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RACISMO CIENTÍFICO COMO PLATAFORMA PARA COMPREENSÃO CRÍTICA DAS RELAÇÕES CTS Um estudo do desenvolvimento de uma sequência didática INTRODUÇÃO Este trabalho é derivado de um processo de pesquisa colaborativo desenvolvido durante um curso de mestrado no Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências (UFBA/UEFS). Ele nasceu da inquietação de membros do Grupo Colaborativo de Pesquisa em Ensino de Ciências (GCPEC) a respeito das dificuldades de ensino e de aprendizagem de Ciências em uma perspectiva mais ampliada, que considere a relevância do estudo sobre Ciência sua natureza e suas relações com a tecnologia e a sociedade nos currículos científicos. No Brasil, duas tendências curriculares se destacam no ensino de ciências: a Abordagem Contextual e a Abordagem Ciência/Tecnologia/Sociedade. A primeira propõe a introdução e integração da história e filosofia das ciências nos currículos de ciências, procurando contextualizar a produção científica de acordo com seus aspectos históricos, filosóficos, sociológicos e epistemológicos, caracterizando, pois, um estudo sobre a Natureza da Ciência (MATTHEWS, 2012). Já a Abordagem C/T/S procura promover a compreensão crítica e equilibrada das relações entre ciência, tecnologia e sociedade, com a intenção de auxiliar os estudantes a construírem conhecimentos, habilidades e valores necessários para tomar decisões responsáveis sobre questões de ciência e tecnologia na sociedade e atuar na solução de tais questões (SANTOS, 2008). Ainda que se reconheçam as contribuições que ambas as abordagens fornecem ao ensino de ciências, são poucas as iniciativas em propor diálogos teóricos e práticos entre abordagens curriculares CTS e contextual (SANTOS, 2008). Nesse sentido, em um artigo de 2012, os pesquisadores Juan Manuel Sánchez-Arteaga e Charbel Niño El-Hani, que também participam do GCPEC, apresentaram uma posposta capaz de integrar essas duas abordagens. Os autores sugerem que o estudo do racismo científico pode servir como uma “plataforma para uma apreciação crítica das contribuições e riscos associados ao conhecimento científico e sua relação com a sociedade e a tecnologia, tanto no passado como no presente” (SÁNCHEZ-ARTEAGA e EL-HANI, 2012, p. 9). Propunha-se que o tema do racismo científico poderia dar suporte para

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RACISMO CIENTÍFICO COMO PLATAFORMA PARA COMPREENSÃO

CRÍTICA DAS RELAÇÕES CTS

Um estudo do desenvolvimento de uma sequência didática

INTRODUÇÃO

Este trabalho é derivado de um processo de pesquisa colaborativo desenvolvido durante

um curso de mestrado no Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História das

Ciências (UFBA/UEFS). Ele nasceu da inquietação de membros do Grupo Colaborativo de

Pesquisa em Ensino de Ciências (GCPEC) a respeito das dificuldades de ensino e de

aprendizagem de Ciências em uma perspectiva mais ampliada, que considere a relevância do

estudo sobre Ciência – sua natureza e suas relações com a tecnologia e a sociedade – nos

currículos científicos.

No Brasil, duas tendências curriculares se destacam no ensino de ciências: a Abordagem

Contextual e a Abordagem Ciência/Tecnologia/Sociedade. A primeira propõe a introdução e

integração da história e filosofia das ciências nos currículos de ciências, procurando

contextualizar a produção científica de acordo com seus aspectos históricos, filosóficos,

sociológicos e epistemológicos, caracterizando, pois, um estudo sobre a Natureza da Ciência

(MATTHEWS, 2012). Já a Abordagem C/T/S procura promover a compreensão crítica e

equilibrada das relações entre ciência, tecnologia e sociedade, com a intenção de auxiliar os

estudantes a construírem conhecimentos, habilidades e valores necessários para tomar decisões

responsáveis sobre questões de ciência e tecnologia na sociedade e atuar na solução de tais

questões (SANTOS, 2008).

Ainda que se reconheçam as contribuições que ambas as abordagens fornecem ao ensino

de ciências, são poucas as iniciativas em propor diálogos teóricos e práticos entre abordagens

curriculares CTS e contextual (SANTOS, 2008). Nesse sentido, em um artigo de 2012, os

pesquisadores Juan Manuel Sánchez-Arteaga e Charbel Niño El-Hani, que também participam

do GCPEC, apresentaram uma posposta capaz de integrar essas duas abordagens. Os autores

sugerem que o estudo do racismo científico pode servir como uma “plataforma para uma

apreciação crítica das contribuições e riscos associados ao conhecimento científico e sua relação

com a sociedade e a tecnologia, tanto no passado como no presente” (SÁNCHEZ-ARTEAGA

e EL-HANI, 2012, p. 9). Propunha-se que o tema do racismo científico poderia dar suporte para

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discussões que envolvessem tanto tópicos sobre a natureza da ciência quanto sobre as relações

C/T/S.

No artigo citado, os autores também apresentaram sete princípios de design que

poderiam orientar a elaboração de intervenções pedagógicas que tivessem como tema o racismo

científico e o objetivo de promover uma visão crítica e equilibrada da natureza da ciência e suas

relações com a tecnologia e a sociedade. Esses princípios foram adotados pelo grupo de

pesquisa, que os utilizou para desenhar algumas intervenções educacionais (consultar

SANCHEZ-ARTEAGA, SEPÚLVEDA e EL-HANI, 2013) e, dentre elas uma sequência

didática com o tema “teoria darwiniana da evolução e relações CTS” para ser aplicada em uma

turma de alunos de licenciatura em Ciências Biológicas da Universidade Estadual de Feira de

Santana.

Na pesquisa que relatamos aqui, utilizamos a metodologia da Design Research para

buscar a validação dos princípios de design propostos pelos autores, no contexto da aplicação

da referida sequência didática. Os dados para essa pesquisa foram produzidos por meio da

aplicação de questionários de pré e pós-teste e registros de interações discursivas entre

estudantes e professora através de filmagens das aulas ministradas.

Neste trabalho, apresentamos a análise de dados oriundos das filmagens realizadas com

o objetivo de investigar em que medida discursos que tratam de tópicos de natureza da ciência

e das relações CTS de maneira crítica e equilibrada podem emergir das discussões

proporcionadas pelas atividades da sequência didática, elaborada com base nos princípios de

design propostos por Sánchez-Arteaga e El-Hani. Espera-se com os resultados dessa análise

avaliar a capacidade do racismo científico para servir como uma plataforma temática para uma

apreciação crítica das contribuições e riscos associados ao conhecimento científico, sua relação

com a sociedade e a tecnologia, e aspectos da natureza da ciência.

Na seção de referenciais teóricos, apresentamos os conceitos de alterização e racismo

científicos – explicitando suas relações com a ciência. Na metodologia explicaremos o processo

de construção de uma pesquisa segundo a metodologia de Design Research e da sequência

didática que aplicamos. Nos resultados e conclusões, traremos alguns dos resultados

encontrados, tecendo considerações sobre eles.

QUADRO TEÓRICO

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Para melhor compreender os objetivos, a metodologia e os resultados obtidos neste

trabalho, faz-se necessário apresentar conceitos importantes que o nortearam. Nesse sentido, as

seguintes subseções tratarão dos conceitos de alterização, racismo científico e design research.

Esclarecemos também as referências que fundamentam nosso entendimento sobre a

compreensão crítica das relações CTS e sobre uma visão equilibrada da natureza da ciência.

Alterização e Racismo Científico

A alterização é o processo de gerar ‘outros’, de marcar e nomear aqueles que

consideramos diferentes de nós mesmos, ou de um ‘nós’ idealizado que conforma nossa própria

comunidade (WEIS, 1995). Segundo Johnson e colaboradores (2004), os processos de

alterização têm uma função importante na construção de nossas próprias identidades, na qual

temos “os outros” como referência.

Ainda que seja algo que normalmente ocorre nas sociedades e culturas, a alterização

comumente contribui para a marginalização daqueles considerados diferentes (ver por exemplo

JOHNSON et al., 2004; SÁNCHEZ-ARTEAGA e EL-HANI, 2012), pois esse processo

costuma atuar na defesa e no fortalecimento da identidade de um indivíduo ou grupo através da

exclusão e marginalização de outros (MUÑOZ e EL-HANI, 2012).

Tendo em vista os aspectos e a abrangência da alterização, é possível reconhecer que

ela acontece sob variadas formas. Nesse sentido, consideramos aqui o racismo como um

exemplo emblemático para um estudo prolífico desses processos. No racismo, a separação entre

‘nós’ e ‘outros’ ocorre baseada em pressupostas diferenças raciais entre grupos humanos, com

aspectos biológicos, psicológicos e culturais bem demarcados. Onde quer que ocorra, o racismo

gera a inferiorização e discriminação do grupo alterizado, assim como em outras formas de

alterização. Isso geralmente conduz à marginalização do grupo considerado inferior – sobretudo

a população negra – e seu consequente desempoderamento, o que afeta diretamente as relações

dos grupos alterizados na sociedade, dificultando o acesso aos direitos – humanos e

constitucionais – e o exercício pleno de sua cidadania.

Como veremos na próxima seção, historicamente, a ciência e o racismo estão

profundamente relacionados, pois diversos estudos e pesquisadores definiram, sobre bases

científicas, muitas das características e valores que identificariam e separariam as diversas

“raças humanas”. Isso resultou no surgimento de um tipo específico de alterização científica: o

racismo científico.

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Raça e Ciência

A ideia de raças humanas e o racismo subsequente têm uma origem relativamente

recente na história das sociedades, (MUNANGA, 2004), história essa que se entrelaça com o

desenvolvimento das tecnociências biomédicas, da antropologia e da etnologia.

Até o século XV, não era comum o uso do termo “raça” para se referir a diferentes

povos. Com o advento das grandes navegações houve a consequente descoberta, pela sociedade

europeia, de povos nunca vistos antes – ameríndios, negros, asiáticos – e que eram bastante

distintos fisicamente dela. Desde então, procurou-se nomear e classificar esses novos povos,

algo inerente ao processo de alterização. No século XVIII, filósofos iluministas, numa tentativa

de construir uma explicação científica para as diferenças encontradas entre os povos humanos,

lançam mão do conceito de raça, já existente na Biologia. Muitos cientistas da época

propuseram diferentes classificações taxonômicas da humanidade, incluindo Carolus Linnaeus,

que dividiu a humanidade em Americanos, Asiáticos, Africanos e Europeus, com base não

apenas nas diferenças de cor de pele, mas associando a elas características comportamentais,

culturais e morais (MUNANGA, 2004).

A partir daí, tem-se início a história das teorias raciais que se desenvolveram nos últimos

três séculos. Até o final do século XVIII, prevaleceu uma forte noção de unidade da

humanidade, corroborada pela teoria humanista de Rousseau, que considerava a igualdade dos

humanos, tidos como uma única espécie espalhada ao redor do mundo (SCHWARCZ, 1993).

Rousseau acreditava no princípio da perfectibilidade, segundo o qual todos os homens teriam

uma capacidade inerente de sempre se superarem e aperfeiçoarem. Uma implicação desse

princípio era a visão de que os povos primitivos, não europeus, eram intrinsecamente bons e

moralmente superiores, por não acumularem os vícios das sociedades mais desenvolvidas.

O pensamento de Rousseau não prevaleceu por muito tempo e, no final do século XVIII,

as imagens que depreciavam os povos do Novo Mundo se intensificaram e começou-se a

atribuir aos nativos, principalmente negros e ameríndios, características que os detratam, tais

como inferioridade física e mental (SCHWARCZ, 1993). Cientistas como Buffon e De Paul

contribuíram para caracterizar os povos do continente americano como degenerados e

corrompidos, criando um senso de hierarquia que moldou as teorias raciais dominantes.

No entanto, uma das teorias que teria maior impacto na ciência da raça seria divulgada

em 1859, por meio da publicação de A Origem das Espécies, de Charles Darwin. Isso aconteceu

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porque as ideias darwinistas extrapolaram os limites da biologia para ser aplicadas também na

psicologia, na linguística, na pedagogia, na literatura e nas ciências sociais (SCHWARCZ,

1993). A interação entre essas áreas distintas gerou novas subáreas de estudo e, na interface do

evolucionismo darwinista com as ciências sociais, o “darwinismo social” surgiu para tratar das

questões de raça.

O darwinismo social postula a existência de raças humanas puras e verdadeiras e propõe

uma relação direta entre caracteres físicos e aspectos morais, adotando uma postura

determinista no que diz respeito à influência da “raça-cultura” sobre o comportamento dos

indivíduos (SCHWARCZ, 1993), o que constitui as bases para o conceito atual de racismo.

Para o darwinismo social, as ideias darwinistas de competição inter-racial, extinção racial e

sobrevivência diferencial serviram de base para as noções de “competição social”,

“sobrevivência do mais forte” e “extinção dos mais fracos”, o que contribuiu posteriormente

para que a comunidade europeia enxergasse os outros povos como espécies inferiores, fracas,

que estavam fadadas ao desaparecimento (SCHWARCZ, 1993). Dessa maneira, as concepções

evolutivas de biólogos, antropólogos e do próprio Darwin contribuíram para a construção de

uma base científica que justificasse o racismo e as pretensas hierarquias raciais existentes no

imaginário coletivo europeu (SÁNCHEZ ARTEAGA, SEPULVEDA e EL-HANI, 2013).

No contexto do imperialismo do século XIX, as teorias darwinistas, através do

darwinismo social, cumpriram um papel político muito importante como justificativa científica

para as atitudes de opressão, desempoderamento e extermínio dos povos nativos das novas

colônias (SÁNCHEZ-ARTEAGA, SEPULVEDA e EL-HANI, 2013; SCHWARCZ, 1993). É

também por meio do darwinismo social que se difunde a ideia de que o progresso e a civilização

estariam restritos a somente algumas sociedades: aquelas constituídas por “raças puras”, livres

da miscigenação.

A preocupação com a mestiçagem era maior nos países do Novo Mundo, onde ela

ocorria com mais frequência que na Europa. Dentre esses países, o Brasil era considerado pelos

estudiosos da raça “como um gigantesco laboratório natural para estudar experimentalmente os

resultados da mestiçagem” (SÁNCHEZ-ARTEAGA, 2009, p. 75).

Influenciados pelo pensamento imbuído nos trabalhos científicos estrangeiros, médicos

e naturalistas brasileiros tentaram encontrar soluções para a transformação do Brasil em um

Estado moderno a partir de uma população majoritariamente mestiça, negra e índia, considerada

degenerada e inferior em comparação com a “raça branca pura” encontrada nos países

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desenvolvidos (SÁNCHEZ-ARTEAGA, 2009). Tendo em vista que as classes sociais

brasileiras eram organizadas segundo um forte componente biológico/social, legado da história

de escravização de negros e indígenas, seria também parte da agenda científica encontrar as

causas naturais para justificar a manutenção da hierarquia racial no Brasil.

Na época, as soluções mais contundentes para o problema da mestiçagem seriam

propostas sob a orientação de teorias raciais de base evolucionista e poligenista, que incluiriam,

posteriormente, discursos do darwinismo social e sua corrente mais radical, a eugenia. Alguns

cientistas brasileiros tiveram destaque na pesquisa sobre teorias raciais e soluções eugênicas

para o “problema da mestiçagem”: para Nina Rodrigues, os mestiços apresentariam vários graus

hierárquicos, sendo que os mais altos graus seriam aqueles nos quais os traços caucasianos

fossem mais abundantes e evidentes. Portanto, ele defendia a necessidade de estabelecer

códigos penais diferenciados para brancos, negros e mestiços (SÁNCHEZ-ARTEAGA, 2009).

Guedes Cabral foi um dos primeiros cientistas brasileiros a aplicar princípios lamarckistas para

apresentar as possibilidades de “produzir uma raça melhor”. Para ele, os negros seriam

considerados um estado intermediário entre os macacos antropomorfos e o homem europeu

(SÁNCHEZ-ARTEAGA, 2009). Para João Batista de Lacerda, os genes brancos com o tempo

suplantariam a presença dos genes negros na população e, portanto, a mestiçagem entre negros

e caucasianos seria uma via para a resolução do “problema do negro” no Brasil. Ele incentivava

políticas migratórias favoráveis à entrada de europeus (SÁNCHEZ-ARTEAGA, 2009).

No final do século XIX os principais nomes da antropologia e da medicina no Brasil

defendiam teorias raciais baseadas na perspectiva poligenista e no evolucionismo darwinista,

devido à influência dos pensadores estrangeiros. Essas teorias fundamentaram as medidas

políticas, sociais, culturais e sanitárias para inibir o crescimento das populações negra, indígena

e, principalmente, mestiça, e incentivar o aumento da população branca, com a finalidade de

resolver a problemática da grande presença de negros e mestiços que impediria o avanço da

nação (SÁNCHEZ-ARTEAGA, 2009).

A história das políticas racistas e anti-mestiçagem do Brasil mostra como o racismo

científico teve um importante papel na construção da nossa identidade nacional e como ele

influenciou as tensas relações etnicoraciais que hoje permeiam a sociedade brasileira.

Atualmente, o racismo está difundido pelo mundo e foi mote de conflitos de grande

importância no século XX, como o Apartheid da África do Sul. De acordo com Munanga (2004,

p.11), “depois da supressão das leis do apartheid na África do Sul, não existe mais, em nenhuma

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parte do mundo, um racismo institucionalizado e explícito”. Isso não significa, contudo, que o

racismo foi erradicado das sociedades humanas nem da comunidade científica. Como apontam

Sánchez-Arteaga e El-Hani (2012), há ainda hoje discursos e práticas das Ciências Biomédicas

com implicações racistas. Um exemplo é o trabalho de Philippe Rushton, um professor de

psicologia da Univerity of Western Ontario, que, recentemente, escreveu um artigo no qual

relaciona características raciais a comportamentos sexuais e agressividade (RUSHTON e

TEMPLER, 2012). Além disso, embora desde a década de 1960 várias pesquisas venham

apontando para a inexistência de raças humanas genética ou morfologicamente definidas, o

conceito de “raças humanas” ainda está presente e desempenha papéis importantes em outras

ciências, como a Antropologia e a Sociologia, e está na raiz de vários programas e projetos

políticos que se propõem a garantir direitos e participação social a grupos étnico-raciais

minoritários.

Nota-se, pois, que embora a relação entre racismo e ciência contemporânea não seja tão

direta e explícita quanto no passado, ela ainda possui bastante relevância atualmente não apenas

pelo fato de ainda existir, mas por ter se tornado mais abrangente e complexa.

Racismo, Relações CTS e Natureza da Ciência

Sánchez-Arteaga e El-Hani (2012) elaboraram sete princípios de design que

fundamentariam a construções de intervenções didáticas com o propósito geral de promover

uma compreensão crítica das relações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade e a construção de

uma visão equilibrada da natureza da ciência, tendo com plataforma os processos de alterização

e o racismo científico. Como primeiro princípio, os autores defendem que uma intervenção

didática sobre racismo no contexto do ensino de ciências deva ser criada tendo em perspectiva

a abordagem CTS de ensino. No segundo princípio, eles sugerem que, além das relações CTS,

seja dada atenção a temas da natureza da ciência nessa intervenção didática. O terceiro princípio

afirma que as relações entre a biologia humana e as questões raciais devem ser tratadas de

maneira balanceada, evitando ao mesmo tempo o mero enaltecimento ou a demonização do

conhecimento científico. No quarto princípio, os autores propõem que a seleção e adaptação do

material a ser utilizado na intervenção didática deve ter como base as fontes primárias, originais,

ou fontes secundárias provenientes de trabalhos no campo da história da Ciência. Como quinto

princípio, eles afirmam que para discutir as funções ideológicas da ciência no passado e no

presente é preciso considerar as transformações sofridas pela biologia e pela antropologia no

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século XX, tendo o cuidado de, em sua narrativa, não saltar do século XIX direto para o século

XXI. No sexto princípio, os autores sugerem as intervenções didáticas tratem também das

formas atuais de alterização científica, como uma maneira de conectar os casos históricos de

alterização do século XIX com os conhecimentos que estão sendo ensinados nos currículos

científicos de hoje. Por fim, o sétimo princípio trata da necessidade de incorporar, nas salas de

aula, discussões sobre as Ciências Biomédicas quem possam habilitar os alunos a atuar como

cidadãos críticos e informados no que diz respeito a assuntos que envolvem as relações

Ciência/Tecnologia/Sociedade.

A respeito da abordagem CTS, tendo em vista a pluralidade de visões sobre esse tema,

nos norteamos pelo trabalho de Santos (2008), que afirma que o objetivo central dos currículos

CTS é promover a educação científica e tecnológica dos cidadãos, auxiliando o aluno a

construir conhecimentos, habilidades e valores necessários para tomar decisões responsáveis

sobre questões de ciência e tecnologia na sociedade e atuar na solução de tais questões.

Um dos objetivos da sequência didática desenvolvida neste trabalho, relacionado à

abordagem CTS, foi o de prover os estudantes de condições para superarem ou negociarem o

compromisso com ideal cientificista e com a crença no mito da neutralidade científica descrito

por Auler e Delizoicov (2001), sem, contudo, incorrerem no ceticismo em relação aos

conhecimentos e práticas científicas. Outro objetivo foi o de prover condições para que os

estudantes desenvolvessem habilidades para a compreensão críticas das relações CTS:

questionar o determinismo tecnológico ou considerar a influência da sociedade no

desenvolvimento tecnocientífico; questionar os modelos e valores de desenvolvimento

científico e tecnológico em nossa sociedade; examinar forças políticas, funções ideológicas e

imperativos econômicos que orientam o desenvolvimento tecnológico.

Quanto à Natureza da Ciência, apesar da falta de consenso sobre um conjunto de

características que defina e seja comum às ciências (IRZIK E NOLA, 2011; LEDERMAN et

al., 2002; MATTHEWS, 2012), decidimos explorar na sequência didática as características que

acreditamos ser mais relacionadas com a abordagem CTS e que são citadas pelos autores que

fundamentaram nossa pesquisa. A primeira característica escolhida foi o reconhecimento de

que os processos científicos e a investigação científica são permeados pelos fatores sociais,

políticos, econômicos e culturais do contexto nos quais ocorrem, influenciando-os e sendo

influenciados por eles (LEDERMAN et al., 2002). A segunda característica se refere ao caráter

subjetivo da ciência: por ser uma atividade humana, a investigação científica está sujeita à

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subjetividade pessoal do cientista e à subjetividade entre os cientistas (intersubjetividade),

representada pelas leis e teorias que são mais aceitas em determinada época e que orientam a

construção dos conhecimentos científicos (LEDERMAN et al., 2002). A terceira característica

diz respeito ao o caráter provisório do conhecimento científico: embora esse conhecimento

possa ser considerado confiável e durável – principalmente devido aos métodos e regras

metodológicas adotadas pelas ciências (IRZIK e NOLA, 2011) – ele também é provisório no

sentido que é passível de mudança à medida que surjam novas evidências, teorias e tecnologias.

Norteados pelos princípios de design e fundamentados pelas noções de relações CTS e

de Natureza da Ciência que pretendíamos explorar, pudemos construir a intervenção didática

que seria desenvolvida e analisada neste trabalho.

PROCEDIMENTOS INVESTIGATIVOS

A sequência didática elaborada, aplicada e analisada na investigação (FADIGAS, 2015)

e que forneceu os dados que serão apresentados neste artigo foi produzida e investigada sob os

marcos da Design Research, uma abordagem metodológica adotada pelo CoPPEC para os

estudos em desenvolvimento de inovações educacionais. Essa metodologia de pesquisa é

compreendida como um estudo sistemático do desenho, desenvolvimento e avaliação de

intervenções educacionais com o objetivo de apresentar soluções para problemas complexos da

prática educacional para os quais ainda não há soluções disponíveis e que busca também

avançar o conhecimento sobre as características dessas intervenções e os processos para

desenhá-las e desenvolvê-las (PLOMP, 2009).

As inovações educacionais desenvolvidas através da Design Research são

fundamentadas e orientadas por princípios de design – afirmações heurísticas que podem ser

descritas da seguinte maneira: “Se você quer desenhar uma intervenção X para o

propósito/função Y no contexto Z, então é recomendado dar a essa intervenção as características

A, B e C, e fazer isso através dos procedimentos K, L e M, por causa dos argumentos P, Q e

R”. Ao final desse tipo de pesquisa, geralmente são validados princípios de design ou

produzidos novos princípios que apontam características que podem ser providas a novas

intervenções educacionais com a expectativa de apresentarem resultados semelhantes aqueles

obtidos nos contextos em que foram investigados.

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Apesar de o processo da pesquisa em desenho educacional poder ser descrito de várias

formas diferentes, os autores da área concordam no que diz respeito ao seu caráter cíclico,

envolvendo a realização de três etapas: a pesquisa preliminar, a fase de prototipagem e fase de

avaliação. A pesquisa preliminar inclui: a) a análise dos conteúdos e das demandas da

intervenção; b) revisão de literatura; e c) desenvolvimento de um quadro teórico para o estudo,

com criação ou adaptação de princípios de design. A fase de prototipagem consiste na

realização de vários microciclos de pesquisa iterativos (que detalharemos mais adiante), cuja

atividade mais importante é a avaliação formativa, para melhorar e refinar a intervenção. Por

fim, na fase de avaliação somativa é realizada uma avaliação geral para concluir se a solução

ou intervenção atende às especificações pré-determinadas e, muitas vezes, são geradas

recomendações para a melhoria da intervenção (PLOMP, 2009).

Apresentamos aqui os resultados de uma investigação que incluiu a fase preliminar e o

primeiro ciclo de pesquisa da fase de prototipagem. Cada ciclo iterativo da Design Research é

um microciclo de pesquisa, que inclui uma reflexão sistemática dos princípios de design e suas

relações com o andamento da intervenção, portanto ele foi suficiente para dar origem dados

ricos sobre a intervenção didática estudada e para iniciar o processo de validação dos princípios

de design propostos.

A sequência didática do primeiro protótipo da pesquisa, construída a partir dos

princípios de design de Sánchez-Arteaga e El-Hani (2012), foi aplicada a uma turma de

estudantes do curso de licenciatura em Biologia da Universidade Estadual de Feira de Santana,

que frequentavam a disciplina “Docência em Ciências I: saber científico vs. saber escolar”,

ministrada pela professora Claudia Sepúlveda. A sequência foi planejada para um total de cinco

encontros, com quatro horas de duração cada.

Para o primeiro encontro, planejamos a aplicação do pré-teste e a apresentação dos

princípios de uma abordagem curricular C/T/S e o exame das possibilidades, limites e

pertinência do uso desta abordagem no ensino de evolução. No segundo encontro, a principal

atividade proposta foi a leitura, em grupos, de cinco textos que tratam da abordagem

panorâmica de discursos de alterização fundamentados no pensamento Darwinista (para mais

detalhes, consultar FADIGAS, 2015).

Para o terceiro encontro, foi exibido o trecho do documentário da BBC “Racismo: uma

história” – a fim de apresentar uma abordagem histórica da construção do conceito de raça pelas

ciências naturais e sua relação com práticas e discursos de alterização da ciência. A essa

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exibição seguiu-se uma discussão do filme orientada por um roteiro com perguntas e, por fim,

uma aula expositiva abordando a apropriação das teorias raciais no Brasil na transição entre o

império e a primeira república.

No quarto encontro, os alunos foram orientados a fazer um exercício, em grupos, de

tomada de decisão a respeito de financiamento de um projeto de pesquisa que tem como

objetivo mapear na população branca do Brasil atual as distribuições espaciais das linhagens

genealógicas ameríndias, europeias e africanas. Para tanto, recebem uma breve descrição do

projeto, construída tendo como base o artigo de Sérgio Pena e colaboradores (2000). Ao final

da atividade, foram discutidos com toda a turma os argumentos daqueles que aprovaram o

financiamento e daqueles que reprovaram. A professora sistematizaria os argumentos, tratando

de questões sobre Ciência, tecnologia e sociedade e sobre a natureza do conhecimento

científico. O quinto encontro foi reservado apenas para a realização do pós-teste.

RESULTADOS E CONCLUSÕES

Segundo os autores, alterização e racismo científico podem servir como plataforma para

o ensino das relações CTS e de tópicos de Natureza da Ciência. Portanto, durante os quatro

encontros as aulas da sequência, foram realizadas as atividades apresentadas na seção anterior,

através das quais planejamos que os estudantes atingissem um conjunto de expectativas de

aprendizagem, das quais destacamos: a) compreender que a ciência é parte integrante da

sociedade e interage com os demais setores sociais, influenciando-os e sendo influenciada por

eles; b) reconhecer a existência e examinar forças políticas, funções ideológicas e imperativos

econômicos que orientam o desenvolvimento científico e tecnológico; c) compreender o

conceito de Alterização, sua relação com racismo e com a Ciência; d) reconhecer que o racismo

científico é parte integrante da história da ciência – em especial da biologia; e) ser capaz de

identificar os riscos potenciais que discursos teóricos e práticas das tecnociências

contemporâneas podem apresentar para gerar alterização; f) compreender o caráter provisório

do conhecimento científico.

Uma das formas de registrar os discursos dos estudantes ao longo da sequência foi a

realização das filmagens das aulas, com enfoque nas interações discursivas envolvendo a

professora e estudantes. Após a sequência, os dados provenientes das filmagens foram

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analisados com o intuito de evidenciar discursos em que os estudantes indicassem terem

alcançado as expectativas de aprendizagem listadas no parágrafo acima.

Os trechos das filmagens nos quais aparecem esses discursos foram selecionados e a

partir da sua transcrição foram produzidos episódios de ensino. Procuramos investigar, nas

interações discursivas, quais ações, falas e atividades contribuíram para que a expectativa de

aprendizagem fosse alcançada. Nos próximos parágrafos apresentaremos alguns dos trechos

que ilustram momentos do discurso em que isso é evidenciado.

Em relação à expectativa de que os estudantes compreendessem que a ciência é parte

integrante da sociedade e interage com os demais setores sociais, influenciando-os e sendo

influenciada por eles, temos a fala de uma estudante que indica ter alcançado essa

aprendizagem. Ela afirma que “A Ciência ela veio/ no caso nesse texto/ pra justificar o

pensamento racista que se tinha na época/ né? Como se fosse pra legitimar dele/ que Guedes

tinha. Então com base nisso ele pegou as ideias de Darwin e/ com base nisso ele colocou as

suas ideias/ justificou as suas ideias/ Então teria essa relação/ da sociedade/ que a sociedade da

época era racista e estava tendo (+) começando a ter o movimento abolicionista/ Esse era o

momento que Guedes ‘tava’ vivendo/ então eu acho que ele se utilizou da ciência e das

tecnologias pra (+) pra ‘resolver’ ou pra promover/ não sei/ questões sociais”. Esta fala emergiu

no segundo encontro, no momento em que a sala estava dividida em grupos e um deles debate

uma questão do roteiro de discussão que solicitava aos estudantes relacionarem um texto sobre

as ideias de Guedes Cabral a respeito dos limites da educação nas diferentes raças e um texto

de Darwin sobre os limites da educação para os diferentes gêneros, e o que esses textos

revelavam sobre as relações entre ciência, tecnologia e sociedade.

Sobre a capacidade de reconhecer a existência e examinar forças políticas, funções

ideológicas e imperativos econômicos que orientam o desenvolvimento científico e tecnológico,

uma estudante afirma que “Uma das práticas (+) que eram feitas anteriormente pelo nazismo

era a questão de estarem eliminando os inaptos (+) Eles começaram a matar as pessoas que

tinham problemas mentais e depois começaram a transferir isso pra outras problemáticas”. Ao

ser perguntada sobre quem fazia isso, ela responde “Os eugenistas”. Assim, ela reconhece que

a política nazista estimulou o desenvolvimento de uma área científica – a eugenia. Essa fala

aconteceu no terceiro encontro, quando os estudantes estavam discutindo sobre o trecho do

documentário “Racismo: uma história”, exibido nessa aula da sequência.

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Uma das principais expectativas de aprendizagem – compreender o conceito de

alterização, sua relação com racismo e com a Ciência – também foi alcançada durante as aulas

da sequência. Durante a discussão com toda a turma, no segundo encontro, sobre os cinco textos

que tratavam de diferentes formas de alterização, a professora questiona qual seria a relação

entre Darwin, a extinção de raças e a política imperialista da Inglaterra vitoriana, ao que a

estudante responde: “As ideias dele [Darwin] serviam pra (+) pra justificar talvez/ eh (+) as

coisas que estariam acontecendo na época da sociedade que ele vivia” e complementa “A

questão da colonização (+) pra justificar a dominação do grupo sobre o outro”. A estudante,

portanto, reconhece a alterização enquanto a separação e estabelecimento de hierarquia entre

grupos e ainda evidencia a relação entre as ideias darwinistas e esse processo de alterização.

Em relação à expectativa de que os estudantes reconhecessem que o racismo científico

é parte integrante da história da ciência – em especial da biologia, as falas a seguir mostram

que ela foi alcançada, inclusive indicando uma apreciação crítica e equilibrada das relações

CTS pelos estudantes. Também durante a discussão do vídeo, após a professora perguntar por

que é preciso discutir as questões raciais no curso de Biologia, uma estudante responde “Porque

muito tempo/ como a senhora falou lá/ foi utilizada a nossa área de conhecimento pra

fundamentar tais ações/ O racismo científico tem principalmente como uma base biológica”.

Um tempo depois, indagada sobre a adequação do termo “utilizada” empregado pela colega,

outra estudante afirma “Eu acho que usada tipo dá a impressão de passividade/ né? e eu não

acho que ela foi passiva a essa relação/ tipo/ a ciência não foi passiva (+) eu acho que ela assim

tipo/ contribuiu pra que essa relação acontecesse/ Não acho que ela foi usada/ não sei tipo

também o termo/ mas passiva ela não foi”.

Os trechos dos discursos apresentados indicam que a sequência didática criada a partir

dos princípios de design de Sánchez-Arteaga e El-Hani (2012) obteve sucesso relação à

apresentação do conceito de alterização e conseguiu fazer emergir dos alunos discursos que

tratam das relações CTS de maneira ampliada, crítica e equilibrada. As atividades propostas

mostraram-se efetivas na promoção de discussões que oferecem subsídios para uma

compreensão crítica das relações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade e a construção de uma

visão equilibrada da natureza da ciência. Embora nos trechos mostrados não haja evidências

que indiquem a abordagem de tópicos de natureza da ciência nos discursos, é razoável pensar

que a sequência tenha potencial para isso também. De modo geral, conforme Fadigas (2015), é

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possível afirmar que o tema “racismo científico” pode servir como plataforma para plataforma

para uma apreciação crítica relações CTS e para discutir tópicos sobre a natureza da ciência.

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