Racismo Virtual_ Sem Medo de Buscar a Defesa - Jornal Do Commercio
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CRIME
Racismo virtual: sem medode buscar a defesaEm vez de se calarem, vítimas procuram medidas judiciais
Publicado em 04/11/2015, às 00h05
Vítima de racismo, Dandara Marques ganhou repercussão nacional e diz que seucaso representa muitos outros
Foto: Acervo pessoal/divulgação
Mariana Mesquita
O mito da “democracia racial” brasileira vem sendo abalado nas
redes sociais, de forma continuada e lamentável. Casos de
racismo explícito, ao longo do último mês, atingiram a atriz Taís
Araújo, o jogador de futebol Michel Bastos e a candidata a miss
pelo Estado de Goiás, Tainara Santos. Antes deles, a jornalista e
“garota do tempo” da TV Globo, Maria Júlia Coutinho, e a gestora
ambiental pernambucana Dandara Marques também tinham
sido alvo do mesmo tipo de ofensa. E em vez de se calarem,
todas as vítimas escolheram denunciar o agressor.
“O fenômeno das redes sociais mostra a extensão do racismo no
Brasil”, con�rma a promotora Helena Capela, que é integrante
do GT Racismo, grupo do Ministério Público de Pernambuco
(MPPE) que presta apoio às vítimas e à polícia civil, responsável
pela investigação dos crimes de racismo de forma geral. Os
dados assustam: embora a Secretaria Estadual de Defesa Social
não tenha dados especí�cos sobre a internet, computou 1.391
casos de injúria racial desde janeiro de 2013. Mas, para Helena,
o racismo não aumentou - ele sempre existiu. “A diferença é que
na internet as pessoas se sentem ‘protegidas’ e escrevem sem
pensar. Alguns casos tomam proporções muito maiores do queo criminoso e a vítima poderiam imaginar”, explica a promotora,
que acredita que a impunidade e a lentidão da Justiça
inuenciam negativamente o processo.
“Hoje a sociedade se sente mais livre para manifestar o racismo
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crime cibernét ico Ministério Público de Pernambuco crime
Igualdade Racial racismo
publicamente”, concorda Vera Baroni, yabassé (cargo feminino
do Candomblé) e ativista dos Direitos Humanos. “O fato de
muitos negros ocuparem posições de visibilidade nos meios
sociais e na mídia incomoda, porque quebra os privilégios dos
racistas, que se acreditam superiores por serem brancos e agem
de forma inaceitável contra outras pessoas com base apenas no
fato de terem mais melanina na pele”, a�rma Vera.
O meia Michel Bastos foi chamado de “macaco negro safado”,
após ter mandado a torcida do São Paulo “calar a boca” depois
de ter feito o último gol na vitória do time sobre o Sport, noúltimo sábado. Já Taís, Maria Júlia, Tainara e Dandara foram
vítimas também de machismo. “Quando se trata de uma mulher
negra, a primeira coisa a ser criticada é o cabelo, que é um
elemento de destaque da feminilidade. Por muito tempo, o
cabelo crespo foi encarado como ruim, sujo, fedorento. E
quando uma mulher negra se destaca por qualquer razão, mas
ainda mais por sua beleza, ela é atacada porque esses
pressupostos são abalados”, analisa Vera Baroni. “O cabelo é
algo que nos dá personalidade. Quando um negro usa e ousa
assumir sua identidade, isso choca algumas pessoas. Assumir
um padrão de beleza que vai contra o que a mídia impõe é
revolucionário. Cabelo é política”, reforça Dandara Marques. Ao
expor orgulhosamente sua cabeleira na internet, ela foi atacada
por um desconhecido de São Paulo. “Me dê uma caixa de
fósforos que faço progressiva nessa infeliz”, disse ele, entre
outras ofensas.
CASOS AUMENTAM A CADA ANO
Mais de 2.165 episódios de racismo foram denunciados, desde
2011, à ouvidoria do Ministério da Igualdade Racial, através do
fone (61) 2025-7001 ou do e-mail [email protected]. O
número cresce a cada ano. Para o secretário especial de Políticas
de Promoção da Igualdade Racial, Ronaldo Barros, é
importantíssimo que os casos sejam denunciados e
investigados.
Em Pernambuco, os boletins de ocorrência contra atos racistas,
em geral, podem ser registrados em qualquer delegacia ou, se
forem crimes virtuais, na Delegacia de Repressão aos Crimes
Cibernéticos de Pernambuco, no bairro da Boa Vista.
Paralelamente, o MPPE oferece o apoio do GT Racismo, cujo
fone é o 31827000, e de uma central de denúncias, que atende
através do fone 0800 281 9455.
A promotora Helena Capela, do GT Racismo do MPPE, lamenta o
fato de que a maioria dos crimes de racismo seja classi�cada
pelos juízes como simples injúria racial, delito que tem uma
pena menor. “Nós entendemos que este tipo de ofensa
repercute em todo um grupo e afeta a sociedade. Ao
desquali�car alguém por sua cor, está se atingindo os direitosbásicos de cidadania daquela pessoa”, a�rma.
“Ao mesmo tempo que a internet aumenta o racismo, ela nos dá
condições de combatê-lo”, analisa a pernambucana Dandara
Marques. Vítima de preconceito, ela não imaginava que seu caso
fosse ganhar repercussão nacional. “Foi surpreendente e muito
positivo receber dezenas de mensagens de apoio de
desconhecidos que se identi�cavam comigo. Isso me deu forças
para lutar, pois vejo que estou brigando não apenas por mim,
mas por muitas outras pessoas que estão sendo representadas
por meio de minha atitude”, resume.
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