de lutas pelo domínio do Estado nacional. E este, na maioria

dos casos, era extremamente fraco, com receitas limitadas e exércitos pouco mais

fortes do que as forças que eventualmente poderiam ser reunidas nas províncias

constituídas.

Como visto no Mapa 1, no contexto geral de emancipação política, as antigas

colônias da América Espanhola passaram por um processo de fragmentação

enquanto o Brasil conseguiu, a despeito das imensas diferenças regionais, manter

seu território intacto. Na discussão deste fato, Bethell (2001b) diz que uma

consciência de autodeterminação política e econômica desde fins do século XVIII se

fez menos presente aqui do que nas demais colônias do continente. Ao investigar

os pressupostos da independência brasileira, lança luz nesta questão e na relação

que a produção da colônia representava no conjunto da economia lusa.

Para ele, o principal fator responsável pela manifesta prosperidade da

metrópole no início do século XIX foi o crescimento das exportações agrícolas

brasileiras de açúcar e algodão em volume e em valor desde o último quarto do

século XVIII. A este tempo, a produção brasileira respondia por 80% das

exportações realizadas pelas colônias portuguesas e cerca de 60% do que Portugal

reexportava para os demais centros europeus. Também em termos demográficos, o

Brasil começava a apresentar números superiores ao da metrópole e, no final do

século XVII, contava com cerca de 2,5 milhões de habitantes de acordo com as

estimativas mais modestas. Citando Robert Southey em seu Journal of a residence

in Portugal 1800-1801, o autor escreve que “um galho tão pesado, não poderia ficar

preso por muito tempo a um tronco tão podre” (BETHEL, 2001b, p. 192),

descrevendo Portugal no período em que a Inglaterra expandia a sua Revolução

Industrial como um país atrasado em termos econômicos, isolado culturalmente em

relação à Europa, com limitados recursos naturais em seu próprio território e com

um modesto poderio militar e naval.

Neste contexto de grande peso da produção das colônias portuguesas,

sobretudo do Brasil, na composição das rendas da Coroa, surgia um senso mais

agudo de insatisfação com a tutela econômica e política de Portugal (além da

hostilidade interna entre os brasileiros nativos e os portugueses, que ocupavam a

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maioria dos altos cargos do governo e monopolizavam o comércio ultramarino e

local) e com a própria situação de colônia, uma vez que ficava evidente o relativo

atraso econômico da metrópole em relação à sua mais importante possessão.

Conflitos reais e potenciais com Portugal começavam de fato a ser perceptíveis.

No âmbito das colônias espanholas e inglesas da América, este senso de

identidade em importantes setores da oligarquia colonial branca e nativa vinha se

desenvolvendo durante toda a segunda metade do século XVIII, mesmo que com

traços distintos da realidade brasileira. Aqui, o autor afirma que segundo a tese de

estudiosos, os colonos tinham vínculos mais estreitos de interesse com a metrópole

do que os criollos nas demais colônias do continente fazendo com que houvesse

menos motivos de insatisfação com o controle português (fato que não impediu a

ocorrência de importantes movimentos reivindicatórios, acarretando em um

processo de independência ímpar no contexto do continente). Tais razões podem

ser enumeradas da seguinte forma: 1) A oligarquia brasileira do período era ainda

iniciante, não tendo raízes muito antigas ou consolidadas enquanto classe. Poucas

famílias de fazendeiros tinham suas origens relacionadas aos donatários do século

XVI; 2) O governo colonial português não foi tão opressivo como a Espanha em

suas colônias. Aqui, alguns brasileiros natos chegaram a ocupar postos de nível

médio no aparato burocrático e até cargos de magistrados da coroa e governadores

em diversos territórios do império português, além de funções administrativas no

próprio Portugal. Diferente da Espanha, os portugueses governavam com o

intermédio das classes dominantes locais que atuavam na aplicação das políticas

da metrópole e estabeleciam um status quo em que as contestações eram raras; 3)

O Brasil colonial não possuía universidades (nem mesmo imprensa) de tal forma

que os vínculos pessoais e familiares entre setores das elites brasileiras e

portuguesas eram estreitados por conta de uma formação intelectual comum; 4) A

base escravista da sociedade colonial brasileira fazia com que a maior parte da

população da colônia fosse constituída por negros (cativos ou libertos) o que gerava

um grande desconforto para a minoria branca no que se refere aos riscos de uma

convulsão racial e social, aceitando o governo português como instrumento para o

controle social desejado; 5) A economia agrária e exportadora da colônia fazia com

que os grandes senhores de lavouras mantivessem estreitos laços com os

comerciantes da metrópole, elos com o mercado europeu e com o comércio

atlântico, inclusive de escravos (um empreendimento predominantemente

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português). Ressalta-se aqui uma diferença desta estrutura em relação à verificada

nas colônias espanholas que, através dos hacendados, eram dinamizados o

comércio interno e a economia doméstica; e 6) A reorganização imperial que

Portugal executou na segunda metade do século XVIII acabou beneficiando muitos

brasileiros que lucraram com o confisco dos bens dos jesuítas após a sua expulsão

e com a expansão do aparato burocrático e militar, abrindo novas oportunidades de

inserção da população local nos quadros e nos negócios públicos.

Assim, para Bethell, tais aspectos explicam porque no Brasil uma consciência

de autodeterminação política e econômica desde fins do século XVIII se fez menos

presente do que nas demais colônias da América espanhola. É verdade que a

separação das colônias do continente americano de suas metrópoles (Inglaterra,

Espanha e Portugal) é entendida pela crise econômica, política e ideológica do

sistema colonial no mundo atlântico no final do século XVIII e inicio do XIX, no

entanto no Brasil a independência muito se deveu às repercussões dos

acontecimentos políticos e militares que ocorriam na Europa naquele momento. Se

é condizente afirmar que o Brasil caminhava para um confronto direto com Portugal

desde 1808, quando recebeu a família real e alçou posto de sede da capital do

reino, também é importante observar que até 1820 não havia um sentimento sólido

de separação total entre ambos. Neste sentido, as revoluções portuguesas de 1820

(com o retorno de D. João VI a Lisboa) e a determinação de Portugal de reverter as

conquistas que o Brasil experimentara desde 1808 foram também os motivos que

fizeram com que as elites brasileiras abraçassem a causa da independência.

Diferentemente do que ocorreu nas demais colônias da América espanhola

(onde a luta pela independência durou anos e contou com episódios de violência e,

sobretudo, onde a separação resultou na fragmentação do território em variados

países que adotaram o sistema republicano federalista), o processo de

independência no Brasil foi marcado por um grau extremado de continuidade

política (D. Pedro I e as elites assumiram o aparato burocrático do Estado português

sem grandes alterações), econômica (mantiveram-se o modo colonial de produção

e o papel do Brasil na divisão internacional do trabalho, alterado com a substituição

de Portugal pela Inglaterra no posto de principal parceiro comercial do Brasil) e

social (não houve rebeliões que chegassem a alterar a ordem vigente e nenhuma

concessão importante foi dada aos setores menos privilegiados, mantendo-se

intacta, inclusive, a base escravista da sociedade). Tratou-se, portanto, de uma

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revolução conservadora, ou mesmo, nos dizeres de Bethell (2001b), de uma

“contra-revolução”.29

Um outro aspecto a ser observado faz referência ao papel da Igreja no

processo de independência da América e a sua situação no período seguinte. Aqui,

encontramos novamente diferenças entre o ocorrido nas ex-colônias espanholas e

no Brasil. Em meio à revolução conservadora que foi a sua independência, a

continuidade nas questões eclesiásticas também foi observada tal como nas de

ordem econômica, política ou social. Não houve no Brasil um anticlericalismo liberal

e agressivo no pós-independência como verificado nos países vizinhos e, ao

contrário, Roma não tardou em reconhecer a transferência do padroado do rei de

Portugal para o imperador brasileiro, assegurando o Catolicismo como religião de

Estado.

É ainda Bethell (2001a) quem afirma que uma considerável parte da hierarquia

da Igreja no Brasil era composta por brasileiros natos e que muitos defendiam a

causa fundiária, a questão nativista e a manutenção da monarquia sob manto de D.

Pedro I. Também há que se observar que a instalação da Corte no Rio de Janeiro

acabou por isolar o Brasil dos conflitos políticos e ideológicos que varriam a Igreja

hispano-americana no período pós-independência. A partir destes fatores, o autor

afirma que a Igreja acabou por congregar fortes elementos para manter-se sólida

como instituição do Império sem sofrer grandes percalços tal como vivenciado nas

recém-repúblicas do continente onde sofreu sérias baixas no seu pessoal e bens

econômicos.

Ali a Igreja de Roma emergira das lutas de independência muito enfraquecida,

uma vez que os seus laços com a coroa espanhola sempre foram estreitos e

marcados por lealdade incondicional. Diferente do que ocorrera no Brasil, a quase

totalidade da hierarquia católica nas colônias hispânicas era formada por bispos

peninsulares e identificados com os interesses da coroa, que tentava combater a

expansão dos ideais liberais que se propagavam pela Europa do período. Em um

intricado jogo de interesses, o alto clero tinha consciência da ameaça que

movimentos revolucionários representavam para a posição solidamente

estabelecida pela Igreja na estrutura política e administrativa do reino espanhol e,

29 Para Bethell (2001b, p.230), “(...) se considerarmos que o liberalismo radical (e o republicanismo) de 1789, 1798, 1817, 1821-1823 e 1824 fora enfrentado e derrotado, pode-se dizer que se tratou de uma contra-revolução”.

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como uma de suas ações mais difundidas, destituía das funções ou determinava o

retorno à metrópole todos os bispos distantes desta postura de lealdade.

Assim, a instalação das repúblicas na América espanhola representou um forte

golpe para a Igreja católica tanto em relação ao seu prestígio político quanto à sua

influência ideológica. Os novos tempos trouxeram uma legitimação para as

mudanças em curso baseadas não mais no pensamento político católico, mas na

filosofia da era da razão referida ao utilitarismo de Bentham que oferecia um sólido

suporte intelectual para o republicanismo e uma filosofia alternativa de vida

(BETHELL, 2001a). Uma situação de ordem prática acentuou um certo desmonte da

Igreja Católica naquele período: muitos bispos comprometidos com a causa da

metrópole decidiram ou foram impelidos a retornar, deixando vagas muitas sedes

episcopais30. Por outro lado, Roma recusava-se a cooperar imediatamente com os

novos governos ou se via envolta em uma certa inércia administrativa motivada

pelas três mudanças do papado em um período curto de tempo (1823-1831).

Apenas a partir deste momento, a Igreja em vários países da América iniciou um

processo de reorganização administrativa, ocupando gradativamente os cargos em

aberto e reintegrando as estruturas eclesiásticas nos níveis inferiores ao

episcopado.

Mesmo reconhecendo o catolicismo como religião oficial, os novos governos

da América espanhola adotaram a tolerância religiosa como princípio e, algumas

vezes, uma legislação hostil para com Roma (como no caso de Bolívar e Sucre). O

liberalismo instalado nas ex-colônias afirmava a supremacia do Estado secular e a

liberdade de pensamento como forma de superar o poder temporal e a influência da

Igreja como premissas para se atingir a pretendida modernização política,

econômica e social. Como forma de resistência, Roma instruía seus bispos a

mobilizarem as forças conservadoras locais de maneira que, podemos afirmar, foi

30 É Bethell (2001a, p. 270) quem nos traz alguns dados deste quadro: Para a região que inclui atualmente o Equador, Peru, Bolívia, Chile e Argentina, havia apenas um único bispo legítimo em 1825. Toda a extensão do México e da América Central não contava com nenhum bispo na maior parte do ano de 1829. Inúmeras dioceses ficaram vagas por períodos que vão de uma ou duas décadas (como Caracas, 1817-1827; México, 1824-1839; Guatemala, 1830-1844; Lima, 1822-1834; Buenos Aires, 1813-1833; e Santa Cruz, 1813-1835) até mais de trinta anos (como Cuenca, 1814-1847 e Córdoba, 1816-1857). De uma forma geral, a Igreja perdeu no período quase 50% de seu clero secular e para o regular mais do que este percentual. Diminuíram expressivamente o número de ordenações nos diversos países, chegando inclusive a não ocorrer nenhuma em alguns casos (como na província franciscana de Lima durante todo o período 1821-1837). O retorno de muitos religiosos à Espanha no período pós-independência e a hostilidade para com a Igreja fizeram com que 25 de um total de 41 conventos existentes na Bolívia fossem fechados no primeiro ano da república.

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este contínuo embate entre Estado liberal e Igreja Católica que marcou o segundo

terço do século XIX em toda a América de origem espanhola. Em alguns casos,

como no México, esta questão política assumiu contornos de guerra civil de grandes

proporções em um quadro marcadamente distinto daquele observado no Brasil

(onde um conflito entre a Igreja e o Império foi verificado apenas a partir da década

de 1870 e em meio a um questionamento do poder monárquico por parte de outros

segmentos da sociedade).

Até aqui, procuramos distinguir mais o processo de emancipação política

observado no Brasil em relação àqueles ocorridos em seus vizinhos do que

considerar especificamente a natureza do projeto nacional implantado na ex-colônia

portuguesa. Pensamos ter sido necessário tal caminho para as reflexões que se

seguem a respeito de temas como o grau de pertencimento da população brasileira

à comunidade nacional, os vários critérios de definição da nacionalidade ou os

padrões de relacionamento entre Estado, sociedade e o território.

Os primeiros trabalhos sobre a construção da nação no Brasil ainda estavam,

segundo Botelho (1988) vinculados ao tema do nativismo, próximo de um

protonacionalismo tal qual nos moldes defendidos por Hobsbawm (1990)

estabelecendo um continuum que vai até meados do século XIX, quando o tema da

nacionalidade aparece, sobretudo associado à literatura e à produção intelectual de

modo mais amplo. Alguns trabalhos abordam a questão ao tratar do período da

Independência, quando vários conceitos de nação estiveram em debate. Após esse

momento, o processo de construção da nação brasileira passa a ser quase que

exclusivo do aparelho estatal imperial (e, portanto, sem maiores questionamentos),

voltando a ter uma discussão crítica por parte dos cientistas sociais a partir da

década de 1870. Para o autor, tal período é visto como uma ruptura tanto do ponto

de vista da produção intelectual como das próprias possibilidades de difusão de

sentimentos de nacionalidade em camadas mais amplas da população,

consolidando-se a difusão de uma identidade nacional apenas ao avançar do século

XX.

Consideremos, a partir de agora, mais especificamente o rebatimento destas

questões no Brasil do século XIX e, em especial, as suas relações com a questão

do território. Assim, em uma primeira aproximação, observamos que no caso

brasileiro a idéia de imaginação é central como ferramenta explicativa da construção

ideológica e material da nação no que diz respeito, sobretudo, às concepções de

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patriotismo e ao estabelecimento das fronteiras do Império. Parece-nos que tal idéia

tem o mesmo significado de invenção para Hobsbawm e Ranger (1984) e confirma

a expressão “comunidade imaginada” de Anderson (1989).

Em seus escritos, Magnoli (1997) não contrapõe ideologia à imaginação/

imaginário, mencionando uma “ideologia nacionalista” para denominar a invenção

de tradições nacionais que ancorariam a legitimidade da nação no imaginário de um

passado a ser superado. Refere-se também ao termo ao lembrar do expansionismo

norte-americano e da sua noção de “fronteira” como imaginação espacial e

identitária, compreensão geográfica e concepção de grupo no tempo através da

premissa de “destino manifesto”.

Ainda sobre esta representação, comenta que o uso pela elite imperial da

lenda geográfica da “Ilha Brasil” apoiou a construção de “um edifício ideológico

verossímil” que discursava em prol de um nacionalismo que operou como alicerce

para a idéia de que as instituições do Império tinham uma “ideologia imanente” ao

contrário daquilo que o passado mostrava em variados aspectos. Por outro lado,

afirma também que a força da idéia de fronteiras naturais emana não de

considerações racionais, mas de “consensos imaginários” que influem sobre o real

no que se relaciona à questão das políticas de cunho territorial, tratadas como

assunto de soberania.

Sobre esta idéia seminal que inspirou a concepção imaginária da

nacionalidade brasileira, é válido destacar que pressupunha:

(...) a existência, na América do Sul, de um todo geográfico e geometricamente definido e quase insulado, o qual comporia o território natural do Brasil. Tal narrativa, inspirada em relatos e mapas de viajantes, funcionou como mito de origem da nação. Segundo ela, o Brasil seria uma unidade natural, herdada pela colonização portuguesa e consagrada pela independência. Desta forma, o conceito de território brasileiro antecipou-se à emergência do próprio Estado nacional (OLIVEIRA, 2008, p.3).

Cabe observar que a doutrina das fronteiras naturais valeu-se de categorias

aparentemente opostas, como neste caso ideológico-imaginário, mas que

estabeleciam campos comunicantes para cada uma delas. Nestes termos, Magnoli

(1997 e 2003) afirma que a ideologia está sempre ligada à necessidade de

legitimação do poder e o imaginário não é cerceado por esta necessidade, pois

independe em seu surgimento de comprovações racionais e compõe um corpus

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assistemático e indeterminado de figuras, formas e imagens do qual a ideologia

pode e precisa (por conta de seu enraizamento entre as pessoas) servir-se para

cumprir sua função legitimadora.

Além do mito da Ilha Brasil, o de uma língua geral dos indígenas, referência de

uma unidade cultural ameríndia que daria ao território brasileiro um caráter de

unidade anterior aos portugueses, é outra idéia que colabora fundamentalmente

com a legitimação da nacionalidade, por contribuir para que fosse estendida ao

passado. Magnoli argumenta que esta idéia corresponde mais aos desejos e

realizações dos jesuítas, interessados em uma língua com a qual pudessem se

comunicar e evangelizar índios de variados grupos culturais e lingüísticos. Com

isso, os jesuítas acabaram tornando concreta a presença dessa língua, por utilizá-la

e ensiná-la em tribos de troncos lingüísticos diversos.

Com estas referências do período colonial, o autor dedica especial atenção ao

estudo da formação das fronteiras e de seu componente ideológico: um patriotismo

que, no Império, teria a função de garantir a unidade da nação recém instituída e

criar uma identidade nacional em sintonia com as iniciativas geopolíticas e

diplomáticas. É neste sentido que, revogando os mitos aqui mencionados, uma das

principais idéias postas à disposição do poder imperial era a da nação brasileira

preexistente, mas oculta sob o manto português que se apresentava à História a

partir da Independência. No que nos interessa em particular, observemos que esta

imagem tinha a missão de subordinar e submeter os processos revolucionários

separatistas e republicanos (ou monarquistas em alguns casos como a guerra pela

Independência na Bahia) que se tornaram constantes, sobretudo no período

1831/1848. Estes movimentos, já enumerados nesta tese, eram considerados pelos

poderes imperiais como ameaças ao rumo glorioso da nação tal qual seu discurso

pregava.

Ainda no que concerne à fundação imaginária e simbólica da nacionalidade

brasileira, lembremos de Marilena Chauí quando nos fala que:

Para realizar tal tarefa, o poder político precisa construir um semióforo fundamental, aquele que será o lugar e o guardião dos semióforos públicos. Esse semióforo-matriz é a nação. Por meio da intelligentsia (ou de seus intelectuais orgânicos), da escola, da biblioteca, do museu, do arquivo de documentos raros, do patrimônio histórico e geográfico e dos monumentos celebratórios, o poder político faz da nação o sujeito produtor dos semióforos nacionais e,

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ao mesmo tempo, o objeto do culto integrador da sociedade uma e indivisa (CHAUÍ, 2000, p. 14).

A questão aqui envolve imagem e representação e, como fica evidente nas

palavras da autora, o poder político aparece como agente principal na sua produção

e reprodução. Se voltarmos à discussão dos mitos tal qual Magnoli nos apresentou,

vale ressaltar um trecho onde diz que:

A crítica da narrativa mitológica só pode ter sucesso se, antes de tudo, for capaz de definir adequadamente o seu objeto, que é um relato historiográfico. É esse relato, e não uma suposta verdade empírica escondida, que deve ser iluminado e desvendado. Ele tem de ser encarado como um fenômeno histórico, cujas raízes encontram-se nas formas específicas de constituição do Estado brasileiro. Para isso, é preciso levá-lo a sério, tratando-o como é: um mito de fundação. (...) o alvo da crítica não é o de contar uma outra história - uma história verdadeira - da nacionalidade, mas o de contar a história da narrativa (MAGNOLI, 1997, p. 290-291).

Destas considerações, constatamos o papel central do Estado na construção

da narrativa da nação brasileira e, assim, confirmamos a assertiva de Hobsbawm

(1990) na qual “as nações não fazem Estados e nacionalismo, mas o contrário”.

Apenas a título de exemplo, Graham (1997), ao observar em parte de seu livro a

questão dos Estados-nacionais no contexto da América Latina, cita o historiador

chileno Mario Góngora ao afirmar que naquele país também “a nação não teria

existido sem o Estado, que o moldou através dos séculos XIX e XX” e cita William

Taylor e Brian Hamnett para dizer que o mesmo ocorreu no subcontinente como um

todo.

Sobre a questão da centralização no Brasil promovida pelo Estado, Barman

(1988) declara que a unidade nacional foi, em grande parte, criada por um governo

central e Sérgio Buarque de Holanda destaca que “a unidade nacional (...) estará ao

ponto de esfacelar-se nos dias que imediatamente antecedem e sucedem à

proclamação da Independência. Daí por diante irá fazer-se passo lento de sorte que

só em meados do século pode dizer-se consumado” (HOLANDA, 1962, p. 16).

Ao contrário de Magnoli, Graham (1997) diz que a identificação com a unidade

territorial certamente não foi predeterminada no Brasil que, nunca havia tido tal

característica durante a Colônia. E continua: depois que a separação entre o Estado

do Maranhão e o Estado do Brasil foi abolida em 1772, muitas das 14 (mais tarde

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18) capitanias continuavam a relacionar-se diretamente com a metrópole. Elas

prestavam contas diretamente ao rei em Lisboa e desconsideravam o Governador

Geral ou Vice-rei, no Rio de Janeiro, que permanecia como um primeiro entre pares,

diferenciado mais por seu título do que por sua jurisdição maior. Com cada capitania

voltada para as exportações à Europa, poucas conexões econômicas as ligavam

entre si e a comunicação das capitanias do norte com Lisboa era mais fácil do que

com o Rio de Janeiro. Para o autor, não existiu nenhuma cidade centralizadora na

América portuguesa, assim como não existiu nenhuma na América espanhola como

um todo.

Sendo assim, os precursores do movimento de independência no país, em

conspirações tramadas em Minas Gerais, em 1789, e na Bahia, 1798, tentaram

libertar do domínio português somente aquelas áreas e não visaram a

independência de um todo unido e maior. Alguns autores, inclusive, afirmam

freqüentemente que, quando o governo português se transferiu para o Rio de

Janeiro, em 1808, tornou-se o Brasil de fato independente, especialmente porque

declarou a abertura dos portos para comercializar com outra nação e pôs fim ao

monopólio colonial de comércio ultramarino, que estava nas mãos das casas de

comércio portuguesas. A este passo, destruiu-se uma característica determinante

da relação colonial anterior. Mas tal afirmativa, uma vez mais, pressupõe que o

“Brasil” já existisse. Ao contrário, não importando o quanto algumas pessoas, em

cada uma das capitanias anteriores, desejassem a liberdade conseguida do controle

de Lisboa, elas não se regozijavam em ser governadas a partir do Rio de Janeiro.

Em 1815, um observador francês disse que o Brasil era apenas “a designação

genérica das possessões portuguesas na América do Sul” (citado por HOLANDA,

1962, p. 16).

No entanto, é sabido que uma rebelião republicana separatista irrompeu em

Pernambuco, em 1817 e, apesar de reprimida em poucos meses por tropas leais

vindas de outras regiões, revelou um sentimento regionalista profundo. Quando, em

1820, foi exigido o retorno do rei D. João VI a Portugal, as províncias do norte do

Brasil aprovaram a sua ida enquanto importantes atores sociais do sul insistiam na

sua permanência em terras brasileiras. Quando seu filho declarou a Independência

do Brasil, a maior parte das províncias do norte foi contra e permaneceu leal a

Portugal até defrontar-se com uma força vinda do Rio de Janeiro. A unidade do

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Brasil pareceu duvidosa para os contemporâneos, e historiadores que a tem

explicado desde então desconsideram a “desunião” que ocorria no território colonial.

Graham ainda nos fala que historiadores nacionalistas recorreram a certos

contorcionismos para explicar esses fatos. Na opinião de Oliveira Lima, foi a corte

portuguesa que “fomentou (...) a desunião (...) privando (o Brasil) de seu centro

natural de atração, que era a capital consagrada por D. João VI”. José Honório

Rodrigues, que argumenta vigorosamente pela pré-existência de uma nação

brasileira unida, descartou esses eventos, considerando-os como sem importância:

“Somente a minoria dirigente de umas poucas províncias não teve a sensibilidade

histórico-política de sentir que o Brasil era singular, único, individual, diferente de

Portugal”. Contrasta ainda os “verdadeiros brasileiros”, aqueles que resistiram ao

domínio português, dos “brasileiros infiéis”, que perpetraram tantas “traições”. Por

fim, reforça Graham, forças do sul cumpriram “a obra de ajuda aos patriotas” em

sua batalha para unir-se à nação. Na visão contrária de Barman, mesmo o fato dos

grupos do sul terem declarado sua aliança a D. Pedro I em meados de 1822, não

implicariam no “triunfo do nacionalismo”, denotando simplesmente a preferência por

uma promessa de autonomia local ao invés do domínio português. Afirma ainda que

a unidade do país não se destacava entre suas aspirações na época.

Observemos ainda que depois de D. Pedro I coroado imperador e da expulsão

das forças portuguesas, ele ainda enfrentou resistência local. Barman nos informa

que o líder da revolta pernambucana de 1824, Frei Caneca, afirmou que o Brasil

havia se tornado “independente, não apenas como um todo, mas em cada uma de

suas partes ou províncias, e estas, independentes uma das outras (...) Uma

província não tem o direito de forçar qualquer outra província a fazer nada”

(BARMAN, 1988, p. 121). E continua dizendo que o embaixador britânico, no Rio de

Janeiro, em 1826, acreditava numa provável fragmentação do Brasil, uma vez que

“grande parte da população daquelas províncias distantes (do Pará e do Maranhão),

e até mesmo do Pernambuco e da Bahia estava contra o governo imperial e

inclinada (...) a separar-se dos estados do sul” (BARMAN, 1988, p.121 citando Frei

Caneca).

Tais observações fazem com que um período específico da História do Brasil

desperte interesse especial dos estudiosos no que se refere à sua dimensão

espacial. Aqui, falamos do intervalo que vai da abdicação forçada de D. Pedro I,

quando o país parecia desintegrar-se, até meados do século XIX quando, para

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muitos, consolidava-se um Império com líderes locais vinculados a outros através

de todo o território. Discutiremos a seguir esta mudança a partir de autores como

José Murilo de Carvalho, Caio Prado Junior, Fernando Novais e Carlos Guilherme

Mota, além de Ilmar Rohloff de Mattos.

Carvalho (1988) discute essa questão, observando a formação ideológica e

intelectual comum de uma elite política. Ele lembra que, diferentemente da situação

na América espanhola, onde numerosas universidades treinavam profissionais

locais, nenhuma universidade existia no Brasil colonial. No início do regime

independente no Brasil, dependia-se de homens educados na Universidade de

Coimbra, em Portugal, para administrar a burocracia do Estado e desempenhar as

funções do judiciário, contando assim com funcionários e burocratas que tinham alta

estima por uma autoridade central firme. Sua educação também enfatizava

obediência para com a figura real (tido como o juiz supremo, próximo ao próprio

Deus), pois como um ex-aluno relembrara “o direito de resistência, este baluarte da

liberdade, era inteiramente proscrito; e desgraçado de quem dele se lembrasse!”

(CARVALHO, 1988, p. 51).

Atento ao fato de que muitos brasileiros letrados já haviam servido ao antigo

regime em Portugal, na Índia ou África e no Brasil, o autor argumenta que tal

formação e experiência explicam a unidade frágil do Brasil, não somente a elite

nacional, mas advogados e juízes haviam recebido uma formação no direito romano

e compartilhavam uma crença nas virtudes do poder centralizado e no que tem sido

chamado de “ditadura monárquica”. Observamos que, como funcionários do Estado,

criaram uma nação.

A interpretação de Carvalho tem a vantagem de não transformar o Estado em

objeto, mas suscita uma questão que nos remete a aceitação da visão política

desses homens por parte da elite econômica de tantas regiões diversas e os

interesses materiais em jogo nesse processo. E esta questão nos leva para o

segundo eixo interpretativo que relaciona uma classe dominante ao controle do

Estado. Em um extremo do espectro, Prado Júnior (1975), em livro publicado pela

primeira vez em 1933 e que se tornou referência para gerações de historiadores

brasileiros, declara que a independência resultou unicamente do interesse da classe

agrícola em livrar-se dos portugueses. Os eventos na Europa (invasão napoleônica,

a fuga da Corte para o Brasil e, posteriormente, as tentativas de imposição sobre a

colônia por parte das cortes portuguesas) explicam o modo mais ou menos pacífico

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da elaboração da independência e a ausência de uma longa guerra, uma vez que

esses acontecimentos deixaram a classe comercial portuguesa enfraquecida não

conseguindo manter seu controle exclusivo sobre o comércio colonial. Os

proprietários de terras e os escravocratas brasileiros emergiram triunfantes. Para o

autor, era deles o novo Estado.

Novais e Mota (1986) também enfatizam o triunfo dessa classe, mas ao invés

de apenas apontarem os mercadores portugueses como inimigos da independência,

enfatizam a própria natureza do sistema mercantilista nas Américas, visto que era

baseado no princípio do exclusivo comercial. Aquele sistema enfrentou uma crise

causada pelo próprio sucesso, pois havia criado uma classe de fazendeiros mais

próspera e exigente além de descontente com o monopólio colonial; havia

estimulado o crescimento do número de escravos, exigindo vigilância mais firme e

havia fomentado uma rivalidade entre os poderes imperiais e ex-imperiais que

encorajaram a Inglaterra olhar favoravelmente para a independência latino-

americana. Para estes autores, se a independência foi um processo decorrente das

exigências dos fazendeiros, segue-se que estes dominaram o Estado resultante.

Talvez o argumento mais criterioso e provocativo sobre as origens da coesão

nacional do pós-independência esteja em Mattos (1994) que procura demonstrar

como interesses de classes se uniram especificamente ao poder do Estado. O autor

se concentra no período de meados da década de 1830 até o início da década de

1860 e considera um bloco de fazendeiros de café da região do Rio de Janeiro,

recentemente enriquecidos, e liderado por um pequeno grupo de políticos/estadistas

ativos (ou saídos daquele bloco ou a ele ligados por laços de casamento).

Esforçando-se com sucesso para absorver líderes de outras regiões, chegaram a

constituir-se em uma classe única que se definia por sua oposição a outras classes,

especialmente aos escravos, mas também à plebe urbana rude e inquieta. Para ele,

essa classe senhorial abraçou uma ideologia da ordem desenvolvida e defendida

por advogados, juízes, jornalistas, professores, médicos, empresários, políticos e

burocratas, isto é, os “intelectuais orgânicos” (conceito trazido por Gramsci). Através

deste processo de formação de uma classe poderosa que dominava todo o Brasil,

prossegue o autor, emergiu um forte Estado centralizado. Mattos entende esse

Estado não apenas como aparato coercitivo, mas como instrumento de orientação

intelectual e moral. Por meio dele, a classe senhorial construiu sua unidade e

expandiu seu poder, tanto horizontalmente, por todo o território brasileiro, quanto

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verticalmente, sobre maiores segmentos da população livre, não impondo a

submissão, mas incorporando esses grupos à “civilização”.

Até aqui, procuramos considerar como as preocupações econômicas e sociais

contribuíram de maneira decisiva para assegurar a unidade do Brasil. Tais

interesses conduziram a aceitação de um Estado centralizado que contribuiu

decisivamente para a formação de uma nação. Interesses materiais e econômicos

forjaram um Estado centralizado e uma unidade nacional.

Ainda sobre o conturbado período na história imperial - o dos seguidos

movimentos revolucionários - cabe observar, ressaltando alguns aspectos, os

motivos que fizerem as elites locais e regionais aceitarem um comando centralizado

possibilitando a unidade territorial. Graham (1997) chega a falar em uma “desordem

social” que ameaçava mais as elites do que a centralização a partir do Rio de

Janeiro. Para ele, em esforços para sustentar auto-governos regionais ou a

independência completa do poder central, ficou gradualmente claro que abalar a

unidade do Império significaria enfraquecer a autoridade dos senhores de

propriedades sobre os escravos e sobre as classes inferiores em geral. É desta

constatação que o autor caracteriza o referido espectro de desordem social que

incomodava as elites.

Por outro lado, enfatiza que na maioria das revoltas do Brasil, exceto a do Rio

Grande do Sul, faltava coesão e controle. Ele descreve que, quando ocorriam

revoltas regionais, o caos se seguia, e a própria instituição da escravatura parecia

ameaçada. Assim, as elites políticas, que haviam exigido autonomia local mais

ampla, retrocederam e o curso das exigências foi mudado quando passaram a

apoiar uma série de medidas nacionais destinadas a fortalecer a autoridade central

e a limitar as liberdades regionais.

Passaram a temer a desordem mais do que se ressentiam da autoridade

central, pensando-a como uma maneira de prevenir aquela. A elite, nos diversos

pontos do Brasil, coadunou com as novas instituições por conta de aspectos inter-

relacionados como o seu envolvimento pelo discurso hegemônico, aspecto

lembrado por Mattos (1994), o fato de que tivera seus filhos instruídos sobretudo em

Coimbra, como enfatizou Carvalho (1988), e o compromisso com interesses

imediatos contra os quais trabalhavam os levantes revolucionários. Assim,

identificamos mais um aspecto para a anuência dos líderes regionais do Império em

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relação à autoridade central e à unidade territorial como pressupostos

fundamentais.

Seguindo Moraes (2002) dizíamos em outro momento deste trabalho que, nos

países de formação colonial, a dimensão espacial adquiriu considerável importância

na explicação de suas dinâmicas históricas, pois a própria colonização já estava

pautada na relação sociedade e espaço. A partir desta lembrança e dos tópicos

discutidos até aqui, destacamos que a questão da unidade territorial, necessidade

da nação, sugere que argumentos de índole geográfica (que nos remetem ao

campo das “ideologias geográficas”) legitimaram discursos de um Brasil também

como espaço a ser conquistado. E esta necessidade coloca em evidência uma outra

face do processo: a que nos mostra o padrão discursivo básico do século XIX

estruturado em torno do conceito de “civilização” e da empreitada monárquica em

sua missão civilizadora.

E, nesta nova frente, o papel dos núcleos urbanos é tomado como essencial.

Eles seriam vistos como espaço dos semióforos desejados mais do que pontos de

articulação das regiões e do Império como um todo. No entanto, para a discussão

da nação como projeto civilizatório e o papel dos núcleos urbanos como espaço dos

símbolos, é importante que observemos que a figura do Imperador oferecia

legitimidade em um ambiente onde os chefes locais tinham poder baseado em seus

recursos econômicos, alianças políticas ou na força, mas a autoridade dependia de

serem aceitos por seus possíveis seguidores como legitimamente investidos deste

poder. O status individual das elites brasileiras dependia, em larga escala, de

fatores não econômicos e poderia ser reforçada se derivasse do governo legítimo

de um monarca frente a uma ordem social profundamente hierarquizada.

A legitimação imperial e a efetivação da autoridade do monarca serviam aos

líderes locais melhor que uma república fragmentada. Neste sentido, é importante

frisar que suas ações fundamentaram uma proposta social de controle das classes

inferiores e também uma proposta política de dar legitimidade às suas influências.

Como disse Graham, “o governo central não foi imposto às pessoas influentes ou

até mesmo vendido a eles. Eles o escolheram” (GRAHAM, 1997, p. 12). E esta

escolha também considerava o fato de que a monarquia também lhes oferecia a

possibilidade e os meios pelos quais resolveriam suas diferenças sem minar a

ordem, uma vez que o imperador, juiz supremo em todas as ocasiões, tomaria as

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decisões aceitas por todos sem perda de prestígio. Neste sentido, é reveladora a

citação seguinte:

Ninguém [no Brasil] deseja obedecer a seu semelhante; o imperador está acima de todos, ninguém é igual a ele; a vaidade de ninguém, o orgulho de ninguém é ferido por obedecer a um governante hereditário (BARMAN, 1988, citando relato do embaixador da Áustria em visita ao império brasileiro).

A manutenção da monarquia, no entanto, bem como a constante reprodução

da força do imperador para desempenhar tais funções, além da manutenção do seu

carisma, era apenas possível pela considerável constância com que os símbolos de

sua autoridade, respeito e familiaridade eram disseminados pelo território imperial.

Assim, o jogo de cena incluía as datas comemorativas de sua vida pessoal (seu

aniversário, o de casamento, de nascimento de seus filhos, ocasiões semelhantes

na vida de sua família) que eram comemoradas em diversas partes do império com

fogos de artifício, missas solenes, discursos, bandeiras, tambores e música,

paradas com carros alegóricos, e, durante a noite, “iluminações”, quando em toda

casa, seja de rico ou pobre, acendia-se, pelo menos, uma vela em cada janela

(GRAHAM, 1997).

Além do mais, os símbolos cívicos também foram utilizados em demasia para

marcar a figura do imperador como soberano ímpar: ruas e praças das diversas

cidades e vilas eram batizadas com seu nome ou com o de personagens da realeza

ou de acontecimentos importantes em suas vidas, erguiam-se monumentos para o

imperador e cunhavam-se moedas com sua efígie. Aqui relembramos que, através

“do patrimônio histórico e geográfico e dos monumentos celebratórios, o poder

político faz da nação o sujeito produtor dos semióforos nacionais e, ao mesmo

tempo, o objeto do culto integrador da sociedade uma e indivisa” (CHAUÍ, 2000, p.

14). E nestes termos, observamos que, se os interesses materiais levavam os

senhores de engenho e os fazendeiros a apoiarem a monarquia, os esquemas

culturais moldavam e solidificavam os seus compromissos em um cenário no qual

esta assegurava uma lealdade coletiva baseada em tradições.

Neste momento da discussão, a questão do Estado se impõe e a observamos

como instrumento deste processo. Seguimos a posição de Mattos (1994) quando vê

o Estado como um artefato cultural, construído precisamente para legitimar o que

poderia ser visto como ilegítimo (o domínio de uns sobre os outros). Contando com

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a força que tenta monopolizar, seus principais instrumentos são culturais, ou seja, a

criação de uma visão de mundo, de atitudes e noções que legitimam seu domínio

como algo conveniente e certo. Dessa forma, o Estado combina a ameaça da força

com o consentimento e, no caso do Brasil Império, por ação do poder moderador,

fazendeiros de café dos arredores do Rio de Janeiro (o proferido “tempo

saquarema” de Mattos) e proprietários e escravocratas espalhados por todo o

Brasil, de onde dominavam a política local e tomaram a iniciativa de construir um

Estado para controlar a massa informe dos pobres e escravos. Estes atores

econômicos, além de agraciados que eram com títulos nobiliárquicos,

freqüentemente tornaram-se membros do gabinete ministerial e das demais casas

de representação política daquele momento.

Imbuídos da necessidade de reforçar sua “clientela” local e estendê-la para

além desta esfera, os líderes com habilidade política buscavam se envolver com

questões provinciais e nacionais fazendo com que, através destas atitudes do

cotidiano, o Rio de Janeiro (residência do Moderador) passasse a se firmar como

capital do Império e centro do Brasil no século XIX. Observamos que o esforço das

elites em manter uma clientela local acabava por enaltecer a idéia de um Estado

centralizado e, portanto, a idéia de uma unidade nacional.

Martins (2005) revela como um outro viés desta questão, o jurídico-

institucional, nos ajuda a entender a monarquia constitucional brasileira a partir de

um longo processo de organização de uma autoridade central no qual a instituição

do Conselho de Estado desempenhou papel fundamental. Este Conselho, estudado

pela autora, foi responsável pela montagem da estrutura jurídico-administrativa que

fortaleceu as bases do Estado Imperial, constituindo-se em espaço de negociações,

acomodação dos conflitos e conciliação de interesses das elites. Para ela, a

compreensão das ações e do comportamento das elites imperiais brasileiras (que

não representavam um todo uno nem um grupo isolado) pode ser alcançada através

da análise da dinâmica desta instituição e da identificação de suas redes de

sociabilidade e parentesco que eram estruturalmente confirmadas a cada momento.

Em última análise, os membros do Conselho integravam diferentes grupos

constituídos desde o século anterior baseados em grupos familiares tradicionais e

suas alianças clientelistas que se perpetuavam.

Gravitando, assim, em torno dos cargos mais importantes, a elite brasileira em

suas diferentes representações acabava por sustentar o equipamento do Estado,

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tornando-o a sua própria razão de ser. Para Graham (1997), depois de 1840, na

visão da maioria dos homens abastados, a função principal do governo central era

conceder-lhes tais posições e cargos e era através de tal nomeação que o governo

melhor preenchia seu objetivo. Ainda, as posições mais procuradas eram as de

oficial da Guarda Nacional, delegado de polícia ou juiz substituto de município.

Assim, para além de seu poder econômico, tais posições asseguravam aos

senhores proprietários a autoridade legítima em suas regiões de origem.

Entretanto, frisemos que esta forma de se fazer prestigiado e legítimo,

desenvolveu um consentimento e depois um entusiasmo por parte das elites em

compor o corpo político mais amplo, alimentando uma expectativa de favores a

serem obtidos através do Gabinete Ministerial. Tal realidade fez consolidar um

senso de vantagens e experiências compartilhadas com outros líderes mesmo

através de longas distâncias de tal maneira que, apesar das queixas em relação à

omissão do Governo às necessidades locais, nenhuma revolução irrompeu entre

1848 e 1889 e, ao que consta, nenhuma também chegou a ser planejada.

É bem verdade que a dinâmica da produção cafeeira no interior imediato da

capital do Império, fortaleceu em seu apogeu a estabilidade característica daquele

momento. Mas também o é o fato de que tal estabilidade de nada ou pouco serviria

para as elites das demais regiões se elas não possuíssem os laços de

pertencimento ao governo como um todo através de seus mecanismos

patrimonialistas. Assim, é correto afirmar que, neste cenário, o apego à região não

desapareceu, mas aquele em relação à nação expandiu-se fortemente e as duas

idéias já não apareciam mais como excludentes, uma vez que das transações

políticas diárias surgia um sistema de lealdades que mantinha a união nacional.

Se a Corte contribuiu fortemente para a construção de um sentimento de

nacionalidade entre os líderes provinciais, ela era, antes de tudo, um símbolo e

impunha uma coesão a partir de uma rede nacional de clientelismo e patrocínio

baseada nos princípios gerais da hierarquia, lealdade e obrigações pessoais.

Nestes termos, o ideário da nação foi prontamente disseminado e demonstrado nas

localidades quando dos variados rituais de patriotismo que passaram a ser

realizados nos mais diversos lugares (arraiais, vilarejos, cidades, fazendas) sob a

promoção das elites locais que reforçavam o projeto moderador de constituição da

nação sob sua ordenação e seus valores políticos, econômicos, sociais, culturais,...

civilizatórios. Gradualmente, e isto já era verdade em meados do século XIX, todos

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na população se consideravam “brasileiros” a despeito do que ocorria quando da

transição do Brasil colonial para o Império como informávamos no início desta tese.

Do ponto de vista da produção intelectual que legitimaria o discurso

nacionalizante brasileiro, coube aos políticos e letrados reunidos em torno do IHGB

a missão de amalgamar “em um corpo sólido e político” (nos dizeres de José

Bonifácio em discurso de 1813) a heterogeneidade observada no Brasil, criando-lhe

uma gênese para a sua história. Com esta postura notadamente iluminista, pois se

partia do esclarecimento dos membros do topo da pirâmide social para o posterior

esclarecimento dos seus demais integrantes, o Instituto se revestia da missão de

definir uma identidade para a nação. Entre os aspectos a serem observados neste

projeto, pensemos que a definição de um corpo social requer necessariamente a

assimilação dos seus elementos externos, apontando para aclaração do “outro”. Ao

pensar no Brasil como representante da idéia de civilização branca e européia no

Novo Mundo31, a elite o faria através de uma dupla angulação: apontar, tanto no

plano interno quanto no externo, quem estaria excluído do seu projeto nacional.

Fortemente marcada pela dificuldade em assimilar a questão racial, a elite

letrada do IHGB operava seus trabalhos a partir de um par de categorias que

isolavam o branco, associado ao mundo da “civilização e estado social”, dos índios,

relacionados à “natureza e barbárie”, e dos negros, a quem cabia apenas esta

última. Articulando metáforas de parentesco para valorizar as heranças do Brasil em

relação à antiga metrópole, a nação restrita dos brancos foi ávida na produção de

imagens depreciativas desses “outros” a ponto de seu poder de reprodução

extrapolar o momento histórico preciso de sua produção. É verdade, como já

dissemos, que o elemento indígena foi tomado como uma “espécie de matriz de

uma nacionalidade originária”, mas o foi de maneira romanceada e em meio a um

arraigado debate no interior do Instituto, em um dos raros momentos em que sua

militância intelectual não se mostrou homogênea.32

31 As elites se viam como responsáveis por uma missão civilizadora iniciada por Portugal de tal forma que aqui nação, Estado e Coroa foram tratados como unidade nas discussões sobre o problema nacional. São ilustrativas, neste caso, as palavras de Adolfo Varnhagem sobre os fundamentos de sua obra premiada pelo IHGB, conforme indicamos anteriormente: “Em geral busquei inspirações de patriotismo sem ser no ódio a portugueses, ou à estrangeira Europa, que nos beneficia com ilustração; tratei de pôr um dique à tanta declamação e servilismo à democracia; e procurei ir disciplinando produtivamente certas idéias soltas de nacionalidade...” (Grifo nosso) 32 Se existia uma defesa das origens européias da nossa história, a exemplo de Varnhagem, também havia os que viam o indígena na matriz desse processo, como o poeta Gonçalves Dias. É sintomático o fato de que ambos foram agraciados com os sugestivos títulos de barão (depois visconde) de Porto Seguro e de Araguaia, respectivamente.

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A despeito da valorização de uma herança indígena na nossa historiografia

registrada pelo IHGB, foi secundário o papel efetivo desse povo na sociedade. Os

que se salvaram da dizimação, apesar de considerados “vassalos livres”, foram

afastados da corte e continuaram distantes dos momentos decisivos da vida

pública, além de explorados em termos de mão-de-obra. Quanto aos negros, em

sua absoluta maioria formada por cativos, a própria Constituição lhes negava

direitos ao assegurar o trabalho compulsório. Estes foram os excluídos da nação em

seu plano interno.

Quanto ao externo, o maior receio das elites imperiais era a perda de poder

frente à ameaça republicana como acontecia nos países vizinhos. Criar

mecanismos para manter o Brasil “livre dos traumas e furores democráticos” foi

missão prontamente assimilada pelo IHGB em sua defesa na manutenção do

regime monárquico e na construção de um discurso que sustentasse o isolamento

do país no contexto continental como política externa no Segundo Reinado. A

unidade entre Estado, monarquia e nação foi o critério político utilizado para

justificar as diferenças quanto às formas de organização do primeiro e para associar

a idéia de barbárie ao sistema republicano. Aqui, enfatizamos também que o poder

dessa representação extrapolou o momento histórico de sua criação, refletindo-se

nos desdobramentos diplomáticos da região.

Tais posições dos membros do IHGB, que revelam o seu engajamento com o

projeto de Dom Pedro II, são compreendidas quando observadas a sua composição

e trajetórias. A maior parte do elenco dos 27 fundadores do Instituto desempenhava

funções no aparelho de Estado e havia nomes que circulavam no meio político luso-

brasileiro desde tempos joaninos. Parte ainda desses fundadores era formada por

portugueses vindos para o Brasil quando das invasões napoleônicas na Europa,

refletindo certamente uma recusa ao mote revolucionário francês e uma fidelidade à

casa monárquica de Bragança. Completavam a lista, muitos com carreira na

magistratura, na vida militar e na média burocracia do governo. No conjunto dos

políticos de origem brasileira, a carreira tinha sido iniciada quando da Constituinte

ou ganho notoriedade após a abdicação.

Resgatamos Carvalho (1988) para marcar que uma diversidade na origem

social desses atores era nivelada por um processo de educação jurídica nos moldes

de Coimbra que se completava com a prática no aparelho estatal. Neste contexto,

na missão instituída pelo IHGB, trabalharam por uma memória nacional que partia

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do pressuposto da continuidade de um império branco e europeu como assinalado

até o momento. Com este viés ideológico, foram pródigos em sua ação e alçaram a

entidade ao reconhecimento inquestionável. No rol de suas realizações estava a

organização de missões de pesquisadores ao exterior e concursos de monografias,

a promoção de intercâmbio com associações afins internacionais, colaboração nos

processos de demarcação de fronteiras, edição de mapas referenciais do período,

coleta e guarda de importante documentação sobre o país e publicação sistemática

de textos de seus associados e da ininterrupta Revista do IHGB. De periodicidade

trimestral, esta publicação funcionou como instrumento de divulgação dos ensaios

sobre a nação pretendida ao ser distribuída para mais de uma centena de

sociedades acadêmicas estrangeiras.

O caráter político de centralização do Império também se fazia presente no

IHGB através de sua prevista ramificação pelo país. A idéia era a de um instituto

histórico sediado na Corte que subordinaria as instituições semelhantes nas

províncias para concentrar o conhecimento produzido sobre o Brasil criando uma

espécie de centro autorizado do discurso da nação. Entre os exemplos de medidas

tomadas neste intuito, indiquemos a sugestão para que a biblioteca da sede do Rio

de Janeiro funcionasse como depósito geral para as publicações das diversas

regiões e o projeto de transformar o Instituto em guardador dos relatórios dos

presidentes de províncias e de todos os dados estatísticos produzidos. Embora o

plano de sucursais não tenha se efetivado, todas as demais ações do IHGB

mostravam uma entidade comprometida com a construção do Brasil em seus

variados aspectos a partir de uma determinada visão de mundo. Em síntese:

Na verdade, composto, em sua maior parte, da ‘boa elite’ da corte de alguns literatos selecionados, que se encontravam sempre aos domingos e debatiam temas previamente escolhidos, o IHGB pretendia fundar a história do Brasil (...). Por meio do financiamento direto, do incentivo ou do auxílio a poetas, músicos, pintores e cientistas, Dom Pedro II tomava parte de um grande projeto que implicava, além do fortalecimento da monarquia e do Estado, a própria unificação nacional, que também era obrigatoriamente cultural (SCHWARCZ, 2000, p.127).

Quando a autora cita que a unificação pretendida era “também cultural”, afirma

o fato de uma primazia do território como ente da nação brasileira e a necessidade

do Instituto de pensar seu projeto além desta questão primeira. Assim, a memória

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nacional seria escrita textualmente por historiadores, visualizada por pintores e teria

seus tipos simbólicos apresentados pelos literatos. No entanto, como a nação

estivera sempre associada imediatamente ao seu território de tal maneira que falar

em unidade nacional significava discursar a favor da integridade territorial, coube

aos geógrafos o pensar sobre esse aspecto.

No contexto da internacionalização da economia pelo qual passava a Europa

no século XIX, a Geografia já possuía os pressupostos necessários para a sua

sistematização enquanto ciência acadêmica. Sua instrumentalização a partir da

idéia de “espaço vital” se impunha pelo imperativo de organização do volume de

novas informações surgidas com o desenvolvimento técnico do período. Os temas

geográficos, portanto, passaram a ser primordiais tanto no âmbito da geopolítica

imperialista quanto para os novos Estados que surgiam com a descolonização.

Vale lembrar que, segundo Foucault (1979, p. 14), o exercício do poder nos

Estados territoriais implicou em uma espacialização da política e na consideração

da população como “objeto primeiro da dominação estatal”, percebida como o

conjunto de “habitantes de uma dada porção de espaço”. Neste sentido, apesar das

diferentes conjunturas na própria Europa ou fora dela, concordamos com Moraes

quando afirma que:

Um traço, todavia, parece aproximar as várias manifestações: a centralidade do discurso geográfico nos momentos de ordenamento ou reordenamento das esferas de dominação estatal, necessariamente momentos de dificuldade na afirmação das identidades. Tal fato anima a fazer um cruzamento entre a história social das idéias geográficas com a história dos países do chamado capitalismo tardio, aqueles onde as formas de legitimação social se mostram mais problemáticas (MORAES, 1991, p. 168).

Vale relembrar que, para o autor, as teorias modernas da Geografia foram

legitimadoras dos projetos nacionais e seu discurso foi central na consolidação da

idéia de identidade coletiva pelo apego à pátria. Não bastasse essa questão, no

contexto da América Latina e mais particularmente do Brasil, a soberania política

não se completaria sem a conquista das áreas interioranas não-povoadas. E este

aspecto reforçou a proximidade das idéias de “unidade nacional” e “integridade

territorial”, trazendo à tona o papel do pensamento geográfico e sua aplicação na

consolidação de ambas.

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Embora sem o devido destaque no seu estudo no Brasil, o pensamento

geográfico assumiu um papel importante nas representações do território e da

população durante o século XIX. Se a institucionalização da ciência Geografia seria

processo apenas nas primeiras décadas do século seguinte, a verdade é que seus

temas estiveram no centro da produção do Brasil. A construção de “ideologias

geográficas” foi intensa durante o Império e talvez a literatura sobre o tema não

tenha ainda reconhecido este fato por conta do caráter pragmático e oportunista da

contribuição dos geógrafos no período, a serviço que estavam da dominação

estatal.

No ambiente do IHGB em que historiadores literatos e pintores inventaram uma

sociedade para o país, o inventário geográfico desta se distanciou e fixou-se apenas

na natureza e seus aspectos físicos. À sua Comissão de Geografia, coube o

mapeamento sistemático e as descrições corográficas das diversas províncias e,

por isso, era composta por militares que definiam os rumos e temas dos trabalhos.

A nação estava sendo construída, mas, no âmbito de sua principal instituição

legitimadora, a geografia se via envolta em coordenadas cartesianas, relevo, clima e

demais temas estratégicos para as questões militares. No entanto, esta não era a

única geografia que se fazia no país e este é o ponto essencial em nossas

considerações.

Mesmo diante do exposto, salientamos que o IHGB era fundamentalmente

geográfico uma vez que se pautava em referências ao território como premissa e

não à sociedade que o ocupava. O seu discurso até era para a construção de uma

sociedade, mas esta seria em consonância com uma ideologia conservadora que

tinha o território como ponto de partida e o poder que emana do seu controle como

ponto de chegada. Lembremos que já foi assinalado nessa tese que a propriedade

fundiária era a base das relações de sociabilidade no Brasil, que o país ainda era

um espaço a ser conquistado em seu interior e que a nação constituída no Império

era desprovida do povo (meros habitantes a serem dominados e civilizados), não

configurando a simbiose entre autoridade pública e mecanismos de cidadania.

Portanto, a valorização dos atributos espaciais estava na base das formulações

ideológicas que sustentavam a monarquia e que davam a diretriz dos trabalhos

realizados em suas instâncias, entre elas o IHGB. O uso político do espaço foi

eficiente enquanto discurso exatamente por não ter sido posto de maneira

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transparente, anunciada. Estava implícito e arraigado na elite pelo conjunto que as

características relembradas acima impunha no traço social brasileiro.

Os estudos sobre o pensamento geográfico brasileiro precisam incorporar esse

apego ao “chão” como base das falas e políticas que definiram o Império de Dom

Pedro II. Além do mais, mesmo que quiséssemos considerar a Geografia isolada

enquanto disciplina, não poderíamos nos deter apenas à sua cooptação no âmbito

do IHGB. No período monárquico, além de uma geografia para o poder (que estava

expressa também nos bancos escolares do ensino regular proferido), existiam os

geógrafos e nosso primeiro trabalho de fôlego nesta área.

No país, o esforço inaugural para compreender o meio natural em suas

relações com a ação humana foi proferido pelo conhecido Senador Pompeu em seu

Compêndio Elementar de Geographia Geral e Especial do Brasil, de 1856. Nesta

obra, que se espelhava nas novas concepções que vinham da França, ele utilizava

princípios de outras disciplinas e relacionava, por exemplo, clima com políticas

sanitárias, discutia a realidade da seca e a melhor forma de utilização da água

disponível, entre outras questões inéditas até então. Por sua posição ideológica

liberal, apresentava uma definição do território relacionada ao povo de maneira

distinta da ensinada na escola: considerava este como “alma do paiz (...) se

felizmente governado” (SOUZA NETO, 1997, p. 76). Por uma série de inovações,

sobretudo metodológicas, este Compêndio se distanciou de uma tradição descritiva

e pode ser considerado a primeira tentativa de se fazer uma geografia científica por

aqui.

Nestes termos, supera a importância do livro Corografia Brazílica (Relação

Histórico-Geográphica do Reino do Brazil), escrito em 1817 (ainda no período

joanino) pelo padre português Aires de Casal e tido como a primeira produção

geográfica do país. Mesmo não sendo um trabalho apurado, pois ignora os

preceitos científicos da época, a compilação que Corografia fez dos dados

existentes sobre o país acabou por torná-la a principal referência para o Império e

para os compêndios geográficos produzidos na Europa. Seu prestígio foi diminuído

apenas quando da publicação da obra do Senador Pompeu e da tradução para o

português de importantes textos sobre o Brasil escritos por estrangeiros e para cá

trazidos por Capistrano de Abreu, também divulgador no país da Antropogeografia

de Ratzel (CAMPOS, 2004, p. 46).

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Enquanto estas inovações não se verificavam, o texto de Casal forneceu a

base para o reduzido material escolar produzido no Brasil, denotando um ensino

oficial simplório, descritivo e atrasado no seu tempo. No contexto do projeto

nacional em implantação, não havia um sistema uniforme de ensino e de alcance

nas províncias. Existia inicialmente apenas a preocupação de educar os filhos dos

seus dirigentes, criando alguns cursos superiores e regulamentando suas formas de

acesso. Com a complexidade gradual das populações urbanas ao longo do século,

a escola foi sendo vista como instrumento de ascensão social e experimentou uma

certa expansão, mais em termos quantitativos do que qualitativos. No conjunto, o

ensino secundário ficou sob a responsabilidade da iniciativa privada e o primário

sob a tutela do Estado (ROMANELLI, 1991).

Apesar de garantido na Constituição em seu artigo 179, o ensino primário foi

delegado às municipalidades por lei de 1827. Por conta das dificuldades em seu

cumprimento, o Ato de 1834 “outorgou às províncias o direito de legislar sobre a

instrução pública, com exceção dos cursos superiores e do ensino da capital do

Império, responsabilidades do poder central” (CAMPOS, 2004, p. 48). Mesmo com

tais mudanças, tratava-se de um ensino elementar que priorizava os “instruções

pátrias” e conteúdos compartimentados nas disciplinas. A exceção foi o Colégio

Pedro II, criado em 1837 na corte para funcionar como modelo e, nos dizeres de

Schwarcz (2000, p. 151), “foi o único que, de certa forma, escapava ao ensino

excessivamente livresco, anticientífico e pouco abrangente da época”.

A nação, portanto, confirmava a sua intenção de mais incutir um dado ideal do

que ofertar conhecimento efetivo à sua população. E esta sequer estava abrangida

por este serviço, reforçando a questão dos semióforos que eram produzidos para o

cotidiano da vida social. Quanto à educação formal, esta era para poucos: os

“mappas” e estatísticas divulgados oficialmente (como, por exemplo, os incluídos

em alguns dos relatórios dos presidente da província que consultamos e que estão

indicados na bibliografia desta tese) mostram que, em seus últimos anos, o Império

tinha ainda 4/5 de sua população livre analfabeta, taxa que atingia mais de 99%

entre os cativos.

O interesse pela formação cidadã através da educação foi restrito a tal ponto

de não existir cursos para formação de professores no Brasil até 1880, sendo os

critérios para a seleção dos instrutores para a educação básica a maioridade,

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moralidade e amizade.33 Mais uma vez confirmamos que nossas elites, “filhas

legítimas da Europa” como as demais do continente americano, na contingência de

construir uma organização autônoma nos moldes da nação, o fizeram mais para si

do que para o conjunto de “brasileiros”. Esta esteve:

Entre o país real dos escravos e miseráveis e o país oficial da elite dos bacharéis e barões do café. Entre a multidão dos analfabetos e a limitada camada culta. Entre o interior arcaico e a capital europeizada. Entre as modas modernas nas ruas e a precariedade da vida nos cortiços. Entre uma política clientelística de favores e o arcabouço de um Estado parlamentar. Entre o exercício cotidiano das práticas mais tradicionais da colonização portuguesa e o desprezo pela herança ibérica, sublimada em nome do progresso e das Luzes do século (NEVES, 2002b, p. 546).

Ao relembrar dos teóricos da nação trazidos a esta tese, constatamos que a

“comunidade imaginada” (Anderson) constituída pelo projeto nacional imperial se

distanciava da principal característica do Estado moderno (ou seja: a simbiose

construída entre Estado e nação através da simultaneidade e reciprocidade entre a

burocratização da autoridade pública e a extensão dos mecanismos de cidadania)

(Tilly e Bendix), pois, ferindo a equação que nivela nação, Estado e “povo soberano”

(Hobsbawm), não concebia a idéia de um grupo populacional assistido em ampla

maioria por direitos iguais. A “homogeneização” da população aqui serviu mais para

a criação de uma identidade que permitisse o sentimento de pertencimento ao todo

imperial, sem o compromisso desse Estado com mecanismos efetivos de

compensação dos recursos extraídos de seus (obedientes) membros. Do ponto de

vista do território, este conseguiu sustentar um estatuto nacional e centralizado. Em

especial, através do viés geográfico do IHGB, reafirmamos a eficiência do uso

político do espaço no período imperial de tal sorte que, por exemplo, a maior parte

das nossas fronteiras estava definida antes da República.34 Observar a natureza da

questão territorial no Império será o próximo passo.

33 As Escolas Normais já existiam no Brasil desde 1830 (com a criação da primeira em Niterói) e foram poucas que a sucederam no período imperial: Salvador (1836) e São Paulo (1875/1878) (ROMANELLI, 1991). No entanto, em seus currículos, não existia disciplinas voltadas para o fazer pedagógico. Suas aulas eram de gramática portuguesa, primeiras letras, francês, inglês, geografia, história, latim, matemática, filosofia moral e racional, grego e retórica (RIO DE JANEIRO, 1843). A exceção foi a Escola Normal do Rio de Janeiro, criada em 1880. 34 O lema da integridade territorial estava dado no Império, o de sua integração ficaria para o momento histórico seguinte juntamente com a questão do federalismo.

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2.3. A base material da nação

Para uma elite que se definia como “representante das idéias da Ilustração”

(GUIMARÃES, 1988), construir um país, afora os interesses mais imediatos do

mundo econômico e político, significava levar a civilização aos povos e ocupar o

solo. Esta era a fórmula a ser seguida e através da qual a população foi pensada

apenas como instrumento do processo. As “ideologias geográficas” subjacentes a

esses interesses nos levam a pensar no papel representado pelos núcleos urbanos

como espaço preferencial para a manifestação e reprodução dos semióforos

nacionais. Também há de se reafirmar a cidade como nó articulador de uma rede

através da qual os fluxos aconteciam. Neste sentido, destacamos o seu caráter

regional como profícuo caminho para a análise do rebatimento no território

fluminense das determinações históricas analisadas até o momento.

Precisamos verificar a afirmativa de que a essência do controle territorial

alvejado pelo poder central era a região, sendo esta atingida na prática através dos

aglomerados urbanos subjugados para confirmarem o Império. Entender o processo

de transformação de espaços em território imperial requer, inicialmente, que se

discorra sobre o conceito de “território” e sua relação com a instância de um poder.

No entanto, é necessário ainda observar a natureza do território herdado pela

colônia e das políticas efetivas de domínio territorial implantadas pela monarquia,

bem como enquadrar as discussões sobre região e cidade neste contexto.

Em primeiro lugar, quanto ao território, é importante perceber que se trata de

um dos conceitos fundamentais do pensamento geográfico e que encerra uma

diversidade de concepções no âmbito desta ciência. Em nosso trabalho, ele é

entendido como:

Um espaço onde se projetou um trabalho, seja energia e informação, e que, por conseqüência, revela relações marcadas de poder. (...) o território se apóia no espaço, mas não é o espaço. É uma produção a partir do espaço. Ora, a produção, por causa de todas as relações que envolve, se inscreve num campo de poder (RAFFESTIN, 1993, p. 144).

Esta concepção considera o território posterior ao espaço e nos possibilita

considerar três vertentes possíveis para a sua interpretação: uma jurídico-política

que se refere a ele como um espaço delimitado e controlado a partir de um poder de

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caráter estatal; uma cultural(ista) que, priorizando dimensões simbólicas, o vê como

“produto da apropriação feita através do imaginário e/ou identidade social sobre o

espaço”; e uma vertente econômica que o destaca “em sua perspectiva material,

como produto espacial do embate entre classes sociais e da relação capital-

trabalho” (SPOSITO, 2004, p.18). O fundamental aqui é perceber que estas

dimensões não são excludentes e, ao contrário, devem se justapor para a

apreensão do conceito em tela.

Ao lembrar que um dado território sempre encena uma materialidade como

fundamento para o seu sustento econômico, político e de identificação cultural de

um grupo, Souza (2001) enfatiza a existência de múltiplos territórios na

contemporaneidade e colabora para a visão de que estes não se limitam a uma

ideologização a partir de um poder centralizador como o Estado. No entanto, para o

nosso caso, o processo inverso nos possibilita ver que se o postulado acima é

correto também o é o fato de que não há separação entre Estado e território. Com

efeito,

Num sentido mais restrito, o território é o nome político para o espaço de um país. Em outras palavras, a existência de um país supõe um território. Mas a existência de uma nação nem sempre é acompanhada da posse de um território e nem sempre supõe a existência de um Estado. Pode-se falar, portanto, de territorialidade sem Estado, mas é praticamente impossível nos referirmos a um Estado sem território (SANTOS; SILVEIRA, 2001, p. 19).

Assim, fica posto que observamos o território como sinônimo de “espaço

geográfico” e o entendemos como central para a compreensão das diversas etapas

da história humana ao tratá-lo como unidade e, ao mesmo tempo, diversidade. Por

isto, a nossa preocupação com as escalas e a opção pelo viés metodológico

geográfico-histórico.

A questão que nos move a partir deste momento é a que se refere aos usos do

território em suas formas hegemônicas. E aqui nos referimos tanto à implantação de

infra-estruturas quanto aos mecanismos que dinamizam a economia e a sociedade

(padrões de localização das atividades produtivas, movimentos da população e leis

de caráter civil, fiscal ou financeiro). Admitindo o pressuposto de que a história dos

territórios é a história dos movimentos que lhes dão fluidez, interessa-nos apreender

as formas jurídicas e políticas presentes no Império do Brasil. Entendemos que tais

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movimentos não se realizam sem uma regulação política e também econômica e

que, se quisermos dar conta desse olhar geográfico sobre a sociedade, temos que

perceber que este arcabouço condiciona e reflete a instituição de “regiões do

mandar” e “regiões do fazer”. Atentar para estas questões no processo histórico é

desafio que apenas pode ser tomado a partir do instrumento da periodização. Isto

devido ao fato de que o território, a cada momento, denota processos mais breves e

outros mais duradouros e não se caracteriza por uma linearidade dos fatos,

acumulando defasagens e superposições.

No esforço de compreensão da história do território brasileiro, importantes

pensadores propuseram diferentes periodizações a partir de variáveis distintas da

realidade. Apenas para citar alguns clássicos, lembremos que o Império (em si, já

delimitado por critérios políticos que lhes dão início e fim) é observado por diversas

fases e elementos conforme mostrado no Quadro 1 a seguir.

Quadro 1: Inserção do Império em distintas periodizações da História do Brasil Autor Obra Período em que o Império se insere Argemiro Jacob Brum

O desenvolvimento econômico brasileiro

1500/1930: Longa fase agro-exportadora

Caio Prado Jr.

Formação do Brasil contemporâneo

1808/1850: Era do liberalismo e fim do pacto colonial 1850/1889: Império escravocrata e aurora burguesa

Celso Furtado

Formação econômica do Brasil

Século XIX: Economia de transição para o trabalho assalariado

Florestan Fernandes

A revolução burguesa no Brasil

1808 até meados do XIX: Eclosão do mercado capitalista moderno Último quartel do XIX até década de 1950: Formação e expansão do capitalismo competitivo

Elaborado a partir de SANTOS; SILVEIRA (2001, p. 24-27).

Considerando a dinâmica dos eventos históricos, chamamos a atenção para o

fato de que ao geógrafo cabe a missão de compreender o território como um misto

de registros materiais e representações. Ele é reflexo e condição para as

sociedades e estes aspectos impõem variáveis distintas das utilizadas por outros

especialistas na análise das formações humanas. Portanto, nesta tese, a partir de

importantes contribuições olhamos para a nação através do seu território,

estudamos o Império por seu ordenamento político e territorial. E, neste sentido,

julgamos conveniente tecer comentários sobre os usos predominantes no período

anterior à Independência para compreender em que bases ocorreram as políticas

imperiais no trato com o seu “chão”.

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O aparato da empresa colonizadora tinha na ocupação do solo o seu impulso

fundamental. No Brasil, Portugal assegurou um território continental e nele

introduziu uma certa unidade jurídica e administrativa que escondia diferenças

regionais marcantes. Interessa-nos observar as características do território naquele

momento e iniciamos com a falsa idéia de uniformidade contida na expressão

“Brasil Colônia”.

Vale lembrar que em meados do século XVII convivem no atual território brasileiro distintas zonas de soberania: além do estado do Brasil, também o do Maranhão (o primeiro respondendo na época ao Conselho de Portugal, e o segundo diretamente à corte de Madri), o Brasil holandês (ou Nova Holanda), o território livre de Palmares (soberano em seu espaço) e os territórios missionários (de ambíguas relações de obediência, formalmente vinculados à Coroa espanhola ou portuguesa, mas também respondendo ao comando papal) (MORAES, 1991, p. 169).

Com os tratados de Madri (1750) e de Santo Ildefonso (1777), a colônia tem

seu espaço ampliado e as diferenças se acentuam. No extremo sul, os campos de

criação de gado levavam uma existência quase autônoma. No centro, extensas

áreas se mantinham aberas à ocupação portuguesa. A região mineira

ensimesmara-se após o apogeu. No interior nordestino, as fazendas de gado

conservavam-se imunes as autoridades e mecanismos de controle centrais. No

litoral, a faixa entre Recife e Rio de Janeiro configurava a única porção da colônia

com relações efetivas. No entanto, ela era descontínua e marcada por rivalidades

regionais.

O espaço brasileiro ainda não se consubstanciava efetivamente como território

sob um comando central. Nas capitanias35 situadas onde atualmente identificamos

as regiões Nordeste e Sudeste, as relações sociais eram definidas a partir dos

grandes proprietários rurais, ávidos por poder junto ao Estado português. Falamos

de um contra-poder à Coroa de caráter regionalista e formado por oligarquias rurais

com forte poder político local e mesmo regional. Esta realidade não foi vista, por

exemplo, nas áreas da atual região Norte onde “a atividade extrativista, com base

no trabalho indígena, não estabeleceu a propriedade privada, não criou uma classe

de proprietários fundiários” (NOGUEIRA, 1999, p. 70). Muitos autores falam em um

35 Em 1759, as capitanias hereditárias foram abolidas pelas reformas pombalinas, sendo transformadas em capitanias régias. Entre 1808 e 1821, o termo “capitania” se confundia com “província” na legislação e na fala cotidiana.

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arrivismo como marca histórica dos seus mandatários, sobretudo quando do

posterior advento dos seringais. A diferença entre tais regiões fazia com que fossem

mais intensas as relações da Amazônia com Portugal do que com as demais áreas

da costa brasileira.

Dizíamos em nota anterior que era evidente a divisão entre as capitanias do

norte e as do sul e este fato tornou-se traço na nossa cultura em inúmeros

momentos. Quando da constituição do Reino Unido de Portugal e Brasil, surgiram

nas da Amazônia duas frentes políticas com defesas dissonantes em relação aos

acontecimentos:

(...) uma, composta por comerciantes reinóis, defendia a tutela colonial [não tinham interesse em subordinar-se ao Rio de Janeiro]; outra, apesar de composta por fazendeiros e proprietários de engenho, não possuía qualquer poder de intervenção na administração provincial [mas conseguiu articular ainda colonos e índios contra o domínio português no Pará], e propunha autonomia36 (NOGUEIRA, 1999, p. 71).

Apesar dessas dissonâncias e da desarticulação do espaço, a empreitada

lusitana conseguiu instalar um aparato produtivo que, diferente do que foi visto em

outros pontos do mundo colonial da época, não partiu de uma infra-estrutura

territorial pré-existente. Neste sentido, a colônia brasileira foi uma invenção

portuguesa baseada em “um padrão extensivo de ocupação do solo aliado a um

padrão intensivo de apropriação dos recursos” (MORAES, 1991, p. 170) que carecia

constantemente de abundante mão-de-obra e terras.

No plano político, a instituição do Governo Geral37 pleiteava um centro de

comando com poderes para fundar vilas e povoações, conceder sesmarias para a

instalação de engenhos de açúcar ou qualquer outra atividade econômica, explorar

e descobrir terras no sertão, exterminar corsários, edificar fortes e construir navios

para a defesa da terra, garantir o monopólio real sobre a exploração do pau-brasil e

36 Esta realidade originaria depois um dos mais fortes movimentos contrários ao Império, a Cabanagem. Após esse evento, a Amazônia apenas voltaria ao cenário nacional no final do século XIX com a exploração da borracha em grande escala. “As províncias da Amazônia, até a ascensão da borracha como principal produto econômico, viviam reclamando maior atenção do poder central. Achavam-se desprestigiadas em diversos sentidos, principalmente quanto aos gastos do governo com o incentivo à colonização e imigração para o sul do país” (NOGUEIRA, 1999, p. 72). 37 Perdurou até 1808 sendo que seus governadores foram chamados de vice-reis a partir de 1720. Em todo caso, contavam com a assessoria de um provedor-mor (responsável pelas finanças e cobrança de impostos), um ouvidor-mor (juiz) e um capitão-mor (militar responsável pela defesa da terra e da costa).

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fazer alianças com tribos para a catequese. É notório o fato de que a maior parte

destas funções se referia à conquista do solo. Diante das dificuldades de um poder

centralizado, tais atribuições foram divididas com as classes latifundiárias regionais

que assumiram o controle dos órgãos políticos locais e regularam a sociedade e o

território.

A subdivisão política-administrativa dos territórios atendia sobremaneira as

questões de justiça coercitiva e fisco. No interior das capitanias, as Câmaras

deliberavam pela criação de vilas ou de novas freguesias e comarcas38. Em alguns

casos, desmembrava-se a própria capitania para melhor gerência dos fluxos

econômicos, garantindo segurança aos negócios régios. Foi o caso da de Minas

Gerais, separada em 1720 da de São Paulo e Minas do Ouro, de 1709. Esta

capitania ainda seria desmembrada para o surgimento da de Goiás e de Mato

Grosso conforme mostra o mapa a seguir.

Mapa 2: Desmembramentos da Capitania de São Paulo no século XVIII

Base cartográfica: IBGE (2007).

38 Adiante, nos deteremos com mais vagar no tema das freguesias e comarcas.

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O contexto da exploração aurífera é revelador das posturas de Portugal em

relação ao controle das parcelas rentáveis da colônia. As decisões não se

inscreviam apenas na construção de objetos geográficos (fortes, registros, acessos,

etc.) para dinamizar territórios, mas chegavam à proibição de determinados fluxos.

Para evitar o contrabando, foram vetadas a abertura de caminhos e a circulação por

alguns já abertos.

Diversos foram os alvarás e ordens régias nesse sentido. Em 1701, foi emitida uma ordem proibindo a comunicação da Bahia para as Minas, que foi estendida, em 1704, à capitania do Espírito Santo. Em 1727, uma ordem régia vetava a abertura de picadas entre as Minas Gerais e as minas de Cuiabá e as de Goiás. Em 1733, ficou proibida a abertura de quaisquer caminhos para as regiões de mineração já descobertas sem autorização prévia por parte da Coroa. E, em 1736, a ocupação de todas as regiões ainda não povoadas da capitania foi oficialmente proibida (PIMENTA, 1971, p. 22-23).

Através do trabalho de Soares (2008) sobre a expansão da rede urbana

mineira na segunda metade do século XVIII, podemos visualizar um território que foi

se equipando com marcos da administração portuguesa em tempos de vigilância

redobrada. Em poucas décadas, o aparato real implantou ou fez surgir no território

cidades, vilas, sedes de freguesias, sedes de comarcas, registros, presídios,

capelas, aldeamentos, além de fazendas, caminhos, pontos de pouso para tropeiros

e pontos de trocas de mercadorias.

Dentre essas formas, as vilas e cidades detinham um papel preponderante na

hierarquia administrativa e serão consideradas adiante. Destacamos os registros e

os presídios como ilustração das políticas coloniais para o estrito controle territorial

e suas atividades econômicas. Os primeiros, comuns em todo o Brasil, tinham um

caráter fiscal e, na maioria das vezes, eram constituídos por um casebre ao longo

dos caminhos. Neles, trabalhavam um funcionário do provedor-mor e outro do

ouvidor-mor na coleta de impostos “de passagem” sobre mercadorias, anotando e

controlando a entrada e saída desses produtos em suas regiões de atuação.

Cresciam em número de acordo com a intensificação dos fluxos econômicos e

localizavam-se, preferencialmente, em pontos do território que dificultassem o

desvio das tropas por rotas alternativas. Alguns desses registros, que também

fizeram parte da política imperial, chegaram a originar arraiais ou vilas em várias

capitanias ou províncias.

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Quanto aos presídios, podemos ressaltar que foram característicos das áreas

de fronteira e dos sertões de floresta no século XVIII e serviam para o

estabelecimento militar destinado à defesa do território, ao trato com os índios

“brabos” e ao controle do contrabando. Eram tidos como local de degredo por terem

seu efetivo composto por homens livres pobres, recolhidos compulsoriamente em

rondas nas vilas entre aqueles sem ocupação permanente e, por isto, considerados

“vadios”. Foram essas construções a forma encontrada pela Coroa para a

imposição de sua posse nas áreas de acesso mais difícil.

Expressão de conquista, as vilas e cidades constituíam o locus da

administração régia na colônia. Desde o início das capitanias, várias vilas foram

criadas por iniciativa dos donatários a quem competia definí-las, segundo o foro e

os costumes do Reino, com seu termo, jurisdição, liberdades e insígnias

respectivas. Reproduzindo a ordem política da sociedade ibérica, tendo por base as

instituições romanas, os municípios foram criados como entidade político-

administrativa cujas funções deveriam corresponder aos princípios estabelecidos

nas ordenações do rei e autoridades metropolitanas. As cartas de doação dos

capitães, assim como os forais, delegavam poderes aos donatários e grandes

senhores para receberem como patrimônio os ofícios das alcaidaria-mores e para

criarem e proverem alguns dos ofícios municipais, como tabeliões do público e do

judicial. Com isso, reproduziam os privilégios que o rei concedia para que as “coisas

da justiça e governança” fossem corretamente administradas e sua autoridade fosse

sentida e observada no novo território.

A literatura específica recente tem mostrado que a história territorial brasileira

tem sido um contínuo processo de ocupação que acentuou, no período colonial, o

papel de determinados “funcionários do urbanismo”.39 Esta produção acadêmica

conta ainda com variados textos preocupados em evidenciar o fato de que foi

transferida, nos primeiros séculos de nossa história, a responsabilidade pelas

39 Expressão apresentada por Araújo (1998) para enfatizar a idéia de uma política portuguesa de caráter urbano durante nossa colonização. Entre os aspectos mais particulares de suas considerações, está o fato de que antes do século XVIII os nossos antigos “funcionários do urbanismo” eram clérigos, engenheiros militares e “homens bons” da colônia. Diante do Iluminismo e de suas idéias de que o Rei seria o representante do povo, e não de Deus, a questão do poder público sobressaiu nas políticas portuguesas, inclusive nas de caráter urbano. Como conseqüência, o Estado deixou de delegar ao privado as funções relativas às suas cidades e iniciou a formação de “pensadores” em instituições próprias que se constituiriam em uma nova elite. Marcamos aqui que, antes das “aulas de arquitetura e fortificação”, fazer cidades (seu espaço interno) não era o que podemos chamar de um serviço público. No máximo, construíam-se fortalezas uma vez que o objetivo maior era o controle dos fluxos no espaço maior da colônia.

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instalações e melhorias urbanas aos homens de posse, comerciantes e aos

religiosos, que pela escassez de uma legislação civil sobre o assunto, estabeleciam

determinações eclesiásticas sobre a estruturação da cidade e seu cotidiano.

O conjunto de assentamentos urbanos criados no período colonial, o caráter

desta iniciativa, as funções que desempenhavam e sua estruturação interna são

aspectos que têm possibilitado o debate sobre uma política territorial portuguesa

eminentemente urbana. Não se trata de discutir apenas se no Brasil houve

determinações prévias para o traçado das cidades nos moldes do que ocorrera na

América espanhola, discussão esta iniciada com a célebre indicação feita por Sérgio

Buarque de Holanda de que as cidades portuguesas aqui instaladas eram

desprovidas de planejamento. Trata-se mais de refletir sobre uma urbanística

portuguesa como elemento de sua geopolítica para a colônia. Trata-se da

territorialização de suas políticas através do instrumento urbano. É este o viés já

aceito para se repensar a história colonial pelo seu fenômeno citadino.

Em termos quantitativos, valem os números trazidos por Aroldo de Azevedo

em estudo clássico:

Seria esse o panorama urbano do Brasil no momento em que se libertou do domínio português: 12 cidades [Belém, São Luís, Oeiras, Paraíba (atual João Pessoa), Olinda, Salvador, Mariana, Cabo Frio, Rio de Janeiro, São Paulo, Goiás, e Cuiabá] e 213 vilas, fortemente concentrada na Região Leste, onde indubitavelmente se situava o “coração” do país, num amplo triângulo isósceles, cujos vértices poderiam ser representados por Salvador, Rio de Janeiro e Vila Rica (AZEVEDO, 1992, p. 56 e 58).

Com o conjunto de mecanismos considerados até aqui, o aparato jurídico

institucional da Coroa portuguesa assegurou ao Brasil um território que não

estabelecia um contínuo espacial, abrangendo o litoral do nordeste, o recôncavo da

Baía de Guanabara, os estuários e baixadas costeiras como a santista, além de

uma interiorização do fato urbano nas Minas Gerais e Goiás e, em menor escala

devido ao seu caráter esporádico, na bacia amazônica e no golfo maranhense. Era

este o espaço geográfico sobre o qual o Império iria construir sua nação,

aprimorando-lhe alguns instrumentos da política territorial, mantendo outros, e

buscando a centralização até então apenas formal.

A divisão político-administrativa do Brasil no final do período colonial com as

suas cidades e vilas está representada no mapa a seguir:

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Mapa 3: Divisão político-administrativa e povoamento no Brasil (1822).

Base cartográfica: IBGE (2007) e AZEVEDO (1992, p. 56).

A divisão territorial do Império manteve a tradição das capitanias, mudando-

lhes o nome para províncias. No entanto, em relação à representatividade, aquelas

já vinham passando por mudanças importantes desde 1811 com a criação de juntas

eleitas regionalmente para auxiliar a administração geral. Pela primeira vez, era

estabelecida uma instância intermediária entre as localidades e a capital. Mas foi

por decreto de 1821 que se criou o modelo administrativo que seria mantido por

todo o período imperial: aquele constituído por juntas provisórias de governo

formadas através do voto dos eleitores de paróquias nas províncias. A este

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mecanismo, se somou o já citado Conselho de Procuradores Gerais das Províncias

com status de Conselho de Estado, criado em 1822 em meio a crise político-

institucional quando da independência e confirmado pela Carta de 1824 em seu

Capitulo 5º, conforme mostrado a seguir.

O Ato Adicional de 1834 também manteve estes Conselhos, ampliando-lhes o

número de representantes: 36 em Pernambuco, Bahia, Rio de Janeiro, Minas

Gerais e São Paulo; 28 no Pará, Maranhão, Ceará, Paraíba, Alagoas e Rio Grande

do Sul; e 20 nas demais. No entanto, foi com a Lei de Interpretação de 1837 que a

relativa autonomia experimentada pelas províncias seria abolida, encaminhando o

Império para a centralização política que lhe caracterizaria.

Sustentada por forte determinação econômica, a concentração do poder foi a

maneira encontrada no Segundo Reinado para a efetivação do projeto imperial da

nação. E esta requeria, para a apropriação dos espaços, um aparato administrativo

que preterisse a autonomia das localidades. Recuperando o que já foi construído

sobre este aspecto até aqui, podemos lembrar que:

O programa da unidade implicava a subordinação das oligarquias ao centro político. O centralismo político e administrativo do Império brasileiro, que consagrou o poder do Executivo sobre as esferas regionais e locais, evidenciava a distinção entre o Estado e as oligarquias. O traço centralista aparece na Constituição de 1824 em todos os lugares, mais caracteristicamente na abordagem da divisão espacial do território. As províncias funcionavam unicamente como circunscrições territoriais da unidade geral. A divisão do território circunscrevia-se apenas à dimensão administrativa, não possuindo nenhuma substância política. Ou dito de outro modo, a atividade

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política tinha por condição a lealdade à integridade territorial do Estado e implicava a renúncia à própria representação de espaços políticos regionais (MAGNOLI, 2003, p. 295).

Posição semelhante também foi defendida por Gouvêa (2008), em texto datado

de 1989, quando afirmava que:

Para estabelecer e organizar um complicado conjunto de instituições administrativas e políticas, o governo central progressivamente editou um complexo conjunto de leis. Essas peças legislativas se formaram em meio a disputas e conflitos, através dos quais o grupo fluminense [os “saquaremas”] pôde emergir como núcleo vital do grupo governante do Brasil, após 1837. (...) tendo em vista o processo de centralização política estabelecido por aquela legislação, muito pouco foi deixado sob a responsabilidade das instituições políticas e administrativas provinciais (...) (GOUVÊA, 2008, p. 76).

Entretanto, a feição centralista desse período brasileiro encontra nesta mesma

autora um ponto de inflexão em trabalho mais recente ao observar o intricado jogo

de interesses e instituições regionais que se articulava na esfera geral. Para ela:

A política imperial por certo foi algo mais complexo e sofisticado do que o simples favoritismo e clientelismo geridos a partir do Rio de Janeiro. Nesse sentido, uma significativa descontinuidade em relação ao período colonial deve ser apontada, na medida em que haviam se constituído espaços de representação dos interesses regionais/provinciais, o que no período colonial se restringia ao âmbito das célebres câmaras. O estrangulamento político, institucional e fiscal das províncias foi, porém, traço marcante do período monárquico, ensejando inúmeros debates e críticas extensivos ao Poder Moderador (GOUVÊA, 2002, p. 599).

A discussão que levaria ao federalismo se nutria também do caráter

patrimonialista da sociedade. A ação do Estado Imperial se espraiava por todos os

setores da vida cotidiana e era percebida com preocupação entre os distintos

segmentos políticos. São ilustrativas as falas mostradas a seguir do conservador

José de Alencar no jornal O Protesto, reproduzido por Vitorino (2002), e do liberal

Tito Franco D’Almeida em seu Balanço do Império:

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(VITORINO, 2002, p.161).

(D’ALMEIDA, 1877, p.169). Como indicou Faoro, na segunda metade do século XIX, estava em

funcionamento a dominação patrimonial do Estado imperial através do centralismo

de praticamente todas as atividades desenvolvidas no país. No entanto, a partir da

ascensão liberal no cenário político seriam mais constantes e efetivos os embates a

este status quo. Foi o momento em que um discurso federalista ganhou ênfase

através de grupos que nele viam uma forma de garantir a descentralização e o

aumento da autonomia local reivindicada pelas oligarquias regionais. Embora seu

discurso pregasse inspiração no modelo institucional norte-americano, o federalismo

que aqui foi defendido e o próprio instalado com a República deste se distanciou.

A despeito de sua origem na Europa da época da Revolução Francesa através

do pensamento de Kant, o federalismo alcançou sua plenitude enquanto idéia na

segunda metade da década de 1780 nos Estados Unidos. Escrito para ratificar a

Constituição implantada naquele país, o clássico O Federalista reunia artigos de

Alexander Hamilton, James Madison e John Jay e, de forma pioneira, formulava

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uma teoria sobre a implementação do Estado federal. Em seus textos, defendiam o

princípio de que um efetivo Estado de direito constitucional apenas poderia realizar-

se plenamente ao adotar uma substancial distribuição das competências através de

um executivo e um judiciário com funções e características do Estado federal. Este

sistema seria estabelecido com instituições garantidoras de um poder central

fortalecido. De contrapartida, uma outra corrente de pensamento polarizou a

discussão e, representada por Thomas Jefferson, defendia a descentralização do

poder para salvaguardar a livre iniciativa e o empreendedorismo dos proprietários

privados.

Mais que a hamiltoniana, foi esta segunda vertente da tradição federalista

norte-americana que chegou, com variações, ao Brasil e a muitos países latino-

americanos no século XIX. Desta forma, o “federalismo entre nós significava e

significa descentralização, self-government, condição para a liberdade, se não a

própria liberdade” (CARVALHO, 2001, p.15). Diferia da matriz da América do Norte

uma vez que o seu princípio básico não era o de unir territórios sob o julgo de um

poder centralizador, mas o de manter uma união destes através do primado regional

(STEPAN, 1999). Voltamos a enfatizar a matriz territorial daquele período. Seguindo

a inflexão apontada por Gouvêa (2002) e depois de considerar o conceito de

território (seu uso no período colonial e disputas no Império), um enquadramento

sobre região e cidade se impõe.

O conceito de região, em diferentes abordagens, tem sido uma constante nos

estudos da Geografia. Para Fonseca (1999), cinco são as suas concepções que têm

prevalecido desde o final do século XIX: região singular, região como classe de

áreas, região de vivência, região do capital e região de poder. Um primeiro enfoque

a ganhar vulto foi a explicação ambientalista da realidade regional defendida pelo

alemão Ratzel, que vinculava a existência de diferenças regionais às formas

naturais distintas de cada porção do planeta. Não tardaria para essa corrente

determinista ser combatida pelo pensamento possibilista, desenvolvido por

franceses, notadamente Vidal de la Blache. Para este, o homem interfere na

natureza de acordo com os seus valores culturais e nível de conhecimento e isto faz

com que cada sociedade crie seu próprio espaço ou suas regiões singulares.

A partir destas abordagens, estruturou-se o conceito de região geográfica (de

acordo com a literatura francesa) ou o de região-paisagem (seguindo pensadores

alemães e norte-americanos). Para todos, caberia ao geógrafo o estudo, ainda que

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descritivo, sobre os fenômenos naturais e humanos que baseavam as

singularidades observadas nas diversas áreas conhecidas do planeta. Neste

contexto, Hettner, na Alemanha, defendendo o conceito de região-paisagem como

síntese e objeto da Geografia, se destacou por indicar que a simples descrição dos

fenômenos observados não permitiria a explicação das formas regionais e que, para

tal empreitada, estudos mais dinâmicos ofertariam resultados proveitosos. Ainda no

início do século XX, nos Estados Unidos, Sauer (que valorizou a análise cultural das

regiões-paisagens) e Hartshorne (que, para além do objeto, estava preocupado com

o método da Geografia, defendendo o regional como o único possível para integrar

fenômenos heterogêneos) ofereceram importantes contribuições ao debate.

Uma guinada significativa foi apenas observada a partir dos anos de 1950 com

a forte influência do pensamento positivista lógico e dedutivo que adjetivaram o

método científico da época como teorético-quantitativo. No contexto da Geografia, a

região passou a ser vista como uma criação intelectual definida a partir de

instrumentos classificatórios utilizados amplamente nas ciências naturais. A análise

numérica e estatística ficou evidente e Corrêa (1986, p. 32) nos lembra que a região

era definida como uma classe de área ou “um conjunto de lugares onde as

diferenças internas entre esses lugares onde as diferenças internas são menores

que as existentes entre lês e qualquer elemento de outro conjunto de lugares”.

Buscando a explicação das diferenças regionais via padrões espaciais

quantificados, esta abordagem utilizou fartamente o arsenal de teorias de

localização e de desenvolvimento regional ou já existentes ou desenvolvidas

naquele contexto. São exemplos: a Teoria do Estado Isolado de Von Thunen (de

1826)40, a Teoria da Localização Industrial de Alfred Weber (1909)41, a Teoria das

Localidades Centrais de Walter Christaller (1933)42, a Teoria dos Pólos de

40 Von Thunen procurou demonstrar que o padrão locacional e as especializações sub-regionais da agricultura alemã estavam relacionados a três fatores básicos: produtividade física da terra, distância aos mercados e custos de transportes. Assim, uma forma elementar de configuração das relações cidade-região seria a relação cidade-campo que conforma o Estado Isolado segundo o autor. 41 Weber, levando em consideração a importância do mercado de trabalho e das economias de aglomeração, procurou enfatizar o papel dos custos de transportes de matérias primas e dos produtos acabados, bem como a localização dos mercados consumidores na determinação da localização industrial. 42 Christaller, em sua teoria, introduz o conceito de centros urbanos e argumenta que a concentração das atividades econômicas ocorre nessas áreas.

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Crescimento de François Perroux (1950)43, a Teoria da Propagação das Ondas de

Inovação de Hagerstrand (1953) e a Teoria Centro-Periferia de J. Fiedman (1969).

Segundo Corrêa (1994), uma crítica contundente a tais posturas foi

desenvolvida a partir dos anos de 1970 quando a análise regional passou a se

fundamentar no materialismo histórico e dialético e na Geografia humanista e

cultural que se desenvolvia. É neste período que o tema da região passou a ser

interesse efetivo de outras áreas do conhecimento humano, ganhando outros vieses

analíticos. Um deles, apesar das críticas, é o que busca a identificação do indivíduo

em suas relações de classe e lugar através de teorias behavioristas dando ênfase

na percepção subjetiva da região. Autores de peso nesta abordagem são Tuan

(1980) e Fremont (1980) que passaram a valorizar a consciência a as atitudes dos

indivíduos em relação ao seu espaço circundante, uma vez que, para eles, tais

indicadores expressam as representações do cotidiano e criam laços de afetividade

do ser social e o lugar. Foi deste segundo autor a expressão “espaço vivido” que,

considerado em toda sua complexidade, revelaria as distintas realidades regionais.

Um outro viés analítico ganhou força a partir dos anos de 1970 e se nutriu de

uma base materialista-dialética para dar à região uma visão totalizante.

Diferentemente das anteriores, a região passou a ser vista como uma materialidade

resultante de processos econômicos desiguais e combinados que consubstanciam a

acumulação capitalista. Lipietz (1988) foi importante no debate ao enfatizar que a

região é resultante de modos de produção diferentes que geram espaços desiguais.

Entre nós, Oliveira (1981), analisando o Nordeste brasileiro, marcou que as regiões

são decorrentes das distintas formas pelas quais o capitalismo se reproduz,

influenciadas ainda pelo peso que a esfera política desempenha nas conformações

regionais. Acreditava ele (e este ponto tem sido amplamente refutado na atualidade)

que as regiões tenderiam a desaparecer devido ao dinamismo do sistema capitalista

que tenderia à homogeneização dos espaços.

Neste viés da análise, a região passou a ser entendida como uma totalidade

menor onde se combinam elementos da esfera geral (que tem o modo de produção

capitalista como elemento uniformizador) e da particular (as determinações do lugar

como elementos diferenciadores). Acrescentando a esta linha a leitura da região

43 É Perroux quem desenvolve a idéia de polarização de um lugar central subjacente ao conceito de região. Ele define região por sua natureza econômica e por sua posição de força no contexto da hierarquia urbana, resultando em “regiões pólo” e “regiões dominadas” (GARCIA; LEMOS, 2004).

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como uma totalidade social, Costa (1988, p. 25) a define como “um espaço não

institucionalizado como o Estado-Nação, de identidade ideológico-cultural e

representatividade política articuladas em função de interesses específicos,

geralmente econômicos, por uma fração ou bloco ‘regional’ de classe que nele

reconhece sua base territorial de reprodução”.

Neste caminho aqui esboçado, nos permite observar que a análise regional

superou o determinismo ambiental (empirista, indutivo, positivista, endógeno e

singular) para assentar-se em um outro tipo de determinismo, igualmente

problemático: o econômico (materialista e dialético, exógeno e global). Sendo

assim, no conjunto da discussão, diferenciam-se aqueles que têm privilegiado a

análise sob a ótica da dimensão política, até então colocada em segundo plano ou

omitida nos textos e debates. Autores como Claval (1979) e sobretudo Raffestin

(1993) e Lacoste (1988) se destacam no contexto. Tentando entender a

organização espacial das sociedades, Claval se lança, mesmo de uma forma mais

generalista, à análise política da região e nos oferece um estudo sobre a origem e

dimensões do poder puro e complexo, abrangendo desde as sociedades arcaicas

até sua atualidade. No entanto, são os outros autores citados que executam um

trabalho detalhado sobre o poder na conformação das sociedades e de seus

territórios, reforçando a tese de que não emana apenas do Estado, mas também de

grupos individuais e coletivos.

Para Raffestin, as diferenças regionais são explicáveis a partir do momento

que se compreende que as representações simbólicas projetadas no espaço

expressam as relações de poder nos distintos grupos sociais. O estudo do poder,

em uma análise relacional, é o que deve estar, para o autor, na base das análises

regionais. Tomando também o fato político para explicar a dinâmica interna das

distintas formações territoriais, Lacoste utiliza o termo “geopolítica interna” para

dizer que as relações de poder entre os atores sociais de um lugar ou de uma

região, suas contradições, seus mecanismos de articulação e os seus

desdobramentos territoriais em diferentes escalas podem ser explicados quando se

percebe o valor estratégico da região no contexto do Estado-Nação.

Identificamos neste arsenal teórico as questões que circunscrevem o nosso

objeto de estudo em suas relações com as redes técnicas do mandar e do fazer

estabelecidas no território como instrumento para viabilizar a circulação e a

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comunicação.44 Raffestin nos mostra como elas se adaptam às variações do espaço

e às mudanças que advêm do tempo e como são móveis e inacabadas. Para ele, “a

rede faz e desfaz as prisões do espaço tornado território: tanto libera como

aprisiona. É porque ela é instrumento, por excelência, do poder” (RAFFESTIN,

1980, p.185).

Esta noção de primeira importância no tratamento da nossa questão é

encontrada também em Lefèbvre e Claval. O primeiro chama a atenção para os

objetos geográficos que permitem a transformação do espaço em território e o

segundo nos faz pensar sobre a mobilidade das idéias e ordens que as redes

permitem realizar. Um ponto que merece atenção neste trabalho de tese é a

propriedade da “conexidade” inerente a rede. Os “nós” são assim lugares de

conexões, de poder e de referência, como sugere Raffestin. É pela conexidade que

a rede solidariza elementos e, ao mesmo tempo, tem o potencial para excluí-los.

As principais matrizes interpretativas da região foram apresentadas para que

pudéssemos observar como a Geografia, disciplina-mãe deste conceito, tem

oferecido elementos para a sua construção e como tais podem ser ampliados e/ou

utilizados no âmbito das demais áreas do conhecimento. Buscamos pensar no

espaço transformado pelos aspectos econômicos, políticos e culturais no processo

histórico com o qual a noção de região, como categoria analítica, expressa uma

especificidade, configurando um espaço particular dentro de uma determinada

organização social mais ampla.

A operacionalização do conceito em tela, doravante reconhecida como

regionalização, se refere ao estabelecimento de uma divisão espacial em “porções”

com características sociais, culturais, ambientais e econômicas semelhantes entre

si e distintas das apresentadas nas demais com as quais constituem o território.

Nosso interesse é pensar a lógica no território fluminense. Acreditamos na premissa

de que o nível de serviços ofertados por uma localidade, seu poder político e

44 Neste caminho, pensemos que toda a história das redes técnicas é a história de inovações que uma após as outras surgiram em resposta a uma determinada demanda social. Uma leitura atenta nos mostra o quanto as inovações nos transportes e nas comunicações redesenharam o mapa do mundo, sobretudo no século XIX. De uma forma geral, as trilhas e os caminhos foram substituídos pelas estradas de ferro no transporte de bens e mercadorias e o advento do telégrafo e telefone incrementou a circulação das ordens. Estas inovações modificam os espaços que, atingidos por linhas de sistemas técnicos permitiram maior velocidade na circulação de bens, de pessoas e de informações, cumprindo sua razão primeira de ser: agilizar o sistema socioeconômico que as desenvolveu. No mundo capitalista de então, observou-se a habilidade com a qual as classes burguesas influenciavam a organização do espaço através dos investimentos nestes sistemas de infra-estrutura, diferenciando regiões dentro da divisão territorial do trabalho.

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simbólico foram, no período trabalhado, os indicadores mais evidentes da

capacidade de polarização que os núcleos urbanos teriam que exercer. Lembramos

que o que se quer enfatizar é a função de pólo aglutinador das forças regionais

desempenhada por determinados núcleos urbanos da província, demarcando áreas

de influência. Estas levavam em conta o poder de atração dado pelo gradiente de

trocas com a capital e pela superação das distâncias, vista a urgência conferida às

matérias que se relacionavam com a abertura de caminhos e custos com o

transporte de uma forma geral. Em muitos casos, a incorporação de determinadas

parcelas do território passava primeiro pela instituição desses núcleos urbanos.

Por fim, observar teoricamente a constituição das cidades brasileiras em

momentos pretéritos, no que diz respeito às suas características e relações, não é

uma tarefa das mais simples visto que o arcabouço conceitual sobre o tema e sobre

a área do conhecimento humano em que está inserido apenas se institucionalizou a

partir do final do século XIX. Lembremos, por exemplo, que na tradição geográfica,

são numerosos os estudos sobre hierarquia e natureza das redes urbanas. No

entanto, tais questionamentos apenas foram colocados a partir das primeiras

décadas do século passado e têm na Teoria dos Lugares Centrais sua principal

referência teórica. Assim, a despeito do fato de que muitos autores têm dado

contribuições importantes para as discussões e de que não faltam textos clássicos

sobre o assunto, a questão dos conceitos a serem considerados para a análise das

formações urbanas do passado continua posta.

No contexto de uma ex-colônia que se torna Império quando o mundo, liderado

por forças econômicas provenientes do continente europeu, caminhava para a

afirmação e expansão do capitalismo em sua fase industrial, tomamos a cidade

como um ponto do espaço geográfico que, inicialmente vista como expressão de

controle sobre um território conquistado e como símbolo de poder e civilização,

avança na apropriação dos excedentes agrícolas, canalizando e controlando a

produção rural para exportação. Mais: se seguirmos Corrêa (2006) e utilizarmos o

termo “rede urbana” como o conjunto de núcleos urbanos funcionalmente

articulados entre si ou a um núcleo principal através de acessos materializados no

território, poderemos falar em uma divisão territorial do trabalho que enfatiza o papel

da rede urbana através das funções de suas cidades.

De uma forma geral, no Brasil, as cidades se configuravam de acordo com o

modelo espacial mais simples de rede urbana (o dendrítico, orientado sobremaneira

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pela conformação fluvial existente) e caracterizava-se pela primazia de única cidade

que, muitas vezes sendo a mais antiga, representava a porta de entrada e de saída

de sua hinterlândia. Este modelo, herança do passado colonial, expressava o

processo econômico de remessa direta dos produtos aos mercados externos à

região explorada. Há de se constatar, neste caso, que: 1) as mediações e fluxos

pouco complexos neste modelo de rede determinam o beneficiamento da cidade

principal em detrimento das demais e 2) o processo evolutivo da organização

espacial tornou a rede urbana mais complexa, mas não eliminou, de um todo, a

herança deixada pela forma dendrítica original da rede considerada.

Em nosso olhar sobre o Brasil do passado, uma direção que nos parece

oportuna é a que relaciona cidade e região, através dos circuitos ou redes criadas

entre os núcleos que emergiam no território, mostrando como determinada cidade

espelhou a região em que estava inserida e, por outro lado, como determinadas

regiões refletiram a ação dos atores hegemônicos urbanos a elas associados.

Quando se pensou em um projeto nacional para o Brasil, as redes imaginadas

e/ou criadas desempenhariam papel primordial na unidade territorial e na

articulação do Império ao circuito econômico que se mundializava. Sabemos que a

constituição de uma rede urbana no país ocorreu de forma lenta nos quatro

primeiros séculos, ditada pelo ritmo da exploração do vasto território e marcada por

baixas densidades, e que apenas no último quartel do XIX, esta dinâmica sofreu

alterações significativas. A partir desta consciência e dos elementos trazidos até

aqui, tomamos o território fluminense e sua sociedade nobiliárquica e estratificada

como recorte para nossos estudos sobre a estruturação de um território em relação

direta com a construção da nação.

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3. Cidade e nação na província fluminense

A província do Rio de Janeiro ocupou lugar de destaque no Império brasileiro

não por ser a porção territorial que envolvia diretamente a capital, mas por que foi a

responsável pela maior parte da renda que sustentou o regime monárquico. A

expansão e o auge da cultura cafeeira em terras fluminenses coincidiu com a

afirmação e o ápice do Estado imperial. Os barões do café que a província produziu

fincaram seu poder não apenas em suas fazendas ou vilas próximas (muitas criadas

ou promovidas por eles neste momento de afirmação), mas principalmente na Corte

onde se faziam decisivos na cena política e determinavam os rumos da nação

brasileira.

Não sem complexidades, reafirmamos o Rio de Janeiro como centro das

disputas travadas no Império e pólo irradiador dos semióforos nacionais, sobretudo

após a conciliação entre saquaremas e luzias. Apesar das descontinuidades físicas

herdadas da colônia e que o país tentou superar, pensamos que a província

também pode ser vista como espelho do que foi experimentado naquele momento

em termos de administração pública e suas relações com as ações privadas.

Ao lembrar de Machado (1990), enfatizamos os acordos necessários entre

centralização e interesses regionais para o estabelecimento da unidade territorial

como unidade política. Assim, ao se defender a primeira assegurava-se na verdade

a propriedade privada da terra e de escravos e a reprodução de uma organização

social e do trabalho, afastando a possibilidade de ameaças representadas pelos

movimentos urbanos em sua maior parte.

É no trato destas questões que olhamos para o espaço fluminense. As

ideologias geográficas que permearam as teias do poder estabelecido denotaram

um uso do território igualmente hierarquizado e baseado na busca por regiões de

domínio. Neste cenário complexo, o café e as cidades nos parecem instrumentos

para tal intento.

Entendemos que para perceber o conjunto das interferências no espaço da

província durante o período imperial não podemos deixar de aludir ao papel que a

cultura cafeeira representou neste processo, seja no chamado “sertão do oeste”

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(capitaneado por Vassouras) ou posteriormente no “sertão do leste” (cujo pólo foi

Cantagalo). No entanto, uma cultura do açúcar consolidaria uma pujança no norte e

noroeste do território (liderada pela cidade de Campos) e um boom da extração de

sal em Cabo Frio traria ainda algum destaque em termos de relevância territorial. Do

outro lado da moeda, o desenvolvimento técnico dos transportes e mais

especificamente a construção de ferrovias da mesma forma que criaria uma

intensificação dos projetos econômicos de dadas porções do Rio de Janeiro

também faria com que outras experimentassem o isolamento e a perda de

importância relativa entre os “lugares” da província.

Como dizíamos, todas estas questões são essenciais para se entender o

conjunto das interferências no espaço da província durante o período imperial. Mas

discorrer sobre o território legado pelos anos de colônia é essencial para entender

os nexos desse processo. Afinal, a permanência de expressões como “certão

d’oeste” ou “certão d’leste” em momentos de afirmação de uma civilidade associada

a ambientes urbanos é, no mínimo, motivo para curiosidade.

3.1. O território legado

Já foi dito que o mecanismo jurídico-administrativo de controle territorial que

Portugal utilizou no Brasil era baseado nas doações feitas em Cartas de Sesmarias

que, destacadas do domínio público, viriam a constituir-se em terras de domínio

privado. Neste contexto, as terras que pertenceriam à província fluminense se

inseriam na Capitania de São Vicente, na de São Tomé (depois Paraíba do Sul) e

na pequena Capitania Real do Rio de Janeiro (inserida no interior da primeira).

Sobre a constituição desse território, é importante relatar que:

Martim Afonso de Souza foi contemplado com 100 léguas de costa, sendo a Capitania que lhe foi doada denominada São Vicente e dividida em dois lotes. O primeiro com 55 léguas, tendo o rio Macaé como marco inicial, ia ate o rio Carupacê ou Juquiriquerê; apos a expulsão dos franceses e tamoios, em 1567, este, em virtude do abandono do donatário, reverteu a Coroa, passando a denominar-se Capitania do Rio de Janeiro. O segundo lote, um pouco menor, com 45 léguas, com inicio na foz do rio São Vicente, ia findar-lhe na Ilha do mel, a entrada da baia de Paranaguá. A Pero de Góis da Silveira

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foi destinada à área compreendida entre a foz do rio Itapemirim, no paralelo 21, e a do rio Macaé, conforme o Alvará expedido em 10 de marco de 1534, confirmado pela Carta de doação de 28 de janeiro de 1536, denominado Capitania de São Tome e, posteriormente, capitania do Paraíba do Sul. Não tendo contudo, Pero de Góis, em face dos constantes ataques dos goitacazes, condições de honrar os seus compromissos, mormente o assumido com o negociante e armador lisboeta Martim Ferreira, da exportação anual de alguns milhares de arrobas de açúcar e dar continuidade à empresa, apos refugiar-se no Espírito Santo, manifestou o referido donatário, por carta de 29 de abril de 1546, o abandono da capitania. Setenta e três anos mais tarde, em 1619, o seu filho, Gil de Góis da Silveira, a ela renunciou a favor da Coroa. Em 1709, e criada a Capitania de São Paulo e Minas do Ouro, a qual, em 1720, se divide em duas, constituindo-se, respectivamente, as de São Paulo e a de Minas Gerais, estabelecendo-se novos limites com as capitanias do Rio de Janeiro e a de São Tome. Dentro da área territorial dessas duas capitanias, teve assento à província fluminense, ao ser instituída pela Carta de 25 de marco de 1824 e corporificada através do Ato Adicional de 12 de agosto de 1834. Com a criação das províncias do Rio de Janeiro e a do Espírito Santo, a divisa estabelecida inicialmente pelos donatários pero de Góis e Vasco Fernandes Coutinho, tendo por marco o paralelo 21, é deslocada para o rio Itabapoana. Dentro desses limites especificados, formou-se o território do Estado do Rio de Janeiro (ABREU, 1994, p. 5-6).

Podemos dizer a sua ocupação inicial foi motivada pelo receio português em

relação à presença francesa na região. É neste contexto, inclusive, que se dá em

1565 a fundação da cidade do Rio de Janeiro, tomada por este título por ter sido

instituída pelo poder real. A despeito da feitoria de Cabo Frio, este foi o primeiro

assentamento urbano verificado no nosso recorte espacial e não tardaria a

monopolizar os fluxos que foram se estabelecendo no seu entorno, consolidando-se

como entreposto portuário e comercial. A partir deste ponto na entrada da Baía de

Guanabara, a ocupação da região se estendeu pela própria Baixada da Guanabara

e seguiria em direção a serra e à Baixada Campista (LAMEGO, 1963).

Nesse processo, o governo português atuava para assegurar sua possessão

distribuindo sesmarias. Ao final do século XVI, parte do entorno da cidade do Rio de

Janeiro já estava ocupado e, em seguida, seria estendida o povoamento tanto do

litoral sul (através da fundação de Angra dos Reis e do surgimento da vila de Parati)

quanto da costa em direção aos lagos (a exemplo de Cabo Frio). A área campista,

que pertencia à Capitania de São Tomé, teve suas terras anexadas à Capitania do

Espírito Santo por conta das constantes lutas entre seus donatários e a população

local. Na área, já existia alguns arraiais e a Vila de São José, de 1677.

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O início da ocupação do território fluminense esteve integrado ao processo

maior de articulação primitiva do capital mercantil açucareiro. Portanto, a

dinamização que ele iria experimentar se deu por conta dos engenhos de açúcar

instalados no interior da Baía, além da atividade de exploração de madeira. Nos

dois casos, o estabelecimento de diversos portos fluviais foi essencial para viabilizar

o escoamento da produção e a estruturação física daquele recorte. Fridman (1999),

no capítulo “Cidades flutuantes”, já se debruçou sobre esta questão mostrando

como estes portos e as inúmeras fazendas do recôncavo da Guanabara traduziam a

associação da iniciativa privada à empresa colonizadora portuguesa. Empresa esta,

que na região fluminense muito deveu aos engenhos. Com efeito:

Dos séculos XVI até o XX, a cana de açúcar representou a principal atividade econômica da Baixada, estabelecendo-se logo após a expulsão dos franceses em 1567. A chamada “zona velha” do açúcar se caracterizou pela existência de médias e grandes propriedades que se instalaram principalmente próximas às bacias dos rios Meriti, Sarapuí, Iguaçu, Pilar, Saracuna, Inhomirim, Suruí, Magé, Guapimirim, Macacu e Guaxindiba. O bom êxito dessa cultura, aclimatada à região, concorreu para a multiplicação dos engenhos que se espalharam desde os extremos costeiros de Parati e escarpas serranas até as planícies de Campos (CRHYSOSTOMO, 2003, p. 149).

É importante observar que, desde esse momento, durante o século XVII, a

economia do Rio de Janeiro foi baseada nessa produção de açúcar e aguardente a

ponto de todas as demais atividades se submeterem aos movimentos desta

produção. Cabe frisar que Campos se destacaria neste contexto e a colônia como

um todo, favorecida por incentivos do governo português e por um cenário

internacional favorável, viria este produto suplantar em importância econômica a

exploração de madeira que tanto rendera aos cofres portugueses. Há de se

destacar também que a maioria das unidades produtoras da região era formada por

pequenos engenhos utilizando-se de técnicas rudimentares em glebas que haviam

servido de teste com a pecuária.

Um outro ponto a se marcar é o fato de que os donatários desempenhavam as

funções de produtores, exportadores e responsáveis pelo comércio em suas terras.

Este, de fato, não chegou a promover o povoamento da colônia nem nas poucas

capitanias em que o empreendimento colonial surtiu resultados efetivos. Podemos

dizer que praticamente não existia comércio nos pequenos povoados em uma

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realidade distinta dos principais portos. No processo de expansão da cana para

regiões mais distantes, portos como o de Angra e Parati, ao sul, e o de São José da

Paraíba do Sul (atual São João da Barra), no norte, assumiram a centralização da

produção local e o recebimento de produtos que chegavam de Portugal pelo porto

do Rio de Janeiro.

Por terra, os caminhos ainda eram insuficientes para um povoamento. Mas não

era esta a única questão. O fato de não haver, naquele momento, uma ocupação

nas áreas mais altas da capitania ocorria por conta de impedimentos técnicos

relativos à:

(...) barreira da Serra do Mar e ao (...) relevo compartimentado de planalto neste trecho e sua cobertura florestal contínua (...) a inexistência de um curso fluvial navegável e (...) ausência de trilhas indígenas, que orientassem a penetração dos primeiros exploradores, impediram, por dois séculos a expansão para o interior a partir do Rio de Janeiro, ao contrário do que se daria em Santos e São Paulo, onde apesar da mesma barreira (...) as demais condições eram favoráveis (LIMONAD, 1996, p. 84 apud BERNARDES, 1964, p. 58).

Com a prosperidade açucareira, a cidade do Rio de Janeiro continuava sendo

a única aglomeração naquelas extensões. Somando-se às indicações de

Bernardes, lembremos do fato de que donatários geralmente dividiam com

subalternos mais próximos a missão de fundar vilas para melhor prestar serviço a

Coroa, possibilitando um quantitativo maior de núcleos nessas capitanias em

detrimento das reais. Talvez estas condições reunidas expliquem a dinâmica na

Capitania de São Vicente (da qual faziam parte Angra dos Reis e Parati) e na

Capitania do Espírito Santo (para a qual foram incorporadas Campos e São João da

Barra em 1753).

Aliás, esta incorporação aconteceu no momento em que a região se

consolidava como a principal produtora de açúcar face ao declínio desta atividade

no recôncavo da Guanabara. A população rural de Campos que era de

aproximadamente 12.000 habitantes em 1752 já alcançava os 50.000 em 1814

(BERNARDES, 1957, p. 197). A autora ainda nos informa que no fim do século XVIII

mais da metade dos engenhos fluminenses estava em Campos e esta dinamização

da produção fizera com que alguns centros de comercialização surgissem no início

do XIX, como foram os casos de Macaé (que já existia como aldeamento defensivo

desde 1615) e Maricá (que seria anexada logo depois à povoação de Praia Grande,

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futura Niterói). Este aspecto difusor de uma hegemonia local verificado em Campos

se deveu em grande parte à precariedade de sua ligação com o Rio de Janeiro.

Tanto que sua produção era escoada pelo pequeno porto de São João da Barra e

depois pelo de Macaé.45

Afora a iniciativa de particulares no uso do solo e na gestão da economia,

outros agentes fizeram parte da empresa portuguesa de colonização. Como parte

da política da metrópole, o território da colônia também foi tomado por aldeamentos

e freguesias. Os primeiros serviam para a submissão dos indígenas, usando-os no

domínio do território, na segurança dos caminhos e na produção econômica, e

existiam desde 1575. Tais aldeamentos consistiam em uma das formas comuns de

origem de núcleos urbanos no período colonial. Além da Aldeia de Nossa Senhora

das Neves de Macaé, já citada, existiram na área do atual estado do Rio de Janeiro

as de São Lourenço (Niterói), São Barnabé (Itaboraí), São Francisco Xavier

(Itaguaí), Nossa Senhora da Guia (Mangaratiba), São Pedro (Cabo Frio), Sacra

Família de Ipuca (Casemiro de Abreu), Santa Rita (Cantagalo), Santo Antônio de

Guarulhos (Campos), São Fidélis de Sigmaringa (São Fidélis), São José de

Leonissa ou da Pedra (Itaocara), Santo Antônio de Pádua (Santo Antônio de

Pádua), São Luis Beltrão (Resende), Nossa Senhora da Glória (Valença) e Santo

Antonio do Rio Bonito (Conservatória).

Por sua vez, as freguesias eram divisões administrativas submetidas à

jurisdição espiritual de um representante da igreja católica, que exercia a

administração civil em nome do rei. Fridman (2008) lembra que, em meio à estrutura

eclesiástica centralizadora, o expediente das freguesias favoreceu o envolvimento

maior de cada pároco com as famílias locais do que com o bispo que lhe era

superior. Enfatiza ainda o caráter local da vida política ao lembrar que o fato de

pequenas povoações sempre se iniciarem a partir de cruzeiros ou capelas

demonstra um “sistema patriarcal do domínio político” e uma mistura entre a coisa

pública e o negócio privado na ordem espacial. Um esquema revelador do

surgimento de muitas vilas e povoados na colônia por este processo é ilustrado a

seguir.

45 Apenas no século XIX, iria se desenvolver uma relação de dependência entre o Rio e Campos. Macaé, a meio caminho, seria a “porta para o norte fluminense”.

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Figura 1: Surgimento e evolução de núcleos urbanos coloniais a partir de um marco religioso.

Fonte: MACEDO (2002, p. 163, a partir da reunião das imagens de MARX, 1991).

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124

Para muitos estudiosos do assunto, há de se pensar na instituição de

freguesias como uma decisão que imbricava uma ordem urbana de base patrimonial

e eclesiástica. Como foram constantes, suas instalações indicaram os locais de

povoamento nas capitanias e as conexões estabelecidas na região. Eram comuns

as doações de terrenos às igrejas com a recompensa em forma de postos na

hierarquia pública ou militar, estreitando os vínculos entre religiosos e a “nobreza da

terra”. Na área do atual estado do Rio de Janeiro, foram identificadas as seguintes

freguesias no último quartel do século XVIII: Nossa Senhora da Piedade orago do

Iguaçu; Nossa Senhora da Guia orago de Pacobaíba; Nossa Senhora d´Ajuda orago

da Ilha do Governador; Nossa Senhora do Desterro orago de Itambi; Santíssima

Trindade orago de Santíssima Trindade; Nossa Senhora da Conceição orago do

Alferes; São João Marcos orago de João Marcos; Nossa Senhora da Conceição

orago de Campo Alegre; São Tiago orago de Inhaúma e Sacra Família orago do

Caminho do Tinguá, São Salvador do Mundo orago de Guaratiba; Nossa Senhora

d´Ajuda orago de Guapimirim; Nossa Senhora do Amparo orago de Maricá; Nossa

Senhora de Nazaré orago de Saquarema; Santana de Macacu; Nossa Senhora da

Conceição, São Pedro e São Paulo orago da Paraíba caminho de Minas Gerais;

São Lourenço orago da aldeia dos índios; Nossa Senhora da Conceição orago de

Marapicu; São Francisco Xavier orago da aldeia de Itaguaí; São Barnabé orago da

aldeia dos Índios; Nossa Senhora da Conceição orago de Iguaba; Sacra Família

orago da aldeia de Ipuca; Nossa Senhora da Guia orago da aldeia de Mangaratiba;

Nossa Senhora da Conceição orago do Rio Bonito, Santíssimo Sacramento orago

de Cantagalo e São Sebastião orago de Araruama.

O Mapa 4 a seguir mostra a delimitação aproximada destas freguesias

desenhada por este autor para Fridman (2008) em seu trabalho a partir das

anotações realizadas pelo Monsenhor Pizarro (iniciadas em 1781 e publicadas em

1794) referentes àquelas localizadas no recôncavo norte ocidental, enseada de

Angra dos Reis e da vila de Santo Antônio de Sá (fundada em 1697 e atual

Cachoeiras de Macacu). A idéia era a de confirmar parcelas do território abarcadas

pela política portuguesa em parceria com agentes privados e a Igreja, tomados

como seus representantes em terras coloniais. Não significa que naquele período

toda a área do atual estado do Rio de Janeiro estivesse ocupada, mas denota o raio

de alcance em que a Coroa desejava que seus párocos atuassem.

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125

Mapa 4: Freguesias fluminenses (Século XVIII e início IX)

Elaborado pelo autor para FRIDMAN (2008).

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126

A divisão do território, tal qual o mapa mostra, nos dá a dimensão da

importância que os sistemas de comunicação deveriam desenvolver. De início muito

modesto, estes sistemas também se inserem na discussão que trouxemos sobre

uma política territorial portuguesa de caráter urbano. Na área em estudo, o

surgimento dos primeiros núcleos populacionais esteve associado à abertura

dessas vias de circulação. Se as primeiras seguiam o traçado das originais trilhas

indígenas, as seguintes estavam enquadradas em determinações para o

povoamento e que foram intensificadas em número e em movimentação com o

advento da exploração do ouro nas Minas Gerais.

É fato que um primeiro surto urbanizador vivido na colônia ocorreu na região

mineira quando um grande contingente de populacional para lá convergiu, fazendo-

se necessária a infraestrutura para residência, consumo e trabalho. De lá, foram

estabelecidos os primeiros acessos efetivos vindos das capitanias do nordeste e

incrementados os abertos por bandeirantes vindos das “bandas do sul”. Entre 1711

e 1718, oito vilas surgiram na paisagem enquanto o conjunto de vilas e cidades na

área da província fluminense somava sete e não se ampliou mesmo com o fato da

produção ser escoada pelo porto carioca. Em “bandas de cá”, apenas o pouso de

Paraíba do Sul viria a se estruturar e tornar-se povoação. A partir destas questões,

há de se perceber o conjunto de núcleos urbanos em terras fluminenses durante os

séculos XVII e XVIII conforme a tabela a seguir.

Tabela 3 : Vilas e cidades fluminenses criadas durante o período colonial. Município Ato de criação Instalação Rio de Janeiro Ato de 1565 1567 Angra dos Reis Ordem régia de 1608 1624 2a vila Cabo Frio Ato de 1615 1615 Parati Ordem régia de 1654 1667 Campos dos Goytacazes Ato de 1677/73 1677 São João da Barra Ato de 1677 1677 Santo Antonio de Sá Alvará de 1697 1697 (Distrito extinto em 1908) São Jose d`El Rei Alvará de 1772 1783 (Incorporado a Itaboraí em 1833) Magé Ordem régia de 1789 1789 Resende Carta régia de 1786 1801 São João Marcos Alvará de 1811 1813 (Extinto em 1938) Macaé Alvará de 1813 1814 Cantagalo Alvará de 1814 1815 Maricá Alvará de 1814 1815 Itaguaí Alvará de 1818 1820 Praia Grande (Niterói) Alvará de 1819 1819 Nova Friburgo Alvará de 1820 1820 Valença Alvará de 1823 1826

Fontes: ABREU (1994) e CIDE (1998).

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127

A ação colonizadora consubstanciada na apropriação do território fez surgir

vilas e cidades, caminhos e pontos de pouso ou de comércio, além de portos e

ancoradouros. Esta retaguarda garantiu a prosperidade da cidade do Rio de Janeiro

que teve seu porto utilizado para remeça da produção local para o exterior e como

porta de entrada do território para os produtos que vinham da metrópole. A primazia

da cidade foi confirmada com o advento do ouro quando os produtos que nela

chegavam de Portugal passaram a abastecer as Minas Gerais, Goiás e Mato

Grasso e quando passou a ser a plataforma de exportação do ouro daquela

região.46 O papel comercial desempenhado pela cidade ressaltava sua importância

política, cuja origem se manifestara desde 1572 quando fora escolhida sede do

governo do sul por conta da sua posição geográfica estratégica.

A cidade firmar-se-ia ainda como centro político, administrativo e financeiro de

uma sociedade dominada por Portugal quando adquiriu o status de sede da capital

do governo no século XVIII em meio ao desejo da metrópole de legitimar seu

território no extremo sul e impedir o contrabando do ouro. Ao longo de sua história,

a cidade incorporou papéis que lhes possibilitava funcionar como ponto de

drenagem de produtos, ordens e serviços em escala regional por assim dizer. Tal

situação seria exacerbada quando da chegada da família real.

A despeito do que acontecia nas baixadas e no litoral em termos de

incorporação efetiva do território à Coroa, o interior fluminense ainda era em boa

parte apenas espaço. Não muito distante do final do período colonial, os mapas

produzidos demonstravam como os seus “certões” ainda eram expressivos e

demandariam novas ações para o controle do território. Não foi sem propósito que a

carta régia de 18 de janeiro de 1751, endereçada ao governador, expressou ordem

de Dom José I para a domesticação do “gentio bravo” em todos os “sertões que

correm para a parte do norte da capitania”. Ver Mapa 5 a seguir.

46 Já em 1750, amplas regiões do oeste e do sul da colônia estavam atreladas ao porto e comércio do Rio de Janeiro pelo Caminho Novo de Garcia Rodrigues, aberto em 1725, que saindo do litoral atingia o Mato Grosso.

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Mapa 5: “ Certões” da Capitania do Rio de Janeiro no final do século XVIII

Base: Carta Geográfica da Capitania do Rio de Janeiro elaborada pelo Ajudante de Engenheiro João Jorge Lobo em 1778 (Arquivo Nacional).

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A ilustração nos mostra também que a área a ser ocupada pelo café era, na

época, um dos espaços a serem convertidos em território. Sobre a região, registrou-

se que os Coroados dificultavam o estabelecimento de “qualquer fabrica de açúcar

ou de aguardente” e “os poucos brancos viviam do cultivo da mandioca, do milho e

de alguns legumes e do comercio com os viajantes da Estrada Geral” (PIZARRO,

1945, vol. 4, p. 91).

Em sua expansão, o café traria à tona o expediente da ação colonizadora

urbana e, neste sentido, a importância da cidade é novamente acentuada.

Entendemos ser importante recuperar Ribeiro (2006, p. 177) quando diz que o

Brasil, surgido “pela via evolutiva da atualização histórica, nasceu já como uma

civilização urbana” e que esta, “vale dizer, separada em conteúdos rurais e

citadinos, com funções diferentes mas complementares e comandadas por grupos

eruditos da cidade”. Ao longo da história brasileira, variadas têm sido as funções

desempenhadas pelos núcleos urbanos com o ritmo maior de sua apropriação:

suporte ao povoamento, centros de controle político e de armazenamento da

produção agro-extrativa, pontos de conexão com os circuitos mercantis, pólos de

crescimento industrial e ou os atuais nós de redes financeiras e informacionais.

Para Egler (2001, p. 38-9), entre nós, podem ser identificadas três formações

territoriais distintas, expressando as correspondentes relações entre cidade e

campo e entre as cidades no processo de desenvolvimento brasileiro: “escravista

atlântica”, “agro-mercantil nacional” e “urbano-industrial nacional”.

Ao lembrar da lógica de funcionamento do comércio triangular atlântico, o autor

destaca a necessidade de se melhor compreender o papel desempenhado pelas

relações cidade e campo em uma economia submetida ao monopólio mercantil e

controle metropolitano, durante a fase colonial, ou de estruturas de poder

oligárquicas e latifundiárias, durante o período de formação dos Estados Nacionais.

Voltamos ao questionamento que o professor Roberto Lobato Corrêa indicara sobre

um viés que assimilasse a história territorial brasileira a partir das relações entre

rede urbana e oligarquias ou, em outras palavras, o papel da cidade em tempos

pretéritos à afirmação do capitalismo e da ciência urbana.

Sobre esta temática, em meio às discussões mais atuais sobre a cidade no

passado, vale ressaltar que:

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(...) destaca-se a comprovação de que a economia colonial era muito mais complexa do que se pensava anteriormente, o que coloca em xeque (ou relativiza) uma série de afirmações consagradas. É o caso, por exemplo, das teses que (...) pregam a impossibilidade de realização de acumulação endógena à colônia (...) (ABREU, 1996, p. 149).

O caso da cidade do Rio de Janeiro nos mostra que na fase “escravista

atlântica”, cidade e campo foram faces da mesma moeda consubstanciada pelo

estabelecimento mercantil, não havendo uma nítida separação de funções pois

estas eram complementares. A cidade era uma extensão do campo e do seu ritmo

dependia para definir seu fazer. De contrapartida, no contexto da formação e

consolidação nacional, o espaço urbano inicia um processo de diferenciação de

suas atividades em relação ao campo. As cidades começaram a adquirir funções

urbanas associadas à acumulação do capital mercantil e à sua aptdão financeira.

Mais ainda: até certo ponto, podemos perceber o fortalecimento de uma capacidade

endógena na cidade capaz de nutrir a produção no campo.

Pensamos ser importante trazer esta discussão uma vez que a cidade

oitocentista no Brasil, a tomar pelo exemplo fluminense, apresentou tais

características. As casas comissárias no Rio de Janeiro e as pressões dos

agraristas contra os novos ventos que chegavam da Europa ilustram este aspecto.

Ajudam também a entender como a base escravista que foi capaz de unir posições

políticas e ideológicas contrárias limitaria a expansão e acumulação ampliada da

economia nacional.

Para encerrar este item sobre o quadro do território fluminense anterior a 1822,

podemos sintetizar as transformações aqui observadas. Ao longo do período

colonial, sua área teve a ocupação e circulação determinados pelo ritmo e eficácia

da base técnica disponível e pelo conjunto de políticas portuguesas para o controle

territorial (sesmarias, fortificações, instituição de vilas e cidades divisão física em

freguesias e comarcas, aldeamentos, abertura de caminhos, registros, portos e

ancoradouros), muitas em parceria com a ação de particulares que tomavam para si

o ônus e o poder decorrente da conquista.

Até finais do século XVII, o espaço fluminense apresentava pequenos núcleos

(quase todos aldeias ou aldeamentos) localizados principalmente próximas aos

cursos de água. O controle da Coroa também se manifestava pela rede de

fortificações que foi se constituindo no entorno da baía de Guanabara e pela

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atuação dos religiosos na cidade do Rio de Janeiro, nos seus arredores e,

posteriormente, em localidades mais distantes (levando a religião e a administração

portuguesa). A missão de “levar a metrópole para o interior” também foi dada aos

proprietários particulares que, explorando rotas e instituindo povoações,

estabeleceram as comunicações possíveis frente às condições do meio e á

presença indígena.

A abertura de picadas e caminhos, bem como o maior conhecimento e uso das

vias fluviais, marcaria um outro momento na ocupação fluminense. Desta vez, com

uma presença mais efetiva da Coroa por conta economia em torno do ouro.

Pensamos ser deste momento um primeiro desenho das regiões que

caracterizariam o território e que demandariam técnicas de circulação e comando

para a sua posterior incorporação efetiva e integração. Neste contexto, o processo

histórico definiria também os novos grupos que entrariam na disputa por poder

político, econômico, social e espacial.

Por fim, é importante indicar alguns vetores da ocupação fluminense

estabelecidos a partir da proeminência do Rio de Janeiro. Em direção à cidade de

Campos, a atividade açucareira fez surgir novas localidades na região norte e ao

longo do caminho até a capital (que subordinou inclusive todo o território em torno

de Vitória na capitania vizinha). Em direção à antiga área mineradora, a abertura de

caminhos havia estabelecido algum tipo de povoamento na “serra acima”, mas com

o declínio as áreas mais remotas subsistiram em torno de pequenos centros. Por

fim, em direção ao litoral sul, a realidade experimentada por Angra dos Reis e Parati

como entrepostos do açúcar, aguardente e ouro passava por um breve momento de

inflexão. Em todos os casos, o café traria uma outra dimensão para os fatos.

3.2. O movimento da economia fluminense e suas cida des

Nesta tese, já havíamos marcado as principais linhas da expansão cafeeira no

Brasil. No entanto, agora nos interessa em particular a sua marcha no território

fluminense, onde se iniciou como uma cultura de quintas e chácaras em locais onde

hoje está o perímetro urbano carioca. Expandiu-se na velocidade do aumento de

sua cotação e consumo no mercado internacional e o seu vetor partiu do Arraial de

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Mataporcos, no Estácio, e das serras da Tijuca, Gávea, Jacarepaguá e Campo

Grande, expandindo-se para a vila de São João Marcos e depois para o Vale do rio

Paraíba do Sul até Campo Alegre (atual Resende).47

O Vale se constituiu em grande centro cafeicultor a partir da década de 1820 e,

naquele tempo, por toda parte já não existiam mais terras disponíveis para plantar

café. Pois,

Depois que as minas de ouro começaram a se esgotar e a liberdade de comercio passou a dar maior valor aos produtos coloniais, os chefes de famílias voltaram as vistas para a agricultura e se pode esperar ver multiplicarem-se, dentro em breve, os habitantes nas vastas matas que margeiam a parte dos caminhos de Vila Rica mais próximas do Rio de Janeiro (SAINT-HILAIRE, 1975, p. 40).

A região utilizada como passagem para as minas e os caminhos que haviam

sido abertos possibilitaram a ocupação do café no antigo eixo do ouro.48 Além do

mais lá se encontravam condições favoráveis para o cultivo desta rubiácea:

importância e proximidade da cidade do Rio de Janeiro, fatores geográficas (terreno

sem escarpas ásperas, solo fértil, inclinações suaves na superfície do planalto),

recursos originários das minas e do setor de subsistência mercantil, além dos

referidos caminhos do ouro. Na seqüência, a Tabela 4 mostra a importância do café

para a economia da província fluminense e a Tabela 5 possibilita observar a sua

representatividade na renda geral do Império.

47 D. Jose Justiniano iniciou o cultivo em suas terras do Capão (Irajá) e distribuiu mudas e sementes para outros padres. Entre eles estava o Pe Antonio Couto da Fonseca que as plantou em suas terras em Campo Grande e no Arraial de Nossa Senhora do Campo Alegre, iniciando o cultivo no Vale do Paraíba (MACHADO, 1993). 48 As picadas que partiam do litoral para as antigas regiões das minas foram aproveitadas no vale do café a exemplo do Caminho Velho (que ligava Guaratinguetá a Parati e depois ao Rio de Janeiro através de Itaguaí e Santa Cruz) e do Caminho Novo de Garcia Rodrigues Paes (conectando Paraíba do Sul a Baia de Guanabara via Irajá ou o porto de Iguaçu).

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Tabela 4 : Principais receitas da província fluminense no ano financeiro 1841/1842 Imposto (Repartição): Total:

Dízimo do café 589:311$967 Patente sobre aguardente de consumo 48:103$400 Direitos de portagem 48:005$950 Legados e heranças 44:790$004 Dívida ativa 1832/1833 a 1841/1842 33:137$163 Meia siza 26:708$654 Décima urbana 15:995$152

Fonte: RIO DE JANEIRO (1843).

Tabela 5 : Participações das províncias nas rendas gerais do Império (1859/1864) Províncias Termo médio das rendas % do total das rendas Rio de Janeiro e Município da Corte 26:914$000 54,45% Pernambuco 6:066$000 12,27% Bahia 5:771$000 11,68% São Pedro (Rio Grande do Sul) 2:889$000 5,84% Grão Pará 1:823$000 3,71% Maranhão 1:535$000 3,10% São Paulo 1:458$000 2,95% Ceará 617$000 1,24% Minas Gerais 585$000 1,18% Alagôas 365$000 0,74% Parahyba 351$000 0,71% Paraná 202$000 0,40% Sergipe 162$000 0,32% Sancta Catharina 159$000 0,32% Piauhy 151$000 0,30% Rio Grande do Norte 129$000 0,26% Matto Grosso 118$000 0,23% Espírito Santo 66$000 0,13% Goyaz 21$000 0,04% Amazonas 17$000 0,03% Total 49:402$000 100,00%

Fonte: VITORINO (2002, p. 157). Com a consolidação da atividade ocorreria a ocupação efetiva deste interior

fluminense. A região serrana transformou-se com o café. Resende, que era apenas

um local de passagem dos povos de São Paulo e das Gerais, não tardaria a

constituir-se em ponto de difusão do café para Barra Mansa, Vassouras, Valença,

Paraíba do Sul e Barra do Piraí, sendo a primeira vila da serra (1801) e elevada a

cidade em 1848. Praticamente toda a província do Rio de Janeiro viveu alguma

experiência relacionada com o cultivo do café, inclusive áreas litorâneas. No entanto

os vetores de expansão foram bem definidos por uma conjuntura de fatores.

Cantagalo, por exemplo, foi pólo de irradiação do café para a parte oriental da

região serrana (ocupada por indígenas em suas densas matas) como Resende era

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para a parte ocidental (antes pouco circulada por tropas). Rapidamente, os cafezais

de Vassouras e Valença encontraram os de São Gonçalo e Cantagalo.

Vassouras era um simples pouso quando a região era ocupada por mineiros

que cultivavam o anil e criavam porcos e carneiros. Logo virou o centro dos grandes

latifundiários fluminenses. Esta ocupação foi devida à construção de variantes do

Caminho Novo em direção a Pati do Alferes, Pau Grande e Sacra Família do Tinguá

pela margem direita do Paraíba do Sul. Tornou-se símbolo da cafeicultura

fluminense e seus fazendeiros receberam importantes títulos nobiliárquicos,

fazendo-se presente nos salões da Corte e na arena política imperial. Era tempo de

saquaremas, conforme nos indicou Mattos (1994) quando destrinchou o “mundo do

governo” da época. “Mundo” este que também se representaria na idéia de

civilidade que estes nobres bebiam.

Quanto ao território desta região, a sua infra-estrutura herdada da colônia foi

prontamente adensada por novos caminhos e freguesias, além da constituição de

novos núcleos como se vê no Mapa 6 adiante.

Se o centro do café imperial era fluminense e era em Vassouras, outras

localidades iriam também se destacar em opulência e prestígio, ilustrando a forma

de tomada do território. Valença, que se tornou importante centro da região, era

antiga área indígena dos coroados que foram sendo exterminados na medida em

que o café avançava. Era um dos “certões” indicados no Mapa 5. Em 1789, Ignacio

de Souza Werneck havia subvertido os índios daquela localidade e depois se

tornara um dos grandes nomes da região. Segundo Pizarro, as orientações da

Coroa eram de “cultivar a terra bravia de indivíduos criados à lei da natureza (...)

agregar ao Estado tão numeroso povo, lançando-se mão das terras por eles

ocupadas sem o menor beneficio da lavoura” (PIZARRO, 1945, vol. 5, p. 253). Em

1823, Valença já era vila com território desmembrado de Resende e São João

Príncipe e em 1857 era cidade. Ainda floresceram na região os núcleos de Barra

Mansa (desmembrada de Resende), Piraí, Barra do Pirai e Paraíba do Sul,

formando as principais fortunas da época como no caso do Comendador Breves, do

Barão de Piraí e das famílias Werneck e Lacerda.

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Mapa 6: Caminhos freguesias e aldeias na região de Vassouras no início do século XIX.

Confeccionado pelo autor para FRIDMAN (2005).

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Este processo de ocupação urbana para e por conta do café pode ser

observado na Tabela 6 a seguir que traz o conjunto de núcleos urbanos em terras

fluminenses criados durante o período imperial. Ele ainda se acentua se

observarmos antigos povoados que foram elevados à vila naquele momento, como

foram os casos de Resende e Valença.

Tabela 6 : Vilas e cidades fluminenses criadas durante o período imperial Município Ato de criação Instalação Mangaratiba Decreto de 1831 1833 Barra Mansa Decreto de 1832 1833 Itaboraí Lei Geral de 1833 1833 Paraíba do Sul Lei Geral de 1833 1833 Nova Iguaçu Lei Geral de 1833 1833 Vassouras Lei Geral de 1833 1833 Piraí Lei Provincial de 1837 1838 Saquarema Lei Provincial de 1841 1841 Silva Jardim Lei Provincial de 1841 1842 Estrela Lei Provincial de 1846 1846 (Extinta em 1892) Rio Bonito Lei Provincial de 1846 1846 Casemiro de Abreu Lei Provincial de 1846 1859 Rio Claro Lei Provincial de 1849 1850 São Fidélis Lei Provincial de 1850 1855 Petrópolis Lei Provincial de 1857 1859 Araruama Lei Provincial de 1859 1859 Santa Maria Madalena Lei Provincial de 1861 1862 Sapucaia Lei Provincial de 1874 1875 Carmo Lei Provincial de 1881 1833 Sto. Antonio de Pádua Lei Provincial de 1882 1883 Itaperuna Lei Provincial de 1885 1889

Fontes: ABREU (1994) e CIDE (1998).

Ao considerar esse processo, Fridman (2005) sugere uma reflexão sobre o

padrão de ocupação territorial observado em suas relações com um projeto de

colonização articulado ao fazer urbano. Para a autora, uma onda colonizadora na

zona serrana do sertão do oeste fluminense foi levada à prática por cafeicultores,

colonos e escravos que estabeleceram a chamada “civilização do café”. E lembra

ainda que se Pombal havia determinado um processo de interiorização do

povoamento foi a partir da chegada de D. João VI e durante o século XIX que

ocorreram alterações territoriais através de uma política oficial vinculada a

interesses particulares da exploração do café.

A política de colonização também foi observada na região norte da província

como atesta o texto a seguir:

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Tendo o Governo Geral concedido a esta província uma sesmaria de 144 légoas de terra quadradas, juntas ou destacadas, onde houvesse terrenos devolutos, ordenou o Governo o estabelecimento de Colônias nos Sertões da Pedra Liza em Campos lugar fertilíssimo e com todas as proporções para taes estabelecimentos. Começarão no anno findo os trabalhos da medição e tombamento, os quaes interrompidos pela estação calmosa e pluvial, serão retomados em Maio, e continuados com vigor; e além disto contractou o Governo com o Belga Ludgero José Nélis, o estabelecimento de 40 Colonos do mesmo lugar. Igualmente a receita para fazer face a este ramo de serviço público tem de ser alcançada por empréstimo na forma da lei (RIO DE JANEIRO, 1843, p.12).

A tabela apresentada anteriormente mostra ainda como a decisão política de

criação de vilas foi presente no início do período imperial e como ela esteve voltada

para a região cafeeira ou para as áreas de escoamento de sua produção. E, neste

sentido, os vetores que dinamizaram o território foram, conforme assinalados, os

que atingiam Resende e Cantagalo. Ao longo dos caminhos abertos, a expansão da

fronteira agrícola impulsionava as economias regionais e o crescimento das

atividades urbanas a elas relacionadas. Sobre a questão específica do trato do

território, ainda é importante frisar que a autora enfatiza que novos atores surgiriam

aliados à Igreja e prestigiados pelo Estado (quando não eram o próprio Estado).

Este surto urbano no território fluminense trouxe mudanças significativas como

a valorização do solo e a sua concentração, a expulsão dos posseiros das terras e a

transformação de significativa parte deste contingente em agregados das grandes

fazendas de café. E este dinamismo também se refletia no aumento da população

na região e o exemplo de Vassouras é ilustrativo: 20.589 habitantes em 1840

(sendo 14.333 escravos) e mais de 35.000 em 1850 (20.158 escravos). O aumento

populacional condicionava uma maior complexidade na vida econômica e social

através, por exemplo, da vinda de diferentes artífices, portugueses, imigrantes e

mascates para estes novos territórios. Além do mais, sobretudo os núcleos que

assumiam papel de liderança nesta nova rede regional, receberam os próprios

senhores de terra que passaram a optar por estabelecerem residência em palacetes

citadinos. Lá, ampliavam suas atividades econômicas (eram financistas, banqueiros,

etc) e seus horizontes culturais com os modismos modernos e “civilizados”.

No entanto, esta dinâmica haveria de ser possibilitada através de uma rede de

transporte que permitisse os fluxos crescentes de mercadorias e de população. Os

rios que do vale vinham para a baía foram importantes para o intercâmbio entre

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serra e o porto do Rio de Janeiro. Neste movimento, muitos engenhos e fazendas

se estabeleceram e expandiram ao longo de canais como o Meriti, Sarapuí, Iguaçu,

Pilar, Saracuruna, Suruí, Guapemirim, Magé, Inhomirim, Macacu e Guaxindiba. Era

por estes rios que também subiam os desbravadores e parte do comércio de

mercadorias. A este tempo, os principais portos do fundo da Baía de Guanabara

eram os de Iguaçu (escoava a produção de Vassouras, Valença e Paraíba do Sul

antes da construção de ferrovia), Estrela (escoava a produção de Saracuruna) e o

das Caixas (pelo rio Macacu vinha o café do eixo oriental do vale, notadamente de

Cantagalo). Também portos no sul da província como Parati, Angra dos Reis e

Mangaratiba escoavam café, se especializando na produção que vinha da parte

mais ocidental do Vale, do norte paulista e da zona meridional de Minas.

Uma análise nos relatórios do Ministério do Império da época comprova um

interesse especial das autoridades da Corte a respeito desta região e, em especial,

na sua infraestrutura de circulação. Do conjunto das estradas mencionadas, por

exemplo, nos documentos dos anos entre 1832 e 1840, a maioria se refere a trechos

desta parte sul do território fluminense. Em termos absolutos, a Estrada da

Mambucaba a Angra dos Reis é citada em igual número ao Canal da Pavuna (obra

no município da Corte e de grande importância por conta da conexão que faria com

demais municípios da baixada). Ambos foram citados em cinco dos nove relatórios

editados no período indicado.

O papel estratégico desta região foi expresso em citações como:

O Governo não perde vista o melhoramento das estradas existentes, que communicão entre si as quatro Provincias Rio de Jan eiro, S. Paulo, Santa Catharina, e S. Pedro ; bem como a abertura de huma estrada nova, que torne indicada communicação mais directa, e mais facil; como porém elle não possue ainda todos os esclarecimentos, que se lhe fazem indispensaveis para poder resolver-se com o preciso conhecimento, espera que elles cheguem, e então dará a este objecto o impulso, que os meios postos á sua disposição permittirem (BRASIL, 1836, p. 38-39, grifo nosso).

Ou ainda quando o interesse centrou-se na agilidade das comunicações entre a

grande região cafeeira e as províncias vizinhas com a capital do Império, novamente

a região era observada como fundamental. Com efeito:

Teve lugar o estabelecimento de huma Agencia na Freguezia de Itacurussá, e augmentarão-se dois estafetas, hum delles na Agencia

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da Villa de Vassouras, para conduzir de cinco em cinco dias as malas do Correio da mesma Villa, e do da Villa de Valença, á Freguezia do Paty, recebendo nesta as que tiverem chegado para aquelles lugares pelo de Minas; e outro na Administração da Villa de Paraty, para que houvesse communicação regular, também de cinco em cinco dias, entre essa Villa, e a Cidade d’Angra dos Reis (BRASIL, 1837, p. 41).

Nossos estudos também mostram, por exemplo, como foram recorrentes as

iniciativas dos presidentes da província em prover o território de infra-estruturas

técnicas capazes de sustentar e alavancar o apogeu do café. Neste sentido, os

esforços eram direcionados e tratados como assunto prioritário. Tomemos o pedido

do presidente da província em 1839 para melhorar a estrada que ligava Parati à

serra por conta do importante movimento do seu porto (4.000 arrobas que vinham

de São Paulo, “alem da produção dessa florescente freguesia que se pode avaliar

em 20.000 arrobas”) (MACHADO, 1993, p. 26). Neste contexto, Angra foi depois do

Rio de Janeiro o porto mais movimentado do sul do Brasil na primeira metade do

XIX, conforme sugeria o nosso grifo em citação anterior.

Quanto à referida estrada, vale ressaltar o seu abandono em momentos

anteriores a ponto de despertar preocupações como a descrita na seguinte citação

do Ministro do Império:

A Villa de Parati tem decahido muito do seu commercio por se haver tornado cada vez menos transitavel a sua estrada da Serra, que horrorisa a todos os viandantes. Ha mais de vinte annos se dispõe o melhoramento della, e apenas ha poucos mezes se concluírão os exames necessarios, planta, e orçamento, que monta a quarenta e dois contos de réis (BRASIL, 1832, p. 28).

A dinâmica da região justificaria, pois, a convergência de recursos para os

seus aparatos territoriais em detrimento de outras áreas da província marcadas por

semelhantes estados de má conservação de seus caminhos. De uma forma geral,

podemos ressaltar que as estradas eram todas precárias, apenas tinham sofrido

melhorias a partir de 1808 com a política joanina de atração da população e dinheiro

para a capital e hinterlândia. O projeto de construção de vias terrestres incluiu a

Estrada do Comércio concluída em 1817 (levava o café até o porto de Iguaçu) e a

Estrada da Polícia que enveredava por Sacra Família, Vassouras e atingia Valença.

Serviram, pois, para incrementar a valorização e concentração da terra ao irradiar a

economia cafeeira. No entanto, se mostraram insuficientes para tamanho fluxo e os

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próprios fazendeiros tratavam da manutenção ou abertura de caminhos para não

sofrerem prejuízos. Foram constantes as demandas desta ordem junto ao poder

provincial.

De uma forma geral, após as indicações aqui trazidas podemos resumir a

mudança abissal que esta região sofreu com a atividade cafeeira e que foi capaz de

propagar sua dinâmica, envolvendo outros eixos da província. Se antes, era

composta por simples pousos com poucas habitações para o abastecimento das

tropas de passagem, com o surto cafeeiro viria a se transformar no principal centro

econômico do Império.

Sobre as diversas transformações impostas pela meteórica expansão dessa

cultura em sua ocupação da baixada fluminense ao Vale do Paraíba do Sul, cabe

observar que extensas áreas de florestas foram desmatadas, um fluxo considerável

de escravos foi direcionado para a região proveniente tanto do continente africano

como do nordeste brasileiro, novos núcleos urbanos foram organizados (vilas e,

mesmo, cidades) de maneira que uma soma vultosa de capitais diversificou sua

aplicação com a gradativa complexidade da vida citadina ao mesmo tempo em que

se ampliavam as novas fortunas e os novos latifúndios, sobretudo cafeeiros. Este

surto fez surgir no Brasil uma nova classe social e política e foi responsável pela

inauguração de uma infraestrutura ferroviária e pela vinda efetiva de imigrantes.

A estrutura fundiária baseada ainda no regime colonial das sesmarias

proporcionou um grupo de privilegiados com autoridade em uma sociedade

aristocratizada. Além da formalidade para a concessão de títulos, havia o

pagamento por sua expedição. Não era um mecanismo para todos e assim a

monarquia se distanciava dos princípios desejados para uma nação. As elites

pensavam nas grandes fazendas como ponta de lança da economia e nos

fazendeiros como empresários. Neste sentido, foram constantes os casos em que

grandes produtores ampliavam suas terras a partir da grilagem de pequenas

propriedades, vistas como pouco aproveitadas ou improdutivas. Aqui, as ideologias

também se confirmam ao pensarmos que o pequeno lote possibilitava uma certa

autonomia para o seu possuidor e esta realidade desdizia a ordem implantada

naquele momento: a dependência pessoal. Portanto, não era apenas questão do

porte da lavoura para incrementar a arrecadação fiscal. Mesmo assim, aconteceram

casos de sucesso entre pequenos sitiantes.

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No entanto, foram constantes os conflitos judiciais entre posseiros e sesmeiros.

Em 1817, o governo português mandou fazer o registro independente da origem da

terra pois existiam muitas sem regulamentação e tal fato negava fundamentalmente

a autoridade do Estado, dividia a classe proprietária e dava condição para a revolta

de muitos. Em Ordem de 14 de marco de 1822, Dom Pedro I reconhecia a

existência das posses e determinava que elas prevalecessem sobre as sesmarias

posteriormente concedidas. Em nova ordem de 22 de outubro de 1823, decretou a

extinção das concessões de sesmarias e acirrou a confusão. As determinações não

cessaram as disputas e os grandes avançaram em seus domínios, inclusive como

posseiros. As pressões se estenderam até a Lei de 1850, proibindo a obtenção de

terras públicas, exceto se compradas, legitimando as sesmarias e as posses

(contanto que cultivadas e não apenas roçadas) e exigindo a anotação das

propriedades irregulares nos Registros paroquiais. Também no período veio a

extinção legal do tráfico negreiro no Brasil e este contexto denotou a preocupação

das elites com uma possível escassez da mão-de-obra para as fazendas de café.

Pensava-se em dificultar o acesso à terra por parte destes e dos imigrantes futuros.

Assim, o Império do café e da conquista de terras era confirmado através de um

número pequeno de famílias controlando as extensas e melhores lavouras. Por

laços de matrimônio no interior da própria elite, mantinha-se o status quo daquela

realidade. O próprio Império vivia momento de consolidação e pacto oligárquico.

Esta realidade apenas mudaria concomitante ao final do próprio Império. O

café continuaria a ser o principal produto da pauta de exportação da República, mas

viria de terras paulistas e seria cultivado em outros moldes, além de encontrar um

outro cenário internacional baseado na expansão do capital e da técnica na Europa

e Estados Unidos. Por aqui, já nos anos de 1860, a cafeicultura na parte ocidental

do Vale iniciava seu processo de declínio motivado pelas dificuldades de se

conseguir novas terras e escravos (seus dois sustentáculos). Ao analisar o processo

de desintegração da economia cafeeira provincial, destacamos o modo predatório

de uso do solo (que impunha a necessidade constante de expansão pelo território

em busca de “terras virgens” em detrimento ao abandono das já cultivadas),

concorrendo para a grande imobilização de capitais em terras e escravos. O

sistema estava comprometido na base mesmo com tentativas em relação ao uso de

novas técnicas de cultivo, modernizando a produção para liberar mão-de-obra. Os

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arraigados métodos extensivos de uso do solo e coercitivos sobre a forca de

trabalho foram barreiras definitivas para a sua reprodução.

O declínio da atividade no Rio de Janeiro juntamente com o do sistema

monárquico nos possibilita afirmar que o Império brasileiro foi fundamentalmente

fluminense. Antes de esvair-se, ditou a economia e as regras sociais, políticas e

administrativas que deveriam conformar a nação. E este processo, em que

interesses vários estavam em jogo, deixou seus registros fundantes no território e

na sociedade do país e, em particular, da província que era seu epicentro.

Mesmo respondendo por grande parte das rendas imperiais, a origem desse

volume era restrita a poucas regiões da província. Lembremos que sua dinâmica

territorial no que se refere ao interior tinha se iniciado com a chamada “economia de

passagem” ou “economia acessória” quando da atividade mineradora. Mas, esta

não tinha sido capaz de estabelecer assentamentos efetivos na região e, até então,

as aglomerações existentes se encontravam instaladas no litoral ou na Baixada. A

região do Médio Paraíba do Sul encontrava-se pouco povoada e contava com

escassos núcleos e com alguns posseiros que trabalhavam na produção de gêneros

alimentícios e na pecuária às margens dos precários caminhos.

Com o crescente desenvolvimento agrícola a partir das primeiras décadas do

século XIX, intensificaram-se as condições favoráveis à produção para o

abastecimento e à integração de um mercado interno dinamizado pela riqueza do

café e pela retomada da atividade açucareira na região polarizada por Campos.

Notemos que esta região seria alvo prioritário para instituição de mecanismos como

freguesias, vilas e núcleos coloniais naquele momento. Ver Mapa 7 a diante.

O fato urbano da região de Campos esteve sempre associado ao açúcar e à

riqueza trazida por ele. Se a cidade em si crescia e ganhava novos e modernos

equipamentos, na parte rural grandes propriedades faziam florescer esta economia

que também contava com a importante produção de médias e pequenas lavouras.

O mapa nos mostra uma ocupação preferencial na porção sul do rio Paraíba

denotando áreas ainda a serem ocupadas. A jurisdição já estava instalada e a terra

em muitos casos registrada. A ocupação efetiva desse significativo território de

fronteiras era assunto para discussão nos espaços da geopolítica local, como

veremos adiante.

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Mapa 7: Aldeias, freguesias, vilas e núcleos coloniais na região de Campos (meados XIX)

Elaborado pelo autor para CHRYSÓSTOMO (2006, p. 354).

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Um outro ponto que queremos destacar se refere às mudanças nos sistemas

valorativos dos lugares neste contexto de afirmação territorial. No interior do Rio de

Janeiro, desenvolveu-se um processo de integração através da articulação entre as

áreas produtoras e o mercado consumidor viabilizado pelos meios de comunicação

existente entre as extremidades dessas conexões. Processo este, observado antes

do advento do sistema ferroviário e que determinou o uso seletivo do território em

que áreas como a de Angra dos Reis e Parati voltaram a experimentar uma

conexão ao comércio da província ao terem sua atividade portuária solicitada para

operacionalizar a empresa cafeicultora.

Se relembrarmos dos pressupostos do ideário nacional promovido pelo

Império, veremos que um deles se refere à constituição e fortalecimento de núcleos

urbanos que trabalhariam para a unidade pretendida. Assim, observamos a

organização territorial da província do Rio de Janeiro como algo pensado, uma vez

que não se tratou apenas do surgimento de um conjunto de núcleos articulados e

com funções distintas, mas de uma intenção no âmbito de um projeto maior. Tanto

as políticas de abertura de caminhos já estabelecidos quanto os que seriam abertos

pelas ferrovias pretendiam integrar ou mesmo constituir territórios.

Sobre este aspecto ainda é importante observar que o advento das estruturas

ferroviárias é uma conjugação de efeitos múltiplos em sua associação com os

processos de urbanização. Com efeito,

(...) os núcleos urbanos pré-existentes que não fossem privilegiados pela proximidade das linhas férreas e sua articulação com, no caso do sudeste brasileiro, a cultura do café, seriam “cidades mortas” na expressão já consagrada de Monteiro Lobato (LANNA, 2002, p.2).

A autora fala especificamente das cidades que não assumem o papel de

“pontas de trilho” para justificar o fato de que as que contavam com estações de

meio de linha não teriam garantidas as benesses da rede ferroviária. No nosso

caso, pensamos nas cidades que tiveram suas redes de comunicação e de

circulação de mercadorias preteridas pela ferrovia: Angra dos Reis e Parati.

Portanto, nos referimos aqui a um conjunto não homogêneo de realidades em

que cabe ao Estado articular na arena política (como veremos adiante a partir dos

acontecimentos na Assembléia Provincial) uma visão totalizante e integradora. Não

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sem conflitos, esta ação passava por instrumentos de diversas ordens. Alguns deles

já citados aqui mas que merecem uma atenção mais detalhada pela importância

que tiveram junto ao poder público. No plano da repartição territorial, foram

mantidas as divisões em freguesias (atendendo às estruturas eclesiásticas de

poder), em comarcas (como unidades de controle jurídico) e em distritos(para fins

eleitorais e posteriormente para o trato das obras).

De tradição colonial no Brasil, as freguesias passaram a se configurar como

uma unidade elementar da partilha e da administração pública, sendo dotada de

autoridade militar e policial e de relativa autonomia jurídica. Cada uma delas,

também denominada de paróquia, recebia o nome de um santo católico e seu poder

se expressava pela influência ideológica da Igreja e pela produção agrícola, pastoril

e de serviços, além do acúmulo de propriedades imobiliárias dos grandes senhores

de terra localizados sob sua jurisdição. Se no início do século XIX, já se podia falar

em pelo menos 46 freguesias instaladas na província do Rio de Janeiro, este total

chegou a 68 no ano de 1843 e a 119 em 1870. O Quadro 2 a seguir registra o

momento de 1843, identificando-as nos respectivos municípios e comarcas as quais

pertenciam.

Quadro 2: Comarcas, municípios e freguesias na província fluminense (1843) 8 comarcas 25 municípios 68 freguesias

Niterói Niterói São João Baptista de Nicteroy São Gonçalo São Sebastião de Itaipú São Lourenço da Aldea dos Índios Magé Nossa senhora da Piedade São Nicolao de Suruhy Nossa Senhora da Ajuda de Guapimerim Nossa Senhora Guia da Pacobahiba Nossa Senhora da Piedade de Inhomirim Iguaçu São João de Merity Nossa Senhora do Pilar Santo Antonio de Jacotinga Nossa Senhora da Piedade de Iguassú Nossa Senhora da Conceição do Marapicu Itaboraí Itaboraí São José de Itaboraí Nossa Senhora do Desterro Nossa Senhora da Conceiçao do Rio Bonito Santo Antonio de Sá Santo Antonio de Sá Santíssima Trindade São José da Boa Morte de Guapiassú Maricá Nossa Senhora da Amparo (=) Cabo Frio Saquarema Nossa Senhora de Nazareth (=) Cabo Frio Nossa Senhora da Assumpção Nossa Senhora da Lapa de Capivary São Pedro da Aldea dos Índios São Sebastião de Araruama

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Macaé São João Baptista de Macaé Sacra Família do Rio de São João Nossa Senhora do Desterro de Quissaman Nossa Senhora das Neves e Santa Rita Nossa Senhora da Conceição de Carapebus Angra dos Reis Angra dos Reis Nossa Senhora do Rozário de Mambucaba Nossa Senhora da Conceição de Angra dos Reis Santana da Ilha Grande de Fora Nossa Senhora da Conceição da Ribeira Itaguaí São Francisco Xavier São Pedro e São Paulo do Ribeirão das Lajes Parati Nossa Senhora dos Remédios Mangaratiba Nossa Senhora da Guia Santanna de Itacurussá Campos Campos São Salvador São Sebastião Santo Antonio de Guarulhos São Gonçalo São Fidélis de Sigmaringa Santa Rita da Lagoa de Cima São João da Barra São João Baptista Resende Resende Nossa Senhora da Conceição São José do Campo Bello São João do Príncipe São João Marcos Nossa Senhora da Piedade do Rio Claro Capivary Santo Antonio de Capivary Barra Mansa São Sebastião da Barra Mansa Vassouras Piraí Santanna São João Baptista do Arrozal Vassouras Sacra Família do Tinguá Nossa Senhora da Conceição Nossa Senhora da Conceição do Paty do Alferes Valença Santo Antonio do Rio Bonito Nossa Senhora da Glória Paraíba do Sul São Pedro e São Paulo Santanna de Cebollas São José do Rio Preto Cantagalo Cantagalo Santa Rita do Rio Negro Santíssimo Sacramento Nova Friburgo Nossa Senhora da Apparecida São João Baptista Pastor Protestante

Fonte: RIO DE JANEIRO (1843). (Organizado pelo autor)

Tal expansão da divisão territorial denota a necessidade de especialização das

medidas de administração e, neste sentido, é importante voltar à Lei de Terras.

Através dela, legitimava-se a aquisição pela posse no Brasil, mas esta apenas teria

validade, isolando-se do domínio público, se levada ao Registro do Vigário, livro de

notas da paróquia ou freguesia em que a terra estava localizada. Entre outros

aspectos importantes, cabia ao pároco das freguesias do Império a indicação das

terras que passariam a ser consideradas privadas e aquelas chamadas de

devolutas ou do patrimônio das províncias, vindo daí o caráter obrigatório do

registro e a importância administrativa das freguesias.

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Quanto às comarcas, é sabido que foram mantidas pelo Código de Processo

Criminal, que extinguiu os Juízes Ordinários e estabeleceu a seguinte estrutura para

cada uma delas: um Juiz Municipal, um Promotor Público, um Conselho de Jurados,

um Escrivão das Execuções e demais oficiais.49 Como expressão de força das elites

ao redor do Imperador, é importante observar que, para o caso do Ministério

Público, uma lista tríplice deveria ser apresentada pelas Câmaras Municipais para

que os promotores fossem nomeados por um período de três anos pelo governo na

Corte e pelos presidentes de província.

Tal decisão passou a ser ainda mais centralizada através da reforma do

Código de Processo Criminal, quando os promotores não seriam mais indicados por

lista elaborada pelas Câmaras Municipais, mas seriam diretamente nomeados pelo

Imperador ou pelos presidentes de província para cargos com tempo indeterminado.

Além do mais, cada comarca contaria com apenas um promotor e não mais quantos

fossem os seus termos. Apenas nos casos das comarcas mais importantes, poderia

haver a nomeação de mais de um promotor.

Segundo o CIDE (1988), se ainda no início de século XIX existiam apenas as

comarcas de Rio de Janeiro, Ilha Grande, Paraíba Nova, Cantagalo, Cabo Frio e

Campos dos Goytacases, em um total de 6, este número passou para 9 em 1835

(com o novo arranjo territorial, surgem novas denominações como Resende,

Vassouras, Angra dos Reis, Município Neutro, Niterói e Itaboraí) e para 13, incluindo

a Corte, em 1869 (a nova configuração faz surgir comarcas como a de São João

Príncipe, Petrópolis e Magé). Este processo está indicado no Mapa 8 a seguir.

49 Para uma visão panorâmica sobre a constituição da Justiça no Brasil e no Rio de Janeiro, ver Apêndice 1.

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Mapa 8: Comarcas na província fluminense

Reelaborado pelo autor a partir de FRIDMAN (2005).

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As subdivisões sucessivas revelam o crescimento em importância de

determinadas localidades, sendo necessária uma administração mais próxima. O

aumento do aparato institucional para gestão política, judiciária, fiscal e militar do

território muito se deveu ao seu fenômeno urbano. Mas é importante ressaltar que

as comarcas tinham em sua jurisdição um conjunto de outras cidades, além das

demais formas de assentamento urbano encontradas. Portanto, tratava-se de olhar

para o todo da província por regiões. E, neste contexto, eram os municípios mais

importantes que funcionariam como “cabeça de comarca” e teriam sua influência

mais uma vez confirmada sobre determinados conjuntos territoriais da província. No

final do Império, haviam sido criadas 25 comarcas. Além da Corte, Campos dos

Goytacazes e Vassouras se destacaram sem dúvida alguma.

3.3. Operacionalizando o território

Pensar na administração de um todo político e territorial significa não esquecer

dos mecanismos de aplicação do aparato legal e no caso do Império brasileiro

significa entender em que moldes o judiciário se estruturou em suas relações com

os demais poderes, sobretudo o Moderador. No nosso trabalho, foi importante

perceber como ele se relacionou com o executivo provincial. Assim, entender a

história das instituições da Justiça e seus rebatimentos no território carioca e

fluminense requer uma linha do tempo que se inicia em 1751 com a criação da

Relação do Rio de Janeiro. (Ver Apêndice 1)

Naquilo que nos interessa em particular, é importante ressaltar que ela havia

sido transformada em Casa de Suplicação do Brasil por Dom João VI em 1808 e

que, com o Império e a extinção desta Casa50, a Relação do Rio de Janeiro voltou a

funcionar com esta denominação e com estatuto de Tribunal de Segunda Instância.

O Desembargador dos Agravos era o cargo de maior importância, sendo escolhido

entre seus pares. Segundo a Carta de 1824, deveria haver uma Relação em cada

província e delas seriam retirados os juízes letrados que comporiam o Tribunal

50 Dom Pedro I extinguiu em 1833 a Casa de Suplicação, a Mesa do Desembargo do Paço e a Mesa de Consciência e Ordem em prol das Relações e do Conselho.

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Superior de Justiça, condecorado com o titulo de Conselho. Na verdade, esta

instituição iria subjugar a Relação fazendo do Judiciário um poder político e uma

delegação da nação.

De início, eram quatro as Relações estabelecidas (Corte, Salvador, Recife e

São Luis).51 A presidência da Relação do Rio de Janeiro ou da Corte foi ocupada

por muitos deputados e nobres que também exerceram a presidência da província.

Alguns nomes são: João Antonio Rodrigues de Carvalho, Jose Vernek Ribeiro de

Aguilar, Jose Carlos Pereira de Almeida Torres (2º Visconde de Macaé), Manoel

Ignácio Cavalcante de Lacerda (Barão de Pirapama), Euzébio de Queiroz Coutinho

Matoso Câmara, Manoel de Jesus Valdetaro (Visconde de Valdetaro), José Tavares

Bastos e Francisco de Faria Lemos. A estes homens estiveram submetidos os

juízes de primeira instância que atuavam na vida cotidiana dos membros da

sociedade. Ressaltamos a Justiça como um poder político em sua estreita relação

com o executivo fluminense. O próximo passo em nosso trabalho consiste na

observação sobre as questões administrativas da província a partir das posturas e

discursos desse poder

Com a Independência, a cidade do Rio de Janeiro passou a ser o município da

Corte e, através da Constituição de 1824 compreendia toda a província fluminense.

Este território continuou administrado de forma única pelo Ministério do Império até

1833, quando foi dividido em seis comarcas. A que incluía a Corte foi separada

político-administrativamente das demais por força do Ato Adicional no ano seguinte.

No contexto das políticas descentralizadoras do momento, esta medida organizou o

funcionamento do município-sede e da província do Rio de Janeiro, equiparando-a

às demais através da criação de sua Assembléia Legislativa.

Regulamentando este dispositivo, a Regência decretou em 23 de agosto de

1834 que a Vila Real de Praia Grande seria a sede da primeira reunião da

Assembléia Provincial que aí inaugurou os seus trabalhos em 01 de fevereiro de

1835. Entre os primeiros atos desta Assembléia, estava a Lei nº 2 de 26 de março

elegendo aquela vila como Capital da Província e, por conseqüência, a Lei nº 6 de

28 de março elevava a cidade à nova capital com o nome de Niterói. No entanto,

esta autonomia em relação à Corte não seria efetiva uma vez que:

51 Apenas em 1873, a lei de n° 2.342 elevaria para 11 o número de Relações no Império, ficando a do Município Neutro com jurisdição sobre as províncias do Rio de Janeiro e do Espírito Santo.

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151

(...) a criação do Município Neutro não deu à Província do Rio de Janeiro representação isolada na Assembléia Geral, pois continuou o território da Corte a figurar como primeiro distrito eleitoral da província fluminense (LACOMBE, 1973, p. 8).

Resumia-se a autonomia na existência de um poder legislativo (exercida pela

Assembléia, composta de deputados escolhidos por eleição e com mandato de dois

anos) e um poder executivo exercido, de acordo com o artigo 165 da Constituição,

“por um presidente nomeado pelo Imperador que o poderá remover quando

entender que assim convém ao bom serviço do Estado” (ibdem). O decreto nº 207

de 18 de setembro de 1841 equipararia os cargos de presidente e vice das

províncias no que se refere às origens e estabilidade.

Ao lembrarmos de que a política administrativa das províncias foi caracterizada

pelo embate entre os seus representantes e o poder central, consideramos ter

ocorrido no caso fluminense um misto de potencialização desse conflito e de

harmonia. A proximidade entre os dois pólos e a parceria entre ambos fazia da

política do Rio de Janeiro um espelho do país. Por vezes, eram os mesmos os

representantes que ocupavam os cargos tanto na província quanto na Assembléia

Geral e no Senado.

Os deputados provinciais eram, em sua maioria, representantes da elite

política e econômica do Rio de Janeiro, sendo muitos aliados do imperador. Na

disputa por interesses locais, não apenas vereadores atuavam mas os presidentes

e deputados provinciais destacaram-se na defesa de questões relativas aos

municípios onde fincaram seus vínculos familiares, políticos e econômicos. No

complexo jogo de interesses entre esses níveis do poder, cabia ao presidente da

província fazer-se porta-voz de comunidades e de regiões frente às autoridades

nacionais. Nem sempre as questões foram resolvidas no âmbito da disputa político-

ideológica, uma vez que era relevante a posição que determinada figura ocupava no

meio social aristocrático da monarquia.

Portanto, pensamos ser fundamental olhar para a província por um viés que

também prestigie o conjunto de atributos que os seus representantes maiores

carregavam. Ao relacionar tais informações ao contexto da formação da nação

conforme indicamos na unidade anterior, pensamos poder perceber os discursos e

interesses que conformaram a organização política, socioeconômica e espacial

daquele território. A tabela “Listagem dos Presidentes da Província Fluminense” (ver

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152

Apêndice 2), construída com minudência, apresenta detalhes sobre todos os

ocupantes do executivo do Rio de Janeiro, numerando os mandatos regulares e

indicando os vices que assumiram em caráter interino. Também nos preocupamos

em identificar a formação, títulos e cargos que ocuparam na vida pública. Em uma

primeira avaliada, nos chamou a atenção o quão era recorrente o fato de ocuparem

o cargo de presidente em distintas províncias. Embora por demais extensa,

julgamos essencial uma vista esmerada nas informações da tabela para

comprovação da sociedade elitizada, instruída, aristocrática e ávida por poder que

se constituiu na base e como reflexo da nação em seu período imperial. Através

dela, confirmamos ainda nomes já indicados nesta tese e decisivos para a política

fluminense (seja por conta de sua atuação e posição econômica seja em suas

relações com o Moderador).

Se o conjunto dos presidentes indicados mostra um grupo com longa

permanência no poder e uma esfera centralizada em que os cargos superiores eram

revezados entre seus ocupantes, a burocracia constituiu-se em veículo de ascensão

e afirmação social. Através dos cargos públicos de segundo e terceiro escalões,

constituídos por brancos pobres e negros libertos, camadas médias urbanas se

formaram e estruturaram as cidades e sociedade fluminense do século XIX. Desta

forma, entendemos que a estrutura territorial da província foi impulsionada e ganhou

feição com a instalação desse aparato administrativo de controle político,

econômico e social. Destaquemos os órgãos de segurança e de definição de obras

de infra-estruturas que deveriam ser incorporadas às localidades.

Falamos aqui especificamente da ação do Estado que consagra as cidades

como locus para a sua política de territorialização de seus objetivos. No entanto,

esta cidade apenas cumpriria este papel se considerada na escala da região em

que se inseria e representava. Por algumas terem concentrado população, serviços

e prestígio, se destacaram do conjunto conformando uma hierarquia do poder e do

dinheiro em exclusivos pontos do território fluminense. Foi neste jogo de poder que

o Estado nacional utilizou os núcleos urbanos para atingir o regional. E, neste

contexto, diversas foram as políticas que transpareciam as “ideologias geográficas”

de que tratamos nesta tese. Como exemplo, tomemos a citação a seguir para o

caso de um projeto de conquista e ocupação dos “terrenos devolutos” do país a

partir da instauração de núcleos a serem inicialmente habitados por “indigentes e

desocupados” das cidades já consolidadas. O discurso fala por si sobre os objetivos

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153

e meios a serem tomados para a efetiva apropriação de parcelas mais remotas do

território (regiões, portanto) através da criação de núcleos coloniais (urbanos, em

essência, mesmo que atrelados às atividades agrícolas). Com efeito,

De outra medida, e vem a ser o estabelecimento da Colonias Nacionaes nas margens dos nossos rios navegaveis, e á beira das estradas principaes, onde apparecessem terrenos devolutos, a começar da proximidade das povoações para os lugares mais remotos. Formado o nucleo destas colonias com familias de camponezes indigentes, para ellas se deverião successivamente remetter as pessoas de hum e outro sexo, que não exercem honesto emprego nas povoações, ou não encontrão em que se occupem. Desta sorte tornar-se-hião mais commodas e mais seguras nossas communicações; dar-se-hia maior extensão á agricultura; animar-se-hião os consorcios entre pessoas, que muitas vezes os não contrahem por falta de meios de subsistencia; diminuir-se-hia consideravelmente a corrupção dos costumes; finalmente aproveitar-se-hião braços que jazem na ociosidade. Fazer productivos braços inteiramente inuteis equivalle á sua adquisição. Este assumpto, Senhores, he hum dos mais importantes, que se vos pode offerecer; e não duvida o Governo que o mediteis com toda a attenção, que elle merece (BRASIL, 1834, p. 25).

Nesta citação, chama a atenção também o caráter moral e civilizatório a ser

pretendido pela proposta defendida pelo Ministro do Império quando associa a

retirada dos “indigentes e desocupados” das cidades como uma forma de diminuir-

lhes a “corrupção dos costumes” degradados, entre outras coisas, pela ociosidade,

tornando-os comprometidos com as atividades que dinamizariam os novos núcleos

de ocupação e produção.

Partindo do pressuposto de que modelos idealizadores de sociedade e de

ordenamento encontram nos núcleos urbanos um espaço privilegiado para a sua

difusão, entendemos que a discussão e montagem dos aparatos administrativos

refletem esta intenção. Eles operacionalizam uma vontade prévia e, portanto, um

planejamento. Pretendemos recuperar a natureza das intervenções engendradas

pelos atores sociais e pelo Estado no contexto da formação de uma Nação. Para tal,

o termo intervenção é adotado como prática planejadora, imposição ou negociação

de normas de controle do presente e projeto para o futuro, consubstanciada em um

plano e relacionada, mas não limitada, à gestão da ocupação física. Enfim, uma

prática ideológica hegemônica (FRIDMAN, 2001).

Ao observar o aparato institucional na escala da província fluminense, estamos

atentos aos seus desdobramentos na estrutura e à relevância que determinadas

cidades apresentavam. A partir desta postura, observamos que a prática se nutria

de mecanismos para a perpetuação do poder através da concretização de uma

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154

política administrativa que visava articular anseios locais em uma dimensão regional

em sua estreita relação com a esfera central do Império. Portanto, chamamos a

atenção para a criação de uma rede burocrática que se disseminou para levar os

ideais de progresso e civilização defendidos pelo projeto imperial a todos os pontos

do território. Ao dividir funções a partir de pontos previamente escolhidos no

território, a burocracia tinha a intenção de usá-los como multiplicadores para que a

presença do Estado (sua força e símbolos) chegasse também aos locais que

mantinham pouco ou quase nenhum contato com a Corte.

Sobre este aspecto, é importante ver que a reconstituição das estruturas

administrativas da província do Rio de Janeiro (desde o início da organização do

seu poder executivo) nos possibilita uma melhor compreensão dos mecanismos de

domínio arquitetados pelo Estado.

Para o período em estudo, foram elaborados cinco organogramas que dão

conta das (des)continuidades da estrutura administrativa fluminense. Recorremos

às nossas notas sobre o período imperial para entender as mudanças propostas em

cada nova alteração da estrutura política e administrativa da província. A partir

desta observação das diretrizes na escala nacional, tecemos comentários sobre as

ações na escala fluminense.

Os organogramas são os seguintes:

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155

Figura 2: Organograma da Administração Provincial 1834/1840

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Reproduzido pelo autor a partir de original manuscrito em CAMPOS et al (1986).

O marco inicial foi o Ato Adicional que criou o Município Neutro e, na prática, deu origem ao Poder Executivo provincial e à organização do governo da província. O ano de 1840 antecede a promulgação do regulamento de 21/06/1841 da Secretaria da Presidência, tornando-a mais complexa e com algum poder sobre segmentos administrativos até então subordinados diretamente ao presidente da província (como quase todos os órgãos).

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156

Figura 3: Organograma da Administração Provincial 1841/1846

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Até1844

Reproduzido pelo autor a partir de original manuscrito em CAMPOS et al (1986).

Verifica-se um maior nível de decisão nas Obras Públicas e da Guarda Policial da Província. Formam-se novas estruturas para a polícia definidas por legislação imperial (Lei nº 261 de 03/12/1841 e Regulamento 120 de 31/01/1842). Cria-se, em 1842, a Administração da Fazenda, responsável diretamente pelos assuntos fazendários provinciais. As secretarias da presidência ampliam suas atribuições.

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157

Figura 4: Organograma da Administração Provincial 1846/1858

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Reproduzido pelo autor a partir de original manuscrito em CAMPOS et al (1986).

A Deliberação de 03/06/1846 transformou a Administração da Fazenda em Tesouraria Provincial, subordinando-a à 1ª Secretaria da Presidência que, aliás, vê no período ampliarem-se suas atribuições.

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158

Figura 5: Organograma da Administração Provincial 1859/1875

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Reproduzido pelo autor a partir de original manuscrito em CAMPOS et al (1986).

A Lei nº 1.127 de 04/02/1859 implementa uma Reforma Administrativa na província. Há, através dela, uma total reestruturação da Secretaria da Presidência, que perdia alguns de seus assuntos (instrução, obras públicas e fazenda) para Diretorias próprias vinculadas diretamente ao presidente da província. A Secretaria ficou com autoridade exclusiva apenas sobre a Força Policial da Província.

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Figura 6.1: Organograma da Administração Provincial 1876/1889 (1)

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Reproduzido pelo autor a partir de original manuscrito em CAMPOS et al (1986).

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160

Figura 6.2: Organograma da Administração Provincial 1876/1889 (2)

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(2)

Reproduzido pelo autor a partir de original manuscrito em CAMPOS et al (1986).

A Deliberação de 11/08/1876 implementa uma nova Reforma Administrativa na província reforçando a tendência racionalizadora das medidas de 1859. Continuam as Diretorias (com mudanças em suas estruturas), mas agora vinculadas à Secretaria da Presidência, que voltou a ter autoridade também sobre órgãos como o Arquivo Estatístico, o Instituto Vacínico e a Secretaria de Polícia.

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161

Do conjunto desses organogramas, algumas observações devem ser feitas. A

primeira se refere à Repartição da Fazenda e Tesouraria da Província. A lei imperial

de 04/10/1831 (que organizou o Tesouro Nacional) rezava em seu artigo 45 que

“haveria em cada província uma Repartição de Fazenda Pública, denominada de

Tesouraria da Província (...)”. A Tesouraria do Rio de Janeiro só foi extinta pelo

decreto imperial nº 736 de 20/11/1850. No entanto, em 20/05/1842, foi criada, por

regulamento, a Administração da Fazenda da Província Rio de Janeiro, responsável

pela administração, contabilidade, distribuição, arrecadação e fiscalização da renda

pública provincial. Assim, houve sobreposição de órgãos entre 1842 e 1850. Eram,

mesmo assim, independentes uma vez que a Administração da Fazenda ficou com

as rendas propriamente provinciais e a Tesouraria da Província, como nas demais

províncias, estava incumbida das rendas gerais. Assim, este último órgão, a partir

de 1842, passou a servir unicamente ao Tesouro Nacional, não sendo parte do

Executivo provincial.

Uma segunda observação diz respeito aos cargos de nível pessoal. Nas

“Fichas de Registro de Órgãos”, havia sempre um espaço para o “nome do órgão ou

cargo” e este segundo caso era para documentar competências funcionais

importantes, delegadas a nível pessoal e que se confundiam com o próprio

organismo burocrático. Como exemplo, o cargo de Chefe da Polícia tinha suas

atribuições definidas pela legislação sobrepostas à Secretaria de Polícia que,

teoricamente, deveria cuidar desses assuntos (Lei 261 de 03/12/1841 e

Regulamento 120 de 31/01/1842) (Coleção de Leis do Império 1841/1842).

Listemos alguns desses órgãos ou cargos de interesse em nosso trabalho

indicados por Campos et al (1986, grifos nossos):

Presidente da Província Criação: 03/10/1834 (Lei nº 40) Extinção: 29/06/1891 (Constituição de 1891) Superior hierárquico: Ministros de Estado Antecessor: Presidente em Conselho Sucessor: Presidente de Estado Competência:

Executar e fazer executar as leis. Dispor da força a bem da segurança e tranqüilidade da província. Somente em casos extraordinários e indispensáveis removerá as Guardas Nacionais para fora dos seus municípios. Exercer sobre as Tesourarias provinciais as atribuições consideradas pela Lei 04/10/1831. Convocar Assembléia Provincial extraordinariamente, prorrogá-la e adiá-la quando assim o exigir o bem da província, contando que não deixe de haver sessão em nenhum ano. Suspender a publicação das Leis provinciais em casos dos artigos 15 e 16. (...)

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162

Diretoria de Obras Públicas Criação: 19/12/1836 (Lei nº 64) (regulamentada em 20/05/1837) Extinção: 13/04/1844 (Lei nº 316 que cria a Junta Diretora de Obras Públicas) Superior hierárquico: PP (Em 21/06/184152, passa a ser subordinada à 2ª Seção da Secretaria da Presidência) Competência:

Direção, inspeção e conservação das obras públicas. Dar o plano de todas as obras públicas que se houve rem de fazer na Província. Formar um plano geral de estradas, pontes e canais para a província, acompanhado dos respectivos orçamentos e estabelecer prioridades . Dar planos de concerto e melhoramentos das estradas atuais. Cuidar e fiscalizar a conservação das obras depois de concluídas. Fazer executar tais trabalhos, depois de aprovado o plano e orçamento da obra pela Assembléia Legislativa Provincial ou Presidente da Província. Determinar o método de fabrico dos carros, marcando o seu comprimento e largura, bem como a largura do trilho de suas rodas. Levantar a carta corográfica da província, logo que as circunstancias permitirem este trabalho. Fixar os pontos onde se deve estabelecer barreiras, organizar o melhor sistema delas e o cálculo provável do que podem produzir em cada estr ada que forem estabelecidas. Dirigir as obras em construções necessárias, propor os seus empregados ao Presidente da Província e fiscalizar o cumprimento de seus deveres, ficando desde já estabelecido, que a gente de pé não pagaria direito de barreira. Coadjuvar a organização do tombo dos próprios provinciais. Preparar os materiais para a organização da estatís tica da província que forem relativos ao objeto de que se acha encarregada, e colher aque las informações que lhe forem exigidas pelo Presidente da Província. Apresentar ao Presidente da Província, pelo menos um mês antes da abertura das sessões ordinárias da Assembléia Legislativa Provincial, um relatório circunstanciado a cerca das obras que foram concluídas; do estado das que se acham em andamento, declarando quais devam ser empreendidas com preferência para que possa a mesma Assembléia, por meio de seu Presidente, ser anualmente informada sobre este importante ramo da Administração e providenciar como julgar conveniente.

Junta de Direção e Inspeção das Obras Públicas Criação: Regulamento de 27/04/184453 Superior: 2ª Seção da Secretaria da Presidência da Província Competência:

Discutir os projetos de obras que forem empreendidos na província, as plantas e orçamento delas, e tudo o mais que pelo Presidente da Província for submetido ao seu exame e inspeção, dando sobre todos esses assuntos o seu parecer por escrito, que será levado a Secretaria da Presidência, a fim de por ela se deliberar o que convier. Propor ao Presidente da Província os regulamentos e planos que tratam o art 2° e §4° do presente regulamento, bem como a art 6°, assim como todos os demais que forem necessários para estabelecer uniformidade no sistema de obras, na administração delas, no modo de processar e legalizar as férias e no meio de fiscalizar os dinheiros despendidos neste ramo de serviço. Indicar tudo que julgar conveniente ao melhoramento material da província e a difusão e propagação dos conhecimentos necessários ao ramo ci entífico que conduz a este melhoramento. Examinar e fiscalizar as contas dos engenheiros chefes de distritos e todas as mais relativas as obras públicas que lhes forem remetidas para este fim pelo Presidente da Província.

52 Esta lei marcava os deveres dos empregados da Secretaria de governo. 53 Criou sete distritos de obras públicas na província, nomeando vários oficiais do corpo de engenheiros e marcando suas atribuições.

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163

Distritos de Obras Públicas Criação: 27/04/1844 (regulamento) Superior: Junta de Direção e Inspeção das Obras Públicas Estrutura: um Engenheiro chefe de Distrito Competência: 54

Direção, administração e fiscalização das obras públicas. Levantar a planta e fazer o orçamento das obras feitas no seu distrito. Propor obras de utilidade pública que entender conv eniente no seu distrito. Inspecionar e fiscalizar os Registros, Coletorias e Barreiras do seu distrito.

Diretoria de Obras Públicas Criação: Lei 1.127 de 1859 Superior: Presidente da Província Estrutura: uma seção e distritos de obras públicas, com cada um tendo um engenheiro chefe. Competência:

Inspecionar e fiscalizar os serviços de todas as obras públicas provinciais. Uma terceira observação se refere a estes três últimos órgãos a partir das

mudanças verificadas na Junta de Direção e Inspeção das Obras Públicas. Através

da Deliberação de 28/11/1855, ela passou a subordinar-se a 3ª Seção da Secretaria

da Presidência. Por sua vez, voltou a ser subordinada à 2ª Seção da Secretaria da

Presidência pela Deliberação de 17/04/1856. A Lei nº 1.127 de 04/02/1859

(Reforma de 1859 que marcava as repartições de que se compõe a administração

pública provincial) promoveu mudanças no nome do órgão (que passou se chamar

Diretoria de Obras Públicas), na sua subordinação hierárquica (submeteu-se

diretamente ao Presidente da Província) e na sua estrutura com a criação de uma

seção.

É importante também ressaltar que a Seção da Diretoria de Obras Públicas

(extinta pelo Decreto nº 1.040 de 19/07/1890) não tinha sua competência e estrutura

esclarecidas pela Lei de 1859. Este órgão só seria explicitado pela Reforma de

1876 (Deliberação de 01/08/1876). Por ela, a Seção passa a ter uma atribuição

especifica: incumbir-se de tudo que diz respeito às estradas de ferro e obras

hidráulicas e fiscalização das empresas desta natureza auxiliadas pela Província,

exceto a do Ferro-Carril Niteroiense e da de Cantagalo, que poderão ter

engenheiros fiscais, remunerados a sua custa, como estipulado nos respectivos

contratos, mas imediatamente subordinados ao Diretor de Obras Públicas.55

Sistematizando os atos administrativos pelos quais o Executivo exercia o seu

poder, nos foi possível enxergar os instrumentos utilizados para as práticas políticas 54 Dados retirados do Regulamento de 27/04/1844, já citado, e do Regulamento Interno de 31/01/1845, da própria repartição encarregada das obras públicas na província. 55 Sobre esta questão ainda, nos chama a atenção o fato de que o Regulamento de 26/06/1882 passa a tratar os distritos por circunscrições.

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164

sobre a sociedade e o território. Chama atenção, por exemplo, a preocupação no

sistema físico e técnico a ser montado na província, seu caráter regional e as

mudanças do setor de Obras Públicas na arquitetura institucional do poder. Este

setor teve o seu momento em que voltava sua legislação prioritariamente para a

abertura de estradas (sobretudo para o norte da província) e já no final do período

imperial se voltou para as questões de urbanização e higienização das cidades,

dentro de um conceito moderno de urbe.

Todas as reformas são entendidas como reflexo da história que se fazia na

Corte em sua luta por centralização do poder. Na verdade, são entendidas como a

própria história pois a nobreza e a classe política do Império se confundiam nos

meandros da administração da província fluminense.

Ao resgatar esta classe, o fazemos pela fala dos presidentes indicados no

Apêndice 2. No conjunto de seus relatórios, entendemos que se assentam

informações preciosas sobre a realidade da província e do Brasil. Inúmeras

entradas podem ser feitas para a investigação e o nosso trabalho, atento aos

preceitos do método científico indicado quando de nossas vigilâncias

epistemológicas, escolheu um viés que capturasse a base territorial engendrada nos

discursos proferidos. Antes de serem prestações de conta e de administrações, os

relatórios presidenciais eram discursos. Estamos atentos, então, às necessárias

mediatizações conforme nos orientou Lefèbvre.

Começando pelas rendas municipais, percebemos um jogo de interesse ou

bairrismos quando confrontávamos o local de nascimento do presidente com os

assuntos que ele relatava, priorizando-o “por ser do bem de todo o paíz” ou

relegando-o “por falta de rendas provinciais” conforme anotações recorrentes nos

discursos do executivo. Além deste aspecto e independente da orientação política

ou da naturalidade dos presidentes, ficou evidente que muitas câmaras não tinham

condições financeiras para cumprir as determinações impostas por lei em relação

aos melhoramentos em seus domínios. Aqui, vale ressaltar que era determinação

central priorizar determinadas obras “para o bem da nação” conforme texto de

relatório do Ministro do Império citado a seguir:

Entre as Obras Publicas, as que interessão mais directa, e poderosamente á riqueza Nacional, são as estradas, e canaes: ellas abrem novos mercados, e enriquecem os existentes com utilidade dos productores, e consumidores, por quem se reparte a despeza

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poupada nos transportes. O Governo lhes tem dado toda a atenção, ainda que os resultados não possão por ora corresponder aos seus desejos (BRASIL, 1832, p. 25).

E, no contexto que estamos marcando aqui, a origem dos parcos resultados

neste assunto reclamados pelo Ministro residia na frágil realidade das finanças da

maioria das municipalidades e esta queixa se repetiu em grande parte dos relatórios

provinciais analisados. A saber:

Bem ao facto estaes, Senhores, dos graves defeitos da organisação das Camaras Municipaes e do quanto soffrem por isso os negócios que pela Lei do 1º de Outubro de 1828 lhes forão confiados; e se na alçada da Assembléa Provincial não cabe remediar a todos os inconvenientes que dahi provêm, compete-lhe legislar sobre a parte mais importante dos objectos cuja administração pertence aos Conselhos Municipaes; quero dizer, pontes, canaes e estradas publicas. (...) vós conheceis por huma experiencia penivel e quotidiana o estado de nossas estradas, e sabeis quanto, sem duvida pelos motivos que acabo de ponderar, he inefficaz a acção das Camaras Municipaes para promover o melhoramento e conservação destes indispensáveis vehiculos de nossos productos e communicações (RIO DE JANEIRO, 1835, p. 5-6).

Ou ainda:

As Camaras Municipaes não tem podido fazer aos seus Municípios todos os bens, que teve em vista a Lei de sua creação. Muitas causas, que para isso concorrem, nascem dos vícios orgânicos destas Corporações, por que a Lei do 1º de Outubro de 1828, e outras confiarão-lhes muitos encargos, e importantes atribuições, sem lhes deixar todavia alguns dos meios, de que dispunhão as antigas camaras (RIO DE JANEIRO, 1844, p. 21).

Por conseqüência:

Releva porém, Senhores, reflectir que tal he a multiplicidade de obras decretadas no corpo de nossa Legislação Provincial, cada uma das quaes se antolha como mais útil, necessária, e urgente, que he de impossibilidade absoluta satisfazer as innúmeras reclamações, que de todos os pontos acodem a presidência para serem preferidas, por forma que o Governo se vê em sérios embaraços sobre a escolha (RIO DE JANEIRO, 1843, p. 38-39).

Esta dificuldade foi registrada na quase totalidade de relatórios, demonstrando

uma luta em que os núcleos menores eram preteridos em relação aqueles auto-

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sustentados, sendo poucos aqueles “capazes de manter algum controle sobre o

gerenciamento das questões locais” (GOUVÊA, 2008, p. 115). De contrapartida,

ainda era de se contar o fato de que a população era reduzida e mal distribuída pelo

território, reduzindo um pouco as pressões sobre os menores aglomerados por suas

dificuldades intrínsecas, como nos mostra o relato a seguir:

Se a nossa Provincia estivesse por tal modo povoada, que fosse possível estreitar consideravelmente os Districtos Municipaes, sem correr-se o perigo de ahi não encontrar-se o numero suffieciente de individuos habilitados para desempenharem os empregos que essas divisões exigem (...) seria minha opinião que todas as obras e melhoramentos materiaes, que só dizem respeito a cada Conselho fossem por elles mesmos promovidos (RIO DE JANEIRO, 1835, p. 6).

Tais questões são fundamentais para as políticas que se enquadram no

escopo do nosso trabalho. Como nos interessou mais de perto a questão da

integração ou não das regiões da província, um assunto a ser visto de perto se

referia ao tratamento que as vias de comunicação tiveram nos círculos da

administração pública e sua relação com as iniciativas privadas. Apenas para se ter

um exemplo, observemos a defesa em prol de uma dada parcela do território

fluminense quando de sua afirmação econômica como imperativo para melhoria de

sua infraestrutura viária sugerida. Neste contexto, perguntava o presidente:

Quaes são porém as estradas, cujos reparos devem por agora ser

preferidos? A fertilidade e riqueza do Termo de Cantagallo, e o

progressivo crescimento, que ali vai adquirindo a cultura do Café,

são, além d’outros, motivos para procurarmos facilitar os transportes

e communicações hoje tão difficeis com aquella parte da Provincia

(RIO DE JANEIRO, 1836 [a], p. 17).

Assim, buscamos observar inicialmente como a administração provincial tratou

tal temática e, desta forma, buscamos compreender a partir dos organogramas

apresentados, a ciranda pela qual os órgãos de obras públicas passaram ao longo

dos anos. Eles, de maneira destacada, envolveriam receitas significativas e diante

da escassez desta caberia ao governo provincial as devidas incumbências frente às

demandas sempre constantes e crescentes. Mais adiante apresentaremos uma

sistematização das principais realidades que eram verificadas neste processo de

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montagem de infra-estrutura territorial de circulação. Os contratos, as arrematações,

as justificativas e os agentes envolvidos nos oferecem profícuos elementos de

análise.

No entanto, tendo em vista ainda o grau de carência de diversas

municipalidades, a administração fluminense teria que dar conta da geração da

renda para que estas conseguissem prestar contas de suas principais obrigações,

como eram os consertos e reparações de estradas. Como nos mostram os trechos

a seguir, as soluções tentadas envolviam desde a transferência dos rendimentos de

bens indígenas até o restabelecimento de antigos impostos. Com efeito,

Vós sabeis, Senhores, quanto o Codigo do Processo Criminal veio empeiorar a administração do patrimonio destes indolentes habitadores do Brasil; por isso e porque cumpre tomar quanto antes a este respeito huma providencia, não seria quiçá fora de proposito transferir ás Camaras Municipaes dos respectivos Termos a administração e rendimento de bens dos Indios; ficando todavia sujeitas ellas aos encargos que erão desempenhados pela Conservatoria. Este arbitrio, sobre ser de vossa attribuição, nenhum prejuizo traria aos Indios e accrescentaria os rendimentos de algumas Camaras, que os tem tão mingoados (RIO DE JANEIRO, 1835, p. 8-9).

Quando, Senhores, por todo quanto acabo de expôr-vos, se vê que a receita d’esta provincia, com quanto seja maior que a de qualquer outra do imperio, não basta a satisfazer todas as suas necessidades e melhoramentos reclamados para o seu mais rapido progresso na carreira da civilização, da industria e do commercio; quando se observa que estão começadas e projetadas tantas vias de communicação, que nada menos são do que tantas outras veias de riqueza individual e publica; e que muitas outras vão sendo justamente exigidas pela lavoura e commercio, que progride e estende-se pela provincia, sede do governo geral; vias que não só cumpre accelerar, como tambem conservar sempre em bom estado depois de abertas, quando o augmento de população nas cidades e villas traz a necessidade de templos, escolas, aqueductos, fontes, casas de caridade, cadêas, augmento da força publica, e tantos outros objectos de despeza (...) Quero fallar-vos da necessidade de restabelecerdes um imposto que havíeis abolido em circustancias talvez em que a provincia podia d’elle prescindir, ou em que cumpria favorecer a industria sobre que recahia; isto é, o dízimo do assucar (RIO DE JANEIRO, 1847, p. 44).56

56 Esta citação nos chama a atenção também pelo fato de reafirmar a província fluminense como a principal do país e por deixar claro que o trato com as obras que envolviam a questão das vias de comunicação era uma fonte de “riqueza individual e publica”. É primorosa também a descrição da dinâmica econômica e territorial a ser alcançada a partir da abertura de estradas e caminhos.

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Nas primeiras duas décadas de vida autônoma da província, os presidentes

muitas vezes se referiam às dificuldades encontradas como inerentes a fatores

como a desorganização das Câmaras e sobretudo ao baixo grau de integração dos

municípios e de povoamento em determinadas partes da província. A meta de

vencer estas dificuldades era colocada pelos atores como questão nacional como já

citado em exemplo anterior. No entanto, a força do discurso nos faz reproduzir ainda

um texto sobre a importância da Directoria de Obras Públicas que alteia seus “muito

reaes e valiosos serviços á nação” e seus “princípios luminosos” (RIO DE JANEIRO,

1843, p. 24) e um outro que enaltece o canal que ligaria Niterói e Campos, definindo

esta obra de âmbito provincial como a que “colloca o paíz em communicação directa

com o Estrangeiro, mudando-lhe a face para melhor” (RIO DE JANEIRO, 1843, p.

43).

A idéia de nação como objetivo, atrelada à de pátria ou ainda à de civilização,

estava dada em todas as dimensões das políticas imperiais e em seus diferentes

níveis. O uso de tais conceitos foi recorrente e utilizado em variados contextos,

como, por exemplo, nos casos vistos até aqui e, por último, na defesa da vinda de

uma mão-de-obra européia para o Brasil. Com efeito,

(...) não ha ahi hoje quem desconheça os uteis da colonisação européa, e mais interessados do que ninguem, somos nós em promove-la, não seria talvez fora de razão, que a Assembléa Legislativa authorisasse o Governo da Provincia para tomar hum certo numero de acções da Companhia que ha pouco se organisara no Rio de Janeiro com fim tão patriotico e vantajoso. Fôra este hum meio, em quanto nos não he dado recorrer a outro mais efficaz, de alentar os esforços dos Cidadãos illustrados que meditão nos meios de tornar effectivas sem quebra dos interesses materiaes do Paiz, as dispozições legislativas, que vedão a perniciosa introducção de escravos (RIO DE JANEIRO, 1836 [a], p. 25).

Assim, através destas citações, podemos melhor indicar o contexto em que se

insere a necessidade de integração territorial do país e da província em particular. E

este imperativo crescente no que se refere à intervenção do governo fluminense na

implementação de melhoramentos materiais, em especial em obras de circulação

“para o bem público”, justificava a centralidade que o trato com as licitações para

obras dessa natureza passaria a ter. Afirmando a precisão de fortalecer o mercado,

sempre discursado em nome dos interesses da nação, os presidentes da província

se valeram do poder que detinham para moldar a estrutura administrativa que

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melhor se adequasse ao cumprimento dessas prerrogativas. Além da construção de

vias de circulação, eles incorporariam uma necessidade de coleta de informações

sobre os locais para que se pudesse melhor racionalizar os investimentos e tornar a

administração mais eficaz em seus propósitos. Assim, novos órgãos e funções

foram sendo estruturados. O Arquivo Estatístico, neste sentido, foi criado em 1850 e

se manteve até a reforma de 1876 vinculado diretamente à Presidência da Província

no mesmo nível da Diretoria de Fazenda e da Diretoria de Obras.

No entanto, a tomada efetiva do território esbarrava em problemas na

organização política e administrativa das municipalidades frente à legislação

imperial que restringia o papel das Câmaras. Os discursos sinalizavam o processo

de repartição do território em seus vínculos com a ordem política e econômica

vigente no Segundo Reinado. Não faltaram alusões à sua centralização e ao seu

tom modernizador.

A adminstração municipal ressente-se em geral dos inconvenientes de sua lei orgânica, que se acha na mais completa desharmonia com índole e lettra da legislação moderna. Mesmo quando essas corporações fossem sempre formadas de pessoas as mais bem intencionadas, e que por sua intelligencia podessem supprir de algum modo á fraqueza e defeitos, de sua organisação, ainda assim os maus effeitos de uma lei não apropriada ás circusmstancias se farião sentir. É evidente, e geralmente reconhecida em todo império, a necessidade de se alterar a instituição d’esses corpos, ao mesmo tempo deliberativos e executivos, restringindo, definindo e precisando suas diversas atribuições, no interesse da boa gestão dos negócios locaes, segundo os princípios de uma bem entendida centralisação (RIO DE JANEIRO, 1848, p. 39).

Dessa humilde casa, que tem o nome de escola, pende o futuro de toda uma sociedade. No meio da reacção que se operou em algum tempo contra as idéas da centralização, o ensino que era o laço mais forte da unidade do imperio, foi roto, arrancando-se-lhe a uniformidade e substituindo-a pela cor local de cada provincia. (...) Esta provincia não pode deixar de disputar precedencia á muitas de suas irmãs (RIO DE JANEIRO, 1859, p. 57).

Em outra fala e em outro momento, o problema das precárias condições de

muitas municipalidades persistia. No entanto, é importante perceber que estas

passaram a ser relacionadas sobretudo às pequenas localidades, reforçando o

papel dos principais centros da província que se sustentavam e geravam renda aos

cofres provinciais e nacionais. O desafeto de algumas falas confirmava, para nós, o

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quão era arraigado o Estado territorial imperial nos “microdomínios da vida

cotidiana”. Sobre os pequenos núcleos municipais, um presidente registrou:

Dependentes em tudo da Assembléa e da presidência da provincia, e dispondo de escassos recursos, que em algumas dellas são absorvidos pelas despezas do pessoal, não têm as Camaras Municipaes a necessária iniciativa, e vivem pela parte de expediente. Cumpre, todavia, não attribuir somente aos vícios da lei, o que é também devido á índole de nosso povo, que está sempre á espera da acção do governo em tudo que diz respeito aos interesses communs da sociedade (RIO DE JANEIRO, 1869, p. 26).

O papel das principais cidades no projeto provincial e imperial de “espalhar

luzes” sobre o território também se confirmava quando a matéria era a instrução.

Dois pontos aqui devem ser observados. O primeiro era o fato de que a palavra

“educação” não estava posta, cabendo ao Estado a missão de “instruir” a

população, dar-lhe ordenamentos. Pensamos ser reveladora esta realidade diante

do contexto em que se inseria o império brasileiro naquele momento e cujas

premissas articulamos neste trabalho. O segundo ponto fundamental para a nossa

tese confirma a precariedade da “instrução” ou o seu pouco valor enquanto

elemento de formação de cidadania, mas confirma o projeto territorial pensado a

partir da cidade. Mais ainda: não de todas as cidades. Pinçadas do início do período

de Dom Pedro II, identificamos como reveladoras dessa questão as seguintes falas:

Ja n’outra época mandou a Assembléa sobr’estar no provimento das cadeiras de instrucção secundária com intuito de formular um systema geral de estudo. Dispersas essas cadeiras pela província, e entregues os seus professores a si mesmos, quasi nenhuma tem podido ser a acção do Governo sobre taes Escolas; que uma das Leis últimas permitio se provassem. He mui conveniente pois que sejão ellas subordinadas a um centro, e como existe o Diretor das escolas primárias, para o qual cargo he sempre nomeada pessoa de variada instrucção, me parece o mais habilitado para ser ao mesmo tempo Director das escolas de Instrucção secundária, ou seja ensinada por Professores e collocados nas diversas Villas e Cidades da província, ou reunida em Lycêos e Collégios Provinciaes. Como se acha atualmente dispersa, sem inspecção, pouco fructo tem produzido semelhantes estabelecimentos. (...) A única participação que tive de seu Director (Lyceo d’Angra dos Reis) foi um offício em que elle me pedia providências para se poderem realisar os exames dos alumnos, que o frequentarão o anno findo, porque os Professores do Lyceo lhe havião declarado que não se achavão habilitados para examinarem os examinados senão nas matérias próprias de suas cadeiras, não tendo conhecimento nas das outras. Este facto demonstra, no seu entender, que estabelecimentos desta ordem são sempre

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collocados com mais fructo nas grandes Cidades, ond e abundão as capacidades , que ainda mediante escassos ordenados se dedicão ao magistério. Não julgo que esta capital necessite já de um Lyceo idêntico, pela proximidade, em que esta da Corte , onde existem estabelecimentos soffríveis d’instruccao primária e secundária; mas certamente para o Norte da província reputo uma necessidade; e bom serviço fareis a província dotando com um Lyceo a Cidade de Campos , o lugar mais longe da Província inquestionavelmente. Este Lyceo porém deverá ser montado de forma que podesse espalhar algumas luzes sobre a agricultura , estabelecendo-se cadeiras approvadas para tal fim (RIO DE JANEIRO, 1843, p. 45-46, grifos nossos).

Ninguem hoje desconhece que entre nós, desconexa, sem unidade, sem uma direcção central, a instrucção publica não tem o carater de uma instituição nacional ; e longe está de corresponder á natureza, índole e necessidade do paiz . Tão rico nos tres reinos da natureza, em vez de propagarmos as sciencias physicas, para aproveitarmos todos os dons que a Providencia tão liberalmente nos outorgou, a instrucção de nossas escolas, collegios e lyceus é quase exclusivamente litteraria . Nossos mancebos assim acostumados a uma instrucção classica e especulativa, não aspirão senão a um titulo de bacharel, ou doutor, que lhes dê presumpção de saber, e não encontrarão outro meio de vida senão o de empregado s publicos . Entendo, Srs., que é tempo de dar outra direccção ao espírito de nossa mocidade, excitando-lhe o gosto pelos conhecimentos uteis , formando homens activos e intelligentes que cultivem a riqueza do paiz, que tirem nossa agricultura da velha rotina que preguiçosa segue ha tantos annos, e desenvolvão nossa industria nascente, para qual abundão ahi tantos elementos, que ou ficão estereis, ou vamos permutar com o estrangeiro, para que nol-os transforme em objectos de primeira necessidade, que em retorno nos são vendidos a subido preço. Quando assim me exprimo, não pretendo proscrever os estudos litterarios; sei que elles engrandecem a esphera do pensamento, entreteem isnpirações generosas e são indispensaveis á educação moral da nação ; tenho-os até como necessarios, a fim de contrabalançar essa tendencia exclusiva para os gosos materiaes da vida, que a civilisação industrial soe desenvolver, e que não offerecem por fim á especie humana senão o bem-estar physico. O que eu, porem, condeno e considero altamente prejudicial ao paiz, é que a instrucção c lassica se alimente a expensas dos conhecimentos uteis, das sc iencias e das artes que tanto interessão ao commercio, indust ria e lavoura (RIO DE JANEIRO, 1847, p. 41, grifos nossos).

Em meio à precariedade da instrução, contando também a dos instrutores, os

exemplos a serem transmitidos seriam todos os provenientes da base econômica e

do jeito de ser das elites baseado na formação culta e seletiva e nos costumes de

uma classe que se espelhava na “civilizada” Europa. E, neste mar de dificuldades,

as ideologias geográficas são prontamente acionadas. Niterói, apesar de capital da

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província não mereceria tanto destaque em relação às necessidades observadas

em Campos por uma única razão: sua localização no território. De caráter

predominantemente administrativo, a primeira se subjugaria à Corte tão próxima. De

contrapartida, a segunda era tomada pelo que representava para a economia

nacional e pela necessidade de superar efetivamente sua distância física do poder a

partir dos mais variados instrumentos. Mais revelador ainda para o nosso trabalho é

o fato de que os presidentes da província vêem a instrução como ferramenta para

“iluminar” a agricultura prioritariamente. O saber aqui é meramente técnico,

operacionalizado para agregar territórios que excediam o espaço restrito da cidade.

Assim, através de aparatos localizados em alguns pontos da província a gerência

em espaços largos estava dada. E na retórica, instrução, defendida principalmente

por seu viés técnico, não era educação e sim geopolítica territorial apenas.

Sobre este aspecto ainda, são relevantes os seguintes trechos:

Algumas Camaras Municipaes reclamão a favor de seus respectivos Termos a creação de novas escolas de Primeiras Letras, e de outros estudos menores; e porque vos compete providenciar a este respeito, farei remetter á Secretaria da Assembléa Provincial todos os documentos relativos a este e outros assumptos. Não devo porém deixar de emitir a minha opinião sobre objecto de tanta magnitude, e vem a ser: (...) fôra de meu parecer que, quando mesmo se julgasse dever continuar inteiramente gratuito o ensino dessas materias, conviera reunir em Collegios, e em tres ou quatro differentes pontos da Província todas as Cadeiras já creadas, e que se houverem de crear. Assim tornava-se mais facil a disciplina destes estabelecimentos, e a despeza com que o Estado deve carregar achar-se-ha mais módica e profícua (RIO DE JANEIRO, 1835, p. 4, grifo nosso).

Não posso informar a V. Ex. qual seja o numero de a lumnos matriculados no corrente anno ; asseguro porem que no anno proximo findo elevou-se a mais de 6,000, sendo cerca de 4,000 do sexo masculino e o resto do sexo feminino. Comparando-se esse numero com a população approximada da provincia de 840,000 habitantes, vê-se o fundamento das minhas serias preoccupações no começo deste assumpto. Para uma população de 840,000 almas ha em toda a provincia 176 escolas de ambos os sexos. Reduzido que seja aquelle numero a um terço por causa da escravatura, ainda assim teremos para cada escola o numero de 1,590 individuos, dos quaes discriminando outro terço, isto é, deduzindo os adultos, resta ainda a cada uma dellas o numero de 530 meninos. Não avanço pois proposição que já não esteja no espirito de muitos; o atraso da instrucção primaria indica a necessidade de uma reforma no seu regime actual. (...) Quanto á instruncção publica secundaria, permitta-me V. Ex. confessar-lhe que não conheço provincia alguma do

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Brazil em que ella esteja menos considerada do que na do Rio de Janeiro . Apenas existem 3 escolas publicas, sendo 2 de francez, uma em Angra dos Reis e outra em Campos , e 1 de inglez nesta capital , entretanto que nas outras provincias de ordem inferior, pelo menos tem as suas capitaes um lycêo publico, em que se leccionão todas as materias preparatorias exigidas para o curso superior das academias. Sei que a isso me objectárão, que a proximidade da corte dispensa essas aulas . Talvez haja razão, entretanto não o creio porque os poucos collegios particulares de instrucção secundaria que tem a capital são frequentados por grande numero de alumnos (...) (RIO DE JANEIRO, 1867 [a], p. 9, grifos nossos).

Em especial, esta última citação tenta discutir a questão das deficiências do

sistema de ensino no que se refere à sua pouca abrangência tanto em termos

populacionais (não apenas quantitativos pelo tom mais liberal do discurso) quanto

em termos territoriais. Expondo algumas mazelas da província, defende a idéia de

um ensino mais irradiado pelos municípios em detrimento a um discurso em prol de

uma dada natureza “inteligente” conferida apenas a alguns deles.57

Independente das conjunturas políticas no executivo provincial, o fato era que

a infraestrutura de comunicações assumia papel preponderante fosse para expandir

um sistema de instrução ou para otimizar o escoamento da produção econômica e a

disseminação das ordens. Se a questão fundamental que estava dada era a de

suprir o território de mecanismos de integração, importante se faz listar os portos

que funcionariam como elo entre o interior e as rotas oceânicas e indicar também as

principais vias térreas que em um dado momento do Império mereceram atenção

por parte das sucessivas presidências. Quanto aos portos, cabe a seguinte citação:

Além dos portos principaes das cidades de Cabo Frio, e Angra, e das Villas de Macahé, S. João da Barra, Itaguahy, Mangaratiba, e Paraty, nas quaes criei collectorias, outros secundários existem, dos quaes os que demorão ao Sul do Rio de Janeiro começão a florescer com a freqüência das tropas que descem do centro desta provincia, e da de São Paulo, principalmente dos municípios do Bananal e Arêas, com quantidade de café , que he daqui levado por mar para o Rio de Janeiro. A necessidade de conduzir com maior facilidade e menor despendio esse importante e avultado producto da nossa Agricultura tem feito há tempos a esta parte, com que os Povos tenhão aberto algumas communicações para aquelles p ontos da costa que offerecem maior proximidade; e para o embarque a commodidade precisa. Alguns destes portos, ou saccos, tem attrahido a si muitas Tropas que antes se dirigião á respectiva cidade, ou Villa,

57 “Ora, ha certas localidades onde torna-se difficil, quase impossível mesmo, achar bons monitores; e por isso aquelle methodo [de ensino secundário] é principalmente adoptado nas grandes cidades e povoações intelligentes (RIO DE JANEIRO, 1847, p. 40, grifo nosso).

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compartindo assim, e diminuindo mais ou menos consideravelmente o seu Commercio (RIO DE JANEIRO, 1836 [b], p. 24, grifos nossos).

Observando esta dinâmica do território, atrelada ao crescimento na importância

de determinadas vias e regiões, focalizamos o papel do aparato institucional

montado (não sem conflitos) para tal, justificando, pelas reformas identificadas nos

organogramas apresentados, a atenção que as obras públicas relativas às vias de

circulação tiveram junto ao poder provincial e central. Aliás, vias térreas estas

hierarquizadas no final da década de 1870 por conta de reivindicações anteriores e

constantes junto à Assembléia Provincial como nos mostra o seguinte trecho:

A classificação das estradas da provincia era indispensavel para guiar o governo na decretação das despezas, e desde longa data havia sido infructiferamente tentada. O regulamento dado pela deliberação de 4 do corrente mez, attendeu a essa necessidade, estabelecendo tres ordens de estradas e definindo os requisitos da classificação em cada ordem: por outra deliberação da mesma data, completei o trabalho, classificando as estradas de 1ª e 2ª ordem, únicas que ficam total ou parcialmente a cargo da provincia (RIO DE JANEIRO, 1878, p. 6).

Ao observarmos uma divisão em três ordens de estradas, sendo uma delas

excluída totalmente da alçada da responsabilidade do poder provincial, buscamos

marcar que o adjetivo “público” foi sempre tomado como neologismo visto que na

prática este setor da administração estatal revelava um dos principais pontos na

estrutura do sistema imperial: a relação intrínseca entre as esferas públicas e os

interesses privados. Fossem nos documentos do Ministério do Império (referentes

não apenas ao Rio de Janeiro, mas também às demais regiões do país) ou dos

presidentes fluminenses, esta forte imbricação estava dada mostrando uma certa

expectativa dos governos pela ação privada e um certo desconforto quando de sua

ausência. As citações a seguir mostram como a iniciativa dos “empresários” era

desejada e instituída frente às constantes declarações a respeito das limitações das

rendas públicas no que se refere às obras mais corriqueiras no dia-a-dia da

província (como a arrematação de estradas) ou aos intentos de grande porte (como

os primeiros projetos para a abertura de “caminhos de ferro” efetuando a ligação

entre a Corte e as províncias vizinhas de Minas Gerais e São Paulo). Com efeito,

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A Villa de Parati tem decahido muito do seu commercio por se haver tornado cada vez menos transitavel a sua estrada da Serra (...). Na falta de empresario o Governo mandou dar começo á obra, applicando o rendimento da Barreira, que pouco avulta no estado decadente do seu commercio; e hum conto de réis mensal, da consignação para as obras publicas. Pareceo conveniente a clausula de emprestimo, para que esta somma, quando puder ser paga pelo rendimento da respectiva barreira, vá utilisar a outra estrada, ou se remetta, pedindo-o assim as circustancias. Do mesmo modo se tem praticado com outras estradas, que tem renda própria (BRASIL, 1832, p. 28-29).

Começando pela Provincia do Rio de Janeiro, ha a participar-vos que o engenheiro César Cadolino tem projectado a construcção de huma estrada de fero para transito de carros movidos por machinas locomotivas, a qual, partindo do Campo de S. Christovão, vá finalisar em S. João d’El-Rei na Provincia de Minas Geraes. O requerimento do emprehendedor foi remettido ao Tribunal da Junta do Commercio, o qual ainda não consultou sobre este importante objecto, por lhe faltarem esclarecimentos, que são exigidos do referido Engenheiro (BRASIL, 1838, p. 32).

O Governo, tomando em consideração as Representações de numerosos habitantes do Município da Corte, e da Provincia do Rio de Janeiro, e sobre tudo o parecer da commissão de Agricultura de huma das Augustas Câmaras Legislativas, dado em 23 de Setembro de 1839; attendendo tambem á convenienia de se transplantar para o Brasil huma industria, de que não temos ainda conhecimento pratico; concedeo a Thomaz Cochrane o Privilegio Exclusivo, pelo tempo de oitenta annos, para a construcção de hum caminho de ferro, que deve principiar no Município da Corte, e terminar na Provincia de São Paulo; concedendo-lhe para isso as vantagens, que o mesmo Governo entendeo caberem nas suas attribuições, e constão, assim como as obrigações da Companhia, que o dito Cochrane tem de organisar para levar a effeito aquella empresa, das condições annexas ao Decreto de 4 de novembro do anno passado. Com as simples concessões do Governo não poderá realisar-se aquella obra: o empresário terá de certo de recorrer ao corpo legislativo para amplia-las de huma maneira proporcionada á magnitude do objecto própria (BRASIL, 1840, p. 40).

Não tendo apparecido quem arrematasse a estrada que do porto de Estrella conduz ao Parahybuna, ordenou a Presidência que começasse a obra por administração; encetada em 11 de janeiro findo com a consignação (por ora) de 6:000$000 mensaes; tem 55 trabalhadores e está em effectivo andamento (RIO DE JANEIRO, 1843, p. 12).

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Uma vez que a documentação fala por si sobre tais aspectos, selecionamos o

relatório de 1843 do presidente João Caldas Viana58 para uma espécie de raio-x das

obras de circulação na província. E os motivos foram: 1) Trata-se de uma das

descrições mais detalhadas sobre este assunto entre o conjunto de relatórios; 2) O

momento em que foi feito refletia o impulso que a questão tomou no início do

Segundo Reinado, quando foi tratada como prioridade para a nação; 3) Vivia-se um

período de “estado sactisfatorio e florescente das finanças da Província”; 4) Boa

parte das obras indicadas se estendeu por períodos posteriores de maneira que

eram citadas nos relatórios subseqüentes; 5) O fato do presidente ser campista

revelava como seus interesses locais, atrelados a região atingida por aquela

municipalidade, ganhavam destaque no trato provincial; 6) Não apenas na

justificativa de aumento da arrecadação, o fato do presidente ser campista mostrava

como se revelava os mecanismos de representação vigentes; 7) Ilustram com

detalhe a relação público-privado na estruturação do espaço a partir de interesses

locais e regionais ao se referir aos constantes entraves ou sucessos nos

arrematamentos; e 8) Denotam os espaços tomados para circulação na província

anteriores ao advento efetivo das ferrovias, que lhe daria uma feição atrelada a

questões relacionadas a um outro nível de contexto.

Havíamos falado sobre uma sistematização das principais realidades que eram

verificadas no processo de montagem de infra-estrutura territorial de circulação por

que achamos que os conflitos e agentes transparecem no texto e, como dito, nos

oferecem profícuos elementos de análise. Tomamos, a partir do Quadro 3 a seguir,

a indicação dessas obras e a percepção da dinâmica em que estão inseridas como

elementos essenciais para a nossa reflexão.

58 O Apêndice 2 mostra que ele já havia assumido a província em 1838. Neste segundo governo, foi primeiro interino por conta da exoneração do Marques de Paraná até 2 de março de 1843 e depois efetivo até 11 de abril de 1844. Por seu intermédio, a Fazenda Córrego Seco foi arrendada ao Major Koeler e pelo seu papel com referência a essa fazenda de Dom Pedro II é tido como um dos fundadores de Petrópolis.

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Quadro 3: Obras de infra-estrutura de circulação na província fluminense em 1843. Estrada Geral de Itaguahy Passara por melhoramentos e “offerece seguro transito a qualquer hora do dia ou da noite ” Estrada da serra de Mangaratiba A ordem era aplicar o rendimento liquido da respectiva Barreira, mas este se mostrou insuficiente. Estava passando por obras pequenas com o trabalho de 15 africanos livres. Pede a Assembléia 32:000$000 para o término das obras em um prazo de 3 anos pois, “por sua importância esta estrada não deve ser mais demorada ” Estrada da Pedra e João d’Oliveira (para Angra dos Reis) Obras de conservação com o rendimento líquido da Barreira da Pedra e sob a direção do negociante João Altenfeder. Ponte e pontelhões no rio Palheiro Reparos e madeiramento e um aterrado feito à custa de subscrições e donativos. Estrada da Mambucaba Levantamento indicou a necessidade de construção de uma ponte orçada em 10:271$800. Propõe o estabelecimento de Barreira e a elevação d a consignação . Estrada de Paraty “Na estrada nova pouco se fez durante o anno financeiro. Na velha, por onde continua o trânsito geral do Commércio fizerão-se algumas estivas, aterros e pequenas calçadas nos esgotos e alguns outros reparos tendentes a sua conservação, e a não difficultar o trânsito.” Estrada do Mato Grosso Devido ao péssimo estado nos lugares Morro do Cambraia e Morro do Alexandre, o Governo dissolveu a Comissão Administrativa da Estrada dos Fazendeiros substituindo-a por outra composta por um Conselheiro Barreto Pedrozo e por dois cidadãos Bento da Cunha e João Jose Ferreira. A consignação passou para 300$000 mensais e foi destinada a renda líquida da Barreira do Mato Grosso . Estrada do Rodeio O cidadão arrematante Daniel Joaquim de Sant’Anna se obrigou a fazer mediante a quantia de 8:000$000 obras na estrada. Entre elas: pontelhão em frente de sua casa com pegões de pedra e cal e 25 palmos de vão Estrada da Polícia “O Governo, attendendo a importância desta estrada contractou em 15 de janeiro de 1842 com o Tenente Coronel Albino José de Siqueira, a fornecer elle os operários precisos para o concerto desta estrada pelo jornal diário de 900 réis cada trabalhador, correndo a despesa com o sustento, curativo, e ferramenta necessária por conta do contractador”. Um outro contrato, agora com Antonio Pereira de Sampaio, estabelecia o conserto da ponte do Desengano e a casa da mesma Barreira por 3:900$000. Estrada do Commércio A parte plana entre a raiz da Serra do Tinguá e a Villa de Iguassú está em bom estado e oferece trânsito de toda qualidade . Em 6 léguas ela tem 6 pontes de madeira de Lei assentadas em sólidos paredões de alvenaria seca, 1 aterro de 200 braças por 28 palmos de largura e 6 esgotos subterrâneos convenientemente dispostos para o escoamento das águas. A parte entre o alto da Serra e o ribeirão das Palm eiras tem 8 pontes e 10 esgotos bem construídos . Entre o ribeirão das Palmeiras e o rio Santana “falta muito trabalho nas suas 400 braças”. Daí ainda faltam 5 léguas para a margem do Paraíba. A ponte no Paraíba com passagem para Ubá foi orçada em 80:000$000 e coube ao Coronel Conrado Jacob Niemeyer apresentar projeto. Por contrato adicional de 17 de dezembro de 1842 no valor de 24:000$000, o mesmo fará a execução das obras de calçamento de toda a serra e guarnecerá os lugares mais estreitos com grandes pedras ou frades de madeira de lei e calçar a Serra Viúva nos lugares de maior declividade. Recebeu prazo até 30 de setembro de 1844. “He de lamentar que esta estrada, que tem custado a província enormes despezas, não possa dar trânsito a carros e seges! O declive da serra chegando a ser em certos lugares de 1:7 a condena a não servir senão para animaes de carga.” Estrada e Serra do Couto Acha-se feita a porção da Serra e o restante consiste apenas “n’uns trilhos mal abertos”. Esta estrada “he empresa” do Coronel Custódio Ferreira Leite e seu irmão Francisco Leite Ribeiro. Estrada do Vernek Precisa só de conservação e existe um contrato com o Tenente Coronel José Pinheiro de Sousa Vernek de 4 anos para conservá-la desde a encruzilhada com a estrada do

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Commércio até a ponte do rio do Alferes na Fazenda do Pau Grande. Estrada dos 3 Córregos do Porto Novo do Cunha A primeira porção está feita entre os 3 córregos e Bernardo; tem uma boa ponte sobre o rio Preto. A 2ª entre Aparecida e o Porto Novo do Cunha foi iniciada sob a comissão formada pelo brigadeiro Inácio Gabriel Monteiro de Barros, padre Manoel Dias Codeco e Luiz de Sousa Brandão com consignação mensal de 1:000$000. Estada Velha da Estrella Foram removidos 18 africanos livres das obras do Cunha para esta obra. Estrada Normal da Estrella Não houve arrematantes com a marcação de 6:000$000 mensais e o governo iniciou as obras em janeiro deste 1843 com 55 trabalhadores. Abriu-se um caminho da casa de Leonardo Dias Alves na estrada velha até o lugar dos novos quartéis, roçou-se e derrubou-se no alto da serra uma nova picada, fez-se vários ranchos, armazém, casa do Administrador e “outros misteris”. “Estes, e muitos outros trabalhos miúdos são apenas preparatórios, mas trabalha-se com grande actividade, e farei todos os esforços por corresponder ao empenho, que esta Assemblea demonstrou para a construção d'esta importantíssima estrada , na qual autorisou o Governo a despender até a quantia annual de 200.000$000.” Estrada do Porto das Caixas a Cantagallo Muitos reparos na serra do Morro Queimado, na vargem de Santana e na ponte entre o rio Tuy e o rio Valério. Os consertos entre a ponte de Casseribu e a morada de Domingos Caetano Madeira aguardam acordo de valores referentes aos pontelhõoes. Da ponte do rio Tuy e o rio Valério, o estado da estrada he péssimo por ser o solo pedregozo e inundável com as enchentes do rio Banguella. Há de se abrir uma nova direção pela outra encosta da montanha. Da villa de Nova Friburgo a Cantagallo, todos os tr ês caminhos são péssimos. O mais breve (o da banqueta) he crivado de atoleiros. Investiga-se uma nova picada. Estrada de Cantagallo a Macahé Os trabalhos estão divididos em três secções: 1) entre Cantagallo e o córrego da Luciana (arrematado por Augusto Maulaz), 2) entre os córregos da Luciana e Sanglard (João Baptista Midosi) e 3) entre o córrego de Sanglard e o porto de Sapucaia (Bernardino Jose d'Almeida). “Os trabalhos executados em qualquer das três Secçõe s não tem sido feitos com continuidade ” Estrada que de Nictheroy conduz a Maricá pelo Mato da Paciência Estado deteriorado por não ter o seu arrematante cu mprido com o que se obrigou . Estrada do Morro da Viração Necessita de consertos e tenciona por em arrematação. Estrada do Morro do Cavallão Necessita de consertos e tenciona por em arrematação. Estrada que de Campos conduz a Nictheroy É, sem dúvidas, a principal da 4ª Secção e a que ma is incômodos, fadigas e precipícios oferece aos viajantes . “De Nictheroy até Cabo Frio, differentes direccões melhorão o trânsito no tempo das cheias, mas de Cabo Frio a Campos he de extrema necessidade que se evitem os passos perigozos, que em certos lugares ameação a vida dos passageiros.” O aterro do brejo contíguo ao rio das Ostras está arruinado e “serve hoje só para aumentar a dificuldade de o transporte, quando as ágoas extravasadas do rio (...) chegão as vezes até aos arções da sella e outras vezes obrigão os animaes a nadar. Nesta passagem morreo um preto no mez de Novembro último”. A obra foi decretada pela Assembléia. O arrematante do aterro do Quilombo em Macabu o fazendeiro Joaquim Ribeiro de Castro tem um ano para as obras. Cabe a Câmara de Campos, por portaria de 10 de marco de 1840, pôr em arrematação a estrada entre a cidade e o Ururay orçada em 30:291$800. Segundo informações técnicas, não é prudente fazer tal obra sem antes fazer o canal entre o Paraíba e o Ururahy “obra também de immensa importância para o Paíz ”. O caso merece discussão. “Vede pois, Senhores, que na 4ª Secção não há estrada alguma em construção, ou em reparos.” Na estrada pública na margem direita do rio Parahyba, que do Município da Villa de São João da Barra conduz a Cantagallo, mandarão se fazer melhoramentos na porção pedregosa da estrada do Morro do Fabre a custa do Cofre Municipal; e bem assim a ponte sobre o rio do Collégio do mesmo cofre pela Lei de 26 de maio de 1842 nº 267. Pede para que a Assembléia reconheça tais despesas como provinciais . Ponte do Rio d’Ostras Necessita de obras devido ao ruinoso estado.

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Ponte sobre o Rio Carrapato na Lagoa de Carapebus O aumento do nível da água na lagoa chegou ao piso da ponte, estragando-a. “O mesmo Ten Cel Jose Carneiro da Silva e irmão que a construíram com expensas suas avisaram que irão reparar às suas custas os estragos.” Ponte sobre o Rio Ururahy Precisa de reparos na pintura e na substituição de algumas tábuas. Tinha a conservarão mantida (via termo com a Câmara local) por um fazendeiro que falecera há um ano. Ponte da Valla navegável de que trata a Lei nº 244 A Câmara de Campos fez esta ponte e construiu uma barca de passagem para o rio S João. Faltam aterros e pontilhões que serão em breve feitos. Barca de passagem sobre o Rio Macahé “O atterrado do lado não está solidamente construído, e por isso presumo que será de mui curta duração.” Aterrado do Tipota O arrematante desde 1837 fez uma obra de 391,5 braças que só serve no tempo seco . Ponte sobre o Rio Santo Antonio no Município de Nova Friburgo O arrematante faleceu e as obras ficaram pela metad e. Ponte do Banquete (sobre o rio Grande, liga Cantagalo a Nova Friburgo) “Esta inteiramente arruinada e precisa ser reedificada, ou feita toda de novo” Ponte do Casseribu Esta com soalho podre e nega passagem . “A ponte sobre o rio Valério na estrada do Morro Queimado, a ponte do rio Sapucaia na estrada de Cantagallo ao Porto da Caixas, e a ponte do Barreto na estrada de Nictheroy, achão-se destruídas; urge pois que sejão reconstruídas, e feita uma de novo sobre o rio Macacu na estrada de Cantagallo ao pé da povoação de Santa Anna.” Ponte do Bananal Já estão sendo providenciadas obras no pegão e na base. Ponte do Piraqueassu junto a Villa de Paraty “Sendo esta ponte ordenada pela Lei nº 214 marcou-se-lhe o lugar em que deverá ella ser collocada, e poz-se em arrematação a sua construcção; mas não tendo apparecido quem a quizesse tomar por arrematação, ficou sem seguimento algum esta obra, orçada com largueza em 5:312$500. Ponte sobre o Rio Santo Antonio “Reconhecendo o governo que esta ponte era uma necessidade pública do lugar na estrada do Picu, ordenou que se levantasse a planta, fizesse o orçamento, e organizasse as condições para a sua arrematação.” Foi entregue ao Ten Cel Antonio Pereira Leite. Ponte sobre o Rio Bananal e Barreiros na estrada entre as Villas de Barra Mansa e Rezende Ordenará reparos na estrada “pela frequência com que he transitada ” (p. 37) e a construção de uma ponte sobre o rio Bananal por 8:070$000, abandonando o projeto de ali construir uma ponte barca. Pede urgência “pois que por esta estrada descem continuamente grande número de tropas com café e outros gêneros ”. Existe uma ponte arruinadíssima sobre o rio Barreiros aos cuidados da Câmara de Rezende. Pede 2:795$000 para a obra. Ponte sobre o Rio Pirahy na Fazenda do Coronel José Francisco Ferreira Esta importante e elegante ponte deu passagem ao público no dia 10 de novembro do ano findo. Promete vida longa pela solidez e perfeição. Custou a Fazenda Provincial 9:384$700, mais 400, 400 e 50$000 de subscrição. “Collocada no cruzamento de duas frequentadíssimas estradas de Minas e S. Paulo, e tendo franqueado um passo mui diffícil do rio, he de transcedente utillidade”. Foi administrada gratuitamente pelo Dr. João José Pereira. Já ordenou a 1ª Secção fazer projeto para collocação de uma barreira com taxas razoáveis para a sua conservação . Ponte sobre o Rio Pirahy junto a povoação Foi aprovada em 1840 e construída em um ano. Foi feita com verba da Câmara e administrada pelo cidadão Manoel José de Barros Vianna “com grande zelo e desinteresse ”. Caminhos da Vendinha, no Passa-Três, e do Arrozal e cortes do Rio do Sacco em Mangaratiba Precisam de obras mas só serão realizadas se “estado das rendas permitir”. Melhoramentos na Barra do Rio Macacu O Capitão d’Engenheiros Egídio José de Lorena está sondando as barras dos vários rios desta bahia para apresentar os meios de melhoramentos. Fez a planta hydrographica do rio Inhomirim desde a sua foz até o Porto da Estrella.

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Pharol da Estrella Pede para que seja reparado nos moldes do de Macacu. Canal do Nogueira As obras, iniciadas com tanto entusiasmo por conta da importância do canal e a utilidade que ia prestar em todo o sentido e até na higiene pública , estão paradas e abandonadas. Valla navegável de Cacimbas Está em andamento pela Companhia empresária. Já transpôs a lagoa do Silva (onde navegam diariamente 10 a 12 canoas de todos os port es, carregadas de taboado, e das produções agrícolas de todos os portes) Canalisação da Lagoa Araruama em Cabo Frio A escavação dos baixos da lagoa é a obra mais urgente do município mas de difícil realização por conta do “estado sempre vacilante, e muitas vezes péssimo da renda da Província”. Corte do Rio de Saco em Mangaratiba Também é obra urgente do município e também de difícil realização por conta do “estado sempre vacilante, e muitas vezes péssimo da renda da Província”. Melhoramento de navegação pelo Porto de Itaguahy Como os obstáculos progridem na foz, mandou levantar obra e aguarda o retorno. Secção do grande canal de Nictheroy a Campos entre esta última cidade e a Villa de Macahé Repete o pedido do antecessor sobre a importância desta obra e diz que já providenciou os seus levantamentos. “Exceptuada a estrada de ferro projectada desde Rezende até a Corte, não concebo que haja de mais transcedente utilidade, de maior importância, e que immediatamente deve concorrer para a prosperidade da Província , do que o Canal (...) um bom Canal facilita os meios de trazer aos grandes mercados as produções de seu solo. Elle parece destinado a tornar-se a Veneza Brazileira. Esta obra, e uma Alfândega em Macahée, colloca o paiz em communicação directa com o Estrangeiro, deve mudar- lhe a face para melhor dentro de poucos annos ”.

Fonte: RIO DE JANEIRO (1843, p. 25-43, grifos nossos). (Organizado pelo autor)

O conjunto de obras em andamento na província, além de indicar as regiões

mais “valorizadas” ou movimentadas em um dado momento, nos mostra as bases

com as quais o Estado promoveria seu propósito de ser territorial. Afinal, parecia

estar dado que:

Os beneficios que produzem as vias de communicação entre as nações mais cultas e civilisadas , avultão de valor entre aquellas, que como o Brazil ainda na infancia dos grandes melhoramento s materiaes tem necessidade de encurtar as distancias que separão seus ricos e productivos sertões , do litoral, em que o commercio se desenvolve sempre em maior escala (RIO DE JANEIRO, 1867 [a], p. 9-10, grifos nossos).

Neste processo de retirada do país de sua “infância” material, o aspecto que

transpassa todas as notas que utilizamos para reflexão se refere à questão do

público e do privado. Por exemplo, como registra o último item do Quadro 3, em

texto também já assinalado nesta tese, o canal entre Niterói e Campos (em si, uma

infraestrutura microrregional) extrapola a escala provincial para colocar o “paiz em

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communicação directa com o Estrangeiro” (com E maiúsculo conforme o original),

aludindo ao tom nacional da empreitada que envolveria também atores do setor

privado. Neste sentido, a preocupação antiga de um dado presidente é ilustrativa

dessa realidade conforme registrou em seu relatório:

Não me consta que esteja formada a Companhia para abrir o Canal de Campos a Macahé, e fazer outras obras publicas (...) os capitaes, que nos fallecem, superabundão em outros paizes , onde difficilmente achão vantajoso emprego, e o interesse particular he mui sagaz em atinar com o que melhor lhe convém, confio, que não esteja distante a epoca em que, realisada a primeira empresa, afuão para nossa terra os capitaes e industria dos povos mais do que nós avançados em civilisação para fazerem, com grande vantagem nossa e delles, brotar os germes de riqueza aqui profusamente disseminados (RIO DE JANEIRO, 1836 [a], p. 24, grifos nossos).

Portanto, para a nação que estava sendo construída deveriam convergir

também os homens de “grossa ventura”, além dos representantes do estamento

burocrático. Foi comum o envolvimento “com grande zelo e desinteresse” de ambos

nas obras de infraestrutura que possibilitariam o engrandecimento da nação e este

passaria pela instalação de barreiras a cada novo provimento. Lembremos de

Mattos (1994) e das formas encontradas pelo poder estatal para aproximar os

interesses privados dos públicos foi a promoção de mecanismos para o

melhoramento das condições físicas das estradas e a instalação de equipamentos

públicos, fato que permitiria a ampliação das trocas econômicas e políticas.

Chama a atenção também a indicação da coleta de dados sobre os locais e a

elaboração de cartas hidrográficas. Muito do material produzido naquele momento

sobre o território se referia a rede de “cannaes por água” que deveriam cortar a

província, pois a cada tempo a sua técnica. Esta solução vinha, como vimos, desde

o período colonial e também foi política central durante o Império.

Quanto às demais informações e agentes observados na sistematização que

fizemos através do Quadro 3, o conjunto de grifos confirma processos e agentes

com os quais trabalhamos em nossa tese.

Um outro ponto a ser destacado com importância é aquele que se refere aos

equipamentos e serviços voltados à disseminação da ordem e à civilização na

província em consonância com os ideais nacionais. Aqui, identificamos uma das

mais reveladoras faces do projeto imperial: a de que o território foi tomado como a

própria motivação para a nação. Ressaltemos Moraes (2002) quando afirma que,

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desde a Independência, as elites brasileiras conceberam o país não como uma

sociedade, mas como um espaço a ser conquistado através de um movimento

expansivo de seu aparato burocrático e institucional. Nestes termos, observamos

que a construção física do Brasil foi alçada à condição de pressuposto básico para o

projeto nacional e civilizador.

Portanto, quando dizíamos sobre um dos aspectos mais reveladores do projeto

imperial em meio aos discursos analisados nos referíamos ao trato sintomático que

equipamentos físicos como escolas, hospitais, casas de caridade e cadeias

receberam, denotando uma população que era tomada apenas como instrumento.

Apesar de muita defesa em prol do aumento da receita para com estes

assuntos, a ótica era desvirtuada de um verdadeiro Estado nacional. Se antes

observamos as políticas de educação sob o ponto de vista territorial, aqui buscamos

entender como a cidadania era desvirtuada neste contexto, servindo para legitimar

imposições. Com efeito,

A despeza feita com este ramo de serviço publico fora sem duvida huma das mas justificadas, se dela a tirasse toda a vantagem possivel (...). Depois de havermos conseguido formar hábeis professores, cumpre multiplicar quanto compatível for com nossos recursos pecuniários, as escolas de Primeiras letras. Os conhecimentos que ahi se adquirem são indispensáveis, não só para tratar dos negocios domesticos, mas ainda para bem desempenhar todos os deveres de Cidadão (RIO DE JANEIRO, 1835, p. 3-4, grifo nosso).

O cidadão era visto apenas pela ótica dos deveres e da vida doméstica, sem

atrelá-lo aos preceitos de uma sociedade nos padrões utilizados como referência.

De contrapartida, o aparato repressivo era ampliado apesar das dificuldades sempre

enumeradas pelos chefes do Executivo. No entanto, lembremos da força local

exercida diretamente pelos representantes da economia e da lei.

Com relação às casas de cadeia, muitas foram as recomendações para

expandir os prédios tanto em quantidade quanto em área. Aqui, não havia

entrelinhas e o aparato institucional era voltado para a coerção, sendo constantes

as reclamações quanto ao número insuficiente de guardas ou as exposições sobre

o aumento dos gastos com a manutenção e compra de munição e equipamentos do

corpo policial. Em ambos os casos, a segurança e tranqüilidade pública eram

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acionadas para justificar os números, sobretudo em tempos de guerra (e de

afirmação nacional, por conseqüência) como nos mostra o texto a seguir:

Para acudir ao serviço da policia da capital, mandei posteriormente, por deliberação de 14, destacar um contingente da guarda nacional composto de 1 tenente, 3 alferes, 4 inferiores, 8 cabos e 120 praças, sendo 20 de cavallaria, que ficará substituindo o corpo policial durante a sua ausencia, ou emquanto se não tomarem por acto legislativo as providencias que aconselhar a partida de mesmo corpo para o theatro da guerra. (...) Aproveito esta occasião para render uma justa homenagem aos sentimentos, de que se possuirão os officiaes e praças do corpo policial provisorio, quando em um pensamento commum de patriotismo e abnegação espontaneamente se apresentarão a partilhar os sacrificios, privações e perigos de todo o genero, a que estão sujeitos os valentes defensores da honra nacional (RIO DE JANEIRO, 1867 [b], p. 9).

Em alguns relatórios, o fornecimento de homens para as comarcas era

sugerido tendo em vista a necessidade de condução de presos e recrutas a grandes

distâncias, denotando o baixo grau de fluidez destas regiões. Vale ressaltar também

os valores patrióticos sempre avultados fossem os assuntos que estivessem sendo

considerados.

Sobretudo em épocas de instabilidade política em regiões próximas à província

fluminense, como no cenário das revoltas ocorridas em São Paulo e Minas Gerais

no início da década de 1840, o território também foi incorporado ao poder por este

viés da segurança. A demanda por maiores efetivos e em maior número de locais

se via, por exemplo, através da solicitação para construção de quartéis e,

sobretudo, pela forma através da qual a Guarda Nacional era gerenciada. Um dos

relatórios do executivo do Rio de Janeiro, o de 1843, mostra que o território

fluminense estava abrangido por 15 legiões dessa milícia, cada uma com um

coronel chefe que devia obrigação ao seu comando superior. Na divisão desse

poder, apareciam nomes civis de peso na cena da província (como representantes

de famílias de destaque econômico e político na época a exemplo dos Breves,

Vernek e d’Almeida) conforme nos mostra o Quadro 4 a seguir:

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Quadro 4: Legiões da Guarda Nacional na província fluminense em 1843. Legiões Freguesias a que pertencem Comando Superior 1ª Niterói Niterói, São Gonçalo e Itaipu Belarmino 15ª Magé Magé, Guapimirim, Inhomirim, Nossa

Senhora da Guia e Seruhy Ricardo de Siqueira

2ª Itaboraí Itaboraí, Rio Bonito, Nossa Senhora do Desterro

3ª Sto Antonio de Sá Sto Antonio de Sá, São José e Trindade

Baltazar de Abreu Cardozo

7ª Cantagalo e Nova Friburgo Cantagalo e Nova Friburgo 4ª Maricá e Saquarema Maricá e Saquarema Manoel Ribeiro 5ª Cabo Frio Cabo Frio, Araruama e São Pedro da

Aldeia D’Almeida

6ª Campos e São João da Barra

Campos, São João da Barra, São Salvador, São Fidelis, Guarulhos, São Sebastião e São Gonçalo

Manoel Joaquim Pereira Baptista

14ª Macaé e Capivari Macaé e Capivari 8ª Valença, Vassouras e Paraíba do Sul

Valença, Vassouras, Paraíba do Sul, Rio Bonito, Paty do Alferes, Sacra Família, Cebolas, São José e Rio Preto

Francisco Peixoto de Lacerda Vernek

13ª Iguaçu Iguaçu, Pilar, Marapicu, Jacutinga e Merety

9ª Barra Mansa e Resende Barra Mansa, Resende, Amparo, Espírito Santo, São Vicente, Ferreira e Santa Ana

José de Souza Breves Filho

12ª Pirai e Itaguaí Piraí, Itaguaí, Arrozal, Dores, São Pedro e São Paulo

10ª Parati e Angra dos Reis Parati, Angra dos Reis, Ribeira e Ilha Grande

Ananias d’Oliveira

11ª São João do Príncipe e Mangaratiba

São João do Príncipe, Mangaratiba, São João Marcos, Rio Claro e Itacurussá

e Souza

Fonte: Tabela “Commandos superiores, legiões, corpos e esquadrões de cavalaria, batalhões e corpos de infanteria, e companhias de artilharia da Guarda Nacional da Província” (RIO DE JANEIRO, 1843).

A tabela mostra ainda um território dividido em 25 municipalidades (um número

maior de freguesias) congregadas em 15 áreas de responsabilidade de apenas 7

comandantes superiores. A este mesmo tempo, o corpo policial oficial da província

operacionalizava suas funções através de 13 destacamentos que não

correspondiam aos mesmos indicados pela Guarda Nacional (atrelada que estava à

localização da moradia de seus comandantes superiores). Eram os seguintes os

destacamentos de polícia: Capital, Campos, Cabo Frio, Cantagalo, Vassouras,

Rezende, Paraíba, São João do Príncipe, Arrozal, Itaboraí, Angra dos Reis, Barra

Mansa e Paraibuna.

Tal forma de abarcar o todo físico foi comum em diversas instâncias da

administração fosse ela civil, jurídica, eclesiástica, militar ou paramilitar, fiscal,

eleitoral, etc. O ponto de partida do comando em todas elas era praticamente o

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mesmo: as cidades mais significativas no conjunto do território fluminense. Quanto

mais particularizado fosse o objetivo da divisão, núcleos de menor significância

assumiam algum tipo de centralidade nos documentos oficiais. No entanto, para

comandos mais centralizados apenas as “cabeças de comarcas” assumiam o posto

e traduziam a quantas o território estava efetivamente estruturado em seu conjunto

hierarquizado de núcleos referenciais. Entendemos que este processo já estava

delineado através do Quadro 2 quando víamos a província por suas comarcas,

municipalidades e freguesias. Vejamos mais alguns exemplos.

O Quadro 5 a seguir nos mostra que o Decreto nº 1.828 de 1° de outubro de

1856 tomava o território fluminense por 12 districtos eleitoraes para um conjunto,

naquela época, de 30 municípios. Eram eles:

Quadro 5: Distritos eleitorais da província fluminense e Corte (1856). Distritos eleitorais e suas cabeças

Paróquias do Colégio Local de reunião para votação

1º Parochia do Santissimo Sacramento na Cidade do Rio de Janeiro

Parochia do Santissimo Sacramento na Cidade do Rio de Janeiro, de Santo Antonio dos Pobres, de Sana Rita, de Nossa Senhora D’Ajuda da Ilha do Governador, e do Senhor Bom Jesus do Monte da Ilha de Paquetá.

Escola Militar

2° Parochia de Sant’Anna da Cidade do Rio de Janeiro,

Parochia de Sant’Anna da Cidade do Rio de Janeiro, de S. Francisco Xavier do Engenho Velho, de S. Thiago de Inhaúma, de Nossa Senhora da Apresentação de Irajá, de Nossa Senhora do Desterro de Campo Grande, de S. Salvador do Mundo de Guaratiba, e do curado de Santa Cruz.

Paço da Illustrissima Camara Municipal

3° Parochia de S. José na Cidade do Rio de Janeiro

Parochia de S. José na cidade do Rio de Janeiro, de Nossa Senhora da Candelária, de Nossa Senhora da Gloria, de S. João Baptista da Lagoa, e de Nossa Senhora do Loreto de Jacarepaguá.

Faculdade de Medicina

4° Cidade de S. Salvador de Campos dos Goytacases,

Parochia de S. Salvador de Campos, de Nossa Senhora das Neves, da Nossa senhora da Conceição de Macabú, de Nossa Senhora da Conceição de Carapebus, de Nossa Senhora do Desterro de Quissiman, de Santa Rita da Lagoa de cima, de S. Gonçali, de S. Sebastião, de Santo Antonio dos Guarulhos, de Santo Antonio do Carangola, de S. João a Barra, e do curato da Barra Secca.

Camara Municipal da Cidade de Campos

5° Villa de Cantagalo

Parochia do Santissimo Sacramento de Cantagallo, de Nossa Senhora do Carmo, de S. Francisco de Paula, de Santa Maria Magdalena, de Santa Rita do Rio Negro, de S. Sebastião, de S. João Baptista de Nova Friburgo, de Nossa Senhora da Conceição de Paquequer, de S. Fidelis de Sigmaringa, de S. José de Leonissa da Aldêa da Pedra, de Santo Antonio de Padua, e do Curato de S. João Baptisa do Vallão dos Veados.

Matriz da Villa de Cantagallo

6° Cidade de Cabo Frio

Parochia de Nossa Senhora da Assumpção de Cabo Frio, de Nossa Senhora de Nazzaret de Saquarema, de S. Sebastião de Araruama, de Nossa Senhora da Lapa de Capivary, de Nossa Senhora do Amparo de

Matriz da Cidade de Cabo Frio

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Correntezas, de Nossa Senhora da Conceição de Rio Bonito, do Curato de Nossa Senhora da Conceição da Boa Esperança, de S. Pedro da Aldêa, do Curato de S. Francisco de Paula, da Sacra família da Barra de São João, e de S. João Baptista de Macahé.

7° Imperial Cidade de Nicterohy

Parochia de S. Sebastião de Nicterohy, de Nossa Senhora da Várzea, de S. Lourenço, de S. Gonçalo, de Nossa Senhora da Conceição dos Cordeiros, de S. Sebastião de Itaipú, de Nossa Senhora do Amparo de Maricá, de S. João Baptista de Itaborahy, e de Nossa Senhora do Desterro de Tamby.

Câmara Municial da Imperial Cidade de Nicterohy

8° Villa de Magé

Parochia de Nossa Senhora da Piedade de Magé, de S. Nicolao de Suruhy, de Nossa Senhora d’Ajuda de Guapemerim, de Nossa Senhora d’Apparecida, de Santo Antonio de Paquequer, de Santo Antonio de Sá de Macacú, de S. Jose da Boa Morte, da Santíssima Trindade, de Nossa Senhora da Piedade de Inhomerim, de Nossa Senhora do Pilar, de Nossa Senhora da Guia de Pacopahyba, e de S. Pedro d’Alcantara de Petropolis.

Matriz da Villa de Magé

9° Villa de Vassouras

Parochia de Nossa Senhora da Conceição de Vassouras, de Santa Cruz dos Mendes, de S. Pedro e S. Paulo da Parahyba do Sul, de Santo Antonio da Encruzilhada, de Sant’anna de Cebolas, de S. José do Rio Preto, de Nossa Senhora da Conceição da Bemposia, da Sacra Família do Tinguá, de Nossa Senhora da Conceição do Paty do Alferes, de Nossa Senhora da Glória de Valença, de Santa Teresa, de Santo Antonio do Rio Bonito, de Nossa Senhora da Piedade das Ipyabas, e de Santa Isabel do Rio Preto.

Matriz da Villa de Vassouras

10° Villa da Barra Mansa

Parochia de S. Sebastião da Barra Mansa, de S. José do Turvo de Nossa Senhora do Rosário de Quatís, de S. Joaquim, do Espírio Santo, de Nossa Senhora do Amparo, de Sant’Anna do Pirahy, de S. João Baptista do Arrozal, de Nossa Senhora das Dores, de Nossa Senhora da Conceição de Resende, do Senhor Bom Jesus do Ribeirão de Sant’anna, de S. José de Campo Bello, de S. Vicente Ferrer, e no curato de Santo Antonio da Varzea Grande.

Matriz da Villa da Barra Mansa

11° Villa de Itaguahy

Parochias de S. Francisco Xavier de Itaguahy, de Nossa Senhora da Conceição do Bananal, de S. Pedro e S. Paulo do Ribeirão das Lages, de S. João Marcos, de S. José da Cacaria, de Nossa Senhora da Conceição do Passa-Tres, de Nossa Senhora da Piedade de Iguassú, de Sant’Anna das Palmeiras, de Nossa Senhora da Conceição d Marapicú, de Santo Antonio de Jacotinga, e de S. João de Merity.

Matriz da Villa de Itaguahy

12° Cidade de Angra dos Reis

Parochia de Nossa Senhora da Conceição de Angra dos Reis, de Sant’Anna da Ilha Grande de fora, de Nossa Senhora da Conceição da Ribeira, de Nossa Senhora do Rosario de Mambucaba, de Nossa Senhora da Guia de Mangaratiba, de Sant’Anna de Itacurussá, de Nossa Senhora dos Remedios de Paraty, de Nossa Senhora da Conceição de Paratymirim, de Nossa Senhora da Piedade do Rio Claro, e de Santo Antonio de Capivary.

Paço da Câmara Municipal da Cidade de Angra dos Reis

Fonte: Decreto n. 1.828, de 1 de Outubro de 1856 (Arquivo Nacional). (Quadro organizado pelo autor)

Na arrecadação de impostos, por sua natureza específica, todo o conjunto da

província era chamado a participar das atividades e assim a hierarquização dos

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lugares apenas era vista quando confrontados os totais arrecadados e não pela

concentração da tarefa em dados pontos do território. Por corresponder à base da

sustentação econômica do regime, desde o início da história da província a

instalação de postos de fiscalização e arrecadação estava dada. No entanto, esta

questão esbarrava nas dificuldades de trânsito oferecidas pelos caminhos da

província como vemos no seguinte texto:

E ainda essa vastíssima secção sejão seis os caminhos que de Minas Geraes penetrão nesta Provincia, a saber: os do Porto Novo e o Velho do Cunha, da Pomba, do Muriahé, do Peripitinga e Feijão Cru, tive todavia por conveniente crear registros somente nos três primeiros, por se avaliarem apenas o numero de 150 a 200 os animaes de carga que annualmente descem pelo Muriahé, os quaes geralmente não conduzem café, e assucar; e por estarem em tão mao estado os de Peripitinga e Feijão Cru, que impossível he que os transitem animaes carregados (RIO DE JANEIRO, 1836 [b], p. 19).

Se esta dificuldade era sentida no controle do fluxo de mercadorias, também

era observada na inspeção do trabalho e lisura dos próprios responsáveis por estes

postos. Não sem efeito, a questão das grandes distâncias e dos seus impedimentos

é exposta na citação a seguir:

A difficuldade em fiscalisar e inspecionar os empregados dos Registros he muito grande. Achando-se estabelecidos longe das Povoações, e a maior parte em lugares ermos, a grandes distancias da Capital da Provincia, poucos meios tem o governo para ser informado com exactidão e imparcialidade acerca do seu procedimento. (...) Difficiel he, Senhores, encontrar homens probos e idôneos, que se sujeitem a fazer huma longa e penosa viagem para hir viver em Registros na extrema da Provincia, no meio da solidão e da privação das commodidades da vida pela gratificação annual de 500U000 e 400U000rs (RIO DE JANEIRO, 1836 [b], p. 27-28).

Ainda no mesmo relatório, por outros aspectos, podemos observar como as

finanças da província eram dificultadas por este baixo grau de fluidez do território

que, ademais, contava com um incipiente acervo documental sobre suas reais

características. Com efeito,

Tinha de crear Registros em todos os lugares, por onde entrão nesta provincia gêneros sujeitos ao imposto do Dizimo, e nenhun esclarecimentos encontrei na Secretaria da Presidência acerca dos pontos, onde devessem ser collocados. As estradas da Provincia, que começarão a ser exploradas com systema debaixo da Administração

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do seu primeiro Presidente, não havião sido todas examinadas, e menos para fim similhante. Nenhum soccorro me offerecêrão as cartas existentes, por quanto a melhor não indica exactamente, nem podia indicar, pela confusão em que se achão, muitos pontos principaes das extremas da Provincia, além de que, sendo reduzida e correcta em 1807, não he possível que traga muitos caminhos, que o tempo, o incremento da população e riqueza, e a necessidade das communicações tem aberto por toda a provincia. As indagações e exames, a que logo mandei proceder, e as informações que obtive, me convencerão de que era necessária a creação de 11 Registros e 7 collectorias de Portos Marítimos, que com effeito forão creados pelos dous regulamentos de 26 de Maio próximo pretérito, que vos serão presentes, e nos quaes se contém todas as providencias que então julguei necessárias para a boa fiscalisação, e arrecadação da renda (RIO DE JANEIRO, 1836 [b], p. 19).

Ampliando as estimativas dadas em 1836 quanto ao número destes postos de

fiscalização e arrecadação, podemos perceber esse processo em dois momentos

distintos: existiam 17 coletorias no início da década de 1840 para um total de 25

municipalidades enquanto que, na década de 1880, eram 34 para 36 núcleos

urbanos autônomos. No primeiro caso, as receitas provinham das seguintes

repartições provinciais: da Administração da Fazenda (impostos sobre os próprios

provinciais, prêmios de loteria, produtos de loterias a benefício de igrejas e casas de

caridade e cobranças de letras), das 17 Coletorias e 7 Mesas de Renda

(contribuição de polícia, dívida ativa, décima urbana, imposto de 1.800 réis sobre

“cada rez que se talhar”, imposto de patente sobre o consumo de aguardente,

imposto de patente sobre os engenhos, meia siza sobre escravos, legados e

heranças e subsidio literário), das 12 Barreiras (direitos de portagem), das 4 Barcas

de passagem (direito de portagem) e da Mesa Provincial (dízimo do algodão e de

miunças, emolumentos de certidões, multas e quota de dízimo do café). O conjunto

destes postos e o total da arrecadação são mostrados na Tabela 7 a seguir:

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Tabela 7: Receitas da província fluminense por repartições (1841/1842 e 1843/1844). Tipo: Nome: Arrecadação:

1843 / 1844 Obs.: Arrecadação:

1841 /1842 Obs.:

Administ. Fazenda 53:580$000 Obs 1 149:996$242 Obs 3 Coletorias Nicterói 26:989$040 16:739$360 Iguassú 14:038$000 17:567$466 Magé 10:612$000 10:672$069 Itaboraí 15:212$000 12:168$598 Santo Antonio de Sá 4:690$600 4:670$478 Maricá 4:592$400 5:376$675 Cantagalo 1:666$000 1:244$020 Nova Friburgo 1:430$000 1:137$438 Vassouras 8:426$060 22:514$702 Paraíba do Sul 1:996$000 1:781$925 Valença 3:832$000 5:116$221 Rezende 7:519$600 10:577$047 São João do Príncipe 7:702$360 7:417$770 Barra Mansa 3:696$000 1:932$350 Campos 35:863$200 Obs 2 19:692$188 Piraí 4:021$600 6:202$470 Saquarema 2:661$200 398$609 Mesas de renda São João da Barra 4:734$000 5:838$941 Cabo Frio 8:252$400 8:276$188 Angra dos Reis 7:904$000 15:137$527 Macaé 3:866$000 8:101$095 Mangaratiba 2:966$000 4:358$856 Itaguaí 4:516$800 3:661$366 Parati 4:522$800 5:797$333 Barreiras Estrada da Estrella 15:000$000 15:500$000 de Parati 2:400$000 590$490 do Commércio 6:600$000 3:032$240 de Mangaratiba 12:000$000 3:663$640 de Itaguaí 12:000$000 8:643$590 do Mato Grosso 8:000$000 3:575$360 do Rodeio 5:000$000 2:482$290 de Mambucaba 3:000$000 - da Pedra 8:000$000 503$080 da Polícia 15:000$000 7:825$650 de Cantagallo 6:000$000 2:189$610 Ponte do Desengano 8:000$000 7:534$300 Barcas de passagem Rio Paraíba 10:000$000 - Paraibuna 4:000$000 - Macaé 1:800$000 - Ubá 2:600$000 1:435$490 Mesa Provincial 540:970$000 509:207$265 Obs 4 TOTAL GERAL 905:660$000 993:559$939

Obs 1: Do total, 45:120$000 vem de produtos de loterias a benefício de igrejas. Obs 2: No total, está incluído 2:000$000 coletado de passagens de rios. É a única coletoria com este imposto. Obs 3: No período, correspondia a “Thesouraria”. Obs 4: No período, correspondia a “Mesa Provincial do Consulado da Corte”. Na tabela original: “Consulado”.

Fonte: RIO DE JANEIRO (1844). (Tabela organizada pelo autor)

Além da questão já levantada sobre a relação coletorias-municipalidades, os

dados da tabela mostram um esforço da administração em prover o território de

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mecanismos fiscais. Se as repartições citadas eram simplórias ou deficientes do

ponto de vista material (como relatavam freqüentemente seus presidentes) o fato é

que a base técnica do Estado estava presente em sua atividade de fisco. E ao

compararmos estes dados com os apresentados até aqui pelos outros mecanismos

de divisão territorial, constatamos que, mesmo com as dificuldades inerentes da

época, um grupo reduzido de cidades acumulava funções de centros econômicos,

políticos, eclesiásticos, policiais, eleitorais, etc.

No segundo caso indicado (quando já existiam 34 coletorias para 36 núcleos

urbanos autônomos durante a administração de Bernardo Avelino Gavião Peixoto

no início da última década do Império) tais coletorias haviam concentrado um maior

número de impostos a arrecadar. Eram eles: décima urbana, patente sobre o

consumo de aguardente, contribuição de polícia, imposto de 50$ na compra e venda

de escravos, selo de herança e legado, emolumentos, multas, rendimentos de

próprios provinciais, rendimento de “pennas d`água” (“menos em Nictheroy, em que

esta renda é directamente arrecadada pela thesouraria”), selo e emolumentos de

patente de Guarda Nacional, imposto de 1:500$ sobre a averbação de cada escravo

vindo de fora da província, imposto anual de 1:000$000 a que estão sujeitos os

negociantes de escravos e cada um de seus agentes, cobrança de dívida ativa,

rendimento extraordinário, depósitos e “qualquer quantia a que a província tiver

direito, precedendo ordem legal para exigíl-a e recebêl-a” (RIO DE JANEIRO,

1882a, p. 10-11).

Em cada uma dessas repartições do governo, trabalhavam dois funcionários: o

coletor e o escrivão. Seu regulamento garantia uma comissão a esses homens

estabelecida da seguinte forma: 3/5 para o coletor e 2/5 para o escrivão de 25% a

se arrecadação não excedesse 10:000$000, 15% se ficasse entre 10:000$000 e

20:000$000, 10% se entre 20:000$000-30:000$000 e de 5% de tudo que excedesse

30:000$000. De contrapartida, se o coletor não entregasse a arrecadação à

Diretoria da Fazenda até o prazo estabelecido, pagaria 9% de toda a quantia

indevidamente detida em seu poder, além de perder o direito a porcentagem na

arrecadação.

Optamos por apresentar as coletorias as quais nos referimos aqui a partir do

calendário estipulado para o recolhimento de suas rendas para percebermos mais

aspectos desse aparato técnico e administrativo de extração de rendas das

atividades desenvolvidas no território. Segundo o regulamento dessas repartições,

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existiam cinco datas ao longo do ano financeiro para a entrega da arrecadação por

parte de seus funcionários, exceto na capital da província onde esse ato aconteceria

de maneira mais freqüente. O Quadro 6 a seguir especifica as datas e indica as

coletorias existentes naquele momento.

Quadro 6: Datas para entrega dos saldos de arrecadação provincial (1882). Dia Coletoria 1 e 10 Niterói 4 Estrella, Iguassu, Itaboraí, Magé, Maricá, Petrópolis 5 Itaguaí, Nova Friburgo, Santana de Macacu e Vassouras 7 Barra Mansa, Piraí, Paraíba do Sul, Rio Bonito e Sapucaia 9 Capivary, Rio Claro, Rezende e Valença 11 Angra dos Reis, Araruama, Mangaratiba, Parati e Saquarema 13 Cantagalo, Cabo Frio, São João do Príncipe e Santa Maria Magdalena 15 Barra de São João e São João da Barra 17 Macaé e São Fidélis 18 Campos

Obs: Os dias especificados se referem aos meses de janeiro, março, abril, julho e outubro. Fonte: RIO DE JANEIRO (1882a, p. 9).

Deste quadro há de se observar ainda que a quase totalidade dos municípios

existentes na província naquele momento já tinha sido capturada pelos mecanismos

diretos de cobrança de impostos. Chama a atenção o caráter exclusivo dado a

Campos nesta tabela. Na verdade, em todas as distintas formas de se olhar e se

apropriar do território mostradas até aqui, esta cidade reservava seu destaque na

realidade fluminense no período. As rendas provenientes desta cidade, que

capitaneava as atividades de grande área do norte da província, garantiram a

centralidade deste município nos assuntos da época.

Naquele momento, foram constantes também as chamadas dos presidentes

para a questão da melhoria material das vilas e cidades. Ora reclamando a falta de

sustento dos menores, ora enaltecendo as potencialidades de determinados

núcleos. Ora sugerindo à Assembléia mais verbas para novos sistemas técnicos59 e

ora disputando recursos para o reparo de estruturas precárias. No período áureo do

Império (que correspondeu aos ciclos de saldo positivo na arrecadação de rendas

da província fluminense), foram as barreiras, registros e coletorias que responderam

pela segunda fonte de recursos para o Rio de Janeiro, atrás apenas do café. 59 Solicitando a criação de uma Secção de Navegação Interior dos Rios e Lagos da Província e a construção de um estaleiro e mais barcas para a circulação, Caldas Viana diz: “Peco-vos pois que habiliteis o Governo com meios para conseguir tão importantes fins, ampliando devidamente a Lei nº 277. Tudo neste gênero está por crear; o grande impulso deve partir da Assembléa” (RIO DE JANEIRO, 1843, p. 24).

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Com o declínio deste no Vale do rio Paraíba do Sul, uma tentativa ainda seria

observada com seu deslocamento para as “bandas de leste” até Cantagalo. Mas um

novo cenário econômico se confirmaria a partir da década de 1860 com a expansão

continuada da atividade açucareira em Campos. Se a estagnação seria notada nas

antigas áreas do café e a decadência verificada naqueles núcleos portuários que

cumpriram significativo papel no escoamento das mercadorias a ele associadas, no

norte da província a dinâmica seria intensificada com o retalhamento da região para

a criação de novas municipalidades. Desta forma, a marcha de ocupação foi

acelerada com o acréscimo de cidades, anteriormente freguesias, vilas e arraiais, e

com a criação de novas estradas e caminhos.

Campos se destacou ainda na produção de gêneros voltados para o

abastecimento interno da província. Mas o açúcar foi a base da opulência do norte

fluminense. A região constituiu-se em espaço privilegiado de legitimação do poder

estatal confirmando uma administração como ordenamento territorial nos espaços

urbanos. Foi intensa, naquele momento, a instalação de infra-estruturas e aparatos

administrativos na cidade e em seus distritos e freguesias voltados para o controle

produtivo e político da população. Também nos mecanismos de formação social

como o ensino, esta realidade se observou. O Decreto nº 2.503 de 22/11/1880 pode

ser tomado exemplo. Ele criava o Liceu de Humanidades de Campos vinculado à

Diretoria de Instrução que tinha por competência ministrar o ensino das línguas

portuguesa, francesa, inglesa e latina, da Matemática Elementar, da História, da

Geografia Retórica e Poética e da Filosofia. Na província, apenas em Niterói se

ensinava um cabedal amplo de assuntos. 60

A posição de Campos já se fazia presente desde cedo e, no conjunto das

obras que sempre recebeu, destaquemos quando da construção de uma muralha

para proteger a cidade do rio Paraíba. Na Assembléia, o presidente do Rio de

Janeiro dizia:

Esta obra, indispensável para conservar uma Cidade , que por sua população, riqueza e civilisação he sem duvida a primeira da Província, e dest’arte as vidas, e fortunas de immensas famílias, que nella habitão. Mandei fazer esta obra na extensão de toda a cidade entre a Coroa e porto do Maciel com parapeito, alteamento e

60 A preeminência de Campos entraria na república e, pelo Decreto nº 72 de 15/04/1890, este Liceu passou a ter a mesma organização que o da antiga capital da província.

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calçamento da beira do rio pela Câmara, e plantio de arvoredo (RIO DE JANEIRO, 1843, p. 41, grifo nosso).

E, mais adiante, metaforizando a questão para justificar o apreço com a obra e

solicitar a aprovação dos seus gastos pelos deputados, discursava:

O primeiro cuidado de um individuo, e de uma Nação he sua conservação. Primeiro se existe, para depois curar-se do modo de existir. O primeiro objecto he vital , o modo de existir he segundário (RIO DE JANEIRO, 1843, p. 41, grifo nosso).

Ao grifarmos estas citações, cremos ter assinalado as bases que orientam as

nossas investigações. O ideal nacional do Império estava assentado, pois, em uma

relação muito próxima entre cidade, civilização e fortuna (de poucos). E os

discursos e práticas daqueles incluídos nesta esfera foram sempre no sentido de

manter esta estrutura. Tal qual documentos textuais ou transmitidos pela oralidade,

o território registrou esse movimento. No caso fluminense, alguns de seus pontos

foram reveladores desta rede de poder que se materializava através de uma rede

urbana para subjugação de determinadas regiões. Na realidade específica de

Campos, esta rede conectava sua hinterlândia à capital do Império, transformando

as relações estabelecidas em seu interior e denotando o recorte regional das

políticas territoriais de então. Com efeito,

Para viabilizar a difusão e perpetuação desse poder, o Estado engendrou uma política de circulação na qual participaram diferentes grupos com interesses antagônicos. Tal política, por envolver grupos de poder localizados em diferentes espaços da Província, esteve no centro do debate da política centralizadora do Império. Portanto, na medida em que os caminhos eram abertos e foram se instalando os aparatos administrativos (...) os interesses desses grupos e do Estado foram assegurados, o que concorreu para a formação de uma rede urbana, pois permitiu o contato e intercâmbio de mercadorias, pessoas, informações e ordens (CHRYSÓSTOMO, 2006, p. 7).

Assim, os fluxos se consolidavam na medida em que os vínculos de uma dada

cidade com os demais pontos do território se estreitavam, caracterizando arranjos

regionais diretamente vinculados à capital da província e à cidade do Rio de

Janeiro. Foi o caso de Campos no contexto do norte fluminense. No entanto, uma

questão nos chama a atenção: as fronteiras e as políticas lançadas para a sua

conquista. E, neste caso a região campista é tomada como um profícuo exemplo

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uma vez que esteve por muito tempo caracterizada por grandes espaços sem um

povoamento efetivo.61 Neste cenário, a definição e posse das fronteiras assumiam

relevância no contexto das decisões administrativas e revelavam o mote da política

imperial para com o seu território. Sobre esta questão, relatemos os seguintes fatos

ocorridos ainda na época do franco cultivo de café em muitas áreas do atual

sudeste brasileiro:

Parece-me excessiva a quantidade de café de produção de Minas que se despacha guiado livre do pagamento da cota provincial, com quanto reconheça que as margens do Parayba, Paraybuna e do Rio Preto do lado de Minas são férteis, apropriadas para a cultura do café e effectivamente applicadas a essa cultura. Tive denúncia de fraude, que não suspeito. Tenho exigido informações e não deixarei de perscrutar com muita attenção e cuidado os fundamentos desta denúncia, para chegar ao conhecimento se existe com effeito a fraude denunciada. Este accréscimo consideravel de producção de café das províncias limitrophes despachado livre da quota do dízimo no Consulado provincial já foi notado e assignado no último relatório do meu antecessor, que não encarava como naturaes, filhas do progressivo, mas lento crescimento da produção, as differencas que se enxergavão para mais no número de arrobas, comparadas às exportações em diversos semestres (RIO DE JANEIRO, 1843, p. 11-12, grifo nosso).

Os problemas advindos da imprecisão das fronteiras foram sempre registrados

nos documentos da administração provincial durante todo o Império. As duas

citações a seguir mostram que, desde os primeiros anos da província, houve um

eco de tais reivindicações dos presidentes fluminenses junto aos ministros na Corte.

Com efeito,

A incerteza, irregularidade e a natureza dos limites desta Provincia com a de S. Paulo não somente embaraçarão o governo na collocação dos Registros, como tambem tem de difficultar a fiscalisação que lhes he commetida, dando lugar ao extravio. Accresce achar-se o município do Bananal, e grande parte do de Arêas inteiramente encravado por huma língua de terra entre os nossos de Angra, S. João do Príncipe, Barra Mansa, e Rezende, e serem os caminhos mais vantajosos deste ultimo Município para os nossos portos de mar os que atravessão aquella língua de terra pertencente a S. Paulo, e do Rio de Janeiro, os que mais florescem com a cultura do café, poderia acontecer que algumas tropas descendo do Rezende recebessem guias na Provincia de S. Paulo,

61 Esse histórico está na base do fato de que, por muito tempo, os municípios desta região contaram com extensões territoriais destacadas no contexto da província e do Estado do Rio de Janeiro. Atualmente, Campos se mantém como o maior dos municípios fluminenses neste aspecto.

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vindo depois verifica-las, e annota-las no competente registro, ou que gêneros sujeitos á quota, produzidos aquém dos mesmos registros fossem transportados por atalhos para o territorio da provincia visinha para fim similhante. O mesmo pode acontecer em algumas das Fazendas sitas na margem d’aquem do rio Parahyba, nos lugares onde serve de divisa com Minas Geraes (RIO DE JANEIRO, 1836 [b], p. 19-20).

O Governo esta bem esperançado de que vos convencereis da necessidade de dar ás nossas Provincias huma divisão mais natural, e mais conforme aos princípios das boas divisões topographicas; e nella não vos esquecereis de estender ao Sul os Limites da Provincia do Rio de Janeiro, comprehendendo-os dentro de huma linha tirada do pico da Serra da Bocaina ao pico da Serra da Mantiqueira, e traspassando-lhe os Municipios de Arêas, e Bananal, ora pertencentes á Provincia de S. Paulo, e que ficão encravads pelo Norte com a Villa de Rezende, e pelo Sul com as de Paraty, S. João do Principe, Mangaratiba, e Ilha Grande (BRASIL, 1837, p. 8-9).

No entanto, as três citações que se seguem nos mostram como a questão da

delimitação definitiva das fronteiras provinciais continuou protelada por décadas,

mantendo este assunto presente nos discursos do executivo fluminense.

Os conflictos constantes que se dão entre as autoridades desta provincia e as de S. Paulo e Minas exigiam de ha muito tempo providencias, que os fizessem cassar, determinando-se claramente as divisas entre estas tres provincias. Em virtude desta necessidade, por aviso do ministerio do Imperio de 6 de abril do anno passado ordenou-se, que se começasse o exame para a demarcação dos limites desta provincia com a de S. Paulo, e foi nomeado o coronel Galdino Justiniano da Silva Pimentel para proceder a este trabalho de accordo com o engenheiro que fôsse nomeado pelo presidente daquella provincia. (...) officiei ao governo imperial ponderando-lhe a necessidade de prosseguir o levantamento da carta de fronteira entre as duas provincias para que houvesse uma base segura, em que se firmasse o corpo legislativo para decidir esta questão já tão antiga, e cuja decisão torna-se urgente (RIO DE JANEIRO, 1859, p. 31).

Chamo a attenção de V. Ex. para os conflictos de jurisdição que tem havido entre as autoridades policiaes desta provincia e a de Minas Geraes ácerca dos limites de ambas. (...) O decreto nº 297 de 19 de maio de 1843 foi que traçou os limites entre essas duas provincias, e os conflictos que se tem dado, originão-se fa falta de precisão e clareza da linha por elle estabelecida. Para evitar-se questões repetidas e suscitadas todos os annos, senão todos os mezes, (...) Ordenei á directoria de obras que mandasse activar o levantamento da planta dos terrenos entre as parochias de Nossa Senhora da Conceição das Duas Barras e as que lhe ficão circumvisinhas, afim de poder-se com acerto resolver as duvidas suscitadas entre as

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autoridades e os moradores desses logares ácerca dos respectivos limites dessas parochias (RIO DE JANEIRO, 1867 [a], p. 33).

Infelizmente a Provincia não possue uma boa demarcação dos limites, e esta falta muito prejudica a boa administração da justiça, não sabendo bem os Juizes até que ponto do territorio se estende a sua jurisdição, e onde começa a do seu visinho. Não é só na parte judiciaria que se encontram esses inconvenientes. A divisão eclesiastica, administrativa e política, resentem-se da mesma incerteza, e a Presidência é chamada muitas vezes a decidir questões de limites para que lhe faltam os devidos esclarecimentos (RIO DE JANEIRO, 1872, p. 12).

As citações mostram que em todas as décadas da vida da província, a questão

da indefinição das fronteiras foi colocada e sempre o problema maior a ser resolvido

fazia referência à perda de impostos devidos. Frente aos casos de denúncia de

sonegação motivada por indefinições territoriais, o Estado não hesitou, mesmo que

com demora, em usar o aparato disponível para definir a situação a seu favor. E

reuniu alguns dos instrumentos de controle do território fartamente utilizados no país

como, por exemplo, a instituição da freguesia.

No caso da demanda de 1843, ao expor sua estratégia, ilustrada na citação a

seguir, o poder provincial também nos ofereceu uma definição detalhada dos limites

em disputa.

Chamo finalmente vossa attenção sobre uma lacuna que escapou na Lei de 04 de Maio de 1842 sob nº 266. O Curato da Aldea da Pedra e de São José de Leonissa he um e o mesmo Curato; denomina-se Curato de São José de Leonissa da Aldea da Pedra. O outro Curato que se quizesse introduzir n’essa Lei, elevando-o á Capela Filial Curada da Freguezia de São Fidélis de Sigmaringa, he o de Santo Antonio de Pádua, sito nos Sertões dos Puris, ou da Pomba, quasi fronteiro á Capella Filial Curada de São José de Leonissa da Aldea da Pedra. Esta fica na margem direita do rio Parahyba e o Curato de Santo Antonio de Pádua fica na margem esquerda do mesmo rio mais para o centro, e he limitado pelo Município de Cantagallo, pelo rio Parahyba, pelas divisas da Freguezia de Santo Antonio de Guarulhos, e pelo lado da Província de Minas pelas divisas provisórias , que o meu antecessor mandou observar pela sua Portaria de 18 de Outubro de 1842, no intuito de ob star as invasões da Província de Minas no território da nos sa província por esse lado . Esses limites, que se ordenou ás autoridades locaes observassem restrictamente são: o riacho Prepetinga desde a sua foz no Parahyba até um ponto fronteiro á barra do ribeirão Santo Antonio, correndo depois por este ribeirão acima até a Serra denominada Santo Antonio, d’ahi a um ponto do Muriahé, chamado Poço Fundo correndo pela Serra do Gavião até a Cachoeira dos Tombos no rio Carangola, e seguindo a Serra do Carangola até encontrar a

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Província do Espírito Santo. Urge pois que nesta Sessão emendeis a Lei no sentido acima exposto. Filiado este Curato, que o Exm. Diocesano acaba de prover de Pastor, á Freguezia de S.Fidelis, que lhe he a mais próxima, porá barreira á ambição dos muitos Mineiros , que atrahidos pela fertilidade de nossas terras e matas, tem vindo estabelecer-se n’esse nosso território, mas dão de propósito, ou por hábito, obediência ás Autoridades Mineiras mais visinhas, e só n’esse tíitulo funda Minas sua pretenção a parte do Município de Campos, com quem confina. Talvez fosse mesmo conveniente elevar desde já á Freguezia este Curato , para ahí estabelecer Autoridades Civis, Criminaes e Militare s, e termos melhor garantia contra a desanexação ambicionada (RIO DE JANEIRO, 1843, p. 15-16, grifos nossos).

Alguns anos depois, com o receio de que freguesias fossem criadas de forma

indiscriminada, mas atento às ações observadas nas províncias com as quais

disputa limites, o presidente defende que:

É da maior conveniencia que por lei sejão estabelecidas regras fixas segundo as quaes possa qualquer territorio ser elevado á cathegoria de freguezia. Muito importa estabelecer que nenhuma parochia seja creada sem que seu territorio comprehenda uma determinada população, e nelle exista templo com todos os paramentos necessarios para a celebração do culto, e administração dos Sacramentos; que os projectos ou requerimentos relativos á creação de freguezias sejão baseados em um mappa estatístico da população do lugar, e da parochia, ou parochias, que soffrerem desmembração, em informações da camara municipal respectiva sobre a necessidade da nova parochia e suas convenientes divizas; finalmente, em attestado do Ordinario sobre a utilidade da creação pelo lado espiritual, acompanhado da informação do parocho ou parochos respectivos. A assembléa legislativa da provincia de Minas acaba mui sabiamente de prover sobre semelhante objecto pela sua resolução nº 314 de 8 de abril do anno preterito. Condições analogas devem regular tambem a creação de novas villas, ou comarcas (RIO DE JANEIRO, 1847, p. 12-13).

No contexto das definições municipais na província, demandas e soluções nos

quadros apresentados até aqui explicam o processo de retalhamento das terras por

divisões administrativas em alguns casos e o crescimento da área de abrangência

em outros em um constante refazer das fronteiras durante os anos correspondentes

ao Segundo Reinado. Pareceu clara a decisão política das autoridades fluminenses

voltada para um projeto de conquista do interior. Lembremos que ao fim do período

colonial os “certões” ainda eram um desafio para a posse efetiva do território pelas

elites, uma vez que o histórico da capitania e província, bem como do Brasil havia

sido pautado na proeminência das faixas litorâneas. Vassouras e a região cafeeira

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nos trouxeram os exemplos que mostram a usurpação de terras indígenas em prol

de uma economia para o Império e para os proprietários privados donos de terras e

escravos. Lá, o interior havia sido conquistado.

Tal projeto parece ter tido êxito quando conseguia o povoamento nos distintos

pontos da província ao mesmo tempo em que legitimava o poder imperial através de

um aparato administrativo e institucional que se ajustava às necessidades que

surgiam em um contexto de inquestionável afirmação social das elites. No entanto,

temos que considerar também que uma integração de fato do território seria

experiência reservada para o século seguinte. Mas esta ocorreria a partir do

arcabouço técnico montado no período imperial conforme nos lembra Lamego

(1963), para quem o conjunto de ferrovias e o plano viário provincial se mostraram

compatíveis com as necessidades observadas nas primeiras décadas da República.

Ao afirmar sobre o povoamento de distintos pontos do Rio de Janeiro, estamos

recapitulando o rol de iniciativas levadas à prática para tal finalidade e este envolve

os mecanismos de aumento de captação de renda para conquista de novas áreas

através da criação de vilas e cidades, abertura de vias de circulação em diferentes

modais e o incentivo à imigração via núcleos coloniais. O rol de instrumentos pra tal

empreitada também já foi ressaltado. Na análise desse processo de afirmação do

Estado, ressaltemos Abreu (1997) quando considera a importância dos saberes

técnicos voltados para a organização dos espaços citadinos e suas conexões com

outros pontos do território através da ampliação das obras públicas.

Foi notória a evolução da rede de circulação e de cidades no território

fluminense a partir da década de 1830 e sobretudo a partir dos anos de 1850. Até

então, momentos de crises econômicas e políticas inibiam os investimentos desta

ordem. No entanto, a segunda metade do XIX iria documentar um conjunto de

medidas para a ocupação econômica do território a partir dos preceitos

estabelecidos para “o bem da nação e da civilidade”. Estas refletiam as novas

demandas trazidas com “as luzes” e incorporavam novos saberes e códigos de

linguagem na qual o discurso cientifico estruturava sua legitimação e ia rompendo a

farta produção de ensaios sobre o território. Reflexo deste processo, a

administração estatal dinamizava sua organização e estrutura para dar conta dos

mecanismos de geração de conhecimento sobre os lugares e de interferência sobre

os espaços.

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Em sua parceria com as iniciativas de particulares de fato ou particulares do

Estado (integrantes do funcionalismo público que participavam como contribuintes e

beneficiados em inúmeras e significativas obras), o governo provincial fluminense

levou a cabo uma política territorial que em seu conjunto foi responsável por uma

polarização de grandes áreas por um número restrito de cidades que, no ritmo dos

processos econômicos observados (com diferença no tempo e no espaço) criaram

uma rede de feição dendrítrica.

Assim, o “chão” da província mais importante do Império foi redesenhado com

um riscado que atingia, pela primeira vez, pontos inacessíveis à “civilização”. Em

nome dela e da modernidade, fartamente aludidas nos discursos e nas conversas

de salão, o Estado se obrigou a promover os meios apropriados para que estradas,

ferrovias, barreiras, coletorias, pontes, pontilhões, escolas, cadeias, casas de

câmara pudessem escrever no território as insígnias da nação.

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Considerações finais

Nossa atenção no caso da província fluminense buscou compreender a base

territorial do planejamento político imperial engendrado para garantir a construção

de um país que se tornava independente. Apoiando-se em uma análise desta

questão a partir de um viés geográfico-histórico, nosso trabalho buscou nas políticas

territoriais e nos espaços produzidos as bases geográficas que nortearam o império

brasileiro quando de seu projeto nacional, avaliando até que ponto as idéias de

cidade e região foram efetivamente operacionalizadas e relacionadas.

Como considerado ao longo de todo este texto, as insígnias da nação tomaram

também a forma de objetos construídos no espaço para inaugurar uma nova fase de

fluxos materiais e econômicos no território, defendidos em nome da riqueza a ser

perseguida. Além deste aspecto, e permeado a ele, pretendiam ainda estabelecer o

início de uma aludida civilidade ao Brasil nos padrões previamente defendidos por

uma elite ávida por poder e mecanismos de autopreservação e reprodução.

Partindo do pressuposto de que modelos idealizadores de sociedade e de

ordenamento espacial encontram nos núcleos urbanos um espaço privilegiado para

a sua difusão, buscamos compreender tal base no conjunto das medidas pensadas

e/ou tomadas durante o período de existência da província do Rio de Janeiro.

Período este, marcado pelas décadas inaugurais da nação brasileira formalmente

instituída. Sendo assim, as reflexões sobre a natureza deste projeto nacional se

impuseram nesta tese para que as questões do nosso recorte espacial fossem

consideradas no conjunto da dinâmica imperial e de suas principais questões

ideológicas.

Neste contexto, consideramos que, na condição de país recém inaugurado,

parece que o ato em si de criar uma nação despertou mais o pensamento e os

esforços da elite imperial brasileira do que imaginar as bases de uma sustentação

continuada. Construída por interesses imediatistas e por um padrão intensivo de

apropriação dos recursos, a monarquia subjugava a questão da identidade e

atrelava o Estado a uma base dinástica para legitimar sua soberania. Os recursos

aqui considerados incluíam também a população, uma vez que a idéia a nação

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estava sendo efetivada mais por sua referência ao território e à economia dele

decorrente do que à sociedade.

Lembramos do preterido “mundo da desordem” e dos atributos de liberdade e

prosperidade garantidos em Carta e exclusivos da “boa sociedade” que vivia uma

civilização nos moldes das festas do requintado Cassino Fluminense na Corte. Em

contraposição, lembramos também dos inúmeros pequenos sitiantes que tiveram

suas terras tomadas por grandes cafeicultores no Vale do rio Paraíba do Sul e da

celeuma que encontrava nesses mesmos cafeicultores a figura da justiça que

resolveria os conflitos a seu favor. O enriquecimento constante era motivo de

comemoração e talvez fossem esses mesmos a freqüentar o fidalgo salão da Lapa.

Desde cedo, o Brasil se assentara em uma base escravocrata e racial que

negava a existência de um povo. Tal estrutura se manteve no período imperial e o

ideário de nação acabou como produto de aplicações desvirtuadas das teorias

vindas da Europa. Aqui, uma produção oficial de idéias foi tomada como

pressuposto para informar e legitimar os padrões pretendidos de sociedade,

criando-lhe uma história e determinando-lhe caminhos incompatíveis com a

estrutura social presente e seus diversos anseios.

No entanto, o poder não consistia em um bloco único e a mudança institucional

trazida pelo Império fortalecia as disputas dentro da elite intelectual e política do

país. Esboçou-se então uma certa oposição ao restrito círculo das grandes famílias

agrárias que comandavam a vida econômica brasileira. Este fato nos leva a pensar

que, de certo, o jogo político presente durante as distintas fases do período

monárquico no país não foi simplesmente um embate entre conservadores e

liberais. As teias eram complexas e lembramos que, mesmo em tempos de

centralização promovida pelo Moderador (quando se deu o momento de calma no

Império), havia mecanismos de liberdade local. De maneira distinta do período

colonial, a complexidade da cena política abrira caminhos para as questões e

representatividades regionais, sobretudo as referentes aos interesses provinciais.

Apontamos na tese o quadro que determinava esta complexidade e do qual a

categoria povo passaria a ser discursada como fundante da nação. No âmbito da

intelectualidade, foi apenas no último quartel do século XIX que ela foi tomada como

objeto de análise crítica ao se iniciar um pensamento apurado sobre a formação

brasileira. A questão dada era agora a de explicar o que se fazia brasileiro e não

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mais imaginá-lo. E isto passava necessariamente pela revista aos impasses que se

acumulavam na nação.

Podemos sentenciar que a nação dos barões de café, que representaram o

apogeu das finanças da província, foi construída a partir de alguns desacertos

estruturais. Sustentou-se e discursou em cima da monocultura primária. Confundiu

o território atributo da nação como sendo a própria nação. Pregou uma civilidade

sem se importar em estar cercada por escravos e pobreza. A nação dessa

sociedade era algo exclusivo e inatingível para a maioria. Na busca por lucro

imediato através da incorporação de mais terras e escravos e da imposição do

poder também simbólico ignorou a natureza do chão tomado por nação. O uso

predatório fez o solo empobrecer e a volumosa massa escrava imobilizou seu

capital. Diante destas questões, os barões de café conheceram o declínio. E, nos

moldes em que foi assentada, a nação demoraria a encontrar um novo eixo.

No que se refere ao nosso objeto de estudo, relembramos dos pressupostos

de uma identidade nacional pelo espaço como fórmula para se atingir a integração

pretendida. Assim, os discursos do poder executivo, os planos de infraestrutura

física, os documentos administrativos, os textos de lei, entre outros documentos,

mostraram um planejamento territorial baseado na privatização do solo e em

políticas de urbanização baseadas, em larga medida, na participação de agentes

privados e na profusão dos símbolos de modernidade e civilidade. Sobretudo nos

casos em que a carência material era notória, esses foram os referenciais tomados.

Ao olhar as cidades e a natureza das políticas e das representações que

indicamos, constatamos os processos de privatização do solo e incremento da vida

urbana como a forma espacial adotada para a criação, apropriação e circulação dos

mecanismos de mando. O caso fluminense parece ser exemplar. Como a própria

nação, o que foi tentado neste território foi primeiro a ocupação para depois articular

uma integração que não se efetivou em sua base. Esta ficaria aberta às ideologias

(também geográficas) seguintes.

O processo de estruturação do território fluminense durante o século XIX

acabou por configurar espacialidades, contrapondo áreas de concentração

populacional e de esvaziamento ou com ocupação rarefeita e reduzidos fluxos de

interconexão entre poucas centralidades expressivas, aglomeradoras de população

e atividades econômicas. Observamos que os efeitos das mudanças no âmbito das

relações econômicas e sociais resultaram em um misto de continuidade e mudança

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no qual os aspectos pré-existentes condicionam o surgimento do novo. Buscamos

entender o que movia esses processos, como se redefiniram os centros de

comando e como se (re)distribuíram as formas de exercício de poder econômico e

político a partir da emergência de atores que gradativamente dinamizaram as

economias urbanas e/ou regionais emergentes.

Os núcleos urbanos surgiram em um território com extensões a serem

encurtadas e, neste processo, observamos os mecanismos que legitimaram a

produção de imagens para a conquista do território. Reafirmamos que, no caso

fluminense, os distintos níveis de acessibilidade nas diferentes regiões da província

denotavam um embrionário processo de divisão espacial do trabalho. Este indicava,

naquela escala, a existência de um comércio interno e o surgimento de um

processo de urbanização e, em escalas maiores, a confirmação do uso seletivo de

espaços articulados à expansão do capitalismo europeu e a confirmação do papel

do Brasil como ofertador de matérias-primas na divisão internacional do trabalho

que se consubstanciava.

Novamente na escala provincial, vimos que a dinâmica urbana e a alocação

das infra-estruturas administrativas a seu serviço consolidaram o poder político dos

agentes econômicos mais importantes relacionados às atividades agrícolas,

comerciais e manufatureiras consideradas. Eles foram determinantes ainda para o

fortalecimento estatal na regulação dos fluxos e na ampliação de sua rede

administrativa.

Entendendo Estado-nação como formação política típica da modernidade,

tomamos o Império brasileiro em seu projeto de afirmação territorial estruturado

como conjuntos urbanos regionais ligados diretamente ao poder centralizado da

Corte. O caso da província fluminense nos permite investigar sobre a configuração

de uma desejada rede e seus nós e sobre a importância das cidades e vilas em

seus momentos de apogeu e de declínio (como em alguns casos). Tal perspectiva

oferece elementos para se buscar explicações neste período para as configurações

espaciais observadas na história do Estado do Rio de Janeiro. Pensamos ser esta

indicação um dos corolários da discussão travada nesta tese.

Por fim, os conceitos de cidade e de região se imbricaram na nossa análise por

conta do caráter territorial dado ao projeto nacional desenvolvido no Brasil no

período. Nele, a questão político-regional estava dada a priori uma vez que se

pensou no poder como um bloco único emanando de um centro em direção à sua

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hinterlândia. Nestes termos, o conceito de região, tão discutido e ainda aberto a

novos vieses, voltou a se assemelhar ao seu conteúdo clássico quando estava

associado às idéias de centralização, uniformização administrativa e diversidades

sobre as quais um poder único deveria ser exercido. A geopolítica local provincial

espelhou este processo.

Afirmamos novamente a importância do conceito em tela por permitir as

discussões políticas sobre a dinâmica do Estado e a incorporação da dimensão

espacial nas demais esferas da vida social. No nosso caso específico, observamos

uma política territorial que utilizava o discurso da nação para controlar distintas

regiões e suas dinâmicas econômicas e sociais através dos núcleos urbanos.

Acreditamos poder pensar no caráter regional que as cidades detinham no contexto

do Estado imperial nacional brasileiro. Era este o “serviço” a ser desempenhado

pelo território “para o bem da nação”. Pensamos que discutir cidade naquele

momento era discutir região.

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RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa Provincial do Rio de Janeiro na primeira sessão da vigesima primeira legislatura no dia 22 de outubro de 1876 pelo presidente, conselheiro Francisco Xavier Pinto Lima. Rio de Janeiro, Typographia do Apostolo, 1876. (Códice: 25) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa Provincial do Rio de Janeiro na segunda sessão da vigesima segunda legislatura no dia 8 de setembro de 1879 pelo presidente, dr. Americo de Moura Marcondes de Andrade. Rio de Janeiro, Typographia Montenegro, 1879. (Códice: 28) RIO DE JANEIRO (Província). Legislação. Regulamento das Collectorias das rendas da Província do Rio de Janeiro . Rio de Janeiro: Typographia Montenegro, 1882a. (Sala de Leitura) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa Provincial do Rio de Janeiro na abertura da primeira sessão da vigesima quarta legislatura em 8 de agosto de 1882 pelo presidente, desembargador Bernardo Avelino Gavião Peixoto. Rio de Janeiro, Typographia Montenegro, 1882b. (Códice: 30) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa Provincial do Rio de Janeiro na abertura da primeira sessão da vigesima quarta legislatura em 8 de agosto de 1884 pelo presidente, José Leandro de Godoy e Vasconcellos. Rio de Janeiro, Typographia Montenegro, 1884. (Códice: 32) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa Provincial do Rio de Janeiro na abertura da segunda sessão da vigesima sexta legislatura em 12 de setembro de 1887 pelo presidente, dr. Antonio da Rocha Fernandes Leão. Rio de Janeiro, Typographia Montenegro, 1887. (Códice: 33) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa Provincial do Rio de Janeiro na abertura da primeira sessão da vigesima setima legislatura em 8 de agosto de 1888 pelo presidente, dr. José Bento de Araujo. Rio de Janeiro, Typographia Montenegro, 1888. (Códice: 34) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa Provincial do Rio de Janeiro na abertura da segunda sessão da vigesima setima legislatura em 15 de outubro de 1889 pelo presidente, conselheiro Carlos Affonso de Assis Figueiredo. Rio de Janeiro, Typographia Montenegro, 1889. (Códice: 36)

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● APERJ (ARQUIVO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO ) Coleção de Leis do Brasil Coleção de Leis do Império do Brasil ● LAMP-CRL (THE LATIN AMERICAN MICROFORM PROJECT AT THE CENTER FOR RESEARCH LIBRARIES), com apoio da BIBLIOTECA NA CIONAL DO RIO DE JANEIRO. Relatórios dos Presidentes da Província do Rio de Janeiro Acervo disponível em <http://www.crl.edu/content/brazil/jain.htm> RIO DE JANEIRO (Província). Falla com que o presidente da provincia de Rio de Janeiro , o conselheiro Joaquim José Rodrigues Torres, abriu a 1.a sessão da 1.a legislatura da Assembléa Legislativa da mesma província, no dia 1.o de fevereiro de 1835. Nictheroy, Typographia de Amaral & Irmão, 1850. (Códice: 768 BN) RIO DE JANEIRO (Província). Falla com que o presidente da provincia de Rio de Janeiro , Joaquim José Rodrigues Torres, abriu a Sessão Ordinária da Assembléa Legislativa Provincial em 1º de Março de 1836. [a] (Códice: U814) RIO DE JANEIRO (Província). Exposição do Presidente da Província do Rio de Janeiro Paulino José Soares de Souza apresentada em 18 de outubro de 1836 á Assembléa Provincial. Nicterohy, 1836. [b] (Códice: U815) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do presidente da provincia do Rio de Janeiro , o conselheiro Paulino José Soares de Souza, na abertura da 2.a sessão da 2.a legislatura da Assembléa Provincial, acompanhado do orçamento da receita e despeza para o anno de 1839 a 1840. Segunda edição. Nictheroy Typographia de Amaral & Irmão, 1851. (Códice: 770 BN) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do presidente da provincia do Rio de Janeiro , o conselheiro Paulino José Soares de Souza na abertura da 1.a sessão da 3.a legislatura da Assembléa Provincial, acompanhado do orçamento da receita e despeza para o anno de 1840 a 1841. Segunda edição. Nictheroy, Typographia de Amaral & Irmão, 1851. (Códice: 771 BN) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do presidente da provincia do Rio de Janeiro , o senador Aureliano de Souza e Oliveira Coutinho, na abertura da Assembléa Legislativa Provincial no 1.o dia de março de 1847, acompanhado do orçamento da receita e despeza para o anno financeiro de 1847. Rio de Janeiro, Typographia do Diario, de N.L. Vianna, 1847. (Códice: 777 BN)

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RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do presidente da provincia do Rio de Janeiro , o doutor Luiz Pedreira do Coutto Ferraz, na abertura da 2.a sessão da 7.a legislatura da Assembléa Provincial, no dia 1.o de março de 1849, acompanhado do orçamento da receita e despesa para o anno financeiro de 1849 a 1850. Rio de Janeiro, Typographia do Diario, de N.L. Vianna, 1849. (Códice: 779 BN) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do vice-presidente da provincia do Rio de Janeiro , o commendador João Pereira Darrigue Faro, na abertura da 1.a sessão da 8.a legislatura da Assembléa Provincial, no dia 1.o de março de 1850, acompanhado do orçamento da receita e despesa para o anno financeiro de 1850-1851. Rio de Janeiro, Typographia do Diario, de N.L. Vianna, 1850. (Códice: 780 BN) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio do vice-presidente da provincia do Rio de Janeiro , o veador João Pereira Darrigue Faro, na abertura da segunda sessão da oitava legislatura da Assembléa Provincial, no dia 1.o de agosto de 1851, accompanhado do orçamento da receita e despeza para o anno de 1852. Rio de Janeiro, Typographia Universal de Laemmert, 1851. (Códice: 781 BN) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa Provincial do Rio de Janeiro na 1ª sessão da 11ª legislatura pelo vice-presidente da provincia, o conselheiro Antonio Nicoláo Tolentino. Nictheroy, Typographia da Patria de C.B. de Moura, 1856b. (Códice: 786 BN) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado ao excellentíssimo Presidente da Província do Rio de Janeiro , o senhor doutor Ignácio Francisco Silveira da Motta, pelo Ex-Presidente, o doutor João de Almeida Pereira, sobre o estado da administração da mesma província em 25 de Abril de 1859. Nictheroy, Typographia da Pátria, 1859. (Códice: u836) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado a Assembléa Legislativa Provincial do Rio de Janeiro na segunda sessão da decima quinta legislatura no dia 1.o de outubro de 1863, pelo presidente da mesma provincia, dr. Polycarpo Lopes de Leão. [n.p.] Typographia do Correio Mercantil, 1863. (Códice: 793 BN) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á S. Exª o Sr. 1º Vice-Presidente da Província do Rio de Janeiro Dr. Eduardo Pindahyba de Mattos pelo Presidente Dr. Espiridião Eloy de Barros Pimentel em 21 de Maio de 1867. Rio de Janeiro, Typographia de Quirino & Irmão, 1867.[a] (Códice: u846)

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RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa Provincial do Rio de Janeiro na segunda sessão da decima-sexta legislatura no dia 20 de outubro de 1867 pelo presidente da mesma província, dr. Esperidião Eloy de Barros Pimental. Rio de Janeiro, Typographia Universal de Laemmert, 1867. [b] (Códice: 798 BN) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa Provincial do Rio de Janeiro na primeira sessão da decima nona legislatura no dia 29 de setembro de 1872 pelo presidente, conselheiro Josino do Nascimento Silva. Rio de Janeiro, Typographia Perseverança, 1872. (Códice: 803 BN) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa Provincial do Rio de Janeiro na sessão extraordinaria no dia 20 de março de 1874 pelo presidente, dezembargador Manoel José de Freitas Travassos. Rio de Janeiro, Typographia do Apostolo, 1874. (Códice: 806 BN) RIO DE JANEIRO (Província). Exposição com que o Visconde de Prados passou a administração da Província do Rio de Janeiro ao Exm. Sr. Dr. Luiz Pinto de Miranda Montenegro, 1º Vice-Presidente da mesma Província, no dia 26 de Dezembro de 1878. Rio de Janeiro, Typographia Nacional, 1879. (Códice: u855) RIO DE JANEIRO (Província). Exposição com que o Bacharel Américo de Moura Marcondes de Andrade passou a administração da Prov íncia do Rio de Janeiro ao 1º Vice-Presidente da mesma Província Bacharel Paulo José Pereira de Almeida Torres no dia 20 de Abril de 1880. Rio de Janeiro, Typographia Montenegro, 1880. (Códice: u857) RIO DE JANEIRO (Província). Relatorio apresentado á Assembléa Legislativa Provincial do Rio de Janeiro na abertura da segunda sessão da vigesima terceira legislatura em 8 de agosto de 1881 pelo presidente, dr. Martinho Alvares da Silva Campos. Rio de Janeiro, Imprensa Industrial de João Paulo Ferreira Dias, 1881. (Códice: 813 BN) ● ARQUIVO NACIONAL BRASIL (Ministério do Império). Ministro Nicolau Pereira de Campos Vergueiro. Relatório do ano de 1832 , apresentado à Assembléia Geral Legislativa em sessão ordinária de 1833. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1833. BRASIL (Ministério do Império). Relatório ministerial de 1833 publicado em maio de 1834, por Antônio Pinto Chichorro da Gama.

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BRASIL (Ministério do Império). Ministro Joaquim Vieira da Silva e Souza. Relatório do ano de 1834 apresentado à Assembléia Geral Legislativa na sessão ordinária de 1835. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1835. BRASIL (Ministério do Império). Ministro Jose Ignacio Borges. Relatório do ano de 1835, apresentado à Assembléia Geral Legislativa na sessão ordinária de 1836. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1836. BRASIL (Ministério do Império). Ministro Antonio Paulino Limpo de Abrêo. Relatório do ano de 1836 , apresentado á Assembléia Geral Legislativa na sessão ordinária de 1837. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1837. BRASIL (Ministério do Império). Relatório do Ministério do Império de 1837 . Ministro e secretário de Estado Interino, Bernardo Pereira de Vasconcellos. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1838. BRASIL (Ministério do Império). Ministro Francisco de Paula de Almeida e Albuquerque. Relatório do ano de 1838 , apresentado à Assembléia Geral Legislativa na sessão ordinária de 1839. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1839. BRASIL (Ministério do Império). Ministro Francisco Ramiro D’Assis Coelho. Relatório do ano de 1839 , apresentado à Assembléia Geral Legislativa na sessão Ordinária de 1840. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1840. BRASIL (Ministério do Império). Ministro Candido José de Araújo Vianna. Relatório do ano de 1840 , apresentado na Assembléia Geral Legislativa na sessão ordinária de 1841. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1841. RIO DE JANEIRO (Província). Decreto nº 1.828 de 1 de Outubro de 1856 , divide a Província do Rio de Janeiro em districtos eleitoraes. Conjunto Documental: Capitania do Rio de Janeiro Notação: caixa 746, pct. 01 Datas-Limite: 1700-1808 Título do Fundo ou Coleção: Vice-reinado Código do Fundo: D9 Conjunto Documental: Câmaras municipais. Ofícios de diversas autoridades e câmaras municipais

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Notação: IJJ9 536 Datas-Limite: 1808-1870 Título do Fundo ou Coleção: Série Interior Código do Fundo: AA Conjunto Documental: Criação de vilas e limites de províncias Notação: códice 602, vol. 02 Datas-Limite: 1750-1795 Título do Fundo ou Coleção: Diversos códices - SDH Código do Fundo: NP ● REAL GABINETE PORTUGUÊS DE LEITURA Dicionário da Língua Portuguesa , por Bernardo de Lima e Melo Bacellar. Lisboa, 1783. Dicionário da Língua Portuguesa . Lisboa: Academia Real das Ciências, 1793. Dicionário da Língua Portuguesa , por Antônio de Moraes Silva e revisto por Theotônio José de Oliveira Velho. Lisboa, 1831. Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa , por Antonio Joaquim de Macedo Soares. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, 1889. Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa , por Antenor Nascentes. Rio de Janeiro, 1932, 1ª edição. Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa . Elucidário etimológico crítico das palavras e frases que originárias do Brasil não se encontram nos dicionários da língua portuguesa ou neles vêem com forma ou significado diferente (1875-1888). Por Antonio Joaquim de Macedo Soares e revisto por Julião Rangel de Macedo Soares. Rio de Janeiro, 1954.

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Anexos ANEXO 1: OS GABINETES DO SEGUNDO REINADO Os Gabinetes Partido Data da

Posse

Antônio Carlos, Antônio Limpo Paulino de Abreu (Visconde de Abaeté), Martins Francisco, Aureliano Coutinho (Visconde de Sepetiba), Holanda Cavalcanti (Visconde de Albuquerque), Francisco de Paula Cavalcanti de Albuquerque (Visconde de Suassuna)

Liberal 24/07/1840

Araújo Viana, Paulino de Souza, Aureliano Coutinho, Miguel Calmon, Francisco Vilela Barbosa (Marquês de Paranaguá) , Clemente Pereira Silva Maia, Carneiro Leão, Joaquim Francisco Viana, Salvador Maciel e Rodrigues Torres

Conservador Conservador

23/03/1841 1843

Almeida Torres, Manuel Alves Branco, Ferreira França e Jerônimo Coelho Marcelino de Brito, Fernandes Torres, Bento da Silva Lisboa, Holanda Cavalcanti, João Paulo dos Santos Barreto Manuel Alves Branco, Visconde de Caraveles (36) José Carlos Pereira de Almeida Torres (Visconde de Macaé) Francisco de Paula Souza e Melo

Liberal Liberal Liberal Liberal Liberal

02/02/1844 1846 22/05/1847 08/03/1848 31/05/1848

Pedro Araújo Lima (Visconde depois Marques de Olinda) Conservador 29/09/1848

José da Costa Carvalho (Marques de Monte Alegre) Liberal 08/10/1849

Joaquim José Rodrigues Torres (Visconde de Itaboraí) Honório Hermeto Carneiro Leão Luís Alves de Lima e Silva (Duque de Caxias) Pedro de Araújo Lima (Visconde, depois, Marques de Olinda) Antônio Paulino Limpo de Abreu (Visconde de Abaeté) Ângelo Muniz da Silva Ferraz (Barão de Uruguaiana) Luís Alves de Lima e Silva (Duque de Caxias)

Conservador Conservador Conservador Conservador Conservador Conservador Conservador

11/05/1852 06/09/1853 03/09/1856 04/05/1857 12/12/1858 10/08/1859 02/03/1861

Zacarias de Goes e Vasconcelos Pedro de Araújo Lima (Visconde, depois Marques de Olinda) Zacarias de Goes e Vasconcelos Francisco José Furtado Pedro de Araújo Lima (Visconde, depois Marques de Olinda) Zacarias de Goes e Vasconcelos

Liberal Liberal Liberal Liberal Liberal Liberal

24/05/1862 30/05/1862 15/01/1864 31/08/1864 12/05/1865 03/08/1866

Joaquim José Rodrigues Torres (Visconde de Itaboraí) José Antônio Pimenta Bueno (Visconde de São Vicente) José Maria da Silva Paranhos (Visconde do Rio Branco) Luís Alves de Lima e Silva (Duque de Caxias)

Conservador Conservador Conservador Conservador

16/07/1868 29/09/1870 07/03/1871 25/06/1875

João Lins Vieira C. Sinimbú (Visconde de Sinimbú) José Antônio Saraiva Martinho Alvares Silva Campos João Lustosa da Cunha Paranaguá (2° Marques de Para naguá) Lafayette Rodrigues Pereira Manoel Pinto de Souza Dantas José Antônio Saraiva

Liberal Liberal Liberal Liberal Liberal Liberal Liberal

05/01/1878 28/03/1880 21/01/1882 03/07/1882 24/05/1883 06/06/1884 06/05/1885

João Maurício Wanderley (Barão de Cotejipe) João Alfredo Correia de Oliveira

Conservador Conservador

20/08/1885 10/03/1888

Afonso Celso de Assis Figueiredo (Visconde de Ouro Preto) Liberal 07/06/1889

Fonte: SOARES, Carlos Dalmiro da Silva. Evolução histórico-sociológica dos partidos políticos no Brasil Imperial. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1503>. Acesso em 04/01/2008.

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ANEXO 2: REPRODUÇÃO DE “A GRANDE POLÍTICA” (D’ALME IDA, 1877). (Folha de rosto e Capítulo X, p. 143-147)

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D’ALMEIDA, 1877, folha de rosto e p. 143-147.

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Apêndices

Apêndice 1: JUSTIÇA NO BRASIL E NO RIO DE JANEIRO

Entender a história das instituições da Justiça nos seus rebatimentos no território carioca e fluminense significa entender uma linha do tempo que se inicia em 1751 com a criação da Relação do Rio de Janeiro. Ela se inseria em um processo de constituição da Justiça no Brasil e, para entendermos seus precedentes, é importante olhar o seguinte quadro:

Justiça no Brasil 1530 a 1548 Exercida através de Portugal pelos seus ouvidores e Tribunais Superiores

como a Mesa do Desembargo do Paço. 1548 a 1580 Ouvidor Geral no próprio Brasil e cargos de juízes ordinários e de vintena que

atuavam no nível das capitanias. 1580 a 1640 União Ibérica: Código Filipino substitui o manuelino.

Relação do Estado do Brasil 1609 com governador, chanceler, desembargador dos agravos e apelações, etc e, no nível municipal, os juízes ordinários e de vintena. Sede: Salvador e jurisdição em todo o território brasileiro. A relação desaparece por alvará do rei de Espanha em 1626 e somente o Ouvidor Geral permanece como distribuidor da justiça no Brasil.

1640... Restauração do trono português A Relação do Estado do Brasil é restaurada quase que com os mesmos cargos. Apenas no nível municipal ha ampliação: juiz de fora e dos órfãos quase que diretamente vinculados às câmaras.

Fonte: SILVA (1990) Uma vez que todo o aparato judicial se concentrava na Relação da Bahia e esta não se

fazia atuante frente às demandas judiciais de todo o território, criou-se a Relação do Rio de Janeiro (1751-1808) por conta do incremento populacional verificado com o aumento da importância econômica da região. A estratégia de D. Jose I era economizar os cofres públicos. Com efeito,

Tendo consideração a me representarem os povos da parte Sul do Estado do Brasil, que por ficar em tanta distancia a Relação da Bahia não podem seguir nela as suas causas e requerimentos sem proceder grandes demoras, despesas e perigos, o que só poderia evitar-se criando-se outra relação na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, que os ditos povos se ofereciam a manter as suas custas, fui servido mandar ver esta matéria (...) houve por bem de criar a dita Relação (SILVA, 1990, p. 29).

A referência era clara e apenas os que pagassem estariam sob a proteção da justiça

colonial e o domínio era, sem dúvida, o das câmaras municipais e de seus “homens bons”. A presidência do Tribunal da Relação foi dada ao governador da capitania do Rio de Janeiro. Quanto ao seu limite de atuação, o artigo 10 do seu Regimento estabelecia que:

Terá esta Relação por seu distrito todo o território que fica ao Sul do estado do Brasil, em que se compreendem treze comarcas, a saber, Rio

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de Janeiro, São Paulo, Ouro Preto, Rio das Mortes, Sabará, Rio das Velhas, Serro do Frio, Cuiabá, Goiáses, Paranaguá, Espírito Santo, Itacazes e Ilha de Santa Catarina, incluindo todas as Judicaturas, Ouvidorias e capitanias, que houverem criado, ou de novo se criarem no referido âmbito, que hei por bem separar inteiramente do distrito e jurisdição da Relação da Bahia (SILVA, 1990, p. 30-31).

A referência era clara e apenas os que pagassem estariam sob a proteção da justiça

colonial e o domínio era, sem dúvida, o das câmaras municipais e de seus “homens bons”. A presidência do Tribunal da Relação foi dada ao governador da capitania do Rio de Janeiro. Quanto ao seu limite de atuação, o artigo 10 do seu Regimento estabelecia que:

Terá esta Relação por seu distrito todo o território que fica ao Sul do estado do Brasil, em que se compreendem treze comarcas, a saber, Rio de Janeiro, São Paulo, Ouro Preto, Rio das Mortes, Sabará, Rio das Velhas, Serro do Frio, Cuiabá, Goiáses, Paranaguá, Espírito Santo, Itacazes e Ilha de Santa Catarina, incluindo todas as Judicaturas, Ouvidorias e capitanias, que houverem criado, ou de novo se criarem no referido âmbito, que hei por bem separar inteiramente do distrito e jurisdição da Relação da Bahia (SILVA, 1990, p. 30-31).

Em 1808, a Relação do Rio de Janeiro passou para a Casa da Suplicação do Brasil em

uma estratégia geopolítica em que Dom João VI mostrava ao mundo seu novo endereço e iniciava a modernização no Brasil de acordo com os valores em voga (geralmente associado ao discurso do sentir-se amparado por um substancial aparato burocrático) e com a ótica colonizador-colonizado. A Casa da Suplicação do Brasil funcionou como Superior Tribunal de Justiça, subjugando a Relação da Bahia.

Com o Império, a Casa foi extinta e a Relação do Rio de Janeiro voltou a funcionar com a denominação até 1889 e com estatuto de Tribunal de Segunda Instância. O Desembargador dos Agravos era o cargo de maior importância, sendo escolhido entre seus pares. Segundo a Carta de 1824, deveria haver uma Relação em cada província e delas seriam retirados os juízes letrados que comporiam o Tribunal Superior de Justiça, condecorado com o titulo de Conselho. Na verdade, a instituição do Conselho iria subjugar a Relação e o judiciário seria, assim, um poder político e uma delegação da nação e os que o exerciam (magistrados) eram nomeados pelo Imperador, que podia também suspendê-los. No tribunal Superior, cabia também ao Imperador a escolha do presidente.

De início, eram quatro as Relações estabelecidas de maneira que apenas a parte norte do Império foi dividida para efeito de atuação. Eram elas: Corte (com jurisdição sobre todo o território da Província do Rio de Janeiro), Salvador, Recife e São Luis. A lei de n° 2.342 de 06/08/1873 elevou para 11 o número de Relações no Império, tendo a do Município Neutro jurisdição sobre as províncias do Rio de Janeiro e do Espírito Santo. A presidência da Relação do Rio de Janeiro, foi ocupada por muitos deputados, nobres que também exerceram a presidência da província fluminense e, mais comum, de outras províncias do Império. Alguns nomes são: João Antonio Rodrigues de Carvalho, Jose Vernek Ribeiro de Aguilar, Jose Carlos Pereira de Almeida Torres (2o Visconde de Macaé), Manoel Ignácio Cavalcante de Lacerda (Barão de Pirapama), Euzébio de Queiroz Coutinho Matoso Câmara, Manoel de Jesus Valdetaro (Visconde de Valdetaro), José Tavares Bastos e Francisco de Faria Lemos. A estes homens estiveram submetidos os juízes de primeira instância que atuavam na vida cotidiana dos membros da sociedade e que expressavam as leis da nação que estava sendo criada.

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A partir de Silva (1990, p. 146-147), indicamos no quadro abaixo os seguintes juízes de primeira instância no Rio de Janeiro naquele momento:

Juízes ordinários (extintos pelo Código Criminal): tinham por circunscrição o conselho e eram eleitos em segredo por seis eleitores do segundo grau. Processavam e julgavam feitos cíveis e crimes, alem das atribuições administrativas municipais. Eram também juízes de sisas. Sua alçada era de 3000 reis nos lugares de população superior a 200 almas e de 1800 reis em moveis e 1200 reis em bens de raiz nos lugares menos populosos. Nas causas que a excedessem de suas sentenças havia apelação ou agravo para o Ouvidor Geral da comarca ou para a Relação competente, conforme o valor coubesse ou não na alçada do ouvidor. Juízes de órfãos: eram eleitos como ordinários ou nomeados como de fora nos termos com mais de 400 pessoas. Juízes do crime: atribuições criminais dos de fora. Policiava os bairros com jurisdição em toda cidade e seu termo. Cumpriam determinações do Intendente geral de policia nomeado pelo governador da capitania. Juízes de fato: criados em 1822 para as causas de abuso de liberdade da imprensa. Das suas decisões só cabia recurso a Coroa. Juízes de paz: criados pela lei de 15 de outubro de 1827 em cada uma das freguesias e capelas filiais curadas eleitos da mesma forma que os vereadores. Funções: conciliar partes antes da demanda, julgar causas pequenas menores que 16$, por em custodia os bêbados, corrigir bêbedos, turbulentos e meretrizes escandalosas (obrigando-os a assinar temo de bem viver), fazer observar as posturas policiais das câmaras e, pelo artigo 88 da lei de 1 de outubro de 1828, tinha competência privativa para conhecer das multas por contravenção as posturas municipais. Resumo: muitas funções administrativas exercidas em nome de uma coletividade municipal. Juízes municipais: O Código de processo Criminal criou em cada termo um que era nomeado pelo governador na província do rj e pelo presidente do conselho nas outras de uma lista tríplice que a câmara enviava de 3 em 3 anos (p. 148). Eles substituíam os juízes de direito, executavam sentenças dos juízes de direito e dos tribunais, exerciam cumulativamente as atribuições policiais, concediam hábeas corpus e processavam os feitos cíveis ate a sentença. Juízes de direito: nomeados pelo imperador como os desembargadores dentre os bacharéis bem conceituados e com pratica de pelo menos um ano nos foros. Preferencialmente tinham que ter sido juízes municipais ou promotores. O aviso de 22 de outubro de 1833 declarou que nas cidades populosas um dos juízes de direito seria o chefe de Policia. O aviso de 3 de dezembro do mesmo ano completava dizendo que não havendo mais de um as atribuições policiais pertenciam aos juízes de paz ou municipais. Juízes de vintena: eleitos ano a ano pelos vereadores, juízes e procurador e atuavam em causas ate $400, prender e entregar criminosos de sua jurisdição.

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Apêndice 2: LISTAGEM DOS PRESIDENTES DA PROVÍNCIA FLUMINENSE (Chefes do Executivo: presidentes e vices interinos)

Nº Nome Período (Posse) Formação Títulos e Honrarias Conselho Cargos que ocupou 01 Joaquim José

Rodrigues Torres

14/08/1834 a 21/04/1836 (exonerado)

Estudou Coimbra Doutor em matemática

Visconde com grandeza de Itaboraí em 1854

Dep. Geral Pres. Assemb. Ministro (vzs) Senador

02 Paulino Jose Soares de Sousa

Nomeado em 21/04/1836 até 05/08/1840

Direito Coimbra

Visconde com grandeza do Uruguai em 02/12/1854

Efetivo desde 1853

Ministro (vzs) Senador

Jose Inácio Vaz Vieira

30/04 a 23/10/1837 período final de Feijó

Bacharel FDSP 1832

Oficial da Rosa Conselho do Imperador

Deputado

Manuel Jose de Oliveira

30/04 a 18/06/1838

João Caldas Viana

18/06 a 22/10/1838

Estudou o secundário em Coimbra Bacharel FDSP

Deputado (vzs) Advogado na Corte.

Luis Antonio Muniz dos Santos Lobo

02/05 a 02/10/1839 (ver 06.4)

Ordenou-se sacerdote

Antonio Alves da Silva Pinto Junior

23/10 a 04/11/1839

FDSP em 1833.

Brás Carneiro Nogueira da Costa e Gama

03/04 a 02/08/1840

Visconde com grandeza de Baependi desde 1828, foi Conde em 1858. Filho dos Marqueses de Baependi

Deputado das AG e AP: RJ e Senador em 1872, chegando a PS: PE em 1868

03 Manuel Jose de Sousa França

22/08/1840 a 31/03/1841

Conselho de Sua Majestade

Advogado na corte e deputado desde a constituinte 1823 (vzs)

Brás Carneiro Nogueira da Costa e Gama

31/03/1841 a 01/12/1841

04 Honório Hermeto Carneiro Leão

Nomeado em 04/10/1841 a 01/01/1843 (Exonerado)

Bacharel em Direito pela Universidade de Coimbra

Visconde de Paraná em 1852 e marquês em 1854

Conselheiro em 1842

Deputado (vzs), Senador 1842, Ministro (2x). Morreu como chefe do Gabinete Conciliação. PP: PE

05 João Caldas Viana

01/01/1843 a 02/03/1843 e 02/03/1843 a 11/04/1844

Estudou o secundário em Coimbra Bacharel FDSP

Deputado provincial (vzs) e, no fim da vida, advogava na corte.

06 Aureliano de Sousa e Oliveira Coutinho

12/04/1844 a 03/04/1848

Bacharel em Coimbra

Visconde de Sepetiba em 1855 Gentil-Homem da Imperial Câmara. Foi um dos fundadores do IHGB

Conselho Ministro (vzs) Deputado: MG e RJ Senador: AL em 1842 PP: SP

Luis Antonio Muniz dos Santos Lobo

(…) 1846 (Ver 02.4)

Ordenou-se sacerdote

07 Manuel de Jesus Valdetaro

04/04 a 06/06/1848

FDSP 1832 Visconde de Valdetaro em 1886 e elevado a grandeza em 1889 Sócio do IHGB

Conselho Seguiu magistratura e foi Ministro do Supremo Tribunal, sendo seu presidente Foi DP e DG: RJ

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08 Felisberto Caldeira Brant Pontes

Nomeado em 02/06/1848, tomou posse em 07/06 exerceu o cargo ate 09/10/1848

2° Visconde com grandeza de Barbacena desde 1830 Filho dos marqueses

Militar, depois diplomata e político. Deputado pela BA, Industrial e Diretor da Estrada de Ferro D Pedro II

09 Luis Pedreira do Couto Ferraz

Empossado em 10/10/1848, exerceu o cargo até 02/05/1853

Bacharel, doutor e professor da FDSP

Barão e Visconde do Bom Retiro em 1867 e 1872 Veador da Casa Imperial Fundador e presidente do IHGB Condecorado com as ordens do Cruzeiro, da Rosa e Grã-Cruz de Cristo

Conselheiro do Imperador e do Estado em 1871

Deputado pela pv ES Dep e senador pela pv RJ Ministro 1853 PP: ES

João Pereira Darringue de Faro

Como 3º Vice, nomeado em 25/10/1849, ocupou o governo de: 15/12/1849 a 15/09/1850 05/05/1851 a 24/09/1851 03/05/1852 a 10/09/1852 03/05/1853 a 22/09/1853

2º Barão e Visconde de Rio Bonito em março e dezembro de 1854 Filho do barão do Rio Bonito Joaquim Jose Pereira de Faro Hábito do Cruzeiro Comenda da Rosa Veador

Major da Imperial Guarda de Honra Vereador ao Senado da Câmara do Rio e Deputado da assembléia fluminense

10 Luís Antonio Barbosa

22/09/1853 a 02/10/1857 (exonerado)

FDSP 1835 Conselho do Imperador

DP e DG: MG (vzs), chegando a presid. Magistratura Ministro da Justiça 1853 Senador: MG 1859 (foi escolhido, mas não tomou posse)

Brás Carneiro Nogueira da Costa e Gama

23/10 a 11/10/1853

Visconde de Baependi

João Pereira Darringue de Faro

02/05 a 13/09/1854

Barão do Rio Bonito

Brás Carneiro Nogueira da Costa e Gama

18/09 a 15/10/1854

Visconde de Baependi

José Ricardo de Sá Rego

03/05 a 18/09/1855

FDSP 1837 Comendador da Rosa Juiz e Desembargador na Relação da Corte até aposentadoria MG 1850 e foi vice AL

Brás Carneiro Nogueira da Costa e Gama

19/09 a 25/11/1855

Visconde de Baependi

Antonio Nicolau Tolentino (ver 11)

02/05 a 07/10/1856

Grande dignitário da Rosa Cavaleiro de Cristo

Conselho do Imperador

Funcionário do Tesouro Nacional e outras repartições da fazenda Diretor da Academia Belas Artes Presidente Caixa Econômica

João Manuel Pereira da Silva

03/05 a 04/08/1857

FDSP 1838 “Historiador de nomeada, obteve de

Início advogado e jornalista

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Sua Majestade o título de Conselho, a dignataria da Rosa e a comenda de Cristo. Era sócio do IHGB.” p.26

DP e DG: RJ (vzs) e Senador pelo RJ 1888

11 Antonio Nicolau Tolentino

04/08/1857 a 24/10/1858

Grande dignitário da Rosa Cavaleiro de Cristo

Conselho do Imperador

Funcionário do Tesouro Nacional e outras repartições da fazenda Diretor da Academia Belas Artes Presidente Caixa Econômica

12 José da Silva Paranhos

30/10/1858 a 13/12/1858

Graduado Escola Militar

Visconde com grandeza do Rio Branco em 1870

DP e DG: RJ Senador: MT 1862 Diplomata, Ministro de Estado (vzs)

13/12/58 a 17/12/1858

13 João de Almeida Pereira Filho

17/12/1858 a 24/04/1859

FDSP 1850 Veador Comendador de Cristo

Conselho de Sua Majestade

DG: RJ (vzs) Ministro do Império 1859

14 Inácio Francisco Silveira da Mota

25/04/1859 a 15/04/1861 (Exonerado)

FDSP 1838 Barão de Vila França em 1875 e elevado a grandeza em 1877 Comendador de Cristo

DP:Niterói PP: PI PP: CE

José Ricardo de Sá Rego

16/04 a 20/09/1861

15 Luis Alves Leite de Oliveira Belo

21/09/1861 a 09/02/1863 (Exonerado) Permaneceu até 14/02/63

FDSP 1841 Magistrado no RJ e RS Dep RS (vzs) Vice PP: RS

José Norberto dos Santos

04/05 a 09/09/1862

FDSP

16 Policarpo Lopes de Leão

14/02/1863 a 23/01/1864 (Exonerado) Permaneceu até 15/02

FD Olinda 1834

Conselho Vários cargos magistratura BA MA e Corte. Desembargador e aposentou-se com honras de Min.do ST

16.1

José Tavares Bastos

15/02 a 03/05/1864

FD Olinda 1836

Sócio do IHGB Conselho Deputado PE (vzs) PP: SP

17 João Cipriano Soares

03mai64 a 17out64 (Exonerado) Permaneceu até 21/10

FDSP 34 e doutor 35

Conselho de Sua Majestade

PP: MG PP: MT PP: SP

José Tavares Bastos

21/10 a 02/11/1864

FD Olinda 1836

Sócio do IHGB Conselho Deputado PE (vzs) PP: SP

18 Bernardo de Souza Franco

03/11/1864 a 21/09/1865 (Exonerado)

FD Olinda 1835

Visconde com grandeza de Souza Franco em 1872 Grã-Cruz de Cristo e Dignitário da Rosa

1859 Conselho

Magistrado desembargador DG: PA (vzs) Senador PA 1855 Ministro (2x) PP: PA; PP: AL

José Tavares Bastos

06/05 a 11/07/1865

FD Olinda 1836

Sócio do IHGB Conselho Deputado PE (vzs) PP: SP

José Tavares Bastos

23set65 a 06dez65

FD Olinda 1836

Sócio do IHGB Conselho Deputado PE (vzs) PP: SP

19 Domiciano Leite Ribeiro

07/12/65 a 03/05/1866

FDSP 33 Visconde com grandeza de Araxá em 1872

Conselho Estado 1866 como membro extrord e

Magist, liter, advoc DG: MG Minist Agric em 1864 No final, advogava em Barra Mansa

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236

efetivado em 1878

PP: SP

José Tavares Bastos

03/05 a 04/10/1866

FD Olinda 1836

Sócio do IHGB Conselho Dep PE vzs SP

20 Espiridião Elói de Barros Pimentel

04/10/1866 a 20/02/1868 (Renúncia)

FD Olinda 1847

Magistrado (vp); Desembarg da Relação de SP e da Corte; Min. e Presid do ST ; DP e DG:AL PP: AL (vzs); PP: RS PP: BA

Tomás Gomes dos Santos

20/02/1867

Eduardo Pindaíba de Matos

13/05 a 30/09/1867

Conselho Chefe da Polícia (vp) Ministro do Supremo

Eduardo Pindaíba de Matos

20/02 a 10/03/1868

Conselho Chefe da Polícia (vp) Ministro do Supremo

21 Américo Brasiliense de Almeida e Melo

10/03/1868 a 22/07/1868 (Exonerado)

FDSP 1835 Dr 1860

Sócio IHGB Adv/magist Minist STF por Mal Floriano DP (vzs) e DG: SP 1891 Gov SP Foi um dos proj da Constit Republicana PP: PB

Eduardo Pindaíba de Matos

09/05 a 30/07/1868

Conselho Chefe da Polícia (vp) Ministro do Supremo

22 Benevuto Augusto de Magalhães Taque

30/06/1868 a 01/05/1869 (Renúncia)

Conselho 1870

DG BA 1869 Ministro de Estrangeiros 1861 PP: RN, MA, PE

Diogo Teixeira de Macedo

01/05/1869 a 05/05/1870 (Renúncia)

FDSP Barão de São Diogo em 1873

DG: RJ 1853 Aposent. como desembargador

Manoel José de Freitas Travassos

05/06 a 20/10/1870

23 José Maria Correia de Sá e Benevides

01/01 a 26/10/1870

FDSP 54 Dout SP 58

Lecionou FDSP Magist e jornal. DP: SP PP:MG

24 Teodoro Machado Freire Pereira da Silva

27/10/1870 a 06/03/1871

FD Olinda 52 Conselho Chefe policia (vp, inclusive a Corte) DP e DG: PE 1871 Min Agric no gabinete Visc RBco e referendou Lei ventre Livre PP: PB, BA

Manoel José de Freitas Travassos

07/03 a 15/04/1871

25 Josino do Nascimento da Silva

15/04/1871 a 10/10/1872

FDSP 34 Sócio IHGB Comend Cristo

Conselho Adv e magist DP e DG: RJ Jornalista PP: SP

26 Bento Luís de Oliveira Lisboa

10/10/1872 a 26/03/1873 (Exonerado a pedido)

FDSP 59 Conselho Magist (vp) RJ: Minist STF DP Nite RS

27 Manoel José de Freitas Travassos

26/03/1873 a 18/09/1874 (Exonerado a

FDSP 34 Prov SCasa da Corte Hábitos da Rosa e do Cruzeiro e a Comanda

Magist, aposent como Min ST

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pedido) Permaneceu até 26/09/1974

de Cristo Foro de Guarda Roupa e Veador da casa Imperial

Vice PP: RS

28 Francisco Xavier de Pinto Lima

26/09/1874 a 16/01/1878

FD Olinda 57 Barão com grandeza de Pinto Lima 1888 Comendador da Rosa

Conselho Magist DP BA DG: BA, ES (vzs) Min Mar 1864 PP: RS, SP

Bernardo Augusto Nascentes de Azambuja

15/03 a 11/11/1875

Letras Paris FDSP

Conselho

Francisco Antônio de Souza

13/01/1877 a 10/11/1877

José Francisco Cardoso

16 e 17/01/1878

FDSP Comendador da Rosa e de Cristo

PP: PR 1859

29 Camilo Maria Ferreira Armond

18/01 a 25/12/1878

Dir e Medic Paris

Br Prados 61 Visc 71 Conde 81

Membro extraord.

DG: MG (vzs) Dir Observ Astron RJ

Luís Pinto de Miranda Montenegro

25/12/1878 a 05/03/1879

FDSP 53 Filho 2º Visc c grand da Vila Real Praia Grande

Desembargador

30 Américo de Moura Marcondes de Andrade

05/03/1879 a 20/04/1880 (Exonerado)

FDSP 57 Magistr e advocacia PP: RS

Paulo José Pereira de Almeida

20/04 a 24/04/1880

FDSP 58 Filho 2º Visc grand de Macaé

Diretor (vários anos) Muito dedicado a província

31 João Marcelino de Souza Gonzaga

24/04/1880 a 14/03/1881

FDSP 41 Moço Fidalgo da Casa Imperial Ordem da Rosa e Cristo

Juiz munic na pv Sp Dep prov SP PP AL e RS

32 Martinho Álvares da Silva Campos

15/03 a 12/12/1881 (Exonerado?)

Medic Corte 37

Conselheiro efetivo

DP Niterói; DG Chefe gabinete 82 c/ Fazenda Sen MG

Paulo José Pereira de Almeida

12/12/1881 a 16/03/1882

FDSP 58 Filho 2º Visc grand de Macaé

Diretor (vários anos) Muito dedicado a província

33 Bernardo Avelino Gavião Peixoto

16/03/1882 a 27/10/1883 (Exonerado)

Bac Acad SP 49

Magist SP DP: SP (vzs)

Paulo José Pereira de Almeida

13/11 a 23/11/1882

FDSP 58 Filho 2º Visc grand de Macaé

Diretor Faz vários anos Muito dedicado a província

Teodoro de Azevedo Júnior

28/10 a 30/10/1883

Comendador Rosa Cel GNac Dir Caixa Econ

34 José Leandro Godói e Vasconcelos

31/10/1883 a 17/08/1884

FD Olinda 57 DG: PE PP: MA PP: RS

35 José Cesário de Faria Alvim

18/08/1884 a 25/08/1885

FDSP 62 Adv MG DP: Ouro Preto (vzs) DG: MG (3x) Pref DFed PP: MG

36 Antonio da Costa Pinto e Silva

26/08/1885 a 19/04/1886 (Exonerado)

FDSP 49 Cavaleiro de Cristo Conselho DProv Nit DG SP vzs Ministro gab Caxias PP: PB, RS, SP

Manoel Jacinto Nogueira da Gama

20/04/1886 a 17/05/1886

FDSP 59 Filho do 2º Conde Baependi

DP: Niterói

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Antônio da Rocha Fernandes Leão

18/05 a 29/07/1886

37 Antônio da Rocha Fernandes Leão

30/07/1886 a 25/04/1888 (Exonerado) Ficou até 29

FDSP 61 Promotor MG Advoc DG: MG desde 63 Sem do Imp 89

Manoel Jacinto Nogueira da Gama

30/04 a 03/05/1888

FDSP 59 Filho do 2º Conde Baependi

DP: Niterói

38 José Bento de Araújo

Ver OBS 04/05/1888 a 18/06/1889

FDSP 68 Conselho Adv na Corte PP: MA (3x) PP: MT (2x) PP: SC

39 Carlos Afonso de Assis Figueiredo

19/06 a 15/11/1889 (República)

FDSP 67 Irmão do Visc Ouro Preto

Conselho Adv MG DP e DG: MG (vzs) Minist Guerra 82

Organizado pelo autor a partir de Lacombe (1973) e Relatórios dos Presidentes de Província.

Siglas utilizadas: FDSP – Faculdade de Direito de SP FD Olinda – Faculdade de Direito de Olinda PP – Presidente de Província PS – Presidente do Senado AG – Assembléia Geral

AP – Assembléia Provincial DP – Deputado Provincial DG – Deputado Geral ST – Supremo Tribunal vp – várias provícias vzs – várias vezes

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