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PRÁTICA DE LEITURA – CONTOS E CRÔNICAS

Ivanir Braz Fuzer 1 Izabel Cristina Souza Gimenez 2

RESUMO: O tema da pesquisa foi leitura de contos e crônicas no Ensino Fundamental, intitulado “Prática de Leitura – contos e crônicas”, sendo implementado na Escola Estadual "Jorge Nacli" – Ensino Fundamental e tendo como público de intervenção alunos de 6ª série do Ensino Fundamental. Partiu-se da discussão sobre alfabetização e letramento, pois o sistema de alfabetizar, durante muito tempo, foi direcionado para „ler e escrever‟ sem se preocupar em ler as entrelinhas do discurso, a ideologia que estava embutida nas palavras, motivo pelo qual o aluno repetia e treinava a leitura e a escrita mecanicamente. Desse modo, o aluno chegava à 5a série do Ensino Fundamental e seguia para as demais séries sem, efetivamente, saber “ler”. Diante disso, a questão que se colocou foi: como motivar os alunos de 6ª série à leitura? Além disso, como possibilitar que eles desenvolvam a habilidade da leitura ultrapassando ao menos o primeiro nível que é a decodificação e cheguem à interpretação? Tentando responder a essas questões, foi realizado um trabalho com crônicas e contos, por serem textos curtos, muitas vezes com humor, adequando a seleção dos textos ao universo dos alunos. A metodologia de ensino utilizou estratégias de leitura com os gêneros textuais conto e crônica, criando situações de ensino baseadas nas concepções de Cattelan (1996), acerca da tipificação do leitor. Os resultados obtidos estão evidenciados no desenvolvimento da unidade didática.

Palavras-chave: Tipificação do leitor, leitura, contos, crônicas.

1 INTRODUÇÃO

Muito se discute sobre alfabetização e letramento. Segundo Magda Soares,

“[...] letrar é mais que alfabetizar, é ensinar a ler e escrever dentro de um contexto

onde a escrita e a leitura tenham sentido e façam parte da vida do aluno” (SOARES,

2003, p. 1). O sistema de alfabetização, durante muito tempo, porém, foi direcionado

para „ler e escrever‟ sem se preocupar em ler as entrelinhas do discurso, a ideologia

que estava embutida nas palavras, razão pela qual o educando repetia e treinava a

1 Professora PDE, com formação em Letras – Português/Inglês, atua na Escola Estadual "Jorge Nacli" – Ensino Fundamental no Município de Nova Aurora – PR, NRE de Assis Chateaubriand, 2012.

2 Professora de Literatura na Universidade Estadual do Oeste do Paraná - UNIOESTE - Campus de Marechal Cândido Rondon. 2012.

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leitura e a escrita para se alfabetizar, mas pouco ou quase nada entendia daquilo

que lia. Sobre esse assunto, Soares declara que

Contrária a essa perspectiva liberal do conceito de alfabetismo é a perspectiva anteriormente denominada „radical‟ e „revolucionária‟ – a versão forte das relações entre alfabetismo e sociedade. Enquanto na perspectiva liberal progressista, o alfabetismo é definido pelo conjunto de habilidades necessárias para responder às práticas sociais em que a leitura e a escrita são requeridas, na perspectiva radical revolucionaria, as habilidades de leitura e escrita não são vistas como „neutras‟, habilidades a serem usadas em práticas sociais, quando necessário, mas são vistas como um conjunto de práticas socialmente construídas envolvendo o ler e o escrever, configuradas por processos sociais mais amplos e responsáveis por reforçar ou questionar valores, tradições, padrões de poder presentes no contexto social. (SOARES, 2010, p.35).

Por isso, alfabetizar, no contexto atual, vai muito além, chega ao letramento,

pois designa práticas de leitura e escrita, não apenas funcionais, conhecidas como

aquelas em que as pessoas são alfabetizadas, porém não sabem fazer uso da

leitura e da escrita de forma consciente. Para entrar no universo do letramento é

necessário muita leitura em jornais, revistas, livros e isso se dá com a entrada do

aluno no mundo da escrita e pela aprendizagem de toda a complexa tecnologia

envolvida no aprendizado do ato de ler e escrever.

Ainda para Magda Soares,

[...] é necessário a prática social da leitura, que pode ser feita por exemplo com o jornal que é um portador real de texto, que circula informações, ou com a revista ou, até mesmo com o livro infantil. Tem que haver uma especificidade, aprendizagem sistemática sequencial de aprender. (SOARES, 2003, p. 3).

A escola precisa dar condições para o letramento. Cada professor é

responsável em sua área e precisa oportunizar o letramento. Isso é importante

porque às vezes a escola é a única oportunidade que a criança tem de entrar em

contato com a leitura.

Tomando como base o conceito de letramento, verifica-se que muitos dos

alunos chegam a 5ª série sem conseguir ultrapassar o nível de decodificação nos

textos que leem. E isso se deve a fatores diversos que vão desde a problemática de

alfabetização a, efetivamente, ausência do hábito da leitura, ou seja, os alunos não

veem a leitura do texto impresso como algo atraente e, se não leem, obviamente

não desenvolverão habilidades de leitura.

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Essa realidade vem sendo constatada nos alunos de 5ª a 8ª série da Escola

Estadual "Jorge Nacli" – Ensino Fundamental, ou seja, os alunos não gostam de ler

e, quando leem, não conseguem, a maioria, romper a barreira de decodificação,

realizando, assim, uma leitura apenas linear.

Desse modo, o que se propôs na pesquisa foi a realização de um trabalho

com alunos de 6ª série, objetivando o desenvolvimento, por meio dos gêneros

crônica e conto, da habilidade de leitura, visando superar a mera decodificação e

atingir, no mínimo, a interpretação.

Em se tratando de leitura, ao menos nas séries iniciais do Ensino

Fundamental, parece que a motivação não é problema, pois, quando motivados

pelos professores, os alunos normalmente gostam de ouvir histórias, assistir vídeos

de desenhos animados ou reprodução dos clássicos da literatura infantil, leem livros

sem textos, apenas com ilustrações e, depois de alfabetizados, a grande maioria

continua a ler livros infantis.

O problema parece começar na transição da 4ª para a 5ª série. A partir daí

os alunos parecem perder o interesse, a vontade de ler e, com isso, não

desenvolvem as habilidades necessárias à realização de uma leitura proficiente, pois

o ato de ler é muito mais que decodificar textos.

O ato de ler não se esgota na decodificação pura da palavra escrita, ou da linguagem escrita, mas que se antecipa e se alonga na inteligência do mundo. A leitura de mundo precede sempre a leitura da palavra, a leitura deste implica a continuidade da leitura daquele. Aprender a ler, a escrever, alfabetizar-se é, antes de mais nada, aprender a ler o mundo, compreender seu contexto, não numa manipulação mecânica de palavras, mas numa relação dinâmica que vincula linguagem a realidade. (FREIRE, 1982, p. 8).

Se o alfabetizador pensar a leitura dessa forma, o alfabetizando se

envolverá num processo criador, de que ele é também sujeito, visto que, “[...] desde

o começo, na prática democrática e crítica, a leitura do mundo e a leitura da palavra

estão dinamicamente juntas” (FREIRE, 1982, p. 34).

O ato de ler envolve todo o nosso ser, lembrando que, no ato da leitura,

saímos do nosso estado normal para mergulhar num estado de êxtase que envolve

os sentidos, as emoções e a razão, transportando-nos para dentro do texto.

Para Maria Helena Martins (1981, p. 34-35),

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Aprender a ler significa também aprender a ler o mundo, dar sentido a ele e a nós próprios, o que mal ou bem fazemos mesmo sem ser ensinados. A função do educador não seria precisamente a de ensinar a ler, mas a de criar condições para o educando realizar a sua própria aprendizagem, conforme seus próprios interesses, necessidades, fantasias, segundo as dúvidas e exigências que a realidade lhe apresenta. Enquanto permanecemos isolados da cultura letrada, não podemos encarar a leitura senão como instrumento de poder, dominação dos que sabem ler e escrever sobre os analfabetos ou iletrados. Importa começar a ver a leitura como instrumento liberador e possível de ser usufruído por todos, não apenas pelos letrados.

Sob esse aspecto, a aprendizagem da leitura é um processo muito mais

complexo, uma vez que a superação da decodificação deve ser trabalhada pelo

professor, levando o educando a novas aprendizagens dentro da realidade e

superando as relações de poder e dominação da sociedade em que vivem.

O processo de leitura deve garantir que o leitor compreenda os diversos textos que se propõe a ler. É um processo interno, porém deve ser ensinado. Uma primeira condição para aprender é que os alunos possam ver e entender como faz o professor para elaborar uma interpretação do texto: quais as suas expectativas, que pergunta formula, que dúvidas surgem, como chega à conclusão do que é fundamental para os objetivos que o guiam, que elementos toma ou não do texto, o que aprendeu e o que ainda tem para aprender [...] em suma, os alunos têm de assistir a um processo/modelo de leitura, ver as estratégias em ação em uma situação significativa e funcional. (SOLÉ, 2008, p. 116).

Assim, quando os alunos estão motivados a aprender a ler e o professor

possui encaminhamentos que possam ajudar no desenvolvimento da leitura, o

objetivo de compreensão de textos, torna-se mais claro.

Diante disso, a questão que se colocou foi: ─ Como motivar os alunos de 6ª

série à leitura? ─ Além disso, como possibilitar que eles desenvolvessem a

habilidade da leitura ultrapassando ao menos o primeiro nível, que é a

decodificação, e chegassem à interpretação? Tentando responder a essas questões,

pensou-se que, com a realização do trabalho com crônicas e contos, por serem

textos curtos, muitas vezes com humor, e adequando a seleção dos textos ao

universo dos alunos, fosse possível iniciar esse trabalho de motivação e,

consequentemente, uma leitura que ultrapassasse a linearidade.

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2 ACERCA DA LEITURA

Discorrendo sobre a leitura, Paulo Freire declara que,

[...] a leitura de mundo precede sempre a leitura da palavra. O ato de ler se veio dando na minha experiência existencial. Primeiro, a leitura do mundo em que se movia; depois, a leitura da palavra que nem sempre ao longo de sua escolarização foi a leitura da palavramundo (FREIRE, 1982, p. 12).

Diante da experiência vivenciada, Freire coloca aos professores o que

devem realizar como educadores, ou seja,

[...] é preciso de ir „lendo‟ cada vez melhor a leitura do mundo que os grupos populares com quem trabalho fazem do seu contexto imediato e do maior do que o seu é parte, o que quero dizer é o seguinte: não posso, de maneira alguma, nas minhas relações político-pedagógicas com os grupos populares, desconsiderar seu saber de experiência feito. Sua explicação do mundo de que faz parte a compreensão de sua própria presença no mundo. E isso tudo vem explicitado ou sugerido ou escondido no que chamo „leitura do mundo‟ que precede sempre a leitura da palavra (FREIRE, 2002, p. 90).

É importante ponderar que, quando a pessoa chega à escola, já tem um

conhecimento prévio, convive em seu microcosmo com familiares, parentes e

vizinhos, adquire um determinado vocabulário e sabe tomar alguns conceitos. É,

portanto, necessário valorizar esse conhecimento de mundo possuído pelos

educandos: “É preciso que quem sabe saiba sobretudo que ninguém sabe tudo, e

que ninguém tudo ignora” (FREIRE, 2002, p. 32).

Desde o primeiro contato com o mundo, a criança já percebe, por instinto ou

não, o carinho das mãos das mães, o calor do seu corpo aquecendo, alguns sons

que irritam; chora quando apresenta fome, assim começa o aprendizado com o

mundo. Pensa-se que esses também são os primeiros passos para aprender a ler,

pois Paulo Freire (2002) lembra que “[...] ninguém educa ninguém, tampouco

ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão, mediatizados

pelo mundo”.

Maria Helena Martins (1981, p. 32) enfatiza que

[...] a leitura vai além do texto, seja qual for, e começa antes do contato com ele. O leitor assume um papel atuante, deixa de ser mero decodificador ou receptor passivo. E o contexto em geral em que ele atua, as pessoas com quem convive passam a ter influência apreciável em seu desempenho de leitura. Isso porque o dar sentido a um texto implica sempre levar em conta a situação desse texto e de seu leitor.

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Nesse aprendizado de leitura, nem sempre leem porque dá prazer, muitas

vezes leem por necessidade, leem obrigados para uma prova. Para a autora,

O leitor, entretanto, pouco se detém no funcionamento do ato de ler, a intrincada trama de inter-relações que se estabelecem. Todavia, propondo-se a pensá-lo perceberá a configuração de três níveis básicos de leitura, os quais são possíveis de visualizar como níveis sensorial, emocional e racional. Cada um destes três níveis corresponde ao modo de aproximação do objeto lido. Como a leitura é dinâmica e circunstanciada estes três níveis são inter-relacionados, senão simultâneos, mesmo sendo um ou outro privilegiado segundo a experiência, expectativas e necessidades e interesses do leitor e das condições do contexto geral em que se insere. (MARTINS, 1981, p. 36-37).

Parafraseando Martins (1981), portanto, quando visitamos uma feira, um

museu, de todos os objetos que vemos estamos fazendo uma leitura, estamos lendo

com os sentidos, com as emoções, e com conhecimento de mundo que possuímos.

A leitura sensorial começa muito cedo e nos acompanha por toda vida. Ler

sensorialmente uma história contada, um quadro, uma canção, até uma comida,

pode ser fácil, mas como ler assim um livro? Será que conseguimos? Certamente,

visto que há leituras que nos deixam alegres, outras que nos deixam deprimidos,

despertam a curiosidade, estimulam a fantasia e provocam descobertas,

lembranças, aí deixamos de ler apenas com os sentidos e passamos à leitura

emocional. Essa leitura mexe com sentimentos, escapa ao controle do leitor, talvez

seja uma leitura que nos dê prazer, ou pode ser perigosa quando nos angustia ou

nos deixa deprimidos.

Na leitura emocional emerge a empatia, tendência de sentir o que se sentiria

caso estivéssemos na pele de outra pessoa, uma realidade alheia, fora de nós, na

leitura emocional não importa sob o que certo texto trata, mas, sim, o que ele faz, o

que provoca em nós, pode ser emoções controláveis ou incontroláveis, pode ser

leitura como passatempo, para extravasar emoções, ou alguém que se nega a viver

seus próprios problemas. O leitor pode ficar suscetível a manipulações, às

ideologias que o texto apresenta.

A leitura racional é concebida e mantida pelos intelectuais, no âmbito do

status letrado. A leitura a esse nível intelectual enfatiza, pois, o intelectualismo,

doutrina que afirma a preeminência e anterioridade dos fenômenos intelectuais

sobre os sentimentos e a vontade. Tende a ser unívoca, o leitor se debruça sobre o

texto, pretende vê-lo isolado do contexto e sem envolvimento pessoal, com certas

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normas preestabelecidas usando o texto como pretexto para avaliar coisas alheias

ao texto.

Em síntese, a leitura racional acrescenta à sensorial e à emocional o fato de

estabelecer uma ponte entre o leitor e o conhecimento, a reflexão e a reordenação

do mundo objetivo, possibilitando-lhe, no ato de ler, dar sentido ao texto, questionar

a própria individualidade como o universo das relações sociais. Considerando os

apontamentos acima, torna-se difícil apenas realizarmos a leitura sensorial ou

emocional ou racional, pelo simples fato de ser próprio da condição humana inter-

relacionar sensações, emoção e razão, tanto na tentativa de se expressar, como na

de buscar sentido, compreender a si próprio e o mundo. Assim, uma leitura depende

da outra, conforme o texto lido, o contexto momento e o estado de espírito do leitor.

A partir das concepções de Martins sobre a leitura sensorial, emocional e

racional, Cattelan (1996) estabelece uma tipificação do leitor, no qual enfatiza que

cada leitor tem uma forma de compreender o objeto lido.

Parafraseando João Carlos Cattelan (1996), um texto pode ser lido de

diversas formas, pois cada leitor pode entendê-lo de uma maneira. As leituras de um

texto não são iguais. Quando o texto é lido pela segunda vez, já é entendido de

outra forma. É possível que um leitor estabeleça para com o texto uma leitura que

não ultrapasse a figurativização, limitando-se a caracterizar seus personagens,

revendo o enredo e fixando o desfecho. Outro pode ler esse mesmo texto e perceber

que os personagens são entidades ficcionais, que são revestimento a um

determinado conteúdo. Essa leitura é mais profunda, mas não é a essencial, ainda é

parcial e problemática. Outros podem ler e servir-se dele para questionamento,

reflexão acerca do assunto lido. Essa leitura ainda não é a mais profunda, porque

não passou da verificação da realidade.

Há outros modos de se ler um texto: a tomada de posição argumentativa

frente às posturas do autor, a argumentação de posições para com outro leitor que

tiver lido o texto de forma diferente. Qualquer atitude que se tenha será, porém, pela

visão de mundo, da história de leitor, da postura política, pessoal que cada um tem.

Um leitor pode ler um texto e fazer uma leitura que não ultrapasse a mera

memorização e entendimento daquilo que está apresentado no nível superficial, e

pode perceber os personagens do texto, quem influenciou quem, mas não

aprofundar seus questionamentos, sendo assim, um leitor ingênuo vê o texto como

algo verídico, os personagens reais e particulares. Esse leitor não vai além daquilo

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que o texto apresenta superficialmente. A esse leitor Cattelan chama de leitor

„decodificador‟. Esse leitor não percebe a temática e a argumentação que

implicitamente aparecem no texto.

O leitor intérprete perceberá que, por detrás do corpo formal expresso no

texto, existe uma temática, existe uma orientação argumentativa, uma

intencionalidade. Conseguirá ainda penetrar naquilo que se tem chamado de ideia

central, ou de mensagem ou tema do texto. Esse leitor consegue realizar uma leitura

num grau de complexidade maior que o leitor decodificador.

O terceiro tipo de leitor, segundo Cattelan (1996), o confrontador, realiza

duas tarefas, decodifica e interpreta e vai além. Ele procura confrontar tal construção

com a realidade circundante, com o intuito de verificar as particularidades de ver ou

manifestar o mundo, ele faz ponte entre texto e contexto, sua leitura será sempre

extensiva ao mundo. Depois de observar as entrelinhas do texto, ele confronta as

posturas assumidas pelo autor do texto com dados que o concreto lhe fornece. No

seu ato de ler, ele vê enredo, memoriza figuras, grava fatos; ele interpreta; confronta

a significação com o contexto circundante. O leitor, após se perceber da temática,

verificará se tal afirmação é adequada, procurará fatos que confirmem ou que

rejeitem o conceito dado pelo autor.

Continuando a tipificar o leitor, Cattelan define o leitor argumentador. É

aquele que, após ter decodificado, interpretado e confrontado o texto-objeto, constrói

sua própria forma de conceber a temática apresentada. Esse leitor realiza a etapa de

decodificar a linearidade textual, constrói para tal uma significação, realiza a etapa

de confrontar essa significação com o mundo, constrói uma forma particular e

pessoal de conceber os fenômenos. Ele percebe ser o texto a manifestação de uma

individualidade diferente da sua, com outras experiências, com outra concepção de

mundo, outras crenças, com direito de pensar diferente. Um leitor argumentador ao

se defrontar com o texto buscará evidências no real, no concreto circundante, que

confirmem ou refutem as ideias defendidas pelo texto.

Por último, ele enfatiza o leitor interagente. É o leitor que realiza todas as

quatro etapas e chega à etapa da confrontação entre leitores. É necessário que o

indivíduo aprenda desde sempre a perceber suas leituras como fenômenos

individuais que terão formas diferentes de concepção, que, como as suas, devem

ser discutidas e reformuladas quando necessário. Essa etapa da leitura supõe a

polêmica, o entrechoque de opiniões, a manifestação dos argumentos que

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sustentam diferentes formas de crenças.

Cattelan conclui que

Leitores que realizam algumas etapas, e outras não, podem ser considerados como leitores críticos e reflexivos. Um leitor que realiza as primeiras quatro etapas e não a última, tende a ser autoritário, pensando ser a sua leitura otimamente embasada, rejeita a dos demais, ele se dá o direito de ditar suas leituras e suas concepções aos demais indivíduos. Um leitor que não realiza a etapa da confrontação tende a encarar o texto como uma verdade imutável, e será levado a não tomar a realidade como parâmetro. O leitor deve ser encaminhado para o domínio de todas as posturas, para que suas leituras não sejam mediocrizadas ou se torne autoritária, negando a si e aos demais o direito de conceberem o mundo. O que se tem constatado é que as pessoas pelos mais diversos motivos e circunstâncias têm sido levadas a realizarem um processo de leitura que não chega a estar calcado na racionalidade, sem que se despreze a emoção e a sensação e nem a ser realizado no intuito de dominar todas as diferentes posturas possíveis. (CATTELAN, 1996, p. 7-8).

Sob esse aspecto, Cattelan afirma que a escola, até certo ponto, tem sido

responsável por formar o leitor que não atua racionalmente quando constrói

significados, ou seja, quando lê. Mesmo quando leva o aluno a ler racionalmente, ela

não o tem exercitado no sentido de levá-lo ao domínio das posturas necessárias

para que a sua leitura seja mais efetiva: “A escola não é única responsável, os meios

de comunicação de massa com sua forma unilateral de leitura também contribuem,

tem feito o leitor calar-se e não exercitar o seu potencial de atribuição de significados

aos fenômenos que os circulam” (CATTELAN, 1996, p. 9).

Sob a ótica de Cattelan (1996), foi desenvolvido o trabalho de

implementação, procurando ultrapassar os limites da decodificação e interpretação,

objetivando chegar, haja vista a série em que estão os alunos (6ª série), pelo menos

ao leitor argumentador. Para tanto, os textos utilizados foram crônicas e contos.

2.1 CRÔNICA E CONTOS

Na escola existe uma diversidade de textos, devendo o professor escolher

aqueles mais adequados aos objetivos propostos, no entanto,

Considero que alguns textos são mais adequados que outros para determinados propósitos de leitura - assim como para determinadas finalidades de escrita - e que as estratégias que utilizamos para ler se diversificam e adaptam em função do texto que queremos abordar. (SOLÉ, 2008, p. 82).

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Diante disso, acredita-se que, em se tratando de um trabalho com alunos da

6ª série do ensino fundamental, a escolha dos textos deva ser dirigida a partir de

temas que sejam de interesse do aluno e também que sejam textos atrativos, que

possuam elementos que despertem o interesse e a atenção do estudante. Assim

sendo, optou-se pelos gêneros crônica e conto, a respeito dos quais se fará uma

breve abordagem.

Etimologicamente, a palavra crônica vem do grego khrónos, que significa

tempo. Segundo Lima,

A crônica é o relato de um ou mais acontecimentos em um determinado tempo, a qualidade de personagem é reduzida, podendo inclusive não haver personagens, por ser um relato de um fato do cotidiano, tem características líricas, faz reflexões com certo tom de ironia e humor. (LIMA, 1981, p.3).

Numa sequência lógica, Lima (1981) cita Arriguci Junior (1987), definindo

crônica como „um relato ou comentário de fatos corriqueiros do dia a dia, dos fait

divers, fatos da atualidade que alimentam o noticiário dos jornais, desde que esses

se tornaram instrumento de informação de grande tiragem no século passado‟.

Também faz uso das palavras de Neves (1995), para complementar dizendo que a

crônica é um texto que tematiza o tempo e o mimetiza. Já Bender e Laurito (1993)

colocam que o termo evoluiu, mas nunca perdeu os vínculos com o sentido

etimológico que lhe é inerente e que está em sua formação, mostrando que a

evolução da crônica ocorre conforme épocas e culturas ao longo do tempo.

A propósito do conto, Nadia Batella Gotlib coloca que

[...] o conto é muito antigo, desde os tempos remotos sempre apareciam aqueles que contavam e outros que ouvia. Em sociedades primitivas, sacerdotes e seus discípulos, para a transmissão dos mitos e ritos da tribo; nos nossos tempos, em volta da mesa, a hora das refeições, pessoas trazem notícias, trocam ideias [...] contam casos, só variam de assunto ou modo de contar. (GOTLIB, 1991, p. 5).

Para alguns os contos egípcios – os contos dos mágicos – são os mais

antigos, devem ter aparecido 4000 anos antes de Cristo. Enumerar as fases da

evolução do conto seria percorrer a nossa própria história, a história da nossa

cultura, detectando os momentos da escrita que a representa.

O surgimento dos contos tornou-se relevante devido à história de

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As mil e uma noites que circulou na Pérsia (séc. X) no Egito (séc. XII) e na Europa (séc. XVIII). Como não nos determos um pouco nesta coletânea de mil e um contos? Pois estas mil e uma histórias desenhavam, no seu modo de organização, o próprio curso da história. Nestas histórias que se seguiam noite após noite, contadas por Sheherazade, que, assim, ia distraindo o rei que à condenara a morte. O plano do rei Shariar era este: desposar uma virgem por noite, que morreria no dia seguinte para que nenhuma pudesse repetir o ato de traição de sua antiga esposa. Quando Sheherazade conta histórias ao rei, aguça-lhe a curiosidade, ele quer continuar ouvindo a história na noite seguinte. O conto enquanto vida acaba também encantando o rei. E Sheherazade, contando histórias, vai adiando a morte e prolongando a vida. (GOTLIB, 1991, p. 5).

Assim, portanto, enquanto a força do contar história se faz permanecendo

necessária e vigorosa, através dos séculos, assim aparece o modo de narrar

caracterizado, em princípio, pela própria natureza dessa narrativa: a de

simplesmente contar histórias (Cf. GOTLIB, 1991).

3 INTERVENÇÃO PEDAGÓGICA

A intervenção pedagógica foi realizada com a 6ª série, turma E, do turno

vespertino, da Escola Estadual "Jorge Nacli" – Ensino Fundamental, Nova Aurora –

Paraná, Núcleo Regional de Assis Chateaubriand. Aqui está descrito o

desenvolvimento da implementação do Projeto de Intervenção Pedagógica e

contempla as estratégias pedagógicas para atender as dificuldades diagnosticadas.

A proposta de trabalho apresentada foi a Unidade Didática, com o objetivo

maior de formar leitores que consigam ampliar seus conhecimentos, tornando-se

críticos e atuantes no contexto em que vivem.

A Unidade Didática trabalhou com o tema de leitura de contos e de crônicas

no Ensino Fundamental, tendo como título “Prática de Leitura - contos e crônicas”. A

realização do trabalho por meio dos gêneros citados objetivou motivar os alunos

para a leitura e elevar o nível de compreensão dos textos lidos.

A metodologia foi baseada nos apontamento de Cattelan (1996), nos quais

ele estabelece uma tipificação do leitor e enfatiza que cada leitor tem uma forma de

compreender o objeto lido. Sob a ótica do autor citado, foi desenvolvido o trabalho

de implementação, procurando ultrapassar os limites da decodificação e da

interpretação, tentando chegar, haja vista a série em que estão os alunos (6ª série),

pelo menos ao leitor argumentador.

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As estratégias utilizadas estão inseridas no universo dos alunos, ou seja,

elas tratam de temas do cotidiano, do grupo onde convivem. O levantamento do tipo

de texto a ser trabalhado foi realizado a partir da aplicação de um questionário que

teve o objetivo de tomar o conhecimento sobre as preferências dos alunos. O

questionário revelou que a maioria gostaria de discutir acerca de amizade, namoro e

amor. Também colocaram seus cantores preferidos: Luan Santana, com a música

“Amar não é pecado”, e NXZero, com a música “O que é o amor pra você”, razão

pela qual as músicas e os clipes desses cantores foram inseridos no trabalho.

Além disso, o trabalho foi desenvolvido a partir da leitura de poemas, como

uma forma de motivação e diversificação das estratégias de leitura, sendo utilizados

três poemas com autores diferentes que enfocavam o amor: “Receita contra dor de

amor”, de Roseana Murray; “Minha namorada”, de Wilson Pereira; e “A surpresa”, de

Bartolomeu Campos de Queiroz.

As crônicas utilizadas foram “Notícia da mais que amada”, de Carlos Heitor

Cony; “Mãe”, de Rubem Braga; “Entre Amigos”, de Martha Medeiros; “Procura-se um

Amigo”, de Vinícius de Moraes; “Meu amigo virtual”, de Fátima Merigue de

Mendonça e os contos: “Amizade verdadeira”, de autor desconhecido; “Era uma

vez... numa terra muito distante...”, de Luís Fernando Veríssimo; “O velho Corado, a

flor colorida e a cidade cinzenta”, de Nelson Ricardo Candido dos Santos; e “As

plantas mágicas”, de Theobaldo Miranda Santos. Ainda houve a proposta da leitura

de uma tirinha da “Mafalda”, de um quadro de “Renoir” e um fragmento de O

Pequeno Príncipe.

1ª Ação: Vídeoclipes e Música

A primeira ação foi realizada a partir da apresentação dos videoclipes das

músicas, tal como proposto pelos alunos, por meio da TV Pendrive. Os vídeos foram

repetidos de três a quatro vezes, de forma que os alunos não apenas ouviram como

também cantaram as músicas, individualmente, em duplas e em grupo. Esse foi o

trabalho inicial, realizado apenas oralmente e visou, nesse primeiro momento,

apenas a decodificação, isto é, na sequência a professora realizou questionamentos

sobre o tema das músicas, a forma como cada autor aborda os temas, e as

diferenças e ou semelhanças encontradas nas duas músicas, sendo respondido

pelos alunos em duplas.

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2ª Ação: Texto Poético

Como forma de motivação, foi utilizado o texto poético. Para esse trabalho

foram escolhidos três poemas: “Receita de amor”, de Roseana Murray, “Minha

namorada”, de Wilson Pereira, e “A surpresa”, de Bartolomeu Campos de Queirós.

Após propor a atividade, os textos foram lidos na íntegra pelos alunos na

sala de Informática – Paraná Digital.

A atividade foi iniciada com a leitura oral dos poemas e, por meio de

questões orais e escritas, trabalhou-se a decodificação e também a interpretação

dos poemas. Antes disso, porém, discorreu-se, para os alunos, sobre os autores.

Além dos poemas, foi pesquisado pelos alunos na sala de informática sobre vida e

obra de cada autor, bem como outras obras dos mesmos literatos.

Realizada a atividade, a professora ouviu as respostas e as colocou em

discussão até que chegassem às respostas mais prováveis para análise da

decodificação sobre as informações. Essa atividade serviu para avaliação

diagnóstica, de forma que se percebeu o grau de compreensão dos textos por parte

dos alunos, realizando a decodificação das informações e alguns alunos, uma

minoria, a interpretação.

3ª Ação: Temática Amor e Amizade

Os alunos foram à sala de informática e buscaram, na internet, outras

músicas que abordassem a temática do amor e da amizade. Utilizaram a ferramenta

e-mail para enviar à professora outras músicas com o mesmo tema. Esta fez a

socialização dessas propostas. Para tanto, a professora criou um e-mail para a

turma. Os alunos também foram à biblioteca e selecionaram em livros, jornais e

revistas, textos diversos sobre as temáticas abordadas. Os textos selecionados

foram entregues à professora, que recolheu todo o material e realizou uma aula de

leitura sobre o assunto.

Após essas atividades, os alunos escreveram frases, versos ou estrofes ─

criados por eles ou não (podendo ser frases, versos e estrofes das quais eles

tenham gostado) ─ em cartazes que foram ilustrados (com desenhos ou colagens) e

afixados no mural do refeitório.

Como resultado, os alunos continuaram praticando a decodificação. Em

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vários momentos, a professora os chamava a pensar sobre as entrelinhas e debater

sobre as ideias principais, a partir da formação de equipes.

4ª Ação: Crônica

Essa ação foi desenvolvida em quatro partes, sendo:

Parte A: o trabalho foi realizado a partir da leitura de crônicas que também

versaram sobre o tema amor, porém com suas variantes de amor pelos animais, de

amor pelos filhos e de amor pelos amigos. Buscou-se aprofundar um pouco mais a

leitura, além da decodificação e da interpretação, enfatizando a argumentação, isto

é, segundo a tipologia de Cattelan (1996), tentando formar um leitor argumentador,

que é aquele que dialoga com o texto, concordando ou não com ele.

Nessa parte foram utilizados os seguintes autores e suas respectivas obras:

“Notícia da mais que amada”, de Carlos Heitor Cony; “Mãe”, de Rubem Braga; “Entre

Amigos”, de Martha Medeiros; “Procura-se um Amigo”, de Vinícius de Moraes; “Meu

amigo virtual”, de Fátima Merigue de Mendonça. Após essas informações, os alunos

foram ao Laboratório de Informática – Paraná Digital e realizaram a pesquisa sobre a

biografia dos autores, formando um texto e expondo no mural da sala de aula.

Realizada a leitura oral da crônica, a professora realizou uma breve

explanação sobre o gênero.

Retomando o texto, a professora solicitou nova leitura e, após, fez

questionamentos aos alunos, realizando a decodificação do texto. Essa atividade foi

realizada oralmente. Após ouvir e discutir as respostas da turma, a professora

desencadeou um debate, levando-os a dialogar com o texto. As questões colocadas,

oralmente, versaram sobre amor por animais; se eles concordam que os animais de

estimação agem conforme o autor afirma no texto; se eles gostam e têm animais; se

se pode amar os animais da mesma forma que se ama uma pessoa, etc.

Na parte B foi utilizada a crônica “A Mãe”. A partir da leitura, a professora

explicou aos alunos sobre o conceito de crônica, fazendo uma retrospectiva sobre o

trabalho já desenvolvido de decodificação e interpretação. Para cada ação havia

objetivos já estabelecidos e nessa parte buscava junto aos alunos pelo menos a

ação de interpretar.

Após essa explanação, a professora dividiu a turma em grupos de quatro

alunos, organizou questões referentes à decodificação, interpretação e

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argumentação com o texto proposto.

A realização da tarefa foi feita através de sorteio, ou seja, houve equipes que

fizeram somente a decodificação, outras apenas a interpretação e outras apenas a

argumentação, de acordo com o número de equipes. O trabalho foi acompanhado

pela professora, havendo intervenção quando necessário.

Concluindo a atividade, a professora recolheu, corrigiu e devolveu às

equipes na aula seguinte, levando a apresentação das questões e a solicitação das

respostas dos colegas.

Esse trabalho foi realizado também por escrito. Recolhidas as respostas,

após correção, a professora as devolveu e promoveu a discussão sobre o assunto.

Essa atividade serviu como avaliação diagnóstica, verificando o grau de

compreensão de leitura dos alunos. Os resultados apontaram para o problema de

pesquisa, ou seja, alguns alunos somente decodificam, outros decodificam e

interpretam e poucos alunos, mesmo com a intervenção da professora, conseguem

atingir esse estágio, denotando que esse trabalho deve ser proporcionado de forma

sistematizada em todas as séries.

Na Parte C foram apresentadas as crônicas “Entre Amigos”, de Martha

Medeiros; “Procura-se um Amigo”, de Vinícius de Moraes; “Meu amigo virtual”, de

Fátima Merigue de Mendonça, que tratavam de um outro tipo de sentimento, a

amizade. Essa atividade foi realizada em duplas. A princípio, cada dupla recebeu

uma crônica, aleatoriamente, e conversaram sobre ela, buscando decodificar e

interpretar. A professora acompanhou o trabalho das duplas e realizou a intervenção

quando necessário.

Cada dupla anotou o resultado da discussão e, posteriormente, trocaram de

texto, dando a oportunidade de todos realizarem a leitura dos textos apresentados.

Todos os trabalhos foram entregues à professora, que realizou a correção.

Após a entrega dos trabalhos corrigidos, formou-se um grande grupo e escolheu as

duplas que apresentaram seus trabalhos, havendo interação entre todos e discutindo

o assunto amizade, conforme foi entendido pelos alunos.

Na sequência, a professora promoveu outra discussão trazendo os textos

para a realidade dos alunos, isto é, fez questionamentos sobre, por exemplo, o que

eles concordam ou discordam nos textos lidos; sobre como é a amizade entre eles;

quais são e por que são seus verdadeiros amigos? Seus pais e irmãos também são

seus amigos? Entre outros.

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Na sequência, a partir da crônica 4: “Procura-se um amigo”, cada aluno pôde

escrever um classificado (de jornal), colocando as características que ele procurava

em alguém para ser seu amigo. Após correção, pela professora, os classificados

foram afixados no mural da sala. Como resultado, os alunos passaram a produzir

com coerência e ampliar as ideias acerca dos temas propostos.

Na Parte D, os alunos foram direcionados ao laboratório de informática para

pesquisarem na internet sobre os autores lidos, bem como outros textos, dos

mesmos autores, com temática diferente da qual eles estavam trabalhando. Os

trabalhos foram enviados, via e-mail, para a professora, que os socializou através do

e-mail da turma.

5ª Ação: Contos

Nessa atividade fizeram parte os contos, também relacionados com a

temática até agora em questão: os sentimentos de amor e de amizade.

Antes da leitura dos contos “Amizade Verdadeira”, de autor desconhecido;

“Era uma vez... numa terra muito distante...”, de Luís Fernando Veríssimo, “O velho

Corado, a flor colorida e a cidade cinzenta”, de Nelson Ricardo Candido dos Santos;

“As plantas mágicas”, de Theobaldo Miranda Santos, a professora realizou uma

breve explanação sobre o conto, principalmente diferenciando-o da crônica.

Na sequência foram realizadas as leituras dos contos, formando duplas e

para cada dupla foi destinado um conto, aleatoriamente, e, após a leitura, cada dupla

fez, para a turma, a propaganda do conto lido e propôs a troca, de forma que todas

as duplas realizaram a leitura de todos os contos propostos.

Após a leitura, formaram o grande grupo e as duplas, com seus contos

iniciais, discorreram sobre ele, apontando a temática, os principais aspectos

observados, isto é, as principais reflexões que foram realizadas a partir do texto e a

relação deste com a realidade, a realidade da sociedade de modo geral e a

realidade de cada um.

A professora fez as intervenções que julgou necessárias, de forma que os

alunos conseguiram decodificar, interpretar e dialogar com os textos. Desse modo,

houve a possibilidade de uma grande discussão e reflexão acerca dos valores

abordados nos contos sobre a verdadeira amizade, o verdadeiro amor, o amor

fraternal e filial e, por fim, o amor universal, que foram os assuntos tratados nos

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textos.

6ª Ação: Gêneros Diferenciados

Para finalizar o trabalho, a professora propôs a leitura de outros três tipos de

texto: uma tirinha, da Mafalda; um quadro de Renoir e um fragmento do livro O

Pequeno Príncipe, de Antoine Saint-Exupéry, o diálogo entre o príncipe e a raposa.

Para trabalhar com este último, além do fragmento escrito, a professora utilizou de

um vídeo na TV Pendrive.

Os alunos foram reunidos em grupo e, por escrito, realizaram análise dos

textos, discorrendo sobre o assunto e as conclusões retiradas. Os textos foram

entregues à professora que, após correção, os devolveu e cada grupo realizou a

apresentação de seu trabalho aos colegas. Essa apresentação foi realizada

oralmente e por meio de cartazes. Essa atividade possibilitou que a professora

avaliasse os alunos dentro dos objetivos propostos, ou seja, decodificar, interpretar e

dialogar com os textos. O resultado obtido nessa fase é o mesmo das anteriores, ou

seja, os alunos realizam com frequência a decodificação, a interpretação e muito

pouco a argumentação, tendo a professora o papel de intervir com frequência nas

colocações dos alunos.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em função das dificuldades apresentadas pelos alunos sobre a leitura e a

escrita, propôs-se desenvolver um trabalho por meio do qual eles se sentissem

motivados a participar de atividades diferenciadas daquelas propostas pelos livros

didáticos. A proposta se justifica no fato de que, a partir do momento em que os

alunos parecem perder o interesse pela leitura, eles deixam de desenvolver

habilidades necessárias à realização de uma leitura eficiente. Para tanto, foi

elaborada uma sequência didática, com músicas, poemas, contos e crônicas, tendo

como objetivo primeiro motivar os alunos e, na sequência, atender a três dos

critérios estabelecidos por Catellan (1996) acerca da tipificação do leitor, ou seja,

decodificação, interpretação e argumentação.

No desenvolvimento do trabalho verificou-se que, nas atividades propostas,

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os alunos realizaram as leituras e demonstraram aprendizagem no nível da

decodificação. Quando buscavam a interpretação eles necessitavam de

intervenções do professor e do acesso a novas leituras, constatando que esse

processo é longo e que cabe ao professor organizar encaminhamentos

metodológicos que aprimorem esse processo de leitura e de interpretação.

O trabalho desenvolvido atendeu aos objetivos propostos em uma parte dos

alunos. Não foi possível atingir os objetivos com todos os alunos dadas as

dificuldades individuais de cada um. Esse aspecto permite a conclusão de que não

há um método eficiente para obter resultados que, principalmente, atinjam todos os

alunos, mas, sim, de que há necessidade de um trabalho sistematizado e contínuo a

ser realizado pelo professor.

Quanto ao trabalho desenvolvido e às respostas manifestadas pelos alunos,

observou-se que o comportamento e a motivação melhoraram, demonstrando

interesse pelas atividades programadas. A maior dificuldade encontrada foi o tempo

disponível para desenvolvê-las, visto que a motivação para a leitura e a leitura

eficiente são processos complexos e que exigem um trabalho contínuo, não sendo

possível colher resultados em um tempo específico e determinado. Além disso, há

que se atentar para as características individuais de cada aluno, pois, ainda que

todos tenham praticamente a mesma faixa etária, são alunos que possuem vivências

escolares e pessoais diferentes e isso precisa ser levado em conta ao se realizar um

trabalho referente à leitura. Aliás, em qualquer atividade de ensino esse aspecto

precisa ser observado para que não haja massificação e os alunos possam, de fato,

aprender.

Da forma como foram desenvolvidas as atividades, constatou-se, portanto,

que a leitura pode ser aprimorada, uma vez que o professor explore, através de

diferentes tipos de textos, o potencial do aluno, não tornando este trabalho cansativo

e repetitivo. A leitura pode ser aprimorada, mas é necessário um trabalho contínuo e

integrado entre todos os professores que trabalham com esses alunos na série em

que se encontram e nas séries posteriores. Com trabalhos isolados e fragmentados

pouco se conseguirá em termos da formação do leitor e da leitura eficiente.

Pensa-se que o projeto desenvolvido foi importante como um trabalho inicial,

mas que deverá ser reavaliado na medida em que se tenha mais tempo para a

continuidade com os mesmos alunos. Uma certeza fica: a de que é possível motivar

para a leitura desde que se tenha vontade e compromisso para com os alunos.

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VÍDEOS, MÚSICAS E VIDEOCLIPES Luan Santana. Amar não é pecado. Composição: Fred / Gustavo / Marco Aurélio / Márcia Araújo. Disponível em: <http://letras.terra.com.br/luan-santana/>. NX Zero. O que é o amor pra você. Disponível em: <http://letras.terra.com.br/nx-zero/1645696/>. SAINT-EXUPERY, Antoine de. O pequeno príncipe. Disponivel em: <http://www. youtube. com/watch?v=M9_8M668VSU>.