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Que a Justiça faça justiça, apesar da mídia

NO BRASIL, VÁRIAS categorias de trabalhadores estão em greve. Na América Latina, movimentos popu-lares do Paraguai resistem ao gol-pe parlamentar que derrubou a de-mocracia e privilegiou as trans-nacionais do agronegócio contra os pequenos lavradores. Em ou-tros países, comunidades indíge-nas e movimentos populares apro-fundam um caminho de libertação que se denomina bolivariano por-que se realiza a partir da educação e da valorização das culturas autóc-tones. Desde o seu início, esse pro-cesso social e político contou com a participação de muitos pastores e cristãos de várias Igrejas.

Em 1968, na 2ª conferência do episcopado latino-americano em Medellin, os bispos católicos do continente afi rmaram que a Igre-ja deveria ser libertadora “de toda a humanidade e de cada ser huma-no por inteiro” (Cf. Conclusões de Medellin, 5, 15). Foi obedecendo a essa inspiração que, em nome da fé e para realizar no mundo o pro-jeto divino de justiça e paz, mui-tos irmãos e irmãs arriscaram a vi-da e muitos seguiram a Jesus no martírio.

Assim como nos primeiros sé-culos do cristianismo, também nas últimas décadas, a Igreja latino-americana foi agraciada com o tes-temunho de vida e doação desses numerosos mártires da caminhada de libertação.

A Igreja de Goiás, Goiânia e de todo o Centro-oeste pode se orgu-lhar de ter em sua história recen-te gerado e fortalecido vários des-ses irmãos, testemunhas do Evan-gelho. Entre eles, brilha a fi gu-ra do padre Francisco Cavazzutti que, vítima de um atentado à bala, resistiu e está vivo. Embora cego, continua fi rme no testemunho da justiça e da paz.

Nessa semana, celebram-se os 25 anos do atentado que o padre Chi-co sofreu quando, na noite de 27 de

agosto de 1987, saía de uma cele-bração em uma capela da paróquia de Mossâmedes. A mão que atirou a bala foi de um pistoleiro profi s-sional, mas a cabeça que ordenou o crime é de um sistema que con-tinua forte e livre na opressão aos empobrecidos e na destruição da natureza.

Nesses dias, o padre Francis-co Cavazzutti está de volta a Goi-ás e Goiânia. Vários eventos recor-dam o seu martírio e agradecem a Deus sua fi delidade. Entretan-to, a homenagem mais verdadeira que se pode fazer a ele e tantos ou-tros que deram sua vida pela justi-ça é não deixar que morra o mode-lo de Igreja pelo qual Chicão e tan-tos companheiros e companheiras consagraram a vida e deram tudo de si. Nosso irmão profeta, Dom Pedro Casaldáliga nos ensinou que uma Igreja que esquece ou deixa de celebrar seus mártires está es-quecendo ou ignorando o evange-lho de Jesus.

Na mesma data do atentado so-frido pelo padre Chico, em 1999, no Recife, falecia Dom Hélder Câ-mara. Poucos dias antes, um jorna-lista lhe perguntava se ele tinha al-cançado os objetivos a que dedicou toda a sua vida, no serviço aos mais empobrecidos. Dom Hélder res-pondeu sem hesitar: “Não! Conse-gui muito pouco, mas prometo de-dicar até o último suspiro de mi-nha vida por essa causa que foi a de Jesus, meu mestre e é a de to-dos os que têm fome e sede de jus-tiça”. Nesse mesmo dia, em 2007, também partiu desse mundo, Dom Luciano Mendes de Almeida, arce-bispo de Mariana, pastor compro-metido com o testemunho do amor de Deus.

É urgente recordar esses profe-tas e agradecer a Deus por termos ainda conosco irmãos como o pa-dre Francisco Cavazzutti. Embora frágil, ele se rejuvenesce cada vez mais no testemunho pelo qual con-sagrou sua vida. Ele e tantos ou-tros irmãos e irmãs da caminhada interpelam a nossa Igreja para que não se deixe seduzir pela tentação do acomodamento, pelo gosto do poder e pela miragem do prestígio mundano.

Quando a Igreja passa a olhar apenas para si mesma e se preocu-pa apenas com suas atividades in-ternas, se torna idólatra. Deixa de ser sinal de Jesus Cristo e apresen-ta uma imagem mesquinha e in-digna de Deus. Ainda bem que, nas periferias, com ou sem apoio ofi -cial, as comunidades e pastorais proféticas continuam obedecen-do a voz do Espírito que sopra on-de quer. Como disse Paulo, “onde houver espírito de liberdade, aí es-tá o Espírito de Deus” (2 Cor 3, 17).

Marcelo Barros é monge beneditino e autor de vários livros, entre os quais A Vida se torna Aliança, (Como orar

ecumenicamente os Salmos), Ed. CEBI-Rede da Paz, 2005.

Marcelo Barros

Memória insurgente

crônica Ademar Bogo

O PRESIDENTE do Supremo Tribu-nal Federal (STF), Ayres Britto, con-sidera necessário dar uma resposta enérgica à impunidade aos escânda-los de corrupção. Para ele, a Ação Pe-nal 470, (mensalão do PT para a mí-dia tucana), é uma ótima oportunida-de para o Supremo passar essa men-sagem ao país. Não há nenhuma ob-servação contrária a essa preocupa-ção do presidente do Supremo. Ao contrário, é merecedora de elogios.

No entanto, acreditamos que o pre-sidente Ayres Britto sabe que o com-bate à impunidade da corrupção, in-crustada histórica e estruturalmente no Estado brasileiro, não se restringe à condenação dos acusados presen-tes nos bancos dos réus. Há que pre-valecer a Justiça. Esta, nos parece, exige um processo que respeite ple-namente as regras do jogo, imparcial, livre de qualquer interferência exter-na. Um julgamento em que seja asse-gurado, completamente, o direito de defesa dos réus. E mais. Que seja as-segurado o direito de presunção de inocência dos que são acusados.

Ora, se são essas algumas premis-sas para que a Justiça faça justiça, in-dependente do resultado julgamento, a “imagem da corte está em risco e, com ela, a do Poder Judiciário”, aler-ta Renato Janine Ribeiro, professor titular de Ética e Filosofi a Política na Universidade de São Paulo.

Em agosto de 2007 o ministro do STF Ricardo Lewandowski denun-ciou que “a imprensa acuou o Supre-mo” para que ocorresse a abertura da Ação Penal contra os acusados. “Su-premo votou com a faca no pesco-ço, afi rma Lewandwski”, foi a man-chete de alguns jornais. Daquela da-ta aos dias de hoje, a mídia identifi -cada que sempre se opôs ao governo petista, não esperou pelo julgamen-to: condenou sumariamente os réus. O direito de presunção de inocên-cia foi posto na lata do lixo pela mí-dia corporativa. O jornalista Jânio de Freitas, da tucana Folha de S. Pau-lo, chegou a escrever: “O julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal é desnecessário. Entre a insi-nuação mal disfarçada e a condena-ção explícita, a massa de reportagens e comentários lançados agora, sobre o mensalão, contêm uma evidência condenatória que equivale à dispensa dos magistrados e das leis a que de-vem servir os seus saberes”.

Partindo do mesmo caso, a Ação Penal 470, o advogado constitucio-nalista Pedro Estevam Serrano con-clui que no Brasil há dois tribunais: um do Estado, outro da mídia. Só falta, agora, os editoriais da mídia tucana exigirem que ambos sejam unifi cados e a corte togada se mude para as dependências da Folha, Es-tadão ou da Globo.

A postura dessa mídia não sur-preende ninguém. Partidarizada e sem compromissos com a verdade e com a ética, manipula a informa-ção em prol dos seus interesses par-ticulares. Ridículo é alguns minis-tros se submeterem a essa pressão da mídia e aceitarem, passivamente, a pressão de quem coloca a faca em seu pescoço. Patética é a fi gura do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso que escreveu nos jornais exigindo a condenação antes mes-mo dos advogados dos réus apre-sentarem a defesa dos mesmos.

Prevalecem, ainda hoje, incerte-zas e inseguranças sobre os rumos do julgamento. O próprio ministro Mar-co Aurélio Mello faz críticas à condu-ção do julgamento. A decisão do Su-premo de fragmentar o julgamento em vez de cada ministro ler seu voto sobre o processo de uma só vez, defi -nida durante o julgamento, pegou de surpresa tanto o ministro Lewando-wski, na condição de revisor do vo-to do relator, quanto os advogados de defesa dos réus. Alguns advoga-dos chegaram a alertar que a decisão adotada era uma aberração e confi -gurava um julgamento de exceção.

Pressionado pela mídia, que exigiu a realização do julgamento nos meses que antecedem as eleições de 2012, a cada dia surgem novas interrogações e propostas de mudanças das regras. Algumas dessas difi culdades são na-turais de um processo longo e com-plexo. Outras são de correntes da pressão a que foi submetido o STF.

Superadas essas e outras difi cul-dades – inclusive os fatos e notícias que diariamente minam a autorida-de intelectual e moral dos membros da Corte – esperamos que o STF fa-ça justiça e continue sinalizando sua disposição de combater a corrupção no país.

Casos é que não faltam. O chama-do mensalão tucano, tratado de for-ma diferenciada pelo STF e pelo Mis-

tério Público Federal (MPF), pode ser também, ministro Ayres Britto, um exemplo de combate a corrupção. Inexplicavelmente o banqueiro Da-niel Dantas – fi gura central nas pri-vatizações promovidas pelo governo FHC – jamais foi chamado para ex-plicar sua vinculação com os esque-mas do Marcos Valério. E, certamen-te, o presidente do STF, Ayres Britto, e o Procurador Geral da República, Roberto Gurgel, desconhecem a exis-tência do livro A Privataria Tucana, do jornalista Amaury Ribeiro Jr. Far-tamente documentado, receamos que Ayres Britto somente terá tempo pa-ra lê-lo após sua aposentadoria. Já o Procurador Gurgel, pela qualidade da peça acusatória que apresentou no julgamento da AP 470, imaginamos, tem uma enorme difi culdade para li-dar com provas documentais, prefe-rindo condenações sem provas e de-nuncias baseadas no achismo de tes-temunhas. Afi nal, “como quase sem-pre ocorre, os chefes das quadrilhas não aparecem na execução dos cri-mes”, afi rmou o Procurador Gurgel.

Diante das fartas provas apresen-tadas pelo jornalista Amaury Ribeiro Jr. e desse sagaz raciocínio do Rober-to Gurgel, deduzimos que o José Ser-ra, uma das fi guras centrais do referi-do livro, não pode ser o chefe da qua-drilha que se locupletou com a priva-taria tucana. Quem será então?

de 30 de agosto a 5 de setembro de 20122editorial

GamaA tampa da caixa

Superadas essas e outras difi culdades, esperamos que o STF faça justiça e continue sinalizando sua disposição de combater a corrupção no país

A esperança ainda está na caixa embora a tampa esteja aberta até a metade

A Igreja latino-americana foi agraciada com o testemunho de vida e doação desses numerosos mártires da caminhada de libertação

opinião

ENCONTRAMOS NO MITO de Pandora, do período pré-socrático, escrito pelo poeta Hesíodo por volta de 800 anos antes de Cristo, uma ajuda para entender as polêmicas ecológicas nos tempos atuais.

Trata o mito das desavenças entre Zeus e Prometeu, quando o primei-ro imbuiu Hefesto, o deus da técnica, de criar uma bela mulher e levá-la para a assembleia dos deuses de onde deveria ser enviada, com uma cai-xa lacrada, para se juntar a Prometeu. Ao vê-la, os deuses deram-lhe o no-me de Pandora (aquela que tem todos os dons). Prometeu, o deus do fogo, não se impressionou como esperado e não aceitou o presente de Zeus.

No entanto, Epimeteu (aquele que refl ete tarde demais), irmão do deus do fogo, tomou Pandora como sua esposa e guardou a caixa. Um certo dia, julgando nada ter de perigoso nela, o casal decidiu destampá-la. Surpre-endentemente começaram a sair as maldades lá depositadas, como a fo-me, a peste, os vícios, a inveja, insanidades e perversidades de todos os ti-pos. Percebendo o que estava acontecendo, o casal fechou a caixa e salvou a única coisa que ainda restava dentro dela, prestes a voar, a esperança.

A relação da caixa de Pandora com a situação de nosso planeta é em-blemática. A tampa da terra que, pela perversidade humana, em nome do desbravamento e da civilização fora retirada e, no lugar das fl orestas e da biodiversidade, apareceram a morte dos rios e dos lagos, a desertifi cação, os solos envenenados e contaminados, a erosão e a perda de milhares de espécie de plantas e sementes; coloca a esperança em risco, prestes a vo-ar para o além.

É verdade que, como Epimeteu, a humanidade sem distinção de classes, por ignorância, falta de normas, capricho, ganância ou por “refl etir tarde demais”, contribui de alguma forma, para soltar as perversidades e aten-tar contra a vida, mas a briga atual é entre aqueles que querem fechar e os que querem escancarar a tampa da caixa.

Aristóteles ao expor seus princípios éticos declarou a “Justa Medida” como referência. Mas qual é ela em se tratando das relações com a nature-za? As polêmicas em torno do Código Florestal em discussão, cuja peque-na disputa é por metros às margens dos rios e nas encostas, impede de ver que as dívidas com a natureza estão demarcadas em milhares de quilôme-tros.

O IBGE divulgou recentemente um estudo sobre a perda dos biomas re-conhecendo que no Brasil já perdemos 88% do bioma da Mata Atlântica; 54% do Pampa Gaúcho, 49,1% do Cerrado; 45,6 da Caatinga; 15% do Panta-nal e 14,83% da Amazônia que por sua vez, guarda ainda 70% da água doce dos rios brasileiros. Logo, a falta da aplicação da justa medida fez com que, aqui e no planeta todo, nos últimos 300 anos, 50% das fl orestas tenham si-do exterminadas.

Junto com a devastação dos biomas vem a desertifi cação a perda e con-taminação da água doce restante. Hoje, cerca de 20% de toda área do pla-neta Terra já está desertifi cada. A contaminação das águas com esgotos não tratados e com o uso de agrotóxicos compromete cada vez mais os mananciais. A ONU alerta que, para cada litro de água contaminada, con-taminam-se mais 8 litros. No Brasil, 51% do abastecimento de água já é feito com águas subterrâneas retiradas dos 200 mil poços tubulados e das mais de um milhão de cacimbas de menor profundidade. A continuar o atual padrão de consumo os cientistas alertam que no ano de 2050, o con-sumo de água aumentará em 55%; considerando que no mundo cerca de 2,3 bilhões de pessoas já sentem e sofrem com a falta d´água; os dados apenas indicam o que nos espera.

Se considerarmos a Justa Medida em números os defensores do desfl o-restamento deveriam contabilizar os prejuízos do lado oposto. Mas não se tratam de prejuízos fi nanceiros, trata-se de perdas de aliados, de compa-nhia e apoio para que a espécie humana, ignorante, apesar de toda a inteli-gência, possa continuar a exibir a sua superioridade.

A esperança ainda está na caixa embora a tampa esteja aberta até a me-tade. Se é verdadeiro o dito popular de que “a esperança é a última que aca-ba”, é hora de fechar o vão da tampa antes que a esperança voe pelos ares.

Ademar Bogo, fi lósofo, escritor e agricultor.

Editor-chefe: Nilton Viana • Editores: Aldo Gama, Cristiano Navarro, Renato Godoy de Toledo • Subeditor: Eduardo Sales de Lima • Repórteres: Aline Scarso, Michelle Amaral, Patricia Benvenuti • Correspondentes nacionais: Joana Tavares (Belo Horizonte – MG), Pedro Carrano (Curitiba – PR), Pedro Rafael Ferreira (Brasília – DF) • Correspondentes internacionais:

Achille Lollo (Roma – Itália), Baby Siqueira Abrão (Oriente Médio), Claudia Jardim (Caracas – Venezuela), Marcio Zonta (Peru) • Fotógrafos: Carlos Ruggi (Curitiba – PR), Douglas Mansur (São Paulo – SP), Flávio Cannalonga (inmemoriam), João R. Ripper (Rio de Janeiro – RJ), João Zinclar (Campinas – SP), Joka Madruga (Curitiba – PR), Leonardo Melgarejo (Porto Alegre – RS), Maurício Scerni (Rio de Janeiro – RJ) • Ilustradores: Latuff, Márcio Baraldi, Maringoni • Editora de Arte – Pré-Impressão: Helena Sant’Ana • Revisão: Jade Percassi • Jornalista responsável: Nilton Viana – Mtb 28.466 • Administração: Valdinei Arthur Siqueira • Programação: Equipe de sistemas • Assinaturas: Francisco Szermeta • Endereço: Al. Eduardo Prado, 676 – Campos Elíseos – CEP 01218-010 – Tel. (11) 2131-0800/ Fax: (11) 3666-0753 – São Paulo/SP – [email protected] • Gráfi ca: Folha Gráfi ca • Conselho Editorial: Angélica Fernandes, Alipio Freire, Altamiro Borges, Aurelio Fernandes, Bernadete Monteiro, Beto Almeida, Camila Dinat, Cleyton W. Borges, Dora Martins, Frederico Santana Rick, Igor Fuser,José Antônio Moroni, Luiz Dallacosta, Marcela Dias Moreira, Marcelo Goulart, Maria Luísa Mendonça, Mario Augusto Jakobskind, Milton Pinheiro, Neuri Rosseto, Paulo Roberto Fier, Pedro Ivo Batista, René Vicente dos Santos, Ricardo Gebrim, Rosane Bertotti, Sávio Bones, Sergio Luiz Monteiro, Ulisses Kaniak, Vito Giannotti • Assinaturas: (11) 2131– 0800 ou [email protected] • Para anunciar: (11) 2131-0800

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de 30 de agosto a 5 de setembro de 2012

povos, a transparência nos assuntos públicos. Chama atenção, nesse contexto, a unidade entre vertentes dis-tintas no campo daqueles que batalham por um “outro mundo”, em oposição à barbárie neoliberal. Assange se projetou, nos anos recentes, como referência importante para uma constelação de ativistas que cultuam o espon-taneismo político, adotando uma postura de indiferença pelos processos eleitorais e rejeição aos partidos e mo-vimentos organizados (inclusive de esquerda). Muitos, entre eles, subscrevem a ideia anarquista de que é possí-vel “mudar o mundo sem tomar o poder”. Já a existência de um governo progressista no Equador, assim como em outros países latino-americanos, se deve a um processo de mobilização social que tem como foco a conquista do poder de Estado para colocá-lo a serviço da transforma-ção da sociedade.

O abrigo concedido pelo presidente Rafael Correa a As-sange é uma prova viva de que a participação na política institucional faz avançar a luta e de que, sim, é possível impulsionar, a partir do Estado, mudanças em favor dos 99% da humanidade oprimidos pelo capitalismo.

Assange e os 99%UM NOME HOJE serve de divisor de águas entre a tru-culência política do imperialismo e a defesa do convívio humano civilizado: Julian Assange. A partir da ameaça das autoridades britânicas de invadir a embaixada equa-toriana em Londres para pôr as mãos no fundador do WikiLeaks e entregá-lo à Suécia, rumo a uma quase certa extradição para os EUA, articulou-se uma ampla aliança de governos, movimentos sociais e personalidades públi-cas, em favor do direito de asilo e das leis internacionais que garantem a inviolabilidade das sedes diplomáticas. A corrente solidária começou pela imediata tomada de posi-ção da Alba, reforçou-se com o apoio unânime da Unasul e culminou com a votação histórica na OEA, endossando a posição do Equador.

A esta altura, o episódio já transcendeu o drama de um indivíduo – ameaçado pela ousadia de divulgar os segredos sujos da política externa dos EUA – ou mesmo de um pequeno país sul-americano disposto a afrontar a prepotência do Reino Unido. O que se vê, na prática, é a articulação de uma frente única global em torno de valo-res universais: o Direito Internacional, a soberania dos

Gama

instantâneo

Igor Fuser

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EM 2010 O MUNDO foi surpreendido pela divulgação de uma série de documentos comprobatórios de que muitos governos e autoridades dizem uma coisa e fazem outra. A máscara caiu. Todos viram que o rei estava nu.

O site WikiLeaks, monitorado pelo australiano Julián Assange, publicou documentos secretos que deixaram governos e autoridades envergonhados, sem argumen-tos para justifi car tantos abusos e imoralidades.

Maquiavel já havia afi rmado, no século 16, que a polí-tica tem pelo menos duas caras. A que se expõe aos olhos do público e a que transita nos bastidores do poder.

Bush e Obama admitiam torturas no Iraque, no Afega-nistão e na base naval de Guantánamo, enquanto acusa-vam Cuba, na Comissão de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, de maltratar prisioneiros...

O WikiLeaks nada inventou. Apenas se valeu se fontes fi dedignas para coletar informações confi denciais, em geral constrangedoras para governos e autoridades, e di-vulgá-las. Assim, o site desempenhou importante papel pedagógico. Hoje, as autoridades devem pensar duas ve-zes antes de dizer ou fazer o que as envergonhariam, ca-so caísse em domínio público.

Apesar da saia justa, o cinismo dos governos pare-ce não ter cura. Em vez de admitirem seus erros e tra-móias de bastidores, preferem bancar a raposa da fábula de Esopo, divulgada por La Fontaine. Já que as uvas não podem ser alcançadas, melhor alegar que estão verdes...

Acusam Julián Assange – não de mentir ou divulgar documentos falsos – mas de haver praticado estupro de prostitutas, na Suécia.

Ora, com todo respeito à mais antiga profi ssão do mundo, sabemos todos que prostitutas se entregam a quem lhes paga. E por dinheiro – ou ameaça de extra-dição quando são estrangeiras - algumas delas podem ser induzidas a fazer declarações inverídicas, como a es-drúxula acusação de estupro.

Muito estranho, considerando que relações com pros-titutas muitas vezes parecem um estupro consentido. O cliente paga pelo direito de usar e abusar de um corpo desprovido de reciprocidade – sem afeto e libido. Daí a sensação de fraude que o acomete quando deixa o pros-tíbulo. Perdeu o sêmen, o dinheiro... e não encontrou o que procurava – amor.

De fato, governos e autoridades denunciados pelo WikiLeaks é que estupraram a ética, a decência, a so-berania alheia, acordos e leis internacionais. Assange e seu site foram apenas o veículo capaz de tornar mun-dialmente transparentes documentos contendo infor-mações mantidas sob rigoroso sigilo.

Punidos deveriam ser aqueles que, à sombra do poder, conspiram contra os direitos humanos e a legislação in-ternacional. No mínimo, deveriam fazer autocrítica pú-blica, admitir que abusaram do poder e violaram prin-cípios áureos, como foi o caso de ministros brasileiros que se deixaram manipular pelo embaixador dos EUA, em Brasília.

Assange se encontra refugiado na embaixada do Equador, em Londres. O governo de Rafael Correa já lhe concedeu o direito de asilo no país latino-america-no. Porém, o governo britânico, do alto de sua majestá-tica prepotência, ameaça prendê-lo caso ele saia da em-baixada a caminho do aeroporto, onde embarcaria pa-ra Quito.

Nem a ditadura brasileira na Operação Condor che-gou a tanto em relação a centenas de perseguidos refu-giados em embaixadas de países do Cone Sul. Por isso, a OEA, indignada, convocou uma reunião de seus associa-dos para tratar do caso Assange. Este teme ser preso ao deixar a embaixada e entregue ao governo sueco que, em seguida, o poria em mãos dos EUA, que o acusam de es-pionagem – crime punido, pelas leis estadunidenses, in-clusive com a pena de morte.

Assange não se nega a comparecer perante a Justiça sueca e responder pela acusação de estupro. Teme ape-nas ser vítima de uma cilada diplomática e acabar em mãos do governo mais desmoralizado pelo WikiLeaks – o que ocupa a Casa Branca.

O caso Assange já prestou inestimável serviço à mo-ralidade global: demonstrou que, debaixo do sol, não há segredos invioláveis. Como diz o evangelho de Lucas(12, 2 e 3) “nada há encoberto que se não venha a des-cobrir; nem oculto, que se não venha a saber. Por isso o que dissestes nas trevas, à luz será ouvido; o que fa-lastes ao ouvido no interior da casa, será proclamado dos telhados.”

Frei Betto é escritor, autor de A obra do Artista – uma vi-são holística do Universo (José Olympio), entre outros livros.

Frei Betto

O caso Assange

Governos e autoridades denunciados pelo WikiLeaks é que estupraram

gro, o sertanejo, o índio, o camponês, gays e lésbicas e tantos outros foram e seguem sendo invisibilizados pe-la mídia.

Temos uma lei velha e que representa valores velhos. São 50 anos de negação da liberdade de expressão e do di-reito à comunicação para a maior parte da população.

Por isso, precisamos de uma nova lei, que refl ita o tem-po que vivemos. Um tempo de afi rmação da pluralidade e da diversidade. De busca do maior número de versões e visões sobre os mesmos fatos. Um tempo em que não ca-bem mais discriminações de nenhum tipo. Tempo de re-conhecer um Brasil grande, diverso e que tem nas suas di-ferenças regionais parte importante de sua riqueza. Tem-po de convergência tecnológica, de busca da universaliza-ção do acesso à internet, de redução da pobreza e da desi-gualdade. Tempo de buscar igualdade também nas condi-ções para expressar a liberdade. De afi rmar o direito à co-municação para todos e todas.”

A campanha é aberta a adesões pela página www.paraexpressaraliberdade.org.br

Para expressar a liberdadeNO DIA 27 DE AGOSTO, foi lançada a campanha “Para expressar a liberdade”, uma iniciativa de dezenas de enti-dades da sociedade civil que acreditam que uma nova lei geral de comunicações é necessária e urgente. Reproduzo aqui parte da apresentação da campanha, um texto escri-to a várias mãos:

“Neste 27 de agosto, o Código Brasileiro de Telecomu-nicações completou 50 anos. A lei que regulamenta o fun-cionamento das rádios e televisões no país é de outro tem-po, de outro Brasil. Em 50 anos muita coisa mudou. Su-peramos uma ditadura e restabelecemos a democracia. Atravessamos uma revolução tecnológica e assistimos a um período de mudanças sociais, políticas e econômicas que têm permitido redução de desigualdades e inclusão.

Mas estas mudanças não se refl etiram nas políticas de comunicação do nosso país. São 50 anos de concentra-ção, de negação da pluralidade. Décadas tentando impor um comportamento, um padrão, ditando valores de um grupo que não representa a diversidade do povo brasilei-ro. Cinco décadas em que a mulher, o trabalhador, o ne-

João Brant

Hospitais do MA negam atendimentoO Ministério Público Federal (MPF) no

Maranhão entrou com uma ação civil para que pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) transportados pelas ambulâncias do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) sejam atendidos nas Unidades de Pronto Atendimento (UPA). A ação – con-tra o Estado e a União – pede garantia de atendimento a qualquer paciente, respei-tando a integração dos serviços prestados. Conforme denúncias, na cidade de São Luís (MA), a Secretaria de Estado da Saúde tem criado difi culdades no recebimento desses usuários, pois eles chegam até o local de atendimento médico, de gestão do Estado, utilizando transporte municipal. O MPF constatou que a conduta desrespeita a Constituição Federal e as próprias normas internas do Ministério da Saúde, que deter-minam o funcionamento da UPA e do Samu de forma integrada.

Condenados por uso de agrotóxicosUm Tribunal de Justiça da província de

Córdoba condenou os responsáveis por re-alizar a pulverização aérea de agrotóxicos. Depois de mais de dois meses de julgamento, dia 21 saiu a decisão de condenar o produtor rural Francisco Parra e o piloto Edgardo Pancello. As penas são de três anos de prisão em regime aberto, mais serviços comunitá-rios. Eles também fi carão de oito a dez anos sem poder manejar agrotóxicos. A sentença se refere a aplicação de endosulfán e glifo-sato que afetou o bairro Ituzaingó, próximo à capital de Córdoba, nos anos de 2004 e 2008. A população do local sofre com pro-blemas de saúde causados pelos agrotóxicos há mais dez anos.

Obras de Belo Monte são suspensasA Norte Energia, empresa privada que

reúne todas as donas da barragem de Belo Monte, foi obrigada a suspender, dia 23 de

agosto, o andamento das obras da barragem. A suspensão ocorre dez dias após a Justiça determinar a imediata paralisação, sob pena de multa de R$ 500 mil diários. A 5ª Turma do Tribunal Federal Regional da 1ª Região determinou a suspensão por constatar ilega-lidade no processo de autorização da obra, que deve respeitar a Constituição Brasileira e a Convenção 169 da Organização Internacio-nal do Trabalho (OIT) sobre a obrigatorieda-de da escuta prévia aos povos indígenas.

Atingidos ocupam sede da Copel Atingidos pela usina hidrelétrica de Colíder no MT ocuparam dia 20 a sede da Com-panhia Paranaense de Energia (Copel), proprietária da barragem que está em fase avançada de construção. O grupo é formado, sobretudo, por pescadores que reivindicam que a empresa reconheça os prejuízos que centenas de famílias tiveram depois do início da construção da barragem.

fatos em focoda Redação

Assine o Brasil de FatoDesde a edição 444, o jornal Brasil de Fato passou a ter quatro páginas a mais. Ou seja, ago-ra são 16 páginas de informação e formação. Com isso, podemos levar para você mais reportagens, jornalismo inteligente e comprometido com as lutas da classe trabalhadora. Assim, acredita-mos contribuir ainda mais para elevar o nível de consciência do povo, para que lute por mudan-ças e por uma sociedade justa. Quem ganha com isso é você, leitor.

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brasilde 30 de agosto a 5 de setembro de 20126

Amanda Grecco, Gabriela Monteiro e Jaqueline Gutierres

de São Paulo (SP)

“A ELITE BRASILEIRA não aceita que não se construam pontes para carros em lugar de metrôs, que atrapalham o trân-sito com obras que duram anos. Ela não aceita que se priorizem as demandas pa-ra a cidade se tornar mais democrática.” Essa questão, levantada pelo economis-ta e arquiteto-urbanista João Sette Whi-taker, é um dos fatores que determinam medidas governamentais e que colabo-ram para que a situação da metrópole se-ja desigual.

A segregação e a disparidade espacial de São Paulo, segundo Whitaker, são re-fl exos do modo como se estruturaram as cidades brasileiras desde que se forma-ram. Membro do Conselho Municipal de Política Urbana e professor da Uni-versidade de São Paulo, Whitaker res-gata a teoria de subdesenvolvimentismo do professor Celso Furtado, afi rmando que a lógica de crescimento econômico do país é baseada no descaso com o bem estar social, principalmente das classes baixas.

Assim, os problemas deixam de estar ligados apenas ao espaço urbano e a inte-resses econômicos. “A questão se estende para a área da saúde, frente à precarieda-de desse setor. E também para a área da educação, pela insufi ciente oferta educa-cional aos mais pobres”, ressalta.

Como os fatores históricos levam à atual situação conturbada do urbanismo em São Paulo?João Sette Whitaker – O processo histórico, político e econômico das cida-des brasileiras, principalmente São Pau-lo, é marcado pelo subdesenvolvimentis-mo. Ou seja, a lógica de desenvolvimen-to do país é baseada no antagonismo en-tre dois extremos: o país cresce ao se ali-mentar da pobreza. A renda é concentra-da, a mão-de-obra barata é explorada e é de interesse do Estado que a pobreza se mantenha para que este processo não se interrompa. Nunca se trabalhou na dire-ção de diminuir estas contradições, por-que são elas que giram a economia. Essa lógica garante que o Brasil não tenha um Estado de bem estar social, atento às ne-cessidades da população em sua amplitu-de. A situação é refl etida no espaço da ci-dade pela enorme desigualdade espacial e pela segregação, onde a riqueza existe em função da própria pobreza.

Existe alguma atitude que realmente mudaria este quadro?

O país vem passando por mudanças que escancaram estas contradições e co-locam difi culdades para os governantes. Porém, mesmo que existam mudanças no campo da política, no urbanismo elas são mais demoradas. Mudar essa lógi-ca signifi ca opor-se à classe mais alta. A primeira atitude a ser tomada é por par-te dos governos, de ter a coragem de en-campar uma mudança radical nas prio-ridades das políticas urbanas. É preci-so uma inversão dos investimentos pú-blicos, favorecendo as classes mais bai-xas. Em vez de gastar 1,2 bilhões de re-ais em novas vias para carros na Margi-nal, gastassem esse dinheiro para fazer 10 quilômetros de metrô. Mas são obras que demorariam para fi car prontas e a construção de novas vias tem um ganho eleitoral muito mais rápido. Há também uma parte de aceitação da população. Ela pode até reclamar do quadro políti-co e econômico, mas nem sempre vai re-clamar da questão urbana. Levar as pes-soas a terem atitude de mudança é um processo bastante complexo.

Quais os primeiros passos para diminuir o trânsito de São Paulo de modo efetivo?

Não há primeiro nem segundo passo. É preciso fazer uma única coisa: uma in-versão radical nos investimentos, levan-do-os maciçamente para o transporte público.

A partir do momento em que o inves-timento trouxer uma qualidade melhor do serviço público, pode-se começar a taxar a utilização do carro, diminuindo a circulação. Por enquanto é muito com-plicado. Cria-se um preço alto para a pessoa sentir no bolso o uso de um car-ro, mas o que se oferece em contrapar-tida é muito ruim. Não existe condição política de se colocar em prática esse ti-po de atitude, mas a partir do momento em que houver investimento pesado em transformação da modalidade do trans-porte, pode-se fazer com que as pessoas migrem para o serviço público. Essa é a única solução possível depois de um pe-ríodo de seis ou oito anos.

O centro da cidade foi esquecido pelo poder público? E o que dizer sobre os novos projetos para a região?

Lá é o espaço de uma grande tensão, porque foi aos poucos sendo abando-nado pelos setores de alta renda. A re-gião fi cou popular a partir da década de 1940, à medida que todos os investi-mentos em infraestrutura no transpor-te iam para lá, como em qualquer cida-de do mundo, atraindo o comércio po-pular e uma população mais pobre. Es-se movimento fez com que aos poucos as elites que moravam lá se deslocas-sem para outros locais. O centro foi dei-xado de lado pelo próprio governo e, ao longo desse processo, foi considerado degradado. Na verdade, ele é provavel-

mente a área da cidade mais vitalizada, com mais empregos, só que de caráter mais popular. Atualmente, com a falta de terrenos para o mercado imobiliário, passou a ser visto com olho gordo. Nes-se atual governo, temos um Estado típi-co patrimonialista, que defende os inte-resses dos grupos dominantes e traba-lha junto com o mercado para transfor-mar o centro em um espaço atrativo pa-ra os investimentos. E, para isso, pre-cisa promover a retirada da população mais pobre, sobretudo daquela que está onde eles chamam de Cracolândia. Es-se é um processo chamado de gentrifi -cação, com a retirada da população po-bre e a valorização do perfi l econômico de quem mora ali.

Essa valorização de determinadas áreas da cidade feita pelo mercado imobiliário tende a ser um ciclo? Ou a terminar em uma crise?

É um ciclo e pode terminar em uma crise. Porém, é exatamente essa a lógica do mercado, de abrir novas frentes imo-biliárias. Ao mesmo tempo, abre pou-co para as classes mais populares, a não ser quando há auxilio do poder público, como aconteceu durante o governo Lu-la com as mudanças no crédito imobili-ário. O mercado acaba sempre reinven-tando o produto imobiliário para quem já mora, já pagou ou já tem onde mo-rar. Um bom exemplo é a questão da se-gurança pública. Os índices de crimina-lidade de São Paulo são altos, mas são iguais aos de qualquer grande cidade do mundo, como Nova Iorque. Então, na verdade, essa ideia de que é preciso viver dentro de uma fortaleza urbana é meio relativa, e muito disso foi o mer-cado que criou. Com isso, cria-se um efeito bola de neve, porque os assaltan-tes vão se interessar pelos prédios que parecem fortalezas.

Além dos possíveis novos ‘elefantes brancos’ construídos na cidade, o que a Copa do Mundo pode trazer de melhoria para a cidade?

Esta é uma questão muito polêmica. As pessoas imaginam que as cidades se benefi ciam dos eventos esportivos, mas isso é muito relativo. Primeiro porque o equipamento principal, motor da trans-formação, é o estádio, que nem sempre será aproveitado em futuros jogos. Em segundo lugar, a localização e os equi-pamentos que eles [os estádios] trazem dos outros municípios não são discu-tidos pela sociedade para saber se são mais necessários do que outros investi-mentos. Normalmente, o que vem junto são prédios de negócios e linhas de me-trôs que levam às arenas. Mas será que não é preciso fazer linhas que vão pa-ra outros lugares mais urgentes da ci-dade? Será que não é mais necessário fazer saneamento para toda a popula-

ção? O problema é que esses grandeseventos subordinam os planejamentosaos interesses privados dos organizado-res dos eventos. Quem manda nos pla-nejamentos urbanos hoje é a FIFA [Fé-dération Internationale de Football As-sociation], mas quem deveria mandar éa população através de seus governan-tes eleitos.

Em 2011, foi aprovado pela prefeitura um projeto de urbanização da favela de Heliópolis. A polêmica sobre esse projeto é o custo e a utilidade, já que o orçamento foi alto. Qual é a sua opinião?

É importante que haja a urbanizaçãoda favela, mas o foco dessa ação foi fazermarketing em cima da política. Em vez de realizar um projeto efi caz e racional, com um custo bem pensado, foi convi-dado para tal tarefa um arquiteto de re-nome [Ruy Ohtake] que tem pouquís-sima experiência com urbanização defavela. A obra tem o intuito de apare-cer, e não de resolver o que foi posto empauta. É desconectada da realidade, um projeto um pouco estranho. Não é só ca-ro, como é muito pouco funcional.

Superfi cialmente, os maiores problemas de São Paulo parecem ser moradia e transporte. Quais outras questões você apontaria?

É isso mesmo: moradia, transporte esaneamento. E depois, educação e saú-de para todos. Se fi zéssemos essas cin-co grandes revoluções, estaríamos emum novo país. Os nossos problemas sãosimples, a questão é que não existe a mobilização política para enfrentá-los,não há nada além disso. (Esta entrevis-ta foi publicada originalmente na re-vista Esquinas, publicação laboratorialdo curso de Jornalismo da FaculdadeCásper Líbero, em São Paulo).

ENTREVISTA Professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP), João Sette Whitaker aponta as causas dos problemas espaciais e segregacionistas da cidade de São Paulo

QUEM ÉJoão Sette Whitaker é doutor em Arquitetura e Urbanismo e mestre em Ciência Política, pela Universidade de São Paulo (USP). É gradu-ado em Economia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Além disso, é consultor nas áreas de políticas habitacionais, desenvolvimento e economia urbana, e mer-cado imobiliário.

Pobreza estruturalPobreza estrutural

“É preciso fazer uma única coisa: uma inversão radical nos investimentos, levando-os maciçamente para o transporte público”

“Abre pouco para as classes mais populares, a não ser quando há auxilio

do poder público, como aconteceu durante o governo Lula com as

mudanças no crédito imobiliário”

“É um processo chamado de gentrifi cação, com a retirada da população pobre e a valorização do perfi l econômico de quem mora ali”

Para Whitaker, o país cresce ao se alimentar da pobreza

Tânia Rêgo/ABr

Mariana Oliveira

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brasil 7de 30 de agosto a 5 de setembro de 2012

José Francisco Neto,da Redação

POLICIAIS MILITARES estão cada vez mais inseridos nos setores da administra-ção pública do Estado e da capital paulis-ta. Atualmente, 30 dos 31 subprefeitos de São Paulo são coronéis da reserva da PM. Além das subprefeituras, eles se encon-tram em órgãos como a Secretaria de Se-gurança Pública, Secretaria de Transpor-tes, Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), serviço funerário, serviço ambula-torial e defesa civil.

Mas os cargos administrativos parecem não bastar. Os membros da “corporação” decidiram “disputar” mentes e corações no âmbito municipal. O número de candi-datos PMs dobrou em quatro anos. Na úl-tima eleição, em 2008, 21 ofi ciais concor-reram à vaga para vereador. Hoje são 42, entre militares e civis.

Dentre os 29 partidos, eles estão pre-sentes em 22, em sua maioria no Parti-do do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), com cinco candidatos; no Parti-do Democrático Trabalhista (PDT) com quatro e no Partido Verde (PV) e Parti-do da Social Democracia Brasileira (PS-DB) com três.

Dois deles são ex-comandantes da PM. O primeiro, coronel Álvaro Camilo, res-ponsável pela indicação dos atuais 30 subprefeitos/coronéis, concorre à vaga na Câmara pelo Partido Social Democra-ta (PSD), do prefeito Gilberto Kassab. Se-gundo o jornal Valor Econômico, cinco dos subprefeitos que indicaram o ex-co-mandante da PM para concorrer ao cargo de vereador estão estrategicamente locali-zados nas quatro pontas da cidade de São Paulo e na região central – Sé, Cidade Ti-radentes, Jabaquara, Jaçanã e Pinheiros- e são, também, fi liados ao PSD.

O segundo, coronel Adriano Lopes Lu-cinda Telhada, ex-chefe da Rota, que re-tribui a José Serra o “voto de lealdade” que este lhe concedeu ao nomeá-lo co-mandante da corporação quando gover-nador do Estado, concorre a uma vaga na Câmara pelo PSDB, com o slogan “Uma nova Rota na política de São Paulo”.

Outros dois egressos de corporações policiais já são vereadores: o ex-sargen-to Abou Anni, do Partido Verde (PV) e o delegado licenciado da Polícia Civil, Cel-so Jatene, do Partido Trabalhista Brasi-leiro (PTB).

Despreparo Com os militares na gestão das cida-

des e infi ltrados nos setores públicos ad-ministrativos, reforça-se a tese de que é “necessário ter poder de comando da PM mesmo fora da corporação para manter a ordem”, segundo considera o analista cri-minal e ex-secretário de segurança públi-ca de Guarulhos (SP) Guaracy Mingardi.

“É uma tentativa errada de fazer fun-cionar a máquina pública. O que aconte-ce é que partiram do princípio que o co-ronel sabe mandar, o que é uma boba-gem. Mandar numa estrutura militar e numa estrutura civil são coisas diferen-tes. O que precisava nessas administra-ções regionais, por exemplo, era ter ou bons administradores ou sujeitos que possuam traquejo político, e os coro-néis não tem nem uma nem outra coi-sa”, critica.

Uma das principais molas propulsoras para a criação das subprefeituras é apro-ximar a população da administração mu-nicipal. Nelas o contribuinte pode reivin-dicar, reclamar, receber informações so-bre os serviços prestados pelo município e, principalmente, participar da adminis-tração em seu bairro.

Mingardi aponta, contudo, que os co-ronéis não têm a capacidade de dialogar nem com a população nem com a Câmara Municipal, e o risco é que os municípios fi quem desassistidos.

“Os militares têm que se habilitar é pa-ra gerir o batalhão. Essa é a sua função, que em princípio deveriam ter aprendi-do. Agora, se eles não têm capacidade nem de fazer isso, imagine se vão ter con-dições para gerir outra coisa além daqui-lo que supostamente aprenderam”, criti-ca Mingardi, que complementa, “gerir um comando da área de um batalhão é com-pletamente diferente de gerir uma admi-nistração de uma área civil.”

“Atentado à democracia”A ocupação de militares na adminis-

tração pública revela o autoritarismo de quem comanda a prefeitura da capital paulista. Isso é o que avalia o conselheiro

suplente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Conde-pe), Dojival Vieira.

Ele ressalta que a militarização do po-der público é inaceitável em período democrático.“Isso num contexto de um regime militar seria até compreensível, ainda que não aceitável, mas num Estado Democrático de Direito revela muito as li-mitações dessa democracia em que vive-mos”, comenta Vieira, que também é ad-vogado e jornalista.

De acordo com o presidente da Comis-são dos Direitos Humanos da Assem-bleia Legislativa de São Paulo, Adriano Diogo, a infi ltração dos militares na má-quina pública representa um “atentado à democracia”. Diogo ressalta que os coro-néis, além de “frequentar” as subprefei-turas e outros setores da administração pública, também se infi ltraram na Coor-denação Estadual dos Conselhos Comu-nitários de Segurança (Conseg) e chama a atenção para uma suposta “milicializa-ção” no Estado.

“É uma coisa terrível, gravíssima. Uma afronta ao Estado democrático de direito. Isso é o que eu chamo de um estado para-militar paralelo”, diz Diogo, que também é deputado estadual pelo Partido dos Tra-balhadores (PT), em São Paulo.

CaminhosMas o que poderia ser feito para mudar

esse quadro em São Paulo, já que em ne-nhuma outra região é tão intensa a inser-ção de militares no poder público? Como acabar com esse corporativismo da polí-cia em setores administrativos? Por meio do voto eleitoral? O ex-secretário de Jus-tiça do Estado de São Paulo, Hédio Silva Júnior, diz que a forma ideal para a no-meação de cargos na administração mu-nicipal seria a participação popular. Pa-ra ele, é necessário que se avance no con-senso de democratização.

“Não sei se exatamente uma eleição, mas quem sabe uma espécie de referen-do ou de plebiscito, enfi m, uma forma de consultar a população a respeito. Sem dú-vida nenhuma, esse seria o modelo ideal para as subprefeituras”, afi rma Hédio.

Já Mingardi não acredita que eleições

resolveriam o caso. Para ele, a nomea-ção nos setores na administração públi-ca deveria ser somente para pessoas quetêm “conhecimento na área”. “Tem queter o diálogo nas duas pontas: com a po-pulação, com as ONGs, associações debairro, e também com a Câmara Muni-cipal”, aponta.

“Combate ao inimigo”Ainda de acordo com Dojival Vieira, do

Condepe, a militarização das subprefeitu-ras refl ete a relação do poder público com a sociedade civil, principalmente nas pe-riferias da cidade. Segundo ele, o militar não foi preparado pela cultura democráti-ca, pois a sua formação consiste no “com-bate ao inimigo”.

“Eu sou a favor da democratização completa do país, e não dessa democra-cia de compromisso de prática e costumes oriundos do regime militar. Como é pos-sível uma cidade como São Paulo, a mais populosa do país, apresentar esse tipo de anomalia?”, questiona.

Essa política de militarização das sub-prefeituras começou em 2008, com a in-dicação do coronel Rubens Casado para a Subprefeitura da Mooca, na segunda ges-tão do prefeito Gilberto Kassab. De lá pa-ra cá, multiplicou o número de policiais na máquina municipal.

“É uma série de erros, um atrás do ou-tro, que está deixando a cidade muito mal administrada”, critica Mingardi, que atu-almente também é assessor da Comissão Nacional da Verdade.

da Redação

Em junho deste ano , 87% dos coro-néis da Polícia Militar do Estado de São Paulo receberam mais do que o gover-nador Geraldo Alckmin (PSDB). O ven-cimento líquido desses ofi ciais supe-ra os R$ 14 mil pagos ao governador, conforme divulgado no Portal da Trans-parência Estadual – até o fechamento dessa edição, o Portal da Transparência não havia divulgado os vencimentos lí-quidos referentes ao mês de julho.

Dos 1.130 ofi ciais da PM listados, foi verifi cado que 105 receberam acima do teto do servidor público, R$ 26, 7 mil, o que corresponde a 9% do total dos mi-litares. O vencimento líquido dos oito primeiros coronéis que aparecem na lis-ta, se somado, resulta em R$ 773,5 mil, o sufi ciente para pagar 305 soldados em um mês ou 553 professores estaduais em SP – isso quando recebem o piso de R$ 1.400.00.

Somente o coronel Ailton Araújo Bran-dão, que já foi subprefeito em Santo Amaro (SP) e hoje ocupa o cargo na sub-prefeitura da Lapa , recebeu R$ 254 mil, 410 vezes mais do que um salário míni-mo (que vale atualmente R$ 622), e 19 vezes mais do que o do governador. O co-mandante geral da PM, Roberval Ferrei-ra França, recebeu R$ 14.820,50, e o ex-chefe da Rota, Adriano Lopes Lucinda Telhada, R$ 8.351.

Dos 30 coronéis que chefi am as sub-prefeituras, 20 receberam o vencimento líquido referente ao mês de junho mais o salário de R$ 19.294 como subprefeitos. Os dez vencimentos mais altos resultam, somados, em mais de R$ 400 mil.

À reportagem do Brasil de Fato, a as-sessoria de imprensa da Polícia Militar in-formou que todos os coronéis estão apo-sentados. Já as assessorias das subprefei-turas não quiseram comentar o caso.

Candidatos e ex-comandantes da PMÁlvaro Camilo (PSD)

Ex-comandante da Polícia Militar, foi um dos responsáveis pela “desocupação” na Comunidade do Pinheirinho, em que 2 mil policiais, 220 viaturas, cem cavalos, 40cães e 300 agentes da prefeitura participa-ram da operação para retirar as 1.600 fa-mílias que moravam no local. Camilo tam-bém esteve à frente da ação que retirou os cerca de 70 alunos que ocuparam a Rei-toria da Universidade de São Paulo (USP) em novembro de 2011 – quando mais de 200 homens da Tropa de Choque invadi-ram o prédio que os estudantes ocupavam para reivindicar o fi m do convênio entre a universidade e a PM e pelo fi m dos proces-sos criminais e administrativos contra alu-nos e trabalhadores.

Adriano Lopes L. Telhada (PSDB)O ex-chefe da Rota, que também é mem-

bro da Congregação Cristã do Brasil (CCB), foi comandante da corporação des-de maio de 2009 até novembro de 2011. Em dois anos e meio no cargo, a Rota in-fl ou o número de mortes sob sua respon-sabilidade em 63,16%, com 114 assassina-tos cometidos. Telhada é um conhecido li-nha-dura, que se orgulha em sentenciar “bandidos” com morte (sob seu próprio julgamento) e ter 29 processos judiciais e militares arquivados, segundo a matéria do site Carta Maior. (JFN)

Relação dos coronéis subprefeitos com vencimentos líquidos acima do salário do governador, que é de R$ 14.019Airton Nobre de MelloSubprefeito da Casa VerdeVencimento Líquido – R$ 20.462

Antonio Sergio PalazziSubprefeito de Ermelino MatarazzoVencimento líquido – R$ 31.185

João dos Santos de SouzaSubprefeito do Itaim PaulistaVencimento líquido – R$ 21.352

Roberto Ney Campanhã Marciano Subprefeito do JabaquaraVencimento líquido – R$ 15.670

Ailton Araujo BrandãoSubprefeito da LapaVencimento líquido – R$ 254.099

Eduardo José Felix de OliveiraSubprefeito da PenhaVencimento líquido R$ 21.354

Sérgio Teixeira AlvesSubprefeito de PinheirosVencimento líquido – R$ 21.502

Manoel Antônio da Silva AraújoSubprefeito da Vila MarianaVencimento líquido – R$ 20.860

No comando, farda e coturnoSÃO PAULO Das trinta e uma subprefeituras de São Paulo, trinta são comandadas por coronéis da reserva da PM

Coronéis receberam mais que o governadorEntre os trinta coronéis que chefi am as subprefeituras, vinte receberam o vencimento líquido referente ao mês de junho mais o salário de R$ 19.294, como subprefeitos

Por sua vez, o governador Geraldo Al-ckmin (PSDB) negou que policiais mili-tares de São Paulo ganhem mais que ele, que tem um salário bruto de R$ 18.725. De acordo com Alckmin, a folha de pa-gamento de Brandão, por exemplo, in-cluía 14 licenças-prêmios que ele não havia usufruído.

Os valores pagos em junho podem in-cluir benefícios como férias, adianta-mento do 13º salário e indenizações, mas essas informações não se encon-tram no Portal da Transparência. Salá-rios acima do teto, de acordo com o go-verno, só são pagos por ordem judicial.

Impacto de R$ 19 milhõesDesde janeiro deste ano, os coronéis

subprefeitos tiveram aumento salarial de 193,52% – de R$ 6.573.00 passaram a receber R$ 19.294.00. O projeto de Lei foi proposto pelo atual prefeito Gilberto Kassab (PSD).

Em fevereiro, o aumento foi barrado por meio de uma ação civil do Ministério Público, mas em junho o governo muni-cipal entrou com recurso baseado na Lei Municipal 15.509, aprovada no fi m de 2011, que “institui o regime de subsídio para os cargos em comissão e funções de confi ança do nível de direção superior das Secretarias, Subprefeituras, Autar-quias e Fundações Municipais”. De uma vez só, ela elevou a quantia paga a fun-cionários – não concursados.

À época, Kassab defendeu o reajuste como um “legado importante para a ci-dade”, pois as novas quantias atrairiam profi ssionais qualifi cados. O impacto da mudança no erário foi estimado em R$ 19 milhões por ano. (JFN)

“Gerir um comando da área de um batalhão é completamente

diferente de gerir uma administração de uma área civil”

O coronel Ailton Araújo

Brandão, que já foi

subprefeito em Santo

Amaro (SP) e hoje ocupa o

cargo na subprefeitura da

Lapa , recebeu R$ 254 mil,

410 vezes mais que um

salário mínimo

Ricardo Fonseca-Secom

Kassab e a PM: 30 dos 31 subprefeitos de São Paulo são coronéis da reserva

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brasilde 30 de agosto a 5 de setembro de 20128

da Redação

Qualidade do empregoRepresentantes das centrais sindicais

se reuniram, dia 23 de agosto, com o Dieese, na sede da CUT em São Paulo, para debater “propostas que melho-rem a qualidade do emprego”, a serem incorporadas ao “Programa de Investi-mentos em Logística: Rodovias e Fer-rovias”, anunciado recentemente pelo governo federal. De acordo com o go-verno, o objetivo principal do progra-ma de “concessões” à iniciativa privada é a elevação de investimentos em infra-estrutura e logística, restabelecendo a capacidade de planejamento integrado do sistema de transportes. Os dirigen-tes da CUT, CGTB, CTB, Força e UGT defenderam que o movimento sindical seja ouvido e sejam incorporadas me-didas para garantir que os investimen-tos que serão aplicados na construção de obras de infraestrutura redundem em melhorias concretas para a classe trabalhadora, o país e a sociedade bra-sileira como um todo, com serviços de qualidade e a preços justos.

Portuários prometem paralisaçãoA Federação Nacional dos Portuários

(FNP) indica paralisar as atividades caso não receba esclarecimentos do governo federal sobre as concessões à iniciativa privada dos portos públicos. Em reunião com os presidentes de sin-dicatos fi liados, a federação aprovou um calendário de mobilizações para pressionar o governo. Ao lado da FNP, estão envolvidas a federação nacional dos conferentes e consertadores de carga e descarga, vigias portuários, trabalhadores de bloco, arrumadores e armadores de navios, entre outros.

Greves dos servidoresAs rodadas de negociações entre os

servidores federais em greve e o go-verno foram concluídas dia 26, mas os trabalhadores saíram insatisfeitos com o percentual de 15,8%, dividido em três anos, proposto pelo governo. No próxi-mo dia 31, termina o prazo para o enviodo Orçamento da União para 2013 ao Congresso Nacional, com a previsão de gastos com a folha de pagamento dos servidores para o ano que vem. Segun-do a Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef), o percentual oferecido pelo governo “não altera o quadro de distorções que tanto prejudicam a administração pública” e foi responsável pela defl agração da gre-ve, que envolve mais de 30 setores do funcionalismo.

Secretaria do idoso O Sindicato Nacional dos Aposenta-

dos (Sindnapi/Força Sindical) encami-nhou ao governo proposta para criação da Secretaria dos Idosos. O documento propõe que a futura secretaria seja in-tegrada ao Ministério da Previdência Social e reúna as políticas voltadas aos idosos, atualmente dispersas por oito ministérios. O presidente do Sindnapi, João Inocentini, destaca que a ideia é unifi car todas as políticas setoriais sob uma mesma direção. “A dispersão de recursos provoca um desperdício de energias”, afi rma.

Luta dos rodoviários de MaceióOs rodoviários de Maceió realizam

greve por aumentos salariais e reajuste no vale-alimentação. Os trabalhadores não foram contemplados pela proposta patronal e, em assembleia na porta do Tribunal Regional do Trabalho, de-zenas de rodoviários destacaram que não aceitam o retorno das atividades enquanto não houver o julgamento que decidirá sobre o reajuste da categoria, que cobra 15% no salário e 25% nos tí-quetes de alimentação.

Proposta não contempla PFOs 27 sindicatos de policiais federais

em todo o Brasil aprovaram a propos-ta de continuação do movimento em razão do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão não ter apresen-tado a proposta de reestruturação da carreira e reestruturação salarial para a categoria. Policiais federais e governo negociam há mais de 900 dias. O Mi-nistério do Planejamento manteve a mesma fórmula que vem apresentando aos demais servidores do funcionalis-mo público federal em greve: reajuste de 15,8%, diluído entre os próximos três anos.

Greves na construção pesadaA Federação Nacional dos Trabalha-

dores na Indústria da Construção Pesa-da (Fenatracop) realizou levantamento das greves ocorridas e/ou em anda-mento no setor de infraestrutura (cons-trução pesada), no primeiro semestre de 2012, na indústria da construção. Nos últimos seis meses houveram greves em 20 estados do Brasil, nesse contexto, 302 mil operários do setor estiveram ou ainda permanecem em greve de janeiro até agora. Para o pre-sidente da federação, Wilmar Gomes dos Santos, grande parte das paralisa-ções foi motivada por descumprimento de acordos ou por melhores condições de trabalho.

espaço sindical

José Carlos Alves Pereira

“VI NA TV que em Florianópolois (SC) estão contratando pedreiros de “luxo”. Salário de R$ 5 mil, mais casa, alimenta-ção e lazer. É por isso que estou indo. Eu estava ganhando muito pouco na Paraíba e sem poder tocar lavoura. Não pensei duas vezes. Pobre não tem escolha”. A frase é de Sérgio, 25 anos, 1º grau de es-colaridade incompleto, com quem via-jei num ônibus, do Vale do Jequitinho-nha (MG) até São Paulo, com destino fi -nal Florianópolis. Cidade esta a que Sér-gio nunca tinha ido e também não sabia qual empresa de ônibus fazia o transpor-te para lá. Além disso, não havia pessoa alguma o esperando. Atendera ao cha-mado do anúncio da TV que dizia haver tratamento de ‘luxo’ para pedreiros que fossem trabalhar lá.

A atitude de Sérgio é como um Grito de milhares de trabalhadores subemprega-dos ou desempregados que se sujeitam a trabalhos de qualquer espécie para so-breviver em um Brasil que acaba de se tornar a “5ª maior economia do mundo”. Este grito simbólico nos ajuda a consta-tar diversos outros gritos que as classes ricas e poderosas escondem ou espeta-cularizam em seus grandes canais de co-municação; gritos que os governos pro-curam sufocar.

Como Sérgio, milhares de trabalhado-res buscam melhorar a condição de vida. Seus deslocamentos são impulsionados pela falta de meios básicos de sobrevi-vência, como água potável, trabalho, mo-radia e acesso à saúde, etc. Quantos mi-lhares de Sérgios não têm acesso à traba-lho decente e à saúde na 5ª maior econo-mia do mundo?

Também vale lembrar que seus deslo-camentos ocorrem e são impulsionados no bojo da mundialização do capital, da transnacionalização de empresas, da fi -nanceirização, autonomização da produ-ção, cujo caráter principal é a desregula-mentação da política, da economia, a in-formalidade do trabalho, e, o esgarça-mento da cidadania e da democracia. O que signifi ca, na prática, perda de direi-tos e tratamento policial no lugar de po-líticas públicas adequadas à solução de problemas sociais graves. Veja-se o caso das diversas greves de trabalhadores nos canteiros de obras da Copa 2014 e do Rio Madeira para a construção de barragens.

Não é fácil encontrar trabalho decente e garantias de acesso a direitos. Do ponto de vista da razão pura, os trabalhadores não lograrão alcançar a tão sonhada me-lhor condição de vida. Do ponto de vista da capacidade de invenção humana, da resistência e esperança, se não uma radi-cal transformação social, ao menos uma mudança na própria condição pessoal se vislumbra como miragem ou sonho pos-sível em seu horizonte.

Não seria o caso de nos perguntarmos sobre uma cidadania orientada não pela ação policial, mas, pelos valores da pes-soa humana e as potencialidades da de-mocracia como distribuição social de ri-quezas e direitos à toda população? Afi -nal, para que serve o Estado? Para pro-mover violência e desigualdades ou para proteger e promover a justiça social?

Dias depois, em outra viagem de ôni-bus – esta mais curta – do Terminal Sa-comã até o Jardim Patente, em São Pau-lo (SP) conheci dona Eloisa, 51 anos, ce-arense do Crato. Ela tinha rosto sofrido, mas brilho, alívio e sorriso no olhar. Du-rante 20 anos dormira sob papelão em um barraco às margens do córrego Ta-manduateí. Mas, há cinco anos, foi à lu-ta com o movimento dos sem-teto. En-frentou a violência do Estado policial e o preconceito. Há dois dias, ela conseguiu uma casa popular. Muito contente, car-regava umas sacolas e disse-me que vol-tava do centro da cidade, onde fora com-prar um colchãozinho infl ável. Depois de 25 anos, fi nalmente ia poder voltar a dor-mir em um colchão. Mais um Grito por moradia abafado durante um quarto de século. Mas que resistiu, sonhou, lutou e junto com muitos outros gritos alcan-çou seu grão de cidadania, uma mora-da. Quantos milhares de famílias dor-mem em barracos de madeiras às mar-gens de esgotos e lixões na 5ª maior eco-nomia do mundo?

Outro Grito veio de um imigrante bo-liviano, José Jamil, que trabalhou co-mo escravo em ofi cinas de costura, em

São Paulo (SP). Resgatado, Jamil disse não “ter para onde ir”. Não havia outra alternativa senão permanecer alvo das empresas transnacionais e suas forne-cedoras que lhes supre de mercadorias baratas às custas do trabalho mal pago ou escravo de muitos imigrantes. Quan-tos imigrantes trabalham como escra-vos, sem moradia, sem escola, sem aces-so à cidadania na 5ª maior economia do mundo?

Em um dos bancos do terminal urba-no Ana Rosa, enquanto eu esperava o ônibus, conheci o Marcelo. Jovem de 25 anos, morador de rua. Pediu um lanche e perguntou-me se eu sabia onde fi cava uma Igreja ali perto que oferecia banho e café da manhã para moradores de rua. Enquanto comia o lanche, Marcelo dizia que já fora pessoa trabalhadora com seu pai e sua mãe em um sítio em Nova Ve-nécia (ES). Mas um fazendeiro tomou-lhes a terra e plantou eucalipto em tu-do. O pai falecera dias depois. A mãe fo-ra para um asilo. A ele, restou “sair de mund’afora”. Perguntei-lhe sobre o fa-to do prefeito Gilberto Kassab colocar a guarda civil metropolitana no encalço dos moradores de rua e proibir a distri-buição da sopa a eles pelas organizações de solidariedade. Marcelo olhou-me fi -xamente, tomou uma cachaça que tra-zia na mochila e disse-me: “Já fui escor-raçado várias vezes por esses guardas, apanhei deles inclusive. Mas não tenho para onde ir a não ser mudar de rua em rua...”. Quantos milhares de campone-ses são expulsos da terra para trabalhar duro no eito dos canaviais, nos cantei-ros das grandes obras, para trabalhar como escravos na construção civil e nos monocultivos produzindo riquezas pa-ra um seleto grupo de pessoas, ou, pa-ra morar nas ruas na 5ª maior economia do mundo?

Outro dia, encontrei Dona Eva pelas estradas empoeiradas do Vale do Je-quitinhonha (MG). Ela mora em uma comunidade quilombola sem acesso a água potável. Tem três fi lhos, um deles trabalhador migrante cortador de cana. Todos os dias, de manhã e à tarde, dona Eva precisa caminhar seis quilômetros caatinga adentro para ir buscar água em uma represa que a Ruralminas fez para irrigar monocultivos de banana. Quan-tos milhares de famílias não tem aces-so à água potável na 5ª maior encono-mia do mundo?

Semana passada, encontrei-me com Dona Francisca e o Mestre Magrão. Ela falou-me sobre um grupo de mulheres que luta bravamente para sobreviver no Jardir Rincão, periferia de São Paulo. Ali, além das tarefas domésticas, elas ela-boram costuras e artesanatos para ten-tar complementar a parca renda fami-liar. Como diria Sidnei Silva, “costuram

sonhos” de viver com dignidade humana em suas famílias, em suas comunidades. Tarefa nada fácil. Pois lhes faltam espa-ços e apoios de governos e outras insti-tuições sociais que deveriam promover a solidariedade e o bem estar comunitário. Já o Mestre Magrão falou-me do traba-lho de capoeira e de formação que ele faz com crianças, adolescentes e jovens na mesma periferia do Jardim Rincão. Com sua arte, procura colaborar para que me-ninos e meninas não encontrem na vio-lência, nas drogas e prostituição, sua úni-ca alternativa de vida. Contudo, quantas Donas Franciscas e Mestres Magrões lu-tam sem o reconhecimento e apoio do poder público neste importante traba-lho sociocultural na 5ª maior economia do mundo?

Na 5ª maior enconomia do mundo, o Estado e os governos locais ignoram, de propósito, Sérgios, Eloisas, Josés, Mar-celos, Evas, Franciscas, Magrões. Não ouvem seus gritos por direitos básicos de cidadania. Ao contrário, os reprimem com a violência organizada, instituciona-lizada. A quem e como serve o Estado na 5ª maior economia do mundo? Serve à reprodução do sistema de desigualdades imposto pelo neoliberalismo.

O 18º Grito dos Excluídos questio-na esse sistema, por um lado, e, por ou-tro, busca potencializar os Gritos da gen-te que a gente não vê, não ouve, não re-conhece. Procura, através das lutas, so-nhos, esperanças, mostrar que há possi-bilidades e alternativas populares de se construir um país melhor, no qual o Es-tado garanta direitos a toda população, onde o ‘luxo’ não seja exceção ilusionis-ta de tv, e, nem favor de empresas e go-vernos.

Assim, o 7 de Setembro é mais que um dia da Pátria. Mais que um momento, que um evento. Faz parte de um proces-so de lutas por dignidade, cidadania e so-berania popular. Se os direitos de cidada-nia e os valores democráticos forem ga-rantidos aos trabalhadores, esta já é a es-sência do gozo – e não luxo – da nossa condição humana e do convívio em uma sociedade, onde o Estado esteja de fato a serviço da nação garantindo direitos a toda a população!

José Carlos Alves Pereira é sociólogo do Serviço Pastoral dos Migrantes.

Gritos de gente que a gente não vêOPINIÃO O 7 de Setembro é mais que um dia da Pátria. Mais que um momento, que um evento. Faz parte de um processo de lutas por dignidade, cidadania e soberania popular

Quantos milhares de famílias dormem em barracos de madeiras às margens de esgotos e lixões na 5ª maior economia do mundo?

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de 30 de agosto a 5 de setembro de 2012 9brasil

Pedro Rafael Ferreirade Brasília (DF)

NUMA DEMONSTRAÇÃO de força po-pular, os movimentos sociais do campo marcharam com 10 mil pessoas pelas ruas da capital do País, no dia 22 agos-to, para denunciar o “esmagamento” da população rural frente ao atual padrão de desenvolvimento promovido pelo Estado brasileiro na agricultura. Era o ato de encerramento do Encontro Uni-tário dos Trabalhadores, Trabalhado-ras e Povos do Campo, das Águas e das Florestas, que durou três dias, e selou uma história articulação conjunta entre as principais entidades que militam na questão agrária, incluindo indígenas e quilombolas.

“O governo conhece bem as nossas rei-vindicações, mas não nos atendeu. A não resposta às nossas pautas fez com que unifi cássemos as ações, com forte ex-pressão política. Para o próximo perí-odo, se desenha um cenário de grandes mobilizações nos estados”, prevê Rosân-gela Piovizani, do Movimento de Mulhe-res Camponesas (MMC). Ainda não es-tá defi nido um calendário de ativida-des, mas a pauta unifi cada sugere ações de massa promovidas em conjunto pelas organizações sociais.

O Encontro ocorreu mais de 50 anos após o I Congresso Nacional Camponês, organizado em 1961, no auge da atuação das Ligas Camponesas. Naquela ocasião, também foram reunidas, em Belo Hori-zonte (MG), de forma inédita, as princi-pais organizações políticas que atuavam no campo.

Para os movimentos, apesar do forta-lecimento do agronegócio na última dé-cada, somente agora foi possível reunir forças para uma ação conjunta entre di-

ferentes entidades. “O dito projeto po-pular do último governo [período Lula] deixou encantados muitos companhei-ros e agora esse encantamento está sen-do quebrado. Está muito claro que es-se governo tem lado”, avaliou Rosânge-la, do MMC.

Efeitos da criseNa avaliação que predominou durante

o encontro, o meio rural brasileiro esta-ria sendo “sequestrado” para satisfazer o lucro de poucas grandes empresas mul-tinacionais do agronegócio. O quadro te-

ria sido agravado ainda mais como refl e-xo da crise econômica internacional, a partir de 2008.

“A sociedade brasileira vem sendo sequestrada pelo modelo de produção agrícola chamado agronegócio”, avaliou João Pedro Stédile, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Há mais de quatro anos, tem ocorrido uma fuga de capitais internacionais pa-ra aquisição de bens de produção nos países em desenvolvimento. “Parte dos capitalistas do mundo inteiro está vin-do para o Brasil comprar terra, usinas

de Brasília (DF)

O documento fi nal do Encontro Uni-tário dos Trabalhadores, Trabalhado-ras, Povos do Campo, das Águas e das Florestas não poupa críticas ao atual modelo de desenvolvimento do meio rural, centrado no agronegócio. Além disso, expõe a questão do meio ru-ral de forma ampla, abrangendo não apenas discussão sobre território, mas também exploração dos recursos hí-dricos e minerais.

“Nós estamos construindo a uni-dade em resposta aos desafi os da de-sigualdade na distribuição da terra. Como nos anos 60, esta desigualda-de se mantém inalterada, havendo um aprofundamento dos riscos econômi-cos, sociais, culturais e ambientais, em consequência da especialização primá-ria da economia”, diz um trecho.

Em outra parte, o documento sin-tetiza as principais contradições do setor: “este projeto, na sua essên-cia, produz desigualdades nas rela-ções fundiárias e sociais no meio ru-ral, aprofunda a dependência externa e realiza uma exploração ultrapreda-tória da natureza. Seus protagonis-tas são o capital fi nanceiro, as gran-des cadeias de produção e comer-cialização de commodities de escala mundial, o latifúndio e o Estado bra-sileiro nas suas funções fi nanciadora – inclusive destinando recursos pú-blicos para grandes projetos e obras de infraestrutura – e (des) regulado-ra da terra”.

Na avaliação feita durante os três dias de encontro, o projeto em curso no Brasil visa tão somente a “acumu-lação de capital especializado no setor primário, promovendo superexplora-ção agropecuária, hidroelétrica, mine-ral e petroleira”. Para atender o equilí-brio das transações externas, as conse-quências, denunciam os movimentos, são a concentração da propriedade da terra e da renda e a perda do territó-

de Brasília (DF)

A situação de quilombolas e indígenas vive momen-to delicado, segundo relatos de lideranças que partici-param do Encontro Unitário. Otoniel Guarani, da etnia Guarani Kaiowá, em Mato Grosso do Sul, citou os mais recentes episódios de violência contra indígenas no país, como o desaparecimento de duas lideranças Guarani no estado. “Os fazendeiros estão armando-se contra os in-dígenas no Mato Grosso do Sul e afi rmando isso publi-camente. Cadê os nossos direitos? Queremos demarca-ção das nossas terras, segurança e punição daqueles que não nos respeitam”, exigiu.

Para Denildo Rodrigues, da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilom-bolas (Conaq), a pressão sobre indígenas e quilombolastem uma razão clara. “A mineração e a abertura de fron-teiras agrícolas são os ovos de ouro do agronegócio e do capital especulativo. E terras indígenas e quilombolas, uma vez demarcadas, não voltam mais para o mercado. Há vários setores que não querem isso”, observou.

Denildo comentou sobre as ofensivas para retroce-der a política de regularização dos territórios tradi-cionais, como a Ação Direta de Inconstitucionalidade(Adin) nº 3239, que praticamente inviabiliza a demar-cação de terras quilombolas, assim como a Propostade Emenda Constitucional (PEC) nº 215, que transferedo Executivo para o Legislativo a regularização de áre-as indígenas.

O líder quilombola criticou ainda as ações do próprio governo sobre áreas tradicionais, como a expulsão de centenas de famílias da região de Alcântara, no Mara-nhão, para construção de uma base aeroespacial, e dadisputa entre o quilombo Rio dos Macacos e a Marinha, no interior da Bahia. “O próprio Estado brasileiro, que tem o papel de defender, é justamente quem age como violador de comunidades quilombolas”, afi rmou. (PRF)

Movimentos sociais defi nem programa político para o campoLUTA Encontro histórico reuniu milhares de camponeses, quilombolas, pescadores, extrativistas e indígenas em Brasília

“Esse ano o país importou feijão preto da China e todo ano temos que importar 28 milhões de toneladas de fertilizantes químicos”

Linhas contra o agronegócio Soberania territorial ameaçadaPara lideranças, demarcação de terras indígenas e quilombolas contraria a lógica de mercado do agronegócio

Movimentos criticam modelo de desenvolvimento no meio rural

rio. “O Estado brasileiro está vendido para o capital do agronegócio, por is-so não se respeita o direito de territó-rio indígena, nem quilombola”, afi r-mou Denildo Rodrigues, da Coorde-nação Nacional de Articulação das Co-munidades Negras Rurais Quilombo-las (Conaq).

“Vivemos em um território muito ri-co de terra, água e diversidade, mas que foi apropriado apenas para dar lucro a alguns. Queremos que a ter-ra seja destinada para produção de alimentos saudáveis. Esse ano o país importou feijão preto da China e to-do ano temos que importar 28 mi-lhões de toneladas de fertilizantes quí-micos, porque não se usa insumos lo-cais”, pontuou Stédile, da Via Campe-sina. (Íntegra do documento e outras informações: www.encontrounitario.wordpress.com). (PRF)

de combustível, hidrelétricas, agredindo o meio ambiente, forçando a mudança da legislação indígena e levando a uma maior concentração da propriedade da terra e da renda”, acrescentou.

Para exemplifi car seu raciocínio, Sté-dile comentou que, no mercado do eta-nol, 70% da produção estão nas mãos de apenas três corporações: Bunge, Car-gill e Shell. Ainda segundo o líder da Via Campesina, o preço da terra aumen-tou, em média, cerca de 200% nos últi-mos anos. “O que vai sobrar é um enor-me passivo ambiental, com a imposição da lavoura de monocultivo em grandes extensões de terra, que não incorpora os trabalhadores”, afi rmou.

O esvaziamento do meio rural foiapontado como consequência do atu-al modelo de produção agrícola. “Nosso mundo rural está cada vez mais deser-to. Não dá para ter uma agricultura fa-miliar que produz a maior parte dos ali-mentos sem pesquisa, sem tecnologia,sem assistência técnica e sem o acesso a terra, pela reforma agrária”, criticou Eli-sângela Santos, da Federação Nacionaldos Trabalhadores na Agricultura Fami-liar (Fetraf).

Sem negociação, com repressãoDessa vez, os movimentos sociais não

pretenderam dialogar diretamente com o governo federal. “Nós já conversamos no primeiro semestre e não queremos ouvir mais do mesmo. É um momento para dedicar especial atenção aos traba-lhadores da base”, esclareceu o secretá-rio de política agrária da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agri-cultura (Contag), Willian Clementino. Segundo o dirigente, o encontro serviu mesmo para continuar pautando “a luta por reforma agrária e pelo direito ao ter-ritório, desenvolvimento rural e produ-ção de alimentos saudáveis”.

Apesar disso, no ato de encerramentodo Encontro, quando 10 mil pessoas se aboletaram em frente ao Palácio do Pla-nalto, não foi possível conter a decepçãocom o governo. Barracas de lona preta chegaram a ser montadas na praça dos Três Poderes com mensagens de pro-testo. Ao tentarem se aproximar da se-de do Executivo Federal, os trabalhado-res foram reprimidos pela Polícia Mili-tar (PM) com cassetetes, gás lacrimogê-nio e spray de pimenta. Após a confu-são, um grupo de 13 lideranças mulhe-res foi atendido pelo ministro chefe daSecretaria Geral da Presidência, Gilber-to Carvalho. Na audiência, que durou poucos minutos, Carvalho recebeu o do-cumento fi nal do Encontro que defi ne o programa político dos movimentos so-ciais para o campo.

Quando 10 mil pessoas se aboletaram em frente ao Palácio do Planalto, não foi possível conter a decepção com o governo

O ato de encerramento do encontro levou 10 mil pessoas às ruas de Brasília

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Ruy Sposati/Cimi

César Ramos/Contag

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de 30 de agosto a 5 de setembro de 201210

DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS EM – 31 de dezembro de 2011 e 2010 – Valores em reais (R$)

BALANÇO PATRIMONIAL – 31 de dezembro de 2011 e 2010

2011 2010ATIVOCirculante

Disponibilidades (nota 3) 710.952 832.884Contas a receber (nota 4) 464.303 790.921Outras contas a receber (nota 5) 130.701 45.270

1.305.956 1.669.075Não circulante

Imobilizado (nota 6) 182.353 200.515182.353 200.515

TOTAL DO ATIVO 1.488.309 1.869.590

PASSIVOCirculanteFornecedores e contas a pagar 27.916 153.338Tributos a recolher 191.234 140.984Obrigações trabalhistas 2.419 4.457Provisões trabalhistas 170.757 137.888Serviços faturados a executar (nota 7) – 509.063Adiantamento de projetos (nota 8) 15.409 121.272

407.735 1.067.002Patrimônio social

Patrimônio social (nota 10) 1.080.574 802.5881.080.574 802.588

TOTAL DO PASSIVO E PATRIMÔNIO SOCIAL 1.488.309 1.869.590

Centro de Educação Estudos e Pesquisas — CEEP CNPJ 02.809.261/0001–82

DEMONSTRAÇÕES DO SUPERÁVIT E DAS MUTAÇÕES NO PATRIMÔNIO SOCIALExercícios fi ndos em 31 de dezembro de 2011 e 2010

2011 2010Receita operacional

Contribuições, convênios e parcerias 3.576.627 2.800.107Vendas, serviços e outros 6.728.575 2.332.204

10.305.202 5.132.311Impostos sobre faturamento (336.406) (117.800)Receita líquida 9.968.796 5.014.511Custos dos convênios e parcerias (3.576.627) (2.800.107)Custos dos serviços prestados (5.948.027) (1.893.842)Resultado bruto 444.142 320.562Despesas operacionais

Despesas com viagens e estadas (2.846) (1.745)Despesas de ocupação e manutenção (38.018) (31.022)Depreciações e amortizações (28.026) (45.114)Despesas gerais e administrativas (146.706) (72.376)

(215.596) (150.257)Resultado operacional antes do resultado fi nanceiro 228.546 170.305Receitas fi nanceiras 57.848 53.857Despesas fi nanceiras (8.408) (4.602)Superávit (défi cit) do exercício 277.986 219.560Patrimônio social no início do exercício 802.588 583.028Patrimônio social no fi nal do exercício 1.080.574 802.588

DEMONSTRAÇÃO DOS FLUXOS DE CAIXAExercícios fi ndos em 31 de dezembro de 2011 e 2010

2011 2010ATIVIDADES OPERACIONAIS

Superávit (défi cit) apurado 277.986 219.560Valores que não afetam o caixaDepreciações e amortizações 28.027 45.114

306.013 264.674Variação de contas a receber 326.618 (517.213)Variação de outras contas a receber (85.431) (31.570)Variação de fornecedores e contas a pagar (125.422) 151.317Variação de tributos a recolher 50.250 82.951Variação de obrigações trabalhistas 30.831 134.197Variação de serviços faturados a executar (509.063) 509.063Variação de adiantamento de projetos (105.863) 121.272

TOTAL DAS ATIVIDADES OPERACIONAIS (418.080) 714.691ATIVIDADES DE INVESTIMENTO

Compras de ativo imobilizado (9.865) (138.746)TOTAL DAS ATIVIDADES DE INVESTIMENTO (9.865) (138.746)CAIXA GERADO NO PERÍODO (121.932) 575.945Variação de caixa, bancos e aplicações fi nanceiras

Disponibilidades no fi m do exercício 710.952 832.884Disponibilidades no início do exercício 832.884 256.939

VARIAÇÃO (121.932) 575.945

NOTAS EXPLICATIVAS ÀS DEMONSTRAÇÕES FINANCEIRAS31 de dezembro de 2011 e 2010

1. Contexto operacionalFundado em 1º/5/1998, o Centro de Educação, Estudos e Pesquisas – CEEP é uma associação sem fi ns lucrativos, de direito privado, constituída por tempo indeterminado. De caráter fi lantrópico, educacional, cultural e de promoção humana e social, o CEEP tem por objetivo: Elaborar estudos e pesquisas em educação, formação profi ssional e geração de renda; Desenvolver projetos formativos e de profi ssionalização para empregados e desempregados; Realizar programas de formação profi ssional para adolescentes, jovens e adultos, proporcionando formação sistemática, realizando cursos e estágios de formação e atuando como incubadora tecnológica; Estabelecer convênios e/ou relações de cooperação com instituições públicas e privadas, Associaçãos do movimento social e sindical, de âmbito nacional e internacional, para consecução de objetivos comuns; Propiciar aos participantes o desenvolvimento técnico, cultural, ético e educativo, visando a integração e a promoção social; Incentivar comportamentos de participação e solidariedade, criando ou estimulando, para esse fi m, atividades, movimentos, organismos e associações; Criar, aperfeiçoar e difundir uma metodologia que instrumentalize os seus objetivos, assim como divulgar resultados e/ou avaliação de pesquisas, estudos e experiências educativas; Produzir fi lmes e materiais áudios–visuais, impressos e periódicos de caráter informativo, educativo e científi co para desenvolver suas atividades; Promover, debater e participar de simpósios, mesas redondas, concursos e cursos sobre questões ligadas aos objetivos do CEEP; e Editar publicações ligadas as suas atividades.

2. Apresentação das demonstrações fi nanceiras e principais práticas contábeis adotadasa) Base de apresentação. As demonstrações fi nanceiras foram elaboradas de acordo com as práticas contábeis adotadas no Brasil, aplicáveis a

associações sem fi ns lucrativos, as quais abrangem a legislação societária, os Pronunciamentos, as Orientações e as Interpretações emitidas pelo Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC), com destaque para o Pronunciamento Técnico CPC–PME – Contabilidade para Pequenas e Médias Empresas, aprovado pela Resolução de no. 1.255/09 do Conselho Federal de Contabilidade.

b) Base de mensuração. As demonstrações fi nanceiras são preparadas pelo custo histórico.c) Moeda funcional e de apresentação. Essas demonstrações fi nanceiras são apresentadas em Real, moeda funcional da Associação. Todas as infor-

mações fi nanceiras apresentadas em Real foram arredondadas para o valor mais próximo, exceto quando indicado de outra forma.d) Uso de estimativas e julgamento. As demonstrações fi nanceiras incluem várias estimativas; entre elas, aquelas referentes à determinação das vidas

úteis do ativo imobilizado e sua recuperabilidade nas operações, avaliações de ativos fi nanceiros pelo seu valor justo e pelo método de ajuste a valor presente, assim como análise dos demais riscos na determinação das demais provisões necessárias para passivos contingentes e similares. Por serem estimativas é possível que os resultados reais possam apresentar variações.

e) Principais práticas contábeis. As principais práticas contábeis adotadas para a elaboração das demonstrações fi nanceiras são resumidas a seguir:

Ativos fi nanceiros e passivos fi nanceirosA Associação possui instrumentos fi nanceiros não–derivativos como caixa e equivalentes de caixa, outros recebíveis e contas a pagar. A Associação não efetuou transações envolvendo instrumentos fi nanceiros para fi ns de reduzir seu grau de exposição a riscos de mercado, de moeda e taxas de juros. Não foram desenvolvidas transações envolvendo instrumentos fi nanceiros com o objetivo de especulação. A Associação em 31 de dezembro de 2011 e 2010 não possuía saldos de ativos fi nanceiros mantidos para negociação ou designado ao valor justo por meio de ganhos e perdas.Disponibilidades e aplicações fi nanceirasEstas contas são registradas ao custo acrescido dos rendimentos auferidos até a data do balanço, de acordo com as taxas pactuadas com os bancos, até o limite de seu valor de mercado.Demais ativosOs demais ativos são apresentados pelo menor valor entre o valor de custo, incluindo, conforme aplicável, os rendimentos e as variações monetárias auferidas, ou de realização.ImobilizadoAvaliado pelo custo de aquisição, deduzido das depreciações acumuladas igualmente corrigidas e são depreciadas de acordo com as taxas mencio-nadas na nota explicativa 6. A Administração da Associação promoveu a revisão e avaliação das taxas de depreciação e entende que os percentuais utilizados pela Associação são adequados para representar a vida útil dos bens, bem como constatou que não há ativos registrados contabilmente por um valor superior àquele passível de ser recuperado por uso ou por venda.Passivo circulanteOs passivos circulantes estão demonstrados pelos valores conhecidos ou calculáveis, acrescidos, quando aplicável, dos correspondentes encargos e das variações monetárias incorridas, previstas contratual ou legalmente.Apuração do superávitO superávit (défi cit) do exercício é apurado em conformidade com o regime de competência. Os recursos provenientes de parcerias e convênios são contabilizados como receitas quando aplicados nos projetos; em decorrência, os montantes ainda não utilizados fi cam registrados no passivo circulan-te, representando a parcela que ainda deverá ser aplicada nos projetos, acrescida dos rendimentos fi nanceiros auferidos de sua aplicação. As receitas de doações e contribuições voluntárias são contabilizadas quando recebidas. As despesas com projetos, assim como as demais despesas e receitas são contabilizadas observando o regime de competência de exercícios.Isenção tributáriaPor constituir–se como associação sem fi ns lucrativos a Associação, de acordo com a legislação tributária brasileira, é isenta do recolhimento de impos-tos e contribuições federais sobre os resultados contábeis.

3. Disponibilidades

31/12/2011 31/12/2010Caixa 4.355 77C/C Banco do Brasil S/A — Educ. e Gestão 13.540 –C/C Banco do Brasil S/A — Educ. Profi ssional 23.587 –C/P Banco do Brasil S/A — Educ. Profi ssional 69 65C/C Bradesco — Educ. e Arte 45 44C/C Nossa Caixa Nosso Banco — Baile Soul Brasil – 1.142C/C Banco do Brasil S/A — Educ. Étnica 20.155 384C/C Banco do Brasil S/A — EJA Conv 015/2011 227 –C/C Banco do Brasil S/A — Recreio nas Férias 8.979 –Aplicação CDB DI Banco do Brasil — Institucional 239.500 –Aplicação fundo Banco do Brasil — Institucional 28.704 –Aplicação CDB Banco do Brasil — Institucional 87.500 –Aplicação fundo Banco do Brasil — Educ. Gestão – 79.760Aplicação fundo Banco do Brasil — Educ. São Bernardo – 137.778Aplicação fundo Banco do Brasil — Educ. Profi ssional – 14.734Aplicação CDB Banco do Brasil — Educ. Gestão 49.691 49.691Aplicação fundo Banco do Brasil — Educ. Profi ssional 65.293 72.360Aplicação fundo Banco do Brasil — Educ. Social 169.307 323.719Aplicação fundo Banco do Brasil — Educ. Social – 153.130Totais 710.952 832.884

As aplicações fi nanceiras no Banco do Brasil S. A. referem–se a fundo de investimento em renda fi xa ou CDB. Por tratar–se de operações de alta liquidez, que são prontamente conversíveis em um montante conhecido de caixa e que estão sujeitas a um insignifi cante risco de mudança de valor, tais aplicações foram consideradas como disponibilidades. Nomes de projetos no fi nal da conta se referem a contas bancárias movimentadas exclusi-vamente para operacionalização de termos de parcerias ou projetos faturáveis mantidos com os respectivos fi nanciadores.

4. Contas a receber

31/12/2011 31/12/2010

Serviços faturados e executados 464.303 255.065

Serviços faturados a executar – 535.856

Totais 464.303 790.921

5. Outras contas a receber

31/12/2011 31/12/2010

Adiantamentos trabalhistas 7.696 44.640

Custos de projetos a reembolsar 123.005 –

Adiantamentos a fornecedores – 630

Totais 130.701 45.270

6. Imobilizado

Tempo de vida útil

Saldo em 31/12/2009 Adições

Saldo em 31/12/2010 Adições

Saldo em 31/12/2011

Móveis e utensílios 10 anos 11.179 19.894 31.073 3.656 34.729

Computadores e periféricos 4 anos 42.830 2.408 45.238 1.689 46.927

Máquinas e equipamentos 10 anos 64.404 27.444 91.848 4.520 96.368

Instalações 10 anos 300 – 300 – 300

Imóveis 15 anos – 89.000 89.000 – 89.000

Total custo histórico 118.713 138.746 257.459 9.865 267.324

Móveis e utensílios (991) (9.172) (10.163) (3.382) (13.545)

Computadores e periféricos (2.268) (24.198) (26.466) (9.273) (35.738)

Máquinas e equipamentos (8.511) (11.160) (19.671) (9.409) (29.080)

Instalações (60) (90) (150) (30) (180)

Imóveis – (494) (494) (5.933) (6.428)

Total depreciação acumulada (11.830) (45.114) (56.944) (28.027) (84.971)

106.883 93.632 200.515 (16.162) 182.353

7. Serviços faturados a executar

31/12/2011 31/12/2010

Valor faturado – 535.856

Impostos incidentes – (26.793)

Totais – 509.063

8. Adiantamento de projetos

Não auditado

Projetos 2.009 2.010 2.011

Contribuição recebida 750.207 698.582 763.939

Receita Financeira 227 4.092 10.677

Recuperação de despesas e outros 9.346 6.873 (544)

Custos empenhados 759.779 704.091 766.746

Educ Profi ssional – Proj Florestan Fernandes – 5.456 12.782

Contribuição recebida – 1.705.254 379.781

Receita fi nanceir – 23.296 8.108

Recuperação de despesas – 7.487 30.884

Custos empenhados – 1.620.604 657.211

Reclassifi cação de saldo para o ativo – – (123.005)

Educação Gestão – São Bernardo do Campo – 115.432 –

Contribuição recebida – 20.000 –

Custos empenhados – 19.616 384

Educação Étnica – P.M.S.P – 384 –

Contribuição recebida – – 2.361.969

Custos empenhados – – 2.359.341

Conv 015/2011 – São Bernardo do Campo – – 2.627

Contribuição recebida 942.181 376.271 20.000

Receita fi nanceira 227 27.388 –

Recuperação de despesas 9.346 14.360 1.814

Custos empenhados 951.754 418.019 21.814

Projetos já encerrados – – –

Contribuição e rendimentos recebidos 1.711.533 2.883.602 3.576.627

Custos empenhados 1.711.533 2.762.330 3.805.495

Reclassifi cação de saldo para o ativo – – (123.005)

Totais e saldo do adiantamento – 121.272 15.409

Educação profi ssional — Fundação Florestan Fernandes. Síntese: Programa de elevação de escolaridade com ênfase no mundo do trabalho e com certifi cação sócio–profi ssional para jovens acima de 16 anos e adultos. O programa está ligado ao Termo de Convênio 004/2007 assinado em 22/1/2007 e que vêm recebendo renovações anuais. Período: 22/1/2007 a 31/12/2012.Valor contratual: R$ 2.656.215 (totais desde 2008). Valor contratual não recebido até 2012: R$ 187.022.

Educação gestão — Prefeitura do Município de São Bernardo do Campo. Síntese: Programa com objetivo de oferecer cursos de qualifi cação profi ssional para jovens e adultos nos termos da Lei 9.394/1996. O programa está ligado ao Termo de Convênio 010/2011–SE assinado em 5/4/2010 e encerrado em 4/4/2011.Período: 11/6/2007 a 4/4/2011Valor contratual: R$ 2.533.336. Valor contratual não recebido até 2011: R$ 448.301

Educação étnica — Prefeitura do Município de São Paulo. Síntese: Programa visando realizar atividades de interesse público relativos ao projeto de prevenção à discriminação racial e garantia dos direitos humanos. O programa está ligado ao Termo de Convênio PA 2011–0.044.703–7 assinado em 17/8/2011.Período: 11/6/2007 a 8/9/2011Valor contratual: R$ 20.000. Valor contratual não recebido até 2011: R$ 0

Conv 015/2011 — Prefeitura do Município de São Bernardo do Campo. Síntese: Programa com objetivo de oferecer cursos de qualifi cação profi ssional para jovens e adultos nos termos da Lei 9.394/1996. O programa está ligado ao Termo de Convênio 015/2011–SE assinado em 5/4/2011 e que vêm recebendo renovações anuais.Período: 5/4/2011 a 31/12/2011Valor contratual: R$ 2.361.969. Valor contratual não recebido até 2011: R$ 0

9. ContingênciasNão existiam contingências em andamento contra a Associação em 31 de dezembro de 2011.

10. Patrimônio socialAs rendas geradas pela Associação são empregadas integralmente nos seus objetivos sociais comentados na Nota 1. Em caso de extinção da Associação, que se dará somente em caso de Lei e por decisão de Assembléia Geral, desde que convocada com essa fi nalidade, os bens patrimoniais serão obriga-toriamente doados para outra associação sem fi ns lucrativos, de objetivos semelhantes.

SERGIO IPOLDO GUIMARÃES PINHEIRO CÍCERO UMBELINO DA SILVA JANILSON DAS NEVES PRESIDENTE TESOUREIRO CONTADOR CRC 1SP15686209

Relatório dos auditores independentes sobre as demonstrações fi nanceiras

Ao Centro de Educação, Estudos e Pesquisas — CEEP– São Paulo – SP

1. Examinamos as demonstrações fi nanceiras do Centro de Educação, Estudos e Pesquisas – CEEP que compreendem o balanço patrimonial em 31 de dezembro de 2011 e as respectivas demonstrações do superávit, das mutações do patrimônio social e dos fl uxos de caixa, para o exercício fi ndo naquela data, assim como o resumo das principais práticas contábeis e demais notas explicativas.

Responsabilidade da administração sobre as demonstrações fi nanceiras2. A Administração da Associação é responsável pela elaboração e adequada apresentação das demonstrações fi nanceiras de acordo com as práticas contábeis adotadas no Brasil, assim como pelos controles internos que ela determinou como necessários para permitir a elaboração dessas demonstra-ções fi nanceiras livres de distorção relevante, independentemente se causada por fraude ou erro.

Responsabilidade dos auditores independentes3. Nossa responsabilidade é a de expressar uma opinião sobre essas demonstrações fi nanceiras com base em nossa auditoria, conduzida de acordo com as normas brasileiras e internacionais de auditoria. Essas normas requerem o cumprimento de exigências éticas pelos auditores e que a auditoria seja planejada e executada com o objetivo de obter segurança razoável de que as demonstrações fi nanceiras estão livres de distorção relevante.

4. Uma auditoria envolve a execução de procedimentos selecionados para obtenção de evidência a respeito dos valores e divulgações apresentados nas demonstrações fi nanceiras. Os procedimentos selecionados dependem do julgamento do auditor, incluindo a avaliação dos riscos de distorção relevante nas demonstrações fi nanceiras, independentemente se causada por fraude ou erro. Nessa avaliação de riscos, o auditor considera os con-troles internos relevantes para a elaboração e adequada apresentação das demonstrações fi nanceiras da Associação para planejar os procedimentos de auditoria que são apropriados nas circunstâncias, mas não para fi ns de expressar uma opinião sobre a efi cácia desses controles internos da Asso-ciação. Uma auditoria inclui, também, a avaliação da adequação das práticas contábeis utilizadas e a razoabilidade das estimativas contábeis feitas pela Administração, bem como a avaliação da apresentação das demonstrações fi nanceiras tomadas em conjunto.

5. Acreditamos que a evidência de auditoria obtida é sufi ciente e apropriada para fundamentar nossa opinião.

Opinião6. Em nossa opinião, as demonstrações fi nanceiras referidas no parágrafo 1, apresentam, adequadamente, em todos os aspectos relevantes, a posição patrimonial e fi nanceira do Centro de Educação, Estudos e Pesquisas – CEEP em 31 de dezembro de 2011, o desempenho de suas operações e os seus fl uxos de caixa para o exercício fi ndo em 31 de dezembro de 2011, de acordo com as práticas contábeis adotadas no Brasil.

São Paulo, 25 de julho de 2012.

Pontevedra Assessoria Empresarial e Contábil Ltda. Eduardo Nunes de Carvalho CRC 2SP023498/O–0 Contador CRC–1–SP–152980/O–4

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cultura de 30 de agosto a 5 de setembro de 2012 11

Eduardo Campos Limade São Paulo (SP)

A PRECARIZAÇÃO das políticas pú-blicas para a cultura e a concentração de recursos e meios de produção cul-tural nas mãos do empresariado – com incentivo do Estado – são alguns dos principais problemas históricos que os grupos de teatro paulistanos enfren-tam. Nos últimos anos, contudo, a es-peculação imobiliária tem aparecido como uma das formas mais danosas de impedir a atividade dos coletivos. A al-ta dos preços de terrenos e imóveis em todas as regiões da cidade – principal-mente no centro – difi culta tremenda-

descaso público”, afi rmam, em relatório sobre os trabalhos, Paula Cortezia e Os-valdo Pinheiro.

Os participantes deste fórum criaramum espaço de informes sobre essa pau-ta, no site da Cooperativa, e planejampublicar, mensalmente, um relato dasocupações promovidas por coletivos ar-tísticos em espaços ociosos. “A intenção é que os relatos sirvam para o aprendi-zado daqueles que se propuserem a esse tipo de ação, nos próximos tempos”, ex-plica Pinheiro. Uma das possíveis pro-postas é a ocupação coletiva dos imó-veis, de modo que vários grupos divi-dam um mesmo “ateliê compartilhado”.

Politicamente, um passo importante será estreitar as relações com movimen-tos sociais – principalmente os de mora-dia, que, de acordo com os organizado-res do debate, devem contribuir bastan-te para a articulação dos grupos em tor-no dessa pauta.

Miguel Urbano Rodrigues

TIVE A OPORTUNIDADE de acompa-nhar na Europa e na América Latina fes-tas de Partidos Comunistas.

Não conheci Festa como a do Avante!É diferente pela concepção e pelo obje-

tivo, mas sobretudo pela atmosfera hu-manizada.

Não esqueci a primeira festa, em Al-cântara, no Pavilhão da Feira das Indus-trias no ano de 1976.

Foi um grande acontecimento popu-lar, mas fi cou logo transparente que aquele espaço era inadequado. No ano seguinte, a festa mudou-se para o vale do Jamor, e adquiriu um formato dife-rente, a céu aberto.

Durante os seus três dias atraiu mul-tidões.

Pela dimensão e pelo seu signifi ca-do político, a iniciativa começou a inco-modar a burguesia. A Prefeitura de Lis-boa, proprietária dos terrenos do Jamor, criou tais entraves à cedência do lugar, que a festa, no seu quarto ano, foi força-da a mudar-se para as colinas do Alto da Ajuda, um descampado de difícil acesso na periferia da capital.

Mas para desespero da direita o êxito não parou de crescer. O prestígio da fes-ta atravessou as fronteiras e a participa-ção de dezenas de partidos comunistas e outras organizações progressistas em stands próprios e a sua presença no co-mício de encerramento conferiram pro-jeção internacional ao grandioso conví-vio revolucionário dos comunistas por-tugueses.

A campanha que visava o seu apaga-mento prosseguiu e intensifi cou-se. A festa foi escorraçada do Alto da Ajuda e transferida para Loures, um município então comunista, contíguo a Lisboa.

Aí se instalou durante dois anos. Em trânsito, porque a direção do PCP, ti-rando conclusões da perseguição per-manente à sua festa, tomou a decisão de criar para ela uma sede própria.

Encontrou-a na Quinta da Atalaia, uma antiga exploração agrícola, situa-da à beira da Margem Sul do estuário do Tejo, um recanto verde e tranquilo de se-rena beleza.

Porventura mudou a festa ao adquirir um estatuto sedentário desde 1990?

Sim e não.É a 34ª. Mais organizada, sem poei-

ra, com maior presença da cultura – es-petáculos, música, canto, dança, teatro, cinema, pintura, literatura, exposições, conferências, debates etc. – continua a ser um acontecimento político promo-vido por um Partido que se assume co-mo marxista-leninista, mobilizado para a luta contra o capitalismo e a constru-ção do socialismo.

A componente ideológica não impede que a festa refl ita a imagem da diversi-dade de Portugal.

Cada Distrito no seu espaço – conce-bido e instalado pela organização regio-nal – apresenta a imagem de Portugal na perspectiva comunista, desde as lutas revolucionárias da sua gente à produção, à cozinha e ao artesanato.

Ao abrir as portas, sempre no primeiro fi m-de-semana de setembro, cada festa é o desfecho de 20 mil horas de trabalho voluntário de 12 mil militantes (e ami-gos) realizado ao longo do ano.

O que falta hoje na festa? Não é fá-cil encontrar ali ausências porque além dos stands das regiões o visitante des-cobre o Pavilhão Central (onde se po-de aprender muito sobre a história do Partido), uma Cidade Internacional, os espaços do livro, da ciência, das artes, da juventude e da criança, os pavilhões da mulher, da emigração, dos imigran-tes e outros.

Não há estatísticas sobre o total de pessoas que cada ano visita a festa. Mas são muitas centenas de milhares.

A grande parte não é do PCP. O Parti-do tem hoje somente 70 mil fi liados.

Mas a festa gera um fenômeno de os-mose que surpreende os estrangeiros. Irradia uma atmosfera de fraternidade que não é identifi cável em qualquer ou-tra, um sentimento que transcende a ale-gria, comovente.

A atitude comunista está na origem desse contágio.

Merece referência o fato de dois des-tacados jornalistas, intelectuais de di-reita da mídia de Portugal, Marcelo Re-belo de Sousa e Miguel Esteves Cardoso, terem dedicado artigos altamente elo-giosos a essa atmosfera fraterna da fes-ta. Não esperavam encontrar “aquilo” e quase lamentam sentir a necessidade de afi rmar que Portugal seria melhor se o povo tomasse como modelo o ambiente da festa do Avante!

Ali não registaram atitudes agressi-

A festa do Avante!

vas, discussões azedas, cada um pare-cia amigo do desconhecido que lhe diri-gia a palavra.

São os comunistas portugueses seres excepcionais?

Não. A festa desenvolve-se numa mi-cro atmosfera profundamente humani-zada. Uma criação comunista? Sim. É o grande coletivo do Partido, soma de ho-mens e mulheres muito diferentes, que a torna possível. Tal como acontece nas

revoluções em que naqueles que por ela se batem se produz uma ascese que faz desabrochar as suas melhores potencia-lidades, na festa do Avante! ocorre al-go similar.

Ali emergem as virtudes; submergem, desambientadas, a hipocrisia, a inveja, a avareza, os instintos agressivos.

E os não comunistas são contagia-dos pela fraternidade, pela solidarie-dade comunista. Na Quinta da Atalaia

transmutam-se durante três dias de se-tembro. O coletivo partidário recorda o25 de Abril, vai mais longe, reencontra-se na festa com o sonho comunista. OPortugal de hoje é uma terra de muitospárias e um punhado multimilionários,submetida a uma ditadura do capital edo imperialismo.

Mas a esperança numa sociedade hu-manizada, melhor, permanece latente, viva. Essa esperança forte, quente, de in-centivo à luta que Álvaro Cunhal conse-guia transmitir como ninguém nos dis-cursos de encerramento da festa.

Abril parecia impossível e aconteceu.O fi m do refl uxo da História pode tar-

dar mas chegará inevitavelmente.Os co-munistas portugueses não temem o fu-turo. Um dia Portugal será uma socieda-de com a atmosfera de fraternidade de uma gigantesca festa do Avante!

Miguel Urbano Rodrigues é jornalista eescritor português.

mente o aluguel de espaços adequados à ocupação artística. Ao mesmo tem-po, uma grande quantidade de prédios, terrenos e galpões antigos permanece vazia e sem uso algum.

Diante dessa contradição, diversos nú-cleos artísticos estabeleceram, em par-ceira com a Cooperativa Paulista de Te-atro, um fórum de discussões para cons-truir uma proposta de ocupação coletiva de espaços públicos ociosos. Os artistas, que têm se encontrado de maneira mais contínua desde o fi m de 2011, forma-ram comissões de trabalho para a pes-quisa e organização de dados relativos a esses espaços – e já concluíram uma primeira lista de imóveis que poderiam sediar iniciativas culturais (o relatório pode ser acesso em www.cooperativadeteatro.com.br/2010/?p=7124).

Além da pesquisa, esse fórum promo-veu debates com a participação de nú-cleos que já ocupam locais públicos, pa-ra que compartilhassem suas experiên-cias, e organizou uma conversa com o professor Francisco Alambert, docente da Universidade de São Paulo e mem-bro do Conselho de Defesa do Patrimô-nio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat).

“As ações, de modo geral, contri-buem para a politização do debate, que põe em pauta a reivindicação por espa-ços que, por estarem ociosos, não aten-dem a sua função social, reservados em nome da especulação imobiliária ou do

Ocupação de espaços públicos de São PauloTEATRO Diversos núcleos artísticos estabeleceram, em parceira com a Cooperativa Paulista de Teatro, um fórum de discussões para construir uma proposta de ocupação coletiva de espaços públicos ociosos

OPINIÃO Portugal seria melhor se o povo tomasse como modelo o ambiente da festa do Avante!

Politicamente, um passo importante será estreitar as relações com movimentos sociais – principalmente os de moradia

Um dia Portugal será uma sociedade

com a atmosfera de fraternidade de

uma gigantesca festa do Avante!

Milhares de pessoas se reúnem na Quinta da Atalaia, na freguesia de Amora, no conselho do Seixcal, para a Festa do Avante

Realizada anualmente com trabalho voluntário, a festa é aberta a todos, independente de ideologias

Nuno Castro/CC

José

Gou

lão/

CC

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culturade 30 de agosto a 5 de setembro de 201212

Horizontais: 1.Neologismo popularizado pelo deputado Roberto Jefferson para referir-se a

uma “mesada” paga a deputados para votarem a favor de projetos de interesse do então go-

verno Lula – Tema que “sequestrado” pela direita se transformou em discurso politicamente

correto de indignação. 2.Grupo que busca a independência do País Basco – Pequena rua.

3.Uma das cartas do baralho - Tirar, com instrumento próprio, partes da superfície de um

corpo sólido – Marca de absorvente íntimo que se transformou em sinônimo desse tipo de

absorvente. 4.Fêmea do cachorro – O pai (?) histórias infantis para o seu fi lho. 5.Uma forma

de saudação – Permutado – O maior deserto de (?) do mundo fi ca na Bolívia. 6.Catedral – Pe-

na. 7.Tira o nó – Sigla para o aviso de recebimento do Correio – Do latim “sonus”. 8.Ganho

líquido – Sigla do estado da Califórnia, nos Estados Unidos. 9.Que custa mais dinheiro que

aquele que se pode ou se quer gastar – Sigla de tonel. 10.Reza. 11.Bloco alternativo à Alca

(Área de Livre Comércio das Américas) – Como o bilionário Eike Batista chamou o recém-

lançado Programa de Investimento em Logística do governo federal.

Verticais: 1.Zona de livre comércio e política comercial comum da América do Sul, cujo

mais novo integrante é a Venezuela. 2.Extra Terrestre – Alagoas – “Ele”, em espanhol. 3.Bolsa

de valores eletrônica dos EUA. 4.Costa (?), país da América Central. 5.Humilhado, desonrado.

7.Articulação Nacional de Agroecologia – Sigla de Rio Grande do Sul – Comitê Olímpico

Internacional. 8. “Arte”, em inglês. 9.Rote Armee Fraktion, organização guerrilheira alemã de

extrema esquerda. 10.Qualidade de quem quer saber de tudo (fem.). 11.Organização dos

Estados Americanos – Sigla de Ceará. 12.Sigla da Fundação Rosa Luxemburgo, no original,

em alemão – Município do Rio Grande do Norte da região de Seridó. 13.Alimento à base

da cana-de-açúcar com alto valor energético. 14.Unidade de Tratamento Intensivo. 15.País

da América do Sul que há cinco anos sofreu um forte terremoto.17.Sobrecarregado (bras.).

18.Usina hidrelétrica que teve a paralisação de sua construção esse mês.

Horizontais: 1.Mensalão – Corrupção. 2.ETA – Ruela. 3.Ás – Raspar – OB. 4.Cadela – Lê. 5.Olá – Trocado – Sal. 6.Sé – Dó. 7.Desata – AR – Som. 8.Lucro – CA. 9.Caro – Ton. 10.Ora. 11.Alba – Kit felicidade.

Verticais: 1.Mercosul. 2.ET – AL – Él. 3.Nasdaq. 4.Rica. 5.Aviltado. 7.ANA – Rs – COI. 8.Art. 9.RAF. 10.Curiosa. 11.OEA – CE. 12.RLS – Acari. 13.Rapadura. 14.UTI. 15.Peru. 17.Atolado. 18.Belo Monte.

PALAVRAS CRUZADAS

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Pedro Carrano

SÃO QUATRO DA MANHÃ e eu poderia estar em qualquer lugar do mundo, mas estou andan-do pelo centro de Curitiba (PR). Para ser mais exato, próximo a um parque onde as árvores for-mam um grande pano de fundo para a luz dos postes. Um ônibus viria bem a calhar, mas não há como fi car parado neste frio.

Os poucos carros que passam não param nos sinais, as ruas estão um deserto só. Lembro que relutei para sair esta noite. Além do frio, sou um bocado solitário; é difícil trocar a segurança de um quarto por qualquer outra coisa. E não é só isso. Na verdade, eu não bebo, e isso é um cri-me para os amigos com quem costumo sair. Nem sei por que bebem, se nem mesmo na bebida são capazes do menor gesto humano. Meus amigos são mais interessantes que uma manada de elefantes, escreveu um poeta fi ctício destas noites tão reais.

Perto de uma esquina um pouco mais iluminada, me consolo por faltarem só cinco quadras para chegar ao meu prédio. A sola do tênis chia com o chão irregular, a calça roça uma perna na outra, fazendo ruído junto com o sobretudo. Em frente à entrada do parque, me surpreendo com um vulto que surge estriado pela sombra do portão. Gritar e coisas do gênero não são re-ações autênticas a este tipo de cena, o corpo apenas gela e segue adiante, enquanto a prostitu-ta me diz uma graça qualquer.

O vulto do parque me deixa mais alerta a tudo o que acontece por perto. Não foi difícil perce-ber outro sujeito que caminha no mesmo sentido que eu, só que do outro lado da rua. Como se-rá agonizar com uma faca atolada em meu estômago, por não ter coragem de dizer Não tenho nada, chefe, ou não conseguir despertar a compaixão do cara para isso? Continuamos os dois no mesmo fl uxo, eu um pouco mais à frente, tentando apressar o passo.

Esboço uma atitude e, tentando desencorajar o outro, atravesso a rua, talvez como forma de intimidá-lo, para que ele não venha primeiro. Porém, continuo à sua frente. Agora tudo piorou, pois estou andando de costas para meu inimigo, sem coragem de olhar para trás, ouvindo ape-nas seus passos atrás de mim. Falta só uma quadra para chegar ao prédio, quem sabe eu consi-ga. O que me preocupa é se o porteiro vai abrir o portão de imediato. Um telefonema de celular só vai chamar a atenção do marginal.

Em frente à portaria do meu prédio, porém, outra pessoa está encostada na grade. Veste um sobretudo e tem a cabeça guinada na minha direção. Se eu diminuir o passo, corro o risco de ser assassinado pelo inimigo atrás de mim. E o novo cara pode ser um ajudante do marginal, bloqueando a passagem.

Num impulso, atravesso a rua de novo. Passo em frente ao meu prédio, que me acena com sua fachada triste. Estou tomado pelo medo e observo com o canto dos olhos ele bruscamente vindo até mim. O suspeito tem o rosto coberto pela escuridão. Suas palavras são incompreen-síveis. Saio correndo. Ele vem atrás. Eu previa.

Já estou a uma quadra longe de casa e decido virar à direita, contando com que o homem sem rosto não persista. Mas ele persiste e só me resta, desta vez, descer tudo aquilo que eu tinha conquistado, pela rua paralela. Quando vejo já estou com os pés fazendo eco na madrugada, tão rápido corro, deslizando sobre as calçadas irregulares. Em pouco tempo, desço a quadra e pego à direita de novo, buscando voltar à portaria. No caminho me arrependo, temo dar de cara com o primeiro perseguidor – o marginal –, mas algo me mantém fi rme, em frente.

Chego ao meu prédio. A princípio não há ninguém por perto, e toco o interfone, mas ninguém responde. Olho para o lado e o homem sem rosto ainda não apareceu. Com os lábios secos e a respiração ofegante, me encosto no portão, à procura de alguma ideia. Frustrado, vejo um no-vo homem subindo a rua, com passos apressados. Estou tão exausto que sou capaz de me en-tregar. Atrás dele segue um sujeito, um pouco mais lento. Antes de se aproximar de mim, o pri-meiro parece se assustar, atravessa a rua e sai correndo. Reconheço a fi gura: é Pedro, morador aqui do prédio. Não entendo o que o faz sair no pinote. Desinteressado, o homem que vinha atrás dele já havia dobrado a esquina e desaparecido. De qualquer modo, é melhor correr atrás para alertá-lo sobre o homem sem rosto.

Pedro Carrano é jornalista – Este texto é parte do livro Três Vértebras e um Primeiro Testamento, sele-ção de poesia e contos, a ser publicado em breve.

Homem sem rostoCONTO O suspeito tem o rosto coberto pela escuridão. Suas palavras são incompreensíveis. Saio correndo. Ele vem atrás. Eu previa

Quando vejo já estou com os pés fazendo eco na madrugada, tão rápido corro, deslizando sobre as calçadas irregulares

Olho para o lado e o homem sem rosto ainda não apareceu. Com os lábios secos e a respiração ofegante, me encosto no portão, à procura de alguma ideia

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américa latina de 30 de agosto a 5 de setembro de 2012 13

Darío Arandade Buenos Aires (Argentina)

ELE SE AUTODEFINE como “militan-te pelos direitos humanos”. E deixa em segundo plano o Prêmio Nobel da Paz, com o qual fi cou internacionalmente co-nhecido em 1980. Adolfo Pérez Esquivel começou sua militância em 1971. Dois anos depois fundou o periódico Paz e Justiça, espaço de encontro para organi-zações e militantes. Em 1975 participou da criação da Assembleia Permanente pelos Direitos Humanos (APDH) e, en-tre 1977 e 1978, esteve preso na Argenti-na por ordem da ditadura militar.

Desde a década de 1970 Esquivel acompanha os povos indígenas da Amé-rica e, a partir de 2010, passou a ter par-ticipação ativa no acompanhamento da comunidade Qom, na província de For-mosa. “O governo nacional não quer so-lucionar o confl ito; prioriza seus aliados provinciais”, resume sobre a situação em Formosa. Acrescenta, ainda, qual a visão global do modelo extrativista (mi-neração, soja): “Os povos dizem não a essas atividades, por exemplo o de Es-quel ou o de Andalgalá, mas o gover-no diz sim às empresas porque priori-za o interesse econômico sobre a vida do povo”.

Pérez Esquivel adverte sobre a grande repressão sobre aqueles que se opõem ao modelo extrativista; denuncia que o Instituto Nacional para Asssuntos Indí-genas (Inai) “não trabalha para os po-vos originários, mas para os interesses dos governos”; aponta que o kirchneris-mo tem delimitado os direitos humanos no período de 1976 a 1983; e descrê que o novo secretário de Direitos Humanos (Martín Fresnada) acompanhe as atuais vítimas da repressão.

Félix Díaz [líder da etnia qom] sofreu na última semana um “acidente” na província de Formosa. Uma caminhonete lhe atingiu quando andava de moto e terminou no hospital. Díaz assegurou que não foi foi um acidente. Adolfo Pérez Esquivel – Falei com Félix. É terrível, um governo feudal que atenta contra todo aquele que exija seus direitos. Em muitas províncias sucede o mesmo; em Salta e Neuquén, os gover-nos fazem o que querem, não reconhe-cem os direitos dos povos originários e isto tem relação direta com as políticas do governo nacional.

Que políticas do governo nacional?

A política de não reconhecimento dos povos originários. Um exemplo claro é o INAI. Não trabalha para os povos ori-ginários, senão para os interesses dos governos, seja das províncias ou nacio-nal; mas não para o desenvolvimento dos povos originários.

Você esteve próximo da construção da mesa de diálogo pela comunidade La Primavera, ao fi nal de 2010.

Foi lamentável a política do gover-no para com o Povo Qom, de Formo-sa. Não reconheceu Félix Díaz como lí-der qom apesar de a comunidade o ter elegido por ampla maioria. Permitiu o avanço dos Parques Nacionais sobre a comunidade e, ainda por cima, termi-nou suspendendo a mesa de diálogo.

Por que um governo que tem demonstrado sensibilidade com os direitos humanos e que tem levantado essa bandeira não respeita os direitos humanos dos povos indígenas?

O governo nacional não tem sensi-bilidade, têm interesse político nos di-reitos humanos que abarcam o perío-do de 1976 a 1983. Nem sequer aborda as atuações da AAA (Aliança Anticomu-

nista Argentina). O governo não quer entender de direitos humanos de antes de 1976 nem de depois de 1983. A polí-tica de direitos humanos está restringi-da à última ditadura militar.

Como se deve compreender os direitos humanos?

Nós entendemos os direitos huma-nos desde a sua integridade, o que cla-ramente deve incluir os direitos dos po-vos originários, os direitos de quem lu-ta contra a mineração. Por isso não en-tendo um projeto que se diz “nacional e popular” mas que não aborde essas si-tuações. Quanto a direitos humanos, há mais discursos que políticas.

À época do julgamento da utilização agrotóxicos no bairro Ituzaingó Anexo (Córdoba), você disse que o modelo agropecuário viola direitos humanos fundamentais. Algo similar disse Nora Cortiñas (Mães da Praça de Maio, uma de suas fundadoras)...

É que não se pode compreender de outra maneira. É não respeitar popula-ções inteiras, não respeitar culturas, de-vastar o ambiente, mudar a forma de vi-da das comunidades e provocar enfer-midades; são claras violações aos direi-

tos humanos. Não compreendo que se possa entender de outra maneira. Os povos dizem não a essas atividades, por exemplo em Esquel ou em Andalgalá, mas o governo diz sim às empresas por-que prioriza o interesse econômico so-bre a vida do povo.

Por que outros organismos de direitos humanos não denunciam o extrativismo?

Há duas questões. Muitos organis-mos provêm do drama da última dita-dura. Justiça por esses fatos é seu úl-timo objetivo, e está bem, não lhe di-go como crítica. Também há outros or-ganismos de direitos humanos que não denunciam a violência atual porque são aliados do governo e recebem fundos do governo. São opções. Nós estamos con-vencidos de que as políticas de direitos humanos são integrais. Se há crianças

morrendo de fome, não existe respeitoaos direitos humanos. E na Argentinacrianças morrem de fome. Faz duas se-manas estive com médicos de Córdobaque relatavam com tristeza a quantida-de de meninos e meninas desnutridos.

Além dos governos, parece que entre a opinião pública ou a sociedade há uma negação em relação aos direitos humanos dos povos indígenas. Um exemplo, quando assassinaram Mariano Ferreyra havia 50 mil pessoas na Praça de Maio. Quando mataram o qom Roberto López não havia mais de 600 pessoas em frente da Casa de Formosa.

Na Argentina há uma negação histó-rica e cultural em relação aos povos ori-ginários; não os reconhecem. A Argen-tina não olha para suas raízes, segue odiscurso de que “somos um país de imi-grantes”, quando na realidade essa é sóuma parte da história. É tanta discrimi-nação que até as universidades públi-cas nacionais, de Formosa e de La Pla-ta, retiram terras das comunidades ori-ginárias.

O respeito aos direitos de indígenas e camponeses é um dos pontos mais débeis do governo. Qual a sua expectativa para os próximos anos?

São questões não resolvidas. E la-mento dizer que não tenho expectativade que este governo cumpra [com o queseria seu dever] com as comunidadesoriginárias e com os camponeses.

Por quê? Porque não há políticas que vão além

do período de 1976 a 1983.

E em relação ao novo secretário de Direitos Humanos (Martín Fresneda)? É fi lho de desaparecidos, provém da militância e conhece de perto as consequências do modelo de agronegócio em Córdoba.

Sei, eu vim para vê-lo. Até agora nãotem feito absolutamente nada pelos po-vos originários. Não tenho a expectati-va de que faça cumprir os direitos hu-manos em sua integralidade. Não vejoisso. Se no futuro ver fatos concretos,lhe direi de imediato. Mas este governonem sequer dialoga com os povos origi-nários. O Inai joga contra as comunida-des, o Instituto Nacional contra a Dis-criminação (Inadi) também. O gover-no nacional e os provinciais, como o deFormosa, jogam até o desgaste duro.

Desgaste duro?Reuniões que não resolvem nada, sem

avanços. Um dia, junto a Félix [Díaz]estivemos das 17h até as duas da manhãna mesa de diálogo com o governo. E[Florencio] Randazzo (ministro do In-terior) nos dizia “ somos um país fede-ral, não podemos nos meter na provín-cia”. Por favor! Já somos grandes paraque nos diga isso! O governo nacionalnão quer solucionar o confl ito, priori-za seus aliados provinciais. A verdade éque não há avanços porque no governonão há vontade política de respeitar ospovos originários. É duro, mas não mecontaram, eu vivi.

O “desgaste duro” inclui a repressão?

O avanço da soja e da mineração in-clui ameaças, perseguições e claro queinclui repressão. Só observar Formosa,Santiago del Estero, Catamarca, La Rio-ja. É claro que os governos provinciaisque reprimem são aliados do governonacional. Exigimos que se deixe de per-seguir e de reprimir os que lutam, masnão somos otimistas nesse sentido. Vera La Cámpora (grupo político peronis-ta) fazendo campanha contra Félix [Dí-az], e apoiando Gildo Insfrán, é de nãoesperar uma mudança positiva.

O La Cámpora, com a atual deputado Andrés Larroque à frente, foi quem desalojou os qom da Avenida de Maio e da 9 de Julho, em maio de 2011.

Recordo essa expulsão. O La Cámpo-ra como força de choque contra os po-vos originários.

Por suas críticas lhe vão acusar de “fazer o jogo da direita”.

Não podem fazer isso. O jogo da direi-ta faz quem olha para o outro lado. Nósdenunciamos injustiças porque quere-mos um país melhor para todos e comverdadeiro respeito pelos direitos hu-manos, de todos. E sempre, há décadas,estamos do lado dos que sofrem. Nestecaso, estamos junto do Povo Qom. Deque lado está o La Cámpora? De que la-do está o governo? (Observatório dosDireitos Humanos dos Povos Originá-rios – ODHPI)

“Não há vontade política de respeitar os povos originários”ENTREVISTA Esquivel, prêmio Nobel da Paz critica governo argentino por ter uma visão limitada dos direitos humanos

“Também há outros organismos de direitos humanos que não denunciam a violência atual porque são aliados do governo e recebem fundos do governo”

“A Argentina não olha para suas raízes, segue o discurso de que ‘somos um país de imigrantes’, quando na realidade essa é só uma parte da história”

O Prêmio Nobel da Paz Adolfo Perez Esquivel

Félix Diaz, líder da comunidade Qom da província argentina de Formosa

Reprodução

Marcello Casal Jr./ABr

Page 14: Que a Justiça faça justiça, apesar da mídia fileque se pode fazer a ele e tantos ou-tros que deram sua vida pela justi-ça é não deixar que morra o mode-lo de Igreja pelo qual

américa latinade 30 de agosto a 5 de setembro de 201214

Damien Halleux-CC

Em Honduras, prisão perpétua Em seu informe anual, o Comissionado

Nacional de Direitos Humanos em Hondu-ras (Conadeh), Ramón Custódio, voltou a pedir que o Congresso hondurenho aprove sua petição para que as execuções extraju-diciais, cometidas por agentes do Estado, sejam punidas com prisão perpétua. Custó-dio enfatiza ainda que apesar das execuções extrajudiciais não serem uma política de Estado, se evidenciam atos arbitrários co-metidos por agentes com autoridade para exercer seu poder.

Lembrou que, ante as Organizações das Nações Unidas (ONU), se tipifi ca um caso como de execução extrajudicial quando existem provas ou suspeitas muito fortes de participação da autoridade no homicídio. Citou como casos paradigmáticos as execu-ções dos estudantes universitários Rafael Alejandro Vargas Castellanos e Carlos David Pineda Rodríguez e de Alfredo Landaverde, ocorridos em 2011 e do General Julián Aris-tides Gonzáles, ocorrido em 2009.

Além desses casos, Custódio citou que desde 2003, foram assassinadas em cir-cunstâncias violentas 32 pessoas vincula-das a meios de comunicação hondurenhos, entre jornalistas e comunicadores sociais. Segundo ele, existe no país um terrorismo

implantado por certas autoridades, particu-larmente a policial, que tem aterrorizado a população.

Chávez agradece solidariedade O presidente Hugo Chávez expressou seu

agradecimento aos povos e governos que se solidarizaram com Venezuela logo após o lamentável acidente na refi naria de Amuay. Chávez que visitou o local do acidente, en-viou também uma mensagem de alento ao povo venezuelano, exortou união e garantiu todo o apoio necessário para superar essa tragédia.

A refi naria de Amuay faz parte do Com-plexo de Refi naria de Paraguaná, que é considerado o maior do mundo, com ca-pacidade de processamento de mais de um milhão de barris de petróleo por dia. Mais de sessenta trabalhadores perderam a vida e centenas fi caram feridas na madrugada do dia 25, devido a um vazamento de gás que ocasionou a explosão de vários depósitos de combustível.

O presidente destacou o esforço de todas as equipes de emergência envolvidas no socorro às vítimas e pediu aos meios de co-municação a não especular, serem objetivos e a respeitar o momento de dor que enluta o povo venezuelano.

No Paraguai, juízo ético Foi apresentado, dia 24, o Juízo Ético ao

Parlamento Paraguaio. Os cidadãos poderão fazer suas acusações, um grupo de fi scais as estudarão, os acusados, ou seja, os legis-ladores terão um período de defesa e um tribunal dará um veredito fi nal. O Tribunal será composto pelos historiadores Ignacio Telesca e Magarita Durán, pelo Jurista Luis Lezcano Claude, pelo educador popular Dionisio Gauto, pela cientista política Line Bareiro e pelo linguista Bartolomeu Meliá.

Dionisio Guato relatou que a história dos júris populares vem desde a derrubada da ditadura de Alfredo Stroessner em 1989. Um dos últimos ocorreu contra a empresa de se-mentes Delta Pine – que depois foi adquirida pela Monsanto – por haver vendido semen-tes de algodão contaminadas que causaram a morte de 35 pessoas. Mas indicou que esse é o primeiro que irá julgar a atuação dos parla-mentares, que nesse caso serão julgados por sua conduta no processo que resultou na der-rubada do presidente Fernando Lugo.

O processo irá se desenvolver até o dia 22 de novembro, onde o tribunal avaliará as acusações e a argumentação da defesa, para dar o seu veredito. Caso seja apontado como culpado, a sentença ao Parlamento, mais que punitiva, terá um valor simbólico-político.

Comunidades e governo da Colômbia Está programada para essa semana um

novo encontro entre o governo da Colômbiae as comunidades indígenas do departa-mento de Cauca, onde se instalarão as trêsmesas de trabalho anteriormente acordadaspara tratar dos confl itos existentes nessazona do país.

Nesses grupos de trabalhos serão tratadostemas como direitos humanos, confl ito ar-mado, território, produção, cultura, educa-ção, saúde, entre outros.

A proposta é que o resultado desses deba-tes faça parte de um programa de desenvol-vimento para a região que, segundo o gover-no, será apresentado em setembro e paraonde se destinarão recursos para diminuir ahistórica desigualdade social existente nes-sas comunidades indígenas.

Participarão do encontro os líderes do Conselho Regional Indígena do Cauca (Cric), e pelo governo se espera a presença do mi-nistro do Interior, Federico Renjifo, (se con-tinuar no cargo), e o ministro da Defesa, JuanCarlos Pinzón.

Desta maneira se espera avançar nas so-luções do confl ito nesta zona, onde comuni-dades exigem do governo a desmilitarizaçãodo Cauca e o a apoio ao desenvolvimentoendógeno.

fatos de nossa américaJoaquín Piñero

Jonatas Camposde Caracas (Venezuela)

UM DOS PARADIGMAS mais aceitos na ciência política, ao estudar compor-tamentos eleitorais, está na constatação de que a diminuição dos abismos sociais e o fortalecimento da classe média ten-dem a enfraquecer o embate político-ideológico. Quem for aplicar essa lógica na Venezuela, porém, dará com os bur-ros n’água. A disputa entre os campos chavista e antichavista se acirra na mes-ma proporção em que o país se torna so-cialmente mais homogêneo, alcançando o topo do ranking latino-americano de distribuição da renda.

“A politização de todas as classes so-ciais, radicalizada desde a eleição do presidente Chávez, conduz a um posicio-namento que vai além de interesses ime-diatos dos diversos setores”, analisa Jes-se Chacon, diretor da Grupo de Investi-gação Social Século 21 (GIS XXI). “Aqui esquerda e direita, governo e oposição, vão às ruas para disputar projetos na-cionais, que ultrapassam reivindica-ções pontuais, benefícios econômicos ou avanços sociais.”

Participante da rebelião militar de 1992, quando o atual presidente lan-çou-se na tentativa de derrubar a IV Re-pública, Chacón era então um jovem te-nente que acabou atrás das grades junto com seu chefe. Engenheiro de sistemas e mestre em telemática, já foi ministro das Comunicações, do Interior e de Ciência e Tecnologia no atual governo. Com 46 anos, dedica-se a estudar a dinâmica po-lítico-social da Venezuela.

“O ponto central de tensão é que os proprietários dos meios de produção estão deixando rapidamente de ser os donos do poder político, o que provo-ca forte reação dos extratos mais altos e seu entorno”, ressalta. “A renda mé-dia dos 20% mais ricos não foi afetada, tampouco seu estilo de vida, mas per-cebem que não detém mais o comando sobre o Estado e a sociedade, o que lhes provoca medo e raiva.”

Nos setores mais pobres, atendidos por amplo repertório de políticas so-ciais e distributivistas, o comportamento é igualmente ditado por motivações que extrapolam conquistas ou expectativas econômicas. A combustão dessas cama-das, tendo na melhoria de vida seu pano de fundo, determina-se também pelo es-forço do presidente em travar permanen-temente batalhas por ideias e valores.

Desde o início de seu governo, mas de forma mais ampla depois do golpe de Estado em 2002, Chávez trata de ocu-par o máximo de espaço nos meios de comunicação. Seu discurso é voltado, quase sempre, para identifi car cada mo-vimento de seu governo como parte de um processo revolucionário, ao mesmo tempo em que fermenta entre seus se-guidores um sentimento de repulsa aos adversários das mudanças em curso.

Avesso à lógica da conciliação, o pre-sidente fez uma aposta pedagógica que aparentemente tem sido bem-sucedi-da: quanto maior a polarização, quanto mais cristalino o confronto entre pon-tos de vista, mais fácil seria criar uma

forte e mobilizada base de sustentação. Para os bons e os maus momentos.

A princípio, o fi o condutor da peda-gogia chavista foi o resgate da história e do pensamento de Simón Bolívar, o pa-triarca da independência venezuelana, chefe político-militar da guerra antico-lonial contra os espanhóis no século 19. Por esse caminho, Chávez imprimiu ao seu projeto forte marca nacionalista, que contrapôs aos novos senhores co-loniais (os Estados Unidos) e seus alia-dos internos (a elite local).

Aos poucos, juntou-se ao bolivaria-nismo original a sintaxe do socialis-mo histórico. Esse amálgama entre na-cionalismo de raiz e valores da esquer-da passou a ser difundido amplamente como código cultural que dá cara e cor às realizações do governo. O presidente foge, assim, da receita na moda, mes-mo entre correntes progressistas, de carimbar a política como uma questão de efi cácia. Para usar o velho jargão, Chávez é um político da luta de clas-ses, na qual aposta para isolar e derro-tar seus inimigos.

A oposição, animada pela predo-minância nos meios de comunicação, também colocou suas fi chas no enfren-tamento aberto. Além das reservas mi-diáticas, sempre contabilizou a seu fa-vor forças econômicas e relações in-ternacionais para mobilizar as cama-das médias contra o governo. Mesmo após o golpe e o locaute de 2002, no auge da polarização, os partidos anti-chavistas deram continuidade à estra-tégia da colisão.

Classe CMas ambos os lados atualmente têm

que levar em conta um novo fenôme-no. Mais de 30% da população trocou de extrato social. Migraram dos segmentos mais pobres para o que a sociologia das pesquisas chama de classe C – mais pro-priamente, viraram classe média.

O campo opositor se vê obrigado a re-conhecer certos avanços no terreno so-cial, ao contrário do rechaço absoluto anterior. A campanha de Capriles pro-mete preservar as missões sociais, ape-sar de propor em seu plano de governo a eliminação do Fonden, fundo de fi nan-ciamento dos programas abastecido com dinheiro do petróleo. Além disso, mode-ra relativamente sua mensagem, para poder dialogar com os setores benefi cia-dos pela V República.

Para os governistas também surgem novas questões. “O problema do pro-cesso é disputar corações e mentes des-se novo contingente de classe média”, afi rma Chacón. “Muitos dos que ascen-deram socialmente graças às iniciativas

governamentais abraçaram os valores morais e culturais das elites, cujo mo-do de vida é sua referência”. O ex-mili-tar focaliza especialmente a preservação das aspirações consumistas, o desapego a projetos e organizações coletivos, a ne-gação da identidade original de classe e, às vezes, até de raça.

As pesquisas diversas, tantos as do GIS XXI quanto dos institutos próxi-mos à oposição, apontam que emergiu, nos últimos anos, um grupo de eleitores informalmente referidos como os ‘ni-ni’. Ou seja, sem alinhamento automáti-co com Chávez ou com seus inimigos. A maioria de seus integrantes é parte des-sas camadas ascendentes.

Os ni-ni chegam a representar ao re-dor de 40% dos eleitores, contra igual montante de adeptos fi rmes do chavis-mo e 20% de oposicionistas fi éis. A es-querda, contudo, tem colhido resultados que ultrapassam suas fronteiras, gra-ças à combinação entre satisfação popu-lar com programas governamentais (es-pecialmente o da habitação) e o clima afetivo de solidariedade provocado pe-lo câncer de Chávez. O presidente vem beirando, nas pesquisas mais confi áveis, os 60% de intenção eleitoral para o plei-to de outubro, abrindo vantagem de 15% a 30% contra Capriles.

EstratégiasUm dos aspectos da estratégia pa-

ra vencer resistências entre esses seto-res híbridos, ao que parece, é desmon-tar a ideia, em grande medida forjada pelos veículos de comunicação vincula-dos à oposição, de que Chávez preten-de liquidar com a propriedade privada e colocar toda a atividade econômica nas mãos do Estado.

“O processo aumentou o número de proprietários no país, especialmente de-pois que começou a reforma agrária”, afi rma o diretor da GIS XXI. “O progra-ma da revolução se volta contra os mo-nopólios, fortalece o Estado, mas abre espaço para vários tipos de propriedade, de caráter privado, cooperativo ou social. O governo precisa defi nir melhor o papel de cada uma dessas modalidades para enterrar a imagem de fundamentalismo estatista que a oposição tenta vender.”

O candidato oposicionista, por sua vez, tem problema inverso. Representan-te de uma aliança formada por grandes empresários (como a cervejaria Polar, o grupo agroindustrial Mavesa e com-panhia alimentícia Alfonzo Rivas, en-tre outros), Capriles precisa convencer que é capaz de absorver ao menos par-te das medidas que, desde 1999, favore-ceram os 80% de eleitores que não estão nas classes A e B.

Seu programa de governo não aju-da muito. Mesmo tendo abrandado su-as críticas às políticas sociais do presi-dente, o ímpeto privatista está presente e com força. Não apenas fala em reduzir o Estado, reverter nacionalizações ou ti-rar a PDVSA do controle estatal, mas de-fende explicitamente que as terras de-sapropriadas dos grandes latifundiários voltem às mãos dos antigos donos. “Pri-meiro, precisamos acabar com as expro-priações, devemos trazer a segurança ao campo, dar confi ança a partir do gover-no”, afi rmou Capriles em recente coleti-va de imprensa.

Qualquer que seja o resultado, no en-tanto, a administração de Hugo Chá-vez terá conseguido um feito que me-rece análise apurada de cientistas polí-ticos. Ao contrário do que acontece na maioria dos países, nos quais o marke-ting domesticou a política e oculta a dis-puta de ideias para atender o gosto do eleitor. Na Venezuela sequer as necessi-dades eleitorais diluem a batalha frontal entre programas. (Opera Mundi)

Menos desigualdade e mais lutaVENEZUELA País com menor iniquidade da América Latina apresenta aumento na disputa político-ideológica nos anos Chávez

“A renda média dos 20% mais ricos não foi afetada, tampouco seu estilo de vida, mas percebem que não detém mais o comando sobre o Estado e a sociedade”

Vista de comunidade na periferia de Caracas, capital venezuelana

Partidários de Capriles passam diante de muro com pintura de Chávez

Orsini/CC

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internacional de 30 de agosto a 5 de setembro de 2012 15

José Maria León de Quito (Equador)

EM ENTREVISTA ao site equatoriano GkillCyty, o linguista e fi lósofo estadu-nidense Noam Chomsky defende que Assange não teria hipóteses de ter um julgamento justo nos Estados Unidos. Chomsky acrescenta que do ponto de vis-ta de quem ama a democracia, o funda-dor do Wikileaks merecia “uma medalha de honra” em vez de um julgamento.

“A sombra que paira sobre todo este assunto é a expectativa de que a Suécia envie rapidamente Assange para os Esta-dos Unidos, onde as hipóteses de ele re-ceber um julgamento justo são virtual-mente zero”.

Numa entrevista com Amy Goodman para o Democracy Now!, você afi rmou que a principal razão para os segredos mantidos pelos Estados é protegerem-se da sua própria população. É a primeira vez na história em que o mundo vê as verdadeiras cores da diplomacia?Noam Chomsky – Qualquer um que estuda documentos cujo prazo de sigi-lo expirou percebe que o segredo é, em grande parte, um esforço para proteger os políticos dos seus próprios cidadãos – e não o país dos seus inimigos. Sem dúvi-da o segredo é por vezes justifi cado, mas é raro – e no caso dos documentos ex-postos pelo Wikileaks, eu não vi um úni-co exemplo disto.

Esta não é – de maneira nenhuma – a primeira vez que as verdadeiras “cores da diplomacia” foram expostas por docu-mentos divulgados. Os Pentagon papers são um caso famoso. Mas a questão é que se trata de um tema recorrente. As infor-mações contidas inclusive nos documen-tos desclassifi cados ofi cialmente são, em geral, muito impressionantes. Porém, muito raramente estas informações tor-nam-se conhecidas pelo público – e até pela maior parte dos acadêmicos.

Sobre o asilo oferecido pelo Equador para Assange, aponta-se uma ambiguidade na atitude do governo de Rafael Correa. Por um lado, manteria confronto retórico constante com os media (estando em disputa judicial com o diário El Universo e o jornalista Juan Carlos Calderón e Christian Zurita, autores do livro

Big Brother). Por outro, defende Julian Assange. Você também vê uma contradição nisso?

Pessoalmente, acho que só em circuns-tâncias extremas o poder do Estado de-veria limitar a liberdade de imprensa – não importando, a esse respeito, quão vergonhoso e corrupto seja o compor-tamento dos media. Não há dúvida que houve vários graves abusos – por exem-plo, quando as leis de difamação inglesa foram usadas por uma grande empresa mediática para destruir um pequeno jor-nal dissidente, que publicou uma crítica a uma de suas notícias sobre um escân-dalo internacional. Ocorreu há alguns anos, e não despertou praticamente ne-nhuma critica.

O caso do Equador tem de ser analisa-do pelos seus méritos, mas qualquer que seja a conclusão, não há qualquer infl u-ência em dar asilo ao Assange; assim co-mo a supressão vergonhosa da liberdade de imprensa, no caso que mencionei, não deveria pesar, se a Grã-Bretanha conce-desse o direito de asilo a alguém que te-me perseguição estatal. Nem ninguém afi rmaria o contrário, no caso de um po-deroso Estado ocidental.

Já que estamos falando de ambiguidade, haveria um duplo padrão na aplicação das leis pelos britânicos, já que no caso de Pinochet o pedido de extradição solicitado por Baltazar Garzón foi negado?

O padrão reinante é subordinado aos interesses de poder. Raramente há uma exceção.

Qual é, na sua opinião, o futuro imediato no caso Assange? A polícia britânica invadirá a embaixada equatoriana? Assange será capaz de deixar a Inglaterra? Mais tarde, estará

em perigo, mesmo recebido pelo Equador?

Não há praticamente nenhuma possi-bilidade de Assange sair do Reino Unido, ou da embaixada. Duvido bastante que a Inglaterra invada o território, uma vio-lação radical do direito internacional – mas esta hipótese não pode ser descar-tada. Vale a pena lembrar o ataque con-tra a embaixada do Vaticano, por forças norte-americanas, depois da invasão no Panamá, em 1989. As grandes potências normalmente consideram-se imunes à lei internacional; e as classes próximas ao poder costumam proteger essa postu-ra. Ao meu ver, a Inglaterra tentará ven-cer Assange pelo cansaço, esperando que ele não consiga suportar o confi namento num pequeno quarto na embaixada.

Num aspecto mais amplo, Slavoj Zizek disse que não estamos a destruir o capitalismo, mas apenas a testemunhar como o sistema se destroi a si mesmo. Seriam os movimentos do Occupy, a crise fi nanceira na Europa e nos EUA, a ascensão da América Latina e outros países marginais ou o caso Wikileaks sinais deste desmoronamento?

Longe disso. A crise fi nanceira na Eu-ropa poderia ser resolvida, mas está a ser usada como uma alavanca para minar o contrato social europeu. É basicamen-te um caso de guerra de classes. A atua-ção do banco central dos EUA (o Federal Reserve) é melhor do que a do europeu, mas é muito limitada. Outras medidas poderiam aliviar a grave crise no EUA, principalmente o desemprego. Para a maior parte da população, o desemprego é a principal preocupação, mas para as instituições fi nanceiras, que dominam a economia e o sistema político, o interes-se está em limitar o défi cit, para permitir que prossiga o pagamento de juros.

Em geral, há um enorme abismo en-tre a vontade pública e política. Este é apenas um caso. A ascensão da Améri-ca Latina é um fenômeno de grande sig-nifi cado histórico, mas está longe de es-tremecer o sistema capitalista. Embora o Wikileaks e os movimentos Occupy se-jam irritantes para os que estão no poder – e um grande apoio para o bem público –, não são uma ameaça para os poderes dominantes.

(Entrevista publicada no site equatoriano Gkillcity – www.gkillcity.com) .

Tradução: Cauê Ameni, para o site Outras Palavras .

Atílio Borón

A PARTIR DE FINS do século passado, ganhou crescente aceitação na opinião pública internacional a expressão “Es-tado canalha”. Incentivado pela máqui-na propagandística norte-americana, o conceito tinha como objetivo satanizar os países hostilizados por Washington, com a evidente intenção de justifi car as agressões do império.

Nesta lista estavam incluídos Afeganis-tão, Coreia do Norte, Cuba, Iraque, Irã, Líbia, Sérvia e Montenegro, Sudão e Sí-ria. Atualmente, a listagem se reduziu a cinco países, porque, graças às políticas de promoção de “mudanças de regime” (eufemismo para evitar dizer “interven-ção aberta dos EUA”), Afeganistão, Ira-que, Líbia, Sérvia e Montenegro foram incorporados à categoria de nações de-mocráticas. O Sudão, por sua vez, foi di-vidido em dois e a região rica em petró-leo se converteu em Sudão do Sul. O res-to continua sendo “Estado canalha”.

Porém, as reviravoltas da história ou a “astúcia da razão” hegeliana fi zeram com que hoje esse termo se volte con-tra seu criador. Os estigmatizados o

eram por sua pretensa violação aos di-reitos humanos, seu apoio ao terroris-mo e suas armas de destruição maci-ça constituíam ameaças letais à comu-nidade de nações. Cuba, a maior expor-tadora mundial de professores e médi-cos, permanece nessa lista da infâmia até os dias de hoje! Em síntese, eram governos que violavam a legalidade in-ternacional e, por isso mesmo, a obri-gação dos Estados Unidos e seus alia-dos era acabar com esse fl agelo. No en-tanto, foram dois eminentes intelectu-ais norte-americanos, Noam Chomsky e William Blum, e um cineasta, Oliver Stone, que desconstruíram o argumen-to da Casa Branca ao fundamentar as razões pelas quais o principal “Estado canalha” do planeta e a maior ameaça terrorista à paz mundial não era outro senão os Estados Unidos.

O Reino Unido não fi ca atrás como “Estado canalha”. Nos últimos tem-pos fez mais que o sufi ciente para divi-dir o pódio com seu descendente do ou-tro lado do Atlântico. A evidência é es-pantosa e, se algo faltava às suas rei-

teradas manifestações de desprezo pe-rante a legalidade internacional, repre-sentada pelas resoluções da Assembleia Geral e o Comitê de Descolonização das Nações Unidas, no caso das Ilhas Malvi-nas (bem como em outros casos, totali-zando 16), a atitude de Londres em re-lação a Julian Assange acaba com qual-quer dúvida sobre o assunto. Seria pos-sível afi rmar que, com a gestão de Da-vid Cameron, o Reino Unido se conver-teu em um autêntico “violador em série” de leis e tratados internacionais.

Bravatas, como o envio do destróier Dauntless às Malvinas, empalidecem diante da denúncia do chanceler equa-toriano Ricardo Patiño, afi rmando que o governo britânico transmitiu a Quito uma “ameaça expressa e por escrito de que poderiam assaltar nossa Embaixa-da do Equador em Londres caso não en-tregassem Julian Assange”. O Secretá-rio de Assuntos Estrangeiros do Reino Unido ratifi cou, posteriormente, essa ameaça que viola a Convenção de Vie-na, onde se estabelece a inviolabilidade das sedes diplomáticas (extensiva à re-sidência dos embaixadores, automóveis das embaixadas e às bagagens diplomá-ticas), coisa que nem os sanguinários ditadores como Jorge Rafael Videla e Augusto Pinochet se atreveram a des-respeitar. Basta lembrar que o ex-presi-dente Héctor Cámpora fi cou refugiado na embaixada do México em Buenos Ai-res durante cinco anos e, quando obteve asilo político, saiu do país sem ser mo-lestado. No entanto, Londres assegu-rou, ainda que o Equador já tenha con-cedido o asilo a Assange, que não o dei-

xará sair da embaixada. Assim, trans-gride o que explicitamente estabelece a Convenção sobre o Estatuto dos Refu-giados que o próprio Reino Unido as-sinou, descumprindo-o na prática comsua desobediência. É que o delito come-tido por Assange tornou-se imperdoávelao tornar públicos a corrupção e os cri-mes cometidos e mantidos em segredopelo império. Em consequência, os Es-tados Unidos vêm mobilizando suas for-ças em nível mundial para acossá-lo, ainda que violando todas as leis e trata-dos internacionais e atropelando todasas liberdades e direitos humanos, paradar a ele o castigo que merece

A imprensa hegemônica de todo omundo aplaude a “coragem de Londres”. É que o Reino Unido é um dócil peão da estratégia imperial, como também o é o atual governo sueco e, pior ainda, o da Austrália, país do qual é oriundo Assan-ge e que, de maneira escandalosa, igno-rou o caso. Claro, em novembro de 2011, Barack Obama anunciou que enviariauma tripulação de 2.500 marines a uma nova base a ser inaugurada em Cam-berra, na Austrália, como primeiro pas-so de uma estratégia muito mais ambi-ciosa para conter o “expansionismo chi-nês” nesse país. Diante disso, como po-deria o governo australiano preocupar-se com a sorte do atualmente mais fa-moso de seus cidadãos?

Atílio Borón é sociólogo, professor universi-tário, argentino.

Tradução: Portal do Partido Comunista Brasileiro (PCB).

O Reino Unido como “Estado canalha” OPINIÃO

O Reino Unido não fi ca atrás como “Estado canalha”. Nos últimos tempos fez mais que o sufi ciente para dividir o pódio com seu descendente do outro lado do Atlântico

É que o delito cometido por Assange tornou-se imperdoável ao

tornar públicos a corrupção e os crimes cometidos e mantidos em

segredo pelo império

“Querem vencer Assange pelo cansaço”ENTREVISTA Noam Chomsky, linguista e fi lósofo estadunidense acredita que do ponto de vista de quem ama a democracia, Assange merecia “uma medalha de honra”

“A crise fi nanceira na Europa poderia ser resolvida, mas está a ser usada como uma alavanca para minar o contrato social europeu. É basicamente um caso de guerra de classes”

“A ascensão da América Latina é um fenômeno de grande signifi cado histórico, mas está longe de estremecer o sistema capitalista”

Reprodução

Para o fi lósofo Noam Chomsky, Assange merecia uma medalha

Page 16: Que a Justiça faça justiça, apesar da mídia fileque se pode fazer a ele e tantos ou-tros que deram sua vida pela justi-ça é não deixar que morra o mode-lo de Igreja pelo qual

internacional de 30 de agosto a 5 de setembro de 201216Pete Souza/ White House

Achille Lollo correspondente em Roma (Itália)

AS REPORTAGENS do jornal britâni-co Sunday Times, do alemão Bild am Sonntag e da rádio francesa Bfmtv-Rmc revelaram que os governos da Grã Bre-tanha, da Alemanha e da França, auto-rizaram a intervenção de seus serviços especiais para sustentar os rebeldes do Exército Livre da Síria (ELS), formado por desertores sírios pagos pelo Qatar e comandados por ofi ciais da Arábia Sau-dita, por sua vez monitorados por agen-tes da CIA. Neste contexto Obama pro-mete fazer o que Bush fez no Iraque, ameaçando intervir na Síria para impe-dir que Assad use as armas químicas. Já Israel ameaçou atacar o Irã com fogue-tes nucleares.

Nos últimos dias, os diretores de jor-nais, revistas e televisões, bem como todos os blogueiros que apoiam os re-beldes do ELS e que fazem uso massi-vo das imagens da TV Al-Jazeera e das informações divulgadas pelo Conselho Nacional Sírio (CNS), se calaram após ter lido as seis laudas de textos do jor-nal britânico Sunday Times e do ale-mão Bild am Sonntag, seguidos pelos três minutos gravados pelo canal de rá-dio Bfmtv-Rmc com o primeiro minis-tro francês Jean-Marc Ayault. Textos que desmentiam tudo o que eles disse-ram nesses últimos meses.

O jornal britânico Sunday Times – que não é de esquerda e não tem ne-nhuma simpatia pelo governo sírio – por ser um produto de mercado e por não estar com o rabo preso ao gover-no de David Cameron, decidiu publi-car em sua edição de domingo uma re-portagem chocante sobre a Síria. De fa-to, a edição do Sunday Times esgotou e o mesmo aconteceu na Alemanha com a edição do Bild am Sonntag. Duas pu-blicações desvendaram o pretenso pa-cifi smo não-intervencionista da pode-rosa primeira-ministra Ângela Merkel, bem como do britânico Cameron, reve-lando que esses governos autorizaram – já há vários meses – a intervenção no confl ito sírio com seus serviços secre-tos, além de providenciar a transferên-cia de tecnologia militar para nortear as operações militares dos rebeldes contra o exército sírio.

No Sunday Times

O jornal britânico abriu sua reporta-gem dizendo: “Enquanto a comunida-de internacional não sabe como parar a guerra civil na Síria, a Grã Bretanha de-cidiu entrar nesse confl ito e ajudar as forças do ELS. Uma ajuda participativa que está sendo realizada pelas tropas es-peciais do Special Air Service (SAS) e os agentes especiais do Military Intelligen-ce, Section 5 (MI5) que monitoraram os ataques das tropas do ELS no enfrenta-mento contra unidades do exército re-gular sírio”.

Não se trata de ensinar novas for-mas de sabotagens ou treinar as técni-cas de guerrilha urbana. Os agentes es-peciais britânicos ou melhor “os 007 de Londres” – como o Sunday Times pre-fere – na realidade estão trabalhando para organizar os bandos armados dos grupos salafi tas (extremistas da Irman-dade Muçulmana Síria) e os deserto-res contratados pelos emissários do Qa-tar (10.000 dólares por mês ao simples soldado e até 100 mil para os coronéis e generais) em um exército regular ca-paz de enfrentar e derrotar, o mais rápi-do possível, as unidades fi eis ao governo de Damasco.

Para confi rmação disso tudo o jornal cita fontes dos “007 de Londres” que ad-mitiram “ter dirigido e participado em uma emboscada nos arredores de Ale-po contra 40 blindados do exército re-gular sírio”.

Este dado, na realidade, signifi ca es-tar monitorando brigadas mecanizadas de 500 e até 1000 homens, armados de canhões anti-tanques, foguetes RPG-7 e metralhadoras pesadas de 50 mm. Armas que saem das bases britânicas, franceses, italianas e alemãs da Otan e chegam a Bengase, na Líbia, para de-pois serem transportadas até a base tur-ca da Otan, em Adana, onde os rebeldes do mantém seu Comando Geral. É neste lugar que “os 007 de Londres se juntam aos homens do ELS organizando, tam-bém o reabastecimento de homens, ar-mas, munições e sobretudo o transpor-te de foguetes anti-tanques para as uni-dades do ELS espalhadas nos arredores das cidades da Síria”.

Para fi nalizar o articulista explica que os “007 de Londres”, antes de chegar à base turca de Adana, fazem seu plane-jamento operacional nas duas bases mi-litares que a Grã Bretanha mantém na ilha de Chipre. Além disso o Sunday Ti-mes cita vários dirigentes da oposição síria, segundo os quais “as autoridades britânicas estão plenamente informadas das operações em curso de suas tropas especiais e as aprovam em 100%”.

No Bild am Sonntag O jornal alemão Bild am Sonntag

aponta que há muitos meses – pratica-mente desde o início do confl ito – um navio-espião do Bundesnachrichten-dienst (BND, a inteligência federal ale-mã), equipado com várias centrais pa-ra espionar as telecomunicações sírias, continua navegando nas águas territo-riais da Síria. A função desse navio-es-pião é de gravar todas as mensagens e as comunicações militares, dos membros do governo e do Estado maior, também, descobrir com scanner satélite a movi-mentação das tropas síria até um raio de 600 quilômetros da costa. O jornal su-blinha que, neste momento, o navio-es-pião alemão está dando uma particular

atenção às movimentações do exército sírio na região de Alepo, onde está em curso uma grande ação do exército re-gular contra as brigadas do ELS.

As informações e os vídeos são, de-pois, despachados para o comando ope-rativo regional da CIA e do MI5 britâ-nico que, após uma leitura estratégica, transmitem ao Comando Militar turco as orientações que devem ser repassa-das aos comandantes do ELS sob forma de ordens de combates.

A reportagem revela que, além do na-vio-espião o BND instalou um “centro de escuta permanente” na própria base turca de Adana para interceptar todas as ligações telefônicas efetuadas na ca-pital Damasco. Por isso, suspeita-se que o atentado onde morreu o Ministro da Defesa e o do Interior, na realidade foi monitorado a partir dessas centrais de espionagem, estabelecendo a data, o ho-rário e o local da explosão dos dois fo-guetes que foram lançados contra a se-de do Comando Geral do exército Sírio no mês de julho.

Na rádio Bfmtv-RmcOs representantes do novo governo

francês, e o próprio presidente François Hollande, seguem o mesmo roteiro be-licista de Sarkozy, apesar de pertencer ao Partido Socialista do saudoso Fran-çois Mitterrand. De fato, eles não hesi-tam em declarar que o presidente sírio deve ser derrubado o mais rápido pos-sível e por isso apoiam as atividades do ELS. O presidente François Hollan-de declarou sua posição quando rece-beu no Palácio do Eliseu um represen-tante do Conselho Nacional Sírio. E é o que reafi rmou o primeiro ministro Je-an-Marc Ayault quando foi entrevista-do pela rádio Bfmtv-Rmc, sublinhan-do: “Aqui na França estamos ajudando os rebeldes do ELS, a quem estamos for-necendo uma ajuda militar que compre-ende equipamento de telecomunicações e também de defesa”.

Uma atitude que se explica visto que os Estados Unidos, após a eleição do “socialista” François Hollande, haviam, diplomaticamente, afastado a França do grupo de Estados que estava trabalhan-do para derrubar o governo de Bashar al-Assad. As declarações beligerantes de Hollande e do seu primeiro ministro Ayault reconstituíram a tríade imperial. Assim, na noite de 22 de agosto o pri-meiro ministro britânico David Came-ron, o presidente Obama e o presiden-te francês Hollande usaram o telefone vermelho para estudar como sustentar o ELS e como impedir a contra-ofensiva do exército de Bashar al- Assad.

No dia seguinte, dia 23 de agosto, a embaixadora dos EUA, Elisabeth Jo-nes e o vice-subsecretário das relações exteriores da Turquia, Halit Cevik, che-fi avam na capital, Ankara, uma impor-tante reunião operativa entre diploma-tas, altos ofi cias, responsáveis pelos ser-viços secretos e consultores estratégicos

da Turquia e dos EUA com o objetivo de“acelerar a queda de Assad aplicando ao confl ito uma estratégia comum” .

O show de Obama e NetanyahuTodos sabem que nos Estados Unidos,

desde os tempos do presidente Truman, nenhum candidato se elegeu presidentesem o apoio dos banqueiros sionistas –que fi nanciam as campanhas eleitorais – e sem o consentimento da infl uen-te comunidade judaica de New Yorque. Por isso Obama, por um lado, deve tran-quilizar o eleitorado democrata de bai-xa renda de que depois as aventuras noIraque e no Afeganistão, não quer outra intervenção na Síria. Por outro, deve ga-rantir aos governantes sionistas de Isra-el que os EUA não deixarão Bashar al-Assad no governo. Em função desse con-texto, Obama recuperou o roteiro, fan-tástico e mentiroso de George Bush Jr. para justifi car uma possível intervenção na Síria, alegando que os generais de As-sad fazem uso de armas químicas contra os combatentes do ELS. Ao mesmo tem-po, e com vista de tornar mais comple-xo o cenário geo-estratégico, o primei-ro ministro sionista, Netanyahu, e seu ministro da Defesa, afi rmaram publica-mente que em novembro – isto é, depois das eleições nos EUA – devem lançar um ataque cibernético-nuclear contra o Irã para evitar que o regime dos Ayatollah fi nalize suas centrais atômicas.

Os analistas dizem que as palavras de Obama e as ameaças de Netanyahu são elementos de uma guerra psicoló-gica que o EUA e Israel mantêm ativos, apenas, para provocar o descontrole de seus opositores no Oriente Médio. Po-rém a maior parte dos eleitores israelen-ses e até dos EUA e de muitos países eu-ropeus acreditam que os iranianos que-rem, mesmo, destruir Israel por ser um estado judeu.

As palavras do democrata Obama vão perigosamente nessa direção, criando um clima de mera provocação. No cená-rio político das capitais ocidentais come-ça a crescer a ideia de que o presidente da Síria, Bashar al-Assad irá utilizar as ar-mas químicas.

Um argumento que a mídia ocidental vai certamente agravar divulgando os re-latórios que indicam as quantidades de bombas químicas que a Rússia vendeu ao regime de Damasco. Enfi m o estopim po-derá ser aceso pelas TV árabes que apre-sentam desertores sírios admitindo que o potencial destruidor de bombas quími-cas seja usado contra Israel.

Nesse âmbito, o novo presidente dos EUA, seja ele o democrata Obama ou o republicano Roney, terá todas as condi-ções para atacar a Síria, enquanto Isra-el vai cometer seu maior erro estratégico indo bombardear o Irã e iniciar, assim, uma guerra sem fi m.

Achille Lollo é jornalista italiano, correspon-dente do Brasil de Fato na Itália e editor do

programa TV “Quadrante Informativo”.

ANÁLISE Sunday Times, Bild e RMC denunciam: Tropas especiais de países da Otan norteiam a guerra civil síria

Os agentes especiais britânicos ou melhor “os 007 de Londres” na realidade estão trabalhando para organizar os bandos armados dos grupos salafi tas

Os representantes do novo governo francês, e o próprio presidente François Hollande, seguem o mesmo roteiro belicista de Sarkozy

O novo presidente dos EUA, seja ele o democrata Obama ou o

republicano Roney, terá todas as condições para atacar a Síria

O presidente estadunidense Barack Obama e a secretária de Estado Hillary Clinton

Ataques contra a Síria