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Revista Diagnóstico & Tratamento, volume 18, número 1

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):3-4.

Editorial

E-learning: de ferramenta útil a indispensável*Alessandro Wasum MarianiI, Ricardo Mingarini TerraII, Paulo Manuel Pêgo-FernandesIII

Instituto do Coração (InCor), Hospital das Clínicas (HC), Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), São Paulo, Brazil

O termo em inglês conhecido como e-learning, que pode ser traduzido como ensino eletrônico, diz respeito a um mo-delo de ensino baseado no uso da tecnologia, com uma carac-terística fundamental: não ser presencial. Em outras palavras, consiste no aprendizado obtido pelo estudo de conteúdos ambientados no computador, internet ou outras mídias ele-trônicas, onde o professor, caso exista, permanece a distância.1

Existem, classicamente, duas modalidades de e-learning: ensino a distância e aprendizado assistido por computador. A primeira usa a tecnologia da informação para levar o ensino a locações. O aprendizado assistido por computador, também chamado de treinamento baseado em computador, utiliza o computador como ferramenta única de ensino através de dife-rentes mídias sem a presença de um professor ou tutor, mesmo a distância.2 Essas duas modalidades são cada vez mais integra-das na medida em que a internet se desenvolve.

A medicina tem sido uma área do conhecimento com alto investimento no desenvolvimento de ferramentas  de  e-learning. A prova contundente é que somente na base de dados PubMed, verificamos que um total de 111 trabalhos foram publicados so-bre este tema em 2011 (procuradas as palavras-chave: “e-learning”, “medical” e “education”).

Alguns exemplos recentes incluem:• Richardsonecols.3 publicaram sua experiência com o uso

de uma ferramenta online por um período de dois anos em três países da América do Norte, um total de 24 sítios dife-rentes, visando o ensino em radiologia músculo-esqueléti-ca. Os autores referem que, mesmo utilizando plataformas diferentes (PC, Mac e Smartphones) e diversas bandas de internet para conexão, a experiência foi muito produtiva para alunos e educadores;

• UmainiciativamaisousadafoiadeJoshiecols.4 que avalia-ram um programa de teleducação no estado de Pernambuco, Brasil, construído com quatro aulas semanais de uma hora ao longo de 20 meses, versando sobre as áreas mais essenciais da medicina, como saúde pública, saúde mental e pediatria.

Após cada sessão, os participantes preenchiam um questio-nário de avaliação. Participaram 141 centros em 73 municí-pios. Os autores coletaram um total de 3.504 respostas sobre o programa e houve elevada taxa de satisfação, sendo avalia-do como bom ou excelente em 97%;

• Ousodatele-educaçãoparasoluçãodedeficiênciasdaqua-lificação médica foi exemplificado por Agrawal e cols.,5 que desenvolveram um programa para treinamento de radiotera-peutas a distância para suprir a deficiência desses profissionais emumestadoindianodeUttarPradesh.Durantedoisanos,toda a programação teórica e discussão de casos da residência do centro em Lucknow, Índia, foram compartilhados com residentes no ponto remoto. No final de dois anos, toda a atividade educacional, bem como o impacto na atividade dos profissionais que o realizaram, foram auditados. Os autores concluíram que o programa foi efetivo em formar os especia-listas a distância.

• UmaexperiênciabrasileiramuitointeressanteéoCyberTutor,umaferramentadeensinosobreDermatologiadesenvolvidapara a graduação médica, utilizando um website interativo.6 OstemasdasaulassebasearamnocurriculodaUniversidadeFederaldoRioGrandedoSul.Selecionaram-secasosclinicosdidáticos, aulas teóricas e referências bibliográficas atualiza-das. As fotografias das lesões foram obtidas pela seleção de pacientesatendidosnoambulatoriodeDermatologia.

A Disciplina de Cirurgia Torácica, em parceria com aTelemedicina,ambasdaFaculdadedeMedicinadaUniversidadedeSãoPaulo(FMUSP),criaramnesteanoumcursoonline sobre cirurgia torácica oncológica (www.cirurgiatoracica.org.br/cacto), cujo público-alvo era constituído por cirurgiões de tórax de todo o Brasil. O conteúdo foi ministrado através da disponibilização de ar-tigos científicos relevantes a cada assunto, seguido de discussões mo-nitoradas em um fórum por aproximadamente 15 dias. Finalizando cada tema, uma aula gravada para a internet foi disponibilizada. Outra atividade do curso foi a realização de web-conferências para a

*Este artigo foi publicado na versão em inglês no periódico São Paulo Medical Journal/Evidence for Health Care, volume 130, edição número 6, de novembro e dezembro de 2012.IMédico, pós-graduando da Disciplina de Cirurgia Torácica e Cardiovascular da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.IIAssistente doutor do Serviço de Torácica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo.IIIProfessor associado ao Departamento de Cardiopneumologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

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4 E-learning: de ferramenta útil a indispensável*

discussão de casos que foram prejudicados devido, principalmente, à baixa velocidade média da internet brasileira.

Umafiguraimportantequeaparecenessecontextoatualdee-learning são os repositórios: instituições ou associações que disponibilizam as ferramentas, cursos e programas produzidos por eles ou por terceiros. Alguns exemplos importantes são:• MedEdPortal, Association of American Medical Colleges

(AAMC) – https://www.mededportal.org;• The Health Education Assets Library (HEAL) – http://

www.healcentral.org.

Algumas universidades estão capitaneando iniciativas simi-lares tanto para o ensino de seus alunos, como também extra--muros,comoocasodaassociaçãodaHarvardUniversitycomoMassachusettsInstituteofTechnologyeaUniversityofCalifornia,Berkeley,quedesenvolveramositehttps://www.edx.org,comdi-versos cursos sobre diferentes áreas disponíveis mundialmente.

Outra importante iniciativa é o site Coursera  (https://www.coursera.org/), que congrega atualmente 33 univer-sidades, sendo a maior parte norte-americana, com nomes tradi-cionais,comoDukeUnivesityeUniversityofStanford,mastam-bémcomoutrasinstituições,comoasuiçaÉcolePolytechniqueFédéraledeLausanneeaHongKongUniversityofScienceandTechnology.Todasessasinstituiçõesdisponibilizamcursosdedi-versas áreas do conhecimento de forma gratuita para alunos do mundo inteiro, porém, mantendo alto nível de qualidade.

São apontadas como algumas vantagens do e-learning: fa-cilidade de acesso e flexibilidade de horários, personalização do conteúdo, o ritmo de aprendizagem pode ser definido pelo aluno, disponibilidade permanente dos conteúdos, redução do custo e do tempo dispensado pelo aluno, possibilidade de formação de um grande número de pessoas ao mesmo tempo, possibilidade de cobertura de públicos geograficamente disper-sos, desenvolvimento no aluno de capacidades de autoestudo e autoaprendizagem.

Quanto às desvantagens, destacam-se: ocorrência, ainda co-mum, de problemas técnicos; dificuldade de alguns alunos de adaptação ao ambiente digital; necessidade de maior disciplina e auto-organização por parte do aluno; maior demora na cria-ção e na preparação do curso online quando comparada a cursos tradicionais; custo de implementação da estrutura para o de-senvolvimento dos programas de e-learning ainda alto; a baixa qualidade da internet em diversos lugares gera grandes limita-ções principalmente para a transmissão de imagens e vídeos. Todavia,amaiorcriticafeitaaoe-learning é ausência do contato direto e às deficiências que isso pode gerar, como limitação na socialização do aluno. Os defensores do e-learning argumentam que isso pode ser compensado com a criação de comunidades virtuais, interação por chat, fóruns, e-mails, entre outros.

Entre críticas e limitações, o que é certo é que a tecnologia aplicada à educação médica permite o aumento das possibi-lidades de difusão do conhecimento, tornando-se uma forma

de democratizar o saber, permitindo que o conhecimento possa estar disponível “a qualquer hora e em qualquer lugar”. Logo, concluímos que o aprendizado baseado em ferramentas de e-learning é consistente, efetivo e deve cada vez mais estar presente no ensino médico em todos os níveis, da graduação à pós-graduação. A incorporação dessas ferramentas deve ser algo desejável por todos os que trabalham com educação médica.

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INFORMAÇÕES:Endereço para correspondência:Alessandro Wasum MarianiPaulo Manuel Pêgo FernandesAv. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44 — 2o andar — Bloco II — Sala 9Cerqueira César — São Paulo (SP) — BrasilCEP 05403-900E-mail: [email protected]: [email protected]

Fonte de fomento: nenhuma declaradaConflito de interesse: nenhum declarado

Data de entrada: 30 de setembro de 2012Data da última modificação: 30 de setembro de 2012Data de aceitação: 9 de outubro de 2012

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Artigo original

Frequência de alterações citológicas anais em pacientes com citologia cervical normal

Claudia Maria Ricardo Serafim GiaccioI, Patricia Lourenço BragagliaII, Edenilson Eduardo CaloreIII, Carmem Ruth ManzioneIV, Sidiney Roberto NadalIV

Instituto de Infectologia Emilio Ribas, São Paulo, Brasil

INTRODUÇÃOAcredita-se que o câncer cervical esteja intimamente ligado

à infecção pelo papilomavírus humano (human papillomavirus, HPV) e com as respectivas lesões intraepiteliais precursoras,1-3 e que o controle da infecção por este vírus possa diminuir subs-tancialmente a prevalência deste tipo de câncer.4,5 No entanto, embora em muitos países existam programas de prevenção ri-gorosos do carcinoma do colo uterino, a prevalência, incidên-cia e mortalidade do carcinoma espinocelular do colo do útero permanece elevada,6 especialmente em jovens e pessoas imunos-suprimidas.7,8 As explicações vigentes para essa alta incidência é que as lesões pré-neoplásicas do colo uterino estejam provavel-mente relacionadas à promiscuidade sexual9 e a uma deficiente resposta imune local contra o HPV.10

O câncer anal corresponde a 4% de todas as neoplasias ma-lignas do trato digestivo baixo.11-13 A incidência desse tipo de câncer e de suas respectivas lesões precursoras aumentou nos Estados Unidos, Europa14 e Brasil,15 em homens e mulheres, porém, principalmente em mulheres nascidas após 1940.16 Estudos epidemiológicos mostram fases pré-clínicas antes do início do próprio câncer anal em pacientes de risco para esse tipo de câncer.17-19 A lesão intraepitlelial de baixo grau anal (LIEBG) tem resolução espontânea em grande parte dos ca-sos.16 A lesão intraepitelial escamosa anal de alto grau (LIEAG anal) é considerada provável precursora do tumor invasivo16 com clara associação com os subtipos de alto risco do HPV.20-23 A incidência de LIEAG anal tem aumentado significativa-mente, mesmo após a era HAART (highly active antiretroviral therapy) em homossexuais masculinos, principalmente recep-tores de sexo anal, portadores do vírus da imunodeficiência humana (HIV).18,19,23-25 Além disso, há alguma evidência de ligação entre o câncer anal e o câncer genital. Em um estu-do realizado em Ontário, Canadá, observou-se associação entre o câncer ginecológico prévio do trato genital inferior e o posterior desenvolvimento de carcinoma escamoso anal.26

A presença dos subtipos de HPV 16, 18, 31, 35, 23, 24 e 33 também foi observada na maioria dos casos de carcinoma espinocelular anal, sugerindo que o seu comportamento bio-lógico seria semelhante ao câncer de colo uterino.27

OBJETIVOO objetivo do presente estudo foi estimar a prevalên-

cia de alterações citológicas da mucosa anal em mulhe-res com citologia cervical positiva, mas sem lesão anal ma-croscópica. Em última análise, tentamos investigar se a mucosa anal pode ser um reservatório de HPV, o que permi-tiria a reinfecção do colo do útero e a contínua transmissão inter-humana do vírus.

MÉTODOSEste estudo foi aprovado pela Comissão Científica, Comitê

de Ética em Pesquisa e Diretoria Técnica de Departamento do Instituto Emílio Ribas, onde o estudo foi desenvolvido.

O tamanho da amostra foi calculado no Software Epinfo 2000, e considerando um intervalo de confiança (IC) de 95% (erro tipo 1 ou α de 5%), um poder de 80% (erro tipo 2 ou β de 20%), o tamanho amostral mínimo foi de 54 mulheres. Todavia, foram selecionadas 104 mulheres, de modo sequen-cial, no sistema público municipal de saúde, com idade entre 16 e 77 anos, com citologia cervical anormal (lesões intraepi-teliais de baixo e alto graus). Todas as pacientes foram infor-madas sobre o estudo e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Foram excluídas as mulheres grávidas ou imunodeficientes.

Em um período não superior a um mês do resultado da primeira coleta citológica, foi realizada nova coleta cervical e duas amostras de esfregaço do canal anal. Todas as amostras foram obtidas com escova de coleta citológica do tipo cytobrush. A amostra anal foi coletada com a paciente em posição gineco-lógica, e a escova citológica foi introduzida na porção distal do

IMédica ginecologista, Departamento de Ginecologia, Leonor Mendes de Barros Hospital, São Paulo, Brasil. Professora, Faculdade de Medicina Universidade Cidade de São Paulo (UNICID), São Paulo, Brasil.IIProfessora, Faculdade de Medicina Universidade Cidade de São Paulo (UNICID), São Paulo, Brasil.IIIMédico patologista, Departamento de Patologia, Instituto de Infectologia Emílio Ribas, São Paulo, Brasil. Chefe do Departamento de Patologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Santo Amaro (Unisa).IVMédico proctologista, Departamento de Proctologia, Instituto de Infectologia Emilio Ribas, São Paulo, Brasil.

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orifício anal. Em seguida, girou-se a escova três vezes em senti-do horário de forma a obter material de toda a borda do orifício anal. Nos casos com material insuficiente, os procedimentos foram repetidos.

As pacientes foram questionadas quanto à prática de inter-curso anal.

A análise citológica dos esfregaços anais e cervicais foi reali-zada pelos autores. Os esfregaços citológicos foram classificados segundo a classificação de Bethesda 2001.28

Mulheres com diagnóstico de LIEAG cervical por exa-me de Papanicolaou foram encaminhadas à colposcopia e biópsia para confirmar o diagnóstico citológico para deli-neamento do tratamento. Pacientes com diagnóstico cito-lógico de LIEBG foram seguidas clinicamente e orientadas a realizar nova coleta em seis meses. Os dados foram sub-metidos à análise estatística (testes t não pareado e teste de Mann-Whitney).

RESULTADOSA idade das mulheres variou de 16 a 77 anos com média de

32,8 anos.Das 104 pacientes estudadas (portanto, com citologia cer-

vical anormal), 75 (72%) também apresentaram citologia anal anormal e 29 pacientes (28%) esfregaços anais normais ou in-flamatórios. Das pacientes com citologias cervicais anormais (104), 51 (49%) apresentaram LIEAG cervical, 48 (46,2%) apresentaram LIEBG cervical, 5 (4,8%) apresentaram ASC-US (atipia escamosa de significado indeterminado, provavelmente não neoplásico) cervical.

Dos 51 casos com LIEAG cervical, 38 (74,5%) apresenta-ram citologia anal anormal, sendo 18 (47,4%) LIEAG anal e 20 (52,6%) LIEBG anal. As restantes 13 (25,5%) apresentaram citologia anal normal ou inflamatória.

Dos 48 casos de LIEBG cervical, 34 (70,8%) apresentaram citologia anal anormal, dos quais 11 (32,3%) LIEAG anal e 23 (67,7%) LIEBG anal. As restantes 14 pacientes (29,2%), apresentaram citologia anal normal ou inflamatória. Não hou-ve diferença estatística entre os grupos com LIEAG e LIEBG cervicais, no que tange à propensão a apresentar citologia anal anormal (P > 0,05).

Das 5 pacientes com citologia cervical com ASC-US, 1 (20%) apresentou LIEBG anal e 2 (40%) apresentaram LIEAG anal (Tabela 1).

Das 75 pacientes com citologia anal anormal 43 (57,3%), referiam praticar sexo anal, 28 (37,3%) negaram e 4 (5,3%) não responderam. Das 29 pacientes com citologia anal normal, 11 (37,9%) referiam praticar sexo anal, 6 (20,7%) negaram e 12 (41,4%) não responderam. A análise estatística não mostrou diferença estatística significante entre os dois grupos acima ci-tados (com citologia cervical anormal ou normal, praticantes de sexo anal) quanto à propensão a apresentar citologia anal anormal (P > 0,05) (Tabela 2).

Citologia cervical (104 casos)

Citologias anais (75) (72%)

TotalLIEAG anal

LIEBG anal

Normal/inflamatória

LIEAG – 51 (49%) 38 (74,5%) 18 20 13LIEBG – 48 (46,2%) 34 (70,8%) 11 23 14ASC-US – 5 (4,8%) 3 (60%) 2 1 2

LIEAG = lesão intraepitelial escamosa anal de alto grau; LIEBG = lesão intraepitlelial escamosa de baixo grau; ASC-US = atypical squamous cells of undermined significance (células escamosas atípicas de significado indeterminado).

Tabela 1. Alterações citológicas anais em pacientes com citologia cervical alterada

Citologia anal

Prática de sexo analSim Não Não respondeu

Positiva 43 (57,3%) 28 (37,9%) 4 (5,3%)Negativa 11 (37,9%) 6 (20,7%) 12 (41,4%)

Tabela 2. Relação entre a citologia anal alterada e a prática de sexo anal

DISCUSSÃOEmbora a infecção e reinfecção pelo HPV estejam forte-

mente associadas com a atividade sexual, é possível que outros fatores, além da resposta imune local, estejam relacionados à persistência das lesões pré-neoplásicas cervicais, uma vez que a imunidade natural não parece proporcionar um efeito dese-jado quanto ao controle da reinfecção.29 Corroborando com esta hipótese, um estudo mostrou que a infecção pelo mes-mo tipo de HPV entre casais recém-formados foi de 41%.30,31 Além disso, estudos demonstraram que a maioria dessas in-fecções em homens é transitória e o clearance ocorre com re-lativa rapidez em indivíduos imunocompetentes.32 Por isso é provável que um possível reservatório anatômico silencioso para o HPV seria a mucosa anal, ou seja, a mulher se autoin-fectaria em um ciclo persistente, propiciando o surgimento de lesões pré-neoplásicas do colo uterino de reinfecção, e parale-lamente poderia indiretamente infectar outras mulheres pelo seu parceiro. O primeiro passo para provar esta teoria seria estudar a prevalência de lesões intraepiteliais escamosas anais em pacientes com neoplasia intraepitelial cervical ou câncer do colo do útero.

Muitos estudos foram realizados para caracterizar a pre-sença e persistência do HPV no colo do útero. Um estudo envolvendo 599 mulheres infectadas pelo HPV revelou que há regressão das lesões e depuração do HPV em 67% das mulheres após os 12 meses do diagnóstico.33 Alguns fato-res como a idade e o uso crônico de álcool34,35 estão associados com recidiva da infecção do vírus, enquanto que o uso de contraceptivos orais e tabagismo não foram associados à reci-diva das lesões após a cirurgia a laser de CO2.

36 No entanto, observou-se também que mulheres fumantes têm um risco maior de ter uma nova infecção cervicovaginal por HPV.37 As mulheres com citologia anormal ou persistência do HPV após conização tinham risco maior de recidiva das lesões.38,39

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Claudia Maria Ricardo Serafim Giaccio | Patricia Lourenço Bragaglia | Edenilson Eduardo Calore | Carmem Ruth Manzione | Sidiney Roberto Nadal 7

Este risco diminui significativamente de seis meses a um ano pós-conização.38

Há relatos na literatura de que a maioria das infecções por HPV anal regride espontaneamente. Segundo alguns autores, a depuração média para o HPV 16 e 18 foi de 132 e 212 dias, respectivamente. Há fatores que influenciam o tempo da depu-ração viral, tais como: o fumo, o sexo anal e o uso de duchas anais.39 Foi observada uma associação entre uma maior preva-lência de recorrência de lesão intraepitelial anal em pacientes com aids. Esses pacientes tinham, em comum, uma maior ex-pressão do KI-67.40 Um estudo realizado no Canadá mostrou que mulheres portadoras de câncer anal apresentaram uma for-te associação com câncer ginecológico prévio. O tempo médio entre o câncer ginecológico anterior ao diagnóstico de câncer anal foi de 20 anos.26

Alterações citológicas anais podem ser observadas mes-mo em pacientes sem lesões macroscópicas.41 Em estudo da prevalência de citologia anal anormal em mulheres com ne-oplasia intraepitelial do trato genital e câncer, observou-se a citologia anal positiva em 9% dos pacientes, com alta taxa de HPV anal por meio de análise de DNA de HPV (51%).42 A diferença desses resultados com o nosso estudo (maior prevalência em nosso estudo) seria devido a procedimentos técnicos na coleta dos esfregaços anais, ou seja, a técnica que descrevemos para a coleta de material para citologia anal é mais sensível.

CONCLUSÕESO presente estudo mostrou uma alta prevalência de lesões

intraepiteliais anais em pacientes com lesões cervicais escamo-sas, sendo similar entre os casos de LIEAG e LIEBG cervicais. Esses resultados ajudam a apoiar a hipótese de que a mucosa anal seria um reservatório de HPV, que pode ser uma fonte de reinfecção do colo do útero. No entanto, não houve asso-ciação significativa entre a prática de sexo anal e a prevalência de alterações citológicas anais, fato que também foi observado por outros autores.11 Isso sugere que a transmissão do vírus da mucosa anal para cervical ou vice-versa possa ser decorrente de questões anatômicas, como proximidade do orifício anal e há-bitos de higiene pessoal. Estes fatos são epidemiologicamente importantes para futuros programas de erradicação de lesões cervicais relacionadas ao HPV.

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INFORMAÇÕESEndereço para correspondência:Edenilson Eduardo CaloreDepartamento de Patologia do Instituto Emílio RibasAv. Dr. Arnaldo, 165 São Paulo (SP)CEP 1246-900Cel. (11) 99606-6636Fax. (11) 3721-2467E-mail: [email protected]: [email protected]

Fonte de fomento: nenhuma declaradaConflito de interesse: nenhum declarado

Data de entrada: 24 de março de 2011Data da última modificação: 10 de agosto de 2011Data de aceitação: 31 de agosto de 2011

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):5-9.

Claudia Maria Ricardo Serafim Giaccio | Patricia Lourenço Bragaglia | Edenilson Eduardo Calore | Carmem Ruth Manzione | Sidiney Roberto Nadal 9

PALAVRAS-CHAVE:Papillomaviridae.Citologia.Neoplasias do colo do útero.Carcinoma in situ. Carcinoma de células escamosas.

RESUMOContexto e objetivo: O câncer anal corresponde a 4% de todas as neoplasias malignas do trato digestivo baixo. A incidência deste tipo de câncer e de suas respectivas lesões precursoras aumentou nos Estados Unidos, Europa e Brasil. A lesão intraepitelial escamosa anal de alto grau (LIEAG anal) é considerada provável precursora do tumor anal invasivo. Há alguma evidência de ligação entre o câncer anal e o câncer genital. O objetivo do presente estudo foi estimar a prevalência de alterações citológicas da mucosa anal em mulheres com citologia cervical positiva.Tipo de estudo e local: Corte transversal, realizado no Instituto de Infectologia Emílio Ribas.Métodos: Foram colhidas amostras para citologia cervical e anal de 104 mulheres (todas com lesões intraepiteliais de baixo ou alto graus). Em um período de até um mês do resultado da primeira coleta citológica, foi realizada nova coleta cervical e duas amostras de esfregaço do canal anal. Todas as amostras foram obtidas com escova de coleta citológica cytobrush. As pacientes foram questionadas quanto à prática de intercurso anal. Os esfregaços citológicos foram classificados segundo a classificação de Bethesda 2001. Resultados: Das 104 pacientes com citologia cervical anormal, 51 (49%) apresentaram LIEAG cervical, 48 (46,2%) LIEBG cervical, 5 (4,8%) atipia escamosa de significado indeterminado (ASC-US) cervical. Destas 104 pacientes, 75 (72%) também apresentaram citologia anal anormal e 29 (28%) esfregaços anais normais ou inflamatórios. Não houve diferença estatística entre os grupos com HSIL e LSIL cervicais, no que tange à propensão a apresentar citologia anal anormal (P > 0,05). Não houve diferença estatística significante entre os grupos quanto à propensão da presença de alterações citológicas anormais anais nas pacientes que praticavam intercurso anal (P > 0,05).Discussão: Nossos resultados sugerem que a transmissão do vírus HPV da mucosa anal para cervical ou vice-versa seja decorrente de questões anatômicas, como proximidade do orifício anal e hábitos de higiene pessoal, e não de relações sexuais anais.Conclusão: Houve prevalência de 72% de citologia anal anormal nas pacientes com citologia cervical positiva, porém, é necessária realização de mais estudos para se estabelecer se a mucosa anal é realmente um reservatório para o HPV, o que por si só já é epidemiologicamente importante para futuros programas de erradicação de lesões cervicais relacionadas ao HPV.

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Revisão narrativa da literatura

Evidências sobre o tratamento da acneCaroline Sousa CostaI, Ediléia BagatinII

Centro Cochrane do Brasil e Departamento de Dermatologia da Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp)

INTRODUÇÃOA conduta terapêutica inicial na acne vulgar deve levar em

conta a gravidade clínica do tipo de lesão, ou seja, se há predomí-nio de lesões inflamatórias ou comedonianas. A classificação da acne vulgar quanto à gravidade das lesões em leve (comedoniana ou papulo-pustulosa), moderada (papulo-pustulosa ou nodular) e grave (nódulo-cística ou conglobata) mostra-se útil na determi-nação da terapêutica a ser escolhida e foi adotada nos algoritmos terapêuticos de consensos internacionais mais recentes.1-5

Muitas terapias amplamente praticadas na dermatologia clí-nica carecem de respaldo em estudos de melhor nível de evi-dência científica. O Instituto de Medicina dos Estados Unidos coloca pesquisas comparativas de eficácia no tratamento da acne entre as 100 prioridades científicas da área naquele país.6

OBJETIVOO objetivo desta revisão narrativa é apresentar o que há de

mais recente em termos de evidências científicas de boa qua-lidade no tratamento tópico e sistêmico da acne vulgar. São enfatizadas as informações de revisões sistemáticas e de en-saios clínicos com bom desenho metodológico, controlados e randomizados.

MÉTODOSFoi realizada busca sistematizada nas principais bases de

dados por estudos relacionados ao tratamento da acne no pe-ríodo compreendido entre os anos de 2001 e 2011, utilizando descritores em saúde ou termos relacionados ao assunto em questão (Tabela 1).

RESULTADOS E DISCUSSÃOTerapêutica tópica da acne vulgar

As drogas de utilização tópica mostram-se efetivas na prática clínica para o tratamento da acne leve em monoterapia (exceto os antibióticos) ou em associações entre si e/ou com medica-ções sistêmicas. Há várias opções terapêuticas tópicas disponí-veis para a acne, com diferentes modos de ação. Embora sejam

mais efetivas do que placebo na acne leve, ainda não há uma única estratégia terapêutica tópica inicial e de manutenção bem validada por evidências científicas consistentes.3-6

Peróxido de benzoila (PB)O peróxido de benzoila (PB) é usado nas formas moderadas

e graves de acne de forma isolada ou, preferencialmente, em combinações fixas ou sequenciais com retinoides tópicos, áci-do azelaico, antibióticos tópicos ou antibióticos sistêmicos.1,2,5 Utiliza-se, ainda, em mulheres com acne moderada a grave que estão em tratamento hormonal sistêmico antiandrogênico.5 Pode também ser administrado em monoterapia na conduta inicial diante da acne leve papulo-pustulosa. Essa estratégia para casos leves com predomínio de pápulas e pústulas aparece preferencialmente recomendada nos consensos mais atuais bri-tânicos e germânicos. O embasamento para a recomendação está no menor custo e no histórico mais longo em relação aos registros de segurança e eficácia do PB quando comparado aos retinoides tópicos.2,5-8

O PB é droga de venda livre. A atividade antimicrobia-na com redução da colonização dos folículos pilosos pelo Propionibacterium acnes constitui seu principal mecanismo de ação, embora também atue de forma discreta na redução da inflamação e da hiperqueratinização folicular.5,6 Ao contrário da antibioticoterapia a longo prazo, o uso do PB não induz resistência bacteriana.1,5

A monoterapia com PB funciona tão bem quanto a associa-ção do PB a antibióticos tópicos ou orais.9 Seidler e Kimball, em 2010, realizaram uma metanálise com o intuito de compa-rar a eficácia do PB associado a ácido salicílico ou à clindami-cina com clindamicina tópica isolada e com PB isolado. Os re-sultados mostraram uma discreta maior eficácia das associações de PB em relação à droga isolada, uma diferença significante, porém, pouco provável de ser clinicamente importante.10

Concentrações menores do PB são recomendadas, pois pro-duzem menor irritação local, principal efeito adverso da medi-cação. Em uma revisão sistemática (RS), Fakhouri e cols., em

IDoutoranda do Programa de Medicina Interna e Terapêutica da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Médica dermatologista do Centro de Referência e Treinamento em DST/AIDS do Governo do Estado de São Paulo. IIDoutora em Dermatologia pela Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp). Professora adjunta do Departamento de Dermatologia da Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp).

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Caroline Sousa Costa | Ediléia Bagatin 11

2009, concluíram que a eficácia é similar nas concentrações de 2,5%, 5% e 10% e pode ser aumentada com o acréscimo de vi-tamina E e de aminas terciárias à formulação, assim como pela associação aos retinoides tópicos. Segundo os autores, novos mecanismos de liberação da droga aumentam a tolerabilidade sem diminuir a eficácia.8,11

Retinoides tópicosOs retinoides são derivados da vitamina A que previnem

a formação dos comedões por meio da normalização da des-camação do epitélio folicular. Também apresentam alguma ação anti-inflamatória. Os retinoides estão contraindicados em gestantes, e as mulheres em idade fértil devem utilizar métodos contraceptivos eficazes concomitantemente ao tra-tamento com essas drogas. Os principais retinoides utilizados topicamente no tratamento da acne são: tretinoína, adapaleno e tazaroteno; o último não disponível atualmente no Brasil.6,12 Os retinoides tópicos são indicados como monoterapia na acne leve (comedoniana e pápulo-pustulosa) e no tratamen-to de manutenção após o controle da doença. Nas formas moderadas e graves, são utilizados em combinações fixas ou sequenciais com PB, ácido azelaico e/ou antibióticos tópicos ou sistêmicos. Também estão recomendados para mulheres com acne moderada e grave que estão em tratamento hormo-nal sistêmico antiandrogênico.5

Há vários ensaios clínicos randomizados e controlados (ECRCs) que comparam os retinoides tópicos com placebo e demonstram a eficácia e a tolerabilidade, mas ainda são neces-sários mais estudos que comparem os retinoides tópicos entre si e com outras drogas do arsenal terapêutico da acne.6 No geral, todos os retinoides tópicos são efetivos em reduzir o número de comedões e lesões inflamatórias numa ordem de 40% a 70%. Dados de ECRCs sugerem que os retinoides tópicos em con-centrações mais altas têm uma eficácia melhor, mas com risco de maior irritação. O adapaleno parece ter menor potencial ir-ritativo e melhor tolerância quando comparado a tretinoína e ao tazaroteno, e o tazaroteno parece mais eficaz.12

Cunliffe e cols., em 1998, numa metanálise de cinco ECRCs, multicêntricos e com cegamento do investigador, compararam a eficácia do adapaleno a 0,1% gel com a tretinoína a 0,05% gel e demonstrou que o adapaleno produz resposta terapêutica melhor e com menor ocorrência de irritação da pele.13

Uma RS investigou se o uso dos retinoides tópicos pode causar piora temporária paradoxal das lesões no início do trata-mento, um dogma até então muito difundido entre os derma-tologistas norte-americanos. Os autores analisaram oito estudos que não encontraram evidência da piora e apenas um estudo sugeriu discreta deterioração do quadro clínico da acne preco-cemente ao longo do tratamento. Os autores confirmam que os retinoides tópicos causam irritação da pele, mas que há desen-volvimento de boa tolerância ao tratamento ao longo dos dois a três primeiros meses de tratamento.11,14,15

Antibióticos tópicosOs antibióticos tópicos mais comumente utilizados no

tratamento da acne são a clindamicina e a eritromicina. Melhoram a acne devido à supressão da proliferação da bacté-ria Propionibacterium acnes nos folículos pilosos afetados, com redução da inflamação local.6,12 A monoterapia tópica com antibióticos na acne é contraindicada, devido à possi-bilidade de indução de resistência bacteriana, a qual se rela-ciona a piores respostas terapêuticas e ao relativamente lento início de ação quando comparada a outros esquemas antimi-crobianos utilizados na terapêutica da acne.1,4,9,12 Simonart e Draimax, em 2008, numa RS, analisaram ECRCs de inter-venções terapêuticas para a acne e concluíram que há uma diminuição gradual de eficácia da eritromicina ao longo dos últimos anos, o que provavelmente se relaciona ao surgimen-to de cepas resistentes de Propionibacterium acnes.16 A terapia com antibióticos tópicos é recomendada na acne leve ou mo-derada e sempre em associação com retinoides tópicos, PB ou ácido azelaico. Prestam-se, ainda, ao uso combinado com o tratamento sistêmico hormonal antiandrogênico na acne mo-derada das mulheres.5

Eritema, descamação, ressecamento e ardor podem surgir durante o tratamento com os antibióticos tópicos.3 Entre as principais contraindicações e limitações ao uso estão a gestação e a amamentação para a clindamicina tópica e o risco de he-patoxicidade para a eritromicina quando aplicada a áreas mais extensas da pele em pacientes com função hepática anormal.5

Outras terapias tópicasO ácido salicílico é utilizado há muitos anos no tratamen-

to da acne e compõe várias preparações farmacêuticas tópicas

Base de dados Estratégia de buscaResultados

iniciais

Estudos selecionados para citação na revisão

Revisões sistemáticasEnsaios clínicos randomizados

e controladosPubMed “Acne Vulgaris” [Mesh] 2.915 17 (de 113) 6 (de 305)Cochrane Library “Acne Vulgaris” [Mesh] 737 8 (de 21) 6 (de 705)Lilacs mh: “acne vulgar” 271 0 (de 0) 0 (de 8)Embase ‘acne vulgaris’/exp 2.064 9 (de 39) 6 (de 212)

Tabela 1. Busca sistematizada por evidências em tratamento da acne vulgar realizada em 5 de agosto de 2012

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):10-4.

Evidências sobre o tratamento da acne12

disponíveis atualmente para venda sem prescrição. Possui ação esfoliativa, ceratolítica e comedolítica, mas não há evidências consistentes que corroborem o uso rotineiro em preferência a nenhum outro tratamento tópico. Quanto à eficácia, é inferior aos retinoides tópicos e somente está recomendado para pa-cientes que eventualmente não tolerem a irritação decorrente da ação dos retinoides.4,6

Ainda há limitações quanto à qualidade de evidência cientí-fica disponível em relação ao uso de certos agentes tópicos no manejo da acne, entre eles enxofre, resorcinol, sulfacetamida sódica, cloreto de alumínio e zinco.4,6 Com ação principalmen-te comedolítica, antibacteriana e discreta atividade anti-infla-matória, o ácido azelaico tem eficácia comprovada na acne. Os efeitos colaterais mais comuns são irritação local, com erite-ma, prurido, ardência e leve descamação, os quais tendem a desaparecer após quatro semanas de tratamento.17-19 É possível indicá-lo nas mesmas formas clínicas de acne e condições de tratamento já citadas para os retinoides tópicos, com a diferen-ça que o emprego do ácido azelaico em gestantes e lactantes não oferece riscos.5

Combinações de terapias tópicasHá evidência a partir de ECRCs de que as associações de

duas drogas tópicas com diferentes mecanismos de ação são mais eficazes na resolução da acne do que o uso isolado.20-22 As apresentações tópicas com a associação de dois agentes antiacne (exemplo: retinoide tópico ou PB + antibiótico tópico ou reti-noide tópico + PB) estão recomendadas como primeira escolha no tratamento da acne papulosa ou papulo-pustulosa leve a moderada.1,5,20 As combinações de agentes tópicos aumentam a aderência ao tratamento devido à conveniência da posologia, especialmente no caso das apresentações de uso único diário, e ao início de ação mais rápido. Além disso, devido à maior eficácia quando comparadas à monoterapia tópica, também promovem maior melhora na qualidade de vida dos pacientes com acne vulgar leve a moderada.22-25

Terapêutica sistêmica da acne vulgarO uso de medicações orais no tratamento da acne vulgar

destina-se aos casos moderados a graves ou refratários à terapia tópica.6,11,13

Antibióticos oraisOs antibióticos orais estão entre os agentes de primeira es-

colha na acne grave e nos casos moderados com lesões infla-matórias que acometem áreas extensas da pele, principalmente o tronco. Também podem ser empregados em casos de acne inflamatória leve a moderada que não respondem plenamente à terapia tópica. Atuam por meio da redução da colonização bacteriana e da inflamação nos folículos afetados.1,4,5,12 Apesar da efetividade na redução do número de lesões inflamatórias, nenhum antibiótico oral clareia a acne completamente.6

Antibióticos orais devem sempre ser associados aos retinoi-des tópicos, PB, ácido azelaico e/ou medicações antiandrogê-nicas, no caso das mulheres, devido à possibilidade de desen-volvimento de resistência bacteriana. A questão torna-se mais importante quando se administram antibióticos orais por lon-gos períodos e/ou em baixas doses, e é contraindicado o uso concomitante de antibiótico tópico e oral.1,5,26,27

Não há evidência conclusiva de que um antibiótico possa ser mais efetivo do que outro, inclusive entre as tetraciclinas de primeira e de segunda geração que compõem as opções prefe-renciais de antibioticoterapia oral para a acne. A minociclina, no entanto, dentre as tetraciclinas, tem maior potencial de efei-tos adversos e maior custo.9,28,29 A escolha do antibiótico oral deve basear-se na preferência do paciente, no padrão de efeitos adversos e no custo.6

Contraceptivos orais e antiandrógenosOs contraceptivos orais combinados (COCs) suprimem a

atividade da glândula sebácea e reduzem a formação de andró-genos ovarianos e adrenais. A terapia hormonal antiandrogêni-ca com COCs deve ser usada precocemente em mulheres com acne moderada a grave.1,3,5 Há boas evidências, segundo uma RS Cochrane, de que COCs não diferem muito entre si quanto à eficácia na redução de lesões inflamatórias e não inflamatórias faciais. No entanto, não é ainda possível afirmar o quanto os COCs são efetivos no tratamento da acne se comparados a outras terapêuticas.30 Não há evidência da efetividade da espironolacto-na no tratamento da acne, segundo RS Cochrane.31 Nenhuma das preparações comerciais com espironolactona atualmente disponíveis no Brasil e no mundo é aprovada para uso no trata-mento da acne, o que também se verifica em relação à flutamida, droga proscrita no tratamento da acne em decorrência dos efeitos adversos, especialmente a insuficiência hepática aguda.4,5

Isotretinoína oralApenas a isotretinoína oral apresenta mecanismo de ação

que atua sobre todos os mecanismos etiopatogênicos relacio-nados à acne vulgar. É a medicação contra a acne mais efetiva disponível e promove a cura clínica em 85% dos casos. A iso-tretinoína está indicada em casos graves, resistentes às demais terapias, e pacientes com tendência à formação de cicatrizes ou com importante impacto psicossocial.1,5 Ainda se fazem neces-sárias evidências científicas consistentes acerca do uso precoce em casos moderados, principalmente devido aos efeitos adver-sos graves relacionados à isotretinoína, entre eles, a teratogeni-cidade, e o possível risco de surgimento de doença inflamatória intestinal, depressão e suicídio, até hoje não confirmados em estudos populacionais.32-37

Lasers, fontes de luz e terapia fotodinâmicaHá na literatura boa evidência de que vários tratamentos

com fontes de luz podem melhorar a acne infamatória em curto

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Caroline Sousa Costa | Ediléia Bagatin 13

prazo, sendo que a terapia fotodinâmica apresenta resultados mais consistentes em comparação aos demais. No entanto, ain-da não há evidência consistente quanto à resposta terapêutica a longo prazo e em relação às terapias convencionais da acne.38,39

Medicações alternativas e complementares (MACs):Tratamentos alternativos com ervas, Aloe vera, piridoxina,

ácidos derivados de frutas, óleo de melaleuca, acupuntura e moxabustão apresentam uso ainda limitado ao empirismo. São necessários mais estudos clínicos e bem conduzidos para que se definam adequadamente a eficácia e a segurança das terapêuti-cas alternativas.6,40

CONCLUSÃOHá um grande número de produtos comerciais disponíveis

para o tratamento da acne e, entre eles, várias combinações de diferentes drogas. Sabe-se que não existem, até o momento, estudos comparativos suficientes para gerar evidência de boa qualidade em relação ao arsenal terapêutico da acne. Este fato parece ser o motivo de os consensos internacionais mostrarem algumas diferenças quanto às suas recomendações e de não apresentarem completo embasamento em evidências científicas consistentes. Restringem-se, em alguns aspectos da terapêutica da acne, à opinião de especialistas, muitos dos quais declaram conflitos de interesses potencialmente relevantes.

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INFORMAÇÕESEndereço para correspondência:Caroline Sousa CostaRua Doutor Jose Estéfano, 80 — apto 42Jardim Vila Mariana — São Paulo (SP)CEP 04116-060Tel: (11) 5575-8558E-mail: [email protected]

Fonte de fomento: nenhuma declaradaConflito de interesse: nenhum declarado

Data de entrada: 6 de agosto de 2012Data da última modificação: 10 de setembro de 2012Data de aceitação: 12 de setembro de 2012

PALAVRAS-CHAVE: Acne vulgar.Terapêutica.Medicina baseada em evidências.Antibacterianos.Isotretinoína.

RESUMONa terapêutica atual da acne vulgar, muitas opções amplamente praticadas carecem de respaldo em estudos de melhor nível de evidência científica. O objetivo desta revisão narrativa é apresentar o que há de mais recente no tratamento tópico e sistêmico da acne vulgar. São enfatizadas as informações de revisões sistemáticas e de ensaios clínicos com bom desenho metodológico, obtidas a partir de busca sistematizada nas principais bases de dados em medicina. Há importantes questões referentes à conduta clínica diante da acne que ainda requerem embasamento em evidências científicas consistentes, entre elas: a dose e a duração ideais do tratamento com antibióticos orais, sem que ocorra indução de resistência bacteriana, e a segurança da isotretinoína oral.

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Esteroides sexuais e músculo esquelético16

Nos capilares, as proteínas ligantes interagiriam com a glicá-lix endotelial determinando a liberação e difusão dos esteroides sexuais; também haveria a união do complexo esteroide globu-lina ligante com a megalina, realizando a endocitose aparente-mente mais eficaz que a difusão.9

Esteroides sexuais e crescimento muscularO emprego de esteroides para aumentar a massa muscular

iniciou-se ao redor de 1940 tanto em animais de corte como em fisiculturistas.10,11 Implantes contendo estrógenos ou an-drógenos determinam aumento de aproximadamente 20% da massa muscular (carne) no gado bovino, mais acentuado quan-do se associam ambos esteroides (nível 3).12-14

O crescimento muscular pós-natal decorre de hipertrofia das miofibras preexistentes cujo pré-requisito é a multiplicação dos mionúcleos em virtude da existência do domínio nuclear, cada mionúcleo regulando determinado volume de miofibrilas.15 Como os mionúcleos não se multiplicam em condições natu-rais, as células satélites ou miossatélites, situadas entre o sarco-lema e a lamina basal das miofibras, multiplicam e diferenciam--se em mioblastos, que se integram às miofibras, fornecendo os núcleos necessários ao crescimento muscular (Figura 2).1,12,13,15

Costumeiramente atribuem-se, à classe dos esteroides andro-gênico-anabólicos constituídos por testosterona e afins, os efeitos ligados à diferenciação sexual (androgênicos) e retenção de nitrogê-nio (anabólicos).16 Como estradiol e afins também são anabólicos, há necessidade de reciclar este conceito (nível 3).17,18 No homem, os androgênico-anabólicos são usados no hipogonadismo e na per-da muscular progressiva associada à idade (sarcopenia) ou ligada à enfermidade em qualquer idade (miopenia), decorrente de dimi-nuição da síntese proteica e ativação da apoptose muscular, com

diminuição progressiva da capacidade funcional e aumento do ris-co de quedas, fraturas, dependência e morte precoce.4,19 O exercício físico concomitante facilita a adaptação muscular (desenvolvimen-to por carga) e diminui este risco (nível 1).20-25 Na mulher adulta com hipogonadismo e na menopausada, em que o músculo está comprometido, além de estradiol é possível o uso de testosterona e seus precursores para tratar ou prevenir a astenia e sarcopenia.4,19 Doping (aumento ilícito do rendimento muscular) é o uso de este-roides androgênico-anabólicos para aumentar a massa e qualidade muscular além do natural em doses suprafisiológicas.11,16,26

Estradiol também aumenta o desenvolvimento muscular, ati-vando a proliferação e diferenciação de células satélites, e preservan-do a população de mioblastos através de ação antiapoptótica (nível 3).17,27 Adicionalmente, o estradiol fortalece a ligação da miosina a actina, essencial à contração muscular (Figura 3) (nível 3).27

Pró-hormônios e ação hormonalDeidroepiandrosterona e seu sulfato são pró-hormônios de

testosterona e estradiol.28,29 No homem adulto, os níveis circulan-tes do sulfato de deidroepiandrosterona atingem o zênite aos 20 anos de idade e começam a declinar aos 30. Em menopausadas,

Figura 1. Diminuição etária da qualidade muscular conforme a atividade física (treinamento, atividade normal e sedentarismo). A qualidade muscular do indivíduo de 80 anos que treina (seta) corresponde à do sedentário de 50 anos de idade.5

Figura 2. Processo de hipertrofia das miofibras.15

Tabela 2. As frações circulantes de testosterona no homem e estradiol na mulher8,9

FraçãoHomem (testosterona)

(%)Mulher (estradiol)

(%)Livre A 2-2,5 1-1,9Ligada à SHBG 44-73,8 39,7-69Ligada à albumina B 23,7-54 30-58,3Biodisponível (A+B) 25,7-56,5 31-60,2

SHBG = proteína ligadora de hormônios sexuais.

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os níveis circulantes são em média 80% menores àqueles existen-tes em mulheres de 20 anos de idade (nível 3).30

Deidroepiandrosterona é secretada principalmente na zona reti-cular das ad-renais onde, como também no fígado, é sulfatada pela sulfotransferase, aumentando sua meia-vida; nos tecidos-alvo, o sul-fato de didroepiandrosterona é hidrolisado pela sulfatase (nível 3).31

Receptores esteroidianosTestosterona atua no músculo em parte após conversão em di-

-hidrotestosterona pela 5α-redutase, e estradiol pela aromatase.29 É desconhecida a proporção do efeito muscular devida à testoste-rona, di-hidrotestosterona e ao estradiol, mas ratos orquiectomi-zados tratados com estradiol ou testosterona ou di-hidrotestos-terona ganham músculo, sendo o efeito mais acentuado com as últimas; acredita-se haver divisão funcional entre os hormônios com superposição de efeitos.4,18 Assim, por exemplo, a modula-ção de genes que aumentam a síntese de glicogênio e utilização de ácidos graxos pelo músculo é feita pelo estradiol, cabendo à di-hidrotestosterona modular genes que geram a sinapse neuro-muscular, transmissão do sinal neural, transporte de oxigênio e síntese de poliaminas.18

Testosterona e di-hidrotestosterona atuam por mecanismos genômico e não genômico, este sem ativação gênica imediata. No genômico, de ação mais lenta, a ligação com receptor ativa dire-tamente o gene.32 No não genômico, de ação mais rápida, há intera-ção com receptor androgênico membranar acoplado à proteína G ou com vias sinalizadoras.33,34 No exercício físico há aumento temporário dos níveis circulantes de testosterona total e livre que estimulam a síntese e diminuem a degradação proteica, aumentam o reaproveita-mento de aminoácidos e ativam as células satélites (nível 3).35,36

Estradiol atua por meio de três receptores: α, β e receptor es-trogênico acoplado à proteína G localizado no retículo endoplásmi-co.37 Os efeitos não genômicos de estradiol elicitam respostas rápi-das envolvendo vias sinalizadoras, ativadas de modo dependente ou

independente do receptor estrogênico.38,39 A aromatase também se localiza no retículo endoplásmico, próxima ao receptor estrogênico.40

Esteroidogênese muscularO nível de deidroepiandrosterona muscular depende do teor

deste esteroide circulante, mas os níveis de testosterona e estra-diol dependem da esteroidogênese local.30,31 As células satélites e miofibras contêm sulfatase, aromatase, 17β-hidroxiesteroide desidrogenase e 3β-hidroxiesteroide desidrogenase (Figura 4).31

Em ratos, os níveis basais musculares de testosterona livre e di-hidrotestosterona são maiores em machos, mas, quanto à dei-droepiandrosterona não diferem entre os sexos.30 Os níveis mus-culares de deidroepiandrosterona, testosterona e di-hidrotestos-terona, bem como a expressão muscular de 17β-hidroxiesteroide desidrogenase e 3β-hidroxiesteroide desidrogenase aumentam em ambos os sexos após o exercício, o mesmo acontecendo com o sulfato de deidroepiandrosterona também nos dois sexos.30 Graças ao exercício, esses estímulos aumentam massa, qualidade, metabolismo energético e capacidade antioxidante muscular.30

Di-hidrotestosterona ativa a expressão de genes associados com a síntese proteica e proliferação celular aumentando a massa muscular e, através de mecanismo não genômico, ativaria vias sinalizadoras, elevando a produção de adenosina trifosfato, responsável pela quali-dade muscular.30 Esse mecanismo acaba falhando no idoso em razão do hipogonadismo. Na menacma, a mulher preenche suas necessi-dades musculares, convertendo deidroepiandrosterona em testoste-rona, a seguir em estradiol e di-hidrotestosterona. Por isso, apesar de o nível circulante de testosterona ser mais elevado no homem, cujo desenvolvimento muscular é maior, a adaptação muscular também ocorre na mulher. Mas na menopausada, a esteroidogênese local se-ria insuficiente para sanar o déficit estrogênico e manter a qualida-de muscular.6 Neste contexto, o metabólito da di-hidrotestosterona com ação estrogênica, 5α-androstane-3α, 17β-diol, ainda não tem um papel definido.41

Figura 3. Efeitos do estradiol sobre a qualidade muscular.6 RE = receptor estrogênico. DNA = ácido desoxirribonucleico. GPER = receptor estrogênico acoplado à proteína G1 localizado no retículo endoplásmico.

Figura 4. Esteroidogênese muscular. DHEA, SDHEA = deidroepiandrosterona e seu sulfato; 17β-HSD = 17β-hidroxiesteroide desidrogenase; 3β-HSD = 3β – hidroxiesteroide desidrogenase; 3α-HSD = 3α-hidroxiesteroide desidrogenase.

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SISTEMA HORMÔNIO SOMATOTRÓPICO/FATOR INSULINOIDE DE CRESCIMENTO 1

Na produção de hormônio somatotrópico atuam no mínimo seis fatores: dois hormônios hipotalâmicos (hormônio liberador de hormônio somatotrópico e somatostatina), três hormônios este-roidianos (testosterona, di-hidrotestosterona e estradiol) e o teor de gordura abdominal visceral, associada com menor produção de grelina (do inglês ghrelin onde gh indica a sua ação liberadora do hormônio de crescimento).38,39,42,43 Grelina teria o duplo efeito de aumentar a liberação de hormônio do crescimento e inibir a ação de somatostatina (nível 3).44 Hormônio somatotrópico aumenta a massa e qualidade muscular por meio das células satélites e mi-tocôndrias.45 Seu nível circulante diminui em 1% ao ano após os 30 anos de idade e cerca de 30% dos idosos com mais de 60 anos têm déficit do hormônio e fator insulinoide de crescimento 1; a diminuição decorreria do aumento do tônus somatostatinérgico.42

As ações do hormônio somatotrópico são realizadas através de seu receptor, porém, muitos efeitos são mediados por fator insu-linoide de crescimento 1 de origem hepática ou suas isoformas produzidas no músculo, sob ação de di-hidrotestosterona por splicing alternativo, principalmente a isoforma 1Ea, similar ao fator hepático, e a isoforma 1Ec, conhecida como fator mecano de crescimento, recrutada quando há dano ou estresse mecânico muscular (nível 3).45,46 O fator mecano estimula a proliferação de células satélites e síntese de miofibrilas, ao passo que a isoforma 1Ea modula a diferenciação de células satélites em mioblastos e a respectiva fusão às miofibras.12,35,47 Os principais determinadores do crescimento corporal pós-natal seriam o fator insulinoide de crescimento 1 e suas isoformas de origem autócrina ou parácrina.48

O efeito muscular da coadministração de testosterona e soma-totrópico seria maior que o uso isolado de ambos (nível 2).49 No envelhecimento associado com diminuição da sensibilidade à in-sulina devido à alteração pós-receptora, a atividade de fator insuli-noide de crescimento 1 diminui, aumentando o déficit muscular.50

Mesmo na ausência de estradiol, o fator insulinoide de crescimen-to 1 ativaria o receptor estrogênico por meio de vias sinalizadoras.36 Estradiol também aumenta a concentração de receptores de fator in-sulinoide de crescimento 1, favorecendo a ativação das proteínas do substrato do receptor de insulina, mediadoras de vias sinalizadoras.51

CitocinasHá equilíbrio entre os efeitos anabólicos do sistema hormônio

somatotrópico/fator insulinoide de crescimento 1 e os efeitos cata-bólicos, principalmente de interleucina-6, na proteína muscular.36 Esta citocina é pró-inflamatória e aumenta a produção de proteínas ligantes de fator insulinoide de crescimento 1 no músculo, dimi-nuindo a sua ação. Este efeito é recíproco porque o fator insulinoide infrarregula a produção de citocinas pró-inflamatórias (nível 3).52 O hipogonadismo menopausal aumenta as citocinas pró-inflama-tórias interleucina-6 e fator de necrose tumoral α, responsáveis pela inflamação muscular de baixo grau nesta fase. A ação anti-inflama-tória do estradiol resulta da redução local destas citocinas.53

Mitocôndrias e radicais oxidantesAs mitocôndrias regulam a respiração celular e a fosforilação

oxidativa que origina os elétrons responsáveis pelo gradiente eletro-químico que sintetiza trifosfato de adenosina. O produto colateral é a produção da maior parte de radicais oxidantes no organismo.53

O receptor β localiza-se na matriz mitocondrial, participando da regulação do gradiente eletroquímico e da expressão do genoma da organela (nível 3).54 A exclusão experimental do receptor β determina diminuição da qualidade muscular.18 A aromatase também se situa na matriz mitocondrial, facilitando a utilização do estradiol.53

A diminuição do nível circulante de estradiol na menopausa ele-varia a vulnerabilidade celular ao estresse oxidativo pelo aumento da fração de receptor β livre, pois a ligação dos estrógenos ao re-ceptor β estabilizaria o potencial de membrana das mitocôndrias, reduzindo tal vulnerabilidade.53 Através de mecanismo genômico, estradiol promoveria a produção de energia por fosforilação oxida-tiva e diminuiria a geração mitocondrial de radicais oxidantes que afetariam o ácido desoxirribonucleico mitocondrial, induzindo a mutações responsáveis por doenças relacionadas à idade.54 Todavia, falta ao estradiol a capacidade de reverter as mutações acumuladas, constituindo uma explicação de sua impotência na reversão de doenças cardiovasculares nos estudos da Womens’ Health Initiative.54

O mecanismo da influência de testosterona sobre as mito-côndrias dos miócitos seria a conversão para estradiol, estímulo genômico da biogênese mitocondrial, estímulo da interação com cofatores que regulam a expressão de proteínas de desa-coplamento ou associação direta com o genoma mitocondrial, alterando a formação de radicais oxidantes.55

As mitocôndrias estão envolvidas na apoptose, forma de morte celular responsável pela remoção de células de tecidos, desempenhando papel crítico no desenvolvimento e manu-tenção do músculo, sobretudo na atrofia resultante do desuso muscular crônico e sarcopenia. O exercício atenuaria algumas etapas pró-apoptóticas que ocorrem nestas condições.56

CONCLUSÃOEstradiol e testosterona atuam no músculo, efeito otimizado

por alimentos e exercícios adequados. O dispositivo esteroidogê-nico local converte pró-hormônios em testosterona, di-hidrotes-tosterona e estradiol, fomentando a manutenção e crescimento muscular. O maior desenvolvimento muscular no homem é de-terminado por nível circulante mais elevado de testosterona, mas a esteroidogênese local possibilita a adaptação muscular na mu-lher. A ação do hormônio somatotrópico seria direta ou através do fator insulinoide de crescimento 1 ou suas isoformas produzidas localmente. Estradiol beneficiaria o músculo diminuindo o efeito catabólico local de citocinas. Enquanto estradiol ativaria a fosfori-lação oxidativa através do receptor estrogênico β situado na matriz mitocondrial, o mecanismo de ação mitocondrial de testosterona é menos esclarecido. Reduzindo a concentração de radicais oxidan-tes, estradiol diminuiria a geração de mutações do ácido desoxirri-bonucleico mitocondrial no decorrer da vida, mas não reverteria a

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mutação já ocorrida. Dada a sua importância, deve ser enfatizada a necessidade de exercício constante para a preservação da qualidade muscular, estando também indicado o uso de esteroides androgê-nico-anabólicos no hipogonadismo e sarcopenia.

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44. Veldhuis JD, Mielke KL, Cosma M, et al. Aromatase and 5alpha-reductase inhibition during an exogenous testosterone clamp unveils selective sex steroid modulation of somatostatin and growth hormone secretagogue actions in healthy older men. J Clin Endocrinol Metab. 2009;94(3):973-81.

Page 22: Rdt v18n1

Diagn Tratamento. 2013;18(1):15-20.

Esteroides sexuais e músculo esquelético20

PALAVRAS-CHAVE:Estradiol.Testosterona.Desidroepiandrosterona.Músculo esquelético.Mitocôndrias.

RESUMOAntecedentes: Exercício físico, doping, sarcopenia e astenia menopausal envolvem alterações significativas dos níveis de esteroides sexuais.Objetivo: Estudo das interações entre esteroides sexuais e fatores que influenciam a manutenção muscular.Metodologia: Busca bibliográfica na United States National Library of Medicine, Biblioteca Cochrane, Biblioteca de Medicina Baseada em Evidência do British Medical Journal, Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde e Scientific Electronic Library Online, selecionando-se 58 artigos preferencialmente a partir de 2008.Resultados: Os esteroides sexuais ativam massa, qualidade (força por unidade de massa), metabolismo energético e capacidade antioxidante muscular. O nível superior de testosterona determina maior desenvolvimento muscular no homem, mas a adaptação (desenvolvimento por carga) ocorre nos dois sexos, modulada pela síntese esteroidiana local. O exercício ativa esta síntese para aumentar a massa e a qualidade muscular, elevando o gasto energético e a capacidade antioxidante do músculo. No músculo, testosterona é convertida parcialmente em di-hidrotestosterona e estradiol, possivelmente todos estes hormônios contribuindo para manter e aumentar a massa e qualidade muscular, pois em animais de corte, o tratamento com testosterona ou estradiol aumenta a produção de carne, principalmente quando ambos são associados. O doping decorre do uso de doses suprafisiológicas de esteroides androgênico-anabólicos. Vários efeitos do hormônio somatotrópico, cuja secreção é estimulada pelos esteroides sexuais, são mediados por fator insulinoide de crescimento 1 ou suas isoformas produzidas localmente.Conclusões: Na astenia menopausal e sarcopenia são necessários exercício físico e alimentação adequados, e correção do déficit esteroidiano sexual para adaptar a integridade morfofuncional do músculo.

45. Giovannini S, Marzetti E, Borst SE, Leeuwenburgh C. Modulation of GH/IGF-1 axis: potential strategies to counteract sarcopenia in older adults. Mech Ageing Dev. 2008;129(10):593-601.

46. Hameed M, Lange KH, Andersen JL, et al. The effect of recombinant human growth hormone and resistance training on IGF-1 mRNA expression in the muscles of elderly men. J Physiol. 2004;555(Pt 1):231-40.

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48. Camacho-Hubner C. Normal physiology of growth hormone and insulin-like growth factors in childhood. Endotext.org. Disponível em: www.endotext.org/neuroendo/neuroendo5a/neuroendoframe5a.htm. Acessado em 2012 (20 jul).

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INFORMAÇÕESEndereço para correspondência:

Hans Wolfgang Halbe

Rua Benta de Andrade, 146

São Paulo (SP)

CEP 04503-000

Tel. (11) 3885-8394

E-mail: [email protected]

Fonte de fomento: nenhuma declarada

Conflito de interesse: nenhum declarado

Data de entrada: 11 de janeiro de 2012

Data da última modificação: 9 de agosto de 2012

Data de aceitação: 15 de agosto de 2012

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):21-3.

Dermatologia

Ataque de jacaré a pescador no Pantanal de Mato Grosso (Brasil): relato de caso

Manoel Francisco de Campos NetoI, Hamílton Ometto StolfII, Vidal Haddad JuniorIII

Hospital Regional de Cáceres, Mato Grosso, e Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista, São Paulo

INTRODUÇÃOOs acidentes por jacarés são pouco conhecidos (Tabela 1).

Os raros relatos apontam o fato de a maioria dos ataques ser provocada por falta de cuidados quando da aproximação des-ses animais ou por provocação.1 Isso ocorre especialmente com as espécies Caiman yacare (jacaré-do-Pantanal) (Figura  1) e Caiman latirostris (jacaré-do-papo-amarelo). Entretanto, exis-tem espécies amazônicas de grande porte que podem atacar se-res humanos para predação, como o jacaré-açu (Melanosuchus niger).1-3 O jacaré-do-Pantanal existe em grande número após a instalação de medidas preservacionistas na região e, mesmo assim, os acidentes com humanos permanecem raros, devendo ser considerados verdadeiros acidentes e não ataques.

RELATO DE CASOEm novembro de 2011, NPV, do sexo masculino, 61 anos de

idade, por volta das 15 horas, estava pescando no barranco de sua propriedade às margens do Rio Paraguai e, após limpar os peixes que havia pescado, foi atacado por um jacaré-do-Pantanal de cer-ca de 1,50 m de comprimento. O réptil saiu debaixo da vegeta-ção aquática que estava ao seu lado, mordendo sua mão direita. O ferimento apresentou sangramento copioso e dor intensa, o que fez com que a vítima retornasse à sua casa para lavar os ferimentos com água corrente e pedir auxílio à vizinha, que uti-lizou linha de costura para suturar os ferimentos da mão. Após três dias, o paciente ainda apresentava dores, estando sua mão

edematosa e com elevação da temperatura. Devido à presença de calafrios e febre, procurou atendimento médico no Hospital Regional de Cáceres.

No primeiro exame foram retirados os pontos com linha de costura (os ferimentos estavam abertos e sem curativos). A seguir, foi realizada rigorosa limpeza com soro fisiológico. Os ferimentos tinham características perfurocontusas e perfurolaceradas, com efeitos tangenciais possivelmente causados por mecanismos de contrarresistência (defesa) no instante do ataque. Toda a área se mostrava eritematosa, com volumoso edema e diminuição das funções motora e sensitiva (Figuras 2 e 3). Não foi possível a realização de cultura para bactérias. O exame radiológico da mão direita nas incidências anteroposterior e oblíqua mostrou fratura-arrancamento de pequeno fragmento ósseo da cabeça do segundo metacarpiano direito (Figura 4). O paciente foi interna-do para acompanhamento médico com introdução de cefalexina 1 g por via endovenosa (EV) de 6 em 6 horas, e gentamicina, 80 mg em 100 ml de soro fisiológico, EV lenta de 8 em 8 horas, além de tenoxicam, 20 mg de 12 em 12 horas, SAT 5.000 U IM, dipirona 2 ml EV, de 6 em 6 horas, omeprazol, 20 mg EV, de 12 em 12 horas, curativos diários e cuidados gerais. Após cinco dias de internação, houve significativa regressão do quadro inflama-tório (por provável controle da infecção secundária), quando o paciente obteve alta hospitalar para posterior acompanhamen-to ambulatorial (semanal) da evolução dos ferimentos. Recebeu também orientação para o tratamento fisioterápico, visando

IMédico legista, Departamento de Medicina Forense, Politec, Cáceres, Mato Grosso.IIProfessor doutor, Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista.IIProfessor livre-docente, Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista.

Tabela 1. Resultados da busca sistematizada nas bases de dados médicas com os descritores de saúdeBase de dados Estratégia de busca Artigos relacionados Artigos selecionados

PubMed“caiman attacks AND bites” 7 5 relatos de casos e 2 revisões

“alligator attack” 20 2 relatos de casos“alligator bites” 11 0

Lilacs “acidentes jacarés” 1 1 relato de caso

Cochrane Library

“caiman attacks” 0“caiman bites” 0

“alligator attack” 0“alligator bites” 0

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):21-3.

Ataque de jacaré a pescador no Pantanal de Mato Grosso (Brasil): relato de caso22

Figura 1. Caiman yacare, o jacaré-do-Pantanal. Ataques por estes animais são raros e o réptil prefere evitar a presença dos humanos.

Fotografia: Vidal Haddad Junior.

Figura 2. Vista do dorso da mão da vítima, evidenciando o edema, o eritema e as pérfuro-lacerações causadas pelos dentes do jacaré.

Fotografia: Manoel Francisco de Campos Neto.

Figura 3. Vista da região palmar com as mesmas lesões.Fotografia: Manoel Francisco de Campos Neto.

Figura 4. Exame radiológico simples da mão da vítima, revelando fratura-arrancamento de pequeno fragmento ósseo da cabeça do segundo metacarpiano direito.

Fotografia: Manoel Francisco de Campos Neto.

precoce reabilitação funcional da mão lesada, até a alta médica ortopédica definitiva, o que aconteceu 45 dias após.

DISCUSSÃOOs ferimentos causados por jacarés e crocodilos

assemelham-se aos causados por tubarões, apresentando grandes lacerações, sangramento copioso e infecções secundárias graves, devido à dentição e à potência das mandíbulas desses répteis. Embora algumas espécies amazônicas possam matar as vítimas por apreensão e afogamento,4 o jacaré-do-Pantanal não causa mortes, mas é fundamental que se perceba que mesmo espécimes de tamanho pequeno podem causar lesões traumáticas graves e infecção secundária importante, como

observado neste relato, em que o animal provavelmente estava interessado nos peixes capturados, mordendo por reflexo ou defesa.

Os ferimentos apresentaram infecção secundária e foram me-dicados com associação de antibióticos. Silva e cols. demonstra-ram que as bactérias mais comuns na flora bucal de jacarés-de-pa-po-amarelo são Staphylococcus sp, Corynebacterium sp, Escherichia coli e Shigella sp, mas também foram encontradas Citrobacter sp, Klebsiella pneumoniae e Salmonella sp.5,6 Existe risco de infecções por bactérias ainda mais agressivas, como por Aeromonas hydro-phila.4 As orientações para lesões desse tipo incluem lavagem intensa dos ferimentos, debridamento cirúrgico, contenção de hemorragias, tratamento de possíveis fraturas e antibioticoterapia preventiva de amplo espectro.1,4

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):21-3.

Manoel Francisco de Campos Neto | Hamílton Ometto Stolf | Vidal Haddad Junior 23

CONCLUSÕESDevido ao potencial traumático e capacidade de inoculação

de micro-organismos, as mordidas de jacarés devem ser encara-das pelas equipes de saúde como ferimentos de alto risco.

REFERÊNCIAS1. Haddad V Jr. Animais aquáticos potencialmente perigosos do Brasil: guia

médico e biológico. São Paulo: Roca; 2008.2. Portal Amazônia.com. Ataques de jacarés preocupam pescadores do

Amazonas. Disponível em: http://portalamazonia.globo.com/new-structure/view/scripts/noticias/noticia.php?id=66439. Acessado em 2012 (22 nov).

3. Brasil K, Magalhães JC. No AM, cheias favorecem ataques de jacarés. Folha de S.Paulo. Cotidiano de 12 de maio de 2009. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff120.520.0902.htm. Acessado em 2012 (22 nov).

4. Haddad V Jr, Fonseca WC. A fatal attack on a child by a black caiman (Melanosuchus niger). Wilderness Environ Med. 2011;22(1):62-4.

5. Flandry F, Lisecki EJ, Domingue GJ, et al. Initial antibiotic therapy for alligator bites: characterization of the oral flora of Alligator mississippiensis. South Med J. 1989;82(2):262-6.

6. Silva JSA, Mota RA, Pinheiro Junior JW, et al. Microflora bacteriana aeróbica da cavidade oral e cloaca de jacaré-de-papo-amarelo (Caiman latirostris) procedentes do Zoológico de João Pessoa, PB, Brasil [Aerobic bacterial microflora of Broad-snouted caiman (Caiman latirostris) oral cavity and cloaca, originating from Parque Zoológico Arruda Câmara, Paraíba, Brazil]. Braz J Microbiol. 2009;40(1):194-8.

AGRADECIMENTOSOs autores agradecem à médica Juliana Polizel Ocanha pelo

auxílio na busca sistematizada.

EDITORES RESPONSÁVEIS POR ESTA SEÇÃOHamilton Ometto Stof. Professor doutor, Faculdade de Medicina de Botuca-

tu, Universidade Estadual Paulista.

Ricardo Romiti. Professor assistente do Hospital das Clínicas da Faculdade de

Medicina da Universidade de São Paulo.

INFORMAÇÕESVidal Haddad Junior

Caixa Postal 557

Botucatu (SP)

CEP 18618-000

Tel. (14) 3882-4022

E-mail: [email protected]

Fonte de fomento: nenhuma declarada

Conflito de interesse: nenhum declarado

Data de entrada: 14 de novembro de 2012

Data da última modificação: 6 de dezembro de 2012

Data de aceitação: 7 de dezembro de 2012

PALAVRAS-CHAVE: Jacarés e crocodilos.Ferimentos e lesões.Animais selvagens.Infecções bacterianas.Emergências.

RESUMOContexto: O manuscrito descreve o ataque não provocado de um jacaré-do-Pantanal a um pescador. Ataques por jacarés são pouco relatados e a espécie do Pantanal raramente causa acidentes.Descrição do caso: A vítima foi mordida na mão direita quando limpava peixes nas margens do rio Paraguai, por um jacaré de cerca de 1,5 m que saiu debaixo da vegetação aquática. O paciente apresentou dor, secreção purulenta e febre e procurou auxílio médico, apresentando ferimentos perfurocontusos e perfurocortantes e fratura-arrancamento no segundo metacarpiano direito. Após cinco dias de internação, houve significativa regressão do processo inflamatório, quando obteve alta hospitalar para posterior acompanhamento ambulatorial.Discussão: Os acidentes por jacarés podem ser muito graves, devido à dentição e à potência das mandíbulas desses répteis. Embora algumas espécies amazônicas possam predar seres humanos, o jacaré-do-Pantanal não causa mortes, mas mesmo espécimes de pequeno tamanho podem causar lesões graves e infecção secundária importante, como observado no caso.Conclusões: Devido ao potencial traumático e capacidade de inoculação de micro-organismos, as mordidas de jacarés devem ser encaradas como ferimentos de alto risco pelas equipes de saúde.

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):24-6.

Nutrologia

PrópolisHernani Pinto de Lemos JúniorI, André Luis Alves de LemosII

Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica e Medicina Baseada em Evidências da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Centro Cochrane do Brasil

INTRODUÇÃOPrópolis é uma substância fabricada pelas abelhas. Elas co-

lhem resinas da natureza que são modificadas pela ação das enzi-mas contidas em sua saliva. As abelhas utilizam a própolis como proteção física e climática para as colmeias. As propriedades físico-químicas da própolis variam de acordo com a região em que ela é produzida. Mais de 300 compostos químicos já foram identificados na própolis de diversas regiões do mundo, numa tentativa de se identificar substâncias com poderes medicinais.1-3

Na Antiguidade, os povos gregos, romanos, chineses, egíp-cios e outros já apregoavam o uso da própolis para a cura de infecções. Na atualidade, pelo dito popular, seu uso é maior nas infecções das vias aéreas superiores.

MÉTODOSEm uma busca sistematizada na literatura nas bases Cochrane

Library, Medline, Lilacs e PubMed, procuramos artigos cientí-ficos sobre a própolis e encontramos uma variedade deles com diferentes indicações.

RESULTADOSUm estudo polonês avaliou a própolis em infecções gripais

comuns em 50 pessoas durante o ano de 1987. No grupo ex-perimental, a regressão dos sintomas ocorreu no primeiro dia de tratamento. A recuperação completa deste grupo deu-se em 1 dia (5 pacientes), em 2 dias (16 pacientes) e em 3 dias (3 pa-cientes). O grupo placebo teve sua plena recuperação em média 4,8 dias. No grupo própolis, os sintomas duraram 2,5 menos tempo do que no grupo controle.4

Um estudo experimental com própolis, em ágar nutriente mostrou inibição completa do crescimento de Staphylococcus aureus e epidermidis, Enterococcus spp., Corybacterium spp., Branhamella catarrhalis e Bacilus cereus. A própolis inibiu parcialmente o crescimento de Pseudomonas aeruginosa e Escherichia coli, mas não teve efeito na Klebsiella pneumoniae. Assim, verificou-se que tem efeito inibitório preferencial sobre cocos Gram-positivos.5

Um estudo feito na Universidade Estadual de Maringá pro-curou determinar a atividade in vitro de extrato de própolis contra 67 leveduras isoladas de onicomicose. As leveduras tes-tadas foram: Candida parapsilosis 35%, C. tropicalis 23%, C. albicans 13% e outras espécies de 29%. A própolis apresentou excelente atividade antifúngica: a concentração capaz de inibir a todas as leveduras foi de 5 x 10 (-2) mg/ml de flavonoides e 2 x 10 (-2) mg/ml de flavonoides, estimulando a morte celular.6

Um estudo experimental foi feito na China para testar o efeito apoptótico em células de melanoma humano de seis substâncias extraídas da própolis, chamadas propolinas A, B, C, D, E e F. O tratamento de células de melanoma humano com esses extratos de própolis durante 24 horas induziu alterações morfológicas celulares, tais como condensação da cromatina do núcleo e encolhimento celular. Presumiu-se que as alterações morfológicas celulares são provocadas por apoptose celular.7

Noventa homens e mulheres com infecções recorrentes de herpes genital tipo II participaram de um estudo randomizado, duplo-cego, multicêntrico para comparar a eficácia da poma-da de própolis contendo naturais flavonoides com pomadas de aciclovir e placebo. Trinta indivíduos foram randomizados para cada grupo. O tratamento foi iniciado na fase de bolha. Os participantes foram examinados nos dias 3, 7 e 10 de trata-mento por médicos de 7 diferentes centros. Em cada exame, as lesões foram classificadas em quatro etapas: vesiculares, ulcera-das, com crosta e curadas. No 10o dia, 24 dos 30 indivíduos do grupo de própolis tinham se curado; no grupo de aciclovir, 14 de 30 pacientes e no grupo de placebo, 12 de 30 foram conside-rados curados (P = 0,0015). O processo de cicatrização foi mais rápido no grupo da própolis.8

Um estudo clínico com extrato de própolis versus tinidazol foi feito com o objetivo de mostrar sua efetividade contra giar-díase em 48 crianças e 90 adultos, em dois grupos selecionados aleatoriamente. A própolis foi usada com concentração menor em crianças (10%) e os resultados mostraram cura de 52%. Em 40 adultos (concentração a 20%), foi obtido resultado seme-lhante ao do tinidazol, e quando a concentração foi elevada a

IMédico, mestre e doutor em Medicina Interna e Terapêutica e Medicina Baseada em Evidências da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina (Unifesp). Médico pesquisador do Centro de Pesquisas em Revisões Sistemáticas do Centro Cochrane do Brasil e médico assistente da Universidade Federal de São Paulo. E-mail: [email protected]édico, mestre e doutorando em Medicina Interna e Terapêutica e Medicina Baseada em Evidências da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de Medicina (Unifesp). Pesquisador colaborador do Centro Cochrane do Brasil. E-mail: [email protected]

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):24-6.

Hernani Pinto de Lemos Júnior | André Luis Alves de Lemos 25

30% nos restantes 50 pacientes, houve maior efetividade (60% de cura versus 40% com tinidazol).9

Um estudo duplo-cego investigou a eficácia de solução con-tendo própolis para bochecho na inibição da formação de placa dentária, comparando com clorexidina e placebo. O clorexidi-na foi significativamente melhor do que os outros na inibição da placa, enquanto a própolis foi marginalmente melhor do que o placebo, mas essa diferença não foi significativa.10

Foi realizado um estudo para analisar os efeitos de própo-lis na boca na reparação de feridas cirúrgicas após sulcoplastia pela técnica Kazanjian modificada. Vinte e sete pacientes que foram submetidos à sulcoplastia foram divididos em três gru-pos: pacientes que não usam o bochecho, pacientes que usaram bochecho contendo 5% de álcool e pacientes que usaram bo-checho contendo própolis em solução aquosa de 5% de álcool. Os pacientes retornaram 7, 14, 30 e 45 dias após a cirurgia para avaliação citológica e clínica. Foi concluído que a solução para bochecho contendo própolis repara feridas cirúrgicas in-trabucais e exerce efeito analgésico e anti-inflamatório peque-no; e que o veículo utilizado tem menor efeito irritante sobre as feridas cirúrgicas intrabucais.11

Um estudo de caso-controle feito em pré-escolares e esco-lares testou o efeito da própolis na inflamação aguda e crôni-ca das vias aéreas superiores, durante toda a temporada fria de 1994-1995. O monitoramento dos subgrupos investigados foi realizado por observação clínica do estado de saúde e dos sin-tomas característicos de doenças rinofaríngea aguda ou crônica, bem como por exame laboratorial periódico para a detecção e caracterização viral, bacteriana ou fúngica, e do transporte de germes. A análise dos dados obtidos mostrou efeitos favoráveis desse tratamento local, com redução dos sintomas agudos ou crônicos e diminuição ou supressão da flora viral-microbiana das vias aéreas superiores.12

Um estudo prospectivo foi realizado em cervicite aguda e com esfregaço vaginal positivo para algum tipo de infecção. As pacientes foram randomizadas, o grupo experimental recebeu topicamente própolis a 5% e o grupo controle solução de lugol por 10 dias consecutivos. Verificou-se que todos os pacientes do grupo experimental não apresentaram quaisquer sintomas após o tratamento, 100% dos esfregaços vaginais foram negativos e 90% das pacientes atingiram epitelização total do colo do útero em 10 dias de tratamento.13

DISCUSSÃOOs estudos experimentais apresentados são altamente auspi-

ciosos para o futuro. Como imaginar que extratos de substâncias retiradas da natureza poderiam ter ação em doenças infecciosas que já devastaram populações? Como imaginar que um câncer extremamente agressivo como o melanoma possa sucumbir à própolis? Qual ou quais dentre as 300 substâncias que com-põem a própolis têm esta ação miraculosa? Existe a necessidade

de maiores investimentos dos governos e particulares em pes-quisadores e em centros de pesquisas bem aparelhados.

Os estudos não experimentais, feitos em humanos, preci-sam ter continuidade e, dentro do possível, ter alta qualida-de metodológica. Sabe-se que o estudo ideal para verificar a efetividade e segurança de uma intervenção é o ensaio clíni-co randomizado, se possível duplo-cego. Precisa-se saber se o efeito antibiótico, antiviral e antifúngico perde-se com o uso continuado da própolis. Precisa-se saber se seus bons efeitos são dose-dependentes e se a médio e longo prazos efeitos colaterais podem aparecer. Todas essas questões e muitas outras têm que ser respondidas para que se possa usufruir regularmente dos be-nefícios da própolis.

CONCLUSÕESPelos estudos apresentados, os efeitos anti-infecciosos tópi-

cos da própolis estão bem demonstrados nas infecções cutâneas, genitais e vias aéreas superiores em estudos isolados. Há neces-sidade de mais estudos com boa qualidade metodológica para ratificar as demais indicações.

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Page 29: Rdt v18n1

Diagn Tratamento. 2013;18(1):27-8.

POEMs: Patients oriented evidence that matters

Consumo de nozes e amendoim durante a gestação pode diminuir risco de doenças

alérgicas em crianças Autores da tradução:

Pablo Gonzáles BlascoI, Marcelo Rozenfeld LevitesII, Cauê MonacoIII

Sociedade Brasileira de Medicina de Família

QUESTÃO CLÍNICA As mulheres grávidas devem evitar consumir amendoim ou

nozes durante a gestação, a fim de reduzir o risco de doenças alérgicas em seus filhos?

RESUMO Esse estudo1 não encontrou associação significativa entre o

consumo de amendoim e nozes na gravidez e aumento no risco de asma nas crianças. Na verdade, a ingestão materna de amen-doim e de nozes, pelo menos uma vez por semana durante a gravidez, foi associada a risco significativamente reduzido de asma em seus filhos.

DESENHO DO ESTUDOEstudo de coorte (prospectivo). Nível de evidência: 2b.2

CASUÍSTICA Gestantes e seus filhos (acompanhados até os sete anos de idade).

DISCUSSÃOEvitar o consumo de nozes e de amendoim durante a gravi-

dez para reduzir o risco de doenças alérgicas em crianças ainda é questão controversa. Os autores dessa pesquisa relacionaram dados da Coorte Nacional Dinamarquesa de Nascimentos (um estudo de coorte prospectivo sobre dados pré-natais em gestantes e doenças em seus filhos) a registros médicos e far-macêuticos nacionais da Dinamarca. De um total de 101.045 gestantes recrutadas entre janeiro de 1996 e outubro de 2002, foram obtidos os dados completos de 61.902 delas. As partici-pantes forneceram informações sobre o consumo de amendoim e nozes durante a gestação com o uso de questionário validado

de frequência alimentar. As categorias de consumo incluíram: nenhuma vez, uma vez por mês, uma a três vezes por mês, e uma ou mais vezes por semana. As mães foram questionadas so-bre a ocorrência de asma infantil diagnosticada por um médico, sintomas de sibilância e número desses episódios desde o nas-cimento em entrevista 18 meses após o parto, e novamente aos 7 anos de idade da criança. Além disso, os autores recuperaram informações sobre consultas ambulatoriais, visitas a hospitais e a serviços de emergência relacionados à asma, bem como infor-mações em âmbito individual sobre prescrições relacionadas ao tratamento da asma. Foram realizadas múltiplas análises estatís-ticas para o controle de variáveis de confusão, incluindo status socioeconômico, idade materna no parto, tabagismo materno durante a gravidez, duração da amamentação, idade gestacio-nal, sexo da criança e história familiar de doença alérgica. Um total de 61% das mulheres relatou não consumir esses alimen-tos durante a gravidez, enquanto 3% consumiram amendoim e 9% consumiram nozes uma ou mais vezes por semana.

A ingestão materna de amendoim e nozes foi, de maneira significativa, inversamente associada com o diagnóstico de asma em crianças aos 18 meses de idade (odds ratio [OR] = 0,79, intervalo de confiança, IC, 95%: 0,67-0,97). Na avaliação de acompanhamento, as crianças cujas mães consumiram amen-doins ou nozes pelo menos uma vez por semana eram significa-tivamente menos propensas a ter asma (OR = 0,66, 0,44-0,98) do que as crianças cujas mães que não ingeriram esses alimentos durante a gestação. Também não houve associação significativa entre esse consumo e diagnósticos de rinite alérgica.

COMENTÁRIOEsse estudo de coorte baseou-se na hipótese de que essas ole-

aginosas seriam um fator de risco para desfechos gestacionais

IMédico de família, doutor em Medicina, diretor científico e membro-fundador da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).IIMédico de família e diretor da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).IIIMédico de família, professor do curso de Medicina do Centro Universitário São Camilo, membro ativo da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):27-8.

Consumo de nozes e amendoim durante a gestação pode diminuir risco de doenças alérgicas em crianças 28

indesejáveis, mas acabou constatando o contrário. Para avaliar esse efeito “protetor” com menor chance de incerteza, no en-tanto, será necessário um ensaio clínico randomizado com qua-lidade metodológica e poder amostral suficiente.

REFERÊNCIAS1. Maslova E, Granström C, Hansen S, et al. Peanut and tree nut consumption

during pregnancy and allergic disease in children-should mothers decrease their intake? Longitudinal evidence from the Danish National Birth Cohort. J Allergy Clin Immunol. 2012;130(3):724-32.

2. Centre for Evidence Based Medicine. Oxford Centre for Evidence-based Medicine - Levels of Evidence (March 2009). Disponível em: http://www.cebm.net/index.aspx?o=1025. Acessado em 2012 (3 dez).

EDITORES RESPONSÁVEIS POR ESTA SEÇÃOPablo Gonzáles Blasco. Médico de família, doutor em Medicina, diretor científico e membro-fundador da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).Marcelo Rozenfeld Levites. Médico de família e diretor da Sociedade Brasi-leira de Medicina de Família (Sobramfa).Cauê Mônaco. Médico de família, membro ativo da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).

INFORMAÇÕESTradução e adaptação:Sobramfa (Sociedade Brasileira de Medicina de Família)Rua Silvia, 56 Bela Vista — São Paulo (SP) CEP 01331-000Tel. (11) 3253-7251/3285-3126E-mail: [email protected]://www.sobramfa.com.br

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Responsável pela edição desta seção: Sobramfa

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):29-30.

POEMs: Patients oriented evidence that matters

Suplementação de ácidos graxos ômega-3 não reduz eventos cardiovasculares nem mortalidade

Autores da tradução:

Pablo Gonzáles BlascoI, Marcelo Rozenfeld LevitesII, Cauê MonacoIII

Sociedade Brasileira de Medicina de Família

QUESTÃO CLÍNICA A suplementação dietética com ácidos graxos ômega-3

reduz o risco de doença cardiovascular grave e mortalidade prematura?

RESUMO Essa revisão sistemática1 não encontrou nenhuma evidência

que apoie recomendação clínica para a suplementação alimen-tar com ácidos graxos ômega-3 para redução do risco de doença cardiovascular ou de morte.

DESENHO DO ESTUDORevisão sistemática com metanálise (ensaios clínicos

randomizados).Nível de evidência: 1a.2

CASUÍSTICA Adultos portadores ou não de doença cardiovascular

conhecida.

DISCUSSÃOOs investigadores pesquisaram de maneira minuciosa o

Medline, o Embase, o registro Cochrane e as referências re-levantes de citações pertinentes em busca de ensaios clínicos randomizados que avaliaram a suplementação de ácidos graxos ômega-3 em adultos portadores ou não de doença cardiovas-cular conhecida. Não houve restrições especificadas de idio-ma. Dois pesquisadores avaliaram de maneira independente os estudos individuais quanto à elegibilidade e qualidade me-todológica usando o padrão de critérios validados pela colabo-ração Cochrane para avaliar o risco de viés. As discrepâncias foram resolvidas por consenso após discussão com um terceiro

revisor. Um total de 20 estudos (n = 68.680) preencheu os cri-térios de inclusão, com duração média do tratamento de dois anos. Eles reportaram 7.044 mortes, 3.993 mortes por causa cardíaca, 1.150 mortes súbitas, 1.837 infartos do miocárdio e 1.490 acidentes vasculares encefálicos. A maioria dos estudos era de alta qualidade metodológica, com baixo risco de viés. Nenhuma associação estatisticamente significativa ocorreu com a suplementação de ácidos graxos ômega-3 em compara-ção com o controle para redução de mortalidade por qualquer causa (risco relativo, RR = 0.96, intervalo de confiança, IC, de 95%: 0.91-1.02), morte cardíaca, morte súbita, infarto do miocárdio ou acidente vascular cerebral. Análises formais não encontraram nenhuma evidência de heterogeneidade significa-tiva ou viés de publicação.

COMENTÁRIOA duração média dos ensaios avaliados nessa revisão foi de

apenas dois anos, mas ela corrobora os resultados de uma revi-são Cochrane de 2009,3 que analisou ensaios de até seis anos de duração e também não encontrou evidência de benefícios para mortalidade ou eventos cardiovasculares.

REFERÊNCIAS1. Rizos EC, Ntzani EE, Bika E, Kostapanos MS, Elisaf MS. Association between

omega-3 fatty acid supplementation and risk of major cardiovascular disease events: a systematic review and meta-analysis. JAMA. 2012;308(10):1024-33.

2. Centre for Evidence Based Medicine. Oxford Centre for Evidence-based Medicine - Levels of Evidence (March 2009). Disponível em: http://www.cebm.net/index.aspx?o=1025. Acessado em 2012 (3 dez).

3. Hooper L, Harrison RA, Summerbell CD, et al. Omega 3 fatty acids for prevention and treatment of cardiovascular disease. The Cochrane Library. 2009;1. Disponível em: http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/14651858.CD003177.pub2/abstract. Acessado em 2012 (3 dez).

IMédico de família, doutor em Medicina, diretor científico e membro-fundador da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).IIMédico de família e diretor da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).IIIMédico de família, professor do curso de Medicina do Centro Universitário São Camilo, membro ativo da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):29-30.

Suplementação de ácidos graxos ômega-3 não reduz eventos cardiovasculares nem mortalidade30

EDITORES RESPONSÁVEIS POR ESTA SEÇÃOPablo Gonzáles Blasco. Médico de família, doutor em Medicina, diretor científico e membro-fundador da Sociedade Brasileira de Medicina de Fa-mília (Sobramfa).Marcelo Rozenfeld Levites. Médico de família e diretor da Sociedade Brasi-leira de Medicina de Família (Sobramfa).Cauê Mônaco. Médico de família, membro ativo da Sociedade Brasileira de Medicina de Família (Sobramfa).

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):31-3.

Linguagens

AdjetivosAlfredo José MansurI

Unidade Clínica de Ambulatório do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

O progresso recente do conhecimento médico e científico tem trazido contribuições relevantes à medicina, entre elas a compreensão aprofundada da fisiologia, da patologia e da ex-pressão clínica de doenças e técnicas diagnósticas e terapêu-ticas novas ou aperfeiçoadas. O conhecimento científico, um dos fundamentos mais importantes da Medicina, tem entre as suas características o fato de ser aberto ao teste de hipóteses, à experimentação e ter a possibilidade de ser transitório. Tais características conferem especial dinamismo ao progresso. Este, por sua vez, tem exigências para vir a ser; é modulado por com-petências, fatores que o fundamentam, amparam, estimulam, desenvolvem, produzem, ofertam, disponibilizam ou vendem.

As características desse processo trazem qualificações, noções de extensão e de quantidade, conexões, subordinações, que re-percutem nos valores e no sistema lógico de pensamento no qual esse conhecimento transita. Consequentemente, elas re-percutem na linguagem e podem chegar aos adjetivos que ocu-pam lugar ao lado do substantivo Medicina.

Dicionário de etimologia ensina que o termo adjetivo1 (adjectivum, a, um) deriva do verbo adjicio, -is,-eci, -ectum, -icere, que pode significar atirar, lançar, por ao lado (ad “ao lado de”, jacere “lançar, deitar, jogar, atirar, arrojar contra ou sobre, enviar, despedir, estabelecer, por, colocar”. Em outro di-cionário,2 encontra-se adjicio (adicio), -is, ere, jeci, jectum, em sentido próprio, lançar alguma coisa ao lado de, atirar, jogar perto; e por enfraquecimento do sentido, ajuntar, acrescentar, unir, aumentar, e em sentido figurado, dirigir ou voltar os olhos ou o pensamento para alguém, lançar em leilão. Professores Henrique e France Murachco, casal de filólogos, ainda ensi-nam que os adjetivos não têm existência própria [comunicação pessoal] (como leigos na matéria, podemos ficar mais sensíveis àquilo que aos profissionais do ramo pode soar óbvio). Além disso, para pacientes, palavras podem não ser apenas palavras.3

O significado e as acepções dos adjetivos podem ser am-plos a ponto de estimular reflexões sobre o tema, não so-mente aos gramáticos, mas também aos práticos, no caso médicos com atividade clínica ou profissionais que atuam na área da saúde. Embora não seja o foco específico da literatura

médico-científica, o assunto vez por outra vem à tona.4,5 Há os que se alegram com o fato de poderem usar o substantivo como adjetivo e até termos compostos com hífens em alguns contex-tos.4 Seguem algumas reflexões.

Expectativas – é possível que, frente a algumas circunstân-cias, os adjetivos desenvolvidos e apostos ao substantivo medi-cina venham impregnados de expectativa, de tal modo a sugerir implícita noção que soluções urgentemente necessárias já este-jam acessíveis ou possam estar disponíveis no curto prazo, sem tomar em firme consideração o fato de que, entre a necessidade, a hipótese dos trabalhos de investigação, seus resultados e a sua disponibilização, pode haver um longo hiato de investimento, tempo, trabalho, pesquisa e discussão.

Um exemplo interessante foi enfatizado recentemente na expressão medicina de precisão. Especialistas relataram o caso bem encaminhado de uma paciente de 35 anos de idade por-tadora de uma forma de câncer pulmonar, a qual teve o trata-mento orientado por um painel de variantes genéticas; adver-tiram em seguida para a necessidade de expectativas realistas, e lembraram que o progresso não é automático e nem de um dia para outro.6 Enquanto isso, as necessidades dos pacientes continuam a surgir e os médicos continuarão a atendê-las com os recursos disponíveis.

Modernidade – quando lemos ou ouvimos falar sobre medici-na personalizada, pode-se ter a impressão de que esse conceito seja aquisição recentíssima da medicina. De fato, atualmente, graças a pesquisas mais recentes, o caráter “personalizado” do cuidado médico pode estar fundamentado com o auxílio de bases mais recentes ou até mais sólidas (por exemplo, com base genética),6,7 ainda que não disponível em sentido amplo para a população.

Entretanto, insiste em desvelar-se o fato de que médicos na prática clínica fazem isso há muito: adequar o conhecimento médico-científico disponível à necessidade de cada paciente, personalizando-o de acordo com os dados disponíveis. Duas etapas fundamentais da prática médica – o diagnóstico e o tratamento – cotidianamente reiteram isso. A manifestação de cada afecção passa pela individualidade do paciente, inclusive quanto aos sintomas. Do mesmo modo, a terapêutica ainda

ILivre-docente em Cardiologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Diretor da Unidade Clínica de Ambulatório do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):31-3.

Adjetivos32

toma em consideração, além das preferências pessoais dos pa-cientes, os recursos disponíveis e a tolerância individual a cada um aos tratamentos escolhidos, que frequentemente podem necessitar ajustes. Para tanto têm sido empregados a ciência, mas também a arte. Esta, por sua vez, sendo aberta e não delimitada, garante o empirismo do qual surgem novas neces-sidades, perguntas, hipóteses e investigação. Talvez, nesse caso particular, houvesse necessidade de não se restringir ao adjeti-vo personalizada, mas ampliar a expressão “personalizada com o auxílio do método a, b, ou c”; esses métodos, sim, podem ser recentes, mas o substantivo medicina tem a permanência que dá sentido às qualificações.

Delimitação – a medicina dita especializada foi entendida durante muito tempo como buscando conhecimento apro-fundado sobre determinada área da prática médica. O dicio-nário1 relaciona mais de 20 adjetivos para a medicina, desde a letra “a” – “aiurvédica” até a letra “t” – “tropical”. Mesmo as atuações de caráter mais geral adquiriram a postura de es-pecialidades (por exemplo, medicina interna). O progresso do conhecimento, a quantidade de informação disponível e o trabalho de selecioná-las, o tempo de formação e a natureza dos novos métodos de diagnóstico e de tratamento contribuí-ram para construir e firmar essa necessidade. O conhecimento aprofundado conceitualmente se opõe à ideia da restrição e limitação ao conhecimento, em que pese a limitação científica de delimitar assuntos para explorá-los empírica ou cientifica-mente. Fica implícita a natureza da relação entre o conheci-mento fundamental, o método e o conhecimento de ponta numa era de aparente excesso de informação.

Entretanto, é conveniente a reflexão sobre o risco de a me-dicina às vezes dita superespecializada (e, do mesmo modo, excessivamente adjetivada) se tornar medicina “de interesse es-pecífico” (novo adjetivo?), situação na qual delimitaria o seu campo de visão da prática de tal modo a turvar a integridade do paciente e passar a ver-se a si mesma como setor do conhe-cimento e não voltada ao paciente. A menção já foi feita em uma entrevista por um ministro da Saúde – a atuação médica como atuação tecnóloga – na qual se avalia tal possibilidade, em detrimento da visão médica (na qual se passa pela discussão diagnóstica e da indicação terapêutica).8

Curiosamente, a necessidade de não se restringir à visão específica e perder a visão geral já foi enunciada há anos em outros países dentro de uma própria especialidade – haveria a necessidade do especialista “invasivo” (?!?), do “não invasivo”, e do especialista “geral”, e ganhamos mais um adjetivo, que, ao contrário de muitos, não restringe mas amplia, e cujo empre-go pode soar paradoxal.9 Tem sido também nossa experiência a demanda por esse tipo de qualificação, há mais de 10 anos, em médicos que se dedicam à formação em cardiologia. De algum modo, há certa preocupação com a delimitação que pode ser lembrada nos adjetivos.

Hífen – a adjetivação da medicina também requer que pro-gressivamente tenhamos hifens em uso, como conquista da mo-dernidade – pode ser necessário que tenhamos a medicina psico--neuro-endócrino-cardiológica. Surgiram, na prática cotidiana, termos como medicina neuro-psico-geriátrica, entre outros.

Também é fato que o adjetivo da especialidade ao mesmo tempo em que qualifica, e delimita, restringe. Quando isso acontece, recorre-se ao uso de hifens, fazendo-se composições dos adjetivos, de tal modo que, para contemplar todo o orga-nismo humano, teríamos que compor uma palavra composta de inumeráveis adjetivos.

Importação – alguns adjetivos da medicina podem ser rapidamente importados. Evidentemente, uma qualificação expressa em um adjetivo representa o resultado de um pro-cesso de conhecimento e de tecnologia. Ao se usar o adjeti-vo, pode-se trazer o entendimento de que a importação do adjetivo e do falar sobre ele signifique o domínio do pro-cesso, naquelas mágicas que as palavras têm ou podem ter, particularmente quando expressas em posições de poder, seja ele econômico, político ou acadêmico. Os adjetivos podem ser importados sem ônus; máquinas ou equipamentos têm custos altos, manutenção, depreciação e é mais difícil de se-rem importados. Parece que competências e processos são mais resistentes à importação do que os adjetivos.

Implicação organizacional – é interessante se indagar a res-peito das implicações organizacionais dos adjetivos da medi-cina. As estruturações organizacionais (organogramas) podem seguir diferentes orientações – da necessidade do sistema de saúde (às vezes chamada de política), da demanda de pacientes, dos objetivos e interesses de cada serviço em particular, da etapa diagnóstica, da etapa terapêutica e do tratamento crônico de pacientes. Imagine-se, de repente, organogramas passarem a ser ditados pelos adjetivos da medicina.

Relação – existem adjetivos de relação.1 Portanto, pode-se per-guntar a natureza da relação de certos adjetivos com a medicina.

Qualificação – às vezes os adjetivos que qualificam a medi-cina dizem respeito ao método empregado. Assim, podemos falar em medicina molecular, em medicina nanotecnológica etc. Ocasionalmente, o adjetivo pode dizer respeito à etapa do processo, como por exemplo, medicina diagnóstica. Às vezes, a medicina pode dizer respeito à complexidade do cuidado e da tecnologia disponibilizada – assim, fala-se em primária, se-cundária, terciária e até quaternária. Portanto, dependendo da circunstância, o adjetivo irá variar.

Finalizando estas reflexões, transite-se, ainda que momen-taneamente, pela pergunta de inquiridores mais ousados, que chegaram a indagar se o termo medicina deixou de ser subs-tantivo e exige-se sempre adjetivado. Ensina o dicionário que há adjetivos que podem ser substantivados.1 Concluindo, não devemos deixar de lembrar que a experiência de outros colegas pode enriquecer as reflexões acima.

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):31-3.

Alfredo José Mansur 33

REFERÊNCIAS1. Houaiss A, Villar MS. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de

Janeiro: Objetiva; 2001.2. Faria O. Dicionário escolar latino-português. 5a ed. Rio de Janeiro: MEC/

Fename; 1975.3. Colaianni A. The language of medicine. Ann Intern Med. 2012;157(2):146-7.4. Baer DM. Adjectives, nouns, and hyphens. Science. 1983;222(4622):368.5. Reider J, Korytkowski MT. The adjectives of inpatient glycemic management.

Curr Diab Rep. 2012;12(1):1-3.6. Mirnezami R, Nicholson J, Darzi A. Preparing for precision medicine. N Engl

J Med. 2012;366(6):489-91.7. Collins FS. A linguagem da vida: O DNA e a revolução na sua saúde. São

Paulo: Editora Gente; 2010. 8. Racy S, Venceslau P. ‘Sexo? Eu tento cumprir à risca’. Temporão assume a

polêmica e analisa a saúde do País. O Estado de São Paulo, 10 de maio de 2010. p. D2. Disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,sexo-eu-tento-cumprir-a-risca,549381,0.htm. Acessado em 2012 (3 dez).

9. Hurst JW. Will the nation need more cardiologists in the future than are being trained now? J Am Coll Cardiol. 2003;41(10):1838-40.

INFORMAÇÕESEndereço para correspondência:Unidade Clínica de Ambulatório do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São PauloAv. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44São Paulo (SP)CEP 05403-000Tel. InCor (11) 2661-5237Consultório: (11) 3289-7020/3289-6889E-mail: [email protected]

Fonte de fomento: nenhuma declaradaConflito de interesse: nenhum declarado

Data de entrada: 1o de novembro de 2012Data da última modificação: 30 de novembro de 2012Data de aceitação: 3 de dezembro de 2012

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):34-5.

Residência e ensino médico

A política, a universidade e a política universitáriaOlavo Pires de CamargoI, Luiz Eugênio Garcez LemeII

Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP)

A política é com certeza atividade nobre, em que pesem as percepções negativas de todos nós quando mencionamos ou lembramo-nos dos políticos. Segundo Aurélio Buarque de Holanda, é a ciência dos fenômenos referentes ao Estado, um sistema de regras relativas à direção dos negócios públicos, sen-do, portanto, indispensável em qualquer atividade comunitá-ria, seja um país, seja uma universidade.

A política tem, ainda, peculiaridades que se adaptam às características das comunidades às que se destinam. Assim, a política do governo de um país ou estado tem característi-cas diferentes daquela que se refere a uma comunidade de ensino-aprendizado-pesquisa-serviço que caracteriza a moder-na universidade. O grande perigo, quando se consideram ações políticas em si boas para suas realidades, é a tentativa singela de se exportar/importar soluções exóticas para situações distintas às realidades originais.

A utilização acrítica de soluções acadêmicas para a realidade cotidiana pode levar a um academicismo inoperante com solu-ções teóricas ou inócuas para muitos problemas sociais; por ou-tro lado, a tentativa de se propor ou impor soluções de política de governo às universidades pode levar ao risco de se enviesar a busca da verdade em benefício de sistemas de governo ou de ideologias, como infelizmente pôde ser observado em momen-tos marcantes do século XX.

Uma das mais caras conquistas da universidade desde suas origens ocidentais no século XXI é a autonomia universitária. A busca da verdade que caracterizou e caracteriza o mais im-portante objetivo desta instituição depende da liberdade de busca e de ensino nas diversas áreas do conhecimento, sejam elas de aplicação imediata ou de aquisição teórica. Dessa ma-neira, objetivos que são válidos e mesmo desejáveis em uma política de governo, como a ampliação do acesso da população aos benefícios materiais e culturais disponíveis, devem ser vistos com prudência quando se referem a políticas de administração universitária, em que o valor mais importante é a meritocracia.

Por outro lado, em um país com a extensão e a heterogenei-dade do Brasil, a tentativa de se propor políticas universitárias universais em atos simples, “canetadas”, sem discussão ampla por toda a comunidade universitária e todo o mundo da cultu-ra, tem inquestionável tendência à inadequação imediata e ao fracasso mediato.

Pôde-se obervar, recentemente, que a crescente participação das universidades e dos pesquisadores brasileiros no universo do conhecimento de ponta, com pelo menos duas de nossas universidades atingindo níveis mundiais, tem sido incorpora-da pelo marketing político e de governo, como se a produção científica fosse consequência automática e imediata da melhora econômica ou se pudesse ser estimulada com os mesmos meca-nismos com que se procura controlar a produção industrial ou a inflação. Esse tipo de generalização simplista parece pedir por um cada vez maior aporte de prudência.

Essa prudência seria bem-vinda à crítica de estatísticas uni-versitárias. É o caso da euforia com que foi divulgada, recente-mente, a notícia de que o Brasil era o “campeão” mundial na formação de doutores, generalizando um dado, por sinal secun-dário, da Universidade de São Paulo, que, aliás, não é federal. Será que a pura e simples ampliação na formação de doutores é um fato positivo?

Na edição de 23 de fevereiro de 2012 de “O Estado de São Paulo”, podemos ler o seguinte texto:

“A USP é a universidade que mais forma doutores mundialmente. A cons-tatação é do Ranking Acadêmico de Universidades do Mundo (ARWU, na sigla em inglês), elaborado pelo Centro de Universidades de Classe Mundial (CWCU) e pelo Instituto de Educação Superior da Universidade Jiao Tong, em Xangai, na China, que aponta a universidade paulista como a primeira colocada em número de doutorados defendidos entre 682 instituições glo-bais. Em segundo e terceiro lugares estão a Universidade da Jordânia e a Universidade de Tóquio, respectivamente. Harvard aparece em 12o lugar”.1

Será que a Universidade da Jordânia e nós mesmos estamos certos e a Universidade de Harvard está errada?

IProfessor titular e chefe do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).IIProfessor associado II do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):34-5.

Olavo Pires de Camargo | Luiz Eugênio Garcez Leme 35

Felizmente, outros índices mostram, de fato, uma progres-são significativa das universidades públicas paulistas, particu-larmente a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) nos escores internacionais, graças a muitas décadas de esforço e a investimentos que se somaram por muitas e muitas administrações.

Essa prudência deveria, igualmente, ser aplicada no caso re-cente da preocupante reserva de 50% das vagas em universida-des federais para alunos quotistas de raça negra ou indígenas. Mais preocupante ainda é a informação, ainda não confirmada, de que haveria interesse do governo federal em reservar quo-tas de vagas raciais também nos cursos de pós-graduação. No tocante à reserva de vagas raciais na graduação muito já se fa-lou, desde a impossibilidade da real separação de raças nesse amálgama étnico que é a população brasileira, o que leva as autoridades a considerar de raças diferentes até irmãos gêmeos univitelinos como aconteceu recentemente na Universidade de Brasília (UnB),2 até o estímulo à separação e discriminação ra-cial indireta que esse tipo de “auxílio” desastrado pode propor-cionar. Mais razoável é a atitude de estimular, temporariamente, o acesso às universidades de alunos da escola pública, por meio de algum tipo de benefício nas notas de acesso. No entanto, mesmo esse recurso deveria ser evidenciado como temporário, evitando, assim, a colocação de um curativo no verdadeiro mal que é a queda de qualidade da escola pública, a ser corrigido no mais curto espaço de tempo possível.

Se quanto à reserva de vagas na graduação a polêmica está instalada, a reserva de vagas em pós-graduação é de um absurdo tão grande que nem deveria ser polêmico. A primeira realidade a ser considerada é a de que não há falta de vagas em pós-gra-duação no Brasil, segundo se pode depreender dos relatórios da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Seria, pois, a instituição de um remédio amargo para um problema que não existe.

A segunda e mais importante realidade é a de que, mesmo que houvesse limitação de vagas, a inserção de quotas no acesso à graduação já as deveria ter resolvido, segundo a lógica do pró-prio governo, uma vez que, mesmo de origens e raças diferen-tes, cursaram as mesmas universidades. Não deveria ser difícil perceber que a inserção de outro privilégio nesse ponto seria uma evidente e revoltante injustiça.

Platão e Aristóteles denominavam a prudência como a “au-riga virtutum” (aquela que dirige as virtudes), comparando-a ao “auriga” que sabia dirigir e controlar os cavalos de uma carrua-gem. Esse tipo de prudência seria muito bem-vinda a todos os responsáveis pelos diferentes níveis de decisões políticas.

REFERÊNCIAS1. USP é universidade que mais forma doutores no mundo. Estadão.com.br/

Educação. 23 de fevereiro de 2012. Disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias/vidae,usp-e-universidade-que-mais-forma-doutores-no-mundo,839463,0.htm. Acessado em 2012 (6 nov).

2. Zakabi R, Camargo L. A decisão da banca da Universidade de Brasília que determina quem tem direito ao privilégio da cota mostra o perigo de classificar as pessoas pela cor da pele – coisa que fizeram os nazistas e o apartheid sul-africano. Veja.com. Disponível em: http://veja.abril.com.br/060607/p_082.shtml. Acessado em 2012 (6 nov).

EDITOR RESPONSÁVEL POR ESTA COLUNAOlavo Pires de Camargo. Professor titular e chefe do Departamento de Or-topedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).

INFORMAÇÕESEndereço para correspondência:Olavo Pires de CamargoRua Barata Ribeiro, 490 – 3o andar — conj. 33Bela Vista — São Paulo (SP)CEP 01308-000Tel. (11) 3123-5620E-mail: [email protected]

Fonte de fomento: nenhuma declaradaConflito de interesse: nenhum declarado

Data de entrada: 1o de novembro de 2012Data da última modificação: 1o de novembro de 2012Data de aceitação: 22 de novembro de 2012

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):36-7.

Eletrocardiograma

Eletrocardiograma típico de comunicação interatrial em adultoAntonio Américo FriedmannI, José GrindlerII, Carlos Alberto Rodrigues de OliveiraIII, Alfredo José da FonsecaIII

Serviço de Eletrocardiologia da Clínica Geral do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

Uma jovem mulher de 22 anos de idade, assintomática, foi aprovada em concurso público. No exame médico admissional, constatou-se sopro cardíaco. O eletrocardiograma realizado no mesmo dia estava alterado e a paciente foi encaminhada para um cardiologista. O especialista primeiro examinou o eletro-cardiograma (Figura 1) e verificou sobrecarga do átrio direito e distúrbio de condução do ramo direito. Pensou na possibilida-de de sobrecarga diastólica do ventrículo direito. Em seguida,

examinou a paciente e auscultou sopro sistólico em área pulmo-nar de intensidade ++, em crescendo e decrescendo, sugestivo de sopro de ejeção. A segunda bulha apresentava desdobramen-to constante e fixo, ou seja, invariável com a respiração.

O médico concluiu que tanto o eletrocardiograma como os achados da ausculta eram característicos de co-municação interatrial e pediu ecocardiograma, que con-firmou o diagnóstico.

ILivre-docente, diretor do Serviço de Eletrocardiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).IIMédico supervisor do Serviço de Eletrocardiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).IIIMédico assistente do Serviço de Eletrocardiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).

Figura 1. Sobrecarga do átrio direito (ondas P pontiagudas). Distúrbio de condução do ramo direito (rsR’ em V1).

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DISCUSSÃOEm decorrência dos avanços da cirurgia cardíaca e do ca-

teterismo intervencionista, houve aumento da expectativa de vida para os portadores de cardiopatias congênitas. Assim, sur-giu uma nova população de doentes, os adultos que sobrevive-ram à cirurgia cardíaca corretiva, alguns com lesões residuais, e os pacientes com cardiopatia congênita não operados. Dessa forma, o clínico geral não raro se defronta com eletrocardio-grama de adultos portadores de cardiopatias congênitas. As cardiopatias congênitas mais comuns encontradas em adultos são a comunicação interatrial, a comunicação interventricu-lar, a persistência do canal arterial, a estenose pulmonar, a estenose aórtica, a coartação da aorta e a tetralogia de Fallot.1

Na comunicação interatrial do tipo ostium secundum, mais comum, o principal achado eletrocardiográfico é o registro de complexos QRS de morfologia rsR’ nas precordiais direitas, geralmente de pequena amplitude, associado à sobrecarga do átrio direito. Quando há desvio do QRS para direita, o eletro-cardiograma exibe caracteristicamente padrão de sobrecarga diastólica do ventrículo direito: morfologia de distúrbio do ramo direito (rsR’) em V1 em vez de onda R. Tais modifi-cações decorrem de sobrecarga volumétrica e dilatação das câmaras direitas.2

O eletrocardiograma da paciente mostra sinais evidentes de sobrecarga do átrio direito nas derivações precordiais direitas. Quando há sobrecarga de uma câmara, aumenta a probabi-lidade de sobrecarga da câmara vizinha em série, porque os mecanismos fisiopatológicos que as determinam devem ser os mesmos. Assim, a sobrecarga do átrio direito em nosso caso sugere a presença de sobrecarga ventricular direita. Como não há desvio do QRS para direita, além de +90°, nem ondas R em V1, podemos supor que o distúrbio de condução do ramo direito (rsR’) seja a manifestação da sobrecarga ventricular di-reita e, portanto, sobrecarga diastólica.

Nos casos de hipertrofia do ventrículo direito por au-mento da pós-carga ventricular (estenose pulmonar e hi-pertensão arterial pulmonar), além do desvio do QRS para direita no plano frontal, há desvio para frente com ondas R de grande amplitude em V1. Na comunicação inte-ratrial tipo ostium primum, além do padrão de distúrbio de condução do ramo direito, ocorre bloqueio divisional anterossuperior do ramo esquerdo.3 Nessa circunstância, o eixo da despolarização ventricular orienta-se para cima, aparecendo complexos rS em D2, D3 e aVF.

A evolução da comunicação interatrial para hipertensão ar-terial pulmonar com aumento da resistência vascular pulmo-nar (síndrome de Eisenmenger) determina sinais de acentuada sobrecarga das câmaras direitas no eletrocardiograma, mudan-do as características do QRS em V1. Nas demais cardiopatias congênitas encontradas em adultos e citadas anteriormente, o eletrocardiograma é menos específico.

CONCLUSÃOComo a comunicação interatrial é uma cardiopatia congênita

que pode ser encontrada em adultos assintomáticos e apresenta características peculiares no eletrocardiograma, é importante que o clínico geral tenha conhecimento dessas manifestações.

REFERÊNCIAS1. Friedmann AA. ECG no Hospital Geral. In: Friedmann AA, editor. Eletrocardiograma

em 7 aulas: temas avançados e outros métodos. São Paulo: Manole; 2010. p. 95-120.2. Tobias NMMO. ECG na infância. In: Friedmann AA, editor. Eletrocardiograma em

7 aulas: temas avançados e outros métodos. São Paulo: Manole; 2010. p. 121-37.3. Sanches PCR, Moffa PJ. Eletrocardiograma nas cardiopatias congênitas.

In: Sanches PCR, Moffa PJ, editores. Eletrocardiograma. Uma abordagem didática. São Paulo: Roca; 2010. p. 278-89.

EDITOR RESPONSÁVEL POR ESTA SEÇÃOAntonio Américo Friedmann. Livre-docente, diretor do Serviço de Eletrocar-diologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).

INFORMAÇÕESEndereço para correspondência:Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São PauloPrédio dos AmbulatóriosServiço de EletrocardiologiaAv. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 155São Paulo (SP)CEP 05403-000Tel. (11) 2661-7146Fax. (11) 2661-8239E-mail: [email protected]

Fonte de fomento: nenhuma declaradaConflito de interesse: nenhum declarado

Data de entrada: 21 de outubro de 2012Data da última modificação: 21 de outubroData de aceitação: 5 de novembro de 2012

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Medicina baseada em evidências

Avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados pela ferramenta da colaboração CochraneAlan Pedrosa Viegas de CarvalhoI, Valter SilvaII, Antonio José GrandeIII

Centro Cochrane do Brasil (CCB), em conjunto com o Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica (PgMIT) da Disciplina de Medicina de Urgência e Medicina Baseada em Evidências do Departamento de Medicina da Universidade Federal de São Paulo

INTRODUÇÃOA validade de um estudo está diretamente relacionada a duas

dimensões, validade interna e externa. A primeira diz respeito se o estudo responde a uma questão de pesquisa de forma apro-priada, ou seja, livre de vieses. É determinada pela forma com que o delineamento, a coleta de dados e as análises foram con-duzidas e expostas a todos os vieses. A segunda está relacio-nada com a pergunta de pesquisa, se essa foi gerada de forma apropriada, está ligada à capacidade de generalizar e aplicar os resultados dessa pesquisa em outros cenários.1

Ensaio clínico randomizado é um tipo de estudo experimen-tal, no qual os participantes são colocados aleatoriamente no grupo intervenção e grupo controle. Esse é considerado o pa-drão de excelência ou padrão ouro entre todos os métodos de investigação clínica utilizados, pois é capaz de produzir evidên-cias científicas diretas e com menor probabilidade de erro para esclarecer uma relação causa-efeito entre dois eventos.2

A amostra é selecionada a partir de uma condição clíni-ca de interesse e, após a seleção dos participantes, esses são divididos utilizando a randomização para dois grupos ou mais. Os termos randomização, aleatorização e casualização são sinônimos, cujo sentido é “ao acaso”, “a esmo”, “sortea-do”, “casualizado”, “sem seleção ou critério de escolha”, “de-pendente de fatores incertos e sujeitos ao acaso”. Nesse caso, um grupo é chamado de experimental, pois é exposto a uma intervenção que se acredita ser melhor que as intervenções atuais. O outro grupo é chamado de controle ou de compa-ração, pois nesse grupo não se aplica a intervenção do grupo experimental, ou se aplica a intervenção usual. Os pacientes são acompanhados por  determinado período de tempo em ambos os grupos e assim se avaliam os desfechos relacionados

à doença ou problema. Portanto, as diferenças encontradas nos desfechos podem ser atribuídas à intervenção recebida com menor probabilidade de viés.3

Apesar de ensaio clínico randomizado ser o padrão ouro para o desenvolvimento de pesquisa com seres humanos, esse tipo de estudo é muito propenso a vieses, seja pela arbitrariedade dos investigadores na seleção da amostra e aferição das variáveis analisadas, seja na dificuldade no controle de outros fatores que podem influenciar no desfecho clínico.2 Viés ou erro sistemáti-co pode ser definido como qualquer tendenciosidade na coleta, análise dos dados, interpretação, publicação ou revisão dos da-dos, que induz a conclusões que sistematicamente tendem a se distanciar da verdade.3

A saúde baseada em evidências é uma ciência e um movi-mento que visa reduzir as incertezas para a tomada de decisão.4 Um profissional qualificado e atualizado não apenas necessita de o domínio das ferramentas que estão disponíveis atualmente para busca de evidências, mas precisa de um olhar crítico sobre aquilo que é publicado, para que assim possa confiar ou não nas informações com que está se deparando. Assim, um dos passos essenciais para a prática da saúde baseada em evidências é a avaliação da qualidade metodológica dos estudos. Para isso, é necessário saber onde e como procurar os vieses presentes nos estudos, o que pode ser feito, determinar se o viés realmente está presente e qual é o seu tamanho, e finalmente decidir se os vieses são importantes e, portanto, capazes de comprometer a integridade dos resultados/conclusões apresentados.

OBJETIVOSO objetivo desta revisão foi descrever o método utilizado

para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados

IAssistente de Pesquisa voluntário do Centro Cochrane do Brasil (CCB). Mestre pelo Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica (PgMIT) da Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp). Doutorando do Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica (PgMIT) da Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp). IIAssistente de Pesquisa voluntário do Centro Cochrane do Brasil (CCB). Doutorando do Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica (PgMIT) da Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp). Professor da Faculdade de Ciências Sociais e Agrárias de Itapeva (FAIT). IIIAssistente de Pesquisa voluntário do Centro Cochrane do Brasil (CCB). Doutorando do Programa de Pós-graduação em Medicina Interna e Terapêutica (PgMIT) da Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp).

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de acordo com os critérios da Colaboração Cochrane para de-senvolvimento de revisões sistemáticas de intervenção.

MATERIAIS E MÉTODOS Trata-se de um estudo descritivo, em que foi utiliza-

do como fonte de informação o Manual Cochrane para Desenvolvimento de Revisões Sistemáticas de Intervenção, versão 5.1.0 (Cochrane Handbook),1 para podermos descrever e detalhar as peculiaridades da atual ferramenta utilizada para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados em revisões sistemáticas Cochrane. O manual encontra-se dispo-nível no programa Review Manager (RevMan),5 criado para o desenvolvimento e manutenção de Revisões Sistemáticas, que está disponível para download gratuito para autores de revisão sistemática (http://ims.cochrane.org/revman/download), e pode ser acessado online gratuitamente pelo site (http://www.cochrane-handbook.org/).1

RESULTADOSA recomendação atual da Colaboração Cochrane para ava-

liação do risco de viés de ensaios clínicos é de uso de uma fer-ramenta em que se utiliza avaliação baseada em domínios, ou seja, uma avaliação crítica é feita de forma separada para dife-rentes aspectos do risco de viés desse tipo de estudo. Essa foi desenvolvida entre 2005 a 2007 por um grupo de metodologis-tas, editores e autores de revisão sistemática (Tabela 1). É uma ferramenta composta de duas partes, em que estão contidos sete domínios, denominados: geração da sequência aleatória, ocul-tação da alocação, cegamento de participantes e profissionais,

cegamento de avaliadores de desfecho, desfechos incompletos, relato de desfecho seletivo e outras fontes de vieses (Tabela 1).

A primeira parte refere-se à descrição do que foi relatado no estudo que está sendo avaliado, em detalhes suficientes para que o julgamento seja feito com base nessas informações. A segunda parte é o julgamento quanto ao risco de viés para cada um dos domínios analisados, que podem ser classificados em três categorias: baixo risco de viés, alto risco de viés ou risco de viés incerto (Tabela 1).

Os domínios geração da sequência aleatória, ocultação de alocação e relato de desfecho seletivo devem ser considerados em um único julgamento para cada estudo. Já para os domí-nios cegamento dos participantes e profissionais, cegamento de avaliadores de desfechos e para desfechos incompletos, dois ou mais julgamentos podem ser utilizados, pois os jul-gamentos geralmente precisam ser feitos separadamente para diferentes desfechos ou para o mesmo desfecho em diferentes momentos (Tabela 1).

Uma alternativa para limitar o número de questões para os domínios é agrupar os desfechos em subjetivos e objetivos para avaliar o cegamento de avaliadores de desfecho. E, para desfe-chos incompletos, subdividir em desfechos relatados em 6 me-ses e desfechos relatados em 12 meses.

O suporte para o julgamento de cada domínio é um sumário no qual o julgamento para o risco de viés poderá ser baseado e trará transparência para o julgamento de todos os domínios (Tabela 2). O suporte para o julgamento geralmente é obti-do de um único artigo de um estudo publicado, mas poderá ser obtido por uma mistura de artigos advindos de um único

DomínioSuporte para o

julgamentoJulgamento do autor da revisão e critérios para julgamento

Viés de seleção

1. Geração da sequência aleatória

Descrever em detalhe o método utilizado para gerar a sequência aleatória, para permitir avaliar se foi possível produzir grupos comparáveis.

Baixo risco de viés:Tabela de números randômicos;Geração de números randômicos por computador;Arremesso de moeda;Embaralhamento de cartões ou envelopes;Jogando dados;Sorteio;Minimização.

Alto risco de viés:Sequência gerada por data par ou ímpar de nascimento;Sequência gerada por alguma regra com base na data (ou dia) de admissão;Sequência gerada por alguma regra baseada no número do prontuário do hospital ou clínica;Alocação pelo julgamento do profissional;Alocação pela preferência do participante;Alocação baseada em resultados de exames ou testes prévios;Alocação pela disponibilidade da intervenção.

Risco de viés incerto:Informação insuficiente sobre o processo de geração da sequência aleatória para permitir julgamento.

Tabela 1. Ferramenta da Colaboração Cochrane para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados

Continua...

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Viés de seleção

2. Ocultação de alocação

Descrever em detalhes o método utilizado para ocultar a sequência aleatória, para determinarmos se a alocação das intervenções pôde ser prevista antes ou durante o recrutamento dos participantes.

Baixo risco de viés:Ocultação de alocação por uma central;Recipientes de drogas numerados de forma sequencial com aparência idêntica;Envelopes sequenciais numerados, opacos e selados.

Alto risco de viés:Utilizando um processo aberto de randomização (exemplo: lista randômica de números);Envelopes sem critérios de segurança (exemplo: envelopes não selados, ou que não sejam opacos ou que não sejam numerados sequencialmente);Alternância ou rotação;Data de nascimento;Número de prontuário;Qualquer outro procedimento que não oculte a alocação.

Risco de viés incerto:Informação insuficiente sobre o processo de geração da sequência aleatória para permitir julgamento. Este é o caso se estiver descrito que a ocultação foi realizada utilizando envelopes, mas não estiver claro se foram selados, opacos e numerados sequencialmente.

Viés de performance

3. Cegamento de participantes e profissionais

Avaliação deve ser feita para cada desfecho principal (ou classes de desfechos)

Descrever todas as medidas utilizadas para cegar participantes e profissionais envolvidos em relação a qual intervenção foi dada ao participante. Fornecer informações se realmente o cegamento foi efetivo.

Baixo risco de viés:Estudo não cego ou cegamento incompleto, mas os autores da revisão julgam que o desfecho não se altera pela falta de cegamento;Cegamento de participantes e profissionais assegurado, e é improvável que o cegamento tenha sido quebrado.

Alto risco de viés:Estudo não cego ou cegamento incompleto, e o desfecho é susceptível de ser influenciado pela falta de cegamento;Tentativa de cegamento dos participantes e profissionais, mas é provável que o cegamento tenha sido quebrado, e o desfecho é influenciado pela falta de cegamento.

Risco de viés incerto:Informação insuficiente para julgar como alto risco e baixo risco de viés;O estudo não relata esta informação.

Viés de detecção

4. Cegamento de avaliadores de desfecho

Avaliação deve ser feita para cada desfecho principal (ou classes de desfechos)

Descrever todas as medidas utilizadas para cegar os avaliadores de desfecho em relação ao conhecimento da intervenção fornecida a cada participante. Fornecer informações se o cegamento pretendido foi efetivo.

Baixo risco de viés:Não cegamento da avaliação dos desfechos, mas os autores da revisão julgam que o desfecho não pode ser influenciado pela falta de cegamento;Cegamento da avaliação dos desfechos foi realizado, e é improvável que o cegamento tenha sido quebrado.

Alto risco de viés:Não houve avaliação cega dos desfechos, e os desfechos avaliados são influenciáveis pela falta de cegamento;Os avaliadores de desfechos foram cegos, mas é provável que o cegamento tenha sido quebrado, e o desfecho mensurado pode ter sido influenciado pela falta de cegamento.

Risco de viés incerto:Informação insuficiente para julgar como alto risco e baixo risco de viés;O estudo não relata esta informação.

Continua...

Tabela 1. Continuação

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Viés de atrito

5. Desfechos incompletos

Avaliação deve ser feita para cada desfecho principal (ou classes de desfechos)

Descrever se os dados relacionados aos desfechos estão completos para cada desfecho principal, incluindo perdas e exclusão da análise. Descrever se as perdas e exclusões foram informadas no estudo, assim como suas respectivas razões. Descreve se houve reinclusão de algum participante.

Baixo risco de viés:Não houve perda de dados dos desfechos;Razões para perdas de dados não estão relacionadas ao desfecho de interesse;Perda de dados foi balanceada entre os grupos, com razões semelhantes para perda dos dados entre os grupos;Para dados dicotômicos, a proporção de dados perdidos comparados com o risco observado do evento não é capaz de induzir viés clinicamente relevante na estimativa de efeito;Para desfechos contínuos, estimativa de efeito plausível (diferença média ou diferença média padronizada) nos desfechos perdidos não é capaz de induzir viés clinicamente relevante no tamanho de efeito observado;Dados perdidos foram imputados utilizando-se métodos apropriados.

Alto risco de viés:Razões para perda de dados pode estar relacionada ao desfecho investigado, com desequilíbrio na quantidade de pacientes ou razões para perdas entre os grupos de intervenção;Para dados dicotômicos, a proporção de dados perdidos comparada com o risco observado do evento é capaz de induzir viés clinicamente relevante na estimativa de efeito;Para desfechos contínuos, estimativa de efeito plausível (diferença média ou diferença média padronizada) nos desfechos perdidos, capaz de induzir viés clinicamente relevante no tamanho de efeito observado.“As-treated” análise, feita com desvio substancial da intervenção recebida em relação à que foi randomizada;Imputação simples dos dados feita de forma inapropriada.

Risco de viés incerto:Relato insuficiente das perdas e exclusões para permitir julgamento (exemplo: número randomizado não relatado, as razões para perdas não foram descritas).

Viés de relato

6. Relato de desfecho seletivo

Indicar a possibilidade de os ensaios clínicos randomizados terem selecionado os desfechos ao descrever os resultados do estudo e o que foi identificado.

Baixo risco de viés:O protocolo do estudo está disponível e todos os desfechos primários e secundários pré-especificados que são de interesse da revisão foram reportados de acordo com o que foi proposto;O protocolo do estudo não está disponível, mas está claro que o estudo publicado incluiu todos os desfechos desejados.

Alto risco de viés:Nem todos os desfechos primários pré-especificados foram reportados;Um ou mais desfechos primários foram reportados utilizando mensuração, método de análise ou subconjunto de dados que não foram pré-especificados;Um ou mais desfechos primários reportados não foram pré-especificados (a não ser que uma justificativa clara seja fornecida para o relato daquele desfecho, como o surgimento de um efeito adverso inesperado);Um ou mais desfechos de interesse da revisão foram reportados incompletos, e não podem entrar na metanálise;O estudo não incluiu resultados de desfechos importantes que seriam esperados neste tipo de estudo.

Risco de viés incerto:Informação insuficiente para permitir julgamento. É provável que a maioria dos estudos caia nesta categoria.

Outros vieses

7. Outras fontes de viés

Declarar outro viés que não se enquadra em outro domínio prévio da ferramenta.

Se em protocolos de revisões forem pré-especificadas questões neste domínio, cada questão deve ser respondida.

Baixo risco de viés:O estudo parece estar livre de outras fontes de viés.

Alto risco de viés:Alto risco relacionado ao delineamento específico do estudo; ouFoi alegado como fraudulento;Teve algum outro problema.

Risco de viés incerto:Informação insuficiente para avaliar se um importante risco de viés existe; ouBase lógica insuficiente de que um problema identificado possa introduzir viés.

Tabela 1. Continuação

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Tabela 2. Exemplos de suporte para o julgamento para o domínio geração da sequência aleatória e ocultação de alocação

Domínio Suporte para o julgamento

Geração da sequência aleatóriaCitação do estudo: “os pacientes foram alocados de forma randômica”

Comentário: provavelmente realizada de forma correta, pois estudos anteriores publicados pelo mesmo investigador descrevem de forma clara a geração da sequência aleatória.

Geração da sequência aleatória

Citação do estudo: “os pacientes foram alocados de forma randômica”

Citação do e-mail: “randomização foi realizada de acordo com o dia de tratamento”

Comentário: não foi randomizado.

Ocultação de alocaçãoCitação do e-mail: “foi gerada por computador pelo nosso estatístico”

Comentário: não está claro se ocultação de alocação foi realizada de maneira apropriada. A resposta do autor não foi clara.

Figura 1. Exemplo de gráfico de risco de viés de uma revisão sistemática.

Cegamento de avaliação de desfecho (mortalidade por todas as causas)

Geração da sequência aleatória

Ocultação de alocação

Cegamento de avaliação de desfecho (desfechos reportados pelo paciente)

Cegamento de avaliação de desfecho (mortalidade por todas as causas)

Desfechos incompletos (curto prazo [2-6 semanas])

Desfechos incompletos (longo prazo [> 6 semanas])

Relato de desfecho seletivo

Outras fontes de viés

0% 25% 50% 75% 100%

Baixo risco de viés Risco de viés incerto Alto risco de viés

estudo, protocolos, comentários sobre o estudo e contato direto com o investigador. De forma adicional, um comentário sobre o que foi obtido pode ser feito. Quando não houver nenhu-ma informação relacionada a algum domínio, este fato deve ser exposto.

Com a utilização do programa RevMan,5 pode-se criar figuras para sumarizar o julgamento do risco de viés dos ensaios clínicos incluídos em uma revisão sistemática (Figura 1). Para fazer um julgamento geral do risco de viés de um único ensaio clínico para um determinado desfecho (exemplo: dor) devemos selecionar os principais domínios relacionados ao desfecho e julgar como alto risco de viés, risco de viés incerto e baixo risco de viés.

Para determinar o risco de viés em um desfecho único com relação a todos os estudos que analisaram aquele desfecho (no caso de metanálise), julga-se baixo risco de viés (se a maior par-te da informação for de estudos classificados como baixo risco de viés), risco de viés incerto (se a maior parte da informação for de estudos de baixo risco e incerto risco), alto risco de viés (se a proporção de informação de alto risco é suficiente para afetar a interpretação dos resultados).

DISCUSSÃO Diante da grande quantidade de ferramentas disponíveis

para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomiza-dos6 (como exemplo: Maastricht,7 Delphi8 Jadad9), a ferramen-ta desenvolvida pela Colaboração Cochrane para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados,10 é uma ferra-menta singular que não se enquadra em critérios de um checklist nem de uma escala, ou seja, não é possível obter uma pontua-ção final, como geralmente acontece com outras ferramentas.9

Essa ferramenta é baseada em sete domínios, os quais ava-liam diversos tipos de vieses que podem estar presentes nos ensaios clínicos randomizados. O julgamento de cada domí-nio em três categorias (alto risco de viés, baixo risco de viés e risco de viés incerto) depende de um conhecimento prévio do avaliador dos critérios estabelecidos para cada julgamento. Além disso, de acordo com as peculiaridades de cada revi-são sistemática Cochrane, essa ferramenta pode ser adaptada, acrescentando domínios e/ou separando os domínios já prees-tabelecidos de acordos com os desfechos explorados em cada revisão sistemática.

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Apesar de terem sido publicadas desde 1996, as normas foram consolidadas para o relato de ensaio clínico randomi-zado de dois grupos paralelos (Consort).11 Os ensaios clínicos publicados ainda carecem de informações detalhadas sobre os métodos utilizados e apresentam erros metodológicos que com-prometem a sua validade interna.12 Se esses vieses não forem tratados devidamente, podem repercutir negativamente desde a tomada de decisão em saúde de forma errônea, até a incorpora-ção de novos tratamentos e tecnologias em âmbito nacional que poderão causar mais danos que benefício.

CONCLUSÕESA recomendação da Colaboração Cochrane para avaliação

do risco de viés de ensaios clínicos randomizados é que seja utilizada uma ferramenta baseada em sete domínios. Esses do-mínios englobam a avaliação de viés de seleção, viés de perfor-mance, viés de detecção, viés de atrito, viés de relato e outros vieses. O julgamento é subjetivo, e cada desfecho deve ser jul-gado separadamente. A transparência do método utilizado para avaliação do risco de viés garante reprodutibilidade no processo de julgamento dos autores de revisão sistemática Cochrane, o que repercute diretamente na qualidade das revisões sistemáti-cas Cochrane.

REFERÊNCIAS1. Higgins JPT, Green S. Cochrane handbook for systematic reviews of

interventions. Version 5.1.0 [updated March 2011]. The Cochrane Collaboration; 2011. Disponível em: http://www.cochrane-handbook.org. Acessado em 2012 (3 out).

2. Pereira MG. Epidemiologia: teoria e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2008.

3. Fletcher RH, Fletcher SW. Epidemiologia Clínica: elementos essenciais. 4a ed. Porto Alegre: Artmed; 2006.

4. Atallah NA. Medicina Baseada em Evidências: A incerteza, a ciência e a evidência. Diagn Tratamento. 2004;9(1):27·8.

5. Review Manager (RevMan) [Computer program]. Version 5.1. Copenhagen: The Nordic Cochrane Centre, The Cochrane Collaboration; 2011. Disponível em: http://ims.cochrane.org/revman/download. Acessado em 2012 (04 set).

6. Olivo SA, Macedo LG, Gadotti IC, et al. Scales to assess the quality of randomized controlled trials: a systematic review. Phys Ther. 2008;88(2):156-75.

7. de Vet HCW, de Bie RA, van der Heijden GJMG, et al. Systematic reviews on the basis of methodological criteria. Physiotherapy. 1997;83(6):284-9. Disponível em: http://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0031940605661755. Acessado em 2012 (3 out).

8. Verhagen AP, de Vet HC, de Bie RA, et al. The Delphi list: a criteria list for quality assessment of randomized clinical trials for conducting systematic reviews developed by Delphi consensus. J Clin Epidemiol. 1998;51(12):1235-41.

9. Jadad AR, Moore RA, Carroll D, et al. Assessing the quality of reports of randomized clinical trials: is blinding necessary? Control Clin Trials. 1996;17(1):1-12.

10. Higgins JPT, Altman DG. Chapter 8: Assessing risk of bias in included studies. In: Higgins JPT, Green S, editors. Cochrane handbook for systematic reviews of interventions. Version 5.1.0 [updated March 2011]. The Cochrane Collaboration; 2011. Disponível em: http://hiv.cochrane.org/sites/hiv.cochrane.org/files/uploads/Ch08_Bias.pdf. Acessado em 2012 (3 out).

11. Moher D, Hopewell S, Schulz KF, et al. CONSORT 2010 Explanation and Elaboration: Updated guidelines for reporting parallel group randomised trials. J Clin Epidemiol. 2010;63(8):e1-37.

12. Pildal J, Chan AW, Hróbjartsson A, et al. Comparison of descriptions of allocation concealment in trial protocols and the published reports: cohort study. BMJ. 2005;330(7499):1049.

Agradecimentos: Pela concessão da bolsa, os autores Alan Pedrosa Viegas de Carvalho, Valter Silva, Antonio José Grande, agradecem a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)

INFORMAÇÕESEndereço para correspondência:Valter SilvaCentro Cochrane do BrasilUniversidade Federal de São Paulo (Unifesp)Rua Borges Lagoa, 564 — conj. 63Vila Clementino — São Paulo (SP)CEP 04038-000Tel. (11) 5575-2970E-mail: [email protected]

Fonte de fomento: nenhuma declaradaConflito de interesse: nenhum declarado

Data de entrada: 3 de setembro de 2012Data da última modificação: 21 de setembro de 2012Data de aceitação: 31 de outubro de 2012

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):38-44.

Avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados pela ferramenta da colaboração Cochrane44

PALAVRAS-CHAVE: Viés (epidemiologia).Ensaio clínico controlado aleatório.Revisão.Avaliação da pesquisa em saúde.Prática clínica baseada em evidências.

RESUMO Contexto e objetivo: Ensaio clínico randomizado é considerado o padrão ouro para o desenvolvimento de pesquisa com seres humanos. No entanto, este tipo de pesquisa é susceptível a diversos vieses, que podem comprometer os seus resultados. O objetivo foi descrever o método utilizado para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados de acordo com os critérios da Colaboração Cochrane para desenvolvimento de Revisões Sistemáticas de Intervenção. Tipo de estudo e local: Estudo descritivo, realizado no Centro Cochrane do Brasil, em conjunto com o PgMIT da Disciplina de Medicina de Urgência e Medicina Baseada em Evidências do Departamento de Medicina da Unifesp.Métodos: Foi utilizado como fonte de informação o capítulo 8 (Avaliação do risco de viés dos estudos incluídos) do Manual Cochrane para Desenvolvimento de Revisões Sistemáticas de Intervenção versão 5.1.0 (Cochrane Handbook) para descrever e detalhar as peculiaridades da atual ferramenta usada para avaliação do risco de viés de ensaios clínicos randomizados em revisões sistemáticas Cochrane. Resultados: A ferramenta é composta por sete domínios que avaliam viés de seleção, viés de performance, viés de detecção, viés de atrito, viés de relato e outros vieses, que podem comprometer a validade interna de um ensaio clínico. A avaliação do risco de viés deve ser feita para cada desfecho separadamente ou para grupo de desfechos. Conclusões: O julgamento do risco de viés recomendado pela Colaboração Cochrane é feito por meio de uma ferramenta que traz transparência do método aplicado pelos autores, o que garante a reprodutibilidade dos seus resultados.

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):45-8.

Medicina sexual

Síndrome metabólica como fator de risco para disfunção sexual feminina

Regina Maria Volpato BedoneI, Carmita Helena Najjar AbdoII

Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo

INTRODUÇÃOObesidade, hipertensão, dislipidemia e diabetes tipo 2 são

doenças consideradas fatores de risco para aterosclerose e dis-função endotelial. Essas alterações estão frequentemente pre-sentes em indivíduos com síndrome metabólica, também co-nhecida como síndrome X. Inúmeros estudos comprovam a correlação entre disfunção endotelial, doença cardiovascular e disfunção erétil.1 Outros comprovam a correlação entre síndro-me metabólica e disfunção sexual feminina.1-5 Entre a ampla variedade de fatores de risco para a disfunção sexual feminina, está a disfunção endotelial, que pode comprometer a oxigena-ção dos tecidos e promover subsequente dano funcional e estru-tural no trato genital feminino.6

A obesidade tornou-se uma epidemia mundial, tanto nos países subdesenvolvidos quanto nos mais desenvolvidos, com maior prevalência entre as mulheres.7 De acordo com o National Health Examination Survey (NHES) e o National Health and Nutrition Examination Survey (NHANES) hou-ve aumento crescente das taxas de obesidade na população dos Estados Unidos ao longo da segunda metade do século 20.8 Atualmente, mais de um terço da população norte-americana é obesa. Entre as mulheres adultas, em 2003 e 2004, a prevalên-cia de obesidade era de 33,2% e, em 2005 e 2006, de 35,3%. Na população adulta masculina, a prevalência nos mesmos pe-ríodos foi de 31,1% e 33,3%, respectivamente.9 Segundo dados atualizados do Ministério da Saúde, no Brasil a prevalência de obesidade na população adulta das 26 capitais brasileiras, mais o Distrito Federal, é de 15,8%, sendo ligeiramente menor entre os homens (15,6%) do que entre as mulheres (16%).10

SÍNDROME METABÓLICAA diretriz do Adult Treatment Panel III (ATP III) recomen-

da como definição de síndrome metabólica a presença de pelo menos três das cinco características: obesidade abdominal (cin-tura > 102 cm no homem e > 88 cm na mulher), triglicérides

elevados (> 150 mg/dL), redução dos níveis de HDL (high density lipoprotein) colesterol (< 40 mg/dL no homem e 50 mg/dL na mu-lher), hipertensão arterial (> 130/85 mmHg) e glicemia de jejum elevada (> 110 mg/dL).3

A obesidade abdominal promove resistência aos efeitos da insulina sobre a glicose periférica e sobre a utilização dos ácidos graxos periféricos. A resistência à insulina, a hiperinsulinemia, a hiperglicemia e as citocinas dos adipócitos podem levar a al-terações no perfil lipídico e na pressão arterial. A inflamação vascular e a disfunção endotelial são os fatores-chave no desen-volvimento da aterosclerose.6

O hipogonadismo no homem está associado com o aumen-to do risco de síndrome metabólica, doença cardiovascular e disfunção sexual. Ao contrário, hiperandrogenismo associa-se a aumento do risco de síndrome metabólica em mulheres, com ou sem a síndrome dos ovários policísticos.11

A síndrome metabólica é um dos maiores problemas de saúde pública nos países ocidentais, com prevalência de 30% e com projeção de aumento contínuo desse índice nas próximas décadas.6 A prevalência da síndrome metabólica aumenta em conjunto com a epidemia de obesidade e estima-se que incida em 34% dos adultos norte-americanos.12 No sexo feminino, a prevalência da síndrome cresce na quinta e sexta décadas de vida, coincidindo com o período da pós-menopausa.13 Llaneza e cols. sugerem que a síndrome metabólica seja um dos mais importantes fatores que comprometem a qualidade de vida de mulheres no climatério.14

DISFUNÇÃO SEXUAL FEMININADisfunção sexual feminina é definida como um transtorno

do desejo sexual, da excitação, do orgasmo ou a presença de dor na relação sexual, levando a sofrimento pessoal.15 Na mulher, as dificuldades sexuais parecem ser mais generalizadas, influen-ciadas por fatores psicológicos e biológicos, comprometendo a qualidade de vida e as relações interpessoais.5

IGinecologista e obstetra, certificada em Sexologia pela Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e mestranda do Departamento de Fisiopatologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). IIPsiquiatra, livre-docente e professora associada do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Fundadora e coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP.

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Síndrome metabólica como fator de risco para disfunção sexual feminina46

No Brasil, como em outros países, a disfunção sexual é con-siderada um problema de saúde pública pela alta prevalência e por estar relacionada com a qualidade de vida dos indivíduos. O “Estudo da Vida Sexual do Brasileiro”, realizado entre 2002 e 2003, constatou importante prevalência de todos os tipos de disfunções sexuais em homens e em mulheres, sendo respecti-vamente, 48,1% e 50,9%.16

Nos Estados Unidos, a disfunção sexual é mais prevalente nas mulheres (43%) do que nos homens (31%) e está associa-da com várias características demográficas, incluindo idade e escolaridade.17

Até recentemente, somente a disfunção sexual feminina de natureza psicológica era estudada. Atualmente é reconhecida como um fenômeno complexo, controlado por fatores hormo-nais, neurovasculares e psicológicos,18 além daqueles de nature-za relacional e exclusivamente psíquica. O comprometimento de alguns desses fatores pode resultar em disfunção sexual.3

Estudos epidemiológicos demonstram correlação entre dis-funções sexuais femininas e deficiências hormonais, hiperten-são arterial, diabetes, doenças cardiovasculares, câncer, neuro-patias, etilismo, tabagismo, uso de alguns medicamentos ou drogas ilícitas, depressão e obesidade.5,19-24

OBESIDADE, SÍNDROME METABÓLICA E DISFUNÇÃO SEXUAL FEMININA

Por serem, obesidade e síndrome metabólica, problemas de saúde pública, modificar os fatores comportamentais de risco (sedentarismo, dieta hipercalórica) é muito importante para impedir a progressão de ambas. Essa também pode ser uma estratégia para diminuir a prevalência das disfunções sexuais,

diminuindo o risco da disfunção endotelial.3

Adultos obesos, inscritos em programa para perda de peso, submetidos a questionário multidimensional para avaliar a função sexual, apresentaram prejuízos na função sexual em maior propor-ção quando comparados com adultos de peso normal. O compro-metimento dessa função foi mais evidente em mulheres obesas.25

Estudo com 108 mulheres saudáveis, que correlacionou o ín-dice de massa corpórea e o Female Sexual Function Index (FSFI: questionário validado e usado no diagnóstico de disfunção sexual), concluiu que, quanto maior o índice de massa corpórea, maior é a probabilidade de disfunção sexual. Os autores mostraram que as mulheres obesas apresentam prejuízos em vários aspectos da fun-ção sexual, incluindo excitação, lubrificação e orgasmo, mas desejo sexual preservado e ausência de dor à relação sexual.4

Recentemente, Esposito e cols. avaliaram a pre-valência de disfunção sexual em 120 mulheres na pré-menopausa e com síndrome metabólica. Observaram redu-ção da satisfação sexual e diminuição significativa da excitação, do orgasmo e da lubrificação, quando elas foram comparadas com grupo controle de 80 mulheres na pré-menopausa e sem síndrome metabólica.2 Em outro estudo, com 329 mulhe-res em pré-menopausa, cuja média de idade era 38,5 anos, a

síndrome metabólica foi considerada um fator de risco inde-pendente para o comprometimento do desejo sexual.6 Veronelli e cols., em um estudo com 91 mulheres na pré-menopausa (28 com diabetes, 39 obesas e 24 com hipotireoidismo), en-contraram aumento da prevalência de disfunção sexual nes-sas mulheres, quando comparadas com outras saudáveis. Relataram ainda que a presença de síndrome metabólica em algumas delas também elevou a prevalência de disfunção se-xual, independentemente da doença subjacente ou associada.24 Martelli e cols. compararam 103 mulheres na pós-menopausa com síndrome metabólica com 105 controles saudáveis na pós-menopausa. Concluíram que a prevalência de disfun-ção sexual foi maior entre aquelas com síndrome metabólica. Também concluíram que os níveis mais elevados de triglicérides estavam associados a maior risco de disfunção sexual.26

Em estudo com 659 mulheres com diabetes tipo 2, Esposito e cols. concluíram que o risco para disfunções sexu-ais está aumentado em diabéticas e que idade, síndrome me-tabólica e dislipidemia aterogênica são fatores independentes para disfunção sexual feminina. Nível mais intenso de ativi-dade física foi considerado fator de prevenção de disfunção sexual.27 Outro estudo semelhante com mulheres hiperglicê-micas, com média de idade de 54 anos, na pós-menopausa e com síndrome metabólica, constatou impacto negativo sobre a resposta sexual.13

COMO DIMINUIR O IMPACTO DA SÍNDROME METABÓLICA SOBRE A FUNÇÃO SEXUAL FEMININA

A prevenção e o tratamento da síndrome metabólica tem como finalidade evitar as complicações do diabetes, síndrome coronariana aguda e acidente vascular cerebral.28 Entretanto, Kinzl e cols. mostraram que, para 17% das mulheres obesas, a melhora na aparência e no relacionamento sexual com seus parceiros são os fatores mais significativos para se submeterem à cirurgia bariátrica.29

O tratamento clínico da síndrome metabólica deve ser rea-lizado por meio da mudança de estilo de vida (perda de peso, exercícios físicos, abandono do tabagismo e do sedentarismo e dieta balanceada), tratamento clínico do diabetes, da hiperten-são e da dislipidemia, administração de aspirina e atenção espe-cial às consequências da síndrome, como por exemplo, as dis-funções sexuais.1,3,5 Avaliação sistemática da função sexual deve ser enfatizada nesses pacientes, de modo a identificar aqueles que necessitam de tratamento.1

A dieta do Mediterrâneo melhora o risco cardiovascular e, como consequência, reduz efetivamente a prevalência de síndro-me metabólica. Esposito e cols. estudaram o efeito dessa dieta por dois anos em mulheres com síndrome metabólica e disfun-ção sexual. Concluíram que o consumo de mais frutas, vegetais, nozes, grãos e azeite de oliva melhorou a função sexual delas.30 Kim e cols., em um estudo com 44 mulheres com sobrepeso e obesas, referiram melhora significativa na excitação, lubrificação,

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orgasmo e satisfação sexual após tratamento clínico para perda de peso (terapia comportamental e sibutramina).31

Estudos a respeito da ação da terapia estrogênica na pós-menopausa sobre a resistência à insulina e outros parâme-tros metabólicos indicam que a reposição hormonal reduz a obesidade abdominal,32 a resistência à insulina, a incidência de diabetes, o colesterol LDL (low density lipoprotein), a pressão arterial média e outros fatores metabólicos. Esse aspecto foi ob-servado tanto no tratamento por via oral como por via trans-dérmica. A terapia por via oral aumentou a proteína C-reativa e diminuiu a proteína S, mas a via transdérmica não ocasionou esses efeitos. Por essa razão, a via transdérmica é preferível na terapia hormonal em pacientes com síndrome metabólica.33

Diversos estudos mostraram que o tratamento cirúrgico para perda de peso tem impacto positivo sobre a função sexual.29,34-36 Outros contrariaram esses resultados.37-40 No futuro, algumas evidências preliminares sobre a cirurgia bariátrica, relacionadas com a melhora da resposta sexual, deverão ser obtidas por meio de estudos clínicos mais sistematizados.1 A alta prevalência de síndrome metabólica e sua evidente associação com piora na qualidade de vida justificam a promoção de mudanças de estilo de vida na população.41

CONCLUSÃOEstudos epidemiológicos sobre síndrome metabólica e dis-

função sexual feminina são escassos e deveria ser estabelecida metodologia padrão para obtenção de resultados confiáveis sobre essa correlação. A ocorrência simultânea de obesidade, síndrome metabólica e disfunções sexuais, principalmente nos países ocidentais, tornando-as problemas de saúde pública, devido à alta morbidade e prevalência, chama a atenção para a prevenção em âmbito educacional. Devem ser incentivados hábitos saudáveis, como atividade física diária, alimentação balanceada, controle do peso e esclarecimento sobre a impor-tância da prevenção de doenças, como o diabetes e as doenças cardiovasculares, as quais interferem na qualidade de vida em todos os seus domínios, inclusive na qualidade de vida sexual.

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):45-8.

Síndrome metabólica como fator de risco para disfunção sexual feminina48

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EDITOR RESPONSÁVEL POR ESTA SEÇÃOCarmita Helena Najjar Abdo. Psiquiatra, livre-docente e professora asso-ciada do Departamento de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Univer-sidade de São Paulo (FMUSP). Fundadora e coordenadora do Programa de Estudos em Sexualidade (ProSex) do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da FMUSP.

INFORMAÇÕESEndereço para correspondênciaRegina Maria Volpato BedoneAlameda dos Colibris, 62Jardim do Cedro — São José do Rio Preto (SP)CEP 15038-000 Tel. (17) 3231-5169E-mail: [email protected]

Fonte de fomento: nenhuma declaradaConflito de interesse: nenhum declarado

Data de entrada: 5 de novembro de 2012Data da última modificação: 5 de novembro de 2012Data de aceitação: 26 de novembro de 2012

PALAVRAS-CHAVESexualidade.Síndrome X metabólica.Obesidade.Qualidade de vida.Climatério.

RESUMOObesidade, hipertensão, dislipidemia e diabetes tipo 2 são doenças consideradas fatores de risco para aterosclerose e disfunção endotelial e estão frequentemente presentes em indivíduos com síndrome metabólica. Inúmeros estudos comprovam a correlação entre disfunção endotelial e disfunção sexual, pelo comprometimento da oxigenação dos tecidos e subsequente dano funcional e estrutural no trato genital masculino e feminino. A prevalência da síndrome metabólica aumenta em conjunto com a epidemia de obesidade nos países ocidentais e parece ser um dos mais importantes fatores que comprometem a qualidade de vida de mulheres no climatério.Em geral, as disfunções sexuais são prevalentes em ambos os sexos, com taxas mais elevadas entre as mulheres. Por serem, obesidade e síndrome metabólica, problemas de saúde pública, modificar os fatores comportamentais de risco (sedentarismo, dieta hipercalórica) é essencial para impedir a progressão de ambas e, consequentemente, diminuir a prevalência das disfunções sexuais, sobretudo na pré e pós-menopausa. A prevenção e o tratamento da síndrome metabólica inclui evitar principalmente complicações mórbidas, tratando o diabetes, a hipertensão, a dislipidemia e promovendo mudanças no estilo de vida (perda de peso, exercícios físicos, abandono do tabagismo e do sedentarismo, dieta balanceada). Atenção às disfunções sexuais também proporciona melhora na qualidade de vida em homens e mulheres. Na mulher, a terapia hormonal parece ter influência positiva nos parâmetros metabólicos. O benefício da cirurgia bariátrica sobre a função sexual feminina ainda é controverso e são necessárias novas pesquisas.

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):49-51.

Rastreamento diagnóstico das principais disfunções da tireoide50

Por isso, esse exame não deve ser solicitado na avaliação rotinei-ra da função tireoidiana.

O T3 total também pode ser alterado pelas variações da TBG, embora em menor proporção. Ele pode ser solicitado em alguns casos de hipertireoidismo. A dosagem do T3 total pode ser normal em 30% a 40% de pacientes com hipotireoi-dismo, por isso, esse exame não deve ser solicitado na avaliação de estados de hipotireoidismo. Outro fato relevante é que o T3 pode diminuir em doenças sistêmicas graves não tireoidianas, no paciente muito idoso, e com o uso de medicamentos como amiodarona ou corticosteroide.

O T3 livre representa 0,5% do T3 total, circula não ligado a proteínas, sendo a fração biologicamente ativa. Em geral, as do-sagens de T3 total e T3 livre apresentam boa correlação, só di-vergindo quando existem alterações significativas das proteínas carregadoras como acontece na gravidez, no uso de estrógenos e na diminuição da TBG. A indicação do T3 livre, assim como o T3 total, é no diagnóstico do hipertireoidismo, em poucas situ-ações especiais, onde o T4 livre ainda é normal, já que algumas vezes o T3 é o primeiro hormônio a se elevar, tanto na doença de Graves como no bócio uninodular tóxico.

USO CLÍNICO DOS TESTES DE FUNÇÃO TIREOIDIANAEsses testes são usados para a triagem da função tireoidiana,

para avaliar a terapia com levotiroxina nos estados de hipotireoi-dismo e para monitorar o tratamento do hipertiroidismo. Devem ser realizados também em pacientes não portadores de doença tireoidiana com história de doença autoimune como artrite reu-matoide, diabetes tipo 1, lúpus eritematoso, que tenham fami-liares com doenças da tireoide, em mulheres com antecedentes de abortamento, na gravidez, nos idosos e nos recém-nascidos.

Na prática clínica, a maioria dos laboratórios está usando a determinação do TSH para avaliação inicial da função tireoi-diana: vindo normal, nenhum outro teste se faz necessário. Quando o TSH é elevado, a determinação do T4 livre deve ser feita no sentido de determinar o grau do hipotireoidismo e, quando a dosagem do TSH está diminuída, o T4 livre deve ser solicitado para a determinação do grau de hipertireoidismo. No caso de o TSH estar diminuído e o T4 livre estar nomal, a dosagem do T3 total está bem indicada.

Em duas situações clínicas devem ser solicitados o TSH e o T4 livre na avaliação inicial:1. Quando se suspeitar de doença hipofisária ou hipotalâmica,

como por exemplo, uma mulher em amenorreia e fadiga.2. Quando, apesar da dosagem do TSH normal, o pacien-

te apresentar convincentes sinais e sintomas de hipo ou hipertireoidismo.

A determinação da função tireoidiana em pacientes hospita-lizados não é recomendada, a menos que se suspeite fortemente de doença tireoidiana, já que doenças graves não tireoidianas

podem provocar mudanças nos hormônios da tireoide, na liga-ção dos hormônios às proteínas carregadoras e nas concentra-ções do TSH.

MONITORIZAÇÃO DA TERAPIA COM LEVOTIROXINAUma das razões mais comuns para avaliar a função tireoidia-

na é monitorizar a terapia com levotiroxina em pacientes com hipotireoidismo através da dosagem do TSH. Se o TSH está alto, a dose precisa ser aumentada; se está baixo, a dose precisa ser reduzida. Quando o TSH está muito suprimido, pode au-mentar o risco de fibrilação atrial e osteoporose, principalmente em pacientes idosos e mulheres após a menopausa, devido ao hipertireoidismo subclínico.

As medidas do T4 livre são muito insensíveis para avaliar apropriadamente a dose de levotiroxina.4

Uma situação na qual o T4 livre deve ser usado para se ajus-tar a dose correta do hormônio da tireoide é em pacientes com hipotireoidismo secundário devido a doença pituitária ou hipo-talâmica, que apresenta liberação de TSH prejudicada.

Outra situação em que o T4 livre é muito importante se refere aos casos de hipertireoidismo em tratamento, no qual o TSH permanece vários meses suprimido e o T4 livre passa a ser o exame escolhido para monitorizar a função tireoidiana até que o TSH volte à normalidade.

Disfunção tireoidiana na gravidez – A mulher grávida pre-cisa de muito mais iodo do que a não grávida. A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda a ingestão diária de 250 µg/dia de iodo durante a gravidez e 150 µg/dia para mu-lheres não grávidas. Por isso se recomenda que as gestantes fa-çam uso de multivitamínicos para suplementar iodo durante este período. Esse aumento das necessidades de iodo ocorre de-vido ao clearance renal aumentado de iodo e ao iodo desviado para a unidade fetoplacentária.5

Os hormônios tireoidianos atravessam a barreira placentária antes e após o início da função tireoidiana fetal. Os recepto-res de T3 no cérebro fetal já podem ser identificados ao redor da décima semana,6 porém, como o desenvolvimento cerebral mais rápido começa no início do segundo trimestre, a suple-mentação de hormônio tireoidiano da mãe por meio da barrei-ra placentária é fundamental para se evitar déficit neurológico irreversível na criança.

A meta, durante a gravidez, é manter as concentrações de TSH em valores menores que 2,5 µUI/ml no primeiro trimestre, e menores do que 3 µUI/ml no segundo e terceiro trimestres.5,7,8

REFERÊNCIAS1. Ross DS, Ardisson LJ, Meskell MJ. Measurement of thyrotropin in clinical

and subclinical hyperthyroidism using a new chemiluminescent assay. J Clin Endocrinol Metab. 1989;69(3):684-8.

2. Surks MI, Hollowell JG. Age-specific distribution of serum thyrotropin and antithyroid antibodies in the US population: implications for the prevalence of subclinical hypothyroidism. J Clin Endocrinol Metab. 2007;92(12):4575-82.

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):49-51.

Orsine Valente 51

3. Elkins R. The free hormone hypothesis and measurement of free hormones. Clin Chem. 1992;38(7):1289-93.

4. Carr D, McLeod DT, Parry G, Thornes HM. Fine adjustment of thyroxine replacement dosage: comparison of the thyrotrophin releasing hormone test using a sensitive thyrotrophin assay with measurement of free thyroid hormones and clinical assessment. Clin Endocrinol (Oxf). 1988;28(3):325-33.

5. Abalovich M, Amino N, Barbour LA, et al. Management of thyroid dysfunction during pregnant and postpartum: an Endocrine Society Clinical Practice Guideline. J Clin Endocrinol Metab. 2007;92(8 Suppl):S1-47.

6. Morreale de Escobar G, Obregon MJ, Escobar del Rey F. Role of thyroid hormone during early brain development. Eur J Endocrinol. 2004;151 Suppl 3:U25-37.

7. Stagnaro-Green A, Abalovich M, Alexander E, et al. Guidelines of the American Thyroid Association for the diagnosis and management of thyroid disease during pregnancy and postpartum. Thyroid. 2011;21(10):1081-125.

8. Cooper DS, Biondi B. Subclinical thyroid disease. Lancet. 2012;379(9821):1142-54.

INFORMAÇÕESEndereço para correspondência:Orsine ValenteAv. Moema, 265 — 3o andar — CJ 33/34Moema — São Paulo (SP) CEP 04077-020Tel. (11) 5051-1904/5052-2670E-mail: [email protected]

Fonte de fomento: nenhuma declaradaConflito de interesse: nenhum declarado

Esta seção é um serviço público da Revista Diagnóstico & Tratamento. As in-formações e recomendações contidas neste artigo são apropriadas na maio-ria dos casos, mas não substituem o diagnóstico do médico. Esta página pode ser fotocopiada não comercialmente por médicos e outros profissionais de saúde para compartilhar com os pacientes.

Data de entrada: 15 de julho de 2012Data da última modificação: 9 de novembro de 2012Data de aceitação: 27 de novembro de 2012

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):52-3.

Destaques Cochrane

Agonistas parciais dos receptores de nicotina para a cessação do tabagismoAutora da tradução:

Rachel RieraI

Autor dos comentários independentes:

Igor Bastos PolonioII

RESUMOIntrodução: Os agonistas parciais dos receptores de nicotina

podem ajudar as pessoas a deixar de fumar por meio da manu-tenção de níveis moderados de dopamina para contrabalançar os sintomas de abstinência (atuando como agonistas) e da redu-ção da satisfação de fumar (agindo como antagonistas).

Objetivos: Avaliar a eficácia e a tolerabilidade dos agonistas parciais do receptor de nicotina, incluindo citisina, dianiclina e vareniclina para cessação do tabagismo.

Métodos de busca: Foram realizadas buscas por estudos no Cochrane Tobacco Addiction Group’s Specialised Register utilizando-se os termos “cytisine” or “Tabex” or “dianicline” or “varenicline” or “nicotine receptor partial agonist” no título, no resumo, ou como palavras-chave. Este registro especializado é formado a partir de pesquisas no Medline, Embase, PsycINFO e Web of Science usando termos MeSH e texto livre para iden-tificar ensaios clínicos controlados de intervenções para cessa-ção e prevenção do tabagismo. Os autores entraram em contato com os autores dos estudos para obter informações comple-mentares, se necessário. A atualização mais recente deste regis-tro especializado foi em dezembro de 2011. Os autores também procuraram em bases online de registros de ensaios clínicos.

Critérios de seleção: Foram incluídos ensaios clínicos ran-domizados que compararam as medicações listadas acima com placebo, bupropiona e adesivos de nicotina. Foram excluídos estudos que não relataram um período de acompanhamento mínimo de seis meses a partir do início do tratamento.

Coleta de dados e análise: Foram extraídos os dados sobre tipo de participante, dose e duração do tratamento, medidas de resul-tados, procedimento de randomização, ocultação de alocação e acompanhamento. O desfecho principal foi a abstinência do fumo durante o acompanhamento. Foi usada a definição mais rigorosa de abstinência. Quando apropriado, as razões de risco (RR) foram agrupadas utilizando um modelo de efeito fixo (Mantel-Haenszel).

Principais resultados: Dois recentes ensaios clínicos com citisina (n = 937) mostraram que mais participantes que

usaram citisina pararam de fumar em comparação com o place-bo durante o maior período de acompanhamento, com um RR combinado de 3,98 (intervalo de confiança de 95% [IC] = 2,01 a 7,87). Um estudo com dianiclina (n = 602 pessoas) não con-seguiu encontrar evidências de que ela foi eficaz (RR = 1,20; IC95% = 0,82 a 1,75). Quinze ensaios clínicos compararam vareniclina com placebo e três deles também incluíram um bra-ço de tratamento com bupropiona. Foi encontrado um estu-do aberto comparando vareniclina mais aconselhamento com aconselhamento sozinho, um ensaio clínico comparando vare-niclina com placebo na prevenção de recaídas, e dois estudos abertos comparando vareniclina com a terapia de reposição de nicotina (NRT). Também foi incluído um ensaio clínico com vareniclina associada a suporte comportamental online e/ou por telefone. Este ensaio não foi incluído na análise, mas contribuiu para os dados de segurança e tolerabilidade. Os estudos citados incluíram no total 12.223 participantes, dos quais 8.100 utili-zaram vareniclina. A RR combinada para a abstinência contí-nua ou sustentada em seis meses ou mais para a vareniclina na dose padrão versus placebo foi de 2,27 (IC 95% = 2,02 a 2,55; 14 estudos; n = 6.166 pessoas, excluindo um estudo que ava-liou a segurança no longo prazo). A vareniclina em doses mais baixas ou variáveis também se mostrou eficaz, com um RR de 2,09 (IC 95% = 1,56 a 2,78; quatro estudos; n = 1.272 pesso-as). A RR combinada para a vareniclina contra a bupropiona, durante um ano, foi de 1,52 (IC 95% = 1,22 a 1,88; três estu-dos; n = 1.622 pessoas). O RR para a vareniclina contra NRT para a prevalência de abstinência pontual em 24 semanas foi de 1,13 (IC 95% = 0,94 a 1,35; dois estudos; n = 778 pessoas). Os dois estudos que testaram a utilização de vareniclina, além do regime padrão de 12 semanas, mostraram que a medicação foi bem tolerada durante o uso prolongado. O principal efeito adverso da vareniclina foi náusea, que foi, na maioria das vezes, leve a moderada e, geralmente, diminuiu ao longo do tempo. Uma metanálise de relatos de eventos adversos graves ocorri-dos durante ou após o tratamento ativo, e não necessariamente

ICoordenadora assistente do Centro Cochrane do Brasil (CCB). Professora adjunto da Disciplina de Medicina de Urgência e Medicina Baseada em Evidências da Escola Paulista de Medicina — Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp).IIProfessor de Pneumologia, Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Coordenador do Ambulatório de Tratamento do Tabagismo, Santa Casa de São Paulo.

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):52-3.

Rachel Riera | Igor Bastos Polonio 53

devidos ao tratamento, sugere que pode haver aumento de um terço na chance de efeitos adversos graves em pessoas que usam a vareniclina (RR = 1,36; IC 95% = 1,04 a 1,79; 17 estudos; n = 7.725 pessoas), mas esses achados ainda precisam ser compro-vados posteriormente. Dados de segurança pós-comercialização têm levantado questões sobre uma possível associação entre vare-niclina e humor depressivo, agitação, ideação ou comportamento suicida. Até agora, os relatórios de vigilância e análises secundá-rias de dados de estudos não são conclusivos, mas a possibilidade de uma ligação entre a vareniclina e eventos psiquiátricos graves ou cardiovasculares não pode ser descartada.

Conclusão dos autores: A citisina aumenta as chances de parar de fumar, embora taxas absolutas de abandono tenham sido modestas em dois estudos recentes. A vareniclina na dose padrão aumentou as chances de parar de fumar com sucesso no longo prazo entre duas e três vezes em comparação com tentativas não farmacológicas. Regimes de dose mais baixa tam-bém conferiram benefícios para a cessação do tabagismo, além de reduzir a incidência de eventos adversos. Mais participantes abandonaram o tabagismo com vareniclina do que com bupro-piona. Dois ensaios abertos da vareniclina contra NRT sugeri-ram um benefício modesto da vareniclina, mas os intervalos de confiança não descartaram equivalência. Evidências limitadas sugerem que a vareniclina pode ter um papel na prevenção de recaídas. O principal efeito adverso da vareniclina é a náusea, mas leve a moderada, e tendendo a diminuir com o tempo. Possíveis associações com eventos adversos graves, incluindo eventos psiquiátricos graves ou cardiovasculares, não podem ser descartadas. Futuros ensaios clínicos com citisina podem tes-tar esquemas mais prolongados e um suporte comportamental mais intensivo. Ainda são necessários ensaios clínicos para ava-liar a eficácia da vareniclina por período superior a 12 semanas.

REFERÊNCIA1. Cahill K, Stead LF, Lancaster T. Nicotine receptor partial agonists for smoking

cessation. Cochrane Database Syst Rev. 2012;(4):CD006103.

INFORMAÇÕESEste é um resumo de uma revisão Cochrane publicada na Cochrane Database of Systematic Reviews (CDSR) 2012, edição 4, DOI: 10.1002/14651858.CD006103.pub6 (http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/14651858.CD006103.pub6/abstract). Para citação completa e detalhes dos autores, veja a referência 1.

Tradução e adaptação:Centro Cochrane do BrasilRua Pedro de Toledo, 598Vila Clementino — São Paulo (SP)CEP 04039-001Tel. (11) 5579-0469/5575-2970E-mail: [email protected]://www.centrocochranedobrasil.org.br/

O texto completo desta revisão está disponível gratuitamente em: http://www.cochranejournalclub.com/smoking-cessation-clinical/pdf/CD006103.pdf

COMENTÁRIOSOs agonistas parciais dos receptores de nicotina são drogas

eficazes para o tratamento do tabagismo,1 conforme demonstra-do em diversos estudos. A droga mais estudada é a vareniclina. A principal preocupação é o risco de suicídio. Nesse sentido, um estudo de coorte publicado em 2009 não encontrou evidência de aumento do risco de suicídio estudando 80.660 homens e mulheres que receberam vareniclina e bupropiona.2 Outra preo-cupação importante que tem surgido na literatura é sobre o risco cardiovascular durante o uso da vareniclina. Sabe-se que pacien-tes tabagistas têm maior risco cardiovascular e este é proporcio-nal ao número de cigarros fumados.3 Uma metanálise4 encontrou aumento do risco cardiovascular associado a vareniclina, porém, outra mais recente não encontrou risco cardiovascular, mesmo nos pacientes com história de doença cardiovascular.5

REFERÊNCIAS1. Cahill K, Stead LF, Lancaster T. Nicotine receptor partial agonists for smoking

cessation. Cochrane Database Syst Rev. 2012;(4):CD006103.2. Gunnell D, Irvine D, Wise L, Davies C, Martin RM. Varenicline and suicidal

behaviour: a cohort study based on data from the General Practice Research Database. BMJ. 2009;339:b3805.

3. Teo KK, Ounpuu S, Hawken S, et al. Tobacco use and risk of myocardial infarction in 52 countries in the INTERHEART study: a case-control study. Lancet. 2006;368(9536):647-58.

4. Singh S, Loke YK, Spangler JG, Furberg CD. Risk of serious adverse cardiovascular events associated with varenicline: a systematic review and meta-analysis. CMAJ. 2011;183(12):1359-66.

5. Prochaska JJ, Hilton JF. Risk of cardiovascular serious adverse events associated with varenicline use for tobacco cessation: systematic review and meta-analysis. BMJ. 2012;344:e2856.

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):54-5.

Destaques Cochrane

Imersão em água fria (crioterapia) para prevenir e tratar a dor muscular após o exercícioAutora da tradução:

Rachel RieraI

Autor dos comentários independentes:

Marco Túlio CostaII

RESUMOIntrodução: Muitas estratégias são utilizadas com a intenção

de prevenir ou minimizar a dor muscular tardia e a fadiga após o exercício. Imersão em água fria com temperaturas inferiores a 15 °C é atualmente uma das estratégias mais populares utiliza-das após o exercício.

Objetivo: Determinar os efeitos da imersão em água fria no manejo da dor muscular após o exercício.

Métodos de busca: Em fevereiro de 2010, os autores realiza-ram busca nas bases de dados Cochrane Bone, Joint and Muscle Trauma Group Specialised Register, Cochrane Central Register of Controlled Trials (The Cochrane Library (2010, Edição 1), Medline, Embase, Cumulative Index to Nursing and Allied Health (CINAHL), British Nursing Index and archive (BNI) e Physiotherapy Evidence Database (PEDro). Também busca-ram nas listas de referência de artigos, fizeram busca manual em revistas e anais de conferências e contataram especialistas. Em novembro de 2011, os autores refizeram a busca na Central (2011, Edição 4), Medline (até semana 3 de novembro de 2011), Embase (até semana 46 de 2011) e CINAHL (até 28 de novembro de 2011) para verificar as publicações mais recentes.

Critérios de seleção: Ensaios clínicos randomizados e qua-si-randomizados que comparam o efeito da imersão em água fria após o exercício com: intervenção passiva (repouso/não intervenção), imersão de contraste, imersão em água quente, recuperação ativa, compressão, ou imersão em água fria com duração/esquema diferentes. Os principais desfechos foram dor (dor muscular) ou sensibilidade (dor à palpação), e recu-peração subjetiva (voltar às atividades anteriores sem sinais ou sintomas).

Coleta e análise dos dados: Três autores, independente-mente, avaliaram a qualidade do estudo e extraíram os dados. Alguns dos dados foram obtidos após correspondência com o autor ou extraídos a partir dos gráficos dos artigos dos estudos. Sempre que possível, os dados foram agrupados utilizando o modelo de efeito fixo.

Principais resultados: Dezessete pequenos ensaios foram incluídos, envolvendo um total de 366 participantes. A quali-dade dos estudos foi baixa. A temperatura, duração e frequên-cia da imersão em água fria variaram entre os diferentes en-saios, bem como os exercícios e a situação clínica. A maioria dos estudos não realizou uma vigilância ativa pré-definida de eventos adversos. Quatorze estudos compararam imersão em água fria com intervenção passiva. Resultados agrupados para dor muscular apresentaram efeitos estatisticamente significa-tivos a favor da imersão em água fria após o exercício em 24 horas (diferença média padronizada [DMP] = -0,55; intervalo de confiança [IC 95%] = -0,84 a -0,27; 10 ensaios), 48 horas (DMP = -0,66; IC 95% = -0,97 a -0,35; oito ensaios), 72 horas (DMP = -0,93; IC 95% = -1,36 a -0,51; quatro ensaios) e 96 horas (DMP = -0,58; IC 95% = -1,00 a -0,16; cinco ensaios). Estes resultados foram heterogêneos. Análise exploratória de subgrupos mostrou que estudos usando desenhos cross-over ou exercícios com corridas apresentaram efeitos significativamente maiores a favor da imersão em água fria. Resultados obtidos a partir de dois estudos encontraram que os grupos de imer-são em água fria tiveram classificações significativamente mais baixas de fadiga (diferença média [DM] = - 1,70; IC 95% = -2,49 a -0,90; escala de 10 unidades, do melhor para o pior), e avaliações potencialmente melhores de recuperação física (DM = 0,97; IC 95% = -0,10 a 2,05, escala de 10 unidades, do pior para o melhor) imediatamente após o fim da imersão em água fria. Cinco estudos compararam imersão em água fria com imersão de contraste. Os dados obtidos para a dor não mostraram nenhuma evidência de diferenças entre os dois gru-pos em quatro tempos de acompanhamento (imediatamente, 24, 48 e 72 horas após o tratamento). Achados similares foram encontrados para análise de dados agregados em 24, 48 e 72 horas de acompanhamento nos quatro estudos comparando imersão em água fria com imersão em água quente. Ensaios únicos compararam imersão em água fria com a recuperação

ICoordenadora assistente do Centro Cochrane do Brasil (CCB). Professora adjunto da Disciplina de Medicina de Urgência e Medicina Baseada em Evidências da Escola Paulista de Medicina – Universidade Federal de São Paulo (EPM-Unifesp).IIMédico assistente do Grupo do Pé e Tornozelo da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):54-5.

Rachel Riera | Marco Túlio Costa 55

ativa, compressão e uma segunda dose de imersão em água fria durante 24 horas.

Conclusão dos autores: Há alguma evidência de que a imer-são em água fria reduz a dor muscular de início tardio após o exercício em comparação com intervenções passivas envolven-do repouso ou nenhuma intervenção. Não há evidências sufi-cientes para conclusões sobre outros desfechos ou sobre outras comparações. A maioria dos estudos não realizou vigilância ati-va pré-definida de eventos adversos. Pesquisas de alta qualidade e bem relatadas nesta área são necessárias.

REFERÊNCIA1. Bleakley C, McDonough S, Gardner E, et al. Cold-water immersion

(cryotherapy) for preventing and treating muscle soreness after exercise. Cochrane Database Syst Rev. 2012;(2):CD008262.

INFORMAÇÕESEste é um resumo de uma revisão Cochrane publicada na Cochrane Database of Systematic Reviews (CDSR) 2012, edição 2, DOI: 10.1002/14651858.CD008262.pub2. (http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/14651858.CD008262.pub2/abstract). Para citação completa e detalhes dos autores, ver a referência 1.

Tradução e adaptação:Centro Cochrane do BrasilRua Pedro de Toledo, 598Vila Clementino — São Paulo (SP)CEP 04039-001Tel. (11) 5579-0469/5575-2970E-mail: [email protected]://www.centrocochranedobrasil.org.br/

O texto completo desta revisão está disponível gratuitamente em: http://www.cochranejournalclub.com/cryotherapy-preventing-treating--muscle-soreness-exercise/pdf/CD008262.pdf

COMENTÁRIOSA aplicação de gelo após atividade física para prevenção e

tratamento da dor muscular é uma prática comum entre es-portistas e fisioterapeutas. Este artigo tem como objetivo deter-minar, utilizando revisão sistemática da literatura, os efeitos da imersão em água gelada (crioterapia) na prevenção e tratamen-to da dor muscular após atividade física. Buscou-se também determinar a eficácia da crioterapia em comparação com pla-cebo, com imersão em água quente e com contraste (imersão em água gelada seguida da imersão em água quente). Artigos que compararam a imersão em água gelada com intervenções farmacológicas foram excluídos. Dezessete estudos randomiza-dos controlados foram incluídos nesta revisão, no total de 366 pacientes, a maioria homens. Os autores concluíram que há evidências favoráveis à imersão em água gelada para prevenção e tratamento da dor muscular após atividade física. Apesar dos resultados significativos quando comparados ao placebo, não foi possível encontrar evidências de que a crioterapia tenha re-sultados superiores à imersão em água quente ou ao contraste.

Do mesmo modo, não foi possível determinar o método de aplicação ideal (temperatura da água, tempo de imersão, nú-mero de repetições). Não foram encontrados relatos de compli-cações após crioterapia.

Embora a crioterapia seja amplamente empregada no nos-so meio, e com artigos publicados relatando parecer favorável, faltam ainda estudos criteriosos, com alto nível de evidência, para determinar a eficácia e o melhor método da imersão em água gelada, tanto para prevenção como para tratamento da dor muscular após a atividade física.

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):56-7.

Carta ao editor

Mudanças no currículo médicoMauricio Alves RibeiroI, Luiz Arnaldo SzutanII

Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP)

Na última edição desta revista, Mariani e Pêgo-Fernandes publicaram excelente editorial sobre a utilização de simulação e realidade virtual no ensino médico.1 Muitas questões devem ser analisadas a respeito do impacto e da necessidade de adoção de novas práticas, de novos currículos na formação dos médicos e dos médicos residentes.

A adoção da simulação médica deve ser estimulada, pois per-mite um treinamento realista de procedimentos invasivos, em que se podem cometer erros sem riscos para os pacientes, além de ser um eficiente método de aprendizado com diminuição dos erros.2

Alguns aspectos são relevantes na simulação médica, como a diminuição da curva de aprendizado em pacientes, a sua se-gurança, bem como a possibilidade de acreditação em procedi-mentos médicos. Inúmeras são as modalidades de simulação, tais como: ambiente, manequim, baseadas em computação, realidade virtual e sistemas hápticos, além da integração entre estes. Dentre as possibilidades, a simulação por realidade virtual parece ser a mais interessante, pois permite um treinamento repetitivo e ilimitado, com feedback imediato e detalhado e re-dução do nível de estresse proporcionando diminuição das cur-vas de aprendizado. Existem, porém, muitas dificuldades para a simulação, entre elas: estabelecimento da importância de simu-lações para professores e médicos, a falta de instrutores, a falta de um currículo específico para cada nível de educação médica e estudos especializados, a criação de centros de simulação e os custos dos simuladores.

Novos currículos são necessários e, neste contexto, recente es-tudo clínico randomizado,3 comparou a formação habitual com um currículo alternativo com três etapas: simulação em realidade virtual, treinamento cognitivo (leituras e vídeos selecionados) e treinamento em cadáver, e demonstraram que os alunos do se-gundo grupo apresentaram melhor conhecimento técnico e na sala cirurgia em cirurgia colorretal laparoscópica, ou seja, é ne-cessária a discussão sobre o currículo a ser adotado. Além dis-so, envolver os alunos precocemente é fundamental, pois já foi demonstrado que o impacto da realidade virtual e simulação é menor nos mais experientes,4 provavelmente devido ao ganho

de habilidade já obtido com os pacientes, com todos os riscos envolvidos.

Muitos discutem qual o melhor ambiente para um centro de simulação: hospitais, escolas médicas ou sociedades médicas, provavelmente a associação desses ambientes seja fundamental para a viabilização da simulação no ensino médico.

A Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo possui um centro de treinamento e simulação e progres-sivamente vem adotando o uso da simulação no ensino médico. Entretanto, algumas das dificuldades aqui apresentadas estão presentes.

Aperfeiçoar a prática médica através de simulação causa um reforço multidimensional da aprendizagem e experiência, per-mitindo que ocorra aquisição, desenvolvimento e manutenção de habilidades, com posterior validação, acarretando uma me-lhora da assistência ao paciente e competência do profissional, o que acabará por reduzir os custos.5

Além disso, a simulação pode ser usada para a verificação de formação, não importando qual o nível de formação. Será que todos os residentes de cirurgia, por exemplo, estão obten-do treinamento equivalente em laparoscopia em um mesmo ou diversos serviços?

Será que podemos testar a experiência dos nossos formandos apenas com exames escritos ou orais? Será que a realização de exames em simuladores não seria uma forma mais adequada de testar nossos alunos? Sem dúvida, a utilização de provas prá-ticas nos exames de acesso à residência médica foi um avanço importante, mas a adoção de simulação por realidade virtual deve ser o próximo passo.

Alguns discutem também a possibilidade de certificação por simulação, o que permitiria, a partir de casos e assistentes pa-dronizados, e de normas para o desempenho esperado definido por especialistas experientes, avaliar se um profissional estaria ou não capacitado para determinado procedimento.

Sem dúvida, o editorial abre espaço para trazer as socieda-des médicas e sua comunidade à necessidade de discutir como devemos ensinar medicina nos dias de hoje e como iremos ensinar no futuro.

IProfessor Instrutor Mestre da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP). Médico Assistente do Grupo de Fígado e Hipertensão Portal e do Serviço de Emergência do Departamento de Cirurgia da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (ISCMSP). Supervisor da Residência de Cirurgia Geral do Hospital e Maternidade São Cristóvão.IIProfessor Adjunto Doutor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP). Chefe do Grupo de Fígado e Hipertensão Portal Departamento de Cirurgia da ISCMSP.

Carta ao editor

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):56-7.

Mauricio Alves Ribeiro | Luiz Arnaldo Szutan 57

REFERÊNCIAS1. Mariani AW, Pêgo-Fernandes PM. Ensino médico: simulação e realidade

virtual. Diagn Tratamento. 2012;17(2):47-8.2. Seymour NE, Gallagher AG, Roman SA, et al. Virtual reality training improves

operating room performance: results of a randomized, double-blinded study. Ann Surg. 2002;236(4):458-63; discussion 463-4.

3. Palter VN, Grantcharov TP. Development and validation of a comprehensive curriculum to teach an advanced minimally invasive procedure: a randomized controlled trial. Ann Surg. 2012;256(1):25-32.

4. Moore AK, Grow DR, Bush RW, Seymour NE. Novices outperform experienced laparoscopists on virtual reality laparoscopy simulator. JSLS. 2008;12(4): 358-62.

5. Ikonen TS, Antikainen T, Silvennoinen M, et al. Virtual reality simulator training of laparoscopic cholecystectomies - a systematic review. Scand J Surg. 2012;101(1):5-12.

INFORMAÇÕESEndereço para correspondência: Mauricio Alves Ribeiro Rua Padre Vieira, 472Jardim – Santo André (SP)CEP 09090-720Tel. (11) 2176-7270E-mail: [email protected]

Fonte de fomento: nenhuma declaradaConflito de interesse: nenhum declarado

Data de entrada: 30 de agosto de 2012 Data da última modificação: 6 de setembro de 2012Data de aceitação: 12 de setembro de 2012

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Diagn Tratamento. 2013;18(1):58-9.

Carta ao editor

Por um verdadeiro bônus à medicina brasileiraPedro Tadao Hamamoto FilhoI

Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista (FMB/Unesp)

Prezado Editor,

Com relação ao recente editorial deste periódico,1 que tra-ta do ônus que o Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica (Provab) traz aos profissionais, na verdade os desvalorizando, há que se concordar que, deveras, os fins não justificarão os meios. Trata-se de paliativo para o problema na-cional de desarticulação entre políticas educacionais e políticas de saúde.

Convém acrescentar à discussão alguns dados:1. O número de médicos no país é crescente e supera o cres-

cimento populacional. Em 1950, havia 0,36 médicos por 1.000 habitantes. Em 1990, a relação passou para 1,49; em 2010, para 1,91. A projeção para 2028 é que essa relação chegue a 2,53.2,3

2. Esse aumento se deve ao crescimento do número de cursos de medicina no Brasil, principalmente nas duas últimas déca-das. Há, hoje, 185 cursos de medicina – 99 dos quais foram criados a partir de 1996, sendo a maioria deles de instituições privadas.4,5

3. O número de programas de residência médica, por outro lado, não acompanhou esse ritmo, tornando os concursos para residência médica cada vez mais concorridos, estimu-lando a criação de cursinhos preparatórios para as provas de residência médica.6 A partir disso, fica evidente uma situação em que a iniciativa privada investe na abertura de cursos de medicina, mas não na especialização dos médicos, que é fi-nanciada majoritariamente pelo setor público.5

4. Apesar do aumento do número de médicos no país, sua dis-tribuição permanece muito heterogênea, com uma evidente concentração de médicos nas regiões Sudeste e Sul. Na re-gião Norte, a relação de médicos por 1.000 habitantes é de 0,98; na região Sudeste, de 2,61.3

5. Essa heterogeneidade também acontece na distribuição dos programas e vagas de residência médica: a região Norte ofe-rece 3% das vagas; a Nordeste, 14%; a Centro-Oeste, 7%; a Sul, 16%; e a Sudeste, 60%.5

Assim, o Brasil está na berlinda de um contingente crescente de médicos recém-formados que buscam em serviços públicos de atenção à saúde e de pronto-atendimento oportunidades de traba-lho temporário até que consigam uma vaga de residência médica num grande centro do país.6 Essa situação tem precarizado o tra-balho médico e o próprio sistema de saúde.

Por outro lado, levantamentos feitos pelo Conselho Nacional de Residência Médica têm mostrado que um dos fatores mais importantes na fixação de profissionais em localidades menos favorecidas é a residência médica. A chance de um profissional exercer a medicina no Acre, por exemplo, é maior se ele cursar seu programa de residência médica lá. O mesmo não acontece com a mesma intensidade se ele apenas cursar a graduação lá.7 Essas conclusões são similares às de estudo realizado no Canadá.8

Assim, é imperativo às esferas governamentais investir em determinados programas de residência médica em áreas estratégicas do território nacional. Esses programas poderão prover médicos às localidades que mais necessitam, pois poderão fixá-los. E por que programas de residência médica fixam profissionais? Porque, com a criação dos programas, abrem-se caminhos para melhorias de condições de trabalho onde os programas acontecem – tanto em termos de infraestrutura e parque tecnológico, como da presença de profissionais da saúde de diversas áreas. Os programas de residência médica são estratégicos para a consolidação do sistema de saúde local.

Estamos tratando, portanto, de investimento financeiro e pessoal na saúde. Com boas condições de trabalho, o médico é valorizado – principalmente na atenção básica.

Há, entretanto, o problema do não preenchimento de vagas de residência médica em áreas básicas, como Medicina de Família e Comunidade. Há que se equacionar essa questão – afinal de contas, para trabalhar no Programa de Saúde da Família (PSF), não é necessária especialização na área. E o salário do PSF pago pela maioria dos municípios é superior ao valor das bolsas de residência médica. Que incentivo o egresso tem para fazer a espe-cialização? Não pode ser outro que não a carreira de Estado – já bem defendida no referido editorial.1

IMédico-residente em Neurocirurgia, Departamento de Neurologia, Psicologia e Psiquiatria, Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista (FMB/Unesp).

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Cabe, então, questionar: como o Provab valorizará a formação especializada para a atenção básica? Como fará, se o maior estímu-lo para o médico participar do Provab é a perspectiva de bônus para cursar uma residência médica concorrida? Naturalmente, um candidato a Medicina de Família e Comunidade, pela sobra de vagas, não necessita de qualquer bônus para o concurso. Os inte-ressados no bônus são os candidatos de especialidades mais concor-ridas (aquelas com grande influência de mercado). Assim, o maior incentivo para participar do Provab é poder, depois de um ou dois anos, sair da atenção básica!

Além disso, se a participação nessa espécie de “serviço civil” confere bônus nas provas de residência médica, a participação no já instituído Serviço Militar também poderia prover bônus aos seus médicos.

Para valorizar a atenção básica, é mister investir no sistema de saúde e oferecer aos médicos boas condições de trabalho. O investimento em saúde pode ser otimizado com a criação de programas de residência médica com as especialidades neces-sárias às localidades menos favorecidas. Para isso, é preciso es-tabelecer políticas que atendam às demandas de determinados especialistas em determinadas áreas – políticas que deverão se pautar em estudos das necessidades de especialistas para dife-rentes populações.9

Não precisamos de bônus para concursos de residência médica. Residência médica não é moeda de troca. Se nós de-sejamos um verdadeiro bônus para a Medicina brasileira – e para o Sistema de Saúde, precisamos investir em residência médica, o que significa, em última análise, equilibrar políticas educacionais e políticas de saúde.

REFERÊNCIAS1. Auler Junior JOC, Pêgo-Fernandes PM, Bibas BJ. Bônus? Não, somente ônus.

Diagn Tratamento. 2012;17(3):99-100.2. Conselho Federal de Medicina. Conselho Regional de Medicina do Estado de

São Paulo. Demografia Médica no Brasil. Estudo de Projeção “Concentração de Médicos no Brasil em 2020”. Disponível em: http://www.cremesp.org.br/pdfs/EstudoDemografiaMedica13Julho18horas.pdf. Acessado em 2012 (4 out).

3. Scheffer M, Biancarelli A, Cassenote A, et al. (coord.) Demografia Médica no Brasil. Vol 1. Dados gerais e descrições de desigualdades. São Paulo: Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo: Conselho Federal de Medicina; 2011. Disponível em: http://www.cremesp.org.br/pdfs/demografia_2_dezembro.pdf. Acessado em 2012 (4 out).

4. Bueno RRL, Pieruccini MC. Abertura de escolas de medicina no Brasil: relatório de um cenário sombrio. Brasília: Conselho Federal de Medicina; 2004. Disponível em: http://www.amb.org.br/escolas_abertura.pdf. Acessado em 2012 (4 out).

5. Ribeiro MAA. Apontamentos sobre Residência Médica no Brasil. Brasília: Biblioteca Digital da Câmara dos Deputados; 2011. Disponível em: http://bd.camara.gov.br/bd/bitstream/handle/bdcamara/6065/apontamentos_residencia_ribeiro.pdf?sequence=1. Acessado em 2012 (4 out).

6. Hamamoto Filho PT, Zeferino AMB. Cursinhos preparatórios para residência médica: reflexões sobre possíveis causas e consequências [Preparatory courses for medical residency: reflections on possible causes and consequences]. Rev Bras Educ Med. 2011;35(4):550-6.

7. Nunes MPT, Michel JLM. Iniciativas educacionais relacionadas ao provimento e fixação de médicos no SUS. Graduação e residência médica como fatores de fixação de médicos. Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/apres_14m_maria_e_jeanne.pdf. Acessado em 2012 (4 out).

8. Mathews M, Rourke JT, Park A. National and provincial retention of medical graduates of Memorial University of Newfoundland. CMAJ. 2006;175(4): 357-60.

9. Michel JLM, Oliveira RAB, Nunes MPT. Residência médica no Brasil. Cadernos ABEM. 2011;7:7-12.. Disponível em: http://www.abem-educmed.org.br/pdf/caderno_abem7.pdf. Acessado em 2012 (4 out).

INFORMAÇÕESEndereço para correspondência:Pedro Tadao Hamamoto FilhoUniversidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp)Campus de Botucatu Distrito de Rubião Junior, s/nBotucatu (SP)CEP 18618-970E-mail: [email protected]

Fonte de fomento: nenhuma declaradaConflito de interesse: nenhum declarado

Data de entrada: 1o de outubro de 2012Data da última modificação: 1o de outubro de 2012Data de aceitação: 18 de outubro de 2012

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Instruções aos autores

INDEXAÇÃO E ESCOPOA Revista Diagnóstico & Tratamento (ISSN 1413-9979) tem por objetivo oferecer

atualização médica, baseada nas melhores evidências disponíveis, em artigos escritos por especialistas. Seus artigos são indexados na base de dados Lilacs (Literatura Latino--Americana e do Caribe em Ciências da Saúde). São aceitos artigos originais (ensaios clínicos, estudos coorte, estudos caso-controle, revisões sistemáticas, estudos transver-sais, avaliações econômicas), relatos de caso, revisões narrativas da literatura (artigos de atualização) e cartas ao editor, que devem enquadrar-se nas normas editoriais dos manuscritos submetidos a revistas biomédicas (do International Committe of Medical Journal Editors1).

POLÍTICAS E PROCEDIMENTOS DA REVISTAApós o recebimento do manuscrito pelo setor de Publicações Científicas, os autores

receberão um número de protocolo que servirá para manter o bom entendimento entre os autores e o setor. Em seguida, o artigo será lido pelo editor, que verificará se está de acordo com a política e o interesse da revista. Em caso afirmativo, o setor de Publicações Científicas vai verificar se o texto cumpre as normas de publicação expressas nestas Instruções para Autores. Se o texto estiver incompleto ou se não estiver organizado como exigido, os autores deverão resolver os problemas e submetê-lo novamente.

Quando o formato estiver aceitável, o setor enviará o trabalho para a revisão por pares, na qual os revisores não assinarão seus veredictos e não conhecerão os nomes dos autores do trabalho. Cada manuscrito será avaliado por dois revisores: um especialista no assunto e um consultor ad hoc (que vai avaliar aspectos metodológicos do trabalho); as discordâncias serão resolvidas pelos editores.

Os autores então receberão a avaliação e será solicitado que resolvam os problemas apontados. Uma vez que o setor de Publicações Científicas receba o texto novamente, o artigo será enviado ao editor científico e revisor de provas, que identificará problemas na construção de frases, ortografia, gramática, referências bibliográficas e outros. Os autores deverão providenciar todas as informações e correções solicitadas e deverão marcar , no texto, todos os pontos em que realizaram modificações, utilizando cores diferentes ou sistemas eletrônicos de marcação de alterações, de maneira que elas fiquem evidentes.

Quando o texto for considerado aceitável para publicação, e só então, entrará na pauta. O setor de Publicações Científicas fornecerá uma prova, incluindo Tabelas e Figuras, para que os autores aprovem. Nenhum artigo é publicado sem este último procedimento.

INSTRUÇÕES PARA AUTORESDiretriz geral: para todos os tipos de artigos

Os artigos devem ser submetidos exclusivamente pela internet para o e-mail [email protected] e/ou [email protected].

O manuscrito deve ser submetido em português e deve conter um resumo e cinco palavras-chave em português, que devem ser selecionadas das listas DeCS (Descritores em Ciências da Saúde), conforme explicado em detalhes abaixo (nenhuma outra palavra-chave será aceita).

Artigos submetidos devem ser originais e todos os autores precisam declarar que o texto não foi e não será submetido para publicação em outra revista. Artigos envolvendo seres humanos (individual ou coletivamente, direta ou indireta ou indiretamente, total ou parcialmente, incluindo o gerenciamento de informações e materiais) devem ser acompanhados de uma cópia da autorização do Comitê de Ética em Pesquisa da instituição onde o experimento foi realizado.

Todo artigo submetido deve cumprir os padrões editoriais estabelecidos na Convenção de Vancouver (Requerimentos Uniformes para Manuscritos Submetidos a Revistas Biomédicas),1 e as diretrizes de qualidade para relatórios de estudos clínicos,2 revisões sistemáticas (com ou sem metanálises)3 e estudos observacionais.4 O estilo conhecido como “estilo Vancouver” deve ser usado não somente quanto ao formato de referências, mas para todo o texto. Os editores recomendam que os autores se familiarizem com esse estilo acessando www.icmje.org.

Para a classificação dos níveis de evidência e graus de recomendação de evidên-cias, a Revista Diagnóstico e Tratamento adota a nova classificação elaborada pelo Centro de Medicina Baseada em Evidências de Oxford (Centre for Evidence-Based Medicine - CEBM) e disponível em http://www.cebm.net/mod_product/design/files/CEBM-Levels-of-Evidence-2.pdf Abreviações não devem ser empregadas, mesmo as que são de uso comum. Drogas ou medicações devem ser citadas usando-se os nomes genéricos, evitando-se a menção desnecessária a marcas ou nomes comerciais. Qualquer produto citado no capítulo de Métodos, tal como equipamento diagnóstico, testes, reagentes, instrumentos, utensílios, próteses, órteses e dispositivos intraoperatórios devem ser descritos juntamente como o nome do fabricante e o local (cidade e país) de produção entre parênteses. Medicamentos administrados devem ser descritos pelo nome genérico (não a marca), seguidos

da dosagem e posologia.Para qualquer tipo de estudo, todas as afirmações no texto que não sejam resultado

da pesquisa apresentada para publicação à revista Diagnóstico & Tratamento, mas sim dados de outras pesquisas já publicadas em outros locais, devem ser acompanhadas de citações da literatura pertinente.

Os relatos de caso e as revisões narrativas deverão conter uma busca sistematizada (atenção: o que é diferente de uma revisão sistemática) do assunto apresentado, realizada nas principais bases de dados (Cochrane Library, Embase, Lilacs, PubMed, outras bases específicas do tema).

Bolsas, apoios e qualquer suporte financeiro a estudos devem ser mencionados separadamente na última página. Agradecimentos, se necessário, devem ser colocados após as referências bibliográficas.

A Diagnóstico & Tratamento apóia as políticas para registro de ensaios clínicos da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do International Committee of Medical Journal Editors (ICMJE), reconhecendo a importância dessas iniciativas para o registro e divulgação internacional de informação sobre estudos clínicos, em acesso aberto. Sendo assim, somente serão aceitos para publicação, a partir de 2007, os artigos de pesquisa clínicas que tenham recebido um número de identificação em um dos Registros de Ensaios Clínicos validados pelos critérios estabelecidos pela OMS e ICMJE, cujos endereços estão disponíveis no site do ICMJE (http://www.icmje.org/). O número de identificação deverá ser registrado ao final do resumo.

FORMATO Primeira página (capa)

A primeira página deve conter: 1) classificação do artigo (original, revisão narrativa da literatura, relato de caso e

carta ao editor);2) o título do artigo, que deverá ser conciso, mas informativo;3) o nome de cada autor (não abreviar), sua titulação acadêmica mais alta e a

instituição onde trabalha; 4) o local onde o trabalho foi desenvolvido;

Segunda página Artigos originais: a segunda página, neste caso, deve conter um resumo5 (máximo

de 250 palavras) estruturado da seguinte forma:1) contexto e objetivo; 2) desenho e local (onde o estudo se desenvolveu); 3) métodos (descritos em detalhes); 4) resultados; 5) Discussão;6) conclusões. Relatos de caso: devem conter um resumo5 (máximo de 250 palavras) estruturado

da seguinte forma:1) contexto; 2) descrição do caso;3) discussão;4) conclusões.Revisão da narrativa da literatura: deve conter um resumo (máximo de 250 palavras)

com formato livre.O resumo deve conter cinco palavras-chave, que devem ser escolhidas a partir dos

Descritores em Ciências da Saúde (DeCS), desenvolvidos pela Bireme, que estão disponíveis na internet (http://decs.bvs.br/).6

ReferênciasAs referências bibliográficas (no estilo “Vancouver”, como indicado pelo Comitê

Internacional de Editores de Revistas Biomédicas, ICMJE) devem ser dispostas na parte final do artigo e numeradas de acordo com a ordem de citação. Os números das citações devem ser inseridos após pontos finais ou vírgulas nas frases, e sobrescritos (sem parênteses ou colchetes). Referências citadas nas legendas de Tabelas e Figuras devem manter a sequência com as referências citadas no texto. Todos os autores devem ser citados se houver menos de seis; se houver mais de seis autores, os primeiros três devem ser citados seguidos de “et al.” Para livros, a cidade de publicação e o nome da editora são indispensáveis. Para textos publicados na internet, a fonte localizadora completa (URL) ou endereço completo é necessário (não apenas a página principal ou link), de maneira que, copiando o endereço completo em seus programas para navegação na internet, os leitores possam ser levados diretamente ao documento citado, e não a um site geral. A seguir estão dispostos alguns exemplos dos tipos mais comuns de referências:

Artigo em periódico• LahitaR,KlugerJ,DrayerDE,KofflerD,ReidenbergMM.Antibodiestonuclear

antigens in patients treated with procainamide or acetylprocainamide. N Engl J

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Instruções aos autores

Med. 1979;301(25):1382-5.Livro

• StyneDM,BrookCGD.Currentconceptsinpediatricendocrinology.NewYork:Elsevier; 1987.Capítulo de livro

• ReppertSM.Circadianrhythms:basicaspectsandpediatricimplications.In:StyneDM,BrookCGD,editors.Currentconceptsinpediatricendocrinology.NewYork:Elsevier; 1987. p. 91-125.Texto na internet

• WorldHealthOrganization.WHOcallsforprotectionofwomenandgirlsfromtobacco. Disponível em: http://www.who.int/mediacentre/news/releases/2010/women_tobacco_20100528/en/index.html. Acessado em 2010 (8 jun). Dissertações e teses

• NevesSRB.DistribuiçãodaproteínaIMPACTemencéfalosdecamundongos,ratos e saguis. [tese]. São Paulo: Faculdade de Medicina da Universidade Federal de São Paulo; 2009.Última página

A última página deve conter: 1) a data e o local do evento no qual o artigo foi apresentado, se aplicável, como

congressos ou defesas de dissertações ou teses; 2) fontes de apoio na forma de suporte financeiro, equipamentos ou drogas e número

do protocolo; 3) descrição de qualquer conflito de interesse por parte dos autores; 4) endereço completo, e-mail e telefone do autor a ser contatado quanto à publicação

na revista. Figuras e tabelasAs imagens devem ter boa resolução (mínimo de 300 DPI) e ser gravadas em

formato “.jpg” ou “.tif ”. Imagens não devem ser incluídas em documentos do Microsoft PowerPoint. Se as fotografias forem inseridas num documento Microsoft Word,asimagenstambémdevemserenviadasseparadamente.Gráficosdevemser preparados com o Microsoft Excel (não devem ser enviados como imagem) e devem ser acompanhados das tabelas de dados a partir dos quais foram gerados. O número de ilustrações não deve exceder o número total de páginas menos um.

Todas as figuras e tabelas devem conter legendas ou títulos que descrevam precisa-mente seu conteúdo e o contexto ou amostra a partir da qual a informação foi obtida (por exemplo, quais foram os resultados apresentados e qual foi o tipo de amostra e local). A legenda ou título devem ser curtos, mas compreensíveis independentemente da leitura do artigo.

O MANUSCRITO# Relatos de caso devem conter Introdução, Descrição do Caso, Discussão (con-

tendo a busca sistematizada sobre o tema) e Conclusão. # Artigos originais e revisões narrativas devem ser estruturados de maneira que

contenham as seguintes partes: Introdução, Objetivo, Método, Resultados, Discus-são e Conclusão. A Revista publica revisões narrativas desde que contenham busca sistematizada da literatura. O texto não deve exceder 2.200 palavras (excluindo tabelas, figuras e referências), da introdução até o final da conclusão. A estrutura do documento deve seguir o formato abaixo:

1. Introdução: as razões para que o estudo fosse realizado devem ser explicitadas, descrevendo-se o atual estado da arte do assunto. Deve ser descrito o contexto, o que se sabe a respeito. Aqui não devem ser inseridos resultados ou conclusões do estudo. No último parágrafo, deve ser especificada a principal questão do estudo e a principal hipótese, se houver. Não se deve fazer discussões sobre a literatura na introdução; a seção de introdução deve ser curta.

2. Objetivo:deveserdescritooprincipalobjetivodoestudo,brevemente.Hipótesespré-estabelecidas devem ser descritas claramente. De preferência deve-se estruturar a pergunta do estudo no formato “PICO”, onde P é a população ou problema, I é intervenção ou fator de risco, C é o grupo controle e O vem de “outcome”, ou desfecho.

3. Métodos3.1. Tipo de estudo: deve-se descrever o desenho do estudo, adequado para respon-

der a pergunta, e especificando, se apropriado, o tipo de randomização, cegamento, padrões de testes diagnósticos e a direção temporal (se retrospectivo ou prospectivo). Por exemplo: “estudo clínico randomizado”, “estudo clínico duplo-cego controlado por placebo”, “estudo de acurácia”, “relato de caso”

3.2. Local: deve ser indicado o local onde o estudo foi desenvolvido, o tipo de instituição: se primária ou terciária, se hospital público ou privado. Deve-se evitar o nome da instituição onde o estudo foi desenvolvido (para cegamento do texto para revisão): apenas o tipo de instituição deve ficar claro. Por exemplo: hospital universitário público.

3.3. Amostra, participantes ou pacientes: devem ser descritos os critérios de elegibilidade para os participantes (de inclusão e exclusão), as fontes e os proce-dimentos de seleção ou recrutamento. Em estudos de caso-controle, a lógica de distribuição de casos como casos e controles como controles deve ser descrita,

assim como a forma de pareamento. O número de participantes no início e no final do estudo (após exclusões) deve ficar claro.

3.4. Tamanho de amostra e análise estatística: descrever o cálculo do tamanho da amostra, a análise estatística planejada, os testes utilizados e o nível de signi-ficância, e também qualquer análise post hoc. Descrever os métodos usados para o controle de variáveis e fatores de confusão, como se lidou com dados faltantes (“missing data”) e como se lidou com casos cujo acompanhamento foi perdido (“loss from follow-up”).

3.5. Randomização: descrever qual foi o método usado para implementação da alocação de sequência aleatória (por exemplo, “envelopes selados contendo sequências aleatórias de números gerados por computador”). Adicionalmente, descrever quem gerou a sequência aleatória, quem alocou participantes nos grupos (no caso de estudos controlados) e quem os recrutou.

3.6. Procedimentos de intervenção, teste diagnóstico ou exposição: descrever quais as principais características da intervenção, incluindo o método, o período e a duração de sua administração ou de coleta de dados. Descrever as diferenças nas intervenções administradas a cada grupo (se a pesquisa é controlada).

3.7. Principais medidas, variáveis e desfecho: descrever o método de medida do principal resultado, da maneira pela qual foi planejado antes da coleta de dados. Afirmar quais são os desfechos primário e secundário esperados. Para cada variável de interesse, detalhar os métodos de avaliação. Se a hipótese do estudo foi formulada durante ou após a coleta de dados (não antes), isso deve ser declarado. Descrever os métodos utilizados para melhorar a qualidade das medidas (por exemplo, múltiplos observadores, treinamento etc.). Explicar como se lidou com as variáveis quantitativas na análise.

4. Resultados: descrever os principais achados. Se possível, estes devem conter os intervalos de confiança de 95% e o exato nível de significância estatística. Para estudos comparativos, o intervalo de confiança para as diferenças deve ser afirmado.

4.1. Fluxo de participantes: descreva o fluxo dos participantes em cada fase do estudo (inclusões e exclusões), o período de acompanhamento e o número de participantes que concluiu o estudo (ou com acompanhamento perdido). Considerar usar um fluxograma. Se houver análise do tipo “intenção de tratar”, esta deve ser descrita.

4.2. Desvios: se houve qualquer desvio do protocolo, fora do que foi inicialmente planejado, ele deve ser descrito, assim como as razões para o acontecimento.

4.3. Efeitos adversos: devem ser descritos quaisquer efeitos ou eventos adversos ou complicações.

5. Discussão: deve seguir a sequência: começar com um resumo dos obje-tivos e das conclusões mais relevantes; comparar métodos e resultados com a literatura; enfatizar os pontos fortes da metodologia aplicada; explicar possíveis pontos fracos e vieses; incluir implicações para a prática clínica e implicações para pesquisas futuras.

6. Conclusões: especificar apenas as conclusões que podem ser sustentadas, junto com a significância clínica (evitando excessiva generalização). Tirar con-clusões baseadas nos objetivos e hipóteses do estudo. A mesma ênfase deve ser dada a estudos com resultados negativos ou positivos.

CARTAS AO EDITORÉ uma parte da revista destinada à recepção de comentários e críticas e/ou

sugestões sobre assuntos abordados na revista ou outros que mereçam destaque. Tem formato livre e não segue as recomendações anteriores destinadas aos artigos originais, relatos de casos e revisão da literatura.

Documentos citados 1. International Committee of Medical Journal Editors. Uniform requirements

for manuscripts submitted to biomedical journals. Disponível em: http://www.icmje.org/urm_main.html. Acessado em 2010 (7 jun).

2.CONSORTTransparentReportingofTrials.WelcometotheCONSORTstatement website. Disponível em: http://www.consort-statement.org. Acessado em 2010 (7 jun).

3.MoherD,CookDJ,EastwoodS,OlkinI,RennieD,StroupDF.Impro-ving the quality of reports of meta-analyses of randomised controlled trials: the QUOROM statement. Quality of Reporting of Meta-analyses. Lancet. 1999;354(9193):1896-900.

4. STROBE Statement Strengthening the reporting of observational studies in epidemiology.Checklist on items that should be included in reports ofobservational studies. Disponível em:: http://www.strobe-statement.org/index.php?eID=tx_nawsecuredl&u=0&file=fileadmin/Strobe/uploads/checklists/STROBE_checklist_v4_combined.pdf&t=1257007091&hash=7713ea8f7f2662b288689b3dab40c1cb. Acessado em 2010 (7 jun).

5.HaynesRB,MulrowCD,HuthEJ,AltmanDG,GardnerMJ.Moreinformative abstracts revisited. Ann Intern Med. 1990;113(1):69-76.

6. BVS Biblioteca Virtual em Saúde. Descritores em Ciências da Saúde. Disponível em:: http://decs.bvs.br/. Acessado em 2010 (7 jun).

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