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PUBLICIDADE, PROPAGANDA E GUERRA FRIA: UM RELATO DE EXPERIÊNCIA NO ENSINO DE HISTÓRIA. Sílvio Ricardo Gouveia Cadena 1 Universidade Federal Rural de Pernambuco - Graduando em História [email protected] Resumo O trabalho em questão trata-se de um relato de experiência acerca de uma intervenção realizada nas aulas de História da Escola Dom Bosco, localizada no bairro de Casa Amarela, em Recife. Em específico, as turmas do 9º ano do turno da tarde. Tendo em vista o assunto curricular Guerra Fria, optou-se trabalhar pela perspectiva da produção de bens culturais e o funcionamento dos meios de comunicação de massa. Assim sendo, ofertou-se aos alunos as técnicas utilizadas pela publicidade e propaganda, como a utilização de imagens, construção de textos, análise de sua finalidade e o público a que se destina. Desta maneira, buscou-se por desnaturalizar os ideais vendidos em campanhas publicitárias e de propaganda, gerando um posicionamento crítico ante a produção midiática e ao consumismo. Em mãos com as ferramentas acima citadas, o alunado pôde melhor refletir e analisar as propagandas utilizadas por EUA e URSS no período da Guerra Fria. Além disto, durante a referida intervenção, foram utilizadas de postagens fictícias de perfis representando Estados Unidos e União Soviética, trazendo-se para sala de aula um linguajar extremamente familiar do corpo discente. Palavras-chave: Guerra fria, Ensino de História, Publicidade e Propaganda. Resumen Este trabajo es un relato de experiencia acerca de una intervención realizada en las clases de historia de la Escuela Don Bosco, ubicada en el barrio de Casa Amarela de Recife. En concreto, las divisiones del noveno año del turno de la tarde. Teniendo en 1 Graduado em Comunicação Social com habilitação em Publicidade e Propaganda pela AESO Barros Melo.

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PUBLICIDADE, PROPAGANDA E GUERRA FRIA: UM RELATO DE

EXPERIÊNCIA NO ENSINO DE HISTÓRIA.

Sílvio Ricardo Gouveia Cadena1

Universidade Federal Rural de Pernambuco - Graduando em História

[email protected]

Resumo

O trabalho em questão trata-se de um relato de experiência acerca de uma intervenção

realizada nas aulas de História da Escola Dom Bosco, localizada no bairro de Casa

Amarela, em Recife. Em específico, as turmas do 9º ano do turno da tarde. Tendo em

vista o assunto curricular Guerra Fria, optou-se trabalhar pela perspectiva da produção de

bens culturais e o funcionamento dos meios de comunicação de massa. Assim sendo,

ofertou-se aos alunos as técnicas utilizadas pela publicidade e propaganda, como a

utilização de imagens, construção de textos, análise de sua finalidade e o público a que se

destina. Desta maneira, buscou-se por desnaturalizar os ideais vendidos em campanhas

publicitárias e de propaganda, gerando um posicionamento crítico ante a produção

midiática e ao consumismo.

Em mãos com as ferramentas acima citadas, o alunado pôde melhor refletir e analisar

as propagandas utilizadas por EUA e URSS no período da Guerra Fria. Além disto,

durante a referida intervenção, foram utilizadas de postagens fictícias de perfis

representando Estados Unidos e União Soviética, trazendo-se para sala de aula um

linguajar extremamente familiar do corpo discente.

Palavras-chave: Guerra fria, Ensino de História, Publicidade e Propaganda.

Resumen

Este trabajo es un relato de experiencia acerca de una intervención realizada en las

clases de historia de la Escuela Don Bosco, ubicada en el barrio de Casa Amarela de

Recife. En concreto, las divisiones del noveno año del turno de la tarde. Teniendo en

1 Graduado em Comunicação Social com habilitação em Publicidade e Propaganda pela AESO Barros

Melo.

cuenta el tema del plan de estudios de la Guerra Fría, he optado por trabajar desde la

perspectiva de la producción de bienes culturales y el funcionamiento de los medios de

comunicación. Por lo tanto, se ha ofrecido a los estudiantes las técnicas utilizadas por la

publicidad, y el uso de las imágenes, la construcción de textos, análisis de su propósito y

el público que se pretende. De esta manera, se trató de deconstruir la venta ideales en las

campañas de publicidad y propaganda, generando una posición crítica ante la producción

y el consumo de medios.

En la mano con las herramientas mencionadas anteriormente, el alumnado podría

reflejar mejor y analizar los anuncios utilizados por los Estados Unidos y la Unión

Soviética durante la Guerra Fría. Además, durante esa intervención, utilizaron perfiles

ficticios en redes sociales que representan los Estados Unidos y la Unión Soviética,

trayendo en las aulas un lenguaje muy familiar del alumnado.

Palabras clave: la Guerra Fría, Enseñanza de la Historia, Publicidad.

Introdução

Antes de adentrarmos o relato de experiência acerca da intervenção sobre Guerra

Fria, que fora aplicada nas turmas do 9º, vale ressaltar em que pilares estava apoiada, no

caso, o projeto O Presente Como Tema: Contando Histórias Por Meio de Personagens

Digitais.

A partir da realidade experimentada no PIBID, no ano de 2014, durante as aulas

de História da Escola Dom Bosco, da rede estadual de educação, localizada no bairro de

Casa Amarela, em Recife, algumas demandas do alunado foram percebidas. A primeira

delas, a vontade dos alunos em serem ouvidos e expressarem suas opiniões, já a segunda,

estava diretamente ligada na necessidade de se abordar os assuntos estudados de forma

mais dinâmica, renovando o currículo de História.

Para isto, Optou-se pelo uso de temáticas relativas às suas vivências, além da

apropriação do linguajar da web e criação de perfis de personagens históricos (reais ou

fictícios) em redes sociais. Com a utilização de tais temáticas, nos mais distintos períodos,

como o lixo, a escola e a propaganda, visou-se trazer questões relativas ao presente como

forma de problematizá-lo historicamente e despertar criticidade ao seu meio.

Outro fato contributivo para o uso do linguajar midiático está no fato de que

vivemos em uma sociedade de massa e de consumo, onde o contato intenso com os meios

de comunicação produz impactos sociais expressos em sala de aula. Desta forma,

propusemos dar um caráter pedagógico ao massmedia. Como no relato de experiência

presente neste trabalho.

Assim, a escolha pela criação de um espaço digital para a execução do projeto,

a homepage do Historbook (http://www.historbook.blgspot.com), foi de grande

importância. A página em questão teve a função de abrigar os recursos didáticos

utilizados em sala, bem como serviu de um local para avaliar o conhecimento que fora

experimentado.

O objetivo da intervenção, bem como de todo o projeto, era trazer ao corpo

discente temas candentes e socialmente vivos. Os saberes históricos não resultam apenas

da experiência escolar com a disciplina, estão no cotidiano, na vivência de alunos e alunas

com sua comunidade, nos meios de comunicação etc. Segundo Cerri (2011 p.44), os

conteúdos das grades curriculares não garantiriam de forma imperiosa a aprendizagem do

corpo discente.

[...] o ensino escolar de historia, portanto, não é dar algo a quem não tem, não

é dar saber ao ignorante, mas é gerenciar o fenômeno pelo qual os saberes

históricos são colocados em relação, ampliados, escolhidos e modificados.

Nada pode ser mais prejudicial para isso do que uma tábua inflexível de

conteúdos selecionados previamente e fora da relação educativa. (CERRI,

2011, p.69).

Desta maneira, a abertura à temáticas de maior apelo possibilitam o acesso a um

saber histórico mais sensível.

As OCEM (2006, p.65), em seu texto, nos aponta a forma como a velocidade das

informações e dos meios de comunicação termina por afetar nossos jovens em seus

valores e em sua formação identitária. Assim sendo, trazer a baila o funcionamento dos

meios de comunicação de massa, as técnicas utilizadas pela publicidade e propaganda e

a Indústria Cultural, é de grande valia para a leitura de mundo dos discentes. Pois desta

forma, bem como recomendam o PCN+(2002 p.74), auxiliá-los na formação crítica e na

análise/interpretação de fontes documentais.

Outro importante ponto para considerarmos ao tratarmos da produção de bens

culturais nesta intervenção diz respeito ao consumo. Nas recentes décadas de 2000 e 2010,

no Brasil, houve uma grande ascensão econômica e vários indivíduos passaram a ter

acesso ao crédito e ao consumo. Muitos destes são pais de alunos e alunas que passaram

a gozar de bens que antes seriam tidos como artigos de luxo. Desta forma, tornam-se

público alvo de um mercado ávido por lucros. Sobre o acesso ao consumo, Morin (2002)

afirma,

[...]Mas, sobretudo, os lazeres abrem os horizontes do bem estar, do consumo

e de uma nova vida privada. A fabricação em série, a venda a crédito abrem

portas para os bens industriais, para a limpeza do lar com aparelhos

eletrodomésticos, para os fins de semana motorizados. É então possível

começar a participar da civilização do bem-estar, e essa participação

embrionária no consumo significa que o lazer não é mais apenas o vazio do

repouso e da recuperação física e nervosa; não é mais a participação coletiva

na festa, não é tanto a participação nas atividades familiares produtivas ou

acumulativas, é também, progressivamente, a possibilidade de ter uma vida

consumidora.

O consumo de produtos se torna, ao mesmo tempo, o autoconsumo da vida

individual. Cada um tende não mais a sobreviver na luta contra a necessidade,

não mais a se enroscar no lar familiar, não inversamente, a consumir sua vida

na exaltação, mas a consumir sua própria existência. As massas têm acesso, no

quadro de um lazer determinado, pelos desenvolvimentos técnicos, aos níveis

de individualidade já atingidos pelas classes médias. (MORIN, 2002, p.68)

A discussão acerca da Indústria Cultural, fruto da intervenção, apesar de tratar de

algo relativo às experiências do alunado, manteve relação direta com o conteúdo

programático da disciplina, no caso, A Guerra Fria. A ideia de apresentar os mecanismos

de funcionamento do mass media foi de possibilitar aos discentes uma reflexão sobre seu

presente e uma analise mais aprofundada das propagandas utilizadas por EUA e URSS

no período da Guerra Fria.

Sonhos de consumo, consumidos por sonhos.

Qual é o seu sonho? Esta pergunta fora realizada inicialmente a cada aluno e aluna

presente durante a intervenção. Uma calça jeans da marca tal, uma bolsa da marca tal, um

celular da marca x. Estas respostas, a maior parte delas na verdade, faziam alusão a um

sonho, não um qualquer, mas sim de consumo. Tal constatação não fora revelada de

imediato, sendo no fim da aula objeto de reflexão.

No início da apresentação dos slides foram expostas as consequências da

revolução industrial. Produtos como as commodities passaram a necessitar de atributos

que os diferenciassem frente aos demais. Assim valores intangíveis e abstratos passaram

a constar em seu valor de venda. Nas sociedades de massa não apenas o que é palpável

viria a ser consumido, a cultura passou a ser compreendida como um bem de consumo

produzido em larga escala e com a definida prioridade de gerar lucro.

As invenções técnicas foram necessárias para que a cultura industrial se

tornasse possível: o cinematógrafo e telegrafo sem fio, principalmente. Essas

técnicas foram utilizadas com frequente surpresa de seus inventores: o

cinematógrafo, aparelho destinado a registrar o movimento, foi absorvido pelo

espetáculo, o sonho e o lazer; o T.S.F., primeiramente de uso utilitário, foi por

sua vez absorvido pelo jogo, a música e o divertimento. O vento que assim

arrasta em direção à cultura é o vento do lucro capitalista. E para o lucro que

se desenvolvem as novas artes técnicas. (MORIN, 2002, p.22)

Ao apresentar peças publicitárias da década de 1960, onde notadamente a mulher

é apresentada como subserviente ao lar e devota a sua família, várias alunas chamaram

logo atenção para aquele fato. Embora já seja possível vermos mulheres ocupando

diversas esferas da vida social nas atuais campanhas publicitárias, o espaço doméstico

continua ainda sendo um local predominantemente feminino. O mass media, sem dúvida

alguma pode e é utilizado como reforçador de determinados valores. Entretanto, segundo

Morin (2002, p.46), não podemos afirmar que a cultura de massa, dentro do universo

capitalista, impõe comportamentos, pois antes de tudo, estaria muito mais preocupada

com sua rentabilidade no mercado. Outra questão problematizadora para as peças

apresentadas seria se elas corresponderiam a realidade do período. Todas as mulheres se

comportariam como aquelas? Neste momento houve grande debate na sala. As mulheres

que hoje elencam as campanhas de cervejas correspondem a todas as mulheres? Esta

segunda questão, inclusive, foi levantada por uma aluna.

Por meio deste ângulo podemos trazer a tona a História Cultural, onde a

publicidade debatida em sala pode ser concebida como uma representação da realidade e

não a realidade de fato. Segundo Chartier (1990, p.19), “tome por objetivo a compreensão

das representações do mundo social, que o descrevem como pensam que ele é ou como

gostariam que fosse”.

Outros questionamentos também foram possíveis de serem realizados ao

analisarmos a campanhas publicitárias no decorrer da intervenção. Grandes estrelas

endossantes como Neymar, Sandy etc. emprestam seus carismas e agregam valores aos

produtos nas peças de TV, jornais e revistas. Mas todos nós, indistintamente, agiríamos

como meros zumbis consumistas passíveis aos apelos dos meios de comunicação?

Certeau (2001, p.44), afirma que apesar de fazermos parte de uma grande massa

marginalizada dos “não produtores de cultura”, não podemos nos enxergar como seres

homogeneizados e padronizados, há resistências no consumo.

Os efeitos padronizadores dos meios de comunicação de massa foram

apresentados em sala, seja na proposição de um dado tipo de beleza, seja na moda, ou até

mesmo na narrativa de novelas e filmes. Segundo Morin,

[...] que modo é possível uma organização burocrática-industrial da cultura.

Essa possibilidade reside, sem dúvida, na própria estrutura do imaginário. O

imaginário se estrutura segundo arquétipos: existem figurinos-modelo do

espírito humano que ordenam os sonhos e, particularmente os sonhos

racionalizados que são os temas míticos romanescos. Regras, convenções,

gêneros artísticos impõem estruturas exteriores as obras, enquanto situações-

tipo e personagens-tipo lhes fornecem as estruturas internas. A análise

estrutural nos mostra que se pode reduzir os mitos a estruturas matemáticas.

Ora, toda estrutura constante pode se conciliar com a norma industrial. A

indústria cultural persegue a demonstração à sua maneira, padronizando

grandes temas romanescos, fazendo clichês dos arquétipos em estereótipos.

(MORIN, 2002, p.26)

Apesar da padronização proposta pela indústria cultural, a mesma se vê diante de

consumidores que tendem a buscar uma personalização, algo próprio. Não sendo à toa a

busca pela customização, que vão desde peças de roupas à adesivagem de automóveis.

Tais usos podem ser concebidos pela ótica de Certeau (2001), com seu conceito de tática,

ao perceber a não passividade do consumidor frente ao produtor. Uma estratégia de

marketing que tenta alimentar o afã por produtos diferenciados, pode ser percebida, por

exemplo, na produção das sandálias Havaianas. Onde a grande quantidade modelos

coloridos sugerem ao consumidor uma ideia de escolher um modelo único. Por meio de

Morin (2002), podemos perceber o paradoxo em que se encontram os grandes produtores.

A Concentração técnico-burocrática pesa universalmente sobre a produção

cultural de massa. Donde a tendência a despersonalização da criação, à

predominância da organização racional de produção (técnica, comercial,

política) sobre a invenção, à desintegração do poder cultural.

No entanto, essa tendência exigida pelo sistema industrial se choca com uma

exigência radicalmente contrária, nascida na natureza própria do consumo

cultural, que sempre reclama um produto individualizado, e sempre novo.

(MORIN, 2002, p.25)

A busca pelo novo, pela invenção criativa, se faz imprescindível para a

manutenção do sistema burocrático-cultural, não sendo incomum a adoção e

pasteurização de ícones da contracultura, como Che Guevara. Ritmos antes tidos como

marginais, com uma nova roupagem, passam a ocupar o mercado pop.

Conforme Morin (2002, p.26), outra característica bastante peculiar na produção

dos meios de comunicação de massa é a simplificação. Por meio dela obras tidas como

de alta cultura ganham ares dicotômicos e maniqueístas, numa luta simplificada entre o

bem e o mal e com um lugar garantido para o happy end. A utilização de fórmulas prontas

chega a ser aplicada nos mais distintos produtos culturais, como novelas, filmes e muitas

vezes, em grupos musicais e bandas, vide a quantidade de duplas sertanejas. Além disso,

Modelos de sucesso no exterior tendem a ser replicados no país.

Figura 012-“Astros teens”

2 Imagem retirada do slide apresentado em sala de aula.

Disponível em: <https://app.box.com/s/gridou1i3zsp5y968ip6> Acesso em dez. 2015.

Fonte: Elaborada pelo autor.

Ao falar do desenvolvimento de aparelhos técnicos que, com o capitalismo, logo

ganharam força e foram incorporados ao mundo do espetáculo, Morin (2002), afirma:

[...]Não há dúvida de que, sem o impulso o espírito prodigioso do espírito

capitalista, essas invenções não teriam conhecido um desenvolvimento tão

radical e maciçamente orientado. Contudo, uma vez dado esse impulso, o

movimento ultrapassa o capitalismo propriamente dito: no começo do Estado

Soviético, Lenin e Trotsky reconheceram a importância social do cinema. A

indústria cultural se desenvolve em todos os regimes, tanto no quadro do

Estado quanto no da iniciativa privada. (MORIN, 2002, p.22)

Desta forma, logo podemos inferir que mesmo em regimes distintos, a produção

cultural em série se faz presente. Em locais onde o Estado é mais forte, como na extinta

União Soviética, a ideologia do estado desempenha grande papel. Já em países com forte

iniciativa privada, a coisa também não ficaria solta, o Estado agiria, ao menos como

polícia. Em ambas formas de administração, o objetivo estaria em atingir o maior número

de indivíduos. (MORIN 2002). Embora com uma análise coerente sobre o papel

desempenhado entre os dois modelos de gestão, o autor em questão parece esquecer o

forte teor ideológico e político contido também na produção capitalista.

Outra pauta levantada e discutida durante a intervenção abordou como os meios

de comunicação como a televisão, jornais e revistas estão presos as suas amarras editoriais

e estas, por sua vez, atendem a uma lógica que ultrapassa a do consumo, ou daquilo que

é “vendível”. Os interesses políticos e ideológicos dos poucos grupos que hegemonizam

o mercado brasileiro de comunicação são os grandes vieses destas produções. Foucher

(2013), aponta que a diversificação dos meios de comunicação e seu pluralismo tenderiam

a ajudar a consolidação da democracia no Brasil, quando na realidade vemos o inverso.

A concentração acaba por gerar quase que um discurso único e longe de ser plural.

Como aceitar que a democracia brasileira se consolide e que continue a

conviver com uma espécie de coronelismo midiático, que usa e abusa do poder

de concentração? Esta é uma questão que poderíamos fazer aos dirigentes e

políticos brasileiros.

Entretanto, na Constituição Brasileira de 1988, ela define no capitulo § 5 que

"os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser

objeto de monopólio ou oligopólio". Todavia, basta consultar os estudos

realizados recentemente sobre este assunto para verificar que a própria

constituição é por vezes usurpada. (FOUCHER, 2013)

As propagandas de origem Norte Americana e Soviética elaboradas durante a

Guerra Fria, utilizadas na intervenção, tinham como objetivo expor, principalmente, suas

similaridades do que suas distinções, principalmente no que se refere ao conteúdo do que

sua plástica. Nas várias representações temáticas foram verificadas semelhanças. Por

exemplo, como na famosa imagem do Uncle Sam- I want you que tinha seu equivalente

soviético.

Figura 02 3- Semelhanças

3 Imagem retirada do slide apresentado em sala de aula.

Disponível em: <http://patriofil.ru/uploads/files/1/_ph/18/2/726068416.jpg>. Acesso em dez. 2015

Fonte: patriofil.ru

Assim como nos E.U.A., no país de regime comunista podemos verificar cartazes

de campanhas publicitárias de alimentos, sapatos e até mesmo cigarros, o que gerou certo

espanto na turma. Pelo que expuseram, não imaginavam campanhas destes tipos de

produtos na URSS. As campanhas soviéticas, muitas vezes, tinha o claro sentido de

estimular a demanda por um dado bem, numa tentativa de regular os estoques

administrados pelo Estado. Contudo, o apelo à subjetividade e valores intangíveis

estavam tão presentes nelas quanto naquelas produzidas pelo capitalismo.

A indústria cultural do Tio Sam, durante o período analisado, não se cansou de

utilizar do entretenimento como forte ferramenta de propaganda política e ideológica.

Seja na produção cinematográfica, com o personagem de James Bond a perseguir os

vilões comunistas, ou na elaboração de histórias em quadrinhos, onde para boa parte de

seus heróis patriotas, os seus inimigos seriam “vermelhos”.

A forma como Stalin aparece na série de cartazes apresentados nos slides

confeccionados para intervenção suscitou algumas observações por parte dos alunos.

Muitos perceberam similaridades com as imagens produzidas pelas campanhas eleitorais

de nossos dias. Na verdade, eles tinham razão. O líder Russo sempre aparece de forma

destacada, ocupando o primeiro do quadro. Sua aura conotava autoridade, mas, no

entanto, estava longe de possuir um ar severo. Por sinal, posar junto a crianças para se

mostrar mais sensível e humano parece ser uma estratégia de sedução utilizada até hoje.

Figura 03 4– Propaganda Soviética

4 Imagem retirada do slide apresentado em sala de aula.

Disponível em: <http://www.sovietposters.ru/pages/025.htm>. Acesso em dez. 2015

Fonte: /www.sovietposters.ru/

As duas grandes potencias mundiais do pós II Guerra, travavam uma tremenda

batalha tecnológica. A corrida espacial pela supremacia do espaço servia como

propaganda tanto para norte americanos, quanto para russos. Tendo em vista elucidar tal

evento, foram confeccionadas postagens na rede fictícia, o Historbook. Segue exemplo

de uma das imagens que foram utilizadas em aula.

Figura 04 5– Postagem URSS no Historbook

5 Imagem retirada do slide apresentado em sala de aula.

Disponível em: <https://app.box.com/s/gridou1i3zsp5y968ip6> Acesso em dez. 2015

Fonte: Elaborada pelo autor.

Do processo de avaliação.

A avaliação da intervenção aplicada se deu em dois momentos distintos. O

primeiro deles era verificado por meio da participação do debate em sala de aula. Os

alunos tomaram iniciativa para se exporem em diversos momentos durante a intervenção

e apresentaram suas considerações a respeito do que foi visto. Vale salientar que em

nenhum momento houve qualquer tipo de ofensa por conta do consumo, a ideia foi

justamente lançar reflexões acerca desta temática e trazer uma visão mais crítica sobre

funcionamento do mass media. Já o segundo momento avaliativo se deu em espaço

digital. Lá, os discentes acessaram a página do projeto e encontraram um questionário

contendo quatro questões subjetivas. As perguntas eram efetuadas com o auxílio dos

próprios personagens digitais e versavam sobre o conteúdo experimentado em sala, sem

qualquer apelo para que decorassem nomes ou datas. A concepção das questões buscou

averiguar a aplicabilidade do conhecimento e verificar se o alunado conseguiu

compreender a base do funcionamento da indústria cultural.

1). Por qual razão a disputa entre EUA e URSS se chama guerra fria?

2). Por qual motivo, a corrida espacial que envolveu EUA e URRS, foi utilizada como

forma de propaganda??

3). Por qual razão pode-se afirmar que a publicidade vende algo além de um produto?

Exemplifique?

4). Cite exemplos de propagandas soviéticas e americanas que tenham um teor

ideológico.

Questões retiradas de https://docs.google.com/forms/d/1WsUACrUug--l1oKDG0mQniFyh3J-

e2Cgd5oobRsGw68/viewform

O questionário foi respondido via internet no período de uma semana. 20 alunos

dos 9º anos (C e D), de aproximadamente 40 que assistiram à intervenção, responderam

de maneira satisfatória o questionário. Este resultado, de maneira inicial, não pareceu algo

animador. Entretanto, vale ressaltar, que o exercício em questão foi respondido fora do

espaço escolar e sem nenhum tipo de bonificação extra. Além disto, aconteceram vários

retornos positivos por parte dos alunos.

Conclusão

Por meio da vivência oriunda do projeto e, da intervenção em especifico, foi

possível perceber o quanto se faz necessário está atento aos alunos, ouvi-los. O que eles

conversam? O que assistem? O que gostam de fazer? Quais problemas lhes afligem?

Buscar compreender o contexto em que seu aluno está inserido é candente. Sim, é

necessário sairmos de nossa zona de conforto.

Ao tratar de uma temática relativa a publicidade, propaganda e ao consumo, é

imprescindível estarmos livres de quaisquer tipos de preconceitos. Não nos cabe julgar o

fato de uma adolescente humilde querer um celular de última geração. Mais uma vez,

devemos atentar em qual contexto estamos inseridos. Os meios de comunicação de massa

conclamam todos, indistintamente, a consumir.

Músicas tidas por nós docentes como indecorosas, não podem e não devem ficar

a escanteio, esta é justamente uma oportunidade de problematizá-la. Assim como a

música, são possíveis inúmeros exemplos que nós, do alto de nosso pedestal acadêmico,

recusamo-nos a olhar.

Os êxitos obtidos com a intervenção junto aos alunos, não podem ser mensurados

quantitativamente. Como pontuar os debates acalorados, as palavras elogiosas à aula e

um novo olhar sobre a disciplina? Enfim, buscou-se gerar um posicionamento mais crítico

e reflexivo ante a produção midiática e ao consumismo que, por sua vez, auxiliou tornar

o conteúdo histórico mais sensível e próximo a realidade destes alunos.

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