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RAZÃO ÁUREA DA ANTIGUIDADE GREGA AO SÉCULO XX: NA MÚSICA, NO DESIGN E NA ARQUITETURA Christian James Henschel Tânia Baier RESUMO Com discussões recentes quanto ao desenvolvimento da Base Nacional Curricular Comum (BNCC), tendo em vista o ensino da matemática, percebe-se a necessidade crescente dos educadores em relacionar conceitos matemáticos com aplicações interdisciplinares e oriundas de diversas áreas do conhecimento. Neste artigo são apresentadas abordagens históricas, da antiguidade grega até o século XX, relacionadas com a razão áurea e enfocando a sua presença em peças de Mozart, em obras arquitetônicas e no design de produtos. A razão áurea nas composições musicais está relacionada com a harmonização das disposições de elementos melódicos que são fundamentais em uma obra musical. Na elaboração de projetos arquitetônicos e no design, a secção áurea tem sido usada com propósitos estéticos e funcionais. Evidenciar a razão áurea em diversas áreas da atividade humana é uma estratégia pedagógica que pode instigar estudantes à aprendizagem matemática de um modo contextualizado. PALAVRAS-CHAVE: Razão Áurea; Música; Design; Ensino de matemática. SECÇÃO ÁUREA Elam (2010, p. 5) apresenta o entendimento do arquiteto Le Corbusier, que considera a geometria como uma linguagem humana e identifica ritmos inventados pelo homem: “[...] ritmos sensíveis ao olho, nítidos nas suas relações. [...] Ressoam no homem por uma fatalidade orgânica, a mesma fatalidade que faz com que as crianças, os velhos, os selvagens, os letrados tracem a seção áurea”. Aproximações das proporções relacionadas com a secção áurea podem ser observadas no corpo humano e em padrões de crescimento de plantas e animais. No decorrer do tempo, em diversos contextos culturais, foram realizados estudos sobre a preferência cognitiva dos seres humanos pelas proporções relacionadas com a secção áurea. Em pesquisas realizadas no final do século XIX pelo psicólogo Gustav Fechner e, em 1908, por Charles Lalo os resultados foram notavelmente similares: observando uma série de retângulos, a maioria das pessoas preferia os retângulos com proporções próximas às da áurea (ELAM, 2010).

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RAZÃO ÁUREA DA ANTIGUIDADE GREGA AO SÉCULO XX:

NA MÚSICA, NO DESIGN E NA ARQUITETURA

Christian James Henschel

Tânia Baier

RESUMO

Com discussões recentes quanto ao desenvolvimento da Base Nacional Curricular

Comum (BNCC), tendo em vista o ensino da matemática, percebe-se a necessidade

crescente dos educadores em relacionar conceitos matemáticos com aplicações

interdisciplinares e oriundas de diversas áreas do conhecimento. Neste artigo são

apresentadas abordagens históricas, da antiguidade grega até o século XX, relacionadas

com a razão áurea e enfocando a sua presença em peças de Mozart, em obras

arquitetônicas e no design de produtos. A razão áurea nas composições musicais está

relacionada com a harmonização das disposições de elementos melódicos que são

fundamentais em uma obra musical. Na elaboração de projetos arquitetônicos e no

design, a secção áurea tem sido usada com propósitos estéticos e funcionais. Evidenciar

a razão áurea em diversas áreas da atividade humana é uma estratégia pedagógica que

pode instigar estudantes à aprendizagem matemática de um modo contextualizado.

PALAVRAS-CHAVE: Razão Áurea; Música; Design; Ensino de matemática.

SECÇÃO ÁUREA

Elam (2010, p. 5) apresenta o entendimento do arquiteto Le Corbusier, que

considera a geometria como uma linguagem humana e identifica ritmos inventados pelo

homem: “[...] ritmos sensíveis ao olho, nítidos nas suas relações. [...] Ressoam no

homem por uma fatalidade orgânica, a mesma fatalidade que faz com que as crianças,

os velhos, os selvagens, os letrados tracem a seção áurea”.

Aproximações das proporções relacionadas com a secção áurea podem ser

observadas no corpo humano e em padrões de crescimento de plantas e animais. No

decorrer do tempo, em diversos contextos culturais, foram realizados estudos sobre a

preferência cognitiva dos seres humanos pelas proporções relacionadas com a secção

áurea. Em pesquisas realizadas no final do século XIX pelo psicólogo Gustav Fechner e,

em 1908, por Charles Lalo os resultados foram notavelmente similares: observando uma

série de retângulos, a maioria das pessoas preferia os retângulos com proporções

próximas às da áurea (ELAM, 2010).

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Para Schenck e Selby (1992, p. 42), o ponto B “[...] divide o segmento AC em

média e extrema razão se a razão entre o menor e o maior dos segmentos é igual à razão

entre o maior e o segmento todo, isto é, AB/BC = BC/AC”.

Figura 1 - Secção áurea

Fonte: Schenck; Selby, 1992, p. 42

Na atual simbologia, usando x como incógnita e fazendo 𝑏

𝑎= 𝑥 em

𝑎

𝑏=

𝑏

𝑎+𝑏, com

𝑎 < 𝑏 , é obtida a equação 𝑥² − 𝑥 − 1 = 0 que produz 𝑥 =(1±√5)

2. A raiz positiva

1,618034… é frequentemente simbolizada por 𝜑 (letra grega fi) e às vezes por 𝜏 (letra

grega tao) e 1

𝜑= 0,618... A razão a/b, cujo valor igual a 0,618..., é denominada por

alguns autores de razão áurea (SCHENCK; SELBY, 1992).

Ávila (1985) relata que a divisão áurea é conhecida desde a época da escola

pitagórica tendo sido observado que ela comparece no pentágono regular estrelado,

também conhecido como pentagrama, que possui uma quantidade significativa de

segmentos na razão áurea. Talvez por isso os pitagóricos adotaram o pentagrama como

símbolo de sua seita. A figura 2 mostra um exemplo da presença da divisão áurea em

um pentagrama onde a interseção de duas de suas diagonais divide qualquer uma das

diagonais em média e extrema razão: 𝐴𝐶

𝐶𝐵=

𝐶𝐵

𝐴𝐵.

Figura 2 - Uma das secções áureas no pentagrama

Fonte: Ávila, 1985, p. 14

Schenck e Selby (1992) explicitam que o polígono estrelado, que identificava os

pitagóricos, é símbolo da saúde. Os autores apontam que, da divisão de um segmento de

reta em média e extrema razão, decorre que cada um dos cinco segmentos divide os

outros em média e extrema razão. A figura 3 mostra um pentágono regular e o

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correspondente pentagrama estrelado onde 𝜑 = AC/AB = AC/AD = AD/AE = AE/DE e

assim por diante.

Figura 3 - Pentagrama estrelado e pentágono

Fonte: Schenck; Selby, 1992, p. 43

Boyer (1996, p. 35) informa que a denominação secção áurea de um segmento,

descrita por Kepler como sendo uma joia preciosa, só foi usada aproximadamente dois

mil anos após Pitagóras e descreve o procedimento de Euclides, mostrado na Figura 4:

Para dividir um segmento de reta AB em média e extrema razão, Euclides

construía sobre AB o quadrado ABCD [...]. Então bissectava AC pelo ponto

E, traçava EB e prolongava a reta CEA até F tal que EF = EB. Completando o

quadrado AFGH o ponto H será o ponto procurado, pois pode-se ver

imediatamente que AB:AH = AH:HB.

Figura 4: Divisão de um segmento em média e extrema razão

Fonte: Boyer, 1996, p. 35

Na obra Liber abaci, publicada em 1202, Leonardo Fibonacci apresenta o

problema que visa investigar quantos pares de coelhos são produzidos no período de um

ano, a partir de um único jovem casal, sendo que cada novo casal se torna produtivo

após dois meses e gera um novo par a cada mês. Esse problema se relaciona com a

sequência 1, 1, 2, 3, 5, 8, ..., un, ... , conhecida com sequência de Fibonacci, sendo uma

das suas propriedades: “[...] cada termo após os dois primeiros é a soma dos dois

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imediatamente precedentes. [...] limn

(un/un-1) é a razão da secção áurea ( 1- 5 )/2”

(BOYER, 1996, p. 175).

Robert Simson, em 1753, constatou a relação entre a sequência de Fibonacci e a

razão áurea provando que 𝜑 = lim𝑛→∞

𝑓𝑛+1

𝑓𝑛 e J. P. M. Binet, em 1843, descobriu a fórmula

𝑓𝑛 =𝜑𝑛−(−𝜑)−𝑛

√5 (GANIS, 1993).

RAZÃO ÁUREA NA MÚSICA

Shah (2010) apresenta um exemplo, mostrado na Figura 5, da proximidade da

música com a matemática que pode ser percebida relacionando o sistema de notação

musical europeu, conhecido como partitura, com o plano cartesiano onde o eixo x é

relacionado com o tempo e o eixo y ao tom musical.

Figura 5 - Comparação entre a partitura musical e o plano cartesiano

Fonte: Shah, 2010, p. 17

A Figura 6 mostra a sequência de teclas de um teclado qualquer, dividido em

treze partes representando as tonalidades de uma oitava musical até o início da próxima.

Observando as oito teclas brancas e as cinco teclas pretas do teclado, nota-se que as

cinco teclas pretas estão dispostas em grupos de 2 e de 3, indicando o início da

sequência de Fibonacci, com as razões 2/3, 3/5 e 5/8 e tendendo para 0,618 ..., a razão

da secção áurea (JABLONSKI, 2014).

Figura 6 - Esquema de um teclado

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Fonte: Jablonski, 2014, p. 31

A razão áurea é encontrada, na música, em geração de mudanças rítmicas, por

exemplo, ou na composição de uma linha melódica. Quando a razão é percebida em

disposição de elementos melódicos no decorrer da música, o clímax dela fica localizado

aproximadamente no ponto da razão áurea, ou seja, cerca de 61,8% do tempo total da

composição. É nesse ponto que ocorrem significativas mudanças de notas ou estruturas

de acordes. Uma música de 32 compassos, por exemplo, terá seu clímax no compasso

12. Esse conceito de estrutura é muito utilizado no Sistema Schillinger de Composição

Musical e comparece no primeiro movimento de Music for Strings e Percussion and

Caleste de Béla Bartók, onde o clímax da música localiza-se no 55º compasso dos 89

compassos que constituem a obra completa. As composições de Chopin denominadas

Nocturnes e Études também estão relacionadas com a razão áurea (SHAH, 2010).

No período ocidental clássico, a estrutura básica de composição de uma sonata

era formada de três movimentos. Na maioria das vezes o primeiro rápido, o segundo

lento e o terceiro novamente rápido. Cada movimento consistia em três secções

principais: a exposição, quando apresenta-se o tema principal; o desenvolvimento, onde

há o desenrolar do tema; e a recapitulação quando é retomado e reafirmado o tema

principal. A Figura 7 mostra um segmento de reta representando a divisão da sonata

clássica nas três secções, onde a representa a exposição e b representa o

desenvolvimento e a recapitulação (SOUZA; ABDOUNUR, 2011).

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Figura 7 - Divisão da sonata clássica

Fonte: Souza; Abdounur, 2011, p. 4

Massin e Massin (1997, p. 568) relatam que Mozart era filho um exímio

violinista, compositor e autor de um método para estudo de violino; nos primeiros anos

de sua infância, o pequeno Wolfgang: “Queria aprender tudo (como, por exemplo,

matemática) e gostava de contar para si próprio histórias saídas de sua fervilhante

imaginação”.

Putz (1995) trouxe dados numéricos sobre todos os movimentos de sonatas

compostas pelo músico Wolfgang Amadeus Mozart apresentando as duas secções e

mostrando a presença da razão áurea em sua estrutura.

Mozart compôs sua primeira sonata para piano aos 18 anos e, nos quatro anos

seguintes, criou a maioria das suas 19 sonatas. Dos 56 movimentos, 29 eram

construídos seguindo uma proporção matemática. A Figura 8 mostra uma tabela onde,

na primeira coluna está a catalogação das sonatas de Mozart feita pelo musicólogo

Köchel; na segunda coluna, representada por a, está o total de compassos referentes à

exposição do tema da sonata; na terceira a quantidade de compassos do

desenvolvimento e recapitulação, representada por b; e, na última coluna, a quantidade

total de compassos a + b na sonata. Codas não são contadas como parte da secção

(PUTZ, 1995).

Quadro 1 - Secções das sonatas de Mozart

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Fonte: Putz, 1995, p. 277

O quadro 1 mostra o gráfico de dispersão, formado pelos eixos b e a+b,

construído a partir dos dados dessa tabela, onde há uma visível linearidade,

evidenciando que as sonatas de Mozart estão relacionadas com a secção áurea. Neste

gráfico, os dados expressam-se de forma aproximadamente linear: 𝑦 = 𝜑. 𝑥... (PUTZ,

1995).

Figura 8 - Gráfico b/(a+b)

Fonte: Putz, 1995, p. 278

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Incluindo a reta 𝑦 = 𝜑. 𝑥 , sendo assumido para 𝜑 o valor aproximado 0, 6180, e

a reta de regressão correspondente aos dados anteriores, conforme mostra a Figura 9,

percebe-se o quão próximo os dados estão da razão áurea. O valor de 𝑟² confirma o alto

grau de linearidade dos dados, pois seu valor resulta em 0,990 e sua reta de regressão é

representada pela função 𝑦 = −0,003241 + 0,6091𝑥. A reta correspondente a função

𝑦 = 𝜑. 𝑥, possui maior coeficiente angular que a reta da regressão linear dos dados

(PUTZ, 1995).

Figura 9 - Reta da regressão linear e da reta 𝑦 = 𝜑. 𝑥

Fonte: Putz, 1995, p. 278

De modo similar, a figura 10 mostra o gráfico de dispersão, formado pelos eixos

a e b.

Figura 10 - Pontos a/b

Fonte: Putz, 1995, p. 279

Nesta análise, teremos a reta de regressão linear com a função de formação 𝑦 =

1,360 + 0,6260𝑥 e o valor de 𝑟² igual a 0,938. Continua sendo um valor de alto índice

de relevância, entretanto, é um pouco menor do que o da relação 𝑏

(𝑎+𝑏). Na figura 11

apresenta-se o gráfico em que está disposto novamente a reta definida pela função 𝑦 =

𝜑. 𝑥 e a reta definida pela regressão linear acima já definida. As duas retas, 𝑦 = 𝜑. 𝑥 e a

reta da regressão linear, evidenciam a presença do número de ouro nas sonatas de

Mozart (PUTZ, 1995).

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Figura 11 - Gráfico a/b, reta da regressão linear e reta 𝑦 = 𝜑. 𝑥

Fonte: Putz, 1995, p. 279

Apesar das sonatas terem restrições em sua composição, o que acaba fazendo

com que a divisão de seus trechos tende a ser próxima da razão áurea, pode-se levantar

a hipótese que Mozart, sendo um gênio que apreciava temas matemáticos, talvez tenha

conhecido a razão áurea e assim influenciado de modo que as suas obras apresentam

uma proporção mais harmoniosa (PUTZ, 1995).

Na avaliação de Souza e Abdounur (2011) não pode ser afirmado que Mozart

utilizou de fato a razão áurea para a formulação da harmonia de suas sonatas porque há

vários pesquisadores que defendem tanto a ideia de que Mozart utilizou da razão áurea

quanto que não usou, mas o que deve-se levar em conta, é quanto a criatividade e a

incrível noção de proporcionalidade aplicada à música que gênios como Mozart podem

ter desenvolvido nas composições de suas obras.

RAZÃO ÁUREA NA ARQUITETURA E NO DESIGN

Uma seleção de obras arquitetônicas e da área do design é apresentada por Elam

(2010, p.5) que usou como critério de escolha o fato de “[...] terem passado pela prova

do tempo e de serem consideradas, em muitos aspectos, exemplos clássicos de design”.

A autora esclarece que a secção áurea foi adotada, desde a antiguidade clássica, em

esculturas criadas nos anos 1400 a.C., tais como o Doríforo (o portador de lança) e Zeus

do Cabo Artemísion. A secção áurea é encontrada em obras arquitetônicas como, por

exemplo, o templo do Partenon, a fachada da catedral de Notre-Dame e a Villa (1916)

do arquiteto Le Corbusier.

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Jules Chéret, em 1877, idealizou o cartaz Folies-Bergère onde as posições dos

membros dos dançarinos estão dispostas em um pentágono no qual divisões internas

delimitam outro pentágono e cinco triângulos, formando um pentágono estrelado. Em

1923, Mies van der Rohe cria a cadeira Brno, com formato compacto que possibilita

sua acomodação sob o tampo de uma mesa. Observada de cima, encaixa-se exatamente

em um quadrado e, nas vistas frontal e lateral, “[...] a cadeira coincide com um

retângulo áureo” (ELAM, 2010, p. 61). Charles Eames, em 1946, projetou a cadeira

Plywood cujo encosto encaixa-se em um retângulo áureo e a análise das vistas lateral e

frontal revela que “[...] as proporções são bem próximas da seção áurea” (ELAM, 2010,

p. 71).

Na figura 12 está evidenciada a construção geométrica envolvendo a secção

áurea no design do Novo Fusca, cuja carroceria segue aproximadamente uma elipse

áurea inscrita em um retângulo áureo. O contorno superior da carroceria está alinhado

com a metade superior dessa elipse e o eixo principal com a carroceria um pouco abaixo

do centro das rodas.

Figura 12 - Secção áurea no Novo Fusca

Fonte: Elam, 2010, p. 99

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Matemática, a arte e a música são tradicionalmente ensinadas como matérias

isoladas. Os conteúdos que tratam uma das outras são frequentemente negligenciados o

que acarreta que o estudante, se quiser estabelecer relações entre conhecimentos, terá

que o fazer por conta própria (ELAM, 2010).

Este artigo pode se tornar material de apoio para professores que decidam

evidenciar as ligações de temas matemáticos com música, design e arquitetura porque

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está relacionado com as discussões em torno do desenvolvimento do documento Base

Nacional Comum Curricular (BNCC), atualmente em discussão. Visa-se um currículo

matemático dialogando com todas as áreas, estabelecendo conexões entre os eixos da

Matemática e entre outras áreas do saber. Conforme os textos em construção da BNCC,

no estudo da Matemática, um objetivo é o estudante fazer abstrações fundamentadas em

situações concretas, generalizar, organizar e representar, ou seja, perceber elementos

matemáticos numa determinada situação.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais alertam que a aprendizagem da

matemática deve estar relacionada à compreensão de significados, o que pressupõe

relacioná-lo com outros. “O significado da matemática para o aluno resulta das

conexões que ele estabelece entre ela e as demais disciplinas, entre ela e seu cotidiano e

das conexões que ele estabelece entre os diferentes temas matemáticos” (BRASIL,

1998, p. 20).

Portanto, este artigo possibilita atingir o objetivo da abordagem matemática da

razão áurea, nas aulas de matemática, através da música, da arquitetura e do design

contribuindo para o entendimento dos estudantes acerca da presença de conteúdos

matemáticos nessas áreas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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de Fibonacci. Revista do Professor de Matemática, São Paulo, v. 6, p.9-14, jan. 1985.

Semestral.

BOYER, Carl B. História da Matemática. 2. ed. São Paulo: Edgard Blücher, 1996. xiv,

496p.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Base Nacional Comum Curricular –

Apresentação. Brasília: MEC/SEB, 2015.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Parâmetros curriculares nacionais:

matemática. 3. ed. Brasília, 2001. v. 3. 142 p.

ELAM, Kimberly. Geometria do Design: Estudos sobre Proporção e Composição. São

Paulo: Cosac Naify, 2010. 108 p.

EVES, Howard. Introdução à História da Matemática. Campinas: Ed. da UNICAMP,

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JABLONSKI, Enilso. Frações e Música: ligações históricas e atividades didáticas.

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