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UNIVERSIDADE DO PLANALTO CATARINENSE
CURSO DE PÓS GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA DE SEGURANÇA DO TRABALHO
RAPHAEL STEFFEN DOS SANTOS
DOENÇAS OCUPACIONAIS E O TRABALHO DOS POLICIAIS
LAGES
2012
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RAPHAEL STEFFEN DOS SANTOS
DOENÇAS OCUPACIONAIS E O TRABALHO DOS POLICIAIS
Trabalho de conclusão de curso apresentado à Universidade do Planalto Catarinense – UNIPLAC, como requisito parcial para a conclusão de curso de Pós- Graduação. Orientador: Profª Frida Pereira Becker
LAGES
2012
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................... 5
1 O TRABALHO E QUALIDADE DE VIDA .................................................. 6 1.1 O trabalho humano ................................................................................... 6 1.2 Trabalho e aspectos vitais na vida social ................................................ 8 1.3 Condições de Trabalho ............................................................................ 9
2 AS DOENÇAS OCUPACIONAIS E DO TRABALHO ................................. 12
2.1 Doenças do ocupacionais ........................................................................ 13
2.1.1 Doenças profissionais ou tecnopatias ................................................... 16
2.1.2 Doenças do trabalho ou mesopatias ..................................................... 17
2.2 Diagnóstico ............................................................................................... 18
3 TRABALHO E SAÚDE DOS POLICIAIS .................................................... 20
3.1 A atividade policial e suas peculiaridades ................................................ 20
3.2 Violência no trabalho policial ................................................................... 23
3.3 A saúde mental dos policiais .................................................................... 24
3.4 A saúde física dos policiais ...................................................................... 27
CONCLUSÃO ................................................................................................ 29
REFERÊNCIAS .............................................................................................. 31
4
RESUMO
Este estudo tem como objetivo abordar as doenças do trabalho em uma
profissão específica, ou seja, as doenças desenvolvidas em razão das
condições de trabalho dos policiais. Sabe-se que as atividades desenvolvidas
por estes profissionais, sejam eles civis ou militares, na maioria das vezes, se
dão em condições especiais, principalmente no que diz respeito ao estresse
enfrentado pelos policiais, já que a grande maioria dos chamados dizem
respeito à crimes e situações de tensão e perigo. Assim, o que se pretende
com neste trabalho é averiguar através de pesquisas o impacto das atividades
inerentes à profissão de policial na saúde de tais profissionais.
Palavras -chave: Doenças do Trabalho. Policiais. Saúde Mental. Trabalho
Policial. Condições de Trabalho.
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INTRODUÇÃO
Pretende-se abordar, em um primeiro momento, a relação entre
trabalho-saúde-doença, apontando como esta se desenvolveu historicamente e
como hoje vem sendo compreendida pelos órgãos públicos e profissionais que
trabalham diretamente relacionados com a mesma.
Uma vez que, o presente trabalho trata das doenças desenvolvidas em
razão das atividades profissionais dos policiais, as quais são desenvolvidas na
maioria das vezes sob condições especiais, como por exemplo estresse,
tensão e risco, é necessário primeiramente, conhecer as doenças
ocupacionais.
Normalmente confunde-se as doenças do trabalho com as doenças
laborais.
É importante a diferenciação desses dois tipos de doenças, a fim de
saber em quais situações deve o policial se enquadra, e como ele é amparado
pela legislação em razão de uma possível incapacidade laborativa, bem como,
quais as condições de trabalho capazes de gerar enfermidades.
Assim é necessário conhecer e diferenciar tais doenças para procurar
formas de prevenção e combate.
Em situações normais, as doenças de trabalho, podem ser facilmente
combatidas, ou prevenidas, bastando somente a mudança no ambiente de
trabalho, não havendo a necessidade do afastamento do empregado de suas
atividades profissionais.
Entretanto, no caso específico dos policiais, não é possível haver uma
mudança no ambiente de trabalho, uma vez que a grande maioria das doenças
são desencadeadas em razão das situações estressantes que os policiais
enfrentam em seu cotidiano, as quais não podem ser simplesmente alteradas.
Assim, no caso dos policiais, já que a prevenção não pode, na maioria
das vezes ser realizada, tem-se que buscar tratamentos ou outras soluções, a
fim de proporcionar aos policiais um ambiente de trabalho menos nocivo,
garantindo sua saúde física, e principalmente mental, pois só assim, estes
profissionais poderão continuar desempenhando de forma efetiva suas
6
atividades, já que estas atividades são de grande importância para a
sociedade.
O TRABALHO E QUALIDADE DE VIDA
O corpo humano precisa estar em total equilíbrio, gozando de saúde
física, mental, psíquica e emocional. Para promover a saúde e o bem-estar é
preciso garantir atividade física em condições adequadas, uma alimentação
qualitativa e quantitativamente adequada e sono reparador para alívio das
tensões e cargas a que o indivíduo está sujeito na vida cotidiana.
Assim, havendo excessos ou carências em qualquer uma das
necessidades descritas, o sistema físico e/ou psíquico do indivíduo se
desequilibra, o que compromete o bem-estar, e o bem- estar, por sua vez, é
fundamental para que o indivíduo tenha uma vida particular e profissional
satisfatória.
1.1 O trabalho humano
Na antiguidade, o trabalho humano era visto como castigo, penalização,
e estava diretamente relacionado à pobreza, à miséria, já que somente os
pobres trabalhavam.
Vieira (2005, p. 188):
Dentro de todas as utopias criadas a partir do século XVI, nenhuma se realizou tão desgraçadamente como a sociedade do trabalho. Para se ter uma idéia da força dessas utopias realizadas, impregnando todos os momentos da vida social a partir do século XVIII, basta considerar a transformação positiva do significado verbal na própria palavra trabalho, que até a época moderna sempre foi sinônimo de penalização e de cansaços insuportáveis, de dor e de esforço máximo, de tal modo que sua origem só poderia estar ligada a um estado extremo de miséria e pobreza.
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Entretanto, a partir do século XVI, o trabalho passou a ser visto como
fonte de riqueza, de produtividade e inclusive, sendo considerado como parte
da condição humana.
Vieira (2005, p. 189), atribui esse novo status do trabalho à produção
mecanizada, ou seja, ao surgimento das fábricas na Revolução Industrial:
A dimensão crucial dessa glorificação do trabalho, encontrou suporte definitivo no surgimento da fábrica mecanizada, que se tornou a expressão suprema da utopia realizada, alimentando, inclusive, as novas ilusões de que, a partir dela, cessem os limites para a produtividade humana.
O trabalho humano é um ato de transformação da natureza.Os seres
humanos ao trabalhar modificam a natureza, criando algo que tenha utilidade
para a satisfação de suas necessidades.
No caso dos policiais, estes oferecem um serviço de utilidade pública, ou
seja, oferecem segurança, garantem que as normas sejam cumpridas,
garantindo a convivência em sociedade.
Vieira (2005, p. 189) define o trabalho como sendo:
(...) toda a atividade pela qual o homem, no exercício de suas forças físicas e mentais, direta ou indiretamente, transfigura a natureza para colocá-la a seu serviço. Diretamente cooperam para este objetivo todos os que trabalham na agricultura, nas industrias extrativas – setor primário e nas industrias de transformação – setor secundário. A categoria de cooperadores indiretos compreende todos os que se ocupam de serviços, sem os quais seria impossível o trabalho criador do homem, ou seja, o setor terciário, abrangendo desde serviços domésticos até a especulação científica e a pesquisa tecnológica, passando por todas as atividades artísticas.
Atualmente, o trabalho é visto como sendo um dever,porém, vale
lembrar que, mais que um dever, é um direito, reconhecido inclusive na
Declaração Universal dos Direitos Humanos. Assim, é Direito de todo indivíduo
procurar pelo trabalho, a fim de garantir a sua subsistência, bem como
daqueles que dele dependem, e também é direito de todo indivíduo,
8
desenvolver o seu trabalho nas condições necessárias para garantir a sua
dignidade, e integridade física e mental, proporcionando-lhe assim qualidade
de vida.
1.2 Trabalho e aspectos vitais na vida social
O trabalho assume papel central na vida das pessoas, chegando a
definir aspectos vitais como status e identidade pessoal.
Segundo Vieira (2005, p. 85):
A qualidade de vida de uma pessoa e de seus dependentes depende grandemente da qualidade de vida no trabalho desta pessoa. Para fundamentar isso, basta lembrar que, pelo menos um terço do dia é usado no trabalho, além do tempo gasto no trajeto feito para ir ao trabalho e retornar; as condições em que é feito este trajeto também têm efeitos sobre a saúde e o bem-estar da pessoa. O indivíduo carrega consigo os seus problemas e suas dificuldades relacionadas com o trabalho, como por exemplo, dificuldades de relacionamento com superiores, colegas e subalternos; se estas relações são ruins, desequilíbrio psicoemocional pode ser a conseqüência. A possibilidade de ter para si e seus dependentes uma alimentação qualitativa e quantitativamente adequada, bem como a satisfação de outras necessidades básicas, depende essencialmente do poder de compra, ou seja, do salário do trabalhador; a participação em atividade de lazer para redução de fadiga e estresse, normalmente, também custa algo.
Assim, pode-se afirmar que, a qualidade de vida do indivíduo também
depende da qualidade de vida no trabalho.
Desta forma, o trabalho deve ser realizado em condições tais que
ajudem a promover a saúde, o equilíbrio físico e emocional, e em conseqüência
o bem- estar total do indivíduo.
Seguindo esse entendimento, Vieira (2005, p. 87), destaca que:
Então, o trabalho não pode agredir, porque é preciso manter a integridade física e psicoemocional do indivíduo. E, acidentes, doenças ocupacionais ou do trabalho, monotonia, estresse, fadiga exagerada e desequilibrada, como nos casos em que causa distúrbios osteomusculares relacionados com o trabalho (DORT), são efeitos condenáveis do trabalho, e portanto, devem ser evitados,
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pois causam custos e problemas para o indivíduo, para a empresa, mas sobretudo, para a sociedade. Trabalho não é maldição, não pode ser tortura. Pelo contrário, trabalho deve trazer satisfação, o que promove o equilíbrio emocional.
Portanto, o trabalho deve não somente servir ao sustento do indivíduo,
mas também lhe proporcionar bem estar e realização pessoal, e para isso,
deve-se proporcionar ao profissional, condições mínimas para que o trabalho
seja desenvolvido de forma agradável, ou que ao menos não se torne
prejudicial ao trabalhador.
1.3 Condições de trabalho
As condições de trabalhos englobam tudo que influencia o trabalho. Isso
inclui o posto, o ambiente, os meios, a tarefa, a jornada, a organização do
trabalho, alimentação, transporte, relações entre pessoas e entre produção e
salário.
Vieira (2005, p. 87), elenca exemplificativamente as condições de
trabalho necessárias para que se alcance a qualidade de vida:
(...) meios de produção adequados às pessoas, o que significa o projeto ergonômico das máquinas, dos equipamentos, dos veículos, das ferramentas e dos dispositivos auxiliares, usados no sistema de trabalho; Objetos de trabalho, materiais e insumos inócuos às pessoas que com eles entram em contato direto; ou evitar a possibilidade deste contato; postos de trabalho ergonomicamente projetados, o que inclui, bancadas, mesas, assentos, as disposição e a alocação de comando, controles, meios de informação e ferramentas fixas em bancadas, de modo a garantir boa postura, boa visibilidades, bom alcance por parte do trabalhador; organização do trabalho que garanta a cada pessoa uma tarefa com conteúdo adequado às suas capacidades físicas, psicoemocionais e mentais, e que seja interessante e motivante; (...)
E continua Vieira (2005, p. 87):
(...) postos de trabalho, meios de produção, objetos de trabalho sem perigos mecânicos, físicos, químicos ou outros, isso é sem partes móveis expostas, sem ferramentas cortantes acessíveis ao
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trabalhador, sem a emissão de gases, vapores, poeiras nocivos, etc.; organização temporal do trabalho que permita ao trabalhador levar uma vida com ritmo sincronizado com seu ritmo circadiano; regimes de turnos de trabalho que comprometa ao mínimo a saúde do trabalhador, bem como seu convívio familiar e social; clima social sem atritos, bom relacionamento com colegas superiores e subalternos, possibilidade de contato com colegas durante a jornada.
É claro que, no caso específicos dos policias, não é possível a
realização de algumas das condições supra mencionadas, uma vez que é
natureza da própria profissão as situações de estresse e tensão intensas,
entretanto, estes profissionais, tanto quanto qualquer outro, necessitam de
condições saudáveis de trabalho, para que não venham a ter problemas de
saúde que comprometam a sua atividade profissional e muito menos sua vida
pessoal.
É notório o fato de que os policiais vivem sob intenso estresse, e que
isso pode criar-lhes vários problemas, desde problemas com a convivência
familiar, como transtornos e distúrbios psíquicos, e em casos mais graves,
doenças psicossomáticas.
Assim, é essencial que os profissionais desta área tão importante para
nossa sociedade, bem como os governos, dediquem uma maior atenção para
as condições de trabalho dos policiais, bem como, sejam buscadas soluções
para a diminuição destes problemas.
Cabe destacar aqui, o texto esclarecedor de Vieira (2005, p. 89):
Como “condições de trabalho” engloba tudo o que se relaciona com o trabalho, tanto os aspectos positivos como os negativos, e em conseqüência, tudo o que afeta o trabalhador, qualidade de vida no trabalho é sinônimo de boas condições de trabalho. Então, o trabalho não pode agredir, e acidentes, doenças ocupacionais ou do trabalho, monotonia, estresse, fadiga exagerada e desequilibrada são efeitos condenáveis do trabalho e devem ser evitados.
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Vale por fim destacar que, como agressão ao trabalhador, deve-se
considerar tudo o que afeta seu bem-estar total, tanto em termos físicos como
em termos emocionais.
No caso específico dos policiais, é importante dizer que, as condições de
trabalhos devem ser oferecidas para lhes proporcionar uma maior qualidade e
vida, já que com isso, indiretamente será proporcionado à sociedade também
um aumento na qualidade de vida, já que são os policiais os responsáveis pela
segurança, e segurança é sem dúvida um fator de grande importância na
qualidade de vida.
Assim, o aumento da qualidade de vida da população em geral, depende
inclusive dos serviços prestados pelos policiais, e para que estes realizem seu
trabalho de forma satisfatória, atingindo seus objetos, é necessário que lhes
sejam dadas condições de trabalho que também lhes proporcionem qualidade
de vida. De forma cíclica, uma coisa depende da outra.
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AS DOENÇAS OCUPACIONAIS E DO TRABALHO
No capítulo anterior, foi abordado de forma sucinta a importância do
trabalho na vida do homem, bem como, a igual importância de que esse
trabalho, seja desenvolvido de forma à não prejudicar o trabalhador, sendo que
para isso, é necessário que lhe sejam oferecidas condições dignas, que
proporcionam bem estar ao trabalhador, não só na hora em que o trabalho está
sendo realizado, como também após, evitando futuros problemas de saúde.
Quando tais condições não são proporcionadas ao trabalhador, podem
surgir as chamadas doenças ocupacionais, que definidas de forma
generalizada são todas aquelas doenças que tem como causa ou
agravamento, fatores relacionados ao ambiente e às condições em que o
trabalho é realizado, bem como à natureza das atividades desenvolvidas por
determinado trabalhador.
No caso específico deste trabalho, os trabalhadores analisados são os
policiais, os quais, em razão da natureza de suas atividades, são
freqüentemente expostos à fatores que podem desencadear problemas de
saúde.
Isso porque, a natureza das atividades desenvolvidas por este grupo de
profissionais, por si só, já é bastante perigosa, haja vista que está relacionada,
na grande maioria das vezes com a solução de crimes. Assim, além dos riscos
físicos que o policial corre no seu cotidiano, ainda existe a questão psicológica,
que por vezes, pode ser muito mais grave e nociva que o problema físico.
Desta forma, antes de tratar do assunto principal deste trabalho, se faz
necessária uma exposição, ainda que rápida e de certa forma superficial, das
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doenças ocupacionais, sua classificação, e como a legislação pátria trata tais
doenças
2.1 Doenças Ocupacionais
As doenças ocupacionais são consideradas pela nossa legislação, bem
como pela doutrina, como sendo acidentes de trabalho, como bem delimita
Neto (2008, p.3):
[...] A expressão acidente de trabalho é gênero que abrange: acidente-tipo; doenças ocupacionais e acidentes por equiparação legal. Respectivamente, arts. 19, 20 e 21 da lei nº. 8.212/91. Todas essas espécies de acidente, uma vez tipificadas, produzem os mesmos efeitos para fins de liberação de benefícios previdenciários, indenização civil em ação trabalhista e até mesmo para fins de crime contra a saúde do trabalhador.[...]
E continua o Neto (2008, p. 3):
[...]O acidente de trabalho-tipo, ou típico, se caracteriza pela existência de evento único, súbito, imprevisto e bem configurado no espaço e no tempo. Nesses acidentes típicos as conseqüências são geralmente imediatas, ao contrário das doenças ocupacionais que se caracterizam por um resultado madiato, porém, evolutivo.[...] Oportuna a transcrição do conceito legal do acidente-tipo previsto na Lei nº. 8.213/91: “Art. 19. Acidente de trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho de segurados referidos no inciso VII do art.11 desta Lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.”
Neto, além de distinguir as doenças profissionais dos acidentes típicos,
subdivide aquelas em doenças profissionais, as quais são também chamadas
de tecnopatias ou ergopatias e as doenças do trabalho, também conhecidas
como mesopatias. (NETO, 2008, p. 4)
Segundo o autor, as doenças profissionais são aquelas que têm a sua
causa no trabalho, ou seja, somente surgem com o desenvolvimento de
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determinada atividade profissional, ou melhor, surgem em conseqüência da
atividade desenvolvida, e se, tal atividade não fosse desenvolvida, a doença
não existiria.(NETO, 2008, p. 4)
Já as doenças do trabalho são as adquiridas em razão das condições
em que o trabalho é realizado. Nas palavras de Neto (2008, p. 4):
Quanto às doenças do trabalho, também denominadas mesopatias, são aquelas que não têm no trabalho a causa única ou exclusiva, mas são adquiridas em razão das condições especiais em que o trabalho é realizado. São patologias comuns, mas que excepcionalmente, a execução do trabalho em condições irregulares e nocivas contribui diretamente para a sua contração e desenvolvimento.
Assim, as doenças do trabalho são aquelas doenças comuns, que
poderiam afetar qualquer pessoa, mas que em razão das condições de
trabalho proporcionadas ao trabalhador estas doenças surgem.
Atualmente, muito se tem discutido acerca das doenças ocupacionais,
isso porque nos últimos tempos o aparecimento dessas doenças tornou-se
alarmante. Segundo estudiosos na área, isso se deu em razão da explosão do
regime capitalista em que vivemos hoje, uma vez que houve a necessidade de
um aumento de produção, o que por conseqüência faz com que os
trabalhadores se esforcem mais para conseguir os resultados exigidos.
Entretanto, tal esforço a maior pode vir a prejudicar a saúde dos trabalhadores.
Segundo o site Farol Comunitário o número de trabalhadores que
apresentaram doenças ocupacionais só no ano de 2008 foi alarmante, senão
vejamos:
O registro de doenças ocupacionais deu um salto nos últimos anos. Desde que o mundo descobriu o ‘boom’ do capitalismo com o advento da revolução industrial, o número de colaboradores com lesões relacionadas ao trabalho cresceu assustadoramente. Segundo dados do Ministério da Previdência, só no início de 2008, as notificações de doenças do sistema osteomuscular - nas quais incluem as lesões por esforço repetitivo (a famosa LER) e que representam 84,7% do total de doenças empregatícias, aumentaram
15
512%, induzindo um crescimento de 134% nas enfermidades ocupacionais. (SORNA, 2008)
1
Entretanto, a relação entre trabalho-saúde-doeça não é um assunto que
se originou na contemporaneidade. Desde a antiguidade já se fazia menção a
esta relação, porém nada muito amplo, uma vez que, as pessoas que estavam
mais expostas aos possíveis danos resultantes do trabalho eram escravos,
considerados naquela época como não-cidadãos. Hipócrates (Hipócrates, 460-
375 a.C., apud Mendes, 2003) foi um dos pioneiros a avançar nessa temática,
embora não fosse esse seu objetivo central. Em seus estudos identificou que
havia riscos ocupacionais específicos e, a partir da relação existente entre
determinadas substâncias e a doença, que outros autores já haviam
estabelecido, Hipócrates pôde então interligar doenças particulares e
determinadas ocupações.
Apesar das teorias de Hipócrates, somente em 1700 que este campo
obteve o que até o século XIX foi o maior referencial sobre as patologias do
trabalho, o clássico “De morbis Artificum Diatriba” (Tratado sobre as doenças
dos trabalhadores) escrito por Bernardino Ramazzini (1633-1714) o qual lhe
concedeu o epíteto de “Pai da Medicina do trabalho”.
Podem se destacar na obra de Ramanzzini quatro aspectos, como
esclarece Mendes (2003, p. 84):
“[...] a preocupação e o compromisso com uma classe de pessoas que habitualmente esquecida e menosprezada pela medicina; [...] sua visão sobre a determinação social das doenças; [...] contribuição metodológica; [...]como deve ser a abordagem dos problemas [...] a sistematização e classficação das doenças segundo a natureza e o grau de nexo com o trabalho.
Vale destacar que, dentre as classificações feitas por Manzzini e citadas
por Mendes, a que tem maior importância para o presente trabalho, é, sem
1 SORNA, Janaina. Doenças ocupacionais registram crescimento. Disponível em
http://www.farolcomunitario.com.br/saude_000_0052.htm. Acesso em 03/03/2012
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dúvida, a sistematização e classificação das doenças segundo a natureza e o
grau de nexo com o trabalho.
A sistematização das patologias do trabalho, feita por Ramanzzini,
auxiliou na classificação das mesmas, conforme já salientado anteriormente,
estas se dividiram em dois grandes grupos: as doenças profissionais ou
tecnopatias e as doenças adquiridas pelas condições especiais em que o
trabalho é realizado ou mesopatias. (MENDES, 2003, p. 84)
Assim, passaremos agora ao estudo individualizado de cada um desses
grupos.
2.1.1 Doenças Profissionais ou Tecnopatias
O art. 20, I , da Lei de Benefícios (Lei n.º 8.213/91) traz a definição legal
do que seja doença do trabalho e doença profissional, o qual transcreveremos:
Art. 20 – Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:
I – doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;
As doenças profissionais ou tecnopatias referem-se às doenças que
possuem como causa única o trabalho.
Na definição de Monteiro (1998, p. 128):
As doenças profissionais ou ocupacionais também são conhecidas como ergopatias, idiopatias, doenças profissionais típicas, doenças profissionais verdadeiras ou tecnopatias propriamente ditas e definidas como as que são produzidas ou desencadeadas pelo
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exercício profissional peculiar a determinada atividade (MONTEIRO, 1998)
2
Ou seja, possuem no trabalho sua causa única. São doenças típicas de
algumas atividades, peculiares ao exercício de determinadas profissões. Na
interpretação de Martinez, são enfermidades que acompanham o trabalhador
até em outras empresas, perseguindo-o durante toda sua vida laboral.
(MONTEIRO, 1998, p. 128)
2.1.2 Doenças do Trabalho ou Mesopatias
As doenças do Trabalho por sua vez, estão dispostas também no artigo
20 da Lei nº. 8.213/91, em seu inciso II, in verbis:
Art. 20 – Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas: [...]
II – doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.
Ao contrário das doenças profissionais, as doenças do trabalho, também
denominadas mesopatias, ou do meio, ou doenças de condições de trabalho,
indiretamente profissionais não tem no trabalho sua causa única, pois o
ambiente de trabalho é o fator que põe a causa mórbida em condições de
produzir lesões incapacitantes. São doenças típicas de algumas atividades
laborativas.
Segundo Oliveira (1994, p. 183):
As mesopatias, se não adquiridas em decorrência direta da atividade laborativa, podem ser oriundas das condições em que o trabalho é realizado (tuberculose, bronquite, sinusite, etc.). As condições excepcionais ou especiais do trabalho determinam a quebra da resistência orgânica e a conseqüente eclosão ou exacerbação do quadro mórbido, ou até o se agravamento. Estas, não tem o nexo etiológico presumido com o trabalho, segundo a lei, sendo aquele
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determinável conforme prova pericial, testemunhal e até mesmo indiciária em certos casos.
2.2 Diagnóstico
Tanto as tecnopatias (doenças profissionais), como as mesopatias
(doenças do trabalho), nem sempre são diagnosticadas como tais, por se
tratarem de doenças comuns, que todos podemos vir a desenvolver, sendo que
a única diferença está no fato de que o trabalho é a causa, direta ou indireta
destas doenças.
Além da difícil distinção entre doenças comuns e doenças causadas pelo
trabalho, estas últimas podem ser de difícil percepção, pois, somente acidentes
ou extremas exposições a ruídos, substâncias tóxicas, ou riscos físicos podem
resultar em doenças agudas, de fácil identificação. Mas a maioria dos
trabalhadores acha-se exposta a baixos níveis destes riscos, os quais podem
ser fatais a longo prazo, apesar de serem menos evidentes a curto prazo.
Na tentativa de resolver tal problema, a doutrina adotou a
concausalidade, que segundo Neto (2008, p. 5):
A concausalidade é uma circunstância independente do acidente e que a ele se soma para atingir o resultado final. Mais que isso: só configurará concausa se a circunstância em exame constituir, em conjunto com o fator trabalho, o motivo determinante da doença ocupacional ou do acidente do trabalho.
E continua Neto (2008, p. 5):
Ainda que a execução do trabalho não tenha sido a causa única e exclusiva do acidente ou da doença ocupacional, mesmo assim tais sinistros serão considerados acidentes de trabalho para efeitos de lei quando as condições de trabalho concorrerem diretamente para o advento do infortúnio. A essa causa “concorrente” a doutrina chama de concausa, a qual encontra-se prevista na Lei nº. 8.213/91.
Assim, de acordo com a teoria da concausa, se a doença manifestar-se
em razão da atividade desenvolvida, ou em razão das condições em que tal
19
atividade é desenvolvida, esta será considerada uma doença ocupacional, ou
melhor, um acidente de trabalho, sendo concedido ao trabalhador os benefícios
dispostos na Lei nº. 8.213/91.
Vale destacar que, no caso dos policiais, estes possuem um regime de
previdência próprio, não incidindo a lei supra mencionada. Como cada Estado
da Federação é responsável pela organização de suas polícias, através das
Secretárias de Segurança Pública, também é responsável pela criação de lei
que institui o plano de previdência dos policiais, os quais são servidores
públicos.
Uma vez que o objetivo deste trabalho não é demonstrar o perfil
previdenciário dos policiais, mas sim, demonstrar as doenças ocupacionais que
os mesmo podem vir a sofrer em razão das atividades desenvolvidas, e ainda,
em razão do grande número de leis e demais dispositivos que seriam
pertinentes a demonstração dos benefícios aos quais os policiais têm direito,
não será aprofundado o presente trabalho no que diz respeito aos benefícios
concedidos aos policiais.
20
TRABALHO E SAÚDE DOS POLICIAIS
No terceiro e último capítulo deste trabalho, será abordado o tema
proposto, apresentando as doenças ocupacionais que mais acometem os
policiais, bem como, o vem sendo feito para tentar minimizar a ocorrência de
tais doenças.
3.1 A atividade policial e suas peculiaridades
No Capítulo I deste estudo, o trabalho foi definido através de conceitos
de ilustres doutrinadores, porém, todos conceituam o trabalho como sendo, em
síntese, a transformação da natureza pelo homem.
Entretanto, o policial, não transforma a natureza, pelo menos não no
sentido estrito da expressão, porém, ainda assim, é uma profissão, como
assevera Poncioni (2003, p. 69):
(...) a atividade policial é exercida por um grupo social específico, que compartilha um sentimento de pertencimento e identificação com sua atividade, partilhando idéias, valores e crenças comuns, baseados numa concepção do que é ser policial. Considera-se, ainda, a polícia como uma “profissão” pelos conhecimentos produzidos por este grupo ocupacional sobre o trabalho policial – o conjunto de atividades atribuídas pelo Estado à organização policial para a aplicação da lei e a manutenção da ordem pública-, como também os meios utilizados por este grupo ocupacional para validade o trabalho da polícia como “profissão”.
Além disso, a relação da polícia com o Estado, que como já dito é o
responsável pela organização da segurança pública, constitui uma relação de
trabalho, como descreve Fraga (2006, p. 04):
Ao se considerar a polícia como profissão, como uma especialização na divisão socitécnica do trabalho, destaca-se que o policial é um sujeito que desenvolve um processo de trabalho. O trabalho do policial na sociedade produz um valor de uso (o serviço de segurança público oferecido à sociedade) e um valor de troca (preço pago pelo empregador, o Estado, pelo serviço).
21
Fraga (2006, p.04) ainda descreve os elementos constitutivos do
processo de trabalho do policial:
1. O trabalho propriamente dito – a atividade policial desenvolvida com a finalidade de executar a política de segurança pública; são as ações da polícia (vão desde o policiamento ostensivo até controle de tumulto); é sempre, “em tese” planejado. 2. A matéria –prima do trabalho policial- é a sensação de segurança social, a ordem pública, o policiamento ostensivo, a defesa pública, enfim, é a segurança pública na sociedade. 2.1. O objetivo do trabalho é etéreo – é a segurança pública (prestação de serviço), tanto formal (variáveis de policiamento), como informal (ações que visam à sensação de segurança da Comunidade). 3. os meios- tudo aquilo de que o policial se utiliza na realização de seu trabalho; podem ser subdivididos em instrumental e
conhecimento técnico-operativo.
Sobre o papel da polícia, Monjadert (2003, p. 15) destaca que:
(...) esta trata de problemas humanos, quando sua solução necessita ou possa necessitar do emprego da força e, na medida em que isso ocorra, no lugar e no momento em que tais problemas surgem. É isso que dá homogeneidade a atividades tão variadas. Assim, para que o policial possa realizar o seu trabalho com eficiência, é fundamental que aprenda a intervir nos mais distintos espaços, de modo que exerça sua autoridade como profissional dentro das prerrogativas que lhe conferem o poder de polícia, mas sem abusar desse poder, de maneira arbitrária ou autoritária.
Uma vez definida e entendida a polícia como uma profissão, pode-se
então, analisar as suas peculiaridades.
Inicialmente, explica Fraga (2006, p. 06):
O policial é o profissional responsável pela execução da política de segurança pública, funcionário público estatal (logo, tem o Estado como empregador) e no caso de policiais militares, é o único profissional que é julgado por duas justiças (a civil e a militar), podendo ser submetido a punições por atos que não redundem em nenhum tipo de pena para o cidadão civil.
Importante salientar que, em que pese a definição acima descrita,
existem diferenças entre o trabalho das polícias em razão de serem civis ou
militares, sendo a primeira responsável pela parte de investigação, nem
sempre ficando tão próxima da população; já a segunda, realiza um trabalho de
policiamento ostensivo, com o intuito de prevenir a ocorrência do crime, o que
ocorre através de rondas, e por tal motivo, estão mais próximos a população, o
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que faz com que ao se falar em polícia, seja a imagem de um policial militar
que vem à mente das pessoas.
Outra peculiaridade no trabalho policial é que o regime de trabalho é
prescrito por escalas, as quais podem varias de 6 (seis) horas de trabalho por
18 (dezoito) horas de folga; 12 (doze) horas de trabalho por 48 (quarenta e oito
de folga) ou até 24 (vinte e quatro horas) de trabalho por 72 (setenta e duas) de
folga.
Sobre a escala de horários destaca Fraga (2006, p. 08):
Assim, o trabalho da polícia reveste-se de características muito peculiares: não possuem horários predeterminados, principalmente para o término do serviço, ou seja, não têm uma jornada fixa, como os outros trabalhadores. Além disso, depois que a escala de serviço acaba, os policiais estão sujeitos, ainda ao atendimento de ocorrência. Significa dizer que eles têm de estar à disposição do Estado, ou melhor, da segurança da sociedade, por imposição legal, nas 24 horas do seu dia.
Outra peculiaridade são à dificuldades e os riscos que o policial enfrenta,
tais como chuva, sol forte, frio, risco de ser baleado, ou sofrer um acidente
durante uma perseguição, etc.
Por tais circunstâncias, o trabalho do policial é diferenciado, sendo que,
como assevera Santos (1997, p. 162), o limite desta diferença é a própria vida:
A vida situa-se como limite, seja pelo risco de vida a que se sentem submetidos os policiais, civis e militares, nos campos e cidades brasileiras, devido ao aumento de conflitos sociais-agrários e à criminalidade urbana violenta; seja pela ameaça à vida ou no limite da norma social, exercendo um poder de modo próximo ao excesso.
Em razão, dessa incerteza no que diz respeito às atividades
desenvolvidas, afirma Monjardet (2003, p. 20):
(...) o trabalho policial não procede de uma adição de tarefas prescritas, mas da seleção, pelos próprios interessados (no caso a comunidade) de suas atividades. Por esse motivo, são os mecanismos desse processo da seleção os principais determinantes da definição, da organização e da análise do trabalho policial. (...) O trabalho do policial não é não é uma soma de tarefas prescritas, isto é, não existe
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um manual indicando o que seja ou não tarefa da polícia, mas o policial aprende que é preciso identificar uma situação de crime, uma ocorrência policial. Talvez, o mais difícil para o profissional não seja identificar ou não se a tarefa é de sua alçada, mas como intervir em situações que sempre reservam uma certa dose de rotina, suspense e surpresa.
Por conseqüência dessas situações de incerteza, os policiais vivem em
um estado quase que constante de tensão, que podem acarretar diversos
problemas de saúde.
3.2 A violência no trabalho policial
Segundo Costa (1997, p. 89):
A violência é a agressão premeditada, sistemática, e por vezes, mortal, de um indivíduo ou grupo contra outro (s). Considera-se , dessa maneira, a agressão premeditada como a violência em si e não uma de suas manifestações, por isso o seu conceito carece de maior amplitude.
Para Pinheiro de Almeida (2003, p. 56) a violência é: “(...) a ação,
produção de dano/destruição e intencionalidade, ou seja, para uma definição
básica de violência pode-se dizer que é uma ação intencional que provoca
dano.”
O trabalho policial, além de lidar com a violência, também utiliza-se dela
como instrumento na realização de suas atividades. É claro que, quando se
trata de utilizar a violência na ação policial, a policia tem uma limitação, ou seja,
violência é utilizada de forma prudente, ou seja, na proporção necessária para
conter uma violência já existente, como destaca Fraga (2006, p. 10)
No caso da polícia, é válida essa definição, até certo ponto, para se estabelecer uma distinção entre violência e uso de força na ação policial. A violência é arrebatadora, exagerada; já a força [e comedida. Enquanto o uso da força é prudente, dentro de seus limites, a violência é força cega, que não enxerga as conseqüências de seus atos. Na ação policial, a tênue linha que separa o uso da força comedida e moderada da violência como força cega e brutal é uma das questões que está cotidianamente no cerne da intervenção da polícia.
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Ocorre que, o fato de os policiais estarem lidando diretamente com a
violência, seja para impedí-la, seja utilizando-a pra conseguir realizar seu
trabalho, faz com que estes profissionais vivam freqüentes situações de
estresse, e de tensão, o que como já dito anteriormente, pode causar
problemas de saúde, em especial problemas psicológicos.
Isso ocorre em razão do desgaste psíquico que os policiais têm ao
conviver diariamente à situações de perigo, bem como, ao fato de estarem
sempre alerta, pois como já explicitado, os policiais têm o dever legal de
estarem 24 horas à disposição da sociedade, caso hajas alguma ocorrência.
Além disso, existe também a sobrecarga de trabalho, já que em alguns
Estados faltam profissionais para a realizações de plantões, existem ainda as
questões ligadas à má-remuneração dos policiais, e problemas de
relacionamento interno, seja com superiores, colegas de trabalho ou
subalternos.
3.3 A saúde mental dos policiais
Em função das situações de estresse à que os policiais são submetidos
no desempenho de suas funções, os principais problemas de saúde
apresentados por estes profissionais são os psicológicos, ligados com a fadiga
mental, a depressão e o estresse pós-traumático,.
Segundo Santos (1997, p. 119):
Os policiais em atividade fim – sejam eles civis e/ou militares –
caminham na maioria das vezes no limiar da vida, por estarem constantemente expostos ao risco de vida, seja na área rural, devido ao alto índice dos conflitos sócio-agrários, ou nas cidades, por causa da criminalidade urbana violenta. Eles estão sempre agindo em áreas conflituosas.
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Santos (1997, p. 119) ainda destaca que:
As intervenções policiais, que tem sempre propósito de atuar em situações de conflitos, que podem ser entre os pares sociais, da sociedade contra o Estado ou vice-versa, são marcadas por um essencial contato com o público de natureza diversa e momentos complexos. O trabalho da polícia é por si marcado por incertezas, visto ser constituído por elementos de difícil previsão. Pois os policiais além de se prepararem “psicológicamente” para dada ocorrência, quando chegam ao local solicitado, se deparam com um cenário complexo: quem é o bandido? Quem está certo ou errado? O motivo que suscitou sua presença? Caso haja necessidade do uso de força ou arma qual o limite? Qual procedimento à valer-se? Questões que carecem de respostas em curto espaço de tempo. Um erro de avaliação pode lhe ser fatal, ou induzí-lo a ter comportamentos equivocados.
Além dos fatores acima descrito, outros motivos de preocupação entre
os policiais, que podem chegar a causar transtornos psicológicos e problemas
de saúde, são as condições de trabalho oferecidas pelo Estado.
Ora, se num primeiro momento a causa de estresse, tensão, angústia e
até insatisfação são circunstâncias alheias à vontade dos policiais, bem como
do Estado, num segundo momento é justamente as condições de trabalho,
muitas vezes precária, oferecidas pelo Estado.
A polícia, por ser um órgão público, mas que mantém a organização de
uma prestadora de serviços, portando, uma organização de trabalho, já que
mesmo sendo pública, tem como função a prestação de serviços de segurança
à sociedade, sofre a pressão inerente à essa organização, também sofre
pressão por parte da sociedade, que exige que os serviços prestados pela
polícia sejam sempre satisfatórios e efetivos, e ainda, sofre pressão em razão
das condições de trabalho.
Pode-se dizer então que, a conseqüência dessas pressões sobre o
policial contribui para a insatisfação e o comprometimento de sua saúde.
Em pesquisa realizada por Silva (2008, p.10) em parceria com
Universidade Federal da Paraíba, em 2008, foi constatada que entre as
preocupações dos policiais, estavam o estado das fardas, que estavam velhas,
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assim como o estado de funcionamento das viaturas e das armas, sendo estas
últimas consideradas obsoletas em comparação com as dos bandidos.
Segundo Silva (2008, p. 10):
Este fato demonstra uma precarização do trabalho; armas obsoletas, viaturas insuficientes e em más condições de uso, falta de reconhecimento tanto por parte da instituição como pela sociedade e os baixos salários. Esses fatores externos aumentam as exigências da tarefa, que por sua vez, que posr sua vez, exige do policial um esforço maior para realizá-la. A forma em que o trabalho é organizado – conforme a concepção taylorista-fordista – os processos mentais e psíquicos são desconsiderados, e conseqüentemente, termina por impedir o escoamento das tensões oriundas da situação de trabalho. O trabalhador é o primeiro a sentir esse impacto, que repercute no estado físico, mental e psico-afetivo, comprometendo a regularidade da produção.
A pesquisa realizada por Silva (2008, p. 11), revela ainda outro fato
preocupante acerca dos policiais do Estado da Paraíba:
A relação entre os aspectos objetivos e subjetivos do trabalho do policial do Estado da Paraíba, em atividade fim, é constituída por miríades de exigências que faz com que muitos policiais sintam o efeito ruim dessas pressões. É o que afirmam as lideranças da polícia militar, quando expõem suas preocupações referentes ao alto índice de policiais com dependência química (alcoolismo), bem como o elevado número de depressão e o suicídio entre eles. Os fatores patogênicos oriundos de uma organização que não propicia certa liberdade ao trabalhador, tolhendo-lhe sua capacidade criativa, fazem com que ele acione os sistemas internos de defesas, individuais ou coletivos, demonstrando que o trabalhador desenvolve uma postura pró-ativa frente a esses fatores com propósito de alcançar um equilíbrio instável por certo tempo.
Por fim, a referida pesquisa realizada por Silva (2008, p. 12), apresenta
dados estatísticos acerca das aposentadorias por invalide em razão de
transtornos psiquiátricos entre os policias militares da Paraíba:
O percentual de aposentadorias por invalidez devido aos transtornos psiquiátricos, homologados pela junta médica da PMPB em 2008 equivale a 25,5%. Um outro dado importante é que cerca de 75,8% de reformados estão entre 20 a 29 anos, ou seja, entre os profissionais jovens, praticamente em início de carreira. Considerando o escalonamento hierárquico da PM, verifica-se que 73,2% dos mais afetados são os soldados e cabos, talvés por estarem em contato mais direto com a violência. Outro dado preocupante é que entre o período de 2005 - 2008 a junta médica da PM homologou 74 reformas por invalidez, desses 41,9% foram por motivo de ordem mental. Os dados
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também apontam certos fatores que contribuem para o sofrimento psíquico desses profissionais, a saber: baixos salários (92%), carga excessiva de trabalho (69%); condições de trabalho desfavoráveis (61%)
Esses dados, ainda que não sejam específicos do Estado de Santa
Catarina, ajudam a demonstrar os impactos das pressões sofridas pelos
policiais, bem como, das más condições de trabalho que lhes são oferecidas,
pois, infelizmente, os problemas enfrentados pelos policiais da Paraíba, são
enfrentados pelos policiais do Brasil inteiro, como se pode ver todos os dias
nos noticiários, que informa a respeito de greves ou outro tipo de protesto da
polícia.
Vale destacar que, a referida pesquisa também relata que, em razão dos
baixos salários pagos aos policiais, estes se vêem obrigados à fazer os
chamados “bicos”, ou seja, prestam serviços à particulares nas horas vagas a
fim de complementar a renda. Ocorre que, em razão desse “segundo
emprego”, o policial acaba não descansando no seu tempo de repouso, e como
já dito no início do segundo capítulo, a falta de alimentação adequada, ou de
descanso adequado, acarreta ao indivíduo problemas de saúde.
3.4 A saúde física dos policiais
A pesquisa realizada por Silva (2008, p. 14), destacou os policiais não
enfrentam menos problemas físico do que mentais. Os acidentes de trabalho
quase não ocorrem, principalmente nos casos em que os policias fazem
trabalhos estritamente burocráticos:
Os acidentes de trabalho são pouco freqüentes, embora, os equipamentos de proteção individual sejam apontados como obsoletos e ruins. Quanto à saúde dos policiais, de forma geral, a maioria respondeu que goza de boa ou ótima saúde. Ao se levantar a sintomatologia que eles apontam com relativa freqüência, observa-se que sofrem um desgaste psicológico grande, necessitando de uma assistência mais próxima e efetiva dos setores responsáveis pela saúde dos funcionários.
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Desta forma, resta claro que, em que pese a periculosidade do trabalho
desenvolvido pelos policiais, principalmente por aqueles responsáveis pela
realização do policiamento ostensivo, os quais ficam na linha de frente, por
assim dizer, os problemas de saúde que mais acometem estes profissionais,
sem dúvida são os de ordem psicológica.
É claro que as doenças físicas também ocorrem nos referidos
profissionais, porém, a causa ou o agravamento destas nem sempre é a
natureza da atividade por estes desenvolvidas.
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CONCLUSÃO
Através do exposto neste estudo, pode- se estabelecer certas conexões
que oportunizam o entendimento favorável às mudanças na forma de trabalho
da polícia, principalmente no que diz respeito à organização do trabalho e a
saúde mental dos policiais.
As circunstâncias de trabalho enfrentadas pelos policiais, têm a
propensão de causar grande estresse nestes profissionais. As situações de
violência e tensão enfrentadas no seu ambiente de trabalho, podem vir à
causar sérias conseqüências à saúde mental dos policiais.
Não bastasse tais circunstâncias, os policiais enfrentam dificuldades no
que se refere às condições de trabalho oferecidas pelo estado, as quais são
ruins e dificultam a realização das tarefas, uma vez que as viaturas quase
sempre estão em péssimo estado, as armas são consideradas obsoletas em
comparação com as dos bandidos, e por vezes, nem as fardas que os policiais
usam estão em bom estado.
A carga horária também é um fator causador do estresse e demais
problemas psicológicos nos policias, já que, primeiramente, estes, em que pese
trabalharem em forma de escalonamento, têm o dever legal de permanecerem
à disposição 24 horas, pois, caso sejam necessários seus serviços, terão que
prestá-los independente de ser ou não seu dia de folga.
Além disso, em razão dos baixos salários pagos aos policiais, alguns se
vêem obrigados a aceitar ofertas de trabalho de particulares, assim, nos
períodos que têm folga de seus trabalho na polícia, e que deveriam estar
descansando, estes policiais trabalham, com seu repouso prejudicado, o que
pode lhes levar à fadiga.
Com relação aos problemas de saúde física dos policiais, estas não são
tão comuns como às de fundo psíquico, e conforme pesquisas realizadas, as
queixas dos policiais sobre seu estado de saúde na maioria das vezzes eram
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sobre cansaço e estresse, e quando ocorria alguma queixa de dor física, esta
poderia ser em decorrência das questões psicológicas.
Os acidentes de trabalho, principalmente nas áreas da polícia que
realizam trabalhos burocráticos quase não ocorrem, sendo mais suscetíveis à
tais acidentes os policiais que efetuam o chamado policiamento ostensivo.
Existem poucas pesquisas e material informativo acerca do tema, motivo
pelo qual o presente estudo não pode ser mais abrangente. Porém, acredita-se
que é de grande importância o estudo das doenças ocupacionais relacionadas
ao trabalho da polícia, a fim de se criar normas mais específicas, que possam
de alguma forma preservar a saúde destes profissionais, à exemplo de outras
categorias que já tem legislação especial.
Também é importante que, através de pesquisas surjam políticas de
prevenção e tratamento das moléstias que acometem os policiais, a fim de que
estes profissionais não fiquem impossibilitados de realizar suas atividades
profissionais, e nem sejam privados de suas vidas privadas, ou do convício
com sua família ou amigos.
Acredita-se que uma boa forma de se começar a prevenção seria a
valorização destes profissionais, através de fornecimento pelo Estado de
condições dignas de realização do trabalho, o que pode se entender como o
fornecimento de instrumentos de trabalho (viaturas, armas, fardas,
computadores, etc.) em boas condições, que facilitem a realização de suas
tarefas, não lhes exigindo esforço maior do que o normal, poupando-lhes
assim, de algumas situações de estresse.
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REFERÊNCIAS
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