RAPHAEL DRACCON · das cinco. Com quase vinte metros, seu corpo lembrava um lagarto de ... -se para...

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RAPHAEL DRACCON LEGADO RANGER II

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RAPHAEL DRACCON

LEGADO RANGER I I

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PRÓLOGO

No fim, restou o fogo.O primeiro choque veio com a visão. Os primeiros a testemu-

nhar foram os turistas, afinal, eram eles que olhavam para o céu. A mais de setecentos metros acima do mar, ao redor de uma das sete maravilhas do mundo moderno, estrangeiros registraram em ima-gens digitais um acontecimento histórico. Mais tarde, descobririam que a primeira foto compartilhada publicamente viera do celular do pai de uma família portuguesa de férias. Era apenas um borrão, mas a imagem seria propagada pelas redes sociais e transmitida em tele-jornais de todo o mundo. O grito inicial veio de uma turista romena em lua de mel, quando a primeira criatura de dez metros com garras, asas e cauda sobrevoou o Morro do Corcovado, rodeando as pessoas desesperadas.

A segunda criatura tinha nove metros, formato mais esguio e uma cabeça alongada, sustentada por um pescoço curto e espesso. Como se quisesse exibir sua envergadura, estendeu as asas, que tinham um tom anil ao longo das bordas.

E então uma terceira, ignorando os que corriam, se manteve pla-nando acima das outras.

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A quarta mergulhou no mar e subiu novamente.A quinta e última pousou na estátua do Cristo Redentor.Acomodando-se no ombro do monumento, de longe era a maior

das cinco. Com quase vinte metros, seu corpo lembrava um lagarto de proporções colossais. A pele escamosa remetia a metal, os olhos eram globos verdes incandescentes. Oito chifres se projetavam em uma face alongada e enrugada, com protuberâncias no queixo e maxilar. Uma crista repleta de nervuras se estendia pelo dorso, curvando--se para dentro, na direção da espinha. Um rufo largo se arrastava pelas falanges alares, e, como uma cobra, a criatura balançava a lín-gua comprida. Com as asas fechadas, observou a cidade, ignorando o caos que se iniciava nas ruas. Aquele cenário passaria a fazer parte de todos os livros de História, ilustrando o início de uma nova era da humanidade. Uma mudança que obrigaria a raça humana a repensar tudo em que acreditava até aquele momento.

em seguida, o caos.Todas as atenções convergiam para onde aproximadamente

oitenta mil pessoas festejavam. Jornalistas diriam no futuro que o barulho incessante do agito das pessoas foi o que atraiu a primeira criatura.

No Rio de Janeiro, dentro do Estádio Jornalista Mário Filho, a seleção brasileira de futebol disputava com a seleção uruguaia uma vaga para a próxima Copa do Mundo. Dezenas de jornalistas inter-nacionais cobriam o evento ao lado da imprensa local, e as pessoas se concentravam na transmissão do evento. Em caso de derrota, depen-dendo da combinação de resultados de outras partidas, a seleção brasileira poderia pela primeira vez ficar de fora do torneio de fute-bol mais importante do mundo. Em uma partida disputada em casa e ainda em pleno Maracanã, contra aquele adversário, a apreensão

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alcançava proporções ainda maiores. Era com esse sentimento que, nos arredores da avenida Maracanã, centenas de famílias se reuniam diante dos televisores de tela plana. Em meio aos bares da praça Varnhagen, no bairro da Tijuca, torcedores brasileiros provocavam um grupo de uruguaios uniformizados, em clima de rivalidade. O jogo seguia violento. Pressionados pela imprensa e por torcedores furiosos, e incitados pelo adversário, os brasileiros se mostravam tensos e irritadiços em campo. Na metade do primeiro tempo da partida, mesmo os narradores locais, acostumados a se expressarem de maneira exagerada e ufanista em suas transmissões, pareciam frustrados.

Aos trinta e dois minutos de jogo, porém, tudo mudou.A partida continuava sem gols, quando, em um momento de

inspiração, um dos atacantes da seleção brasileira arrancou na direção do goleiro uruguaio, deixando para trás três defensores. Torcedores se levantaram nas arquibancadas. O atacante armou um chute. Olhos se arregalaram. O goleiro uruguaio se posicionou, afastando os braços. Prestes a saltar para defender o gol, escutou o grito do atacante, atingido por trás por um lateral uruguaio. O jogador brasileiro caiu no chão com expressão de dor, girando e se debatendo, mais parecendo ter levado um tiro. Quando se pôs de joelhos e ouviu o apito, viu o juiz perto da grande área apontar para a marca de pênalti.

O estádio explodiu em euforia.Milhares de pessoas dentro da arena esportiva começaram a

pular, a gritar e a agitar bandeiras, fazendo a estrutura estremecer. Do lado de fora do estádio, o sentimento crescia. A onda emocional se alastrou pelas transmissões para todos os estados de um país de mais de duzentos milhões de pessoas. No gramado, a penalidade não foi cobrada imediatamente. Ao expulsar o lateral que acertara por trás o atacante brasileiro, o juiz se viu em meio a uma confusão de empur-rões, xingamentos e ameaças de todos os lados. A Polícia Militar teve

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de intervir quando membros de ambas as comissões técnicas invadi-

ram o campo e começaram a trocar insultos.

Após a interrupção de alguns minutos devido ao tumulto, o ata-

cante brasileiro segurou a bola debaixo do braço e caminhou em

direção à marca do pênalti. Os torcedores iniciaram uma canção de

orgulho nacionalista. As câmeras fecharam o ângulo no jogador. E

todos os narradores pediram a atenção de milhões de espectadores.

Foi quando a primeira sombra se espalhou pelo gramado.

Tudo aconteceu depressa; mas, para quem estava no estádio, a

percepção do tempo foi diferente. A sombra contornou a grande área,

como se fizesse parte do show. Milhares de pessoas começaram a

apontar para o campo e a murmurar. Assim que olharam para o céu,

a criatura deu um rasante. Pousando pesadamente, no centro de uma

arena com câmeras transmitindo imagens ao vivo para todo o plane-

ta, um réptil de escamas matizadas de anil se apresentou a um mundo

que até então o considerava lenda. De súbito, a arena se calou. As

pessoas, perplexas, olhavam umas para as outras sem saber se aquilo

era real ou a melhor ação publicitária de toda a História. Milhares

de câmeras e celulares foram erguidos para registrar o fenômeno.

Parecendo um tanto fascinada com a atenção e o silêncio provocado,

a besta analisou com seus olhos grandes os seres humanos mais pró-

ximos, tão surpresa quanto eles. Quando o primeiro tentou correr, ela

esticou bruscamente o pescoço reptiliano, e seus dentes rasgaram três

corpos em uma única mordida. Foi assim que as pessoas se deram

conta de que aquilo era real. Todos observavam boquiabertos a poça

de sangue que manchava o gramado, quando a segunda criatura des-

ceu abruptamente em outra parte do campo e projetou a cabeça para

cima, emitindo um som aterrorizante.

E o caos reinou.

Restara apenas o instinto de sobrevivência, o descontrole. Pessoas

corriam por cima umas das outras como formigas.

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Com nítido prazer, uma terceira criatura desceu no meio da

arquibancada, rasgando e reduzindo com as garras um amontoado

de gente. Do outro lado, a quarta criatura quebrou o vidro de um dos

camarotes, enfiou a cabeça lá dentro e cuspiu pedaços de corpos em

direção ao campo. Espalhados por cento e dez camarotes, empresá-

rios, celebridades e políticos derrubaram bandejas, tropeçaram em

cadeiras e viraram mesas de cabeça para baixo. O pandemônio se

tornou regra quando milhares de pessoas correram e tentaram pas-

sar por uma mesma entrada, esmagando umas as outras na saída.

Adultos foram pisoteados, crianças se perderam dos pais. Mais de

trezentas câmeras de segurança capturavam a fuga desenfreada da

multidão, enquanto jornalistas se dividiam entre o medo e a luta pela

sobrevivência. Grande parte dos locutores esportivos abandonou

as cabines de imprensa e deixou os microfones capturando o som

ambiente de pânico. Outros poucos, porém, permaneceram em suas

funções, bradando em vozes trêmulas que aquilo tudo não era uma

brincadeira nem um espetáculo com efeitos especiais.

No campo, os jogadores tentavam fugir. O réptil no gramado esta-

lou a cauda e arremessou longe oito uniformizados com as cores uru-

guaias. Adolescentes que atuavam como gandulas saltaram as mure-

tas e seguiram na direção do vestiário. Policiais militares munidos

de armas de fogo surgiram no gramado, e o som dos tiros apavorou

ainda mais a multidão. As balas não causavam dano quando batiam

nas escamas; pareciam apenas atiçar e irritar as criaturas, que avança-

vam em movimentos surpreendentemente ágeis para seus tamanhos,

abocanhando policiais. Era possível ouvir os ossos se partindo nos

seus dentes. Uma das bestas, de escamas esverdeadas, sobrevoou a

arquibancada, deu um rasante em linha reta com a bocarra aberta,

lembrando um tubarão. E o que se ouvia ao fundo ainda era choro,

grito e desespero. Tudo o que as criaturas queriam ouvir.

Era para isso que estavam ali.

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do lado de fora do estádio, as pessoas corriam, enlouquecidas. Algumas atravessaram as ruas sem pensar e foram atropeladas pelos carros. O som de pneus freando se uniu ao de buzinas frenéticas, metal amassando e vidro se partindo. As janelas se tornaram cama-rotes de cinegrafistas amadores. Policiais militares a cavalo tentavam trazer alguma ordem ao caos, mas as pessoas não ouviam, e mesmo eles estavam assustados com uma ameaça para a qual nunca haviam sido treinados. Bares fecharam as portas às pressas, e multidões esmurraram as entradas de aço, exigindo entrar. O trânsito deu um nó quando os carros começaram a bater uns nos outros. Helicópteros sobrevoavam o local com câmeras a postos, e canais de notícias do mundo inteiro interromperam a programação para mostrar imagens trêmulas das ruas cariocas. Repórteres gaguejavam e diziam qualquer coisa que passasse pela cabeça, ao tentar explicar tudo aquilo. As gra-vações mostravam pessoas correndo pela rampa da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, debandando em direção às áreas de trem e causando congestionamento ao redor. Nem as cenas mais cho-cantes, em que os voadores devoravam pessoas, fazendo jorrar san-gue e pedaços de corpos sobre outras foram omitidas. E então veio a imagem mais assustadora: um dos cinegrafistas sobrevoava uma das entradas do estádio, narrando sobre o transtorno nos arredores, e de repente gritou no microfone, estourando o áudio dos telespectadores. A imagem tremeu, a câmera girou e passou a filmar trechos picotados do interior do helicóptero, pés do repórter e o céu, como num filme de terror. Quando o cinegrafista conseguiu erguer a lente outra vez, o primeiro plano da imagem revelava a face da quinta besta, os dentes à mostra. Em seguida, estática. Milhões de pessoas recuaram diante das televisões, como se a criatura tivesse avançado em cima delas. A hélice cortou um pedaço da fronte da criatura, fazendo jorrar sangue vermelho. O helicóptero tombou sem controle, girando na direção da

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entrada principal do estádio, onde se localizava a estátua do Bellini, e as pessoas se desesperavam, gritavam e caíam. A estrutura metaliza-da despencou, esmagando inocentes e produzindo um estrondo que fez tremer a avenida Maracanã.

Sem se dar por satisfeito, o monstro resolveu descer.Aportando seus vinte metros diante de uma população des-

controlada, o réptil causou insanidade. A cauda estalou e pessoas foram arremessadas contra as grades. Como resultado, alguns dos que corriam para longe hesitaram e correram de volta para o estádio, chocando-se com os que tentavam sair. Por todo o lugar se ouviam guinchos, ossos se partindo e gemidos de pessoas morrendo. Carros tentavam fugir pelas brechas. Um motorista invadiu a calçada e acer-tou um grupo de pessoas. Parte da multidão enlouquecida quebrou o carro, arrancou o homem de dentro e o espancou. Alguns veículos conseguiram ultrapassar a criatura, mas uma mulher perdeu o con-trole e se chocou contra uma das suas patas. Irritada por causa da dor, a criatura perfurou com as garras o motor, ergueu o carro e o arremessou na direção de outros veículos. Um motoqueiro tentou se desviar, mas bateu e voou em direção à morte. Carros derraparam e caíram no rio Maracanã. Policiais começaram a atirar com fuzis, e civis se jogaram no chão, proferindo orações e implorando para não morrerem. O réptil esmagou alguns com as patas, subiu nos carros e afundou a carroceria com as pessoas dentro. E os tiros continuaram. Na televisão, âncoras e especialistas militares explicavam que, para uma ameaça como aquela, as tropas de elite do Exército Brasileiro deveriam ser convocadas a entrar em ação imediatamente. Contudo, era quase fim de ano.

As tropas estavam em recesso.Uma unidade de elite da Polícia Militar, oriunda do Batalhão

de Operações Policiais Especiais, conseguiu se aproximar com um Maverick blindado. Com quase três metros de altura, o carro-for-te ainda parecia pequeno diante da criatura, e foi ignorado, até que

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a primeira bala de um fuzil calibre 7,62 x 51mm partiu de uma das seteiras e acertou um dos oito chifres da criatura, que saltou para perto do veículo. Outros helicópteros de imprensa passaram a trans-mitir o conflito ao vivo. Um dos policiais acionou uma metralhado-ra posicionada em uma montagem em pino e deu início ao som da guerra. Mesmo quem estava distante do conflito correu com as mãos na cabeça, sem saber de onde vinham as rajadas. As balas, quando batiam nas escamas, empurravam a criatura um pouco para trás, mas não a feriam profundamente. Algumas chegavam a ricochetear, e um civil teve a cabeça perfurada por uma bala perdida. Quando as balas conseguiam passar pela armadura inerente e acertar a carne, a cria-tura grunhia monstruosamente. A cauda agigantada estalou em cima do blindado, que rodopiou sobre o próprio eixo, mas resistiu ao golpe. Lança-granadas de 40mm foram acionados e de longe ouviam-se as primeiras explosões. Fumaça, gritos, tiros, choro, detonações. A criatura por um momento pareceu surpresa com toda aquela reação. Carros da Coordenadoria de Recursos Especiais da Polícia Civil do Rio de Janeiro frearam próximos ao blindado, e mais agentes corre-ram com fuzis e submetralhadoras para se unir ao combate. O som era tão ensurdecedor, que um policial mal entendia o outro. O réptil se encolheu para se proteger. Finalmente parecia possível destruir ao menos uma das aberrações.

Envolvida pelas asas em uma posição retraída, de súbito, as par-tes sob as escamas rubras da besta pareceram se acender. Os olhos se tornaram brasas. As narinas exalaram vapor. E então o monstro subiu em um voo giratório, parando no ar diante da fileira de policiais.

E cuspiu o fogo.O rastro incandescente desceu em forma de cone, carbonizando a

pele de policiais por debaixo de coletes à prova de balas. Alguns mor-reram na hora, outros ficaram cegos instantaneamente, e outros cor-reram, implorando ajuda, o corpo em chamas. Diante das câmeras de telejornais, um dos policiais incinerados se lançava no rio Maracanã,

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agonizando. O cheiro da carne queimada embrulhou estômagos, e alguns policiais chegaram a perder o equilíbrio e largar as armas, em pânico. E enquanto agentes ainda em choque tentavam se recupe-rar do contra-ataque da criatura, o monstro decidiu encerrar aquele conflito e voltou a se alçar aos céus. Um dos seus guinchos atraiu as outras quatro de dentro da arena e, juntas, elas voaram para longe dali, deixando seu rastro de morte para trás.

Em um cenário quase apocalíptico, havia carros batidos e des-troçados, monumentos destruídos, pessoas caídas, machucadas e carbonizadas. E também fumaça, choro e lamentos, mas cada vez menos orações. Repórteres e jornalistas continuaram a transmitir ou retransmitir as imagens locais, tentando explicar o que acontecera. Não importava o idioma; a mensagem que todos eles enviavam ao mundo era a mesma.

Os dragões haviam chegado.

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virgínia, eua (horas antes)

– Você é como um super-herói?A pergunta viera de um agente governamental em um dos mais de

dois mil cômodos do prédio blindado de cinco andares do Pentágono. A vestimenta formal consistia em terno e gravata, e a idade não ultra-passava ainda os quarenta anos. Naquele momento, estava sentado em uma mesa diante de um homem algemado. As algemas do inter-rogado, porém, não pareciam incomodá-lo. Com aproximadamente trinta anos, o prisioneiro tinha o porte, o corte de cabelo e os trejeitos de um militar.

– Não – respondeu.– Você se considera um super-herói? – insistiu o agente.– Qual a diferença?– É o que nós estamos tentando descobrir.Na mesa havia uma xícara de café quente e uma pasta. Quando o

agente abriu o arquivo, um nome foi revelado.Derek Duke.– Sabe o que é isto? – questionou o agente.– A minha ficha.

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– Você tem consciência então de que nós sabemos quem você é.– Se sabem mesmo, por que me interrogam?O agente segurou o riso.– Porque nós sabemos quem você é, sargento! Mas não sabemos

o que você se tornou...Derek se movimentou pela primeira vez, incomodado. As alge-

mas tilintaram, como se para lembrá-lo de que estavam ali.– Eu vou reformular a pergunta – disse o agente. – Você se con-

sidera um herói?– Eu me considero um soldado.– Soldados são considerados heróis.– Então agradeço sua consideração por mim.O engravatado sorveu um pouco do café, fazendo questão de

prolongar o som irritante. Olhou o sargento nos olhos, então pousou a xícara na mesa novamente e continuou:

– Sabe o que mais se espera de um soldado? Obediência. Ele segue ordens.

– Você também – disse Derek, acenando com a cabeça. – Apesar de não ser um soldado.

– De quem você segue ordens, sargento Duke? – O tom de voz do agente engrossou um pouco.

Silêncio. Ao repetir, o tom se elevou ainda mais:– De quem você segue ordens, sargento Duke?– Quer mesmo saber que ordens eu sigo? Eu sigo princípios que

serviram de base para constituições.– É o que todos os ditadores dizem.– Não – revidou o sargento, de maneira enfática. – Os ditadores

usam esses princípios para justificar ações que hoje eu combato.O interrogador inclinou o corpo para frente e cruzou as mãos

sobre a mesa, os olhos ainda fixos no interrogado.– E é aqui que começam os nossos problemas! – disse. – Você sabe

por que nossos problemas começam aqui, sargento Duke? Porque

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soldados... soldados de verdade... fazem parte de organizações auto-

rizadas a utilizar a força na defesa de países. De novo, defesa contra

possíveis ameaças à segurança de uma nação! Ameaças como a que

você está se tornando, sargento Duke!

– A única ameaça que vejo aqui é que você, além de interrogador,

também parece gostar do papel de juiz.

O agente se irritou e bateu na mesa, fazendo a xícara tremer e o

café transbordar no pires.

– Eu sou de uma alta patente do governo dos Estados Unidos da

América! – gritou, fechando a expressão. – Represento três agências

e quarenta e oito líderes militares que aguardam o resultado deste

interrogatório. E são só esses que sabem da sua presença aqui! A

questão na verdade é: quem é Você pra brincar de juiz nas situações

em que anda se metendo?

Derek permaneceu em silêncio e voltou a se movimentar, inco-

modado. A cadeira rangeu.

– O que você quer? – perguntou o agente. – Quer que a gente te

exponha, é isso? Eu dou um telefonema. Melhor ainda: eu acesso a

internet. Cento e quarenta caracteres e de repente o mundo inteiro

vai confirmar quem você é.

– Na verdade, você não pode fazer isso – desafiou Derek.

– Posso. Poder, eu posso – corrigiu o interrogador. – Você quer

dizer que eu não deveria? E por que eu não deveria?

– Porque se você me expor, vai ter que explicar quem eu sou. –

Uma pausa. – Repare bem: não vai ter que explicar quem eu me tornei

e, sim, quem eu sou. E vai ter que falar sobre missões confidenciais.

Sobre falhas em missões confidenciais. E também vai ter que explicar

como um ranger americano, declarado morto pelo seu próprio gover-

no, reaparece após uma missão fracassada, vestindo uma armadura

de última geração e sendo tratado como ameaça por um engravatado

que aprendeu a digitar!

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Houve um silêncio constrangedor, daqueles que antecedem a fúria.

– Você é um baita de um filho da puta, não é? – disse o agente.– Pelo menos me visto melhor do que você.Cadeiras foram arrastadas, a xícara e o pires caíram e se partiram,

o café foi derramado, algemas tilintaram, portas se abriram e outros engravatados correram para segurar o interrogador que avançava para cima do algemado.

– Eles vão acabar com você, sargento! Eles vão acabar com você! – gritava o agente, enquanto o retiravam da sala.

– Eles, talvez. Você, não.– Você é uma ameaça, está ouvindo? – gritou o agente. – Você

não é um herói!– Nenhum de nós é – concordou Derek. – Mas você sabe o que

dizem por aí, não sabe?Rangers lideram o caminho.

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Copyright © 2015 by Raphael Draccon

Direitos desta edição reservados à EDITORA ROCCO LTDA.

Av. Presidente Wilson, 231 – 8º andar 20030-021 – Rio de Janeiro, RJ

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Larissa Helena Milena Vargas

Manon Bourgeade (arte) Viviane Maurey

AssIsTEnTEs Gilvan Brito

silvânia Rangel (Produção Gráfica)

REVIsãO Monique D’Orazio sophia Lang Wendell setubal Joana DiConti

ILusTRAçãO DE CAPA E MIOLO Ramon saroldi

DEsIGnER DE CAPA Guilherme Rodrigues

O texto deste livro obedece às normas do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

CIP-Brasil. Catalogação na fonte. sindicato nacional dos Editores de Livros, RJ.

Draccon, RaphaelD791c Cidades de dragões /Raphael Draccon. Primeira

edição. Rio de Janeiro: Fantástica Rocco, 2015. (Legado Ranger; 2)

IsBn 978-85-68263-25-9

1. Fantasia - Ficção. 2. Ficção brasileira. I. Título. II. série.

15-23769 CDD: 869.93 CDu: 821.134.3(81)-3

Para João Carlos Honório, por ser herói até o fim.

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