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Informativo da Rare Brasil n o 3 | Fevereiro 2017 Rare amplia atuação no Brasil e chega aos Estados do Pará e Pernambuco Pesca para Sempre promove encontro de intercâmbio entre as equipes dos seis países onde programa é implementado...................................................... pág. 4 Entrevistas com Cintia Miyaji, Coordenadora de Pesquisa e Apoio Pedagógico da Unimonte................................................................................................................pág. 7 Fique por dentro: oportunidades de trabalho, vídeos educativos, a importância do diário de bordo............................................................................................... pág. 10 Entrevistas com Coordenadores de Campanha.....................................................pág. 11

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Informativo da Rare Brasilno 3 | Fevereiro 2017

Rare amplia atuação no Brasil e chega aos Estados do Pará e Pernambuco

• Pesca para Sempre promove encontro de intercâmbio entre as equipes dos seis países onde programa é implementado......................................................pág. 4

• Entrevistas com Cintia Miyaji, Coordenadora de Pesquisa e Apoio Pedagógico da Unimonte................................................................................................................pág. 7

• Fique por dentro: oportunidades de trabalho, vídeos educativos, a importância do diário de bordo...............................................................................................pág. 10

• Entrevistas com Coordenadores de Campanha.....................................................pág. 11

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Após dois anos de implementação do programa Pesca para Sempre em seis Reservas Extrativistas (Resex) Marinhas, a Rare iniciará, no mês de março, a sua segunda fase de campanhas que expande o trabalho para outros pontos no litoral brasileiro. O novo grupo de Áreas Marinhas Protegidas contempla cinco Resex do Estado do Pará – Caeté-Taperaçu, Gurupi-Piriá, Soure, Mãe Grande de Curuçá e São João da Ponta que integram, junto com outras sete áreas, o conjunto intitulado Salgado Paraense – e duas Áreas de Proteção Ambiental (APAs) situadas em Pernambuco – APA Costa dos Corais, que é a maior unidade de conservação marinha do Brasil, e APA Estadual de Guadalupe. Além disso, nesta etapa, reiterando o compromisso com a continuidade e a consolidação das campanhas e ações já iniciadas, a Rare seguirá atuando em algumas regiões da primeira fase: na APA Delta do Parnaíba, no Piauí, e no Maranhão, onde pretende apoiar o pleito das comunidades de Carutapera e Baía do Tubarão para a criação de Resex em suas áreas.

Entre 2017 e início de 2019, a iniciativa Pesca para Sempre promoverá um total de seis etapas de treinamento e formação para os Coordenadores de Campanha, que são as pessoas responsáveis pelo planejamento e execução das atividades do plano de ação de cada área. Em seu novo ciclo, o programa mantém a parceria do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e da Comissão Nacional para o Fortalecimento das Reservas Extrativistas Costeiras e Marinhas e das Populações Tradicionais Costeiras e Marinhas (Confrem) e ganha a adesão do governo do Estado do Pará. Assim, visando propiciar um processo de multiplicação e potencialização do uso da metodologia do Pesca para Sempre na gestão da pesca artesanal no país, os treinamentos que, primordialmente, deverão acontecer na cidade de Bragança (PA), terão vagas abertas também para ouvintes indicados pelo governo paraense e pela Confrem.

Luís Lima, diretor executivo da Rare Brasil, explica que, diferentemente da abordagem utilizada na primeira fase, que teve suas áreas distribuídas ao longo do litoral brasileiro com o objetivo de avaliar a potencialidade da metodologia em diferentes realidades regionais, neste segundo momento, a Rare decidiu concentrar a maior parte dos seus esforços em um mesmo território. “O intuito agora é impulsionar o novo modelo de gestão e ganhar escala, demonstrando resultados efetivos no contexto regional e na dimensão sistêmica”, revela. Lima lembra que, com 200 mil hectares de manguezais

A Rare inicia segunda fase de trabalho no país em dez novas áreas costeiro-marinhas

do Programa Pesca para Sempre

exuberantes, o litoral do Pará abriga uma das maiores áreas contínuas desse ecossistema no mundo. “O Estado tem a maior produção oriunda da pesca artesanal no país e ocupa a segunda posição nacional na produção de pescado”, informa. Neste sentido, a Rare está formando uma parceria estratégica com o governo do Pará, por meio das Secretarias de Estado de Desenvolvimento Agropecuário e da Pesca (Sedap), de Ciência, Tecnologia e Educação Profissional e Tecnológica (Sectet) e do Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade do Estado do Pará (Ideflor-bio). Lima aponta que essas alianças têm sido fundamentais para a construção do programa estadual de Agentes Comunitários da Pesca, que visa capacitar moradores e lideranças locais para atuarem junto aos pescadores promovendo a construção de processos participativos de gestão da pesca, o uso

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sustentável dos recursos pesqueiros e a melhoria da qualidade de vida das comunidades.

Em Pernambuco, o trabalho será feito em parceria com o Centro de Pesquisa e Conservação da Biodiversidade Marinha do Nordeste (Cepene/ICMBio) e com as universidades locais que atuam com pesquisa e conservação dos recursos naturais e pesqueiros. Para Gabriel Vianna, especialista de pesca da Rare, será uma grande oportunidade para testar técnicas alternativas mais sustentáveis na gestão da pesca, bem como novas tecnologias que ajudem a preservar espécies capturadas indevidamente na pesca do camarão em Pernambuco. Na avaliação da zootecnista Natali Piccolo, gerente de projetos da Rare, a adoção de áreas de conservação e reprodução de estoques no contexto das Áreas Marinhas Protegidas pode ajudar a aumentar a abundância das mais importantes espécies comerciais em cada comunidade. “Assim, procuramos garantir uma produção sustentável nos próximos anos”, complementa.

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A estimativa é a de que as campanhas alcancem, nos sete locais nos Estados do Pará e Pernambuco, aproximadamente 1.500 famílias e 5.500 pescadores, num total de 40 comunidades. “Considerando uma área de cobertura de cerca de 630 mil hectares onde, em mais de 135 mil serão fomentadas áreas de manejo pesqueiro, podemos afirmar que esta nova etapa de trabalho representa uma oportunidade sem precedentes de construção de modelos inovadores de gestão participativa da pesca no Brasil”, afirma Lima. Somadas às três áreas de replicação no Piauí e Maranhão, a segunda etapa de trabalho da Rare no país totaliza dez novas áreas. “Nesses locais, empenharemos nossos melhores esforços e capacidades, visando consolidar uma proposta de gestão colaborativa da pesca artesanal que agregue seus valores, conceitos e ferramentas”, finaliza.

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Intercâmbio de Aprendizagem da equipe global do Pesca para Sempre*

*por Natali Piccolo, gerente de programa da Rare Brasil

No início de dezembro de 2016, a equipe da Rare Brasil desembarcou em Dumaguete, Filipinas, para uma semana de intercâmbio e aprendizado com representantes dos países que, assim como o Brasil, implementam o programa Pesca para Sempre da Rare: Indonésia, Filipinas, Micronésia e Moçambique.

Durante as sessões ao longo de uma semana, os 60 participantes compartilharam aprendizados e discutiram possibilidades de customização de produtos e de programas que possam contribuir para a implementação exitosa do programa em suas diferentes realidades. Entre os destaques, tivemos uma sessão sobre a customização dos diários de bordo, com o uso de imagens das espécies-alvo, para a coleta de dados da pesca artesanal nas campanhas do Brasil, além de outras sessões onde foram

apresentadas as diversas ferramentas de marketing social que o programa das Filipinas tem usado com sucesso na busca pela mudança de comportamento.

Um dos pontos altos da semana foi a visita a uma das áreas focais do Pesca para Sempre nas Filipinas – Bindoy –, onde foram anunciadas a criação de uma reserva de Direito de Uso Territorial da Pesca (Dutepe ou Turf, na sigla em inglês) e a aliança “Batman”. Esta iniciativa foi assim intitulada graças às iniciais dos quatro municípios que a integram e tem por objetivo expandir e fortalecer, entre as comunidades, práticas sustentáveis na pesca artesanal. A visita ao local foi dividida em três sessões: 1) ‘política e governança’, que foi uma oportunidade

Materiais pedagógicos de apoio às campanhas, desenvolvido pela Rare nas Filipinas

para conversar com os prefeitos e os representantes do Conselho de Gestão de Recursos Pesqueiros Marinhos e Aquáticos; 2) ‘comunidades’, que permitiu um bate-papo com os pescadores locais sobre a experiência na implementação das campanhas do Pesca para Sempre; e 3) ‘visita ao posto de vigilância’, uma construção em meio aos corais que, junto a uma equipe de oficiais do Estado, serve de base para um sistema de vigilância permanente sobre uma área de exclusão de pesca, garantindo assim a sua recuperação e a preservação da vida marinha. Por fim, a visita foi celebrada com a assinatura dos termos da aliança Batman por parte dos prefeitos e da Rare e contou

Assinatura da aliança Batman pelos quatro prefeitos dos mu-nicípios integrantes, acompanhados da equipe da Rare Brasil

Confraternização entre os participantes do Brasil na visita à Bindoy e o mascote da Campanha nesta área

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também com música, comida e a presença dos mascotes locais. Nossa colega Márcia Cota, Diretora de Estratégia e Desenvolvimento da Rare, esteve presente no evento e ressaltou que a parte mais valiosa de toda a semana foi ver a campanha em Bindoy acontecendo, com a assinatura do pacto entre os governos locais e o apoio demonstrado pela comunidade pesqueira. “Realmente o Pesca para Sempre tem um impacto positivo na governança local”, constatou.

O uso de novas tecnologias para o aprimoramento do monitoramento pesqueiro na pesca de pequena escala também foi foco de uma sessão, na qual o novo vice-presidente global para o Pesca para Sempre, Dr.

Integração dos participantes de diversos países e discussão sobre suas expectativas para o evento

“Isso nos dá um direcionamento para saber onde queremos e

onde podemos chegar, mesmo que com diferentes realidades”

O ano de 2017 será repleto de momentos importantes para a Rare. Neste ano, 41 áreas serão ‘graduadas’ no Brasil, na Indonésia e nas Filipinas, ou seja, estarão completando o ciclo da campanha pelo programa Pesca para Sempre. Por esse motivo, lideranças da Rare participaram de sessões especiais dedicadas à Operação 41 – nome dado ao plane-jamento para a finalização do trabalho nessas 41 áreas –, onde foram discutidos quais seriam os resultados espera-dos em cada localidade, os esforços e o escopo do Pesca para Sempre na fase pós-campanha e quais os principais aprendizados do processo de implementação.

Por fim, novas possibilidades para a Rare foram apresenta-das, em sessão dedicada às mudanças climáticas. A con-sultora de mudanças climáticas da Rare, Pippa Heylings, trouxe ao grupo a visão de como o trabalho dos países do

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Stephen Box, apresentou um aplicativo para celular que otimiza a coleta de dados a um baixo custo. Esse sistema permite que os países tenham fontes de informação sobre a importância da atividade pesqueira na economia nacional e na segurança alimentar. Enrico Marone, gerente de programa da Rare Brasil que também participou do encontro, ficou satisfeito com a oportunidade de aprender com experiências e bons exemplos de outros países. “Isso nos dá um direcionamento para saber onde queremos e onde podemos chegar, mesmo que com diferentes realidades”, afirmou.

Pesca para Sempre pode contribuir e ser compatível com a agenda internacional sobre o tema, abordando desenvolvi-mento sustentável, resiliência, redução de vulnerabilidade e construção de capacidades para comunidades pesqueiras de pequena escala.

O evento foi reconhecido pelos participantes como um marco na trajetória da Rare e do programa Pesca para Sempre, aprofundando o sentimento de integração e co-laboração entre as equipes e promovendo novas parcerias e contribuições positivas ao futuro do programa. O diretor executivo da Rare Brasil, Luiz Henrique de Lima, reitera que o encontro proporcionou uma intensa troca de conhecimen-to. “Foi muito importante saber que a Rare é formada por pessoas tão competentes. Foi, de fato, um momento muito rico para a instituição”.

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Apresentação dos diretores dos países sobre os resultados da ‘Operação 41’

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Parte da equipe Rare, representante de cinco países onde o Pesca para Sempre é implementado, no evento global nas Filipinas.

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Devemos, com urgência, desestimular o consumo de espécies cujos estoques não estão saudáveis, cujas artes de pesca impactem fortemente os ecossistemas de forma

negativa”, recomenda Cintia Miyaji, oceanógrafa e docente da Unimonte, em entrevista à Rare

A bióloga Cintia Miyaji, coordenadora de pesquisa e apoio pedagógico do Núcleo Acadêmico do Centro Universitário Monte Serrat - Unimonte, em Santos (SP), é mestre e dou-tora em Oceanografia Biológica pelo Instituto Oceanográf-ico de São Paulo. Na Unimonte desde 2000, ela já ocupou diversos cargos na administração superior acadêmica, tendo atuado por sete anos na coordenação do curso de Oceanografia. Como representante suplente dos cursos de graduação junto ao Comitê Executivo para a Formação de Recursos Humanos em Ciências do Mar (PPGMar), coorde-nou o grupo de trabalho para a Qualificação Docente.

A pesquisadora integra o conselho técnico da Fundação Parque Tecnológico de Santos e o conselho gestor do Insti-tuto Anima Sociesc de Inovação, Pesquisa e Cultura, além de coordenar a Secretaria Executiva da Aliança Brasileira pela Pesca Sustentável e representar o Grupo Anima Edu-cação na Global Seafood Ratings Alliance.

Quais são os principais gargalos na cadeia pro-dutiva do pescado no Brasil?

Na verdade, nunca me dediquei profissionalmente ao estudo da atividade pesqueira no país. Tenho trabalhado nos últimos 18 anos na área de educação, especificamente com formação de recursos humanos em Ciências do Mar, e um desafio com o qual sempre nos deparamos é o da comunicação com a sociedade. Ainda é muito incipiente o conhecimento do público em geral sobre os assuntos rel-acionados aos oceanos e, sem conhecer, não dá para pro-teger. Ao mesmo tempo, vivencio junto aos meus colegas pesquisadores as dificuldades encontradas na tentativa de que seus estudos se concretizem em políticas públicas de conservação da biodiversidade, planos de gestão, manejo e recuperação. Pesquisadores, que há décadas se dedicam ao estudo e levantamento de dados, têm dificuldades para que seus resultados se projetem além dos trabalhos científicos, que circulam apenas entre seus pares. Com base na experiência de outras instituições fora do Brasil, comecei a pensar há alguns anos que um caminho mais eficaz seria “traduzir” para o público o conhecimento ger-ado pelos pesquisadores, na tentativa de que de posse dessas informações o consumidor pudesse alterar seus hábitos. O consumo responsável de pescados surgiu como uma possibilidade que integraria conhecimentos de várias áreas em que venho atuando. A partir da elaboração da

primeira versão do Guia de Consumo Responsável de Pes-cados Unimonte, em 2008, foi que me dei conta da enorme lacuna que existia nessa área. As pessoas não sabem qual pescado consomem, não têm consciência de onde ele vem, como é pescado, como é processado, que tipo de impacto as pescarias ocasionam e muito menos se as populações exploradas estão em risco ou não. Mas por outro lado, querem, precisam, procuram por orientação quando per-cebem que podem contribuir com a conservação desses recursos. Então o grande desafio é despertar essa deman-da latente e levar a informação ao consumidor da forma mais precisa, mas ao mesmo tempo acessível a ele. Alguns dos gargalos mais difíceis de transpor são as questões dos nomes populares que variam muito ou que podem ser muito genéricos (como os cações e atuns, por exemplo), e que geram os problemas de rotulagem. Outra questão crucial é a rastreabilidade do pescado. Quando ele chega ao consumidor é muito difícil saber de onde veio ou como foi pescado.

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Quais são as potenciais soluções disponíveis para superar estes obstáculos?

Procuramos nos espelhar nas iniciativas e nas experiên-cias de sucesso (ou fracasso) que existem. Muitas vezes a questão é adaptar essas experiências à realidade local, regional e nacional, que é muito diversa culturalmente, quase que da mesma forma que biologicamente. Ao longo dos últimos anos, apesar da persistência em trabalhar com o consumidor final diretamente através dos guias, procur-amos também diversificar o público-alvo, iniciando a con-versa sobre sustentabilidade com os grandes varejistas, com os fornecedores de serviços de alimentação, restau-rantes industriais e com os chefs de cozinha formadores de opinião. Mas para cada segmento, surgem também novos obstáculos. De forma pioneira, conseguimos reunir representantes de diversos setores da cadeia produtiva do pescado, da pesca artesanal à industrial, do pequeno restaurante aos mais conceituados chefs, estudantes e professores, pesquisadores, aquários, ONGs e governo, em dois eventos anuais que realizamos em parceria com o Programa Seafood Watch, do Aquário de Monterey Bay, da Califórnia.

Desses encontros, nasceu a Aliança Brasileira pela Pesca Sustentável (ABPS, da qual a Rare participa desde o início), a partir da compreensão de que cada uma dessas pessoas, grupos e entidades reunidos sob um mesmo objetivo, poderia contribuir com informações, ferramentas e conta-tos, criando uma sinergia que permitirá novos avanços na questão da sustentabilidade da pesca e da aquicultura no Brasil. Acredito que esse modelo de parceria tende a evolu-ir. Estamos trabalhando para definir uma agenda comum para integrantes da ABPS para otimizar as ações, mas ain-da buscamos recursos para viabilizar uma estrutura opera-cional e um modelo de governança para esse grupo.

Quais são os produtos pesqueiros de maior valor comercial, cobiçados pelos restaurantes que poderiam pagar/exigir um produto de ori-gem sustentável? Qual o estado da exploração destes recursos? Como evitar o colapso desses estoques?

Quando falamos de alto valor comercial, não há como não mencionar a lagosta e os camarões. Mas para esses crustáceos ainda não temos uma alternativa verdadeira-mente sustentável quando utilizamos os critérios adotados internacionalmente. Pode haver iniciativas localizadas de carcinicultura (criação de crustáceos em cativeiro) que estão evoluindo para patamares mais elevados dentro dos critérios de certificação e recomendação de consumo, mas ainda há uma longa jornada.

Uma grande preocupação é o elevado consumo de pes-cados importados, seja o salmão do Chile, o panga ou a polaca. Além dos questionamentos sobre o de uso de an-

tibióticos e pesticidas, e os impactos nos ambientes natu-rais, temos que considerar que a pegada de carbono gera-da pelo transporte desses pescados até o Brasil é imensa. Podemos e devemos valorizar as pescarias locais, tradicio-nais e de baixo impacto, que nos forneceriam proteína de qualidade.

Devemos, com urgência, desestimular o consumo de es-pécies cujos estoques não estão saudáveis, cujas pescarias atinjam outras espécies ameaçadas de extinção (como albatrozes, tartarugas e mamíferos), cujas artes de pesca impactem fortemente os ecossistemas de forma negativa (como as de arrasto de fundo), e ainda as pescarias que de alguma forma estimulem ou promovam o desrespeito aos direitos humanos. Ao mesmo tempo, devemos ofere-cer opções de substituição ao consumidor que busca uma alimentação mais saudável e nutritiva. Tudo isso demanda pesquisa e levantamento de dados.

Fale um pouco das principais iniciativas ou ações de sustentabilidade na produção e no consumo do pescado no Brasil que você e sua instituição estão liderando.

A Unimonte, uma instituição de ensino superior do Grupo Anima Educação, foi pioneira, no Brasil, na elaboração e divulgação do Guia de Consumo Responsável de Pes-cados. Existem inúmeras iniciativas semelhantes de recomendação de consumo espalhadas pelo mundo, al-gumas baseadas em metodologias robustas, em critérios científicos amplamente debatidos e aceitos pela comuni-dade internacional.

Nunca tivemos a pretensão de “inventar a roda” e, assim, temos buscado parcerias que viabilizem um programa brasileiro, com suas particularidades e desafios, mas que já nasça com uma chancela e credibilidade no mercado. Nossa referência, desde o início, foi o Programa Seafood Watch, do Aquário de Monterey Bay. Para nossa sorte, Simone Jones, uma brasileira profundamente comprometi-da com a causa da sustentabilidade e apaixonada pelo seu país de origem, atua profissionalmente no Seafood Watch há muitos anos e assim que o programa iniciou seus pla-nos de internacionalização, ela conseguiu, de maneira bril-hante e competente, colocar o Brasil na agenda estratégica do programa.

Logo no primeiro ano de parceria, capacitamos oito pesquisadores brasileiros no uso da metodologia do Seafood Watch, para a elaboração de relatórios de recomendação. Cinco desses analistas produziram duas recomendações, já publicadas, sendo uma delas para três espécies de lutjanídeos da costa brasileira: guaiúba, cio-ba e ariacó. Os avanços que conseguimos nos primeiros dois anos nos impulsionaram para uma nova iniciativa do Seafood Watch, que é a Global Seafood Ratings Alliance (GSRA), na qual o Grupo Anima é o único representante da América do Sul. Essa aliança reúne instituições dos cinco

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continentes que desenvolvem e publicam recomendações de consumo de pescados. Há uma intensa troca de ex-periências que visa a melhoria na efetividade, eficiência e influência das recomendações dessas instituições ao redor do mundo. Estratégias e ações conjuntas, bem como a padronização de critérios mínimos, estão na pauta de dis-cussão deste grupo.

Planejamos o terceiro workshop Pesca e Aquicultura: Bus-cando Soluções Sustentáveis para o próximo mês de maio,

quando pretendemos reunir novamente os mais diversos segmentos da cadeia produtiva do pescado para discutir-mos avanços e oportunidades para a Aliança Brasileira pela Pesca Sustentável.

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Fique por dentro

Pescadores falam sobre a importância do diário de bordo

O diário de bordo é um instrumento fundamental para o monitoramento de uma pescaria, no qual o pescador registra informações sobre as espécies capturadas, o número de indivíduos, a data e o local. No documento, constam também dados sobre o esforço de pesca, ou seja, quanto tempo o pescador precisou para obter aquela captura. Quando coletados de forma sistemática, os diários de bordo permitem o acompanhamento da variação de tamanho dos estoques pesqueiros ao longo do tempo, o que geralmente está relacionado ao impacto causado pela pesca sobre um determinado estoque. É, portanto, um componente importante para a organização dos pescadores, para que possam garantir a qualidade em seu trabalho. Seu Waguinho e Seu Edinaldo, pescadores da Resex Cururupu (MA), uma das áreas-foco da primeira fase do trabalho da Rare no Brasil, sabem disso. Assista os depoimentos deles em https://www.facebook.com/pg/rarebrasil/videos/?ref=page_internal

Difusão de inovações: a curva da adoção

Em toda sociedade, a aquisição de um novo produto ou a adoção de um novo comportamento se dá em ritmos difer-entes por parte de segmentos da população. Num extremo, estão os ‘inovadores’, que são os primeiros a testarem um novo produto e, no outro, os ‘retardatários’ que, por serem mais relutantes às mudanças e/ou terem menor exposição aos meios de comunicação, são os últimos a fazê-lo e, em alguns casos, sequer chegam a isso. “Difusão de inovações: a curva da adoção” é um breve vídeo produzido pela Rare para apresentar os diferentes perfis de grupos compor-tamentais, divididos conforme o tempo de adesão a uma determinada inovação. Assista a mais esse material educa-tivo que a Rare utiliza para disseminar sua metodologia de trabalho: https://www.youtube.com/watch?v=l6KwMVsZPy8

Estratégia de 5 anos

Quem quiser conhecer a estratégia de trabalho da Rare no Brasil, referente ao quinquênio 2015-2020, pode acessar em www.rare.org/pt-br/brazil um sumário executivo, que contém as metas e os objetivos da atuação da organização no país.

Oportunidades na Rare

A Rare Brasil está com duas vagas abertas em seu escritório no Rio de Janeiro:

Diretor de Implementação de Programas. Dentre as princi-pais funções atribuídas à posição estão a implementação de Campanhas por Orgulho; comunicação institucional da Rare no país; gestão de pessoas; coordenação, desenvolvimento e implementação do marketing social e planejamento es-tratégico. O candidato deverá ter, como requisitos mínimos, bacharelado em área afim com as temáticas relacionadas à função (mestrado é desejável), nível avançado – escrito e falado – de inglês, experiência de dez anos em gestão de projetos, liderança, gestão de pessoas, comunicação e mar-keting social, além de disponibilidade para viagens.

Gerente de Treinamento. Dentre as principais funções atribuídas à posição estão o desenvolvimento e a coorde-nação dos programas de treinamento para líderes comu-nitários e comunidades pesqueiras marinhas em ferramen-tas de marketing social e manejo pesqueiro. É importante que o candidato tenha formação em educação para adultos e algum conhecimento de marketing social. O candidato deverá ter, como requisitos mínimos, bacharelado em área afim com as temáticas relacionadas à função (mestrado é desejável), nível avançado – escrito e falado – de inglês, experiência de cinco a sete anos no tema e disponibilidade para viagens.

Profissionais interessados nas posições devem acessar o link www.rare.org/pt-br/careers para prosseguir com sua candidatura no sistema online e atentar para o fato de que CVs enviados por email não serão considerados para o recrutamento.

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Filho de pescadores nascido na maior ilha do Delta do Parnaíba (divisa do litoral do MA e PI) – a Ilha Grande de Santa Isabel (PI) –, desde criança Luciano Galeno ajudava os pais nas atividades para manter a casa. Nunca se conformou com a situação social vivenciada pelos moradores da região e da sua comunidade.

Ciente da beleza natural singular daquele pedaço do litoral brasileiro e do seu consequente potencial turístico, o morador da menor comunidade rural do município de Ilha Grande, chamada Canto do Igarapé, foi estudar bacharelado em turismo, em 2010, na Universidade Federal do Piauí. Seu espírito inquieto e questionador o aproximou da Comissão Ilha Ativa (CIA), organização que nascia naquele mesmo ano, com o propósito de defender e apoiar a participação efetiva da população local na busca por avanços socioambientais. Em 2013, Luciano se associou à CIA e começou a trabalhar de uma forma mais próxima com extrativistas e pescadores. No ano seguinte, iniciou um levantamento das histórias dos pescadores da comunidade piauiense de Pedra do Sal e, ao retratar seus ofícios e desejos, pode perceber que, apesar da caminhada de luta ser árdua, o esforço para a melhoria da realidade local era gratificante. Envolveu-se posteriormente com populações pesqueiras da Área de Proteção Ambiental (APA) do Delta do Parnaíba, que vai de Canárias (MA) até o estuário do Timonha e Ubatuba (PI/CE), onde

Entrevistas com Coordenadores da Campanha por Orgulho

Sensibilidade social e visão turística a serviço das comunidades locais

Luciano Galeno, Coordenador da Campanha “Robalo para Sempre” na Resex Delta do Parnaíba

recentemente foi publicado um dos poucos Acordos de Pesca do setor costeiro e marinho no Brasil.

Luciano também colabora com o Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais do Piauí, apoiando o fortalecimento da luta em defesa da pesca e das comunidades pesqueiras. É ainda conselheiro da APA Delta do Parnaíba desde 2014 – onde atualmente articula a Câmara Temática de Ordenamento e Gestão Pesqueira – e vem desenvolvendo trabalho voluntário, desde 2015, com a Associação de Catadores de Marisco de Ilha Grande (PI).

A partir da ação da Campanha por Orgulho, como os pescadores passaram a se comportar com relação à sustentabilidade da pesca?

Eles mudaram o comportamento, a forma ou a quantidade da pesca?

No presente momento, os pescadores entendem que precisam fazer algo em prol da sustentabilidade das pescarias, pois percebem a redução dos pescados. Hoje buscam discutir e implementar ações que garantam a sustentabilidade, criando e demarcando pesqueiros na sua principal área de pesca,

restringindo o uso a um apetrecho menos impactante, como a pesca de linha, numa área definida na barra de Canárias. Esperamos que este processo de manejo possa ser utilizado em outras áreas também. Noto que eles estão cada vez mais engajados nos processos decisórios da gestão da Reserva Extrativista Marinha Delta do Parnaíba.

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As famílias de pescadores estão sensibilizadas pela ação da Campanha na Resex Delta do Parnaíba? O que você percebeu de mudança?

Os comunitários passaram a verificar e sentir que a presença conjunta da Rare e seus parceiros implementadores – como a Comissão Ilha Ativa (CIA), a Universidade Federal do Piauí, as Associações de Pescadores e Moradores de Canárias, além do ICMBio na gestão da UC – foi a alavanca para a campanha Robalo Para Sempre na comunidade, envolvendo os pescadores, as mulheres, os jovens e as crianças locais. E isso gerou a discussão e se desdobrou em ações voltadas para a conservação do meio ambiente e dos recursos pesqueiros no Delta do Parnaíba.

Qual é a principal expectativa dos pescadores após o término da Campanha por Orgulho?

A de que o grande papel transformador cabe a eles e a de que cabe a eles, também, continuar esse caminho. Mas reconhecem que o apoio conjunto da Rare e de organizações parceiras foi de suma importância para que as primeiras transformações e melhorias acontecessem.

Quais são os resultados que você, como coordenador da campanha, espera obter?

Estou sentindo que a comunidade pode continuar a gerir seus recursos naturais, a melhorar sua organização social, por meio da continuação do trabalho coletivo dos comunitários iniciado pela campanha, mesmo que se dê de forma mais lenta, dentro do tempo de transformação natural de cada comunidade.

Com o término da campanha, como a comunidade está se organizando para manter a pesca sustentável?

A comunidade buscará trabalhar em conjunto com os parceiros que se apresentaram localmente e com a unidade de gestão da Resex (ICMBio e conselho), pois o pontapé inicial foi dado e sonhos foram construídos nesse período da Campanha. De agora em diante, é continuar a navegar a canoa pelo movimento dos ventos e das marés, em direção à sustentabilidade pesqueira no Delta do Parnaíba.

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Natural do município de Cururupu (MA), Josenilde Ferreira Fonseca (conhecida como ‘Mocinha’) nasceu e cresceu em uma comunidade de pescadores tradicionais da Resex de Cururupu. Filha e esposa de pescador, ela sempre ajudou a família na atividade pesqueira, trazendo no sangue o apreço pela natureza e pela arte da pesca. Mocinha tem formação de Técnica Agrícola, mas sua real profissão é a de pescadora artesanal. Mãe de duas meninas, iniciou sua luta em 2005 pela conservação das tartarugas marinhas e, desde então, tem se engajado em ações que buscam colaborar com as comunidades locais e o meio ambiente. Tornou-se uma forte liderança local e hoje é Secretária da Associação Mãe da Resex de Cururupu, integrando a Secretaria da Mulher da Confrem e também o Conselho Deliberativo da Resex. Como coordenadora da Campanha por Orgulho ‘Pescando Sustentabilidade’, Mocinha tem realizado um importante trabalho de envolvimento dos pescadores na definição de um calendário de rotatividade de pesca nos poços de desova da pescada amarela, o que representa um grande passo para o manejo e a conservação da espécie. Movida pelo amor por seu território e pelo sonho de que seu povo tenha uma vida mais sustentável e de qualidade, ela dedica sua luta por um mar com mais peixes, um lugar com políticas públicas adequadas e direitos garantidos às comunidades.

Josenilde Ferreira Fonseca (“Mocinha”), Coordenadora da Campanha “Pescando Sustentabilidade” na Resex de Cururupu ssessora Pesqueira da Campanha “Robalo - eu pesco, eu amo, eu cuido”

Amor pelo território e liderança feminina na luta pela garantia dos direitos das comunidades de pesca

Você notou alguma mudança no comportamento dos pescadores com relação à sustentabilidade da pesca?

Hoje os pescadores estão mais preocupados com a situação em que a pesca se encontra, estão discutindo formas de manejo mais sustentáveis, e conversam mais entre si. A campanha despertou algo diferente neles. Estão participando mais ativamente e de forma coletiva, discutindo como pescar de forma a manter um estoque saudável da pescada amarela em longo prazo.

Como se deu o engajamento das famílias dos pescadores na Campanha?

As famílias foram as primeiras a se engajar na campanha. Nos preparativos para o lançamento da campanha, foram elas que ajudaram como equipe de apoio. Esposas e

filhos participaram do concurso e da gincana do evento, e estão hoje mais engajados e conscientes. O envolvimento das famílias foi fundamental para estimular a maior participação dos pescadores nas atividades relacionadas à campanha, como o monitoramento da pesca e a proposta de rotatividade nas áreas de pesca, segundo um calendário envolvendo todos os poços de desova da pescada

amarela, mapeados na barra de Guajerutiua pelos próprios pescadores locais.

Quais são os resultados que você, como coordenadora da campanha, espera obter?

Considero que já conquistamos grandes resultados, como o engajamento dos pescadores na campanha participando das decisões para melhorar a produção da pescada amarela. Uma comunidade mais unida e fortalecida pode decidir por novos caminhos para que a pesca seja sustentável hoje e amanhã. Espero que esse trabalho sirva de modelo para outras comunidades e inclusive para o

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manejo sustentável de outras espécies também.

Qual é a perspectiva dos pescadores com o término da Campanha por Orgulho?

A expectativa é continuar o projeto, definir um período de reprodução da pescada amarela para poder buscar a regulamentação de um defeso da espécie. Os pescadores esperam que as novas formas de manejo discutidas possam ajudar na sustentabilidade da espécie e na segurança alimentar das comunidades, contribuindo para uma melhor qualidade de vida para suas famílias.

De que forma a comunidade está se organizando para manter a pesca sustentável na Resex?

O projeto foi uma fase importante para pensarmos em mecanismos de participação dos pescadores e de manejo da pesca na região. Agora a comunidade deve incorporar o que foi aprendido e trabalhado para dar continuidade às atividades. Isso deve acontecer por meio de rodas de conversas, de reuniões para decisões de forma de manejo mais sustentável, de maior participação no Conselho Deliberativo, além, é claro, do monitoramento das capturas das espécies e do desembarque pesqueiro.

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Informativo

Texto, revisão e coordenação editorial: Isabela Santos e Marcia Cota

Colaboração: Sacha Gilbert