R - Eco, Umberto. Como Se Faz Uma Tese
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RESENHA
Como se faz uma tese
ECO, Umberto (2005)
19o edição. Tradução de Gilson César Cardoso de Souza. São Paulo: Perspectiva. 174 p.
Vagner Ribeiro Brazil
O escritor italiano Umberto Eco, autor de obras nas áreas da filosofia, semiótica e
literatura, apresenta ao público um livro denominado Como se faz uma tese com o objetivo de
realizar uma série de considerações acerca da elaboração de uma tese, ou seja, um trabalho de
pesquisa baseado em métodos científicos a ser apresentado ao final de um curso de
licenciatura1 como requisito de conclusão.
Na introdução do livro percebe-se claramente a motivação do autor para a
elaboração desse trabalho que está intimamente associada ao fenômeno da universidade de
massa e às problemáticas a ela associadas. É a partir consciência crítica que possui sobre a
realidade dos universitários contemporâneos que Eco definiu explicitamente o público alvo
deste livro: estudantes com menos recursos e/ou aptidões para dedicar-se à carreira
acadêmica, mas que desejam fazer um trabalho com certo rigor e método. Assim Eco pretende
proporcionar aos seus leitores dois objetivos principais, quais sejam: dar orientações para
elaboração de uma tese com dignidade; contribuir para que a tese sirva de meio para a
descoberta de um sentido para o estudo que deve ser entendido “[...] como elaboração crítica
de uma experiência, [como] aquisição de uma capacidade (útil para o futuro) de identificar
os problemas, [de modo a] encará-los com método e expô-los segundo certas técnicas de
comunicação”.
No primeiro capítulo denominado Que é uma Tese e para que Serve, o autor
descreve as características e a natureza de uma tese. No tocante a essa última, Eco diferencia a
tese de licenciatura, requisito legal de formatura na Itália, da tese de doutorado como
conhecemos aqui no Brasil. Na definição do autor a tese de doutorado é um trabalho original
1 Como o autor escreve a partir de uma realidade italiana, ele refere-se a tese como requisito para conclusão docurso de graduação. No entanto, esse trabalho acadêmico difere do que usualmente conhecemos aqui no Brasil,qual seja, aquele realizado numa fase mais avançada da formação do pesquisador, no doutorado.
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de investigação com capacidade de contribuir cientificamente com o campo disciplinar no
qual está inserido. Em razão da maturidade intelectual necessária e capacidade de trabalho do
pesquisador, a tese de licenciatura se aproxima mais de um trabalho de compilação no qual o
estudante demonstrar habilidade de sistematizar e expor de forma harmônica, integrada e
coesa uma literatura escolhida. A tese de doutorado é um trabalho de pesquisa que
obrigatoriamente precisa trazer algo de novo e depende de um tempo de maturação do
pesquisador no tema escolhido para que consiga reunir em seu trabalho a característica
principal de uma tese, a originalidade. Por esse motivo que Eco afirma que: “[...] pode-se
fazer uma tese de compilação ou uma tese de pesquisa; uma tese de licenciatura ou de PhD”.
No entanto o autor reconhece que trata-se de apenas uma tendência e que é possível que
estudantes ilustres consigam reunir no seu trabalho características de uma tese de
doutoramento.
No segundo capítulo denominado A Escolha do Tema o autor discutiu algumas
questões dentre elas os formatos e abordagens possíveis para uma tese, orientações quanto à
administração do tempo de pesquisa e ao conhecimento de línguas estrangeiras e por fim o
que entende por cientificidade e como é possível adotá-la em qualquer tipo de tema.
Primeiramente nesse capítulo, o autor contrapõe a tese de tipo panorâmica à tese
de tipo monográfica. No caso de uma tese panorâmica, ressaltou através de exemplos a
necessidade de delimitação do tema proposto, tanto do ponto de vista espacial, temporal ou do
próprio conteúdo a ser abordado. Por ser um tipo em que há uma tendência de maior
abrangência, os conselhos contidos no livro são fundamentais para se empreender um trabalho
que seja viável tendo em vista recursos, maturidade intelectual do estudante, dentre outros
fatores. Nesse quesito Eco dá uma dica muito importante: “[...] quando mais se restringe ocampo, melhor e com mais segurança se trabalha [...]”.
A tese monográfica diferentemente da anterior “[...] é a abordagem de um só
tema, como tal se opondo a uma “historia de”, a um manual, a uma enciclopédia [...]”. Entre
um tipo e outro há uma infinidade de possibilidades e é por esse motivo que o autor destaca
com bastante lucidez, a necessidade de perspicácia para saber o que conservar e o que excluir
do tema. É preciso saber, por exemplo, a diferença de “[...] usar um panorama como pano de fundo [...] [e de] elaborar um quadro panorâmico [...]”. Essa consciência é muito importante
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porque é possível adotar um meio termo, qual seja, realizar um trabalho monográfico sem
perder de vista o panorama, no qual este servirá de contextualização para o tema escolhido.
Eco discute outras possibilidades de tese como a tese teórica ou histórica. A
primeira trata de um tema abstrato. A recomendação do autor nesses casos é buscar um ponto
de apoio de modo que o tema seja trabalhado de forma satisfatória, sem risco de não
conseguir terminá-lo ou ser superficial. Isso é muito comum nos estudantes iniciantes quando
se propõem a abordar temas universais. Daí a sugestão do autor de escolher, por exemplo, um
ou dois autores para lançar um olhar diferente sobre seu pensamento, apresentar uma crítica
ou apontar limitações. Naturalmente essa escolha implicará num trabalho de cunho
historiográfico, a exemplo do tema A noção de liberdade em Kant , citado pelo próprio autor.
Ainda nesse capítulo Eco discute a sua definição de cientificidade para demonstrar
que é possível realizar um trabalho de pesquisa com qualquer tema e que não há diferença
entre tese política ou tese científica. Para tanto, segundo o autor, faz-se necessário obedecer à
algumas regras, são elas: o objeto precisa ser reconhecível e definido; o estudo deve dizer
algo que não foi dito ou dizê-lo de uma forma diferente; o estudo deve ser útil às pessoas; o
estudo deve fornecer elementos para verificação e contestação das hipóteses defendidas tendoem vista permitir a continuidade de pesquisa para os que queiram.
No capítulo 3 A Pesquisa do Material o autor oferece aos leitores conceitos,
orientações e instrumentos importantes para uma boa realização do levantamento
bibliográfico.
O autor inicia o capítulo definindo o que são fontes primárias, fontes secundárias eliteratura crítica. Ressalta a relevância de fatores como a localização das fontes, o seu grau de
acessibilidade e a capacidade do pesquisador de manuseá-las, para a escolha de um tema e
verificação da sua viabilidade.
O uso da biblioteca também é uma questão abordada por Eco que oferece
instruções úteis para a pesquisa da bibliografia. O autor recomenda a elaboração de uma
bibliografia básica que pode ser montada a partir de um arquivo de fichas. As fichas de leiturasão dedicadas a livros lidos, portanto são registros de resumos, citações, opiniões, ou seja,
tudo o que for útil para a redação final e da bibliografia final. O autor também recomenda o
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uso de fichas bibliográficas nas quais se registram todos os livros objeto do levantamento
bibliográfico.
Ainda no terceiro capítulo, as formas de citação bibliográfica em cada caso são
comentadas pelo autor, o qual justifica a necessidade de certas informações, o que deve ou
não deve ser colocado, os erros mais freqüentes. Essa parte é rica em exemplos úteis para que
as citações sejam feitas de forma correta2.
No capítulo quatro O Plano de Trabalho e Fichamento o autor faz algumas
recomendações quanto ao planejamento do estudo e sobre a forma de usar fichas e o papel de
cada tipo para efeito da tese que se objetiva escrever.
O autor sugere a elaboração de um plano de trabalho a partir da elaboração do
título, introdução e índice final após a pesquisa bibliográfica. Apesar do aparente caráter
paradoxal (começar pelo fim), esse conselho do autor tem o objetivo de tornar mais clara a
hipótese do trabalho. O autor ressalta a natureza provisória desse plano cujo objetivo é servir
de guia inicial e por esse motivo será constantemente alterado ao longo de todo o processo de
pesquisa. Após a definição da hipótese, o autor defende que as fichas e os outros tipos de
documentação deverão se referir aos itens do índice do trabalho. Na visão do autor, “ Para
refletir a estrutura lógica da tese (núcleo e periferia, tema central e suas ramificações etc.), o
índice deve ser articulado em capítulos, parágrafos, e subparágrafos [...]” pois “[...] Uma
divisão bem analítica ajuda a compreensão lógica do discurso” e “ A organização lógica deve
refletir-se no índice [...]”.
Na segunda parte do capítulo, o autor discorre sobre os mais variados tipos de
fichas explicando a sua função e adequação aos tipos de trabalho. Dentre elas podemos citar as fichas de leitura, temáticas, por autores, de citações, de trabalho. Com exemplos retirados
do seu próprio arquivo, o autor comenta os fichamentos feitos nos seus estudos de forma a
facilitar a compreensão por parte do leitor das formas de construir fichas de acordo com cada
situação.
No quinto capítulo A Redação o autor versa sobre tópicos relacionados a forma
expositiva da pesquisa, ou seja, a produção do texto que compõe o relatório final. A primeira2 Porém é preciso estar consciente de que muitas delas são diferentes das regras de citação ereferência da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT.
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questão é “ A quem nos dirigimos ao escrever uma tese?”. Eco argumenta que o trabalho
destina-se aos examinadores, mas que pode ser lido por outras pessoas não necessariamente
ligadas diretamente ao campo de conhecimento da tese. O reconhecimento de quem é o
público real ou potencial deve ser levado em consideração na exposição das idéias. De
qualquer modo, independente dessa questão, o autor considera importante a definição dos
termos técnicos, sempre usando o bom senso, principalmente aqueles que são elementos-
chave do discurso.
Além disso, o autor também comenta a importância do saber como se escrever
bons textos e oferece uma série de orientações bem como exemplos do que se deve evitar na
redação de textos acadêmicos. Aliado a isso, o autor também reúne um cabal de 10 regras de
citação de autores. Por fim, justifica ao final do capítulo a importância das notas de rodapé e
dá instruções do uso correto delas, bem como apresenta vantagens e desvantagens de dois
sistemas de referência mais usados: citação-nota e autor-data.
Em termos de comentários finais, o livro alcança o objetivo a que se propõe, o de
orientar um público iniciante no meio acadêmico para realizar um trabalho digno dentro das
circunstâncias de uma universidade de massa que trata todos de forma igual e que, portantonão reconhece que no estágio atual da sociedade e cultura, o trabalho acadêmico e a carreira
universitária são ainda para poucos. Os motivos são vários dentre eles a escassez de recursos
dos estudantes em geral para empreender um estudo de maior envergadura, haja vista a
necessidade de se inserir profissionalmente no mercado (o que implica em escassez de tempo
para aprofundar os estudos), a falta de aptidão do estudante, que é obrigado a cumprir um
requisito legal para obter um título de graduação, e a falha de um sistema educacional que não
foi bem sucedido na capacidade de aflorar no indivíduo o interesse pela ciência e proporcionar sentido social ao conhecimento.
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